Analise de Uma Sequencia Didatica Sobre Pilhas e Baterias

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     XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ)  Especificar a rea do trabalhoEA

    Análise de uma seqüência didática sobre pilhas e baterias: umaabordagem CTS em sala de aula de química

    *Ruth do Nascimento Firme 1(FM) ([email protected]), Edenia Maria Ribeiro doAmaral2(PQ), Rejane Martins Novais Barbosa3 (PQ) 

    1 Av. Governador Agamenon Magalhães, - Derby, Recife -PE

    2,3 R. Dom Manoel de Medeiros, s/n - Dois Irmãos 52171-900 - Recife/PE

     Palavras Chave:  seqüência didática, abordagem CTS, ensino de química.

    Resumo: Este trabalho tem como objetivo a análise do desenvolvimento de uma seqüência didática elaboradacom base em uma abordagem de ensino CTS (Ciência-Tecnologia-Sociedade), buscando caracterizar relaçõesepistêmicas e ações pedagógicas estabelecidas em uma sala de aula de química no processo decontextualização e construção de significados para os conceitos científicos estudados. Os resultados da análiserevelaram que a seqüência proposta apresenta diferentes possibilidades de dinamização do ensino-aprendizagem, das quais podemos apontar: uma maior participação e interesse dos alunos quando se busca aarticulação dos conceitos químicos com o contexto tecnológico e social (dimensão epistêmica) e a instauraçãode processos interativos na dinâmica da sala de aula, o que não é muito comum em abordagens de ensinomais tradicionais (dimensão pedagógica). Dentre as limitações, está a dificuldade de promover atividadesmais interativas quando do tratamento dos aspectos tecnológicos envolvidos na temática abordada, devido aoacesso restrito às informações técnicas sobre pilhas. 

    INTRODUÇÃO

     Neste trabalho temos como objetivo a análise do desenvolvimento de uma seqüênciadidática elaborada com base em uma abordagem de ensino CTS (Ciência-Tecnologia-Sociedade), buscando caracterizar relações epistêmicas e ações pedagógicas estabelecidas emuma sala de aula de química no processo de contextualização e construção de significados paraos conceitos científicos estudados. A dimensão epistêmica foi analisada tomando por base a

     proposta de estabelecer relações entre ciência, tecnologia e sociedade a partir dos estudos dereações de oxidação e redução, as pilhas, o seu descarte e as implicações ambientais e sociais domesmo. As ações pedagógicas foram estudadas considerando as interações estabelecidas entre

     professora e alunos e entre alunos na sala de aula. Pretendemos que os resultados obtidos possamcontribuir no sentido de apresentar uma experiência inovadora para o ensino de química esubsidiar a estruturação de propostas futuras.

    A partir de análises e críticas às pesquisas que consideram diversos modelos de ensino-aprendizagem em ciências, Cachapuz (1999) propõe um novo olhar nos referenciais teóricos

    dessa área de forma a garantir uma educação científica inserida no quadro de uma educação paraa cidadania. Segundo este autor, fertilizar o cognitivo com o afetivo e ter em vista não só aconstrução de conceitos, mas o desenvolvimento de atitudes de interesse para com aaprendizagem poderão ser alguns dos passos a serem dados para uma necessária mudança daeducação em ciências. Nesse sentido, consideramos que a proposição, aplicação e análise deseqüências didáticas que considerem orientações representativas de uma nova fase para o ensinode ciências (Cachapuz, 1999), poderão se constituir em uma perspectiva de pesquisa que buscacontribuir para revelar estratégias didáticas que promovam mudanças significativas nas salas deaula de ciências.

    Leach et al  (2005) consideram que propostas de seqüências curtas de ensino de ciênciassurgem como uma tentativa de aproximar o contexto da pesquisa da prática de sala de aula. Com

    essa perspectiva, esses autores desenvolveram um trabalho com o objetivo de avaliar as possibilidades de se obter bons resultados na aplicação de seqüências de ensino que incorporam

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    resultados de pesquisa sobre a aprendizagem dos alunos. Nessa direção, um grupo de professorese pesquisadores trabalhou conjuntamente na elaboração de seqüências de ensino (fase dedesenvolvimento) que foram aplicadas nas salas de aulas de professores participantes e não

     participantes do grupo (fase de transferência). Para a avaliação dessas seqüências considerou-seem que medida os alunos conseguem construir uma compreensão mais significativa de

    conteúdos conceituais quando comparados com outros alunos que foram submetidos aabordagens tradicionais de ensino. Leach et al   (2005) encontraram evidências de que asseqüências didáticas propostas promoveram um desempenho melhor dos alunos com relação aoutros submetidos a abordagens mais tradicionais de ensino.

    Segundo Méheut (2005) a proposição e aplicação de seqüências didáticas de ensino-aprendizagem (teaching-learning sequences – TSL) surgiu como uma tentativa em responder às

     pesquisas sobre concepções informais dos alunos nos anos 70 e 80. Algumas abordagens podemser adotadas no planejamento de TLS e para caracterizá-las, a autora apresenta um modelo quedefine quatro componentes básicos: professor; alunos; mundo material; e conhecimentocientífico. No modelo proposto, duas dimensões podem ser consideradas quando da proposiçãode uma TLS: a dimensão epistêmica – na qual são considerados os processos de elaboração,

    métodos e validação do conhecimento científico, que podem significá-lo com relação ao mundoreal - e a dimensão pedagógica, na qual são considerados aspectos inerentes ao papel do

     professor, interações professor-aluno e aluno-aluno. Segundo a autora, para romper comabordagens tradicionais, na proposição TLS deve-se privilegiar: a relação dos alunos com omundo real a partir da consideração de suas concepções informais e das suas formas deelaboração conceitual, as relações entre o conhecimento científico a ser ensinado e o mundomaterial, e a gênese histórica deste conhecimento. Nesse sentido, Méheut propõe considerarconjuntamente a dimensão epistêmica e pedagógica numa perspectiva denominada construtivistaintegrada. Na perspectiva construtivista integrada toma-se por base linhas de pesquisa como aEngenharia didática (Artigue, 1988 apud   Méheut, 2005) e Educational Reconstruction(Kattmann et al . 1995 apud Méheut, 2005) e coloca-se ênfase em aspectos tais como: o conteúdoa ser ensinado e sua gênese histórica; as características cognitivas dos alunos; a dimensãodidática relativa à instituição de ensino; motivação para a aprendizagem e significância doconhecimento a ser ensinado.

