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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS FACULDADE DE ARTES VISUAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTE E CULTURA VISUAL DOUTORADO JORDANA FALCÃO TAVARES Advergames e educação da cultura visual. Um estudo sobre a noção de juventude em “Mais Fanta, mais diversão” Goiânia - 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE ARTES VISUAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTE E CULTURA VISUAL

DOUTORADO

JORDANA FALCÃO TAVARES

Advergames e educação da cultura visual.

Um estudo sobre a noção de juventude em

“Mais Fanta, mais diversão”

Goiânia - 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE ARTES VISUAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTE E CULTURA VISUAL

DOUTORADO

Advergames e educação da cultura visual. Um estudo

sobre a noção de juventude em “Mais Fanta, mais

diversão”

Texto apresentado à banca examinadora

da Faculdade de Artes Visuais da Universidade

Federal de Goiás, por ocasião da defesa,

exigência parcial e última, para obtenção do

título de doutora em Arte e Cultura Visual, sob

orientação do prof. Dr. Raimundo Martins.

Jordana Falcão Tavares

Goiânia – 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE ARTES VISUAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTE E CULTURA VISUAL

Jordana Falcão Tavares

Advergames e educação da cultura visual. Um estudo sobre

a noção de juventude em “Mais Fanta, mais diversão”

TESE DE DOUTORADO

Abril de 2017

____________________________________________________________

Prof. Dr. Raimundo Martins – FAV/UFG

Orientador e presidente da banca

___________________________________________________________

Prof. Dr. Arão Nogueira Paranaguá de Santana - UFMA

Membro externo

___________________________________________________________

Prof. Dr. Fernando Miranda - UDELAR

Membro externo

___________________________________________________________

Prof. Dr. José Maria Gonçalves da Silva Ribeiro – FAV/UFG

Membro interno

___________________________________________________________

Prof. Dr. Luiz Carlos Pinheiro Ferreira – UNB

Membro externo (suplente)

___________________________________________________________

Prof. Dr. Thiago Fernando de Santanna – FAV/UFG

Membro interno (suplente)

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Pela partilha e multiplicação,

Pelas falas e silêncios,

Por estar junto e dar espaço,

Minha mais sincera gratidão...

Às amarras de amor: Pablo Sérvio;

Aos nós de sangue: os Falcão;

Aos laços de afeto: Ágatha Couto, Aleksandra Oliveira, Bárbara Lyra, Celso

Lucas, Ítala Carvalho, Juliana Falcão, Leandro Abreu, Lilian Calixto, Lorena Cintra,

Mônica Lopes Lima, Paulo Passos, Pedro Henrique Andrade, Regiane Miranda,

Renato Cirino;

Aos que ataram algumas das pontas: Raimundo Martins, Mirna Anaquiri,

professor Diego e alunos do Bernardo Élis. Mariana Pajaro. Cleidson Lima.

Jullena Normando. Rone Soares;

Aos que foram se enovelando: Alex Mateus, Alice Martins, Alzira Martins, Arlete

de Castro, Camila Alves, Claúdio Aleixo, Eduardo Ávila, Fabrício Carrijo, Fernando

Miranda, Hidemi Nomura, Irene Tourinho, Keila Alves, Leda Guimarães, Marcela

Blanco, Pedro Simon, Rosana Hório, Tiago Santanna, Wesley Play Cópias, Zen

com a gente. Todos os professores, servidores e terceirizados da casa, ao núcleo

EAD/FAV, aos comparsas de pesquisa, aos alunos da UFG e todos que são

inspiração e resistência, força e leveza.

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RESUMO

Esta investigação, desenvolvida entre 2013 e 2016, busca entender o conceito

de juventude e sua representação na mídia tomando como suporte teórico

reflexões do campo da Educação da Cultura Visual. Para realizar a pesquisa de

campo foi escolhido um artefato cada vez mais presente na vida dos jovens: os

videogames, mas especificamente, os advergames, jogos eletrônicos

desenvolvidos para divulgar marcas ou produtos. O trabalho de campo foi

planejado de modo a proporcionar a interação dos jovens participantes com o

advergame “Mais Fanta, mais diversão” e as campanhas publicitárias de Fanta

com o intuito de examinar seus entendimentos sobre as construções midiáticas

em torno da ideia de ser jovem. O grupo foi formado por 14 estudantes de uma

escola pública da região periférica de Goiânia com idades entre 11 e 16 anos

que opinaram sobre as narrativas e personagens dos jogos, bem como sobre

tecnologia, consumo e a noção de juventude. Os temas discutidos nos

encontros com os colaboradores constituem também o corpo desta

investigação, organizada em cinco capítulos. O primeiro, apresenta o leitor aos

conceitos de jogo e advergame. O segundo capítulo, discute princípios que

fundamentam a relação entre jogos e educação. A metodologia é descrita e

detalhada no terceiro capítulo incluindo o trabalho de campo e uma

netnografia sobre o espaço virtual dos jogos. O conceito de juventude é

abordado e discutido no capítulo quatro. O quinto e último capítulo é

composto pela análise das falas dos jovens colaboradores da investigação. Vale

ressaltar que a conclusão é um arranjo contingente que levou em consideração

as características do grupo de participantes, mas, especialmente, as várias

mudanças que se impuseram em relação ao planejamento inicial da pesquisa

alterando seu curso.

Palavras chave: Educação da Cultura Visual, juventude, videogames,

advergames.

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ABSTRACT:

This investigation, developed between 2013 and 2016, try to understand the

concept of youth and its media representation taking as theoretical support

reflexions of Visual Culture Education. To perform field work was chosen an

artifact that is increasingly present in young's lifes: videogames, specifically,

advergames, electronic games designed to promote brands or productsThe field

work was planned to allow the interaction of the young participants with the

advergame "More Fanta, more fun" and Fanta advertising campaigns in order to

examine the understandings builded by the media around the idea of being

young. The group was formed by 14 students, aged between 10 and 16 years.

They were studied at a public school placed in a peripheral region of

Goiânia.They gave opinions about the narratives and characters of the games, as

well as about technology, consumption and the notion of youth. The topics

discussed at meetings with the group are also the body of this investigation,

divided into five chapters. The first chapter presents the reader to the concepts

of game and advergame. The second discusses principles that underlie the

relationship between games and education. The methodology is described and

detailed in the third chapter including fieldwork and a netnography on the

virtual space of the games. The concept of youth is addressed and discussed in

chapter four. The fifth and final chapter consists of the analysis of the lines of

young research staff. It is worth mentioning that the conclusion is an

arrangement that took into account the characteristics of the Group of

participants, but especially the various changes imposed to the initial planning

of the research by changing its course.

Key words: Visual culture education, youth, videogames, advergames.

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Resumen:

Esta investigación desarrollada entre 2013 y 2016 busca entender el concepto

de juventud y su representación en los medios de comunicación con la ayuda

del campo teórico de la educación de la cultura Visual. Para se realizar esta

investigación de campo se eligió un artefacto que está cada vez más presente

en las vidas de los jóvenes: videojuegos, pero específicamente, advergames,

juegos electrónicos diseñados para promocionar marcas o productos. El trabajo

de campo fue planeado para permitir la interacción de los jóvenes participantes

con el advergame "Mais Fanta, mais diversión" y campañas de publicidad de

Fanta para examinar su comprensión acerca de las construcciones de los medios

de comunicación alrededor de la idea de ser joven. El grupo estaba formado por

14 alumnos de una escuela pública en la región periférica de Goiânia de edades

comprendida entre 10 y 16 años que dieron sus opiniones sobre los relatos y

personajes de los juegos, así como sobre la tecnología, el consumo y la noción

de juventud. Los temas tratados en las reuniones con los alumnos forman parte

también del cuerpo de esta investigación, dividida en cinco capítulos. El primer

presenta al lector a los conceptos de juego y advergame. El segundo capítulo,

aborda los principios que subyacen a la relación entre juegos y educación. La

metodología está descrita y detallada en el capítulo tercero incluyendo trabajo

de campo y una netnography en el espacio virtual de los juegos. El concepto de

juventud es tratado y discutido en el capítulo cuatro. El quinto y último capítulo

consiste en el análisis de lo que han dicho los estudiantes. Cabe destacar que la

conclusión es que un arreglo de cuotas que tuvo en cuenta las características

del grupo de participantes, pero especialmente los cambios impuestos en

relación con la planificación inicial de la investigación, cambiando su curso.

Palabras clave: Educación de la Cultura Visual, juventude, videojuegos,

advergames.

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Sumário

Rótulos inaderentes. Juventude(s): do consumo à tecnologia, da diversão ao

conteúdo. ......................................................................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 – TUDO ISSO É SÓ UM JOGO? Conceitos essenciais acerca dos

jogos .................................................................................................................................................. 5

1.1 “SOU UM JOGADOR, TENHO MUITAS VIDAS” – O alcance dos games na

sociedade contemporânea ........................................................................................................ 5

1.2 NOVOS BRINQUEDOS PARA NOVAS CRIANÇAS – Games, infância e

juventude ....................................................................................................................................... 11

1.3 VIVÊNCIA A PARTE DA VIDA - Conceito(s) de jogo ................................................ 13

1.4 FAZER BRINCANDO - Princípios da gamificação ..................................................... 17

1.5 A REALIDADE QUEBRADA - Por que os jogos encantam .................................... 20

1.6 VAMOS BRINCAR DE QUE? - O que se joga hoje .................................................... 27

1.7 OS 10 TOMATES – Sobre advergames ......................................................................... 29

CAPÍTULO 2 – CONHECIMENTOS NECESSÁRIOS, APRENDIZADOS POSSÍVEIS.

Sobre educação e jogos ........................................................................................................... 34

2.1 VÁRIOS OBJETOS PARA UM CAMPO - culturas visuais e Cultura Visual. ........ 34

2.2 Um parêntese sobre arte, cultura visual e imagens da mídia .............................. 41

2.3 L1 + > + R1 + > - O que se aprende com os games ............................................ 50

2.4 MÁQUINAS DE ENSINAR - Games como pedagogias culturais ......................... 57

CAPÍTULO 3 – TRILHAS DO OBJETO, PASSOS DOS SUJEITOS, CAMINHOS DA

PESQUISADORA. Traçando rotas metodológicas ............................................................ 71

3.1 LOCALIZAÇÃO - Uma pesquisa qualitativa, pós-crítica ou, fazendo

bricolagem ..................................................................................................................................... 71

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3.2 NEGOCIAÇÕES METODOLÓGICAS – Bricolagem ou “epistemologia da

complexidade”.............................................................................................................................. 75

3.3 IDA A CAMPO - Netnografando “Mais Fanta, mais diversão” ............................. 78

3.4 REVISANDO A ROTA – Montando um grupo focal ............................................. 100

CAPÍTULO 4 – DE/COM QUEM ESTAMOS FALANDO? Sobre a noção de

juventude .................................................................................................................................... 117

4.1 Espírito jovem - A ideia de juventude como uma condição ............................. 117

4.2 Gerando crianças - A invenção do conceito de infância .................................... 120

4.3 As crianças viram jovens - Um conceito inicial de juventude ........................... 123

4.4 Ser jovem hoje – Uma noção de juventude consolidada? ................................. 128

O sujeito na sociedade de controle ................................................................................... 130

4.5 Multiconectados - Ainda sobre a ideia de ser jovem nos dias de hoje ........ 134

4.6 Eles por eles - Os jovens colaboradores se apresentam .................................... 142

CAPÍTULO 5 – GALERA FANTA. A noção de juventude segundo Fanta .............. 146

5.1 QUEM VAI NOS GUIAR? - Declínio das instituições disciplinares ................... 147

Cadê a família? .......................................................................................................................... 148

Cadê a escola? ........................................................................................................................... 155

Cadê a igreja? ............................................................................................................................ 159

5.2 “Olha o estilão!” - Controle, consumo e identificação ........................................ 164

Consumo ostentação .............................................................................................................. 164

Origem fantástica ..................................................................................................................... 171

Personalidade produto .......................................................................................................... 174

5.3 Os playless - Imperativo do gozo, tédio e hiperestímulo. ................................. 183

Utopia, cidade multicolorida! .............................................................................................. 183

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Cidade cinza ............................................................................................................................... 187

Quem quer ser playless?........................................................................................................ 189

Conclusão .................................................................................................................................... 195

Bibliografia .................................................................................................................................. 208

ANEXO I – ROTEIRO PARA REALIZAÇÃO DE GRUPO FOCAL COLETA DE DADOS

DE PESQUISA DE DOUTORADO COM ALUNOS DA ESCOLA MUNICIPAL

BERNARDO ÉLIS ........................................................................................................................ 221

ANEXO 2 – APRESENTAÇÃO DA PESQUISADORA E TERMO DE CESSÃO DE

DIREITOS ENVIADO AOS PAIS DOS ALUNOS ................................................................ 228

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Lista de figuras

Figura 1 - Camiseta usada por possível jogador. Tradução: Eu não preciso de

uma vida, sou um jogador, tenho várias vidas. .................................................................. 7

Figura 2- Cosplays dos personagens do game Halo ....................................................... 8

Figura 3- Escada piano, parte do projeto ‘the fun theory’ da empresa

Volkswagem .................................................................................................................................. 19

Figura 4- Imagem do jogo World of Warcraft .................................................................. 22

Figura 5 – Imagem do jogo Super Monkey Ball 2 ........................................................... 23

Figura 6 - Imagem do jogo Farmville .................................................................................. 24

Figura 7 - Imagem do game Halo 3 ..................................................................................... 26

Figura 8 - Jogadores experimentam Spacewar ................................................................ 27

Figura 9 - Exemplo de comunicação bidirecional Autobel no Facebook ............... 31

Figura 10 - Placas publicitárias compõem o cenário em ProEvolution Soccer ..... 32

Figura 11 - Jogo dos 10 tomates ........................................................................................... 33

Figura 12 - Still Life #35, Tom Wesselmann, 1963. ......................................................... 42

Figura 13 - I Shop, therefore, I am. Barbara Kruger, 1987. ........................................... 44

Figura 14 - Outdoor do coletivo Guerrilla Girls, 2011.................................................... 45

Figura 15 - Banksy ...................................................................................................................... 46

Figura 16 - Cartucho do jogo Tetris com interveção do artista ................................. 48

Figura 17 - Jetpack girl, jogo que apresenta o artista Steph Thirion ....................... 49

Figura 18 - Long March: restart. Feng Mengbo. .............................................................. 50

Figura 19 - Imagem do jogo The Sims 2 Ikea Home Stuff. Nessa versão do jogo

é possível comprar produtos disponíveis na loja para decorar a casa virtual. ..... 53

Figura 20 - Kratus com a cabeça da Medusa em frente à Acrópole ........................ 55

Figura 21 - Imagem do jogo on line V de Vinagre. Disponível em UOL Games .. 64

Figura 22 - Imagem do jogo on line Studio Fashion. Disponível em UOL Games

........................................................................................................................................................... 67

Figura 23 - Game Detona Ralph, baseado no filme de mesmo nome .................... 68

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Figura 24 - personagens de Detona Ralph: o protagonista, Vanellope e Sgt.

Calhoun ........................................................................................................................................... 69

Figura 25 - Página inicial do site de Fanta ......................................................................... 80

Figura 26 - Página inicial do site mostrando os ambientes a serem explorados 81

Figura 27 - Recorte do comic book ...................................................................................... 82

Figura 28 – Imagem do jogo Todd's van ............................................................................ 84

Figura 29 - Imagem do jogo Lola's fizz fazer .................................................................... 85

Figura 30 - Imagem do jogo Llavas twins roller .............................................................. 86

Figura 31 - Perfil do jogador ................................................................................................... 87

Figura 32 - Lola, Gigi, Todd, Floyd, Tristan e Andy ......................................................... 89

Figura 33 - Vista geral de Utopia .......................................................................................... 90

Figura 34 - Imagem do jogo Maude's cine dance .......................................................... 91

Figura 35 - Imagem do jogo Yoyo jump, da Gigi ............................................................ 92

Figura 36 - Imagem do jogo hover board rider ............................................................... 93

Figura 37 - Quarto do Floyd .................................................................................................... 94

Figura 38 - Quarto da Gigi ....................................................................................................... 95

Figura 39 - Casa do Todd ......................................................................................................... 96

Figura 40 - Cachoeira de Fanta .............................................................................................. 97

Figura 41 - Floresta de frutas .................................................................................................. 98

Figura 42 – Cidade ...................................................................................................................... 99

Figura 43 - Cena final do comic book. O guardião da torre comemora a volta da

diversão ....................................................................................................................................... 100

Figura 44 - Cartaz de apresentação de Carlos Henrique ........................................... 110

Figura 45 - Cartaz de apresentação de Janderson ....................................................... 111

Figura 46 - Cartaz de apresentação de Alana ................................................................ 111

Figura 47 - Alunos no laboratório de informática da escola .................................... 113

Figura 48 - Alunos participam da atividade de desenho ........................................... 114

Figura 49 - quadro do VT Play zone.................................................................................. 136

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Figura 50 - personagens usam fone de ouvido e vídeo game portátil ou celular

........................................................................................................................................................ 138

Figura 51 - um relógio marca a intervenção homogeneizadora ........................... 139

Figura 52 - O molde torna as cabeças quadradas ....................................................... 140

Figura 53 - Celebração com o fim da homogeneidade ............................................. 141

Figura 54 - Casa da Gigi......................................................................................................... 149

Figura 55 - Desenho de Kauane ......................................................................................... 150

Figura 56 - Desenho de Ricardo ......................................................................................... 151

Figura 57 - Tela final do advergame “Salvando a fonte” .......................................... 153

Figura 58 - Cidade ideal desenhada por Adrielly ......................................................... 162

Figura 59 - Cidade ideal desenhada por Janderson .................................................... 163

Figura 60 – MC Pedrinho ....................................................................................................... 166

Figura 61 – MC Biel .................................................................................................................. 167

Figura 62 - quadro de Happyness Factory ...................................................................... 172

Figura 63 - Floyd no jogo jetpack ambientado na cachoeira .................................. 174

Figura 64 - Imagem geral de Utopia com a Vanta em primeiro plano ................ 175

Figura 65 - Emojis do Facebook ......................................................................................... 182

Figura 66 - Diálogo entre Tristan e Todd mostrado no comic book .................... 188

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1

Rótulos inaderentes. Juventude(s): do consumo à

tecnologia, da diversão ao conteúdo.

Millennials, screenagers, Geração Y ou Z são alguns dos rótulos que tem

sido colados aos jovens desde que passaram a ser tanto os provedores de

conteúdo de suas famílias quanto a parcela da população que mais consome

(BORGES, 2014). Crianças, adolescentes e jovens adultos em todo o mundo nunca

tiveram tanto acesso à informação, tecnologia e crédito. Por esta razão, este

segmento da população tem despertado o interesse de empresas levando-as a

buscar estratégias publicitárias cada vez mais originais e envolventes para

fortalecer vínculos com ele. Uma das alternativas mais usadas se baseia, por um

lado, na familiaridade dos potenciais consumidores com as tecnologias e, por

outro, na importância dada por essa parcela da população à diversão e ao

entretenimento (IBOPE, 2010): os advergames.

Advergames são ações publicitárias gamificadas desenvolvidas

exclusivamente para marcas e empresas, disponibilizadas normalmente de forma

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gratuita para seu público. Embora predominantemente on line, existem também

versões off line desses jogos que funcionam como uma opção interativa e

envolvente para fortalecer a relação público-marca. A gamificação é um fenômeno

que tem ganhado cada vez mais espaço já que o videogame é um dos principais

artefatos de lazer contemporâneo e sua indústria uma das mais rentáveis do

mundo. Gamificar, esquematicamente, é aplicar os princípios dos jogos a

atividades oferecendo diversão como recompensa a realização de tarefas e,

consequentemente, gerando engajamento do sujeito que interage.

A maciça presença dos jogos eletrônicos na sociedade contemporânea traz

a reboque dúvidas e temores sobre a conformação de um novo ambiente

midiático e as mudanças socioculturais daí advindas. Dessa preocupação surge o

interesse por investigar e perceber que sentidos os jovens atribuem às

representações de juventude criadas em uma cultura visual comercial e

gamificada, bem como verificar de que forma essa construção é recebida pelo

público ao qual se destina.

Para tanto, escolhi como praça de encontro para dialogar com os atores

que motivam esta pesquisa o universo de “Mais Fanta, mais diversão” que contem

uma série de filmes publicitários e o advergame “Salvando a fonte” da marca de

refrigerantes Fanta, da Companhia Coca Cola. Vídeos publicitários contextualizam

a narrativa do jogo virtual em que os jovens de uma cidade ideal se deparam com

um problema: o desaparecimento da diversão. Essa é a senha para que a “galera

Fanta” encare os desafios – os advergames – a fim de reestabelecer o

divertimento como ordem do lugar.

A campanha “Mais Fanta, mais diversão” reitera o papel dos jovens como

formadores de opinião e consumidores hoje. Ao examinar sua narrativa, temas

como independência financeira, família, escola, relacionamentos, entre outros,

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vem à tona, gerando a pergunta central desta pesquisa: que sentidos/significados

são inferidos/entendidos por jogadores à representação da noção de juventude

do universo de Fanta, em especial do advergame “Salvando a fonte”?

A partir dessa questão adotei a perspectiva da educação da Cultura Visual

para me acercar do tema. A ideia foi dialogar com sujeitos entre 10 e 16 anos a

respeito de sua familiaridade com a mídia, artefatos tecnológicos em geral e

games de modo específico, questionando-os sobre seu entendimento de si

mesmos como jovens. Ao formular estas interrogações tinha em mente que

Uma proposta educativa a partir da cultura visual pode ajudar a

contextualizar os efeitos do olhar mediante práticas críticas (anti-

colonizadoras), explorar as experiências (efeitos, relações) de como o que

vemos nos conforma, nos faz ser o que os outros querem que sejamos e

poder elaborar respostas não reprodutivas frente ao efeito desses

olhares (HERNANDEZ, 2011, p.44).

Ao nos valer da Cultura Visual para trabalhar com imagens, deixamos de

nos ater a superficialidade delas para acessar as estruturas sobre as quais seus

significados são postos. Durante a investigação refleti com os participantes sobre

como e se experiências visuais como os videogames estão incidindo em seus

modos de pensar e interagir, em seu aprendizado (não escolar) e em suas relações

sociais. De certa forma, a proposta da pesquisa era também compreender o que

as experiências proporcionadas pelo jogo tem a dizer sobre os jogadores, pois

entendo que o campo

(...d)a cultura visual não seria tanto um que (objetos, imagens) ou um

como (um método para analisar ou interpretar o que vemos), pois se

constitui como um espaço de relação que traça pontes no “vazio”, que se

projeta entre o que vemos e como somos vistos pelo que vemos. A

cultura visual, quando se refere à educação, pode-se articular como um

cruzamento de relatos em rizoma (sem uma ordem pré-estabelecida)

que permite indagar sobre as maneiras culturais de olhar e seus efeitos

sobre cada um de nós. Por isso não nos enganamos e pensamos

(sabemos) que não vemos o que queremos ver, mas sim aquilo que nos

fazem ver, o que descentra a preocupação por produzir significados e a

desloca para indagar a origem – os caminhos de apropriação de sentido

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– a partir dos quais viemos aprendendo a construir os significados; o que

nos leva a explorar as fontes das quais se nutre não apenas a nossa

maneira de ver/olhar, mas os significados que fazemos nossos e que

formam parte de outros relatos e referências culturais (HERNANDEZ,

2011, p. 34)

A relevância de tomar artefatos midiáticos, como os advergames, como

objeto de estudo incide na emergência da imagética do consumo, como admite

Duncun (2011), e na naturalização das tecnologias no cotidiano dos nascidos no

fim do século XX e começo do XXI (IBOPE, 2010). Ao considerar que a diversão

oferecida por esses jogos traz, também, conteúdos ideológicos, faz-se necessário

convidar à reflexão os sujeitos a que se destinam a fim de que reflitam

criticamente sobre as autorrepresentações que lhes são vendidas.

Várias reconfigurações foram necessárias até que esta investigação fosse

levada adiante, negociações e rearranjos descritos na metodologia. É importante

esclarecer desde já que esta pesquisa se desenvolve a partir de uma abordagem

qualitativa e pós-crítica, construindo uma metodologia alicerçada nos princípios

da bricolagem. Para aproximar-me da questão norteadora, construí uma

argumentação que se inicia no capítulo 1 com uma explanação sobre jogos e

publicidade e, também, advergames. O capítulo dois examina questões da

educação da Cultura Visual e das mídias sob a perspectiva das pedagogias

culturais. A metodologia está explicitada no terceiro capítulo, acompanhada de

uma descrição detalhada de “Mais Fanta, mais diversão”. O capítulo quatro

apresenta os conceitos de juventude e examina diferentes entendimentos dessa

ideia a partir das falas dos sujeitos colaboradores. No quinto capítulo faço uma

análise de alguns aspectos salientados pelos participantes sobre a narrativa de

Fanta, reiterando algumas observações e críticas sobre suas visões em relação à

noção de juventude contemporânea.

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CAPÍTULO 1 – TUDO ISSO É SÓ UM JOGO?

Conceitos essenciais acerca dos jogos

1.1 “SOU UM JOGADOR, TENHO MUITAS VIDAS” – O alcance dos

games na sociedade contemporânea

Roger Silverstone (2005), com a inquietante pergunta (e título de seu livro)

“Por que estudar as mídias?”, chama atenção para o avanço de artefatos como a

TV e o computador sobre o nosso cotidiano. O autor adapta a noção de

encantamento1 de Alfred Gell às mídias, uma vez que as sociedades, inclusive a

nossa, “encontram na tecnologia uma fonte e uma esfera de magia e mistério” (p.

49). As tecnologias midiáticas, para Silverstone, tem um grande poder sobre o

nosso imaginário: causam aflição, dependência e alegria, por exemplo. Diante

disso, o autor considera ser necessário “começar a ver a tecnologia como cultura:

ver que as tecnologias, no sentido que inclui não só o quê, mas também o ‘como’

1 “Ele [Gell] a emprega para descrever as tecnologias de encantamento que os humanos criaram para ‘exercer

controle sobre as ideias e ações de outros seres humanos’ (GELL, 1988, p. 7), referindo-se com isso (...) a todos

os artefatos intelectuais e práticos que surgiram para nos permitir expressar toda a gama das paixões

humanas” (SILVERSTONE, 2005, p.49)

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e o ‘porquê’ da máquina e seus usos, são objetos e práticas simbólicos e materiais,

estéticos e funcionais” (idem, p. 50). Incluídos como mídia e tecnologia, é preciso

lançar sobre os advergames um olhar curioso capaz de nos permitir vislumbrar

seu papel cultural na sociedade de hoje.

É exatamente sobre mídia e publicidade que esta pesquisa trata. A ideia é

perceber as construções contidas na mensagem publicitária narrada por meio do

jogo eletrônico desenvolvido para Fanta. Para isso é preciso ter em mente que o

largo alcance dos jogos eletrônicos está gerando mudanças socioculturais e

criando um novo ambiente midiático. Pode-se dizer que hoje, esses artefatos

estão inaugurando uma nova matriz cultural. Vale a pena esclarecer a noção de

cultura que utilizamos ao considerá-los artefatos culturais. Nesse sentido, tomo o

conceito de cultura como a produção social de significados que instauram formas

de vida e políticas de identidade (HALL, 1997).

Amparada por Hall e pela compreensão similar de cultura proposta por

Geertz, Shaw (2010) investiga como jornalistas e estudiosos caracterizam, a seu

modo, o que chamam de “subcultura” dos games. A autora chama atenção para o

fato de que as definições do mainstream costumam ser opostas às da academia.

Enquanto a mídia esteriotipa os jogadores como jovens, homens, brancos e

geeks2, pesquisadores (COPELAND, 2000; PHAM, 2007 apud SHAW, 2010)

afirmam que a diversidade de perfis não pode ser reduzida a essa imagem, mas,

de toda forma, concordam que é impossível negar que o universo dos gamers é

marcado pelo uso de jargões, senso de solidariedade e até modos de vestir

(idem/figura 1), ou seja, é marcado pela produção e comunhão de significados

culturais.

2 Gíria que designa pessoas excêntricas e aficionadas por tecnologias.

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Outra amostra de como o universo dos jogadores está repleto de códigos e

experiências tanto produzidas quanto mediadas pelas tecnologias é o evento

Campus Party. Com edições brasileiras desde 2006, é descrito no site como: “o

maior acontecimento tecnológico do mundo! Criada há 16 anos na Espanha, ela

atrai anualmente geeks, nerds, empreendedores, gamers, cientistas e muitos

outros criativos que reúnem-se para acompanhar centenas de atividades sobre

Inovação, Ciência, Cultura e Entretenimento Digital” (CAMPUS PARTY, 2014). Em

convenções semelhantes à Campus Party, considerando o foco em tecnologias ou,

ainda, em cultura pop e oriental, como o festival cearense Sana, aficionados por

jogos chegam a transformar-se momentaneamente nos personagens com quem

interagem por meio da caracterização cosplay (figura 2).

Figura 1 - Camiseta usada por possível jogador.

Tradução: Eu não preciso de uma vida, sou um jogador, tenho várias vidas.

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Figura 2- Cosplays dos personagens do game Halo

A visão sobre os games como produtos culturais tem sido assunto inclusive

do mundo da arte. Em 2012, o MOMA - Museu de Arte Moderna de Nova York -

incluiu em seu acervo pelo menos 14 títulos clássicos de jogos eletrônicos

disponíveis para que o público interagisse. A exposição apresentou os jogos como

expressões contemporâneas de design criativo, mas a curadora Paola Antonelli,

em nota na internet, revelou vê-los para além disso: “um jogo pode ser

propositalmente projetado para treinar ou educar, para induzir a emoções, testar

novas experiências ou questionar como as coisas são e pensar como elas

poderiam ser”3 (ANTONELLI, 2012).

As reações à novidade do MOMA tem gerado controvérsias. Sobre isso, o

crítico de cinema norte americano Roger Ebert, por exemplo, publicou em abril de

2010 o artigo Video games can never be art4, título que é autoexplicativo. Seu

texto responde a uma palestra proferida por Kellee Santiago, designer de games,

3 Do original: “A purposefully designed video game can be used to train and educate, to induce emotions, to

test new experiences, or to question the way things are and envision how they might be”. 4 Em livre tradução: “Videogames nunca poderão ser arte”. Disponível em <www.rogerebert.com>

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que atesta que os videogames já são arte. Ebert afirma, entretanto, que nenhum

jogador viverá o suficiente para ver os games como arte, pois ele tende a ver a

arte como criação de um indivíduo5. Ele considera que há artistas talentosos, os

gênios, e o que faz alguns melhores que os outros é questão de gosto. Por fim,

diz que uma diferença crucial entre jogos e obras de arte é que há competição e

vitória nos primeiros, enquanto à arte só cabe a contemplação, a experiência

(EBERT, 2010 a).

Em resposta a Ebert, Mendonça e Freitas (2011) resgatam o conceito de

“experiência estética” de John Dewey (2010) para verificar as potencialidades dos

jogos digitais. De acordo com Dewey, o observador (especialmente de arte) age

sobre a produção de sentidos a partir da imagem, pois o processo de recepção é

ativo, único e pode resultar na experiência estética (idem). Segundo Mendonça e

Freitas (2011, p. 149) “para ser considerada estética, uma experiência deve assumir

uma dimensão singular ao promover o arrebatamento da criatura viva da

experiência ordinária”. Afirmam, ainda, que é possível que alguns jogos envolvam

o jogador de tal forma que lhe permita vivenciar uma experiência como a estética.

Diante das críticas, o próprio Ebert publicou três meses depois do primeiro artigo

Ok, kids, play on my Law (2010 b). Nesse texto, o crítico não volta atrás em seu

posicionamento, mas admite ter sido tolo (fool) ao falar sobre algo que

desconhece. Admite ainda que, depois das réplicas ao primeiro artigo e de ter

sido presenteado com vários games, testou Shadow of the Colossus e apreciou a

experiência. Seu novo posicionamento retoma a dúvida em torno do conceito de

arte para dizer que talvez os jogadores desfrutem nos games de sensações

semelhantes às suas ao ler/ver/ouvir certas obras, livros, filmes ou músicas que

considera arte.

5 Do original: “I tend to think of art as usually the creation of one artist.”

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Nessa discussão cabem vários tipos de argumento, mas sua própria

existência reitera a importância dos jogos eletrônicos nas sociedades de hoje.

Assim, participando do cotidiano de pessoas de várias faixas etárias, os games

fazem parte de uma cultura visual contemporânea midiatizada, da qual falaremos

adiante. São capazes de articular significados e habitar o imaginário de tal forma

que já não é possível desconsidera-los como força e potência nas experiências

humanas (SILVESTONE, 2005).

Para Moita (2005), que estuda jogos eletrônicos relacionando-os ao

currículo, às práticas e às motivações dos jovens de hoje, o que diferencia uma

geração de outra não é somente a faixa etária, mas, principalmente, os conteúdos

que cada uma delas simboliza. A autora defende que os jogos eletrônicos

associam-se bem à imagem da juventude contemporânea, pois “representam para

a cultura lúdica infantil e juvenil não só o que há de mais moderno e inovador em

matéria de diversão eletrônica. Também aparentam ser a expressão cultural do

processo de mundialização que, em última instância, ‘co-habita e se alimenta’ das

culturas e dos imaginários locais e regionais” (ORTIZ, 1994 apud MOITA, 2005).

Rushkoff (1999, p. 33 in ALVES, 2005) chama essa juventude de

screenagers, ou geração que “(...) nasceu [a partir da] na década de 1980 e

interage com os controles remotos, joysticks, mouses, internet, pensam e

aprendem de forma diferenciada. Aprendem com a descontinuidade, aceitam que

as coisas continuem mudando sem se preocupar com um final determinístico”.

A geração screenager convive com os jogos inclusive na escola e foi a

crescente invasão dos games nas salas de aula que levou estudiosos da educação

a analisar também sua influência nesse espaço. Pesquisas constataram (CORREA e

FANTIN, 2011; MENDES, 2006) a melhora no aprendizado curricular e a aquisição

de competências cognitivas entre crianças jogadoras de games educativos. No

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capítulo seguinte trataremos sobre a relação entre jogo e educação, entretanto,

veremos logo adiante, ainda nesse capítulo, que não são exatamente os jogos

educativos que permeiam o cotidiano dos jogadores.

Para além das consequências positivas sobre o conteúdo regular, é possível

e importante abordar os jogos eletrônicos, de todas as naturezas, e investigar seu

papel social, pois, conforme Fantin e Correa (2011, p. 11), “concebidos como

produções culturais, os videogames implicam produções de sentido que se dão a

partir da articulação das esferas de produção, mediação e recepção”. Falemos

então sobre as crianças screenagers.

1.2 NOVOS BRINQUEDOS PARA NOVAS CRIANÇAS – Games, infância e

juventude

A importância dos games como lugar de aprendizagem está sendo

intensificada pelo seu reconhecimento em instituições empresariais, militares e

por escolas que cada vez mais os utilizam como recurso pedagógico. Como

estratégia para gerar interesse e motivação, eles evocam mensagens culturais e

articulam campos de significado social através dos quais os jogadores se sentem

partícipes na arquitetura desses cenários ou gestores desse mundo imaginário.

Para Shaffer et al (2004, p. 4 e 5), isso acontece porque:

Nos mundos virtuais, aprendizes experimentam realidades concretas que

palavras e símbolos descrevem. Através dessas experiências, em

múltiplos contextos, estudantes podem entender conceitos complexos

sem perder a conexão entre ideias abstratas e os problemas reais que

podem ser usados para solucionar6.

6 Do original: “In virtual worlds, learners experience the concrete realities that words and symbols describe.

Through such experiences, across multiple contexts, learners can understand complex concepts without losing

the connection between abstract ideas and the real problems they can be used to solve”.

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No entanto, vale salientar que não são os jogos educativos os mais

presentes no dia a dia da geração screenager. Em 2013, o título Pro Evolution

Soccer 2013 dominava o ranking dos games mais comprados (VEJA, 2013). No

ano seguinte, o site especializado em jogos eletrônicos UOL Jogos, apontou que

League os legends foi o preferido daquele ano. É claro que tais dados precisam

ser reconsiderados e atualizados com frequência haja visto sua efemeridade

diante de uma indústria em constante avanço. Junto a esses números, pesquisas

indicavam que até 2014 cerca de 70% das organizações globais já teriam ao

menos uma aplicação gameficada (PETTEY, 2011) sendo que “(...) as marcas

voltadas ao público infantil (Nestlé, Danone, McDonald’s, Burger King, Nutrexpa,

Kellogs etc.) são as principais impulsionadoras dos advergames7 e as que mais

jogos desenvolveram em seus websites8” (NOGUERO, 2010).

O interesse das empresas em desenvolver advergames para crianças se

justifica pelo fato de que 45% dos jogadores de games é menor de 18 anos

(DAHL, EAGLE e BÁEZ, 2009) e dois terços das crianças entre 5 e 14 anos que

acessam a internet, o fazem especificamente para jogar (DAHL, EAGLE E BÁEZ,

2009). Esses dados revelam que as crianças ainda são os principais usuários dessa

forma de entretenimento.

Assim como os games são companhia cada vez mais assídua das crianças, o

temor a eles é presença constante na vida de pais e educadores justamente

porque a sua inserção é mais intensa entre elas. Esta condição preocupa porque

as crianças “particularmente podem não estar aptas a identificar ou avaliar o

material; junto a isso, sua falta de habilidades cognitivas ou críticas pode torna-las

7 Junção das palavras advertising com videogame, caracteriza uma nova proposta interativa desenvolvida pela

industria publicitária para fortalecer a relação dos consumidores com as marcas. 8 No original: “De ahí que las marcas dirigidas a un público infantil (Nestlé, Danone, McDonalds, Burger King,

Nutrexpa, Kellogs, etc.) sean las principales impulsoras del advergaming y las que más juegos han

desarrollado en sus páginas web”.

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especialmente vulneráveis às comunicações persuasivas” (DAHL, EAGLE E BÁEZ,

2009, p. 3). Analisando portarias publicadas pelo Ministério da Justiça sobre a

classificação indicativa dos jogos eletrônicos no Brasil, Alves (2005, p. 77) constata

que “os pais tem muito mais medo dos videogames do que da televisão”.

Ao falar da incidência das mídias sobre as crianças, tendo como objeto

específico as propagandas voltadas para o público infantil, Nascimento (2010)

alerta para a existência da ideia de “vulnerabilidade das crianças em relação à

publicidade”. O autor, contudo, discorda da iniciativa de preservar uma distância

ou, uma margem de segurança entre as crianças e as mídias. Ao contrário,

defende a “importância de promover discussões, de cunho pedagógico, a partir

do universo televiso, atentando para as interpretações que as crianças fazem a

partir do que assistem na TV” (p. 32).

De forma análoga, podemos dizer que mais efetivo do que evitar o acesso

das crianças aos games e advergames é incluí-las em debates sobre a recepção

dessas imagens/mensagens munindo-as de criticidade para uma interação

reflexiva. É esse o caminho que buscamos apontar nesta investigação.

1.3 VIVÊNCIA A PARTE DA VIDA - Conceito(s) de jogo

Parece consenso entre pais e educadores que é por meio da brincadeira

que as crianças descobrem o mundo e adquirem seus primeiros conhecimentos.

Antes mesmo de nascerem, seus quartos já as esperam decorados com animais de

pelúcia, bolas, carrinhos ou bonecas. Seus primeiros pertences, afora as peças de

vestuário, são os brinquedos. Na escola conhecem cores, números e partes do

corpo brincando com coleguinhas e seguem experimentando outras

possibilidades lúdicas individualmente ou em grupo: quebra-cabeças, pique-

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esconde, damas, entre outras. Ainda na infância a brincadeira começa a aproximá-

las do mundo adulto de forma lúdica: “[o jogo] é um canal de comunicação que

permite à criança a apropriação do mundo que, a princípio, e aparentemente,

pertence somente aos adultos” (SANTOS, 2005, p. 50).

À medida que crescem, as crianças vão se interessando cada vez menos

pelos brinquedos, mas as brincadeiras continuam como parte do cotidiano juvenil:

baralho, boliche, jogos eletrônicos, esportes, jogos de/com palavras (literatura e

música) e até jogos de conquista. Esses prazeres lúdicos muitas vezes seguem

conosco por todas as etapas da vida. Existem, contudo, jogos de variadas

naturezas e ainda assim é possível classificar igualmente como jogo atividades

bem distintas, como: lançar um peão, participar de uma partida de futebol ou

jogar pôquer. O que, então, limita o que entendemos por jogo?

Em seu livro Homo Ludens, Johan Huizinga (1999) caracteriza o ser humano

não como sábio (homos sapiens), mas como jogador e toma o jogo como

elemento da cultura. Esse autor conclui que o lúdico, a brincadeira e o

divertimento são parte da natureza inclusive de espécies animais. Quando trata

dessas manifestações entre pessoas, Huizinga tenta explicar o jogo como “forma

significante, como função social” (idem, p. 6) e entende que é jogando que o ser

humano constrói e compartilha significados:

As grandes atividades arquetípicas da sociedade humana são, desde o

início, inteiramente marcadas pelo jogo. Como por exemplo, no caso da

linguagem, esse primeiro e supremo instrumento que o homem forjou a

fim de poder comunicar, ensinar e comandar. (...) Na criação da fala e da

linguagem, brincando com essa maravilhosa faculdade de designar, é

como se o espírito estivesse constantemente saltando entre a matéria e

as coisas pensadas. Por detrás de toda expressão abstrata se oculta uma

metáfora, e toda metáfora é um jogo de palavras. Assim, ao dar

expressão à vida, o homem cria outro mundo, um mundo poético, ao

lado do da natureza (HUIZINGA, 1999, p.7).

