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Artigo Soraya Teles Quirino Entrega

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Trabalho de conclusão de curso USP

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Uso da Conversação Didática Guiada no texto-base: um caminho para a autonomia na aprendizagem.

Soraya Teles Quirino

[email protected]

Universidade de São Paulo

Resumo: Este trabalho apresenta contribuições para a elaboração de textos-bases de cursos de educação a distância e analisa a relevância desse material para os processos de ensino-aprendizagem a distância. Investiga-se o papel que a linguagem empregada na escrita de textos-base desempenha no processo de aprendizagem para isso foi utilizada a pesquisa bibliográfica e entrevistas realizadas com alunos cursistas de Ensino a Distância (EAD). Concluiu-se que o uso de uma linguagem que prioriza a comunicação direta com o aluno nos moldes da teoria da “Conversação Didática Guiada” de Borje Holmberg é um recurso capaz de motivar os alunos e levá-los a assumir a autonomia do processo de aprendizagem.

Abstract: This paper provides contributions to the writing process of didactic guides of distance education courses and to analyze the role played by this material in distance learning processes. It also investigates the role that the language employed in the writing of didactic guides plays in the learning process through scientific literature research and interviews with distance education learners. This research concluded that using the principles postulated by Borje Holmberg in the “Guided Didactic Conversation Theory” in the writing of didactic guides of distance education courses is a viable alternative to motivate students and lead them to take control of the learning process in an autonomous manner.

1. IntroduçãoA motivação para esta pesquisa advém da experiência da autora como aluna de EAD e

autora de materiais didáticos. De um lado, existe a frustração em observar a baixa qualidade dos materiais didáticos com os quais a autora teve contato ao longo da experiência como aprendiz de cursos a distância. Por outro lado, há o desejo da profissional de tentar atender aos anseios dos alunos, que são o centro do processo educacional e são para eles e pensando neles que se deve produzir os objetos de aprendizagem. Afinal, estamos conseguindo motivar os nossos alunos a explorar o que o material didático tem a oferecer? Quais as características de um material didático levam o aluno a desenvolver a autonomia nos estudos?

A Educação a Distância é uma modalidade de ensino que pressupõe a separação físico-temporal entre aluno e professor e o uso das tecnologias da informação e comunicação para mediar o processo de aprendizagem. Deve-se compreendê-la como um tipo distinto de oferta educacional que possui suas próprias particularidades, as quais se diferem da educação presencial (BRASIL, 2007).

Um dos objetivos centrais dos projetos de Educação a Distância é desenvolver nos aprendizes a autonomia para que sejam capazes de construir por si próprios novos conhecimentos, o que pressupõe a superação do modelo de ensino centrado na figura do professor e na transmissão de conteúdos em prol da autogestão da aprendizagem (KENSKI, 2007).

Neste contexto, o material didático assume um lugar de destaque no processo educativo, pois é através dele que acontece a mediação pedagógica.

[...] os materiais didáticos são recursos que merecem uma atenção especial quando se trata de educação a distância, pois nessa modalidade, os materiais didáticos,

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em seus mais variados formatos, são responsáveis pela organização, desenvolvimento e dinâmica de todo o processo educativo. Para tal, os materiais didáticos devem ser planejados, desenvolvidos e aplicados respeitando as características e especificidades que a modalidade exige (CORRÊA, 2013, p. 136).

Os primeiros materiais didáticos produzidos para EAD online foram influenciados pelas práticas pedagógicas da educação tradicional, baseada no modelo do professor-autoridade detentor de todo o conhecimento e no aluno-ouvinte passivo. Desta forma, os materiais possuíam um formato mais conservador que não permitia que fossem traçadas muitas conexões e interações entre professor, aluno e conteúdo (SANTOS, 2009).

A própria Web vivia um momento muito diferente há 18 anos, quando a lei 9.394 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) tornou possível a ampliação da EAD para todos os níveis educacionais. Àquela época, a Internet era um repositório de informações que estavam disponíveis para todos os usuários da rede e podiam ser lidas, mas não modificadas ou reeditadas de forma colaborativa. Os sites eram estáticos e as formas de interação dos usuários com os conteúdos disponíveis eram extremamente limitadas, o que ficou conhecido como Web 1.0, termo criado em conexão ao termo Web 2.0 (O’ REILLY 2005).

Com o advento da Web 2.0, os websites deixaram de lado sua estrutura unidirecional e rígida, adotando modelos de contribuição e interatividade. Conforme O’Reilly (2005), o usuário saiu da condição de mero consumidor para produtor de conhecimento. Isso causou um enorme impacto na forma como o indivíduo lida com a informação e ampliou consideravelmente as oportunidades de aprendizagem. É nesse contexto da Web 2.0, que o material didático para EAD vem sendo pensado e produzido atualmente.

Apesar da grande diversidade de recursos e ferramentas educacionais que surgiram com os avanços tecnológicos, o material didático textual continua a desempenhar um papel de extrema relevância para a construção do conhecimento nos processos de ensino-aprendizagem a distância. Um levantamento feito pela E-learning Brasil1, no qual os participantes de cursos EAD foram entrevistados para indicar sua forma de aprendizagem favorita, apontou que a maioria dos participantes aprendiam mais com a leitura de textos seja no formato impresso ou no digital.

Em praticamente todos os cursos de educação a distância, é possível notar a presença de um material textual, em formato impresso ou digital, que serve como base para os conhecimentos principais das disciplinas, e é conhecido como apostila, texto eletrônico, material didático impresso (MDI), entre outras denominações. Contudo, será convencionalmente chamado aqui de “texto-base”, pois não há a intenção de diferenciar se esse material está disponibilizado na forma impressa ou digital. Além disso, empreende-se um esforço para uma nomenclatura comum, pois ao longo dessa pesquisa foram encontrados diversos nomes associados a esse material2.

O texto-base se constitui no principal meio de gestão da aprendizagem e possui enorme importância para os processos de aprendizagem EAD, pois é a partir dele que o aluno irá fazer conexões, ressignificar conhecimentos e selecionar os conteúdos pelos quais possui mais interesse.

O objetivo do texto-base deve ser não só de garantir o desenvolvimento do conteúdo básico indispensável ao andamento do curso, mas também o de abrir oportunidades para o processo de reflexão-ação-reflexão por parte dos alunos. Nesse sentido, o texto deve possibilitar ao aluno, por meio de um processo dialógico, construir seu conhecimento sobre a área ou tema em foco (NEDER, 2009b, p.17)

1 Fonte: http://www.elearningbrasil.com.br/pesquisa/resultados/pesq_result_67.asp2 Neder (2009) é outra autora que utiliza essa denominação e menciona que alguns autores também o chamam de “guia didático”; Roesler e Sartori (2014) utilizam o nome “material escrito”; Averbug (2003) e uma grande parte dos autores utiliza “material didático impresso”, mesmo quando estão se referindo à tecnologia digital.

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Os textos-base produzidos hoje são muito mais dinâmicos e interativos graças aos novos recursos e ferramentas disponíveis na Internet. Um arquivo de texto hoje, não precisa mais ser apenas um emaranhado de letras, palavras e parágrafos. Com pouco esforço, ele pode se tornar um documento hipertextual e hipermidiático, no qual materiais audiovisuais podem ser inseridos em textos através de links, e quando acessamos esses links podemos nos deparar com outro que nos levará a um mapa mental ou a um podcast ou a uma fotografia. Assim, aumentamos as possibilidades de múltiplas interpretações e caminhos de aprendizagem que podem ser percorridos (POSSARI, 2009).

No entanto, não basta recorrer apenas aos recursos tecnológicos disponíveis para dar uma aparência inovadora aos objetos de aprendizagem. Se concebido dessa forma, o texto-base se torna apenas uma sobreposição vazia de textos, que estará longe de atender as demandas contemporâneas da aprendizagem autônoma. É a forma como ele será elaborado que vai fazer toda a diferença no processo, criando pontes entre os links, atribuindo-lhes sentido, instigando a curiosidade e conduzindo o aluno ao caminho da autonomia.

