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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA PELA
PENA EM PERSPECTIVA
Por
Ricardo Gonçalves da Silva Júnior
Prof. Orientador Francis Rajzman
Rio de Janeiro
2010
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA PELA
PENA EM PERSPECTIVA
OBJETIVOS
Esta publicação atende a complementação
didático-pedagógica de metodologia da
pesquisa e a produção e desenvolvimento
de monografia, para o curso de pós-
graduação em Direito e Processo Penal pelo
pós-graduando Ricardo Gonçalves da Silva
Júnior.
3
SUMÁRIO
RESUMO ...........................................................................................................07
INTRODUÇÃO ...................................................................................................08
1.O PODER-DEVER DO ESTADO DE PUNIR ................................................11
2.OS FUNDAMENTOS DO DIREITO DE PUNIR .............................................17
3.EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PRESCRIÇÃO ...............................................20
4.CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DA PRESCRIÇÃO ...........................23
5.PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA PROPRIAMENTE DITA .......26
6.PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA INTERCORRENTE ...............29
7.PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA RETROATIVA ......................31
8.PRESCRIÇÃO EXECUTÓRIA ......................................................................34
9.CAUSAS INTERRUPTIVAS DA PRESCRIÇÃO ........................................36
4
10.CAUSAS SUSPENSIVAS (IMPEDITIVAS) DA PRESCRIÇÃO .................38
11.PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA PELA PENA EM
PERSPECTIVA (OU ANTECIPADA, OU VIRTUAL, OU PROJETADA) .........41
11.1 ARGUMENTOS CONTRÁRIOS .....................................................42
11.2 ARGUMENTOS FAVORÁVEIS .....................................................49
CONCLUSÃO....................................................................................................55
BIBLIOGRÁFIA..................................................................................................56
5
Dedico este trabalho a Deus. A minha querida mãe maravilhosa, Regina de Souza Oliveira, exemplo de talento e determinação na busca de nossos objetivos. Ao meu precioso padrasto, Geraldo Eurípedes de Souza Porto, que nos momentos mais difíceis sempre prestou seu auxílio de forma sensacional.
6
AGRADECIMENTOS
Ao meu Tio, Renato Gonçalves da Silva e minha Tia Maria de Fátima Esteves
Bandeira de Mello, pelo amor, pelo carinho e pela amizade, no incentivo a
trilhar a honrosa carreira jurídica. Agradeço ainda a todos aqueles que me
apoiaram e torceram por cada vitória, em especial, minha esposa, Aline
Ferreira de Mendonça, e minha amada filha, Ana Paula Mendonça Gonçalves
da Silva.
7
RESUMO
Este trabalho tem por finalidade o estudo da prescrição da pretensão punitiva
estatal pela pena em perspectiva, também chamada de prescrição pela pena
ideal, antecipada, virtual, ou projetada, como forma de extinção da punibilidade,
com base na legislação penal vigente e na Constituição Federal de 1988,
passando por um estudo histórico da evolução da prescrição, suas teorias e
espécies. É analisada de forma mais profunda a espécie de prescrição a que
se destina este trabalho, ou seja, a prescrição pela pena em perspectiva, sendo
analisados os argumentos contrários e favoráveis à aplicação desta
espécie/modalidade de prescrição, trazendo à baila o posicionamento de parte
da doutrina que, baseada principalmente no princípio da obrigatoriedade e na
possibilidade de haver mutatio libelli, rechaça a aplicabilidade da referida
espécie de prescrição. Traz também o posicionamento de outra parte da
doutrina que, baseada principalmente na economia processual e no
funcionalismo penal defende a aplicação da prescrição antecipada. O trabalho
coleciona ainda breves considerações sobre as causas interruptivas e
suspensivas da prescrição, o aspecto polêmico da prescrição na medida de
segurança e a posição de diversos julgados à respeito da aplicabilidade da
prescrição pela pena em perspectiva. A exposição é feita com fundamento de
cooperar com a discussão e definir o futuro desta espécie de prescrição, seja
ela abarcada pela nossa legislação (positivada de forma clara) ou não.
Palavras-chave: Prescrição; Prescrição pela pena ideal; Prescrição antecipada;
Prescrição virtual; Prescrição pela pena em perspectiva; Prescrição projetada.
8
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo o estudo da prescrição da
pretensão punitiva do estatal pela pena em perspectiva, também chamada de
antecipada, virtual, pela pena ideal ou projetada, como forma de fomentar a
discussão a cerca da aplicabilidade desta espécie de prescrição, e foi realizado
através de uma pesquisa exploratória, de levantamento bibliográfico e
jurisprudencial, com ênfase nas principais questões teóricas disponíveis,
oferecendo subsídio para a argumentação favorável e contrária a aplicação do
enunciado.
Cabe ressaltar que este tema fora escolhido por despertar grande
interesse, uma vez que se trata de uma espécie de prescrição da pretensão
punitiva que não está abarcada em nosso ordenamento jurídico, sendo uma
criação doutrinária e jurisprudencial que vem ganhando força a cada dia.
A extinção da punibilidade pode-se dar por vários motivos, dentre
eles a prescrição, que pode ser da pretensão punitiva ou da pretensão
executória, esta quando o Estado demora na execução de uma sentença,
aquela quando o Estado demora em prolatar uma sanção.
O artigo 107 do Código Penal prevê as formas de extinção da
punibilidade, dentre elas em seu inciso IV a prescrição, enquanto os artigos
109 a 119 do Código Penal são dedicados a prescrição, passando pelo termo
inicial, causas impeditivas e interruptivas, os prazos, a forma de contagem e
aplicação em caso de transito em julgado ou não, até aplicação da prescrição
em caso de concurso de crimes.
Para um estudo mais alicerçado, no primeiro capítulo é traçado
breves linhas quanto ao poder-dever do Estado de punir, com um estudo
voltado para bases filosóficas e históricas.
9
No segundo capítulo é tratado dos fundamentos do direito de punir
estatal, novamente, com base filosófica e histórica, dando continuidade ao
primeiro capítulo.
O terceiro capítulo traz bases da evolução histórica da prescrição em
si, a fim de entendermos melhor todas as espécies de prescrição e para que
foram criadas, quando do estudo específico de cada uma.
O quarto capítulo fora destinado à definição do conceito de
prescrição, trazendo a definição dos estudiosos sobre o assunto.
No quinto capítulo começa-se a tratar das subespécies ou
modalidades de prescrição, sendo tratada neste capítulo a prescrição da
pretensão punitiva propriamente dita, trazendo explicações teóricas e exemplos
práticos.
O sexto capítulo examina a subespécie ou modalidade de prescrição
da pretensão punitiva intercorrente, trazendo explicações teóricas e exemplos
práticos.
O sétimo capítulo é dedicado a analisar a subespécie ou modalidade
de prescrição da pretensão punitiva retroativa, observando ser, certamente, a
subespécie mais comum e a que se baseia a prescrição pela pena em
perspectiva, objeto deste estudo, sendo de profunda importância a explanação
desta espécie, por isso, traz-se também explicações teóricas e exemplos
práticos.
No oitavo capítulo é estudado de forma a alinhavar breves
comentários sobre a espécie de prescrição da pretensão executória, quando o
Estado se delonga na aplicação de uma sanção.
No nono capítulo estudamos as causas interruptivas da prescrição,
com breve análise das causas constante em nossa legislação.
No décimo capítulo estudamos as causas impeditivas, ou, mais
conhecidas como causas suspensivas, com breve análise das causas
constantes em nossa legislação.
10
Por fim, no último capítulo é estudado de forma mais aprofundada a
espécie de prescrição pela pena em perspectiva, ou virtual, ou pela pena ideal,
ou projetada, ou retroativa, apresentando, na medida do possível, de forma
exaustiva os principais argumentos contrários e favoráveis à aplicação desta
espécie de prescrição que fora originada dos tribunais e dos estudiosos, é
apresentado, ainda, de forma concisa a origem desta subespécie ou
modalidade como forma de uma melhor elucidação das questões atuais e
futuras, bem como colecionamos algumas jurisprudências contrárias e
favoráveis.
Visto isso, ficará demonstrado ao final da pesquisa, o entendimento
sobre a aplicabilidade desta subespécie ou modalidade de prescrição, por parte
da doutrina e dos Tribunais.
