21
Texto sobre circuitos de corrente alternada Kleber Daum Machado 30 de Maio de 2007 Circuitos de Corrente Alternada Ap´ os analisar o que ocorre com circuitos simples de corrente cont´ ınua, vamos considerar circuitos tamb´ em elementares s´ o que agora supondo que a corrente e a tens˜ ao possam ser alternadas, isto ´ e, E = E (t)e i = i(t). Em particular, estaremos interessados em uma dependˆ encia temporal para a tens˜ ao externa aplicada, do tipo E = E 0 cos ωt (1) onde E 0 ´ e a amplitude da tens˜ ao, ou valor m´ aximo, e ω =2πν ´ e a freq¨ encia angular, sendo ν a freq¨ encia linear de oscila¸ ao da tens˜ ao. Tal condi¸ ao ´ e importante porque corresponde aproximadamente ao que ocorre na pr´ atica na distribui¸ ao de tens˜ ao ` a popula¸ ao, em que geradores alternados oscilantes fornecem tens˜ oes senoidas ou cossenoidais numa certa freq¨ encia, e no Brasil usa-se ν = 60 Hz. Assim, vamos nos concentrar nessa forma funcional para a tens˜ ao. Para proceder ao estudo, ´ e interessante introduzir, em paralelo, um procedimento anal´ ıtico e uma an´ alise gr´ afica para os circuitos. Para estabelecer conceitos, vamos come¸ car com o circuito mais simples que podemos ter, que corresponde a um resistor ligado em s´ erie a uma fonte de tens˜ ao, como mostra a figura 1. Para esse caso extremamente simples, que corresponde a um circuito puramente resistivo, a lei das malhas torna-se Figura 1: Um circuito de corrente alternada puramente resistivo. E− Ri R =0 (2) ou i R = E R (3) ou ainda, usando a express˜ ao 1, 1

Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Nome do arquivo:Análise de Circuitos em Corrente Alternada 3.pdf

Citation preview

Page 1: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Texto sobre circuitos de corrente alternada

Kleber Daum Machado

30 de Maio de 2007

Circuitos de Corrente Alternada

Apos analisar o que ocorre com circuitos simples de corrente contınua, vamos considerar circuitos tambemelementares so que agora supondo que a corrente e a tensao possam ser alternadas, isto e, E = E(t) e i = i(t).

Em particular, estaremos interessados em uma dependencia temporal para a tensao externa aplicada, dotipo

E = E0 cos ωt (1)

onde E0 e a amplitude da tensao, ou valor maximo, e ω = 2πν e a frequencia angular, sendo ν a frequencia

linear de oscilacao da tensao. Tal condicao e importante porque corresponde aproximadamente ao que ocorrena pratica na distribuicao de tensao a populacao, em que geradores alternados oscilantes fornecem tensoes

senoidas ou cossenoidais numa certa frequencia, e no Brasil usa-se ν = 60 Hz. Assim, vamos nos concentrarnessa forma funcional para a tensao.

Para proceder ao estudo, e interessante introduzir, em paralelo, um procedimento analıtico e uma analise

grafica para os circuitos. Para estabelecer conceitos, vamos comecar com o circuito mais simples que podemoster, que corresponde a um resistor ligado em serie a uma fonte de tensao, como mostra a figura 1. Para esse

caso extremamente simples, que corresponde a um circuito puramente resistivo, a lei das malhas torna-se

Figura 1: Um circuito de corrente alternada puramente resistivo.

E − RiR = 0 (2)

ou

iR =ER

(3)

ou ainda, usando a expressao 1,

1

Page 2: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

iR =E0

Rcos ωt = i0,R cos ωt (4)

Essa expressao nos informa que a corrente no resistor e a tensao nele estao em fase, ou seja, atingem os

valores maximos, nulos, mınimos, etc, ao mesmo tempo. Podemos representar graficamente essa situacaoutilizando a ideia de fasor. Um fasor e a representacao vetorial de uma grandeza escalar que varia de forma

senoidal ou cossenoidal. Considere o vetor apresentado na figura 2.

Figura 2: Representacao de um fasor.

A projecao de ~V no eixo x vale

Vx = V cos θ = V cosωt (5)

Agora, considere a tensao dada em 1,

E(t) = E0 cos ωt

O valor num dado tempo t, ou seja, o valor instantaneo de E , corresponde a projecao no eixo x de um vetor,

ou, mais precisamente, um fasor, de modulo E0, cujo angulo instantaneo com o eixo e θ = ωt. A medida queo tempo passa, esse valor muda, e o fasor “gira” no plano xy. Assim, um fasor e um vetor com uma fase que

varia com o tempo. Se representarmos a tensao E(t) num diagrama de fasores, teremos a figura 3.

