13
REAÇÕES DE PRECIPITAÇÃO E EQUÍLIBRIO DE SOLUBILIDADE A dissolução é um fenômeno importante no qual uma ou mais substâncias, os solutos, se misturam de forma homogênea com uma outra substância, o solvente. Embora também existam soluções sólidas, as soluções mais comuns envolvem um solvente líquido. Todos os dias dissolvemos substâncias em água, por exemplo, tal como o sal de cozinha ou o açúcar. Para cada conjunto de condições existe uma quantidade limite de uma dada substância que se consegue dissolver num determinado solvente, e que se designa por solubilidade dessa substância nesse solvente. Por exemplo, à temperatura de 25°C, conseguem-se dissolver cerca de 36 gramas de cloreto de sódio (o sal de cozinha) em 100 ml de água, sendo, portanto de 36 g / 100 ml a solubilidade do cloreto de sódio em água. Se adicionar mais sólido à solução este não se irá dissolver, permanecendo o soluto dissolvido em equilíbrio com o respectivo sólido que está em contacto com a solução. Tendo em conta a quantidade de soluto dissolvido num determinado solvente e a solubilidade deste, as soluções podem apresentar-se: a) Solução Saturada – contém a quantidade máxima de soluto que pode ser dissolvido em equilíbrio com o soluto 1

Analítica - Solubilidade e precipitação 1

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Analítica - Solubilidade e precipitação 1

REAÇÕES DE PRECIPITAÇÃO E EQUÍLIBRIO DE SOLUBILIDADE

A dissolução é um fenômeno importante no qual uma ou mais

substâncias, os solutos, se misturam de forma homogênea com uma outra

substância, o solvente.

Embora também existam soluções sólidas, as soluções mais comuns

envolvem um solvente líquido. Todos os dias dissolvemos substâncias em

água, por exemplo, tal como o sal de cozinha ou o açúcar.

Para cada conjunto de condições existe uma quantidade limite de uma

dada substância que se consegue dissolver num determinado solvente, e

que se designa por solubilidade dessa substância nesse solvente. Por

exemplo, à temperatura de 25°C, conseguem-se dissolver cerca de 36

gramas de cloreto de sódio (o sal de cozinha) em 100 ml de água, sendo,

portanto de 36 g / 100 ml a solubilidade do cloreto de sódio em água.  Se

adicionar mais sólido à solução este não se irá dissolver, permanecendo o

soluto dissolvido em equilíbrio com o respectivo sólido que está em contacto

com a solução.

Tendo em conta a quantidade de soluto dissolvido num determinado

solvente e a solubilidade deste, as soluções podem apresentar-se:

a) Solução Saturada – contém a quantidade máxima de soluto que pode ser

dissolvido em equilíbrio com o soluto não dissolvido (ou seja, se a

quantidade de soluto em solução for igual à solubilidade desse soluto).

b) Solução não saturada ou Insaturada – contém uma quantidade de

soluto dissolvido menor do que a solução saturada (ou seja, quando a

quantidade de soluto na solução é inferior à sua solubilidade).

c) Solução supersaturada – contém uma quantidade de soluto dissolvida

maior do que na solução saturada, sob condições experimentais análogas

(ou seja, soluções em que a concentração de soluto em solução é superior à

sua solubilidade).

1

Page 2: Analítica - Solubilidade e precipitação 1

Uma solução supersaturada é instável. Se um pequeno cristal do soluto

é adicionado, o soluto excedente cristaliza-se sobre esse cristal (chamado

gérmen da cristalização) até atingir a concentração da solução saturada.

Quando um soluto se dissolve num solvente, as moléculas do solvente

formam estruturas em torno das moléculas de soluto, num processo

designado por solvatação.

No caso de substâncias iônicas que se dissolvem em solventes como a

água, o processo de dissolução implica a separação dos respectivos íons

constituintes, os quais irão ser solvatados pela água. Nestes casos, o

equilíbrio que se estabelece entre o sólido e o composto dissolvido depende

das concentrações em solução de todos os íons que constituem o sal.

Substâncias solúveis, parcialmente solúveis e insolúveis

Solúveis → quando em 1 L de solução se consegue dissolver pelo

menos 0,1 mol de soluto.

Insolúveis → quando a concentração máxima que se pode obter na

sua solução é menor do que 0,01 mol/L.

Parcialmente solúveis → quando se obtém no máximo soluções

0,1 mol/L e no mínimo soluções 0,01 mol/L.

