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AS CHUVAS DE JANEIRO/2004 NO NORDESTE DO BRASIL, SUAS
CARACTERÍSTICAS ATMOSFÉRICAS E SEUS IMPACTOS NOS RECURSOS
HÍDRICOS DA REGIÃO
José Maria Brabo Alves1, José Nilson B. Campos1,2, Flaviano F. Ferreira1, Ticiana M. Carvalho
Studart2
RESUMO: Este artigo faz uma análise das fortes chuvas ocorridas em janeiro de 2004 no Nordeste
do Brasil e seus impactos nos recursos hídricos da região. Os resultados mostraram que as chuvas
observadas sobre o NEB, por exemplo, para o estado do Ceará, tem período de retorno da ordem de
100 anos. Em outra análise investigou-se o que ocorreu nas características atmosféricas para
explicar a alta precipitação ocorrida no mês de janeiro de 2004, na Região Nordeste. A partir dos
desvios normalizados de janeiro (1971-2000), foram escolhidos 6 anos referentes a janeiros
chuvosos (1974, 1977, 1985, 1992 e 1994) e 3 anos a secos (1976, 1990 e 1993), para comparar
essas configurações com o janeiro de 2004. Os principais resultados mostraram que, em janeiro de
2004, os ventos alísios de nordeste ficaram mais intensos do que os alísios de sudeste,
impulsionando a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) a atingir o setor norte do NEB, como
também um anômalo transporte de umidade oriundo da Amazônia e do Oceano Atlântico na baixa
troposfera. Esse padrão termodinâmico, favoreceu a uma intensificação na Zona de Convergência
do Atlântico Sul (ZCAS), possibilitando a maiores penetrações das frentes frias oriundas do sudeste
do Brasil a permanecer mais ao norte do NEB. Este padrão observado em janeiro de 2004 foi
consistente, embora menos evidente em algumas variáveis, com padrão médio para a composição
de anos chuvosos no mês de janeiro (1971-2000). Para anos de janeiros secos essas características
foram contrárias.
ABSTRACT: The presents paper analyses the strong rainfalls that occurred over Northeast Brazil
(NEB) in January 2004 and its impacts in water resources in the region. The results showed that the
rainfall over Northeast Brazil (NEB) observed in January, for instance, in Ceará State, have
recurrence time around 100 years. Another analysis compared the occurrence of an extremely wet
period over NEB during January 2004, with atmospheric and oceanic patterns observed during the
same month in the past (1971-200). The data used for the comparison comprised the month January
for the period 1971 to 2000, from NCEP-NCAR reanalysis and rain data from FUNCEME and
1 FUNCEME - Rui Barbosa,1246,Aldeota-60115-221, Fortaleza-email: [email protected] 2 Universidade Federal do Ceará - Centro de Tecnologia e Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental
2
INMET over the NEB. The methodology consisted of comparing atmospheric fields with global and
regional features of the atmosphere and oceans that occurred concurrent with wet and dry Januarys
over NEB during the period 1971-2000. Six years (1974, 1977, 1985 and 1994) and three years
(1976, 1990 e 1993) were classified as wet and dry years over NEB, and were used to make a
comparison on the thermodynamic features of January of 2004. The main results suggest that in
January of 2004, the northeast trade winds were more intense than the southeast trades, and the
Intertropical Convergence Zone (ITCZ) reached the northern portion of NEB, contributing to the
transport of humidity from the Amazon region and the Atlantic Ocean into NEB (a feature not
observed in dry Januarys over the region). These features proportionate the intensification of the
South Atlantic of the Convergence of Zone (SACZ), and deep penetration of cold fronts from
higher latitudes of the Southern Hemisphere over NEB. The penetration of mid-latitude baroclinic
systems into the deep tropics also was observed during wet Januarys of other years, but not during
dry ones.
Key-words: Northeast of Brazil (NEB), Atlantic Ocean, Precipitation
Palavras-chave: Nordeste do Brasil (NEB), Oceano Atlântico, Precipitação.
