Antes-de-Amarrar-Satanas Elben-M-Lenz-Cesar.pdf

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  • ANTS PAMARRAT*SATANS...

    Csar

  • UltimatoEDITORA

    ISBN 85-86533-09-0

    y 7 8 8 5 8 6 5 3 9 0 9 1

    ANTK AMARRAR SATANS...... amarre voc mesmo!

    A nfase demasiada que hoje damos a Satans est nos deixando desarmados quanto aos mpetos pecaminosos que esto escondidos dentro de ns.De nada adianta amarrar Satans se no amarramos tambm a pecaminosidade latente. Estamos dando muita importncia ao inimigo externo e pouca importncia ao inimigo interno.No se faz uma igreja santa apenas desferindo golpes em Satans. preciso esmurrar o corpo do pecado, obrigando-o a ser completamente controlado (1 Co 9.27). Foi exatamente essa tcnica que Deus props a Caim nos primrdios da histria do pecado;Eis que o pecado ja z porta; o seu desejo ser contra ti mas a ti cumpre domin-lo (Gn 4.7).Antes de amarrar Satans... pe para fora a capacidade pecaminosa do ser humano e aponta o caminho da vitria.

  • A ntes d ; A marrar S i \ nas..

    inlise bblica e secular ta natureza humana e de

    como lidar com a pecaminosidade latente

    UltimatoEDITORA

  • Copyright 1998 by Elben M. Lenz CsarProjeto Grfico:Editora Ultimato

    Capa:Expresso Exata

    Ia Edio:A bril de 1998

    Reviso:Bem adete Ribeiro

    Dlnia M . C. Bastos

    Ficha catalogrfica preparada pela Seao de Catalogao e Classificao da Biblioteca Central da UFV

    Csar, Elben M. Lenz, 1930-

    C421a Antes de Amarrar Satans...; uma anlise 1998 bblica e secular da natureza humana e de como

    lidar com a pecaminosidade latente / Elben M. Lenz Csar; reviso de Bernadete Ribeiro e Dlnia Bastos. - Viosa : Editora Ultimato, 1998.

    120p.ISBN 85-86539-09-0

    1. Pecado. 2. Tentao. 3. tica crist. I. Ttulo.CDD 19.ed. 241.3 CDD 20.ed. 241.3

    1998Todos os direitos desta edio reservados

    E d it o r a U ltim ato L t d a .Caixa Postal 43

    36570-000 Viosa - MG Telefone: (031) 891-3149 - Fax: (031) 891-1557

    E-mail: [email protected]

  • Sum rio

    A presentao 7P rim eira P a r t e

    - 1 . S eis B ilhes de C arentes 1 32. O P roblema d o M al N o P roblema de F brica 1 63 . A P arte M aldita d o Ser H um ano 1 9

    * 4 . O O bstculo-chefe 2 2- 5 . C rebro M aligno 2 5

    6 . E sprito P o r c o 2 8- 7 . C om plexo de D eus 31 8 . D esobedincia C ontnua 3 4

    9 . Q u a n d o o bvio D eixa de S er bvio 3 810 . P ecam inosidade e P ermissividade 4 111 . A u t o n o jo 4 412 . F ilhos de B elial 4 71 3 . H P ecado mais G rave q u e O u tro? 5114 . A F esta da M dia e a F esta da Igreja 5 415 . O P rovrbio das U vas V erdes 5 616 . A G uerra d os D esejos 5 917 . E ntre o A p sto lo P aulo e o M arqus de Sade 6 21 8 . M elhor E scolher o La d o 6 5

  • S eg u nd a P a r te 19- U m a S a c u d id a n a r v o r e G e n e a l g ic a d e Je s u s 7120. P e r d o e C a s t ig o , U m a C o n v iv n c ia N e c e s s r ia 742 1 . N o V er d a d e q u e P a u Q u e N asce T o r t o

    T a r d e o u N un c a se E n d ir eita 7 7

    22. P l s t i c a n o C a r t e r 8323- A lin h a m e n to 8624. C o n v e r s o C o n t n u a 8925- D o m n io P r p r i o 9326. S o b N o rm a s e N o S o b m p e to s 9627. A A r t e d e J o g a r o L ix o n o L ix o 9928. D e R o m a n o s S e t e p a ra R o m a n o s O i t o 10229. Do S a lm o D o is p a ra I s a a s D o is 10530. P le n i t u d e d o E s p r i t o 10931. V u ln e r a b i l id a d e 11232. S U m a C o is a d C e r t o 115

    E p l o g o 117

    As referncias bblicas nao seguidas de indicao foram retiradas da Edio Revista e Atualizada da traduo da Bblia por Joo

    A b r e v ia e s

    BLH - A Bblia na Linguagem de Hoje BJ - A Bblia de Jerusalm BV - A Bblia VivaNVI - Nova Verso Internacional (N ovo Testamento)

    Ferreira de Almeida.

  • A presentao

    Em dezem bro de 1992, o arcebispo catlico de Curitiba, Dom Pedro Fedalto, e o parapsiclogo Geraldo Dallegrave travaram uma ruidosa polmica sobre o diabo. Dallegrave sustenta que demnios, diabos ou Sat no existem: so meros simbolismos para designar, comumente, doenas subjetivas, pecado, tentao, inimigo, adversrio etc. J o arcebispo acredita na existncia de Satans e dos demnios e assevera que esta crena faz parte da doutrina da Igreja Catlica, diramos, mais acertadamente, da igreja crist.

    Todavia, a crena na existncia de Satans, baseada na revelao das Sagradas Escrituras, no justifica o frenesi que existe hoje em torno de sua pessoa. Alguns setores da igreja crist, sem querer, esto fazendo um alarde enorme sobre o demnio. Esto apavorando os fiis e colocando a culpa de qualquer fracasso em Satans.

  • A Palavra de Deus freqentemente nos exorta ao equilbrio. Tanto a descrena como o exagero, nesta e em outras reas e doutrinas, causam problemas muito srios.

    Uma vez comprometido com Cristo, o crente liberto do domnio daquele que governa os poderes espirituais no espao (Ef 2.2, BLH). Este esprito continua a atuar nos filhos da desobedincia e no nos filhos da obedincia (1 Pe 1.14). Joo d uma boa explicao: Sabemos que os filhos de Deus no continuam pecando, porque o Filho de Deus os guarda, e o diabo no pode tocar neles (1 Jo 5.18, BLH). Aquele que guarda os filhos da obedincia refere-se ao diabo assim: Ele no tem poder sobre mim (Jo 14.30, BLH).

    No trato com as foras demonacas, o mandamento : No deis lugar ao diabo (Ef 4.27). O que se preconiza aqui no a prtica de um exorcismo constante e nervoso, na tentativa de mandar o diabo ir embora do corpo, da casa, da rua, do bairro, da cidade, da igreja, da roupa, do alimento, dos instrumentos musicais e do aparelho de som, como se o diabo enchesse todas as coisas. mais inteligente no deixar o diabo entrar. Deixa-se o diabo de fora pelo continuado exerccio da santidade de vida, que s possvel por meio da f e da obedincia, da orao e do sentimento de dependncia de Deus e de todos os recursos devocionais. Andando em santidade de vida, o crente no cede lugar nem oportunidade ao diabo, e este no pode molest-lo. Satans entrou em Judas (Lc 22.3) certamente porque o apstolo traidor nunca se comprometeu por inteiro como Senhor, nunca fechou todas as portas em direo ao pecado (Jo 12.4-6). Qualquer rea da vida fechada a Cristo est aberta ao diabo. Da o trato que Jesus dispensou ao jovem rico, exigindo que ele vendesse todos

  • os seus bens em favor dos pobres e, depois, o seguisse (Lc 18.22). Da a inutilidade de expulsar o esprito imundo e deixar a casa vazia (Lc 11.24-26). As muitas exortaes apostlicas contidas nas Epstolas gerais e pastorais dizem respeito necessidade de crescer na f e na santidade de vida. No encontramos os apstolos expulsando demnios dos crentes e das igrejas. Eles pregavam vida abundante, cheia do Esprito, que no deixa espao para o diabo.

    Satans existe e incomoda. Ele maior que o homem e infinitamente menor que Deus. ladro de semente (Mt 1319) e plantador de joio (Mt 13-39). Tem poder controlado para tentar (J 1.12; 2.6; Lc 22.31;1 Co 10.14) e no perde a oportunidade de tentar (1 Pe 5.8). Mas Satans no o nico instrumento de induo ao pecado. Os trs clssicos promotores do pecado so: as inclinaes da carne (problema interno), o curso deste mundo (problema externo) e a atuao satnica (problema extraterreno). Os trs so mencionados juntos por Paulo na Espstola aos Efsios (2.1-3) e analisados cuidadosam ente por Russell Shedd em O mundo, a carne e o diabo1.

    Mesmo amarrando Satans (no por meio de algumas palavras mgicas, mas com a completa armadura de Deus), o crente continua sujeito ao pecado, porque ainda h duas foras desamarradas: o apetite pecaminoso prprio e a perturbadora influncia do meio em que vive. Ele tem de investir contra essas trs influncias com o mesmo cuidado, o mesmo mpeto e a mesma f.

    O livro que o leitor tem diante de seus olhos focaliza apenas o problema interno, provavelmente o mais complexo. Da o ttulo: Antes de amarrar Satans... Trata-se de uma anlise bblica e secular da complicadssima natureza humana e de como lidar com a pecaminosidade latente.

  • Quase todos os captulos deste livro foram publicados originalmente na revista U ltim ato . Aqui aparecem reunidos, depois de algumas adaptaes.

    N o ta .

    1 So Paulo: Edies Vida Nova, 1995. 126 p.

    Todos que so beneficiados pelo que fao, fiquem certos que sou conra a venda ou troca de todo material disponibilizado por mim. Infelizmente depois de postar o material na Internet no tenho o poder de evitar que v'alguns aproveitadores tirem vantagem do meu trabalho que feito sem fins lucrativos e unicamente para edificao do povo de Deus. Crticas e agradecimentos para: mazinhororiguesQyahoo. com. br

    Att: Mazinho Rodrigues.

  • P rimeira P a rte

    U ma anlise

    bblica e secular da

    NATUREZA HUMANA

  • 1.

    Seis B ilh es d e C arentes

    Q uando Paulo escreveu que todos pecaram e carecem da glria de Deus (Rm 3-23), havia 250 milhes de pessoas carentes no planeta. Esse nmero subiu para 450 milhes na poca da Reforma Religiosa do sculo XVI e para 1,65 bilho no incio do presente sculo. Em 1975 ramos 4 bilhes e no incio do terceiro milnio seremos 6 bilhes.

    Somos um contingente enorme de homens e mulheres moral, espiritual e fisicamente enfermos. Mais do que carentes, estamos todos mortos em delitos e pecados (Ef 2.1). O planeta um enorme e mal cheiroso necrotrio. So mortos no sentido espiritual, pois esto separados de Deus. Todos necessitam de uma ressurreio igualmente espiritual. Em todos h uma centelha acesa que nunca se apaga a lembrana remota e contnua de Deus. Uma espcie de saudade da criao, do Criador, da ordem original, dos primeiros dias de vida, da casa paterna. De uma forma e de outra todos

  • expressam a angstia dessa ausncia: Como suspira a cora pelas correntes das guas, assim, por ti, Deus, suspira a minha alma (SI 42.1).

    Tamanha distncia de Deus dolorosa demais. to ou mais desastrosa que a distncia que separa a me do recm-nascido. A criana precisa da presena da me, do carinho da me, do olhar da me, do leite da me. Ela precisa tocar na me e ser tocada por ela, para ter a sensao e a certeza de que a me est por perto. Se for privada dessas coisas, a criana, caso sobreviva, crescer confusa, triste e ficar emocionalmente perturbada, talvez para sempre. Ora, se isso acontece no relacionamento sangneo, quanto mais no relacionamento do homem com Deus, o maior e o mais subjetivo de todos os relacionamentos. A alma humana tem sede de Deus.

