352
A OMC e a Reforma Agrícola

A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

  • Upload
    others

  • View
    2

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A OMC e a Reforma Agrícola

Page 2: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES

Ministro de Estado Embaixador Celso Amorim

Secretário-Geral Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães

FUNDAÇÃO ALEXANDRE DE GUSMÃO

Presidente Embaixador Jeronimo Moscardo

INSTITUTO RIO BRANCO (IRBr)

Diretor Embaixador Fernando Guimarães Reis

A Fundação Alexandre de Gusmão, instituída em 1971, é uma fundação pública vinculada ao Ministériodas Relações Exteriores e tem a finalidade de levar à sociedade civil informações sobre a realidadeinternacional e sobre aspectos da pauta diplomática brasileira. Sua missão é promover a sensibilizaçãoda opinião pública nacional para os temas de relações internacionais e para a política externa brasileira.

Ministério das Relações ExterioresEsplanada dos Ministérios, Bloco HAnexo II, Térreo, Sala 170170-900 Brasília, DFTelefones: (61) 3411 6033/6034/6847Fax: (61) 3411 9125Site: www.funag.gov.br

Page 3: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

Brasília, 2007

Maria Nazareth Farani Azevêdo

A OMC e a Reforma Agrícola

Page 4: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

Direitos de publicação reservados à

Fundação Alexandre de GusmãoMinistério das Relações ExterioresEsplanada dos Ministérios, Bloco HAnexo II, Térreo70170-900 Brasília – DFTelefones: (61) 3411 6033/6034/6847/6028Fax: (61) 3411 9125Site: www.funag.gov.brE-mail: [email protected]

Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional conforme Decreto n° 1.825 de 20.12.1907

Equipe Técnica

Coordenação:Eliane Miranda Paiva

Programação Visual e Diagramação:Cláudia Capella e Paulo Pedersolli

Originalmente apresentado como tese da autora no XLII CAE, Instituto Rio Branco, 2002.

Capa:Animá de Paula - Paisagem Barbacena (MG)82 x 100cm - Óleo sobre tela - Ass. CIE e Dat.1982

Impresso no Brasil 2008

Azevedo, Maria Nazareth Farani. A OMC e a reforma agrícola / Maria NazarethFarani Azevedo. - Brasília : Fundação Alexandre de Gusmão, 2007.

232 p.

ISBN 978-85-7631-089-1

1. Organização Mundial do Comércio. 2. Agricultura - Comércio internacional. I.Azevedo, Maria Nazareth Farani. II. Título.

CDU: 339.52:631061.1OMC

Page 5: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

Sumário

INTRODUÇÃO ................................................................................................... 9

CAPÍTULO I: O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO –ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA ........................................................ 15

Origem....................................................................................................... 17

Evolução na Europa.................................................................................... 20

Evolução nos EUA ...................................................................................... 23

CAPÍTULO II: O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O ARCABOUÇO JURÍDICO

INTERNACIONAL NA ÁREA DE MEIO AMBIENTE ........................................ 27

A incorporação do Princípio da Precaução nos instrumentos

multilaterais e plurilaterais de meio ambiente ............................................. 29

A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e

Desenvolvimento (UNCED, 1992) e o Princípio 15 da Declaração do Rio ..... 33

O Status do Princípio da Precaução no Direito Internacional ....................... 37

Tratados ou convenções Internacionais ............................................... 37

Direito consuetudinário ...................................................................... 38

Princípios gerais e decisões judiciais ................................................... 40

CAPÍTULO III: O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA ......... 43

Risco .......................................................................................................... 46

Incerteza .................................................................................................... 49

Incerteza científica e “ciência precautória” ................................................. 51

Processo decisório ...................................................................................... 54

Ônus da prova ............................................................................................ 58

Page 6: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CAPÍTULO IV: O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO

DE BIOSSEGURANÇA: A TRANSPOSIÇÃO DO MEIO AMBIENTE PARA

O COMÉRCIO DE ALIMENTOS ............................................................. 65

Terminologia .............................................................................................. 67

O processo negociador do Protocolo de Biossegurança e o

Princípio da Precaução ............................................................................... 68

Os principais grupos negociadores e suas posições .................................... 73

Grupo de Miami ................................................................................. 73

A União Européia ................................................................................ 75

Grupo dos “Like-Minded” .................................................................. 76

Grupo do Compromisso (“Compromise Group”) ................................. 77

Grupo dos países da Europa Central e do Leste ................................... 78

Principais temas controversos e o compromisso alcançado ........................ 78

Acordo de Informação Avançada (AIA) ............................................... 79

A cobertura do Protocolo .................................................................... 80

O Princípio da Precaução .................................................................... 81

A relação entre o Protocolo de Biossegurança e outros acordos

internacionais existentes. “The Savings Clause” e o

Princípio da Precaução ............................................................................... 83

As visões conflitantes sobre o alcance e o significado para o Sistema

Multilateral de Comércio da inclusão do Princípio da

Precaução no Protocolo de Biossegurança ................................................. 86

As interpretações divergentes ............................................................. 87

A transposição do Princípio da Precaução para o comércio

de alimentos ....................................................................................... 92

CAPÍTULO V: A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE

MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC:A JURISPRUDÊNCIA EM EVOLUÇÃO ...................................................... 97

O Acordo de SPS ...................................................................................... 100

Origem ..................................................................................................... 100

Os principais dispositivos do Acordo de SPS ..................................... 103

As controvérsias na área sanitária e fitossanitária ...................................... 108

Page 7: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O mecanismo de solução de controvérsias na OMC .......................... 108

União Européia – Medidas relativas à carne e seus derivados –

O contencioso dos hormônios .......................................................... 110

Austrália – Medidas que afetam a importação de salmão –

O contencioso de salmões ................................................................ 112

Japão – Medidas que afetam produtos agrícolas –

O contencioso sobre variedades vegetais .......................................... 113

O Acordo de SPS à luz dos contenciosos: a jurisprudência na OMC .......... 114

A medida sanitária e fitossanitária ..................................................... 115

Fundamentação científica ................................................................. 117

Patamares de risco ............................................................................ 120

Análise de Risco ................................................................................ 124

Nível apropriado de proteção sanitária e fitossanitária

(ALP, Appropriate Level of Protection) ............................................... 128

A medida provisória. ......................................................................... 129

Harmonização das medidas sanitárias ............................................... 132

Coerência e não-discriminação ......................................................... 137

O ônus da prova ............................................................................... 142

O Princípio da Precaução .................................................................. 145

CAPÍTULO VI: O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC .... 151

As iniciativas da União Européia ............................................................... 153

O contexto político .......................................................................... 153

O Comunicado da Comissão Européia sobre o

Princípio da Precaução ...................................................................... 155

A Resolução do Conselho Europeu sobre o Princípio da Precaução ... 161

O debate no Comitê de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias .............. 164

As propostas negociadoras sobre o Princípio da Precaução ...................... 167

As deliberações no Codex Alimentarius .................................................... 171

CAPÍTULO VII: O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA

O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL ............................................. 175

As implicações sistêmicas das iniciativas comunitárias ............................. 177

Page 8: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

Fundamentação científica ................................................................. 178

Risco: patamares, análise e nível apropriado de proteção sanitária .... 182

A medida provisória .......................................................................... 189

Harmonização das medidas sanitárias e fitossanitárias ...................... 192

Coerência e não-discriminação ......................................................... 195

O Ônus da prova e o Princípio da Precaução ..................................... 197

CONCLUSÃO ................................................................................................ 203

BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 217

ANEXO ...................................................................................................... 235

Page 9: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

INTRODUÇÃO

Page 10: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 11: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

11

O Acordo sobre Agricultura da Organização Mundial doComércio, concluído no final da Rodada Uruguai, constituiu o primeiroesforço bem sucedido no sentido de aproximar as disciplinas docomércio internacional de produtos agrícolas das regras gerais dosistema multilateral de comércio. O novo arcabouço jurídico, emboramodesto, transformou barreiras não-tarifárias em tarifas, disciplinou asmedidas de apoio ao comércio, à produção e à exportação e promoveumaior transparência no comércio agrícola.

O Acordo sobre a Aplicação de Medidas Sanitárias eFitossanitárias (SPS) insere-se nesse contexto disciplinador docomércio agrícola internacional. Idealizado para promover a eliminaçãodas restrições sanitárias ao comércio que não tenham por base a ciência,o objetivo principal do Acordo de SPS consiste em evitar que medidasdomésticas tenham efeitos negativos desnecessários sobre o comércioe não sejam utilizadas para mascarar interesses protecionistas.

Paralelamente – e talvez como conseqüência da maiorcompetitividade internacional propiciada pelo esforço liberalizante naárea agrícola –, o desenvolvimento tecnológico passa a desempenharpapel fundamental na agricultura para, mediante a introdução de novastécnicas, reduzir custos de produção. Como resultado desse fenômeno,a agricultura intensifica-se, especialmente nos países menoscompetitivos, mas com excedente de capital; agravam-se os problemase as distorções resultantes de modelos agrícolas artificiais e intensivos;proliferam as crises alimentares, de que são exemplos mais notórios a

INTRODUÇÃO

Page 12: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

12

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

encefalopatia espongiforme bovina (EEB), a contaminação de carnede frango por dioxina, e a doença de “Creutzfeld Jakob”. Na esteiradessas crises, emerge a polêmica internacional e de alta sensibilidadepolítica relativa à carne tratada à base de hormônios de crescimento.Surgem os produtos agrícolas geneticamente modificados.

À sucessão de crises na área sanitária os consumidoresrespondem com desconfiança e questionamentos e passam a exigir deseus governos maior responsabilidade no controle e na inspeção dosprodutos agrícolas. O regulador vê-se diante do dilema de reagir aosriscos percebidos pela sociedade, mas não confirmados pela ciência.Sua decisão regulatória oscila, portanto, entre a incerteza científica eas pressões políticas.

A União Européia, principal palco das crises sanitárias e dosquestionamentos da sociedade civil, redescobre o Princípio daPrecaução, que estimula a ação preventiva na ausência da certeza oudo fundamento científico. Embora aceito no campo da proteçãoambiental, a aplicação desse princípio ao comércio agrícola mostra-secontroversa. O caráter subjetivo do Princípio da Precaução contrapõe-se ao critério científico que permeia as disciplinas do Acordo de SPSe, por isso, desperta dúvidas sobre a conveniência de sua aplicação naárea comercial.

O presente trabalho procura examinar os diferentes aspectosdessa complexa realidade, em particular à luz das conseqüências daintrodução do Princípio da Precaução no Acordo de SPS da OMC.

Para tanto, o Capítulo I descreve a origem e a evolução históricado Princípio da Precaução, com ênfase nos dois principais mercadosagrícolas mundiais: UE e EUA.

O Capítulo II centra-se na dimensão ambiental do Princípio daPrecaução; discute sua inserção nas Convenções de Meio Ambiente esua progressiva consolidação como princípio do direito internacional,em particular na área ambiental.

O Capítulo III contempla a discussão sobre a natureza do riscona sociedade moderna. Além do conceito de risco, esse Capítulo discute

Page 13: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

INTRODUÇÃO

13

os conceitos relativos à incerteza científica, à “ciência precautória”, aoprocesso decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução.O mesmo Capítulo apresenta, ainda, debate sobre o “dilema doregulador” que, na sociedade moderna, se defronta com a dialéticaentre precaução e ciência, entre os custos da ação e os da inação.

O Capítulo IV discorre e comenta a inclusão do Princípio daPrecaução no Protocolo de Biossegurança que, para alguns analistas,poderia configurar a transposição desse princípio da área ambientalpara a de comércio internacional.

O Capítulo V, inicialmente, descreve e analisa o Acordo deSPS e seus dispositivos mais relevantes para a aplicação do Princípioda Precaução. Em seguida, discute, a partir de uma abordagem temática,os pareceres dos painéis e do Órgão de Apelação nos três contenciosossob o Acordo de SPS: EC-Hormones, Australia-Salmon e Japan-Varietals. Esse capítulo avalia, ainda, a evolução da jurisprudência naOMC na área sanitária e a latitude regulatória do Acordo de SPS paraacomodar o recurso a medidas precautórias.

O Capítulo VI tece breves comentários sobre o contexto políticoda precaução na UE, para, em seguida, descrever o Comunicado daComissão sobre o Princípio da Precaução e a Resolução do ConselhoEuropeu sobre o mesmo tema. Ressalta, ainda, os aspectos principaisdo debate sobre as iniciativas comunitárias no Comitê de SPS da OMCe comenta, em linhas gerais, a iniciativa européia no Codex Alimentarius.

O Capítulo VII avalia, a partir da análise temática desenvolvidano Capítulo V, as implicações sistêmicas que decorreriam das iniciativascomunitárias no Acordo de SPS. Nesse sentido, procura demonstrarcomo as obrigações contidas no Acordo de SPS, tal como hojeinterpretadas pelos painéis e Órgão de Apelação, seriam afetadas poruma eventual introdução de elementos precautórios adicionais.

Finalmente, a conclusão do trabalho estima em que medida oquadro regulatório hoje vigente no Acordo de SPS permite o recursolegítimo a medidas de precaução; comenta como a eventual introduçãodo Princípio da Precaução no Acordo de SPS alteraria o equilíbrio de

Page 14: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

14

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

direitos e obrigações do sistema multilateral de comércio; oferececomentários sobre a atuação brasileira na OMC e em outrosorganismos internacionais que ora deliberam sobre o Princípio daPrecaução; e discute a possibilidade de formulações aceitáveis, inclusiveà luz da proporcionalidade das medidas sanitárias. Faz, ainda, sugestõessobre cursos de ação para conciliar os interesses exportadoresbrasileiros com as crescentes preocupações dos consumidores comsaúde alimentar, bem como com as progressivas exigências em matériasanitária.

Page 15: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CAPÍTULO I

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO –ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Page 16: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 17: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

17

ORIGEM

O Princípio da Precaução surgiu na Alemanha Ocidental, nadécada de 1970. A filosofia de Vorsorge, cuja tradução literal parao inglês é, segundo Boehmer-Christiansen, “beforehand or priorcare and worry”, serviu de base à precaução alemã1. Agir comVorsorge significava “preparing for the future which is expected tobe difficult”2.

Nos anos 70, o governo social-democrata alemão aplicavaessa filosofia nas diferentes áreas de política pública. No campo domeio ambiente, a acepção do Vorsorge abarcava a idéia de que, “sea sabedoria e a ciência informam que ações presentes podem resultarem dano, o governo tem o dever de mudar a sociedade por meio depersuasão e regulamentação”3. O Vorsorge sustentava, portanto, queo dano ambiental deveria ser evitado; conclamava à proteção e aouso sustentável dos recursos naturais; e visava à ação preventivaemcontraste com as tradicionais políticas de compensação pelo danoambiental. Em suma, o Vorsorge autorizava o Estado a intervir naeconomia para evitar ou minimizar os riscos de dano ambiental “not(yet) identifiable, or even in the absence of risk”4.

CAPÍTULO IO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO – ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

1 BOEHMER-CHRISTIANSEN, Sonja. “The Precautionary Principle in Germany –Enabling Government”. In: VVAA, Interpreting the Precautionary Principle. Londres,Cameron May Ltd, 1994, organizado por Timothy O’Riordan e James Cameron, p. 38.2 Id.3 Ibid., p. 39.4 JORDAN, Andrew. “The Precautionary Principle in the European Union”. In: VVAA,Reinterpreting the Precautionary Principle. Londres, Cameron May Ltd, 2001,organizado por Timothy O’Riordan, James Cameron e Andrew Jordan, p. 144.

Page 18: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

18

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Do ponto de vista econômico, o Vorsorge conflitava com osprincípios do livre comércio, mas suas idéias mostravam-separticularmente atrativas ao governo social-democrata da época, poislegitimavam o papel intervencionista do Estado na reestruturação emodernização industrial da Alemanha5.

Alguns analistas6 vinculam o conceito de Vorsorge às políticasde disciplinamento de emissão de poluentes então estabelecidas naAlemanha. De fato, a primeira referência ao Vorsorge na área ambientalé encontrada no Federal Air Quality Protection Act, de 1974, queestabeleceu o objetivo de prevenir o desenvolvimento de efeitosdanosos ao meio ambiente. As preocupações com os efeitos nocivosda chuva ácida sobre as florestas coníferas e da neblina fotoquímicasobre a saúde pública favoreceram a aprovação dessa legislação.

Em 1976, o Vorsorge já era observado como diretriz geralpara as deliberações e decisões governamentais sobre produtospoluentes. Transformava-se, então, em princípio basilar –Vorsorgeprinzip – da política ambiental alemã, que, segundo Boehmer-Christiansen, foi assim definido:

The principle of precaution commands that the damages done tothe natural world should be avoided in advance and in accordancewith opportunity and possibility. … It also means acting whenconclusively ascertained understanding by science is not yetavailable. Precaution means to develop, in all sectors of theeconomy, technological processes that significantly reduceenvironmental burdens, especially those brought about by theintroduction of harmful substances7.

Em 1980, o governo alemão implementou rigorosas políticaspara minimizar problemas relacionados a chuva ácida, mudança

5 BOEHMER-CHRISTIANSEN, op. cit., p. 36.6 HAIGH, Nigel. “The Introduction of the Precautionary Principle into UK”. In: VVAA,Interpreting the Precautionary Principle, op. cit., p. 231.7 BOEHMER-CHRISTIANSEN, op. cit., p. 37.

Page 19: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO – ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

19

climática e poluição do Mar do Norte. Característica comum a essaspolíticas foi o recurso ao Vorsorgeprinzip para justificar a utilização detecnologias modernas e, assim, minimizar as emissões de poluentes. Aabordagem precautória alemã buscava, então, combinar a filosofia doVorsorge com a política de Stand der Technik (“melhor tecnologiadisponível”), que favorecia o desenvolvimento de tecnologias maislimpas. Essa combinação de filosofia ambiental com política industrialincentivaria o investimento na modernização tecnológica; promoveriaa reestruturação industrial; e estimularia a aplicação e a exportação denovas técnicas. Para alguns analistas, o Vorsorgeprinzip ou Princípioda Precaução favoreceu as metas do governo social-democrata deassegurar influência e liderança tecnológica e política da Alemanha nocenário internacional.

Críticos do modelo alemão afirmam, no entanto, que o Vorsorge,associado à política de Stand der Technik, não resolvia o problemaambiental. Segundo eles, o enfoque do Princípio da Precaução limitadoà promoção da mudança tecnológica diante da ameaça ao meio ambienteapenas contribuía para contornar problemas imediatos, ao mesmotempo em que adiava a solução de questões ecológicas maiores8.

A crítica acima não chega a ser totalmente descartada pelosdefensores do Vorsorge, pois estes reconhecem suas limitações comopolítica de proteção ambiental. O Vorsorge é, nas palavras de Boehmer-Christiansen, uma “metáfora”9 ou uma política ambiental voltada parao desenvolvimento tecnológico que mobiliza e legitima a política industriale econômica do governo social-democrata.

Uma vez transposto à dimensão européia, o Vorsorge asseguraráque, na nova e ampliada distribuição do ônus da proteção ambiental, aindústria alemã não só mantenha sua competitividade, mas, sobretudo,ganhe novos mercados com a exportação de tecnologias limpas e deprodução sustentável.

8 Id., p. 56.9 Ibid., p. 51.

Page 20: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

20

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

EVOLUÇÃO NA EUROPA

No início dos anos 80, o governo alemão iniciou campanhapara que toda a União Européia adotasse medidas ambientaissemelhantes. A motivação dessa campanha não era, como afirmaAndrew Jordan, um “enlightened environmentalism”10, massimplesmente a busca de novos mercados e de condições eqüitativaspara os produtos e a tecnologia alemã de vanguarda. Segundo Waele11,“the policy debate was more dominated by competitive considerationsrather than environmental concerns, as much of the delay in adoptingmeasures was due to fears about comparative costs and benefits ofindividual states”.

Legítima ou oportunista, a liderança alemã foi decisiva para atransição da política ambiental européia de reativa, em matéria deformulação política, para pró-ativa em termos de administração econtrole ambiental. O primeiro resultado concreto do esforço alemãopode ser encontrado na Decisão do Conselho das ComunidadesEuropéias 80/372, de abril de 1980, que determina:

Whereas, in accordance with the common position of MemberStates of 6 December 1978 and in accordance withRecommendation III of the Munich Conference, a significantreduction should, as a precautionary measure, be achieved inthe next few years in the use of chlorofluorocarbons giving riseto emissions12.

Em 1987, o Single European Act, que emenda o Tratado deRoma, introduz dispositivos referentes ao meio ambiente e, nesse

10 JORDAN, op. cit., p. 146.11 Apud JORDAN, Andrew e O’RIORDAN, Timothy. “The Precautionary Principlein Contemporary Environmental Policy and Politics”. In: VVAA, Protecting PublicHealth and the Environment – Implementing the Precautionary Principle, Washington,D.C., Island Press, 1999, organizado por Carolyn Raffensperger e Joel Tickner, p. 21.12 HAIGH, op. cit., p. 243.

Page 21: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO – ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

21

sentido, constitui etapa importante no desenvolvimento da nova políticaambiental da União Européia. Embora não contemple, ainda, qualquerreferência ao Princípio da Precaução, a reforma do Tratado de 1987determina, em seu Artigo 130r(1), três objetivos de ação: (i) preservar,proteger e melhorar a qualidade do meio ambiente; (ii) contribuir paraproteger a saúde humana; e (iii) assegurar prudência e racionalidadena utilização dos recursos naturais. O Artigo 130r(2) complementa odispositivo anterior, ao estabelecer três princípios para a consecuçãodaqueles objetivos: (i) a ação deve ser preventiva; (ii) o dano ambientaldeve ser sanado na origem; e (iii) aquele que polui deve pagar. Alémdisso, a consecução daqueles objetivos deve, de acordo com o Artigo130r(3), levar em conta fatores como a informação científica disponível;as condições ambientais nas diferentes áreas da União Européia; ospotenciais custos e benefícios da ação ou inação; e o desenvolvimentoeconômico e social das Comunidades Européias e o equilíbrioeconômico entre as regiões que a compõem13.

Em 1990, a Declaração de Dublin refere-se aos princípios dedesenvolvimento sustentável e de “preventive and precautionary action”e, ao fazê-lo, recomenda que o V Programa de Ação para o MeioAmbiente seja inspirado nesses princípios. Aprovado em 1992, o VPrograma de Ação, estabelece que:

the guiding principles for policy decisions under the Programmederive from the precautionary approach and the concept of sharedresponsibility, including effective implementation of the PolluterPays Principle14.

O Princípio da Precaução é finalmente incorporado aoarcabouço legal da UE pelo Tratado de Maastricht de 199215. Nessesentido, o Artigo 174, que versa sobre matéria ambiental, dispõe que:

13 Id., pp. 233 e 234.14 Ibid., p. 235.15 O Tratado de Maastricht foi assinado em fevereiro de 1992, mas entrou em vigor emnovembro de 1993.

Page 22: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

22

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Community policy on the environment shall aim at a high level ofprotection taking into account the diversity of situations in the variousregions of the Community. It shall be based on the precautionaryprinciple and on the principles that preventive action should be taken,that environmental damage should as a priority be rectified at sourceand that the polluter should pay. Environmental protectionrequirements must be integrated into the definition andimplementation of other Communities policies16. (Ênfase da autora.)

Na prática, a maioria dos Estados Membros da UE já haviaaceito o Princípio da Precaução que então figurava em váriosinstrumentos multilaterais e internacionais de meio ambiente, como aDeclaração do Rio e a Convenção sobre a Mudança do Clima, entreoutros. Mas é o Tratado de Maastrich que constitui desdobramentojurídico e constitucional de grande importância para a legitimaçãofutura do Princípio da Precaução no âmbito europeu.

Ao julgar a validade do embargo imposto pela Comissão àsexportações de carne britânica, por força da crise de encefalopatiaespongiforme bovina (EEB), a Corte Européia de Justiça emite parecerque se inspira no Princípio da Precaução, pois afirma que “where thereis uncertainty as to the existence or extent of risks to human health, theinstitutions may take protective measures without having to wait untilthe reality and seriousness of those risks become fully apparent”17.

A Corte vale-se, portanto, de um paradigma de políticaambiental do Tratado de Maastrich para julgar questão eminentementede comércio e saúde humana. Trata-se do primeiro precedente datransposição intra-européia do Princípio da Precaução do meioambiente para o campo da saúde humana.

É também no Tratado de Maastrich que a UE fundamenta seurecurso ao Princípio da Precaução para justificar a imposição de

16 HAIGH, op. cit., p. 245.17 JORDAN, 2001, op. cit., p. 148.

Page 23: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO – ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

23

restrições ao comércio de carne bovina tratada à base de hormônios ede produtos agrícolas geneticamente modificados. A partir dessemomento, o Princípio da Precaução passa a ser o epicentro das disputascomerciais entre os dois maiores mercados mundiais. “It moved out ofthe shadows and into the full glare of media attention”18. Inicia-se acruzada européia para reinterpretar o Princípio da Precaução de formaa legitimar sua aplicação ao comércio internacional.

EVOLUÇÃO NOS EUA

Enquanto o modelo europeu incorpora o Princípio daPrecaução como diretriz normativa e código de conduta para a políticaambiental, nos EUA, o reconhecimento do Princípio da Precauçãoocorre, no plano federal, apenas de forma implícita, por força dealgumas legislações ambientais – National Environmental Policy Act,Endangered Species Act, Clean Air Act, Federal Food, Drug andCosmetic Act, Clean Water Act, Safe Drinking Water Act, ResourceConservation and Recovery Act, Comprehensive EnvironmentalResponse Compensation and Liability Act e Oil Pollution Act19.

O National Environmental Policy Act (NEPA), de 1969, porexemplo, instrui as agências federais a proceder a análises de impactoambiental previamente à aprovação de projetos públicos. A Seção 102do NEPA determina às agências envolvidas nessas análises que “identifyand develop methods and procedures (...) which will insure that presentlyunquantified environmental amenities and values may be givenappropriate consideration in decision making along with economicaland technical considerations”20.

18 Id., p. 149.19 STILLWELL, Mathew. “The Implications of the Precautionary Principle for Tradeand Sustainable Development”. Genebra. Versão de 11.11.1999. Documento não-oficialdo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, encaminhado informalmente àautora em 1.11.1999, p. 18.20 STILLWELL, op.cit., pp.18-19.

Page 24: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

24

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

A Seção 109 do Clean Air Act (CAA) instrui o Administradorda Agência de Proteção Ambiental dos EUA – EnvironmentalProtection Agency (EPA) – a elaborar as normas necessárias paraproteger o bem-estar público “from any known or anticipated adverseeffects associated with the presence of such air pollutant in the ambientair”21.

No campo da proteção da saúde humana, a exigência do FDA– Federal Drug Administration - de que a indústria farmacêutica provea segurança e eficácia do medicamento antes de sua comercialização éapontada por alguns autores22 como uma manifestação importante doPrincípio da Precaução na legislação norte-americana.

Talvez por força desse tratamento apenas implícito, o Princípioda Precaução tem sido implementado nos EUA de forma errática esegundo o discurso político predominante no momento.

Os anos 80, por exemplo, assistem ao enfraquecimento doendosso do Executivo norte-americano a políticas ambientais e deproteção à saúde humana. Durante a Administração Reagan, oselementos de precaução implicitamente inseridos nas legislaçõesemanadas da década de 70 não são aplicados, pois contrastam e inibema ênfase no livre comércio. Essa mesma tendência se reflete nojulgamento pela Suprema Corte da reclamação da União dosTrabalhadores (AFL-CIO) contra a American Petroleum Instituterelativa às normas de trabalho para a manipulação de produtos químicosconsiderados perigosos. Ao assentar sua decisão na precedência daavaliação do risco quantitativo sobre o qualitativo, a Suprema Corteteria, na visão de alguns estudiosos, aportado contribuição adicionalao enfraquecimento do elemento de precaução nas normas ambientaisexistentes nos EUA23.

21 Id.22 Ibid., p. 21.23 TICKNER, Joel and RAFFENSPERGER, Carolyn. “The American View on thePrecautionary Principle”. In: VVAA, Reinterpreting the Preacutionary Principle, op.cit., p. 188.

Page 25: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO – ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

25

A eleição do governo democrata, na década de 90, fazressurgir pressões de grupos organizados no sentido de que os EUAsejam mais sensíveis a questões relacionadas à saúde humana e aomeio ambiente.

Reagindo a essas pressões, o Presidente Clinton cria o ConselhoPresidencial para o Desenvolvimento Sustentável (PCSD), que, emseu relatório de 1996, procura promover a seguinte definição doPrincípio da Precaução:

There are certain beliefs that we as Council members share thatunderlie all of our agreements. We believe even in the face ofscientific uncertainty, society should take reasonable actions toavert risks where the potential harm to human health or theenvironment is thought to be serious or irreparable24.

Nessa linha de maior favorecimento de ações de caráterprecautório e na esteira da controvérsia entre os EUA e a UE sobre ocomércio de brinquedos fabricados com ftalatos, o então vice-presidente Al Gore envia, em 1998, carta ao Congresso em que afirmareconhecer e respeitar o direito de qualquer nação a aplicar medidasde precaução nas áreas ambiental e de saúde pública. Recorda, ainda,a instrução dada pelo Presidente norte-americano aos Departamentosde Comércio e de Estado para que evitem desencorajar medidas deprecaução julgadas necessárias por outros países.

O debate interno nos EUA sobre o Princípio da Precaução étambém informado pelas controvérsias comerciais na área de saúdealimentar, em particular aquelas relativas à utilização de hormônios nogado de corte e à comercialização de organismos geneticamentemodificados. Desdobramentos nessas áreas levam o Governo Clintona tomar posição mais enérgica no debate internacional sobre aprecaução, a ciência e o comércio de produtos agrícolas. Como atestaa Declaração da Casa Branca sobre Comércio e Meio Ambiente, de

24 Id., p. 184.

Page 26: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

26

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

1999, o discurso democrata inspira-se na jurisprudência da OMC ebusca colocar limites ao recurso ao Princípio da Precaução:

Precaution is an essential element of the US regulatory systemgiven that regulators often have to act on the frontiers of knowledgeand in the absence of full scientific certainty. We believe that thisprecautionary element is fully consistent with WTO rules, whichmake it clear that a regulatory agency may take precautionaryaction where there is a rational basis for concern based uponavailable pertinent information. We will insist that this ability totake precautionary action be maintained in order to achieve ourenvironmental objectives25. (Ênfase da autora.)

Mais recentemente, a polêmica decisão do recém-eleitoPresidente Bush de não ratificar o Protocolo de Quioto reacende o debatesobre os limites da aplicação do Princípio da Precaução no arcabouçojurídico ambiental dos Estados Unidos.

Críticos da política ambiental norte-americana e alguns membrosda comunidade acadêmica que advogam pelo Princípio da Precaução26

ressaltam que os EUA têm sistematicamente apresentado oposição aesse Princípio no plano internacional. Essa oposição é identificada naatuação norte-americana nas negociações do Protocolo de Quioto; doProtocolo de Biossegurança e da recém-concluída Convenção sobre osPoluentes Orgânicos Persistentes (POPs).

Como os representantes norte-americanos costumam afirmar nasreuniões do Comitê de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias da OMC, alegislação de seu país encontra-se imbuída da necessidade da precauçãono processo regulatório de proteção do meio ambiente e da saúdehumana. Para os EUA, no entanto, essa abordagem precautória deveser fundamentada na evidência científica e na análise de risco necessáriaà identificação dos efeitos adversos associados a um produto ou processo.

25 Ibid., p. 185.26 Ibid., p. 195.

Page 27: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CAPÍTULO II

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O ARCABOUÇO

JURÍDICO INTERNACIONAL NA ÁREA DE MEIO AMBIENTE

Page 28: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 29: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

29

CAPÍTULO IIO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O ARCABOUÇO JURÍDICO

INTERNACIONAL NA ÁREA DE MEIO AMBIENTE

A INCORPORAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NOS

INSTRUMENTOS MULTILATERAIS E PLURILATERAIS DE MEIO AMBIENTE

Os teóricos do Princípio da Precaução afirmam com freqüênciaque este instrumento é parte de um sistema de regras estabelecidas paraorientar a conduta humana e, dessa forma, alcançar o objetivo dodesenvolvimento sustentável27. Nesse contexto, o Princípio da Precauçãoconstituiria a “autoridade filosófica”28 que orientaria as políticas públicase as decisões regulatórias, no campo da proteção do meio ambiente ouda saúde humana, quando confrontadas com a incerteza científica.

Esse grupo de analistas defende o ponto de vista de que aincorporação do Princípio da Precaução em Convenções e em outrosinstrumentos multilaterais, plurilaterais e regionais de meio ambiente reúneevidências e argumentos jurídicos suficientes para caracterizá-lo como“um princípio de direito internacional consuetudinário”29.

Os críticos e mais céticos, por sua vez, salientam que o Princípioda Precaução “is a statement of common sense”30; é conceito “ilusório”31

e “vago”32, portanto inadequado ou insuficiente como norma de conduta.

27 CAMERON, James. “The Precautionary Principle in International Law”. In: VVAA,Reinterpreting the Preacutionary Principle, op. cit., p. 113.28 Id.29 Ibid., p. 133.30 Ibid., p. 114.31 Ibid., p. 116.32 CAMERON, 2001, op. cit., p. 122, ou CAMERON, 1994, op. cit., p. 264.

Page 30: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

30

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Ao se referir à alegada natureza vaga ou generalista do Princípioda Precaução, Bodansky recorda ser “appropriate to take a cautiousattitude towards the precautionary principle. We may wish to adopt itas a general goal. But it would be a mistake to believe it will resolve thedifficult problems of international environment regulation or prevent newhazards from emerging in the future”33.

Na mesma linha, Gunther Handl argumenta que “state practice,resolutions of international organizations and other pertinent ‘indicia’point to the emergence of community expectations that, at least as amatter of international policy, activities potentially affecting theenvironment be subject to constraints. However, at present theprecautionary principle is not a term of art. The principle’s exact political,and ‘a fortiori’, legal implications remain elusive”34.

Tendo em vista essas percepções divergentes sobre o status eo papel do Princípio da Precaução, faz-se necessária uma discussãosobre a evolução e a inserção desse princípio no arcabouço jurídicointernacional na área de meio ambiente. Esse debate é, ainda,especialmente relevante à luz de conjecturas sobre a aplicação doPrincípio da Precaução a temas comerciais. Os simpatizantes desseprincípio acreditam que, se reconhecido como fonte de direitointernacional, ele poderá ser utilizado por painéis e pelo Órgão deApelação da Organização Mundial do Comércio (OMC) em suasdeliberações sobre disputas comerciais relacionadas à proteção domeio ambiente e da saúde humana. Tal expectativa busca fundamentaçãona letra do Artigo 3.2 do “Understanding on Rules and ProceduresGoverning the Settlement of Disputes” (DSU), que, inter alia,determina:

The dispute settlement system of the WTO… serves to preservethe rights and obligations of Members under the coveredagreements, and to clarify the existing provisions of those

33 Apud CAMERON, 1994, op. cit., p. 264.34 Id., pp. 264 e 265.

Page 31: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O ARCABOUÇO JURÍDICO INTERNACIONAL NA ÁREA DE MEIO AMBIENTE

31

agreements in accordance with customary rules of interpretationof public international law.

Note-se, entretanto, que as disputas comerciais levadas aoÓrgão de Solução de Controvérsias da OMC são solucionadas à luzdos compromissos assumidos pelos Membros nos “acordos cobertos”pelo “Understanding on Rules and Procedures Governing the Settlementof Disputes”. Adicionalmente, segundo Palmeter, “the customary rulesof interpretation of public international law are, so far, the only portionsof customary international law to have found their way meaningfullyinto the WTO dispute settlement”35. (Ênfase da autora.)

À luz desse debate, este capítulo procurará, sem se engajar emexame exaustivo das diferentes fontes de direito internacional, analisara incorporação do Princípio da Precaução nos instrumentos multilateraise plurilaterais de meio ambiente e discutir o seu status no direitointernacional.

A incorporação do Princípio da Precaução nos instrumentosmultilaterais e plurilaterais de meio ambiente

Segundo a literatura especializada, é possível encontrarreferências implícitas ao Princípio da Precaução em instrumentosmultilaterais e plurilaterais que remontam aos anos 70, tais como: aConvention for the Prevention of Marine Pollution from Land-Based Sources (1974); Convention for the Prevention of MarinePollution by Dumping from Ships and Aircraft (1972); Conventionon International Trade in Endangered Species of Flora and Fauna(1975); e London Convention on the Prevention of MarinePollution by Dumping of Wastes and Other Matter (1972); entreoutros36.

35 PALMETER, David e MAVROIDIS, Petros, Dispute Settlement in the World TradeOrganization. Haia, Kluwer Law International, 1999, p. 48.36 Informação sobre o tema pode ser encontrada em inúmeros artigos, entre eles Cameron,1994, op. cit., pp. 263-283, e CAMERON, 2001, op. cit., pp. 113-142; e STILLWELL,op. cit., pp. 11-14, entre outros autores.

Page 32: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

32

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Na década de 1980, intensificam-se as referências, aindaimplícitas, ao Princípio da Precaução. Em 1985, o preâmbulo da ViennaConvention for the Protection of the Ozone Layer dispõe sobremedidas precautórias no contexto da proteção da camada de ozônio.Em convergência com a linha conceitual da Convenção, o Protocolode Montreal, concluído em 1987, também determina a aplicação demedidas de precaução.

O primeiro instrumento internacional a adotar explicitamente odiscurso da precaução data de 1987. A Final Declaration of theSecond International Conference on the Protection of the NorthSea, onde se lê que:

(...) in order to protect the North Sea from possibly damagingeffects of the most dangerous substances, a precautionaryapproach is necessary which may require action to control inputsof such substances even before a causal link has been establishedby absolutely clear scientific evidence37. (Ênfase da autora.)

Alguns autores, entre eles Cameron, recordam que aConvention for the Protection of the Marine Environment of theNorth-East Atlantic (OSPAR) constitui, no entanto, o primeiroinstrumento a mencionar o Princípio da Precaução de forma mandatória.O Artigo 2 daquela Convenção estabelece, assim, que os membros“shall apply the precautionary principle, by virtue of which preventivemeasures are to be taken when there are reasonable grounds forconcern…”38.

As décadas de 80 e 90 foram, assim, profícuas em instrumentosque invocaram a precaução. Até 1992, no entanto, a formulação maisconhecida do Princípio da Precaução é encontrada na DeclaraçãoMinisterial sobre Desenvolvimento Sustentável da Comissão EconômicaEuropéia, The Bergen Declaration, que, em 1990, determinava:

37 HAIGH, op. cit., p. 243.38 CAMERON, 2001, op. cit., p. 123.

Page 33: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O ARCABOUÇO JURÍDICO INTERNACIONAL NA ÁREA DE MEIO AMBIENTE

33

In order to achieve sustainable development, policies must bebased on the precautionary principle. Environmental measuresmust anticipate, prevent, and attack the causes of environmentaldegradation. Where there are threats of serious or irreversibledamage, lack of full scientific certainty should not be used as areason for postponing measures to prevent environmentaldegradation39.

A CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA OMEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO (UNCED, 1992) E OPRINCÍPIO 15 DA DECLARAÇÃO DO RIO

Independentemente de sua linha de pensamento, analistas ehistoriadores de meio ambiente – céticos e simpatizantes do Princípioda Precaução – concordam em que a UNCED constitui o marcohistórico para a confirmação e popularização desse princípio na áreaambiental.

O esforço de disseminação do conceito de antecipação comopolítica de proteção do meio ambiente e da saúde humana, iniciado nadécada de 70 e intensificado nos anos 80, culmina, em 1992, noconsenso multilateral em torno do Princípio da Precaução. Esseconsenso encontra-se refletido no Princípio 15 da Declaração do Rio:

where there are threats of serious or irreversible damage, lackof scientific certainty shall not be used as a reason for postponingcost-effective measures to prevent environmental degradation.

Registre-se, entretanto, que a definição do Princípio daPrecaução permanece em bases muito vagas, o que, na percepção dealguns estudiosos, enfraquece e dificulta a sua implementação. Alémdisso, a formulação aclamada no Rio de Janeiro introduz elemento atéentão alheio ao caráter político e social que se quer atribuir ao Princípio

39 HAIGH, op. cit., pp. 244-245.

Page 34: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

34

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

da Precaução: a menção a medidas “cost-effective”. Esse elementoincorpora uma dimensão econômica, que, se por um lado, jamais passoudespercebida pelos idealizadores da filosofia do Vorsorge, por outro,nunca foi explicitada. Paradoxalmente, a mesma Declaração do Rioque outorga ao Princípio da Precaução estatura sem precedentes,também lhe subtrai autonomia e, nesse processo, expõe os limites doaclamado consenso multilateral.

Na prática, portanto, a definição do Princípio da Precauçãoaprovada no Rio autorizaria a decisão de não recorrer a uma medidade precaução caso o exame do custo e do benefício de suaimplementação não se mostre favorável. Estudiosos como Santillo,Johnston e Stringer40, que registram e discutem esse ponto tendem aatribuir a inclusão da expressão “cost-effective” aos negociadores norte-americanos presentes à Conferência do Rio. De fato, a incorporaçãode elemento adicional que determina o exame das vantagens edesvantagens de uma ação, à luz de considerações econômico-financeiras, estaria em linha com a abordagem racional e científica queos EUA vêm imprimindo ao Princípio da Precaução.

Analistas como Cameron e Stillwell adotam uma linha decomentários que tende a exaltar o consenso do Rio e caracterizar oresultado da UNCED como a “cristalização” do Princípio daPrecaução41.

Tal conclusão advém do reconhecimento e do endossointernacional outorgado pela Declaração do Rio ao Princípio daPrecaução como referência política para ações na área da proteçãoao meio ambiente. A Declaração do Rio propicia igualmente umadivulgação extraordinária desse princípio, que é invocado por todosos instrumentos resultantes da UNCED, à exceção da Declaraçãosobre Florestas.

40 SANTILLO, David, JOHNSTON, Paul e STRINGER, Ruth. “The PrecautionaryPrinciple in Practice: A Mandate for Anticipatory Preventative Action”. In: VVAA,Protecting Public Health and the Environment, op. cit., pp. 43-44.41 CAMERON, 2001, op. cit., p. 123.

Page 35: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O ARCABOUÇO JURÍDICO INTERNACIONAL NA ÁREA DE MEIO AMBIENTE

35

A Convenção sobre Mudança do Clima ou United NationsFramework Convention on Climate Change, em seu Artigo 3.3,por exemplo, determina que:

The Parties should take precautionary measures to anticipate,prevent or minimize the causes of climate change and mitigateits adverse effects. Where there are threats of serious orirreversible damage, lack of full scientific certainty should not beused as a reason for postponing such measures, taking intoaccount that policies and measures to deal with climate changeshould be cost-effective so as to ensure global benefits at thelowest possible cost. (Ênfase da autora.)

Outro instrumento multilateral de meio ambiente que resultouda Rio–92, a Convention on Biological Diversity, também invoca oPrincípio da Precaução em seu preâmbulo:

Where there is threat of significant reduction or loss of biologicaldiversity, lack of full scientific certainty should not be used as areason for postponing measure to avoid or minimize such a threat.

A Agenda 21 da Conferência do Rio incorpora o Princípioda Precaução em pelo menos três áreas. No campo da proteçãodos recursos marinhos, conclama por ações precautórias emoposição a abordagens reativas. Relaciona, dentre essas ações, autilização de tecnologias limpas, tais como a reciclagem de resíduose o manejo adequado de substâncias perigosas. Em referência àspreocupações sobre qualidade e manejo da água, a Agenda 21valoriza o recurso à precaução para prevenir focos de poluição.Propõe, nesse sentido, a adoção de novas tecnologias e aminimização da poluição na fonte. Com relação aos resíduosradioativos, determina que os governos devem evitar oarmazenamento de substâncias perigosas, mas o autoriza nos casosem que haja comprovado controle dos riscos e em que sejamtomadas medidas precautórias.

Page 36: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

36

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Dentre os instrumentos pós-UNCED, o Straddling StocksAgreement é freqüentemente apontado como “the most advancedexpression of the Precautionary Principle”42.

O Straddling Stocks Agreement dispõe sobre a preservaçãode espécies de peixes – atum e espadarte, por exemplo – cuja naturezamigratória dificulta a determinação científica sobre a conservação dosestoques. A mobilidade dessas populações favorece a pesca intensivae, por isso, requer ação política internacional concertada no campo daconservação e preservação das espécies. O Acordo estabelece, assim,objetivos de longo prazo, que, fundamentados em alguns princípios,entre eles o da precaução, orientam a ação política dos governosenvolvidos. Ao dispor sobre o Princípio da Precaução, o Acordodetermina que

The States shall apply the precautionary approach widely toconservation, management and exploitation of straddling fishstock….the States shall be more cautious when information isuncertain, unreliable, or inadequate. The observation of adequatescientific information shall not be used as a reason for postponingor failing to take conservation and management measures43.

O Protocolo de Biossegurança da Convenção sobreDiversidade Biológica, embora só finalizado em 2000, insere-se noconjunto de instrumentos resultantes da UNCED. A inclusão deformulações que refletem o Princípio da Precaução no preâmbulo, nosArtigos I, X, XI e XV e Anexo II desse instrumento tem sido interpretadapor vários analistas como outro momento crítico da confirmação ou“cristalização” desse princípio. Há quem considere esse fato político omomento pós-UNCED mais importante na história recente do Princípioda Precaução44.

42 STILLWELL, op. cit., p. 14.43 Artigo 6 e Anexo II do Straddlling Stocks Agreement.44 Entre os autores que defendem esse ponto de vista estão Cameron, Stillwell eRaspenserger.

Page 37: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O ARCABOUÇO JURÍDICO INTERNACIONAL NA ÁREA DE MEIO AMBIENTE

37

Ao dispor sobre a conservação da biodiversidade e sobre omovimento transfronteiriço de organismos geneticamente modificados,entre eles as “commodities” agrícolas transgênicas, o Protocolo deBiossegurança encontra-se na fronteira jurídica entre o comércio e omeio ambiente. Como se verá no Capítulo IV, políticos da UEinterpretarão o Protocolo de Biossegurança como o primeiro passo nadireção da transposição do Princípio da Precaução da esfera ambientalpara a de comércio agrícola. Representantes dos EUA e da indústriade alimentos transgênicos tenderão a minimizar o significado doProtocolo e, por conseguinte, o da incorporação do Princípio daPrecaução nas disciplinas do sistema multilateral de comércio. Asopiniões divergem e a ambigüidade da letra do Protocolo não contribuipara esclarecer as interpretações discrepantes; ao contrário, alimentaa dúvida e sugere ser este instrumento “a conflict postponed ratherthan a conflict avoided”45.

O STATUS DO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NO DIREITO INTERNACIONAL

O ponto inicial de uma análise sobre o status do Princípio daPrecaução remonta ao exame das fontes tradicionais de direitointernacional, que, segundo o Estatuto da Corte Internacional de Justiça,são as Convenções ou Tratados internacionais, o direito consuetudinárioe os princípios gerais.

Tratados ou convenções Internacionais

Os tratados obrigam as partes signatárias e apenas são aplicadossobre o escopo da matéria acordada. Os compromissos nelesestabelecidos devem, portanto, ser observados pelos Estados que osassinaram e ratificaram (segundo a sua própria interpretação), pela

45 COSBEY, Aaron. “The Cartagena Protocol on Biosafety: An analysis of Results”.Winnipeg, International Institute for Sustainable Development, 2000.

Page 38: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

38

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

prática das organizações internacionais relevantes e pelos tribunaisinternacionais instados a decidir sobre controvérsias entre dois ou maisEstados Partes46.

Sempre e quando o Princípio da Precaução for invocado emalgum tratado ou instrumento jurídico internacional, ele será, portanto,aplicável aos Estados Partes daquele instrumento, nos termos e nolimite de sua própria incorporação. Terá caráter obrigatório ouvoluntário, segundo os termos legais de sua invocação.

À luz desses fatos e da análise apresentada nas duas seçõesanteriores sobre a inclusão do Princípio da Precaução em tratados,convenções e outros instrumentos multilaterais e plurilaterais, há quemdefenda a idéia de que esse princípio já é parte do “direito internacionalambiental”47.

Direito consuetudinário

A Corte Internacional de Justiça determina que o direitoconsuetudinário origina-se da prática do Estado e da opinio juris48.Diz a Corte que o direito internacional consuetudinário “results froma general and consistent practice of states followed by them from asense of legal obligation”49. Os acordos internacionais, ao criaremleis para os seus Estados Partes, também contribuem para a instituiçãodo direito consuetudinário, sempre que tais acordos tenham carátergeral, isto é, sejam abertos a qualquer Estado e amplamente aceitos.Em “North Sea Continental Shelf Cases”, a Corte Internacional deJustiça confirma esse parecer com a determinação de que as regrasde tratados podem evoluir para uma lei consuetudinária internacional

46 CAMERON, 1994, op. cit., p. 121.47 Cameron e Stillwell encontram-se entre os que procuram divulgar essa versão dosfatos.48 STEWART, Terence. A Nexus of Trade and the Environment: The Relationship betweenthe Cartagena Protocol on Biosafety and the SPS Agreement of the World TradeOrganization. Washington, D.C., Stewart and Stewart, 2000, p. 34.49 CAMERON, 2001, op. cit., p. 122.

Page 39: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O ARCABOUÇO JURÍDICO INTERNACIONAL NA ÁREA DE MEIO AMBIENTE

39

se a participação naquele tratado é “widespread, representative, andis supported by states whose interests are particularly affected”50.

Segundo alguns estudiosos do tema, a aplicação de leisconsuetudinárias na área ambiental é restrita. O respeito à liberdadeem alto-mar e a cooperação no uso de recursos naturaiscompartilhados seriam alguns dos poucos exemplos de práticasconsistentes ou costumes internacionais no campo da proteção domeio ambiente.

Entretanto, a presença do Princípio da Precaução nasconvenções de meio ambiente é, para muitos analistas, evidência deprática de Estado e também de opinio juris, na medida em que oscompromissos assumidos por força de um tratado podem serutilizados em argumentação diante de corte internacional. Ilustra esseargumento a referência ao caso Diversion of the Danube River, emque a Hungria alegou, diante da Corte Internacional de Justiça, em1977, estar obrigada pela lei internacional a aplicar o Princípio daPrecaução para proteger recursos naturais transfronteiriços51.

A incorporação, implícita ou explícita, do Princípio daPrecaução nas legislações nacionais e estaduais de vários países oublocos regionais, como Alemanha, EUA e União Européia, reforçaria,na visão de muitos analistas, a inferência de que esse princípio estáse fortalecendo progressivamente como lei consuetudinária.

Duas ordens de argumentos parecem contradizer as opiniõesversadas acima. O primeiro argumento considera que a merareferência a um princípio em tratados não o eleva à categoria de leiconsuetudinária. Sua aplicação a casos concretos seria condiçãoindispensável para a transformação da prática em costume52.

50 Id.51 É interessante notar que esse mesmo caso foi citado pelo Órgão de Apelação nocontencioso de EC-Hormones para fundamentar parecer de que o Princípio da Precauçãonão havia adquirido status de direito consuetudinário internacional. Vide WT/DS26/AB/R, parágrafo 123, nota 93.52 STEWART, op. cit., p. 35.

Page 40: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

40

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

O segundo argumento versa sobre as alegadas fraquezas doPrincípio da Precaução, como o seu caráter vago, o que dificulta, senão impede, sua plena aplicação a casos concretos.

Princípios gerais e decisões judiciais

Há vários exemplos, na história recente, do recurso ao Princípioda Precaução em cortes internacionais. As decisões judiciais baseadasnesse princípio, no entanto, são ainda restritas.

O Princípio da Precaução foi, em 1995, por exemplo, invocadodiante da Corte Internacional de Justiça em contencioso entre a NovaZelândia e a França sobre testes nucleares. A referência ao princípionão partiu só da Nova Zelândia, parte no litígio, mas de países cominteresses na região do Pacífico Sul. A Austrália, as Ilhas Salomão, asIlhas Marshall e os Estados Federados da Micronésia foram unânimesna argumentação de que a França estava obrigada por lei internacionalconsuetudinária a respeitar o Princípio da Precaução e, por via deconseqüência, a proceder a análises de risco ambiental antes de conduzirtestes nucleares. A disputa em exame não prosperou em seu mérito e aCorte Internacional de Justiça tampouco se pronunciou sobre o statusdo Princípio da Precaução no direito internacional. Alguns autoresrecordam, entretanto, que os juízes Weeramantry e Palmer, apósextensa pesquisa aos tratados internacionais que incorporam o Princípioda Precaução, concluíram que esse princípio havia evoluído e poderia,portanto, ser considerado um “principle of custom in international lawrelating to the environment”53. (Ênfase da autora.)

Outros exemplos do recurso ao Princípio da Precaução emtribunais internacionais são os recentes “Southern Bluefin TunaCases”, julgados pelo Tribunal Internacional sobre Direito do Mar(ITLOS). Austrália e Nova Zelândia invocaram o Princípio da Precauçãopara argumentar que o Japão havia violado as obrigações acordadas

53 CAMERON, 2001, op. cit., p. 128.

Page 41: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O ARCABOUÇO JURÍDICO INTERNACIONAL NA ÁREA DE MEIO AMBIENTE

41

no âmbito da Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar(UNCLOS) relativas à conservação do peixe espada (southern bluefintuna, SBT).

A violação, segundo as Partes reclamantes, se consubstanciavana prática japonesa de pesca experimental, que contribuía para agravaro problema de extinção da espécie e resultava no descumprimento dequota nacional determinada pela Comissão para a conservação dopeixe espada. Ainda que as Partes na controvérsia não tenham disputadoo fato de que os estoques daquele peixe sofriam sério risco de extinção,elas não se puseram de acordo quanto aos dados científicos relativosao efeito dos programas experimentais de pesca sobre a conservaçãodos estoques de SBT. Sob o argumento de que agiam em linha com oPrincípio da Precaução, Austrália e Nova Zelândia solicitaram aoTribunal a aprovação de algumas medidas provisórias até que a disputafosse definitivamente resolvida. O ITLOS determinou que as Partesdeveriam agir com prudência e cautela para assegurar a efetivaimplementação de medidas visando à preservação do SBT. Alegandoa ausência de certeza científica sobre a matéria em exame, o Tribunalfrisou a necessidade de que medidas preventivas fossem observadaspara evitar a progressiva deterioração dos estoques de atum e, emseguida, estabeleceu que as Partes deveriam restringir sua pesca àsalocações nacionais.

A impossibilidade de recorrer a fatos e dados científicosconclusivos contribuiu para que o ITLOS determinasse medidas deprecaução, apesar de a Convenção relevante (UNCLOS) sequerincorporar em seu arcabouço jurídico o Princípio da Precaução.

Alguns analistas consideram este um episódio emblemático daforma pela qual os tribunais internacionais estariam começando a aplicaro Princípio da Precaução como princípio geral ou lei consuetudináriado direito internacional54.

54 Id., p. 130, e STILLWELL, op. cit., pp. 14-15.

Page 42: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 43: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CAPÍTULO III

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO

NA SOCIEDADE MODERNA

Page 44: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 45: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

45

A formulação adotada na Declaração do Rio, de 1992,reúne as características e os elementos básicos do Princípio daPrecaução: a percepção de dano sério ou irreversível; a incertezacientífica sobre a possibilidade e magnitude do dano; e oreconhecimento de que a incerteza científica não deve ser obstáculoà ação regulatória.

Quando invocado, o Princípio da Precaução introduz noprocesso decisório três elementos básicos: a preferência por evitaro risco em vez de administrá-lo; o recurso à ação antecipatória; ea inversão do ônus da prova, ou seja, o proponente de uma novaatividade deve prover a certeza científica quanto à sua segurança.

O Princípio da Precaução lida, assim, com o que Bodaskydenominou de “dilema do regulador”55, o qual se vê diante deuma percepção de risco, cuja materialização ou concretização nãopode ser confirmada pela ciência, mas exige ação. Esse dilema éagravado pelo reconhecimento de que, pelo menos no planoteórico, a incerteza é inerente a qualquer empresa científica e àhipótese que a fundamenta. O “Hume’s Problem” bem caracterizaessa situação:

No matter how many times a phenomenon is observed, wecannot be sure that this represents a universal pattern or ‘law’– logically, even large numbers of past examples cannotguarantee that the same events and relationships will continueto be found in the future. Even when “laws” provide convincingand effective explanations for phenomena, we cannot be sure

CAPÍTULO IIIO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

55 SANTILLO, JOHNSTON e STRINGER, op. cit., p. 37.

Page 46: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

46

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

that such ‘laws’ will continue to hold true, nor that we have notimperfectly devised them and that new exceptions will not ariseunder circumstances we have not foreseen56.

À luz dessa incerteza ou da certeza de que a ciência jamais ofereceráresposta definitiva para um problema específico, pelo menos não dentrodo universo temporal necessário para a tomada de decisão, o reguladorgeralmente busca a orientação necessária no consenso científico. Quandoa emergência de diferentes pontos de vista torna impossível esse consenso,o Princípio da Precaução entra em cena e conclama a ação antecipadapara proteger o meio ambiente e a saúde humana.

Esse é o tema do presente capítulo, que discute a percepçãodo risco na sociedade moderna, a relação entre a incerteza científica ea “ciência precautória” e o processo político decisório que emana dessequadro. A partir dessa discussão será possível entender as expectativaspolíticas em relação ao Princípio da Precaução e os limites de suaaplicação na sociedade moderna.

RISCO

De acordo com a literatura especializada57, a civilização industrialmoderna assiste ao advento da “sociedade do risco” (“Risk Society”).Os avanços tecnológicos produzem benefícios sem precedentes, masa evolução cada vez mais acelerada do conhecimento humano tambémtraz seus riscos intrínsecos. Impõe-se à sociedade decisões sobre comoidentificar, evitar, minimizar ou administrar esses riscos tecnológicos.Os que constatam o nascimento da sociedade de risco afirmam que oconceito abstrato do risco vem-se transformando em princípioordenador dominante da estrutura social. A percepção do risco

56 STILLWELL, op. cit., p. 4.57 STIRLING, Andy. “The Precautionary Principle in Sience and Technology”. In:VVAA, Reinterpreting the Precautionary Principle, op. cit., p. 63, referência a Beck.

Page 47: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

47

condiciona e influencia as relações institucionais e substitui os elementoscultural e financeiro na emergência das tensões sociais e dos conflitospolíticos. Valores e interesses divergentes, somados a incidentes recentesque apontam para erros de avaliação política (a questão da EEB naInglaterra é exemplo flagrante), fazem emergir a desconfiança do poderpolítico, o que, por sua vez, incentiva o debate sobre o direito e alegitimidade da interpretação e regulamentação do risco. Este passa,assim, a integrar o conjunto de elementos que compõe e influencia osistema decisório, inclusive, como defendem alguns analistas, empatamar de igualdade com a ciência58.

A complexidade das novas tecnologias introduz dificuldadesadicionais à identificação e administração do risco. Na sociedademoderna, esse risco é multifacetado, pois não se limita a uma únicaárea. A biotecnologia é um bom exemplo de múltiplo potencial do riscotecnológico. O debate nessa área não se restringe aos efeitos sobre omeio ambiente, mas abarca preocupações com a saúde humana, compráticas agrícolas, com questões sociais, econômicas e até éticas.

Além da questão dos produtos geneticamente modificados, oaquecimento do planeta, a utilização crescente de produtos químicos,cujos efeitos desconhecemos, a emissão de poluentes orgânicospersistentes, a proliferação de doenças em animais e seres humanos,geralmente associadas a práticas agrícolas intensivas, são outrosexemplos que demonstram a característica multidimensional do riscotecnológico na sociedade moderna. Essa diversidade de potenciaisimpactos aumenta o desafio para identificar e mensurar o risco.

Para tanto, é freqüente o recurso ao mecanismo de análise derisco. O Banco Mundial59, ao definir análise de risco, determina queesse mecanismo deve envolver o exame do perigo, a estimativa dafreqüência ou probabilidade e a avaliação ou estimativa do dano. Trata-se, portanto, de processo baseado na ciência.

58 Id., p. 64.59 STILLWELL, op. cit., p. 6.

Page 48: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

48

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Dizem os estudiosos que o processo científico convencionalde análise de risco geralmente recorre a uma única medida: o índicede mortalidade humana. Algumas técnicas, consideradas maissofisticadas, servem-se também da relação entre pessoas sãs edoentes, ou seja, dos índices de morbidade associados adeterminada atividade ou produto. Esses processos de verificaçãocientífica resultariam, muitas vezes, na simplificação do problema ena conseqüente redução da avaliação do risco a um único fator. Acrítica mais freqüente a esse método “reducionista” ou quantitativodiz respeito à impossibilidade de avaliar a dimensão qualitativa, sociale de julgamento de valor inerente ao risco tecnológico.

A Organização Mundial de Saúde oferece elementos paraesse debate. Sua definição de análise de risco não descarta apreeminência da ciência, mas identifica duas etapas necessárias aesse processo: a científica e a político-administrativa. A fase científicaenvolve a identificação do perigo, a avaliação do risco e o examedo dano. A etapa política inclui a determinação do risco aceitável,a identificação do público ou segmento da sociedade que deve serprotegido; a escolha da tecnologia a ser controlada ou autorizada eo equilíbrio dos custos e benefícios. Segundo, a OMS, portanto, aanálise de risco comporta uma visão crítica da ciência e oconseqüente julgamento de valor inerente à decisão política.

A perspectiva da OMS aproxima-se, assim, da visão daquelesanalistas que advogam ser o risco na sociedade moderna multidimensionale incomensurável. De acordo com essa linha de raciocínio, a análise dorisco deve levar em consideração diferentes tipos de fatores, de custos ede benefícios. Segundo Stirling, deve também ser completa e abrangente60

ou seja, deve levar em conta a ampla gama de temas pertinentes ao riscoem exame. Outros analistas que compartilham esse ponto de vista referem-se também a um processo mais democrático de consultas ou a esquemamais inclusivo dos segmentos da sociedade. Nas palavras de McGarvin:

60 STIRLING, op. cit., p. 70

Page 49: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

49

It is when faced with such profound issues, and where thefactual basis is disputed, values within society diverse, and netbenefits highly uncertain or unevenly spread, that the assessmentof benefits must be widely drawn. Scientific appraisal is still anessential element, but other dimensions also have to come tothe fore61.