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O primeiro relato sobre a função social dos jogos, no entanto, data de mais

de três mil anos. Heródoto, geógrafo e historiador grego, descreveu como o povo

lidiano atravessou uma escassez de alimentos que durou quase duas décadas

distraindo-se com jogos de dados e bolas de gude, entre outros (MCGONIGAL,

2012). Seja real ou apócrifo (como dizem alguns historiadores), o registro

atribuído a Heródoto aborda uma preocupação que continua atual: o papel dos

jogos na sociedade.

Em busca de um conceito de jogo a partir das características desta pesquisa

chegamos ao dado por Huizinga. Sua colocação nos ajuda a compreender a

unidade existente entre o lançamento de um peão, uma partida de futebol e o

pôquer:

O jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de

certos e determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras

livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um

fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de

alegria e de uma consciência de ser diferente da ‘vida cotidiana’ (1999, p.

33).

Roger Caillois (1990) admite a definição de Huizinga e lista ainda seis

características que definem os jogos como atividade:

1) Livre: o jogador participa somente por vontade;

2) Delimitada: dentro de espaço e tempo definidos para tal;

3) Incerta: com desenrolar não definido;

4) Improdutiva: não gera bens;

5) Regulamentada: sujeita a regras claras e aceitas pelos jogadores;

6) Fictícia: a parte da vida.

Caillois (1990, p. 24), contudo, ressalva que Huizinga ao “apresentar o jogo

como uma ação destituída de qualquer interesse material exclui pura e

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simplesmente as apostas e jogos de azar”. Para ele, ao entrarem em apostas, os

participantes se comprometem com as normas dos jogos estando sujeitos a

perder ou ganhar o que foi negociado como prêmio. Coerente com sua própria

colocação de que o jogo não gera bens e atento ainda ao que diz Huizinga sobre

a finalidade do jogo, Caillois defende que nos jogos de azar “há deslocação de

propriedade, mas não produção de bens. Dizendo melhor, esse deslocamento só

afeta os próprios jogadores e unicamente na medida em que eles aceitarão de

decisão livre, renovada a cada jogada, a eventualidade de tal transferência”

(CAILLOIS, 1990, p. 25, grifo do original). Quando os participantes – lutadores,

enxadristas, apostadores etc. – entram em confronto por uma recompensa externa

à disputa não devem ser tomados por jogadores, mas por trabalhadores.

Mcgonigal (2012), que se lança ao desenvolvimento e teorização de jogos

eletrônicos, também compartilha como Huizinga algumas definições essenciais

para o que entende por jogo, a saber:

Metas: são resultados que os jogadores devem alcançar;

Regras: limitam e orientam as ações no jogo;

Sistema de feedback: garante aos envolvidos metas alcançáveis e os estimula a

continuar na disputa;

Participação voluntária: exige a anuência dos participantes para os três itens já

listados e os coloca em nível de igualdade.

Considerando os vários entendimentos e, principalmente, a necessidade de

estabelecer um limite para o objeto desta investigação, daqui para frente

consideraremos os jogos como interações cuja participação seja voluntária, tenha

regras claras e aceitas pelos participantes, um fim em si mesmo, recompense os

envolvidos de forma material ou mesmo por sentimentos como alegria, além da

notável distinção com a vida real.

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1.4 FAZER BRINCANDO - Princípios da gamificação

Como apresentei na sessão anterior, Huizinga (1999), Caillois (1990) e

Mcgonigal (2012) se apoiam no princípio de que os jogos praticamente

acompanham o desenvolvimento das sociedades, seja ajudando a criar e

compartilhar significados ou colaborando para a superação de momentos de

crises, por exemplo. O princípio dos jogos, portanto, não é novo e consiste em

oferecer divertimento como recompensa a quem executa determinada atividade.

Dessa forma, por meio da diversão, torna-se possível gerar um maior

envolvimento das pessoas em tarefas que se tornam gratificantes (HUIZINGA,

1999).

O emprego do princípio dos jogos a situações cotidianas tem crescido de

maneira exponencial desde o final do século XX, dando origem ao termo

gamification ou, numa versão aportuguesada, gamificação. A palavra foi usada

pela primeira vez em 2008 por empresas de mídias digitais (DETERDING et al,

2011). Seu uso é controverso gerando sentidos pejorativos que surgiram entre os

designers de jogos eletrônicos e as indústrias midiáticas (idem). Além disso, há

contradição, pelo fato de que este princípio também é aplicável a atividades não

eletrônicas.

Deterding et al (2011) apontam dois possíveis caminhos para explicar a

gamificação. Uma abordagem mais pontual a vê como uma influência dos

(video)games sobre a vida cotidiana e seus modos de interação. A outra, mais

ampla, também alicerçada sobre videogames, ressalta que o tipo de interação

promovida por eles oferece experiências positivas, motiva os jogadores a

permanecerem engajados em experiências intensas e duradouras – embora não

necessariamente experiências eletrônicas.

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A última concepção parece ter obtido maior alcance. A empresa Bunchball

(que se apresenta como líder em gamificação no mundo), por exemplo, resume o

termo como sendo “aplicar mecanismos dos games a atividades que não são

jogos para mudar o comportamento das pessoas”9 (BUNCHBALL, 2010, p. 2) e

afirma que é possível usar tal dinâmica no mundo dos negócios, da política e da

educação, entre outros, para gerar participação e engajamento. Em seu artigo

sobre gamificação e educação, Lee & Hammer (2011) resumem o termo como

sendo a aplicação de mecanismos, dinâmica e estrutura de jogos para promover

comportamentos desejáveis e focam sua atenção nas possibilidades abertas ao

campo da educação.

A gamificação pode ser (e tem sido) aplicada a disciplinas escolares para

facilitar o aprendizado, já que por meio de jogos, sejam eles digitais ou não, os

estudantes – em vez de aprender por abstrações - aplicam os conteúdos a

situações simuladas de realidade (SHAFFER et al, 2004, p. 4 e 5). Usos industriais,

militares e acadêmicos também tem acontecido porque “simuladores de jogos são

muito eficientes (e economicamente viáveis) para o treinamento de soldados,

pilotos, motoristas, pois evitam que o ser humano coloque em risco a própria vida

em um treinamento inicial de algo perigoso e pouco conhecido” (MENDES, 2006,

p. 10).

Como recurso publicitário, exemplos de gamificação foram desenvolvidos e

postos em prática por empresas como a multinacional Volkswagem. O site da

indústria automobilística <www.thefuntheory.com> disponibilizou experiências

filmadas que mostram o divertimento levando pessoas a mudar sua relação

consigo mesmas, com o meio ambiente e esforço físico, por exemplo. Em um dos

vídeos (fig. 3) os degraus da escadaria de uma estação de metrô foram

9 No original: “gamification applies the mechanics of gaming to nongame activities to change people’s

behavior”.

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transformados em teclas de piano que emitiam sons musicais. A ideia era

incentivar hábitos mais saudáveis como usar a escada fixa em vez da rolante.

Mesmo exigindo mais disposição, o piano se tornou preferência absoluta em

relação à escada rolante ao lado.

Por oferecer potenciais de usos variados, que englobam desde aplicações

analógicas a eletrônicas, entendo o conceito de gamificar no sentido mais amplo,

proposto por Deterding (2011), Bunchball (2011) e Lee & Hammer (2011), ou seja,

como o uso do princípio dos jogos a tarefas – sejam elas virtuais ou reais -

tornando-as prazerosas e envolventes.

Figura 3- Escada piano, parte do projeto ‘the fun theory’ da empresa Volkswagem

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1.5 A REALIDADE QUEBRADA - Por que os jogos encantam

Ao apresentar o conceito de gamificação, trouxe ao debate a posição

consensual de pesquisadores que consideram que o jogo, por princípio, envolve

os participantes e pode guiá-los a certos comportamentos. Se a adesão dos

jogadores é inicialmente voluntária, o que os motiva a seguir jogando? O que,

depois de uma perda, os leva a entrar em outra partida? Jane Mcgonigal (2010),

pode nos ajudar a pensar sobre como os jogos encantam.

A autora inicia essa discussão apresentando a opinião do economista

Edward Castronova sobre um “êxodo em massa” da realidade. Segundo

Castronova, “centenas de milhões de pessoas ao redor do mundo estão

preferindo renunciar à realidade [jogando videogames] por períodos de tempo

cada vez maiores” (apud MCGONIGAL, 2010, p. 13). Mcgonigal é taxativa ao dizer

que isso acontece por que a realidade está quebrada10, esgotou-se, não consegue

satisfazer e motivar as pessoas.

A pesquisadora, entusiasta do poder dos jogos para melhorar, de modo

geral, a vida das pessoas elenca quatro motivos pelos quais os jogos podem

proporcionar essa melhora:

1) aumentam a produtividade pelo prazer (blisfull productivity);

2) conferem otimismo imediato (urgent optimism);

3) estimulam relações sociais (social fabric);

4) proporcionam realizações com sentidos épicos (epic meaning).

Apresentando títulos de games eletrônicos para ilustrar cada um dos itens

listados anteriormente, Mcgonigal (idem) defende suas ideias. Comecemos pela

10 Reality is broken é o título original de seu livro que em português se chama A realidade em jogo.

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produtividade prazerosa. Imagine um trabalhador cuja função é, em uma linha

de montagem de computadores, soldar as placas do processador. O funcionário,

muitas vezes, sequer conhece o modelo final do computador que ajudou a

produzir e ainda é pressionado para cumprir metas ou acelerar a produção sem

nenhuma gratificação imediata. Esse tipo de situação não o motiva, ao contrário, o

desestimula.

Em contraposição a esta situação desmotivadora, em um jogo, os esforços

do “trabalhador” são destinados a um objetivo claro e, a cada avanço ou

conquista, ele é agraciado com pontos, elementos que melhoram seu

desempenho, recompensas, vidas extras etc. Em World of Warcraft11 (figura 4), por

exemplo, a primeira tarefa do jogador é o auto aprimoramento. O personagem do

jogo precisa melhorar suas habilidades e o faz desenvolvendo talentos, buscando

armas e trabalhando sua reputação, ou seja, o esforço resulta em recompensa

imediata. “A produtividade bem-aventurada é a sensação de estar imerso em um

trabalho que produz resultados óbvios e imediatos. Quanto mais nítidos os

resultados, e quanto mais rapidamente os atingimos, mais produtivos nos

sentimos” (MCGONIGAL, 2012, p.62).

11 World of Warcrat é um jogo Massive Multiplayer on line role-playing game (MMORPG), um jogo on line de

interpretação de personagens que permite a ação simultânea de vários jogadores. Cada participante controla

um personagem com profissão definida, certas habilidades e filiado a um clã. A interação se passa num

universo fantástico em que há guerras, alianças e aventuras místicas.

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Figura 4- Imagem do jogo World of Warcraft

Sobre o otimismo que caracteriza e acompanha os jogos, Mcgonigal

(idem) explica que um fracasso na vida normalmente nos deixa desapontados e

tristes. No entanto, se fôssemos indefinidamente bem-sucedidos nos jogos, eles

se tornariam entediantes. Como exemplo do erro positivo, a autora apresenta os

resultados de uma pesquisa desenvolvida no M.I.N.D. Lab, um centro de estudos

em psicofisiologia, sobre o jogo Super Monkey Ball 2 (fig. 5). O jogo consiste em

lançar bolas com macacos dentro em pinos de boliche, as bolas que não atingem

os pinos se rompem lançando os macacos no espaço.

A equipe da pesquisa monitorou jogadores e percebeu sua empolgação

mesmo quando erravam o alvo com a monkey ball. Essa satisfação provinha de

um fracasso espetacularmente divertido, pois o erro era recompensado por uma

divertida animação do macaco rodopiando até sumir no espaço. “Quando somos

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lembrados de nossas próprias ações de uma forma tão positiva, é quase

impossível não nos sentirmos otimistas” (MCGONIGAL, 2012, p. 75). Falhar no

jogo nos faz confiantes sobre nossa probabilidade de sucesso, além disso, “um

fracasso divertido é uma maneira de prolongar a experiência do jogo e estender o

processo de aprendizagem” (idem), pois indica outros caminhos possíveis para

alcançar a vitória.

Figura 5 – Imagem do jogo Super Monkey Ball 2

Quando se refere a estimular relações sociais, a autora acredita que

“qualquer dupla ou grupo de pessoas que jogue sistematicamente um jogo em

conjunto, seja on line ou presencial, terá mais oportunidade de expressar

admiração mútua, se dedicar a um objetivo comum, expressar simpatia quando as

outras perderem, e, até mesmo, se apaixonar” (MCGONIGAL, 2012, p. 91). O

terreno é fértil para possibilitar o estreitamento de laços de amizade ou mesmo

amor, principalmente por que os sujeitos compartilham o mesmo propósito e

para isso precisam trocar informações, ou seja, necessitam comunicar-se.

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O exemplo dado é Farmville (fig. 6), incluído na rede social Facebook. O

jogo consiste em gerenciar uma pequena fazenda, plantando frutas e flores,

criando animais e aumentando o tamanho da propriedade. Os jogadores podem

escolher entre os participantes, quem gostariam de ter como vizinhos, além de

oferecer e receber ajuda com a manutenção da fazendinha virtual. O jogo informa

quem colaborou de forma que o favor possa ser retribuído em troca de pontos.

“Não se trata de um bom substituto para a interação real, mas ajuda a manter

amigos e familiares em nossas vidas cotidianas. Do contrário, estaríamos muito

ocupados para permanecermos conectados” (MCGONIGAL, 2012, p. 91).

Figura 6 - Imagem do jogo Farmville

Por fim, o jogo oferece ao participante uma realização épica, a impressão

de fazer parte de algo maior que ele mesmo, uma comunidade ou uma

organização, por exemplo. Esse recurso também aparece como princípio

unificador de religiões e fraternidades, elemento que ajuda a manter o grupo

coeso. Para ilustrar essa ideia, vejamos o caso de Halo 3 (fig. 7). Os jogadores

trabalharam juntos para recrutar colaboradores, montaram estratégias e trocaram

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dicas, para, em 2009, alcançar o feito de exterminar 10 bilhões de inimigos

virtuais. Depois da façanha, os participantes trocaram felicitações e comemoraram

sua colaboração com a certeza de que participaram de algo épico realizado pelo

grupo - mesmo se tratando de uma ação sem consequências fora do mundo

virtual.

Mcgonigal lista motivos para estar no jogo, mas Huizinga (1999)

complementa e até mesmo avança nesse processo ao discutir o momento de

culminância, o ápice do jogo: a vitória. “Jogamos ou competimos ‘por’ alguma

coisa. O objetivo pelo qual jogamos e competimos antes de mais nada e

principalmente [é] a vitória” (p. 58). Ganhar por si só já dá sensação de prazer, mas

o autor afirma ainda que é preciso “gabar-se a outros de seus êxitos” (idem, p. 57).

Caillois (1990, p. 59) reforça as palavras de Huizinga sobre a importância de

uma plateia ou adversários no desenrolar do jogo:

Por mais individual que se suponha ser o manusear do brinquedo com

que se joga: papagaio, ioiô, pião, diabolo, passavolante ou arco,

deixaríamos rapidamente de nos divertir, se acaso não houvesse nem

concorrentes nem espectadores, por imaginários que fossem. Nestes

variados exercícios surge um elemento de rivalidade já que cada um

tenta ofuscar os seus rivais, talvez invisíveis ou ausentes, realizando

inéditas proezas, aumentando a dificuldade, estabelecendo recordes

precários de tempo, velocidade, precisão e altura, alcançando a glória,

mesmo que só para si, por uma qualquer proeza difícil de igualar.

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Figura 7 - Imagem do game Halo 3

Huizinga (1999) questiona, portanto, se é possível ganhar um jogo

individual, como Paciência, por exemplo, ou se o objetivo é apenas alcançado. Ao

ganhar e comemorar em grupo se conquista estima, prestígio, status. Nesse

sentido, seu argumento é diverso dos anteriores, mas deixa claro que o jogo

cativa pelo divertimento e recompensa por sua função social. A sociabilização é

também mencionada por Caillois (1990, p. 59) como motivação para envolver-se

no jogo, uma vez que “proprietários de brinquedos iguais reúnem-se num local

consagrado pelo hábito ou, simplesmente, que dê jeito, e é aí que avaliam a sua

habilidade, o que constitui, muitas vezes o essencial do seu prazer”.

Seja para fazer parte de um grupo, para alcançar a vitória ou para ser

otimista, o que se tem observado é um aumento progressivo do envolvimento das

pessoas com os jogos. Na próxima sessão tentarei apresentar ferramentas de

encantamento que configuram/caracterizam o conceito de lúdico nos dias de

hoje.

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1.6 VAMOS BRINCAR DE QUE? - O que se joga hoje

Os primeiros jogos eletrônicos datam da década de 50 do século passado.

Desenvolvidos em instalações militares americanas como um exercício de

exploração das possibilidades dos computadores disponíveis nas bases daquela

época, eram muito apreciados por visitantes e funcionários, mas nunca saíram

daqueles espaços (OLIVEIRA, 2010). Foi no início dos anos 60, entretanto, que

estudantes do Massachusetts Institute of Technology criaram o Spacewar (fig. 8).

Nele, cada um dos dois jogadores controlava uma nave espacial tentando

destruir-se mutuamente num espaço sem gravidade. O jogo se tornou tão

conhecido que os computadores comercializados na época passaram a sair da

fábrica com o aplicativo já instalado (MATOS, 2012).

Figura 8 - Jogadores experimentam Spacewar

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Desde os anos 60, os games se desenvolveram em uma sucessão

incontável de avanços tecnológicos. Tais avanços favoreceram o desenvolvimento

diversificado de jogos de vários gêneros e a incorporação de acessórios de

controle como instrumentos musicais e simuladores de voo. Os consoles agora

podem ser individuais e portáteis ou ainda podem permitir a ação de múltiplos

jogadores. Além disso, o acesso tornou-se facilitado pela possibilidade de jogar

conectado à internet ou mesmo por meio de celulares.

A partir de Spacewar as novidades no universo dos jogos eletrônicos não

param de crescer bem como a quantidade de jogadores, o tempo e a energia

investidos nessa atividade.

Jane McGonigal (2011) contabilizou que todos os jogadores de videogames

ao redor do globo, juntos, gastam atualmente 3 bilhões de horas por semana em

desafios on line. Somente no World of Warcraft (fig. 4) já foram gastos,

coletivamente, aproximadamente 6 milhões de anos jogando. O título do jogo é

tema da segunda maior enciclopédia colaborativa virtual do mundo, perdendo

apenas para a Wikipedia. A indústria cresce tão avassaladoramente que até

mesmo a movimentação financeira em torno dos games já ultrapassou a gigante

indústria do cinema (GRAU E VEIGL, 2011). Venticinque e Sollito (2012)

completam: Call of Duty 3, que narra uma guerra entre americanos e russos em

2016, vendeu só no dia de seu lançamento, em 2011, 400 milhões de dólares

enquanto o campeão de bilheterias de cinema do mesmo ano, o último filme da

série Harry Potter, arrecadou 381 milhões.

Se não é possível concluir qual é a brincadeira ou o jogo mais praticado do

mundo, diante desses dados se pode apreciar o alcance e a importância que os

jogos eletrônicos conquistaram atualmente. Eles estão fortemente presentes entre

as representações visuais que engendram o imaginário contemporâneo, operando

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como ferramenta de interação, recreação e persuasão. Diante disso, ganha força o

argumento de Silverstone (2005, p. 49) ao afirmar que “não se deve compreender

a tecnologia apenas como máquina. Ela inclui as habilidades e competências, o

conhecimento e o desejo, sem os quais não pode funcionar”. O autor afirma ainda

que “(...) as tecnologias são coisas sociais, impregnadas pelo simbólico e

vulneráveis aos paradoxos e contradições eternas da vida social, tanto em sua

criação como em seu uso” (idem, p. 60). Pensando nisso, trataremos no próximo

tópico sobre as valorações em questão quanto ao lugar do jogo eletrônico na

sociedade de hoje. É importante ressaltar que daqui em diante a palavra jogo será

utilizada como sinômino de jogo eletrônico.

1.7 OS 10 TOMATES – Sobre advergames

Embora a palavra advergame que surge no título deste tópico já tenha sido

citada anteriormente, é nesta sessão que pretendo analisá-la/discuti-la mais

detidamente, pois é fundamental para esta investigação. Nomeados pela

aglutinação das expressões advertising e videogame, os advergames são

estratégias mercadológicas que usam jogos especialmente desenvolvidos para

promover marcas, produtos ou pontos de vista (MARKETING FURUTO, 2013).

Parreño, Pérez e García (2010) acreditam que, devido ao grande funil que

empresas e profissionais da propaganda enfrentam pela atenção do público, a

publicidade - que já buscava alternativas para além de simplesmente apresentar

as vantagens de serviços e produtos - alcançou hoje um novo paradigma: passou

a solicitar ao espectador a colaboração na construção de valores para as marcas.

Dessa forma, afirma Noguero (2010), a comunicação já há algum tempo incluiu o

engajamento do público como parte da própria mensagem.

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A necessidade de interação encontrou na tecnologia e nas mídias sociais

campo fértil para desenvolver o advertainment. Soma das palavras advertising e

entertainment, advertainment são experiências lúdicas promovidas por empresas

para envolver seus clientes em vivências gratificantes e oferecer satisfação

pessoal. Nessa perspectiva, Noguero (2010) apresenta três novos tipos de

comunicação que se tornam possíveis: a bidirecional, a híbrida e o advergame.

Na internet e nas mídias móveis se dá a comunicação bidirecional. É o

anunciante que propõe a mensagem inicial, mas fica a cargo do espectador o

momento, o tema e a forma como se dará a comunicação (NOGUERO, 2010). Um

bom exemplo é a peça publicitária criada para a revendedora de automóveis

AUTOBEL (fig. 9) usando como recurso o álbum de fotografias da rede social

Facebook. Postados em sequência, desenhos vão evoluindo de acordo com a ação

do usuário e compondo uma animação stopmotion que mostra um personagem

entrando a pé na concessionária e saindo imediatamente com seu veículo. Para se

efetivar, a peça exige a ação do público, é seu interesse que determina a exibição

e há ainda a possibilidade direta de manifestar-se sobre o anúncio por meio de

comentários.

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Figura 9 - Exemplo de comunicação bidirecional Autobel no Facebook

A comunicação híbrida entre anúncio e informação acontece quando o

produto ou a empresa aparecem em outras mídias que não as tradicionalmente

publicitárias. É o que o autor chama de product placement e o que poderíamos

entender, grosso modo, como posicionamento do produto. Seria algo como

merchandising em novelas, clipes ou filmes, por exemplo, bem como revistas ou

programas com temas relativos ao anunciante (NOGUERO, 2010). As

demonstrações de uso de produto que acontecem em programas diários, como

Big Brother Brasil, ilustram bem esse tipo de comunicação. Parreño, Pérez e García

(2010) entendem que esse tipo de ação também se aplica a aparição de marcas e

publicidades em jogos (fig. 10), o que pode ser considerado por alguns estudiosos

como um advergame associativo, já que a marca está apenas associada à

interação, mas não é determinante para a trama.

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Figura 10 - Placas publicitárias compõem o cenário em ProEvolution Soccer

O advergame, por fim, é um jogo criado com a finalidade de divulgar

determinado produto, marca ou ideia. Exemplo claro das exigências por

interatividade do novo paradigma da publicidade, no advergame publicidade e

ludicidade se fundem na experiência do jogador envolvendo-o de forma que já

não é possível separar diversão e mensagem publicitária (NOGUERO, 2010). O

“Jogo dos 10 tomates”, da marca Hellmann’s, ilustra esse conceito. Nele, o jogador

é convidado a colocar personagens-tomates na embalagem. Os tomates

caracterizados como pessoas saltam de trampolins (fig. 11) até chegarem ao seu

objetivo: a bisnaga de ketchup. O caminho requer atenção do jogador ao mesmo

tempo em que, sem uma só palavra, a mensagem – cada embalagem de ketchup

contem 10 tomates - é passada.

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Figura 11 - Jogo dos 10 tomates

O panorama descrito até o momento apresenta o cenário contemporâneo

em que crianças e videogames dividem o mesmo espaço. Elas tem sido seu

principal destinatário, mas, talvez, não tenham consciência de seu papel como

jogadores nem mesmo de seus brinquedos como meios de difusão de ideias e

valores. Pensando dessa maneira, o próximo capítulo dará seguimento a esta

discussão abordando e analisando noções importantes sobre educação. Pretendo

apresentar o modo como conteúdos não curriculares, no caso os advergames, são

capazes de ensinar e que de tipo de conteúdo estão tratando.

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CAPÍTULO 2 – CONHECIMENTOS NECESSÁRIOS,

APRENDIZADOS POSSÍVEIS. Sobre educação e

jogos

2.1 VÁRIOS OBJETOS PARA UM CAMPO - culturas visuais e Cultura

Visual.

No capítulo anterior apresentei detalhadamente os games, parte essencial

desta investigação. Nele foram apresentados os conceitos de jogo e os princípios

da gamificação. Estão postos, também, debates sobre o encantamento que os

jogos proporcionam e, consequentemente, o papel de destaque que vem

alcançando na sociedade de hoje. O panorama apresentado permite perceber que

os games tem chegado, dentre outras áreas, à educação e às artes visuais. A

invasão dos games nesses campos de estudo é uma amostra de que estamos

modificando ou sendo modificados em relação à compreensão e, em decorrência,

ao modo como lidamos com atividades cotidianas até recentemente consideradas

supérfluas ou apenas entretenimento. Neste capítulo, pretendo contextualizar

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como transformações midiáticas e culturais vem dando forma a uma cultura visual

que nos cerca.

Quando uso a expressão cultura visual - com iniciais minúsculas - me

avizinho de Martin Jay em seus conceitos e reflexões sobre Regimes Escópicos da

Modernidade. Nele, Jay (1988, p. 31) retoma o conceito de “regime escópico” - de

Christian Metz - como “um conjunto de discursos e práticas que constituem

formas distintas de experiências visuais em circunstâncias históricas específicas”12,

para tratar dos marcos definidores sobre o que e como “ver” na modernidade. O

autor apresenta o que denomina “subculturas visuais”, que coexistiam e

contestavam-se de tal forma que proporcionaram múltiplas implicações sobre a

visão e as visualidades da modernidade em diante. Em vez de entrar no debate

proposto por Jay, me interessa destacar sua afirmação sobre o ocularcentrismo da

era moderna. Para ele, o “perspectivismo cartesiano”, a arte descritiva e o barroco

deram início a predominância do visual e elevaram a visão a sentido mestre, ou

seja, definiram, a partir de então, a primazia do olhar.

Mas é importante fazer um complemento às ideias Jay (1988) quanto à

predominância do visual a partir da era moderna. Embora a visão tenha ganhado

destaque com os três eventos citados por ele, visualidades anteriores a esse

momento histórico certamente já influenciavam percepções e pressupunham

interpretações. Tanto é assim que Mitchell (2002) rebate esse ponto, entre outros,

em seu artigo sobre as críticas feitas à Cultura Visual. Mitchell (2002) chama de

virada pictórica a predominância das mídias visuais sobre atividades verbais ou

escritas na cultura moderna. Para ele, não há uma obsessão pelo visual, como

muitos acreditam, mas “uma generalização e familiarização da presença do virtual

na realidade e no entendimento da realidade, facto que não é único do nosso

12 No original: “a set of discourses and practices constituting distinctive forms of visual experience in

historically specific circumstances” (Chaney, 2000, apud Menezes, 2003, p. 31, tradução minha).

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tempo, mas encontra situações similares ao longo da história da humanidade,

com sintomas de pânico e euforia em torno do visual” (CAMPOS, 2002, p. 58).

Ao tomar por objeto de pesquisa a interação de jogadores com

advergames, parto do princípio de que sentidos e significados estão sendo

configurados e investigados. Dizendo de outra forma, acredito que os games,

atualmente, estão influenciando o modo “como” e o “que” olhamos, ou seja, estão

moldando uma cultura visual contemporânea midiatizada. Daí a importância de

entrarmos no debate sobre o que vem a ser cultura visual.

Artefatos e fenômenos visuais “geram padrões estéticos, comportamentais,

enfatizam determinadas identidades de gênero” (GASPAR e GARCÍA, 2010, p. 51)

direcionando por meio de imagens e experiências visuais como devemos agir e

reagir socialmente. Esse entendimento pressupõe imagens como visualidades, ou

seja, artefatos dotados de sentidos culturalmente atribuídos. Assim, “as imagens e

outras representações visuais são portadoras e mediadoras de significados e

posições discursivas que contribuem para pensar o mundo e para pensarmos a

nós mesmos como sujeitos” (HERNANDEZ, 2011, p. 33).

Histórias em quadrinhos, cinema, arte, publicidade, grafite, arquitetura,

peças de vestuário, entre tantas possibilidades, são exemplos de artefatos que

agem sobre a forma como olhamos e percebemos o mundo hoje. Isso esclarece

porque, às vezes, a cultura visual é explicada como sendo “objetos materiais,

prédios e imagens, além de meios de comunicação e eventos baseados no tempo,

produzidos pelo trabalho e imaginação humana, que tem funções estética,

simbólica, ritual ou político-ideológicas e/ou práticas que apelam

significativamente para o sentido da visão”13 (WALKER e CHAPLIN, 2002, p. 16

13 No original: “aquellos objetos materiales, edificios e imágenes, más los medios basados en el tiempo y

actuaciones, producidos por el trabajo y la imaginación humana, que sirven para fines estéticos, simbólicos,

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apud GASPAR e GARCÍA, 2010). Entretanto, acredito que essa descrição lista

coisas/objetos que compõem (sub)culturas visuais14 com minúsculas, já que tais

artefatos tem papel importante e definido em determinados círculos sociais.

Quando instigado a delimitar cultura visual, Hernandez (2011) lista três

possibilidades que considera reducionistas e sem fronteiras bem demarcadas,

podendo se misturar entre si. O segundo de seus três conceitos15 entende a

cultura visual como “um guarda-chuva debaixo do qual se incluem imagens e

artefatos do passado e do presente que dão conta de como vemos e somos vistos

por esses objetos” (p. 33).

Esse entendimento se assemelha a uma história cultural da arte ao enfatizar

os contextos de produção, distribuição e recepção, ao mesmo tempo em que

situa o lugar onde o sujeito é colocado. Entretanto, essa posição acaba caindo

numa descrição do que é visto, já que temos a “ilusão de que dizer dá conta do

que vemos, quando na realidade, sempre vemos mais do que dizemos ver.

Esquecemos que o dizer é um caminho em direção à construção de experiências

(uma práxis) que subverte o que vemos e os efeitos do olhar” (HERNANDEZ, 2011,

p. 34).

Em seguida, Hernandez concebe a cultura visual – ainda sem caixa alta -

como “uma condição cultural que, especialmente na época atual, está marcada

por nossa relação com as tecnologias da aprendizagem e comunicação que afeta

como vemos a nós mesmos e ao mundo” e, continua, “isso significa que a cultura

visual não seria tanto um quê (objetos, imagens) ou um como (um método para

rituales o ideológico-políticos, y/o para funciones prácticas, y que apelan al sentido de la vista de manera

significativa”. 14 Ao incluir o prefixo sub não pretendo hierarquizar as culturas visuais ou inferir que haja uma hegemônica.

Ao contrátio, seu emprego nesse caso tem a intenção de nivelá-las considerando que haja muitas

coexistentes. 15 O primeiro dos apontamentos será abordado por último nesse texto por uma questão de coerência no

desenvolvimento dos argumentos.

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analisar ou interpretar o que vemos), pois se constitui como um espaço de relação

que traça pontes no ‘vazio’ que se projeta entre o que vemos e como somos

vistos por aquilo que vemos” (2011, p. 34).

Mesmo que não sejam hegemônicas, as mídias interagem e competem

com outras coisas no panorama de uma cultura visual do nosso tempo, ou seja, na

composição de forma(s) de moldar a maneira como enxergamos e lidamos com a

realidade.

A mídia é, se nada mais, cotidiana, uma presença constante em nossa

vida diária (...) É no mundo mundano que a mídia opera de maneira mais

significativa. Ela filtra e molda realidades cotidianas, por meio de suas

representações singulares e múltiplas, fornecendo critérios, referências

para a condução da vida diária, para a produção e a manutenção do

senso comum (SILVERSTONE, 2005, p. 20).

Enquanto Silverstone elenca entre as mídias veículos analógicos, como

rádio e jornal impresso, Martins e Tourinho (2011) enfatizam suas preocupações

com as imagens em movimento e as mídias digitais que, segundo eles,

potencializam e ampliam “(...) as formas de recepção e visualidades estendendo

seu alcance e impacto para a produção e a criação” e, ainda, tornaram-se

“veículo(s) propício(s) para estimular e catalisar expectativas, desejos e sonhos de

crianças, jovens e adultos susceptíveis (...) às influências do capitalismo cultural

eletrônico” (p. 56).

Creio que a segunda reflexão sobre cultura visual proposta por Hernandez

(2011) abre espaço para situar o debate acerca dos sentidos que jogadores de

advergames dão a esses artefatos. Meu interesse é mapear os caminhos pelos

quais essas tecnologias tem atraído ou conduzido seus adeptos na relação com

eles mesmos, com outros, com o mundo e com aprendizados. Ainda de acordo

com Hernandez (2011), não estamos falando de um “quê” ou de um “como”, mas

de uma relação, uma mentalidade, um afeto.

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Prédios, posters, filmes, desenhos, fotos, máscaras, imagens virtuais etc.,

são, enfim, objetos de interesse da Cultura Visual – agora com maiúsculas. Assim,

retomo o primeiro apontamento de Hernandez (2011), para definir a Cultura

Visual como “um campo de estudo transdisciplinar ou adisciplinar que indaga

sobre as práticas culturais do olhar e os efeitos desse olhar sobre quem vê” (p. 32).

Sem reivindicar limites disciplinares, a Cultura Visual transita pelos estudos

culturais, pelos estudos feministas, pesquisa em artes visuais, teorias sobre

fotografia e cinema, antropologia, história da arte, entre outros campos

(HERNANDEZ, 2011), buscando abordar as potencialidades de vários tipos de

imagem, artefatos e experiências para consolidar, descontruir ou questionar

processos interpretativos (NASCIMENTO, 2011).

A Cultura Visual, como campo de estudos, se aproxima da educação ao

investigar a construção de sentidos e significados advindos de experiências com

imagens e artefatos culturais predominantemente visuais16. A educação da Cultura

Visual, portanto, inclui nos seus debates, fenômenos e artefatos visuais

contemporâneos alheios ao currículo, estudando seus usos e efeitos sensíveis e

sociais. Investiga, também, a potência educativa desses artefatos para os

indivíduos, situando a escola como espaço de interseção entre alunos e

educadores, espaço onde se pode indagar, perceber e aprender através de formas

distintas de cotidianidade. Nascimento (2010, p. 213) explicita da seguinte

maneira os objetivos da educação da Cultura Visual:

É possível presumir que o [seu] interesse principal é tentar confrontar

diferentes modos de ver, dizer, pensar e fazer veiculados pelas imagens.

Questionar as interpretações existentes, atentando para as condições

históricas que contribuíram para tornar uma determinada afirmação

16 Em seu texto Show Seeing: a critique of visual culture, Mitchell (2002) responde também à crítica de que

não existem mídias exclusivamente visuais, mas apenas mistas. Para saber mais ver o artigo disponível em <

http://www.nyu.edu/classes/bkg/methods/mitchell.pdf>

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aceitável, e criar possibilidades para que outras possam surgir são as

provocações fundamentais da Educação da Cultura Visual.

Pautados pela educação da Cultura Visual, Tourinho e Martins (2011)

concordam com Nascimento (2010) quanto à escola como local e aos professores,

mais propriamente os de arte, como mediadores das discussões sobre as imagens

cotidianas e as produções simbólicas daí depreendidas.

Essas condições e circunstâncias [emergência da imagem digital e seu

uso pelas indústrias de entretenimento] apontam para a necessidade de

formar professores de arte preparados não apenas para analisar e

interpretar imagens, artefatos artísticos e tecnológicos, mas,

especialmente, para ajudar os alunos a compreender e desenvolver uma

atitude crítica em relação à indústria da imagem e do entretenimento

(TOURINHO E MARTINS, p. 56).

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, atualmente os

estudantes brasileiros devem receber formação para uma “cultura do cidadão

contemporâneo” (BRASIL, 1997, p. 19). Ainda segundo o documento, esses

saberes devem ser oferecidos já a partir do ensino fundamental por meio de um

trabalho conjunto entre as disciplinas curriculares. Dessa forma, professores de

português, educação física e geografia, junto aos demais, devem abordar em sala

de aula assuntos como ética, meio ambiente, consumo e pluralidade cultural.

Entretanto, esses pontos são definidos como temas transversais e dirigidos

especificamente aos professores de arte, que devem:

Problematizar situações em que os alunos tenham oportunidade de

perceber a multiplicidade de pensamentos, ações, atitudes, valores e

princípios relacionados, à ética; meio ambiente; orientação sexual; saúde;

trabalho, consumo e cidadania; comunicação e tecnologia informacional;

pluralidade cultural, além de outros temas locais definidos na

organização escolar (BRASIL, 1997, p. 38).

Na prática escolar, a disciplina de artes muitas vezes engloba tanto

atividades de música, teatro e dança, quanto as artes visuais. Se a educação da

Cultura Visual se detém em abordar imagens e experiências que desencadeiem

debates sobre gênero e sexualidade, mídia e entretenimento, entre outros,

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acredito que é preciso aproximá-las dos professores de arte visuais, encarregados

de instrumentalizar seus alunos para discussões e reflexões sobre o mundo

contemporâneo. Falarei mais sobre isso adiante.

Depois de apresentar essa modalidade de cultura visual que surge com os

games (advergames de modo específico) como o objeto desta investigação e a

Cultura Visual como terreno acadêmico da pesquisa, sigo com um esboço dos

primeiros traços deste objeto de estudo discutindo o “que” ou “como” os jogos

eletrônicos tem ensinado aos seus adeptos.

2.2 Um parêntese sobre arte, cultura visual e imagens da mídia

Não raro a Cultura Visual é acusada de rivalizar com a História da Arte

neglicenciando produções artísticas em nome de produções midiáticas, cultura de

massa etc. No tópico anterior, tentei esclarecer que esse campo de estudos não se

restringe ou privilegia determinados tipos de imagens, mas se preocupa em

verificar como são estruturadas as práticas do olhar a respeito dos artefatos

visuais. Ainda frente a esse julgamento vale lembrar que os limites do campo da

arte tem sido muitas vezes esgarçados pelos próprios artistas, curadores e críticos.

No começo do século XX, por exemplo, Duchamps subverteu a ideia do artista

como gênio criador com seus ready mades e a emblemática Fonte, de 1917. Em

meados do mesmo século, Andy Warhol transitava, sem pudores, entre

publicidade, cinema, música, galerias e museus. A produção em série e as

mercadorias de fácil consumo – como em Campbell’s soup can, de 1962, e Brillo

Box, de 1964 - marcam parte significativa de sua carreira artística.

Em se tratando de assuntos relativos a esta investigação – como

publicidade e games – não são poucos os exemplos de sua aproximação com o

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circuito da arte. O movimento pop art foi profícuo na apropriação indireta da

linguagem da mídia pela arte: “Um dos aspectos mais característicos e

perturbadores da arte pop é que, embora figurativa, ela se mostra incapaz de usar

diretamente a imagem observada” (LUCIE-SMITH, 2006, p.122). Além do já

mencionado Warhol, na década de 60 do século passado, outros artistas pop se

valeram da estética da cultura popular (midiática) para compor seus trabalhos.

Roy Lichtenstein pintou telas baseadas em retículas de serigrafia e traços de

histórias em quadrinhos. Tom Wesselmann (fig. 12) também produziu quadros em

que registrava bens de consumo e modos de viver de seu tempo.

Figura 12 - Still Life #35, Tom Wesselmann, 1963.

Nos anos 1970, o movimento feminista ganhou força. Artistas mulheres

exploraram questões de gênero usando linguagens consideradas até então menos

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nobres, como colagens e fotografias, e fazendo referências claras ao cinema e a

publicidade. Cindy Sherman explorou a fotografia em

uma série de autorretratos fotográficos iniciadas em 1977, mostra a

artista em poses e situações copiadas de filmes B. As referências são

cuidadosamente inespecíficas, mas Sherman apresenta as mulheres

americanas de sua geração, em geral e a si mesma, como produtos de

uma cultura saturada de imagens hollywoodianas, e por meio destas,

como vítimas da falsidade dos valores vigentes em Hollywood. Sherman

(...) levou ainda mais longe a análise de estereótipos do sexo feminino

em fotografias que parodiavam famosas pinturas dos grandes mestres e

em outras que usavam próteses médicas para construir quadros vivos

sexuais (LUCIE-SMITH, 2006, p.193).

Já Barbara Kruger usou sua experiência como editora de uma revista para

criar peças que unem fotografias (muitas vezes de arquivo) e textos enxutos

chegando “a um resultado muito semelhante ao obtido pelos criadores de

cartazes construtivistas russos” (idem, p.192). Afora as questões femininas, as

obras de Kruger apontam também para reflexões sobre consumo política (fig. 13).

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Figura 13 - I Shop, therefore, I am. Barbara Kruger, 1987.

Se valendo de veículos notadamente comerciais, as placas de outdoor (fig.

14), em 2011, o grupo Guerrilla Girls questionou a presença do nu feminino no

Metropolitan Museu de Nova York ao invés da presença feminina no espaço com

trabalhos.

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Figura 14 - Outdoor do coletivo Guerrilla Girls, 2011.

No Brasil, Cildo Meireles utilizou garrafas de Coca Cola em circulação no

mercado como suporte de suas inquietações no projeto “Inserções em circuitos

ideológicos”, de 1970, mostrando uma vez mais a estreita relação entre arte e

consumo. Na mesma linha, Banksy produz desde meados dos anos 2000 imagens

em grafiti que chamam a atenção para os problemas gerados pela concentração

de renda e pelo consumismo personificado em símbolos de marcas emblemáticas

(fig. 15).

