Alvaro Nascimento Trabalho Completo

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    Tese de Doutorado

    Propaganda de Medicamentos.

    possvel regular?

    lvaro Csar NascimentoOrientadora:Jane Dutra Sayd

    ___________________________________________

    rea de concentrao:Planejamento, Administrao e Polticas___________________________________

    2007

    Propaganda de Medicamentos. possvel regular?

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    UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

    INSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

    PROPAGANDA DE MEDICAMENTOS.

    POSSVEL REGULAR?

    lvaro Csar Nascimento

    Tese apresentada como requisito parcial para obteno

    do grau de Doutor em Sade Coletiva, Programa dePs - Graduao em Sade Coletiva rea de concentrao

    em Poltica, Planejamento e Administrao em Sade, do

    Instituto de Medicina Social da Universidade

    do Estado do Rio de Janeiro

    Orientadora : Professora Jane Dutra Sayd

    Rio de Janeiro

    2007

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    C A T A L O G A O N A F O N T E U E R J / R E D E S I R I U S / C B C

    N244 Nascimento, lvaro Csar.Propaganda de medicamentos. possvel regular? / lvaro Csar Nascimento.

    2007.286f.Orientadora: Jane Dutra Sayd.Tese (doutorado) Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de

    Medicina Social.1. Anncios Medicamentos Brasil - Teses. 2. Propaganda Teses. 3. Indstria

    farmacutica Teses. 4. Vigilncia sanitria Teses. 5. Medicamentos Marketing Teses. I. Sayd, Jane Dutra. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Instituto deMedicina Social. IV. Ttulo.

    CDU659.1____________________________________________________________________________

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    A Annette Nascimento (em memria),

    por todos os aprendizados e, em particular

    por me ensinar o que certo e o que errado.

    A Daniel Nascimento, esperana de

    continuidade, pelo estmulo.

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    Agradecimentos

    Este trabalho no resultado apenas de um esforo individual. Ele nasce de

    significativas contribuies que recolhi durante minha trajetria profissional, acadmica

    e como cidado, ao lidar com pessoas (infelizmente algumas no esto mais entre ns) einstituies que foram fundamentais a essa construo.

    Consciente de que impossvel listar todos que de uma forma ou de outra me

    acrescentaram conhecimentos e experincias essenciais forma de ver o mundo e nele

    atuar - particularmente em relao rea da sade e da assistncia farmacutica -

    preciso expressar meu agradecimento por ter convivido e aprendido com pessoas como

    Antonio Sergio da Silva Arouca (1940-2003), Davi Capistrano da Costa Filho (1948-

    2000), Suely Rozenfeld, Jorge Zepeda Bermudez, Vera Lucia Edais Pepe, Vera Lcia

    Luiza, Claudia Osrio, Rosany Bochner, Jos Ruben de Alcntara Bonfim, Norberto

    Rech, Jos Augusto Cabral de Barros, Jussara Calmon, Guacira Corra de Matos, Jorge

    Cavalcanti de Oliveira, Mirian Ribeiro Leite Moura, Luiz Fernando Chiavegatto, Alba

    Lvia Andrade Pereira, Selma Castilho, Andr Reis e Elizabeth Gonzaga.

    De forma coletiva, preciso registrar a contribuio das equipes de trabalho das quais

    participei e eventualmente dirigi, como a do Programa Reunio, Anlise e Difuso deInformao sobre Sade (Radis), Descentralizao on Line (DOL) e do Centro

    Colaborador em Vigilncia Sanitria (Cecovisa) da Escola Nacional de Sade Pblica

    da Fiocruz. Um agradecimento especial merece ser feito aos meus colegas do

    Departamento de Cincias Sociais (DCS) da Ensp/Fiocruz, com quem tenho tido a

    oportunidade de unir uma convivncia agradvel, companheira e produtiva.

    Entre as instituies com as quais me relacionei e muito aprendi, preciso registrar a

    Escola Nacional de Sade Pblica da Fiocruz - onde trabalho - e o Conselho Regional

    de Farmcia do Estado do Rio de Janeiro, onde tive o prazer de editar por mais de dez

    anos a revista RIOPHARMA.

    Ainda entre as instituies, dirijo um agradecimento especial direo da Associao

    Brasileira de Ps-Graduao em Sade Coletiva (Abrasco), que me confiou sua

    representao, nos ltimos dois anos, na Cmara Setorial de Propaganda de Produtos

    Sujeitos Vigilncia Sanitria da Anvisa, frum que me propiciou acompanhar de pertoa dinmica e os interesses que ali se manifestam, com impacto direto no modelo de

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    regulao adotado no setor. No exagero afirmar que, sem ocupar a cadeira que cabe

    Abrasco naquele espao, este trabalho no seria o mesmo.

    Agradeo profundamente Direo, meus professores (do Mestrado e do Doutorado) e

    aos funcionrios do Instituto de Medicina Social da UERJ, pelo acolhimento, ateno e

    principalmente pelo ambiente acadmico arejado e aberto ao pensamento crtico e ao

    debate de idias. No IMS, ns, alunos, encontramos as condies ideais para

    transformar nossa experincia profissional, social e poltica em produo acadmica. A

    Jos Luis Fiori, Kenneth Carmargo, George Kornis, Hsio Cordeiro, Jos Noronha,

    Laura Tavares, Madel Luz, Ricardo Tavares, Ruben Mattos e Roseni Pinheiro, o meu

    reconhecimento e profundo agradecimento, extensivo a Sulamis Daim, que alm de

    minha professora no Mestrado contribuiu enormemente sendo a ledora desta Tese.

    Meu agradecimento e minha homenagem carinhosa a Jane Dutra Sayd. Mais que minha

    professora e orientadora no Mestrado e no Doutorado, agradeo por sua cumplicidade e

    responsabilidade direta na construo desta Tese. O resultado deste processo criativo

    que acabamos construindo uma fraternal e cada dia mais slida amizade, que

    carregaremos para sempre, comprovando que o IMS muito mais que uma instituio

    acadmica de referncia.

    Preciso homenagear, ainda, os amigos queridos que de uma forma ou de outra

    contriburam com sua fora e estmulo para que eu conseguisse completar este percurso.

    Em nome de Alex Molinaro, Marcia Garcia, Andr Malho, Ary Carvalho, Lilian

    Fonseca, Claudia Andrade, Luciana Mota, Celso Coelho, Mauro Paiva e Tatiana

    Lassance, agradeo e homenageio a todos.

    Finalmente, agradeo a presena amorosa, a ajuda e o estmulo de Yrlene VelosoCherques. Produzir uma tese tendo ao lado uma companheira deste quilate um

    presente. A ela, meu eterno agradecimento, extensivo a seus dois filhos, Thiago e Pedro.

    A meu filho, Daniel Nascimento, agradeo o estmulo, sua cumplicidade, seu carinho,

    sua presena e sua prpria existncia, que h 27 anos me d fora e sentido.

    Rio de Janeiro, dezembro de 2007.

    lvaro Csar Nascimento

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    Meu sonho, h muito tempo, produzir medicamentopara as pessoas saudveis. Assim, a minha empresa

    poder vender produtos para todo mundo

    Henry Gadsden (Diretor da Merck)

    O dado mais alarmante que a maior proporo dessas infraes (...)

    tem a ver com a veiculao de informaes enganosas. (...)

    Tais quebras de conduta confirmam nossa opinio de que

    a atual propaganda de medicamentos no tem priorizado os interesses dos

    consumidores, sendo focada no lucro atravs do aumento da receita das vendas.

    Relatrio da Consumers International

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    RESUMO

    A regulao da propaganda de medicamentos no Brasil incorpora quatro fragilidades: 1.

    A monitorao, fiscalizao e punio de irregularidades so realizadas a posteriorido

    acometimento da infrao (quando a populao j foi submetida a risco sanitrio); 2. As

    multas cobradas pela Anvisa tm valor irrisrio frente aos investimentos do marketing

    farmacutico; 3. No h mecanismo que impea que mesmo os valores irrisrios das

    multas sejam repassados aos preos dos produtos, onerando o consumidor; 4. A frase

    tida como de alerta - A PERSISTIREM OS SINTOMAS O MDICO DEVER SER

    CONSULTADO - ao invs de conscientizar a populao a respeito dos riscos da

    automedicao, estimula o uso de medicamentos sem receita, aconselhando a busca de

    um mdico apenas no caso da persistncia dos sintomas. Segundo dados da Anvisa e de

    estudos acadmicos, 90% da publicidade exibida contm irregularidades. Assim, a RDC

    102/2000 da Anvisa, que regulamenta o setor, se constitui em um aparente sistema de

    regulao, que beneficia o infrator e mantm a populao sob risco.

    Este trabalho analisa o conceito e o uso dos mecanismos de marketing na busca de se

    elevar a comercializao de produtos farmacuticos (no que se denomina produo de

    doenas), examina os conceitos de propaganda, medicamento, regulao e

    manipulao; percorre alguns estatutos internacionais referentes ao setor da publicidade

    de medicamentos (com foco nas diretivas da Unio Europia) e expe a avaliao de

    organismos europeus de defesa do consumidor sobre o desempenho destas normas.

    Ao final, este estudo expe as posies do setor regulado brasileiro (indstria, agncias

    de publicidade e meios de comunicao) frente s posies de rgos de defesa dos

    consumidores, da academia e da sociedade organizada no mbito do SUS, para propor

    como alternativa um modelo regulador que supere as fragilidades do atual.

    Palavras-chave: vigilncia sanitria, propaganda, medicamentos, regulao, mdia.

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    ABSTRACT

    Four frailties incorporate the regulation of drug advertising in Brazil: 1. The monitoring,

    overseeing and punishment of irregularities occur after the infraction has been

    committed (when the population has already been submitted to sanitary risks); 2. The

    fines imposed by Anvisa (Brazilians National Health Surveillance Agency) have

    ludicrous values compared to the sums destined for drug advertising; 3. There is no

    mechanism to prevent that those same ludicrous sums be passed on to consumer prices;

    4. The alert phrase: Should the symptoms persist, a medical doctor must be consulted

    instead of enlightening the population on the risks of self-medication, stimulates the

    usage of medication without prescription, suggesting the search for medical advice only

    in case the symptoms endure. According to data collected by Anvisa and academic

    studies, 90% of all the drug marketing in Brazil contains irregularities. Thus, Anvisas

    Resolution 102/2000 (that legislates on the sector), constitutes itself only as an apparent

    regulation system, that benefits the offender and places the population under risk.