Desse conflito entre a carência de consenso científico e anecessidade de arbitrar as preferências em uma sociedade modernaemerge o processo de tomada de decisão sobre o risco que é,sobretudo, fundamentado na interpretação dos elementos políticos edos valores sociais envolvidos. Os dados coletados e examinados pormétodos científicos têm seu papel, mas, na medida em que não sãocapazes de aportar a certeza sobre o melhor curso político a seguir,sua participação deve ser acessória e não determinante. Essa é a tesecomunitária que sustenta a aplicação do Princípio da Precaução. Esteprincípio fornece a necessária fundamentação conceitual para que adeterminação política, quando confrontada com a incerteza científica,não opte pela inação. O Princípio da Precaução propõe, portanto, aação antecipada e precautória em defesa do meio ambiente e da saúdehumana. Daí o conflito ou a complementaridade (como defendemalguns) entre a ciência precautória e a ciência mecânica, tema a serdesenvolvido mais adiante neste capítulo.

INCERTEZA

Diante das ameaças crescentes à saúde do ser humano e àproteção do meio ambiente, intensifica-se no contexto acadêmicointernacional o debate sobre o papel da ciência e o da precaução nasociedade moderna.

61 McGARVIN, Malcom. “Science, Precaution, Facts and Values”. In: VVAA,Reinterpreting the Precautionary Principle. Londres, Cameron May Ltd., op. cit., p. 54.

Page 50: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

50

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Permeia e alimenta este debate a questão da incerteza científica.O termo “incerteza” é geralmente utilizado para descrever situaçõesem que o conhecimento não é objeto de consenso ou as evidênciasdisponíveis são consideradas insuficientes.

Para Hunt62, a incerteza pode se manifestar sob quatro formasdiferentes: risco, incerteza (propriamente dita), ignorância eindeterminação. O risco englobaria o conhecimento do sistema e dosfatores envolvidos. A incerteza científica implicaria o conhecimento doslimites do sistema, mas o desconhecimento do significado quantitativodos fatores nele envolvidos. A ignorância é o que não se conhece;entretanto, só é identificada a partir da possibilidade da descoberta denovos conhecimentos. A indeterminação constituiria conceito maiscomplexo. Envolve a aceitação de que o conhecimento científico é,por natureza, infinito e condicionado pelo contexto social. Hunt completaesse raciocínio ao afirmar que:

In the conventional classification, risk and uncertainty areperceived as amenable to resolution by the production of ‘morescience’ to fill the gaps. Risk, uncertainty and ignorance can beconceived as a linear scale from more to less knowledge.…indeterminacy, particularly that of a social kind is implicated inrisk, uncertainty and ignorance and is a feature of all forms ofscientific and technical knowledge63.

A partir desse raciocínio, portanto, a incerteza científica será,sob qualquer uma de suas formas de manifestação, produto maisassociado às relações e aos conflitos sociais do que à própria ciência.O que equivale a dizer que a certeza ou incerteza científica variarásegundo o contexto político e social em que se inserir. Da mesma forma,a resposta a essa incerteza estará igualmente condicionada ao ambientesocial.

62 HUNT, Jane. “The Social Construction of Precaution”. In: VVAA, Interpreting thePrecautionary Principle. Londres, op. cit., p. 117.63 Id., 118.

Page 51: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

51

A influência da sociedade nesse processo pode ser verificada,por exemplo, quando governos, por meio de suas agências competentes,opinam sobre a segurança de novos produtos ou atividades. Emseguida, grupos ambientalistas, associações de proteção dosconsumidores e outros segmentos da sociedade entram em cena,divulgam incertezas sobre os produtos ou os métodos utilizados nasanálises de risco, e, assim, contestam a determinação governamentalcom a sua “indeterminação”. O debate ou embate internacional sobrea comercialização de produtos geneticamente modificados éemblemático dessa situação. A questão do embargo europeu à carnenorte-americana tratada à base de hormônios constitui outro exemploimportante. Os EUA questionaram a medida européia na OMC.Venceram o contencioso, cujas decisões foram fundamentadas empareceres científicos sobre a natureza do risco associado ao uso dehormônios. Imune à opinião dos cientistas e à decisão jurídica do Órgãode Solução de Controvérsias da OMC, que, aliás, constitui obrigaçãolegal para o governo do país afetado, a sociedade européia determinoua incerteza científica dessa questão a partir de sua própria percepçãodo risco.

A alta subjetividade na determinação e no manejo da incertezacientífica leva, portanto, alguns autores a concluir que “uncertainty ispart of a rhetoric of science, an argumentative strategy which canbe employed for a variety of purposes. It is the opposite side of thecoin to the equally negotiated term ‘adequate proof”64. Essa é amatéria em discussão nas próximas seções do trabalho.

INCERTEZA CIENTÍFICA E “CIÊNCIA PRECAUTÓRIA”

Críticos do Princípio da Precaução costumam afirmar que esseprincípio é antagônico à ciência, na medida em que determina que aação política deve antecipar-se à prova científica de dano. Tal ação

64 Ibid., op. cit., p. 121.

Page 52: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

52

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

antecipatória é percebida como uma atitude de desrespeito à ciência ede irreverência à autoridade científica. O Princípio da Precaução é,assim, visto como uma ameaça importante à fundamentação científicado processo de decisão sobre políticas em matéria de meio ambiente ede saúde humana.

Os simpatizantes do Princípio da Precaução, entretanto, nãocompartilham desse ponto de vista. Consideram que a ciência e aprecaução não são antagônicas. Acreditam, ao contrário, que a ciênciadesempenha papel fundamental na aplicação de medidas de caráterantecipatório. Para tanto, desenvolveram raciocínio conceitual queprocura justificar essa proposta e, por meio dela, legitimar o recursoao Princípio da Precaução.

Esses analistas partem da premissa básica de que osproblemas ambientais e de saúde humana são complexos, de longoprazo e permeados de juízo de valor (“value-laden”). McGarvin,por exemplo, comenta sobre a dificuldade de analisar cientificamenteo impacto ambiental e afirma: “There is no ‘grand unifying concept’equivalent to the chemist’s Periodic Table, which predictsproperties and consequences. Instead we are forced to rely onempirical and time-consuming individual studies, a theoreticallyincomplete ‘building-site’, and a firm need for precaution”65.Peters, em Critique for Ecology, recorda que a ecologia colocaperguntas importantes - “important questions that can never beanswered” -, as quais, na opinião de McGarvin, reforçam anecessidade da precaução66.

Dessa complexidade, mas, sobretudo, da relação entre os dadoscientíficos e as percepções e preferências da sociedade moderna emergea incerteza científica inerente às questões ambientais e de saúde humana.Ao ser fruto do contexto social e político, esse tipo de incerteza nãoencontra solução, na perspectiva desses estudiosos, na ciência clássica,

65 McGARVIN, op. cit., p. 38.66 Apud McGARVIN, op. cit., p. 37.

Page 53: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

53

ou seja, naquela que Barrett e Raffensperger67 denominam de “ciênciamecânica”, por ser fundamentada na análise do risco causal. A ciênciaque busca a precisão e a exatidão nos cálculos e nas previsões; quetende a caracterizar a incerteza científica como temporária e superável;e que, nesse processo, ignora o contexto social e político da matériaem exame, não teria aplicação no universo ambiental. Ademais, naavaliação de McGarvin, a “ciência mecânica”, por si só, reúne elementosde dúvida sobre a sua capacidade de analisar fatos a partir deperspectiva neutra, pois “the ‘facts’ to which we attach significanceare very much influenced by our world view and the observationswe choose to make”68.

A “ciência precautória”69, por sua vez, é descrita como aquelaem que o processo de desenvolvimento e de disseminação doconhecimento tecnológico incorpora valores da sociedade e leva emconta o contexto social e político em que se insere. De acordo com essemodelo, o cientista é co-partícipe no processo analítico, que reúne tantoo exame técnico de dados coletados por parâmetros cognitivos quantoa apreciação política dos elementos subjetivos de uma sociedade.

Essa “ciência” seria, ainda na visão dos simpatizantes doPrincípio da Precaução, o modelo mais adequado, até ideal, para lidarcom o universo mais amplo das incertezas inerentes às decisões sobrea proteção do meio ambiente e da saúde humana. Na interpretação deWynne70, a “ciência precautória” atua no plano da indeterminação, queé, como se recorda, o conjunto de situações dinâmicas e complexas,que emanam da interação do elemento político e social com o dadocognitivo. A ciência clássica ou “mecânica” deliberaria, por sua vez, nouniverso restrito do que é determinável.

67 BARRETT, Katherine e RAFFENSPERGER, Carolyn. “Precautionary Science”. In:VVAA Protecting Public Health and the Environment – Implementing the PrecautionaryPrinciple, op. cit., p. 106.68 McGARVIN, op. cit., p. 36.69 BARRET e RAFFENSPERGER, op. cit., p. 115.70 Apud BARRET e RAFFENSPERGER, op. cit., p. 119.

Page 54: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

54

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Em suma, o debate em pauta busca legitimar a aplicação doPrincípio da Precaução a situações de incertezas científicas ou sociais. Demodo a minimizar resistências a esse princípio, alguns analistas procurammostrar que a “ciência da precaução” não é derrogatória da ciência clássica.Tal afirmação levanta dúvidas, na medida em que a construção conceitualda “ciência da precaução” assenta-se em relação de complementaridadeartificial. Embora muitas vezes legítimos, os elementos subjetivos quecompõem a fundamentação conceitual da precaução subtraem do processode tomada de decisão regulatória a previsibilidade que lhe é inerente. Nocontexto da “ciência precautória”, a prerrogativa ou a autoridade de arbítrioinerente ao governo (que se presume representante da vontade dasociedade) lhe é retirada. O Princípio da Precaução requer, portanto,processo decisório mais participativo, para alguns, mais ineficiente, paraoutros. Esse é o tema em debate na próxima seção.

PROCESSO DECISÓRIO

Os estudiosos que advogam pelo recurso à “ciência precautória”para lidar com as complexidades e incertezas inerentes às questõesambientais e de saúde humana defendem, até por coerência conceitual, aadoção de um processo decisório mais “democrático”. Joel Tickner ecoaessa visão quando afirma que “democratic decision-making processesare an important component of the Precautionary Principle. Decisionsmade under great uncertainty are policy decisions. Science onlyprovides information about the kind of harm that is likely; it cannottell us what to do so that we avoid the harm” (Ênfase da autora.)71.

De acordo com essa corrente de pensamento, as políticas queautorizam a introdução ou proíbem a disseminação de determinadaatividade ou produto com potencial de afetar o ecossistema ou a saúdehumana são decisões que cabem ao público e, portanto, requereriam

71 TICKNER, Joel. “A Map Toward Precautionary Decision Making”. In: VVAA,Protecting Public Health and the Environment – Implementing the Precautionary Principle,op. cit., p. 175.

Page 55: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

55

análises holísticas e qualitativas. Tais análises têm por característicabásica zelar pelo equilíbrio entre o exame das evidências científicas e aapreciação dos valores sociais. Como se vê, esse processo decisóriomais amplo, participativo e democrático, que promove o diálogo entreo governo, o cientista, os grupos de interesses constituídos e o cidadãocomum, consiste, na prática, na implementação da “ciência precautória”ou na própria operacionalização do Princípio da Precaução. Na palavrasde Tim O’Riordan, “the handling of scientific uncertainty in themodern age is as much a feature of democratic participatory styleas it is a matter of scientific integrity. This development isrewarding for science, as it extends the finest of scientific traditionsinto a co-operative relationship with civil society”72.

As estruturas de decisão democrática promovidas por essegrupo de pensadores envolvem, portanto, a participação do cidadãoleigo, cuja opinião passa a ter peso igual ao parecer técnico e científico.Segundo os simpatizantes dessa linha de pensamento, esse novoprocesso decisório nasceu e se fortaleceu da crescente desconfiançado cidadão comum em relação às políticas de governo nas áreas deenergia nuclear, de biotecnologia, de comercialização e consumo desubstâncias perigosas, de utilização indevida de produtos químicos,entre outros temas controversos. Estudo de Russel Dalton, PoliticalSupport in advanced industrial democracies73, demonstra que aconfiança do público em seu respectivo governo teria diminuído em 18das 22 principais democracias do mundo por um fator de 3, desde1950 e de 2, desde 1970. Esse dado reforçaria a percepção de que“governments are seen to be pursuing an agenda that suits theirkey lobbies, not the popular will”74. Analistas citam como exemplo

72 O’RIORDAN, Tim. “The Precautionary Principle and Civic Science”. In: VVAA,Reinterpreting the Precautionary Principle.Londres, Cameron May Ltd., 2001, organizado por Timothy O’Riordan, James Camerone Andrew Jordan, p. 95.73 Apud O’RIORDAN, CAMERON e JORDAN, 2001, op. cit., p. 30.74 Id.

Page 56: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

56

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

concreto desse quadro a atitude do governo inglês de desconsiderarou de não interpretar corretamente a vontade do público no recentedebate sobre a comercialização de alimentos geneticamentemodificados. Dizem que “in the UK, the government gave everyindication that it was committed to biotechnology as a modernizingindustry, and that it thought the initial protest against GM foodwould disappear in a few months”75.

A conclusão da pesquisa de Dalton sugere “that there is littlepoint in governments taking a lead in the promotion ofbiotechnology or, indeed, any other controversial technology” ereforça a idéia de que processos decisórios mais inclusivos sãonecessários para resolver temas controversos na sociedade moderna76.

Estruturas deliberativas inovadoras, que promovem o diálogodo governo com a chamada sociedade civil, vêm-se desenvolvendoem vários países77, e tomando formas diferentes. A literaturaespecializada refere-se à prevalência de três modelos de decisãopopular. São eles: “conference consensus”, “scenario workshops” e“science shops”.

Os “Conference Consensus” envolvem a participação degrupos de cidadãos que recebem informações adiantadas sobredeterminado assunto e, após deliberação conjunta, preparam relatóriocom recomendações. As “conferências de consenso” são tambémrealizadas no formato de “júri popular”. Essas atividades, já muitocomuns na Europa, estão se disseminando para outros países. Recenteiniciativa do gênero, realizada na Noruega, foi determinante para que ogoverno do país optasse pelo banimento de produtos geneticamentemodificados daquele mercado. Na Índia, um “júri popular” decidiupela moratória para produção e comercialização de produtostransgênicos.

75 Ibid.76 Ibid.77 Dinamarca, Noruega, Suécia, Holanda, EUA.

Page 57: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

57

Os “Scenario Workshops” deliberam sobre temas maisabrangentes, como, por exemplo, políticas de desenvolvimentosustentável. O modelo contempla, igualmente, a participação dediferentes grupos da sociedade que, em conjunto, analisam alternativasou cenários de ação para superar obstáculos à consecução de objetivosde mais longo prazo.

Os “Science Shops” visam a habilitar o cidadão a participar dodebate científico seja com opiniões críticas sobre evidências científicasdisponíveis, seja com seus próprios estudos. Essa iniciativa geralmenteresulta na produção de novos insumos, quantitativos e qualitativos, parasubsidiar o processo decisório. As atividades de universidadesindependentes e de organizações não-governamentais que envolvem opúblico em trabalhos de pesquisa são exemplos desse modelodeliberativo.

O processo decisório participativo, democrático e inclusivo quepropõem os teóricos do Princípio da Precaução não se afasta muitode modelos de consulta utilizados por governos democráticos. Comou sem o Princípio da Precaução, existe a percepção de que o diálogoentre representantes governamentais e a sociedade civil não só éproveitoso, mas, sobretudo, necessário para a decisão e condução depolíticas. Não haveria, portanto, qualquer inovação nesse modelo nãofosse a importância que se pretende atribuir às informações que resultamdessas sessões deliberativas. Por mais legítimos que possam ser osresultados desses seminários, pois se pressupõe que representam avontade de seus participantes, não deixam de ser um, dentre outros,insumos à decisão governamental. Não será, por exemplo, o tribunalpopular sobre transgênicos realizado no Ceará, em 2002, que ditará apolítica brasileira sobre a matéria. A opinião deste e de outros foros deconsulta terá seu peso, como também terão as evidências científicassobre a matéria, bem como os interesses estratégicos do Brasil comoexportador de bens agrícolas. Todos esses dados devem ser parte dopacote decisório, não apenas a opinião ou a percepção de determinadosegmento da sociedade, seja ele consumidor ou produtor.

Page 58: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

58

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

ÔNUS DA PROVA

O ônus da prova é o encargo ou a obrigação de prova nasquestões judiciais. “Neste particular está certo e afirmado o princípiode que a obrigação de provar cabe a quem alega ou diz: onus probandiincumbit et qui dicit (...) Assim, firma-se o princípio aludido de que oônus da prova cabe sempre ao litigante que alega, seja para afirmardireito, ou seja para contestá-lo, em defesa ou oposição à pretensãodo adversário” 78.

O “Black’s Law Dictionary” confirma a definição acima aoafirmar que ônus da prova consiste na “party’s duty to prove adisputed assertion or charge. The burden of proof includes boththe burden of persuasion and the burden of production”79. E cita oseguinte comentário de William Hawkland:

The expression ‘burden of proof’ is tricky because it has beenused by courts and writers to mean various things. Strictlyspeaking, burden of proof denotes the duty of establishing by afair preponderance of the evidence the truth of the operativefacts upon which the issue at hand is made to turn by substantivelaw. Burden of proof is sometimes used in a secondary sense tomean the burden of going forward with the evidence. In thissense it is sometimes said that a party has the burden of counteringwith evidence a prima facie case made against that party80.

O ônus da prova é, portanto, a obrigação que incumbe à parteno litígio que alega ou afirma ou que tem o “duty of establishing (...)the truth”. Mesmo o significado secundário, a que se refere a passagemcitada, estaria compreendido na acepção de que o ônus da prova servetanto para “afirmar direito” quanto para “contestá-lo, em defesa ou

78 SILVA, De Plácido, Vocabulário Jurídico, Rio de Janeiro, Companhia Editora Forense,2000, 17a edição, atualizado por Nagib Slaibi Filho e Geraldo Magela Alves.79 Minesota, West Group, 1999, 7a Edição.80 Id., p. 191.

Page 59: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

59

oposição à pretensão do adversário”. Ambas as definições coincidem,nesse sentido, em que a parte que reclama tem o ônus inicial dedemonstrar com evidências de vínculo causal a existência de violaçãode uma obrigação contratual. A parte questionada é então obrigada acontestar os argumentos apresentados contra si, sob o risco de que oseu silêncio contribuirá para presumir verdadeira a evidência apresentadapela parte que iniciou o processo.

Definido o termo “ônus da prova”, é importante examinar comoo tema de sua “inversão” se insere no debate sobre o Princípio daPrecaução.

Alguns analistas iniciam esse debate com referências ao sistemapenal. Nesse sentido, uma deliberação judicial sobre a conduta humanana sociedade moderna fundamenta-se no princípio jurídico dasuposição da inocência até prova em contrário. Segundo Saunders,“this important rule reflects society’s view that convicting theinnocent is far worse than acquitting the guilty. It has profoundeffect on the outcome of many trials, but it still leaves the jurywith a lot to do. They still have to weigh up the evidence, and theyhave to decide for themselves what constitutes ‘reasonable’doubt”81.

A lei civil, como lembra James Cameron, geralmente estabeleceque as partes acusadas de degradar o meio ambiente “must be provenwrong in law by evidence, before they are required to stop theactivity in question”82. Preenchidos os requisitos “pré-mercadológicos”, a disseminação ou comercialização de novastecnologias, tradicionalmente, desenvolve-se sob a suposição de queuma atividade é “safe until proven harmful” ao meio ambiente e àsaúde humana83. Pressupõe-se, portanto, que, nessas condições, o

81 SAUNDERS, Peter. “The Precautionary Principle is Coherent”. Cambridge, Science,Technology and Innovation Program, Harvard Viewpoint, fev. de 2001, disponível em<www.cid.harvard.edu-cidbiotech-projects-pp.htm>.82 CAMERON, 2001, op. cit., p. 120.83 TICKNER, op. cit., p. 168.

Page 60: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

60

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

processo judicial observaria a seguinte dinâmica: a premissa de que ainovação tecnológica é legal contrapõe-se à obrigação contratual de nãocausar dano ao meio ambiente ou à saúde humana. O litigante quequestiona essa tecnologia tem por encargo, portanto, provar a violaçãoda obrigação contratual, por meio de “a fair preponderance ofevidences” ou por meio de vínculo causal entre a tecnologia e o meioambiente ou a saúde humana. Se a evidência apresentada for julgadasuficiente, o ônus da prova transfere-se para a outra parte, a quem cabecontestar aquelas afirmações. De acordo com esse cenário, a incertezacientífica opera a favor da inovação tecnológica, pois esta não é proibidae, em princípio, não sofre restrições, até que o consumidor ou orepresentante do público afetado ou interessado levante o problema eprove, por meio de evidência de vínculo causal genuíno e substantivo,que o produto ou a tecnologia sob suspeita pode afetar negativamente omeio ambiente ou o ser humano. Só então a atividade é proibida,regulamentada ou substituída.

A aplicação do Princípio da Precaução introduz nova dinâmicanessa relação, na medida em que faz desaparecer o pressuposto de quea inovação tecnológica é legal, embora a obrigação contratual permaneçaa mesma. Ao questionar a nova tecnologia o litigante tem apenas quealegar o risco implícito à inovação tecnológica ou expor sua percepçãode que a tecnologia em pauta não apresenta garantias de segurança.Desaparece a obrigação da demonstração do vínculo causal, que, nessecenário, limita-se a uma mera afirmação de possibilidade de risco. Oônus da prova passa automaticamente à outra parte, a quem cabe refutaraquela afirmação com a certeza científica de que o risco não existe. Trata-se de provar o negativo. Dizem os cientistas que a certeza científica éequivalente ao fato, portanto impossível de verificação empírica. Dá-sedessa forma a chamada “inversão” do ônus da prova pelo Princípio daPrecaução, que, na prática, constitui a “inversão” ou a redução do patamarde exigência da prova quanto à existência de risco. Desaparece o encargo“of establishing a fair preponderance of evidence” imposto ao litiganteque afirma a violação da obrigação contratual. Em outras palavras, o

Page 61: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

61

“onus probandi incumbit et qui dicit” é legitimado por nível muito baixode prova que se restringe a uma mera alegação de possibilidade deexistência de risco associado à inovação tecnológica. Como caracterizaTickner: “the amount of proof needed before taking precautionaryaction is much lower than that required under current decision-making schemes”84. Por outro lado, ao inovador é imposto um “onusprobandi” excessivamente alto, a ponto de constituir-se, na prática,obstáculo intransponível.

Barun Mitra85, sintetiza esse processo ao sublinhar que “theprecautionary principle seems to reverse the accepted judicialprinciple that one is innocent unless proven guilty, and advocatesthat in view of lack of certainty in knowledge, one is to be assumedguilty unless proven innocent. Logically, it is impossible to disprovea negative, more so if guilt includes even the potential to commit amistake”. (Ênfase da autora.)

Na dinâmica “precautória”, a incerteza científica milita contra ainovação tecnológica, pois sua disseminação, embora não proibida,está condicionada a um ônus de prova muitas vezes inalcançável. Essacaracterística do Princípio da Precaução é objeto de críticas freqüentes.Bodansky diz, por exemplo, que “ironically, this selective burdenshifting may actually produce greater long-term harm than anunshifted burden of proof, by preventing the introduction of newactivities or products which, while not risk free, are better thanwhat they would replace”86.

Outros analistas centram seus comentários na gravidade dasituação criada pela inversão do ônus da prova, à luz da indefiniçãosobre o que é seguro ou aceitável. Inerente a essa indefinição, comolembram esses analistas, é o seu caráter altamente subjetivo, pois a84 Id., p. 184, nota 4.85 MITRA, Barun. “Endangering the Principles of Free Society”. Cambridge, USA,Science, Technology and Innovation Program, Harvard Viewpoint, fevereiro 2001,disponível em <www.cid.harvard.edu-cidbiotech-projects-pp.htm>.86 BODANSKY, Daniel. “The Precautionary Principle in US Enviromental Law”. In:VVAA, Interpreting the Precautionary Principle, op. cit., p. 223.

Page 62: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

62

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

determinação do risco aceitável varia segundo a sociedade e ossegmentos nela envolvidos. Stirling corrobora essa linha de pensamentoao dizer que “precaution threatens to undermine science by openingthe floodgates to subjectivity”87.

Há também críticas que apontam para o fato de que essainversão do ônus da prova estaria mesclando os conceitos de perigo erisco que, na literatura científica, têm significados diferentes. ParaMarchant, perigo (“hazard”) seria o potencial intrínseco de um agentecausar efeito danoso, enquanto o conceito de risco, como se viuanteriormente, está vinculado à probabilidade e à magnitude de o efeitodanoso se manifestar88. Toda substância ou produto teria, em princípio,potencial intrínseco de perigo que poderá ou não se traduzir em risco.Nesse sentido, complementa Marchant, “because hazard potential isubiquitous, basing regulatory decisions on hazard alone creates thepotential for arbitrary, unfair and inefficient regulations”89. Ao ilustrarseu raciocínio, Marchant cita exemplos regulatórios na área dabiotecnologia. Na sua opinião, não existiria evidência científica de queprodutos geneticamente modificados apresentem riscos significativos àsaúde humana ou ao meio ambiente. Não obstante, perigos potenciaisrelacionados à transferência de genes entre espécies ou aodesenvolvimento de novas formas de alergia estariam motivando aproibição da exploração e comercialização dessa tecnologia emergente.

Somem-se a essas críticas aquelas relacionadas ao tratamentoda incerteza científica pelo Princípio da Precaução que incorpora nãosó dados quantitativos, mas, sobretudo, valores qualitativos. Essasubjetividade na interpretação da incerteza científica aliada à inexistênciade uma clara definição sobre o limiar do que é seguro e de uma

87 STIRLING, Andy. “Science and Precaution in environmental protection?”. Cambridge,USA, Science, Technology and Innovation Program, Harvard Viewpoint, fev. de 2001,disponível em <www.cid.harvard.edu-cidbiotech-projects-pp.htm>.88 MARCHANT, Gary. “Two problems with the precautionary principle”. Cambridge,USA, Science, Technology and Innovation Program, Harvard Viewpoint, fev. de 2001,disponível em <www.cid.harvard.edu-cidbiotech-projects-pp.htm>.89 Id.

Page 63: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO NA SOCIEDADE MODERNA

63

diferenciação entre perigo e risco, leva alguns analistas a afirmar que oPrincípio da Precaução contribui para o congelamento tecnológico.

Referindo-se ao problema da poluição do ar, Bodansky oferecealguns comentários a propósito da inversão do ônus da prova sob oPrincípio da Precaução: “Shifting the burden of proof (...) is the simplestway of coping with uncertainty. But unless we want to stop everyonefrom doing everything, neither approach provides a general solution.No matter how cautious we are, we cannot always require proof ofsafety as a condition for action, not least because safety is evenmore difficult to establish than harm. Harm at least can be shownafter the fact. But safety is in essence a negative (i.e., no harm), andproving a negative is, as we know, impossible. For example, evenwhen products appear to be safe, they may later turn out to haveharmful effects”90.

A inversão do ônus da prova é talvez o elemento mais controversodo Princípio da Precaução. Nem mesmo os mais árduos defensoresdesse princípio admitem a aplicação generalizada e sistemática desseelemento às políticas de meio ambiente e de saúde humana. JamesCameron reconhece, por exemplo, que exigir do inovador ou “daqueleque propõe mudar o status quo do meio ambiente” prova incontestávelde segurança é problemático, pois a própria definição do que constituiriao status quo do meio ambiente é, em si, uma situação controversa91.Nesse sentido, a inversão do ônus da prova seria, para ele, aplicávelapenas em alguns casos. Essa abordagem caso a caso, a que se refereCameron, tem-se revelado igualmente polêmica, pois é muitas vezespercebida como uma barreira disfarçada ao comércio, em particular deprodutos agrícolas. Nas palavras de Braun Mitraz: “the precautionaryprinciple comes in very handy to keep the produce of developingcountries from the market”92.

90 BODANSKY, op. cit., p. 223.91 CAMERON, 2001, op. cit., p. 121.92 MITRA, op. cit.

Page 64: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 65: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CAPÍTULO IV

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO

E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA:A TRANSPOSIÇÃO DO MEIO AMBIENTE

PARA O COMÉRCIO DE ALIMENTOS

Page 66: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 67: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

TERMINOLOGIA

É importante notar que no debate internacional sobrebiotecnologia são utilizados diferentes termos para identificar objetosou técnicas semelhantes. O Protocolo de Biossegurança, por exemplo,refere-se aos organismos vivos modificados ou LMOs para designar“any living modified organism that possesses a novel combinationof genetic material obtained through the use of modernbiotechnology”93. Ainda segundo o Protocolo, os LMOs sãoclassificados em duas categorias: (i) os “intended for release into theenvironment” – nessa classe estão incluídas as sementes, os peixesvivos e microorganismos geneticamente modificados utilizados embiorrecuperação (“bioremediation”)94 – e (ii) os “intended for directuse as food or feed, or for processing”; essa categoria, que égeralmente denominada de LMO-FFPs, reúne, sobretudo os produtosagrícolas95.

Nas discussões sobre biotecnologia em diferentes instituiçõesinternacionais e na própria imprensa, no entanto, é comum a referênciaa expressões tais como OGMs (organismos geneticamentemodificados); produtos ou alimentos transgênicos; produtos GM, entreoutros, para designar de forma mais geral os LMOs. O presente

CAPÍTULO IV O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE

BIOSSEGURANÇA: A TRANSPOSIÇÃO DO MEIO AMBIENTE

PARA O COMÉRCIO DE ALIMENTOS

67

93 Artigo 3(g) do Protocolo de Biossegurança.94 Artigos 7 e 10 do Protocolo de Biossegurança.95 Artigo 11 do Protocolo de Biossegurança.

Page 68: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

68

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

trabalho adotará a terminologia do Protocolo de Biossegurança para odebate sobre este instrumento. Segundo o contexto da discussão,poderá, no entanto, recorrer às expressões menos precisas e maispopulares.

O PROCESSO NEGOCIADOR DO PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

E O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO

Desde o início dos anos 70, cientistas utilizam a biotecnologiapara transformar genética ou bioquimicamente plantas, animais emicrorganismos e, nesse processo, criar os chamados organismos vivosmodificados ou LMOs. Muitos dos países detentores dessa tecnologiadesenvolveram sua legislação doméstica para assegurar o manejo, atransferência, o uso e a eliminação segura dos LMOs. Esse conjuntode leis e regulamentos é conhecido por “biossegurança”.

O desenvolvimento da biotecnologia e a disseminaçãointernacional de seus produtos evidenciaram a necessidade de uminstrumento multilateral para regular os movimentos transfronteiriçosde produtos geneticamente modificados.

Assinada em 1992, no Rio de Janeiro, no contexto da UNCED,a Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD), em seu Artigo 19.3,determina às Partes considerar a eventual negociação de um protocolode biossegurança. O Artigo 19.3 lê:

The Parties shall consider the need for and modalities of a protocolsetting out appropriate procedures, including, in particular,advanced informed agreement, in the field of the safe transfer,handling and use of any living modified organism resulting frombiotechnology that may have adverse effect on the conservationand sustainable use of biological diversity.

Em julho de 1996, reunida na Dinamarca, a II Conferênciadas Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (II COP)cria o Grupo de Trabalho ad hoc sobre Biossegurança (BSWG) e

Page 69: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

69

acorda lista tentativa dos elementos que deverão constar do futuroprotocolo.

Entre julho de 1996 e dezembro de 1998, o Grupo de Trabalhoreúne-se repetidas vezes, na busca uma aproximação de posições sobreos elementos constitutivos do protocolo. O debate evidencia, desdeentão, interesses divergentes quanto (i) ao escopo do futuro instrumento,ou seja, quanto à inclusão de todos ou apenas de alguns tipos de LMOse seus subprodutos; e (ii) à abrangência e aos procedimentos do Acordosobre Informação Avançada (AIA – “Advanced InformedAgreement)”. Os negociadores divergem também sobre se caberia aoimportador ou ao exportador o ônus da análise do risco e se esta seriafundamentada em evidência científica ou no Princípio da Precaução.Há ainda dúvidas sobre a relação entre o Protocolo de Biossegurançae outros acordos internacionais, nomeadamente a OMC.

A VI Sessão do Grupo de Trabalho, realizada em Cartagenadas Índias, na Colômbia, em fevereiro de 1999, é interrompida semque se alcançasse o resultado esperado. O Protocolo não é concluído.Os temas relacionados ao comércio; o tratamento a ser estendido às“commodities” agrícolas ou LMO-FFPs; a inclusão do Princípio daPrecaução continuam a ser os pontos mais controversos.

Durante o ano de 1999, ou seja, entre Cartagena (fevereiro de1999) e Montreal (janeiro de 2000), intensifica-se o debate internacionalsobre o comércio de organismos vivos modificados. As seguidas crisesna área de saúde alimentar, especialmente na Europa, atingemdimensões de histeria, por força, sobretudo, da falta de controle àdisseminação da EEB – Encefalopatia Espongiforme Bovina – e desua vertente humana a Creutzfeld Jakob. Esse quadro favorece osopositores da biotecnologia, cada vez mais associada à questão desaúde alimentar, e contribui para o fortalecimento do movimento políticointernacional que demanda a conclusão do Protocolo.

No mesmo período, cresce o número de países que reformulamsuas leis domésticas relativas à utilização e ao manuseio de OGMs. AUnião Européia mantém sua política restritiva para o cultivo,

Page 70: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

70

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

comercialização e importação de organismos geneticamentemodificados. Relatórios sobre a interação desses organismos com omeio ambiente, em particular sobre o efeito do pólen de milhotransgênico nas borboletas “monarch”96, recrudescem o debateinternacional. A União Européia estende por pelo menos mais doisanos sua “moratória” para processo de aprovação de novas variedadesde produtos genéticos. O governo dos EUA anuncia que irá rever sualegislação doméstica. A indústria processadora de alimentos tambémreage. Fabricantes de queijo “tofu” no Japão, de “tortilla” no Méxicoe de comida de bebês nos EUA anunciam que não utilizarão maisinsumos transgênicos em seus produtos. Os mercados internacionaisfecham-se progressivamente às “commodities” norte-americanasgeneticamente modificadas, o que gera sérios problemas financeirosàs empresas de biotecnologia e aos agricultores norte-americanos97.

Essa situação culmina com o impasse da III Reunião Ministerialda Organização Mundial do Comércio (OMC), em Seattle. Os paísesmembros da OMC não coincidem sobre o lançamento de nova rodadade negociações multilaterais. São frustradas as expectativas dosprincipais países produtores de sementes e “commodities” transgênicas,sobretudo da indústria norte-americana, de se encontrar na OMC, nomédio prazo, eventual solução para o comércio internacional deprodutos geneticamente modificados.

O momentum internacional favorece, portanto, os simpatizantesdo Protocolo de Biossegurança, entre eles a União Européia. Os EUAe os outros dois exportadores de produtos agrícolas geneticamentemodificados, Argentina e o Canadá, encontravam-se crescentementeisolados na sua oposição ao Protocolo ou, pelo menos, ao Protocolotal como idealizado pela UE. Ademais, após a reunião – e os protestos

96 Relatório de pesquisa universitária informava que borboletas “monarch” estariammorrendo por força de contaminação do pólen disseminado pelo milho geneticamentemodificado. O relatório recebeu ampla divulgação e serviu de argumento a favor de tesesque questionavam a sanidade dos alimentos transgênicos.97 STEWART, op. cit., p. 2.

Page 71: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

71

- de Seattle, nenhum país, em particular os EUA, queria ver-se associadoa iniciativas que pudessem ser interpretadas como um favorecimentodos interesses comerciais em detrimento da proteção ao meio ambientee à saúde humana. Afigura-se generalizada a percepção de que o quadrodas relações internacionais poderia se beneficiar da distensão queadviria da adoção do Protocolo sobre Biossegurança.

É, portanto, nesse ambiente politicamente conturbado, mas degrande expectativa quanto à conclusão do Protocolo que o Presidentedo Grupo de Trabalho promove suas consultas informais. Os “ViennaSettings”, como vieram a ser conhecidos os procedimentos de consulta,assegura a transparência e a abertura necessárias na busca de soluçãopara os principais temas.

A reunião de Cartagena é retomada em Montreal, em janeirode 2000. Após uma semana de intensas negociações o Protocolo deCartagena sobre Biossegurança é adotado. O texto do novo acordoincorpora, no preâmbulo e na parte operativa, formulações que refletemo Princípio da Precaução. Em seu Artigo I, determina, na linha daabordagem precautória (“precautionary approach”) preconizada peloPrincípio 15 da Declaração do Rio, o objetivo de assegurar níveladequado de proteção e segurança para a transferência, o manuseio ea utilização de organismos vivos modificados que possam ter efeitosadversos na conservação e no uso sustentável da diversidade biológica.Estabelece também que os riscos à saúde humana sejam levados emconta e que os movimentos transfronteiriços de LMOs sejam objetode atenção especial98.

O Protocolo de Cartagena cria, ainda, o Acordo sobreInformação Avançada (AIA) relativo a organismos vivos modificados;estabelece diretrizes para informação e documentação de movimentostransfronteiriços de LMOs; e adota dispositivos relacionados àcapacitação técnica, a recursos financeiros e à divulgação deinformações.

98 Artigo 1º do Protocolo de Biossegurança.

Page 72: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

72

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

A letra do Protocolo de Cartagena é, no entanto, ambígua emrelação aos temas mais delicados. Essa ambigüidade é flagrante nosdispositivos relacionados ao Princípio da Precaução; na relação entredo Protocolo e outros acordos internacionais sobre comércio; e nadefinição do próprio caráter e escopo do instrumento.

Talvez por força de sua própria ambigüidade, o Protocolo éaclamado e comemorado por grande parte da comunidade ambientale pelos simpatizantes do livre comércio; pelos conservadores e pelosliberais em matéria de comércio agrícola; enfim, todos os gruposnegociadores clamam vitória. As ambigüidades são, assim, exploradas,senão evidenciadas nas interpretações e nas descrições do significadoe alcance do Protocolo.

A aclamação pública ao recém-concluído acordo não impediráum afluxo de críticas ao seu texto. Tais críticas evidenciam certafrustração da parte daqueles segmentos da sociedade que alimentavama esperança de que o Protocolo de Cartagena estabelecessedefinitivamente a supremacia dos temas ambientais sobre os interessescomerciais. Essas questões permanecem abertas e o seguinte relatoconfirma essa percepção:

While the protocol includes the precautionary principle and somelabeling requirements, and thus perhaps a plus for environmentalgroups, it may turn out to be much less than made out. For anytrade restrictions will be tested through the WTO disputesettlement process and the obligations on importing countriesinterpreted cumulatively, by panels and the appellate body99.

Esse debate será melhor desenvolvido nas próximas seções dopresente capítulo, quando serão apresentados os principais gruposnegociadores e descritos seus interesses. Serão, em seguida,examinados os principais temas negociados e o compromisso alcançado.

99 LIN, Lim. “Environment: Biosafety talks end on mixed note”. South-NorthDevelopment Monitor, 4596, Genebra, fev. de 2000, pp. 2-5.

Page 73: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

73

OS PRINCIPAIS GRUPOS NEGOCIADORES E SUAS POSIÇÕES

Durante as negociações do Protocolo de Biossegurançaevidenciou-se a formação de grupos de países que se constituíram apartir da identidade de suas posições e interesses negociadores. Dessesgrupos, cinco se destacaram por sua atuação. São eles: (i) o Grupo deMiami, composto por Argentina, Austrália, Canadá, Chile, EstadosUnidos e Uruguai; (ii) a União Européia; (iii) o Grupo dos “Like-Minded”, integrado pelo Brasil e os demais países do G-77, à exceçãoda Argentina, Uruguai e Chile; (iv) o Grupo do Compromisso(“Compromise Group”), do qual faziam parte Japão, México, Noruega,Cingapura, Coréia do Sul, Suíça e Nova Zelândia100; e (v) Grupo dospaíses da Europa Central e do Leste.

Grupo de Miami

Esse grupo reunia os principais exportadores de produtos,sementes e alimentos geneticamente modificados. Os EUA respondiam,à época, por cerca de 72% desse comércio; a Argentina, por 17% e oCanadá, por 10%101. A atuação do grupo pautava-se por seu interesseem que a regulamentação do comércio de produtos transgênicos nãoresultasse em complicados procedimentos burocráticos para aprovaçãode novas variedades, nem em barreiras não-tarifárias ao comércio deprodutos agrícolas. O grupo suspeitava do interesse de alguns países,particularmente da UE, de utilizar o Protocolo para legitimarprocedimentos considerados ilegais à luz dos compromissos da OMC.Os integrantes do grupo mostravam-se, portanto, vigilantes para que aproteção do meio ambiente não servisse de pretexto ou disfarce apolíticas protecionistas. Assegurar a inclusão da “savings clause”,manifestação que preservaria os direitos e as obrigações acordados

100 A Nova Zelândia só se juntou ao Grupo do Compromisso em Montreal.101 A China responde por 1%.

Page 74: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

74

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

na OMC, e limitar a aplicação do Princípio da Precaução e deconsiderações de ordem econômica e social no processo de decisãoconstituíam os principais objetivos negociadores do Grupo de Miami.Para tanto, seus representantes argumentavam que decisões sobreanálise de risco deveriam ser baseadas em fundamentos científicos.No pano de fundo, figurava o desfecho da disputa comercial relativa àcarne tratada a base de hormônios.

O Grupo de Miami estava também atento para evitar que osLMO-FFPs (para alimentação e processamento) fossem incluídos noâmbito do Acordo sobre Informação Avançada (AIA). Argumentavamque, além de seguros para o consumo, esses produtos nãoapresentavam ameaça ao meio ambiente. Ademais, sua inclusão noAIA poderia representar barreira intransponível ao comérciointernacional de “commodities”, à luz das características particularesde comercialização dos LMO-FFPs.

O Grupo de Miami preocupava-se também com possíveis decisõessobre rotulagem de LMO-FFPs. Consideravam que o exercício desegregação, além de difícil no caso de “commodities”, era desnecessário,dada a sua alegada segurança para consumo. A exigência de rotulagemresultaria, portanto, em gasto adicional que prejudicaria o produtor eencarecia o produto, sem ganho para o consumidor ou o meio ambiente.

Durante os anos de 1998 e 1999, à margem das reuniões dosComitês de Agricultura, de Comércio e Meio Ambiente e de MedidasSanitárias e Fitossanitárias, representantes do Grupo de Miamiencontraram-se informalmente com diplomatas dos países membrosdo Grupo de Cairns para manifestar sua preocupação com osdesdobramentos nas negociações do Protocolo de Biossegurança.Sublinhavam, em particular, as ameaças que o processo de Montrealencerrava para o comércio internacional de bens agrícolas. Nessa linha,chamavam atenção para os temas que consideravam mais sensíveispara os países exportadores agrícolas, entre eles a “savings clause”,o Princípio da Precaução, o Acordo de Informação Avançada (AIA) ea exigência de rotulagem.

Page 75: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

75

A União Européia

A União Européia defendia um protocolo forte, com ênfase emconsiderações socioeconômicas e, sobretudo, orientado à proteçãoda saúde humana. A incorporação do Princípio da Precaução no textooperativo do Protocolo foi, desde o início das negociações, o principalobjetivo a nortear a atuação da UE. As crises da EEB, da dioxina nofrango, dos queijos contaminados e a derrota na controvérsia sobrecarne tratada a base de hormônio provocaram reação fortíssima daopinião pública européia, que exigia uma atuação conseqüente de suadelegação nas reuniões negociadoras do Protocolo de Biossegurança.Os negociadores, os representantes de alto nível e os Ministros queparticiparam das sessões de negociação estavam sob grande pressãopara lograr um instrumento capaz de evitar que os crescentes problemasde saúde alimentar se propagassem para o campo dos alimentosgeneticamente modificados.

Alguns analistas, entre eles Francis Smith102, apontam para omodelo agrícola europeu como mais um elemento na definição da posturanegociadora desse grupo de países. Diz ela: “EU countries, with theirheavily subsidized farming, view foreign agribusinesses as acompetitive threat. With heavy subsidies and price supports, EUfarmers see no need to improve productivity”103.

Com freqüência, as posições européias eram diametralmenteopostas às do Grupo de Miami. Ademais de sua postura em favor deuma versão robusta do Princípio da Precaução, os europeus defendiama inclusão dos LMO-FFPs no Acordo de Informação Avançada (AIA)e argumentavam em favor da rotulagem. Os negociadores da UEmostravam-se igualmente vocais na objeção à inclusão da “savings

102 SMITH, Francis. “The Biosafety Protocol: The Real Losers are DevelopingCountries”. Briefly, Perspectives on Legislation, Regulation, and Litigation, Volume 4,Número 3, Washington, D.C., National Legal Center for the Public Interest, março de2000, p. 1-40.103 SMITH, op. cit., p.10.

Page 76: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

76

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

clause”, pois não desejavam que o Acordo de SPS da OMCprevalecesse sobre o Protocolo de Biossegurança.

Grupo dos “Like-Minded”

Constituía o grupo mais numeroso. Sua composiçãocompreendia a maioria dos países em desenvolvimento, desde aquelesque não possuíam qualquer legislação, estrutura ou indústria domésticana área de biotecnologia até os detentores de sistemas embrionáriosou já razoavelmente desenvolvidos.

Como a UE, o grupo dos “like-minded” também defendiaa adoção de um instrumento forte e estrito, que, na sua percepção,era necessário não só para proteger o meio ambiente e a saúdehumana, mas também para proteger a si próprios, dada a suadeficiência estrutural para lidar adequadamente com a novidadetecnológica dos LMOs. Por essa razão, esse grupo foi o maioradvogado dos dispositivos sobre capacitação técnica que requereriados países desenvolvidos ou da indústria de biotecnologia o ônusfinanceiro para formar quadro institucional capaz de desenvolverlegislação doméstica adequada. Essa postura negociadora ajudoua UE em suas pretensões de transferir ao produtor ou exportador oônus da análise de risco e, portanto, da prova da segurança doproduto a ser exportado.

Em geral, as posições dos países em desenvolvimentointegrantes desse grupo aproximavam-se mais das da UE do quedaquelas defendidas pelo Grupo de Miami. Advogavam uma coberturaabrangente do Protocolo, isto é, a inclusão dos LMO-FFPs ou“commodities” agrícolas no AIA, sob o argumento de que poderiamser inadvertidamente plantados (“released into the environment”) enão consumidos como alimentos nos países em desenvolvimento. Os“like-minded” apoiavam também a adoção do Princípio da Precauçãoe a precedência do Protocolo sobre outros acordos internacionaisexistentes.

Page 77: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

77

Embora integrasse o Grupo dos “Like-Minded”, o Brasil nãomanteve uma aliança automática e inequívoca com as posturas dessegrupo. À luz de sua característica singular de país em desenvolvimento,rico em biodiversidade, detentor de grande potencial exportador agrícolae com indústria de biotecnologia nascente, o Brasil atuou de forma apreservar esses interesses específicos e, muitas vezes, conflitantes. Porisso, as posições brasileiras ora coincidiam com os interesses europeusora com os dos EUA. Assim, se, por um lado, o Brasil apoiou a inclusãodo Princípio da Precaução no texto do Protocolo, por outro, aliou-secom os EUA na questão da “savings clause”.

No que tange ao AIA, a posição brasileira novamente inclinava-se na direção dos interesses europeus, na medida em que favorecia ainclusão de produtos de base (LMO-FFPs) nesse mecanismo. Aomesmo tempo, o Brasil defendia o estabelecimento de um AIA comprocedimentos simplificados104.

Grupo do Compromisso (“Compromise Group”)

Esse grupo reunia países como México, Noruega, Suíça,Cingapura, Japão e Nova Zelândia, cujas posições, ao longo doprocesso negociador, foram sempre percebidas como moderadas.Essa característica, aliada ao fato de o grupo ser composto de paísesdetentores seja de indústria avançada na área de biotecnologia sejade riqueza em matéria de diversidade biológica, propiciou legitimidadepara que o grupo desempenhasse, a partir dos últimos dias deCartagena, papel de mediador em algumas das questões maiscomplexas.

No que tange às suas posições comuns, há registros105 deque o grupo favorecia uma cobertura abrangente do Protocolo e a

104 Documento informal que relaciona os principais aspectos das posições da delegaçãobrasileira às reuniões negociadoras do Protocolo de Biossegurança. O documento foiencaminhado à autora pelo Chefe da Divisão de Meio Ambiente, Ministro Everton Vargas.105 Cosbey, op. cit., p. 6.

Page 78: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

78

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

incorporação nele do Princípio da Precaução. Sua divergência internaresidia no tratamento a ser dado à “savings clause”.

Em que pese ao papel de mediador atribuído a esse grupopor vários analistas106, é importante notar, entretanto, que três deseus membros – Japão, Noruega e Suíça – são aliados tradicionaisda União Européia nas negociações agrícolas em curso na OMC,onde tendem a impedir ou desacelerar o processo de reforma doAcordo sobre Agricultura. Exemplo disso está consignado naspropostas negociadoras desses três países, em especial do Japão,às Sessões Especiais do Comitê de Agricultura da OMC.

Grupo dos países da Europa Central e do Leste

Como o anterior, este grupo também demonstrou interesseem desempenhar papel de mediador entre a UE e o Grupo de Miami.Composto, primordialmente, por países em processo de associaçãoà União Européia, suas posições, muitas vezes, tendiam a favoreceras posturas comunitárias.

Alguns analistas do processo negociador dão conta,entretanto, de que esse grupo apoiava a inclusão no preâmbulo doProtocolo de referências que preservassem as obrigações e osdireitos contraídos em outros acordos internacionais existentes.

PRINCIPAIS TEMAS CONTROVERSOS

E O COMPROMISSO ALCANÇADO

Dentre os temas mais controversos do Protocolo deCartagena figuram (i) o Acordo de Informação Avançada (AIA);(ii) a cobertura do Protocolo; (iii) o Princípio da Precaução; e (iv)a relação entre o Protocolo e outros acordos internacionaisexistentes.

106 Idem e SMITH, op. cit., p. 13.

Page 79: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

79

Acordo de Informação Avançada (AIA)

Com base no mandato consignado no Artigo 19.3 da Convençãosobre Diversidade Biológica, os negociadores acordaramprocedimentos para a troca de informações sobre a transferência e omanuseio de LMOs. Esse conjunto de procedimentos foi denominadoAcordo de Informação Avançada (AIA).

O AIA condiciona os movimentos transfronteiriços dedeterminados tipos de LMOs ao consentimento prévio do paísimportador. Aplica-se essa condição apenas às exportações deorganismos vivos modificados para introdução intencional no meioambiente, ou seja, sementes, peixes vivos e microorganismosgeneticamente modificados utilizados para biorrecuperação(“bioremediation”). Nesse caso, o exportador deve, previamenteao primeiro embarque, notificar o potencial recipiendário do produtosobre a exportação pretendida. Em seguida, o potencial importadordecide se autoriza a entrada do LMO. Tal decisão deve ser baseadaem análise de risco. Ao contrário do Acordo de SPS, a obrigação eos custos de uma análise de risco podem ser transferidos aoexportador.

Os dispositivos relativos ao Acordo de Informação Avançada,descritos nos Artigos 7, 8, 9 e 10 do Protocolo, estabelecem, de formaresumida, o seguinte procedimento. Uma vez efetuada a notificação daexportação, o potencial importador dispõe de período de até 90 diaspara comunicar sua decisão. Esta pode ser no sentido de autorizarimediatamente a operação ou de manifestar a necessidade de prazoadicional para consideração. No segundo caso, o importador terá 270dias para manifestar-se sobre uma das seguintes hipóteses de decisão:(i) aprovar, com ou sem condições; (ii) proibir a importação; (iii)requerer informação adicional; ou (iv) estender, por tempo determinado,a data limite para uma nova resposta. O potencial importador podetambém recorrer ao Artigo 10.6 que reflete a linguagem do Princípioda Precaução e adiar indefinidamente uma resposta.

Page 80: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

80

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Trata-se de procedimento que poderá ter implicações gravesao comércio de sementes transgênicas; além de abrir sério precedentepara o comércio de produtos agrícolas em geral.

A cobertura do Protocolo

A controvérsia em torno do Acordo de Informação Avançadacentrou-se na definição de seu escopo e, portanto, na definição daabrangência e cobertura do próprio Protocolo.

O Artigo 19.3 da Convenção sobre Diversidade Biológica,determina, como se recorda, que o AIA seja aplicado ao “field of safetransfer, handling and use of any living modified organism resultingfrom biotechnology that may have adverse effect on theconservation and sustainable use of biological diversity”.

Com base nesse mandato, que enfatiza aspectos ambientais,os países que advogavam pela exclusão dos LMO-FFPs do âmbitodo AIA, em particular os do Grupo de Miami, argüiram que, ao nãoserem destinados à introdução no meio ambiente e sim à alimentaçãoou ao processamento industrial, aqueles organismos vivos modificadosnão apresentavam ameaça à biodiversidade; portanto, não deveriamser objeto do Protocolo de Biossegurança.

Seus opositores sublinhavam ser impossível assegurar queLMO-FFPs não fossem introduzidos no meio ambiente, por issodeveriam fazer parte do escopo do Protocolo. Por essa via deargumentação, a UE e seus aliados defendiam, na verdade, a ampliaçãodo mandato do Protocolo para legislar também sobre os riscosassociados à saúde humana.

O resultado desse debate está consignado nos Artigos 7, 11 e18 do Protocolo, que estabelecem procedimentos menos estritos doque os do AIA para os movimentos transfronteiriços dos LMOs incluídosna categoria de “commodities” agrícolas. Em geral, as exigênciasimpostas às exportações de LMO-FFPs são menos onerosas aoexportador. Os procedimentos relativos à circulação desses produtos

Page 81: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

81

mostram-se menos restritivos ao movimento transfronteiriço e maisenfocados em garantir transparência na divulgação de informaçõespertinentes aos bens comercializados.

O Protocolo estabelece ainda que as Partes decidirão sobre aimportação de LMO-FFPs com base em sua legislação doméstica,que deve ser, é claro, consistente com os objetivos do instrumento emquestão.

A exigência de rotulagem que informe sobre a possível existência(“may contain”) de organismos vivos modificados em determinadocarregamento de “commodities” constitui outro compromissoimportante. O Grupo de Miami atuava para evitar uma obrigação derotulagem que determinasse a segregação entre produtos convencionaise geneticamente modificados. A UE pressionava por rotulagem queresultasse em segregação e, segundo seu ponto de vista, permitisse aoconsumidor a escolha entre um ou outro produto. O resultado acordadonão impõe o exercício de segregação e atende parcialmente aosobjetivos negociadores da UE.

A questão da rotulagem de LMO-FFPs, no entanto, permaneceaberta para consideração futura, de acordo com o disposto no Artigo18.2107.

O Princípio da Precaução

A literatura especializada é unânime em reconhecer que aincorporação do Princípio da Precaução no Protocolo de Biossegurançafoi o principal objetivo negociador da UE no processo de Montreal.Christoph Bail, o negociador europeu, manifestou de forma inequívocaa posição européia de que em casos de incerteza científica“governments must be able to have the freedom and sovereign

107 O Artigo 18.2 determina que a Conferência das Partes “shall take a decision on thedetailed requirements for this purpose, including specification of their identity and anyunique identification, no later than two years after the date of entry into force of thisProtocol”.

Page 82: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

82

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

right to take precautionary action, as risks that may arise may belong term and irreversible”108.

A origem desse interesse estaria, segundo alguns analistas109,na derrota sofrida na OMC no caso da carne tratada a base dehormônio. A inclusão daquele princípio em instrumento que lida com ocomércio e o meio ambiente poderia ser instrumental para a revisãodos resultados obtidos na OMC.

Os relatos da reunião em Montreal mostram que, à exceçãodo Grupo de Miami, a UE tinha apoio de todos os demais grupos paraalcançar seu objetivo negociador de incorporar o Princípio daPrecaução à Convenção.

O Grupo dos “Like-Minded”, por exemplo, insistiusistematicamente na inclusão do Princípio da Precaução na parte operativado Protocolo, ou seja, como elemento integrante do Acordo sobreInformação Avançada. Esse objetivo seria “central to the question ofsafety”110. Para os países da Europa Central e do Leste, o Princípio daPrecaução, constituía “the basis of the protocol”111; para o“Compromise Group”, consistia na “the cornerstone of the Protocol”.Ainda na reunião de Montreal, a Suíça, falando em nome do Grupo,manifestou sua percepção de que seria difícil resolver a questão da relaçãoentre o Protocolo e outros acordos internacionais existentes, caso nãofosse dada a devida consideração ao tema da precaução.

O quadro parlamentar de Montreal apontava para o crescenteisolamento do Grupo de Miami, na medida em que todos os demaisgrupos negociadores, com maior ou menor ênfase, apoiavam a referênciaao Princípio da Precaução. O discurso do grupo de exportadoresagrícolas passou a centrar-se então na dicotomia entre “sound science”e “precaution” de forma a inserir no texto elementos capazes deaproximar a linguagem do Princípio da Precaução daquela do Artigo 5.7

108 LIN, op. cit.109 STEWART, op. cit., p. 15, nota de rodapé 102.110 Id.111 Ibid.

Page 83: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

83

do Acordo de SPS112. Esse objetivo foi parcialmente alcançado com aincorporação, no Artigo 15, de referência a análises de risco “carriedout in a scientifically sound manner, in accordance with Annex II”.

Em que pese ao fato de a expressão “Princípio da Precaução”não ter sido incluída no texto do Protocolo, a linguagem que refleteesse princípio é sólida, clara e legitima o recurso pleno a açõesantecipadas na ausência da certeza científica sobre o risco em apreço.O recurso à precaução encontra-se incorporado tanto ao preâmbuloquanto à parte operativa do Protocolo: Artigos I, X(6), XI (8) e XV(parágrafo 4 do Anexo II). O Artigo I dispõe sobre os objetivos doProtocolo. Os Artigos 10 e 11 versam sobre os movimentostransfronteiriços de LMOs; o Anexo II do Artigo 15 delibera sobreanálise de risco. Nos três últimos casos, é considerável o nível dediscrição outorgado às Partes para tomar decisões sobre a importaçãoe exportação de organismos vivos modificados.

As interpretações sobre o alcance dessa incorporação sãodivergentes. Os EUA e demais membros do Grupo de Miami procuramminimizar o impacto desse fato novo no comércio internacional de alimentos.A UE e seus aliados, inclusive alguns do “Compromise Group”, cantamvitória e procuram caracterizar a inclusão do Princípio da Precaução noProtocolo de Biossegurança como a sua legitimação internacional.

A RELAÇÃO ENTRE O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA E OUTROS

ACORDOS INTERNACIONAIS EXISTENTES. “THE SAVINGS CLAUSE”E O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO

A questão da eventual inclusão de dispositivo que preserveexplicitamente os direitos e as obrigações contraídas em outros acordosinternacionais - a “savings clause” - remonta ao debate sobre uma situaçãode conflito entre o meio ambiente e o comércio. Por exemplo, em uma

112 Relato pessoal à autora sobre a reunião de Montreal feito em fevereiro de 2000 peloeconomista João Magalhães, da Divisão de Agricultura da OMC.

Page 84: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

84

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

controvérsia que envolva restrições ao comércio de organismos vivosgeneticamente modificados aplicadas para proteger o meio ambiente e asaúde humana, que regras prevaleceriam: as da Convenção de MeioAmbiente ou as da Organização Mundial do Comércio?

Esse foi, como na avaliação de alguns analistas, um “thornyissue”113 do processo negociador do Protocolo de Biossegurança. OGrupo de Miami, temeroso de que o Protocolo fosse utilizado paraeludir os compromissos da OMC e, portanto, restringir o comércio de“commodities”, pressionou em favor dessa cláusula. A posiçãodiametralmente oposta da UE foi resumida pela Ministra de MeioAmbiente da União Européia, Margot Wallström, segundo a qual, oacordo alcançado em Montreal não poderia ser “undermined later inthe context of the World Trade Organization”114.

A maioria dos países em desenvolvimento e alguns membrosdo Grupo do Compromisso compartilhavam a posição européia. Ospaíses da Europa Central e do Leste apresentavam-se mais flexíveis efavoreciam, segundo alguns relatos, uma referência sobre a matéria nopreâmbulo do Protocolo.

O resultado dessa negociação encontra-se consubstanciado emtrês parágrafos do preâmbulo do Protocolo de Biossegurança. São eles:

(i) “Recognizing that trade and environment agreements shouldbe mutually supportive with a view to achieving sustainabledevelopment;”

(ii) “Emphasizing that this Protocol shall not be interpreted asimplying a change in the rights and obligations of a Party underany existing international agreements;”

(iii) “Understanding that the above recital is not intended tosubordinate this Protocol to other international agreements…”.

À exceção desses parágrafos, o texto operativo do Protocoloé omisso quanto ao tratamento da relação entre este instrumento e113 SMITH, op. cit., p. 20.114 STEWART, op. cit., p. 13.

Page 85: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

85

outros acordos internacionais existentes. Em meio a essa aparenteambigüidade emerge o Princípio da Precaução, cuja relevância nodebate é acrescida. Ele é o elemento subjacente à discussão sobre a“savings clause”, pois a sua implementação futura determinará aexistência e a abrangência de eventual conflito entre o meio ambientee o comércio ou entre o Protocolo de Biossegurança e a OMC. Emsua acepção clássica, o Princípio da Precaução autoriza a adoçãode políticas sem a necessária fundamentação científica. Privilegia,portanto, a ação preventiva ou antecipada orientada a proteger omeio ambiente e a saúde humana. Nessa hipótese, o Princípio daPrecaução poderia ser interpretado como instrumento que, à luz doProtocolo de Biossegurança, legitimaria a imposição de barreiras aocomércio, sem a adequada evidência científica sobre o produtoafetado. Por isso a insistência do Grupo de Miami em minimizar ainfluência do Princípio da Precaução por meio de referência aoimperativo da fundamentação científica ou, alternativamente, pelaincorporação da “savings clause”.

Essa percepção do processo negociador está presente no relatode alguns analistas115, que procuram evidenciar a estreita vinculaçãoentre o Princípio da Precaução e a “savings clause”. De um lado, oGrupo de Miami não esconde que sua prioridade negociadora passapela preservação de seus interesses comerciais, em geral, e pelas regrasda OMC, em particular. Note-se, a esse respeito, o comentário deDavid Sandalow, em conferência de imprensa, em Montreal: “TheUnited States and our Miami Group allies believe that thisagreement should make clear the intention of governments not torenegotiate the WTO. I’ll say it differently. Governments have saidthat they are not renegotiating the WTO here in Montreal, and thisagreement should make that clear”116.