    Da a importncia da enftica declarao de Paulo: Todos pecaram e carecem da glria de Deus (Rm 3.23). Se consultarmos outras verses do texto, encontraremos mais riqueza ainda:

    Em A Bblia de Jerusalm e na Traduo Ecumnica - Todos pecaram e esto privados da glria de Deus.

    Na Traduo Interconfessional (de Portugal) - Todos pecaram e ficaram longe de Deus.

    Em A Bblia na Linguagem de Hoje - Todos pecaram e esto afastados da presena gloriosa de Deus.

    Em A Bblia Viva (do Brasil) - Todos fracassaram e no puderam alcanar o glorioso ideal cle Deus.

    Em A Bblia Viva (de Portugal) - Todos pecaram, tendo perdido o direito de acesso glria de Deus e falhado o destino glorioso que Ele preparara para a humanidade.

    Sejam quais forem as palavras empregadas pelos tradutores, a idia contida no texto paulino de distncia entre o homem e Deus, como resultado direto do

  • pecado geral e particular. Logo aps a queda do homem, o misericordioso Deus fez o primeiro anncio de sua completa redeno: a promessa de que o descendente da mulher esmagaria a cabea da serpente (Gn 3.15).

    Na plenitude do tempo, Deus cumpriu a dita promessa e enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para resgatar os que estavam sob a lei, a fim de que recebssemos a adoo de filhos (G1 4.4-5). Desde ento, os 6 bilhes de carentes do sculo XXI tm a possibilidade de ser restaurados e de se tornar outra vez filhos de Deus!

  • 2O P ro blem a d o M al no

    P ro blem a d e F brica

    O planeta est cheio de misria, cheio de injustia, cheio de violncia, cheio de sangue, cheio de impureza sexual, cheio de dor, cheio de contradies. De quem a culpa?

    A Bblia registra uma curiosa e sria discusso entre Deus e os israelitas na poca do profeta Ezequiel, menos de 600 anos antes de Cristo. O povo reclamava: O modo de proceder do Senhor no est certo. E Deus rebatia: Ser o meu procedimento que no est certo, casa de Israel? No ser antes o vosso procedimento que no est certo? (Ez 18.29, BJ).

    Um diz que da madeira torta da qual o homem foi feito nada de completamente reto pode ser trabalhado (Immanuel Kant). Outro discorda: Deus fez o homem reto, e este procura complicaes sem conta (Ec 7.29, BJ).

  • O livro das origens afirma que Deus criou o homem sua imagem (Gn 1.26). J Lus Fernando Verssimo faz troa e troca o nome de Deus pelo nome do diabo, provocando a seguinte aberrao: Disse o Diabo: Faamos o homem nossa imagem; e criou o homem sua imagem.

    O masdesmo, antiga religio da Prsia, hoje Ir, segue caminho diferente. Ensina que h dois princpios rivais disputando a hegemonia do mundo: o princpio do bem (Ahura-Mazl) e o princpio do mal (Ahira-man). O dever do homem ajudar o bem a triunfar. Zaratrsta, tambm chamado Zoroastro no Ocidente, o principal porta-voz deste sistema religioso dualista (sculo VI a.C.).0 cristianismo teve de repudiar a intromisso dessa heresia em diversas ocasies. Alguns grupos religiosos adotaram o dualismo iraniano, como os maniquestas (a partir do terceiro sculo d.C.), os gnosticistas, os marcionistas, os paulicianos (sculo VII), os logomilistas (sculo X) e os ctaros (sculo XI). A Bblia jamais ensinou tal coisa. A primeira pgina das Escrituras suficiente para acabar com a interpretao dualista do mal, desde que h um s Criador e um s Senhor de todas as coisas visveis e invisveis. No h dois princpios, mas um s Deus. A existncia do diabo e do mal s pode ser atribuda ao abuso do livre arbtrio por parte dos seres criados, quer anjos, quer hom ens (G. C. D. Howley). O dualismo no pe a culpa do mal em Deus, mas diminui a culpa do homem e exagera o poder do mal.

    Na verdade, o problema do mal no problema de fbrica. problema do prprio homem, do mau uso de sua vontade e de seu poder. O primeiro passo para a1 estaurao do bem e da ordem tem de comear com a declarao conjunta da inocncia de Deus e da

  • culpabilidade do homem. A culpa sempre nossa. De nossa arrogncia. De nossa estupidez. De nosso desvario. De nossa insatisfao. De nosso egocentrismo. De nossa indisciplina.

    Naturalmente muito mais cmodo colocar a culpa sobre o ombro alheio, sobre as circunstncias e sobre as fatalidades do que sobre ns mesmos. A culpa de Deus, a culpa da mulher, a culpa do diabo, a culpa da igreja, a culpa da sociedade, a culpa da televiso, a culpa do governo. Todos so culpados, exceto ns prprios. Assim no se chega a nada. No se avana sequer um milmetro rumo interpretao e soluo do problema.

    Quem melhor explica que o problema do mal no problema de fbrica Tiago. Segundo o apstolo, ningum deve pensar nem dizer explcita ou implicitamente que tentado por Deus, pois Deus no pode ser tentado pelo mal, e Ele mesmo a ningum tenta. O pecado o resultado concreto do conbio da concupiscncia com a vontade de cada um. o sim proposta pecaminosa, depois das provocaes iniciais (Tg 1.13-15).

  • 3.

    A P arte M aldita d o

    Ser H um ano

    Ao ser humano Deus deu uma importncia enorme, que pode ser expressa nesta simples nota do livro de Gnesis: Criou Deus, pois, o homem sua imagem (Gn 1.27).

    Ele tem um corpo ereto, elegante e bonito, capaz de se manter vivo, capaz de locomover-se e capaz de reproduzir-se. Tem uma mente capaz de pensar, raciocinar, armazenar dados, lembrar-se, sonhar, criar e amar. Tem uma alma capaz de relacionar-se com Deus. E a ele foi dado o domnio de toda a criao.

    No obstante tanta glria, o ser humano tem aquilo que o pensador francs Jean Baudrillard chama de a parte maldita do homem ou o princpio do mal. Todos os estragos causados no meio ambiente, no relacionamento entre cnjuges, entre famlias, entre grupos tnicos e entre naes, e na comunho do homem com Deus derivam dessa parte maldita do ser humano.

  • Baudrillard no o nico a chamar a ateno para esse problema acentuadamente complexo. O escritor srvio Vidosav Stevanovia diz sem rodeios que o mal, como o bem, faz parte da condio humana e, ento, exorta: Antes de combater o mal nos demais, cada um deve combat-lo no interior de si mesmo1. A psiquiatra brasileira Nise da Silveira afirma: Todos ns temos uma parcela do mal, no somos bonzinhos cem por cento. A mesma confisso faz o pastor Caio Fbio na apresentao de suas Confisses-. Puxei um fiapo na minha alma e achei uma grossssima corda de amarrar navio atada bem no cerne de meu ser2. A socialite carioca Georgiana Guinle, convertida ao evangelho em 1994, reafirma tudo isso quando declara: Passei 10 anos de minha vida invocando espritos externos, me esquecendo de exorcizar os meus fantasmas interiores3.

    Antes de Jean Baudrillard, o juiz lvaro Mayrink da Costa explicava que em todo homem h um leo adormecido e acord-lo s uma questo de oportunidade4.

    Antes de lvaro Mayrink, o escritor americano William Saroyan dizia que o homem mau deve ser perdoado todos os dias e amado porque alguma coisa de cada um de ns est no pior homem do mundo e alguma coisa dele est em cada um de ns5.

    Antes de Saroyan, o pasto r lu terano D ietrich Bonhoeffer perguntava-se, com espanto: Quem sou eu? Este ou aquele? Sou eu um, hoje, e outro, amanh? Sou eu ambos ao mesmo tempo?.

    Pouco antes de Bonhoeffer, o escritor Mrio de Andrade, autor de Macunama, mencionava a sua prpria parte maldita numa carta a Portinari: Voc me revelou o meu lado anglico, ao passo que Segall me revelou o meu lado diablico, as tendncias ms que procuro vencer.

  • Antes de Mrio de Andrade, o telogo cartagins Tertuliano explicava que alm do mal que sobrevem alma, proveniente da interveno do esprito mau, existe um mal antecedente e, em certo sentido, natural, proveniente de sua origem corrupta6.

    Antes de Tertuliano, o filsofo romano Sneca indagava: Oh! que isso que, quando queremos ir para um lado, nos arrasta para o lado oposto?.

    Na mesma poca de Sneca, Pedro, Tiago e Paulo escreviam aos cristos, instruindo-os a respeito dessa dificuldade interior e permanente que facilita o pecado e dificulta a virtude. Pedro afirma categoricamente que as paixes carnais fazem guerra contra a alm a (1 Pe 2.11). Tiago garante que cada um tentado pela sua prpria cobia, quando esta o atrai e seduz (Tg 1.14). E Paulo acrescenta: O que a nossa natureza humana deseja contra o que o Esprito quer, e o que o Esprito quer contra o que a nossa natureza humana deseja (G1 5.17, BLH).

    E 700 anos antes dos apstolos e de Sneca, o profeta Jeremias j dizia: No h ningum capaz de saber at que ponto mau e pecador o corao humano! (Jr 17.9, BV).

    Notas1 O Correio da UNESCO, 5/97. p. 7.2 Confisses do pastor Caio Fbio. So Paulo: Editora Record, 1997. p. 12. Do outro lado da eternidade. So Paulo: Editora Vida, 1997. p. 133.4 Revista Veja, out. 1971. Revista Veja, 4 dez. 1968.

    Histria da igreja crist. Editora Aste, 1967. vol. 1. p. 99-

  • 4.

    O O bstculo - c h efe

    O chefe da sucursal do Jornal do Brasil em Porto Alegre perguntou ao humorista Lus Fernando Verssimo se ele, depois de tantas viagens por este mundo fora, em contato com costumes e hbitos diversos, chegou a alguma concluso sobre a raa humana. A resposta do autor de O analista de Bag foi seca: todo mundo igual. Foi seca e verdadeira, pois coincide com a anlise da teologia bblica: Todos se extraviaram e juntamente se corromperam (SI 14.3).

    Pergunta semelhante foi feita ao historiador francs George Duby: o ser humano evoluiu desde a Idade Mdia?. A resposta do autor de A histria da vida privada mais realista que pessimista: Houve modificaes materiais, mas as condies morais no mudaram. Os indivduos continuam selvagens e cruis.

    Os dois escritores confirmam a velha doutrina calvinista e paulina da total depravao humana, no tempo (resposta de George Duby) e no espao (resposta

  • cle Lus Fernando Verssimo). Este o problema bsico, que comanda os acontecimentos de ontem e de hoje, do Norte e do Sul. Qualquer boa inteno, qualquer mudana para melhor, qualquer reforma moral, qualquer esforo em direo justia social encontra a dificuldade interna de se rebelar contra o mal e de se dobrar ao bem.

    Ao se considerar solto aos seus prprios desejos egostas e maus, o homem se perverte e perverte a sociedade no meio da qual vive. A sociedade por ele pervertida contribui, por sua vez, para aumentar ainda mais a perverso do homem e do seu ambiente, formando um crculo vicioso de propores assustadoras. deste mal que estamos sofrendo. E contra ele que precisamos fazer uma revoluo, pois ainda somos escravos do pecado, ainda fazemos a vontade da carne, ainda estamos sob dominao estranha aos propsitos originais, ainda no amarramos a ns mesmos.

