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0 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO CAMPUS XIV COLEGIADO DE LETRAS ANA ELMA DOS SANTOS SILVA A PRÁTICA DE LITERATURA NO ENSINO MÉDIO: COMO INOVAR? Conceição do Coité 2012

A prática de literatura no ensino médio como inovar

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Page 1: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS XIV

COLEGIADO DE LETRAS

ANA ELMA DOS SANTOS SILVA

A PRÁTICA DE LITERATURA NO ENSINO MÉDIO: COMO

INOVAR?

Conceição do Coité

2012

Page 2: A prática de literatura no ensino médio como inovar

1

ANA ELMA DOS SANTOS SILVA

A PRÁTICA DE LITERATURA NO ENSINO MÉDIO: COMO

INOVAR?

Trabalho de conclusão apresentado

ao curso de Letras com Habilitação

em Língua Portuguesa e Literatura –

Licenciatura, na Universidade do

Estado da Bahia, como requisito

parcial de obtenção do grau de

Licenciatura em Letras.

Orientadora: Profa. Juréia Maria

Ferreira da Silva.

Conceição do Coité

2012

Page 3: A prática de literatura no ensino médio como inovar

2

Dedico este trabalho à minha

família, pelo apoio na escolha

do Curso e pelas contribuições

para realização deste.

Page 4: A prática de literatura no ensino médio como inovar

3

AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus pela vida e oportunidade de estudar.

A família pelo apoio e ajuda na realização de algumas atividades.

Aos colegas que souberam me compreender e exerceram companheirismo.

Aos diretores, professores e alunos das escolas que cederam informações

necessárias à realização desta monografia.

Aos professores que me ofereceram bons ensinamentos.

E, de forma especial, a professora Juréia Ferreira pela humildade, dedicação,

paciência nas orientações e os bons conselhos oferecidos para realização dessa

pesquisa.

Page 5: A prática de literatura no ensino médio como inovar

4

“O bom educador é o que consegue, enquanto fala, trazer

o aluno até a intimidade do movimento de seu

pensamento” (Paulo Freire).

Page 6: A prática de literatura no ensino médio como inovar

5

RESUMO

A partir da premissa que a literatura está constantemente presente no cotidiano de cada indivíduo, esta monografia tem como objetivos identificar e propor estratégias metodológicas para o ensino de literatura em escolas de nível médio, tomando como objeto de estudo duas escolas da cidade de Valente/BA. O intuito do trabalho é perceber o desenvolvimento pessoal dos alunos perante a literatura, se o ensino desta contribui para a vida dos leitores e se os tornam sujeitos atuantes na comunidade em que vivem. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e as teorias de Lajolo (1999), Cosson (2006), Leite (2002), Masini (2004), Machado (2002), Martins (2006), Compagnon (2003), Coutinho (1995), entre outros, direcionam e apontam melhorias no ensino de Literatura no nível médio. Para completar tais vozes, realizou-se pesquisa qualitativa com abordagem fenomenológica com técnicas de pesquisa participante e questionário de entrevista com professores e alunos. Os resultados apresentados apontam que o ensino de Literatura no nível médio ainda encontra-se focado em análises históricas e estudos de textos, sem trabalhar a relação entre Literatura e vida, o que tira do aluno/leitor o conhecimento crítico e expressivo e a oportunidade de uma aprendizagem significativa. Palavras-chave: Ensino Médio. Literatura. Vida.

Page 7: A prática de literatura no ensino médio como inovar

6

ABSTRACT

At From the premise that literature is constantly present in everyday life of each individual, this thesis aims to identify and propose methodological strategies for teaching literature in high schools, taking as an object of study two schools of Valente city/BA. The aim of this work is to realize the personal development of students before the literature, the teaching of this contributes to readers' lives and make them liable active in the community they live in. The National Curriculum Parameters (NCP) and the theories of Lajolo (1999), Cosson (2006), Leite (2002), Masini (2004), Machado (2002), Martins (2006), Compagnon (2003), Coutinho (1995) , among others, direct and link improvements in teaching literature in high school. To complete these voices, there was qualitative research with a phenomenological approach to participatory research techniques and questionnaire interviews with teachers and students. These results suggest that the teaching of literature at the secondary level is still focused on historical analysis and study of texts, without working the relationship between literature and life, which takes the student / reader critical knowledge and expressive and an opportunity to meaningful learning. Keywords: Teaching Medium. Literature. Life.

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ..................................................................................... 9

CAPITULO I A PRÁTICA DE LITERATURA NO ENSINO MÉDIO:

COMO INOVAR? ........................................................

11

1.1 O que é literatura? ...................................................... 11

1.2 A função da literatura .................................................. 15

1.3 Teoria da recepção ..................................................... 18

1.4 A literatura escolarizada .............................................. 22

CAPITULO II REFERENCIAL METODOLÓGICO .............................

28

2.1 Metodologia de pesquisa qualitativa com abordagem

fenomenológica

............................................................

28

2.2 Descrição do Lócus da pesquisa ................................. 30

2.3 Coletas de dados ......................................................... 32

2.3.1 Observação participante .............................................. 33

2.3.2 Questionário de entrevista ........................................... 34

CAPITULO III ANÁLISE DE DADOS ..................................................

36

3.1 O ensino de literatura: uma prática desarticulada das

propostas curriculares e das necessidades do aluno

......................................................................................

36

3.2 A escolarização da literatura em detrimento de uma

formação leitora para a humanização do aluno / leitor

......................................................................................

43

Page 9: A prática de literatura no ensino médio como inovar

8

3.3 O sentido da literatura no Ensino Médio: alunos

desinteressados, professores desestimulados

......................................................................................

53

CONSIDERAÇÕES

FINAIS.......................................................................... 68

REFERÊNCIAS

......................................................................................

APÊNDICES

......................................................................................

Page 10: A prática de literatura no ensino médio como inovar

9

INTRODUÇÃO

Esta monografia foi produzida com a intenção de entender como está

ocorrendo o ensino de literatura no nível médio e, quais os meios de inovar essa

prática.

Buscou-se entender se o trabalho com a literatura contempla as

especificidades de significação e produção que são propostas pelo texto literário. E

também, se esse trabalho oferece ao aluno uma aprendizagem significativa e um

crescimento crítico e expressivo, tornando-o sujeito capaz de atuar no contexto em

que vive.

O principal objetivo desse trabalho é propor estratégias metodológicas para o

ensino de literatura em escolas de nível médio, com vistas à obtenção de uma

aprendizagem mais efetiva no domínio da literatura, além de identificar estratégias

para a prática educativa de literatura com base nos Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCN) do ensino médio e, observar como essas estratégias se efetivam

em sala de aula. Objetiva-se ainda, descrever como é realizada a prática

pedagógica por professores do ensino médio com o texto literário, bem como

contrastar a metodologia utilizada pelos professores de literatura com os métodos

indicados pelos PCN de nível médio.

Como a literatura está constantemente presente no cotidiano de cada

indivíduo, e tem o poder de encantar e fascinar quem a consome, o interesse pelo

tema surgiu a partir da necessidade de buscar formas alternativas de aprimoramento

da prática do professor, em função de serem poucos os recursos disponíveis nesta

área que mostrem as possibilidades de um ensino mais dinâmico e mais

contextualizado.

Para concretização desse estudo optou-se por uma pesquisa qualitativa com

abordagem fenomenológica, sendo realizada uma pesquisa de campo em duas

escolas do município de Valente, sendo estas o Colégio Estadual César Borges e o

Colégio Estadual Wilson Lins, e observações diretas e participantes. Além disso,

foram aplicados questionários de entrevista para professores e para alunos. Dessa

forma, considerando-se a abrangência da Literatura, este estudo propõe estratégias

que possam ajudar a solucionar o problema e essas propostas enfatizam a relação

do leitor com o texto literário e sua realidade.

Page 11: A prática de literatura no ensino médio como inovar

10

Esta monografia encontra-se desenvolvida em três capítulos. No capítulo 1,

foi apresentada a Literatura, sua função, recepção e sua prática no Ensino Médio.

Essas descrições foram embasadas por teóricos como Compagnon (2003), Cosson

(2006), Coutinho (1995), Eagleton (2003), Lajolo (1999), Leite (2002), Martins

(2006), Coelho (1993), apenas para citar alguns. No capítulo 2, embasado por

Bicudo (1994), Goldenberg (2003), Lakatos e Marconi (1996), Machado (1994),

Noronha (2004), Masini (2004), entre outros, far-se-á uma descrição da metodologia

de pesquisa com abordagem fenomenológica, a ser utilizada para a coleta dos

dados, e também para a pesquisa participante e o questionário de entrevista. No

capítulo 3, apresenta-se o resultado da pesquisa, a prática desarticulada, a

Literatura escolarizada e o sentido desta no Ensino Médio.

Entendo, por conseguinte, que a proposta contida neste estudo possibilitará

o desenvolvimento de uma nova concepção sobre como conduzir as aulas de

literatura e, principalmente, como encontrar metodologias para lecionar essa

disciplina de modo a propiciar aos alunos a oportunidade de uma aquisição do

conhecimento que seja enriquecedora, transformadora e prazerosa.

Page 12: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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CAPÍTULO 1 A PRÁTICA DE LITERATURA NO ENSINO MÉDIO: como inovar?

A Literatura no Ensino Médio é um considerável meio dos alunos não só

adquirirem conhecimentos acerca de escolas literárias e dados biográficos de

autores de diferentes períodos, também é necessário que saibam o que é e qual a

função, a recepção dos textos/obras pelos alunos e a que se destina a literatura.

Entretanto, mais do que isso, o estudo de Literatura no currículo das escolas é

importante tanto para o processo do conhecimento escolar como para o papel de

cidadão consciente. Dessa forma, através do professor de Língua e Literatura, a

escola deve, no ato do ensino, levar em consideração a realidade sócio-cultural dos

discentes, para assim, contribuir para a formação de uma consciência crítica de

mundo e formar cidadãos competentes e atuantes no convívio social e, ainda,

estimular nestes, a capacidade da criatividade, da curiosidade e o gosto pela leitura,

tornando-os então, leitores hábeis e autônomos.

1.1 O que é literatura?

De acordo com o Dicionário Aurélio, século XXI, Literatura classifica-se como:

[Do lat. litteratura.] s.f. 1. Arte de compor ou escrever trabalhos artísticos em prosa

ou verso. 2. O conjunto de trabalhos literários dum país ou duma época.

Através dos tempos, foram estabelecidos e criados por teóricos, muitos e

diferentes conceitos acerca da literatura. Entretanto, nenhum desses chega a ser

decisivo e completo, pois cada época e teórico baseia-se em diferentes tipos de

conhecimentos da vida, da arte, da palavra; enfim, dos valores e desvalores do

mundo e da condição humana.

Page 13: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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Nunca se chegou a uma definição concreta da Literatura, porém, dentre todos

os conceitos criados, é de comum acordo que a literatura é um tipo de manifestação

artística que tem como „matéria prima‟ a palavra.

Literatura é Arte, é um ato criador que, por meio da palavra, cria um universo autônomo, realista ou fantástico, onde os seres, coisas, fatos, tempo e espaço mesmo que se assemelhem ao que podemos reconhecer no mundo concreto que nos cerca, ali transformados em linguagem, assumem uma direção diferente: pertencem ao universo da ficção (COELHO, 1993, p. 37).

A Literatura é o reflexo, exposto em forma de texto, da experiência de um

artista vivenciada em uma determinada época. Mediante a visão que o artista possui

das ideologias presentes na sociedade em que vive, utiliza-se deste pretexto para

expor seu pensamento sobre a realidade e, o faz através da ficção, recriando tal

realidade por meio de outras palavras. É arte que usa os conteúdos dos textos para

proporcionar prazer e também estabelecer comunicação e, esta comunicação é feita

através de diferentes meios, tais como livros, televisão, rádio, revistas, cinema,

teatro entre outros que fazem da palavra seu elemento comum.

Além de tudo isso, a Literatura tem a capacidade de provocar estranhamento;

a cada releitura que fizermos de um mesmo texto, ainda nos serão apresentados

novos elementos que nos causarão estranhamento, uma vez que, muitas das

palavras são expostas não somente pela significação própria, mas empregadas no

sentido mais geral que se pode atribuir a um termo. Na definição de Vítor Manuel de

Aguiar e Silva (2009), “[...] o texto literário caracteriza-se pelo facto de pertencer a

uma linguagem de conotação” (p. 654).

A linguagem da Literatura é uma forma particular, diferente da linguagem

„comum‟ que usamos no nosso cotidiano. “A literatura transforma e intensifica a

linguagem comum, afastando-se sistematicamente da fala cotidiana” (EAGLETON,

2003, p. 2). Ela tem leis específicas, estruturas e mecanismos próprios que refletem

sobre a realidade social, constituindo um erro, na visão de Terry Eagleton,

considerar esse vasto campo de saberes unicamente como expressão do

pensamento de um autor.

A Literatura tem uma especificidade única, a de agir sobre o homem e fazer

com que este tenha uma visão variada da realidade. Diferente da fala cotidiana, que

Page 14: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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muitas vezes, por estar amortecida e apagada, é ignorada, a linguagem da literatura

busca elevar a palavra, e por meio dela, tornar belo aquilo que é considerado

comum no dia a dia. O escritor/ artista, por meio de seu instrumento de trabalho, que

é a palavra, intensifica o significado daquilo que realmente já existe. “A literatura,

impondo-nos uma consciência dramática da linguagem, renova essas reações

habituais “perceptíveis”” (EAGLETON, 2003, p. 5).

A Literatura não deve concentrar seu valor no que concerne às técnicas e aos

métodos que estimulam e favorecem a memorização, mas deve sim, ser entendida

como obra artística mais ampla, que busca representar a experiência real das

diferentes culturas.

Antônio Soares Amora (1977), diz que só na teoria é possível separar o

conteúdo da forma, para ele é impossível apreciar e compreender a literatura sem

entender o que significam as palavras e as frases que compõem uma obra. “[...] o

fenômeno literário é muito mais que simplesmente uma obra que está diante de

nossos olhos e que é conteúdo-forma;” (p. 61).

Uma obra literária é o reflexo da expressão dos conhecimentos individuais de

um determinado autor. Mas, se todos nós, escritores e leitores, temos nosso

conhecimento, o que determina que um escrito de uma determinada pessoa seja

considerado literatura, enquanto que um texto e/ou mesmo uma carta escritos por

nós, leitores comuns, não sejam? Segundo Amora (1977), o que caracteriza

determinada obra como tal, é a forma de percepção da realidade nela descrita,

realidade profunda e original que surge da íntima intuição do autor e é transformada

no conteúdo da narrativa.

O artista possui a sensibilidade de perceber, com maior facilidade, a realidade

que o rodeia, vê de outro ângulo as dúvidas da vida. Por assim se diferenciar do

homem comum, o escritor é capaz de criar novas expressões e desenvolver melhor

a palavra e, assim, quem tem mais conhecimento para dizer algo, o faz de forma

mais espontânea e expressiva. A única diferença entre o leitor comum e o escritor é

que o último é naturalmente dotado de bem mais expressão e intuição da realidade

do que o primeiro. “[...] a expressão do conhecimento intuitivo e individual só é

literatura quando o conteúdo dessa expressão é uma intuição profunda e original da

realidade” (p. 52).

