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Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina ACÓRDÃON. 31158 RECURSO CRIMINAL N. 8-58.2014.6.24.0050 - CLASSE 31 - RECURSO CRIMINAL - 50 A ZONA ELEITORAL - DIONÍSIO CERQUEIRA Relator: Juiz Vílson Fontana Recorrente: Ministério Público Eleitoral Recorrido: Jeferson Jonas Ávila RECURSO CRIMINAL - ABSOLVIÇÃO - CRIMES CONTRA A HONRA - CALÚNIA, DIFAMAÇÃO E INJÚRIA (CÓDIGO ELEITORAL, ART. 324, 325 E 326) - PUBLICAÇÕES NA INTERNET NA REDE SOCIAL FACEBOOK - OFENSAS À HONRA OBJETIVA E SUBJETIVA DE CANDIDATO CARACTERIZADAS - OFENSOR ATUANTE NA CAMPANHA ELEITORAL DO CANDIDATO OPONENTE AO OFENDIDO - MANIFESTA CONJUNTURA ELEITORAL DOS FATOS - OFENSAS QUE TRANSCENDEM À LIBERDADE DE EXPRESSÃO, EVIDENCIANDO-SE O DOLO DE DANO À HONRA - PROVIMENTO - CONDENAÇÃO. "Não obstante o acirramento e veemência da campanha eleitoral possam, por um critério de razoabilidade, flexibilizar as balizas do conceito que de ordinário se empresta à ofensa antijurídica, nisso não se encerra um absoluto salvo-conduto para o vilipêndio da honra dos candidatos. Sobretudo há de sér sancionada a imputação ofensiva quando não se apresenta o mero propósito crítico, mas resulta inequívoca, como ato doloso, a intenção de causar dano à honra objetiva ou subjetiva" (Precedente: Acórdão TRESC n. 25.663, de 14.3.2011, Rei. Juiz Sérgio Torres Paladino). Vistos, etc., ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, à unanimidade, em conhecer do recurso e a ele dar provimento, para condenar o recorrido à pena de 1 (um) ano de detenção e pagamento de 19 (dezenove) dias-multa, substituindo a pena privativa de liberdade por multa, no valor de R$ 5.000,00, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante da decisão. Sala de Sessões do Tribunal Re< Florianópolis, 1 o de fevereiro de 2 Eleitoral. Juiz V illon I ) W ana ^Relate \

Acórdão TRESC n. 31.158, de 1º.2.2016, Relator Juiz Vilson Fontana

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Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina ACÓRDÃON. 3 1 1 5 8

RECURSO CRIMINAL N. 8-58.2014.6.24.0050 - CLASSE 31 - RECURSO CRIMINAL -50A ZONA ELEITORAL - DIONÍSIO CERQUEIRA Relator: Juiz Vílson Fontana Recorrente: Ministério Público Eleitoral Recorrido: Jeferson Jonas Ávila

RECURSO CRIMINAL - ABSOLVIÇÃO - CRIMES CONTRA A HONRA - CALÚNIA, DIFAMAÇÃO E INJÚRIA (CÓDIGO ELEITORAL, ART. 324, 325 E 326) - PUBLICAÇÕES NA INTERNET NA REDE SOCIAL FACEBOOK - OFENSAS À HONRA OBJETIVA E SUBJETIVA DE CANDIDATO CARACTERIZADAS - OFENSOR ATUANTE NA CAMPANHA ELEITORAL DO CANDIDATO OPONENTE AO OFENDIDO - MANIFESTA CONJUNTURA ELEITORAL DOS FATOS - OFENSAS QUE TRANSCENDEM À LIBERDADE DE EXPRESSÃO, EVIDENCIANDO-SE O DOLO DE DANO À HONRA -PROVIMENTO - CONDENAÇÃO.

"Não obstante o acirramento e veemência da campanha eleitoral possam, por um critério de razoabilidade, flexibilizar as balizas do conceito que de ordinário se empresta à ofensa antijurídica, nisso não se encerra um absoluto salvo-conduto para o vilipêndio da honra dos candidatos. Sobretudo há de sér sancionada a imputação ofensiva quando não se apresenta o mero propósito crítico, mas resulta inequívoca, como ato doloso, a intenção de causar dano à honra objetiva ou subjetiva" (Precedente: Acórdão TRESC n. 25.663, de 14.3.2011, Rei. Juiz Sérgio Torres Paladino).

Vistos, etc.,

A C O R D A M os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, à unanimidade, em conhecer do recurso e a ele dar provimento, para condenar o recorrido à pena de 1 (um) ano de detenção e pagamento de 19 (dezenove) dias-multa, substituindo a pena privativa de liberdade por multa, no valor de R$ 5.000,00, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante da decisão.

Sala de Sessões do Tribunal Re<

Florianópolis, 1o de fevereiro de 2

Eleitoral.

Juiz V i l l o n I ) W a n a ^Relate \

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RECURSO CRIMINAL N. 8-58.2014.6.24.0050 - CLASSE 31 - RECURSO CRIMINAL -50A ZONA ELEITORAL - DIONÍSIO CERQUEIRA

RELATÓRIO Trato de recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra a

sentença proferida pelo Juiz da 50a Zona Eleitoral que julgou improcedente ação penal proposta contra Jeferson Jonas Ávila pela suposta prática dos crimes de calúnia, difamação e injúria, respectivamente previstos nos arts. 324, 325 e 326, incidente a majorante do art. 327, III, todos do Código Eleitoral, absolvendo-o com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal (fls. 246-256).

