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IV CONALI - Congresso Nacional de Linguagens em Interação Múltiplos Olhares 05, 06 e 07 de junho de 2013 ISSN: 1981-8211 ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE PRODUÇÕES TEXTUAIS EM INGLÊS EM TORNO DO GÊNERO FÁBULA Gabriel Both BORELLA (UTFPR) 1 Didiê Ana Ceni DENARDI (UTFPR) 2 Introdução As Diretrizes Curriculares da Educação Básica (PARANÁ, 2008), orientam o professor de Línguas Estrangeiras Modernas (LEM) a trabalhar o conteúdo estruturante, ou seja, o discurso e a língua como práticas sociais de comunicação. “A língua será tratada de forma dinâmica, por meio da leitura, da oralidade e da escrita que são as práticas que efetivam o discurso” (p.61). Segundo Rosa (2011, p. 2), “a orientação para o professor é que o trabalho com o discurso se dê por meio do estudo de variados textos de diferentes gêneros, ampliando as possibilidades de conhecimento da riqueza da língua em diferentes esferas” de comunicação. Neste sentido, há que se ressaltar a importância dos gêneros textuais em nosso cotidiano, bem como na escola. Schneuwly e Dolz (2010, p. 65) afirmam que “toda forma de comunicação – portanto, também aquela centrada na aprendizagem – cristaliza-se em formas de linguagens específicas, ou seja, através de gêneros textuais". Sendo a escola tomada como “autêntico lugar de comunicação” (SCHNEUWLY; DOLZ, 2010, p. 66), o uso de gêneros nessa esfera de atividade humana torna-se relevante no processo de ensino-aprendizagem, pois quando o professor em sala de aula cria 1 Acadêmico do Curso de Licenciatura em Letras Português/Inglês da UTFPR Câmpus Pato Branco e Bolsista PIBID/CAPES do Subprojeto PIBID: Docência em Inglês. 2 Docente do Curso de Licenciatura em Letras Português-Inglês da UTFPR Câmpus Pato Branco e Coordenadora de Área de Inglês PIBID/CAPES- Orientadora.

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IV CONALI - Congresso Nacional de Linguagens em Interação Múltiplos Olhares

05, 06 e 07 de junho de 2013ISSN: 1981-8211

ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE PRODUÇÕES TEXTUAIS EM INGLÊS

EM TORNO DO GÊNERO FÁBULA

Gabriel Both BORELLA (UTFPR)1

Didiê Ana Ceni DENARDI (UTFPR)2

Introdução

As Diretrizes Curriculares da Educação Básica (PARANÁ, 2008), orientam o

professor de Línguas Estrangeiras Modernas (LEM) a trabalhar o conteúdo estruturante, ou

seja, o discurso e a língua como práticas sociais de comunicação. “A língua será tratada de

forma dinâmica, por meio da leitura, da oralidade e da escrita que são as práticas que

efetivam o discurso” (p.61). Segundo Rosa (2011, p. 2), “a orientação para o professor é

que o trabalho com o discurso se dê por meio do estudo de variados textos de diferentes

gêneros, ampliando as possibilidades de conhecimento da riqueza da língua em diferentes

esferas” de comunicação.

Neste sentido, há que se ressaltar a importância dos gêneros textuais em nosso

cotidiano, bem como na escola. Schneuwly e Dolz (2010, p. 65) afirmam que “toda forma

de comunicação – portanto, também aquela centrada na aprendizagem – cristaliza-se em

formas de linguagens específicas, ou seja, através de gêneros textuais".

Sendo a escola tomada como “autêntico lugar de comunicação” (SCHNEUWLY;

DOLZ, 2010, p. 66), o uso de gêneros nessa esfera de atividade humana torna-se relevante

no processo de ensino-aprendizagem, pois quando o professor em sala de aula cria

1 Acadêmico do Curso de Licenciatura em Letras Português/Inglês da UTFPR Câmpus Pato Branco e Bolsista PIBID/CAPES do Subprojeto PIBID: Docência em Inglês.2 Docente do Curso de Licenciatura em Letras Português-Inglês da UTFPR Câmpus Pato Branco e Coordenadora de Área de Inglês PIBID/CAPES- Orientadora.