INTRODUÇÃO
O Nordeste do Brasil (NEB) é localizado entre os paralelos 1oS e 18oS e os meridianos 35oW
e 47oW, tem uma área aproximada de 1,5 milhões de Km2, e é conhecido como uma região
problemática do ponto de vista climático. A precipitação é muito variável e condiciona as atividades
sócio-econômicas. Na maior parte dessa região, a precipitação é escassa e tem flutuações interanuais
muito altas ([11], [6], [7], [10], [2]). Essa variabilidade causa secas severas e enchentes em anos
diferentes, e algumas secas duram dois anos ou mais. Na área afetada pela maioria das secas,
chamada de “Polígono das Secas”, a precipitação total média anual é menor do que 800 mm, caindo
para 500 mm no interior, com algumas localidades com precipitação total média anual da ordem de
300 mm, como é o caso de Cabaceiras na Paraíba. Dentro do Polígono das secas existem sub-regiões
serranas onde a precipitação total média anual ultrapassa os 1.000 mm. No Litoral e Zona da Mata
(leste da região, fora do Polígono das Secas), a precipitação chega a mais de 2.000 mm. Assim, além
da distribuição espacial irregular, o NEB possui alta variabilidade interanual de precipitação.
Existem pelo menos seis sistemas atmosféricos que produzem precipitação significativa no
NEB: a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), as bandas de nebulosidade associadas a Frentes
Frias, os Distúrbios de Leste, os Ciclones na Média e Alta Troposfera do tipo Baixa Frias, cold-lows,
(conhecidos como Vórtices Ciclônicos de Ar Superior, VCAS), as Brisas Terrestre e Marítima e a
Oscilação de 30-60 dias. Esses fenômenos atuam em sub-regiões distintas e se superpõem em
algumas sub-regiões, nas mesmas épocas ou em épocas diferentes. Alguns desses sistemas são
influenciados pelo albedo e orografia. Os VCAS são transientes, variam muito de posição e não
possuem uma sub-região preferencial para atuar, embora possam modificar o tempo em todo o NEB,
atuando por vários dias. As brisas ocorrem na faixa costeira de todo o NEB, em quase todos os
meses do ano, e seus efeitos podem ser sentidos até 400 Km dentro do continente. Durante os meses
de janeiro e fevereiro, a precipitação sobre o NEB é influenciada pelas frentes frias que chegam à
Bahia ocasionando instabilidade, que favorece a formação de convecção nos estados mais ao norte,
principalmente no sul dos estados do Maranhão, Piauí e Ceará ([1], [6], [9], [12], [13]). Também são
importantes as presenças em altos níveis dos VCAS associados com frentes frias (Kousky e Gan
1981). Janeiro é, climatologicamente, um dos meses mais chuvosos do centro-sul do NEB e o mês
mais chuvoso da pré-estação do setor norte do NEB.
Na pré-estação (novembro a janeiro) as chuvas do NEB aparentemente sofrem pouca
influência das condições de contorno à superfície, por exemplo a Temperatura da Superfície do Mar
(TSM), como acontece com o seu período chuvoso, em particular do seu setor mais semi-árido ([7],
[8]). Essa característica é ilustrada na Figura 1 que mostra a correlação das anomalias de chuva para
o período novembro a dezembro, média para uma área do NEB (2oS-15oS e 55oW-37oW) e as
anomalias de TSM nos oceanos Atlântico e Pacífico. Pode-se observar que as condições térmicas do
4
Pacífico não têm influência significativa no total de chuva desse período (valores de correlação não
são significativos estatisticamente, segundo teste t Student, r > 0,3 é significativo a 95%), embora a
configuração da correlação seja similar ao observado entre essas variáveis para a estação chuvosa do
semi-árido nordestino. Isto é a presença de anomalias negativas na bacia do Pacífico e Atlântico
Norte e positivas no Atlântico Sul. Ressalta-se uma área junto a costa do NEB com valores
superiores a 0,6.
Figura 1 - Correlação linear entre as anomalias de Temperatura da Superfície do Mar(TSM) e as anomalias de chuva para uma área do NEB (2oS-15oS e 55oW-37oW). Valores de r em módulo superiores a 0,3 são significativos a 95% segundo teste t Student.
