A UTILIZAÇÃO DO MESILATO DE NELFINAVIR NA · PDF file1. INTRODUÇÃO A Síndrome da ... ciency Virus ou Vírus da Imunodeficiência Humana), ... retrovírus citopáticos e não-oncogênicos,

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  • Infarma, v.18, n 11/12, 200626

    1. INTRODUO

    A Sndrome da Imunodeficincia Adquirida (SIDA) foi descrita, em 1981. Os primeiros casos foram identificados, devido alta incidncia de casos de Sarcoma de Kaposi e pneumonia por Pneumocystis carinii, quadros acompanha-dos de comprometimento do sistema imune em pacientes homossexuais masculinos procedentes das grandes cidades norte-americanas Nova Yorque, Los Angeles e So Francisco (TOLEDO, 2004). A rpida evoluo da doena com con-seqente morte dos pacientes levou concluso de que se tratava de uma enfermidade ainda no classificada, de etiologia provavelmente infecciosa e transmissvel (ALVES, 2004).

    O HIV foi isolado, em 1983, pelos pesquisadores Ro-bert Gallo, nos EUA, e Luc Montaigner, na Frana, recebendo os nomes de HTLV-III (Human T-Lymphotrophic Virus ou V-rus T-Linfotrpico Humano tipo lll) e LAV (Lymphadenopa-thy Associated Virus ou Virus Associado a Linfadenopatia) respectivamente, nos dois pases. Em 1986, um comit in-ternacional recomendou o termo HIV (Human Immunodefi-ciency Virus ou Vrus da Imunodeficincia Humana), reco-nhecendo-o como capaz de infectar seres humanos (VASCO, 2004).

    Neste mesmo ano, foi identificado um outro agente etiolgico com caractersticas semelhantes ao HIV, sendo denominado HIV-2 (ALVES, 2004; VASCO, 2004). Ambos so retrovrus, com genoma RNA, pertencentes famlia Retro-viridae (retrovrus), subfamlia Lentiviridae e ao grupo dos retrovrus citopticos e no-oncognicos, potencialmente capazes de causar a AIDS (ALVES, 2004). Tm sido descri-tas variantes genmicas de ambos os vrus, em pacientes infectados de diferentes regies demogrficas.

    O HIV-1, disseminado por todo o mundo, apresen-ta-se classificado em dois grupos M (major) e O (outlier). No grupo M identificam-se dez subtipos (A-J) e no grupo O apenas um. Em relao ao HIV-2, descrevem-se cinco subtipos (A-E). Embora ainda no estudada, especula-se a possibilidade de essas variantes virais possurem diferentes ndices de transmissibilidade e/ou patogenicidade (ALVES, 2004; BRASIL, 2004a; VASCO, 2004).

    Para que as partculas virais infectantes penetrem em suas clulas-alvo, h necessidade de que ocorra interao molecular entre glicoprotenas do envelope viral externo e receptores expressos nas membranas ce-lulares. Participam desta interao inicialmente a gp120 (glicoprotena viral) e a molcula CD4+ (glicoprotena de superfcie presente em vrias clulas do sistema hemato-poitico) (VASCO, 2004). Os linfcitos TCD4+ constituem o alvo principal do HIV j que exibem grandes concentra-es da molcula CD4 em suas membranas. Os moncitos, macrfagos e clulas dendrticas tambm apresentam o CD4+ em sua superfcie, porm em menor concentrao, constituindo assim um alvo alternativo na infeco (MAN-GANO, 2004).