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Figura 15 - Banksy

Em se tratando de games, uma amostra de sua relação com a arte é a já

citada exposição permanente de 14 jogos eletrônicos no Museu de Arte Moderna

de Nova York, o MOMA, aberta em 2012. Se ocupar o espaço do museu com

videogames não é suficiente, podemos ilustrar a pertinência de incluí-los nos

debates sobre arte e cultura visual por meio das obras alguns artistas.

Atento ao potencial das novas tecnologias e à cultura jovem, Cory

Arcangel17 se define como artista e empreendedor que produz um “monte de

coisas”18, desde internet, arte, música etc. A última atualização do site, espaço em

que divulga seus trabalhos, traz imagens da série Screen-agers, tall boys and

17 Para saber mais sobre Cory Arcangel acesse < http://www.coryarcangel.com/> . acesso em

06/10/2016 18 Na sessão de apresentação de seu site, Arcangel escreve: I am an artist and entrepreneur living

and working in Stavanger, Norway. This is my internet home. I tend to make alot of stuff - web, fine

art, music, etc, etc.

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whales. A exposição é composta por flutuadores em formato de macarrão

“vestidos” com objetos que caracterizam os jovens da contemporaneidade, que

Arcangel também define como screenagers. Os macarrões estão, portanto,

munidos de headphones, celulares, colares, meias e outros objetos. A relação de

Arcangel com a tecnologia está também em obras anteriores.

Em “QuickOffice”, de 2013, e “Room for squares”, de 2014, o artista usou

celulares e tablets touchscreen como suporte de seus experimentos. Ainda em

2005, sua obra Super Slow Tetris (fig. 16) foi exposta no Migros Museum für

Gegenwartskunst, de Zurique. Nela são discutidas a pressa e o imediatismo de

nosso tempo, pois o jogo - em que se deve encaixar peças a fim de formar linhas

- foi reprogramado (ou hackeado) de modo que cada bloco demora cerca de 8

horas até chegar à base da tela. Acompanhar o trajeto, segundo ele, “é

enlouquecedor” (ARCANGEL, 2015).

Entre seus vários trabalhos com videogames, Steph Thirion apresenta seu

portfólio que inclui música, fotografia e jogos eletrônicos por meio de um site19

cuja navegação acontece a medida que o usuário joga (fig. 17). Cada uma das

mídias ou informações sobre o artista são abertas quando o personagem

controlado pelo visitante aciona os comandos disponíveis.

Daniel Benmergui criou o jogo Today I die20 em que três possibilidades de

mundos (doloroso, escuro ou morto) são cenários a escolha do jogador para a

morte da personagem em 8 bits. Interessado em histórias, Benmergui está

desenvolvendo Storyteller21, jogo cuja tônica é a construção colaborativa de

narrativas.

19 <http://trsp.net/> acesso em 06/10/2016 20< http://todayidie.s3-website-us-east-1.amazonaws.com/> acesso em 06/10/2016 21 <http://www.storyteller-game.com/> acesso em 06/10/2016

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Figura 16 - Cartucho do jogo Tetris com interveção do artista

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Figura 17 - Jetpack girl, jogo que apresenta o artista Steph Thirion

Feng Mengbo é mais um exemplo do uso de videogames como meio

artístico. O chinês mistura jogos com questões políticas de seu país levantando

críticas sociais e convidando o público a jogar. Em 2008, seu trabalho Long March:

Restart foi exposto também no MOMA de Nova York, em uma tela gigante em

que os visitantes podiam controlar soldados do exército vermelho22.

22<http://www.moma.org/explore/inside_out/2010/02/04/new-acquisition-feng-mengbos-long-

march-restart> acesso em 06/10/2016

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Figura 18 - Long March: restart. Feng Mengbo.

O rol de nomes que se aproximaram dos videogames ou se apropriam

deles como suporte, linguagem ou experimento artístico vai bastante além dos

elencados. Esses artistas e suas produções compõem apenas uma nota não para

justificar o interesse pelo tema, mas para afirmar sua importância no que concerne

à educação e à cultura visual contemporânea.

2.3 L1 + > + R1 + > - O que se aprende com os games

Como os games mexem com a cabeça de crianças, adolescentes e jovens,

tem sido uma preocupação entre pesquisadores de várias áreas de conhecimento,

como psicologia e educação da Cultura Visual, entre outras. A ampla pergunta

que tem norteado essas investigações é: como os games nos ensinam? A seguir,

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apresento algumas questões recorrentes nas discussões sobre como mente e

corpo dos nativos digitais tem sido modificados por essa cultura visual.

Cláudio Mendes (2006, p. 10), ao analisar e construir relações entre jogos

eletrônicos e o conceito foucaltiano de subjetivação, lista algumas preocupações

sobre o que os games são capazes de ensinar:

(...) os jogos eletrônicos são considerados artefatos nada inocentes. Eles,

segundo a literatura, educam de alguma forma: educam para o consumo

(CABRAL, 2001); educam para a violência (CHILDREN & THE MEDIA,

2002; JOGOS DO MILÊNIO, 2001; AGUIAR, 2002); educam para os papéis

de gênero (CHILDREN & THE MEDIA, 2002). De uma forma ou de outra,

os estudiosos reafirmam seu papel pedagógico (PROVENZO JR. 1997;

LOPES, 2000; PIRES, 2002).

O autor centra sua análise nas relações que se estabelecem nas

comunidades de jogadores e seu entorno (lojas, revistas, sites e programas

dedicados a eles). Ele destaca dois aspectos da aprendizagem promovida pelos

games: Os jogos educam para o consumo à medida que hard e softwares se

tornam rapidamente obsoletos e exigem atualização, e educam o corpo

condicionando-o para uma economia de gestos e habilidades necessárias à

interação com personagens e cenários (MENDES, 2006). O primeiro aspecto é

relevante, contudo, não está intrinsicamente ligado ao uso dos jogos, mas às

indústrias que os produzem e promovem. Já o segundo aspecto, demanda um

pouco mais de atenção da minha parte.

Mendes destaca como primeiro aprendizado necessário para o jogo a

própria adaptação do corpo para captar e responder estímulos: posição das mãos

sobre os botões de comando, atenção auditiva e visual para identificar sinais

sonoros e imagéticos e interpretar suas mensagens. Para ele, o domínio de tais

técnicas conforma uma estratégia de governo, pois “a medida que o jogador

aumenta sua capacidade de dominar as proposições do jogo, este se torna cada

vez mais eficiente em educa-lo (2006, p. 72)”. Por outro lado, quanto mais hábil

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em relação aos comandos, mais o jogador pode autogovernar-se e resistir às

formas de governo do jogo ou ainda exercer poder sobre jogadores menos

habilidosos.

Fantin e Correa (2011) também investigam e buscam identificar o que se

aprende com os videogames. As autoras destacam o domínio de uma linguagem

própria dos jogos (específica em cada título) como um aprendizado essencial para

que haja interação. A medida que os sinais (visuais, sonoros e mesmo táteis23) são

decodificados, os jogadores podem organizar ideias e prever ações, ou seja, entrar

de fato no jogo.

Na pesquisa que desenvolveram, Fantim e Correa (2011, p. 09) aproximam

os games dos hipertextos, pois os entendem como narrativas participativas em

que o interator pode atuar – mesmo que dentro de possibilidades pré-

determinadas.

Diante de tais características (hiper)textuais, específicas dos videogames,

podemos ensaiar algumas hipóteses em relação às possíveis habilidades

necessárias para o que seria um “comportamento letrado” em

videogame. Como com a leitura e escrita, os videogames envolvem um

conjunto de habilidades e competências diversas: desde a capacidade de

identificar o significado dos ícones até o planejamento de jogadas a

partir de diferentes opções.

Em sua dissertação, Correa (2010) pergunta a um grupo de estudantes do

ensino médio, sendo parte de uma escola pública e outra parte de uma particular,

o que aprendem jogando The Sims24 (fig. 19). Além de decodificar símbolos e

organizar ideias, ela identificou que os jogadores citam entre as habilidades

desenvolvidas, o reconhecimento de padrões, a orientação espacial e a seleção de

informações pertinentes frente a vários estímulos simultâneos, entre outras. A

23 Em alguns consoles, como o PlayStation, o controle vibra de acordo com a interação no jogo. 24 The Sims é um jogo on line que simula a vida real. Nele os jogadores assumem o papel de personagens

que interagem com a família, vizinhança, trabalho e outros aspectos cotidianos da vida. A primeira versão foi

lançada em 2000, hoje existem versões temáticas, como a medieval, cinema e anos 70, 80 e 90. Na versão Ikea

Home Stuff os jogadores podem mobiliar e decorar a casa com produtos disponíveis na rede lojas Ikea.

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autora observa que a ideia de decodificar sinais se aplica, inclusive, à linguagem

em que o jogo opera, pois a aquisição de princípios de inglês (presentes em

comandos sonoros ou escritos na tela) está listada entre as competências que os

jogadores dizem trabalhar e desenvolver.

Figura 19 - Imagem do jogo The Sims 2 Ikea Home Stuff.

Nessa versão do jogo é possível comprar produtos disponíveis na loja para decorar a casa virtual.

Alves (2005, p. 209), em seu estudo sobre jogos e violência, relata sobre os

aprendizados comentados por seus colaboradores:

Percebe-se nas narrativas dos autores e atores que se aprende porque

há interação com o objeto do conhecimento, nesse caso, os games, que

demandam respostas rápidas diante de constantes desafios que exigem

soluções para os problemas, desenvolvendo estratégias, raciocínio

lógico-matemático e um pensamento hipertextual, caracterizado por

conexões e associações com diferentes janelas.

Para o médico e neurocientista Ramon Cosenza (2009) há ganhos

mensuráveis quanto à plasticidade cerebral daqueles que ele chama de nativos

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digitais, a geração que no capítulo anterior denominamos screenagers. Cosenza

explica que essa geração tem a memória operacional25 constantemente desafiada

ao executar várias tarefas simultaneamente. Esse pesquisador apresenta dados de

um levantamento realizado em 2006 sobre a realização de atividades entre os

jovens. Enquanto realizavam as atividades escolares, 84% dos adolescentes

americanos escutavam música, 42% assistiam TV e 21% faziam duas ou mais

atividades ao mesmo tempo em que estudavam. Sabemos que a realidade norte

americana não é exatamente a mesma de outros países, mas vale ressaltar que

existem tendências comuns entre eles. Segundo o neurocientista:

O envolvimento nessa quantidade de tarefas múltiplas, com seu fluxo

contínuo de informação, requisição de ações paralelas e mudança

contínua do foco de atenção, produz alterações no cérebro dos

indivíduos que a elas se submetem. Naturalmente, com o treino, eles

passam a ter maior habilidade. Essas pessoas desenvolvem, por exemplo,

uma atenção periférica mais eficiente e conseguem responder mais

rapidamente aos estímulos visuais (COSENZA, 2009, s/p).

Mendes (2006) soma aos aprendizados que os videogames proporcionam

saberes históricos e geográficos e, ainda, saberes mitológicos e ficcionais (grifos

do original). Esses saberes estão relacionados à temática ou ao pano de fundo em

que se constrói a narrativa do jogo. Como exemplo, ele cita o Endgame - jogo no

qual 16 capitais de países da Europa estão sob ameaça terrorista e, para não

seguir pistas erradas, é preciso ter noção de suas localizações. Cita, também, God

of War – em que o jogador encarna Kratus e luta contra os deuses do Olimpo e

criaturas mitológicas (fig. 20).

É importante ressaltar que os games não são desenvolvidos com a intenção

de educar ou ensinar - exceto os jogos educativos – mas, mesmo assim, o fazem

de modo indireto. Em artigo para uma revista semanal, Venticinque e Sollitto

25 Memória operacional ou memória de trabalho é a capacidade de manter na consciência as informações

necessárias para realizar uma tarefa em andamento, como extrair o sentido geral de um parágrafo ao final de

sua leitura, por exemplo (CONSEZA, 2009).

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(2012) apresentam exemplos de jovens que com base nos games tomaram

decisões para a vida. Foi o caso de um vestibulando que optou pelo curso de

ciências aeronáuticas a partir de sua identificação com os simuladores de voo e do

vencedor de um campeonato de jogo de corrida que tornou-se piloto profissional.

Figura 20 - Kratus com a cabeça da Medusa em frente à Acrópole

Ao abordar os aprendizados que eles proporcionam ou tornam possíveis,

estou tentando entender de que maneira essas ferramentas e temáticas

influenciam e agem sobre esse comportamento/prática cotidiano, visto que o

fenômeno da gamificação tem se mostrado efetivo.

Ao elencar informações sobre o ‘que’ e ‘como’ se pode aprender com

games, não é minha intenção ratificar uma influência positiva entre seus adeptos.

O fato é que, diante de novas mídias como computadores e consoles cada vez

mais acessíveis econômica e tecnicamente, por um lado é válido reconhecer o

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potencial formador/educativo dos games, mas, por outro, é imprescindível

aprender a lidar com o impacto e as interferências na educação escolar/formal.

Cosenza (2009), que constata vantagens dos jogos eletrônicos para o

desenvolvimento do cérebro dos jogadores, também diagnostica, entretanto,

problemas para essa geração. Sobre a memória operacional, por exemplo, ele

afirma:

Há evidências de que a memória operacional, mesmo sendo um pouco

modificável, não consegue exceder determinados limites, pois o cérebro,

que se desenvolveu ao longo da evolução de nossa espécie em um

ambiente muito diferente daquele encontrado no mundo moderno, tem

dificuldade no processamento simultâneo de uma grande quantidade de

informações. Além disso, ele não divide a atenção, mas faz uma

alternância rápida entre os diferentes focos, o que leva a um retardo nas

respostas e a uma perda na eficiência de processamento da informação

(COSENZA, 2009, s/p).

O pesquisador também constata que há maior propensão à obesidade e

diminuição das habilidades interpessoais entre os jogadores. Observa, ainda, que

a recompensa imediata conseguida nos jogos torna os nativos digitais

impacientes no que se refere a atividades que exigem concentração, como a

leitura de textos longos e atenção durante as atividades escolares.

Sobre a falta de interesse pela escola, Lee e Hammer (2011) afirmam que,

nos Estados Unidos, todos os anos pelo menos 1,2 milhão de alunos deixam de

concluir o ensino médio e a falta de compromisso é um dos principais motivos.

No Brasil, a evasão chega a cerca de 3,5 milhões de alunos do ensino médio

(dados de 2005) e as principais justificativas são a necessidade de entrar no

mercado de trabalho, falta de transporte ou doenças, mas, também, o

desinteresse (LOPES, 2010).

As soluções para manter os alunos brasileiros dentro das escolas passam

principalmente por questões estruturais, mas é importante também criar

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estratégias que os envolvam com o ensino e lhes recompensem de forma mais

clara do que apenas a expectativa de “um futuro melhor”. Lee e Hammer (2011)

sugerem que a gamificação do ensino pode ser de grande valia porque gera

engajamento, proporciona aprendizados aplicados e, sobretudo, valoriza o

exercício da tentativa e erro, princípio da pesquisa empírica.

Embora esteja indiretamente relacionada ao tema, a gamificação do

processo de ensino não é o foco desta investigação. Meu propósito é verificar as

implicações que os games tem para os aprendizados relacionados às novas

condições que a tecnologia cria e, de certa forma, tacitamente, impõe. Nesse

sentido, concordo com Lee e Hammer (2011) quando dizem que a “gamificação

vai fazer parte da vida dos estudantes nos próximos anos. Se pudermos guiar essa

energia, motivação e potencial dos games direto para o aprendizado, podemos

dar aos estudantes ferramentas para se tornarem recordistas na vida real26”.

Reconheço que tal afirmação carrega um tom excessivamente otimista e, em

decorrência, exige cautela e prudência. Mas, a propósito, no próximo tópico

discutirei os games como pedagogias culturais.

2.4 MÁQUINAS DE ENSINAR - Games como pedagogias culturais

Como vimos no último segmento quando nos perguntamos o que é

possível aprender com jogos eletrônicos, os videogames tem agido sobre seus

aficionados de modo a condicioná-los fisicamente para o próprio jogo, além de

favorecer a aquisição de conteúdos que servem de pano de fundo para as

narrativas e, ainda, exercitam a neuroplasticidade dos jogadores. Tais artefatos

26 No original: “Gamification will be a part of students' lives for years to come. If we can harness the energy,

motivation and sheer potential of their game-play and direct it toward learning, we can give students the

tools to become high scorers and winners in real life” (LEE and HAMMER, 2011, p. 4).

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tem exercido também grande impacto sobre a cultura infantil e juvenil infundindo

valores e preferências, legitimando determinadas concepções pessoais, instituindo

estéticas e, sobretudo, estabelecendo e reacomodando papéis para os indivíduos

na sociedade.

Chama atenção que a imensa produção, circulação e recepção de imagens

e artefatos visuais coincidam com a emergência das novas tecnologias, o que, de

maneira irreversível, converteu a cultura dos games no principal meio no qual os

jovens produzem cultura visual, compartilham aprendizagens, aprendem sobre

eles mesmos, sobre os outros e sobre o mundo em que vivem e atuam (AGUIRRE,

2014). As novas tecnologias eletrônicas funcionam como máquinas de ensinar e

de aprender que, de maneira subliminar, enunciam estratégicas pedagógicas

inculcando valores, imagens e identidades. É importante, por isso, verificar qual o

papel desse objeto como ferramenta pedagógica, uma vez que a “pedagogia é

um conceito que enfoca os processos pelos quais se produz conhecimento”

(GIROUX e SIMON, 1994, p. 98).

Se os games são dotados de potencial pedagógico, é preciso também

definir em que espaços abordá-los. Seria a escola um desses espaços? De acordo

com os Parâmetros Curriculares Nacionais, sim. Mas em seu debate sobre a

construção de um currículo escolar, Giroux e Simon (1994) chamam a atenção

para a resistência de políticas educacionais em abrir as portas das salas de aula

para a cultura popular. Por cultura popular, entenda-se:

Os produtos [da cultura de massa] em seus respectivos circuitos de

distribuição, enfocando-os não como textos, mas como eventos. Em

outras palavras, considerar não só a oportunidade em si de acolher

determinado produto, mas também as formas como esse produto é

utilizado ou absorvido (GIROUX e SIMON, 1994, p. 109).

É possível, portanto, classificar como cultura popular programas de TV com

discursos sobre gênero ali veiculados, esquetes humorísticas da internet e suas

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críticas explícitas, jogos eletrônicos e os apelos ao consumo neles contidos, entre

várias outras possibilidades. Os autores acreditam que para muitos educadores

prevalece o antagonismo entre cultura popular – organizada em torno do prazer –

e currículo – predominantemente instrumental. É como se a cultura popular fosse

inferior, “insignificante da vida cotidiana (...) indigna de legitimação acadêmica ou

alto prestígio social” (GIROUX e SIMON, 1994, p. 97) enquanto os saberes

curriculares servissem de base para o cumprimento das expectativas em torno de

papeis sociais/profissionais.

Giroux (1997) explica essa ruptura entre o currículo escolar e experiências

cotidianas na vida dos alunos tomando a escola como uma instituição social

ligada a aspectos econômicos e políticos do país. Para ele, existe um ensino tácito

embutido tanto nos conteúdos quanto nas relações sociais em torno da sala de

aula que reiteram certos interesses ideológicos. É o que chama de “currículo

oculto”, que “tem servido para reproduzir as ideologias tecnocráticas e

corporativistas características das sociedades dominantes” (GIROUX e MCLAREN,

1994, p. 128).

Enquanto algumas políticas educacionais ainda resguardam ideologias

dominantes e reduzem a experiência do estudante com o aprendizado ao seu

desempenho imediato, há educadores preocupados em ajudá-los “a

compreenderem que o conhecimento não é apenas variável e relacionado com os

interesses humanos, mas também deve ser examinado com respeito a suas

pretensões de validade” (GIROUX, 1997). Quando adota essa visão sobre o

conhecimento oferecido aos discentes, o professor se pauta pela “pedagogia

crítica”, passando a levar em conta as relações estabelecidas no espaço de

aprendizado, tomando as experiências dos alunos como ponto de partida para

discussões, considerando seus interesses e oportunizando a voz de cada um. “A

educação baseada em uma pedagogia crítica procura questionar de que forma

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podemos trabalhar a construção da imaginação social em benefício da liberdade

humana” (GIROUX e SIMON, 1994, p. 99).

Giroux (1997) detalha que a pedagogia crítica passa pela análise de três

discursos particulares e relacionados: produção, texto e culturas vividas. Ao

examinar o discurso da produção, os educadores críticos atentam para a escolha

dos conteúdos e materiais que compõem a agenda curricular a fim de

compreenderem e descontruírem os significados ali encobertos. Para isso,

questionam o privilégio dado a um ou outro tema ou grupo, por exemplo.

Observações que apontam para as condições impostas ao trabalho docente e os

interesses incutidos aí.

Estreitamente relacionado ao discurso da produção está o do texto. Sua

análise consiste em evidenciar as discretas construções de valores nos conteúdos

de revistas, livros, publicidade etc. Giroux (1997, p. 140) exemplifica a aplicação da

análise de texto em dois trabalhos. O primeiro fala sobre materiais didáticos

prontos que “utilizam uma forma de tratamento que coloca os professores em

uma posição de meros implementadores do conhecimento”. No outro, um

pesquisador “analisa como a Riders Digest27 usa um tipo de representação que

minimiza a importância de ver o conhecimento em suas conexões históricas e

dialéticas”. Textos que compõem mensagens supostamente desinteressadas,

podem revelar, se olhados criticamente, o reforço de determinadas práticas

ideológicas ou políticas.

Já o discurso das culturas vividas é composto por histórias, experiências,

memórias e desejos de professores e alunos, bem como de que forma essas

vivências são criadas. Ao incluir elementos de culturas populares na pedagogia

escolar, os educadores críticos não apenas permitem a inclusão de temas

27 Publicação norte americana criada em 1922 que traz uma seleção de matérias curtas e variadas com temas

leves sobre saúde, biografias, humor etc. Sua intensão expressa é promover a leitura.

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daqueles que constantemente são silenciados pela normatização da escola, mas

também questionam com eles como ocorre esse silenciamento. Não se trata

meramente de legitimar as produções da cultura popular presente na vida dos

alunos, mas de levá-los a identificar nelas debates limitados ou viesados em torno

de assuntos como gênero, classe e raça. “É somente partindo destas formas

subjetivas que os educadores críticos poderão desenvolver uma pedagogia que

confirme e envolva as formas contraditórias de capital cultural que constituem a

maneira como os estudantes produzem significados que legitimam formas

particulares de vida” (GIROUX, 1997, p. 141).

Diante de um cenário complexo de produção e consumo de informações e

bens pautados por recursos tecnológicos, se faz cada vez mais importante que

professores e alunos abordem juntos temas que permeiam seu dia a dia, que lhes

despertam interesse e incidem sobre suas relações afetivas e sociais. Hernandez

(2007, p. 35 e 36) acredita que educar é ir além de transmitir o conteúdo, é

aproximar o saber escolar da realidade cotidiana:

Hoje, um docente, ou qualquer pessoa interessada pela educação, que

queira compreender o que está acontecendo no mundo (...) não pode se

limitar a ‘saber a matéria’ ou a ter alguns conhecimentos de

psicopedagogia. (...) se vivemos em uma sociedade de complexidades na

qual, pela primeira vez, nos deparamos com um ciclo de renovação do

conhecimento mais curto que o ciclo de vida do indivíduo; se as

subjetividades se configuram como base de fragmentos e emergências,

requer-se não apenas uma outra proposta radical para o sistema

educativo, mas que nos apropriemos de outros saberes e de maneiras

alternativas de explorar e de interpretar a realidade, em comparação às

atuais disciplinas escolares.

Hernandez defende que os alunos se sentem mais motivados a aprender

quando conseguem traçar relações entre o que é ensinado na escola e o que

vivenciam fora dela. Por isso, acredita que o “objetivo dos educadores (...) deveria

ser o de considerar os interesses e os prazeres da cultura visual dos alunos e

alunas como possibilitadores de reflexão crítica” (2007, p. 81).

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Dando continuidade às ideias da pedagogia crítica e considerando

exatamente produtos da cultura popular tão presentes na vida de crianças e

jovens em idade escolar, Giroux (2004) faz severas observações sobre o império

Disney, que considera fundamental para a constituição da cultura norte americana

contemporânea. Para ele, personagens e histórias normatizam papeis masculinos

e femininos, além de instituírem conceitos como família, felicidade e consumo:

(...) o império Disney deve ser visto como um empreendimento

pedagógico politicamente engajado no espaço cultural da identidade

nacional [norte americana] e na ‘instrução’ da mente das crianças. Isso

não é sugerir que haja algo sinistro por trás do que a Disney faz, mas sim

apontar para a necessidade de refletir sobre o papel da fantasia, do seio

e inocência para assegurar interesses ideológicos particulares,

legitimando relações sociais específicas e influenciando de maneira

significativa a memória pública (GIROUX, 2004, p. 106).

Essas produções estão irremediavelmente acessíveis às crianças e jovens e,

para esse pesquisador, tem tanta legitimidade e autoridade quanto os espaços

tradicionais de educação para ensinar-lhes valores e ideais. Filmes e produtos

Disney são exemplos do que Giroux (2004) denomina pedagogia cultural.

Aguirre define pedagogia cultural como sendo “um conjunto de conteúdos

formativos que não são administrados pelas vias tradicionais de educação formal,

mas sim pelos meios de comunicação de massa, basicamente” (2009, p. 165). Fica

claro que as pedagogias culturais não formam um bloco sólido de informações,

objetos ou imagens. Essa denominação é contingente e aplicável a temas que

aparecem em produtos, vídeos, histórias em quadrinhos, games, entre outros, que

contem valores políticos ou ideológicos latentes. Da mesma forma, sua

abordagem pedagógica não obedece a um método preestabelecido. Ao contrário,

cabe ao docente perceber que debates e práticas surgem a cada caso.

O que fizeram Tavin e Anderson (2010) ilustra bem o uso das pedagogias

culturais juntos aos alunos. Em seu relato, eles contam que levaram seus alunos

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de arte, do quinto ano do ensino fundamental (em uma escola norte americana), a

analisarem filmes infantis como Pocahontas, Aladin e A Bela e a Fera

(coincidentemente todos produzidos pela Disney). Nas atividades conduzidas

pelos professores e adaptadas à linguagem dos participantes, os alunos foram

estimulados a relacionar os aspectos dos filmes com estereótipos retratados na

mídia. Com mediação dos educadores, houve, então, diálogos sobre situações

como o significado de Ariel abrir mão da própria voz em nome do amor, em A

pequena sereia, e a ausência do povo africano (ou sua substituição por macacos)

em Tarzan. Assim os alunos puderam debater sobre papeis de gênero, raça,

história e violência a partir de objetos familiares e que indubitavelmente tem

“grande impacto sobre o modo como as crianças concebem a si mesmas e aos

outros” (TAVIN E ANDERSON, 2010, p. 65).

Diante do reconhecido papel que as imagens das mídias – em nosso

recorte específico, os games - vem representando atualmente, vários teóricos

atentam para a necessidade de voltar as atenções para as novas formas de

visualização e novas ordens de visibilidade (GRAU e VEIGL, 2011) que tais

experiências visuais vem requisitando. Por isso mesmo, a proposta dessa

investigação é tomar os jogos eletrônicos cujo tema envolve mensagens

publicitárias como uma pedagogia cultural.

Em um breve exercício sobre que assuntos e dilemas poderiam despontar a

partir de games, recorri à internet para visitar e refletir sobre a estruturação dos

sites destinados a jogos on line. A internet se apresenta como espaço de grande

acessibilidade aos games, portanto, digitei a expressão “jogos on line” no portal

de busca Google e acessei o primeiro dos endereços sugeridos, no caso:

clickjogos.uol.com.br.

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Foi possível perceber rapidamente o que sugere Mendes (2006) sobre os

jogos como ferramentas de governo que normatizam comportamentos e práticas.

Estão disponíveis nesse endereço virtual games que imitam práticas esperadas ou

desejáveis no trânsito, que ensinam a cuidar de animais de estimação e até

mesmo games simulando o comportamento de manifestantes nos protestos

nacionais ocorridos nos meses de junho e julho de 2013. No game V de Vinagre28

(figura 21) um jovem deve coletar garrafas de vinagre enquanto foge de um

policial. Se for pego, o jovem fugitivo apanha da polícia e é preso.

Figura 21 - Imagem do jogo on line V de Vinagre. Disponível em UOL Games

28 O título do jogo faz referência ao incidente em que a polícia paulistana prendeu pessoas que portavam

vinagre durante protestos (a substância minimiza os efeitos do gás lacrimogêneo) e ainda à máscara

conhecida por anonimous, muito usada em manifestações em todo o mundo e popularizada por meio do

filme V for Vendeta.

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Nesse site, onde os jogos são apresentados por classificação, o que mais

chamou a atenção entre os itens do menu foi o que encabeça a lista: meninas.

Além de alguns outros títulos de destaque, logo abaixo, em ordem alfabética, os

jogos estão relacionados em categorias como: administrar, aventura, fazendas,

multiplayer, tiro ao alvo, entre várias outras.

Em pesquisa realizada sobre imagens levadas pelos alunos para a sala de

aula, Nunes (2010) questiona o comportamento de meninos e meninas sobre as

escolhas de materiais escolares. A autora constatou que os alunos buscam

explicitar por meio dessas escolhas suas identificações com papeis de gênero. As

garotas preferem personagens doces, tímidas e recatadas, enquanto os garotos

optam por personagens dinâmicos, fortes e superpoderosos: “as crianças

ressaltam a docilidade das personagens femininas e a agressividade dos

personagens masculinos” (NUNES, 2010, p. 75). Se esses discursos aparecem nas

falas e atos de crianças como naturalizados, nos games disponíveis no site eles

ganham mais ênfase e intensidade. Às meninas são oferecidos jogos femininos,

enquanto os meninos podem se sentir donos de todos os demais jogos, pois eles

exigem movimento, agilidade, força e precisão.

A existência de uma categoria especificamente destinada a elas deixa

evidente que são tratadas como um grupo especial ou diferenciado de jogadores.

Ao mesmo tempo em que o site as coloca no topo da lista do menu, elas são

excluídas de participar dos demais tipos de desafios eletrônicos. Selecionando

entrar no espaço virtual destinados às jogadoras, vê-se, então, um novo menu que

apresenta os títulos disponíveis para garotas. São sete os jogos em destaque e,

rapidamente, pode-se perceber que todos reiteram expectativas sociais

construídas para o gênero feminino.

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Alguns dos exemplos que chamam a atenção são Studio Fashion (fig. 22),

jogo no qual as garotas escolhem peças de roupas que, juntas, comporão um

vestido de noiva e, Cleaning Cheerleading. Neste jogo, como líderes de torcida, as

jogadoras devem arrumar a bagunça feita pelos atletas do time de futebol da

escola. Esse dois jogos revelam claramente, conforme explica Mendes (2006),

formas de governo destinadas a orientar e formatar um tipo de conduta, a

delinear formas de comportamento social. Nesse caso, reforçam a dependência e

submissão das mulheres em relação aos homens (GOFFMAN, 2006).

Em todos os títulos propostos para meninas, em especial nos dois jogos

citados, outras características construídas como femininas ganham força.

Desenhos suaves, a predominância de tons rosados e avermelhados, corpos

delgados com curvas evidentes (seios e glúteos) e poses delicadas - joelhos

flexionados mostrando certo desequilíbrio, mãos etéreas tocando o próprio corpo

- compõem os cenários desses games. Para Goffman (2006), essas construções

reiteram, conforme mencionamos acima, o que se espera socialmente das

mulheres. Assim, tais jogos reforçam comportamentos desejados para elas – como

vaidade, habilidades culinárias e artesanais – afastando-as da possibilidade de

vivenciar outras feminilidades.

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Figura 22 - Imagem do jogo on line Studio Fashion. Disponível em UOL Games

Entendo que os games on line exemplificados podem ser tomados como

pedagogias culturais a fim de debater papeis de gênero, pois normatizam e

revalorizam comportamentos, práticas e gostos tomados como adequados às

mulheres. Tais jogos seriam espaços pedagógicos propícios para abordar

deslocamentos conceituais, perceptivos e geracionais como, por exemplo, a ideia

de casamento como a realização máxima da mulher ou, ainda, como sendo

feminina a obrigação de realizar as tarefas domésticas, de limpeza e arrumação.

Retomando a atividade que propuseram Tavin e Anderson (2010) ao

analisarem filmes da Disney, me deparei com mais uma produção desses estúdios

para o cinema: Detona Ralph, de 2013. O filme de animação se passa numa

realidade paralela à de um fliperama. Depois que a loja fecha, os personagens dos

jogos ganham vida, saem das máquinas e circulam por uma cidade virtual. O

personagem título do game destrói janelas de prédios para que o herói Felix Jr. as

conserte. Mas, ao fim de seu expediente de trabalho, o “vilão” não consegue

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socializar com outros habitantes de seu jogo e passa a ser evitado em outros

espaços da cidade. Cansado de ser excluído, Ralph, então, parte para outros jogos

em busca de uma medalha, artefato que provará seus méritos e permitirá seu

ingresso no grupo.

A estratégia de divulgação do filme englobou também o lançamento on

linei dos principais jogos presentes no filme, como o próprio Detona Ralph (fig.

23), Corrida Doce e Missão de Herói, além de uma versão do longa metragem em

jogo para o console Wii.

Figura 23 - Game Detona Ralph, baseado no filme de mesmo nome

A história divertida que envolve personagens pode ser usada como

pedagogia cultural, espaço estratégico para construir com os alunos/crianças uma

reflexão crítica sobre estereótipos, educação inclusiva e representações de

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gênero29. Isso por que a trama traz, além de Ralph (fig. 24) personagem título -

não entende a ideia de mau que seus colegas tem sobre vilões – Vanellope (fig.

24), uma menina excluída por ser um tilt e Calhoun (fig. 24), militar que não é

delicada e sensível como se espera que uma mulher seja.

Figura 24 - personagens de Detona Ralph: o protagonista, Vanellope e Sgt. Calhoun

Ao convidar jogadores a questionar e discutir esses temas, podemos levá-

los a refletir sobre a forma como gostariam de, ou como podem, se relacionar

com o mundo, com a sociedade em que vivem e consigo mesmos. Debates sobre

artefatos eletrônicos como os games são propícios ao exercício da crítica. Ao

exercitá-la, crianças e jovens podem compreender como perspectivas de mundo,

de sociedade e de relações com o ‘outro’ são dispositivos culturais resultantes de

processos de construção social de significados.

29 A análise detalhada de Detona Ralph como pedagogia cultural pode ser conferida nos anais do

22º Encontro Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas, disponível em <

http://anpap.org.br/anais/2013/ANAIS/ANAIS.html#>

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Nesse sentido, podemos dizer que o exercício da crítica no trabalho

pedagógico com imagens no contexto escolar ajuda a visualizar alternativas em

relação ao pensamento hegemônico, a ampliar horizontes transformando-os em

territórios conceituais e imagéticos fecundos para a interpretação de sentidos,

significados e visualidades. Ajuda, também, a criar condições para abalar

convicções rígidas, sedimentadas, que omitem de crianças e jovens jogadores a

possibilidade de compreender que o mundo da cultura, das imagens e artefatos

visuais, ou seja, o mundo simbólico é frágil e dinâmico e, portanto, vulnerável às

investidas daqueles que tem a pretensão de prescrever receituários educacionais

para salvaguardar a escola dos demônios que rondam e/ou se manifestam como

agentes indesejáveis na cena cultural contemporânea. Para o próximo capítulo,

reservo a descrição da metodologia construída para aproximar-me do problema.

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CAPÍTULO 3 – TRILHAS DO OBJETO, PASSOS DOS

SUJEITOS, CAMINHOS DA PESQUISADORA.

Traçando rotas metodológicas

3.1 LOCALIZAÇÃO - Uma pesquisa qualitativa, pós-crítica ou, fazendo

bricolagem

Sempre me pareceu claro que esta investigação teria um caráter qualitativo,

visto que se atem às minúcias de relatos, percepções, ideias, relações e conceitos.

Via meu objeto de pesquisa como algo dinâmico e multiconectado e, portanto,

em sintonia com a abordagem da pesquisa qualitativa, ancorada no

fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o

sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo

indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. O

conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados a

uma teoria explicativa; o sujeito-observador é parte integrante do

processo de conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes

significado. O objeto não é um dado inerte e neutro; está possuído de

significados e relações que sujeitos concretos criam em suas ações

(CHIZZOTTI, 1991, p. 79).

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Restava, então, trazer essa compreensão para a estrutura da tese, de

maneira que ficasse clara, justificando a articulação desses conceitos e

argumentos. Considerando que me propus a transitar, mesmo que rapidamente,

por aspectos epistemológicos, creio que cabe aqui uma explicação sobre

diferenças entre as abordagens de pesquisa qualitativa e quantitativa.

Revisando brevemente a epistemologia das pesquisas em ciências sociais,

vê-se a influência do positivismo sobre o campo. Por volta do século XVIII,

cientistas sociais se baseavam no empirismo e assim repetiam experiências a fim

de perceber regras que normatizassem o funcionamento de fenômenos sociais.

Essa postura era influenciada pelas noções quantitativas de pesquisa, que

trabalhavam a partir de dados processando números e utilizando modelos

estatísticos para explicar os fatos (BAUER, GASKELL e ALLUM, 2002). Dessa forma,

não se atem necessariamente a detalhes, qualidades e riquezas tendendo para a

construção de generalizações (DENZIN e LINCOLN, 2007).

Impelidos pelas renovações sociais, econômicas e culturais do início do

século XX, os pesquisadores sociais gradativamente passaram a “enfatizar a

natureza socialmente construída da realidade, a íntima relação entre o

pesquisador e o que é estudado, e as limitações situacionais que influenciam a

investigação” (idem, p.23). Desse modo as pesquisas qualitativas ganharam corpo

abrindo espaço para os pontos de vistas dos indivíduos, investindo e valorizando

as descrições do mundo social e os aspectos específicos de cada caso ou situação

em contexto.

Pesquisadores que trabalham com a abordagem quantitativa, as vezes,

desdenham daqueles que utilizam abordagens qualitativas dizendo que não

produzem ciência, mas apenas visões romantizadas sobre os acontecimentos. Em

contrapartida, pesquisadores qualitativos afirmam que os pesquisadores

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quantitativos silenciam um enorme número de vozes. Os dois tipos de

pesquisadores acreditam trabalhar pelo bem da ciência e, de fato, o fazem, mas

embasados em métodos, critérios e crenças próprias e, muitas vezes,

complementares, conforme explicam Denzin e Lincoln (2007, p. 23 – 24) ao citar

Flick:

Flick (1998, p. 2 -3) resume de uma maneira eficaz as diferenças entre

essas duas abordagens à investigação. Ele observa que a abordagem

quantitativa tem sido empregada com a finalidade de isolar “as causas e

os efeitos (...) operacionalizando as relações teóricas (...) [e] medindo e

(...) quantificando os fenômenos (...) permitindo a generalização das

descobertas” (p. 3). Mas, atualmente, esses projetos são postos em

dúvida, pois “a mudança social acelerada e a consequente diversificação

dos mundos da vida estão cada vez mais fazendo com que os

pesquisadores sociais defrontem-se com novos contextos e novas

perspectivas sociais (...), metodologias dedutivas tradicionais (...) estão

fracassando (...) e assim a pesquisa é cada vez mais obrigada a utilizar

estratégias indutivas em vez de partir de teorias e testá-las (...) o

conhecimento e a prática são estudados como conhecimento e prática

social”.

Em vez de polarizar as duas formas de fazer científico, abordagens

qualitativas e quantitativas devem operar colaborativamente no campo de

conhecimento complexo abarcado pelas ciências sociais. Se uma amostragem

muito limitada pode não ter representatividade social, por outro lado, pesquisas

englobando um grande número de colaboradores podem não dar conta de

resultados individualizados. Nesse sentido, é adequado que a pesquisa social

considere tanto as experiências vividas individualmente quanto sua importância

para o todo social. Sempre que necessário, ou possível, o pesquisador deve

mesclar resultados macro (quantitativos) com estudos micro (qualitativos), pois

não há quantificação sem interpretação, nem qualificação sem relevância para/em

um grupo ou extrato social.

Ao focar nos sentidos construídos discursivamente pelos colaboradores

sobre “Mais Fanta, mais diversão” esta investigação envereda por um viés de

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caráter pedagógico e se embasa nos princípios da Cultura Visual30, campo que

Meyer e Paraíso (2012) não citam nominalmente como pós-estruturalista, mas

cuja familiaridade é evidente:

Sob o[s] rótulo[s] de “pós” – pós-estruturalismo, pós-modernismo, pós-

colonialismo, pós-gênero, pós-feminismo – e outras abordagens que,

mesmo não usando em seus nomes o prefixo “pós”, fizeram

deslocamentos importantes em relação às teorias críticas –

Multiculturalismo, Pensamento da Diferença, Estudos Culturais, Estudos

de Gênero, Estudos Étnicos e Raciais e Estudos Queer, entre outros

(idem, p. 17)

As autoras (2012) organizaram uma série de textos – seus e de outros

pesquisadores - que tratam basicamente do processo de coleta de dados em

pesquisas nas áreas de educação e saúde. Todavia, as abordagens revelam

afinidade e sintonia com investigações de outras áreas do conhecimento,

especialmente aquelas que estudam fenômenos complexos e não estão em busca

de resultados generalistas. As autoras esclarecem que entendem por metodologia

“um conjunto de procedimentos de coleta de informações” (idem, p.16) e

ressaltam a impossibilidade de se fixar rotinas metodológicas para pesquisas pós-

críticas:

... a maior parte das correntes denominadas pós-críticas não se refere a

um método de pesquisa, no sentido usual do termo. Algumas delas –

como os estudos culturais, os estudos queer, o pós-feminismo – dizem

explicitamente que a metodologia deve ser construída no processo de

investigação e de acordo com as necessidades colocadas pelo objeto da

pesquisa e pelas perguntas formuladas (idem, p. 15).