Page 15: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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A Literatura, em princípio, sempre será considerada como arte. Arte da

palavra, da emoção, da criação dentre tantas outras características. O artista

transforma e recria a realidade por meio de seu espírito criador e, através das

palavras, expõe na obra literária, a forma recriada da imaginação. Contudo, mesmo

com o avanço da modernidade através dos tempos, algumas particularidades

próprias do estudo de uma obra literária permanecem conservadas.

Afrânio Coutinho (1995) mostra que no século XIX havia uma falta de fé na

literatura, uma vez que os estudos literários não passavam de estudos históricos. O

autor defende também que a literatura devia ser vista, estudada e aplicada de forma

crítica sendo valorizada a sua estética. Para ele, não é preciso abandonar a

dimensão histórica, apenas colocá-la em segundo plano, pois, a estética literária

pode fazer uso do material histórico para dar caminho à crítica. O teórico mostra

que:

A obra literária é encarada como instituição social. Para interpretá-la, julga-se mister elucidar os componentes da estrutura social em que apareceu. O estudo crítico, assim, reduzir-se-ia a uma simples variedade de estudo social e a obra a condição de documento (p. 60).

No entanto, toma defesa que a causa primária da Literatura é de cunho

estético e não histórico. Que o fenômeno literário precisa estar em paralelo com os

outros modos de vida com os quais se relaciona e, que em toda e qualquer instância

a Literatura não deve deixar de ser considerada uma arte.

Dotada de uma composição específica, que elementos intrínsecos lhe fornecem, tem um desenvolvimento autônomo. A crítica é, sobretudo, a análise desses componentes intrínsecos, dessa substância estética, a ser estudada como arte e não como documento social ou cultural, com um mínimo de referência ao ambiente sócio-histórico (p. 61).

A literatura tem sua compreensão na própria natureza. Em suas leis,

elementos intrínsecos e particulares estão a essência de seus conteúdos.

Desenvolve-se, de forma imanente, e isso seria mostrado de forma melhor se fosse

retratada como pura arte, e não como objeto de análise histórica e social. As

Page 16: A prática de literatura no ensino médio como inovar

15

Orientações Curriculares Para o Ensino Médio (2006) propõem estratégias

metodológicas que mostram que para cumprir com os objetivos de uma Literatura

humanizadora, “não se deve sobrecarregar o aluno com informações sobre épocas,

estilos, características de escolas literárias, etc., como até hoje tem ocorrido, [...]” (p.

54). Dessa forma, cabe à Escola colocá-las em práticas da melhor forma possível,

buscando a maneira mais adequada dos alunos adquirirem informação e

conhecimento. Assim, os discentes poderão estudar Literatura sem amarras, com

possibilidade de um aprendizado significativo, eficiente e prazeroso, capaz de abrir

uma diferente visão do mundo em que vivem.

1.2 A função da Literatura

Diz-se que a principal função da Literatura é proporcionar prazer e, que sua

característica primordial é a representação da realidade. Porém, através da

linguagem, proporciona também aos leitores o encontro com os diferentes fatores da

cultura, tais como: transmitir informações, causar sensações, emoções, rejeições e,

principalmente, atuar na educação e formação do homem como um ser social,

promovendo aquisição do conhecimento e, possibilitando-lhe reconhecer a realidade

em que vive representada no mundo ficcional. Pode ainda, integrar o leitor ao

universo vivenciado pelas personagens, associando a realidade da obra às

experiências pessoais.

O trabalho da Literatura, de um modo geral, consiste em inovar, deixar a

linguagem comum de lado para falar do cotidiano em uma linguagem própria, que

pode representar diferentes sentidos e/ou interpretações para uma só palavra. E,

através dessas palavras expressivas, o mundo real ganha uma nova significação.

Pois, a linguagem cotidiana com a mesma rapidez com que pode ser compreendida,

pode ser também esquecida; enquanto que a linguagem literária é diferente, possui

elementos próprios e diferentes. A linguagem comum é denotativa e espontânea; a

literária segue regras e leis próprias, é conotativa, contínua, constante e persistente.

A Literatura faz uso do material linguístico para anunciar o seu dizer. É como diz

Page 17: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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Antoine Compagnon (2003): “[...] não há essência da literatura, ela é uma realidade

complexa, heterogênea, mutável” (p. 44).

Em geral, existem diferentes funções associadas à ideia de Literatura. A

função cognitiva permite extrair experiências advindas do conhecimento exposto

pelo autor; a função estética permite a visualização do belo, de ver a obra artística

como elemento transmissor da beleza que satisfez nossos desejos e prazeres; a

função catártica adentra o nosso íntimo e nos faz sentir a emoção retratada pelas

palavras; e temos ainda a função social, que retrata a sociedade pela ótica da

opinião de seu povo, estabelecendo assim, através da comunicação exposta em

palavras, uma ligação entre a tríade autor, texto e leitor, proporcionando a esse

último a percepção do mundo que o cerca. Todo indivíduo possui uma história de

vida, e dessa forma, muitos se veem envolvidos nas tramas descritas no texto

literário, deixando fluir seu imaginário nas descrições sociais relatadas.

Todas essas noções da Literatura estão diretamente relacionadas à formação

intelectual do indivíduo e, cabe a esse, reconhecer a importância que lhe é de direito

para que possa continuar exercendo de forma plena todas as suas funções. E, para

isso acontecer, é preciso continuar reforçando a prática da leitura. O leitor encontra

na obra literária a oportunidade de descobrir o novo, de deixar fluir a liberdade que,

às vezes, fica presa dentro de si. Essa é uma das funções da Literatura, possibilitar

ao indivíduo a sensação de coragem, de defesa, de buscar realizar as fantasias que

lhe dão prazer, fazendo desse pensamento, a oportunidade de transformar sua

realidade nos aspectos moral, intelectual e social. Jonathan Culler (1997), numa

abordagem pós – estruturalista ressalta que:

O resultado de ler, parece, é sempre o conhecimento – talvez uma compreensão das limitações impostas pelas convenções interpretativas conhecidas -, como se terminar o livro os conduzisse para fora da experiência da leitura e lhes desse o domínio sobre ela (p. 94).

A função social da Literatura visa ajudar o homem a entender tanto os seus

conflitos, como os que a sociedade lhe impõe. Ler, sempre é sinônimo de uma nova

experiência, e para que haja um questionamento sobre essa experiência é preciso

haver a interação do leitor com o texto. Esse texto se constitui como um objeto de

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análise que permite ao leitor interpretá-lo, e nessa interpretação tem a função de

surpreender, fazer com que algo novo seja descoberto a cada nova interpretação.

Compagnon (2003), fala que a literatura ajuda a desenvolver a percepção dos

leitores. “A literatura, ou arte em geral, renova a sensibilidade linguística dos leitores

através de procedimentos que desarranjam as formas habituais e automáticas da

sua percepção” (p. 41).

É função da Literatura promover a leitura por prazer, que faça com que o

aluno compreenda o texto como possível de múltiplos significados dentro das

diferentes esferas: cultural, social, ideológica, histórica e política. E, ainda, desperte

neste um sentimento agradável pela obra literária, que é capaz de transportá-lo a

outros mundos possíveis. Esse exercício deve propor a compreensão das obras

dentro de uma avaliação crítica e relacionada com a realidade social e/ou pessoal

dos alunos, promovendo, assim, uma leitura interessada, atenta e, principalmente,

prazerosa, que leve em conta a multiplicidade do texto e suas várias possibilidades

de interpretação e significação como mostram os PCN (2000):

O texto é único como enunciado, mas múltiplo enquanto possibilidade aberta de atribuição de significados, devendo, portanto, ser objeto também único de análise/síntese. Este procedimento de estudo da dimensão dialógica dos textos pressupõe abertura para construção de significações e dependências entre aqueles que se propõem estudá-los (p. 19).

Também Coutinho (1995), fala-nos do prazer que a arte literária desperta nos

indivíduos que a cultiva.

A literatura é uma arte, a arte da palavra, isto é, um produto da imaginação criadora, cujo meio específico é a palavra, e cuja finalidade é despertar no leitor ou ouvinte o prazer estético. Tem, portanto, um valor em si, e um objetivo, que não seria de comunicar ou servir de instrumento a outros valores – políticos, religiosos, morais, filosóficos (p. 61).

É com o desenvolver da percepção que vão surgindo as diferentes visões de

mundo representadas nos livros literários. O escritor retrata em suas obras os

acontecimentos da época e da sociedade em que vive isso, porque, toda obra

literária está vinculada a um contexto histórico no qual foi criada. Entretanto, não

Page 19: A prática de literatura no ensino médio como inovar

18

podemos entender a literatura como reflexo da sociedade, ela é o meio pelo qual

são expostas as características e críticas feitas ao sistema de uma sociedade. Ela

tanto pode estar de acordo com a sociedade, como pode também estar em

desarmonia, ela pode andar em companhia do movimento no qual está inserida,

bem como preceder o mesmo. E, nesse ciclo, vai sendo estabelecida a relação do

homem com o universo e com o outro e, quanto à literatura, continua cumprindo sua

verdadeira função humanizadora.

1.3 Teoria da recepção

A teoria da recepção trata da relação existente entre o emissor (autor),

mensagem (texto) e receptor (leitor). Na teoria da recepção há entre literatura e leitor

um conjunto de manipulações para obter um resultado. Logo, o autor pretende algo

com a escrita, porém, o leitor interpreta a leitura de acordo com sua experiência de

vida e com os diversos conhecimentos de mundo que possui (social, pessoal,

intelectual, ideológico, linguístico), nem sempre correspondendo às expectativas do

emissor.

A teoria da recepção apresenta a história da Literatura de forma diferente,

baseada na história da arte literária experienciada por seus leitores. O receptor é o

objeto de estudo da estética da recepção e, essa, busca um leitor necessário ao

conhecimento da estética bem como o conhecimento histórico. Para Culler (1997), o

leitor, representa na leitura do texto, o papel do ouvinte de uma piada, se o ouvinte

não rir, a piada não se constitui como tal. Assim acontece com o aluno/leitor, que

constitui um papel decisivo na recepção do sentido anunciado. A significação da

leitura não se encontra no texto, mas na experiência de vida do leitor. O texto nada

mais é do que um conjunto de estruturas formais que recebem o sentido conferido

pelo leitor.

Um leitor que cria tudo nada aprende, mas um leitor que está constantemente se deparando com o inesperado pode fazer descobertas significativas e perturbadoras. Quanto mais uma teoria salienta a liberdade, o controle e a ação constitutiva do leitor, mais provável é que leve a histórias de encontros e

Page 20: A prática de literatura no ensino médio como inovar

19

surpresas dramáticas, que retratam a leitura como processo de descobrimento (p. 86).

O ato da leitura e seu efeito é privilégio da estética da recepção, que busca

revelar a história da Literatura de outro modo, dessa vez, o objeto de estudo será a

experiência da obra literária vivenciada por seus leitores.

O autor tem o/a papel/função de escrever o texto, mas esse, ao entrar em

contato com o leitor adquire outra forma e produz uma mensagem diferente daquela

pretendida pelo escritor. Isso porque, a vida do leitor possui uma estrutura

totalmente diferente da vida do autor. Dessa forma, quando as experiências de um e

de outro se fundem no ato da leitura, surge algo diferente do que o primeiro leu e do

que o segundo escreveu, o resultado dessa história é o produto da junção de duas

experiências distintas.

A teoria da recepção está voltada não apenas para a produção e leitura de

textos literários, mas também a recepção de tais textos, ou seja, o modo como nós

leitores os interpretamos, é a Literatura vista na perspectiva do leitor. Geralmente,

assumimos certa postura ao estarmos diante de um texto: criamos expectativas que

podem ou não nos satisfazer. Mas, é certo que o envolvimento que passamos a ter

com o texto literário causa em nós a mesma dificuldade de entendimento que

também nos causa algo estranho. Segundo Rogel Samuel (2002), “Se as

expectativas de um leitor não são “desapontadas” ou “violadas”, então o texto é de

segunda categoria” (p. 119).

É através do processo de leitura que, nós, leitores, conseguimos estar

incluídos em um processo de autorrealização que nos permite buscar a mudança no

modo de ler. O encontro do leitor com a Literatura permite um melhor entendimento

de si e melhora a relação com o outro. Pois, diante da leitura de cada gênero ou

tipologia literária, seja o poema, a narrativa, o conto entre outros, são mobilizadas as

ciências do homem e da sociedade e, também, a moderna e repleta de saberes

ciência da Literatura, que faz parte do resultado da multiplicação da cultura e do

trabalho humano. Samuel (2002), diz que:

A literatura potencializa uma causa de experiências do leitor. Inúmeras possibilidades de leituras a obra literária oferece, e em cada uma delas o

Page 21: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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leitor tem uma experiência nova, em cada leitura o leitor toca o coração da matéria estética (p. 14).

A teoria da recepção considera o leitor como um elemento da obra literária.

Para valorizar a recepção, o texto literário deve ser visto não só na forma estética,

mas também na social, propondo um sistema articulado entre produção, recepção e

comunicação e que estabeleça uma relação dinâmica entre autor, obra e leitor e,

desfaça a „fantasia‟ de literatura como sistema fechado e único. “A obra de arte é um

sistema complexo. Não é o resultado da experiência individual, mas social”

(SAMUEL, 2002, p. 13).

Através do ato da leitura o homem entende e percebe melhor o mundo, as

palavras vão além do extremo da significação e, assim, conquistam espaços novos.

A Literatura provoca a sensação de liberdade, de experimentar acontecimentos ou

situações que muitas vezes estão presentes na vida real cotidiana. De acordo com

Eagleton (2003), “o discurso literário torna estranho, aliena a fala comum; ao fazê-lo,

porém, paradoxalmente nos leva a vivenciar a experiência de maneira mais íntima,

mais intensa” (p.5).

O trabalho realizado pela teoria da recepção tem o objetivo de abordar a

Literatura não como uma herança, conhecida como um conjunto de textos antigos e

parados que foram escritos no passado e nada tem a servir nos estudos e na vida

atual. É preciso mostrar que a literatura é um processo contínuo de produção, da

qual fazem parte os textos mais antigos como também os modernos. Conjunto de

textos que, na ocasião em que são criados podem trazer à memória lembranças de

textos conhecidos, bem como causar alterações através de uma releitura feita nos

mesmos. Para Silva (2009):

O texto literário constitui uma unidade semântica, dotada de certa intencionalidade pragmática, que um emissor/ autor realiza através de um acto de enunciação regulado pelas normas e convenções do sistema semiótico literário e que os seus receptores/ leitores decodificam utilizando códigos apropriados (p. 574-5).

Às vezes, os professores de Literatura colocam os alunos diante de um

mundo literário muito distante da realidade deles. Sem falar que, alguns textos

Page 22: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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trabalhados apresentam uma linguagem que complica o entendimento dos

estudantes, o que faz com que esses se afastem da leitura de tais textos.