De acordo com Neder (2009a, p.43):

Como um dos interlocutores privilegiados no processo, cabe ao professor possibilitar ao aluno (receptor) constituir-se também em autor (emissor), crítico, ativo, de novos textos, ao mesmo tempo em que se constitui, ele próprio, também em aprendiz. É um processo de troca, diálogo.

A autora defende que por trás da escrita de um material didático há algo muito maior: a construção de um projeto educativo. A educação é uma prática social que acontece na interação entre indivíduos que fazem parte de uma determinada sociedade e um determinado tempo. O resultado dessa interação é a construção de sentidos que irão causar desdobramentos na vida das pessoas e da sociedade em geral. Segundo Neder (2009a, p.47) a autonomia do estudante deve ser uma das preocupações fulcrais da ação educativa, pois vivemos em uma época na qual o conhecimento se modifica e se reproduz de forma incontrolável. Portanto, a capacidade de aprender por conta própria e se manter sempre atualizado é uma competência essencial.

Averbug (2003) argumenta que os materiais didáticos para EAD devem ser concebidos segundo o princípio da aprendizagem significativa, trazendo temas que são relevantes e terão utilizações práticas na vida pessoal e profissional do aluno. Além disso, quando escolhemos o profissional que irá escrevê-lo, devemos ter em mente que a qualidade desse material será impactada pela criatividade, competência profissional e principalmente pela concepção pedagógica do professor autor. Se a opção pedagógica for por uma educação crítica, então a linguagem empregada em sua elaboração deve estimular a autonomia e a curiosidade.

Os Referenciais de Qualidade para a Educação a Distância (2007) explicitam a preocupação com a linguagem que será utilizada na redação de materiais EAD.

Outro aspecto relevante é a garantia de que o material didático propicie interação entre os diferentes sujeitos envolvidos no projeto. Para atender a estas orientações, o material deve [...] ser estruturado em linguagem dialógica de modo a promover autonomia do aluno, desenvolvendo sua capacidade para aprender e controlar o próprio desenvolvimento (BRASIL, 2007, p.15).

Borje Holmberg (1995) em sua teoria da “Conversação Didática Guiada” defende que o material didático desenvolvido com uma linguagem que priorize a comunicação direta com o aluno pode oferecer vantagens que impactam positivamente na motivação para os estudos e levar o aluno a alcançar a autonomia na aprendizagem. Segundo o autor, esse estilo de escrita resulta na ampliação da sensação de proximidade do aluno com o professor-autor, o aumento do senso crítico em relação aos conteúdos estudados e o incremento da interatividade do aluno com os materiais didáticos.

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A linguagem nunca é neutra e nossas escolhas linguísticas estão relacionadas com a nossa visão de mundo e, no caso do texto-base, com a nossa concepção de educação e aprendizagem. Ao redigir o material didático, o autor faz escolhas pedagógicas e para que elas façam sentido, e possam desempenhar o seu papel, os materiais precisam ser redigidos em uma linguagem que seja compatível com tais escolhas.

Assim, o presente trabalho se propõe a analisar o papel que a linguagem desempenha no processo de aprendizagem. Nesta pesquisa, objetiva-se responder à seguinte questão: entre as possíveis escolhas linguísticas do professor-autor, o uso da “Conversação Didática Guiada” em textos-base de cursos a distância contribui para promover a autonomia na aprendizagem?

Defende-se que quanto mais interativa for a linguagem utilizada na elaboração do texto-base, maior a possibilidade de o aluno exercer um papel ativo e autônomo em seu processo de aprendizagem. Por autonomia entende-se a capacidade que o aluno possui de controlar sua própria aprendizagem. Acredita-se que para que se possa elaborar um material didático capaz de garantir a interatividade necessária do processo ensino-aprendizagem é essencial que a Conversação Didática Guiada seja empregada como estratégia de linguagem na escrita de textos-base. Assim, o aluno terá o papel de arquiteto de seu próprio projeto de estudos, dentro de um contexto de aprendizagem autônoma.

Em suma, para que cumpra o seu papel, o texto-base precisa ser escrito em uma linguagem leve, palatável, que seja capaz de tecer um diálogo com o aluno, desafiá-lo a ir além, motivá-lo a fazer múltiplas conexões. Não basta apenas usar recursos como hipertexto e hipermídias, o autor tem que convidar o aluno a acessá-los, a navegar pelos seus nós.

A relevância desta pesquisa reside no fato de que, apesar de haver diversos estudos que tratam da elaboração de materiais didáticos para a EAD, observa-se que há uma lacuna no que diz respeito à importância da compatibilidade entre a linguagem na qual o material didático é redigido e seus objetivos pedagógicos. Além disso, nota-se que o texto-base é subestimado e possui um lugar desprivilegiado no meio acadêmico, o que pode ser observado com a dificuldade que se encontrou de achar artigos recentes sobre o tema. Além disso, notou-se a escassez de trabalhos que investigam e analisam a opinião dos alunos de EAD sobre o texto-base.

O objetivo geral desta pesquisa é analisar o papel que o diálogo didático utilizado na escrita do texto-base desempenha no processo de aprendizagem autônoma em um curso de pós-graduação a distância da Universidade de São Paulo.

Os objetivos específicos são:

Pesquisar a opinião de alunos de um curso de pós-graduação a distância da Universidade de São Paulo sobre a linguagem do texto-base

Sugerir o uso da nomenclatura “texto-base” para designar o material didático textual principal de cursos EAD.

Primeiramente, serão expostas as referências teóricas utilizadas para embasar esta pesquisa e, posteriormente, a metodologia empregada para conduzi-la. Em seguida, será feita a análise sobre os dados levantados na pesquisa de campo. Por fim, serão apresentadas as considerações finais.

2. Referencial TeóricoA relevância do material didático, denominados nessa pesquisa como texto-base, vem

sido amplamente debatida. Entre os autores que tratam do tema, destacamos Averbug (2003), Possari (2009), Anderson (2004), Filantro (2011), Holmberg (1995), Horn (2014), Koelling e Lanzirini (2009), Neder (2009) e Preti (2009). Apesar de analisarem o material didático a partir de diferentes questões, os autores tem em comum o fato de acreditarem que o texto-base desempenha um papel fundamental na construção do conhecimento e funciona como o principal pilar para aprendizagem autônoma.

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Averbug (2003) enfatiza a importância do material didático na EAD, e nos mostra que ao contrário do que ocorre na educação presencial, na qual o material didático é um recurso de apoio e pode até, em alguns casos, ser suprimido, ele se constitui como o principal canal de comunicação do professor com o aluno e tamanha a sua importância, muitas vezes ele acaba por se confundir com o próprio curso. Segundo a autora, há uma crescente demanda por EAD e ela se dá em diversos contextos socioeconômicos, logo, faz-se necessário utilizar todas as tecnologias disponíveis, pois nem todos os alunos têm acessos às mais recentes.

Além disso, não é necessariamente a tecnologia que irá garantir que a aprendizagem aconteça, mas sim a qualidade e consistência do que é colocado nela. Dessa forma, a autora destaca o papel do material didático impresso e sustenta que ainda há espaço para ele, pois apesar de ser uma tecnologia antiga “está inserido no conjunto de tecnologias educacionais disponibilizadas para a educação a distância, que podem contribuir para o desenvolvimento de projetos pedagógicos sintonizados com as necessidades educacionais que se apresentam para o nosso milênio” (AVERBUG, 2003, p.8).

O processo de leitura também foi influenciado pela Web 2.0, pois, a partir dos novos suportes eletrônicos e estruturas textuais da multimídia, o processo de leitura se tornou muito mais dinâmico e interativo, permitindo a sobreposição de diferentes mídias e diferentes recursos. Baseada nas ideias de Santaella sobre o leitor contemporâneo, Possari (2009, p.53) afirma que o ato de ler não é mais uma ação contemplativa e passiva, muito pelo contrário, “Estamos falando do texto que o leitor constrói à medida que opta por vias, nexos de sua preferência, ou seja, não há linearidade de escrita, de proposição ou de leitura”.

