64

ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro

Embed Size (px)

Citation preview

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 1/64

ROSAN E DE AN DRADE

FOTOGRAFIA E ANTROPOLOGIA

olh ar es fora -deI-tiro

ecJu~ .::FAPESPEstccco liberdade

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 2/64

Copyright © Rosane de Andrade, 2002

© Fundacao Pi er re Verge r, Pave l Fr ic & Yvonna Fricova, Claudia Andujar , Magnum Photos,

Al exander Lavr ientiev, Museum of Modern Art (MoMA/New York) , J ean -Loup Piv in e

Rosane de Andrade, para as fotografias. Todos os direitos reservados

Preparacdo de texto Tereza Lourenco

Diagramacdo e composicdo Pedro Barros / Estacao Liberdade

Capa e scans de imagens Wildiney Di Masi / Es tacao Liberdade

Coordenacdo editorial Angel Bojadsen e Edi lberto Fernando Verza

Dados Internacionais de Catalogacao na Publicacao (CIP)

Andr ade, Rosane de

Fotogra fia e antr opologia : o lhare s fo ra -dent ro /

Rosane de Andrade. - Sao Paulo: Estacao Liberdade ;

EDUC, 2002.

Apoio: FAPESP,

Bibliografia.

ISBN 85-7448-067-3 (Estacao Liberdade)

ISBN 85-283-0290-3 (EDUC)

1. Fotografia em ant ropologia 2. Mitologia afr icana

3. Verger, Pierre 1. Titulo.

02-6064 CDD-301

Indices para catalogo sistematico:

1. Antropologia e fotografia 301

2, Fotografia em antropologia 301

Todos os direi tos des ta edicdo reseruados

Editora Estacao Liberdadc Ltda

Rua Dona Eli sa , 116 01155-030 S;IO Pau lo - 51'

Tel. : (] 1) 3661-2881 Fax: (] 1) 3825-4239

e-mail: [email protected]

http.z'/www.estacaoliberdade.coIn.br

EDl,C - Editora da pec-sp

RuaMinistro Godoi, 1213

05015-001 Sao Pau lo - S l?

Tel. ( I]) 3873-3359 Fax: (I I) 3873-6133

e-mail: educ@puCSp,coIll,br

SUMARIO

Pref6cio 15

Apresentocco 17

o OBSERVADOR SELVAGEM 25

lntroducco

1 A M AQ UIN A D E R OU BA R A LM AS 33

F oto gr afia : a h is to ric r eb eld e d o a rt e 34

A m agia d o im agem 47

o o lh ar o n tr op ol cq ic o n o f ot og ra fia 52

l .c dr ce s d e a lm a 56

2 A V ISUAL ID ADE NA ANTROPOLOG IA 65

o p e rc ur so d o a nt ro po lo gi a v is ua l 66

R e pe ns an do a i ma gem 71

3 D E P IE RR EE DO U AR D L EO PO LD V ER G ER A

P IERREFATUMB IVERGER OJUOBA 75

Verger , 0 Iotoqrofo 76

Fatumbi , Q re na sc id o d e If6 83

O ju obc, os olhos do re i 86

P ie r re F a tumb i V e rg e r O j uo b 6 92

4 OLHARES FORA -DENTRO 11 3

Bibliografia 12 3

Cred it os fo tog r6 fi cos 13 1

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 3/64

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 4/64

AGRADECIMENTOS

Aos retratos da minha vida. Especialmente a minha mac,

pela sua disposicao para a vida. Aos novos e velhos amigos,

amores, loucos, chatos , artis tas, cient is tas, incul tos , sabios,

mestres e sacerdotes. Pessoas comuns, como fotografias

muito bem cuidadas, que permanecern e alimentam minha

historia e meu sonho de olhar para um mundo livre, justo e

mais humano.

Especialmente ,\ pessoa de CarmenJunqueira, que e comoo movimento da vida, generosa. Fornece sinais, alimenta

nossas fantasias com historias, mitos e lcndas dos pajes e

feiticeiros: cuidado ao ver 0 espirito do pavu, e sinal de

morte, e 0 ciume e um castigo que um pequeno passaro

deixou em nossos coracoes. Mas com golpes precisos de

mestre, ela nos estabelece limites, norrnas, enos enquadra

na comunidade. Carmen e ternperanca e pajelanca

R. deA.

A Editora Estacao Liberdade agradece a Pavel Fric e Yvonna Fricova, que

nos perrniti rarn gent ilmente a reproducao das fotografias de Guido Boggiani

contidas no livro de sua autoria Guido Boggiani: Photographer, Praga, Titanic,

1997, ISBN 85-85909-25-1.

As fotos de Pierre Verger incluidas nesta obra sao ongmanas dos livros

Orixas, LeMessager Photographies 1932-1962; Notas sobre 0culto aos orixas

e ioduns, sendo que todas tern copyright da Fundacao Pierre Verger, Salvador,

Bahia (www.pierreverger.org.br), e foram reproduzidas por acordo com a

rnesma, que se reserva todos os direitos.

Os Editores

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 5/64

o FOTOGRAFO

Dificil fotografar 0silencio.

Entretanto tentei. Eu conto:

Madrugada a minha aldeia estava morta.

Nao se ouvia um barulho, ninguern passava entre as casas.

Eu estava saindo de uma Festa.

Erarn quase quatro ciamanha

Ia 0Silencio pela rua carregando um bebado.

Preparei minha maquina.

o silencio era um carregador?

Estava carreganclo 0bebado.Fotografei esse carregador.

Tive outras visoes naquela maclrugacla.

Preparei minha maquina de novo.

Tinha um perfume de jasmim no beiral de urn sobrado.

Fotografei 0perfume.

Vi uma lesma pregada na existencia mais do que na pedra.

Fotografei a existencia deb.

Vi ainda um azul-perdao no olho de um mendigo.

Fotografei 0perdao.

Olhei uma paisage:n velha a desabar sobre uma casa.

Fotografei 0sobre.

Foi dificil fotografar 0sobre.

Por fim eu enxerguei a Nuvem de calca.

Representou para mim que ela andava na aldeia de braces com

Maiakovski - seu criador.

Fotografei a Nuvem de calca e 0poeta.

Ninguem outro poeta no munclo faria uma roupa mais justa para

cobrir a sua noiva.

A foto saiu legal.

Manoel de Barros, 2000

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 6/64

PREFAclO

Quando nos Iancarnos na aventura de conhecer urna outra cultura,

nao podernos abrir mao das tradicoes antropologicas; elas nos dao dica s

importantes no caminho a seguir, mas e preciso ter cuidado para na o

transforrnar esse caminho em uma visao univoca.

Eu venho de uma geracao em que os grandes classicos cia antropolo-

gia deveriam ser aparatos essen cia i s em nossas pesquisas c, par muitas

vezes, em conversas longas e prazerosas com 0 amigo Darcy Ribeiro,

que ja havia escrito sobre os indios Kadiweu, discutiarnos se seria essa

a forma ideal para captar uma cultura. E lembro-me bem da sua Frase:"E preciso pensar se tanto aparato nao seria como colher um pe de

alface com um trator."

Nesse sentido a proposta de Rosane de unir 0olhar fotografico ao

olhar antropologico vem como uma lufada de vento no campo da antro-

pologia; nao como uma contribuicao teorica, mas como uma incitaca o

metodologica despertando-nos para uma reflexao. Como nos, ant rop6-

logos, olhamos 0outro? Fotografamos como olhamos?

Rosane nos diz, sem dizer diretamente, que fotografamos como vc-

mos, satisfazendo as teorias, e nao interessados realmente em nossos

povos, ambientes c classes. Ela nos explica:

- Olha, voce fotografa do jeito que voce velPorern, como e esse olhar para 0 outro? Com atencao? Com uma

cornunicacao ampla e dernocratica?

Observando 0desenvolvimento do seu trabalho, percebi que Rosane

descobriu que e possivel pensar a antropologia como uma comunhao de

tecnicas , visoes e expericncias possibi li tando-nos senti r 0imaginario do

artista, mas tambern 0imaginar io que nos fornece espaco e os parametros

na busca do conhecimento e da criacao.

Essa lufada de vento vem como uma advertencia nao so para os

antropologos, mas para todos nos que vivemos, vemos e ainda nao sa-

bemos como olhar para as mudancas, a diversidade de culturas, as desi-

15

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 7/64

FOTOG IW 'I A EANTROPO lOGI A

gualdades e as preconceitos. Rosane nos cobra sirn esse olhar, 0olhar

om cuidado, a olhar atento percebendo-se no outro, C0l110 a foto de

sua autoria nde ela se vE:no olho do cavalo. Ou entao quando ela se ve

na pessoa de Dona da Luz, que de mansinho revela as pequenos (CSOU-

ros e segreclos que enfeitam e m<UC,,1 m 0 pedaco de sel l rnundo. Irnagens

e simbolos carregudos de certezas, rernores e sonhos estao ali, cada qual

reinando soberan no proprio espaco, e apesar da profusao de coisas,

tudo parece necessario para compor 0dia-a-dia cia existencia.

A medida que as paginas sao folheadas, ocorre a metarnorfose, aquela

senhora fixa 0olhar em n6s, deixa cair os cabelos sobre os om bros e

comeca a se desdobrar, Numa danca de olhares desfllam a velha dona

de casa, a rnisteriosa bruxa a rnulher altiva, a coquete. : E como se lim

sopro magico transformasse mae em rnulher, serenidade em seducao.

E uma aventura fuscinanre olhar pelos olhos de Rosane e ser levada

pelas ondas de espanto e reverencia dlante do belo.

Agora sua rarefa como antropologa e , corn a rnesma intensidade de

suns fotografias, descobrir pesquisar Urn carninho de uniao desses OU1<l-

res, onde nos, assim como 0outre, nilo sejarnos:

"Urn pi! de alface arrancado por urn trator,"

Prof'Dr" Carmen funqueira

Al1u'op61og~ - PonLifki:! Unlversidade C:116Lic:1 de Sao Paulo

APRESENTAC;Ao

R o so n e de A n d r o de , C ov o lo , R ib e ir6 0 P ire" 1 99 9

A v id a, c om o a s im ag en s, n ao p ed e d in em ic a f am ili ar n er n d is po sic oe s g en eti ca s.

A v id a se m ostra com o im ag em an tes m esm o d e h aver urn a h isturia d e vid a. E la

p ed e p ri m e ; r am en te .p a r a s er vi sta, M es mo s e c ad a i mag em es tiv er d e fato p ren h e

d e s ig nif ic ad o5 e s uj eit a a u ma a na li se r ni nu cio sa . s e p ula rm os p ara 0 significado

s em a pr ec ia r a i ma gem, t er em os p er di do u rn p ra ze r q ue n ao p o d e s er r ec up er ad o n em

pe la meLhor d a s i n te rp r et ac ce s . I er er n os t ar n hem t ir ad e 0 p r az e r d a v i da que e s ta rn o s

c on tem p L an do . A e xi bi ~a o d e s ua h el ez a t or na -s a ir el ev a n t e p a ra s e u s ig n if ic a do .

Hil lman. 1997, p. 47

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 8/64

F O TO G RA F IA E A N TR O PO L OG IA

Discutir as diferencas e as relacoes entre arte e ciencia e uma tarcfa

difici l, mas a tentat iva de precisa-las parece-me desafiante e necessaria

no ambito social e antropologico. Para desenvolver essa relacao, optei

por unir a minha experiencia como fotografa com a vontade de funda-

mentar 0meu trabalho na antropologia. Percebi, entao, como as ima-

gens fotograficas contribuem e podem contribuir ainda mais para as

pesquisas etnograficas, se aprendermos a olhar e a observar com cuidado

as coisas do mundo. Ate entao, eram apenas as minhas imagens que eu

colocava em exposicao. 0 mundo acadernico era tao distante de mim

como a arte da ciencia, Mas serao tao distantes assim?

Ha vinte anos fotografo as diferencas do dia-a-dia, artistas e cientistas,

cidade e campo, pregos e plantas . Muito mais do que isso, 0exercicio de

fotografar ensinou-me a contemplar as coisas do mundo, a reparar no mo-

vimento da natureza e na natureza dos movimentos. Aprendi a observar as

pequenas coisas dentro cleum universo, os detalhes dentro ciaglobalidade.

Escolhi a antropologia, a fotografia e a desafiante tarefa de discutir

sobre antropologia visual. Tarefa dificil, pois as imagens "dialogarn' ' com

a realidade e com a representacao dessa realidade - as imagens tam-

bern sao observacoes esteticas e documentais da real idade. Ate que pon-

to a ciencia nao nasce dessa cornunhao? Como nao discutir sobre as

imagens nas ciencias sociais? Se a propria fotografia sobrevive, na sua

historia, do social, entao por que nao aperfeicoa-la no ambito das pes-

quisas etnograficas? Tarefa dificil , po is nao existe uma bibl iografia de

facil acesso na antropologia , tampouco a linguagem visual e legit imada

integralmente como conhecimento cientifico. Mas como viver sem ela?

Como nao discutir sobre ela?

Na verdade, rnais do que simplesmente questionar a visualidade na

antropologia , meu objet ivo e dissertar sobre a maneira como essas irna-

gens podern ser elaboraclas e analisadas posteriormente. E mais: como a

fotografia e a etnografia podem contribuir entre si; como os processos

de observacao da ciencia e da arte podem completar-se e nao atri tar-se.

E ainda mais: como essas mesmas imagens carregam significados trans-

parentes de ernocao, afetividade e religiosidade.

Foram precisos alguns anos para que eu entendesse os olhares cruza-

dos entre a fotografia e a antropologia. Meu processo de percepcao ao

fotografar assemelha-se ao observador na antropologia - olhar arnplo e

pequeno. Perceber 0outro, as diferencas do outro e registra-las, isso sern-

pre foi para mirn uma tarefa da fotografia . 0 antropologo e urn fotografo

que escreve aquilo que ve - e muito pouco fotografa. E a pergunta de

APRESENTAc ; Ao

Etienne Samain (987)' vem complementar a reflexao: "0 antrop6logo

nao pode esc rever com a imagem sobre 0assunto de sua disser tacao ou

tese de doutorado?"

Como dissertar sobre a fotografia , as Ciencias Sociais e os sentidos?

o homern e naturalmente rel igioso, como afirrna Mircea Eliade (996).

o homern carrega crencas, mitos, s imbolos que absorve de sua cultura e

de sua sociedade. E ele necessita encontrar um meio de expressar essa

religiosidade no tempo e no espaco. Sera que a linguagem visual tem a

autonomia de registrar e, ainda, de transrnitir as ernocoes de urn povo,

uma tr ibo ou uma pessoa? Como captar essas imagens, as imagens sagra-

das, no tempo e no espaco do outro? Retratar, fazer retratos, como fazia

Nadar, como faz Cartier-Bresson, como fez Pierre Verger: formas de con-

tribuir na dernonstracao de uma pesquisa. Um antropologo experimenta

da arte, cia religiao e da magia.

Escolhi, em rninha analise, Verger - Fatumbi e Ojuoba. Escolhi Pierre

Fatumbi Verger Ojuoba, exemplo da possibilidade de unir 0 artista, 0

etn6grafo e 0 religioso - sentimentos expressos nas imagens e tarnbem

nos seus textos. Escolhi Verger, po is seu trabalho representa um pouco

das minhas bus cas pessoais , religiosas e estet icas. Em suas fotografias,

podemos enxergar a delicadeza e a sutileza da luz envolvendo todos os

elementos enquadrados em plena harmonia. Essas imagens vern carre-

gadas, sobretudo, de urn sentimento de cumplicidade com 0objeto foto-

grafado: olhos que mergulham na magia do presente; olhos que

mergulharam em mitos, sonhos, lendas da religiao afro-brasileira.

Escolhi Verger principalmente porque de nos da a possibilidade de

compreender e reconhecer a nossa cultura, as nossas origens, e de en-

tender um POLCO rnelhor a cliversidade em nosso pais. Verger nos faz

viajar nas suas irnagens pelo nosso proprio mundo. Com auxilio de olhos

de estrangeiro, ele nos leva aver 0 diferente e, no diferente, a ernocao

de ser diferente; a viajar em nossa propria cultura e a conhecer um

pouco de nos mesmos. eis a funcao de um etnografo, urn pesquisador,

um investigador e um artista .

l. Etienne Samain: antrop6logo, professor do Departamento de Multimeios do Insti tuto de

Artes da Universidade Estadual de Campinas (Unicarnp).

2. Existem alguns nucleos em universidades de Ciencias Sociais que estao cmpenhados em

estudos e usos de iconograf ias, fotografias, f ilmes e videos como terna, como fontc do-

cumental na antropologia. Ha, por exernplo, 0Nucleo Audiovisual de Documentacao do

Laborat6rio de Pesquisa Social (Navedoc) da UFRJ.Cada grupo de imagens liga-se a regis-

tros pontuais, ensaios fotogriificos e a projetos de pesquisa que utilizarn a fotografia como

urn insrrumento ou terna de investigacao (Galano, 2000).

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 9/64

FO TOG I IA F IA E AN TRO PO lO G IA

Urn questionarnenro ciavisualidade na antropologia - aliada a lim a

vtsao estetica no momenta de elaboracao de suas imagens e, rnais do

que isso, a maneira de olhar essa realidade - pode transcender 0signi-

ficado comum, tornando-se algo alern cia cultura de uma sociedade, dos

costumes de umatribo, de lima cidade, de umapessoa. Um antropologo

pode escrever visualrnenre sobre a alma; urn anrropologo pocle escrever

sobre e com as irnagens.

Asfotos selecionadas para compor este trabalho sao imagens de pes-

soas que aliararn 0ate de fazer fotografias com 0saber ciaantropologia.

Os crirerios de escolha foram os J11eSmOSue aprendi ao forografar Dona

da Luz da Paz, como ela diz que se chama, nurna experiencia que foi

para rnim mais do que urn registro Essa pessoa tinha e tern urna aura

que eu queria conhecer, tinha urn olhar que estava alern daquUo que

aparentava ser. Eu queria ve-la rnais profundarnente, saber 0 que eJa

pensava e como era a seu mundo. Ela era e e urn universo, que nem as

palavras nem as imagens podem narrar,

Sobre Dona ciaLuz, registre-se que ela instirulu em Curitiba a "Dia de

bencao dos anirnais", quando passaros, gatos, cavalos, leoes e elefantes

(qu 0dono do circa teve de levar a prar;a cia cldade, diante da intirnacao

de Dona da Luz), todos juntos sao abencoados por um padre nas pracas

publicas. Acreclita em Allan Kardec, jesus Cristo e Iemanja. Imagine 0

quanto perdemos quando nao utilizamos todas as possibilidades, a pala-

vra, a imagem e as sentidos para captar 'a!guem assirnl Urn processo

lento, com cornpreensao e paixao par lima pessoa tao ram e delicada,

foi um carninho possivel para que ell pudesse entender sua transforrna-

r;ao e seus segredos, E e com carinho que apresento estas imagens, urna

forca que nao aparece sirnplesmenre. e precise captura-la e conquista-la,

Fotos 6, pp. 21·24:Rosene de Andrade, Dono do Luz , Curil i bo o 1999

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 10/64

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 11/64

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 12/64

FOTOGRAFIA E ANTROPOlOGIA

A hist6ria do pensamento humano e repleta de comparacoes e refle-

xoes entre os olhos e 0espirito, os olhos e 0saber, os olhos que contem-

plam a beleza divina, os olhos que se chocam com a realidade e diante

da qual tambern permanecem indiferentes, desavisados. Fique de olbo

neles, nos olbos da alma!

Com 0olbo clinico somos capazes de diagnosticar, com olbo de lince

vemos longe e, com olbos magicos, enxergamos atraves das portas. Isso

sem perigo de pegarmos um olbo gordo e acabarmos no olho da ruav

Do erudito ao popular, a visao ref1ete a alma do homem e espelha 0

mundo em que vive. Janela da alma, espelho do mundo, como afirma

Marilena Chaui:

Porque cremos que a vis ao se faz em nos pelo fora e , s imul taneamente ,

se faz de nos para fora, olhar e , ao mesmo tempo, sair de si e trazer 0

mundo para dentro de si. Porque estamos certos de que a visao depende

de nos e se origina em nossos olhos, expondo nosso interior ao exterior

C ..) Crenca que su sten ta os chamados "testes pro jetivos" da p sicologia,

onde se espera que a con sciencia, lancando -se qual p rojetil atraves do s

o lhos, pro jete no fo ra 0seu dentro. (Chau i, 1989, p . 33)

E com base nessa tenue relacao entre a visao do observadar e a coisa

observada que podemos estabelece r pa rale los entre a ant ropologia e a foto-

grafia, e tambern mostrar como a imagem elaborada com determinados

cuidados complementa essa comunhao, Essa imagem acontece quando 0

observador esta atento as coisas que observa. A experimentacao de certos

sentimentos que 0 outro nos desperta em momentos da pesquisa pode

transformar-se num apoio irnportante para a antropologia e pa ra um conhe-

cer mais aprofundado do grupo. Da mesma forma , a fotografia , como urn meio

de expressao, pode nos fornecer uma visao arnpliada das coisas alheias.

Para Levi-Strauss (962), esse perceber 0mundo imediato, sintetico, e

um pensar selvagem, nao domesticado. Essa e a atencao que os povos

indigenas mantern, por exemplo, com as plantas, sendo capazes de classi-

ficar um grande nurnero delas simplesrnente pela vontade de descobrir,

1. Expressoes de linguagem incluidas no Nuvo Dicionario Aurelio (2000) que fazcm parte da

filosofia popular: OLIOS NELE, cuidado, vigi15ncia; OLHOS DA ALMA, aquilo que distingue, guia,

esclarece, OLHO CU"ICO, tendencia para acertar no diagnostico, OLHO IlF LNCE, vista agudissima;

OLHO MAGICO, dispositive circular dotado de pequcnu lcrue que pcrmite enxergar atravcs das

portas, OLHO GOIUJO, cobica, inveja, olho grande; OLIO IJA I{[JA, cxpulsao, lugar indctcrrninado

para onde se manda alguem.

o O B SE RV A DO R S ll VA G EM

pela uontade de conhecer. A natureza nao existe para servir e SCI' domi-

nuda pelo homem. Em uma sociedade indigena, a significacao nasce

dessa relacao espontanea, assim como a arte, os mitos, os objetos, os

ritos, a cura e 0 saber.

Para esse autor , 0olhar selva gem e 0de um bricoleur, que transforma

o objeto e a realidade - olhos que nao se cegaram para 0comum, que

ainda podem enxergar reparando, transforrnando a realidade em obra,

em outro significado que nao seja s6 funcional e pratico.

Com que olhos deveriamos retratar aqueles que enxergam com cui-

dado as coisas do mundo? Que maneira de olhar deveriamos lancar

aqueles que veern e reparam ness as coisas? Poderiamos dizer: com olbo

de lince, com olbos da alma! Uma das repostas seria a do texto do livro

Le Vayeur absolu, de Evgen Bavcar (992), fot6grafo esloveno cego

desde os 11 anos de idade.

Quando discernia ainda alguns bocados de luzes e de cores, estava

feliz por que v ia ainda: guar do a lernbranca muito v iva desses momen tos

de adeu ses ao mundo visiv el. Mas a monocromia invadiu minha ex isten-

cia e devo fazer um esforco para conservar a paleta das nuancas, para

que 0mundo escape ,\ monoton ia e ,\ tr ansparencia. Dou co res aos ob je-

tos, as pessoas que apreenclo: conheco uma mulher cuja voz e tao azul

que cia consegue colocar 0 azul sobre um clia que eu sei ser cinza cle

outono.

Encontrei um pintor que tinha voz vermelho-escura, e 0 acaso quis

que ele gostasse clesta cor ... 0 que vem a ser portanto urn olhar? I:

talvez a soma de toclos os sonhos, cuja parte de pesadelo se esquece,

quando a genre pocle por-se a olh:ir diferentemente.. (Bavcar, apud

Samain, 19$)8 ,pp . 12-3)

E possivel, entao, a um olhar ser selvagem, olhos que percebem com

os sentidos 0obje to, sua caca, sua vida, sel l me io e sua genre? Util izando-

se dos sentidos, lim antrop6logo, urn etnologo, lim fotografo, lim artista

podem mergulhar sem cerimonia nem medo na historia c na vida de sua

presa, de sell objeto. Podem, assim, tatear seus habitos, seu jeito, sua lin-

guagem, e decifrar seus simbolos, os quais se misturarn aos nossos e

que , par isso, deverao ser codifi cados.