Nas razões recursais, o agente ministerial alega, em síntese, que há provas manifestas de que "o denunciado escreveu palavras ofensivas à honra subjetiva e objetiva do ofendido publicamente, por meio que facilitou a ofensa, ao publicar utilizando-se de perfil falso no Facebook com nome 'Lucas Zan", que era administrado pelo Jeferson Jonas Ávila, para fazer propaganda em favor do adversário da vítima na campanha eleitoral municipal do ano de 2012". Requer a condenação do recorrido (fls. 258-272).

Nas contrarrazões, Jeferson Jonas Ávila insta pela confirmação da sentença afirmando não estar evidenciada a finalidade eleitoral, que caracteriza o elemento subjetivo (dolo específico) dos crimes previstos nos arts. 324, 325 e 326 do Código Eleitoral, sem o qual não há falar em adequação típica. Assevera que o endereço de correio eletrônico "Lucas Zen" foi criado muito antes do pleito de 2012, mais precisamente no ano de 2011, e, ao contrário do sustentado pelo Ministério Público Eleitoral, encontra-se ainda em funcionamento, contendo diversas publicações resultantes da sua atividade jornalística, "inclusive críticas a figuras públicas de todos os partidosn. Nega ter sido o responsável pelo marketing da campanha do então candidato ao cargo de prefeito Altair Rittes, dizendo que se limitou a publicar fatos dos quais teve conhecimento através dos meios de comunicação locais, em especial programas de rádio e televisão, tudo em conformidade com o exercício da crítica jornalística. Postula, ao final, o desprovimento do recurso (fls. 276-292).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifesta-se pelo conhecimento e provimento do recurso, concluindo que "o recorrido incidiu nas penas do art. 324 (cinco vezes) e 326 (dez vezes), c/c artigo 327, inciso III, todos do Código Eleitoral" (fls. 297-316).

V O T O

O SENHOR VÍLSON FONTANA (Relator): Senhor Presidente, o recurso é tempestivo e preenche as demais condições de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

De início, convém reafirmar a competência ratione materiae desta Justiça Eleitoral para exame do feito criminal, pois as circunstâncias que envolvem os fatos denunciados revelam, em tese, o dolo específico - "visando a fins de propagâfida" -exigido nos tipos especiais de crimes contra a honra do Código Eleitoral, o qua\ resta bem evidenciado pela prova oral (fls. 187-189).

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Com efeito, conforme narra a denúncia, o réu Jeferson Jonas Ávila teria utilizado falso perfil na rede social Facebook para publicar, no decorrer da campanha eleitoral de 2012 do Município de Dionísio Cerqueira, expressões caluniosas, difamatórias e injuriosas em desabono do então candidato a prefeito Thyago Wanderlan Gnoatto Gonçalves.

Por isso mesmo, atribui ao denunciado a prática de crimes contra a honra previstos pelo Código Eleitoral, agravados pela majorante do uso de meio facilitador da ofensa, os quais possuem as seguintes definições jurídicas:

Art. 324. Caluniar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: Pena - detenção de seis meses a dois anos, e pagamento de dez a quarenta dias-multa.

Art. 325. Difamar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena - detenção de três meses a um ano, e pagamento de cinco a trinta dias-multa. Parágrafo único. A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.

Art. 326. Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção até seis meses, ou pagamento de trinta a sessenta dias-multa [...]

Art. 327. As penas cominadas nos arts. 324, 325 e 326 aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: [...] Ill - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da ofensa.

A respeito da calúnia, oportuno notar que o delito se materializa pela imputação falsa de fato criminoso determinado e concreto. Ofende-se, na hipótese, a reputação, a integridade moral da pessoa, sua honra objetiva. Contudo, a lei expressamente admite a exceção da verdade, possibilitando ao autor da irrogação provar a veracidade dos fatos imputados.

Na difamação, a ofensa também atinge a honra objetiva da vítima, porém não se reveste de caráter criminoso, externando juízo de valor depreciativo a respeito da reputação que goza na sociedade. O fato imputado, neste caso, induz à reprovação ético-social do ofendido, devendo ser determinado, como na calúnia. Se for genérico, poderá caracterizar a injúria.

Desimportante, na difamação, que a imputação seja falsa, sendo%dmitida a exceção da verdade somente em razão de ofensa dirigida a funcionári^ pi teor do parágrafo único do art. 325 do Código Eleitoral. r

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RECURSO CRIMINAL N. 8-58.2014.6.24.0050 - CLASSE 31 - RECURSO CRIMINAL -50a ZONA ELEITORAL - DIONÍSIO CERQUEIRA

Quanto à injúria, a honra subjetiva é o bem juridicamente protegido, a qual deve ser compreendida como a consciência, a percepção que a pessoa tem sobre seus próprios atributos, sobre sua valia e prestígio, como espécie de auto-estima. Portanto, o dolo do crime reside no animus injuriandi, na determinação do agente de atingir o conceito subjetivo da vítima, por ultraje ou menoscabo.

Na demarcação do crime de injúria em face dos delitos afins pertinentes à honra, preleciona Mirabete1:

"Na injúria, não há imputação de fatos precisos e determinados como na calúnia e na difamação. Refere-se ela à manifestação de menosprezo, ao conceito depreciativo; mencionam-se vícios ou defeitos do sujeito passivo ou mesmo fatos vagos e imprecisos desabonadores que não chegam a integrar outro crime contra a honra."

