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Artigo Original CORAL DO CEREST DE VITÓRIA DA CONQUISTA: PROJETO “NÃO SE ESPANTE, CANTE” Autor: Alberto Lima Ferreira ¹ ¹ Médico do CEREST de Vitória da Conquista/BA, docente do Curso de Medicina da UESB Resumo O Coral do CEREST (Centro de Referência em Saúde do Trabalhador) iniciou suas atividades em 2005 formado por integrantes usuários, e familiares, além de trabalhadores do serviço, originada da Secretaria Municipal de Saúde representada pela coordenação do CEREST naquele ano. É parte importante de uma forma de terapia e convivência interpessoal, procurando amenizar as dificuldades da rotina pessoal e coletiva e elevar a qualidade de vida dos seus participantes. Esse trabalho apresenta dados bastante positivos, quantitativos e qualitativos, mostrando o perfil dos coralistas (prevalência feminina, idade acima dos 40 anos, grupo com profissões heterogêneas, e tempo de participação no coral). Evidenciou-se a vontade de todos na permanência dessa atividade em face da repercussão muito benéfica na saúde (bem estar mental, elevação da auto-estima), finalizando com unanimidade na recomendação para o ingresso de novos participantes. Há registro de fotos e vídeo. Palavras chave: musicoterapia; coral do CEREST; terapia. Introdução A música tem sido uma grande aliada na melhoria da qualidade de vida das pessoas, e cada vez mais inserida como alternativa de relaxamento e ocupação lúdica. Tem transcendido o plano do bem estar individual, de iniciativas pontuais, para se tornar uma forma de terapia estruturada. "...Musicoterapia é a utilização da música e/ou seus elementos (som, ritmo, melodia e harmonia) por um musicoterapeuta qualificado, com um cliente ou grupo, num processo para facilitar, e promover a comunicação, relação, aprendizagem, mobilização, expressão, organização e outros objetivos terapêuticos relevantes, no sentido de alcançar necessidades físicas, emocionais, mentais, sociais e

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Artigo Original

CORAL DO CEREST DE VITÓRIA DA CONQUISTA:

PROJETO “NÃO SE ESPANTE, CANTE”

Autor: Alberto Lima Ferreira ¹ ¹ Médico do CEREST de Vitória da Conquista/BA, docente do Curso de Medicina da UESB

Resumo

O Coral do CEREST (Centro de Referência em Saúde do Trabalhador) iniciou suas

atividades em 2005 formado por integrantes usuários, e familiares, além de

trabalhadores do serviço, originada da Secretaria Municipal de Saúde representada

pela coordenação do CEREST naquele ano. É parte importante de uma forma de terapia

e convivência interpessoal, procurando amenizar as dificuldades da rotina pessoal e

coletiva e elevar a qualidade de vida dos seus participantes. Esse trabalho apresenta

dados bastante positivos, quantitativos e qualitativos, mostrando o perfil dos coralistas

(prevalência feminina, idade acima dos 40 anos, grupo com profissões heterogêneas, e

tempo de participação no coral). Evidenciou-se a vontade de todos na permanência

dessa atividade em face da repercussão muito benéfica na saúde (bem estar mental,

elevação da auto-estima), finalizando com unanimidade na recomendação para o

ingresso de novos participantes. Há registro de fotos e vídeo.

Palavras chave: musicoterapia; coral do CEREST; terapia.

Introdução

A música tem sido uma grande aliada na melhoria da qualidade de vida das pessoas, e

cada vez mais inserida como alternativa de relaxamento e ocupação lúdica. Tem

transcendido o plano do bem estar individual, de iniciativas pontuais, para se tornar uma

forma de terapia estruturada. "...Musicoterapia é a utilização da música e/ou seus

elementos (som, ritmo, melodia e harmonia) por um musicoterapeuta qualificado, com

um cliente ou grupo, num processo para facilitar, e promover a comunicação, relação,

aprendizagem, mobilização, expressão, organização e outros objetivos terapêuticos

relevantes, no sentido de alcançar necessidades físicas, emocionais, mentais, sociais e

cognitivas. A Musicoterapia objetiva desenvolver potenciais e/ou restabelecer funções

do indivíduo para que ele/ela possa alcançar uma melhor integração intra e/ou

interpessoal e, conseqüentemente, uma melhor qualidade de vida, pela prevenção,

reabilitação ou tratamento".