E 0que fez Roger Bastide, que se viu dividido entre lima atitude de

grande envolvimento e 0desejo de fazer uma pesquisa objetiva. Afirrna,

pOI' exemplo, que "0 soci6logo que quer compreender 0 Brasil t em que

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 13/64

se tornar urn poeta" (995). Embora nao tenha realizado muitas viagens

e prolongadas pesquisas, defendia uma metodologia de trabalho de campo

segundo a qual 0pesquisador nao deveria se colocar do lado de fora da

experiencia social de seus pesquisados, mas vivencia-la e integrar-se a

eta. Defendia uma ernpatia entre sujeito e objeto, quase que uma trans-

ferencia, urn autoconhecimento atraves do outro, ou seja, 0 conheci-

mento dos pr6prios sentimentos atraves da observacao do OLltro.Paraete, 0 etn6grafo e aquele que deve ser capaz de viver em si pr6prio a

principal cultura que estuda, se a sociedade tern preocupacoes religio-

sas, deve rezar junto com ela. Afirma, ainda, que foi preciso mudar toda

a sua cornpreensao 16gicaem suas pesquisas:

o OBSERVADOR SE lV AGEMFOTOGRAF IA E ANTROPO lOG I A

o fot6grafo e, pois, uma categoria de observador que se po de reali-

zar, imediata e inteiramente, no vazio verbal, mas nao no visual C ..). Ele

fotografa 0 que ve, muitas vezes sem compreender, mas sem por isso se

sentir frustrado por uma compreensao intelectual que, alias, nao busca

em estado, em prime ira instancia. Diferente do etn6logo, que ressente

penosamente este estado de h ipersensorial idade desprov ida de palavras

C.. ). (Maresca, 1998 , p . 142)

Eu abordava 0 candornble com uma mentalidade moldada por tres

secu los de car tesian ismo. Devia deixar-me penetrar por uma cul tura que

nao era minha. Devia portanto converter-me a uma outra mentalidade.

A pesquisa cientifica exigia de mim a passagem previa pelo ritual de

iniciacao, (Bastide, 1945)

A pesquisa etnografica tern mostrado como a compreensao da reali-

dade e tambern composta por sensacoes e sentimentos a maneira de

Claude Levi-Strauss, que na narracao de sua prime ira viagem ao Brasil

revela 06dio e 0amor pelo pais atraves de percepcoes sensoriais. E uma

forma de narrar aproximando a antropologia da arte, da literatura e da

poesia:

Esse novo tratamento dado a antropologia provoca, assim, uma ver-

dadeira revolucao epistemol6gica, que corneca pelo olhar e por uma

maneira diferente de olhar. E preciso compreender que, como afirma

Bastide (972), "eu sou mil possiveis em mim; mas nao posso me resig-

nar a querer ser apenas urn deles".

E com base ness a metodologia da observacao participante - 0 su-

jeito comungando com 0objeto - que podemos relacionar a antropo-

logia com 0processo fotografico ou com 0processo da criacao na arte.

Sera que 0 observador, na fotografia e na antropologia, e movido pela

mesma intencao de apreender do objeto tudo 0que se pode enxergar?

Volta-se a questao da tenue relacao - que podemos entender como

a comunhao nao s6 do sujeito e do objeto, do observador e da coisa

observada, mas dos sentimentos e dos sentidos, relevantes na elabora-

cao de algumas pesquisas. Surge, entao, uma nova questao. como narrar

tais sentimentos e sensacoes, como decifra-los? As formas narrativas sao

muitas, e varias delas sao capazes de expressa-los e transmiti-los, como,

por exemplo, a imagem fixa obtida pela fotografia. 0 objetivo do foto-

grafo nao se limita as irnagens e este nao tern limites na sua busca de

conhecer seu objeto. Mas alguns sociologos afirmam que a fotografia

trabalha 0visual e nao 0conceito:

o Brasi l desenhava-se na minha imaginacao como feixes de palmei -

ras torneadas escondendo arquite turas bizarras, tudo isto banhado num

cheiro de incensador, pormenor olfativo introduzido subrepticiamente,

ao que parece, pela homofonia inconscientemente apreendida da s pala-

vras "Brasil" e "brasido", 0que de qualquer modo explica que hoje, para

alern de qualquer experiencia adqui rida , eu pense no Brasi l em primeiro

lugar como um perfume queimado . (Levi -Strauss, 1955, p. 54)

Sobre a etnografia, na mesma obra Tristes tr6picos (p. 70), Levi-Strauss

declara que somente como etn6grafo pode tranquilizar seu apetite in-

quieto pelo conhecimento. A diversidades de culturas, usos e costumes

s6 pode ser observada e reconciliada pela etnografia, rnais do que pela

filosofia.

Nesse sentido, e com esse "ver com olhos livres? que urn sujeito pode

cacar suas imagens, suas palavras, sua ciencia. Nao e preciso ser selvagem

para pensar seluagem? Necessita-se de urn olhar unico e singular, urn

processo solitario na tentativa de se redescobrir no outro e 0outro em si

mesmo - uma permissao ao inconsciente, ao imaginario e a "loucura",

2. Frase presente em pichacao an6nima nos muros da PUC-SP.

3. Grifos do texto da tese de doutorado de Dorothea Voegcl le Passetti (1999), referente ao

fil6sofo Bergson na visao de Levi-Strauss: "Bergson e , portanto, um fil6sofo de gabinete C..)

que, em certos aspectos, pensa como urn selvagern", ()que comprova que "nao e necessa-

rio ser selvagem para pensar selvagem" Cp.320).

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 14/64

Rosene de Andrnde, Vercorn o l hos l i vr e " Sao Pau lo , 1998

A lo uc ura h um an a e fo nte d e 6 dio , c ru eld ad e, b arb arie, c:e gu eira. M as s em as

desordens da afetividade e as irrupcoes do imaqinario. e sem a loucura do

i mp os si ve l, n ao h av er ia elan, c ri a~ ao , i nv en ~a o amo r, p oe si a.

Morin, .1999, p. 7

o OBSEIWADOR mV" 'G~M

Para Morin, a afeiividade nos ilurnina enos cega, mas entre 0homo

sapiens e 0 homo demens existe urna fronteira nitida: sao do is p6Jos.

Define-se homo unicarnente como sapiens; oculta-se dele a aferividade,

separando-a da razao inteligente (1999, p. 53),

o hornern necessira do caos para criar orderu, e isso rnerece uma

pesquisa aprofundada na questao da genese do olhar, tanto para a arte

como para a ciencia. A loucura do olhar, a olhar inconsciente, o olhar

que sacraliza mereceriarn ser objetos de pesquisas futuras.

Diaries, anotacoes e correspondencias sao documenros que, ~lsve-

zes, conseguern flagrar e arquivar registros da percepcao: sao as reservas

passionais do anista (Salles, 1998, p. 90). Nesse sentido, podernos refletir

sobre a percepcao do antropologo e 0 rnornenro de estabelecer l imites

para sua afetividade quando, por exemplo, ele forografa au escreve

Claude Levi-Strauss, em urna ent revista publicada na Polba deS.Paulo

(27.6.1999), conduzida par Beatr iz Perrone-Moises, novarnente declarna a

lernbranca, em Iinguagem rnarcada pela visualidade, os momenta vivi-

dos durante a pesquisa no Brasil.

(. .. ) nao era a floresta arnazonica, ert! mals 0 campo, uma especle de

f loresta seca- e de repente, rnoruado no cavalo, vi no solo lim campo

de abacaxis selvagens . Bastava incllnar-se bern baixo. sern desrnontar,

para arrancar cs frutos e come-los, E urna das sensacoes gustatlvas e

olfatlvas que fica ram, porque nao era como 0 abacaxi que conhecemos,

era urn abacaxi com urn cheiro de framboesa absolutarnente extraordina-

rio. rEt muuos e muiros outros chelros, mencicnei esse arenas como

exernplo.; hll alnda a cheir o do fu 1 1 10 , cheiro de Fumo de rolo em toda

parte. Alias, era 0 que eu fumava, em folhas de rnilho, que davarn ao

tabaco u!n saber e urn cheiro multo, multo paniculares, que tarnbem

f icou. H1i tambern a pinga . .. ( . .. ) ha muitos mod os de ser anrropologo e

de tornar-se antropologo.

A fotografia, no entanto, e apenas Lima imitacao, urna reproducao:

regist ra paisagens, aconreci rnentos, sern chegar ao que eles rea lmente sao,

afirma Levi-St rauss, Para ele , nao podernos falar de arte , pols fotografia nao

e arte, e mecinica e documental. Eis0velho dialogo entre fotografia e

arte: a pintura nao pode ser substiruida pOl' urn processo que nao tern

l inguagem propria. Mas a fotografia mudou 0componamento do mundo!

Assim como a anrropologia, a fotografia rem urn observador partici-

pante que escava detalhes e fareja com seu olhar 0alvo e 0 objeto de

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 15/64

F010GIW'lA EANTROPOLOGIA

suas lentes e de sua interpretacao, Mas, essencialmenre, ver com olhos

lrvres e possuir urn olhar estrangeiro, urn olhar de espanto e uma "von-

tade de conhecer", como a dos "indiosKarnaiura.

Os Karnaiura tern um modo peculiar de observar as coisas, reparando

com vagar nos detalhes, como se buscassern qualidades: cheiram, apal-

pam, testarn a saber. E urn exarne lento, cuidadaso, no qual os senudos

apurados sao exigentes e nao deixam que 0 tempo corra livre, ordenan-

do e definindo ritmos e llmites. 0 tempo parece solidario, com vonrade

de conhecer.

E posslvel, rarnbem, que esse usa profunda dos sentidos estimule a

criatividade mltica, arnpliando as registros da irnaginacao, permitinda

enxergar uma riqueza de relacces, sernelhancas e oposicoesescondidas

na aparente insignifidincia das coisas materials mais corriqueiras.

(Iunqueira, 1999)

A MAaUINA DE ROUBARALMAS

C laudio Andu ja r , Yonomoml, 1998

A m aq uin a f oto grM ic a n ao v io la , n em m es mo d om in a, a mb ora 0 f u r ; : i l crer , penet re,

i rw ad a, d is to rc a. e xp lo re e , u sa nd o a r ne ta fc ra e m s ua f or ca m ax im a, a ss as sin e,

Sontag, 1981, p. 13

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 16/64

FOTOGRAFIA: A HISTORIA REBELDE DA ARTE

A invencao da fotografia mediante fixacao de uma imagem em uma

placa, iodada, (mica, rara e cara como uma j6ia provocou as rnais diver-

sas reacoes. Espanto, naqueles que desconheciam 0processo da carnara

escura - urn instrumento que possuia lentes que projetavam as ima-

gens, favorecendo aqueles que ate entao s6 podiarn fixa-las por rneio de

desenhos e pinturas. Medo, nos artistas que tinharn como funcao regis-

trar a hist6ria atraves da arte de pintar retratos da aristocracia. Indigna-

cao, em alguns intelectuais que terniarn a contaminacao da fotografia na

"arte pela arte".

Joseph Nicephore Niepce 0765-1833) nao pode acompanhar 0reco-

nhecimento de seu invento, pois morreu antes; e Louis-Jacques Mande

Daguerre 0787-1851), continuador e criador do daguerre6tipo, espera

ate 1839 para ter sua criacao reconhecida na Academia de Ciencias e

Artes, no Instituto Frances, e isso gracas ao Fisico Arago, que defende

brilhantemente a tese na Camara dos Deputados, dizendo:

Quando os inventores de um novo instrumento 0aplicarn a observa-

<;:aoda natureza, 0 que eles esperavam da descoberta e sempre uma

pequena fracao das descobertas sucessivas, em cuja origem esta 0 instru-

mento. (Benjamin, 1996, p. 93)

Em pleno romantismo e em meio a grandes transforrnacoes sociais e

econornicas, a fotografia j{lnasce instigante, provocando reacoes contra-

rias de artistas e intelectuais. Uma mudanca acentuada na sociedade

corneca a acontecer. Ha uma busca compulsiva por fazer-se retratar nos

estudios fotograficos e poder admirar a sua propria imagem, ocasionando

urna democratizacao do retrato, bem mais barato que pinturas a 6leo, ate

entao um privilegio da aristocracia e da burguesia. Nesse entremeio,

alguns pintores mediocres transformam-se em fot6grafos retratistas e en-

riquecem com 0novo modismo narcisico. Essa e umas das principals

razoes da fotografia sofrer discriminacao: 0 fato de industrializar e

comercializar a arte.

A partir desse momento, a sociedade imunda precipitou-se, como um

unico Narciso, para contemplar sua imagem trivial no metal e uma loucura,

um fanatismo extraordinario apoderou-se de todos aqueles novos adorado-

res do sol. (Charles Baudelaire, apudRosemblum, 1984, p. 38, trad. da autora)

A MAQUINA DEROUBAR ALMAS

Baudelaire e um dos criticos mais radicals da fotografia. Ele faz ques-

tao de separar a pintura da fotografia, afirrnando ser a fotografia um

produto da industria tecnol6gica.

Estou convencido de que os progressos mal aplicados da fotografia

contribuiram muito, como alias todos os progressos puramente matcriais,

para 0 empobrecimento do genio artistico frances, ja tao raro (...). Disso

decorre que a industria, ao irromper na arte, se lorna sua inimiga mais

mortal e que a confusao das Juncoes impede que cada uma delas seja

bem realizada (...). Quando se permite que a fotografia substitua algumas

das funcoes da arte, corre-se 0 risco de que ela logo a supere ou corrom-

pa por inteiro gracas a alianca natural que encontrara na idiotice da mul-

tidao, :E portanto necessario que ela volte a seu verdadeiro dever, que e 0

de servir ciencias e artes, mas de maneira bem humilde, como a tipogra-

fia e a estenografia, que nao criaram nem substituiram a literatura. c . . . )que seja finalmente a secretaria e 0 caderno de notas de alguem que

tenha necessidade em sua profissao de uma exatidao material absoluta,

ate aqui nao existe nada melhor. Que salve do esquecimento as ruinas

oscilantes, os livros, as estampas e os manuscritos que 0 tempo devora, (...)

e que necessitam um lugar nos arquivos da memoria, seremos gratos a ela e

iremos aplaudi-Ia. Mas se the for permitido invadir 0dominio do impalpavel

e do imaginario, tudo 0que s6 e valido porque 0homern the acrescenta a

alma, que desgraca para n6s. (Dubois, 1994, p. 29)

Afixacao de imagens atraves do daguerre6tipo quebrou um paradigma

das artes plasticas: a obsessdo da semelbanca. Para alguns, contrariando as

afirrnacoes de Baudelaire, a fotografia e a libertacao da arte de copiar a

realidade, ela contribui e influencia na continuidade das artes visuais.

Nesse sentido, e superior a pintura, afirma Andre Bazin (979), pois

alcanca com objetividade a realidade, sendo um decalque do real.

o desenvolvimento da industria, concomitantemente ao aprirnora-

mento da tecnica da fotografia, transformou conceitos e valores, sobre-

tudo da burguesia. Surge assim uma nova consciencia da realidade e

urna apreciacao desconhecida da natureza. Exige-se exatidao cientifica e

uma reproducao fielda realidade em obras de arte, 0que desperta olha-

res para a fotografia.

Seria a fotografia uma nova forma de artc ou um auxilio para a

ciencia? 0 publico adrnirava as c6pias exatas da natureza, e os pinto-

res realistas, por sua vez, censuram a imagmacao como algo subjetivo.

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 17/64

F O TO G AA F IA E A N TR O PO lO G IA

A necessidade de reproduzir as cores e as forrnas reais pas ou a ser

urna meta dos artistas realistas.

Com a revolucao industr ial, ver if ica-se Lim enorrne desenvolvimento

das ciencias em seus vartos campos; surge naquele proeesso de transfer-

macao economica, social e cultural uma serie de lnvencoes que viriarn

influtr decisivarnente nos rurnos cia hlstoria rnoderna. A fotografia, uma

das Invencoes que ocorre naquele contex to, teria Limpapel fundamental

enquanto possib ll idade inovadora de in formar;a<) e conhecimento, instru-

mente de apolo a pesqulsa nos diferenres campos da ciencia e tarnbem

como forma de expressso artistica. (Kossoy, 1989, p, 14)

Na decada de 1840, Fox Talbot (1800-1877) cornpoe a forografla nos

moldes da pintura, mas tambern utillza a carnara para captar fragmentos da

realidade. Corneca a fotografar insetos, conchas, plantas e flares para as

botanicos, e esses registros historicos dao a fotografia urn vaLorcientifico,amenizando, em parte, a rivalidade com a pintura. Essas imagens sao

registradas na publicacao do Iivro de Talbot The Pencil of Nature (1842).

A pintura, par sua vez, tarnbern tentou aproximar-se da realidade.

o hornern voltou-se para a terra, as belezas do corpo e da natureza. A arte

romou-se mais realista, libertando-se dos temas religiosos, 0 interesse

pela realidade exterior desviou 0 artista daarte irnaginativa para leva-lo

a natureza. 0 interesse sensual pela luz estabeleceu urn padrao que se

firmou nos impressionisms. Delacroix pintavaseus quadros baseando-se

em fotografias. Monet percebia a paisa gem utilizando-se de uma lingua-

gem visual marcacla peJa leirura da luz. Assim, a fotografia entra na arte

com pinceladas suaves, fingindo copiar a realidade e dando aos artistas

da epoca a possibilidade de enxergar mais do que a irnagern real. Exis-

tern quadros de Claude Monet que ilustram os efeitos da luz e como eles

pod ern rnudar a aparencia de urn objeto De certa forma, ilustrarn tam-

bern a teoria de Rene Descartes: a observacao direta freqiientemente nos

ilude e nunca podernos estar certos de que as colsas sao como parecem

(cf. Magee, 1998, p. 86).

Sobre as irnpressionistas, jung cementa:

o fasdnio que sennam pela t er ra e pela natureza em tao profundo que foi

praticarnenre 0fator deterrninante cia evolucao cia arte visual ( . .. ). Os t1ltimos

grandes representantes da arte sensorial , a arte do ins tante que passa, a arte

cia luz e do ar, foram os irnpressionistas do seculo XIX. Cjung, 1964, p. 246)W i ll ia m H en ry F ox T al bo t, &Iomcol Specimen, 1839

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 18/64

fOTOGRI\fIII E ANT~Of'OlOGlA

Com 0passar do tempo, uma explosao de produtos, recni as e pro-

cessos produziu uma mudanca significativa nas formas de aplicacao das

lmagens fotograficas, que a partir desse momenta vinharn carregadas de

Informacoes do mundo, a que alterou tanto as atitudes publicas quanto

a percepcao da realidade. Foi atribuido a forografia 0peso de expressar

oreal, sendo a foro vista como lima especie de prova, necessaria e

suficiente, que atesta a existencia daquilo que e vista.

Classificada par alguns ora como urn simples instruroento de uma

memoria documental do real, ora como pura criacao imaglnaria, a foto-

grafia assume 0 papel de auxiliar a memoria.

( . .) photography , from being merely another way of procuring or making

i ma ge s o f things alrea dy seen by our eyes, has become a m ea ns of ocu lar aware-

ness of things that our eyes can never see directly (..,) it has effected a very

complete revolution in the ways we use our eyes and ( . ..) inthe kinds ofthings

our minds permit our eyes to [ellus. ( Ivinsjr. , apudRosenblum, 1998, p. 244)

Gaspard-Felix Tournachon (1820-1910) torna-se Nadar aos 20 anos, ja

rnunido de luzes artiflciais, sai fotografando as subterraneos das catacumbas

de Pa ri s. Voando num balao, conseguiu mostrar LUna cidade de LIm ponto jarnais

vista. Fotografou ainda as chamadas aberracoes, como hermafrodhas e ana-

tornias patologicas, Era rambem pintor (caricarurista) e urn dos grandes retra-

ti stas da epoca. como Etienne Carjat (1877), Este retratou e captou a alma de

grandes personagens de seu tempo, como Baudelaire, registrando ern fotos roda

a angiisua eo mau humor cia escriror. A prop6sito, Baudelaire, rnesrno criti-

cando a fotografia , sol ici ta varias vezes que Nadar e Carjat facam seu ret rato.

Com a superacao cia tecnica e 'l im maier dornlnio cia luz, a cornerciali-

zacao dos retratos comeca a e sofi ticar. Criarn-se cenarios nos estudios

- colunas que saern de tapetes, palrneiras e [ardins -, rnesclando cada

vez mais realidade e ficcao. Mas algurna coisa, apesar de todos esses

artificios, rnantinha uma relacao de fidelidade com a pessoa rerratada,

como coloca Benjamin ao descrever urn retrato in fan til de Kafka:

o menino de cerca de sets anos e representado nurna especie de

paisagem de jardim de inverno, vest ido com urna roupa de crianca, mul to

apertada, quase humllharue, sobrecarregada de rendas, No fundo, erguern-

se as palmeiras im6veis. E, para tornar esse aco lchoado arnbiente tropical

a inda rnais abafado e sufocanre, 0modele segura na mao esquerda urn

chapeu ext raordinariarnente grande, com abas largas, do i ipo usado pelos

Etienne Coriol, QlOrIe s B a ud e/ p or E , 1a7 B

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 19/64

Fo il l~Nodor , Sam l> Ikrnhordl, 1877

40

I I MAaUINI \ DE ROUBARAlMAS

espanh6is. 0 menlno feria desaparecldo nesse quadro se sells olhos 10-

cornensuravelrncnte mstes nao dorn inassern essa paisagern felta sob me-

dida para eles. Em sua tristeza, esse retrato contrasta com as pnmeiras

fetografias, em que as hornens ainda nao lancavarn no rnundo, como 0

[overn Kafka, urn olhar perdido e desoladc. Havia l ima aura em torno

deles, Limmeio que atravessado por seu o lhar lhes d < 1 V 3 urna sensacao de

plenitude e seguranca, (Benjamin, 1996, p, 98)

Mas, ao que parece, Franz Kafka nao conseguiu superar 0 trauma. Ii0que revela em Limacon versa com janouch.

Mostrei unrrserie dessas rows a Kafka e disse-lhe brincando: "Por

rnais au menos duas coroas, e posslvel fazer corn que alguern (1 foiografe

sob [ados os angulos. I~0conheee a tt mesrno auromarlco!".

"Voce quer dizer 0engane a u mesrno automatico" - replicou Kafka

com 11mleve sorriso. Protesiel: "Par que diz isso? 0 aparelho nao conse-

gllt: mentir!", Kakfa lnclinou a cabeca sobre 0 ombro: "De onde voce

tirou isso? A foiografla concenrra seu olhar sabre 0 superficial, desse

modo obscurece a vida secreta que brilha atraves dos con tornos dns

coisas num [ogo de luz e sornbra. Nao se pede captnr isso, nem ruesruo

com a auxllio das lcntes mais poderosas. Devemos nos aproxlrnar dessa

vida interim pe ante pe..." (Dubois. 1994, p, 44)

o que Kafka argurnerua e por que, em sell texto, ete descreve suus perso-

nagens com uma vida interior. Ha uma aura, l ima narrativa marcuda pelu

visualidade, como fotografias, Embora tome 0 mundo mais precise ell'

informacoes e conhecimento, a fctografia nao e urna copia quimlcnmente

revelada cia realidade, nao e arenas sell registro documental e cientifico.

E urna realidade revelada, resgatada, atingida e, para alguns, ate roubada.

Em surna, 0 que e aura? E urna [igUf<l singular, composta de elementos

espaciais t: temporals: a apari~ao unica de uma coisa distantc, por mats

proxima que ela este]a , Observar, em repouso, nurna tarde de verite, lima

cadeia de moruanhas no horizontc, ou urn galho que projeta SU~ sornbra

sabre nos, are que 0nstarue au a hera participem de sua rnanifestacao, significa

respi rar a aura dessa montanha, desse galho , (Benjamin, 1996, p . 101)

o forografo registra e docurnenta, mas isso nao irnplica que as Irna-

gens sejam despldas de valores estericos, Representarao sernpre wn rneio

41

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 20/64

F010GRAFIA E ANWOPOlOGIA

de informacao, de conhecimento, e conterao sempre urn valor documental

e iconografico (Kossoy, 1989).

Foi com a uniao desses dois segmemos - 0 regis tro socia l e 0artistico

- que a fotografia aparece com urna linguagem pr6pria, defendida por

rnovimenros como photo Secession, na revista Camera Work(1903/1917),

liderados pela fot6grafo americana Alfred Stieglitz 0864-1946). Ele re-

rrata a cidade de Nova Iarque e 0 movimento das ruas rnesclado poruma beleza estetica quase pict6rica, influenciado, em parte, pelo rnovi-

mento anterior dos pictoralistas.'