Relatos mostraram que janeiro de 2004 foi o janeiro mais chuvoso de todas as séries de
observações do NEB, inclusive tendo um total médio de chuva na região superior aos meses de abril
e março de alguns anos com observações no passado. Ressalta-se que abril e março são os dois
meses mais chuvosos da estação chuvosa do setor norte do NEB. As chuvas foram tão intensas em
janeiro de 2004 que inundaram várias cidades do NEB e áreas rurais com o arrombamento de várias
barragens e elevando à cota máxima a maioria dos reservatórios da região. A Figura 2 mostra o total
de chuva observado em janeiro de 2004 e sua anomalia, onde é evidenciado o quadro de chuvas
intensas ocorridas do NEB. Análises mais detalhadas da distribuição de chuva a partir de janeiro até
maio que ocorreram no Nordeste são apresentadas na seção de resultados. Uma análise mais
detalhada sobre as chuvas ocorridas na região de janeiro a maio/04 pode ser vista na seção de
resultados e discussão.
O objetivo deste trabalho foi de analisar os impactos das fortes chuvas ocorridas em janeiro
2004 em todo o Nordeste nas vazões afluentes em várias barragens da região e principais
características termodinâmicas que favoreceram as intensas precipitações sobre o NEB, ocorridos
durante o mês de janeiro de 2004. Além disso, foi feita uma comparação dessas características com
as observadas em anos em que ocorreram janeiros chuvosos e secos no período de 1971-2000. Uma
análise da evolução termodinâmica dos parâmetros atmosféricos e oceânicos sobre os oceanos
Pacífico e Atlântico Tropicais, entre os meses de Janeiro e Maio/2004, também foi executada para
5
mostrar as diferenças e o porquê das fortes chuvas observadas em janeiro e a deficiência de
precipitação ao longo do NEB a partir de março.
METODOLOGIA
Foram usados dados do projeto de reanálise do National Centers for Environmental
Prediction-National Center for Atmospheric Research (NCEP-NCAR) do National Oceanic and
Atmospheric Adminstration (NOAA), com resolução de 2,5 x 2,5 grau de latitude e longitude, desde
de 1971 a 2000 das variáveis vento (componentes u e v), umidade específica, divergência de massa,
e vorticidade. Os dados de precipitação utilizados foram obtidos do banco de dados da Fundação
Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (FUNCEME) e do Instituto Nacional de
Meteorologia (INMET) e serviram para comparar o janeiro de 2004 com os janeiros (1971-2000).
Com dados de precipitação foram classificados alguns anos considerados como janeiros
chuvosos (1974, 1977, 1985, 1992 e 1994) e secos (1976, 1990 e 1993). Para classificar os anos
chuvosos e secos, referentes ao mês de janeiro, foi calculado um índice médio anual de chuva
(período de fevereiro a maio) usando todos os postos pluviométricos do NEB. Esse índice foi dado
pela soma do total de cada ano (período fevereiro a maio) para cada posto com observação e
dividido pelo número de postos usados. Após esse procedimento calculou-se um desvio
normalizado pelo desvio padrão do referido índice (1971-2000) para cada respectivo ano. Os anos
classificados como chuvosos foram os com valor desse índice acima de 0,5 e os secos foram os que
tiveram esse valor abaixo de -0,5.
Para composição dos anos acima foram calculadas as suas médias para o mês de janeiro e
respectivas anomalias e comparadas com o observado em janeiro 2004 (média e anomalia) das
seguintes variáveis: fluxo meridional de umidade (g.kg-1.m/s) e vento (m/s), média dos níveis de
1000 a 850 hPa, 200 hPa, vorticidade relativa (s-1) em 200 hPa, um perfil vertical de velocidade
Omega (Pa/s), fluxo meridional de umidade (g.kg-1.m/s) com médias entre os meridianos de 54oW–
36ºW e fluxo zonal de umidade (g.kg-1.m/s) com médias entre as latitudes de 14ºS–1ºN. O período
base para climatologia usada nas anomalias de todos esses campos foi 1971-2000.
Análises de dados de vazão observada em várias barragens do Nordeste (Bacia do Rio São
Francisco - fonte de Dados: Figuras da WEB-CPTEC/INPE-área de energia) e cota volumétrica de
Açudes do estado do Ceará (fonte de dados Companhia de Gestão de Água do Ceará- COGERGH),
foram feitas para mostrar a evolução dos volumes afluentes nesses reservatórios a entre os meses
desde outubro/01 a junho/2004.