Anderson (2004) trata a importância da interação aluno-conteúdo como um dos pilares para que a aprendizagem efetiva ocorra. A análise destaca que a Internet possui diversos recursos e mídias que, ao serem disponibilizados no formato de hipermídia e hipertexto, podem ser usados pelos alunos que desejam mergulhar ainda mais fundo no objeto de conhecimento. Desta forma, devido a essa variedade de formatos e contextos que a Internet provê, os alunos podem traçar a sua própria rota no caminho para o conhecimento. O autor defende que o uso desses recursos está em consonância com a teoria de design instrucional construtivista, que enfatiza a importância da descoberta individual e da construção do conhecimento.

Nesse sentido, Filantro (2011) afirma que designer instrucional e professor conteudista devem trabalhar lado a lado para garantir a interação entre aluno e conteúdo instrucional. Para a autora, o desenvolvimento de uma conversa instrucional deve ser prioridade no processo de produção de materiais didáticos para EAD, pois é ela que irá guiar o aluno na exploração dos conteúdos.

Segundo a autora, cada área de conhecimento possui uma linguagem própria, isto é, jargões e peculiaridades léxicas e linguísticas que, em conjunto, colaboram para a compreensão de sua lógica interna. Contudo, se o educador só usar essa linguagem específica e técnica para compartilhar seus conhecimentos com os alunos, não estará desempenhando seu papel de maneira apropriada. Para que o aluno consiga compreender os conteúdos e interagir com eles é necessário que o educador faça uso do diálogo didático em seu discurso. Filantro define o diálogo didático como:

[...] uma comunicação de mão dupla, na qual cada parte se manifesta e está interessada no que a outra tem a dizer. [...] O diálogo didático envolve ainda comunicar conhecimentos, experiências e opiniões, bem como questionar, criticar e refletir junto com o aluno, de que modo ele também possa expor suas ideias, argumentar objetivamente utilizando a linguagem do domínio do conhecimento, assumir posições, criticar e pensar produtivamente participando de maneira ativa na construção do conhecimento. (FILANTRO, 2008 p.114).

Horn (2014) afirma que a linguagem é facilitadora da aprendizagem e possui um papel preponderante na qualidade dos materiais didáticos a distância, já que, é através dela que acontecerá a interação do aluno com o professor-autor e com o conteúdo a ser estudado. Para

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cumprir o seu papel, a linguagem precisa ser concebida de uma forma que possa garantir o diálogo com o aluno. “É, pois, fundamental refletir sobre o material didático impresso para a educação a distância que ressignifique a prática pedagógica e constitua um apoio ao processo de aprendizagem do aluno, ancorado na autonomia.” (HORN, 2014, p. 120).

Ainda de acordo com Horn (2014), por características que são intrínsecas aos processos de aprendizagem a distância, como o distanciamento espaço-temporal entre aluno e professor, o material precisa ser desenvolvido de forma a motivar o aluno a se desenvolver, ganhar e manter sua atenção e estimular sua autonomia. Assim, o cuidado com a linguagem é essencial e definitivo para que os materiais didáticos possam desempenhar seu papel.

Segundo Preti (2009), o texto base é uma porta de entrada para o universo de novos conhecimentos, por isso a escrita desse material não deve ser confundida com a escrita textos acadêmicos. Apesar de essa atitude ser comum entre os autores, ela se configura como um erro que pode interferir no processo de aprendizagem. Para o autor, “O grande desafio do autor de texto didático é aproximar o discurso científico (escrito) às condições do discurso narrativo (oral)”. (PRETI, 2009, p.15).

Em sua teoria da “Conversação Didática Guiada”, Holmberg (1995) destaca o papel dos processos de comunicação na educação a distância e acredita que há dois tipos de diálogos envolvidos nesse processo. Um é o diálogo simulado que o ocorre na interação do estudante com o material didático oferecido pela instituição. O outro é o diálogo real que é realizado através do contato do aluno com a própria instituição, ou seja, a interação direta com o coordenador, o professor, o tutor e outros alunos.

A conversação didática acontece a partir da conjunção entre o diálogo real e o diálogo simulado. Para que o diálogo simulado seja possível, é essencial que os materiais oferecidos aos alunos sejam de excelente qualidade e possuam as seguintes características:

- Linguagem clara, objetiva e menos formal;

- Temas acessíveis, inteligíveis e fluxo de informação moderado;

- Uso de uma linguagem de estilo pessoal, na qual há referência direta ao leitor;

- Utilização de sugestões e instruções explícitas e

- Recursos que viabilizem a troca de ideias e a formulação de questionamentos.

Em suma, para Borje, se elaborados a partir desses princípios, o material resultaria em um processo de conversa simulada entre professor-autor e aluno e entre o aluno e ele mesmo, o que resultaria numa maior motivação do aprendiz e na promoção de sua autonomia para os estudos.

Holmberg (1995, p.2) se baseia em alguns pressupostos para justificar a sua teoria. O primeiro deles é que o uso desses princípios leva à interpersonalização do processo de ensino-aprendizagem que é capaz de incrementar o prazer e a motivação para o estudo. Essa interpersonalização pode e deve ser promovida através da elaboração de materiais de autoestudo de qualidade e da comunicação bidirecional a distância. Além disso, Holmberg acredita que a comunicação estabelecida na forma de uma conversa é mais eficiente e fácil de ser lembrada.

No que diz respeito aos processos comunicativos na aprendizagem, Kenski (2008) afirma que o propósito fundamental da ação comunicativa que faz parte de todo processo educacional é o aprender. “A ação educativa que se realiza como aprendizagem é mais complexa e compreende a essência da comunicação. Exige a participação plena e a intercomunicação frequente entre os diversos parceiros do processo” (KENSKI, 2008, p. 651).

De acordo com Neder (2009a, p.43) “Pensar o processo de comunicação na perspectiva da relação comunicacional, portanto de comunicação interativa ou multidirecional, é imprescindível para qualquer modalidade educativa, sobretudo quando essa modalidade é a EAD”.

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Resta ainda fazer uma definição dos conceitos de interação e interatividade. De acordo com Wagner (1994), interação é uma ação recíproca que para acontecer demanda a existência de dois objetos e duas ações, que irão se influenciar mutuamente. Interatividade é a capacidade que um sistema possui de proporcionar conexões e interações. Para que a interação ocorra é fundamental que o sistema onde desejamos que a interação ocorra seja dotado de interatividade.

Para embasar a concepção de aprendizagem que foi adotada nesta pesquisa, foram escolhidos os teóricos Freire e Vygotsky, que irão dialogar de forma mais próxima, e Siemens, que irá complementar essa discussão ao tratar das mudanças na educação na idade digital.

Freire acredita que ensinar não é o mesmo que transferir conhecimentos e que o educador não possui a palavra final sobre os temas e conteúdos que estão sendo abordados. O autor critica aquilo que chama de “concepção bancária de educação”, que é o tipo de educação tradicional, mecanicista, na qual o professor deposita conhecimentos nos educandos e espera que eles o memorizem e, depois, o reproduzam. Dentro dessa perspectiva, o processo de aprendizagem é vertical e autoritário, partindo do princípio de que o aluno é uma caixa vazia e o professor é detentor de toda a sabedoria. Freire (1987, p.40) afirma que neste tipo de educação:

Não pode haver conhecimento, pois os educandos não são chamados a conhecer, mas memorizar o conteúdo narrado pelo educador. Não realizam nenhum ato cognoscivo, uma vez que o objeto deveria ser posto como incidência de seu ato cognoscente é posse do educador e não mediatizador da reflexão crítica de ambos.