Não obstante se cogitar do crime de menor gravidade ante a calúnia e a difamação, cumpre fixar que o tipo penal de injúria não tutela a extremada suscetibilidade, motivo pelo qual não resta tipificada diante de mera descortesia ou expressões deselegantes, que se mostram minimamente ofensivas ao respeito a que todos têm direito.

Particularizo, ainda, que a verossimilhança ou não do fato ofensivo é despiciendo para conformação da injúria, não se admitindo, pois, a exceção da verdade.

Firme nessas premissas passo ao exame dos fatos.

Autoria

Compulsando os autos, denoto que a divulgação do conteúdo afirmadamente ofensivo encontra-se devidamente comprovada pelas cópias das diversas postagens inseridas na rede social Facebook trazidas aos autos pela acusação (fls. 06-15).

Outrossim, a autoria das publicações também restou demonstrada pela quebra de sigilo de dados deferida pelo Juiz Eleitoral no curso do inquérito policial (fls. 22-23), a qual implicou na colheita das seguintes informações prestadas pela Polícia Federal (fls. 28-31).

"[.••] apuramos que o administrador da página do Facebook intitulada com LUCAS ZAN - https//www.facebook.com/lucaszan.98, realmente é JEFERSON AVILA, o qual trabalhou como 'marqueteiro' na campanha de reeleição do prefeito ALTAIR RITTES" [...] muitas das postagens efetuadas no perfil LUCAS 2 irdade compartilhamentos do perfil JEFERSON W. AVILA [...]

1 Manual de Direito Penal, Atlas, 25a edição, 2007, p. 141

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Atualmente JEFERSON JONAS AVILA trabalha como Assessor de Comunicação e Marketing da Prefeitura Municipal de Dionísio Cerqueira [...]".

No seguimento das investigações, os dados cadastrais fornecidos pelas empresas Net Serviços de Comunicação Ltda. e Oi S.A., em cumprimento à ordem do Juiz Eleitoral (fl. 113), revelaram que os usuários dos IPs utilizados para administrar a referida página do Facebook eram o recorrido, o seu irmão Marcelo Ávila e a sua tia Isabel Teresinha Ávila, bem como a Prefeitura Municipal de Dionísio Cerqueira (fls. 123-124 e 125-129).

De outro norte, os testemunhos são harmônicos ao revelarem que o recorrido é jornalista de formação e participou ativamente da campanha eleitoral do candidato a reeleição Altair Cardoso Rittes (PT), adversário do candidato ofendido Thyago Wanderlan Gnoatto Gonçalves (PMDB), sendo localmente conhecido como "marqueteiro do PT\

Nesse sentido, a testemunha Gilmar Brizola de Campos afirmou ter cuidado em conjunto com o recorrido - que era o coordenador da propaganda da campanha - da publicidade eleitoral do candidato Altair Cardoso Rittes. Precisou que o recorrido foi assessor de imprensa de um deputado federal em Brasília e que, vindo para Dionísio Cerqueira, seguidamente mencionava ao depoente a internet como ferramenta para fazer publicidade durante a campanha eleitoral.

O próprio denunciado, em seu interrogatório, embora tenha recusado o qualitativo de "marqueteiro do PT\ ao argumento de que não foi contratado para tanto, não negou a sua efetiva intervenção nas atividades de campanha do candidato a reeleição Altair Cardoso Rittes, informando que já o conhecia quando veio residir em Dionísio Cerqueira [final de maio de 2012], em busca de um emprego na sua área profissional.

Aliás, o entrelaçamento de interesses políticos é revelado, ainda, pelo fato de o denunciado ter sido contemplado com um cargo na Prefeitura Municipal de Dionísio Cerqueira após a reeleição do candidato a prefeito Altair Cardoso Rittes, consoante desvela a prova oral.

Dentro desse contexto, não há como negar a notória predisposição do denunciado em realizar condutas capazes de favorecer a reeleição do candidato Altair Cardoso Rittes, razão pela qual exsurge inequívoco ser o autor das publicações negativas propagadas no Facebook a respeito do candidato Thyago Wanderlan Gnoatto Gonçalves.

Fatos atribuídos ao acusado

Dirimida a autoria das diversas assertivas incriminadas, examino os trechos que, na versão da acusação, tipificam a prática de crimes contrai a honra.

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No que se refere às mensagens contidas nas fls. 6 e 7, o Ministério Público Eleitoral aponta a ocorrência concomitante de calúnia (CE, art., 324), difamação (CE, art. 325) e injúria (CE, art. 326), nestes termos:

Publicação de fl. 6:

"'Ele nunca foi nada na vida e já é ficha suja, imagina se for prefeito'. Além de Thyago ter sido intitulado de 'ficha suja', também foi inserido o n° 171 como adesivo de sua camisa, fazendo alusão ao crime de estelionato, previsto no Código Penal (fl. 6)"

"Ofendeu a dignidade e o decoro da vítima, chamando-o de [...] "ficha suja" (fl. 06)"

"o denunciado imputou fatos ofensivos à reputação da vítima, publicando na rede de relacionamentos 'Facebook' frases falsamente atribuídas à vítima, utilizando da foto de Thyago ao lado das mensagens 'putz, tentei enganar um nome fantasia na eleição, mas não deu, eles me pegaram' (fl. 06)"

Publicação de fl. 7:

"'Tiago Gnoatto está sendo condenado por CRIME DE CAIXA 2...', chamando-o novamente de ficha suja (fl. 7)"

"Ofendeu a dignidade e o decoro da vítima, chamando-o de [...] "ficha suja" (fl. 07)"

Inequivocadamente, a idéia central que se busca transmitir com as publicações seria a de que o candidato é "ficha suja" e praticaria ainda mais ilegalidades caso eleito prefeito, imputações com caráter flagrantemente difamatório, pois ofensivo à reputação do candidato por propalar fato desabonador a sua imagem perante os demais indivíduos.