A dificuldade de assumir procedimentos como próprios da pesquisa pós-

crítica deriva, também, da posição de autores considerados fundamentais para as

teorias denominadas “pós”, como Foucault e Deleuze, por exemplo. Esses filósofos

contribuíram de maneira significativa para a criação de procedimentos e práticas

30 Em minha dissertação de mestrado discuto a emergência da Cultura Visual em sua relação com pós-

modernidade e as influências do pós-estruturalismo para o campo. A dissertação na íntegra está disponível

no site do Programa de Pós-graduação em Arte e Cultura Visual <www.fav.ufg.br/culturavisual>

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de pesquisa como a arqueologia, a genealogia e a desconstrução. Ainda assim,

resistiam à ideia de estarem propondo métodos.

Posicionamentos como o de Foucault e Deleuze não são incomuns nas

investigações e no tempo em que vivemos, “tempo que gostamos de chamar de

‘pós-moderno’31, por que ele produz uma descontinuidade com muitas das crias,

criações e criaturas da modernidade” (PARAÍSO, 2012, p. 26). O tempo e as

abordagens “pós” desmancharam a noção de progresso, a racionalidade do

sujeito, a estabilidade das identidades, a linearidade da história, a solidez do

discurso cientifico. Já não há verdades, mas versões de verdade e, para acessá-las,

precisamos considerar que “mudaram as formas como vemos, ouvimos, sentimos,

fazemos e dizemos o mundo. Mudaram nossas perguntas e as coisas do mundo.

Mudaram os ‘outros’ e mudamos nós” (PARAÍSO, 2012, p. 26).

Essas mudanças tem operado na produção de conhecimento diluindo

fronteiras entre disciplinas, gerando permeabilidade inter/trans-disciplinar que

instiga uma postura de pesquisador-articulador de métodos para coleta de

informações: a bricolagem (KINCHELOE e BERRY, 2007; PARAÍSO, 2012).

3.2 NEGOCIAÇÕES METODOLÓGICAS – Bricolagem ou “epistemologia

da complexidade”

Uma preocupação crescente entre cientistas, de modo geral –

especialmente aqueles das áreas de humanas e sociais - é construir maneiras de

abordar o objeto de pesquisa de forma holística, atentos ao seu entorno e às

influências que o objeto recebe e de certa forma impõe ao redor. Esse tipo de

fazer científico não pressupõe investigadores generalistas, mas, ao contrário,

31 Minha visão sobre esse momento histórico como pós-moderno também está posto na dissertação,

disponível em <www.fav.ufg.br/culturavisual>.

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demanda pesquisadores curiosos, capazes de entender os fenômenos em suas

relações políticas, históricas, geográficas, biológicas etc., conforme o caso. Nesse

tipo de abordagem é necessário transitar por conhecimentos e métodos

rearranjando-os de acordo com a necessidade delineada pelo objeto. Essa é a

postura do bricoleur, “palavra francesa [que] descreve um faz-tudo que lança mão

das ferramentas disponíveis para realizar uma tarefa” (KINCHELOE, 2007a, p.15).

Ao pesquisador bricoleur (ou bricolador) pós-crítico, cabe, portanto, “ouvir”

o objeto, deixando que ele se mostre e sinalize que perguntas devem ser feitas e

como perguntar. Kincheloe (idem) explica que “a bricolagem é (...) o processo de

emprego de estratégias metodológicas à medida que são necessárias no

desenrolar do contexto da situação de pesquisa” e Paraíso (2012, p. 33)

complementa estas ideias ao afirmar que “usamos tudo aquilo que nos serve, que

serve aos nossos estudos, que serve para nos informarmos sobre nosso objeto,

para encontrarmos um caminho e as condições para que algo novo seja

produzido”.

A bricolagem é um ato de negociação metodológica, uma costura de

posicionamentos teóricos, um amálgama de ferramentas epistemológicas que

resulta numa “epistemologia da complexidade” (KINCHELOE, 2007a, p. 16). Essa

negociação inclui revelar como são moldados jogos de poder, forças sociais e

elementos discursivos, tendo claro que o pesquisador também é um sujeito com

história e afetos, e que suas escolhas na pesquisa alteram profundamente sua

perspectiva sobre o objeto. A bricolagem não busca uma explicação para o

mundo, mas uma explicação para nossa relação com o mundo (idem). Nesse ato

de negociação metodológica, nós, pesquisadores

eliminamos as barreiras entre as diferentes disciplinas.

Deslocamos as linhas que separam ciência e literatura,

conhecimento e ficção, arte e ciência, filosofia e comunicação.

Explodimos as separações entre teoria e prática, discurso e

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‘realidade’, conhecimento e saberes do senso comum,

representação e realidade. (PARAÍSO, 2012, p. 33)

Epistemologicamente, a bricolagem flerta com o construcionismo social ao

considerar que “as categorias conceituais são construções humanas” (idem, p. 22)

e, por isso, insiste no fato de que o bricoleur tenha consciência de sua própria

historicidade a fim de entender a incidência dessa historicidade na narrativa da

pesquisa. “A consciência do bricoleur acerca do construcionismo e da

historicidade ajuda-o a apontar essas omissões [na produção oficial de sentidos] e

seus efeitos nos processos de produção de conhecimento” (idem, p. 26).

Quanto à dimensão interpretativa da pesquisa, a bricolagem se fundamenta

na hermenêutica crítica e reconhece o caráter instável e, ao mesmo tempo,

revelador da linguagem:

Todos os aspectos do saber humano – também conhecido como

interpretação – são filtrados linguisticamente, fundamentados

contextualmente, saturados de poder, implicados em um

determinado processo social, moldados por formas narrativas

específicas e marcados por teorias tácitas sobre a natureza da

realidade. (KINCHELOE, 2007b, p.106)

Essa postura diante do poder desvelador da linguagem está presente

também nas ideias de autores pós-estruturalistas, vertente familiar à bricolagem.

Segundo o pós-estruturalismo, o sujeito é constituído por uma negociação

constante de posicionamentos identitários efetivados na e através da linguagem:

Eles [pós-estruturalistas] descrevem o sujeito em toda sua

complexidade histórica e cultural – um sujeito ‘descentrado’ e

dependente do sistema linguístico, um sujeito discursivamente

constituído e posicionado na interseção entre as forças libidinais e

as práticas socioculturais. (PETERS, 2000, p. 32)

Embora a bricolagem não prescreva métodos de coleta de dados, os

discursos, as falas, enfim, a linguagem, tem papel fundamental como recurso

utilizado pelo pesquisador para acessar o objeto. Assim, a interpretação tem

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patentes inclinações hermenêuticas e passa a ser a ênfase. Mas, ao mesmo tempo,

não há pudores na hora de encontrar e juntar informações a serem analisadas:

Usamos nessa tarefa elementos da etnografia, da netnografia, na

etnografia pós-moderna. Usamos grupos focais, entrevistas, narrativas,

documentos. Juntamos materiais impressos, textos, livros, projetos.

Coletamos cartazes, desenhos, figuras, fotografias. Usamos o MSN, o

Orkut, qualquer site de relacionamento, a internet. Olhamos,

observamos, escutamos. Entrevistamos, registramos, anotamos,

gravamos, filmamos. Perguntamos, interrogamos, questionamos,

fotografamos. Olhamos professores/as, alunos/as, crianças, jovens,

adultos, meninas, meninos, branco/as, negros/as, surdos, ouvintes,

cegos, videntes, movimentos sociais. Observamos a rua, laboratórios de

ensino de ciências, pátios de recreio, salas de aulas, aulas, conversas,

brincadeiras, jogos, reuniões, quadras esportivas, encontros,

assentamentos, acampamentos, aldeias, shows, espetáculos, gestos e

mímicas. Escutamos conversas, bate-papo, discussões, aulas, músicas.

Perguntamos a pessoas, autores/as, filmes, programas televisivos,

campanhas publicitárias. Interrogamos currículos escritos, livros de

literatura, livros didáticos. Questionamos documentos de políticas,

projetos pedagógicos, projetos de intervenção, diretrizes, leis. Em

síntese, usamos tudo que acreditamos nos servir em nossas pesquisas,

fazendo bricolagem (PARAÍSO, 2012, p. 33 - 34).

Quando se faz bricolagem, a circunstância impõe ao mesmo tempo que

oferece os instrumentos de produção de dados.

Pouco a pouco minha ida a campo foi sendo mapeada. Os contornos

delimitaram uma pesquisa eminentemente qualitativa, pós-crítica, fundamentada

na bricolagem. Havia chegado o momento de buscar os equipamentos e

utensílios adequados para registrar o trabalho de campo.

3.3 IDA A CAMPO - Netnografando “Mais Fanta, mais diversão”

Foi por meio de um anúncio de televisão que conheci “Mais Fanta, mais

diversão”. As propagandas são apenas parte da campanha dos refrigerantes Fanta

que aposta na importância da diversão para seus consumidores de vários países.

A partir do VT visitei o site da empresa e constatei que a maior parte dos esforços

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de comunicação são feitos on line. Como a campanha alcançava cerca de 180

países, foram criados conteúdos gerais e também específicos para cada país. O

site brasileiro continha um advergame com cerca de 14 etapas, além de

ambientes e situações que simulam o cotidiano dos personagens da campanha.

“Mais Fanta, mais diversão” foi se configurando como espaço adequado a

ser explorado nesta investigação já que tem como protagonistas jovens

adolescentes. Além disso, há no jogo um metadiscurso sobre tecnologia e

diversão, pois em vários momentos os jogadores podem dispor de gadgets

eletrônicos e são solicitados a realizar tarefas que se transformam em

brincadeiras.

Tinha a convicção de que antes de disparar perguntas aos colaboradores

precisava conhecer intimamente o assunto de nossos diálogos. Assim atentei para

a necessidade de proceder a uma netnografia. A etnografia virtual, netnografia ou

e-etnografia é uma versão da etnografia para o mundo da internet. Enquanto o

etnógrafo deixa sua zona de conforto em nome da imersão em uma cultura

estudada, o netnógrafo não precisa mudar-se para o ambiente a ser explorado,

mas deve mudar seu olhar sobre ele, atentando para a internet como um espaço

de geração de cultura e significativa interação social (HINE, 2000, p. 19).

Se a etnografia se ocupa “[da] interação entre o pesquisador e seus

objetos de estudo” (FONSECA, 1999 in SALES, 2012), a netnografia inclui a

observação dos espaços virtuais, a participação em comunidades ou debates de

internautas sobre o tema e o compartilhamento dos códigos simbólicos e

linguísticos do ciberespaço, por exemplo (SALES, 2012). Assim, precedendo ao

contato com os participantes da pesquisa, a netnografia dos advergames de Fanta

serviu como reconhecimento do terreno em que se localizam os sentidos de

juventude que pretendia ouvir/negociar com os colaboradores.

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O endereço de “Mais Fanta, mais diversão” (fig. 25) na internet

<www.fanta.com.br> não privilegiava informações sobre o produto ou sobre a

empresa, mas convidava imediatamente o visitante a “embarcar numa aventura

incrível”. O banner virtual com uma imagem dos cenários dos jogos avisava: “Uma

força misteriosa acabou com a diversão do mundo. E a turma da Fanta vai precisar

da sua ajuda para trazer ela de volta”. Essa era a porta de entrada para Utopia, o

cenário em que as brincadeiras aconteciam e que descrevo detalhadamente a

seguir.

Figura 25 - Página inicial do site de Fanta

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A “galera Fanta”, formada pelos personagens da campanha, também tinha

destaque e o internauta que clicasse sobre ela seria direcionado ao perfil de cada

personagem. Com a mesmo grau de importância está o link para receitas que

tornarão o lanche “mais divertido”. Abaixo desses espaços, havia opções menos

chamativas. Em uma delas, o visitante era convidado a conectar-se com a empresa

por meio do Facebook e, em outra, podia divertir-se com Pula Macaco, um jogo

em parceria com a fabricante de brinquedos Estrela.

Escolhendo aceitar o convite para entrar na aventura, o internauta era

transportado para uma vista panorâmica de todo o site (fig. 26). Ficavam a mostra

Utopia, a Casa do Todd, a Cachoeira, a Cidade e a Floresta de Frutas, que podem

ser selecionados com o mouse. Acima desses espaços havia um menu com as

seguintes opções: “galera Fanta”, ranking, A história da diversão – “Salvando a

fonte”, minha conta e comic book. O site não sugeria uma ordem de exploração,

entretanto, depois de visitar todos os espaços notava-se que há uma sequência

que facilitaria o entendimento da narrativa.

Figura 26 - Página inicial do site mostrando os ambientes a serem explorados

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Comic book, o último item do menu, era uma espécie de história em

quadrinhos com diálogos não traduzidos do inglês que contavam ao visitante

tudo o que ele/ela precisa para entender aonde está indo (fig. 27). Os quadrinhos

mostravam que na cidade de Utopia há um relógio que marca a hora para a

diversão começar. Às 4 horas todos os jovens se encontravam ao redor da torre

para brincar, paquerar, dançar etc. Mas aconteceu algo misterioso e a fonte de

diversão que fazia o relógio funcionar quebrou. O guardião da torre do relógio, o

único adulto da narrativa, avisava que agora resta pouco tempo até que todos

tornem-se playless, ou sem-diversão, criaturas apáticas, entediadas e incapazes de

se divertir. Frente a esse perigo, a “galera Fanta” resolve consertar a fonte e salvar

a diversão.

Figura 27 - Recorte do comic book

Floyd distribuiu, entre os amigos, alguns gadgets que ele mesmo construiu

preocupado que todos estejam preparados para a aventura. Gigi recebeu um ioiô.

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Andy um skate flutuante, o hovermatic. Lola ganhou o fizz fazer, o fazedor de

bolhas Fanta. Maude ficou com o tapete beat blanket que a incentiva a dançar. E

Floyd pegou a jetpack, uma mochila propulsora movida a Fanta.

Ainda na opção comic book, o visitante podia acessar um discreto menu

acima da história em quadrinhos e escolher, sobre os ícones de uma bússola, o

desenho simplificado de um dos personagens, uma caixa aberta e um ponto de

interrogação. A bússola mostrava um mapa com todos os locais pelos quais o

grupo deveria passar em busca da fonte. A caixa oferecia conteúdo extra sobre

Fanta, como os VTs da campanha, e o ponto de interrogação apresentava os

comandos de navegação naquele espaço já que os quadros da história são

passados a medida que o internauta movia a barra de rolagem com o mouse ou

com o teclado. O desenho do personagem apresentava uma ilustração de cada

um dos 9 jovens com uma breve descrição. Abaixo de 5 deles havia um joytick, o

que indicava a existência de um jogo.

O primeiro dos jogos era o Todd´s van game (fig. 28) , o jogo da van do

Todd. Antes de jogar, um pop up trazia uma ideia geral do jogo e de como jogar.

Além disso, localizava aquela ação na narrativa geral da trama. Todd e seu amigo

Tristan precisavam encontrar a turma para juntos seguirem até a fonte. O jogador

deveria controlar o carro de forma a fazê-lo voar em algumas rampas coletando

bolhas de Fanta que são seu combustível. O objetivo é ir o mais longe possível.

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Figura 28 – Imagem do jogo Todd's van

O jogo seguinte era o da Lola com seu fizz fazer (fig. 29). Numa rua cheia

de playless, o jogador deveria mover a personagem Lola para que ela atirasse

bolhas de Fanta nos playless para que fazê-los recuperar a alegria. Ao mesmo

tempo, Lola precisava coletar recargas para seu gadget. O objetivo é conseguir

devolver o máximo de playless à normalidade enquanto houver energia para isso.

Em seguida, temos o jogo do ioiô da Gigi. A personagem deveria colher laranjas

com seu brinquedo antes que elas caíssem no chão, mas sem deixar de pegar os

relógios que atravessam a tela, pois eles garantem mais tempo no jogo. Se

perdesse um relógio ou uma laranja, o tempo de jogo diminuía. Quanto mais

frutas, mais pontos.

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Figura 29 - Imagem do jogo Lola's fizz fazer

O próximo jogo é o jetpack do Floyd. Ele foi desafiado por Andy a chegar

ao topo da cachoeira e, para conseguir, deveria usar a mochila propulsora. O

jogador tem que levar Floyd ao cume da cachoeira no menor espaço de tempo

possível, desviando de galhos e pedras e, ainda, pegando bolhas de Fanta como

combustível. O último jogo é o das irmãs Lhavas com seus patins (fig. 30). O

jogador deveria controlar as duas patinando sincronizadamente por uma estrada.

Galhos, cavaletes e buracos devem ser evitados, bolhas e garrafas coletadas. A

ideia era ir o mais longe possível, sem acidentes.

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Figura 30 - Imagem do jogo Llavas twins roller

A aba ranking do menu trazia listas mostrando todos os jogadores

ordenados por pontuação, da maior para a menor – com seu desempenho geral,

em cada fase (nos ambientes cidade, cachoeira etc.) ou jogo específico. Minha

conta continha os dados sobre o jogador: nome, pontos em cada fase, medalhas

conquistadas por ser o jogador que mais pontuou na semana e seu avatar

personalizado como um membro da “galera Fanta”, que entretanto não aparece

em nenhum jogo (fig. 31). O item central A história da diversão funciona apenas

para retornar à página principal.

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Figura 31 - Perfil do jogador

A aba inicial do menu, destinada à “galera Fanta” (fig. 32), apresentava cada

um dos personagem com informações sobre sua personalidade e uma ilustração

que o caracterizava fisicamente. São, ao todo, nove personagens: Todd, o

protagonista, sua namorada Gigi e Tritan, seu melhor amigo. Maude, Andy, Lola,

Floyd e as irmãs Lhavas. Seguem, abaixo, as descrições dos personagens como

consta no site:

Os amigos são a família de Todd. Logo cedo ele se

apaixonou pela fotografia e nunca mais parou. Aos 16 anos,

ganhou do irmão a van. É com ela que leva os amigos as

parques, festas, festivais de música em toda parte.

Maude tem a mente aberta e criativa. Ela sempre gostou de

inventar brincadeiras novas. Desde cedo, um simples objeto

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já servia de inspiração para que ela criasse um jogo

diferente. Dela, tudo se pode esperar.

Tristan tem otimismo e entusiasmo para reunir pessoas. Ele

conhece todo mundo e está em todas as festas e eventos

interessantes. Tristan tem estilo. É com Fanta que ele

consegue energia para tanta animação.

As Lhavas são irmãs gêmeas. Uma dupla misteriosas que

adora aparecer de surpresa nos momentos chave das

brincadeiras. Elas se divertem e levam os outros

personagens mais longe do que eles imaginavam ir.

Gigi é a líder do grupo. Ela formou uma turma de amigos

incríveis à sua volta e é a inspiração de todos eles. Uma

garota que vive embarcando em novas aventuras e que se

diverte com um entusiasmo contagiante.

Andy é carismático, talentoso e sabe curtir a vida. Cresceu

na praia, adora andar de skate e pegar onda. É adorado pelo

pessoal mais novo e domina o violão como poucos. Um

showman que arranca suspiro das meninas.

Floyd sempre foi mais esperto que os garotos da sua idade

na escola. Ele é o típico geek. Descolado, ele adora

tecnologia e aproveita tudo o que sabe para criar novas

brincadeiras. Floyd é nosso menino prodígio.

Lola era a caçula da casa. No meio de irmãos mais velhos

logo aprendeu a se impor para conseguir as coisas. Ela é ágil

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e não entra para perder. Mas agora está descobrindo que

trabalhar em equipe pode ser muito melhor.

Figura 32 - Lola, Gigi, Todd, Floyd, Tristan e Andy

Conhecidos os itens do menu, passo a descrever os ambientes que

compõem o site e sediam os jogos. Utopia (fig. 33) era a cidade onde estava o

relógio que marcava a hora para a diversão começar. Quando o visitante entrava

ali, outro comic book (diferente daquele já descrito) se abria contando em

português que o relógio está quebrado e mostrando os gadgets que Floyd criou e

distribuiu para a turma.

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Figura 33 - Vista geral de Utopia

Uma vista geral da cidade mostrava a praia, várias casas e prédios

residenciais, mas mostrava, também, outros equipamentos urbanos como um

estádio e um parque de diversões. Existiam ícones acima de alguns lugares

sinalizando ao visitante que aquele espaço guardava mais informações. Sobre o

estádio existia um ícone que, quando aberto, incentivava o jogador a praticar

exercícios físicos. Na casa de shows, estava o jogo Cine Dance da Maude (fig. 34).

A personagem fazia passos de dança movimentando-se de acordo com as

indicações que surgiam sobre o tapete. O jogador deveria repetir os passos

seguindo a mesma sequência. A cada rodada mais um passo era adicionado e o

jogo acabava quando o jogador errava a sequência ou não realizava o passo no

tempo certo.

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Figura 34 - Imagem do jogo Maude's cine dance

No fliperama havia um jogo em que o Floyd usava sua mochila propulsora,

o Landing Jetpack. O jogador tinha que controlar o personagem fazendo-o subir

para pegar bolhas de Fanta que dão pontos. Ele deveria coletar garrafas do

refrigerante e desviar dos obstáculos. O jogador também deveria ter cuidado para

não fazer o personagem despencar de grandes alturas, pois isso danificaria o

jetpack e o faria perder o jogo.

Clicando sobre a roda gigante, tinha-se acesso ao jogo Yoyo Jump (fig. 35)

da Gigi. Ela precisava treinar para usar seu gadget cada vez melhor. Cabia ao

jogador fazê-la arremessar e prender o ioiô em pontos fixos do cenário,

movendo-se pelo ar. Assim, ela coletaria bolhas e garrafas de Fanta para ganhar

pontos e vidas. Se não conseguisse prender o brinquedo, Gigi caia e o jogador

perdia.

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Figura 35 - Imagem do jogo Yoyo jump, da Gigi

Havia, também, uma pista de skate na qual Andy usava seu hovermatic no

jogo hover board rider (fig. 36). O jogador deveria controlar o personagem dentro

da pista desviando de cones e coletando bolhas e garrafas sem deixá-lo cair.

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Figura 36 - Imagem do jogo hover board rider

Na quadra de basquete fica o jogo Bubbles Basketball da Lola. O jogador

deveria levá-la para frente ou para trás, por meio de teclas, e usar o mouse para

que ela pudesse criar bolhas com seu fizz fazer, cujo objetivo é envolver as bolas

de tênis, volei ou basquete que quicam pela quadra. As bolas envoltas seguiam

para a cesta de basquete marcando pontos. O jogador não poderia deixar a

personagem ser atingida pelas bolas, deveria recolher as garrafas e bolhas de

Fanta para garantir energia para continuar no jogo.

Em Utopia, havia também duas casas: a do Floyd e a da Gigi. Clicando

sobre as casas, via-se, apenas, o quarto de cada personagem. Floyd é aficionado

por tecnologia e inventa dispositivos robóticos que fazem a alegria de toda a

turma. Seu quarto é repleto de artefatos tecnológicos, como um braço mecânico

feito por ele, uma TV enorme, computadores e outras máquinas (fig. 37). No

quarto da Gigi (fig. 38) há telas sobre as paredes que foram pintadas por ela, há,

também, um computador, seu principal meio de comunicação com a turma e um

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aparelho de som, pois, para ela, dançar é uma grande fonte de diversão. Papeis e

alguns objetos fora de lugar deixam ambos os quartos ligeiramente

desarrumados.

Figura 37 - Quarto do Floyd

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Figura 38 - Quarto da Gigi

No centro da tela do site estava a casa do Todd (fig. 39). Ela ficava fora da

cidade, no alto de uma colina. Ao clicar sobre ela, mais uma parte da história era

contada: Todd e Tristan arrumavam o carro antes de sair para encontrar o resto do

grupo, quando Todd nota o desânimo no amigo sempre tão cheio de energia e

diz que eles precisam correr para resolver a falta de diversão. A casa tinha

decoração sofisticada, com espaço para os jogos, garagem para o carro, mas não

tinha cômodos para outros familiares. Ali, o visitante era convidado a procurar

peças espalhadas pela casa para customizar a van antes de participar do jogo de

corrida. Com o carro preparado, o jogador entrava na Todd´s van race. Uma pista

de corrida circular sai da garagem da casa do Todd e, nela, havia outras vans

disputando o primeiro lugar.

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Figura 39 - Casa do Todd

Perto da casa do Todd ficava a Cachoeira (fig. 40). Mais uma vez, uma

história em quadrinhos surgia contextualizando a situação. O grupo formado por

Maude, Gigi, Lola, Andy e Floyd estava seguindo para a fonte, mas seus gadgets

ficaram sem combustível, ou seja, sem Fanta. Para continuar, o jogador deveria

achar 8 garrafas de Fanta escondidas pelo cenário da cachoeira. Após vencer o

desafio, o jogador poderia experimentar Rise up, um jogo no qual deve ajudar

Floyd, em seu jetpack, a subir até o cume da cachoeira desviando de obstáculos e

coletando garrafas e bolhas.

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Figura 40 - Cachoeira de Fanta

Ao lado da cachoeira ficava a Floresta das Frutas (fig. 41). A história

contada nos quadrinhos explicava que Gigi se perdeu do resto da turma na

floresta, mas cachorrobô, uma invenção de Floyd, permaneceu ao seu lado para

ajudá-la a sair da cilada. O jogador deveria procurar os objetos dos amigos de

Gigi, porque, somente depois de encontra-los, poderia acessar a Fruit forest quest.

Aqui o jogador guiava Gigi pela floresta pegando bolhas que somavam pontos, ao

mesmo tempo em que procurava garrafas de Fanta em moitas para ativar o

desafio do localizador. Era preciso vencer cada desafio para que o localizador

indicasse ao cachorrobô o paradeiro dos gadgets perdidos. Eram 4 desafios, e

cada um liberava um dos equipamentos, mas todos deveriam ser recuperados

antes que o tempo acabasse.

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Figura 41 - Floresta de frutas

O último ambiente era a Cidade (fig. 42), destruída e abandonada desde

que o relógio quebrou. O comic book contava que o grupo conseguiu sair da

floresta e chegar até a cidade, mas foi cercado por playless, aquelas figuras sem-

diversão. Acuados, eles não sabiam o que fazer, mas, felizmente, Todd chegou

com a van, tocando música, e a diversão devolveu a alegria normal aos habitantes

da cidade. Ali se podia jogar The town club, jogo no qual Tristan é o DJ e o

jogador deveria apertar as teclas indicadas para tocar notas musicais da canção

sendo executada. O objetivo era marcar o máximo de pontos dedilhando a nota

certa no momento indicado.

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Figura 42 – Cidade

Os jogos aqui descritos não apresentam como desfecho a “galera Fanta”

consertando a fonte, mas observando o que é mostrado no comic book do menu

principal, isso acontece. Com o retorno da diversão à Utopia via-se, mais uma vez,

o único adulto da trama. O guardião da torre do relógio ficou entusiasmado com

o sucesso do grupo e os compara a heróis, assim “como ele foi um dia”,

segurando uma foto de si mesmo quando jovem (fig. 43).

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Figura 43 - Cena final do comic book. O guardião da torre comemora a volta da diversão

3.4 REVISANDO A ROTA – Montando um grupo focal

Toda pesquisa começa com um planejamento. É preciso antes de tudo

estabelecer procedimentos, como contatos a fazer, prazos a cumprir, material a

coletar, entre outras variantes. Mas pesquisar é persistir, reinventar, por que essa

espécie de carta de navegação indica caminhos, mas não assegura que as coisas

sairão como planejado. Em alguns casos, como o caso desta investigação, ela

funcionou, ao contrário, como motivo de frustração. Meu plano de viagem inicial

foi traçado e apresentado à banca na qualificação no começo de 2014.

A ideia era contatar por e-mail jogadores que apareciam nos rankings dos

advergames de Fanta e convidá-los a responder questionários narrativos on line.

Até abril daquele ano, mais de 25 mil pessoas constavam na lista de pontuação,

bastava então entrar em contato com algumas delas. Busquei na rede social

Facebook e enviei mensagem privada com uma explanação sobre a pesquisa e o

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convite para participar dela para cerca de 200 potenciais colaboradores. Obtive

apenas 3 respostas demonstrando interesse.

Na tentativa de aumentar as participações, retomei uma lista de contatos

fornecida no ano anterior pelo LabTime, centro de desenvolvimento de cursos e

materiais educativos para educação a distância da Universidade Federal de Goiás.

Envei e-mail para alunos de escolas públicas de todo o estado que participaram

em 2013 de um curso piloto de desenvolvimento de jogos junto ao centro. Foram

38 mensagens e mais 3 voluntários.

Além desses 6, mais um voluntário foi contatado. Em busca por

informações sobre o universo do jogo na internet, me deparei com um vídeo

postado no youtube em que um garoto, na época com 13 anos, jogava e

comentava os desafios de “Mais Fanta, mais diversão”. Também pelo site de

postagem de vídeos, mandei mensagem convidando-o a fazer parte da pesquisa.

Agora eram 7 pessoas dispostas a participar.

Era com esse grupo que daria sequência à aplicação dos questionários, não

fora a surpresa de uma reviravolta profissional. Logo após a qualificação, ainda na

mesma semana, recebi por telefone a notícia de que assumiria o cargo de técnica

em assuntos educacionais do Instituto Brasileiro de Museus – IBRAM - na Cidade

de Goiás. A vaga havia sido disputada em concurso público quatro anos antes e

eu já a considerava perdida devido ao tempo decorrido. Mas, diante da

perspectiva de uma crise econômica que começava a se configurar no país e,

especialmente, considerando o panorama futuro de instabilidade profissional,

decidi tomar posse na vaga para qual havia sido convocada.

Em junho de 2014 assumi o emprego e passei a morar, de segunda a sexta-

feira, em Goiás velho, a antiga capital do estado, distante 150 km de Goiânia. Os

dois primeiros meses foram de adaptação: morar em hotel, transportar livros e

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computador de uma cidade a outra, rotina de trabalho a cumprir, acesso instável e

limitado à internet. Era difícil pensar na pesquisa, mais difícil, ainda, realizá-la.

Depois de 4 ou 5 meses, já morando numa casa alugada e precariamente

mobiliada, comecei a voltar minha atenção atenção para a investigação. Além

dessas condições, não estava recebendo retorno dos contatos feitos com os

colaboradores. Era hora de rever o plano e adequá-lo à nova realidade.

A partir dos contatos institucionais feitos como educadora de museu com

professores da cidade de Goiás, tentei estabelecer parcerias para realizar

entrevistas e grupos focais presencialmente. A primeira instituição a ser convidada

foi a escola estadual Prof. Alcides Jubé. Na época, seu currículo incluía uma

disciplina chamada Projeto de Vida encabeçada pelos professores de geografia,

história e filosofia. Nela, os alunos do segundo ano do ensino médio trabalhavam

temas não curriculares, como gênero, mercado de trabalho, corpo etc. A ideia era

que os alunos acessassem o universo Fanta e depois participassem de uma

reflexão sobre a construção da noção/conceito de juventude. Mas a proposta

esbarrou tanto na agenda da escola (era preciso cumprir o calendário semestral)

quanto na impossibilidade de que os alunos acessassem o jogo pela internet. A

escola dispunha de poucos computadores e a conexão na cidade é ineficiente,

dificultando qualquer atividade on line. Encerrou-se então o ano de 2014, e o Jubé

– como é chamado intimamente por alunos e professores - foi descartado como

possibilidade. Mais uma vez, era preciso reconsiderar e reavaliar a situação da

pesquisa.

Conversando com colegas da cidade sobre os problemas enfrentados,

alguns sugeriram que eu procurasse a escola militar do município. Com uma

infraestrutura bem melhor que a maioria das escolas locais, o Colégio Militar João

Augusto Perillo conta com sala de informática e conexão à rede. A negociação

com a coordenação foi trabalhar com a turma do nono ano do ensino

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fundamental na disciplina de artes e o acesso ao jogo seria feito pelos

participantes da pesquisa em casa. Questões outras emperraram a realização da

proposta: encontros semanais de apenas 50 minutos, o conteúdo do currículo da

disciplina artes a ser concluído pela professora, a demora dos pais ou

responsáveis a autorizar a participação dos alunos... O primeiro semestre de 2015

chegou ao fim, mas não foi possível realizar a produção de dados. Antes de

retornar no semestre seguinte para realizar o trabalho de campo no Colégio

Militar, descobri que o jogo “Mais Fanta, mais diversão” havia sido suspenso no

Brasil. Somente em alguns países da América Latina ainda estava disponível online

e era possível jogar. Surpresa e insegura diante dessa dificuldade, me perguntava:

Como agir a partir de agora? Haveria alguma alternativa ao meu alcance? Faria

sentido levar a versão do jogo em espanhol para a sala de aula?

Cogitei procurar colaboradores nas escolas de línguas na cidade de Goiás,

já que os alunos do colégio militar não estudam espanhol. Entretanto, os cursos

da cidade não oferecem o idioma. Mesmo sabendo da dificuldade de conciliar a

pesquisa em uma cidade com o trabalho de pesquisa em outra, insisti nesse

caminho e contatei também escolas em Goiânia nas quais os alunos tem aulas de

espanhol. Por meio de um professor de espanhol do Colégio Santo Agostinho,

apresentei à coordenação o projeto de pesquisa com a justificativa sobre a

participação específica de seus discentes. Embora receptivo, o colégio tinha o

calendário escolar fechado e as conversas com os professores ou com a

coordenação eram corridas, difíceis, devido a seus compromissos profissionais.

No final de 2015, as versões de “Mais Fanta, mais diversão” para países

latinos também não estavam mais disponíveis. Era necessário repensar não

somente o grupo, mas a maneira de acessar o tema, visto que eu já que não podia

contar com a interação dos jovens com o jogo. Junto às impossibilidades de

seguir com a pesquisa, enfrentava um momento delicado no trabalho. A vida

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pessoal acabou sendo também abalada e desenvolvi um quadro de depressão.

Diante de tal situação, no início de 2016 protocolei junto ao IBRAM um processo

solicitando minha transferência para Goiânia. Além do estresse emocional, a

possibilidade de esse processo equivalia a instabilidade quanto à permanência em

entre Goiânia e a cidade de Goiás.

Assim que possível comecei mais uma busca por colaboradores. Fazendo

alguns ajustes à proposta inicial da pesquisas projetei a realização de grupos

focais nos quais jovens debatessem sobre o universo de Fanta na mídia (TV e

internet) e do jogo. Visitei o Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação,

também conhecida como Escola de Aplicação da Universidade Federal de Goiás,

em Goiânia. Em paralelo, mantive contato com a Escola Municipal Bernardo Élis,

também na capital, na qual fui apresentada por intermédio de uma colega do

Programa de Pós-graduação em Arte e Cultura Visual. Enquanto negociava com a

direção da Escola de Aplicação da UFG, a recepção na Escola Bernardo Élis foi

calorosa gerando expectativas positivas.

Em 08 de junho visitei, pela primeira vez, a Escola Bernardo Élis para

conversar pessoalmente com um dos coordenadores, o professor Diego Alves.

Falei sobre a investigação, explicitei detalhes sobre os procedimentos da pesquisa,

conheci as instalações e alguns professores. A escola fica no bairro São Carlos,

periferia de Goiânia, oferece o ensino fundamental e curso supletivo para jovens e

adultos. Em termos de estrutura, dispõe de 12 salas de aula, uma sala de

informática, uma sala com recursos multifuncionais (TV, vídeo etc.), um pátio

coberto e uma cozinha que fornece alimentação para os estudantes. O

coordenador me falou da dificuldade de montar o grupo com idade média entre

12 e 15 anos, pois seria necessário reunir alunos de turmas diferentes com carga

horária a cumprir em sala de aula. Mas, em contrapartida, ele apresentou o

projeto “Mais Educação”, que oferece atividades extracurriculares para que os

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alunos permaneçam na escola no contra turno. Depois das aulas, no período entre

13h às 16h30, o professor Diego organiza exibição de filmes, projetos no

laboratório de informática, sessões de jogos, oficinas de leitura, desenho e várias

outras atividades. Segundo ele, a função principal do projeto “Mais Educação” é

manter crianças e jovens fora da rua, considerando que muitos deles ficam

sozinhos em casa enquanto os pais trabalham.

Pensando no projeto “Mais Educação”, troquei e-mails com o professor

Diego detalhando as atividades – planejamento dos encontros segue em anexo -

a serem desenvolvidas no trabalho de campo a ser realizado com os alunos da

Escola Bernardo Élis. Interessado em oferecer atividades diferentes ao grupo, ele,

por sua vez, conversou com alunos sobre o interesse em participar da pesquisa e,

assim, conseguimos formar um grupo com cerca de 15 alunos.

Como o projeto “Mais Educação” dava liberdade para abordar temas

diversificados e sem a exigência de afinidade com os conteúdos das disciplinas

curriculares, planejei a realização de um grupo focal levando em consideração o

interesse dos alunos participantes e no qual refletissem sobre a construção do

conceito de juventude a partir das propagandas e jogos de Fanta. Estava ávida

para concluir essa etapa do trabalho de campo e, desse modo, combinamos

encontros consecutivos nas tardes dos dias 20 a 24 de junho de 2016. Devido a

vários imprevistos, passíveis de acontecer em pesquisa de campo, foram

necessários mais duas sessões. Descrevo a seguir cada encontro.

20 de junho de 2016 – segunda feira

Cheguei à escola por volta das 13h10. Perdi alguns minutos tentando

encontrar o caminho até a escola e o pequeno atraso foi suficiente para criar

bastante ansiedade entre os alunos. O professor Diego me apresentou como a

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pessoa que estava estudando jogos e me deixou sozinha com 14 alunos32: Keven

Pereira, Jonathan Ramon, Marcos Vinícius, Ricardo Rodrigues, Carlos Daniel,

Janderson Michel, Paulo Henrique, Carlos Henrique, Kauane Riberio, Otávio

Soares, Marcela Namillys, Adrielly Cristine, Alana Rodrigues e Djully Oliveira.

Ao invés de apresentar cada um dos colaboradores destacando

características que os diferenciem em entre si, preferi focar nas características que

os une, pois as singularidades vão aparecendo aos poucos nas falas e até mesmo

nos silêncios de cada um deles. A faixa etária dos estudantes variava entre 10 e 16

anos, todos moravam nas cercanias da escola, em bairros periféricos, com a

família nuclear normalmente formada por mãe, pai (em alguns casos padrasto) e

irmãos.

Os colaboradores estavam organizados em grupos de quatro em cada

mesa, mas logo transformei o arranjo em um círculo de modo que todos podiam

se ver. Apresentei-me novamente, explicando que era uma aluna de doutorado.

Detalhei da melhor maneira possível o que é um curso de mestrado e de

doutorado explicitando como cheguei até a Escola Bernardo Élis e minha

expectativa de contar com a participação deles na pesquisa que estava realizando.

Vários alunos me olhavam com curiosidade, atentos ao meu sotaque, observando

meus movimentos e acompanhando cada coisa que dizia. Na expectativa de

quebrar o gelo, deixa-los mais à vontade e criar um ambiente mais informal,

propus uma dinâmica de aproximação: sorteei pares para que eles conversassem

e se conhecessem melhor. Após algum tempo, expliquei que inverteríamos esse

processo de aproximação e conhecimento e cada um ia apresentar o colega.

Tentando criar com os alunos uma relação mais lúdica e convidativa, propus que

sentássemos no chão para a próxima etapa da atividade. Esse convite

32 No formulário de consentimento de participação, os colaboradores escolheram como queriam

ser apresentados no trabalho e todos preferiram ser tratados pelos próprios nomes.

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surpreendeu alguns alunos que, em seguida, comentaram que de início me

acharam “metida”, mas, agora, se davam conta que eu era uma pessoa “simples,

sem frescura”.

Saquei uma caixa de fósforos e expliquei que cada aluno teria o tempo do

palito aceso para apresentar o colega. Alguns tiveram tempo apenas para dizer o

nome do colega, mas outros ofereceram, além do nome, informações sobre a

família, algumas preferências e assim por diante. A proposta de apresentação os

deixou mais a vontade para falar dos colegas e, também, conversar comigo. Após

a rodada de apresentações, me dispus a responder as questões e curiosidades

tivessem sobre mim. Foi importante observar que entre as preocupações e

interesses dos alunos estava saber a minha origem, por que mudei para Goiânia,

se era casada e se tinha filhos. Essa etapa foi encerrada com o anúncio da

merendeira de que o lanche estava servido.

A aproximação inicial tinha sido realizada e eu percebia que os alunos

continuavam curiosos, porém, agora em relação a pesquisa e às atividades que

iríamos realizar. Narrei, brevemente, as minhas tentativas frustradas de dar

continuidade a investigação e fazer o trabalho de campo - grupo focal - em

outras instituições. Falei, também, da indisponibilidade do jogo on line e como

estava planejando as atividades que seriam realizadas nos encontros. Expliquei

que as nossas conversas seriam gravadas e posteriormente transcritas. Ressaltei o

fato de que os participantes da pesquisa não deveriam se preocupar com

respostas certas, pois o meu interesse era conhecer a posição, a opinião deles

sobre as questões que serias discutidas. Fiz, ainda, a ressalva de que a participação

deles era totalmente voluntária, podiam participar ou não de alguma etapa,

podiam desistir ou continuar, conforme quisessem. Entreguei aos participantes

duas vias do Termo de Consentimento de Livre Participação (em anexo) assinadas

por mim e para ser assinada também pelos pais ou responsáveis, visto que todos

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eram menores. Lemos o termo juntos, parte a parte, tirando dúvidas e explicando

algumas questões sobre o correto preenchimento. Por fim, distribui folhas de

cartolina, revistas e cola pela sala e pedi que criassem cartazes para se

apresentarem no dia seguinte. A ideia era que retirassem das revistas imagens

com as quais se relacionassem, fossem elas imagens de produtos, de

personalidades ou personagens.

