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105
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
PARTE II – POVO DE DEUS
O PODER ECLESIÁSTICO
ORDEM SAGRADA E PODER DE REGIME
A Igreja como instituição e o princípio hierárquico
Além de acolher em seu ordenamento jurídico os direitos e deveres de seus
membros, toda sociedade conta com o poder necessário para tutelar esses direitos e
exigir o cumprimento dos deveres. Poder que deve ser exercido segundo o Direito e a
serviço da sociedade.
Chama-se "autoridade" a qualidade em virtude da qual pessoas
ou instituições fazem leis e dão ordens a homens, e esperam obediência
da parte deles (CCE 1897).
Toda comunidade humana tem necessidade de uma autoridade
que a dirija. Tal autoridade encontra seu fundamento na natureza
humana. É necessária à unidade da cidade. Seu papel consiste em
assegurar enquanto possível o bem comum da sociedade (CCE 1898).
A autoridade exigida pela ordem moral emana de Deus (cf. Rm
13,1-2) (CCE 1899).
Se, por um lado, a autoridade remete a uma ordem fixada por
Deus, por outro, são entregues à livre vontade dos cidadãos a escolha do
regime e a designação dos governantes (CCE 1901).
A diversidade dos regimes políticos é moralmente admissível,
contanto que concorram para o bem legítimo da comunidade que os
adota. Os regimes cuja natureza é contrária à lei natural, à ordem
pública e aos direitos fundamentais das pessoas não podem realizar o
bem comum das nações às quais são impostos. A autoridade não
adquire de si mesma sua legitimidade moral. Não deve comportar-se de
maneira despótica, mas agir para o bem comum, como uma "força
moral fundada na liberdade e no senso de responsabilidade". A
legislação humana não goza do caráter de lei senão na medida em que
se conforma à justa razão; de onde se vê que ela recebe seu vigor da lei
eterna. Na medida em que ela se afastasse da razão seria necessário
declará-la injusta, pois não realizaria a noção de lei; seria antes uma
forma de violência (CCE 1902).
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A primeira parte desse texto se refere também ao povo de Deus, que peregrina
neste mundo. Já a segunda parte, não, porque a Igreja possui certas peculiaridades com
relação à sociedade humana.
A Igreja é uma entidade institucional, cuja constituição e governo não dependem
da livre iniciativa dos seus membros, mas do disposto por Jesus Cristo.
Jesus Cristo instituiu a Igreja como comunidade sacerdotal estruturada
organicamente (cf. LG 11), dotada de órgãos hierárquicos, governada pelo sucessor de
Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele (cf. LG 8).
Dizer que a Igreja é uma instituição significa:
Que ela foi instituída, o que remete à vontade de Jesus Cristo como critério
determinante do seu modo de ser e de agir (missão);
Que foi estabelecida para manter sua identidade ao longo do tempo, com
independência de seus membros que a integram em cada momento da
história.
Isso supõe a existência de uma estrutura permanente, que deriva do estabelecido
pelo Fundador e implica a existência de vínculos, funções e fins institucionais, que não
mudam segundo as pessoas que os realizam.
Para transmitir as funções hierárquicas, existe a instituto divino do sacramento
da ordem, graças ao qual a missão confiada por Jesus Cristo aos apóstolos segue sendo
exercida até o fim dos tempos (cf. CCE 1536).
O princípio hierárquico tem todos esses pressupostos teológicos.
As funções hierárquicas na história
A peculiaridade do poder eclesiástico não consiste apenas no princípio
hierárquico, mas também se manifesta no caráter sagrado do próprio poder. Além de ter
origem divina e natureza sacramental, concede a capacidade de realizar funções
sagradas, principalmente os sacramentos.
Função de ensinar (cf. c. 747 §1):
Função de santificar (cf. c. 834 §1):
Função de reger: tem diversas manifestações, desde a exortação e o exemplo até
o mandato imperativo, expresso em virtude do poder de regime (cf. c. 129).
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Na Igreja primitiva, nem se quer se colocava o problema da distinção entre
funções hierárquicas relativas aos meios de santificação e as de governo. Com o passar
do tempo, se começa a fazer a distinção entre poder de ordem e poder de jurisdição.
Torna-se usual entre teólogos e canonistas, sendo recolhida no CIC 1917 (cc. 108-109).
Porém, a excessiva diferenciação, chegando ao extremo de separá-los por completo, deu
lugar a abusos e a posições incompatíveis com a fé da Igreja. O iniciador dos principais
erros nessa matéria foi Marsílio de Pádua (c.1280-c.1343).
O poder sagrado
O Concílio Vaticano II, sem rejeitar a distinção entre ordem e jurisdição,
sublinha o caráter unitário do poder na Igreja.
O conceito teológico: De acordo com o ensinamento conciliar (cf. CCE 875 e
1538), o poder sagrado, que os Bispos e presbíteros recebem de Jesus Cristo mediante o
sacramento da ordem, consiste na faculdade de agir in persona Christi Capitis. Abarca
os âmbitos dos três múnus de Cristo.
O conceito jurídico: Faculdade de dar mandatos vinculantes para outros com
determinados efeitos jurídicos.
O poder de regime (poder de jurisdição)
Regime do latim regere (reger). Poder de governar o povo de Deus como
sociedade e dirigi-lo a seus fins.
O poder de regime não deve ser confundido com a função de reger (munus
regendi), que é um conceito mais amplo. A função régia, da qual todos os fiéis cristãos
participam pelo batismo, inclui todas as atividades que contribuem para ordenar a vida
do povo de Deus até a consecução do fim da Igreja (exortações, conselhos, exemplo,
testemunho...). O poder de regime, em sentido estrito, consiste apenas nas disposições
imperativas e juridicamente vinculantes.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Função pastoral
(munus pascendi)
Poder sagrado
(sacra potestas)
Função de ensinar Poder de magistério Tem sentido análogo.
Função de santificar Poder de ordem Tem sentido análogo.
Função de reger
(munus regendi)
Poder de regime
(potestas regiminis)
O poder de regime ou poder de jurisdição, em sentido estrito, se refere à emissão
de disposições, decisões ou mandatos que tem eficácia, reconhecida pelo ordenamento
canônico, de vincular juridicamente, externa e internamente, a conduta dos fiéis
cristãos. Trata-se de uma capacidade de decisão, necessária para estabelecer o justo na
Igreja (cf. VIANA, 2010, p.43). Segundo o princípio da distinção dos poderes, o poder
de regime se expressa como poder legislativo, executivo e judicial (cf. c. 135 §1).
O poder de regime é um aspecto da função de governo, que consiste na
capacidade jurídica pública, de instituição divina e regulação eclesiástica, de dirigir a
vida social da Igreja para o fim sobrenatural de seus membros, mediante a emissão de
mandatos e decisões legislativas, executivas e judiciais (cf. VIANA, 2010, p.44).
Observação:
Poder de ordem ou poder de santificação: capacidade, que pode ser chamada de
poder apenas em sentido amplo. Costuma ser denominado poder de ordem, porque se
transmite pelo sacramento da ordem e se sustenta na especial configuração do fiel
cristão ordenado com Jesus Cristo.
Poder de magistério: pode ser chamado de poder apenas em sentido amplo. É
exercido quando acontece:
O anúncio oficial da palavra de Deus;
A emissão de juízo de conformidade evangélica sobre atividades, instituições
e formas de espiritualidade;
A decisão de controvérsias.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A transmissão do poder de regime
Para ser titular do poder de regime, se requer a missão canônica.
A missão canônica é o ato jurídico da autoridade eclesiástica pelo qual se
confere um ofício ou se transmitem funções e encargos concretos com independência do
ofício. Exigência confirmada pelo Concílio Vaticano II.
Na sagração é conferida a participação ontológica nos ofícios
sagrados, como indubitavelmente consta da Tradição, mesmo litúrgica.
Intencionalmente se emprega a palavra munerum e não potestatum,
porque esta última palavra poderia entender-se como poder apto para o
exercício. Ora, para que tal poder exista, deve sobrevir a determinação
canônica ou jurídica, por parte da autoridade hierárquica. Esta
determinação do poder pode consistir na concessão de um ofício
particular ou na atribuição de súditos, e é dada segundo as normas
aprovadas pela autoridade suprema. Essa norma ulterior é exigida pela
própria natureza das coisas, visto tratar-se de poderes que devem ser
exercidos por diversas pessoas que, segundo a vontade de Cristo,
cooperam hierarquicamente. E evidente que esta «comunhão» se foi
exercendo na vida da Igreja, segundo as circunstâncias dos tempos,
mesmo antes de, por assim dizer, ser codificada no direito (NEP 2).
Como conjugar isso com o caráter essencialmente unitário e radicalmente
sacramental do poder na Igreja? Em outras palavras: o que a missão canônica acrescenta
ao que é recebido no sacramento da ordem?
Para responder a questão, existem diversas teorias.
Seja como for, duas coisas devem ser afirmadas simultaneamente:
a) O caráter unitário do poder sagrado;
b) A necessidade da missão canônica para o exercício do poder de governo nas
diversas circunscrições eclesiásticas.
Assim ensina a Tradição da Igreja. Tanto o CIC 1983 quanto o CCEO utilizam o
conceito de poder de regime (ou de jurisdição).
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os sujeitos do poder de regime
De acordo com as prescrições do direito, são capazes do poder
de regime que, por instituição divina, existe na Igreja e se denomina
também poder de jurisdição, aqueles que foram promovidos à ordem
sacra (cânon 129 §1).
No exercício desse poder, os fiéis leigos podem cooperar, de
acordo com o direito (§2).
É um texto intencionalmente impreciso, porque o supremo Legislador não quis
resolver um tema controvertido.
O c. 129 apresenta as seguintes premissas:
1. A relação entre poder de regime e sacramento da ordem;
2. Para exercer poder de regime não basta a ordenação, mas é necessária a
missão canônica;
3. A aptidão (habilitas) dos fiéis ordenados para o exercício do poder de regime
não exclui a possibilidade de certa cooperação dos fiéis cristãos leigos.
O § 2 do c. 129 está em sintonia com LG 33, que afirma que os fiéis cristãos
leigos têm “a capacidade de ser chamados pela hierarquia a exercer certos cargos
eclesiásticos, com finalidade espiritual”.
Diferença entre participação e cooperação:
Participar:
Cooperar:
Qual a diferença entre sujeito apto e a possibilidade de cooperar no exercício do
poder de regime?
A capacidade de atuar como representante de Jesus Cristo, cabeça da Igreja, não
é requerida para todos os atos de governo, segundo atestam os dados históricos e o
Direito vigente. A história do Direito canônico demonstra que fiéis cristãos leigos tem
tido parte no exercício do poder de regime, normalmente mediante a delegação.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
FORMAS DE ATRIBUIÇÃO E EXERCICIO DO PODER DE REGIME
As formas de atribuição do poder de regime
A importância da missão canônica (e não apenas do sacramento da ordem) para
a titularidade e exercício do poder de regime aparece com claridade no CIC 1983. O
título “O poder de regime” (cc.129-144) dedica quase todas as suas normas a duas
expressões típicas da missão canônica: o ofício e a delegação.
O poder de regime ordinário é aquele que pelo próprio direito
está anexo a algum ofício; poder delegado, o que se concede à própria
pessoa, mas não mediante um ofício (cânon 131 §1).
§ 2. O poder de regime ordinário pode ser próprio ou vicário.
§ 3. Aquele que se diz delegado, cabe o ônus de provar a
delegação.
1. Poder ordinário: aquele que está vinculado pelo próprio Direito a um ofício
eclesiástico. Isso significa duas coisas:
(a) Basta receber a titularidade de um ofício para que, ipso iure, se atribua
ao sujeito o correspondente poder;
(b) O âmbito e a extensão desse poder são determinados pelo próprio Direito
quando estabelece o ofício, e não pelo ato jurídico pelo qual o titular é
nomeado.
Em consonância com a sua forma de atribuição, o poder ordinário se
extingue com a perda do ofício.
Pode ser:
1.1 Poder ordinário próprio: exercido em nome próprio. Característico dos
ofícios capitais, ou seja, aqueles que são cabeça de estruturas
jurisdicionais autônomas, em virtude do Direito divino ou eclesiástico.
1.2 Poder ordinário vicário: exercido em nome de outro. Característico dos
ofícios auxiliares, que colaboram e dependem dos ofícios capitais.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Poder ordinário próprio:
Em virtude do Direito divino: Romano Pontífice e Bispos diocesanos.
Em virtude do Direito eclesiástico: prelados e abades territoriais (c. 370),
prelados de prelazias pessoais (c.295), ordinários militares, superiores (c.596
§§1-2).
Poder ordinário vicário:
Igreja universal (vigários pontifícios): vigários, prefeitos e administradores
apostólicos, dicastérios da Cúria romana, juízes dos Tribunais pontifícios;
Igreja particular (vigários do Bispo diocesano): vigários gerais e episcopais,
vigário judicial.
Sobre o ofício de pároco (cf. VIANA, 2010, p.60): A partir da distinção entre
função de reger (munus regendi) e poder de regime (potestas regiminis), se pode dizer
que ao pároco corresponde uma função de governo geral da paróquia e certos aspectos
limitados do poder de regime executivo.
2. Poder delegado: aquele que é concedido à pessoa mesma, não por meio de
um ofício. A delegação é um ato jurídico em virtude do qual o titular de um
oficio eclesiástico com poder de regime ordinário (delegante) transfere a
uma pessoa concreta (delegado) a capacidade de exercer determinadas
funções eclesiásticas de governo com eficácia jurídica.
A delegação poder ser:
a) Singular ou especial: quando se confere para um ato concreto;
b) Universal ou geral: quando permite atuar em um número indeterminado
de casos da mesma espécie.
O delegado pode às vezes subdelegar o poder recebido, segundo as
prescrições do c. 137 §§2-4.
A delegação comporta uma comunicação do exercício do poder de regime.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A delimitação jurídica do exercício do poder de regime
Principais aspectos:
Âmbito de competência;
Distinção de funções;
Condições jurídicas para o exercício do poder de regime;
Foro interno e foro externo.
Âmbito de competência: A competência é a faculdade do sujeito para exercer o
poder em determinado âmbito. Pode ser determinada de diversos modos. Os principais
são:
a) Competência territorial: o poder é exercido em determinado território (p. ex.
a competência de um Bispo diocesano);
b) Competência pessoal: sobre determinadas pessoas (p. ex. os fiéis cristãos de
uma Igreja ritual);
c) Competência material: em determinadas matérias (p. ex. os dicastérios da
Cúria romana).
Distinção de funções: Postulada pelo 7º princípio diretivo para a reforma do CIC
como recurso técnico para melhor garantir a tutela dos direitos e para conseguir um
exercício mais ordenado e seguro do poder.
O poder de regime se distingue em legislativo, executivo e
judiciário (c. 135 §1).
O poder legislativo na Igreja é o poder de regime que se exerce ao estabelecer as
leis eclesiásticas.
O poder executivo na Igreja é o poder de regime que se exerce na atividade
ordinária de governo e de administração com a qual se busca (de modo imediato,
concreto e prático) os fins próprios da Igreja. Seus atos jurídicos mais característicos são
os atos administrativos singulares.
O poder judiciário na Igreja é o poder de regime que se exerce na atividade
judiciária, mediante a qual se resolvem as controvérsias surgidas na comunidade
eclesial, que são transferidas para os Tribunais de justiça. Seus atos jurídicos peculiares
são os próprios do processo, especialmente as sentenças e os decretos judiciais.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Condições jurídicas do exercício do poder legislativo, executivo e judiciário:
O poder legislativo deve ser exercido no modo prescrito pelo
direito; o poder que tem na Igreja um legislador inferior à autoridade
suprema não pode ser delegado, salvo explícita determinação contrária
do direito; por um legislador inferior não pode ser dada lei contrária ao
direito superior (c. 135 §2).
O poder judiciário, que têm os juízes e os colégios judiciais,
deve ser exercido no modo prescrito pelo direito; não pode ser
delegado, a não ser para realizar os atos preparatórios de algum decreto
ou sentença (c. 135 §3).
No tocante ao exercício do poder executivo, observem-se as
prescrições dos cânones seguintes (c. 135 §4).
Foro interno e foro externo:
O poder de regime se exerce por si no foro externo; às vezes,
contudo, só no foro interno, de tal modo, porém, que os efeitos que o
seu exercício possa ter no foro externo não sejam reconhecidos neste
foro, a não ser enquanto isto seja estabelecido pelo direito em casos
determinados (c. 130).
Foro externo é o âmbito dos atos que, por natureza, tem transcendência pública.
Foro interno é o âmbito dos atos que passam ocultos.
Poder de foro externo: quando o poder de regime exibe seus efeitos
publicamente com atos jurídicos que podem ser provados. Por exemplo: quando a
autoridade confere um ofício, declara uma pena ou proíbe algo publicamente.
“O poder de regime se exerce por si no foro externo”, porque esse
é o seu âmbito natural, no qual a autoridade eclesiástica organiza,
promove e tutela a ordem da comunidade eclesial.
Poder de foro interno: quando o poder de regime se exerce de forma reservada,
sem a normal publicidade. Por exemplo: sacramento da penitência.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A noção canônica de Ordinário e de Ordinário do lugar
Com o nome de Ordinário se entendem, no direito, além do
Romano Pontífice, os Bispos diocesanos e os outros que, mesmo só
interinamente, são prepostos a alguma Igreja particular ou a uma
comunidade a ela equiparada, de acordo como cânon 368; os que nelas
têm poder executivo ordinário geral, isto os Vigários gerais e
episcopais; igualmente, para os seus confrades, os Superiores maiores
dos institutos religiosos clericais de direto pontifício e das sociedades
clericais de vida apostólica de direito pontifício, que têm pelo menos
poder executivo ordinário (c. 134 §1).
Com o nome de Ordinário local se entendem todos os
mencionados no § 1, exceto os Superiores dos institutos religiosos e das
sociedades de vida apostólica (§2).
O que se atribui nominalmente ao Bispo diocesano, no âmbito
do poder executivo, entende-se competir somente ao Bispo diocesano e
aos outros a ele equiparados no cânon 381, § 2, excluídos o Vigário
geral e o episcopal, a não ser por mandato especial (§3).
As Igrejas particulares, nas quais e das quais se constitui a una e
única Igreja católica, são primeiramente as dioceses, às quais, se
equiparam, não constando o contrário, a prelazia territorial, a abadia
territorial, o vicariato apostólico, a prefeitura apostólica e a
administração apostólica estavelmente erigida (c. 368).
A prelazia pessoal se rege pelos estatutos dados pela Sé
Apostólica; tem à sua frente um Prelado ou Ordinário próprio; que tem
o direito de erigir seminário nacional ou internacional, incardinar os
alunos e promovê-los às ordens, a título de serviço à prelazia (c. 295
§1).
Ordinário:
Romano Pontífice
Bispos diocesanos
Prelado (prelazia territorial e prelazia pessoal)
Abade territorial
Vigário apostólico
Prefeito apostólico
Administrador apostólico
Vigários gerais
Vigários episcopais
Superiores maiores (IR e SVA clericais de direito pontifício)
Ordinário local: todos os mencionados acima, exceto os Superiores.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
As faculdades habituais
As faculdades habituais regem-se pelas prescrições sobre o
poder delegado (c. 132 §1).
Entretanto, a não ser que na sua concessão se determine
expressamente o contrário, ou tenha sido escolhida a competência da
pessoa, a faculdade habitual concedida ao Ordinário não cessa ao cessar
o direito do Ordinário a quem foi concedida, mesmo que ele tenha
começado a executá-la, mas passa a qualquer Ordinário que lhe sucede
no governo (§2).
As faculdades habituais são um tipo de poder jurídico outorgado com certa
estabilidade para exercer algumas atividades conexas com o próprio ofício, que, a não
ser por essa concessão do superior, não poderiam ser exercidas ordinariamente.
Algumas faculdades habituais estão ligadas a atos de caráter sagrado
(sacramental), como a pregação e a administração dos sacramentos (cf. p. ex. c. 966-
976). No caso dos atos vinculados ao exercício da ordem, um sujeito ontologicamente
capaz recebe também a faculdade de realizar esses atos, ou validamente, ou licitamente.
A suplência do poder
No erro comum de fato ou de direito, bem como na dúvida
positiva e provável, seja de direito, seja de fato, a Igreja supre, para o
foro tanto externo como interno, o poder executivo de regime (c. 144
§1).
A mesma norma se aplica às faculdades de que se trata nos
cânones 882, 883 (confirmação), 966 (penitência) e 1111, § 1
(matrimônio) (§2).
Erro comum: erro da comunidade, sem malícia, nem culpa, fundado em fato
objetivo e público.
Dúvida positiva e provável: dúvida na qual se alega razões positivas
aparentemente suficientes. Refere-se principalmente a situações nas quais o sujeito ativo
do ato administrativo carece de juízo certo sobre a existência do poder. A dúvida deve
ser positiva, ou seja, fundada em motivos realmente existentes. Não basta a dúvida
meramente negativa, equivalente, na prática, à ignorância. A dúvida deve ser provável,
isto é, o fundamento da dúvida positiva deve ter razão suficiente. É de fato, quando se
refere à realização das condições exigidas pelo Direito, no caso concreto. É de direito,
quando se refere à existência, vigência ou modo de aplicação da norma.
117
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Igreja supre: a suplência por parte da Igreja exige que o sujeito tenha capacidade
ontológica para realizar o ato. O defeito suprido é apenas algum requisito legal previsto
pelo Direito eclesiástico.
Ato de poder executivo.
Faculdades.
A finalidade dessa disposição é dupla:
a) Por um lado, salvar o exercício normal do poder executivo, quando faltam os
elementos necessários que garantem uma certeza absoluta sobre a validade
do ato jurídico;
Por exemplo: impossibilidade prática de consultar a autoridade em
casos de dúvida positiva e provável.
b) Garantir o bem espiritual e a tranqüilidade de consciência dos fiéis cristãos
destinatários do poder executivo.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
PARTE II – POVO DE DEUS
A ORGANIZAÇÃO HIERÁRQUICA DA IGREJA
A ORGANIZAÇÃO ECLESIÁSTICA
Missão da Igreja e atividade institucional
A vida da Igreja, enquanto instituição, orientada total e exclusivamente para a
missão de evangelizar, apresenta uma série de exigências próprias, as quais
correspondem certas funções públicas.