    This work analyses the marketing mechanisms used for increasing commercialization of

    pharmaceuticals (in whats called disease mongering), as well as their recent uses;

    examines the concepts of medication, regulation and manipulation;covers a few of the

    drug advertising international codes (focusing on the European Union directives) and

    exposes the evaluation of some of the European consumer defense organisms on the

    effective implementation of these codes.

    Finally, this study exposes the positioning of the regulated agents in Brazil (industry,

    publicity agencies and media) contrasting it with those of the consumer defense

    organisms, the academy and the organized society (in the scope of the Brazilian

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    Universal Public Health System), in order to propose an alternative regulation model

    that overcomes the weaknesses of the current system.

    Keywords: sanitary surveillance, advertising, drugs, regulation, media.

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    LISTA DE SIGLAS

    ABA - Agncia Brasileira de Anunciantes

    ABAP - Associao Brasileira de Agncias de Publicidade

    ABEM - Associao Brasileira de Educao Mdica

    ABERT - Associao Brasileira de Empresas de Rdio e Televiso

    ABIA - Associao Brasileira da Indstria de Alimentos

    ABIHPEC - Associao Brasileira da Indstria de Higiene Pessoal, Perfumaria eCosmticos

    ABIMED - Associao Brasileira dos Importadores de Equipamentos, Produtos eSuprimentos Mdico-Hospitalares

    ABIMIP - Associao Brasileira da Indstria de Medicamentos Isentos de Prescrio

    ABIMO - Associao Brasileira da Indstria de Artigos e Equipamentos Mdicos,Odontolgicos, Hospitalares e de Laboratrio

    ABIPLA - Associao Brasileira das Indstrias de Produtos de Limpeza e Afins

    ABRASCO - Associao Brasileira de Ps-graduao em Sade ColetivaABTA - Associao Brasileira de TV por Assinatura

    ACCME - Conselho de Acreditao para a Educao Mdica Continuada

    AIS - Ao Internacional p-ara a Sade

    ALANAC - Associao dos Laboratrios Farmacuticos Nacionais

    ANATEL - Agncia Nacional de Telecomunicao

    ANDI - Agncia de Notcias dos Direitos da Infncia

    ANEEL - Agncia Nacional de Energia Eltrica

    ANER - Associao Nacional de Editores de Revistas

    ANFARMAG - Associao Nacional de Farmacuticos Magistrais

    ANJ - Associao Nacional de Jornais

    ANP - Agncia Nacional de Petrleo

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    ANS - Agncia Nacional de Sade Complementar

    ANVISA - Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    ASFOC - Associao dos Servidores da Fundao Oswaldo Cruz

    ASREL - Assessoria de Relaes Institucionais

    CAPES - Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

    CBDL - Cmara Brasileira de Diagnstico Laboratorial

    CDC - Cdigo de Defesa do Consumidor

    CEATRIM - Centro de Apoio Terapia Racional pela Informao sobre Medicamentos

    CEBES - Centro Brasileiro de Estudos da Sade

    CEBRIM - Centro Brasileiro de Informao sobre Medicamentos

    CECOVISA - Centro Colaborador em Vigilncia Sanitria

    CEE - Comunidade Econmica Europia

    CFF - Conselho Federal de Farmcia

    CFM - Conselho Federal de MedicinaCFN - Conselho Federal de Nutricionistas

    CFO - Conselho Federal de Odontologia

    CI - Consumers International

    CNI - Confederao Nacional de Indstria

    CNS - Conselho Nacional de Sade

    COMIN - Ncleo de Assessoramento em Comunicao Social e Institucional

    CONAR - Conselho Nacional de Auto-Regulamentao Publicitria

    CONASEMS - Conselho Nacional de Secretrios Municipais de Sade

    CONASS - Conselho Nacional de Secretrios de Sade

    CP - Consulta Pblica

    CRF/RJ - Conselho Regional de Farmcia do Estado do Rio de Janeiro

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    CVS/SES/RJ - Centro de Vigilncia Sanitria as Secretaria de Estado de Sade do Riode Janeiro

    DCB - Denominao Comum Brasileira

    DCI - Denominao Comum Internacional

    DE - Disfuno Ertil

    DF - Distrito Federal

    DOU - Dirio Oficial da Unio

    DPZ - Duailib, Petit e Zaragoza Propaganda

    DSF - Disfuno Sexual Feminina

    ECR - Ensaios Clnicos Randomizados

    EFPIA - Federao Europia das Associaes Farmacuticas Industriais

    EFPIA - Federao Europia das Associaes Farmacuticas Industriais

    ENSP - Escola Nacional de Sade Pblica Srgio Arouca

    EPSJV - Escola Politcnica de Sade Joaquim Venncio

    ES - Esprito Santo

    EUA - Estados Unidos da Amrica

    EURATOM - Tratado da Comunidade Econmica Europia

    FDA - Food and Drug Administration

    FEBRAFARMA - Federao Brasileira da Indstria Farmacutica

    FENAFAR - Federao Nacional dos Farmacuticos

    FENAPRO - Federao Nacional das Agncias de Propaganda

    FENEC - Federao Nacional de Empresas Exibidoras Cinematogrficas

    FIOCRUZ - Fundao Oswaldo Cruz

    GFIMP/ANVISA - Gerncia de Fiscalizao e Controle de Medicamentos e Produtos

    GGIMP/ANVISA - Gerncia Geral de Inspeo e Controle de Medicamentos

    GO - Gois

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    GPROP - Gerncia de Fiscalizao e Monitoramento de Propaganda, Publicidade,Promoo e Informao de Produtos Sujeitos Vigilncia Sanitria

    HAI - Health Action International

    IAB - Interactive Advertising Bureau/Brasil

    IBFAN - Rede Internacional em Defesa do Direito de Amamentar

    IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    ICICT - Instituto de Comunicao e Informao Cientfica e Tecnolgica

    ICRT-CSR - Organizao Internacional de Pesquisa e Testes deConsumo/Responsabilidade Social Empresarial

    IDEC - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

    IFPMA - Federao Internacional de Associaes e Produtores Farmacuticos

    IMS/UERJ - Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro

    IND - Investigational New Drug

    INMETRO - Instituto Nacional de Metrologia

    INTERFARMA - Associao da Indstria Farmacutica de PesquisaMARE - Ministrio da Administrao e Reforma do Estado

    MC - Ministrio das Comunicaes

    MG - Minas Gerais

    MIP - Medicamentos Isentos de Prescrio

    MJ - Ministrio da Justia

    MS - Ministrio da Sade

    MS - Ministrio da Sade

    OMS - Organizao Mundial de Sade

    OPAS - Organizao Panamericana de Sade

    PB - Paraba

    PDC - Propaganda Direta ao Consumidor

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    PhRMA - Associao de Pesquisadores e Fabricantes Farmacuticos dos EstadosUnidos

    PLOS MEDICINE - Public Library of Science

    PR GENRICOS - Associao Brasileira das Indstrias de Medicamentos Genricos

    RDC - Resoluo de Diretoria Colegiada

    RN - Rio Grande do Norte

    RS - Rio Grande do Sul

    RSC - Responsabilidade Social Corporativa

    SBTOX - Sociedade Brasileira de Toxicologia

    SC - Santa Catarina

    SE - Sergipe

    SINITOX - Sistema Nacional de Informaes Txico-Farmacolgicas

    SNVS - Sistema Nacional de Vigilncia Sanitria

    SOBRAVIME - Sociedade Brasileira de Vigilncia de Medicamentos

    SUS - Sistema nico de Sade

    THDA - Transtorno de Hiperatividade e Dficit de Ateno

    TRH - Terapia de Reposio Hormonal

    UE - Unio Europia

    UFF - Universidade Federal Fluminense

    USP - Universidade de So Paulo

    VISA - Vigilncia Sanitria

    WHO - World Health Organization

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    SUMRIO

    1 APRESENTAO.................................................................................... 20

    2 INTRODUO.......................................................................................... 28

    3 CAPTULO 1 - ASPECTOS HISTRICOS: SURGE O MONOPLIO DACURA E DA VIDA............................................................................................ 31

    4 CAPTULO 2 - PARMETROS CONCEITUAIS: O QUE MARKETING,MEDICAMENTO, REGULAO E MANIPULAO. ..................................... 45

    4.1 Marketing .................................................... ........................................................... ....................45

    4.1.1- Necessidades, desejos e demandas.............................................................................................494.1.2 - Valor, satisfao e qualidade......................................................................................................524.1.3 - Mercado atual e potencial...........................................................................................................524.1.4 Biomarcas: o marketing baseado em experincia versuso marketing baseado em evidncias.....54

    4.2 Medicamento .................................................... ........................................................... ....................574.2.1 Medicamento e risco sanitrio ............................................................ ....................................... 61

    4.3 REGULAO.................................................................................................................................64

    4.4 - MANIPULAO.............................................................................................................................65

    5 CAPTULO 3 - EXPANSO DE MERCADO: DEZ EXEMPLOS DE USODA PROPAGANDA COMO PRODUTORA DE DOENAS ............................ 71

    5.1 Pfizer altera definio de disfuno ertil para elevar mercado ................................................. 78

    5.2 O Transtorno de Hiperatividade e Dficit de Ateno (THDA) como objeto de marketing nasescolas 84

    5.3 A disfuno sexual feminina: como medicalizar a busca do prazer............................................87

    5.4 O transtorno bipolar e a estabilizao do humor. .......................................................... ..........93

    5.5 O papel da mdia na produo da Sndrome das Pernas Inquietas .......................................... 101

    5.6 A produo da Terapia de Reposio Hormonal na Menopausa..............................................106

    5.7 Inibidores de Colinesterase: um medicamento a procura de uma doena para curar............108

    5.8 A produo de doena junto aos estudantes de Medicina e Farmcia......................................116

    5.9 possvel regular a produo de doena?...............................................................................119

    5.10 Brasil: a integralidade e a universalidade do SUS como ferramentas do marketingfarmacutico............................................................................................................................................125

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    6 CAPTULO 4 - A VIGILNCIA SANITRIA E AS EXPERINCIASREGULADORAS INTERNACIONAIS NA REA DA PROPAGANDA DEMEDICAMENTOS.......................................................................................... 130

    6.1 Os critrios ticos de propaganda de medicamentos preconizados pela OMS.........................131

    6.2 As Diretivas reguladoras da Unio Europia..............................................................................132

    6.3 - A viso da Consumers International e o real impacto das normas reguladoras em sete paseseuropeus. .......................................................... ............................................................ ...........................143

    7 CAPTULO 5 - A LEGISLAO REGULADORA DA PROPAGANDA DEMEDICAMENTOS PARA GRANDE PBLICO NO BRASIL......................... 154

    7.1 - A criao da Anvisa e seu papel regulador na propaganda de medicamentos .........................160

    7.2 - A construo, implementao e os resultados da RDC 102/2000 da Anvisa.............................165

    7.3 - O Projeto de Monitorao da Propaganda de Medicamentos da Anvisa..................................171

    7.4 - O controle social na monitorao da propaganda de medicamentos.....................................186

    8 CAPTULO 6 - A CONSULTA PBLICA 84/2005 E OS INTERESSES DECADA SETOR................................................................................................ 198

    8.1 - Setor regulado reage e Anvisa paralisa processo de mudana...................................................202

    8.2 - Paralisada a CP 84/2005, Anvisa passa a ver avanos metericos na monitorao..............241

    8.3 - Regulao versus educao para a sade.................................................................................244

    9 CONCLUSO ............................................................................................. 258

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    1 APRESENTAO

    Este trabalho d um passo adiante na pesquisa por mim realizada, nos anos de 2002 e

    2003, com vistas produo de minha dissertao do Curso de Mestrado do

    Departamento de Polticas, Planejamento e Administrao em Sade (DPPAS) do

    Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj):

    AO PERSISTIREM OS SINTOMAS O MDICO DEVER SER CONSULTADO.

