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Apresentação acerca da minha pesquisa de mestrado, defendida no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Unicamp. Sob orientação da professora Regina Facchini, do Pagu da Unicamp.
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Fronteiras da política: relações e disputas no campo do movimento LGBT
em Campinas (1995-2013)
Gostaria, primeiramente, de agradecer de maneira breve a todos os
presentes, que vieram assistir à defesa, e aos professores que se dispuseram a
compor a comissão julgadora. Então, vamos lá!
Esta dissertação se configura como uma análise do movimento
LGBT (de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais) brasileiro, focando-
se nessa modalidade de ativismo na cidade de Campinas.
Esse movimento é um dos mais visíveis na sociedade brasileira
contemporânea. Como decorrência desse aumento da visibilidade, da epidemia
do HIV/Aids e de processos de institucionalização temos, principalmente entre
anos 1990 e 2000, um grande número de parcerias entre movimento LGBT e
Estado na promoção de políticas públicas.
Apesar disso, e talvez como consequência da própria ampliação da
visibilidade, a virada da última década registra um momento marcado por
disputas em torno do reconhecimento de demandas de LGBT, que têm
encontrado forte resistência na política institucional, principalmente por parte
de políticos conservadores religiosos atuantes no Congresso Nacional. Essa
resistência, se não tem causado retrocesso nas políticas já conquistadas, tem
impedido o avanço do reconhecimento dos LGBT enquanto sujeitos de direito
no Brasil.
Como apontei, a pesquisa centra a investigação nas relações do
movimento LGBT em Campinas, tanto aquelas estabelecidas entre os grupos da
cidade, quanto as estabelecidas entre os ativistas e o Estado em seus diversos
âmbitos. Além disso, a pesquisa ressalta também a necessidade de se levar em
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consideração as relações com outros atores sociais importantes no “campo” do
ativismo, como partidos políticos, centrais sindicais e outros movimentos
sociais.
O trabalho de investigação para o mestrado teve início em 2013 e
estendeu-se até meados do primeiro semestre de 2014, quando iniciei a escrita
desta dissertação. O trabalho de campo foi dividido em três frentes: (i) as
reuniões da Associação da Parada do Orgulho LGBT de Campinas e as
atividades do Mês da Diversidade Sexual, em 2013; (ii) o dia-a-dia dos
funcionários do Centro de Referência LGBT de Campinas, também em 2013, e
(iii) reuniões que congregavam os diversos atores sociais presentes no “campo”
do movimento LGBT campineiro. Essas reuniões foram esporádicas e
ocorreram durante todo o período de realização da pesquisa.
O interesse em realizar a investigação em Campinas baseava-se na
falta de pesquisas sobre o movimento LGBT em cidades do interior. Apesar
disso, percebi que a relevância em realizar pesquisa na cidade ia para além dessa
característica da cidade. O pioneirismo do movimento LGBT e das políticas
públicas implementadas em Campinas passaram a chamar minha atenção. Trago
agora alguns exemplos.
A partir da atuação do movimento da cidade, Campinas implementou
um dos primeiros serviços de denúncia de homofobia por telefone do país, o
Disque-Defesa Homossexual, em 2002. E no ano seguinte, implementou o
primeiro serviço de combate a homofobia do Brasil a oferecer assistência social,
jurídica e psicológica, o Centro de Referência LGBT.
Ademais, Campinas foi sede de um dos primeiros grupos
organizados de transexuais do Brasil, o Movimento Transexual de Campinas,
fundado em 1997 e já extinto. Campinas foi também pioneira na implementação
na cidade, impulsionada pelo grupo Identidade, de um protocolo de
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atendimento, pelo SUS, a usuários de silicone industrial. Tal protocolo, pensado
a partir da lógica da redução de danos, visava colaborar com o atendimento e
acompanhamento de usuários desse tipo de silicone.
A literatura mais recente sobre o movimento LGBT trata das relações
entre Estado e ativismo a partir de termos como “trânsitos”, “múltiplos
pertencimentos institucionais” e “porosidade de fronteiras” (FACCHINI, 2009;
CARRARA, 2010). Essas categorias analíticas possuem, como características
comuns, o objetivo de compreender melhor as relações do movimento LGBT
com o Estado e com os diversos governos democráticos, além de relações com
outros atores sociais, como o mercado segmentado, outros movimentos sociais,
dentre outros.
Meu argumento, aqui é que o olhar para os “trânsitos”, a
“porosidade” e os “múltiplos pertencimentos institucionais” dos sujeitos,
evidencia uma disputa em torno do próprio significado do que seria ativismo,
militância e movimento social. Essa ênfase da análise aponta ainda para a produção
discursiva da delimitação das fronteiras entre o que seria o Estado e o Movimento
Social. Ao mesmo tempo, no entanto, os ativistas e gestores, na prática diária,
borram e reconfiguram tais fronteiras, produzindo, em alguns momentos, um
“Estado-ativista”. Tais fatores expressam uma disputa e uma ressignificação em
torno da própria ideia de política. Assim sendo, mais do que uma porosidade
entre as fronteiras, existem suspensões temporárias e redefinições de fronteiras
acompanhadas desse processo de ressignificação da política.