    Basta ouvir as notcias corriqueiras, enfadonhas, sujas, desanimadoras e dolorosas do Brasil e do mundo, dos pases ricos e dos pases pobres. S h misria, loucura, maldade, obsesso por dinheiro, mania de sexo, dio, mentira e corrupo generalizada e incurvel. O homem livre mas no feliz. Faz o que quer mas no se realiza. Promove conferncias, escreve teses, assina tratados, muda de cnjuge, de pas, de religio, de partido, de ideologia e at de sexo, mas no se sente seguro em lugar algum. Est desesperado e sem esperana. A crise deixou de ser individual para ser coletiva. Tudo porque o obstculo-chefe no foi lembrado, no foi identificado, no foi enfrentado, no foi removido. Estamos atrs de bruxas e no do obstculo-chefe. Sabemos que ele existe, mas no queremos tocar nele nem com o dedo. Mentimos aos outros e a ns mesmos. Rodeamos

  • o ncleo da questo, mas no chegamos a ele. Temos medo. O vazio nos faz idiotas e nos obriga a correr atrs do vento e do misticismo inoperante que serve apenas de desculpa e de tranqilizante para a mente agitada. Nosso alvo precisa ser a destruio do obstcu- lo-chefe que a vontade solta e no a boa, agradvel e perfeita vontade de Deus (Rm 12.2). S assim seremos realmente sal da terra e luz do mundo e poderemos contribuir para causar algum impacto na histria e na geografia deste planeta.

  • 5 .

    C r ebr o M aligno

    Em fevereiro de 1990, um mdico da Clnica Mayo, nos Estados Unidos, disse francamente ao editor brasileiro Alfredo Machado que ele tinha um tumor maligno no crebro. O proprietrio da Editora Record fez ento uma brincadeira com o mdico: Maligno? Mas s o tumor? O crebro tambm maligno, doutor.

    A palavra de Alfredo Machado, que morreu no ano seguinte, mais do que uma piada. Encerra uma das verdades bblicas bsicas e de demorada aceitao.

    A queda deixou o homem definitivamente enfermo: Toda a cabea est doente e todo o corao enfermo (Is 1.5). O texto vai mais alm e completa: Desde a planta do p at a cabea no h nele coisa s, seno feridas, contuses e chagas inflamadas, umas e outras no espremidas, nem atadas, nem amolecidas com leo (Is 1.6). O profeta no est falando de enfermidade fsica, mas de doena moral.

    Essa e outras passagens das Escrituras Sagradas referem-se depravao total do homem. O autor bblico

  • que mais procurou entender a natureza humana chegou concluso de que, embora Deus tenha criado o homem perfeito, cada um preferiu cuidar da vida a seu modo e todos acabaram se desviando (Ec 7.29, BV). Somos todos um rebanho enorme de ovelhas desgarradas (Is 53.6). Ns nos extraviamos e juntamente nos corrompemos (Sl 14.3). Aprendemos a fazer o mal e desaprendemos a fazer o bem. Sentimos uma atrao enorme por Deus e somos atrados tambm pelo pecado. Vivemos uma situao confusa, contraditria e tremendamente difcil.

    Nosso crebro de fato maligno. Somos todos capazes de pequenos e grandes delitos. Capazes de descer todos os degraus da retido e subir todos os degraus da dissoluo. A brincadeira de Alfredo Machado explica por que o ser humano troca a verdade pela mentira, o Criador pela criatura, a sabedoria pela loucura, a glria de Deus pela imagem de um rptil e a heterossexualidade pela homossexualidade (Rm 1.18-32). S mesmo um crebro maligno amaria mais as trevas do que a luz (Jo 3-19) e mataria o Autor da vida (At 3-15), livrando da pena de morte aquele que estava no crcere por causa de uma sedio na cidade, e tambm por homicdio (Lc 23.19).

    Nosso crebro maligno nos induz a chamar o mal de bem e o bem de mal, a transformar as trevas em luz e a luz em trevas, e a mudar o amargo em doce e o doce em amargo (Is 5.20). Esse mesmo crebro doentio danifica o raciocnio, a inteligncia, o livre arbtrio e a conscincia. ele que escraviza a nossa vontade, fazendo- nos dependentes de coisas que proporcionam mais estragos que benefcios. ele que inspira comportamentos absolutamente injustificveis e destruidores, como a inveja, o dio, a violncia, a discriminao, a injustia, a escravatura, o fanatismo, o estupro, o assassinato e a guerra.

  • O cncer no crebro leva morte fsica, mas o crebro moralmente maligno leva morte espiritual, alm cie fazer muitas outras vtimas. .

  • 6.

    E sprito P o rco

    Na anlise do comportamento humano, o criminalista brasileiro Waldir Troncoso Peres, que j defendeu cem homens que mataram suas esposas e trinta mulheres que mataram seus maridos, aproxima-se muito da teologia bblica da pecaminosidade latente do ser humano. Basta ler os seguintes pronunciamentos retirados de sua entrevista revista Veja, de 30 de novembro de 1994:

    O esprito do homem porco. Por ali passam desejos de todos os matizes que so os mais cruis e terrveis. O mais generoso dos homens j deve ter desejado a morte de uns cem. Esse impulso todo mundo tem.

    No h quem no tenha lixo atmico na cabea. preciso descarregar isso em algum lugar.

    Qualquer um de ns tem instintos homicidas.Se cada um pensar melhor, ver que no nada

    impossvel que amanh seja o agente do crime.O criminalista, que j passou 3-000 horas nos tribu

    nais, cita ainda um conselho atribudo ao mdico

  • francs Maurice Fleury: Depois de percorrer todos os escaninhos da alma humana, cheguei a uma concluso: tenhamos piedade uns dos outros.

    H muitas outras vozes que tm falado as mesmas coisas em outras ocasies. O filsofo romano Sneca, que foi contemporneo de Jesus Cristo e conselheiro de Nero, para quem a catstrofe resultado da destruio da razo pela paixo, declarou: Somos todos perversos. O que um reprova no outro, ele o achar em seu prprio peito. Vivemos entre perversos, sendo ns mesmos perversos. J o moralista ingls Samuel Johnson, que escreveu A vaidade dos desejos humanos em 1749, confessou: Cada qual sabe de si mesmo o que ele no ousa contar ao seu mais ntimo amigo. Poucos anos depois, o poeta alemo J. W. Goethe exclamou: No vejo falta cometida que eu no a pudesse ter cometido.

    por causa desses impulsos negativos da nossa espcie, expresso usada por Carlos A. Dunshee de Abranches, articulista do Jornal do Brasil, que Tiago garante que o profeta Elias era homem semelhante a ns, sujeito aos mesmos sentimentos (Tg 5.17). Para evitar que o povo de Listra os tomasse por semideuses ou deuses, Paulo e Barnab explicam: Ns tambm somos homens como vs, sujeitos aos mesmos sentimentos (At 14.15).

    Na Epstola aos Romanos, Paulo desvenda o seu corao e diz sem o menor rodeio: Ao querer fazer o bem, encontro a lei de que o mal reside em mim (Rm 7.21).

    Todas essas confisses nos levam ao ensino de Jesus Cristo: O que sai do homem, isso o que o contamina. Porque de dentro, do corao dos homens, que procedem os maus desgnios, a prostituio, os furtos,

  • os homicdios, os adultrios, a avareza, as malcias, o dolo, a lascvia, a inveja, a blasfmia, a soberba, a loucura: Ora, todos estes males vm de dentro e contaminam o homem (Mc 7.20-23).

    O poeta romano Ovdio, autor de A arte de amar, era bem mais velho que o apstolo Paulo. Ambos se queixam desse lixo atm ico a que se refere o criminalista Waldir Troncoso: Vejo o que melhor e aprovo; contudo, fao o que pior (Ovdio) e No fao o que prefiro, e sim o que detesto (Paulo).

    Davi era piedoso, mstico, compositor e cantor de Salmos, homem de orao, mas tambm cometeu um crime passional: mandou matar Urias, esposo da mulher com a qual adulterou (2 Sm 11.1-25). A viso do corpo nu ou seminu de Bate-Seba atiou a paixo interior, que, por sua vez, destruiu no s a razo, como dizia Sneca, mas tambm a preciosa comunho que Davi tinha com Deus. Da a palavra do segundo filho de Davi e Bate-Seba: Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu corao, porque dele procedem as fontes da vida (Pv 4.23).

    Para este problema dos impulsos negativos da nossa espcie ou do esprito porco s h uma estratgia que d certo: a arte de negar-se a si mesmo todas as vezes que o desejo for pecaminoso, criminoso, anti- tico, egosta ou louco.

    Esta uma condio sine qua non para se tornar cristo: Se algum quer vir aps mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me (Lc 9-23). como veremos na segunda parte deste livro.

  • C o m plexo d e D eus

    Talvez a mais ousada manifestao da pecaminosidade latente do ser humano seja o complexo de Deus.

    H pessoas que elevam-se a si mesmas ao ponto de pensar que so iguais a Deus. No so necessariamente doentes mentais. A doena delas de fundo espiritual: uma forma grave e desenvolvida de orgulho. O prncipe de Tiro um exemplo clssico. Ele disse sem o menor constrangimento: Eu sou Deus, sobre a cadeira de Deus me assento.... A resposta de Deus foi pronta e categrica: No passas de homem e no s Deus, ainda que estimas o teu corao como se fora o corao de Deus (Ez 28.2).

    Atitude mais estranha ainda a do rei da Babilnia, que alguns intrpretes acreditam referir-se tambm a Lcifer: Eu subirei ao cu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono..., subirei acima das mais altas nuvens, e serei semelhante ao Altssimo (Is 14.13-14).

  • O com plex o de D eus com ea com aq u e la propenso soberba, que afeta toda a raa humana, como conseqncia natural da queda. Desde ento o homem no est mais preocupado com a glria de Deus, mas com a prpria glria. E porque, no fundo, todos querem ser Deus, a desordem total. O clima de intensa rivalidade entre os homens e destes para com Deus. Nessa corrida para as mais altas nuvens tudo vlido. O alvo inicialmente proposto pela serpente ser como Deus (Gn 3-5), rivalizar com o Altssimo e assentar-se na cadeira de Deus.

    Porque nos esquecemos de que tudo vem de Deus, q u an to m ais d o ta d o s , m aior a te n ta o de envaidecimento. Somos levados a nos glorificar de nossa sabedoria, de nossa valentia e de nossa riqueza, embora nosso nico motivo de orgulho seja o conhecimento de Deus (Jr 9-23-24).

    Aqueles que so possudos pelo complexo de Deus, eles mesmos alimentam a sua prpria vaidade e vo se transtornando cada vez mais. Cuidam das aparncias e insinuam ser o Grande Poder, como Simo, o mago de Samaria (At 8.9-13). Escondem do grande pblico a sua fragilidade e deixam que todos os chamem de portentos. Apresentam-se como salvadores da ptria, salvadores dos pobres, salvadores da liberdade, salvadores dos direitos humanos e assim por diante. Eles querem pblico, querem palmas, querem ibope, querem multides, querem adoradores, querem alcanar as mais altas nuvens, querem assentar-se na cadeira de Deus.

    As vtimas do complexo de Deus jamais fariam o que Pedro fez na casa de Cornlio. Quando o centurio romano de Cesaria se encontrou pela primeira vez com Simo, prostrou-se a seus ps e o adorou, mas Cefas o levantou e lhe ordenou: Ergue-te, que eu tambm sou

  • homem (At 10.26). Tambm no diriam o que Paulo e Silas disseram multido de Listra, que os tratava como deuses em forma de homens: Senhores, por que fazeis isto? Ns tambm somos homens como vs, sujeitos aos mesmos sentimentos (At 14.15).

    A estratgia dos metidos a Deus diametralmente oposta estratgia adotada por Joo Batista: enquanto Joo diz convm que Ele (Jesus) cresa e que eu diminua (Jo 3.20), eles certamente pensam, e s vezes chegam a dizer: Convm que Ele diminua e que eu cresa.

    De acordo com a histria, o complexo de Deus ataca mais aqueles que esto investidos de autoridade civil c religiosa. Afeta tambm os que alcanam grande sucesso e se esquecem da origem e do propsito desse sucesso. A lista comea com Lcifer e vai alm de Jim Jones, aquele lder carismtico que provocou o suicdio coletivo de uma comunidade religiosa estabelecida na Guiana. Talvez o mais notvel seja Nabucodonosor, que leve de aprender a duras penas que a cadeira de Deus nunca esteve vaga, como se fosse a cadeira de algum imortal que morre... (Dn 4.25).