Em Paris, as fotos de Eugene Atget (1857-1927) documentavam 0

coridiano parisiense. Segundo afirma Walter Benjamin, ele foi 0primeiro

a desinferar a atmosfera sufocante difundida pela fotografia convencional,

especializada em retratos,

(...)as fOlOS parisienses de A lg er - sa o precursoras da fotografia surrealista, a

vanguarda do uruco destacarnento verdadeirarnente expressive que 0sur-

realismo conseguiu por em rnarcha C..) . Ele saneia essa atmosfera, pur if ica-a:

corneca a libertar 0 01 jeto da sua aura, consistindo 0 rneriro mais incontes-

tavel da moderna escola fo tograflca , (Benjamin, 1996 , p . 101)

A fotografia passa a ser urn rneio de expressao Individual, mas ram-

bern urn instrumento de conhecimento das diversidades do mundo, e

fOt6grafos como Henri Cartier-Bresson, Anare Ker tesz, Werner Bishop,

Alexander Rodchenko e Pierre Verger encontrarn-se no rneio dessa

dualidade: a criap5.o e a docurnenracao

(...) a forografla e urn duplo resrernunho: por aqul lo que ela nos rnos tra da

cena passada, irreversivel, ali congelada fragmentariamente, e por aquilo que

nos informa acerca de seu aura r C ..) e Lim tesremunho segundo urn filtro

cultural, ao rnesmo tempo que e Limacriacao a partir de um vislvel fotograflco,

Toda fo tografia rep resenra 0 testernunho de urna cria~.l!o.Por OUtrO lado, ela

r ep re sem ar a s em p re a c ri ao ;a ode urn testernunho. (Kossoy, 1999, p. 33)

1, "Pictoralism was an instrument that enabled the aesthet ic photograph to be regarded as a

persuasive expression ofpersonal temperament and choice, Despite misguided attempts to

emulate tradi tonal painting and works of graphic art, despite disagreements about the

qualities that give [he photographic prints their unique character. and despite many images

mat now seem hackneyed and uninspired, H body of fOrceful work was created under the

banner of aesthet ic photography. Both the seriousness of purpose and the efforts by the

rnovernem ro erase the division between the way cri tics and public viewed images made

entirely by hand and those produced by a machine have continued to be vital concepLS

that still engage photographers and graphic artist alike." (Rosenblum, 1984, p. 332)

42

(

Eugene Aigel. Prosfflulo, Poris. 1920

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 21/64

A direito.

A1exo~der Rod(hen~o, Relrolo de rnlnho rna". 1924

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 22/64

Carlo", de vlsltc, Budapes t . . , H ung r io , 1874

46

A MAGIA DA IMAGEM

Hay religlones en las que 13representacion del mundo esta prohibtda

(usurpacion del poder de un Dios creador de todas las casas). Pensandolo

bien , es muy pos ihle que Fotagrafar sea anlmana de! diablo y c a m disparo

un pecudo, (Gerard Castel lo Lopes, apud Fontcuberta, 1997 , p . 21)

As prirneiras fotos produzidas pelo daguerreotipo erarn tao perfeitas

que a nitidez assustava as pesso8s. Tinharn a impressao de que os peque-

nos rostos humanos que apareciaru 1 1 < 1 irnagern erarn capazes de ve-las

(Benjamin, 1996, p. 95). A tecnica ou 0processo mecanico da fotografia,

que para muiros era Iria e insensivel, passou a ser LIm misterio cheio de

maglas. Quando mergulharnos profundamerue e m LIm a imsgem percebe-

mos que ali nao exisie urn mere registro da realidade, mas sim uma CUl11-

plicidade do autor com 0 objeto Fotografaclo. E e desses extremes que

sobrevive a fotografla. a recnica rnais exara pode dar a s suas criacoes urn

valor maglco que' urn quadro nunca terri para n6s, afirma Benjamin.

Essa magia preocupava ate a alta cupula do clero. A forografla etransgressors e pecadora, tao perigosa e diab61ica que foi condenada por

reproduzir a natureza - e s6 poderia ser conternplada pelos olhos abencoa-

dos dos pintores. E . isso que diz 0[ornal alernao tetpziger Anzeiger(l855),

inspirado pela opiniao hostil cia Igreja er n relacao a invencao da fotografia:

Fix:u eferneras irnagens de espelho nao e somente uma impossibi-

lidade, como 11 ciencia alerna 0 provou irrefutavelmente, como um pro-

jete sacrilege. 0 hornem foi feito a sernelhanca de Deus, e a Irnagern de

Deus n~o pode ger I1xada per nenhurn mecanisme humane, No maximo,

o p ro pr io < lr lJ sl a divino, movido par urna Insplracao celeste, poderia

a trever- se a reproduzi r esses t race ao rnesrno tempo divines e hurnanos,num momenta de suprema solenidade, obedecendo a s direirizes supe-

r tores, cia seu genio, e sem qualquer artificio mecanico. (Freund, 1974,

p. 67, irad. cia aurora)

Esse texro - rnuito interessante ao analisarmos 0desenvolvimento da

historia da fotografia e as declaracoes de diversos fotografos - os quais

afirmam que, instant~s.,antes do "clique", essa "inspiracao celeste" cicada

no texto surge como urna visao lntuitiva all vtsionarta,

Os fot6grafos sao por natureza pecadores (Fonrcuberra). E precise

sernpre tomar muuo cuidado com lima camara. Ela revela e incornoda.

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 23/64

FOTOGRAFIA E ANTROPOlOGIA

Mas ira a fotografia alem do que mostra a realidade? Ou alern da palavra,

ou melhor, do registrado? 0 ato fotografico e visionario?

En otras lat itudes y s ituaciones cul tur ales, e l acto fo tografico ha s ide

considerado una mani festaci6n de la luz , una revelaci6n de 10 sobrenatural.

Y la consecuencia de todo ella pod ria ser, par ejemplo, Robert Leverant,

autor de Zen in the Art a/Photography (969), que d ice que " la fotografia

tambien es una busqueda de Dios". (Fontcuberta , 1997, p. 28)

Esse encantamento outorgado a fotografia justifica 0horror que os

primitivos tinham em deixar-se fotografar, 0mesmo temor vindo dos

espelhos que refletem a imagem, mas nao a retem, A fotografia, no

entanto, e espelho da mem6ria: imobiliza nossa imagem para sempre.

EI temor a que la imagem nos robe el alma se halla enormemente

extendido, inc luso mas alia de la supersticion y la magia negra ( ... ). En el

Congo, por ejemplo, algunas tribus da habla bantu se servien de unos

fetiches antropom6rficos que lIevan un pequeno espejo en la zona del

ombl igo cuya mision consis te jus tamente en arr ancar y apri sionar el a lma

del enemigo invocado. c...) Pero la fotografia inmobiliza nuestra imagem

para s iempre ( .. .). Una inmobil izaci6n y apr isionamiento que nos acercara

ineluctablemente a la idea de la muerte. (Ibidem, p. 30)

Qual seria a razao do verdadeiro temor provocado pela fotografia?

Sera que a forca da imagem nos contamina, podendo assim dar passa-

gem a sonhos e mitos?Desse modo, como diz Benjamin, a imagem passa

a ser um meio de comunicacao no nivel da oralidade:

Pel a primeira vez no processo de reproducao da imagem, a mao foi

liberada das responsabi lidades arti st ic as mais importan tes, que agora ca-

biam unicamente ao olho. Como 0 olho apreende mais depressa do que

a mao desenha, 0processo de reproducao das imagens experimentou tal

aceleracao que cornecou a situar-se no mesmo nivel que a palavra oral.

(Benjamin, 1996, p . 167)

Para Andre Breton, 0fantastico e carregado de real, mas podemos

inverter isso: quando se trata de fotografia, sao as coisas reais que

irradiam 0fantastico. 0 real e 0fantastico estao interligados na fotogra-

fla e identificam-se.

,I

A MAQUINA DE ROUI1ARALMAj

Tudo se passa como s«, peranrc a imugcm fotogr. if ica, a vis:[o cmpir icu

s~ desdobrasse numa visao onirica. aruilog.. a isso a que Rimbaud cha-

mava vidcncia, e nao de todo estranha ao que as videntcs chamarn ver

uma segunda visao, como e costume dizer-se, uma visao que, por ul-

timo, viesse revelar as belezas ou segredos ignorados da primeira. Cer-

tamente nao fo i par acaso que as tecnicos sentiram a necessidade de

inventar , para preencher a insuficicncia do verba ver, a verbo "visionar" .(Morin, 1970 , p . 23)

Com a industrializacao praticada em larga escala, a fotografia pcrdeu

em qualidade artistica como uma obra (mica, mas ganhou em populari-

dade com 0advento de rnaquinas mais baratas e de facil manuseio;

"tirar" fotografias tornou-se um habito em festas, aniversarios, casamen-

tos, viagens, batizados. Todas essas imagens nos levarn a resgatar 0pra-

zer do instante, do momento presente e do ausente, daquilo que passou,

mas que permanece na memoria. Olhamos para fotografias para resgatar

o passado no presente. Tirarnosfotografiaspara nos apropriarmos do obje-

to que desaparecera. Existe uma magia quando imortalizamos as pes-soas e 0tempo nas fotos. Para as tribos urbanas, fotografias sao como

provas de sua existencia, de sua identidade e hist6ria.

No filme de ficcao cientifica Blade Runner, 0cacador de andr6ides

(982), as fotografias construiam a hist6ria das personagens, pois os

andr6ides eram criados pelo homem a sua sernelhanca. Sem identidade e

com um tempo Iimitado de vida, erarn na verdade iludidos atraves das

imagens de uma familia que nunca existiu, de amigos de infancia, de

escolas, de aniversarios que nunca existiram. As fotografias eram provas

de continuidade e, ao mesmo tempo, mem6ria da sua pr6pria historia.

Isso os fazia acredijar serem humanos e nao criaturas da genialidade

hurnana. Mas se tratava apenas de uma representacao, de uma realidade

que nunca existiu. Faz-se uma analise de nossa sociedade que "ve ou nao

ven nas imagens todas as possibilidades de vida e de identidade. A vida

moderna ensiha como viver sendo muitos, necessitando-se ser um s6.

Amaisbanal das fotografiasdetern ou apela para uma presen<;a.Guarda-

mos em nossas carteiras e em nossas casas imagens de santos, de bichos,

da familia, bem C O ! ! 1 0 imagens daqueles que gostariamos de ser, idolos,

her6is, objetos de des.s:jo.Recorremos as fotografias para fazer presente 0

que ou quem esta ausente. Nossa identidade individual depende da me-

moria - e a fotografia e uma atividade fundamental para 0contorno

dessa identidade, seja para a auto-afirmacao, seja para 0conhecimento.

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 24/64

FOTOGRAFIA E ANTROPOLOGIA

o fot6grafo luta por deixar pontos vivos na imagem, mantendo a

fidelidade e a autenticidade naquilo que enxerga.

Por outro lado, ha uma especie de agressividade no ato de retratar:

fotografar uma pessoa e ve-la como ela pr6pria nao se ve jamais. Implica

transforrna-la num objeto que se pode simbolicamente possuir. Para

assegurar-se de alguma coisa, ou mesmo para preserva-la, aeaba esvaziando-ade toda v ida . E por isso que a camara tem sido tomada como uma repre-

sentacao sublimada de uma arma de fogo. Em ingles, to shoot significa

tanto "clicar" quanto "atirar".

Neste universo de coisas em desaparicao, os individuos procuram

desesperadamente deixar marcas . Pois a cidade moderna, antes da catas-

trofe, era como urn interior. Os homens se sentiam em casa nela. Em todo

lugar, deixavam suas impressoes digitais, Os objetos traziam os sinais

daqueles que as possuiarn. Al i era f acil ident if icar. (Br issac , 1999 , p. 471)

Sobre isso, Susan Sontag (981) afirma que a fotografia e urn inventa-

rio da mortalidade. As pessoas e as coisas tern uma idade especifica desuas vidas, momentos rnais tarde, ja terao dispersado e continua do no

curso de seus destinos independentes.

Lernbrancas: para Henri Bergson, urn fil6sofo do tempo, e do presen-

te que parte 0 chamado, ao qual a lernbranca responde. A Iernbranca

vern, de uma certa forma, libertar a alma do corpo, que tern acao cons-

tante no presente, mas urn presente com imediato passo para 0futuro.

Olhar fotografias e semelhante a congelar por instantes 0 tempo. Foto-

grafar e tarnbem assim. E esse e 0encantamento, 0fascinio no momenta

do clique. 0 ato de acionar 0botao de uma maquina fotografica e 0

unico em que 0tempo interno esta de acordo com 0tempo externo.

Aqui lo que a fo tografia r eproduz ate 0 infini to s6 acon teceu uma vez:

ela repete meeanicamente 0 que nunca mais podera repetir -se existencial-

mente. Nela 0 aeonteeimento nunca se transforma noutra coisa: ela remete

sempre 0 corpus de que necessito para 0 corpo que vejo: ela e 0 Parti-

cular absolute, a Contingencia soberana, impenetravel e quase animal, 0

Tal (tal foto e nao a foro), em suma, a Tyehe, a Ocasiao, 0 Eneontro, 0

Real, na sua inf at igavel expressao. Para clesignar a real idade, 0 buclismo

diz sunya, 0 vazio, mas, ainda melhor, tatbata, 0 Iato de ser esse, de ser

isso, tat, em sanscrito, significa isso e lembro 0 gesto de uma crianca que

apon te qualquer coisa como 0 declo e d iz : Ta, Da, < ; '4 ( . . . ) .

A MAQUINA DEROUBAR ALMAS

Contudo, eu persistia; uma outra voz, a mais forte, levav a-me a negar

o comentario sociologico: perante cer tos fa tos, eu preferia ser selvagem,

sem cul tur a. (Barthes, 1984 , p . 21)

Barthes tarnbern afirma que olhar fotografias foi a razao maior para

pensar as fotografias, que 0espectador das imagens e tarnbem urn inter-

prete, urn investigador apaixonado dessa realidade: "Como urn especta-

dor, eu s6 me interessava pela Fotografia por 'sentimento'; eu queria

aprofunda-la, nao como uma questao (urn terna), mas como uma ferida:

vejo, sinto, portanto noto, olho e penso." (Ihidem, p. 30)

Susan Sontag declara em seu livro Ensaios sobre fotografias (981)

que sua vida divide-se em duas partes: antes de ver certas fotografias e

depois, quando passou a entender seus significados:

( ... ) quando fitei aquelas fotografias, algo se rompeu. Acertava-me a um

limite que nao era apenas 0de horror; sent i-me i rrevogavelmente ma-

goada, f erida , mas uma parte de meus sent imentos comecou a enri jecer-se;

algo morreu; algo ainda ehora. ( . .. )A imagem perfura. A imagem anestesia.(Sontag, 1981 , p. 20)

Italo Calvino, em seu conto "Aventura de urn fot6grafo", descreve 0

personagem de Antonino Paraggi como urn apaixonado pela fotografia

que ve a foto como urn meio de eternizar os instantes do mundo:

- Para quem quer aproveitar tudo 0que passa na sua f rente - exp licava

Antonino c.J, 0 unico modo de agir C0111 coerencia e t irar pelo menos uma

foto pOI' minuro desde quando abre os olhos de manha ate quando vai clormir .

S6 ass im os ro los de fi lme eons ti tui r: lo um di.irio f ie! de nossas jornadas,

sem que nada fique excluido. Se eu fosse me meter a forografar, iria ate 0

11mnesse caminho, a cus ta de perder a razao com isso. (Calvino , 1998, p . 55)

Pensandona aventura de ser fotografo, nao poderia deixar de relaciona-

la com a aventura de ser antropologo, e perguntar qual seria a diferenca

entre elas. Seria uma busca de significados mais cientificos, mais minucio-

sos e "reais"? Ou a busca cia beleza enquadrada em uma luz e uma

composicao bern 'dis~ribuidas? Sera que a fotografia e a antropologia nao

sao resultado dessas duas buscas?

Urn etn6logo fot6grafo deve lidar com esses temores. A obtencao de

uma imagem atraves da carnara e uma conquista clo fot6grafo, e ela se

51

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 25/64

FOTOGRAFIA E ANTROPOLOGIA

cia mediante urna visao formal C geral permitida, para so depois entrar

na inforrnalidade e em algo privado. Ele deve saber entender que essa

magia de fotografar e um temor para quem e fotografado, e um fascinio

para quem se ve espelhado e se assusta com as nossas interpretae,:()es.

o OLHAR ANTROPOLOGICO NA FOTOGRAFIA

A imagem fotografica, exatamente porter nascido modificando com-

portamentos e provocando questoes ontol6gicas, carregara sernpre 0

estigma de ser a realidade congelada no tempo e fruto da imaginacao e

cia interpretacao do autor. Sejam quais forem as questoes nascidas dessa

dualidade, a propria historia cia fotografia vern carregada de reflexoes e

equivocos, gerando desinformacao a respeito da imagem e de sua apli-

cacao, especial mente nas investigacoes e nas pesquisas,

Equivocos ocor rem pela desinfonnac. to conceitual quanto aos funda-mentos que regcm a express .to fotografica , 0 que os leva a estacionar

apenas no plano iconografico , sem perceber a ambiguldade das informa-

cocs contidas nas representacoes fotograficas, Resulta de tal desconheci-

mento, ou despreparo, 0 ernprego das imagens do passado apenas como

ilustracocs dos textos: 0potencial do documento nao e explorado, suas

inforrnacoes nao sao decodificadas, posto que, nao raro, se encontram

alern da propria imagem. (Kossoy, 1999, p. 20)

A investigacao ant ropol6gica, por exernplo, nasce junto com a neces-

sidade de artistas fot6grafos documentarern 0mundo desconhecido.

A sociedade deixa de retratar-se individualrnente para se reconhecerculturalmente nas fotografias e conhecer no outro seus costumes e habi-

tos, como afirrna Gisele Freund 0974, p. 82).

Uma outra questao: se a imagem fotografica nasce da observacao de

uma realidade que esta contida em urna estrutura cultural, ela vem carre-

gada de significados, de fragmentos que deverao ser moldados em um

relato unico e revelaclor. A imagern comunga com 0 texto para nos fazer

mel hor compreencler e elaborar uma analise desses significados.

o que se fotografa e a imagem do outro, e a imagem nao-verbal

tende a ser rnais carregada do ponto de vista emocional do que aquilo

que se expressa verbalrnente (Collier Jr., 1973, p. 22). A imagem e mais

52

A MAQUINA DEROUBAR ALMAS

(explicita, c a esse respeito Patricia Hitchcock, fotografa experiente em

campos de pcsquisa, afirrna que devemos aprender que nao sao todas as

pessoas que querem ser rctratadas, sendo preciso enxergar 0que elas

gostam de vel'. E mais:

Em algumas cul tu ras, fo tos ele pessoas que mor reram afasuun a ass i s-

tcncia. Numa cid.ide do norte da lndia, a s mulhcres se escondem para se

protegerem dos estranhos. Um m.uido pode fica I' muito aborrecielo sc

VOCl- mostrar urn retr.uo ela mulher dele :1 homens estr:lI1hos :1 f.rmilia

Mesmo em cielaeles oncle mocas podem d. incar for a ell ' casa em oCIs ic)es

ell' testa, os mais velhos nao gostam que fotos ell' suas filha-, dane.indo

sejam mostradas ao publ ico. As mops nao danc.un em publ ico, (Col lierl r.,

1973 , p . 23)

Mesmo que 0recurso audiovisual seja empregado sis tematicamente

nas pesquisas antropologicas, usa-se porern uma camara nao como urn

instrumento tecnico de investigacao, pois nao existe urn conhecimento

tecnico e muito menos um criterio de analise das imagens. Alern de

ilustrativa, a fotografia tornou-se uma parceira do trabalho de campo,

urn recurso imprescindivel para qualquer pesquisa. Assim como a antro-

pologia, ela ordena culturalmente os dados, os fragmentos da realidade,

atraves da observacao. Nesse sentido, tanto a escrita como a imagem

estao amarradas ao contexto cultural: "0 hornern e urn animal arnarrado

a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como

sendo essas teias e sua analise" (Geertz, 1978, p. 15).

Seguindo esse pensamento, podemos dizer que a imagem resgatada

pelo fot6grafo signi fica para 0antropologo nao so a esterica que a com-

poe, mas a historia , it cultura, 0que se opoe, em parte, :1 intencao de seu

autor. Mas nao seria um ponto de complernentacao, ja que podemos dar a

imagern um signi ficado que contribua para as pesquisas, para as invest iga-

coes e - pOI' que nao? - para 0 entendimento de nos mesrnos?

Com os desenvolvimentos tecnicos que perrnitirarn rcproducoes mais

nitidas, mais rapidas, as imagens fotograficas passararn a fazer parte do

nos so cotidiano. Mesmo que nem olhemos para elas, as imagens se

confundern. com 'a .realidade, banalizando-a, vivernos com elas, sern

entende-las.

Diante dos clientes ell' um cafe, alguem elisse justamente: - "Olhe

como sao apugados, as imagens slo mais vivas que a s pessoas". Uma das

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 26/64

FOTOGRAFIA E ANTROPOLOGIA

marcas do nosso mundo talvez seja essa inversao. vivernos segundo urn

imaginario generalizado. Vejarn os Estados Unidos tudo ai s t C, e ranslonna

em imagens: s6 existem, s6 se produzem e s6 se consomem imagens (. ..).

o que caracteriza as sociedades d itas avancadas e que hoje essas socie-

dades consomem imagens e nao crencas, como as do passado, sao, por-

tanto, mais liberais, menos fanaticas, mas tambern mais falsa s (rnenos

autent icas ). (Barthes, 1984 , p . 173)

Aprendemos aver apenas 0 que praticamente precisamos ver. Atra-

vessamos nossos dias com viseiras, observando apenas uma fracao do

que nos rodeia. Os homens modernos nao sao bons observadores e 0

uso de uma maquina fotografica pode auxiliar sua percepcao. No caso

da antropologia, 0 ato de fotografar pode dar uma visao global e uma

observacao detalhada.

Somente a sensibilidade humana pode abrir os "olhos" da carnara de

forma significativa para a antropologia. Para compreendennos a funcao da ca-

mara nas pesquisas, enrretanto, precisamos primeiramente voltarnossa aten-

cao para os fen6menos da observacao humana. (Col lier J r. , 1973 , p. 4)

Assim como na fotografia, as tensoes entre dualidades sempre existi-

ram na antropologia e, muitas vezes, por causa delas, solucoes foram

gerada~. 0co,~poe a a~ma, 0 uno e 0 diferente, a compreensao do "por

dentro e do por fora , a neutralidade e a participacao sao confrontos

que acompanham a pratica da antropologia.

o a~trop610go e urn observador integrante do objeto de estudo

(Lapla~tme, 1:8.8,. p. 185). Nao e testemunha objetiva observando obje-

tos, mas urn sujeito observando outros sujeitos, portanto, uma pessoa

narrando sobre outras pessoas. E esse e 0 grande desafio do antropologoa partir do seculo xx: ser urn observador participante e integrante do

campo de pesquisa. Esse fazerlsaber foi desenvolvido sobretudo atraves

da visao, segundo Bronislaw Malinovski.?

A condicao basica para urn anrropologo e fazer/saber, ser urn observa-

dor - urn observador clooutro e de si mesmo. Nesse sentido, 0 cuida-

clo cle preservar os dados e os resultados coletados 0 distancia desse

sentir, embora seu sentimento possa estar representado na imagem

2. Malinovski afi rma que 0 etnc' i ro d '.'. d: . oogo eve vivencrar c expcrimcnrar a cultura da populacao

que ~stui.,I. A socicdade tern que ser pesquisada como urna total idade no momcnro emque e observ.idn •

54

A MAQUINA DEROUBAR ALMAS

fotografica, por exernplo. Mas que tipo cle observacao 0etn6logo fot6-

grafo deve ter para narrar visualmente 0 verdadeiro quadro da vida, da

sociedade?

o etnologo" nao pocle carregar ideias preconcebidas ou preconcei-

tuosas. Cabe a ele colocar uma ordem, transformar 0 que e tido como

urn mundo sensacional, selvagem e desconhecido em uma comunidade

govern ada por leis e principios. Portanto, 0 olhar do antropologo e de

urn observador participante (Malinovski), que, alern cia coleta minuciosa

de dados e da compilacao de documentos, olha cautelosa e diretamente

para os instantes. Olha cada comportamento na rotina de trabalho, deta-

lhes como 0 cuidado com 0 corpo, a maneira clepreparar comida, 0 tom

de conversa, a vida social em volta do fogo, hostilidades e simpatias

entre eles... Observa apurando todos os sentidos, observa ouvindo, E urn

participante em todos os sentidos.

Essa cumplicidade entre observador e objeto observado pode desper-

tar momentos fundamentais e de grande apoio nas pesquisas. Da mesma

forma, a maneira de olhar na fotografia pode nos fornecer uma visao

ampliada das coisas - urn dado pode estar em forma de vapor etereo:

Por caminhos diversos, a antropologia e a fotografia alimentaram-se

de uma mesma fonte: a observacao. Existe, porem, uma distincao entre

registrar ever. Mas, afinal, como podemos diferenciar 0 ato de produzir

uma imagem etnografica e "tirar" fotografias? Como observar atentamente

e captar nao uma imagem ilustrativa, mas a representativa de emocoes,

afetos e sensibilidade do observado? Essa diferenca corneca na atividade

de olhar, no exercicio clo olhar, e sao esses processos perceptivos que

aproximam a arte de fotografar e a antropologia - ou as distanciam:

"quando se convive urn pOLlCOcom ambas, percebe-se que a distancia

que as separa e a mesma que as aproxima" (Leopoldo e Silva, 1992,

p. 141).

