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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE ANALICE OLIVEIRA FRAGOSO Intervenção em funções executivas, compreensão e metacompreensão de leitura em crianças com transtorno de déficit de atenção/hiperatividade São Paulo 2014

ANALICE OLIVEIRA FRAGOSO Intervenção em …tede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/1632/1/Analice Oliveira... · F811i Fragoso, Analice Oliveira. Intervenção em funções executivas,

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  • UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

    ANALICE OLIVEIRA FRAGOSO

    Interveno em funes executivas, compreenso e metacompreenso de leitura em

    crianas com transtorno de dficit de ateno/hiperatividade

    So Paulo

    2014

  • ANALICE OLIVEIRA FRAGOSO

    Interveno em funes executivas, compreenso e metacompreenso de leitura em

    crianas com transtorno de dficit de ateno/hiperatividade

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao

    em Distrbios do Desenvolvimento, como requisito parcial

    obteno do ttulo de Mestre em Distrbios do

    Desenvolvimento.

    Orientadora: Profa. Dra. Alessandra Gotuzo Seabra

    So Paulo

    2014

  • F811i Fragoso, Analice Oliveira.

    Interveno em funes executivas, compreenso e

    metacompreenso de leitura em crianas com transtorno de dficit

    de ateno/hiperatividade / Analice Oliveira Fragoso. 2014.

    173 f. : il. ; 30 cm.

    Dissertao (Mestrado em Distrbios do Desenvolvimento) -

    Universidade Presbiteriana Mackenzie, So Paulo, 2014.

    Referncias bibliogrficas: f. 153-173.

    1. Funes executivas. 2. Transtorno do dficit de ateno com

    hiperatividade (TDAH). 3. Metacognio. 4. Interveno. I. Ttulo.

    CDD 616.8589

  • ANALICE OLIVEIRA FRAGOSO

    Interveno em funes executivas, compreenso e metacompreenso de leitura em

    crianas com transtorno de dficit de ateno/hiperatividade

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao

    em Distrbios do Desenvolvimento, como requisito parcial

    obteno do ttulo de Mestre em Distrbios do

    Desenvolvimento.

    BANCA EXAMINADORA

    Profa. Dra.Alessandra Gotuzo Seabra

    Universidade Presbiteriana Mackenzie

    Prof. Dr.Luiz Renato Rodrigues Carreiro

    Universidade Presbiteriana Mackenzie

    Profa. Dra.Maria Cristina Rodrigues Azevedo Joly

    Universidade de Braslia

  • Dedico esse trabalho primeiramente a Deus, que me

    capacitou; aos meus pais, famlia e amigos, que acreditaram

    em meu desempenho.

    Soli Deo Gloria

  • AGRADECIMENTOS

    A minha me Climene, meu pai Jos Carlos e a minha irm Alicia, minha

    famlia, minha base e meu apoio. Devo a vocs grande parte de tudo que sou hoje.

    Obrigada pelo incentivo e acolhimento nos momentos em que minhas foras pareciam

    se esgotar.

    Aos professores do programa de Distrbios do Desenvolvimento, Dr. Luiz

    Renato Rodrigues Carreiro, Dr.Jos Salomo Schwartzman, Dr Maria Cristina Triguero

    Veloz Teixeira, Dr. Elizeu Coutinho de Macedo, Beatriz Regina Pereira Saeta, Dr.Paulo

    Srgio Bggio, Dr. Marcos Jos da Silveira Mazzotta, Dr Silvana Maria Blascovi de

    Assis e Dr Sueli Galego de Carvalho pelos ricos ensinamentos.

    minha querida orientadora Professora. Dra. Alessandra Gotuzo Seabra por

    sua prontido e disponibilidade em me auxiliar sempre que precisei. um privilgio ser

    orientada por uma pessoa que alm de sbia to especial e amiga. Trabalhar com

    voc foi uma experincia nica e marcante. Obrigada por sua dedicao, empenho e

    apoio durante essa jornada que percorri.

    Agradeo as colegas do grupo de pesquisa neuropsi, em especial a Amanda

    Menezes, Natlia Dias e Bruna Trevisan por compartilharem comigo seus

    conhecimentos e de me proporcionarem a oportunidade de partilhar do trabalho de

    vocs e principalmente pela colaborao e apoio que me deram sempre que precisei.

    Aos professores Dr. Luiz Renato Rodrigues Carreiro e a Dra. Maria Cristina

    Joly, que aceitaram participar da minha banca de Defesa da Dissertao.

    Ao Instituto Presbiteriano Mackenzie, por me proporcionar a oportunidade de

    concluir o mestrado me beneficiando com bolsa 100%.

    Agradeo a todos os pais que permitiram que seus filhos participassem das

    atividades, acreditando no meu trabalho e pelo empenho que tiveram em traz-los

    fielmente em todas as sesses, muitas vezes vindo de longe.

  • Agradeo de uma forma toda especial a todas as crianas que participaram das

    intervenes, me dando o privilgio de conviver com elas durante um ano. Obrigada

    pelo carinho, e ternas demonstraes de afeto para comigo.

    Quero agradecer aos meus colegas de trabalho que alm de me aturarem

    todos os dias, me auxiliaram sempre que precisei. Deixo o meu muito obrigada aos

    meus queridos amigos, Leandro Okuma, Zenilde Hiplito dos Santos, Paula Pamplona

    de Castro, Alexandre Slowetzky Amaro, Betania Felipe Soares, Renato de Moraes

    Santiago e Karine Silva.

    Aos Pastores Carlos Alberto Henrique e Agnaldo Duarte de Faria, pelas

    mensagens de conforto nos meus momentos de angstia. Homens usados por Deus.

    As minhas coordenadoras Paula Pina Cabral Bicudo Conti e Mrcia de Souza

    Leite Nepomuceno, por me liberarem nos dias de trabalho em que precisei cumprir com

    minhas atividades programadas obrigatrias.

  • Mas os que esperam no Senhor renovaro as suas foras,

    subiro com asas como guias, correro e no se cansaro,

    caminharo e no se fatigaro. Isaas 40:31

  • RESUMO

    FRAGOSO, A. O. Interveno em funes executivas, compreenso e metacompreenso de leitura em crianas com transtorno de dficit de ateno/hiperatividade. Dissertao de Mestrado, Programa de Ps-Graduao em Distrbios do Desenvolvimento, Universidade Presbiteriana Mackenzie, So Paulo, 2013.

    Estudos tm investigado a associao entre transtorno de dficit de ateno e hiperatividade e dficits no funcionamento executivo e na leitura. Em consequncia, so necessrias intervenes com o objetivo de tentar amenizar o impacto dos sintomas e das dificuldades geradas por essa associao na vida das pessoas. Assim, o objetivo do estudo foi implementar um programa de interveno para crianas com TDAH que promova o desenvolvimento de suas funes executivas e de leitura, incluindo as habilidades de compreenso e metacompreenso. O estudo foi realizado com quatro participantes com idades entre 7 e 14 anos, com diagnstico de TDAH, devidamente matriculados em escolas regulares da grande So Paulo. A pesquisa foi conduzida em trs fases. Na primeira, foram aplicados s crianas: Teste de Trilhas, Teste de Memria de Trabalho Auditiva e Visual, Teste Wisconsin de Classificao de Cartas, Teste de Ateno por Cancelamento, Escala de Metacompreenso META Fundamental I, Teste de Cloze e Subtestes Cubos e Vocabulrio do WISC-IV. Adicionalmente, pais e professores responderam dois inventrios de funcionamento executivo e regulao. Na segunda fase, foi conduzida a interveno com base no Programa de Interveno sobre Autorregulao e Funes Executivas (PIA-FEx) e em tcnicas para desenvolver compreenso e metacompreenso de leitura, em sesses com duplas de crianas, duas vezes por semana, ao longo de um ano. Na terceira fase, todos os testes foram reaplicados. A anlise quantitativa descritiva revelou que todos os sujeitos evoluram em compreenso de leitura, na maioria dos escores de metacompreenso de leitura e em alguns dos escores de funes executivas. A anlise qualitativa tambm sugeriu que os quatro sujeitos parecem ter obtido melhoras nos desempenhos das tarefas de funes executivas, compreenso e metacompreenso de leitura. Na aplicao do teste de Cloze, por exemplo, foi possvel perceber uma melhora de todos os sujeitos avaliados no nmero de acertos, tanto na correo literal quanto na por significado, o que sugere que obtiveram ganhos em relao compreenso de leitura. No Teste de Ateno por Cancelamento, observou-se uma tendncia de aumento no desempenho de trs sujeitos avaliados. Essa tendncia foi observada tambm para alguns sujeitos nos demais testes aplicados. Assim, de forma geral, o procedimento parece ter sido eficaz para promover avanos nos desempenhos dos participantes, principalmente nas tarefas de metacompreenso e compreenso de leitura, mas tambm em algumas atividades de funes executivas.

    Palavras-chave: Funes executivas, TDAH, metacognio, interveno.

  • ABSTRACT

    FRAGOSO, A. O. Intervention in executive functions, understanding and meta-understanding reading in children with attention deficit disorder/hyperactivity. M.S. Thesis, Graduate Studies in Developmental Disorders, Universidade Presbiteriana Mackenzie, So Paulo, 2013.

    The studies have investigated the association between attention deficit desorder and

    hyperactivity and deficits in executive functioning and reading. Consequently, the

    interventions are necessary in order to try to mitigate the impact of symptoms and

    difficulties generated by this association in people's lives. Thus, the aim of this study

    was to implement an intervention program for children with ADHD that promotes the

    development of their executive functions and reading, including comprehension skills

    and meta-understanding. The study was conducted with four participants aged between

    7 and 14 years old, diagnosed with ADHD, duly enrolled in regular schools in the

    Greater So Paulo. The research was conducted in three phases. In the first, were

    administered to the children: Trail Making Test, Auditory and Visual Memory Working

    Test, Wisconsin Card Sorting, Attention Test for Cancellation, Meta-understanding

    Scale META Elementary I, Cloze Test and Cubes Subtests and the WISC-IV

    Vocabulary. Additionally, parents and teachers answered two surveys of executive

    functioning and regulation. In the second phase was conducted the intervention based

    on Early Intervention Program on. Executive Functioning (PIAFEx) and techniques to

    develop understanding and meta-understanding reading, in sessions with a pair of

    children, twice a week, over 1 year. In the third phase, all tests were reapplied.

    Quantitative descriptive analysis revealed that all subjects evolved in reading

    comprehension scores in most meta-understanding reading and some of the scores of

    executive functions. Quantitative analysis also suggested that the four subjects seem to

    have achieved improvements in the performance of tasks of executive functions,

    reading comprehension and meta-understanding. In application of Cloze test, for

    example, it was possible to realize an improvement of all subjects evaluated in the

    number of hits, both in the literal and in correction for meaning, which suggests that

    gained in relation to reading comprehension. The Attention Test for Cancellation, it was

    observed a tendency of increase in performance of three subjects evaluated. This trend

    was also observed for some subjects in other tests applied. Thus, in general the

    procedure seems to have been effective to promote advances in the performances of

    the participants, especially in tasks of meta-understanding and reading comprehension,

    but also in some activities of executive functions.