Funções públicas são aquelas atividades que se realizam oficialmente, sob a
autoridade e responsabilidade da hierarquia, para responder a essas exigências
específicas da vida eclesial e da missão evangelizadora.
Organização eclesiástica é a estrutura oficial que assume as funções públicas da
Igreja.
O desempenho dessas funções não corresponde por igual a todo povo de Deus.
Há diversidade funcional entre os ministros ordenados e os demais fiéis cristãos.
A atividade da organização eclesiástica tem natureza ministerial. É serviço
orientado a tornar possível a vida cristã dos fiéis, proporcionando-lhes abundantemente
os meios de salvação e promovendo na vida eclesial as condições adequadas para que
cada fiel cristão, na liberdade, possa alcançar a santidade e evangelizar.
O reto exercício das funções públicas e o bom governo são um dever dos
pastores e um direito dos fiéis cristãos.
A organização da atividade pública da Igreja para cumprir a missão de
evangelizar não é resultado de um acordo social entre os fiéis cristãos, mas está
determinada essencialmente pela ação de Jesus Cristo. Nosso Senhor entregou a Pedro e
ao Colégio apostólico não apenas a responsabilidade, mas também os meios e os
poderes necessários e adequados para desempenhar essas funções essenciais.
Evidentemente, o exercício desses poderes e responsabilidades varia em maior ou
menor grau historicamente.
A organização da Igreja segue um padrão de Direito divino, mas também
obedece a outros fatores de Direito humano.
119
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A distribuição e organização das funções públicas eclesiais se realizam:
a) Por via institucional, mediante ofícios e institutos que têm assinaladas
determinadas competências e faculdades;
b) Por via pessoal, ou seja, por atribuição direta (delegação).
120
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os ofícios eclesiásticos
Ofício eclesiástico é qualquer encargo constituído estavelmente
por disposição divina ou eclesiástica, a ser exercido para uma finalidade
espiritual (c. 145 §1).
As obrigações e direitos próprios de cada ofício eclesiástico são
definidos pelo próprio direito pelo qual o ofício é constituído, ou pelo
decreto da autoridade competente com o qual é simultaneamente
constituído e conferido (§2).
Encargo constituído estavelmente: o cânon sublinha a estabilidade objetiva do
ofício, que explica a sua qualificação como canal institucional da organização das
funções públicas.
Mediante esse instrumento técnico, se unificam de modo permanente um
conjunto de responsabilidades, funções, poderes, faculdades e atribuições, que se
institucionalizam.
Os ofícios eclesiásticos podem ser classificados segundo diversos critérios.
1. Ofícios de instituição divina: Romano Pontífice, Colégio episcopal, Bispo
diocesano.
2. Ofícios de instituição eclesiástica:
3. Ofícios capitais: presidem em nome próprio as comunidades de fiéis cristãos.
4. Ofícios auxiliares: colaboram no exercício de algumas funções pertencentes
aos anteriores (vigário geral, vigário episcopal, vigário judicial).
5. Ofícios com cura de almas: exigem o exercício do poder de ordem.
a. Cura de almas parcial: clérigos;
b. Cura de almas plena: apenas sacerdotes (cf. c. 150).
6. Ofícios sem cura de almas:
7. Ofícios com poder ordinário de jurisdição, que pode ser próprio ou vicário
(cf. c.131): Bispo diocesano, vigário geral, vigário judicial.
8. Ofícios sem poder de jurisdição (cf. c.129): professor, notário.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Provisão de ofícios:
Não se pode obter validamente um ofício eclesiástico sem a
provisão canônica (c. 146).
A provisão de um ofício eclesiástico se faz: por livre colação da
competente autoridade eclesiástica; por instituição feita por ela, se
houve apresentação; por confirmação ou por admissão feita por ela, se
houve eleição ou postulação; finalmente, por simples eleição e aceitação
do eleito, se a eleição não precisa de confirmação (c. 147).
Por provisão canônica, se entende o conjunto de atos que se realizam para
designar validamente o titular de um ofício vacante (cf. c. 153 §1).
A provisão de ofícios pode adotar as seguintes modalidades:
1. Livre colação: a autoridade tem liberdade para selecionar e nomear
pessoalmente o candidato (cf. c.157), sempre que a pessoa escolhida possua
as condições e requisitos estabelecidos pelo Direito para o desempenho do
ofício (cf. c. 149). É o sistema ordinário para a provisão de ofícios.
2. Nomeação com prévia apresentação: quando uma pessoa ou um grupo de
pessoas tem direito de apresentação (cf. cc. 158-163). A autoridade
competente faz a nomeação do candidato como titular do ofício. É um modo
de provisão que tem raízes históricas no direito de padroado e no sistema de
benefícios.
3. Eleição: trata-se da designação de um titular de um ofício por um colégio ou
por um grupo de pessoas através de votação, que deve seguir as normas dos
estatutos ou regimentos do CIC 1983 (cf. cc. 164-179). A eleição pode
necessitar ou não ser confirmada pela autoridade eclesiástica.
4. Postulação: quando o candidato que os eleitores consideram mais adequado
tem um impedimento eclesiástico, que pode ser dispensado. Os eleitores
podem pedir (postular) com seus votos, que a autoridade competente
dispense do impedimento (cf. cc. 180-181). Se a autoridade aceita, concede a
dispensa do impedimento e, se a eleição o requer, também a confirmação (cf.
cc. 182-183).
122
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Perda do ofício:
Perde-se o ofício eclesiástico, transcorrido o tempo prefixado,
completada a idade determinada pelo direito, por renúncia, por
transferência, por destituição e por privação (c. 184 §1).
Cessado de qualquer modo, o direito da autoridade que o tiver
conferido, não se perde o ofício eclesiástico, salvo determinação
contrária do direito (§2).
A perda do ofício que tiver obtido efeito deve ser notificada,
quanto antes, a todos aqueles a quem cabe qualquer direito à provisão
desse ofício (§3).
Os modos e procedimentos pelos quais se pode deixar de ser titular de um ofício:
1. Transcurso do tempo estabelecido.
2. Cumprimento da idade determinada.
3. Renúncia: o titular do ofício por justa causa pode apresentar a sua renúncia
diante da autoridade (cf. cc. 187-189).
4. Transferência: mudança do titular de um ofício para outro (cf. cc.190-191).
O CIC 1983 regula o procedimento para a transferência de párocos (cf. cc.
1748-1752).
5. Remoção: perda do ofício que se produz por decreto da autoridade (c.193) ou
por disposição da lei (c.194), em certos casos (cf. c.192). O CIC 1983 regula
o procedimento para a remoção de párocos (cf. cc.1740-1747).
6. Privação: tipo especial de remoção, que tem natureza de sanção penal (cf.
c.196), imposta como resultado de um processo judicial ou de um
procedimento administrativo.
123
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Organismos colegiais
Conceito: organismo cuja característica jurídica mais destacada é a atuação
colegial, ou seja, a adoção de decisões que expressam a vontade única desse grupo de
pessoas, enquanto instituição, por maioria de votos dos seus membros.
Manifestações de atuação colegial na Igreja:
1. A colegialidade episcopal: princípio eclesiológico de Direito divino, que
expressa o vínculo que une todos os Bispos entre si e com sua cabeça, o
Romano Pontífice (cf. c.330; LG 19, 22).
2. A cooperação sacramental dos presbíteros com o Bispo: os presbíteros,
unidos com o Bispo por comunhão hierárquica e com os demais presbíteros,
são, por natureza, cooperadores da ordem episcopal e, na Igreja particular,
formam com o Bispo um só presbitério (cf. LG 28). Esse é o fundamento de
alguns colégios da organização diocesana, tais como o Colégio de
consultores (c. 502) e o Conselho de presbíteros (cc.495-501).
3. A corresponsabilidade de todos os fiéis cristãos na missão da Igreja: pelo
batismo, os fiéis cristãos têm comum dignidade e participam ativamente da
missão da Igreja, cada um segundo sua condição (cf. c. 204 §1). Um dos
canais jurídicos dessa comum responsabilidade é a participação em colégios,
que cooperam em funções próprias da organização eclesiástica, como, por
exemplo, o Sínodo diocesano (cc. 460-468) e os Conselhos pastorais (c. 511-
514).
124
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Tipos de colégios na organização eclesiástica:
Segundo o âmbito, podem ser:
Paroquiais: Conselho econômico;
Diocesanos: Sínodo diocesano;
Interdiocesanos: Conferências episcopais;
Da Igreja universal: Concílio ecumênico.
Segundo a eficácia jurídica de suas decisões:
Colégios consultivos: quando assessoram com sua opinião (cf. c. 127) a
autoridade que tem poder exclusivo de tomas as decisões.
Colégios deliberativos: quando tomam diretamente decisões juridicamente
vinculantes.
Segundo as funções públicas envolvidas:
Conselhos pastorais: Sínodo diocesano;
Conselhos técnicos: Conselho econômico;
Conselhos que envolvem o exercício de poder de regime:
a) Legislativos: Concílios;
b) Administrativos: Congregações da Cúria romana;
c) Judiciais: Tribunais colegiais de diversos graus.
125
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Circunscrições eclesiásticas
Conceito: tradicionalmente, o conceito de circunscrição esteve ligado à
delimitação territorial e a uma visão eclesiológica incompleta. O Concílio Vaticano II
superou e aperfeiçoou essa visão, sublinhando o elemento pessoal e comunitário.
As circunscrições eclesiásticas são comunidades integradas por um ofício
capital, os presbíteros que cooperam em sua missão e os fiéis cristãos correspondentes,
segundo os diversos critérios jurídicos de delimitação.
Estrutura orgânica:
Ofícios e colégios são instituições que servem de meio para organizar diversas
funções públicas na Igreja. As circunscrições são instituições nas quais se concretiza a
organização da Igreja. A estrutura característica da circunscrição reflete a estrutura
constitucional da Igreja: Pastor (ofício capital), presbíteros e demais fiéis cristãos
reunidos pelos vínculos da comunhão dos fiéis e da comunhão hierárquica.
Tipos:
Segundo o grau de implantação da Igreja:
1. Circunscrições de regime ordinário: Diocese.
2. Circunscrições de missão: Prefeituras apostólicas, Vicariatos apostólicos.
Segundo os critérios de delimitação da comunidade:
1. Circunscrições territoriais: Diocese, Prelazia territorial.
2. Circunscrições pessoais: Ordinariato militar.
Discutível: Segundo a missão evangelizadora para a qual são criadas:
1. Cura pastoral ordinária (comum): Diocese.
2. Obras pastorais peculiares: não substituem a organização anterior, mas a
pressupõe e a complementam.
126
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
ORGANIZAÇÃO DA IGREJA EM CIRCUNSCRIÇÕES ECLESIASTICAS
Igreja universal e Igrejas particulares
A Igreja universal se faz presente e atua nas Igrejas particulares, formadas à
imagem da Igreja universal, nas quais e a partir das quais existe a Igreja de Jesus Cristo
una e única (cf. LG 23).
A relação entre a Igreja universal e as Igrejas particulares é uma relação de
mútua interioridade, porque em cada Igreja particular se encontra e opera
verdadeiramente a Igreja de Cristo.
A categoria teológica da Igreja particular:
O conceito de Igreja particular é uma categoria teológica utilizada pelo CIC
1983, no seu intento de recolher os principais elementos da eclesiologia conciliar (cf. cc.
368-374).
O conceito genérico de circunscrição eclesiástica resulta útil e aplicável com
igual rigor jurídico a todas as instituições mediante as quais a Igreja se organiza na
dimensão particular. Com esse conceito, é possível estudar descritivamente as
características jurídicas de cada instituição, baseado em seus elementos comuns e nas
funções análogas e complementares que cumprem a organização pastoral.
A delimitação das circunscrições:
O Concílio Vaticano II abordou a possibilidade de flexibilizar o critério
territorial (cf. PO 10). A delimitação pode ser territorial ou pessoal.
Por via de regra, a porção do povo de Deus, que constitui uma
diocese ou outra Igreja particular, seja delimitada por determinado
território, de modo a compreender todos os fiéis que nesse território
habitam (c. 372 §1).
Entretanto, onde a juízo da suprema autoridade da Igreja,
ouvidas as Conferências dos Bispos interessados, a utilidade o
aconselhar, podem-se erigir no mesmo território Igrejas particulares,
distinta em razão do rito dos fiéis ou de outra razão semelhante (§2).
127
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Comunhão, complementaridade e coordenação das circunscrições eclesiásticas:
Todas as circunscrições eclesiásticas particularizam em determinadas
circunstâncias de tempo e de lugar a missão da Igreja. No entanto, o sentido principal e
decisivo não está nessa particularidade, mas em ser expressão da presença operante da
Igreja, com diversos acentos e intensidades.
Por isso, as Igrejas particulares não devem ser entendidas como âmbitos
fechados, mas constitutivamente abertos à Igreja universal e às demais Igrejas
particulares. A Igreja é corpus ecclesiarum (cf. LG 23), com peculiar comunhão e
mútua interioridade.
A complementaridade se manifesta juridicamente em normas e sistemas de
coordenação.
Regime jurídico das circunscrições eclesiásticas:
As Igrejas particulares, nas quais e das quais se constitui a una e
única Igreja católica, são primeiramente as dioceses, às quais, se
equiparam, não constando o contrário, a prelazia territorial, a abadia
territorial, o vicariato apostólico, a prefeitura apostólica e a
administração apostólica estavelmente erigida (c. 368).
Deixando claro que as Igrejas particulares são principalmente as dioceses, o CIC
1983 não se pronuncia sobre a natureza teológica das outras figuras assimiladas
juridicamente à diocese.
A técnica da assimilação ou equiparação jurídica, sem eliminar as diferenças de
natureza entre as circunscrições eclesiásticas, permite que se aplique analogamente à
entidades assimiladas o regime jurídico previsto para a diocese, quando não é
estabelecida outra coisa.
128
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Circunscrições territoriais de regime ordinário
1. A Diocese:
A diocese é uma porção do povo de Deus confiada ao pastoreio
do Bispo com a cooperação do presbitério, de modo tal que, unindo-se
ela a seu pastor e, pelo Evangelho e pela Eucaristia, reunida por ele no
Espírito Santo, constitua uma Igreja particular, na qual está
verdadeiramente presente e operante a Igreja de Cristo una, santa,
católica e apostólica (c. 369).
A diocese é a principal figura jurídica da Igreja particular, ou seja, o modelo de
organização jurídica da Igreja para o pleno cuidado pastoral.
O cânon, ao reproduzir um texto conciliar (cf. CD 11), indica os elementos
fundamentais da comunidade diocesana.
2. A Prelazia territorial e a Abadia territorial:
A prelazia territorial ou a abadia territorial são uma determinada
porção do povo de Deus, territorialmente delimitada, cujo cuidado, por
circunstâncias especiais, e confiado a um Prelado ou Abade, que a
governa como seu próprio pastor, à semelhança do Bispo diocesano (c.
370).
O Prelado e o Abade territorial governam sua circunscrição com poder próprio,
não vicário, mas com jurisdição quase-episcopal, porque não corresponde à natureza
dessas circunscrições a plenitude do ofício capital próprio da diocese.
129
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Circunscrições territoriais de missão
A suprema direção e coordenação da atividade missionária da Igreja competem
ao Romano Pontífice e ao Colégio episcopal (cf. c.782 §1; AG 38). Daí que as
circunscrições missionárias são governadas vicariamente em nome do Romano
Pontífice e com especial dependência da Santa Sé, mediante a Congregação para a
evangelização dos povos (cf. PB 85).
1. O Vicariato apostólico e a Prefeitura apostólica:
O vicariato apostólico e a prefeitura apostólica são uma
determinada porção do povo de Deus que, por circunstâncias especiais,
ainda não está constituída como diocese, e que é confiada a um Vigário
apostólico ou a um Prefeito apostólico, como a seu pastor, que a
governa em nome do Sumo Pontífice (c. 371 §1).
Ainda não está constituída em diocese: De certo modo, o Vicariato apostólico e
a Prefeitura apostólica são dioceses em formação, em lugares nos quais não é possível
erigir uma estrutura pastoral capaz de sustentar sua atividade com meios próprios.
2. A Diocese de missão e a missão sui iuris:
As dioceses de missão são dioceses de regime peculiar erigidas em territórios
que dependem da Congregação para a evangelização dos povos, não da Congregação
para os Bispos (cf. PB 89).
A missão sui iuris, ou seja, autônoma, é a estrutura missionária mais simples e
elementar, governada com poder vicário por um superior eclesiástico, pertencente a um
Instituto missionário. Geralmente, constitui o primeiro passo para a evangelização de
uma região.
130
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Circunscrições de regime especial
1. A Administração apostólica estavelmente erigida:
A administração apostólica é uma determinada porção do povo
de Deus que, por razões especiais e particularmente graves, não é
erigida pelo Romano Pontífice como diocese e cujo cuidado pastoral é
confiado a um Administrador apostólico, que a governa em nome do
Sumo Pontífice (c. 371 §2).
A Administração apostólica está classificada como circunscrição de regime
especial, porque possui ampla elasticidade de constituição, que permite utilizá-la em
uma grande diversidade de circunstâncias especiais, particularmente graves.
Por exemplo:
A Administração apostólica pode ser pessoal. A Administração apostólica
pessoal se organiza através de legislação especial extracodicial.
Por exemplo: em 18/01/2002, foi erigida a Administração apostólica pessoal
para os fiéis procedentes do cisma do bispo Marcel Lefebvre e recebidos na plena
comunhão com a Igreja. Chama-se Administração apostólica São João Maria Vianney.
O Administrador apostólico tem jurisdição cumulativa com o Ordinário diocesano de
Campos (Brasil).
Observação: a Administração apostólica não é exclusivamente pessoal, mas
também territorial, porque compreende somente o âmbito da diocese de Campos.
131
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Circunscrições pessoais
1. A Prelazia pessoal:
Para promover adequada distribuição dos presbíteros ou realizar
especiais atividades pastorais ou missionárias em favor de várias
regiões ou diversas classes sociais, podem ser erigidas pela Sé
Apostólica, ouvidas as Conferências dos Bispos interessadas, prelazias
pessoais que constem de presbíteros e diáconos do clero secular (c.
294).
A prelazia pessoal se rege pelos estatutos dados pela Sé
Apostólica; tem à sua frente um Prelado ou Ordinário próprio; que tem
o direito de erigir seminário nacional ou internacional, incardinar os
alunos e promovê-los às ordens, a título de serviço à prelazia (c. 295
§1).
O Prelado deve prover à formação espiritual e digna sustentação
dos que tiver promovido pelo referido título (§2).
Fazendo convênios com a prelazia, leigos podem dedicar-se às
atividades apostólicas da prelazia pessoal; o modo de tal cooperação
orgânica, bem como os respectivos deveres e direitos principais, sejam
determinados devidamente nos estatutos (c. 296).
Os estatutos definam igualmente as relações da prelazia pessoal
com os Ordinários locais, em cujas Igrejas particulares a prelazia, com
prévio consentimento do Bispo diocesano, exerce ou deseja exercer suas
atividades pastorais ou missionárias (c. 297).
A Prelazia pessoal é governada por um Prelado com jurisdição própria quase-
episcopal. Podem se incardinar na Prelazia presbíteros e diáconos do clero secular. Com
relação aos fiéis cristãos leigos, cabem diversas fórmulas organizativas, segundo a
variedade das missões pastorais possíveis.
Convênio ou acordo:
Conceito de cooperação orgânica: a cooperação orgânica implica a realização
conjunta da ação evangelizadora por parte do clero e dos fiéis cristãos leigos, segundo
suas respectivas posições constitucionais (dinamismo da estrutura ordem-povo).
Jurisdição compartilhada entre Prelado e Bispo diocesano:
Estão sob a jurisdição do Prelado, no relativo à missão peculiar;
Estão sob a jurisdição do Bispo da Igreja particular do seu domicílio, no
relativo ao cuidado pastoral comum.
132
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
2. O Ordinariato militar:
Os Ordinariatos militares são circunscrições eclesiásticas peculiares,
juridicamente assimiladas às dioceses, criadas para promover o cuidado pastoral de
amplos grupos de pessoas, que se encontram em particulares condições de vida, em
razão de sua pertença às forças armadas ou por sua relação com elas.
Os Ordinariatos militares são regulados por legislação especial extracodicial e
pela práxis da Santa Sé.
O Ordinário militar, que tem normalmente a dignidade episcopal, governa a
circunscrição com poder ordinário próprio equiparado juridicamente ao Bispo
diocesano. É membro da Conferência episcopal da nação.
Jurisdição cumulativa do Ordinário militar com o poder do Bispo diocesano
sobre os mesmos fiéis cristãos.
3. O Ordinariato latino para féis cristãos de rito oriental:
Os Ordinariatos latinos são circunscrições eclesiásticas para atender
pastoralmente aos fiéis cristãos católicos dos diversos ritos orientais domiciliados em
lugares nos quais a hierarquia eclesiástica é de rito latino. São erigidos por Decreto da
Congregação para as Igrejas orientais.
Preside cada Ordinariato um Ordinário de rito latino, ao qual é confiada, além do
governo de sua diocese latina, uma missão pastoral de âmbito interdiocesano, pois se
estende a todos os fiéis cristãos residentes no país.
No Brasil, atualmente, esse Ordinário é o arcebispo de Belo Horizonte (MG).
4. O Ordinariato pessoal para anglicanos recebidos na Igreja católica:
Regulação por Bento XVI, Constituição apostólica Anglicanorum Coetibus de
04/11/2009.
133
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
ORGANIZAÇÃO INTERNA DAS DIOCESES
O Bispo diocesano
Os Bispos que, por divina instituição, sucedem aos Apóstolos,
são constituídos, pelo Espírito que lhes foi conferido, pastores na Igreja,
a fim de serem também eles mestres da doutrina, sacerdotes do culto
sagrado e ministros do governo (c. 375 §1).