3. ETNOLOGA ramo da antropologia que estuda a culture das populucoes primitivas; ETNOGRAFIA

descricao material de um povo / parte integrande da etnologia. Utiliza-se as tres denomina-

cocs (antropologo, etn6grafo e etn6logo) sem distincoes na dissertacao.

4 . Foi assirn que Edward R.Tylor, urn dos classicos da antropologia , def in iu a alma vista pelos

primitives: ··U.l11aenue imagem scm corpo por natureza, uma especie de vapor, pelicula

ou sornbra , causa. da vida e do pensarncnto no individuo que habi ta; possui independen-

ternentc a conscicncia e a vontade do seu possuidor corporal anterior ou atual , sendo

capaz de deixar 0corpo muito atr{ls de si para ir velozmente de urn l ugar a outro; na

rnaioria dos casos, e invisivcl e intangivel, mas manifesta tambcm Iorca f isica e aparece

especi al mente aos mortais, em estado de sono ou vig il ia, como fantasma separado do

corpo que habita; finalmente, pode penetrar no corpo de outros individuos, animais e

rnesmo coisas, tornando posse dell 'S e nclcs int luindo" (1871 e 1958).

55

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 27/64

FO TOGR AFI A E AN l1 ! O PO LOGI A

Sao esses laces e essas brechas que ligam a anrropologia e a fotogra-

ria, 0observad r participante a observacao do artista. Ambos sao pro-

cessos que apontarn para solucoes ou para problemas nus investigacoes

e nas pesquisas. Isto porque

L') vernos que aqullo que a obra nos mostr; est1 neb, mas apon ta para alern

dela, pols n ao e ru en de rn os a o bra de arte como urna eXIXJsi{,-'ilo objetiva, amaneira de uma teoria descri tlva clo r eal, mas senumos que isso que para 0

meio dela nos e apontado esta multo proximo de n6.~,quando nao E ' . s l : i em nos,

A relacao estenca nos compromete porque a cria910 artisuci s6 rode ser eruer»

dlda nos (em1QS d e u ma pa.tidpa~'iio. (,..) No eruan to, s e PO I 'r n e io da ob ra d e a rt e

se d : ' 1 ~Iapreensao cia realidade, podernos dlzer que ai se encontrarn, ao

rnesrno tempo, uma consrataeao e urn problema. (ibidem, p, 142)

Em urn anigo publicado em Cadernos de Antropotogia e Imagem

(n. 2 , Howard Becker afirrna que geralrnenre distinguimo ciencia e

arte, mas que as duns logicas esrao aprisionadas em carninhos que 010

podem se misturar, Devernos tram-las, no enranto, mais como cornple-meniares do que como opostas.

Percebernos que, desde 0inicio, os fot6grafos tem lim interesse es-

pecial por lugares disrantes, povos exoticos, urn interesse pelo rnundo

social. A sociedade quer ver outras culturas e a ciencia quer saber mais

sobre elas, Na verdade. a fotografia ajuda a aprofundar a analise anrro-

pologica, quando bern feira esteticarnente, podendo assim facilirar a in-

rerpretacao e analise de alguns significados do objeto esrudado.

LADROES DE ALMA

M as 0 qu e e Fa ze l' f ot og r af ia s ? Re t ra ta r? E r n urn artigo da revista lmagens,

Ana Maria de Niemeyer afirrna que herdarnos uma perspectiva euro-

centrica, fria e violema na forma de retratar alguns povos. Antigarnente,

a ernografia preocupava-se apenas em focal' 0 objeto de sen esrudo,

neutralizando-o, para que nenhurn elernenro interferisse no processo

de analise, As imagens feitas em 1939 de urna rnulher de Fofa, na Africa

Oriental, ilustra bern esse distanciamento, Que muLher e essa da Africa

Oriental? Qual seu meio e seu comportarr~ento diante de algumas situa-

~oes? Que sensacoes essas irnagens podern transmltir?

Lldio Ciprioni, Muther de Foro.

Alrico Oriental, 1939

Vejarnos as fmos de Indios que Guido Boggiani, forografo e etn6grafo,

observou, participativamente, e registrou na aldeia dos Kadiweu. Com

auxilio da camara fotografica (934), registrou e documentou nao 56 as

pinturas feitas na pele das mulheres indigenas dessa aldeia, mas OUlrOS

elementos que perrnltissern aprofundar urna analise.

As fotografias erarn tiradas no habitat natural, no meio cia selva, masI

muitos dos modelos p rmaneciarn [moveis, talvez peJos temores que a

maquina fotografica provocava. Aquela "coisa" rnandada pelos deuses

dificultava a elaboracao das imagens, mas isso nao impediu que Boggiani

perrnanecesse entre 0 Kadiweu durante anos

0;7

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 28/64

FCTOGRAFIA f ANHOf'OlOGIA

A qualldade superior dos reiratos urados por Boggian; d[1 uirnbem a

entender seu estaturo no rnelo dos indios, suas relacoes mutua s. A des-

confiunca dos selvagens para com a objeto estranho e 0 medo de perder

sua alma cedendo sua lmagern ao outre, dlf lcultarn 0 oflcio de retrausta a

muucs fotogrufos, (Fric & Fricova, 1997, p. 27)

. - - . . . . .

o retracesnao sao apenas Un1 documenro de urna alcleiaindlgena, mas deuma comunidade real, viva; a o p SSCXlS m urn arnbiente lnt imo e humane.

A imagem cia "india c m a pinrura sobre a pele. fotografada por

Boggiani, revela nao 56 a pintura, mas urns naturalidad ao exibi-la,

como e vivenciada. Os simbolos e os desenhos tern para 0 grupo urn

valor sentimental, sendo Limarnanifestacao ciavida, dos rnltos que fazern

parte da pratica cultural. A foro cia indio revela a alrivez e a deterrnina-

~a o cia tribe.o olhar de Boggiani eternizou a alma indigena, a cultura, a arte na

pele dos Kadiweu, aruando como antropologu, fot6grafo e artista. M<lS

GUIdo Boggiool,

• Velhode cobelo bronco,Iribo Chomccccc,

, A ile do Paroguol, 1896

I

A d l re n o .

Guido B099ioni, M uJher lovern

pmtccic, Nob,leque,

Molo Grosso do S w l , 1897

A M AO UIN A D E R OU BA R A LM AS

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 29/64

GU ido Bo991on l , l o a r ", .~rio-,mb o Chomococo, Alto do Poroguoi. 1896

sera mesrno que a carnara nao pode tambern captar a alma para rnelhor

transrnlt ir e sentir uma cornunidade?

( . .. ) a objeto que nos ve e 0 mundo que ospensu. A coisa a ser foiogra-

fsda quer ser csptada diretamente, violada ali mesmo, lluminada no seu

deta lhe, na sua qualidade fr acta l. Serne que uma colsa quer ser forografada,

quer tornar-se irnngern, e que nao e para dura r, e p:JX~1elhor desapurecer,

Criar uma imagem conslsie em if retirando do objeio todas as dlrnensoes,

uma a uma: 0 peso, 0 relevo, 0 perfume, a profundidade, a tempo, a

conunuidade e, Ii! daro, 0senLido. (Baudrillard, 1997, p. 30)

Afotografia comofeitico foi 0 tl tulo que Laymen Garcia dos Santos

deu it exposicao de fotograflas que Claudia Andujar realizou, em 2000, no

Museu da Irnagern e do Sorn CMlS) , em S ao P au lo , e assirn a apresenta:

(..J D~Ifulgurdncia t da ardencla do mundo do outro, a processo fotogra-

[jeD filln1 irnagens do outre mundo. Trata-se de urn mundo em gestacao,

SUH forca eruretanro e bastan ie para apossar-se da cflmara que nele pene-

Ira, contagia-la e convene-la, ntio em instrurnento de descoberta e explo-

ra\,:ilo. Em feitico para 0nosso encantamento, (MIS, 2000)

A fotografa declara que ficou entre as Yanornarni durante muitos

anos, criando urn acervo de rnilhares de negativos, que considera urna

mina replera de imagens de urna hist6 ria, de uma culrura e de urna

comunidade, Trata-se de urn trabalho estetico, cientifico e cheio de

signlflcados.

Face c?mo as Yanornarni, que st ilo elaborando sells mhos, ju stifi-

cando-os, r et rabalhando cont lnuamente a oralidade de sua hist6ria, paraajusta-Ia ao novo, aos tempos de hoje. Uma bricolagern de adaptacao e

atuallzacso dos tempos dos mitos primordia is. Sern esse passado, a sua

h lsro ria, a br icolagem cal rla no vazio, E t por isso que a rnernorla rem

fun~ao vital no prccesso de adaptacao e elaboracao do novo, (...) Meu

trabalho ainda nao encon trou sua forma deflnirlva, que na verdade creio

q~e nao existe, Como as rnitos se adaptam, incorporam novas Irnagens e

tornarn novas fo rrnas, passarn pela r ranscod iflcacao (das imagens) para

se arualizar, numa brlcolagern uirtual lnflnira. (Andujar, 1998, p. 11)

1 ' \ 1

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 30/64

fO l' OGAA f . .. . E Ho I lRO l 'O l OG lA

Nada melhor para ilustrar esses sentirnentos do que as imagens de

Claudia Andujar, acompanhadas do texto do rnito Yanomami:

. . . . ~ j ; . .: : . - "

..... ..- _

£

~ 1

C loud la Andu ja r , YanamQmr, 1998

o invisivei

Quando se toma pela prime ira vez a

p6 da aware yakoanahi, as espiriros

xapir ipe cornecarn a chegar are voce. Prt-

meiro, ouvem-se de longe seus camas de

alegria, renues COmo zurnbidos de rnos-

qultos. Depois, quando os olhos estao

morrendo , comeeam-se aver Iuzes cint l-

lames que trernern nas alturas, vindas de

todas as direcoes do ceu, Aos poueos, as

espiriros se revelarn, avsneando e recuan-

do corn passes de danca rnultos lentos,

( .. .) Suas cabecas sao cobertas de phi rnu-

las brancas de gaviao e suas bracadeiras

cheias de rabos de amra e de papagaio.

Dancam em circulo, sern pressa , mas, de

repente, armadas com grandes "espadas",

pattern ao meio sua coluna vertebral. Cor-

tam sua"cabeea e sua lingua. Serue-seen-

tao uma dar intensa e voce desrnain. Sell

envelope corporal fica no chao mas os

xapi rite voam para longe, levando as par-

tes do seu corpo irnaterial. Deitarn-nas

em seus espelhos, nas costas do Cell, e

plntarn-nas com u ru cum , R a sp a rn SUII lin-gua e a cobrem de plurnulas bran cas.

Mals tarde, recornpoern seu corpo, mas

ao contrarlo:juntarn a cabeca no Iugar do

traseiro e as pernas no lugar des braces.

Uma vez virado do avesso, voce pode

responder aos espiritos e irnitar seus

cantos, voce pode ser urn xama, (Davi

Kopenawa Yanornami, apud Andujar,

19~8, p. 6 6)

C laud io AnduJa r , Y c nomQml . 1 9 98

,

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 31/64

A VISUALIDADE NA ANTROPOLOGIA

Pierre Verger, Porto Prin.dpe, Hoill , )948

As p a la v ra s na o passam d e im ag e n s d a ma te ri a.

A p ai xo na r- se p or e La s Ii a pa ix on ar -s e p er u rn q ua dr o.

F r an ci s B a co n , 1 9 92

A I 'LSUAl lDAOE NA IINTROI'Ol .OGIA

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 32/64

o PERCURSO OA ANTROPOLOGIA VISUAL

Apesar de todas as tensoes e duvidas geradas pelo invento do

daguerre6t ipo, houve urn rapido desenvolvimento tecnol6gico da ima-

gem fixa. A fotografia ficou barata, m6vel e rapida, introduzindo uma

nova vlsao para 0 entendimento humano. E, principalmente, perrnitiu-

nos enxergar a realidade das pessoas e das coisas com urna visao muito

rnais legitimada do que a pintura, embora, COmoafima Collier, os criticos

possarn alegar [ustamente que, as vezes, esta aceitacao do real isrno in-

discutivel da camara e mais mistica do que real. A rnaquina pam muitos

nao pede mentir (Collier jr., 1973, p. 5).

Com a decadencia do fazer retratos de farnilias burguesas (900),

alern da evolu~ao da tecnica e da sirnplificacao dos procedimentos fotogra-

ficos, a fotografla pode entrar na vida de cada individuo. Nesse sentido,

ela passa a ser uma forma de descoberta do cotidiano, do social. Os

rep6rteres-fot6grafos registram uma serie de fotos selecionadas e edita-

da s que mostram om mundo ate entao desconhecido. Por exemplo, Eugene

Atget forografa as prost itutas de Paris; Alfred Stiegl itz , 0 rransporte: ePaul Strand sai pelo mundo buscando outros povos.

Alias, desde sua invencao, a fotografla e os fotografos fizerarn-se

presentes na vida social e em festas populares. Muiros artistas - como

Man Ray, Brassai, Doisneau - participavam de festas como fonte de

suas criacoes, e outros fot6grafos apenas documentavam e testemunha-

varn as multiplas faces dessas festas (Iezequel, 1996).

Foi exatamente nesse cenario de intensa vida social, e par ser teste-

munha dessa oerdade, que surgiu a fotografia em serie, A aposta de urn

excentrico e rico frequentador de hip6dromos pede basear-se em foto-

grafias quando eie contratou Eadweard Muybridge pam registrar 0galo-

pe de urn cavalo, Muybridge (1872) engenhosarnente colocou dozecamaras, uma ao lado cia ou-

tra, e as fez disparar em urn

tempo sincronizado, criando

uma sequencia de imagens e,

consequenrernente, uma ante-

cipacao da Jinguagem cinema-

tografica. Ele provou que, em

urn memento determinado do

galope, urn cavalo mantern as

quarro patas no : : f .

Muybridge nao s6 elabo-rou uma fotografia sequencial,

mas tambem nos fez repen-

sar sobre a nossa percepcao

cia realidade: "S e a camara nos

rnostra assirn, assirn deve ser"

(Guamer! 1997, p. 148). Ainda

Muybricige, em 1887, publicou

onze volumes do Animal

Locomotion, com vinte mil

foros com estudos de todos

~ . - - = ~ ~ · B ~ · . ~. ~ _ ~ _ ~. ~ : . J . I

E a dw 8<J rd Mu y b ri dg . ., C a po d a S d oo ti ll c AmeriCll'i), 1878

FOTOGRAFIA E ANTROPOlOGIA A VISUALIDADENA ANTROPOlOGIA

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 33/64

os movimentos possiveis dos animais e dos homens - urn trabalho que

rnais tarde seria utilizado para investigacoes cientificas.

o metodo de Muybridge foi utilizado depois pelo frances jules-Etienne

Marey, que mostrou para a Academia de Ciencias de Paris, em urn rolo

de papel celul6ide, a sequencia de vinte imagens de urn corpo em mo-

vimento, disparadas por segundos, dando inicio ao processo da carnara

de filmar. Alguns anos depois, 0fisiologista Felix Regnault combinou sua

investigacao de diferentes grupos etnicos com 0registro visual. Os mo-

vimentos - como () j eito de caminhar, trepar em arvores - foram filma-

dos e documentaclos para estudos posteriores.

Podemos dizer que neste periodo, por volta de 1890, inicia-se a uti-

lizacao clos recursos visuals na etnografia, mas a consagracao do conhe-

cimento desses recursos vem mesmo com a projecao publica do filme

dos irrnaos Lurniere. Foram documentadas as cenas mais corriqueiras,

como a saida clostrabalhadores da fabrica de automoveis Peugeot, aguar-

dando em fila 0momenta de bater 0 ponto, Foi 0maier espet.iculo:

multidoes queriam vcr exatamente essa trivialidade, 0cotidiano, ccnas

"rea is" de gente andando pelas ruas, tomando banhos de mar e movi-mentando-se em comboios a entrar em estacoes.

Depuis Louis Lumiere, :1qui on doit l'invention, en 1895, du cinematogra-

phe et ~ qui l'on doit aussi la realisation des premiers documents filmes

d'ethonographie, les specialistes des sciences de l'homme ont peu it peu delaisse

ce moyen procligieux d'analyse du mouvement et d'enregisrrernent du "temps".

Auspectable des innombrables etudes de Muybridge mises ainsi en f ilm,

i l se degage une certaine ethique de lar echerche que les anthropologues ont

presque totalernent ouhliee depuis. (Godelier , 1976, p. 106).

Sem duvida, essas sao imagens que mostram urn forte acento etno-grafico, com registros de urna antropologia urbana. Recorria-se a camara

fotografica para mostrar as condicoes das favelas de Nova Iorque, e

camaras armadas com flashes de p6lvora registravam cenas de banditismo,

interiores das casas e escolas (Collier Jr., 1973, p. 6)

Na verdade, nao foi sornente a descoberta de urn mundo desconheci-

do que atraiu multidoes, nao foi apenas 0cotidiano das ruas, mas sim as

imagens que encantaram e encantam 0mundo:

C..) 0 que atraiu as primeiras ruultidoes nao foi a saida duma fabrica , ou

urn comboio a entrar numa estacao (bastaria ir ate a estacao ou ate a

fabrica), mas uma imagem do comboio, uma imagem da saida da fabrica.

Nao era pelo real, mas pel a imagem do real que a multidao se comprimia

as portas do "Salon Indien", Lumiere t inha conseguido sent ir e explorar 0

encan to da imagem cinematograflca . (Morin, 1970, p. 21)

Lurniere teve a intuicao genial de fazer das imagens mais comuns urn

espetaculo, aumentando duplamente a impressao de realidade da foro-

grafia, dando as coisas um movimento natural. E nesse momenta que a

obtencao da mais apurada fidelidacle dessa realidade pode orientar as

aplicacoes cientificas. E aqui cabe a reflexao de Morin: "A tecnica e 0

sonho andarn, de nascenca, a par. Em nenhum momenta da sua genese

e do seu desenvolvimento se pode confinar 0 cinemat6grafo ao campo

exclusive do sonho ou da ciencia" (1970, p. 16).

A imagem vive essa dicotomia entre 0 fantastico e 0 real. Nesse sen-

tido, pode-se afirrnar que a imagem nunca podera dizer algo do mundo,

que ela nao tem a objetividade necessaria para compor urn discurso

cientifico.

A relatividade no decorrer da recepcao da imagem, evidentemente

lastimavel no campo da pesquisa cientifica, e pelo contrario parte inte-

g rante do d ispos it ivo art is tico. Quando se faz fotografia arti srica , ou p in-

tura , n .io representa incornodo 0 faro de 0 receptor atribuir toda s as

slgnificacoes que quer naquilo que esta vendo: mergulhamos, nesse

memento, no dominio da sub je tividade e da sens ibi lidacle, nao do discur -

so racional. (Darbon, 1998, p. 108)

Toda imagem tem necessariarnente um autor; arras da camara existe

o observador. 0aptrop6logo nao e urn autor? Ele nao trabalha 0inespe-

rado e0

novo com0

mesmo carater da arte. Nao pode usar os meiosvisuais, porque, diferentemente cia razao da ciencia, "a obra de arte tem

a final idade de agradar, proporcionar prazer, excitando nossa irnagina-

cao a ponto de nos levar a sentimentos e percepcoes dantes insuspei-

tados" (Leopoldo e Silva, 1992, p. 142).

o ternor das Ciencias Sociais e exatamente ate onde 0campo das

producoes materiais e utilitarias, artisticas e esteticas, definidas pela

enorme visualidade, foi verdadeiramente contemplado e pensado en-

quanta canal expressivo das culturas humanas (Samain & Solha, 1987).

Mas se pensarmos na visualidade como registro e na visualidade da

antropologia, 0filme, por exernplo, e urn testemunho e urn docurnen-

Q

FOTOGRAFI A E ANTROPOLOG IA

I

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 34/64

tario da realidade vivida, tornando-se urn instrumento poderoso para a

mem6ria coletiva. Atraves das imagens, podemos aproximar mais as

lernbrancas e as sensacoes daquilo que vivemos e estamos vivendo

(Pollak, 1989, p. 11).

Continuando 0percurso da hist6ria, a fotografia passou a ser a ilustra-

cao cientifica e documental para as academias de ciencias da Europa. Em

1900, a arqueologia introduz a fotografia nao s6 como urn meio ilustrativo,mas como ferramenta na coleta de dados de campo. Durante os anos

seguintes, 0filme e a fotografia foram instrumentos para investigacoes -

como ados aborigenes australianos por Baldwin Spencer. Mas0primeiro

filme etnografico foiNanook of the North, de 1922,sobre a vida dos esqui-

m6s, feito por Robert J . Flaherty, que nao se considerava etn6grafo mas

cineasta; mesmo criticado por suas inovacoes na forma de filmagem, foi

considerado 0pai do cinema etnografico (Guarner, 1997,p. 149).

Filmes etnograficos sao real izados desde 0 inicio do seculo, sendo

class icos , na decada de v inte, os real izados por Robert Flaherty. Nanook

of the North, 0famoso de Flaherty sobre a vida dos esquimos, aparece em1922, mesmo ana em que e publicado Argounatas do Pacifico Ocidental,

de Malinowski (oo.). Os dois autores inves tem na ten ta tiva de reconst ru-

cao da sociedade como totalidade articulada e integrada, dotada de sen-

t ido proprio. Para ambos , a h is t6 ria deveria emergi r do proprio material

de pesquisa, e 0 impor tante era cap tar 0chamado ponto de vista do

nativo. (Caiuby, 1998, p. 115)

Paralelamente, a arte fotografica era utilizada pela etnografia em

estudos extensos de recuperacao de culturas indigenas e registros de

nOVasculturas.

Quais os recurs os especiais da carnara que tornam a fotografia de

grande valor para a antropologia? A carnara e um instrumento automatico,

mas urn dos rna i s s ensiveis as atitudes do seu operador. Como 0gravador

de fita , ela documenta mecanicamente, mas a sua rnecanica nao limita,

necessariarnente, a sensibilidade do observador humano - ela e urn

inst rumento que exige sele tividade. ( . .. ) Quais as l imi tacoes da carnara?

Fundamentalmente, sao as limitacoes dos homens que a usam. (Collier

Jr., 1973, p. 5)

REPENSANDO A IMAGEM

Com a evolucao tecnica, 0aparecimento do Formatode 16 mm e de

maquinas fotograficas rnais leves, a utilizacao dos recursos visuais tornou-

se mais sistematica nas mvestigacoes socioculturais. Os pioneiros na apli-

cacao desses recursos em pesquisas e analises foram Margaret Mead e

Gregory Bateson.

Entre 1936 e 1938, aproximadamente, Mead e Bateson elaboraram

urn trabalho sem precedentes na historia das Ciencias Sociais. Eles pro-

curaram, atraves de recursos fotograficos, entender 0carater dos bali-

neses. Mas, antes de utilizara linguagem visual, ficarammeses observando

na perspectiva de uma antropologia tradicional. Observaram e anotaram

a-maneira de ser do povo de Bali, mas entenderam que as descricoes

verbais jamais alcancariam aquilo que uma apreensao visual do ethos

balines chegaria a desvendar e a dizer (Sarnain & Solha, 1987). Seus

objetivos eram claros: nao queriam apenas pesquisar os costumes

balineses, mas como "as pessoas vivem, cornportam-se, comem, dan-

earn, dormem, entram em transe e incorporam essa abstracao a qual

chamamos de cultura" (Becker, 1996).

o trabalho de pesquisa era aprofundar os estudos da esquizofrenia

em criancas. Escolhem Bali para investigar, principalmente 0 transe como

comportamento cultural institucionalizado. 0 diretor da Clinica de De-

senvolvimento Infantil, Arnold Gesell (945), tarnbem utilizou a fotogra-

fia no dia-a-dia de muitas criancas para cstudos de comportamento e

desenvolvimento social, 0que influenciou profundamente a psicologia

infantil. Mas, como afirma Collier, seu trabalho nao se compara ao de

Bateson e Mead. Estes utilizaram mais de 6 mil metros de filme e 25mil

fotos - que resultaram num livro com 759 fotografias, chamado Balinese

Character. A Photographic Analysis (942).

Esse livro constitui uma autentica revolucao metodol6gica na tecnicas

de coleta de dados e consolidara 0status da fotografia como ferramenta

na investigacao cultural. Seu conteudo evidencia a importancia das ex-

periencias corporais, da gestualidade, dos olhares e dos jogos do pr6prio

povo balines (Guarner, 1997, p. 150).

Mesmo com 0interesse na elaboracao das pesquisas, Mead e Bateson

cuidavam desse povo como individuos a partir de urna observacao parti-

cipativa. Uma pesquisa que vem de uma compreensao e aprendizado,

resultado dessa observacao e empatia. Antropologia aplicada nao e apenas

um meio de ver c registrar c um modo de participar e perceber 0outro.

