57

Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Essa é a parte dos pôsteres dos anais do I CIDS

Citation preview

Page 1: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres
Page 2: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

CONCEIÇÃO DE MARIA DE ARAUJO RAMOS

JOSÉ DE RIBAMAR MENDES BEZERRA

MARIA DE FÁTIMA SOPAS ROCHA

(organizadores)

I CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIALETOLOGIA E SOCIOLINGUÍSTICA:

Homenagem a Maria do Socorro Silva de Aragão

ANAIS

SÃO LUÍS

2011

Page 3: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres
Page 4: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

PROMOÇÃOUNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁUNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

COMISSÃO ORGANIZADORAJosé de Ribamar Mendes Bezerra – UFMA

CoordenadorAbdelhak Razky – UFPA

Conceição de Maria de Araujo Ramos – UFMAMaria de Fátima Sopas Rocha – UFMA

Maria Elias Soares – UFC Marilúcia Barros de Oliveira – UFPA Mônica Magalhães Cavalcante – UFC

COMISSÃO CIENTÍFICAAntonio Luciano Pontes – UFC

Ilza Maria de Oliveira Ribeiro – UFBA Maria Denilda Moura – UFAL

Marilúcia Barros de Oliveira – UFPA Márluce Coan – UFC

Mônica da Silva Cruz – UFMA Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso – UFBA

SECRETARIAArthur Pereira Santana

Cibelle Corrêa Béliche AlvesEdson Lemos Pereira

Georgiana Márcia Oliveira SantosGizelly Fernandes Maia dos Reis

Heloísa Reis CurveloJulianne Maria Cutrim SantosLarissa Régia Ramos da Silva

Luís Henrique SerraMaria do Socorro Pereira da Costa

Priscila Ramos DiasRenata Gleicy Pinto Silva

Rosete Rodrigues Pires NetaRosimeri Teixeira Barros

Sandra Nívea Dutra de MoraesWendel Silva dos SantosZuleica de Sousa Barros

ANAIS - EquIPE DE APOIOAlana Brito Barbosa, Arthur Pereira Santana, Edson Lemos Pereira, Ludmilla Gratz Melo,

Luís Henrique Serra, Mírian Rodrigues Reis, Paulo Gabriel Calvet Ribeiro, Theciana Silva Silveira, Wendel Silva dos Santos

ANAIS - PROjETO GRáFICO E INTERATIvOMindo Soluções - [email protected]

Page 5: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística (1.;2011, São Luís)

Anais do I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística: homenagem a Maria do Socorro Silva de Aragão/ Conceição de Maria de Araujo Ramos; José de Ribamar Mendes Bezerra; Maria de Fátima Sopas Rocha, São Luís, 2011. 1. 890 pp. 1 CDROM.

ISBN 978-85-7862-210-7 CD-ROM

1. Dialetologia 2. Sociolinguística 3. Geografia Linguística

I. Título

CDU 81’28

Page 6: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

Atenção: Como navegar neste documento.

O ícone >> indica que você pode clicar para ser redirecionado para a página seguinte.

Encontre o ícone >> na parte inferior das páginas, próximoà numeração.

No sumário, você encontra a lista dos trabalhos referente à sessão indicada no título.

Para ir ao texto que você deseja, basta clicar em cima do título do trabalho e você será redirecionado automaticamente.

No topo da página existe uma indicação da sessão em que você está navegando. Para voltar ao sumário, basta clicar na palavra destacada no topo da página e você será redirecionado automaticamente.

Page 7: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

Estes Anais reúnem os trabalhos apre-sentados no I Congresso Internacio-nal de Dialetologia e Sociolinguística (CIDS), em homenagem a Maria do Socorro Silva de Aragão, realizado em São Luís, Maranhão, no período de 17 a 21 de outubro de 2010.

Resultado do desejo de um grupo de professores-pesquisadores de in-centivar a discussão e o intercâmbio de conhecimentos entre os centros de pesquisa na área dos estudos dialetais e sociolinguísticos, e da parceria de três universidades fede-rais – Maranhão, Pará e Ceará – o Congresso, nesta sua primeira edi-ção, presta uma justa homenagem à professora Maria do Socorro Silva de Aragão que, acreditamos, materia-liza a ideia de que a construção do conhecimento é o resultado de uma ação solidária, do diálogo, da acu-mulação de experiências e do desejo de fazer acontecer.

Com o tema A contribuição dos estudos dialetais e sociolinguísticos para uma política de línguas, o CIDS reuniu 682 pesquisadores que se distribuíram entre as atividades desenvolvidas – 10 conferências, 13 mesas-redondas, 164 comunicações individuais que integraram 28 sessões, 16 pôsteres e 14 minicursos, além do lançamento de livros e da reunião das equipes de dois grandes projetos da área em que se insere o Congresso, o Atlas Linguístico do Brasil (ALiB) e o Tesouro do Léxico Patrimonial Galego e Português, aos quais estão vinculadas várias universidades brasileiras, dentre elas as instituições promotoras do Evento.Com a publicação destes Anais, as instituições promotoras do CIDS dão continuidade a seu compromisso de estimular a pesquisa e o ensino e promover o intercâmbio e a divulgação do conhecimento.

APRESENTAÇÃO

Os organizadores

Page 8: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

8

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

AS FRICATIVAS /V S S Z Z/ NO PORTUGUÊS ORAL POPULAR E CULTO DE FORTALEZA: UMA ABORDAGEM VARIACIONISTA POR ANA GERMANA PONTES RODRIGUES E ALUIZA ALVES DE ARAúJO (ORIENTADORA)

A ABORDAGEM DAS VARIANTES LINGUÍSTICAS NA AULA DE ESPANHOL COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA POR ALANA BRITO BARBOSA, PALOMA VERAS PEREIRA, PRISCILA MARTINS qUINTANS E JOÃO DA SILVA ARAúJO JUNIOR (ORIENTADOR)

A NORMA CULTA FALADA NA CIDADE DE MANAUS EM SITUAÇÕES COMUNICATIVAS DE ENTREVISTAS POR BRUNO DE SOUSA ANDRADE E SILVANA ANDRADE MARTINS (ORIENTADORA)

A CONCORDÂNCIA VERBAL DE PRIMEIRA PESSOA DO PLURAL NA FALA POPULAR DE INFORMANTES DE MARTINÓPOLIS-TO: CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES POR CÍCERO DA SILVA E MARIA APARECIDA NUNES CARVALHO

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA EM IGUAÍBA – PAÇO DO LUMIAR POR ELAINE CRISTINA ROCHA, NORMA CRISTINA SOUZA, PAULO GABRIEL CALVET RIBEIRO E THECIANA SILVA SILVEIRA

O LÉXICO DAS BRINCADEIRAS INFANTIS NO MARANHÃO: PROPOSTAS PARA O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA EM SALA DE AULA POR LUÍS HENRIqUE SERRA E SANDRA NÍVEA DUTRA DE MORAES

O PROCESSO DE CRIATIVIDADE DA LINGUAGEM NA INTERNET POR GLAUCIA FERNANDES ARAUJO, REGIELLy SANTOS DE LEMOS, VALDENIRA CARDOSO PEREIRA , PROFº MS. JOÃO DA SILVA ARAúJO-JúNIOR (ORIENTADOR) E PROFª DRª. VERALUCE LIMA DOS SANTOS (ORIENTADORA)

INqUÉRITOS DA NORMA CULTA FALADA EM MANAUS EM SITUAÇÕES DIALÓGICAS INFORMAIS POR LEANDRO D’VINCI BABILôNIA BRANDÃO, CAROLINA kOSSOSkI FELIX DE MORAES

REZENDE E SILVANA ANDRADE MARTINS (ORIENTADORA)

MUDANÇA LINGUÍSTICA E VARIAÇÃO SINCRôNICA NA LÍNGUA FALADA E NA LÍNGUA ESCRITA POR GILMENNA SILVA DE LIMA E MARILENE CARLOS DO VALE MELO (ORIENTADORA)

UMA ANÁLISE FUNCIONAL DA TRANSITIVIDADE NO FALAR SERTANEJO POR FRANCINARA SILVA FERREIRA, SÉRGIO DA SILVA PEREIRA E EDIENE PENA FERREIRA (ORIENTADORA)

A PRESENÇA DAS LÍNGUAS AFRICANAS NO LÉXICO DA CULINÁRIA MARANHENSE POR TATIANA DO NASCIMENTO CUNHA E PROF.ª MS. MARIA DE FÁTIMA SOPAS ROCHA (ORIENTADORA)

O SUJEITO NO LIVRO DIDÁTICO: UM CONSTITUINTE ESSENCIAL? POR THAyANE SOARES DA SILVA, VANESSA AGUIAR FRANÇA E CONCEIÇÃO DE MARIA DE ARAúJO RAMOS (ORIENTADORA)

PôSTERES

Page 9: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

9

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

AS FRICATIVAS /V S S Z Z/ NO PORTUGUÊS ORAL POPULAR E CULTO DE FORTALEZA: UMA ABORDAGEM VARIACIONISTA

Ana Germana Pontes Rodrigues

(Orientadora) Aluiza Alves de Araújo

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho é um projeto de pesquisa a ser executado a partir de janeiro de 2010. Ele está dividido nas seguintes etapas: problematização, justificativa, objetivos, referenciais teóricos, metodologia e procedimentos, hipóteses e referências bibliográficas. Ele será apresentado neste evento com o objetivo de buscar a opinião da comunidade acadêmica a respeito da análise que nos propomos a fazer deste fenômeno.

2. PROBLEMATIZAÇÃO

Esta proposta de estudo converge para os seguintes problemas:

a) Considerando-se a realização variável das fricativas /v s S z Z/ no português falado em Fortaleza, qual(is) o(s) fator(es) que mais favorece(m) a sua aspiração (“reificação”)1?

b) qual(is) o(s) fator(es) que mais privilegia(m) o apagamento?

c) A realização variável das fricativas /v s S z Z/ no português falado em Fortaleza é um fenômeno que atualmente2 reflete variação estável ou mudança em progresso?

d) O fator escolaridade ainda exerce alguma influência sobre o apagamento/reificação das fricativas em posição final de sílaba?

e) quanto menor o grau de escolaridade, maior a aspiração em ataque silábico?

f) O aumento da faixa etária condicionará o apagamento/reificação das fricativas ou a sua realização plena?

g) qual o papel da variável sexo para os estudos em questão?

h) Se há aumento no grau de formalidade, também diminui o uso da aspiração em todos os contextos analisados?

i) qual o papel exercido pelo fator frequência de uso do segmento na ocorrência do apagamento/reificação das fricativas e da sua realização plena?

1 Os termos aspiração e “reificação” serão usados como sinônimos neste trabalho.2 Levando em consideração as pesquisas anteriormente feitas sobre esse mesmo assunto.

Page 10: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

10

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

3. JUSTIFICATIVA

Encontramos, no português do Brasil (doravante PB), uma enorme diversidade de falares. Esse fato sempre instigou muitos pesquisadores a estudar fenômenos linguísticos que dele decorrem, principalmente os de natureza variacionista, colaborando para a descrição do português atual. O conhecimento de nossos falares e sua valorização são de grande importância para o estudo e ensino da língua portuguesa na nossa região e em todo o País.

As línguas possuem heterogeneidade estruturada e variam sistematicamente, a partir de fatores linguísticos e extralinguísticos. Negar a existência disso seria disfuncional. Faz parte da competência linguística monolíngue do indivíduo dominar essas estruturas heterogêneas. (WEINREICH; HERZOG; LABOV, 1968, p.36)

O estudo da variação linguística traz à tona discussões nos âmbitos sociais, culturais e ideológicos em qualquer comunidade, visto que essa abordagem concebe a língua falada tal como ela é usada na vida diária pelos membros da sociedade em situações naturais de interação social.

A presente pesquisa propõe-se a descrever e analisar linguisticamente questões e problemas de natureza fonético-fonológica no falar fortalezense. Esse tipo de pesquisa permite esclarecer a heterogeneidade linguística e a sua sistematicidade, promovendo uma maior competência comunicativa aos falantes no momento em que eles reconhecem as variantes existentes em sua língua.

Por se tratar de um estudo acerca da língua falada, é imprescindível levar em consideração os diversos tipos de variações existentes dentro de cada sistema linguístico, caso contrário, produziríamos uma pesquisa incompleta. Por esse motivo, resolvemos adotar o modelo teórico-metodológico da sociolinguística quantitativa para este trabalho, procurando sistematizar os dados linguísticos, descrevendo a estrutura e a evolução da língua dentro de um contexto social e estabelecendo relações entre os fatores linguísticos e extralinguísticos.

Os resultados de pesquisas nessa área podem contribuir para o ensino de língua materna e estrangeira, fazendo com que professores e alunos conheçam melhor a diversidade linguística brasileira e saibam como lidar nas inúmeras situações de heterogeneidade linguística com as quais se deparam – por exemplo: o professor passa a dar mais importância ao contexto social em que o aluno está inserido, passando a respeitar a variedade que ele aprendera com a sua família, sem deixar de ensiná-lo a escolher o registro adequado a cada situação na qual se processa a comunicação. Segundo Camacho (2001, p. 69), essa é a tarefa fundamental da pedagogia da língua materna. Além disso, a escola, ao propiciar aos alunos o acesso a todos os bens simbólicos – sendo a variedade padrão um deles –, cumpre um papel político muito importante.

Outra relevância desta pesquisa está no fato de ela inserir o falar fortalezense no contexto nacional, regional e local, fazendo com que esse fenômeno e seus fatores condicionantes tornem-se mais conhecidos, contribuindo, assim, para a descrição de nossa língua.

A escolha desse tema justifica-se, primeiramente, pelo fato de o aspecto fonético ser um dos que mais rapidamente revelam as variações linguísticas, tanto as diatópicas quanto as diastráticas; além disso, por ser a aspiração e o apagamento das fricativas /v s S z Z/ um dos fatos linguísticos mais estigmatizados no falar fortalezense apesar da sua notável ocorrência.

O processo de enfraquecimento pode ser explicado pela “escala de sonoridade” e pela “escala de força” (kATAMBA, 1993, apud MARqUES, 2001). quanto mais obstruinte for o som, mais forte ele será e quanto maior a sonoridade, menor a resistência à saída da corrente de ar – como demonstrado a seguir:

Escala de força: Oclusivas surdas > oclusivas sonoras > fricativas surdas > fricativas sonoras > nasais > líquidas (vibrantes, laterais) > glides > vogais

Escala de sonoridade: o inverso da escala de força

Page 11: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

11

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Portanto, a “reificação” das fricativas, isto é, sua substituição pela vibrante múltipla em sua forma aspirada /ɦ/ (também conhecido por fricativa glotal), poderia ser explicada, a princípio, por essas escalas. De acordo com Hora et al. (2010), a variação existente na fricativa está relacionada ao seu ponto de articulação e há uma tendência à perda desse ponto.

Historicamente, as consoantes fricativas, durante a passagem do português para o latim, fixaram-se simetricamente com suas respectivas homorgânicas, o que até então só acontecia com as oclusivas.

Este tema já fora abordado, em diversos períodos por autores, como: Aguiar (1937), Seraine (1984), Bueno (1944, apud ARAGÃO, 2009), Silva Neto (1979, apud MARqUES, 2001), Macambira (1987), Roncarati (1988), Alencar (2007), Aragão (2009) – a respeito desse fenômeno no falar cearense; e por Canovas (1991), Marques (2001), Callou, Leite & Moraes (2002, apud ALENCAR, 2007) – ocorrendo em outros locais do País.

Aguiar (1937, p. 290), ao traçar uma fonética do português do Ceará, descreve a ocorrência do “r” velar no lugar de “j”, “s”, “v” e “z” (cada qual em contextos diferentes numa palavra), principalmente na linguagem infantil e dos rústicos.

Seraine (1984, p. 59), por sua vez, relata que esse uso também se dá entre os que são alfabetizados e, até mesmo, entre os que possuem certo grau de instrução.

Macambira (1987, p. 273-4) menciona o fenômeno apenas em relação à pronúncia de “r” espirante no lugar de “v” em algumas regiões cearenses e mesmo no português coloquial de Fortaleza, “na boca de formandos e formados”.

Roncarati (1988) faz um estudo sociolinguístico sobre o enfraquecimento das fricativas sonoras /v, z, Z/ no falar cearense, levando em conta fatores linguísticos e sociais que condicionariam o fenômeno e a correlação entre estigmatização e possibilidade de afetamento de itens lexicais. Ela utiliza como corpus 10 gravações registradas no projeto Dialetos Sociais Cearenses (ARAGÃO; SOARES, 1996), 1 gravação de interação médico-paciente e 4 de falantes do interior, pertencentes ao Projeto ALECE (Atlas Linguístico do Ceará).

Ao fazer um estudo sócio-dialetal sobre os róticos (/r/ e /R/) na língua falada em Fortaleza, Alencar (2007, p. 114-21) observa, em seus dados, e descreve a ocorrência da reificação nas fricativas vozeadas /v/, /z/ e /Z/, em determinados contextos. No entanto, a autora não submete essas ocorrências desse fenômeno a dados quantitativos.

Aragão (2009), por sua vez, procura complementar esses estudos utilizando também o corpus do projeto Dialetos Sociais Cearenses e o corpus experimental do Atlas Linguístico do Brasil, estado do Ceará, analisando o fenômeno da neutralização dos fonemas /v, z, Z, r/ e sua realização com a variante aspirada [ú] do fonema /r/, com novos informantes (de 6 entrevistas), com metodologia diferente e com itens lexicais dos questionários Fonético-Fonológico e Semântico-Lexical.