Pela própria consagração episcopal, os Bispos recebem,
juntamente com o múnus de santificar, também o múnus de ensinar e de
governar, os quais, porém, por sua natureza não podem ser exercidos, a
não ser em comunhão hierárquica com a cabeça e com os membros do
Colégio (§2).
Chamam-se diocesanos os Bispos a quem está entregue o
cuidado de uma diocese; os demais chamam-se titulares (c. 376).
Compete ao Bispo diocesano, na diocese que lhe foi confiada,
todo o poder ordinário, próprio e imediato, que se requer para o
exercício de seu múnus pastoral, com exceção das causas que forem
reservadas, pelo direito ou por decreto do Sumo Pontífice, à suprema ou
a outra autoridade eclesiástica (c. 381 §1).
No direito, equiparam-se ao Bispo diocesano os que presidem a
outras comunidades de fiéis mencionadas no cânon 368, a não ser que
outra coisa se depreenda pela sua natureza ou por prescrição do direito
(§2).
O ofício capital previsto pelo Direito para apascentar a porção do povo de Deus
que constitui a diocese é o Bispo diocesano.
Na Igreja latina, a nomeação dos Bispos compete ao Romano Pontífice, que a
realiza por livre colação ou por confirmação, quando algum colégio tem direito de
eleição (cf. c. 377 §1).
O c. 377 §§2-5 regula os diversos aspectos do procedimento para a nomeação
dos Bispos.
A partir da tomada de posse canônica (cf. cc. 380 e 382), o Bispo diocesano
exerce, como representante de Jesus Cristo, sua função pastoral sobre a porção do povo
de Deus que lhe foi confiada, sendo princípio e fundamento visível da unidade da sua
Igreja particular (cf. LG 23, 27).
134
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os cc. 383-402 recolhem a doutrina conciliar acerca da solicitude pastoral dos
Bispos, em seus aspectos fundamentais (funções de ensinar, santificar e reger), e
regulam também alguns dos seus deveres.
Sobre a sede vacante, vide cc. 416-430.
Bispos coadjutores e auxiliares:
O Sínodo diocesano
O sínodo diocesano é uma assembléia de sacerdotes e de outros
fiéis da Igreja particular escolhidos, que auxiliam o Bispo diocesano
para o bem de toda a comunidade diocesana, de acordo com os cânones
seguintes (c. 460).
A natureza do Sínodo diocesano é a de um colégio consultivo (cf. c. 466), que
atua dentro do marco das competências do Bispo diocesano. Todas as questões
propostas são submetidas à livre discussão dos membros das sessões sinodais (cf. c.
465). No entanto, o único legislador do Sínodo é o Bispo diocesano (cf. c. 466).
Vide cc. 460-468.
135
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A Cúria diocesana
A cúria diocesana consta dos organismos e pessoas que ajudam
o Bispo no governo de toda a diocese, principalmente na direção da
ação pastoral no cuidado da administração da diocese e no exercício do
poder judiciário (c. 469).
A nomeação dos que exercem ofícios na cúria diocesana
compete ao Bispo diocesano (c. 470).
A Cúria diocesana é um conjunto de organismos e de pessoas.
O CIC 1983 regula a Cúria diocesana nos cc. 469-494.
1. Os Vigários gerais e episcopais:
Em cada diocese deve ser constituído pelo Bispo diocesano o
Vigário geral que, com poder ordinário, de acordo com os cânones
seguintes, o ajude no governo de toda a diocese (c. 475 §1).
Tenha-se como regra geral que se deve constituir um só Vigário
geral a não ser que a extensão da diocese, o número de habitantes ou
outras razões pastorais aconselhem diversamente (§2).
Sempre que o bom governo da diocese o exigir, podem ser
constituídos pelo Bispo diocesano um ou mais Vigários episcopais que
tenham, em determinada parte da diocese, ou em determinada espécie
de questões, ou quanto aos fiéis de determinado rito ou de certa classe
de pessoas, de acordo com os cânones seguintes, o mesmo poder
ordinário que compete ao Vigário geral por direito universal (c. 476).
O Vigário geral e o Vigário episcopal devem referir ao Bispo
diocesano as principais atividades já realizadas ou por realizar; nunca
procedam contra sua vontade e sua mente (c. 480).
136
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
2. O chanceler e outros notários:
Em toda a cúria constitua-se um chanceler, cujo ofício
principal, salvo determinação diversa do direito particular, é cuidar que
os atos da cúria sejam redigidos e despachados, bem como sejam
guardados no arquivo da cúria (c. 482 §1).
Se parecer necessário, pode-se dar ao chanceler um auxiliar
com o nome de vice-chanceler (§2).
O chanceler como também o vice-chanceler são, por isso
mesmo, notários e secretários da cúria (§3).
O chanceler é o notário e secretário da Cúria diocesana. Sua assinatura tem fé
pública, ou seja, faz com que o escrito constitua um documento público apto para provar
o que nele está contido de modo direto e principal (cf. cc.1540-1541).
Os atos jurídicos necessitam de sua assinatura junto com a do Ordinário
competente para a validade (cf. c. 474).
3. O Conselho de Assuntos Econômicos (CAE):
Em cada diocese seja constituído o conselho de assuntos
econômicos, que é presidido pelo próprio Bispo diocesano ou por um
seu delegado, e consta de ao menos três fiéis nomeados pelo Bispo,
realmente peritos em economia e direito civil e distintos pela
integridade (c. 492 §1).
Os membros do conselho econômico sejam nomeados por um
qüinqüênio, mas, passado esse tempo, podem ser assumidos para outros
qüinqüênios (§2).
São excluídos do conselho econômico os parentes do Bispo até
o quarto grau de consangüinidade ou de afinidade (§3).
Além do CAE, o Bispo diocesano deve nomear também um ecônomo diocesano,
perito em questões econômicas e de reconhecida probidade. No fim de cada ano, o
ecônomo deve prestar contas das receitas e despesas ao CAE (cf. c.494 §4).
137
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os principais colégios diocesanos
1. Conselho de presbíteros:
Em cada diocese, seja constituído o conselho presbiteral, a
saber, um grupo de sacerdotes que, representando o presbitério, seja
como o senado do Bispo, cabendo- lhe, de acordo com o direito, ajudar
o Bispo no governo da diocese, a fim de se promover ao máximo o bem
pastoral da porção do povo de Deus que lhe foi confiada (c. 495 §1).
Nos vicariatos e prefeituras apostólicas, o Vigário e o Prefeito
constituam um conselho de ao menos três presbíteros missionários, cujo
parecer devem ouvir, mesmo por carta, nas questões mais importantes
(§2).
O conselho presbiteral tenha os próprios estatutos aprovados
pelo Bispo diocesano, respeitando-se as normas dadas pela Conferência
dos Bispos (c. 496).
Quanto a sua natureza jurídica, o Conselho de presbíteros é um colégio consultivo,
vinculado no exercício de suas funções à autoridade do Bispo diocesano, que deve ouvi-
lo em questões mais importantes (cf. p. ex. cc. 461 §1, 515 §2, 1215 §2).
O Bispo necessita obter seu consentimento (cf. c. 127), em casos expressamente
previstos pelo Direito:
O conselho presbiteral tem voto somente consultivo; o Bispo
diocesano ouça-o nas questões de maior importância, mas precisa do
seu consentimento só nos casos expressamente determinados pelo
direito (c. 500 §2).
Direito particular:
Composição: membros representativos do presbitério.
138
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
2. Colégio de consultores:
Entre os membros do conselho presbiteral, são livremente
nomeados pelo Bispo diocesano alguns sacerdotes, não menos de seis
nem mais de doze, que constituam por um qüinqüênio o colégio dos
consultores, ao qual competem as funções determinadas pelo direito;
terminado o qüinqüênio, porém, ele continua a exercer suas funções
próprias, até que seja constituído novo colégio (c. 502 §1).
Ao Colégio dos consultores preside o Bispo diocesano; ficando,
porém a sé impedida ou vacante, preside aquele que substitui
interinamente o Bispo, ou então, se ainda não foi constituído, o
sacerdote mais antigo por ordenação no colégio dos consultores (§2).
A Conferência dos Bispos pode determinar que as funções do
colégio dos consultores sejam confiadas ao cabido da catedral (§3).
No vicariato e na prefeitura apostólica, as funções do colégio
dos consultores competem ao conselho da missão, mencionado no
cânon 495 § 2, a não ser que no direito se determine outra coisa (§4).
O Colégio de consultores foi estabelecido pelo CIC 1983 e dotado de muitas
competências que o CIC 1917 atribuía ao cabido.
Sua natureza é semelhante ao Conselho de presbíteros, mas sua composição
reduzida (6-12 membros) o faz mais ágil para a consulta habitual do Bispo e para
assessorá-lo em assuntos urgentes.
Situações nas quais é obrigatório ouvir o seu conselho (cf. c.127 §2, 2º):
Imposição de tributo moderado (cf. c. 1263);
Atos de administração (cf. c.1277).
Situações que exigem também seu consentimento (cf. 127 §2, 1º):
Atos de administração extraordinária (cf. c.1277).
Alienação de bens da diocese (cf. c. 1292 §1).
O Colégio de consultores desempenha um papel de relevância nas situações de
Sé vacante ou de Sé impedida: eleger o Administrador diocesano (cf. c. 421 §1).
139
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
3. Cabido de cônegos:
O cabido de cônegos, seja da catedral seja colegial, é o colégio
de sacerdotes, ao qual compete realizar as funções litúrgicas mais
solenes na igreja catedral ou colegiada; além disso, compete ao cabido
da catedral desempenhar funções que lhe são confiadas pelo direito ou
pelo Bispo diocesano (c. 503).
4. Conselho pastoral:
Em cada diocese, enquanto a situação pastoral o aconselhar,
seja constituído o conselho pastoral, ao qual compete, sob a autoridade
do Bispo, examinar e avaliar as atividades pastorais na diocese propor
conclusões práticas sobre elas (c. 511).
A origem do Conselho pastoral se encontra no ensinamento do Concílio
Vaticano II a respeito (cf. CD 27). Seu fundamento é a responsabilidade comum de
todos os fiéis cristãos, na missão da Igreja. Corresponsabilidade que nasce da igualdade
na dignidade batismal. O Conselho de pastoral é um dos possíveis meios para essa
participação.
140
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A organização paroquial
1. A paróquia:
Paróquia é uma determinada comunidade de fiéis, constituída
estavelmente na Igreja particular, e seu cuidado pastoral é confiado ao
pároco como a seu pastor próprio, sob a autoridade do Bispo diocesano
(c. 515 §1).
Erigir, suprimir ou modificar as paróquias compete
exclusivamente ao Bispo diocesano, o qual não erija, nem suprima
paróquias, nem as modifique de modo notável, a não ser ouvindo o
conselho presbiteral (§2).
A paróquia legitimamente erigida tem, ipso iure, personalidade
jurídica (§3).
2. O pároco:
O pároco é o pastor próprio da paróquia a ele confiada; exerce o
cuidado pastoral da comunidade que lhe foi entregue, sob a autoridade
do bispo diocesano, em cujo ministério de Cristo é chamado a
participar, a fim de exercer em favor dessa comunidade o múnus de
ensinar santificar e governar, com a cooperação também de outros
presbíteros ou diáconos e com a colaboração dos fiéis leigos, de acordo
com o direito (c. 519).
As funções especialmente confiadas ao pároco são as seguintes:
1° - administrar o batismo;
2° - administrar o sacramento da confirmação aos que se acham em
perigo de morte, segundo o cânon 883, n.3;
3° - administrar o viático e a unção dos enfermos, salva a prescrição do
cânon 1003, §§ 2 e 3, e dar a bênção apostólica;
4° - assistir aos matrimônios e dar bênção nupcial;
5° - realizar funerais;
6° - benzer a fonte batismal no tempo pascal, fazer procissões fora da
igreja, e dar bênçãos solenes fora da igreja;
7° - celebrar mais solenemente a Eucaristia nos domingos e festas de
preceito (c. 530).
3. Os vigários paroquiais (cf. cc. 545-548):
141
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
4. Outras formas de organização do ministério paroquial:
O modelo organizativo comum previsto pelo Direito para cada paróquia é o
formado por um pároco e, conforme o caso, um ou mais vigários paroquiais, com a
ajuda de outros presbíteros e outros fiéis cristãos. Todavia, as circunstâncias e
necessidades pastorais podem exigir outros modos de organização.
Onde as circunstâncias o exigirem, o cuidado pastoral de uma
paróquia, ou de diversas paróquias juntas, pode ser confiado
solidariamente a mais sacerdotes, com a condição, porém, que um deles
seja o coordenador do cuidado pastoral a ser exercido, isto é, dirija a
atividade conjunta e responda por ela perante o Bispo (c. 517 §1).
Por causa da escassez de sacerdotes, se o Bispo diocesano
julgar que a participação no exercício do cuidado pastoral da paróquia
deva ser confiada a um diácono ou a uma pessoa que não tenha o caráter
sacerdotal, ou a uma comunidade de pessoas, constitua um sacerdote
que dirija o cuidado pastoral, munido dos poderes e das faculdades de
pároco (§2).
Vide também c. 543.
5. Os conselhos paroquiais:
O CIC 1983 prevê certos Conselhos, na organização paroquial, análogos aos
diocesanos, que ajudem o pároco em vários aspectos de suas funções, também como
manifestação da participação ativa dos fiéis cristãos na comunidade eclesial.
Em cada paróquia, deve existir um Conselho de assuntos econômicos (cf. c. 537)
e pode ser constituído um Conselho pastoral (cf. c. 536).
142
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
ORGANIZAÇÃO PARTICULAR SUPRADIOCESANA
A solicitude colegial do episcopado
A ordem dos Bispos, constituída a modo de colégio, sucede ao Colégio
apostólico, no magistério e no governo pastoral da Igreja (cf. LG 22). Isso implica na
solicitude por todas as Igrejas (sollicitudo omnium ecclesiarum), que tem múltiplas
manifestações.
O Colégio episcopal, junto com o Romano Pontífice (e nunca sem ele), é sujeito
do supremo poder de magistério e de jurisdição (cf. c. 336). Esse poder sobre toda a
Igreja se exerce mediante atos colegiais em sentido estrito, segundo dois modos
distintos:
a) Solenemente, no Concílio ecumênico (cf. c. 337 §1);
b) Mediante ação conjunta de todos os Bispos dispersos pelo mundo,
promovida pelo Romano Pontífice ou aceita livremente por ele (cf. c. 337
§2).
Além disso, mesmo não havendo uma ação colegial em sentido estrito, os
membros do Colégio atuam sempre unidos por vínculo de afeto colegial (collegialis
affectus), que impele a todos a proceder em comunhão e a promover a ação
evangelizadora de modo harmônico e solidário em toda a Igreja.
Principais instituições nas quais a solicitude pastoral dos Bispos se expressa
estabelecendo relações de cooperação e coordenação entre Igrejas particulares
próximas:
1. Província eclesiástica;
2. Região eclesiástica;
3. Patriarcado (Igrejas orientais católicas);
4. Concílios particulares;
5. Conferência episcopal.
143
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Conferência episcopal
1. Conceito:
A Conferência dos Bispos, organismo permanente, é a reunião
dos Bispos de uma nação ou de determinado território, que exercem
conjuntamente certas funções pastorais em favor dos fiéis do seu
território, a fim de promover o maior bem que a Igreja proporciona aos
homens, principalmente em formas e modalidades de apostolado
devidamente adaptadas às circunstâncias de tempo e lugar, de acordo
com o direito (c. 447).
2. Constituição e membros:
A competência para erigir, modificar ou suprimir Conferências episcopais
pertence à Sé Apostólica, que ouvirá previamente os Bispos interessados. Uma vez
erigida, a Conferência episcopal tem ipso iure personalidade jurídica (cf. c. 449).
Os membros da Conferência se determinam em parte por Decreto universal e em
parte pelos estatutos de cada Conferência (cf. c. 451).
A Conferência dos Bispos pertencem pelo próprio direito todos
os Bispos diocesanos do território e os que são a eles equiparados pelo
direito, os Bispos coadjutores, os Bispos auxiliares e os outros Bispos
titulares que exercem no mesmo território algum encargo especial,
confiado pela Sé Apostólica ou pela Conferência dos Bispos; podem ser
convidados também os Ordinários de outro rito, de modo, porém, que
tenham só voto consultivo, a não ser que os estatutos da Conferência
dos Bispos determinem outra coisa (c. 450 §1).
Os outros Bispos titulares e o Legado do Romano Pontífice, não
são, de direito, membros da Conferência dos Bispos (§2).
144
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
3. Estrutura:
O CIC 1983 se refere a alguns dos ofícios e órgãos da Conferência episcopal,
ainda que a estrutura completa e o funcionamento efetivo de cada uma serão
determinados nos estatutos.
Órgão supremo: assembléia plenária, composta por todos os membros da
Conferência.
As Assembléias plenárias são necessariamente periódicas e de curta duração. A
natureza de “instituição permanente” (c. 447) da Conferência e a sua capacidade de
oferecer aos Bispos meios estáveis de consulta e de ação comum exigem a existência
de:
a) Conselho permanente, presidido pelo presidente da Conferência (cf. c. 457);
b) Secretaria geral (cf. c. 458).
Ofícios: presidente, vice-presidente e secretário geral (cf. c. 452).
4. Competências jurídicas:
A Conferência episcopal não constitui um organismo de governo intermediário
entre a Sé Apostólica e cada Bispo diocesano, porque não possui competências de
jurisdição de caráter geral, como as dos Concílios particulares. Nela, os Bispos, sem
prejuízo da autonomia no governo de suas dioceses, exercem conjuntamente algumas
funções pastorais, especialmente para coordenar sua ação evangelizadora, em virtude do
afeto colegial que os une.
Em certas matérias e ocasiões, o bem da Igreja poderá requerer que essa
coordenação adote também a forma de decisões vinculantes ou declarações doutrinais
da Conferência enquanto tal, a fim de que em todas as Igrejas particulares do território
se apliquem os mesmos critérios e normas.
O c. 455 dispõe que a Conferência episcopal pode dar decretos gerais (cf. cc.29-
33), nos casos previstos pelo Direito universal ou quando receba mandato especial da
Santa Sé.
O c. 753 prevê que os Bispos, em comunhão com o Colégio episcopal e sua
Cabeça, podem exercer magistério autêntico também unidos em Conferências
episcopais.
145
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
PARTE III – MISSÃO DA IGREJA
A FUNÇÃO DE ENSINAR
FUNÇÃO DE ENSINAR E MAGISTERIO ECLESIASTICO
A missão da Igreja e os três múnus
A Igreja é povo de Deus, que peregrina na história, em continuidade com a
missão redentora de Jesus Cristo. É comunidade, constituída e ordenada neste mundo
como uma sociedade (cf. LG 8). É enviada por Deus a todos os povos para ser
sacramento universal de salvação (cf. AG 1).
Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações, e batizai-
os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-lhes a
observar tudo o que vos tenho ordenado. Eis que estou convosco
todos os dias, até o fim dos tempos (Mt 28,19-20).
O Concílio Vaticano II recorreu à distinção da tríplice função de Jesus Cristo
(sacerdotal, profética e real) para abordar a missão da Igreja. Dessa missão, participa
todo o povo de Deus (cf. CCE 783-786). A distinção dos tria munera Christi não é a
única forma de explicar a missão de Jesus Cristo, mas se fundamenta na Escritura,
aparece nos escritos patrísticos, é empregada pelo Magistério e é muito didática.
O múnus de ensinar
O múnus de ensinar é a função que Jesus Cristo deu a sua Igreja de anunciar o
Evangelho a todos os povos e nações, para comunicar a fé a quem ainda não a recebeu e
para fortalecer na fé todos que já fazem parte do povo de Deus.
A função evangelizadora da Igreja acontece de múltiplas formas: testemunho de
vida, pregação, catequese, educação, aprofundamento teológico, ensino do Magistério...
Atenção: não dissociar Palavra e sacramentos, função de ensinar e função de
santificar. As três funções podem ser distinguidas, mas são inseparáveis.
146
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A participação de toda a Igreja na função de ensinar
A Igreja, a quem Cristo Senhor confiou o depósito da fé, para
que, com a assistência do Espírito Santo, ela guardasse santamente a
verdade revelada, a perscrutasse mais profundamente, anunciasse e
expusesse com fidelidade, compete o dever e o direito originário de
pregar o Evangelho a todos os povos, independentes de qualquer poder
humano, mesmo usando de seus próprios meios de comunicação social
(c. 747 §1).
Os fiéis cristãos são chamados a intervir ativamente na missão comum (cf. c.
204). Todos os fiéis cristãos têm o dever e o direito de evangelizar (cf. c. 211). O CIC
1983 abandona a distinção entre Igreja docente e Igreja discente.
A participação de todos na função de ensinar não significa, porém, que todos
façam exatamente as mesmas coisas, porque há diversidade de membros do povo de
Deus. Existem direitos e deveres de todos os fiéis cristãos (p. ex. cc. 212 §1, 213) e há
direitos e deveres específicos dos ministros ordenados (p. ex. cc. 386, 528 §1).
O cânon resume em quatro verbos (guardar, aprofundar, anunciar e expor) o
amplo conjunto de ações que comporta a função de ensinar.
1. Guardar:
2. Aprofundar:
3. Anunciar:
4. Expor:
A estrutura do livro III é a seguinte:
Ministério da Palavra de Deus (pregação e catequese);
Ação missionária;
Educação católica;
Comunicação social.
147
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O Magistério da Igreja
Por Magistério eclesiástico, se entende o ofício conferido por Jesus Cristo aos
apóstolos e seus sucessores de guardar, interpretar e propor a verdade revelada com sua
autoridade e em seu nome (cf. CCE 85-87). Também se usa o mesmo termo para
designar os sujeitos que desempenham esse ofício e os ensinamentos propostos com
essa autoridade.