Em contraste a essa concepção, o autor defende que o aluno deve possuir um papel preponderante e ativo no processo de aprendizagem e que o papel do professor é o de criar condições para que os educandos possam construir eles mesmos novos conhecimentos. Assim, o educador que se propõe a praticar esse tipo de educação deve estar disposto a criar um clima democrático dentro da sala de aula, no qual a indagação, a curiosidade e os questionamentos são partes indispensáveis do processo de aprendizagem. (FREIRE, 2011, p. 27).

O fundamental é que o professor e alunos saibam que a postura deles (...) é dialógica, aberta, curiosa, indagadora e não apassivada, enquanto fala ou enquanto ouve. O que importa é que professor e alunos se assumam epistemologicamente curiosos. (FREIRE, 2011, p. 52)

Vygotsky (1998) critica a aquisição mecânica de conhecimentos, baseada na memorização e repetição de conteúdos e defende que o aluno deve desempenhar um papel ativo na aprendizagem. O autor acredita que a integração do conhecimento é mais intensa quando os alunos são instigados a relacionar novos conhecimentos àquilo que já sabiam, quando interagem e cooperam com pessoas em seu ambiente.

Nesse contexto, o papel do professor é o de mediar a aprendizagem utilizando estratégias que levem o aluno a tornar-se independente buscando por si mesmo a aquisição de novos conhecimentos. Para Vygotsky, a aprendizagem de fato somente acontece quando o aluno passa de um momento de estranhamento do objeto a um estágio no qual ele o internaliza e é capaz de ressignificá-lo dentro de sua própria lógica.

Siemens foi escolhido para enriquecer nossa discussão, pois apesar da enorme relevância de Freire e Vygotsky para nossa pesquisa, esses dois autores não vivenciaram a aprendizagem na era digital.

Em sua teoria do conectivismo, Siemens (2004) sustenta que o conhecimento pode residir fora dos indivíduos em dispositivos não humanos, como bancos de dados e redes sociais. Assim, os indivíduos não precisam mais acumular em si mesmos os conhecimentos, pois os mesmos estão disponíveis na Internet e podem ser acessados rapidamente e utilizados apenas quando necessários.

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O ponto de partida do conectivismo é o indivíduo. O conhecimento pessoal é composto por uma rede que alimenta as organizações e instituições, que por sua vez alimenta de volta a rede e então continua a prover aprendizagem para o indivíduo. Este ciclo de desenvolvimento do conhecimento (da pessoa para a rede para a organização) permite que os aprendizes se mantenham atualizados em seus campos, através das conexões que formaram (SIEMENS, 2004, p. 7).

Desta forma, a habilidade que o indivíduo tem de selecionar e filtrar as informações que lhes são relevantes é central para o processo de aprendizagem. Outro processo mental relevante é a capacidade de realizar conexões entre conceitos e ideias, pois, nas palavras de Siemens, “... as conexões que nos capacitam a aprender mais são mais importantes que nosso estado atual de conhecimento” (SIEMENS, 2004, p.6).

Nesta discussão sobre o processo de aprendizagem e os papeis desempenhados por professor e aluno, cabe ainda falar em mediação pedagógica. A mediação pedagógica é um conceito central na nossa pesquisa, já que defende-se um processo educacional no qual o professor atue como facilitador mediador, motivador e facilitador, e que, através de materiais didáticos e técnicas, leve o aluno a desenvolver o senso crítico, a relacionar conhecimentos prévios a novos e a atuar de forma ativa e participativa.

De acordo com Belloni (2001, p.26), mediatizar significa:

[...] conceber metodologias de ensino e estratégias de utilização de materiais de ensino/aprendizagem que potencializem ao máximo as possibilidades de aprendizagem autônoma. Isso inclui desde a seleção e elaboração de conteúdos, a criação de metodologias de ensino e de estudo, centradas no aprendente, voltadas para a formação da autonomia, seleção dos meios mais adequados e a produção de materiais, até a criação de estratégias de utilização de materiais e de acompanhamento do estudante de modo a assegurar a interação do estudante com o sistema de ensino.

Deste modo, nesta pesquisa parte-se do princípio que a linguagem é primordialmente dialógica. Para Bakhtin (2002), a linguagem é um fenômeno social de interação verbal, isto é, um processo de interação entre interlocutores que culmina na produção de significados dentro de um determinado contexto sócio-histórico-cultural, que no caso de nossa pesquisa é o contexto do processo de ensino-aprendizagem a distância. A linguagem não é estática e amórfica, pelo contrário, o discurso é vivo e dinâmico, uma vez que ele se adapta, se transforma e pode ser apropriado de diferentes formas.

A orientação dialógica é naturalmente um fenômeno próprio a todo o discurso. Trata-se da orientação natural de qualquer discurso vivo. Em todos os seus caminhos até o objeto, em todas as direções, o discurso se encontra com o discurso de outrem e não pode deixar de participar, com ele, de uma interação viva e intensa (BAKHTIN, 2002, p.88).

Bakhtin (2002) defende que a unidade básica da linguagem é o enunciado. Todo enunciado para ser emitido leva em conta o discurso do outro que perpassa o seu próprio discurso. Assim, um enunciado é sempre constituído por vários outros. Para existir o enunciado demanda a presença de um enunciador e um receptor dentro de um determinado tempo e local. Ninguém cria um enunciado sem que haja a intenção de ser respondido, ou seja, o enunciado pressupõe a presença e a intervenção do outro.

É na interação entre interlocutores que reside o princípio fundador da linguagem. [...] O sentido do texto e a significação das palavras dependem da relação

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entre sujeitos, ou seja, constroem-se na produção e na interpretação dos textos; a intersubjetividade é anterior à subjetividade, pois a relação entre os interlocutores não apenas funda a linguagem e dá sentido ao texto, como também constrói os próprios sujeitos produtores do texto (BAKHTIN, apud BARROS, 2005b, p. 30-31).

Assim, cada indivíduo se apropria de um mesmo enunciado à sua forma. Isso significa dizer que cada vez que um texto é apropriado por um novo sujeito, em um novo contexto, temos um novo enunciado.

Freire destaca o papel da dialogicidade, isto é, a capacidade de se estabelecer o diálogo genuíno, problematizador e construtivo no processo de ensino-aprendizagem. Segundo o autor, o diálogo é um fator de transformação e libertação do homem, pois é através dele que os indivíduos são capazes de se posicionar de igual para igual, de penetrar no mundo do outro e de desenvolver o senso crítico. (FREIRE, 1987, p. 46) Desta forma, o diálogo é uma condição essencial para que a “educação como prática da liberdade” (ou “autêntica”) aconteça.

3. Método Optou-se por realizar uma pesquisa do tipo qualitativa, exploratória e bibliográfica

associada à pesquisa de campo. A pesquisa exploratória tem como objetivo familiarizar-se com um assunto que foi insuficientemente explorado, visando a fazer contribuições para torná-lo mais explícito e/ou a elaborar hipóteses (GIL, 2002).

Além disso, essa pesquisa foi desenvolvida a partir de fontes bibliográficas, através das quais se analisou os diferentes posicionamentos acerca do tema a fim de elaborar uma conclusão própria sobre o objeto de pesquisa e levantar uma hipótese e da pesquisa de campo a partir da qual se levantou informações que pudessem corroborar com a hipótese levantada.

Nessa pesquisa, a leitura é vista como um processo dialógico e dinâmico, no qual se dá um diálogo entre autor e leitor, mediado pelo texto escrito (MOOR, 2001). Segundo Kleiman, a leitura é um processo individual, mas ao mesmo tempo social, uma vez que pode ser situada em um determinado momento sócio-histórico, que determina contexto, linguagem e sentido. Além disso, acredita-se que o leitor exerce um papel ativo no processo de leitura e usa seu conhecimento de mundo para interagir com o texto e reconstruir conceitos e ideias (KLEIMAN, 2004, p.36).