    Considerando a discussão colocada acima, neste trabalho, elaboramos uma seqüênciadidática com base em uma abordagem CTS, na qual as dimensões epistêmicas e pedagógicasforam consideradas conjuntamente com a preocupação de não se privilegiar uma dimensão emdetrimento da outra. O processo de elaboração ocorreu no âmbito de um projeto de pesquisafinanciado pelo CNPq, que reúne pesquisadores, professores, alunos de pós-graduação egraduação com o objetivo de analisar o desenvolvimento de seqüências didáticas em salas deaula de química.

    A seqüência didática proposta: dimensão epistêmica

    Com relação à dimensão epistêmica, na seqüência didática foi considerada a proposiçãode atividades que possibilitassem a construção de significados pelos alunos para os conceitosquímicos abordados a partir de uma perspectiva CTS para o ensino.

    Segundo Roberts (1991 apud  Santos e Mortimer, 2001), na perspectiva CTS, o conteúdoa ser trabalhado em sala de aula deve ser abordado a partir de interações entre explicaçãocientífica, planejamento tecnológico e solução de problemas, e tomada de decisão sobre temas

     práticos de importância social. Para Martins (2002) na orientação curricular CTS são tratadas problemáticas socioambientais, a partir da seleção e estudo de conceitos da ciência e da

    tecnologia pertinentes à compreensão dessas problemáticas, também são levantadas questõessobre as implicações sociais do desenvolvimento científico e tecnológico. Dessa forma, os

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    objetivos gerais da perspectiva CTS para o ensino são: a aquisição de conhecimentos, autilização de habilidades, e o desenvolvimento de valores (Bybee, 1987 apud  Santos e Mortimer,2001). A inclusão de temas sociais é uma questão central (Santos e Schnetzler, 1997) e os

     problemas científicos abordados nas aulas devem estar associados às necessidades sociais e aos processos tecnológicos. A abordagem de temas locais relacionados aos problemas da vida real é

    fundamental para tornar a discussão mais próxima (Santos e Mortimer, 2001). Nessa direção, asestratégias de ensino em uma abordagem CTS são diversificadas. Além das práticas atuais deaulas expositivas, demonstrações, sessões de questionamento, solução de problemas eexperimentos em laboratório, pode-se incluir jogos de simulação, fóruns e debates, pesquisas nocampo de trabalho, palestrantes convidados e ação comunitária (Hofstein et al, 1988 apud  Santose Schnetzler, 1997). A opção pelo uso de uma abordagem CTS para contemplar a dimensãoepistêmica da seqüência didática justifica-se pela pretensão de se promover no ensino da químicaa aquisição de conhecimentos que contribuam para os alunos compreenderem o mundo e suastransformações no âmbito das questões científicas, tecnológicas, sociais, políticas, éticas, entreoutras. Dessa forma, ensinar química na perspectiva CTS pode se constituir em uma forma decriar consciência civil com responsabilidade social e política e proporcionar ferramentas

    intelectuais necessárias ao julgamento, avaliação, e tomada de decisão frente às aplicações eimplicações sociais do desenvolvimento científico e tecnológico (Silva, 2000).

     Na elaboração da seqüência didática a ser analisada neste trabalho, buscamos aproximaros conceitos químicos – reações de oxidação e redução – do mundo real dos alunos, articulando-os às questões tecnológicas - relacionadas com a produção de pilhas e baterias - e às questõessociais – as implicações do descarte inadequado de pilhas e baterias – tentando estabelecerrelações entre a discussão feita em sala de aula com situações reais que a maioria dos alunosvivencia.

    A dimensão pedagógica da seqüência didática

    Quanto à dimensão pedagógica, foram utilizadas estratégias para a promoção deinterações sociais na sala de aula. Segundo Machado (1999, p. 50), é “na interação com o outroque o sujeito se constitui e que se dá a elaboração conceitual”. Com esse ponto de vista, asatividades desenvolvidas na seqüência didática buscaram garantir processos interativos entre o

     professor e os alunos e entre alunos e alunos. Algumas dessas atividades foram: atividades de pesquisa de campo – no sentido de subsidiar discussões iniciais; atividade experimental – nosentido de fundamentar discussões do ponto de vista científico e tecnológico; atividades dedebate e fórum escolar – buscando possibilitar o desenvolvimento de valores a partir dediscussões acerca de posicionamentos dos alunos quanto à questão socioambiental.

