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 O REAL ANARQUISMO: IDEIA, HISTÓRIA E CONTEMPORANEIDADE Leandro Kuhn Duarte 1  Matheus Rogério Rigui Bueno 2  RESUMO O intento deste artigo é revelar o verdadeiro significado do movimento anarquista, trazendo consigo seus fundamentos, pensadores, contexto histórico e especialm ente sua importância, tanto no passado, quanto no presente e futuro. O primeiro aspecto a ser desmistificado é a relação imposta entre anarquia e caos (desordem), explanando seus princípios e fundamentos. Posteriormente, tratará da revolução a que a sociedade deve passar para atingir o Estado Anarquista pleno. Será desenvolvido o embasamento teórico e apresentados os fatos históricos que envolveram e envolvem o movimento. Ainda haverá citações de pensadores e estudiosos do assunto conceituando a doutrina e visando a uma forma instrumental de melhor aproveitamento da mesma. O Anarquismo terá aqui uma fonte de progresso e pleno desenvolvimento das melhores características humanas e sociais: a liberdade, a solidariedade, a união e a igualdade, configurando-se como uma melhor forma de vida coletiva e, cada vez mais próxima do ideal humano- organizacional. Palavras-chave: Anarquismo. Liberdade. Solidariedade. Revo lução.  1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS  A doutrina Anarquista semp re propôs críticas à sociedade vigente e uma visão de sociedade ideal do futuro, apresentando os meios de passagem de uma à outra. O princípio de não-doutrinação, a revolta social, o humanismo, a liberdade, o antiautoritarismo, a ação direta, o apoio mútuo, o internacionalismo, a virtuosidade da revolta, a flexibilidade e naturalidade organizacionais, o federalismo libertário, a responsabilidade individual e coletiva, o amor livre e a educação avançada são alguns dos princípios e fundamentos chave do Anarquismo. Também é importante estabelecer à relação anarquista com outras doutrinas, gerando embates ou criando vertentes, como o anarquismo socialista, anarquismo comunista e anarquismo verde. Apesar das suas muitas variantes: como um sistema de filosofia social que visa a promover mudanças na estrutura básica da sociedade e, principalmente, a substituição do Estado autoritário por alguma forma de 1  Acadêmico de Direito (UNIFRA). E-mail: [email protected] 2  Acadêmico de Direito (UNIFRA). E-mail: [email protected]

Artigo - ANARQUISMO

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Artigo científico sobre o Anarquismo.

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  • O REAL ANARQUISMO: IDEIA, HISTRIA E CONTEMPORANEIDADE

    Leandro Kuhn Duarte1

    Matheus Rogrio Rigui Bueno2

    RESUMO O intento deste artigo revelar o verdadeiro significado do movimento anarquista, trazendo consigo seus fundamentos, pensadores, contexto histrico e especialmente sua importncia, tanto no passado, quanto no presente e futuro. O primeiro aspecto a ser desmistificado a relao imposta entre anarquia e caos (desordem), explanando seus princpios e fundamentos. Posteriormente, tratar da revoluo a que a sociedade deve passar para atingir o Estado Anarquista pleno. Ser desenvolvido o embasamento terico e apresentados os fatos histricos que envolveram e envolvem o movimento. Ainda haver citaes de pensadores e estudiosos do assunto conceituando a doutrina e visando a uma forma instrumental de melhor aproveitamento da mesma. O Anarquismo ter aqui uma fonte de progresso e pleno desenvolvimento das melhores caractersticas humanas e sociais: a liberdade, a solidariedade, a unio e a igualdade, configurando-se como uma melhor forma de vida coletiva e, cada vez mais prxima do ideal humano-organizacional. Palavras-chave: Anarquismo. Liberdade. Solidariedade. Revoluo.

    1 CONSIDERAES INICIAIS

    A doutrina Anarquista sempre props crticas sociedade vigente e uma

    viso de sociedade ideal do futuro, apresentando os meios de passagem de uma

    outra. O princpio de no-doutrinao, a revolta social, o humanismo, a liberdade, o

    antiautoritarismo, a ao direta, o apoio mtuo, o internacionalismo, a virtuosidade

    da revolta, a flexibilidade e naturalidade organizacionais, o federalismo libertrio, a

    responsabilidade individual e coletiva, o amor livre e a educao avanada so

    alguns dos princpios e fundamentos chave do Anarquismo.