6
RESULTADOS E DISCUSSÕES
A evolução da distribuição de chuvas e a configurações termodinâmicas de janeiro a maio e
seus impactos nos recursos hídricos da região
Nessa seção faz-se uma análise da evolução da precipitação, vazão afluente em reservatórios
hídricos da região Nordeste e as principais características atmosféricas e oceânicas que controlam as
chuvas da região, principalmente no período de fevereiro a maio. As figura 3 e 4 mostram a
distribuição de chuva na região Nordeste do Brasil e vazão afluentes nas principais barragens da
região. Pode-se observar excesso de chuvas em janeiro e fevereiro em toda a região (figuras 3a, 3b),
e predomínio de chuvas baixo da média a partir de março, mais evidente em abril (figuras 3c a 3f).
Como o Pacífico Tropical, apresentava uma condição neutra (sem El Niño e La Niña), a
evolução das características termodinâmicas (ventos, pressão ao nível do mar e temperatura da
superfície do mar - figuras não mostradas), em particular no Atlântico Tropical, entre os meses de
março a maio/04, foram os principais fatores para uma redução das chuvas no setor norte do
Nordeste. Suas características foram semelhantes a ocorrentes à anos de escassez de chuvas na
Região ([7], [8]). Entre essas características cita-se: a presença de um gradiente negativo de TSM
entre os setores norte e sul da bacia do Atlântico Tropical, com o predomínio de anomalias positivas
(negativas) de TSM nos setores norte (sul) da bacia. Associados a esse gradiente térmico, foi
observado ventos alísios de nordeste (sudeste) mais fracos (fortes) que a climatologia no Atlântico
tropical. Essa configuração termodinâmica não favorece a descida e freqüência da Zona de
Convergência Intertropical (ZCIT), para latitudes mais próximas ou sobre a o norte do NEB,
reduzindo as chuvas na região.
a) b)
7
c) d)
e)
Figura 3 - Precipitação no Nordeste do Brasil acumulado por mês (mm), climatologia (mm) e anomalia (mm). a) janeiro/04, b) fevereiro/04, c) março/04, d)abril/04, f)maio/04. Fonte: Centro de Previsão de Tempo e Clima e Estudos Climáticos (CPTEC/INPE).
8
A Figura 4, mostra o período de retorno da chuva média mensal, meses de janeiro a junho,
ocorrida no estado do Ceará desde 1920 até maio de 2004, para vários limiares. Pode-se observar
que para a maioria dos totais mensais o período de retorno é inferior a 20 anos. Entretanto, para
chuva ocorrida em janeiro de 2004, média no estado da ordem de 400mm, o período de retorno é
em torno de 85 anos, indicando a característica anômala da precipitação ocorrida sobre o NEB
durante esse mês.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
1 2 3 4 5 6
Meses
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nos) >50 < 100 mm
> 100 mm> 200 mm> 300 mm
Figura 4 - Período de retorno em anos para o total médio mensal (janeiro a junho) de chuva no Estado do Ceará. Período de análise (1920-2004).
As vazões afluentes refletiram essas fortes chuvas de janeiro e fevereiro, a Figura 5 mostra o
volume afluente de água em várias barragens do NEB. Pode-se observar nessas figuras um
significativo aporte de água em todas barragens nesses dois meses. Nos meses seguintes, apesar das
chuvas terem sido mais escassas sobre a região ainda houve um aporte significativo de vazão,
embora com menor magnitude do que observado em janeiro e fevereiro, em todas as barragens.
Fato que se explica pelo escoamento superficial ainda influenciado pelas características de
saturação do solo, relacionada à alta incidência de chuva em janeiro e fevereiro. Nessas figuras
também é evidente o aporte de água com as abundantes chuvas de janeiro/04 no aumento do volume
útil, exceto na represa de Moxotó que não tem essa informação.
9
a) b)
c) d) Figura 5 - Vazões afluentes e suas comparações com suas respectivas MLT (m3/s) nas principais barragens da Bacia do São Francisco na região Nordeste. A curva em vermelho é o volume útil da barragem em percentual (escala da direita nas figuras). a) Itaparica, b) Moxotó, c) Sobradinho e d) Três Marias. Fonte: CPTEC/INPE.