Para evitar problemas, decidi não fazer registro gravado do primeiro

encontro porque ainda não tinha a autorização de participação com assinatura

dos pais ou responsáveis. Por volta das 15h50 encerramos o primeiro encontro e

nos despedimos com boas expectativas para o encontro seguinte. No período de

tempo que restava até 16h30, os alunos iriam assistir o filme Jumanji33.

21 de junho de 2016 – terça feira

No dia seguinte a ansiedade dos estudantes parecia ainda maior. Pelas

conversas que corriam na sala, tal ansiedade não estava era propriamente

relacionada à pesquisa e ao trabalho de campo do qual eles participariam, mas a

uma tentativa de discordar ou rejeitar proposta feita pelo professor Diego,

coordenador do projeto “Mais Educação”. Os primeiros minutos foram de

agitação total. Ao mesmo tempo em que os alunos entregavam as autorizações

de participação assinadas pelos pais, corriam, trocavam insultos e socos,

conversavam em voz alta revelando uma espécie de excitação. Pedi que se

sentassem e, aos poucos, os ruídos e a algazarra foram diminuindo embora eles

ainda continuassem visivelmente irrequietos. Propus, então, alguns momentos de

relaxamento e meditação. Coloquei uma música calma no computador, pedi que

baixassem a cabeça e respirassem fundo. Entre murmúrios e suspiros, lembrei que

ninguém era obrigado a participar da investigação. Cinco minutos depois voltei a

33 Filme de 1995 baseado no livro infantil de Chris Van Allsburg, lançado em 1982. Dirigido por Joe

Johnston e protagonizado por Robin Wlliams.

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recolher as autorizações e entreguei novos formulários para aqueles que havia

perdido. Cada aluno apresentou o cartaz que preparou no dia anterior e falou um

pouco mais sobre si. As figuras a seguir exemplificam as colagens as colagens que

foram feitas.

A primeira colagem (fig. 44), feita por Carlos Henrique, enfatiza seu prazer

de cozinhar, sua simpatia por aves como a coruja e seu interesse representado por

um aparelho de celular, um relógio e um óculos. A segunda (fig. 45), do aluno

Janderson Michel, foi composta por personagens da mídia porque, segundo ele

mesmo, gosta muito de desenhos, quadrinhos, filmes e vídeo games. No último

dos cartazes (fig. 46), Alana Rodrigues ressaltou que fez questão de colar artefatos

considerados importantes para a mulher, incluindo vários acessórios e a imagem

de um homem.

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Figura 44 - Cartaz de apresentação de Carlos Henrique

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Figura 45 - Cartaz de apresentação de Janderson

Figura 46 - Cartaz de apresentação de Alana

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Num segundo momento, expliquei que iríamos assistir algumas

propagandas de Fanta e conversar sobre algumas questões e aspectos dos vídeos.

Repeti, três vezes, a exibição do filme de 30 segundos “Manifesto à diversão” e dei

início a um debate convidando-os a se posicionar em relação perguntas como

consta na transcrição das anotações daquele dia (em anexo). Antes de começar a

gravar as atividades, pedi cooperação para mantermos silêncio. Permanecia o

mesmo grupo, exceto pela ausência de Paulo Henrique, que saiu devido à outro

compromisso na escola. Às 14h30 tivemos um intervalo de 10 minutos para o

lanche. Por volta das 14h40 retomamos a gravação das atividades. Assistimos os

vídeos “Mímica” e “Mister músculos” para dar continuidade à conversa, que

encerrou-se às 15h30, quando a turma passou para o laboratório de informática

(fig. 47). Ali, solicitei aos alunos que escrevessem por que ou como cada um se via

como jovem, o que consideravam pontos positivos e também negativos em

relação a ser jovem. Os alunos responderam rapidamente e em seguida passaram

a jogar Pipa Combate. Às 16h devolvi a turma à coordenação. Eles dariam

sequência à exibição do filme Jumanji que tinham começado a assistir no dia

anterior.

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Figura 47 - Alunos no laboratório de informática da escola

22 de junho de 2016 – quarta feira

O terceiro dia foi, talvez, o mais conturbado. A presença do coordenador

em sala de aula deixou os alunos quietos, mas, também, pouco participativos,

intimidados, como se temessem alguma coisa. Comecei o encontro pedindo que

me explicassem, falassem sobre o game que estavam jogando no laboratório de

informática depois de escreverem como se sentiam como jovens, pontos positivos

e negativos, como eu havia solicitado. Gravei as várias posições/opiniões dos

alunos e o debate que aconteceu, mas, além do grupo estar muito calado, uma

equipe de manutenção da escola que consertava lâmpadas entrou na sala. Essa

interferência inesperada deixou os alunos ainda mais dispersos. Encerrei a

gravação com o chamado para o lanche.

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Na volta pedi a eles que desenhassem numa folha A3 a cidade que

consideravam ideal para viver e também a casa que gostariam de ter, com

atenção especial ao quarto de cada um (fig. 48). Como exemplo, levei algumas

ilustrações de cidades e quartos retirados da internet. Por voltas das 15h50 a

maioria tinha terminado os desenhos e íamos conversar sobre os desenhos, mas

devido ao adiantado da hora preferi dar continuidade a atividade no dia seguinte

visto que os alunos estavam dessa vez muito agitados. Eles concordaram, pois

estavam ansiosos queriam concluir a exibição do filme Jumanji.

Figura 48 - Alunos participam da atividade de desenho

Vale a pena anotar, ainda, algumas observações desse dia. Num

determinado momento 8 participantes formaram 2 grupos trocando ofensas

racistas. Um garoto que sofre bullying dos colegas por seus trejeitos “afeminados”

imitava o coordenador, que é homossexual. Outro garoto discutiu com uma

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colega sobre tatuagens, afirmando que esse tipo de registro no corpo podem

ofender as leis de deus.

23 de junho de 2016 – quinta feira

Iniciamos o encontro na quinta-feira com os alunos apresentando os

desenhos de suas cidades, casas e quartos. Como estavam inquietos, eles mesmos

sugeriram um momento de meditação. Ramom, Djully e Alana preferiram não

participar. Depois de cerca de uma hora de apresentação, descrições e detalhes

sobre suas produções, mostrei os cenários que compõem o jogo para

conversarmos sobre semelhanças e diferenças entre a cidade e as casas de “Mais

Fanta, mais diversão” e aquelas que eles haviam desenhado. Entre as ausências

citadas ficou muito claro a importância da igreja para a maior parte do grupo,

algo que me surpreendeu. Devido a várias interferências e imprevistos, não foi

possível concluir o trabalho nesse encontro e, por esta razão chegamos a um

acordo no sentido de realizar mais um encontro na segunda-feira já que na sexta

seria a festa junina na escola. Pedi ao grupo que tentasse explorar um pouco mais

sobre o universo do jogo durante o fim de semana.

27 de junho de 2016 – segunda feira

Com a proximidade das férias – a escola encerraria as atividades no dia 29

de junho – apenas cinco alunos apareceram na segunda: Carlos Daniel, Ricardo,

Kauane, Adrielly e Alana. Alguns haviam, de fato, procurado referências sobre os

personagens na internet. Nosso bate papo foi sobre os personagens e a

identificação dos alunos com eles. Com um número reduzido de participantes a

conversa foi mais tranquila e encerramos por voltas das 14h com a merenda

escolar. Os acompanhei no pátio e percebi que alguns participantes dispensaram

a merenda à espera do lanche com Fanta que encerraria nosso trabalho, conforme

havíamos combinado. No intervalo alunos que não participaram me procuraram

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para falar da frustração de ter ficado de fora. Outros falavam que achavam que

iam jogar videogame e não só conversar sobre. Voltamos à sala às 14h30. Servi

biscoitos e refrigerante, fanta, para o grupo inicial e alguns outros participantes

do projeto “Mais Educação” que estavam presentes.

As impressões, percepções e opiniões dos alunos serão apresentadas e

discutidas no quinto capítulo, momento em que analiso o universo de “Mais

Fanta, mais diversão”.

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CAPÍTULO 4 – DE/COM QUEM ESTAMOS

FALANDO? Sobre a noção de juventude

4.1 Espírito jovem - A ideia de juventude como uma condição

Em 2015, a soma de homens e mulheres com menos de 24 anos em todo o

mundo chegou a 42,4%. Enquanto isso, pessoas com idades entre 25 e 54 anos

somaram 40,7% e as com mais de 55 anos, 16,8% (INDEXMUNDI). Os dados

mostram que a quantidade de crianças e jovens ultrapassam o número de adultos

e de pessoas da terceira idade, se considerados separadamente. Para além dessa

impressionante expressividade numérica – mais de 3 bilhões de pessoas – a

parcela jovem da população mundial tem se destacado em termos de

importância. A geração que ainda não havia nascido quando o muro que

separava as duas Alemanhas caiu, em 1989, é filha de um momento histórico

efervescente em mudanças sociais, sobretudo motivadas por avanços

tecnológicos. Talvez apenas a industrialização - e a modernidade consequente

dela - tenham operado alterações sociais mais profundas, como veremos ao longo

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deste capítulo, condição permitiu chegarmos a configuração do mundo em que

vivemos.

Na última metade do século XX, as pesquisas na área de informática

estavam ganhando força. O videogame, por exemplo, tem a primeira de suas

versões ainda nos anos 50 e o que conhecemos como internet era, até o fim dos

anos 60, apenas uma rede de computadores montada pelo Departamento de

Defesa dos Estados Unidos para otimizar pesquisas em tecnologia militar, àquela

época conhecida como Arpanet (CASTELLS, 2003). Menos de um século depois, os

games gozam de status cultural, como vimos no capítulo 1, e o universo virtual

reconfigurou as relações sociais, popularizou a criação, divulgação e

armazenagem de informações, nos tornou virtualmente onipresentes e cada vez

mais fascinados pelas imagens (SIBILIA, 2012).

Outros acontecimentos marcantes - notadamente perceptíveis na cultura

norte americana - como o fim da segunda grande guerra ou o declínio do

movimento hippie, também tiveram seus herdeiros, no caso, os baby boomers e

os yuppies, respectivamente. Entretanto, nenhuma geração anterior se diferenciou

tanto de sua antecessora como a juventude atual, cuja definição ainda é instável e

os rótulos múltiplos. É possível notar que a entrada no mercado de trabalho e a

autonomia financeira e marcavam o início da vida adulta de várias das gerações

anteriores. No entanto, na contemporaneidade, as pessoas tem demorado cada

vez mais a se assumirem como adultas e cultuado um estilo de vida juvenil, em

grande proporção definido pelo consumo.

Esse cenário é reiterado pela centralidade dada pela indústria cultural a

uma fatia de mercado associada ao lazer (música, cinema, TV etc.) e pelo

alargamento do tempo de formação escolar que dificulta a independência

econômica: “existe, portanto, a tendência para a manutenção de uma identidade

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juvenil durante um período mais longo, reflexo de condições sociais que

favorecem essa juvenilidade” (CAMPOS, 2002, p. 110). O que se vê em todas as

faixas etárias é uma busca incessante por liberdade, atitude e prazer, levando

pesquisadores como a psicanalista Maria Rita Kehl (2004, p. 89 e 90) a afirmar:

“Difícil precisar o que é juventude. Quem não se considera jovem hoje em dia? O

conceito de juventude é um estado de espírito, é um jeito de corpo, é um sinal

saúde e disposição, é um perfil de consumidor, uma fatia de mercado onde todos

querem se incluir”.

Adolescência e juventude são ideias, construções conceituais. A primeira é

muito usada para se referir à puberdade, período de maturação sexual dos

indivíduos e, no discurso médico, corresponde à fase entre a infância e a vida

adulta. A outra, por seu turno, atualmente remete a um sentimento, uma atitude.

Mas os conceitos são cambiáveis se fizermos um apanhado sócio-temporal:

Para que exista juventude, devem existir, de um lado, uma série de

condições sociais (normas, comportamentos e instituições que

diferenciem os jovens de outros grupos etários) e, de outro, uma série de

imagens culturais (valores, atributos e ritos associados especificamente

aos jovens). Ambas dependem da estrutura social em conjunto, quer

dizer, as formas de subsistência, as instituições políticas e as cosmovisões

ideológicas que predominam em cada sociedade (FEIXA, 2004, p. 18 |

tradução minha)34.

Entre as novidades surgidas no fim do século passado, está, portanto, a

juventude apartada da noção de idade e lançada a uma condição quase

específica. Para entender melhor a criação e o desenvolvimento dessa categoria é

34 Do original: Para que exista la juventude, deben existir, por uma parte, uma serie de condiciones sociales

(es decir, normas, comportamentos e insituiciones que distingan a los jóvenes de otros grupos de edad) y,

por outra parte, uma serie de imágenes culturales (es decir, valores, atributos y ritos associados

especificamente a los jóvenes). Tanto unas como otras dependen de la estrutura social em su conjunto, es

decir, de las formas de subsistencia, las instituiciones políticas y las cosmovisiones ideológicas que

predominan em cada tipo de sociedade.

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preciso voltar a um tempo em que ainda não existia o conceito de infância, tal

como conhecemos hoje, o que faremos a seguir.

4.2 Gerando crianças - A invenção do conceito de infância

A tese de que a infância não é natural, mas cultural, foi tratada pela

primeira vez pelo historiador francês Philippe Ariès (2011) em seu livro História

Social da Criança e da Família. Ariès analisa quadros, diários e trajes, entre outras

evidências, para defender que a criança foi ganhando importância junto à família

e à sociedade apenas depois da Idade Média. As publicações dos séculos XV ou

XVI já mencionavam as diferentes fases da vida humana, entretanto, as “idades da

vida” designavam terminologias eruditas, restritas aos intelectuais e estudiosos da

época. Embora alguns dos termos tenham resistido até hoje, eles não guardam o

significado de então:

As ‘idades’, ‘idades da vida’ ou ‘idades do homem’ correspondiam no

espírito de nossos ancestrais a noções positivas, tão conhecidas, tão

repetidas e tão usuais, que passaram do domínio da ciência ao da

experiência comum. Hoje em dia não temos mais ideia da importância

da noção de idade nas antigas representações do mundo. A idade do

homem era uma categoria científica da mesma ordem que o peso ou a

velocidade o são para nossos contemporâneos (ARIÈS, 2011, p. 4).

A palavra criança, por exemplo, é citada em uma publicação do século XVI

para designar uma pessoa aos 24 anos, já em outra, do século XVII, fala-se de um

jeune enfant (uma jovem criança) de 14 anos. “A ideia de infância estava ligada à

ideia de dependência. (...) Só se saía da infância ao se sair da dependência” (ARIÈS,

2011, p. 11). A associação estabelecida entre infância e dependência se reitera

pela linguagem quando eram também chamados de fils, valets e garçons aqueles

que mantinham relações feudais de dependência ou os serviçais (idem).

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O sentido precioso de infância como se entende hoje não tinha significado

até a Idade Média devido às condições demográficas que acarretavam grande

mortalidade infantil. Era extremamente comum que bebês não chegassem aos 7

anos e sua morte era quase banal. Tanto é que Ariès (2011) se surpreende com a

precocidade do valor atribuído às crianças enquanto as condições sociais agiam

contra sua sobrevivência. Para o autor, a cristianização é responsável pela

mudança de costumes, pois se acreditava que a alma entrava no corpo com o

batismo, assim o sacramento conferia relevância divina aos pequenos, logo,

importância social.

Enquanto dependentes, as crianças possuíam também pouca diferenciação

de gênero quanto às vestimentas, até por que se acreditava que fossem alheias à

sexualidade. Se até o século XIII só existiam trajes de adultos em diferentes

tamanhos, a partir do século XVII surgem as roupas específicas de criança. Assim

que deixavam os cueiros, meninos e meninas eram metidos em saias, vestidos e

aventais:

Tornou-se impossível distinguir um menino de uma menina antes dos

quatro ou cinco anos, e esse hábito se fixou de maneira definitiva

durante cerca de dois séculos. Por volta de 1770, os meninos deixaram

de usar o vestido com gola aos quatro-cinco anos. Antes dessa idade,

porém, eles eram vestidos como meninas, e isso continuaria até o fim do

século XIX: o hábito de efeminar os meninos só desapareceria após a

Primeira Guerra Mundial, e seu abandono deve ser relacionado com o

abandono do espartilho das mulheres: uma revolução do traje que

traduz a mudança dos costumes. (...) A informação fornecida pelo traje

confirma os outros testemunhos da história dos costumes: os meninos

foram as primeiras crianças especializadas.

Em paralelo aos trajes infantis, surge também, em meados do século XV, o

zelo pela inocência infantil. Jean Charlier de Gerson, religioso e intelectual que

viveu entre os séculos XIV e XV, deu início a uma reforma moral que condenava as

brincadeiras corporais (que poderiam tornar-se sexuais) e a masturbação infantil,

censurava situações de contato entre crianças e adultos tais como dividir camas,

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hábito corriqueiro e nunca questionado até o momento (in ARIÈS, 2011, p. 80 e

81). O pudor e a decência passaram a regular a lida com a criança de modo que

no século XVII livros eram editados para adequar-se às crianças, divertimentos

categorizados em bons e maus, criadagem e educadores deveriam vigiar as

crianças seguindo rígidos limites e com o mínimo de contato físico.

Sibilia (2012, p. 32) afirma que tanto a infância quanto a escola são produto

da modernidade: “para que houvesse escola, tinha que haver crianças; por isso

diante da necessidade histórica de realizar o projeto modernizador anunciado

pelas revoluções científicas, industriais e democráticas, foi preciso ‘inventar’ as

duas”. Para Ariès (2011), a vida escolástica também foi significativa para se

entender a invenção da infância. Na Idade Média, os colégios e escolas não eram

espaços de aprendizagem, mas lugares de formação de clérigos em que se

misturavam meninos de várias idades – as meninas eram excluídas. Para as

mulheres, a infância era normalmente mais curta, pois tinha fim com o casamento,

que podia acontecer logo aos 13 ou 14 anos.

Por volta do século XV os colégios viraram instituições educativas e a partir

daí veio a necessidade de dividir os alunos adequando o nível do mestre ao do

grupo. Aos 10 anos um garoto era considerado apto a entrar na escola do século

XVII. Antes disso seria considerado incapaz de acompanhar o conteúdo

ministrado. Desse modo, a primeira infância, aquela em que a criança é

totalmente dependente, “frágil e tola”, se prolongou até os 10 anos. Nos colégios,

mantinham-se grupos separados por idades: 10 a 14, 15 a 18 ou 19 a 25 anos.

Essas idades se encaixavam numa segunda infância que era substituída, com o fim

da formação, pela vida adulta. Nem todos tinham acesso ou interesse pela vida

escolástica, assim o período da infância era estendido até o momento em que a

criança tornava-se adulta desempenhando um serviço laboral ou militar (ARIÈS,

2011).

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Até o século XVIII, portanto, a infância acabava com independência

econômica, no caso dos homens, ou com casamento, no caso das mulheres. Esse

cenário mudou, de acordo com Kehl (2004, p. 91), porque o “conceito de

adolescência, que se estende em certos países até o final da juventude (hoje em

dia não hesitamos em chamar adolescente a um moço de 20 anos), tem uma

origem e uma história que coincidem com a modernidade e a industrialização”. A

partir daí a juventude continuou a ser tida como o intervalo entre a infância e a

vida adulta, entretanto, não como fase de maturação física e emocional, mas

segundo um “modelo conformista de juventude, o ideal de adolescência como

período livre de responsabilidades, politicamente passivo e dócil” (FEIXA, 2004, p.

41). Feixa (2004) assegura, contudo, que cada tipo de organização social é dotado

de condições e imaginário que caracterizam sua compreensão de juventude. Esse

autor apresenta entendimentos sobre os jovens de acordo com as cosmovisões de

cada tipo de sociedade, como veremos a seguir.

4.3 As crianças viram jovens - Um conceito inicial de juventude

Embora os estudos sobre idades e fases da vida tenham sido bastante

explorados durante a Idade Média, os discursos eram predominantemente

médicos e pautados em experimentos pseudocientíficos, como relatam Feixa

(2004) e Ariés (2011). Ambos citam o Grand propriétaire de toutes les choses,

“espécie de enciclopédia dos saberes sagrado e profano” (FEIXA, 2004, p.31),

publicada na França do século XVI, como a principal fonte de informações sobre o

tema. O livro distingue as sete idades do homem, mas os limites entre elas são

relativos, pois a classificação considerava menos o tempo de vida do que as

capacidades dos indivíduos (ARIÈS, 2011).

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Conforme já pontuou Kehl (2004), a juventude tal como compreendemos

hoje é produto da industrialização e da modernidade. Para Campos (2007), essa

juventude é uma categoria ocidental, inventada política, midiática e

academicamente no século XX despertando o interesse das ciências sociais pelo

viés da psicologia, da sociologia e da antropologia. A primeira, se preocupando

com os aspectos e enfrentamentos individuais, enquanto as demais tratando da

observação da vida social dos jovens. As investigações especificamente voltadas a

esse grupo etário ganham força a partir da segunda guerra, quando ser jovem

“entra na moda”. Feixa (2004) mostra, contudo, que, antes disso ou em outros

arranjos sociais diferentes daquele no qual estamos inseridos, o período que

precede a vida adulta já recebia atenção especial.

Em seu levantamento, Feixa (2004) apresenta estudos antropológicos de

culturas primitivas – termo que usa para referir-se a culturas sem Estado - em que

a adolescência está ligada a um segundo nascimento, uma vez que morre a

criança para nascer o adulto. Os púberes, como são designados, normalmente

são do sexo masculino e passam por ritos que marcam sua maturidade sexual e

comprovam sua competência como provedores para as futuras famílias. Embora

os rituais sejam impostos a uma faixa etária juvenil, de acordo com a visão

ocidental, nota-se que não existe uma transição clara ou imagens culturais que

diferenciem esse grupo de idade dos demais. Se não há uma ideia de jovem,

estabelecer cerimônias que marquem o fim da infância, por outro lado, funciona

para definir os papeis dos indivíduos e organizar essas sociedades:

Os sistemas de idade servem para legitimar um acesso desigual aos

recursos, às tarefas produtivas, ao mercado matrimonial e aos cargos

políticos. Poderíamos interpretá-los como categorias em trânsito

bastante formalizadas, equivalentes estruturalmente a nossa juventude,

ritualizadas mediante cerimônias de iniciação, cuja função é legitimar a

hierarquização social entre as idades impedindo o conflito aberto (pois

os jovens acabam tornando-se adultos) e assegurando a sujeição dos

mais novos às pautas sociais estabelecidas (idem, p. 25 e 26).

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Nas sociedades em que o Estado é proeminente, como entre os antigos

gregos e romanos, a hierarquização social, a divisão de trabalho e a urbanização

possibilitaram o surgimento de um grupo etário especializado. Com alguma folga

econômica, parte da população masculina pode dedicar-se a tarefas não

produtivas e formação militar. Assim surgiu a efebia, na Atenas do século V a.C. A

instituição que em princípio dedicava-se a formar militares, logo passou a

enfatizar os aspectos educativos. Para frequentá-la era preciso dispor de tempo

livre para a formação acadêmica e o cumprimento das obrigações militares (idem,

p. 27). A imagem dos jovens efebos passou a ser vinculada ao amor erótico, a

ânsia de saber e o desejo de reforma e beleza.

Na Idade Média, como posto no tópico anterior, cria-se antes do moço, a

criança. Ariés (2011) relata que quando tornavam-se minimamente autônomos,

entre os 7 ou 9 anos, meninos e meninas deixavam suas famílias para viver com

outras a fim de serem formados em um ofício e também para aprenderem sobre

relações sociais, comportamento e demais aspectos da vida na prática. Poucas

pessoas frequentavam escolas e o ensino escolar não era restrito aos mais novos,

mas recebia e misturava gente de todas as idades. Tão logo conseguisse um ofício

e se tornasse financeiramente independente – ou casasse, no caso das garotas -, o

indivíduo chegava à vida adulta.

Durante o processo de industrialização da Europa, com o capitalismo

suplantando o feudalismo, quatro instituições sofreram significativas mudanças

que acabaram por incidir também sobre o jovem como produto desse tempo

(FEIXA, 2004). Família, escola, exército e trabalho foram reconfigurados. A família

começou a cultivar um sentimento cada vez maior de responsabilidade e respeito

pelos filhos que se tornaram dependentes moral e financeiramente por mais

tempo (ARIÈS, 2011). Junto a isso, a escola se especializou como lugar de

educação. Assim a escola se converteu em instrumento de iniciação social e

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ganhou a responsabilidade de afastar momentaneamente os jovens do mundo

adulto ao mesmo tempo em que os preparava para ele (FEIXA, 2004).

Ainda por ocasião da modernidade, o exército garantiu seu papel na

conformação juvenil a partir da obrigatoriedade do serviço militar – instituída com

a Revolução Francesa. Longe de suas famílias, os rapazes conviviam com outros da

mesma idade e origens diversas, desse modo desenvolveu-se gradativamente a

consciência de geração. Além disso, servir às forças armadas equivalia a um rito, já

que depois desse compromisso se poderia pensar em constituir família (idem).

Por fim, a industrialização remodelou o mundo laboral. A princípio o

trabalho infantil foi bastante explorado. Os avanços técnicos – e a sua

regulamentação paulatina –, entretanto, diminuíram a necessidade de mão de

obra dispensando especialmente crianças e requisitaram mais preparação técnica.

Dessa forma, os jovens foram excluídos do mercado e voltaram para as salas de

aula. Com a necessidade de mais tempo de formação sob a tutela dos pais, dá-se

o “descobrimento” dos adolescentes na primeira metade do século XX. É por essa

época também que o conceito se democratiza abarcando pela primeira vez

mulheres e se estendendo para classes operárias e zonas rurais (idem). Para

Grossman (2010, p. 48), no século XIX, “a figura do adolescente foi balizada com

nitidez. A adolescência masculina foi definida como o período entre a primeira

comunhão e o bacharelado ou serviço militar, e a feminina entre a primeira

comunhão e o casamento”.

Campos (2007) acrescenta a tais mudanças a importância crescente dada

ao tempo e ao espaço destinados às atividades não produtivas que Dumazedier

(1988 in CAMPOS, 2007) apelidou de revolução dos tempos livres. O tempo que

essa geração não dedicava ao trabalho era usado para promover e compartilhar

outras experiências – estudos, música, esporte, lazer, por exemplo – o que acabou

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sendo importante como “recurso para a definição das identidades sociais e

construção de estilos de vida, convertendo-se num campo de investimento

afetivo, econômico ou simbólico” (idem, p. 109).

A marcha adolescente é barrada, contudo, pela eclosão das grandes

guerras. Os homens na linha de frente e as mulheres na retaguarda sofreram

perdas e traumas que acabaram por comprometer hábitos juvenis de todas as

classes sociais. Foi como se a juventude tivesse sido roubada. Por outro lado,

participar desses feitos significou uma experiência de liberdade e maturidade em

relação ao compromisso social que cumpriram. Seu protagonismo lhes garantiu o

direito de serem tratados como adultos.

Se as guerras interromperam a jornada rumo à conquista da juventude,

depois delas o caminho estava aberto. Começando pelos Estados Unidos e se

espalhando pelo globo. Para Feixa (2004), cinco reconfigurações pós-guerra

permitiram que na metade final do século XX a juvenilidade ganhasse destaque na

sociedade. O crescimento econômico e o estado de bem-estar social privilegiaram

os jovens incrementando seu poder de compra, além de oferecer possibilidades

de formação, tempo livre e serviços específicos. Com mais dinheiro e tempo, os

jovens promoveram o enfraquecimento da autoridade familiar e outras formas

de controle, tomando, ainda que precariamente, as rédeas da própria vida. O

mercado percebeu aí uma oportunidade e segmentou o consumo produzindo

conteúdo e produtos destinados a esse público – tais como moda, lugares de ócio

etc. -, ou seja, o teenager marketing. A comunicação de massa reiterou essa

ideia legitimando a representação de uma cultura juvenil em filmes e músicas,

por exemplo. Os jovens passaram a identificar-se mais com seus pares etários do

que com membros de classes ou etnias. Essa geração vivenciou ainda a crise do

puritanismo e a revolução sexual proporcionada pelos anticoncepcionais, o que

permitiu relações afetivas outras além do casamento.

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O papel do capitalismo na “invenção” da ideia de juventude foi, de acordo

com Kehl (2004), decisivo. Para ela, o jovem passou a ser considerado cidadão

quando percebido como consumidor em potencial: “essa longa crise, que alia o

tédio, a insatisfação sexual sob alta pressão hormonal, a dependência em relação

à família e a falta de função no espaço público, acabou por produzir o que as

pesquisas de marketing definem como nova fatia de mercado” (p. 91).

Assim como o avanço do cristianismo concorreu para o nascimento da

infância na Idade Média, a expansão econômica do pós-guerra e suas

consequências – impactando inclusive valores morais – foram determinantes para

a consolidação da ideia de juventude. Entretanto, o final do século XX trouxe

novidades que mais uma vez ressignificaram o que é ser jovem.

4.4 Ser jovem hoje – Uma noção de juventude consolidada?

A nova ordem social do pós-guerra produziu uma dilatação da

adolescência. Os jovens já não contam com fortes referências como a autoridade

parental ou mesmo estatal e, por outro lado, tem suas expressões próprias de

lazer, afetos, estilo etc. Assim, o jovem indivíduo ganha autonomia, expressividade

e costura suas identidades:

Século XXI, tempo de atrativos tecnológico e de busca desenfreada de

bens de consumo. A oferta é constante, mas nada é suficiente. Calligaris

(2000) afirma que crianças e adolescentes aprendem que há duas

qualidades subjetivas para ser reconhecido e valorizado na sociedade

atual: é necessário ser desejável e invejável. Birman (2006) considera que

existe na atualidade um alongamento da adolescência, que hoje começa

mais cedo do que outrora e que se prolonga pelo período anteriormente

denominado de idade adulta. A contemporaneidade tem como marcas a

dissolução de certezas e um estado de desamparo coletivo que implicam

uma experiência complexa e plural de adolescer (GROSSMAN, 2010, p.

50).

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As culturas juvenis tornaram-se “um dos fenômenos mais característicos da

nossa história recente” (CAMPOS, 2007, p. 110). Vale destacar o uso do plural,

pois em comparação às outras gerações, o conceito de juventude é homogêneo,

tal como não é sólida uma ideia sobre velhice ou infância, já os conjuntos sociais a

que esses conceitos se aplicam é heterogêneo (PAIS, 1993, p. 34-35 in CAMPOS,

2007, p. 101). Assim é preciso ter em mente que não há um só modelo de ser

jovem:

Se por um lado existe uma ideia relativamente comum e uniforme sobre

jovem, com a qual todos os que se incluem nesta fase etária se

identificam minimamente, por outro lado, deparamo-nos com uma série

de variações, ramificações de um tronco comum, que marcam fronteiras

estruturais, simbólicas, econômicas, sociais, culturais, étnicas ou de

gênero entre os diferentes jovens e os grupos com que se identificam

(CAMPOS, 2007, p. 100).

As primeiras pesquisas preocupadas em entender mais sobre juventude,

realizadas ainda nos anos 1920 ou 1930, estavam profundamente vinculadas à

ideia de desvio, remetendo aos estudos sobre “grupos marginais, minorias étnicas

e culturais ou subculturas urbanas (idem, p. 96). Por volta dos anos 1970, novas

propostas de investigação sobre o tema surgem com autores ligados ao Centre

for Contemporary Cultural Studies – instituição de que descendem também os

estudos em Cultura Visual. Além de debaterem a relação entre as culturas juvenis,

os processos de produção e consumo cultural e as origens sociais, esses estudos

se ocupavam ainda da imagem dos jovens filiados ao movimento ‘punk’ ou

‘rastafari’, por exemplo (idem, p 96), sempre sob um viés político.

Por volta dos anos 1980, se renovam outra vez os olhares acadêmicos

sobre a temática e os grupos/movimentos juvenis começam a ser percebidos para

além de sua força política involuntária, mas também como relações de

identificação e pertencimento. Maffesoli descreve as tribos urbanas como

encontros afetivos e estéticos, contingentes e instáveis:

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a ideia de tribalismo insiste ‘no aspecto coesivo da partilha

sentimental de valores, de lugares ou de ideias que estão, ao

mesmo tempo, absolutamente circunscritos (localismo) e que são

encontrados, sob diversas modulações, em numerosas

experiências sociais’ (MAFFESOLI, apud CAMPOS, 2007, p. 102).

O século XX ainda não parece um passado distante quando nem chegamos

ao final da segunda década do século seguinte. Mas as renovações tecnológicas

que se popularizavam por volta dos anos 1990 marcaram as gerações nascidas a

partir daí de forma definitiva. A era do computador de mesa da família com

acesso discado a internet transformou-se rapidamente no tempo da conexão à

rede quase ubíqua por meio de aparelhos celulares estritamente pessoais.

Sibilia (2015, p.17) reflete sobre a geração screenager, conforme

descrevemos no primeiro capítulo, tendo a certeza de que as mudanças trazidas

pelas tecnologias incidem sobre várias instâncias da vida, inclusive sobre sua

organicidade: “Hoje proliferam outros modos de ser e de narrar o que somos:

novas definições de vida, dos corpos e das subjetividades, em sintonia com as

mudanças ocorridas no campo tecnocientífico e em todos os fatores que

contribuem para alimentá-lo”. Pautada em Deleuze, a autora reflete sobre o

conceito de juventude a partir da lógica da sociedade de controle. Para entender

as implicações dessa ordem social sobre os sujeitos, vale a pena nos determos

sobre o assunto.

O sujeito na sociedade de controle

Antes de falar dos sujeitos controlados é necessário tratar da própria

invenção da noção de sujeito. Silva (2006) recorre aos estudos foucaultianos sobre

arqueologia dos saberes para explicar tal fato. Em seus estudos, Foucault busca

relações entre “as palavras e as coisas” que regem a elaboração dos

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conhecimentos sobre óticas específicas em diferentes momentos. Assim, Foucault

identifica três epistemes: renascentista, clássica e moderna. Só quando o ser

humano passa a ser objeto do discurso de saberes, como a filosofia e a medicina,

da passagem da episteme clássica para a moderna, aparecem as condições para o

nascimento do sujeito (idem).

Cada episteme se vale de mecanismos específicos de poder que garantem

sua operacionalização. Na clássica, o rei era soberano sobre os destinos e corpos

de seus súditos. Com a emergência da epistem moderna em paralelo à

industrialização “a vida humana tornou-se alicerce dessa nova tecnologia de

poder” (SILVA, 2006, p. 81). Ao mesmo tempo em que se entende a existência do

sujeito é preciso adequá-la às demandas do capitalismo em marcha.

Com a modernidade, a queda das monarquias e a consolidação do

modelo burguês, cresce a necessidade de um poder que agisse sobre os

corpos, não para destruí-los, mas, para torná-los dóceis e úteis,

produtivos. Isso dependia da introjeção de valores que justificassem a

necessidade de uma ordem para um progresso incessante (SÉRVIO,

2015, p. 134).

Reforçando as ideias de Sérvio, Sibília (2015) afirma que instituições

modernas como escola, exército e indústria, se alinhavam para conformar cada

elemento das massas em indivíduos controlados e plenamente operantes na

sociedade como cidadãos e operários. Sem um poder centralizado, como o do rei,

cada sujeito tornou-se responsável por si mesmo, daí a urgência de conhecer e

honrar seu lugar na sociedade, ou seja, de ser autônomo e autocentrado.

Foi nesse grande espaço de controle que a subjetividade ganhou

centralidade. A subjetividade foi possível diante das técnicas

individualizantes, dos registros de informação sobre o corpo, da

necessidade de conhecer e dominar as paixões e as vontades do sujeito,

de modo a melhorar seu desempenho laboral, aumentar sua impotência

política. Nesse sentido, o controle a partir da disciplina ganhou o corpo

do homem, através do adestramento, da motilidade e do psiquismo

(SILVA, 2006, p. 82 e 83).

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Como atesta Silva, na citação que fizemos acima, individualizar, examinar,

observar, normatizar e funcionalizar estão entre as práticas da sociedade

disciplinar que moldavam o sujeito moderno. Da arquitetura panóptica ao

gerenciamento do tempo, da etiqueta social à regulação da sexualidade, os

mecanismos de vigilância sujeitavam todas as pessoas a regras, lhes impunha

identidades fixas. As tecnologias disciplinares modelavam a vida seguindo os

preceitos modernos de ordem para o progresso:

os organismos humanos foram adestrados para alimentar as

engrenagens da produção fabril e as fileiras dos exércitos

nacionais. Por isso tais corpos não eram apenas dóceis, mas

também úteis, já que respondiam e serviam a determinados

interesses econômicos e políticos (SIBILIA, 2015, p. 32).

Reiteirando a explicação de Sibília, pode-se dizer que o modelo disciplinar

sentiu um grande baque com a “virtualização do dinheiro” (idem, p. 24). A

sociedade pós-moderna – considerando pós-modernidade como sucessão à

modernidade – ainda preserva muito da ótica moderna de produção quanto à

otimização dos processos e lucros. Entretanto, as identidades fixas, em notável

medida, atreladas à cidadania e trabalho na sociedade disciplinar, a que se

filiavam os indivíduos, caíram por terra com a crise do ideal moderno no pós-

guerra:

Contemporaneamente, o capitalismo industrial transmuta-se no

capitalismo financeiro, inaugurando a época do mercado e globalização.

A soberania do sujeito moderno dá espaço para um novo ator: as

populações. Segundo Foucault, a partir das Grandes Guerras há uma

nova construção de poder, mas não se trata da substituição das

disciplinas e, sim, de um novo tipo de poder complementar, que se torna

responsável por gerir uma sociedade em franca transformação. É a

emergência do biopoder (SILVA, 2006, p. 83).

A lógica capitalista financeira ou empresarial, como explicita Silva

apoiando-se em Foucault, fez com que a individualização – importante para o

capitalismo industrial - perdesse centralidade em nome da escala global, do

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entendimento de padrões populacionais como fatias de mercado. O sujeito

moldado perde lugar para o modulado, capaz de escolher segundo contingências

a que ideologias e identidades se filiar e torna-se responsável por tais escolhas.

Bauman (2012) e Canclini (2006) concordam que a sociedade disciplinar composta

por trabalhadores transformou-se em uma sociedade de consumidores na qual

consumir equivale a existir. Sibilia (2015), inspirada em Deleuze, adjetiva tal

existência como a de consumidores controlados. Isso por que aparelhos

teleinformáticos conectam os sujeitos virtualmente a tudo. Para Silva (2006, p. 89),

os “homens modulados são os produtos típicos da ‘sociedade multirrede’, reitora

das formas de consumo liberalizante, tecnológico e mercadológico”. Toda e

qualquer ação por meio de computadores que fazemos são controladas, servindo

de banco de dados para empresas:

O modo de funcionamento associado aos novos dispositivos de poder é

total e constante, opera veloz e em curto prazo. Sua impulsividade e

ubiquidade costumam ignorar todas as fronteiras: atravessam espaços e

tempos, devorando tudo o que poderia ter ficado de fora e desativando

alternativas que se interpõem em seu caminho. Por isso, apesar da leveza

e dos tons coloridos com que costuma se apresentar, a nova

configuração socioeconômica e política pode ser vista como “totalitária”

num novo sentido: nada, nunca, parece estar fora de controle (SIBILIA,

2015, p. 29).

Concordando com, mas ao mesmo tempo ampliando os argumentos

utilizados por Sibília, Sérvio (2015) busca interseções entre a teoria da sociedade

do espetáculo, de Debord, e a sociedade do consumo, de Deleuze, para entender

por que a sociedade pós-moderna valoriza mais a flexibilidade, a modulação em

vez do molde. Em uma análise sucinta, podemos dizer que a sociedade do

espetáculo baseada no modelo de produção capitalista moderno uniformiza e

isola as pessoas. Seria a publicidade, como parte dessa estrutura, que

impulsionaria o consumo pressupondo desejos comuns a todos. Deleuze, por

outro lado, desconfia do conformismo e da homogeneidade da sociedade do

espetáculo, pois acredita que a sociedade de consumo vai além da conformação

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sendo ativa nos usos dados às mercadorias e retroalimenta o mercado com

informações e oportunidades. Como afirma Sérvio (2015, p. 334):

Hoje, vigiar não significa apenas confinar, regular, mas interceptar, ver,

ouvir e interpretar. De posse desses dados, por meio de estudos

qualitativos e quantitativos, empresas buscam constantemente criar

estratégias para sobreviver em um mercado extremamente competitivo e

gerir um crescimento econômico com regularidade.

Em sintonia com as ideias de Sérvio, podemos dizer que a lógica capitalista

pós-moderna lançou em desuso o conceito moderno de propriedade, por

exemplo, já que “é uma instituição lenta demais para se ajustar à nova velocidade

da nossa cultura” (RIFKIN, apud SIBILIA, 2015, p. 5). Assim também foi desgastada

a estabilidade das identidades dando lugar à fluidez da lógica da identificação

(CAMPOS, 2007, p. 102). Se a organização social em que estamos inseridos está

pautada pelo consumo, mais vantajoso é que o mercado possa atender vários

interesses em vez de uma só demanda, visto que,

Na sociedade, a permissividade de certa flexibilidade de ação para os

indivíduos é componente que alimenta o sistema. Neste momento de

intensa flexibilidade, as massas tornam-se amostras, dados, mercados

que precisam ser rastreados, cartografados e analisados para que

padrões de comportamento possam ser percebidos (SÉRVIO, 2015, p.

333).