    A soberba tem de ser localizada e amarrada desde o incio, antes que prejudique as faculdades mentais e vire uma sndrome, de cura quase sempre impossvel.

  • 8.

    D eso bed in cia C o n tn ua

    O homem saiu das mos de Deus. Encontrou tudo pronto e este tudo era muito bom (Gn 1.31).

    Todavia, hoje h os que dizem: No h Deus (Sl 14.1). H os que ficam em cima do muro e ainda no sabem ou no tm certeza da existncia ou da no existncia de Deus. H os que no tm a menor dvida quanto existncia de Deus, mas no lhe do nenhuma ateno. H os que s o procuram na hora do desespero e da morte. H os que no gostam de Deus nem concordam com Ele e lhe viram as costas. H os que lhe prestam culto formal, culto interesseiro ou culto hipcrita. Um bom nmero no lhe presta culto algum. H os que se apropriam do nom e de Deus e o comercializam. H os que no reconhecem a sua soberania e vivem como se Deus no existisse. H os que colocam fantasias em Deus e o moldam de acordo com as suas prprias paixes.

  • A situao extremamente catica. A distncia entre a criatura e o Criador enorme. A razo de tamanha tragdia uma s: a eterna desobedincia humana. Esta incrvel capacidade negativa de no glorificar a Deus c omo Deus (Rm 1.21) pode ser analisada sob trs ngulos: a desobedincia inicial, a desobedincia contnua e a desobedincia generalizada.

    Deus havia dito ao homem para no comer da rvore do conhecimento do bem e do mal (Gn 2.16-17) mas ele comeu (Gn 3.1-7). Era a nica restrio da parte de Deus e tinha o propsito de dar ao homem a oportunidade de manter a santidade original por livre escolha. Mas a ordem no foi obedecida e o homem caiu em pecado. As conseqncias foram trgicas. O homem e toda a sua descendncia sofreram uma terrvel ruptura no seu relacionamento com Deus, o que se chama de morte espiritual. A partir da, o homem passou da capacidade de no pecar para a incapacidade de no pecar. Erguido do p para viver, o homem pecador agora condenado a voltar para o mesmo p, como lembra kobert G. Clouse. Por ter comido da rvore do conhecimento do bem e do mal, ele ento impedido de comer da rvore da vida, que simboliza uma vida eterna de comunho com Deus. Por causa dessa primeira desobedincia, entrou o pecado no mundo e pelo pecado a morte (Rm 5.12).

    O homem no deixou de pecar depois da amarga experincia da queda. Ao contrrio, a maldade se multiplicou e a vontade de pecar tornou-se contnua (Gn 6.5). muito mais fcil pecar do que no pecar, como to bem explica Paulo na Epstola aos Romanos (7.13-24). O pecado no est somente do lado de fora, mas dentro do homem. Ao mesmo tempo que sente sede de Deus, ele sente tambm forte necessidade

  • interior de pecar. Mesmo reconciliado com Deus, a sua natureza interior milita contra o Esprito e exige satisfao (Gl 5.17). S com o auxlio sobrenatural do Esprito que ele consegue dizer no carne (Rm 8.13). Mas para tanto preciso negar-se a si mesmo a vida inteira (Lc 9-23) e esmurrar o corpo para obrig-lo a ser completamente controlado (1 Co 9-27). Porque de contnuo e abertamente irrita a Deus (Is 65-3), o homem exortado por este mesmo Deus a cessar de fazer o mal (Is 1.16).

    A desobedincia no um problema nem da minoria nem da maioria, mas da totalidade dos habitantes deste planeta. um problema geral e universal, tanto no tempo quanto no espao. No h excees: Todos se extraviaram e juntamente se corromperam: no h quem faa o bem, no h nem um sequer (SI 14.3). Quanto mais longe de Deus, mais o homem desconhece e ama a sua desobedincia. Quanto mais perto de Deus, mais o homem enxerga e detesta a sua desobedincia. O esprito de desobedincia assume formas cada vez mais ousadas. a filha que embriaga o pai para se deitar com ele (Gn 19.30-38). a nora que se veste de prostituta para se deitar com o sogro (Gn 38.12-19). o irmo que se finge de doente para estuprar a irm (2 Sm 131-14). o filho que arma uma tenda no eirado para se ditar com as concubinas do pai (2 Sm 16.20-23). a mulher que se deita com outra mulher e o homem que se deita com outro homem (Rm 1. 26-27). o homem que se deita com animal e a mulher que se pe peran te um animal para se contam inar com ele (Lv 18.23). a populao desvairada de Sodoma que cerca a casa de L na tentativa de abusar sexualmente da dup la de anjos celestes que ele h o sped av a (Gn 19-1-12). a populao bissexual de Gibe que

  • ora e abusa de uma mulher casada a noite toda at deix-la morta (Jz 19-22-30).

    Os avanos em direo mais completa e arrogante desobedincia e a permanente insaciabilidade do homem cado obrigam-no a inventar novas e muitas maneiras de fazer mal (Rm 1.30). No s na rea de perverso do sexo, mas em todas as reas: na prtica da violncia, da injustia, do egosmo, da explorao econmica de pessoas (escravatura) e de naes menos poderosas (colonialismo), da hipocrisia, da mentira, da apropriao indbita, do amor ao dinheiro, do genocdio e at do culto (a loucura de adorar a criatura e no o Criador, a loucura de adorar o diabo e no a Deus), liste o Homo insipiens e no o Homo christianus.

  • 9.

    Q uan d o o O bv io

    D eixa d e Ser bvio

    O sindicato dos ourives de feso era de fazer inveja. Eles tinham fora. Quando perceberam que a pregao de Paulo estava colocando em descrdito a profisso deles e diminuindo a olhos vistos a venda das miniaturas do templo de Diana, a famosa deusa da mitologia romana (a mesma rtemis, da mitologia grega), os artfices reuniram-se no enorme teatro da cidade (que podia acomodar mais de 25.000 pessoas). Sob a liderana de Demtrio, fizeram um grande tumulto, gritando por espao de quase duas horas: Grande a Diana dos efsios! (At 19.23-40). Foi com dificuldade que o escrivo da cidade dissolveu a assemblia para evitar que o protesto se degenerasse em graves perturbaes da ordem.

    Na defesa de seus interesses e de sua classe, Demtrio fez o seguinte discurso: Senhores, vocs sabem que

  • temos uma boa fonte de lucro nesta atividade e esto vendo e ouvindo como este indivduo, Paulo, est convencendo e desviando grande nmero de pessoas aqui em feso e em quase toda a Provncia da sia. Ele diz que deuses feitos por mos humanas no so deuses (At 19-26, NVI).

    Ora, o que Paulo estava afirmando era absolutamente bvio para a sua formao religiosa e para o nosso raciocnio. evidente que o Deus verdadeiro, criador e sustenta dor de todas as coisas visveis e invisveis, no produzido por mos de artfices que trabalham com ouro e prata. Mas para os membros do sindicato dos ourives de feso o louco era Paulo.

    Uma das loucuras humanas que abandona o bvio e abraa o no bvio a fabricao sem medida de dolos. uma coisa estpida, mas foi com muita dificuldade que os profetas de Deus conseguiram convencer o seu povo a desacreditar nos dolos, mostrando sempre a idiotice dessa expresso religiosa, comum entre os gentios e acidental entre os judeus. Jeremias, que viveu 600 anos antes de Cristo, por exemplo, ridiculariza as imagens de escultura, recordando a origem delas: Eles derrubam uma rvore e dela fazem um dolo, com o trabalho cuidadoso de um artista. Depois enfeitam a imagem com ouro e prata, e prendem seu deus firmemente, com pregos, para no ser derrubado. Esses dolos tm tanto valor quanto um espantalho, parado no meio de uma plantao; no so capazes sequer de falar! Precisam ser carregados, porque no podem andar! (Jr 10.3-5, BV). Dois Salmos lembram que os dolos tm boca, e no falam; tm olhos, e no vem; tm ouvidos, e no ouvem; tm nariz, e no cheiram; suas mos no apalpam; seus ps no andam; nem som nenhum lhes sai da garganta (SI 115.5-7; 135.15-18).

  • H muitos outros exemplos de ocasies quando o bvio deixa de ser bvio, em conseqncia da absoro progressiva do mal e do repdio igualmente progressivo do bem. O mais recente a defesa do casamento de homossexuais. At agora qualquer dicionrio define casamento como ato solene de unio entre duas pessoas de sexos diferentes, capazes e habilitadas, com legitimao religiosa e, ou, civil1. Ora, a prtica homossexual uma ruptura com a criao original, e o casamento homossexual a legalizao dessa ruptura. Mas isso j deixou de ser bvio para muitos formadores de opinio.

    Quando o ser humano se embrutece, ele perde a capacidade de raciocnio, o que um estgio frente para quem j perdeu a conscincia de pecado.

    Aquele que chama o bvio de no bvio e o no bvio de bvio realiza trocas incrveis: troca a glria de Deus por um animal que come capim (SI 106.20), troca a verdade pela mentira e troca as relaes heterossexuais pelas relaes homossexuais (Rm 1.18-27).

    Quanto menos reprimimos os impulsos de nossa ndole pecaminosa, mais corremos o risco de trocar o no bvio pelo bvio. Esse auto-embrutecimento significa o fim de tudo. Marca o ponto a partir do qual no h mais retorno.

    Nota1 Novo Dieionrio Aurlio.

  • 10.

    P ecam inosidade e

    P erm issividade

    O j citado criminalista Waldir Troncoso Peres, aquele que declara que o esprito do homem porco, explica que quem comete um crime obviamente tem uma estimulao que vem de dentro e vai para fora. Mas existe uma coadjuvao do lado de fora para dentro. Existe um comando social que determina que ele mate.

    Trata-se do mais complexo e destruidor de todos os crculos viciosos. O ser humano peca por causa de sua propenso natural para o pecado. Porque todos tm a mesma dificuldade e pecam, a sociedade por eles constituda e dirigida ao m esmo tem po corrupta e corruptora. O comando social posterior queda e filho legtimo da pecaminosidade latente. Exerce uma presso to forte quanto a parte maldita do homem. A vontade de pecar e a permissividade oferecida pela soc iedade se juntam , se aliam , se alim entam , se

  • favorecem m utuam ente e esmagam qualquer bom propsito em direo santidade de vida.

    O nome que o criminalista de So Paulo d a esta fora de fora para dentro, que se une com a fora de dentro para fora, comando social. A Bblia chama isso de o curso deste mundo (Ef 2.2) ou simplesmente mundo (1 Jo 5.4). Da o adjetivo mundano, que define aquele que dado a gozos e prazeres montados sobre uma estrutura pecaminosa, sem se importar com as regras de comportamento ditadas por Deus. O cristo no deve amar o mundo porque tudo que h no mundo a cobia da carne, a cobia dos olhos e a ostentao dos bens no provm do Pai, mas do m undo e tambm porque o mundo e a sua cobia passam, o que no acontece com aquele que faz a vontade de Deus (1 Jo 2.15 e 17, NVI).

    S com a sabedoria de Deus e o poder do Esprito possvel vencer a presso da maioria e nadar contra a correnteza deste mundo.

    A Bblia encoraja o rompimento do crente com o comando social. H um texto lindo, mas pouco conhecido, no Velho Testamento, que ajuda muito: No seguirs a multido para fazeres mal, nem depors, numa demanda, inclinando-te para a maioria, para torceres o direito (x 23.2). Na Bblia de Jerusalm, a primeira parte deste verso fica assim: No tomars o partido da maioria para fazeres o mal. Vale a pena citar tambm a verso de A Bblia na Linguagem de Hoje: No siga a maioria quando ela faz o que errado.

    Na Epstola aos Romanos a mesma exortao feita com outras palavras: No imitem a conduta e os costumes deste mundo, mas seja, cada um, uma pessoa nova e diferente, mostrando uma sadia renovao em tudo quanto faz e pensa. E assim vocs aprendero, de

  • experincia prpria, como os caminhos de Deus realmente satisfazem a vocs (Rm 12.2, BJ).