O carisma da infalibilidade
O poder de Magistério (Magistério em sentido estrito) recai, por Direito divino,
sobre o Romano Pontífice e os Bispos em comunhão com ele.
A função de Magistério está a serviço da Palavra de Deus.
148
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Extensão e modalidades do exercício do Magistério
Segundo a sua forma de exercício, o Magistério eclesiástico pode ser:
a) Solene, quando se realiza mediante formas ou modos solenes (feito com
todos os requisitos necessários para ser legal);
b) Ordinário, quando ensina os fiéis cristãos mediante formas ou meios
habituais: pregação, diversos tipos de cartas e escritos pastorais.
Segundo a sua extensão, o Magistério eclesiástico pode ser:
a) Universal: quando detém um consentimento moralmente unânime, de
maneira sincrônica (no momento histórico concreto) e também diacrônica
(em continuidade com o Magistério de todos os tempos e em fidelidade com
a tradição apostólica).
b) Particular: quando não há essa convergência de convicção de todo o corpo do
Magistério.
Segundo o grau de autoridade, o Magistério eclesiástico pode ser:
a) Meramente autêntico, quando os Pastores atuam estritamente como tais;
b) Infalível: Magistério solene (pontifício ou conciliar) naquelas verdades
referentes à fé ou à moral, que pretende definir. É também infalível o
Magistério ordinário e universal, quando transmite a certeza dessas
doutrinas.
Em virtude de seu ofício, o Sumo Pontífice goza de
infalibilidade no magistério quando, como Pastor e Doutor supremo de
todos os fiéis, a quem cabe confirmar na fé os seus irmãos, proclama,
por ato definitivo, que se deve aceitar uma doutrina sobre a fé e os
costumes (c. 749 §1).
Também o Colégio dos Bispos goza de infalibilidade no
magistério quando, reunidos os Bispos em Concílio Ecumênico,
exercem o magistério como doutores e juízes da fé e dos costumes,
declarando para toda a Igreja que se deve aceitar definitivamente uma
doutrina sobre a fé ou sobre os costumes; ou então quando, espalhados
pelo mundo, conservando o vínculo de comunhão entre si e com o
sucessor de Pedro, e ensinando autenticamente questões de fé ou
costumes juntamente com o mesmo Romano Pontífice, concordam
numa única sentença, que se deve aceitar como definitiva (§2).
149
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Assistência divina e objeto das intervenções do Magistério
O carisma da infalibilidade envolve as verdades referentes à fé ou aos costumes,
que estão contidas explícita ou implicitamente no depósito da Revelação ou que
resultam necessárias para protegê-lo e expô-lo fielmente, ainda que não tenham sido
propostas pelo Magistério como formalmente reveladas.
Vinculação e deveres do fiel cristão com relação ao Magistério
Quando o Magistério ensina (infalivelmente) que uma doutrina é de fé divina e
católica, se pede ao fiel cristão uma adesão de fé teologal, que se fundamenta
diretamente na autoridade da Palavra de Deus. Por exemplo: Os artigos do Símbolo
apostólico e os dogmas cristológicos e marianos. Os fiéis cristãos estão obrigados a
evitar qualquer doutrina contrária (cf. c. 750 §1). Quem, depois de recebido o batismo,
nega alguma dessas verdades ou duvida com pertinácia delas incorre em heresia (cf. c.
751).
Quando o Magistério ensina de maneira definitiva doutrinas acerca da fé e da
moral que são requeridas para guardar santamente e expor fielmente o depósito da fé, os
fiéis cristãos estão obrigados a abraçar e reter fielmente essas proposições. Quem as
recusasse se oporia à doutrina da Igreja católica (cf. c. 750 §2).
As doutrinas acerca da fé e dos costumes, que o Romano Pontífice ou o Colégio
episcopal ensinam no exercício de seu Magistério autêntico, devem ser aceitas com
assentimento religioso da vontade e da inteligência. Tudo o que não é congruente com
esses ensinamentos deve ser evitado (cf. c. 752).
Magistério e teologia
A atividade teológica, enquanto busca da inteligência da fé, é exigida pela
natureza racional do ser humano e constitui um serviço à função de ensinar da Igreja.
Vide: Congregação para a Doutrina da Fé.
Documento doutrinal: Instrução sobre a vocação eclesial do teólogo, Donum
veritatis (24/05/1990).
Documento disciplinar: Regulamento a seguir no exame das doutrinas,
Agendi Ratio, aprovado em forma específica por João Paulo II (29/06/1997).
150
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A profissão de fé
Têm obrigação de fazer pessoalmente a profissão de fé, segundo
a fórmula aprovada pela Sé Apostólica:
1° diante do presidente ou de seu delegado, todos os que
participam de um Concílio Ecumênico ou particular, do Sínodo dos
Bispos ou do sínodo diocesano, com voto deliberativo ou consultivo; o
presidente, por sua vez, diante do Concílio ou do Sínodo;
2° os promovidos à dignidade cardinalícia, segundo os estatutos
do sacro Colégio;
3° diante do delegado da Sé Apostólica, todos os promovidos ao
episcopado, e os que se equiparam ao Bispo diocesano;
4° diante do colégio dos consultores, o Administrador
diocesano;
5° diante do Bispo diocesano ou de seu delegado, os Vigários
gerais, os Vigários episcopais e os Vigários judiciais;
6° diante do Ordinário local ou de seu delegado, os párocos, o
reitor, os professores de teologia e filosofia nos seminários, no início do
exercício do cargo; e os promovidos à ordem do diaconato;
7° diante do Grão-chanceler e, na sua falta, diante do Ordinário
local ou dos respectivos delegados, o reitor de universidade eclesiástica
ou católica, no início do exercício do cargo; diante do reitor, que seja
sacerdote, ou diante do Ordinário local ou dos respectivos delegados, os
professores que lecionam disciplinas referentes à fé e aos costumes
em qualquer universidade, no início do desempenho do cargo;
8° os Superiores nos institutos religiosos e sociedades clericais
de vida apostólica, segundo a norma das constituições (c. 833).
151
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os julgamentos da hierarquia sobre questões temporais
Compete à Igreja anunciar sempre e por toda a parte os
princípios morais, mesmo referentes à ordem social, e pronunciar-se a
respeito de qualquer questão humana, enquanto o exigirem os direitos
fundamentais da pessoa humana ou a salvação das almas (c. 747 §2).
A Doutrina Social da Igreja (DSI) e as ações concretas da hierarquia eclesiástica
em favor da paz, da solidariedade e do respeito à justiça e aos direitos humanos
demonstram a importância desse aspecto da missão da Igreja.
O caráter das intervenções do Magistério sobre essas questões é de princípios e
juízos éticos. Não se trata de propostas ou soluções políticas, econômicas ou técnicas.
Os direitos humanos:
152
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A ATIVIDADE EVANGELIZADORA
Aspectos da atividade evangelizadora e modos de participação
A atividade evangelizadora é aquela pela qual a Igreja comunica o Evangelho a
todos os povos. Nessa atividade, é comum distinguir três aspectos, segundo sua
finalidade e seus destinatários principais:
1. Ministério da palavra: para quem já forma parte da Igreja e está em
comunhão com ela;
2. Atividade ecumênica: para os cristãos não católicos, em busca a união dos
cristãos na plena comunhão eclesial;
3. Atividade missionária: para quem ainda não conhece a Jesus Cristo ou onde
a Igreja não está suficientemente constituída.
A ação evangelizadora é missão de todo o povo de Deus (cf. c. 747 §1).
No que se refere à Igreja universal, o múnus de anunciar o
Evangelho foi confiado principalmente ao Romano Pontífice e ao
Colégio dos Bispos (c. 756 §1).
No que se refere à Igreja particular a ele confiada, cada Bispo
exerce esse múnus, porque ele é nela o dirigente de todo o ministério da
palavra; entretanto, às vezes alguns Bispos o exercem conjuntamente
para diversas Igrejas reunidas, de acordo com o direito (§2).
É próprio dos presbíteros, que são os cooperadores dos Bispos,
anunciar o Evangelho de Deus; são obrigados a isso, em relação ao
povo a eles confiado, principalmente os párocos e outros a quem esteja
confiada a cura de almas; compete também aos diáconos servir ao povo
de Deus no ministério da palavra, em comunhão com o Bispo e seu
presbitério (c. 757).
Em virtude da própria consagração a Deus, os membros de
institutos de vida consagrada dão testemunho do Evangelho de maneira
especial; convém que sejam assumidos pelo Bispo para auxiliar no
anúncio do Evangelho (c. 758).
Em virtude do batismo e da confirmação, os fiéis leigos são
testemunhas da mensagem evangélica, mediante a palavra e o exemplo
de vida cristã; podem também ser chamados a cooperar com o Bispo e
os presbíteros no exercício do ministério da palavra (c. 759).
153
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Ministério da Palavra (ministerium verbi) é uma noção técnica que abarca
principalmente a pregação e a catequese. Em sentido amplo, inclui também as demais
formas de educação da fé.
No ministério da palavra, que deve basear-se na sagrada
Escritura, na Tradição, na liturgia, no magistério e na vida da Igreja,
seja proposto integral e fielmente o mistério de Cristo (c. 760).
Os diversos meios à disposição sejam utilizados para anunciar a
doutrina cristã, principalmente a pregação e a instrução catequética, que
conservam sempre o primeiro lugar; empregue-se ainda a exposição
doutrinal nas escolas, academias, conferências e reuniões de todo o
gênero, bem como a sua difusão mediante declarações públicas feitas
pela legítima autoridade, por ocasião de certos acontecimentos, através
da imprensa e demais meios de comunicação social (c. 761).
154
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A pregação da Palavra de Deus
Em sentido estrito, segundo as normas do CIC 1983, por pregação se entende um
ato de ensino público da doutrina cristã, feito em nome da Igreja, por ministros
ordenados ou por outros sujeitos especialmente autorizados, diante de fiéis cristãos
convocados, a fim de instruí-los e confirmá-los na fé em Jesus Cristo.
A pregação tem sempre um caráter público (vide c. 834 §2). Tradicionalmente, a
pregação está vinculada a um contexto litúrgico.
A disciplina canônica sobre a homilia:
Entre as formas de pregação, destaca-se a homilia, que é parte
da própria liturgia e se reserva ao sacerdote ou diácono; nela se devem
expor, ao longo do ano litúrgico, a partir do texto sagrado, os mistérios
da fé e as normas da vida cristã (c. 767 §1).
Em todas as missas que se celebram com participação do povo,
nos domingos e festas de preceito, deve-se fazer a homilia, que não se
pode omitir, a não ser por causa grave (§2).
Havendo suficiente participação do povo, recomenda-se
vivamente que se faça a homilia também nas missas celebradas durante
a semana, principalmente no tempo do advento e da quaresma ou por
ocasião de alguma festa ou acontecimento de luto (§3).
Compete ao pároco ou reitor da igreja cuidar que essas
prescrições sejam observadas religiosamente (§4).
O conteúdo da pregação:
Os pregadores da palavra de Deus apresentem aos fiéis
principalmente o que se deve crer e fazer para a glória de Deus e a
salvação dos homens (c. 768 §1).
Apresentem aos fiéis também a doutrina que o magistério da
Igreja propõe sobre a dignidade e liberdade da pessoa humana, sobre a
unidade e estabilidade da família e suas funções, sobre as obrigações
civis e sobre a organização das coisas temporais segundo a ordem
estabelecida por Deus (§2).
A doutrina cristã seja apresentada de modo apropriado à
condição dos ouvintes e, em razão dos tempos, adaptada às
necessidades (c. 769).
155
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A formação catequética
Globalmente, pode-se partir da noção de que a catequese é a educação da fé das
crianças, jovens e adultos, a qual compreende especialmente o ensino da doutrina cristã,
dado em geral de maneira orgânica e sistemática, com a finalidade de iniciá-los na
plenitude da vida cristã (cf. Exortação apostólica Catechesi tradendae, nº 18).
Evidentemente, não se trata de mera transmissão de conteúdos objetivos, mas de
atividade que busca articular fé e vida.
É dever próprio e grave, sobretudo dos pastores de almas,
cuidar da catequese do povo cristão, para que a fé dos fiéis, pelo ensino
da doutrina e pela experiência da vida cristã, se torne viva, explícita e
atuante (c. 773).
Além do CIC 1983, as principais fontes normativas da catequese são:
Ritual de iniciação cristã de adultos (1972);
Exortação apostólica de Paulo VI Evangelii nuntiandi (1975);
Exortação apostólica de João Paulo II Catechesi tradendae (1979);
Catecismo da Igreja católica (1992);
Diretório Geral para a Catequese (1997);
Regime de aprovação e uso dos textos catequéticos:
O ministério da Palavra deve propor de forma íntegra e fiel o mistério de Cristo
(cf. c. 760). Isso se exige de modo particular na formação catequética. Entre os
instrumentos mais eficazes de formação estão os catecismos, que são sínteses das
principais verdades da fé e da moral, expostas de forma simples, orgânica, sistemática e
inequívoca.
Um catecismo requer aprovação, porque não basta que esteja livre de erros, mas
é necessário também que não tenha omissões, nem deficiências consideráveis em outros
aspectos.
No âmbito universal, as competências para aprovação e uso de catecismos e
demais instrumentos catequéticos correspondem a Santa Sé.
Os catecismos nacionais devem ser aprovados pelas Conferências episcopais (cf.
c. 775 §2).
No âmbito da Igreja particular, as referidas competências pertencem
primordialmente ao Bispo diocesano. O Ordinário do lugar pode aprovar a edição de
catecismos (cf. c. 827 §1), mas é o Bispo diocesano quem pode estabelecer o uso de
determinado catecismo e, inclusive, promover a sua elaboração (cf. c. 775 §1).
156
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A atividade ecumênica
O movimento ecumênico é o conjunto das atividades e iniciativas, que, segundo
as diferentes necessidades da Igreja e das circunstâncias dos tempos, são suscitadas e
ordenadas a promover a unidade dos cristãos (cf. UR 4).
O ecumenismo é a missão da Igreja com relação aos cristãos separados de sua
estrutura visível, com o objetivo de restabelecer a plena comunhão.
Compete, em primeiro lugar, a todo o Colégio dos Bispos e à Sé
Apostólica incentivar e dirigir entre os católicos o movimento
ecumênico, cuja finalidade é favorecer o restabelecimento da unidade
entre todos os cristãos, a cuja promoção a Igreja está obrigada por
vontade de Cristo (c. 755 §1).
Compete igualmente aos Bispos e, de acordo com o direito, às
Conferências dos Bispos, promover essa unidade e, de acordo com as
diversas necessidades ou oportunidades de circunstâncias, estabelecer
normas práticas, respeitando as disposições da suprema autoridade da
Igreja (§2).
157
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A atividade missionária
A atividade missionária propriamente dita é o meio pelo qual se realiza a
evangelização e a implantação da Igreja nos diversos povos nos quais ela ainda não está
presente (cf. AG 6).
O CIC 1983 dedica à atividade missionária os cc. 781-792.
Sendo que a Igreja toda é missionária por sua natureza e que a
obra de evangelização é dever fundamental do povo de Deus, todos os
fiéis conscientes da própria responsabilidade, assumam cada um a sua
parte na obra missionária (c. 781).
Todos os fiéis têm o direito e o dever de trabalhar, a fim de que
o anúncio divino da salvação chegue sempre mais a todos os homens de
todos os tempos e de todo o mundo (c. 211).
A suprema direção e coordenação da atividade missionária:
Compete ao Romano Pontífice e ao Colégio dos Bispos a
suprema direção e coordenação das iniciativas e atividades próprias da
obra das missões e da cooperação missionária (c. 782 §1).
Vide Organização eclesiástica: circunscrições territoriais.
1. Missão sui iuris
2. Diocese de missão
3. Vicariato apostólico e Prefeitura apostólica
4. Prelazia territorial
5. Diocese
Competência do Bispo diocesano:
Como responsáveis pela Igreja universal e por todas as Igrejas,
os Bispos todos tenham especial solicitude pela obra das missões,
principalmente despertando, incentivando e sustentando iniciativas
missionárias em sua própria Igreja particular (c. 782 §2).
158
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A EDUCAÇÃO CATOLICA E A COMUNICAÇÃO SOCIAL
Noção de educação católica
Educar é o processo mediante o qual a pessoa humana se desenvolve e se
aperfeiçoa nas diversas dimensões do seu ser, a fim de se dirigir ao seu fim próprio.
A educação cristã se caracteriza por oferecer à pessoa uma visão cristã da
realidade, ajudando-a a desenvolver toda a sua vida em comunhão com Jesus Cristo.
A educação cristã pode ser denominada católica enquanto seus conteúdos e fins
são conformes com a doutrina da Igreja.
Responsabilidade e liberdade dos pais e da Igreja na educação
A Igreja tem o dever e o direito de educar por uma dupla razão:
Porque é capaz de educar como outros grupos humanos;
Porque Deus lhe confiou a missão de auxiliar os homens para que possam
chegar à plenitude da vida cristã.
Atenção: Nos dias de hoje, há o risco da sociedade não compreender esse
aspecto da missão da Igreja.
Todos os fiéis cristãos têm direito de educação cristã (cf. c. 217).
Os pais e os que fazem suas vezes têm a obrigação e o direito de
educar sua prole; os pais católicos têm também o dever e o direito de
escolher os meios e instituições, com que possam, de acordo com as
circunstâncias locais, prover do modo mais adequado à educação
católica dos filhos (c. 793 §1).
Compete também aos pais o direito de usufruir da ajuda que
deve ser prestada pela sociedade civil e de que necessitam para
proporcionar aos filhos uma educação católica (§2).
159
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
As escolas católicas
Por escola, se entende os estabelecimentos de ensino de nível primário e médio.
Em sentido material, escolas católicas são aquelas que nas quais acontece uma
educação católica, independentemente de outras condições.
Em sentido formal ou técnico, se considera escola católica:
A que está dirigida por autoridade eclesiástica competente;
A que está dirigida por pessoa jurídica eclesiástica pública;
A que é reconhecida como tal pela autoridade eclesiástica mediante
documento escrito (cf. c. 803 §1).
Competência do Bispo diocesano:
Compete ao Bispo diocesano o direito de supervisionar e visitar
as escolas católicas situadas em seu território, mesmo quando fundadas
ou dirigidas por membros de institutos religiosos; compete ainda a ele
dar prescrições referentes à organização geral das escolas católicas; tais
prescrições têm valor também para as escolas dirigidas por esses
membros de institutos religiosos, salva porém a autonomia dessas
escolas quanto a seu governo interno (c. 806 §1).
O projeto educativo deve ter identidade católica e facilitar a formação científica
de qualidade:
Os dirigentes das escolas católicas, sob a supervisão do
Ordinário local, cuidem que a formação nelas dada atinja pelo menos o
nível científico das outras escolas da região (§2).
Os professores devem se destacar por sua reta doutrina e integridade de vida (cf.
c. 803 §2). Os fiéis cristãos, por sua vez, devem prestar apoio especial a essas escolas
(cf. c. 800 §2).
160
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O ensino religioso católico
Está sujeita à autoridade da Igreja a formação e educação
religiosa católica que se ministra em quaisquer escolas, ou que se
promove pelos diversos meios de comunicação social; compete à
Conferência dos Bispos traçar normas gerais nesse campo de ação, e ao
Bispo diocesano compete organizá-lo e supervisioná-lo (c.804 §1).
A indicação dos professores (questão chave):
O Ordinário local seja cuidadoso para que os indicados como
professores para a formação religiosa nas escolas, mesmo não-católicas,
se distingam pela retidão de doutrina, pelo testemunho de vida cristã e
pela capacidade pedagógica (§2).
Direito do Ordinário local:
É direito do Ordinário local, em sua diocese, nomear ou aprovar
os professores de religião, como também afastá-los ou exigir seu
afastamento, caso o requeira algum motivo de religião ou moral (c.
805).
Esse direito do Ordinário do lugar está supostamente garantido nas escolas
formalmente católicas, mas a Igreja procura salvaguardá-lo também nos demais casos,
mediante acordos com os Estados.
As universidades católicas e outros Institutos de estudos superiores
As universidades são centros de estudos superiores dedicados à investigação, ao
ensino e à formação nos diversos campos do conhecimento.
Em sentido formal, se considera universidade católica:
A erigida pela própria autoridade eclesiástica: Santa Sé, Conferência
episcopal, Bispo diocesano;
A constituída por um Instituto religioso ou outra pessoa jurídica eclesiástica
pública, com o consentimento do Bispo diocesano;
A que, tendo sido constituída por outras pessoas eclesiásticas ou por fiéis
cristãos leigos, conta com o consentimento da autoridade eclesiástica
competente para usar o título de “universidade católica” (cf. c. 808).
161
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
As universidades e faculdades eclesiásticas
As universidades e faculdades eclesiásticas são aquelas que se ocupam
especificamente das ciências sagradas e de outras ciências relacionadas com elas (cf. c.
815).
Esses centros acadêmicos são erigidos ou ao menos aprovados pela Santa Sé.
Compete sempre à Santa Sé a sua suprema direção, assim como aprovar seus estatutos e
planos de estudo (cf. cc. 815-816). As universidades e faculdades eclesiásticas são as
únicas que podem conceder títulos acadêmicos com validade na Igreja (cf. c. 817).
A comunicação social
O Concílio Vaticano II dedicou o Decreto Inter mirifica aos meios de
comunicação social.
O CIC 1983 trata do assunto nos cc. 822-823.
Os pastores da Igreja, no cumprimento do seu ofício, usando o
direito próprio da Igreja, procurem utilizar os meios de comunicação
social (c. 822 §1).
O CCEO reflete melhor do que o Código latino o decreto conciliar (cf. cc. 651-
666).
162
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
As exigências canônicas para a publicação de escritos
A licença eclesiástica para a publicação, que supõe o nihil obstat prévio de um
censor (cf. c. 830), se expressa tradicionalmente mediante o termo imprimatur
(imprima-se, pode-se imprimir). Significa que a obra está livre de erros sobre a fé
católica e os costumes.