SOLUBILIDADE DOS PRECIPITADOS

Um grande número de reações utilizadas em análise qualitativa

inorgânica envolve a formação de precipitados. Um precipitado é uma

substância que se separa de uma solução, formando uma fase sólida. O

precipitado pode ser cristalino ou coloidal e pode ser removido da solução

por filtração ou centrifugação. Forma-se um precipitado, quando a solução se

torna supersaturada com uma substância em particular. A solubilidade (S) de

um precipitado é, por definição, igual à concentração molar da solução

saturada. A solubilidade depende de várias circunstâncias, tais como:

2

Page 3: Analítica - Solubilidade e precipitação 1

temperatura, pressão, concentração de outros materiais na solução e da

composição do solvente.

A variação da solubilidade com a pressão tem, na prática, uma

importância reduzida em análise qualitativa inorgânica, visto que todas as

operações são conduzidas em recipientes abertos a uma pressão

atmosférica; ligeiras variações da pressão não apresentam influência

apreciável na solubilidade. De maior importância é a variação da solubilidade

de acordo com a temperatura. De modo geral, pode-se dizer que a

solubilidade dos precipitados aumenta com a temperatura, a não ser em

casos especiais (como o sulfato de cálcio), onde ocorre o oposto. A taxa do

aumento da solubilidade com a temperatura é variável, desprezível em

alguns casos e considerável em outros. A variação da solubilidade com a

temperatura pode, em alguns casos, servir como base de separação. A

separação de íons chumbo dos íons prata e mercúrio (I) pode ser realizada,

por exemplo, pela precipitação dos três íons sob forma de cloretos,

seguindo-se o tratamento da mistura com água quente. O cloreto de chumbo

será dissolvido, enquanto os cloretos de prata e de mercúrio (I) permanecem

praticamente insolúveis. Após a filtração da solução quente, os íons chumbo

passarão para o filtrado onde poderão ser identificados por meio de reações

características.

A variação da solubilidade com a composição do solvente apresenta

alguma importância em análise química qualitativa inorgânica. Embora a

maioria dos ensaios seja conduzida em meios aquosos, em alguns casos é

preferível usar outros solventes (como álcool, éter etc.). A separação dos

metais alcalinos, por exemplo, pode ser realizada por extração seletiva de

seus sais com vários solventes. Em outros casos, o reagente usado no

ensaio é dissolvido em um solvente não aquoso e a adição do reagente à

solução de teste, na realidade, muda a composição do meio.

A solubilidade depende também da natureza e concentração de outras

substâncias, principalmente de íons, na mistura. Há uma diferença

3

Page 4: Analítica - Solubilidade e precipitação 1

acentuada entre o efeito dos denominados íons comuns e o de íons

estranhos.

Denomina-se íon comum aquele que também participa da constituição

do precipitado. No caso do cloreto de prata, por exemplo, tanto os íons prata

como os íons cloreto são íons comuns; porém, qualquer outro que se

apresente será estranho. Pode ser dito, de um modo geral, que a

solubilidade de um precipitado diminui consideravelmente se um dos íons

comuns estiver presente em excesso, se bem que este efeito possa ser

contrabalançado pela formação de um complexo solúvel com o excesso do

íon comum. A solubilidade do cianeto de prata, por exemplo, pode ser

suprimida pela adição de um excesso de íons prata à solução. Se, por outro

lado, adicionarmos um excesso de íon cianeto, primeiro haverá um ligeiro

decréscimo na solubilidade, porém, quando adicionarmos grandes

quantidades de cianeto, o precipitado dissolver-se-á completamente, dando

origem à formação do complexo dicianoargentato [Ag(CN)2]. Na presença de

um íon estranho, aumenta a solubilidade do precipitado, mas este aumento é

geralmente muito pequeno, a menos que ocorra uma reação química (como

a formação de um complexo ou uma reação ácido-base) entre o precipitado

e o íon estranho, quando então o aumento da solubilidade é mais

pronunciado.