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situações de comunicação através de textos autênticos, pertencentes a um

determinado gênero textual, ele estará levando o aluno "ao domínio do gênero, exatamente

como este funciona (realmente) nas práticas de linguagem de referência3" (SCHNEUWLY;

DOLZ, 2010, p. 67). Schneuwly e Dolz (2010, p. 68) destacam que o foco é o domínio do

gênero correspondente à prática de linguagem para que o aluno possa responder às

exigências comunicativas com as quais ele é confrontado.

Porém, conforme observado em nosso trabalho como bolsistas do Programa

Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) do subprojeto PIBID: Docência em

Inglês da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) Câmpus Pato Branco,

tanto os professores de Inglês, iniciantes e como os que já possuem experiência de ensino,

sentem dificuldades em desenvolver o trabalho em sala de aula conforme as orientações das

DCEs (PARANÁ, 2008) mencionadas acima. Tal limitação parece ter origem na falta de

compreensão dos conceitos de gênero e discurso e na dificuldade para desenvolver um

trabalho de transposição didática4 adequada ao trabalho com gêneros textuais orais escritos

na escola, por exemplo.

Desta forma, o presente trabalho tem por finalidade sugerir o procedimento

metodológico de Sequência Didática5 (SD) (DOLZ, NOVERRAZ, SCHNEUWLY, 2010)

como uma forma de trabalhar gêneros textuais/ literários na sala de aula de Língua Inglesa.

Especificamente, este trabalho apresenta, rapidamente, o processo de aplicação de uma SD

em torno do gênero fábula em uma oficina de produção textual no contra-turno a alunos do

8º e 9º anos do Ensino Fundamental de uma escola pública na cidade de Pato Branco, bem

como a análise da segunda versão da produção textual de fábula de uma aluna participante

dessa oficina com foco no uso que esta aluna faz de mecanismos de coesão nominal em seu

texto. A perspectiva teórico-metodológica para a análise dessas produções é a do

Interacionismo Sociodiscursivo - ISD (BRONCKART, 2003).

3Segundo Schneuwly e Dolz (2010, p. 62) esse conceito visa, basicamente, as dimensões particulares do funcionamento da linguagem. 4De forma bastante resumida, pode se dizer que o conceito de “Transposição Didática” e a transferência do conhecimento da esfera científica para a esfera didática. Uma discussão detalhada pode ser encontrada em Denardi (2009).5 O conceito de SD será apresentado na fundamentação teórica do artigo.

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1. A fábula e suas contribuições para o ensino de escrita

Segundo Brockart (2003, p. 72) "os textos são produtos da atividade humana e,

como tais, [...] estão articulados às necessidades, aos interesses e as condições de

funcionamento das formações sociais no seio das quais são produzidos". Essa

identificação de texto aplica-se bem a noção do gênero literário fábula, uma vez que as

fábulas surgiram de modo natural, com a intenção de transmitir um ensinamento através de

uma narrativa. Há registros que as primeiras fábulas foram escritas em sânscrito antes de

Cristo, e que eram muito apreciadas pelos hindus e gregos (PERFEITO et al., 2011, p. 3).

A fábula é uma pequena narrativa que serve para ilustrar algum vício ou alguma

virtude, e termina, invariavelmente, com uma lição de moral (BAGNO, 2006, p. 51).

Muitas vezes, involuntariamente, utilizamos lições de moral provinda das fábulas em nosso

dia-a-dia, lições essas que acabaram se tornando provérbios nas línguas do Ocidente, como

afirma Bagno (2006, p. 51):

A moral de algumas fábulas muito conhecidas acabou se tornando provérbios nas línguas do Ocidente, muitas vezes até sem que a maioria das pessoas conheça a fábula original. É o caso, por exemplo, dos provérbios "quem desdenha quer comprar" ou "quem ama o feio bonito lhe parece.