Por esse motivo, os alunos costumam rotular de “chatos” e “desinteressantes”

os textos que conhecemos como “clássicos” antes de lê-los, e, se o professor não

buscar uma prática que torne o ato dessa leitura prazeroso e necessário a sua

formação, por fim, esses textos passarão a ser mesmo desinteressantes para os

discentes. Isso, porque os estudantes em sua maioria têm pouco ou nenhum

interesse pela leitura, pois estão imersos em uma sociedade que torna mais

apreciável e/ou notável a imagem do que a palavra. Essa realidade faz com que os

alunos desconheçam o mundo literário que é apresentado pelos professores de

Literatura, mundo esse, muitas vezes composto de textos escritos em um português

que, devido às novas tecnologias da comunicação e da informação, não faz parte do

entendimento e do cotidiano desses alunos.

Sabendo-se que, às vezes, a linguagem presente nos textos dificulta o

entendimento, uma forma útil de aprendizado, é o professor, para trabalhar

determinado conteúdo, em um primeiro momento ler o texto junto com os alunos,

esclarecendo suas dúvidas, o que possibilitará a esses conhecer as funções e

intenções da Literatura.

Muitos professores, mesmo sendo responsáveis pelo desencadeamento do

processo de leitura, e, de forma consequente, da Literatura, desconhecem a

essência do ato de ler e o propósito do seu ensino no Ensino Médio. É preciso que

professores e alunos tenham consciência das múltiplas possibilidades que existem

na leitura de textos literários e, que almejem a transformação social brasileira

através das ideias e mudanças no comportamento do povo. Coelho (1993) diz que:

“A verdadeira Arte (aquela que resulta de um ato criador) expressa sempre algo de

vital para o homem, porque direta ou indiretamente ela se nutre de valores

essenciais para a existência humana” (p. 37).

Dificilmente conseguiremos entender o mundo, o universo em que vivemos e,

talvez nem a nós mesmos sem a estética literária, sem o sentimento da beleza que

ela, através dos livros, desperta em nós. “É ela que condiciona nosso modo de

pensar, de amar, de desejar, agir e perceber o mundo” (COELHO, 1993, p. 37).

Page 23: A prática de literatura no ensino médio como inovar

22

Esse é o fim determinado a que se destina a teoria da recepção: entender o

que pretende o autor ao lançar de si o conjunto de palavras que constituem o texto

e, qual a reação do leitor ao ter contato com as informações recebidas.

Dessa forma, percebe-se que, a melhor maneira de apossar-se do sentido do

texto literário é conhecer as experiências adquiridas pelo leitor no ato da leitura. É

preciso inverter a ordem das coisas, tirar o texto e o contexto histórico em que foi

escrito do centro das atenções e privilegiar quem de fato faz do texto um elemento

importante no processo da leitura.

1.4 A literatura escolarizada

A presença e utilização do livro didático de Língua Portuguesa e Literatura em

sala de aula é inquestionavelmente uma fonte de conhecimentos e descobertas,

além de proporcionar o desenvolvimento da atividade cognitiva e do processo

perceptivo do aluno. O professor nunca deve desprezar o princípio fundamental da

obra literária, que, como toda obra de arte, é o de representar o ser humano, o

universo e a vida, intercalando sonho e realidade por meio da palavra.

Marisa Lajolo afirma que “lê-se para entender o mundo, para viver melhor”

(1999, p. 07) e assim “quanto mais abrangente a concepção de mundo e de vida,

mais intensamente se lê, num espiral quase sem fim, que pode e deve começar na

escola, [...]”. Entretanto a autora mostra-nos também que os professores de

literatura se deparam constantemente com problemas e dúvidas diante do

desinteresse dos alunos e da falta de estudos e pesquisas consistentes que

orientem o seu trabalho com o texto. O que resta então é a sensação de que “Não

parece que o que fazer com o texto literário na sala de aula seja ainda de sua

competência” (LAJOLO, 1999, p. 14-5). A autora sustenta ainda que:

O que há, então, para o professor, é um script de autoria alheia, para cuja composição ele não foi chamado: leitura jogralizada, testes de múltipla escolha, perguntas abertas ou semiabertas, reescritura de textos, resumos comentados [...] que, [...] mestres, menos ou mais treinados, estrelam para platéias às vezes desatentas, às vezes rebeldes, quase sempre desinteressadas (p. 15).

Page 24: A prática de literatura no ensino médio como inovar

23

Com tais afirmações a autora corrobora a ideia de que os professores

encontram-se, ainda hoje, reféns, aprisionados ao livro didático e a roteiros de

leituras criados por outrem, que não dão conta das demandas e especificidades do

texto literário, pois, os livros didáticos de literatura abrem cada vez mais espaço para

imagens, mas não ampliam o número de poemas e de textos literários, enfatizando

assim, mais o projeto gráfico do que a mudança no modo como ensinar Literatura.

Cosson (2006) afirma que:

A multiplicidade dos textos, a onipresença das imagens, as variedades das manifestações culturais, entre tantas outras características da sociedade contemporânea, são alguns dos argumentos que levam à recusa de um lugar à literatura na escola atual (p.20).

Da mesma forma, Lígia Chiappini de Moraes Leite (2002) reflete sobre as

dificuldades de unir Língua e Literatura em uma disciplina homogênea e plena, já

que esta última é entendida apenas como análises históricas, culturais e canônicas.

[...] da disciplina de comunicação e expressão, no primeiro grau, não faz parte a literatura – que só vai entrar no programa de segundo grau, entendida como história literária ou apresentação de autores e obras exigidos no vestibular [...] Ontem, como hoje, dificilmente conseguimos integrar o estudo da língua e o estudo da literatura (p. 17).

Desse modo, segundo a autora, mesmo obtendo leis e parâmetros nacionais

que legitimem essa prática, o ensino de literatura mostra-se ainda, deficiente e

incompleto.

A divisão de Língua e Literatura na LDB nº 5.692/71 repercutiu na

organização curricular, nos livros didáticos e nas escolas que até hoje mantêm

profissionais especialistas para cada tema, como se leitura/literatura, estudos

gramaticais e produção de textos não tivessem relação entre si. Esta constatação

mostra que entre a LDB e os PCN existe um ponto de contradição, pois, de acordo

com os PCN o ensino de Língua Portuguesa e de Literatura deve se realizar de

forma articulada, integrada e intertextual:

Page 25: A prática de literatura no ensino médio como inovar

24

O processo de ensino/aprendizagem deve basear-se em propostas interativas língua/ linguagem, consideradas em um processo discursivo de construção do pensamento simbólico, constitutivo de cada aluno em particular e da sociedade em geral (2000, p. 18).

E ainda:

O aluno deve ser considerado como produtor de textos, aquele que pode ser entendido pelos textos que produz e que o constitui como ser humano. O texto só existe na sociedade e é produto de uma história social e cultural, único em cada contexto, porque marca o diálogo entre os interlocutores que os produzem e entre os outros textos que o compõem. O homem visto como um texto que constrói textos (PCN, 2000, p. 18).

Como facilmente se pode depreender, os PCN propõem o caráter

transdisciplinar, como a base essencial a todo e qualquer processo de transmissão e

aquisição do conhecimento. E este aspecto deve ser incorporado aos currículos,

visando uma aprendizagem socialmente transformadora e expressiva. Nesse

sentido, o ensino de literatura não pode ser algo desvinculado da leitura, tampouco

servir apenas como pretexto para o estudo de gramática ou análise linguística.

Muitas vezes, o texto literário no Ensino Médio é apresentado aos alunos

como uma estrutura que por si determina o sentido. Os professores não abrem

espaço para os alunos demonstrarem que, ao entrarem em contato com a Literatura,

são capazes de criar e experimentar os espaços em que flui o conhecimento

pessoal. Talvez o aluno seja considerado um leitor passivo que não tem interesse

pelo conhecimento que lhe é externo, como ser incapaz de entender o elo entre

forma e conteúdo, e isso geralmente ocorre em função do despreparo do próprio

professor.

A prática pedagógica do professor de literatura no Ensino Médio deve, entre

outras coisas, estimular o aluno que lê textos literários a sentir prazer em aprender

literatura e, também, encontrar diferentes sentidos na leitura realizada. O aluno pode

estudar e buscar entender se a condição histórico-social pode interferir nos sentidos

criados a partir da realidade. Os sentidos que o sujeito atribui ao conteúdo de um

texto, ocorrem de acordo às condições em que este foi produzido (espaço/tempo) e,

também ao meio social em que vive. Compagnon (2003) diz que a Literatura é a

Literatura, incluindo-se ai, muito dos diferentes conceitos a ela atribuídos. Vejamos:

Page 26: A prática de literatura no ensino médio como inovar

25

Retenhamos disso tudo o seguinte: a literatura é uma inevitável petição de princípio. Literatura é literatura, aquilo que as autoridades (os professores, os editores) incluem na literatura. Seus limites, às vezes se alteram, lentamente, moderadamente [...], mas é impossível passar de sua extensão à sua compreensão, do cânone à essência. Não digamos, entretanto, que não progredimos, por que o prazer da caça, como lembrava Montaigne, não é a captura, e o modelo de leitor, como vimos, é o caçador (p. 46).

No ensino de Literatura é preciso saber relacionar o saber escolarizado com

os saberes adquiridos fora da escola, promovendo, dessa forma, uma relação de

sentido entre Literatura e vida. O professor deve propor um ato de leitura que se

torne parte de uma situação de vida, possibilitando que o aluno signifique e produza

sentidos acerca do discurso contido nos (as) textos/obras exigidos para leitura.

A “obrigatoriedade” que faz com que os estudantes leiam obras exigidas pelo

currículo da disciplina Literatura, apresenta ao professor, o desafio de desenvolver

um ensino estimulante, que sensibilize o educando a ler produzindo sentido na

leitura, e que, através da leitura de determinados textos, esse, possa tornar-se

também autor e, assim, produzir seus próprios textos de forma a expressar seus

pensamentos e posicionamento, assumindo, por conseguinte, tanto a função de

sujeito leitor quanto de sujeito produtor de textos.

No ensino de Literatura na escola, o professor encontra-se diante de um

duplo desafio: despertar no aluno o gosto pela leitura de livros literários como forma

de prazer e, paralelo a isso, cumprir todo o conteúdo programático designado para

cada série do Ensino Médio. Esses conteúdos abrangem autores, escolas literárias

e, ainda, particularidades históricas que apresentam detalhes distante da realidade

do aluno e o afasta da leitura. Dessa forma, resta ao professor a seguinte pergunta:

como trabalhar conteúdos de caráter históricos e literários aliados ao prazer da

leitura literária?

O ensino de Literatura está intimamente relacionado à formação metodológica

do professor e também com suas experiências de leitura do texto literário. Se as

diferentes formas de olhar o texto literário não forem repensadas pelo professor,

esse terá como consequência, a rejeição dos alunos para com a leitura, o que irá

desencadear desinteresse e falta de motivação pelo estudo da Literatura. Ivanda

Martins (2006) diz que:

Page 27: A prática de literatura no ensino médio como inovar

26

Enquanto isso não ocorrer, as aulas de literatura continuarão desinteressantes, devido aos exercícios fragmentados e repetitivos de boa parte dos livros didáticos, à postura tradicional diante do texto literário, à avaliação da leitura literária como forma de punição e não de prazer (p. 100).

É possível perceber que a escola não consegue adaptar o trabalho com o

texto literário às exigências que são requeridas pelo mundo moderno. Pois, a

Literatura num âmbito geral continua sendo trabalhada de forma independente,

como um objeto único que não dá espaço para as intervenções dos alunos/leitores.

A análise tradicional ainda tem prioridade, enfatizando a leitura como obrigação e

necessidade para seguir roteiros das atividades escolares, desmotivando, dessa

forma, a leitura feita por prazer. E, esse ensino: maçante e mecânico da literatura no

Ensino Médio faz com que o interesse dos alunos limite-se aos conteúdos que de

praxe „caem‟ no vestibular, sem nenhuma intenção de estudar e conhecer que a

Literatura é repleta de saberes acerca do homem e do próprio mundo que o cerca. É

nessa perspectiva que, as aulas de Literatura não passam de roteiros informativos

sobre escolas e obras literárias – que ainda que organizadas, muitas vezes tornam-

se incompreensíveis aos alunos -, esquecendo-se que, mais que adquirir um

conhecimento literário, o aluno precisa compartilhar as experiências advindas da

leitura, além de experimentar o sentimento agradável que a literatura faz nascer em

nós. E, esse papel humanizador da literatura só será cumprido quando

conseguirmos mudar o rumo da escolarização.

Portanto, nota-se a necessidade de mudar a forma de ver o texto literário. O

ensino não pode continuar perpetuando-se de forma cristalizada, sem possibilitar ao

aluno, através da Literatura, desejar e expressar o mundo por ele mesmo. É preciso

buscar uma reflexão, e tentar construir junto com o aluno, de forma ampla e crítica, a

compreensão da literatura, de modo que seja reconhecido por esses seu caráter

plural e o seu fazer artístico. É preciso deixar de lado a omissão e, preservar a arte

da palavra que nos envolve e nos torna humanos, pois, a Literatura tem o poder de

fazer o leitor sair do comum, deixar de lado a rotina e buscar novas e diferentes

experiências, as quais contribuem na formação da cidadania.

Em vista da temática em questão, far-se-á uma investigação que promova

uma compreensão densa da realidade das nossas escolas, lócus de investigação, e

Page 28: A prática de literatura no ensino médio como inovar

27

para tal, a Abordagem Qualitativa e Fenomenológica e seus procedimentos de

coleta de dados será bastante pertinente.

Page 29: A prática de literatura no ensino médio como inovar

28

CAPÍTULO 2 REFERENCIAL METODOLÓGICO

A escolha dos métodos de pesquisa é feita com base em critérios e

fundamentos acerca do fim que se quer obter e que sejam compatíveis com a

natureza do fenômeno a ser estudado. Dessa forma, a partir das diferentes

metodologias que podem ser adotadas, optou-se por trabalhar com a pesquisa

qualitativa com abordagem fenomenológica, que ao invés de quantidade, buscam o

entendimento do problema e interação com os sujeitos que o compõem, para a partir

da vivência diária desses indivíduos, interpretar, entender e descrever o fenômeno

observado. Para complementar tal metodologia, far-se-á uma observação

participante para, posteriormente, realizar uma análise comparativa entre duas

escolas, tendo como instrumento de coleta de dados o questionário de entrevista

com perguntas mescladas entre abertas e fechadas.

2.1 Metodologia de pesquisa qualitativa com abordagem fenomenológica

Diante das diferentes opções de metodologias disponíveis, optou-se pela

pesquisa qualitativa com abordagem fenomenológica, pois constitui esta, uma

conveniente alternativa para estudar determinados efeitos próprios da ação humana.

