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O ALICERCE PARA UM MINISTÉRIO BÍBLICO DE ACONSELHAMENTO Maria Cecilia Alfano 1 Ao longo dos séculos, os cristãos se relacionaram uns com os outros e juntos lidaram com os problemas do cotidiano de acordo com a Palavra - praticaram o aconselhamento bíblico. Quando os cristãos de hoje - pastores, líderes, pais, amigos e amigas ou colegas - têm diante de si o desafio de ajudarem uns aos outros a refletirem a Cristo nos mais diversos aspectos da vida, o aconselhamento bíblico deveria igualmente acontecer. Por que nos preocuparmos com estabelecer alicerces para o ministério de aconselhamento na Igreja? Responder a esta pergunta parece-nos relevante por no mínimo quatro razões. Em primeiro lugar, o movimento de aconselhamento bíblico fortaleceu-se nos Estados Unidos nos últimos quarenta anos e seu eco chegou até nós. Alguns resistem, por identificarem no aconselhamento bíblico uma ameaça à estrutura profissional e ao espaço intelectual conquistado pela chamada psicologia cristã. Outros resistem por temeram a possibilidade de importar um modelo de ministério alheio à realidade brasileira. O brasileiro tende a ser um povo relacional e hesita diante de um enfoque que sistematize algo que lhe parece dizer respeito a uma dinâmica de relacionamento. No entanto, esta dinâmica necessita de um alicerce firme. Segundo, vivemos em uma época que se declara contrária a absolutos. Tudo é relativo. Esta idéia contamina a igreja, sorrateiramente, em especial quando se trata de lidar com os problemas da vida. Ouvimos dizer que há muitas verdades a considerar, e isso mesmo quando estamos em meio a irmãos em Cristo que declaram que a Bíblia é inspirada e inerrante. Mais do que nunca, precisamos de um fundamento seguro para que bíblico não seja um mero adjetivo adicionado ao nosso ministério. Paul Tripp, citando David Henderson, diz: O termo “bíblico” precisa ser redefinido. Ele não pode simplesmente significar “extraído de alguma página das Escrituras”. À luz de como a Bíblia está escrita, com uma unidade de pensamento do começo ao fim, bíblico deve significar “de acordo com aquilo de que a Bíblia trata”. E a Bíblia trata da paixão incontida de Deus por ser conhecido, amado e servido, mediante Jesus Cristo, por aqueles que Ele criou. 2 Terceiro, o aconselhamento bíblico não foi monolítico desde seus primórdios: ele reuniu cristãos com diferentes panos de fundo denominacionais e posições doutrinárias. 3 O que manteve o movimento unido é o reconhecimento de que estas diferenças são secundárias. Precisamos, então, identificar quais são as convicções pessoais, baseadas em diferentes interpretações de conteúdos da Palavra, que permitem diferenças de interpretação e quais são os compromissos fundamentais de que não é possível abrir mão. Em quarto lugar, o corpo de Cristo precisa estar pronto para alcançar os mais diversos contextos culturais. Devemos nos preocupar com identificar a essência supra-cultural do aconselhamento bíblico e definir as bases do ministério dirigido a todos os indivíduos, que transpõe barreiras as mais diversas e é capaz de comunicar a verdade de Deus a pessoas afligidas pelos transtornos atuais, em diferentes faixas etárias e contextos, mas igualmente carentes de uma orientação segura no estilo de vida. O corpo de Cristo pode se expressar no aconselhamento de uns aos outros de formas diferentes, em momentos diferentes e com a singularidade pessoal com que Deus nos criou e recriou em Cristo. As pessoas a serem atingidas são diferentes e interagem com o mundo ao seu redor de maneiras diferentes. Não queremos sugerir que estas diferenças sejam ignoradas. No entanto, há pontos que são inegociáveis, que fazem o aconselhamento ser bíblico. É para estes pontos inegociáveis que desejamos olhar ao identificar a abrangência e o alvo, o âmago, a ação e o agente do aconselhamento de acordo com as Escrituras. 1 Este texto é parte da dissertação apresentada no programa Master in Arts of Biblical Counseling em The Master’s College, Santa Clarita, Califórnia, em 2004. 2 TRIPP, Paul D. Wisdom in counseling. The Journal of Biblical Counseling, v. 19, n.2, Winter 2001, p.7. 3 Para um panorama histórico do movimento de aconselhamento bíblico, consulte Biblical counseling in the Twentieth Century, escrito por David Powlison. In: MacARTHUR, John F. Jr., MACK, Wayne A. Introduction to biblical counseling. Dallas, Tex.: Word, 1994.

Alicerce para o Aconselhamento Bíblico

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O ALICERCE PARA UM MINISTÉRIO BÍBLICO DE ACONSELHAMENTO Maria Cecilia Alfano1

Ao longo dos séculos, os cristãos se relacionaram uns com os outros e juntos lidaram com os problemas do cotidiano de acordo com a Palavra − praticaram o aconselhamento bíblico. Quando os cristãos de hoje − pastores, líderes, pais, amigos e amigas ou colegas − têm diante de si o desafio de ajudarem uns aos outros a refletirem a Cristo nos mais diversos aspectos da vida, o aconselhamento bíblico deveria igualmente acontecer.

Por que nos preocuparmos com estabelecer alicerces para o ministério de aconselhamento na Igreja? Responder a esta pergunta parece-nos relevante por no mínimo quatro razões. Em primeiro lugar, o movimento de aconselhamento bíblico fortaleceu-se nos Estados Unidos nos últimos quarenta anos e seu eco chegou até nós. Alguns resistem, por identificarem no aconselhamento bíblico uma ameaça à estrutura profissional e ao espaço intelectual conquistado pela chamada psicologia cristã. Outros resistem por temeram a possibilidade de importar um modelo de ministério alheio à realidade brasileira. O brasileiro tende a ser um povo relacional e hesita diante de um enfoque que sistematize algo que lhe parece dizer respeito a uma dinâmica de relacionamento. No entanto, esta dinâmica necessita de um alicerce firme.

Segundo, vivemos em uma época que se declara contrária a absolutos. Tudo é relativo. Esta idéia contamina a igreja, sorrateiramente, em especial quando se trata de lidar com os problemas da vida. Ouvimos dizer que há muitas verdades a considerar, e isso mesmo quando estamos em meio a irmãos em Cristo que declaram que a Bíblia é inspirada e inerrante. Mais do que nunca, precisamos de um fundamento seguro para que bíblico não seja um mero adjetivo adicionado ao nosso ministério. Paul Tripp, citando David Henderson, diz:

O termo “bíblico” precisa ser redefinido. Ele não pode simplesmente significar “extraído de alguma página das Escrituras”. À luz de como a Bíblia está escrita, com uma unidade de pensamento do começo ao fim, bíblico deve significar “de acordo com aquilo de que a Bíblia trata”. E a Bíblia trata da paixão incontida de Deus por ser conhecido, amado e servido, mediante Jesus Cristo, por aqueles que Ele criou.2

Terceiro, o aconselhamento bíblico não foi monolítico desde seus primórdios: ele reuniu cristãos com diferentes panos de fundo denominacionais e posições doutrinárias.3 O que manteve o movimento unido é o reconhecimento de que estas diferenças são secundárias. Precisamos, então, identificar quais são as convicções pessoais, baseadas em diferentes interpretações de conteúdos da Palavra, que permitem diferenças de interpretação e quais são os compromissos fundamentais de que não é possível abrir mão.