(Federação Mundial de Musicoterapia Inc. 1996).

A aplicação da musicoterapia como especialidade terapêutica deve requerer uma

formação específica para tal finalidade, mas não impede ou desabilita as iniciativas de

pessoas, grupos ou instituições de implantarem essa modalidade nas suas rotinas.

Existem diversas empresas que se utilizam dessa modalidade, instituindo o canto coral

para os seus funcionários e colaboradores.

Em 2005, o CEREST (Centro de Referência em Saúde do Trabalhador) de Vitória da

Conquista/BA, por iniciativa e apoio da sua coordenação naquele momento, e

percebendo a necessidade de estruturar atividades de terapia ocupacional aos pacientes

assistidos pelo Centro, implantou o Coral do CEREST através do projeto “Não se

Espante, Cante”. Ao longo desse tempo, mesmo com alternância na coordenação do

CEREST, que nesse momento (agosto/2012), está na quarta coordenação, esse trabalho

vem se mantendo ativo, sempre encontrando suporte dessas pessoas que assumiram o

cargo, assim como do nível central da Secretaria Municipal de Saúde. O grupo vem se

reunindo regularmente (proposta quinzenal, 1 hora e 30 minutos), composto de usuários

e trabalhadores do CEREST, além de convidados e familiares. A condução do coral e

regência é executada pelo médico da equipe, que também é músico. Há períodos de

maior intensidade dos ensaios, mas devido à dificuldade em conciliar os horários de

todos, é natural o espaçamento dos encontros. Dentro da filosofia terapêutica e de bem

estar, o ensaio pode acontecer em apenas 30 minutos, somente com dois participantes,

ou até com intervalo de um mês, o que não diminui a sua importância. “...poucas

pessoas hoje, mas foi maravilhoso...”. Não existe cobrança. Já passaram pelo grupo

cerca de 30 pessoas. Alguns chegaram e ficaram desde o início, outros compareceram,

desaparecem, retornaram e lamentaram a ausência com suas justificativas pessoais,

todas sempre compreensíveis. A maioria dos usuários que pode participar mais

ativamente estão afastados do trabalho devido ao comprometimento da sua saúde

(ocupacional ou não).

Atualmente o coral é composto por 12 integrantes mais assíduos. Foram diversas

apresentações ao longo desse tempo: Natal da Cidade na praça, confraternizações

internas, na abertura de eventos especialmente relacionados à Saúde do Trabalhador,

feira de saúde, e até participação surpresa na formatura do Curso de Medicina da

Universidade do Sudoeste da Bahia (UESB) em 2011. No repertório estão inclusas

canções da música popular brasileira de vários estilos, sugeridas e aprovadas

coletivamente pelo grupo, e adaptações próprias (arranjos e letras).

Objetivo

Apresentar a importância do Coral do CEREST na vida dos participantes.

Materiais e métodos

Foram aplicados questionários (anexo 1), coletando a opinião dos integrantes e ex-

integrantes sobre a vivência no Coral do CEREST, com ênfase na influência gerada por

essa experiência. De todas as pessoas que participam ou participaram do coral até o

momento, algumas não foram localizadas ou estavam há muito tempo ausentes,

resultando em 13 respostas. Procurou-se definir um breve perfil do “coralista”, seguido

das repercussões propriamente ditas da ação, aspectos práticos para facilitação dos

encontros, finalizando com sugestões de melhoria. Outra coleta de dados e registros é a

construção de um vídeo com momentos dos ensaios e apresentações, entrevistas faladas

e fotos de apresentações e momentos festivos.