A pesquisa qualitativa é utilizada na realização da observação de um

fenômeno. Busca em primeiro lugar observar e compreender determinado

fenômeno, para depois descrever o que o mesmo significa. Segundo Mirian

Goldenberg (2003),

Não é possível formular regras precisas sobre as técnicas de pesquisa qualitativa porque cada entrevista ou observação é única: depende do tema, do pesquisador e de seus pesquisados (p. 57). O pesquisador deve, então, apresentar claramente as características do indivíduo, organização ou grupo, que foram determinantes para sua escolha, de tal forma que o leitor possa tirar suas próprias conclusões sobre os

Page 30: A prática de literatura no ensino médio como inovar

29

resultados e a sua possível aplicação em outros grupos ou indivíduos em situações similares (p. 58).

Na pesquisa qualitativa, o pesquisador não trabalha com hipóteses

construídas previamente, ao contrário, só depois de observar é que as cria com

base na realidade observada no contexto escolar.

Na pesquisa, o pesquisador busca obter dados descritivos através do contato

e interação com os indivíduos e com a situação que compõe o objeto de estudo e,

ainda, busca entender os fenômenos que ocorrem no campo observado a partir da

vivência e comportamentos dos participantes da ação.

Enquanto os métodos quantitativos pressupõem uma população de objetos de estudos comparáveis, que fornecerá dados que podem ser generalizavéis, os métodos qualitativos poderão observar, diretamente, como cada indivíduo, grupo ou instituição experimenta, concretamente, a realidade pesquisada (GOLDENBERG, 2003, p. 63).

Tais palavras mostram que a pesquisa qualitativa objetiva encurtar a distância

que existe entre a teoria e a prática e expor a significação do fenômeno observado,

dependendo ainda das opções teóricas e também da descrição das diferentes

situações que compõem o dia a dia dos sujeitos que fazem parte da pesquisa.

A abordagem do método fenomenológico consiste na compreensão do

fenômeno através das descrições individuais dos sujeitos da ação. E, sendo a

pesquisa qualitativa inerente a fenomenologia, que é ciência que estuda o fenômeno

através do mundo cotidiano, é consideravelmente importante valorizar o indivíduo, o

qual é elemento fundamental no processo analisado.

Elcie F. Salzano Masini (2004) diz que “Este enfoque de Pesquisa

caracteriza-se pela ênfase ao “mundo da vida cotidiana”, [...] (p. 61). É um método

que leva em conta a personalidade do indivíduo e sua consciência acerca de seu

comportamento no momento da pesquisa. Este modelo de pesquisa apresenta

alguns desafios, entre eles, destaca-se a coleta de dados, que exige um amplo

esforço e determinação para coletar materiais, resultando em um mínimo de

informações.

Page 31: A prática de literatura no ensino médio como inovar

30

Literalmente, a fenomenologia possui como objeto de estudo o próprio

fenômeno, e não coisas ditas a respeito do mesmo. Não se baseia por definições ou

conceitos, mas por uma compreensão daquilo que é vivido, ou seja, volta-se para os

significados das coisas que são percebidas no viver cotidiano. São as expressões

que o sujeito adquire no seu ambiente de pesquisa, expressando ele mesmo as

percepções que obteve. Mostra a consciência do sujeito observado por meio de

suas experiências e também pela descrição de sua vida. Para Masini (2004),

O método fenomenológico trata de desentranhar o fenômeno, pô-lo a descoberto. Desvendar o fenômeno além da aparência. Exatamente porque os fenômenos não estão evidentes de imediato e com regularidade faz-se necessário a fenomenologia (p. 63).

Com tais palavras, nota-se que a pesquisa fenomenológica constitui-se no ato

de interrogar fenômenos, e, para isso, envolve um modo de pensar e de olhar por

meio da consciente experiência do sujeito no seu mundo e vida, para, assim, chegar

a sua essência.

Dessa forma, nota-se que a compreensão do fenômeno estudado se dará por

meio de relatos que descrevem a vida social e, posteriormente, esses relatos serão

usados pelo pesquisador como fundamentos para entender a essência do

fenômeno.

2.2 Descrição do Lócus da pesquisa

Os colégios que constituirão campo de pesquisa serão o Colégio Estadual

César Borges e o Colégio Estadual Wilson Lins, ambos localizados no município de

Valente/ BA.

O Colégio Estadual César Borges está localizado na Rua Dr. Antonio Edil

Lopes, nº 289, Bairro Antonio Lopes, Valente-Ba. As atividades do Colégio tiveram

início no ano de 2003, como primeira escola a oferecer somente o curso de Ensino

Médio no município.

Page 32: A prática de literatura no ensino médio como inovar

31

Desde a época da sua construção, a Escola possui Laboratório de

Informática, Sala de vídeo, Refeitório, Pátio, Jardins internos e externos, Sala de

professores, Sala de coordenação, Biblioteca, Recepção, Banheiros para alunos,

professores e funcionários e Quadra poliesportiva (construída em terreno vizinho

pertencente a uma escola municipal).

A escola possui diretor e vices, secretários, agentes auxiliares e um quadro

docente constituído por todos os professores graduados e, atualmente funciona com

16 turmas distribuídas nos três turnos, atendendo a uma média geral de 507 alunos

entre educação básica e E.J.A, e um anexo localizado no distrito de Valilândia

atendendo ao Projeto EMITEC (Ensino Médio com Intermediação Tecnológica). A

escola também promove várias atividades internas de natureza educativa artística e

cultural como: festival de pizza, gincana cultural, festa junina, projetos

interdisciplinares e faz adesão aos projetos promovidos pela Secretaria de Educação

do Estado e Direc 12 como: FACE, TAL e AVE.

O Atual Colégio Estadual Wilson Lins, localizado na Praça Nemésio Martins

da Silva nº. 476, Centro, Valente-Ba, teve sua origem no ano de 1948, com a

construção da Escola Rural Catarina Paraguaçu. No ano de 1965 foi criada a

biblioteca do Grupo Escolar Wilson Lins, denominada Biblioteca Infantil Machado de

Assis.

Atualmente, o Colégio Estadual Wilson Lins funciona nos turnos matutino,

vespertino e noturno. A escola possui um quadro de professores efetivos, diretor e

vices, secretários e agentes auxiliares e, atende 29 turmas somando uma média de

890 alunos na educação básica e E.J.A. Conta com 13 salas de aula, 1 biblioteca, 1

diretoria, 1 secretaria, 1 sala de professores, 1 vice diretoria, 1 laboratório de

informática, sala de projeção, almoxarifados, 1 cantina, 1 quadra de esportes, 10

sanitários e grande área livre para outras atividades. Promove ainda gincanas,

festas juninas, feira de conhecimento.

Os colégios estaduais César Borges e Wilson Lins serão denominados,

respectivamente, na pesquisa de escola 1 e escola 2. Dessas escolas, serão no total

5 professores e 10 anos entrevistados, que serão denominados pelas letras A, B, C

etc.

Page 33: A prática de literatura no ensino médio como inovar

32

2.3. Coletas de dados

A coleta de dados é a etapa em que se busca aplicar as técnicas que foram

previamente selecionadas para obter as informações necessárias para realização da

pesquisa.

Para realizar a coleta de dados, existem diferentes procedimentos que podem

ser adotados, entre eles: coleta documental; entrevista; questionários, testes,

formulários, observação etc. Na pesquisa em questão, optou-se por observação

participante e, posteriormente, questionários de entrevista.

Na coleta de dados da pesquisa qualitativa, busca-se compreender o

fenômeno e para tal, os dados obtidos serão o resultado das situações vivenciadas

pelos sujeitos. Para que isso ocorra de forma natural, busca-se interrogar e entender

a origem do homem/sujeito e os princípios das experiências da vida cotidiana,

perceber a real existência do sujeito. Para Maria Aparecida Viggiani Bicudo (1994):

A essência do fenômeno é mostrada pela realização de uma pesquisa rigorosa que busca as raízes, os fundamentos primeiros do que é visto (compreendido) e o cuidado com cada passo dado na direção da verdade (“mostração” da essência). O rigor do pesquisador fenomenológico se impõe a cada momento em que interroga o fenômeno e ao seu próprio pensar esclarecedor (p. 20).

É preciso que o pesquisador tenha bastante atenção no seu trabalho de

coleta, atentando para o fato de descrever o fenômeno e não de explicá-lo, pois só

através da descrição e atenta observação conseguirá chegar a essência de

determinado fenômeno. Sabe-se que o fenômeno só existe se existir o sujeito que o

situe e o vivencie. Logo, o observador só conseguirá encontrar descrições acerca do

fenômeno através da visão de quem o conhece no dia a dia. Segundo Maria Inês

Fini (1994), “[...] não existe possibilidade de interrogar, por exemplo, o ensino ou a

aprendizagem, mas sim o sujeito que está aprendendo” (p. 24). Isso é o que a

fenomenologia mostra: que sempre haverá, numa determinada situação, um sujeito

que vivencia o fenômeno, seja ele educacional, social ou cultural.

Diante de tais considerações, nota-se que para realizar uma pesquisa fiel, é

necessário e fundamental que o pesquisador, antes de dar início ao trabalho, deixe

Page 34: A prática de literatura no ensino médio como inovar

33

de lado toda e qualquer informação e/ou afirmação que já possua a respeito do

fenômeno a ser interrogado. Ele não pode e nem deve basear-se em teorias ditas a

priori, mesmo que sejam consistentes ou que se julgam proposições verdadeiras

sobre o homem e o lugar que este ocupa no mundo.

Portanto, na coleta de dados da pesquisa qualitativa com abordagem

fenomenológica, não se busca encontrar problemas a serem resolvidos, mas

objetiva-se encontrar a essência e estrutura do fenômeno contidas no mundo real

dos sujeitos e, assim, descritas por eles.

2.3.1 Observação participante

A observação participante é um modo de não se impor de forma estática fora

do objeto estudado, mas sim propiciar uma integração entre o pesquisador e os

sujeitos que participam da ação, sem posição de hierarquias, todos de um mesmo

lado, podendo o observador vivenciar o mesmo que os elementos do grupo

observado vivenciam.

Consiste na participação real do pesquisador com a comunidade ou grupo. Ele se incorpora ao grupo, confunde-se com ele. Fica tão próximo quanto um membro do grupo que está estudando e participa das atividades normais deste (LAKATOS E MARCONI, 1996, p. 82).

Nesse tipo de observação, o observador, quando a circunstância o permite,

participa das atividades realizadas pelo grupo observado.

A significação precisa da observação participante é definida pelo contato do

observador com o contexto da pesquisa, pois este estará numa observação direta e,

consequentemente, mais apto a entender a realidade na qual as pessoas vivem e

atuam. Dessa forma, adquirindo experiências de primeira mão, o pesquisador torna-

se mais hábil e capaz de inferir o significado da situação, sendo capaz de aprender

coisas diferentes das que seriam possíveis com outro tipo de pesquisa.

A pesquisa participante permite que pesquisados e pesquisadores convivam

juntos em um mesmo ambiente e tornem-se sujeitos ativos para produzirem

Page 35: A prática de literatura no ensino médio como inovar

34

conhecimento. Diante dessa visão, observa-se que é preciso mesmo o contato com

a experiência vivida das pessoas que compõem a ação, de modo a não se contentar

com a descrição em partes de como os fenômenos se apresentam, mas investigar

como um todo a maneira como são produzidos. Segundo Heller (1982) (apud

Noronha 2004, p. 142), “É fundamental portanto que o pesquisador não assuma

esses “pedaços” como objeto de pesquisa, mas que trabalhe com a categoria de

totalidade, que se faça o esforço metodológico de articular Cotidiano e História”.

Assim, nota-se que a pesquisa participante consegue atingir seu estatuto

quando supera o nível do imediato e consegue, de forma metodológica, unir o

cotidiano ao que se conhece da história.

2.3.2 Questionário de entrevista

Sabe-se que nenhum questionário é uma fonte completa de dados

necessários para obter informações sobre um estudo. Logo, é de fundamental

importância que os entrevistados sejam informados da finalidade e importância de

sua participação tanto no trabalho como na vida de estudantes, para que não

apresentem nenhuma objeção a responder às questões. Ou seja, antes que o

pesquisador entregue o questionário ao informante é preciso explicar a importância

desse questionário, o objetivo da pesquisa e o porquê da necessidade de obter as

respostas das perguntas que o constitui, isso poderá despertar o interesse daquele

que o recebe, sensibilizando-o a ser fiel nas respostas e que o devolva preenchido.

“O entrevistado deve ter certeza de que todas as respostas são valiosas – que não

há respostas “corretas” ou ”incorretas”” (PARKER e REA, 2002, p. 41). Ou seja, será

uma participação valorosa e ao mesmo tempo sigilosa, o nome de cada entrevistado

não será divulgado e nem as respostas serão comparadas entre os demais.

O questionário precisa ser breve e claro, sem muitas enrolações, é preciso

apenas que contemple as necessidades do estudo. “O questionário deve ser o mais

conciso possível, mas cobrindo a gama necessária do assunto requerido pelo

estudo” (PARKER e REA, 2002, p.54). É preciso ainda que o questionário seja

simples e direto, sem frases técnicas e nem palavras associadas aos níveis mais

Page 36: A prática de literatura no ensino médio como inovar

35

elevados de escolaridade, pois este não é um exemplo de boa escrita, mas sim um

instrumento de busca de informações.

O questionário utilizado nessa pesquisa contemplará 5 professores e 10

alunos (4 da escola 1 e 6 da escola 2) e será formado por perguntas objetivas e

subjetivas em função da rejeição à somente perguntas abertas, além de, muitas

vezes, provocar respostas complexas e longas que dificultam o entendimento.

A intenção do questionário não é colher dados aleatoriamente, mas obter

descrições das experiências relacionadas ao fenômeno estudado, de modo que os

sujeitos descrevam de fato a experiência que possuem acerca do fenômeno

observado. Segundo Fini (1994),

Os dados são, pois, as situações vividas pelos sujeitos que são tematizadas por eles, conscientemente nas descrições que faz. Ao descrevê-las, espera-se que os sujeitos simplesmente relatem de modo preciso o que ocorre com eles ao viver suas experiências (p. 28).

Portanto, a autora confirma-nos que a obtenção dos dados se dá por meio do

conhecimento que o sujeito adquire por prática e das descrições da maneira habitual

que possui de proceder. Sendo o homem conhecedor das coisas da vida, os

significados dos eventos vividos pelos sujeitos da pesquisa são obtidos através de

diferentes manifestações de sentimentos dos mesmos, suas percepções são

elementos fundamentais do objeto estudado e investigado, as quais serão depois

descritas pelo pesquisador ou pelo próprio sujeito que as percebe.

Os métodos aqui explicitados serão utilizados para coleta e análise de dados

do capítulo que segue. A pesquisa qualitativa com abordagem fenomenológica será

utilizada para entender a vivência do sujeito no contexto em que vive e atua durante

a observação participante e, a coleta de dados por meio do procedimento de

questionário de entrevista permitirá ter acesso de forma direta às informações do

próprio sujeito da ação sobre o ensino que está vivenciando.

Page 37: A prática de literatura no ensino médio como inovar

36

CAPÍTULO 3 ANÁLISE DE DADOS

A seguinte análise buscou compreender o propósito do ensino de literatura no

nível médio. Procurou-se observar a prática do professor de literatura, se atendia às

necessidades dos alunos. Entretanto, percebe-se que cada vez mais a literatura está

escolarizada, buscando, principalmente, uma formação leitora, e deixando de lado a

humanização desse leitor. Com isso, ao tentar encontrar o sentido da literatura, o

que nota-se é cada vez mais é o desestimulo do professor e o desinteresse do

aluno.