    ISTO REGULAO?.

    Naquela pesquisa, analisei os interesses da indstria farmacutica, agncias de

    publicidade, empresas de comunicao e do comrcio varejista, com vistas a elevar o

    consumo de produtos farmacuticos no Pas, atravs da disseminao da sua

    propaganda para o grande pblico. O estudo examinou de forma crtica a presso

    mercadolgica destinada a criar supostas necessidades teraputicas que levam aoconsumo de produtos que possuem significativos riscos, com possibilidade de que se

    multipliquem reaes adversas com seu uso incorreto, irracional, abusivo e muitas vezes

    perigoso.

    Com base na anlise de 100 peas publicitrias de medicamentos, a pesquisa comparou

    o contedo destes anncios (imagens, texto e indicaes de cada produto) com as

    disposies da Resoluo 102/2000 da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    (Anvisa), que tentava ento em seu terceiro ano de vigncia - estabelecer limites

    propaganda farmacutica. Ao final da pesquisa, conclumos que todas as 100 peas

    publicitrias analisadas infringiam pelo menos um artigo da referida norma.

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    No estudo desenvolvido entre 2002 e 2003, uma das concluses foi a de que a RDC

    102/2000 da Anvisa apresenta substanciais fragilidades em pelo menos cinco aspectos.

    Estes aspectos passam a ser, na pesquisa aqui desenvolvida, tomados como pressupostos

    para a anlise das aes de marketing e de propaganda de medicamentos para grande

    pblico no Brasil. Uma pergunta resume o esforo que orienta este estudo: quando se

    trata de propaganda de medicamentos, possvel regul-la? A esta pergunta, pode-se

    acrescentar outra: uma boa legislao reguladora na rea da propaganda de

    medicamentos para grande pblico capaz de assegurar os resultados esperados, no

    sentido de se proteger a sade dos agravos resultantes do uso incorreto, abusivo,

    irracional ou inconsciente do medicamento?

    Os cinco pressupostos deste estudo, portanto, refletem literalmente o resultado da

    pesquisa anterior, que identificou no modelo regulador brasileiro, consubstanciado na

    RDC 102/2000 da Anvisa, cinco significativas fragilidades, listadas a seguir:

    1a A RDC 102/2000 da Anvisa incorpora um modelo de ao reguladora cujas

    iniciativas, tomadas no campo da proteo sade, so feitas a posteriori, isto , aps a

    veiculao da pea publicitria pelos mais variados meios de comunicao, quando o

    risco sanitrio j se estabeleceu. Assim, entre a veiculao da publicidade de

    determinado medicamento no mercado - atravs da TV, rdio, jornal, revista, outdoor,

    cinema, teatro, cartazes em estabelecimentos, busdoor, pontos de nibus, folhetos

    promocionais, placas em campos de futebol, etc. - e a tomada de eventuais medidas

    coercitivas no mbito do modelo regulador, nos casos de se constatar irregularidades,

    transcorre um perodo de tempo que transforma a ao reguladora em uma atividade que

    desconsidera a importncia da preveno ao agravo.

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    2a Esta fragilidade do modelo regulador tem sua magnitude agravada pela grande

    quantidade de infraes cometidas pelos responsveis pela veiculao de peas

    publicitrias de medicamentos: a indstria farmacutica, as agncias de publicidade, os

    veculos de comunicao e o comrcio varejista de produtos farmacuticos. Segundo a

    Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (Anvisa), entre 6.004 propagandas avaliadas

    num perodo entre 2001 e 2004, mais de 90% delas desconsideravam o texto regulador

    (www.anvisa.gov.br/divulga/noticias/2005/261205_1_texto_de_esclarecimento.pdf).

    Vale ressaltar o fato que o artigo mais infringido , justamente, o que obriga a citao

    das contra-indicaes que aquele determinado produto possui.

    3a - As multas efetivamente arrecadadas pela Anvisa, quando ocorrem as

    irregularidades, tm valor irrisrio frente ao total de gastos com propaganda realizados

    pelo setor, o que transforma a ao punitiva em mera formalidade.

    4 a- No h mecanismos que impeam que mesmo os valores irrisrios cobrados nas

    multas aplicadas pela Agncia sejam transferidos pela indstria para o preo dos

    medicamentos (prtica comum relativa ao conjunto dos demais gastos com publicidade

    de seus produtos), sendo finalmente pagos pelo prprio consumidor.

    5a- Ao tornar obrigatria a insero da frase AO PERSISTIREM OS SINTOMAS O

    MDICO DEVER SER CONSULTADO ao final de cada propaganda, o atual

    modelo regulador estimula pelo menos o primeiro consumo incorreto, inconsciente ou

    irracional de medicamentos. Na verdade, a mensagem inserida aps cada anncio

    publicitrio deseduca a populao, no sentido de que fortalece a j existente cultura da

    automedicao, pois transmite a mensagem de que PRIMEIRO TENTE POR SI

    MESMO ENCONTRAR O MEDICAMENTO QUE LHE TRAGA A CURA,

    COMPRANDO O PRODUTO QUE JULGAR MAIS CONVENIENTE. CASO NO

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    OBTENHA SUCESSO, PROCURE O PRESCRITOR COMPETENTE PARA

    AJUD-LO. Essa lgica contida no modelo regulador presta, na verdade, um

    inestimvel papel indstria, s empresas de mdia e ao comrcio de medicamentos, e

    no sociedade a quem deveria proteger. (NASCIMENTO, 2005, p. 77).

    A concluso a que cheguei naquela pesquisa - seja em relao magnitude das

    irregularidades, seja em relao pouca eficcia das aes reguladoras patrocinadas

    pela Anvisa - indicava que o problema no se limita falta de rigor na esfera da

    fiscalizao. A questo mais ampla e se localiza na prpria forma como se estrutura o

    modelo regulador vigente. Mesmo que a Anvisa multiplicasse sua atuao, as

    propagandas irregulares continuariam a ser reprimidas a posteriori (quando o risco

    sanitrio j est estabelecido); as multas continuariam a ser de um valor irrisrio

    comparado ao total de gastos com publicidade; seus custos continuariam sendo

    repassados aos preos dos medicamentos e pagos pelo consumidor; e a advertncia

    colocada a cada final de propaganda permaneceria estimulando o uso inconsciente,

    irracional, abusivo e perigoso de medicamentos. (NASCIMENTO, 2005, p.78)

    OBJETIVO GERAL

    O objetivo geral desta tese descrever e analisar dados e informaes sobre as polticas

    pblicas implementadas no Brasil que impactam a propaganda de medicamentos.

    Especial ateno dada aos aos mecanismos utilizados pelo marketing farmacutico

    diretamente junto ao grande pblico, no sentido de elevar a venda destes produtos. A

    tese parte de alguns pressupostos que indicam a existncia de significantes fragilidades

    no atual modelo regulador da propaganda de medicamentos no Brasil. E prope um

    debate sobre iniciativas no campo regulador capazes de efetivamente superar estas

    fragilidades, com base no conjunto da Poltica Nacional de Sade, nos princpios e

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    diretrizes do Sistema nico de Sade (Lei 8.080/90) e nas diretrizes preconizadas pela

    Poltica Nacional de Medicamentos (Portaria 3.916/98 do Ministrio da Sade).

    OBJETIVOS ESPECFICOS

    Entre os objetivos especficos desta pesquisa esto:

    3.1 Analisar alguns exemplos das prticas de marketing patrocinadas pela indstria

    farmacutica, agncias de publicidade, veculos de comunicao e comrcio varejista de

    medicamentos, no sentido de elevar o consumo destes produtos atravs de mensagens

    veiculadas diretamente para o grande pblico;

    3.2 - Analisar o impacto regulador de dois estatutos internacionais que impactam o

    setor: as Diretivas da Unio Europia que tratam de propaganda enganosa e a que

    estabelece um cdigo comunitrio relativo aos medicamentos para uso humano.

    3.3 - Analisar a viso de entidades de defesa do consumidor europias em relao

    eficcia destes estatutos no que eles se propem a proteger a sade dos cidados atravs

    da diminuio do risco sanitrio representado pela propaganda de medicamentos

    diretamente veiculada para o grande pblico;

    3.4 - Analisar a legislao reguladora brasileira no setor de propaganda de

    medicamentos (leis, decretos e cdigos que tratam do tema, alm da RDC 102/2000 da

    Anvisa), comparando-a com modelos reguladores adotados em outros pases, com foco

    especial no que estas legislaes tratam da propaganda de medicamentos dirigida ao

    grande pblico;

    3.5 Analisar especificamente o processo da Consulta Pblica 84/2005 da Agncia

    Nacional de Vigilncia Sanitria (Anvisa), que se propunha a alterar o atual modelo

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    regulador da propaganda de medicamentos no Brasil, identificando nele as diferentes

    linhas de argumentao e interesses que cercam o tema, assim como as posies dos

    principais setores envolvidos, especificamente os que representam a indstria

    farmacutica, os meios de comunicao, as agncias de publicidade, os consumidores e

    a comunidade cientfica.

    No Brasil, a magnitude dos problemas j causados pela delicada relao entre a

    indstria farmacutica, as estratgias de marketing e as polticas voltadas para a

    promoo do uso correto do medicamento leva a que o Estado, nos ltimos 30 anos,

    busque regular a propaganda de medicamentos atravs de leis, decretos e cdigos.

