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A narrativa cinematográfica ___________________________________________ André Gaudreault e François Jost Universidade de Santa Cruz do Sul – Unisc Narrativas Midiáticas Audiovisuais Reconfiguradas Cristiane Lautert Soares – PROBIC/FAPERGS

A narrativa cinematográfica - André Gaudreault e François Jost

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Slide desenvolvido para o grupo de pesquisa Narrativas Midiáticas Audiovisuais Reconfiguradas. Orientação da professora Fabiana Quatrin Piccinin. Universidade de Santa Cruz do Sul - Unisc.

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Page 1: A narrativa cinematográfica - André Gaudreault e François Jost

A narrativa cinematográfica

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André Gaudreault e François Jost

Universidade de Santa Cruz do Sul – Unisc

Narrativas Midiáticas Audiovisuais Reconfiguradas

Cristiane Lautert Soares – PROBIC/FAPERGS

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Descrição do primeiro flash-back do filme Cidadão Kane, de Orson Welles, 1941.

a) Como acontece a passagem da frase manuscrita a essas imagens que parecem mostrar diretamente os acontecimentos?

b) Essa visualização/audiovisualização de uma parte das memórias é uma narrativa da mesma forma que as frases que a constituem?

c) Se sim, quem narra? Quem narra de forma escrita ou alguma instância abstrata, responsável pela ordenação das imagens?

d) As imagens e sons são apenas uma ilustração objetiva das próprias memórias ou são representações subjetivas do que o jornalista imagina ao ler as memórias? Quem vê essas imagens?

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Narrativa oral e narrativa escrita

Narrativa oral – supõe apenas um narrador explícito e uma única atividade de comunicação narrativa, efetuada face a face. É imediata, na hora, sem intermediários.

Narrativa escrita – não é entregue no mesmo momento em que é emitida. O leitor toma conhecimento da narrativa por um intermediário – livro, jornal -, que resulta de um ato de escrita anterior: uma mídia.

A narração oral se faz in praesentia enquanto a narração escritural, in absentia.

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Narratologia e cinema

Narratologia modal/da expressão – ocupa-se das formas de expressão por meio das quais alguém conta algo: formas de manifestação do narrador, materiais de expressão postos em jogo por meio de uma mídia narrativa (imagens, palavras, sons), níveis de narração, temporalidade, pontos de vista.

Narratologia temática/de conteúdo – ocupa-se da história contada, das ações, dos papéis e das relações dos personagens.

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Um precursor: Albert Laffay

Laffay define a narrativa por oposição ao mundo:

A narrativa cinematográfica é ordenada. O mundo não tem começo nem fim.

A narrativa possui uma trama lógica. É ordenada por um mostrador de imagens, um

grande imagista. O cinema conta na medida em que representa. O

mundo apenas é.

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Cinco critérios para reconhecer uma narrativaChristian Metz

Uma narrativa tem um começo e um fim.

É uma sequência de duas temporalidades. O tempo da coisa narrada e o tempo da narração, propriamente dita.

Toda narrativa é um discurso. Ela também seria um objeto

proferido por uma instância narrativa – o grande imagista, conforme Laffay.

A consciência da narrativa desrealiza a coisa contada. Ao lidarmos com uma narrativa, sabemos que ela não é realidade.

Uma narrativa é um conjunto de acontecimentos. Metz não afirma que o plano seja um enunciado, mas que o plano é mais semelhante a um enunciado do que a uma palavra.

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O que é uma narrativa cinematográfica?

Para a imagem cinematográfica, é muito difícil significar um único enunciado por vez. Todo plano contém uma pluralidade de enunciados narrativos que se superpõem e podem se recobrir quando o contexto nos é favorável. Um homem que leva a mão ao peito pode ter levado um tiro e morrido, mas pode estar fingindo-se de morto. Se ele acorda, pode ter ressuscitado ou parado de fingir.

A imagem mostra, mas não diz (Jost).

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O nascimento da narrativa cinematográfica

No começo, o argumento narrativo era muito simples. Os filmes eram unipontuais. A unidade de tomadas em um único plano era suficiente para servir à causa dos cineastas antes de 1902. Um só plano. Uma tripla unidade de lugar/tempo/ação.

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Mostração - mimèsis

Peça de teatro - seria um produto de mostração ou de uma narração? Seria um estado intermediário entre narração e mostração?

No teatro - a apresentação do ator é feita em simultaneidade com a recepção do espectador.

No cinema - o filme apresenta ao telespectador uma ação terminada.

A câmera (pelos ângulos e movimentos) pode interferir na percepção que o espectador tem da performance dos atores.

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Cinema sonoro – dupla narrativa

A imagem e o som veiculam duas narrativas fortemente imbricadas.