A aprovação manifesta que o texto é aceito pela Igreja ou que a obra é conforme
com sua doutrina autêntica. Pode ser concedida a um livro já publicado, a fim de
autorizá-lo para um determinado uso.
Os principais tipos de publicações que precisam de aprovação são as seguintes:
Os livros da Sagrada Escritura (cf. c. 825);
Os livros litúrgicos (cf. c. 838);
Os catecismos (cf. cc. 775 §2; 827 §1);
Os textos de ensino, que tratam de questões relativas à Bíblia, à teologia, ao
direito canônico, à história eclesiástica e a disciplinas religiosas ou morais
(cf. c. 827 §2).
Para os livros de orações, é suficiente a licença do Ordinário local (cf. c. 826
§3).
Qualquer escrito que contenha algo que afete de maneira peculiar à religião ou à
integridade dos costumes, se recomenda que seja submetido ao juízo do Ordinário local
(cf. c. 827 §3).
163
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
PARTE III – MISSÃO DA IGREJA
A FUNÇÃO DE SANTIFICAR
FUNÇÃO DE SANTIFICAR, LITURGIA E SACRAMENTOS
A função de santificar (munus sanctificandi)
A evangelização não se realiza somente com o anúncio da Palavra de Deus. A
Igreja deve cumprir a sua missão também tornando presente a graça da salvação que
proclama.
Assim como Cristo foi enviado pelo Pai, assim também Ele
enviou os Apóstolos, cheios do Espírito Santo, não só para que,
pregando o Evangelho a toda a criatura, anunciassem que o Filho de
Deus, pela sua morte e ressurreição, nos libertara do poder de satanás e
da morte e nos introduzira no Reino do Pai, mas também para que
realizassem a obra de salvação que anunciavam, mediante o sacrifício e
os sacramentos, à volta dos quais gira toda a vida litúrgica (SC 6).
A liturgia e os sacramentos são estudados pela:
Ciência litúrgica;
Teologia dos sacramentos;
Teologia moral;
Teologia pastoral.
O Direito canônico se ocupa dessas questões naquilo que lhe corresponde como
ordenamento: determinar e tutelar os aspectos jurídicos básicos, sejam de Direito
divino, sejam de Direito meramente eclesiástico.
164
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Função de santificar e liturgia
A Igreja, em comunhão com Jesus Cristo, por Ele e nele (cf. CCE 824), cumpre
a função de santificar comunicando os bens da salvação aos homens.
A Igreja desempenha seu múnus de santificar, de modo especial
por meio da sagrada Liturgia, que é tida como exercício do sacerdócio
de Jesus Cristo, na qual, por meio de sinais sensíveis, é significada e,
segundo o modo próprio de cada um, é realizada a santificação dos
homens, e é exercido plenamente pelo Corpo místico de Jesus Cristo,
isto é, pela Cabeça e pelos membros, o culto público de Deus (c. 834
§1).
Para que o culto possa ser considerado litúrgico (a palavra liturgia significa
originalmente obra pública, cf. CCE 1069), é preciso cumprir três requisitos
mencionados no c. 834 §2:
Ser exercido em nome da Igreja,
Por pessoas legitimamente destinadas a isso,
Por atos aprovados pela autoridade da Igreja.
Ordenação da liturgia
A direção da sagrada liturgia depende unicamente da autoridade
da Igreja; esta se encontra na Sé Apostólica e, de acordo com as normas
do direito, no Bispo diocesano (c. 838 §1).
Celebração fiel da liturgia
Na celebração dos sacramentos, sigam-se fielmente os livros
litúrgicos aprovados pela autoridade competente; portanto, ninguém
acrescente, suprima ou altere coisa alguma neles, por própria iniciativa
(c. 846 §1).
Os sacramentos
Os sacramentos do Novo Testamento, instituído pelo Cristo
Senhor e confiados à Igreja, como ações de Cristo e da Igreja,
constituem sinais e meios pelos quais se exprime e se robustece a fé, se
presta culto a Deus e se realiza a santificação dos homens; por isso,
muito concorrem para criar, fortalecer e manifestar a comunhão
eclesial; em vista disso, os ministros sagrados e os outros fiéis, em sua
celebração, devem usar de suma veneração e devida diligência (c. 840).
165
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Exigências de justiça na celebração e administração dos sacramentos
A atividade sacramental comporta relações de justiça, tanto com referência à
celebração dos sacramentos, quanto acerca da sua administração.
O direito dos fiéis cristãos:
Os fiéis têm o direito de receber dos Pastores sagrados, dentre
os bens espirituais da Igreja, principalmente os auxílios da Palavra de
Deus e dos sacramentos (c. 213).
Requisitos que condicionam o direito dos fiéis cristãos:
Os ministros sagrados não podem negar os sacramentos àqueles
que os pedirem oportunamente, que estiverem devidamente dispostos e
que pelo direito não forem proibidos de recebê-los (c. 843 §1).
Atenção: Não se pode absolver quem não está arrependido, nem dar a comunhão
eucarística a quem obstinadamente persiste em manifesto pecado grave (cf. c. 915).
A necessidade da devida preparação:
Os pastores de almas e os outros fiéis, cada um conforme o seu
próprio múnus eclesiástico, têm o dever de cuidar que todos os que
pedem os sacramentos estejam preparados para recebê-los, mediante
devida evangelização e instrução catequética, segundo as normas dadas
pela autoridade competente (§2).
O cuidado com os mais pobres:
Além das ofertas estabelecidas pela autoridade competente, o
ministro nada peça pela administração dos sacramentos, tomando
sempre cuidado para que os necessitados não sejam privados do auxílio
dos sacramentos por causa de sua pobreza (c. 848).
O caráter pastoral do Direito canônico: pastoral e direito não se excluem. Ao
contrário, se exigem mutuamente.
166
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A comunicação nos bens espirituais (communicatio in spiritualibus)
O batismo válido estabelece um vínculo sacramental de unidade entre todos os
fiéis cristãos (cf. UR 22), inclusive com aqueles que não estão em plena comunhão com
a Igreja católica.
Isso possibilita certa comunicação nos bens espirituais com os cristãos não
católicos, condicionada por determinadas exigências de justiça:
Oração em comum;
Uso comum de coisas ou lugares sagrados;
Participação comum na liturgia e nos sacramentos (communicatio in sacris).
Da oração em comum, o CIC 1983 nada diz.
O Diretório para a aplicação dos princípios e normas sobre o ecumenismo (1993)
a recomenda (cf. DE 108-115). A Encíclica Ut unum sit (1995) também a aconselha (cf.
nº 21-28).
Do uso comum de coisas ou lugares sagrados:
Por justa causa e com licença expressa do Ordinário local, é
lícito ao sacerdote, removido o escândalo, celebrar a Eucaristia em
templo de alguma Igreja ou comunidade eclesial que não tenha plena
comunhão com a Igreja católica (c. 933).
Em sentido inverso, o Bispo diocesano pode permitir a outros cristãos o uso de
uma igreja, edifício católico ou cemitério, assim como de capelas de escolas ou
hospitais (cf. DE 137-142).
167
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Da comunicação no sagrado (communicatio in sacris):
Comunicação na liturgia não sacramental:
a) Exéquias eclesiásticas de batizados não católicos (cf. c. 1183 §3);
b) Bênçãos (cf. c. 1170).
Comunicação nos sacramentos:
Regra geral: Os ministros católicos só administram licitamente os
sacramentos aos fiéis católicos que, por sua vez, somente dos ministros católicos
licitamente os recebem (cf. 844 §1).
Os fiéis católicos podem receber licitamente os sacramentos: Sempre que a
necessidade o exigir ou verdadeira utilidade espiritual o aconselhar, e contanto
que se evite o perigo de erro ou indiferentismo, é lícito aos fiéis, a quem for
física ou moralmente impossível dirigir-se a um ministro católico, receber os
sacramentos da penitência, Eucaristia e unção dos enfermos das mãos de
ministros não-católicos, em cuja Igreja esses sacramentos são válidos (cf. 844
§2).
Os ministros católicos podem administrar licitamente os sacramentos: Os
ministros católicos administram licitamente os sacramentos da penitência,
Eucaristia e unção dos enfermos aos membros das Igrejas orientais que não têm
plena comunhão com a Igreja católica, se eles o pedirem espontaneamente e
estiverem devidamente preparados; vale o mesmo para os membros de outras
Igrejas que, a juízo da Sé Apostólica no que se refere aos sacramentos, se acham
nas mesmas condições que as referidas Igrejas orientais (cf. c. 844 §3).
Caso excepcional (cinco condições): Se houver perigo de morte ou, a juízo
do Bispo diocesano ou da Conferência dos Bispos, urgir outra grave
necessidade, os ministros católicos administram licitamente esses sacramentos
também aos outros cristãos que não tem plena comunhão com a Igreja católica e
que não possam procurar um ministro de sua comunidade e que o peçam
espontaneamente, contanto que manifestem, quanto a esses sacramentos, a
mesma fé católica e estejam devidamente dispostos (cf. c. 844 §4).
168
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A intercomunhão eucarística:
As possibilidades relacionadas pelo c. 844 não devem ser confundidas com
prática ilegítima denominada de intercomunhão ou hospitalidade eucarística, que
entende a Eucaristia em comum como um meio para alcançar a unidade, violando,
assim, os limites estabelecidos pela teologia e pelo direito.
A Eucaristia em comum é a meta final para a qual se encaminha o ecumenismo.
A unidade da Igreja, realizada e manifestada pela Eucaristia, exige a plena
comunhão também nos vínculos da profissão de fé e do governo eclesiástico. Não é
possível concelebrar a liturgia eucarística com cristãos não católicos, se não é
restabelecida a integridade dos referidos vínculos.
Os três vínculos de comunhão (cf. c. 205):
Vínculo simbólico: fé única;
Vínculo litúrgico: unidade nos sacramentos;
Vínculo social-hierárquico: unidade na vida comunitária sob o ministério
apostolicamente fundado.
169
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O SACRAMENTO DO BATISMO (cc. 849-878)
Importância e necessidade do batismo
O sinal sacramental do batismo
O sujeito do batismo
Ministro, lugar e dia do batismo
Os padrinhos
A relevância canônica do batismo
O batismo, porta dos sacramentos, necessário na realidade ou ao
menos em desejo para a salvação, e pelo qual os homens se libertam do
pecado, se regeneram tornando-se filhos de Deus e se incorporam à
Igreja, configurados com Cristo mediante caráter indelével, só se
administra validamente através da ablução com água verdadeira,
usando-se a devida fórmula das palavras (c. 849).
Conseqüências canônicas do caráter impresso pelo batismo:
A pessoa adquire a condição de fiel cristão (cf. c. 204), com igualdade na
dignidade e na ação comum e com um conjunto de direitos e deveres que lhe
são próprios (cc. 208-223). Observação: O exercício desses direitos depende,
entre outros fatores, de estar em plena comunhão com a Igreja;
Pode ser admitida validamente aos demais sacramentos (cf. cc. 842 §1; 849);
Passa a ser sujeito passivo das leis meramente eclesiásticas, sempre que
cumpra as demais condições do c. 11.
Anotação e prova do batismo
O pároco do lugar em que se celebra o batismo deve anotar
cuidadosamente e sem demora os nomes dos batizados, fazendo menção
do ministro, pais, padrinhos, testemunhas, se as houver, do lugar e dia
do batismo, indicando também o dia e o lugar do nascimento (c. 877
§1).
170
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O SACRAMENTO DA CONFIRMAÇÃO (cc. 879-896)
A confirmação: sinal sacramental, efeitos e relevância canônica
Sujeito da confirmação
Obrigatoriedade da confirmação
Padrinho, anotação e prova da confirmação
Ministro da confirmação
O ministro ordinário da confirmação é o Bispo; administra
validamente este sacramento também o presbítero que tem essa
faculdade em virtude do direito comum ou de concessão especial da
autoridade competente (c. 882).
Tem concedida ipso iure a faculdade de confirmar:
a) Dentro dos limites de sua jurisdição, os que se equiparam ao Bispo
diocesano (cf. c. 368; 427);
b) O presbítero que, por razão do seu ofício ou por mandato do Bispo
diocesano, batiza um adulto ou recebe alguém já batizado na plena
comunhão da Igreja católica;
c) O pároco e inclusive qualquer presbítero (ainda que incurso em uma censura
ou em outra pena canônica, desde que não tenha perdido o estado clerical)
para os fiéis cristãos que estão em perigo de morte (cf. c. 883).
Atenção: O ordenamento canônico não faculta a um presbítero determinado para
que confirme um adulto batizado na Igreja católica, que nunca se situou fora de sua
estrutura visível (cf. c. 205), ainda que nunca tenha praticado a fé católica.
A concessão peculiar da faculdade de confirmar contempla duas possibilidades:
O Bispo diocesano administre a confirmação por si mesmo ou
cuide que seja administrada por outro Bispo; se a necessidade o exigir,
pode conceder faculdade a um ou mais presbíteros determinados para
administrarem esse sacramento (c. 884 §1).
Por motivo grave, o Bispo e também o presbítero que, pelo
direito ou por especial concessão da autoridade competente, têm a
faculdade de confirmar, podem, caso por caso, associar a si presbíteros
que também administrem o sacramento (§2).
171
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O SACRAMENTO DA EUCARISTIA (cc. 897-958)
A Eucaristia no mistério da Igreja
A celebração eucarística
As condições da celebração eucarística referentes ao ministro
A sagrada comunhão
Reserva e veneração da Eucaristia
CIC 1983:
1. A celebração eucarística: ministro, participação, ritos, tempo e lugar;
2. Conservação e veneração da Eucaristia;
3. Espórtulas.
172
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O SACRAMENTO DA PENITÊNCIA (cc. 959-997)
Ministro
Cânon 965 Ministro do sacramento da penitência é somente o
sacerdote.
Faculdade para confessar
Cânon 966 § 1. Para a válida absolvição dos pecados se requer
que o ministro, além do poder de ordem, tenha a faculdade de exercer
esse poder em favor dos fiéis aos quais dá absolvição.
§ 2. Essa faculdade pode ser dada ao sacerdote pelo próprio
direito ou por concessão da autoridade competente, de acordo com o c.
969.
Cânon 967 § 1. Além do Romano Pontífice, pelo próprio
direito, os Cardeais têm a faculdade de ouvir confissões em todo o
mundo, como também os Bispos que dela usam licitamente, em
qualquer parte, a não ser que em algum caso particular o Bispo
diocesano num caso particular se tenha oposto.
§ 2. Aqueles que têm faculdade de ouvir confissões
habitualmente, em virtude de seu ofício ou por concessão do Ordinário
do lugar de incardinação ou do lugar onde têm domicílio, podem
exercer essa faculdade em toda a parte, a não ser que o Ordinário local
se oponha em algum caso particular, salvas as prescrições do c. 974, §§
2 e 3.
Cânon 970 Não se conceda a faculdade de ouvir confissões, a
não ser a presbíteros que tenham sido julgados idôneos por meio de
exame, ou cuja idoneidade conste por outro forma.
173
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Atitude e deveres do confessor
Cânon 978 § 1. Lembre-se o sacerdote que, ao ouvir confissões,
desempenha simultaneamente o papel de juiz e de médico, e que foi
constituído por Deus como ministro da justiça divina e, ao mesmo
tempo, de sua misericórdia, para procurar a honra divina e a salvação
das almas.
O sigilo sacramental
Cânon 983 § 1. O sigilo sacramental é inviolável; por isso é
absolutamente ilícito ao confessor de alguma forma trair o penitente,
por palavras ou de qualquer outro modo e por qualquer que seja a causa.
O penitente
Cânon 987 Para obter o remédio salutar do sacramento da
penitência, o fiel deve estar de tal modo disposto que, repudiando os
pecados cometidos e tendo o propósito de se emendar, se converta a
Deus.
Cânon 988 § 1. O fiel tem a obrigação de confessar, quanto à
espécie e ao número, todos os pecados graves de que tiver consciência
após diligente exame, cometidos depois do batismo e ainda não
diretamente perdoados pelas chaves da Igreja, nem acusados em
confissão individual.
§ 2. Recomenda-se aos fiéis que confessem também os pecados
veniais.
Cânon 991 Todo fiel é livre de se confessar ao confessor
legitimamente aprovado, que preferir, mesmo de outro rito.
174
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
As indulgências
Cânon 992 Indulgência é a remissão, diante de Deus, da pena
temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à culpa, que o fiel,
devidamente disposto e em certas e determinadas condições, alcança
por meio da Igreja, a qual, como dispensadora da redenção, distribui e
aplica, com autoridade, o tesouro das satisfações de Cristo e dos santos.
Uso das indulgências
Cânon 997 Quanto à concessão e uso das indulgências,
observem-se ainda as outras prescrições contidas em leis especiais da
Igreja.
Leis especiais
Carta Apostólica Doutrina das indulgências (Indulgentiarum doctrina) de Paulo VI
(1/1/1967).
Enchiridion Indulgentiarum : normae et concessiones (29/6/1968).
175
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O SACRAMENTO DA UNÇÃO DOS ENFERMOS (cc. 998-1007)
Cânon 1003 § 1. Todo sacerdote, e somente ele, pode
administrar validamente a unção dos enfermos.
Cânon 1004 § 1. A unção dos enfermos pode ser administrada
ao fiel que, tendo atingido o uso da razão, começa a estar em perigo por
motivo de doença ou velhice.
§ 2. Pode-se repetir este sacramento se o doente, depois de ter
convalescido, recair em doença grave, ou durante a mesma
enfermidade, se o perigo se agravar.
176
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O SACRAMENTO DA ORDEM (cc. 1008-1054)
O sacramento do ministério apostólico
Sinal sacramental e efeitos do sacramento da ordem
Ministro e celebração do sacramento da ordem
Inscrição e certificado de ordenação recebida
O sujeito do sacramento da ordem
Condições de validade (duas):
Só um varão batizado pode receber validamente a ordenação
sagrada (c. 1024).
Condições de licitude (cinco):
Para serem conferidas licitamente as ordens do presbiterato ou
diaconato, requer- se que o candidato, após a prova exigida de acordo
com o direito, possua a juízo do Bispo próprio ou do Superior maior
competente, as devidas qualidades, não tenha nenhuma irregularidade
ou impedimento e tenha preenchido todos os requisitos de acordo com
os cânones 1033-1039; além disso, haja os documentos mencionados no
cânon 1050 e tenha sido feito o escrutínio mencionado no cânon 1051
(c. 1025 §1).
Além das condições mencionadas anteriormente, se requer o seguinte:
Requer-se ainda que seja considerado útil para o ministério da
Igreja, a juízo desse legítimo Superior (§2).
A utilidade deve ser avaliada com relação às necessidades da Igreja.
177
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Condições do ordenando:
A devida liberdade:
Para que alguém seja ordenado, é preciso ter a devida liberdade;
é absolutamente ilícito forçar, de qualquer modo, por qualquer causa,
alguém a receber ordens ou afastar da recepção delas alguém
canonicamente idôneo (c. 1026).
A formação com esmerada preparação:
Os que aspiram ao diaconato e ao presbiterato devem ser
formados com preparação cuidadosa, de acordo com o direito (c. 1027).
O conhecimento da ordem que receberá e das obrigações inerentes à ordem:
Cuide o Bispo diocesano ou Superior competente que os
candidatos, antes de serem promovidos a alguma ordem, sejam
devidamente instruídos sobre essa ordem e as obrigações inerentes (cf.
1028).
A idoneidade pessoal do ordenando e a ciência devida:
Sejam promovidos às ordens somente aqueles que, segundo o
prudente juízo do Bispo próprio ou do Superior maior competente,
ponderadas todas as circunstâncias, tenham fé integra, sejam movidos
por reta intenção, possuam a ciência devida, gozem de boa reputação e
sejam dotados de integridade de costumes virtudes comprovadas e
outras qualidades físicas e psíquicas correspondentes à ordem a ser
recebida (c. 1029).
A ciência pode ser presumida, uma vez concluídos os estudos exigidos pelo
Direito universal e particular (cf. c. 1032).
A idade canônica e a suficiente maturidade (cf. c. 1031).
Não se confira o presbiterato a quem não tenha completado
vinte e cinco anos de idade e não possua maturidade suficiente,
observando-se o intervalo de ao menos seis meses entre o diaconato e o
presbiterato. Os que se destinam ao presbiterato sejam admitidos à
ordem do diaconato somente depois de terem completado vinte e três
anos de idade (c. 1031 §1).
178
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Impedimentos para receber ou exercer as ordens (cf. cc. 1040-1049):
Impedimentos simples (cessam se desaparece sua causa):
Estão simplesmente impedidos para receber ordens: o homem
casado e o neófito.
Estão simplesmente impedidos para exercer as ordens recebidas:
quem as recebeu ilegitimamente por ter um impedimento e quem
sofre de enfermidade psíquica.
Impedimentos de caráter perpétuo (irregularidades):
São irregulares para receber as ordens: quem padece de
enfermidade psíquica; quem tiver mutilado a si próprio ou
tentado suicídio; quem comete homicídio voluntário ou coopera
positivamente para um aborto; quem tiver tentado matrimônio;
quem tiver exercido um ato de ordem reservado aos que estão
constituídos na ordem do episcopado ou do presbiterato; quem
comete delito de apostasia, heresia ou cisma;
São irregulares para exercer as ordens recebidas: quem foi
ordenado com uma das irregularidades mencionadas.
179
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Requisitos prévios à ordenação:
Ter recebido o sacramento da sagrada confirmação (cf. c. 1033).
Ser previamente admitido entre os candidatos mediante o rito litúrgico de
admissão pela autoridade mencionada nos cânones 1016 e 1019, após prévio
pedido escrito de próprio punho e assinado, e após aceitação escrita dessa
autoridade (cf. c. 1034 §1). Não está obrigado a essa admissão quem estiver
ligado pelos votos a um instituto religioso clerical (§2).
Receber os ministérios de leitor e de acólito e os exercer por tempo
conveniente (cf. c. 1035 §1). Entre a recepção do acolitato e do diaconato,
deve interpor-se o intervalo de ao menos seis meses (§2).