De acordo com o autor (2006, p. 51) "a grande maioria das fábulas tem como

personagens animais ou criaturas imaginárias (criaturas fabulosas), que representam, de

forma alegórica, os traços de caráter (negativos e positivos) dos seres humanos". Já para

Perfeito, Nantes e Ferragini (2011, p. 3), as fábulas são "histórias ágeis, curtas, bastantes

simbólicas, falando das/criticando as atitudes humanas ou aconselhando as pessoas. Podem

ser escritas em prosa ou versos".

Estruturalmente, as fábulas apresentam a seguinte organização textual:

[...] apresentação do contexto da situação (a exibição da personagem, e, raramente, do espaço e do tempo, a não ser o textual); a ação (surge um conflito para desequilibrar a situação inicial); um momento máximo de tensão - clímax - e, por fim, a resolução do conflito. Pode ser finalizada com a apresentação explícita da moral, ou esta pode aparecer implícita no texto (PERFEITO et al., 2011, p. 4).

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Por reunir as características acima citadas, e por ser um gênero considerado

estruturalmente simples e curto, escolhemos o gênero literário fábula para a realização da

oficina de produção de texto ofertada a alunos de 8º e 9º anos do Ensino Fundamental e ser

relatada neste texto.

2. O procedimento de sequência didática para o ensino de escrita

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p. 82) conceituam uma sequência didática

como "um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno

de um gênero textual oral ou escrito". Os autores, também, afirmam que "as sequências

didáticas servem [...] para dar acesso aos alunos a práticas de linguagem novas ou

dificilmente domináveis" (p. 83).

Continuando a explicação sobre as sequências, Dolz, Noveraz e Schneuwly (2010)

afirmam que "uma sequência didática tem, precisamente, a finalidade de ajudar o aluno a

dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe, assim, escrever ou falar de uma

maneira mais adequada numa dada situação de comunicação” ( p. 83- grifo dos autores).

Estruturalmente, uma sequência didática é constituída pelo seguinte esquema:

Figura 1- Esquema de sequência didática (DOLZ;NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 83)

Conforme podemos observar uma SD se constitui de 4 momentos fundamentais:

apresentação da situação, primeira produção, módulos e produção final. Especificamente,

um SD inicia-se com a apresentação da situação, ou seja com a apresentação de um projeto

de trabalho e torno de um gênero textual/literário.

Após uma apresentação da situação na qual é descrita de maneira detalhada a tarefa de expressão oral ou escrita que os alunos deverão realizar, estes elaboram um primeiro texto inicial, oral e escrito, que

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corresponde ao gênero trabalhado; é a primeira produção. Esta etapa permite ao professor avaliar as capacidades já adquiridas e ajustar as atividades e os exercícios previstos na sequência às possibilidades e dificuldades reais de uma turma. Além disso, ela define o significado de um sequência para o aluno, isto é, as capacidades que deve desenvolver para melhor dominar o gênero de texto em questão. Os módulos, constituídos por várias atividades ou exercícios, dão-lhe os instrumentos necessários para esse domínio, pois os problemas colocados pelo gênero são trabalhados de maneira sistemática e aprofundada. No momento da produção final, o aluno pode pôr em prática os conhecimentos adquiridos e, com o professor, medir os progressos alcançados. A produção final serve, também, para uma avaliação de tipo somativa, que incidirá sobre os aspectos trabalhados durante a sequência (DOLZ, NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 84).

Portanto, com o uso do procedimento de SD em sala de aula é possível ensinar a

escrever textos em situações autênticas, escolares e extra-escolares através da criação de

contextos de produção precisos, e de atividades múltiplas e variadas que permitam aos

alunos apropriarem-se das noções, técnicas e dos instrumentos necessários ao

desenvolvimento de suas capacidades de expressão escrita em determinada situação

comunicativa (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2010, p. 82). Nesse sentido,

escolhemos o procedimento de SD por este se mostrar adequado ao objetivo da oficina em

torno do gênero fábula e ao contexto no qual ela se inseriu, como veremos a seguir.