115 STEWART, op. cit., p. 16.116 SANDALOW, David, U.S. Department of State, International Information Programs,Press Briefing, 25.1.2000, disponível na Internet em <usinfo.state.gov/topical/global/biotech/00041205.htm>.

Page 86: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

86

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

A UE, por outro lado, faz do Princípio da Precaução a suabandeira negociadora e, nessa linha, insiste que se inclua linguagemsobre a matéria na parte operativa do Protocolo. Ao comentar essefato, Kristin Dawkins afirma: “In exchange for the precautionaryprinciple, the EU conceded a weird recitation of clauses in thepreamble of the Protocol regarding its relationship to the WTO”117.

Nesse embate que contrapõe a “savings clause” ao Princípioda Precaução estavam, portanto, encapsulados os objetivosnegociadores prioritários, mas adversos, dos dois “major players” doprocesso de Montreal. A inclusão da linguagem pretendida por umaParte fazia ainda mais importante o dispositivo pretendido pela outraParte.

Em resumo, o texto do Protocolo de Biossegurança é resultantede um intenso e polêmico exercício negociador que produz textoimpreciso e ambíguo. Esse texto será objeto de diferentes interpretaçõesque procurarão identificar ou delimitar o alcance e o significado doconsenso de Montreal.

AS VISÕES CONFLITANTES SOBRE O ALCANCE E O SIGNIFICADO PARA OSISTEMA MULTILATERAL DE COMÉRCIO DA INCLUSÃO DO PRINCÍPIO DA

PRECAUÇÃO NO PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

Apenas duas semanas após a adoção do Protocolo deCartagena sobre Biossegurança, a imprensa especializada publica artigoem que se lê talvez a melhor descrição do caráter impreciso e ambíguodo acordo alcançado em Montreal:

The Cartagena Protocol on Biosafety, agreed in Montreal at theend of January was hailed as a big step forward in the handlingof transboundary movements of GMOs. But the agreement wasfinalized with difficulty and after some ambiguous drafting ofkey provisions to meet the requirements of the major GMO

117 STEWART, op. cit., p. 20, nota 136.

Page 87: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

87

exporters, developing countries and, especially, the EU. It willtake time to understand the relationship between the Protocoland the trade rules of the WTO. The Precautionary Principle isincluded, but will it be operational? The effective coverage ofthe protocol is unclear especially with respect to bulk commodities.Clarification may only come with disputes…. Ironically, it willalmost certainly be the inconsistencies with, and potential forconflict in, the WTO, which will ultimately take the gloss off theachievement in Montreal. Even now, trade and environmentallawyers are trying to understand and clarify the meaning andintention of several provisions of the protocol…The job of mappinga clear and predictable relationship between environmental andtrade objectives … turns out to be half done118.

De fato, o texto final constitui desafio de interpretação paraadvogados, analistas e estudiosos sobre as relações entre o meioambiente e o comércio. O consenso de Montreal, no entanto, permitiuaos governos dos países que para ele contribuíram manifestar-sepositivamente e afirmar que seus objetivos negociadores foram, notodo ou em boa parte, alcançados. Esse é o mérito e, paradoxalmente,o demérito do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança.

As interpretações divergentes

Os Estados Unidos, maior exportador e produtor mundial deLMOs, reagiram positivamente à conclusão do Protocolo. Emboranão sejam membros dele, até porque não ratificaram a Convençãosobre Diversidade Biológica, os EUA têm interesses concretos noestabelecimento de um sistema previsível, que propicie não só a

118 “Biosafety Protocol finally agreed in Montreal, but does it provoke more questionsthat answers for potential trade disputes?” World Trade Agenda; número 00/03; Genebra,fevereiro-março de 2000, pp. 7-9.

Page 88: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

88

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

aprovação, mas também a circulação de organismos vivos modificadose aporte de dividendos aos investimentos tecnológicos no setor.

Em suas declarações à imprensa, portanto, as autoridadesnorte-americanas perseguem o objetivo duplo de valorizar osdispositivos relacionados ao comércio internacional de LMO-FFPs eminimizar o impacto sobre as regras multilaterais de comércio daincorporação do Princípio da Precaução ao Protocolo. Nesse sentido,buscam divulgar interpretações que atribuem previsibilidade aocomércio; confirmam a preservação dos direitos e obrigações contraídosnos acordos da OMC; e vinculam o recurso à precaução a uma análisede risco fundamentada na ciência. Em mais de uma entrevista à imprensa,autoridades do Departamento de Estado manifestam sua interpretaçãode que o Protocolo não exige a segregação de LMO-FFPs e tampoucoestabelece a obrigatoriedade da rotulagem para o consumidor119. DavidSandalow oferece a seguinte análise do Protocolo: “Under the WTO,all countries are obligated to trade fairly, in a non-discriminatoryfashion, and to regulate on the basis of sound science. Nothing inthe protocol changes those fundamental obligations under the WTO,and nothing about the WTO trumps or changes any obligationunder the protocol. They must work together and be mutuallysupportive.”120

Para tranqüilizar sua indústria e assegurar que o instrumento deMontreal não prejudicará o comércio de produtos transgênicos, osEUA procuram desmistificar as imprecisões do preâmbulo quanto à“savings clause”. Nessa linha, freqüentemente realçam o valor legaldo parágrafo sobre “direitos e obrigações” e identificam os dois outroscomo meras declarações políticas.

Os EUA procuram, também, passar a mensagem de que oProtocolo de Biossegurança incorpora seus objetivos negociadores

119 LOY, Frank, Undersecretary of State for Global Affairs, US Department of State,International Information Programs, Press Briefing, 12.04.2000.120 SANDALOW, David, “The Biosafety Protocol Protocool: What It Does and Doesnot”. Inside US Trade. Washington, D.C., 23.02.2000, p. 2.

Page 89: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

89

principais: moldar o acordo para a proteção do meio ambiente eminimizar seu impacto negativo sobre o comércio internacional. SegundoSandalow, “both of those objectives are met in the BiosafetyProtocol”121.

As declarações das autoridades norte-americanas alimentamtambém o propósito de identificar o Protocolo como instrumento quereconhece e valoriza os benefícios da biotecnologia. Buscam, assim,reduzir ou mascarar a ênfase da letra do Protocolo nos riscos que osorganismos vivos modificados podem apresentar ao meio ambiente eà saúde humana. Catherine Woteki, Undersecretary for Food Safety,do Departamento de Agricultura, confirma essa percepção: “TheBiosafety Protocol is the first international agreement to expresslyrecognize the potential benefits of modern biotechnology”122.

As reações de representantes dos governos europeus e de altosfuncionários da Comissão Européia apontam também para os pontospositivos do Protocolo de Biossegurança, à luz, é claro, de sua própriaperspectiva negociadora.

No dia 28 de janeiro de 2000, ou seja, na véspera da conclusãodas negociações em Montreal, a Agência “France-Press” divulgaentrevista com ministros dos Estados Membros da UE, na qual essasautoridades reiteram “their determination not to allow the BiosafetyProtocol to be run by the World Trade Organization”. José Sócrates,Ministro do Meio Ambiente de Portugal, país que então ocupava apresidência rotativa da UE, afirma que “this Protocol will not besubordinated to the WTO”.

Tão logo concluído o acordo, a Comissária para o meio ambiente,Margot Wallström, confirma a posição européia de que nada noProtocolo de Biossegurança exigirá mudança nas regras ou na atitudeeuropéias relativas a produtos geneticamente modificados. Essa é

121 Id.122 WOTEKI, Catherine. U. S. Department of State, International Information Programs,Press Briefing, 8.02.2000, disponível na Internet em <usinfo.state.gov/topical/global/biotech/00041205.htm>.

Page 90: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

90

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

precisamente a mensagem que se quer passar ao público europeu einternacional.

As interpretações européias sobre o acordo alcançado emMontreal são consistentes com o principal objetivo negociadorperseguido por aquele grupo de países. Apontam, nesse sentido, parao fortalecimento do Princípio da Precaução e seu conseqüente novopapel no campo da saúde alimentar e do comércio internacional dealimentos. A manifestação atribuída à Ministra do Meio Ambiente daFrança, Dominique Voyne, reflete a eloqüência européia sobre oassunto: “This is an historic step which allows a full application ofthe principle of precaution to trading these products which willensure a better protection of biological diversity and the health ofconsumers”123.

As referências explícitas e reiteradas ao Princípio da Precauçãono texto do Protocolo permitiram à UE propalar sua visão sobre ostatus desse princípio no direito internacional. Apenas uma semana apósa conclusão das negociações em Montreal, a Comissão Européiadivulga o seu Comunicado sobre o Princípio da Precaução, onde afirmaque “the principle has been progressively consolidated ininternational law, and (...) become a full-fledged and generalprinciple of international law”124.

Outros interessados na aplicação do Protocolo deBiossegurança – organismos internacionais, organizações não-governamentais ligadas ao meio ambiente, coalizões de indústria,advogados comerciais, analistas e estudiosos de questões relativasao meio ambiente e a própria imprensa especializada – também foramvocais em suas interpretações sobre o alcance e o significado doacordo de Cartagena. Seus comentários, que nem sempre observaramo padrão das declarações oficiais, tendem ora a reconhecer pontos

123 MITCHENER, Brandon. “Biosafety Agreement Raises Questions”, Wall StreetJournal, 31.1.2000.124 Communication from the European Commission on the Precautionary. G/SPS/GEN/168 (14.03.2000).

Page 91: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

91

positivos, ora a criticar o enfoque limitado, ora a enfatizar asambigüidades do texto.

De modo geral, todos esses comentários parecem conter umponto em comum: a percepção de que o compromisso alcançado nãoatende às expectativas nele depositadas pelo público, seja para protegero meio ambiente e a saúde humana, seja para preservar as disciplinasdo sistema multilateral de comércio, seja para delimitar claramente afronteira entre os interesses comerciais e as preocupações ambientais.

Francis Smith, da “International Consumers for CivilSociety”, organização não-governamental com representações empaíses da África, América Latina, Ásia, Europa e Estados Unidos,participa desse debate internacional com comentários mais enfocadosna vinculação e nos potenciais conflitos entre o Protocolo e o sistemamultilateral de comércio. Ao comentar sobre os dispositivos para aexportação de LMO-FFPs, Smith afirma que:

The major agricultural exporting countries claimed that theserequirements represented a victory because their basic foodcommodities are not subject to extensive and lengthy advancenotification and approval procedures even if produced throughbiotechnology. However, the victory may be hollow, because theagreement sets a precedent for genetically modified crops to betreated differently from hybridized crops, even when there is noscientific evidence that they represent a threat to anything. Assuch these crops are being judged on the basis of the processused to produce them rather on the level of risk represented bythe product itself125.

A incorporação do Princípio da Precaução é parte integrante econstante desse debate internacional sobre o significado do Protocolode Biossegurança. Sem esconder sua preocupação com aimplementação desse princípio, a indústria de biotecnologia busca, em

125 SMITH, op. cit., p. 20.

Page 92: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

92

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

suas declarações, circunscrevê-lo aos limites do Acordo de SPS daOMC. São freqüentes, portanto, na imprensa internacional eespecializada, referências desse setor à necessidade de decisõespautadas na ciência e em exercício de análise de risco. Nessa mesmalinha, recorda-se que o Protocolo exige a análise de risco, cujametodologia está descrita no Anexo II do documento.

Grupos ambientalistas contrapõem-se a essa interpretação eecoam a percepção européia de que o recurso à precaução é umadecisão política a ser exercida mesmo na ausência de informaçãocientífica suficiente.

A transposição do Princípio da Precauçãopara o comércio de alimentos

Outro tema muito presente nas discussões sobre o alcance esignificado do Protocolo de Biossegurança diz respeito às visõesconflitantes sobre a sua eventual cobertura de temas ligados à saúdealimentar.

Pode-se identificar mais de uma origem para esse debate. Aprimeira, e talvez mais óbvia, está relacionada à fragilidade doinstrumento alcançado em Montreal. Essa fragilidade, refletida naimprecisão do texto acordado, autoriza interpretações de qualquercorrente de pensamento. O consenso político possível à época dasnegociações gerou texto fraco e dúbio; ou alternativamente, o textofraco foi o único caminho para o consenso político. Em qualquer dessasduas hipóteses, o resultado passa pelo adiamento, não pela soluçãodos problemas que, em uma primeira instância, geraram a necessidadedo Protocolo.

Uma segunda origem para o debate, apenas derivativa ouresultante da primeira, aponta para a necessidade, em particular noque se refere aos grandes exportadores de produtos agrícolas, decircunscrever a um universo mais restrito o alcance jurídico e osdesdobramentos práticos do Protocolo de Biossegurança. Permitir que

Page 93: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

93

este instrumento legisle sobre saúde alimentar equivale a aceitar que ocomércio não só de organismos vivos modificados, mas de qualquerproduto alimentar, passe a ser objeto do recurso ao Princípio daPrecaução.

Como o texto do Protocolo não oferece clareza quanto aoalcance e à forma com que as Partes implementarão aquele princípio etendo em vista as dificuldades crescentes de segregar produtos básicosconvencionais dos geneticamente modificados, os países com maioresinteresses na manutenção de um sistema previsível de comércio paraprodutos agrícolas buscam limitar a abrangência de aplicação doProtocolo e, por essa via, a do próprio Princípio da Precaução.

Os defensores do alcance mais restritivo argumentam que oArtigo 19.3 da Convenção sobre Diversidade Biológica, ao instruir asPartes considerar a necessidade de um protocolo, utiliza linguageminequívoca sobre o objeto desse novo instrumento. Estabelece que oAcordo sobre Informação Avançada, deve circunscrever-se ao “fieldof the safe transfer, handling and use of any living modifiedorganism resulting from biotechnology that may have adverse effecton the conservation and sustainable use of biological diversity”.O mandato da CBD, portanto, parece enfocado na solução deproblemas que afetem a conservação e o uso sustentável da diversidadebiológica.

No entanto, o termo “saúde humana” permeia todo o texto doProtocolo de Cartagena, do preâmbulo aos anexos. Na parte operativa,aparece em onze diferentes artigos, inclusive naqueles referentes aocomércio de LMO-FFPs e ao Princípio da Precaução126. O Artigo 4do Protocolo descreve o próprio escopo desse instrumento jurídico e,ao fazê-lo, determina que se leve em consideração os riscos à saúdehumana.

Não obstante os elementos acima, os EUA argumentam que oProtocolo não se aplica ao campo da saúde alimentar. Representantes

126 STEWART, op. cit., p. 7, nota 47.

Page 94: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

94

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

do Departamento de Estado, em diversas ocasiões, declararam queesses temas são tratados por “organismos especializados”127. Na mesmalinha, grupos de interesse ligados à área agrícola nos EUA expressam,igualmente, a percepção de que questões de saúde alimentar são dacompetência do CODEX Alimentarius e do Acordo de SPS da OMC.

David Aaron, “Undersecretary of Commerce forInternational Trade”, confirma essa visão, ao afirmar que “thearticulation of the precautionary principle in the protocol is not aradical statement, but an articulation of the need for precautionin the absence of scientific information where there is concernprimarily about the environmental impact of GMOs. You have toremember this protocol talks about environment andbiodiversity”128. Aaron argumenta, ademais, que, diferentemente doAcordo de SPS da OMC, a linguagem do Protocolo não é dirigidadiretamente à questão de saúde alimentar e que as referências à saúdealimentar acontecem “in the context of the environment, not in thecontext of how these things might affect human health directly”129.

A União Européia desafia o esforço interpretativo norte-americano. A seu ver, o Protocolo versa sobre riscos aos seres humanosimpostos por alimentos geneticamente modificados. O histórico dasnegociações do Protocolo mostra que foram eles, os europeus, os quemais insistiram na incorporação dessa dimensão humana – ou comercial- ao Protocolo. A pressão política a que estavam submetidos osnegociadores e as autoridades agrícolas e ambientais da UE à épocaexplica essa postura negociadora. Além disso, as análises de observadorese da imprensa internacional apontam para o fato de o Protocolo estarmais orientado a minimizar riscos à saúde humana do que a proteger abiodiversidade dos potenciais efeitos danosos da biogenética130.

127 “GMO Protocol Offers Compromise on Crops, WTO Relationship”, Inside USTRADE, 4/2/2000.128 Id.129 Ibid.130 STEWART, op. cit., p. 7.

Page 95: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E O PROTOCOLO DE BIOSSEGURANÇA

95

A determinação européia de expandir o escopo do Protocolode Biossegurança para o campo de saúde alimentar também pode serconfirmada pelo Comunicado da Comissão, lançado apenas umasemana após a conclusão das negociações em Montreal. Com essedocumento, a UE lidera iniciativa que visa a divulgar o Princípio daPrecaução e discutir suas características agora ampliadas.

Ao participar do debate sobre o escopo do Protocolo deCartagena, Francis Smith compartilha a percepção de que, ademaisde tratar das ameaças que organismos vivos modificados possam imporà biodiversidade, o Protocolo autoriza o recurso a medidas precautóriaspara lidar com temas relacionados à saúde humana em vários de seusdispositivos131.

A questão relativa ao escopo do Protocolo, em particular seele abarca alimentos para consumo humano, torna-se especialmenterelevante no contexto de futuras controvérsias na área comercial. Riscosà saúde humana impostos por produtos agrícolas são tema dacompetência do Acordo de Aplicação de Medidas Sanitárias eFitossanitárias da OMC. Portanto, disputas relacionadas ao consumodesses produtos, sendo eles geneticamente modificados ouconvencionais ou os dois (no caso de que não sejam segregados) são,no que tange ao sistema multilateral de comércio, da competência doAcordo de SPS. Se o Protocolo de Biossegurança incorpora adimensão da saúde humana, como quer a UE, haveria uma justaposiçãode competências entre esse instrumento e o SPS e, necessariamente,um potencial de conflito de regras. Esse conflito estaria, sobretudo,relacionado com a aplicação do Princípio da Precaução e a latitudeque este oferece para questões comerciais. Se, por outro lado, oProtocolo não abarca questões de saúde humana, como desejam osEUA, seu escopo é razoavelmente limitado e estaria restritopraticamente à implementação do AIA no campo dos LMOs paraintrodução no meio ambiente.

131 SMITH, op. cit., pp. 26-27.

Page 96: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

96

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Qualquer que seja a interpretação dada ao escopo do Protocolode Biossegurança, o mecanismo de controvérsias da OMC (MSC),seus painéis e o Órgão de Apelação estão submetidos às regras doUnderstanding on Rules and Procedures Governing the Settlementof Disputes (DSU), que, como se recorda, tem duas característicasprincipais no que se refere à sua competência: (i) o MSC apenas dirimedisputas à luz dos “covered agreements” da OMC (Artigo 1.1); e (ii)somente os princípios de direito internacional relativos à interpretaçãode tratados são explicitamente incorporados ao arcabouço conceitualdo MSC da OMC (Artigo 3.2).

Essa limitação explicitamente imposta pelo DSU aos painéis eÓrgão de Apelação coloca em cheque as expectativas daqueles queprocuram caracterizar o Protocolo de Biossegurança como um vetorpara introdução do Princípio da Precaução nas deliberações conduzidassob o MSC.

Além de formalmente excluir qualquer texto internacional(exceto os “covered agreements”) como fonte de direitos eobrigações para os países membros da OMC, o DSU, ao mencionara aplicabilidade dos “customary rules of interpretation of publicinternational law”, de certa forma impõe circunspecção a qualquertentativa de referência a outros princípios de direito internacional. Orecurso a esses outros princípios estará seguramente condicionado àconsagração destes como fundamentos tradicionais, sólidos econsensualmente aceitos do direito internacional, o que não parece sera condição atual do Princípio da Precaução. Essa questão será retomadamais adiante.

Page 97: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CAPÍTULO V

A PRECAUÇÃO E O ACORDO

SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS

E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC:A JURISPRUDÊNCIA EM EVOLUÇÃO

Page 98: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 99: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

99

CAPÍTULO VA PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE

MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC:A JURISPRUDÊNCIA EM EVOLUÇÃO

O Capítulo IV discorreu sobre aspectos do processo negociadordo Protocolo de Biossegurança com ênfase na incorporação doPrincípio da Precaução. Discutiu, em seguida, as visões discrepantessobre o significado e o alcance do instrumento jurídico acordado emMontreal. Transparece desse debate a percepção de que os conflitosentre o Protocolo de Biossegurança e a disciplinas multilaterais decomércio não foram resolvidos. O Princípio da Precaução, sobretudoa sua futura implementação, vem sendo identificado como a principalfonte de conflito. Sob o Protocolo de Biossegurança, esse princípiooutorga amplo poder de arbítrio ao país importador para restringir ocomércio de organismos vivos modificados de forma, inclusive,permanente e com base em questões relacionadas à saúde humana.No contexto da OMC, em particular do Acordo de SPS, a latitudediscricionária para recorrer a medidas de precaução é mais limitada ecircunscrita a determinados requisitos relacionados à ciência e ao tempo.Na medida em que subsistem essas diferenças entre os dois sistemas,persiste o desafio da conciliação dos interesses comerciais com aspreocupações ambientais. À luz desse quadro, estudiosos prognosticamserem as disputas comerciais decorrentes da aplicação dos dispositivosdo Protocolo apenas uma questão de tempo.

Alguns analistas desmistificam a discussão sobre a supremaciados sistemas ambiental e comercial ou sobre a aplicação ampla ourestrita do Princípio da Precaução. Afirmam ser esse um debateorientado a manipular a opinião pública, com vistas a alcançar o objetivo

Page 100: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

100

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

de preservar modelos agrícolas superados e altamente subsidiados. Aprogressiva liberalização do comércio agrícola internacional, acordadana Rodada Uruguai, é vista como uma ameaça à sobrevivência dosprivilégios existentes, tornando, assim, necessária a busca por formasmais discretas e elaboradas de protecionismo132.

Qualquer que seja o objetivo subjacente à campanha pelofortalecimento e legitimação do Princípio da Precaução, faz-senecessária uma análise do Acordo de SPS, em particular dosdispositivos que incorporam ou autorizam o recurso à precaução. Oexame da jurisprudência do Órgão de Solução de Controvérsias daOMC sobre a matéria também contribuirá para determinar em quemedida o sistema multilateral de comércio já permite a proteçãolegítima do meio ambiente e da saúde humana via uma abordagemprecautória.

O presente capítulo propõe-se, portanto, a discorrerbrevemente sobre a origem do Acordo de SPS; apresentar seusdispositivos principais; explicar os procedimentos do mecanismo desolução de controvérsias; relatar os pareceres e as conclusões dasdisputas na área sanitária e fitossanitária; e, finalmente, comentar oAcordo de SPS à luz da jurisprudência dos painéis e do Órgão deApelação.

O ACORDO DE SPS

Origem

A década de 80 foi fecunda em conflitos de origem sanitária efitossanitária. O mais notório dentre eles, a disputa entre EUA e UniãoEuropéia sobre carne tratada a base de hormônio de crescimentopermanecia sem solução. Alguns analistas sugerem que essedesentendimento entre EUA e UE motivou o Acordo de SPS e moldou

132 SMITH, op. cit., pp. 34-35.

Page 101: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

101

várias de suas cláusulas133. Os EUA julgavam necessário, por exemplo,evitar abusos na utilização de medidas sanitárias que, a seu ver,constituíam barreiras não-tarifárias ao comércio. A UE consideravaque regulamentos nacionais mais estritos que as normas acordadaspor organismos internacionais deveriam ser aceitos e respeitados “emsituações particulares”134. Além disso, nenhuma medida sanitária levadaao mecanismo de solução de controvérsias do GATT fora até entãoquestionada com sucesso. Paralelamente, a iminência do lançamentoda Rodada Uruguai, aliada ao compromisso de negociar um acordosobre agricultura que disciplinaria a utilização de barreiras não-tarifárias,intensificara o debate sobre eventual recurso a medidas administrativas,entre elas as de caráter sanitário e fitossanitário, para compensar pelaeventual liberalização do comércio agrícola135.

Em 1986, a Declaração de Punta del Este, que lança a RodadaUruguai, estabelece entre os seus objetivos o de negociar disciplinaspara minimizar os “adverse effects that sanitary and phytosanitaryregulations and barriers can have on trade in agriculture”.

As negociações iniciais visam apenas ao preenchimento delacunas do Acordo de Barreiras Técnicas (TBT), acordado na RodadaTóquio, que dificultavam a solução de controvérsias na área sanitária.Por exemplo, a definição de “medidas” sob o Acordo de TBT excluíareferência a métodos e processos de produção. Essa omissãopropiciaria o argumento legal para a UE bloquear a solicitação dosEUA de que fosse instituído grupo técnico para examinar a basecientífica do embargo europeu à carne norte-americana tratada comhormônio de crescimento.

133 ROBERTS, Donna, “The Integration of economics into SPS risk managementpolicies: issues and challenges”. In: VVAA, The Economics of Quarantine and the SPSAgreement. Adelaide, Austrália, Centre for International Economic Studies, janeiro de2001, organizado por Kym Anderson, Cheryl McRae e David Wilson.134 QUINTILLAN, Sara Pardo. “Hormone-treated Beef and Genetically ModifiedOrganisms”. Journal of World Trade. Volume 6, dezembro de 1999, p.155135 ROBERTS, op. cit., p. 12.

Page 102: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

102

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Em que pese ao relativo progresso alcançado nos momentosiniciais da Rodada Uruguai para acomodar, no contexto do Acordo deTBT, preocupações de ordem sanitária, emergiu do processonegociador a percepção de que, dadas certas características inerentesàs medidas sanitárias e fitossanitárias, seria necessário um instrumentojurídico específico sobre a matéria. Reconheceu-se, por exemplo, quea aplicação daquelas medidas poderia variar segundo a origem ou odestino do produto envolvido. Havia, assim, que disciplinar essa possívelviolação dos princípios basilares do GATT: nação mais favorecida etratamento nacional136. À luz dessas ponderações, os negociadoresverificaram a inconveniência de incorporar ao Acordo de TBT umconjunto de disciplinas multilaterais orientadas para questões sanitárias.

Em 1988, instituiu-se, no contexto das negociações da RodadaUruguai, grupo de trabalho com o mandato de elaborar acordo sobremedidas sanitárias e fitossanitárias. Logo ao início dos trabalhos e, porforça da União Européia, que pressionava por um instrumento deabrangência ampla, coincidiu-se que “saúde alimentar”, “proteção àsaúde animal” e “proteção vegetal” seriam incluídos no futuro acordo.Desde então, a UE insistia, sem sucesso, na incorporação ao Acordosobre SPS de temas, tais como “bem estar animal” e “preocupaçõesambientais e dos consumidores”. O pano de fundo da posição européia,assim como a origem da oposição norte-americana, era a controvérsiados hormônios, vista como exemplo de normas aplicadas semfundamentação científica, mas em linha com preocupações dosconsumidores europeus.

Em novembro de 1990, o Grupo conclui um primeiro projetoque reúne consenso a respeito dos seguintes pontos: (i) medidas sanitáriase fitossanitárias não deveriam representar barreiras disfarçadas decomércio; deveriam ser objeto de harmonização com base em princípioscientíficos e normas, diretrizes e recomendações internacionais; (ii)tratamento especial e diferenciado seria estendido aos países em

136 ROBERTS, op. cit., p. 13, nota 3.

Page 103: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

103

desenvolvimento; (iii) transparência deveria ser assegurada naelaboração de regulamentos e na solução de controvérsias advindasda aplicação de políticas sanitárias. Alguns pontos permanecem,todavia, à margem do consenso, entre eles a questão da implementaçãode legislações domésticas mais estritas do que as normas internacionaise o debate sobre se a análise de risco deveria levar em contaconsiderações de ordem econômica e preocupações de consumidores,ademais daquelas relacionadas à saúde.

Em 1991, o chamado “Dunkel Draft”, elaborado pelo entãoDiretor Geral do GATT, incorpora o projeto de novembro de 1990,com dispositivos adicionais que autorizam a aplicação de medidasdomésticas mais estritas que as internacionais, mas excluem asconsiderações de ordem econômica e “genuine consumerconcerns”137 do conjunto de fatores a ser levado em conta nas análisesde risco.

O texto aprovado ao final da Rodada Uruguai reflete, em grandemedida, o “Dunkel Draft” e resulta em instrumento que reúne asseguintes características: (i) preâmbulo que estipula os objetivos maisgerais do Acordo; (ii) 14 artigos que dispõem sobre disciplinassubstantivas e de procedimento; e (iii) anexos que enunciam definiçõese estabelecem requisitos procedimentais.

O Acordo sobre a Aplicação de Medidas Sanitárias eFitossanitárias (SPS) entrou em vigor no dia 1o de Janeiro de 1995138

Os principais dispositivos do Acordo de SPS

O General Agreement on Tariffs and Trade – o GATT de1947 já incorpora preocupações relacionadas à saúde humana. Emseu Artigo XX(b), sobre as exceções gerais, o GATT 1947 dispõeque medidas necessárias à proteção da vida ou saúde humana, animal

137 QUINTILLAN, op. cit., p. 156.138 O texto do Acordo de SPS está em anexo.

Page 104: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

104

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

e das plantas podem ser compatíveis com os princípios gerais do sistemamultilateral de comércio, desde que não sejam discriminatórias ou nãoconstituam restrições disfarçadas ao comércio.

O Acordo de SPS constitui, assim, um desenvolvimento ouuma explicitação das exceções gerais ao GATT refletidas no ArtigoXX(b), na medida em que reconhece, mas também disciplina, o direitolegítimo de os países membros legislarem sobre as medidas “necessáriasà proteção” da saúde humana, animal ou das plantas. O reconhecimentodesse direito legítimo está enunciado já no primeiro parágrafo dopreâmbulo do Acordo de SPS, que repete, em linhas gerais, o caputdo Artigo XX. O disciplinamento do uso desse direito encontra-serefletido no quarto parágrafo do preâmbulo, que estabelece o objetivodo Acordo de SPS de “guide the development, adoption andenforcement of sanitary and phytosanitary measures in order tominimize their negative effects on trade”.

O objetivo principal do Acordo de SPS é, portanto, o de evitarque medidas domésticas de natureza sanitária e fitossanitária tenhamefeitos negativos desnecessários sobre o comércio internacional e sejamutilizadas para mascarar intenções protecionistas. Para tanto, o critériocientífico é o princípio basilar do Acordo de SPS.

O Artigo 1.1 determina que o acordo se aplica a todas asmedidas sanitárias e fitossanitárias que afetem o comércio internacional.A definição de medidas sanitárias e fitossanitárias pelo SPS é, no entanto,bastante ampla. São incluídas nessa categoria todas as medidasaplicadas para proteger a vida e a saúde humana, animal e vegetal deriscos externos ao território de um país membro com implicações sobreo comércio internacional. Medidas sanitárias e fitossanitárias podemtomar várias formas. Leis, decretos, regulamentos, requerimentos,procedimentos e, inclusive, critérios para processos e métodos deprodução. São, igualmente, consideradas medidas sanitárias efitossanitárias: inspeção de produtos, permissão para utilização de certosaditivos nos alimentos, determinação de níveis máximos de resíduosde pesticidas, designação de áreas livres de doenças, exigências de

Page 105: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

105

quarentenas, embargo a importações entre outras139. Os riscos a quese refere o Acordo compreendem, entre outros, a disseminação dedoenças e pestes; ameaças à saúde humana e animal apresentadas poraditivos, contaminantes e toxinas; doenças causadas por organismosencontrados em alimentos, bebidas e ração animal.

O Artigo 2 enuncia os direitos e as obrigações básicas doAcordo de SPS. Este artigo estabelece que os membros têm o direitode adotar medidas sanitárias e fitossanitárias necessárias para a proteçãoda saúde humana, animal e vegetal, desde que sejam consistentes comas disciplinas estabelecidas no Acordo. Esse direito é qualificado portrês obrigações constantes do Artigo 2.2 relativas às medidas sanitáriase fitossanitárias, que (i) devem ser aplicadas somente na medida donecessário; (ii) devem estar fundamentadas em princípios científicos; e(iii) não podem ser mantidas sem suficiente evidência científica, “excetono caso do Artigo 5.7” (que será discutido mais tarde).

O Artigo 3 encoraja os países membros a basear suas medidassanitárias e fitossanitárias nas normas, diretrizes e recomendaçõesinternacionais existentes de forma a promover a harmonização dosregulamentos nacionais. Vários organismos internacionais desenvolvemnormas sanitárias e fitossanitárias. Três são expressamente mencionadosno Acordo: (i) o Codex Alimentarius Commission (CODEX) paratemas de saúde alimentar; (ii) o International Office of Epizootics (OIE)para questões relacionadas a animais; e (iii) a International PlantProtection Convention (IPPC) da FAO para medidas ligadas às plantas.

O Artigo 3.3, entretanto, autoriza os países membros a aplicarmedidas que resultem em nível de proteção superior a aqueleestabelecido por normas internacionais. A esse direito, no entanto,corresponde a obrigação de observar o critério científico e osdispositivos sobre análise de risco.

O Artigo 4 dispõe sobre o tema da equivalência entre medidassanitárias e fitossanitárias. Trata-se de mecanismo adicional para

139 Artigo 1 e Anexo A, parágrafo 1 do Acordo de SPS.

Page 106: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

106

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

promover a harmonização de regulamentos nacionais. Esse artigodetermina, portanto, que os membros devem aceitar medidas sanitáriasde outro país membro como equivalentes à sua, “if the exportingmember objectively demonstrates to the importing member thatits measures achieve the importing member’s appropriate level ofsanitary and phytosanitary protection”.

O Artigo 5, em conjunto com os Artigos 2 e 3, constituem abase jurídica dos relatórios dos três contenciosos na área do SPS.Alguns analistas consideram que esses três artigos formam, portanto,os dispositivos centrais das disciplinas enunciadas no Acordo deSPS140.

De forma geral, o Artigo 5 explicita a obrigação horizontal sobreo fundamento científico enunciada no Artigo 2. Nesse sentido, determinacomo e em que medida os países membros devem conduzir análisesde risco e estabelecer o nível apropriado de proteção sanitária –Appropriate Level of Protection (ALP). No que tange às análises derisco, os países membros são instados a recorrer às técnicas ou àsdiretrizes desenvolvidas por organismos internacionais (o CODEX, porexemplo, quando a preocupação se relacionar à saúde humana). Oestabelecimento do nível apropriado de proteção sanitária (ALP) estávinculado à flexibilidade outorgada pelo Artigo 3.3, que autoriza aaplicação de regulamentos sanitários domésticos mais estritos do queas normas internacionais, desde que baseados em evidência científica.O usufruto desse direito é regulamentado em vários parágrafos do Artigo5. Os membros são, assim, instados a levar em consideração o objetivode minimizar os efeitos negativos ao comércio; a assegurar que suasmedidas não sejam mais restritivas ao comércio do que o necessário; eque sejam coerentes com o risco em questão de forma a não discriminarentre produtos e situações similares.

140 THORN, Craig e CARLSON, Marinn. “The Agreement on the Application ofSanitary and Phytosanitary Measures and The Agreement on Technical Barriers toTrade”. In: American Bar Association. Symposium: The First Five Years of WTO.Washington DC, janeiro de 2000.

Page 107: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

107

O Artigo 5.7 constitui o dispositivo do Acordo de SPS quemais se aproxima do Princípio da Precaução, ou seja, do conceito deque a incerteza científica não deve impedir o governo de atuar paraproteger a saúde humana, animal e vegetal. A exigência de análise derisco e de fundamentação científica que permeia todo o Acordo deSPS é flexibilizada pelo Artigo 5.7. Essa flexibilização, no entanto,aplica-se de forma provisória, com base em informações pertinentesdisponíveis e segundo os testes específicos relacionados ao dadocientífico “adicional” e ao período de tempo considerado razoável.

A leitura do Artigo 5.7 pelos painéis e Órgão de Apelação, queserá analisada mais adiante, vem sendo considerada pelos defensoresdo Princípio da Precaução como muito restrita para acomodar, em suaplenitude, o recurso à precaução no processo de tomada de decisãopolítica.

Os demais artigos do Acordo de SPS lidam com questõesmenos relevantes para o presente trabalho. Compreendem cláusulasde caráter substantivo, como o reconhecimento de regiões livres dedoenças e o tratamento especial e diferenciado aplicado aos países emdesenvolvimento, e requisitos de procedimento, a saber, as notificaçõesde medidas sanitárias e fitossanitárias, a administração e implementaçãodo Acordo.

O Artigo 11, entretanto, versa sobre a solução de disputascomerciais. Em seu parágrafo primeiro, esse dispositivo determina queas cláusulas do GATT 1994 consagradas pelo Understanding onRules and Procedures Governing the Settlement of Dispute (DSU)aplicam-se às consultas e à solução de controvérsias sob o Acordo deSPS. O parágrafo 2, entretanto, estabelece que nas disputas queenvolvam temas técnicos e científicos, o painel deve consultar peritos aserem selecionados de comum acordo com as Partes no contencioso.

Relevante também para o presente trabalho é o disposto noparágrafo 3 do Artigo 11. Este determina que nada no Acordo de SPSenfraquece ou prejudica o direito de os membros buscarem soluçãopara suas divergências em mecanismos de solução de controvérsias

Page 108: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

108

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

estabelecidos ao amparo de outros acordos ou organismosinternacionais.

AS CONTROVÉRSIAS NA ÁREA SANITÁRIA E FITOSSANITÁRIA

O mecanismo de solução de controvérsias na OMC

Os países membros da OMC acordaram conjunto de regrasque visa ao disciplinamento e à expansão do comércio internacional.O mecanismo de solução de controvérsias (MSC) é peça central desseconjunto de disciplinas. Elaborado para encorajar, facilitar e assegurara plena observação dos compromissos assumidos ao amparo dosacordos constitutivos da OMC, esse sistema favorece soluçõesmutuamente satisfatórias.

Os procedimentos do sistema de solução de controvérsias sãoprecisos, detalhados e de natureza jurídica. Abarcam cronogramas,processos de apelação e programas de acompanhamento paraassegurar a implementação das decisões141. O sistema da OMC autorizapouco espaço para a intervenção de considerações de ordemeconômica, social ou política. O Understanding on Rules andProcedures Governing the Settlement of Disputes (DSU) nãocontempla mandato para que os painéis e o Órgão de Apelação(“Appellate Body”- AB) busquem soluções eqüitativas. A naturezajurídica desse sistema privilegia o texto dos “acordos cobertos” quesão interpretados “in accordance with customary rules ofinterpretation of public international law”142.

141 O trabalho não se deterá em aspectos mais detalhados do mecanismo de solução decontrovérsicas da OMC. Busca-se aqui apenas apresentar, em breves linhas, ofuncionamento do MSC, com vistas a introduzir a discussão sobre os trabalhos dospainéis constituídos sob o Acordo de SPS.142 A menção a “customary rules of interpretation of public international law” constituireferência indireta à Convenção de Viena sobre Interpretação de Tratados. Tal referênciafoi necessária para acomodar a situação dos EUA, que não são membros daquelaConvenção.

Page 109: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

109

Os procedimentos para a solução de uma disputa comercialiniciam-se com a solicitação de consultas pela parte reclamante ao membroquestionado. Essa solicitação é obrigatória, mesmo na hipótese em queas partes tenham previamente mantido contatos informais orientados àsolução do problema, e passa necessariamente pelo Órgão de Soluçãode Controvérsias da OMC ou DSB (“Dispute Settlement Body”).

Se as consultas formais falham na busca de solução satisfatória, aparte reclamante pode requerer o estabelecimento de um painel ou grupode peritos para arbitrar a pendência. O painel é geralmente composto deum presidente e dois outros membros, selecionados de comum acordopelas partes envolvidas. No caso de não haver consenso sobre suacomposição, os três peritos são nomeados pelo Diretor-Geral da OMC.As decisões dos painéis podem ser recorridas ao Órgão de Apelação.

De caráter permanente, o Órgão de Apelação da OMC ou AB(“Appellate Body”) compõe-se de sete membros, geralmente advogadosde renome internacional, que atuam como juízes. Para cada pedido deapelação, seleciona-se, dentre os sete juízes, uma “Divisão” de três paraconsiderar o caso específico. O AB pode manter, modificar ou reverteralgumas ou todas as decisões e conclusões apresentadas pelo painel. Essarevisão, entretanto, é limitada a questões de lei (“issues of law”). O ABconclui seu relatório em prazo de 60 dias ou, excepcionalmente, 90 dias.

Desde a entrada em vigor do Acordo de SPS, em janeiro de 1995,18 alegações de violação foram invocadas diante do DSB. Desse conjunto,apenas três evoluíram para a constituição de painéis. A pedido do Canadáe EUA, foram estabelecidos, em 1996, dois painéis independentes parajulgar as medidas européias relativas à carne tratada a base de hormônios;por solicitação do Canadá, instituiu-se grupo de peritos, em abril de 1997,para examinar as restrições da Austrália à importação de salmão; finalmente,a pedido dos EUA, o DSB iniciou, em 1997, processo formal para analisaras exigências japonesas de teste de fumigação em variedades de frutas143.

143 Para uma visão geral sobre o assunto, vide STANTON, Gretchen. “The WTODispute Settlement Framework and Operation”. In: VVAA, The Economics ofQuarantine and the SPS Agreement, op. cit.

Page 110: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

110

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

União Européia – Medidas relativas à carne eseus derivados – O contencioso dos hormônios

A reclamação dos EUA e do Canadá contra o embargo impostopela União Européia às importações de carne tratada a base dehormônios foi a primeira disputa comercial na área de competência doAcordo de SPS a ser submetida à arbitragem de um painel144.

O contencioso remonta à década de 1970, quando osconsumidores europeus manifestam-se, pela primeira vez, preocupadoscom a utilização de hormônio de crescimento em gado bovino. Em1977, no Norte da Itália, crianças exibem traços de desenvolvimentofísico precoce. Embora não conclusivos, os pareceres dos técnicosque investigam o problema apontam para uma vinculação com o usoilegal de hormônio de crescimento na vitela e na carne de frango servidasnas escolas. Em 1980, são detectados resíduos de hormônios emalimento para crianças recém-nascidas produzido a base de vitela.Organizações européias promovem boicote ao consumo de vitela, sobsuspeita, portanto, de causar disfunções hormonais em crianças eadolescentes.

Em 1980, o Conselho das Comunidades Européias aprova obanimento do uso de estrogênio. Em 1988, tal medida é acompanhadada proibição do uso de outros seis hormônios de crescimento naturaise sintéticos.

As Comunidades Européias, em seguida, proíbem a importaçãode carne e produtos de carne tratados com os hormônios banidos, sobo argumento de que a medida se fazia necessária para proteger a saúdehumana de riscos potenciais causados por aquelas drogas, cujosresíduos eram encontrados na carne. A utilização dos hormônios naturaispor razões terapêuticas ou para manejo de rebanhos permaneceuautorizada.

144 “The Sanitary and Phytosanitary Measures in WTO law”, Monographs in TradeLaw, Volume 4, Bruxelas, O’Connor and Company, dezembro de 2000, pp. 101-105.

Page 111: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

111

No curso de 1996 e após inúmeras tentativas de solucionar apendência pelas vias bilateral e multilateral (GATT), os EUA e o Canadá,em oportunidades diferentes, solicitam ao Órgão de Solução deControvérsias da OMC (DSB) a constituição de painéis para julgar adisputa. Estes são estabelecidos, respectivamente, em maio e outubrode 1996. Tendo em vista a natureza das disputas, acorda-se, em seguida,que a composição desses dois painéis será idêntica.

Os principais argumentos das partes demandantes enfatizarama ausência de evidência científica que comprovasse riscos à saúdehumana associados à utilização apropriada dos hormônios decrescimento; a falta de fundamentação em análise de risco e em normainternacional; existência de medidas menos restritivas capazes deassegurar a proteção da saúde humana; e a identificação de elementosde discriminação.

Consistentes com o disposto no Artigo 11 do Acordo de SPS,os painéis recorreram à opinião de cientistas. Os pareceres técnicosversaram sobre os efeitos nos serem humanos de hormônios veterináriose outras drogas aplicadas a animais destinados ao consumo humano; arelação entre os hormônios e a ocorrência de câncer nos seres humanos;e o processo do CODEX para desenvolvimento de normasinternacionais no campo da saúde.

Os relatórios dos dois painéis foram divulgados em agosto de1997145. Todas as partes na disputa apelaram as decisões dos painéis.Em janeiro de 1998, o Órgão de Apelação concluiu seu relatório quefoi aprovado pelo DSB no mês de fevereiro146.

As conclusões e os pareceres legais, a serem discutidos naseção sobre jurisprudência, centraram-se nos Artigos 2 (fundamentaçãocientífica), 3 (harmonização), 5 (análise de risco). O Princípio daPrecaução também foi objeto de discussão pelo painel e Órgão deApelação. A UE invocou esse princípio para justificar o banimento da

145 WT/DS26/R/USA e WT/DS48/R/CAN.146 WT/DS26/AB/R e WT/DS48/AB/R.

Page 112: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

112

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

carne tratada à base de hormônios de crescimento. As determinaçõesdo painel e do AB sobre o Princípio da Precaução são de particularrelevância para o trabalho.

Austrália – Medidas que afetam a importação de salmão – O contencioso de salmões

A reclamação do Canadá contra as restrições australianas àimportação de salmão fresco e congelado constituiu a primeira disputacomercial relativa a medidas orientadas à proteção da saúde animal deriscos associados à introdução de doenças no território de ummembro147.

Sob a alegação, portanto, de que era necessário evitar aintrodução na Austrália de doenças exóticas, o governo daquele paísproibiu, em 1975, a entrada em seu território de salmão fresco econgelado. As importações de salmão defumado, inclusive enlatado,eram permitidas, mas sob condições especiais.

Após consultas bilaterais realizadas ainda no período do GATT,a Austrália concordou em realizar análises dos riscos potenciaisassociados a doenças suscetíveis de serem transmitidas por salmão innatura. A pedido do Canadá e dos EUA, prioridade seria atribuída aosalmão adulto e selvagem pescado no oceano pacífico.

O resultado de uma análise de risco preliminar, publicada apenasem maio de 1995, concluiu que, mediante o cumprimento de certascondições, os riscos relacionados às doenças exóticas seriamnegligenciáveis.

Publicada em dezembro de 1996, a análise de risco oficialopinou no sentido da manutenção do embargo à importação desalmão fresco e congelado, uma vez que fora identificada apossibilidade de pelo menos 20 doenças exóticas serem introduzidasna Austrália.

147 “The Sanitary and Phytosanitary Measures in WTO law”, op. cit., pp.105-108.

Page 113: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

113

Sob a argumentação de que o salmão importado para consumohumano apresentava risco muito baixo de transmissão de doenças, oCanadá solicitou ao Órgão de Solução de Controvérsias da OMC aconstituição de painel para examinar sua reclamação.

O pedido canadense justificou-se nos seguintes argumentoslegais:

(iv) as restrições australianas não eram baseadas em normasinternacionais, tampouco em análise de risco adequada;

(v) os níveis de risco impostos pelo governo australiano parao salmão eram inconsistentes com os adotados para outrospeixes;

(vi) o mesmo nível de proteção sanitária visado pela Austráliapoderia ser alcançado com medidas menos restritivas aocomércio.

O painel foi estabelecido em abril de 1997. Segundo a letra doArtigo 11 do Acordo de SPS, peritos da OIE – OrganizaçãoInternacional de Epizootias - foram convidados a aportar seuconhecimento científico referente a doenças transmissíveis por peixes;à análise de risco; e ao trabalho da OIE.

As decisões sobre patamares e análise de risco foramparticularmente importantes nesse contencioso, cujas principaisconclusões e pareceres legais versaram sobre os Artigos 5.1. 5.2 e 5.6148.

Japão – Medidas que afetam produtos agrícolas –O contencioso sobre variedades vegetais

O terceiro painel na área do Acordo de SPS consistiu nareclamação dos EUA contra medida japonesa sobre importação defrutas149. Com vistas a ter segurança de que a fruta importada não

148 WT/DS18/R e WT/DS18/AB/R.149 “The Sanitary and Phytosanitary Measures in WTO law”, op. cit., pp. 108-114.

Page 114: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

114

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

continha larvas (codling moth), o Japão apenas permitia a entradadaquelas variedades submetidas a extensos e complicados testes quevisavam a garantir a eficácia dos tratamentos de fumigação. Japãoalegava ser esta uma medida provisória e necessária para proteger asaúde das plantas.

O painel foi estabelecido em novembro de 1997. De acordocom o Artigo 11 do Acordo de SPS, foram consultados técnicos doInternational Plant Protection Convention (IPPC)150.

Os EUA argumentaram inexistir justificativas científicas para aaplicação da medida, particularmente no que toca à exigência de testepara cada variedade de determinada fruta. A principal linha daargumentação norte-americana apontava para o fato de que a medidajaponesa não estava baseada em princípios científicos e vinha sendomantida sem evidência científica que comprovasse a sua necessidade.

O Japão invocou o Artigo 5.7 na primeira fase do processo desolução de controvérsias, e recorreu ao Princípio da Precaução nafase de apelação. Para defender-se da determinação do painel de quesua medida não poderia ser mantida sem suficiente evidência científica,alegou que o Artigo 2.2 deveria ser lido à luz do Princípio da Precaução.De modo geral, o AB nessa disputa valeu-se da jurisprudência docontencioso EC-Hormones para rejeitar a alegação japonesa de queesse princípio autorizaria uma leitura mais ampla do Artigo 2.2.

O ACORDO DE SPS À LUZ DOS CONTENCIOSOS: A JURISPRUDÊNCIA NA

OMC

Na presente seção serão apresentados, a partir de umaabordagem temática, comentários sobre como o Acordo de SPS vemsendo interpretado pelos painéis e Órgão de Apelação. Com basenessa discussão, será avaliada a latitude regulatória existente no Acordode SPS para o recurso a medidas de precaução. As iniciativas orientadas

150 WT/DS76/R e WT/DS76/AB/R.

Page 115: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

115

a introduzir o Princípio da Precaução no sistema multilateral de comércioe suas implicações sistêmicas para esse quadro normativo serãoexaminadas nos dois capítulos subseqüentes. Precedem o exame dajurisprudência do Acordo de SPS breves comentários sobre a definiçãode medida sanitária e fitossanitária.

A medida sanitária e fitossanitária

Ponto relevante nessa discussão é a própria definição do queseja uma medida sanitária e fitossanitária.

O primeiro critério para identificar uma medida de SPS éinerentemente subjetivo. De acordo com o parágrafo 1 do Anexo A doAcordo de SPS, deve-se primeiramente examinar se a medida emquestão está orientada a proteger a vida e a saúde humana, animal evegetal. Nas três disputas, as partes demandadas argüiram que suasmedidas tinham por objetivo a proteção da vida e da saúde humana(hormônios), animal (salmão) e vegetal (variedades vegetais). Taisalegações não foram questionadas, o que significa que o Acordo deSPS não foi, ainda, testado por uma medida apenas parcialmenteorientada a proteger a saúde humana, animal e vegetal. Uma medidarelacionada com o comércio de produtos agrícolas geneticamentemodificados poderia visar à proteção da saúde humana e/ou animalmas, também estar orientada à proteção da biodiversidade.

Os outros dois critérios para identificar uma medida sanitária efitossanitária mostram-se mais objetivos. Verifica-se, inicialmente, se oregulamento visa (i) à proteção da vida e saúde humana e animal deriscos associados a alimentos; ou (ii) à proteção da vida humana, animale vegetal de riscos oriundos de pragas e outras doenças. Essa distinçãoé importante por força da jurisprudência que determinou diferentesanálises de risco para essas duas categorias de medidas. No contenciosoEC-Hormones, a medida procurava mitigar alegado risco associadoaos alimentos para seres humanos, mais especificamente aquelesrelacionados a resíduos de hormônios ou contaminantes em carne ou

Page 116: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

116

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

produtos de carne. Na disputa Australia-Salmon, identificou-se anecessidade de proteger os animais da introdução de doenças exóticasligadas ao salmão. No caso Japan-Varietals, pretendia-se evitar aintrodução de parasita encontrado em frutas e, assim, proteger a vidae saúde vegetal.

O terceiro e último critério exige que se constate se a medidaafeta direta ou indiretamente o comércio internacional.

Os requisitos para conformação de uma medida sanitária efitossanitária não se afiguraram controversos nas disputas examinadas.Entretanto, os painéis e Órgão de Apelação adotaram duas decisõesrelevantes.

Concluíram, primeiramente, que o Acordo de SPS aplica-se atodas medidas classificadas como sanitárias e fitossanitárias que afetamo comércio internacional, independentemente de ser ou não violatóriado GATT. O painel na disputa EC-Hormones expressou-se sobre oassunto da seguinte forma:

According to Article 1.1 of the SPS Agreement, two requirementsneed to be fulfilled for the SPS Agreement to apply: (i) themeasure in dispute is a sanitary and phytosanitary measure; and(ii) the measure in dispute may, directly or indirectly, affectinternational trade. There are no additional requirements. TheSPS Agreement contains, in particular, no explicit requirementof a prior violation of a provision of GATT which would governthe applicability of the SPS Agreement, as asserted by theEuropean Union151.

Antes da entrada em vigor do Acordo de SPS, medidas relativasà saúde eram justificadas apenas após a identificação de violação deobrigações de princípios do GATT. Ou seja, aplicava-se o Artigo XX(b)– exceções gerais ao GATT – somente quando uma inconsistência,por exemplo com a cláusula de não-discriminação, era verificada. Sob

151 WT/DS26/R/US, parágrafo 8.36 e WT/DS48/R/CAN, parágrafo 8.39.

Page 117: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

117

o Acordo de SPS, toda medida sanitária está sujeita às suas disciplinas,mesmo que não seja identificada prévia violação ao GATT. Isso significaafirmar que uma medida sanitária e fitossanitária, mesmo que recorraao Princípio da Precaução para legitimar-se, como demonstraram oscontenciosos EC-Hormones e Japan-Varietals, tem que se adequara todas as exigências do Acordo de SPS, em particular o critériocientífico e a análise de risco.

Fundamentação científica

A interpretação do Artigo 2.2 foi desenvolvida sobretudo pelopainel e Órgão de Apelação de Japan-Varietals152.

De acordo com o Artigo 2.2, as medidas sanitárias efitossanitárias, à exceção das provisórias, não podem ser mantidas sem“suficiente evidência científica”.

As determinações sobre esse dispositivo fundamentaram-se noexame do significado ordinário e do contexto das palavras “científico”e “suficiente”. Considerou-se, primeiramente, que “científico” dizrespeito a algo “used in science, broadly, having or appearing tohave an exact, objective, factual, systematic or methodologicalbasis”153 e que “suficiente” relaciona-se com “a quantity, extent, orscope adequate to a certain purpose or object”154.

Com base nessas considerações, o Órgão de Apelação emJapan Varietals julgou que o conceito de “sufficiency” requer aexistência de uma relação “suficiente” ou “racional” entre dois elementos:a medida de SPS e a evidência científica.

From this we conclude that “sufficiency” is a relational concept.“Sufficiency” requires the existence of a sufficient or adequate

152 O Artigo 2.2 ou o tema da fundamentação científica foi também relevante na disputaEC-Hormones. No entanto, como o painel concluiu que as medidas européias violavamos Artigos 3.1, 5.1 e 5.5, não foi julgado necessário o exame aprofundado do Artigo 2.2.153 WT/DS26/AB/R, parágrafo 187, nota 172.154 Id., parágrafo 73, nota 24.

Page 118: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

118

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

relationship between two elements, “in casu”, between the SPSmeasure and the scientific evidence… we agree with the Panelthat the obligation…that an SPS measure not be maintainedwithout sufficient scientific evidence requires that there be arational or objective relationship between the SPS measure andthe scientific evidence155.

O exame do contexto da palavra “sufficient”, ou seja, da frase“maintained without sufficient scientific evidence” no Artigo 2.2,levou o Órgão de Apelação em Japan-Varietals a afirmar ainda queeste dispositivo incorpora conceitos contidos nos Artigos 5.1, 3.3 e5.7 do Acordo de SPS.

Esclareceu o Órgão de Apelação que o Artigo 5.1 estabelecea exigência da análise de risco e, ao fazê-lo, explicita a obrigação básicado Artigo 2.2. Conforme determinou o Órgão de Apelação em EC-Hormones, os Artigos 2.2 e 5.1 devem ser lidos juntos, pois o Artigo2.2 informa e dá significado ao Artigo 5.1, que, por sua vez, define oselementos da obrigação horizontal enunciada no Artigo 2.2:

Article 5.1, when contextually read as it should be, in conjunctionwith and as informed by Article 2.2 of the SPS Agreement, requiresthat the results of the risk assessment must sufficiently warrant –that is to say, reasonably supports – the SPS measure at stake.The requirement that an SPS measure be “based on” a riskassessment is a substantive requirement that there be a rationalrelationship between the measure and the risk assessment156.

No entanto, o AB considerou oportuno recordar o seu parecerem EC-Hormones, segundo o qual o:

Article 5.1 does not require that the risk assessment mustnecessarily embody only the view of a majority of the relevant

155 WT/DS76/AB/R, parágrafos73-84.156 WT/DS26/AB/R, parágrafo 193.

Page 119: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

119

scientific community. (...) In most cases, responsible andrepresentative governments tend to base their legislative andadministrative measure on “mainstream” scientific opinion. Inother cases, equally responsible and representative governmentsmay act in good faith on the basis of what, at a given time, maybe a divergent opinion coming from qualified and respectedsources157.

Dando curso ao exercício de interpretação do contexto doArtigo 2.2, o AB referiu-se ao Artigo 3.3 que autoriza um país membroa adotar medidas mais estritas do que as normas internacionaisrelevantes, desde que respaldadas em “justificativa científica”. Naopinião do AB em Japan-Varietals, a determinação dessa “justificativacientífica” está vinculada ao teste da “relação racional” entre uma medidasanitária e a evidência científica disponível.

(...) there is a “scientific justification” for an SPS measure, withinthe meaning of Article 3.3, if there is a rational relationshipbetween the SPS measure at issue and the available scientificinformation158.

O Artigo 5.7, que é mencionado de forma explícita no Artigo2.2, estabelece que os países membros podem adotar medidasprovisórias quando a evidência científica é insuficiente, desde queobservados seus requisitos específicos. O Artigo 5.7 foi, portanto,considerado pelo Órgão de Apelação, em Japan-Varietals, como “a‘qualified’ exemption from the obligation under Article 2.2 not tomaintain SPS measures without sufficient scientific evidence”159.

À luz dessas e outras considerações sobre o texto e contextodo Artigo 2.2, o Órgão de Apelação concluiu que a existência de uma“relação racional” entre a medida e a evidência científica só poderá ser

157 WT/DS26/AB/R; parágrafo 194; e WT/DS76/AB/R, parágrafo 77.158 WT/DS76/AB/R, parágrafo 79.159 WT/DS76/AB/R, parágrafo 80.

Page 120: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

120

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

determinada “on a case-by-case basis” e dependerá das circunstânciasparticulares ao caso, inclusive as características da medida em questãoe da qualidade e quantidade da evidência científica160.

Do ponto de vista do Brasil ou de países exportadores agrícolas,pode-se dizer que a leitura do Artigo 2.2, ou a interpretação doprincípio científico que norteia o Acordo de SPS, por meio da verificaçãode uma “relação racional” entre a medida sanitária e a evidência científicaconstitui uma interpretação razoável e até algo restrita. A vinculaçãodo Artigo 2.2 com os Artigos 5.1, 3.3 e 5.7 reforça o imperativocientífico imposto à medida sanitária à luz do Acordo de SPS. Noentanto, a afirmação subseqüente do AB, de que esta “relação racional”será definida segundo o caso, suas circunstâncias específicas e aqualidade e quantidade da informação científica apresentada, matizaaquela primeira interpretação e deixa margem de subjetividade paradeterminações futuras sobre uma “relação racional” e, por implicação,sobre a suficiência da evidência científica. Ainda que não chegue afacultar a aplicação do Princípio da Precaução nos moldes reivindicadospela UE, a presente leitura do AB facilita o recurso a uma abordagemprecautória na medida em que flexibiliza os parâmetros de revisão.

Patamares de risco

Invocado nos três contenciosos descritos, o Artigo 5.1 constituium dos mais relevantes dispositivos operacionais do Acordo de SPS.Como se viu na seção anterior, o Artigo 5.1 explicita o enunciado doArtigo 2.2, quando estabelece a obrigação específica de que todamedida sanitária seja baseada em análise de risco.

Igualmente relevante para a presente discussão é o parágrafo 4do Anexo A, que define análise de risco. Esse dispositivo divide oexercício de análise de riscos em duas categorias. A primeira, relativaaos riscos associados a pragas e outras doenças, busca avaliar a

160 Id.

Page 121: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

121

“probabilidade” (“the likelihood”) de entrada, estabelecimento oudisseminação de uma praga ou doença no território do país importador,em conformidade com as medidas sanitárias e fitossanitárias que possamser aplicadas, e das potenciais conseqüências biológicas e econômicas.A segunda categoria, referente aos riscos à saúde humana e animalvinculados ao consumo de alimentos, deve identificar o potencial (“thepotential”) de efeitos adversos à saúde humana e animal, resultanteda presença de aditivos, contaminantes, toxinas ou organismospatogênicos em alimentos, bebidas ou ração animal.

O Órgão de Apelação na disputa EC-Hormones desenvolveuargumentação para demonstrar que a exigência de “likelihood” ésuperior àquela de “potential”. “Likelihood” equivaleria a“probabilidade”, ou seja, “a thing that is judged likely to be true”161.“Potential” corresponderia à “possibilidade”, isto é “that which ispossible as opposed to actual”162. Com base nessa linha de raciocínio,o AB concluiu que a “probabilidade” implica patamar mais alto desuficiência científica do que “potencialidade” ou “possibilidade”. Nessesentido, pode-se inferir que o limiar de fundamento científico de umamedida orientada a proteger a saúde ou a vida humana é mais baixo emais flexível do que aquele relativo a medidas aplicadas para combaterpragas e doenças. Essa categorização de análise de risco foi confirmadapelo Órgão de Apelação no contencioso Australia-Salmon163.

Outra distinção importante entre os dois tipos de análises derisco pode ser encontrada na jurisprudência dos três contenciosos.