3.1 O ensino de literatura: uma prática desarticulada das propostas curriculares e

das necessidades do aluno

A literatura, de modo geral, está presente na vida de todo e qualquer

indivíduo, o que falta é este saber reconhecer e, esse reconhecimento, para aqueles

que têm oportunidade de estudar, deve (ou deveria) começar na escola de ensino

médio e ser perpetuado para a vida. Entretanto, com o atual ensino, o aluno não

considera a literatura como algo importante para sua formação e,

consequentemente, para sua vida.

Os alunos participantes da pesquisa, quando questionados sobre a leitura,

dizem, alguns, ter o hábito de ler, outros que só às vezes. Confira modelos de

questionários em anexo.

Sobre a questão “Você tem o hábito de ler?”, observem as respostas dos

alunos:

a) Alunos da escola 1:1

1 A transcrição das falas de professores e alunos está exatamente como os sujeitos escreveram no questionário.

Os “erros gramaticais”, então, são dos entrevistados e não da autoria deste trabalho.

Page 38: A prática de literatura no ensino médio como inovar

37

Aluno A: “Sim”.

Aluno B: “As vezes”.

Aluno C: “As vezes”.

Aluno D: “As vezes”.

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “Sim”.

Aluno B: “Sim”.

Aluno C: “Às vezes um pouco”.

Aluno D: “Sim”.

Aluno E: “Sim”.

Aluno F: “Sim”.

Em referência à questão “Qual dos itens você lê com maior frequência?”, os

alunos foram questionados com a possibilidade de seis opções de respostas: a)

jornais; b) romances; c) revistas; d) quadrinhos; e) poesia; f) outros (explique qual).

Sendo elas:

a) Alunos da escola 1:

Aluno A: “outros (bíblia)”.

Aluno B: “romances”.

Aluno C: “outros (reflexões)”.

Aluno D: “jornais”.

Page 39: A prática de literatura no ensino médio como inovar

38

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “revistas”.

Aluno B: “poesia”.

Aluno C: “jornais”.

Aluno D: “revistas”.

Aluno E: “romances, revistas, quadrinhos e poesia”.

Aluno F: “revistas”.

Diante das respostas às questões 1 e 2, nota-se que quase todos os alunos

dizem ter o costume de ler, mas os textos literários, a exemplo de romances e

poesias, não estão em suas preferências. Embora naturalmente leitura e literatura

estejam interligadas, o aluno que não gosta ou não tem hábito de ler não,

necessariamente, gostará da disciplina de literatura.

É preciso que ao incentivar a leitura, especificamente literária, mostre ao

aluno que o conhecimento que pode obter não ficará restrito a literatura, servirá

também para sua vida social e pessoal. Para Maria Zélia Versiani Machado (2002):

[...] perceber a leitura literária como uma prática social permite que o olhar se dirija não só para o momento de instauração do pacto ficcional pela leitura do texto literário, mas para uma série de fatores, entre eles aqueles que dizem respeito aos processos seletivos que orientam as escolhas no vasto leque de possibilidades oferecido aos alunos (p. 73).

Assim, o sujeito/leitor não estará realizando uma leitura apenas por

“obrigação”, mas também por prazer e, perceberá ainda que, a leitura literária está

atrelada a vários outros tipos de leitura, principalmente aquelas que estão voltadas

às necessidades práticas da vida cotidiana, a exemplo de ler bilhetes, notícias etc.

Questionados acerca da leitura de obras literárias, os estudantes citaram a

última obra literária lida e se esta foi por livre vontade ou solicitada pela escola.

“Qual a última obra literária que você leu? Essa leitura foi solicitada pela escola?”

Page 40: A prática de literatura no ensino médio como inovar

39

a) Alunos da escola 1:

Aluno A: não respondeu.

Aluno B: “Mar morto, sim”.

Aluno C: “Comece o dia feliz, não”.

Aluno D: “Monteiro Lobato, sim”.

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “Memórias Póstumas de Brás Cubas, sim”.

Aluno B: “O Cortiço, sim”.

Aluno C: “Dom Casmurro. Foi solicitado pela escola”.

Aluno D: “Senhora. Foi solicitado pela escola”.

Aluno E: “O Primo Basílio. Sim, foi solicitado pela escola”.

Aluno F: “Memórias Póstumas de Brás Cubas. Foi para um seminário de português”.

Percebe-se, pelas respostas dadas, que os estudantes não leem obras

literárias por livre e espontânea vontade, mas sim por solicitação da escola. Isso

decorre em função da tradição de trabalhar a obra literária de forma isolada, como

expressão artística carregada de expressão própria e, sem levar em conta a leitura

prévia do aluno e suas expectativas. Quanto a isso, nos alerta Ângela B Kleiman

(2006) quando diz que:

[...] quando apresentamos uma obra literária aos nossos alunos, comumente, a preocupação não é com a fruição ou a apreciação estética. Ela se torna um objeto para o ensino das características presentes na obra, ligadas à escola literária ou às figuras de linguagem que possam ter sido usadas pelo autor. Fragmentamos a obra, não poucas vezes, reduzindo-a um conjunto de características de uma escola literária ou de um estilo próprio do autor (p. 46).

Page 41: A prática de literatura no ensino médio como inovar

40

Esse tipo de prática escolar cria um leitor que não consegue construir

sentidos para o texto, este sujeito/leitor apenas é capaz de reproduzir o sentido que

a priori já foi dado ao texto. Infelizmente é o tipo de leitor que não possui autonomia

própria a interpretar o que lê. Através das observações e da pesquisa qualitativa

realizada em salas de aula das duas escolas, percebeu-se que os alunos não

pertencem a uma cultura de incentivo a leitura e, consequentemente, na escola não

demonstram interesse em praticá-la. Devido a isso, a escola deve buscar formas de

incentivar os alunos a tomar gosto pela leitura, pois o conhecimento que nesta

adquire, leva para a vida. Rildo Cosson (2006) diz que a literatura no ambiente

escolar é lócus de conhecimento e, para que dessa forma funcione, convém que

seja explorada de maneira adequada. Para ele, a escola precisa ensinar o aluno a

fazer essa exploração.

Ler implica troca de sentidos não só entre o escritor e o leitor, mas também com a sociedade onde ambos estão localizados, pois os sentidos são resultados de compartilhamentos de visões do mundo entre os homens no tempo e no espaço. Ao ler, estou abrindo uma porta entre o meu mundo e o mundo do outro (p. 27).

Entretanto, com base nas conversas tidas com alguns alunos e nos dados

dos questionários, nota-se a falta de perspectivas e de interesses relacionados à

leitura, pois, quando feita a pergunta “Qual sua postura em relação às obras que são

indicadas pelo professor (a) de literatura?”, entre as cinco opções dadas, alguns

disseram que só leem algumas ou partes das mesmas.

a) Alunos da escola 1:

Aluno A: “lê quase todas”.

Aluno B: “lê todas”.

Aluno C: “lê quase todas”.

Aluno D: “lê algumas”.

Page 42: A prática de literatura no ensino médio como inovar

41

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “lê quase todas”.

Aluno B: “lê todas”.

Aluno C: “lê o texto parcialmente”.

Aluno D: “lê algumas”.

Aluno E: “lê quase todas”.

Aluno F: “lê todas”.

Diante de tais respostas e também através das conversas com alunos, não foi

difícil notar que o texto literário não é a base do ensino de literatura e nem é

trabalhado de maneira interessante e prazerosa para os alunos e, talvez seja esse o

motivo da recusa de uma leitura integral da obra por parte de alguns, tratando-a

como algo de difícil compreensão. Martins (2006) diz que “A carência de noções

teóricas e a escassez de práticas de leituras literárias são fatores que contribuem

para que o aluno encare a literatura como objeto artístico de difícil compreensão” (p.

83).

Essa falta de teoria e da leitura literária propriamente dita deve-se ao fato de a

literatura ser, basicamente, trabalhada por meio de textos fragmentados presentes

no livro didático e, ainda, muitas vezes usados para leituras extras ou como pretexto

para o trabalho de análise linguística. “[...] nos livros didáticos, os textos literários ou

considerados como tais estão cada vez mais restritos às atividades de leitura

extraclasse ou atividades especiais de leitura” (COSSON, 2006, p. 21).

Os PCN (2000) recriminam o ensino de uma arte de expressão em que os

alunos não podem se expressar, dizem que: “Quando deixamos o aluno falar, a

surpresa é grande, as respostas quase sempre são surpreendentes” (p. 16). Essa

questão deve-se ao fato de que, se a leitura for realizada de forma prazerosa, sem

pressão e exigências, mas por uma ação espontânea, e essa espontaneidade deve

surgir de um trabalho realizado em sala de aula, o aluno sentirá mais gosto pela

literatura. Porém, nos estudos literários foca-se mais a história da literatura para

Page 43: A prática de literatura no ensino médio como inovar

42

compreensão do texto, e torna dessa forma, belas obras em um martírio para os

alunos.

As Orientações Curriculares para o Ensino Médio propõem o ensino que

desperte o lado sensível e humano do sujeito, e, para isso, cita o Inciso III da Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 1996 (LDBEN). “III) aprimoramento do

educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da

autonomia intelectual e do pensamento crítico” (apud Orientações Curriculares para

o Ensino Médio, 2006, p. 53). “O ensino de Literatura (e das outras artes) visa,

sobretudo, ao cumprimento do Inciso III dos objetivos estabelecidos para o ensino

médio pela referida lei” (p. 53).

Mesmo diante dessas propostas curriculares, o ensino da Literatura continua

sendo fragmentado pelas instituições, e só visa basicamente os textos de

consagrados autores e, durante as observações nas escolas, observou-se a

evidência da recusa dos adolescentes que não gostam do que leem, pois as leituras

solicitadas são obrigatórias e não despertam seus interesses. A proposta dos

Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino Médio, 2002 (PCN+) é a realização de

um ensino contextualizado e para que isso aconteça o professor precisa estar firme

neste propósito.

O conceito implica compreender todo conhecimento como resultado de uma construção coletiva. Na situação escolar, como resultado da interação permanente entre alunos, professores e escola. Em vez de um conjunto de informações pouco significativas e descontextualizadas, o conhecimento é um patrimônio dinâmico, que se renova diante do amadurecimento intelectual do aprendiz, de novos pontos de vista, das descobertas científicas (p. 68).

Vemos também:

É inegável que toda proposta de mudanças de que é alvo qualquer sistema passa, ou deveria passar, pela reflexão e eventuais adesão e ação dos profissionais que dele fazem parte. As rupturas efetivas de antigos paradigmas dependem sem dúvida da conscientização e da vontade de mudar dos profissionais envolvidos, sem mencionar uma adequada transposição das idéias propostas no plano teórico para a prática (p. 85).

Tais palavras permitem ver que uma reforma é precisa, para assim alcançar a

realidade do aluno e introduzi-lo de fato no contexto social que vivencia fora da

escola, fora dos conhecimentos por esta repassados e, através desse conhecimento

Page 44: A prática de literatura no ensino médio como inovar

43

influenciar e atuar na realidade vivida. A aprendizagem só torna-se significativa

quando o aluno indentifica-se com aquilo que o professor propõe e para que esse

trabalho dê certo não se pode perder de vista o mais importante, o aluno.

Diante dos impasses da prática literária, que não contempla às necessidades

doa alunos, buscar-se-á- entender o abandono da característica principal da

literatura, que é humanizar o indivíduo, em função da escolarização que só visa

formar um “bom” leitor.

3.2 A escolarização da literatura em detrimento de uma formação leitora para a

humanização do aluno / leitor

Diante dos diferentes modos de abordagens acerca do ensino de Literatura,

urge que se tenha atenção para a questão de se criarem novos procedimentos

didáticos para o ensino dessa disciplina.

Os documentos e leis que regem o ensino no Brasil, a exemplo dos PCN e da

Lei de Diretrizes e Bases (LDB), propõem e defendem que o ensino de Língua

Portuguesa e Literatura seja feito de forma integrada. Contudo, na maioria dos

casos, esta última encontra-se inserida na área da primeira, mas não são ensinadas

de forma intertextual. Ao contrário, o ensino literário resume-se basicamente a

análises gramaticais, sintáticas, estudo de vocabulário etc. Dão preferências às

obras de “grandes escritores” e, com toda essa análise, acabam por torná-los

desinteressantes aos alunos. É interessante ressaltar que as aulas de Língua

Portuguesa e Literatura das escolas analisadas acontecem de forma separada, um

dia é destinado para a primeira e outro para a segunda. No mais, fazem atividade de

interpretação de texto nas aulas de literatura porque o texto apresentado pelo livro

didático já vem acompanhado por um questionário a ser respondido.

Nota-se, com isso, que a essência da literatura com seu poder de sedução, se

instigada nos alunos, poderia contribuir para a formação de um grande leitor atento e

influente. Entretanto, as atividades mecânicas e maçantes da escola influenciam de

forma negativa para a formação desse futuro leitor.

Com relação à importância da literatura, os professores foram questionados

acerca do que é mais relevante na disciplina de literatura, sendo dadas cinco opções

Page 45: A prática de literatura no ensino médio como inovar

44

e pedida uma justificativa. “De acordo a sua experiência pedagógica, o que você

acha que deve ser mais valorizado na disciplina literatura?”

a( )Decorar nomes de autores obras e datas.

b( )Conhecer a ordem sequencial das escolas literárias e suas características.

c( )Identificar nos textos características do período a que pertence.

d( )Estabelecer uma relação do texto literário com o mundo atual.

e( )Fazer crescer nos alunos o interesse e a capacidade de interpretar textos

literários.

Justifique:

a) Professores da escola 1:

Professor A: “c; d; e;”.

Professor B: “c; d; e;”.

Professor C: “c; d; e;”.

b) Professores da escola 2:

Professor A: “d; e;”.

Professor B: “c; d; e;”.

Nenhum dos professores justificou as opções.

As respostas dos professores não condizem com o que dizem os alunos

quando questionados sobre as atividades das aulas de literatura, pois, durante

conversas, relatam esses, que muitas aulas tornam-se repetitivas em relação aos

roteiros de textos que fazem. Diante da pergunta “Que atividades você faz nas aulas

de literatura?”

Page 46: A prática de literatura no ensino médio como inovar

45

a) Alunos da escola 1:

Aluno A: “ler e escrever”.

Aluno B: “Nós lemos o texto e respondemos as margens do texto”.

Aluno C: “pesquisa as obras dos autores”.

Aluno D: “exercícios, leitura as vezes e outros”.

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “seminários”.

Aluno B: “Na maioria sobre escritores”.

Aluno C: “Ler paradidáticos”.

Aluno D: “atividades relacionadas a interpretação de textos, leituras de livros e Aluno

seminários”

Aluno E: “Interpretação de textos, atividades e etc”.

Aluno F: “Atividades referidas a cada assunto dado, tais como: Seminário,

questionário”.