11
1.O PODER-DEVER DO ESTADO DE PUNIR
Ao passo que o poder público foi se afirmando ao longo da história,
o Estado passou a intervir também nas infrações de interesses privados, e. g. o
homicídio, o furto, a injúria, entre outros, além dos interesses do próprio Estado
ou da sociedade que já vinham sofrendo intervenções do Estado.
Nas espécies de infrações relativas aos interesses privados, a
intervenção do Estado se deu não apenas para a satisfação do particular de
ver o infrator punido, mas, certamente, por se tratar de forma indireta de
interesse da sociedade como um todo, que desejava a reparação àquele mal
gerado pelo infrator, como por exemplo a sensação de insegurança gerada
para sociedade por um homicídio.
Não obstante à reparação aos danos causados, seja ao particular,
seja à sociedade, o Estado teve que intervir as infrações de interesses privados
como forma de evitar a regressão na própria sociedade e forma de estado,
pois, se não interviesse nessas espécies de infrações, culminaria na vingança
do particular diretamente sobre o ofendido.
Decorre daí o nascimento do Direito Penal Público, na acepção
moderna da palavra, sobre o qual Carla Rahal Benedetti diz que
esse direito penal do Estado necessita fornecer de
maneira rápida e eficaz o sentido da paz, da ordem e da
segurança aos cidadãos. Para tanto, o legislador deve
conceber delitos e penas de acordo com o juízo de valor e
em conformidade com a consciência moral de um povo
para que assim possa declarar-se o delito não apenas um
ato anti-social, mas também e sobretudo, ofensa ao
sentido de justiça. Com uma visão panorâmica do
ordenamento jurídico, podemos dizer que o direito penal é
12
formado pelo conjunto de normas que se relacionam e
interagem com o direito de punir.1
Sendo assim, para que o Estado seja soberano deve este ter
capacidade de originar as regras as quais estarão sujeita a sociedade e,
principalmente, de aplicar suas decisões, impondo aos subordinados, que na
verdade compõem o próprio Estado, pois decorre deles a vontade de instituir o
ente qual irá regular suas relações até mesmo entre particulares.
Miguel Reale Júnior nos diz a respeito que
no dizer e aplicar o direito, mesmo porque o Estado
(moderno) existe na medida em que dita o Direito e se
põe como pessoa jurídica. (...) Assim, uma vez havendo o
Direito positivo, de maneira originária, o Estado, ente
então soberano, declara o Direito que regula a sociedade,
exercendo, inclusive, o monopólio da jurisdição, isto é, o
Estado possui o poder de legislar e de aplicar o direito,
ficando, pois, superada a autorização da vingança
privada, bem como a composição entre a vítima ou seus
familiares e o réu.2
Assim como todos os ramos jurídicos, o Direito Penal se distingue
entre o direito subjetivo e o direito objetivo, bem como o direito penal material e
o direito penal adjetivo.
No direito material é difundida a idéia do direito de punir do Estado,
já no direito adjetivo é a idéia de direito subjetivo público independente que
1 BENEDETTI, Carla Rahal. Presc rição Penal Antecipada. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p.82. 2 REALE JÚNIOR, Miguel. Instituições de Direito Penal. Parte Geral. vol. I. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2004, p.14 e 15.
13
domina, nada mais é que o nascimento do próprio processo, de onde decorre o
direito de punir.
Neste sentido afirma Giulio Battaglini
isso significa que a existência em concreto desse direito
de punir está intimamente ligada com o resultado do
processo, que pode ser comprovado como verdadeiro, ou
não, o fato histórico afirmado que foi objeto do processo.
O direito penal adjetivo (formal ou processual) pode ser
definido como o conjunto de normas que regulam os
modos e as formas, mediante os quais se comprova, no
caso concreto, positiva ou negativa, o direito de punir.3
O jus puniendi do Estado, ou seja, o direito de punir, como direito
penal subjetivo para Carla Rahal Benedetti significa que somente ao Estado é
permitido o exercício desse direito, que é posto em prática pela autoridade
pública que representa o Estado.4
Deste direito subjetivo de punir emanam duas vertentes: a primeira,
faculdade ou pretensão; e a segunda obrigação.
Pretensão não é conceituada de forma pacífica na doutrina, quanto a
sua aplicabilidade e abrangência.
Para Pontes de Miranda, pretensão é a posição subjetiva de poder
exigir de outrem alguma prestação positiva ou negativa, é a tensão para algum
ato ou omissão dirigida a alguém. Na pretensão, o direito tende para si,
dirigindo-se para que alguém cumpra o seu dever jurídico.5
3 BATTAGLINI, Giulio. Direito Penal. Parte Geral. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1973, p. 11. 4 Ob. cit. P. 84. 5 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Geral. Tomo V. Rio de Janeiro: Editor Borsoi, 1996, §615, p.451 e 452.
14
Para Aníbal Bruno, não há um direito penal subjetivo. Entendo o
autor que o direito penal subjetivo, nada mais é do que uma tentativa de
relacionar a doutrina dos direitos públicos subjetivos coma excessiva tendência
dos dogmáticos em construir o Direito Penal sobre o padrão estrutural do
Direito Privado.6
Já para Miguel Reale Júnior, mais que um direito, o Estado possui o
dever de aplicar a lei penal e executar as sanções inerentes ao caso concreto
que decorrem dela, não podendo deixar de atuar sob pena de gerar uma
grande insegurança jurídica para a sociedade e fragilizar a sua soberania.7
No aspecto objetivo, segundo Basileu Garcia, o Direito Penal
representa o conjunto de normas jurídicas que o Estado estabelece para
combater as infrações penais, que consistem em crimes ou delitos e
contravenções, bem como a aplicação de suas respectivas penas ou medidas
de segurança.8
Pontua Carla Rahal Benedetti que
verificada, porém, a violação de um bem juridicamente
preexistente, intervém a norma penal secundária que é a
sanção, pois sujeita o infrator (réu) à pena correlata ao
direito do Estado de impor essa pena, e possui, ainda, a
pretensão de que a ela o réu se submeta, surgindo o
direito concreto de punir, cuja titulação é sempre Estado-
Administração, jamais do particular ofendido, ainda que se
trate de ação penal de natureza privada.9
6 BRUNO, Aníbal. Direito Penal. Parte Geral. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1967, p.19 e 20. 7 Ob. cit. P. 15. 8 GARCIA, Basileu. Instituições de Direito Penal. vol. 1, Tomo I. 3ª ed.São Paulo.: Max Limonad, 1956, p. 8. 9 Ob. ciit. p. 86
15
Surgindo então ao Estado o direito de executar o título penal
executivo (jus executionis), nesse diapasão nos ensina Nelson Hungria que
direito de punir não é só direito de exigir a imposição da pena cominada, mas
também o direito de reclamar a imposição da pena in concreto.10
Tobias Barreto segue a linha de pensamento de Rudolf Ihering e diz:
ou o direito seja o conjunto das condições de existência
da sociedade asseguradas por uma coação externa, isto
é, pelo poder público, ou se defina mais concisamente,
segundo Wilhelm Arnold, uma função da vida nacional, ou
seja, enfim o que quer que seja, que não se pode conter
dentro dos limites de uma definição, o certo é que o
direito, da mesma forma quue a gramática, da mesma
forma que a lógica, é um sistema de regras, é, como tal,
um produto de indução, um edifício levantado sobre base
puramente experimental.11
Assim, segundo Carla Rahal Benedetti
O Estado não possui o direito de escolher se deve ou não
punir, isto é, não possui a liberdade de aplicar ou não a lei
penal. Possui, sim, o dever, por meio de órgãos dotados
de autoridade, pelo ministério Público e pelo Judiciário, de
agir contra todo indivíduo ao qual apenas a ameaça da lei
penal tornou-se insuficiente. Não se trata, portanto, de um
10 HUNGRIA, Nelson. A extinção da punibilidade em face do novo Código Penal. vol. 87. Rio de janeiro: Forense, 1958, p. 580. 11 BARRETO, Tobias. Estudos de Direito. 1ª ed., Campinas: Bookseller, 2000, p. 170.