Entregar ao Bispo próprio ou ao Superior maior competente uma declaração
escrita de próprio punho e assinada, no qual ateste que vai receber
espontânea e livremente a ordem sagrada e que pretende dedicar-se
perpetuamente ao ministério eclesiástico e, ao mesmo tempo, pedir para ser
admitido a receber a ordem (cf. c. 1036).
Assumir publicamente perante Deus e a Igreja a obrigação do celibato (cf. c.
1037). Salvo o candidato ao diaconato permanente casado ou quem já emitiu
votos perpétuos em Instituto religioso.
Dedicar-se a exercícios espirituais, ao menos por cinco dias, no lugar e modo
determinados pelo Ordinário (cf. c. 1039).
Prestar juramento de fidelidade (cf. CCDDS. Carta circular de 10/11/1997
sobre os escrutínios).
180
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O MATRIMÔNIO, INSTITUIÇÃO NATURAL E SACRAMENTO DA NOVA
ALIANÇA
O pacto matrimonial, pela qual o homem e mulher constituem
entre si o consórcio de toda a vida, por sua índole natural ordenado ao
bem dos cônjuges e à geração e educação da prole, entre batizados foi
por Cristo Senhor elevado à dignidade de sacramento (c. 1055 §1).
O matrimônio, instituição natural
Dizer que o matrimônio é uma instituição natural significa que:
Tem sua origem na natureza humana;
Não é apenas uma entre múltiplas formas de união sexual entre pessoas, mas
é a forma especificamente humana de desenvolvimento completo da
sexualidade;
É de Direito natural e, por isso, a razão pode descobrir sua lógica intrínseca,
suas exigências morais e jurídicas, enquanto realização especificamente
humana;
Não é uma estrutura imposta por leis para organizar as uniões entre as
pessoas, mas é uma realidade prévia à intervenção (legítima) de qualquer
legislador, que regule o matrimônio com relação à sua dimensão social e à
sua incidência no bem comum.
A essência do matrimônio:
Por isso deixará o homem o pai e a mãe e se unirá à sua mulher,
e eles serão uma só carne (Gn 2,24).
Essa expressão “uma só carne” é recordada por Jesus Cristo no Evangelho (cf.
Mt 19,6) e pelo Concílio Vaticano II (cf. GS 48).
O matrimônio é uma unidade de dois:
a) É uma unidade nas naturezas que comporta uma comunhão de vida e amor;
b) O princípio formal do matrimônio (essência) é o vínculo jurídico;
c) Esse vínculo se caracteriza por três bens: ordenação à prole, unidade e
indissolubilidade.
As propriedades essenciais do matrimônio:
As propriedades essenciais do matrimônio são a unidade e a
indissolubilidade que, no matrimônio cristão, recebem firmeza especial
em virtude do sacramento (c. 1056).
181
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os fins do matrimônio:
O matrimônio está ordenado por sua índole natural ao bem dos cônjuges e à
geração e educação da prole (cf. c. 1055 §1). Fins intimamente relacionados e
coordenados entre si, sem que seja possível separá-los.
Pela união dos esposos realiza-se o duplo fim do matrimônio: o
bem dos cônjuges e a transmissão da vida. Esses dois significados ou
valores do casamento não podem ser separados sem alterar a vida
espiritual do casal e sem comprometer os bens matrimoniais e o futuro
da família. Assim, o amor conjugal entre o homem e a mulher atende à
dupla exigência da fidelidade e da fecundidade (CCE 2363).
O matrimônio, sacramento da nova aliança
O matrimônio tem de específico (com relação aos outros
sacramentos) o ser sacramento de uma realidade que já existe na
economia da criação: o mesmo pacto conjugal instituído pelo Criador
desde o princípio (Exortação Familiaris Consortio, n. 68).
A natureza sacramental do matrimônio supõe:
a) Que a realidade natural descrita anteriormente (essência, propriedades e fins)
é elevada por Jesus Cristo à dignidade de sacramento entre batizados (cf. c.
1055 §1);
b) Que, entre batizados, não pode haver verdadeiro matrimônio natural que não
seja, por isso mesmo, sacramento (cf. 1055 §2);
c) Que a elevação do matrimônio à ordem da graça não anula a natureza, mas a
assume, eleva e aperfeiçoa, santificando-a com eficácia sacramental
específica.
O matrimônio é uma instituição natural, que tem para os batizados uma
dimensão sacramental. Essa sacramentalidade própria do matrimônio dos batizados faz
com que o matrimônio sacramental seja algo mais do que o matrimônio natural. Esse
algo mais não significa justaposição, mas que o matrimônio natural passa a ter uma
nova dimensão e função: a de sacramento.
182
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O princípio de inseparabilidade entre contrato (pacto) e sacramento (letra b):
Portanto, entre batizados não pode haver contrato matrimonial
válido que não seja por isso mesmo sacramento (c. 1055 §2).
O efeito jurídico próprio e imediato do matrimônio não é a graça, mas o vínculo
conjugal cristão (cf. FC 13).
Do matrimônio válido origina-se entre os cônjuges um vínculo
que, por sua natureza, é perpétuo e exclusivo; além disso, no
matrimônio cristão, os cônjuges são robustecidos e como que
consagrados, com o sacramento especial, aos deveres e à dignidade do
seu estado (c. 1134).
O direito de matrimônio (ius connubii)
O direito de contrair matrimônio é um direito natural da pessoa humana e
também um direito fundamental do fiel cristão, no âmbito eclesial (cf. c. 219).
Dois aspectos integram o conteúdo desse direito:
O poder eficiente e exclusivo:
É o consentimento das partes legitimamente manifestado entre
pessoas juridicamente hábeis que faz o matrimônio; esse consentimento
não pode ser suprido por nenhum poder humano (c. 1057 §1).
A liberdade:
Podem contrair matrimônio todos os que não são proibidos pelo
direito (c. 1058).
Ao ordenamento jurídico corresponde não conceder, mas reconhecer esse
direito, como os cc. 1057 e 1058 citados fazem (e genericamente o c. 219).
183
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Conceito-chave
Matrimonium
in fieri
Ato de fazer o
matrimônio
Consentimento Aliança (foedus)
Matrimonium
in facto esse
Estado de vida Realização
existencial
Consórcio (consorcio)
Elementos teológicos constitutivos do sacramento do matrimônio:
Sujeitos: os nubentes.
Ministros: os próprios nubentes.
Sinal sacramental: o próprio matrimônio.
Realidade significada: a união de Jesus Cristo com a Igreja.
Efeito próprio e imediato: o vínculo conjugal elevado e santificado pela graça do
Espírito Santo.
Elementos jurídicos constitutivos do matrimônio canônico enquanto ato:
1. Pessoas juridicamente hábeis;
2. Ato de consentir;
3. Manifestação legítima.
184
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Conceitos
1. Matrimônio válido diante do Direito da Igreja (cf. cânon 1059): trata-se de um
conceito singular. Significa que este matrimônio concreto reúne todos os requisitos
para produzir efeitos jurídicos (contraído entre duas pessoas juridicamente hábeis,
que manifestam seu consentimento na forma da lei).
2. Matrimônio inválido: aquele que não causa efeitos jurídicos, por defeito essencial
do consentimento ou por impedimento dirimente ou por defeito da forma canônica.
3. Matrimônio putativo ou presuntivo (cf. cânon 1061 §3): matrimônio inválido
celebrado de boa fé (ao menos por uma das partes), enquanto ambas as partes não se
certificarem de sua nulidade.
4. Matrimônio tentado: tentativa de matrimônio. Matrimônio inválido (nulo) contraído
de má fé por uma das partes.
5. Matrimônio inexistente: aquele que não existiu o consentimento e não pode, por
conseguinte, ser sanado na sua raiz.
6. Matrimônio público: matrimônio contraído na forma canônica ordinária ou
extraordinária. Há publicidade de fato (notoriedade) ou de direito (pode ser provado
juridicamente). Registro eclesiástico ordinário (por natureza, é público).
7. Matrimônio celebrado secretamente: aquele em que as investigações prévias e a
celebração são mantidos em segredo pelo Ordinário do local, pelo ministro
assistente, pelas testemunhas ordinárias e pelos próprios cônjuges. Registro no
arquivo secreto da Cúria diocesana.
8. Matrimônio natural: matrimônio válido pelo Direito natural.
9. Matrimônio civil (cerimônia civil, nunca matrimônio civil para católicos): entre
católicos, tem efeitos jurídicos apenas no Estado.
10. Matrimônio canônico: matrimônio celebrado de acordo com a forma canônica. Tem
efeitos jurídicos na Igreja e em alguns Estados em virtude do Direito concordatário.
11. Matrimônio ratificado pelo sacramento: matrimônio válido entre batizados.
12. Adquire uma dimensão nova dada pelo sacramento.
13. Matrimônio consumado pelo ato conjugal: se os cônjuges realizarem entre si, de
modo humano, o ato conjugal apto por si para a geração da prole (cf. cânon 1061
§1).
185
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O REGIME CANONICO DO MATRIMONIO
O cuidado pastoral
Os pastores de almas têm a obrigação de cuidar que a própria
comunidade eclesial preste assistência aos fiéis, para que o estado
matrimonial se mantenha no espírito cristão e progrida na perfeição.
Essa assistência deve prestar-se, sobretudo:
1° - pela pregação, pela catequese apropriada aos menores, aos jovens e
adultos, mesmo com o uso dos meios de comunicação social, com que
sejam os fiéis instruídos sobre o sentido do matrimônio e o papel dos
cônjuges e pais cristãos;
2° - com a preparação pessoal para contrair matrimônio, pela qual os
noivos se disponham para a santidade e deveres do seu novo estado;
3° - com a frutuosa celebração litúrgica do matrimônio, pela qual se
manifeste claramente que os cônjuges simbolizam o mistério da unidade
e do amor fecundado entre Cristo e a Igreja, e dele participam;
4° - com o auxílio prestado aos casados para que, guardando e
defendendo fielmente a aliança conjugal, cheguem a levar na família
uma vida cada vez mais santa e plena (c. 1063).
Etapas:
Preparação remota para o casamento: catequese de crianças, jovens e adultos
(dar conceitos e transmitir valores);
Preparação próxima para o casamento: o noivado. Oportunidade para a
catequese pré-matrimonial;
Celebração litúrgica do matrimônio;
Pastoral pós-matrimonial (pós-celebração).
Sobre as etapas da pastoral familiar, vide Exortação apostólica Familiaris
consortio, nn. 65-69.
186
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O processo de habilitação matrimonial
Antes da celebração do matrimônio, deve constar que nada
impede a sua válida e lícita celebração (c. 1066).
Finalidade:
Recolher os dados pessoais dos nubentes e averiguar claramente a ausência
de impedimentos para a celebração válida e lícita do matrimônio;
Adquirir certeza moral sobre a liberdade do consentimento que os nubentes
deverão prestar;
Verificar e, se necessário, suprir o grau de instrução suficiente dos noivos
acerca da doutrina católica sobre o matrimônio.
Etapas:
Os documentos a serem apresentados: formulário devidamente preenchido,
contendo dados pessoais e declaração assinada pelos nubentes que não estão
detidos por qualquer impedimento ou proibição e que aceitam o sacramento
do matrimônio, tal como a Igreja o entende. Além disso:
a) Certidão de batismo;
b) Atestado de óbito do cônjuge anterior (se for o caso);
c) Comprovante de habilitação para o casamento civil;
d) Outros documentos eventualmente necessários.
Os proclamas: Faça-se a publicação do futuro matrimônio. A forma escrita é
mais apropriada (quadro de avisos na entrada do templo, boletim paroquial).
O exame dos noivos: Uma conversa franca e informal com cada um dos
noivos em separado e com os dois reunidos.
A instrução sobre o matrimônio (catequese pré-matrimonial): Em geral, o
denominado curso de noivos (encontro de noivos).
187
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O resultado do processo de habilitação matrimonial:
Não aparece nenhum impedimento: proceda-se à celebração.
Aparece um impedimento certo:
Dispensável: procure-se a dispensa;
Não dispensável: com prudência pastoral, informe-se os noivos da
impossibilidade da celebração.
Aparece um impedimento duvidoso:
Na dúvida de direito: prevalece o princípio da liberdade.
Na dúvida de fato:
a) Impedimento de direito eclesiástico: procure-se a dispensa
ad cautelam;
b) Impedimento de direito natural: prevalece o princípio de
liberdade. Exceto nos seguintes casos: impedimento de
impotência (c. 1084 §2), impedimento de vínculo (c. 1085
§2), impedimento de consangüinidade na linha reta ou no
segundo grau da linha colateral (c. 1091 §4).
188
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
As proibições do cânon 1071
O cânon 1071 enumera sete hipóteses em que, “fora do caso de necessidade”, se
proíbe que alguém assista, ou seja, atue em representação da Igreja (proibição dirigida
ao ministro assistente), num casamento sem a licença do Ordinário local.
1) O matrimônio de vagantes: a razão da proibição é evitar a possibilidade de
fraude;
2) O matrimônio que não possa ser reconhecido ou celebrado civilmente: a
razão da proibição é assegurar os direitos da família também no âmbito civil
(vide CNBB, Documento 12, p.11);
3) O matrimônio de quem tem obrigações naturais, originadas de união
precedente, para com outra parte ou para com filhos;
4) O matrimônio de quem tenha abandonado notoriamente a fé católica:
Abandonar a fé não significa aderir a outra confissão religiosa, mas
consiste na recusa positiva da fé (“não sou católico”, “não creio na Igreja”).
5) O matrimônio de quem esteja sob uma censura:
Conceito de censura: pena medicinal (aquela que procura em primeiro
lugar a emenda do delinqüente), mediante a qual a pessoa batizada fica privada
de alguns bens espirituais ou anexos aos espirituais, até que, desistindo de sua
atitude reprovável, seja absolvida.
Tipos de censura: excomunhão, interdito e suspensão.
No caso do direito matrimonial, a suspensão não entra em questão,
porque só pode ser aplicada a clérigos (impedimento de ordem sagrada).
6) O matrimônio de um menor, sem o conhecimento ou contra a vontade
razoável de seus pais (maioridade 18 anos);
7) O matrimônio a ser contraído por procurador, mencionado no cânon 1105.
189
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os impedimentos matrimoniais
Os impedimentos em geral:
Os impedimentos são circunstâncias objetivas tipificadas pelo Direito como
inabilitantes da pessoa (cf. c. 10) para contrair matrimônio validamente (cf. c. 1073).
O impedimento dirimente torna a pessoa inábil para contrair
validamente o matrimônio (c. 1073).
Apenas a autoridade suprema da Igreja pode tipificar (classificar em tipos)
impedimentos matrimoniais:
Pode declarar que uma circunstância faz nulo o matrimônio por Direito
divino;
Pode estabelecer novos impedimentos por Direito eclesiástico.
Compete exclusivamente à autoridade suprema da Igreja
declarar autenticamente em que casos o direito divino proíbe ou dirime
o matrimônio (c. 1075 §1).
Considera-se público o impedimento que se pode provar no foro
externo; caso contrário, é oculto (c. 1074).
Classificação dos impedimentos:
1. De Direito divino (natural ou revelado);
2. De Direito eclesiástico;
3. Público: que pode se provar no foro externo;
4. Oculto: que não se pode provar ou que, de fato, não tem divulgação;
5. Dirimente: que afeta a validade;
6. Impediente: que afeta a licitude.
Atenção: No CIC 1983, todos os impedimentos matrimoniais são dirimentes.
190
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os impedimentos em particular:
1. Idade
2. Impotência
3. Disparidade de culto
4. Vínculo
5. Ordem sagrada
6. Voto
7. Rapto
8. Crime
9. Parentesco: consanguinidade, afinidade, honestidade pública, parentesco
legal
Dispensa dos impedimentos:
A dispensa é relaxação de uma lei meramente eclesiástica num caso particular,
concedida pela autoridade competente (cf. c. 85).
É sempre um ato singular. Não há dispensas de caráter geral.
Autoridade competente para dispensar dos impedimentos matrimoniais:
O Ordinário local pode dispensar os seus súditos, onde quer que
se encontrem, e todos os que se acham no seu território, de todos os
impedimentos de direito eclesiástico, exceto aqueles cuja dispensa se
reserva à Sé Apostólica (c. 1078 §1).
Os impedimentos cuja dispensa se reserva à Sé Apostólica são:
1° - o impedimento proveniente de ordens sagradas ou do voto público
perpétuo de castidade num instituto religioso de direito pontifício;
2° - o impedimento de crime mencionado no cânon 1090 (§2).
Nunca se dá dispensa do impedimento de consanguinidade em
linha reta ou no segundo grau da linha colateral (§3).
191
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Impedimento de idade
Cânon 1083 § 1. O homem antes dos dezesseis anos completos
e a mulher antes dos catorze também completos não podem contrair
matrimônio válido.
§ 2. Compete a conferência dos Bispos estabelecer uma idade
superior para a celebração lícita do matrimônio.
Impedimento de impotência
Cânon 1084 § 1. A impotência para copular, antecedente e
perpétua, absoluta ou relativa, por parte do homem ou da mulher, dirime
o matrimônio por sua própria natureza.
§ 2. Se o impedimento de impotência for duvidoso, por dúvida
quer de direito quer de fato, não se pode impedir o matrimônio nem,
permanecendo a dúvida, declará-lo nulo.
§ 3. A esterilidade não proíbe nem dirime o matrimônio, salva a
prescrição do c. 1098.
Impedimento de vínculo
Cânon 1085 § 1. Tenta invalidamente contrair matrimônio
quem está ligado pelo vínculo de matrimônio anterior, mesmo que este
matrimônio não tenha sido consumado.
§ 2. Ainda que o matrimônio anterior tenha sido nulo ou
dissolvido por qualquer causa, não é lícito contrair outro, antes que
conste legitimamente e com certeza a nulidade ou a dissolução do
primeiro.
O c. 1085 proíbe a poligamia. Estabelece que o sujeito que está ligado por um
vínculo matrimonial não pode contrair matrimônio com terceira pessoa sob pena de
nulidade. O fundamento desse impedimento é a igualdade entre homem e mulher. O
impedimento de vínculo não pode ser dispensado.
Sobre a dissolução do vínculo matrimonial, ver adiante.
192
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Impedimento de disparidade de culto
Cânon 1086 § 1. É inválido o matrimônio entre duas pessoas,
uma das quais tenha sido batizada na Igreja católica ou nela recebida e
que não a tenha abandonado por um ato formal, e outra não é batizada.
§ 2. Não se dispense desse impedimento, a não ser cumpridas as
condições mencionadas nos cc. 1125 e 1126.
§ 3. Se, no tempo em que se contraiu matrimônio, uma parte era
tida comumente como batizada ou seu batismo era duvidoso, deve-se
presumir a validade do matrimônio, de acordo com o c. 1060, até que se
prove com certeza que uma das partes era batizada e a outra não.
Impedimentos de acatolicidade:
a) O c. 1086 proíbe com caráter dirimente que um cristão católico contraia
matrimônio com pessoa não batizada;
b) O c. 1124 proíbe que (sem licença do Ordinário local) se celebre matrimônio
entre um cristão católico e um cristão não católico.
c) O c. 1071 §1, 4º proíbe que (sem licença do Ordinário local) se celebre
matrimônio quando um dos contraentes abandonou notoriamente a fé
católica.
O conceito de “católico” presente no CIC 1983:
O c. 11 entende por católico aquela pessoa que foi batizada na Igreja católica ou
batizada fora da Igreja católica posteriormente foi nela recebida. A esse conceito é
aplicável o aforismo semel catholicus semper catholicus, ou seja, quem em algum
momento da sua vida foi católico será sempre considerado como católico.
Os cc. 1086 e 1124 proporcionavam outra acepção do conceito de católico. O
Papa Bento XVI, porém, eliminou essa hipótese.
O c. 1071 §1, 4º tem em conta a adesão interna à religião católica, mas apenas no
caso de notoriedade (notório: aquilo que pode ser provado).
193
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Impedimento de ordem
Cânon 1087. Tentam invalidamente o matrimônio os que
receberam ordens sagradas.
Impedimento de voto
Cânon 1088. Tentam invalidamente o matrimônio os que estão
ligados por voto público perpétuo de castidade num instituto religioso.
Impedimento de rapto
Cânon 1089. Entre um homem e uma mulher arrebatada
violentamente ou retida com intuito de casamento, não pode existir
matrimônio, a não ser que depois a mulher, separada do raptor e
colocada em lugar seguro e livre, escolhe espontaneamente o
matrimônio.
Impedimento de crime
Cânon 1090 § 1. Quem, com o intuito de contrair matrimônio
com determinada pessoa, tiver causado a morte do cônjuge desta, ou do
próprio cônjuge, tenta invalidamente este matrimônio.
§ 2. Tentam invalidamente o matrimônio entre si também
aqueles que, por mútua cooperação física ou moral, causaram a morte
do cônjuge.
194
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Impedimento de consanguinidade
Cânon 1091 § 1. Na linha reta de consanguinidade, é nulo o
matrimônio entre todos os ascendentes e descendentes, tanto legítimos
como naturais.
§ 2. Na linha colateral, é nulo o matrimônio até o quarto grau
inclusive.
§ 3. O impedimento de consanguinidade não se multiplica.
§ 4. Nunca se permita o matrimônio, havendo alguma dúvida se
as partes são consanguíneas em algum grau de linha reta ou no segundo
grau da linha colateral.
Impedimento de afinidade
Cânon 1092 A afinidade em linha reta torna nulo o matrimônio
em qualquer grau.
Impedimento de honestidade pública
Cânon 1093. O impedimento de honestidade pública origina-se
de matrimônio inválido, depois de instaurada a vida comum, ou de um
concubinato notório e público; e torna nulo o matrimônio no primeiro
grau da linha reta entre o homem e as consangüíneas da mulher, e vice-
versa.
Impedimento de parentesco legal
Cânon 1094. Não podem contrair validamente matrimônio os
que estão ligados por parentesco legal surgido de adoção, em linha reta
ou no segundo grau da linha colateral.