4.5 Multiconectados - Ainda sobre a ideia de ser jovem nos dias de

hoje

Ser jovem hoje, como vimos, é estar inserido em uma sociedade cujos

fluxos financeiros são virtuais, os mercados são alimentados por informações

fornecidas voluntariamente pelos próprios consumidores como nós de redes

sociais on line, nas quais as subjetividades são exteriorizadas por meio de

símbolos. Esses fatores implicam na associação de ideologias a estéticas

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consumíveis: o estilo de que fala Hebdige (apud CAMPOS, 2007) referindo-se aos

jovens.

A identificação das identidades socioculturais dos jovens é realizada em

grande medida, à custa da ostentação e manipulação simbólica dos tênis

Adidas ou Nike, das calças Levis, da MTV, da Shakira, dos Arcade Fire,

dos piercings ou dos fanzines, independente do local do mundo onde

tem origem como objeto ou mito coletivo (idem, p.114).

O apelo e o acesso à juventude são reforçados pelos mass media. Por meio

do consumo é possível afiliar-se a uma ideia de juventude, independente da faixa

etária. Como disse Kehl (2004), ela é só um estado de espírito que externamos. Se

antes a juventude dependia de organizações modernas como família e escola para

ser identificada, a disciplina exercida pelas instituições foi desafiada. A própria

marca de refrigerantes Fanta ironiza o fim dos cidadãos disciplinados. Uma série

de peças publicitárias da campanha “Mais Fanta, mais diversão” retratam a ruína

da disciplina. No vídeo Let them play, uma banda é calada por personagens cujas

cabeças são megafones. A cada acorde produzido pelo grupo um megafone

emite som mais alto. Até que a saxofonista turbina as notas musicais ao derramar

Fanta no instrumento. Outro músico pluga os cabos do teclado e a guitarra na

cabeça autofalante e a banda converte a censura em volume para seu som.

O VT Play zone (fig. 49) traz um guarda com cabeça de apito que silva

denunciando infrações como a música e afixando placas de proibições. Em

oposição, o personagem jovem reage rindo e desobedecendo as regras impostas

enquanto o guarda estremece contrariado. Quando uma garrafa de Fanta é

aberta, os objetos proibidos pelas placas ganham cor e movimento comemorando

o fim das interdições.

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Figura 49 - quadro do VT Play zone

Já o comercial Flagra mostra um casal namorando na sala sendo

surpreendido pelo que se presume ser o pai da moça. Os dois se afastam na

presença do homem, mas voltam ao contato quando ele sai. Para solucionar as

interrupções, o garoto abre uma Fanta e deixa que as borbulhas da garrafa

formem uma silhueta feminina que encanta o sogro e transforma seu semblante

hostil em um sorriso. A mulher leva o disciplinador para outro cômodo dando

privacidade aos namorados.

O filme Conveyor Belt35 (fig. 50 a 53) segue rompendo a lógica do cidadão

disciplinado e introduz a figura do consumidor controlado. A peça publicitária de

35 Lançado no Reino Unido em 2008.

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30 segundos foi lançada em 2007 ainda antes da campanha que inclui o

advergame “Salvando a fonte”. O filme mostra uma espécie de linha de produção

em que diversos personagens de animação seguem por uma esteira, sem se dar

conta, até uma prensa que os uniformiza, atribuindo-lhes uma cabeça quadrada.

Vale ressaltar que vários dos personagens portam objetos tecnológicos como um

fone de ouvido e um game boy ou celular (fig. 50), signos do controle citado por

Sibilia (2015). Além do formato quadrado das cabeças (fig. 52), é sintomático que

um grande relógio apareça sobre o molde (fig. 51), pois Sibilia (2015, p. 21) o

considera a mais emblemática das máquinas do capitalismo industrial por

controlar o tempo. A cena é uma metáfora da conformação do cidadão

disciplinado, moldado em série para se ajustar como uma peça na sociedade. Essa

lógica é subvertida por um dos personagens que usa uma garrafa de Fanta para

sabotar o mecanismo, fazendo-o retroagir e devolver a individualidade aos

sujeitos moldados. Sem slogans ou frases de efeito, a narrativa deixa claro a

importância dada à diversão e à diversidade de estilos, pois as pessoas

comemoram o fim da homogeneidade (fig. 53).

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Figura 50 - personagens usam fone de ouvido e vídeo game portátil ou celular

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Figura 51 - um relógio marca a intervenção homogeneizadora

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Figura 52 - O molde torna as cabeças quadradas

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Figura 53 - Celebração com o fim da homogeneidade

A juventude contemporânea tem íntima relação com o consumo e se

posiciona associando sua imagem a marcas, estilos e, em grande proporção, a

artefatos tecnológicos. Entre eles os games, apresentados/abordados nesta

investigação. Para Moita (2005) os videogames são símbolos de uma geração

globalizada, sem apego a tradições regionais e para a qual o lúdico está

desterritorializado.

Esses jogos representam para a cultura lúdica infantil e juvenil não só o

que há de mais moderno e inovador em matéria de diversão eletrônica.

Também aparentam ser a expressão cultural do processo de

mundialização (ORTIZ, 1994 apud MOITA, 2005).

.

Talvez atenta a essa ideia de juventude a marca de refrigerantes Fanta

tenha desenvolvido o advergame “Salvando a fonte”, universo fantástico no qual

só existem jovens e suas identidades são construídas em grande parte por suas

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posses, predominantemente artefatos eletrônicos. Até agora miramos os jovens

de cima pra baixo, a partir de olhares teóricos e adultos. Mas, como são eles, os

protagonistas deste estudo? Reservemos a eles um espaço para dar-lhes voz.

4.6 Eles por eles - Os jovens colaboradores se apresentam

O próximo capítulo propõe uma análise de Utopia e da “galera Fanta”

enfatizando sua relação com a juventude contemporânea. É o momento em que

as falas dos colaboradores se farão presentes e suas opiniões sobre o jogo serão

confrontadas ou alinhadas com a análise que faço do universo Fanta. Antes disso,

no entanto, acredito que depois de conceituarmos a ideia de juventude é

importante traçar um paralelo entre os apontamentos de estudiosos sobre o tema

e a posição os colaboradores por si mesmos.

A partir das principais características atribuídas aos jovens no decorrer do

debate deste capítulo, podemos dizer que eles não são definidos por sua idade,

mas por um estado de espírito (KEHL, 2004) cuja expressão é vinculada ao estilo

(HEBDIGE, 1976 in CAMPOS, 2007). Eles são vistos, também, como uma

importante fatia de mercado dentro da lógica econômica e sua existência on line

fornece voluntariamente informações a esse mercado (SIBILIA, 2015; SÉRVIO,

2015). Esses aspectos estão presentes nas falas dos colaboradores, embora de

maneira um pouco dispersa, conforme registros feitos durante os encontros,

como veremos no capítulo a seguir.

No dia 21 de junho de 2016 aconteceu o segundo encontro com o grupo

focal, como descrito nos apontamentos do capítulo 3. No laboratório de

informática da Escola Municipal Bernardo Élis, os participantes foram convidados a

escrever respostas às perguntas: o que é ou como é ser jovem? O que é positivo

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ou negativo em relação a ser jovem? Eu me considero jovem? Por que? A ideia era

que pudessem sentir-se a vontade, colocar-se sem receio em termos de possíveis

julgamentos a serem feitos pelos colegas. Meu intuito era encorajar os

participantes a descreverem sua compreensão sobre juventude de forma

espontânea antes de entrar nas questões referentes ao universo do advergame. É

importante notar que estas perguntas foram feitas aos alunos logo depois da

exibição dos VTs “Manifesto à diversão”, “Mister músculos” e Mímica36, uma

espécie de preparação que para as conversas que entabularíamos sobre o

conceito de juventude e o mundo Fanta.

Quando solicitados a refletir sobre si mesmos, a maior parte dos

participantes - faixa etária variando entre 10 e 16 anos – pareceu retroceder à

idade média, quando infância e juventude não tinham necessariamente correlação

com idade, mas equivaliam ao período em que o indivíduo dependia da família

(ARIÈS, 2011). Enquanto grande parte do grupo desvinculou o entendimento de

ser ou não jovem à idade, Adrielly foi exceção ao afirmar que: “não me considero

jovem por que eu tenho 10 anos ainda e por que eu não saio de casa sozinha com

minhas amigas” (Grupo focal realizado em 21/06/2016).

Para a maioria dos colaboradores ficou clara a importância que dão ao fato

de não serem mais identificados como crianças, ou seja, como submissos,

inexperientes ou dependentes, especialmente em relação aos seus pais. Alana, ao

se posicionar em contraposição a afirmação de Adrielly, disse: “o ruim de ser

jovem é que não somos mais a criancinha da mamãe que ela bajula tanto como

antes. Eu me considero [jovem] sim por que eu não me vejo mais aquela

36 Manifesto à diversão, de 2013, fala sobre a importância do divertimento e da imaginação para o

jovens. Em mister músculos, de 2011, dois garotos comparam-se a homens fortes dentro de um

academia e usam garrafas de Fanta sobre a roupa para simular músculos. Mímica é a animação,

lançada em 2010, em que a personagem Gigi transforma um momento constrangedor em

divertido.

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criancinha de antes, eu já sei o que é certo ou errado (Grupo focal realizado em

21/06/2016).

Carlos Henrique manifestou opinião semelhante: “eu me considero jovem

porque já passei da idade de ser criança, pois já tenho 13 anos e já estou bem

grandinho para brincar de carrinho” (Grupo focal realizado em 21/06/2016). Sem

muita clareza sobre o que os faz jovens, os participantes tentam se diferenciar da

fase da infância assumindo comportamentos que demonstrem autossuficiência e

maturidade, mas ao mesmo tempo negando hábitos considerados pueris como,

receber carinho e cuidados da família ou até mesmo brincar.

De forma análoga, abrir mão da infância significa para muitos assumir

certas responsabilidades como preparação para a vida adulta, de modo

aproximado como sucedia aos efebos e moços, conforme pontuou Ariés (2011).

Mas ao contrário desses dois grupos, nossos jovens permanecem no seio da

família, por isso seus encargos estão normalmente relacionados a ajudar nas

atividades domésticas. Pensando em cabular eventualmente as tarefas, Marcos

afirmou que prefere não se definir como jovem: “eu gosto de ser pequeno

[criança] por que eu posso jogar bola e posso ajudar minha mãe em casa, como

lavar vasilhas. O que eu não gosto de fazer é arrumar a casa, lavar banheiro, varrer

o quintal. Só isso que eu não gosto de fazer” (Grupo focal realizado em

21/06/2016). Ao se identificar como criança, Marcos se prontifica a colaborar, mas

tenta se isentar da compulsoriedade de cumprir os compromissos. Já Michel

exemplificou as atribuições que recebe dando a entender que ao definir-se como

jovem, barganha algum tipo de autonomia em troca da realização de tarefas: “é

bom [ser jovem] por que você pode se cuidar sozinho, não é bom ser jovem por

que você tem que cuidar dos [irmãos] menores” (Grupo focal realizado em

21/06/2016).

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Carlos Daniel pontuou que com a chegada da juventude é preciso focar no

futuro: “o ruim em ser jovem é que a gente tem que já pensar em seu futuro e

deixar de morar na casa da mãe, começar a trabalhar, [ter] mais atitude. E aí

acaba a sua vida como criança” (Grupo focal realizado em 21/06/2016). Carlos

sugere que a diversão tem fim com a infância e que a adolescência deve ser

mesmo o tempo de preparação para a vida adulta. Sua colocação se alinha com a

de Feixa (2004) acerca da juventude como um período de formação escolar (e

talvez técnica ou universitária) até a inserção no mercado de trabalho.

As características mais citadas como determinantes sobre a ideia de ser

jovem são aquelas que surgem no pós-guerra e estão relacionadas às liberdades

conquistadas por essa faixa etária (FEIXA, 2004, GROSSMAN, 2010, e CAMPOS,

2007). Além das responsabilidades, ser jovem, para essas pessoas, é sinônimo de

autonomia, como Marcela explicitou: “eu acho bom ser jovem por que eu posso

fazer coisas que eu não fazia antes, quando eu era criança, como mexer no

facebook e sair com minhas amigas” (Grupo focal realizado em 21/06/2016). A

companhia dos amigos sem supervisão talvez seja a permissão mais desejada,

pois esteve presente também nas falas de quatro dos doze colaboradores que

participaram do trabalho de campo: Alana, Adriely, Carlos e Carlos Daniel.

Como jovens, os sujeitos da pesquisa também transitaram pelos

apontamentos ressaltados pelos teóricos com os quais dialoguei no início deste

tópico. Prezam por manifestar seu estilo, estão continuamente conectados e são

ávidos consumidores. Essas características ficam claras quando eles se expressam

sobre outras questões que veremos adiante. Por ora, vale ressaltar que o

entendimento dos sujeitos participantes da pesquisa tem como ênfase dois

aspectos que parecem contraditórios: liberdade e responsabilidade, pois ainda

não tem a autonomia que almejam e já estão imbuídos de algumas das

atribuições/responsabilidades que não desejam.

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CAPÍTULO 5 – GALERA FANTA. A noção de

juventude segundo Fanta

Depois que o universo virtual de “Salvando a fonte” e os arranjos

metodológicos foram descritos, chegamos ao jogo e seus personagens com o

intuito de relacioná-los com as pontuações feitas pelos colaboradores da

investigação. De acordo com a discussão feita anteriormente, envolvendo as peças

publicitárias Conveyor belt, Play Zone, Flagra e Let them play, a sociedade está

enfrentando uma série de mudanças que envolvem o arrefecimento de uma lógica

de produção ligada à disciplina e a ascensão de uma lógica de consumo associada

a uma nova dinâmica de controle. Assim, organizei esse tópico em três partes que

serão explicadas em seguida.

O primeiro assunto a ser tratado é o declínio das instituições

disciplinares. A consequente reconfiguração social dessas instituições é a base do

segundo item: a relação entre controle, consumo e identificação. Seguindo essa

nova lógica, outras subjetividades são desenvolvidas e privilegiadas. A juventude

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passa a ser a representação ideal do prazer e da diversão. Imersos na atmosfera

da mídia e do consumo, os jovens se valem da hiperestimulação para aplacar a

ausência de sentido, ou seja, o vazio. Essa condição desagua num ciclo de

estímulos e enfastiamento cada vez mais intensos que nos leva ao tópico final:

imperativo do gozo, hiperestímulo e tédio. É importante ressaltar que essa

divisão é uma estratégia para organizar a análise, mas vale salientar que de

alguma maneira, por vezes, os temas ou alguns aspectos deles se sobrepõem ou

até mesmo se repetem.

5.1 QUEM VAI NOS GUIAR? - Declínio das instituições disciplinares

Durante o percurso em busca das origens da ideia/conceito de juventude

registrei várias mudanças nas formas de organização social e econômica que

acabaram por incidir sobre a sociedade como um todo e esse grupo etário de

modo específico. Instituições modernas como a escola, o exército e a família

foram determinantes para a conformação da ideia de adolescência, conforme

descrito no item 4.2, mas essas organizações também foram postas em cheque

revelando instabilidades a partir das quais os jovens continuam tendo que se

repensar.

“Salvando a fonte” é um site composto por cinco cenários interativos (fig.

16): Utopia, Casa do Todd, Cidade, Floresta de frutas e Cachoeira. Algumas

omissões revelam que o ambiente ficcional reproduz, em alguma medida, a crise

disciplinar da qual falamos ao ignorar presenças ainda comuns à juventude atual.

Provocados sobre as semelhanças e diferenças entre o mundo de “Salvando a

fonte” e a vida cotidiana, os colaboradores apontaram ausências pontuais como

aeroporto, pizzaria, delegacia e feira, entre outras. Entretanto, as ausências que

foram recorrentes em várias falas foram aquelas referentes à família, escola e

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igreja, as quais daremos mais atenção costurando outros apontamentos

pertinentes.

Cadê a família?

A campanha, com foco nos jovens, traz poucas referências aos pais nos VTs

ou no ambiente do jogo. Nem mesmo o comic book que registra a narrativa faz

alusão à família, à escola ou a outras instituições disciplinares. A única e vaga

menção a adultos é feita por meio das casas dos personagens Gigi (fig. 54) e Floyd

que constam na vista geral de Utopia e que só permitem acesso aos espaços

privados de cada personagem: seus quartos. Daí se presume que os demais

ambientes são compartilhados por seus familiares. O projeto da casa do Todd, por

sua vez, não comporta quartos ou qualquer espaço para outros parentes. A

família, como porto seguro e medida da vida, é praticamente dispensável na

realidade utópica de Fanta.

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Figura 54 - Casa da Gigi

No segundo encontro do grupo focal, quando o diálogo girava em torno

do VT “Manifesto à diversão”37 e a importância do divertimento na vida, Adrielly

enfatizou que a família era o mais importante para ela. No quarto encontro,

propus que os colaboradores comparassem as cidades e casas que haviam

desenhado com aquelas apresentadas por Fanta. Essa atividade deixou mais

evidente as faltas/ausências que os participantes observaram ou sentiram no jogo.

Dos 11 alunos que desenharam, 9 mencionaram a família, enquanto os outros

dois preferiram não apresentar seus desenhos.

Kauane, descreveu a casa que desenhou (fig. 55) da seguinte maneira: “tem

o meu quarto, tem a cozinha, tem a sala, tem o banheiro, a garagem, o quarto da

37 Em manifesto à diversão, a galera Fanta propaga que a diversão é o mais importante.

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minha mãe, o quintal e a área. Ah! E o quartinho da bagunça” (Grupo focal

realizado em 23/06/2016). Entre as menções à família, apenas Ricardo fala do pai

como familiar que mora na casa que ele idealizou (fig. 56), embora em outros

momentos Ramon e Keven citem a figura paterna como presenças constantes em

suas vidas. A menção apenas às mães, na maioria das falas do grupo, reitera o

crescimento do número de mulheres como chefes de família. De acordo com o

IBGE, no ano 2000 cerca de 45 milhões de lares brasileiros eram comandados por

mulheres. Em 2010 esse número subiu para mais de 57 milhões e, segundo a

Secretaria de Políticas para as Mulheres, em 42% deles, elas vivem sem parceiros e

com os filhos.

Figura 55 - Desenho de Kauane

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Figura 56 - Desenho de Ricardo

Perguntados sobre por que não existem adultos no universo do jogo, os

colaboradores veem essa falta como uma incongruência, uma impossibilidade.

Adrielly, por exemplo, apresentou a sua justificativa baseando-se no nome da

cidade fictícia: “lá é uma mentira, uma utopia”! Marcela, por sua vez, completou:

“uma imaginação, um sonho. O sonho de todas as crianças” (Grupo focal realizado

em 23/06/2016). Ricardo observou que, sem adultos, as crianças estariam livres

para fazer o que quisessem. Mas a primeira opinião sobre a falta de adultos como

algo positivo não demorou a ser contestada entre os próprios colegas.

Keven disse que uma cidade assim seria uma cidade sem controle. Ramon

reconheceu a importância dos pais em seu cotidiano quando perguntado sobre

quais eram os adultos mais presentes em sua vida: “meu pai e minha mãe. Por que

minha mãe faz comida (ou seja, cuida da manutenção da casa) e meu pai resolve

as coisas” (se responsabiliza pelo lado financeiro e lida com questões práticas,

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como pequenas reformas etc.) (Grupo focal realizado em 23/06/2016). A partir

dessas falas, até Marcela repensou a função dos adultos: “os adultos... [servem]

pra dar conselho, pra várias coisas. Principalmente quando a gente tem que tomar

uma decisão errada. Eles falam: ‘minha filha, não faz isso. Isso não tá certo. Tipo

quando eu queria matar meu primo (risos) ou fugir de casa...’” (Grupo focal

realizado em 23/06/2016).

Para Sarti (2004) embora sejam únicas em sua dinâmica de funcionamento

ou composição, as famílias tem papel fundamental na vida do jovem, pois o

regulamentam socialmente:

Cada família constrói, assim, sua própria história, ou seu próprio mito,

entendido como uma formulação discursiva em que se expressam o

significado e a explicação da realidade vivida, com base nos elementos

objetiva e subjetivamente acessíveis aos indivíduos na cultura e na

sociedade em que vivem. Os mitos familiares, expressos nas histórias

contadas, cumprem a função de imprimir a marca da família, herança a

ser perpetuada (p. 118).

A partir da afirmação de Sarti podemos constatar que é em família que os

jovens dão sentidos a experiências vividas. É também na família que os jovens

exercitam a alteridade ao trazerem consigo traços de identificação com outros

grupos – compartilham interesses musicais ou esportivos, por exemplo - para o

diálogo/embate com esse núcleo:

nas relações dos jovens com a família joga um papel fundamental

a forma como esta incorpora esses ‘outros’, estranhos ao meio

familiar, que o jovem traz pra casa, por que ele neles se

reconhece, sendo parte essencial da busca de sentido para a sua

existência pessoal (idem, p. 123).

Em Utopia não há embates ou diálogos já que os protagonistas estão entre

iguais. Só um adulto aparece em toda a narrativa: o “guardião da fonte”, mas em

momento algum ele interage com os demais personagens. Isolado em uma sala

de controle, ele assiste a ação da “galera Fanta” por visores que mostram também

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o rosto de jogadores que entraram nos desafios e seus amigos no Facebook (fig.

57). As fotos dos participantes sendo exibidas remetem ao que Sibilia (2015)

chamou de consumidores controlados, pois deixa claro que Fanta tem acesso a

suas informações e imagens disponibilizadas na rede.

Figura 57 - Tela final do advergame “Salvando a fonte”

Sérvio (2015) concorda com Sibilia (2015) no que concerne à emergência

de uma sociedade de controle. Para Sérvio, uma premissa dessa sociedade é

controlar/monitorar preferências e hábitos das pessoas para orientar a economia

no sentido de adquirir mais eficiência. Considerando que o consumo é ativo e são

os sujeitos que conferem significados outros às mercadorias – a bricolagem –, é

necessário que o mercado mantenha seu público sob exame constante para suprir

e alimentar novas demandas - a contrabricolagem:

Como afirmam Sturken e Cartright (2001), é fundamental inserir-se com

eficiência no intenso jogo de bricolagem e contrabricolagem entre

empresas e consumidores. Ao mesmo tempo em que as pessoas no

momento do consumo frequentemente subvertem das mais diversas

formas os significados originais para os quais os bens foram produzidos,

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o mercado por sua vez aproveita-se desta criatividade estudando-a para

realimentar sua linha de produção (SÉRVIO, 2015, 334).

Para Sibilia (2015), ao contrário do que parece, não é difícil para o sistema

econômico ter acesso aos dados daqueles que transitam no mundo virtual. Por

meio das redes sociais e dos aparelhos eletrônicos, os próprios usuários tornam

pública sua inserção na sociedade de controle:

Esse meticuloso “trabalho” individual que agora realizamos, e que não

deveria ter pausa, não é empreendido em obediência à pesada

obrigação moral de cumprir regulamentos e evitar castigos, como

ocorria sob a lógica do confinamento disciplinar; ao contrário, tudo isso

hoje se faz por prazer. E desperta o interesse dos demais, tecendo-se

assim uma rede muito eficaz de permanente controle mútuo (SIBILLIA,

2015, p. 175).

A fala dos participantes da pesquisa se alinha a essa ideia quando

mencionam sua participação no Facebook entre as principais atividades que

realizam online. Quando perguntados sobre o que fazem na internet, o grupo se

dividiu. Paulo, por exemplo, afirmou que apenas joga; Adrielly, disse que fica

conectada para assistir a vídeos de youtubers e, séries, mas quando Alana revelou

que seu principal passatempo na rede é mesmo o Facebook, pelo menos mais

cinco colegas (Carlos Daniel, Adrielly, Marcela, Ramon e Carlos) concordaram.

Alana usa o site para publicar fotos que faz de si mesma e de seu cotidiano,

Ramon para “conversar com as meninas” e os demais colegas para se manterem

em contato com os amigos. Embora os usos sejam diferentes, a participação de

todos em sites como Facebook termina por transformar suas ações em dados a

serem utilizados nas páginas que visitaram voluntariando informações valiosas

para empresas anunciantes que sustentam o sistema.

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Cadê a escola?

Quando discutimos as diversas definições sobre a ideia de juventude, vimos

que o conceito ganhou em importância quando foi tomado como um período de

formação técnica e intelectual para a entrada no mercado de trabalho. Em Utopia,

os personagens gozam de responsabilidades ou direitos como dirigir e morar

sozinho (Todd) e produzir apetrechos tecnológicos (Floyd), mas não há alusão a

instituições educacionais ou profissionais. Sibilia (2012) acredita que o

enfraquecimento do papel do Estado e o afrouxamento das instituições de

controle como a família e o professor geram um descompasso entre a realidade

dos jovens de hoje, notadamente naquilo que diz respeito ao consumo e às

tecnologias e também à escola, que permanece em grande medida, estruturada

sobre a lógica disciplinar moderna.

A geração personificada no jogo é a de nativos digitais ou screenagers,

como observamos anteriormente. Esses sujeitos, assim como os colaboradores da

pesquisa, estão constantemente conectados por meio de aparelhos celulares,

computadores ou tablets e usam a internet como um espaço tanto privado –

quando substituem os diários por blogs, por exemplo - quanto público - ao

compartilhar músicas, vídeos, imagens etc. Para Palfrey e Gasser (apud

PESCADOR, 2010) essa turma leva uma vida offline apartada da internet, mas

também online usando aparelhos como smartphones e as redes de

relacionamentos para criar personas online. Daí a urgência da maioria dos

colaboradores em se sentirem incluídos e ativos em redes sociais como Facebook

e grupos de whatsapp.

Essa representação virtual é uma exigência da sociedade de controle

baseada na lógica capitalista contemporânea em que tudo alimenta o mercado.

Assim, se o sujeito moderno era disciplinado e entre suas características desejáveis

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estava o autocontrole e a normatização, o sujeito contemporâneo deve ser ele

mesmo gerido como marca, criando uma imagem pública por meio da qual seja

possível expressar-se (SIBILIA, 2012).

Numa sociedade fortemente midiatizada, fascinada pela incitação à

visibilidade e instada a adotar com rapidez os mais surpreendentes

avanços tecnológicos, em meio aos vertiginosos processos de

globalização de todos os mercados, entra em colapso a subjetividade

interiorizada que habitava o espírito do ‘homem-máquina’, isto é, aquele

modo de ser trabalhosamente configurado nas salas de aula e nos lares

durante os dois séculos anteriores (SIBILIA, 2012, p. 49).

Utopia é mais um espaço de atuação dessa persona online. Ali as imagens

pessoais devem ser construídas para serem consumidas por jovens. A escola

tradicional torna-se desnecessária e obsoleta nesse sentido, pois seu modelo

disciplinar pouco mudou e continua dando pouco ou nenhum espaço para

visibilidade dessas marcas pessoais em processo de autogestão. Ou, utilizando o

jargão publicitário, em “Salvando a fonte” a escola não seria o veículo certo para o

tipo de mensagem – jovialidade - que se quer transmitir ao público alvo – os

pares.

O modelo de escola que surgiu ainda na Idade Média e se massificou como

instituição disciplinar no século XIX em quase nada se atualizou. Continua

pautado na transmissão do saber do professor para o aluno, exigindo disciplina e

docilidade, se contrapondo à índole exploradora dos jovens de hoje. Mesmo

estranhando seu corpo discente da atualidade, a escola ainda é importante lugar

de aprendizado e sociabilidade (SIBILIA, 2012) e, por esta razão, merece a nossa

atenção frente aos desafios pelos quais tem passado.

Os alunos da Escola Municipal Bernardo Élis que participaram do grupo

focal, relataram em diferentes momentos que acreditam na importância da escola

para seu futuro profissional, mas confessam que entre as principais motivações

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para continuar frequentando as aulas estão os amigos que fizeram na escola. Num

dos encontros, aconteceu o seguinte diálogo:

Pesquisadora: Então vir pra escola é importante?

Carlos: - Sim e não. É bom que a gente aprende o conteúdo que passa

na escola e brinca com os amigos. Não [é bom] por que a gente tem que

levantar cedo e ficar [até] o resto da tarde todinha... agora quando a

gente tá em casa a gente dorme até mais tarde, mas é ruim que a gente

não tá com os amigos e não aprende o que os professores passam.

(Grupo Focal realizado em 23/06/2016)

Além de Carlos, outros colaboradores – Marcela, Ricardo, Kauane, Paulo e

Michel - reconheceram a necessidade da educação formal para sua inserção no

mercado de trabalho. Adrielly, por sua vez, enfatiza que a interação social é

determinante: “eu venho sabe pra que? Se meus amigos não tivessem estudando

aqui eu não vinha na escola, mas como a gente tem que ter um futuro melhor,

né?” (Grupo Focal realizado em 23/06/2016).

A educação escolar sempre preconizou atenção e consciência pela seleção

dos estímulos aos quais deve se ater. Ler e escrever pressupõem um tempo linear

e um avanço gradativo. Mas para o sujeito contemporâneo os estímulos são

tantos e tão sucessivos que pouco chega a se alojar na consciência, suas

“vivências são dominadas pela percepção” (SIBILIA, 2012, p. 119). A lógica

predominante nos dias de hoje é o esfacelamento/fragmentação, a sobreposição,

mas sem necessariamente a composição de uma narrativa única, como nos

videogames. Em “Salvando a fonte”, por exemplo, existem algumas possibilidades

de entender os acontecimentos. Há um comic book (fig. 17 e 34) contando a

história em que tudo se baseia, mas ele tem pouco destaque porque a narrativa

usa como estratégia motivar os jogadores a recontarem a história à medida que

exploram os espaços e jogos:

no caso dos videogames, por exemplo, quando se aprende a usá-los, é

claro que ocorrem aprendizagens e pensamentos, mas estes não

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parecem ser reflexivos, conscientes e racionais, baseados na explicação

ou na interpretação, e sim em ‘uma eficácia operativa que não necessita

de consciência’ (SIBILIA, 2012, p. 119 -120).

Esse novo jovem consumidor de Fanta tem sido rascunhado a partir da

reconfiguração socioeconômica neoliberal tanto quanto da revolução tecnológica.

Em se tratando da escola, sua dinâmica de aprendizagem é também fragmentada

e contingente, ou seja, em grande parte motivada pela necessidade de responder

a uma provocação:

Esta geração não consegue simplesmente ficar parada, sentados em seus

lugares, enquanto o professor discorre em aulas expositivas. Para eles,

por exemplo, não faz sentido ler um manual de um aplicativo ou de um

jogo para saber usá-lo. Os nativos digitais preferem, num processo de

tentativas e erro, ir se apropriando da lógica do programa ou do jogo,

para utilizá-lo. Esse processo pode revelar uma forma de aprendizagem,

que não é baseada em informações/instruções, mas numa busca que

parte daquele que precisa aprender, fuçar, explorar (PESCADOR, 2010, p.

4).

Embora não haja no cenário da educação institucionalizada o estilo de vida

encenado no advergame, “Salvando a fonte” parece ir ao encontro daquilo que os

jovens esperam e que o mercado de hoje valoriza, pois se baseia na

espontaneidade, na aprendizagem por engajamento (aprender fazendo) e na

autorrealização. No último encontro com os colaboradores, lancei ao grupo uma

pergunta sobre onde os personagens do jogo adquirem formação, dando ênfase

a atividade de Floyd, que constrói artefatos tecnológicos:

Pesquisadora: A gente falou quando conheceu o mapa que a cidade não

tem escola. Como é que eles (personagens) aprendem?

Carlos Daniel: Nas ruas, nos jogos.

Ricardo: Pode ser que ele (Floyd) é bem interessado e quer descobrir as

coisas. (Grupo Focal realizado em 27/06/2016)

Essas falas reiteram a ideia de que o mercado (e a vida) atualmente

requisita e celebra novas competências que nem sempre são adquiridas por meio

da educação formal. De acordo com Sibilia (2012, p. 48):

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Nossa época convoca as personalidades a se exibir em telas cada vez

mais onipresentes e interconectadas. (...) os novos ritos trabalhistas

requerem outras habilidades e disposições corporais e subjetivas, ao

mesmo tempo em que desprezam certas capacidades ou aptidões antes

valorizadas, mas que são consideradas cada vez menos úteis. (...) hoje se

estimulam a criatividade e o prazer, inclusive nos ambientes laborais. E, é

claro, também nos outrora circunspectos territórios escolares. (...) Sem

esquecer, por outro lado, que tudo isso se dá numa cultura que enaltece

a busca da celebridade e a satisfação instantânea, exaltando valores

como a autoestima, a aparência juvenil e o gozo constante.

Ao omitir a escola em Utopia, Fanta não diminui a importância da

juventude como período de preparação para o mercado de trabalho, mas destaca

valores dos dias atuais em sintonia com as expectativas e demandas

contemporâneas. Sociabilização, criatividade, experimentação e realização, por

exemplo, são reafirmados como necessários para o desenvolvimento intelectual e

afetivo dos jovens, especialmente em se tratando de um espaço de interação

virtual.

Cadê a igreja?

As duas primeiras ausências citadas pelos colaboradores, família e escola,

acabam convergindo para a terceira ausência que eles apontaram: a igreja.

Admito que fui surpreendida quando reclamaram tal falta, pois, de acordo com

Sofiati (2009, p. 2), a religião tem se tornado acolhedora para os jovens que não

encontram perspectivas em outras instituições:

A condição social dos jovens na sociedade atual é uma das principais

circunstâncias desse cenário [ascensão do neopentecostalismo], já que

esta se encontra destituída de um ancoradouro seguro. Assim, também é

apresentada uma caracterização dos jovens brasileiros, com suas

necessidades e perspectivas. As estruturas sociais, políticas e culturais

encontram-se fragilizadas e uma parcela dessa juventude busca refúgio

no universo religioso. Há, atualmente, três grandes ausências na

sociedade brasileira: ausência de educação formal, de empregabilidade

possível no mercado de trabalho e a descrença no universo político. A

precariedade da educação, a restrição de emprego e o esvaziamento

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ideológico da política colocam essa categoria social em uma situação de

grande fragilidade e falta de perspectiva para o futuro. A ida para o

religioso é uma das saídas para esse segmento social, sendo as

instituições religiosas a principal forma de organização juvenil na

sociedade brasileira atual.

Um levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estáticas feito em

2010 contou cerca de 35 milhões de jovens entre 15 e 24 anos no país. Nessa faixa

etária, somente pouco mais de 3.480 milhões se declararam sem religião, ou seja,

apenas por volta de 10% dos jovens não tem vínculos religiosos – embora isso

não represente participação ativa em grupos religiosos. Mesmo manifestando

uma compreensão precária sobre a função das instituições religiosas em suas

vidas, os colaboradores encontram ali grupos de interação:

Pesquisadora: E a igreja, vocês começaram a falar e não terminaram...

Quem vai a igreja?

[Quase todos levantam a mão e começam a dizer para quais igrejas vão.]

Pesquisadora: Só você, Ramon, que não vai a igreja?

Ramon sinaliza que vai sim.

Ricardo: É bom, você tira seus pecados.

Pesquisadora: E quais são os seus pecados? Pode contar?

Ricardo: Xingar, teimar com minha mãe!

Pesquisadora: Você vai a igreja? [Me dirijo ao Paulo que agora

permanece calado, mas já havia mencionado algo sobre religião]

Paulo afirma com a cabeça.

Pesquisadora: Você vai por que quer ou por que seus pais te levam?

Paulo: Por que eu quero.

Pesquisadora: Vocês tem amigos na igreja?

Paulo: Sim.

Pesquisadora: E o que vocês fazem juntos na igreja?

Paulo: A gente ora, a gente come... (Grupo Focal realizado em

23/06/2016)

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Talvez a igreja supra a falta de espaços de sociabilidade, pois enquanto

faltam parques, praças e outros equipamentos públicos, todas as cidades do país

contam com pelo menos um espaço dedicado à religião.

Sofiati (2009) atribui o crescimento do movimento religioso entre os jovens

contemporâneos à falta de espaços para sociabilização. Nas décadas de 60 e 70

do século passado os jovens se juntavam em torno dos sindicatos e movimentos

estudantis. Nos anos 80, os encontros eram promovidos por meio de movimentos

sociais, como a pastoral da juventude. Nos anos 90, movimentos culturais e

lúdicos, como hip hop, crescem em popularidade entre os jovens. A partir dos

anos 2000, a chamada “terceira onda” os aproximou dos movimentos religiosos,

especialmente dos carismáticos e pentecostais. Santos (2005) complementa

dizendo que o avanço desse movimento tem a ver com a divulgação do sagrado

nos meios de comunicação como rádios, TVs, shows, internet etc. As mídias

tornaram o transcendente acessível e as igrejas evangélicas introduziram novas

dinâmicas – com música e danças, por exemplo - aos cultos tornando-os atrativos

aos jovens.

Na atividade de desenhar a cidade que consideravam ideal, Adrielle (fig.

56), Kauane, Janderson (fig. 58), Marcela e Keven fizeram questão de posicionar a

igreja entre as construções urbanas. Admirada com a recorrente menção ao tema,

já que não sou praticante de nenhum credo, tentei insistir sobre o assunto para

conhecer a opinião dos demais alunos e perguntei quem frequentava a igreja.

Ramon, Ricardo e Paulo reconheceram a importância da religião e afirmaram

participar de missas e cultos com as famílias.

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Figura 58 - Cidade ideal desenhada por Adrielly

Para Santos (2005, p. 167), não “há como desconsiderar o importante

movimento produzido pelas igrejas pentecostais e neopentecostais na contenção

de problemas sociais”. As igrejas gozam de credibilidade junto às comunidades e

acabam por assumir certas responsabilidades que deveriam ser do poder público,

como tornar-se um espaço de lazer entre os jovens.

Hoje é nas igrejas que os jovens encontram espaços e pessoas com quem

podem aprender, compartilhar experiências e sentirem-se parte de algo. Quando

perguntados sobre aprendizados além dos curriculares, uma das colaboradoras

revelou competências desenvolvidas a partir da comunidade religiosa de que faz

parte:

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Pesquisadora: E você, Kauane, aprendeu a tocar violão fora da escola?

Quem te ensinou?

Kauane: Eu fico na igreja, né? Aí o Paulo Neto (outro membro da

congregação) me ensinou. (Grupo Focal realizado em 27/06/2016)

Figura 59 - Cidade ideal desenhada por Janderson

Para Moreira (apud SOFIATI, 2009, p. 3), o “neopentecostalismo é a face

religiosa do neoliberalismo” por se colocar como uma escolha possível num

cenário que apresenta e valoriza as múltiplas possibilidades de escolhas, mas

dificulta acessos e nega oportunidades, especialmente aos mais pobres.

A adesão à religião desempenha, portanto, a importante função de conferir

pertencimento a um grupo ou a uma comunidade, lacuna cada vez mais sentida

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na contemporaneidade. Entretanto, pode funcionar como uma nova instituição

disciplinar a medida que regula a vida prática, definindo o que é certo e errado,

“pecado e boa ação”, como falou o colaborador Ricardo em citação anterior. Essa

constatação abre um debate, entre outros, sobre laicidade na escola. Debate que

deve ser amplo ao mesmo tempo que profundo, motivo pelo qual não tratarei

esse tema aqui, pois entendo que é apenas vicinal ao assunto proposto nesta

investigação.

5.2 “Olha o estilão!” - Controle, consumo e identificação

O debate que intitula esta sessão teve início ainda no capítulo anterior,

visto que ele desponta a medida em que a sociedade disciplinar vai perdendo

espaço para a sociedade de controle. Vale retomar o determinante papel da

economia na contemporaneidade, seja controlando as pessoas para transformá-

las em potenciais consumidores, seja oferecendo possibilidades de identificação

pela associação a estilos de vida consumíveis.

Consumo ostentação

Para Canclini (2006), as identidades hoje são muito mais organizadas a

partir do consumo e dos media do que das instituições democráticas, como

ocorria na modernidade – ou na sociedade disciplinar. Assim, as representações

ou a falta delas reflete a significância atribuída a determinado grupo pelos

discursos midiáticos:

Para muitos homens e mulheres, sobretudo, jovens, as perguntas

próprias dos cidadãos (...) são respondidas antes pelo consumo

privado de bens e meios de comunicação do que pelas regras

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abstratas da democracia ou pela participação em organizações

políticas desacreditadas. (CANCLINI, 2006, p. 14)

A observação de Canclini ficou evidente durante um dos encontros com os

participantes da pesquisa. Falávamos sobre objetos que caracterizam ser jovem

tentando fazer um paralelo entre os colaboradores e a “galera Fanta” com suas

ferramentas para salvar a fonte. Os participantes tentaram, a princípio, se manter

fieis aos equipamentos que participam do jogo:

Pesquisadora: E quais são os objetos que mais são a cara de vocês? Por

exemplo, a Adrielly já falou que gosta de patins...

Adrielly: Ioiô tb.

Pesquisadora: Não precisa ser só os que aparecem aqui não. Pode ser

também celular, por exemplo, ou coisas que vocês tem em casa.

Ricardo: Arraia!

Carlos Daniel: Boné! Tablet!

Alana: Eu sou viciada em roupas.

Kauane: Bateria (instrumento musical). (Grupo Focal realizado em

27/06/2016)

Em seguida passaram a listar marcas com as quais se identificam:

Pesquisadora: O Carlos Daniel tinha falado que gosta de roupas de

marca. Quais são as marcas que vocês mais gostam?

Alana: Quik Silver, Maresia.

Adrielly: Adidas

Ricardo: Nike

Alana: o que vocês veem em Adidas? Que marca brega! Preto e branco,

coisa de velho!

Pesquisadora: Se Adidas é marca de velho, quais são as marcas de jovem,

então?

Alana: Maresia, Nike, Quik Silver

Por que? O que faz essas marcas serem bacanas?

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Adrielly e Ricardo: o estilo! (Grupo Focal realizado em 27/06/2016)

As marcas preferidas são eleitas a partir de uma identificação com um

modelo de juventude que a mídia promove por meio dos ídolos teens como os

alunos detalharam na sequência da conversa:

Ricardo: A Quik Silver ninguém gostava, aí o MC Pedrinho (Fig. 60)

começou a usar e todo mundo começou a usar.