Sobre a fala soteropolitana, Canovas (1991) descreve as ocorrências de /S/ pós-vocálico e de /v, z, Z/ em ataque silábico. No entanto, por falta de disponibilidade local de programas como o VARBRUL, restringiu sua análise dos dados a um tratamento estatístico.

Sobre a reificação na fala pessoense, Marques (2001) delimita-se a descrever – fazendo uma abordagem sociolinguística quantitativa – sua ocorrência em relação ao fonema /v/ por ser a mais produtiva das três citadas em seu trabalho: /v, z e Z/.

No entanto, como conclamam alguns desses autores em seus trabalhos:

Muito embora não tenhamos conseguido reunir evidências mais conclusivas sobre a relação relevância informacional/economia linguística/enfraquecimento, consideramos que pesquisas futuras poderiam explorar mais detidamente o efeito dessa tríade na variação das fricativas sonoras. (RONCARATI, op. cit., p. 6)

Page 12: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

12

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

A “reificação” das fricativas [...], que ocorre de modo significativo nos informantes, constitui uma marca muito forte no falar fortalezense, revelando a importância de um estudo mais aprofundado de descrição do PB. (ALENCAR, op. cit., p. 138)

Com isso, o presente estudo propõe-se a fazer uma discussão mais aprofundada e atual sobre o assunto, utilizando:

•um número maior de informantes: de acordo com Guy e Zilles (2007), o tamanho ideal de uma amostra é de 4 ou 5 informantes por célula. Com isso, as chances de distorção de dados diminuem. É claro que esse tamanho dependerá da natureza linguística da variável a ser estudada;

•uma estratificação diferente, com informantes diferentes, proposta pelos projetos NORPORFOR e PORCUFORT, a qual será melhor detalhada no item Metodologia e procedimentos;

•a comparação dos resultados obtidos tanto na norma popular quanto na norma culta do falar fortalezense, a fim de verificar o estágio em que o fenômeno se encontra durante os momentos de execução desses projetos: se em variação estável ou mudança em progresso, e se atualmente ele é estigmatizado.

4. OBJETIVOS:

Geral:

- Descrever e analisar o efeito de fatores linguísticos e sociais sobre a realização variável das fricativas /v s S z Z/ na língua culta e popular falada em Fortaleza.

Específicos:

- Descrever e analisar as variáveis linguísticas que condicionariam o fenômeno, tais como: contextos fonológicos antecedente e subsequente (para /v/, no início e no interior do vocábulo; para /s/, em ataque silábico e no final do vocábulo; para /z/, em ataque e em coda silábica; para /Z/, no início do vocábulo; para /S/, contexto antecedente, no interior do vocábulo, em coda silábica, precedendo os fonema /d/ e /t/), posição/tonicidade do segmento e sua frequência de uso, dimensão do vocábulo, classes de palavras e ainda, para /v/, status morfológico do segmento;

- Descrever e analisar os condicionamentos sociais que interferem na realização do fenômeno em análise, tais como: sexo, faixa etária, escolaridade, formalidade, tipo de registro;

- Verificar, a partir dos resultados obtidos, se o fenômeno encontra-se atualmente em variação estável ou em mudança em progresso;

- Comparar os resultados obtidos neste estudo com os de trabalhos realizados em outros falares do português brasileiro.

5. REFERENCIAIS TEÓRICOS

A definição feita por Ferdinand de Saussure, no Curso de Linguística Geral, optava por uma língua como um sistema fechado e de caráter homogêneo e, portanto, não-variável no sistema linguístico. Para Saussure, a língua é um fato social, mas o é em termos de “sistema convencional adquirido pelos indivíduos no convívio social” (ALKMIM, 2001, p. 23). A língua é “um produto social da faculdade da linguagem” (SAUSSURE, 1973, p. 17).

Page 13: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

13

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Segundo esse linguista, a língua e a fala são duas partes antagônicas e indissociáveis entre si. No entanto, ele mesmo admite que essas duas partes seriam impossíveis de serem estudadas juntas, uma vez que não seria possível sistematizar a fala devido ao seu caráter individual, multiforme e heteróclito. Já a língua é totalmente passível de regularização por constituir-se num sistema fechado, regido por leis próprias e de caráter homogêneo. E, apesar de definir a língua como um fato social, Saussure excluiu a preocupação com os elementos de ordem social (como idade, sexo, escolaridade, etc.) e previu que a homogeneidade seria uma exigência básica para a descrição.

Ainda de acordo com esse linguista, todos os falantes possuem um conhecimento da língua, já que esta é um sistema que existe virtualmente em cada cérebro, e o que é fato da langue está no campo social, o que é fato da parole situa-se na esfera do individual. (op. cit., p. 21). No entanto, ele não menciona a comunidade como a matriz do desempenho da fala individual (WEINREICH, op. cit., p. 56). Sendo assim, poderíamos obter os dados para a descrição de uma língua a partir do depoimento de apenas um indivíduo. Este é um paradoxo saussuriano, pois, partindo-se de um único indivíduo, seria possível analisar o lado social da linguagem, mas somente pela interação de duas ou mais pessoas se poderia estudar o aspecto individual. (MONTEIRO, 2002, p.14).

A homogeneidade e a “exclusão” de variabilidade na língua foram princípios seguidos pelo estruturalismo, intensificados pelos adeptos da glossemática e fortalecidos pelo gerativismo.

Em 1968, Weinreich, Labov e Herzog propõem um modelo teórico conhecido por Teoria da Variação linguística, mais tarde denominada sociolinguística variacionista, na qual levam em consideração (como o próprio nome diz) a regra variável e seus determinantes sociais e estilísticos do(s) uso(s) da língua. Eles não se limitavam apenas a descrever a parole, mas sim, uma teoria para o sistema da língua. Tal sistema passaria a ser a língua em uso, e a parole (ou fala) estaria intrinsecamente ligada a ela, e uma não poderia se constituir sem a outra. Com isso, a Sociolinguística passa a preocupar-se com os elementos de ordem social (deixados de lado por Saussure). Segundo os autores, a associação entre estrutura e homogeneidade é uma ilusão, e a língua é justamente a junção entre fatores linguísticos e extralinguísticos (ou de ordem social).

A variação a ser estudada por esses autores comporta regularidades, passíveis de definição, que garantem que a língua mantenha sua sistematicidade dentro do universo aparentemente caótico da variação. É a chamada variação sistematizada. A prova de que essa heterogeneidade pode ser regularizada é a de que, entre os membros de uma comunidade, existe uma diversificação linguística, mas ela não os impede de se entenderem, de se comunicarem (TARALLO, 2001, p.6).

A partir disso, podemos definir o variacionismo como sendo um modelo teórico- metodológico que, assumindo a não-uniformidade dos mecanismos de expressão/significação linguística, procura alcançar a organização dinâmica que se manifesta e que efetivamente pode ser entendida como um ponto de partida a favor da diversidade que se revela na fala. (WEINREICH, op.cit., p. 37-8)

A variação é observada dentro de um determinado período de tempo em que duas ou mais formas competem em uma mesma gramática. Já o processo de mudança constitui um (re)arranjo na estrutura do sistema. E é por meio da variação que as línguas mudam, e mudança é uma característica das línguas naturais. As variantes linguísticas, por sua vez, são justamente as formas em variação, ou seja, são as “diversas maneiras de se dizer a mesma coisa em um mesmo contexto, e com o mesmo valor de verdade.” (TARALLO, op. cit., p.8)

Com base nesses pressupostos teóricos, trataremos o fenômeno em estudo com a metodologia a ser descrita a seguir neste projeto e interpretaremos os resultados, amparados pela teoria da Variação e Mudança, buscando eliminar preconceitos e contribuir para a descrição da língua em uso.

É importante ressaltar que não analisamos ainda todos os trabalhos que contemplam a realização das fricativas no PB e em outras línguas (como o espanhol), no entanto procuramos investigar trabalhos salientes em outras universidades brasileiras (UFPB, UFBA e UFC) aos quais tivemos acesso até o presente momento. Outros trabalhos com os quais venhamos a nos deparar servirão para ajustar/reorganizar a pesquisa que ora realizamos.

Page 14: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

14

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

6. METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS

6.1. Metodologia

Esta pesquisa utiliza como suporte teórico metodológico a perspectiva da Teoria Sociolinguística quantitativa Laboviana e segue os parâmetros estabelecidos pelo Projeto Norma Oral do Português Popular de Fortaleza (NORPORFOR) e do Projeto Português Oral Culto de Fortaleza (PORCUFORT).

Essa escolha justifica-se pelas seguintes razões:

a) O NORPORFOR é um projeto cujos inquéritos foram coletados entre 2003 e 2006, sob a coordenação da profª Drª Aluiza Araújo, e cujo objetivo é armazenar e disponibilizar material linguístico representativo do falar popular dos fortalezenses. Ele é composto por 197 informantes, estratificados de acordo com o sexo, a faixa etária (15 a 25, 26 a 49 e + de 50 anos), a escolaridade (0-4, 5-8, 9-11 anos de estudo) e o tipo de registro (DID, D2 e EF). Esse projeto atende às exigências da pesquisa sociolinguística quantitativa no que diz respeito aos critérios de seleção dos informantes e de coleta de dados. Além disso, trata-se do banco de dados de fala popular fortalezense mais atual que temos. Os informantes desta pesquisa, ao todo 76, foram distribuídos no quadro a seguir. Foram eliminados os DID’s para evitar qualquer forma de interferência do documentador que pudesse influenciar na realização de ocorrências do fenômeno em estudo. A faixa etária de 15 a 25 anos também foi eliminada para que a estratificação ficasse mais semelhante à do PORCUFORT.

SexoHomem Mulher

Registro D2 EF D2 EFEscolaridade

Idade

0-4 5-8 9-11 0-4 5-8 9-11 0-4 5-8 9-11 0-4 5-8 9-11

26 a 49 anos 4 4 4 4 3 4 4 5 5 0 5 450 em diante 3 3 4 3 2 1 4 5 4 1 1 1

quadro retirado do Projeto de Pesquisa: Digitalização e transcrição do corpus NORPORFOR (Norma Oral do Português Popular de Fortaleza); proponente: Profª Drª Aluiza Alves de Araújo

b) O PORCUFORT é um banco de dados levantados, sob a coordenação do prof. Dr. José Lemos Monteiro, de agosto de 1993 a setembro de 1995, cujas técnicas e métodos baseiam-se nos do Projeto NURC (Norma Linguística Urbana Culta do Brasil). Seu objetivo era documentar e descrever o português culto3 falado na cidade de Fortaleza. A tabela a seguir mostra a estratificação dos informantes para o presente estudo:

SexoHomem Mulher

Registro

Idade

D2 EF D2 EF

22 a 35 anos 4 3 9 436 a 50 anos 3 3 2 251 em diante 4 4 4 1

Para que a estratificação ficasse semelhante à escolhida no NORPORFOR, também foram eliminados os DID’s, ficando, então, 43 informantes.

6.2. Procedimentos (com resultados parciais)

Primeiramente serão feitas revisões das transcrições dos inquéritos juntamente com o armazenamento dos dados e das ocorrências encontradas neles. Em seguida, partiremos para a definição operacional das variáveis, em dependentes e independentes. Cada fonema será separado da seguinte forma:

3 O termo culto quer dizer, neste caso, “instruído”, ou seja, há apenas falantes que possuem nível superior.

Page 15: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

15

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

a) sua realização plena /v/ (ex.: “eu ia [v]oltá né?”)

< v >b) sua reificação /h/ (ex.: “amiga [ú]ai começá o Fortal”)

a) sua realização plena /s/ (ex.: “mai[s] quando eu digo...”; “Ave Maria ela pa[s]ou...”)< s > b) sua reificação /h/ (ex.: “...que ia ficá mai[ú] sei lá::”; “lá tem nego[ú]o de mêa” )

c) seu apagamento /∅/ (ex.: “...a côha mai[∅] sofisticada...”)

a) sua realização plena /z/ (ex.: “eu só di[z]eno a ela...”)

< z > b) sua reificação /h/ (ex.: “amiga lá em ca[ú]a...”)c) seu apagamento /∅/ (ex.: “e é me[∅]mo...”; “...poi[∅] eu só gosto...”)

a) sua realização plena /S/ (ex.: “...ficô de co[S]ta pra gente”)

< S >b) sua reificação /h/ (ex.: “pelo meno∅ ma[ú]tiga”)

a) sua realização plena /Z/ (ex.: “...tinha dado um [Z]antá”)

< Z >

b) sua reificação /h/ (ex.: “ela [ú]á terminô...”)

Portanto, as 5 variáveis dependentes foram analisadas separadamente, constituindo-se 3 delas variáveis binárias, e as outras 2, ternárias.

Em seguida, serão determinadas as variáveis independentes, isto é, os contextos ou grupo de fatores que estariam norteando a ocorrência das variáveis dependentes. A partir da audição de alguns inquéritos, pudemos chegar aos seguintes fatores linguísticos:

- Para /v/: contextos fonológicos antecedente e subsequente, no início e no interior do vocábulo;

- Para /s/: contextos fonológicos antecedente e subsequente, em ataque silábico e no final do vocábulo;

- Para /z/: contextos fonológicos antecedente e subsequente, em ataque e em coda silábica;

- Para /S/: contextos fonológicos antecedente, no interior do vocábulo (em coda silábica), precedendo os fonema /d/ e /t/;

- Para /Z/: contextos fonológicos antecedente e subsequente, no início do vocábulo.

Além dos contextos fonológicos, também serão levados em consideração, em todas as variáveis, a posição/tonicidade do segmento e sua frequência de uso, a dimensão do vocábulo, classes de palavras, e ainda, para /v/, o status morfológico do segmento.

As variáveis independentes e extralinguísticas analisadas são: sexo, faixa etária, escolaridade, formalidade e tipo de registro.

Em seguida, partiremos para a codificação de cada fator para que eles sejam submetidos ao pacote de programas específico para trabalhar com o modelo logístico descritivo, o VARBRUL, objetivando a análise estatística do fenômeno.

Page 16: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

16

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Por último, será feita a interpretação dos resultados com base na teoria da Variação e Mudança linguística.

8. HIPÓTESES

8.1. Hipótese Básica

Os fatores que mais favorecem o enfraquecimento (reificação e apagamento) das fricativas /v s S z Z/ são: contextos fonológicos antecedente e subsequente, frequência de uso do segmento, formalidade e tipo de registro. Ou seja, fatores de natureza linguística e extralinguística condicionam o fenômeno, de forma geral.

8.2. Hipóteses Secundárias

a) A realização das fricativas /v s S z Z/ no falar fortalezense é um fenômeno que reflete variação estável em alguns itens lexicais e mudança em progresso em outros, dependendo da frequência de usos destes;

b) O fator escolaridade exerce influência apenas no apagamento das fricativas, pois quanto menor o grau de escolaridade, maior o apagamento de /s/ e /z/, em final de sílaba;

c) Os fatores faixa etária e sexo não exercem influência sobre os fenômenos;

d) quanto o menor o grau de formalidade, maior será a aspiração/apagamento em todos os contextos analisados. No entanto, mesmo aumentando o grau de formalidade, ainda existe o uso da aspiração em alguns contextos;

e) quanto maior a frequência de uso do segmento, maior será a sua ocorrência na forma aspirada/apagada, dependo também dos contextos fonológicos antecedente e subsequente do mesmo;

f) O fenômeno em análise é estigmatizado no falar culto fortalezense, apesar da sua notável ocorrência.

A partir deste estudo, é possível perceber, através do conhecimento da forma de falar de uma comunidade, as características peculiares da origem ou do grupo do indivíduo e seu estilo pessoal, fazendo com que ele passe a valorizar mais a sua cultura e a entender que não fala “errado”, mas, sim, uma das variantes da sua língua.

9. REFERÊNCIAS

AGUIAR, Martins de. Fonética do português do Ceará (1937) Revista do Instituto do Ceará. Fortaleza: 51(51): 271-307. Disponível em: < http://www.ceara.pro.br/Instituto-site/Rev-apresentacao/RevPorAno/1937/1937-FoneticadoPortuguesdoCeara.pdf

ALENCAR, M. Silvana Militão de. A linguagem regional popular na obra de Patativa do Assaré: aspectos fonético-lexicais. 1997. 179f. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 1997.

_______________________________. Aspectos sócio-dialetais da língua falada em Fortaleza: as realizações dos fonemas /r/ e /ɾ/. Fortaleza, 2007. 184f. Tese (Doutorado em Linguística) – Centro de Humanidades, Universidade Federal do Ceará.

ALkMIM, Tânia M. Sociolinguística. In: MUSSALIM, Fernanda; BENTES, Anna C. (orgs.) Introdução à linguística: domínios e fronteiras. 2 ed. São Paulo: Cortez, p. 21-47, 2001.

ARAGÃO, M. do Socorro Silva de; SOARES, Maria Elias. A linguagem falada em Fortaleza: diálogos entre informantes e documentadores - materiais para estudo. Fortaleza: UFC, 1996.

Page 17: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

17

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

ARAGÃO, M. do Socorro Silva de. A neutralização dos fonemas /v,z,Ʒ/ no falar de Fortaleza. In: RIBEIRO, Silvana; COSTA, Sônia B.B.; CARDOSO, Suzana Alice M. (Orgs.). (Org.). Dos sons às Palavras: Nas Trilhas da Língua Portuguesa. Salvador - BA: EDUFBA, 2009, v. , p. 187-200.