Além disso, pretendo ainda situar a multiplicidade de atores
envolvidos com política LGBT em Campinas, procurando indicar a complexa
dinâmica das relações que encontrei em campo.
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As pesquisas mais recentes sobre movimento LGBT, como as de
Silvia Aguião e Marcelo Dailiauskas, procuraram compreender as relações entre
os diversos atores a partir de um olhar direcionado ao âmbito nacional das
políticas LGBT. Ao realizar esta pesquisa, no entanto, decidi lançar o olhar
sobre o processo político de que tratam tais autores, a partir de um contexto
localizado, a cidade de Campinas. Tal decisão tem como objetivo a
compreensão do impacto do processo produção de LGBT enquanto sujeitos
direito, e das diversas relações resultantes desse processo no dia-a-dia de sujeitos
envolvidos com a política LGBT. Com isso, não pretendo desconsiderar o
processo em âmbito nacional, mas entender de que maneira tal processo ocorre
em nível local.
A análise das relações entre movimento LGBT e Estado em nível
local, em Campinas, é importante também por outro motivo. A pesquisa de
Aguião (2014), apesar de se centrar na constituição dos LGBT enquanto
sujeitos de direito a nível nacional, analisa também um caso mais localizado, a
implementação da versão fluminense do BSH, o Rio Sem Homofobia. Ao olhar
para tal processo em nível estadual, Aguião (2014) encontrou o que pode ser
descrito como o ápice de um modelo bem sucedido de institucionalização.
Em Campinas, entretanto, acredito ter me deparado com o que
parece ser uma realidade mais possível de se encontrar em outras regiões do
país no que diz respeito ao processo de institucionalização que tem início em
meados da década de 1990: tensões e disputas provenientes de um processo de
institucionalização não tão sucedido.
O que eu quero dizer com isso? Bom, os grupos em Campinas, por
terem seu surgimento no período que Facchini (2005) definiu como “terceira
onda”, se institucionalizaram e passaram a realizar ações conjuntas na
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implementação, execução e avaliação de políticas públicas. Apesar disso, com o
avançar dos anos 2000, por falta de condições administrativas, esses grupos não
conseguiram manter a parceria com o Estado na execução de projetos,
perdendo a possibilidade de se manterem ativos no processo de receber
recursos e prestar contas. Além disso, a despeito da criatividade e do
pioneirismo da ação dos ativistas na cidade, nota-se considerável precariedade
das políticas que foram implementadas e do reconhecimento de LGBT como
sujeitos de direitos na cidade.
Apresento agora brevemente o que tratei em cada capítulo da
dissertação.
O primeiro capítulo é um subsídio teórico e empírico aos demais.
Dessa maneira, discuto os principais conceitos mobilizados durante a
dissertação, além de apresentar o surgimento do movimento LGBT nacional e
seu processo de institucionalização. Feito isso apresento o surgimento do
movimento LGBT de Campinas e seu processo de institucionalização.
No segundo capítulo, a partir da apresentação da narrativa de dois
interlocutores – que chamei aqui de “gestores-ativistas” – sobre suas trajetórias
políticas e sua relação com a política LGBT, discuto a produção de fronteiras
entre o que se concebe como Estado e como movimento social. Discuto, ainda,
como na prática diária os interlocutores da pesquisa, muitas vezes, borram e
suprimem fronteiras entre Estado e movimento social, produzidos
discursivamente como opostos. Ademais, aponto que tal movimento de borrar e
suprimir as fronteiras diz respeito a uma disputa em torno dos próprios
significados de política. Por fim, apresento uma discussão acerca da importância
de documentos nas redes ativistas através da narrativa em torno da mobilização
de um documento produzido pelos ativistas.
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No terceiro capítulo, procuro situar a multiplicidade de atores que
fazem parte do “campo” do movimento LGBT em Campinas, como partidos
políticos, sindicatos e outros movimentos sociais. Retomo, dessa maneira, a
trajetória de dois grupos ativistas LGBT de Campinas, o Aos Brados!! e o E-
Jovem como fio condutor para compreender tais relações. Além disso, levando-
se em consideração que esses grupos não pautam a produção de sua identidade
coletiva apenas a partir de umas das orientações sexuais ou identidades de
gênero que compõem o acrônimo LGBT, dar-se-á especial atenção ao processo
de proliferação e multiplicação das identidades coletivas do movimento LGBT
brasileiro.
Nas considerações finais, retomo algumas das principais questões
abordadas nos capítulos, pontuando, principalmente, a importância da
diversificação dos recortes empíricos para o estudo de processos políticos
envolvendo movimentos sociais.
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