    O cristo precisa lembrar-se constantemente da ruptura que Jesus pregou entre a vida crist e a vida mundana: Entrem pela porta estreita porque a porta larga e o caminho fcil levam perdio, e h muita gente que an por esse camii x A porta estreita e o carr 1 ) difcil conduzem vida e pouca gente encontra esseC caminho (Mt 7.13, BLH). ^

    Chama-se de converso a transferncia de^ai do caminho fcil para o caminho difcil.

    dem de dentro para fora

    evas e \ no qual

    graa de Deus: Ele nos arrancou do pp nos transportou para o Reino do Fi{k temos a redeno a remisso dspcados (Cl 1.13, BJ). Chama-se de santificaorttyw&nuao da converso e a purificao pr

  • 11.

    A u to n o jo

    No adianta procurar no Aurlio. A palavra autonojo no existe. Est sendo criada agora e usada pela primeira vez.

    Autonojo significa simplesmente nojo prprio, nojo de si mesmo. Expressa uma sensao muito desagradvel e humilhante, que pode, todavia, participar da cura de quem portador deste mal.

    muito fcil ter nojo dos outros, nojo do marido, nojo de quem est sujo e fedendo, nojo de um bbado todo vomitado, nojo de uma prostituta que se deitou com vrios homens durante a noite, e assim por diante. Mas o autonojo no to freqente quanto o nojo alheio.

    Deixando de lado as crises de nojo de si prprio provocadas por algum distrbio (passageiro ou no) de fundo psicolgico, bom valorizar o autonojo quando ele provm de um equilibrado processo de convico de pecado. bem possvel que Jesus tenha querido transmitir esta idia na famosa parbola do filho

  • prdigo (Lc 15.11-32). O fato de o rapaz ter consumido tudo, ter passado necessidade numa terra distante, estar guardando porcos (animais imundos para sua cultura) e no ovelhas, de no encontrar generosidade alguma, nem para comer comida de porco, depois de ter desperdiado a sua herana com meretrizes certamente mostra que ele est tomado de autonojo quando confessa sua misria e decide voltar para casa.

    No h dvida de que Davi, depois do adultrio, depois do assassinato de Urias e depois de acusado por Nat, tenha experimentado uma alta dose de autonojo. isto que ele demonstra no Salmo 51, quando usa os verbos lavar e purificar: Purifica-me com hissopo, e ficarei limpo; lava-me e ficarei mais alvo que a neve (v. 7).

    Como conseqncia do pecado e para sair do pecado, o autonojo inevitvel. Trs vezes o profeta Ezequiel avisa o povo de Israel: Tereis nojo de vs mesmos por causa das vossas iniqidades e das vossas abominaes (Ez 6.9; 20.43; 36.31).

    Depois de vencida a cauterizao da conscincia e depois de iniciado o processo de restaurao, o pecado visto como de fato ele . Aquela roupagem mentirosa que esconde a feira do delito retirada e, ento, o que se v imundcia mesmo. como Jesus denuncia: o interior dos sepulcros caiados de branco e de aparncia bela est cheio de ossos de mortos e de toda imundcia, cheio de hipocrisia e de iniqidade. Ele est se referindo aos escribas e fariseus de seu tem po (Mt 23.27-28). Paulo fala de paixes vergonhosas (Rm 1.26) e Pedro, de imundas paixes (2 Pe 2.10). Uma das confisses mais explcitas de toda a Bblia esta: Mas todos ns somos como o imundo, e todas as nossas justias como trapo da imundcia (Is 64.6). Em

  • Apocalipse, o pecador chamado de imundo: Continue o imundo na imundcia (Ap 22.11, NVI).

    A horrvel sensao de autonojo no um fim, mas um meio. No precisa durar muito tempo. No para sempre. O nojo de si mesmo acaba quando a imundcia localizada e confessada, quando se obtm em seguida perdo e purificao. Da a palavra direta de Deus a Israel na poca de Isaas: Lavai-vos, purificai-vos, tirai a maldade de vossos atos de diante dos meus olhos: cessai de fazer o mal (Is 1.16). Se h alguma coisa que Deus sabe fazer, a purificao da sujeira moral uma delas: Ainda que os vossos pecados so como a escarlate, eles se tornaro brancos como a neve; ainda que so vermelhos como o carmesim, se tornaro como a l (Is 1.18). Muitos membros da igreja de Corinto possuam um histrico vergonhoso. Antes de serem alcanados pelo evangelho eram im puros, adlteros, efeminados, sodomitas, ladres e bbados. Mas tudo isso eram guas passadas, porque foram lavados, justificados e santificados em o nome do Senhor Jesus Cristo (1 Co 6.9-11). A partir de ento eles eram santurios do Esprito Santo (1 Co 6.19).

    Um dos provrbios de Salomo diz que h pessoas que pensam que so puras, mas a sua sujeira ainda no foi lavada (Pv 30.12, BLH). So exatamente estas pessoas que necessitam desesperadamente do autonojo. Elas so to impuras que no enxergam a sua sujeira. Precisam sentir o mau cheiro delas mesmas e comear a ter repugnncia daquilo que fere a santidade de Deus. Imediatamente depois, devem ouvir o mesmo conselho que Paulo ouviu: E agora, por que te demoras? Levanta-te, recebe o batismo e lava os teus pecados, invocando o nome dele (At 22.16).

  • 12 .

    F ilhos d e B elial

    A ltima das ltimas palavras de Davi foram: Os filhos de Belial sero todos lanados fora como os espinhos (2 Sm 23-6).

    Quem este Belial, cujos filhos esto espalhados pelo mundo inteiro e no prestam?

    Na verdade, Belial nunca existiu. No nome prprio. um termo abstrato, que significa literalmente bom para nada ou no serve para nada. Filho de Belial, portanto, quer dizer pessoa sem valor, totalmente intil, to ruim que .

    Na traduo de Joo Ferreira de Almeida, as expresses filho de Belial, homem de Belial e testemunha de Belial aparecem catorze vezes em Juizes, 1 e 2 Samuel, 1 Reis e Provrbios. Nas lnguas originais aparecem mais algumas vezes, porm Almeida traduz como homens malignos (Dt 13.13) e Maligno (2 Co 6.15). Fram expresses corriqueiras, pelo menos na poca dos juizes e dos primeiros trs reis de Israel (Saul, Davi e

  • Salomo), de 1385 a 931 a.C. (por mais de 400 anos). Por exemplo, quando Eli julgou que Ana estivesse embriagada, a mulher respondeu: No tenhas, pois, a tua serva por filha de Belial" (1 Sm 1.16). Tanto um dos empregados de Nabal como sua esposa Abigail disseram que ele era filho de Belial (1 Sm 25.17 e 25). Um parente de Saul, chamado Simei, aproveitou-se do infortnio de Davi para xing-lo de filho de Belial (2 Sm 16.7).

    Os filhos de Belial no servem para nada simplesmente porque so horrveis, porque so pessoas moral e tremendamente defeituosas. por isso que outras verses da Bblia traduzem as expresses filhos de Belial e homens de Belial mais abertamente por homens maus, homens imorais, homens ordinrios e pessoas de mau carter (BLH), ou por vagabundos, bandidos, vadios, desonestos, violentos, grosseiros e depravados (BJ). A Traduo Ecumnica da Bblia a que usa as palavras mais fortes: idiotas (1 Sm 25-17 e 25), canalhas (2 Sm 20.1), patifes (Pv 6.12) e tratantes (Pv 19-28).

    Chama-se de filhos de Belial aqueles rapazes de Gibe que queriam abusar sexualmente do levita de passagem pela cidade e que acabaram forando e abusando da mulher dele a noite inteira at mat-la (Jz 19.22 e20.13). O mesmo nome dado aos dois filhos de Eli, Hofni e Finias, que no se importavam com o Senhor e, embora casados, ainda deitavam-se com as mulheres que serviam porta da tenda da congregao (1 Sm 2.12 e 22). O tal marido de Abigail, por ser mau e grosseiro com todo mundo, tambm recebe o nome de filho de Belial. Bem como aqueles homens que, apriori, desprezaram Saul no dia em que foi escolhido o primeiro rei de Israel (1 Sm 10.27) e alguns dos 400 homens de Davi que no quiseram repartir os despojos com os 200 que no puderam ir guerra por estarem extenuados (1 Sm 30.10 e 22).

  • No Novo Testamento, Belial equivale a Satans, adversrio de Cristo. Da a pergunta de Paulo: Que harmonia (pode haver) entre Cristo e o Maligno (Beliar; em grego)?. Na literatura apocalptica posterior, Belial um nome que sintetiza todos os poderes contrrios divindade, um demnio ou o prprio anticristo. Nas cincias < >cultas, Belial o demnio da desordem, da pederastia e do vcio, embora sob traos de grande beleza fsica1.

    Quais so os filhos de Belial hoje? Ainda so os que no servem para nada. Ainda so os patifes, os vagabundos, os violentos, os imorais, os desonestos, os de mau carter e os depravados de ontem. So policiais que matam por matar. So traficantes que viciam crianas e adolescentes. So mdicos que matam velhinhos c pacientes renais. So lobistas que trabalham contra os oprimidos e a favor dos poderosos. So testemunhas que mentem em juzo. So juizes que pem na rua criminosos de colarinho branco e no xadrez criminosos de cueca. So publicitrios que se servem do apetite sexual para aumentar o consumismo. So brancos de extrema direita que incendeiam igrejas de negros. So lerroristas que explodem bombas. So pensadores, educadores e psiclogos que liberam o amor livre, o homossexualismo, o adultrio e o aborto. So pais e mes que se divorciam por qualquer motivo e destroem a estrutura emocional de seus filhos. So homens que seduzem e arrastam mulheres solteiras e casadas para os motis. So mulheres que seduzem e arrastam rapazes e homens casados para o seu leito. So assassinos que matam sem piedade e simulam suicdio. So governantes que estendem seu domnio sobre outros pases por meio da opresso e da guerra. So ministros de Deus que pregam uma coisa e vivem outra. Todos sos modernos filhos de Belial.

  • O ex-filho de Belial no pode mais ser chamado de filho de Belial. Esse foi o erro de Simei, parente de Saul, que se aproveitou de uma situao difcil de Davi para cham-lo de homem de sangue, homem de Belial (2 Sm l6.7). Davi havia se portado como filho de Belial no que diz respeito ao adultrio com Bate-Seba e ao assassinato de Urias (2 Sm 11.1-25), mas tambm j havia confessado seu pecado e alcanado o perdo de Deus, como se l claramente nos Salmos 32 e 51.

    No podemos ser ao mesmo tempo filhos de Deus (Jo 1.12) e filhos de Belial. Precisamos romper cada vez mais com Belial e nos comprometer cada vez mais com Deus.

    H muita esperana para os que so bons para nada. Pois Jesus veio para buscar e salvar os filhos de Belial e torn-los filhos de Deus (Lc 19-10). Ele no veio para os sos, que no precisam de mdicos, e sim para os filhos de Belial. Ele no veio chamar justos, e sim filhos de Belial ao arrependimento (Lc 5-31-32).

    A galeria dos ex-filhos de Belial enorme e edificante. L esto prostitutas (Raabe), mulheres adlteras (a que foi levada a Jesus), ladres (o que foi crucificado com Ele), torturadores (Paulo) e bruxos (os de feso). S na igreja de Corinto havia uma quantidade enorme de ex- filhos de Belial (1 Co 6-9-11)- Talvez alguns fossem at presbteros e diconos daquela congregao crist.

    de todo necessrio vivermos como filhos de Deus e no mais como filhos de Belial. Na teoria e na prtica. Sempre com o auxlio de Deus.

    Nota1 Dicionrio enciclopdico das religies, vol. 1. p. 360.

  • 13.

    H P ec a d o mais G rave

    q u e O u tr o ?