Sobre a pergunta seguinte “Quais as atividades mais rotineiras nas aulas de

literatura?”, percebe-se, através das respostas, a literatura como uma atividade

mecânica e rotineira.

a) Alunos da escola 1:

Aluno A: “ler textos”.

Aluno B: “ler textos”.

Aluno C: “ler um texto sobre cada um dos autores”.

Aluno D: “muito exercício”.

Page 47: A prática de literatura no ensino médio como inovar

46

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “Leituras em todas as aulas, e textos longos”.

Aluno B: “Romantismo, Realismo, Naturalismo”.

Aluno C: “Questionários sobre as obras”.

Aluno D: “interpretações de textos”.

Aluno E: “atividades com textos”.

Aluno F: “Responder questões dos livros e fazer questionários”.

Percebemos através dessas respostas que o ensino de literatura não está

sendo feito com base nas orientações dos PCN que defendem um ensino integrado

ao de língua, e não utilizá-la como suporte ou pretexto, fragmentando o texto e,

consequentemente, tirando sua essência. O estudo da gramática pode ser feito não

de forma isolada por meio de palavras, frases e períodos, mas de forma integrada

ao estudo literário, sendo o texto a unidade de privilégio. A análise linguística pode

ser trabalhada pela comparação entre os diferentes gêneros. Márcia Mendonça

(2006) diz que:

O texto literário, ao invés de ser utilizado pela gramática para exercícios de transformar adjetivos em locuções adjetivas, pode ser utilizado para mostrar que a adjetivação pode acontecer através de diferentes estratégias e recursos, criando, assim, efeitos e sentidos diferentes (210-1).

Em face do que foi apresentado, essa forma escolarizada de ensinar literatura

é inadequada e afasta-se cada vez mais da proposta de um ensino interdisciplinar,

contribuindo consequentemente para um estudo isolado, impossibilitando o aluno de

perceber a integração que existe entre a literatura e as demais disciplinas.

Compagnon (2006) diz que:

Page 48: A prática de literatura no ensino médio como inovar

47

A literatura, ou estudo literário, está sempre imprensada entre duas abordagens irredutíveis: uma abordagem histórica, no sentido amplo (o texto como documento), e uma abordagem linguística (o texto como fato da língua, a literatura como arte da linguagem) (p. 30).

Muito mais que isso, a literatura precisa ser entendida como produção

artística que está inserida na cultura e recebe diferentes influências: histórica, social,

ideológica, política etc, e por meio dessas interfere na realidade. Notamos assim, a

carência das metodologias que se direcionam ao ensino de literatura, principalmente

no Ensino Médio, e se faz necessário buscar alternativas didáticas que motivem os

alunos a ler e estudar literatura por prazer. “Não cabe mais continuar privilegiando

uma escolarização inadequada da literatura, encarando-se o texto literário como

simples pretexto para questões de análise gramatical” (MARTINS, 2006, p. 91).

Precisamos compreender/ entender que o ensino de literatura além de

responsabilidade da escola é também uma prática social e, precisa ser vista não só

como disciplina escolar, mas principalmente, veículo de conhecimento pessoal e

social. Cosson (2006) ressalta que:

A questão a ser enfrentada não é se a escola deve ou não escolarizar a literatura, [...] mas sim como fazer essa escolarização sem descaracterizá-la, sem transformá-la em um simulacro de si mesma que mais nega do que confirma seu poder de humanização (p. 23).

No entanto, no Ensino Médio a literatura resume-se, basicamente, ao ensino

de características dos períodos literários, o nome dos autores e das obras. Porém,

sabe-se que essa sequência poderia e pode ser trabalhada na disciplina de história

ou de forma intertextual a ela. Assim sendo, propõe-se que o professor tenha um

cuidado especial não só com o tratamento do conteúdo adequado, mas também

com as estratégias metodológicas para abordá-los.

Aos professores entrevistados foram feitas perguntas acerca do material

didático, do acervo indicado e da metodologia utilizada. Diante da pergunta “Que

material didático utiliza na realização das atividades literárias?”, obteve-se as

seguintes respostas:

Page 49: A prática de literatura no ensino médio como inovar

48

a) Professores da escola 1:

Professor A: “Na realização das atividades literárias em sala de aula, utilizo uma

diversidade de material didático: aparelho de som, músicas e textos diversos,

cartazes, transparência, tarjetas, livros, revistas, etc”.

Professor B: “Livro didático, TV pendrive, multimídia, mídias de CD e DVD,

paradidáticos, textos impressos etc”.

Professor C: “Sempre que possível alterno a forma de trabalhar; logo o material

didático varia desde o livro didático, paradidático, transparência, retroprojetor,

tarjetas, textos digitados, jornais, revistas, plaquetas, aparelho de som, TV, DVD,

mídias (CDs e DVDs) a projetor de slides e pendrive. Sem esquecer, é obvio, do

quadro branco e pincéis”.

b) Professores da escola 2:

Professor A: “Nas minhas aulas costumo trabalhar não apenas com o livro didático,

mas com paradidáticos, jornais, revistas, textos e livros científicos e literários,

Romances, observação de quadro, pintura etc”.

Professor B: “Utilizo muitos texto (poemas) slides com imagens, pois também é

importante perceber o movimento literário em outras manifestações artísticas, utilizo

também o livro didático”.

Com relação ao acervo de trabalhado, nota-se variados tipos e critérios

adotados para a referida leitura, porém, critérios que privilegiam mais o currículo e

as escolas literárias, que a necessidade do aluno. A pergunta “Que critério utiliza na

seleção do acervo a ser indicado para leitura?” revela essa realidade.

a) Professores da escola 1:

Page 50: A prática de literatura no ensino médio como inovar

49

Professor A: “Sempre procuro indicar romances para serem lidos pelos alunos de

acordo com os movimentos literários que estão sendo estudados”.

Professor B: “A relação com o movimento literário em estudo e obras solicitadas

para vestibular”.

Professor C: “As obras literárias indicadas para leitura seguem, primeiro, a relação

das mesmas com os movimentos literários em estudo; depois, o acesso até elas,

atentando também às obras requisitadas nos vestibulares, isso mais

especificamente nas 3ªs séries. Mas no noturno a leitura extraclasse é uma luta”.

b) Professores da escola 2:

Professor A: “Não menosprezo a capacidade dos meus alunos, por isso prefiro que

eles leiam os romances ao invés de resumos mesmo com os alunos do noturno. E

primeiramente observo se a linguagem é acessível aos meus alunos, procuro livro

não muito extenso (muitas páginas) e histórias envolventes. Instigam mais os

alunos”.

Professor B: “Gosto de selecionar, pelo menos, uma obra de cada movimento para

que os alunos se aproximem do que estudaram. Entretanto na 3ª série do ensino

Médio priorizo as obras indicadas para o vestibular”.

Com relação à metodologia adotada pelos professores, através das respostas

obtidas por meio da questão “Qual a metodologia que utiliza nas aulas de

literatura?”, vê-se que a descrição é muito mais rica do que de fato foi possível ver

em sala de aula. Vale ressaltar que não observei as aulas durante todo um ano, mas

apenas algum período e, nesse tempo, vi apenas utilização de sala multimídia para

exposição de slides.

a) Professores da escola 1:

Page 51: A prática de literatura no ensino médio como inovar

50

Professor A: “Exibição de slides e vídeos para explanação e discussão dos

conteúdos selecionados; Aplicação de dinâmicas de textos não-verbais,

comparando-os a textos de linguagem verbal; Leitura comentada de trechos de

obras literárias (lidas extraclasse) em aula; ao término da leitura, avaliação dinâmica

e construtiva por meio de exposições orais, de painéis, poesia, paródia,

representação de cenas (teatro); Seminários”.

Professor B: “Dinâmicas diversas, estudo dirigido, debates, Seminários e estudo em

grupo”.

Professor C: “Aulas expositivas através de esquemas, estudo dirigido, seminários,

debate, estudo em grupo, exercícios, áudio e análises de músicas, projeção de

slides e filmes, gincana literária...”.

b) Professores da escola 2:

Professor A: “Procuro diversificar minhas aulas de literatura com atividades que

tenham significado para meus alunos, costumo indicar leitura de romances, teatro,

dramatização, filmes, pesquisas, vídeos etc”.

Professor B: “Trabalho muito com slides tanto de poesias, textos como imagens.

Muita análise de poemas e claro, o conhecimento da biografia do autor e

características do movimento”.

As descrições dos professores confirmam o que foi observado em sala. O

ensino de literatura ocorre ainda de forma tradicional, atendendo às necessidades

do currículo, ainda que muitos recursos didáticos sejam utilizados, o aluno não é

preparado para a vida, não conhece a relação existente entre vida e Literatura. Se

houvesse uma proposta pedagógica que valorizasse também o conhecimento de

mundo do aluno juntamente com seus saberes, toda atividade de Literatura seria

antes de meras análises, atividades de produção de sentidos. Propõe-se que o

professor adote uma diferente prática de leitura na escola, que, consequentemente,

reflita na sociedade. Para isso, a leitura precisa ser antes de tudo consciente,

valorizando o aluno e o seu contexto de vida. Mas, saindo do ideal e passando ao

Page 52: A prática de literatura no ensino médio como inovar

51

plano do real, vemos que o ensino resume-se a descrições de movimentos literários.

Nas palavras de Ione Maria Rich Vinhais (2009):

[...] o ensino de literatura apresenta-se didaticamente distribuídos em períodos ou épocas literárias que representam movimentos e estilos, tendo cada um sua linguagem determinada por características comuns, que se contrapõem dentro de um contexto sócio – histórico – cultural, com a finalidade de facilitar a leitura de obras clássicas pelo aluno de ensino médio (p. 19).

Tais palavras mostram que em grande parte dos casos, o professor decide o

que o aluno vai ler, e, muitas dessas leituras, encontram-se nas páginas do livro

didático, que já vem acompanhado por roteiros prontos e não abrem espaços para a

opinião dos discentes sobre o que gostariam de ler e, com isso, restringem a

disciplina aos conteúdos estudados nas aulas. E, se o ensino de Literatura

continuar restringido apenas ao que é visto em aula, a aprendizagem do aluno

limitar-se-á ao processo de escutar passivamente o que é dito pelo professor.

Sabendo-se que um dos maiores suportes do professor para o trabalho com

Literatura no Ensino médio é o livro didático, Pedro Demo (2002) defende que, ao

invés de ser apenas intérprete externo do livro didático, o professor deveria ser a

ponte entre esse e o aluno. Trata-se de uma convivência produtiva com ele.

A sala de aulas, lugar em si privilegiado para processos emancipatórios através da formação educativa, torna-se prisão da criatividade cerceada, à medida que se instala um ambiente meramente transmissivo e imitativo de informações de segunda mão. Na frente está quem ensina, de autoridade incontestável, imune a qualquer avaliação; na platéia cativa estão os alunos, cuja função é ouvir copiar e reproduzir, na mais tacanha fidelidade. “Bom aluno”é o discípulo, que engole sem digerir o que o professor despeja sobre ele, à imagem e semelhança (p. 83).

O professor precisa tomar atitudes diferentes das tradicionais e estabelecer

um diálogo com a realidade, fazendo da Literatura um processo de evolução da

sociedade. Só depende deste, reavaliar sua prática pedagógica e, juntos com os

alunos, por ele próprio instigados, tornarem-se novos construtores de conhecimento

e agentes de mudança na sociedade.

Page 53: A prática de literatura no ensino médio como inovar

52

Muito mais que disciplina escolar, a Literatura, como toda forma de arte, é um

modo de conhecimento do outro e do mundo por meio da realidade construída por

autor e leitor. A escola precisa trabalhar também esse lado da Literatura, e não

precisa abrir mão de sua escolarização, apenas mostrar para o aluno que a

importância do texto literário vai além da análise do movimento a que pertence, do

estilo do autor e sua biografia. Através do texto literário podemos questionar nossa

concepção de realidade, podemos indagar e interrogar sobre a natureza da nossa

própria realidade.

É evidente que o sentido da obra não está resumido a subjetividade do aluno,

mas é próprio de um trabalho de conhecimento. No percurso desse caminho pode

ter utilidade que o aluno estude e aprenda sobre história literária e alguns princípios

da análise estrutural das obras, entretanto, o estudo desses meios não deve em

nenhum momento substituir o sentido da obra. Para Tzvetan Todorov (2009):

O conhecimento da literatura não é um fim em si, mas uma das vias régias que conduzem a realização pessoal de cada um. O caminho tomado atualmente pelo ensino literário, que dá as costas a esse horizonte [...], arrisca-se a nos conduzir a um impasse – sem falar que dificilmente poderá ter como consequência o amor pela literatura (p.33).

Sendo assim, se o ensino fica baseado em estudo do tipo “hoje estudaremos

tal conteúdo e, semana que vem passaremos a conteúdo tal”, dificilmente

conseguiremos melhorar o rumo da escolarização literária. Veremos belas propostas

em papel, mas nenhuma atitude de mudança.

Sobre a pesquisa em questão, verificou-se que o ensino tradicional da

Literatura vigente nas escolas 1 e 2 é fundamentado em livros didáticos que

apresentam uma abordagem cronológica, baseada em panoramas históricos e

características de estilos de épocas, sem se deter, diretamente, na “leitura” de textos

literários. Possui ênfase em aulas expositivas com o auxilio de recursos tecnológicos

em algumas aulas, porém, mesmo com tais recursos os alunos mostram-se

desinteressados e sem estímulos, e como se trata de uma pesquisa qualitativa, não

há a possibilidade de generalizar resultados, mas a mesma indica uma tendência.

Diante da importância desse tema e das considerações apresentadas, faz-se

necessário entender onde encontra-se o sentido da Literatura no Ensino Médio, o

Page 54: A prática de literatura no ensino médio como inovar

53

porquê de tanto desinteresses dos alunos e desestímulos dos professores, entender

também qual o motivo desse frequente rotina escolar.

3.3 O sentido da literatura no Ensino Médio: alunos desinteressados, professores

desestimulados

A existência do homem no mundo da leitura é sempre marcada por

atribuições de significados, descobertas, pensamentos e, consequentemente,

análises, que mostram a capacidade humana de atuar no mundo. Nessa situação, o

homem adentra um universo conhecido com significados já estabelecidos, podendo

também criar suas próprias compreensões.

Para entender a visão de leitura dos professores entrevistados, foram feitas

perguntas sobre a Literatura e seu hábito de leitura, e diante desta questão “Você

possui o hábito da leitura literária?”, obteve-se as seguintes respostas.

a)Professores da escola 1:

Professor A: “Eu procuro sempre desenvolver o hábito da leitura, e dentre as

diversas leituras que faço inclui-se a literária”.

Professor B: “Fui leitora assídua de livros literários, hoje talvez pela falta de tempo,

somente a leitura como objeto de ensino”.

Professor C: “A leitura literária não poderá, jamais, deixar de fazer parte do dia a dia

de um professor de Língua Portuguesa e Literatura. Já fui leitora assídua de obras

literária; mas ultimamente ando meio acomodada. Tenho lido mais aquilo que me dá

prazer ou que é necessário para o trabalho em sala de aula”.

b) Professores da escola 2:

Page 55: A prática de literatura no ensino médio como inovar

54

Professor A: “Sim, gosto muito de ler romances, jornais, revistas, textos etc”.