Figura 3: Representacao da tensao alternada como um fasor.

Agora, podemos desenhar um diagrama de fasores para o circuito puramente resistivo da figura 1, incluindo

a tensao e a corrente. Nesse caso, como elas estao em fase, o diagrama fica como na figura 4.

Assim, os dois fasores giram ao mesmo tempo, e em fase. Vamos agora considerar um circuito puramentecapacitivo, formado por um capacitor e a fonte de tensao, como mostra a figura 5.

Nesse caso, a lei das malhas fornece

2

Page 3: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Figura 4: Diagrama de fasores para o circuito da figura 1.

Figura 5: Um circuito puramente capacitivo.

E − Q

C= 0 (6)

ou

Q = CE = CE0 cos ωt (7)

Lembrando que

i =dQ

dt

vamos calcular a corrente no capacitor, ou seja,

iC = −ωCE0 sen ωt (8)

Agora, considere que

cos(

ωt +π

2

)

= cos ωt cosπ

2− sen ωt sen

π

2= − sen ωt (9)

Assim, podemos escrever a equacao 7 como

iC = ωCE0 cos(

ωt +π

2

)

(10)

Agora, vamos definir uma grandeza chamada reatancia capacitiva XC , por intermedio de

XC =1

ωC(11)

e assim, a equacao 10 pode ser escrita como

3

Page 4: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

iC =E0

XC

cos(

ωt +π

2

)

= i0,C cos(

ωt +π

2

)

(12)

Agora, podemos comparar esta expressao com a equacao 4, para o caso do circuito puramente resistivo. O

primeiro fato a notar e que R e XC tem a mesma unidade, o ohm, com a diferenca de que R e a resistenciade um resistor, onde ocorre dissipacao de energia, e no capacitor isso nao ocorre. Outro fato a notar consiste

nas fases dos cossenos. A corrente esta, no capacitor, na frente da tensao, por um valor de π2 , ou 90◦. Assim,

quando a corrente atinge seu valor maximo, a tensao e nula, e vice-versa. Podemos entender o processofisicamente do seguinte modo. Comecemos a analise quando o capacitor esta descarregado, sendo a tensao

nele nula. Nesse ponto a corrente do circuito e maxima, e ela comeca diminuir, pois cargas comecam achegar as placas do capacitor, produzindo uma tensao inversa e dificultando a chegada de mais cargas. A

medida que o tempo passa, a quantidade de cargas no capacitor aumenta, e tambem a tensao nele, enquantoa corrente tende a se anular, o que ocorre quando o capacitor esta totalmente carregado. Nesse ponto,

a corrente inverte de sentido, pois cargas vao passar de uma placa para a outra do capacitor. Assim, atensao comeca a diminuir e a corrente aumenta, ate chegar ao valor maximo de corrente quando o capacitor

esta completamente descarregado, e o ciclo continua. Como a reatancia capacitiva XC depende do inversoda frequencia, vemos que ela e importante em frequencias baixas, diminuindo com o aumento de ω. Num

diagrama de fasores, E e iC ficariam como na figura 6.

Figura 6: Diagrama de fasores para o circuito da figura 5.

Passamos agora a um circuito puramente indutivo, ou seja, um circuito formado por um indutor e umafonte de tensao, como mostra a figura 7.

Figura 7: Um circuito puramente indutivo.

Nesse caso, a lei das malhas fornece

E − LdiL

dt= 0 (13)

ou

4

Page 5: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

diL

dt=

EL

e, usando 1,

diL

dt=

E0

Lcosωt

Vamos integrar esta equacao, usando o que ja sabemos sobre circuitos RL, alem do comportamento de

indutores, o que nos indica que quando a corrente atinge uma maximo, por exemplo, sua derivada deve sernula, e vice-versa. Entao, temos

diL

dtdt =

E0

L

cosωt dt

ou

iL =E0

ωLsen ωt (14)

Note que

cos(

ωt − π

2

)

= cosωt cosπ

2+ sen ωt sen

π

2= sen ωt (15)

Assim, podemos reescrever 14 como

iL =E0

ωLcos

(

ωt − π

2

)

(16)

Vamos definir agora a reatancia indutiva XL por meio de

XL = ωL (17)

Com essa definicao, podemos escrever

iL =E0

XL

cos(

ωt − π

2

)

= i0,L cos(

ωt − π

2

)

(18)

Comparando esta expressao com as equacoes 4 e 12, vemos que nesse caso a corrente esta atrasada comrelacao a tensao do angulo π