195
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O consentimento matrimonial
O consentimento matrimonial é o ato de vontade pelo qual um
homem e uma mulher, por aliança irrevogável, se entregam e se
recebem mutuamente para constituir matrimônio (c. 1057 §2).
É de grande importância para o Direito regular a celebração válida do
matrimônio (matrimônio in fieri), porque do pacto matrimonial válido nasce o vínculo
matrimonial, pelo qual os cônjuges passam a ser matrimônio (matrimônio in facto esse),
com direitos e deveres mútuos, perpétuos e exclusivos.
Uma vez prestado o consentimento matrimonial com os devidos requisitos:
O matrimônio goza do favor do direito; portanto, em caso de
dúvida, deve-se estar pela validade do matrimônio, enquanto não se
prova o contrário (c. 1060).
Anomalias do consentimento Cânon
Incapacidade 1095
Vícios (defeitos) 1096-1107
Incapacidade consensual:
São incapazes de contrair matrimônio:
1°- os que não têm suficiente uso da razão;
2°- os que têm grave falta de discrição de juízo a respeito dos direitos e
obrigações essenciais do matrimônio, que se devem mutuamente dar e
receber;
3°- Os que não são capazes de assumir as obrigações essenciais do
matrimônio, por causas de natureza psíquica (c. 1095).
O objetivo do legislador é definir a capacidade para o consentimento e
estabelecer critérios jurídicos para medir seu defeito. O c. 1095 estabelece três critérios
de valor normativo de significação jurídica: o uso da razão, a discrição de juízo e a
capacidade de assumir os deveres conjugais essenciais.
196
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Noção de capacidade consensual: Goza de capacidade de contrair matrimônio o
sujeito que, além do uso da razão necessário para o ato humano das núpcias, tem
discrição de juízo sobre os direitos e deveres conjugais, que se dão e de aceitam ao
fundar o vínculo conjugal, e capacidade de assumir as obrigações essenciais do
matrimônio, pelas quais o consórcio tende aos seus fins objetivos ao longo de toda a
existência do matrimônio. Uso da razão, discrição de juízo e capacidade de assumir
definem o conteúdo da capacidade consensual. Quem os possui é capaz. O
consentimento que os contêm é válido.
Carência de suficiente uso da razão: por falta de desenvolvimento psíquico
suficiente (crianças), por transtorno permanente (congênito ou adquirido),
por transtorno transitório (p. ex. uso de drogas).
Grave defeito de discrição de juízo sobre os direitos e deveres essenciais do
matrimônio: a discrição de juízo significa conhecimento prático,
discernimento, saber ponderar as coisas, porque deve haver uma adequada
proporcionalidade entre as obrigações conjugais e a capacidade de entendê-
las e querê-las por parte do contraente.
Incapacidade de assumir, por causas de natureza psíquica, as obrigações
essenciais do matrimônio: a expressão “causas de natureza psíquica” tem
sentido patológico. É necessária a intervenção de peritos (psiquiatras).
Observação: os transtornos psíquicos que produzem esse tipo de
incapacidade podem afetar mais ou menos o uso da razão, impedir mais ou
menos o discernimento, mas sempre causam incapacidade patológica de
assumir as obrigações essenciais do matrimônio.
Suposto de fato: literalmente “figura do fato” (facti species). Situação de
fato da qual a norma positiva faz derivar determinadas consequências
jurídicas.
197
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Vícios do consentimento:
o Os vícios que incidem sobre o entendimento:
1.1 – Ignorância (cf. c. 1096)
1.2 – Erro:
1.2.1 Erro sobre a instituição matrimonial (cf. c. 1099)
1.2.2 Erro sobre a pessoa (cf. c. 1097)
1.2.3 Erro doloso (cf. c. 1098)
o Os vícios que incidem sobre a vontade:
2.1 – Simulação (cf. c. 1101):
2.2 – Violência física e medo (cf. c. 1103):
2.3 – Condição (cf. c. 1102):
A ignorância
Cânon 1096 § 1. Para que possa haver consentimento
matrimonial, é necessário que os contraentes não ignorem, pelo menos,
que o matrimônio é um consórcio permanente entre homem e mulher,
ordenado à procriação da prole por meio de alguma cooperação sexual.
§ 2. Essa ignorância não se presume depois da puberdade.
O erro sobre a instituição matrimonial
Cânon 1099 O erro a respeito da unidade, da indissolubilidade
ou da dignidade sacramental do matrimônio, contanto que não
determine a vontade, não vicia o consentimento matrimonial.
O erro sobre a pessoa
Cânon 1097 § 1. O erro de pessoa torna inválido o matrimônio.
O erro sobre qualidade
§ 2. O erro de qualidade da pessoa, embora seja causa do
contrato, não torna nulo o matrimônio, salvo se essa qualidade for direta
e principalmente visada.
198
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O erro doloso Cânon 1098 Quem contrai matrimônio, enganado por dolo
perpetrado para obter o consentimento matrimonial, a respeito de
alguma qualidade da outra parte, e essa qualidade, por sua natureza,
possa perturbar gravemente o consórcio da vida conjugal, contrai
invalidamente.
O consentimento simulado
Presume-se que o consentimento interno está em conformidade
com as palavras ou com os sinais empregados na celebração do
matrimônio (c. 1101 §1).
Contudo, se uma das partes ou ambas, por ato positivo de
vontade, excluem o próprio matrimônio, algum elemento essencial do
matrimônio ou alguma propriedade essencial, contraem invalidamente
(§2).
As diversas hipóteses de simulação ou restrição do consentimento são as
seguintes:
Exclusão do próprio matrimônio (simulação total): a comunhão de vida.
Mais do que um vício, é ausência de consentimento;
Exclusão de algum elemento essencial do matrimônio: o bem dos cônjuges, a
geração da prole ou a educação da prole;
Exclusão de alguma das propriedades essenciais do matrimônio: a unidade
ou a indissolubilidade.
O consentimento coagido
Cânon 1103 É inválido o matrimônio contraído por violência ou
por medo grave proveniente de causa externa, ainda que incutido não
propositadamente, para se livrar do qual alguém seja forçado a escolher
o matrimônio.
O consentimento sob condição
Cânon 1102 § 1. Não se pode contrair validamente o
matrimônio sob condição de futuro.
§ 2. O matrimônio contraído sob condição de passado ou de
presente é válido ou não, conforme exista ou não aquilo que é objeto da
condição.
§ 3. Todavia, a condição, mencionada no § 2, não pode
licitamente ser colocada sem a licença escrita do Ordinário local.
199
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A forma canônica de celebração do matrimônio
o Declaração de vontade diante de um representante da hierarquia
eclesiástica e de suas testemunhas (cf. c. 1108);
o Forma comutada (c. 1127 §2);
o Declaração de vontade diante de duas testemunhas (c. 1116);
o Declaração de vontade diante do Ordinário local ou de presbítero
delegado por este (cf. normas CDF de 13/1/1971);
o Declaração de vontade diante de um ministro ordenado cristão (c. 1127
§1)
Forma ordinária de celebração do matrimônio
Somente são válidos os matrimônios contraídos perante o
Ordinário local ou o pároco, ou um sacerdote ou diácono delegado por
qualquer um dos dois como assistente, e, além disso, perante duas
testemunhas, de acordo porém com as normas estabelecidas nos
cânones seguintes, e salvas as exceções contidas nos cânones 144, 1112,
§ 1, 1116 e 1127, §§ 2-3 (c. 1108 §1).
Considera-se assistente do matrimônio somente aquele que,
estando presente, solicita a manifestação do consentimento dos
contraentes, e a recebe em nome da Igreja (§2).
A forma jurídica substancial: manifestação e recepção do consentimento.
Elementos da forma canônica ordinária de celebração:
A presença dos contraentes;
A expressão verbal do consentimento (cf. c. 1104);
A presença e atuação do ministro assistente;
A presença das testemunhas ordinárias (cf. c. 1108).
Atenção: a observância da forma canônica de celebração é necessária para a
validade do matrimônio.
Quem está obrigado à forma canônica:
A forma acima estabelecida deve ser observada, se ao menos
uma das partes contraentes tiver sido batizada na Igreja católica ou nela
tenha sido recebida, salvas as prescrições do cânon 1127 §2 (c. 1117).
Há uma importante exceção: o caso em que um cristão católico contrai
matrimônio com um cristão oriental não católico (cf. c. 1127 §1).
200
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Dispensa da forma canônica, no caso dos matrimônios mistos:
Se graves dificuldades obstam à observância da forma canônica,
é direito do Ordinário local da parte católica dispensar dela em cada
caso, consultado, porém o Ordinário do lugar onde se celebra o
matrimônio e salva, para a validade, alguma forma pública de
celebração; compete à Conferência dos Bispos estabelecer normas,
pelas quais se conceda a dispensa de modo concorde (c. 1078 §2).
Celebração em forma canônica extraordinária:
Se não é possível, sem grave incômodo, ter o assistente
competente de acordo com o direito, ou não sendo possível ir a ele, os
que pretendem contrair verdadeiro matrimônio podem contraí-lo válida
e licitamente só perante as testemunhas:
1°- em perigo de morte;
2°- fora de perigo de morte, contanto que prudentemente se preveja que
esse estado de coisas vai durar por um mês (c. 1116 §1).
Declaração de vontade diante de um ministro ordenado cristão
Cânon 1127 § 1. No que se refere à forma a ser empregada nos
matrimônios mistos, observem-se as prescrições do c. 1108; mas, se a
parte católica contrai matrimônio com outra parte não-católica de rito
oriental, a forma canônica deve ser observada só para a liceidade; para a
validade, porém, requer-se a intervenção de um ministro sagrado,
observando-se as outras prescrições do direito.
A forma comutada
§ 2. Se graves dificuldades obstam à observância da forma
canônica, é direito do Ordinário local da parte católica dispensar dela
em cada caso, consultado, porém o Ordinário do lugar onde se celebra o
matrimônio e salva, para a validade, alguma forma pública de
celebração; compete à Conferência dos Bispos estabelecer normas,
pelas quais se conceda a dispensa de modo concorde.
A forma canônica de celebração do matrimônio pode ser substituída por outra
forma pública de celebração, quando um dos contraentes não é católico e existem
dificuldades graves para utilizar a forma canônica.
A forma litúrgica do matrimônio:
Sejam observados os ritos litúrgicos para a licitude (cf. cânones 1119-1120).
201
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A revalidação do matrimônio
O matrimônio pode resultar nulo por três motivos fundamentais:
Impedimento dirimente (lei inabilitante da pessoa);
Consentimento:
Incapacidade consensual (lei inabilitante da pessoa);
Vício do consentimento (lei irritante do ato jurídico);
Falta de forma canônica (lei irritante do ato jurídico).
Se um matrimônio for celebrado invalidamente por algum motivo, pode ser
instaurado o processo judicial para a declaração de nulidade. Muitas vezes, porém, essa
não é a atuação mais adequada.
Antes de aceitar a causa e sempre que percebe esperança de
sucesso, o juiz use meios pastorais a fim de que os cônjuges sejam
levados a convalidar eventualmente o matrimônio e restabelecer a
convivência conjugal (c. 1676).
Com essa finalidade, o CIC 1983 regula:
A convalidação simples (cf. cc. 1156-1160): é um ato de renovação do
consentimento por parte de um ou dos dois cônjuges, com ou sem nova
celebração. A convalidação simples é um instituto de foro interno. Não é
necessária publicidade, nem prova da sua realização. Sua função é
tranqüilizar a consciência de quem julga acertada ou equivocadamente que
seu matrimônio é nulo, mas não pode provar a sua consideração diante do
Tribunal eclesiástico.
A sanação na raiz (sanatio in radice) (cf. cc. 1161-1165): é um ato
administrativo de dispensa (graça) pelo qual a autoridade competente
concede validade a um matrimônio nulo. A autoridade eclesiástica dispensa
das leis meramente eclesiásticas, que impedem que o consentimento dos
contraentes produza o vínculo matrimonial.
202
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Convalidação simples Sanação radical
Matrimônio nulo por defeito do
consentimento ou por impedimento.
Matrimônio nulo por defeito de forma
canônica ou por impedimento.
Há renovação do consentimento com
novo ato da vontade.
Revalidação do matrimônio, sem
renovação do consentimento.
A autoridade competente concede
dispensa da forma canônica e do
impedimento a posteriori.
Retroagem alguns efeitos jurídicos do
matrimônio (fundamentalmente a
filiação legítima dos filhos).
Alguns aspectos particulares da relação jurídica matrimonial:
O CIC 1983 descreve em parte o conteúdo essencial da relação jurídica
matrimonial nos cc. 1134-1140 (efeitos jurídicos do matrimônio).
A relação mútua entre os cônjuges: o vínculo matrimonial é único, perpétuo,
exclusivo e mútuo.
A relação dos cônjuges com a prole: o dever da paternidade responsável.
A relação entre os cônjuges e a comunidade eclesial: os cônjuges têm o
dever de testemunhar a união de Jesus Cristo com a Igreja e o direito de
receber ajuda da comunidade. A comunidade, por sua vez, tem a obrigação
de ajudar os esposos a cumprir o seu dever.
203
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A dissolução do matrimônio
O matrimônio pode ser dissolvido:
a) Por morte;
b) Por não consumação, cf. procedimento previsto nos cc. 1697-1706;
c) Por procedimento denominado privilégio paulino (cf. cc. 1143-1147);
d) Por procedimento previsto no c. 1148;
e) Por procedimento previsto no c. 1149.
O matrimônio não consumado:
O matrimônio não consumado entre batizados, ou entre uma
parte batizada e outra não-batizada, pode ser dissolvido pelo Romano
Pontífice por justa causa, a pedido de ambas as partes ou de uma delas,
mesmo que a outra se oponha (c. 1142).
O privilégio paulino:
O matrimônio celebrado entre dois não batizados dissolve-se
pelo privilégio paulino, em favor da fé da parte que recebeu o batismo,
pelo próprio fato de esta parte contrair novo matrimônio, contanto que a
parte não-batizada se afaste (c. 1143 §1).
Considera-se que a parte não-batizada se afasta, se não quer
coabitar com a parte batizada, ou se não quer coabitar com ela
pacificamente sem ofensa ao Criador, a não ser que esta, após receber o
batismo, lhe tenha dado justo motivo para se afastar (§2).
204
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Quadro resumo
Cânon 1055: o pacto matrimonial.
Cânon 1057: o consentimento.
Ato jurídico
Pessoas juridicamente
hábeis
Capacidade legal da pessoa Impedimentos
cc.1083-1094
Consentimento
Capacidade de consentir Incapacidade consensual
c.1095
Ato de consentir Defeitos (vícios)
cc.1096-1107
Manifestação legítima
do consentimento
Forma de celebração
Falta da forma canônica
cc.1108-1123
Capacidade consensual Incapacidade
Uso da razão Razão teórica Ex parte rationis
Discrição de juízo Razão prática
Capacidade de assumir Vontade livre Ex parte voluntatis
Observação: há interdependência das faculdades da inteligência e da vontade no
ato livre. A vontade move o entendimento a deliberar e também põe fim ao juízo prático
do entendimento.
205
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
PARTE III – MISSÃO DA IGREJA
FUNÇÃO DE REGIME (ASPECTOS PARTICULARES)
OS BENS TEMPORAIS DA IGREJA
Os princípios fundamentais
1. Os bens temporais estão a serviço da missão da Igreja:
A Igreja católica, por direito originário, independentemente da
autoridade civil, pode adquirir, possuir, administrar e alienar bens
temporais, para a consecução de seus fins próprios (c. 1254 §1).
Direito originário e independente do Estado, mas não absoluto. A capacidade
patrimonial da Igreja não se justifica por fins de influência temporal (cf. GS 42).
Seus principais fins próprios são: organizar o culto divino,
cuidar do conveniente sustento do clero e dos demais ministros, praticar
obras de sagrado apostolado e de caridade, principalmente em favor dos
pobres (c. 1254 §2).
2. Os sujeitos com capacidade patrimonial:
A Igreja universal e a Sé Apostólica;
As demais pessoas jurídicas públicas (circunscrições eclesiásticas, paróquias,
seminários, institutos de vida consagrada e sociedades de vida apostólica,
associações públicas);
As pessoas jurídicas privadas (cf. c. 1255).
3. Os bens eclesiásticos:
Todos os bens temporais pertencentes à Igreja universal, à Sé
Apostólica ou a outras pessoas jurídicas públicas na Igreja são bens
eclesiásticos e se regem pelos cânones seguintes e pelos estatutos
próprios (c. 1257 §1).
Os bens temporais de uma pessoa jurídica privada se regem
pelos estatutos próprios e não por estes cânones, salvo expressa
determinação em contrário (§2).
206
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Administração significa gerenciamento de recursos para atingir objetivos:
1. Recursos humanos: pessoas.
2. Recursos materiais: bens temporais.
2.1 Aquisição
2.2 Conservação
2.3 Alienação
Organização econômica da sustentação dos ministros ordenados
Entregues ao serviço de Deus, pelo desempenho do cargo que
lhes foi confiado, os presbíteros são merecedores da justa recompensa,
visto que «o operário é digno do seu salário» (Lc 10,7) e «o Senhor
ordenou àqueles que anunciam o Evangelho, que vivam do Evangelho»
(1 Cor 9,14).
A remuneração, porém, a receber por cada um, tendo em conta
a natureza do múnus e as circunstâncias dos tempos e dos lugares, seja
fundamentalmente a mesma para todos aqueles que se encontrem nas
mesmas condições, e proporcional à sua situação, que lhes permita,
além disso, não só prover devidamente à remuneração daqueles que se
encontram ao seu serviço, mas também auxiliar por si mesmos de algum
modo aos pobres, já que nos primeiros tempos a Igreja teve sempre em
grande conta o serviço dos pobres. Esta remuneração deve, além disso,
ser tal, que permita aos presbíteros, todos os anos, ter algum tempo de
férias, justo e suficiente, que os Bispos devem fazer que lhes seja
possível.
É necessário, todavia, dar a principal importância à missão que
os ministros sagrados desempenham. Por isso, o chamado sistema
beneficial seja abandonado ou, pelo menos, seja reformado de tal
maneira que a parte beneficial ou o direito aos rendimentos anexos, se
considere secundário, e se dê de direito o lugar de primazia ao próprio
ofício eclesiástico, que, de futuro, se deve entender como qualquer
múnus conferido estavelmente a exercer com um fim espiritual (PO 20).
Relação entre ofício e benefício: o sistema de benefícios eclesiásticos tendia a
deixar em segundo plano o sentido espiritual e pastoral do serviço do ministro
ordenado, concretizado no ofício.
A reforma exigida pelo Concílio Vaticano II é acolhida pelo CIC 1983.
207
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Haja em cada diocese um instituto especial que, recolhendo os
bens ou as ofertas, providencie, de acordo com o cânon 281, o sustento
dos clérigos que prestam serviço à diocese, a não ser que de outro modo
se tenha providenciado em favor deles (c. 1274 §1).
Onde a previdência social em favor do clero não está
devidamente constituída, cuide a Conferência dos Bispos que haja um
instituto, com o qual se providencie devidamente à seguridade social
dos clérigos (§2).
Em cada diocese constitua-se, enquanto necessário, um
patrimônio comum, com o qual os bispos possam satisfazer às
obrigações para com outras pessoas que estejam, a serviço da Igreja,
acudir às diversas necessidades da diocese, e por meio do qual as
dioceses mais ricas possam também socorrer as mais pobres (§3).
Toda Diocese tem o dever jurídico de constituir três fundos:
a) Fundo para o sustento do clero;
b) Fundo para a previdência social do clero;
c) Fundo comum diocesano para o sustento de outras pessoas que estão a
serviço da Igreja e para atender a outras necessidades da diocese, ajudando
também as dioceses mais pobres.
CIC 1983: BENS TEMPORAIS (cc. 1254-1310)
Aquisição dos bens (cc. 1259-1272)
Administração dos bens (cc. 1273-1289)
Contratos e alienação (cc. 1290-1298)
Vontades e fundações pias (cc. 1299-1310)
208
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A TUTELA PENAL DA COMUNHÃO ECLESIAL
O Direito penal no âmbito da função pastoral
A função de governo inclui também o direito de punir (ius puniendi). Faz parte
do poder de regime o poder de impor racionalmente sanções proporcionais aos delitos
cometidos, a fim de proteger bens jurídicos relevantes, quando isso é exigido pelo bem
comum da Igreja e o bem espiritual do fiel cristão infrator.
A Igreja tem o direito nativo e próprio de punir com sanções
penais os fiéis delinqüentes (c. 1311).
Os fins que justificam o emprego de meios de coerção na Igreja:
O Ordinário só se decida a promover o procedimento judicial ou
administrativo para infligir ou declarar penas, quando vir que nem com
a correção fraterna, nem com a repreensão, nem através de outras vias
de solicitude pastoral, se pode reparar suficientemente o escândalo,
restabelecer a justiça e corrigir o réu (c. 1341).
Os três fins:
Reparar o escândalo;
Restabelecer a justiça;
Corrigir o réu.
Atenção: a imposição está incluída entre os recursos próprios da solicitude
pastoral. É, no entanto, o último recurso.
Conceito e elementos do delito
O delito é a violação externa e moralmente imputável de uma lei ou preceito que
tem anexa uma sanção penal.
Elementos:
Infração externa de uma lei ou preceito (elemento objetivo);
Infração gravemente imputável a quem a cometeu, por dolo ou por culpa
(elemento subjetivo);
Infração classificada como delito e castigada com pena por uma norma
jurídica (elemento legal).
209
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Tipos de sanções canônicas
1. Penas medicinais ou censuras: Toda pena canônica é medicinal, porque se
orienta para a emenda do delinqüente e a seu bem espiritual. Esse aspecto
está especialmente ressaltado nas censuras.