    Todos, em maior ou menor grau, tm sido desrespeitados pelo marketing

    medicamentoso (NASCIMENTO, 2005).

    Uma alternativa ao modelo regulador atual o desafio que essa pesquisa pretende

    enfrentar. Vale frisar que a prpria Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (Anvisa)

    depois de resistir de 2001 a 2005 s crticas feitas atual regulao por vrios setores da

    sociedade - incluindo rgos de defesa do consumidor como o Idec e instituies de

    referncia no setor sade, como a Sociedade Brasileira de Vigilncia de Medicamentos

    (Sobravime) colocou em debate, atravs da Consulta Pblica 84, de novembro de

    2005, um novo texto com o objetivo de aprimorar a atual regulao da propaganda de

    medicamentos. Como tambm pretendemos demonstrar neste estudo, o texto publicado

    para debate pela Anvisa, entretanto, no altera de forma substancial o atual modelo, no

    conseguindo superar nenhuma das cinco substanciais fragilidades j citadas.

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    PERCURSO METODOLGICO

    Este estudo realizar uma anlise de artigos cientficos, discursos, documentos oficiais e

    de legislaes nacionais e internacionais relativos rea da propaganda de

    medicamentos voltada para grande pblico, com base em vrias fontes de informao,

    descritas em cada captulo. Entre o material analisado est:

    1. A edio especial da Public Library of Science (PloS) Medicine, de maio de

    2006, onde vrios artigos analisam a produo e a promoo de doenas com

    vistas a elevar o uso de medicamentos.

    2. As duas diretivas da Unio Europia (EU) que impactam as prticas do

    marketing medicamentoso. Uma que visa a proteger os consumidores frente da

    prtica da propaganda enganosa e outra que trata especificamente da propaganda

    de produtos farmacuticos, no mbito do cdigo comunitrio sobre

    medicamentos de uso humano.

    3. As concluses de recente pesquisa - realizada em 2006 pela Consumers

    International(CI) com financiamento da prpria Unio Europia - a respeito das

    irregularidades praticadas pelo marketing farmacutico em vrios pases

    europeus.

    4. As legislaes reguladoras que, com vistas a diminuir o estabelecimento do

    risco sanitrio e proteger a sade da populao, impactam a prtica da

    propaganda e do marketing farmacutico no Brasil.

    5. Os dados do Projeto de Monitorao da Propaganda de Medicamentos no Brasil,

    realizado sob a coordenao da Gerncia de Propaganda de Produtos Sujeitos

    Vigilncia Sanitria da Anvisa.

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    6. O processo relativo Consulta Pblica 84/2005 da Anvisa, com vistas a alterar a

    Resoluo de Diretoria Colegiada (RDC) 102/200 que regula a propaganda de

    medicamentos no Brasil, incluindo os posicionamentos do setor regulado,

    Governo e entidades representativas de consumidores e da academia.

    7. Os debates travados nos ltimos trs anos na Cmara Setorial de Propaganda da

    Anvisa a respeito da regulao da propaganda de medicamentos, incluindo uma

    anlise da participao social naquele frum e as iniciativas da Gerncia de

    Propaganda da Anvisa nos campos da regulao e da educao para a sade.

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    2 INTRODUO

    A lgica que norteia o mtodo desta pesquisa est na compreenso de que a Vigilncia

    Sanitria (rea onde se inserem as aes reguladoras da propaganda de medicamentos)

    parte integrante da sade pblica. Para delimitar a abrangncia deste estudo - no que ele

    diz respeito publicidade de produtos farmacuticos - e ao mesmo tempo assegurar a

    sua viabilidade, esta pesquisa ir realizar, inicialmente, a descrio de quatro objetos: o

    Marketing, o Medicamento, a Regulao e a Manipulao.

    Este estudo realiza um levantamento do que se conceitua como marketing de negcios,

    a partir da utilizao da produo de trs tericos do setor: Philipp Kotler, Gary

    Armstrong e Franoise Simon. A opo por estes trs autores se justifica com o fato de

    serem referncia internacional no setor - como ser explicitado no captulo dedicado ao

    tema - e se dedicarem s especificidades do mercado publicitrio voltado para aschamadas biomarcas.

    A seguir, so descritos e analisados alguns exemplos das prticas utilizadas pelo

    marketing farmacutico no sentido de elevar o consumo de medicamentos no Brasil e

    no mundo. Para a realizao deste levantamento, so utilizados como referncia

    publicaes internacionais cujos autores se dedicaram especificamente ao campo que se

    estabeleceu definir como Disease Mongering (Produo de Doenas) e estudiosos da

    rea da sade no Brasil, cuja produo trata de uso correto do medicamento e seu

    impacto no Sistema nico de Sade.

    A terceira etapa deste estudo analisa um exemplo de legislao reguladora de

    publicidade de medicamentos, tomando como base duas Diretivas da Unio Europia

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    destinadas a impor limites ao marketing farmacutico nos seus 15 pases-membros. A

    opo por analisar estes dois instrumentos se deu pela amplitude geogrfica dos dois

    mecanismos, sua atualidade - na medida em que a reviso mais recente foi realizada em

    2004 - e finalmente pela cultura reguladora j estabelecida nas Naes que compem

    aquele bloco de pases. Ainda nesta etapa do estudo, sero analisados o real impacto e a

    verdadeira eficcia destes mecanismos reguladores, considerando a avaliao feita por

    um conjunto de organismos de defesa do consumidor da Europa, liderados pela

    Consumers International. A escolha deste instrumento motivada pelo fato de a anlise

    produzida tambm ser de uma fonte recente (datada de 2006), ser geograficamente

    ampla (analisou as prticas do marketing farmacutico em oito pases europeus, todos

    fazendo parte da Unio Europia) e incorporar referncias fidedignas, como se

    demonstra no captulo referente ao tema.

    A quarta etapa desta tese realiza uma anlise do atual modelo regulador da propaganda

    de medicamentos para o grande pblico no Brasil (hoje consubstanciado na Resoluo

    de Diretoria Colegiada - RDC 102/2000 da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria -

    Anvisa), suas fragilidades mais evidentes, a forma como feita a fiscalizao de seu

    cumprimento pela indstria farmacutica e as punies aos infratores. Ainda neste

    bloco, identificado o conjunto de interesses que se manifestam no campo regulador da

    propaganda de medicamentos para o grande pblico no Pas e que se tornaram mais

    explcitos por ocasio do processo de participao da sociedade na Consulta Pblica

    84/2005 da Anvisa, que tinha como objetivo aprimorar o modelo regulador da

    propaganda de medicamentos no Pas.

    Neste ponto do estudo, so analisados os posicionamentos pblicos e identificados os

    interesses de setores que atuam no campo da propaganda de produtos farmacuticos

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    para o grande pblico no Pas, incluindo as representaes da indstria farmacutica

    (com particular ateno no segmento de medicamentos de venda livre ou isentos de

    prescrio, j que estes so os produtos cuja publicidade autorizada para grande

    pblico), das agncias de publicidade e dos meios de comunicao de massa.

    Finalmente, a ttulo de concluso, este estudo prope um debate - com base na anlise

    realizada no conjunto do trabalho - sobre os parmetros necessrios a um modelo

    regulador capaz de superar as fragilidades do atual sistema (consubstanciado na RDC

    102/2000 da Anvisa) e assegurar a implementao de polticas voltadas para a

    preveno do risco provocado pela publicidade enganosa, perigosa e/ou abusiva

    veiculada nos meios de comunicao de massa no Brasil.

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    3 CAPTULO 1 - ASPECTOS HISTRICOS: SURGE OMONOPLIO DA CURA E DA VIDA

    O impacto positivo na sade humana e a inquestionvel elevao da qualidade de vida

    das pessoas a partir do desenvolvimento da sntese farmacutica - tornados viveis em

    grande escala atravs dos medicamentos de base qumica e do significativo aumento na

    variedade de princpios ativos - um dos fatos marcantes da segunda metade do sculo

    XX. Entre 1940 e 1960, este processo leva a indstria farmacutica a conhecer sua

    chamada idade de ouro. (Barros, 1995)

    Mas a origem da teraputica como atividade de preservao da sade, do bem-estar, da

    prpria vida e o uso de produtos tidos como medicinais, se confundem com a prpria

    histria da Humanidade. No sculo XX, arquelogos encontraram escritos sumerianos

    com mais de 7.000 anos. A Sumria era uma vasta regio - ocupada a partir de 10.000

    A.C. - pelos povos que mais tarde formariam as civilizaes que ocuparam o Oriente

    Mdio. Ali j eram descritas frmulas e processos teraputicos s cientificamente

    comprovados milhares de anos depois, como o caso do uso da papoula como

    analgsico. (OLIVEIRA, 2006)

    Outros documentos que refletem a longevidade da atividade teraputica com produtos

    a Tor judaico (com 5.700 anos); o Papiro de Ebers, da medicina egpcia (com 3.550

    anos e onde constam mais de 700 remdios); o Pen Tsao ou Grande Herbrio, da

    medicina chinesa (organizado pelo Imperador Shen Nung em 2.800 A.C. e escrito h

    mais de 4.800 anos, contendo 365 remdios); o Cdigo de Hamurabi, da medicina

    assria (com mais de 4 mil anos); e o Rgyad Bahi, da medicina tibetana, com mais de

    2.800 anos. (Idem)

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    Cludio Galeno (131 201 D.C.), mdico do Imperador Marco Aurlio, que

    estabelece a necessidade de determinao de uma base fisiopatolgica para que, a partir

    dela, se efetive uma interveno teraputica. Na poca, admitia-se que as doenas eram

    manifestaes secundrias dos desequilbrios dos quatro humores orgnicos:

    sanguneo, colrico, melanclico e fleumtico. Galeno viaja por todo o mundo ento

    conhecido e descreve centenas de frmacos, no que veio a ser conhecida como a

    Farmcia Galnica. (Idem)

    Depois de Galeno, outro fato marcante no uso teraputico de produtos se d com o

    filsofo e mdico rabe Avicena ou Abu Ali al-Hussein Abdullah ibn Sina - (980

    1037 D.C), professor da Escola de Medicina de Bagd, precursora do ensino mdico

    mesmo em relao s universidades europias. Avicena amplia, j na Idade Mdia, os

    conhecimentos e as aplicaes da Farmcia Galnica, passando a organizar a

    transferncia do conhecimento adquirido atravs dos sculos para seus alunos. (Idem)