2 radianos ou 90◦, havendo, portanto, uma defasagem entre elas. Isso pode ser

entendido se considerarmos a lei das malhas 13 e o modo como o indutor responde a variacoes de corrente.Considere que a tensao esteja em seu valor maximo. Nesse caso, pela lei das malhas, vemos que a derivada

da corrente esta em seu valor maximo, o que ocorre quando a corrente e nula. A partir daı, a tensao vaidiminuir, o que corresponde a uma diminuicao da derivada de i. Alem disso, a corrente, como esta variando,

passa do valor nulo para um valor diferente de zero, e ela aumenta ate que atinge um valor maximo, quandosua derivada se anula e tambem a tensao no circuito. A partir daı, a tensao volta a crescer, assim como aderivada da corrente, mas i decresce ate chegar em zero, e o ciclo continua. Note que XL tambem e medido

em ohms, mas nao e uma resistencia real, pois nao dissipa energia. Esse fator torna-se mais importante amedida que a frequencia ω aumenta, o que pode ser facilmente entendido, pois, nesse caso, havera grande

inducao eletromagnetica e a fem de retorno sera tambem grande, fazendo com que seja mais “difıcil” oestabelecimento de uma corrente. Num diagrama de fasores, o circuito puramente indutivo da figura 7

ficaria como na figura 8.

5

Page 6: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Figura 8: Diagrama de fasores para o circuito da figura 7.

Estamos agora em condicoes de estudar um sistema mais complexo, como um circuito RLC em serie dafigura 9.

Figura 9: Circuito RLC em serie.

A lei das malhas, para esse caso, fica

E − Ri − Ldi

dt− Q

C= 0

ou, derivando em relacao ao tempo,

Ld2i

dt2+ R

di

dt+

i

C=

dEdt

(19)

Note que, como o circuito esta em serie, a corrente que passa por todos os elementos e a mesma. Recordando

os tres casos que vimos acima, podemos estabelecer o seguinte:

• A tensao no resistor, ER, esta em fase com a corrente i no resistor, que e a corrente no circuito.

• A tensao no capacitor, EC , tem uma diferenca de fase de 90◦ com relacao a corrente no circuito, sendo

que a corrente fica na frente da tensao.

• A tensao no indutor, EL, esta adiantada, com relacao a corrente, de 90◦.

Considerando os tres pontos acima, o diagrama de fasores para o circuito tem o aspecto qualitativo

mostrado na figura 10.

Observe, na figura, que a soma dos fasores das tensoes nos elementos resulta na tensao da fonte, que emgeral nao esta em fase com relacao a corrente i do circuito. A defasagem entre E e i e dada pelo angulo de

fase φ e, na figura, E esta adiantada com relacao a i, indicando um circuito com caracterısticas indutivas.

6

Page 7: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Figura 10: Diagrama de fasores qualitativo para ocircuito RLC em serie da figura 9.

Agora que, graficamente, temos uma ideia de como se comportam tensao e corrente no circuito, preci-samos resolver a equacao diferencial 19. Sendo ela uma equacao nao-homogenea, sua solucao e dada pela

solucao da homogenea correspondente somado a uma solucao particular. Considerando a forma 1 para atensao e tambem o diagrama de fasores 10, vamos escrever como solucao particular para a corrente uma

expressao do tipo

i = i0 cos(ωt + φ) (20)

Assim, vamos precisar calcular

di

dt= −ωi0 sen(ωt + φ) (21)

e

d2i

dt= −ω2i0 cos(ωt + φ) (22)

alem de

dEdt

= −ωE0 sen ωt (23)

Substituindo as equacoes 20–23 em 19, temos

−Lω2i0 cos(ωt + φ) − Rωi0 sen(ωt + φ) +i0

Ccos(ωt + φ) = −ωE0 sen ωt

ou

ωLi0 cos(ωt + φ) + Ri0 sen(ωt + φ) − i0

ωCcos(ωt + φ) = E0 sen ωt

que pode ser reescrita, usando as definicoes das reatancias XC e XL, como

XLi0 cos(ωt + φ) + Ri0 sen(ωt + φ) − XC i0 cos(ωt + φ) = E0 sen ωt (24)

Vamos definir agora a grandeza impedancia, por meio de

7

Page 8: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Z =E0

i0(25)

Com o uso de 25, a equacao 24 simplifica-se para

(XL − XC)i0 cos(ωt + φ) + Ri0 sen(ωt + φ) = Zi0 sen ωt

ou, definindo a reatancia mediante

X = XL − XC (26)

temos

X cos(ωt + φ) + R sen(ωt + φ) = Z sen ωt (27)