Em caso análogo, assim decidiu esta Corte:

"A fala insultosa 'vai querer fazer falcatruas1, externada com intuito de conjecturar que o candidato, no exercício da chefia do Executivo, poderia desviar dinheiro púbico para compensar suas despesas de campanha por não se reportar a fatos definidos e determinados não tipifica o crime de calúnia e difamação, mas é suficiente para confiqurar o delito de injúria, pois presente o dolo, o ânimo de ofender a honra subjetiva do candidato. O dizer não evidencia simples e admissível crítica, juízo ou opinião desabonadora a respeito do ofendido, transmite, em verdade, a deliberada e consciente vontade de aviltá-lo, de feri-lo em sua honorabilidade e respeitabilidade restando tipificada a prática do delito" (TRESC, Ac. n. 25.663, de 14.03.2011, Juiz SÉRGIO TORRES PALADINO). !

1 X ' E não infirma a conotação difamatória a pretensa; justificativa,

consignada nas publicações, de que o candidato seria réu em determinada ação por

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Tribuna! Regional Eleitoral de Santa Catarina RECURSO CRIMINAL N. 8-58.2014.6.24.0050 - CLASSE 31 - RECURSO CRIMINAL -50a ZONA ELEITORAL - DIONÍSIO CERQUEIRA improbidade administrativa (fl. 6) ou de que, por outra ação civil pública, "está sendo condenado por crime de caixa 2 na prefeitura de Rio Negrinho, onde ele trabalhou como advogado, está com os bens bloqueados pela Justiça" (fl. 7), pois, como dito, a exceção da verdade somente é possível no crime de difamação "se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções" (CE, art. 325, § único).

Mesmo que, noutra consideração, se perfilhasse a tese de que "a divulgação de um fato desabonador, não criminoso, mas verdadeiro atende ao interesse público na máxima transparência daquele que pretende ocupar cargos eletivos" (in Crimes Eleitorais e Processo Penal Eleitoral, Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, Atlas - 2012), ainda assim é de se evidenciar que não se revela manifesta a verdade que excepcionaria a difamação.

Com efeito, a Lei da Ficha Limpa, nas alterações que fez na Lei Complementar n. 64/1990, não autoriza imputar a pecha de "ficha suja" ao cidadão que tenha em seu desfavor ações por improbidade administrativa, reclamando a existência de "decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, por ato doloso que importe lesão ao patrimônio e enriquecimento ilícito" (LC 64/1990, art. 1o, I, T) .

Não se trata de primar pelo tecnicismo jurídico em detrimento da informalidade das publicações realizadas; porém se impõe, a quem se arvora em informante do eleitorado, a cautela e prudência de bem se instruir a respeito do conteúdo que dissemina, para não fazer assertivas desarrazoadas e descair para a ofensa antijurídica.

Enfatizo, outrossim, que as demais irrogações veiculadas nas publicações apenas servem para reforçar a referida qualificação desabonatória, mediante o expediente da sátira.

Nesse sentido, na publicação de fl. 6, foram incluídas na fotografia do candidato o emblemático número 171 (popular alusão a estelionatários) e a mensagem "putz, tentei enganar um nome fantasia na eleição, mas não deu, eles me pegaram", dando a entender que o candidato utilizou-se de manobra para transpor eventuais restrições à sua elegiblidade pelo suposto fato de ser"ficha suja".

Não identifico a capacidade desses expedientes satíricos formarem idéias autônomas de injúria e calúnia dissociadas da pecha de "ficha suja", como quer fazer crer a acusação, pelo que devem ser absorvidas pelo mote fulcral da mensagem em apontar a existência de antecedentes processuais desabonadores da candidatura do ofendido.

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Acerca da publicação de fl. 8, o Ministério Público imputa a ocorrência das figuras típicas dos arts. 325 e 326 do Código Eleitoral, alegando que "ofendeu a dignidade e o decoro da vítima, chamando-o de [...] "bandido" (fl. 08)".

A publicação em consideração faz menção a suposta operação policial "que prendeu 15 pessoas na última terça-feira; todos eram ligados ao grupo do 15; os indivíduos, na tentativa de atacar o prefeito Altair; ao ver seu carro passando por uma das ruas do bairro, impediram sua passagem, mas para a surpresa dos marginais, o carro era conduzido por dois policiais que não estavam em serviço; após receberem inúmeras ameças e serem impedidos pelo grupo de seguirem, pasmem, que era liderado pelo candidato Tiago Gnoatto, os mesmos solicitaram reforço das PMs de Dionísio Cerqueira e Barracão e da PF, que conduziu os agressores à delegacia".

E remata com a pergunta retórica: 'Voce não vai querer bandido na prefeitura, não é?"

A ofensividade caluniosa do texto é manifesta, na medida em que imputa a pecha de "bandido", com menção a circunstâncias fáticas descrevendo elementares do crime de constrangimento ilegal (CP, art. 146) e de ameaça (CP, art. 147), alegadamente realizadas sob a liderança do candidato, que teria resultado na prisão de vários envolvidos.

Conquanto a denúncia impute a prática de difamação e injúria, é juridicamente viável nesta instância recursal a emendatio libelli (CPP, art. 383), a fim de emprestar diversa definição jurídica ao fato, mesmo que lhe decorra pena mais grave, pelo que a publicação de fl. 8 deve ser tipificada como calúnia.