    Tambm importante estabelecer relao anarquista com outras doutrinas,

    gerando embates ou criando vertentes, como o anarquismo socialista, anarquismo

    comunista e anarquismo verde. Apesar das suas muitas variantes: como um sistema

    de filosofia social que visa a promover mudanas na estrutura bsica da sociedade

    e, principalmente, a substituio do Estado autoritrio por alguma forma de

    1 Acadmico de Direito (UNIFRA). E-mail: [email protected]

    2 Acadmico de Direito (UNIFRA). E-mail: [email protected]

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    cooperao no-governamental entre indivduos livres, o elemento comum a todas

    as formas de Anarquismo. Assim, tornou-se inevitvel seu mau entendimento pela

    opinio pblica, influenciada pelos meios de comunicao patronais e religiosos.

    Sua variedade prpria de formas de abordagem e ao sempre gerou, portanto,

    confuso.

    Em tempos de coroao do capitalismo, da consolidao dos mais bem

    capacitados financeiramente e de uma poltica discriminatria voltada para os

    interesses da burguesia, entre milhares de exemplos, surgiu uma produo filosfica

    constante e crtica, de contedos, certamente revolucionrios, os quais perpetuaram

    na histria dos acontecimentos. Num mundo em que a liberdade sem socialismo

    privilgio e injustia e o socialismo sem liberdade escravido e brutalidade, temos

    no Anarquismo um forte pilar para um futuro ideal e, de fato, humano.

    2 ANARQUIA ORDEM

    Popularmente, o significado de anarquia se disseminou de maneira

    equivocada durante anos como caos e ausncia de laos de solidariedade

    (indiferena) entre homens. Essa idia, ainda no sculo XIX, estava bem distante do

    que pensavam os filsofos Tolstoi, Godwin e Kropotkin, que utilizavam anarchos, em

    grego, para definir no-coero, falta de governo ou no existncia da necessidade

    do mesmo. Assim, etimologicamente, anarquia quer dizer sem coero, sem

    autoridade, e no desordem. Se hoje, com todo acesso informao, a palavra

    ainda utilizada com o sentido de ausncia de ordem, passivo que, durante a

    Revoluo Francesa, os girondinos usassem pejorativamente anarquia para injuriar

    seus adversrios de esquerda. De fato, no h, necessariamente, relao alguma

    entre violncia, arruaa e Anarquismo.

    George Woodcock exprime um pensamento rpido e conciso sobre o

    movimento Anarquista

    preocupa-se, basicamente, com o homem e a sua relao com a sociedade. Seu objetivo final sempre a transformao da sociedade; sua atitude no presente sempre de condenao a essa sociedade, mesmo que essa condenao tenha origem numa viso individualista sobre a natureza do homem; seu mtodo sempre de revolta social, seja ela violenta ou no. Os discpulos de Tolstoi no admitiam a violncia, quaisquer que fossem as circunstncias. Godwin desejava obter mudana atravs da palavra e Proudhon e seus companheiros, atravs da proliferao pacfica de

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    organizaes cooperativas. Kropotkin aceitava a violncia, embora com certa relutncia, por ver nela uma parte inevitvel das revolues, que considerava etapas necessrias ao progresso da humanidade.

    3

    Logo, no h uma necessidade de desordem para atingir a mudana. A luta

    no deve ser delegada aos heris. So rejeitados meios indiretos para resoluo de

    problemas sociais, como mediao pelo Estado ou por polticos. A soluo est na

    atuao direta, como o mutiro, a assemblia, a greve, o boicote e a desobedincia

    civil. Por outro lado, em situaes crticas, ainda que no imprescindvel, pode haver

    o uso de meios mais destrutivos, como a sabotagem.

    A revolta, enquanto compreenso dos anarquistas, um substrato humano.

    Uma virtude absolutamente natural e efetivamente produtiva. O que define essa

    efetividade da revolta a forma como ela ultrapassa a sua condio abstrata para se

    consolidar em aes. Da mente de cada um transformao social. O princpio da

    flexibilidade e naturalidade organizacionais fundamenta que a realidade concreta

    que deve definir as bases da organizao da sociedade anarquista. As situaes

    imaginrias criadas pelos tcnicos, em contrapartida aos anarquistas, tendem a ser

    manipuladas a favor de interesses parciais. O federalismo libertrio vai alm e define

    que as problemticas sempre prescreveriam a organizao, e no os interesses.