Agora, temos

cos(ωt + φ) = cosωt cos φ − sen ωt sen φ (28)

sen(ωt + φ) = sen ωt cosφ + cosωt sen φ (29)

Substituindo essas expressoes em 27, achamos

X(

cos ωt cosφ − senωt sen φ)

+ R(

senωt cos φ + cos ωt sen φ)

= Z sen ωt

ou

X cos ωt cosφ − X senωt sen φ + R sen ωt cos φ + R cosωt sen φ = Z sen ωt

ou ainda,

(

X cos φ + R sen φ)

cos ωt +(

R cosφ − X sen φ −Z)

sen ωt = 0 (30)

Como a equacao acima deve valer para qualquer valor de t, cada parenteses deve se anular, o que resultaem duas equacoes, isto e,

X cosφ + R sen φ = 0

R cos φ − X sen φ − Z = 0

ou

tgφ = −X

R(31a)

Z = R cos φ − X sen φ (31b)

A equacao 31a pode ser representada graficamente por meio de um triangulo, como mostra a figura 11.

Assim, a hipotenusa do triangulo vale

a =√

R2 + X2

e, da figura, temos tambem

8

Page 9: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Figura 11: Triangulo definido a partir da equacao 31a.

cosφ =R√

R2 + X2(32a)

sen φ = − X√R2 + X2

(32b)

Utilizando essas equacoes em 31b, obtemos

Z = RR√

R2 + X2− X

(

− X√R2 + X2

)

ou

Z =R2

√R2 + X2

+X2

√R2 + X2

o que resulta em

Z =R2 + X2

√R2 + X2

ou, finalmente,

Z =√

R2 + X2 (33)

que pode ser reescrita nas formas

Z =√

R2 + (XL− XC)2 (34)

ou tambem

Z =

R2 +(

ωL − 1

ωC

)2(35)

A equacao 32a pode ser reescrita em termos de Z como

cosφ =R

Z (36)

ou, conforme a necessidade, como

Z =R

cosφ(37)

9

Page 10: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Note que, sendo conhecidos R, C e L, a impedancia Z e o angulo φ serao funcoes da frequencia ω da fontede tensao externa. Em particular, para um dado valor de R, o menor valor de Z ocorre quando a reatancia

X em 33 se anula, quando entao ocorre

Zmın = R (38)

Para que ocorra essa condicao, devemos ter X = 0 ou entao, de 35,

ωcL − 1

ωcC= 0

ou

ωc =

1

LC

ou seja, a frequencia da fonte de tensao deve ser igual a ωc, quando entao teremos a menor impedancia docircuito. Note que essa e precisamente a frequencia natural de oscilacao do sistema, dada pela equacao

ω0 =

1

LC(39)

o que indica que estamos na condicao de ressonancia para o circuito. Nessa condicao, a amplitude da correnteque circula no circuito, para um dado valor de E0, e maxima, ja que, de 25, temos

i0 =E0

Z (40)

e, quando ω = ω0, Z = Zmın, o que resulta em i0 = i0,max, para um dado valor de E0. Usando 37 e 40 em 20,

temos

i =E0

Z cos(ωt + φ) (41)

ou

i =E0

Rcos φ cos(ωt + φ) (42)

Dessas expressoes, vemos que Z , no circuito de corrente alternada, faz o papel da resistencia R em circuitos

de corrente contınua. Entretanto, e preciso lembrar que, em geral, E e i nao atingem os valores maximos aomesmo tempo, havendo entre eles uma diferenca de fase dada pelo angulo φ. Considerando a equacao 31a

vemos que, quando X > 0, o que corresponde a XL > XC , a tangente de φ sera negativa, indicando umangulo φ negativo. Nesse caso, observando a equacao 42, veremos que a corrente i se atrasa com relacao a

tensao total E , numa situacao parecida com a que ocorre na figura 10. Nesse caso, a tensao E0,L no indutor

e maior que a tensao E0,C no capacitor, indicando um circuito com caracterısticas indutivas. E o caso, porexemplo, de motores eletricos, nos quais ha uma grande carga resistiva, formada pelos fios dos enrolamentos,e tambem indutiva, por causa da indutancia associada aos proprios enrolamentos. Ha tambem uma pequena

carga capacitiva, que surge na regiao entre dois fios proximos, por exemplo, mas a situacao total resultanum circuito indutivo. Note que, nesse caso, como XL > XC , usando as expressoes explıcitas para XL e XC ,

veremos que a frequencia de operacao e tal que ω > ω0, onde ω0 = 1√LC

e a frequencia de ressonancia.