    A dimensão pedagógica da seqüência foi considerada para análise a partir da perspectivadiscursiva, e nessa direção, aspectos do conteúdo e da forma como ele é abordado foram levadosem conta no processo de construção de significados. Para a análise das interações discursivas nodesenvolvimento das ações na sala de aula foram consideradas categorias propostas porMortimer e Scott (2002). Algumas dessas categorias dizem respeito à abordagem comunicativaque ocorre em sala de aula e quatro diferentes formas de abordagens são propostas paracaracterizar a comunicação entre professor e alunos: interativa/dialógica – quando há a

     participação de mais de uma pessoa e são cons iderados diferentes pontos de vista na interação;interativa/de autoridade – quando há a participação de mais de uma pessoa e somente um pontode vista é considerado na interação; não-interativa/dialógica – quando somente uma pessoa estáenvolvida na ação comunicativa e mais de um ponto de vista é considerado; não interativa/deautoridade – quando somente uma pessoa produz enunciados, e somente um ponto de vista é

    considerado. Ressaltarmos que nas categorias propostas está implicada uma concepção dediscurso fundamentada nas idéias de Bakhtin e que pode ser vista como realização interativa

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    (Kerbrat-Orecchiooni, 1990 apud  Cunha, 2005). Para Bakhtin (2006), a comunicação verbal serealiza a partir de uma troca de enunciados, na forma de diálogo, dessa forma, um enunciado

     precisa ser considerado como resposta a enunciados anteriores refutando-os, confirmando-os oucomplementando-os. Nesse sentido, não há enunciado isolado. Todo enunciado é parte de umcontexto só podendo ser compreendido no interior desse contexto. Diante do exposto, a análise

    do discurso produzido ao longo da seqüência didática proposta neste trabalho levou emconsideração as enunciações feitas pela professora e pelos alunos na dinâmica interativa que sedesenvolveu em sala de aula.

    METODOLOGIA

    Este trabalho é parte de um projeto de pesquisa mais amplo em desenvolvimento naUniversidade Federal Rural de Pernambuco que tem como objetivo elaborar, aplicar e analisarseqüências didáticas para o ensino de química no nível médio. Nessa perspectiva, o projeto temcomo objetivo fazer uma análise do processo de elaboração conjunta (pesquisadores, professoresdo ensino médio, alunos de pós-graduação e graduação) de seqüências didáticas e de aspectos

    relativos ao ensino-aprendizagem estabelecido em salas de aulas a partir da implementação dasseqüências propostas. Para este estudo específico, de natureza qualitativa, interessa-nosinvestigar: na dimensão epistêmica, como a abordagem de conceitos químicos inserida em uma

     perspectiva CTS aproximou o conhecimento científico do contexto real dos alunos; e nadimensão pedagógica, em que medida as intervenções desenvolvidas pela professora

     promoveram interações sociais na sala de aula. A seqüência didática foi aplicada por uma das professoras do ensino médio envolvida na elaboração da respectiva seqüência e integrante daequipe técnica do projeto. As atividades desenvolvidas durante a aplicação da seqüência didáticaforam filmadas para posterior transcrição e análise, com a participação de outra professoratambém integrante da equipe técnica do projeto. A seqüência didática foi aplicada em uma turmada 2ª  série do ensino médio de uma escola pública da cidade de Recife onde a professoraintegrante do projeto leciona. Foram envolvidos 42 alunos, e as atividades contemplaram seismomentos em horário escolar. Cada momento correspondeu a duas aulas geminadas constituindoum total de 12 aulas de cinqüenta minutos cada. A turma envolvida foi selecionada considerandoque no período da aplicação da seqüência, a professora estava tratando o conteúdo reaçõesquímicas e, neste conteúdo seriam abordados os conceitos químicos de reações de óxido-redução. Considerando a abordagem de um tema social, como proposto em uma abordagemCTS, a temática tratada na seqüência didática refere-se aos problemas socioambientaisenvolvidos no descarte de pilhas e baterias. A escolha pela temática justifica-se tanto pelarelevância do tema no contexto científico-tecnológico contemporâneo que exige cada vez mais aformação de um cidadão informado, crítico e participativo, quanto pela demanda do uso de

     pilhas e baterias no cotidiano do aluno. Os objetivos pretendidos na seqüência didática foram:apreender conhecimentos científicos e tecnológicos a partir do estudo da problemática ambientaldo descarte das pilhas; utilizar conhecimentos científicos e tecnológicos como meio decompreensão dessa problemática; apontar soluções a partir da adoção de comportamentos deresponsabilidade social; e avaliar criticamente possibilidades e limitações da ciência e datecnologia frente ao bem-estar social.

    De forma resumida, as atividades desenvolvidas em cada um dos seis momentoscontemplaram: atividade em grupo para coleta de informações sobre métodos de tratamento dolixo e sobre o descarte das pilhas e baterias; entrevistas com pessoas sobre a forma comodescartam pilhas utilizadas, sobre os critérios para opção de escolha na compra de pilhas, sobre acompreensão das indicações presentes no rótulo das pilhas, etc.; simpósio para socialização dos

    dados coletados pelos grupos; debates com o grande grupo; exposição em transparências daevolução histórica das pilhas e de diversos modelos de pilhas e suas especificidades técnicas;

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    atividade experimental; apresentação de vídeos; leitura de texto em pequenos grupos; simulaçãode um fórum escolar. Assim, as atividades vivenciadas foram realizadas em ambientes diversos,tais como: sala de aula, auditório, e laboratório de química.