    Keywords: Executive functions, ADHD, metacognition, intervention.

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela1. Caracterizao dos Participantes. .............................................................. 39

    Tabela 2. Escores na Escala de Metacompreenso META Fundamental I, nas condies antes, durante, depois da leitura e total, antes e aps a interveno, para todos os quatro sujeitos. ........................................................................................... 53

    Tabela 3. Escores brutos e, entre parnteses, pontuaes-padro no Teste de Ateno por Cancelamento, antes e aps a interveno, para todos os quatro sujeitos. ....... 54

    Tabela 4. Escores brutos e, entre parnteses, pontuaes-padro no Teste de Trilhas: Parte A e B, antes e aps a interveno, para todos os quatro sujeitos. .................. 56

    Tabela 5. Escores de Cloze e porcentagem entre parnteses, antes e aps a interveno, para todos os quatro sujeitos. ............................................................... 57

    Tabela 6. Escores do Teste de Memria de Trabalho Auditiva (MTA) e Teste de Memria de Trabalho Visual (MTV), antes e aps a interveno, para todos os quatro sujeitos. ..................................................................................................................... 58

    Tabela 7. Escores do Teste Wisconsin de Classificao de Cartas (WCST), antes e aps a interveno, para todos os quatro sujeitos. ................................................... 59

    Tabela 8. Escores no IFEI Pais e Professores, antes e aps a interveno, para todos os quatro sujeitos. ..................................................................................................... 60

    Tabela 9. Escores brutos e pontuao padro, entre parnteses, nos subtestes de Cubos e Vocabulrio do WISC, antes e aps a interveno, para todos os quatro sujeitos. ..................................................................................................................... 61

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1 Segmento do Teste de Cancelamento Parte 1 ..................................... 40

    Figura 2 Segmento do Teste de Cancelamento Parte 2 ..................................... 41

    Figura 3 Segmento do Teste de Cancelamento Parte 3. .................................... 41

    Figura 4 - Tela do MTA, com a sequncia de itens 1 e bola. ............................... 42

    Figura 5 - Telas do MTV, esquerda ilustrando .... .................................................. 43

    Figura 6 - Ilustrao do exemplo fornecido na instruo do Teste de Trilhas Parte B.45

    Figura 7 Exemplos de itens da Meta I ................................................................... 49

    Figura 8 Exemplos de itens do Teste de Cloze. .................................................... 49

  • SUMRIO

    INTRODUO .................................................................................................. 12 1. FUNES EXECUTIVAS ............................................................................ 14 2. COMPREENSO E METACOMPREENSO DA LEITURA ...................... 21 3. TRANSTORNO DE DFICIT DE ATENO E HIPERATIVIDADE (TDAH) ...........................................................................................................................

    26

    3.1 TDAH E FUNES EXECUTIVAS ...................................................... 31 3.2 TDAH E LEITURA ................................................................................. 35 4. OBJETIVOS ................................................................................................. 38 4.1 Objetivo Geral ....................................................................................... 38 4.2 Objetivos Especficos ........................................................................... 38

    5. MTODO .................................................................................................... 39 5.1 Participantes ........................................................................................ 39 5.2 Instrumentos ........................................................................................ 40 5.2.1 Teste de Ateno por Cancelamento ................................................ 40 5.2.2 Teste de Memria de Trabalho Auditiva (MTA) e Teste de Memria de Trabalho Visual (MTV) ................................................................................

    42

    5.2.3 Teste de Trilhas Parte A e Parte B .................................................... 44 5.2.4 Teste Wisconsin de Classificao de Cartas (WCST) ....................... 45 5.2.5 Inventrio de Funcionamento Executivo Infantil (IFEI) para pais e professores ...................................................................................................

    46

    5.2.6 Inventrio de Funes Executivas e regulao infantil (IFERI) para pais e professores .............................................................................................

    47

    5.2.7 Escala de Metacompreenso META Fundamental I ........................... 47

    5.2.8 Teste de Cloze .................................................................................... 48 5.2.9 Subtestes Cubos e Vocabulrio da Escala de Inteligncia Wechsler para Crianas ..................................................................................................................... 49

    49

    5.2.10 Programa de Interveno ................................................................. 50

    5.3 Procedimento ......................................................................................... 51

    5.4 Anlise de Dados ................................................................................... 52

    6. RESULTADOS .............................................................................................. 53

    6.1 Anlise quantitativa descrita dos desempenhos dos sujeitos no pr e no ps- Teste ....................................................................................................

    53

    6.2 Anlise qualitativa dos comportamentos e dos desempenhos dos sujeitos na interveno .....................................................................................

    62

    CONSIDERAES FINAIS .............................................................................. 152

    REFERNCIAS ................................................................................................. 155

    ANEXOS ............................................................................................................ 172

  • 12

    INTRODUO

    O Transtorno de Dficit de Ateno/Hiperatividade (TDAH) um dos

    distrbios do desenvolvimento mais comuns na infncia (AMERICAN PSICHIATRIC

    ASSOCIATION/APA, 2002) e tem como principais caractersticas dificuldades em

    manter os nveis necessrios de ateno, impulsividade e inquietude motora e

    psquica (BARKLEY, 2002). Pesquisas realizadas apontam que esse transtorno vem

    sendo associado, com frequncia, a alteraes nas funes executivas, que so

    responsveis por modular os controles cognitivo, social, emocional e motivacional

    (NIGG et al., 2005; WILLCUT et al., 2005). Crianas e adolescentes que apresentam

    tais disfunes tendem a ter hbitos de leitura inadequados, prejudicando a

    compreenso e trazendo dificuldade em atingir notas mnimas nas avaliaes

    escolares (HBNER; MARINOTTI, 2000; PERGHER; VELASCO, 2007).

    Um mtodo de tratamento frequentemente aplicado nesses e em diversos

    outros distrbios, alm das intervenes medicamentosas, so as intervenes

    comportamentais e cognitivas, sendo que essas intervenes tm se mostrado

    eficazes na melhora de sintomas em diversos transtornos (DIAMOND et al, 2007).

    Tais mtodos tm o objetivo de proporcionar ganhos em longo prazo. Estudos

    descritos por Menezes (2012) vm sendo realizados com o objetivo de promover

    intervenes cognitivas em crianas e adolescentes com diagnstico de TDAH, por

    meio de atividades ldicas que estimulem as habilidades executivas.

    Nesse contexto, o presente trabalho aborda a relao entre funes

    executivas, compreenso e metacompreenso de leitura e TDAH, buscando

    investigar teoricamente suas relaes e investigar a possibilidade de interveno

    nessas habilidades. O objetivo desta pesquisa foi de promover uma interveno para

    promover as funes executivas, a compreenso e a metacompreenso de leitura

    em crianas entre 7 e 14 anos de idade devidamente diagnosticadas com TDAH, por

    meio do uso do Programa de Interveno sobre autorregulao e Funes

    Executivas (PIA-FEx) e de outras atividades para desenvolver compreenso e

    metacompreenso de leitura. Na parte terica do trabalho, so apresentados os

    conceitos de funes executivas e seus componentes, compreenso e

  • 13

    metacompreenso de leitura e TDAH, suas caractersticas, etiologia, formas de

    tratamento.

  • 14

    1. FUNES EXECUTIVAS

    As funes executivas (FE) so indispensveis para a capacidade do

    indivduo de se engajar em comportamentos orientados a objetivos, realizando

    aes espontneas e auto-organizadas (CAPOVILLA; ASSEF; COZZA, 2007). Elas

    envolvem diferentes processamentos cognitivos e metacognitivos, que permitem que

    o indivduo perceba e responda de forma adaptativa aos estmulos. Esses

    processamentos referem-se s habilidades necessrias para ter iniciativa, realizar

    planejamentos, e monitorar comportamentos intencionais, relacionados a um

    objetivo (HANNA-PLADDY, 2007; LEZAK et al, 2004).

    Diamond et al. (2007) relatam que as FE tm como principal base

    neurolgica o crtex pr-frontal, que ocupa em mdia um tero do crebro humano e

    responsvel pela execuo de atividades a partir de informaes recebidas pelas

    regies posteriores do crtex. A parte pr-frontal dividida em trs reas distintas,

    denominadas crtex pr-frontal dorsolateral, crtex pr-frontal ventromedial e crtex

    cinguado anterior. Uma das funes do crtex pr-frontal a capacidade de

    planejamento e desenvolvimento de estratgias para alcanar metas, requerendo

    flexibilidade de comportamento, integrao de detalhes num todo coerente e manejo

    de mltiplas fontes de informao, coordenados com o uso do conhecimento

    adquirido.

    As FE so compostas por habilidades que atuam de forma integrada, ou

    seja, que apesar de serem operaes diferenciadas, se relacionam e trabalham em

    conjunto (MIYAKE et al, 2000; SOUZA et al, 2001). Segundo Malloy, Cohen e

    Jenkins (1998 apud TREVISAN, 2010), as FE incluem seis habilidades: 1.

    Formulao de objetivos relacionados s consequncias de longo-prazo; 2. Gerao

    de mltiplas respostas alternativas; 3. Escolha e iniciao de comportamento

    direcionado a objetivos; 4. Automonitoramento da adequao e correo do

    comportamento; 5. Correo e modificao de comportamento quando as condies

    mudam e 6. Persistncia frente distrao.

    Porm, h uma grande variabilidade na definio de FE e das habilidades

    que a caracterizam, conforme descrito por Barkley (2011). Segundo esse autor, em

  • 15

    um congresso realizado em 1994, dez especialistas foram convidados a colocarem

    termos que pudessem representar as FE. Foram mencionados trinta e trs termos,

    tendo uma maior concordncia para autorregulao, sequncia de comportamentos,

    flexibilidade, controle inibitrio, planejamento e organizao de comportamento.

    Miyake et al. (2000) e Diamond (2013) elencam trs habilidades bsicas

    relacionadas s FE: memria de trabalho, inibio e flexibilidade cognitiva. Essas

    trs habilidades so descritas a seguir.

    Segundo Baddeley (1992), a memria de trabalho refere-se a uma

    habilidade que permite tanto o processamento ativo quanto o armazenamento

    transitrio de informaes durante tarefas cognitivas. Alm da manuteno ou

    armazenamento passivo da informao, este sistema possibilita uma srie de

    operaes mentais, mantendo a informao sempre ativa e integrando-a a estmulos

    e resgatando conhecimentos anteriores a memria de longo prazo, permitindo a

    manipulao ativa da informao e uma atualizao constante na prpria memria

    de trabalho.