PRODUTO DE SOLUBILIDADE

A solução saturada de um sal, que ainda contém um excesso de

substância não dissolvida, é um sistema em equilíbrio, ao qual pode ser

aplicada a lei da ação das massas. Se, por exemplo, um precipitado de

cloreto de prata está em equilíbrio com sua solução saturada, pode-se

estabelecer o seguinte equilíbrio:

AgCl Ag+ +Cl–

É um equilíbrio heterogêneo, visto que o AgCl está na fase sólida,

enquanto os íons Ag+ e Cl– estão na fase dissolvida. Pode-se escrever a

constante de equilíbrio:

4

Page 5: Analítica - Solubilidade e precipitação 1

A concentração do cloreto de prata na fase sólida é invariável e,

portanto, pode ser incluída numa nova constante Kps, denominada produto

de solubilidade:

Kps = [Ag+].[Cl–]

Assim, numa solução saturada de cloreto de prata, a uma temperatura

e pressão constantes, o produto da concentração dos íons prata e cloreto é

constante.

O que foi dito para o cloreto de prata pode ser generalizado. Para a

solução saturada de um eletrólito AaBb que se ioniza, formando os íons aAm+

e bBn-

AaBb aAm+ + bBn-

o produto de solubilidade (Kps ) pode ser expresso por:

Kps = [Am+]a.[ Bn-]b

Assim, pode-se afirmar que, numa solução saturada de um eletrólito

fracamente solúvel, o produto das concentrações de seus íons constituintes

é constante para qualquer temperatura dada, sendo a concentração de cada

íon elevada a uma potência igual aos respectivos númer os de íons de cada

espécie produzida pela dissociação de uma molécula do eletrólito. Esse

princípio foi, pela primeira vez, estabelecido por W. Nernst em 1889.

As concentrações dos íons na expressão do produto de solubilidade

são expressas em mol L-1. A unidade de Kps é, portanto, (mol L-1)a+b.

Por exemplo, para o caso do sulfato de alumínio sólido (Al2(SO4)3) em

contato com uma solução saturada de sulfato de alumínio (Al2(SO4)3

(dissociado em íons Al3+ e SO42-), o equilíbrio é traduzido por

Al2(SO4)3(s) → 2Al3+(aq) + 3SO4

2-(aq)

O Kps é expresso, no caso deste sal, pelo produto das concentrações

molares de equilíbrio dos íons cada qual elevada aos respectivos

coeficientes estequiométricos:

5

Page 6: Analítica - Solubilidade e precipitação 1

Kps=[Al3+]eq2.[SO4

2-]eq3

A relação do produto de solubilidade esclarece o fato da considerável

diminuição de solubilidade de uma substância ao se adicionar um reagente

contendo um íon comum com a substância. De vez que a concentração do

íon comum é alta, a do outro íon deve tornar-se baixa na solução saturada

da substância; assim, o excesso da substância será precipitado. Se,

portanto, for preciso remover por precipitação um íon, será necessário

adicionar um excesso de reagente. Um excesso muito grande ocasionará

mais danos que benefícios, visto que poderá aumentar a solubilidade do

precipitado pela formação de complexos.

O efeito de íons estranhos na solubilidade de precipitados é

exatamente o oposto; a solubilidade aumenta ligeiramente na presença dos

mesmos.

Para esclarecer o efeito de íons estranhos na solubilidade de

precipitados, deve-se ter em mente que a relação do produto de solubilidade,

no sentido mais estrito, deve ser expressa em termos de atividades. Para a

solução saturada do eletrólito AaBb que se ioniza, formando os íons aAm+ e

bBn-

AaBb aAm+ + bBn-

o produto de solubilidade (Kps ) pode ser expresso como:

Os coeficientes de atividade dependem, no entanto, da

concentração de todos os íons (íons comuns e estranhos) na solução.

Quanto mais alta for a concentração total de íons na solução, mais alta será

a força iônica e, conseqüentemente, menores serão os coeficientes de

atividade. Como o produto de solubilidade deve permanecer constante, as

concentrações [Am+] e [Bn-] devem aumentar para contrabalançar o

decréscimo dos coeficientes de atividade; daí o aumento da solubilidade.

Exemplo 1. Uma solução saturada de cloreto de prata contém 0,0015 g

de substância dissolvida por litro. Calcular o produto de solubilidade.

6

Page 7: Analítica - Solubilidade e precipitação 1

A massa molecular relativa de AgCl é 143,3. A solubilidade (S) é,

portanto:

Na solução saturada, a dissociação é completa:

AgCl Ag+ +Cl–

Assim, 1 mol de AgC1 produz 1 mol de Ag+ e 1 mol de Cl–. Portanto:

[Ag+] = 1,045 x 10-5 mol/L

[Cl–] = 1,045 x 10-5 mol/L

e

Kps = [Ag+].[Cl–] = 1,045 x 10-5 x1,045 x 10-5 = 1,1 x 10-10 (mol/L)2

Exemplo 2. Calcule o produto de solubilidade do cromato de prata,

sabendo que 1 litro da solução saturada contém 3,57 x 10-2 g de material

dissolvido.