3. A oficina de produção textual em torno do gênero literário fábula

Objetivando melhorar a leitura e a escrita em Inglês através de gêneros de textos

autênticos, uma oficina de produção textual em torno do gênero literário fábula foi ofertada,

no contra-turno, a alunos de 8º e 9º anos do Ensino Fundamental da Escola Estadual

Carmela Bortot, localizada na cidade de Pato Branco, no sudoeste do Paraná e uma das

escolas parceiras do Subprojeto PIBID: Docência em Inglês da Universidade Tecnológica

Federal do Paraná, Câmpus Pato Branco.

Com a carga horária de 2 horas/aula semanais, e atendendo 5 alunos por semana,

essa oficina teve a duração de 9 encontros semanais, de junho a agosto de 2012, e abordou

desde o contexto de produção das fábulas até a produção textual final dos alunos

participantes da oficina.

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Primeiramente, os alunos foram apresentados ao gênero escolhido através da

leitura de 2 fábulas de Esopo: "The Fox and the Stork" e "The Boy Who Cried Wolf". A

partir da leitura e da escuta das fábulas narradas em Inglês, os alunos, juntamente com o

professor PIBID Gabriel Borella, refletiram sobre os seguintes pontos do gênero literário:

conceito de fábula, surgimento do gênero, os principais autores, as fábulas no nosso dia-a-

dia, características, estrutura narrativa, as intenções com que as fábulas eram e são hoje

produzidas, para quem foram/são produzidas, e elementos textuais (sequência narrativa) e

linguísticos (coesão nominal e coesão verbal) que ajudam na construção do gênero fábula e

presentes nos textos lidos e produzidos na oficina.

A primeira atividade na oficina foi a da apresentação da situação, isto é ler e

produzir fábulas em Inglês a serem publicadas em um blog

(http://themurdererofminds.blogspot.com.br/p/fables.html) criado pelo professor PIBID,

especificamente para essa atividade. O objetivo da criação do blog foi mostrar aos alunos

que suas estórias seriam lidas por colegas e/ou outras pessoas que tivessem acesso ao site.

Assim, a atividade passou a ser uma atividade interessante para os alunos, ao mesmo tempo

que lhes atribuía responsabilidade do que seria publicado, ou seja a responsabilidade da

autoria do texto.

Após esse primeiro momento, apresentação da situação, os alunos foram guiados a

produzir uma primeira versão do gênero fábula. Na primeira produção, os alunos

conseguiram, embora parcialmente, seguir as instruções dadas pelo professor. Segundo

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2010, p. 86), "a apresentação da situação não desemboca

necessariamente em uma produção inicial completa. Somente a produção final constitui,

bem frequentemente, a situação real, em toda sua riqueza e complexidade".

Finalizada e entregue a primeira produção, as fábulas de Esopo foram retomadas e

discutidas com foco na organização do texto e nos elementos linguísticos. Na sequência

houve a devolutiva do professor e a orientação para o trabalho de análise das primeiras

versões de suas fábulas. Os alunos compararam suas produções com as fábulas já

estudadas, de forma a caracterizar o que os mentores da SD afirmam sobre os módulos de

ensino. "Nos módulos, trata-se de trabalhar os problemas que aparecem na primeira

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produção e de dar aos alunos os instrumentos necessários para superá-los" (DOLZ,

NOVERRAZ, SCHNEUWLY, 2010, p. 87- grifo dos autores).

Logo que os problemas no primeiro módulo foram trabalhados, os alunos

reescreveram seus textos e entregaram a segunda versão das fábulas para o professor. Esse,

após ler e fazer novos apontamentos, fez nova devolutiva e solicitou que os alunos

escrevessem a versão final de seus textos.

A produção final os alunos, em sua maioria, mostrou que esses conseguiram pôr em

prática as noções e os instrumentos elaborados separadamente no módulo de ensino. E

também, ao comparar a primeira produção com a última, o professor PIBID pode realizar a

avaliação de caráter somativo de todo o trabalho do aluno desde a apresentação do gênero

aos alunos até a produção final de suas fábulas.

No total foram produzidos 15 textos, ou seja, os alunos produziram 3 versões

(primeira, segunda e final) cada um. A oficina encerrou-se oficialmente após a publicação

das fábulas no blog (http://themurdererofminds.blogspot.com.br/p/fables.html). Dentre as 5

versões das fábulas produzidas em sua segunda versão, a fábula produzida pela aluna

Cristina6 será aqui analisada com relação ao uso dos mecanismos de coesão nominal.