ARAúJO, Aluiza A. de. A monotongação na norma culta de Fortaleza. Fortaleza, 2000. 110f. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2000.

___________________. As vogais pretônicas no falar popular de Fortaleza: uma abordagem variacionista. Fortaleza, 2007. Tese (Doutorado em Linguística) – Centro de Humanidades, Universidade Federal do Ceará.

BAGNO, Marcos. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística. São Paulo: Parábola Editorial, 2007.

CAMACHO, Roberto G. Sociolinguística. In: MUSSALIM, Fernanda; BENTES, Anna C. (orgs.) Introdução à linguística: domínios e fronteiras. 2 ed. São Paulo: Cortez, p. 49-75, 2001.

CANOVAS, Maria I. F. Variação fônica de /S/ pós-vocálico e de /v, z, Ʒ/ cabeças de sílaba, na fala de Salvador. Salvador, 1991. 168f. Dissertação (Mestrado em Língua Portuguesa) – Instituto de Letras, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 1991.

GUy, Gregory R.; ZILLES, Ana. Sociolinguística Quantitativa. São Paulo: Parábola, 2007.

HORA, Dermeval; PEDROSA, Juliene L. R.; CARDOSO, Walcir. Status da consoante pós-vocálica no português brasileiro: coda ou onset com núcleo não preenchido foneticamente? Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 45, n. 1, p. 71-79, jan./mar. 2010. Disponível em: < http://revistaseletronicas.pucrs.br/fale/ojs/index.php/fale/article/viewFile/6860/4992

LABOV, William. Sociolinguistics Patterns. Philadelphia: University of Pennsylvania, (1972) [ed. br.: (2008). Padrões Sociolinguísticos. trad. M. Bagno; Mª Marta P. Scherre & Caroline R. Cardoso. São Paulo: Parábola Editorial].

MACAMBIRA, José R. Fonologia do Português. Fortaleza: Secretaria de Cultura e Desporto, 1987.

MARqUES, Sandra M. O. A produção variável do fonema /v/ em João Pessoa. 2001. 96f. Dissertação de Mestrado - Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2001.

MARTINS, Marco Antonio. Entre estrutura, variação e mudança: uma análise sincrônica das construções com -se indeterminador no Português do Brasil. 134 f. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2005.

MONTEIRO, José Lemos. Para compreender Labov. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

RONCARATI, Cláudia N. Variação fonológica e morfossintática na fala cearense. In: RONCARATI, C. N. S. de. at alli. Projeto Dialetos Sociais Cearenses. Fortaleza: UFC, 1988. (12 págs.)

SAUSSURE, Ferdinand. Cours de Linguistique Générale. Organizado por Ch. Bally et A. Sechehaye, Paris, Payot, 1916 [ed. br.: (1973). Curso de linguística geral. trad. A. Chelini; J. P. Paes; I. Blikstein. São Paulo: Cultrix].

SERAINE, Florival. A relação do Maranhão do Padre Luís Figueira e o falar cearense atual. Revista do Instituto Histórico do Ceará. Fortaleza, 84 (81):21-55, 1970. Disponível em: < http://www.ceara.pro.br/Instituto-site/Rev-apresentacao/RevPorAno/1970/1970-RelacaoMaranhaoPadreLuisFigueiraFalarCearense.pdf

________________. Relações entre níveis de norma na fala atual de Fortaleza. In: SERAINE, Florival. Linguagem e cultura - estudos e ensaios. Fortaleza: Secretaria de Cultura e Desporto, 1984.

SILVA, Thaïs Cristófaro. Fonética e fonologia do português: roteiro de estudos e guia de exercícios. 7 ed.

Page 18: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

18

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

– São Paulo: Contexto, 2003.

TARALLO, Fernando. A pesquisa sociolinguística. São Paulo: Ática, 2001.

TORRES, Fábio Fernandes. O gerúndio na expressão de tempo futuro: um estudo sociofuncionalista. 2008. Projeto de Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2008.

WEINRICH, Uriel; LABOV, William & HERZOG, Marvin I. (1968). Empirical Foundations for a Theory of Language Change, in LEHMANN & MALkIEL (1968) [ed. br.: (2006). Fundamentos empíricos para uma teoria da mudança linguística. trad.: M. Bagno. São Paulo: Parábola Editorial].

Page 19: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

19

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

A ABORDAGEM DAS VARIANTES LINGUÍSTICAS NA AULA DE ESPANHOL COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA

Alana Brito BARBOSA (uFMA)

Paloma veras PEREIRA (uFMA)

Priscila Martins quINTANS (uFMA)

(Orientador) joão da Silva Araujo juNIOR (uFMA)

1. INTRODUÇÃO

A partir da assinatura do Tratado de Assunção em 1991, a língua espanhola conquistou um novo espaço no cenário brasileiro. As relações entre os países integrantes do Mercosul (Brasil, Uruguai, Paraguai e Argentina) intensificaram-se nos planos político, econômico, cultural e social. Em razão disso, o contato entre essas nações vizinhas tornou-se uma necessidade urgente, uma vez que as relações entre os países deveriam ser estabelecidas e mantidas.

A nova relação entre o Brasil e os países de língua espanhola que compõem o Mercosul teve reflexos no âmbito educativo (sobretudo no Ensino Médio). No dia 5 de agosto do ano de 2005 foi sancionada a Lei no 11.161

que torna obrigatória a oferta da Língua Espanhola, em horário regular, nas escolas públicas e privadas brasileiras que atuam nesse nível de ensino. A lei também faculta a inclusão do ensino desse idioma nos currículos plenos da 5ª à 8ª série do ensino fundamental. (BRASIL, 2006, p. 127).

A partir da obrigatoriedade da oferta da língua espanhola nas escolas de nível médio, muitas foram as questões levantadas acerca do ensino dessa disciplina. Uma dessas questões é levantada pelo próprio documento que norteia o ensino médio no Brasil, as Orientações Curriculares para o Ensino Médio: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. Ao tratar do ensino do espanhol no nível médio, o citado documento questiona: “O que fazer com a heterogeneidade do Espanhol?” (BRASIL, 2008, 134).

De acordo com Camargo (apud BRASIL 2006, p. 128), a relação entre os brasileiros e a língua espanhola

foi marcada (...), ao longo das últimas décadas, por uma hegemonia do Espanhol peninsular, que se impôs, por várias razões, tanto a professores hispanofalantes latino-americanos quanto a professores e estudantes brasileiros, levando à consolidação de preconceitos, à camuflagem das diferenças locais e ao apagamento das diferentes culturas e manifestações linguísticas que configuram a diversidade identitária do universo hispanofalante.

Page 20: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

20

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Desse modo, o panorama de ensino da língua espanhola tem girado em torno da valorização da variante peninsular, em detrimento das variantes hispano-americanas. No entanto, essa realidade não encontra respaldo nas Orientações Curriculares, uma vez que este documento ressalta a

(...) necessidade de substituir o discurso hegemônico pela pluralidade linguística e cultural do universo hispanofalante, ensejando uma reflexão maior. Nesse contexto, certamente a questão “Que Espanhol ensinar?” deve ser substituída por uma outra: como ensinar o Espanhol, essa língua tão plural, tão heterogênea, sem sacrificar as suas diferenças nem reduzi-las a puras amostragens sem qualquer reflexão maior a seu respeito? (BRASIL, 2006, p. 134)

Nessa mesma direção, Alkmim (2001, p.32) afirma: “(...) toda comunidade se caracteriza por diferentes modos de falar. A essas diferentes maneiras de falar, a Sociolinguística reserva o nome de variedades linguísticas”. Assim sendo, o ensino de língua espanhola deverá, obrigatoriamente, levar em consideração a heterogeneidade constitutiva da língua.

Assim, partindo do pressuposto de que todas as línguas variam e de que o espanhol, por ser língua oficial de diversos países, apresenta um significativo grau de variação geográfica, entendemos que se torna relevante um estudo acerca de como essas variações vêm sendo abordadas nas aulas de espanhol como língua estrangeira no ensino médio. Objetivamos, com esse estudo, verificar como os docentes têm tratado a questão da variação linguística nas aulas de língua espanhola e como conduzem suas aulas nesse sentido.

2. VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: O ESPANHOL COMO LÍNGUA PLURAL

O espanhol é língua oficial em mais de vinte países em três continentes, sendo que, como língua materna, há aproximadamente 350 milhões de falantes.

Nas últimas décadas, em nível mundial, mais pessoas estão aprendendo este idioma como língua estrangeira e, além disso, é atualmente a terceira língua mais utilizada na Internet.

Considerando que a língua é um produto sócio-histórico-cultural, e que em cada povo e em cada época ela assume peculiaridades em seus diversos níveis de análise (léxico, fonético, fonológico, morfológico, sintático), a língua espanhola, por sua amplitude geográfica e cultural, é particularmente rica em diversidade linguística, o que podemos observar nos mais diversos níveis da análise linguística, como veremos a seguir.

No plano morfológico, por exemplo, temos o caso do voseo, que consiste no uso do pronome vos em lugar do pronome tú, sendo utilizado, geralmente, em situações nas quais os falantes mantêm uma relação de proximidade, familiaridade como seus interlocutores. Assim, por exemplo, vemos: tú hablas > vos hablás, tú vienes > vos venís.

[...] el voseo ha persistido en gran parte de Hispanoamérica. Si descendemos por el mapa de América, lo encontraremos en los estados del sur de México, en Centroamérica, en la zona andina de Colombia y Venezuela, donde también se da en la región occidental, en la zona costera y serrana del Ecuador, en algunas provincias del norte y del sur de Perú, en Bolivia, en Paraguay, Uruguay, Argentina y Chile (CARRICABURO, 1997, p. 19).

Há, também, nos países sul-americanos uma notória preferência pela utilização do pronome de 2ª pessoa do plural ustedes mesmo em contextos familiares, enquanto que na Espanha esse pronome é utilizado unicamente em contextos formais, sendo o vosotros utilizado nos contextos familiares (cf. Malmberg, 1974).

Outro fenômeno bastante recorrente em alguns países, como na Argentina, é o uso do pretérito indefinido em situações em que, na variante padrão, se utilizaria o pretérito perfeito (cf. Malmberg, 1974).

No plano fonético, temos, por exemplo o fenômeno denominado yeísmo, que consiste em pronunciar o /

Page 21: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

21

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

ll/ como /y/: calle > [úkaye], pollo > [úpoyo]. Além desse, destacamos a aspiração ou a perda do /s/, como documentado por quillis et all (1995, p.533):

La aspiración o pérdida de /s/ en posición silábica implosiva o posnuclear. Se aspira en las zonas litorales del sur de Méjico, gran parte de Centro América, interior de Venezuela y Colombia, zona litoral del Ecuador y Perú, en el este de Bolivia, Chile, Argentina, Uruguay y Paraguay. En estas zonas, se dice: [éhte] este, [móhca] mosca, lo mismo que en la parte centro y meridional de España.

No plano lexical, há um rol extenso de palavras que têm sua forma diferente, mas que remetem ao mesmo significado. Por exemplo, em português, para saia (peça do vestuário), temos falda, na Espanha, e pollera, na Argentina; para ônibus, temos, autobus, na Espanha, guagua, em Cuba, colectivo, na Argentina, camión, no México, e liebre, no Chile.

Estes exemplos constituem algumas amostras da abrangência e da forma como se apresenta a variação linguística no âmbito da língua espanhola.

É importante, ainda, deixar claro que, como afirma Castilho (2010, p. 197), as línguas são “(...) também inevitavelmente voltadas para a mudança, pois os grupos humanos são dinâmicos, e as línguas que eles falam precisam adaptar-se às novas situações históricas.”.

Como afirma Faraco (2005, p. 32):

Cada variedade é resultado das peculiaridades, das experiências históricas e socioculturais do grupo que a fala: como ele se constituiu, como é sua posição na estrutura socioeconômica, como ele se organiza socialmente, quais seus valores e visão de mundo, quais suas possibilidades de acesso à escola, aos meios de informação, e assim por diante.

Essa diversidade, portanto, não ocorre de forma aleatória, sendo, condicionada por diversos fatores internos e externos, que recobrem questões de variação no eixo individual, no eixo temático, no eixo social (variação diastrática), no eixo geográfico (variação diatópica) (cf. Castilho, 2010).

Pesquisas sobre a realidade do ensino da língua espanhola e a questão da variação estão sendo realizadas em várias partes do Brasil. Dentre elas destacamos o trabalho de Nascimento (2007) que analisou a questão das variantes da língua espanhola no que diz respeito à utilização dos pronomes pessoais sujeito (já que há uma notória diferença de uso entre a Espanha e os países hispano-americanos) em materiais didáticos e em sala de aula, na cidade de João Pessoa. O estudo constatou que tanto nas aulas quanto nos materiais didáticos, há o predomínio das formas pronominais utilizadas na Espanha.

Bugel (1999), por sua vez, constatou que, na cidade de São Paulo, há o predomínio de livros elaborados na Espanha e que, portanto, a abordagem feita nas aulas parte da variante peninsular, desconsiderando, por exemplo, a situação geográfica do Brasil.

3. METODOLOGIA

Para realizarmos nossa investigação utilizamos o método de pesquisa etnográfica, por meio da observação, da análise e descrição dos fatos que giram em torno da forma como os docentes têm tratado a questão da variação linguística em suas aulas.

Segundo Heberlein (2010, p. 478), “Uma das principais características da Etnografia é seu caráter interpretativista, (...) que retrata um recorte de tempo no qual aquela cultura foi pesquisada, sem (...) mostrar resultados estáticos e verdades imutáveis.”.

Ademais, a investigação teve como fundamentação as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (BRASIL, 2008) para que tivéssemos um embasamento a respeito de como podemos lidar com

Page 22: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

22

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

heterogeneidade da língua espanhola em sala de aula; os estudos realizados por Alkmim (2001), Bugel (1999) e Nascimento (2007), no que concerne, respectivamente, à observação de que as comunidades são marcadas por distintos modos de falar, tratando-se, dessa forma, das variações linguísticas, e, os dois últimos, estudos sobre a abordagem das variantes espanholas em um contexto escolar e social e, por fim, Castilho (2010) pontuando sobre as questões concernentes à variação linguística.

Para a realização desta pesquisa seguimos as seguintes etapas: 1 – observação das aulas de cada professor, verificando de que forma conduzia o trabalho com as variantes por meio das temáticas abordadas; 2 – aplicação de questionários aos docentes, o que nos possibilitou fazer uma comparação entre o observado durante as aulas e o discurso dos docentes em sua prática propriamente dita.

Observamos as aulas em quatro escolas públicas durante o primeiro trimestre letivo de 2010 e aplicamos os questionários a seis professores do 2° ano do ensino médio, sendo que em duas escolas (identificadas, para efeito desta pesquisa, como A e B) havia dois professores de língua espanhola e nas outras duas (B e C) havia apenas um docente.

O fato de termos observado aulas dadas somente em turmas de 2º ano nos proporcionou uma melhor comparação entre as aulas, pois os professores estavam trabalhando praticamente o mesmo conteúdo.

Nos primeiros dois meses, assistimos a cinco aulas de cada professor e anotamos os pontos que foram relevantes, no que dizia respeito ao tratamento das variantes linguísticas. Após a observação, voltamos às escolas e aplicamos o questionário com cada professor. Os questionários formam aplicados em forma de diálogo, tendo como base as seguintes indagações:

1 – Você encontra dificuldades ao ensinar espanhol pelo fato de se tratar de uma língua que é falada em muitos países?

2 – Você dá ênfase a uma variante em particular em suas aulas?

3 – Como você procura abordar o tema variação linguística nas suas aulas?

4 – Você faz uso de amostras linguísticas (música, vídeo) de falantes nativos de diversos países como forma de mostrar as variantes existentes?

Da mesma forma que fizemos com a observação das aulas, não utilizamos gravador ou outra forma de gravação, de modo a manter a espontaneidade dos docentes e deixá-los mais a vontade, pois caso houvesse gravação, acreditamos que os professores, talvez, tivessem mais cautela e monitorariam mais o seu dizer.

4. ANÁLISE DOS DADOS

Tal como elucidado anteriormente, nossa pesquisa teve como cerne dois momentos: a observação das aulas e a aplicação do questionário aos docentes.

No primeiro momento da pesquisa, ficou nítido que os seis professores priorizaram a abordagem da variante peninsular em detrimento das outras variantes, quando, por exemplo, ao tratarem da questão pronominal, não enfocaram a utilização do voseo, fenômeno tão recorrente em alguns países latino-americanos e, também, por darem uma grande ênfase à utilização do pronome vosotros, que possui seu uso, quase que exclusivo, pelos espanhóis.

No que se refere à variação lexical, três, dos seis professores, deixaram claro, em suas aulas, que, dependendo do país, a forma de se referir a determinado objeto ou ser pode variar, no entanto, não aprofundam tal temática.

Na segunda parte da pesquisa – a aplicação do questionário – houve unanimidade entre os professores no

Page 23: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

23

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

que diz respeito à consciência da importância do ensino das distintas variantes do espanhol em suas aulas. Afirmaram, inclusive, que para os alunos perceberem que estavam tendo contato com a “heterogeneidade da língua espanhola”, usavam aparatos como músicas, vídeos, ou mesmo passavam trabalhos de pesquisa sobre a língua espanhola e sua pluralidade no mundo, a fim de que encontrassem pronúncias, vocabulários, costumes e tradições de diferentes países hispanofalantes.