    O anarquista, como indivduo, deve agir sempre de forma a progredir por

    completo a sociedade, atravs de seus deveres e conscincia coletivos. A educao

    avanada parte como base da coexistncia harmoniosa. As sociedades existem

    graas s vantagens que o princpio da solidariedade garante a cada indivduo que

    as compem, sendo essa a principal defesa dos mesmos contra o poder coercitivo

    do Capital e do Estado.

    A tecnologia tida enquanto mais um instrumento de potencialidade humana,

    podendo ter uma expressiva funo libertria como nos campos da medicina, das

    comunicaes, dos transportes, da segurana e desenvolvimento produtivo do

    trabalho. Tambm representa uma funo efetiva no esclarecimento e difuso dos

    princpios e ideais anarquistas.

    3 HAVENDO AUTORIDADE, NO H LIBERDADE

    3 WOODCOCK, George. Histria das idias e movimentos anarquistas. Porto Alegre: L&PM,

    2002. p. 14.

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    Quem quer que coloque a mo sobre mim para governar-me um usurpador

    e um tirano eu o declaro meu inimigo! 4 A histria no caminha seguindo as linhas

    inflexveis da necessidade dialtica, como julgam os marxistas, mas da luta, e a luta

    humana produto do exerccio da vontade do homem, baseada no lampejo da

    conscincia que existe dentro dele, reagindo ao estmulo de qualquer impulso da

    razo ou da natureza que desperte sua eterna nsia de liberdade.5

    A liberdade a base lgica de qualquer formulao, ao ou pensamento

    anarquista. A liberdade deixa o plano do pensamento (abstrato) para ganhar uma

    funcionalidade prtica, smbolo e dinmica do desenvolvimento humano real. Ainda,

    para os anarquistas, apenas a erradicao completa de qualquer forma de

    autoridade poder gerar autonomia. A repulsa e o combate total a qualquer

    hierarquia imposta ou domnio de um indivduo sobre o outro representa o

    antiautoritarismo. A igualdade est inserida a essa revoluo social direta e incisiva.

    A quebra drstica e efetiva do Estado e todas as suas estruturas (que o regem e

    sustentam) torna plenamente tangvel a independncia, permitindo ao sujeito

    renovar de forma efetiva os seus preceitos humanistas.

    A presena de hierarquias baseadas na fora corrompe a organizao social

    por inibir a capacidade inata de auto-organizao e originar a desigualdade. Apenas

    a conscientizao e aceitao da existncia humana (suprimida anteriormente pelo

    Estado) podem fazer emergir naturalmente o anseio pela ascenso da idia base de

    qualquer forma real de vida: a Liberdade. Cada anarquista deve desenvolver dentro

    de si mesmo o seu prprio instrumento intelectual para legitimar e potencializar

    concretamente a emergncia de um sentimento puro de Anarquismo. A no

    doutrinao nada mais do que rejeitar a idia de gurus polticos e religiosos. Os

    mestres devem ser respeitados, no reverenciados. H autonomia doutrinria para

    que os autores desenvolvam ideias prprias de forma original e desinibida.

    O anarquista imagina uma sociedade na qual as relaes mtuas seriam

    regidas no por leis ou por autoridades auto-impostas ou eleitas, mas por mtua

    concordncia de todos os seus interesses e pela soma de usos e costumes sociais

    no imobilizados por leis, pela rotina ou por supersties mas em contnuo

    4 PROUDHON, Pierre-Joseph. cit.

    5 WOODCOCK, George. Histria das idias e movimentos anarquistas. Porto Alegre: L&PM,

    2002. p. 32.

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    desenvolvimento, sofrendo constantes reajustes para que pudessem satisfazer as

    exigncias sempre crescentes de uma vida livre, estimulada pelos progressos da

    cincia, por novos inventos e pela evoluo ininterrupta de ideais cada vez mais

    elevados. No haveria, portanto, autoridades para govern-la. Nenhum homem

    governaria outro homem; nem cristalizao nem imobilidade, mas contnua evoluo

    tal como a que vemos na Natureza. (A cincia moderna e anarquismo) 6

    4 O ANARQUISTA COMO INSTRUMENTALIZADOR DA LIBERDADE

    A Liberdade: um objetivo de poucos, mas inconscientemente, um sonho de

    todos. Aspirando a encorajar as pessoas, os anarquistas trouxeram produes

    tericas a seus militantes. Proudhon sugere, na sua Phylosophie du Progrs, a

    contradio como elemento positivo e produtivo e o equilbrio como uma condio

    num mundo que muda constantemente, sem jamais atingir a imobilidade da

    perfeio, porque a imperfeio causa e consequencia do seu eterno movimento.