O que ocorreu na atmosfera do Nordeste e vizinhanças que favoreceu o quadro de chuvas
intensas em janeiro 2004
Nessa seção faz-se uma análise das características atmosféricas ocorridas no mês de
janeiro/04 que foram anômalas em termos climatológicos e consequentemente causaram as fortes
chuvas sobre o NEB. Além disso, compara-se essas configurações com àquelas ocorridas em
janeiros secos e chuvosos sobre o NEB. A climatologia do vento e do fluxo meridional de umidade
para janeiro, observado em um nível médio entre 1000 e 850 hPa, é observado na Figura 6a, e a sua
anomalia para o mês de janeiro de 2004 na Figura 6b, como também a anomalia para anos
considerados de janeiros chuvosos pode ser observada na Figura 6c e para janeiros de anos secos
na Figura 6d.
Climatologicamente, o encontro dos ventos alísios de nordeste e sudeste são próximo à linha
de equador, o centro de alta pressão do Atlântico Sul fica localizado próximo a 30ºS e entre as
longitudes de 20ºW a 0ºE. O fluxo meridional de umidade para o NEB é normalmente de nordeste
10
vindo da Amazônia e do Atlântico próximo à borda oeste do Giro Subtropical do Atlântico Sul
(Figura 6a). Para janeiro de 2004, observa-se que os ventos alísios de nordeste ficaram mais
intensos do que os alísios de sudeste, impulsionando a ZCIT a atingir o setor norte do NEB, como
também transportando umidade da Amazônia e do Oceano Atlântico (Figura 6b). Esta configuração
tem uma semelhança com a Figura 6c, referente aos anos de janeiros chuvosos, com relação aos
ventos. Entretanto, em relação ao fluxo meridional de umidade, em janeiro de 2004 foi observado
um fluxo com maiores magnitudes e mais intenso climatologia.
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 6 – Vento (m/s) e Fluxo meridional de umidade *1000 (g.kg-1.m/s) para um nível médio entre 1000 e 850 hPa. Climatologia de janeiro (a), anomalia de janeiro de 2004 (b), anomalia para anos com janeiro chuvoso (c) e anomalia para anos com janeiro seco (d).
Na Figura 6b também pode-se observar que a circulação de ventos no Atlântico tropical
norte é menos intenso do que a climatologia, ressaltando-se presença de um ciclone entre as
latitudes de 20oN e 60ºN, com centro próximo a 50ºN, que é observado na composição de janeiros
chuvosos (Figura 6c), entretanto menos intenso. Pode-se observar também nessa Figura um dipolo
11
de fluxo meridional de sul (norte) entre o Atlântico subtropical norte (Atlântico equatorial e
proximidades). Essas características na composição de anos com janeiros secos são contrárias
(Figura 6d).
No Atlântico sul a configuração de janeiro 2004 dos ventos de sudeste soprando mais fortes
que a climatologia, junto a região de giro da Alta subtropical do Atlântico Sul, em torno de 20oS, no
setor sudeste da bacia. Na composição de anos chuvosos é interessante observar um anticiclone,
junto a costa sudeste do Brasil, configuração típica o enfraquecimento dos alísios de sudeste junto
ao costa do NEB. Essa característica é contrária a observada na composição de anos secos. Na
Figura 6d, são observadas anomalias também de ventos maiores de sudeste, próximo à região norte
do Brasil, com isso dificultando a penetração da ZCIT e umidade da Amazônia.
A Figura 7 mostra as mesmas variáveis da Figura 6, sendo que observada no nível de 200
hPa, para os ventos e 300 hPa para o fluxo meridional de umidade. A Figura 7a mostra a
climatologia de todos os janeiros, a Figura 7b a anomalia para janeiro de 2004, a Figura 7c a
anomalia para anos com janeiros chuvosos e a Figura 7d mostra a anomalia para anos de janeiros
secos. Climatologicamente, observa-se que sobre o Oceano Atlântico se forma um cavado com
centro em 30ºW e entre as latitudes de 5oS e 25ºS e que não se observa nenhum fluxo meridional de
umidade em 300 hPa, como era de se esperar, pois grande parte da umidade atmosférica fica
confinada nas camadas mais baixas da atmosfera. Também podemos observar uma pequena
semelhança nas figuras 7b e 7c, como a presença de um Cavado mais intenso que a climatologia
com eixo no Oceano Atlântico e uma desintensificação do jato no setor sul, próximo à latitude de
40ºS. Nessas figuras o centro da Alta da Bolívia (AB) aparece posicionado próximo sua posição
climatológica e sua circulação mais intensa que a média. Entretanto, na Figura 7d para a
composição dos anos secos, a circulação associada ao Cavado e AB foi observada contrária ao
escoamento médio, indicando que esses sistemas estiveram menos freqüentes nesses anos .