    A teraputica permanece praticamente inalterada at que o astrlogo e mdico suo

    Phillipus Aureolus Theophrastus Bombast von Hohenheim (1493 1541), ou

    simplesmente Paracelso, cria a iatroqumica (doutrina que pretendia explicar os

    fenmenos relativos sade pela qumica ainda rudimentar da poca). Ele amplia e

    sistematiza, na teraputica, o uso de metais como ferro, chumbo, mercrio, cobre,

    enxofre e antimnio. Paracelsus prega a necessidade de se usar o raciocnio cientfico e

    a experincia para validar hipteses teraputicas, mas se utiliza de uma srie de

    mistificaes em suas frmulas, chegando a afirmar ser o descobridor do Elixir da

    Vida e de ser capaz de transformar metais em ouro. (Idem)

    A partir do Renascimento, cristaliza-se o pensamento cientfico, estruturado

    principalmente sobre os escritos de So Toms de Aquino (1225 1274), Galileu

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    Galilei (1564 1642), Francis Bacon (1561 1626), Ren Descartes (1596 1650) e

    depois Immanuel Kant (1724 1804), Auguste Comte (1798 1857), John Stuart Mill

    (1806 1873) e Claude Bernard (1813 1878). (Idem)

    no sculo XIX que o mundo assiste ecloso de uma nova era da Medicina, baseada

    no experimento e na teraputica, mas marcada pela crtica cientfica e pela verificao

    sistemtica da segurana e eficcia dos remdios. Este cuidado com o uso de

    medicamentos alcana especial relevncia em 1890, quando se constituem as primeiras

    comisses de especialistas para a verificao das mortes sbitas ocorridas durante o uso

    de anestesia com clorofrmio. (Idem)

    A introduo da ainda incipiente sntese qumica no incio do sculo XIX (proposta por

    Paracelsus 300 anos antes) pelas mos de farmacuticos e qumicos, leva (em 1817) ao

    primeiro isolamento qumico de um princpio ativo o da morfina, a partir da mesma

    papoula presente nos escritos sumerianos de 7 mil anos atrs. A descoberta estimula

    cientistas franceses e alemes, que isolam, a partir de plantas medicinais, a emetina, a

    estricnina, a brucina, a veratrina, a colchicina, a quinina, a cinchonina, a cafena, a

    nicotina, a atropina e a codena. (Idem)

    Em 1824, Emmanuel Merck (1794 1855) estabelece novo salto, com a sntese de

    frmacos em grande quantidade e grau de pureza elevado. Surge a empresa E. Merck e

    logo depois dela so criadas a Schering AG, Eli Lilly, Glaxo, Abbott, Parke Davis,

    Searle e Sharp & Dome (que aps a segunda guerra mundial se funde com a Merck).

    Para a poca, era uma verdadeira revoluo no tratamento de doenas. Mas no se tinha

    sequer uma pequena idia do que estava por surgir nas dcadas seguintes. (Idem)

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    Um dos marcos no desenvolvimento da indstria de medicamentos se d em 1828,

    quando a bioqumica reproduz a uria em laboratrio, a partir do cloreto de amnio e do

    cianato de prata. Depois, August von Hoffman (1818 1892) sintetiza a anilina e seu

    assistente, William Perkin (1838 1907) produz a malvena, estabelecendo a primeira

    ligao com a microbiologia. Esses dois corantes so usados para identificar bactrias

    j que a sua prpria existncia ainda era questionada por muitos e j no sculo XX,

    Paul Ehrlich (1843 1910) descobre que alguns corantes utilizados na identificao de

    microorganismos conseguiam atuar como antibiticos. Depois de 600 tentativas de

    modificao celular de sais de arsnico, ele chega frmula do Salvarsan, o primeiro

    medicamento anti-sfilis realmente eficiente. Ehrlich passa a ser considerado o pai da

    quimioterapia e divide o Prmio Nobel de Fisiologia e Medicina de 1908 com Ilia

    Metchnikov (1845 1916), pela descoberta do mecanismo qumico por onde se

    estabelece a imunidade. As pesquisas subseqentes sobre os compostos arsnicos levam

    ao composto neosalvarsan. (Idem)

    A segunda metade do sculo XIX marcada por uma srie de descobertas de novos

    frmacos sintticos, entre eles a aspirina ou fenazona (por E.Fischer, Knorr e Filehne,

    da Hoechst, em 1884); a fenacetina (Duisberg, da Bayer, em 1887); a aspirina ou cido

    acetilsaliclico (Gerhardt em 1853, aperfeioada por Dresser em 1898, ambos da Bayer);

    o barbital (batizado de Veronal por E. Fisher, da Hoechst, em 1903). Mas foi com a p-

    sulfamidocrisoidina, um corante sulfamdico sintetizado no comeo da dcada de 1930

    por Gehardt Domagk (1895-1964), lanado com o nome de Prontosil rubrum pelo

    conglomerado IG Farbenindustrie (formado pela Bayer, Basf e Hoechst), que a indstria

    farmacutica altera de forma mais profunda sua concepo em relao ao mercado. O

    corante se mostra um eficaz antibitico para tratamento de pneumonias, escarlatina e

    infeces urinrias. Posteriormente, pesquisas do Instituto Pasteur comprovam que o

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    princpio ativo com real atividade antibitica era um metabolito do corante, a

    sulfanilamida, que desde 1908 era conhecida como um metabolito do Prontosil. Como

    sua ao antibitica no fora identificada, no houve, ento, preocupao em registrar

    sua patente, fazendo com que seu uso casse em domnio pblico. O conglomerado

    alemo, entretanto, registrou rapidamente a patente do Prontosil rubrum nos anos 30,

    passando a ser proprietrio do uso da descoberta. (Idem)

    Este detalhe se reveste de extrema importncia, na medida em que o processo de

    desenvolvimento e de descobertas cientficas, naquele momento, faz surgir um

    monoplio de grande valor no processo de acumulao no s do conhecimento, mas de

    riqueza e, conseqentemente, de poder. O monoplio da cura e da vida se estabelece e

    com ele uma nova lgica: a de que o preo final dos frmacos recm-descobertos

    (ao contrrio da quase totalidade dos bens existentes at ento) no seria

    determinado pela planilha de custos dos produtos, mas pela necessidade de

    manuteno da vida, que era o produto a ser valorado no imenso mercado que

    se criava.

    Investir pesadamente em novos frmacos, que comprovadamente fossem eficazes, era a

    chave da obteno de lucro. E isso ocorre num mundo praticamente vazio de produtos

    cujo uso teraputico estivesse cientificamente sustentado. A viso e a lgica comercial

    impactam de forma definitiva o setor farmoqumico, criando monoplios de

    conhecimento e riqueza que perduram um sculo depois. Com raras excees, as

    mesmas empresas que estavam presentes no momento desta guinada mercadolgica

    dada pelo setor no incio do sculo XX, permanecem sendo, no incio do sculo XXI, as

    de maior faturamento no mercado mundial, tendo algumas delas optado por se

    fundirem, elevando sua participao no mercado. (Idem)

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    At o sculo XX, a maioria dos medicamentos era obtida atravs da purificao ou

    destilao de substncias de origem natural. Pouco ou nada se conhecia de sua natureza

    ou de sua estrutura qumica. O uso de remdios se baseava principalmente na tradio e

    na observao emprica de seus efeitos (NASCIMENTO, 2002, p. 13).

    Estes investimentos pesados na descoberta e sntese de novos frmacos fazem com que

    na virada do sculo XIX para o XX, sobretudo com Koch (1843 1910) e Pasteur (1822

    1895), a teoria microbiana e os antibiticos desencadeiem uma revoluo na

    teraputica, criando os alicerces da farmacologia de orientao cientfica.

    Em 1928, Alexander Fleming descobre e, em 1930, H. Florey e E. Chain produzem a

    penicilina. Onze anos depois, em 1941, aparece no mercado a sua primeira forma

    injetvel para uso teraputico. Portanto, da descoberta ao uso prtico passam-se 13 anos.

    A introduo da penicilina para o tratamento da sfilis, na dcada de 40 do sculo XX,

    modifica o panorama da doena. Logo aps a introduo do frmaco no tratamento, as

    taxas de sfilis diminuem nos EUA, incluindo a sfilis congnita. (OLIVEIRA, 2006)

    Em 1943, quinze anos aps a descoberta de Fleming, Selman Waksman descobre a

    estreptomicina, que passa a ser o primeiro agente antimicrobiano descoberto aps a

    penicilina. Com ela, a cincia chega a uma substncia qumica eficaz no s contra

    muitas doenas at ento incurveis, mas ao primeiro antibitico eficaz contra a

    tuberculose. (Idem)

    Os anos imediatamente posteriores Segunda Guerra Mundial trazem a produo, agora

    em larga escala, de novos produtos farmacuticos, patrocinada pelos avanos cientficos

    e tecnolgicos. Este processo de industrializao acelerada eleva o medicamento

    categoria dos demais produtos manufaturados, favorecendo de forma extraordinria a

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    abertura de um novo campo para o desenvolvimento dos mecanismos de acumulao de

    capital.

    Primeiramente a sulfanilamida (para tratar as pneumonias, escarlatina e infeces

    urinrias), depois a penicilina (para tratar a sfilis), depois a estreptomicina e a

    isoniazida (ambas para tuberculose), a fenilbutazona (para artrites), seguindo-se as

    vitaminas B 12 (para a anemia megaloblstica), os hipnosedantes (para o tratamento do

    sofrimento mental), os primeiros anovulatrios orais (para a contracepo), os

    antitrombticos, antihipertensivos e antiarrtimicos (para as doenas cardiovasculares) e

    finalmente os primeiros princpios ativos para o controle das neoplasias (Barros, 1995)

    elevam o at ento quase artesanal setor de produo de medicamentos categoria de

    indstria de grande porte. Somados a estes medicamentos, surgem, ainda, os

    antialrgicos, os antiasmticos, os ansiolticos e um grande nmero de antiparasitrios.

    Este processo no foi percorrido sem significativas agresses tica ou aos seres

    humanos. Ainda durante a Segunda Guerra Mundial, a IG Farbenindustrie ficou

    tristemente famosa ao utilizar o campo de concentrao de prisioneiros de Auschwitz

    como local de testes voluntrios em ensaios clnicos de novos frmacos. Aps a

    guerra, surgem denncias de que pelo menos 150 prisioneiros morreram nestes testes.