    Dentre essas utilidades, Baddelley e Hitch (1974) estruturaram um modelo

    de memria de trabalho, que foi dividido em trs componentes, sendo esses: central

    executivo, ala-fonolgica e esboo visuoespacial. O central executivo o centro de

    controle e comando responsvel pelas interaes entre a memria de longo prazo e

    a ala fonolgica e esboo visuoespacial. Ele coordena os processos da memria de

    trabalho e controla suas aes. A ala fonolgica est relacionada ao som,

    correspondente a uma memria de informaes auditivas. Ela utilizada no

    armazenamento curto acstico composto pelos sons de entrada. Por fim, o esboo

    visuoespacial que responsvel pelo armazenamento da informao visual e

    cdigos visuoespaciais (BADDELLEY, 2000; 2006; 1974; GAZZANIGA et al., 2006;

    REPOVS; BADDELEY, 2006).

    Baddeley (2000) afirma que o principal componente da memria de trabalho

    o executivo central, responsvel por controlar e regular o processamento da

    informao, assim como orientar o comportamento e a cognio.

  • 16

    O segundo componente das FE, a inibio, compreende a ateno seletiva e

    o controle inibitrio (DIAMOND, 2013). A ateno seletiva um mecanismo cerebral

    cognitivo que possibilita que o individuo processe informaes, aes e

    pensamentos, e durante esse processamento consegue ignorar informaes

    irrelevantes que podem causar distrao. Essa habilidade permite ao sujeito

    processar diferentes informaes ao mesmo tempo, sendo capaz de selecionar as

    mais importantes (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006; STERNBERG, 2008).

    Segundo Lezak et al. (2004), a ateno pode se classificar em diferentes

    aspectos, sendo: a seletividade, sustentao, diviso de recursos e alternncia de

    informaes, conhecidos como ateno seletiva, ateno sustentada, ateno

    dividida e ateno alternada, sendo que o comportamento pode sofrer influncias de

    todos esses elementos. Resumidamente, a ateno seletiva a capacidade de

    selecionar o estmulo adequado diante de diversos distratores, a ateno sustentada

    capacidade que o individuo tem de se manter atento por um maior perodo de

    tempo durante a realizao de uma tarefa. A ateno dividida a diviso dos

    recursos atencionais em dois ou mais estmulos em duas ou mais tarefas diferentes,

    tornando o individuo capaz de trabalhar com inmeras informaes de forma

    simultnea. A ateno alternada aparece quando o indivduo consegue alternar ou

    substituir os estmulos relevantes (LEZAK et al., 2004). A ateno seletiva

    especificamente relacionada s FE.

    O controle inibitrio, que tambm integra o componente de inibio,

    considerado uma importante funo e pode ser compreendido como um mecanismo

    de filtragem que complementa a ateno seletiva e inibi os estmulos irrelevantes

    que do soluo a um dado problema, diminuindo a demanda sobre o

    processamento da informao (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006). MALLOY-DINIZ

    et al. (2008) consideram o controle inibitrio como sendo uma habilidade que o

    sujeito possui de inibir respostas no adaptadas, permitindo ao sujeito inibir

    estmulos distratores que influenciem em suas aes. Gil (2010) descreve que

    controle inibitrio permite ao sujeito agir de maneira adequada, controlando

    comportamentos incorretos que de certa forma se tornam prejudiciais naquele

    momento.

  • 17

    J a flexibilidade cognitiva, o terceiro componente das FE, um processo de

    controle de tarefa (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006). Tal habilidade solicitada

    sempre que o indivduo engaja-se em aes mais difceis devendo considerar

    diferentes informaes, sempre mudando o foco de processamento entre elas. A

    flexibilidade cognitiva fundamental para a capacidade de regular o prprio

    comportamento adaptando assim, s demandas ambientais. Nesta habilidade

    podem incidir padres de rigidez cognitiva e comportamental, conhecidos pela

    dificuldade de mudar respostas ou o foco de processamento, tendo prejuzo na

    autorregulao do indivduo (LEZAK; HOWIESON; LORING, 2004). Gil (2010)

    descreve a flexibilidade cognitiva como uma capacidade de adaptar as escolhas s

    contingncias, tornando o indivduo capaz de alterar seu comportamento de acordo

    com o que o meio lhe oferece. Baseando-se nessas descries pode-se afirmar que

    a flexibilidade cognitiva e o controle inibitrio trabalham juntos.

    Alm desses trs componentes bsicos das FE, outros autores elencam

    outras habilidades. Por exemplo, para Lezak, Howieson e Loring (2004), o

    monitoramento um outro aspecto componente das FE. Ele permite que o sujeito

    tenha a capacidade de corrigir e mudar a direo de seu comportamento, quando

    percebe que o mesmo tenha sido adequado ou inadequado, praticando o

    monitoramento e um controle executivo da situao. O monitoramento associa-se ao

    crtex cingulado anterior e caracteriza como Sistema Supervisor Atencional (SSA),

    sistema originalmente proposto por Shallice, responsvel por monitorar as aes em

    andamento e as operaes de controle que permitem a regulao, adaptativa das

    demandas ambientais, o processamento cognitivo e consequentemente, o

    comportamento do indivduo (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006).

    Outros autores consideram o planejamento como um aspecto complexo das

    FE (MIYAKE et al., 2000). Segundo Krikorian, Bartok e Gay (1994), o planejamento

    envolve a antecipao de eventos e de suas consequncias, como o monitoramento

    de quo prximo ou quo distante se est de alcanar o objetivo final (KRIKORIAN;

    BARTOK; GAY, 1994 apud CAPOVILLA; ASSEF; COZZA, 2007).

    Malloy-Diniz e colaboradores (2008) afirmam que, apesar de no existir uma

    nica definio para as FE, as muitas definies existentes podem ser, em certo

    sentido, consideradas complementares, pois, de maneira geral, todas correspondem

  • 18

    a um conjunto de habilidades que permitem que o indivduo seja capaz de direcionar

    comportamentos a metas e substituir estratgias ineficazes em prol de outras mais

    eficientes, desta forma resolvendo problemas imediatos, de mdio e longo prazo.

    Goldberg (2002) tambm afirma que a perda dessas funes so as mais

    comprometedoras em relao ao comportamento humano, pois indivduos que

    apresentam leses nos lobos pr-frontais sofrem com graves problemas no controle

    e na regulao dos seus comportamentos, no sendo capazes de ter um

    funcionamento normal em suas tarefas cotidianas.

    O desenvolvimento das funes executivas tem incio j no primeiro ano de

    vida. Ele continua ao longo da infncia e da adolescncia, tendo um aumento

    considervel no desenvolvimento durante essa fase, indo at o incio da vida adulta,

    quando entra em fase de estabilizao, com posterior declnio ao longo do

    envelhecimento (BERNIER; CARLSON; WHIPPLE, 2010; DIAMOND, 2007;

    GARON; BRYSON; SMITH, 2008; GOLDBERG, 2002; HUIZINGA et al., 2006;

    MIRANDA; MUSZKAT, 2004; PAPAZIAN; ALFONSO; LUZONDO, 2006). Huizinga et

    al. (2006) afirmam que, ao longo do desenvolvimento, a criana torna-se cada vez

    mais capaz de controlar os seus pensamentos e aes. De fato, Blakemore e

    Choudhury (2006) comprovaram que os adolescentes conseguem manter com mais

    facilidade conceitos em mente, sendo, assim, capazes de pensar em solues com

    maior nmero de estratgias, mais bem elaboradas do que as feitas pelas crianas.

    Com o objetivo de examinar essas mudanas nas FE relacionadas idade,

    alguns estudos foram realizados. Por exemplo, Davidson et al. (2006) investigaram

    as relaes do desenvolvimento com a memria de trabalho, a inibio e a

    flexibilidade cognitiva. Participaram do estudo 325 sujeitos, crianas e adolescentes

    americanos, com faixa etria entre 4-13 anos, e jovens, sendo 50% do sexo

    feminino. Foram realizados testes com todos os participantes, em que uma bateria

    computadorizada, destinada a manipular a memria e inibio de forma

    independente e em conjunto. Os autores observaram que, na troca de tarefas, as

    crianas mais novas j conseguiram sustentar na mente informaes que podiam

    inibir uma resposta predominante, podendo combin-las entre si. J a partir dos 6

    anos de idade elas apresentaram melhoras significativas no controle inibitrio,

    embora a tarefa ainda exigisse um esforo maior que nos jovens. A flexibilidade

  • 19

    cognitiva, mesmo com menores demandas de memria, os autores mostram uma

    progresso maior aos 13 anos de idade, porm ainda no em nveis adultos.

    Menezes (2008), em seu estudo sobre evidncias de validade de

    instrumentos para avaliar funes executivas, investigou 193 estudantes da 5 8

    srie do ensino fundamental. Foram utilizados nove instrumentos, sendo eles: Teste

    de Memria de Trabalho Auditiva, Teste de Memria de Trabalho Visual, Teste de

    Stroop Computadorizado, Teste de Gerao Semntica, Testes de Trilhas Parte A e

    Parte B, Torre de Londres e Teste de Fluncia Verbal FAS. Houve correlaes

    significativas mas baixas a moderadas entre os testes. Os resultados confirmaram a

    hiptese de que existem habilidades distintas relacionadas s funes executivas e

    que as funes executivas desenvolvem-se de acordo com a progresso escolar.

    Dias (2009) investigou tendncias de validade de instrumentos de avaliao

    neuropsicolgica das habilidades relacionadas s funes executivas. Participaram

    do estudo 572 crianas e adolescentes com idades entre 6 e 14 anos, matriculadas

    em escola pblica, cursando entre o 1 e o 8 ano. Foram utilizados os seguintes

    instrumentos: Teste de Memria de Trabalho Auditiva, Teste de Memria de

    Trabalho Visual, Teste de Ateno p Cancelamento, Teste de Trilhas partes A e

    B, Teste de Gerao Semntica, Teste de Stroop Computadorizado, Torre de

    Londres e Teste de Fluncia Verbal FAS. O resultado revelou efeito da idade sobre

    os desempenhos em todos os instrumentos e, de acordo com a autora, as

    habilidades avaliadas seguem cursos de desenvolvimento um pouco distintos entre

    si. J Cozza (2005) investigou se tais testes identificavam crianas com e sem

    sintomatologia para o TDAH. Encontrou evidncias para os Testes de Memria de

    Trabalho Auditiva e de Trilhas Parte B, que so utilizados para avaliar o componente

    auditivo da memria de trabalho e a flexibilidade cognitiva, respectivamente,

    mostrando que tais testes discriminaram entre os grupos com e sem TDAH.

    As FE, que aumentam com a idade, conforme descrito nos estudos j

    citados, so fundamentais em diferentes aspectos, como na atividade escolar, em

    que a criana precisa demonstrar um conjunto de habilidades, com independncia e

    autonomia, utilizando sua estrutura cognitiva e comportamental prvia. E nessas

    situaes que a criana solicitada frequentemente a atender regras ter disciplina,

  • 20

    sejam elas sociais, na relao com seus colegas, ou atencionais e de organizao,

    para desfrutar da possibilidade de aprender (CYPEL, 2006).