    Os principais passos do ciclo vital do HIV esto des-critos a seguir (ALVES, 2004):

    1. Ligao de glicoprotenas virais (gp120) ao recep-tor especfico da superfcie celular (principalmente linfci-tos TCD4);

    2. Fuso do envelope do vrus com a membrana da clula hospedeira;

    3. Liberao do core do vrus para o citoplasma da clula hospedeira;

    4. Transcrio do RNA viral em DNA complementar, dependente da enzima transcriptase reversa;

    A UTILIZAO DO MESILATO DE NELFINAVIR NA TERAPIA ANTI-RETROVIRAL DE COMBATE A AIDS

    VANDESSA CRISTINA DA SILVA MONTEIRO1 JOS GUEDES DE SENA FILHO1 ROSALI MARIA FERREIRA DA SILVA1,3 FLVIA PATRCIA MORAIS DE MEDEIROS1,3 MIRACY MUNIZ DE ALBUQUERQUE2 PEDRO JOS ROLIM NETO1,3

    1. Laboratrio de Tecnologia dos Medicamentos, Departamento de Cincias Farmacuticas, Av. Prof. Arthur de S, S/N, Cidade Universitria. 50.740-020, Recife, PE.

    2. Ncleo de Controle de Qualidade de Medicamentos e Correlatos, Departamento de Cincias Farmacuticas, Av. Prof. Arthur de S, S/N, Cidade Universitria. 50.740-020, Recife, PE.

    3. Laboratrio Farmacutico do Estado de PernambucoLAFEPE, Largo de Dois Irmos,1117, Dois Irmos, 52.171-010, Recife, PE.

    Autor responsvel V.C.S. Monteiro. E-mail: [email protected]

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    5. Transporte do DNA complementar para o ncleo da clula, onde pode haver integrao no genoma celular (pro-vrus), dependente da enzima integrase, ou a permanncia em forma circular, isoladamente;

    6. O provrus reativado e produz RNA mensageiro viral, indo para o citoplasma da clula;

    7. Protenas virais so produzidas e quebradas em subunidades, por intermdio da enzima protease;

    8. As protenas virais produzidas regulam a sntese de novos genomas virais, e formam a estrutura externa de outros vrus que sero liberados pela clula hospedeira; e

    9. O vrion recm-formado liberado para o meio circundante da clula hospedeira, podendo permanecer no fludo extracelular, ou infectar novas clulas.

    A interferncia em qualquer um destes passos do ciclo vital do vrus impede a multiplicao e/ou a liberao de novos vrus. Atualmente esto disponveis comercialmente drogas que interferem em duas fases deste ciclo: a fase 4 (inibidores da transcriptase reversa - RTIs) e a fase 7 (ini-bidores da protease-IP) (VASCO, 2004).

    A caracterstica fundamental da doena a deteriora-o gradual dos linfcitos TCD4+. Essas clulas, eliminadas durante a evoluo da doena so essenciais para a respos-ta imunolgica, atuando como sinalizadoras de outras c-lulas do sistema imune para o desempenho de suas funes (MERCK SHARP & DOHME, 2004). Algumas semanas aps a infeco pelo HIV, podem surgir sinais de uma sndrome viral aguda (fase aguda) como febre, calafrios, sudorese e mialgia, os quais desaparecem, em torno de duas a trs semanas.

    Passada esta fase, o paciente atravessa um perodo varivel (oito a dez anos), durante o qual no apresenta nenhum sintoma (fase assintomtica) (BRASIL, 2004a). A fase sintomtica da doena reflete progressiva deteriorao do sistema imunolgico e apresenta como sinais de alerta: emagrecimento progressivo, febre intermitente, fadiga etc. Na fase avanada, esses sintomas tendem a se agravar e ainda surgem as doenas infecciosas e as neoplasias.

    As doenas oportunistas mais comuns so tuberculo-se, pneumonia pneumocstica, toxoplasma, citomegalovi-rose, Sarcoma de Kaposi e outras neoplasias (ALVES, 2004; BURLAMAQUI, 2004). A ocorrncia de formas graves ou atpicas de doenas tropicais como Paracoccidioidomicose, Leishmaniose e Doena de Chagas tm sido observadas no Brasil (BRASIL, 2004a).