Por outro lado, ainda que os professores tenham afirmado trabalhar dessa forma, quando foram indagados sobre a ênfase dada a alguma variante do espanhol em suas práticas, responderam que a mais utilizada era, sem dúvidas, a variante peninsular: “nos centros acadêmicos nós tivemos e ainda temos contato mais aprofundado com o espanhol da Espanha” (professor da escola A), “(...) é uma vertente de certa forma mais pura, clássica” (professor da escola C), “a credibilidade da variante peninsular já está arraigada nos centros de ensino e a consciência em relação às outras variantes aparece a título de amostra que as línguas, de modo geral, são heterogêneas.” (professor da escola B).

Além disso, ao serem indagados sobre a possível dificuldade de ensinar espanhol pelo fato de se tratar de uma língua rica em variedades, os professores disseram lidar bem com esse fato, por se considerarem bem capacitados e plenamente capazes de conduzir suas aulas abordando as diferentes variantes do espanhol, uma vez que, além de fazerem uso dessas, inclusive, deixam seus alunos conscientes de seu método de ensino e de suas escolhas a respeito das variantes.

Com esses apontamentos, alguns aspectos devem ser enfatizados, como, por exemplo, o contraponto encontrado entre a nossa observação durante as aulas e as suas respostas ao questionário, pois, ainda que os docentes tenham afirmado veementemente que seus alunos tinham conhecimento do contato e uso de distintas variantes do espanhol, nas aulas não foi explicitado que os discentes tinham absoluta consciência deste fator, tampouco que dispunham de meios que os fizessem ter esse discernimento.

É importante assinalar, ainda, a existência de discursos sobre a “credibilidade e pureza” da variante peninsular. O que ainda percebemos, com nitidez, é que parâmetros sociais e políticos influenciam a escolha dessa variante, uma vez que supostamente são esses parâmetros os motivadores do “prestígio”.

O uso da variante peninsular em detrimento do uso de variantes como a rio-platense, por exemplo, é um claro indício da permanência do ideal de que as variantes da Espanha são preferíveis por ser este país “o berço da língua e da cultura”, como assinala Bugel (1999, p.84).

Esse fato nos leva inevitavelmente ao pensamento de uma “castidade da língua espanhola falada na Espanha”, o que é impossível, afinal, nos próprios meandros da sociedade espanhola é comum a presença da variação linguística.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos meandros do processo de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras é comum refletirmos sobre questões do tipo: “o que se quer aprender”, “o que se quer ensinar” e, principalmente, “como realizar o estudo e a análise de uma língua, como a espanhola, que apresenta variações nos níveis semântico, sintático, morfológico, e que, por ser falada em muitos países, apresenta diferenças que vão desde o âmbito econômico até manifestações de cunho sócio-cultural.”.

São indagações como estas que motivam pesquisas que, diante do contexto globalizado e repleto de diversidades, propõem investigar como se encontra o panorama do ensino de língua espanhola no Brasil e como os aprendizes estão sendo preparados para lidar com a questão da variação linguística e, de forma mais ampla, com a questão da heterogeneidade com a qual todos se deparam.

Nesse sentido, as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (BRASIL, 2006, p.134) trazem uma pergunta bastante pertinente “como ensinar o Espanhol, essa língua tão plural, tão heterogênea, sem sacrificar as suas diferenças nem reduzi-las a puras amostragens sem qualquer reflexão maior a seu respeito?” que deixa claro que os docentes devem observar que não basta levar às aulas pequenas amostras de variantes. É preciso, portanto, utilizar meios que levem os alunos ao entendimento da heterogeneidade inerente a qualquer língua e cultura.

Page 24: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

24

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

No que concerne tema deste estudo, observamos que a prática dos docentes não condiz com o que é proposto nas Orientações Curriculares, pois, de modo geral, essa prática não cria condições para que os alunos tenham conhecimento e optem pela variante linguística que considerem mais viável ao seu aprendizado, uma vez que, dando ênfase apenas à variante peninsular e tratando as demais como “curiosidade”, os professores não oferecem subsídios suficientes ao aluno para que este tenha uma real percepção a respeito da heterogeneidade da língua.

Com isso, há a necessidade de levarmos em conta um fator essencial: o ensino pautado na explanação de exclusivamente uma variante, como a peninsular, significa a continuidade de uma concepção homogênea de língua, que não condiz com a realidade linguística da língua espanhola.

REFERÊNCIAS

ALkMIM, T. M. Sociolinguística: parte I. In: MUSSALIM, F; BENTES, A.C. (Orgs.). Introdução à linguística: domínios e fronteiras. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2001. v. 1.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Linguagens, códigos e suas tecnologias/Secretaria de Educação Básica (Orientações Curriculares para o ensino médio; volume 1). Brasília: Ministério da Educação, 2006.

BUGEL, Talia. O espanhol na cidade de São Paulo: quem ensina qual variante a quem? Trabalhos de Linguística Aplicada, Campinas, v. 33, p. 71-87, jan/jul. 1999.

CARRICABURO, Norma. Las fórmulas de tratamiento en el español actual. Madrid: Arco Libros,1997.

CASTILHO, Ataliba T. de. Nova gramática do português brasileiro. São Paulo: Contexto, 2010.

FARACO, C. A. Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas. São Paulo: Parábola, 2005.

HEBERLEIN, Maria Carolina Terra. O uso de estratégias de comunicação no contexto de sala de aula: um estudo de caso. Via Litterae, Anápolis, v. 2, n. 2, p. 474-489, jul./dez. 2010. Disponível em:

<http://www.unucseh.ueg.br/vialitterae/assets/files/vl_v2_v2/11-55- O_uso_de_estrategias_de_comunic_em_sala_de_aula-MARIA_C_T_HEBERLEIN.pdf.> Acesso em: 15 jul. 2010.

MALMBERG, Bertil. La América hispanohablate: unidad y diferenciación del castellano. 3. ed. Madrid: Ediciones ISTMO, 1974.

NASCIMENTO, Erivaldo Pereira do. Prestígio linguístico no ensino de espanhol como língua estrangeira: o caso dos pronombres personales sujeto. Studia Diversa, João Pessoa, v. 1, n. 1, p. 23-35, out. 2007. Disponível em: <http://www.ccae.ufpb.br/public/studia_arquivos/arquivos_01/sd_completa_01.pdf. > Acesso em: 25 jun. 2010.

qUILLIS, Antonio et all. Lengua española: curso de acceso. 2. ed. Madrid: Editorial Centro de Estudios Ramón Areces, 1995.

Page 25: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

25

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

A NORMA CULTA FALADA NA CIDADE DE MANAUS EM SITUAÇÕES COMUNICATIVAS DE ENTREVISTAS

Bruno de Sousa Andrade (PAIC/uEA-ENS)

(Orientadora) Silvana Andrade Martins (PAIC/uEA-ENS/FAPEAM)

INTRODUÇÃO

O presente trabalho é um dos três desdobramentos que compõem o macroprojeto Fala Manauara Culta (Famac) – projeto que propõe a instauração de pesquisas sistemáticas sobre a variedade urbana culta da língua portuguesa falada na cidade de Manaus. Em contraste com os outros dois subprojetos filiados (situações dialógicas informais e elocuções formais), este é voltado especificamente para o registro de situações comunicativas de entrevistas. Por se tratar de uma pesquisa no âmbito da sociolinguística, entende-se que nosso objeto de estudo – a língua falada, ou seja, o fato linguístico – “é uma atividade sociointerativa, histórica e cogntiva, e não um sistema de regras ou simples instrumento de informação” (MARCUSCHI, 2001). Portanto, objetivou-se, a fim de dar contribuição aos estudos sobre a pluralidade de normas do português brasileiro, montar um banco de dados com registros sonoros da fala de um grupo linguístico-cultural específico, a dos manauaras. Segundo as palavras de Labov (1998), “o método básico para se obter uma grande quantidade de dados confiáveis da fala de uma pessoa é a entrevista individual gravada”. Por isso, justifica-se a escolha dessa modalidade como uma das situações comunicativas adotadas.

METODOLOGIA

Abstraindo o conceito de Norma Culta, a partir das palavras de Bagno (2007), de que esta “deve ser entendida como (...) a norma linguística praticada, em determinadas situações (aquelas que envolvem certo grau de formalidade), por aqueles grupos sociais mais diretamente relacionados com a cultura escrita, em especial por aquela legitimada historicamente pelos grupos que controlam o poder socialdeve ser entendida como designado”, definiu-se o perfil dos locutores. Para tanto, os seguintes critérios foram utilizados: ser manauara nascido e residente na cidade há pelo menos 20 anos e possuir Ensino Superior completo. Após o preenchimento de uma ficha de identificação, eram feitos os registros das entrevistas. As variáveis utilizadas na seleção dos participantes da pesquisa foram gênero e faixa etária. Essa última foi dividida em três grupos de falantes: de 25 a 36 anos; de 36 a 55 anos e de 55 anos em diante. As entrevistas versaram sobre temas tais como: cidade, família, política, turismo, viagens, profissão etc, os quais se desenvolviam a partir de perguntas retóricas formuladas pelo entrevistador. As gravações foram registradas por meio de um gravador modelo da Panasonic, que possui todas as funções necessárias que garantiram a obtenção de registros de qualidade.

RESULTADOS

Ao término do subprojeto, produziu-se um banco de dados constituído de 14 entrevistas, que correspondem a 6 horas de gravação. Dessas entrevistas, participaram 7 mulheres e 7 homens das seguintes áreas de

Page 26: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

26

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

conhecimento: turismo, política, negócios bancários, educação etc. Houve um maior número de participantes da primeira faixa etária (de 25 a 36 anos) e os temas preferenciais das entrevistas foram profissão e casa, os quais foram direcionados tanto pelo documentador quanto pelo entrevistado.

Excerto da entrevista, conforme está disponível no site: Inquérito 01 / Tema: Casa / Duração:36:30 Data de Registro:24/10/09 Informante: sexo feminino, 40 anos de idade, pais amazonenses, bancária

D2: qual era a parte da casa que a senhora mais gostava? INF: ah... era a varanda nossa senhora lá eu brincava de velocipe corria jogava bola perdia também muito brinquedo porque quando a bola caía a parte da varanda até... (inint.) então a gente gostava muito de ficar lá porque tinha umas casas então a gente ficava olhando todo mundo lá de cima e na realidade

Por fim, efetivou-se a criação do site, o qual tem como meta de globalizar o material para que sirva de subsídio a futuros estudos e trabalhos relacionados à fala manauara.

REFERÊNCIAS

BAGNO, Marcos. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística. São Paulo: Parábola, 2007.

LABOV, Willian. Padrões sociolinguísticos. São Paulo: Parábola, 2008.

MARCUSCHI, Luiz Antonio .Da fala para a escrita : atividades de retextualização. São Paulo. Cortez: 2001.

Page 27: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

27

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

A CONCORDÂNCIA VERBAL DE PRIMEIRA PESSOA DO PLURAL NA FALA POPULAR DE INFORMANTES DE MARTINÓPOLIS-TO: CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Cícero da SILvA4

Maria Aparecida Nunes CARvALHO5

1. Introdução

A concordância verbal de primeira pessoa do plural na fala popular constitui uma regra variável, bastante recorrente no português brasileiro (doravante PB), como alguns estudos têm mostrado. E, observando o contexto geográfico e linguístico nacional e sua dimensão, nota-se que os estudos sociolinguísticos sobre o português falado no Estado do Tocantins ainda são poucos. E a maioria das pesquisas variacionistas realizadas no Estado têm como foco as línguas das etnias indígenas ou o PB nas comunidades quilombolas.

Dessa maneira, este estudo tem por objetivo descrever a variação na concordância verbal de primeira pessoa do plural na fala de informantes da comunidade de Martinópolis, distrito localizado na zona rural do município de Bandeirantes, Estado do Tocantins. A proposta do trabalho é poder contribuir para a descrição do PB falado no Tocantins.

À luz das teorias linguísticas, a primeira parte do artigo delineia considerações sobre algumas correntes de estudos linguísticos do século XX, bem como uma contextualização sobre a Sociolinguística variacionista, seu surgimento e seus pressupostos teóricos (LABOV, 2008). Já na segunda parte do trabalho, apresentamos a metodologia, a amostra, os procedimentos de coleta e análise dos dados, local da pesquisa de campo e resultados obtidos sobre a unidade linguística em estudo.

Assim, a fala popular pode ser vista como aquela que traduz com maior frequência algum tipo de variação, pois é a linguagem usada de forma natural, espontânea no cotidiano das pessoas. Por isso, está condicionada ao assunto e a aspectos históricos e geográficos da região dos informantes. E o modelo teórico-metodológico da sociolinguística variacionista permite explicar e descrever a língua analisando os fatores sociais e linguísticos que estão envolvidos em fenômenos de variação ou mudança.

2. Fundamentação teórica

A visão de língua como expressão social, já que se pode considerá-la como parte integrante da cultura de um povo, só vai ganhar importância entre os linguistas a partir do Estruturalismo saussureano (LyONS, 1987). Nesse período, isto é, início do século XX, a língua vista como sistema abstrato firma-se como método teórico-metodológico dos estudos linguísticos. Todavia, a partir da análise de algumas ideias de Ferdinand Saussure, especialmente aquela que ele descreve a noção de língua e suas dicotomias (diacronia 4 Professor da Secretaria de Educação e Cultura do Tocantins (SEDUC-TO) e Mestrando do Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal do Tocantins (UFT). E-mail: [email protected] Licenciada em Letras e Professora da Secretaria de Educação e Cultura do Tocantins (SEDUC-TO).

Page 28: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

28

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

e sincronia), vão surgir conflitos em relação às ideias de outros linguistas que têm a concepção de língua enquanto mecanismo variacional e uso concreto.

De acordo com Calvet (2002, p.14), o francês Antoine Meillet (1866-1936) foi o primeiro linguista a ter conflito frente às ideias saussureanas, quando este discorre sobre o polêmico conceito de que “a linguística tem por único e verdadeiro objeto a língua considerada em si mesma e por si mesma”, presente no final da obra Curso de linguística geral, de Ferdinand Saussure. Para Meillet, essa afirmação reconhece como verdadeiro o caráter social da língua, porém transforma em outra coisa, uma espécie de linguística que estuda a língua como sistema fechado, isolado da comunidade de fala. Assim, o problema que se vai arrastar por mais de meio século é o fato do estruturalismo linguístico ter sido estabelecido sem levar em consideração o que existe de social na língua, que na visão de Calvet, a explicação da estrutura linguística dá-se pela história, pois “Enquanto Saussure busca elaborar um modelo abstrato de língua, Meillet se vê em conflito entre fato social e o sistema que tudo contém: para ele não se chega a compreender os fatos da língua sem fazer referência à dicotomia, à história.” (CALVET, 2002, p. 14)

Essa ideia passa-nos a noção de língua como fato social, concebida pela sociedade, o que seria anti-saussureano, pois apesar de Saussure reconhecer que a língua é um sistema elaborado pela comunidade de fala, é somente nela que ele a considera social. Portanto, contrariando esse ponto de vista, Meillet (o qual foi um dos grandes discípulos de Saussure) defende que em um estudo da estrutura linguística é preciso unir estrutura e história, já que a língua é um fato social, pois é do seio social que ela brota. Surge, então, a linguística moderna.

Mas os estudos linguísticos não vão parar por aí. Esses dois discursos vão estender seus ecos até os anos 1950 e 1960, de forma calorosa entre os linguistas, até o Gerativismo chomskyano ganhar força e espaço. Contudo, o fervor desta nova teoria de estudo da língua(gem) vai ser muito restrito ao estudo da frase, o que significa dizer que era mais um estudo abstrato da língua(gem), pois Lyons (1987, p. 211) define-o como “(...) uma versão particular do estruturalismo”. Desse modo, aos estudos gerativistas vai interessar mais aquilo que as línguas possuem em comum, apontando-se certa tendência à gramática universal. Na prática, essa visão teórica de estudo de língua não comungava com a visão de Meillet, ou seja, com uma linguística de caráter social. Mas, finalmente, entra em cena o linguista William Labov, o qual irá defender contundentemente que a linguística é uma ciência social. A partir daí, floresce e frutifica a Sociolinguística, embora não se possa negar que essa nova linha de pesquisa da linguagem já havia aflorado muito cedo, isto é, a partir dos embates teórico-metodológicos entre Saussure e Meillet.

E foi confrontando os estudos linguísticos saussureanos e meilletanos que Labov procurou segmentar a sua teoria variacionista. Ao aprofundar os estudos e as análises envolvendo o confronto entre as ideias teóricas de seus predecessores, Labov reconhece a importância da ideia que Meillet defendia, ao afirmar que a língua é um fato social. Com efeito, implicaria ainda aos estudos labovianos um aprofundamento maior acerca do método de estudo linguístico adotado por Meillet, para conceber de fato o método variacionista. E, de acordo com Calvet,

(...) Meillet, comparista de alto nível, trabalhou sobretudo com as línguas mortas, enquanto Labov trabalha continuamente com situações contemporâneas concretas, enfrenta problemas de metodologia da pesquisa, em suma, constrói um instrumento de descrição que tenta ultrapassar Meillet, integrando-os, aos métodos heurísticos da linguística estrutural (...). (CALVET, 2002, p. 33)

Desse modo, Labov atém-se ao fato de que é preciso formular uma nova metodologia de estudo, pois suas pesquisas envolveriam análise da língua(gem) em uso por uma comunidade de fala, e não língua morta. Segundo Labov (2008, p. 215), “A língua é uma forma de comportamento social: (...) ela é usada por seres humanos num contexto social, comunicando suas necessidades, ideias e emoções uns aos outros.” Partindo dessa concepção, foi necessária a adoção de novos métodos de coleta de dados, envolvendo variáveis sociais e linguísticas, já que se propôs a verificar uma situação de uso real da língua.