    Por meio dos estudos realizados, pode-se relacionar FE com processos

    cognitivos e metacognitivo. Shimamura (2000) e Bolvar (2002) entendem a

    metacognio como o conhecimento e o autocontrole que a pessoa tem sobre sua

    prpria cognio; envolve conscincia na sua forma de pensar, envolve processos e

    eventos cognitivos e tambm habilidade para controlar estes processos, com o

    intuito de organiz-los, armazen-los e modific-los.

    Segundo Shimamura (2000), pode-se relacionar FE com metacognio

    porque, assim como os processos metacognitivos modulam e imprimem flexibilidade

    aos cognitivos, os sistemas executivos ativam esquemas de ao de acordo com as

    intenes do indivduo. Assim, a metacognio atua como facilitadora para tomada

    de deciso, seleo de estratgias e soluo de problemas por meio da identificao

    do erro, do controle inibitrio e da regulao emocional.

    A metacognio utilizada em estratgias de aprendizagem, bem como a

    autorregulao, que por sua vez uma habilidade relacionada s funes

    executivas, correspondente ao seguimento e avaliao de um determinado

    processo, no necessariamente linear, que objetiva a resoluo de um problema.

    Essa habilidade se refere a um conjunto de processos comportamentais e cognitivos

    que so fundamentais para o ajustamento e a adaptao do indivduo, o que se d

    por meio do monitoramento, regulao e controle de seus estados motivacional,

    emocional e cognitivo (BLAIR, 2007; DIAMOND, 2007).

    Fernadez-Duque et al. (2000) observam a influncia da metacognio e das

    FE nas atividades do dia a dia atravs do monitoramento das aes dos indivduos

    quando no existe um plano pr-estabelecidos para responder, principalmente em

    situaes novas. O uso da metacognio e das FE permitem maior eficincia de

    processamento e escolha das melhores respostas para as diferentes tarefas

    estabelecidas. A metacognio, portanto, estende-se a diferentes atividades

    cotidianas. Uma delas a metacompreenso de leitura, que ser abordada no tpico

    seguinte.

  • 21

    2. COMPREENSO E METACOMPREENSO DE LEITURA

    por meio da leitura que o sujeito qualifica sua formao cognitiva, social,

    aumentando, assim, sua insero cultural. Para que isso ocorra, o leitor precisa ser

    capaz de realizar uma leitura que lhe d condies de aprender, podendo assim

    interagir com o meio (SANTOS, et al., 2002).

    A leitura um processo complexo que engloba diferentes habilidades. Nesse

    processo, Cabral (1986) discorre quatro etapas, so elas: decodificao,

    compreenso, interpretao e reteno. Segundo Menegassi (1995), o aluno realiza

    primeiro a decodificao dos smbolos escritos; depois, prepara-se para passar para

    prxima etapa de leitura, a compreenso do que foi lido. Segundo Menegassi (1995)

    a decodificao, apesar de ser apenas parte da leitura, fundamental, por vezes

    sendo necessrio inclusive faz-la mais de uma vez durante a leitura de um mesmo

    texto. o momento em que o individuo pode anotar palavras desconhecidas e

    localizar um sinnimo.

    A compreenso da leitura indispensvel para aquisio de novos

    conhecimentos (DUKE, PERSON, 2002; SALVIA, YSSELDYKE, 1991). Leffa (1996)

    comenta que quando o leitor diz: li, mais no entendi, ele permanece no primeiro

    elemento da realidade, ou seja, ocorreu a decodificao, mas no o entendimento. A

    compreenso envolve o processamento de informaes a partir de habilidades

    cognitivas e metacognitivas, ao lado de influncias sociais, afetivas e educativas, as

    quais so determinadas para aquisio de conhecimentos (MOKHTARI, REICHARD,

    2002). Yopp (1988) acredita que os leitores adquirem uma melhor compreenso do

    texto lido quando aprendem a gerar perguntas sobre o texto, trabalhando assim sua

    metacognio.

    Para Menegassi e Calciolari (2002), compreenso significa interagir com o

    texto, considerando-se o papel do leitor, o papel do texto e a interao entre leitor e

    texto. Assim, a compreenso s ocorre se houver afinidade entre o leitor e o texto,

    se houver uma inteno de ler, com a finalidade de atingir um determinado objetivo.

  • 22

    Para a leitura de um texto, o leitor precisa tambm interpret-lo, ou seja,

    conseguir responder a questes feitas sobre um determinado texto, razo pelas

    quais os materiais escolares esto cheios de tarefas de interpretao de textos.

    Na reteno, considerada a ltima etapa da leitura, considerado o

    armazenamento das informaes mais importantes na memria de longo prazo.

    Essa etapa pode concretizar-se em dois nveis: aps a compreenso do texto, com o

    armazenamento da sua temtica e de seus tpicos principais; ou aps a

    interpretao, em um nvel mais elaborado (MENEGASSI; CALCIOLARI, 2002).

    Assim, para realizao de uma leitura necessrio se utilizar de vrias

    estratgias, algumas podem ser consideradas cognitivas e outras metacognitivas. As

    cognitivas fazem referncias s aes de domnio do contedo e a escolha do

    procedimento que os leitores fazem para atingir os seus objetivos frente leitura

    (Bolvar, 2002; Kopke Filho, 2002 apud Joly, 2012). As metacognitivas relacionam-se

    ao gerenciamento da compreenso, ao pensar sobre a leitura, o que pode ser mais

    eficaz por meio do uso de estratgias adequadas ao tipo e complexidade dos

    textos (COLLINS, 1998; KOPKE FILHO, 2001 apud JOLY, 2012).

    Portanto, para que o indivduo alcance um nvel adequado de leitura, ele

    precisa ter recursos que vo alm da decodificao e, inclusive, alm da cognio,

    alcanando a metacognio, monitorando, regulando e adequando seus

    conhecimentos de acordo com suas metas (SANTOS, et al., 2002).

    Flavell (1979) definiu metacognio como sendo a cognio sobre a

    cognio, ou conhecimento e autocontrole da cognio. Desta maneira, Block e

    Pressley (2002) denominam metacompreenso como sendo a metacognio quando

    aplicada compreenso da leitura. Segundo Bolvar (2002), a metacompreenso

    permite que o indivduo seja capaz de planejar, monitorar e avaliar o seu prprio

    pensamento e os processos cognitivos envolvidos durante a leitura, podendo

    controlar o conhecimento necessrio viabilizando a compreenso do contedo de

    um determinado texto, tendo o objetivo de organiz-lo, revis-lo e modific-lo.

    As estratgias de metacompreenso podem ser utilizadas, antes

    (planejamento), durante (monitoramento) e aps (avaliao) a leitura. No momento

  • 23

    denominado anterior leitura, o leitor procura analisar o texto de uma maneira geral

    e utiliza seu conhecimento prvio sobre aquele determinado assunto. No momento

    durante a leitura, ele realiza uma compreenso da mensagem do texto,

    selecionando as informaes mais relevantes e fazendo relaes acerca do tema da

    leitura, a fim de concordar ou discordar com as informaes contidas no texto. J no

    momento aps a leitura, o leitor analisa o contedo lido por meio de um resumo ou

    da releitura do texto, a fim de buscar a importncia das informaes do texto e o

    significado da mensagem. (JOLY, ABREU, & PIOVEZAN, 2006; KOPKE FILHO,

    1997 apud JOLY; DIAS, 2012).

    Alguns estudos tm buscado desenvolver instrumentos para avaliar a

    compreenso e a metacompreenso de leitura e para verificar suas propriedades

    psicomtricas. Por exemplo, Joly (2009) conduziu uma pesquisa com intuito de

    avaliar a compreenso de leitura por meio do teste de Cloze. Esse foi aplicado em

    500 estudantes de 4 srie do ensino fundamental. Os resultados revelaram

    proficincia em leitura para a maioria dos estudantes da escola particular (89,8%) e

    para 14,5% dos que frequentavam escola pblica. O teste apresenta evidncias que

    as meninas compreendem mais o que lem do que os meninos. Estes dados

    evidenciam a importncia de interveno no ensino de leitura, e fornecem evidncia

    de validade para essa verso do teste de Cloze.

    Em outro estudo, a fim de buscar evidncias de validade para a Escala de

    Metacompreenso (META-FII) por meio da correlao com o WISC-III, Joly e Dias

    (2012) avaliaram 61 estudantes, 59% do gnero feminino, regularmente

    matriculados em uma escola da rede pblica de ensino de So Paulo, com idades

    entre 10 a 13 anos. Os resultados evidenciaram diferena significativa quanto ao

    gnero apenas para o QI compreenso verbal. Foram encontradas correlaes

    positivas entre os QIs, verbal, compreenso verbal e total com a META-FII, o que

    atribuiu evidncia de validade para a Escala de Metacompreenso.

    Silva (2012), em seu estudo, objetivou verificar a relao entre compreenso

    da leitura e alguns dos processos envolvidos no ato de ler, como a competncia de

    leitura, a fluncia verbal, o uso de estratgias metacompreensivas e o

    monitoramento metacognitivo. Participaram do estudo 38 alunos com idades entre

  • 24

    10 e 12 anos, matriculados no 6 ano do ensino fundamental de uma escola

    particular de Porto Alegre. Os sujeitos foram divididos em dois grupos, sendo que o

    critrio de diviso baseou-se na mdia do desempenho na compreenso de leitura

    avaliada por meio do teste de Cloze, analisado qualitativamente. A relao entre

    compreenso leitora e fluncia verbal apresentou uma dupla dissociao, ou seja,

    houve alunos com alta fluncia verbal e baixa compreenso na leitura, e tambm

    alunos com baixa fluncia verbal e alta compreenso na leitura. Na anlise feita

    entre o uso das estratgias metacompreensivas de leitura e a compreenso da

    leitura, foram encontrados quatro subgrupos formados por: alunos com alta

    compreenso de leitura e alto relato do uso de estratgias metacompreensivas,

    alunos com alta compreenso de leitura e baixo relato do uso de estratgias

    metacompreensivas, alunos com baixa compreenso da leitura e alto relato de uso

    de estratgias metacompreensivas, alunos com baixa compreenso da leitura e alto

    relato do uso de estratgias metacompreensiva, e alunos com baixa compreenso

    de leitura e baixo relato do uso de estratgias metacompreensivas.

    Segundo Silva (2012), as estratgias mais utilizadas apresentadas no estudo

    foram a de soluo de problemas e as mais frequentes no momento durante a

    leitura. Os dados do julgamento metacognitivo mostraram-se mais precisos na ps-

    dico do que na predio. Os resultados evidenciaram que o processo de leitura

    envolve vrios processos cognitivos, o que sugere que mais fatores podem interferir

    no desenvolvimento desta habilidade, o que pode implicar em uma complexidade do

    processo ensino-aprendizagem.