Carlos Daniel: Um boné de aba reta, desde a primeira vez que eu vi, eu

queria.

Alana: Quem começou a usar a Quik Silver foi o [MC] Biel (Fig.61) que é

mais velho que o Pedrinho, viu? (Grupo focal realizado em 27/06/2016)

Figura 60 – MC Pedrinho

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Figura 61 – MC Biel

Pedrinho e Biel fazem parte de um nicho musical conhecido por funk

ostentação. Como o nome indica, as letras e os ídolos desse estilo pregam mais

que o consumo, a exibição de bens como a máxima que toca as relações

interpessoais e os papeis de gênero. Vargas e Carvalho (2015) analisaram hits

como “Mulher do Poder”38, da MC Pocahontas, e “Onde eu chego eu paro tudo”39,

38 Trecho da música Mulher no poder, de MC Pocahontas

Ostentação, palavra que eu gosto de ouvir

Se me quer do seu lado, tem que me fazer rir

Vem me buscar de Hornet, R1, RR

Me dá condição

Deixa eu totalmente louca, chapadona de Chandon

Gosto de gastar, isso não é novidade

Hoje eu já torrei mais de 10 mil com a minha vaidade

É salão de beleza, roupa de marca, sandália de grife no pé

Bolsa da Louis Vuitton, sonho de toda mulher

39 Trecho de Onde eu chego eu paro tudo, de Boy do Charme

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do Boy do Charme, para entender como tais discursos tem pautado a vida de seus

alunos de escolas municipais de Porto Alegre. A pesquisadora pontua que:

As músicas relacionadas ao funk ostentação traçam, em sua maioria,

narrativas acerca dos “benefícios” que o acúmulo de bens e de

patrimônio proporciona aos homens jovens: a companhia de belas

mulheres e a elevação de um status frente aos demais. O mesmo estilo

musical apresenta músicas que descrevem os desejos femininos como

unicamente relacionados à vaidade e à beleza. Nas canções, tais desejos

são atendidos, de um modo geral, por homens que pagam às mulheres

o que elas querem. Os relacionamentos afetivos também são

organizados a partir da mesma lógica; mulheres namoram homens que

"bancam" tudo o que elas desejam (VARGAS, 2015, p. 6).

Ao detalhar o modo como ídolos e suas músicas influenciam a vida jovens,

Vargas ressalta que a parte de sugerir identidades associadas a opulência e a

sexualização, o funk ostentação de certa forma legitima a criminalidade como

meio de vida. Isso porque os produtos e marcas celebrados no meio são

inacessíveis para a maioria da população, especialmente para as classes em que

esse tipo de música faz mais sucesso.

Em determinados versos da música “Onde eu chego eu paro tudo”, é

possível pensar que o uso de artefatos de marcas de grife e de

automóveis caros seja propiciado pela prática de atividades ilícitas, tais

Onde eu chego eu paro tudo

A mulherada entra em pânico

Meu cordão é um absurdo

Meu perfume é da armani

(...)

Picape cabine dupla

De jet na carroceria

Correria traz fartura

Fartura traz alegria

(...)

E no meu vocabulário

Não existe economia

Nós investe no poder

E usufruir da putaria

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como roubos e furtos. Refiro-me aqui, especificamente, aos versos

“correria traz fartura, fortuna traz alegria” e “nós investe no poder e

usufrui da putaria”. No ambiente da periferia é de conhecimento geral

que “aqueles que fazem correria” são os sujeitos envolvidos em práticas

ilícitas, a exemplo do tráfico de drogas e do comércio de máquinas caça-

níqueis (VARGAS, 2015, p. 7).

As menções aos itens caros nas músicas do estilo não são definidoras para

sua aquisição bem como a alusão ao crime não é determinante para transgressões

entre os apreciadores do funk ostentação. É importante lembrar que ídolos como

os que foram citados e a narrativa de “Salvando a fonte” são mensagens

midiáticas que operam muito mais como uma idealização, um modelo para além

da realidade.

Nesse sentido, o jogo representa apenas uma juventude que não precisa se

dedicar a uma ocupação, de certa forma definindo o público alvo do refrigerante

como aqueles com poder de compra, mesmo que a renda não seja fruto de seu

trabalho. Isso excluiria boa parcela dos jovens brasileiros que não desfrutam

desses momentos de curtição porque dedicam seu tempo a algum tipo de

trabalho ou porque não dispõem de possibilidades de lazer pela falta de dinheiro

ou perspectivas:

A existência de tempo livre não implica necessariamente em lazer. O

tempo livre do trabalho muitas vezes pode significar o espaço de

penúria, da opressão e da falta de oportunidades. Este é o caso

dramático do desemprego e da desocupação, situação vivida por uma

expressiva parcela de jovens brasileiros. O lazer é atividade social e

historicamente condicionada pelas condições de vida material e pelo

capital cultural que constitui sujeitos e coletividades (BRENNER, DAYRELL

e CARRANO, 2008, p. 178).

A lógica da visibilidade social alcançada por meio do consumo é

reproduzida no universo virtual de Fanta, de modo que só são mostrados ali os

consumidores ideais do produto. Mas, mesmo para aqueles que não estão

representados, as imagens veiculadas pela campanha se prestam a modelos (ou

reflexo) do que os jovens querem. Conforme Kehl (2004, p. 93): “Poucos são

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aqueles capazes de consumir todos os produtos que se oferecem ao adolescente

contemporâneo – mas imagem do adolescente consumidor, difundida pela

publicidade e pela televisão, oferece-se a identificação de todas as classes socais”.

Num determinado momento, já mencionado anteriormente, os

participantes debatiam sobre objetos que os representavam. Pipa, bonés de aba

reta, patins, ioiô, tablet e chuteiras entre outras coisas foram citados. Algumas

falas chamam a atenção para o descompasso entre a vontade de consumir e as

limitações financeiras. Keven disse: “coisa mais ruim é ir no shopping sem

dinheiro”, e Alana completou: “quando eu vou no shopping tem que ter dinheiro,

viu? (...) se for pra olhar e passar raiva, é melhor não ir”. (Grupo Focal realizado em

27/06/2016)

Feixa (1999) e Campos (2007) concordam que a juventude hoje é uma

condição que abrange muito mais que uma faixa etária. Em grande parte, por

meio do consumo, “o feito paradoxal do campo de identificações imaginárias

aberto pela cultura jovem é que convoca pessoas de todas as idades. Quanto mais

tempo pudermos nos considerar jovens hoje em dia, melhor” (KEHL, 2004, p. 93).

Ciente da demanda por jovialidade, o mercado trata de oferecer por meio de bens

a possibilidade de adotar um estilo de vida associado à juventude.

Comentando sobre marcas e produtos que preferem, Alana disparou que

os produtos da marca Adidas são “coisa de velho!”. Os colegas complementaram

dizendo que colorido e estilo é o que confere jovialidade a certas marcas, por isso

justificam, inclusive, a preferência por alguns personagens.

Pesquisadora: Esse é o Tristan.

Ricardo: Esse é top!

Carlos Daniel: Olha o estilão dele!

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Pesquisadora: Tristan tem otimismo e entusiasmo para reunir pessoas.

Ele conhece todo mundo e está em todas as festas e eventos. Tristan tem

estilo. E é com Fanta que ele consegue energia pra tanta animação. [leio

a descrição do personagem contida no site]

Carlos Daniel: Olha eu aí, professora!

Aqui é toda a turma, cada um com seu objeto [mostro a imagem com

toda a galera Fanta].

Ricardo: Eu só não entendi a do Tristan. Ele não tem nada... (os outros

tem skate, ioiô etc.)

Pesquisadora: Ele perdeu a diversão, ele tá playless...

Carlos Daniel: É esse que tem que salvar.

Pesquisadora: Com quem vocês se parecem mais?

Carlos Daniel: Com o moreninho (Tristan). Na rua eu só uso roupa

cabulosa!

Pesquisadora: Como é roupa cabulosa? Como vc descreve? É moderna? É

colorida? É grande?

Carlos Daniel: De marca! (Grupo Focal realizado em 27/06/2016)

Origem fantástica

A mídia, por meio de campanhas publicitárias ou celebridades, funciona

tanto para elaborar valores, como explicamos acima, quanto para apagar traços

da lógica do capitalismo em nome de uma lógica do consumo simbólico

(CARRASCOZA, CASAQUI E HOFF, 2007). Ciente das implicações de ordem

econômica e até mesmo ecológica envolvidas em seus processos de produção,

Fanta oferece uma ressignificação para o feitio do refrigerante apelando para

Floresta de frutas e Cachoeira. Esses dois cenários, que compõem “Salvando a

fonte”, são recolocados como origens fantásticas da bebida.

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Carrascoza, Casaqui e Hoff (2007) abordam uma estratégia semelhante

utilizada por Coca-cola no VT Happyness Factory (fig. 62) de 2006. No artigo, os

autores descrevem e analisam o filme em que uma linha de produção divertida

operada por criaturas ficcionais trabalham carinhosamente para gerar garrafas de

Coca-cola. Nesse caso, como em vários outros, a publicidade funciona como um

artifício para apagar os elementos reais de produção da mercadoria (idem, p. 73)

em nome de um consumo idealizado e prazeroso.

Figura 62 - quadro de Happyness Factory

Rocha (2006, p. 93) se alinha a essa posição ao afirmar que a mídia

enquadra a produção cultural e simbolicamente:

É nesse contexto da modernidade (contemporaneidade) que

aparece a indústria cultural como forma básica de distribuição dos

significados, permitindo que a produção adquira seu destino de

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consumo. A mídia faz com que a produção possa ter sentido e,

portanto, possa ser percebida como consumo.

Nos jogos, a Floresta de frutas e a Cachoeira (fig. 63) funcionam, assim,

como uma floresta mágica, colorida e divertida, com frutas usadas no preparo da

bebida ou mesmo uma torrente de Fanta, respectivamente. A realidade da fábrica

com seus funcionários, a matéria prima e sua origem, as garrafas desde o

transporte ao descarte, são trocados pela produção encantada oferecida pela

marca, muito mais adequada ao consumo em que nada deve ser desagradável.

A esfera da produção, sem atribuição de significados, é a esfera de uma

falta que coloca na disjunção as palavras (o significado) e as coisas

(produtos e serviços). Introduzir o significado na esfera da produção

quer dizer criar um código que faça delas nascer o consumo. A produção

em si mesma não é nada, ela não diz. Em certo sentido, uma casa vazia

não é uma casa, como lembra Marshall Sahlins (1979). É preciso construir

um código, um sistema simbólico que complete os produtos e serviços,

dotando-os de sentido, sob a forma de usos, razões, desejos,

necessidades, instintos ou o que mais se queira (ROCHA, 2006, p. 101).

Entretanto, a representação do processo produtivo precisa se aproximar de

realidades conhecidas, as corporações são ressignificadas simbolicamente para se

adequarem aos ideais do consumidor, ao que ele projeta: “as imagens e

representações do mundo do trabalho estabelecem vínculo de verossimilhança,

de apropriações de traços da realidade para conotar as experiências

potencializadas do consumo de produtos” (CARRASCOZA, CASAQUI e HOFF,

2007, p. 70). Um produto que surge de cachoeiras ou florestas de um mundo

divertido deve gerar felicidade.

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Figura 63 - Floyd no jogo jetpack ambientado na cachoeira

Personalidade produto

Voltando aos ambientes do site analisado, destaca-se ainda na Casa do

Todd o automóvel do personagem, a Vanta (que aparece na figura 62), como

exemplo de estilo de vida externado por um produto. No jogo o carro não é

apenas um meio de transporte, é também um difusor de som. Embora não tenha

reservado ocasião própria para trazer a música ao debate, revendo as transcrições

dos encontros me dei conta de que mesmo diluída, sua importância está presente

nas narrativas dos alunos. Enquanto alguns participantes revelam cantar para

espantar a tristeza, outros tomam ídolos adolescentes como referência, como

veremos adiante.

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Quanto ao carro, na cultura norte americana, ganhá-lo é como um rito de

passagem essencial à juventude (MOBILIZE, 2013), simboliza, de certa forma,

independência em relação aos pais. O automóvel é um sonho de consumo que

representa status e liberdade “desde o início do século 20, quando Ford criou sua

montadora, os carros estão entre os bens de consumo mais desejados do mundo”

(LOUREIRO, 2013). Mas, quando falamos de jovens, brasileiros em especial, há

duas contradições nessa associação. O poder aquisitivo é uma delas, pois essa

etapa ainda é de instabilidade profissional e, portanto, financeira. A outra

contradição é a idade, já que a carteira de habilitação é concedida apenas a

maiores de 18 anos.

Figura 64 - Imagem geral de Utopia com a Vanta em primeiro plano

Entrevistas com executivos de três montadoras sediadas no país (Kia,

Chevrolet e Ford) revelam que os jovens consumidores são uma minoria que

pertence às classes A e B e ganham o veículo da família, ou já estão pela casa dos

25 anos (nem tão jovens assim?), empregados, e podem arcar com a compra de

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um carro (REVISTA POACARROS, 2010). Levando essa informação para o âmbito

do game a discrepância fica ainda mais evidente: o único personagem que possui

carro não tem família e tampouco emprego. Essas omissões, a rigor, revelam a

idealização do período de adolescência e do próprio consumidor do refrigerante

como sem regulação parental ou compromisso laboral, mas com grande poder de

compra e disponibilidade total para a diversão.

Em contrapartida, a notícia anterior informa também que os jovens usam o

carro como espelho da personalidade. Desse modo, o uso de automóvel para

construir um personagem independente e bem sucedido socialmente é

justificado. Todd, como líder da “galera Fanta” pode contar com uma van equivale

a proporcionar aos colegas a mesma possibilidade de autonomia. Ao personalizá-

la [nos jogos relacionados], o participante tem a ilusão de estar expressando sua

individualidade por meio da construção de um estilo (CAMPOS, 2007).

Outra questão a ser discutida é o apagamento da aura em torno dos carros

como objeto de desejo, especialmente entre os jovens. Loureiro (2013 s/p.) afirma

que:

As novas gerações já não estão nem aí para motores, pistões e cilindros.

Em 1998, 64% dos americanos de até 19 anos tinham carteira de

habilitação. Em 2008, a fatia caiu para 46%. No ano passado, chegou a

28%. No Brasil, apesar de a venda de carros bater recorde atrás de

recorde, os jovens também já não se entusiasmam tanto com o volante.

Uma pesquisa da consultoria Box 1824, especializada em

comportamento, mostra que comprar um carro é prioridade para só 3%

dos jovens de 18 a 24 anos.

Seja por razões ideológicos, como o engajamento em causas ecológicas, ou

pela incapacidade de arcar com os gastos, os jovens estão cada vez menos

interessados em automóveis. Embora a inserção de um veículo na história permita

esta análise, os participantes do grupo focal não expressaram interesse por eles. A

maioria informou que sua família possui pelo menos um carro, mas ninguém

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mencionou o objeto como sonho de consumo. Talvez pela pouca idade (a média

era 13 anos), os gadgets e a internet estão entre os objetos de consumo mais

desejados entre os participantes.

Pesquisadora: E com tecnologia, vocês mexem com tablet? Com

computador, celular, notebook? Vocês aprendem a mexer nessas coisas

onde?

Ricardo: Os caras vão na lan house aí você vê e aprende.

Adrielly: Professora, com tecnologia eu gosto muito de escutar música.

Pesquisadora: Com o que você escuta música, no mp3?

Adrielly: No youtube.

Pesquisadora: Quem tem tablet?

Todos levantam as mãos.

Pesquisadora: Vocês instalam coisas nos tablets? Quem ensinou pra

vocês?

Kauane: Minha irmã.

Alana: Sozinha.

Ricardo: Eu aprendi foi vendo as pessoas baixando.

Carlos Daniel: tem menino desse tamanhozinho (pequeno) que sabe

baixar coisas...

Alana: Minha irmã tem 7 anos e sabe mexer melhor do que eu.

Carlos Daniel: dá vergonha, não dá?

Pesquisadora: E a questão de aprender pela internet? Vocês já

aprenderam alguma coisa pela internet?

Alana: Aprendi a baixar música pelo youtube

Carlos Daniel: Aprendi a mexer no youtube, no face (facebook)..

Ricardo: Igual ao PB (point blanc - jogo), eu vi no youtube pra baixar.

GTA (grand theft auto – jogo)...

Kauane: Eu aprendi a baixar jogos, música.

Adrielly: Música e dicionário de inglês, português e espanhol (Grupo

Focal realizado em 27/06/2016).

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Loureiro (2013) confirma que o símbolo de status transferiu-se dos carros

para os tablets e smartphones. Além disso, a noção de presença está sendo

ressignificada por meio da conectividade:

Graças à internet e às mídias sociais, mais pessoas podem se conectar

com os amigos, no trabalho ou até mesmo fazer seus trabalhos escolares

sem sair de casa, tornando-as potencialmente menos dependentes dos

carros, porém mais dependentes das traquitanas eletrônicas (MOBILIZE,

2013, s/p.).

Acrescentando à invasão das tecnologias o fim das instituições disciplinares

e das identidades fixas baseadas na família ou no trabalho, por exemplo, podemos

vislumbrar o mundo virtual como novo espaço público de constituição dos

sujeitos:

No novo ambiente, perdem sentido aqueles relatos edificantes sobre as

gestas patrióticas repletas de grandes acontecimentos e figuras

admiráveis, que pontilhavam o imaginário escolar com batalhas e

proclamações comandadas por homens ilustres, por exemplo, enquanto

cresce o interesse por uma multiplicidade de pequenas narrativas sobre

as minúcias privadas de qualquer um. Não se trata apenas do

surgimento e da veloz popularização de fenômenos como os reality

shows da televisão e a interação via internet, embora um exemplo bem

claro dessa transmutação surja neste último campo. Trata-se da “linha do

tempo” que a rede social Facebook implementou em 2011 para expor o

perfil de seus milhões de associados, convertendo a história pessoal de

cada um num breve relato audiovisual. (SIBILIA, 2012, p. 146)

A afirmação de Sibília nos ajuda a concluir que se a modernização

desmanchou o que era sólido, o período seguinte reduziu os fragmentos a

partículas. O indivíduo moderno dispunha de códigos estáveis que o

instrumentalizavam para depreender sentidos, assumir identidades e proceder à

comunicação. Entretanto, “desmorona-se a utopia da comunicação que alumiou o

sonho iluminista e sustentou o projeto moderno. Sobre as ruínas dessa ilusão, no

entanto, caberia agora inventar pequenos laços precários, mas talvez poderosos,

meramente situacionistas ou válidos para cada ocasião” (idem, p. 65).

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O jovem contemporâneo, tal como uma marca a ser gerida, se adapta ou se

associa transitoriamente a identidades a fim de desempenhar um papel social. Sua

identidade é transitória e, por isso, a identificação em muito é definida a partir do

consumo ou dos media: “As tecnologias visuais e audiovisuais, e mais

recentemente os media digitais, são territórios onde as gerações mais jovens,

incluindo as crianças, fazem uma série de aprendizagens e adquirem

competências, constroem imagens do mundo, comunicam e experimentam

identidades” (CAMPOS, 2007, p. 115).

Hoje e cada vez mais a existência é pautada pelo engajamento em

comunidades virtuais. Essa ideia aparece nas falas dos colaboradores sobre seu

apego ao celular e à internet:

Pesquisadora: Sobre celular, alguns de vocês citaram o celular como

importante.

Adrielly: Se eu ficar um dia sem meu celular, eu acho que morro de

infarto.

Alana: Eu explodo. Quando eu tou com meu celular eu fico mais calma...

Adrielly: Uma vez eu perdi meu celular. Eu não conseguia achar. Eu fui

ficando branca, eu comecei a chorar... (Grupo Focal realizado em

27/06/2016)

A presença nas redes sociais também é citadas como ação importante

pelos colaboradores:

Pesquisadora: Todo mundo aqui tem acesso a internet em casa?

(falam ao mesmo tempo e tem opiniões divididas)

Keven: Sim, pelo celular.

Pesquisadora: O que vocês fazem pela internet?

(Falam ao mesmo tempo: vídeo, música)

Adrielly: Assisto Whyndersson Nunes (comediante e youtuber) com w. é

muito diferente... Supernatural, Estrelas, Miraculous (séries de TV).

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(...)

Pesquisadora: Ninguém tem rede social... ?

Marcela: Facebook

Adrielly: Entra no Facebook

Carlos Daniel: eu não gosto desse treco de ... (inaudível), agora Facebook

vai.

Marcela: eu tenho Facebook, eu entro no meu whatsapp e vejo o grupo.

(Grupo Focal realizado em 27/06/2016)

Na opinião de alguns críticos, participar desse tipo de sociabilidade é

essencial para elaborar significação, embora não corresponda a criação de

sentidos. Passa muito mais por sentir-se parte de algo, “nos apropriarmos do

fluxo” (SIBILIA, 2012, p. 90 e 91):

Para a subjetividade do espectador ou usuário midiático, o sentido não é fundamental. Como dois lados da mesma moeda, hoje a estimulação é abundante, mas escasseia a capacidade de incorporar esses estímulos, que deslizam sem se assentarem na subjetividade por meio da consciência. Esse seria um dos motivos, aliás, pelos quais se revela tão importante tecer tais redes, já que estas multiplicam as conexões e permitem habitar de modo conjunto a torrente informacional, produzindo uma densidade capaz de desacelerar essa avalanche e captar de algum modo o que se sucede tão rapidamente, transformando-o em experiência.

O esvaziamento do sentido, como explica Sibília, é também o esvaziamento

da experiência de que falava Walter Benjamin pelos idos dos anos 1930, a morte

da conversação descrita por Debord nos anos 60 do século passado e o

apodrecimento da comunicação anunciada por Deleuze na década de 1990

tratavam essencialmente das mídias analógicas, mas podem ser muito bem

sentidas em tempos digitais. Assim como a industrialização cobrou o preço da

adaptação do sujeito moderno à velocidade, a pressa pegou as pessoas de

surpresa e de jeito, sendo justificada em nome das “utopias políticas, que

prometem tempos de felicidade e de fraternidade; aparece a ciência, que promete

a compreensão humana do universo; aparece a tecnologia, que promete a

emancipação do homem em relação às agruras na natureza” (LA TAILLE, 2009, p.

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31). As palavras de ordem que impulsionavam a marcha da modernidade eram

ideias promissoras de futuro.

Para La Taille (idem), o ideário moderno chegou à década de 1970, mas foi

enfraquecendo até ser categoricamente encerrado com a derrubada das torres do

World Trade Center em 2001. Esse intervalo de tempo engloba vários

acontecimentos que concorreram para a derrocada dos grandes sistemas: fim da

União Soviética, da separação entre as Alemanhas e da proposta social-comunista,

reformas econômicas neoliberais afetando mercados e trabalhadores,

desequilíbrio climático e crise de recursos naturais. Já não há perspectivas de

futuro, tampouco referências de passado.

Por meio das redes sociais, das mensagens instantâneas ou mesmo de e-

mails, troca-se informações, posta-se imagens, registram-se encontros, presenças,

opiniões, mas não se estabelecem conversações. Escasseia a produção de sentido

e a sensação de pertencimento a algo sólido ou mesmo a um grupo:

Tem-se a impressão de que, hoje em dia, muitos dos inúmeros atos de

comunicação traduzem mais uma vontade de estar em contato com

outrem do que estabelecer trocas com ele. Por exemplo, Ana Cristina

Garcia Dias, em seu estudo sobre as motivações dos jovens usuários dos

chats na internet, verificou que, para muitos deles, não se tratava de

participar de diálogos edificantes, mas apenas de atividade de

divertimento (DIAS e LA TAILLE, 2006). É como se se tratasse de uma

grande e constante “festa”, de uma grande e constante reunião social

que se basta (LA TAILLE, 2009, p. 56).

A despreocupação com diálogos edificantes e a ênfase em atividades

apenas como divertimento, conforme explica La Taille, são características da

persona online, ou seja, a pessoa como marca que é elaborada pela participação

em grupos de discussão, como no aplicativo Whatsapp; ou em redes sociais que

se encarregam de montar painéis de interesses e estilo, como o Pinteret;

promover encontros amorosos, como o Tinder; estabelecer contatos profissionais,

como o Linked in, entre outros. A interação nesses canais, em grande medida, é

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pautada pela associação a informação terceirizada e reação do ciclo/grupo a que

pertence. No Facebook, por exemplo, é possível fazer parte de comunidades

virtuais que tratam dos mais variados temas, desde religião, passando por música,

esporte, sexualidade e consumo, até posições políticas. Ali também existe espaço

para publicação de opiniões pessoais, que – como observo - é comumente

substituída por textos de veículos ou autores cuja credibilidade muitas vezes é

duvidosa. Há ainda o intenso compartilhamento de imagens pré-fabricadas, os

memes, que por sua vez são fragmentos de acontecimentos divulgados pela

internet. Embora os usuários possam responder às postagens, em sua grande

maioria se limitam a reagir a partir dos emojis disponibilizados (fig. 65), se

abstendo de palavras e utilizando animações pré-determinadas para expressar

emoções. Ali também pode-se ainda decidir ignorar certos tipos de informações

publicadas e até desfazer “amizades.

Figura 65 - Emojis do Facebook

A homogeneização que a modernidade tratou de impor aos indivíduos

perde força até ser totalmente desconstruída no fim do século XX.

Gradativamente a felicidade individual se sobrepõe à ordem social e a filiação às

estruturas sólidas é muito mais opcional do que compulsória. Não se trata de que

já não se aposte na família ou no trabalho, por exemplo, ou mesmo na pátria e até

na religião; porém, todas essas instâncias se converteram em opções individuais –

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não necessariamente dadas a priori, mas adaptáveis e definíveis ao gosto de cada

um. Esses novos modos de identificação e interação social estão no que Sibilia

(2012, p. 71) identifica, em Neal Gabler, como “a conquista da realidade pelo

entretenimento”.

Para aprofundar um pouco mais nossas reflexões sobre essas questões, vamos

tratar a seguir do imperativo do gozo e suas consequências.

5.3 Os playless - Imperativo do gozo, tédio e hiperestímulo.

A narrativa que conduz “Salvando a fonte” é baseada no desaparecimento

da diversão. Em Utopia há uma torre com um relógio que marca a hora certa para

que a diversão tenha início. Entretanto, o relógio quebrou e todo o ambiente

corre o risco de cair na apatia e na falta de alegria. Nessa cidade repleta de

espaços de lazer e diversão, onde mora a “galera Fanta”, eles assumiram o

compromisso de resolver o problema que motiva o jogo.

Utopia, cidade multicolorida!

Como explica Sibilia (2015), o relógio foi adaptado desde sua origem, nos

mosteiros medievais, para o uso cotidiano a fim de conferir ritmo à lida diária e

otimizar a produtividade. Ao associar a torre do relógio ao divertimento, o jogo

subverte a lógica capitalista industrial substituindo o compromisso com o trabalho

pela recreação. Essa primeira impressão revela que, de acordo com Fanta, seria

perfeito transformar o tempo de produção em momento compulsório de lazer.

Utopia é um lugar composto por vários espaços de recreação como estádio

de futebol, parque de diversões, fliperama, pista de skate, quadra de esporte e

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praia, além de casas e prédios. Com tantas estruturas de lazer, a cidade parece

projetada para a sociabilidade, aspecto importante para o desenvolvimento

juvenil. Segundo Brenner, Dayrell e Carrano (2008, p. 176), o tempo livre, a

diversão e a interação corroboram para a construção de identidades entre os

jovens, inclusive identidades coletivas.

Essas formas descomprometidas (atividades de lazer) possuem,

entretanto, uma grande efetividade social para o estabelecimento de

valores, conhecimentos e identidades. No espaço-tempo do lazer, os

jovens consolidam relacionamentos, consomem e (re)significam

produtos culturais, geram fruição, sentidos estéticos e processos de

identificação cultural.

Em sua análise sobre a cultura do lazer e do tempo livre, pesquisadores

(idem) revelam, contudo, que a maior parte de nossas cidades não oferece

espaços para o convívio dos jovens. No Brasil, a distribuição dos equipamentos

culturais segue as desigualdades sociais concentrando-se nas regiões mais ricas.

Ricardo marcou bem essa discrepância analisando a apresentação da cidade

fictícia:

Ricardo: - Queria morar nessa cidade

Pesquisadora: Por que você queria morar aí?

Ricardo: - Tem tudo! Tem “campinho” de ping pong. Olha lá...

(...)

Pesquisadora: O que vocês acharam daquela cidade ali?

Marcos: Muito legal!

Ricardo: De gente rica

Marcela: Eu queria morar lá...

Ricardo: Parece de gente rica, que não vai faltar nada.

Pesquisadora: Deixa te perguntar uma coisa, Ricardo. Como é cidade de

gente pobre?

Paulo: Rua esburacada.

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Keven: Favela.

Ricardo: Igual lá no JK [Juscelino Kubistchek, setor vizinho]. No JK não

tem asfalto...

Carlos: [Tem] lixo.

Ricardo: Água tem que ser de poço ou então tem que ter ligação urbana

pra lá. E olha lá se água vai pra lá, por que é fraquinha. Quando chove é

só barro. Pra você vir pra escola tem que por sacola nos pés..

Alguns colegas riem!!!

Ricardo: É! Eu não vou vir com os pés sujos. (Grupo Focal realizado em

2/3/06/2016)

De acordo com pesquisas do IBGE (2012), de 5.565 municípios brasileiros

menos de 2.000 possuem centros culturais, por volta de 1.400 tem teatro, a oferta

de cinemas nem chega a 600 deles e só há shoppings em cerca de 350. As

bibliotecas e as quadras de esporte são os equipamentos mais comuns, existindo

em quase 5.400 e 4.900 cidades respectivamente. Para a maioria dos jovens

brasileiros, um lugar como o do jogo é mesmo uma utopia.

Fazem parte do cenário ainda a Floresta das frutas e a Cachoeira. Ambas

são opções para curtir a natureza disponíveis no jogo, já que nelas há fases

relacionadas à busca da diversão. Entretanto, as interações concentram-se mesmo

sobre o espaço urbano acompanhando os dados que indicam a concentração de

jovens nas áreas urbanas é de 81% (FRIGOTTO, 2004) e, ainda, sua preferência por

atividades eletrônicas, como apontamos até aqui.

Reiterando o destaque dado à diversão, a casa do Todd se sobressai como

parte do ambiente do jogo. O espaço, assim como Utopia, é projetado para o

entretenimento formado por duas salas, cozinha, quarto, espaço de jogos,

garagem, piscina e uma pista de corrida. É importante assinalar a presença de

vários apetrechos destinados à distração, como TVs, aparelhos de som, jogos

estilo pinball e mesa de ping pong numa sala de jogos, bicicleta e equipamentos

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para customizar veículos na garagem. Mais uma vez, bens de consumo são

utilizados para oferecer uma vinculação identitária ao personagem associando-o à

ideia de juventude.

A falta de autoridades e o convite ao divertimento agem em favor do

imperativo do gozo. Pela perspectiva da psicanalista Maria Rita Kehl no

consultório, para a juventude sem tutoria, tem sido angustiante – e não prazeroso

– ser colocado no centro da sociedade. As falas dos participantes se dividem

quando o assunto é a falta de supervisão adulta. Em princípio, acreditavam que

aproveitariam, mas logo se deram conta que sentiriam falta:

Ricardo: Pras crianças deve ser uma diversão, não ter os pais. Fazer o

que eles quiserem...

Adrielly: Eu acho que eu não viveria sem meus pais. Sem minha mãe, né?

Sem meu pai eu até que viveria

Pesquisadora: Como é que seria um lugar que só tivesse criança, não

tivesse adulto nenhum?

Adrielly, Marcela e Ricardo riem e falam ao mesmo tempo.

Keven: Sem controle!

Pesquisadora: Os adultos então servem para controlar?

Carlos Daniel: É, controlar.

Keven: Se não nós se mata (sic.)

Carlos: Ia ter liberdade

Pesquisadora: Ia ter liberdade demais?

Adrielly: Ia virar bagunça

Marcela: As vezes até com a minha mãe eu acabo dando muita

liberdade...

Marcos: Se nessa cidade não tivesse nenhum adulto ia ser bom demais, a

gente podia pegar tudo o que quisesse.

Adrielly: Ia ser horrível. Se a gente não soubesse fazer comida ia morrer

de fome... (Grupo Focal realizado em 23/06/2016)

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O imperativo do gozo faz parte dos jovens tentarem escapar da

adolescência ao não corresponderem aos ideais que lhes são impostos. Por outro

lado, ninguém quer crescer, pois “como ingressar no mundo adulto onde nenhum

adulto quer viver?” (KEHL, 2004, p. 97). Se os adultos perseguem o ideal de

juventude e deixam de definir referências ou limites para os jovens, a “vaga de

‘adulto’, na nossa cultura, está desocupada” (idem, p. 96). O que parece liberdade

termina em omissão por deixar os adolescentes desamparados. Essa lacuna de

valores e transmissão de experiências pode ser ocupada por “razões de mercado”

(idem, p. 97) ou serem pautadas pelas representações midiáticas.

Cidade cinza

Antagônica à Utopia, existe a Cidade, outro centro urbano que aparece na

base da tela e é bem menor que Utopia ou, apenas um recorte no mapa. Os

prédios e as quadras, de basquete e futebol, estão em ruínas. Uma nuvem escura

se desloca para encobri-la, não há sinal de vida nem mesmo cores em nenhum

lugar. A história em quadrinhos 40 (fig. 66) conta que, com o defeito na torre do

relógio, a falta de diversão que ameaça Utopia já se instalou na Cidade. Seus

habitantes se transformaram em playless, ou seja, pessoas sem-diversão, pessoas

cinza incapazes de divertir-se, interagir e demonstrar empolgação. Para evitar que

o tédio e a “chatice” se espalhem, jogadores e a “galera Fanta” devem salvar a

fonte.

40 Tradução do diálogo:

Todd: - Cara, o que está acontecendo com seu braço?

Tristan: - Não sei. Sei lá!

Todd: - Sei lá!? Está cinza como minha avó!

Tristan: suspira.

Todd: Bem, deite-se ou qualquer coisa. Eu vou acabar com isso.

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Figura 66 - Diálogo entre Tristan e Todd mostrado no comic book

A associação da cor cinza com o tédio remete às observações feitas por

Singer (2010) em sua análise sobre o sensacionalismo nas mídias modernas. Para

ele, a modernidade inaugurou um período em que a atenção das pessoas

requisitava cada vez mais estímulos para ser conquistada. Como resultado, a

apatia frente ao excesso de excitação também se tornou comum.

As tentativas de compreender o sensacionalismo popular como um

sintoma da vida moderna também ocasionaram uma crença difundida

sobre as consequências fisiológicas da superestimulação nervosa. (...) A

ideia era de que os nervos humanos eram sujeitados ao desgaste físico e

tornavam-se mais fracos, lentos e progressivamente menos sensíveis

quando estamos expostos a muitos estímulos. “Nervos excitados e

esgotados” criaram um modo de percepção “fatigada” ou “blasé” que

imaginava o mundo “em um tom uniformemente insípido e cinzento”.

Sensações cada vez mais fortes eram necessárias para penetrar os

sentidos atenuados, para formar uma impressão e redespertar uma

percepção (SINGER, 2010, p. 118).

O autor continua a análise explicando que industrialização, urbanização e

crescimento populacional incidiram sobre as subjetividades por meio de choques

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físicos pela sobrecarga nos sentidos. A intensidade do trânsito, concentração de

pessoas, excesso de placas, sons, barulhos etc., atordoavam e requisitavam

atenção seletiva: “a modernidade implicou um mundo fenomenal –

especificamente urbano – que era marcadamente mais rápido, caótico,

fragmentado e desorientador do que as fases anteriores da cultura humana”

(idem, p. 96). Mais do que adestrar o corpo para a funcionalidade fabril, a

modernidade imprimiu um novo ritmo ao modo de entender e reagir aos

estímulos sensoriais: “o organismo mudou de marcha, por assim dizer,

sincronizando-se ao mundo acelerado” (SINGER, 2010, p. 117). Condicionados à

cadência frenética e fracionada das linhas de produção, os indivíduos

necessitavam de experiências excitantes para compensar o tédio de um trabalho

burocratizado e vazio. Essa compensação, entretanto, deveria basear-se no

“empobrecimento da experiência estética da modernidade” (idem) sendo

igualmente rápida e superficial. Daí o cinema ter sido designado por Walter

Benjamin como um sinal dos tempos modernos.

As pessoas, alheias ao sentido do trabalho e do divertimento, requisitavam

estímulos ainda mais potentes alternando tédio e excitação em graus cada vez

maiores. Contra o enfastiamento, o hiperestímulo, entretanto, pode também não

ser a compensação adequada.

Quem quer ser playless?

La Taille (2009) explica que se o indivíduo não consegue atribuir sentido às

coisas, pode tornar-se apático ou depressivo, mas afirma, também, que o excesso

de estímulos pode levar a uma busca ainda mais complexa:

Várias razões podem levar alguém a associar sua vida ao tédio. Às vezes,

trata-se de um destino infeliz que prendeu a pessoa a atividades

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repetitivas e sem interesse, um destino que a desviou de lugares, de

pessoas, de trabalhos mais ricos. Todavia, não apenas os destinos cruéis

podem trazer o tédio. Até mesmo com a possibilidade de realizar

atividades variadas, conhecer pessoas e lugares diferentes, é possível

sentir tédio por que a vida carece de sentido. Nesse caso: cai-se na

melancolia, na depressão. Ou então, para fugir desse mal, procura-se

ocupar freneticamente o tempo, correr de lá pra cá, realizar mil

atividades diferentes, verificar a cada hora de chegam e-mails, recados,

torpedos, toda hora mandar e-mails, mensagens, torpedos, ligar do

celular para falar qualquer detalhe, manter incessantemente a televisão

ligada na esperança de que notícias graves façam cair do céu um novo

assunto que dará a impressão de viver intensamente por alguns dias,

comer, malhar, comer novamente, divertir-se, desviar constantemente a

atenção com pequenas atividades justapostas (LA TAILLE, 2009, p. 17).

Por meio de exemplos, os colaboradores reforçam com os argumentos de

La Taille ao dizerem que precisam ocupar seu tempo para não se sentirem

entediados:

Pesquisadora: Eu queria saber de vocês como é que as pessoas perdem a

diversão no cotidiano, o que faz elas ficarem sem diversão, ficarem

playless.

Carlos Daniel: Ficar em casa sem fazer nada.

Adrielly: Dá preguiça!

Michel: Ficar sem conversar, não tem nada pra fazer, não pode se

divertir...

Pesquisadora: Ficar sem conversar, não ter o que fazer... como vocês se

sentem?

Adrielly: Meio sem... com tédio. Quando eu tou com tédio, eu começo a

bater nas coisas, começo a bater nos trem tudo (sic).

Ricardo: Quando eu tou com tédio, eu começo a erguer arraia.

Pesquisadora: Então vc combate o tédio erguendo arraia, brincando, se

divertindo... então é ruim ficar entendiado?

Todos: sim!

Adrielly: É horrível! A gente ficar sem fazer nada... (Grupo Focal realizado

em 21/06/2016)

As mudanças trazidas com a modernidade e a industrialização, naquilo que

diz respeito à atenção e apatia, se intensificaram na contemporaneidade. As

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subjetividades modulares da sociedade de controle dispõem ainda de mais

incitações seja pelos apelos ao consumo, seja pelas demandas das tecnologias

midiáticas, ou mais, pela junção de ambas. É possível e necessário adotar estilos

de vida a venda, é importante gerir a si mesmo como marca. Como parte da

cadeia de consumo, é necessário vender-se como bem sucedido, feliz, de

preferência de forma imediata e permanentemente:

As novas subjetividades em formação são fundadas na cultura do

imediatismo, da possibilidade da obtenção do prazer contínuo e de uma

temporalidade instantânea. É a cultura do "aqui e agora" que liga a

promessa de um estado de bem-estar eufórico, em que não é permitido

sentir-se triste ou angustiado. E para esses "pecados" contemporâneos

há ainda a garantia da medicalização, das "pílulas de felicidade", que

oferecem a tentadora possibilidade de recusa à dor e, de quebra, de

regresso ao consumo. Esta é a lógica dessa sociedade: é possível ter

acesso a qualquer escolha, desde que seja no interior do consumo

(SILVA, 2006, p. 89 - 90).

Concordando com Silva, ao detalhar a formação de subjetividades

baseadas na cultura do imediatismo e associadas a expectativa de prazer

contínuo, podemos dizer que os jovens de hoje são incessantemente convocados

ao gozo, porém, sentem-se incapazes de desfrutá-lo e, consequentemente,

frustrados. Essas condições contribuem para leva-los a situações extremas nas

quais tem sido os protagonistas de crescentes índices de suicídio:

O último quarto do século XX alterou drasticamente uma relação que

mais de 150 anos de estatística haviam incitado a interpretar como

universal: o crescimento regular da taxa de suicídios com o aumento da

idade (...) a taxa de suicídio entre os jovens de 15 a 24 anos triplicou na

segunda metade do século XX, enquanto, no mesmo período de tempo,

o suicídio de adultos e de pessoas idosas diminuiu (BAWDELOT e

ESTABLET, 2006 in LA TAILLE, 2009, p. 70)

Carlos, falando de modo exagerado e em tom de brincadeira, surpreendeu

o grupo ao revelar como se sente quando está longe dos colegas e da escola:

“todas as férias dá um tédio, dá vontade de morrer”. A turma parece concordar

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com o imperativo da diversão proposto no jogo e isso fica evidente no seguinte

diálogo:

Pesquisadora: Vocês falaram antes que a diversão é importante. E a falta

de diversão, se sentir as vezes sem alegria, é importante?

Adrielly: Não!

Carlos: É um desastre... (Grupo focal realizado em 21/06/2016)

Entretanto, os alunos admitem que é preciso se permitir ficar triste em

alguns momentos.