    (OLIVEIRA, 2006)

    Mas no s as foras nazi-fascistas cometeram este tipo de ao. J nos anos 50, o

    bilogo americano Gregory G. Pincus (1903 - 1967) - financiado pela tambm

    americana Margaret Sanger (1884 1966), defensora das causas eugnicas e Presidente

    da International Planned Parenthood Foundation -, utiliza prisioneiros em experincias

    com testosterona como anticoncepcional masculino. A frmula mostra-se eficiente, mas

    o hormnio induz a atrofia dos testculos, provoca fibrose e infertilidade definitiva em

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    alguns participantes dos testes. Diante do problema criado, os testes passaram a ser

    realizados em mulheres (porto-riquenhas). Estes fatos acabaram por levar ao

    estabelecimento de regras e critrios de ensaios clnicos periodicamente reavaliados e

    atualizados. (Idem)

    Na metade final do sculo XX, o uso de novos medicamentos - pelo menos nas

    sociedades consideradas mais avanadas (na medida em que o acesso j era medido pelo

    poder aquisitivo das populaes) - se torna algo corriqueiro e este comportamento se

    baseia na certeza da comprovao experimental de suas propriedades farmacolgicas ou

    biolgicas, conseguidas atravs de testes controlados, realizados primeiramente em

    animais e depois em seres humanos.

    O final do sculo XX contabiliza a existncia de mais de 7 mil especialidades

    farmacuticas introduzidas, entre 1948 e 1963, apenas no arsenal teraputico americano.

    No vcuo das descobertas cientficas, a indstria farmacutica paulatinamente se integra

    ao padro de produo, apropriao de tecnologia, saber, acumulao de capital e

    conquista de mercados similares s demais indstrias, o que mais tarde possibilita sua

    transformao em um dos segmentos mais lucrativos da produo industrial

    contempornea (NASCIMENTO, 2002).

    A disseminao do uso de produtos farmacuticos em vrios pases demonstra, por

    outro lado, que estes frmacos no trazem apenas benefcios Humanidade. Ainda em

    1938, a morte por insuficincia respiratria de 107 pessoas (34 crianas e 73 adultos)

    nos Estados Unidos, por ingesto de um xarope de sulfanilamida, causada pelo

    excipiente nefrotxico dietilenoglicol, leva elaborao, pela FDA (Food and Drug

    Administration) de uma norma mais rgida de Vigilncia Sanitria, voltada para o uso

    de medicamento. A partir de 1938, para que um laboratrio passasse a produzir

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    determinado frmaco em escala industrial, teria de provar, por mtodos controlados pelo

    Estado, sua segurana, atravs de um processo denominado NDA (New Drug

    Application). (Idem)

    J na dcada de 1950, ocorre um dos maiores desastres relativos ao uso de

    medicamentos em larga escala. O laboratrio alemo Grnenthal lanara no mercado

    um novo e revolucionrio sedativo cuja propaganda prometia segurana e eficcia. O

    seu nome fantasia era Contergan e seu princpio ativo a talidomida. Em dezembro de

    1958, o Grnenthal comea a receber notificaes de usurios do medicamento que

    apresentavam neuropatia perifrica (cimbras, fraqueza muscular e falta de coordenao

    motora), com alguns casos irreversveis mesmo aps a suspenso do medicamento. Na

    mesma poca, ainda no fora diagnosticada qualquer relao entre o uso do

    medicamento e o surgimento de alteraes em filhos de mulheres que haviam feito uso

    dele na gravidez. Atribua-se as deformaes a possveis efeitos de viroses. (Idem)

    Duas cartas recebidas pelo Editor do The Lancet, identificando uma possvel relao

    entre o uso do medicamento e as crianas malformadas, alteram o olhar sobre a questo.

    As cartas foram publicadas descrevendo a ocorrncia dos casos e a partir delas surgiram

    dezenas de novos depoimentos de mdicos cujas pacientes tinham utilizado a talidomida

    na gravidez e seus filhos apresentavam deformaes. Mas foram precisos trs anos de

    intensa presso de instituies - e s aps ampla repercusso na imprensa mundial - para

    a talidomida ser retirada do mercado, em 1961. O saldo de uma das maiores tragdias da

    histria do uso de medicamentos foram 8 mil crianas gravemente defeituosas em 46

    pases. (Idem)

    Devido justamente aos rgidos critrios de avaliao para a autorizao de

    comercializao de medicamentos j implementados no Pas, os Estados Unidos no

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    haviam ainda aprovado o uso da talidomida. A FDA havia optado por recomendar o

    aprofundamento da investigao da segurana do produto no por causa das

    deformaes em crianas, mas devido ao surgimento de casos isolados de neurites

    perifricas e alteraes tireoidianas. A catstrofe, que abalou a credibilidade da indstria

    farmacutica e colocou em cheque a segurana dos medicamentos, serviu de alerta para

    governos, instituies e organismos da sociedade civil. A concluso de que os frmacos

    s deveriam ser comercializados aps profundamente estudados - e que para isso eram

    necessrias normas rgidas para a sua introduo no mercado - faz nascer primeiramente

    nos Estados Unidos um movimento que leva a uma maior rigidez na j existente IND

    (Investigational New Drug) e depois o Reino Unido que, em 1968, promulga o

    Medicines Act. Os ensaios clnicos passam a ser instrumentos metodolgicos

    acompanhados de perto pelas autoridades e passos essenciais para a aprovao de novos

    frmacos. (Idem)

    Em 1969, a 22 Assemblia Mundial da Sade cria o Grupo Cientfico para Princpios

    de Avaliao Clnica de Frmacos, que indica a necessidade de todos os pases

    passarem a verificar a eficcia e a segurana dos frmacos neles comercializados. Em

    documento de 1970, o Grupo diz, textualmente, que a ocorrncia de diversos acidentes

    teraputicos aponta a necessidade de adoo de providncias de carter mundial,

    demonstrando o grau de complexidade que atingiu a teraputica atual (OMS, 1970 apud

    OLIVEIRA, 2006, p. 29).

    H quem argumente que, desde ento, as rgidas regras da realizao de ensaios clnicos

    e os testes efetuados antes do lanamento de novos medicamentos no mercado

    asseguram, quase meio sculo depois da tragdia da talidomida, segurana e eficcia

    plena destes produtos. Entretanto, no o que a realidade tem demonstrado. Em

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    setembro de 2004, a Merck Sharp & Dome (MSD) retirou do mercado o Vioxx- lanado

    em 1999 - cuja frmula contm rofecoxib, um inibidor da COX-2, muito tempo depois

    um estudo apontar aumento dos riscos de infarto do miocrdio e de derrame associados

    ao seu uso. A ocorrncia, s nos EUA, de 88 mil a 146 mil casos de infarto atribuveis

    ao Vioxx considerada por vrios especialistas como sendo a maior catstrofe sanitria

    at agora causada por um medicamento, capaz de superar a tragdia da talidomida

    (ROZENFELD, 2006). A exemplo do laboratrio alemo Grnenthal nos anos 50, a

    retirada do Vioxxdo mercado pela MSD foi tardia, pois estudos realizados em 2000 j

    apontavam os perigos do uso do produto. Tanto que, naquele mesmo ano, uma meta-

    anlise - que por coincidncia foi publicada no mesmo TheLancetque tornou pblico

    as primeiras cartas sobre a talidomida -, recomendava a retirada do Vioxxdo mercado

    (Idem). Os estudos demonstravam que os antiinflamatrios do tipo inibidores seletivos

    da ciclooxigenase COX-2, comercializados tanto por venda livre como condicionada

    apresentao de receita mdica, poderiam provocar efeitos adversos, como a diminuio

    da proteo da mucosa gstrica, hemorragias, problemas renais, aumento da presso

    arterial e eventos cardiovasculares.

    Os avanos cientficos e tecnolgicos da segunda metade do sculo XX levam prpria

    alterao da forma de enfrentamento teraputico das doenas, que at a primeira metade

    do sculo passado eram tratadas sem necessariamente se utilizar elementos qumico-

    industriais. Esta nova lgica de combate ao sofrimento humano faz com que os

    medicamentos passem a assumir um papel para o doente no apenas como o de uma

    substncia qumica com um conjunto de indicaes teraputicas. Eles passam a

    representar uma possibilidade de soluo de um problema, que o indivduo, por si s,

    no teria a possibilidade de resolver.

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    Esta relao de confiana nos produtos farmacuticos gerada e fortalecida num

    ambiente extremamente favorvel elevao de seu consumo, onde as descobertas

    viabilizadas pela sntese qumica elevam o medicamento a um statusjamais imaginado.

    O papel do medicamento exacerbado e ele passa a incorporar expectativas e

    representaes relacionadas a fatores como confiana em quem faz a prescrio ou o

    valor atribudo eficincia cientfica e tecnolgica. Algumas vezes, o uso de um

    medicamento no apenas a busca de um auxlio para resolver um problema, mas

    confunde-se com a prpria soluo do problema (Schenkel, 1991).

    Neste processo de exacerbao e de criao de um fetiche em torno do medicamento,

    um elemento vai paulatinamente se tornando essencial ao desenvolvimento do setor: os

    meios de comunicao de massa, capazes - graas ao avano tecnolgico propiciado

    pelas telecomunicaes - de atingir tanto pases inteiros como o prprio planeta, em

    escala de tempo cada vez menor e com maior qualidade de imagem, som e texto. Assim,

    o uso das estratgias de marketing - como nos demais setores da rea da indstria e dos

    servios (automobilstico, de vesturio, eletroeletrnico, imobilirio, econmico-

    financeiro, etc.) absorvido em toda a sua essncia tambm na rea do medicamento.

    O crescimento do consumo de medicamentos torna cada vez mais difcil se avaliar at

    onde prevalece a exigncia estritamente voltada para o controle de enfermidades e

    comea a presso mercadolgica para seu uso. A concepo de sade como um valor ou

    um desejo se adapta lgica imposta pelo mercado, passando a ser identificada, na

    prtica, a mercadorias propiciadoras de sade. (Lefvre, 1991). O tratamento dado pela

    publicidade expande ainda mais este desejo de obter sade e sedimenta a cultura, j

    existente, de que para se ter sade preciso se medicar de forma constante, at mesmo

    quando no se est doente.