    Para a análise e discussão dos resultados obtidos no desenvolvimento da seqüênciadidática consideramos as idéias de Méheut (2005) para a validação externa de uma TLS

    (teaching-learning sequences). Esta validação é feita, de uma forma geral, pela avaliação dosefeitos da TLS com relação ao ensino tradicional, considerando questões relativas aos objetivosda TLS proposta ou aos resultados obtidos a partir de sua aplicação. Para Méheut (2005),experiências com TLS têm apresentado vários tipos de resultados: alguns contribuem para acaracterização, apreciação, avaliação e eficácia pedagógica global das seqüências propostas eoutras subsidiam informações sobre trajetórias cognitivas dos alunos (validação interna) e que

     podem ser úteis para por à prova as hipóteses feitas quando a TLS foi elaborada e contribuir parao aperfeiçoamento das mesmas. É a partir dessa perspectiva que pretendemos desenvolver aanálise neste trabalho, focando principalmente aspectos de sua validação externa. Para adimensão epistêmica foram consideradas como categorias de análise possibilidades e limitaçõesda abordagem CTS proposta no sentido de aproximar o conhecimento científico ao mundo real

    dos alunos. Para a análise da dimensão pedagógica foram consideradas as formas de interaçõesque ocorreram no atendimento aos objetivos propostos para a seqüência didática. 

    RESULTADOS E DISCUSSÃO

    Como foi colocado anteriormente, na nossa análise buscamos caracterizar em que medidaa seqüência didática proposta a partir de uma abordagem CTS contribuiu para aproximar oconhecimento científico do mundo real dos alunos e promover processos de interação social nasala de aula. Nesse sentido, consideramos importante, apresentar inicialmente uma visão maisgeral da seqüência didática a partir de um resumo de atividades desenvolvidas, evidenciando

     para cada momento: o número de aulas, os objetivos propostos, as atividades desenvolvidas, os

     principais temas abordados, e as ações dos participantes (professora e alunos), conformemostrado no quadro 1. Para a análise neste trabalho, foram escolhidas algumas atividadesrepresentativas para alcançar os objetivos propostos na seqüência, tais como: a atividade desimpósio, atividade de debate; a atividade experimental, a apresentação do vídeo, a leitura dotexto; e o fórum escolar.

    Quadro 1: Resumo da seqüência didáticaMomento 1

     Número de aulas/minutos Atividades extra-classe (período de aproximadamente 30 dias)Atividades desenvolvidas Pesquisa na internet; Entrevistas; construção de um terrárioObjetivos das atividades Utilizar fontes de pesquisa e realizar entrevistas para obter informações sobre o

    assunto a ser estudadoPrincipais temas Descarte das pilhas e baterias; destino de tratamento do lixo; uso de pilhas no

    cotidiano das pessoas.Ações dos participantes Trabalho dos alunos em pequenos grupos sob orientação da professora.

    Momento 2 Número de aulas/minutos 02 aulas/100 minutosAtividades desenvolvidas Simpósio para a socialização dos dados coletados. Debate geral com toda turma a

     partir da seguinte questão: Existe um problema social e ambiental, gente? Objetivos das atividades Promover a socialização, análise e avaliação das informações coletadas.Principais temas As concepções das pessoas sobre pilhas, seu descarte; O destino e tratamento do

    lixo; O descarte das pilhas e os problemas decorrentes. Ações dos participantes Os alunos socializaram os dados de suas pesquisas com todo o grupo. A professora

    discutia as informações trazidas pelos alunos e tentava promover a participação da

    turma na discussão. O objetivo da professora era de que os alunos percebessem asituação emergente das discussões como uma problemática ambiental. 

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    Momento 3 Número de aulas/minutos 02 aulas/100 minutosAtividades desenvolvidas Levantamento das idéias prévias dos alunos. Apresentação em transparências da

    evolução histórica das pilhas e de diversos modelos de pilhas e suasespecificidades. Levantamento de algumas questões.

    Objetivos das atividades Classificar alguns tipos de pilhas; Apreciar as contribuições científicas e

    tecnológicas na resolução de problemas ambientais.Principais temas Histórico da pilhas. Pilhas e suas tecnologias.Ações dos participantes Inicialmente os alunos responderam um questionário (questionário 1)

    individualmente. Em seguida a professora levantou questões introdutórias para aapresentação do histórico das pilhas e as caracterís ticas de alguns modelos de

     pilhas.Momento 4

     Número de aulas/minutos 02 aulas/100 minutosAtividades desenvolvidas Apresentação em transparência da desmontagem de uma pilha. Atividade

    experimental. Explicação dos princípios científicos da pilha alternativa tomando por base a pilha de Daniel. Discussão das questões sobre a atividade experimental.Aplicação do exercício de fixação. Aplicação do questionário.

    Objetivos das atividades Conceituar pilhas. Descrever os componentes das pilhas. Explicar a função doscomponentes de uma pilha. Explicar o funcionamento de uma pilha. Observar ofuncionamento de uma pilha. Aplicar regras de nomenclatura para a pilha.Simular uma pilha alternativa.

    Principais temas Composição e funcionamento das pilhas.Ações dos participantes A professora resgatou aspectos do conteúdo trabalhos em momento anterior e

     procurou caracterizar as pilhas como instrumentos tecnológicos. Apresentou emtransparência a desmontagem de uma pilha comum e os alunos participaram daconstrução de uma pilha de batata. Após a atividade experimental, a professoraapresentou a explicação das idéias científicas envolvidas no funcionamento de uma

     pilha, incluindo a pilha-batata. A professora promoveu uma discussão a partir dasquestões propostas na ficha da atividade experimental, os alunos resolveram a fichade exercícios e responderam individualmente um questionário (questionário 2).

    Momento 5 Número de aulas/minutos 02 aulas/100 minutosAtividades desenvolvidas Apresentação do vídeo: Não fique pilhado. Levantamento de questões pela

     professora para a análise do vídeo. Socialização do trabalho do grupo 4: explicandoa experiência da construção do terrário. Apresentação do vídeo: Ilha das flores.

    Objetivos das atividades Identificar relações entre o descarte das pilhas, o meio ambiente e a sociedade;Perceber o descarte das pilhas e baterias como problemática ambiental e social;Perceber as limitações da ciência e da tecnologia considerando aspectos culturais eeconômicos.