Pesquisadora: O Carlos tinha falado antes que as vezes quando seu

bichinho de estimação tá doente ou quando alguém da sua família

morre, a gente fica triste. Esse momento é importante ou é melhor

superar o mais rápido possível?

Carlos: Superar o mais rápido possível!

Marcela: Algumas vezes na vida é importante. Você começa a pensar no

que vc fez de ruim também. Mas assim, tem gente que fica triste todos

os dias...

Carlos: É depressão.

(...)

Adrielly: Tem vez que eu fico sozinha em casa e eu começo a dançar no

meio da casa.

Pesquisadora: Pra espantar a tristeza?

Adrielly: aham!

Pesquisadora: Alguem de vocês já se sentiu entendiado por alguma coisa

que aconteceu, tipo um cachorro que morreu ou alguém da família?

Marcela: Meu cachorro ficou doente... eu fiquei triste.

Pesquisadora: Fala Alana... você estava dizendo que se sentiu triste...

Alana: Quando eu perdi meu avô e uma amiga. Eu fiquei triste.

Pesquisadora: Como foi?

Alana: Eu fiquei abalada, ora. (Grupo Focal realizado em 21/06/2016)

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Agem a favor do aumento de suicídio entre jovens condições sociais como

o aumento de divórcios, a perda do sentimento de pertencimento e o

enfraquecimento de valores tradicionais, traços da vida que levamos hoje. Não é

contraditório, portanto, que em uma sociedade em que existir equivale a consumir

e a construir uma personalidade virtual feliz, deprimir-se, intimidar-se ou falhar

diante desse imperativo seja vergonhoso.

Alguns dos autores convidados ao nosso debate concordam que o modo

de (con)viver atualmente é responsável por criar e ao mesmo tempo excluir quem

não se ajusta a lógica desejada do gozo, da satisfação e do divertimento. Para La

Taille (2009, p. 19):

Sentir-se infeliz é visto mais como incompetência social do que como

resultado de uma tomada de decisão implacável. Sentir tédio é visto

mais como fraqueza de caráter do que como humilde reconhecimento

do vazio da vida. No entanto, como bem afirma Minois (2005, p. 388) em

seu belo livro sobre melancolia: “o contexto sociocultural

contemporâneo produz depressivos e, ao mesmo tempo, os exclui”.

Sibilia (2012), ao falar dos problemas enfrentados pela escola frente ao

alunado de hoje, chama a atenção também para os alunos menos “performáticos”

nas salas de aula e a transformação de traços de personalidade em desvios: “aloja-

se também o problema da timidez com uma ‘falha’ cada vez mais intolerável, que

chegou a ser catalogada como patologia passível de tratamento neuroquímico”

(p. 73). Os próprios colegas apontaram um dos participantes da pesquisa como

discrepante por ser pouco expansivo:

Pesquisadora: Vocês conhecem alguém que se sente triste, entediado?

Paulo: Os roqueiros (apontando pra Alana)

Carlos Daniel: É mesmo, só anda de preto!

Alana, você se sente triste, entendiada?

Alana permanece calada....

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Adrielly: Eu não sou triste e entediada não...

Carlos Daniel e Paulo: O Otavinho, olha aí o Otávio.

Marcos: (Apontando Otávio) Olha aqui tia, ele não é triste não, só não

fala nada. (Grupo Focal realizado em 21/06/2016)

O universo de Fanta é ele mesmo baseado na lógica dos incessantes

estímulos em que o tédio e a tristeza são rechaçados. Indivíduos apáticos,

entediados ou deprimidos são representados por Fanta como playless. Em Utopia,

a alegria é imperativa, perde-la é motivo de preocupação, daí a necessidade de

salvá-los. De acordo com a premissa do jogo é necessário tirá-los desse estado

acinzentado. Ao mesmo tempo, a alegria deve ser constante, contagiante e

redentora. A partir da expectativa do consumidor para gozar, o advergame

“Salvando a fonte” convoca os consumidores a fazer de Fanta um item mágico

capaz de protege-los do temível tédio e até mesmo devolver prazer àqueles que

encontram-se sem diversão.

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Conclusão

Vários são os vieses possíveis para abordar um tema. Desde a localização

do ponto de partida, passando pelas idiossincrasias de quem estuda e se

aprofunda no tema até a definição de um objetivo final, são inúmeras as

combinações possíveis. Em se tratando de jogos eletrônicos, há estudos sobre

características técnicas – como programação ou uso de tecnologias específicas -,

pesquisas que se detém em seus aspectos financeiros focando nas estratégias de

comunicação ou distribuição, por exemplo. Com frequência essas particularidades

são abordadas e incluídas em investigações sobre games mesmo quando elas não

se configuram como foco. Da mesma forma, é necessário ter em mente que cada

abordagem metodológica se constrói a partir de escolhas e exclusões. Assim

outros leitores desta investigação poderão apontar faltas, reivindicar ausências

que tenham sentido ou, ainda, excessos que julguem desnecessários.

Dito isto, retomemos o objetivo desta pesquisa como definido na

introdução e o modo como permeou as diferentes etapas da investigação e o seu

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desenvolvimento: perceber que sentidos os jovens atribuem às representações, ao

conceito de juventude criados em uma cultura visual comercial e gamificada, bem

como verificar de que forma essa construção é recebida pelo público a que se

destina.

Vale salientar que esta investigação se alinha às reflexões que configuram o

campo de estudos da Cultura Visual quando propõe que imagens e experiências

centradas no olhar - não apenas aquelas consideradas hegemônicas - sejam

assuntos de conversas com estudantes. Para este campo do conhecimento,

debates sobre assuntos e objetos que fazem parte do cotidiano de alunos podem

levar os jovens a refletir sobre os valores tácitos que esses artefatos insinuam,

carregam, assim como podem, também, ajudá-los a perceber o que objetos,

experiências e artefatos podem revelar sobre si mesmos como sujeitos.

Os limites [entre conteúdos curriculares e artefatos midiáticos] não

deveriam ser colocados pelo grau de popularidade ou de aceitação que

as práticas culturais venham a ter nos entornos mediáticos ou de poder,

mas pela capacidade de entrelaçar sujeitos em experiências

educacionais, pela capacidade de proporcionar transformações pessoais,

de formar critério, de enriquecer a experiência estética, de ampliar o

conhecimento de si mesmo e dos outros, pela possibilidade de gerar

tramas com causas próprias e alheias ou de suscitar o ânimo compassivo.

Em suma a capacidade de contribuir para isso que tantas vezes se

denomina como a construção identitária. E para esse fim, as artes visuais

têm potencial que nem a escola, nem a educação, em geral, chegaram a

explorar suficientemente. É momento portanto de redefinir a educação

nas artes visuais nessa direção e de aproveitar as suas possibilidades

pedagógicas para afrontar, criticamente, a estreiteza da estereotipante

redudância temática, ideológica e estética da cultura de massa (AGUIRRE,

2009, p. 166 e 167).

Apoiando-me nos conceitos e argumentos desenvolvidos por Aguirre,

busquei me aproximar do propósito estabelecido entendendo que seria

necessário me deter em algumas ideias que culminaram na elaboração dos

capítulos que dão corpo a esta tese. Empreitada que tentei sintetizar na seguinte

pergunta: que sentidos/significados são inferidos/entendidos por jogadores à

representação de juventude do universo de Fanta, em especial do advergame

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“Salvando a fonte”? Conceitos de jogos, os games e seu alcance, concepções

acerca de juventude, seu escopo na contemporaneidade, Cultura Visual e

educação foram, portanto, veios por onde, gradativamente, organizei percepções,

leituras, críticas e argumentos para desenvolver a questão central.

Além de abordagens alternativas que podem ser construídas em torno do

tema, podem existir, ainda, variações dentro da mesma abordagem. Antes de

projetar resultados e tentar chegar a uma conclusão a partir dos dados

produzidos e analisados, ressalto que este estudo – qualitativo e focado em

narrativas pessoais sobre o tema – é, ele mesmo, uma contingência, um registro

de trabalho de campo em contexto temporal e social específicos. Outro, ou

dizendo melhor, um novo estudo sobre o tema estudo, poderia chegar a outras

conclusões a partir das mesmas imagens. Isso porque usei como elemento

detonador de diálogos jogos e filmes publicitários, artefatos cuja estrutura é fixa.

Mas os diálogos, exemplos, ideias, foram emitidos por indivíduos a partir das suas

próprias experiências, jovens cheios de crenças, hábitos, informações, saberes,

traumas e preferências. Se o grupo focal tivesse sido realizado com alunos de uma

escola particular da capital ou de uma escola pública de uma cidade do interior,

outros pontos de vista e experiências poderiam ter sido suscitados reconfigurando

os dados, os apontamentos e, em decorrência, os resultados.

Os atores da cena que compõe este estudo são jovens entre 11 e 16 anos,

estudantes de uma escola pública da periferia de Goiânia. Embora não tenham

sido apresentados individualmente, cada sujeito é definido por trajetórias,

experiências e histórias pessoais que incidem sobre sua visão das narrativas do

jogo. O grupo tem em comum as marcas de suas condições sociais que incluem

restrito acesso à educação, saúde, consumo e tecnologia. O grupo de

participantes da pesquisa foi composto exclusivamente por jovens moradores da

periferia da cidade cuja renda familiar limitada dificulta tanto a posse de

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videogames e computadores, quanto a apreciação/consumo de produtos que são

apresentados/utilizados no jogo em questão. Esta percepção, agora tão clara,

surgiu durante a pesquisa de campo quando registrei a fala espontânea do

colaborador Ricardo Rodrigues41. Ele disse que gostaria de morar numa cidade

como Utopia com infraestrutura não somente de lazer, mas com infraestrutura de

coisas básicas das quais sente falta como saneamento e água encanada.

Quando solicitados a responder o que entendem por ser jovem, os

participantes indicaram que enxergam a si mesmos como jovens por

enquadrarem-se dentro do estilo próprio da sua faixa etária, participarem de uma

realidade on line vivenciada essencialmente por meio das redes sociais e pelo afã

de consumir. Além disso, experimentam uma contraditória sensação de que sobre

a liberdade da juventude pesam responsabilidades que exigem abrir mão da

infância.

Nas interpretações feitas pelos colaboradores em relação aos discursos em

torno de “Mais Fanta, mais diversão” pude perceber uma série de conflitos

importantes. Por um lado, vídeos e jogos de Fanta reforçam a análise de críticos

culturais, como Deleuze e Sibilia, de que estamos vivenciando novas formas de

relações de poder baseadas processos característicos da sociedade de controle,

em detrimento das lógicas próprias das instituições disciplinares. Nesse sentido,

como os jovens colaboradores identificaram, o mundo utópico de Fanta dispensa

menções à família e, em especial, à figura dos adultos, assim como à escola e à

igreja.

Pode-se supor que em um universo que alimenta o sonho da diversão

continuamente, tais instituições poderiam atuar como limites/barreiras ao desejo.

Cabe destacar, contudo, que embora os alunos tenham compreendido o lado

41 A fala completa de Ricardo aparece no item 5.3, do capítulo 5.

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atraente desta proposta, eles próprios não tardaram a fazer questionamentos.

Como vimos, embora eles ressaltem que vão à escola principalmente para

encontrar os amigos, compreendem o valor da formação escolar. Reforçaram,

ainda, a importância dos pais e da igreja como uma espécie de baliza, de

referência nas suas relações com essas instituições e com o mundo. Nesses

círculos, ambientes, admitem sentem-se seguros, aprendem valores, recebem

conselhos e ensinamentos, carinho e cuidado, e até limites diante de excessos,

quando necessário.

Foi importante dar-me conta de que esses adolescentes não vislumbram

como ideal possível uma vida baseada unicamente no tipo de hedonismo

proposto por Fanta. Por isso, revelaram a importância que conferem às

instituições religiosas como um “ancoradouro seguro”, em sintonia com Sofiati

(2009, p.2). Ainda em relação à igreja, observei essa instituição não representa

para eles apenas um espaço de submissão a uma “disciplina espiritualizada”, mas,

principalmente, um lugar de convívio e expressão social. Essa revelação deixa

evidente que instituições de poder conseguem atuar por meio de estratégias

outras, complexas e sedutoras. Também é importante destacar que essas

instituições não se colocam necessariamente contra a lógica do gozo, condição na

qual o mercado opera e ao mesmo tempo depende ao explorar uma realidade

utópica baseada no consumo. Pode-se dizer que em uma sociedade neoliberal,

marcada por amplas desigualdades econômicas, instituições disciplinares como as

igrejas, cumprem uma função especial no sentido de manter a ordem social, uma

vez que nem todos os jovens tem ou terão o mesmo poder de consumir. A ética

religiosa, especialmente a cristã, amiúde age não apenas incentivando o espírito

de resignação diante da desigualdade, mas atua, também, em prol do valor e

mérito do trabalho, reforçando a ideia de posse de objetos como uma benção,

uma recompensa pelo sentimento de submissão a essa condição.

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Para os adolescentes que participaram da investigação a obediência aos

pais e a igreja não implica em impedimento de desejar objetos/artefatos/gadgets

de consumo. Partindo da relação que os personagens de “Mais Fanta, Mais

Diversão” estabelecem com seus equipamentos foi possível discutir como os

colaboradores veem a si próprios a partir de determinados produtos. Fica

evidente a atenção que eles dispensam às construções midiáticas como modelo a

ser seguido, estejam elas presentes em propagandas, programas de TV ou no

modo de se comportar e vestir de ídolos da música.

Entre as celebridades que eles admiram, sobressaem nomes do chamado

funk ostentação – conforme discutido no item 5.2. Os ídolos teens desse nicho de

mercado da música definem tendências acerca de que produtos ou marcas

consumir, bem como os padrões de beleza e atitude desejados. A forma com que

os participantes se relacionam com esses bens e os celebram nas canções diz

muito sobre o consumo como diretriz dessa geração. Ao mesmo tempo, é

intrigante constatar o gosto dos colaboradores pelo funk ostentação e a

relevância que dão a igreja. Isso por que esse estilo de música se constrói a partir

de conteúdos eróticos explícitos aludindo e, por vezes, descrevendo atos

considerados ilícitos, incompatíveis com os códigos de conduta religiosa que

pressupõem retidão e, com muita frequência, castidade.

Por meio de personalidades como MC Biel e MC Pedrinho, ficou evidente

que os adolescentes conhecem não somente as músicas e danças, mas inúmeros

objetos de desejo. Objetos que passam a funcionar como marcadores do que

significa ter estilo, expressão a qual associam o conceito de ser jovem. Assim, a

ideia de juventude passa a ser uma representação ideal do prazer e da diversão,

associando e descriminado determinadas marcas de produtos como sendo de

adultos, ou seja, coisas chatas. Esses jovens também compreendem que para

exibir uma performance jovial necessitam esses bens de consumo sujeitos às

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ondas da moda, que se renovam a cada clipe que é lançado pelas jovens

celebridades.

Fica evidente na fala dos colaboradores que a publicidade não é o único

discurso a persuadi-los para o consumo. Ou melhor, talvez seja o caso de

considerar, como dizia Guy Debord (apud SÉRVIO, 2015), que esta função

publicitária impregna a mídia em seus mais variados produtos. Nesse ambiente

midiático marcado por narrativas publicitárias, mesmo os jovens mais pobres

dominam os nomes de marcas e discutem seus significados. Entretanto, foi

impactante vê-los lamentar as dores de ir ao shopping sem ter dinheiro. Neste

ambiente de consumo, vaidade e ostentação, os significados dos objetos de

consumo devem ser difundidos para todo o público, pois só assim podem

funcionar como símbolo de status, gerando a glória aos que os ostentam e a

inveja aqueles que podem apenas desejá-los.

O status, obviamente, não é o único motivador de seus desejos. O relevante

papel que eles dão a celulares e tablets explica-se, em parte, pelo desejo de estar

em contato com os pares e sentir-se parte de um grupo. Fazendo uma analogia,

podemos relacionar o interesse que, em certa medida, explica a importância que

os colaboradores dão à igreja - pertencer a um coletivo ou participar de grupos

de jovens -, com o interesse que justifica o valor que eles dão a artefatos

tecnológicos e serviços como a internet. Como os personagens de “Mais Fanta,

mais diversão”, que exibem seus celulares, os participantes da pesquisa se

identificaram com a importância de ter amigos, cultivar amizades. O acesso à

tecnologia, exigência para que eles possam acessar o advergame de Fanta, surge

como um novo parâmetro social importante. Como diz Canclini (2006), estar

conectado e nunca fora da rede é mais um imperativo para estar na modernidade.

Os efeitos subjetivos dessa necessidade são claramente observados nos relatos de

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pânico e tristeza dos jovens colaboradores, sentimentos que vivenciam quando,

por algum motivo, ficam sem seus celulares.

Ao comparar a fictícia cidade de Utopia com os bairros que habitam, os

alunos destacaram a diferença patente em relação ao primeiro ambiente -

descrito como sendo de pessoas ricas. Lembraram que alguns moram em bairros

onde não há asfalto, nem mesmo abastecimento regular de água. Diante dessas

faltas básicas, chama atenção a existência de tantos espaços de entretenimento

em Utopia. Essas ausências, comuns no cotidiano dos alunos, pode justificar a

importância que eles dão à diversão e a imersão que vivenciam através de seus

aparelhos celulares. Fora do mundo digital, na cidade real, eles tem poucos

espaços para recreação e, além disso, se deparam com a insegurança que ronda

os lugares públicos de entretenimento. Assim, o mundo digital passa a suprir

essas faltas.

A realidade de experiências enfadonhas nas vidas desses alunos os levou a

compreender, de forma imediata, a relação que “Mais Fanta, mais diversão”

estabelece entre os persoagens playless e suas sensações de tédio, tristeza e

depressão. É notório o quanto o mundo de diversão proposto por Fanta, em

Utopia, pode ser sedutor para os jovens. Não sem razão, os olhos dos

colaboradores brilhavam ao fantasiar viver em uma cidade com tantas

oportunidades e espaços para lazer.

Quando provocados a refletir sobre o valor das experiências de tristeza

ficou explícito o desconforto. Foram poucos os alunos que descreveram como

sendo natural estar triste em alguns momentos, mas rapidamente fizeram a

ressalva de que não se deve ficar triste por muito tempo e é necessário encontrar

estratégias para voltar a ser feliz. Nesse sentido, “Mais Fanta, mais diversão” além

de prometer a felicidade através do consumo de Fanta, o advergame expressa

uma lógica cultural que entende o gozo como um imperativo, a felicidade como

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uma obrigação, a tristeza e o tédio como um problema. Essa lógica está associada

ao um consumismo que não é estimulado exclusivamente por este aspecto da

vida. Daí, talvez, a impressão deixada pelos adolescentes de que estar triste é algo

vergonhoso e que pode levá-los a sofrer a rejeição dos pares.

Reconheço que este é um tema delicado e não é a minha intenção propor

que a infelicidade deveria ser um objetivo. Contudo, compreendo que negar a

realidade da tristeza, escamoteá-la por meio de paliativos, pode ser ainda mais

prejudicial. Faz muito mais sentido para o bem estar desses jovens que seus

bairros recebam as melhorias de infraestrutura necessárias, inibindo a sem que

eles tenham que usar como escape para eese tipocompra de um boné ou

consumir refrigerante, por mais que sejam levados a alimentar sonhos em torno

destes produtos. Esta ressalva justifica-se ainda mais considerando que estas

fantasias promovem mais competição e comparação e do que colaboração e

solidariedade.

Em relação a aspectos estruturais da vida contemporânea, é importante

questionar o quanto a contemporaneidade age para estimular o tédio, dando aos

jovens poucas expectativas plausíveis. Ocupar o tempo com qualquer tipo de

estímulo pode não ser apenas um desejo de felicidade, mas a necessidade de

escapar do sentimento de infelicidade, de frustração e desânimo que de outra

forma não poderia ser enfrentado. Essa contradição promove uma escalada da

expectativa de gozo ao mesmo tempo em que não alimenta esperanças e cria

obrigações. À velocidade e intensidade da vida, reconhecidamente estressante,

somam-se os hiperestímulos das imagens de informação, persuasão,

entretenimento, imagens cada vez mais impactantes, disputando umas contra as

outras a atenção cada vez mais fatigada de jovens e adolescentes. Assim como

nas experiências com narcóticos, o corpo dos jovens passa a exigir sempre mais

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estímulos em meio a uma conjuntura social permeada por instabilidades e

desigualdade.

É importante duvidar do imperativo da felicidade e do modo como a

sociedade de consumo propõe essa satisfação. A relação que estabelecemos com

as imagens e artefatos da mídia deve ser, ela mesma, objeto de questionamento

crítico ao considerarmos o lugar dos jovens no contexto contemporâneo e o

conceito de juventude como uma ideia amplamente associada a esses jogos e

tramas culturais. Se a mídia se presta a criar modelos e padrões para o que espera

que sejamos e tenhamos, os jovens tem também consciência das falácias que suas

mensagens propõem. Tanto é assim que no último encontro, quando pedi que

avaliassem as atividades e as tardes que passamos juntos, eles falaram, a seu

modo, de maneira espontânea e descompromissada, sobre as dissonâncias entre

aquilo que prometem as mensagens publicitárias e a realidade de suas vidas.

Mostraram que são capazes de por em dúvida, criticar, aquilo que a mídia lhes

oferece:

Pesquisadora: Para encerrar, eu queria saber de vocês opiniões sobre o

trabalho que realizamos juntos. Sobre a Fanta, sobre as coisas que a

gente conversou...

Carlos Daniel: Foi legal, a gente expressou os sentimentos...

Ricardo: Eu acho que a Fanta tem a propaganda mais legal, tipo com

desenho animado...

Carlos Daniel: Só que dura pouco (o acesso ao site)

Ricardo: A Coca-cola pega personagens virtuais (na verdade, se refere a

pessoas reais, atores) pra fazer a propaganda. Ela fala que com Coca-cola

você pode ter um amor...

Pesquisadora: O que vocês acham dessa mensagem como a que o

Ricardo citou, que com Coca-cola a gente pode ter um amor?

Ricardo: Sempre. Em todas as propagandas tem!

Pesquisadora: O que vocês acham dessas mensagens?

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Alana: Eu acho mentira a questão da Coca-cola com o amor. Por que é

mentira! Meu pai toma esses trens todo dia e não ama nem ele mesmo.

Ricardo: Olha essa Coca-cola verde (Coca-cola Stevia, recém lançada no

país). O cara toma e conhece uma menina. Na propaganda passada (no

trecho inicial do VT), ele arruma um amor. A Coca-cola quebra e ele

separa. Depois ele compra outra Coca-cola de novo, bebe e oferece pra

ela e volta!

Pesquisadora: Não é assim na vida real?

Ricardo: Não!

Alana: Que nem a propaganda do Boticário pro dia dos namorados. A

mulher compra um perfume pro homem pro dia dos namorados. Eles se

beijam. Que mentira! Como é que um cara que nunca viu a mulher... Não

sabe nem de onde é aquela mulher, vai lá e beija ela! É mentira esse

trem! (grupo focal realizado em 27/06/2017)

O trabalho com sujeitos jovens revelou não somente a necessidade de

negociar para encorajá-los a falar, mas sobretudo a importância de ajuda-los a

desenvolver habilidades para ler nas entrelinhas e criticar suas próprias opiniões.

Suas falas, por vezes, podem parecer inocentes ou desconexas, mas a um olhar

mais acurado, ficam evidentes reflexões pertinentes sobre suas experiências, sobre

o que sentem e o que pensam. O diálogo acima mostra a preocupação deles com

representações irreais de situações propostas em peças comerciais, mas, para

além disso, aponta para uma potência crítica no modo de interpretar imagens e

objetos da cultura da mídia.

Esta imersão na pesquisa de campo realizada com os alunos da Escola

Municipal Bernardo Élis me alertou particularmente para a importância dos

professores – desde aqueles que se dedicam ao ensino básico quanto aqueles que

atuam na universidade – experimentarem vivências na escola fundamental e

pública. Essa aproximação oferece ao pesquisador a oportunidade de entender

um pouco sobre a realidade e as condições em que vive a maioria dos

adolescentes e jovens nas grandes cidades do país ao mesmo tempo em nos faz

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pensar sobre a utilidade prática da pesquisa: “de que vale meu trabalho para essas

pessoas?” – como eu mesma pensei.

Concordo com Aguirre (2009, p. 166 e 167) quando afirma que levar

imagens, sejam artísticas ou cotidianas, não é suficiente para melhorar os

ensinamentos oferecidos nas escolas.

É ilusório pensar que, devido ao fato da cultura visual em seu conjunto,

ou das artes, ganharem presença na escola, fica garantida a solução dos

problemas de aprendizagem ou da construção de uma identidade.

Podem ajudar a incrementar os conhecimentos sobre arte, obviamente,

mas em nosso estudo pudemos constatar que o fato de frequentar

cursos de arte, sejam de música, no conservatório, ou especializados em

artes visuais, não tem como consequência necessária uma sensibilidade

estética maior, uma integração dos produtos da cultura canônica nos

imaginários juvenis e, muito menos, um uso mais crítico dos artefatos

estéticos da cultura midiática. (...) Mas o problema é que, para superar a

distância, hoje quase insuperável, entre esses mundos (escola x cultura

juvenil), não é suficiente “escolarizar”, voluntariosamente, a cultura de

rua.

(...)

O que precisamos é promover a análise crítica entre os estudantes,

colocando-os em relação com outras formas culturais do seu próprio

entorno, com as formas mais tradicionais da cultura artística canônica e

com a de outros entornos culturais distintos. Assim, colocar em marcha

um novo imaginário para a reestruturação disciplinar e uma

transformação dos objetivos formativos.

Se não é bastante promover reflexões como as que foram desenvolvidas

com os participantes desta pesquisa, podemos oferecer aos alunos a experiência

de aguçar seus pensamentos sobre as imagens e artefatos que os rodeiam. Não

se trata, como colocam Tavin e Anderson (2010, p. 67) de “um apelo aos

professores para que se tornem terroristas psíquicos, a destruírem o verdadeiro

prazer que os alunos sentem em relação à cultura popular. Esta oferece

oportunidades consideráveis de fuga, fantasia, alegria e sonhos”, especialmente

frente à realidade de um cotidiano cada vez mais difícil e hostil. Mas, é possível

conciliar a ludicidade contida em imagens e objetos da mídia e momentos de

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diversão acompanhado por reflexões que estimulem a construção de uma visão

crítica do mundo, da vida, da escola.

Mergulhar, mesmo que brevemente nas práticas do dia a dia e no chão da

escola, me motivou a conhecer mais de perto os sujeitos que contribuíram com

suas percepções, experiências e opiniões para esta investigação. Aprendi com eles,

como imagino que aprendem os pesquisadores que atuam na área de educação –

a refletir com mais clareza sobre como se dá a minha prática docente e minha

atuação no mundo como sujeito.

Estou convencida de que a ideia/conceito de juventude e sua

representação midiática depende do ponto de vista de quem pergunta e,

principalmente, da posição de quem responde, a partir de contextos específicos e

de experiências vividas em relação ao tema. Em se tratando de uma investigação

baseada nos estudos de Cultura Visual, a experiência visual tomada como mote

para deflagrar as discussões e análises desenvolvidas nesta investigação deve,

também, ser considerada ao final deste trabalho porque, “aquilo que é visto atua

como espelho de quem vê” (HERNANDEZ, 2011, p. 35).

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219

SILVA, Luana Carvalho. Entre a disciplina e o biopoder: as novas tecnologias

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Eletrônica do CEJUR, V. 1, N. 1, AGO./DEZ. 2006

SILVERSTONE, Roger. Por que estudar a mídia? São Paulo: Loyola, 1999.

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2009. Tese de doutorado. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências humanas,

Universidade de São Paulo. São Paulo.

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Ensino Fundamental: uma desconstrução da Disney. In: MARTINS, Raimundo;

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invadem a escola... Santa Maria: Editora da Universidade Federal de Santa Maria,

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no mundo. <http://games.terra.com.br/candy-crush-passa-angry-birds-como-

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mundo,52c3f0ec785ae310VgnVCM10000098cceb0aRCRD.html> Acesso em

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http://revistaepoca.globo.com/ideias/noticia/2012/02/maior-diversao-da-

terra.html> Acesso em 12/03/2014.

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ANEXO I – ROTEIRO PARA REALIZAÇÃO DE GRUPO FOCAL COLETA DE

DADOS DE PESQUISA DE DOUTORADO COM ALUNOS DA ESCOLA

MUNICIPAL BERNARDO ÉLIS

TÍTULO DA PESQUISA: Advergames e educação da cultura visual. Um estudo sobre

a noção de juventude em “Mais Fanta, mais diversão”

PESQUISADORA: Jordana Falcão

Pesquisa de doutorado realizada junto ao Programa de Pós-graduação em Arte e

Cultura visual da Faculdade de Artes Visuais da UFG sob orientação do prof. Dr.

Raimundo Martins.

PERÍODO: 20 a 27/06/2016 – segunda a segunda - 13h às 14h30 e 15h às 16h30

ENCONTRO 1 (20/06/16) – Apresentações e auto-imagem.

O primeiro encontro tem por finalidade contextualizar o trabalho e criar

conexão entre a pesquisadora e o grupo. Assim, reservamos a primeira parte do

encontro para apresentação da pesquisadora, da pesquisa, dos alunos e do

desenvolvimento do trabalho como um todo. Nesse momento, os alunos devem

receber o termo de consentimento a ser assinado por seus responsáveis e que é

imprescindível para sua continuação na pesquisa. Na segunda parte do encontro,

a turma vai criar representações visuais como auto-imagem.

OBJETIVOS:

• Apresentar a pesquisa e a pesquisadora à turma;

• Conhecer cada participante;

• Promover um debate sobre autorrepresentação por meio de imagens.

CONTEÚDOS:

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• Referentes à pesquisa, como a noção de juventude e jogos eletrônicos;

• Auto-imagem.

RECURSOS:

• Cartolinas;

• Cola;

• Tesouras;

• Lápis de cor, canetas coloridas, giz de cera etc;

• Revistas, papeis coloridos, cartazes e impressos em geral.

METODOLOGIA:

Etapa 1 (13h às 14h30) – O encontro tem início com a apresentação da

pesquisadora. Além de de falar de si, a pesquisadora deve contextualizar a

pesquisa de doutorado, falar da relação da universidade com a escola e, por fim,

chegar ao tema: juventude e jogos eletrônicos. Na sequência os alunos serão

convidados a participar e para se apresentarem. Para quebrar o gelo, a proposta é

que se formem pares e cada dupla converse por 5 minutos em média para se

conhecer. Depois cada um apresenta o outro à pesquisadora. Antes de encerrar, a

pesquisadora falará sobre o termo de consentimento de participação como

determinante para a participação na pesquisa.

Etapa 2 (15h às 16h30) - Após as devidas apresentações, os alunos serão

convidados a construir representações visuais com auto-imagens. A pesquisadora

disponibilizará materiais para que cada participante possa elaborar desenhos,

colagens etc. expressando como se vêem. Os participantes podem também usar

outros recursos como artefatos de que disponham, estampas, adesivos etc. Após a

produção das auto-imagens, os participantes apresentarão suas produções ao

grupo comentando os sentidos que construíram para si mesmos ou, sobre si

mesmos. As falas serão gravadas como material de análise da pesquisa.

ENCONTRO 2 (21/06/16) – Mais Fanta, mais diversão

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Já tendo entendido os procedimentos da pesquisa, o grupo será

apresentado ao universo do jogo que serve de ponto de partida para as questões

levantadas pela pesquisadora. No segundo encontro os participantes vão

conhecer peças publicitárias de Fanta e iniciar conversas sobre sua narrativa. As

falas serão gravadas como material de análise da pesquisa.

OBJETIVOS:

• Contextualizar o universo de Mais Fanta, mais diversão;

• Debater sobre a narrativa proposta pelo jogo;

• Abordar a alegria e o divertimento tal como representados pelo jogo em

sua relação com os colaboradores.

CONTEÚDOS:

• VT publicitários, sites etc. referentes a Mais Fanta, Mais diversão;

RECURSOS (verificar o que a escola dispõe):

• TV ou projetor (data show);

• Caixas de som;

• Computadores com acesso a internet.

METODOLOGIA:

Etapa 1 (13h às 14h30) – A fim de inteirar os alunos sobre o jogo e os

personagens desenvolvidos para Fanta, a pesquisadora vai apresentar o site, a

narrativa do jogo, VTs publicitários, personagens etc. Os alunos poderão procurar

mais informações sobre Mais Fanta, mais diversão na internet usando os

computadores da escola.

Etapa 2 (15h às 16h30) – Já familiarizados com o tema, jogos, personagens,

os participantes serão convidados a opinar sobre o universo de Mais Fanta, mais

diversão. A ideia é fazer blocos de perguntas por temas e o primeiro é diversão.

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As seguintes questões vão mediar a conversa que será gravada como material de

análise para a pesquisa:

1. Com base no site, na narrativa do jogo e dos Vts publicitários quais os valores e

atitudes mais importantes pra galera Fanta?

2. Que valores e atitudes fazem parte do seu cotidiano como jovem? Pode narrar

um exemplo da importância disso na sua vida?

3. Nos jogos, a galera Fanta tenta concertar o relógio que é fonte de diversão.

Qual o papel da diversão na sua vida?

4. Quais são as suas principais fontes de diversão? Explique porque.

ENCONTRO 3 (23/06/16) – Galera Fanta e playless

O terceiro encontro dá continuidade aos debates iniciados no anterior. Para

esse momento focaremos nos personagens que aparecem no jogo - galera Fanta

e playless - fazendo relações entre tecnologia, sociabilidade e apatia (ou

depressão) conforme descrito a seguir. As falas serão gravadas como material de

análise para a pesquisa.

OBJETIVOS:

• A partir da galera Fanta debater sobre o papel das tecnologias e das

relações sociais na vida dos jovens;

• A partir dos playless debater sobre apatia e depressão em suas

manifestações na juventude.

CONTEÚDOS:

• VT publicitários, sites etc. referentes a Mais Fanta, Mais diversão;

RECURSOS:

• Computadores com acesso a internet.

METODOLOGIA:

Etapa 1 (13h às 14h30) – A proposta é iniciar um diálogo sobre a noção de

juventude, tecnologia, sociabilidade, diversão etc pela caracterização da galera

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Fanta. Os participantes devem falar sobre sua identificação ou não com os

personagens a partir das seguintes perguntas:

1. A galera Fanta é formada por gente com características marcantes, como o

Floyd que adora tecnologia ou a Maude que ama dançar. Pra você, a galera

Fanta representa bem o que é ser jovem? Por que?

2. Você se identifica com algum (ou mais de um) dos personagens? Pode

contar algum acontecimento que mostre isso?

3. Cada personagem tem seu acessório que une tecnologia e diversão, como

o ioiô da Gigi ou Jetpac do Floyd. Eletrônicos como smartphone e tablets

ou objetos “de diversão” como skate ou videogames fazem parte da sua

vida? Quais?

4. Tente descrever uma situação que mostre o que esses acessórios dizem

sobre você, sobre sua personalidade.

Etapa 2 (15h às 16h30) – No momento seguinte, semelhante ao anterior, os

participantes serão perguntados sobre sua identificação ou não com os playless.

As perguntas abaixo darão início à conversa:

5. Em alguns ambientes do game aparecem pessoas que não conseguem se

divertir, os“playless”. Para você, quem seriam os “playless” da vida real?

Explique ou dê algum exemplo!

6. Em algum momento você se sente como um “playless”? Pode descrever

uma situação em que isso acontece?

7. O que você acha dos playless? É normal sentir-se assim ou é necessário

superar esse sentimento?

8. Você acha que convive mais playless ou pessoas alegres como a Galera

Fanta?

ENCONTRO 4 (24/06/16) – Identificações e discrepâncias

O quarto encontro encerra a atividade e será dividido em 3 etapas.

Dedicaremos a primeira a tratar sobre as ausências sentidas na construção do

jogo (tais como família e escola). Na etapa seguinte, faremos um balanço sobre as

representações de juventude proposta pelo jogo a fim de descartar as

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identificações e as discrepâncias sentidas entre os colaboradores e os

personagens. Por fim, faremos um lanche e conversaremos sobre a experiência na

escola.

OBJETIVOS:

• Verificar que temas os participantes apontam como ausentes na

representação da noção/ideia de juventude proposta por Fanta;

• Destacar a identificação ou não do grupo de jovens participantes com a

ideia de juventude apresentada no jogo.

• Encerrar a atividade com um momento de integração.

CONTEÚDOS:

• VT publicitários, sites etc. referentes a Mais Fanta, Mais diversão;

RECURSOS:

• Computadores com acesso a internet.

METODOLOGIA:

Etapa 1 (13h às 14h00) – Tendo guiado as conversas sobre as temáticas

apresentadas por Mais Fanta, mais diversão, a proposta é instigar os participantes

sobre as ausências sentidas no jogo de elementos que fazem parte de sua

realidade. A expectativa é que o próprio grupo cite escola, família, entre outros

temas, por isso não há perguntas pré-estabelecidas para esse momento.

Etapa 2 (14h30 às 16h00) – Na etapa seguinte, os colaboradores vão

retomar a primeira atividade de produzir auto-imagens. A ideia agora é elaborar

personagens a serem propostos para marca e que acreditam ser mais

representativos de sua própria realidade. Os participantes apresentarão suas

produções ao grupo, como fizeram no atividade do primeiro dia.

Etapa 3 (16h às 16h30) – Finalizando a participação da pesquisadora e dos

colaboradores, reservaremos um momento em que todos serão convidados a falar

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sobre a experiência, os aprendizados, opiniões, impressões etc. Encerraremos com

um lanche proporcionado pela pesquisadora.

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ANEXO 2 – APRESENTAÇÃO DA PESQUISADORA E TERMO DE CESSÃO

DE DIREITOS ENVIADO AOS PAIS DOS ALUNOS

TÍTULO DA PESQUISA: Advergames e educação da cultura visual. Um estudo sobre a

juventude em Mais Fanta, mais diversão

PESQUISADORA: Jordana Falcão

APRESENTAÇÃO: Olá, me chamo Jordana Falcão e sou aluna do doutorado em

arte da UFG. Quero convidar seu filho ou filha para participar da minha pesquisa.

Estou estudando como os jovens são retratados na campanha publicitária da

Fanta chamada Mais Fanta, mais diversão. Essa campanha tem propagandas de TV

e jogos na internet – os advergames - que vou apresentar a quem quiser e puder

participar da pesquisa. A participação do seu filho ou filha acontece por meio de

questionários em que faço perguntas sobre o que ele acha dos jogos, dos

personagens e da mensagem da campanha, por exemplo.

Todas as etapas da pesquisa vão acontecer no espaço da escola e com

supervisão de professor. Para que ele ou ela participe é necessário ter a

autorização assinada pelos pais ou responsáveis. Essa autorização descreve a

pesquisa, garante que é um trabalho sério e dá informações sobre mim, a

pesquisadora. Também registra que ele ou ela está participando por vontade e

que pode sair do estudo a qualquer momento se desejar.

Espero contar com a opinião do seu filho ou filha para minha pesquisa e

me coloco a disposição para conversar e esclarecer sobre o que você, como

responsável, ou ele ou ela, como participantes, precisem saber.

Jordana Falcão

_________________________________

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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIMENTO - CESSÃO DE

DIREITOS SOBRE DEPOIMENTO.

1. Pelo presente documento, Eu, ____________________________________________,

RG____________________, responsável legal por

___________________________________,transfiro, gratuitamente, em caráter universal

e definitivo, a Jordana Falcão Tavares a totalidade de seus direitos patrimoniais de autor(a)

sobre as informações condecidadas por meio de questionário como parte de sua pesquisa

de doutorado que tem por tema: Advergames e educação da cultura visual. Um estudo

sobre a juventude em Mais Fanta, mais diversão

2. Deixo Jordana Falcão Tavares autorizada a utilizar o depoimento cedido, no que todo

ou em parte, editado ou integral, inclusive cedendo seus direitos a terceiros, no Brasil e ou

no exterior.

3. Declaro que a participação do(a) colaborador(a) é voluntária, tendo total confiabilidade

na investigadora e permitindo que seja utilizado seu relato (parcial ou total) no resultado

da pesquisa, por tempo indeterminado. O(a) colaborador(a) concorda em ter seu

nome/pseudônimo citado por ocasião de qualquer utilização, sendo identificado(a) como:

____________________________.

4. Afirmo que tenho conhecimento sobre a pesquisa, do qual o relato do(a) colaborador(a)

faz parte, declaro estar ciente que ele(a) pode recusar-se a responder qualquer

questionamento, bem como a continuar participando da pesquisa, retirando seu

consentimento em qualquer momento.

5. Asseguro ter sido esclarecido(a) sobre os procedimentos e desenvolvimento da pesquisa

da doutoranda Jordana Falcão Tavares, uma pesquisa sobre a representação de juventude

nos advergames de Fanta, entre os anos de 2013 e 2017, vinculada ao Programa de Pós-

Graduação em Arte e Cultura Visual FAV/UFG, sob orientação do professor dr.

Raimundo Martins.

6. Responsabilizo-me a buscar esclarecimentos sobre a investigação com a pesquisadora,

tendo a certeza de em qualquer momento ela estará disponível a explicar eventuais

dúvidas existentes.

7. Informações sobre a pesquisadora:

Jordana Falcão Tavares, RG. 97006034201 SSP CE, CPF 654.004.453-49

Endereço: R. Dona Stela, 422, Ap. 706A, Negrão de Lima, Goiânia - Goiás

Telefone: (62) 98191.0768 E-mail: [email protected]

Sendo esta a forma legítima e eficaz que representa legalmente os nossos interesses,

assinam o presente documento em duas vias de igual teor e para só um efeito.

Goiânia, _____ de __________ de 20___

__________________________________________

Pesquisadora

Goiânia, _____ de __________ de 20___

____________________________________________

Responsável pelo colaborador

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