    Michail Alexandrovich Bakunin7 foi um anarquista muito conhecido. Russo,

    filho de Aristocratas, viajante do mundo, dedicou-se a uma vida repleta de

    peripcias, participando de todas as barricadas que podia, fundou organizaes

    clandestinas, elaborando cdigos secretos que o fez ser uma figura conhecida. Era

    uma pessoa de persuaso incontestvel, fato que lhe concedeu at a ateno dos

    inimigos, pois sua fala arrebatava os auditrios e sua personalidade atingia a todos.

    Apesar de muito conhecido, falhou como escritor, pois no deixou obra pronta. Foi

    um homem de idias, de ao, e, acreditando na perfeio da instituio humana e

    bondade natural do homem, tentou solucionar o problema social, aniquilando a

    sociedade atual. Falou: No creio na Constituio nem nas leis, a mais perfeita

    Constituio no conseguiria satisfazer-me. Para ele, o homem necessitava de algo

    diferente: Inspirao, vida, o mundo sem leis e, portanto, livre.

    Para Proudhon8, o indivduo seria justamente o ponto de partida e a meta

    ltima dos humanos, ratificando todo o pensamento anarquista, o qual idealiza uma

    sociedade que proporcionaria a liberdade individual e que o homem gozaria de uma

    funo e realizao pessoal. Acreditava que a propriedade um mal e destrua o

    6 KROPOTKIN, Piotr Alexeyevich. cit.

    7 COSTA, Caio Tlio. O que anarquismo. So Paulo: Abril Cultural: Brasiliense, 1985. p. 39.

    8 COSTA, Caio Tlio. O que anarquismo. So Paulo: Abril Cultural: Brasiliense, 1985. p. 35.

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    igualitarismo. Assim, esta frase se tornou o slogan dos libertrios do mundo inteiro:

    A propriedade um furto. Com isso, o autor evidencia toda problemtica social do

    sculo XIX, em que a posse determinaria a excluso da maioria dos produtores.

    Para o libertrio francs, o Comunismo negava a independncia e somente a

    anarquia ou liberdade dos indivduos poder-se-ia encontrar a igualdade, justia e

    independncia individual que outros sistemas sociais no proporcionavam.

    Outro anarquista famoso Allan Moore, criador dos quadrinhos V de

    Vingana 9. A histria se passa em um distpico futuro de 1997 no Reino Unido, em

    que um misterioso homem mascarado tenta destruir o Estado atravs de uma idia e

    aes diretas. Trata-se de uma realidade em que um partido de cunho Totalitrio

    ascende ao poder aps uma guerra nuclear. A semelhana com o regime Fascista

    inevitvel devido ao fato do governo ter o controle sobre a mdia, a existncia de

    uma polcia secreta e campos de concentrao para minorias raciais e sexuais.

    V, o personagem principal, planeja aes para que haja uma revoluo

    anarquista na sua sociedade, fixando o argumento de que sozinho um indivduo no

    consegue chegar mudana, mas coletivamente representa uma idia, que pode

    derrubar governantes e at mesmo Estados. Entre suas frases mais notveis, esto

    O povo no deve temer seu Estado. O Estado deve temer seu povo. e Um

    smbolo sozinho pode no representar nada, mas se todos se juntam, um smbolo

    pode significar muito, pode significar a mudana de um pas. No final da trama, um

    dilogo do protagonista com o facnora militar Sr. Creedy demonstra seu sentimento

    anarquista aps ser atentado de morte, com forte impacto ao dizer: Por baixo desta

    mscara h uma idia, Sr. Creedy, e idias so prova de balas.

    5 A ANARQUIA COMO INSTRUMENTO DE MELHORIA SOCIAL

    Apesar de o Anarquismo ter sido pouco difundido e mesmo nunca colocado

    em sua plena prtica, sua existncia sempre foi importante na construo da

    liberdade mesmo que longe da idealizada em que vivemos hoje, assim como

    seguir servindo de parmetro para a evoluo e busca do verdadeiro sentido de

    Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

    9 MOORE, Alan. V for Vendetta. Vertigo, DC Comics. Reino Unido, 1988.

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    Segundo o depoimento de Marques10 (2011), as doutrinas anarquistas de

    Mikhail Bakunin desenvolveram-se fortemente no cenrio mundial durante o final do

    sculo XIX e inicio do sculo XX, pois encontrou nos operrios explorados seu

    suporte principal de apoio ideolgico e aceitao poltica, tal qual ocorria com o

    Socialismo de Karl Marx.