16
direito de ser, ou não, a pena executada contra um
infrator, mas um dever do Estado soberano.12
Os princípios penais constitucionais limitam o jus puniendi do
Estado, assim como o princípio político do nulla poena sine judicio, acerca
disso assevera a referida autora.
esses limites tutelam o direito individual de liberdade, ou
seja, direito subjetivo público e inerente a todo cidadão,
embora exercido pelo poder do Estado. Na verdade, o
direito individual de liberdade, que todo cidadão possui, é
um direito natural, e a sua garantia de integridade é
justamente o direito subjetivo de punir, e cabe somente ao
Estado dele se utilizar.13
12 Ob. cit. p. 87 e 88. 13 Ibidem, p. 88.
17
2.OS FUNDAMENTOS DO DIREITO DE PUNIR
Para alguns a palavra pena vem do latim poena, para outros vem da
palavra pondus que significa peso.
Há quem acredite ter origem no vocabulário grego da palavra ponus,
que significa trabalho, ou do sânscrito punya, que significa pureza e virtude.
Já para uma outra parcela de pessoas, a origem da palavra pena
tem procedência medieval da palavra expiar que originada do grego Eus (pius),
bom, religioso, afável – não podemos nos esquecer que Platão julgava a pena
como um bem.
Historicamente primeiro se aplicou as penas antes mesmos de se ter
os direitos fixados, pois, como as sociedades evoluíram, passaram a aplicar
penas a qualquer forma de dano, sem que existisse o próprio direito.
Tais regras são indispensáveis ao convívio da sociedade como
expõe Carla Rahal Benedeti
e foi, com interesse de se defenderem contra os que se
recusavam a obedecer às convenções ditadas pelo grupo,
que o homem naturalmente passou a exigir um complexo
de normas disciplinadoras das regras que são
indispensáveis ao convívio dos indivíduos.14
Como nos ensina Cesare Bonesana, ou mais conhecido como o
Marquês de Baccaria, “os povos, cansados de só viver no meio de temores e
14 Ob. cit. p. 89.
18
de encontrar inimigos por toda a parte, sacrificam uma parcela de sua liberdade
para gozar do resto com mais segurança”15
Segue o referido Autor
só a necessidade constrange os homens a ceder uma
parte de sua liberdade; daí resulta que cada indivíduo só
consente em pôr no depósito comum a menor porção
possível dela, isto é, precisamente o que era necessário
para empenhar os outros a mantê-lo na posse do resto. 16
Cessare Beccaria termina aduzindo que “são justamente essas
pequenas porções de liberdade que fundamentam o direito de punir”17
No século XVIII os professores, tratadistas e monografistas criaram
teorias para fundamentar a pena e o fim do direito penal, são elas: absolutas,
relativas e mistas.
Para a teoria absoluta, fundamenta-se a pena em sua própria
natureza, ou seja, não se leva em consideração sua justiça e utilidade,
bastando o crime para fundamentar a pena.
Já para a teoria relativa, atribuía-se à pena uma finalidade política e
utilitária, como fundamento de preservar a segurança coletiva. Nesta teoria o
crime era considerado pressuposto e não como fundamento da pena.
Para a teoria mista, atribuí-se ora uma, ora outra, tentando conjugar
a retribuição da teoria absoluta com a prevenção da teoria relativa, entretanto,
há discussão desafiando tal conciliação.
15 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Trad. Florio de Angelis. Bauru/SP: Edipro, 2001, p. 16. 16 Ibidem, p. 17. 17 Ibidem, mesma página.
19
Para Tobias Barreto, o conceito da pena é um conceito político e não
jurídico. O direito é uma obra do homem, ao mesmo tempo em que é uma
causa e um efeito do desenvolvimento humano.18
Roberto Lyra também defende a mesma linha de raciocínio de
Tobias Barreto e aduz que
o fundamento da pena, que não resulta de um conceito
jurídico, mas de um conceito político, foi conduzido para
abstração filosófica. Formaram-se, a respeito, teorias que
somente são classificáveis para fins didáticos, tantas as
sutilezas das opiniões e dos pontos de vistas.19
Para Carla Rahal Benedetti seja qual for a linha de raciocínio ou a
origem que se defenda da palavra pena “as teorias que fundamentam o direito
de punir podem ser consideradas em três idéias: justiça ou expiação; defesa
social ou intimidação; contrato social”20.
18 Ob. cit. p. 169. 19 LYRA, Roberto. Comentários ao Código Penal. vol. II. Rio de Janeiro: Forense, 1958, p. 22. 20 Ibidem, p. 96.
20
3.EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PRESCRIÇÃO
A previsão legal mais antiga de prescrição remonta ao Direito
Romano do século 17 ou 18 a. C., mais precisamente à Lex Iulia adulteriiss.
Segundo Carla Rahal Benedetti
os romanos não conheceram instituto da prescrição da
pena. Foi somente no século XVIII que o instituto da
prescrição da pena foi incorporado na legislação francesa
pelo Código Penal francês de 1791, por influência do
liberalismo.21
No direito comparado, o direito germânico na lei dos visigodos foi o
primeiro a se referir à prescrição, apontando suas raízes no direito romano.
No direito francês antigo existia a imprescritibilidade de alguns
delitos e como regra o prazo de 20 anos dos romanos.
Como prescrição da pena afirma Carla Rahal Benedetti
como fontes de prescrição, os franceses também tiveram
o Direito Romano. Entretanto, uma vez não tendo sido
encontradas disposições acerca da prescrição após a
sentença condenatória, a jurisprudência francesa avançou
e estipulou o prazo de prescrição de 30 (trinta) anos, a
partir da data da sentença. Surgiu, então, a prescrição da
pena na história do Direito Penal.22
21 Ob. cit. p. 121. 22 Ibidem, mesma página.
21
No direito italiano em geral o prazo era de 20 anos para a
prescrição, excetuando-se apenas as infrações sexuais que era de 15 anos.
No Brasil Colônia não havia qualquer menção à prescrição no Livro
V das Ordenações Filipinas, legislação vigente à época.
No Brasil Império destaca Carla Rahal Benedetti
coube o pioneirismo à Lei de 30 de setembro de 1830 –
projeto de Gonçalves Ledo – que, com o objetivo de
regulamentar dispositivo da Constituição de 1824, instituiu
os crimes de abuso de liberdade de imprensa e previu,
para esses casos, a prescrição da pretensão punitiva,
estabelecendo o prazo de 1 (um) ano, contado do
momento em que foi dada a publicidade ao abuso para as
ações públicas e de 3 (três) anos para as ações
privadas.23
Já o Código criminal do Império (1830) determinava expressamente
no art. 65 que não haveria a prescrição das penas, contrariando as idéias
liberais que passavam a assolar o mundo.
Somente o Código de Processo Penal, promulgado em 29 de
novembro de 1832 passou a abarcar o instituto da prescrição da ação.
Posteriormente, em 1841 surgiu a Lei nº 261, sobre a qual Carla
Rahal Benedetti nos conta
o conservadorismo da Lei nº 261, de 03 de dezembro de
1841, elevou, com o intuito reparador das idéias liberais
do Código de Processo de 1832, o prazo prescricional
para 20 (vinte) anos (art. 33) e aumentou o rol dos crimes 23 Ibidem, p. 123.
22
inafiançáveis (art. 38). (...) Posteriormente, o
Regulamento nº 120, editado em complemento à Lei nº
261, abandonou o prazo de 20 anos como termo
exclusivo da prescrição e retornou ao prazo anterior de 6
a 10 anos previstos inicialmente no Código de Processo
Criminal de primeira Instância.24
No Brasil República surgiu o Decreto nº 774 que segundo Carla
Rahal Benedetti
aboliu a pena de galés e reduziu a 30 anos as penas
perpétuas, Fez com que fossem computados os prazos
de prisão preventiva na execução da pena e, finalmente,
estabeleceu a prescrição das penas que não haviam
entrado em execução, tendo como termo inicial da
contagem prescricional a data do trânsito em julgado da
sentença condenatória ou a data em que tenha sido
interrompida, por qualquer modo, inclusive evasão, a
execução da pena.25
Passando por mais algumas alterações até chegarmos ao
estabelecido nos dias atuais com o artigo 109 do Código Penal estabelecendo
a prescrição antes do trânsito em julgado (prescrição da ação) e no artigo 110
estabelecendo a prescrição após o trânsito em julgado (prescrição da pena).
24 Ibidem, p. 124. 25 Ibidem, p. 125.
23
4.CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DA PRESCRIÇÃO
Em Relação ao instituto da prescrição, Carla Rahal Benedetti nos
apresenta que
o decurso do tempo atenua normalmente o interesse do
Estado em perquirir o crime, bem como em impor e
executar a pena pelo esvaimento de memória do fato e de
suas conseqüências sócias. Na hipótese de não ser a
instrução criminal proposta de pronto e da inexistência de
uma sentença condenatória irrecorrível, são geradas, com
o passar do tempo, dificuldades para se obter elementos
probatórios, como provas materiais, testemunhas etc.