Em quarto lugar, o corpo de Cristo precisa estar pronto para alcançar os mais diversos contextos culturais. Devemos nos preocupar com identificar a essência supra-cultural do aconselhamento bíblico e definir as bases do ministério dirigido a todos os indivíduos, que transpõe barreiras as mais diversas e é capaz de comunicar a verdade de Deus a pessoas afligidas pelos transtornos atuais, em diferentes faixas etárias e contextos, mas igualmente carentes de uma orientação segura no estilo de vida.

O corpo de Cristo pode se expressar no aconselhamento de uns aos outros de formas diferentes, em momentos diferentes e com a singularidade pessoal com que Deus nos criou e recriou em Cristo. As pessoas a serem atingidas são diferentes e interagem com o mundo ao seu redor de maneiras diferentes. Não queremos sugerir que estas diferenças sejam ignoradas. No entanto, há pontos que são inegociáveis, que fazem o aconselhamento ser bíblico. É para estes pontos inegociáveis que desejamos olhar ao identificar a abrangência e o alvo, o âmago, a ação e o agente do aconselhamento de acordo com as Escrituras.

1 Este texto é parte da dissertação apresentada no programa Master in Arts of Biblical Counseling em The Master’s College, Santa Clarita, Califórnia, em 2004. 2 TRIPP, Paul D. Wisdom in counseling. The Journal of Biblical Counseling, v. 19, n.2, Winter 2001, p.7. 3 Para um panorama histórico do movimento de aconselhamento bíblico, consulte Biblical counseling in the Twentieth Century, escrito por David Powlison. In: MacARTHUR, John F. Jr., MACK, Wayne A. Introduction to biblical counseling. Dallas, Tex.: Word, 1994.

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Embora o aconselhamento bíblico não deva ser entendido como uma alternativa a outros sistemas de aconselhamento, mas como um imperativo, em sua prática há alternativas peculiares a cada contexto: as questões de forma e estrutura. Um modelo universal de aconselhamento simplesmente não funcionaria. Nenhum modelo padrão para prevenir ou tratar os problemas atuais como transtornos da alimentação, trastornos depressivos, e outros mais, funcionaria. Certamente existem alternativas diferentes que podem emergir de um alicerce bíblico, mas em momento algum elas podem contradizer este alicerce. O que fazemos e como fazemos não é uma questão apenas de metodologia alternativa, mas deve estar alicerçado em uma essência claramente identificada e formulada − uma filosofia bíblica do aconselhamento.

A abrangência e o alvo

Aconselhamento mútuo no corpo de Cristo não é uma onda destinada a durar por certo tempo, e depois passar. É plano de Deus para a Igreja. Encontramos na Bíblia uma ordem clara: “Habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos [exortai-vos, admoestai-vos] mutuamente em toda a sabedoria, louvando a Deus, com salmos, e hinos, e cânticos espirituais, com gratidão, em vosso coração” (Cl 3.16).

Para entender a abrangência desta ordem, vamos situá-la no contexto de outra ordem bíblica mais ampla − a Grande Comissão. O homem foi criado com o objetivo principal de glorificar a Deus (Is 43.7; 1Pe 4.11). Na queda, porém, ele declarou sua independência com respeito a Deus e se afastou do propósito original para o qual fora criado de modo que, em lugar de gozar a vida abundante e a comunhão íntima com Deus, passou a conhecer as trevas, a morte, o temor, a carência da glória de Deus. Em vez de atribuir a Deus a glória que a Ele é devida, o homem prefere glorificar a criatura (Rm 3.23). Em Cristo, há provisão de reconciliação com Deus para o homem perdido (2Co 5.17-21). Também há restauração para que o homem volte a viver em harmonia com o alvo para o qual foi criado − o louvor da glória de Deus (Ef 1.12). E Deus comissiona aqueles que já foram reconciliados para que levem a outros a mensagem de reconciliação e restauração (Rm 5.18-20).

A Grande Comissão é vista geralmente como um chamado missionário. Conforme registrada em Mateus 28.19-20, porém, ela não apenas convoca a Igreja a uma visão missionária, mas ela também provê um paradigma para toda a extensão do ministério da igreja local, incluindo a exposição clara do evangelho, a pregação, a instrução nos princípios de vida cristã e a ajuda para lidar com as dificuldades específicas da vida.

Assim como a primeira parte da Grande Comissão estabelece a direção para a tarefa missionária do povo de Deus, a segunda metade da Grande Comissão define e direciona a vida e o ministério na igreja local, para o pastor, o conselheiro, o líder de pequeno grupo, os irmãos e irmãs em Cristo comprometidos com o ministério mútuo bíblico.4

O aconselhamento é parte desta dinâmica maior, não é algo isolado. Nas palavras de Wayne Mack,

O cumprimento da Grande Comissão envolve três atividades relacionadas e igualmente importantes. Ele envolve ministrar a Palavra de Deus em discipulado preparatório (evangelismo), em discipulado propriamente dito (ensinar e instruir pela pregação, ensino e ato de modelar a Palavra de Deus em grupo ou individualmente) e o discipulado corretivo terapêutico (aconselhar pessoas individualmente ou como parte de um pequeno grupo para superar problemas que estão impedindo o seu crescimento em graça e piedade).5

O modelo bíblico para o evangelismo relaciona-se ao aconselhamento. O evangelismo dirige-se diretamente aos problemas da vida real do incrédulo. Ao evangelizarmos, apresentamos não apenas o caminho para a vida eterna, mas também a esperança de

4 TRIPP, Paul D. The Great Commission: a paradigm for ministry in the local church. The Journal of Biblical Counseling, v. 16, n.3, Spring 1998, p.2. 5 MACK, Wayne. The distinguishing features of Christian counseling. The Master’s Current, v.4, n.3, 1998, p. 6.

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transformação pessoal com base em Cristo. Semelhantemente, quando aconselhamos um incrédulo, devemos trabalhar evangelisticamente. Conforme lembra o pastor Thomas Sigley6, a intervenção do conselheiro bíblico deve mostrar à pessoa o relacionamento entre o seu comportamento e a sua natureza, a ligação entre as dificuldades do cotidiano e o pecado, a relevância da graça de Deus para as necessidades reais. O incrédulo está confuso quanto a quem ele é e o que está errado com ele.

O aconselhamento, propriamente dito, começa após a conversão, como instrumento no processo de santificação ativado pela presença do Espírito na vida da pessoa regenerada. É impossível promover em um incrédulo mudança bíblica que agrade a Deus, pois ele não tem o desejo de servir a Cristo como Senhor nem o poder para fazer a vontade de Deus.