    Conforme o depoente, por defender uma sociedade igualitria, ser contrrio

    ao Capitalismo e pregar a imediata destruio do Estado, enquanto mantenedor de

    qualquer forma de governo, as ideias anarquistas foram absorvidas de maneira

    direta pelo proletariado, que embasados e influenciados por uma ferramenta

    intelectual, passaram a organizar-se em sindicatos e agremiaes partidrias, de

    onde buscavam melhores condies de trabalho nas fbricas e a diminuio da

    extensa carga horria semanal de trabalho. Tais acontecimentos fizeram-se

    presentes na Inglaterra posterior Revoluo Industrial, nos Estados Unidos da

    Amrica na segunda metade do sculo XIX, no perodo anterior Revoluo Russa

    de 1917 e no Brasil do inicio do sculo XX.

    Nesse contexto, Marques destaca que

    as ideologias anarquistas pairavam fortemente no inicio do Brasil Republicano, sobretudo em So Paulo, onde se instalou uma densa corrente anarquista que agitou o movimento operrio por meio do anarco-sindicalismo. Dessa forma, imigrantes italianos, com suas posturas anarquistas dentro e fora das fbricas, auxiliaram intensas mobilizaes da classe trabalhadora brasileira, pregando o fim da burguesia, a runa do Estado Capitalista e a busca incessante por uma sociedade composta por indivduos livres.

    11

    Afirma Marques que os ativistas anarquistas criaram inmeros sindicatos,

    com participao em massa dos operrios brasileiros, elaborando diversas greves e

    reivindicaes, que visavam solidariedade entre os trabalhadores e a busca por

    melhores condies de trabalho e de vida.

    A maior greve realizada pelos operrios em 1917, na viso de Marques,

    contou com o apoio macio dos anarquistas, que agitaram So Paulo numa

    paralisao geral das fbricas, estendendo-se posteriormente para outros estados,

    10

    MARQUES, Joaquim. Professor Ps-Graduado em Histria do Brasil pela Universidade Federal de Santa Maria. 11 MARQUES, Joaquim. Depoimento para Matheus Bueno, em 15 de Junho de 2011.

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    culminando com a conquista de aumentos salariais, libertao de grevistas presos e

    melhorias nas condies de trabalho fabril.

    Desse modo, finaliza Marques, que a relevante participao anarquista junto

    aos trabalhadores brasileiros no inicio do sculo XX serviu como gnese para os

    movimentos operrios posteriores, que por meio da greve, reivindicaes e lutas,

    conseguiram assegurar para as geraes contemporneas inmeros direitos

    trabalhistas, garantidos por lei federal por meio da CLT.

    Para Kropotkin, o luxo no o prazer proporcionado pelas coisas materiais,

    mas as delcias as maiores que um homem pode desejar da cincia,

    especialmente da descoberta cientfica, e da arte, especialmente a criao artstica.

    Ao simplificar a vida de tal maneira que o tempo dedicado ao trabalho seria

    reduzido, o anarquista acredita que o homem poder voltar sua ateno para

    atividades mais nobres, atingindo o equilbrio filosfico no qual a arte deixar de ser

    algo aterrorizante. Proudhon mais conciso ao observar, em De La justice, que a

    vida humana s atinge sua plenitude quando inclui amor, trabalho e comunho

    social, ou justia. Preenchidas essas condies, declara ele, a vida plena: ela

    uma festa, uma cano de amor, um perptuo entusiasmo, um infinito hino

    felicidade.12

    O anarquista v o progresso no como o acmulo constante de bens

    materiais ou como a complexidade crescente de estilos de vida, mas em termos de

    uma moralizao da sociedade atravs da supresso da autoridade, da

    desigualdade e da explorao econmica. Uma vez atingidos esses objetivos, ser

    possvel retornar situao em que os processos naturais voltaro a exercer sua

    influncia sobre a vida das sociedades e dos indivduos, e ento o homem poder

    desenvolver-se interiormente, de acordo com o esprito que o torna superior aos

    animais.13

    Alm das contribuies do movimento com os trabalhadores e com a arte

    entre outros tambm citados anteriormente o Anarquismo contribuiu ao longo do

    tempo com a viso da mulher e das relaes entre os indivduos por pregar o amor

    livre: liberdade sexual, expresso direta de um autodomnio individual. Enfatiza,

    particularmente, os direitos da mulher contra as leis sexualmente discriminatrias

    12 WOODCOCK, George. Histria das idias e movimentos anarquistas. Porto Alegre: L&PM, 2002. p. 30-31. 13 WOODCOCK, George. Histria das idias e movimentos anarquistas. Porto Alegre: L&PM, 2002. p. 31.