Inicialmente, foi feito um levantamento preliminar da bibliografia e realizada uma leitura exploratória do material escolhido, o que possibilitou uma maior familiaridade com a área de estudo e, posteriormente, a formulação do problema. A próxima etapa dessa pesquisa foi a elaboração do plano provisório de assunto através do qual se definiu a estrutura lógica do trabalho visando a garantir que suas partes estivessem vinculadas entre si e ordenadas para proporcionar a unidade do conjunto.

O passo seguinte foi a identificação e a leitura exploratória de novas fontes que colaborassem para o desenvolvimento e aprofundamento da pesquisa. Entre as fontes escolhidas encontram-se livros de leitura corrente, periódicos científicos, teses e dissertações.

As leituras foram divididas em dois blocos. O primeiro bloco é constituído por autores que pesquisaram e dissertaram sobre autoria de materiais didáticos para educação a distância. Tentou-se encontrar afirmações que não só corroborassem com a nossa hipótese, mas também as que as refutassem. O segundo bloco de leituras com os autores que serviram como base para o conceito adotado de aprendizagem e linguagem.

Após a etapa de leituras, seguiu-se a pesquisa de campo qualitativa que foi realizada no formato de entrevistas semiestruturadas. Segundo Duarte (2002, p.147) “a entrevista semiestruturada é uma técnica de coleta de dados que supõe uma conversação continuada entre informante e pesquisador e que deve ser dirigida por este de acordo com seus objetivos”. Em entrevistas semiestruturadas, são apresentados tópicos e/ou questões abertas para os entrevistados, o que permite respostas mais subjetivas sem que se perca o quantitativo de vista.

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Tentou-se pensar na melhor maneira de se elaborar as perguntas e tópicos levando em consideração o referencial teórico, tomando cautela para que as perguntas não apresentassem nenhum tipo de viés. Com o decorrer das entrevistas, é natural que o entrevistador reveja seu roteiro e o adapte, o que aconteceu nessa pesquisa em pelo menos dois momentos, sendo um deles a finalização da rodada de entrevistas-teste. Além disso, algumas indagações não previstas realizadas quando os entrevistados surgiram com alguma informação relevante ou quando não desenvolveram muito alguma indagação já prevista.

Para ajudar a manter o rigor científico, utilizou-se uso de um grupo de controle e dois grupos experimentais. Segundo Gil (2002), o grupo de controle possibilita que o pesquisador estabeleça um parâmetro para que consiga comprovar que as mudanças observadas no grupo experimental podem ser atribuídas ao fator que está sendo testado. Quando não se observa nenhuma alteração entre o grupo de controle e o grupo experimental, é porque o fator analisado não está interferindo no processo em estudo.

Como qualquer outra técnica de coleta de dados, a entrevista também possui suas limitações e armadilhas. Por isso, na hora da análise de dados e uso dos recortes das falas é preciso cuidado para que o discurso do autor não se confunda com o discurso dos entrevistados (OLIVEIRA, 2010).

Além disso, na metodologia de base qualitativa é quase impossível determinar quantos indivíduos serão entrevistados, já que, essa decisão depende da qualidade, profundidade e grau de recorrência das informações adquiridas ao longo das entrevistas (DUARTE, 2002). No total, 28 indivíduos foram entrevistados, e a decisão de parar com as entrevistas surgiu quando se notou ter atingido um ponto de saturação, isto é, quando se observou que com os depoimentos obtidos seria possível: 1) identificar padrões nas respostas no que diz respeito às características do texto-base; 2) verificar algum nível de generalização no que tange o tipo de texto pelo qual os alunos possuem preferência.

As entrevistas foram conduzidas da seguinte forma:

- Decidiu-se fazer uma rodada de entrevistas-teste para verificar a adequação e relevância dos tópicos e perguntas. As entrevistas-teste também foram úteis para que a entrevistadora se familiarizasse com o método;

- O segundo passo foi entrevistar o grupo de controle. Solicitou-se que esse grupo realizasse uma leitura prévia de dois textos: um que continha os elementos linguísticos que são defendidos em nosso trabalho e outro sem esses elementos. Assim, o grupo de controle foi o grupo que obteve conhecimento de todo o processo e foi usado como parâmetro para que se pudesse avaliar os grupos estudados.

- O próximo passo foi a entrevista do primeiro grupo experimental, denominado grupo A, ao qual foi solicitada uma leitura prévia somente do texto que possuía o fator que está sendo aqui estudado, a saber, os princípios de linguagem da “Conversação Didática Guiada”.

- Após entrevistar o grupo A, entrevistou-se o segundo grupo experimental, denominado grupo B, que recebeu um texto sem o fator estudado.

A última etapa foi analisar e comparar as respostas do grupo A e B com as respostas obtidas a com o grupo de controle e avaliar a interferência ou não da variável.

Os nomes dos entrevistados foram mantidos em sigilo, então decidimos denominar os entrevistados pelo grupo ao qual pertenciam e a ordem pela qual foram entrevistados. Entrevistados do grupo A – Entrevistado A1, Entrevistado A2, e assim sucessivamente; Entrevistados do grupo B – Entrevistado B1, Entrevistado B2, e assim sucessivamente.

4. Análise de resultados

4.1 Discutindo o texto-base

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O texto-base é um material didático que contém uma exposição didática dos conteúdos que serão explorados em um determinado curso e sugestões de acesso a outras fontes de conhecimento. Segundo Neder (2009), esse material é geralmente produzido pelo docente responsável pela disciplina que pode contar, ou não, com o auxílio de um designer instrucional. O essencial é que esse material seja produzido por uma equipe que possua formação acadêmico-cultural consistente e tenha em mente as peculiaridades do processo de aprendizagem a distância.

Com a ausência do contato direto entre aluno e professor, que caracteriza a EAD, o texto-base pode ser visto como um dos principais canais de comunicação entre ambos. Não que esse material seja capaz de substituir a figura do professor, mas é a sua voz, o representa e o faz presente no momento da leitura. No que diz respeito aos processos comunicativos na aprendizagem, Kenski (2008) afirma que o propósito fundamental da ação comunicativa que faz parte de todo processo educacional é o aprender. “A ação educativa que se realiza como aprendizagem é mais complexa e compreende a essência da comunicação. Exige a participação plena e a intercomunicação frequente entre os diversos parceiros do processo” (KENSKI, 2008, p. 651).

Por isso, o professor-autor deve ter como principal preocupação a elaboração de um material que garanta a interatividade necessária do processo de ensino-aprendizagem de forma a contribuir para autonomia do aluno. O texto deve ser capaz de persuadir, seduzir e convidar o leitor à descoberta do aprendizado, e para que isso seja possível é essencial a preocupação com a linguagem.

Segundo Horn (2014, p. 120),

Nos materiais didáticos para cursos a distância, mormente os impressos, a linguagem tem um papel preponderante. Ela age como facilitadora da aprendizagem e é através dela que o aluno realizará a interação com o professor e com o conteúdo/tema e, dessa forma, deverá ser concebida de modo a propiciar um diálogo com ele.

Holmberg (1995) acredita que o principal propósito da educação a distância é a autonomia do aluno. Preocupado com formas de comunicação na EAD, especialmente aquelas estabelecidas através dos materiais didáticos, o autor propõe a “Conversação Didática Guiada” como forma de garantir uma maior eficiência no processo de ensino-aprendizagem. A “Conversação Didática Guiada” seria resultado tanto da interação aluno-professor quanto da interação aluno-conteúdo. Para que a interação aluno-conteúdo ocorra, é imprescindível que os materiais sejam elaborados a partir de alguns princípios, nos quais a linguagem tem um papel preponderante.

Essa pesquisa defende que a preocupação com a linguagem deve ser uma preocupação central no processo de elaboração do texto-base e que o emprego dos princípios postulados pela “Conversação Didática Guiada” é essencial para promover a autonomia do aluno no processo de aprendizagem. Para que se pudesse validar essa proposta, optou-se por realizar pesquisa de campo através de entrevistas com alunos de EAD. A análise das amostras se desenvolverá no tópico a seguir.