Resultados

Relativos ao perfil dos coralistas, a maioria é de usuários e convidados (familiares), com

participação efetiva de três trabalhadores(as) (médico, enfermeira/coordenadora e

assistente social). As profissões foram diversas (operador de máquina, auxiliar

administrativo, cozinheira, auxiliar de confeitaria, dona de casa, professora, cobrador de

ônibus, motorista e estudante), sendo que 46% estão ativos e 54% inativos nas suas

ocupações. 23% são homens e 77% mulheres, no entanto essa proporção se inverte

considerando-se a faixa etária: 77% das pessoas com 41 anos ou mais, 15,5 % entre 18 e

40 anos e 7,5% abaixo de 18 anos (uma filha de usuária).

Referente ao tempo de participação dos integrantes, mais que 50% estão ou estiveram

por mais de três anos freqüentando (gráfico 1).

Gráfico 1. Tempo de participação no Coral do CEREST de Vit. da Conquista, 2005 a 2012.

Feito o levantamento dos motivos que levaram as pessoas a participarem do Coral,

houve uma diversidade de inferências, com mais de uma resposta por entrevistado: ter

presenciado uma apresentação prévia, empenho e disposição pessoal do regente,

remédio para as “dores da alma”, recomendação do médico, ter uma vivência mais

coletiva, fazer o bem para o outro, ter um momento prazeroso. Uma maior

concentração de opiniões ficou em “gostar de cantar” e convite de um usuário (quatro

respostas cada), sendo que sete pessoas referiram aderir para fazer uma terapia.

Quando questionados sobre benefícios para a sua saúde, houve unanimidade na resposta

positiva, diferenciando a melhoria em algumas faces (respostas múltiplas).

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frequencia não permaneceram devido à total incompatibilidade com horário de trabalho

e/ou estudo.

Os aspectos motivacionais para participarem do coral se concentraram bastante na

subjetividade (melhorar as dores da alma, empenho pessoal, bem estar pessoal e do

outro, momentos de prazer). Muitos convidados (não usuário ou trabalhador)

permaneceram no coral. Um dos pontos unânimes foi o benefício à saúde, envolvendo o

bem estar mental (grande procura nas turbulentas rotinas de vida). As respostas

apontaram para um aumento na freqüência dos ensaios, melhoria do espaço físico e a

recomendação para que outras pessoas agreguem ao grupo (sinal claro de vontade para

que essa atividade continue). Finalizando com algumas falas dos participantes, muito

espontâneas e profundas, traduzem melhor a importância dessa ação.

“As pessoas acham que não tem tempo, depois que adoece é que a gente

valoriza o apoio das pessoas...o coral apareceu num momento difícil da minha

vida...pensei até em suicídio.” “... ajudou a amenizar as humilhações sofridas

no INSS...melhora além da dor física.” “...estava muito fechada, sozinha...só

tenho essa tarde para me tratar sem dor, diferente de fisioterapia e acupuntura,

peço que não acabe” “... estava quase em depressão, o coral ajudou a me

levantar” “...as pessoas se preocupam com os outros” “ ...me motivou a

tocar violão” “...estava muito abalada, me senti querida e valorizada de novo,

importante, minhas idéias foram válidas” “...me distrai, saio de alma lavada”

“...melhorei a depressão, me deixa bem....quero me organizar para voltar

logo”. “...quando terminam os ensaios do coral me sinto com a alma leve,

reflito nas letras das músicas...” “...quando estamos apresentando e vejo o

brilho nos olhos de quem está assistindo, sinto que além de ser terapia para os

que participam, encanta os que estão na platéia...” “...cantar me faz sentir viva,

com o coração pulsando...me dá uma sensação de felicidade e lapida a minha

sensibilidade.”

Agradecimentos a toda a equipe do CEREST de Vitória da Conquista/BA, à Secretaria

Municipal de Saúde, e especialmente aos participantes do Coral, pela sua persistência e

confiança nesse trabalho.

Anexo 1: Questionário de entrevista

Anexo 2: Fotos

Anexo 3: Vídeo