  • 9

    feitas contra as mulheres, como por exemplo, leis de casamento e medidas de

    controle de nascimentos em certos locais do mundo. Uma das mais famosas

    anarquistas foi Emma Goldman (1869 - 1940), anarco-sindicalista e principal terica

    anarco-feminista.

    Ainda, o movimento anarquista no advoga em favor do atesmo ou

    agnosticismo (como impem religiosos e espiritualistas massa). O problema est

    na consolidao da f como forma de instituio, tornando-se instrumento de

    explorao dos homens. O que negado pelo anarquista a instituio Igreja em

    todas as suas formas, e no a igreja enquanto um templo de f. O que cada um

    pensa ou cr no importa ao prximo, desde que a liberdade e todos os demais

    princpios anarquistas no sejam de alguma forma, ofuscados. Gandhi, hindusta,

    considerado por muitos um anarquista, pois o mesmo usou da desobedincia civil

    para a libertao da ndia ao Imperialismo Britnico.

    Do ponto de vista humano, ainda temos a fundamentao humanista do

    Internacionalismo. O conceito libertrio de Internacionalismo se difere do que

    conhecemos (capitalista) de globalizao. Internacionalismo difuso global de

    servios humanos, globalizao difuso global de hegemonias mercadolgicas.

    A idia de ptria negada pelos anarquistas, pois todo tipo de diviso da sociedade

    que no possua uma funcionalidade plena no campo humano deve ser

    completamente descartada, seja pelos seus antagonismos infundados, seja pela

    burocracia contraproducente que ela encarna na organizao social. A natureza

    humana a mesma em qualquer lugar do mundo, independentemente do universo

    material ou cultural o qual o indivduo esteja inserido. Suas virtudes e seu exercer

    no devem possuir fronteiras, j que a fragilidade do homem tambm no s

    possui.

    6 CONSIDERAES FINAIS

    Foi desmistificada a falsa idia da desordem, da no benevolncia e do

    terrorismo. Anarquistas como Alan Moore, Emma Goldman, Leon Tolstoi, Mikhail

    Bakunin, Pierre Proudhon e Piotr Kropotkin so alguns dos muitos indivduos que

    contestam o sistema como imposto e as informaes como so colocadas, alm

    de outros no citados neste artigo, como Friedrich Nietzsche, Henry David Thoreau,

    Lima Barreto, Raul Santos Seixas e Roberto Freire.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Emma_Goldmanhttp://pt.wikipedia.org/wiki/1869http://pt.wikipedia.org/wiki/1940http://pt.wikipedia.org/wiki/Anarco-sindicalismohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Anarca-feminismo

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    Expostos os fatos, assevera-se que o Anarquismo enquanto ferramenta

    filosfica, cultural, social, intelectual e histrica possui um valor inestimado, e

    somente com a quebra da hierarquia imposta seja pelo Capital, seja pelo Estado

    teremos uma vida de plena liberdade, autonomia e igualdade.

    Ao tempo que o mundo idealizado pelos anarquistas torna o homem livre, ele

    assegura que a harmonia e cooperao entre os indivduos os faam desenvolverem

    mais, sem a algema das fbricas ou as imposies das leis. O Capitalismo escraviza

    e priva, o Socialismo oprime. O Anarquismo libera, fortalece, iguala e ensina.

    REFERNCIAS

    __________. Anarquia Ordem. Disponvel em: . Acesso em: 26,jun. 2011.

    BAKUNIN, Mikhail. Statism and anarchy. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.

    COSTA, Caio Tlio. O que anarquismo. So Paulo: Abril Cultural: Brasiliense, 1985.

    KROPOTKIN, Peter. The Conquest of Bread. Edinburgh: AK Press, 2007.

    __________. O que Anarquismo. Disponvel em: . Acesso em: 26,jun. 2011.

    WOODCOCK, George. Histria das idias e movimentos anarquistas. Porto Alegre: L&PM, 2002.

    http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2004/04/277590.shtmlhttp://www.anarquismo.com.br/oque.html