4. A fábula de Cristina

Antes de iniciar a análise do texto escolhido, é importante apresentar algumas

informações sobre sua autora. Cristina tinha 13 anos de idade, e estava no 8º ano do Ensino

Fundamental no período de realização da oficina e se inscreveu na oficina, "por gostar

muito de Inglês".

Segundo Cristina, bem como seus colegas, essa foi a primeira vez que eles

escreveram um texto em Inglês. As atividades de escrita em Inglês na sala de aula se

limitavam à cópia de orações de textos estudados como forma de respostas às questões

sobre os mesmos, atividades de escrita de palavras, entre outras.

6 Cristina é o nome fictício dado à aluna-participante que teve seu texto escolhido para análise.

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Observações feitas no programa curricular de Língua Inglesa no Ensino

Fundamental (de 6º e 9º anos), nos mostraram que conteúdos estruturais como pronomes

pessoais (todas as classes), classes de palavras, entre elas substantivos e adjetivos –

considerados mecanismos de coesão nominal - são estudados já no 6º. ano de ensino

fundamental e retomados nos anos subsequentes, porém a observação de aulas nos 8º. e 9º.

anos, nos permite dizer que a aplicação do uso desses elementos é geralmente feita de

forma de exercícios gramaticais, o que dificulta sua aprendizagem e uso em contextos

sociais de prática comunicativa.

Nesse sentido, o procedimento de SD de escrita de texto em torno de gêneros

textuais/literários pode nos permitir descobrir se, através da produção de um texto, no

sentido atribuído por Bronckart (2003, p 72), ou seja, texto como um produto da atividade

humana, haverá aprendizagem do uso da linguagem, e aqui, especificamente de

mecanismos de coesão nominal.

Apresentamos, a seguir, a segunda versão da fábula The cat and the mouse, produzida

por Cristina, chamando a atenção para os pronomes e sintagmas nominais grifados.

1- Once upon a time a cat, and a mouse. One day the cat think in to make 2- a play with the mouse. The cat to tied for the mouse, and to invited he 3- for dinner in his house. The cat to know that the mouse alone ate 4- cheese, the cat made a soup. When the mouse came to got surprised 5- with the play that the cat made. Then the mouse to resolved to make the 6- same play with the cat. The mouse sent a letter to invited the cat for 7- dinner in his house. The cat when came there had a surprise since the 8- mouse him gave one piece of cheese. The cat got dreary and with hunger.

9- Moral: Never to make for other, the that no wish for you.

De forma geral, a segunda versão da fábula de Cristina, constituída por 9 linhas,

apresenta certa coesão nominal. Há a presença das duas funções de coesão nominal: a

introdução e a retomada. Já na primeira oração do texto “Once upon a time a cat, and a

mouse”. (l.1), a função de introdução está representada no texto através da marca de

inserção de duas unidades-fonte a cat e a mouse (um gato, um rato) que serão retomadas ao

longo do texto.

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Segundo Bronckart (2003, p. 270), “a função de introdução é, geralmente

realizada por um sintagma nominal indefinido”. Na Língua Inglesa os sintagmas nominais

indefinidos são a e an, ambos significando um e uma, com a diferença que o sintagma

nominal indefinido ‘an’ é utilizado antes de palavras com sons vogais, e o sintagma ‘a’

antes de sons consonantais.

Voltando ao texto de Cristina, na sua segunda oração “One day the cat think in to

make a play with the mouse.” (l.1,2), a função de retomada das unidades fontes -

cat/mouse - é feita através de uma anáfora nominal por repetição, apenas mudando o artigo

indefinido ‘a’ para o definido ‘the’, para as duas unidades-fonte.

Ao utilizar corretamente os sintagmas nominais indefinidos no texto com a função

de introdução das unidades-fonte, percebemos que Cristina mostra ter o conhecimento

necessário para a utilização correta dos artigos em Inglês, percebendo que um é mais

genérico (a, an), e o outro mais específico (the).