Sem a influência regeneradora do Espírito Santo não há como resolver o problema básico do aconselhado, não importa quanto tempo gastemos em aconselhamento. Uma conformidade exterior até mesmo com os padrões bíblicos não pode desfazer os efeitos do pecado. A prioridade do conselheiro bíblico, portanto, é verificar se o aconselhado é convertido a Cristo.7

A tentativa de aconselhar um incrédulo pode provocar maus resultados como, por exemplo, uma conformidade exterior com a Bíblia (hipocrisia), uma falsa impressão de ter resolvido o problema, uma forma mais bem-sucedida de insensatez, uma deturpação da verdadeira transformação espiritual que Deus oferece. Nas palavras de Jay Adams,

O que pode, então, ser feito por um incrédulo? Ele não pode ser aconselhado no sentido bíblico da palavra porque aconselhamento bíblico envolve mudança no coração que conduz a mudança na vida, processo no qual o Espírito Santo faz com que a pessoa regenerada se torne mais semelhante a Cristo. O que pode ser feito? O incrédulo pode ser pré-aconselhado.... Pré-aconselhamento é a tarefa de apresentar Cristo ao incrédulo não apenas como o caminho para a vida eterna, mas também como o caminho para alcançar soluções para os problemas da vida.8

Paz consigo mesmo ou comportamento socialmente aceitável não são alvo adequado para o aconselhamento bíblico. No entanto, ajudar um incrédulo a lidar com situações imediatas de crise, ainda que ele atenda apenas formalmente ao padrão da Palavra de Deus, pode ser caminho para apresentar o evangelho de Cristo, que pode satisfazer a sua necessidade mais profundas e gerar mudança duradoura.

Certamente devemos usar de sabedoria ao tratar com o incrédulo, percebendo quando apresentar o apelo evangelístico e quando conduzi-lo em pequenos passos que possam dar condições de ouvir a apresentação do evangelho. Jesus evangelizou Nicodemos logo no início de sua conversa (Jo 4). Em João 9, Jesus curou o cego e se retirou. Não houve evangelismo naquele primeiro encontro. Em um segundo encontro, Ele apresentou a necessidade de curar a cegueira do coração. Jesus não deixou de apresentar a mensagem de salvação a todos. Às vezes, porém, Ele fez alguma outra coisa pela pessoa, primeiramente, para que ela pudesse ser depois alcançada pelo evangelho.

Dando um passo à frente, vemos que a Grande Comissão aponta também para o processo em que um crente mais maduro no conhecimento e aplicação da Palavra à própria vida ensina um irmão a crescer em seu relacionamento com Cristo e o treina para que venha, por sua vez, a treinar outros. Costumamos identificar este processo como discipulado cristão. O discipulado envolve um investimento significativo de tempo em ensino, treinamento e encorajamento, com o alvo de que o discípulo alcance a maturidade em Cristo e ande de acordo com a Palavra de Deus.

De acordo com este entendimento, parece-nos evidente que o aconselhamento bíblico é parte do discipulado bíblico. Costumamos, porém, fazer uma distinção funcional, chamando de

6 SIGLEY, Thomas. Evangelism implosion: reaching the hearts of non-Christian counselees. The Journal of Biblical Counseling, v. 17, n.1, Fall 1998, p. 7-14. 7 MacARTHUR, John F. The work of the Spirit and biblical counseling. In: MacARTHUR, John F. Jr., MACK, Wayne A. Introduction to biblical counseling. Dallas, Tex.: Word, 1994, p. 140. 8 ADAMS, Jay E. Ready to restore. Phillipsburg, N.J.: Presbyterian and Reformed, 1981, p. 21.

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aconselhamento aquele aspecto do discipulado que envolve uma aplicação mais específica de princípios bíblicos a problemas pessoais e de relacionamento que possam ser obstáculo ao crescimento normal e salutar. Durante determinado tempo, a pessoa necessita de uma estrutura de ajuda e prestação de contas mais intensa do que aquela que normalmente seria oferecida em um relacionamento de discipulado. Talvez seja necessário envolver um número maior de pessoas para o pleno tratamento do problema. Isso é verdade especialmente se o problema com que se está lidando constitui-se em um hábito bem arraigado.

Nas palavras de Carey Hardy, citadas por Dennis Swanson, “Aconselhamento às vezes funciona como uma forma concentrada de discipulado”9. Hardy explica que há ocasiões no processo de discipulado quando problemas específicos são identificados e o discipulador faz um trabalho de aconselhamento. Vice-versa, também é verdade que um crente pode buscar aconselhamento bíblico para tratar de uma questão específica e, no processo, descobrir a necessidade de um relacionamento mais extenso e contínuo de discipulado com um crente maduro para prosseguir em seu crescimento espiritual.

Parece haver uma unanimidade entre os conselheiros bíblicos experientes de que o aconselhamento é parte do ministério de discipulado no corpo de Cristo. Henry Brandt disse: “Discipulado e aconselhamento andam de mãos dadas.... Discipulado inclui andar com a pessoa através dos problemas que ela manifesta no casamento, na criação dos filhos, nas tensões diárias. Ajudar pessoas a examinar e reordenar sua vida à luz da Palavra é o alvo do discipulado e do aconselhamento bíblico”10. Robert Smith expressou-se semelhantemente:

O aconselhamento bíblico é uma simples extensão do discipulado. Não há uma distinção bem definida entre os dois. Discipulado deve ser descrito como o ensino dos princípios cristãos básicos a um crente, enquanto aconselhamento é usar estes princípios para lidar com situações específicas da vida daquela pessoa. O aconselhamento mais produtivo floresce do ministério de discipulado....Conselheiros bíblicos que querem ver vidas transformadas devem ser discipuladores ativos.11

Não vamos nos preocupar, então, com estabelecer limites rígidos para o aconselhamento no intuito de distingui-lo de outros ministérios pessoais, e em especial do discipulado. Muito do que veremos adiante com relação ao aconselhamento bíblico aplica-se igualmente ao discipulado e, no sentido mais amplo, à amizade cristã.

Embora possa pressupor a existência de um problema específico, o aconselhamento bíblico não se propõe apenas a resolver problemas, restaurar relacionamentos ou alterar estados emocionais, mas a colaborar para o processo de santificação progressiva do aconselhado − arrependimento contínuo, renovação da mente pela verdade bíblica e obediência à lei de Deus em amor − estimulando-o a fazer mudanças de acordo com a Palavra de Deus, que o conformem cada vez mais à imagem de Cristo em um contexto de crescimento amplo e contínuo promovido pelo Espírito e assistido por irmãos em Cristo, rumo à completa maturidade em Cristo (Rm 8.29; 2Co 3.18; Cl 1.28).