Professor B: “Sim”.

Em relação à pergunta “O que é Literatura para você?”, vejam as respostas

dadas:

a)Professores da escola 1:

Professor A: “A literatura, como toda arte é uma “transfiguração do real”, resultado

de um processo através do qual o homem, ao liberar seus sentimentos e emoções,

força exaltada da vida afetiva do escritor, consegue fazê-lo de maneira sensível e

bela, predominando, nessa mensagem, a função poética da linguagem. A literatura

é, então, a recriação do mundo (a ficção) feita pelo coração do escritor, conforme

sua vivência, seu talento e sua sensibilidade, visto que a sua função tem sido o

alívio dos escritores e leitores das suas pressões emocionais, deixando-os calmos

de espírito no fim da experiência estética”.

Professor B: “É a arte de escrever de forma artística como recriação da realidade”.

Professor C: “Literatura é a arte de se expressar livre e emocionalmente através da

palavra. É recriar a realidade. O artista literário faz uso da palavra e retrata seu

mundo interior, exterior ou imaginário; denuncia problemas sociais, revela seus

amores ou suas dores, utilizando os diversos recursos da linguagem. O que nos é

retratado através de poemas, contos, crônicas, fábulas, novelas, romances,

cordéis...”.

Professores da escola 2:

Professor A: “É vida, é conhecimento, é o que move o ser humano a expandir seus

horizontes. Ela também é um instrumento de comunicação e de interação e auxílio

no processo de transformação social”.

Page 56: A prática de literatura no ensino médio como inovar

55

Professor B: “É a possibilidade de viajar pela história do mundo, de dar vasão aos

sentimentos e sobretudo, de aprender a ler nas entrelinhas do texto. É arte”.

Diante dessas respostas, percebe-se que cada professor se define como

possuidor do hábito da leitura e, que vê a Literatura como arte, instrumento capaz de

transformar o homem e o mundo. Contudo, em algumas das observações feitas foi

possível notar o descaso diante do ensino, sendo a Literatura tratada apenas como

disciplina escolar mediante cobrança de notas. Em determinadas aulas da escola 1

os alunos teriam que apresentar um seminário, solicitado com um mês de

antecedência, sobre obras literárias e a vida de seus respectivos autores, e no dia

da apresentação os alunos não tinham nada preparado, ou seja, não tinham

interesse em falar, discutir sobre algo que não os interessava e o professor, que

esperava pelas apresentações e nada tinha preparado, reclamou um pouco do

descompromisso e foi à biblioteca pegar o livro para “passar” uma atividade, um

roteiro de texto.

Notamos assim, que se o professor trabalhasse a Literatura de forma mais

rica, lúdica e prazerosa, tornando-a significativa, os alunos teriam interesse em

estudar as obras, em compará-las com sua realidade e expor, por meio de

seminários, seus conhecimentos e opiniões, eles de fato vivenciariam a narrativa

que tivessem que trabalhar. Ao invés de utilizar os textos literários apenas para

atividades de interpretação, o professor poderia e pode estimular o aluno/ leitor a

buscar além das respostas que podem ser encontradas nas questões propostas.

Essa carência do ensino ainda ocorre porque, segundo Demo (2002):

Do lado do professor temos a visão empobrecida do ministrador de aulas, ainda em grande parte pessoas que detêm apenas graduação, sem experiência comprovada no campo científico. Fruto do mero aprender, naturalmente decaem no mero ensinar (p. 47).

O professor de Literatura é a ponte intermediária entre livro e aluno.

Geralmente, os livros que o professor leu ou lê são os mesmos indicados aos seus

alunos, que possivelmente poderão alguns ser também professor no futuro, e com

Page 57: A prática de literatura no ensino médio como inovar

56

isso, por muito tempo, tais livros se repetem no currículo escolar. Essa “sina” do

professor seguirá uma engrenagem reprodutiva tornando-se a mesma do aluno.

O estímulo ao aluno é importante porque este leva para a vida não aquilo que

decora, mas aquilo que por si mesmo é capaz de criar, isto é que faz parta de sua

atitude, de sua vida.

O leitor é livre, maior, independente; seu objetivo é menos compreender o livro do que compreender a si mesmo através do livro; aliás, ele não pode compreender um livro se não se compreende ele próprio graças a esse livro (COMPAGNON, 2003, p. 142).

As referidas palavras nos mostram que o livro não tem interesse para o aluno

se esse não consegue sentir prazer na leitura, se não encontra algo que o estimule,

que dialogue com sua cultura e sua vida. Com base nessa realidade, foi também

questionado aos professores a importância do ensino de Literatura, e, para a

questão “Você considera importante/relevante ensinar Literatura? Por quê?”, temos

as seguintes respostas:

a) Professores da escola 1:

Professor A: “Considero de grande relevância o ensino da literatura no âmbito

acadêmico, pois através da arte literária os alunos têm oportunidade de colocar à

tona aqueles sentimentos que estão adormecidos no seu interior e que só através da

poesia, ou melhor, das composições literárias podem aflorar”.

Professor B: “Sim. Porque abre um novo horizonte para os problemas sócio-político-

sociais”.

Professor C: “Sim, pois através do estudo literário o educando se familiariza com

autores e obras diversas, o que o instiga à leitura, seja esta prazerosa ou

“obrigatória”, levando-o à análise, reflexão e à expansão de conhecimento”.

b) Professores da escola 2:

Page 58: A prática de literatura no ensino médio como inovar

57

Professor A: “Sim, só acho que deve ser mais valorizado nas escolas, pois o ensino

da Literatura desenvolve no aluno a criatividade, imaginação na interação com os

textos, visa a construção e reconstrução de sentido do texto, percebendo com isso

as possibilidades de significação que o texto permite”.

Professor B: “Muito relevante. Porque é através da literatura que o aluno modifica o

seu modo de ver mundo, aprende a questionar, interpretar, a conhecer-se”.

Todos os professores têm uma visão positiva sobre a importância do ensino.

Mas o que justifica então esse ensino fragmentado que se observa em sala de aula?

Talvez o problema não esteja somente no ensino do professor, mas também na falta

de políticas de motivação para esse. O professor muitas vezes necessita de algo

que o estimule, mas este recurso não é oferecido pela escola e, dessa forma,

continua professor desestimulado e aluno desinteressado. Se estiver disposto a um

bom trabalho, o professor terá razões para olhar o material contido nos livros de

forma crítica e, se preciso for, interferir nas propostas apresentadas, buscando

complementá-las e adequá-las a suas necessidades. Cabe a esse, fazer do livro

didático um aliado seu e dos alunos, trabalhando-o em ligação a outros recursos,

para que assim o livro não se torne um objeto de recusa do aluno.

Tudo depende da formação do professor e de sua habilidade para transformar o livro didático em aliado na motivação dos alunos em sala de aula e não em apenas um único recurso que, utilizado à exaustão, pode tornar as aulas cansativas. É preciso, pois, diversificar as atividades e os recursos didáticos utilizados, para atrair o aluno ao estudo da literatura (MARTINS, 2006, p. 93).

Assim sendo, para aproximar a Literatura de seus alunos, o professor deve

desconfiar da didática, tentando inovar, inventando um novo modo de trabalhar com

os textos literários na sala de aula. Partindo dessa ideia, julga-se necessário

desenvolver para o aluno um estilo de vida com a presença do livro e que o aprecie.

Disso nasce a necessidade de paralelo aos Parâmetros Curriculares, questionar os

métodos no ensino da Literatura. Por base dessas ideias, os alunos foram

Page 59: A prática de literatura no ensino médio como inovar

58

questionados sobre a literatura enquanto disciplina escolar, e qual a importância

desta para eles. Para a pergunta “Em sua opinião, Literatura é apenas uma

disciplina escolar, ou é algo além disso? Explique”, seguem as respostas:

a) Alunos da escola 1:

Aluno A: “Algo além disso, pois nos incentiva a leitura”.

Aluno B: “Não, literatura é uma arte de produzir obras em prosa e versos”.

Aluno C: “É algo além disso, pois é vista através de textos e autores representativos,

que aparece relacionada ao contexto histórico de cada época”.

Aluno D: “Não. Porque a literatura você não só vai precisar dela na escola. É muito

importante porque é preciso usar em todo lugar”.

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “É uma disciplina, mas também se torna um algo mais na vida”.

Aluno B: “algo além disso, porque tenho mais interesse pela leitura”.

Aluno C: “Apenas uma disciplina escolar. É porque eu acho que não serve para a

vida”.

Aluno D: “Apenas uma disciplina, porque eu só utilizo no colégio”.

E: “É além disso, pois através dela aprendemos coisas para o longo de nossa vida”.

F: “É apenas algo escolar. Por que eu não me identifico muito bem”.

Já em relação ao questionamento “Qual a importância do ensino de Literatura

para você?”, vemos variadas e positivas respostas, observem:

a)Alunos da escola 1:

Page 60: A prática de literatura no ensino médio como inovar

59

Aluno A: (não respondeu)

Aluno B: “Que nela há muitas histórias de épocas passadas”.

Aluno C: “procurar relacionar textos que motivassem reflexões em outras áreas”.

Aluno D: “Muito ótimo porque aprendemos mais e é muito bom para o nosso dia a

dia”.

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “Tem uma boa importância, pois incentiva a leitura”.

Aluno B: “Várias”.

Aluno C: “É importante para aprendermos sobre a história dos escritores e dos

poetas”.

Aluno D: “Fazer com que eu tenha mais conhecimentos com as artes”.

Aluno E: “Nos incentiva a leitura e o prazer pela mesma”.

Aluno F: “Ficar por dentro dos assuntos que retrata o passado”.

Diante das respostas apresentadas, percebemos que os professores

consideram de suma importância o ensino de Literatura tanto para a formação como

para a vida do sujeito/leitor. Contudo, não vemos clareza nem certeza nas repostas

dos alunos. Esses ou não a consideram importante ou nem sabem bem para que

possa servir. Então, como estão ocorrendo as aulas? O que interfere nessa

imparcialidade entre o desestímulo de um ou o desinteresse do outro?

O problema ocorre por que a Literatura, propriamente no Ensino Médio, não é

ensinada para a vida, e sim para classificação em vestibulares e concursos. É

limitada à história da Literatura brasileira, e segue uma cronologia de estilos,

épocas, cânones, biografias. O texto literário, quando de fato aparece, é por meio de

fragmentos e só servem para comprovar as características das sequências

estudadas antes. Para Cosson (2006):

Page 61: A prática de literatura no ensino médio como inovar

60

[...] o lugar da literatura na escola parece enfrentar um dos seus momentos mais difíceis. Para muitos professores estudiosos da área de Letras, a literatura só se mantém na escola por força da tradição e da inércia curricular, uma vez que a educação literária é um produto do século XIX que já não tem razão de ser no século XX (p. 20).

As palavras do autor indicam a decadência do ensino literário atualmente, que

só existe, basicamente, por tradição e pela necessidade do vestibular, o que torna a

literatura mecânica e de difícil compreensão.

Em sala de aula, o papel do professor não é impor conteúdos, ao contrário, é

partir do que o aluno já conhece para aquilo que ele ainda desconhece, isso o

proporcionará o crescimento enquanto leitor e ampliaria seus horizontes de leitura.

Mas, se essa literatura com atitudes sacralizadoras continuar sendo motivo de

adoração do passado, algo estranho e distante do leitor, a beleza e a magia que

compõem a obra serão esquecidas em função da prática da análise literária. Falta

ao professor incentivar o aluno a estudar a Literatura de forma prazerosa e junto

com ele descobrir as potencialidades do texto. Pois, segundo Cyana Leahy-Dios

(2000), a experiência literária não está voltada para os elementos que desafiam a

educação, volta-se cada vez mais para o “aprender” e distancia-se do prazer. “A

literatura na escola expõe a contradição entre as coisas como são e como poderiam

ser. Mais que intelectual ou estilística, essa é uma questão política” (p. 30).

O professor, nesse sentido, precisa motivar-se e criar as próprias condições

do encontro do aluno com a literatura. E, para entender esses argumentos, foi

perguntado aos professores sobre o trabalho com Literatura no Ensino Médio.

Diante da pergunta, “Para você, qual a essência do trabalho com Literatura

especificamente no ensino médio?”, obteve-se as seguintes respostas:

a) Professores da escola 1:

Professor A: “A essência do trabalho com literatura especificamente no ensino médio

está no estudo e análise de textos e obras de clássicos da literatura (considerados

de destaque na literatura brasileira, como Machado de Assis, Jorge Amado,

Page 62: A prática de literatura no ensino médio como inovar

61

Graciliano Ramos...) comparando-os com a realidade, que concomitantemente

propicia o desenvolvimento da capacidade de interpretação de textos”.

Professor B: “Despertar no aluno o gosto literário e uma consciência de leitura

crítica”.

Professor C: “Acredito que já abordei essa questão no item anterior”.

b) Professores da escola 2:

Professor A: “Acho que o conhecimento das obras literárias ajuda bastante nossos

alunos na produção de textos, despertando o prazer e gosto pela leitura,

contribuindo para o leitor de forma geral”.

Professor B: “A essência é exatamente o poder de levar o aluno a conhecer-se e

melhorar seu nível de interpretação não só dos textos, mas também do mundo”.

Todos os professores defendem a ideia da Literatura como expressão da

realidade, diferentemente dos alunos que relatam que as atividades feitas com o

texto literário são basicamente seminários, interpretação de textos, exercícios,

questionários sobre as obras, entre outras.

Diante dos diferentes tipos de aprendizagens literárias, Cosson (2006), nos

apresenta três tipos, e ressalta que as aulas tradicionais restringem os

conhecimentos sobre e por meio da Literatura e não a aprendizagem “da” literatura.

[...] a literatura é uma linguagem que compreende três tipos de aprendizagem: a aprendizagem da literatura, que consiste fundamentalmente em experienciar o mundo por meio da palavra; a aprendizagem sobre a literatura, que envolve conhecimentos de história, teoria e crítica; e a aprendizagem por meio da literatura, nesse caso os saberes e as habilidades que a prática da literatura proporciona aos seus usuários. As aulas de literatura tradicionais, como já vimos, oscilam entre essas duas últimas aprendizagens e, praticamente, ignoram a primeira, que deveria ser o ponto central das atividades envolvendo literatura na escola (p. 47).

Page 63: A prática de literatura no ensino médio como inovar

62

De fato, há uma divergência entre as respostas de professores e alunos

acerca das aulas e atividades literárias. Sabemos que há carências de ambas as

partes, mas cabe principalmente ao professor ter vontade de melhorar sua prática,

pois se este não o faz, não terá condições de estimular o aluno a gostar de sua

disciplina.

Outra questão levantada aos alunos foi acerca do gosto pelas aulas de

literatura e, se com tais aulas tem ganhado algo na vida pessoal. Para a pergunta

“Você gosta das aulas de literatura? Por quê?”, seguem abaixo as respostas:

a) Alunos da escola 1:

Aluno A: “Não”.