Em EC-Hormones, o AB estabeleceu que uma análise de riscorelativa à saúde e vida humana e animal compreendia dois estágios: (i)identificação do efeito adverso; e, em caso positivo (ii) avaliação dopotencial de sua ocorrência. A partir dessas considerações, o ABconcluiu que a CE não havia adequado sua análise de risco a essesrequisitos específicos e determinou a violação dos Artigos 5.1 e 5.2.161 WT/DS26/AB/R, parágrafo 184, nota 164.162 Id.163 WT/DS18/AB/R, parágrafos 120–123.

Page 122: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

122

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

(...) we find that the EC did not actually proceed to an assessment,within the meaning of Articles 5.1 and 5.2, of the risks arisingfrom the failure of observance of good veterinary practicecombined with problems of control of the use of hormones forgrowth promotion purposes164.

Em Australia-Salmon e Japan-Varietals, o AB estabeleceuque a análise de riscos associados a pragas e outras doenças comportavaprocesso de três estágios:

(vii) Identificação da doença, bem como das potenciaisconseqüências econômicas e biológicas;

(viii) Avaliação da probabilidade de entrada, estabelecimentoe disseminação da praga ou doença, bem como daspotenciais conseqüências econômicas e biológicas; e

(ix) Avaliação da probabilidade de entrada, estabelecimentoe disseminação da praga ou doença, de acordo com amedida de SPS que possa ser aplicada.

De fato, o parágrafo 4 do Anexo A do Acordo de SPSestabelece duas categorias de análise de risco. A que busca aprobabilidade e a que se satisfaz com a identificação da possibilidade.Tal distinção assenta-se na palavra “likelihood” para a primeiracategoria, em oposição à expressão “potential” na segunda categoria.À luz desse fato, a leitura do parágrafo 4 pelos painéis e Órgão deApelação não poderia ser outra, por força, inclusive, do Artigo 3.2 doUnderstanding on Rules and Procedures Governing the Settlementof Disputes que determina que os dispositivos dos acordos por ele“cobertos”165 sejam esclarecidos segundo as regras consuetudináriasde interpretação de tratados. Essas regras estabelecem, como etapa

164 WT/DS26/AB/R, parágrafo 208.165 A expressão “cobertos” refere-se à linguagem utilizada no Artigo 3.2 do DSU –Dispute Settlement Understanding.

Page 123: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

123

primordial nesse processo, a interpretação do significado ordinário daspalavras utilizadas pelos negociadores, em seu contexto, e à luz doobjetivo e propósito do instrumento em exame. Só em casos ambíguos,adotam-se métodos suplementares de interpretação.

Apesar do inequívoco significado das palavras empregadas naredação do parágrafo 4 do Anexo A, alguns analistas sobre comérciointernacional, funcionários do secretariado da OMC e mesmodiplomatas que participaram das negociações da Rodada Uruguai nãotêm certeza se tal distinção fora proposital166. Em que pese à dúvidasobre a intenção dos negociadores, a jurisprudência adotada até omomento permitirá que medidas sanitárias e fitossanitárias orientadasa proteger a saúde humana e animal, em função de riscos alimentares,possam ser fundamentadas por uma análise de risco, em princípio,menos rigorosa. Nesse contexto, uma vez identificado o efeito adverso,bastará a avaliação do potencial de sua ocorrência para que a “relaçãoracional” necessária para determinar a suficiência da base científicaseja estabelecida. O patamar para a legitimação de medida sanitáriaorientada a proteger a saúde humana de risco associado a alimentos é,hoje, portanto, inferior ao nível exigido para as medidas sanitáriasaplicadas em função de riscos associados a pragas e outras doenças.

Pode-se supor que esses pareceres poderão ter implicaçõesimportantes para o comércio de produtos agrícolas, pois facilitam aimposição de restrições comerciais disfarçadas em medidas sanitárias.Outra inferência possível aponta para o Princípio da Precaução, cujorecurso é favorecido pelo patamar mais baixo de suficiência científicarequerido às medidas relacionadas a alimentos.

166 PAUWELYN, Joost. “The WTO Agreement on Sanitary and Phytosanitary (SPS)Measures as Applied in the First three SPS Disputes: EC-Hormones, Australia-Salmonand Japan-Varietals”. Journal of International Economic Law, Volume 2, Número 4,dezembro de 1999, pp. 641–664. A autora trabalhou com a versão de abril de 1999, pp.1-20. A autora também manteve conversas informais sobre a matéria com TrevorMatheson (Nova Zelândia), Paul Martin (Canadá) e Paul Shanahan, Conselheiro Seniorda Divisão de Agricultura do Scretariado da OMC. Todos esses interlocutoresparticiparam das negociações agrícolas da Rodada Uruguai.

Page 124: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

124

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Análise de Risco

Ainda no campo das análises de risco ou, mais especificamente,da determinação de risco à luz dos dispositivos do Acordo de SPS, háimportante jurisprudência formada.

O painel de EC-Hormones, em uma interpretação restritiva doAcordo, expressou seu ponto de vista de que uma análise de riscodeve centrar-se na avaliação científica de dados e estudos factuais.Não constituiria, portanto, exercício político, nem envolveria valores ejulgamentos sociais167. Na opinião do painel, “non-scientific factorsshould (...) not be taken into account in risk assessment but in riskmanagement”168.

O Órgão de Apelação desautorizou tal interpretação, sob oargumento de que não existiria no Artigo 5, nem em outro dispositivodo Acordo de SPS, referências a “risk management”. A seu ver, opainel estaria violando norma fundamental de interpretação de tratadosque:

…requires a treaty interpreter to read and interpret the wordsactually used by the agreement under examination, and not wordsthe interpreter may feel should have been used169.

Recordou, finalmente, discordar da sugestão do painel de excluircertos tipos de risco do âmbito da análise de risco, sob o argumentoque pertencia ao universo da gestão de risco.

As earlier noted, the concept of “risk management” is notmentioned in any provision of the SPS Agreement and, as such, cannotbe used to sustain a more restrictive interpretation of risk assessmentthan is justified by the actual Article 5.2, Article 8 and Annex C of theSPS Agreement170.

167 WT/DS26/R/US, parágrafo 8.94 e WT/DS48/R/CAN, parágrafo 8.97.168 WT/DS26/R/US, parágrafo 8.146 e WT/DS48/R/CAN, parágrafo 8.149.169 WT/DS26/AB/R, parágrafo 181.170 Id., parágrafo 206.

Page 125: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

125

O AB, em seguida, reconheceu e apoiou as considerações dopainel no sentido de que uma avaliação de risco sob o Artigo 5.1 requer“a scientific process aimed at establishing the scientific basis forthe sanitary measure a Member intends to take”171. Recordou, noentanto, que o painel não poderia excluir do âmbito de uma análise derisco sob o Artigo 5.1, todos os fatores não suscetíveis de avaliaçãoquantitativa por métodos empíricos ou práticas de laboratórioassociadas com a ciência física. Argüiu, nessa linha, que a lista de fatoresconstante do Artigo 5.2 a ser levada em conta em uma análise de risco,não era exaustiva ou limitada aos elementos ali relacionados.

Some of the kinds of factors listed in Article 5.2 such as “relevantprocesses and production methods” and “relevant inspection,sampling and testing methods” are not necessarily or whollysusceptible of investigation according to laboratory methods of,for example, biochemistry or pharmacology. Furthermore, thereis nothing to indicate that the listing of factors that may be takeninto account in a risk assessment of Article 5.2 was intended tobe a closed list172.

Ao desenvolver seu raciocínio, o AB afirmou que, à luz doArtigo 5.1, uma análise de risco se propõe não só a avaliar o risco“ascertainable” em laboratórios173, mas também “risk in humansocieties as they actually exist, in other words, the actual potentialfor adverse effects on human health in the real world where peoplelive and work and die”174. (Ênfase da autora.) O Órgão de Apelaçãofoi, ainda, mais adiante nessa determinação e sublinhou que o objeto eo propósito do Acordo de SPS justificam o exame e a avaliação de

171 Ibid., parágrafo 187.172 Id.173 No parágrafo 186 do WT/DS26/AB/R, o AB confirma parecer do painel de que orisco sob o Artigo 5.1 deve ser “ascertainable”, pois “theoretical uncertainty” nãopertenceria ao universo da análise de risco enunciada no Artigo 5.1.174 Vide nota 171.

Page 126: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

126

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

todos os riscos à saúde humana associados a alimentos, “whatevertheir precise and immediate origin may be”175. Esclareceu, entretanto,que não estaria sugerindo avaliação regular de riscos emanados deabusos na administração de contaminantes de forma regular, mas “ona case by case basis”176.

Esse parecer emanou do fato de que todos os estudoscientíficos, relativos aos hormônios em questionamento no contenciosoEC-Hormones, concluíram pela segurança dessas substâncias quandoadministradas de acordo com requisitos de boa prática veterinária.

Com base nas considerações acima relativas à determinaçãodo risco sob o Acordo de SPS, o AB não acatou a conclusão dopainel de EC-Hormones de excluir fatores não científicos ou“laboratoriais” da análise de risco, mas legitimou a interpretação deque a análise de risco sob o Acordo de SPS constitui processo científico,sistemático, disciplinado e objetivo.

We note in this connection that the Panel states that, forpurposes of the EC measures in dispute, a risk assessmentrequired by Article 5.1 is “a scientific process aimed atestablishing the scientific basis for the sanitary measure aMember intends to take”. To the extent that the Panel intendedto refer to a process characterized by systematic, disciplinedand objective enquiry and analysis, that is a mode of studyingand sorting out facts and opinions, the Panel’s statement isunexceptionable177 (ênfase do AB).

É difícil determinar exatamente quais fatores não quantificáveisem laboratórios que podem ser, em uma abordagem caso a caso,levados em conta na avaliação de risco. Embora não tenha sido explícitoa esse respeito, o AB parece ter sugerido que esses fatores nãoquantificáveis poderiam incluir o risco oriundo de práticas abusivas na

175 Vide nota 170.176 WT/DS26/AB/R, parágrafo 186.177 Vide nota 171.

Page 127: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

127

administração de contaminantes, métodos de embalagem, distribuição,armazenamento e outros aspectos do mundo real “where people liveand work and die”.

Uma vez que o AB entendeu ser a lista do Artigo 5.2 nãoexaustiva, amplia-se o universo dos temas a serem examinados emuma análise de risco e, nesse sentido, cria-se espaço para a aplicaçãode medidas sanitárias fundamentadas em riscos não quantificáveis, que,por sua natureza, são imprecisos e podem, em alguns casos, comportarjuízo de valor.

A questão principal, no entanto, é saber se essa “lista ampliada”abarcaria preocupações de consumidores, valores sociais oupreferências culturais ou morais, como desejam a União Européia eoutros defensores do Princípio da Precaução. Eles notam, como severá mais à frente, que a decisão do AB referente a “riscos emsociedades humanas” e a “adverse effects on human health in thereal world where people live and work and die” não só sinaliza nosentido de considerações subjetivas, mas sobretudo rebaixa o patamarde revisão do critério científico estrito, que parece ter sido a motivaçãoinicial do Acordo de SPS.

Outra possibilidade é a de que o AB tenha somente ampliado ouniverso de “fatores” que podem compor a análise de risco. Não apenasseriam pertinentes os testes de laboratório, mas também as condiçõesde produção, armazenamento e distribuição, que podem ter impactono risco real que a medida procura evitar. Por outro lado, a análise derisco em si, que abarcará esse universo ampliado de fatores, devecontinuar obedecendo aos critérios de um “scientific process”.

Em síntese, para que se tenha uma melhor idéia do alcance dasconclusões acima, seriam necessários novos “testes” do Acordo deSPS no mecanismo de solução de controvérsias178.

178 Esse parecer não chegou a ser testado pelos dois outros contenciosos subseqüentes,porquanto estes não diziam respeito a medidas de combate a riscos associados aalimentos.

Page 128: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

128

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Nível apropriado de proteção sanitária e fitossanitária(ALP, Appropriate Level of Protection)

Uma vez cumpridas as etapas de análise de risco e daidentificação do risco, o país membro deve definir o nível de proteçãoque considera apropriado para proteger a saúde humana, animal e vegetal.

A medida sanitária e fitossanitária selecionada para refletir onível de proteção julgado apropriado deverá observar alguns critérios.Ele deverá, inicialmente, instruir e integrar a análise de risco, tal comodefinido no parágrafo 4 do Anexo A. Em seguida, deverá observar odisposto no Artigo 5.6, inclusive os três testes cumulativos constantesda nota de pé-de-página deste artigo. Nesse sentido, uma medidasanitária será “more trade restrictive than required” only if there isanother SPS measure which”:

- is “reasonably available taking into account technical andeconomic feasibility”;

- “achieves appropriate level of sanitary (...) protection”; and- is “significantly less restrictive to trade than the sanitary

measure contested”179.

Em Australia-Salmon e em Japan-Varietals, o Órgão deApelação confirmou esses três testes cumulativos, mas reverteu atentativa dos painéis de, por iniciativa própria, estabelecer uma medida“less restrictive to trade” que, do seu ponto de vista, pudesse atenderao ALP do país demandado. Em ambas ocasiões, o AB sustentou seuparecer na afirmação de que o estabelecimento do nível apropriado deproteção sanitária é “prerrogativa” dos países membros e, portanto,não compete aos painéis nem a ele mesmo180.

Com essa decisão, o AB tende a reforçar o conteúdo políticoque permeia o Artigo 5.6, o que incrementa o grau de subjetividade na

179 WT/DS18/R, parágrafo 8.167.180 WT/DS18/AB/R, parágrafo 199.

Page 129: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

129

determinação de consistência com as obrigações contidas nessedispositivo. Como se verá à frente, esse parecer será em várias ocasiõesutilizado para legitimar o recurso ao Princípio da Precaução. Sempreque invocada, a determinação sobre a “prerrogativa” é destituída deseu contexto, ou seja, da exigência do fundamento científico que deveacompanhar o estabelecimento por um país membro de seu nívelapropriado de proteção sanitária.

A medida provisória

A leitura do Artigo 5.7 pelo AB em Japan-Varietals, o únicodos três painéis em que esse dispositivo foi invocado, iniciou-se pelareiteração do Artigo 2.2, segundo o qual toda medida sanitária efitossanitária deve ser aplicada apenas na medida do necessário paraproteger a vida ou a saúde humana, animal ou vegetal e baseada emprincípios científicos. A última parte desse dispositivo estabelece aindaque a medida sanitária não deve ser mantida sem evidência científicasuficiente, exceto como determinado no parágrafo 7 do Artigo 5.

O Artigo 5.7, como se recorda, autoriza os países membros a,nos casos em que a evidência científica for insuficiente, adotarprovisoriamente uma medida sanitária e fitossanitária. Por isso, foicaracterizado como uma “exceção qualificada”181 da obrigaçãohorizontal estabelecida pelo Artigo 2.2182.

Para ser considerada consistente com o Artigo 5.7, uma medidasanitária e fitossanitária deve: (i) se relacionar a uma situação em que ainformação científica relevante é insuficiente; e (ii) ser aplicada combase em informação pertinente disponível.

Tal medida, no entanto, só poderá ser mantida se o país membroque a aplica: (iii) procurar obter a informação adicional necessária para

181 Vide nota 159.182 A determinação sobre o caráter excepcional do Artigo 5.7 tem implicações relevantessobre o estabelecimento do ônus da prova. Esse ponto será discutido mais à frente.

Page 130: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

130

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

uma avaliação mais objetiva do risco; e (iv) revisar, em conseqüência,a medida em um prazo razoável de tempo.

Na análise desses testes, o AB, em Japan-Varietals,esclareceu, inicialmente, que os quatro requisitos do Artigo 5.7 sãocumulativos por natureza e igualmente importantes para o propósitode determinar a consistência de uma medida provisória com odispositivo em exame.

Whenever one of these four requirements is not met, the measureat issue is inconsistent with Article 5.7183.

No que concerne ao teste referente à “informação adicional”,o AB afirmou não existir no Artigo 5.7, ou em nenhum outro dispositivodo Acordo de SPS, critérios ou procedimentos que disciplinem a coletade informação adicional. Salientou, também, que o Artigo 5.7 tampoucoespecifica que resultados devem ser alcançados nesse exercício, umavez que o compromisso se limita à obrigação de “procurar obterinformação adicional”. O AB concluiu, no entanto, que tal “informaçãoadicional” deve constituir o embrião de uma análise de risco, uma vezque a obrigação de coletar é complementada pela determinação deproceder a uma “avaliação mais objetiva do risco”.

(...) the information sought must be germane to conducting sucha risk assessment, i.e., the evaluation of the likelihood of entry,establishment or spread of, “in casu”, a pest, according to theSPS measures which might be applied184.

Sobre o requisito de “prazo razoável” para rever a medida, oAB, em Japan-Varietals, estabeleceu que uma decisão sobre o queconstitui um “prazo razoável” “has to be established on a case-by-case basis and depends on the specific circumstances of each case,including the difficulty of obtaining the additional information

183 WT/DS76/AB/R, parágrafo 89.184 WT/DS76/AB/R, parágrafo 92.

Page 131: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

131

necessary for the review and the characteristics of the provisionalSPS measure”185. (Ênfase da autora.)

Ao examinar o caso de Japan-Varietals, o AB opinou que,embora a obrigação de “revisão” só existisse após 1o de janeiro de1995, a medida deveria ter sido revista “within a reasonable periodof time”.

A leitura do Artigo 5.7 pelo AB impôs alguns limites à utilizaçãode medidas provisórias. Mesmo que de caráter procedimental, os quatrorequisitos tendem a inibir, senão disciplinar, o uso indevido de medidasem casos de base científica insuficiente. No plano substantivo, ainterpretação do Artigo 5.7 pelo AB foi modesta, mas relevante. Naanálise do terceiro requisito, o AB reconheceu, por exemplo, ainexistência de critérios para determinar o método ou a qualidade dainformação adicional a ser coletada. Implicitamente, no entanto,estabeleceu um padrão de qualidade, quando determinou que estainformação deve propiciar uma avaliação mais objetiva do risco. Orequisito sobre o “prazo razoável” foi interpretado de forma bastanteflexível, pois deverá ser determinado segundo “as circunstâncias” docaso e as “características” da medida.

Alguns analistas consideram que, ainda que de forma implícita,o AB estabeleceu uma referência temporal de cinco anos para definirum “prazo razoável”186. Outros187 divergem desse ponto de vista eafirmam que o painel e o AB, em Japan-Varietals, evitaram pronunciar-se sobre importantes aspectos substantivos do Artigo 5.7, como, porexemplo, o estabelecimento de parâmetros para determinar ainsuficiência científica que autorizaria o recurso a medidas provisóriase o “prazo razoável”.

Talvez por força da estreita vinculação entre o Artigo 5.7 e oPrincípio da Precaução, o Órgão de Apelação buscou estabelecerequilíbrio cuidadoso na leitura do alcance legal do Artigo 5.7. Tal cuidado

185 WT/DS76/AB/R, parágrafo 93.186 PAUWELYN, op. cit., p. 8.187 THORN e CARLSON, op.cit., p. 9.

Page 132: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

132

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

em não propiciar uma interpretação exageradamente liberal dessedispositivo e tampouco muito restrita, é evidenciado pela não fixação,pelo AB, de parâmetros e prazos pré-determinados, o que, de resto,contribui para a persistência de um vácuo de jurisprudência importantee útil para o recurso a medidas de precaução sob o Artigo 5.7.

Harmonização das medidas sanitárias

Os Artigos 3.1, 3.2 e 3.3 constituem a essência do conjunto dedisciplinas do Acordo de SPS que dispõe sobre a harmonização demedidas sanitárias e fitossanitárias. O exame desses dispositivos, emEC-Hormones, foi marcado por divergências de interpretações entreo painel e o Órgão de Apelação. Desse debate emergiram pelo menosdois importantes pareceres. O primeiro deles diz respeito à relaçãoentre os Artigos 3.1 e 3.2.

Determina o Artigo 3.1 que países membros devem basear(“base”) suas medidas sanitárias e fitossanitárias nas normas, diretrizese recomendações internacionais. O Artigo 3.2 dispõe que medidassanitárias e fitossanitárias que obedecerem (“conform to”) às normas,diretrizes e recomendações internacionais serão presumidas consistentescom o Acordo de SPS e com o GATT 1994.

O painel de EC-Hormones considerou equivalentes asexpressões “based on” e “conform to”, o que, por implicação,autorizaria a inferência de que as medidas sanitárias “baseadas” em normainternacional seriam consideradas, por força do Artigo 3.2, consistentescom os dispositivos do Acordo de SPS e com o GATT 1994.

O AB reverteu esse parecer, sob o argumento de que umregulamento é “based on” quando “is founded on” ou “built upon”ou “supported by”. “Conform to” elevaria esse nível de exigência,pois implicaria “correspondence in form or manner” ou “complianceto”188. Determinou, nesse sentido, que:

188 WT/DS26/AB/R, parágrafos 162 e 163.

Page 133: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

133

A measure that “conforms to” and incorporates a CODEXstandard is, of course, “based on” that standard. A measure,however, based on the same standard might not conform to thatstandard, as where only some, not all, of the elements of thestandard are incorporated into the measure189.

A interpretação do painel de que o Artigo 3.2 implicarianecessariamente uma presunção de consistência com o Acordo de SPS,sempre que uma medida sanitária for “based on internationalstandards”, foi, portanto, revertida pelo AB. Este concluiu que talpresunção é restrita à medida que “conform to” ou “comply with”.

O segundo parecer refere-se ao Artigo 3.3. Essa cláusulaautoriza os países membros a aplicar medidas sanitárias e fitossanitáriasmais estritas do que as normas internacionais, desde que sejam apoiadasem justificativas científicas e consistentes com todos os demaisdispositivos do Acordo de SPS. Em outras palavras, o Artigo 3.3determina que uma medida aplicada para alcançar nível de proteçãosanitária mais alto do que aquele implícito nas normas internacionaisnão escapa da exigência de análise de risco ou de fundamentaçãocientífica.

O painel de EC-Hormones determinou que o Artigo 3.3constitui uma exceção à obrigação do Artigo 3.1. Esse entendimentoteve por base o seguinte raciocínio:

Article 3.1 imposes an obligation on all Members to base theirsanitary and phytosanitary measures on international standardsexcept as otherwise provided in the Agreement, and in particularArticle 3.3 thereof. In this sense, Article 3.3 provides an exceptionto the general obligation contained in Article 3.1. Article 3.2, inturn, specifies that the complaining party has the burden ofovercoming a presumption of consistency with the SPS Agreementin the case of a measure based on international standards. It thereby

189 Id., parágrafo 163.

Page 134: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

134

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

suggests by implication that when a measure is not so based, theburden is on the respondent to show that the measure is justifiedunder the exceptions provided for in Article 3.3190.

O Órgão de Apelação discordou desse ponto de vista, aoconsiderar, inicialmente, que o Artigo 3.3 não constitui “exceção” aoArtigo 3.1, mas um “direito autônomo” e uma obrigação distinta esuscetível de violação independentemente do Artigo 3.1. Esse “direitoautônomo” adviria do fato de que o Artigo 3.1 “simply excludes fromits scope of application the kinds of situations covered by Article3.3 … that is, where a member has projected for itself a higherlevel of sanitary protection than would be achieved by a measurebased on an international standard”191.

O direito de estabelecer esse nível de proteção mais alto, porsua vez, também teria respaldo, segundo o AB, no sexto parágrafo dopreâmbulo do Acordo de SPS que dispõe sobre o exercício deharmonização, “without requiring Members to change theirappropriate level of protection of human, animal or plant life orhealth”192.

De forma a melhor examinar o alcance dessas conclusões, torna-se importante avaliar o significado do exercício de harmonização noAcordo de SPS. Esse exercício relaciona-se com um dos aspectosmais relevantes do Acordo de SPS: o de como lidar com a falta deconsenso científico ou a incerteza científica associada ao risco. Busca-se, por meio da harmonização das medidas sanitárias e fitossanitárias,obviar a aplicação indiscriminada e arbitrária de diferentes medidassanitárias que, por sua vez, refletem diferentes níveis de proteção.Quando essas medidas orientam-se por um conjunto de diretrizes ourecomendações acordadas internacionalmente, ainda que sua aplicaçãovarie segundo o país, os parâmetros de exigência são previsíveis, o

190 WT/DS26/R/USA, parágrafo 8.86.191 WT/DS26/AB/R, parágrafo 104.192 Id., parágrafo 172.

Page 135: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

135

que contribui para legitimar a implementação e facilitar a aceitação damedida pela comunidade internacional. Há, portanto, maiorprevisibilidade para o comércio.

Nesse contexto, pode-se afirmar que as conclusões do painelsobre os Artigos 3.1 e 3.2 incentivariam a adoção de medidas sanitáriasbaseadas em normas internacionais. Esse incentivo adviria da presunçãode conformidade enunciada no Artigo 3.2 que seria, no entender dopainel, estendida ao Artigo 3.1. No entanto, ao atribuir a medidas apenas“baseadas” na norma internacional a presunção de consistência oraexistente para medidas que “se conformam” à prática internacionalmenteacordada, o painel estaria reduzindo o patamar de suficiência científicapara a aplicação de medidas sanitárias sob o Artigo 3.1.

A reversão desse parecer pelo AB tenderia a inverter essadinâmica. O AB circunscreveu a presunção de consistência apenas àsmedidas sob o Artigo 3.2, ou seja, àquelas que obedecem ou seconformam às normas internacionais. Alguns analistas, como DavidHurst, consideram que essa interpretação subtrai o estímulo àadequação de medidas sanitárias às normas internacionais193, porquantoapenas há presunção de consistência com o Acordo quando há estritaobservância das normas internacionais. Não existiria, assim, incentivoadicional para que uma medida se “baseie” naquelas normas.

Se, por um lado, a visão de Hurst tem mérito, por outro lado,deve-se notar que a interpretação do AB tende a disciplinar a aplicaçãoindevida de medidas sanitárias, pois pressupõe que, mesmo aquelas“baseadas” nas normas internacionais, passarão pelo crivo do Acordode SPS. Esse parecer tenderá a inibir abusos na implementação dessesdois dispositivos, sob a forma de conformidade cosmética e superficialàs normas internacionais.

O debate sobre a leitura do Artigo 3.3 demonstrou que, nessecaso, a interpretação mais ampla da letra do Acordo de SPS ficou porconta do AB. Ao determinar que o Artigo 3.3 é um “direito autônomo”,

193 Apud PAUWELYN, op. cit., pp. 12-13.

Page 136: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

136

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

e não uma exceção à regra geral de harmonização, o AB retirou dopaís que aplica a medida sanitária inconsistente com o padrãointernacionalmente acordado, uma obrigação importante: o ônus, pelomenos inicial, de prova de consistência. Caberá, portanto, à partedemandante a responsabilidade de provar que a medida divergente danorma internacional não cumpre com os requisitos dos testes do Artigo3.3: a justificativa científica e a consistência com os demais dispositivosdo Acordo de SPS.

Ainda que coerente com a “prerrogativa” atribuída a um paísmembro para aplicar o nível apropriado de proteção sanitária, acaracterização do Artigo 3.3 como “direito autônomo” poderá militar(i) do ponto de vista substantivo, contra a obrigação básica deharmonização das medidas sanitárias; e (ii) do ponto de vistaprocedimental, a favor de quem diverge e se distancia do consenso ouda prática internacional.

A implicação desse parecer para o comércio internacional deprodutos agrícolas é óbvia, pois fica facilitada a adoção de medidasmais restritivas ao comércio, cuja eventual inconsistência com o Acordode SPS terá que ser provada pela parte prejudicada. Note-se que odireito de um país membro aplicar medida sanitária mais rigorosa doque a norma internacional constitui objetivo que a União Européiaperseguia desde o início das negociações do Acordo de SPS. Não épor acaso que, como se verá nos Capítulos VI e VII, a UE temexplorado politicamente a interpretação dada pelo AB ao Artigo 3.3para justificar a aplicação de medidas fundamentadas no Princípio daPrecaução.

Deve-se ter presente, no entanto, que esse parecer não criapadrões diferentes para medidas sanitárias aplicadas sob o Artigo 3.3,apenas autoriza um país membro a aplicar restrições adicionais à entradade um produto que julgue danoso à saúde humana, animal ou vegetal.Os requerimentos para a sustentação jurídica dessa medida não sãoalterados, pois permanecem válidas as exigências do Acordo de SPSsobre fundamentação científica e análise de risco.

Page 137: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

137

Coerência e não-discriminação

Embora governos tenham o direito soberano de decidir sobreo nível de risco aceitável ou, na linguagem do Acordo de SPS, o nívelapropriado de proteção sanitária, o Artigo 5.5 determina que os paísesmembros devem evitar aplicar diferentes níveis de proteção a situaçõescomparáveis, se essas discrepâncias forem arbitrárias ou injustificáveise se resultarem em discriminação ou restrição disfarçada ao comércio.

O tema da não-discriminação ou da coerência da medidasanitária esteve presente nos três contenciosos na área de SPS. O AB,em EC-Hormones, estabeleceu três testes ou elementos que, severificados, concorreriam para a determinação de violação do Artigo5.5. São eles:

(i) the Member concerned adopts different appropriate levelsof sanitary protection in several ‘different situations’;

(ii) those levels of protection exhibit differences which are‘arbitrary or unjustified’; and

(iii) the measure embodying those differences results in“discrimination or disguised restriction on internationaltrade”194.

O AB considerou que esses três elementos são cumulativos.Nesse sentido, a determinação de inconsistência de uma medidasanitária sob o Artigo 5.5 precisa necessariamente passar pelademonstração desses três testes. Na perspectiva do AB, é aindanecessário provar que a forma com que a medida sanitária é aplicadaresulta em discriminação e restrição disfarçada ao comércio. Oraciocínio central do AB pode ser resumido na passagem a seguir:

…the implementing measure must be shown to be applied insuch a manner as to result in discrimination or a disguisedrestriction on international trade. The presence of the second

194 WT/DS26/AB/R, parágrafo 214.

Page 138: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

138

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

element – the arbitrary or unjustifiable character of differencesin levels of protection considered by a Member as appropriate indiffering situations – may in practical effect operate as a“warning” signal that the implementing measure in its applicationmight be a discriminatory measure or might be a restriction oninternational trade disguised as an SPS measure for the protectionof human, life or health. Nevertheless, the measure itself needsto be examined and appraised and, in the context of the differinglevels of protection, shown to result n discrimination or a disguisedrestriction on international trade195.

Na aplicação do primeiro teste, o painel de EC-Hormonesconsiderou que “situações diferentes” ou comparáveis sob o Artigo5.5 são aquelas em que “the same substance or the same adversehealth effect is involved”196.

Com base nesse raciocínio, comparou o embargo imposto pelaUE à carne tratada com hormônio natural e sintético com as medidastambém aplicadas pela UE para tolerância aos hormônios naturais ouendógenos. O painel considerou, portanto, que, ao envolver a utilizaçãode hormônios, ambas situações seriam comparáveis. Ao estudá-las,verificou que os níveis de proteção diferiam: para o primeiro caso,aplicou-se um embargo, enquanto ao segundo não fora impostoqualquer limite. Em seguida, o painel averiguou que (i) os hormôniosexaminados ofereciam o mesmo potencial cancerígeno; e (ii) os níveisde ocorrência de resíduos desses hormônios eram semelhantes nascarnes dos animais tratados e dos criados naturalmente. Na opiniãodo painel, os dados examinados levavam a crer que, embora amboscenários fossem comparáveis, a medida européia diferia e, portanto,mostrava-se arbitrária e resultava discriminatória. O painel concluiupela violação do Artigo 5.5.

195 Id., parágrafo 215.196 WT/DS26/R/USA, parágrafo 8.176 e WT/DS48/R/CAN, parágrafo 8.179.

Page 139: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

139

O Órgão de Apelação confirmou a interpretação do painel sobre“situações diferentes”, ao afirmar que, para aplicação dos testes doArtigo 5.5, estas têm apenas que “present some common element orelements sufficient to render them comparable”197. Reverteu, noentanto, o parecer sobre a violação do Artigo 5.5, sob o argumento deque havia uma diferença fundamental entre hormônios aplicados ehormônios endógenos, o que não autorizaria uma comparação entreas duas substâncias. Com base nesse diagnóstico, afirmou:

to prohibit totally the production and consumption of such foodsor to limit the residues of naturally-occurring hormones in food,entails such a comprehensive and massive governmentalintervention in nature and in the ordinary lives of people as toreduce the comparison itself to an absurdity198.

O AB fundamentou sua decisão de reverter o parecer do paineltambém em considerações constantes de estudos científicosapresentados pela UE que chamavam atenção para “riscos nãoquantificáveis em laboratórios”. Esse parecer encontra-se refletido naseguinte declaração:

The documentation that precede or accompanied the enactmentof the prohibition of the use of hormones for growth promotion… makes clear the depth and extent of the anxieties experiencedwithin the European Communities concerning the results of thegeneral scientific studies… the danger of abuse….and the intenseconcern of consumers within the European Communities overthe quality and drug-free character of the meat available in itsinternal market….We are unable to share the inference that the Panel apparentlydraws that the import ban ….here in dispute …was not reallydesigned to protect its population from the risk of cancer, but

197 WT/DS26/AB/R, parágrafo 217.198 Id., parágrafo 221.

Page 140: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

140

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

rather to keep out US and Canadian hormone-treated beef andthereby to protect the domestic beef producers in the EuropeanCommunities199. (Ênfase da autora.)

O exame dos aspectos de não-discriminação e de restriçãodisfarçada ao comércio pelo AB, em EC-Hormones, contribuiutambém para a decisão de reverter o parecer do painel sobre violaçãodo Artigo 5.5. Com base no raciocínio acima relativo ao requisito decumulatividade de testes, o AB afirmou que a determinação de queuma medida é arbitrária e injustificável não basta para qualificá-la comouma restrição disfarçada ao comércio. Essa constatação seria apenasum elemento, que, juntamente com outros, “may cumulatively leadto the conclusion that discrimination or a disguised restriction oninternational trade in fact results from the application of a measureor measures embodying one or more of those different levels ofprotection”200. Elementos de protecionismo e de discriminação entrepaíses membros, segundo o AB, devem ser provados. Nesse sentido,mesmo após admitir a existência de distinção “arbitrária e injustificável”no tratamento comunitário estendido a hormônios administrados emgado e a antibióticos aplicados a suínos, o AB concluiu que o teste dadiscriminação não havia sido comprovado. Nesse sentido, a medidacomunitária não poderia ser considerada inconsistente à luz do Artigo5.5. O AB complementou seus comentários sobre a matéria com aseguinte determinação:

Evidently, the answer to the question whether arbitrary orunjustifiable differences or distinctions in levels of protectionestablished by a Member do in fact result in discrimination or adisguised restriction on international trade must be sought in thecircumstances of each individual case201. (Ênfase da autora.)

199 Ibid., parágrafo 245.200 Ibid., parágrafo 240.201 Id.

Page 141: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

141

David Hurst considera que “the EC’s good intentions savedits measures from an Article 5.5 violation”. Hurst estima, portanto,que o parecer do AB sobre a matéria transformou a análise do Artigo5.5 em uma apreciação das intenções do país membro que impõe amedida sanitária202.

Embora tal percepção possa estar correta, os contenciosossubseqüentes ao EC-Hormones, não autorizam uma conclusãodefinitiva sobre tal precedente.

Em Australia-Salmon, o painel concluiu, e o AB confirmou,que a medida australiana de impedir a entrada de salmão configuravauma restrição ao comércio internacional “taken in the guise of anSPS measure”203. Tal conclusão fundamentou-se na comparação entrea medida sanitária adotada para o salmão e os regulamentos australianosaplicados à importação de arenque e peixes ornamentais. O painelconsiderou que essas duas situações poderiam representar riscossemelhantes àqueles alegados para a adoção do embargo ao salmãofresco e decidiu pela violação do Artigo 5.5.

Não obstante as interpretações do significado da jurisprudênciaexistente sobre o Artigo 5.5, a leitura desse dispositivo revela algumgrau de discricionariedade para a interpretação de “situaçõesdiferentes”. Para alguns analistas, como O’Connor e Joost, a definiçãode “situações diferentes” seria muito ampla e contrastaria com as noçõesmais restritivas de “like products” no GATT, onde a obrigação de nãodiscriminar envolve produtos iguais ou aqueles que são “directlycompetitive or substitutable”.

No que tange especificamente ao tema de não-discriminação,observa-se mais uma vez a tendência do Órgão de Apelação desugerir que decisões sejam tomadas em base caso a caso, o que,de resto, mantém o tema em aberto e faculta interpretações diferentesno futuro.

202 Apud PAUWELYN, op. cit., p. 12, nota 75.203 WT/DS18/AB/R, parágrafo 166.

Page 142: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

142

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

O ônus da prova

Tendo em vista a natureza complexa das questões sanitárias, adiscussão sobre a atribuição do ônus da prova é relevante para oscontenciosos sob o Acordo de SPS. Nesse instrumento, a incertezacientífica implícita ao risco opõe-se à obrigação horizontal de uma medidasanitária e fitossanitária estar baseada em “evidência científica suficiente”.O debate sobre o ônus da prova é, assim, alimentado por esses doisfatores e os painéis e o Órgão de Apelação são, com freqüência,defrontados com a indagação sobre a quem cabe o ônus da prova: aopaís que aplica a medida sanitária ou ao país que a questiona?

A resposta a essa pergunta remonta à argumentação clássicasobre o ônus da prova. No painel, United States – Measures AffectingImports of Woven Wool Shirts and Blouses from India, por exemplo,o AB recordou que:

… it is a generally accepted canon of evidence in civil law,common law and, in fact, most jurisdictions, that the burden ofproof rests upon the party, whether complaining or defending,who asserts the affirmative of a particular claim or defense204.

Em EC-Hormones, quando defrontado com essa pergunta, oÓrgão de Apelação recorreu à argumentação clássica sobre o ônus daprova e afirmou:

The initial burden lies on the complaining party, which mustestablish a prima facie case of inconsistency with a particular provisionof the SPS Agreement on the part of the defending party, or moreprecisely, of its SPS measure or measures complained about. Whenthat “prima facie case” is made, the burden of proof moves to thedefending party, which must counter or refute the claimedinconsistency205.

204 WT/DS33/AB/R, parágrafo 14.205 WT/DS26/AB/R, parágrafo 98.

Page 143: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

143

Esse parecer foi reiterado pelo AB em Australia-Salmon eJapan-Varietals206.

A jurisprudência firmada pela interpretação dos dispositivosdo Acordo de SPS revela que, sob a perspectiva da atribuição doônus da prova, existem duas categorias de medidas no Acordo deSPS. A primeira categoria abarcaria todas as medidas sanitárias quese fundamentam em evidência científica. Haveria, no âmbito dessegrupo, duas subdivisões de medidas: (i) aquelas que conformam comas normas internacionais; e (ii) aquelas que são baseadas ou quedivergem das normas internacionais.

A essa primeira categoria, a das medidas baseadas emevidências científicas suficientes, aplica-se a regra geral de atribuiçãodo ônus da prova. Ainda que em diferentes graus, essas medidas sãopresumidas consistentes com a obrigação horizontal de não aplicarnem manter uma medida sanitária e fitossanitária sem suficiente evidênciacientífica. Assim, até a apresentação de um prima facie case pelo paísdemandante, com evidências de que alguma obrigação horizontal foiviolada, essas medidas beneficiam-se da presunção de consistência.

A segunda categoria abarcaria as medidas sanitárias baseadasem evidência científica insuficientes. Essas medidas excepcionais eprovisórias, porquanto não observam o critério científico horizontal doAcordo de SPS, não se beneficiam da presunção de consistência. Oônus da prova é, nesses casos, invertido e recai sobre o país que invocaa exceção ou a defesa afirmativa. O ônus da prova é, essencialmente,o de mostrar que a base científica é insuficiente, não nula.

À luz do Acordo de SPS, portanto, uma medida sanitária malsustentada no critério científico ou se justifica pelo Artigo 5.7, maspara tanto tem o ônus da prova de consistência, ou é violatória dosdispositivos do Acordo.

O raciocínio de que cabe ao país que invoca o Artigo 5.7 aresponsabilidade primária de provar que a medida sanitária cumpre os

206 WT/DS18/AB/R, parágrafo 257, e WT/DS76/AB/R, parágrafo 122.

Page 144: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

144

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

requisitos daquela exceção tem paralelo no Artigo XX do GATT(“exceções gerais”). No painel da Gasolina, que opôs o Brasil aosEUA, o painel e o Órgão de Apelação confirmaram tal procedimentoao declarar que:

as the party invoking an exception, the United States bore theburden of proof in demonstrating that the inconsistent measurescame within its scope207.

Tal como elucida Joost Pauwelyn, em uma disputa sob o Acordode SPS, a Parte que (i) apresenta um fato (por exemplo, a existênciade uma norma internacional relevante); (ii) submete uma alegação (amedida sob exame não é fundamentada em evidência científicasuficiente); ou (iii) reivindica uma defesa (o caráter provisório da medida,segundo o disposto no Artigo 5.7) tem o ônus da prova de suaafirmação. Não há necessidade de que tal prova seja definitiva oucompleta, mas deve ser suficiente para estabelecer um caso de primafacie, isto é, para criar a presunção de que o fato, a alegação ou adefesa é correta. O ônus da prova passa então à outra parte para queela submeta evidências capazes de refutar a presunção criada208.

É possível, portanto, inferir desse debate que, embora ofereçafacilidades e flexibilidade para a formulação e adoção de medidassanitárias e fitossanitárias, o Acordo de SPS privilegia a adoção dessasmedidas com base em fundamentos científicos, comprovados poranálise de risco que, por sua vez, deve obedecer a processo científico“characterized by systematic, disciplined and objective enquiryand analysis (...)”209. Nesse sentido, a medida sanitária que se afastadesse critério científico básico do Acordo de SPS perde a presunçãode consistência e tem o ônus de provar-se adequada à exceção dainsuficiência científica provisória.

207 WT/DS2/R e WT/DS2/AB/R.208 PAUWELYN, op. cit., p. 16.209 Vide nota 171.

Page 145: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

145

Medidas baseadas no Princípio da Precaução ou em umaabordagem precautória, pela sua própria natureza, afastam-se docritério científico e, portanto, à luz do Acordo de SPS, têm o ônusda provar que se inserem na exceção. Os defensores desseprincípio, no entanto, desejam alterar essa dinâmica. Na suaperspectiva, o recurso à precaução deveria legitimar medidasfundamentadas em patamar reduzido de suficiência científica, e, paratanto, a dúvida – e não a prova da “relação racional” – sobre aexistência do risco deveria ser condição suficiente. Além disso, oônus da prova científica, ou do estabelecimento da “relaçãoracional”, é transferido ao que alega a segurança do produto e nãoao que levanta a suspeita do risco e, por isso, aplica a medidaprecautória. Foi este o raciocínio que norteou as alegações da UEe do Japão em seus respectivos contenciosos, quando recorreramao Princípio da Precaução.

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO

O Princípio da Precaução foi invocado em dois dos trêscontenciosos na área de SPS. Em EC-Hormones, a União Européiarecorreu a esse princípio para eximir-se da exigência da análise derisco estabelecida pelo Artigo 5.1. Sustentou, para tanto, sua tese deque o Princípio da Precaução constituiria “uma lei consuetudinária dedireito internacional” ou um “princípio geral do direito”.

Referindo-se à argumentação das Comunidades Européias, oAB, em EC-Hormones disse:

(...) applying the precautionary principle, means, in the view ofthe European Communities, that it is not necessary for all scientistsaround the world to agree on the “possibility and magnitude” ofthe risk, nor for all or most of the WTO members to perceiveand evaluate the risk in the same way210.

210 WT/DS26/AB/R, parágrafo 121.

Page 146: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

146

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Em Japan-Varietals, o Japão não só invocou o Artigo 5.7 paracaracterizar sua medida como provisória, mas também recorreu aoPrincípio da Precaução para legitimar uma leitura menos criteriosa dasobrigações constantes dos Artigos 2.2 e 5.1. Segundo os argumentosdo Japão perante o AB:

Not only the notion of an “actual causal link” operate as a denial ofthe precautionary principle, it is also a concept that has no basis inthe SPS Agreement…. In Japan’s view, the Panel failed to give dueregard to the precautionary principle, which was recognized in ECHormones …. Having lawfully established a prohibition on theimportation of host plants of codling moth, Japan submits that it is ina position which warrants a precautionary approach and that Japan’svarietal testing requirement, therefore, needs to be understood inthe context of the precautionary principle, a principle which is echoedby the practice of Member States and reflected in the CodexAlimentarius and the FAO Guidelines for Pest Risk Analysis.211

Ao examinar o recurso comunitário ao Princípio da Precaução,o AB, em EC Hormones, expressou, primeiramente, o seu ponto devista de que o Princípio da Precaução encontra reflexo, não apenas noArtigo 5.7, mas também em outras cláusulas do Acordo de SPS – sextoparágrafo do preâmbulo e Artigo 3.3 – que reconhecem o direito de umpaís membro estabelecer seu nível adequado de proteção sanitária. Talincorporação não autorizaria, entretanto, uma leitura diferente doenunciado desses dispositivos, que, ao contrário, ofereceriam sentidoespecífico ao Princípio da Precaução no contexto do Acordo de SPS.

(...) the principle has not been written into the SPS Agreementas a ground for justifying SPS measures that are otherwiseinconsistent with the obligations of Members set out in particularprovisions of that Agreement212.

211 WT/DS76/AB/R, P. 4, parágrafos 9 e 10.212 WT/DS26/AB/R, parágrafo 124.

Page 147: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

147

O AB determinou, ainda, que o recurso à precaução não invalidaas obrigações dos Artigos 5.1 e 5.2.

Quanto ao caráter internacional e consuetudinário atribuído aoPrincípio da Precaução pela UE, o Órgão de Apelação expressou asua discordância com aquela avaliação e afirmou:

the status of the precautionary principle in international lawcontinues to be the subject of debate among academics, lawpractitioners, regulators and judges213.

Reconheceu, em seguida, que embora o Princípio da Precauçãoseja considerado por alguns analistas como um princípioconsuetudinário internacional na área do meio ambiente, “whether ithas been widely accepted by Members as a principle of general orcustomary international law appears less than clear”. Além disso,o AB recusou-se explicitamente a tomar posição naquela questão“abstrata” e afirmou que, fora do contexto ambiental, esse princípioainda aguardava uma “authoritative formulation”214.

Em Japan-Varietals, o AB valeu-se de sua argumentação emEC-Hormones, em particular, aquela referente ao alcance da inclusãodo Princípio da Precaução no Acordo de SPS, para rejeitar as alegaçõesjaponesas sobre a leitura do Artigo 2.2.

O recurso ao Princípio da Precaução em EC-Hormones eJapan-Varietals ofereceu ao AB oportunidade para interpretar oalcance e o significado da incorporação do Princípio da Precaução noAcordo de SPS.

Importantes conclusões emanam desse debate. Registre-se, porexemplo, o reconhecimento da vinculação do Princípio da Precauçãocom os dispositivos relacionados à adoção do nível apropriado deproteção sanitária. Essa determinação ganha ainda mais relevo se lidaà luz do parecer emanado de Japan-Varietals e Australia-Salmon,

213 WT/DS26/AB/R, parágrafo 123.214 WT/DS26/AB/R, parágrafo 123

Page 148: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

148

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

segundo o qual o estabelecimento do nível apropriado de proteçãosanitária é “prerrogativa” dos países membros. Tal “prerrogativa”encontra-se, é verdade, limitada pela determinação do AB, em EC-Hormones, de que a incorporação do Princípio da Precaução aoAcordo de SPS não autoriza uma revisão ou reinterpretação da letrade seus dispositivos, em particular aqueles relativos ao critério científicoe à análise de risco.

No que tange ao comentário, em EC-Hormones, sobre a“authoritative formulation” de que careceria o Princípio daPrecaução, é importante ter em mente as diversas interpretações sobreo significado e alcance da inclusão do Princípio da Precaução aoProtocolo de Biossegurança, inclusive aquela constante doComunicado da União Européia, a ser examinado no próximo capítulo.A discussão sobre o seu status de lei internacional constitui outro pontorelevante, na medida em que visa à legitimação ampla e à aplicaçãoilimitada do Princípio da Precaução no sistema multilateral de comércio.

A evolução da jurisprudência da OMC sobre esse temademonstra, no entanto, que o Princípio da Precaução, como conceito,já está contemplado no Acordo de SPS, mas não sem limites. Ospareceres dos painéis e do Órgão de Apelação formam um quadroregulatório que não proíbe, mas disciplina o recurso à precaução noâmbito do Acordo de SPS. Assim, transparece das interpretações doAB o entendimento de que o Princípio da Precaução será semprepertinente ao universo do Acordo de SPS, na medida em que ele estejadevidamente refletido no texto do Acordo.

A jurisprudência firmada até o momento, embora contemplelatitude regulatória suscetível de acomodar visões conflitantes sobre opapel do Acordo de SPS, parece não atender aos interesses de paísesque reivindicam uma incorporação mais efetiva do Princípio daPrecaução ao arcabouço jurídico da OMC. Coincidentemente, essespaíses são também aqueles que resistem à liberalização do comérciointernacional de produtos agrícolas. Esses mesmos países lideraminiciativas, dentro e fora da OMC, orientadas a reinterpretar o Acordo

Page 149: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

A PRECAUÇÃO E O ACORDO SOBRE A APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC

149

de SPS; reformar a jurisprudência firmada; e, nesse processo, legitimaro recurso pleno ao Princípio da Precaução nas regras de comérciointernacional. Essas iniciativas serão descritas no Capítulo VI e discutidasno Capítulo VII, que também discutirá as prováveis conseqüências ouas implicações sistêmicas para o comércio agrícola na eventualidadede as campanhas em prol do Princípio da Precaução virem a ser bemsucedidas.

Page 150: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 151: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CAPÍTULO VI

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO EAS INICIATIVAS NA OMC

Page 152: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 153: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

153

CAPÍTULO VIO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

AS INICIATIVAS DA UNIÃO EUROPÉIA

O contexto político

As seguidas crises na área alimentar na Europa, de que sãoexemplos mais populares a contaminação da carne de frango comdioxina, a encefalopatia espongiforme bovina (EEB), a doença de“Creutzfeld Jakob” e, mais recentemente, a crise da febre aftosaalertaram o consumidor europeu para as inconsistências da políticasanitária da União Européia, consubstanciadas ora em lacunas legais eregulatórias, ora em aplicação incompetente e deficiente das disciplinasem vigor. Emerge desse quadro um sentimento crescente dedesconfiança da capacidade técnica da burocracia comunitária delegislar em benefício da saúde humana e da vontade política dosgovernos europeus de proceder aos ajustes necessários no setoragrícola.

Cresce, também, em alguns segmentos da sociedade européia,a percepção de que os problemas sanitários são, de certa forma,produto direto das deformações resultantes de um modelo agrícolaintensivo, artificial e altamente subsidiado. A manutenção desse modeloestaria na raiz das crises sanitárias, que se sucedem desde de meadosda década de 80 e cuja solução é adiada, quando não mascarada pormedidas cosméticas. Os parcos controles sanitários mostram-seineficazes para evitar a reincidência das crises e tentativas de ação

Page 154: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

154

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

regulatória mais firme enfrentam a resistência do lobby agrícola. Alémdisso, como mostram as crises da EEB e da febre aftosa, aharmonização da política sanitária da UE é falha, o que convida àindisciplina dos Estados membros e contribui para acirrar o clima dedesconfiança e de incertezas. As alimentares, que são tratadas deforma indecisa e minimalista, intensificam-se no final da década de90 e a pressão política por soluções eficazes se fortalece.Pressionados por seu público interno, alguns governos dos EstadosMembros passam a adotar decisões nacionais que nem semprecoincidem com a posição da Comissão Européia. A crise dedesconfiança, antes um problema social, adquire dimensões políticas:afeta as relações entre os Estados Membros e entre estes e aComissão. A determinação da França de descumprir a decisão daCE sobre a retomada das exportações de carne bovina britânicapara o mercado comunitário e, nesse processo, invocar o Princípioda Precaução, é emblemática do acirramento dos conflitos entre osEstados Membros215. Uma ação regulatória concertada torna-seinevitável, sob pena de colocar em risco a sobrevivência política dosgovernos europeus, minar a latitude de atuação da CE e,conseqüentemente, afetar negativamente a imagem da ComunidadeEuropéia.

Paralelamente a esse quadro interno conflituoso, no planomultilateral, a UE enfrenta na OMC o questionamento dos EUA e doCanadá ao seu embargo à carne tratada à base de hormônios decrescimento, substância percebida como potencialmente cancerígenapelo consumidor europeu. Os desdobramentos desse contenciososão acompanhados com atenção pela sociedade européia, queidentifica nele um teste importante para afirmação do direito à saúdesobre os interesses e compromissos comerciais. O anúncio, em janeirode 1998, do parecer do Órgão de Apelação da OMC, que dá, emmuitos aspectos, ganho de causa aos EUA e Canadá e instrui a UE a

215 Telegrama de BRASEUROPA, número 889, de 11.10.2000.

Page 155: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

155

rever sua medida sanitária, intensifica a polêmica sobre a precedênciaentre a proteção da saúde humana e os interesses econômicos ecomerciais. Essa polêmica afigura-se também muito presente nodebate internacional sobre a comercialização de alimentosgeneticamente modificados, percebidos, na Europa, como uma ameaçaà saúde do consumidor e à competitividade do produtor agrícolaeuropeu.

Nesse contexto polêmico e de conflito interno e externo, oPrincípio da Precaução surge como instrumento conceitual que permitetratar o problema sanitário sem expor a agricultura européia àconcorrência internacional. Supõe-se que a sua legitimação na áreacomercial neutralizaria os efeitos negativos sobre a competitividade doproduto europeu resultantes, seja das próprias crises sanitárias, sejadas medidas políticas e técnicas necessárias para contorná-las. Noplano interno, o princípio permitiria preservar os privilégios existentese, em alguns casos, até incrementar o apoio à agricultura. No planointernacional, favoreceria a defesa do caráter multifuncional e específicoda atividade agrícola.

O Comunicado da Comissão Européiasobre o Princípio da Precaução

O cenário confuso que permeia o processo decisório na áreasanitária da Comunidade Européia requer, no plano interno, açãoconcertada para solucionar as recorrentes crises alimentares e evitara fragmentação do quadro regulatório. A tendência comunitária deimpor a seus parceiros exigências sanitárias, muitas vezes exageradasem relação às condições de produção nesses países (emboraadequadas para os problemas europeus), autoriza a impressão deque, para alguns segmentos da sociedade européia, essa ação internaconcertada só seria viável se, no plano internacional, se fizesseacompanhar de estratégia conducente à preservação dos interessesagrícolas constituídos. É nesse contexto que se insere a iniciativa da

Page 156: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

156

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Comissão de, em 2 de fevereiro de 2000, adotar o Comunicado sobrePrincípio da Precaução216.

O documento responde à Resolução do Conselho Europeu de28 de junho de 1999, que instrui a Comissão “to be more determinedto be guided by the precautionary principle in preparing proposalsfor legislation”217 e, nesse sentido, reage, também, às interpretaçõesdo Órgão de Apelação da OMC, em particular no caso de EC-Hormones, sobre a latitude legal para aplicação de medidas precautórias.Segundo informe da Comissão disponível em sua web page “theCommunication recalls that a number of recent events haveundermined the confidence of public opinion and consumers becausedecisions or absence of decision were not supported by full scientificevidence and the legitimacy of such decisions was questionable”218.

Segundo a Comissão, o Comunicado visa a informar osconsumidores, o Parlamento Europeu, o Conselho e os EstadosMembros sobre a maneira com que vem aplicando o Princípio daPrecaução e como deverá aplicá-lo no futuro. Busca, igualmente,estabelecer as bases de um entendimento comum – dentro e fora daComunidade – relativo aos fatores que autorizam o recurso a medidasprecautórias. Esse entendimento comum abarcaria (i) o papel doPrincípio da Precaução no processo de tomada de decisão sobre aanálise, a gestão e a comunicação de riscos; e (ii) as diretrizes para asua aplicação em bases racionais e coerentes. Figura, também, dentreos objetivos do Comunicado o de assegurar que o Princípio daPrecaução não seja utilizado para justificar medidas protecionistas.

Em seu documento, a Comissão admite que o Princípio daPrecaução não é definido pelo Tratado da UE, que a ele se refere

216 Texto em anexo, vide nota 124.217 McNELIS, Natalie. “EU Communication on the Precautionary Principle”. In: Journalof International Law, Oxford University Press, 2000, pp. 545-551, nota 8.218 “The Commission adopts Communication on Precautionary Principle”. Health andConsumer Protection Directorate-General. Press Release, 02.02.2000, disponível em<www.europa.eu.int/comm/dgs/health_consumer/library/press>.

Page 157: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

157

apenas no Artigo 174, relativo à proteção do meio ambiente. Apesardessa constatação, o Comunicado atribui a esse princípio umaabrangência mais ampla e afirma ser ele aplicável a todas as situaçõesrelacionadas à saúde do consumidor.

Respondendo a críticas freqüentemente dirigidas ao Princípioda Precaução, a Comissão salienta que a ausência de uma definiçãodesse princípio não constitui insegurança jurídica. Sugere, a esserespeito, caber às instâncias de decisões políticas ou jurídicas definiros contornos do princípio, o que, na percepção da Comissão, já estariaacontecendo por força da jurisprudência desenvolvida em tribunaiseuropeus.

O primeiro reconhecimento do Princípio da Precaução, deacordo com o Comunicado, data de 1982, quando de sua inclusão naCarta Mundial da Natureza. Subseqüentemente, foram incorporadasinúmeras referências ao princípio em instrumentos jurídicosinternacionais, tais como a Declaração do Rio, Convenção-Quadrodas Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, Convenção sobreDiversidade Biológica, entre outros219. Processo que, para a ComissãoEuropéia, culminou na consagração do Princípio da Precaução peloProtocolo de Biossegurança. Ainda que o Comunicado registre apenasinstrumentos ambientais para sustentar seu ponto de vista, a Comissãoconclui que a progressiva consolidação do Princípio da Precaução nodireito internacional faz dele “um verdadeiro princípio de direitointernacional de âmbito geral” (p. 11).

Feitas essas observações de caráter geral, o documentoeuropeu centra sua argumentação apenas na aplicação do Princípio daPrecaução ao comércio de produtos agrícolas. Não há, por exemplo,qualquer referência explícita à eventual utilização desse princípio naárea de produtos industriais ou de serviços potencialmente perigosos.

Para a Comissão, a menção à proteção do meio ambiente nopreâmbulo do Acordo da OMC confirmaria a constatação sobre o

219 Vide Anexo II do Comunicado.

Page 158: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

158

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

status do Princípio da Precaução no direito internacional; justificaria apresunção de que esse princípio deve ser levado em consideração nosAcordos de SPS e de TBT (Agreement on Technical Barriers toTrade); e autorizaria o recurso ao Princípio da Precaução parafundamentar medidas sanitárias mais estritas do que as normasinternacionais.

Estabelece, em seguida, que o Artigo 5.7 do Acordo de SPSconstituiria uma derrogação das obrigações horizontais daqueleinstrumento, a saber (i) os princípios científicos e (ii) a proibiçãohorizontal de não manter uma medida sanitária sem suficiente evidênciacientífica. Nesse sentido, o Acordo de SPS consideraria provisórias“measures adopted in application of a precautionary principle whenthe scientific data are inadequate, (...) and imply that efforts beundertaken to elicit or generate the necessary scientific data”220.A Comissão completa a sua interpretação do Artigo 5.7 ao afirmarque o caráter provisório dessas medidas não estaria “bound up with atime limit but with the development of scientific knowledge”221.

Dando curso à sua leitura dos dispositivos do Acordo de SPSe dos pareceres do Órgão de Apelação, a Comissão deduz que aobrigação constante do Artigo 5.7 sobre a necessidade de se procedera “uma avaliação mais objetiva de risco” para manter uma medidaprovisória autorizaria, por implicação, a adoção de “precautionarymeasures” fundamentadas em avaliação de risco “menos objetiva”.

À luz desses comentários, mas sem qualquer referência, aindaque tangencial, à obrigação relativa ao critério científico, a Comissãoconclui que todos os membros da OMC têm o direito de adotar onível de proteção que considerar adequado, em particular em matériaambiental e de saúde humana, animal e vegetal. A medida selecionadapara refletir o nível de proteção adequado constituiria, entretanto,decisão política sobre o patamar de risco aceitável para a sociedade.

220 Comunicado, op. cit., p. 12.221 Id.

Page 159: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

159

Tal medida inscreve-se no quadro geral de análise de risco, que, napercepção da CE, abarca três elementos: (i) a avaliação de riscos ou aavaliação científica e técnica; (ii) a gestão de riscos ou a decisão políticasobre como agir; e a (iii) a comunicação de riscos. Quando baseadano Princípio da Precaução, tal medida pertenceria ao universo da gestãode risco, ou seja, da decisão política sobre como lidar com um riscopotencial ou incerto. Nessa linha de raciocínio, o Comunicado esclarece,ainda, que precaução e prudência são conceitos diversos que fazemparte de processos complementares que não devem ser confundidos.Enquanto a precaução é parte da gestão de risco, a prudência insere-se no contexto da análise de risco “which is an integral part of thescientific opinion delivered by the risk evaluators”222.

Em suma, na perspectiva da Comissão, o recurso ao Princípioda Precaução constitui decisão política, tomada à luz da gestão dorisco que se aplica a situações em que a evidência científica éconsiderada incompleta, inconclusiva, divergente e a ação se mostranecessária para alcançar o nível apropriado de proteção da saúde edo meio ambiente que é, por sua vez, um julgamento de valor dasociedade. A gestão de risco leva em conta a evidência científica, apercepção de risco inaceitável e as preocupações e ansiedades dopúblico. Por isso, deve ser um processo transparente e incluir todos aspartes envolvidas.