Acerca das publicações de fls. 9, 10 e 11 o Ministério Público atribui a ocorrência da figura típica da calúnia (CE, art. 324), com fundamento nos seguintes argumentos:

Publicação de fl. 9

"'Lucas Zan' - perfil falso do Facebook que praticava tais fatos - publicou notícia de que '...Operação da Polícia Federal e PM prendeu mais de 80 pessoas e o candidato Tiago Gnoatto, que estavam comprando votos no bairro Três Fronteiras e União' (fl. 09)".

Publicação de fl. 10:

"notícia dizendo que Tiago Gnoatto foi condenado por <" irl da prefeitura de Rio Negrinho (fl. 10)".

Publicação de fl. 11:

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"notícia dizendo que a Polícia Federal apreendeu materiais irregulares no Comitê do Candidato Tiago (fl. 11)".

Nas duas primeiras publicações, as imputações caluniosas mostram-se severas, apontando Thyago Wanderlan Gnoatto Gonçalves como agente dos crimes de compra de votos (CE, art. 299) e de peculato pelo afirmado desvio de verbas públicas (CP, art. 312).

São casos, pois, de notórias assertivas ofensivas à honra objetiva do candidato mediante divulgações circunstanciadas de fatos concretos e determinados de natureza criminal, a respeito das quais, embora cabível, sequer foi sucitada a exceção da verdade para prova de que são verdadeiras.

Com relação à publicação de fl. 11, diversamente do que defende o Ministério Público, não identifico a presença dos elementos tificadores do crime de calúnia.

E isso porque a divulgação da suposta "apreensão de materiais irregulares no comitê do candidato Tiago", contendo "mentiras e ataques ao prefeito Altair", não transmite a idéia do cometimento de conduta criminosa.

Evidentemente, seria possível conjecturar que os materiais afirmadamente apreendidos seriam utilizados para a eventual prática de crimes contra a honra do candidato Altair. Contudo, as circunstâncias descritas na publicação são vagas e generalistas, limitando-se a noticiar alegada apreensão de "materiais irregulares no comitê do candidato Tiago", sem particularizar a consumação de qualquer delito eleitoral de autoria de referido candidato.

A propósito, colho da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral que "a ofensa de caráter genérico, sem indicação de circunstâncias a mostrar fato específico e determinado, não caracteriza o crime de calúnia previsto no art. 324 do Código Eleitorar (AR-REspe n. 25.583, de 31.10.2006, Min. CARLOS EDUARDO CAPUTO BASTOS).

Por fim, acerca da publicação de fl. 12, o Ministério Público Eleitoral indica o cometimento dos crimes de difamação e injúria, ao argumento de que "o denunciado imputou fatos ofensivos à reputação da vítima, publicando na rede de relacionamentos 'Facebook' frases falsamente atribuídas à vítima [...] 'DO POVO eu quero duas coisas: o VOTO e DISTÂNCIA!' (fl. 12)".

Os dizeres enfatizados pela acusação - "DO POVO eu quero duas coisas: o VOTO e DISTÂNCIA!" - foram postos ao lado da fotografia do ofendido e, embora não respeitam a fato deteminado para configurar o crime de difamação, são manifestamente ofensivos, já que atribuem o negativo perfil de interesseiro, com ambições políticas desapegadas das causas públicas, assim caracterizando a/njúria reprimida pela legislação penal eleitoral. \ /

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Na síntese da valoração dos fatos, portanto, o acervo probatório desvela, de forma bastante segura, o dolo do recorrido de ofender a honra de Thyago Wanderlan Gnoatto Gonçalves - candidato ao cargo de prefeito nas eleições de 2012 - mediante publicações na rede social Facebook, as quais tipificam a prática dos crimes de calúnia (por três vezes - fls. 8, 9 e 10), difamação (por duas vezes - fls. 6 e 7) e injúria (uma vez - fl. 12).

Não há, diante da veemência e do conteúdo das ofensas, tomá-las como mero exercício da liberdade de expressão, notadamente porque não há direitos absolutos e a honra do indivíduo também constitui bem jurídico de mesma envergadura constitucional (CR, art. 5°, X), a teor do que revelam os seguintes julgados:

"[...] Não obstante o acirramento e veemência da campanha eleitoral possam, por um critério de razoabilidade, flexibilizar as balizas do conceito que de ordinário se empresta à ofensa antijurídica, nisso não se encerra um absoluto salvo-conduto para o vilipêndio da honra dos candidatos. Sobretudo há de ser sancionada a imputação ofensiva quando não se apresenta o mero propósito crítico, mas resulta inequívoca, como ato doloso, a intenção de causar dano à honra objetiva ou subjetiva" (TRESC. Acórdão n. 25.663, de 14.03.2011, Juiz Sérgio Torres Paladino).

"RECURSO CRIMINAL. INJURIA ELEITORAL. CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA. MEIO QUE FACILITE A DIVULGAÇÃO DA OFENSA. INTERNET. BLOG. PESSOA FÍSICA. CONCURSO MATERIAL. TRES VEZES. FERIMENTO À HONRA SUBJETIVA. ESPECIAL FIM DE AGIR. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. ANIMUS INJURIANDI. LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DIREITO À INFORMAÇÃO VERSUS PROTEÇÃO DA HONRA DOS JURISDICIONADOS, ALÉM DO INDISPENSÁVEL EQUILÍBRIO DO PLEITO ELEITORAL. NÃO SE PODE PASSAR POR CIMA DOS DEMAIS DIREITOS DOS INDIVÍDUOS EM NOME DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO. TIPICIDADE DAS CONDUTAS. PRELIMINAR DE INÉPCIA E PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO AFASTADAS. DESPROVIMENTO DO RECURSO" (TRE-RJ. Recurso Criminal n. 235, de 24.5.2012, Juíza Letícia de Faria Sardas -grifei).