    Alguns estudos tm revelado que possvel promover intervenes para

    aumentar a compreenso e a metacompreenso de leitura. A seguir so

    apresentadas algumas estratgias e tcnicas que objetivam contribuir para que o

    leitor, a partir da leitura, possa compreend-lo de modo a retirar informaes do

    texto e atingir os objetivos propostos (NIST, MEALEY,1991).

    Baseando-se nas previses sobre tcnicas de leitura de Mason e Au (1986),

    considera-se muito importante auxiliar o leitor a prtica da leitura silenciosa, e

    orient-lo a realizar previses durante a leitura a cada duas ou trs pginas lidas,

    observando se as previses feitas tornam-se realidade no texto lido. importante

  • 25

    ressaltar que o condutor escolha um texto a ser trabalhado que a criana ou o

    adolescente ainda no tenha lido, mas que seja motivador para o leitor, no escolher

    textos com um vocabulrio muito difcil para que a criana ou adolescente seja

    capaz de realizar a compreenso do texto.

    Outra tcnica comprovada para melhorar a compreenso da leitura, de

    acordo com Duke e Pearson (2002), pensar em voz alta, pois essa prtica envolve

    o pensamento audvel demonstrando a visualizao e previso estratgica,

    exibies visuais no texto tambm auxiliam os leitores na compreenso. Duke e

    Pearson (2002) tambm sugerem que os leitores resumam aquilo que esto lendo

    para melhorar a compreenso global do texto.

    No presente trabalho sugere-se a relao entre FE, metacompreenso e

    compreenso de leitura, devido ao seu carter intencional, voluntrio e

    autorregulado. Como j anteriormente apontado, as funes executivas podem estar

    comprometidas em alguns quadros, tais como o TDAH. Portanto, a seguir esse

    transtorno ser apresentado, bem como suas possveis relaes com as funes

    executivas, a metacompreenso e a compreenso de leitura.

  • 26

    3. TRANSTORNO DE DFICIT DE ATENO E HIPERATIVIDADE (TDAH)

    O TDAH considerado um transtorno e caracterizado por padres de

    desateno e hiperatividade/impulsividade severos e frequentes, que causam

    comprometimento no desenvolvimento da criana, quando comparados queles

    tipicamente observado em indivduos com mesmo nvel de desenvolvimento. Os

    sintomas hiperativo-impulsivos que causam prejuzos devem aparecer antes dos 7

    anos de idade, apesar de muitas pessoas terem sido diagnosticadas tardiamente,

    aps a presena dos sintomas por alguns anos. Este comprometimento pode se

    estender em diferentes situaes, como nos relacionamentos familiares e

    educacionais. (AMERICAN PSICHIATRIC ASSOCIATION/APA, 2002).

    Nos anos trinta e quarenta do sculo XX que a medicina passou a

    observar mais detalhadamente crianas que apresentavam dificuldades na ateno,

    no controle de impulsos, acompanhadas de hiperatividade ou no, e as comparavam

    com adultos que haviam sofrido leso cerebral no lobo frontal direito. Estas crianas

    foram categorizadas historicamente como: portadoras de leso cerebral mnima e

    hipercinsicas, ou seja, com excesso anormal de funo ou atividade motora

    (HALLOWELL, 1999). Apenas em 1980, o Transtorno de Dficit de Ateno foi

    oficialmente reconhecido pelo Manual de Diagnstico da Associao Americana de

    Psiquiatria. Com a edio de 1984, o manual acrescentou o termo hiperatividade

    (GOTAH, 2001).

    Atualmente o Transtorno de Dficit de Ateno e Hiperatividade

    considerado um dos distrbios comportamentais mais frequentes na infncia

    (AMERICAN PSICHIATRIC ASSOCIATION/APA, 2002). De fato, um estudo de meta-

    regresso realizado por Polanczyk et al. (2007) mostrou que a prevalncia do TDAH

    estimada em uma taxa mdia de 5,9% na populao mundial da idade escolar at

    os 18 anos. Entretanto, estudos isolados demonstram uma grande diferena entre

    os valores de prevalncia em diferentes pases, o que pode ser explicado, em

    grande medida, pela utilizao de diferentes instrumentos diagnsticos. Polanczyk et

    al. (2007) observaram que pesquisas que utilizam os itens do DSM-IV como critrios

  • 27

    de diagnstico apresentam maior ndice de prevalncia para o TDAH do que quando

    utilizados o DSM-III ou a CID-10.

    Estudos tambm mostram que a proporo de sujeitos com diagnstico de

    TDAH maior no sexo masculino do que no feminino, tendo como uma das

    explicaes a diferente expresso fenotpica entre ambos. As mulheres apresentam,

    com mais frequncia, sintomas de desateno, e nos homens mais comum

    hiperatividade/impulsividade, caracterstica mais facilmente identificada e mais

    problematizada, quando observada socialmente, por ser muitas vezes um

    comportamento que interfere no funcionamento geral de outras pessoas (AACAP,

    1997; GOLFETO; BARBOSA, 2003; STEFANATOS; BARON, 2007).

    H grandes evidncias a respeito de diferenas estruturais, funcionais e

    neuroqumicas em crianas com TDAH, em regies cerebrais relacionadas a

    funes cognitivas importantes (BIEDERMAN, 2005; NIGG, 2006). Por exemplo, o

    TDAH parece estar associado a uma disfuno no lobo pr-frontal, e pode se

    caracterizar por dificuldades com a concentrao, hiperatividade, impulsividade e

    memria. Geralmente o crebro aumenta seus nveis de ativao quando se depara

    com atividades tais como estudo, leitura e outras tarefas que exijam concentrao,

    no intuito de dar conta dessas exigncias. Nos casos de TDAH mais comum a

    hipofuno do crtex pr-frontal, principalmente quando as exigncias requerem

    mais esforo mental (IPDA, 2002).

    Barkley (2002) aponta uma reduo da quantidade dos neurotransmissores

    do pamina e norepinefrina durante a atividade cerebral, bem como um rebaixamento

    da atividade eltrica e do fluxo sanguneo na regio pr-frontal do crtex,

    responsvel pelas atividades das funes executivas. J Lambek (2010) ressalta

    ainda a associao do TDAH com fatores genticos, apresentando uma disfuno

    no sistema fronto estriatal e problemas no controle inibitrio.

    Em relao s alteraes neurolgicas mais globais, estudos de

    neuroimagem mostram que crianas com TDAH tm em mdia 5% de reduo do

    volume cerebral total e de 10 a 12% de reduo do tamanho de regies cerebrais

    importantes como: crtex pr-frontal, gnglios da base, cerebelo e o corpo caloso.

    de suma importncia observar que essas regies so fortemente interconectadas

  • 28

    (NIGG, 2006). De acordo com Barkley (2002), o TDAH fundamentalmente um

    dficit na capacidade da pessoa de se autocontrolar, caracterizado por dificuldades

    no controle da ateno, dos impulsos e da hiperatividade. Pode acarretar srios

    prejuzos vida dos sujeitos, como comprometimentos acadmicos, psicossociais e

    familiares, prejudicando tambm a vida de outrem.

    Como os sintomas do TDAH so bastante comuns, seu diagnstico se torna

    complexo. O fato do indivduo apresentar sintomas como ansiedade, depresso,

    problemas de aprendizagem, stress crnico e caractersticas de personalidade, no

    significa necessariamente que ele tenha TDAH. Por isso de suma importncia uma

    avaliao multidisciplinar, pois o amplo conhecimento dos profissionais viabiliza um

    diagnstico e um tratamento mais assertivo, sendo de suma importncia que a base

    para o diagnstico do TDAH seja fundamentada em critrios provenientes de

    sistemas classificatrios como o DSM-IV-TR (APA, 2002). de grande relevncia

    obter o relato de pais e professores, para disponibilizar uma gama de informaes,

    por mais de um informante, tendo em vista que cada um descrever sobre como

    cada criana gerencia a sua rotina e de que forma expressa a desateno e a

    hiperatividade (ARAJO et al., 2011; COUTINHO et al., 2009). Silva (2012) relata

    que um dos critrios o diagnstico o relato pessoal da vivncia; escolar, familiar,

    social e afetiva da criana ou do adolescente.

    At recentemente, o TDAH era atribudo somente a crianas, pois se

    acreditava que os sintomas desapareciam na adolescncia. Hoje, estima-se que os

    sintomas desaparecem na adolescncia em apenas um tero da populao

    portadora e dois teros levam os sintomas por toda a vida (HALLOWELL, 1999).

    Estudo realizado por Shekim, et al(1990) aponta que, em mdia, 70% dos

    adolescentes que apresentam comportamentos de desateno, hiperatividade ou

    impulsividade quando crianas mantm o diagnstico aos 14 anos e que, parte

    dessa porcentagem, ainda apresentar o quadro na vida adulta. Entretanto, Benczik

    (2002) e Rodhe et al. (2004) afirmam em seus estudos que as caractersticas se

    modificam na fase adulta e os sintomas de hiperatividade tendem a diminuir,

    enquanto os de desateno e impulsividade permanecem.

    Normalmente o diagnstico estabelecido aps o perodo de alfabetizao,

    o incio do transtorno pode surgir entre os trs e quatro anos de idade, podendo ser

  • 29

    observado em diversos ambientes e situaes. O estabelecimento do diagnstico

    em crianas menores de quatro ou cinco anos, muito arriscado, pois seu

    comportamento muito mais varivel do que em faixas etrias superiores, podendo

    incluir manifestaes semelhantes aos sintomas do TDAH. Alm do mais, difcil

    observar sintomas de desateno em tais crianas, j que de um modo geral,

    passam por poucas situaes em que exigida ateno prolongada (APA, 2002;

    CONNOR, 2002).

    Dentre as dificuldades apresentadas por indivduos diagnosticados com

    TDAH, a ateno merece destaque pela importncia na realizao de tarefas tanto

    cotidianas como as consideradas um pouco mais complicadas. De acordo com

    estudos feitos por Rapport et al. (2013) essa funo cognitiva responsvel pela

    capacidade temporria de armazenar, processar, atualizar e manipular informaes

    e desempenha um papel importante na seleo do comportamento e no

    desempenho de atividades mais complexas como aprendizagem, compreenso,

    racionalizao e planejamento. A memria de trabalho est envolvida nas atividades

    acadmicas e habilidades intelectuais. Essas crianas tambm apresentam

    dificuldade no controle inibitrio. Este processo cognitivo responsvel por regular o

    comportamento e a habilidade de restringir e de inibir respostas. A falta de

    flexibilidade cognitiva tambm aparece como deficitria em crianas que apresentam

    o transtorno. Ela se refere habilidade de raciocinar de diferentes maneiras na

    resoluo de um problema e requer a capacidade de mudanas rpidas de

    estratgia de raciocnio de acordo com a necessidade apresentada. (RAPPORT

    et.al., 2013).