71

FOTOGRAFIA E ANTROPOlOGIA A VISUALIDADENA ANTROPOlOGIA

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 35/64

We tried to shoot what happened normally and spontaneously, rather

than to decide upon the norms and then get Balinese togo through these

behaviors in suitable lighting. We treated the cameras in the field as

recording instruments, not as devices for illustrating our thesis. (Bateson

& Mead, 1942)

Depois desse trabalho, ambos continuaram a utilizar a fotografia:

Mead em seu interesse continuo pe!o desenvolvimento infantil e Bateson

no estudo da comunicacao nao-verbal. Mas nenhum outro trabalho

nessa proporcao de invest igacao fotografica foi fei to desde 1942; 0que

existe sao referencias ocasionais ao uso da camara (Collier Jr., 1973, p. 9).

Por exemplo, Edward Hall estudou por fotografias 0significado do uso

do espaco, "proxemics' (966). Ray Birdwhistell recorreu a fotografia

para estudar os gestos e as posturas culturais padronizadas, aos quais

chamou cinesica. Paul Byes, fot6grafo profissional , esta trabalhando

para compreender a funcao do fot6grafo e do investigador - urn en-

tendimento da relacao do sujeito da antropologia e da fotografia.

Os antropologos aceitaram em parte a util izacao da fotografia como

ilustracao de uma cultura, mas nao confiam nos mecanismos da rnaquina,

na maneira distorcida da visao e da percepcao humanas. Varias sao as

reflexoes a respeito da falta de importancia dada a linguagem visual na

antropologia. Margaret Mead, que elaborou sua pesquisa aplicando os

recursos visuais, coloca algumas observacoes. nao podemos minimizar 0

fato de que fotografar exige cornpetencia, habilidade e treinamento mai-

or que simplesmente escrever no diario e gravar. E, neste sentido -

continua -, e onde esta a "nossa criminosa negligencia'' . Nao 0fazemos

por acreditar nos altos custos de tempo e dinheiro.

John Collier, por sua vez, colabora como fot6grafo em varias pes-

quisas etnograficas e passa defini tivamente para antropologia quando

seus estudos sao dedicados aos novos metodos fotograficos e as for-

mas de aplicacao em trabalhos interculturais de campo. Suas pesqui-

sas foram da orla maritima do Canada as reservas dos indios navajos.

o autor afirma que os antropologos se sentem frustrados em relacao a

fotografia, pois algumas imagens tern inumeras referencias e, pela falta

de urn metodo de analise e de leitura, fica quase impossivel organizar

todos os seus dados. Na verdade, afirma, a mem6ria do filme substitui

o livro de anotacoes e registra situacoes dificeis de descrever textual-

mente.

7?

Urn antropologo contou-me 0que sentia a respeito da fotografia. Nao

e que a fotografia nao seja boa. Ela e otima. Asfotografias sao 0mais puro

realismo. Content tudo. Temos aperfeicoado tecnicas para compilar dados

verbals, mas 0 que podernos fazer com fotografias? Esta e sem duvida a

dificuldade. Uma fotografia pode corner mil rcfcrencias. E, 0que e mais

desconcertante, a maioria das fotografias e prova de urn minuto de tempo

- de urn centesimo de segundo da realidade. (Collier J r . , 1973, p. 9)

Etienne Samain, por seu turno, pondera que a antropologia visual

tende a ficar confinada ao registro de atividades corporais (posturas e

movimentacoes espaciais de participantes durante urn ritual) ou materiais

(trabalhos artesanais e atividades esteticas), quando de fato poderia contri-

-buir a um redimensionamento de campos aparentemente mais abstratos,

como 0parentesco, a politica, a economia, a organizacao social e mesmo

a ideologia.

Nessa linha, e possivel amp liar ainda mais 0alcance da antropologia

visual e afirrnar que ela pode contribuir para a identiflcacao e 0reconhe-

cimento de sentimentos, ernocoes, sensacoes, e, como afirma Geertz,

dentro de um contexto pr6prio para que esses gestos sejam melhor in-

terpretados. A integracao c\as linguagens visual e escrita pode favorecer

o melhor entendimento dos significados culturais, tornando as investiga-

coes e as pesquisas mais completas.

Para ilustrar essa assertiva, selecionei aspectos da obra de Pierre Verger,

ilustre pesquisador da cultura afro-brasileira.

73

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 36/64

DE PIERRE EDOUARD LEOPOLD VERGER

A PIERRE FATUMBI VERGER OJUOSA

PierreVerger,AURHetrolo, Bohle, 1946

N ao s omes riDS quem esco lhe r nos .

s ao e le s q ue m n os e sc olh em .

P ie rr e V e rg e r

DE ~IERJ lE~DOI .JAROt tOF'OLD VERGER11 P I E R R E fl\TUMSI V E R G E R OJL!osA

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 37/64

VERGER, 0 FOTOGRAFO

Pierre Edouard Leopold Verger nasceu em Paris, em 4 de novembro

de 1902, de uma familia burguesa de origem belgo-alema, Sentiu de

perto a morte com a perda da mae e do irmao em urn acidente de carro,

Talvez por refletir 0estilo boernio e burgues em que vivia seu irmao, sua

opcao foi viajar e enconrrar seu proprio estilo e identidade.

Descobre a fotografra e se apaixona. Parte viajando pels Europa em

1932, com uma rnochila, uma rnaquina RolIeiflexe usando qualquer rneio

de transporte. Viaja durante quinze anos, passando POI' : America do Norte,

Poliaesia, Extremo Oriente, Africa, Caribe, Antilhas e, finalmente, Brasil.

Pierre vergertern participacaoativa como fot6grafo na Europa, em 1930;

epoca em que a fotografia estavaern plena euforia criativa e uma geracao

de novas fot6grafos preocupava-se em registrar e documentar a vida social

e cultural do munclo. Surgem names como Pierre Verger, Pierre Boucher,

Emetic Feger e Denise Bellon que em Paris criararn a agenda de fotos

Alliance Photo 0934-1940), intensificando a rnovimento de fot6grafos

como Robert Frank, Robert Capa, David Seymour, Henri Cartier-Bresson,que mats tarde criararn a Magnum Photos (947). Esses fotografos tinham

interesses e preocupacoes jornal ls ticas e documentais, com particular aten-

~ao para as formas de vida das pessoas, seus olhares, seus costumes, seus

cultos, seus mitos, ere, Henri Cartier-Bress~n, por exernplo, pesquisou e

Investigou varies paises, como fez Verger. Ambos buscavarn urn sentido

investigative e social nas fotografias, uma nova forma de ver 0mundo,

uma observaeao que os fizesse sentir participantes do mundo.

A Segunda Guerra Mundial, entreranto, interrompe esse processo e

essa uniao dos fot6grafos na Franca. Filmes e camaras eram alvos diretos

do nazismo, e os fot6grafos dispersaram-se conquistando novas formas

de trabalho. Mas, para quase [ados des, 0objetivo major era uma buscahumanistica e - par que nao? - antropologica, como foi depois mos-

trado em suas imagens, as quais cantribuiram para enriquecer 0entendi-

menta da vida social e cultural de varies povos,

Par volta de 1958, artistas publicarn livros das imagens obtidas em

suas viagens. Robert Frank publica LesAmericains e, quase na mesrna

epoca, Pierre Verger e Werner Bishop lancarn fotografias no livro From

Incas toIndians, todos editados par Robert Delpire.

Verger, como reporter forograflco, trabalha nas melhores publlcacoes

nnmdials, tendo a oportunidade de sentir e apreender outras culturas,

Na passagem par jornais e revistas, tem a oporrunidade de conhecer e

rerratar outros povos. Trabalhando para a Parts Soir (1934), VJaJ<1 ao

redor do mundo: Estados Unidos, japao, China e outros: para a Daily

Mil7"Or(Londres, 1935-1936), val a Indochina; para a agencia Ailiance Photo

(937), faz varias coberturas fotograficas, para a Life (1937), e correspon-dente de guerra na China; para a Match (Londres, 1938), faz varias repor-

tagens no Vaticano. Trabalha ainda para Argentina Libre (1941-1942),

[ornal anarquista, para ElMundo Argentino (942), revista especializada

em fotogrsfias, e para 0Cruzeiro (Brasil, 1946). lDados biograflcos ex-

traidos da revista Afro-ASia (Luhning, 1998/99).]

Pierre Verger, N ov e O n e< lM . • cS !< ld os U ni do ., 1 93 4

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 38/64D E P IU I! ( ~ O OU A RO L E O P O L D V E R G E R A P I E R RE F A T U M B I V 1 'R G E R o J u o e A

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 39/64

Pier re Verger . Xcnllai, C h in o. 1 93 7

Nas imagens do periodo de 1933a 1946,exi ria urn interesse de Verger

na leitura da Iuz e dos contrastes, preocupacoes esteticas que nao 0dis-

tanciavarn do carninho de etnologo. Desde essa epoca, como observarnos

nas imagens, 0 registro dos costumes, dos habitos de negros em diversas

cidades do mundo demonstram seu interesse pm esse povo, A editora e

fotografa Arlete Soares a r u m a que, a partir de 1946,ele deixa de fazer foro-

graflas e trata as irnagens apenas como registros da cultura afro-brasileira.

Na verdade, nao seria uma comunhao do fot6grafo e do etn6grafo?

Vergerviaja para a AfricaOcidental no periodo de 1935-1936 e descobre

a cultura ioruba, seu interesse e tanto que 0caminho da fotografia 0 trans-

formaria, tambem, em antropologo e pesquisadar. Somente em 1946, quan-

do chega em Salvador, e que ele descobre a relacao que a tomaria urn

grande conheceder da cultura afro-braslleira. Corneca com os retratos do

povo baiano, seus gestos, habitos e costumes - contando tarnbern com a

visao dos desenhos de seu amigo e tambern estrangeiro Carybe, argentino

de nascirnento, que reune em desenhos os mites da cultura afro-brasileira,

81

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 40/64

P i e rr e Ve r g er , So l v od o r , B ' o s ;l , 19 4 6 - 196 2

/

FATUMBI, 0 RENASCIDO DE IFA

Na revista 0 Cruaeiro, Verger publico-u, com rextos de Gilberta Freyre,

uma serie de reportagens (mais de 110 ireportagens realizadas, 80 publi-

cadas) sabre aexistencia, na Costa Ocidental da Africa, Nigeria e Benin,

de descendentes de traficantes negreiro.s e de ex-escravos retornados do

Brasil. As cinco reportagens com 0 titurlo "Acontece que sao baianos"

foram publicadas em agosto de 1951 e republicadas por Freyre em

Problemas brasileiros de antropologta (1'959) e, ainda, em Bahia e baianos

(1990). Segundo Alberto da Costa e il""a (999):

Embora lmpressas num acastan.hado escuro, as FOLeserurn excelentes,

e algumas, cornovedoras. ( .. .) Ja as prosas de Freyre rrunsformaram-se nn-

quele fino ensaio, "Acontece que sao baianos...", induido em Problemas

b ras ue tr o s d e an tr opo l og t a. 0 que esurpreendente t: que tenha de escrito

pdginns tao aferuosarnente verdadeeiras sabre descendentes de braslleiros

no golfo de Benin, asagudas au arruoros (como sa o conhectdos ria lgeria),

sern ter estado [arnais naquela p~LI-[edo mundo, e com base apenas nas

imagens e Informacoes trazidas po r Pierre Verger(..J

o olhar curtoso de Verger sabre a h urnanidade e 0amor pelo desco-

nhecido 0 tornam urn pesquisador ern etnografia, sendo considerado

doutor pela Academia na Universidade 50rborme (966) sem nem mesmo

ter LIma formacao acadernica. Isso porque Verger observa atenta e inten-

sarnenre a cultura, sobretudo a africa na. Com urn olhar fotografico e

antropologico, elabora lima das primeiras einografias - Notas sobre 0

culto aos Orixas e voduns (1957, 1998) - e urn trabalho considerado

como irnportante investigacao cientif ca: Pluxo e refluxo do trdfico de

escrauos entre 0 Golfo do Benin e a Ba&ia de Todos os Santos, dos seculos

XVII a XIX (1968, 1987).

o fot6grafo Verger conquista a mundo e descobre-se etnologo quan-

do perrnanece na Africa par vinte anoes esrudando e pesquisando a cul-

tura e a religiao africanas. Nasce Pierre Fatumbt Verger. Aprende entao

as rotas dos navies negreiros, observa, rrabalha, fotografa ... Apoiado

pelo Instirut Francais d'Afrique Noire <Ifan), recebe uma bolsa de escu-

dos e pesquisas, e Theodor Monad, ciiretor do instituto e tambern seu

amigo, exige que codas as anotacoes e os escudos sejam escritos,

A antropologa Juana dos Santos, em Salvador, declara, em depolmeruo

no video Verger: mensageiro entre doiis mundos (1998), que ele era um

83

FOTOGRAFIA E ANTROPOLOGIADE P IERRE EDOUARD LEOPOLD VERGER A P IERRE FAIUMS I VERGER OJUOBA

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 41/64

"fucador" de arquivos. Ele nao era fundamentalmente antropologo, era

urn etn6grafo; foi 0primeiro a mostrar a similaridade do ferramental do

sacerdote Shang6 africano com 0brasileiro.

Fatumbi foi mui to importan te, po is inic iou os estudos sobre 0trafico de

negros entre Africa e Bahia, mostrando que existe uma relacao forte e uma /

continuidade marcante de brasileiros no Benin, assim como de africanos

na Bahia. Jorge Amado, na nota introdut6ria do livro de Verger (999), diz:

Na Africa, quem quiser saber dele deve perguntar por Fatumbi, titulo

que the derarn ialorixas e babalaos e que ele incorporou a seu nome,

po is a personalidade do professor e do pesquisador, homem da Univers i-

dade e do livro, se fizera mais rica de humanismo, e ele tornou-se ho-

mem igualmente, ou sobretudo , do peji , da camarinha, da roda-de-fe ita.

Na Africa, ensinou e aprendeu nao apenas a rota completa dos navios

negreiros, ainda mais a trajet6ria do misterio. Fez-se feitic eiro: Pierre

Fatumbi Verger. (p. 5)

o historiador Luis Vianna Filho afirrna ser admiravel 0trabalho de

Fatumbi pelo aspecto hist6rico e social da escravatura na Bahia, funda-

mental para a cornpreensao da formacao de uma sociedade profun-

damente mesclada culturalmente. Mais admiravel ainda foi a dedicacao

que Pier re Verger dell as suas pesquisas, com extensa bibliografia.

Gilberto Freyre, em texto publicado pela revista 0 Cruzeiro e arqui-

vado no acervo da Fundacao Pierre Verger, rcssalta:

[Verger sahe] juntar a simpatia pelos assuntos que estuda, a capacidade

de considera-los com a distancia necessaria a objetividadc cientif ica. Ao

que se deve acrescentar ainda outra condicao, ra ra em e tnologos e antro-

p61ogos profissionais: a de ser Pierre Verger um horncm livre. Livre decompromissos rigidamente acadernicos . L ivre das ligacoes burocra tica-

mente universitarias. Livre de obrigacoes para com esta ou aquela orto-

doxia cientifica. Dai a frescura de suas paginas de divulgador e, ,I S vezes,

revelador de culturas exo ticas. Dai 0 seu encanto artistico que, nas suas

fotografias, se junta a cxatidao - exatidao que lhes da categoria de

documentos cientificos - sem os prejudicar ou comprorneter. CApud

Luhning, 1998-1999, p. 322)

"Podernos estudar cern anos com 0que Pierre Verger s6 nos apontou

como pistas", declara Milton Guran, fot6grafo e antropologo, autor de

Agudas, os brasileiros do Benin. E acresccnta: "a cornpilacao historio-

grafica c total, plena e de maior competencia em cima dos traficos dos

negros; 0trabalho fei to no livro Fluxo e refluxo de escrauos , todos os docu-

mentos possiveis estao la" (video Verger:mensageiro entre dais mundosi.

Sua tarefa como etn6grafo e observador foi tambern a de escrever e

anotar todas as suas experiencias por exigencia do Ifan e de sell amigo

Monocl. A relacao de Verger com a cultura negra aos POLCOS ultrapassa 0

interesse intelcctual. Mais do que um observador participante, segue os

passos de seu amigo c tambern etn6grafo Roger Bastide: cnvolvc-se no

candomble, em que e aceito e iniciado, passando a exercer funcoes nao

mais como um olhar "para fora", mas como um participar "por dentro".

Em Ketu (Daorne), c iniciado como babalao (pai do segredo), sacerdote

de 1m (dono da adivinhacao e do destine). Ele se torna Faturnbi -

"renascido pelo 1f{\" :Pierre Fatumbi Verger.

Em uma carta dirigida ao sell amigo George Metraux, tarnbem antro-

pologo, Verger declara:

Enconu«! sua carta no retorno de Kcrou, onde eu cheguei Pierre

Verger e de onde voltei Pierre Faiumhi Verger, 0 que signific«: "If :! me

entregou ao mundo." E por dcrnais presuncoso, pois se em meu compor-

tarnento resta alguma coisa de infantil isto torna tudo natural, e alern

d isso quando voce tern selenta anos , eu tere i nao mais que vinte. Ademais

rompi assim as ultimas rela coes com 0 que ainda tinha de minha familia

e, se mais tarde me aconteccr de mentir a urn profuno, terei mesmo mais

restr icao mental a fazcr C lhe declarar: "Se isto nao e verdade, que eu nao

me chamc m. ii s Pierre Verger" . t Apud Luhning, 1998-99, p. 316)

Fatumbi afirrna que muito do conhecimento catalogado foi na sua

maioria coletado na Africa. Af irma ainda que nao se interessava, na epoca,

em assimilar a cultura afro, e talvcz por isso mesmo tenha conseguido

faze-lo.

Cid Teixei ra, h is toriador, em depoimento no video Verger:mensageiro

entre dais mu ndos, diz:

Na sua obra Fluxo e refluxo, 0 que encontrarnos e a historia do con-

trabando de escravos. Formalmente, 0 Brasi l nao poderia ter r ecebido

nenhum cscravo. Porem, boa parte das fortunas da epoca foi feita dos

negocios de escravos, entre os tra ficantes da Africa e da Bahia.

D E P IE R RE E D OU A RU L E OP O LU V E RG E R A P IE RR E f A T UM 8 1 V E RG E R O Ju o8 A

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 42/64

o.JUOBA, OS OLHOS DO REI

Pierre Verger chegou ao Brasil em 5 de agosto de 1946,sob indicacao

do etn6logo Roger Bastide. Fez de Salvador sua nova residencia estabe-

lecendo vinculos com 0 candornble e contatos com os terreiros mais

famosos da Bahia, ganhando a confianca dos iniciados e dos babalaos

(pais do segredo) .Co~e<;a a concentrar ,seus estudos e sua vivencia na cultura yoruba

nos dois lados, Brasil e Africa, passando aos poucos de fot6grafo para

escritor, antrop6logo e historiador. Muitos intelectuais de Salvador pas-

sam < ~ estabelece r com ele laces forte s de amizade: 0escritor Jorge Amado,

o fotografo Mario Cravo , 0artista plastico Carybe e muitas pessoas liga-

das ao candornble, que permaneceriam em sua vida ate 0final.

Exist ia um encantamento do estrangeiro . Muitos se enamoraram da Bahia,

tendo uns fi cado para sempre , como Fatumbi Verger, arti st as, aventu reiros

rel igio sos e c ient ista s. De Darwin a Levi -St rauss, de Bastide a Verger, todos

de alguma forma manifestaram magia e sentimentos , como expressou Charles

Darwin em carta enviada a uma amiga (apudVerger, 1981):

o dia pas sou encantadoramente. Encanto , ent re tanto, e uma palavra

fraca para expressar os sentimento s de um natu ralista, que, pela pr ime ira

vez, andou numa floresta b rasileira. A elegancia das gr amineas, a singu -

larid ade das plantas parasitas, a beleza das flo res, 0 verde lustroso da

fo lhagem , mas acima de tudo a exuber ancia da vegetacao, causaram-me

admirucao . Uma mistu ra paradoxa! de ru ido e silencio invade as par tes

mais sombrias da floresta. 0 zunido dos insetos e tao grande que pode

ser ouvido mesmo de uma cmbarcacao ancorada a algumas centenas de

jardas da costa; entre tanto, nas reentrancias da mata parece reinar um

silencio universal. Para quem gosta de h ist6r ia natu ral, um d ia como esse

carrega consigo um prazer mais profundo do que qualquer outro que

possa esperar exper imentar novamen te. ( p. 3)

Pierre Fa tu,mbi Verger pe rmanece em Salvador, fazendo via gens a lte r-

n~das para a Africa Ocidental e descobrindo, a cada dia mais, os ritos, os

rrutos e a religiao, as hist6rias e a visualidade do povo afro-brasileiro.

Em relacao a sua c: 't f> re, muitos a irmavam que ele nao acreditava em

nada, di~ia-s~ racionalista, frances e europeu dernais para crer em al-

guma corsa E di A I '0 que IZ rete Soares: "gostava que os outros acredi-

tassem mas como ele me" 11 di ,- .SI 0 i zi a, nao cre io na minha propria sombra"'.

Ja Antonio Riserio, antropologo e escri tor, afirrna: "ele tinha uma relacao

ritual com candomble, cumpria todas as obrigacoes, os gestos, mas uma

crenca, em ultima analise, nao".

Uma de suas grandes obras e Dieux d'Afrique (995), que revela

profundamente 0culto dos Orixas e Voduns da cultura yoruba. Seguindo

a mesma linha de pesquisa, surgem outras publicacoes, como 0livro

Orixas (981) e Notas sabre a culto dos orixas e ooduns (999). Essas sao

obras que Theodor Monod classifies como integrantes de um dossie

monumental.

Fatumbi observou e participou tao intensamente desta religiao que 0

t ermo "observacao part icipante" parece "tecnico" demais para qua lifi car

quem se envolveu e se inseriu tanto na vida da comunidade e na cultura

afro-brasileira.

Em seu pr6prio depoimento, Verger nao se considerava um pesquisa-

dor, afirmava que nao tinha a seriedade, 0rigor, a curios ida d e e a von-

tade de perguntar dos pesquisadores. Afirrnava que "todas as perguntas

parecem inuteis". Mas se tornou um grande observador e um investiga-

dor rigoroso, que mais tarde se transformaria em diretor da Recherche

Scientifique c le Pari s. Embora com resi st encia ao munclo acadernico, c riou

um estilo pr6prio cle pesquisar e cle fazer ciencia.

A mesma postura era clefendida por Roger Bastide: 0etn6logo cleve

tornar-se par te integrante cia socieclacle observada. Ao contrar io de Verger,

a producao cleBastide tinha objet ivos academicos, mas nao excluia a pa rtic i-

pacao clireta no candomble. Sobre 0observador participante, Bastide afirma:

Os soc i6 logos nor te -ameri canos inventa ram urn termo para des ignar

uma tecnica de pesquisa, que consiste justamente em identificar-se ao

mcio que .se estuda. E a obser vacao par ticip ante. Mas Pier re Verger e

mais que um observador participante, porque a palavra "observador"

esboca, de qualquer modo, uma cer ta barreir a, e desdob ra 0 etn6grafo,

de modo multo desagrad{lvel, em "hornem de fora" e "homem de den-

tro" . 0 conhecimento em Pierre Verger c fr uto do amor e da co rnunh.Io .

(Apud Verger, 1995, t rad, da aurora)

Verger percorreu arquivos clo Rio de Janeiro, cia Bahia, da Nigeria, do

Benin, cia Franca em busca de informacoes sobre os chamaclos "agudas"

(brasileiros retornaclos para a Africa). Fez muitos amigos, participou de

festas, frequentou casas e nelas comeu feijao com leite de coco, peixe

com pirao, feijoacla e cozido. Ouviu hist6rias de clescendentes, de mhos,

87

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 43/64

Pierre Verger, (guns, Porto Novo, 1949-1954P,err. Verger, Eg' lf ls , Porto Novo, 1949-1954

8 8

FOTOG IWIA f ANTI IC lPOLOGIA D E P I ER Il E E D OU AR D l tO PO LO V ER GE R A p, ERJIE F A T U M B I V ERG ER O J Ll aM

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 44/64

pals e av6s. Teve acesso a documentos de familia, a forografias e cartas

andgas (Costa e Silva, 1999).

Muitos que 0 conhecerarn, e dele se tornaram amigos, afirmarn que

essa simpatla e ernpatia deram para 0renascido de Ifa (Fatumbi) rodas

as Informacoes e as revelacoes desse povo, Mas reria Verger licenca para

fotografar todos os rituals?

Pai Balbina, babalorixa, responde: "dizern que quem tira fotos sao os

eguns [espiritol e por iS50 nao saern nas fotos, mas nas fotos de Verger

aparecern todos os eguns" (video Verger: mensageiro de dais mundcs).

E, ainda, neste sentido, Milton Guran afirrna que se ele [eve acesso a

esses segredos e miros e porque soube guards-los.