Page 29: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

29

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

2.1 Variação linguística

quando falamos em termos de variação linguística, basicamente, procuramo-nos limitar ao uso de variantes constatadas nos diversos níveis da gramática de determinada língua, como a fonética, a morfologia, a sintaxe, etc. Na verdade, podemos aceitar que essa ideia é plausível e faz parte do campo de estudo da sociolinguística. Em se tratando do léxico, Mollica (2004, p. 9) mostra alguns exemplos de variação: “framengo”, “andano”, “ta”, “paia”, encontrados no português falado no Brasil, coexistindo com: “flamengo”, “andando”, “está”, ”palha”. Essas são algumas das ocorrências que ilustram a variabilidade linguística que está presente em todas as línguas naturais humanas. Observa-se também que em certos segmentos sociais não se realiza a concordância entre sujeito e verbo, e isto ocorre com mais frequência se o sujeito está posposto ao verbo (SCHRRE; NARO, 1998). Algumas palavras são empregadas em um sentido específico de acordo com a localidade de cada falante.

Além disso, Beline (2005, p. 125) afirma que “De uma perspectiva variacionista quantitativa, (...) a sociolinguística ocupa-se em desvendar como a heterogeneidade – ou seja, a variação – se organiza”. Em outras palavras, pode-se afirmar que é por meio de um estudo sociolinguístico que se procura constatar e compreender de que modo a variação é regulada, de que modo ela é condicionada por fatores sociais.

Retomando essa ideia, na concepção de Tarallo (1990, p. 8) “variantes lingüísticas” são as diversas maneiras de se dizer a mesma coisa em um mesmo contexto, mantendo-se o mesmo valor de verdade.

Assim, a variação manifesta-se tanto em nível de grupo como no nível individual. No caso atual do português brasileiro, observando os resultados de uma pesquisa envolvendo a variação na marcação de plural nos SNs, Scherre e Naro (1998, p. 1) afirmam que: “Diferentemente do português de Portugal, o português vernacular do Brasil apresenta variação sistemática nos processos de concordância de número, exibindo variantes explícitas e variantes zero (0) de plural em elementos verbais e nominais (...)”. Essa situação configura uma ocorrência de variação linguística na comunidade de fala observada tanto no Brasil quanto em Portugal. O exemplo citado também ilustra que, apesar disso, o uso da variante zero (0) ou não-padrão representa uma das variantes linguísticas peculiares no uso cotidiano do português brasileiro.

2.2 Concordância verbal de primeira pessoa do plural

A alternância das formas dos pronomes sujeitos nós e a gente, representando a primeira pessoa do plural, é de uso comum entre os falantes no Brasil (LOPES, 2008). A gramática normativa, entretanto, por raramente explicar certos fenômenos já consagrados na língua falada, em alguns momentos parece apresentar divergências quanto à classificação e inserção da forma a gente no sistema de pronomes pessoais e considera o pronome nós como mero plural de eu.

Nos últimos anos, foram realizadas várias pesquisas sobre a introdução da forma a gente no quadro dos pronomes pessoais, como uma variante do pronome de primeira pessoa no plural nós (ZILLES; BATISTA, 2005). No caso atual do português brasileiro, observando os resultados de uma pesquisa envolvendo a variação em termos de uso da expressão a gente em vez de nós, a ocorrência geral de uso de a gente chegou a 69% (OMENA, 1996, p. 79). Nota-se, então, que em uma comunidade há falantes que evitam o uso de a gente, enquanto outros dificilmente lembram-se de nós. São atitudes e opções individuais, que, de certo modo, configuram o aspecto social da comunidade linguística, uma vez que neste caso temos a variante não-padrão (a gente) sendo usada concomitantemente com a forma padrão (nós).

Observa-se também que é crescente o emprego da expressão a gente na função de pronome pessoal, ora para fazer referência à primeira pessoa do plural (nós), ora para fazer uma referência genérica, mas sempre o falante inclui-a no conjunto referido. Geralmente, nos casos em que a expressão a gente faz referência a nós, podemos observar que os pronomes possessivos que a ele se relacionam tomam a forma da primeira pessoa do plural. Porém, a concordância com os objetos pode manifestar ou não a primeira pessoa do plural.

Em termos gerais, os pronomes pessoais são caracterizados pelos gramáticos como indicadores universais das três pessoas do discurso: quem fala, com quem se fala e de quem se fala. Admitindo-se formas no singular com correspondente no plural, a descrição gramatical refere-se à oposição singular plural nos pronomes pessoais, dando a noção de número, o que implica o agrupamento de elementos de mesma natureza, embora não seja isto que ocorre com a forma nós, entendida como plural de eu e vós/vocês como plural de tu/você.

Page 30: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

30

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Com base em um levantamento sobre a marcação de plural em língua portuguesa (BECHARA, 1976), verifica-se que vários são os processos utilizados para isso. Mas, na primeira pessoa do plural, o morfema flexional marcador de plural na língua oficial do Brasil tem sua representação pela desinência -mos, oposto a um [0], pois a marcação de plural ocorrerá tanto no sintagma nominal (SN) como no sintagma verbal (SV). De acordo com Monteiro (1991, p. 60), “A desinência /mos/ em viajamos indica a pessoa (primeira) e o número (plural). Será incorreto encontrar dois morfemas, ou seja, dizer que /mo/ marca a primeira pessoa e /s/ caracteriza o plural.” Desse modo, o desinência /mos/ é indivisível e expressa as duas noções simultaneamente.

3. Metodologia

A pesquisa é de natureza bibliográfica e de campo, fundamentada nos princípios teóricos da sociolinguística (LABOV, 2008; TARALLO, 1990), a fim de possibilitar a comparação de resultados entre as variedades linguísticas. O corpus é constituído de seis gravações (em fita K-7) de sessenta minutos cada uma com seis falantes da comunidade de Martinópolis, Estado do Tocantins.

Os informantes foram selecionados de acordo com as variáveis sociais: sexo (3 feminino e 3 masculino), idade (25-54 anos e + de 55 anos), tempo de escolarização (até 4 anos). Após as gravações, os dados foram transcritos e os enunciados que apresentavam a unidade em análise, marcação verbal de primeira pessoa do plural na fala, foram extraídos do texto.

Como Martinópolis foi fundado no final da década de 60, foram entrevistadas pessoas que, em sua maioria, eram agricultores, caseiros e donas de casas. Para participar da pesquisa, o informante deveria: I - ter vivido no mínimo os últimos 35 anos de sua existência em Martinópolis; II - não ter vivido mais de um ano fora da comunidade de Martinópolis nos últimos 35 anos. Mas alguns dos informantes selecionados residem na região há mais de 40 anos, segundo depoimentos.

3.1 A comunidade de fala tocantinense

Segundo Cavalcante (1999, p. 30), as primeiras invasões no norte goiano de que se têm notícias mais precisas datam do século XVII. Partiram inicialmente do bandeirismo paulista, ocasião em que o bandeirante Beuchior Carneiro, em 1607/1609 atingiu essa região, seguido por Martin Rodrigues em 1608/1609. Na verdade, o grande vazio demográfico que constitui o atual Estado do Tocantins só teve a formação dos primeiros núcleos de povoamento em função da descoberta do ouro no século XVIII pelos bandeirantes. Mas os arraiais que surgiam próximos às minas de ouro, na maioria das vezes, eram abandonados após o esgotamento desse minério. Vale lembrar também que a maioria dessas minas estava localizada na atual região Sudeste do atual Tocantins (em Natividade, Arraias e Almas), o que favorecia a ligação com a Bahia e Sul de Goiás. Desse modo, o Norte Goiano tinha pouca importância para o governo da Capitania de Goiás.

Para Aquino (2004, p. 339), o Norte de Goiás (hoje Tocantins) ao longo dos anos foi construindo uma identidade própria, mas contando com uma composição étnico-cultural de larga influência de estados nordestinos, notadamente Maranhão, Piauí e Bahia. Assim, a chegada da BR-153, durante o governo Jk (1956-1961), representa, de maneira definitiva, a ocupação dos sertões do Norte Goiano. Ou seja, é também a partir desse período que vão ocorrer grandes transformações sociais, políticas e econômicas na região. Portanto, a criação do Estado do Tocantins só vai acontecer definitivamente em 5 de outubro de 1988, bem como a emancipação de alguns distritos no mesmo período.

Não há informações precisas sobre a data da criação do distrito de Martinópolis, mas segundo depoimentos de alguns informantes, a origem histórica do referido distrito teria sido aproximadamente no final do ano de 1968. Mas é em 28 de julho de 1975 que o povoado é oficializado com o nome “Martinópolis”, pelo senhor Martinho Pereira Rodrigues, o qual integrava as correntes políticas da cidade de Colinas do Tocantins. O terreno habitado de Martinópolis era um dos lotes rurais de Colinas. Assim, a escola, o posto de saúde, a rede elétrica e a rede de distribuição de água construídos no distrito, até início da década de 1990, foram assistidos e administrados pela Prefeitura do Município de Colinas. Com a criação do Estado do Tocantins em 1988, foram criados alguns municípios no Estado, dentre eles, Bandeirantes do Tocantins. Assim, a partir do início da década de 1990 Martinópolis torna-se um dos distritos que compõem o município de

Page 31: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

31

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Bandeirantes, deixando de fazer parte da área do município de Colinas do Tocantins.

Hoje, são aproximadamente 25 famílias que ainda residem no lugar e vivem basicamente da agricultura de subsistência. Todavia, Martinópolis vive um momento de decadência, já que os jovens estão mudando para cidades próximas em busca de emprego e oportunidade de estudo. Assim, sua população atual é constituída basicamente de crianças menores e adultos.

3.2 Análise dos dados

Ao transcrever as entrevistas, foram excluídos os dez minutos iniciais e os dez finais, pois é fundamental que o pesquisador desconsidere principalmente os dez minutos iniciais de uma entrevista, já que é o tempo necessário para que ele envolva o informante e que este esqueça a presença do gravador e da pessoa do pesquisador. Foram extraídos da amostra todos os enunciados que apresentavam a unidade em análise, marcação verbal de primeira pessoa do plural. Atentou-se também para a questão do conteúdo, perfil do informante, e, quando necessário, foram observados, na análise, outros dados sociais do informante. Embora o mercado disponha de softwares especializados para realização de cálculos estatísticos dos dados de pesquisas sociolinguísticas, neste estudo não foi possível usar nenhum software, o que não nos permite apresentar pesos relativos nas tabelas, apesar de ser uma informação a mais para o estudo. Assim, calculamos apenas os percentuais das ocorrências.

Na variedade padrão do português falado, a concordância verbal em termos de desinência número-pessoal (DNP) é considerada regra básica. Entretanto, algumas pesquisas mostram que, nas variedades não-padrão do português do Brasil, a concordância verbal é uma regra variável, pois

(...) as investigações já realizadas sobre concordância verbal como regra variável se concentram principalmente na presença/ausência de marca de 3ª pessoa do plural, tendo demonstrado variação na concordância verbal ao longo de todo o continuum dialetal brasileiro (...). (ZILLES; BATISTA, 2005, p. 100).

Em outras palavras, significa dizer que é predominante o uso da forma básica do verbo (radical + vogal temática) sem desinência número-pessoal. Agora, vejamos algumas ocorrências de marcação verbal na primeira pessoa do plural na fala de informantes de Martinópolis:

(1) “Nois tomava banho nos córrego”. (FA35)6

(2) “Naquela época nós plantava milho, arroz, feijão...” (MB64)

(3) “Nós gostava de brincar de boneca.” (FA48)

(4) “Depois de uns mês nois queria voltar.” (MB68)

(5) “quando nois chegou aqui as casa era tudo de paia.” (FB66)

(6) “Nós já falamo pro vereador daqui.” (MB64)

Ao observar o aspecto das variáveis sociais dos informantes que enunciaram as frases (1), (2), (3), (4) e (5), nota-se que essas ocorrências são marcadas pela ausência da desinência –mos nos verbos, sendo que em (6) ocorreu apenas o apagamento fonético de /s/, mantendo-se a concordância conforme a norma padrão. Assim, após o cruzamento das ocorrências na fala de cada um dos seis informantes de Martinópolis, chegou-se aos seguintes resultados sobre a marcação verbal na primeira pessoa do plural:

6 Legenda 1: Sexo: F – Feminino / M – Masculino; Faixa etária: A – de 25 a 54 anos / B – mais de 55 anos.

Page 32: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

32

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Tabela7 I – variação na Concordância de 1ª pessoa do plural na fala popular de 6 informantes de Martinópolis-TO em relação ao sexo

variáveis SociaisPD 1 ÑPD 2 ZERO

Aplic. % Aplic. % Aplic. %Feminino 0/36 0,00 5/36 13,89 31/36 86,11Masculino 0/33 0,00 8/33 24,24 25/33 75,76

Total 0/69 0,00 13/69 18,84 56/69 81,16

Como ilustra a tabela I, a partir da soma total individual de ocorrências de concordância de primeira pessoa do plural, obteve-se um corpus com um total de 69 ocorrências. Desse total, a marcação padrão –mos (PD) teve 0%, não-padrão –mo (ÑPD) 18,84% e ZERO 81,16%. Como se observa, é baixa a concordância na unidade em análise – levando-se em consideração a norma culta padrão do português brasileiro (PB), detectada na fala dos 6 informantes selecionados da comunidade em estudo. Tanto na fala de homens quanto de mulheres a presença da marca padrão –mos (PD) foi de 0%, e com o apagamento fonético de /s/ em –mos chegou a 18,84%. É importante ressaltar que foi um estudo sobre o uso da fala popular, envolvendo informantes com no máximo quatro anos de escolaridade.

Assim, podemos considerar que esses resultados trazem um aspecto peculiar da língua portuguesa em uso na fala corrente de uma comunidade rural tocantinense. Observando as ocorrências encontradas em outras comunidades linguísticas brasileiras (urbanas), como os resultados de um estudo realizado com 32 informantes sobre a concordância verbal com a primeira pessoa do plural na fala de Panambi e Porto Alegre (ZILLES; BATISTA, 2005, p. 106), a partir das 1.035 ocorrências que compõem o corpus chegou-se aos seguintes números: marcação zero – 13%, não-padrão –mo – 34%, padrão –mos – 53%.

Apesar de ter sido evidenciada a aplicação da marca padrão –mos – 53% na concordância com a primeira pessoa do plural na pesquisa de Zilles e Batista (2005), isso pode ser justificado uma vez que tal estudo envolveu a fala culta de informantes com primário (4 anos de escolaridade) e segundo grau (11 a 12 anos de escolaridade), o que difere do estudo realizado sobre essa mesma unidade em Martinópolis. Ou seja, os informantes da comunidade tocantinense selecionados tinham mais de 25 anos e até 4 anos de escolaridade.

Quanto aos resultados obtidos em relação à variável social sexo em Martinópolis, fica evidente que a aplicação da regra de concordância entre os informantes do sexo feminino e do sexo masculino não difere muito. Os dados apresentados mostram que na fala dos informantes do sexo feminino (três) é mais elevada a ausência de concordância, pois das 36 ocorrências, 0% foi PD, 13,89 ÑPD e 86,16% são de marcação ZERO. Com o grupo de informantes (três) do sexo masculino, das 33 ocorrências, a marcação PD ficou com 0%, ÑPD 24,24% e ZERO 75,76%. Como se pode observar, a aplicação da marcação ZERO é mais elevada na fala dos informantes do sexo feminino. É importante ressaltar que, segundo Zilles e Batista (2005, p. 105), “(...) o comportamento de homens e mulheres nos processos de variação e mudança lingüística depende dos papéis que desempenham nas sociedades e das características sócio-históricas dessas sociedades.” O que se observou em Martinópolis é que a mulher tem um convívio social um pouco mais limitado que o homem, pois, geralmente é o homem que vai à cidade fazer as compras ou levar um filho doente ao médico. Essa é uma questão cultural que pode influenciar os resultados, apontado maior uso da marca padrão na fala masculina. Entretanto, algumas pesquisas mostram que as mulheres apresentam melhor desempenho que os homens quanto à aplicação da norma padrão ao uso da língua (PAIVA, 2004; MILROy; MILROy, 1997), uma vez que a variedade padrão traz prestígio social. Mas, acima de qualquer coisa, a presença da marcação ZERO e a ausência da marcação padrão (-mos) deixam clara a variação linguística existente neste momento na fala popular dessa comunidade. E, apesar de ser tida como forma “estigmatizada” do ponto de vista padrão, é ela que predomina e estabelece as relações sociais dentro dessa comunidade.

Além disso, outra variante analisada neste estudo foi o emprego do pronome sujeito a gente em lugar da forma padrão nós. E a tabela II traz os seguintes resultados:

7 Legenda 2: PD – Presença da marca padrão -mos (Ex: Nós falamos); ÑPD – Presença da marca não-padrão, ocorrendo apenas o apagamento do –s da desinência –mo (Ex: Nós falamo. Nós trabalhamo.); Zero – Ausência total da marca padrão –mos (Ex: Nós fala.; Nós trabalhava.)