    Pastura et al. (2007) detectaram, em uma amostra de alunos do ensino

    fundamental com TDAH, que 58% dos casos apresentavam comorbidades, sendo a

    mais frequente o transtorno opositivo-desafiador, presente em 38,5%. J Souza e

    colaboradores (2001) observaram na avaliao feita com 34 crianas e adolescentes

    com diagnstico de TDAH uma expressiva ocorrncia de transtornos comrbidos

    (85,7%), sendo o transtorno opositivo-desafiador (20,6%) e o transtorno de conduta

    (39,2%) os mais comuns. Rohde e colaboradores (1999) encontraram uma taxa de

    comorbidade de 47,8% com transtornos disruptivos em adolescentes com

    diagnstico de TDAH, alm de uma taxa de 15% a 20% para depresso, em torno

  • 30

    de 25% para os transtornos de ansiedade e de 10% a 25% para transtornos da

    aprendizagem.

    Por ser se tratar de um transtorno multideterminado, indispensvel que a

    avaliao e o tratamento no TDAH sejam realizados de uma maneira interdisciplinar

    por profissionais das reas da sade e educao, com o intuito de identificar as

    dificuldades apresentadas em cada caso e, consequentemente, originar os tipos de

    interveno mais adequados, tendo sempre como objetivo melhorar a qualidade de

    vida do indivduo em diferentes aspectos. (BARKLEY, 2002; STEFANATOS;

    BARON, 2007).

    Antes de iniciar o tratamento, fundamental que se defina com muita

    clareza os principais sintomas, de acordo com cada caso ou situao, por se tratar

    de um transtorno que pode se apresentar de diferentes formas, podendo ainda

    atrelar comorbidades em seu funcionamento principal (SILVA, 2012).

    O uso de medicamentos costuma ser um dos tratamentos mais indicados, e

    so conhecidos como estimulantes devido a sua capacidade no aumento do nvel da

    atividade ou excitao do crebro, os estimulantes mais indicados para portadores

    de TDAH so: d-anfetamina (Dexedrina), metilfenidato (Ritalina), pemolina (Cylert) e

    d-el-anfetaminas (Adderall) (BARKLEY, 2002).

    No entanto, mesmo se tratando de um medicamento eficaz, questiona-se o

    quanto ele promove mudana nos comportamentos mais adaptativos e funcionais

    dos sujeitos diagnosticados com TDAH, e o quanto ele eficaz na percepo e nas

    atitudes em relao ao funcionamento cognitivo e emocional inadequados. Por isso,

    s vezes os benefcios observados no tratamento com metilfenidato so pequenos,

    principalmente quando se trata de funes executivas. Sendo assim, em paralelo ao

    uso de psicofrmacos, tratamentos no medicamentosos so comumente

    associados (WASSERSTEIN; LYNN, 2001). Barkley (2002) tambm aponta diversos

    estudos mostrando que 10 a 30% das crianas diagnosticadas com TDAH no

    demonstram nenhuma melhora no comportamento fazendo apenas o uso de

    medicamentos, podendo ainda piorar. Por isso, a indicao de outros tratamentos e

    a participao de diversos profissionais e pessoas que fazem parte da vida cotidiana

    da criana se tornam indispensveis. Por exemplo, o papel do professor ter

  • 31

    experincia em relao ao TDAH, e disposio para desempenhar atividades extras

    para ter uma melhor compreenso a respeito da criana ou adolescente, podendo

    assim, contribuir para um melhor desempenho escolar (BARKLEY, 2002).

    Os pais tambm tm seu papel que imprescindvel em casa, incluindo, por

    exemplo, o estabelecimento de regras claras e bem definidas, evitando aplicar

    castigos e punies excessivamente; a oferta de um ambiente com poucos fatores

    que causam distrao, como brinquedos e janelas, principalmente no local de

    realizao das tarefas; e sempre manter horrios determinados para todos os

    deveres rotineiros: acordar, dormir, fazer a tarefa, almoar (ARAJO, 2002).

    Segundo Rohde et al. (2004), para que isso se torne possvel os pais precisam de

    um treinamento, a fim de que conheam as melhores estratgias para auxiliar seus

    filhos na organizao e no planejamento de suas tarefas cotidianas.

    Intervenes para desenvolvimento de habilidades cognitivas tambm tm

    sido realizadas com pessoas com TDAH. O presente trabalho focalizar as

    intervenes em funes executivas, devido relao entre essas e o TDAH,

    conforme descrito a seguir.

    3.1 TDAH E FUNES EXECUTIVAS

    A fim de investigar a relao entre funes executivas como desateno e

    hiperatividade, Capovilla, Assef e Cozza, (2005) realizaram um estudo para observar

    a relao entre escores de 154 crianas de 3 e 4 sries em testes de funes

    executivas e na Escala de Dficit de Ateno e Hiperatividade (ETDAH). Por meio

    dos resultados identificaram correlaes entre testes de Trilhas, Memria de

    Trabalho Auditiva, Memria de Trabalho Visual e Torre de Londres e ETDAH. Esses

    testes avaliam memria de trabalho auditiva, flexibilidade, planejamento e memria

    de trabalho visual. Tambm se observou que no houve correlaes com testes de

    Gerao Semntica e de Stroop, que aferem controle inibitrio e ateno seletiva.

    Os autores concluem que crianas com percentis acima de 75 na ETDAH tiveram

    pior escore nos Testes de Memria de Trabalho Auditiva e de Trilhas.

  • 32

    Estudos feitos com crianas com TDAH (Wu, Anderson e Castiello, 2002)

    investigaram alteraes em funes executivas. Foram utilizados na pesquisa uma

    srie de testes neuropsicolgicos para avaliar ateno seletiva, ateno alternada,

    ateno sustentada, velocidade de processamento, capacidade atencional,

    impulsividade, soluo de problemas e planejamento. Participaram do estudo

    crianas diagnosticadas com TDAH entre 7 e 13 anos, seguindo critrios do DSM-IV.

    Um dos testes utilizados para avaliar a ateno seletiva era o Teste de Stroop. O

    resultado da investigao mostrou que as crianas com TDAH tiveram respostas

    verbais mais lentas e dficit de ateno sustentada. Tambm se pode observar a

    presena de dficit de ateno seletiva e capacidade atencional relacionados aos

    transtornos de aprendizagem. Entretanto no foram observados dficits especficos

    em ateno alternada, planejamento, impulsividade e soluo de problemas

    associados ao TDAH ou aos transtornos de aprendizagem. Os autores concluem

    que os resultados sugerem que o TDAH est relacionado a um dficit na regulao

    dos recursos atencionais.

    Estudos tambm foram realizados a fim de compreender os sintomas

    presentes no TDAH e tambm possveis comprometimentos cognitivos associados,

    podendo ser utilizado tanto para o diagnstico do transtorno quanto para a

    apresentao de reabilitaes que visem o desenvolvimento de reas deficitrias

    (BERWID et al., 2005; BROCKI, BOHLIN, 2006; MAHONE et al., 2005). Em uma

    pesquisa realizada por Trevisan (2010), observou-se o desenvolvimento de funes

    executivas e sua semelhana com sinais de desateno e hiperatividade. Foram

    utilizados no estudo os seguintes instrumentos: Teste de Trilhas, Teste de Ateno

    por Cancelamento, Teste de Stroop Semntico, Teste de Gerao Semntica,

    GO/no-Go Task, Simon Task, Escala de Maturidade Mental Colmbia, Escala de

    Transtorno de Dficit de Ateno e Hiperatividade e SNAP-IV. Participaram 139

    crianas pr-escolares, com idades entre 4 e 7 anos, sendo 65 do sexo masculino.

    Por meio de MANOVAs e testes de Kruskal-Wallis observaram-se

    tendncias desenvolvimentais das habilidades de ateno e controle inibitrio ao

    longo das sries escolares, concluindo que, de fato, essas habilidades aumentam

    com a progresso escolar. A anlise no paramtrica de Mann-Whitney mostrou um

    efeito entre os grupos extremos com e sem indicadores de desateno e

  • 33

    hiperatividade para medidas em todos os instrumentos de funes executivas,

    especialmente para os grupos no domnio de desateno. Tais resultados sugerem

    que, mesmo nessa idade precoce, sinais de desateno e hiperatividade j esto

    relacionados ao desempenho executivo. Anlises de correlao de Spearman

    tambm revelaram correlaes significativas entre os indicadores e os desempenhos

    em funes executivas, com mudanas nos padres de correlao ao longo das

    sries, verificando relao com habilidades cognitivas mais bsicas na srie inicial e

    com habilidades mais complexas nas sries posteriores.

    Como se pode observar por meio dos estudos citados anteriormente, tem se

    constatado com frequncia a presena de dficits executivos no TDAH, por isso, o

    comprometimento geral do transtorno tem se mostrado mais evidente quando

    associado a essas disfunes (NIGG et al., 2006; WILLCUT et al., 2005). J existem

    evidncias em relao a diferenas de estrutura, funcionamento e neuroqumica

    cerebrais no transtorno, nas regies analisadas como fundamentais para as FE.

    De acordo com o modelo de Barkley (1997), as manifestaes

    comportamentais dos sintomas de TDAH so provindas de um prejuzo de FE, tendo

    o controle inibitrio como dficit principal. Alguns componentes de FE so

    condicionados ao bom funcionamento do controle inibitrio para serem efetivos:

    autorregulao de afeto, memria de trabalho, volio e internalizao de discurso e

    motivao. Por isso, apesar do dano principal ser em controle inibitrio, outras

    habilidades dependentes dele tambm pode apresentar alguma deficincia.

    Geurts et al. (2005) averiguaram em sua pesquisa se o TDAH combinado e

    o TDAH desatento podem ser diferenciados um do outro em testes de funes

    executivas, a fim de testar o modelo de Barkley. No estudo foram avaliados 16

    meninos de cada um dos grupos citados e 16 de um grupo controle com a faixa

    etria entre 6 e 13 anos. As anlises da pesquisa contradizem o modelo de Barkley,

    mostrando que, apesar da identificao do comprometimento do controle inibitrio

    nas crianas com TDAH combinado, o nico dano secundrio encontrado foi na

    flexibilidade cognitiva. Os autores concluem que os dois subtipos de TDAH

    investigados no foram diferenciados nas medidas de funcionamento executivo.

  • 34

    Biederman et al. (2004) e Lambek et al. (2010) tambm usaram grupos de

    crianas com TDAH, com e sem disfuno executiva, com o objetivo de verificar se o

    prejuzo funcional do TDAH ocorre independentemente do funcionamento executivo.

    Observaram que apenas 30% a 50% das crianas diagnosticadas com TDAH

    apresentam dficit executivo. Os autores concluem que, na metade dos casos, o

    transtorno mediado por outros fatores, como processos motivacionais.