Esses são alguns dos motivos que estão na base desse
instituto tradicional.26
José Frederico Marques define a prescrição como sendo “a perda do
direito de punir pelo não uso da pretensão punitiva durante certo espaço de
tempo”.27
De acordo com Valério Rodrigues Dias, é, em linhas gerais
uma, regra jurídica cuja hipótese de incidência é o
transcurso de um lapso temporal associado com a inércia
do titular do direito subjetivo lesado ou violado, que não
26 Ibidem, p. 103. 27 MARQUES, José Frederico. Tratado de Direito Penal. Campinas: Bookseller, 1997, p. 497.
24
exercita sua pretensão no tempo assinalado pela norma
jurídica.28
Para muitos ilustres penalistas, o instituto da prescrição é, com o
passar do prazo prescricional, a renúncia ou abdicação do Estado Soberano,
extinguindo-se, assim, o seu poder-dever punitivo.
Ensina-nos José Frederico Marques com relação à renúncia que
somente pode ocorrer “renúncia” na fase legislativa da
norma penal, não mais na esfera de aplicação após sua
promulgação que, uma vez reconhecida como lei, a
prescrição é a perda do poder-dever de punir pelo não
uso da pretensão punitiva durante certo tempo.29
Sobre a definição de prescrição, Carla Rahal Benedetti conclui nos
dizendo que
o Estado Soberano delibera, previamente, a possibilidade
de perder o seu direito conferido pelo povo em exercer
uma de suas funções estatais, que é o poder-dever de ser
instaurada uma persecução criminal diante da
perpetração de um crime, bem como o de executar a
pena anteriormente imposta, pelo decurso de tempo.
Pode-se dizer que a prescrição funciona como limite ao
Estado Soberano, que deve exercer a sua tarefa dentro
de um prazo razoável estipulado em lei, sob a
28 DIAS, Valério Rodrigues. O conceito de prescrição aplicável aos principais institutos de Direito Administrativo. Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifica Universidade católica de São Paulo, sob orientação do Prof. Doutor Sílvio Luís Ferreira da Rocha. São Paulo, 2005, p. 30. 29 Ob. cit. p. 497 e 498.
25
possibilidade de se esvair no tempo tudo o que se
relaciona com o fato delituoso.30
Quanto à natureza jurídica do instituto da prescrição penal existem
três posicionamentos: o de caráter penal; o processual e o misto.
Essa discussão se deve à forma de contagem de prazo contida no
art. 10 do Código Penal, como bem observa Carla Rahal Benedetti
Para os que entendem ser a natureza jurídica da
prescrição um instituto de direito material ou substantivo,
o fundamento usado ampara-se no fato de o prazo
prescricional obedecer à regra insculpida no art. 10 do
Código Penal, bem como estão dispostas todas as regras
pertinentes a ela no mesmo diploma legal, embora
admitam ter algumas de suas conseqüências imediatas
(ação penal ou condenação) pertencentes ao direito
adjetivo.31
Apesar de ser a posição dominante da doutrina é a de que é uma
regra de natureza material com conseqüências processuais, há quem defenda
ser uma regra de natureza processual, é o caso, e. g. de Carnelutti e Lourié.
30 Ob. cit. p. 106 e 107. 31 Ibidem, p. 120.
26
5.PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA
PROPRIAMENTE DITA
Existem duas espécies de prescrição: a prescrição da pretensão
punitiva e a prescrição da pretensão executória, como uma das subespécies de
prescrição da pretensão punitiva temos a propriamente dita.
Antes de adentrarmos na explanação da subespécie propriamente
dita, devemos tecer alguns comentários quanto à espécie.
A prescrição da pretensão punitiva ocorre sempre antes do trânsito
em julgado da sentença e tem como conseqüência o fenômeno do
esquecimento, ou seja, desaparecem todos os efeitos da sentença (principais e
secundários, penais e extrapenais), se houver, bem como a própria pena.
Impede, também, o início ou interrompe a persecução penal em
juízo.
E, por fim, mas não menos importante, por ocorrer o fenômeno do
esquecimento, não poderá acarreta qualquer responsabilidade ou culpabilidade
do agente, não gerando reincidência futura.
Cabe ressaltar que a prescrição da pretensão punitiva pode ser
declarada de ofício a qualquer momento da ação penal, conforme o artigo 61,
caput do Código de Processo Penal, que diz:
Art. 61 – Em qualquer fase do processo, o juiz, se
reconhecer extinta a punibilidade, deverá declará-lo de
ofício.
A prescrição da pretensão punitiva propriamente dita é regulada pelo
artigo 109 do Código Penal e pode ocorrer entre a data da consumação do
27
crime até o recebimento da denúncia ou queixa, ou a partir desse momento até
a sentença.
O artigo 111 do mesmo diploma legal, regula o termo inicial da
prescrição, que diz:
Art. 111 – A prescrição, antes de transitar em julgado a
sentença final, começa a correr:
I – do dia em que o crime se consumou;
II – no caso de tentativa, do dia em que cessou a
atividade criminosa;
III – nos crimes permanentes, do dia em que cessou a
permanência;
IV – no de bigamia e nos de falsificação ou alteração de
assentamento do registro civil, da data em que o fato se
tornou público.
Como nos explica Carla Rahal Benedetti
O prazo desta prescrição regula-se pela pena em
abstrato, ou seja, pelo máximo da pena privativa de
liberdade cominada ao crime, de acordo com a tabela do
artigo 109 do Código Penal.32
Para melhor explanação, vejamos, por exemplo, se um sujeito
comete o injusto penal tipificado no artigo 155, caput do Código Penal (furto), o
qual a pena máxima cominada abstratamente é de 4 (quatro) anos, prescreverá
em 8 (oito) anos, pois de acordo com a regra estabelecida no art. 109, IV: 32 Ibidem, p. 132.
28
Art. 109 – A prescrição, antes de transitar em julgado a
sentença final, salvo o disposto nos §§1º e 2º do art. 110
deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de
liberdade cominada ao crime, verificando-se:
(...)
IV – em 8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a 2
(dois) anos e não excede a 4 (quatro);
29
6.PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA
INTERCORRENTE
A prescrição da pretensão punitiva intercorrente, também conhecida
como superveniente ou subseqüente é calculada pela pena efetivamente
aplicada ao caso concreto, ou seja, pela pena em concreto, conforme se
depreende da inteligência do artigo 110, §1º do Código Penal, vejamos:
Art. 110 (...)
§1º - A prescrição, depois da sentença condenatória com
trânsito em julgado para a acusação, ou depois de
improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada.
Entretanto a base de cálculo para a prescrição é a mesma da
prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, os prazos estabelecidos no
artigo 109 do Código Penal, como nos indica o caput do artigo 110 do mesmo
diploma legal que ainda nos traz a observação de que se reincidente aumenta-
se de 1/3 o prazo fixado para a prescrição.
Art. 110 – A prescrição depois de transitar em julgado a
sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e
verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais
se aumentam de 1/3 (um terço), se o condenado é
reincidente.
Sobre a prescrição superveniente nos explica Carla Rahal Benedetti
30
a sentença condenatória recorrível interrompe a
prescrição, fazendo o prazo correr novamente por inteiro.