    H algum tem po um grupo de jovens cristos discutia sobre pecado. Com base no primeiro captulo da Epstola de Paulo aos Romanos, tentavam chegar concluso de que no h pecado mais grave ou menos grave que outro, j que o apstolo condena tanto o homossexualismo (1.26-27) como a injustia, a avareza, a inveja, o homicdio, a contenda, a soberba, a calnia e outros delitos (1.28-32).

    muito positivo que se chame honestamente o pecado de pecado. Porque as primeiras providncias para superar o problema do pecado comeam com o reconhecimento explcito dele. Mas preciso tomar todo cuidado para no diminuir a gravidade de alguns pecados por uma questo de cultura e convenincia. Seja grave ou no, pecado ainda qualquer falta de conformidade com a Lei de Deus e qualquer transgresso dessa

  • Lei, como reza o Catecismo Menor, elaborado pela Assemblia de Westminster, que se reuniu em Londres, de 1643 a 1649-

    Certamente h pecados mais graves que outros pecados. A Bblia tanto fala de grave aflio (Ec 6.2), causa grave (x 18.22), grave chuva de pedras (x 9-18), enfermidade grave (2 Cr 16.12) e defeito [fsico] grave (Dt 15.21) como de grave delito (Gn 26.10), grave mal (Ec 5.13), pecado grave (Am5.13), rebelio grave (Lm 1.20) e grave transgresso (Ez 14.13). Uma das lamentaes de Jeremias enfoca essa questo: Jerusalm pecou gravemente, por isso se tornou repugnante; todos os que a honravam, a desprezam, porque lhe viram a nudez; ela tambm geme e se retira envergonhada (Lm 1.8).

    As Escrituras Sagradas chegam a mencionar o mais grave de todos os pecados. o pecado e terno (Mc 3-29), o pecado sem perdo (Mt 12.32), o pecado para morte (1 Jo 5.16). Trata-se do pecado da blasfmia contra o Esprito Santo, o pecado da rejeio consciente do evangelho, o pecado da negao total e persistente da presena de Deus em Cristo (G. M. Burge), o pecado cla impenitncia final.

    Mede-se a maior gravidade de um pecado sobre outro quando se leva em conta o seguinte: 1) o volume de transtornos que esse pecado provoca na vida do prprio pecador; 2) o nmero de vtimas inocentes atingidas pelo pecado individual; 3) a intensidade do risco de se cair naquele crculo vicioso de que um abismo chama outro abismo (SI 42.7); 4) o tamanho do prejuzo que o pecado causa no testemunho da igreja de Deus.

    Alm disso necessrio ter em mente que quanto mais responsabilidade tem uma pessoa, mais grave se torna o seu pecado, seja ele qual for. O adolescente

  • que rouba do supermercado uma barra de chocolate comete pecado. Mas o pastor que rouba um envelope de dzimo do gazofilcio comete pecado muito mais grave, que pode destruir por completo o seu ministrio.

    Um rapaz e uma jovem que entram em acordo para praticarem o amor livre esto em pecado luz da lei de Deus, que prev o saudvel exerccio sexual sob a proteo do matrimnio. Mas se o mesmo rapaz obriga a moa a se deitar com ele, seu pecado muito maior.

    O adultrio mental pecado, de acordo com o Sermo do Monte (Mt 5.27-28). Mas a efetivao do adultrio muito mais grave, pois envolve outra pessoa e fere profundamente o cnjuge e os filhos trados. O mesmo se pode dizer da ira e do homicdio (Mt 5.21-22). O primeiro muito menos grave que o segundo.

    A prostituio pecado, pois trata-se de uma profanao do corpo (1 Co 6.15-20) e de uma comercializao do sexo, mas a prtica homossexual mais grave, porque, alm de ser uma relao ilcita, contrria natureza (Rm 1.26-27).

    A classificao do pecado em grave e menos grave inevitvel e, at certo ponto, saudvel. Porm este exerccio exige um acentuado critrio. Ningum est livre para cometer pecados leves. Muito menos para cometer pecados graves, especialmente o pecado para a morte. Todos precisam se resguardar da tentao de considerar o pecado alheio como pecado grave e o pecado prprio como pecado no grave. A gravidade ou no de um pecado no pode ser avaliada por aquele esquem a sutil e duvidoso de defesa pessoal e de cultura coletiva.

  • A F esta da M dia e

    a F esta da Igreja

    A mdia se alegra quando algum sai da igreja e vai para o mundo. A igreja se alegra quando algum sai do mundo e vem para a igreja.

    A mdia se alegra quando algum comete um escndalo. A igreja se alegra quando algum vence uma tentao.

    A mdia se alegra quando algum escorrega e cai. A igreja se alegra quando algum se levanta e anda.

    A mdia se alegra quando v revolver-se na lama a porca lavada. A igreja se alegra quando batiza o pecador arrependido.

    A mdia se alegra quando algum renega sua f em Jesus Cristo. A igreja se alegra quando algum professa sua f em Jesus Cristo.

    A mdia se alegra e ganha dinheiro quando coloca, na capa de uma revista, a montagem fotogrfica de um padre abraado com uma prostituta. A igreja se alegra e

  • gasta dinheiro quando vai atrs de pecadores e meretrizes para falar de perdo e vida nova.

    A mdia se alegra quando consegue o aval de mulheres bonitas para posarem nuas em revistas pornogrficas. A igreja se alegra quando consegue o aval de mulheres piedosas para cuidarem de aidticos.

    A mdia se alegra quando algum anuncia a volta de Cristo para tal dia e isso no acontece. A igreja se alegra com a gloriosa esperana do retorno do Senhor em dia e hora que ningum sabe.

    A mdia igualzinha aos adversrios de Davi, como se l neste Salmo: Quando tropecei, eles se alegraram e reuniram-se contra mim (35.15). A igreja igualzinha ao pastor das cem ovelhas que achou a ovelha perdida, mulher das dez dracmas que achou a dracma perdida, e ao pai dos dois filhos que achou o filho perdido. O pastor, a mulher e o pai, todos os trs, reuniram amigos e vizinhos e se alegraram porque tinham recuperado a ovelha perdida, a dracma perdida e o filho perdido (Lc 15.3-32).

    No tem como fazer as pazes entre a mdia e a igreja. Elas tm filosofias diferentes, propsitos diferentes, pblicos diferentes e festas diferentes. Se a mdia valorizar o que a igreja valoriza, ela perde dinheiro. Se a igreja valorizar o que a mdia valoriza, ela perde poder. A mdia alimenta e estimula a pecaminosidade latente. A igreja alimenta e estimula a semelhana de Deus, que ainda resta no homem. A mdia segue a correnteza. A igreja nada contra a correnteza. A mdia escrava de uma sociedade corrompida. A igreja escrava da Revelao. A mdia , ao mesmo tempo, causa e conseqncia da depravao humana. A mdia aponta para a porta larga e o amplo caminho, cheio de gente, que leva perdio. A igreja aponta para a porta estreita e o apertado caminho, quase vazio, que leva vida (Mt 7.13-14).

  • 15.

    O P ro v rbio das

    U vas V erdes

    Na poca dos profetas Jeremias (626-587 a.C.) e Ezequiel (593-573 a.C.) havia um provrbio muito conhecido: Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos que se embotaram (Jr 31-29; Ez 18.2). Em outras palavras: o sofrimento ou o comportamento de uma pessoa assim por causa de seus pais.

    O provrbio em parte verdadeiro porque Deus visita a iniqidade dos pais nos filhos at a terceira e quarta gerao daqueles que o aborrecem (x 20.5). J que vivemos todos juntos num s mundo, qualquer violao da lei de Deus numa gerao h de afetar as geraes seguintes. At hoje a frica sofre as conseqncias do imperialismo praticado pela Alemanha, Blgica, Espanha, Frana, Gr-Bretanha, Itlia e Portugal no final do sculo XIX.

  • Alguns dos nossos pais comeram as uvas verdes da poluio ambiental e agora seus filhos tm cncer de pele. A me ingeriu lcool e fez uso do tabaco durante a gravidez de um beb, que ela gerou de um marido infiel e portador de doenas sexualmente transmissveis, e deu luz uma criana mal formada para o resto da vida.

    Ao mesmo tempo, o provrbio das uvas verdes um d esastre , p o rq u e p o d e levar ao d esn im o , irresponsabilidade e ao fatalismo, quando se diz ou se pensa: Meu pai comeu uvas verdes e eu estou definitivamente condenado a ter dentes embotados. O comportamento do pai ou da gerao anterior passa a ser mais do que uma explicao. Torna-se uma desculpa que afasta qualquer iniciativa de mudana.

    Era neste esprito que os judeus do exlio citavam o funesto provrbio. E, por esta razo, tiveram de ouvir a seguinte palavra: To certo como Eu vivo, diz o Senhor Deus, jamais direis este provrbio em Israel (Ez 18.3).

    Para combater o mau uso do provrbio das uvas verdes, o profeta fala de uma famlia de trs geraes (Ez 18.1-32).

    O pai era um homem justo, que no praticava o que a lei de Deus proibia. Levava uma vida de obedincia, de negao de si mesmo e de vitria sobre as tentaes. Por ter este estilo de vida, o tal justo certamente viver (18.5-9).

    O filho, no obstante ter recebido uma excelente influncia desde o bero, tornou-se ladro e derramador de sangue. No cumpriu os deveres que a lei de Deus impunha. Optou por uma vida solta, descompromissada, leviana e de exaltao de si mesmo. Tal homem no viver (18.10-13).

  • O neto, no obstante ter recebido uma pssima influncia desde o bero, no fez o que a lei de Deus probe. Escolheu uma vida de disciplina e negao de si mesmo. O tal no morrer pela iniqidade de seu pai; certamente viver (18.14-18).

    Como se v, o velho provrbio no funcionou nessa relao familiar de trs geraes: O filho no levar a iniqidade do pai nem o pai a iniqidade do filho e a justia do justo ficar sobre ele, e a perversidade do perverso cair sobre este (18.20). A responsabilidade rigorosamente pessoal. Se algum dia o justo se desviar de sua justia e imitar o perverso em suas abominaes, certamente morrer , e de todos os atos de justia que tiver praticado no se far memria (18.24). Ele responsvel pelo que faz.

    Se algum dia o perverso se converter de todos os pecados que cometeu e fizer o que reto, certamente viver, e de todas as transgresses que cometeu no haver lembrana contra ele (18.21). Ele responsvel pelo que faz.

    O caminho est aberto para a converso, porque Deus no tem prazer na morte de ningum. O que Ele deseja e tornou possvel que o perverso se converta dos seus caminhos e viva (18.23 e 32).

    Tanto a morte do perverso como a vida do justo por eras que tombam sobre eras numa eterna sucesso.

    preciso tomar cuidado com o provrbio das uvas verdes e com os seus substitutivos!

  • 16.

    A G uerra d o s D esejo s

    O homem um ser que deseja, que tem vontade prpria e que se realiza medida que seus desejos se satisfazem, H desejos fortes e desejos fracos, desejos permanentes e desejos passageiros, desejos nobres e desejos vis. As pessoas que mais se destacam, tanto na virtude como na maldade, em geral tm desejos muito fortes e derrubam todos os obstculos para alcan-los.

    Dentro de todos ns h uma guerra de desejos, uma guerra interna, uma guerra de desejos antagnicos, uma guerra feia e permanente, ora mais feroz ora mais branda.

    De um lado, h o desejo de comer as comidas do Egito, o desejo de se deitar com a mulher de Urias, o desejo de estrangular o ofensor, o desejo de ser amada pelo marido de outra mulher, o desejo de espalhar notcias falsas para denegrir o desafeto, o desejo de no levar desaforos para casa, o desejo de no servir a ningum e de no repartir coisa alguma, o desejo de ajuntar tesouros exclusivamente sobre a terra, o desejo de

  • soltar palavres e muitos outros desejos da mesma linha e do mesmo peso.

    De outro lado, h o desejo de pagar o mal com o bem, o desejo de perdoar at setenta vezes sete, o desejo de ser sal da terra e luz do mundo, o desejo de ser limpo de corao, o desejo de crucificar o eu e espancar a carne, o desejo de seguir a Jesus at a priso ou at a morte, o desejo de se alimentar espiritualmente, o desejo de anunciar o evangelho at os confins da terra, o desejo de distribuir com os pobres e necessitados a metade de nossos bens, o desejo de amar a Deus de todo o corao e ao prximo como a ns mesmos e muitos outros desejos da mesma linha e do mesmo peso.