Por ordem crescente de gravidade, as censuras (cf. cc. 1331-1333) são:
o Suspensão: pode ser imposta apenas aos clérigos. O ministro
ordenado fica proibido de exercer (total ou parcialmente) o poder de
ordem, o poder de regime ou o ofício. Seu direito de receber certos
bens fica suspenso;
o Interdito: o réu fica proibido de participar da liturgia ou receber os
sacramentos. Isso não afeta, porém, a sua comunhão jurídica com a
Igreja, nem o impede de exercer certas funções;
o Excomunhão: o réu é excluído juridicamente da comunhão
eclesiástica em certa medida (não pode celebrar sacramentos e
sacramentais, nem receber os sacramentos, nem participar como
ministro em qualquer ato de culto, nem desempenhar ofícios,
ministérios ou cargos eclesiásticos, nem tampouco realizar atos de
poder de regime).
2. Penas expiatórias: aqui são buscados mais diretamente os aspectos do
restabelecimento da justiça e da reparação do escândalo causado pelo delito.
Diferentemente das censuras, podem ser perpétuas ou ser impostas por um
tempo determinado ou indeterminado.
3. Remédios penais e penitências: os remédios penais são dirigidos à prevenção
do delito. São a admoestação e a repreensão. As penitências consistem no
mandato de realizar uma obra de caridade ou de piedade. Podem ser usadas
para substituir uma pena ou para agravar uma pena.
Observação:
Imputabilidade: significa que a responsabilidade de uma infração pode ser
atribuída formalmente, ou seja, enquanto delito, ao seu ator;
Culpa: omissão da devida diligência;
Dolo: intenção deliberada de infringir a norma jurídica.
210
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Delitos e penas tipificados no CIC 1983
Cânones
Delitos contra a religião e a
unidade da Igreja
1364-1369
Delitos contra as
autoridades eclesiásticas e
contra a liberdade da Igreja
1370-1377
Usurpação de funções
eclesiásticas e delitos em
seu exercício
1378-1389
Crime de falsidade
1390-1391
Delitos contra obrigações
especiais
1392-1396
Delitos contra a vida e a
liberdade do homem
1397-1398
As garantias jurídicas e os recursos em matéria penal
Toda atuação penal tem caráter de último recurso. O Direito considera odiosa
(em sentido técnico) a matéria penal, na medida em que pode afetar gravemente a
situação jurídica das pessoas, a sua fama e a sua dignidade.
Por essa razão, cada um dos momentos da atividade jurídica penal está sujeito a
limitações e requisitos de procedimento, estabelecidos por normas canônicas. A
aplicação rigorosa do princípio da legalidade em matéria penal é um modo de garantir
os direitos dos fiéis cristãos e o exercício do direito de punir (ius puniendi) da
autoridade eclesiástica, sempre conforme com sua natureza e função na Igreja.
Por exemplo:
Interpretação estrita das leis penais (cf. cc. 18 e 36 §1);
Proibição de aplicação analógica das leis em matéria penal (cf. c. 19);
A interposição de qualquer recurso suspende automaticamente a execução da
pena (cf. c. 1353).
211
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA NA IGREJA
A tutela dos direitos na vida eclesial
1. O reconhecimento dos direitos e sua efetiva proteção:
A Igreja é povo de Deus, que peregrina na história, em continuidade com a
missão redentora de Jesus Cristo. É comunidade, constituída e ordenada neste mundo
como uma sociedade. É enviada por Deus a todos os povos para ser sacramento
universal de salvação.
As exigências comuns de organização jurídica da vida em sociedade não são
estranhas à Igreja. Seria pouco prudente e presunçoso pensar diferente. A Igreja
necessita de meios adequados para promover a justiça das relações sociais em seu
interior, reconhecendo e restabelecendo os direitos dos fiéis cristãos.
Compete aos fiéis reivindicar e defender legitimamente os
direitos de que gozam na Igreja, no foro eclesiástico competente, de
acordo com o direito (c. 221 §1).
Os fiéis, caso sejam chamados a juízo pela autoridade
competente, têm o direito de ser julgados de acordo com as prescrições
do direito, a serem aplicadas com eqüidade (§2).
Os fiéis têm o direito de não ser punidos com penas canônicas,
a não ser de acordo com a lei (§3).
São objeto de juízo:
1° - direitos de pessoas físicas ou jurídicas a serem defendidos
ou reivindicados e fatos jurídicos a serem declarados;
2° - delitos, no que se refere à imposição ou declaração da pena
(c. 1400 §1).
2. Ações e exceções processuais:
Todo o direito é não só protegido mediante ação, salvo
determinação expressa em contrário, mas também mediante exceção (c.
1491).
A ação processual é o poder jurídico inviolável que habilita o autor a acudir a
quem tem jurisdição, com garantias de obter proteção e uma sentença favorável, se
provada a situação injusta que afirma padecer.
212
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Ação Exceção
Parte demandante Parte demandada
Poder ativo Poder de defesa ou oposição frente à
demanda judicial interposta contra um
direito próprio.
Pode extinguir-se. É, por natureza, perpétua.
3. Conveniência de evitar os litígios desnecessários:
Todos os fiéis, mas principalmente os Bispos, empenhem-se
diligentemente afim de que se evitem, quanto possível, salva a justiça,
lides no povo de Deus e se componham pacificamente quanto antes (c.
1446 §1).
Sempre que alguém se julgar prejudicado por um decreto, é
sumamente desejável que se evite contenda entre ele e o autor do
decreto, e que se procure de comum acordo uma adequada solução entre
ambos, aproveitando-se inclusive da mediação e do esforço de pessoas
ponderadas, de modo que seja evitada ou dirimida a controvérsia por
caminho idôneo (c. 1733 §1).
O processo judicial tem caráter de recurso extremo.
O processo:
O processo é o marco jurídico, no qual juízes e Tribunais exercem sua jurisdição
para resolver os conflitos. Inicia com a ação de um sujeito frente a outro diante do
Tribunal de justiça. Consta de uma sucessão de atos jurídicos, que culminam com a
sentença mediante a qual a controvérsia é resolvida.
O CIC 1983 regula amplamente o processo em seu livro VII, que contém as
normas fundamentais do Direito processual canônico.
213
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A organização judicial na Igreja
Conceitos:
Jurisdição: autoridade para dizer o Direito. É o poder público que o Tribunal
(juiz) possui para tratar e definir as causas;
Competência: é a delimitação da jurisdição. É o âmbito de jurisdição do
Tribunal (juiz), ou seja, a esfera concreta de exercício do poder, determinado
pelo território ou outros elementos.
O Tribunal de primeira instância (cf. cc. 1419-1437):
Ordinariamente, toda diocese deve ter seu Tribunal de primeira instância. Se não
é possível, diversos Bispos diocesanos podem constituir, com aprovação da Sé
Apostólica, um Tribunal comum (interdiocesano) para julgar todas as classes de causas
ou apenas algumas delas (cf. c. 1423).
Os Tribunais de primeira instância podem ser formados por um único juiz ou por
um colégio de três ou cinco juízes, que tomará as suas decisões por maioria de votos.
O juiz de primeira instância nato em cada diocese é o Bispo diocesano (cf. c.
1419), que pode nomear um Vigário judicial, dotado de poder judicial ordinário. Podem
ser nomeados também um ou mais Vigários judiciais adjuntos (cf. c. 1420).
O Tribunal de segunda instância (cf. cc. 1438-1441):
O Tribunal de segunda instância ou de apelação para todas as dioceses
sufragâneas é normalmente o Tribunal da Arquidiocese metropolitana.
Os Tribunais dos Institutos religiosos clericais de direito pontifício:
Se a controvérsia for entre religiosos ou casas do mesmo
instituto religioso clerical de direito pontifício, o juiz de primeira
instância, salvo determinação contrária das constituições, é o Superior
provincial ou, sendo mosteiro sui iuris, o abade local (c. 1427 §1).
214
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os Tribunais da Sé Apostólica (cf. cc. 1442-1445):
O Romano Pontífice, em razão do seu primado, é o juiz supremo para toda a
Igreja católica (cf. c. 1442). Sempre pode exercer livremente seu poder pleno, supremo,
imediato e universal. Qualquer fiel cristão pode levar diante da Sé Apostólica qualquer
causa, seja qual for o estado ou instância em que se encontre (cf. c. 1417), para pedir
que seja resolvido pessoalmente pelo Romano Pontífice, por juízes delegados ou por
Tribunais ordinários da Santa Sé. Essa petição do fiel cristão, no entanto, não comporta
necessariamente que o Romano Pontífice avoque a si a causa (cf. c. 1417 §2).
Para as chamadas causas maiores (cf. c. 1405 §1), a competência do Romano
Pontífice é exclusiva.
Os Tribunais ordinários da Sé Apostólica são os seguintes:
Tribunal da Rota Romana (cf. PB, art. 130);
Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica (cf. PB, art. 125).
A Rota Romana é o Tribunal ordinário constituído para receber apelações (cf. c.
1443). Cumpre normalmente a função de instância superior em grau de apelação ante a
Sé Apostólica. Tem, além disso, a função de velar pela unidade da jurisprudência e de
ajudar os Tribunais inferiores, mediante as suas sentenças (cf. PB, art. 126).
O Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica (cf. c. 1445) funciona em três
seções.
Primeira seção: Possui as competências típicas de um Tribunal supremo;
Segunda seção: Trata-se do único Tribunal administrativo da Igreja (cf. c.
1400 §2) existente na atual organização judicial;
Terceira seção: Dicastério da Cúria romana com competência para o governo
da administração da justiça na Igreja. Exerce a função de vigilância e
concede as aprovações e autorizações em matéria de organização de
Tribunais (cf. PB, art. 121-124).
215
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
As partes que atuam no processo
1. O triângulo processual:
2. O patrocínio das partes:
A parte pode livremente constituir para si advogado ou
procurador, mas, além dos casos estabelecidos nos §§ 2 e 3, pode
também agir e responder pessoalmente, salvo se o juiz tiver julgado
necessária a ajuda de procurador ou advogado (c. 1481 §1).
3. As partes públicas:
Para as causas contenciosas, nas quais o bem público pode
correr perigo, e para as causas penais, constitua-se na diocese um
promotor de justiça, a quem cabe, por obrigação, tutelar o bem público
(c. 1430).
Para as causas em que se trata de nulidade da ordenação ou da
nulidade ou dissolução do matrimônio, constitua-se na diocese o
defensor do vínculo, a quem cabe, por obrigação, propor e expor tudo o
que razoavelmente possa ser aduzido contra a nulidade ou a dissolução
(c. 1432).
216
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
OS PROCESSOS CANÔNICOS E
O SISTEMA DE JUSTIÇA ADMINISTRATIVA
O processo contencioso ordinário
O CIC 1983 regula, nos cc. 1501-1655, o processo contencioso ordinário
destinado a resolver qualquer controvérsia que não seja sobre matéria própria de um
processo especial.
Fase de introdução (postulatória)
Demanda (libelo introdutório): o processo inicia com a demanda (cf. c. 1501),
normalmente escrita, no qual o autor formula sua reivindicação, expondo os argumentos
que a fundamentam no Direito. O demandante deve ater-se aos requisitos do c. 1504.
Uma vez apresentada, o Vigário judicial designa os juízes do turno e o juiz presidente
admite a demanda, mediante decreto. Pode também rejeitá-la, se há motivos para isso
(cf. c. 1505).
Citação judicial e contestação da demanda: tendo sido admitida a demanda, o
juiz deve citar em juízo o demandado para que conteste a demanda por escrito ou
compareça diante do Tribunal (cf. cc. 1507-1510). Ao contestar a demanda, o
demandado pode admitir a reivindicação ou opor-se a ela, rebatendo os argumentos que
a fundamentam. Pode também alegar exceções (cf. c. 1491) ou inclusive formular uma
demanda contra o demandante, ou seja, uma ação de reconvenção (cf. c. 1494). Se o
demandado, devidamente citado, não se manifesta, o juiz manda que o processo siga
adiante em sua ausência (cf. cc. 1592-1595).
Fixação da dúvida e litiscontestação: a partir das petições e respostas das partes,
o juiz fixa por decreto a dúvida (dubium), estabelecendo os limites da controvérsia (cf.
cc. 1513-1514). Essa situação que ocorre como resultado da fixação da dúvida e que
leva para a seguinte fase do processo se chama litiscontestação (litis contestatio).
217
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Fase de instrução (probatória)
Depois da litiscontestação, o juiz (cf. c. 1516) fixa um tempo conveniente para
recolher as provas que as partes e o próprio juiz consideram úteis para chegar a
esclarecer com certeza moral a verdade sobre a questão controvertida.
O princípio básico “o ônus da prova cabe a quem afirma” está recolhido no c.
1526 §1.
Declaração das partes (cf. cc. 1530-1538);
Prova documental (cf. cc. 1539-1546);
Prova testemunhal (cf. cc. 1547-1573);
Prova pericial (cf. cc. 1574-1581).
Publicação da causa: uma vez praticadas todas as provas propostas, o juiz dita o
decreto pelo qual ordena que sejam publicadas as atas (ou autos) do processo para que
facilite o seu conhecimento às partes e a seus advogados, na chancelaria do Tribunal (cf.
c. 1598 §1).
Conclusão da causa: quando as partes declaram que não tem mais nada a
acrescenta ou expira o prazo para apresentar novas provas ou ainda o juiz considera que
a instrução é suficiente, o mesmo emite o decreto de conclusão da causa (cf. c. 1599).
Fase de discussão
Discussão da causa (cf. cc. 1601-1606): a não que se considere suficiente uma
discussão oral diante do Tribunal, o juiz determina um prazo para as partes
apresentarem por escrito suas defesas ou alegações. Com essa discussão escrita, acaba a
intervenção das partes e se passa para a fase final do processo, que corresponde ao juiz.
Fase de decisão
Essa fase começa com a deliberação do juiz ou do Tribunal colegial (cf. cc.
1609-1610) sobre as atuações levadas a efeito no processo, que devem permitir alcançar
a certeza moral necessária para ditar a sentença.
A sentença definitiva é o ato mediante o qual é resolvida de forma motivada, ou
seja, explicando as razões de fato e de direito, a questão principal controvertida, dando a
cada uma das dúvidas a resposta adequada (cf. cc. 1607-1612).
A sentença não produz nenhum efeito jurídico antes de sua publicação ou
notificação, que pode ser feita entregando uma cópia para as partes ou enviando-a por
correio certificado (cf. cc. 1614-1615).
218
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Coisa julgada e execução da sentença: a eficácia própria da sentença firme, isto
é, aquela contra a qual já não cabe recurso, se denomina de coisa julgada (cf. c. 1641).
A execução da sentença (cf. cc. 1650-1655), determinada pelo juiz mediante decreto,
compreende todas as atuações tendentes a aplicar efetiva e praticamente seu conteúdo,
impondo às partes o cumprimento de obrigações concernentes.
Recursos contra a sentença definitiva: o recurso mais geral é a apelação (cf. cc.
1628-1640). Consiste na impugnação da sentença pela parte que se considera
prejudicada diante do Tribunal superior ao que a ditou.
O CIC 1983 prevê também a possibilidade de impugnar uma sentença mediante
a querela de nulidade (cf. cc. 1619-1627), que pode ser interposta apenas nos casos nos
quais se considera que a sentença esteja afetada por algum vício de nulidade. Existe, por
fim, um recurso extraordinário denominado restituição in integrum (cf. cc. 1645-1648),
que cabe unicamente contra sentenças manifestadamente injustas, que tenham passado a
coisa julgada.
219
DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O processo contencioso oral
Qualquer causa pode tramitar mediante o processo contencioso oral, desde que
não seja excluída explicitamente pelo Direito e nenhuma das partes não se oponha.
Estão excluídas pelo Direito:
As causas de nulidade matrimonial (cf. c. 1690);
As causas que o Direito manda que sejam conhecidas por um Tribunal de
três ou cinco juízes (cf. c. 1425), porque o processo oral se desenvolve em
primeira instância diante de um único juiz (cf. c. 1657).
O processo contencioso oral está regulado pelos cc. 1658-1670.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
Os processos e procedimentos especiais
1. Processos matrimoniais:
o Processo de declaração de nulidade de matrimônio;
o Processo documental;
o Causas de separação matrimonial.
1.1 O processo de declaração de nulidade de matrimônio impugna
legitimamente a validade de um matrimônio, aduzindo uma ou mais causas
(capítulos de nulidade) e reclama do juiz que declare essa nulidade.
Esse processo é regulado nos cc. 1671-1685 e segue em grande parte nas
normas do processo contencioso ordinário.
A sentença é transmitida ex officio ao Tribunal de apelação (cf. c. 1682 §1).
Para que os cônjuges fiquem livres para contrair novo matrimônio, são
requeridas duas sentenças conformes, ou seja, que dois Tribunais de distinto
grau declarem a nulidade de seu matrimônio pela mesma razão (cf. c. 1684).
Em 25/01/2005, foi publicada a Instrução Dignitas Connubii dirigida a todos
os Tribunais eclesiásticos. Apresenta em uma única seqüência o itinerário
seguido na tramitação das causas de nulidade. Reproduz ordenadamente as
normas processuais vigentes, complementadas e harmonizadas com a
jurisprudência, as interpretações autênticas e a experiência prática (práxis),
desde a entrada em vigor do CIC 1983.
1.2 O processo documental (cf. cc. 1686-1688) versa também sobre a
nulidade matrimonial, mas só pode ser empregado nos casos previstos em
lei, ou seja, nos quais a nulidade pode ser comprovada imediatamente à vista
de um documento que tenha crédito.
Por exemplo: A existência de um impedimento que não foi dispensado.
1.3 As causas de separação matrimonial com permanência do vínculo entre
os cônjuges (cf. cc. 1151-1155 + cc. 1692-1696), além da possibilidade de
procedimento por decreto do Bispo diocesano, o CIC 1983 prevê que pode
ser desenvolvido um processo judicial especial. Esse processo é concluído
com sentença do juiz e pode tramitar segundo as normas do processo
contencioso oral, com intervenção necessária do promotor de justiça.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
2. Processo de declaração de nulidade de ordenação:
Quando um clérigo pretende que a sua ordenação foi nula, deve dirigir uma
petição à Congregação do Culto Divino e da Disciplina dos Sacramentos (cf.
PB, art. 68), que decidirá se resolve a causa diretamente por via
administrativa ou mediante Tribunal por ela designado.
A petição pode também ser feita pelo seu Ordinário ou pelo Ordinário da
diocese que o ordenou. As normas especiais dos cc. 1708-1712 incluem a
exigência de dupla sentença conforme favorável à nulidade.
3. Processo penal:
A imposição de penas canônicas deve ser feita mediante processo judicial
ou, em casos nos quais a lei não proíbe, mediante procedimento
administrativo sancionador, no qual é provado que o réu cometeu um delito e
que essa ação lhe é gravemente imputável por dolo ou por culpa (cf. c.
1321).
A investigação prévia (cf. cc. 1717-1719): Quando o Ordinário tem notícia
(ao menos verossímil) da comissão de um delito, deve ordenar que se abra
uma investigação prévia, que deve ser feita com cautela e discrição, sem por
em risco a boa fama do interessado, a fim de determinar se é necessário e
conveniente iniciar os procedimentos para a imposição de uma pena.
o Se não há fundamento, o assunto é arquivado;
o Se há fundamento, segue por via administrativa ou por via judicial.
A evolução do processo (cf. cc. 1720-1728).
Observação: Se o delito comporta pena perpétua, a causa deve ser resolvida
por via judicial (cf. c. 1342 §2).
Direito penal Direito processual penal
Livro VI: Sanções na Igreja Livro VII: Processos
Cânones 1311-1399 Cânones 1717-1731
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
A justiça administrativa
O 7º princípio diretivo para a reforma do CIC 1917 à luz dos ensinamentos do
Concílio Vaticano II afirma:
Para levar convenientemente à prática o que precede, é
necessário que se consagre atenção especial à regulamentação do
procedimento destinado à garantia dos direitos subjetivos. Por isso, na
renovação do direito, atenta-se ao que tanto faltava nesse particular, até
o presente, isto é, aos recursos administrativos e à administração da
justiça. Para tanto, se faz necessário distinguir claramente as diversas
funções do poder eclesiástico, a saber, as funções legislativa,
administrativa e judicial, e determinar adequadamente que organismos
devam exercer cada função (cf. Princípio nº 7. Prefácio do Código de
Direito canônico, p.XXIX).
O CIC 1983 estabelece:
...controvérsias originadas de atos do poder administrativo
podem ser apresentadas somente ao Superior ou ao Tribunal
administrativo (c. 1400 §2).
O sistema vigente de justiça administrativa na Igreja está articulado em uma
dupla via. O recurso do fiel cristão interessado contra um ato administrativo é
interposto, em primeiro lugar, em via administrativa, ante a autoridade executiva
superior a que emitiu o ato administrativo. Chama-se recurso hierárquico. Uma vez
esgotada a via administrativa, ou seja, quando não há mais autoridade administrativa
superior a quem recorrer, se pode passar a via judicial diante de Tribunal administrativo.
Chama-se recurso contencioso administrativo.
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DIREITO DA IGREJA: APONTAMENTOS DE AULA
O recurso hierárquico:
O CIC 1983 regula o recurso hierárquico nos cc. 1732-1739. De acordo com
essas normas, o fiel cristão que, com certo fundamento, se considerar prejudicado por
um ato administrativo, pode recorrer por qualquer motivo justo ao superior hierárquico
(cf. c. 1737).
1. Dicastério da Cúria romana
2. Bispo diocesano
3. Vigário geral
4. Vigário episcopal
O melhor é tentar solucionar de comum acordo o conflito entre a autoridade e o
fiel cristão interessado (cf. c. 1733).
O recurso contencioso administrativo:
Atualmente, apenas o Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica tem
competência judicial para conhecer o recurso contencioso administrativo. A sua
segunda seção (sectio altera) é o único Tribunal administrativo existente na Igreja.
O recurso contencioso administrativo só pode se fundar em um único motivo: a
pretensão de que o ato administrativo impugnado tenha violado alguma lei, seja no
procedimento seguido para emiti-lo, seja na própria decisão (cf. art. 123 da Constituição
PB).
Além disso, o fiel cristão interessado pode pedir ao Tribunal que se pronuncie
sobre o ressarcimento de danos causados ilegitimamente pelo ato administrativo (cf. cc.
57 §3 e 128).