Procedo, então, à dosimetria da pena a ser imposta.

Crimes de Calúnia

Quanto aos crimes de calúnia relativos às publicações de fls. 8, 9 e 10, analisando as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, concluo: a) a culpabilidade do acusado decorre do dolo do agir, a merecer a censura ordinária à espécie, não se identificando o desconhecimento da ilicitute ou a inexigibilidade de conduta diversa; b) não se registram antecedentes criminais a respeito do réu (fls. 1JS3 e 162); c) a conduta social do réu não foi abonada, nem desabonada; so^e a personalidade do réu, não há elementos suficientes para valorá-la; e) c

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Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina RECURSO CRIMINAL N. 8-58.2014.6.24.0050 - CLASSE 31 - RECURSO CRIMINAL -50a ZONA ELEITORAL - DIONÍSIO CERQUEIRA antijurídica, como sói ocorrer nos crimes dessa natureza, é a intenção de prejudicar o candidato ofendido; f) as circunstâncias são ínsitas ao tipo criminal; g) as consequências dos crimes causaram prejuízo à honra e à campanha do candidato ofendido; e h) não se depreende que o comportamento da vítima tenha contribuído para o agir criminoso.

Logo, fixo a pena-base para cada crime de calúnia no mínimo legal de 6 (seis) meses de detenção e 10 (dez) dias-multa.

Não há, por outro lado, circunstâncias agravantes ou atenuantes, pelo que mantenho, na segunda fase, nesse patamar a pena.

Ultrapassada essa etapa, cumpre aplicar a causa de aumento sancionatório prevista no inciso III do art. 327 do Código Eleitoral, pelo uso de meio que facilitou a divulgação das ofensas, na esteira da manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral:

"[...] mesmo que fosse limitado o acesso das respectivas mensagens caluniosas e injuriosas ao seu círculo de amizades, tem-se que tais mensagens, uma vez divulgadas no 1facebookseja com acesso restrito a amigos ou ao público em geral, remanescem ilícitas quanto aos seus teores, pois em um ou outro caso é passível de acesso ao público, já que os inúmeros amigos podem abrir acesso a muitos outros usuários do facebook, ou mesmo difundir a dita mensagem irregular, de produção gráfica razoável, em outros meios publicitários, com difusão em progressão geométrica, não sendo esse fato parâmetro suficiente para que seja afastada a majorante em questão, valendo mencionar que o próprio Thyago Gonçalves pôde acessá-las e imprimi-las para que pudesse oferecer sua representação perante o Ministério Público da Zona Eleitoral de origem (fis. 6-12), o que demonstra o alcance das referidas inserções criminosas veiculadas em rede social anônima pelo apelado".

Efetivamente, o meio utilizado pelo acusado, realizando os assaques à honra do candidato pela internet, em popular site de relacionamentos, demonstra o claro intento de potencializar a difusão do material ofensivo.

De outro norte, os elementos de prova que demarcam a atuação do acusado no marketing de campanha do candidato adversário ao ofendido, também desvelam o flagrante propósito de disseminar em larga escala as mensagens caluniosas, difamatórias e injuriosas para indiretamente favorecer a candidatura que poderia lhe trazer dividendos pessoais.

Diante dessas circunstâncias, deve ser acrescido um terço à pena-base.

Com a soma do acréscimo um terço (CE, art. 327, III) fixo definitivamente a pena para cada crime de calúnia (publicações de fis. 8, 9 e 10) em 8 (oito) meses de detenção e 13 (treze) dias-multa, devendo cada dia-multa corresponder ào patamar inicial estabelecido pelo § 1o do art. 286 do Código Eleitoral, o qual corresponde' ao valor de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos (R$ 20,73). \

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Crimes de Difamação

Quanto aos crimes de difamação relativos às publicações de fl. 6 e 7, analisando as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, concluo da maneira do já expressado que a pena restará no mínimo legal de 3 (três) meses de detenção e 5 (cinco) dias-multa.

Não há, por outro lado, circunstâncias agravantes ou atenuantes, pelo que a mantenho nesse patamar na segunda fase.

Vencida essas etapas, é forçoso concluir que, a exemplo do que se verificou na fixação da pena para os crimes de calúnia, incide na espécie a causa de aumento prevista no inciso III do art. 327 do Código Eleitoral, em razão do uso de meio que facilitou a divulgação das ofensas. Afinal, a utilização da rede social Facebook torna evidente o intuito de potencializar a difusão dos ataques à honra da vítima.

Diante dessas circunstâncias, deve ser acrescido um terço à pena-base.

Com a soma do acréscimo um terço (CE, art. 327, III) fixo definitivamente a pena para cada crime de difamação relativo às publicações de fl. 6 e 7 em 4 (quatro) meses de detenção e 6 (seis) dias-multa, devendo cada dia-multa corresponder ao patamar inicial estabelecido pelo § 1o do art. 286 do Código Eleitoral, o qual corresponde ao valor do salário mínimo diário da época do fato (R$ 20,73).