O alvo do aconselhamento secular, de modo geral, é o bem-estar do aconselhado − um alvo centrado no indivíduo. O aconselhamento bíblico tem um alvo diferente: glorificar e agradar a Deus − um alvo que se completa quando o homem reflete o caráter de Deus, por meio de Cristo, em meio as circunstâncias da vida. Como resultado de uma dinâmica de adoração a Deus motivada pela Palavra, à medida que ela é aplicada ao coração pelo Espírito, o homem encontrará prazer: “agrada-me fazer a tua vontade, ó Deus meu; dentro do meu coração, está a tua lei” (Sl 40.8).

9 SWANSON, Dennis M. Frequently asked questions about biblical counseling. In: MacARTHUR, John F. Jr., MACK, Wayne A. Introduction to biblical counseling. Dallas, Tex.: Word, 1994, p. 369. 10 BRANDT, Henry, SKINNER, Kerry. The word for the wise: making Scripture the heart of your counseling ministry. Nashville, Tenn.: Broadman, 1995, 94. 11 SMITH, Robert. Spiritual discipline and the biblical counselor. In: MacARTHUR, John F. Jr., MACK, Wayne A. Introduction to biblical counseling. Dallas, Tex.: Word, 1994, p. 148.

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A ação e o agente

A Igreja recebeu diretrizes para o cumprimento da tarefa do cuidado pessoal dentro do corpo, e é a partir destas que ela deve articular a dinâmica ministerial do aconselhamento. Para identificar os aspectos que devem integrar o aconselhamento propriamente dito, olharemos para seis verbos do Novo Testamento que expressam diferentes facetas de ação. Em seguida, iremos nos ocupar com o agente.

O verbo de uso mais amplo no Novo Testamento no contexto de ministério pessoal é parakaleō, com grande variedade na tradução para o português: implorar, rogar, recomendar, suplicar, pedir, solicitar, seguido do conteúdo específico do pedido ou convite (Rm. 12.1, Ef. 4.1); consolar, confortar, fortalecer, alentar, visando aliviar dor ou tristeza (1 Ts 4.18; 5.11); exortar, admoestar visando incentivar o cumprimento de determinada conduta (1Co 4.16; 2Co 6.1). De acordo com Arndt & Gingrich12, a idéia principal é a de chamar ao lado para auxiliar, incluindo confortar com relação a alguma circunstância da vida, mas também encorajar ou exortar a seguir determinado curso de conduta futuro.

Schmitz &Stählin destacam que na LXX, parakaleō tem o sentido principal de confortar no sofrimento, expressando compaixão (Jó 2.11; 2Sm 10.2, 1Cr 19.2). Também é usado para encorajar, fortalecer (Dt 3.28, Jó 4.3) ou oferecer exortação amigável (Et 5.1). Na prática, consolação e exortação misturam-se muitas vezes. “No Novo Testamento, admoestação torna-se conforto genuíno e vice-versa, de modo que é difícil separar entre ambos (Cf. Cl 2.2; 4.8; 1Ts 5.11; Fp 2.1, 1Co 14.3).” 13

Katartizō é traduzido como preparar, aperfeiçoar, corrigir, reparar, consertar. Refere-se a restaurar à utilidade, reparar o que está errado, completar o que falta visando uma utilidade maior. Na LXX, de acordo com Schippers,14 aparece em Esdras com o sentido de completar, em conexão com a edificação do muro e do tempo. Também é usado para a atividade de Deus de equipar (Sl 40.6), restaurar (Sl 68.9), estabelecer (Sl 8.2), alicerçar (Sl 11.4), tornar semelhante (Sl 18.33), sempre destacando a atuação de Deus.

Nos evangelhos, katartizō aparece em conexão com o apóstolo Pedro reparando as redes para poder pescar de novo (Mt 4.21, Mc 1.19). Envolve a verdade de Deus aplicada a vidas, comunica amor e preocupação em restaurar (Gl 6.1), em levar a um estado apropriado, aperfeiçoar (1Ts. 3.10; Hb 13.21).

Makrothumeō, traduzido como exercer paciência e longanimidade, indica a disposição paciente e humilde de lidar com os irmãos, suportando-os, sem ofender-se facilmente ou irar-se em meio a provações e desprezo (1Ts 5.14; Tg 5.8). Na LXX, é usado com a idéia de aguentar pacientemente, perseverar.15

Noutheteō é traduzido como admoestar, advertir, exortar, aconselhar. Jay Adams ressalta que podemos identificar pelo menos três elementos básicos contidos neste termo. O primeiro elemento diz respeito a que a ação noutética sempre pressupõe que exista algo errado que precisa ser tratado na vida daquele a quem se está ministrando. “A idéia de alguma coisa errada, algum pecado, algum obstáculo, algum problema, alguma dificuldade, alguma necessidade que precise ser reconhecida e tratada, é fundamental... Daí, o propósito básico da confrontação noutética, que é o de efetuar mudança de conduta e de personalidade.”16

O segundo elemento diz respeito a tratar o problema pela persuasão verbal que fique gravada. O termo − um composto de nous (mente) e tithēmi (colocar) − traz o sentido de ter uma influência corretiva sobre alguém, alcançando o coração. Adams lembra que: “É o

12 ARNDT, William F., GINGRICH, F. Wilburg. A Greek-English lexicon of the New Testament and other early Christian literature. 4. ed. Chicago: The University of Chicago Press, 1974. 13 SCHMITZ & STÄHLIN. Parakaleō. In KITTEL, Gerhard (edit.) Theological dictionary of the New Testament. Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1983. v.5, p. 821. 14 SCHIPPERS, R. Katartizō. In BROWN, Colin. O novo dicionário internacional de teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1983, v. 4. 15 LIDDELL, Henry George, SCOTT, Robert. A Greek-English lexicon. Oxford: At Clarendon Press, 1968. 16 ADAMS, Jay E. Conselheiro capaz. São Paulo: Fiel, 1977, p. 58.

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treinamento mediante a palavra − mediante a palavra de encorajamento, quando isso basta, mas também pela palavra de admoestação, de reprovação, de censura, quando estas se fazem necessárias; em contraste com o treinamento por meio de atos e de disciplina, que é paideia”.17 O terceiro elemento diz respeito ao propósito ou motivo da ação: ajudar o irmão, motivado por amor e interesse profundo.

O termo noutheteō é suficientemente amplo para abranger a confrontação formal e informal. Refere-se à aplicação pessoal da verdade de Deus no âmbito de todo o corpo, uns aos outros (Rm 15.14), ou apenas pelos pastor (1Ts 5.12), sempre trazendo uma verdade específica necessária à vida pessoal do aconselhado e associada a um envolvimento intenso − Paulo admoestava em lágrimas (At 20.31) e amor (1Co 4.14).

Enquanto no Novo Testamento o termo aparece apenas nos escritos de Paulo e em Atos 20.31, onde Lucas relata um discurso do apóstolo, Selter18 destaca que a LXX emprega noutheteō especialmente na literatura sapiencial. No livro de Jó, aparecem os sentidos tanto de instruir (Jó 4.3), como de ganhar compreensão, entender (Jó 23.15, 36.12; 37.14; 38.18). Fora da literatura sapiencial, o termo aparece 1 Samuel 3.13, onde tem o sentido de corrigir, repreender.