Porém, com relação a cadeia anafórica que constitui o texto num todo, o texto de

Cristina apresenta algumas limitações. Há a predominância de retomadas das unidades-

fonte, ou seja dos principais sintagmas nominais: cat e mouse (l. 1-8), enquanto que poucas

e imprecisas retomadas pronominais, entre essas he (l.2), his (l. 3,7) e him (l.8).

Em outras palavras, a retomada dos elementos é predominantemente realizada por

anáforas nominais (the mouse: The cat to tied for the mouse - l.1). O sintagma nominal que

retoma o outro, nesse caso, é sempre idêntico. Essa repetição parece expressar que Cristina

ainda não está preparada para fazer uso de outros mecanismos de coesão mais elaborados,

como por exemplo, trocar the mouse para the animal, que mostraria um maior

conhecimento de vocabulário de sua parte.

Apesar da marcação da coesão nominal pela categoria de anáforas nominais ser

predominante, observa-se também, como já mencionado, a marcação da coesão nominal

por anáforas pronominais, como na linha 2 (The cat to tied for the mouse and to invited he

…). Nessa oração, há a substituição de um sintagma nominal the mouse (o rato), pelo

pronome pessoal he (ele), porém Cristina a faz de maneira inadequada, de acordo com a

gramática oficial do Inglês-padrão. Segundo as normas da gramática de Língua Inglesa, o

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he nessa oração está desempenhando o papel de pronome pessoal oblíquo, pois

substitui o sintagma nominal the mouse e sua forma adequada é him.

Apesar da inadequação do uso do pronome oblíquo em Inglês, observa-se a intenção

de Cristina para tornar o texto menos repetitivo ao leitor, evitando a repetição do sintagma

the mouse. É também interessante ressaltar que esse equívoco da aluna não prejudica a

compreensão do texto, pois na sua intenção ela faz o que muitos usuários de Língua

Portuguesa estão habituados a fazer no Português não-padrão, isto é, trocar o pronome

oblíquo pelo pessoal do caso reto, como podemos observar nas versões Inglês e Português

da oração, que destacamos a seguir:

Forma original (Inglês não-padrão): [...] the mouse and to invited he […]Forma adaptada (Inglês-padrão): [...] the mouse, and invited him […]

Frase original (Português não-padrão): [...] o rato e convidou ele […]Frase adaptada (Português-padrão): [...] o rato, e o convidou[...]

A troca do pronome oblíquo pelo pessoal do caso reto é segundo Silva (2006 p.

2517), mais comum na fala, mas existe historicamente desde os primeiros escritos da

Língua Portuguesa. E de fato, parece que os pronomes oblíquos de 3ª pessoa estão sendo

cada vez menos utilizados na fala, por serem considerados pela maioria dos linguistas

"difíceis e sofisticados”, ao contrário dos pessoais, mais “naturais e espontâneos”.

Como muito do que falamos acaba aparecendo na escrita, adicionado a falta de

conhecimento adequada dos pronomes em Inglês, Cristina comete um equívoco justificável,

e que, embora, não prejudique o entendimento da mensagem contida na oração, evidencia

que tanto a aprendizagem da norma padrão de Língua Inglesa quanto a de Língua

Portuguesa por ela está em fase de desenvolvimento.

Outra evidência de coesão nominal por anáfora pronominal é observada em “The

cat to tied for the mouse, and to invited he for dinner in his house” (l.2,3). Aqui o pronome

he é usado inadequadamente na substituição do substantivo the mouse, enquanto que na

segunda oração his é usado adequadamente na substituição do sintagma nominal the cat.

Nota-se, assim, uma certa confusão na construção da oração como um todo e a dificuldade

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de Cristina em realizar adequadamente a coesão nominal, principalmente através

das anáforas pronominais.

Ainda, na oração “The cat when came there had a surprise since the mouse him

gave one piece of cheese” (l.7, 8), Cristina novamente faz uso da coesão nominal por

anáfora pronominal. Aqui há o uso correto da anáfora pronominal por meio do pronome

him retomando o sintagma nominal the cat, entretanto a posição sintática do pronome him

está inadequada na oração. Corrigindo a oração teríamos: “... since the mouse gave him one

piece of cheese” (l. 8).