Para que não resultem em restrições desnecessárias aocomércio, as medidas fundamentadas no Princípio da Precauçãodevem, de acordo com o Comunicado, orientar-se por algumasdiretrizes. Medidas precautórias devem, assim, ser:

(i) proporcionais ao nível de proteção determinado. Paratanto, devem ser dimensionadas de acordo com o nívelde proteção desejado. O Comunicado sugere, entretanto,que as autoridades regulatórias não busquem a adoçãodo “risco zero”, por ser este dificilmente alcançável,

222 Ibid.

Page 160: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

160

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

embora, reconheça, que o total banimento de um produtoconstitui a única solução viável para alguns casos;

(ii) não-discriminatórias em sua aplicação. O caráterdiscriminatório de uma medida baseada no Princípio daPrecaução adviria do tratamento diferenciado a situaçõescomparáveis ou de tratamento semelhante a situaçõesdiferentes, “a menos que haja fundamentos objetivospara o fazer”223;

(iii) coerentes, no âmbito e na natureza, com medidasadotadas anteriormente;

(iv) baseadas em análise dos potenciais custos e benefíciosde ação ou inação no curto e longo prazos. Relevantesà análise dos custos e benefícios seriam não só os fatoreseconômicos, mas sobretudo as considerações de ordemnão-econômica;

(v) sujeitas à revisão à luz de novos dados científicos. Noentanto, “medidas baseadas no Princípio da Precauçãodeveriam manter-se enquanto a informação científica forincompleta ou inconclusiva e se considerar o riscodemasiado elevado para o impor à sociedade, tendoem conta o nível de proteção escolhido”224; e

(vi) capazes de atribuir a responsabilidade de produzirresultados científicos necessários para uma análise deriscos mais detalhada. Ou seja, para a Comissão, asempresas interessadas em comercializar produtospotencialmente perigosos devem ter o ônus da provade segurança.

Finalmente, a Comissão trata do tema relativo ao ônus da provacientífica, característica central e muito controversa do Princípio da

223 Ibid., p. 4.224 Ibid., p. 5.

Page 161: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

161

Precaução. Segundo o Comunicado, o regulador, “by way ofprecaution”, não está autorizado a aprovar a comercialização de umproduto considerado perigoso a priori até que este seja provadoseguro225. A imposição dessa exigência, aparentemente legítima, podetornar-se uma barreira intransponível à inovação tecnológica, pois,como já se viu, à luz do Princípio da Precaução, a dúvida sobre aexistência de risco seria suficiente para classificar um produto comoperigoso.

A Resolução do Conselho Europeusobre o Princípio da Precaução

Reunido em Nice, em dezembro de 2000, o Conselho Europeuadotou, como Anexo III das Conclusões da Presidência, a Resoluçãosobre o Princípio da Precaução. Com essa iniciativa o Conselhoendossa o Comunicado da Comissão; formaliza os critérios paraaplicação do Princípio da Precaução pelos Estados Membros e pelaComissão; e oficializa a posição da UE sobre o assunto. O texto daResolução foi circulado entre os membros da OMC em 2 de fevereirode 2001226.

O Conselho Europeu parte da base conceitual do Comunicadopara, por meio da Resolução, confirmar e desenvolver vários doselementos que deverão, segundo a ótica européia, nortear o recursoao Princípio da Precaução. Nesse sentido, o Conselho confirma a tesede que o Princípio da Precaução estaria gradualmente fortalecendo-secomo princípio do direito internacional nas áreas ambiental e de proteçãoda saúde e sugere seja avaliada a conveniência de sua incorporaçãoao Tratado da UE, em particular nos dispositivos relativos à saúdehumana. Sublinha que o direito internacional autoriza a Comunidade e

225 Ibid., p. 21.226 European Council Resolution on the Precautionary Principle. SN 400/00 Add. 1,Annex III of the Presidency Conclusions, Nice, 2.02.2000. A Resolução encontra-se emanexo sob a referência G/SPS/GEN/225.

Page 162: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

162

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

seus Estados membros a adotarem o nível de proteção consideradoapropriado, inclusive em patamar mais elevado do que aqueleestabelecido pelas normais internacionais. Confirma que se deverecorrer ao Princípio da Precaução sempre que a possibilidade deefeitos perversos à saúde ou ao meio ambiente seja identificada e aavaliação científica preliminar provar-se inconclusiva no que diz respeitoà determinação do risco. Recorda, a propósito, que a avaliação e dagestão de riscos são processos independentes que devem serfuncionalmente separados. A avaliação de risco seria atividadeeminentemente científica que deve se desenvolver de forma transparentee levar em conta também a opinião técnica minoritária, em especial noque concerne à incerteza científica. A gestão de risco, segundo aResolução, é da competência das autoridades públicas, que devemdecidir sobre o nível de proteção adequado, com base em umaapreciação política (“political appraisal”)227.

De modo geral, a Resolução aprova as diretrizes estabelecidasno Comunicado da Comissão para o recurso ao Princípio da Precaução.No que tange à exigência da proporcionalidade, no entanto, o Conselhosugere que se leve também em conta os riscos de curto e longo prazosquando do estabelecimento do nível adequado de proteção. Concordaque as medidas precautórias não devem ser utilizadas de forma a resultarem discriminação arbitrária e determina que, quando houver mais deuma forma de alcançar o nível de proteção almejado, seja adotada amedida “least trade-restrictive”228. Considera que as medidas devemser coerentes com procedimentos adotados em circunstânciassemelhantes, mas sempre tendo em conta os desenvolvimentoscientíficos mais recentes. O Conselho sublinha, ainda, que as medidasde precaução passam pelo exame dos custos e benefícios da ação ou

227 Essa argumentação tem igualmente como pano de fundo a preocupação de preservar aprerrogativa política dos Estados Membros de influírem na política sanitária da Comunidade.Telegrama BRASEUROPA, número 021, de 17.01.2001, p. 3, parágrafo “i”.228 European Council Resolution on the Precautionary Principle, op. cit., p. 4, parágrafo 18.

Page 163: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

163

inação, que deve (“must”) ter presente considerações de ordem sociale ambiental. Quando possível (“where feasible”), tal exame deve incluiranálise econômica, mas os efeitos sobre o meio ambiente e a saúdepública “must be given priority”229. Ainda na linha das diretrizesapresentadas pela Comissão, o Conselho considera que medidasfundamentadas no Princípio da Precaução devem ser revistas à luz daevolução do conhecimento científico. Para tanto, tais medidas devemser monitoradas e pesquisa adicional conduzida, de forma a reduzir onível de incerteza. No exercício de monitoramento, entretanto, decisõescaso a caso devem ser adotadas para determinar a quem cabe aresponsabilidade de prover a informação científica necessária para umaavaliação de risco mais precisa. Nesse processo, deve-se buscarequilíbrio entre as autoridades públicas, os órgãos científicos e osoperadores econômicos, sem perder de vista a responsabilidade destesúltimos por força de sua própria atividade.

A Resolução instrui, ainda, a Comissão a aplicarsistematicamente as diretrizes relativas ao Princípio da Precaução e aincorporá-lo nas suas propostas legislativas e de ação230.

O Conselho Europeu, finalmente, reconhece que as regras da OMCpermitem levar em conta o Princípio da Precaução. No entanto, insiste emque os Estados Membros e a Comissão assegurem que esse princípio seja“fully recognized in the relevant international health, environment andworld trade fora, in particular on the basis of the principles put forwardin this Resolution; to pursue that aim and ensure that it is taken intoaccount as fully as possible, particularly at the WTO, and at the sametime help to explain it”231. (Ênfase da autora.)

229 Id., p. 4, parágrafo 20.230 Os funcionários da UE com quem a autora conversou informalmente nos últimosmeses, entre eles David Roberts, Chefe da Delegação comunitária às negociaçõesmandatadas em agricultura, e Jesus Zorilla, funcionário responsável por assuntos agrícolasem Genebra, descartam a possibilidade de que o conteúdo do Comunicado venha a serincorporado a uma diretiva comunitária. A presente instrução do Conselho Europeuabre, no entanto, essa possbilidade.231 G/SPS/GEN/225, p. 5.

Page 164: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

164

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

O debate no Comitê de Medidas Sanitáriase Fitossanitárias

Em 15 e 16 de março de 2000, realizou-se a XX Reunião doComitê de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias. Na ocasião, orepresentante das Comunidades Européias procedeu à apresentaçãodo Comunicado da Comissão, cujo texto havia circulado entre osmembros da OMC sob o documento G/SPS/GEN/168232. Em suaapresentação, o representante comunitário sublinhou a expectativada UE de que o Comunicado pudesse contribuir para umentendimento comum sobre como administrar riscos em situações deincerteza científica. Afirmou esperar, igualmente, que o documentodissipasse temores de que o Princípio da Precaução pudesse vir aser utilizado de forma arbitrária ou como um disfarce de interessesprotecionistas. Para tanto, recordou a posição da Comunidade deque medidas baseadas no Princípio da Precaução devem observaros critérios gerais da gestão de risco, ou seja, proporcionalidade,não-discriminação, análise dos custos e benefícios e transparência.

Austrália, Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Hong Kong-China, México e Estados Unidos fizeram observações à iniciativacomunitária. A tônica desses comentários foi de preocupação e dúvidaquanto ao real interesse da UE em propor o desenvolvimento dediretrizes comuns para o recurso ao Princípio da Precaução. Asintervenções versaram, assim, sobre a preocupação relativa ao usoindevido desse princípio e suas repercussões para o comércio debens agrícolas; o papel central do fundamento científico para justificarmedidas sanitárias; a flexibilidade já prevista nos dispositivos doAcordo de SPS para a aplicação de medidas sem suficiente evidênciacientífica; e o conseqüente questionamento sobre as razões que

232 O papel sobre a criação a futura Autoridade Alimentar Européia foi apresentado namesma ocasião, mas não mereceu debate. Esse documento recebeu, na OMC, a referênciaG/SPS/GEN/169.

Page 165: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

165

levavam a UE a defender referências adicionais ao Princípio daPrecaução na OMC.

A Austrália lembrou a necessidade de os países membrosobservarem as obrigações estabelecidas no Acordo de SPS quando dautilização do Princípio da Precaução. Nesse sentido, notou que a abordagemprecautória para decisões sobre medidas sanitárias já se encontravaincorporada ao Artigo 5.7 e em outras cláusulas do SPS. A Argentinacomplementou esse ponto de vista ao afirmar que, embora incorporado, oenfoque precautório não poderia, segundo os pareceres do Órgão deSolução de Controvérsias, anular obrigações constantes de outrosdispositivos, a saber o Artigo 5.1 do Acordo de SPS. Tampouco poderiaser utilizado para modificar compromissos comerciais ou alterar concessõestarifárias sem a necessária compensação. O Canadá informou nãocompartilhar da apreciação constante do papel comunitário sobre o statusdo Princípio da Precaução no direito internacional. Os EUA chamaramatenção para a importância da postura comunitária de que o Princípio daPrecaução não poderia ser utilizado para esconder ou disfarçar motivaçõesprotecionistas. Canadá e EUA enfatizaram, igualmente, a dimensãoprecautória de seus respectivos processos regulatórios, os quais sefundamentam no conhecimento e na evidência científica.

O Brasil procurou caracterizar o papel europeu comodocumento interno ao universo comunitário, descartando-o, assim,como base para eventual negociação de diretrizes comuns na OMC.Assinalou, ainda, que as diretrizes do Comunicado extrapolavam aletra e o espírito do Acordo de SPS, na medida em que propiciavamexagerada latitude discricionária. Tal latitude encontrava-seconsubstanciada na subjetividade das considerações não-econômicase não-científicas que, embora pudessem ser legítimas, minavam o caráterde previsibilidade do conjunto de regras negociado na Rodada Uruguai.Para preservar algum equilíbrio de direitos e obrigações, o Comunicadonecessitaria contemplar conceitos inerentes ao Acordo de SPS, como,por exemplo, a orientação científica e a imperativo de minimizar osefeitos negativos sobre o comércio.

Page 166: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

166

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Em resposta, a UE insistiu em que o conteúdo do Comunicadoera consistente com os dispositivos do Acordo de SPS (“did not addor detract from”), no entanto, reiterou a necessidade de que taisdispositivos fossem “desenvolvidos” para garantir a previsibilidade dosistema multilateral de comércio. Sublinhou, ainda, a importância de sepoder contar com “a clear and explicit set of rules to avoidunwarranted recourse to the precautionary principle, which couldserve as a justification for disguised protectionism”233.

Na reunião do Comitê de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias quese realizou em 14 e 15 de março de 2001, o Canadá apresentou papelinformal sobre o “tratamento do conceito e da prática precautória no Acordode SPS”. O documento elabora de forma breve e superficial sobre osdispositivos daquele acordo relevantes para o recurso a medidas provisóriasou de caráter cautelar. Ao apresentar sua iniciativa, o representantecanadense conclamou o Comitê a discutir de forma estruturada o tema daprecaução, com vistas a que se chegasse a um “common understanding”sobre o tema no âmbito do Comitê de SPS. A reação ao papel canadenserestringiu-se à UE e Suíça, que deram boas vindas à iniciativa, e ao México,que considerou desnecessária aquela discussão.

Em consultas informais prévias, o Grupo de Cairns e os EUAprocuraram dissuadir o Canadá de provocar discussão sobre o Princípioda Precaução na OMC. Para tanto, informaram o Canadá dainconveniência da apresentação daquele papel, uma vez que consideravamperigoso iniciar debate sobre matéria controversa, cujo desfecho mostrava-se imprevisível, especialmente no momento atual em que a OMC se encontramobilizada para lançar uma nova rodada multilateral de negociações. Porforça dessas injunções, o Canadá reconsiderou a apresentação de seupapel em novembro de 2000. Em março de 2001, no entanto, sob o233 O debate sobre a apresentação do Comunicado ao Comitê de SPS encontra-se registradono telegrama de DELBRASGEN número 445, de 28.03.2000, e no documento G/SPS/R/18, de 18.04.2000. O Comunicado foi também apresentado ao Comitê de BarreirasTécnicas ao Comércio (TBT) e ao Comitê de Comércio e Meio Ambiente. De modogeral, os debates nesses dois Comitês refletem o mesmo tom de dúvida e preocupaçãoevidenciado no Comitê de SPS.

Page 167: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

167

argumento de que havia pressões internas insuperáveis, o representantecanadense circulou seu papel sob o item de “outros assuntos” no Comitêde SPS, uma vez que, até o último momento, buscou o apoio dos membrosdo Grupo de Cairns e dos EUA. Qualquer que tenha sido a motivaçãocanadense para levar adiante sua iniciativa, a proposta para que o Comitêinicie debate sobre o Princípio da Precaução reforça as pretensões européiasde definir esse princípio e, progressivamente, legitimar sua aplicação aocomércio internacional de bens agrícolas.

AS PROPOSTAS NEGOCIADORAS SOBRE O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO

Desde o processo preparatório para a reunião ministerial deSeattle, a União Européia desponta como a grande promotora dareforma do Acordo de SPS para acomodar suas pretensões relativasà legitimação do Princípio da Precaução na área sanitária. Em non-paper, intitulado “Communication from the Commission to theCouncil and to the European Parliament – The EU Approach tothe Millennium Round”234, que, então, estabelecia os objetivosnegociadores europeus para a rodada multilateral de Seattle, aComissão inscreve a saúde do consumidor como área prioritária denegociação. No capítulo referente a esse tema, recordam-se osdispositivos do Acordo de SPS que autorizam os países membros daOMC a determinar o nível apropriado de proteção sanitária e, paratanto, a recorrer a medidas restritivas de comércio “provided suchmeasures are based on international standards or sound scientificadvice”235. Quando a evidência científica é insuficiente, reconhece a

234 Documento informal distribuído em Genebra.235 Id., p. 18, parágrafo “K”. É interessante notar que, embora tenha sido esse o tompré-Seattle, não há, hoje, no Comunicado da Comissão, na Resolução do ConselhoEuropeu ou nas propostas relativas ao exercício mandatado na OMC qualquer referênciaa uma eventual primazia da ciência. Quanto às normas internacionais, as referênciashoje encontradas no Comunicado, na Resolução e nas propostas enfatizam sempre odireito de aplicar medidas nacionais mais estritas ou restritivas do que aquelas acordadasinternacionalmente.

Page 168: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

168

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Comissão, o Acordo de SPS permite a adoção provisória de medidas“baseadas no Princípio da Precaução”236, segundo as condiçõesdefinidas pelo Artigo 5.7 daquele Acordo. Dentre essas condições, aComissão cita a exigência de a medida provisória estar fundamentadana informação relevante disponível e a obrigação de o país que aplicabuscar evidências científicas adicionais.

Após reconhecer que o Acordo de SPS pode acomodarsituações de precaução, a UE, entretanto, assinala que as regras vigentesnecessitam ser aperfeiçoadas e, para tanto, sugere que na futuranegociação, a Comunidade busque “clarify and strengthen theexisting WTO framework for the use of the precautionary principlein the area of food safety, in particular with a view to finding anagreed methodology for the scope of action under that principle”237.(Ênfase da autora.)

Ainda no processo preparatório de Seattle, a UE circula, noConselho Geral, o documento “EC Approach to Trade andEnvironment in the New WTO Round”238, pelo qual reitera seuobjetivo de esclarecer as disciplinas da OMC de forma a evitar orecurso à “unjustified precaution”. A Suíça compartilha a posiçãocomunitária e também, sob a forma de documento oficial, sugere ainclusão na declaração ministerial de Seattle de referência ao objetivonegociador de “take better account of basic principles ofenvironmental protection”239.

O protagonismo da União Européia repete-se no contexto dasnegociações mandatadas em agricultura em curso na OMC desdemarço de 2000. Como o objetivo de reabrir o Acordo de SPS nãofora alcançado, em dezembro de 1999, em virtude do fracasso dareunião ministerial de Seattle, a UE procura beneficiar-se dasnegociações mandatadas em agricultura para manter viva a sua idéia

236 Id.237 Ibid.238 WT/GC/W/194, 01.06.1999.239 WT/GC/W/265, 20.06.1999.

Page 169: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

169

de “clarify and strengthen” as disciplinas da OMC para melhoracomodar o Princípio da Precaução. Nesse sentido, por meio depropostas negociadoras, a Comissão busca reunir massa crítica paraincluir o tema na agenda de uma próxima rodada multilateral seja pelavia da agricultura seja pela da reforma do SPS.

Em dezembro de 2000, a “Proposta Negociadora Abrangenteda UE”, em seu capítulo sobre preocupações não-comerciais, identificaa questão de saúde alimentar como um importante objetivo denegociação. Nessa linha, assinala que prevalecem incertezas relativasà forma de implementar o Princípio da Precaução e, novamente, propõe“that the application of the precautionary principle should beclarified”240.

A Coréia, Suíça e Japão compartilham das posições européiase em suas respectivas propostas recordam a necessidade de medidasde precaução, em particular para tratar a questão do comércio deprodutos geneticamente modificados. A Coréia, por exemplo, refere-se à “the right to take measures necessary for the protection ofhuman life and health. Appropriate measures should be taken withinthe WTO regarding consumers’ concerns on food safety and quality,and potential risks of GMOs on human health and the environment.The need for precautionary measures to cover such issues as wellas consumers’ increasing demand for informed choice should bedealt with in the negotiations”241.

Até o presente momento, não houve, no âmbito das negociaçõesmandatadas em agricultura, um debate estruturado sobre o Princípioda Precaução. A discussão sobre esse tema dá-se no plano mais geraldas preocupações não-comerciais. Reações específicas ao Princípioda Precaução geralmente se misturam a comentários sobre a chamadamultifuncionalidade ou especificidade da agricultura. Nesse sentido, odebate oscila entre os países que apóiam as pretensões européias de

240 WT/AG/NG/W/90, 14.12.2000.241 G/AG/NG/W/98, 9.01.2001.

Page 170: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

170

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

matizar a reforma agrícola com maior ênfase nas questões não-comerciais e aqueles que criticam o caráter excepcional ou específicoque se quer atribuir ao comércio agrícola internacional. Entre estes últimosencontram-se os EUA, os membros do Grupo de Cairns, a Índia, oEgito, o Paquistão e alguns países da América Central. Os representantesdesses países, ainda que não questionem o direito soberano de um governoestabelecer sua política agrícola, manifestam preocupação com osinstrumentos e a forma ou modo de implementá-las.

O apoio às idéias comunitárias sobre multifuncionalidade daagricultura é crescente, não só entre os aliados tradicionais da UE,mas, sobretudo, entre a grande maioria dos países em desenvolvimentoou de menor desenvolvimento relativo. O tratamento preferencial nocampo de acesso a mercados, de que o programa “Everything butArms” é exemplo, tem contribuído para que a conformação de forçaspolíticas na OMC seja francamente a favor das pretensões da UniãoEuropéia. Além disso, a estratégia ou a retórica comunitária de identificaras suas preocupações não-comerciais, nem sempre meritórias, comos problemas legítimos e verdadeiros de países pequenos, pobres esem infra-estrutura econômica ou física para participar do sistemamultilateral de comércio tem igualmente propiciado vocais manifestaçõesde apoio às posições da UE. Com essa estratégia, a comunidade reúnedo seu lado da “mesa negociadora” grande número de países pequenosque passa a defender o caráter multifuncional e específico da agricultura,na expectativa de que este seja o caminho para a consecução de seusobjetivos.

Esse estado de coisas terá reflexo importante no desenho domandato agrícola de uma eventual rodada multilateral de comércio.Na ausência desta, o objetivo comunitário de incorporar o Princípioda Precaução no sistema multilateral de comércio será perseguidopela via das negociações mandatadas em agricultura, o que poderátornar o exercício negociador ainda mais complexo. A atuação daUE na OMC e o conteúdo de suas propostas levam a crer que,qualquer que seja o cenário negociador a prevalecer, a UE deverá

Page 171: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

171

fazer do Princípio da Precaução uma das principais bandeiras damultifuncionalidade da agricultura.

AS DELIBERAÇÕES NO CODEX ALIMENTARIUS

Por força das referências encontradas no preâmbulo e no AnexoA do Acordo de SPS, a Comissão do Codex Alimentarius é reconhecidana OMC como organismo internacional relevante para oestabelecimento de normas, diretrizes e recomendações internacionaisrelativas à segurança dos alimentos. Esse fato não passou despercebidoe sua importância encontra reflexo no Comunicado da Comissão:“international guidelines are being considered in relation to theapplication of the Precautionary Principle in Codex Alimentarius.Such guidance in this, and other sectors, could pave the way to aharmonized approach by the WTO Members, to drawing up healthor environment protection measures, while avoiding the misuse ofthe precautionary principle which could otherwise lead tounjustified barriers to trade”242.

Ainda que os países membros tenham opiniões diferentes sobrea automaticidade da incorporação das normas, diretrizes ourecomendações do Codex ao Acordo de SPS, é fato notório que otrabalho daquele organismo internacional tem influência significativa nasdeliberações da OMC na área sanitária e fitossanitária.

À luz desse quadro, o reconhecimento do Princípio da Precauçãono âmbito do Codex poderia ter influência significativa sobre os critérioscientíficos constantes do Acordo de SPS, o que, segundo um negociadornorte-americano243, dificultaria seu questionamento legal na OMC.

Talvez em razão da eventual influência legitimadora do Codexpara a aplicação do Princípio da Precaução ao comércio de produtos

242 Comunicado, op. cit., p. 12.243 Conversa telefônica mantida, em 19.04.2001, com Jim Murphy (USTR), Chefe daDelegação dos EUA para as negociações mandatadas em agricultura.

Page 172: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

172

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

agrícolas, a União Européia procura mobilizar discussões sobre oassunto naquele organismo normativo. Nas palavras de David Byrne,Comissário para assuntos de saúde e proteção do consumidor: “TheEuropean Commission has insisted that consideration is given tothe precautionary principle in Codex. (...)”244. Nesse sentido, oComitê do Codex sobre Princípios Gerais – CCGP – vem deliberandoa propósito da aplicação do Princípio da Precaução nas diretrizesrelativas à gestão de risco constantes da “Proposta tentativa dePrincípios de Trabalho para Análise de Risco”245.

Realizou-se, em Paris, no período de 23 a 27 de abril de 2001,a XVI Reunião do CCGP. Ao inaugurar o encontro, o Ministro daAgricultura e Pesca da França, Jean Glavany, recordou a importânciado Princípio da Precaução para o continente europeu ao advogar anecessidade de se desenhar quadro mais claro e transparente para asua implementação nos níveis nacional e internacional. Nessa ordemde argumentos, assinalou que os três pilares do Codex deveriamcompreender a transparência, a solidariedade e o Princípio daPrecaução. O Ministro francês manifestou ainda que a gestão de riscoà saúde humana deveria levar em conta “outros fatores legítimos”246.

As possíveis implicações da iniciativa comunitária para ocomércio agrícola não escaparam ao governo brasileiro. Em despachotelegráfico de instruções sobre a matéria247, a delegação brasileira àreunião do Codex foi instruída a “opor-se a qualquer menção àexpressão ‘princípio da precaução’, inclusive em nota de rodapé”.

O governo norte-americano também instruiu seus delegados aresistir às tentativas comunitárias de inclusão do Princípio da Precaução

244 BYRNE, David, “The Precautionary Principle in the domain of human health andfood safety”; discurso proferido no The Economist Conferences, em Paris, em 9.11.2000,disponível em <www.europa.eu.int/comm/dgs/health_consumer/library/press>.245 CX/GP 01/3, “Working Principles for Risk Analysis: The application of Precautionin Risk Management”, CODEX, 23.04.2001.246 Relatório da reunião encontra-se registrado no telegrama 557, de Brasemb Paris, de03.05.2001.247 Despacho telegráfico 368, expedido para Brasemb Paris, em 20.04.2001.

Page 173: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS INICIATIVAS NA OMC

173

no Codex. Jim Murphy, chefe da delegação dos EUA às negociaçõesmandatadas em agricultura, manifestou as sérias preocupações quenutria seu governo em relação ao bom encaminhamento dos trabalhosda XVI Reunião do CCGP248. Afirmou, ainda, considerar que aformulação do Princípio da Precaução pela UE constitui perigosoinstrumento político, a ser utilizado por gestores de risco em casos deincerteza científica: “because there is always uncertainty in science,the ‘precautionary principle’ has a great potential to be used, andhas been used by EU members states, as a trade barrier”249.

O tema da incorporação do Princípio da Precaução no Codexsuscitou intenso debate em Paris, mas as pretensões comunitáriasnão prosperaram naquele encontro. Segundo negociadores norte-americanos e australianos250, os trabalhos da XVI Reunião do CCGPnão foram conclusivos sobre o tratamento a ser dado ao Princípio daPrecaução dentro do Codex “em grande medida graças à mobilizaçãode países membros do Grupo de Cairns, dos EUA e de alguns paíseslatino-americanos”251. Não havendo avançado, a “Proposta Preliminarde Princípios de Trabalho para Análise de Risco” foi referida de voltaao Secretariado do Codex para sua reformulação, com base noscomentários apresentados pelas delegações presentes ao encontrode Paris.

248 Conversa telefônica mantida, em 19.04.2001, com Jim Murphy, USTR, chefe dadelegação dos EUA às negociações agrícolas em Genebra.249 Pontos de conversação da delegação norte-americana à reunião do Codex.250 Conversas informais mantidas, em maio de 2001, pela autora com Jim Murphy(USTR), chefe da delegação dos EUA às negociações mandatadas em agricultura, e comMary McCarter, Conselheira da Missão da Austrália em Genebra e responsável porassuntos agrícolas.251 Na entrevista com Jim Murphy, este manifestou à autora o reconhecimento norte-americano pela atuação do Brasil na reunião do Codex, que teve lugar em abril de 2001,em Paris.

Page 174: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 175: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CAPÍTULO VII

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS

PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

Page 176: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 177: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

177

CAPÍTULO VIIO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS

PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

AS IMPLICAÇÕES SISTÊMICAS DAS INICIATIVAS COMUNITÁRIAS

O Capítulo V descreveu e comentou o quadro vigente dasregras que hoje disciplinam o comércio de produtos agrícolas na áreasanitária e fitossanitária. A partir das interpretações do Órgão deApelação, analisou os dispositivos do Acordo de SPS que, de algumaforma, incorporam ou autorizam uma abordagem precautória dosregulamentos sanitários. Por meio do exame da jurisprudênciaestabelecida à OMC foi possível demonstrar que o Princípio daPrecaução, como conceito, encontra reflexo em vários dispositivos doAcordo de SPS.

O quadro regulatório, no entanto, parece não atender aosinteresses e às pretensões da União Européia e de alguns outros paísesque defendem a plena incorporação do Princípio da Precaução naOMC. Suas iniciativas, descritas no Capítulo VI, visam a provocaruma discussão sobre o Acordo de SPS, com vistas ao “esclarecimentoe fortalecimento” das disciplinas atuais. Se bem encaminhadas, essasiniciativas poderão matizar, qualificar ou até anular os resultadosliberalizantes que eventualmente possam ser alcançados na presentenegociação mandatada em agricultura.

A análise desse processo, a partir dos principais elementosconstitutivos do Acordo de SPS e da jurisprudência firmada, bem comosuas implicações para o comércio agrícola internacional são o objetivodeste sétimo e último capítulo.

Page 178: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

178

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Fundamentação científica

O direito soberano de um país membro aplicar medidassanitárias e fitossanitárias para proteger a vida e a saúde humana, animale vegetal é reconhecido pelo Artigo 2.1 e disciplinado pelos dispositivossubseqüentes: 2.2, 2.3 e 2.4 do Acordo de SPS. Particularmenterelevante para a presente discussão é o Artigo 2.2, que estabelece asobrigações horizontais, segundo as quais as medidas sanitárias devemser baseadas em “princípios científicos” e não podem ser mantidas“sem evidência científica suficiente”. Quando a evidência é insuficiente,mas relevante, o Acordo de SPS permite, à luz de determinadosrequisitos, a adoção de medidas provisórias252.

Como se viu em Japan-Varietals, a determinação de suficiênciacientífica dá-se pelo estabelecimento de uma “relação racional” entre amedida sanitária e fitossanitária e a evidência científica. Tal “relaçãoracional”, entretanto, será definida caso a caso, segundo ascircunstâncias particulares da situação, as características específicasda medida e a qualidade e quantidade da informação científicaapresentada. Ademais, a fundamentação científica da medida sanitáriapode refletir a opinião divergente e, nesse sentido, não precisa abarcara visão majoritária da comunidade acadêmica.

Apesar dos aspectos subjetivos dessa determinação, e atéporque a natureza da questão sanitária impede a adoção de “threshold”ou patamar de suficiência científica uniforme para todos os casos, énotória a prevalência do parâmetro científico no Acordo de SPS. Aexigência de uma “relação racional” ou objetiva entre a medida e odado científico constitui o elemento central do processo de legitimaçãode uma medida sanitária à luz do Acordo de SPS.

A abordagem comunitária do processo decisório quefundamenta e legitima uma medida sanitária enfatiza não o parâmetro

252 A insuficiência científica é tratada no Acordo de SPS à luz do Artigo 5.7, que serádiscutido mais à frente.

Page 179: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

179

científico, mas a incerteza científica. Segundo a Diretoria Geral deProteção à Saúde do Consumidor da Comissão Européia, “it (thePrecautionary Principle) covers cases where scientific evidence isinsufficient, inconclusive or uncertain and preliminary scientificevaluation indicates that there are reasonable grounds forconcern…”253. Ao pronunciar-se sobre a matéria, o Comunicado daComissão, diz que: “Decision-makers need to be aware of the degreeof uncertainty attached to the results of the evaluation of theavailable scientific information… Decision-makers faced with anunacceptable risk, scientific uncertainty and public concerns havea duty to find answers.” E complementa: “scientific uncertaintymay also arise from a controversy on existing data or lack of somerelevant data. Uncertainty may relate to qualitative or quantitativeelements of the analysis”254.

De acordo com a discussão apresentada no Capítulo III, otermo “incerteza” é utilizado, pelos analistas de temas ambientais epelos estudiosos do Princípio da Precaução, para descrever situaçõesem que o conhecimento não é objeto de consenso ou quando asevidências disponíveis são consideradas insuficientes. Nessa linha, aincerteza científica implicaria, por um lado, o reconhecimento dos limitesdo processo científico e, por outro, o desconhecimento do significadoquantitativo dos fatores ou riscos nele envolvidos. A incerteza relacionar-se-ia com a percepção do risco pela sociedade e contemplaria aaceitação de que a certeza científica, na prática, é impossível. A incertezaseria, assim, condicionada pelo contexto social.

O papel da ciência no modelo comunitário é restrito ao contextode uma análise de risco que não opina, nem tem participação decisivano processo regulatório, pois apenas informa. A opinião ou a decisãosobre como atuar constituiria exercício de caráter reconhecidamentepolítico, que levará em conta não apenas a evidência, mas também a

253 “Commission adopts Communication on Precautionary Principle”. Bruxelas,02.02.2000, disponível <www.europa.eu.int/comm/dgs/health_consumer/library/press>.254 Comunicado, op. cit., p. 4.

Page 180: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

180

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

incerteza científica que emanar da análise de risco. Como a certeza é aexceção e a incerteza a regra nos processos científicos, pode-se suporque a incerteza científica, com toda a sua carga cultural e social, queadvém essencialmente da percepção do risco pela sociedade, terá pesorelevante, senão predominante, no processo regulatório que preconizaa União Européia.

De forma a legitimar o pensamento europeu sobre o Princípioda Precaução e a favorecer a disseminação do modelo nele baseado,teóricos do Princípio da Precaução costumam referir-se a uma “ciênciaprecautória”, que, em oposição à “ciência mecânica”, seria maisapropriada ao exame das questões relativas à proteção ambiental e dasaúde humana, as quais, por sua vez, são “complexas, de longo prazoe permeadas de juízo de valor”255.

O enfoque regulatório baseado no Princípio da Precaução talqual interpretado pela Comunidade não apresenta quadro equilibradode direitos e obrigações. A justificativa da medida sanitária pelo prismada incerteza científica favorece o arbítrio e subtrai do processo decisórioo imperativo científico que disciplina, no Acordo de SPS, o direitosoberano de um governo legislar sobre questões relativas à proteçãoda saúde humana, animal e vegetal. À luz desse enfoque, é legítimoimaginar, portanto, que medidas sanitárias, desde que sustentadas naincerteza, seja ela quantitativa ou qualitativa, poderiam ser consideradasem conformidade com o Acordo de SPS, em particular se tais medidasemanarem de um processo adequado de “political appraisal” donível de proteção desejado256.

Nessas circunstâncias, o questionamento dessas medidas ficarialimitado a eventuais violações do GATT, e, ainda assim, em se tratandode medida sanitária, a prova de violação de princípios basilares doGATT, tais como não-discriminação e transparência, ficaria em muitodificultada. O sistema multilateral de comércio poderia, nessas

255 Vide Capítulo III.256 Resolução do Conselho Europeu, p. 4, parágrafo 12.

Page 181: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

181

condições, regredir ao cenário de insegurança prevalecente antes daRodada Uruguai, quando a intensificação de conflitos na área sanitáriademonstrou precisamente a necessidade de algum esforço disciplinadorno plano internacional.

Do ponto de vista de um país em desenvolvimento e exportadorde produtos agrícolas, como o Brasil, deve-se ter presente que essamargem ampliada de arbítrio que se busca com o Princípio daPrecaução, poderá acarretar instabilidade adicional ao jádesequilibrado comércio internacional de produtos agrícolas. Se utilizadode forma abusiva ou leviana, esse poder de arbítrio poderá ocasionarproblemas sérios para as exportações de um país, como foi o caso doembargo canadense à carne brasileira em fevereiro de 2001.

Embora o Canadá tenha, nesse episódio, buscado desvincularsua iniciativa do âmbito do Princípio da Precaução, ficou patente o caráterarbitrário da medida, que poderia ter sido justificada com argumentosprecautórios, pois foi fundamentada apenas na alegação de que “Brazil’sBSE status has not been confirmed”257. O embargo canadense éemblemático dos riscos inerentes a uma abordagem precautória dasdisciplinas existentes no Acordo de SPS. Essa abordagem precautóriaquando combinada à amplitude discricionária hoje existente no Acordode SPS poderia acarretar resultados ainda mais nefastos ao produto deum país afetado pela medida sanitária e fitossanitária258.

257 “Health Hazard Alert–Imported Brazilian Beef Products”. Canadian Food InspectionAgency, 02.02.2001.258 Não é aqui o caso de se proceder a uma análise mais aprofundada desse episódio,pois a sua origem e muitos de seus aspectos escapam ao presente trabalho. No entanto,valeria a pena um breve comentário mais vinculado ao tema da fundamentação científicada medida sanitária, ora em discussão. Nesse sentido, se questionada pelo Brasil, amedida canadense poderia ser condenada na OMC por não estar respaldada em basecientífica. Nesse caso, o Canadá poderia recorrer ao “safe haven”, ainda que temporário,do Artigo 5.7. Nesse ínterim, ou enquanto durasse o contencioso, a sanidade da carnebrasileira estaria sub judice perante a OMC e a opinião pública internacional. Uma talsituação poderia acarretar custos muito altos para o produto brasileiro, cuja imagempoderia ser definitivamente associada à EEB ou, no mínimo, a padrões de qualidade nãoaceitáveis.

Page 182: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

182

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Risco: patamares, análise enível apropriado de proteção sanitária

No Acordo de SPS, uma análise de risco constitui processocientífico “aimed at establishing the scientific basis for the sanitarymeasure a Member intends to take”259. É, assim, o instrumento queoperacionaliza o princípio científico. Por esse motivo, os painéis e Órgãode Apelação determinaram que os Artigos 2.2 (princípio científico) e5.1 (análise de risco) devem ser lidos em conjunto. A obrigaçãohorizontal e basilar enunciada pelo primeiro dispositivo é explicitadano Artigo 5.1, que exige que toda medida sanitária seja baseada emanálise de risco.

A jurisprudência dos painéis determinou, ainda, que, uma análisede risco pode (i) ser quantitativa ou qualitativa; (ii) refletir a opiniãocientífica divergente; (iii) resultar no estabelecimento de “risco zero”de proteção sanitária; ou (iv) basear-se em avaliações de riscoelaboradas por outros países membros ou organismos internacionais.Ela deve, entretanto, ser específica em relação à substância em exame,pois o risco a ser analisado deve ser identificável (“ascertainable”), jáque incertezas teóricas ou elementos desconhecidos não justificam umaanálise de risco.

Os riscos qualitativos ou não quantificáveis em laboratórios, ouseja, aqueles encontrados nas sociedades humanas “as they actuallyexist...the actual potential for adverse effects on human health inthe real world where people live and work and die”260, também sãorelevantes e devem fazer parte da análise de risco, senão em basesregulares, pelo menos em uma abordagem caso a caso. De acordocom o Órgão de Apelação em EC-Hormones, esse tipo de efeitoadverso não pode ser excluído da análise de risco sob o argumento deque pertenceria a outra etapa do processo regulatório, no caso, a gestão

259 Vide nota 171.260 Remetemos à mesma nota.

Page 183: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

183

de risco. Esta etapa, afirmou o AB, não se encontra mencionada emnenhum dispositivo do Acordo de SPS e, portanto, não legitimariainterpretações restritivas de uma análise de risco sob o Artigo 5.2.

Firmou-se, ainda, o entendimento de que a análise de risco àluz do Acordo de SPS prevê dois patamares de fundamento científico.O primeiro diz respeito aos riscos oriundos do consumo de alimentos.Nesse contexto, busca-se avaliar o “potencial” dos efeitos adversos àsaúde humana, animal e vegetal e de sua ocorrência. O segundo examinaa “probabilidade” de entrada, estabelecimento e disseminação dedoenças e pragas no território do país importador e leva em conta,nesse processo, as medidas sanitárias e fitossanitárias que possam seraplicadas e as potenciais conseqüências econômicas e biológicasenvolvidas. A interpretação das palavras “potencial” e “probabilidade”pelo Órgão de Apelação leva a crer que o limiar da fundamentaçãocientífica, necessária para a constatação do risco, que legitima umamedida orientada a proteger a saúde e a vida humanas, é mais baixodo que o patamar exigido para a medida dirigida a controlar ou evitara disseminação de pragas e doenças.

Esses pareceres formam, portanto, o quadro de disciplinas aser observado pelos países membros da OMC para operacionalizar ocritério científico que fundamenta uma medida sanitária e fitossanitáriasob o Acordo de SPS. Uma apreciação desse quadro permitevislumbrar ampla latitude jurídica para recorrer a medidas de caráterprecautório. Essa margem de manobra encontra-se consubstanciadaem parâmetros flexíveis e suscetíveis de acomodar diferentes situaçõessanitárias. O fato de o AB, por exemplo, reconhecer que riscosqualitativos pertencem ao universo de uma análise de risco sob o Artigo5.1 constitui decisão que amplia o poder discricionário de um paíspara determinar o fundamento de sua medida sanitária e reduzsubstancialmente o patamar de revisão do critério científico maisrigoroso e, sobretudo, de caráter exato que deu origem ao Acordo deSPS. Some-se a isso a decisão do AB de rejeitar a interpretação dopainel de EC-Hormones que explicitamente excluía critérios “não

Page 184: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

184

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

científicos”, ou “não laboratoriais”, do âmbito do SPS. Embora nãotenha explicitamente incluído esses critérios “não científicos” no universodo Acordo de SPS, o AB considerou não exaustiva a lista de fatores aserem levados em consideração em uma análise de risco sob o Artigo5.2. Esses pareceres corroboram a percepção de que o Acordo deSPS é permeável a considerações de diferentes ordens, desde que orisco em exame, “whatever their precise and immediate origin maybe”261, seja mais do que uma incerteza teórica. Nesse contexto, hátambém que se recordar a decisão que reduz o limiar do fundamentocientífico para medidas sanitárias orientadas à proteção da saúdehumana.

A jurisprudência dos painéis procurou equilibrar as decisõesde maior conteúdo subjetivo com a determinação de que a análise derisco coerente com o Artigo 5.1 constitui processo científico, sistemáticoe objetivo. Também descartou do contexto do SPS o exercício degestão de risco. Ainda assim, persistem algumas indefinições queservirão de teste à solidez da base científica do Acordo de SPS. Aprincipal dentre elas talvez se refira à lista ampliada do Artigo 5.2 e se– e até que ponto – a análise de risco poderia contemplar preocupaçõesde consumidores, valores sociais ou preferências culturais ou políticas.

O Comunicado da UE parece apostar nessas indefinições e,nesse sentido, procura explorar e preencher precisamente a lacuna deinterpretação sobre o alcance de uma análise de risco sob o Acordode SPS. Daí a tentativa de redefinir “análise de risco”, que, no modelocomunitário, contempla três elementos: (i) a avaliação; (ii) a gestão; e(iii) a comunicação. Diferentemente do Acordo de SPS, sob a visãocomunitária, a análise de risco apenas informa sobre o aspecto científicodo tema em exame, mas não determina, nem influencia a decisãoregulatória. Esta compete à gestão de risco, que, a partir de umaapreciação política dos elementos envolvidos, determina o nívelapropriado de proteção sanitária. Com base nesse raciocínio, a gestão

261 WT/DS26/AB/R, parágrafo 186.

Page 185: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

185

de risco poderia, pela via da referência à análise de risco, serincorporada ao arcabouço jurídico do Acordo de SPS.

O problema dessa estratégia européia não advém da introdução,no Acordo de SPS, da prerrogativa política inerente à gestão de risco.Como se viu anteriormente, essa prerrogativa já existe, por força dajurisprudência sobre o direito de um país decidir sobre o nívelapropriado de proteção sanitária. A questão reside na fundamentaçãodesse processo decisório ou da gestão de risco, que nasce da incertezacientífica e se legitima no recurso ao Princípio da Precaução, que, porsua vez, responderia a pressão ou reivindicações sociais.

A Resolução do Conselho Europeu refere-se a esse processoda seguinte forma: “(...) those responsible for scientific assessmentof risk must be functionally separate from those responsible forrisk management (...) risk management measures must be takenby the public authorities responsible on the basis of a politicalappraisal of the desired level of protection”262.

Esse quadro é mais agravado pela determinação do ConselhoEuropeu de, no exame do custo e benefício da decisão regulatória,levar em conta os custos sociais e ambientais e a aceitabilidade dasdiferentes opções para o público. Os “fatores econômicos relevantes”requeridos pelo Artigo 5.3 do Acordo de SPS seriam contemplados,nesse exame, apenas “where feasible”, e, ainda assim, condicionadosao entendimento de que os “requirements linked to the protectionof public health, including the effects of the environment on publichealth, must be given priority”263.

O modelo europeu de decisão regulatória na área sanitáriaparece incorporar os elementos imprevisíveis de uma “sociedade dorisco”, em que a percepção do dano passa a ocupar o conjunto deelementos que compõe e influencia o sistema de tomada de decisões.O papel atribuído à opinião popular, à pressão política e social e à

262 European Council Resolution on the Precautionary Principle, op. cit., pp. 3-4,parágrafos 11 e 12.263 Id., op. cit., p. 4, parágrafo 20.

Page 186: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

186

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

hierarquia e independência entre a análise e a gestão do risco reforça aimpressão de que a UE busca maior liberdade de ação para determinarsua política sanitária. Esse quadro, somado ao protagonismo da incertezacientífica e à “certeza de que a ciência jamais oferecerá respostadefinitiva para um problema específico, pelo menos não dentro douniverso temporal necessário para a tomada de decisão”, revela a ordemde grandeza da iniciativa européia264. Quando defrontado com o dilemainerente à “sociedade do risco”, o regulador, à luz do Acordo de SPS,deveria buscar orientação no universo científico, ao passo que o modelocomunitário sugere que esse universo seja primordialmente político.Como o risco, especialmente na sociedade moderna, é multidimensionale varia segundo o elemento cultural, ético, social e político, não hácomo prever a ação regulatória no cenário apregoado pela UniãoEuropéia.

A pergunta que se coloca, portanto, é como conciliar o enfoqueda Comunidade, altamente politizado e permeado de valores sociais,com o imperativo da previsibilidade, que é essencial ao comérciointernacional, particularmente para aqueles países com menor podereconômico e comercial.

A UE parece sugerir que essa conciliação ocorra por meio danegociação de diretrizes para a plena aplicação do Princípio daPrecaução. Para tanto, apresenta algumas sugestões de diretrizes, taiscomo proporcionalidade, não-discriminação, coerência, exame doscustos e benefícios da ação ou inação e exame dos desenvolvimentoscientíficos e, nesse processo, lança as bases para uma eventualnegociação sobre a matéria. Como se verá na discussão das seçõessubseqüentes, há dúvidas se um acordo sobre as bases propostas noComunicado da Comissão seria suficiente para evitar “unwarrantedrecourse to the precautionary principle, as a disguised form ofprotectionism”265. Não existem, no modelo europeu, critérios objetivos

264 Vide nota 56.265 Comunicado, op. cit., p. 1.

Page 187: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

187

que permitam avaliar o caráter proporcional, não-discriminatório ou mesmode coerência de uma medida sanitária. Ao sugerir que o nível adequado deproteção sanitária seja adotado com base em percepções e não em fatos,o modelo europeu novamente diverge do Acordo de SPS em seu aspectofundamental: a base científica. É ela que aporta previsibilidade,proporcionalidade e coerência às medidas sanitárias. É, igualmente, oinsumo científico que permite avaliar se uma medida sanitária incorporaelementos de discriminação. É, ainda, esse critério que permite a plenaimplementação dos dispositivos do Acordo de SPS relativos àharmonização e equivalência das medidas sanitárias. Em suma, a visãoeuropéia de um processo decisório sobre regulamentos sanitários queincorpore em sua plenitude o Princípio da Precaução, se bem sucedido,poderá destituir o Acordo de SPS do seu pilar básico: o princípio científico.Sem ele não há parâmetros para determinar se uma medida sanitária foiobjeto de uma análise de risco, nem se a análise de risco é consistente comos dispositivos do Acordo de SPS. Não há tampouco como estabeleceruma “relação racional” entre a medida sanitária e a evidência científica. Odireito soberano de que se beneficiam os países membros da OMC paradeterminar o seu nível apropriado de proteção sanitária (aspecto, aliás,muito enfatizado no Comunicado da Comissão) torna-se, sem a evidênciacientífica, uma prerrogativa ilimitada e, portanto, suscetível a abusos políticos.Em suma, não há como determinar se a medida sanitária é efetivamentenecessária, porquanto legítima para proteger a saúde humana, animal evegetal, ou se ela apenas constitui mais um instrumento de protecionismocomercial ou de composição e articulação política.

É verdade que tanto o Comunicado da Comissão quanto aResolução do Conselho Europeu reconhecem que a natureza da decisãoregulatória que resultar do seu modelo precautório pode variar desdemedidas altamente restritivas ao comércio, como o banimento deproduto potencialmente perigoso, até ações mais neutras, como aencomenda de estudos científicos. A UE, assim, parece sugerir,implicitamente, que não se deve necessariamente inferir que o recursoao Princípio da Precaução gere medidas restritivas ao comércio. A

Page 188: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

188

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

prática européia tem demonstrado, no entanto, que suas medidassanitárias, muitas vezes necessárias para solucionar problemas internos,têm sido proporcionalmente mais rigorosas que o justificável à luz dopotencial de risco apresentado pelo produto importado.

Na esteira das medidas aplicadas para controlar a questão daEEB, por exemplo, as exportações de gelatina brasileira foramsubmetidas, em 1999, a exigências sanitárias semelhantes àquelas impostasaos produtores europeus. No entanto, dadas as condições sanitárias noBrasil (não ocorrência de EEB) e o processo produtivo à base de couroe peles (material considerado fora do grupo de risco de contaminação)as autoridades sanitárias competentes do Brasil julgaram aquele conjuntode exigências adicionais não só desnecessárias, como também umaameaça à competitividade do produto brasileiro no mercadocomunitário266. Note-se que o Brasil ocupava, em 1999, o primeiro lugardentre os fornecedores não europeus de gelatina para o mercadocomunitário. O Brasil vinha exportando gelatina para aquele mercadonos últimos 15 anos, sem que qualquer problema sanitário tivesse sidoregistrado. Esses elementos levam a crer que, embora as intençõesregulatórias pudessem ter uma origem sanitária legítima, a forma deaplicação e de extensão a outros países, cujos produtos não oferecem omesmo risco, mostra-se abusiva e discriminatória. Reforçam, ademais, apercepção de que algumas medidas comerciais buscam, pelo disfarcesanitário, garantir o equilíbrio das condições de competitividade doproduto europeu. Se, hoje, o conjunto de disciplinas do Acordo de SPSjá autoriza, ainda que de forma disciplinada, iniciativas do gênero, umaeventual flexibilização dessas disciplinas, pela via do recurso pleno aoPrincípio da Precaução, ampliará expressivamente a margem de arbítrionas decisões sobre medidas sanitárias.

Exemplo do potencial de incertezas que a incorporação doPrincípio da Precaução ao Acordo de SPS poderia acarretar para o

266 Fax DELBRASGEN, número 536, 8.7.99, e telegramas de DELBRASGEN, número970, 20.7.99; e 1560, 18.11.1999.

Page 189: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

189

comércio internacional pode ser encontrado também nas relações entreas Comunidades e os EUA. Em resposta a informações de que a UEpoderia impor novas restrições à carne norte-americana fundamentadasno Princípio da Precaução, os EUA comunicaram à UE que, de seulado, examinariam a possibilidade de proibir, também à luz de umaabordagem precautória, a entrada de vinhos franceses, “especialmenteos mais tradicionais”, tratados à base de sangue bovino267. Surpreendidoscom a reação norte-americana, os representantes comunitários estariamaparentemente repensando a sua medida sanitária. Ainda que os EUAtenham evitado ou adiado a imposição de mais uma medida restritiva –e, na sua perspectiva, arbitrária – contra a sua carne, a verdade é que oambiente de ainda maior leniência regulatória que resultaria da legitimaçãodo modelo europeu propiciaria o acirramento das relações comerciais játensas na área agrícola. Quadro conducente, portanto, à reedição dastensões comerciais que prevaleceram nos anos 80 e ao longo dasnegociações da Rodada Uruguai. O tema dos hormônios de crescimento,aparentemente ainda não resolvido, e dos alimentos geneticamentemodificados ilustram esse conturbado processo.

Em um eventual sistema multilateral de comércio caracterizadopor disciplinas excessivamente permissivas e guiado por consideraçõessociais e interesses políticos, os países em desenvolvimento exportadoresagrícolas serão os primeiros e os mais afetados nesse processo, poisnão dispõem da necessária alavancagem política e econômica para reagir,como fizeram mais recentemente os EUA, a medidas aparentementediscriminatórias e arbitrárias.

A medida provisória

A incerteza científica no Acordo de SPS é tratada pela via dainsuficiência temporária da evidência científica para determinar o risco.Por isso, a obrigação básica constante do Artigo 2.2 é derrogada para

267 Conversa com Jim Murphy, USTR, em maio de 2001.

Page 190: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

190

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

medidas sanitárias provisórias que se enquadrem nas disciplinas do Artigo5.7. Talvez por força do conteúdo controverso desse artigo e a suaestreita vinculação com o Princípio da Precaução, o Órgão de Apelaçãoe os painéis de EC-Hormones e Japan-Varietals evitaram emitir opiniõessubstantivas categóricas. Estabeleceram, no entanto, alguns testes decaráter procedimental que limitam e disciplinam o uso de medidasprovisórias. A medida sanitária provisória, por exemplo, deve se relacionarcom uma situação de informação científica relevante insuficiente e seraplicada com base em dados pertinentes disponíveis. A natureza provisóriaimpõe, ademais, que o país membro que aplique a medida procure obterinformação adicional para avaliação mais objetiva do risco conducente àrevisão da medida em prazo razoável de tempo.

O AB e os painéis não se pronunciaram sobre o método decoleta ou a qualidade da informação adicional, tampouco especificaramos resultados que se busca com essa informação, que, no entanto,deve propiciar uma avaliação mais objetiva do risco. Quanto ao “prazorazoável” para revisão da medida, não há jurisprudência, apenas adeterminação de análises caso a caso, segundo as circunstâncias e ascaracterísticas específicas.

O fato de os painéis não se pronunciarem sobre aspectossubstantivos, tais como o patamar de insuficiência científica que permitiriaa aplicação de uma medida provisória e em que consistiria um “prazorazoável”, resultou em importante vácuo de jurisprudência que poderáser usado para procurar legitimar o recurso a medidas de precauçãode caráter provisório.

Novamente a UE não se mostra satisfeita com as aberturasprevistas no texto do Acordo de SPS tal como interpretado pelos painéise procura com o Princípio da Precaução preencher esse vácuo e reescrevero Artigo 5.7. Nessa linha de atuação, coincide com o Acordo de SPS nosentido de que “medidas fundamentadas no Princípio da Precaução”devem ser objeto de revisão, à luz da evolução do conhecimento científico.Essa revisão, no entanto, objetiva apenas “reduzir a incerteza científica”,pois o caráter provisório da medida tomada ao amparo do Artigo 5.7

Page 191: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

191

estaria, a seu ver, vinculado ao desenvolvimento do conhecimentocientífico, não a constrangimentos de ordem temporal. Como já se discutiuanteriormente, a interpretação e o tratamento comunitário da evidênciacientífica podem ser de tal ordem amplos, irrestritos e subjetivos, queuma medida provisória, à luz do modelo europeu, poderá vigorarindefinidamente, pois dependerá de que se alcance um “consenso político”sobre o desenvolvimento do conhecimento científico necessário para arevisão da medida. Dependerá, também, do “chosen level ofprotection”, que é prerrogativa dos países membros.

No que tange ainda à lacuna de jurisprudência sobre o patamarde insuficiência científica que legitimaria a medida provisória, a UE, emleitura inversa, ou a contrario sensu, opina que o Artigo 5.7 especificaa necessidade de uma avaliação de risco “mais objetiva” com a informaçãoadicional. Isto permitiria, por implicação, que a medida seja, ab initio,baseada em avaliação de risco “menos objetiva”. Com essa interpretação,a UE busca reduzir ainda mais o limiar de insuficiência do Artigo 5.7, quehoje está vinculado à idéia de “informação científica relevante”.

Novamente, volta-se ao ponto central do conflito entre o Acordode SPS e o modelo comunitário de decisão regulatória sobre medidassanitárias e fitossanitárias: a base científica e sua capacidade de aportarsegurança e previsibilidade ao processo decisório e, por conseqüência,à aplicação de medidas sanitárias necessárias e legítimas.

O Artigo 5.7 é freqüentemente o foco de atenção de paísesmembros e de grupos de interesse que reivindicam a revisão do Acordode SPS para a introdução de temas não-científicos, não-econômicos emais controversos. É alto o perfil do Artigo 5.7 junto à opinião pública,em particular na Europa. O fato de que nem o painel, nem o Órgão deApelação se pronunciaram sobre alguns aspectos substantivos pode serexplicado por essa circunstância política. Entretanto, do ponto de vistalegal e prático, não parece razoável esperar que o AB e o painel sepronunciem sobre elementos que, pela natureza da medida sanitária efitossanitária, são de difícil quantificação horizontal, pois tenderão a variarsegundo o caso. Não há como determinar um “prazo razoável” único. A

Page 192: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

192

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

medida japonesa, por exemplo, encontrava-se em vigor desde a décadade 50. O AB achou aceitável, por força deste e outros elementos, afirmarque havia decorrido um “prazo razoável” para uma eventual revisão.

É bem reduzido o patamar de insuficiência científica que ospaíses parecem estimar necessário para o recurso a medidas provisóriasno caso de uma doença de alto grau de contaminação, como a febreaftosa. Isto se viu em episódios no Reino Unido e na Argentina, queresultaram na imposição tempestiva de medidas sanitárias,respectivamente, pelos países europeus e pelo Brasil.

A questão do comércio de OGMs é mais polêmica. Nessecaso, há ampla gama de estudos científicos que enfatizam tanto asegurança quanto os riscos associados a alimentos transgênicos. Opatamar de insuficiência científica para a aplicação de uma medidaprovisória nesse caso, em que é patente a divergência dos cientistas eda opinião pública, vai depender do produto específico, do casoconcreto, da informação disponível, em suma, das circunstâncias e dascaracterísticas próprias à controvérsia.

A persistência desse vácuo de jurisprudência terá granderelevância para o comércio internacional de produtos agrícolas, umavez que, além de favorecer a imprevisibilidade, poderá ampliar o espaçopara o recurso a medidas de precaução sob o Artigo 5.7, cujacaracterística principal é a insuficiência científica.

É possível que alguns patamares relativos a níveis de“insuficiência” ou de horizontes temporais “razoáveis” venham a serfirmados com a sucessão de contenciosos futuros. Por enquanto, comose viu no Capítulo V, os painéis e o Órgão de Apelação não semostraram muito afeitos a uma abordagem exclusivamente assentadano Princípio da Precaução.

Harmonização das medidas sanitárias e fitossanitárias

Harmonização consiste no estabelecimento, reconhecimento eaplicação de medidas sanitárias e fitossanitárias equivalentes por

Page 193: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

193

diferentes países membros. É, portanto, uma das características maisimportantes do Acordo de SPS para lidar com a opinião científicadivergente. Busca-se, por meio do consenso científico possível que seconsubstancia nas normas sanitárias internacionais, a instituição deparâmetros comuns para a aplicação de medidas sanitárias. Essesparâmetros, quando observados, aportam previsibilidade ao processode formulação e aplicação de medidas sanitárias e fitossanitárias.

Como se viu no Capítulo V, dois pareceres importantes emergiramdo exame dos dispositivos referentes ao tema da harmonização.

No que tange aos Artigos 3.1 e 3.2, o AB rejeitou a tentativa dopainel de estender às medidas sanitárias “baseadas” na norma internacionala presunção de consistência prevista no Acordo de SPS para osregulamentos que “se conformam” à prática internacional. Essa leiturados Artigos 3.1 e 3.2 contribui para disciplinar o recurso ao mecanismode harmonização e evitar que normas internacionais sejam manipuladaspara dar legitimidade a medidas que carecem de fundamento científico.O parecer destaca a importância dos organismos internacionaiscompetentes no campo do desenvolvimento de normas sanitárias, vistoser necessário um trabalho de base mais aprofundado para que sejaviabilizado o pleno usufruto do direito enunciado nos Artigos 3.1 e 3.2.

Talvez, por esse motivo, as deliberações dos organismosinternacionais reconhecidos pelo Acordo de SPS têm recebido atençãoespecial dos países membros nos últimos anos. Exemplo disso é a iniciativacomunitária que procura introduzir o Princípio da Precaução no processodecisório do CODEX Alimentarius sobre gestão de risco. Essa iniciativaé objeto de menção nos dois documentos comunitários analisados. AResolução do Conselho instrui, inclusive, os Estados membros e aComissão a “ensure that the precautionary principle is fullyrecognized in the relevant international health, environment andworld trade fora, in particular on the basis of the principles putforward in this Resolution”268.

268 European Council Resolution on the Precautionary Principle, op. cit., p. 5; parágrafo 25.

Page 194: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

194

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

À luz do status de organismo internacional relevante para odesenvolvimento de normas sanitárias e fitossanitárias relativas aalimentos de que desfruta o Codex no âmbito do Acordo de SPS, ainiciativa comunitária reveste-se de particular importância para aeventual legitimação do Princípio da Precaução na área de saúdealimentar. A aceitação desse princípio no Codex poderia resultar nasua introdução no Acordo de SPS, pela via da referência à normainternacional, seja pelo Artigo 3.1, no caso de medidas “baseadas”,seja pelo Artigo 3.2, no caso de medidas que “conformam”. Estasúltimas, como se recorda, seriam, inclusive, presumidas consistentescom o Acordo de SPS e com o GATT 1994. Nesse sentido, otratamento que o Princípio da Precaução vier a receber no Codex serádeterminante para a sua aplicação no Acordo de SPS. Por isso, asdeliberações do Comitê do Codex sobre Princípios Gerais vêem sendoacompanhadas com extrema atenção pelos países do Grupo de Cairns,os EUA e outros países membros da OMC que advogam pelaliberalização do comércio agrícola internacional.

O segundo parecer significativo sobre harmonização diz respeitoao Artigo 3.3, que foi considerado pelo AB, em EC-Hormones, comoum “direito autônomo” de divergir da norma internacional, e não umaexceção ao exercício de harmonização.

A determinação do Artigo 3.3 como um “direito autônomo” deum país membro aplicar medida sanitária mais estrita do que a normainternacional é coerente com a jurisprudência sobre a “prerrogativa”atribuída a um país membro de decidir sobre o seu nível apropriado deproteção sanitária que deseja aplicar. Essas duas decisões têm sidoobjeto de freqüentes referências por parte de representantes eautoridades comunitárias, que buscam caracterizá-las como umreconhecimento, ainda que implícito, da aplicação do Princípio daPrecaução ao Acordo de SPS. A Resolução do Conselho Europeu,por exemplo, lembra “the recommendations made by WTO panels,in particular by the Appellate Body in the hormones case,concerning the right of WTO Members to ‘establish their own

Page 195: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

195

appropriate level of sanitary protection, which level may be higherthan that implied in existing international standards, guidelinesand recommendations’. (...)”269.