    So desejos opostos entre si. Satisfazemos um ou outro. No os dois ao mesmo tempo. Vai depender do volume do temor do Senhor de que estamos possudos, dos ltimos estmulos recebidos e da fora do ideal que tem tomado conta de ns.

    Temos ora fortes desejos de acertar, ora fortes desejos de errar. Dificilmente eles tm o mesmo peso no mesmo espao de tempo. s vezes predomina o desejo de acertar, s vezes predomina o desejo de errar.

    O desejo de acertar encontra srios obstculos, que Paulo enumera em sua Epstola aos Efsios (2.1-3). O primeiro a vontade da carne, o segundo a cultura mundana, o terceiro a oposio satnica. Eles agem independentemente ou juntos. Tm uma fora tremenda e so responsveis por todo o mal que h no mundo.

    Em compensao, o desejo de errar tambm encontra uma enorme barreira. A maior delas a atuao do prprio Esprito de Deus: O Esprito milita contra a carne (G1 5.17). No s a carne que milita contra o Esprito. Muitos outros elementos se juntam ao Esprito

  • para dificultar, em baraar ou im pedir o com pleto desvario do pecado: o temor do Senhor, o no-confor- mismo da nova natureza implantada em ns em virtude do novo nascimento, os compromissos anteriormente assumidos com a luz, o respeito pela Palavra de Deus, a conscincia devidamente alimentada, a viso mais profunda e mais sbia da vida, a lembrana das miragens anteriores, o patrimnio moral e espiritual at ento acumulado, o medo da doena e da morte, a repreenso da igreja e dos irmos e a certeza do juzo final. As inmeras tentativas de acabar com a lei e a ordem estabelecidas pelo prprio Deus sero sempre infrutferas. Deus no solta de suas mos as rdeas. O governo dele.

    Tanto o bem como o mal se detm diante da vontade humana e tentam atra-la ou dobr-la. No den, por exemplo, tanto Deus como a serpente respeitaram a vontade da mulher. Deus no ps uma cerca eletrificada em torno da rvore da cincia do bem e do mal, nem a serpente enfiou fora o fruto proibido na boca da mulher (Gn 3-1-7).

    A vontade humana uma barreira tremenda. Ora para as foras do bem, ora para as foras do mal.

  • 17.

    E ntre o A p sto lo P aulo e

    o M arq us d e Sa d e

    No justo colocar o apstolo Paulo ao lado do Marqus de Sade, o escritor francs Donatien Alphonse Franois, nascido em Paris em 1740. No justo porque Paulo um santo e Sade um obsceno. No justo porque Paulo aprendeu e ensinou a tcnica de crucificar as coisas da carne e Sade lutou para que a corrupo s estendesse a todos os campos sociais, familiares e sexuais. No justo porque as cartas de Paulo dignificam o ser humano e as obras de Sade so to obscenas, que algumas delas s foram publicadas 90 anos depois de sua morte, em 1814. No justo porque a loucura de Paulo no era doentia Somos loucos por causa de Cristo (1 Co 4.10) e a loucura de Sade era patolgica ele passou os ltimos 11 anos de vida num asilo de loucos. No justo porque, embora ambos tenham sido presos vrias vezes e produzido parte de suas obras

  • na cadeia, as prises de Paulo foram por causa de sua coragem de pregar o evangelho e as de Sade, por causa de sua conduta libertina. No justo porque a obra de Paulo at hoje estimula a represso de instintos baixos e a de Sade estimula a liberao dos mesmos instintos.

    H apenas um ponto em comum entre Paulo e Sade: ambos diziam que o homem corrupto em sua essncia. Mas a maneira de lidar com esta verdacle diferencia tremendamente os dois pensadores. O apstolo lamentava o fato e o marqus se agradava dele. O apstolo lutou contra a propenso pecaminosa e o marqus a ela se entregou de corpo e alma. O apstolo descobriu que a depravao foi provocada pela queda do homem e o marqus dizia que os atos criminosos e as anormalidades sexuais so naturais ao comportamento humano. O apstolo buscou soluo para o problema na entrega incondicional ao senhorio absoluto do Esprito e o marqus, na entrega incondicional ao senhorio da carne. O apstolo condenou a satisfao da natureza corrupta do homem e o marqus experimentou e formalizou novas tcnicas de perverso sexual.

    Enquanto Paulo na priso, l pelo ano 62, escreveu sobre as alegrias no Senhor (Fp 4.4), Sade, em 1791, tambm na priso, escreveu sobre as infelicidades da virtude. No h como no dissociar um do outro e apresent-los separadamente como modelos de vida definitivamente opostos entre si, tanto quanto so opostos entre si a carne e o Esprito (G1 5.17). Paulo o profeta do Esprito e Sade o profeta da carne. Ambos tm inmeros seguidores at hoje. O primeiro legou- nos a teologia paulina e o segundo, o sadismo. Paulo ordena: Nada disponhais para a carne, no tocante s .suas concupiscncias (Rm 13-14). Sade, naturalmente,

  • diria o contrrio: Nada disponhais para o Esprito, no tocante s suas asneiras.

    preciso escolher entre o apstolo e o marqus, o que vale dizer, entre o fruto do Esprito e as obras da carne.

  • 18.

    M elh o r E scolher o La d o

    No era de se e sp era r que um m uulm ano no-praticante, considerado hertico e blasfemo por outros muulmanos e ainda arbitrariamente condenado morte pelo aiatol Khomeini, escrevesse uma palavra to certa e to atual no seu polmico livro Os versos satnicos-. As linhas de batalha esto se formando. O secular contra o religioso, a luz contra a escurido. melhor escolher o lado.

    At parece a voz de Elias no Monte Carmelo: At quando vocs vo ficar em dvida sobre o que vo fazer? Se o Eterno Deus, adorem o Eterno; mas, se Baal Deus, adorem a Baal! (1 Rs 18.21, BLH).

    At parece a voz de Josu em Siqum: Se vocs no querem ser servos do Eterno, decidam hoje a quem vo servir. Resolvam se vo servir os deuses que os seus antepassados adoraram na terra da Mesopotmia ou os deuses dos amorreus, na terra de quem vocs esto morando agora. Porm eu e a minha famlia serviremos ao Deus Eterno (Js 24.15, BLH).

  • At parece a voz do prprio Jesus: Ningum pode servir a dois senhores; pois odiar a um e amar o outro, ou se dedicar a um e desprezar o outro. Vocs no podem servir a Deus e ao Dinheiro (Mt 6.24, NVI).

    At parece a voz de Paulo: Os que vivem como a natureza humana quer tm as suas mentes controladas por ela. Mas os que vivem como o Esprito de Deus quer tm as suas mentes controladas pelo Esprito. Ter a mente controlada pela natureza humana produz morte; mas ter a mente controlada pelo Esprito produz vida e paz. Por isso o ser humano se torna inimigo de Deus quando a sua mente controlada pela natureza humana (Rm 8.5-7, BLH).

    Em se tratando dessa constante batalha entre o secular e o religioso, entre a luz e a escurido palavras usadas pelo escritor indiano naturalizado ingls Salmon Rushdie o vocabulrio bblico riqussimo. Diz-se o mesmo com outros jogos de palavras, que transmitem sempre duas idias opostas.

    A opo entre o bem e o mal. Entre Deus e os demnios. Entre a linhagem de Sete e a linhagem de Caim. Entre o cu e o inferno. Entre a vida e a morte. Entre a bno e a maldio. Entre a salvao e a perdio. Entre o puro e o imundo. Entre o certo e o errado. Entre a santidade e a dissoluo. Entre a f e a incredulidade. Entre o trigo e o joio. Entre a casa construda sobre a rocha e a casa construda sobre a areia. Entre a f com obras e a f sem obras. Entre Jesus e Barrabs. Entre o fmto do Esprito e as obras da carne. Entre o novo homem e o velho homem. Entre os justos e os mpios.

    A Bblia no somente apresenta os dois lados da eterna questo sob vrios ngulos, como tambm insiste numa resposta pessoal e intransfervel, do tipo Resolva hoje a quem voc vai seguir.

  • Certa ocasio, logo aps a retirada de muitos dos seus discpulos, Jesus perguntou de chofre aos doze apstolos: Porventura quereis tambm vs outros retirar-vos? Respondeu-lhe Simo Pedro: Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras de vida eterna; e ns temos crido e conhecido que Tu s o Santo de D eus (Jo 6.67-69). Importa-nos escolher o lado certo e tambm permanecer nesse lado, sejam quais forem as dificuldades costumeiras ou emergentes.

    Em 1971 algum bateu uma foto do Presidente Jnio Quadros que entrou para a histria por ser muito curiosa. O presidente estava com o p esquerdo voltado para frente, o p direito e o corpo voltados para um dos lados e a cabea voltada para trs. A frase do autor de Os versos satnicos bem poderia ser a legenda dessa estranha foto: melhor escolher o lado.

  • Seg u n d a P a rte

    C o m o lidar com a

    pecam in o sidad e latente

  • 19.

    U ma Sa cud id a na A rvore

    G en eal g ica d e J esus

    Em sua coluna no Jornal do Brasil, o escritor Lus Fernando Verssimo faz uma solene pergunta: Que tipos cairiam nossa volta se dssemos uma boa sacudida em nossas respectivas rvores genealgicas?.

    Geralmente escondemos do grande pblico o nome do ancestral prximo ou remoto que teve ligao com algum escndalo, algum crime ou com algum tipo de enfermidade, tais como loucura, sfilis, hansenase e, agora, Aids. No queremos que ningum saiba que um de nossos avs, bisavs ou tetravs foi bandido, assassino, prostituta, homossexual, alcolatra ou doente mental.

    Mas isso no acontece com Jesus. Em sua rvore genealgica aparece o nome de algumas pessoas relacionadas com escndalos muito graves. Se citarmos apenas nom es fem ininos, encontrarem os na ordem

  • cronolgica, dos mais prximos aos mais distantes, quatro mulheres: Bate-Seba, Rute, Raabe e Tamar.

    Bate-Seba era esposa de um oficial do exrcito de Israel, na poca de Davi. Na ausncia do marido, que estava servindo a ptria como militar, Bate-Seba cometeu adultrio com o prprio rei, que a deixou grvida. bem provvel que ela tenha sido omissa no intento de Davi em tirar a vida de seu marido por meio de um acidente de guerra. Uma vez viva e casada com o rei, Bate-Seba tornou-se me de Salomo, do qual descende Jesus (2 Sm 11.1-12.25).

    Rute era mulher exemplar, embora no israelita. Descendia de uma unio incestuosa, de L e sua filha mais velha (Gn 19-30-38). Seus ascendentes foram usados por Balao para provocar uma das maiores bacanais da histria, o que motivou a morte de 25-000 israelitas durante o xodo (Nm 25.1-15; 1 Co 10.8). Todavia ficou famosa pelo que declarou sogra: O teu povo o meu povo, o teu Deus o meu Deus (Rt 1.16). Ela se casou em segundas npcias com Boaz e veio a ser bisav de Davi.

    Raabe era uma conhecida prostituta em Jeric, a meio do caminho entre Jerusalm e o Mar Morto. Fez amor com muitos homens em troca de alguma coisa. Converteu-se ao monotesmo e casou-se com um judeu cham ado Salmon, de quem teve um filho (Js 2.1-21, 6.15-25; Hb 11.31). O filho de Salmon e Raabe era exatamente o marido da j citada Rute.

    Tamar era viva duas vezes, de dois filhos de Jud, por sua vez filho de Jac e Lia. Ela sentiu-se prejudicada pelo sogro e resolveu se vingar. Fingiu-se de prostituta, atraiu o sogro, coabitou com ele e engravidou-se dele. Quando Tamar foi denunciada como adltera, Jud mandou que ela fosse queimada. A veio o escndalo

  • maior, pois Jud at ento no sabia que a tal prostituta era sua nora e que o filho que ela estava esperando era ,seu prprio filho (Gn 38.1-30). Jesus no descende de Jos, o melhor de todos os filhos de Jac, mas de Jud, talvez o mais ordinrio de todos.