Page 33: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

33

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Tabela II – Distribuição geral da variação dos Pronomes sujeitos Nós e A gente na fala popular de 6 informantes de Martinópolis-TO

variáveis Sociais

Nós 3 A genteAplic./Total % Aplic./Total %

Feminino 36/50 72,00 14/50 28,00

Masculino 33/39 84,62 6/39 15,38

Total 69/89 77,53 20/89 22,47

Com base na tabela II, considerando apenas a variável sexo, podemos afirma que os resultados obtidos sobre a variação dos pronomes sujeitos nós e a gente, na fala dos 6 informantes da referida comunidade, é bastante peculiar. Das 50 ocorrências na fala dos informantes do sexo feminino, o emprego de nós chegou a 72% e de a gente a 28%. Por outro lado, das 39 ocorrências na fala dos informantes do sexo masculino, o uso de nós é de 84,62% e a gente é de 15,38%. Esses percentuais mostram o emprego mais elevado da variante a gente nas falas do grupo feminino, sendo que o grupo masculino prefere a forma-padrão nós. Apesar disso, a diferença entre os percentuais é pequena, mas a presença da variante não-padrão (a gente) está evidente.

Essa variação que se detectou na fala popular dos seis informantes da pesquisa realizada em Martinópolis reflete o uso simultâneo dos pronomes sujeitos nós e a gente, variante recorrente na fala da maioria da população brasileira. De acordo com os percentuais da tabela II, de um total de 89 ocorrências de emprego de pronome sujeito, a utilização de nós ficou com 77,53% e de a gente com 22,47%, como mostram as seguintes ocorrências:

(7) “Nós passamo um dia na estrada.” (FA48)(8) “quando a gente era moça nóis bricava muito de roda.” (FA35)(9) “A gente ia pros festejo.” (MA55)(10) “A gente é muito fraco.” (MB64)

No geral, os resultados da pesquisa ilustram uma preferência elevada pelo uso de nós versus a gente. Assim, observando os resultados de uma pesquisa de Lopes (2008), envolvendo 18 entrevistas do projeto NURC-BRASIL (6 de cada cidade – RIO, Porto Alegre e Salvador) sobre o emprego dos pronomes sujeitos nós e a gente, “No Rio acusa-se uma preferência de 69% para o uso de a gente, em oposição a Porto Alegre e Salvador, cujos falantes utilizam mais a forma nós (72% e 63%)”. Ou seja, comparando os resultados, nenhuma dessas três cidades atingiu os números obtidos em Martinópolis (nós 77,53% e a gente 22,47%). De qualquer maneira, o estudo nessa comunidade tocantinense ainda é preliminar, todavia revela resultados semelhantes à realidade nacional sobre o uso da variante a gente.

4. Algumas considerações

Como demonstrou o estudo, a falta de concordância na unidade em análise - levando-se em consideração a norma culta padrão do português brasileiro (PB), é bastante elevada, pois na fala de homens e mulheres a presença da marca padrão –mos (PD) foi de 0% e com o apagamento fonético de /s/ em –mos chegou a 18,84%. É importante ressaltar que foi um estudo sobre o uso da fala popular de uma comunidade rural, além de todos os informantes entrevistados só terem até quatro anos de escolaridade. Acreditamos que a inclusão de informantes de outra faixa etária (15-24 anos) e com outro nível de escolaridade (até 8 anos) da comunidade pode mudar os resultados obtidos até aqui.

Assim, podemos afirmar mais uma vez que esses resultados trazem um aspecto regional importante da variação na concordância verbal de primeira pessoa do plural no PB em uso na fala corrente de uma comunidade tocantinense (representada por seis informantes de Martinópolis), muito embora não difira tanto de resultados encontrados sobre a mesma unidade estuda em outras comunidades brasileiras (Cf. OMENA, 1996; ZILLES; BATISTA, 2005; LOPES, 2008).

Page 34: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

34

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Os resultados apontam para concordância de primeira pessoa do plural em algumas direções. quanto aos fatores sociais, a presença da variante não-padrão é forte na fala da comunidade. Mas, independente do falante ser do sexo masculino ou feminino, a marcação zero – ausência total da marca padrão –mos – no geral foi de 81,16%. Além disso, os resultados apresentados mostram também o uso simultâneo dos pronomes sujeitos nós e a gente, variante recorrente na fala da maioria da população brasileira. Nas ocorrências de emprego de pronome sujeito, no geral a utilização de nós ficou com 77,53% e de a gente com 22,47%, sendo que os homens tendem a usar mais o pronome nós que as mulheres. Portanto, os dados mostram que é preciso realizar outros estudos envolvendo informantes mais jovens, com outros níveis de escolaridade para conhecer melhor o fenômeno da variação linguística nessa comunidade tocantinense.

REFERÊNCIAS

AqUINO, Napoleão A. A construção da Belém-Brasília e suas implicações no processo de urbanização do Estado do Tocantins. In: GIRALDIN, Odair (Org.) A (trans)formação histórica do Tocantins. 2. ed. Goiânia: UFG, 2004. p. 312-350

BECHARA, Evanildo. Moderna gramática do português: cursos de 1º e 2º graus. 20. ed. São Paulo: Nacional, 1976.

BELINE, Ronald. A variação lingüística. In: FIORIN, José Luiz (Org.) Introdução à lingüística. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2005. Vol. I, p. 121-140.

CALVET, Louis-Jean. Sociolinguística: uma introdução crítica. São Paulo: Parábola Editorial, 2002.

CAVALCANTE, Maria do E. S. Rosa. Tocantins: o movimento separatista do Norte de Goiás, 1821-1988. São Paulo: A. Garibalde, Ed. da UCG, 1999.

LABOV, William. Padrões sociolinguísticos. São Paulo: Parábola: 2008.

LyONS, John. Algumas escolas e movimentos modernos. In: LyONS, John. Linguagem e linguística: uma introdução. Rio de Janeiro: LTC, 1987. p. 201-218.

LOPES, Célia Regina dos Santos. Nós por a gente: uma contribuição da pesquisa sociolingüística ao ensino. Disponível em: <http://acd.ufrj.br/~pead/tema14/ponto25.html> Acesso em: 20 mai. 2008.

MILROy, James; MILROy, Lesley. Varieties and variation. In: COUkMAS, Florian. The handbook of sociolinguistics. Oxford-Uk: Blackwell, 1997. p. 47-64

MOLLICA, Maria Cecília. Fundamentação teórica: conceituação e delimitação. In: MOLLICA, Maria Cecília; BRAGA, Maria Luiza (Orgs.). Introdução à Sociolingüística: o tratamento da variação. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2004.

MONTEIRO, José Lemos. Morfologia portuguesa. 3. ed. São Paulo: Pontes, 1991.

OMENA, Nelize Pires de & BRAGA, Maria Luiza. A gente está se gramaticalizando. In: MACEDO, Alzira T. de, RONCARATI, Cláudia & MOLLICA, Maria C. (Orgs.) Variação e discurso. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1996.

SCHERRE, M. M. P.; NARO, A. J. Sobre a concordância de número no português falado do Brasil. In: Ruffino, Giovanni (org.) Dialettologia, geolinguistica, sociolinguistica. (Atti del XXI Congresso Internazionale di Linguistica e Filologia Romanza) Centro di Studi Filologici e Linguistici Siciliani, Universitá di Palermo. Tübingen: Max Niemeyer Verlag, n. 5, p. 509-523, 1998.

TARALLO, Fernando. A pesquisa sociolinguística. 3. ed. São Paulo: Ática, 1990.

ZILLES, Ana Maria S.; BATISTA, Hires Héglan R. B. A concordância verbal de primeira pessoa do plural na fala culta de Porto Alegre. In: VANDRESSEN, Paulino (Org.) Variação, mudança e contato lingüístico no Português da Região Sul. Pelotas: Educart, 2006. p. 99-124.

Page 35: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

35

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA EM IGUAÍBA – PAÇO DO LUMIAR

Elaine Cristina ROCHA - uFMANorma Cristina SOuZA - uFMA

Paulo Gabriel Calvet RIBEIRO - uFMATheciana Silva SILvEIRA - uFMA

1. INTRODUÇÃO

A língua(gem) perpassa as relações sociais, culturais e torna-se imprescindível para que a comunicação seja estabelecida. Nesse sentido, compreende-se que a língua é um dos instrumentos de comunicação entre os falantes de uma comunidade e não se constitui como um sistema rígido e homogêneo, mas em um “todo diversificado”, sendo vulnerável a variações.

Desta forma, a proposta deste trabalho é examinar a variação linguística – nos níveis, fonético-fonológico, morfossintático e semântico-lexical – que caracteriza a comunidade de Iguaíba, no município maranhense de Paço do Lumiar, objetivando analisar os fatores determinantes dessa variação.

2. HISTÓRIA E PARTICULARIDADES DE IGUAÍBA

Na época da fundação de São Luís, com a chegada dos franceses e dos holandeses, os jesuítas também chegaram ao Maranhão fundaram uma vila, a Vila de Lumi. Essa vila, alguns anos depois, teve seu nome mudado para Paço do Lumiar. O nome Paço do Lumiar provém da expressão “Palácio de Lumi”, que encontra sua motivação no fato de que, pela manhã, o sol sempre incidia sobre a delegacia do município.

No mesmo ano da fundação da Vila de Lumi, em 1623, foi criada uma comunidade denominada Anidiba, que formaria uma vila homônima. Nessa vila, existia uma população indígena que teria recebido esse nome devido a uma palmeira abundante na região. Anos depois, com a expulsão dos holandeses do Maranhão, os portugueses, almejando tomar posse de toda a região, começaram a fazer doações de sítios a pessoas detentoras de alto poder aquisitivo e de grande influência na comunidade, os chamados patronos, o que lhes asseguraria a manutenção do controle da região. Seguindo essa política, a Vila de Anidiba foi doada à patrona Josefa Gomes e, assim, teve início a chegada das primeiras famílias não-indígenas à região. Essa região que antes era chamada de Anidiba passou, então, a ser chamada de Iguaíba.

Dessa forma, a atual população de Iguaíba representa a miscigenação entre índios, habitantes nativos, holandeses, portugueses e, mais recentemente, cearenses, sendo que grande parte da população é descendente direta de índios. Daí o fato de Iguaíba ser reconhecido como lugar de “homem valente”, o que, segundo moradores da região, não corresponde mais à realidade de hoje.

O desenvolvimento da localidade aconteceu de forma lenta. A energia elétrica passou a ser distribuída apenas entre 1979-1980, não havia ônibus específico para a região, passando a existir apenas com o terminal

Page 36: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

36

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Cohab-Cohatrac (atualmente, gasta-se 40 minutos de Iguaíba para o centro de São Luís). Antes, a população tinha que andar a cavalo o a pé para chegar ao centro. Iguaíba apresenta até hoje certa dependência em relação a São Luís e é considerada uma comunidade rurbana.8

No que concerne à cultura, há aspectos importantes que merecem ser mencionados e que dizem respeito a crenças e costumes. Dentre eles, destacam-se as orações, parte da herança indígena, que, segundo os moradores, são usadas para transformar pessoas em animais ou ainda para que uma pessoa possa esconder-se em palitos de fósforo. Faz parte também do universo cultural da comunidade o contar lendas, como a da “cavalacanga” e a do “homem gritador”. Além disso, existe um grupo de Bumba meu Boi, que reúne grande parte da população.

Há, na comunidade, 11 igrejas evangélicas, 5 terreiros de umbanda.

No âmbito da economia, destaca-se a produção de coco, que já rendeu à comunidade o título de maior produtora de coco d’água do Estado do Maranhão e a criação do Festival do Coco d’Água, maior festival de todo o Paço do Lumiar. A comunidade vem tentando reativá-lo, pois, no momento, encontra-se suspenso.

3. A REALAÇÃO LÍNGUA-SOCIEDADE

A linguagem verbal sempre exerceu sobre o homem um grande fascínio, visto que é por meio dela que se torna possível o ato de comunicação. Segundo Benveniste (1995, p. 26),

A linguagem reproduz a realidade [...] A realidade é produzida novamente por intermédio da linguagem. Aquele que fala faz renascer pelo seu discurso o acontecimento e a sua experiência do acontecimento. Aquele que ouve apreende primeiro o discurso e, através desse discurso, o acontecimento produzido.

Assim, pode-se afirmar que a linguagem é o instrumento fundamental para que haja comunicação entre os homens. Vale, contudo, ressaltar que a língua, uma das possibilidades de linguagem de que dispõe o ser humano, não é homogênea, já que “(...) não há sequer dois falantes que tenham a mesma linguagem, porque é impossível haver duas pessoas que tenham a mesma experiência linguística” (Hudson, 1984 apud Monteiro, 2002, p. 57-58).

Considerando essa perspectiva, pode-se afirmar que a variação linguística é inerente à língua, e que esta, na condição de espelho da sociedade, reflete as peculiaridades decorrentes de mudanças históricas, sócio-econômicas, geográficas, situacionais, possibilitando ao indivíduo usar a língua de diferentes formas. Com isso, o uso diverso permite que a língua se torne um sistema em constante expansão.

Labov (apud MONTEIRO, 2000) também volta os seus estudos para a relação língua- sociedade, nos quais sistematiza condicionadores sociais que estão interligados à variação linguística, como: sexo, escolaridade, faixa etária. Para a Sociolinguística, os fatores linguísticos e os sociais estão imbricados, estando um relacionado com o outro. Desse modo, a Sociolinguística busca registrar a mudança e a variação da língua considerando, para tanto, os fatores sociais.

Identificando as comunidades de fala, Labov (apud MATTOS E SILVA, 2004, p.29) afirma que a comunidade linguística é o “grupo de pessoas que compartilham um conjunto de normas comuns com respeito à linguagem, e não como um grupo de pessoas que falam do mesmo modo”. Esse conjunto de normas e elementos linguísticos (fonéticos e fonológicos, lexicais, sintáticos e etc) em comum a Sociolinguística busca evidenciar, por meio de dados reais e exatos, a relação língua-sociedade.

quando se fala em relação de fatores linguísticos e sociais, na Sociolinguística, tem-se em mente identificar como determinado grupo (mulheres, homens, adolescentes, negros entre outros) utiliza o código linguístico (a língua) em suas relações comunicativas.

8 Ver, a esse respeito, o trabalho de Bortoni-Ricardo (2004).

Page 37: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

37

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Desse modo, para a Sociolinguística, a investigação de fatores como sexo, escolaridade, idade são fundamentais para a compreensão da variação linguística, por isso que tais fatores são essenciais para o pesquisador sociolinguista. Essa ênfase dada aos fatores extralinguísticos dá uma nova perspectiva para os estudos linguísticos, uma vez que pode ser evidenciada, a contento, a relação que há entre a língua e a sociedade.

4. METODOLOGIA

Para a efetivação da pesquisa, foram desenvolvidas as seguintes etapas: (i) pesquisa bibliográfica sobre temas, como língua(gem), teoria variacionista e variação linguística; (ii) pesquisa de campo para a obtenção do corpus; (iii) transcrição dos dados e (iv) análise dos dados.

4.1. Localidade investigada

A pesquisa foi realizada na comunidade de Iguaíba, no município de Paço do Lumiar, que está localizada a 30 km de São Luís, e que conta com mais de oito mil habitantes.

4.2. Perfil dos informantes

Os cinco sujeitos da pesquisa, todos homens, foram selecionados de acordo com o seguinte perfil:

Idade – entre 30 e 70 anos;

Escolaridade – ensino fundamental incompleto e não-alfabetizados;

Naturalidade: todos os informantes são naturais da localidade pesquisada.

4.3. Instrumentos de pesquisa

4.3.1 Ficha dos informantes

Nela encontravam-se registrados dados pessoais do informante, como nome, sexo, idade, endereço, naturalidade e ocupações.

4.3.2. Entrevista

Para obtenção do corpus, foi realizada uma entrevista com perguntas relacionadas com a história da comunidade, como: O que você poderia nos contar sobre a história de Iguaíba?, Quais as principais fontes de renda da localidade?, Você pode nos contar algum fato curioso ocorrido na cidade?

As entrevistas foram gravadas por meio de rádio gravador. Usou-se, ainda, uma câmera fotográfica para registrar o momento da realização das entrevistas.

5. RESULTADOS

A localidade e os informantes da pesquisa foram escolhidos por não terem muito contato com o centro comercial de São Luís, a fim de que fosse possível obter variantes que, de fato, são usadas pela comunidade.

Page 38: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

38

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Nível fonético-fonológico

• AféreseEstavam > tavoEstou > tô

• MonotongaçãoEstou > tô

• Apagamento do /r/ finalFazer > fazê Trabalhar > trabaiá

• Iotização do /lh/mulher > muiéolhou > oioutrabalhar > trabaiá

• Epêntese eu > ieurespeito > arrespeito

• Aspiração do [Z]já > rá

Nível morfossintático

• Caso de concordância verbal e nominal não-padrão:Exemplos: O pessoal daqui > os pessoal daqui Eles já viram pessoas mortas > eles rá viu pessoas morta Diziam os mais velhos > dizio os mais velho

1. Nível semântico/lexical:

• diamba ~ maconha Exemplo: os antigo fumavo diamba na cabaça

• porreta ~ grande Exemplo: vocês viro... aquela igreja porreta?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo desta pesquisa, constatou-se um conjunto de variantes encontradas na fala dos moradores de Iguaíba. Ao analisar a linguagem de indivíduos com escolaridade mínima, percebe-se que sua fala não vigiada apresenta formas não-padrão. A incidência dos fenômenos encontrados na fala dos indivíduos da localidade está diretamente ligada aos condicionadores sociais da língua: os fatores do ambiente familiar, classe social e pela norma linguística da comunidade.

Page 39: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

39

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Cada comunidade linguística possui um modo de falar característico, isso implica dizer que uma comunidade de fala se utiliza da língua a partir da necessidade que os falantes têm para organizar a realidade. Isto é possível porque a língua possui uma variedade riquíssima que a pluraliza.