10

Page 11: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

No caso em que X < 0, ou seja, XL < XC1, vemos que a tangente de φ e positiva, indicando um angulo

φ > 0. Assim, o que se adianta agora e a corrente em relacao a tensao, e o circuito tem caracterısticas

capacitivas. Nesse caso, a frequencia de operacao e tal que ω < ω0.

Quando X = 0 e o circuito esta em ressonancia, φ = 0, e tensao e corrente estao em fase. Nesse caso,XL = XC , e a frequencia de operacao e dada por ω = ω0. Alem disso, os fasores que representam EL e

EC se anulam perfeitamente. Vamos recordar a relacao entre i0 e as amplitudes das tensoes indutiva E0,L ecapacitiva E0,C , dadas pelas equacoes 12 e 18,

E0,C = XCi0,C

E0,L = XLi0,L

ou tambem, usando as definicoes das respectivas reatancias,

E0,C =1

ωCi0,C

E0,L = ωLi0,L

Na ressonancia, ω = ω0 = 1√LC

, e

E0,C =

L

Ci0,C

E0,L =

L

Ci0,L

Enquanto isso, a impedancia Z vale R e a tensao da fonte e dada por

E0 = Zi0 = Ri0

Assim, dependendo dos valores de L

Ce R, pode ocorrer que, na ressonancia, as amplitudes das tensoes no

capacitor e no indutor (E0,C e E0,L) sejam maiores do que a propria amplitude da tensao da fonte (E0),

podendo ser, inclusive, maior que os valores maximos de operacao tolerados pelos elementos do circuito.Essa situacao de operacao, que pode danificar os equipamentos, pode ser contornada retirando-se o sistema

da ressonancia, por meio da alteracao de L ou C, ou tambem mantendo a ressonancia, mas aumentando ovalor de R. Cada opcao depende do que se deseja para a operacao do circuito.

Note que nem sempre a ressonancia e nociva. Um exemplo simples de aplicacao onde se quer ressonancia

ocorre na recepcao de sinais de TV ou radio, por exemplo. Tal recepcao e feita em geral por antenas, que saocondutores metalicos na forma de varetas. Na antena chega radiacao vinda das varias estacoes de radio ou

TV ao mesmo tempo, e nao se pode “desligar” as emissoras que nao se quer ouvir. A radiacao que chega aantena faz com que os eletrons do material condutor se movam, gerando correntes alternadas que circularao

por algum circuito receptor formado por indutores, capacitores e resistores, e serao transformadas em some imagem. Ao selecionar um canal ou estacao, o que fazemos e ajustar esse circuito receptor, alterandoL ou C, ou ambos, para que a frequencia de ressonancia do circuito se ajuste a frequencia do canal ou

estacao desejado, de modo que ele entra em ressonancia e a amplitude das tensoes relacionadas ao canalou estacao selecionado tornam-se muito mais altas do que as das outras emissoras. Um sistema de filtros,

projetados para permitir a passagem de sinal a partir de uma certa amplitude, completa o aparelho receptor,“limpando” o sinal e deixando apenas o que interessa.

1Note que a reatancia X , apesar de ser medida em ohms, como a resistencia R, nao e de fato uma resistencia, ja que pode

inclusive ser negativa.

11

Page 12: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Quando se usa, transmite ou mesmo gera tensao ou corrente alternada, valores instantaneos de grandezascomo a potencia nao sao tao relevantes quanto valores medios dessas grandezas considerados durante um

ciclo de oscilacao da tensao ou corrente. Assim, nosso proximo passo e estabelecer e calcular grandezasimportantes na analise de circuitos. Para comecar, definimos o valor quadratico medio, ou valor RMS 2,como e mais conhecido, de uma grandeza qualquer G mediante

GRMS =√

〈G2〉 (43)

onde a media e calculada durante um ciclo de oscilacao da grandeza. Dois valores importantes sao os valoresRMS da tensao e da corrente, isto e, ERMS e iRMS. Com E dada por 1, temos que calcular, inicialmente,

〈E2〉 =

∫ T

0 (E0 cosωt)2 dt∫ T

0 dt

onde T e o perıodo de uma oscilacao, relacionado a frequencia angular por

T =2π

ω(44)

Temos, entao,

〈E2〉 =ωE2

0

∫ 2π

ω

0cos2 ωt dt

ou, usando

cos2 x =1 + cos 2x

2

achamos

〈E2〉 =ωE2

0

∫ 2π

ω

0

1 + cos 2ωt

2dt

ou

〈E2〉 =ωE2

0

(

t +sen 2ωt

)2π

ω

0

que fica

〈E2〉 =ωE2

0

ω

ou, finalmente,

〈E2〉 =E2

0

2(45)

Portanto, temos, usando 43,

ERMS =√

〈E2〉2Sigla em ingles de Root Mean Square.