    J em outros estudos desenvolvimentais, realizados com diferentes grupos

    etrios, especialmente no perodo pr-escolar, apresentaram juntos resultados que

    produziram um padro de desenvolvimento coerente com o modelo de FE de

    Barkley (1997), observando dados consistentes sobre a relao entre dficits de

    controle inibitrio e sintomas de TDAH (BERLIN; BOHLIN, 2002; BERLIN et al.,2003;

    BROCKI et al., 2010; SONUGA-BARKE et al., 2002, 2003).

    Outros estudos, a fim de relacionar dficits de memria de trabalho e

    sintomas de TDAH em pr-escolares tm sido contraditrios, com alguns estudos

    demonstrando correlaes significativas (MARIANI, BARKLEY 1997; SONUGA-

    BARKE et al. 2003; THORELL, WAHLSTEDT 2006), e outros estudos citaram no

    existir tais correlaes (BROCKI et al., 2007; SONUGA-BARKE et al., 2002).

    Como pode ser observado a partir das pesquisas apresentadas, apesar de

    alguns estudos mostrarem disfuno executiva em crianas e adolescentes com

    TDAH, ainda h resultados que apresentam algumas incongruncias, principalmente

    no que se refere a quais habilidades executivas so mais frequentemente

    comprometidas e em quais subtipos de TDAH (SABOYA et al., 2007; BARKLEY,

    2011). Geurts et al., 2005 indica que uma das possveis causas dessa falta de

    unanimidade nos resultados das pesquisas pode ser devido a diferenas

    metodolgicas ou at de falhas no delineamento desses estudos. Por isso, ressalta-

    se a importncia de que mais estudos investiguem essas questes, a fim

    identificarem melhor as habilidades mais comprometidas em cada subtipo de TDAH.

    Em relao s intervenes em funes executivas em crianas com TDAH,

    Menezes (2012) realizou um estudo, com crianas e adolescentes com o transtorno.

    Objetivou-se caracterizar o desempenho em testes de funes executivas, bem

    como implementar atividades de interveno em funes executivas, buscando

  • 35

    comparar se o procedimento proposto foi eficaz em diminuir o impacto do transtorno

    sobre o desempenho executivo no grupo participante, em comparao a um grupo

    controle que no foi inserido em nenhum tipo de atividade estruturada. Os resultados

    mostram que, de forma geral, as mdias dos desempenhos do grupo experimental

    no ps-teste foram maiores que as do grupo controle. Em relao ao efeito da

    interveno, o procedimento proposto foi eficaz na estimulao da ateno seletiva,

    do controle inibitrio e do componente auditivo da memria de trabalho nos

    participantes do GE. Atravs dos resultados foi possvel observar indicativos de

    eficcia da interveno proposta, a autora sugere mais estudos utilizando o mesmo

    programa de interveno em amostras com TDAH.

    Dessa forma, parece haver possibilidade de interveno em indivduos com

    TDAH por meio da promoo das FE. Adicionalmente, pode-se hipotetizar que

    outras reas, tambm relacionadas metacognio, poderiam ser fomentadas em

    pessoas com TDAH, de forma a diminuir os impactos do transtorno. Tal assunto ser

    abordado no tpico seguinte.

    3.2 TDAH E LEITURA

    Outro aspecto, alm das FE, que tem sido investigado na populao com

    TDAH o desempenho escolar e, mais especificamente, a leitura. Em uma reviso

    sobre a relao entre problemas de desempenho escolar e TDAH feita por Pastura,

    Mattos e Arajo (2005), a maioria dos estudos indica associao positiva. Observou-

    se na avaliao feita por Faraone e colaboradores (1993), que mais de 50% das 140

    crianas com TDAH avaliadas necessitaram de aulas particulares e cerca de 30%

    foram alocadas em turmas especiais ou foram reprovadas. Observou-se, tambm,

    que o desempenho dos alunos com TDAH era pior em testes de aritmtica e leitura

    quando comparados aos alunos sem o Transtorno. De fato, Barkley (2002) afirma

    que 20% e 30% das crianas diagnosticadas com TDAH apresentam no mnimo um

    tipo de deficincia de aprendizado.

    Visto que as funes executivas so fundamentais para os processos

    autorregulatrios presentes na aprendizagem, possvel que pelo menos parte das

  • 36

    dificuldades acadmicas apresentadas pelos indivduos com TDAH esteja

    relacionada a dficits nas funes executivas. Nesse sentido, Biederman et al.

    (2004) verificaram associaes entre disfuno executiva e comprometimentos

    acadmico no TDAH. Foram analisadas crianas e adolescentes com faixa etria de

    6 aos 17 anos diagnosticadas com TDAH, sendo um grupo diagnosticado com

    disfuno executiva (TDAH+DE), outro sem e um grupo controle. Ambas as

    amostras com TDAH apresentaram desempenho inferior ao do grupo controle em

    medidas acadmicas, e o grupo TDAH+DE demonstrou ter maior probabilidade de

    repetncia e pior desempenho acadmico do que o grupo com TDAH sem DE.

    Ambos os grupos experimentais mostraram comprometimento significativo no

    funcionamento global e interpessoal em relao ao grupo controle. Os autores

    concluem que os danos executivos apresentados nas crianas dessa amostra

    contriburam com o agravamento do comprometimento educacional e sugerem como

    fator remediador intervenes que previnam ou melhorem essas perdas. No entanto,

    pode-se concluir que o TDAH, quando relacionado disfuno executiva, se torna

    uma forma mais grave da doena.

    Tem-se observado frequentemente em crianas e adolescentes

    apresentando hbitos de estudo inadequados e de leitura, trazendo dificuldade em

    atingir notas mnimas nas avaliaes escolares (HBNER; MARINOTTI, 2000;

    PERGHER; VELASCO, 2007). Outros comportamentos que esto presentes nas

    crianas e adolescentes e que podem dificultar a compreenso da leitura, impedindo

    o contato com o material pedaggico e a realizao das tarefas escolares, so: olhar

    dispersivo, movimento dispersivo, verbalizaes dispersivas, comportamentos que

    podemos considerar como desateno e hiperatividade (HAMBLIN; HATHAWAY;

    WODARSKI, 1971).

    Alvarado e colaboradores (2011) investigaram a competncia de leitura e

    estratgias metacognitivas na realizao de tarefas de compreenso de leitura em

    crianas com TDAH. Participaram 187 alunos argentinos com idade entre 9 e 13

    anos, sendo que 94 participaram de um grupo controle e 93 no grupo clnico

    diagnosticados com TDAH. A avaliao metacognitiva foi composta por dois testes,

    a escala de conscincia de leitura (ESCOLA; sigla em espanhol), uma adaptao

    espanhola do teste de conscincia metacognitiva de leitura, e o Inventrio de

  • 37

    Conscincia Metacognitiva de Estratgias de Leitura (Marsi). Foi tambm aplicado

    um teste de compreenso de leitura (PROLEC SE; sigla em espanhol). Os

    resultados mostram que os alunos diagnosticados com TDAH apresentam

    desempenho inferior em testes de compreenso de leitura em comparao ao grupo

    controle, no entanto, conforme discutido pelos autores, os resultados sugerem que

    as dificuldades no so necessariamente um problema na compreenso de leitura,

    mas sim decorrentes de alteraes no papel executivo. Isso porque quando os

    desempenhos em compreenso de leitura foram equalizados, os alunos com TDAH

    continuaram apresentando desempenho inferior em metacognio, mais

    especificamente nos processos de planejamento.

    Dessa forma, o TDAH considerado um transtorno com possveis dficits

    em funes executivas, com consequncias prejudiciais metacognio e,

    consequentemente, aos contextos escolar e social (PFIFFNER; BARKLEY;

    DUPAUL, 2008). Por isso, os profissionais envolvidos, por sua vez, juntamente com

    a escola, podem estabelecer metas e estratgias de interveno na criana com

    TDAH podendo atender uma necessidade real da multidisciplinaridade, tanto nas

    dificuldades atuais apresentadas, como na preveno de possveis futuras

    defasagens (WAJNSZTEJN, 2002). Em estudo realizado por Fontana et al (2007),

    aponta-se que na populao escolar h prevalncia importante de TDAH. Outros

    estudos, como o Nunes e Werlang (2008), mostram que a entrada na fase escolar

    propicia uma manifestao mais acentuada do transtorno.

    Por isso, fundamental identificar dficits nas funes executivas, na

    metacompreenso e na compreenso de leitura em escolares com TDAH, bem

    como desenvolver e implementar intervenes nessa habilidades, de modo a

    diminuir possveis consequncias prejudiciais aos sujeitos.

  • 38

    4. OBJETIVOS

    4.1 Objetivo Geral

    Esta pesquisa teve como objetivo avaliar o efeito de um programa de

    interveno em funo executiva e tcnicas de leitura e metacompreenso de leitura

    em crianas e adolescentes diagnosticados com transtorno de dficit de

    ateno/hiperatividade.

    4.2 Objetivos Especficos

    Descrever o desempenho de crianas e adolescentes diagnosticados com

    TDAH ao longo de um procedimento de interveno em funes executivas e

    estratgias de compreenso e metacompreenso de leitura;

    Avaliar o efeito de interveno em funes executivas e estratgias de

    compreenso e metacompreenso de leitura em TDAH sobre desempenhos

    em testes de funes executivas, de leitura e de estratgias de

    metacompreenso de leitura;

    Avaliar a percepo dos pais/responsveis e dos professores sobre o

    comportamento das crianas antes e depois da interveno.

  • 39

    5. MTODO

    5.1 Participantes

    Participaram desta pesquisa quatro sujeitos (3 meninos e 1 menina), com

    idades entre 7 e 14 anos e com diagnstico de TDAH, feito pela equipe

    multidisciplinar do grupo de pesquisa em Avaliao Neuropsicolgica,

    Comportamental e Clnica de Queixas de Desateno e Hiperatividade do Programa

    de Ps-Graduao em Distrbios do Desenvolvimento da Universidade

    Presbiteriana Mackenzie. Os critrios de incluso foram, alm de ter o diagnstico

    de TDAH previamente realizado e de ter idade entre 7 e 14 anos, estar frequentando

    escola regular e no fazer uso de qualquer medicao alm de metilfenidato que

    possa interferir nos comportamentos cognitivos e emocionais.

    Os critrios de excluso foram: dficits sensoriais no corrigidos, conforme

    relato dos pais e da escola; frequentar classe especial; apresentar outro diagnstico

    psiquitrico em comorbidade com o TDAH, especificamente Transtornos Globais de

    Desenvolvimento, Transtornos de Humor ou de Ansiedade, conforme relato dos pais

    e da escola e conforme avaliao multidisciplinar. A Tabela 1 sumariza as

    caractersticas dos participantes.

    Tabela1. Caracterizao dos Participantes.