A Figura 8 mostra um perfil vertical do fluxo meridional de umidade e a velocidade vertical
(Omega), com média entre as longitudes de 54ºW–36ºW (sobre grande parte do NEB), observado
ao longo das latitudes de 60ºS– 60ºN. A Figura 8a apresenta climatologia de todos os janeiros, 8b a
anomalia de janeiro de 2004, 8c a anomalia para anos em que ocorreram janeiros chuvosos e 8d a
anomalia para anos em que janeiro foi seco. Em janeiro de 2004 (Figura 8b) é observado intensa
anomalia negativa do fluxo meridional de umidade de norte, indicando um fluxo acima da média,
desde a superfície até 600 hPa, entre as latitudes de 7ºN–25ºS, associada a movimento vertical
ascendente (anomalias negativas), também com magnitudes acima da climatologia, desde a camada
superficial até 300 hPa (Figura 8c). Para os anos chuvosos e secos (figuras 8c e 8d), essas
características são pouco evidentes ou contrárias.
12
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 7 – Vento (m/s) em 200 hPa e Fluxo meridional de umidade *1000 (g.kg-1.m/s) em 300 hPa. Climatologia de janeiro (a), anomalia de janeiro de 2004 (b) , anomalia para anos com janeiro chuvoso (c) e anomalia para anos com janeiro seco (d).
A Figura 9 mostra o perfil vertical do fluxo zonal de umidade e a velocidade vertical
(Omega), com média entre as latitudes 1ºN–14ºS, observado ao longo das longitudes de 90ºW–20º
E. A Figura 9a é a climatologia de todos os janeiros, 9b a anomalia de janeiro de 2004, 9c a
anomalia para anos em que ocorreram janeiros chuvosos e 9d a anomalia para anos em que os
janeiros foram secos. Climatologicamente (Figura 9a), sobre as longitudes do NEB 55oW-37oW,
pode ser observado um intenso fluxo zonal de umidade de leste para oeste, indicativo de que esse
fluxo predomina de leste vindo do Oceano Atlântico. A essa configuração associa-se a presença de
anomalias negativas de Omega, indicando movimento vertical ascendente, em quase toda camada
atmosférica. Em janeiro de 2004 essas características são evidentes em particular no movimento
vertical, cuja Figura 9b mostra anomalias de omega negativas indicando valores mais intensos que a
climatologia. No fluxo de umidade, essas características climatológicas observadas na Figura 9a
aparecem menos expressivas, principalmente, a anomalia do fluxo de umidade de leste vindo do
13
Oceano Atlântico, cuja anomalia apresentou valores inferiores a média climatológica - embora que
na Figura 9b apareça valores positivos dessa anomalia.
Para os anos em que ocorreram anos chuvosos, essas características de omega e do fluxo
zonal são menos evidentes, principalmente para as anomalias de fluxo zonal de umidade (Figura
9c). Para os anos onde ocorreram janeiros secos (Figura 9d), ressalta-se maiores movimentos
descendentes da superfície até 500 hPa, com pequenos movimentos ascendentes entre os mesmos.
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 8 – Perfil vertical do fluxo meridional de umidade *1000 (g.kg-1.m/s) e Omega (Pa/s). Média entre 55oW-35oW. Climatologia de janeiro (a), anomalia de janeiro de 2004 (b), anomalia para anos com janeiro chuvoso (c) e anomalia para anos com janeiro seco (d).
14
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 9 – Perfil vertical do fluxo zonal de umidade *1000 (g.kg-1.m/s) e Omega (Pa/s). Média entre 1oN-14oS. Climatologia de janeiro (a), anomalia de janeiro de 2004 (b), anomalia para anos com janeiro chuvoso (c) e anomalia para anos com janeiro seco (d).