Aluno B: “Sim, porque nelas conhecemos várias histórias”.

Aluno C: “Sim, pois nos ensina muitas coisas”.

Aluno D: “Chato, que quando começa falar em uma coisa é quase a semana toda só

falando sobre aquele assunto, por isso chateia”.

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “Mais ou menos. Porque as vezes a aula se torna chata com tanta leitura”.

Aluno B: “Sim, porque adquiro mais conhecimento”.

Aluno C: “Gosto um pouco, por que as vezes é divertido aprender sobre os poetas”.

Aluno D: “Sim. Porque adquirimos conhecimentos importantes que serão usados ao

longo da minha vida”.

Aluno E: “Sim. Pois aprendemos coisas de ontem, mas que se refletem até hoje”.

Aluno F: “Gosto, por mais que eu não me identifique muito bem. Por que são

divertidas, revendo as coisas do passado”.

Page 64: A prática de literatura no ensino médio como inovar

63

Para perceber se, na visão do aluno, a Literatura influi em sua vida, fez-se a

seguinte pergunta: “Você tem ganhado ou realizado algo em sua vida pessoal no

estudo da disciplina Literatura? O quê?”. As respostas seguem abaixo.

a) Alunos da escola 1:

Aluno A: “Não”.

Aluno B: “Não”.

Aluno C: “Sim, os autores e suas principais obras”.

Aluno D: “Sim, a sabedoria. Porque as vezes eu fico pensando sobre essas pessoas

mais velhas, como se sentem quando alguém lhe dá um papel escrito que eles não

sabem ler. E hoje já tenho, pelo menos, essa facilidade”.

b) Alunos da escola 2:

Aluno A: “Sim, conhecimento, informações”.

Aluno B: “Sim, o gosto pelos livros”.

Aluno C: “Não”.

Aluno D: “Sim. Pois a literatura depende da leitura. E a leitura é essencial na nossa

rotina”.

Aluno E: “Ganhei vários elogios, como boa leitora”.

Aluno F: “Ganhado mais conhecimento”.

Os alunos falam muito em conhecimento, que adquirem „o conhecimento‟,

mas não possuem opinião formada sobre um tipo de conhecimento, ou o que este

conhecimento o proporciona. Isso comprova a falta de intimidade dos alunos com o

que de fato é Literatura, com os valores, emoções, sensações que esta pode lhes

proporcionar. A realidade é refletida no jogo do “finge que ensina e finge que

aprende”, mas se houvesse comprometimento daqueles que se formaram para

cumprir tal ato, os alunos seriam, no mínimo, instigados a questionarem as

possibilidades da leitura literária. Para Compagnon (2003):

Page 65: A prática de literatura no ensino médio como inovar

64

A leitura tem a ver com a empatia, projeção, identificação. Ela maltrata obrigatoriamente o livro, adapta-o às preocupações do leitor [...] o leitor aplica o que lê à sua própria situação, por exemplo, a seus amores (p. 141).

É justamente isso que o aluno precisa; saber relacionar o tal „conhecimento‟

que adquire nas aulas de Literatura à sua realidade de vida, a cada situação que

vivencia no dia a dia. E cabe ao professor, dentro desse contexto de literatura

escolarizada, mostrar aos alunos que as histórias contidas nos textos que estudam

refletem as experiências de cada um, basta que eles saibam e queiram ver.

Os professores também foram questionados quanto a relação entre Literatura

e sociedade. E, Quanto ao questionamento “Possui o costume de relacionar os

problemas da sociedade às suas aulas de Literatura?”, todos foram positivos, Vejam

abaixo:

a) Professores da escola 1:

Professor A: “Sim. Ao explicar os movimentos literários costumo apresentar textos

e/ou trechos de obras das referidas épocas, estabelecendo um paralelo com a

sociedade contemporânea e seus problemas”.

Professor B: “Sim. Fazendo um paralelo com cada período conforme abordagem no

momento”.

Professor C: “Sim. Estabelecendo paralelo entre ambos”.

Professores da escola 2:

Professor A: “Sim, pois só dessa forma é que eles terão uma ampla compreensão

com relação ao mundo e a sociedade em que ele está inserido, percebendo as

problemáticas, sabendo que pode compreendê-las e tentar solucioná-las”.

Page 66: A prática de literatura no ensino médio como inovar

65

Professor B: “Sim. Sempre tento mostrar que a Literatura não é uma disciplina

morta, sem vida. Pois ela, em seu contexto sempre mostrou de alguma forma as

questões sociais que marcaram o mundo e, que de alguma forma continuam

presente. Falo também sobre o sentimento humano e assim discutimos a atualidade

dentro da literatura”.

Pelas falas apresentadas, todos dizem fazer a intertextualidade entre

Literatura e sociedade, mas infelizmente não possível verificar esse ensino

significativo por meio das respostas dos alunos que, na maioria das vezes foram

vagas. Diante desse quadro de desinteresse do aluno e desestímulo do professor,

questionou-se a esse último se sentia-se realizado com sua prática de professor.

Para finalizar, através da questão “Está satisfeito com o trabalho que realiza

como professor de Literatura? Por quê?” buscou-se ver qual a postura do professor

diante do ensino literário. Vejamos as respostas:

a) Professores da escola 1:

Professor A: “sinto-me satisfeita com o trabalho que realizo como professora de

literatura, pois procuro sempre planejar as minhas aulas fazendo uso de uma

metodologia diversificada. Há uma satisfação melhor no desenvolvimento de

atividades que envolvem a arte literária onde os alunos têm oportunidade de

demonstrar as suas potencialidades através da liberdade de criação de poesias,

paródias a até mesmo de músicas”.

Professor B: “Não. Porque encontro muitas dificuldades no processo ensino-

aprendizagem já que a avaliação quantitativa tornou-se o centro das aulas, pois o

aluno não lê mais por prazer e sim por obrigação”.

Professor C: “Parcialmente, pois a falta de interesse e de empenho dos alunos,

principalmente no que diz respeito à leitura extraescolar, seja do conteúdo especifico

de literatura ou de obras literárias, causa desmotivação e um pouco de insatisfação

ao professor comprometido com o seu trabalho”.

Page 67: A prática de literatura no ensino médio como inovar

66

Professores da escola 2:

Professor A: “Estou, procuro fazer com que meus alunos tenham uma aprendizagem

que dê a eles possibilidades para compreensão também de outros textos que não

sejam apenas literários. Mas, para mim o maior problema ainda é motivar os alunos

para a prática da leitura e compreensão do texto, já que eles chegam do ensino

fundamental desmotivados para essa prática”.

Professor B: “Estou muito satisfeita, pois sinto enorme prazer em estudar e ensinar

Literatura, e perceber que meus alunos sempre modificam sua forma de ver o

mundo e de se ver através desta viagem literária”.

Quase todos dizem relacionar os conteúdos curriculares de Literatura às

questões sociais. Quatro afirmaram estarem satisfeitas com a prática que realizam.

Uma disse não. Na teoria está tudo bem, entretanto no campo de atuação

pedagógica muda um pouco. Os professores têm mais preocupação quanto ao

cumprimento do programa do curso. A Literatura se acha inserida na Língua

Portuguesa, por isso, a prioridade é dada à última. Até mesmo porque além do curto

prazo para se cumprir todo o programa curricular, a matéria vem muito reduzida ao

livro didático.

Desculpas a parte, se o professor quer, de fato, contribuir com a melhoria do

ensino de Literatura, deve este, de início, transformar sua prática naquela que ajuda

o aluno a desenvolver seu próprio conhecimento e, a partir de determinadas leituras,

possa construir seu texto. Se assim agir, o professor será um ser atuante e

participante na situação de sala de aula, possibilitando uma reflexão na forma de ver

o mundo. Dessa forma, será além de educador, um pesquisador que busca entender

a realidade sócio-cultural dos alunos, e por meio da leitura de mundo destes,

fundamentar seu trabalho, construir conhecimentos, fazer educação, produzir

cultura. Além de também ouvir a opinião dos alunos, pois as visões dos alunos

contribuem para a prática pedagógica de Literatura, por isso, as lacunas que existem

nessas aulas podem ser suprimidas por meio do exercício crítico da leitura literária.

Page 68: A prática de literatura no ensino médio como inovar

67

Portanto, sem se deter apenas aos recursos que os alunos possuem e nem

ficar restrito ao tradicional ensino, é preciso pensar novas formas de interação entre

a escola, os alunos e os manuais didáticos, buscando assim, estabelecer uma nova

relação entre teoria e prática e professores e alunos, perdendo o estereótipo de

literatura como algo ruim e chato e, podendo os dois, conquistarem papéis de

sujeitos reais tantos das aulas como dos livros e do saber.

Page 69: A prática de literatura no ensino médio como inovar

68

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em nossa educação, ainda existem algumas dificuldades no processo de

ensino-aprendizagem. Mesmo com o surgimento de novas metodologias que

buscam aprimorar os meios de ensino, o Currículo Escolar ainda prende o professor

a segui-lo fielmente, embora essas disciplinas de cunho obrigatório no currículo

escolar possam ser trabalhadas com metodologias inovadoras.

É importante que as relações sociais presentes na Literatura possam ser

percebidas pelos alunos e, que por meio de uma leitura crítica, percebam nas obras

e seus contextos diferentes significados, além de estabelecer uma relação com a

vida e com sociedade a que pertencem. Os alunos precisam ser estimulados a, por

meio da leitura, perceberem as relações sociais comuns a suas vidas.

O meio mais eficaz de efetivar a educação é aproveitar a vontade do aluno

em aprender; entretanto, nesse trabalho não foi possível notar tal disposição.

Durante o período de observação, os alunos não se mostraram envolvidos com as

aulas de Literatura, talvez em função da prática do professor estar muito ligada ao

livro didático e longe das áreas que os interessam. Mas, se, sem fugir da proposta

do currículo, o professor apresentar formas inovadoras de envolver seus alunos,

essa realidade poderá ser alterada.

Pode-se constatar, por meio desse estudo, que há, na prática atual, muitas

dificuldades de interpretação da obra literária, o que acaba por provocar a falta de

interesse pela leitura de textos clássicos e até mesmo contemporâneos, posto que

só gostamos do que conhecemos. E, se não somos instigados à leitura, nem das

obras recentes teremos conhecimento.

Os dados foram analisados com base em definições literárias, segundo visões

de professores e alunos sobre a prática pedagógica e os conteúdos, bem como os

valores socioculturais relacionados ao fenômeno literário. Por serem dados

qualitativos, as entrevistas revelaram a realidade de como cada sujeito/ aluno

vivencia a situação.

Através do diálogo dos diversos autores que subsidiaram essa pesquisa, bem

como a fala dos professores e até mesmo dos alunos, vê-se que a Literatura é uma

forma de arte capaz de nos transpor a diferentes mundos. Entretanto, como

disciplina escolar, verificou-se que o ensino de Literatura ainda é feito de modo

tradicional, fundamentado em livros didáticos, priorizando panoramas históricos e

Page 70: A prática de literatura no ensino médio como inovar

69

características de movimentos, tudo seguindo uma sequencia cronológica, e, sem

preferência pela “leitura” direta dos textos literários, raras são as chamadas em

paralelo com a sociedade atual e com a vida dos alunos. Por haver muitas aulas

expositivas, mesmo que em algumas sejam utilizados recursos tecnológicos, os

alunos mostram-se indiferentes, sem interesse em aprender.

Com isso, com base nas reflexões dos teóricos e das propostas

apresentadas, espera-se que o ensino de Literatura aos poucos gere algum

progresso, e que o retorno disso tudo implique em alunos mais envolvidos e

motivados nas aulas, e, consequentemente, com um nível de aprendizado mais

ampliado. Assim sendo, desde já, nós, futuros professores de Língua Portuguesa e

Literatura, devemos buscar por envolver os alunos na disciplina de forma a

incentivá-los a ampliar seus conhecimentos de Literatura.

Page 71: A prática de literatura no ensino médio como inovar

70

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APÊNDICES

Page 76: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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Universidade do Estado da Bahia – UNEB Departamento de Educação – Campus XIV – Conceição do Coité Disciplina: Seminário Interdisciplinar de Pesquisa – SIP Professora orientadora: Juréia Ferreira Aluna: Ana Elma dos Santos Silva Escola: Nome:

Questionário de entrevista (professor)

1. Você possui o hábito da leitura literária?

2. O que é literatura para você?

3. Você considera importante/relevante ensinar literatura? Por quê?

4. Para você, qual a essência do trabalho com literatura especificamente no ensino

médio?

5. De acordo à sua experiência pedagógica, o que você acha que deve ser mais

valorizado na disciplina literatura?

a( )Decorar nomes de autores obras e datas.

b( )Conhecer a ordem sequencial das escolas literárias e suas características.

c( )Identificar nos textos características do período a que pertence.

d( )Estabelecer uma relação do texto literário com o mundo atual.

e( )Fazer crescer nos alunos o interesse e a capacidade de interpretar textos

literários.

Justifique:

6. Que material didático utiliza na realização das atividades literárias?

7. Que critério utiliza na seleção do acervo a ser indicado para leitura.

8. Qual a metodologia que utiliza nas aulas de literatura?

9. Possui o costume de relacionar os problemas da sociedade às suas aulas de

literatura?

( ) Sim. De que forma?

( ) Não

10. Está satisfeito com o trabalho que realiza como professor de literatura? Por quê?

Obs.: Os dados serão utilizados para pesquisa de conclusão de curso (TCC) na

Universidade do Estado da Bahia – UNEB. Seu nome não será divulgado.

Page 77: A prática de literatura no ensino médio como inovar

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Universidade do Estado da Bahia – UNEB Departamento de Educação – Campus XIV – Conceição do Coité Disciplina: Seminário Interdisciplinar de Pesquisa – SIP Professora orientadora: Juréia Ferreira Aluna: Ana Elma dos Santos Silva Escola: Nome:

Questionário de entrevista (aluno)

1. Você tem o hábito de ler?

2. Qual dos itens abaixo você ler com maior frequencia?

a( ) jornais

b( ) romances

c( ) revistas

d( ) quadrinhos

e( ) poesia

f( ) outros (explique qual)

3. Qual a última obra literária que você leu? Essa leitura foi solicitada pela escola?

4. Qual a sua postura em relação as obras que são indicadas pelo professor(a) de

literatura.

a( ) lê todas

b( ) lê quase todas

c( ) lê algumas

d( ) lê o texto parcialmente

e( ) nunca lê

5. Em sua opinião, literatura é apenas uma disciplina escolar, ou é algo além disso?

Explique.

6. Qual a importância do ensino de literatura para você?

7. Que atividades você faz nas aulas de literatura?

8. Quais são as atividades mais rotineiras nas aulas de literatura?

9. Você gosta das aulas de literatura? Por quê?

10. Você tem ganhado ou realizado algo em sua vida pessoal no estudo da

disciplina literatura? O quê?

Obs.: Os dados serão utilizados para pesquisa de conclusão de curso (TCC) na

Universidade do Estado da Bahia – UNEB. Seu nome não será divulgado.