Desse modo, conclui-se que língua e sociedade estão intrinsecamente ligadas, como assevera a Sociolinguística. Ao analisar uma comunidade a partir do viés sociológico, torna-se necessário levar em consideração o contexto no qual o falante está inserido.

REFERÊNCIAS

BENVENISTE, Émile. Problemas de linguística geral. 4. ed. Campinas: Pontes,1995. v.1.

BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Educação em língua materna: a sociolinguística na sala de aula. São Paulo: Parábola Editorial, 2004.

COUTO, Hildo Honório do. A redação como libertação. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1990.

FIORIN, José Luiz. Introdução à linguística. São Paulo: Contexto, 2002.

LABOV, Willian. Padrões sociolinguísticos. São Paulo: Parábola, 2008.

MATTOS E SILVA, Rosa Virginia. Variação, mudanças e norma (movimentos no interior do português brasileiro). In: Suzana Alice Marcelino (Org.) Diversidade, Linguística e Ensino. Salvador: EDUFBA, 2004, p.19-43.

MONTEIRO, José Lemos. Para compreender LABOV. Petrópolis: Vozes, 2000.

TARALLO, Fernando. A pesquisa sociolinguística. 8. ed. São Paulo: Ática 2007.

VIARO, Mário Eduardo. Etimologia. São Paulo: Contexto, 2011.

Page 40: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

40

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

O LÉXICO DAS BRINCADEIRAS INFANTIS NO MARANHÃO: PROPOSTAS PARA O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

EM SALA DE AULA

Luís Henrique SERRA9

(uFMA/ALiMA)Sandra Nívea Dutra de MORAES10

(SEDuC/ALiMA)

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A Sociolinguística tem três importantes dimensões aplicadas, segundo Saint-Clair (apud BEZERRA, 1997): linguístico-educacional, geosocial e semiótica. A dimensão geosocial corresponde aos estudos das variedades geográficas e sociais da língua; a semiótica diz respeito às análises descritivo-explicativas dos usos sociais das formas verbais e não-verbais; já no âmbito da dimensão linguístico-educacional, a Sociolinguística estuda as relações sociais entre os falantes das formas inovadoras e as formas standarizadas. Esses estudos tentam analisar a aceitação, a estigmatização ou a rejeição social dos usuários das diferentes formas linguísticas, relacionando os fatores culturais com outros fatores sócio-político-educacionais (BEZERRA, 1997). Os estudos sociolinguísticos têm servido de base para inúmeras interpretações científicas da língua, que têm igualmente contribuído para a desmistificação do preconceito linguístico, tão enraizado em nossa sociedade.

No que diz respeito ao ensino de língua materna, o desenvolvimento dos estudos sociolinguísticos vem contribuir para um melhor entendimento, por parte do professor, da variação linguística do português brasileiro, isto é, dos seus múltiplos dialetos. Essa outra abordagem da língua contribui também para evidenciar o principal papel do professor de língua materna nas escolas, que é “(...) ampliar a capacidade de comunicação, expressão e integração [dos alunos] pela linguagem” (ILARI, 1997, p. 9). É por isso que, segundo Ilari (1997), os cursos de formação de professores devem levar em conta os estudos linguísticos para que os professores das escolas do país não incorram nos mesmos erros que se vêm repetindo por longos anos, motivados por um olhar não-científico e preconceituoso sobre a língua e seu funcionamento real.

Assim pensamos ser importante o conhecimento da variação linguística por parte tanto dos professores, quanto dos alunos, uma vez que, com uma visão real da língua, o aluno terá condições de usar, de forma proficiente, as inúmeras possibilidades comunicativas que a língua põe à disposição de seus usuários. Esse conhecimento, aliado a um trabalho consistente que vise à comunicação social, levará ao desenvolvimento da competência comunicativa, como proposta por Dell Hymes (1971), em seus estudos na década de 70.

Baseados na teoria da Competência Comunicativa, objetivamos, com este estudo, propor ao professor de língua materna, sobretudo àquele que atua nos anos iniciais da educação básica, atividades para uma melhor ampliação do vocabulário visando à adequação linguística e, por consequência, o respeito às diferenças dialetais do português brasileiro. A partir de atividades que possibilitem ao aluno desenvolver pesquisas em língua portuguesa, que aqui será trabalhada no âmbito do léxico. Proporemos ao professor discussões a respeito da realidade linguística do Maranhão que poderão ser feitas na sala de aula com os alunos.

9 [email protected] [email protected]

Page 41: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

41

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Para tanto, enfocaremos de forma sucinta duas questões cruciais para o entendimento de nossas propostas: (i) o ensino do léxico na escola e (ii) a noção de competência linguística, como proposto por Chomsky (1965) versus a noção de competência comunicativa, como postulada por Dell Hymes (1971). Com essas questões como pano de fundo, abordaremos a variação linguística no âmbito do universo infantil, com base em dados da língua oral coletados no município de Balsa, no Maranhão. Por fim, apresentaremos propostas de quatro atividades que visam ao desenvolvimento do vocabulário dos alunos, bem como o uso desse vocabulário em diferentes contextos sociocomunicativos.

Pensamos que com as propostas aqui apresentadas o professor terá subsídios para falar sobre a variação linguística, em sala de aula, e mostrar as diferentes de que dispõe a língua para seu uso nas variadas situações de comunicação entre os falantes.

2 O ENSINO DO LÉXICO NAS ESCOLAS

Atualmente, nas escolas brasileiras, o ensino do léxico é secundário (cf. Antunes, 2012). O ensino de regras gramaticais tem tomado a quase total atenção das atividades, deixando nenhum espaço para um trabalho mais reflexivo e pragmático com o uso das unidades linguísticas. Se observarmos por meio do livro didático das escolas maranhenses – instrumento fundamental nas aulas de língua portuguesa – o ensino de léxico não cumpre, nem de longe, o seu objetivo fundamental, que é o uso real e adequado das unidades linguísticas e o desenvolvimento de textos (oral e escrito) adequados para os diferentes contextos de usos e de interlocução. O preenchimento de lacunas de sentenças descontextualizadas, ou análises mórficas sem algum objetivo comunicativo são as principais atividades com relação ao léxico, nos materiais utilizados nas salas de aula.

Tais modelos não levam o aluno a comparar, classificar, reagrupar as palavras e analisá-las, dando-lhes um sentido em um enunciado ou no texto em que elas se encontram, e mais, a prática que é adotada nas aulas, dificilmente fará com que as palavras estudadas sejam incorporadas ao léxico ativo dos estudantes. (DIAS, 2006, p. 196) (grifo original).

Nessas atividades, o processo de criação de palavras, os movimentos do léxico (neologismos, arcaização e reutilização dos elementos) e a contribuição que as unidades lexicais da língua dão à produção do sentido nos diferentes textos veiculados em nossa sociedade acabam sendo esquecidos nos conteúdos programados para a sala de aula.

Desse modo, é interessante observarmos o que diz Antunes (2003, p. 31), ao diagnosticar as aulas de língua materna nas escolas do Brasil:

No que se refere a atividades em torno da gramática, pode-se constatar o ensino de: (...) uma gramática fragmentada, de frases inventadas, da palavra e da frase isolada, sem sujeitos interlocutores, sem contexto, sem função; frases feitas para servir de lição, para virar exercícios.

Poucos são os livros que exploram a variação linguística da língua portuguesa falada no Brasil. Pelo contrário, quando ela é tratada nesses materiais, é simplesmente para mostrar o que não pode utilizado pelos pequenos aprendizes. Esse retrato é, na verdade, o ressoar de um conhecimento linguístico pautado nas gramáticas normativas que tanto tempo dominaram o ensino de língua no Brasil, além de denunciar o desconhecimento, por parte de nossos professores, das novas descobertas no âmbito da Linguística.

quanto ao acervo lexical dos alunos, vale a pena lembra que estes, quando chegam à escola, têm um bom conhecimento do léxico de sua língua materna. Assim, o que eles devem adquirir na escola é o vocabulário de outros grupos sociais diferentes daquele em que está inserido e que eles ainda não adquiram, para que, desse modo, ele possa ter disponível em seu acervo lexical um bom acervo de recursos linguístico para comunicar-se nos diferentes contextos sociais do qual ele fará parte durante sua vida (BORTONI-RICARDO, 2004).

Page 42: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

42

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

3 A COMPETÊNCIA LINGUÍSTICA E A COMPETÊNCIA COMUNICATIVA

Um dos primeiros linguistas a lançar os pressupostos teóricos da ciência da linguagem, Saussure (2006) concebia duas grandes naturezas na língua: uma social e outra abstrata. Nas palavras do próprio Saussure, a língua é definida da seguinte forma:

Para nós, ela não se confunde com a linguagem; é somente uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente. É ao mesmo tempo um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de conversões necessárias pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos (SAUSSURE, 2006, p 17).

Como observamos na definição saussuriana, a língua é uma parte da linguagem que se define pelo conjunto de elementos socialmente arbitrados pelos indivíduos, ou na terminologia saussuriana, pela massa. Reduzindo ao máximo a definição dicotômica de língua defendida por Saussure – língua e fala –, podemos dizer que ele considerava a língua um elemento tanto social quanto individual, em outras palavras, língua é um sistema abstrato que se encontra na psicologia social, e fala, o resultado físico e individual da abstração da língua (sistema) por cada indivíduo. É válido dizer que é na fala que a língua se concretiza, mediante as escolhas lexicais feitas pelos falantes.

Mais tarde, Noam Chomsky (1968, aqui citado pela edição de 1978) retoma a dicotomia de Saussure, língua e a fala, com algumas alterações. Com a reformulação da teoria saussuriana, Chomsky cria uma nova dicotomia – competência e desempenho (ou performance). Segundo Chomsky (1968), a competência é como algo abstrato (psicológico, mental) e o desempenho, social (subjetivo, cultural). Sobre a competência, escreve Bortoni-Ricardo(2004):

Competência consiste no conhecimento que o falante tem de um conhecimento de regras que lhe permite produzir e compreender um número infinito de sentenças, reconhecendo aquelas que são bem formadas, de acordo com o sistema de regras da língua. (BORTONI-RICARDO, 2004, p 71).

Para Chomsky, todos os indivíduos quando nascem são dotados de uma faculdade da linguagem, isto é, são capazes de produzir e entender infinitas sentenças em sua língua materna. Essa faculdade é igual em todos os seres humanos11, ou seja, ela é inata.

O falante de uma língua tem a habilidade de entender perfeitamente qualquer sentença bem formada em sua língua materna, o que significa produzir uma sentença que respeite as regras básicas da sintaxe e da estilística da língua que ele fala12. Por tanto, sentenças como “Eu comprei esse frango pra mim fazer hoje pro almoço” ou “As casa perto do mar é mais bonita” são sentenças bem formadas, uma vez que elas respeitam a estrutura básica da língua portuguesa, além de conservarem o sentido objetivado pelo falante, quando as produz.

Contudo, ao formular sua teoria, Chomsky encontra muitas críticas, sobretudo pelo fato de sua teoria não dar conta do uso real e social da língua. Um dos principais críticos de Chomky é Dell Hymes (1971), sociolinguista americano, que afirma que o maio problema da teoria da competência linguística é que ela não dá conta da variação linguística, sobretudo no âmbito social. (BORTONI-RICARDO, 2004).

Para Dell Hymes (1971, p. 71):

If the distributional approach neglects semantic structure, there is a common semantic approach that neglects context. It analyses the structure of a set of elements (say, codes, or terms of personal reference) by assuming one normal context. This approach (typical of much componential analysis)

11 (...) seja qual for o ambiente linguístico em que a criança cresça, sejam quais forem suas condições socioeconômicas, o estado inicial da faculdade da linguagem de qualquer criança é o mesmo. Em termos desse estado inicial, não existe diferença entre crianças nascidas no hemisfério norte ou sul, entre crianças pobres e ricas, entre filhos de pobres e plebeus. (NEGRÃO; SCHER; VIOTTI, 2010, p. 127).12 O conceito de sentença bem formada a que nos referimos aqui não é o da gramática normativa, mas sim aquele que consiste na construção de sentenças que correspondam à estrutura de nossa língua. Basicamente, a língua portuguesa tem a seguinte estrutura: Sujeito + Predicado+ Complemento. Isso se traduz, por exemplo, na seguinte sentença: eu sou brasileiro nato, em que eu ocuparia o lugar de sujeito; sou, o do predicado, e brasileiro nato, o de complemento.

Page 43: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

43

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

is equally unable to account for the range of functions a fluent user of language is able to accomplish (d. Tyler, 1966). It is true that the value of a feature is defined first of all in relation to a set of normal contexts (settings, participants, personal relationships, topics, or whatever). But given this “unmarked” (presupposed) usage, an actor is able to insult, flatter, color discourse as comic or elevated, etc., by “marked” use of the feature (code, routine, level of address, whatever) in other contexts. Given their tacit knowledge of the normal values, hearers can interpret the nature and degree of markedness of the use.

Sobre a crítica de Dell Hymes a Chomsky, escreve Poetzscher (1994, p. 12):

D. Hymes considera que os estudos realizados por N. Chomsky são, no que dizem respeito ao conceito de desempenho, relevantes para a problemática da aquisição da linguagem; acredita, porém, que os postulados teóricos de N. Chomsky e os resultados das pesquisas realizadas sob esse aspecto interessam mais de perto à psicologia da percepção, memória e a outros semelhantes, não sendo, pois, de domínio dos padrões culturais e da ação social.

Baseado nessas ideias, Dell Hymes (1971) propõe o conceito de competência comunicativa que é uma ampliação do conceito de competência linguística de Chomsky. Dell Hymes (idem. op. cit.) amplia a ideia de Chomsky, ao associar à noção de competência linguística a habilidade de produzir diferentes discursos em diferentes contextos comunicativos, constituindo o que hoje conhecemos como competência comunicativa.

Em ouras palavras, a competência comunicativa é a habilidade que os falantes têm de produzir sentenças adequadas não só à sintaxe da língua, mas também aos diferentes contextos sociais nos quais eles se inserem. Essas regras monitorizam o estilo de fala dos indivíduos nos diferentes contextos sociais. Por exemplo, na perspectiva da competência comunicativa, o falante se adequa a um estilo de fala ao comunicar-se com um público de conhecimento especializado, e a outro estilo de fala quando se comunica com um público com o qual tem uma relação social mais próxima, como a família e os vizinhos.

Daí, a importância do conceito de competência comunicativa para a aula de língua portuguesa. Como já dissemos, o falante, ao chegar à escola, já tem a habilidade de produzir sentenças adequadas em sua língua materna, ficando, portanto, sob a responsabilidade da escola fazer de sua clientela – o aluno – um competente usuário da língua. Fazer com que o aluno saiba que sua língua lhe oferece diferentes possibilidades comunicativas, em diferentes situações sociais, deve ser um dos principais objetivos de nossas aulas de língua materna.

Contudo, para que o aluno saiba das diferentes possibilidades que uma língua dá a seus falantes, ele antes deve conhecer a variação linguística dela. Por isso, atividades que possibilitem o aluno encarar a variação linguística de forma reflexiva será um importante caminho rumo à adequação comunicativa.

4 A VARIAÇÃO LEXICAL NO UNIVERSO INFANTIL MARANHENSE

O léxico é um dos componentes da língua em que podem ser encontradas valiosas informações sobre o homem e sua forma de ver o mundo. Por meio do léxico, é possível observar como o universo humano se estabelece na memória humana, além de nos proporcionar informações sobre o modo de vida de uma comunidade e sua organização social, entre outras coisas. Portanto, pesquisar o léxico é ir ao étimo de uma cultura, na codificação mais cristalizada de um povo.

Assim, estudar o universo infantil maranhense, objeto de nossa pesquisa, significa investigar unidades linguísticas que refletem particularidades de cada região. Com este objetivo, selecionamos, para este trabalho, o município de Balsas, por ser um município que tem recebido bastante influência de fora do Estado, principalmente de regiões do Sul e do Sudeste brasileiro. Objetivamos examinar a variação lexical no universo infantil no Estado13. Partimos da hipótese de, que em um mesmo universo social de uma mesma 13 Não podemos negar que, ao investigarmos o universo infantil de Balsas, estamos, por um lado, investigando um universo particular que pode conter dados bastante peculiares dessa região. Por outro lado, esses dados também fazem parte do universo linguístico maranhense; por isso, acreditamos que quando investigamos esse universo, estamos investigando o universo maranhense.

Page 44: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

44

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

localidade, a variação lexical. Em outras palavras, acreditamos que dentro de um só município é possível encontrar variação denominativa de um mesmo conceito.

Com o resultado de nossa pesquisa, foi possível produzir um quadro demonstrativo do universo lexical das brincadeiras infantis no Maranhão.

Os dados utilizados para este trabalho fazem parte do Projeto Atlas Linguístico do Maranhão (ALiMA)/Departamento do Curso de Letras da Universidade Federal do Maranhão. Eles fazem parte dos dados que irão compor o Atlas Linguístico do Maranhão, ainda em fase de elaboração.

Os dados foram colhidos por meio da aplicação do questionário semântico-lexical (qSL) do ALiMA, campo semântico jogos e brincadeiras infantis, questões 168, 169, 171, 172, 176 e 183, no município de Balsas – Sul do Maranhão.

Para a realização desta pesquisa, seguimos a seguinte metodologia:

•Seleção do município pesquisado;

•Seleção do campo semântico e das questões do questionário do ALiMA;

•Levantamento do léxico das brincadeiras infantis;

•Análise dos dados.