Paramutheomai, traduzido por consolar, encorajar, animar, tem o sentido geral de falar bem de perto com alguém, de modo positivo e benevolente. Schütz19 destaca que a LXX emprega a palavra no sentido de confortar, consolar, encorajar.

Schmitz & Stählin comentam que é natural se buscar uma distinção entre paramutheomai, e parakaleō, “mas é difícil encontrar um critério convincente para estabelecer uma linha precisa de distinção”.20 Ambos são caracterizados tanto por admoestação quanto por conforto. A distinção possível de se fazer é que no Novo Testamento paramutheomai nunca é usado diretamente para o consolo dado por Deus, mas para o consolo divino mediado pela profecia (1Co 14.3) ou pelo amor de uns aos outros (Fp 2.1). Paramutheomai também nunca denota conforto escatológico, como parakaleō muitas vezes faz − o termo refere-se sempre a uma conforto enquanto na vida presente. A Chave Linguística do Novo Testamento Grego destaca que paramutheomai denota consolar e confortar com maior ternura que parakaleō, com simpatia sentida de coração (Jo 11.19), dirigindo-se mais às emoções que à vontade.21

Embora seu uso seja mais amplo e envolva contextos que vão além do ministério pessoal da Palavra, queremos citar aqui mais um verbo relevante para o aconselhamento bíblico − didasko. Selter escreve: “Em Colossenses 1.28 e 3.16, noutheteō se junta a didasko com referência à proclamação de Cristo. A advertência e o ensino andam inseparavelmente juntos, como contrapartida constante do conhecimento e da ação”.22 Como já vimos, o aconselhamento insere-se na Grande Comissão, e a tarefa está clara: “ensina a obedecer” (Mt 28.20). Sem a transmissão de conhecimento sobre quem é o Senhor e quais as suas ordens, não poderíamos esperar obediência. Por outro lado, no processo de maturação do crente, o ensino necessita do complemento da advertência e encorajamento.

Aconselhar (ou admoestar) e ensinar aparecem lado a lado no ministério do apóstolo Paulo, como dois lados de uma mesma folha de papel, junto com a tarefa de anunciar a Cristo: “Vós bem sabeis como foi que me conduzi entre vós em todo o tempo ... jamais deixando de vos anunciar coisa alguma proveitosa e de vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa. ...Portanto, vigiai, lembrando-vos de que, por três anos, noite e dia, não cessei de admoestar, com lágrimas, a cada um” (At 20.18, 20, 31).

17 ADAMS, Jay E. Conselheiro capaz. São Paulo: Fiel, 1977, p. 59. 18 SELTER, Friedel. Noutheteō. In BROWN, Colin. O novo dicionário internacional de teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1982, v. 2. 19 SCHÜTZ, H. Paramutheomai. In BROWN, Colin. O novo dicionário internacional de teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1982, v. 1. 20 SCHMITZ & STÄHLIN. Op. Cit. p. 821. 21 RIENECKER, Fritz, ROGERS, Cleon. Chave lingüística do Novo Testamento grego. São Paulo: Vida Nova, 1985. 22 SELTER, Friedel. Op. Cit. p. 175.

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“Aconselhamento é mais abrangente que ensino, mas inclui ensino”, diz Adams, e prossegue mostrando como ao longo dos últimos anos houve ênfases diferentes nesta faceta do todo, nem sempre equilibradas.23 Por vezes, o aconselhamento foi influenciado por teorias humanistas, particularmente as de Carl Rogers, que pregam que o homem possui em si a resposta para seus problemas e cuja ênfase está em fazer perguntas, ouvir e prover apoio para que a pessoa descubra por si mesma a resposta. Outras vezes, moveu-se para o extremo oposto, enfatizando demasiadamente o aspecto racional cognitivo. Wayne Mack ecoa a voz de Adams ao avaliar a ênfase em um extremo ou outro, e conclui: “Estas abordagens de aconselhamento não são bíblicas, pois as Escrituras deixam claro que instrução é sempre parte do processo de crescimento espiritual”.24

É compreensível que no início do movimento do aconselhamento bíblico, por razões circunstanciais25, a escolha de Jay Adams recaiu no termo noutheteō para caracterizar a atuação do conselheiro bíblico. De fato, é um termo de amplo campo semântico. Reconhecemos, porém, que a Bíblia não se limita ao uso de um único verbo para expressar o ministério pessoal. Em 1 Tessalonicenses 5.14, por exemplo, aparecem quatro dos verbos que destacamos aqui, e ainda antechomai que é traduzido como amparar. A variedade de palavras que se relacionam ao aconselhamento bíblico indicam que o ministério inclui diferentes tipos de ação, dependo da condição do irmão aconselhado: “Exortamo-vos (parakaleō), também, irmãos, a que admoesteis (noutheteō) os insubmissos, consoleis (paramutheomai) os desanimados, ampareis (antechomai) os fracos e sejais longânimos (makrothume ) para com todos”. Consolar e amparar são expressões de apoio sem o menor traço de repreensão e confrontação, mas no mesmo versículo em que se fala em apoio, lemos que os insubordinados devem ser admoestados. Direcionado pelo Espírito Santo, o conselheiro deve avaliar a situação e atuar da maneira mais oportuna.

Embora cristão possivelmente seja o termo mais apropriado para qualificar o aconselhamento centrado em Cristo e na Palavra de Cristo, praticado pelo corpo de Cristo, reconhecemos que é um termo que hoje inclui muitas abordagens que não correspondem ao aconselhamento prescrito na Palavra. Por isso apoiamos o uso do termo bíblico em substituição a noutético. Na verdade, estamos falando de um aconselhamento bíblico centrado em Cristo.

E uma vez identificados os verbos que nos ajudam a estabelecer o tipo de ação a que a Palavra nos chama, é hora de olharmos para o agente. “O encontro mais importante no aconselhamento não é com o conselheiro humano, mas com o Maravilhoso Conselheiro que opera tanto no aconselhado como no conselheiro”26, diz Paul Tripp.

O Senhor Jesus aconselhou a muitos durante Seus anos de ministério na terra. Ele “...conhecia a todos. E não precisava de que alguém lhe desse testemunho a respeito do homem, porque ele mesmo sabia o que era a natureza humana” (Jo 2.24-25). Ele podia se dirigir à necessidade específica de cada um, conforme revelam os encontros registrados nos evangelhos. Em cada caso, porém, o alvo do aconselhamento foi sempre o mesmo: mudança para se conformar ao estilo de vida que Ele ensinava e exemplificava. Algumas vezes, como para Marta, foi mudança de atitude (Lc 10.41-42); outras vezes, como para a mulher adúltera, mudança completa de estilo de vida (Jo 8.11). É significativo que um dos nomes do Senhor Jesus seja Maravilhoso Conselheiro (Is 9.6).