12

Page 13: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

ou, empregando 45,

ERMS =

E20

2=

E0√2

(46)

Esse valor, tambem chamado de tensao eficaz, e o que normalmente conhecemos a respeito de uma linha detransmissao de corrente alternada. Em particular, e essa grandeza a que nos referimos quando falamos que

a tensao em nossas casas vale 110 V ou 127 V, ou ainda, 220 V. Portanto, o valor da amplitude da tensao emaior que o valor nominal a que estamos acostumados, e, para uma linha onde ERMS = 110 V, temos

E1100 = 110

√2 = 156 V

Para a linha de 220 V, achamos

E2200 = 220

√2 = 312 V

Esses valores tambem sao chamados de valores de pico. Um valor usado mais raramente e o valor da tensao

de pico a pico, que corresponde ao dobro da tensao de pico, ou seja,

Epp = 2E0 (47)

Alem da tensao, precisamos tambem do valor RMS da corrente, o que e feito considerando-se a equacao 20e calculando

〈i2〉 =

∫ T

0

[

i0 cos(ωt + φ)]2

dt∫ T

0 dt

Usando 44, temos

〈i2〉 =ωi202π

∫ 2π

ω

0cos2(ωt + φ) dt

ou

〈i2〉 =ωi202π

∫ 2π

ω

0

1 + cos 2(ωt + φ)

2dt

ou entao,

〈i2〉 =ωi204π

(

t +sen 2(ωt + φ)

)2π

ω

0

que fica

〈i2〉 =ωi204π

ω

ou, finalmente,

〈i2〉 =i202

(48)

de modo que

13

Page 14: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

iRMS =

i202

=i0√2

(49)

Por fim, podemos determinar a potencia media fornecida ao circuito de corrente alternada. A potencia

instantanea e dada por

P = Ei

de modo que a potencia media sera

〈P 〉 =

∫ T

0 E0 cos ωt i0 cos(ωt + φ) dt∫ T

0 dt

ou

〈P 〉 =i0E0ω

∫ 2π

ω

0cosωt cos(ωt + φ) dt

que pode ser escrita como

〈P 〉 =i0E0ω

∫ 2π

ω

0

cos ωt(cosωt cos φ − sen ωt sen φ) dt

ou

〈P 〉 =i0E0ω

{

cosφ

∫ 2π

ω

0cos2 ωt dt − sen φ

∫ 2π

ω

0cosωt sen ωt dt

}

que fica

〈P 〉 =i0E0ω

{

cos φ

∫ 2π

ω

0

1 + cos 2ωt

2dt − sen φ

[sen2 ωt

]2π

ω

0

}

ou

〈P 〉 =i0E0ω

4πcosφ

[

t +sen 2ωt

]2π

ω

0

ou ainda,

〈P 〉 =i0E0ω

4πcosφ

ω

e, finalmente,

〈P 〉 =i0E0

2cos φ

ou, em termos dos valores RMS, dados em 46 e 49,

〈P 〉 = iRMSERMS cos φ (50)

Das expressoes 37 e 40, temos

14

Page 15: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

i0 =E0 cosφ

R(51)

Entao, temos, dividindo 51 por√

2,

iRMS =ERMS cosφ

R(52)

e assim,

〈P 〉 = iRMSRiRMS

cosφcos φ = Ri2RMS (53)

ou

〈P 〉 =ERMS cos φ

RERMS cos φ =

E2RMS cos2 φ

R(54)

Assim, a potencia media transmitida ao circuito de corrente alternada depende dos valores RMS e tambemdo angulo de fase φ entre a tensao e a corrente. O valor cosφ e chamado de fator de potencia, e ele deve

estar tao proximo de 1 quanto possıvel, para que a transferencia de potencia seja a maxima possıvel, oque correponde a termos φ = 0, que e a condicao de ressonancia para o circuito. Se φ 6= 0, o fator de

potencia e menor que 1, e existe uma defasagem entre tensao e corrente. Nesse caso, o vai-e-vem da correntenas linhas de transmissao que ligam os geradores aos receptores produz perdas na forma de aquecimento,conforme mostra a equacao 53, mas a conversao de energia eletromagnetica em trabalho util nos circuitos

receptores nao e feita da forma mais eficiente. Isso pode ser um problema para industrias, por exemplo,que normalmente compram uma certa quantidade de energia mensalmente das usinas geradoras de energia

e que, se o consumo superar o valor contratado, pagam um adicional bastante elevado. Nesse caso, comoos motores industriais sao circuitos bastante indutivos, o angulo φ e em geral grande, e muita energia seria

gasta simplesmente para esquentar os fios de transmissao, e nao para gerar trabalho util. Para corrigir oproblema, a alternativa mais simples e acrescentar ao sistema um banco de capacitores, que dao origem a

uma carga capacitiva, e a uma reatancia capacitiva, que se soma a carga indutiva dos motores e diminui oangulo φ, aumentando, portanto, o fator de potencia.