    Tamar, Raabe, Rute e Bate-Seba aparecem juntas com a me do Salvador na genealogia de Jesus, na primeira pgina do Novo Testamento (Mt 1.1-17).

    Aparecem juntas no famoso sermo do reformador suo Ulrich Zwinglio (1482-1531), pregado na Catedral de Zurique, na entrada do Ano Novo de 1519.

    Esto juntas nas esculturas de bronze colocadas na porta dessa mesma catedral, construda no sculo XI.

    A genealogia de Jesus proclama o velho mote de Paulo: Onde abundou o pecado, superabundou a graa (Rm 5.20).

  • 20.

    P erdo e C a st ig o , U ma

    C onvivncia N ecessria

    O perdo existe. o resultado da graa de Deus. Custou um preo alm de qualquer medida: a encarnao e o sacrifcio de Jesus Cristo. Sem a expiao dos pecados realizada cabalmente por Jesus no haveria perdo nem salvao. Nem antes nem depois do primeiro ano da era crist.

    O perdo divino ao mesmo tempo extremamente fcil e extremamente difcil. fcil porque j foi providenciado, tornado possvel e prometido: Deus em Cristo nos perdoou (Ef 4.32). difcil porque exige convico de pecado, arrependimento e converso (mudana de comportamento) da parte do pecador: Deixe o perverso o seu caminho, e o inquo os seus pensamentos, converta-se ao Senhor, que se compadecer dele, e volte-se para o nosso Deus, porque rico em perdoar (Is 55.7).

  • No se pode brincar com o perdo divino. Deus no se deixa enganar. No faz concesses ao pecado. No deixa de ser severo, mesmo sendo riqussimo em misericrdia (Ef 2.4). Ele ainda trem endo e temvel (SI 89-7). No se pode em absoluto abusar da graa de Deus permanecendo no pecado (Rm 6.1).

    Exagera-se quando se diz ou quando se pensa que o perdo de Deus como uma varinha de condo que isenta o pecador de todas as suas estripulias. O que a Bblia diz exatamente o contrrio: No vos enganeis: de Deus no se zomba; pois aquilo que o homem semear, isso tambm ceifar (Gl 6.7).

    Mesmo quando h arrependimento e confisso, Deus perdoa a culpa mas no afasta as conseqncias da ao pecaminosa. Mais grave ainda o fato de que no s o transgressor que sofre tais penas, mas tambm seus familiares e a prpria sociedade. O rei Davi acabou assumindo o adultrio com Bate-Seba e o assassinato de Urias e alcanou o perdo de Deus, mas no se livrou do escndalo, da morte da criana, da repercusso negativa de seu pecado e de muitos outros transtornos de no pouca durao.

    Por mais contraditrio que parea, o perdo convive com o castigo. Alm do caso de Davi, h o caso de Israel, quando se rebelou ostensivamente contra Deus e contra Moiss, logo aps o regresso dos doze espias enviados terra de Cana. Graas intercesso de Moiss, o povo obteve o perdo de Deus (Nm 14.19-20). O perdo, todavia, no afastou uma srie de castigos temporais: a morte dos dez espias que infamaram a terra de Cana e a resoluo de que nenhum dos homens que, tendo visto a glria e os prodgios de Deus no Egito e no deserto, todavia pecaram contra Ele, sequer veriam a terra prometida. Para que isso acontecesse, o

  • povo eleito teve de peregrinar no deserto por quarenta anos, at que todos morressem, e ento teriam experincia do meu desagrado, como disse o Senhor (Nm 14.34).

    Se o perdo mostra a bondade de Deus, o castigo revela a sua severidade. Tanto o amor como a justia so atributos perfeitos do mesmo Deus. A severidade de Deus para com os que caem, mas a bondade de Deus para com os que perm anecem na graa (Rm 11.22).

  • 21 .

    N o V erd ad e q u e

    P au q u e N asce T o rto

    T arde o u N unca se

    E ndireita

    Nenhum telogo, em qualquer tempo, foi to feliz quanto Joo na apresentao cia divindade de Jesus Cristo. Com uma clareza enorme e sem forar coisa alguma, o apstolo coloca a verdade total dentro de apenas 200 palavras no prlogo do seu Evangelho. a condensao mais bem feita de que se tem notcia, do mais importante tema do cristianismo. A naturalidade com que Joo afirma que no princpio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus... e o Verbo se fez carne (Jo 1.1 e 14) revela uma convico segura, alegre e tranqila.

    Mas no se deve pensar que o apstolo j nasceu assim ou assimilou essas coisas em seu primeiro

  • contato com Jesus Cristo. De forma alguma. Joo deu trabalho ao seu Senhor, fez observaes erradas, recebeu reprimendas, preocupava-se demasiadamente com a sua posio pessoal e era de ndole intolerante.

    A carreira religiosa de Joo comeou quando Jesus, caminhando junto ao mar da Galilia, chamou-o para ser seu discpulo, convite endereado tambm, na mesma ocasio, ao seu irmo Tiago e aos irmos Simo e Andr. Os quatro eram scios de uma empresa de pesca (Lc 5.10), da qual fazia parte tambm seu pai Zebedeu (Mc 1.20). Jesus garantiu aos quatro que os faria pescadores de homens e, de fato, levou ao bom termo o seu intento. O ensino foi mais prtico do que terico. Joo viu coisas admirveis e inadmissveis, ouviu palavras jamais proferidas por homem algum (Jo 7.46).

    Quando Jesus acalmou o mar encapelado, o filho de Zebedeu juntou-se aos demais e perguntou: Quem este que at os ventos e o mar lhe obedecem ? (Mt 8.27). Em outra feita, quando Jesus andou por sobre a superfcie lquida e se aproximou do barco aoitado pelas ondas, Joo pensou que se tratava de um fantasma. Mas, juntamente com os outros, mudou de idia, adorou-o e exclamou: Verdadeiramente s Filho de Deus! (Mt 14.22-33). Por duas vezes, ele viu Jesus multiplicar estranha e modestamente um nmero miservel de pes e peixes para alimentar, no deserto, cerca de 9-000 hom ens, alm de m ulheres e c rian a s (Mt 14.13-21 e 15.32-39). Ele soube do caso do peixe que engoliu o estter (a mesma tetradracma, assim denominada porque era uma moeda de quatro dracmas) e que foi fisgado pelo anzol de Pedro, em obedincia a Jesus e para resolver um problema de urgncia o pagamento do imposto das duas dracmas por parte de

  • Jesus e do prprio Pedro (Mt 17.24-27). Joo viu Jesus em glria no monte da transfigurao e ouviu a voz que dizia: Este o meu Filho amado, em quem me comprazo: a Ele ouvi (Mt 17.5). Ele e Pedro ficaram impressionados com a sucesso dos eventos na ordem predita por Jesus, quando ambos foram a Jerusalm para preparar a Pscoa: o homem com o cntaro de gua, a casa em que ele entrou e o espaoso cenculo mobiliado (Lc 12.7-13). E, finalmente, na madrugada da ressurreio, Joo se enfiou dentro do sepulcro e viu os lenis de linho e o leno que estivera sobre a cabea de Jesus: viu e creu (Jo 20.1-10). Depois disso tudo, e de muitas outras coisas que Jesus fez, mas foram omitidas no relato, porque nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam escritos (Jo 21.25), natural que Joo diga que Jesus estava no princpio com Deus e que todas as coisas foram feitas por intermdio dele, e sem Ele nada do que foi feito se fez (Jo 1.2-3). Esse mesmo Jesus era Deus, e se fez carne, e habitou entre ns, cheio de graa e de verdade, e vimos a sua glria, glria como do unignito do Pai (Jo 1.1 e 14; 1 Jo 1.1-3).

    Joo e seu irmo Tiago tinham temperamento forte que precisava de controle e correo. Jesus os chamou de Boanerges, palavra de derivao incerta que quer dizer filhos do trovo, fato registrado apenas no Evangelho segundo Marcos (3-17).

    Enquanto o sobrenome Pedro dado a Simo por Jesus tornou-se corrente (no h outro Pedro na Bblia), o apelido Boanerges para os filhos de Zebedeu parece que no pegou. Talvez porque Cefas (em aramaico) ou Pedro (em grego) veio a ser de fato uma pedra no grande edifcio da igreja e os Boanerges, especialmente Joo, deixaram de ser filhos do trovo. O fato de Jesus

  • chamar os dois irmos de Boanerges deve ter provocado graa entre os demais, que os conheciam muito bem.

    Apesar de Joo ser menos falador cio que Pedro, verifica-se o seu boanergismo em pelo menos duas ocasies. Certa vez, naturalmente achando que fazia grande vantagem, relatou a Jesus: Mestre, (ns) vimos um homem que em teu nome expelia demnios, o qual no nos segue; e ns lho proibimos, porque no seguiav- conosco (Mc 9-38). Esta iniciativa de Joo, imediaK&\ mente cortada pelo Senhor, mostrou-se ridcula^efe^mi- almente porque, pouco antes, seus com pM fem s no puderam expelir o esprito mudo e suQ km ^\m fjovem possesso (9-18). Nesse incidente,

  • deles seria o maior (Lc 9-46 e 22.24). Numa delas, a controvrsia se processou entre os discpulos durante a viagem para Cafarnaum. Ao chegar, Jesus os interrogou: De que que discorreis pelo caminho?. Mas eles guardaram silncio, envergonhados, porque haviam discutido entre si sobre qual era o maior (Mc 9-33-37). Marcos conta que, certa ocasio, os dois Boanerges se aproximaram de Jesus e, com grande ingenuidade, pediram-lhe: Permite-nos que na tua glria nos assentemos um tua direita e o outro tua esq uerda (Mc 10.37). Mateus diz que o pedido foi formulado pela mulher de Zebedeu, acompanhada de Tiago e Joo (Mt 20.20-28). A famlia estava unida nessa questo de grandeza e honraria. Sabendo disso, os dez, inclusive os dois ex-scios da empresa de pesca, indignaram-se contra os dois irmos (Mc 10.41).

    O convvio com Jesus e a progressiva absoro do esprito daquele que no veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos (Mt 20.28), acabaram com o boanergismo e as ambies de superioridade de Joo. A tempestuosidade do ex-filho do trovo foi de todo excluda ou permaneceu sob controle. O autor do quarto Evangelho, das trs cartas que levam o seu nome e do Apocalipse no parece ser o Joo dos sinticos. Esses escritos esto repletos de amemo-nos uns aos outros (1 Jo 3-11 e 23; 4.7,11 e 12), e os leitores no so chamados de irmos, mas de filhinhos (nove vezes em 1 Joo) ou amados (seis vezes em 1 Joo e quatro em 3 Joo). A modstia substitui o desejo de aparecer: Joo no menciona nem uma vez o seu nome no quarto Evangelho, e quando se refere a ele, usa expresses vagas, como um dos seus discpulos (13-23 e 25), o outro discpulo (18.15-16; 20.2-8), o discpulo am ado (19-26; 21.20 e 23). No conta

  • aqueles fatos da vida de Jesus em que ele, seu irmo Tiago e Pedro esto com o Senhor, sendo a transfigurao um deles. Em contrapartida, o nico a registrar histria do encontro de Jesus com a mulher samaritana e a converso de muitos samaritanos residentes em Sicar (4.1-42), deixando uma impresso diferente daquela contida em Lucas (9-51-56), quando ele queria derramar fogo do cu sobre uma aldeia de Samaria.

    A transformao de Joo ensina-nos que as duas coisas f e vida andam juntas e uma depende da outra. Encoraja-nos tambm a no fazer do provrbio Pau que nasce torto tarde ou nunca se endireita uma lei inflexvel, pois a convivncia com Jesus e a vontade de mudar continuam a fazer maravilhas!

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