Jesus Cristo é o centro do aconselhamento. Ele habita invisivelmente na Sua Igreja, na Pessoa do Espírito Santo − o Consolador (parakletos), o Espírito da Verdade (Jo 14.16,17; 15.26; 16.13) e o agente necessário em todo aconselhamento bíblico. O Espírito Santo é quem

23 ADAMS, Jay E. Teaching to observe: the counselor as a teacher. Woodruff, SC: Timeless Texts, 1995, p. 25.

24 MACK, Wayne A. Providing instruction through biblical counseling. In: MacARTHUR, John F. Jr., MACK, Wayne A. Introduction to biblical counseling. Dallas, Tex.: Word, 1994, p. 250.

25 No início do movimento de aconselhamento bíblico, era essencial distinguir a nova abordagem de outros aconselhamentos que usavam a qualificação bíblico ou cristão, mas não estavam comprometidos integralmente com Cristo e a Palavra.

26 TRIPP, Paul. The Great Commission: a paradigm for ministry in the local church. The Journal of Biblical Counseling, v. 16, n.3, Spring 1998, p.3.

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opera para que ocorra mudança rumo à maturidade no aconselhado. Também é Ele quem capacita o conselheiro a ministrar a verdade bíblica, dando-lhe entendimento e direção. John MacArthur lembra que “o Espírito Santo habitando no crente cumpre um papel que nenhum conselheiro humano pode cumprir − Ele está constantemente em ação, apontando para a verdade, aplicando a verdade diretamente ao coração, e incentivando a conformidade com a verdade − em resumo, santificando na verdade (Jo 17.17)”.27 O Espírito Santo é o agente da santificação progressiva: “E todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito” (2Co 3.18).

Ao apontar para o Espírito Santo como principal agente na dinâmica de mudança que ocorre na vida do aconselhado, e como o Conselheiro com quem o crente pode contar constantemente, não queremos diminuir a importância que há no ministério mútuo de aconselhamento no corpo de Cristo, que acontece como resultado da própria atuação do Espírito em vidas.

Para o conselheiro, a implicação de sua posição em Cristo é que ele não trabalha sozinho. Em Colossenses 1.28, Paulo descreve seu ministério “advertindo (noutheteō) a todo homem e ensinando (didasko)” e, no versículo seguinte, ele explica quem está agindo − “para isso é que eu também me afadigo, esforçando-me o mais possível, segundo a Sua [de Cristo] eficácia que opera eficientemente em mim”. A palavra grega traduzida por “me afadigo” (kopiaō) pode se referir a trabalhar com esforço cansativo, a ponto de ficar exausto. A palavra traduzida por “esforçando-me” (agōnizomai) traz o sentido de lutar, labutar, sofrer.28 Parece-nos que Paulo quer enfatizar aqui o seu trabalho incansável e suas lutas para ver Cristo formado no coração daqueles a quem ministrava (cf. Cl 21,2). Ele lutava, sim, para advertir e ensinar todo homem, mas trabalhava segundo a eficácia do Espírito de Cristo operando nele. Seu trabalho era em harmonia com a ação e o propósito divinos.

A atuação do Espírito Santo na vida do conselheiro fica evidente pelo fruto manifesto (Gl. 5.22-23), que o qualifica para ministrar. Em Romanos 15.14 e Colossenses 3.16, duas passagens onde Paulo fala claramente à Igreja sobre o ministério pessoal de uns aos outros (noutheteō), ele aponta para as qualidades de caráter produzidas pelo Espírito, que qualificam para ministrar: bondade, conhecimento, sabedoria. Em Romanos 15.14, Paulo diz: “E certo estou, meus irmãos, sim, eu mesmo, a vosso respeito, de que estais possuídos de bondade, cheios de todo o conhecimento, aptos para vos admoestardes uns aos outros”. Bondade, parte do fruto mencionado em Gálatas 5.22, diz respeito ao interesse genuíno para com o irmão em Cristo, expresso em ações concretas. Comentando Romanos 15.14, Adams diz: “A bondade abrange tanto o envolvimento como o interesse empático...e também compreende o entusiasmo da vida que manifesta Cristo, pelo qual se comunica esperança ao aconselhado”.29

O conhecimento de que Paulo fala é o conhecimento da Palavra de Deus, que o conselheiro procura diligentemente capacitado pelo Espírito. Muito do ministério do Espírito na vida do crente envolve ensinar a Verdade (Jo 14.26; 1Co 2.13; 1Jo 2.20, 27). Em Colossenses 3.16, Paulo enfatiza no retrato do conselheiro aprovado que ele conheça “ricamente” a Palavra de Deus e saiba usá-la com sabedoria. Sabedoria, para o conselheiro bíblico, é a habilidade para aplicar a Verdade à própria vida, que vem do conhecimento e uso contínuo da Palavra, e a consequente habilidade de aplicá-la à vida do aconselhado, com variedade na ação, sob a direção do Espírito Santo.

O âmago

Embora haja muita discordância entre os diferentes sistemas que se dispõem a ajudar o homem a lidar com seus problemas e conflitos, quase todos têm em comum o fato de que o aconselhamento caminha em direção a uma mudança, seja ela em comportamento, pensamento ou sentimento. O alvo de Deus para o homem também é mudança − transformação à imagem do Seu Filho (Rm 8.29). A diferença está no fato de que enquanto no

27 MACARTHUR, John. The work of the Spirit and biblical counseling. In: MacARTHUR, John F. Jr., MACK, Wayne A. Introduction to biblical counseling. Dallas, Tex.: Word, 1994, p.136. 28 ARNDT, William F., GINGRICH, F. Wilburg. A Greek-English lexicon of the New Testament and other early Christian literature. 4. ed. Chicago: The University of Chicago Press, 1974. 29 ADAMS, Jay E. Conselheiro capaz. São Paulo: Fiel, 1977, p. 72.

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mundo multiplicam-se as teorias para prescrever esta mudança, a Palavra de Deus dá o entendimento perfeito a respeito da natureza e dos problemas do homem, bem como da mudança necessária.

Embora a Palavra tenha passado a ocupar papel secundário no aconselhamento praticado hoje pela Igreja − como um apêndice de certo valor, mas não o âmago − ela continua a declarar a sua superioridade para que o alvo de mudança nos moldes de Deus seja atingido.30 Poderíamos olhar para vários textos bíblicos, mas escolhemos o Salmo 19 e 2 Timóteo 3.1-1731. Inicialmente, o Salmo 19.7-11 nos dá uma lista abrangente de características da Palavra de Deus, relevantes para o ministério do aconselhamento:

A lei do SENHOR é perfeita e restaura a alma; o testemunho do SENHOR é fiel e dá sabedoria aos símplices. Os preceitos do SENHOR são retos e alegram o coração; o mandamento do SENHOR é puro e ilumina os olhos. O temor do SENHOR é límpido e permanece para sempre; os juízos do SENHOR são verdadeiros e todos igualmente, justos. São mais desejáveis do que ouro, mais do que muito ouro depurado; e são mais doces do que o mel e o destilar dos favos. Além disso, por eles se admoesta o teu servo; em os guardar, há grande recompensa.