Crime de Injúria

Quanto ao crime de injúria (publicação de fl. 12), atendendo às circunstâncias já expostas, fixo a pena-base para o crime de injúria no mínimo legal de 30 (trinta) dias-multa.

Não há, por outro lado, circunstâncias agravantes ou atenuantes, pelo que a mantenho, na segunda fase, nesse patamar.

Vencida essas etapas, há que incidir na espécie a causa de aumento prevista no inciso III do art. 327 do Código Eleitoral, pelo uso de meio que facilitou a divulgação das ofensas, no caso, a rede social Facebook.

Logo, deve ser acrescido um terço à pena-base.

Com a soma do acréscimo um terço (CE, art. 327, III) fixo definitivamente a pena para o crime de injúria (publicação de fl. 11) em 40 (quarenta) dias-multa, devendo cada dia-multa corresponder ao patamar inicial estabelecido pelo § 1o do art. 286 do Código Eleitoral, o qual corresponde ao valor do salário míniWio diário (R$ 20,73). , \ /

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Da continuidade delitiva

Fixadas as penas para cada um dos delitos cometidos pelo réu, cumpre destacar que, embora não sejam estritamente de mesma espécie, pois previstos em tipos distinto, os delitos de calúnia, difamação e injúria, no caso concreto, são afins e aparentados, todos enfeixados na unidade do desígnio de ofender a honra de postulante a cargo eletivo, em semelhantes condições de tempo, lugar e maneira de execução, já que todas as publicações ofensivas foram lançadas no Facebook.

Consigno, porém, que os agravos à honra, mesmo aproximados no tempo, foram publicados de forma pulverizada, e não exatamente na mesma data, por condutas diversas e bem demarcadas, razão pela qual impróprio cogitar do princípio da consunção, a fim de tomar os assaques como um fato único, no qual somente deveria ser sopesado o crime de maior gravidade, por ele aborvidos os demais.

Cito, nesse sentido:

"RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIMES DE INJÚRIA E DIFAMAÇÃO. AUSÊNCIA DE DOLO NÃO DEMONSTRADA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ABSORÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PERDÃO JUDICIAL INAPLICÁVEL NA HIPÓTESE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO NOS MOLDES LEGAIS.

Impossibilidade, na hipótese, de aplicação do princípio da absorção pois condutas diversas e bem delineadas. [...]" (STJ. REsp n. 724.224, de 8.11.2005, Min. José Arnaldo da Fonseca - grifei)

Sendo assim, as ofensas devem ser consideradas como crimes seqüenciais, caracterizadores da continuidade delitiva, de modo que a pena mais alta, decorrente do crime mais grave, é que determinará o quantum penal, com o posterior acréscimo de fração prevista no art. 71 do Código Penal.

No caso, como se pode observar, os delitos de maior gravidade são os de calúnia, para os quais, isoladamente, fora aplicada as penas de 8 (oito) meses de detenção e pagamento de 13 (treze) dias-multa.

E, tomando o assente critério do número de infrações para determinar a aumento da pena, reputo que a quantidade elevada de seis infrações cometidas justifica a exasperação em metade, conforme parâmetro adotado pela jurisprudência, a saber:

"É pacífica a jurisprudência deste Sodalício, em se tratando de aumento de pena referente à continuidade delitiva, aplicando-se a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4, para 4 infrações; 1/3, para 5 infrações; 1/2, para 6 infrações; e 2/3, para 7 ou mais infrações. N^ psnér.ip observando o universo de infrações cometidas pela ré (apesar de

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apurado o número de condutas, restou evidente das provas que foram muitas, ocorridas durante o espaço de mais de um ano, sendo utilizadas várias dezenas de cheques falsificados ou adulterados, como eficaz meio fraudulento para os crimes), por lógica da operação dosimétrica, deve-se considerar o aumento de 1/2 (metade) viável" (STJ, HC n. 283.720/RN, DJe 26/08/2014, Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA)

Nesse contexto, tomando por base a pena de 8 (oito) meses de detenção e 13 (treze) dias-multa fixada para o crime de calúnia, acresço-a de metade (CP, art. 71) para torná-la definitiva em 1 (um) ano de detenção e pagamento de 19 (dezenove) dias-multa, devendo cada dia-multa corresponder ao patamar inicial estabelecido pelo § 1o do art. 286 do Código Eleitoral, o qual corresponde ao valor do salário mínimo diário vigente na data dos fatos (R$ 20,73).

Presentes os requisitos do art. 44, caput e § 2o, do Código Penal, ou seja, sendo a pena privativa de liberdade cominada igual a um ano, o crime cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa, não sendo o réu reincidente em crime doloso, é cabível a substituição da pena privativa de liberdade por multa ou restritiva de direito.

Observo que o § 2o do art. 44 indica como cabíveis as penas de "multa" ou "restritiva de direito", nessa ordem, e, para aplicar a maior, necessário fundamento prejudicial ao condenado, o que não encontro neste caderno, exceto os relativos a crime e aumentos de pena.

Não havendo quaisquer fatos ou situações desabonadoras ao condenado, tendo inclusive as penas sido aplicadas no mínimo legal, opto pela forma de substituição indicada pelo legislador, impondo-lhe pena de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), podendo o pagamento ser efetuado de forma parcelada, a critério do Magistrado que executar a pena.

Pelo exposto, dou provimento ao apelo para condenar o réu à pena de 1 (um) ano de detenção e pagamento de 19 (dezenove) dias-multa, devendo cada dia-multa corresponder ao patamar inicial estabelecido pelo § 1o do art. 286 do Código Eleitoral, equivalente ao valor do salário mínimo diário (R$ 20,73), substituindo a pena privativa de liberdade por multa, fixada no montante de R$ 5.000,00 (cinco milréais), em conformidade com o disposto no art. 44, caput e § 2°, do Código Pe^al. /

É como voto.