A massa molecular relativa do Ag2CrO4 é 331,7; portanto, a

solubilidade é:

A dissociação Ag2CrO4 2Ag+ + CrO42– é completa; 1 mol de

Ag2CrO4 produz dois mol de Ag+ e 1 mol de CrO42– , Assim, a concentração

de cada íon é a seguinte:

[Ag+] = 2S = 2,152 x 10-4

[CrO42– ] = S = 1,076 x 10-4

O produto de solubilidade

Kps = [Ag+]2 x [CrO42– ] = (2,152 x 10-4)2 x 1,076 x 10-4 =

Kps = 5,0 x 10-12 (mol/L)3

Previsão das Reações de precipitação

Quando se misturam duas soluções podem, ou não, formarem-se

precipitados. De forma a prever a formação, ou não, destes, recorre-se ao

7

Page 8: Analítica - Solubilidade e precipitação 1

cálculo de um quociente, denominado Quociente de Reação (Q) ou Produto

Iônico da Reação (PI), que envolve o produto das concentrações dos íons

envolvidos elevados aos respectivos coeficientes estequiométricos, de forma

semelhante à que se utiliza para calcular o Produto de Solubilidade (note-se

que o Produto de Solubilidade corresponde ao Produto Iônico da Reação

quando a solução está saturada, ou seja, quando as concentrações dos íons

correspondem às suas concentrações de equilíbrio); compara-se o valor de

PI com o do Kps. Assim, podem ocorrer três casos distintos:

Se PI < Kps a solução não está saturada, logo não haverá precipitação.

Se PI = Kps a solução está saturada, não ocorre precipitação.

Se PI > Kps a solução está supersaturada e ocorre precipitação.

Quando da determinação do valor de PI é preciso ter em conta que, ao

juntar duas soluções, o volume disponível para cada eletrólito se altera.

Sendo assim é necessário calcular as novas concentrações dos íons

intervenientes. Normalmente, para este cálculo, considera-se que os

volumes são aditivos.

Outro fator a ser levado em conta é a temperatura a que as soluções

se encontram; se esta não for conhecida considera-se que ambas as

soluções estavam, inicialmente, à mesma temperatura, e que esta se

mantém após a mistura.

Exemplo 3: Haverá formação de precipitado se 200 mL de solução

10-2 mol/L de Pb(NO3)2 são misturados com 300 mL de solução 8 x 10-2 mol/L

de HCl? Dado Kps PbCl2 = 1,7 x 10-5 (mol/L)3

Efeito do íon comum na precipitação

“A solubilidade de um sal pouco solúvel é maior em água pura ou em

uma solução de um sal que contenha um íon comum?”

8

Page 9: Analítica - Solubilidade e precipitação 1

Exemplo: Solubilidade do MnCO3 em soluções de Na2CO3 nas

seguintes concentrações:

SMnCO3 em Na2CO3 10-4 mol/L = 8,8 x 10-7 mol/L

SMnCO3 em Na2CO3 10-3 mol/L = 8,8 x 10-8 mol/L

SMnCO3 em Na2CO3 10-2 mol/L = 8,8 x 10-9 mol/L

Conclusão:

A solubilidade de um sal pouco solúvel é maior em água pura do que

em uma solução que contém um íon comum.

Quanto maior a concentração do sal que contém o íon comum, menor

será a solubilidade do sal.

Concentração de íons necessária para precipitação

Uma situação muito comum nos equilíbrios de solubilidade, consiste

em: conhecendo-se a concentração de um dado íon constituinte de um sal

pouco solúvel, saber a concentração do outro íon necessária para que ocorra

precipitação do sal.

Aplicação:

Exemplo 4: Qual a concentração mínima de I- que pode provocar a

precipitação do PbCI2 numa solução 0,050 M em Pb(NO3)2? O Kps do PbI2 é

8,7x10-9. Que concentração de íons Pb2+ há em solução quando a

concnetração do I- é 0,0015 M?

(VER EXERCÍCIO RESOLVIDO NO CADERNO)

9