Imagens, ruídos, diálogos, menções escritas e música tocam como as partes de uma orquestra.

Ruídos podem ser portadores de uma narrativa?

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O que é uma narrativa de ficção?

A questão traz consigo duas outras: onde começa a narrativa?, onde começa a ficção?

Todo filme participa, ao mesmo tempo, dos dois regimes – documentário/ficção. É o trabalho de leitura do espectador que permite a um regime tomar precedência sobre o outro.

Filmes como O Almoço do Bebê favorecem a atitude documentarizante. Vestígio do passado. Não há organização do material.

Filmes como O regador regado favorecem a atitude fictivizante. Há organização do material.

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Realidade afílmica e diegese

Realidade afílmica – a que existe no mundo habitual, independentemente da relação com a arte fílmica.

Diegese – definido por Souriau como “tudo aquilo que confere inteligibilidade à história* contada, ao mundo proposto ou suposto pela ficção”.

* sequência cronológica dos acontecimentos narrados

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Os filmes Lumière “em tempo real” não obedecem ao critério mínimo da narrativa – a organização dos acontecimentos. Podem ser considerados como o grau zero da documentalidade.

O assunto do jornal televisivo é estruturado de modo que o comentário no início da matéria faça uma exposição cuja função é definir os postulados que darão forma ao real e à sua interpretação.

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Da enunciação à narração

Enunciação – no sentido mais amplo, designa as relações que se estabelecem entre o enunciado e os diferentes elementos que constituem o quadro enunciativo (protagonistas e situação).

No sentido estrito – vestígios linguísticos da presença do comentador no seio de seu enunciado.

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Dêiticos – marcas do idioma que remetem ao comentador, a quem profere o discurso (aqui, agora, eu).

“Estou só aqui, agora, bem abrigado”.

Quem diz “eu”? No discurso oral, vê-se o falante, o local, a situação. Na escrita, isso não é dado ao leitor diretamente.

Da enunciação à narração

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Enunciação cinematográfica

O momento no qual o espectador, escapando ao efeito-ficção, teria a convicção de estar na presença da linguagem cinematográfica como tal: “eu sou do cinema”.

“A percepção da enunciação cinematográfica varia segundo o espectador e sua “bagagem”.

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Narrador explícito e o grande imagista

As diferenças entre o que um personagem deveria ter visto e aquilo que vemos, bem como as diferenças entre o que o personagem relata e o que vemos, também podem ser encontradas em reportagens e documentários.

O grande imagista fílmico é extradiegético e invisível. Manipula o conjunto da trama audiovisual.

Na ficção, o grande imagista é um narrador implícito. No documentário ou reportagem é o documentarista ou jornalista.

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Das instâncias narrativas ao filme

Subnarração – O grande imagista é considerado o único “verdadeiro” narrador do filme. Todos os outros narradores presentes em um filme se entregam à subnarração.

Narradores segundos – no texto, o narrador narra o que um outro narrador subnarrou (exemplo de Sherazade). Na narrativa cinematográfica, como não há apenas uma só matéria de expressão – a língua -, é relativamente difícil ocultar o narrador primeiro - o grande imagista -, com a interposição de um segundo narrador.

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Narrativa oral, narrativa audiovisual

Concomitância entre a narrativa do grande imagista e a do subnarrador verbal (subnarrativa oral).

Cena - Leland narra oralmente o que se lembrava da vida conjugal de Kane e esposa: subnarração.

Imagens do que Leland (narrador segundo) está relatando: narrativa audiovisual cede lugar à subnarrativa audiovisual.

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Quem narra o filme?

Meganarrador(grande imagista){

Mostrador fílmico (filmagem)

Narrador fílmico (montagem)

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Narratologia fílmica em perspectiva

Para Odin, a realização e a leitura dos filmes são práticas sociais programadas.

A história pressupõe a intervenção de um narrador: “Uma história sempre é narrada, no cinema e em toda parte”.

Para Metz, a enunciação fílmica aponta para o próprio filme como objeto. O enunciador se torna o filme, e não uma instância de fora dele.

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Francesco Casetti identifica o enunciador fílmico como o Eu, o Tu, e o Ele. Essas três instâncias sempre estão presentes, mas seus valores relativos e suas funções podem variar.

Narratologia fílmica em perspectiva

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Narração sem narrador

David Bordwell contesta a necessidade de a teoria do cinema reconhecer a existência de um narrador. Para ele, existem dois tipos de textos: os que pressupõem um narrador e aqueles aos quais é inútil tentar adequar esse princípio.

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Referências

GAUDREAULT, André; JOST, François. A narrativa cinematográfica. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2009.