Deve-se ter presente, no entanto, o hiato entre o discursopolítico e a realidade jurídica evidenciada pelas declarações da UE. Aleitura do Artigo 3.3 pelo AB, em EC-Hormones, não cria padrãodiferente para uma medida sanitária mais estrita, isto é, não a excetuada exigência do critério científico e da análise de risco, apenas autorizaum membro a, a partir desses requisitos, adotar o nível de proteçãosanitária que julgar adequado. Essa é a “prerrogativa” política a que serefere o Acordo de SPS.

A UE, no entanto, procura dar divulgação à sua interpretaçãomais ampla de forma a passar a mensagem de que o Princípio daPrecaução já estaria incorporado em sua plenitude ao Acordo de SPS,daí a necessidade de, segundo a UE, de discutirem-se as diretrizespara a sua plena aplicação.

Coerência e não-discriminação

A jurisprudência firmada sobre os dispositivos do Acordo deSPS relativos à coerência e de não-discriminação das medidas sanitáriase fitossanitárias constitui conjunto de determinações de caráter amplo,flexível e com ênfase em abordagem caso a caso. A aplicação dos trêstestes impostos pelo Artigo 5.5 demonstrou que há espaço paradiferentes interpretações sobre o alcance legal desse dispositivo. OÓrgão de Apelação, por exemplo, determinou que “situaçõesdiferentes” sob o Artigo 5.5 são aquelas que apresentam elementosem comum suficientes para torná-las comparáveis. Tal interpretaçãocontrasta com a noção mais restritiva de “produtos iguais” no GATT,que exige verificar se os produtos são diretamente competitivos ousubstituíveis. No exame de aspectos de discriminação, o AB considerou

269 Id., op. cit., p. 2, parágrafo “J”.

Page 196: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

196

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

que o eventual conteúdo arbitrário e injustificável de uma medida constituiapenas um, dentre outros elementos necessários para caracterizá-lacomo discriminatória. Uma conclusão definitiva sobre a coerência ouo caráter discriminatório de uma medida sanitária e fitossanitáriadependerá de uma avaliação caso a caso. Como se recorda, em EC-Hormones, mesmo após a determinação de que a medida comunitáriaera arbitrária e injustificável, o AB não a considerou discriminatória,nem uma restrição disfarçada ao comércio, o que levou alguns analistasa opinar que o patamar de consistência com o Artigo 5.5 é hoje umaapreciação das intenções do país membro que impõe a medida sanitária.

À luz desses pareceres, a proposta da Comissão no sentido deque critérios de proporcionalidade, coerência e não-discriminação sejamobservados como diretrizes para o recurso ao Princípio da Precauçãotenderia a acentuar o quadro de incertezas que já se verifica com ainterpretação dada pelo AB ao teste do Artigo 5.5.

Essa constatação passa pela análise do papel do Princípio daPrecaução nesse capítulo do Acordo de SPS. Como já se viu, oPrincípio da Precaução expande o universo das medidas sanitárias efitossanitárias possíveis, uma vez que, além daquelas que são baseadasem evidência científica suficiente, esse universo passa a incorporar, deforma permanente, também as medidas com sustentação científicainsuficiente. Nesse sentido, uma vez ampliado o universo de medidassanitárias aceitáveis em bases permanentes, aumentam, também, asoportunidades e possibilidades de discriminação. Esse quadro, porém,não implica que essa discriminação, à luz do Princípio da Precaução,não seja permitida, como, de resto, já ocorre nas disciplinas normaisdo SPS. Pressupõe-se, nessa hipótese, que, uma medida sem evidênciacientífica suficiente, justificada à luz do Princípio da Precaução, sejaaplicada de forma consistente com os princípios de proporcionalidadee de coerência, o que constituiria uma discriminação, portanto, permitidasob o Acordo de SPS. A questão que se coloca, no entanto, é que oPrincípio da Precaução enfraquece justamente as diretrizes horizontais,entre elas a do fundamento científico, da proporcionalidade e da

Page 197: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

197

coerência, que, em última análise, disciplinam o caráter intrinsecamentediscriminatório das medidas sanitárias e fitossanitárias.

Com base nesse raciocínio, pode-se afirmar que as diretrizescomunitárias para aplicação do Princípio da Precaução apenas repeteme atenuam idéias e conceitos já existentes no Acordo de SPS. Nãoestá claro qual a contribuição das diretrizes comunitárias para evitarque medidas sanitárias e fitossanitárias, em particular aquelasfundamentadas no Princípio da Precaução e, portanto, na insuficiênciacientífica e na decisão política, não resultem, como insiste a UE, emprática discriminatória e restrição disfarçada ao comércio internacional.

O Ônus da prova e o Princípio da Precaução

De acordo com a discussão apresentada no Capítulo V, aresponsabilidade inicial em uma disputa na OMC recai sobre a Partedemandante, que deve estabelecer o caso “prima facie” de violaçãode um ou mais dispositivos do Acordo em exame. Legalmente, umcaso será considerado “prima facie”, quando, diante das evidênciasapresentadas pela Parte demandante e na ausência de uma respostada Parte demandada, o árbitro for levado a dar ganho de causa àParte demandante. O ônus da prova também pode recair sobre a Partedemandada quando esta invocar uma exceção, ou uma “defesaafirmativa”. Nas palavras do Órgão de Apelação, o ônus da provarecairá sempre sobre a Parte, demandante ou demandada, queapresentar uma defesa, um fato ou uma alegação270. Assim, a partir domomento em que se verifica o estabelecimento do caso “prima facie”,o ônus da prova é transferido à Parte demandada para que esta sedefenda.

Esse princípio é naturalmente válido também para oscontenciosos no âmbito do Acordo de SPS, inclusive sob o Artigo5.7, que foi, como se recorda, caracterizado pelo Órgão de Apelação

270 WT/DS33/AB/R, parágrafo 14.

Page 198: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

198

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

como uma “exceção qualificada” à obrigação horizontal constante doArtigo 2.2. Nesse caso, já dizia o painel da Gasolina, cabe à Parte queinvoca a exceção em sua defesa a responsabilidade primária de provarque a medida observa os requisitos previstos no âmbito daqueledispositivo excepcional. Portanto, o Artigo 5.7 é invocado apenas apóso estabelecimento pela Parte demandante do caso “prima facie” deviolação do Artigo 2.2. A partir desse momento, a Parte demandadatem o ônus de provar que a violação do Artigo 2.2 é justificada pelaexceção prevista no Artigo 5.7.

A jurisprudência descrita acima assenta-se, portanto, em umaleitura restritiva do Artigo 2.2 que autoriza a imposição e a manutençãode medidas sanitárias e fitossanitárias apenas quando fundamentadasna evidência científica de existência de risco. Os casos de insuficiênciacientífica são remetidos ao Artigo 5.7 que lhes confere caráterexcepcional, impõe o ônus da prova e estabelece limites temporais,ainda que vagos.

Por isso, quando o Japão e a UE buscaram, pelo recurso aoPrincípio da Precaução, eximirem-se, em seus respectivos contenciosos,da obrigação horizontal do Artigo 2.2, o Órgão de Apelação não acatouaquelas alegações. Reconheceu que o Princípio da Precauçãoencontrava reflexo em alguns artigos do Acordo de SPS, inclusive oArtigo 5.7, mas tal situação não autorizava uma leitura diferente dosdispositivos existentes, nem justificava “SPS measures that areotherwise inconsistent with the obligations of Members set out inparticular provisions of that Agreement”271. Em outras palavras, aaplicação do Princípio da Precaução não permitiria, no caso do Artigo2.2, a derrogação da exigência de “evidência científica suficiente”, nemautorizaria, no caso do Artigo 5.7, a reinterpretação do caráterprovisório e das demais obrigações nele contidas, inclusive aquelarelativa ao ônus da prova. Em síntese, o Princípio da Precaução nãopode reescrever o Acordo de SPS.

271 WT/DS76/AB/R, parágrafo 81.

Page 199: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

199

Diante desse parecer, a UE busca reformar o Artigo 2.2 e,por implicação, o 5.7, de forma a deixar explícita no texto do Acordoa aplicabilidade do Princípio da Precaução como obrigaçãohorizontal. Essa iniciativa parte da premissa básica de que cabe àParte que afirma ou alega a segurança de seu produto aresponsabilidade de provar a inexistência de risco. Haveria, assim,respaldo legal para aplicar medidas sanitárias baseadas em evidênciacientífica insuficiente, sem os constrangimentos de tempo e de provaimpostos hoje pelo Artigo 5.7 e, por conseguinte, com um patamarde evidência científica mais baixo do que aquele exigido pelo Artigo2.2. Tratar-se-ia, assim, da incorporação plena do Princípio daPrecaução ao Acordo de SPS. Nessa linha, uma versão possíveldo Artigo 2.2 poderia vir a incorporar a seguinte frase do Artigo5.7: “(...) In cases where relevant scientific evidence isinsufficient, a Member may adopt sanitary or phytosanitarymeasures on the basis of available pertinent information”. Nessecaso, uma medida sanitária sem suficiente evidência científica deexistência de risco passaria a ser parte dos dispositivos regularesdo Acordo de SPS. Passaria a ser a regra (Artigo 2.2) e não maisa “exceção qualificada” (Artigo 5.7). O ônus da prova deconsistência dessa medida seria, assim, invertido da Parte queinvoca a defesa afirmativa, para a que reclama uma violação de umdispositivo do Acordo de SPS. Em outras palavras, a medidasanitária fundamentada no Princípio da Precaução passaria a sebeneficiar da lógica normal aplicada ao ônus da prova, pois caberiaà Parte que reclama uma medida sanitária baseada em evidênciacientífica insuficiente sobre a existência de risco a responsabilidadede provar a ausência do risco em questão.

Como a prova de uma afirmação negativa é impossível, aorequerer que o inovador tecnológico ou o exportador prove ainexistência do risco, o Princípio da Precaução impõe obstáculo naprática instransponível à comercialização de um produto consideradopotencialmente danoso.

Page 200: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

200

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Assim, à luz do Princípio da Precaução e na perspectivacomunitária, bastaria invocar a dúvida sobre a existência do risco paralegitimar uma medida sanitária que, tendo em vista o ônus da provaimposto, poderia tornar-se uma barreira permanente ao comércio.Estariam, dessa forma, obviados os testes científico e temporal dispostosnos Artigos 2.2 e 5.7 para a aplicação e manutenção de uma medidasanitária. Toda a estrutura hoje existente no Acordo de SPS para lidarcom a evidência científica insuficiente seria, portanto, reformada, ousimplesmente obliterada.

As sérias implicações para o comércio e o amplo poderdiscricionário e de manipulação que essa iniciativa comunitáriarepresenta não passam despercebidos por segmentos da sociedadeeuropéia não diretamente vinculados ao interesse agrícola. A UNICE– “Union of Industrial and Employers’ Confederation of Europe”–, por exemplo, preocupa-se com a influência negativa do recurso àprecaução sobre a inovação tecnológica, pois faz desaparecer opressuposto de que esta é legal “até prova em contrário”:

A rigid interpretation of the Precautionary Principle will almostautomatically create a bias against the development of new technologies.If the slightest scientific indication is sufficient to decide on an outrightban of a product, industry will be unable to develop any newly developedtechnology further. …It is noteworthy that society has much less problemaccepting the inherent risks of old technologies compared with theacceptance of the risks inherent in new technologies272.

É essa “rigid interpretation of the Precautionary Principle”que vem sustentando a manutenção das restrições comunitárias àimportação, comercialização e cultivo de alimentos geneticamentemodificados e que encontra respaldo nos dispositivos sobre o Acordode Informação Avançada (AIA) do Protocolo de Biossegurança273.

272 “Unice Discussion Paper on the Precautionary Principle in international trade”.Unice – The Voice of Business in Europe, 20.11.2000.273 Artigos 10 e 15 do Protocolo de Biossegurança.

Page 201: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

O PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E AS CONSEQÜÊNCIAS PARA O COMÉRCIO AGRÍCOLA INTERNACIONAL

201

Transparece, portanto, dessa análise sobre a jurisprudênciarelativa ao ônus da prova a prevalência do imperativo científico doAcordo de SPS, pois a medida sanitária que dele se afasta perde apresunção de consistência e, por conseguinte, ganha o ônus de provarque a sua excepcionalidade é justificada. Essa predominância dofundamento científico, entretanto, não impede, apenas disciplina, orecurso a medidas precautórias.

Page 202: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 203: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CONCLUSÃO

Page 204: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 205: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

205

CONCLUSÃO

A discussão desenvolvida no presente trabalho permite concluirque o Princípio da Precaução encontra-se, em larga medida, incorporadoao Acordo de SPS. Todos os aspectos do Acordo de SPS examinadosnos Capítulos V e VII evidenciam aberturas que facilitam o recurso amedidas precautórias. Essas aberturas encontram-se consubstanciadas:nos pareceres que enfatizam a necessidade de exame caso a caso; nadeterminação sobre os fatores que compõem uma análise de risco,entre eles a opinião científica divergente e minoritária; noreconhecimento de que o risco poderá ter caráter qualitativo; napossibilidade de adoção do “risco zero” de proteção sanitária; etambém, na confirmação da prerrogativa política de um país arbitrarsobre o risco aceitável ou o nível apropriado de proteção sanitária. Ajurisprudência determinou, ainda, que o Princípio da Precauçãoencontra reflexo no Artigo 5.7, que dispõe sobre medidas sanitáriasbaseadas na incerteza científica, bem como no Artigo 3.3, relativo àaplicação de medidas sanitárias que desviam do consenso internacional.

Sobressai, ainda, da análise dos três contenciosos sob o Acordode SPS a tendência do Órgão de Apelação de mostrar-se maispermeável do que os painéis às necessidades e ansiedades dosconsumidores. Ao determinar que uma análise de risco sob o Artigo5.2 pode levar também em conta o risco originário do mundo real“where we live and work and die”, o AB deu mostras de aberturapolítica e de grande flexibilidade na interpretação dos dispositivos doAcordo de SPS.

Page 206: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

206

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Não obstante ser o quadro regulatório e suas interpretaçõesfavoráveis aos interesses europeus, as iniciativas comunitárias na OMCe no Codex são indicativas de que a UE continuará a postular a reformado Acordo do SPS para “esclarecer e fortalecer” os dispositivosrelevantes ao Princípio da Precaução. Essa insistência nasce do interessecomunitário de modificar a letra do Acordo de SPS, em particular ados Artigos 2.2 e 5.7, para obter o direito inquestionável, à luz domecanismo de solução de controvérsias (MSC) da OMC, de aplicaruma medida sanitária e fitossanitária com base em percepções e dúvidassobre eventuais riscos. Em essência, a iniciativa comunitária se resumea modificar de provisório para permanente o caráter de uma medidasanitária com base científica insuficiente. Para tanto, será necessáriotransformar o Artigo 5.7 de exceção qualificada para regra geral. Comessas alterações, o Princípio da Precaução poderá ser aplicado emsua plenitude, pois estarão obviados os limites e os constrangimentosde tempo e de prova científica inerentes ao sistema de “checks andbalances” do Acordo de SPS. Esse é o cenário visado por segmentosda UE que desejam reformar a PAC e manter a exceção agrícola.

Se exitosa, a iniciativa comunitária poderá obliterar o principalsustentáculo do Acordo de SPS: o princípio científico. Como já sediscutiu neste trabalho, é esse fundamento científico que aportaprevisibilidade e coerência às medidas sanitárias. Permite, também,avaliar o elemento de proporcionalidade de uma medida sanitária,justificada por uma “relação racional” e não uma percepção política. Éjustamente esta última hipótese que seria favorecida pelo Princípio daPrecaução. O critério científico é, ainda, essencial para controlar oelemento de discriminação inerente às medidas sanitárias e paradisciplinar a prerrogativa política de um país membro aplicar o seunível apropriado de proteção sanitária. Finalmente, é a evidênciacientífica que permite verificar se uma medida sanitária foi objeto deanálise de risco e se essa análise de risco foi conduzida de formasatisfatória e isenta. Sem esse sistema de pesos e contrapesos, quetem na ciência seu sustentáculo principal, não há como discernir entre

Page 207: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CONCLUSÃO

207

a medida sanitária necessária e legítima e aquela que disfarça e mascaraintenções protecionistas. O modelo comunitário, portanto, altera edebilita o equilíbrio de direitos e obrigações que o princípio científicoconfere ao Acordo de SPS. Sem esse elemento, o Acordo de SPSperde seu principal alicerce e poderá torna-se virtualmente inoperante.

Se, por um lado, o cenário pretendido pela UE deve ser evitado,porquanto resultará em ambiente desregulamentado, destituído deparâmetros objetivos e ditado sobretudo por interesses políticos econsiderações sociais e econômicas, por outro lado, é lícito concluirque não se pode ignorar a realidade política da sociedade moderna ouda “sociedade do risco”. Essa realidade evidencia um consumidor maisengajado e participativo, e por isso mais reivindicativo de políticassanitárias eficientes. Um dos principais traços dessa sociedade modernaé a preocupação do consumidor com os riscos associados a tecnologiasemergentes e às incertezas científicas sobre os efeitos dos novosmétodos de produção na sua saúde e no meio ambiente em que vive.Independentemente da polêmica científica, governos representativosnão podem ignorar ou mesmo menosprezar a ansiedade e a apreensãodo consumidor.

O desenvolvimento do presente trabalho parece mostrar, noentanto, que essa preocupação do consumidor, de resto legítima, vemsendo usada para mascarar medidas de cunho protecionista. Esseaspecto do problema é particularmente evidenciado na política sanitáriada Comunidade, que procura corrigir as disfunções de seu modeloagrícola, mediante a socialização dos custos de uma política sanitáriamais rigorosa e, portanto, atenta aos desejos do consumidor.Confrontada entre a reivindicação legítima da sociedade civil e aspressões políticas do lobby agrícola, a Comunidade busca maiorliberdade de ação no campo internacional para aplicar medidas queatendam a esses interesses conflitantes. O Princípio da Precaução, comsua carga de subjetividade e arbitrariedade, torna-se o instrumentoideal para essa campanha. Ele oferece a latitude política para a aplicaçãode medidas que combatem o problema sanitário e aplacam as críticas

Page 208: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

208

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

à PAC produtivista e intensiva, ao mesmo tempo em que protegem oprodutor agrícola da competição externa. Essa dimensão protecionistada política sanitária da UE é ilustrada pelo episódio da gelatina, pelodesinteresse europeu em aumentar suas importações de carne em meioà crise da EEB274 e pela desproporcionalidade das medidas sanitáriaseuropéias quando estendidas a seus parceiros.

Daí a cautela com que se deve tratar a iniciativa européia deincorporar o Princípio da Precaução no Acordo de SPS. Se esteinstrumento jurídico já autoriza a ação precautória, parece questionávelo interesse comunitário em ampliar o grau de discrição disponível hojeno Acordo de SPS. Como conciliar, portanto, as pressões desseparceiro comercial de importância incontestável com o interessebrasileiro de preservar quadro regulatório adequado, previsível e semdistorções para as trocas internacionais de produtos agrícolas? Comopode o Brasil agir e interagir nesse processo evolutivo sem apresentarpostura de oposição frontal ao Princípio da Precaução e, por via deconseqüência, à União Européia? Como encontrar um sistema de pesose contrapesos que envolva os principais atores e fatores desse processo:o consumidor, o produtor, a informação científica e o governo? Enfim,à luz desse cenário, convém discutir os desafios que se colocam para adiplomacia comercial brasileira.

Primeiramente, deve-se ter presente que a incorporação plenado Princípio da Precaução, como prerrogativa “horizontal”, às

274 Em outubro de 2000, no Canadá, à margem da reunião ministerial do Grupo deCairns, o Ministro Pratini de Moraes e o Comissário Fischler encontraram-se paratrocar idéias sobre comércio bilateral. Nessa ocasião, em resposta à gestão do MinistroPratini em favor do incremento das exportações de carne brasileira para o mercadocomunitário, o Comissário afirmou que o Brasil não deveria esperar qualquer gestocomunitário para facilitar a entrada de sua carne no mercado europeu, pois, apesar dacrise da EEB, o produto continuava a constar da “lista de produtos agrícolas sensíveis”.Além disso, não havia, segundo o Comissário Fischler, interesse da população emconsumir mais carne do que aquela disponível no mercado. Se é verdade que o consumode carne européia havia diminuído em função da crise da EEB, é também verdade quenão havia vontade política para se testar, pela via do mercado, o interesse do consumidorpor carnes de origem saudável.

Page 209: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CONCLUSÃO

209

disciplinas do Acordo de SPS é desdobramento inaceitável queproduzirá efeitos perversos para os interesses exportadores brasileiros.O recurso ilimitado a esse princípio afetará em particular os países emdesenvolvimento exportadores agrícolas que não detêm poder político,econômico e comercial suficiente para impor sua vontade em umambiente desregulamentado, voluntarista e unilateral.

Outro elemento a ser levado em consideração aponta para ofato de que o empenho europeu em reabrir o Acordo de SPS paraincluir o Princípio da Precaução será perseguido tanto no âmbito dasnegociações mandatadas quanto em um contexto negociador maisalargado. É notório, entretanto, o pouco interesse que o setor agrícolana UE atribui ao lançamento de uma rodada negociadora. Essesegmento não quer ser pressionado, em uma negociação abrangente,a fazer concessões na área agrícola que vão além da reforma previstapara a PAC. Prefere manter o processo de reforma do comércio agrícolainternacional adstrito às negociações mandatadas. No entanto, amovimentação do Comissário Lamy no cenário internacional é indicativade que, no limite, o segmento agrícola concorda com uma rodada,desde que seu lançamento não prejulgue ou contemple resultadosambiciosos em agricultura e a negociação permita preservar os interessee as políticas comunitárias que matizam a liberalização agrícola. Aí seinsere o Princípio da Precaução, que deverá integrar o pacotenegociador agrícola de uma eventual rodada multilateral, pois quantomaiores as perspectivas de uma reforma real do comércio agrícolainternacional maior será o interesse da UE em dispor de margem demanobra para impor barreiras não-tarifárias, inclusive a título de medidassanitárias e fitossanitárias.

Nesse sentido, a iniciativa comunitária de incluir o Princípio daPrecaução no Acordo de SPS deve receber oposição frontal na OMC.Uma tal resistência requererá por parte do Brasil a preservação e aintensificação do exercício de coordenação tradicional junto ao Grupode Cairns e aos EUA. O diálogo reforçado com este último será damaior relevância, pois a resistência à iniciativa comunitária será tão

Page 210: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

210

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

mais difícil quanto menor for a importância que o governo norte-americano atribuir à agricultura.

Será necessário também iniciar campanha de aproximaçãosistemática e consistente com os países em desenvolvimento, emparticular aqueles mais dependentes das ofertas preferenciais da UE.Para tanto, o Brasil deve buscar meios de responder de forma concretaaos anseios desse grupo de países (cada vez mais ativos na construçãodo consenso na OMC) de aumentar as oportunidades de acesso amercado para seus produtos. Uma tal atuação do Brasil e de seusparceiros do Grupo de Cairns poderia ajudar a desmobilizar aliançasque hoje dificultam o esforço de reforma agrícola na OMC.

Na hipótese de uma rodada, a preservação dos interessesbrasileiros passará necessariamente pela mobilização de massa críticapara reviver a aliança informal entre o Grupo de Cairns, os EUA esignificativo número de países em desenvolvimento que permitiu, noperíodo pré-Seattle, colocar sobre a mesa de negociação proposta demandato que interpretava o mandato do Artigo 20 e, ao fazê-lo,distinguia claramente entre os temas a serem negociados e aqueles aserem levados em consideração na negociação. Com isso, sepreservaria a reforma agrícola, ao mesmo tempo em que haveria espaçopara a UE e outros países membros, tais como o Japão, a Suíça e aNoruega, levarem adiante suas políticas agrícolas, sempre e quandoapoiadas em medidas não distorcivas de comércio.

Em síntese, o trabalho de lançamento de uma rodada multilateralde comércio deve ter muito presente a tarefa de desenhar um mandatoagrícola que aponte no sentido da liberalização e não apenas de ajustesde uma PAC que se encontra em crise e precisa enfatizar amultifuncionalidade e a especificidade da agricultura e outros artifícios,como o Princípio da Precaução, que limitam sobremaneira o exercícionegociador.

Se, na OMC, a iniciativa européia de flexibilizar ainda mais oAcordo de SPS deve ser combatida com oposição frontal, o custopolítico dessa decisão deve estar presente nas considerações do

Page 211: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CONCLUSÃO

211

governo brasileiro. Há, portanto, que se buscar cursos de ação queatenuem uma eventual percepção de que o Brasil possa estar ignorando(i) as preocupações da sociedade civil relacionadas a direitosfundamentais, como o da saúde pública; e (ii) os interesses econstrangimentos da UE, parceiro comercial importante, que não podeser menosprezado.

A negociação do Protocolo de Biossegurança e as deliberaçõesna OMC e no Codex atestaram a dificuldade de se encontrarformulações alternativas para o Princípio da Precaução capazes depreservar o sistema multilateral de comércio. Tornam-se, assim,imprescindíveis novas abordagens positivas do problema. Talvez, porisso, o caminho mais apropriado aponte para o gerenciamento doPrincípio da Precaução. No que diz respeito ao texto do Acordo deSPS, o Artigo 5.7 parece oferecer o mecanismo adequado degerenciamento desse princípio. Não obstante, há outras áreas relativasao comércio de alimentos que propiciam espaço para um enfoquepositivo e capaz de acomodar preocupações precautórias.

Nessa ordem de idéias, a rotulagem de produtos agrícolaspoderia contribuir para a conciliação dos interesses exportadoresbrasileiros com os efeitos nocivos do Princípio da Precaução. Se éverdade, como diz o Comunicado da Comissão Européia, que asansiedades da sociedade civil estão na origem de sua campanha emfavor do Princípio da Precaução na área alimentar, a rotulagem ofereceao consumidor, agora informado e instruído sobre o produto que omercado lhe oferece, a oportunidade de estabelecer o seu próprionível apropriado de proteção, que poderá ser, inclusive, o de riscozero, pois a ele será dada a opção de comprar ou rejeitar o produtoem questão.

A rotulagem de alimentos não é evidentemente a solução maisfácil para o governo, pois requer decisões importantes sobre o universodos produtos afetados e a composição do rótulo. Tampouco é a soluçãomais barata para a indústria, porquanto encarece o produto objeto dorótulo. Trata-se, no entanto, de uma fórmula alternativa ou uma

Page 212: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

212

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

estratégia de “damage control” que tem a vantagem de evitar a adoçãode medidas mais restritivas ao comércio, como, por exemplo, osembargos comerciais a produtos específicos. Nesse sentido, deve-seter presente o conteúdo de algumas das propostas apresentadas pelosaliados tradicionais da UE, como a Coréia, que se refere explicitamenteà rotulagem de alimentos como uma via de implementação do Princípioda Precaução.

Do ponto de vista do Brasil, a rotulagem poderia ser adotadanão só para trazer conforto aos consumidores brasileiros e estrangeirosque desconfiam da sanidade de determinados produtos novos, porexemplo, os transgênicos, mas sobretudo para fazer valer nossointeresse exportador em um mercado internacional cada vez maisexigente. O empresário brasileiro deve tratar a rotulagem não comoum fardo adicional ou um empecilho ao comércio, mas como uminstrumento de acesso a mercados mais sofisticados. Assim, deve buscaros nichos de mercado que resultam das crises sanitárias, particularmentena Europa, onde o consumidor busca produtos orgânicos. Uma posturapró-ativa e antecipatória com relação à rotulagem que instrua oconsumidor sobre o caráter sustentável e saudável do produto brasileirodeve ser uma das metas a ser alcançada pelo exportador brasileiro.Com uma agricultura competitiva, extensiva e que emprega técnicaslimpas, o produtor brasileiro deve sair na frente nessa disputa pelomercado de produtos naturais que apenas surge na Europa e nosEstados Unidos. Para tanto, são necessários investimentos epropaganda; em outras palavras, atitude pró-ativa que transforme aadversidade em oportunidade.

O diplomata ou o negociador tem dois papéis a desempenharnesse contexto. Estar atento para combater ou minimizar iniciativasque possam resultar em quadro regulatório multilateral desfavorável àsexportações brasileiras e alertar o exportador para as oportunidadesque se abrem com a evolução desse processo de questionamento sobrea sanidade dos alimentos. A rotulagem propicia, assim, espaço para oexportador, interessado em manter mercados tradicionais ou conquistar

Page 213: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CONCLUSÃO

213

novas oportunidades, reagir aos estímulos e às preocupações dosconsumidores. Isso é particularmente verdadeiro no caso dasexportações para o mercado europeu, onde a crise de confiança gerouum mercado para produtos orgânicos, que não poderá ser supridocompletamente pela agricultura européia, à luz dos constrangimentosfinanceiros que enfrenta, inclusive para fazer frente às sucessivas crisesalimentares.

Outra forma de conciliar os interesses brasileiros com aspressões políticas, econômicas e sociais vinculadas ao Princípio daPrecaução consiste em promover a elaboração de normas sanitáriasadequadas à situação atual nos organismos internacionais competentes.Há dois cursos de ação a tomar nessa área. O primeiro consiste emfortalecer e dinamizar a participação brasileira nesses organismos, comdelegações que reúnam, além de diplomatas da área comercial, pessoaltécnico do Ministério da Agricultura e de outras áreas do governo comconhecimento específico na matéria em discussão. Essa composiçãopermitirá identificar melhor o interesse político brasileiro e atuar emconseqüência no plano técnico. Sem o apoio do perito, o diplomatanão poderá avaliar questões que exigem conhecimento técnico ecientífico. Sem o diplomata comercial, que conhece o conjunto dasregras multilaterais, o interesse brasileiro estará apenas parcialmentecoberto. Para tanto, será necessário não apenas fortalecer o quadrode recursos humanos do MRE e do MAA, mas sobretudo dispor derecursos financeiros que permitam ao diplomata e ao técnicoparticiparem das numerosas reuniões de trabalho que precedem aelaboração de normas sanitárias internacionais.

Outro curso de ação importante nessa área consiste empromover e envolver a participação da sociedade civil nas decisõessobre normas, diretrizes e recomendações sanitárias internacionais. Esseenvolvimento pode dar-se antes – mediante processo de consultas – edurante as reuniões, com a assessoria especializada in loco do setorpotencialmente afetado pelas decisões que venham a ser tomadas noâmbito do organismo internacional especializado. Esse procedimento

Page 214: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

214

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

aportará legitimidade à norma acordada, o que, em última análise,facilitará sua introdução no Acordo de SPS, por meio dos Artigos 3.1e 3.2.

Assim, aquela oposição frontal ao Princípio da Precaução naOMC não precisa ser estendida aos organismos internacionaiscompetentes em matéria sanitária, desde que dois aspectos estejamassegurados: (i) a participação ativa e efetiva de delegados brasileiros;e (ii) a introdução adequada e controlada do Princípio da Precauçãonas normas internacionais. Elemento crucial nessa equação é manter oPrincípio da Precaução restrito ao processo de tomada de decisãodos organismos internacionais, sem que, por esta via, seja incorporado,como princípio ou diretriz, à esfera regulatória nacional. Em outraspalavras, o tratamento do tema não pode prescindir de um entendimentoinequívoco de que o Princípio da Precaução, ao nortear o processodeliberativo multilateral – do Codex Alimentarius, por exemplo –, nãoestaria, em si próprio, legitimando medidas ou decisões unilaterais. Dessaforma, o recurso pleno ao Princípio da Precaução virá sempre na formade uma medida internacionalmente acordada e não como parte de umaimposição unilateral, pois esta se vê circunscrita aos requisitos e testesdo Acordo de SPS. Esse modelo é, portanto, equivalente ao processode aplicação do Princípio da Precaução no campo do meio ambiente.

Outro “front” de atuação para minimizar, a partir de um enfoquepositivo, os efeitos do Princípio da Precaução e de outras iniciativasdo gênero sobre o sistema multilateral de comércio consiste no diálogobilateral próximo e freqüente entre o Brasil e seus parceiros comerciais,tanto no plano diplomático quanto técnico. O episódio da classificaçãopela Comissão Européia da carne brasileira no “Nível I”, ou seja, o demenor risco de incidência de EEB, é exemplo a ser seguido e repetidopela diplomacia brasileira. Mesmo na esteira do embargo canadense àcarne brasileira que introduziu dúvidas sobre o real status sanitário doproduto brasileiro, diplomatas, técnicos e veterinários mantiveramdiálogo freqüente e franco com seus respectivos interlocutorescomunitários, o que, além de resultar em ambiente de confiança

Page 215: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CONCLUSÃO

215

recíproca, mostrou-se propício, dos pontos de vista político e técnico,para que a carne brasileira fosse adequadamente classificada. Oresultado desse episódio mostra que um diálogo bilateral reforçadocom a UE favorece a suplantação de obstáculos tópicos, muitas vezes,de difícil ou longa maturação nos planos regional ou multilateral.Demonstra, igualmente, que o exportador brasileiro de carnes devetirar proveito dessa oportunidade, reforçando o poder de penetraçãode seu produto com etiquetas e rótulos que privilegiem e atestem asanidade do produto brasileiro.

Subjacente a todos os comentários acima está a percepção deque o Brasil terá que se aparelhar adequadamente para vencer não sóo desafio do Princípio da Precaução, mas outros obstáculos do gênero,que serão uma constante na área do Acordo de SPS. Dada a importânciado tema de saúde alimentar junto ao consumidor, a dimensão sanitáriado comércio internacional de produtos agrícolas não é mais secundáriaou marginal. É urgente e relevante e está intimamente vinculada aodesempenho exportador do país na área agrícola. Para aumentar a suaparticipação no mercado mundial, o Brasil terá de estar aparelhadopara responder com rapidez e eficiência, tanto no plano nacional quantono internacional, a exigências crescentes na área sanitária e fitossanitária.

Page 216: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 217: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

BIBLIOGRAFIA

Page 218: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 219: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

219

RELATÓRIOS DOS PAINÉIS E DO ÓRGÃO DE APELAÇÃO DA OMC

EC – Measures Concerning Meat and Meat Products(Hormones):WT/DS26/R/USA (18.08.1997)WT/DS48/R/CAN (18.08.1997)WT/DS26/AB/R (16.01.1998)WT/DS48/AB/R (16.01.1998)Australia – Measures Affecting Importation of Salmon:WT/DS18/AB/R (20.10.1998)WT/DS18/R (12.06.1998)Japan – Measures Affecting Agricultural Products:WT/DS76/R (27.10.1998)WT/DS76/AB/R (22.02.1999)

RELATÓRIOS E PROPOSTAS NEGOCIADORAS

WT/GC/W/194 (01.06.1999) – EC Approach to Trade andEnvironment in the New WTO Round – Communication fromthe European CommunitiesWT/GC/W/265 (20.07.1999) – Negotiations on Trade andEnvironment – Communication from SwitzerlandG/SPS/R/18 (18.04.2000) – Committee on Sanitary andPhitosanitary Measures –Summary of the Meeting held on 15-16 March 2000G/SPS/GEN/168 (14.03.2000) – Communication from theEuropean Commission on the Precautionary PrincipleWT/CTE/W/136 (30.03.2000) – Cartagena Protocol onBiosafety to the Convention on Biological DiversityG/AG/NG/W/90 (14.12.2000) – EC Comprehensive NegotiatingProposalG/AG/NG/W/91 (21.12.2000) – Negotiating Proposal by Japanon WTO Agricultural Negotiations

Page 220: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

220

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

G/AG/NG/W/98 (9.01.2001) – Korea – NegotiatingProposalG/SPS/GEN/225 (02.02.2001) – European Council Resolutionon the Precautionary Principle

DOCUMENTOS OFICIAIS

Despacho Telegráfico para BRASEMB Paris, n. 368, 20.04.2001Despacho Telegráfico para DELBRASGEN, n. 631, 30.05.2001Fax DELBRASGEN, n. 536, 8.7.99Telegrama de BRASEMB Paris, n. 557, 03.05.2001Telegrama de BRASEUROPA, n. 21, 17.01.2001Telegrama de BRASEUROPA, n. 122, 07.02.2000Telegrama de BRASEUROPA, n. 103, 16.02.2001Telegrama de BRASEUROPA, n. 418, 18.05.2001Telegrama de BRASEUROPA, n. 889, 11.10.2000Telegrama de BRASEUROPA, n. 1127, 20.12.2000Telegrama de DELBRASGEN, n. 970, 20.07.99Telegrama de DELBRASGEN, n. 1560, 18.11.1999

TEXTOS LEGAIS

“The Rio Declaration on Environment and Development”. InternationalLegal Materials. Cambridge, Cambridge University Press,Volume 31, número 4, Julho 1992, pp. 874-887.

“Convention on Biological Diversity”. International Legal Materials.Cambridge, Cambridge University Press, Volume 31, número 4,Julho 1992, pp. 818-842.

“Straddling Stock Agreement”. International Legal Materials.Cambridge, Cambridge University Press, Volume 34, número 6,Novembro 1995, pp.1542-1580.

“Agreement on the Application of Sanitary and Phitosanitary Measures”.The Results of the Uruguay Round of Multilateral Trade

Page 221: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

BIBLIOGRAFIA

221

Negotiations: The Legal Texts. Geneva, World TradeOrganization, 1995, pp. 69-84.

“Agreement on Agriculture”. The Results of the Uruguay Roundof Multilateral Trade Negotiations: The Legal Texts.Geneva, World Trade Organization, 1995, pp. 39-68.

“The General Agreement on Tariffs and Trade”. The Results of theUruguay Round of Multilateral Trade Negotiations: TheLegal Texts. Geneva, World Trade Organization, 1995, pp.486-558.

“Understanding on Rules and Procedures Governing the Settlementof Disputes”. The Results of the Uruguay Round ofMultilateral Trade Negotiations: The Legal Texts. Geneva,World Trade Organization, 1995, pp. 404-433.

LIVROS

ANDERSON, Kym, POHL NIELSEN, Chantal. “GMOs, the SPSAgreement and the WTO”. In: VVAA, The Economics ofQuarantine and the SPS Agreement. Canberra, Centre forInternational Economic Studies, Adelaide and AFFABiosecurity Australia, 2001, organizado por Kym Anderson,Cheryl McRae e David Wilson.

ATTFIELD, Robin. “The Precautionary Principle and MoralValues”. In: VVAA, Interpreting the PrecautionaryPrinciple. Londres, Cameron May Ltd, 1994, organizado porTimothy O’Riordan e James Cameron.

BECKERMAN, Wilfred. “The precautionary principle and ourobligations to future generations”. In: VVAA, RethinkingRisk and the Precaut ionary Principle . Oxford,Butterwoth-Heinemann, 2000, organizado por JulianMorris.

Page 222: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

222

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

BODANSKY, Daniel. “The Precautionary Principle in US EnviromentalLaw”. In: VVAA, Interpreting the Precautionary Principle.Londres, Cameron May Ltd, 1994, organizado por TimothyO’Riordan e James Cameron.

BOEHMER-CHRISTIANSEN, Sonja. “The Precautionary Principlein Germany – enabling Government”. In: VVAA, Interpretingthe Precautionary Principle. Londres, Cameron May Ltd, 1994,organizado por Timothy O’Riordan e James Cameron.

CAMERON, James. “The Precautionary Principle in InternationalLaw”. In: VVAA, Reinterpreting the Precautionary Principle.Londres, Cameron May Ltd, 2001, organizado por TimO’Riordan, James Cameron e Andrew Jordan.

________________. “The Status of the Precautionary Principle inInternational Law”. In: VVAA, Interpreting the PrecautionaryPrinciple. Londres, Cameron May Ltd, 1994, organizado porTimothy O’Riordan e James Cameron.

CHARNOVITZ, Steve. “Improving the Agreement on Sanitary andPhytosanitary Standards”. In: VVAA Trade, Environment andthe Millennium, editado por Gary P. Sampson e W. BradneeChambers, New York, United Nations University Press, 1999.

GARNER, Bryan A. Black’s Law Dictionary, 7a ed., St. Paul, WestGroup, 1999.

GOH, Gavin, ZIEGLER, Andreas. “Implications of recent SPS disputesettlement cases”. In: VVAA, The Economics of Quarantine andthe SPS Agreement. Canberra, Centre for International EconomicStudies, Adelaide and AFFA Biosecurity Australia, 2001, organizadopor Kym Anderson, Cheryl McRae e David Wilson.

Page 223: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

BIBLIOGRAFIA

223

GOKLANY, Indur M. “Applying the precautionary principle in abroader context”. In: VVAA, Rethinking Risk and thePrecautionary Principle. Oxford, Butterwoth-Heinemann, 2000,organizado por Julian Morris.

HAIGH, Nigel. “The Introduction of the Precautionary Principle intothe UK”. In: VVAA, Interpreting the Precautionary Principle.Londres, Cameron May Ltd, 1994, organizado por TimothyO’Riordan e James Cameron.

HENSON, Spencer. “Appropriate level of protection: a Europeanperspective”. In: VVAA, The Economics of Quarantine andthe SPS Agreement. Canberra, Centre for InternationalEconomic Studies, Adelaide and AFFA Biosecurity Australia,2001, organizado por Kym Anderson, Cheryl McRae e DavidWilson.

HILL, July. “The Precautionary Principle and Release of GeneticallyModified Organisms (GMOS) to the Enviroment”. In: VVAA,Interpreting the Precautionary Principle. Londres, CameronMay Ltd, 1994, organizado por Timothy O’Riordan e JamesCameron.

HUNT, Jane. “The Social Construction of Precautionary”. In: VVAA,Interpreting the Precautionary Principle. Londres, CameronMay Ltd, 1994, organizado por Timothy O’Riordan e JamesCameron.

JAMES, Sallie. “Food safety policy in the WTO era”. In:VVAA, TheEconomics of Quarantine and the SPS Agreement. Canberra,Centre for International Economic Studies, Adelaide and AFFABiosecurity Australia, 2001, organizado por Kym Anderson,Cheryl McRae e David Wilson.

Page 224: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

224

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

JORDAN, Andrew. “The Precautionary Principle in the EuropeanUnion”. In: VVAA, Reinterpreting the Precautionary Principle.Londres, Cameron May Ltd, 2001, organizado por TimO’Riordan, James Cameron e Andrew Jordan.

JOSLING, Timothy E., TANGERMAN, Stefan, WARLEY, T.K.Agriculture in the GATT. New York, St. Martin’s Press, Inc.,1996.

JOSLING, Timothy. Agricultural Trade Policy: Completing theReform. Washington, DC, Institute for International Economics,abril 1998.

MACGARVIN, Malcolm. “Science, Precaution, Facts and Values”.In: VVAA, Reinterpreting the Precautionary Principle. Londres,Cameron May Ltd, 2001, organizado por Tim O’Riordan, JamesCameron e Andrew Jordan.

MILLER, Henry I., CONKO, Gregory. “Genetically modifiedfear and the international regulation of biotechnology”. In:VVAA, Rethinking Risk and the Precautionary Principle.Oxford, Butterwoth-Heinemann, 2000, organizado porJulian Morris.

MORRIS, Julian. “Defining the precautionary principle”. In: VVAA,Rethinking Risk and the Precautionary Principle. Oxford,Butterwoth-Heinemann, 2000, organizado por Julian Morris.

O’RIORDAN, Tim, CAMERON, James, JORDAN, Andrew. “TheEvolution of the Precautionary Principle”. In: VVAA,Reinterpreting the Precautionary Principle. Londres, CameronMay Ltd, 2001, organizado por Tim O’Riordan, James Camerone Andrew Jordan.

Page 225: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

BIBLIOGRAFIA

225

O’RIORDAN, Tim. “The Precautionary Principle and Civic Science”.In: VVAA, Reinterpreting the Precautionary Principle. Londres,Cameron May Ltd, 2001, organizado por Tim O’Riordan, JamesCameron e Andrew Jordan.

O’RIORDAN, Timothy, CAMERON, James. “The History andContemporary Significance of the Precautionary Principle”. In:VVAA, Interpreting the Precautionary Principle. Londres,Cameron May Ltd, 1994, organizado por Tim O’Riordan, e JamesCameron.

ORDEN, David, NARROD, Claire, GLAUBER, Joseph W. “Leasttrade-restrictive SPS policies: an analytical framework is therebut questions remain”. In: VVAA, The Economics of Quarantineand the SPS Agreement. Canberra, Centre for InternationalEconomic Studies, Adelaide and AFFA Biosecurity Australia,2001, organizado por Kym Anderson, Cheryl McRae e DavidWilson.

PALMETER, David, MAVROIDIS, Petros C. Dispute Settlementin the World Trade Organization – Practice and Procedure,The Hague, Kluwer Law International, 1999.

ROBERTS, Donna. “The Integration of economics into SPS riskmanagement”. In: VVAA, The Economics of Quarantine andthe SPS Agreement. Canberra, Centre for InternationalEconomic Studies, Adelaide and AFFA Biosecurity Australia,2001, organizado por Kym Anderson, Cheryl McRae e DavidWilson.

SILVA, e DE PLÁCIDO. Vocabulário Jurídico, 17a ed., atualizadopor Nagib Slaibi Filho e Geraldo Magela Alves , Rio de Janeiro,2000.

Page 226: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

226

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

STANTON, Gretchen. “The WTO dispute settlement framework andoperation”. In: VVAA, The Economics of Quarantine and theSPS Agreement. Canberra, Centre for International EconomicStudies, Adelaide and AFFA Biosecurity Australia, 2001,organizado por Kym Anderson, Cheryl McRae e David Wilson.

STIRLING, Andy. “The Precautionary Principle in Science andTechnology”. In: VVAA, Reinterpreting the PrecautionaryPrinciple. Londres, Cameron May Ltd, 2001, organizado porTim O’Riordan, James Cameron e Andrew Jordan.

TICKNER, Joel, RAFFENSPERGER, Carolyn. “The American Viewon the Precautionary Principle”. In: VVAA, Reinterpreting thePrecautionary Principle. Londres, Cameron May Ltd, 2001,organizado por Tim O’Riordan, James Cameron e Andrew Jordan.

ARTIGOS ESPECIALIZADOS E DOCUMENTOS TÉCNICOS

“Biosafety Protocol finally agreed in Montreal, but does it provokemore questions than answers fro potential trade disputes?”.In: World Trade Agenda, no. 00/03, Genebra, fevereiro,2000.

“Biotech treaty will not be ‘subordinated’ to WTO: EU ministers”. In:Agence France-Presse, Montreal, 27.01.2000.

“EU Pushing For GMO Agreement on Biosafety Protocol – EU pushesfor environmental agreement on GMOs in Montreal”. In: InsideUS Trade, 17 de Janeiro 2000.

“EU Unveils Guidelines for Use of Precautionary Principle”. In: InsideUS Trade, 11.02.2000.

“GMO Protocol Offers Compromise on Crops, WTO Relationship”.In: Inside US Trade, 4.02. 2000.

“GMOs and development”. In: World Trade Agenda, no. 00/01,Genebra, 31.01.2000.

Page 227: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

BIBLIOGRAFIA

227

“Monographs in Trade Law – Sanitary and Phytosanitary measures inWTO law”, 4a ed., Brussels, O’Connor and Company, 2000.

“UNICE discussion paper on the precautionary principle in internationaltrade”. In: UNICE – The Voice of Business in Europe, Brussels,20.11.2000.

ALBRIGHT, Madeleine K.. “Remarks by Secretary of StateMadeleine K. Albright at the Annual Meeting of the AmericanAssociation for the Advancement of Science”. Circularinformativa da Missão do USTR junto à União Européia,Washington D.C., 21.02.2000.

ALDEN, Edward. “Greens and free-traders join to cheer GM cropdeal”. In: Financial Times, 31.01.2000.

________________. “Hopes for deal to allay GMO fears”. In:Financial Times, 28.01.2000.

COSBEY, Aaron. “The Cartagena Protocol on Biosafety: An analysisof results – An IISD briefing note”. Winnipeg, International Institutefor Sustainable Development, 2000.

EGGERS, Barbara e MACKENZIE, Ruth. “The Cartagena Protocolon Biosafety”. In: Journal of International Economic Law(2000), Oxford University Press, Volume 3, número 3, Setembro2000, pp. 525-543.

FALKNER, Robert. “Regulating biotech trade: the Cartagena protocolon Biosafety”. In: International Affairs, vol. 76, número 2,2.04.2000, pp. 299-313.

LAUDON, Anne e NOIVILLE, Christine. Le Principe de Precaution,Le Droit de L’Environnement et L’OMC. Paris, 1998.

LIN, Lim. “Environment: Biosafety talks end on mixed note”. In: South-North Development Monitor (SUNS), Genebra, fevereiro 2000,editado por Chakravarthi Raghavam.

MCNELIS, Natalie. “EU Communication on the PrecautionaryPrinciple”. In: Journal of International Economic Law (2000),Oxford University Press, Volume 4, número 1, março 2001, pp.545-551.

Page 228: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

228

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

MILLER, Henry I., CONKO, Gregory. “ ‘Precautionary Principle’Stalls Advances in Food Technology”. In: Washington LegalFoundation, vol. 15, no. 32, Washington DC, 26.05.2000.

MITCHENER, Brandon. “Biosafety Agreement Raises Question”. In:Wall Street Journal, 31.01.2000.

PAUWELYN, Joost. “The WTO agreement on sanitary andphytosanitary (SPS) measures as applied in the first three SPSdisputes: EC – Hormones, Australia – Salmon and Japan –Varietals”. In: Journal of International Economic Law, volume2, no. 4, dezembro 1999, pp. 641-664.

POLLACK, Andrew. “130 Countries Sign Food Biosafety Pact”. In:New York Times Service, 31.01.2000.

QUINTILLÁN, Sara. “Information in the European and WTO Context:Hormone-treated Beef and Genetically Modified Organisms”. In:Journal of World Trade, volume 33, número 6, dezembro 1999,pp. 147-198.

SANDALOW, David B. “State’s Sandalow on Biosafety Protocol –The Biosafety Protocol: What it does and does not do”. In: InsideUS Trade, 11.02.2000.

SARNO, Nicolo. “Environment: Biosafety negotiations underthreat”. In: South-North Development Monitor (SUNS), no.4952, Genebra, 26.01.2000, editado por ChakravarthiRaghavam.

SMITH, Frances B. “The Biosafety Protocol: the real losers aredeveloping countries”. In: Briefly - Perspectives on Legislation,Regulation, and Litigation, volume 4, numero 3, WashingtonDC, National Legal Center for the Public Interest, março 2000,editado por James V. DeLong.

SMITH, Michael. “‘Precautionary principle’ is not protectionist,Brussels insists”. In: Financial Times, 3.02.2000.

STEWART, Terence P e JOHANSON, David S. “A nexus of tradeand the Environment: The relationship between the Cartagenaprotocol on biosafety and the SPS agreement of the World Trade

Page 229: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

BIBLIOGRAFIA

229

Organization”. In: Agricultural Sanitary and Phytosanitary andStandards Report, editado por Terence P. Stewart, WashingtonDC, julho 2000.

STILLWELL, Mathew. “The implications of the precautionary principlefor trade and sustainable development”. Center for InternationalEnvironmental Law (CIEL), Genebra, 06 de Novembro 1999.

THORN, Craig e CARLSON, Marinn. “The Agreement on theapplication of sanitary and phytosanitary measures and theagreement on technical barriers to trade”. In: American BarAssociation, Symposium: The First Five Years of the WTO,Washington DC, Janeiro 2000.

WALKER, Vern e HICKEY, James E. Jr. “Refining the PrecautionaryPrinciple in International Environmental Law”. In: VirginiaEnvironmental Law Journal, volume 14, número 3, primavera1995, pp. 423 – 454.

WALKER, Vern. “Keeping the WTO from becoming the ‘World Trans-science Organization’: Scientific Uncertainty, Science Policy, andFact-finding in the Growth Hormones Dispute”. In: CornellInternational Law Journal, Volume 31, número 2, 1998, pp.251-320.

ZARRILLI, Simonetta. “International trade in genetically modifiedorganisms and multilateral negotiations – A new dilemma fordeveloping countries”. In: VVAA, United Nations Conferenceon Trade and Development (UNCTAD), Genebra, 20.10.2000.

________________. “WTO Agreement on Sanitary and PhytosanitaryMeasures: Issues for Developing Countries”. In: Trade-RelatedAgenda, Development and Equity (T.R.A.D.E.) - WorkingPapers 3. South Centre, Genebra, julho 1999.

ARTIGOS NA INTERNET

“Address by David Byrne on the Precautionary Principle in the domainof human health and food safety”. In: European Union Health and

Page 230: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

230

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Consumer Protection <www.europa.eu.int/comm/dgs/health_consumer/library/press/press38_en.html>. Paris, EuropeanUnion Health and Consumer Protection , 9.11.2000.

“Biosafety Protocol”. In: A Brief Introduction to the UN Conventionon Biological Diversity <www.iisd.ca/linkages/biodiv/cbdintro.html>. fevereiro, 2000.

“Comments from the European Commission Services to the CodexSecretariat”. In: European Union Health and Consumer Protection<www.europa.eu.int/comm/food/fs/ifsi/eupositions/ccgp01_en.html>. European Union Health and ConsumerProtection , 28.09.2000.

“Commision adopts Communication on Precautionary Principle”. In:European Union Health and Consumer Protection<www.europa.eu.int/comm/dgs/health_consumer/library/press/press38_en.html>. Brussels, European Union Health andConsumer Protection , 2.02.2000.

“The Precautionary Principle – precaution on principle…”. In: EuropeanUnion Health and Consumer Protection <www.europa.eu.int/comm/dgs/health_consumer/library/pub/cv/cv001/cv001-07_en.html>.European Union Health and Consumer Protection , 28.09.2000.

“Transcript: U.S. Officials Brief on Biosafety Protocol – Cite goodagreement that protects the environment”. In: U.S. Department ofState International Information Programs <usinfo.state.gov/topical/global/biotech/00021403.htm>. Bruxelas, 8.02.2000.

BARRETO DE CASTRO, Luiz Antonio. “Brazil’s approach tomonitoring transgenic crops”. In: Harvard View Point, STI<www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments70.htm>.Cambridge, Science, Technology and Innovation Program,fevereiro 2001.

BEREANO, Philip L. “Politics, sound science and the precautionaryprinciple”. In: Harvard View Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments92.htm>. Cambridge, Science,Technology and Innovation Program, fevereiro 2001.

Page 231: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

BIBLIOGRAFIA

231

COMSTOCK, Gary. “Are the policy implications of the precautionaryprinciple coherent?”. In: Harvard View Point, STI<www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments72.htm>.Cambridge, Science, Technology and Innovation Program,fevereiro 2001.

DE GREEF, Willy. “Agricultural Biotechnology and moral imperatives”.In: Harvard View Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments114.htm>. Cambridge, Science, Technologyand Innovation Program, março 2001.

DRATWA, Jim. “Taking risks with the precautionary principle”. In:Harvard View Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments94.htm>. Cambridge, Science, Technologyand Innovation Program, fevereiro 2001.

HEGWOOD, David. “Precaution in the international legal framework”.In: Harvard View Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments106.htm>. Cambridge, Science, Technologyand Innovation Program, março 2001.

MANNING, Robert L. “Risk assessment and the precautionaryprinciple”. In: Harvard View Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments110.htm>. Cambridge, Science,Technology and Innovation Program, fevereiro 2001.

MARCHANT, Gary E. “Two problems with the precautionaryprinciple”. In: Harvard View Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments90.htm>. Cambridge, Science,Technology and Innovation Program, fevereiro 2001.

MITRA, Barun. “Endangering the principles of free society”. In: HarvardView Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments102.htm>. Cambridge, Science, Technology andInnovation Program, fevereiro 2001.

MORRIS, Julian. “Defining the precautionary principle”. In: HarvardView Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments79.htm>. Cambridge, Science, Technology andInnovation Program, fevereiro 2001.

Page 232: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

232

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

MUGABE, John. “Precautionary policies and biotechnology in Africa(1)”. In: Harvard View Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments99.htm>. Cambridge, Science,Technology and Innovation Program, fevereiro 2001.

NEELY, Mildred Sola. “Biosafety Protocol Allows Flow ofBiotechnology Benefits – Under Secretary Loy on Protocol,”. In:U.S. Department of State International Information Programs<usinfo.state.gov/topical/global/biotech/00041205.htm>.Washington, 12.04.2000.

ROGATINA, Anna. “Agricultural education and the precautionaryprinciple”. In: Harvard View Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments88.htm>. Cambridge, Science,Technology and Innovation Program, fevereiro 2001.

SANDALOW, David B. “Press Briefing: David B. Sandalow,Assistant Secretary of State for Oceans, Environment andScience, and head of the United States Delegation at theBiosafety Protocol Negotiations”. In: U.S. Department of StateInternational Information Programs <usinfo.state.gov/topical/global/biotech/00012503.htm>. Montreal, 25.01.2000.

________________. “The Biosafety Protocol: What It Does andDoes Not Do”. In: U.S. Department of State InternationalInformation Programs <usinfo.state.gov/topical/global/biotech/00021101.htm. Washington D.C., 2000.

SAUNDERS, Peter T. “The precautionary principle is coherent”.In: Harvard View Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments109.htm>. Cambridge, Science,Technology and Innovation Program, fevereiro 2001.

SMITH, Frances S. “Only one side of the risk equation”. In: HarvardView Point, STI <www.cid.harvard.edu/cidbiotech/comments/comments100.htm>. Cambridge, Science, Technology andInnovation Program, fevereiro 2001.

STIRLING, Andy. “Science or precaution in environmentalprotection?”. In: Harvard View Point, STI

Page 233: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

BIBLIOGRAFIA

233

< w w w. c i d . h a r v a r d . e d u / c i d b i o t e c h / c o m m e n t s /comments89.htm>. Cambridge, Science, Technology andInnovation Program, fevereiro.

Page 234: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 235: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

Page 236: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 237: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

237

AGREEMENT ON THE APPLICATION OFSANITARY AND PHYTOSANITARY MEASURES

Members,

Reaffirming that no Member should be prevented fromadopting or enforcing measures necessary to protect human, animalor plant life or health, subject to the requirement that these measuresare not applied in a manner which would constitute a means of arbitraryor unjustifiable discrimination between Members where the sameconditions prevail or a disguised restriction on international trade;

Desiring to improve the human health, animal health andphytosanitary situation in all Members;

Noting that sanitary and phytosanitary measures are oftenapplied on the basis of bilateral agreements or protocols;

Desiring the establishment of a multilateral framework of rulesand disciplines to guide the development, adoption and enforcementof sanitary and phytosanitary measures in order to minimize theirnegative effects on trade;

Recognizing the important contribution that internationalstandards, guidelines and recommendations can make in this regard;

Desiring to further the use of harmonized sanitary andphytosanitary measures between Members, on the basis of

ANEXO 1

Page 238: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

238

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

international standards, guidelines and recommendations developedby the relevant international organizations, including the CodexAlimentarius Commission, the International Office of Epizootics,and the relevant international and regional organizations operatingwithin the framework of the International Plant ProtectionConvention, without requiring Members to change theirappropriate level of protection of human, animal or plant life orhealth;

Recognizing that developing country Members mayencounter special difficulties in complying with the sanitary orphytosanitary measures of importing Members, and as a consequencein access to markets, and also in the formulation and application ofsanitary or phytosanitary measures in their own territories, anddesiring to assist them in their endeavours in this regard;

Desiring therefore to elaborate rules for the application ofthe provisions of GATT 1994 which relate to the use of sanitary orphytosanitary measures, in particular the provisions ofArticle XX(b)1;

Hereby agree as follows:

Article 1

General Provisions

1. This Agreement applies to all sanitary and phytosanitarymeasures which may, directly or indirectly, affect international trade.Such measures shall be developed and applied in accordance with theprovisions of this Agreement.

2. For the purposes of this Agreement, the definitions providedin Annex A shall apply.

1 In this Agreement, reference to Article XX(b) includes also the chapeau of that Article.

Page 239: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

239

3. The annexes are an integral part of this Agreement.

4. Nothing in this Agreement shall affect the rights of Membersunder the Agreement on Technical Barriers to Trade with respect tomeasures not within the scope of this Agreement.

Article 2

Basic Rights and Obligations

1. Members have the right to take sanitary andphytosanitary measures necessary for the protection of human,animal or plant life or health, provided that such measures are notinconsistent with the provisions of this Agreement.

2. Members shall ensure that any sanitary or phytosanitarymeasure is applied only to the extent necessary to protect human,animal or plant life or health, is based on scientific principles andis not maintained without sufficient scientific evidence, except asprovided for in paragraph 7 of Article 5.

3. Members shall ensure that their sanitary andphytosanitary measures do not arbitrarily or unjustifiablydiscriminate between Members where identical or similarconditions prevail, including between their own territory and thatof other Members. Sanitary and phytosanitary measures shall notbe applied in a manner which would constitute a disguisedrestriction on international trade.

4. Sanitary or phytosanitary measures which conform tothe relevant provisions of this Agreement shall be presumed to bein accordance with the obligations of the Members under theprovisions of GATT 1994 which relate to the use of sanitary or

Page 240: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

240

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

phytosanitary measures, in particular the provisions ofArticle XX(b).

Article 3

Harmonization

1. To harmonize sanitary and phytosanitary measures on aswide a basis as possible, Members shall base their sanitary orphytosanitary measures on international standards, guidelines orrecommendations, where they exist, except as otherwise provided forin this Agreement, and in particular in paragraph 3.

2. Sanitary or phytosanitary measures which conform tointernational standards, guidelines or recommendations shall be deemedto be necessary to protect human, animal or plant life or health, andpresumed to be consistent with the relevant provisions of this Agreementand of GATT 1994.

3. Members may introduce or maintain sanitary orphytosanitary measures which result in a higher level of sanitary orphytosanitary protection than would be achieved by measures basedon the relevant international standards, guidelines orrecommendations, if there is a scientific justification, or as aconsequence of the level of sanitary or phytosanitary protection aMember determines to be appropriate in accordance with therelevant provisions of paragraphs 1 through 8 of Article 5.2

Notwithstanding the above, all measures which result in a level ofsanitary or phytosanitary protection different from that which would

2 For the purposes of paragraph 3 of Article 3, there is a scientific justification if, on thebasis of an examination and evaluation of available scientific information in conformitywith the relevant provisions of this Agreement, a Member determines that the relevantinternational standards, guidelines or recommendations are not sufficient to achieve itsappropriate level of sanitary or phytosanitary protection.

Page 241: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

241

be achieved by measures based on international standards, guidelinesor recommendations shall not be inconsistent with any other provisionof this Agreement.