O prazo que começa a correr após a sentença
condenatória recorrível é o prazo da prescrição
superveniente (ou subseqüente ou, ainda, intercorrente),
que vai da sentença até o dia do trânsito em julgado
definitivo. É requisito para que ocorra esta prescrição que
a sentença tenha transitado em julgado para a acusação
(CP, art. 112, I, primeira parte), mas não para a defesa,
ou ainda, depois de improvido o recurso da acusação
(sentença inicial confirmada).33
Observa a referida Autora que
entende-se que pode ocorrer a prescrição superveniente
se o tribunal, embora dando provimento ao recurso da
acusação, não eleva a pena imposta de modo a alterar o
prazo prescricional. Exemplo: o réu é condenado a 4
(quatro) meses de detenção; a promotoria e a defesa
recorrem; passados mais de 2 (dois) anos, o tribunal dá
provimento ao recurso da acusação e eleva para 8 (oito)
meses de detenção. Observando-se a tabela dos prazos
prescricionais, prevista no art. 109 do Código Penal,
verificar-se-á que tanto a primeira pena quanto a segunda
prescrevem em 2 (dois) anos (CP, Art. 109 VI) e, portanto,
não houve alteração do prazo prescricional. Neste caso,
considera-se extinta a punibilidade por ter ocorrido a
prescrição superveniente.34
33 Ibidem, p. 133. 34 Ibidem, mesma página.
31
7.PRESCRIÇÃO DA PRENTENSÃO PUNITIVA
RETROATIVA
A prescrição da pretensão punitiva retroativa foi durante muito tempo
alvo de discussão entre doutrinadores e até mesmo na jurisprudência nacional,
pois não há no direito alienígena qualquer instituto semelhante e somente após
muito debate ao longo dos anos e o advento da Lei 7.209 de 11 de julho de
1984 que pôs fim ao entrave dando redação aos §§ 1ª e 2º do art. 110 do
Código Penal de onde decorre a prescrição retroativa, vejamos:
Art. 110 (...)
§1º - A prescrição, depois da sentença condenatória com
trânsito em julgado para a acusação, ou depois de
improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada.
§2º - A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, pode
ter por termo inicial data anterior à do recebimento da
denúncia ou da queixa.
Nesta modalidade, ou subespécie, de prescrição da pretensão
punitiva, igualmente à intercorrente, é necessário que haja sentença
condenatória com trânsito em julgado para acusação, de acordo com o artigo
112, I, primeira parte, verbis:
Art. 112 – No caso do art. 110 deste Código, a prescrição
começa a correr:
I – do dia em que transita em julgado a sentença
condenatória, para a acusação, ou a que revoga a
32
suspensão condicional da pena ou o livramento
condicional;
Nesse diapasão Antonio Rodrigues Porto nos conta que
não contemplada por nenhum outro Código do direito
alienígena, a prescrição retroativa teve sua origem no
Pretório Excelso a partir de uma corrente jurisprudencial
que formou após alguns anos do advento do Código
Penal de 1940, que passou a considerar a pena concreta
aplicada na sentença de forma retroativa, isto é, enquanto
não havia sentença condenatória, a prescrição era
regulada pelo máximo da pena cominada ao crime (pena
in abstracto). Contudo, após a sentença condenatória e
fixada a pena na sentença, o respectivo montante era
utilizado para ser verificado o cálculo da prescrição, em
fases anteriores do processo (da data do fato até o
recebimento da denúncia ou deste até a sentença).35
Na aplicação da prescrição retroativa se leva em consideração os
períodos anteriores à sentença, com os prazos estabelecidos no art. 109 do
Código Penal, de acordo com a pena efetivamente aplicada, conforme explica
Carla Rahal Benedetti
volta-se para períodos anteriores à sentença, tendo como
base de cálculo para o prazo prescricional a pena em
concreto (pena efetivamente aplicada); serve para
verificar se houve prescrição em algumas das faixas 35 PORTO, Antonio Rodrigues. Da prescrição penal. 2ª ed. atual. São Paulo: José Bushatsky, 1977, p. 95.
33
prescricionais que precederam a sentença (CP, art. 110,
§2º).36
Esta modalidade de prescrição é bem semelhante com a modalidade
intercorrente, porém, se difere no seu “ponto de partida”, como bem assevera
Carla Rahal Benedetti
A prescrição superveniente parte-se “para frente”, para
período posterior à sentença condenatória recorrível; já, a
prescrição retroativa parte-se “para trás”, ou seja, aos
períodos anteriores à sentença.37
Lívia Maria Armentano Koenigstein Zago resume dizendo que
a possibilidade de ser atingida a prescrição retroativa
vicula os agentes da persecução penal à rapidez, os
impulsionando para a obtenção da garantia da punição
efetiva, bem como atua como “proibição de persecução
prolongada, além dos limites temporais traçados”.38
36 Ob. cit., p. 134. 37 Ibidem, mesma página. 38 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. Princípio da Impessoalidade. São Paulo: Renovar, 2001, p. 355.
34
8.PRESCRIÇÃO EXECUTÓRIA
A prescrição da pretensão executória nada mais é que a delonga do
Estado em executar uma sentença condenatória transitada e julgado para
ambas as partes.
Devemos observar apenas algumas particularidades, como por
exemplo os efeitos secundários da sentença condenatória que permanecem,
ou seja, a reincidência; e sendo o condenado reincidente deverá ser feito o
acréscimo de 1/3 (um terço), de acordo com o art. 110, caput, última parte, em
relação ao prazo prescricional do art. 109, ambos do Código Penal.
Devemos observar também a regra contida no art. 113 do referido
Diploma Legal, que trata da evasão do condenado a qual será regulada pelo
tempo restante da pena, verbis:
Art. 113 – no caso de evadir-se o condenado ou de
revogar-se o livramento condicional, a prescrição é
regulada pelo tempo que resta da pena.
Carla Rahal Benedetti resumidamente explica a prescrição
executória nos seguintes termos:
ocorre após o efetivo trânsito em julgado da sentença
(para ambas as partes). Essa prescrição extingue a pena
imposta, livrando o condenado do seu cumprimento.
Contudo, afasta os efeitos secundários da sentença
condenatória como: inscrição no rol dos culpados, a
reincidência etc. O prazo desta prescrição começa a fluir
a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória
35
para a acusação (CP, art. 112, primeira parte), todavia,
como já mencionado, exige-se que haja trânsito em
julgado inclusive para a defesa. Tem-se como base de
cálculo para o prazo prescricional dessa espécie de
prescrição, a pena em concreto (pena efetivamente
aplicada e concretizada), utilizando-se, como todas as
demais prescrições, a tabela do art. 109 do Código Penal.
Caso seja o condenado reincidente, o prazo de prescrição
será aumentado em um terço (reconhecimento expresso
na sentença condenatória) (CP, art. 110, caput, última
parte). Há de se observar que o acréscimo se faz sobre o
prazo prescricional e não sobre a pena.39
39 Ob. cit. p. 134 e 135.
36
9.CAUSAS INTERRUPTIVAS DA PRESCRIÇÃO
As causas interruptivas da prescrição são marcos interruptivos de
seu curso, ou seja, é reiniciada a contagem do zero.
Essas interrupções estão dispostas no Código do Penal em seu
artigo 117 e incisos, como bem assevera Carla Rahal Benedetti
assim, o curso da prescrição é interrompido: 1 – pelo
recebimento da denúncia ou queixa (CP, art. 117, I); 2 –
pela pronúncia (CP, art. 117, II); 3 – pela decisão
confirmatória da pronúncia (CP, art. 117, III); 4 – pela
publicação da sentença ou acórdão condenatórios
recorríveis (CP, art. 117, IV); 5 – pelo início ou
continuação da pena (CP, art. 117, V); 6 – pela
reincidência (CP, art. 117, VI).40
Outros detalhes sobre a interrupção são observados pela referida
Autora que diz:
uma vez interrompido, a prescrição volta a correr
novamente por inteiro. Conta-se o prazo do dia da
interrupção até chegar ao seu termo final fixado em lei, ou
até que ocorra outra interrupção. O prazo interrompido
desaparece como se nunca tivesse existido. Como
exceção, há a interrupção provocada pelo início ou
continuação do cumprimento da pena, da revogação do
livramento condicional ou, ainda, no caso de evadir-se o
40 Ibidem, p. 136 .
37
condenado: nesta situação, em conformidade com o
disposto nos artigos 113 e 117, §2º, do Código Penal, não
correrá o prazo prescricional novamente por inteiro; o
prazo prescricional, nestas hipóteses, será regulado pelo
tempo que resta cumprir de pena.41
41 Ibidem, p. 136 e 137.
38
10.CAUSAS SUSPENSIVAS (IMPEDITIVAS) DA
PRESCRIÇÃO
Diferentemente da interrupção, a suspensão da prescrição, como o
nome mesmo denota, apenas suspende a contagem, ou seja, devendo
recomeçar de onde parou e não mais do zero como nas interrupções.