Como observador, iniciou-se na religiao, decifrou ritose mitos, Farumbi

nao era uma pessoa religiosa: seu interesse erarn as pessoas, suas histo-

rias, seu contexte cultural, sua arte, sua religiao e sell cotidiano, Mas

percebeu que era precise tornar-se um deles e que sua inicia~o seria

essencial para a continuidade de sells trabalhos nas sociedades de culro

dos orixas, Tornou-se amigo de Mae Senhora, sua futura mae-de-sante,

em Salvador. A lyalorixa (zeladora des orixas) a entronou como Ojuoba

(as olhos do rei, olhos de Xango) e ele passa a ser zelador da Casa

Branca. do Engenho Velho - lie Axe Opo Afonji.

o L ie A x . e Opo Afonjae a casa de Xango, a Orixa da justlca, que com

a Casa Branca do Engenho Velho e 0Gantois, em Salvador, torna-se a

casa rnatriz do culro do candornble no Brasil. A mais antiga data de 1830,

fundada por Eugenia Anna dos Santos, mae Aninha, filha de negros

africanos da nacao Grund. Com 0 falecimento de mole Aninha, assume

Mae Senhora, com quem Verger aprendeu como oga, zeiador da casa,

quase todos os rnitos e os rituals do candornble no Brasil- aprendizado

que dividiu com as alternadas idas e vindas da Africa, onde tarnbern

mantinha relacoes com babalaos de Benin e recebera tarnbem a perrnis-

sao de conhecer os seus segredos. Jorge Amado (apud Verger, 1999)

coma:

No terreiro do AxeOpe Afonj<i ,Mlk Senhora, a inesqueclvel, seruada

emseu trono de rainha, proclarnou-o quobft, osolhos deXang6, aquele

que rude enxerga e rudo sabe, Nas casas de santo da Bahia Iez-se Figura

familiar, 0 rnestre de rodos nos, 0 igual de cada urn no respeito e a

cordialidade da vibracao dos atsbaques. Professor , pesquisador , fotografo,

escri tor , na Bahia de e Pierre Parumbl Verger Ojuoba, (p, 5)

Farurnbi conseguiu alguns dos segredos que sao rransmltidos pelos

babalaos aos seus discipulos, Essa transmissao oral do conhecimento e

considerada na tradicao ioruba veiculo do axe, do poder e da forca. As

curas de alguns males sao elaboradas mediante manipulacoes com plan-

tas, que apenas funcionarn se canradas e acompanhadas de palavras

"magicas",

o sistema ioruba de classificacao botanica, por exemplo, usa dife-

rentes caracteristicas para identificacao das plantas: 0 cheiro, a cor, a

textura de Sl1aS folhas, a reacao <10 toque, Dessa pesquisa e de uma

investigacao com as ervas surgiu 0 livre E w e , 0 usa da plantas na soc ie-

dade iorubd (1995), de Pierre Verger.

Durante quase quarenta anos, Verger se envolveu com 0 poder das

plantas rnedicinais, coletando dados relatives tanto a s atribuicoes curari-

vas quanto a adivinhacao, Ele elabora pesquisas com objetivos ernobo-

tanicos e segundo as significacoes religiosas ditadas por I f a , aquele que

e pal da adivinhacao. Uniu assim as duas areas de conhecimento. Os

babalaos, pm meio da oralidade, passavam as sells segredos e a utilizacao

corre ta das ervas usando pequenos versos. Com a ajuda de M ae Senhora

e de Olga de Alaketu, Verger formou urn herbaria de cerca de 150 plan-

tas da flora baiana, Tudo foi cientificarnente identificado e classificado

pelo Departamento de Botanica do Institute de Biologia da Universidade

Federal da Bahia. Finalrnerue, depois de um escudo linguistico e

etnoboianico, 0referido livre foieditado. Seu trabalho fornece urna pre-

ciosa base para fururas pesquisas na fitologia.

As receitas que se seguern foram retiradas desse livro, para ilusrrar

como Fatumbi reuniu segmentos t50 distantes e tarnbem tao pr6ximos

- a ciencia e a religii'i.o~, no intuito de melhor cornpreender a saber

cultivado no candornble (d.Verger, 1995, p. 259, trad. da au tora),

R EiC Etr AP AR A T RA T AR " , , , s O N I ..

Folha de BAPHlA NlTlDA, Leguminosae papilionoideae

Sabao-da-costa

Moer as folhas com sabao-da-costa. Colocar tudo em agua.

Pronunciar a encantaeao. 0 padente deve romar a prepar:a~ao e

lavar 0 rosto com ela.

Irosun, deixe-me dormir sempre,

Irosan, deixe-me acordar sempre bern.

Voce trabalha para aquele que nao pode dormir, e par isso ele

dormira,

F OT OG RA FIA E ANTROl'OlOGIAD E P IE RR E ~ DO UA I\ D l tO PO ID V El ', GE R A P IE RR E F A TU Mi lI V ER GE ~ O JU OE VI

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 45/64

REoerrA PARA CURAf1 0 RaIMATleMO

Folha de 'ESAMUM INJ)ICUM, Pedaliaceae (gergellm)

Polha de CELTIS NllIGRJF0L1A, Ulmaceae

Raiz de K l C E L A AflRICANA, Btgnoruaceae

QAHCINfA KOLA, Guttiferae

Pilar tudo. Desenhar a odu em lyerosun, pronunciando a

encantacao. 0paciente deve tamar a preparacao com acaca quente.

E k U ernpre cum do reumatismo. Aape dlz que nao vai demorar

at' Ie near curado. Pandora sernpre mara a reurnatisrno. Or6gb6

deve leva-lo e deixar que venha a cum.

Verger mane em Salvador, como queria, e seria impossivel falar de

tad as as suas obras e artigos, urna quantidade que a Fundacac Pierre

Verger (que fica, hoje, onde era a sua casa em Salvador) tern reunido e

recolhido no mundo todo. Ao ver as imagens nas obras de Verger, senti-

mos a alma do povo, do hornern, do afrieano incorporado no sagrado,

pereebemos a que Roland Barthes chama de punctum na fotografia, em

seu livro Camara clara (984). As imagens forarn expostas no mundo

inteiro e selecionadas pelos olhos do antrop61ogo, artista, etnologo,

babalao, fi lho de Xang6: Pierre Farumbi Verger Ojuoba A sacralidade ecapturada pelas suas lentes e pela sua alma.

PIERRE FATUMBI VERGER o.JUOBA

Como definiriamos esse olhar participante presence nas fotos de

Pierre Verger? A llberdade que ele capta, a forma de ser e estar de urn

povo e uma raga, 0 jeito de sentar, a posrura no trabalho, no lazer, nosseus cultos sao naturalmente expostos com urna sincronicidade impe-

cave] de observador e observado, convidando-nos a entrar sern ceri-

mania na imagern.

As caracterisdcas e as arquetipos dos orixas estao na obra Orixds, deuses

iorubas na it/rica e no NovoMundo (1981), livro publicado sabre as

deuses africanos e a influencia no eandombl€! no Brasil , Salvador, e em

Cuba. Totalmeme ilustrado com 259 fotografias, rnostra cada passo de

uma iniciacao, as rituais, as roupas, as ferramentas, as dancas e, princi-

palmente, as classiflcacoes que apenas as anotacoes de urn etn6grafo

poderiam detectar. Como narrar a altivez, a forca e 0olhar guerreiro de

urn Xango? Os retratos dos onxas sao narrativas e descricoes visuais

representattvas de cada orixa. Essas imagens sao estudos, sao a historia

contada visualmente de cada lenda e de cada mito, As fotograftas forta-

lecem e legitimam a linguagem escrita; sem elas, nao saberiarnos como eurn Xang6.

A rnensagern veiculada pela imagem fotograflca, percebida como uma

gravacao tang lvel da realidade, torna-se a prova material cia presenca do

etnografo em campo - a evidencia de "ter estado" - ao demonstrar que

a autor vivenciou e representou a realldade rotahzante de OULro universe

social. Dessa forma, 0 usc da imagem serve como urn recurso ret6rico que

legitimaa veracidade do texto ant ropologlco. (Bl ttencour t, 1998, p. 198)

D E P IU RE ~ OO u. o. lW LiOPOLD \ 'l :R GE R A P lE R ~E FMUMBI VERGER OJUOBA

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 46/64

P i e rr e Ve r g e r, Xang6. ! len in , Afr ica , ,I dOlo

C.l

XANG6 - sANGO

FWACJ \O : Oranian e Yamase

Esp05J\S; Ola, Oxum e Oba

SiMBOLO: urn machado com duas laminas, estilizado, que seus

eleguns trazern quando em transe. Associa-se ao simbolo de Zeus,

em Creta.

Testernunho de elegancia e maneiras galantes, existe urna hlst6ria

que nos diz como seduziu Oia-Iansa, mulner de Ogum.

"Entre os clientes de Ogum, 0 ferreiro, havia Xango, que gostava

de ser elegaote,

a ponto de trancar seus cabelos como as de uma rnulher,

Havia feito furos nos 16bulos de suas orelhas,

onde usava sempre argolas,

Ele usava colares de contas.

Ele usava braceletes,

Que elegancial

Este homern era Igualrnente poderoso pelos seus talismas,

Era guerreiro par profissao,

Nao fazia prisioneiros no decurso de sua batalhas (rnatava todos

as seus inimigos)

Par essa razao, Xango e saudado:Rei de Kosso, que age com independencial"

Xango e viril e atrevido, violento e justicetro, castiga os mentirosos,

os ladroes e os. malfeitores.

o arqueupo de Xang6 e aquele das pessoas voluntariosas e energi-

cas, altlvas e consciences de sua importancfa real ou suposts. C ..) nilo

toleram a merior contradicao, ( ...J Possuem urn elevado sentido c ia su a

propria dignidade e das suas obrlgacoes, 0que as leva a se comportarem

com urn mlsro de severidade e benevolencia C.) urn profunda e constante

sentirnento de justlca (Verger, 198). p. 140-l).

FOTOGAAFIA E ANlROI'QlDGiA

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 47/64

Na serie de fotografias que ilustram a figura de Xango, as imagens

nao sao apenas urn documento do cenario das arividades de urn ritual.

o enquadramenta e a forca do movirnento congelado do brace e 0olhar

desafiante frontal e direto para a c:amara nos passa exatamente a arque-

tipo deflnido par Verger: voluntarlcso, energetico e consciente de sua

forca e seducao, Essas irnagens nao 56 cumprem uma tarefa esretica do

observador enquanto for6grafo, mas tarnbem a tarefa basica do antropo-

logo de registrar diretamente os observados, nas arividades diarias e

ritualisticas dentro da cornunidade. Registrar, documental', Y r 0 redo e

o detalhe foi a rnarca do trabalho de Verger, como mostram as suas

imagens.

Xango, Sango, historicamente, se tornou a "rei de Oy6", depots de

destronar seu rneio-irmao Dada-Ajaka, que era calma e pacifico, diferente

de Xang6, que tinha urn carater violento e imperioso. Seu nome esta

sernpre associado a forca, sabretudo ao poder que diflcilmenre e centes-

tado, Ii ! um autoritsrio e poderoso.

Orixa do raio e do trovao, castiga as malfeitores e ladroes com envio

do raio, mas utiliza suas armas apenas para faze! justica. Uma casa atin-

gida par ele e marcada, e seus proprieulrios devern pagar pesadas rnul-

tas para as sacerdotes do orixa, que vern procurar nos escornbros pedras

de raios par ele lancados Essas pedras sao colocadas sabre urn pilao de

madeira esculpida, consagrada a Xango, Tais pedras sao consideradas

ernanacoes desse orixa e conrern sell poder, Por isso, toda imagem leva

a associar Xang6 a firmeza da rocha duro e esravel.

As ferramentas de Xango, 0 proprio Verger descreve em Iinguagem

visual e escrita:

o slrnbolo de . ang6 e ° rnachado de duns l :iminas est il izado , ose

(OX(), que seus elegLln trazem nas ruaos quando em transe. Lemhra a

simbolo de Zeus, em Creta. Esse oxe parece SCI' a estillzacto de urn

personagem carregando a fogo sabre a cabeca, este fogo e , ao mesmo

tempo, 0 duple maehado e lembra, de certa forma, a cerimonia charnada

ajere. na qual os iniciados de Xango devem canegar na cabeca uma jaffa

chela de fUfOS, deruro da quaJ queima um fogo vivo. Eles nao se seruem

incomodados peresse fardo ardente, dernonstrando, atraves dessa prova,

que 0 transe nso e sirnulado. (Verger, 1981, p. 135)

P ie rr e Ve r g er . Efegun de X o ng o. S en m , Africo, s/ dolo

fQTOGlW '1A E ANTROPO lOG lA

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 48/64

Xango e sedutor, figura vaidosa e sensual, e teve tres esposas. AI;

lendas contam que ele Ia frequenternente a casa do ferreira Ogum e dele

era fregues, Vlvia sempre muito bern-arrurnado e lancava olhares sedu-

teres para Iansa, mulher de Ogum. Iansa, apaixonada, sal da casa do

marido para ficar com a sedutor Xango Mais tarde, nas suas andancas ,

ele se encontra com Oxum na mara e fica fascinado par sua beleza e

vaidade. Tenta conquista-la de todas as formas e persegue-a incessante-

mente, Dizem as lendas que Exu controls a furia de Xango quando ele

tenta violentar OXUlTI.

Existem outras versoes: Xango, com sua sensualidade e elegancia,

prosta-se aos pes de Oxum. E, ainda. a domina dora Oxurn controla

Xango, fazendo-o dorrnir aos seus pes.

As dancas dos eleguns de Xango sao acornpanhadas par tres tocadores

de batao Os hornens e as mulheres formam grupos separados; as prirnei-

ros, na parte exterior ciaroda e as mulheres, na parte inferior. As dancas

seguem a rirmo dos atabaques (batas), As rnulheres inclinarn a corpo e

dancam com pequenos passos, com as braces caidos ao longo do corpo.

Os hornens dancarn com passos rnais largos e deslizantes, como des-

creve Verger. Inclinarn 0 corpo com mais energia e a braces descem

violenrarnente. Chegam a dar passos mais acrobaticos, acocoram-se e

levantam novamente, rodopiando. Os passes sao marcados pelos sons

do atabaque, sons que, em urn tom agudo e nervoso, seeo e breve,

contribuem para as dancas terern urn cararer vivo e arrebatador. A ves-

timenta tradicional usada em urn elegun possuido e urn grande avental

(bante) feiro de pele de carneiro (comida das oferendas), coberio de

biizios, passando sabre urna porcao de xales (iyeri) amarrados na cintu-

ra e ea indo livremente.

Aornc:

Pierre Verger.

Urn trio de rambor balO.

Benet, Afrlco. s/ deto

Abo,,,o:

Pierre Verger.

Dan<;o de .,I.!,g~n de

Xongo, Sanin , Africa,

, / d olo

DE ~lfRRE ~ DO UAR D l EO P OL D V E RG E R A P IE R RE F Ai UM B I V £ RG E R o J u o e A

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 49/64

Adm~:

P i er re V e rg e r.

Oon ,o de e Ieg "n de

XongO, Benin. Africo.

$/ dote

Aboixo:

P i e rr e V e r g er .

Don,o de eleg"n de

Xong6. Benin. Afri"".II dole ....;.;;_

Na Bahia, Xango e 0mais popular dos orixas, e sua popularidade etao grande que em algumas regioes seu nome e utilizado para designa-

~ao de [ado culto. E sincretizado com SaoJeronimo, no Brasil.

Assirn como Xang6, Ox6ssi e Ogum possuern alguns mites que tam-

bern sao difundidos no Brasil , A figura de Ox6ssi e quase desparecida na

Africa; segundo Verger, ele foi culruado apenas em Keto, onde recebeu a

titulo de rei. Esta nacao, porern, foi invadida e destrulda, no seculo XIX,

por tropas do rei Daorne, e seus habitarue , consagrados a este orixa,foram vendidos e transformados em e cravo no Brasil e em Cuba. Oxossi

e considerado deus cia caca, Ode, e tem como lrmaos Ogum e Exu,

filhos de lemanji.

Oxossl aprendeu com 0 trmao a nobre arte da caca,

sern a qual a vida e rnuho mais dilleil.

Ogum ensinou Oxossl a defender-se por 5i pr6prio

e ensinou Ox6ssi a cuidar cia sua genre.

Agora Ogwn podla vol tar tranquilo para a guerra.

Ogum fez de Ox6ssi 0 provedor.

Ox6ssi e i rmao de Ogurn.

Ogum e a grande guerreiro.

Ox6ssi e 0 grande cacador,

(Prandi, 2001, p. 112)

As caracterlsticas que diferem Oxossi de Ogum estao nas lendas enos

rnitos narrados por Verger. Ogum e urn orixa da guerra, do cornbate e da

cornpetlcao. As pessoas de Ogurn sao violentas, impulsivas e briguentas,

ogu~, 0valente guerreiro,

o homem loueo dos rnusculos de aco:

Ogurn, que tendo agua em casa,

Lava-se com sanguel

(Verger & Sampaio, ]981, p. 16)

Essa unpetuosidade e autoridade de Ogurn sao adquiridas nas suas

conquistas como chefe do exercito de sua cidade-Estado, em invasoes aos

reinos vizinhos, Ele saqueava as Estados derrotados. E protetor do com-

batentes. Diz a lenda que Ogum era ferreira e por isso [em como simbolos

a espada, as armas, a metal e 0 ferro - elementos que simbolizam ainda

com rnais forca seu ternperarnento duro, vigoroso e lnflexivel.

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 50/64

:&

Pierre Verger. fled';' de 0.65:51, ta~ador do oJdeio, B<!nln, A fn ca • • / doto

103

FdlOGMFiA E ANTKOPOLOG IA

Ogum Y e e e ! Esta e a saudacao para esse orixa, que, depots de perceber

D E P IE Rl lE ~ DO UA AO L tO PO lO V ER GE R A PlfRR,- FATUM 51 V £ RG ER OJUoaA

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 51/64

sua pr6pria violencia, larnentou-se e arrependeu-se. E aflrrna a lenda

que, urn dia, ao sentir que ja vivera bastante e conquistara terras para 0

seu povo, baixou entao a espacla e enterrou-se sob a terra. Ogum tornara-

se urn orixa.

Ainda de acordo com as descricoes de Verger, as rnovirnentos de

Ogum diferem multo dos de Oxossi; ele afirrna que, quando OgUIn e

manifestado no corpo em transe de seus iniciados, estes dancam com armarcial, agitando sua espada e procurando urn adversario para golpear.

E sempre Ogum quem desfila na Irente, abrindo carninho para os OlItrOS

orixas ..

Ox6ssi e responsavel pela caca, e age diferente de Ogum. Tern grande

poder de luta, mas se utiliza da observacao, da quietude e do seu arco

com urna (mica flecha para cacar em nome da sobrevlvencia. As lendas

contarn que Ox6ssi, certeiro e com uma (mica f lecha, rnatou urn passaro

gigante enviado pelas feiticeiras que nao forarn convidadas para a Festa

dos inhames que Olefin, rei de Ife, of erecia todo ana cornemorando a

colheita. E por i550 seu sirnbolo e 0 arco e flecha, ofa e darnata, E urn

orixa das rnatas e florestas como Ogum, mas sua caracterisrica e sersolitario e independente. A sua luta e para alimental' seu povo e ter 0

que comer, e nao com finalldades politicas e de poder, como Ogum.

E tradicionaJmente associado a Lua, por ser a noite ideal para a caca.

Os movimentos corporais nas dancas dos mhos de Ox6ssi reprodu-

zem a postura fis ica de urn caeador a espreita na floresta, evitando barulho

e de olhos e ouvidos extrema mente atentos aos rnovimenros da caca, Os

filhos de Ox6ssi, quando incorporados, parecern estar cautelosamenre

a espreita de urn animal, vasculhando 0 chao em busca de seus rastros:

rnovimentam-se sem fazer barulho, retesam 0arco e atirarn a flecha, dando

lim grito de alegria quando 0 alvo e akancado. A pontaria e sempre

perfeita. A saudacao e OM Ar6!

A sequencia de imagens desse rituals no Brasil, principalmeme em

Salvador, faz-nos refletir sobre a preservacao dessa culrura pela reli-

giao, Os africanos que vierarn para c a criararn lima maneira de sobrevi-

ver a submissao causada pelo trafico de escravos, rnantiverarn a

integridacle de Individuo, a identidade e a dignldade de urn povo. Re-

sistiram as mudancas bruscas e adversas de cultura, por meio princi-

palmeme do culto as divindades e de criativas adaptacoes de costumes

brasilelros.

Pier re Verger , F e st a d e OX65S i , B e ni n, s / d ot o

o olhar de Verger certamente foi fundamental para urna outra nova

visao da cul tura afro-brasi le ira eaf ricana, porque abriu e crlou lima nova

forma de ;s pessoas olharem. Quando Verger comecou a fmografar, a

grande maloria Ol inda nao estava acosrumada a enxergar 0Iado estetico

da cul tura africana e afro-brasi le ira , 0 seu est ilo fo rograflco , que rnos tra-

va sempre 0 vivo, a momenta esporuaneo e nunca ° arti£idalmente ar-

r anjado , se cornp lernenta com 0estllo escrito, das legendas e das fotos.

(Luhntng, 1998-99, p. 351)

Tanto nas suas fotografias como nos videos, Africa e Bahia unern-se.

As cores do video sao rarnbem as paginas dos livros. Deste modo, as

correlacoes hist6ricas entre as duas culturas ficarn transparentes nos

movimentos das imagens ou nas linhas dos ilvros.

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 52/64

Pierre Verger, ' (emenid monifesl'odo em condombles de 8"hlo , Salvador, Brtlsil . s / dolo Pier reV erger , T'an.~,Po r to P r i n ci p e , Hc l tl , 194B

F O TO G RA F IA E A N TR O PO L OG IA

sobre a pele, sem uma finalidade estetica funcional. Fatumbi Verger

D E P IE R RE E D O U AR D L E OP O LD V E RG E R A P IE R RE F A TU M BI V E RG E R O JU O BA

preender melhor 0que 0outro tern a dizer para outros que querem ver,

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 53/64

Ojuoba, 0renascido, os olhos de Xango e zelador da casa de candomble.

o que teria de tao sagrado?

A sacralidade estaria no entendimento de ser muitos possiveis, de ser

interdisciplinar e estar aberto para 0entendimento do outro. 0 homem

e naturalmente religioso, afirma Mircea Eliade, e isso se exprime exata-

mente "nesse olhar", "nessa maneira de observar" 0mundo e perceber

em cada coisa a manifestacao do sagrado. Ojuoba fazia de suas fotoshierofanias, e por isso afirmava que as fotografias mostram 0que nao

somos capazes de ver.

Cada ato fotograflco seu era uma manifestacao dessa sacralidade;

trazia, para as imagens, as hierofanias.

A pedra sagrada, a arvorc sagrada nao sao adoradas como pedra ou

como arvore , mas justamente porque sao hierofanias , porque " revelam"

algo que ja nao e nem pedra, nem arvore, mas 0sagrado, 0ganz andere.

(El iade, 1996 , p. 18)

Quando questionado sobre as suas diferencas e as da sociedade onde seintegrou, respondia: "nao somos nos que escolhemos, sao des que esco-

lhem voce". E ainda sobre essas questoes, os editores e os organizadores de

sua exposicao de fotografias no mundo todo - "Lemessager" - enfatizarn.

Face <Ides quest ions que l 'on voudrait fondamentales , Pierre Verger

joue entre une fausse hurnilite de ne rien etre, de ne rien savoir et une

profonde humilite devant les choses de la vie qu'il n'a jamais voulu

expliquer par les sciences de son rnonde car ilsavait qu'expliquer c'etait

prendre, reduire et peut-etre tuer. (Piv in e Leon , apudverger 1999 , p . 203)

A antropologia vem se abrindo para novas metodologias e para pra-

ticas de pesquisa, e a antropologia visual, em especial, vern discutindo 0

quanta a narrativa da visualidade fornece muito mais que dados: ela e

parte integrantc do nosso cntendimento.

A imagcm, hoje, nao pode mais estar separada do saber cientifico.

A antropologia nao dispensa os recursos visuais - e nao sao recursos

apenas como urn suporte de pesquisa, mas imagens que agem como urn

meio de comunicacao e expressao do comportamento cultural .

A antropologia visual nao almeja, dentro dos novos padroes de pes-

quisa, apenas esclarecer 0saber cientifico, mas humanisticamente com-

ouvir e sentir.

Na busca de uma nova identidade, Pierre Verger se descobriu Pierre

Fatumbi Verger Ojuoba. Com olhar multicultural, um homern de multi-

plas faces confessa que, depois dos anos que viveu recusando as coisas

de que nao gostava, a vida cornecou a tomar uma certa forma.

Pierre Fatumbi Verger Ojuoba: um homem e urn observaclor de muitos

olhares. Olhares para a memoria e as lernbrancas que 0faziam chorar:saudades das rabanadas que sua mae fazia quando crianca.

p. 116:

Jeon-Loup Pivin .