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    O tratamento dado pela propaganda de medicamentos ao que deveria ser entendido

    como sade eleva na sociedade a busca por solues para problemas ainda no

    totalmente solucionveis atravs da utilizao de terapias medicamentosas (como a

    beleza, a vitalidade e a energia). A explorao do valor simblico do medicamento

    alimentado pela j existente cultura da automedicao, mas amplamente disseminado

    pela indstria farmacutica, pelas agncias de publicidade, pelas empresas de

    comunicao e pelo comrcio varejista - passa a representar um dos mais poderosos

    instrumentos para a induo e fortalecimento de hbitos voltados para o aumento de seu

    consumo. Os medicamentos - seja para melhor suportar dores de cabea, incmodos

    menstruais, tornar a pele mais macia, fazer crescer cabelos mais sedosos, elevar a

    potncia sexual ou simplesmente emagrecer - passam a simbolizar possibilidades

    imediatas de acesso no apenas sade, mas ao bem estar e prpria aceitao social,

    como se estes produtos pudessem ser adquiridos na farmcia. (NASCIMENTO, 2005)

    Um enorme contingente da populao brasileira - idosos, crianas e portadores de

    doenas crnicas como hipertenso, diabetes ou problemas cardiovasculares - esto

    expostos propaganda, sem que ela traga nenhum tipo de advertncia quanto ao uso de

    determinados medicamentos nocivos a estes grupos. A questo se torna ainda mais

    grave diante do fato de que milhares de pessoas no Brasil sequer tm noo de que so

    portadores, por exemplo, do diabetes ou da hipertenso, sendo levadas, pela propaganda

    indiscriminada, a consumir medicamentos desnecessrios e muitas vezes contra-

    indicados para portadores deste tipo de doena.

    Um dos sintomas dos efeitos da propaganda indiscriminada e do uso incorreto,

    irracional, inconsciente e abusivo de medicamentos surge no significativo crescimento

    tanto do nmero de casos de intoxicao humana, como do nmero de bitos que tm

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    como causa os produtos farmacuticos, registrados nos ltimos anos pelo Sistema

    Nacional de Informaes Toxico-Farmacolgicas (Sinitox), da Fundao Oswaldo

    Cruz/Ministrio da Sade. A Estatstica Anual de Casos de Intoxicao e

    Envenenamentos no Brasil demonstra que h onze anos de 1995 a 2005 - os

    medicamentos ocupam o primeiro lugar entre os agentes de intoxicaes humanas

    registradas por uma rede hoje formada por 36 Centros de Informaes e Assistncia

    Toxicolgicas localizados em 19 estados brasileiros e no Distrito Federal. (BRASIL,

    1995-1998; BRASIL, 1999-2005).

    Os nmeros mais recentes disponibilizados pelo Sinitox/Fiocruz demonstram que o uso

    de medicamentos, em 2005, provocou 21.926 casos de intoxicao humana no Brasil

    (25,96% do total de casos registrados), o que equivale a um registro oficial a cada 24

    minutos. As intoxicaes humanas tendo como agente os medicamento superam os

    agravos causados pelos vrios tipos de animais peonhentos como serpentes, aranhas,

    escorpies e outros; as que ocorrem em conseqncia do uso de produtos

    domissanitrios e mesmo as causadas por agrotxicos de uso agrcola. (Idem)

    Um fator a se considerar a dificuldade encontrada por grande parte da populao para

    conseguir um atendimento no SUS, o que sugere que os nmeros do Sinitox refletem

    apenas os casos realmente graves de intoxicao por medicamento, que fazem as

    pessoas no s procurar, mas muitas vezes terem que insistir para conseguir

    atendimento num sistema de sade reconhecidamente de difcil acesso. Portanto, no

    exagero supor que o nmero de intoxicaes humanas tendo como agente os

    medicamentos deva ser ainda maior.

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    4 CAPTULO 2 - PARMETROS CONCEITUAIS: O QUE MARKETING, MEDICAMENTO, REGULAO EMANIPULAO.

    4.1 Marketing

    O primeiro objeto as ser conceituado neste estudo o marketing como uma teoria de

    mercado cada vez mais utilizada pelas grandes corporaes, inclusive as farmacuticas.

    Ao analisar o significado das mensagens voltadas para o consumo de bens e de servios

    e as relaes advindas dos processos comunicacionais entre emissor e receptor, David

    Harvey aponta para o fato de que os produtores tm um permanente interesse em

    cultivar o excesso e a intemperana nos outros, em alimentar apetites imaginrios, a

    ponto de as idias sobre o que constitui a necessidade social serem substitudas pela

    fantasia, pelo capricho e pelo impulso. Para ele, o produtor capitalista tem cada vez

    mais o papel de alcoviteiro entre os consumidores e seu sentido de necessidade,

    excitando neles apetites mrbidos, espreita de cada uma de suas fraquezas tudo isso

    para que possa exigir o numerrio pelo seu servio de amor (Harvey, 1989).

    Para analisar como se d a regulao das aes de marketing no desenvolvimento da

    indstria farmacutica no mundo e sua atuao no Brasil, utilizaremos nesta pesquisa a

    produo de trs reconhecidos tericos do marketing moderno, que aquele que

    incorpora a seu dia-a-dia as novas tecnologias que revolucionaram o setor e trata as

    aes de propaganda de produtos no como um componente isolado do

    desenvolvimento de setores industriais, mas como um gerenciamento de clientes. A

    lgica do marketingmoderno preconiza que suas aes devem se conectar com todos

    os setores da empresa, determinando qual produto deve ser produzido, em que momento

    isso deve ser feito, que caractersticas este produto deve conter, para que segmento ele

    deve ser principalmente oferecido, a que preo, em que local deve ser exposto, que

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    impacto deve ser medido e finalmente determina as aes de acompanhamento de uso

    necessrias para se manter a fidelidade dos clientes conquistados.

    Entre estes trs tericos do marketing, destacamos Philip Kotler, professor de marketing

    internacional da Kellog Graduate School of Management, da Universidade de

    Northwestern (EUA) e autor de 25 livros sobre a teoria do marketing. Ele foi Presidente

    do College on Marketing do Institute of Management Sciencese Diretor da American

    Marketing Association. Hoje, Kotler presta consultorias estratgicas de marketing a

    dezenas de empresas norte-americanas e europias, entre elas Merck, IBM, General

    Electric, Bank of America, AT&T e Michelin. (KOTLER, P. e ARMSTRONG, G.

    2005)

    O segundo terico que este estudo considera Gary Armstrong, professor emrito de

    graduao na Kenan-Flager Business School, da Universidade da Carolina do Norte

    (EUA). Ele trabalha como consultor e pesquisador para vrias empresas, gerenciando

    vendas e estratgias de marketing. Foi o nico professor a receber mais de uma vez o

    prmio Excellence in Undergraduate Teaching.

    Finalmente, consideraremos os conceitos da professora Franoise Simon, uma das mais

    importantes especialistas americanas em estratgia de marketingvoltadas para a rea da

    biotecnologia, setor que interessa em particular a essa pesquisa tendo em vista a sua

    relao com a sade e o uso de medicamentos. Autora de quatro livros sobre este tema,

    ela professora de Negcios e Sade Pblica na Columbia Universitye Presidente do

    SDC Consulting Group, que presta servios na rea de marketing a empresas em todo o

    mundo.

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    Para Philip Kotler e Gary Armstrong, a principal tarefa do marketing alcanar o

    crescimento lucrativo para a empresa. Para ele, o marketing deve identificar, avaliar e

    selecionar oportunidades de mercado. Deve, tambm, formular estratgias para

    capturar essas oportunidades. (KOTLER, P. e ARMSTRONG, G. 2005, p. 40).

    Segundo eles, o desenvolvimento de qualquer setor industrial, seja na produo de

    sapatos, carros ou produtos biotecnolgicos, deve considerar o fato de que, hoje e no

    futuro, boas empresas satisfazem necessidades, timas empresas criam mercados. Os

    dois autores ensinam que a funo do marketing, mais do que qualquer outra nos

    negcios, lidar com os clientes (...), sendo os principais objetivos do marketing

    atrair novos clientes, prometendo-lhes valor superior, e manter os clientes atuais,

    propiciando-lhes satisfao. O cuidar bem do cliente, na viso do marketing

    moderno, fator essencial para elevar a participao no mercado e aumentar lucros.

    (Idem, p. 3)

    Na viso de Kotler e Armstrong, as atividades de marketing h muito deixaram de ser

    vistas apenas como as exercidas por um grupo de funcionrios que, diante de

    determinado produto, elaboram frases e imagens de impacto com vistas a favorecer o

    aumento de suas vendas. Eles afirmam que h muito mais sobre o marketing do que os

    olhos dos consumidores conseguem ver. Por trs dele h uma macia rede de pessoas e

    atividades que disputam sua ateno e seu dinheiro. (Idem, p. 3)

    Os tericos do marketing estudados para o desenvolvimento desta pesquisa propugnam,

    j h alguns anos, que a forma texto-imagem ou apenas texto, utilizada na

    propaganda, constitui uma pequena parte do que deve ser considerado como uma das

    atividades do setor. Embora sejam importantes, a forma de exibir determinado produto

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    (imagem) e o texto que a acompanha so apenas duas das muitas funes do marketing

    e no necessariamente as mais importantes.

    Kotler e Armstrong ensinam: O marketing inicia-se antes mesmo de a empresa ter

    determinado produto. Ele a lio de casa que os administradores devem fazer para

    avaliar as necessidades, quantificar a extenso, a intensidade delas e com isso

    determinar se h uma oportunidade lucrativa. Ele continua por toda a vida do produto,

    na tentativa de encontrar novos clientes e manter os clientes atuais mediante a melhoria

    do desempenho e do apelo do produto, do aprendizado a partir dos resultados de suas

    vendas e do gerenciamento contnuo de seu desempenho. Se o profissional de marketing

    faz um bom trabalho e acaba entendendo as necessidades dos clientes, desenvolvendo

    produtos que oferecem valor superior e preos vantajosos, distribuindo-os e

    promovendo-os de maneira eficiente, esses produtos sero vendidos com muita

    facilidade. Assim, vendas e propaganda so apenas peas de um 'mix de marketing', ou

    seja, de um conjunto de ferramentas de marketing que operam juntas para impressionar

    o mercado. (Idem, p. 3)

    O profissional de marketing, para os dois autores, busca gerar uma resposta para alguma

    oferta. Esta resposta pode ser mais do que a simples compra de bens ou servios: Um

    candidato busca votos, uma igreja procura fiis e um grupo de ao social quer a

    aceitao de seu projeto. O marketing consiste em aes que levem obteno de uma

    resposta desejada de um pblico-alvo em relao a algum produto, servio, idia ou

    outro objeto qualquer. Na linha de raciocnio de Kotler e de Armstrong, alm da

    gerao de transaes a curto prazo, os profissionais de marketing precisam se

    preocupar em criar relacionamentos de longo prazo com clientes, distribuidores e

    fornecedores, devendo construir vnculos sociais e econmicos fortes. (Idem, p 7)

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    Assim, ao definir o que marketing de forma mais elaborada, dois dos principais

    tericos do setor o enxergam como um processo administrativo e social pelo qual

    indivduos e grupos obtm o que necessitam e desejam, por meio da criao, oferta e

    troca de produtos e valor. (Idem, p. 3). Este processo administrativo e social se d, em

    sua viso, com base em necessidades, desejos e demandas por produtos e servios,

    que so medidos atravs do valor dado a eles, da satisfao encontrada e da qualidade

    de vida adquirida a partir da sua aquisio. Este processo se baseia em iniciativas com

    vistas a formar uma rede de relacionamento que ser to frutfera quanto a capacidade

    das empresas dominarem o mais completamente possvel todas as suas variveis.