    1.1 AIDS no mundoA AIDS tem se constitudo um dos mais srios agravos

    j enfrentados pela humanidade (BRASIL, 2004a). Atual-mente, existem cerca de 38 milhes de pessoas em todo o mundo portadoras do HIV, segundo o ltimo relatrio di-vulgado pelas Naes Unidas (AGNCIA BRASIL, 2004). No

    mundo, 8.000 pessoas morrem diariamente em decorrncia da infeco pelo vrus HIV e a situao se agrava nas na-es mais pobres.

    A situao mais crtica, nos continentes africano e asitico, onde a quantidade de indivduos tratados ainda muito pequena em relao ao nmero de infectados. O pior ndice de infeco por HIV, pertence a Botsuana, na frica: cerca de 40% da populao (CAMPOS, 2004). Essa doena ainda se espalha rapidamente pela Amrica Latina e Cari-be. Em 2003, a doena matou 120.000 pessoas e mais de 250.000 se contaminaram. Nessa rea, o Pas mais atingido o Haiti com 5,6% da populao infectada (VITRIA, 2004).

    1.2 AIDS no Brasil.Os primeiros casos de AIDS confirmados, no Brasil,

    surgiram, em So Paulo, no ano de 1982 (BIBLIOMED, 2004). Inicialmente, a doena se manteve restrita a So Paulo e Rio de Janeiro, maiores regies metropolitanas do Pas. Porm, a partir do final daquela dcada, disseminou-se para as demais regies do Brasil (DHALIA, 2004). Desde 2001, a regio Sul superou a sudeste em registro de novos casos e, hoje, estas duas regies somam 84,8% dos casos de AIDS. (BRASIL, 2004b).

    A taxa de mortalidade por AIDS, no Brasil, vem mos-trando uma tendncia de estabilizao, desde 1999. Esta tendncia comeou a apresentar queda significativa, a partir de 1996, quando o Governo brasileiro introduziu a Poltica Nacional de Medicamentos para Combate a AIDS, garantindo o acesso universal e gratuito ao tratamento anti-retroviral no Sistema nico de Sade (SUS).

    O ltimo relatrio mundial do Programa das Naes Unidas sobre HIV/AIDS (Unaids) aponta o programa brasi-leiro de preveno e combate doena como modelo para outras naes. O Brasil conta atualmente com 235.000 pes-soas infectadas, estando 141.000 em utilizao da tera-pia-anti-retroviral e 94.000 em acompanhamento, havendo ainda a estimativa da existncia de 365.000 que desconhe-cem ser portadoras do vrus HIV. (BRASIL, 2004c).

    2. TERAPIA ANTI-RETROVIRAL

    O principal objetivo da terapia anti-retroviral retar-dar a progresso da imunodeficincia e/ou restaurar, tanto quanto possvel, a imunidade, aumentando o tempo e a qualidade de vida da pessoa infectada. A primeira droga com atividade anti-retroviral, Zidovudina (AZT), foi apro-vada pelo FDA, em 1986. Esta se revelou uma droga com impacto discreto sobre a mortalidade dos pacientes infec-tados, alm de ser eficaz em algumas situaes particulares (TOLEDO, 2004).

    Oito anos depois, surgiram trs outros anlogos nu-cleosdicos inibidores da transcriptase reversa NRTIs (Di-

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    danosina, Lamivudina e Estavudina), que passaram a ser empregados isoladamente ou em associao, sem que re-sultados muito melhores fossem alcanados (SILVA, 2002; TOLEDO, 2004). Entre o final da dcada de 80 e incio da d-cada de 90, pouco se conseguiu de concreto na luta contra a AIDS, o que permitiu que a doena adquirisse propores de pandemia (TOLEDO, 2004).

    De 1995 at 1998, oito novos frmacos anti-retro-virais foram aprovados, inclusive os inibidores no nucle-osdicos da transcriptase reversa NNRTIs (Nevirapina, Delavirdina e Efavirenz) e os inibidores da protease PI (Saquianvir, Ritonavir, Indinavir, Nelfinavir e Amprenavir) (SILVA, 2002). Esta ltima cla