A palavra perfeita é tradução do termo hebraico que significa inteira, completa, suficiente, transmitindo a idéia de algo abrangente, que cobre todos os aspectos de uma questão. Tudo quanto é essencial que o homem saiba pode ser encontrado na Palavra de Deus. Infere-se que Davi contrasta a Palavra com o raciocínio dos homens, imperfeito, insuficiente e falho.

Além de ser perfeita, a Bíblia restaura a alma. A palavra alma, no hebraico nephesh, refere-se à pessoa interior. A Escritura é tão poderosa e abrangente que pode converter e transformar a pessoa toda, tornando-a precisamente como Deus quer que ela seja.

O alcance e relevância das Escrituras para promover mudança no homem é ampliado pelas demais características expressas no Salmo 19. Elas são um testemunho seguro do que Deus requer de nós, e capacitam a viver de modo sábio, em todas as circunstâncias. Elas indicam com clareza o caminho a seguir e dão propósito firme e prazer à vida do abatido. As Escrituras permanecem para sempre, são imutáveis e, portanto, relevantes para qualquer pessoa em qualquer época da história.

A Palavra de Deus não apenas é perfeita, mas ela promete que aqueles que lhe derem ouvidos serão perfeitos e perfeitamente habilitados para toda boa obra (2 Tm 3.17). No contexto desta declaração, os primeiros treze versículos do capítulo 2 da Segunda Epístola a Timóteo, o apóstolo Paulo lista um série de problemas que exemplificam bem aquilo com que os conselheiros bíblicos costumam se deparar. Muitas pessoas que buscam ajuda o fazem por lutarem com dificuldades que surgem de atitudes, desejos e ações pecaminosos ou pelo impacto de se associarem com pessoas cujo estilo de vida é pecaminoso. São seres “egoístas, avarentos, jactanciosos, arrogantes, blasfemadores, desobedientes aos pais, ingratos, irreverentes, desafeiçoados, implacáveis, caluniadores, sem domínio de si, cruéis, inimigos do bem, traidores, atrevidos, enfatuados, mais amigos dos prazeres que amigos de Deus” (v.2-4), pessoas “conduzidas de várias paixões” (v. 6), que “resistem à verdade de Deus” (v.8), e que irão de mal a pior (v. 13).

Onde encontrar recursos para lidar com esta lista de problemas? Paulo responde nos versículos 14 a 17. Em poucas palavras, ele afirma a adequação plena da Bíblia para o ministério pessoal que promove mudança de acordo com o plano de Deus: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra” (2Tm 3.16-17).

30 Neste artigo não defendemos a suficiência da Palavra em comparação a teorias seculares. Faremos isso em outro texto. 31 Boa parte das implicações destes textos para o aconselhamento bíblico, mesmo quando não fazemos referência direta à fonte, provém dos comentários de Wayne Mack em The distinguishing features of Christian counseling. The Master’s Current, v.4, n.3, 1998, p. 6, e de John MacArthur em Nossa suficiência em Cristo: três influências letais que minam a sua vida espiritual. São José dos Campos, SP: Fiel, 1995.

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A Palavra de Deus é útil para ensinar, ou seja, estabelecer um padrão de certo e errado em todos os aspectos da vida. Ela também é útil para repreender, mostrar de modo convincente o erro em nossos pensamentos e ações, motivações e atitudes, de modo que nos disponhamos ao arrependimento. Em terceiro lugar, ela é útil para corrigir, ou seja, literalmente endireitar. Após derrubar por terra nosso estilo errado de vida mediante repreensão, as Escrituras nos mostram como mudar e nos firmam novamente para que andemos no caminho de Deus. Por último, ela é útil para educar, ou seja, prover um treinamento estruturado em novos padrões de vida rumo à maturidade.32

A Palavra contém a revelação de Deus a respeito de Si mesmo, do homem e de como viver uma vida abundante. O ministério de aconselhamento está, portanto, ligado essencialmente a ela não apenas para o desenvolvimento de suas bases teóricas, mas para a prática. Hebreus 4.12 nos diz que a Palavra de Deus: “é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração”. A Palavra de Cristo constitui o âmago do aconselhamento bíblico.

As alternativas

Sempre que se busca realizar uma ação para alcançar determinado alvo, é necessário identificar a alternativa adequada para o procedimento. Vimos que o aconselhamento bíblico possui um alicerce definido na Palavra, mas a sua prática pode assumir características diferentes e ênfases distintas em diferentes lugares. A maneira de ministrar consolo, exortação ou admoestação pode variar de uma comunidade para outra, de uma cultura para outra, de uma pessoa para outra.

Mantida a essência bíblica, não há base para que se busque uma uniformidade ou se afirme um modelo único de aconselhamento bíblico. A dinâmica criativa do ministério de aconselhamento é um reflexo da multiforme sabedoria de Deus expressa na Igreja, e também resultado concreto da diversidade do corpo de Cristo atuando sob a orientação do Espírito. Cada pessoa que transmite o conselho de Deus é única, bem como cada pessoa que o recebe, e Deus ministra de maneira singular por meio de e para cada vida.

O ministério de cada crente é orientado pelos dons espirituais que recebeu. O ministério pessoal também é influenciado por características pessoais diversas que fazem com que cada conselheiro desenvolva um estilo próprio. No entanto, à semelhança do pregador, o conselheiro precisa acomodar sua personalidade à mensagem, e não o inverso. Embora a Bíblia não dê um modelo sistematizado de aconselhamento, qualquer estilo pessoal deve emergir da aplicação dos princípios bíblicos e ser constantemente testado também à luz de princípios bíblicos.

O aconselhado não só possui características pessoais, mas também enfrenta circunstâncias singulares que influem no processo. Ele precisa receber a verdade das Escrituras sob medida para ele. A escolha das perguntas que fazemos, das ilustrações que usamos, do tom de voz, do ambiente em que aconselhamos, dependem de com quem estamos lidando. Nosso aconselhamento não terá sempre a mesma forma.

Além das características pessoais, um outro elemento merece destaque quando falamos em diversidade: a cultura. Entre as várias culturas há diferenças no estilo de comunicação, no significado da linguagem não-verbal, na percepção do espaço interpessoal, na expressão da afetividade. Embora a essência do aconselhamento bíblico seja supracultural, o aconselhamento é cultural em sua aplicação. Isso exige que o conselheiro seja sensível para perceber a própria cultura, identificar a cultura do aconselhado e lidar adequadamente com a diversidade de expressões.