4.2 Perfil do grupo de entrevistados

Para que a análise dos dados levantados a partir das entrevistas fique mais completa e inteligível, é essencial compreender o perfil da amostra de entrevistados. No total, 28 indivíduos entre 28 e 54 anos foram entrevistados. Todos eles são, no presente momento, alunos de um curso de pós-graduação da Universidade de São Paulo na modalidade a distância.

No que diz respeito à experiência com cursos na modalidade a distância, verificou-se que todos os entrevistados declararam possuir mais de uma experiência com estudos EAD, que

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variam desde cursos livres de curta duração a cursos de longa duração, como outro curso de graduação ou de pós-graduação.

O nível de escolaridade do grupo é bastante variado, mas reparou-se que todos os 28 entrevistados possuem nível superior completo e quatro deles disseram estar em sua segunda graduação, sendo que cursaram a primeira na modalidade presencial. No tocante à especialização stricto sensu, dois alunos afirmaram possuir doutorado e outros dois, mestrado. Oito pessoas alegaram estar em sua segunda pós-graduação de nível lato sensu e outras quatro estão cursando duas especializações lato sensu simultaneamente.

A área de formação dos entrevistados inclui: engenharia civil, biologia, pedagogia, história, letras, jornalismo, ciências sociais e administração. Treze dos 28 entrevistados são profissionais da educação a distância.

A análise da amostra proporcionou que se chegasse a duas conclusões relevantes para essa pesquisa: 1) Os entrevistados possuem um perfil relativamente variado no que diz respeito à área de atuação profissional, o que proporcionou a oportunidade de coletar dados de indivíduos que estão acostumados com saberes e métodos de ensino-aprendizagem diferentes, pois cada área de conhecimento possui suas peculiaridades; 2) Os entrevistados possuem grau de escolaridade relativamente alto e estão familiarizados com os estudos à distância.

Separamos os entrevistados em dois grupos, os quais foram denominados grupo A e grupo B. Ambos os grupos receberam textos-base de EAD autênticos, sendo que o grupo A recebeu um material que foi escrito em consonância com a proposta dessa pesquisa e o grupo B recebeu um material didático que foi elaborado com uma proposta divergente, e pode-se dizer até oposta da que essa pesquisa propõe.

4.3 O que os alunos pensam sobre a linguagem do texto-base?

Apesar de todos os avanços tecnológicos, o texto-base é um recurso educacional que continua sendo extensivamente utilizado em cursos de EAD. Segundo o Censo EAD (2010), mais de 90% das instituições entrevistadas fazem uso desse material. A leitura, no geral, possui um lugar privilegiado nos processos de ensino-aprendizagem em nossa sociedade e faz parte da formação dos estudantes dos mais diversos níveis escolares.

De acordo com Silva (2011, p. 21),

Na EAD, os materiais didáticos impressos (MDI), revelam-se como um dos principais meios de orientação dos percursos de aprendizagem dos alunos. Considerando aspectos sociais, econômicos e culturais, os estudantes brasileiros valorizam muito os materiais didáticos impressos, tendo em vista até a falta de estrutura adequada, no que se refere aos Ambientes Virtuais de Aprendizagem.

Os alunos entrevistados reconhecem a importância texto-base como principal suporte ao processo de aprendizagem, o que fica evidenciado nos trechos a seguir:

(o texto-base) É o que vai dar subsídio para eu fazer pesquisa, é a partir desse texto que eu vou ampliar o conhecimento. Se eu tiver uma dúvida em relação ao que eu ler nele, eu vou pesquisar, ir atrás mesmo. É o primeiro material que eu consulto antes de começar a me aprofundar mais na disciplina. Mesmo que haja um vídeo ou um arquivo de áudio, é pra ele que eu vou primeiro. (Entrevistado A8)

O texto-base, pra mim, ele é super importante. Ele tem que existir, independentemente da forma como o curso seja apresentado, eu acho que tem que ter o texto-base porque é pra ele que a gente corre quando aperta alguma coisa. Se você se distraiu em um texto do vídeo, se você perdeu uma aula, o texto base vai estar ali, acessível e é pra ele que eu recorro. (Entrevistado B2)

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Como vemos no discurso dessa amostra, os alunos de ambos os grupos esperam que mais do que apenas transmitir conteúdos, o texto-base deve ser elaborado com o objetivo de ser um guia em sua rota de aprendizagem, pois é a partir dele que encontram os recursos necessários, que os habilitam a gerir o próprio processo de aprendizagem, ressignificar conhecimentos pré-adquiridos e selecionar assuntos pelos quais tem mais interesse e deseja se aprofundar.

O padrão da linguagem utilizada foi outra questão que foi investigada nas entrevistas. Afinal, deve-se empregar uma linguagem mais densa e acadêmica ou uma linguagem mais objetiva, direta e mais próxima à coloquial? De acordo com Preti (2009), a escrita de um texto acadêmico, como dissertações, teses e artigos científicos, se difere da escrita do material didático e o grande desafio do professor-autor é exatamente ser capaz de adaptar o discurso científico para que todos os alunos possam compreendê-lo.

É um equívoco o professor conceber o texto didático como um espaço para publicação científica, colocando-se na atitude de escrever para os pares e não para os estudantes. Houve casos de autores em que simplesmente encaminharam sua tese ou uma coletânea de seus artigos publicados [...] (PRETI, 2009, p.15).

Para Holmberg (1995), a interpersonalização da aprendizagem potencializa no aprendiz a motivação e o gosto pelo que está sendo estudado. E para que essa interpersonalização seja possível, o uso de uma linguagem objetiva amigável é uma condição imprescindível.

Tudo isso pode ser confirmado a partir do relato dos alunos. Enquanto os alunos do grupo A destacaram uma satisfação com a linguagem, acreditando que ela facilitou a compreensão dos conteúdos e proporcionou prazer no ato da leitura, os alunos do grupo B afirmaram que apesar de terem compreendido o texto, a leitura não prosseguiu de forma tão fluída e não correspondeu às expectativas a qual o texto-base se propõe.

Para corroborar essa afirmação, escolheram-se dois trechos que foram representativos:

Achei ele (o texto) simples, bem gostoso de ler e me prendeu bastante a atenção. Gostei da forma como a autora para explicar alguns conceitos antes de trabalhar com eles, não deixou passar batido, sabe? Não foi um texto que tive que me tomou muito tempo para ler, tem uma linguagem menos formal. Se eu começo a ler o material didático a linguagem é muito pesada, eu faço somente uma parte da leitura por vez. [...] O texto-base é apenas o meu primeiro contato com a disciplina, depois dele é que eu vou me aprofundar mais, sei lá, não dá pra ser ele ter uma linguagem muito complexa não, senão vira um artigo. (Entrevistado A2)

Ah, eu não diria que foi um texto difícil de ler, foi ok, até porque eu não tenho problema com leitura, mas poderia ter sido mais didático, nem todo mundo tem a facilidade que eu tenho. Se é o material didático inicial, o material que vai abri o curso, tem que simplificar, tem que falar mais simples. Havia alguns termos que devem ser mais técnicos, eu não conhecia. No início eu fui atrás de alguns, depois eu deixei passar. [...] Eu gosto quando o texto-base me envolve mais. (Entrevistado B4)

Com a leitura dos depoimentos, pode-se perceber que a forma como a linguagem é empregada impactou principalmente os alunos em relação à motivação que tiveram para continuar a leitura. Além disso, está presente em ambos os discursos a noção de que o texto-base não tem a função de esgotar os temas de uma disciplina e, sim, fazer uma introdução simplificada dela. A questão de que o texto-base é um percurso inicial e não um texto científico foi mencionada por 13 dos 18 entrevistados do grupo experimental, o que sugere que os alunos possuem a expectativa de que esse material seja elaborado de forma diferenciada.