Explica Carla Rahal Benedetti que o prazo da prescrição
também pode ser suspenso. Tais causas, ao contrário do
que ocorre na interrupção, fazem com que recomece a
correr apenas pelo que resta de prazo, aproveitando o
tempo anteriormente decorrido. Não há cancelamento do
prazo já decorrido e nova contagem por inteiro, mas
apenas a suspensão e o reinício da contagem, pelo tempo
que ainda restar para contar.42
As causas suspensivas ou impeditivas da prescrição estão
relacionadas no art. 116 do Código penal, vejamos:
Art. 116 Antes de passar em julgado a sentença final, a
prescrição não corre:
I – enquanto não resolvida, em outro processo, questão
de que dependa o reconhecimento da existência do crime;
II – enquanto o agente cumpri pena no estrangeiro;
42 Ibidem, p. 137.
39
Parágrafo único – depois de passada em julgado a
sentença condenatória, a prescrição não corre durante o
tempo em que o condenado está preso por outro motivo.
A referida autora nos traz mais detalhes sobre as causas
impeditivas, como por exemplo:
a lei nº 9.271 de 17.04.96, introduziu uma nova causa de
suspensão do prazo prescricional: se o réu for citado por
edital, e não comparecer nem constituir advogado, o
curso do prazo prescricional ficará suspenso (CPP, art.
366). Discute-se, neste caso, se ocorre uma forma
indireta de imprescritibilidade. Em relação à carta
rogatória, o tempo será o necessário para o cumprimento
estando o acusado no estrangeiro.43
Elucida ainda a referida autora
no caso de deputados e senadores, a prescrição é
suspensa enquanto durar o mandato se a respectiva casa
indeferir o pedido de licença para processo criminal ou
não deliberar sobre o assunto. Contudo, com a Emenda
Constitucional nº 35 de 2001, os parlamentares tiveram
diminuída a denominada imunidade processual. Isso
significa que se cometerem crimes após a diplomação, o
Supremo Tribunal Federal poderá dar início à ação penal
recebendo a denúncia ou queixa sem a autorização prévia
da Casa Legislativa respectiva. Contudo deverá
comunicar o fato à Casa, que poderá, pela maioria dos
43 Ibidem, mesma página.
40
votos de seus membros, impedir o prosseguimento do
feito. Neste caso, suspende-se a prescrição a partir da
comunicação ao Supremo Tribunal Federal.44
44 Ibidem, p. 138.
41
11. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA PELA
PENA EM PERSPECTIVA (OU ANTECIPADA, OU
VIRTUAL, OU PROJETADA)
A cada dia vem ganhando mais força entre os órgãos do Ministério
Público e do Poder Judiciário de primeira instância, uma forma anômala de
prescrição, que consiste em reconhecer a prescrição da pretensão punitiva
retroativa antes mesmo do início da ação penal ou já no curso desta com base
numa eventual pena a ser aplicada (pena hipotética).
Entretanto, sabe-se que, antes da sentença penal, só se calcula a
prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, tomando-se como
paradigma o máximo da pena prevista para o delito, conforme já explicado
anteriormente. Já a prescrição retroativa, ao invés, é calculada somente após a
sentença condenatória, com base na pena efetivamente aplicada.
A prescrição da pretensão punitiva pela pena em perspectiva nada
mais é do que reconhecer a prescrição retroativa antes da haver sentença, ou
antes mesmo de haver processo, tomando-se por base a pena hipotética a que
seria atribuída ao caso concreto.
No entanto, o conceito dessa modalidade de prescrição é dissonante
entre os doutrinadores.
Para CARLOS GABRIEL TARTUCE JR., por exemplo, prescrição
em perspectiva "é a prescrição retroativa reconhecida antes mesmo do
oferecimento da denúncia, tendo por base a suposta pena em concreto que
seria fixada na sentença pelo magistrado."45
No diapasão de um conceito em sentido mais amplo, tem-se o
magistério de OSWALDO PALOTTI JR., que a conceitua como o
45 JUNIOR, Carlos Gabriel Tartuce. Prescrição da pretensão punitiva antecipada. Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. São Paulo: IBCCRIM, n.º 35: 1995, p.113.
42
"reconhecimento da prescrição retroativa, tomando-se por base a pena que
possível ou provavelmente seria imposta ao réu no caso de condenação."46
O instituto da prescrição em perspectiva teve sua origem nos
Tribunais de Alçada do Estado de São Paulo no início dos anos noventa e
desde então muitas foram as manifestações favoráveis e contrárias a ele na
jurisprudência nacional. Não foram poucos os acórdãos publicados em revistas
especializadas de jurisprudência e doutrina penal que enfrentaram o tema.
Todas essas manifestações, bastantes razoáveis para a produção
mais intensa de decisões e manifestações doutrinárias, serviram para realçar
as diversas correntes de entendimento que foram sendo firmadas, as quais
trouxeram à baila uma coletânea de argumentos favoráveis e contrários ao
novo instituto, gerando a formação de dois grandes blocos de entendimento.
De um lado, encontramos a maioria dos Tribunais de nosso país, contrários ao
novo instituto; de outro, parte dos órgãos do Ministério Público e do Poder
Judiciário de primeira instância, além de uma minoria da jurisprudência,
favoráveis a ele.
11.1Argumentos contrários
Muitos são os argumentos contrários à aplicabilidade desta
modalidade de prescrição, como por exemplo, o princípio da legalidade; o
devido processo legal; e a possibilidade de mutatio libelli e emendatio libelli.
Carla Rahal Benedetti elenca entre esses outros argumentos
contrários, vejamos:
para aqueles que rejeitam a prescrição penal antecipada,
alguns argumentos são invocados: inobservância dos 46 JUNIOR, Osvaldo Palotti. Considerações sobre a prescrição retroativa antecipada. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n.º 709: 1994, p. 304.
43
princípios da legalidade, da obrigatoriedade, do
contraditório e da ampla defesa, presunção de inocência;
a aplicação de uma sentença de mérito; observância dos
efeitos secundários da condenação; a incorreta prestação
jurisdicional; a possibilidade da “mutatio libelli”; e, por fim,
a impossibilidade de ser previsto antecipadamente o
“quantum” a ser punido.47
Um dos primeiros argumentos levantados em desfavor da prescrição
pela pena em perspectiva foi o argumento da observância do princípio da
legalidade, ou seja, por ser notório que esta modalidade de prescrição não está
contemplada em nosso ordenamento jurídico, não se poderia utilizar-se desta
subespécie de prescrição da pretensão punitiva, pois como já expusemos
anteriormente o art. 110 §§1º e 2º do Código Penal determina o
reconhecimento da prescrição retroativa após a sentença condenatória com
trânsito em julgado para a acusação, ou depois de desprovido o seu recurso.
Neste diapasão Carla Rahal Benedetti diz que justamente por isso
a jurisprudência entende que, uma vez não sendo
contemplada no ordenamento jurídico vigente a
prescrição antecipada pela pena em perspectiva, não se
pode reconhecê-la, pois a prescrição retroativa pela pena
concretizada na sentença pressupõe a efetiva existência
de sentença condenatória, que vai conferir ao réu o status
de condenado, com a aplicação da pena correspondente,
e o trânsito em julgado daquela para a acusação.48
47 Ob. cit. p. 162. 48 Ibidem, p. 163.
44
O argumento do devido processo legal que é disciplinado no art. 5º,
LIV da Constituição Federal é trazido à baila com o fundamento de que todo
acusado merece o devido processo com todas as garantias e direitos a ele
assegurados, como por exemplo a presunção de inocência; e a produção de
provas (contraditório e ampla defesa) para ao final livrar-se absolvido,
reconhecendo a prescrição antecipada não se tem essa oportunidade,
tampouco se tem a oportunidade do Ministério Público insurgir-se contra a
sentença aplicada em primeira instância.