4. Members shall play a full part, within the limits of theirresources, in the relevant international organizations and their subsidiarybodies, in particular the Codex Alimentarius Commission, theInternational Office of Epizootics, and the international and regionalorganizations operating within the framework of the International PlantProtection Convention, to promote within these organizations thedevelopment and periodic review of standards, guidelines andrecommendations with respect to all aspects of sanitary andphytosanitary measures.

5. The Committee on Sanitary and Phytosanitary Measuresprovided for in paragraphs 1 and 4 of Article 12 (referred to in thisAgreement as the “Committee”) shall develop a procedure to monitorthe process of international harmonization and coordinate efforts inthis regard with the relevant international organizations.

Article 4

Equivalence

1. Members shall accept the sanitary or phytosanitarymeasures of other Members as equivalent, even if these measuresdiffer from their own or from those used by other Members trading inthe same product, if the exporting Member objectively demonstratesto the importing Member that its measures achieve the importingMember’s appropriate level of sanitary or phytosanitary protection.For this purpose, reasonable access shall be given, upon request, tothe importing Member for inspection, testing and other relevantprocedures.

Page 242: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

242

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

2. Members shall, upon request, enter into consultations withthe aim of achieving bilateral and multilateral agreements on recognitionof the equivalence of specified sanitary or phytosanitary measures.

Article 5

Assessment of Risk and Determination of the AppropriateLevel of Sanitary or Phytosanitary Protection

1. Members shall ensure that their sanitary or phytosanitarymeasures are based on an assessment, as appropriate to thecircumstances, of the risks to human, animal or plant life or health,taking into account risk assessment techniques developed by the relevantinternational organizations.

2. In the assessment of risks, Members shall take into accountavailable scientific evidence; relevant processes and production methods;relevant inspection, sampling and testing methods; prevalence of specificdiseases or pests; existence of pest- or disease-free areas; relevantecological and environmental conditions; and quarantine or other treatment.

3. In assessing the risk to animal or plant life or health anddetermining the measure to be applied for achieving the appropriatelevel of sanitary or phytosanitary protection from such risk, Membersshall take into account as relevant economic factors: the potential damagein terms of loss of production or sales in the event of the entry,establishment or spread of a pest or disease; the costs of control oreradication in the territory of the importing Member; and the relativecost-effectiveness of alternative approaches to limiting risks.

4. Members should, when determining the appropriate levelof sanitary or phytosanitary protection, take into account the objectiveof minimizing negative trade effects.

Page 243: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

243

5. With the objective of achieving consistency in the applicationof the concept of appropriate level of sanitary or phytosanitaryprotection against risks to human life or health, or to animal and plantlife or health, each Member shall avoid arbitrary or unjustifiabledistinctions in the levels it considers to be appropriate in differentsituations, if such distinctions result in discrimination or a disguisedrestriction on international trade. Members shall cooperate in theCommittee, in accordance with paragraphs 1, 2 and 3 of Article 12, todevelop guidelines to further the practical implementation of thisprovision. In developing the guidelines, the Committee shall take intoaccount all relevant factors, including the exceptional character of humanhealth risks to which people voluntarily expose themselves.

6. Without prejudice to paragraph 2 of Article 3, whenestablishing or maintaining sanitary or phytosanitary measures to achievethe appropriate level of sanitary or phytosanitary protection, Membersshall ensure that such measures are not more trade-restrictive thanrequired to achieve their appropriate level of sanitary or phytosanitaryprotection, taking into account technical and economic feasibility.3

7. In cases where relevant scientific evidence is insufficient, aMember may provisionally adopt sanitary or phytosanitary measureson the basis of available pertinent information, including that from therelevant international organizations as well as from sanitary orphytosanitary measures applied by other Members. In suchcircumstances, Members shall seek to obtain the additional informationnecessary for a more objective assessment of risk and review the sanitaryor phytosanitary measure accordingly within a reasonable period oftime.

3 For purposes of paragraph 6 of Article 5, a measure is not more trade-restrictive thanrequired unless there is another measure, reasonably available taking into account technicaland economic feasibility, that achieves the appropriate level of sanitary or phytosanitaryprotection and is significantly less restrictive to trade.

Page 244: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

244

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

8. When a Member has reason to believe that a specificsanitary or phytosanitary measure introduced or maintained by anotherMember is constraining, or has the potential to constrain, its exportsand the measure is not based on the relevant international standards,guidelines or recommendations, or such standards, guidelines orrecommendations do not exist, an explanation of the reasons for suchsanitary or phytosanitary measure may be requested and shall beprovided by the Member maintaining the measure.

Article 6

Adaptation to Regional Conditions, Including Pest- orDisease-Free Areas and Areas of Low Pest or Disease

Prevalence

1. Members shall ensure that their sanitary or phytosanitarymeasures are adapted to the sanitary or phytosanitary characteristicsof the area - whether all of a country, part of a country, or all or parts ofseveral countries - from which the product originated and to which theproduct is destined. In assessing the sanitary or phytosanitarycharacteristics of a region, Members shall take into account, inter alia,the level of prevalence of specific diseases or pests, the existence oferadication or control programmes, and appropriate criteria or guidelineswhich may be developed by the relevant international organizations.

2. Members shall, in particular, recognize the concepts ofpest- or disease-free areas and areas of low pest or disease prevalence.Determination of such areas shall be based on factors such as geography,ecosystems, epidemiological surveillance, and the effectiveness ofsanitary or phytosanitary controls.

3. Exporting Members claiming that areas within theirterritories are pest- or disease-free areas or areas of low pest or disease

Page 245: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

245

prevalence shall provide the necessary evidence thereof in order toobjectively demonstrate to the importing Member that such areas are,and are likely to remain, pest- or disease-free areas or areas of lowpest or disease prevalence, respectively. For this purpose, reasonableaccess shall be given, upon request, to the importing Member forinspection, testing and other relevant procedures.

Article 7

Transparency

Members shall notify changes in their sanitary orphytosanitary measures and shall provide information on their sanitaryor phytosanitary measures in accordance with the provisions of Annex B.

Article 8

Control, Inspection and Approval Procedures

Members shall observe the provisions of Annex C in theoperation of control, inspection and approval procedures, includingnational systems for approving the use of additives or for establishingtolerances for contaminants in foods, beverages or feedstuffs, andotherwise ensure that their procedures are not inconsistent with theprovisions of this Agreement.

Article 9

Technical Assistance

1. Members agree to facilitate the provision of technicalassistance to other Members, especially developing country Members,either bilaterally or through the appropriate international organizations.

Page 246: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

246

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Such assistance may be, inter alia, in the areas of processing technologies,research and infrastructure, including in the establishment of nationalregulatory bodies, and may take the form of advice, credits, donationsand grants, including for the purpose of seeking technical expertise, trainingand equipment to allow such countries to adjust to, and comply with,sanitary or phytosanitary measures necessary to achieve the appropriatelevel of sanitary or phytosanitary protection in their export markets.

2. Where substantial investments are required in order for anexporting developing country Member to fulfil the sanitary or phytosanitaryrequirements of an importing Member, the latter shall consider providing suchtechnical assistance as will permit the developing country Member to maintainand expand its market access opportunities for the product involved.

Article 10

Special and Differential Treatment

1. In the preparation and application of sanitary or phytosanitarymeasures, Members shall take account of the special needs of developingcountry Members, and in particular of the least-developed country Members.

2. Where the appropriate level of sanitary or phytosanitaryprotection allows scope for the phased introduction of new sanitary orphytosanitary measures, longer time-frames for compliance should beaccorded on products of interest to developing country Members soas to maintain opportunities for their exports.

3. With a view to ensuring that developing country Membersare able to comply with the provisions of this Agreement, the Committeeis enabled to grant to such countries, upon request, specified, time-limitedexceptions in whole or in part from obligations under this Agreement,taking into account their financial, trade and development needs.

Page 247: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

247

4. Members should encourage and facilitate the active participationof developing country Members in the relevant international organizations.

Article 11

Consultations and Dispute Settlement

1. The provisions of Articles XXII and XXIII of GATT 1994as elaborated and applied by the Dispute Settlement Understandingshall apply to consultations and the settlement of disputes under thisAgreement, except as otherwise specifically provided herein.

2. In a dispute under this Agreement involving scientific ortechnical issues, a panel should seek advice from experts chosen bythe panel in consultation with the parties to the dispute. To this end, thepanel may, when it deems it appropriate, establish an advisory technicalexperts group, or consult the relevant international organizations, at therequest of either party to the dispute or on its own initiative.

3. Nothing in this Agreement shall impair the rights of Membersunder other international agreements, including the right to resort to thegood offices or dispute settlement mechanisms of other internationalorganizations or established under any international agreement.

Article 12

Administration

1. A Committee on Sanitary and Phytosanitary Measures ishereby established to provide a regular forum for consultations. It shallcarry out the functions necessary to implement the provisions of thisAgreement and the furtherance of its objectives, in particular with respectto harmonization. The Committee shall reach its decisions by consensus.

Page 248: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

248

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

2. The Committee shall encourage and facilitate ad hocconsultations or negotiations among Members on specific sanitary orphytosanitary issues. The Committee shall encourage the use ofinternational standards, guidelines or recommendations by all Membersand, in this regard, shall sponsor technical consultation and study withthe objective of increasing coordination and integration betweeninternational and national systems and approaches for approving theuse of food additives or for establishing tolerances for contaminants infoods, beverages or feedstuffs.

3. The Committee shall maintain close contact with the relevantinternational organizations in the field of sanitary and phytosanitary protection,especially with the Codex Alimentarius Commission, the International Officeof Epizootics, and the Secretariat of the International Plant ProtectionConvention, with the objective of securing the best available scientific andtechnical advice for the administration of this Agreement and in order toensure that unnecessary duplication of effort is avoided.

4. The Committee shall develop a procedure to monitor theprocess of international harmonization and the use of internationalstandards, guidelines or recommendations. For this purpose, theCommittee should, in conjunction with the relevant internationalorganizations, establish a list of international standards, guidelines orrecommendations relating to sanitary or phytosanitary measures whichthe Committee determines to have a major trade impact. The list shouldinclude an indication by Members of those international standards,guidelines or recommendations which they apply as conditions for importor on the basis of which imported products conforming to thesestandards can enjoy access to their markets. For those cases in whicha Member does not apply an international standard, guideline orrecommendation as a condition for import, the Member should providean indication of the reason therefor, and, in particular, whether itconsiders that the standard is not stringent enough to provide the

Page 249: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

249

appropriate level of sanitary or phytosanitary protection. If a Memberrevises its position, following its indication of the use of a standard,guideline or recommendation as a condition for import, it should providean explanation for its change and so inform the Secretariat as well asthe relevant international organizations, unless such notification andexplanation is given according to the procedures of Annex B.

5. In order to avoid unnecessary duplication, the Committeemay decide, as appropriate, to use the information generated by theprocedures, particularly for notification, which are in operation in therelevant international organizations.

6. The Committee may, on the basis of an initiative from oneof the Members, through appropriate channels invite the relevantinternational organizations or their subsidiary bodies to examine specificmatters with respect to a particular standard, guideline orrecommendation, including the basis of explanations for non-use givenaccording to paragraph 4.

7. The Committee shall review the operation andimplementation of this Agreement three years after the date of entryinto force of the WTO Agreement, and thereafter as the need arises.Where appropriate, the Committee may submit to the Council for Tradein Goods proposals to amend the text of this Agreement having regard,inter alia, to the experience gained in its implementation.

Article 13

Implementation

Members are fully responsible under this Agreement for theobservance of all obligations set forth herein. Members shall formulateand implement positive measures and mechanisms in support of the

Page 250: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

250

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

observance of the provisions of this Agreement by other than centralgovernment bodies. Members shall take such reasonable measures asmay be available to them to ensure that non-governmental entities withintheir territories, as well as regional bodies in which relevant entitieswithin their territories are members, comply with the relevant provisionsof this Agreement. In addition, Members shall not take measures whichhave the effect of, directly or indirectly, requiring or encouraging suchregional or non-governmental entities, or local governmental bodies, toact in a manner inconsistent with the provisions of this Agreement.Members shall ensure that they rely on the services of non-governmentalentities for implementing sanitary or phytosanitary measures only if theseentities comply with the provisions of this Agreement.

Article 14

Final Provisions

The least-developed country Members may delayapplication of the provisions of this Agreement for a period of five yearsfollowing the date of entry into force of the WTO Agreement with respectto their sanitary or phytosanitary measures affecting importation orimported products. Other developing country Members may delayapplication of the provisions of this Agreement, other than paragraph 8of Article 5 and Article 7, for two years following the date of entry intoforce of the WTO Agreement with respect to their existing sanitary orphytosanitary measures affecting importation or imported products,where such application is prevented by a lack of technical expertise,technical infrastructure or resources.

Page 251: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

251

ANNEX A

DEFINITIONS4

1. Sanitary or phytosanitary measure - Any measureapplied:

(a) to protect animal or plant life or health within the territory ofthe Member from risks arising from the entry, establishmentor spread of pests, diseases, disease-carrying organisms ordisease-causing organisms;

(b)to protect human or animal life or health within the territoryof the Member from risks arising from additives,contaminants, toxins or disease-causing organisms in foods,beverages or feedstuffs;

(c) to protect human life or health within the territory of theMember from risks arising from diseases carried by animals,plants or products thereof, or from the entry, establishmentor spread of pests; or

(d)to prevent or limit other damage within the territory of theMember from the entry, establishment or spread of pests.

Sanitary or phytosanitary measures include all relevant laws,decrees, regulations, requirements and procedures including, inter alia,end product criteria; processes and production methods; testing,

4 For the purpose of these definitions, “animal” includes fish and wild fauna; “plant”includes forests and wild flora; “pests” include weeds; and “contaminants” includepesticide and veterinary drug residues and extraneous matter.

Page 252: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

252

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

inspection, certification and approval procedures; quarantine treatmentsincluding relevant requirements associated with the transport of animalsor plants, or with the materials necessary for their survival duringtransport; provisions on relevant statistical methods, samplingprocedures and methods of risk assessment; and packaging andlabelling requirements directly related to food safety.

2. Harmonization - The establishment, recognition andapplication of common sanitary and phytosanitary measures by differentMembers.

3. International standards, guidelines and recommendations

(a) for food safety, the standards, guidelines and recommendationsestablished by the Codex Alimentarius Commission relatingto food additives, veterinary drug and pesticide residues,contaminants, methods of analysis and sampling, and codesand guidelines of hygienic practice;

(b)for animal health and zoonoses, the standards, guidelines andrecommendations developed under the auspices of theInternational Office of Epizootics;

(c) for plant health, the international standards, guidelines andrecommendations developed under the auspices of the Secretariatof the International Plant Protection Convention in cooperationwith regional organizations operating within the framework of theInternational Plant Protection Convention; and

(d)for matters not covered by the above organizations, appropriatestandards, guidelines and recommendations promulgated byother relevant international organizations open for membershipto all Members, as identified by the Committee.

Page 253: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

253

4. Risk assessment - The evaluation of the likelihood of entry,establishment or spread of a pest or disease within the territory of an importingMember according to the sanitary or phytosanitary measures which mightbe applied, and of the associated potential biological and economicconsequences; or the evaluation of the potential for adverse effects onhuman or animal health arising from the presence of additives, contaminants,toxins or disease-causing organisms in food, beverages or feedstuffs.

5. Appropriate level of sanitary or phytosanitaryprotection - The level of protection deemed appropriate by the Memberestablishing a sanitary or phytosanitary measure to protect human, animalor plant life or health within its territory.

NOTE: Many Members otherwise refer to this concept as the“acceptable level of risk”.

6. Pest- or disease-free area - An area, whether all of a country,part of a country, or all or parts of several countries, as identified by thecompetent authorities, in which a specific pest or disease does not occur.

NOTE: A pest- or disease-free area may surround, besurrounded by, or be adjacent to an area - whether within part of acountry or in a geographic region which includes parts of or all of severalcountries -in which a specific pest or disease is known to occur but issubject to regional control measures such as the establishment ofprotection, surveillance and buffer zones which will confine or eradicatethe pest or disease in question.

7. Area of low pest or disease prevalence - An area,whether all of a country, part of a country, or all or parts of severalcountries, as identified by the competent authorities, in which a specificpest or disease occurs at low levels and which is subject to effectivesurveillance, control or eradication measures.

Page 254: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

254

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

ANNEX B

TRANSPARENCY OF SANITARY ANDPHYTOSANITARY REGULATIONS

Publication of regulations

1. Members shall ensure that all sanitary and phytosanitaryregulations5 which have been adopted are published promptly in such amanner as to enable interested Members to become acquainted with them.

2. Except in urgent circumstances, Members shall allow areasonable interval between the publication of a sanitary or phytosanitaryregulation and its entry into force in order to allow time for producers inexporting Members, and particularly in developing country Members, toadapt their products and methods of production to the requirements ofthe importing Member.

Enquiry points

3. Each Member shall ensure that one enquiry point existswhich is responsible for the provision of answers to all reasonablequestions from interested Members as well as for the provision ofrelevant documents regarding:

(a)any sanitary or phytosanitary regulations adopted orproposed within its territory;

(b)any control and inspection procedures, production andquarantine treatment, pesticide tolerance and food additiveapproval procedures, which are operated within its territory;

5 Sanitary and phytosanitary measures such as laws, decrees or ordinances which areapplicable generally.

Page 255: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

255

(c) risk assessment procedures, factors taken into consideration,as well as the determination of the appropriate level ofsanitary or phytosanitary protection;

(d) the membership and participation of the Member, orof relevant bodies within its territory, in international andregional sanitary and phytosanitary organizations andsystems, as well as in bilateral and multilateralagreements and arrangements within the scope of thisAgreement, and the texts of such agreements andarrangements.

4. Members shall ensure that where copies of documents arerequested by interested Members, they are supplied at the same price(if any), apart from the cost of delivery, as to the nationals6 of theMember concerned.

Notification procedures

5. Whenever an international standard, guideline orrecommendation does not exist or the content of a proposed sanitaryor phytosanitary regulation is not substantially the same as the contentof an international standard, guideline or recommendation, and if theregulation may have a significant effect on trade of other Members,Members shall:

(a)publish a notice at an early stage in such a manner as toenable interested Members to become acquainted with theproposal to introduce a particular regulation;

6 When “nationals” are referred to in this Agreement, the term shall be deemed, in the caseof a separate customs territory Member of the WTO, to mean persons, natural or legal,who are domiciled or who have a real and effective industrial or commercial establishmentin that customs territory.

Page 256: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

256

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

(b)notify other Members, through the Secretariat, of theproducts to be covered by the regulation together with abrief indication of the objective and rationale of the proposedregulation. Such notifications shall take place at an earlystage, when amendments can still be introduced andcomments taken into account;

(c)provide upon request to other Members copies of theproposed regulation and, whenever possible, identify the partswhich in substance deviate from international standards,guidelines or recommendations;

(d)without discrimination, allow reasonable time for otherMembers to make comments in writing, discuss thesecomments upon request, and take the comments and theresults of the discussions into account.

6. However, where urgent problems of health protection ariseor threaten to arise for a Member, that Member may omit such of thesteps enumerated in paragraph 5 of this Annex as it finds necessary,provided that the Member:

(a) immediately notifies other Members, through the Secretariat,of the particular regulation and the products covered, with abrief indication of the objective and the rationale of theregulation, including the nature of the urgent problem(s);

(b)provides, upon request, copies of the regulation to otherMembers;

(c)allows other Members to make comments in writing,discusses these comments upon request, and takes thecomments and the results of the discussions into account.

Page 257: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

257

7. Notifications to the Secretariat shall be in English, Frenchor Spanish.

8. Developed country Members shall, if requested by otherMembers, provide copies of the documents or, in case of voluminousdocuments, summaries of the documents covered by a specificnotification in English, French or Spanish.

9. The Secretariat shall promptly circulate copies of thenotification to all Members and interested international organizationsand draw the attention of developing country Members to anynotifications relating to products of particular interest to them.

10. Members shall designate a single central governmentauthority as responsible for the implementation, on the national level, ofthe provisions concerning notification procedures according toparagraphs 5, 6, 7 and 8 of this Annex.

General reservations

11. Nothing in this Agreement shall be construed as requiring:

(a) the provision of particulars or copies of drafts or thepublication of texts other than in the language of the Memberexcept as stated in paragraph 8 of this Annex; or

(b)Members to disclose confidential information which wouldimpede enforcement of sanitary or phytosanitary legislationor which would prejudice the legitimate commercial interestsof particular enterprises.

Page 258: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

258

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

ANNEX C

CONTROL, INSPECTION AND APPROVAL PROCEDURES7

1. Members shall ensure, with respect to any procedure tocheck and ensure the fulfilment of sanitary or phytosanitary measures,that:

(a) such procedures are undertaken and completed withoutundue delay and in no less favourable manner for importedproducts than for like domestic products;

(b)the standard processing period of each procedure is publishedor that the anticipated processing period is communicatedto the applicant upon request; when receiving an application,the competent body promptly examines the completenessof the documentation and informs the applicant in a preciseand complete manner of all deficiencies; the competent bodytransmits as soon as possible the results of the procedure ina precise and complete manner to the applicant so thatcorrective action may be taken if necessary; even when theapplication has deficiencies, the competent body proceedsas far as practicable with the procedure if the applicant sorequests; and that upon request, the applicant is informedof the stage of the procedure, with any delay being explained;

(c) information requirements are limited to what is necessaryfor appropriate control, inspection and approval procedures,including for approval of the use of additives or for the

7 Control, inspection and approval procedures include, inter alia, procedures for sampling,testing and certification.

Page 259: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

259

establishment of tolerances for contaminants in food,beverages or feedstuffs;

(d)the confidentiality of information about imported productsarising from or supplied in connection with control, inspectionand approval is respected in a way no less favourable thanfor domestic products and in such a manner that legitimatecommercial interests are protected;

(e)any requirements for control, inspection and approval ofindividual specimens of a product are limited to what isreasonable and necessary;

(f) any fees imposed for the procedures on imported productsare equitable in relation to any fees charged on like domesticproducts or products originating in any other Member andshould be no higher than the actual cost of the service;

(g) the same criteria should be used in the siting of facilities used inthe procedures and the selection of samples of imported productsas for domestic products so as to minimize the inconvenience toapplicants, importers, exporters or their agents;

(h)whenever specifications of a product are changed subsequentto its control and inspection in light of the applicableregulations, the procedure for the modified product is limitedto what is necessary to determine whether adequateconfidence exists that the product still meets the regulationsconcerned; and

(i) a procedure exists to review complaints concerning theoperation of such procedures and to take corrective actionwhen a complaint is justified.

Page 260: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

260

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Where an importing Member operates a system for the approvalof the use of food additives or for the establishment of tolerances forcontaminants in food, beverages or feedstuffs which prohibits or restrictsaccess to its domestic markets for products based on the absence ofan approval, the importing Member shall consider the use of a relevantinternational standard as the basis for access until a final determinationis made.

2. Where a sanitary or phytosanitary measure specifies controlat the level of production, the Member in whose territory the productiontakes place shall provide the necessary assistance to facilitate suchcontrol and the work of the controlling authorities.

3. Nothing in this Agreement shall prevent Members fromcarrying out reasonable inspection within their own territories.

Page 261: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

CARTAGENA PROTOCOL ON BIOSAFETY TO THECONVENTION ON BIOLOGICAL DIVERSITY

- The Parties to this Protocol,

Being Parties to the Convention on Biological Diversity,hereinafter referred to as “the Convention”,

Recalling Article 19, paragraphs 3 and 4, and Articles 8 (g) and17 of the Convention,

Recalling also decision II/5 of 17 November 1995 of theConference of the Parties to the Convention to develop a Protocol onbiosafety, specifically focusing on transboundary movement of any livingmodified organism resulting from modern biotechnology that may haveadverse effect on the conservation and sustainable use of biologicaldiversity, setting out for consideration, in particular, appropriateprocedures for advance informed agreement,

Reaffirming the precautionary approach contained inPrinciple 15 of the Rio Declaration on Environment and Development,

Aware of the rapid expansion of modern biotechnologyand the growing public concern over its potential adverse effects

ANEXO 2

261

Page 262: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

262

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

on biological diversity, taking also into account risks to humanhealth,

Recognizing that modern biotechnology has great potential forhuman well-being if developed and used with adequate safety measuresfor the environment and human health,

Recognizing also the crucial importance to humankind of centresof origin and centres of genetic diversity,

Taking into account the limited capabilities of many countries,particularly developing countries, to cope with the nature and scale ofknown and potential risks associated with living modified organisms,

Recognizing that trade and environment agreements should bemutually supportive with a view to achieving sustainable development,

Emphasizing that this Protocol shall not be interpreted asimplying a change in the rights and obligations of a Party under anyexisting international agreements,

Understanding that the above recital is not intended tosubordinate this Protocol to other international agreements,

Have agreed as follows:

Article 1

OBJECTIVE

In accordance with the precautionary approach contained inPrinciple 15 of the Rio Declaration on Environment and Development,the objective of this Protocol is to contribute to ensuring an adequatelevel of protection in the field of the safe transfer, handling and use of

Page 263: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

263

living modified organisms resulting from modern biotechnology that mayhave adverse effects on the conservation and sustainable use of biologicaldiversity, taking also into account risks to human health, and specificallyfocusing on transboundary movements.

Article 2

GENERAL PROVISIONS

1. Each Party shall take necessary and appropriate legal,administrative and other measures to implement its obligations underthis Protocol.

2. The Parties shall ensure that the development, handling,transport, use, transfer and release of any living modified organisms areundertaken in a manner that prevents or reduces the risks to biologicaldiversity, taking also into account risks to human health.

3. Nothing in this Protocol shall affect in any way thesovereignty of States over their territorial sea established in accordancewith international law, and the sovereign rights and the jurisdiction whichStates have in their exclusive economic zones and their continentalshelves in accordance with international law, and the exercise by shipsand aircraft of all States of navigational rights and freedoms as providedfor in international law and as reflected in relevant internationalinstruments.

4. Nothing in this Protocol shall be interpreted as restrictingthe right of a Party to take action that is more protective of theconservation and sustainable use of biological diversity than that calledfor in this Protocol, provided that such action is consistent with theobjective and the provisions of this Protocol and is in accordance withthat Party’s other obligations under international law.

Page 264: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

264

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

5. The Parties are encouraged to take into account, asappropriate, available expertise, instruments and work undertaken ininternational forums with competence in the area of risks to humanhealth.

Article 3

USE OF TERMS

- For the purposes of this Protocol:

(a)“Conference of the Parties” means the Conference of theParties to the Convention;

(b) “Contained use” means any operation, undertakenwithin a facility, installation or other physical structure,which involves living modified organisms that arecontrolled by specific measures that effectively limit theircontact with, and their impact on, the externalenvironment;

(c)“Export” means intentional transboundary movement fromone Party to another Party;

(d)“Exporter” means any legal or natural person, under thejurisdiction of the Party of export, who arranges for a livingmodified organism to be exported;

(e)“Import” means intentional transboundary movement into oneParty from another Party;

(f) “Importer” means any legal or natural person, under thejurisdiction of the Party of import, who arranges for a livingmodified organism to be imported;

Page 265: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

265

(g)“Living modified organism” means any living organism thatpossesses a novel combination of genetic material obtainedthrough the use of modern biotechnology;

(h)“Living organism” means any biological entity capable oftransferring or replicating genetic material, including sterileorganisms, viruses and viroids;

(i) “Modern biotechnology” means the application of:

(a) In vitro nucleic acid techniques, including recombinantdeoxyribonucleic acid (DNA) and direct injection ofnucleic acid into cells or organelles, or

(b)Fusion of cells beyond the taxonomic family,

(j) That overcome natural physiological reproductive orrecombination barriers and that are not techniques used intraditional breeding and selection;

(k)“Regional economic integration organization” means anorganization constituted by sovereign States of a givenregion, to which its member States have transferredcompetence in respect of matters governed by this Protocoland which has been duly authorized, in accordance with itsinternal procedures, to sign, ratify, accept, approve or accedeto it;

(l) “Transboundary movement” means the movement of a livingmodified organism from one Party to another Party, savethat for the purposes of Articles 17 and 24 transboundarymovement extends to movement between Parties and non-Parties.

Page 266: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

266

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Article 4

SCOPE

This Protocol shall apply to the transboundarymovement, transit, handling and use of all living modifiedorganisms that may have adverse effects on the conservationand sustainable use of biological diversity, taking also intoaccount risks to human health.

Article 5

PHARMACEUTICALS

Notwithstanding Article 4 and without prejudice to any rightof a Party to subject all living modified organisms to risk assessmentprior to the making of decisions on import, this Protocol shall notapply to the transboundary movement of living modified organismswhich are pharmaceuticals for humans that are addressed by otherrelevant international agreements or organisations.

Article 6

TRANSIT AND CONTAINED USE

1. Notwithstanding Article 4 and without prejudice to anyright of a Party of transit to regulate the transport of living modifiedorganisms through its territory and make available to the BiosafetyClearing-House, any decision of that Party, subject to Article 2,paragraph 3, regarding the transit through its territory of a specificliving modified organism, the provisions of this Protocol with respectto the advance informed agreement procedure shall not apply toliving modified organisms in transit.

Page 267: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

267

2. Notwithstanding Article 4 and without prejudice to anyright of a Party to subject all living modified organisms to risk assessmentprior to decisions on import and to set standards for contained usewithin its jurisdiction, the provisions of this Protocol with respect to theadvance informed agreement procedure shall not apply to thetransboundary movement of living modified organisms destined forcontained use undertaken in accordance with the standards of the Partyof import.

Article 7

APPLICATION OF THE ADVANCE INFORMEDAGREEMENT PROCEDURE

1. Subject to Articles 5 and 6, the advance informedagreement procedure in Articles 8 to 10 and 12 shall apply prior to thefirst intentional transboundary movement of living modified organismsfor intentional introduction into the environment of the Party of import.

2. “Intentional introduction into the environment” in paragraph1 above, does not refer to living modified organisms intended for directuse as food or feed, or for processing.

3. Article 11 shall apply prior to the first transboundarymovement of living modified organisms intended for direct use as foodor feed, or for processing.

4. The advance informed agreement procedure shall not applyto the intentional transboundary movement of living modified organismsidentified in a decision of the Conference of the Parties serving as themeeting of the Parties to this Protocol as being not likely to have adverseeffects on the conservation and sustainable use of biological diversity,taking also into account risks to human health.

Page 268: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

268

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Article 8

NOTIFICATION

1. The Party of export shall notify, or require the exporter toensure notification to, in writing, the competent national authority ofthe Party of import prior to the intentional transboundary movement ofa living modified organism that falls within the scope of Article 7,paragraph 1. The notification shall contain, at a minimum, the informationspecified in Annex I.

2. The Party of export shall ensure that there is a legalrequirement for the accuracy of information provided by theexporter.

Article 9

ACKNOWLEDGEMENT OF RECEIPT OF NOTIFICATION

1. The Party of import shall acknowledge receipt of thenotification, in writing, to the notifier within ninety days of itsreceipt.

2. The acknowledgement shall state:

(a)The date of receipt of the notification;

(b)Whether the notification, prima facie, contains the informationreferred to in Article 8;

(c)Whether to proceed according to the domestic regulatoryframework of the Party of import or according to theprocedure specified in Article 10.

Page 269: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

269

3. The domestic regulatory framework referred to inparagraph 2 (c) above, shall be consistent with this Protocol.

4. A failure by the Party of import to acknowledge receipt ofa notification shall not imply its consent to an intentional transboundarymovement.

Article 10

DECISION PROCEDURE

1. Decisions taken by the Party of import shall be inaccordance with Article 15.

2. The Party of import shall, within the period of time referredto in Article 9, inform the notifier, in writing, whether the intentionaltransboundary movement may proceed:

(a)Only after the Party of import has given its written consent; or

(b)After no less than ninety days without a subsequent writtenconsent.

3. Within two hundred and seventy days of the date ofreceipt of notification, the Party of import shall communicate, in writing,to the notifier and to the Biosafety Clearing-House the decisionreferred to in paragraph 2 (a) above:

(a)Approving the import, with or without conditions, includinghow the decision will apply to subsequent imports of thesame living modified organism;

(b)Prohibiting the import;

Page 270: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

270

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

(c)Requesting additional relevant information in accordancewith its domestic regulatory framework or Annex I; incalculating the time within which the Party of import isto respond, the number of days it has to wait foradditional relevant information shall not be taken intoaccount; or

(d)Informing the notifier that the period specified in thisparagraph is extended by a defined period of time.

4. Except in a case in which consent is unconditional, adecision under paragraph 3 above, shall set out the reasons on which itis based.

5. A failure by the Party of import to communicate its decisionwithin two hundred and seventy days of the date of receipt of thenotification shall not imply its consent to an intentional transboundarymovement.

6. Lack of scientific certainty due to insufficient relevantscientific information and knowledge regarding the extent of thepotential adverse effects of a living modified organism on theconservation and sustainable use of biological diversity in the Party ofimport, taking also into account risks to human health, shall not preventthat Party from taking a decision, as appropriate, with regard to theimport of the living modified organism in question as referred to inparagraph 3 above, in order to avoid or minimize such potential adverseeffects.

7. The Conference of the Parties serving as the meeting ofthe Parties shall, at its first meeting, decide upon appropriateprocedures and mechanisms to facilitate decision-making by Partiesof import.

Page 271: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

271

Article 11

PROCEDURE FOR LIVING MODIFIED ORGANISMSINTENDED FOR DIRECT USE AS FOOD OR FEED, OR FOR

PROCESSING

1. A Party that makes a final decision regarding domesticuse, including placing on the market, of a living modified organism thatmay be subject to transboundary movement for direct use as food orfeed, or for processing shall, within fifteen days of making that decision,inform the Parties through the Biosafety Clearing-House. Thisinformation shall contain, at a minimum, the information specified inAnnex II. The Party shall provide a copy of the information, in writing,to the national focal point of each Party that informs the Secretariat inadvance that it does not have access to the Biosafety Clearing-House.This provision shall not apply to decisions regarding field trials.

2. The Party making a decision under paragraph 1 above,shall ensure that there is a legal requirement for the accuracy ofinformation provided by the applicant.

3. Any Party may request additional information from theauthority identified in paragraph (b) of Annex II.

4. A Party may take a decision on the import of living modifiedorganisms intended for direct use as food or feed, or for processing,under its domestic regulatory framework that is consistent with theobjective of this Protocol.

5. Each Party shall make available to the Biosafety Clearing-House copies of any national laws, regulations and guidelines applicableto the import of living modified organisms intended for direct use asfood or feed, or for processing, if available.

Page 272: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

272

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

6. A developing country Party or a Party with an economy intransition may, in the absence of the domestic regulatory frameworkreferred to in paragraph 4 above, and in exercise of its domesticjurisdiction, declare through the Biosafety Clearing-House that itsdecision prior to the first import of a living modified organism intendedfor direct use as food or feed, or for processing, on which informationhas been provided under paragraph 1 above, will be taken accordingto the following:

(a)A risk assessment undertaken in accordance with Annex III;and

(b)A decision made within a predictable timeframe, notexceeding two hundred and seventy days.

7. Failure by a Party to communicate its decision accordingto paragraph 6 above, shall not imply its consent or refusal to the importof a living modified organism intended for direct use as food or feed, orfor processing, unless otherwise specified by the Party.

8. Lack of scientific certainty due to insufficient relevantscientific information and knowledge regarding the extent of thepotential adverse effects of a living modified organism on theconservation and sustainable use of biological diversity in the Party ofimport, taking also into account risks to human health, shall not preventthat Party from taking a decision, as appropriate, with regard to theimport of that living modified organism intended for direct use as foodor feed, or for processing, in order to avoid or minimize such potentialadverse effects.

9. A Party may indicate its needs for financial and technicalassistance and capacity-building with respect to living modifiedorganisms intended for direct use as food or feed, or for processing.

Page 273: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

273

Parties shall cooperate to meet these needs in accordance with Articles22 and 28.

Article 12

REVIEW OF DECISIONS

1. A Party of import may, at any time, in light of newscientific information on potential adverse effects on the conservationand sustainable use of biological diversity, taking also into accountthe risks to human health, review and change a decision regarding anintentional transboundary movement. In such case, the Party shall,within thirty days, inform any notifier that has previously notifiedmovements of the living modified organism referred to in such decision,as well as the Biosafety Clearing-House, and shall set out the reasonsfor its decision.

2. A Party of export or a notifier may request the Party ofimport to review a decision it has made in respect of it under Article 10where the Party of export or the notifier considers that:

(a) A change in circumstances has occurred that may influencethe outcome of the risk assessment upon which the decisionwas based; or

(b) Additional relevant scientific or technical information hasbecome available.

3. The Party of import shall respond in writing to such arequest within ninety days and set out the reasons for its decision.

4. The Party of import may, at its discretion, require a riskassessment for subsequent imports.

Page 274: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

274

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Article 13

SIMPLIFIED PROCEDURE

1. A Party of import may, provided that adequate measuresare applied to ensure the safe intentional transboundary movement ofliving modified organisms in accordance with the objective of thisProtocol, specify in advance to the Biosafety Clearing-House:

(a)Cases in which intentional transboundary movement to it maytake place at the same time as the movement is notified tothe Party of import; and

(b)Imports of living modified organisms to it to be exemptedfrom the advance informed agreement procedure.

Notifications under subparagraph (a) above, may apply tosubsequent similar movements to the same Party.

2. The information relating to an intentional transboundarymovement that is to be provided in the notifications referred to inparagraph 1 (a) above, shall be the information specified in Annex I.

Article 14

BILATERAL, REGIONAL AND MULTILATERALAGREEMENTS AND ARRANGEMENTS

1. Parties may enter into bilateral, regional and multilateralagreements and arrangements regarding intentional transboundarymovements of living modified organisms, consistent with the objective ofthis Protocol and provided that such agreements and arrangements do notresult in a lower level of protection than that provided for by the Protocol.

Page 275: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

275

2. The Parties shall inform each other, through the BiosafetyClearing-House, of any such bilateral, regional and multilateralagreements and arrangements that they have entered into before orafter the date of entry into force of this Protocol.

3. The provisions of this Protocol shall not affect intentionaltransboundary movements that take place pursuant to such agreementsand arrangements as between the parties to those agreements orarrangements.

4. Any Party may determine that its domestic regulations shallapply with respect to specific imports to it and shall notify the BiosafetyClearing-House of its decision.

Article 15

RISK ASSESSMENT

1. Risk assessments undertaken pursuant to this Protocol shallbe carried out in a scientifically sound manner, in accordance withAnnex III and taking into account recognized risk assessment techniques.Such risk assessments shall be based, at a minimum, on informationprovided in accordance with Article 8 and other available scientificevidence in order to identify and evaluate the possible adverse effectsof living modified organisms on the conservation and sustainable use ofbiological diversity, taking also into account risks to human health.

2. The Party of import shall ensure that risk assessments arecarried out for decisions taken under Article 10. It may require theexporter to carry out the risk assessment.

3. The cost of risk assessment shall be borne by the notifier ifthe Party of import so requires.

Page 276: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

276

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Article 16

RISK MANAGEMENT

1. The Parties shall, taking into account Article 8 (g) of theConvention, establish and maintain appropriate mechanisms, measuresand strategies to regulate, manage and control risks identified in therisk assessment provisions of this Protocol associated with the use,handling and transboundary movement of living modified organisms.

2. Measures based on risk assessment shall be imposed tothe extent necessary to prevent adverse effects of the living modifiedorganism on the conservation and sustainable use of biological diversity,taking also into account risks to human health, within the territory of theParty of import.

3. Each Party shall take appropriate measures to preventunintentional transboundary movements of living modified organisms,including such measures as requiring a risk assessment to be carriedout prior to the first release of a living modified organism.

4. Without prejudice to paragraph 2 above, each Party shallendeavour to ensure that any living modified organism, whether importedor locally developed, has undergone an appropriate period ofobservation that is commensurate with its life-cycle or generation timebefore it is put to its intended use.

5. Parties shall cooperate with a view to:

(a) Identifying living modified organisms or specific traits of livingmodified organisms that may have adverse effects on theconservation and sustainable use of biological diversity, takingalso into account risks to human health; and

Page 277: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

277

(b)Taking appropriate measures regarding the treatment of suchliving modified organisms or specific traits.

Article 17

UNINTENTIONAL TRANSBOUNDARY MOVEMENTS ANDEMERGENCY MEASURES

1. Each Party shall take appropriate measures to notifyaffected or potentially affected States, the Biosafety Clearing-Houseand, where appropriate, relevant international organizations, when itknows of an occurrence under its jurisdiction resulting in a releasethat leads, or may lead, to an unintentional transboundary movementof a living modified organism that is likely to have significant adverseeffects on the conservation and sustainable use of biological diversity,taking also into account risks to human health in such States. Thenotification shall be provided as soon as the Party knows of the abovesituation.

2. Each Party shall, no later than the date of entry into forceof this Protocol for it, make available to the Biosafety Clearing-Housethe relevant details setting out its point of contact for the purposes ofreceiving notifications under this Article.

3. Any notification arising from paragraph 1 above, shouldinclude:

(a) Available relevant information on the estimated quantitiesand relevant characteristics and/or traits of the living modified organism;

(b) Information on the circumstances and estimated date ofthe release, and on the use of the living modified organism in theoriginating Party;

Page 278: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

278

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

(c)Any available information about the possible adverse effectson the conservation and sustainable use of biological diversity,taking also into account risks to human health, as well asavailable information about possible risk managementmeasures;

(d)Any other relevant information; and

(e)A point of contact for further information.

4. In order to minimize any significant adverse effects on theconservation and sustainable use of biological diversity, taking also intoaccount risks to human health, each Party, under whose jurisdiction therelease of the living modified organism referred to in paragraph 1 above,occurs, shall immediately consult the affected or potentially affectedStates to enable them to determine appropriate responses and initiatenecessary action, including emergency measures.

Article 18

HANDLING, TRANSPORT, PACKAGING ANDIDENTIFICATION

1. In order to avoid adverse effects on the conservation andsustainable use of biological diversity, taking also into account risks tohuman health, each Party shall take necessary measures to require thatliving modified organisms that are subject to intentional transboundarymovement within the scope of this Protocol are handled, packagedand transported under conditions of safety, taking into considerationrelevant international rules and standards.

2. Each Party shall take measures to require thatdocumentation accompanying:

Page 279: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

279

(a)Living modified organisms that are intended for direct use asfood or feed, or for processing, clearly identifies that they“may contain” living modified organisms and are not intendedfor intentional introduction into the environment, as well as acontact point for further information. The Conference of theParties serving as the meeting of the Parties to this Protocolshall take a decision on the detailed requirements for thispurpose, including specification of their identity and any uniqueidentification, no later than two years after the date of entryinto force of this Protocol;

(b)Living modified organisms that are destined for containeduse clearly identifies them as living modified organisms; andspecifies any requirements for the safe handling, storage,transport and use, the contact point for further information,including the name and address of the individual andinstitution to whom the living modified organisms areconsigned; and

(c)Living modified organisms that are intended for intentionalintroduction into the environment of the Party of import andany other living modified organisms within the scope of theProtocol, clearly identifies them as living modified organisms;specifies the identity and relevant traits and/or characteristics,any requirements for the safe handling, storage, transportand use, the contact point for further information and, asappropriate, the name and address of the importer andexporter; and contains a declaration that the movement is inconformity with the requirements of this Protocol applicableto the exporter.

3. The Conference of the Parties serving as the meeting ofthe Parties to this Protocol shall consider the need for and modalities of

Page 280: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

280

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

developing standards with regard to identification, handling, packagingand transport practices, in consultation with other relevant internationalbodies.

Article 19

COMPETENT NATIONAL AUTHORITIES AND NATIONALFOCAL POINTS

1. Each Party shall designate one national focal point to beresponsible on its behalf for liaison with the Secretariat. Each Partyshall also designate one or more competent national authorities, whichshall be responsible for performing the administrative functions requiredby this Protocol and which shall be authorized to act on its behalfwith respect to those functions. A Party may designate a single entityto fulfil the functions of both focal point and competent nationalauthority.

2. Each Party shall, no later than the date of entry into forceof this Protocol for it, notify the Secretariat of the names and addressesof its focal point and its competent national authority or authorities.Where a Party designates more than one competent national authority,it shall convey to the Secretariat, with its notification thereof, relevantinformation on the respective responsibilities of those authorities. Whereapplicable, such information shall, at a minimum, specify which competentauthority is responsible for which type of living modified organism. EachParty shall forthwith notify the Secretariat of any changes in thedesignation of its national focal point or in the name and address orresponsibilities of its competent national authority or authorities.

3. The Secretariat shall forthwith inform the Parties of thenotifications it receives under paragraph 2 above, and shall also makesuch information available through the Biosafety Clearing-House.

Page 281: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

281

Article 20

INFORMATION SHARING AND THE BIOSAFETYCLEARING-HOUSE

1. A Biosafety Clearing-House is hereby established as partof the clearing-house mechanism under Article 18, paragraph 3, of theConvention, in order to:

(a) Facilitate the exchange of scientific, technical, environmentaland legal information on, and experience with, living modifiedorganisms; and

(b)Assist Parties to implement the Protocol, taking into accountthe special needs of developing country Parties, in particular theleast developed and small island developing States among them,and countries with economies in transition as well as countriesthat are centres of origin and centres of genetic diversity.

2. The Biosafety Clearing-House shall serve as a meansthrough which information is made available for the purposes ofparagraph 1 above. It shall provide access to information made availableby the Parties relevant to the implementation of the Protocol. It shallalso provide access, where possible, to other international biosafetyinformation exchange mechanisms.

3. Without prejudice to the protection of confidentialinformation, each Party shall make available to the Biosafety Clearing-House any information required to be made available to the BiosafetyClearing-House under this Protocol, and:

(a)Any existing laws, regulations and guidelines forimplementation of the Protocol, as well as information

Page 282: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

282

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

required by the Parties for the advance informed agreementprocedure;

(b)Any bilateral, regional and multilateral agreements andarrangements;

(c)Summaries of its risk assessments or environmental reviewsof living modified organisms generated by its regulatoryprocess, and carried out in accordance with Article 15,including, where appropriate, relevant information regardingproducts thereof, namely, processed materials that are ofliving modified organism origin, containing detectable novelcombinations of replicable genetic material obtained throughthe use of modern biotechnology;

(d)Its final decisions regarding the importation or release of livingmodified organisms; and

(e)Reports submitted by it pursuant to Article 33, including thoseon implementation of the advance informed agreementprocedure.

4. The modalities of the operation of the Biosafety Clearing-House, including reports on its activities, shall be considered and decidedupon by the Conference of the Parties serving as the meeting of the Partiesto this Protocol at its first meeting, and kept under review thereafter.

Article 21

CONFIDENTIAL INFORMATION

1. The Party of import shall permit the notifier to identifyinformation submitted under the procedures of this Protocol or required

Page 283: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

283

by the Party of import as part of the advance informed agreementprocedure of the Protocol that is to be treated as confidential.Justification shall be given in such cases upon request.

2. The Party of import shall consult the notifier if it decidesthat information identified by the notifier as confidential does not qualifyfor such treatment and shall, prior to any disclosure, inform the notifierof its decision, providing reasons on request, as well as an opportunityfor consultation and for an internal review of the decision prior todisclosure.

3. Each Party shall protect confidential information receivedunder this Protocol, including any confidential information received inthe context of the advance informed agreement procedure of theProtocol. Each Party shall ensure that it has procedures to protectsuch information and shall protect the confidentiality of such informationin a manner no less favourable than its treatment of confidentialinformation in connection with domestically produced living modifiedorganisms.

4. The Party of import shall not use such information for acommercial purpose, except with the written consent of the notifier.

5. If a notifier withdraws or has withdrawn a notification, theParty of import shall respect the confidentiality of commercial andindustrial information, including research and development informationas well as information on which the Party and the notifier disagree as toits confidentiality.

6. Without prejudice to paragraph 5 above, the followinginformation shall not be considered confidential:

(a) The name and address of the notifier;

Page 284: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

284

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

(b)A general description of the living modified organism ororganisms;

(c)A summary of the risk assessment of the effects on theconservation and sustainable use of biological diversity, takingalso into account risks to human health; and

(d)Any methods and plans for emergency response.

Article 22

CAPACITY-BUILDING

1. The Parties shall cooperate in the development and/orstrengthening of human resources and institutional capacities inbiosafety, including biotechnology to the extent that it is requiredfor biosafety, for the purpose of the effective implementation of thisProtocol, in developing country Parties, in particular the leastdeveloped and small island developing States among them, and inParties with economies in transition, including through existingglobal, regional, subregional and national institutions andorganizations and, as appropriate, through facilitating private sectorinvolvement.

2. For the purposes of implementing paragraph 1 above, inrelation to cooperation, the needs of developing country Parties, inparticular the least developed and small island developing States amongthem, for financial resources and access to and transfer of technologyand know-how in accordance with the relevant provisions of theConvention, shall be taken fully into account for capacity-building inbiosafety. Cooperation in capacity-building shall, subject to the differentsituation, capabilities and requirements of each Party, include scientificand technical training in the proper and safe management of

Page 285: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

285

biotechnology, and in the use of risk assessment and risk managementfor biosafety, and the enhancement of technological and institutionalcapacities in biosafety. The needs of Parties with economies in transitionshall also be taken fully into account for such capacity-building inbiosafety.

Article 23

PUBLIC AWARENESS AND PARTICIPATION

1. The Parties shall:

(a)Promote and facilitate public awareness, education andparticipation concerning the safe transfer, handling and useof living modified organisms in relation to the conservationand sustainable use of biological diversity, taking also intoaccount risks to human health. In doing so, the Parties shallcooperate, as appropriate, with other States and internationalbodies;

(b)Endeavour to ensure that public awareness and educationencompass access to information on living modifiedorganisms identified in accordance with this Protocol thatmay be imported.

2. The Parties shall, in accordance with their respective lawsand regulations, consult the public in the decision-making processregarding living modified organisms and shall make the results of suchdecisions available to the public, while respecting confidential informationin accordance with Article 21.

3. Each Party shall endeavour to inform its public about themeans of public access to the Biosafety Clearing-House.

Page 286: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

286

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Article 24

NON-PARTIES

1. Transboundary movements of living modified organismsbetween Parties and non-Parties shall be consistent with the objectiveof this Protocol. The Parties may enter into bilateral, regional andmultilateral agreements and arrangements with non-Parties regardingsuch transboundary movements.

2. The Parties shall encourage non-Parties to adhere to thisProtocol and to contribute appropriate information to the BiosafetyClearing-House on living modified organisms released in, or movedinto or out of, areas within their national jurisdictions.

Article 25

ILLEGAL TRANSBOUNDARY MOVEMENTS

1. Each Party shall adopt appropriate domestic measuresaimed at preventing and, if appropriate, penalizing transboundarymovements of living modified organisms carried out in contravention ofits domestic measures to implement this Protocol. Such movementsshall be deemed illegal transboundary movements.

2. In the case of an illegal transboundary movement, theaffected Party may request the Party of origin to dispose, at its ownexpense, of the living modified organism in question by repatriation ordestruction, as appropriate.

3. Each Party shall make available to the Biosafety Clearing-House information concerning cases of illegal transboundary movementspertaining to it.

Page 287: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

287

Article 26

SOCIO-ECONOMIC CONSIDERATIONS

1. The Parties, in reaching a decision on import underthis Protocol or under its domestic measures implementing theProtocol, may take into account, consistent with their internationalobligations, socio-economic considerations arising from the impactof living modified organisms on the conservation and sustainableuse of biological diversity, especially with regard to the value ofbiological diversity to indigenous and local communities.

2. The Parties are encouraged to cooperate on researchand information exchange on any socio economic impacts of livingmodified organisms, especially on indigenous and localcommunities.

Article 27

LIABILITY AND REDRESS

The Conference of the Parties serving as the meeting ofthe Parties to this Protocol shall, at its first meeting, adopt a processwith respect to the appropriate elaboration of international rulesand procedures in the field of liability and redress for damageresulting from transboundary movements of living modifiedorganisms, analysing and taking due account of the ongoingprocesses in international law on these matters, and shall endeavourto complete this process within four years.

Page 288: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

288

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Article 28

FINANCIAL MECHANISM AND RESOURCES

1. In considering financial resources for the implementationof this Protocol, the Parties shall take into account the provisions ofArticle 20 of the Convention.

2. The financial mechanism established in Article 21 ofthe Convention shall, through the institutional structure entrustedwith its operation, be the financial mechanism for this Protocol.

3. Regarding the capacity-building referred to inArticle 22 of this Protocol, the Conference of the Parties servingas the meeting of the Parties to this Protocol, in providing guidancewith respect to the financial mechanism referred to in paragraph 2above, for consideration by the Conference of the Parties, shalltake into account the need for financial resources by developingcountry Parties, in particular the least developed and the smallisland developing States among them.

4. In the context of paragraph 1 above, the Parties shallalso take into account the needs of the developing country Parties,in particular the least developed and the small island developingStates among them, and of the Parties with economies in transition,in their efforts to identify and implement their capacity-buildingrequirements for the purposes of the implementation of thisProtocol.

5. The guidance to the financial mechanism of theConvention in relevant decisions of the Conference of the Parties,including those agreed before the adoption of this Protocol, shallapply, mutatis mutandis, to the provisions of this Article.

Page 289: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

289

6. The developed country Parties may also provide, and thedeveloping country Parties and the Parties with economies in transitionavail themselves of, financial and technological resources for theimplementation of the provisions of this Protocol through bilateral,regional and multilateral channels.

Article 29

CONFERENCE OF THE PARTIES SERVING AS THEMEETING OF THE PARTIES TO THIS PROTOCOL

1. The Conference of the Parties shall serve as the meetingof the Parties to this Protocol.

2. Parties to the Convention that are not Parties to thisProtocol may participate as observers in the proceedings of any meetingof the Conference of the Parties serving as the meeting of the Parties tothis Protocol. When the Conference of the Parties serves as the meetingof the Parties to this Protocol, decisions under this Protocol shall betaken only by those that are Parties to it.

3. When the Conference of the Parties serves as the meetingof the Parties to this Protocol, any member of the bureau of theConference of the Parties representing a Party to the Convention but,at that time, not a Party to this Protocol, shall be substituted by a memberto be elected by and from among the Parties to this Protocol.

4. The Conference of the Parties serving as the meetingof the Parties to this Protocol shall keep under regular review theimplementation of this Protocol and shall make, within its mandate,the decisions necessary to promote its effective implementation.It shall perform the functions assigned to it by this Protocol andshall:

Page 290: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

290

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

(a)Make recommendations on any matters necessary for theimplementation of this Protocol;

(b) Establish such subsidiary bodies as are deemednecessary for the implementation of this Protocol;

(c)Seek and utilize, where appropriate, the services andcooperation of, and information provided by, competentinternational organizations and intergovernmental and non-governmental bodies;

(d) Establish the form and the intervals for transmitting theinformation to be submitted in accordance with Article33 of this Protocol and consider such information as wellas reports submitted by any subsidiary body;

(e)Consider and adopt, as required, amendments to thisProtocol and its annexes, as well as any additional annexesto this Protocol, that are deemed necessary for theimplementation of this Protocol; and

(f) Exercise such other functions as may be required for theimplementation of this Protocol.

5. The rules of procedure of the Conference of the Partiesand financial rules of the Convention shall be applied, mutatis mutandis,under this Protocol, except as may be otherwise decided by consensusby the Conference of the Parties serving as the meeting of the Parties tothis Protocol.

6. The first meeting of the Conference of the Partiesserving as the meeting of the Parties to this Protocol shall beconvened by the Secretariat in conjunction with the first meeting

Page 291: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

291

of the Conference of the Parties that is scheduled after the date ofthe entry into force of this Protocol. Subsequent ordinary meetingsof the Conference of the Parties serving as the meeting of theParties to this Protocol shall be held in conjunction with ordinarymeetings of the Conference of the Parties, unless otherwise decidedby the Conference of the Parties serving as the meeting of theParties to this Protocol.

7. Extraordinary meetings of the Conference of theParties serving as the meeting of the Parties to this Protocol shallbe held at such other times as may be deemed necessary by theConference of the Parties serving as the meeting of the Parties tothis Protocol, or at the written request of any Party, provided that,within six months of the request being communicated to the Partiesby the Secretariat, it is supported by at least one third of theParties.

8. The United Nations, its specialized agencies and theInternational Atomic Energy Agency, as well as any State memberthereof or observers thereto not party to the Convention, may berepresented as observers at meetings of the Conference of theParties serving as the meeting of the Parties to this Protocol. Anybody or agency, whether national or international, governmentalor non-governmental, that is qualified in matters covered by thisProtocol and that has informed the Secretariat of its wish to berepresented at a meeting of the Conference of the Parties servingas a meeting of the Parties to this Protocol as an observer, may beso admitted, unless at least one third of the Parties present object.Except as otherwise provided in this Article, the admission andparticipation of observers shall be subject to the rules of procedure,as referred to in paragraph 5 above.

Page 292: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

292

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Article 30

SUBSIDIARY BODIES

1. Any subsidiary body established by or under theConvention may, upon a decision by the Conference of the Partiesserving as the meeting of the Parties to this Protocol, serve the Protocol,in which case the meeting of the Parties shall specify which functionsthat body shall exercise.

2. Parties to the Convention that are not Parties to thisProtocol may participate as observers in the proceedings of any meetingof any such subsidiary bodies. When a subsidiary body of theConvention serves as a subsidiary body to this Protocol, decisions underthe Protocol shall be taken only by the Parties to the Protocol.

3. When a subsidiary body of the Convention exercises itsfunctions with regard to matters concerning this Protocol, any memberof the bureau of that subsidiary body representing a Party to theConvention but, at that time, not a Party to the Protocol, shall besubstituted by a member to be elected by and from among the Partiesto the Protocol.

Article 31

SECRETARIAT

1. The Secretariat established by Article 24 of the Conventionshall serve as the secretariat to this Protocol.

2. Article 24, paragraph 1, of the Convention on the functionsof the Secretariat shall apply, mutatis mutandis, to this Protocol.

3. To the extent that they are distinct, the costs of the

Page 293: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

293

secretariat services for this Protocol shall be met by the Parties hereto.The Conference of the Parties serving as the meeting of the Parties tothis Protocol shall, at its first meeting, decide on the necessary budgetaryarrangements to this end.

Article 32

RELATIONSHIP WITH THE CONVENTION

Except as otherwise provided in this Protocol, the provisionsof the Convention relating to its protocols shall apply to this Protocol.

Article 33

MONITORING AND REPORTING

Each Party shall monitor the implementation of its obligationsunder this Protocol, and shall, at intervals to be determined by theConference of the Parties serving as the meeting of the Parties to thisProtocol, report to the Conference of the Parties serving as the meetingof the Parties to this Protocol on measures that it has taken to implementthe Protocol.

Article 34

COMPLIANCE

The Conference of the Parties serving as the meeting of theParties to this Protocol shall, at its first meeting, consider and approvecooperative procedures and institutional mechanisms to promotecompliance with the provisions of this Protocol and to address cases ofnon-compliance. These procedures and mechanisms shall includeprovisions to offer advice or assistance, where appropriate. They shall

Page 294: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

294

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

be separate from, and without prejudice to, the dispute settlementprocedures and mechanisms established by Article 27 of theConvention.

Article 35

ASSESSMENT AND REVIEW

The Conference of the Parties serving as the meeting of theParties to this Protocol shall undertake, five years after the entryinto force of this Protocol and at least every five years thereafter,an evaluation of the effectiveness of the Protocol, including anassessment of its procedures and annexes.

Article 36

SIGNATURE

This Protocol shall be open for signature at the UnitedNations Office at Nairobi by States and regional economicintegration organizations from 15 to 26 May 2000, and atUnited Nations Headquarters in New York from 5 June 2000 to 4June 2001.

Article 37

ENTRY INTO FORCE

1. This Protocol shall enter into force on the ninetiethday after the date of deposit of the fiftieth instrument ofratification, acceptance, approval or accession by States orregional economic integration organizations that are Parties tothe Convention.

Page 295: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

295

2. This Protocol shall enter into force for a State or regionaleconomic integration organization that ratifies, accepts or approvesthis Protocol or accedes thereto after its entry into force pursuantto paragraph 1 above, on the ninetieth day after the date on whichthat State or regional economic integration organization deposits itsinstrument of ratification, acceptance, approval or accession, or onthe date on which the Convention enters into force for that State orregional economic integration organization, whichever shall be thelater.

3. For the purposes of paragraphs 1 and 2 above, anyinstrument deposited by a regional economic integration organizationshall not be counted as additional to those deposited by member Statesof such organization.

Article 38

RESERVATIONS

No reservations may be made to this Protocol.

Article 39

WITHDRAWAL

1. At any time after two years from the date on whichthis Protocol has entered into force for a Party, that Party maywithdraw from the Protocol by giving written notification to theDepositary.

2. Any such withdrawal shall take place upon expiry ofone year after the date of its receipt by the Depositary, or on suchlater date as may be specified in the notification of the withdrawal.

Page 296: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

296

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Article 40

AUTHENTIC TEXTS

The original of this Protocol, of which the Arabic, Chinese,English, French, Russian and Spanish texts are equally authentic, shallbe deposited with the Secretary-General of the United Nations.

IN WITNESS WHEREOF the undersigned, being dulyauthorized to that effect, have signed this Protocol.

DONE at Montreal on this twenty-ninth day of January, twothousand.

Page 297: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

297

ANNEX I

INFORMATION REQUIRED IN NOTIFICATIONS UNDERARTICLES 8, 10 AND 13

(a) Name, address and contact details of the exporter.(b)Name, address and contact details of the importer.(c)Name and identity of the living modified organism, as well

as the domestic classification, if any, of the biosafety level of the livingmodified organism in the State of export.

(d)Intended date or dates of the transboundary movement, ifknown.

(e) Taxonomic status, common name, point of collection oracquisition, and characteristics of recipient organism or parentalorganisms related to biosafety.

(f) Centres of origin and centres of genetic diversity, if known,of the recipient organism and/or the parental organisms and a descriptionof the habitats where the organisms may persist or proliferate.

(g) Taxonomic status, common name, point of collection oracquisition, and characteristics of the donor organism or organismsrelated to biosafety.

(h) Description of the nucleic acid or the modificationintroduced, the technique used, and the resulting characteristics of theliving modified organism.

(i) Intended use of the living modified organism or productsthereof, namely, processed materials that are of living modifiedorganism origin, containing detectable novel combinations ofreplicable genetic material obtained through the use of modernbiotechnology.

(j) Quantity or volume of the living modified organism to betransferred.