    Participante Sexo Idade Escolaridade Tipo de Escola

    C Masculino 13 7 ano Particular

    J Masculino 7 3 ano Pblico

    Ja Feminino 13 8 ano Particular

    V Masculino 11 5 ano Particular

    Alm das crianas, participaram seus respectivos pais/responsveis e

    professores, que tiveram que responder questionrio a respeito do comportamento

    das crianas.

  • 40

    5.2 Instrumentos

    Foi realizada uma bateria de testes, sendo que os seis primeiros testes

    descritos abaixo avaliam funo executiva, o sexto avalia Metacompreenso de

    leitura, o stimo avalia compreenso de leitura e o ltimo, inteligncia.

    5.2.1 Teste de Ateno por Cancelamento

    O Teste de Ateno por Cancelamento (MONTIEL; SEABRA, 2012) tem por

    objetivo medir as habilidades de ateno seletiva e ateno alternada. um teste

    composto por trs matrizes impressas com diferentes tipos de estmulos. A tarefa

    assinalar todos os estmulos iguais ao estmulo-alvo previamente determinado. A

    primeira parte avalia a ateno seletiva e consiste em uma prova de cancelamento

    de figuras numa matriz impressa com seis tipos de estmulos (crculo, quadrado,

    tringulo, cruz, estrela, trao), num total de 300 figuras, aleatoriamente dispostas,

    sendo que a figura alvo indicada na parte superior da folha. A Figura 1 apresenta

    um segmento da Parte 1 do Teste de Ateno por Cancelamento.

    Figura 1 Segmento do Teste de Cancelamento Parte 1

    A segunda parte avalia a ateno seletiva numa prova com maior grau de

    dificuldade, sendo que a tarefa semelhante da primeira parte, porm o estmulo

    alvo composto por figuras duplas. Na terceira diviso, tambm avalia ateno

    seletiva, mas demanda alternncia, sendo necessrio alterar o foco de ateno a

    cada linha. A Figura 2 apresenta um segmento da Parte 2 do Teste de Ateno por

    Cancelamento.

  • 41

    Figura 2 Segmento do Teste de Cancelamento Parte 2

    Na terceira parte, o estmulo-alvo muda a cada linha, sendo que a figura

    inicial de cada linha que deve ser considerado o alvo. O nmero de vezes que o

    estmulo-alvo aparece dentre as alternativas muda a cada linha, variando de duas a

    seis vezes. A Figura 3 apresenta um segmento da Parte 3 do Teste de Ateno por

    Cancelamento.

    Figura 3 Segmento do Teste de Cancelamento Parte 3.

    O tempo de execuo mximo cronometrado em um minuto para cada

    parte. Em cada uma das trs partes do Teste de Ateno por Cancelamento so

    computados dois diferentes escores, a saber, o nmero total de acertos, i.e., nmero

    de estmulos alvos adequadamente cancelados; e o nmero de erros, i.e., o nmero

    de estmulos no alvo incorretamente cancelados.

    Para este estudo, foram extrados escores de acerto, ou seja, o nmero de

    estmulos marcados corretamente. Foram calculados escores de acertos para a

    Parte 1, Parte 2, parte 3 e total. Evidncias de validade do Teste de Ateno por

    Cancelamento foram obtidas por Dias (2009) para crianas de 6 a 14 anos; e por

    Trevisan (2010) para crianas de 4 a 7 anos.

  • 42

    5.2.2 Teste de Memria de Trabalho Auditiva (MTA) e Teste de Memria de

    Trabalho Visual (MTV)

    Estes testes foram desenvolvidos por Primi (2002) e tem por objetivo avaliar

    a capacidade cognitiva. O MTA apresenta uma sequncia de itens, os quais incluem

    palavras e nmeros gravados com voz digitalizada, havendo um intervalo de um

    segundo entre cada item. O sujeito tem como tarefa ouvir a sequncia, repetir em

    voz alta em ordem crescente as palavras e em seguida os nmeros. A tarefa

    interrompida caso ocorram cinco erros consecutivos. A Figura 4 ilustra a primeira

    tela do MTA, visualizada apenas pelo aplicador, com a sequncia de palavras 1 e

    bola, sendo a resposta correta bola, um.

    Figura 4 - Tela do MTA, com a sequncia de itens 1 e bola.

    So apresentadas trs sequncias com diferentes nmeros de itens, num

    total de vinte e sete sequncias. O aplicador realiza treino prvio com o participante

    para que o mesmo compreenda a tarefa a ser desenvolvida. Para a obteno dos

  • 43

    resultados o software calcula automaticamente as informaes. A pontuao no

    teste corresponde a 0 para erro e 1 para acerto, sendo gerados a partir desses

    nmeros dois tipos de escores, o dicotmico, que o total de sequncias corretas, e

    o dgitos lembrados, que representa o nmero total de itens lembrados

    adequadamente.

    No MTV so apresentadas de uma a quatro matrizes 3 x 3, com um estmulo

    em cada uma delas. Em seguida, aparecem manipulaes espaciais representadas

    por flechas que indicam a direo do movimento que se deve realizar mentalmente

    com o estmulo. Por exemplo, uma flecha apontando para a esquerda, seguida de

    outra apontando para cima, indica que o participante deve manipular o estmulo na

    matriz, colocando-o uma coluna esquerda e uma linha acima de sua posio

    inicial. A tarefa do participante apontar na tela a posio final do estmulo aps a

    realizao das manipulaes indicadas.

    A aplicao interrompida pelo software aps cinco erros consecutivos. So

    calculados o escore dicotmico, que o total de sequncias corretas, e o total de

    matrizes lembradas, sendo o nmero total de respostas corretas ou de matrizes

    respondidas corretamente. A Figura 5 ilustra telas do MTV.

    Figura 5 - Telas do MTV, esquerda ilustrando a apresentao de um estmulo numa matriz 3 x 3; direita apresentando a instruo da manipulao a ser realizada, ou seja, movimentar o estmulo

    uma linha abaixo da posio inicial. Neste caso, o sujeito deve apontar a clula do canto inferior esquerdo da matriz como resultado.

  • 44

    Evidncias de validade do MTA e do MTV por diferenciao entre idades

    foram obtidas por Berberian, et al,(2007). Eles avaliaram 405 estudantes de 1 a 4

    srie, e os escores nos instrumentos aumentaram como funo da idade e srie

    escolar, especialmente da 1 3 srie.

    5.2.3Teste de Trilhas Parte A e Parte B

    O Teste de Trilhas partes A e B (PARTINGTON; LEITER, 1949, adaptao

    de MONTIEL; SEABRA, (2009), avalia a ateno alternada e a flexibilidade

    cognitiva. Em sua verso original, a parte A composta por duas folhas, uma para

    letras e uma para nmeros. Em ambas as folhas so apresentadas 12 letras (de A

    a M) ou 12 nmeros (de 1 a 12), dispostos aleatoriamente, sendo a tarefa do

    participante lig-los em conformidade com as ordens alfabtica ou numrica,

    respectivamente. A parte B constada apresentao de letras e nmeros

    randomicamente dispostos em uma folha. H 24itens, sendo 12 letras (A a M) e 12

    nmeros (1 a 12), e a tarefa do indivduo ligar os itens seguindo, alternadamente,

    as sequncias alfabtica e numrica.

    So computados trs tipos de escores. O primeiro corresponde sequncia,

    i.e., nmero de itens ligados corretamente em sequncia na parte A (somadas as

    folhas de letras e de nmeros, com escore mximo de 24); o segundo escore

    corresponde sequncia na parte B, i.e., nmero de itens ligados corretamente em

    sequncia na parte B (escore mximo de 24); e o terceiro escore corresponde ao

    escore de interferncia, que o escore na parte B menos o escore na parte A, e

    representa o quanto o sujeito tem uma queda no seu desempenho quando aumenta

    a interferncia (na parte B em relao A). A Figura 6 ilustra o exemplo fornecido na

    instruo do Teste de Trilhas Parte B.

  • 45

    Figura 6 - Ilustrao do exemplo fornecido na instruo do Teste de Trilhas Parte B.

    5.2.4 Teste Wisconsin de Classificao de Cartas (WCST)

    Conhecido como Wisconsin CardSorting Test (HEATON, et al., 1993), este

    instrumento foi traduzido e adaptado para o portugus por Cunha, et al. (2005). Ele

    avalia a capacidade de raciocnio abstrato, mensura habilidades executivas como

    flexibilidade cognitiva, controle inibitrio, planejamento, memria de trabalho e

    monitoramento. composto por dois baralhos idnticos, com 64 cartas cada, e

    quatro cartas-estmulo. As cartas apresentam figuras que possuem trs tipos de

    configurao, a saber, cor, forma e nmero, nas cores vermelho, azul, amarelo ou

    verde; alm disso, as formas podem em formato de cruz, crculo, tringulo ou estrela

    e o nmero de figuras em cada carta pode variar de um a quatro.

    As quatro cartas-estmulo devem ser dispostas na frente do sujeito, que

    deve retirar uma carta do baralho de resposta e associ-la a uma das quatro cartas-

    estmulo, posicionando-a embaixo. Nesse momento, o sujeito informado que o

    aplicador no poder detalhar a tarefa e informar apenas se a associao foi

    correta ou errada, antes do respondente pegar a prxima carta. O aplicador deve ter

    em mente que a configurao inicial Cor, portanto, dir que a resposta foi correta

    toda vez que o sujeito associar a carta retirada com as cartas-estmulo pela cor.

    Aps 10 respostas consecutivas corretas, o examinador passar a dizer como

    correta as associaes de Forma, e assim por diante, at o trmino das 128 cartas

    ou da sequncia Cor, Forma, Nmero, Cor, Forma, Nmero - CFNCFN - (MIGUEL,

    2005).

  • 46

    No presente estudo, foi aplicado apenas um baralho com 64 cartas e, em

    consequncia, foram usados os escores brutos no padronizados, visto que a

    normatizao brasileira para 128 cartas. Foram utilizadas as pontuaes para

    acertos, erros, perseveraes, escores perseverativos, fracassos e categorias

    completadas.

    5.2.5 Inventrio de Funcionamento Executivo Infantil (IFEI) para pais e

    professores

    O inventrio foi desenvolvido originalmente por Thorell e Nyberg (2008) com

    o objetivo de avaliar FE em crianas com TDAH, traduzido por Trevisan (2012). O

    IFEI composto por 26 itens, sendo que para cada um deles pontuado em uma

    escala likertde cinco nveis, sendo eles (definitivamente falso, falso, parcialmente

    verdadeiro, verdadeiro, definitivamente verdadeiro), com a pontuao,

    respectivamente, de 1, 2, 3, 4 e 5. Assim, quanto maior o escore, maiores as

    dificuldades da criana. Os itens so agrupados em 4 subescalas: memria de

    trabalho (11 itens), planejamento (4 itens), controle inibitrio (6 itens) e

    autorregulao (5 itens).

    As questes correspondentes aos itens do inventrio foram cri