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VOTO-VISTA

O SENHOR JUIZ DAVIDSON JAHN MELLO: Vistos os autos em gabinete, divido com os eminentes colegas o pensamento de que o voto do insigne relator merece coro.

Encontram-se sobejamente demonstradas a autoria e a materialidade dos 3 (três) delitos de calúnia, 2 (dois) de difamação e 1 (um) de injúria, condutas tipificadas nos arts. 324, 325 e 326 da Lei 4.737/65 (Código Eleitoral).

Inicialmente, apenas para rememorar as linhas do eminente relator a respeito dos crimes em comento, vale afirmar que a calúnia se materializa pela imputação falsa de fato criminoso determinado e concreto, consubstanciando ofensa à honra objetiva; a difamação, por seu turno, ocorre com a imputação de fato desabonatório, que deprecie a imagem da vítima, ferindo, também, sua honra objetiva; e, por fim, a injúria pela lesão da honra subjetiva, a qual deve ser compreendida como a consciência, por ultraje ou menoscabo.

As ofensas sob análise nos autos foram perpetradas por meio de publicações na rede social Facebook. As primeiras duas (fls. 6 e 7), que consubstanciam as primeiras difamações, como bem anota o relator, têm como mote fulcral (...) apontar a existência de antecedentes processuais desabonadores da candidatura do ofendido. Assim, a ideia central que se busca transmitir com as publicações seria a de que o candidato é "ficha suja" e praticaria ainda mais ilegalidades caso eleito prefeito, imputações com caráter flagrantemente difamatório, pois ofensivo à reputação do candidato por propalar fato desabonador à sua imagem perante os demais indivíduos.

A publicação de fl. 8, por sua vez, encerra as elementares do tipo da calúnia, dela inferindo-se que o candidato Tiago Gnoatto seria o mandante de condutas previstas no Código Penal como crimes de constrangimento ilegal e de ameaça. Muito embora a denúncia tenha realizado o enquadramento da conduta em tipo penal diverso (injúria eleitoral), sua alteração é impositiva. Nessa quadra, impende asseverar que é plenamente viável a promoção de emendatio libelli (reenquadramento típico do fato) pelo Tribunal, em sede recursal (STJ, HC 87984/SC), vedada apenas a mutatio libelli (expansão dos fatos objeto da denúncia), a qual não se constata no caso.

As publicações de fls. 9 e 10 satisfazem, por sua vez, novamente, a figura da calúnia, porquanto imputam de modo inequívoco os crimes de compra de votos (art. 299 do CE) e de peculato (art. 312 do CP).

A publicação de fl. 12 - que imputou ao candidato Tiago os dizeres Do povo eu quero duas coisas: o voto e distância -, enfeixa o crime de injúria, já que atribui perfil negativo de interesseiro ao candidato, com h&mbições políticas desapegadas das causas públicas. \\

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Com efeito, há inegável continuidade delitiva (art. 71, caput, do CP). De outra ponta, acerta o relator, outrossim, ao ponderar que não há que se falar em aplicação do princípio da consunção (absorção) à espécie, tendo em vista a diversidade e demarcação das condutas, sem vinculação lógica de precedência e sucessividade.

A pena, por fim, mostra-se adequada ao caso concreto.

Diante do exposto, acompanho o relator.

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EXTRATO DE ATA

RECURSO CRIMINAL N° 8-58.2014.6.24.0050 - RECURSO CRIMINAL - AÇÃO PENAL - CRIME ELEITORAL - CALÚNIA - DIFAMAÇÃO - ARTS. 324, 325 E 326 C/C ART. 327, III, DO CÓDIGO ELEITORAL - PEDIDO DE CONDENAÇÃO CRIMINAL - 50a ZONA ELEITORAL - DIONÍSIO CERQUEIRA RELATOR: JUIZ VÍLSON FONTANA

RECORRENTE(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL RECORRIDO(S): JEFERSON JONAS ÁVILA ADVOGADO(S): PAULO CESAR GNOATTO; CLEYTON ADRIANO MORESCO; MARCELA SILVESTRE RITTES

PRESIDENTE DA SESSÃO: JUIZ ANTONIO DO RÊGO MONTEIRO ROCHA PROCURADOR REGIONAL ELEITORAL: ANDRÉ STEFANI BERTUOL

Decisão: à unanimidade, conhecer do recurso e a ele dar provimento para condenar o recorrido à pena de 1 (um) ano de detenção e ao pagamento de 19 (dezenove) dias-multa, no valor do salário mínimo diário vigente na data dos fatos (R$ 20,73), substituindo a pena privativa de liberdade por multa, no valor de R$ 5.000,00, nos termos do voto do Relator. Foi assinado o Acórdão n. 31158. Presentes os Juízes Sérgio Roberto Baasch Luz, Antonio do Rêgo Monteiro Rocha, Vilson Fontana, Fernando Luz da Gama Lobo D'Eça, Alcides Vettorazzi, Davidson Jahn Mello e Ana Cristina Ferro Blasi.

SESSÃO DE 28.01.2016.

REMESSA

Aos dias do mês de de 2016 faço a remessa destes autos para a Coordenadoria de Registro e Informações Processuais - CRIP. Eu,

, Coordenador de Apoio ao Pleno, lavrei o presente termo.