    Principais temas O descarte das pilhas no meio ambiente. A problemática do lixo.Ações dos participantes Os alunos assistiram ao vídeo e a professora levantou questões para promover a

    reflexão dos alunos. Após a apresentação do primeiro vídeo, um grupo de alunos,responsável pela construção de um terrário, apresentou o seu trabalho. Os alunos

    assistiram ao segundo vídeo. O objetivo da professora era de enfatizar que odescarte das pilhas aumenta problemas gerados pelo lixo.Momento 6

     Número de aulas/minutos 02 aulas/100 minutosAtividades desenvolvidas Leitura em pequenos grupos do texto: Descarte de pilhas e baterias. Fórum: Os

     produtos da ciência e da tecnologia sempre promovem o bem-estar da sociedade. Objetivos das atividades Conscientizar da importância do uso de pilhas com menor toxidade; Perceber as

    limitações da ciência e da tecnologia considerando aspectos culturais e econômicos;Promover atitudes responsáveis frente às problemáticas ambientais.

    Principais temas Descarte de pilhas e baterias. Metais pesados. Legislação. Problemas de saúdecausados pelos metais pesados. Limites e possibilidades da ciência e da tecnologiano contexto social.

    Ações dos participantes Os alunos dividiram-se em pequenos grupos de 5 ou 6 alunos para a leitura de

     partes de um texto. No final da le itura, os grupos socializaram para o grande grupoas idéias apresentadas na parte do texto lido pelo grupo. A professora iniciou o

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    fórum a partir de uma frase colocada no quadro, solicitando a participaçãovoluntária dos alunos - dois para a defesa e dois para a acusação da frase colocada eum coordenador para apresentar o veredito final do fórum. O restante da turmatambém fez colocações quando a defesa e a acusação se pronunciaram.

    Análise da dimensão epistêmica na seqüência proposta

     Neste trabalho, pretendemos analisar como ou em que medida a abordagem de conceitosquímicos inserida em uma perspectiva CTS aproximou o conhecimento científico do contextoreal dos alunos. Para isso, na seqüência proposta, avaliamos separadamente as possibilidades deuma boa articulação entre conhecimento científico e tecnológico e questões sociais e ambientaisvivenciadas pelos alunos com relação às pilhas e baterias. Em seguida, foi feita uma análise daslimitações que a abordagem proposta apresentou nesse mesmo sentido. 

     Possibilidades para a aproximação do conhecimento científico ao mundo real dos alunos

    A abordagem dos conceitos químicos inseridos nos contextos tecnológico e social pareceu-nos estimular o interesse dos alunos durante as atividades propostas na seqüênciadidática. Um passo inicial e importante no desenvolvimento da seqüência didática comabordagem CTS foi a tentativa de conduzir os alunos para a caracterização de uma problemáticasocioambiental relacionada ao descarte de pilhas e baterias. Para isso, o fato dos grupos terem seenvolvido em pesquisas sobre a temática (momento 1) facilitou um maior engajamento dosmesmos tanto no simpósio – para socialização dos resultados das pesquisas com o grande grupo

     – como no debate promovidos em sala de aula (momento 2). Entendemos que para aconcretização dos objetivos pretendidos na seqüência didática a percepção dos alunos acerca daexistência de um problema socioambiental, que precisaria ser compreendido em seu aspectocientífico, tecnológico, social, político, etc., seria fundamental para o desenvolvimento dehabilidades e de valores de co-responsabilidade frente à temática abordada. Dessa forma,

    consideramos que atividades de sensibilização e motivação dos alunos para um problema real noinício da seqüência pareceu ser muito frutífero.Outro aspecto que se mostrou relevante para a aproximação entre os conceitos científicos

    e o mundo real dos alunos foi o tratamento de artefatos tecnológicos indiscutivelmente presentesno cotidiano da maioria dos alunos – as pilhas e as baterias. De um modo geral, os alunosmostraram interesse pelo conhecimento desses artefatos sobre diversos aspectos: como as pilhase baterias produzem energia elétrica, de que são constituídas, quais os modelos comerciais de

     pilhas mais usados, quais as diferenças relevantes entre tais modelos, e principalmente, qual arelação desses aparatos com a problemática social que emerge do descarte dos mesmos no meioambiente.

    Outra atividade que abriu algumas possibilidades para aproximar os conceitos químicos

    envolvidos na temática pilhas e baterias com um contexto mais próximo dos alunos foi aatividade experimental (momento 4). A simulação de uma pilha alternativa, a pilha-batata, demontagem simples e utilizando materiais do cotidiano  promoveu um melhor entendimento dofuncionamento de uma pilha na produção de energia. Nesse sentido, consideramos que aapresentação dos conceitos científicos associada a situações cotidianas e o desenvolvimento deatividades ou situações de participação ativa e manuseio de materiais por parte dos alunos,

     possibilita uma melhor visualização dos conceitos, sendo construído significado para os mesmosem situações específicas.