PierreVerger, Bahia, Brasil, 1992

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 54/64

f O rOO1 lA F 1A E i lN T ROl 'O l OGl A

Olhar para o mundo e uma condi-

O l HARES FOAA- DENTRQ

As imagens de Duane Michals estao em forma de foto-historia au

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 55/64

(;3.0; compreende-lo por rneio desse

olhar e uma busca eterna, instiganre e

fascinante, Fascinante porque e pela

coaternplacao da beleza do rnundo que

nos encantamos enos apaixonamos.

Instigante porque a vontade de mer-

gulhar em seu desconhecido pode noslevar ao diferente e transforrnar 0que

estarnos .viciadas a enxergar,

Afinal, os hornens sao do mundo e

estao com todas as coisas desse m.undo

- e essas coisas sao pr6prias para ser

cheiradas, tocadas e vistas. "Ser e apa-

recer coincidern-se. Os seres vivos sao

sujeitos e objetos - percebendo e sen-

do percebidos - ao mesmo tempo"

(Arendt, 1991).

Para detectar a aparente, apenasolhamos, e exatarnente nesse ponro

nos enganamos. onde esta 0ser? Essa

e urna angustia para rnuitos fot6grafos,

a depoimemo de Duane Michals, fot6-

grafo norte-america no, revela multo

bem essa rnelancolia:

c . . . ) que idiota fui eu ao acreditar que

seria tao fki l. Eu confundi as aparenclas

de autornoveis, arvores e pessoas com

realidade eacredi te i que uma Iotografla

dessas aparencias serla necessariarnenre

uma fotografla delas, E urna verdade me-

lancollca ° Jato de que eu rumca serei

capaz de fotografar as coisas da realidade

e, portanto, so poderei Ialhar. Eu sou urn

reflexo fotografando OlltIOS reflexoscorn

seus reflexes . .. Fotografar a r ealidade e

fotograJar 0 nada. (MIchals , 1976, t rad.

daaurora)

D u o ne M i ch ol s, A mone chef/a po,,, 0 oru;;i; ; ,

MaIM, Novo lerque, 1969

' "

fotos sequenciais que narrarn, par exemplo, uma certa continuidade no

tempo. Elas nos mostram, assirn como fez Andujar com as indios

Yanamamis, os simbolos visivels de urna realidade invislvel.

De urn olhar resulta urna imagem, e 0 olhar fotografico e a forma

apreendida, Registra-se a que apareruernente somes ..A antropologia da

forma pela palavra, mase uma ciencia do olhar, e e pelo 01h..T que

chegamas ao outro,esteja ele proximo au distanre. Mas como decifrarnas imagens e nas palavras 0que aparentemente somes e 0que de faro

somas? Como olhar para aquila que nao aparecer

Se observamos atentamente, fazernos parte do rnundo e nao apenas

estamos nele. Quante mais mergulhamos naquilo que enxergarnos, rnais

conhecernos do objeto e de nos mesmos. Tecemos nossas conclusoes

pelos fragmentos e pelos reconesTecemos urn olhar por fotografias

Tecernos urn saber pela antropologia.

Fotografiae antropologia tern a rnesrno instrumento, a mesrna inten-

1,;3.0: atlngir 0 alvo e 0 objeto, Na verdadeye na maneira de olhar que

nasce a diferenca, e na maneira de olhar que estabelecernos relal,;ao com

o objeto. Mas sera que nao e 0mundo que se apresenta para n6s? Seraque nao sao todas as coisas que exibem seus rostos, suas formas, seus

forrnatos e cores? Entao, se pensarmos dessa forma, nao existe diferenca:

o que e necessaria e escutar cada coisa, cheira.r,tocar e reparar: "Urnobjetopresta testernunho de si mesrno na irnagern que oferece, e sua profundi-

dade esta nas complexidades dessa imagem" (Hillman, 1999, p. 15).

Como registrar essa complexidader Para Platao, a nossa alma nao esta

separada da alma do mundo, estarnos aprisionados no mundo e 0 rnun-

do em n6s. Uma maneira de nos libertarrnos e pelo irnaginario, pelo

inconsciente e pela !oucura. E talvez por isso necessiternos da arte.

A antropologia, nesse momento,e urn dos principals instrumentos das

cierrcias hurnanas, mas como os antropologos registram 0que veern?E qual a rnetodologia adotada hoje nas pesquisas de campo? Nao existe

mais tantos povos exoticos, mas sim rnisruras e mesdas de ragas, de

generos e metr6poles. A antropologia aplicada, afirma Margaret Mead

~1962), nao e apenas urn rneio de ver eregistrar as coisas do mundo. E

um modo de participar das rnudancas constantes de uma culturae tarnbem

de discutir sobre a afetividade humana e as sentimentos, porque, se uma

culrura condena alguma coisa au comportamemo que e Intensarnente

praticado denrro de lim grupo, surgirao cada vez mais individuos violentos

e crirninosos, retratos de uma sociedade decadente.

F O TO G RA F IA E A N TR O PO L OG IA

As coisas sao, antes de possuirem urn significado. Uma arvore, uma

O LH ARES FO R A -D EN TRO

na obscuridade das nossas cavernas, acreditando ser a verdade cartesiana,

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 56/64

borboleta, uma pedra simplesmente sao. Sao anteriores ao significado

que estabelecemos, embora nelas possam ser encontrados diversos sig-

nificados ou funcoes que pouco lhes interessam.

Nao posso deixar de colocar, em minhas consideracoes finais, refle-

xoes, referencias de obras preciosas, frutos de pessoas que tern uma

observacao realmentefantastica.Como0poema de Fernando Pessoa/Alberto

Caeiro (em "Guardador de rebanhos", XL):

Passa uma borboleta por diante de mim

E pela a primeira vez no Universo eu reparo

Que as borboletas nao tern cor nem movimento,

Assim como as flores nao tern perfume nem cor.

A cor e que tern cor nas asas da borboleta,

No movimento da borboleta 0movimento e que se move,

o perfume e que tern perfume no perfume da flor.

A borboleta e apenas borboleta

E a flor e apenas flor.

Perdemos a relacao com 0tempo e seu direcionamento. Observar,

contemplar as coisas do nosso meio, isso requer tempo. Para saborea-

las, e preciso parar, 0que e quase impossivel diante do imediatismo das

nossas necessidades diarias. Vidamoderna,fugaz e efernera, como dizia

Baudelaire (1997).

A modernidade e 0 movimento de ideias e praticas nao usuais no

tempo; e impossivel estabe!ecer 0moderno temporalmente, pois tudo

tem no presente uma oposicao que se transforma em futuro. E esse e 0

movimento do moderno: presente dinarnico, com nova consciencia do

tempo, exaltando 0atual e 0transit6rio.

o caos da vida p6s-moderna, ou qualquer nome com que se denomi-na a isso que vivemos atualmente, nao existe com as mesmas propostas

do moderno, mas, pela passividade do pensamento humano, na condi-

cao de acomodamento que 0desenvolvimento da tecnologia nos pro-

porcionou, facilitando a inforrnacao e a cornunicacao, mas nao 0

conhecimento e a sabedoria.

Esse caos e gerado pelo excesso de rnudancas e significados, mas

tambern por falta de mudanca e ausencia de significados. No pos-moder-

nismo perdernos a identidade, somos imagens mirando outras imagens,

como 0mundo platonico no qual a verdade esta fora da caverna. Vivernos

11 6

cientifica, 0unico meio de transcendermos a vida e a morte.

Todas as distancias que os homens criaram em torno de si foram

ditadas por urn temor do contato. As pessoas trancam-se em casas que

ninguern pode adentrar, somente nelas sentem-se mais ou menos seguras.

o medo do ladrao nao se deve unicamente a seu prop6sito de roubar,

mas tambem ante seu toque subito, inesperado, saido da escuridao. A maotransformadora em garra e 0simbolo que sempre se emprega para repre-

sentar esse medo. (Canetti, 1995)

Acredito que essas reflexoes sobre fotografia e antropologia se encai-

xam nesse sentido. Na verdade, as tribos modernas tern 0mesmo temor

dos primitivos, do ladrao de almas. Nao se ver em nenhuma imagem e

nao se identificar e de certa forma um alivio. As imagens, em contrapar-

tida, possibilitam essas distancias, nao e preciso tocar nem sentir para ser

agarrado de subito por uma fotografia.

A fotografia e moderna, nasce na modernidade, faz a modernidade a

cada ato fotografico, eta identifica0

detalhe na massa. Criaidentidade etambern a destr6i. E, nesse ponto, e born relembrar 0que Charles

Baudelaire afirma sobre 0 comportamento da sociedade na epoca do

surgimento da fotografia. Visionario e critico, radicalizou ao responsabi-

lizar a fotografia pela banalizacao da arte.

Nao temos mais0controle clanossa pr6pria imagem. Com a cultura de

massa e a sociecladede consumo, perdemos identiclade.Positivamente,a arte

passou a ser reproduzida, podemos ver Monalisa pelas suas reproducoes.

Pela Internet podemos ate fazer amor, sem 0perigo clasdoencas contagio-

sas!A imaginacao nunca foitao desenvolvida e ao mesmo tempo formatacla.

Arte difundida, a fofografiae 0meio, a mensagem, a comunicacao, a infor-

macae, e e tarnbem a negacao clarealiclade.E c6pia da imagemda imagem,do virtual, do produzido e do estereotipado, do light, do diet, do saudavel,

do politicamente correto e vestido, do eficiente e eficaz,da qualidade total.

o ideal moderno nao e a busca de uma unidade, de autenticidade,

singularidade. Ao contrario. Como posso obter uma imagem igual ,\ de

meu vizinho? Como posso ser aceito pelas estruturas sociaisc pelos movi-

mentos de massa?

Afinal, como ver uma fotografia? Como enxergar nas imagens sua

aura? Mas e preciso ver as imagens? Sera que nao basta apenas elas

existirem? E, ainda, como fazer antropologia visual?

11 7

FOTOGRAFIA E ANTROPOLOGIA

Quando percebemos enos atentamos para urn objeto com determi-

e

OLHARESFORA-DENTRO

do rnundo alguma coisa produzida pelo sistema, que e exterior a

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 57/64

nado reparo e cuidado, estamos identificando-o, trazendo dele 0dife-

rente, captando sua aura, tornando-o unico, Por urn instante, a fotografia

faz 0 moderno e cria 0 passado. Em urn instante, 0 que era moderno,

portanto inexistente, identifica-se, delimita-se, e marcado e recortado

pelo artista da fotografia, e, logo depois, perde-se nas reproducoes, nas

copias e no reconhecimento social.

Nas palavras de Baudelaire, critico feroz da reprodutibilidade e davulgarizacao que a fotografia poderia causar a arte, a singularidade nas-

ce da observacao cuidadosa do artista. Talvez ele nao imaginasse que

agora, quase cern anos depois, com a velocidade e0ritmomaisacelerados,

o seculo das imagens e das reproducoes trouxesse a arte mais pr6xima

daqueles que nao podem ir a museus, teatros e cinemas. Quem sabe a

fotografia nao seja urn metodo para observarmos 0mundo? Quem sabe

podera tornar-se urn fldneur das coisas do mundo?

A busca das imagens deixou de ser uma busca de fatos, mas tambern

uma fragmentacao desses fates. Na multiplicidade, elas estao cada vez

mais se perdendo. Hoje, nao se sabe onde esta0original, nao se tern mais

a proximidade com a realidade, nao existe ponto fixo. A realidade eindetectavel, Asimagens sao profecias de uma epoca e hoje nao passam

de reflexos em vidros sem ponto de referencia. Sao multiplas imagens

refletindo varias realidades.

Nao estariam as imagens caminhando para urn processo novo da

arte? Ou ate seguindo uma proposta do pr6prio espirito do moderno,

perdendo a forma concreta, a ideia de autoria? Para alguns, 0 autor

acaba no momenta da criacao, ou melhor, nao existe autor, apenas uma

funcao-autor, mesmo assim, nao seria indispensavel que esse autor per-

manecesse constante em sua forma, pois poderia sua obra, seu texto,

cair no anonimato murrnurio (Foucault, 1994).

Com a mesma linha de pensamento, 0 sociologo Pierre Bourdieutambern coloca que uma obra nao tern autor porque ela e 0criador sao

produto das estruturas socials; depende do reconhecimento do sistema

social para se tornar obra, portanto, nao existe autoria, obra unica e

singularidade na criacao.

Esses pensadores conternporaneos seguem 0mesmo estilo do

estruturalista Marcel Duchamp, que defendia a tese cia clesnecessi-

clacle de urn sujeito criaclor por tras cle uma obra. A maquina nao

necessita de autor ou cle origem; tudo esta pronto. 0 individuo por

tras de urn ready-made simplesmente nao faz nada alern de coletar

esse individuo e maior do que ele.

o sociologo frances Jean Baudrillard coloca com clareza, em A arte

da desaparicdo (1997), que vivernos imagens das imagens, urn mundo

de simulacros no qual ninguern sabe onde elas comecam ou terminam.

Estarnos indo para uma ausencia completa de imagens. Nao existe mais

o espelho, a tela. Asimagens sao apenas imagens.

Eu ainda colocaria como contraponto as palavras de Baudelaire,quando ele diz sobre 0artista:

Nao: Poucos homens sao dotados da faculdade de ver; ha ainda me-

nos homens que possuem a capacidade de exprimir. Agora, a hora em

que os outros estao dormindo, ele esta curvado sobre sua mesa, lancando

sobre uma folha de papel 0mesmo olhar que ha pouco dirigia as coisas,

lutando com seu lapis, sua pena, seu pincel, lancando agua do copo ate

o teto, limpando a pena na camisa, apressado, violento, ativo, como se

temesse que as imagens the escapassem, belicoso, mas sozinho e deba-

tendo-se consigo mesmo. Eas coisas renascem no papel, natura ise, mais

do que naturals, belas, mais do que belas, singulares e dotadas de uma

vida entusiasta como a alma do autor. (Baudelaire, 1988, p. 173)

As manifestacoes do homem sao inumeras, advindas do poder, da

posse, do desejo descontrolado que a sociedade moderna estabelece.

No cotidiano, acontecem pelas ruas, nos muros grafitados, nos "loucos"

que andam pela cidade, nos pastores ambulantes fazendo suas prega-

coes como uma maneira do homem chegar rnais pr6ximo de sua alma,

de sua "felicidade".

Mas que manifestacao humana aproxima-se do proprio homem? Ou

chega mais pr6ximodo divino?Como percebe-lo se, como obrasde criacao,

buscamos 0nosso criador?Seexiste urn artistaclessaobra e, qualquer que

seja seu nome, ele nos deu a consciencia, 0poder de observacao, de per-

cepcao cia realidade, da existencia,do sentirsagrado?E como perdura-lo na

mem6ria, em obra, em arte e religiao?

o homem torna-se admiravel a partir do momento em que contempla;

admirado e perplexo diante da natureza, ele e capaz de criar, sem de

fato entender 0sol, a lua... Espantado, contempla e cria com tamanha

perfeicao que torna-se criador, e seus sentidos passam a ser tambern

seus instrumentos, transformados em pincers, canetas, reguas - instru-

mentos de elaboracao do mundo.

FOTOGRAFIA E ANTROPOLOGIA

Questiona-se se Pierre Verger era urn antrop6logo, mas nao se pode

OLHARESrORA·DEN1RO

medo, por esse motivo e que as pessoas te rn mesmo de ficar sozinhas,

Ele pensou: Do que e que eu tenho medo? Nao hC I nada, exceto eu

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 58/64

negar que, com sua arte e seus pr6prios metodos de pesquisa, ele mostrou-

nos urn rnundo que desconheciarnos, e rna is completamente quando

trouxe para dentro de cada imagem 0 seu sentimento e a sua relacao

sagrada com 0universo afro-brasileiro.

o art ista, e c laro, realmente revela 0incomum no comum. Essa e a

ta refa - nao distinguir e separar 0comum e 0 incomum, mas enxergar 0

comum com olho incomurn da intensificacao divina. (Hillman, 1999)

A intensif icacao divina , segundo Hil lman, comporta 0oculto, 0invisi-

vel, 0 transparente; retrata 0encontro do homem consigo mesmo e com

o mundo em que vive. Os fatos sao amarrados por dentro e por fora.

Nao e possivel afirmar que a fotografia tern uma autonomia para

registrar os estados da alma, mesmo porque esses estados nao sao uni-

versais, esses sent imentos nao sao unicos, Mas imagens contextualizadas

podem trazer para a ciencia descobertas inesperadas,

"Le bon Dieu est dans ledetail", afirma Flaubert, 0 que nos remete a

filosofia panteista de Giordano Bruno, urn cosmologo visionario que ve

o mundo como urn universo infinito composto por varies mundos, em-

bora nao possa afirmar que ele seja totalmente infinito, porque cada urn

deles e em si finito; infinito e Deus, por.que esta em todas as coisas

(Calvino, 1998).

Para Mircea Eliade, a visao do homem acerca da realidade esta ligada

a descoberta do sagrado, de certa forma desqualificando 0 significado

dos objetos e das coisas comuns. A consciencia do mundo real e signifi-

cativo s6 e constituida pela sacralizacao das coisas.

Talvez seja 0 momenta de questionar 0 individuo nesse oceano

globalizado . Talvez seja 0momenta de descobrir por onde anda a nossa

identidade. Alern da sociedade, do grupo, 0 homem existe s6. E por

estar vivendo, hoje, urn caos, como definem alguns antropologos e soci6-

logos, 0homem recorre aos mitos para obter uma certa ordem. Acredito

que, como nos mitos cle criacao clo Upanishad, 0 homem precisa olhar

para si mesmo e se perguntar novamente;

Ele olhou em volta e nada viu, a nao ser ele mesmo. Em seguida, no

inicio gritou: eu sou ele! Dai 0substantivo EU. E esse 0motivo por que

mesmo hoje, quando interpelada, uma pessoa declara inicialmente "sou

eu" e, em seguida, diz outro nome pelo qual e conhecido. Ele estava com

mesmo, c ai dcsapareccu seu medo ( ... ). Ele se sentia infe liz, e por esse

motive que as pessoas nao se sentem felizes sozinhas. Ele queria uma

companhei ra . Tornou-se tao grande quanto urn homem e uma mulher

abracados. E dividiu esse corpo , que era ele mesmo, em duas partes;

dessa separacao surgiram marido e mulher. E, entao, ele se deu conta do

EU verdadeiro, EU sou a criacao, pois a retirei de mim mesmo: dessemodo, ele se tornou a sua criacao. Em verdade, aquele que conhece isso

sc torna a criacao e 0 criador . (Campbell , 1997)

Nesse scntido, Canetti nos define como gotas que 56 contam quando

mergulhadas no todo, as gotas s6 contam quando nao se pode rna is

conta-las: individuos e massa.

Alem das ondas, no entanto, hi ainda um outro elemento multiple

que e parte do mar, as gotas. Estas, porern, estao isoladas, sao apenas

gotas, nao vinculadas entre si, sua pequenez e seu isolamento possuem

algo impotente. Sao quase nada e despertam um sentimento de compai-xuo no observador. Mergulha-se a mao na agua, erga-se a mao nova mente

e conternplam-se as gotas escorrendo isoladas e debe is por ela. A com-

paixao que se sente e como se elas fossem pessoas desesperadamente

56s. As gotas so contam quando nao se pode mais coma-las, quando se

dissolvem novamente no todo. (Canett i, 1995)

Entencler se a fotografia e urn documento cia rea lidade e discuti r so-

bre a sua pr6pria existencia, sua hist6ria e sua magia. Nao foi 0 objetivo

deste livro enfocar ? "real ou nao real" na imagem fixada pela fotografia

no ambito da antropologia, mas a maneira do sujeito observar essa rea-

lidade, fotografanclo-a.Como utilizar os sentidos, as emocoes do sujeito que fotografa e as

do fotografado?

o antrop61ogo precisa conhecer a arte cle fotografar, a arte de lidar

com seu corpo e a arte de lidar com as emocoes. Precisa olhar-sc, olhares

fora-dentro, dentro-fora.

12 1

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 59/64

BIBLIOGRAFIA

AGUIRRE, A. (Org.), Cultura e identidad cultural. Barcelona: Bardenas, 1997.

ALMEIDA, Cleide Rita. 0bumano, lugar do sagrado. Sao Paulo: Olho d 'Agua, 1996.

ANDUJAR, Claudia. Yanomami. Sao Paulo: DBA, 1998 .

ARCARI, Antonio. Afotografia. as formas, os objetos, 0homem. Sao Paulo: Mart ins

Fontes, 1980.

ARENDT, Hannah. A vida do esp iri to : 0pensar, 0querer, 0julgar. Rio de Janeiro:

Relurne Dumara, 1992.

ARNHEIM, Rudolf. Arte e percepcdo visual: uma psicologia da visao criadora. Sao

Paulo: Pioneira, 1989.

AUMONT, Jacques. A imagem. Campinas: Papirus, 1993.

BACHELARD, Gast6n. A poetica do devaneio. Sao Paulo: Mart ins Fon tes, 1996.

BACON, Francis. Ensaios. Lisboa: Guimaraes, 1992.

BALANDIER, Georges. Poder em cena . Brasilia: UnB, 1985.

BARROS, Manoel de. Ensaios fotogrdficos. Sao Pau lo: Record, 2000.

BARTHES, Roland. A cdmara clara. Rio de Janeiro : Nova Frontei ra , 1984.

___ .06bvio e 0obtuso. Rio de Janeiro : Nova Frontei ra , 1990 .

BASTIDE, Roger. Imagens do Nordeste mistico em branco e preto. 0cruzeiro. Rio

de Janeiro : 1945.

___ . Anatomie d'Andre Gide. Paris: Presses Universitaires de France, 1974.

___ .0candomble na Bahia. Sao Paulo: Cia . Edi to ra Nacional , 1976 .

___ . Antropologia aplicada. Sao Paulo: Perspectiva, 1979.

___ .A s religioes africanas no Brasil: contr ibuicao a uma sociologia das interpene-

t racoes de civi lizacoes, Sao Pau lo: Pionei ra , 1985.

___ . Os orixas, hist6ria dos deuses que vieram da Africa. Planeta, ed. especial , n. 1 ,

maio/1996.

BATESON, Gregory & MEAD, Margaret. Balinese Character: A Photographic Analysis.

Nova Iorque: Academy of Sciences , 1962 .

BAUDELAIRE, Charles. Photography. In: NEWHALL, Beaumont (Org.). Photography:

Essays & Images. Nova Iorque: The Museum of Modern Art, 1981.

12 3

FOTOGRAFIA E ANTROPOLOGIA

___ . Opintorda oida moderna, a modcrnidade de Baudelaire. S:IOPaulo: Paz e

Terra, 1988.

BIBLIOGRAFIA

___ . Scis propostas para 0proximo milenio. Sao Paulo: Companhia das Letras,

1998.

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 60/64

___ . Sobre a modernidade. Sao Paulo: Paz e Terra, 1997.

BAUDRILLARD, Jean. A arte da desaparicdo. Rio de Janeiro: UfRJ, 1997.

BAVCAR, Evgen. Le Voyeur absolu. Paris: Seuil , 1992.

BAZIN, Andre . The Ontology of Pho tographic Image. In : PETRUCK, Pen inah R. The

Camera Viewed. Writtings on Twentieth-Century Photography. Nova Iorque: Dutton,

1979.

BECKER, Howard S. Balinese Character : uma analise fotografic» de Gregory Bateson

e Margaret Mead. Cadernos de Antropologia e Imagem. Antropologia e fotografia,

n. 2. Rio de Janeiro: Programa de Pos-Graduacao em Ciencias Sociais/Nucleo de

Antropo logia e Imagem, 1996 .

BECKS-MALORNY, Ulrike. Kandinsey : em busca da abstracao, Lisboa: Benedikt

Taschen, 1995.

BELLOUR, Raymond. Entre-imagens. Campinas: Papirus, 1997.

BENJAMIN, Walter. Petite Histoire de la photographie. In: . L 'Homme, le langage

et la culture. Essais. Par is: Dcnoe! Gonthier, 1971.

___ . A obra de arte no tempo de suas tecnicas de reproducao, In: . Magia

e tecnica, arte epolitica: ensaios sobre l itera tu ra e hist6ria da cul tu ra . Sao Pau lo:Brasiliense, 1996

BERGSON, Henri. Materia e memoria: ensaio sobre a relacao do corpo com 0 espi-

ri to. Sao Paulo: Mart ins Fon tes, 1990.

BITTENCOURT, Luciana Aguiar. Algumas consideracoes sobre 0 uso da imagem

fotografica na pesquisa antropol6gica. In: FELDMAN-BIANCO, Bela & MOREIRA

LEITE, Miriam. Desafios da imagem, fotografia, iconograf ia e video nas Ciencias

Sociais. Campinas: Papirus, 1998, p. 197-212.