Nesta esteira pontua Carla Rahal Benedetti
outra observação feita contrariando a prescrição
antecipada é que da ampla defesa e da presunção de
inocência pode o acusado ser efetivamente absolvido,
sendo proclamada sua inocência, pois é pelo devido
processo legal, isto é, com o adequado percurso
processual que pode ser conferida a ampla possibilidade
de produção de provas.49
O princípio da obrigatoriedade é outro argumento utilizado para
rechaçar a aplicação da prescrição retroativa antecipada, pois, sendo a ação
penal obrigatória, não possui o Ministério Público a discricionariedade de
postular ou não em favor do Estado, como explica Carla Rahal Benedetti:
“apesar de exercer o Ministério Público, no processo penal, o comando sobre
os atos judiciais (dominus litis) não possui a faculdade de dispor da ação penal
pública”.50
49 Ibidem, p. 165. 50 Ibidem, mesma página.
45
José Frederico Marques diz que “apesar de não haver explícita
manifestação textual sobre o assunto, deduz-se que no Direito Brasileiro vigora
o princípio da ação penal obrigatória”.51
Resumi Carla Rahal Benedetti dizendo que aqueles que rejeitam a
prescrição penal retroativa antecipada argumentam que
pelo princípio da obrigatoriedade da ação penal, o não
recebimento pelo juiz da denúncia, fundamentado nessa
modalidade de prescrição, viola o princípio da
obrigatoriedade, atentando contra os princípios de justiça
que, uma vez declarados, têm o dever de orientar a
atividade repressiva do Estado.52
Como um dos mais fortes argumentos apresentados pelos que são
contrários à prescrição da pretensão punitiva pela pena em perspectiva está a
possibilidade de haver a mutatio libelli ou até mesmo a emendatio libelli, que
Carla Rahal Benedetti nos define a mutatio libelli como sendo a situação
prevista no art. 384 do Código de Processo Penal
que determina caber ao juiz, diante da possibilidade do
reconhecimento de uma nova definição jurídica, diante de
uma circunstância elementar, baixar os autos a fim de que
a defesa possa se manifestar sobre o fato não contido
anteriormente explícita ou implicitamente na denúncia ou
na queixa, ou produzir prova.53
51 MARQUES, José Frederico. Elemento de Direito Processual Penal. vol. I. 2ª ed. Campinas: Millenium, 2000, p. 377. 52 Ob. cit. p. 167. 53 Ibidem, p. 170 e 171.
46
Continua a referida autora definindo a emendatio libelli, por sua vez,
prevista no art. 383 do Código de Processo Penal
permite ao juiz, diante de uma análise mais acurada dos
fatos, dar definição jurídica diversa na sentença , ainda
que tenha que aplicar pena mais grave, pois o réu,
determina a lei, não responde pela capitulação, e, sim,
pelos fatos apresentados da peça vestibular acusatória.54
Baseia-se a fundamentação contrária à aplicação da modalidade de
prescrição estudada no sentido de que se houver o reconhecimento antecipado
da prescrição, não haverá chance de o juiz averiguar no desenrolar do
processo se seria o caso de mutatio libelli e/ou emendatio libelli, o que poderia
mudar substancialmente a pena hipotética a que se atribuiu para o
reconhecimento da prescrição pela pena em perspectiva, mudando assim os
parâmetros para a prescrição do art. 109.
Seguindo o raciocínio contrário à aplicação da prescrição pela pena
em perspectiva está os tribunais superiores, nos seguintes termos:
STF: DIREITO PROCESSUAL PENAL E PENAL.
HABEAS CORPUS. PRESCRIÇÃO POR ANTECIPAÇÃO
OU PELA PENA EM PERSPECTIVA. INEXISTÊNCIA DO
DIREITO BRASILEIRO. DENEGAÇÃO. 1. A questão de
direito argüida neste habeas corpus corresponde à
possível extinção da punibilidade do paciente em razão da
prescrição "antecipada" (ou em perspectiva) sob o
argumento de que a pena possível seria a pena mínima.
2. No julgamento do HC nº 82.155/SP, de minha relatoria,
54 Ibidem, p. 171.
47
essa Corte já assentou que "o Supremo Tribunal Federal
tem repelido o instituto da prescrição antecipada" (DJ
07.03.2003). A prescrição antecipada da pena em
perspectiva se revela instituto não amparado no
ordenamento jurídico brasileiro. 3. Habeas corpus
denegado.55
***
STF: HABEAS CORPUS. CRIME DE PECULATO-
FURTO (§ 1º DO ART. 312 DO CP). FUNCIONÁRIO
PÚBLICO. CONDIÇÃO ELEMENTAR DO TIPO.
COMUNICAÇÃO AO PARTICULAR, CO-AUTOR DO
DELITO (ART. 30 DO CP). PRESCRIÇÃO ANTECIPADA:
IMPOSSIBILIDADE. O particular pode figurar como co-
autor do crime descrito no § 1º do art. 312 do Código
Penal (Peculato-furto). Isto porque, nos termos do artigo
30 do CP, "não se comunicam as circunstâncias e as
condições de caráter pessoal, salvo quando elementares
do crime". Se a condição de funcionário público é
elementar do tipo descrito no artigo 312 do Código Penal,
esta é de se comunicar ao co-autor (particular), desde que
ciente este da condição funcional do autor. Precedentes:
HC 74.588, Relator o Ministro Ilmar Galvão; e HC 70.610,
Relator o Ministro Sepúlveda Pertence. A firme
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal repele a
alegação de prescrição antecipada, por ausência de
previsão legal. Precedentes: HC 88.087, Relator o
Ministro Sepúlveda Pertence; HC 82.155, Relatora a
Ministra Ellen Gracie; HC 83.458 e RHC 86.950, Relator o
Ministro Joaquim Barbosa; RHC 76.153, Relator o
55 STF - HC 94729 / SP - SÃO PAULO Relator(a): Min. ELLEN GRACIE Julgamento: 02/09/2008 Órgão Julgador: Segunda Turma
48
Ministro Ilmar Galvão; entre outros. Habeas corpus
indeferido.56
***
STJ: PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO
EM HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO FISCAL. 1. RÉ
PRIMÁRIA E DE BONS ANTECEDENTES.
PRESCRIÇÃO EM PERSPECTIVA.
RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE.
PRECEDENTES. 2. EXISTÊNCIA DE EXECUÇÃO
FISCAL EM TRÂMITE. IRRELEVÂNCIA. CRÉDITO
TRIBUTÁRIO DEFINITIVAMENTE CONSTITUÍDO.
SUSPENSÃO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. 3.
RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Inviável
o reconhecimento de prescrição antecipada, por ausência
de previsão legal. Trata-se, ademais, de instituto
repudiado pela jurisprudência desta Corte e do Supremo
Tribunal Federal, por violar o princípio da presunção de
inocência e da individualização da pena a ser
eventualmente aplicada. 2. O fato de ainda encontrar-se
em trâmite processo de execução fiscal para a satisfação
do crédito tributário é irrelevante para os fins penais, uma
vez que já houve o lançamento definitivo do crédito
tributário em questão. 3. Recurso a que se nega
provimento.57
56 STF - HC 90337 / SP - SÃO PAULO Relator(a): Min. CARLOS BRITTO Julgamento: 19/06/2007 Órgão Julgador: Primeira Turma 57 STJ - RHC 18569 / MG Relator(a) Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA Órgão Julgador - SEXTA TURMA Data do Julgamento 25/09/2008
49
11.2Argumentos favoráveis
Como explana Carla Rahal Benedetti
São variados os argumentos apresentados por aqueles
que defendem a prescrição antecipada, dentre eles
temos: falta de interesse de agir; princípio da economia
processual; constrangimento ilegal causado ao réu pela
“penalização desnecessária” da morosidade do processo
penal; a instrumentalidade do processo; a lógica; a
funcionalidade; o dispêndio de tempo inútil da Justiça; o
desgaste do prestígio da Justiça; e, as favoráveis
circunstâncias judiciais (art. 59 do Código Penal
Brasileiro) de que se vale o juiz para aplicar a pena
mínima.58
Um dos primeiros argumentos levantados para manter a prescrição
pela pena em perspectiva é o da falta de interesse de agir do Ministério Público
ou do particular, quando se tem uma visão dos requisitos do interesse de agir,
que são: adequação, necessidade e utilidade.
Nesse diapasão defende Fernando Capez que
(...) a utilidade do processo traduz-se na utilidade do
provimento jurisdicional para satisfazer o interesse do
autor. Se, de plano, for possível perceber a inutilidade da
persecução penal aos fins que se presta, dir-se-á que
inexiste interesse de agir. É o caso, e.g., de se oferecer
58 Ob. cit. p. 153.
50
denúncia quando, pela análise da pena possível de ser
imposta ao final, se eventualmente comprovada a
culpabilidade do réu, já se pode antever a ocorrência da
prescrição retroativa. Nesse caso, toda a atividade
jurisdicional será inútil; falta, portanto, interesse de agir.59
Do mesmo entendimento compartilha Ada Pellegini Grinover,
Antonio Scarance Fernandez e Antonio Magalhães Gomes Filho:
(...) o provimento pedido deve ser eficaz: de modo que
faltará interesse de agir quando se verifique que o
provimento condenatório não poderá ser aplicado (como,
por exemplo, no caso de denúncia ou queixa ser oferecida
na iminência de consumar-se a prescrição da pretensão
punitiva. Sem aguardar-se a consumação desta, já se
constata a falta de interesse de agir).60
Outro argumento utilizado para defender a prescrição antecipada é o
princípio da economia processual que se baseia no fundamento de que seriam
gastos esforços materiais e mentais para uma ação penal fadada ao insucesso,
muito provavelmente em detrimento de outras plenamente possíveis.