Por fim, percebe-se que Cristina usa as duas categorias de anáforas - pronominal e

nominal - mas de maneira desproporcional e nem sempre adequada. O uso da categoria de

anáforas nominais por repetição é utilizado 15 vezes (8 vezes para retomar o sintagma the

cat, e 7 vezes para o sintagma the mouse), já a utilização das anáforas pronominais é notada

em 4 momentos, nos quais a aluna utiliza o pronome adequado em 3 dessas situações.

Dessa forma, em relação à aprendizagem de Cristina sobre os mecanismos de

coesão nominal, é possível afirmar que a mesma consegue utilizá-los para gerar coerência

ao texto, e que através do trabalho com o procedimento metodológico de SD, Cristina pôde

usar os pronomes pessoais, substantivos e adjetivos (mecanismos de coesão nominal) em

um contexto autêntico de comunicação escrita.

Para concluir, podemos afirmar que Cristina conseguiu dominar, praticamente em

todo o texto, o uso das anáforas nominais por repetição, mostrando que consegue gerar

coerência no texto através do uso desse mecanismo de coesão. Ademais, o fato de Cristina

conseguir produzir um texto totalmente em Inglês e utilizar as duas categorias de anáforas

em um contexto de produção, é motivo que torna o texto da aluna, embora simples, em uma

grande conquista, haja vista que a maioria dos alunos de Língua Inglesa nas escolas

públicas não escrevem textos em Inglês.

5. Algumas considerações e reflexões

O procedimento de SD e sua aplicação em uma oficina para cinco alunos, no contra-

turno, de uma escola pública de ensino Fundamental, mostrou-se um instrumento

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importante para a aprendizagem de escrita em Língua Inglesa. O resultado final

surpreendeu os alunos envolvidos.

Portanto, tendo em vista, a exposição da SD e da análise da segunda versão da

fábula de uma aluna participante da oficina aqui relatada, apresentamos, a seguir, algumas

questões para reflexão:

• É possível, pontualmente, trabalhar produções escritas em Inglês mediadas por

gêneros textuais na realidade atual da escola pública?

• De que maneira podemos inserir, de forma gradual, crescente e adequada, a

escrita em Inglês na sala de aula nas escolas públicas?

• Que capacidades linguísticas e comunicativas podem ser ensinadas nas aulas de

Língua Inglesa, além do ensino de elementos linguísticos? Há lugar para um

diálogo intercultural?

Através do exposto neste trabalho, em geral, e das questões finais, em específico,

gostaríamos de enfatizar a importância do ensino e aprendizagem da capacidade de escrita,

uma vez que esse processo ainda carrega um ar sombrio e obscuro nas aulas de Língua

Inglesa em escolas públicas de ensino fundamental.

6. Agradecimento

Agradeço à CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior),

pela bolsa concedida e pelo incentivo ao desenvolvimento de pesquisas científicas através

do PIBID.

7. Referências

BAGNO, Marcos. Fábulas Fabulosas. In: PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA. MARIA ANGÉLICA FREIRE DE CARVALHO, ROSA HELENA MENDONÇA (ORGS.). - Brasília: Ministério da Educação, 2006. p. 51-52

BRONCKART, Jean-Paul. Atividades de linguagem, textos e discursos. Por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 2003.

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DENARDI, Didiê Ana Ceni. (2009). Flying together towards EFL teacher development as language learners and professionals through genre writing. Tese (Doutorado em Língua Inglesa e Línguística Aplicada). Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2009.

DOLZ, Joaquim; SCHNEUWLY, Bernard; NOVERRAZ, Michèle. Sequências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim (Orgs.) Gêneros orais e escritos na escola, Campinas: Mercado de Letras p.81-108

PARANÁ. Diretrizes curriculares de língua estrangeira moderna para a educação básica. Secretaria do Estado de Educação do Paraná: Curitiba/PR, 2008.

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IV CONALI - Congresso Nacional de Linguagens em Interação Múltiplos Olhares

05, 06 e 07 de junho de 2013ISSN: 1981-8211