BLADE RUNNER, CA<;;:ADORDE ANDR6IDES (filme) . Direcao de Ridley Scott . Dis-

t ribuidora: Warner Home Video, EUA, 1982. 117 min., 35 mm.

BONI , Jose de. Verde lente. fot6grafos brasi le iros e a natu reza . Sao Pau lo : Empresa

das Artes, 1996.

BOURDIEU, Pierre & BOLTANSKI, Luc. Un Art Moyen: essai sur les usages sociaux

de la photografie. Pari s: Minu it , 1965.

BRADBURY, Malcolm & MCFARLANE, James. Modernismo: guia geral: 1890-1930.

Sao Pau lo: Companhia das Letras, 1999 .

BRISSAC, Peixoto N. As imagens e 0 outro. In: NOVAES, Adauto (Org.l. 0 desejo.

Sao Paulo: Companhia das Letr as, 1999.

CAIUBY, N. Sylvia. 0 uso da imagem na ant ropologia. In : SAMAIN, Et ienne (Org .) .

ofotografico. Sao Paulo: Hucitec , 1998.

CALVINO, Italo. Os amores dificeis. Sao Pau lo: Companhia das Letras, 1998.

CAMPBEL, Joseph. 0 poder do mi to . Sao Pau lo: Palas Athena, 1992 .

As mascaras de Deus, v. 2, Mitologia Oriental. Sao Paulo: Palas Athena,

1995.

o u{Jodo passaro seluagern. Rio de janeiro: Rosas do Tempo, 1997.

CANETTI, Elias. Massa e poder. Sao Paulo: Companhia das Let ras, 1995 .

CAPRA, Fritjot. Tao da fisica. um paralelo entre a fisica modern a e 0 misticismooriental. Sao Paulo: Cultr ix, 1975.

CARTIEI{-BRESSON, Henri. L'Imaginaire d'apres nature, catalogo. Par is, 1984.

CARYBf:, Hector. As sete portas da Bahia: textos e desenhos de Carybe. Rio de

janeiro: Record, 1976.

CHAU!, Marilena. janela da alma, espelho do mundo, In: NOVAES, Adauto (Org.). 0

olhar. Sao Pau lo: Companhia das Let ras, 1989 .

COLLIER jr., john. Antropologia uisual: a fotografia como metodo de pesquisa. Sao

Paulo: Edusp, 1973.

COOPER, J. C. Yin e Yang: t aoismo. Sao Pau lo: Mart ins Fontes , 1981.

CORTAzAR, julio. Blow-up e outras bistorias. Lisboa: Europa-America, 1966.

___ . Fenetrcs sur l'insolite. Le Nouuel Obseruateur, Special Photo. Par is: 1977.

COSTA E SILVA,Alberto da. Prefacio. In: GURAN, Milton. Agudas, os brasileiros do

Benin. Rio de janei ro: Nova Frontei ra /Gama Filho, 1999.

DAlmON, Sebastian. 0 etn61ogo e sua imagens. In: SAMAIN, Etienne (Org.). 0

fotografico. Sao Paulo: Huci tec, 1998.

DEBRAY, Regis. Manifestos midiologicos. Petropolis: Vozes, 1995.

___ . Vida e morte da imagem. Petropolis: Vozes, 1996.

DELEUZE, Gilles. Conuersacoes. Sao Paulo: Ed itor a 34, 1992.

___ . Bergsonismo. Sao Pau lo: Edi tor a 34, 1999 .

DUBOIS, Phi ll ippe. 0 atofotografico. Campinas: Papirus, 1994.

DURANT, Will. A bistoria dafilosofia. Rio de janei ro : Record, 1997 .

ELIADE, Mircea. Irnagens e simbolos, ensaio sabre 0 simbolismo magico-religioso.

Sao Pau lo: Martins Fon tes, 1996.

___ . 0 sagrado e 0profane. a essencia das r el igloes. Sao Paulo: Mart ins Fon tes,

1996.

___ . M efistofele: e 0 androg ino . comportamentos religiosos C valores espirituais.

Sao Pau lo: Mart ins Fontes , 1998.

___ . Tratado da bistoria das religioes. S,IOPaulo: Martins Fontes, 1998.

12 5

FOTOGRAFIA E ANTROPOLOGIA

FELDMAN-BIANCO, Bela & MOREIRA LEITE, Miriam (Orgs.). Desafios da imagem:

fo tografia, iconografia e v ideo nas Ciencias Socia i s. Sao Paulo: Pap irus , 1998 .

BIBLIOGRAFIA

HILLMAN, James. 0 c6digo do ser: urna busca do carater e da vocacao pessoal. Rio

de Janeiro : Objetiva , 1997 .

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 61/64

FONTCUBERTA, Joan. EIbeso dejudas.fotografia y uerdad. Barcelona: Gustavo Gili,

1997.

FOUCAULT, Michel. Las Meninas. In: . As palavras e as eoisas. Sao Paulo:

Mart ins Fon tes, 1992, p . 19-31.

FRANCE, Claudine. Cinema e antropologia. Sao Pau lo : Unicarnp, 1998 .

___ . Do filme etnografico it antropologia .filmica. Campinas: Unicamp, 2000.

FRANK, Robert. The Americans: Photographs . Nova Iorque: Grove Press , 1959 .

FREUND, Gisele. Lafotograf ia como documento social. Barcelona: Gus tavo Gi li ,

1974.

FREYRE, Gilberto. Problemas brasileiros de antropologia. 2. ed. rev. e aumentada.

Rio de Janeiro : Jose Olympic, 1959.

___ . Bahia e baianos. Textos reunidos por Edson Nery da Fonseca. Salvador:

Fundacao das Artes/EGBA, 1990 .

FRICOVA, Yvonna & FRIC, Pavel. Guido Boggtani, fot6grafo. Praga: Nakladatelsti

Titanic, 1997

FRIZOT, Michel (Org.), The New History of Photography. Colonia: Konemann, 1998.

GALANO, Ana Maria . In ic iacao a pesqu isa com imagens . In : FELDMAN-BIANCO,

Bela & MOREIRA LEITE,Miriam (Orgs.). De sa fi os d a imagem: fotografia, iconografia

e video nas Ciencias Socia is . Campinas: Pap irus , 2000 .

GALASSI, Peter. Before Photography: Pain ting and the Invent ion of Pho tography.

Nova Iorque: Museum of Modern Art, 1981.

GEERTZ, Clifford. A interpretacdo das eulturas. Rio de Janeiro : Jorge Zahar, 1978.

___ . Works and Lives: The Antrophologist as Author. Stanford: Stanford University

Press, 1988.

GIDDENS, Anthony. As consequencias da modern ida de. Sao Pau lo : Unesp , 1991.

GODELIER, Maurice. Outils d'Enquete et d'analyse antbropologique. Paris: Francois

Maspero, 1976.

GUARNER B., Comunicacion visual atraves de las imageries. In: AGUIRRE, A. (Org.).

Cultura e identidad cultural. Barcelona: Bardenas, 1997.

GURAN, Milton. Agudds, os "brasileiros" do Benin. Rio de Janeiro: Gama Filho/Nova

Fronteira, 1999.

___ . Notas de pesquisa sobre iniciacao e 0trabalho fotografico de Pierre Fatumbi

Verger no Benin. Cadernos de Antropologia e Imagem, n. 7, v. 2. Antropologia e

Imagem. Rio de Janeiro : 1998.

HALL, Edward T. The Hidden Dimension. Garden Ci ty : Doubleday, 1966.

HARBUTT, Charles. Travelog: I don't Take Pictures, Pictures Take Me. Nova Iorque 1987.

___ . Cidade & alma. Sao Paulo: Studio Nobel, 1999.

HOLBORN, Mark (Org.), Aperture. Wester Spaces, n. 98. California: Aperture

Foundation, 1985.

IVINS Jr., William M. Prints and Visual Communication. Cambridge: Harvard University

Press, 1953.

JEZEQUEL, Herve. A fotografia nas festas populates. Cadernos de Antropologia, n. 2.

Antropologia e fo tografia. Rio de Janeiro : Programa de Pos-Graduacao em Cieri -c ias Socia is/Nucleo de Antropologia e Imagem, 1996, p . 127-34.

JUNG, Carl Gustav. 0 homem e seus sirnbolos. Rio de Janei ro: Nova Fron te ira , 1964 .

JUNQUEIRA, Carmen. Shamans and Sorcerers. In: GEZA, Kezoi (Org.). Menyeruwa.

Honorary Studie s to L. Boglar' s 70th Anniversary. Festal Yearbook. Szimbi6zus,

8. Yearbook of Department of Cultural Anthropology, Budapeste, pp. 150-158,

1999.

___ . Antropologia indigena: uma in troducao, Sao Paulo: Educ, 1999 .

KANDINSKY, Wassily. Do espiritual na arte. Sao Paulo: Mart ins Fon tes, 1990 .

KOSSOY, Boris. Fotograjia e hist6ria. Sao Paulo: Atica, 1989.

___ . Real idades eficcoes na tramafotograf ica. Sao Paulo: Atelie Editorial , 1999.

LAO TSE. 0 livro do camirzho perfeito. Sao Paulo: Pensamento, 1997 .

LAPLANTINE, Francois. Aprender antropologia. Sao Paulo: Brasiliense, 1988.

LE GOFF, Jacques. Por amor as cidades. conversacoes com Jacques Lebrun. Sao

Paulo: Unesp, 1997 .

LEMINSKI, Paulo. Zen e a fotografia. Palest ra na V Semana Nacional da Fotografia,

Curi tiba , 1986, publ icada em Espaco Aberto, Curi tiba , 1989.

LEPOLDO E SILVA,Franklin. Bergson, Proust: tens6es do tempo. In: NOVAES, Adauto

(org.), Tempo e bistoria. Sao Pau lo: Companhia das Letr as, 1992.

LEVI-STRAUSS, Claude, Tristes tr6picos. Sao Pau lo: Mart ins Fon tes 1955.

___ . La Pensee sauvage. Paris: Librair ie PIon, 1962.

___ . Mito e Significado: perspect ivas do homem. Lisboa: Ed icoes 70, 1978.

LIPOVESTSKY, Gilles. A era do vazio. Lisboa: Relogio d'Agua, 1983.

LUHNING, Angela. Pierre Fatumbi Verger e sua obra: homenagem. Afro-Asia-

Reuista do Centro de Estudos Afro-Orienta is, n. 21-22, p. 315-53. Salvador: Centro

de Estudos Afro-Orientais, FFCH/UFBA, 1998-1999.

MACHADO, Arlindo. A i lu s do e s pe c ul ar : inrroducao a fotografia. Sao Paulo: Brasiliense,

1984.

MAGEE, Bryan. Historia da filosofia. Sao Paulo: Loyola, 1998.

12 7

fOTOGRAflA E ANTROPOLOGIA

MALINOVSKI, Bronislaw. Uma teoria cientifica cia cultura. Rio de Janeiro: Jo rge

Zahar, 1962.

PRAN])I, Regmaldo. Mitologia dos orixds. S~10Paulo: Companhia dus let ras, 2001.

PRANDI, Rcgmaldo & PIEI{UCCI, Antonio Flavio. A real idade social das rel igioes no

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 62/64

___ . Os argonautas do Pacifico Ocidental. urn relato do empreendimento e da

aventura dos nat ivos nos arquipelagos da Nova Guine, Melanesia. Col . Os Pensa-

dores. Sao Paulo: Abr il Cu ltur al , 1976.

___ . Magia, ciencia e religido. Lisboa: Edicoes 70, 1988.

MARESCA, Silvain . Olhares cruzados : ensaio comparative ent re as abordagens foto-

grafica e etnografica. In: SAMAIN, Etienne (Org.), Ofotogrdfico. Sao Paulo: Hucitec,

1998.

MERLEAU-PONTY, M. 0uisiuet eo inuisiuel. Sao Paulo: Pcrspectiva, 1971.

___ . Sign os. Sao Pau lo : Martins Fontes , 1991.

MICHALS, Duane. Deal Dreams. Nova Iorque: Addison House, 1976.

MOISES-PERRONE, Beatriz. Entrevista com Claude Levi-Strauss. Folha de 5Paulo,

Maisl, 27/6/1999.

MORIN, Edgar. 0cinema 011 0bomem imaginario. Lisboa: Moraes, 1970.

Cul tura de massas no seculo xx. Vol. 1 - Neurose. Rio de Janeiro: Forense

Universitaria, 1997.

___ . Amor, poesia, sabedoria. Sao Pau lo: Bert rand Brasi l, 1999.

MUSEU DA IMAGEM E DO SOM (MIS). Catalogo da Expos icao Afotografia como

feitico, captando 14m outro mundo mundo do outro. Fotos de Claudia Andujar ,

Harald Schultz e A. Frisch, 19/4/2000.

NANOOK OF THE NORTH (fi lme-documentario). Di recao de Robert Flaherty. Prod .

Revillon Freres. Nova Iorque, 1922, 70 min, p&b, 35 mm.

NIEMEYER, Ana Maria. Rimas urbanas: fa las sobre mult icul tur al ismo em Bolonha e

Paris. Revista Imagens, n. 7, mai./ago. 1996. Campinas. Unicamp, 1996,1'1' .88-96.

NOVAES, Adauto (Org.). 0olbar. Sao Paulo: Companhia das Let ras, 1989 .

NUNES, Benedito. lnt roducdo a f ilosof ia da arte. Sao Paulo: Atica, 1991.

OITICICA, Jose filho. A ruptura dafotografia nos anos 50- catalogo. Rio de Janei-

ro: Funarte, 1984.

ORTEGA Y GASSET, Jose. La rebelion de las massas . Madri: Union Editorial , 1984.

PASSETTI, Dorothea Voegelle. Minuscule incomensurauel. Claude Levi-Strauss, an-

tropologia e arte. 1999. Tese (doutorado em Antropologia) - Faculdade de Cieri-

c ias Socia is , Pont if ic ia Univers idadc Cat61 ica de Sao Paulo, Sal ! Paulo.

PESSOA, Fernando. Obra poetica. Rio de Janeiro: Nova Aguilar , 1994 .

PLATAO. Timeu e critias ou a Atldntida. Sao Paulo: Hernus , 1981 .

- __ . Dialo[!,os. Sao Pau lo: Nova Cul tur al , 1987 .

POLLAK, Michael. Memoria, esquecimento, silencio. Estu dos bistoricos, v. 2, n.3, p.

3-15. Rio de janeiro: FGV, 1989.

12 8

Brasil. Sao Pau lo: Hucitcc , 1996.

RIBEIRO, Darcy. Kadiuieu, ensaios ctno l6gicos sobre 0 saber, 0 azar c a belcza.

Petropolis: Vozes, 1980.

ROSENBLUM, Naomi. A World History ofPhotography. Nova lorque: Abbeville Press,

1984.

RUSSELL,Bertrand. Nosso conhecimento do mundo exterior: estabelecimento de urn

campo para estudos sobre 0metodo cient ifico ern fi losofia. Sao Paulo: Edusp,

1966

SALLES, Cecilia Almeida. Gesto inacabado. processo de criacao art ist ica. Sao Paulo:

Annablume, 1998.

SAMAIN, Etienne & SOLHA, Helio. Antropo logia visual, mi to e tabu. Cadernos de

textos de Antropologia Visual. Rio de Janeiro : Museu do Indio, se t/1987.

SAMAIN, Etienne (Org.). Ojotogr(iji'co. Sao Paulo: Hucitec , 1998 .

SANTAELLA, Lucia & NOTH, Winfried. Imagem. cogn icao, semiot ica, midia. Sao

Paulo: I luminuras, 1998.

SANTOS, Laymcrt Garcia dos. Tempo de ensaio. Sao Paulo: Companhia das Letras,

1989

SCHAEFFER, Jean-Marie. A imagem precaria. sobre 0 dispositive fotografico. Cam-

pinas: Papirus, 1996.

SCHARf, Aoran. Art and Photography. Baltimore: Penguin, 1974.

SEMPIUNI, Andrea. Multicult uralismo. Bauru: Eusc, 1999.

SOCRATES. Col. Os Pensadores. Sao Paulo: Abri l Cu ltura l, 1975

SONTAG, Susan. Ensaios sobre fotografia. Rio de Janeiro: Arbor, 1981 .

SOUZA, Jose Cavalcanti (Org.) Ospre-socraticos, vida e obra. Col. Os Pensadores.

Sao Paulo: Abri l Cul tu ra l, 1980

SPINOZA, Benito. Pe/~salllel/tos metafisicos. Col. Os pcnsadores. Sao Paulo: Abril , 1979.

STIEGLITZ, Alfred. Camera Work: The Complete llustrations 1903-1917. Colonia:Diane Publishing, 1996.

THOREAU, Henry David. in Wildness i s the Preserua tion o fthe World Fotos de El iot

Porter. Sao fr ancisco: Arrowood Press, 1989 .

TYLOR, Edward Burnett. Primitioc Culture. Nova Iorque: I larper, 1958.

VANLlEI{,Henri. Philosopbie de fapbotograpbie. Paris: Les Cahiers de b Photoihraphies,

1983

VASQCEZ, Pedro Como jClzerj(J/ogmjlci Pcrropolis: Vozes, 1986

___ . Fotograjia, n:flcxo c rcflcxoes. Porto Alcgre: L&Pl\j, 1986

FOTOGRAFIA E ANTROPOlOGIA

VERGER: MENSAGEIRO ENTRE DOIS MUNDOS (documentario). Di recao de Lula

Buarque de Hollanda. Rotei ro de Marcos Bernstein. Brasil , Conspi racao Filmes,

GlobosatiGNT-Net/Sky, Gege Produc;:6es,1998, 82min color ., 35mm. Linguas fala-CREDITOS FOTOGRAFICOS

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 63/64

das: portugues, ioruba, mina, fon e f rances.

VERGER, Pierre; BISCHOF, Werner; FRANK, Robert. From Incas to Indians. Parisi

Nova Iorque: R. Delpi re /Universe Books , 1956.

VERGER, Pierre & SAMPAIO, Eneas Guerra. Lendas dos Orixds. Salvador: Corrupio,

1981.

VERGER, Pierre. Notes sur Ie cul te des Orixa et Vodun a Bahia. La Baie de Tous lesSa ints au Bresil et a l 'Ancienne Cote des Esclaves en Af rique, serie Mernoires de

l 'Ins ti tut Francais d'Afr ique Noire , n. 51. Dakar: IFAN, 1957 .

___ . Noticias da Bahia- 1850. Salvador: Corrupio, 1981.

. Orixas: deuses iorubas na Africa e no Novo Mundo. Salvador: Corrupio,

1981.

___ . Fluxo e rejluxo do trafico de escravos entre 0Golfo do Benin e a Bahia de

Todos os Santos. Salvador: Corrupio, 1987.

Dieux d'Afrique. Paris: Revue Noire, 1995.

Le Messager. Photographs 7932-7962. Paris: Revue Noire, 1996.

___ . Notas sobre 0cul to aos orixds e uoduns . Sao Paulo: Edusp, 1998.

___ . E we: 0uso das plantas na sociedade ioruba. Sao Paulo: Companhia das

Letras, 1999.

WENDERS, Wim. Preservar 10 que va a desaparecer: la fotografia como memoria. EI

Correo de fa Unesco, Madr id, abri l de 1988 .

WESTON, Brett. Voyage of the Eye. Nova Iorque: Apertur e, 1975.

WESTON, Edward. The Daybooks of Edward Wes ton . Nova Iorque: Aperture , 1996.

17: Rosane de Andrade, Cavalo, Ribeiroo

Preto, 1999

21: Rosane de Andrade, Dona do L u z ,

Curitiba, 1999

22: Rosane de Andrade, Dona do Lu z ,

Curitiba, 1999

23: Rosane de Andrade, Dona do L u z ,

Curitiba, 1999

24: Rosane de Andrade, Dona do L u z ,

Curitiba, 1999

30: RosanedeAndrade, Vercom o lhos l i vres ,

Sao Paulo, 1998

33: Claud ia Andu ja r, Y an om a mi , 1 9 98

37: William Henry Fox Talbot, Botanical

S pe ci me n, 1 83 9

39: Etienne Carjat, Cha rl e s Ba u de l ai re ,

1878

40: Felix Nadar, Sarah Be r nha rd t , 1 87 7

43: Eugene Atget, Prosti tu ta , Paris, 1920

44: Henri Cartier-Bresson, Arena, Valencia,

Espanha, 1933. Magnum Photos

45: Alexander Rodchenko, Retratod e m in ha

mae, 1924. Col. Alexander Lavrientiev

44: Cor toes de vis ita, Budopeste, Hungr ia,

1874. Col. do autora

57: LIdia Cipriani, M ulh er d e F ofa , Africa

Oriental, 1939. Revi sta Imagens , n. 7,

p. 88-9, artigo deAna Maria Niemeyer

58: Guido Boggiani, Ve lh o d e c a be l o b r an c o,

t ri b o Chama c o co , Alto do Paraguai,

1896. Col. Fric & Fricova

59: Guido Boggiani, Mulher jovem pintado,

Nabileque, Mota Grosso do Sui, 1897.

Col. Fric & Fricova

60: Guido Boggiani, iooto, serio, tr ibo

Chamacoco, Alto do Paraguai, 1896.Col. Fric & Fricova

62: Claudia Andujar, Y an om a mi , 1 9 98

630: Claudia Andujar, Y an om a mi , 1 9 98

63b: Claudia Andujar, Y an om am i, 1 99 8

64: Claudia Andujar, Y a nom am i, 1 9 98

65: PierreVerger,Porto Principe,Haiti, 1948.

Col. Fuodocoo Pierre Verger, Salvador

66: Alfred Stieglitz, Th e Te rm i na l, Nova

lorque, 1892. MaMA, Nova lorque

67: EadweardMuybridge, Capo do Scientific

Am er ic an , 1 8 78

75: PierreVerger,Auto-retrato, Bahia, 1946.

Col. Fundocco Pierre Verger, Salvador

77: Pierre Verger, Novo Orleans, Estados

Unidos, 1934. Col. Fundocco Pierre

Verger,Salvador

78: PierreVerger, Nova lorque, EstadosUni-

des, 1934. Col. Fundccco PierreVerger,

Salvador

79: Pierre Verger, Moon, Burk ina Faso,

1936. Col. Fundocco Pierre Verger,

Salvador

80: PierreVerger,Xangai, China, 1937. Col.

Fundccco Pierre Verger, Salvador

81: PierreVerger,Salvador,Brasil, 1946-1962.

Col. Fundccoo PierreVerger,Salvador

82: PierreVerger,Salvador,Brasil, 1946-1962.

Col. Fundocco PierreVerger, Salvador

88: PierreVerger, Eguns , Porto Novo, 1949-

1954. Col. Fundccoo Pierre Verger,Salvador

89: PierreVerger, Eguns , Porto Novo, 1949-

1954. Col. Fundocco Pierre Verger,

Salvador

93: Pierre Verger, E le gu n d e Xang6, Benin,

Africa, s/d. Col. Fundccco PierreVerger,

Salvador

94: PierreVerger,Xang6, Benin, Africa, sid

Col. Fundccoo Pierre Verger, Salvador

97: Pierre Verger, E le gu n d e X an g6 , Benin,

Africa, s/d. Col. Fundocco PierreVerger,

Salvador

fOTOGRAflA E ANTROPOlOGIA

990: Pierre Verger, Um trio de tambor bore.

Benin, Africa, s/d. Col. Fundocco Pierre

Verger, Salvador

105: Pierre Verger, F es ta d e Oxossi, Benin,

Africa, s/d. Col. Fundocco PierreVerger,Salvador

5/17/2018 ANDRADE, Rosane - Fotografia e Antropologia - Olhares Fora-Dentro - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/andrade-rosane-fotografia-e-antropologia-olhares-fora-dentro-55b07d8e30104 64/64

99b: Pierre Verger, Donco de e/egun de

Xang6, Benin, Afr ica. Col. Fundocoo

Pierre Verger, Salvador

1000: Pierre Verger, Donee de e/egun de

Xang6, Benin, Africa. Cal. Fundocco

Pierre Verger, Salvador

100b: Pierre Verger, Donee de e/egun de

Xang6, Benin,Africa, s/d. Col. FundoccoPierre Verger, Salvador

102: PierreVerger,Ogum, Benin, Africa, s/d.

Col. Fundocoo Pierre Verger, Salvador

103: PierreVerger, E/ede de Oxossi, cocodor

d a a / de ia , Benin, Africa, s/d. Col. Fun-dccco Pierre Verger, Salvador

108: Pierre Verger, Yemanio mandestada

em candomb/ed a B ah ia , Salvador,Brasil,

sid. Col . Fundccco Pie rre Verger,

Salvador

109: PierreVerger,Transe, Porto Principe, Haiti,

1948. Col. Fundccco Pierre Verger,

Salvador

112: Jean-Loup Pivin, Pierre Verger, Bahia,

Brasil, 1992

114: Duane Michals, A morte chega para a

cncid, 1969. MoMA, Nova lorque

136: Rosanede Andrade, Gata, Brasil, 1999