E util comentar aqui sobre uma questao interessante relativa a medida de potencia de equipamentos

eletronicos, em particular equipamentos de som. Em geral, a tais equipamentos sao atribuıdos dois valoresde potencia. Um deles e o valor RMS ou eficaz, ou tambem, o valor medio discutido acima, que e o que tem

validade tanto cientıfica quanto tecnica. O outro e conhecido como valor de potencia PMPO. Rigorosamentefalando, cada fabricante de equipamentos tem sua propria definicao do que seja a potencia PMPO, demodo que nao ha como comparar equipamentos de fabricantes diferentes usando essa grandeza. A questao

e que normalmente os valores de potencia real, ou RMS, sao pequenos (o que nao significa que a sensacaoauditiva tambem seja), e nao “impressionam” tanto quanto os valores PMPO divulgados em propagandas,

que costumam ser muito maiores que os valores RMS. Assim, para nao comprar “gato” por “lebre”, verifiquesempre a potencia real, RMS, dos equipamentos eletronicos.

Podemos agora partir para a solucao da equacao diferencial homogenea, considerando as seguintes defini-

coes:

ω0 =

1

LC

que e a frequencia natural do sistema,

15

Page 16: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

2β =R

L(55)

que e o termo de amortecimento. Assim, a equacao diferencial homogenea fica

d2Q

dt2+ 2β

dQ

dt+ ω2

0Q = 0 (56)

Para resolver essa equacao diferencial, consideramos a suposicao

Q(t) = aebt (57)

onde a e b podem ser complexos, mas Q, a carga, e necessariamente real. Com esta suposicao, temos

dQ

dt= abebt

d2Q

dt2= ab2ebt

Substituindo estas expressoes na equacao diferencial, obtemos

ab2ebt + 2abβebt + aω20ebt = 0

ou

aebt(

b2 + 2bβ + ω20

)

= 0

Como a nao deve ser sempre zero (solucao trivial) e a exponencial nao e nula, temos

b2 + 2bβ + ω20 = 0

que e uma equacao cujas raızes sao os valores de b que devem ser utilizados na solucao tentativa 57. Elas

sao dadas por

b = −2β

4β2 − 4ω20

2

que se desdobra em

b1 = −β +√

β2 − ω20

e

b2 = −β −√

β2 − ω20

As raızes acima podem ser complexas, reais e distintas, e reais e iguais, dependendo do valor do termo dentro

da raiz quadrada. Portanto, temos que separar estes tres casos.

16

Page 17: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Raızes Complexas

Se o termo β2 − ω20 for negativo, entao as raızes serao complexas. Para este caso, e util definir

ω2 = ω20 − β2

de modo que as raızes se tornem

b1 = −β +√

β2 − ω20 = −β +

−ω2 = −β + iω

eb2 = −β −

β2 − ω20 = −β −

−ω2 = −β − iω

Assim, a solucao da equacao diferencial 56, para este caso, e formada pelas funcoes

Q+ = a+e(−β+iω)t e Q− = a−e(−β−iω)t

de acordo com a solucao tentativa 57. A solucao geral e a soma das duas solucoes, ou seja,

Q(t) = a+e(−β+iω)t + a−e(−β−iω)t

Esta expressao pode ser reescrita se definirmos

a+ =A

2eiδ

a− =A

2e−iδ

onde A e δ sao reais. Utilizando estas definicoes, temos

Q(t) =A

2eiδe(−β+iω)t +

A

2e−iδe(−β−iω)t

ou

Q(t) =A

2eiδe−βteiωt +

A

2e−iδe−βte−iωt

Q(t) =Ae−βt

2

[

ei(ωt+δ) + e−i(ωt+δ)]

que fica

Q(t) = Ae−βt cos(ωt + δ) (58)

que e a solucao da equacao diferencial 56 quando as raızes sao complexas. A carga no capacitor oscilacom uma frequencia angular ω, que nao e a frequencia natural do sistema, mas a amplitude da oscilacao

decresce exponencialmente com o tempo, por causa do termo Ae−βt. Esse circuito e chamado de circuitoRLC subcrıtico. Em termos das grandezas eletricas, a frequencia vale

ω =√

ω20 − b2 =

1

LC−

(

R

2L

)2

A figura 12 apresenta um grafico Q(t) × t para o circuito RLC subcrıtico.