A cultura de um grupo étnico ou de uma faixa etária, por exemplo, insere-se em um contexto cultural mais amplo que também precisa ser identificado. Para saber como ministrar de modo relevante hoje, o conselheiro bíblico precisa ser como os filhos de Issacar, “conhecedores da época, para saberem o que Israel devia fazer” (1Cr 12.32). Cabe-lhe avaliar e julgar a cultura à luz da Palavra de Deus, e ministrar com sensibilidade e de modo

32Queremos deixar claro que o aconselhamento bíblico não faz da Bíblia um objeto mágico. A mudança em vidas acontece em Cristo, pela obra do Espírito Santo.

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comunicativo, mas com fidelidade a Deus. Nas palavras de Edward Pentecost, “A mensagem de Deus é supracultural, e significativa em cada cultura. Ela está acima de todas as culturas, e pode ser entendida em todas elas”.33 A Palavra de Deus nos permite-nos alcançar a diversidade cultural, ao mesmo tempo que nos adverte para que nunca entremos em acordo com a estultícia, mas a refutemos com sabedoria, para que a insensatez seja exposta (Pv 26.4,5).

O aconselhamento bíblico atua não apenas na diversidade pessoal e cultural, mas também na diversidade estrutural. O seu campo de base é o contexto da igreja local, mas a estrutura pode variar de igreja para igreja, além de se estender também a hospitais e escolas, entre outros, cada um destes com exigências próprias.

“Alguns gostariam de ter um livro de receitas, com instruções para todas as ocasiões e pessoas”, comenta Powlison, mas “erram em não adaptar a mensagem de Deus, e em ignorar diferenças culturais e individuais”.34 A Bíblia não nos dá uma receita para forma e estrutura, mas ela nos fornece a essência de que precisamos, além de que está repleta de ilustrações de como ministrar esta essência a pessoas com problemas específicos e em situações e estruturas específicas.

Falando sobre diferenças e semelhanças do seres humanos na diversidade de contextos e culturas, David Hesselgreve destaca aspectos relevantes. Embora não concordemos com sua abordagem do aconselhamento, que não enfatiza a suficiência da Palavra, ele nos ajuda no esclarecimento da questão cultural.

Todos os seres humanos ao redor do mundo compartilham algumas semelhanças (por ex., a experiência de nascimento, crescimento etc.). Os seres humanos compartilham algumas coisas com seu grupo cultural (linguagem, expectativas etc). Cada ser humano por sua vez é único, uma impressão digital, uma história de vida, um estilo de vida....O conselheiro quando se encontra com o aconselhado depara-se com os três aspectos − o universal, o específico do grupo, o singular....Cada homem é em certos aspectos (a) como todos os outros homens; (b) como alguns outros homens; (c) como nenhum outro homem.35

Costumamos enfatizar diferenças, porém pouco se tem falado do que há em comum entre todas as pessoas, em todo tempo e lugar. A Bíblia é relevante em nossos dias por mostrar que pessoas e situações diferem umas das outras, e ainda assim possuem aspectos em comum: a natureza do homem, a natureza dos problemas e a solução de Deus para os problemas do homem não mudam.

Um dos pontos fortes do aconselhamento bíblico é que ele pode ultrapassar as diferenças. Por exemplo, os cristãos em todo tempo e lugar têm descoberto que “Não sobreveio tentação a vocês que não fosse comum aos homens” (1Co 10.13, NVI). As diferenças sociais, culturais, históricas e individuais são reais e merecem atenção. Certamente eram reais entre os israelitas e os coríntios, e entre eles e a população brasileira no início do século XXI. No entanto, Paulo conta a história dos israelitas, e acrescenta: “Estas coisas lhes sobrevieram como exemplos e foram escritas para advertência nossa” (1Co 10.11).

É preciso que saibamos identificar e lidar com as preferências de forma e a diversidade de estruturas. Por exemplo, aconselhar sentado atrás de uma mesa e fazendo anotações ou aconselhar sentado em uma poltrona, lado a lado com o aconselhado, depende de uma preferência pessoal e da circunstância. Um não é mais espiritual do que o outro, mais bíblico do que o outro. No que diz respeito ao alicerce, não podemos abrir mão. Nos demais pontos podemos escolher entre alternativas, lembrando sempre que estas não devem ser elevadas ao status de absolutos. Precisamos aprender a exercer toda a liberdade que a Bíblia nos permite, mas sem acomodar nem comprometer a verdade bíblica. Precisamos ser seguidores da Bíblia na cultura, e não seguidores da cultura que acomodam a Bíblia a ela.

33 PENTECOST, Edward C. Reaching the unreached. South Pasadena, Calif.: William Carey Library, 1974, p.65. 34 Do you have any idea? The Journal of Biblical Counseling, v. 14, n. 1, Fall 1995b, p. 4. 35 HESSELGREVE, David J. Counseling cross-culturally: an introduction to theory and practice for Christians. Grans Rapids, Mich.: Baker, 1984, p. 146-7.

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Uma definição

Uma vez estabelecidos a abrangência e o alvo, a ação e o agente, e o âmago do ministério conforme apresentados na Palavra, e tendo percebido que pode haver alternativas, estamos prontos para definir o aconselhamento bíblico.

Entendemos que aconselhamento bíblico é o aspecto da dinâmica ministerial em que o corpo de Cristo, capacitado pelo Espírito Santo e baseado na Palavra de Deus corretamente interpretada e aplicada a situações específicas, ministra à vida de irmãos visando cooperar com o plano de Deus de conformá-los progressivamente à imagem de Cristo.

Os absolutos que servem de fronteira para o ministério de aconselhamento transcendem tempo e espaço, visto que a Palavra foi entregue aos santos “uma vez por todas” (Jd 3). No entanto, percebemos que ao longo do tempo a Igreja firmou paradigmas estranhos à Palavra no ministério de aconselhamento − valores e fronteiras de atuação dentro dos quais ela entende e encontra soluções para os problemas do homem. De modo geral, quando deixa o alicerce firme, a Igreja tem a tendência de ministrar na área do aconselhamento dentro de quatro paradigmas culturalmente influenciados: (1) identificar o homem como um ser essencialmente sofredor e emocionalmente necessitado, (2) integrar a Bíblia e a ciência do comportamento em busca de um modelo superior, (3) considerar o homem como um ser capaz de se auto-dirigir em busca da solução para seus dilemas e (4) oferecer o aconselhamento como ajuda especializada.

Não se trata apenas de alternativas, visto que os paradigmas estabelecidos no alicerce cultural contrapõem à centralidade de Cristo (1) a centralidade dos problemas do homem, (2) a centralidade das idéias seculares, (3) a centralidade da capacidade do homem para encontrar solução e (4) a centralidade do trabalho de um especialista.

Estas quatro questões não são os únicos aspectos que merecem ser avaliados no aconselhamento bíblico à luz da Palavra de Deus. Outros mais necessitam ser considerados, mas certamente estas são questões cruciais para o momento atual e revelam a importância de estabelecer um alicerce firme para o ministério de aconselhamento e definir a tarefa.

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A Palavra suficiente de Cristo

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A CENTRALIDADE DE CRISTO

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