Os acadêmicos precisam perder a resistência de se expressar de forma mais direta e simplificada. O emprego de uma linguagem mais enxuta e direta, não resulta necessariamente no empobrecimento do texto e não faz seu conteúdo parecer menos culto. O historiador José Murilo de Carvalho, professor universitário e membro da Academia Brasileira de Letras, opõe-

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se a este tipo de mentalidade, o que deixou claro em um artigo de tom irônico que escreveu para a o Jornal O Globo intitulado “Como escrever a tese certa e vencer3”.

Dois pontos importantes na feitura da tese são as citações e o vocabulário. Você será identificado, classificado e avaliado de acordo com os autores que citar e a terminologia que usar. [...] Além dos autores e do vocabulário, é preciso ainda aprender a escrever como um intelectual acadêmico (note que acadêmico não se refere mais à Academia Brasileira de Letras, mas à universidade). Sobretudo, não deixe que seu estilo se confunda com o de jornalistas ou outros leigos. Você deve transmitir a impressão de profundidade, isto é, não pode ser entendido por qualquer leitor. (CARVALHO, 1999)

Isso leva à questão seguinte, que é a da presença de elementos que tornam a relação do leitor com o texto mais próxima e pessoal. Uma das premissas da teoria da “Conversação Didática Guiada”, elaborada por Holmberg (1995), é que mensagens emitidas e recebidas em tom de uma conversa são mais facilmente compreendidas e a motivação para os estudos a distância pode ser fomentada pela comunicação bidirecional. O autor acredita que o estabelecimento de uma boa relação com o aprendiz depende da forma como o conteúdo do curso é apresentado e na escolha dos meios mais apropriados para o estabelecimento dessa relação do docente com o aluno

Para Silva (2011), é essencial que o autor realize uma comunicação direta com o leitor com o intuito de despertar a sua atenção e curiosidade ao longo da leitura do texto. De acordo com a autora, a referência direta ao leitor funciona como um convite para que o leitor assuma a coautoria do texto e o estimula a acessar conhecimentos prévios e fazer inferências. Além disso, o aluno se sente como um interlocutor mais próximo do autor e percebe que o texto se aproxima mais dele, como se estivessem conversando.

Vejamos a seguir o que os entrevistados falaram a esse respeito.

Pelo que eu entendi, a forma que o autor encontrou de se aproximar do leitor foi se comunicando diretamente com a gente, falando “caro leitor”, ou “você” mesmo. É realmente uma forma de talvez tentar criar uma certa afetividade com a gente, e isso é importante para a aprendizagem, eu quando estou ensinando também quero criar esse tipo de relação com meus alunos. E eu gosto muito quando o autor fala diretamente comigo, a gente já está tão longe fisicamente do professor. (Entrevistado A5)

Prefiro textos assim, mais dialógicos, que falem comigo, porque isso me faz parar um pouco para pensar sobre o que o autor está falando. Já observei nesse e em outros textos que quando o autor fala diretamente é porque é algum ponto importante, então eu tento entender o que ele quer de mim naquele momento. Agora se o autor para toda hora para falar com o leitor, aí fica cansativo demais. Essa pausa, essa conversa tem que ser comedida e acontecer em momentos estratégicos. (Entrevistado A3)

Na verdade, o que prevalece no texto é o discurso direto, corrido, sem nenhuma referência ao leitor. É um texto-base um pouco mais fechado e acadêmico. O autor está no seu lugar e o leitor no dele. [...] Acho que podia ter sido escrito de uma forma mais interativa, se aproximando mais do aluno. Eu já li alguns textos-base que tinham umas caixas ou balões em destaque e o autor falava com o aluno de uma forma mais direta. A gente ouve tanto falar de interatividade na educação, lê tanto sobre isso, mas parece que na prática os professores nem sempre fazem uso disso. (Entrevistado B1)

Os alunos entrevistados demonstraram gostar dessa forma de aproximação do texto com o leitor e reconheceram a sua importância para aumentar a sensação de interatividade com o texto. Como se pode notar na fala do entrevistado A5, a aproximação do leitor com o aluno

3 Fonte disponível em http://www.ppghis.historia.ufrj.br/media/carvalho_conselhos_doutorando.pdf.

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proporcionada pelo pronome “você” remeteu a aluna à questão da afetividade no processo de ensino-aprendizagem. Sendo ela mesma professora, pode perceber, só que desta vez do ponto de vista de aluna, os impactos significativos de um ambiente de aprendizagem amigável, que nesse caso, foi o de amenizar a distância física do professor.

Para Freire (2011), a afetividade é um elemento essencial para que possa ocorrer a aprendizagem e ela pode ser demonstrada principalmente pelos momentos de diálogo entre aluno e professor. Assim como Freire, Holmberg (1995) também acredita que ao estimular o aluno emocionalmente, o professor pode levá-lo a criar uma maior empatia e interesse pessoal pela matéria, o que facilitaria a aprendizagem.

O entrevistado B1, por sua vez, criticou a ausência dessa proximidade e destacou que o uso de momentos de diálogos direto com o aluno que podem acontecer através de “caixas ou balões” aumentaria a interatividade do aluno com o texto. Nesse sentido, Koelling e Lanzarini (2009) defendem que se pretendemos estabelecer, através do material didático, um espaço de interatividade entre emissor e receptor que vá garantir um processo de aprendizagem nos moldes do que Freire chamava de educação libertária, e que permita ao aluno exercer um papel ativo na construção de seu conhecimento, devemos prezar por uma linguagem dialógica.

Ademais, a interpelação ao leitor desperta a sua atenção, como se fosse um anúncio de que algo maior está para acontecer, o que pode ser comprovado no discurso do Entrevistado A3. Ao ser chamado a participar do texto, o aluno foi levado a refletir sobre o que lhe está sendo proposto e a acessar conhecimentos previamente adquiridos, se posicionando de forma ativa no processo de aprendizagem.

Isso significa que o uso do pronome pessoal “você” deve ser utilizado em momentos oportunos, especialmente naqueles nos quais se faça necessária uma pausa para a reflexão. Não há nada de errado em se referir diretamente ao leitor, não se deve ver esse recurso como uma forma de infantilizar o leitor ou subestimá-lo. Machado de Assis, um dos maiores nomes da literatura Brasileira, recorria à interpelação direta ao leitor como recurso retórico, o que se transformou em uma das marcas de seu estilo de escrita.

Conseguintemente, evito contar o processo extraordinário que empreguei na composição destas Memórias, trabalhadas cá no outro mundo. Seria curioso, mas nimiamente extenso, e, aliás, desnecessário ao entendimento da obra. A obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pago-me da tarefa; se te não agradar, pago-te com um piparote, e adeus. (ASSIS, 1997, p. 89)

Contudo, o uso desse recurso deve ser comedido, conforme foi destacado pelo Entrevistado A3, para que o texto não se torne pesado, repetitivo e se desvie de seu propósito inicial que é o de colaborar para a construção de conhecimentos do leitor.

Para Possari (2009), a partir dos novos suportes eletrônicos e estruturas textuais da multimídia, o processo de leitura se tornou muito mais dinâmico e interativo, permitindo a sobreposição de diferentes tipos de recursos.

Devemos, como educadores, atentar-nos para as novas formas de percepção e cognição que os atuais suportes eletrônicos e estruturas híbridas e alineares do texto escrito estão fazendo emergir, dilatando, com isso, o conceito de leitura, ou seja, a expansão do conceito de leitor de livro para leitor de imagem e para leitor de formas híbridas de signos, incluindo o leitor que navega pelas infovias do ciberespaço. (POSSARI, 2009, p.45)

A Internet, na era da Web 2.0, oferece recursos que antes só estavam disponíveis na forma impressa e hoje podem ser encontrados em diferentes formatos de mídia. Assim, o texto-base deve ser elaborado com inspiração no hipertexto, pois esta estratégia permite que cada aluno acesse a diferentes camadas do texto, percorra diferentes percursos e realize leituras plurais a fim de compor sua autonomia nos estudos (Possari, 2009).