(k) A previous and existing risk assessment report consistentwith Annex III.

Page 298: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

298

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

(l) Suggested methods for the safe handling, storage, transportand use, including packaging, labelling, documentation, disposal andcontingency procedures, where appropriate.

(m) Regulatory status of the living modified organism withinthe State of export (for example, whether it is prohibited in the State ofexport, whether there are other restrictions, or whether it has beenapproved for general release) and, if the living modified organism isbanned in the State of export, the reason or reasons for the ban.

(n) Result and purpose of any notification by the exporter toother States regarding the living modified organism to be transferred.

(o) A declaration that the above-mentioned information isfactually correct.

Page 299: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

299

ANNEX II

INFORMATION REQUIRED CONCERNING LIVINGMODIFIED ORGANISMS INTENDED FOR DIRECT USE AS

FOOD OR FEED, OR FOR PROCESSING UNDER ARTICLE 11

(a) The name and contact details of the applicant for a decisionfor domestic use.

(b) The name and contact details of the authority responsiblefor the decision.

(c) Name and identity of the living modified organism.(d) Description of the gene modification, the technique used,

and the resulting characteristics of the living modified organism.(e) Any unique identification of the living modified organism.(f) Taxonomic status, common name, point of collection or

acquisition, and characteristics of recipient organism or parentalorganisms related to biosafety.

(g) Centres of origin and centres of genetic diversity, if known,of the recipient organism and/or the parental organisms and a descriptionof the habitats where the organisms may persist or proliferate.

(h) Taxonomic status, common name, point of collection oracquisition, and characteristics of the donor organism or organismsrelated to biosafety.

(i) Approved uses of the living modified organism.(j) A risk assessment report consistent with Annex III.(k) Suggested methods for the safe handling, storage, transport

and use, including packaging, labelling, documentation, disposal andcontingency procedures, where appropriate.

Page 300: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

300

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

ANNEX III

RISK ASSESSMENT

OBJECTIVE

1. The objective of risk assessment, under this Protocol, isto identify and evaluate the potential adverse effects of living modifiedorganisms on the conservation and sustainable use of biological diversityin the likely potential receiving environment, taking also into accountrisks to human health.

USE OF RISK ASSESSMENT

2. Risk assessment is, inter alia, used by competent authoritiesto make informed decisions regarding living modified organisms.

GENERAL PRINCIPLES

3. Risk assessment should be carried out in a scientificallysound and transparent manner, and can take into account expert adviceof, and guidelines developed by, relevant international organizations.

4. Lack of scientific knowledge or scientific consensus shouldnot necessarily be interpreted as indicating a particular level of risk, anabsence of risk, or an acceptable risk.

5. Risks associated with living modified organisms or productsthereof, namely, processed materials that are of living modified organismorigin, containing detectable novel combinations of replicable geneticmaterial obtained through the use of modern biotechnology, should beconsidered in the context of the risks posed by the non-modified recipientsor parental organisms in the likely potential receiving environment.

Page 301: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

301

6. Risk assessment should be carried out on a case-by-casebasis. The required information may vary in nature and level of detailfrom case to case, depending on the living modified organism concerned,its intended use and the likely potential receiving environment.

METHODOLOGY

7. The process of risk assessment may on the one hand giverise to a need for further information about specific subjects, whichmay be identified and requested during the assessment process, whileon the other hand information on other subjects may not be relevant insome instances.

8. To fulfil its objective, risk assessment entails, asappropriate, the following steps:

(a)An identification of any novel genotypic and phenotypiccharacteristics associated with the living modified organismthat may have adverse effects on biological diversity in thelikely potential receiving environment, taking also into accountrisks to human health;

(b)An evaluation of the likelihood of these adverse effects beingrealized, taking into account the level and kind of exposureof the likely potential receiving environment to the livingmodified organism;

(c)An evaluation of the consequences should these adverseeffects be realized;

(d)An estimation of the overall risk posed by the living modifiedorganism based on the evaluation of the likelihood andconsequences of the identified adverse effects being realized;

Page 302: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

302

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

(e)A recommendation as to whether or not the risks areacceptable or manageable, including, where necessary,identification of strategies to manage these risks; and

(f) Where there is uncertainty regarding the level of risk, it maybe addressed by requesting further information on the specificissues of concern or by implementing appropriate riskmanagement strategies and/or monitoring the living modifiedorganism in the receiving environment.

POINTS TO CONSIDER

9. Depending on the case, risk assessment takes into accountthe relevant technical and scientific details regarding the characteristicsof the following subjects:

(a)Recipient organism or parental organisms. The biologicalcharacteristics of the recipient organism or parentalorganisms, including information on taxonomic status,common name, origin, centres of origin and centres of geneticdiversity, if known, and a description of the habitat wherethe organisms may persist or proliferate;

(b)Donor organism or organisms. Taxonomic status andcommon name, source, and the relevant biologicalcharacteristics of the donor organisms;

(c)Vector. Characteristics of the vector, including its identity, ifany, and its source or origin, and its host range;

(d)Insert or inserts and/or characteristics of modification.Genetic characteristics of the inserted nucleic acid and the

Page 303: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

303

function it specifies, and/or characteristics of the modificationintroduced;

(e)Living modified organism. Identity of the living modifiedorganism, and the differences between the biologicalcharacteristics of the living modified organism and those ofthe recipient organism or parental organisms;

(f) Detection and identification of the living modified organism.Suggested detection and identification methods and theirspecificity, sensitivity and reliability;

(g) Information relating to the intended use. Information relatingto the intended use of the living modified organism, includingnew or changed use compared to the recipient organism orparental organisms; and

(h)Receiving environment. Information on the location,geographical, climatic and ecological characteristics, includingrelevant information on biological diversity and centres oforigin of the likely potential receiving environment.

Page 304: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 305: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

305

COMMUNICATION FROM THEEUROPEAN COMMUNITIES

SUMMARY

1. The issue of when and how to use the precautionary principle,both within the European Union and internationally, is giving rise tomuch debate, and to mixed, and sometimes contradictory views. Thus,decision-makers are constantly faced with the dilemma of balancingthe freedom and rights of individuals, industry and organisations withthe need to reduce the risk of adverse effects to the environment, human,animal or plant health. Therefore, finding the correct balance so that theproportionate, non-discriminatory, transparent and coherent actions canbe taken, requires a structured decision-making process with detailedscientific and other objective information.

2. The Communication’s fourfold aim is to:

· outline the Commission’s approach to using the precautionaryprinciple,

· establish Commission guidelines for applying it,· ?build a common understanding of how to assess, appraise,

manage and communicate risks that science is not yet ableto evaluate fully, and

ANEXO 3

Page 306: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

306

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

· ?avoid unwarranted recourse to the precautionary principle,as a disguised form of protectionism.

It also seeks to provide an input to the ongoing debate on thisissue, both within the Community and internationally.

3. The precautionary principle is not defined in the Treaty, whichprescribes it only once - to protect the environment. But in practice,its scope is much wider, and specifically where preliminary objectivescientific evaluation, indicates that there are reasonable grounds forconcern that the potentially dangerous effects on the environment,human, animal or plant health may be inconsistent with the high levelof protection chosen for the Community.

The Commission considers that the Community, like other WTOmembers, has the right to establish the level of protection - particularlyof the environment, human, animal and plant health, - that it deemsappropriate. Applying the precautionary principle is a key tenet of itspolicy, and the choices it makes to this end will continue to affect theviews it defends internationally, on how this principle should be applied.

4. The precautionary principle should be considered within astructured approach to the analysis of risk which comprises threeelements: risk assessment, risk management, risk communication. Theprecautionary principle is particularly relevant to the management ofrisk.

The precautionary principle, which is essentially used bydecision-makers in the management of risk, should not be confusedwith the element of caution that scientists apply in their assessment ofscientific data.

Recourse to the precautionary principle presupposes thatpotentially dangerous effects deriving from a phenomenon, product orprocess have been identified, and that scientific evaluation does notallow the risk to be determined with sufficient certainty.

Page 307: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

307

The implementation of an approach based on the precautionaryprinciple should start with a scientific evaluation, as complete aspossible, and where possible, identifying at each stage the degree ofscientific uncertainty.

5. Decision-makers need to be aware of the degree ofuncertainty attached to the results of the evaluation of the availablescientific information. Judging what is na “acceptable” level of risk forsociety is an eminently political responsibility. Decision-makers facedwith an unacceptable risk, scientific uncertainty and public concernshave a duty to find answers. Therefore, all these factors have to betaken into consideration.

In some cases, the right answer may be not to act or at least notto introduce a binding legal measure. A wide range of initiatives isavailable in the case of action, going from a legally binding measure toa research project or a recommendation.

The decision-making procedure should be transparent andshould involve as early as possible and to the extent reasonably possibleall interested parties.

6. Where action is deemed necessary, measures based on theprecautionary principle should be, inter alia:

· ?proportional to the chosen level of protection,· ?non-discriminatory in their application,· ?consistent with similar measures already taken,· ?based on an examination of the potential benefits and

costs of action or lack of action (including, whereappropriate and feasible, an economic cost/benefit analysis),

· ?subject to review, in the light of new scientific data, and· ?capable of assigning responsibility for producing the

scientific evidence necessary for a more comprehensiverisk assessment.

Page 308: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

308

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Proportionality means tailoring measures to the chosen levelof protection. Risk can rarely be reduced to zero, but incomplete riskassessments may greatly reduce the range of options open to riskmanagers. A total ban may not be a proportional response to a potentialrisk in all cases. However, in certain cases, it is the sole possible responseto a given risk.

Non-discrimination means that comparable situations shouldnot be treated differently, and that different situations should not betreated in the same way, unless there are objective grounds for doingso.

Consistency means that measures should be of comparablescope and nature to those already taken in equivalent areas in which allscientific data are available.

Examining costs and benefits entails comparing the overallcost to the Community of action and lack of action, in both the shortand long term. This is not simply an economic cost-benefit analysis: itsscope is much broader, and includes non-economic considerations,such as the efficacy of possible options and their acceptability to thepublic. In the conduct of such an examination, account should be takenof the general principle and the case law of the Court that the protectionof health takes precedence over economic considerations.

Subject to review in the light of new scientific data, meansmeasures based on the precautionary principle should be maintainedso long as scientific information is incomplete or inconclusive, and therisk is still considered too high to be imposed on society, in view ofchosen level of protection. Measures should be periodically reviewedin the light of scientific progress, and amended as necessary.

Assigning responsibility for producing scientific evidence isalready a common consequence of these measures. Countries thatimpose a prior approval (marketing authorisation) requirement onproducts that they deem dangerous a priori reverse the burden of provinginjury, by treating them as dangerous unless and until businesses do thescientific work necessary to demonstrate that they are safe.

Page 309: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

309

Where there is no prior authorisation procedure, it may be upto the user or to public authorities to demonstrate the nature of a dangerand the level of risk of a product or process. In such cases, a specificprecautionary measure might be taken to place the burden of proofupon the producer, manufacturer or importer, but this cannot be madea general rule.

1. INTRODUCTION

A number of recent events has shown that public opinion isbecoming increasingly aware of the potential risks to which the populationor their environment are potentially exposed.

Enormous advances in communications technology havefostered this growing sensitivity to the emergence of new risks, beforescientific research has been able to fully illuminate the problems.Decision-makers have to take account of the fears generated by theseperceptions and to put in place preventive measures to eliminate therisk or at least reduce it to the minimum acceptable level. On 13 April1999 the Council adopted a resolution urging the Commission inter alia“ to be in the future even more determined to be guided by theprecautionary principle in preparing proposals for legislation andin its other consumerrelated activities and develop as priority clearand effective guidelines for the application of this principle”. ThisCommunication is part of the Commission’s response.

The dimension of the precautionary principle goes beyond theproblems associated with a short or medium-term approach to risks. Italso concerns the longer run and the well-being of future generations.

A decision to take measures without waiting until all the necessaryscientific knowledge is available is clearly a precaution-based approach.

Decision-makers are constantly faced with the dilemma ofbalancing the freedoms and rights of individuals, industry andorganisations with the need to reduce or eliminate the risk of adverseeffects to the environment or to health.

Page 310: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

310

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Finding the correct balance so that proportionate, non-discriminatory, transparent and coherent decisions can be arrived at,which at the same time provide the chosen level of protection, requiresa structured decision making process with detailed scientific and otherobjective information. This structure is provided by the three elementsof risk analysis: the assessment of risk, the choice of risk managementstrategy and the communication of the risk.

Any assessment of risk that is made should be based on theexisting body of scientific and statistical data. Most decisions are takenwhere there is sufficient information available for appropriate preventivemeasures to be taken but in other circumstances, these data may bewanting in some respects.

Whether or not to invoke the Precautionary Principle is adecision exercised where scientific information is insufficient,inconclusive, or uncertain and where there are indications that thepossible effects on the environment, or human, animal or plant healthmay be potentially dangerous and inconsistent with the chosen level ofprotection.

2. THE GOALS OF THIS COMMUNICATION

The aim of this Communication is to inform all interestedparties, in particular the European Parliament the Council and MemberStates of the manner in which the Commission applies or intends toapply the precautionary principle when faced with taking decisionsrelating to the containment of risk. However, this generalCommunication does not claim to be the final word - rather, the ideais to provide input to the ongoing debate both at Community andinternational level.

This Communication seeks to establish a common understandingof the factors leading to recourse to the precautionary principle and itsplace in decision making, and to establish guidelines for its applicationbased on reasoned and coherent principles.

Page 311: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

311

The guidelines outlined in this Communication are only intendedto serve as general guidance and in no way to modify or affect theprovisions of the Treaty or secondary Community legislation.

Another objective is to avoid unwarranted recourse to theprecautionary principle, which in certain cases could serve as ajustification for disguised protectionism. Accordingly the developmentof international guidelines could facilitate the achievement of this end.The Commission also wishes to stress in this Communication that, farfrom being a way of evading obligations arising from the WTOAgreements, the envisaged use of the precautionary principle complieswith these obligations.

It is also necessary to clarify a misunderstanding as regards thedistinction between reliance on the precautionary principle and the searchfor zero risk, which in reality is rarely to be found. The search for a highlevel of health and safety and environmental and consumer protectionbelongs in the framework of the single market, which is a cornerstoneof the Community.

The Community has already relied on the precautionary principle.Abundant experience has been gained over many years in theenvironmental field, where many measures have been inspired by theprecautionary principle, such as measures to protect the ozone layer orconcerning climate change.

3. THE PRECAUTIONARY PRINCIPLE IN THE EUROPEANUNION

The Community has consistently endeavoured to achieve a highlevel of protection, among others in environment and human, animal orplant health. In most cases, measures making it possible to achieve thishigh level of protection can be determined on a satisfactory scientificbasis. However, when there are reasonable grounds for concern thatpotential hazards may affect the environment or human, animal or planthealth, and when at the same time the available data preclude a detailed

Page 312: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

312

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

risk evaluation, the precautionary principle has been politically acceptedas a risk management strategy in several fields.

To understand fully the use of the precautionary principle in theEuropean Union, it is necessary to examine the legislative texts, thecase law of the Court of Justice and the Court of First Instance, and thepolicy approaches that have emerged.

Legal Texts

The analysis starts with the legal texts which explicitly or implicitlyrefer to the precautionary principle (Annex I, Ref. 1).

At Community level the only explicit reference to theprecautionary principle is to be found in the environment title of the ECTreaty, and more specifically Article 174. However, one cannotconclude from this that the principle applies only to the environment(Annex I, Refs. 2 and 3). Although the principle is adumbrated in theTreaty, it is not defined there.

Like other general notions contained in the legislation, such assubsidiarity or proportionality, it is for the decision-makers and ultimatelythe courts to flesh out the principle. In other words, the scope of theprecautionary principle also depends on trends in case law, which tosome degree are influenced by prevailing social and political values.

However, it would be wrong to conclude that the absence of adefinition has to lead to legal uncertainty. The Community authorities’practical experience with the precautionary principle and its judicial reviewmake it possible to get na ever-better handle on the precautionary principle.

Case law

The Court of Justice of the European Communities and the Courtof First Instance have already had occasion to review the applicationof the precautionary principle in cases they have adjudicated and henceto develop case law in this area. (see Annex I, Refs. 5, 6 and 7)

Page 313: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

313

Policy orientations

Policy orientations were set out by the Commission in the GreenPaper on the General Principles of Food Safety and the Communicationof 30 April 1997 on Consumer Health and Food Safety, by Parliamentin its Resolution of 10 March 1998 concerning the Green Paper, by theCouncil in its Resolution of 13 April 1999 and by the Joint ParliamentaryCommittee of the EEA (European Economic Area) in its Resolution of16 March 1999 (Annex I, Refs. 8-12).

Hence the Commission considers that the precautionary principleis a general one which should in particular be taken into considerationin the fields of environmental protection and human, animal and planthealth.

Although the precautionary principle is not explicitlymentioned in the Treaty except in the environmental field, itsscope is far wider and covers those specific circumstanceswhere scientific evidence is insufficient, inconclusive oruncertain and there are indications throughpreliminaryobjective scientific evaluation that there arereasonable grounds for concern that the potentially dangerouseffects on the environment, human, animal or plant health maybe inconsistent with the chosen level of protection.

4. THE PRECAUTIONARY PRINCIPLE ININTERNATIONAL LAW

At international level, the precautionary principle was first recognisedin the World Charter for Nature, adopted by the UN General Assembly in1982. It was subsequently incorporated into various international conventionson the protection of the environment. (cf. Annex II).

This principle was enshrined at the 1992 Rio Conference onthe Environment and Development, during which the Rio Declaration

Page 314: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

314

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

was adopted, whose principle 15 states that: “in order to protect theenvironment, the precautionary approach shall be widely appliedby States according to their capability. Where there are threats ofserious or irreversible damage, lack of full scientific certainty shallnot be used as a reason for postponing cost-effective measures toprevent environmental degradation”. Besides, the United Nations’Framework Convention on Climate Change and the Convention ofBiological Diversity both refer to the precautionary principle. Recently,on 28 January 2000, at the Conference of the Parties to the Conventionon Biological Diversity, the Protocol on Biosafety concerning the safetransfer, handling and use of living modified organisms resulting frommodern biotechnology confirmed the key function of the PrecautionaryPrinciple (see Annex II).

Hence this principle has been progressively consolidated ininternational environmental law, and so it has since become a full-fledged and general principle of international law.

The WTO agreements confirm this observation. Thepreamble to the WTO Agreement highlights the ever closer linksbetween international trade and environmental protection18. Aconsistent approach means that the precautionary principle must betaken into account in these agreements, notably in the Agreementon Sanitary and Phytosanitary Measures (SPS) and in the Agreementon Technical Barriers to Trade (TBT), to ensure that this generalprinciple is duly enforced in this legal order.

Hence, each Member of the WTO has the independent rightto determine the level of environmental or health protection they

8 “The parties to this agreement ... recognising that their relations in the field of trade andeconomic endeavour should be conducted with a view to raising standards of living,Ensuring full employment and a large and steadily growing volume of real income andeffective demand, and expanding the production of and trade in goods and services, whileallowing for the optimal use of the world’s resources in accordance with the objective ofsustainable development, seeking both to protect and preserve the environment and toenhance the means for doing to in a manner consistent with their respective needs andconcerns at different levels of economic development ...”

Page 315: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

315

consider appropriate. Consequently a member may apply measures,including measures based on the precautionary principle, which leadto a higher level of protection than that provided for in the relevantinternational standards or recommendations.

The Agreement on the Application of Sanitary andPhytosanitary Measures (SPS Agreement) clearly sanctions the useof the precautionary principle, although the term itself is not explicitlyused. Although the general rule is that all sanitary and phytosanitarymeasures must be based on scientific principles and that they shouldnot be maintained without adequate scientific evidence, a derogationfrom these principles is provided for in Article 5 (7) which stipulatesthat: “in cases where relevant scientific evidence is insufficient,a Member may provisionally adopt sanitary or phytosanitarymeasures on the basis of available pertinent information,including that from the relevant international organizations aswell as from sanitary or phytosanitary measures applied by otherMembers. In such circumstances, Members shall seek to obtainthe additional information necessary for a more objectiveassessment of risk and review the sanitary or phytosanitarymeasure accordingly within a reasonable period of time.”

Hence, according to the SPS Agreement, measures adoptedin application of a precautionary principle when the scientific dataare inadequate, are provisional and imply that efforts be undertakento elicit or generate the necessary scientific data. It is important tostress that the provisional nature is not bound up with a time limitbut with the development of scientific knowledge.

The use of the term “more objective assessment of risk” inArticle 5.7 infers that a precautionary measure may be based on aless objective appraisal but must nevertheless includes an evaluationof risk.

The concept of risk assessment in the SPS leaves leewayfor interpretation of what could be used as a basis for a precautionaryapproach. The risk assessment on which a measure is based may

Page 316: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

316

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

include non-quantifiable data of a factual or qualitative nature and isnot uniquely confined to purely quantitative scientific data. Thisinterpretation has been confirmed by the WTO’s Appellate body inthe case of growth hormones, which rejected the panel’s initialinterpretation that the risk assessment had to be quantitative andhad to establish a minimum degree of risk.

The principles enshrined in Article 5.7 of the SPS must berespected in the field of sanitary and phytosanitary measures;however, because of the specific nature of other areas, such as theenvironment, it may be that somewhat different principles will haveto be applied.

International guidelines are being considered in relation tothe application of the Precautionary Principle in Codex Alimentarius.Such guidance in this, and other sectors, could pave the way to aharmonised approach by the WTO Members, to drawing up healthor environment protection measures, while avoiding the misuse ofthe precautionary principle which could otherwise lead tounjustifiable barriers to trade.

In the light of these observations, the Commission considersthat, following the example set by other Members of the WTO, theCommunity is entitled to prescribe the level of protection, notablyas regards the environment and human, animal and plant health,which it considers appropriate. In this context, the Community mustrespect Articles 6, 95, 152 and 174 of the Treaty. To this end,reliance on the precautionary principle constitutes an essential plankof its policy. It is clear that the choices made will affect its positionsat international and notably multilateral level, as regards recourse tothe precautionary principle.

Bearing in mind the very origins of the precautionaryprinciple and its growing role in international law, andnotably in the agreements of the World Trade Organisation,

Page 317: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

317

this principle must be duly addressed at international levelin the various areas in which it is likely to be of relevance.

Following the example set by the other members ofthe WTO, the Commission considers that the Communityis entitled to prescribe the level of protection, notably asregards environmental protection and human, animal andplant health, that it considers appropriate. Recourse to theprecautionary principle is a central plank of Communitypolicy. The choices made to this end will continue toinfluence its positions at international level, and notably atmultinational level, as regards the precautionary principle.

5. THE CONSTITUENT PARTS OF THEPRECAUTIONARY PRINCIPLE

An analysis of the precautionary principle reveals two quitedistinct aspects: (i) the political decision to act or not to act assuch, which is linked to the factors triggering recourse to theprecautionary principle; (ii) in the affirmative, how to act, i.e. themeasures resulting from application of the precautionary principle.

There is a controversy as to the role of scientific uncertainty inrisk analysis, and notably as to whether it belongs under risk assessmentor risk management. This controversy springs from a confusion betweena prudential approach and application of the precautionary principle.These two aspects are complementary but should not be confounded.

The prudential approach is part of risk assessment policy whichis determined before any risk assessment takes place and which is basedon the elements described in 5.1.3; it is therefore an integral part of thescientific opinion delivered by the risk evaluators.

On the other hand, application of the precautionary principle ispart of risk management, when scientific uncertainty precludes a full

Page 318: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

318

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

assessment of the risk and when decision-makers consider that thechosen level of environmental protection or of human, animal and planthealth may be in jeopardy.

The Commission considers that measures applying theprecautionary principle belong in the general framework of risk analysis,and in particular risk management.

5.1. FACTORS TRIGGERING RECOURSE TO THE PRECAUTIONARY PRINCIPLE

The precautionary principle is relevant only in the event of apotential risk, even if this risk cannot be fully demonstrated or quantifiedor its effects determined because of the insufficiency or inclusive natureof the scientific data.

It should however be noted that the precautionary principle canunder no circumstances be used to justify the adoption of arbitrarydecisions.

5.1.1. Identification of potentially negative effects

Before the precautionary principle is invoked, the scientific datarelevant to the risks must first be evaluated. However, one factor logicallyand chronologically precedes this evaluation, namely identification ofthe potentially negative effects of a phenomenon. To understand theseeffects more thoroughly it is necessary to conduct a scientificexamination. The decision to conduct this examination without awaitingadditional information is bound up with a less theoretical and moreconcrete perception of the risk.

5.1.2. Scientific evaluation

A scientific evaluation of the potential adverse effects should beundertaken based on the available data when considering whethermeasures are necessary to protect the environment, the human, animal

Page 319: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

319

or plant health. An assessment of risk should be considered wherefeasible when deciding whether or not to invoke the precautionaryprinciple. This requires reliable scientific data and logical reasoning,leading to a conclusion which expresses the possibility of occurrenceand the severity of a hazard’s impact on the environment, or healthof a given population including the extent of possible damage,persistency, reversibility and delayed effect. However it is notpossible in all cases to complete a comprehensive assessment ofrisk, but all effort should be made to valuate the available scientificinformation.

Where possible, a report should be made which indicatesthe assessment of the existing knowledge and the availableinformation, providing the views of the scientists on the reliability ofthe assessment as well as on the remaining uncertainties. If necessary,it should also contain the identification of topics for further scientificresearch.

Risk assessment consists of four components - namelyhazard identification, hazard characterisation, appraisal of exposureand risk characterisation (Annex III). The limits of scientificknowledge may affect each of these components, influencing theoverall level of attendant uncertainty and ultimately affecting thefoundation for protective or preventive action. An attempt tocomplete these four steps should be performed before decision toact is taken.

5.1.3. Scientific uncertainty

Scientific uncertainty results usually from five characteristicsof the scientific method : the variable chosen, the measurementsmade, the samples drawn, the models used and the causal relationshipemployed. Scientific uncertainty may also arise from a controversyon existing data or lack of some relevant data. Uncertainty mayrelate to qualitative or quantitative elements of the analysis.

Page 320: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

320

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

A more abstract and generalised approach preferred by somescientists is to separate all uncertainties into three categories of –Bias, Randomness and True Variability. Some other expertscategorise uncertainty in terms of estimation of confidence intervalof the probability of occurrence and of the severity of the hazard’simpact.

This issue is very complex and the Commission launched aproject “Technological Risk and the Management of Uncertainty”conducted under the auspices of the European Scientific TechnologyObservatory. The four ESTO reports will be published shortly andwill give a comprehensive description of scientific uncertainty.

Risk evaluators accommodate these uncertainty factors byincorporating prudential aspects such as:

– relying on animal models to establish potential effects in man;– using body weight ranges to make inter-species

comparisons;– adopting a safety factor in evaluating an acceptable daily

intake to account for intra- and inter-species variability; themagnitude of this factor depends on the degree of uncertainty of theavailable data;

– not adopting an acceptable daily intake for substancesrecognised as genotoxic or carcinogenic;

– adopting the “ALARA” (as low as reasonably achievable)level as a basis for certain toxic contaminants.

Risk managers should be fully aware of these uncertaintyfactors when they adopt measures based on the scientific opiniondelivered by the evaluators.

However, in some situations the scientific data are not sufficientto allow one to apply these prudential aspects in practice, i.e. in casesin which extrapolations cannot be made because of the absence ofparameter modelling and where cause-effect relationships aresuspected but have not been demonstrated. It is in situations like thesethat decision-makers face the dilemma of having to act or not to act.

Page 321: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

321

Recourse to the precautionary principle presupposes:– identification of potentially negative effects resulting

from a phenomenon, product or process;– a scientific evaluation of the risk which because of

the insufficiency of the data, their inconclusive or imprecisenature, makes it impossible to determine with sufficientcertainty the risk in question.

5.2. MEASURES RESULTING FROM RELIANCE ON

THE PRECAUTIONARY PRINCIPLE

5.2.1. The decision whether or not to act

In the kind of situation described above - sometimes undervarying degrees of pressure from public opinion - decision-makers haveto respond. However, responding does not necessarily mean thatmeasures always have to be adopted. The decision to do nothing maybe a response in its own right.

The appropriate response in a given situation is thusthe result of an political decision, a function of the risk levelthat is “acceptable” to the society on which the risk is imposed.

5.2.2. Nature of the action ultimately taken

The nature of the decision influences the type of control thatcan be carried out. Recourse to the precautionary principle does notnecessarily mean adopting final instruments designed to produce legaleffects that are open to judicial review. There is a whole range of actionsavailable to decision-makers under the head of the precautionary

Page 322: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

322

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

principle. The decision to fund a research programme or even thedecision to inform the public about the possible adverse effects of aproduct or procedure may themselves be inspired by the precautionaryprinciple.

It is for the Court of Justice to pronounce on the legality ofany measures taken by the Community institutions. The Court hasconsistently held that when the Commission or any other Communityinstitution has broad discretionary powers, notably as regards thenature and scope of the measures it adopts, review by the Courtmust be limited to examining whether the institution committed amanifest error or misuse of power or manifestly exceed the limits ofits powers of appraisal.

Hence the measures may not be of an arbitrary nature.

Recourse to the precautionary principle does notnecessarily mean adopting final instruments designed toproduce legal effects, which are subject to judicial review.

6. GUIDELINES FOR APPLYING THEPRECAUTIONARY PRINCIPLE.

6.1. IMPLEMENTATION

When decision-makers become aware of a risk to theenvironment or human, animal or plant health that in the event of non-action may have serious consequences, the question of appropriateprotective measures arise. Decisionmakers have to obtain, through astructured approach, a scientific evaluation, as complete as possible,of the risk to the environment, or health, in order to select the mostappropriate course of action

The determination of appropriate action including measuresbased on the precautionary principle should start with a scientific

Page 323: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

323

evaluation and, if necessary, the decision to commission scientiststo perform an as objective and complete as possible scientificevaluation. It will cast light on the existing objective evidence, thegaps in knowledge and the scientific uncertainties.

The implementation of an approach based on theprecautionary principle should start with a scientificevaluation, as complete as possible, and where possible,identifying at each stage the degree of scientificuncertainty.

6.2. THE TRIGGERING FACTOR

Once the scientific evaluation has been performed as bestas possible, it may provide a basis for triggering a decision toinvoke the precautionary principle. The conclusions of thisevaluation should show that the desired level of protection for theenvironment or a population group could be jeopardised. Theconclusions should also include an assessment of the scientificuncertainties and a description of the hypotheses used tocompensate for the lack of the scientific or statistical data. Anassessment of the potential consequences of inaction should beconsidered and may be used as a trigger by the decision-makers.The decision to wait or not to wait for new scientific data beforeconsidering possible measures should be taken by the decision-makers with a maximum of transparency.

The absence of scientific proof of the existence of a cause-effect relationship, a quantifiable dose/response relationship or aquantitative evaluation of the probability of the emergence ofadverse effects following exposure should not be used to justifyinaction. Even if scientific advice is supported only by a minorityfraction of the scientific community, due account should be taken

Page 324: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

324

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

of their views, provided the credibility and reputation of this fractionare recognised9.

The Commission has confirmed its wish to rely onprocedures as transparent as possible and to involve all interestedparties at the earliest possible stage10. This will assist decision makersin taking legitimate measures which are likely to achieve the society’schosen level of health or environmental protection.

An assessment of the potential consequences of inactionand of the uncertainties of the scientific evaluation should beconsidered by decisionmakers when determining whether totrigger action based on the precautionary principle.

All interested parties should be involved to the fullestextent possible in the study of various risk management optionsthat may be envisaged once the results of the scientificevaluation and/or risk assessment are available and theprocedure be as transparent as possible.

6.3. THE GENERAL PRINCIPLES OF APPLICATION

The general principles are not limited to application of theprecautionary principle. They apply to all risk managementmeasures. An approach inspired by the precautionary principledoes not exempt one from applying wherever possible thesecriteria, which are generally used when a complete risk assessmentis at hand.

9 cf The WTO Appellate Body report on hormones, paragraph 194: “In some cases, thevery existence of divergent views presented by qualified scientists who have investigatedthe particular issue at hand, may indicate a state of scientific uncertainty”.10A considerable effort has already been made notably as regards public health and theenvironment. As regards the latter, the Community and the Member States havedemonstrated the importance they attach to access to information and justice by signingthe Aarhus Convention of June 1998.

Page 325: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

325

Thus reliance on the precautionary principle is no excusefor derogating from the general principles of risk management.

These general principles include:

· proportionality,· non-discrimination,· consistency,· examination of the benefits and costs of action or lack of

action· examination of scientific developments.

6.3.1. Proportionality

The measures envisaged must make it possible to achieve theappropriate level of protection. Measures based on the precautionaryprinciple must not be disproportionate to the desired level of protectionand must not aim at zero risk, something which rarely exists. However,in certain cases, an incomplete assessment of the risk may considerablylimit the number of options available to the risk managers.

In some cases a total ban may not be a proportional responseto a potential risk. In other cases, it may be the sole possible responseto a potential risk.

Risk reduction measures should include less restrictivealternatives which make it possible to achieve an equivalent level ofprotection, such as appropriate treatment, reduction of exposure,tightening of controls, adoption of provisional limits, recommendationsfor populations at risk, etc. One should also consider replacing theproducts or procedures concerned by safer products or procedures.

The risk reduction measure should not be limited to immediaterisks where the proportionality of the action is easier to assess. It is insituations in which the adverse effects do not emerge until long afterexposure that the cause-effect relationships are more difficult to prove

Page 326: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

326

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

scientifically and that – for this reason – the precautionary principleoften has to be invoked. In this case the potential long-term effectsmust be taken into account in evaluating the proportionality of measuresin the form of rapid action to limit or eliminate a risk whose effects willnot surface until ten or twenty years later or will affect future generations.This applies in particular to effects on the eco-system. Risks that arecarried forward into the future cannot be eliminated or reduced exceptat the time of exposure, that is to say immediately.

Measures should be proportional to the desired level ofprotection.

6.3.2. Non-discrimination

The principle of non-discrimination means that comparablesituations should not be treated differently and that different situationsshould not be treated in the same way, unless there are objective groundsfor doing so.

Measures taken under the precautionary principle should bedesigned to achieve an equivalent level of protection without invokingthe geographical origin or the nature of the production process to applydifferent treatments in an arbitrary manner.

Measures should not be discriminatory in theirapplication.

6.3.3. Consistency

Measures should be consistent with the measures alreadyadopted in similar circumstances or using similar approaches. Riskevaluations include a series of factors to be taken into account to ensurethat they are as thorough as possible. The goal here is to identify andcharacterise the hazards, notably by establishing a relationship betweenthe dose and the effect and assessing the exposure of the targetpopulation or the environment. If the absence of certain scientific data

Page 327: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

327

makes it impossible to characterise the risk, taking into account theuncertainties inherent to the evaluation, the measures taken under theprecautionary principle should be comparable in nature and scope withmeasures already taken in equivalent areas in which all the scientificdata are available.

Measures should be consistent with the measuresalready adopted in similar circumstances or using similarapproaches.

6.3.4. Examination of the benefits andcosts of action and lack of action

A comparison must be made between the most likely positive ornegative consequences of the envisaged action and those of inaction interms of the overall cost to the Community, both in the long- and short-term. The measures envisaged must produce an overall advantage asregards reducing risks to na acceptable level.

Examination of the pros and cons cannot be reduced to aneconomic cost-benefit analysis. It is wider in scope and includes non-economic considerations.

However, examination of the pros and cons should include aneconomic cost-benefit analysis where this is appropriate and possible.

Besides, other analysis methods, such as those concerning theefficacy of possible options and their acceptability to the public may alsohave to be taken into account. A society may be willing to pay a highercost to protect an interest, such as the environment or health, to which itattaches priority.

The Commission affirms, in accordance with the caselaw of the Court that requirements linked to the protection ofpublic health should undoubtedly be given greater weight thaneconomic considerations.

Page 328: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

328

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

The measures adopted presuppose examination of thebenefits and costs of action and lack of action. This examinationshould include an economic cost/benefit analysis when this isappropriate and feasible. However, other analysis methods,such as those concerning efficacy and the socio-economicimpact of the various options, may also be relevant. Besidesthe decisionmaker may, in certain circumstances, by guidedby non-economic considerations such as the protection ofhealth.

6.3.5. Examination of scientific developments

The measures should be maintained as long as the scientificdata are inadequate, imprecise or inconclusive and as long as the risk isconsidered too high to be imposed on society. The measures may haveto be modified or abolished by a particular deadline, in the light of newscientific findings. However, this is not always linked to the time factor,but to the development of scientific knowledge.

Besides, scientific research should be carried out with a view toobtaining a more advanced or more complete scientific assessment. Inthis context, the measures should be subjected to regular scientificmonitoring, so that they can be reevaluated in the light of new scientificinformation.

The Agreement on Sanitary and Phytosanitary Measures (SPS)provides that measures adopted in the context of inadequate scientificevidence must respect certain conditions. Hence these conditionsconcern only the scope of the SPS Agreement, but the specific natureof certain sectors, such as the environment, may mean that somewhatdifferent principles have to be applied.

Article 5(7) of the SPS agreement includes certain specific rules:The measures must be of a provisional nature pending the

Page 329: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

329

availability of more reliable scientific data. However this provisionalnature is linked to the development of scientific knowledge rather thanto a time factor.

Research must be carried out to elicit the additional scientificdata required for a more objective assessment of the risk.

The measures must be periodically reviewed to take account ofnew scientific data. The results of scientific research should make itpossible to complete the risk evaluation and if necessary to review themeasures on the basis of the conclusions.

Hence the reasonable period envisaged in the SPS Agreementincludes the time needed for completion of the necessary scientific workand, besides, the time needed for performance of a risk evaluationbased on the conclusions of this scientific work. It should not be possibleto invoke budgetary constraints or political priorities to justify excessivedelays in obtaining results, reevaluating the risk or amending theprovisional measures.

Research could also be conducted for the improvement of themethodologies and instruments for assessing risk, including greaterintegration of all pertinent factors (e.g. socio-economic information,technological perspectives).

The measures, although provisional, shall be maintainedas long as the scientific data remain incomplete, imprecise orinconclusive and as long as the risk is considered too high to beimposed on society.

Maintenance of the measures depends on thedevelopment of scientific knowledge, in the light of which theyshould be reevaluated. This means that scientific research shallbe continued with a view to obtaining more complete data.

Measures based on the precautionary principle shall bereexamined and if necessary modified depending on the resultsof the scientific research and the follow up of their impact.

Page 330: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

330

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

6.4. THE BURDEN OF PROOF

· Community rules and those of many third countriesenshrine the principle of prior approval (positive list)before the placing on the market of certain products, suchas drugs, pesticides or food additives. This is one way ofapplying the precautionary principle, by shiftingresponsibility for producing scientific evidence. Thisapplies in particular to substances deemed “a priori”hazardous or which are potentially hazardous at a certainlevel of absorption. In this case the legislator, by way ofprecaution, has clearly reversed the burden of proof byrequiring that the substances be deemed hazardous untilproven otherwise. Hence it is up to the businesscommunity to carry out the scientific work needed toevaluate the risk. As long as the human health risk cannotbe evaluated with sufficient certainty, the legislator is notlegally entitled to authorise use of the substance, unlessexceptionally for test purposes.

· In other cases, where such a prior approval proceduredoes not exist, it may be for the user, a private individual,a consumer association, citizens or the public authoritiesto demonstrate the nature of a danger and the level ofrisk posed by a product or process. Action taken underthe head of the precautionary principle must in certaincases include a clause reversing the burden of proof andplacing it on the producer, manufacturer or importer, butsuch an obligation cannot be systematically entertainedas a general principle. This possibility should be examinedon a case-by-case basis when a measure is adopted underthe precautionary principle, pending supplementaryscientific data, so as to give professionals who have naeconomic interest in the production and/or marketing of

Page 331: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

331

the procedure or product in question the opportunity tofinance the necessary research on a voluntary basis.

Measures based on the precautionary principle mayassign responsibility for producing the scientific evidencenecessary for a comprehensive risk evaluation.

7. CONCLUSION

This Communication of a general scope sets out theCommission’s position as regards recourse to the precautionaryprinciple. The Communication reflects the Commission’s desire fortransparency and dialogue with all stakeholders. At the same it is providesconcrete guidance for applying the precautionary principle.

The Commission wishes to reaffirm the crucial importance itattaches to the distinction between the decision to act or not to act,which is of an eminently political nature, and the measures resultingfrom recourse to the precautionary principle, which must complywith the general principles applicable to all risk managementmeasures. The Commission also considers that every decision mustbe preceded by an examination of all the available scientific dataand, if possible, a risk evaluation that is as objective andcomprehensive as possible. A decision to invoke the precautionaryprinciple does not mean that the measures will be adopted on anarbitrary or discriminatory basis.

This Communication should also contribute to reaffirming theCommunity’s position at international level, where the precautionaryprinciple is receivingincreasing attention. However the Commissionwishes to stress that this Communication is not meant to be the lastword; rather, it should be seen as the point of departure for a broaderstudy of the conditions in which risks should be assessed, appraised,managed and communicated.

Page 332: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

332

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

ANNEX I

LEGAL AND OTHER BASES FOR EC DECISIONS ONPRECAUTIONARY MEASURES

THE LEGISLATIVE TEXTS

Ref. 1The EC Treaty, incorporating provisions already introduced by

the Maastricht Treaty of 1992, and more specifically Article 174 thereof,states:

– “2. Community policy on the environment shall aimat a high level of protection taking into account the diversity ofsituations in the various regions of the Community. It shall be basedon the precautionary principle and on the principles that preventiveaction should be taken, that environmental damage should as apriority be rectified at source and that the polluter should pay …

– 3. In preparing its policy on the environment, theCommunity shall take account of:

– available scientific and technical data, …– the potential benefits and costs of action or lack of

action …”

Ref. 2Article 6 of the EC Treaty provides that “environmental

protection requirements must be integrated into the definition andimplementation of the Community policies and activities referredto in Article 3, in particular with a view to promoting sustainabledevelopment”.

Ref. 3Hence, Article 95(3) of the EC Treaty provides that: “The

Commission, in its proposals envisaged in paragraph 1

Page 333: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

333

concerning health, safety, environmental protection andconsumer protection, will take as a base a high level ofprotection, taking account in particular of any new developmentbased on scientific facts. Within their respective powers, theEuropean Parliament and the Council will also seek to achievethis objective”.

Ref. 4The first paragraph of Article 152 of the EC Treaty provides

that: “A high level of human health protection shall be ensured inthe definition and implementation of all Community policies andactivities”.

CASE LAW

Ref. 5In its judgement on the validity of the Commission’s decision

banning the exportation of beef from the United Kingdom to reducethe risk of BSE transmission (Judgements of 5 May 1998, cases C-157/96 and C-180/96), the Court held:

“Where there is uncertainty as to the existence or extent ofrisks to human health, the institutions may take protective measureswithout having to wait until the reality and seriousness of thoserisks become fully apparent.” (Grounds 99). The next sectionfleshes out the Court’s reasoning: “That approach is borne out byArticle 130r(1) of the EC Treaty, according to which Communitypolicy on the environment is to pursue the objective inter alia ofprotecting human health. Article 130r(2) provides that that policyis to aim at a high level of protection and is to be based in particularon the principles that preventive action should be taken and thatenvironmental protection requirement must be integrated into thedefinit ion and implementation of other Communitypolicies.”(Grounds 100).

Page 334: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

334

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

Ref. 6In another judgement concerning protection of consumer

health (Judgement of 16 July 1998, case T-199/96), the Court ofFirst Instance cites the above passage from the BSE judgement (seeGrounds 66 and 67).

Ref. 7Recently, in the Order of 30 June 1999 (Case T-70/99), the

President of the Court of First Instance confirmed the positionsexpressed in the abovementioned judgements. Note that this judgementcontains an explicit reference to the precautionary principle and affirmsthat “requirements linked to the protection of public health shouldundoubtedly be given greater weight that economicconsiderations.”

POLICY ORIENTATIONS

Ref. 8In its Communication of 30 April 1997 on consumer health and

food safety (COM(97) 183 final), the Commission states: “theCommission will be guided in its risk analysis by the precautionaryprinciple, in cases where the scientific basis is insufficient or someuncertainty exists”.

Ref. 9In its Green Paper on the General Principles of Food Law in

the European Union of 30 April 1997 (COM(97) 176 final), theCommission reiterates this point:

“The Treaty requires the Community to contribute to themaintenance of a high level of protection of public health, the environmentand consumers. In order to ensure a high level of protection and coherence,protective measures should be based on risk assessment, taking intoaccount all relevant risk factors, including technological aspects, the best

Page 335: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

335

available scientific evidence and the availability of inspection samplingand testing methods. Where a full risk assessment is not possible, measuresshould be based on the precautionary principle.”

Ref. 10In its Resolution of 10 March 1998 on the Green Paper, the

European Parliament states:“European food law is based on the principle of preventive

protection of consumer health; stresses that policy in this area must befounded on a scientifically-based risk analysise supplemented, wherenecessary, by appropriate risk management based on the precautionaryprinciple; invites the Commission to anticipate possible challenges toCommunity food law by WTO bodies by requesting the scientificcommittees to present a full set of arguments based on the precautionaryprinciple.”

Ref. 11The Joint Parliamentary Committee of the EEA (European

Economic Area), adopted a Resolution on Food Safety in the EEA on16 March 1999. In this connection, on the one hand, it “emphasisesthe importance of application of the precautionary principle” (point5) and, on the other, “reaffirms the over-riding need for aprecautionary approach within the EEA to the assessment andevaluation of applications for the marketing of GMOs intended toenter the food chain…” (point 13).

Ref. 12On 13 April 1999, the Council adopted a Resolution urging the

Commission, inter alia, “to be in the future even more determined tobe guided by the precautionary principle in preparing proposalsfor legislation and in its other consumer-related activities anddevelop as a priority clear and effective guidelines for theapplication of this principle”.

Page 336: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

336

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

ANNEX II

THE PRECAUTIONARY PRINCIPLEIN INTERNATIONAL LAW

THE ENVIRONMENT

Although applied more broadly, the Precautionary Principle hasbeen developed primarily in the context of environmental policy.

Hence, the Ministerial Declaration of the Second InternationalConference on the Protection of the North Sea (1987) states that “inorder to protect the North Sea from possibly damaging effects ofthe most dangerous substances, a precautionary approach isnecessary which may require action to control inputs of suchsubstances even before a causal link has been established byabsolutely clear scientific evidence”. A new Ministerial Declarationwas delivered at the Third International Conference on the Protectionof the North Sea (1990). It fleshes out the earlier declaration, statingthat “the participants ... will continue to apply the precautionaryprinciple, that is to take action to avoid potentially damagingimpacts of substances that are persistent, toxic and liable tobioaccumulate even where there is no scientific evidence to provea causal link between emissions and effects”.

The Precautionary Principle was explicitly recognised duringthe UN Conference on Environment and Development (UNCED) inRio de Janeiro 1992 and included in the socalled Rio Declaration. Sincethen the Precautionary Principle has been implemented in variousenvironmental instruments, and in particular in global climate change,ozone depleting substances and biodiversity conservation.

The precautionary Principle is listed as Principle 15 of the RioDeclaration among the principles of general rights and obligations ofnational authorities: “In order to protect the environment, theprecautionary approach should be widely applied by States

Page 337: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

337

according to their capabilities. Where there are threats of seriousor irreversible damage, lack of full scientific certainty shall not beused as a reason for postponing costeffective measures to preventenvironmental degradation”.

Principle 15 is reproduced in similar wording in:1. The preamble of the Convention of Biological Diversity

(1992):(…) Noting also that where there is a threat of significant

reduction or loss of biological diversity, lack of full scientificcertainty should not be used as a reason for postponing measuresto avoid or minimise such a threat (…)

2. In article 3 (Principles) of the Convention of Climate Change(1992):

(..) The Parties should take precautionary measures toanticipate, prevent or minimise the causes of climate change andmitigate its adverse effects. Where there are threats of serious orirreversible damage, lack of full scientific certainty should not beused as a reason for postponing such measures, taking into accountthat policies and measures to deal with climate change should becost-effective so as to ensure global benefits at the lowest possiblecost. To achieve this, such policies and measures should take intoaccount different socioeconomic contexts, be comprehensive, coverall relevant sources, sinks and reservoirs of greenhouse gases andadaptation, and comprise all economic sectors. Efforts to addressclimate change may be carried out cooperatively by interested Parties.

In the Paris Convention for the protection of the marineenvironment of the north-east Atlantic (September 1992), theprecautionary principle is defined as the principle “by virtue of whichpreventive measures are to be taken when there are reasonablegrounds for concern that substances or energy introduced, directlyor indirectly, into the marine environment may bring about hazardsto human health, harm living resources and marine ecosystems,damage amenities or interfere with other legitimate uses of the

Page 338: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

338

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

sea, even when there is no conclusive evidence of a causalrelationship between the inputs and the effects.”

Recently, on 28 January 2000, at the Conference of the Partiesto the Convention on

Biological diversity, the Protocol on Biosafety concerning thesafe transfer, handling and use of living modified organisms resultingfrom modern biotechnology confirmed the key function of thePrecautionary Principle. In fact, article 10, paragraph 6 states: “Lackof scientific certainty due to insufficient relevant scientificinformation and knowledge regarding the extent of the potentialadverse effects of a living modified organism on the conservationand sustainable use of biological diversity in the Party of import,taking also into account risks to human health, shall not preventthat Party from taking a decision, as appropriate, with regard tothe import of living modified organism in question as referred to inparagraph 3 above, in order to avoid or minimize such potentialadverse effects”.

Besides, the preamble to the WTO Agreement highlights theever closer links between international trade and environmentalprotection.

THE WTO SPS AGREEMENT

Although the term „Precautionary Principle” is not explicitly usedin the WTO Agreement on the Application of Sanitary and PhytosanitaryMeasures (SPS), the Appellate Body on EC measures concerning meatand meat products (Hormones) (AB-1997-4, paragraph 124) statesthat it finds reflection in Article 5.7 of this Agreement. Art 5.7 reads:

“In cases where relevant scientific evidence is insufficient,a Member may provisionally adopt sanitary or phytosanitarymeasures on the basis of available scientific information,including that from the relevant international organizationsas well as from sanitary and phytosanitary measures applied

Page 339: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

339

by other Members. In such circumstances, Members shallseek to obtain the additional information necessary for amore objective assessment of risk and review the sanitary orphytosanitary measure accordingly within a reasonableperiod of time.”

The Appellate Body on Hormones (Paragraph 124)recognises….” that there is no need to assume that Article 5.7 exhauststhe relevance of a precautionary principle”. Moreover, Members havethe “right to establish their own level of sanitary protection, which levelmay be higher (i.e. more cautious) than that implied in existinginternational standards, guidelines and recommendations”. Furthermore,it accepts that “responsible, representative governments commonly actfrom perspectives of prudence and precaution where risks of irreversible,e.g. life-terminating, damage to human health are concerned.” TheAppellate Body on Japan-Measures affecting agricultural products(AB-1998-8, paragraph 89) clarifies the four requirements which mustbe met in order to adopt and maintain provisional SPS measures. AMember may provisionally adopt an SPS measure if this measure is:

1) imposed in respect of a situation where „relevant scientificinformation is insufficient”; and

2) adopted “on the basis of available pertinent information”.

Such a provisional measure may not be maintained unless theMember which adopted the measure:

1) seek(s) to obtain the additional information necessary for amore objective risk assessment”; and

2) review(s) the … measure accordingly within a reasonableperiod of time”

These four requirements are clearly cumulative and are equallyimportant for the purpose of determining consistency with the provisionof Art 5.7. Whenever one of these four requirements is not met, the

Page 340: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

340

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

measure at issue is inconsistent with Art 5.7. As to what constitutes a„reasonable period of time” to review the measure, the Appellate Bodypoints out (Paragraph 93), that this has to be established on a case-by-case basis and depends on the specific circumstances of each case,including the difficulty of obtaining the additional information necessaryfor the review and the characteristics of the provisional SPS measure.

Page 341: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

341

ANNEX III

THE FOUR COMPONENTS OF RISK ASSESSMENT

An attempt to complete as far as possible these fourcomponentes should be performed before action is taken:

· Hazard identification means identifying the biological,chemical or physical agents that may have adverse effects.A new substance or biological agent may reveal itself throughits effects on the population (illness or death), or on theenvironment and it may be possible to describe the actual orpotential effects on the population or environment beforethe cause is identified beyond doubt.

· Hazard characterisation of determining, in quantitative and/or qualitative terms, the nature and severity of the adverseeffects associated with the causal agents or activity. It is atthis stage that a relationship between the amount of thehazardous substance and the effect has to be established.However, the relationship is sometimes difficult or impossibleto prove, for instance because the causal link has not beenestablished beyond doubt.

· Appraisal of exposure consists of quantitatively orqualitatively evaluating the probability of exposure to the agentunder study. Apart from information on the agents themselves(source, distribution, concentrations, characteristics, etc.),there is a need for data on the probability of contaminationor exposure of the population or environment to the hazard.

· Risk characterisation corresponds to the qualitative and/orquantitative estimation, taking account of inherentuncertainties, of the probability, of the frequency and severityof the know or potential adverse environmental or healtheffects liable to occur. It is established on the basis of the

Page 342: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

342

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

three preceding and closely depends on the uncertainties,variations, working hypotheses and conjectures made at eachstage of the process. When the available data are inadequateor non-conclusive, a prudent and cautious approach toenvironmental protection, health or safety could be to optfor the worst-case hypothesis. When such hypotheses areaccumulated, this will lead to an exaggeration of the real riskbut gives a certain assurance that it will not be underestimated.

Page 343: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

EUROPEAN COUNCIL RESOLUTION ON THEPRECAUTIONARY PRINCIPLE

WORLD TRADE ORGANIZATIONG/SPS/GEN/225G/TBT/W/154WT/CTE/W/1812 February 2001(01-0542)

Committee on Sanitary and Phytosanitary MeasuresCommittee on Technical Barriers to TradeCommittee on Trade and EnvironmentOriginal: English/ French/ Spanish

EUROPEAN COUNCIL RESOLUTION ON THEPRECAUTIONARY PRINCIPLE

SUBMISSION BY THE EUROPEAN COMMUNITIES

The attached Resolution of the European Council on theprecautionary principle was received from the European Communitieswith the request that it be circulated to Members for their information.This resolution was adopted at the European Council Meeting in Nice

343

ANEXO 4

Page 344: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

344

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

on 7-9 December 2000, as Annex III of the Presidency Conclusions.This submission is a follow-up to the Communication of the EuropeanCommission on the precautionary principle, adopted 2 February 2000.The previous document was circulated to delegations as WT/CTE/W/147-G/TBT/W/137 and G/SPS/GEN/168.

EUROPEAN COUNCIL RESOLUTION ON THEPRECAUTIONARY PRINCIPLE

A. Whereas the principles laid down in the EC Treaty providethat Community action must aim at a high level of protection of humanhealth, consumers and the environment and that these objectives mustbe integrated into the European Union’s policies and action;

B. Whereas the Treaty recognizes, in Article 174(2), that theprecautionary principle is one of the principles to be taken into accountin Community policy on the environment; whereas this principle is alsoapplicable to human health, as well as to the animal health and planthealth sectors;

C. Whereas it might be useful to examine, in due course and inthe appropriate fora, whether it is necessary and possible formally toconsolidate the precautionary principle, in accordance with the caselaw of the Court of Justice of the European Communities, also in otherTreaty provisions specifically concerning health and consumerprotection;

D. Recalling that the recognition of this principle is to be seenfrom a perspective of sustainable development;

E. Recalling that this principle is included in various internationaltexts, inter alia the 1992 Rio Declaration, the 1992 Convention onClimate Change, the 1992 Convention on Biological Diversity, the 2000

Page 345: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

345

Protocol on Biosafety and a number of Conventions on protection ofthe marine environment;

F. Pointing to the importance of work in progress on the subjectin the Codex Alimentarius context;

G. Whereas the precautionary principle must not be used inorder to introduce disguised trade restrictions;

H. Whereas the preamble to the World Trade Organization (WTO)Agreement sets out general objectives which include sustainable developmentand environmental protection and conservation; whereas Article XX of theGATT and Article XIV of the GATS contain general exceptions, whileArticle 5(7) of the Agreement on the Application of Sanitary andPhytosanitary Measures (SPS) lays down rules on the procedure to befollowed in the event of risk and insufficient scientific evidence; whereas theAgreement on Technical Barriers to Trade (TBT) allows account to betaken of the risks that failure to apply measures might pose for humanhealth or safety, animal or plant life or the environment;

I. Whereas the European Union attaches great importance tohelping developing countries to participate in the SPS and TBTAgreements in view of their particular difficulties in that respect;

J. Recalling the recommendations made by WTO panels, inparticular by the Appellate Body in the hormones case, concerning theright of WTO Members to “establish their own appropriate level ofsanitary protection, which level may be higher than that implied in existinginternational standards, guidelines and recommendations”, and to takeinto consideration minority expert opinion;

K. Realising that public authorities have a responsibility to ensurea high level of protection of human health and the environment and

Page 346: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

346

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

have to address increased public concern regarding the risks to whichthe public are potentially exposed;

_______________

1.Welcomes the Commission’s initiative in presenting acommunication on the precautionary principle, the broad lines of whichthe Council endorses;

2.Considers that the precautionary principle applies to thepolicies and action of the Community and its Member States andconcerns action by public authorities both at the level of the Communityinstitutions and at that of Member States; that such authorities shouldendeavour to have that principle fully recognized by the relevantinternational fora;

3.Notes that the precautionary principle is gradually assertingitself as a principle of international law in the fields of environmental andhealth protection;

4.Considers that WTO rules do basically allow account to betaken of the precautionary principle;

5.Believes that under international law the Community and theMember States are entitled to establish the level of protection theyconsider appropriate in risk management, that they may to that endtake appropriate measures under the precautionary principle and that itis not always possible to determine in advance the level of protectionappropriate to all situations;

6.Sees a need to establish guidelines for use of the precautionaryprinciple, in order to clarify arrangements for its application;

Page 347: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

347

7.Considers that use should be made of the precautionaryprinciple where the possibility of harmful effects on health or theenvironment has been identified and preliminary scientific evaluation,based on the available data, proves inconclusive for assessing the levelof risk;

8.Considers that the scientific assessment of the risk mustproceed logically in an effort to achieve hazard identification, hazardcharacterization, appraisal of exposure and risk characterization, withreference to procedures recognized at Community level andinternationally, and that, owing to insufficient data and the nature orurgency of the risk, it may not always be possible to complete everystage systematically;

9.Considers that, in order to carry out the risk assessment, publicauthorities must have suitable research facilities and rely in particular onscientific committees and on relevant national and international scientificwork; that the public authorities are responsible for organizing the riskassessment, which must be carried out in a multidisciplinary, independentand transparent manner and ensure that all views are heard;

10.Considers that an assessment of risk must also report anyminority opinions. It must be possible to express such opinions andbring them to the knowledge of the parties involved, in particular if theydraw attention to scientific uncertainty;

11.Affirms that those responsible for scientific assessment ofrisk must be functionally separate from those responsible for riskmanagement, albeit with ongoing exchange between them;

12.Considers that risk management measures must be takenby the public authorities responsible on the basis of a political appraisalof the desired level of protection;

Page 348: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

348

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

13.Believes that, in selecting the risk management measures tobe taken, consideration should be given to the whole range of measuresenabling the desired level of protection to be achieved;

14.Considers that all stages must be conducted in a transparentmanner, in particular the risk assessment and management stages,including the monitoring of measures decided upon;

15.Considers that civil society must be involved and specialattention must be paid to consulting all interested parties as early aspossible;

16.Considers that appropriate means must be used forcommunicating information on scientific opinion and risk managementmeasures;

17.Considers that measures must observe the principle ofproportionality, taking account of short-term and long-term risks andaiming to achieve the desired high level of protection;

18.Considers that measures must not be applied in a way resultingin arbitrary or unwarranted discrimination; where there are a number ofpossible means of attaining the same level of health or environmentalprotection, the least trade-restrictive measures should be opted for;

19.Considers that measures should be consistent with measuresalready adopted in similar circumstances or following similar approaches,having due regard to the latest scientific developments and developmentsin the level of protection sought;

20.Stresses that the measures adopted presuppose examinationof the benefits and costs of action and inaction. This examination musttake account of social and environmental costs and of the public

Page 349: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

ANEXOS

349

acceptability of the different options possible, and include, wherefeasible, an economic analysis, it being understood that requirementslinked to the protection of public health, including the effects of theenvironment on public health, must be given priority;

21.Considers that decisions taken in accordance with theprecautionary principle should be reviewed in the light of developmentsin scientific knowledge. To that end the impact of such decisions shouldbe monitored and additional research conducted in order to reduce thelevel of uncertainty;

22.Considers that, when determining measures taken inaccordance with the precautionary principle and in monitoring them, thecompetent authorities should be able to decide case by case, on the basisof clear rules established at the appropriate level, who is responsible forproviding the scientific data required for a fuller risk assessment; Such anobligation may vary according to the circumstances and the aim must beto strike a satisfactory balance between the public authorities, scientificbodies and economic operators, taking into account in particular theresponsibility held by economic operators by virtue of their activities.

23.Undertakes to put into practice the principles contained inthis Resolution;

24.Calls on the Commission to:

· Systematically apply its guidelines on the conditions for useof the precautionary principle, making allowance for thespecific features of the various areas in which they may beimplemented;

· incorporate the precautionary principle, wherever necessary,in drawing up its legislative proposals and in all its actions;

Page 350: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo

350

MARIA NAZARETH FARANI AZEVÊDO

25.Calls on the Member States and the Commission to:

· Attach particular importance to the development of scientificexpertise and to the necessary institutional coordination;

· ensure that the precautionary principle is fully recognized inthe relevant international health, environment and world tradefora, in particular on the basis of the principles put forwardin this Resolution; to pursue that aim and ensure that it istaken into account as fully as possible, particularly at theWTO, and at the same time help to explain it;

· ensure that the public and the various parties involved areinformed as fully as possible about the state of scientificknowledge, the issues at stake and the risks to which theyand their environment are exposed;

· work actively for international partners’ commitment toreaching an understanding on the application of the principle;and

· have this Resolution as widely disseminated as possible.

Page 351: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo
Page 352: A OMC e a Reforma Agrícola - Funagfunag.gov.br/biblioteca/download/625-OMC_e_a_Re... · processo decisório e ao ônus da prova, à luz do Princípio da Precaução. O mesmo Capítulo