Com relação ao perfil socioeconômico, vale lembra que os informantes do Projeto ALiMA são homens e mulheres naturais das localidades pesquisadas, distribuídos por duas faixas etárias (faixa I – 18 a 35 anos – e faixa II– 50-65 anos).

quadro de lexias do universo infantil maranhense – Balsas

questão

Informante

168 ...Brincadeira em que se gira o corpo sobre a cabeça e acaba

sentado?

169...as coisinhas redondas de vidro que

os meninos gostam de brincar?

171...o brinquedo feito de uma forquilha e

duas tiras de borracha que os meninos usam para

matar passarinho?

172...o

brinquedo feito de varetas

cobertas de papel que se empina no vento por

meio de uma linha?

176 ...a

brincadeira em que uma

criança, com os olhos

vendados, tenta pegar as outras?

183...a brincadeira

em que as crianças riscam uma figura no chão, formada por quadrados

numerados, jogam uma

pedrinha e vão pulando com

uma perna só?

Faixa etária IMasculino Cambalhota Peteca Baladera

Estilingue Pipa Cobra-cega Boneca

Faixa etária IFeminino Pulo mortal Peteca Baladera Papagaio Cobra-Cega Boneca

Faixa etária II

MasculinoMaracambute Peteca Baladera Pipa Cobra-cega Boneca

Faixa etária II

Feminino

Tira-tiubaTirar o

cambutePeteca Baladera Papagaio Cobra-Cega Cancão

Page 45: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

45

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Como podemos observar no quadro de lexias, o léxico do universo infantil maranhense apresenta um número significativo de variantes, principalmente na questão 168 (... a brincadeira em que se gira o corpo sobre a cabeça e acaba sentado?). Para essa questão, registramos quatro variantes, o que significa dizer que cada um dos sujeitos da pesquisa usou uma lexia diferente para o mesmo conceito, confirmando assim a hipótese inicial da pesquisa, em uma mesma localidade, é possível encontrar a variação lexical.

Com relação à questão 183 (... a brincadeira em que as crianças riscam uma figura no chão, formada por quadrados numerados, jogam uma pedrinha e vão pulando com uma perna só?), a forma boneca apresenta bastante regularidade em Balsas. Entretanto, em grande parte dos municípios que integram a rede de pontos do ALiMA, essa forma não foi registrada, tendo sido colhidas as lexias amarelinha, cancão e céu.

A regularidade observada com relação à resposta dada à questão 183 é mais vigorosa, ainda, nas questões 169 e 176, pois os falantes são unânimes ao usar as lexias peteca e cobra-cega, para recobrir, respectivamente, os conceitos apresentados nestas duas questões.

Com relação à questão 171, constatamos o predomínio da forma mais conhecida e usada no Estado – baladera. Entretanto a forma inovadora – estinlingue já aparece com uma ocorrência na faixa etária I entre os homens. Esse fato reflete o processo imigratório que vem ocorrendo em Balsas devido ao cultivo da soja que, por ser bastante expressivo na região, vem atraindo imigrantes do eixo centro-sul do país.

Na questão 172 encontramos as formas pipa, recorrente entre os informantes do sexo masculino das duas faixas etárias, e papagaio, entre as mulheres das duas gerações. Ambas encontram-se dicionarizadas como sinônimos.

A pesquisa aponta alguns elementos característicos do léxico do universo infantil de Balsas, que podem ser observados pelos alunos por meio de pesquisas. Partindo desse conhecimento, propomos algumas atividades de pesquisa e observação do léxico que ajudarão o aluno a melhor conhecer a variação linguística de sua comunidade e, assim, melhor entender sua língua materna.

5. PROPOSTA DE ATIVIDADES PARA A SALA DE AULA

5.1. Proposta 1

O Professor propõe aos alunos que pesquisem, em sua localidade, o nome das brincadeiras infantis. A pesquisa pode ser feita entre os próprios alunos, bem como, com pessoas de fora da escola. É importante que uma parte da sala faça também a pesquisa com pessoas idosas para saber como essas pessoas nomeavam as brincadeiras em seu tempo de criança. Após a investigação dos alunos, o professor reunirá os dados colhidos pelos alunos para mostrar à turma o resultado da pesquisa. É importante que o professor, ao reunir os dados e apresentá-los a turma, não perca de vista as perspectivas diacrônica e sincrônica, o que possibilitará aos alunos perceberem que a língua varia no tempo, entre o passado e o presente, e em um mesmo tempo, dentro de uma mesma comunidade de fala em função de fatores tais como: sexo, escolaridade, classe social.

Para demonstrar a variação diacrônica, o professor explorará os dados dos alunos que se propuseram a buscar o depoimento das pessoas mais idosas. Já a sincronia pode ser demonstrada a partir dos dados coletados entre os próprios alunos.

Objetivos da atividade: com essa proposta, o aluno poderá constatar, por si mesmo, a variação linguística, bem como observar, mediante orientação do professor, o movimento diacrônico da língua. Com essas observações, o professor poderá mostrar que não existe uma só forma de falar, mas múltiplas possibilidades de dizer a mesma coisa.

5.2. Proposta 2

Com o resultado da pesquisa, o professor poderá explorar as classes gramaticais das lexias encontradas: com as lexias, o professor apresentará aos seus alunos os elementos mórficos mais comuns de cada classe gramatical, bem como, demonstrar qual a classe gramatical mais utilizada no universo infantil maranhense.

Page 46: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

46

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Depois disso, aprofundando mais o assunto, o professor poderá demonstrar qual são os processos de formação de palavras mais evidentes naqueles dados, e suas características, respeitando sempre o nível dos alunos.

Objetivo da proposta: Nessa atividade, o aluno conhecerá, de forma mais contextualizada, os processos e mecanismos que agem sobre a língua, além de saber reconhecê-los na língua falada.

5.3. Proposta 3

Partindo do resultado obtido com a pesquisa sobre a variação lexical nas brincadeiras infantis, o professor poderá propor à classe a construção de um caça-palavras. Para tanto, o professor deve entregar a cada aluno uma folha na qual conterá um retângulo traçado com linhas na horizontal e na vertical. De posse dessa ficha, os alunos deverão preenchê-la escrevendo, na horizontal e na vertical, palavras em pares que denominam uma mesma brincadeira. A ficha deverá ser composta por quatro ou cinco tipos de brincadeiras, totalizando oito ou dez denominações; envolta do caça-palavras os alunos deverão desenhar os brinquedos e/ou as brincadeiras aos quais os nomes se referem. Após a confecção do caça-palavras, cada aluno deverá trocar sua ficha com a de outro e assim reiniciar a brincadeira, os pares encontrados deverão ser pintados da mesma cor.

Objetivo da proposta: Com essa atividade, além do trabalho com a variação linguística, também será contemplado o trabalho com a ortografia.

5.4. Proposta 4

Uma atividade interessante que poderá ser proposta à classe, também a partir dos dados obtidos com a investigação da variação lexical nas brincadeiras infantis, é a elaboração de um glossário que deverá ser composto por ilustrações das brincadeiras ou brinquedos; nomes das lexias (com todas as variantes encontradas); e relato (escrito) do modo com é realizado a lexia. Ao fim do trabalho, o glossário poderá ser transformado de livro e organizado um momento de autógrafo da turma.

Objetivo da proposta: Com essa atividade, além da produção textual, o aluno vivenciará um momento importante na vida do escritor: o contato direto com o leitor.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola, através do ensino de língua materna, tem o objetivo de ajudar a desenvolver a competência comunicativa, considerando para tanto a bagagem que o aluno traz de sua casa, e de seu grupo social. Por isso, as atividades escolares devem contemplar o conhecimento da variação linguística para que ele saiba usar a sua língua de forma proficiente, nos diferentes contextos linguísticos e sociais em que se inserir.

É fato que, como observamos ao longo deste trabalho, o ensino de língua portuguesa nas escolas brasileiras carece de propostas de atividades que façam o aluno observar, por si mesmo, como a língua se comporta no meio social. Se quisermos que nossos alunos sejam eficientes quando manifestam seus pensamentos nos diferentes contextos sociais ou que sejam poliglotas em sua própria língua, precisamos dar-lhes suporte para que saibam escolher, entre as diversas possibilidades que a língua lhe oferece, aquela mais adequada para a construção de seu texto; caso contrário, corremos o risco de repetir um modelo de ensino que, observando os dados estatísticos, não geram resultados satisfatórios.

Com uma visão variacionista da língua, o aluno terá subsídios para entender as diferenças dialetais do português brasileiro, compreender que a língua faz-se no seio social e não em livros cheios de regras que, muitas vezes se distanciam do uso real no processo de interação entre os falantes. Do mesmo modo, é importante lembrar que quando conquistamos o respeito pelas variedades da língua, estamos também conquistando o respeito pelas diferentes culturas, tendo em vista a relação intrínseca que há entre língua e cultura.

Page 47: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

47

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

REFERÊNCIAS

ANTUNES, Irandé. Aula de português: encontro e interação. São Paulo: Parábola, 2003.

____________. Território das palavras: estudo do léxico em sala de aula. São Paulo: Parábola, 2012.

BEZERRA, José de Ribamar Mendes. A concordância nominal na obra de Mário Marroquim. In. MOURA, Denilda. (Org.). Contribuição de Mário Marroquim à pesquisa sociolinguística no Brasil. Maceió: EDUFAL, 1997.

BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Educação em língua materna: a sociolinguística na sala de aula. São Paulo: Parábola, 2004.

CHOMSky, Noam. Aspectos da teoria da sintaxe. Coimbra: Sucessor, 1978.

DIAS, Eliana, Reflexão sobre o ensino do léxico na escola fundamental. In. MARTINS, Evandro Silva; CANO, Waldenice Moreira; MORAES FILHO; Waldenor Barros (Orgs.). Léxico e Morfologia: perspectiva e análise. Uberlândia: EDUFU, 2006. p. 195-212.

ILARI, Rodolfo. A Linguística e o ensino de língua portuguesa. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

HyMES, Dell. On communicative competence. In Pride, J., & J. Holmes (eds.), Sociolinguistics. London: Penguin. 1971, pp. 269–293

NEGRÃO, Esmeralda; SCHER, Ana; VIOTTI, Evani. A competência linguística. In. FIORIN, José Luiz. (Orgs.). Introdução à Linguística: objetos teóricos. 6. ed. São Luís: Contexto, 2010. v. 1.

POETZSCHER, Carmem Cinira Bittencourt. Linguagem e seus condicionamentos sociais. Rio de Janeiro: Revinter, 1994.

SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Linguística Geral. São Paulo, 2006.

Page 48: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

48

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

O PROCESSO DE CRIATIVIDADE DA LINGUAGEM NA INTERNET

Glaucia Fernandes ARAujORegielly Santos de LEMOS

valdenira Cardoso PEREIRA Orientador: Profº Ms. joão da Silva Araújo-jÚNIOROrientadora: Profª Drª. veraluce Lima dos SANTOS

INTRODUÇÃO

A linguagem é o principal instrumento de comunicação do homem; é através dela que transmitimos e expressamos nossos sentimentos e estabelecemos relação com outros seres. Contudo, para se comunicar, o ser humano utiliza diversas formas de representações que são manifestadas através de imagens, símbolos, além da linguagem oral e escrita, sendo esta a que mais vem sofrendo transformações quanto a sua forma gráfica, no que se refere a sua utilização/ escrita na internet. Com o advento das tecnologias de informação e comunicação e o surgimento de novos recursos da internet, a linguagem ganhou uma dinamicidade maior. Isso é percebido através dos vários ambientes presentes na internet; entre eles temos: o Orkut, o Chat, o Facebook, MSN, Twiter, entre outros. Com a utilização desses recursos, os jovens criaram uma nova forma de linguagem, o internetês, caracterizado por uma escrita abreviada, com excesso ou falta de pontuação, híbrida pela influência de traços da oralidade na escrita, o que possibilita a criatividade de novos códigos que visualmente traduzem expressões próprias da linguagem oral, facilitando a interação das pessoas no ambiente virtual.

OBJETIVO

Investigar o processo de criatividade da linguagem dos alunos do Ensino Médio, nos textos produzidos no Orkut, um dos ambientes da internet.

METODOLOGIA

O referido trabalho é de base qualitativa, tendo como um dos instrumentos de coleta de dados, a construção de um corpus constituído por textos produzidos pelos alunos do Ensino Médio, na Internet.Realizamos um estudo piloto com os alunos da rede pública estadual de ensino da capital,no período de setembro a outubro do corrente ano, através de observação participante.Participaram do questionário, 12 alunos,com faixa etária entre 15 e 19 anos.O primeiro momento da pesquisa teve como objetivo identificar com que frequência os alunos acessavam o Orkut, o que foi possível com a aplicação de um questionário com perguntas abertas e fechadas. O segundo momento da pesquisa está em andamento, o qual consta da construção de um corpus, conforme já referido anteriormente.

Page 49: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

49

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

BASE TEÓRICA

Para a consolidação da pesquisa, percorremos os seguintes autores que tratam das Tecnologias de Informação e Comunicação no processo educacional, como Marcuschi (2004), Coscarelli (2006), Moran (1997), Munhoz (2002) e ainda, CAIADO (2007), que investiga a escrita nos blogs.

RESULTADOS

O corpus que analisamos, embora reconheçamos tratar-se de um estudo ainda em fase inicial nos permite identificar aspectos peculiares relacionados à criatividade do usuário do ORKUT, seja nos fóruns, scraps e comentários de fotos. Os aspectos observados foram agrupados e analisados com base em duas categorias principais: a multissemiose, que se caracteriza pela coexistência em um mesmo contexto enunciativo, de diferentes linguagens/semioses, em particular a imagem, a escrita e o som. (Um exemplo desta ocorrência encontramos em “obrigada *_*”) (XAVIER, 2002); e a transgressão da ortografia oficial, que se caracteriza entre outros aspectos pela abreviação de vocábulos (“tbm”), supressão de vogais de uma palavra, uso de caixa alta para chamar atenção do interlocutor, prolongamento das vogais de uma palavra, entre outros. (Exemplos: “Tii Amoo!!”; “Owntii, obrigado a TODOOOS =*” “feliiz niveer tdu dii boom,que vc seeja muiito feliiz e que deus ilumiine vc hj e seempre ;) Feliiz niiver . ♥” ).

Page 50: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

50

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

INqUÉRITOS DA NORMA CULTA FALADA EM MANAUS EM SITUAÇÕES DIALÓGICAS INFORMAIS

Leandro D’vinci Babilônia Brandão(Bolsista PAIC/uEA-ENS/FAPEAM)

Carolina Kossoski Felix de Moraes Rezende (Bolsista PAIC/uEA-ENS/FAPEAM)

(Orientadora) Silvana Andrade Martins(PAIC/uEA-ENS/FAPEAM)

Introdução

Nosso conceito de língua deve compreender a “realidade histórica, cultural, social em que ela se encontra” (Bagno, 2004, p.19), pois o que é ela senão o instrumento de comunicação de um grupo, meio pelo qual se refletem a cultura desse grupo e as particularidades dos indivíduos. A comunidade a que nos referimos aqui é a população culta da cidade de Manaus que, segundo Bagno (2007) são os falantes urbanos mais escolarizados. Mattos e Silva (2004) afirma que eles são “consciente[s] da variação possível em outros grupos sociais, e senhor[es] também das normas do dialeto socialmente privilegiado” (p. 76), isto é, eles dominam variados estilos de fala e os alternam de acordo com a situação. Propomo-nos a registrar situações dialógicas em que a informalidade predomine e propicie o discurso fluido, espontâneo do(s) falar(es) culto(s) manauara(s).

Metodologia

A delimitação da população de referência foi feita a partir de dois critérios: a) grau de escolaridade, no mínimo, nível superior completo; b) ter nascido em Manaus e residir nela há pelo menos 20 anos e ser preferencialmente filho de amazonenses. O corpus foi estabelecido considerando como variáveis a idade e o gênero dos falantes. Dividimo-los em três faixas etárias: informantes de 25 a 35 anos; de 36 a 55; e 55 em diante.

Depois de registrados, os dados foram transcritos usando as técnicas metodológicas do NURC apresentadas por Marcuschi (2001).

Pausas breves: ... Pausas longas: ...: Ênfase: MAIúSCULAS Prolongamento: : Não compreensível: (inint.) Interferência: (tipo de interferência) Hesitação: (hes.) Estímulo do interlocutor: (est: tipo) Dúvida do pesquisador: “palavra”

Page 51: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

51

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Silabação: sí-la-ba Superposição de fala: L1: [... L2: ...]

Resultados

O objetivo central da pesquisa foi iniciar os estudos sistemáticos sobre a língua culta falada pelos manauaras, o qual foi alcançado com sucesso. A população do corpus totaliza vinte informantes. Entretanto, para que a pesquisa refletisse a heterogeneidade da população manauara, fizemos uma alteração quanto à origem geográfica dos informantes: alguns não nasceram manauaras, mas residem ali há mais de vinte anos.

Referindo-nos às variáveis consideradas, sexo e faixa etária, a população total da pesquisa está assim distribuída:

REFERÊNCIAS

BAGNO, Marcos. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística. São Paulo: Parábola, 2007.

MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2001.

MATTOS E SILVA, R. V. “O Português são dois...”: novas fronteiras, velhos problemas. São Paulo: Parábola, 2004.

Page 52: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

52

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Page 53: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

53

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Page 54: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

54

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Page 55: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

55

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Page 56: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres

56

Anais :: I Congresso Internacional de Dialetologia e Sociolinguística

Page 57: Anais I CIDS - trabalhos dos posteres