    A exposição do vídeo (momento 5) também se mostrou uma atividade bastante positivana contextualização dos conceitos científicos a partir das interações ciência-tecnologia-sociedade. Após a apresentação do vídeo, a professora levantou algumas questões para a turma

    direcionadas às ações das pessoas no vídeo, às formas de contaminação do meio ambiente pelas pilhas, às diversas formas pelas quais os animais podem ser contaminados, e à mensagem

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    transmitida pelo autor do vídeo. Os alunos fizeram boas articulações entre as idéias apresentadasno vídeo e a questão socioambiental do descarte das pilhas e baterias, o que parece tercaracterizado uma participação significativa por parte dos mesmos.  Naquele momento daseqüência didática, um dos objetivos pretendidos era que os alunos identificassem relações entreo descarte das pilhas e problemas socioambientais. O vídeo tratava dessas interações ao mostrar

    o percurso da contaminação com metais pesados presentes nas pilhas desde o seu descarte atéatingir o organismo humano. Após o vídeo, a apresentação e a discussão sobre o terrárioconstruído por um dos grupos – o terrário consistia de um sistema formado por um recipiente devidro transparente, terra, planta e pilhas “enterradas” – possibilitaram que alunos observassemconcretamente como as pilhas descartadas no lixo comum poderiam ficar quando levadas a umaterro a céu aberto. As pilhas estavam “estouradas” e a plantinha cultivada no terrário estava“morta”. A intenção nesta atividade foi que os alunos ampliassem os dados observados noterrário para os lixões existentes na região metropolitana da sua cidade.

    Finalmente, outra atividade que resultou como uma possibilidade positiva para adimensão epistêmica em uma abordagem CTS foi o fórum escolar (momento 6). Odesenvolvimento de atitudes e posturas de responsabilidade frente às aplicações e implicações do

    desenvolvimento científico e tecnológico na sociedade poderia ser possibilitado neste  momento.Como dizem Santos e Mortimer (2001), é fundamental para o desenvolvimento da capacidade detomada de decisão a discussão de problemas da vida real, pois parece oportunizar o confronto dediferentes valores entre os alunos. As discussões partiram de situações concretas e os alunoscolocaram seus posicionamentos com propriedade. A proposição colocada pela professora paradirecionar o fórum – os produtos da ciência e da tecnologia sempre promovem o bem-estar da

     sociedade – teve um caráter fundamental para o direcionamento das discussões. Os alunos precisavam assumir posturas de acordo ou desacordo com a proposição e apresentar justificativasque fundamentassem suas posturas. A participação dos alunos no fórum escolar foi bastantesignificativa. Vários aspectos, não esperados pela professora, foram levantados, como porexemplo, a questão das orientações presentes nos rótulos de alguns produtos e que o consumidornão segue. A nosso ver, esta atividade parece ter atendido aos objetivos propostos para estemomento da seqüência: conscientizar da importância do uso de pilhas com menor toxidade;

     perceber as limitações da ciência e da tecnologia considerando aspectos culturais e econômicos;e inclinar-se a assumir atitudes responsáveis frente às problemáticas ambientais que envolvem atodos. A participação dos alunos caracterizou esta atividade como um dos momentos maissignificativos em termos da construção e reconstrução das idéias dos alunos acerca das relaçõesCTS, o que não é muito freqüente em abordagens tradicionais no ensino de ciências. 

     Limitações para a aproximação do conhecimento científico ao mundo real dos alunos

     Na análise da seqüência proposta, algumas limitações foram verificadas principalmentecom aspectos envolvidos com a dimensão tecnológica dos conteúdos. Nesse sentido, a atividadeque pretendeu a exposição dos aspectos tecnológicos das pilhas (momento 3) apresentoualgumas limitações para uma contextualização. Isso porque as informações eram muito técnicas.Assim, a professora não conseguiu uma postura mais participativa dos alunos. Os alunos quandoindagados pela professora, não conseguiram expressar algum conhecimento sobre característicasde algumas pilhas – potencial elétrico, vantagens e desvantagens, fator de risco do ponto de vistaambiental, equipamentos de uso – que implicavam em diferenças entre os modelos apresentados

     – pilha alcalina, pilhas seca, pilha de níquel-hidreto metálico, pilha de níquel-cádmio, e pilhasminiaturas. Eles não conheciam os diferentes modelos de pilhas apresentados na aula naquelemomento, uma vez que na maioria dos livros didáticos de química, as pilhas são abordadas a

     partir de esquemas simplificados e há uma convergência maior para o modelo da pilha de Daniel,

    muitas vezes sem que haja uma preocupação em ampliar a discussão considerando a evoluçãotecnológica desses artefatos.

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    Por outro lado, percebemos que os alunos mostraram-se interessados em algunsmomentos, como, por exemplo, quando a professora falou sobre reações de pratele ira que podemocorrer nas pilhas. Naquele momento, os alunos, por um lado, associaram as idéias discutidas

     pela professora ao fato da descarga freqüente das baterias de celulares quando estas já estãoapresentando defeitos, e por outro, associaram a questão da descarga das pilhas quando ficam

    armazenadas por muito tempo sem serem usadas. O uso freqüente das pilhas e baterias pelosalunos pareceu possibilitar uma aproximação entre a discussão de aspectos tecnológicos das pilhas e baterias e suas experiências no cotidiano, e justificar o interesse percebido. Os alunosconheciam na prática o problema mencionado pela professora – o efeito de prateleira das pilhas –mas não sabiam a causa. O interesse por uma explicação científica para este problema parece terenvolvido mais os alunos neste momento da atividade. Apesar desses momentos, na maior partedo tempo durante a aula do momento 3, os alunos foram ouvintes. Este fato leva-nos a considerarque uma alternativa para um maior envolvimento dos alunos no tratamento dos aspectostecnológicos poderia ser uma visita a um contexto de produção de pilhas e baterias. Nessesentido, a apresentação dos aspectos tecnológicos por um técnico ou especialista poderia sermais significativo. Outro ponto a considerar seria que, nesses momentos, os alunos poderiam

    estar tendo contato pela primeira vez com este tipo de abordagem o que tornaria esta postura deescuta, uma postura ativa.