17

Page 18: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

-Ae-βt

Ae-βt

Q(t)

t

Figura 12: Grafico de Q(t) × t para o circuito RLC subcrıtico.

Raızes Reais e Distintas

Quando β2 − ω20 e positivo, a raiz quadrada resulta num numero real. Vamos definir, neste caso,

ω2 = β2 − ω20

e entao as raızes ficam

b1 = −β + ω

e

b2 = −β − ω

As solucoes que formam a solucao geral sao

Q+ = a+e(−β+ω)t e Q− = a−e(−β−ω)t

de modo que achamos

Q(t) = a+e(−β+ω)t + a−e(−β−ω)t

Definimos agora

a+ =A

2eδ

a− =A

2e−δ

onde A e δ sao reais. Utilizando estas definicoes, temos

Q(t) =A

2eδe(−β+ω)t +

A

2e−δe(−β−ω)t

18

Page 19: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

ou

Q(t) =A

2eδe−βteωt +

A

2e−δe−βte−ωt

Q(t) =Ae−βt

2

[

eωt+δ + e−(ωt+δ)]

A funcao cosseno hiperbolico e definida por meio de

cosh θ =eθ − e−θ

2

Com o uso desta expressao, achamos

Q(t) = Ae−βt cosh(ωt + δ) (59)

que e a solucao da equacao diferencial 56 quando as raızes sao reais e distintas. A carga no capacitor decrescerapidamente e nao chega a oscilar, ja que o cosseno hiperbolico nao e uma funcao periodica. Esse circuito

e chamado de circuito RLC supercrıtico. A figura 13 apresenta um grafico Q(t) × t para o circuito RLCsupercrıtico.

Q(t)

t

Figura 13: Grafico de Q(t) × t para o circuito RLC supercrıtico.

Raızes Reais e Iguais

Quando β2 = ω20, temos o caso em que as raızes sao reais e iguais, ou seja,

b1 = b2 = −β = −ω0

Portanto, uma das solucoes que formam a solucao geral e

Q1 = a1e−ω0t

e precisamos obter a outra solucao, para que possamos formar a solucao geral. Ela pode ser encontrada se

supusermos que ela seja da forma

19

Page 20: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Q2 = a2te−bt

Precisamos das derivadas dessa expressao para substituı-las na equacao 56, de modo que

dQ2

dt= a2e

−bt − a2bte−bt

e

d2Q2

dt2= −a2be

−bt − a2be−bt + a2β

2te−βt

d2Q2

dt2= a2b

2te−bt − 2a2be−bt

Voltando agora a equacao diferencial, temos

a2b2te−bt − 2a2be

−bt + 2b(

a2e−bt − a2bte

−bt)

+ ω20a2te

−bt = 0

ou

a2b2te−bt − 2a2be

−bt + 2a2be−bt − 2a2b

2te−bt + ω20a2te

−bt = 0

a2te−bt

(

ω20 − b2

)

= 0

Para que a equacao acima seja valida sempre, devemos ter

ω20 − b2 = 0

ou

b = ω0

o que faz com que a segunda solucao se torne

Q2 = a2te−ω0t

e a solucao geral fica

Q = a1e−ω0t + a2te

−bt

ou

Q(t) =(

a1 + a2t)

e−ω0t (60)

Note que esse caso e o caso limite entre dois comportamentos diferentes. Quando o amortecimento e umpouco menor, temos um circuito oscilante subcrıtico. Quando e um ponto maior, a carga nao oscila mais ecai rapidamente a zero. Por isso, esse circuito e chamado de circuito RLC crıtico. O comportamento da carga

como funcao do tempo e apresentado na figura 14. A solucao da equacao diferencial homogenea 56 e dadapor um dos tres casos descritos acima, e a solucao geral deve levar em conta tambem a solucao particular

obtida anteriormente. Note que, por causa com decaimento exponencial, apos um tempo suficientementelongo apenas a solucao particular permanece, sendo a solucao da homogenea importante apenas no regime

transiente do circuito, que ocorre logo que ele e ligado.

20

Page 21: Análise de Circuitos Em Corrente Alternada 3

Q(t)

t

Figura 14: Grafico de Q(t) × t para o circuito RLC crıtico.

21