    4.1.1 - Necessidades, desejos e demandas

    Para Kotler e Armstrong, o conceito mais bsico de marketing o das necessidades

    humanas, que resultam de situaes de privao (Idem, 2005). Entre elas esto as

    necessidades fsicas bsicas de alimentao, vesturio, abrigo e segurana; necessidades

    sociais de bens e afeto; e as necessidades individuais de conhecimento e auto-

    expresso. Para os dois autores, estas necessidades no foram inventadas pelos

    profissionais de marketing, pois so elementos bsicos da condio humana. (Idem,

    p.4)

    J os desejos seriam a forma que as necessidades humanas assumem quando so

    particularizadas por determinada cultura e pela personalidade individual. (Idem, p. 4)

    Eles exemplificam com o fato de um norte-americano, ao sentir fome, desejar um

    hamburguer, batatas fritas e refrigerante; enquanto um habitante das Ilhas Maurcio

    deseja manga, arroz, lentilha e feijo. Os desejos, para a teoria do marketing, so

    compartilhados por uma sociedade e se manifestam em termos de objetos que satisfaro

    estas necessidades.

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    Aps a identificao das necessidades e dos desejos, um terceiro aspecto deve ser

    considerado no processo administrativo-social do marketing, segundo Kotler e

    Armstrong. Como as pessoas tm desejos praticamente ilimitados, mas possuem

    recursos finitos, a imensa maioria opta por investir seu dinheiro em produtos que tragam

    o mximo de valor e satisfao. Assim, quando apoiados pelo poder de compra, as

    necessidades e os desejos tornam-se demandas, que se corporificaro em produtos.

    (Idem)

    Para se aproximar do trinmio necessidade - desejo - demanda, os dois autores citam

    exemplos de empresas, inclusive algumas brasileiras, cujas direes incorporaram a

    fundo o processo administrativo-social do marketing:

    Os principais executivos do Wal-Mart (rede americana de supermercados) visitam

    lojas e conversam com clientes dois dias por semana. Na Disneyworld, todo gerente

    pelo menos uma vez em sua carreira fica um dia todo andando pelo parque vestido de

    Mickey, Minnie, Pateta ou outro personagem qualquer. Alm disso, os gerentes da

    empresa trabalham uma semana por ano na linha de frente: distribuindo ingressos,

    vendendo pipoca ou fazendo emprstimo de carrinhos. No Brasil, a Ambev envia seu

    staffs sextas-feiras, incluindo os diretores, para visitar os pontos-de-venda e conversar

    com os consumidores. Na AT&T, o diretor-presidente, Michael Armstrong,

    freqentemente visita uma das centrais de atendimento da empresa, atende diretamente

    os clientes, coloca fones de ouvido e comea a atender ligaes para ter uma melhor

    idia dos problemas e das frustraes que os clientes da empresa enfrentam. Na rede de

    hotis Marriott, para ficar prximo dos clientes, o chefe do conselho e presidente, Bill

    Marriott, l pessoalmente cerca de 10% das 8 mil cartas e 2% das 750 mil sugestes

    apresentadas pelos clientes todos os anos. Entender detalhadamente as necessidades, os

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    desejos e as demandas dos clientes traz uma importante vantagem para a elaborao de

    estratgias de marketing. (Idem, p. 4)

    O modelo de empresa que consegue incorporar todas as possibilidades que o marketing

    oferece no seu dia-a-dia, na viso de Kotler, aquela que conhece o 'o qu', o 'onde', o

    'como' e o 'quando' das necessidades, dos desejos e das demandas de seus clientes.

    Ainda segundo ele, estas empresas sabem tudo sobre ns - coisas que nem ns mesmos

    sabemos. Para os profissionais de marketing, isso no uma busca sem importncia.

    Para eles, saber tudo sobre as necessidades dos clientes a pedra fundamental para fazer

    um marketing eficaz. Muitas empresas pesquisam detalhadamente sobre ns e

    acumulam montanhas de informaes. (Idem, p. 5)

    E cita exemplos: a Coca-Cola sabe que os norte-americanos colocam 3,2 cubos de gelo

    em um copo, que assistem a 69 de seus comerciais todo ano, que preferem que as latas

    nas mquinas de vendas estejam a uma temperatura de dois graus, enquanto o

    Laboratrio Abbott descobriu que uma entre cada quatro pessoas tem problemas de

    caspa e a indstria farmacutica sabe que so consumidos, por ano, 52 milhes de

    aspirinas e 30 milhes de comprimidos para dormir. (Idem, p. 5)

    Kotler e Armstrong afirmam que praticamente tudo que engolimos cuidadosamente

    monitorado por algum [...] e as empresas sabem que cada norte-americano, por

    exemplo, consome, em mdia, 156 hambrgueres, 95 cachorros-quentes, 283 ovos, 2,3

    litros de iogurte, 4 quilos de cereal, 900 gramas de pasta de amendoim e 46 saquinhos

    de pipoca por ano e que nos Estados Unidos so gastos 650 milhes de dlares a cada

    12 meses com anticidos, para ajudar na digesto. (Idem, p. 5)

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    4.1.2 - Valor, satisfao e qualidade

    Kotler e Armstrong analisam o caso da FedEx como um exemplo de sucesso de

    marketing, j que como os clientes no julgam os valores e os custos do produto de

    maneira precisa ou objetiva, acabam agindo de acordo com o valor percebido. Na

    verdade, dizem eles, a FedEx realmente oferece maior rapidez e confiabilidade na

    entrega, mas os Correios garantem que seus servios so compatveis com os da FedEx

    e que seus preos so bem mais em conta. Entretanto, nmeros de mercado indicam que

    a FedEx detm mais de 45 por cento do mercado de entrega expressa em todo os EUA,

    enquanto os Correios detm apenas 8%. Concluso de Kotler: o desafio dos Correios

    criar nesses clientes percepes de valor. (Idem, p. 6)

    J a satisfao do cliente, ainda na viso dos dois tericos do marketing, depende do que

    ele percebe sobre o desempenho do produto em relao s expectativas que cada

    consumidor tem dele, cabendo s empresas referncia em marketing se desdobrar para

    manter clientes satisfeitos, pois eles repetem suas compras e contam aos outros suas

    boas experincias com o produto. (Idem, p. 6)

    Finalmente, a satisfao do cliente, para Kotler e Armstrong, est estreitamente

    vinculada qualidade do produto. Eles ressaltam que muitas empresas adotaram

    programas de gesto da qualidade total com o intuito de aumentar constantemente a

    qualidade de seus produtos, servios e processos de marketing, com impacto direto

    sobre o seu desempenho, de seus produtos e, por conseqncia, sobre a satisfao do

    cliente. (Idem, p. 6)

    4.1.3 - Mercado atual e potencial

    Para Kotler e Armstrong, mercado o conjunto de compradores atuais e potenciais de

    um produto. Esses compradores compartilham de um desejo ou de uma necessidade

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    especfica que pode ser satisfeita por meio de trocas e relacionamentos. Assim, o

    tamanho de um mercado depende do nmero de pessoas que apresentam a necessidade,

    tm recursos e esto dispostas a oferecer esses recursos em troca daquilo que desejam.

    (Idem, p.8)

    A teoria do marketing ressalta, tambm, a importncia das organizaes terem um nvel

    desejado de demanda para seus produtos. Em algum momento, pode acontecer no

    haver demanda nenhuma por eles, cabendo administrao de marketing encontrar

    maneiras de lidar com diferentes estados da demanda, tendo como necessidade no

    apenas encontrar, mas aumentar esta demanda. Segundo os dois autores, a

    administrao de marketing a anlise, o planejamento, a implementao e o controle

    de programas desenvolvidos para criar, construir e manter trocas benficas com

    compradores-alvo, para que sejam alcanados os objetivos organizacionais. A

    administrao de marketing tem como uma de suas tarefas primordiais afetar o nvel,

    o ritmo e a natureza da demanda, a fim de contribuir para que a organizao alcance

    seus objetivos. (Idem, p. 9)

    Para construir relacionamentos lucrativos com os clientes, a teoria do marketing

    ensinada por Kotler e Armstrong aponta a necessidade de se dividir a clientela atual e

    potencial em dois segmentos: novos clientes e antigos clientes. Os dois autores ensinam

    que, tradicionalmente, os profissionais de marketing tm como objetivo atrair novos

    clientes e realizar transaes com eles. Mas eles ressaltam que entretanto, no ambiente

    de marketing de hoje, mudanas demogrficas e econmicas, alm de fatores

    competitivos, fazem com que haja poucos novos clientes para buscar, pois os custos

    para atra-los so altos. Assim, apesar de ser muito importante encontrar novos

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    clientes, o mais importante reter clientes lucrativos e construir relacionamentos

    duradouros com eles. (Idem, p. 10)

    Para alcanar este relacionamento duradouro, Kotler e Armstrong frisam que, em alguns

    momentos, so essenciais algumas aes que, mesmo trazendo alguns prejuzos

    administrao da empresa, asseguram confiana e fidelidade da clientela e at mesmo a

    conquista de novos clientes, elementos que traro, no futuro, lucros que compensaro

    em muito um eventual prejuzo momentneo. Ele cita como exemplo disso o trgico

    caso de adulterao de produto, ocorrido nos Estados Unidos, em que oito pessoas

    morreram aps ingerir cpsulas de Tylenol - da Johnson & Johnson que haviam sido

    criminosamente cobertas com cianureto. Apesar de a empresa saber que as plulas

    haviam sido adulteradas apenas em algumas farmcias, e no em sua fbrica, ela

    recolheu todo o produto do mercado antes mesmo que as autoridades determinassem.

    Essa atitude lhe custou 240 milhes de dlares, mas Kotler explica que isso no pode

    ser contabilizado como prejuzo, pois, a longo prazo, o fato de ter recolhido o Tylenol

    fez com que a confiana e a fidelidade do consumidor aumentassem, e o Tylenol

    continua sendo a marca lder no segmento de analgsicos nos Estados Unidos. (Idem,

    p. 15)

    4.1.4 - Biomarcas: o marketing baseado em experincia versuso marketing

    baseado em evidnciasEm seu livro A construo de biomarcas gl