    A avaliação de aprendizagem dos alunos foi contínua em todas as atividades propostas.Como indicadores de aprendizagem consideramos a participação dos alunos nas discussões emtodos os momentos observando posicionamentos fundamentados quanto aos aspectos científicos,tecnológicos, sociais, éticos e políticos. Em termos mais específicos, consideramos paraavaliação de aprendizagem dos alunos as respostas às questões propostas na atividadeexperimental e no exercício de fixação (ponto de vista científico) e as respostas dos alunos aoquestionário 2 (momento 4) buscando evidências de evolução nas idéias prévias coletadasanteriormente (momento 2).

    A seqüência didática implicou em um aumento do tempo do planejamento didático usualno qual são vivenciadas em média seis aulas para abordagem do assunto de pilhas. Entretanto,estamos conscientes de que para criar consciência com responsabilidade social e política e

     proporcionar ferramentas intelectuais para o julgamento, avaliação, e tomada de decisão frente àsaplicações e implicações sociais do desenvolvimento científico e tecnológico (Silva, 2000), esseaumento do tempo do planejamento didático parece necessário.

    De modo geral, a maioria das atividades propostas para a seqüência didática parece teratingidos os objetivos, e nesse sentido, podemos considerar que do ponto de vista epistêmico aseqüência didática com uma abordagem CTS apresentou mais possibilidades que limitações.

    Análise da dimensão pedagógica na seqüência proposta

     Neste item, analisamos em que medida as atividades e intervenções desenvolvidas pela professora promoveram interações sociais na sala de aula e como tais interações seriamcaracterizadas no atendimento aos objetivos propostos para a seqüência didática proposta. Dessaforma, foram analisadas as possibilidades de que interações efetivas (que possam resultar em

     processos de significação dos conceitos estudados) entre alunos e alunos e professora fossemestabelecidas na seqüência proposta. E também foram identificados fatores limitantes para queessas interações possam ocorrer.

    Uma análise das atividades desenvolvidas na seqüência didática proposta nos mostra quemuitas delas foram relevantes para a construção de processos interativos. No transcorrer daseqüência didática percebemos que a maioria das atividades favoreceu ao desenvolvimento de

    interações sociais na sala de aula. No simpósio (momento 2) realizado para a apresentação das pesquisas feitas pelos alunos, eles expressaram suas idéias com propriedade.  A professora fez

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    questão de colocar anteriormente que o simpósio poderia ser visto como uma conversa informalsobre os resultados das pesquisas. A informalidade não interferiu a seriedade da apresentaçãodos grupos, pelo contrário, parece ter facilitado a discussão entre os grupos e a professora. Comoo objetivo neste momento era de caracterizar uma problemática socioambiental a partir dosresultados das pesquisas, a professora discutia as informações trazidas pelos alunos e tentava

     promover a participação da turma na discussão. A discussão caracterizou-se interativa edialógica, uma vez que diferentes pontos de vista foram considerados pela professora e pelosalunos. O debate (momento 2) também foi relevante para o entendimento dos alunos de que odescarte das pilhas e baterias representa uma problemática socioambiental. Após as discussões, a

     pergunta –  Existe um problema? – colocada pela professora para a turma parece ter fortalecidoainda mais tal entendimento. A questão provocativa da professora promoveu interações na salade aula. Dessa forma, o simpósio e o debate com a turma mostraram-se como atividadesrelevantes no sentido dos alunos perceberem a questão do descarte das pilhas e baterias no meioambiente como um problema socioambiental. A nosso ver, um fator que contribuiu para asinterações dialógicas ocorridas nas atividades mencionadas foi uma condição de discutibilidadedada aos alunos quando esses tiveram a oportunidade de pesquisar a temática sob diferentes

     pontos de vista.Outra atividade que favoreceu um processo interativo na sala de aula diz respeito à

    atividade experimental (momento 4). Um aspecto significativo no desenvolvimento da atividadeexperimental que possibilitou uma maior participação dos alunos foi a discussão promovida pela

     professora sobre os resultados da atividade experimental. Neste momento, mesmo com umdiscurso de interativo de autoridade (considerado unicamente o ponto de vista científico), a

     professora e alunos discutiam sobre dúvidas e justificativas científicas acerca de questõesenvolvidas na construção da pilha-batata.

    A exposição do vídeo seguida de discussão sobre as idéias principais apresentadas(momento 5) caracterizou outro momento interativo. Quando a professora levantou questões,como, por exemplo, quais as idéias apresentadas no vídeo? Os alunos puderam se expressar nasua maioria. Um aspecto observado foi o de que as diferentes opiniões apresentadas foramrespeitadas pelos alunos e pela professora caracterizando assim interações dialógicas. Adiscussão das diferentes idéias percebidas pelos alunos foi conduzindo para um entendimentomais consensual acerca da problemática socioambiental envolvida no descarte das pilhas e

     baterias.A atividade de leitura do texto e o fórum escolar (momento 6) foram atividades que

    abriram possibilidades para interações dialógicas, elaborações de idéias e para odesenvolvimento de atitudes frente à problemática abordada. A atividade de leitura do texto emgrupos – cada grupo ficou encarregado de ler um trecho do texto – e posterior socialização dasidéias expostas no mesmo fizeram com que a atividade não se tornasse cansativa. Muito pelocontrário, a dinâmica da leitura – pequenos grupos liam partes do texto e após a leitura, cadagrupo socializava o conteúdo de um determinado trecho com o grande grupo e assim, todostiveram acesso a todas as informações presentes no texto. Essa dinâmica de leitura possibilitouuma maior interação na turma. Alguns alunos questionavam suas dúvidas com o grande grupo

     Neste momento, o texto parece não representar uma voz da ciência, uma voz de autoridade, pordois motivos: primeiro porque trazia questões diversas – não apenas do ponto de vista científico

     – como contaminação por metais pesados, efeitos à saúde por alguns metais pesados, e procedimentos ecologicamente corretos para o descarte das pilhas, e segundo porque váriosaspectos do texto já tinham sido abordados em atividades anteriores, como, por exemplo, adiscussão sobre o vídeo.