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O tratamento dado aos hiperlinks e à consulta a bibliografia sugerida foi outro tema debatido com os alunos e que proporcionou respostas significativas. Afinal, o que os alunos esperam dos hiperlinks e bibliografia sugeridos? Os alunos tem o costume de consultá-los? O que motiva o aluno a ir além do texto-base e ampliar seus conhecimentos?

O tratamento dado aos hiperlinks foi bem interessante. Primeiro, porque o autor os destacou, colocou em uma fonte maior, isso dá um destaque ao conteúdo. Eu costumo acessar alguns hiperlinks, mas depois da minha leitura. Como esses tiveram perguntas relacionadas a eles, eu fiquei curiosa e cliquei. [...] Esse tipo de estratégia é chamativa, é algo a mais, eu acredito que tudo que o professor puder fazer para despertar um interesse extra nos alunos, é válido. Mas não pode ser uma pergunta boba, sem conteúdo, tem que ser bem elaborada e trazer uma reflexão. Essa daí foi interessante, por isso eu me fixei. Então acredito que a pergunta foi o que me fez olhar os hiperlinks durante a leitura. (Entrevistado A7)

Eu acessei alguns hiperlinks sim. Nem sempre eu clico em todos, acho que pode quebrar um pouco o meu raciocínio, especialmente porque eu as vezes nem sei o que vou encontrar ali. [...] Na verdade, não costumo ver nada de diferente sendo feito com eles (os hiperlinks) não. Acho que poderia o conteúdo dos hiperlinks poderia ser melhor explicado, sabe? Afinal, o que eu vou encontrar ali? Um texto? Um vídeo? Podia ter um resumo também daquilo que a gente vai ver, porque aí é mais fácil perceber se aquilo tem relevância pra mim. (Entrevistado B3)

Os dois discursos possuem um ponto em comum muito interessante que é o da importância de dizer algo sobre os hiperlinks que são sugeridos ao longo ou no final do texto. Pelo observado nessas e em outras entrevistas, os alunos realmente esperam obter informações prévias sobre os hiperlinks. Segundo o Entrevistado A7, as perguntas que acompanhavam os hiperlinks foi exatamente o que despertou sua curiosidade e o influenciou a consultar o conteúdo de forma imediata. Portanto, se o que almejamos é criar um texto-base hipermidiático, dinâmico, que proporcione idas e vindas por diversos caminhos e meios, então temos que criar mecanismos para despertar o interesse do aluno e fazê-lo navegar pelos nós do documento.

No geral, os entrevistados do grupo B, mencionaram a ausência de alguma referência aos hiperlinks existentes em seus textos. Como notou o Entrevistado B3, essa ausência gera uma insegurança no aluno e isso o leva a não acessar o conteúdo, afinal ele não tem certeza se o que foi sugerido é relevante para si. Antes de tomar a decisão de comprar um livro, o consumidor sempre está ciente de seu conteúdo seja por ter lido a sinopse ou por ter recebido indicação de um conhecido. Muitos autores tem o costume de escrever apenas “Se quiser saber mais sobre o assunto”, outros nem isso, então como não o aluno não sabe exatamente o que aquele conteúdo está fazendo ali e qual o seu papel, ele tende a não acessá-lo, ou a deixar o acesso para depois.

Anderson (2004) acredita que é principalmente através de conteúdos que são disponibilizados através de hipertextos e hipermídia que os alunos podem se posicionar como sujeitos ativos no processo de aprendizagem. Nesse sentido, Holmberg (1995) afirma que a eficácia do ensino está diretamente relacionada à maneira e aos meios através dos quais o conteúdo é apresentado, por isso é fundamental que o material didático faça uso de múltiplas situações de aprendizagem. Assim, é fundamental que o autor seja criativo, e encontre a sua forma de entusiasmar o aluno a consultar os hiperlinks e sugestões de leituras. De acordo com os dados coletados nas entrevistas, uso de perguntas de compreensão ou um resumo do conteúdo que está para ser acessado, parecem ser úteis.

5. Conclusão

O texto-base é um material didático essencial para os processos de ensino-aprendizagem a distância, pois atua como o alicerce sobre o qual se sustenta a elaboração de novos conhecimentos. É através dele que o aluno irá obter os principais conhecimentos das disciplinas

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e terá a oportunidade de aprofundá-los através do acesso a materiais textuais e outros recursos didáticos que são sugeridos por esse material.

Observou-se nas entrevistas que o texto-base possui um enorme prestígio entre os alunos de Educação a Distância, sendo o material que é capaz motivar e guiar o aluno ao longo de sua jornada de estudos. Alem disso, notou-se que os entrevistados costumam associar ao texto-base o sucesso ou fracasso das disciplinas.

Por isso, acredita-se que a produção desse material deve ser cuidadosamente planejada, especialmente no que diz respeito a seus princípios didático-pedagógicos, que precisam estar em acordo com um dos objetivos centrais da Educação a Distância que é proporcionar a autonomia do aluno.

Assim, se o objetivo do professor-autor ao conceber o texto-base é colaborar para a aprendizagem autônoma, então ele precisa estar preocupado em incluir na escrita elementos que irão proporcionar maior diálogo e proximidade entre os atores do processo de ensino-aprendizagem. O estilo de escrita do texto-base tem de estar em consonância com as escolhas pedagógicas de seu autor, caso contrário corre-se o risco que os objetivos de aprendizagem não sejam atingidos.

De acordo com as informações levantadas nas entrevistas os alunos conseguem alcançar uma maior autonomia nos estudos quando:

O texto proporciona uma maior interatividade com o leitor, através de referência direta ao mesmo, pois isso o leva a perceber a presença do professor-autor que está por trás do texto e a se sentir parte do processo de ensino-aprendizagem;

São feitas questões relacionadas ao conteúdo do texto em momentos oportunos, o que motiva o aluno a realizar uma reflexão mais profunda sobre o tópico estudado e ir em busca de fontes para responder ao questionamento quando não podem fazê-lo com o conhecimento que possuem;

Os hiperlinks são precedidos ou seguidos de perguntas e informações relacionadas a seu conteúdo, já que isso impulsiona a curiosidade do aluno em relação ao que está sendo sugerido e o faz perceber o propósito do link em si;

A linguagem empregada é simples, direta, objetiva, o que torna a leitura mais prazerosa e significativa.

Por isso, essa pesquisa defende que os princípios postulados pela “Conversação Didática Guiada” de Borje Holmberg parecem ser uma alternativa viável para a elaboração de textos-base. Para Holmberg (1995) a aprendizagem deve engajar os alunos em uma atividade intelectual que exija que eles experimentem novas ideias, reflitam sobre os conteúdos e ampliem seu senso crítico. Para isso, ele propõe que o material didático seja apresentado de uma forma na qual haja uma comunicação direta e interpessoal com o aluno, com o intuito de fazer com que esse aluno se sinta envolvido pelo material, aumentando, assim, a motivação para os estudos.

Essa pesquisa teve como objetivo contribuir para uma melhor compreensão do tema nela tratado e não esgotá-lo, especialmente porque a linguagem não é a única questão a ser considerada na produção de materiais didáticos, ainda que seja um aspecto relevante do processo. Além disso, as entrevistas acabaram por proporcionar dados inesperados sobre o tema que podem ser explorados em uma pesquisa futura, como, por exemplo, a questão do layout do texto-base.

Uma das principais limitações desta pesquisa reside na dificuldade que se encontrou de encontrar referências bibliográficas recentes que tratassem da escrita de material didático. A maior parte dos artigos data da última década e poucos foram escritos nos últimos anos. Outra limitação é que os resultados foram restritos apenas à percepção dos alunos quando o ideal seria também entrevistar profissionais da área, o que pode ser feito em outro trabalho.

6. Referências Bibliográficas

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