Edison Aparecido Brandão diz que “é absolutamente inútil dar
prosseguimento à ação penal porque gera o dispêndio de esforços inúteis em
prejuízo de outros processos que, por esta razão, também alcançaram a
prescrição”.61
59 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 97. 60 GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; FILHO, Antonio Magalhães Gomes. As Nulidades no Processo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 61. 61 BRANDÃO, Edison Aparecido. Prescrição em perspectiva. Revista dos Tribunais nº 710/391 (dez/1994), p. 392.
51
A instrumentalidade do processo é mais um argumento utilizado
pelos defensores da prescrição da pretensão punitiva pela pena em
perspectiva, sobre a instrumentalidade do processo diz Cândido Rangel
Dinamarco
é vaga e pouco acrescenta ao conhecimento do processo
a usual afirmação de que ele é um instrumento, enquanto
não acompanhada da indicação dos objetivos a serem
alcançados mediante o seu emprego. Todo instrumento,
como tal, é meio; e todo meio só é tal e se legitima, em
função dos fins a que se destina.62
Pontua Carla Rahal Benedetti “assim, o processo, sem a devida
instrumentalidade, infere-se numa inútil e desproporcional medida do Estado”.63
Em consonância com os entendimentos dos que defendem a
prescrição pela pena em perspectiva está os magistrados de 1º grau e tribunais
regionais, vejamos:
TJRJ: CONDIÇÕES DA AÇÃO - JUSTA CAUSA
AUSÊNCIA - REJEIÇÃO - DECISÃO MANTIDA. Para o
recebimento da denúncia se exige que a acusação esteja
escorada em algum início de prova, não podendo aquela
peça decorrer de mera presunção da autoridade policial.
A doutrina apenas diverge em colocar a justa causa como
quarta condição da ação ou no contexto da demonstração
do interesse de agir. O que não se controverte é que a
instauração da ação penal contra terceira pessoa, por si
só, atinge a dignidade do demandado, daí a
indispensabilidade que a inicial acusatória venha 62 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 10ª ed. Malheiros Editora: São Paulo, 2002, p. 181. 63 Ob. cit. p. 159.
52
acompanhada de suporte mínimo de prova. No caso
presente, sendo imputado ao acusado o delito de lesão
corporal grave por ter resultado incapacidade para as
ocupações habituais por mais de 30 dias e não havendo
nos autos laudo complementar, sendo a lesão constatada
na peça técnica realizada no dia seguinte ao do fato, falta
justa causa para escorar o início da ação, mormente
porque o fato ocorreu há quase 08 anos. Tal lapso
temporal, aliás, escorou a decisão que rejeitou a
denúncia, eis que ausente o interesse no campo da
utilidade, porque, na certa, em caso de condenação, será
inevitável o reconhecimento da prescrição.64
***
TRF 4ª Região: A prescrição pela pena em perspectiva,
embora não prevista na lei, é construção jurisprudencial
tolerada em casos excepcionalíssimos, quando existe
convicção plena de que a sanção aplicada não será apta
a impedir a extinção da punibilidade.65
***
TJRJ: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. Crime de
estelionato. Recurso de assistente de acusação não
habilitado nos autos. Falta de legitimidade para
interposição do recurso. Acolhimento de preliminar de
prescrição pela pena ideal. Extinção da punibilidade.
Decurso de mais de 08 (oito) anos da data da prática
delituosa. Ausência do binômio necessidade/utilidade da
prestação jurisdicional. Descumprimento contratual e
celebração de instrumento particular de confissão de 64 TJRJ – processo nº 2008.051.00280 - Recurso em Sentido Estrito - Des. Marcus Basilio - Julgamento: 14/08/2008 - PRIMEIRA CAMARA CRIMINAL. 65 TRF4ªRegião - 8ª Turma – Habeas Corpus nº. 2004.04.01.049737-1 – Relator Élcio Pinheiro de Castro – Acórdão de 16 de março de 2005, publicado no DJU de 30 de março de 2005.
53
dívida que indicam a natureza civil da lide entre as partes.
Ausência de relevância penal da conduta, e, portanto,
interesse de agir. Sentença que se confirma.
Desprovimento do recurso.66
***
TJRJ: CRIME CONTRA A ORDEM ECONÔMICA
DENÚNCIA - REJEIÇÃO - AUSÊNCIA DE LEGÍTIMO
INTERESSE DO MINISTÉRIO PÚBLICO - INEFICÁCIA
DO EVENTUAL PROVIMENTO CONDENATÓRIO -
FALTA DE JUSTA CAUSA PARA AÇÃO PENAL,Se da
prática do fato delituoso imputado ao denunciado já
decorreram mais de 8 anos até a data do julgamento que
deu ensejo ao recebimento da vestibular acusatória,
merece inteira acolhida o voto divergente que se inclinou
pela rejeição reconhecendo a absoluta falta de interesse
processual do Ministério Público, por isso que
escancarada a falta de justa causa, pois ainda que da
instauração da ação penal resultasse o provimento
condenatório, seria ele inócuo pela ausência de
executoriedade, eis que a pena possível de ser
concretizada estaria alcançada pela prescrição retroativa
da pretensão punitiva, considerando que o longo tempo
decorrido não tornaria eficaz nem mesmo a imposição de
uma sanção penal igual a 4 anos de prisão,
exageradamente superior a pena mínima, que é de 1 ano
de detenção.Embargos infringentes providos.67
66 TJRJ - Recurso em Sentido Estrito 2007.051.000410 - Des. Marco Aurelio Bellizze - Julgamento: 30/10/2007 - TERCEIRA CAMARA CRIMINAL. 67 TJRJ – processo nº 2008.054.00023 - Embargos Infringentes e de Nulidade - 1ª Ementa Des. Valmir de Oliveira Silva - Julgamento: 17/06/2008 - TERCEIRA CAMARA CRIMINAL.
54
Além da jurisprudência o próprio Ministério Público vem orientando
seus membros à aplicação da prescrição antecipada, é o caso da Procuradoria-
Geral do Estado do Rio de Janeiro que em seu enunciado diz:
Enunciado nº 4: É admissível o arquivamento do inquérito
policial com base na falta do interesse de agir, na hipótese
de prescrição pela pena ideal ou prescrição antecipada.68
68Enunciados da Assessoria Criminal do Procurador-Geral de Justiça/2009. Disponível em: http://www.mp.rj.gov.br/portal/page/portal/Internet/Conheca_o_MP/Legislacao/Enunciados_teses_assessorias_CAOPS/Assessorias/Enunciados_da_Assessoria_Criminal. Acesso em 15 de setembro de 2009.
55
CONCLUSÃO
A prescrição é uma das formas de extinção da punibilidade, sendo
possíveis duas formas ou espécies de prescrição, quais sejam: a prescrição da
pretensão punitiva e a prescrição da pretensão executória.
Inserida na espécie de prescrição da pretensão punitiva está a
prescrição pela pena em perspectiva e apesar de não está abarcada pelo
ordenamento jurídico atual, esta vem sendo a cada dia mais aplicada pelos
juízes de primeiro grau e tribunais regionais.
Os fundamentos contrários não são suficientes para impedir o
avanço desta subespécie de prescrição da pretensão punitiva, pois, como
vimos, o Estado tem o poder-dever de agir e punir, entretanto, paralelamente
com esse poder-dever está o dever de uma medida adequada e útil.
Os doutrinadores estão a cada dia mais adeptos a esta modalidade
de prescrição, a jurisprudência idem, só restando os tribunais superiores, por
terem, ainda, uma visão estritamente legalista não reconheceram está
subespécie de prescrição.
Contudo, a prescrição da pretensão punitiva pela pena em
perspectiva é o avanço do Direito Penal no tempo e no espaço, e como todo
avanço é preciso de tempo para de fincar, dependendo apenas de uma
positivação pelos nossos legisladores.
56
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