    Considerando que a abordagem CTS pressupõe que os alunos se posicionem criticamente

    sobre as interações ciência-tecnologia-sociedade entendemos que as atividade do simpósio,debate geral (momento 2), levantamento de questões pela professora para a discussão sobre o

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    vídeo (momento 5) e a simulação de um fórum escolar (momento 6) tiveram comocaracterísticas instigar as opiniões e posicionamentos dos alunos frente a temática do descartedas pilhas e baterias no meio ambiente. As interações promovidas por esta abordagem foram

     predominantemente dialógicas com alguns momentos de interações de autoridade. Enfim, a perspectiva de se promover uma abordagem comunicativa interativa/dialógica (Mortimer e Scott,

    2002) durante as atividades da seqüência didática abriu diversas possibilidades para acompreensão pelos alunos acerca da problemática abordada. Nas atividades citadas, osquestionamentos feitos aos alunos bem como a consideração de suas respostas pela professora e

     por outros alunos propiciaram um maior envolvimento por parte dos mesmos nas atividades emsala de aula. A proposição a ser discutida no fórum – os produtos da ciência e da tecnologia

     sempre promovem o bem-estar da sociedade – direcionou as discussões no grande grupo e propiciou, a nosso ver, interações dialógicas durante toda a atividade.

    Quanto aos fatores limitantes para que as interações pudessem ocorrer efetivamente nasala de aula podemos apontar aspectos relativos à atividade proposta para a abordagem dosaspectos tecnológicos de algumas pilhas e baterias (momento 3). Neste momento, a exposição sedeu de forma predominantemente não-interativa/de autoridade (Mortimer e Scott, 2002) uma vez

    que a fala da professora predominou durante a maior parte da aula e os alunos não expressaramsuas idéias. O processo não interativo e de autoridade parece ser uma demanda de um processoespecífico da seqüência didática. Neste sentido, colocamos como questão até que ponto é

     possível fazer essa ponte entre o conhecimento tecnológico e o conhecimento escolar? Como promover interações quando os alunos não têm conhecimento sobre determinados aspectosenvolvidos na discussão? Uma condição para uma participação mais efetiva dos alunos sobre asquestões tecnológicas poderia ser a inclusão dos aspectos tecnológicos no momento 1 do

     planejamento, ou seja, incluir os aspectos tecnológicos nas pesquisas de forma que subsidie asdiscussões posteriores em sala de aula.  Outro aspecto que se constituiu como limitante noestabelecimento de processos interativos entre a professora e os alunos refere-se ao fato da

     professora em alguns momentos, não esperar as respostas dos alunos aos seus questionamentos.Uma das razões para esta postura parece ter relação com uma preocupação geral da professoraem concretizar de fato as atividades planejadas anteriormente para cada momento da seqüênciadidática. Tal postura parece ser característica de abordagens mais tradicionais de ensino e precisaser superada na aplicação de abordagens inovadoras no âmbito do ensino.

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    A análise do desenvolvimento da seqüência didática com abordagem CTS revelou mais possibilidades do que limitações no que se refere à dimensão epistêmica e à dimensão pedagógica. Do ponto de vista das possibilidades, podemos mencionar que a articulação dosconceitos químicos com o contexto tecnológico e social contribuiu para uma maior participaçãoe interesse dos alunos no desenvolvimento da seqüência didática. Partir de uma temática darealidade parece ter favorecido aos alunos uma melhor compreensão de fatores implicados na

     percepção da mesma como uma problemática sócia e ambiental. O desenvolvimento de processos interativos foi representativo de uma dinâmica de sala de aula não muito comum emabordagens de ensino mais tradicionais. Do ponto de vista das limitações, podemos apontar asdificuldades em propiciar uma atividade mais significativa para os alunos quando da abordagemdos aspectos tecnológicos envolvidos na produção das pilhas e baterias. Esse momento daseqüência didática pareceu ter sido um dos poucos em que a participação dos alunos foi limitada.Por mais que a professora tenha se preparado, a insegurança, a falta de experiência na abordagemde tais aspectos, e a falta de conhecimento dos alunos sobre algumas questões tecnológicas

     parecem ter favorecido para a construção de um discurso não-interativo/de autoridade nestemomento.

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    Ampliando o nosso foco de análise para aspectos estruturais, podemos apontar que do ponto de vista da organização e estrutura da escola nenhum fato se revelou como limitação.Quanto aos aspectos organizacionais, a maioria dos alunos freqüentou todos os momentos daseqüência didática. A professora fazia a chamada em todos os encontros. Em média, a cadaencontro o número de alunos faltosos não passava de quatro alunos em um total de 42. Esse

    controle mais explícito da participação da maioria dos alunos em todas as atividades parece tercontribuído de certa forma para os resultados alcançados no desenvolvimento da respectivaseqüência didática. Quanto aos aspectos estruturais, todos os ambientes necessários paraaplicação da seqüência didática, tais como, a sala de aula, o laboratório, e o auditório estavam

     perfeitamente aptos no acolhimento da professora e de seus alunos no processo de construção designificados em uma abordagem CTS. Enfim, podemos concluir que a seqüência didática

     proposta na perspectiva CTS contribuiu tanto na aproximação do conhecimento científico aomundo real dos alunos como na construção de processos interativos na sala de aula de química.

    REFERÊNCIAS

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