A Figura 10 mostra o perfil vertical do fluxo meridional e zonal de umidade *1000 (g.kg-
1.m/s) e Omega (Pa/s). Média entre 1oN-14oS observado em janeiro 2004. Fluxo meridional de
umidade foi todo de norte, sobre o NEB, indicando o transporte de umidade vindo do Atlântico
tropical (Figura 10a). Na Figura 10b é interessante mostrar que apesar de que no campo de
anomalias (Figura 9b) ter mostrado um fluxo zonal de umidade do Atlântico menos intenso do que a
média, foi observado ventos de oeste vindos da Amazônia convergindo sobre o NEB com ventos
vindos de leste (Figura 10b). Essa característica não é climatológica (Figura 9a), indicando a
contribuição de fluxo de umidade zonal proveniente da Amazônia para as fortes chuvas que
ocorreram em janeiro/2004.
15
Figura 10 – Perfil vertical do fluxo meridional e zonal de umidade *1000 (g.kg-1.m/s) e Omega (Pa/s). Média entre 1oN-14oS em janeiro 2004. Meridional (a), zonal (b)
A Figura 11 mostra a vorticidade relativa no nível de 200 hPa. A climatologia para todos os
janeiros é vista na Figura 11a, a sua anomalia para o mês de janeiro de 2004 na Figura 11b, como
também a anomalia para anos considerados como janeiros chuvosos é visto na Figura 11c e para
janeiros de anos secos na Figura 11d. Climatologicamente, ocorre uma vorticidade ciclônica,
associada aos VCAS e ao cavado de ar superior, localizada no setor centro-norte do NEB e abaixo
na região mais ao sul uma vorticidade anticiclônica representando a AB e a ZCAS (Chaves, 1999).
Em 2004 a circulação ciclônica esteve menos intensa do que a média, presença de anomalias
positivas, sobre o NEB e Atlântico adjacente (Figura 11b). Essa característica também é observada
para a composição de anos chuvosos, embora menos evidente (Figura 11c). A Figura 11d mostra
que a anomalias negativas vorticidade ciclônica, mais intensas do que média, predominam sobre
todo o NEB e proximidades, diferentemente do observado em anos chuvosos. Essa característica
observada em anos secos indica a presença de VCAS ou cavado de ar superior com centro sobre o
NEB, o que segundo a literatura são regiões associados a esses sistemas e suas localizações
inibidoras de chuva.
16
(a)
(
b)
(c)
(d)
Figura 11 – Vorticidade Relativa *10e05 (s-1) em 200 hPa. Climatologia de janeiro (a), anomalia de janeiro de 2004 (b), anomalia para anos com janeiro chuvoso (c) e anomalia para anos com janeiro seco (d).
É provável também que essas chuvas intensas de janeiro de 2004 tenham sido influenciadas
pela passagem da oscilação 30-60 dias sobre a América do Sul, cujas evidências podem ser
observadas no site do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos/Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (CPTEC/INPE), que faz o monitoramento dessa oscilação associada à
ocorrência de chuva no NEB (http://www.cptec.inpe.br/clima/monit/monitor_global.shtml). A
Figura 12 mostra a evolução de anomalias de radiação de onda longa (ROL) e a anomalia de chuva
17
sobre o NEB, período maio/2003 a abril/2004 mostrando essa relação da passagem da Oscilação de
30-60 dias com as anomalias de chuva no NEB.
Figura 12 – Anomalias de radiação de onda longa (ROL) em W/m2 e precipitação (mm) média na área 44oW-34oW sobre o NEB para o período entre maio/2003 3 e abril/2004. Fonte:CPTEC/INPE.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste estudo foram analisados algumas variáveis termodinâmicas, na região compreendida
entre as longitudes de 90ºW a 20ºE e entre as latitudes de 60ºS a 60ºN, para investigar que
características estiveram associadas à intensa precipitação observada durante o mês de janeiro de
2004 sobre a região do NEB. Os principais resultados mostraram que anomalia do vento e do fluxo
meridional de umidade em janeiro de 2004, observado em um nível médio entre 1000 e 850 hPa,
indicou que os ventos alísios de nordeste ficaram mais intensos do que os alísios de sudeste,
impulsionando a ZCIT a atingir o setor norte do NEB.
Relacionado ao fluxo zonal de umidade as análises mostraram que sobre o NEB, em janeiro
de 2004, o perfil apresentou anomalias positivas indicando fluxo de umidade vindo do Atlântico
menos intenso que a climatologia. Porém o campo observado para janeiro de 2004 mostrou um forte
fluxo zonal de umidade de oeste, a oeste de 55oW, indicando que houve uma contribuição de
umidade transportada da Amazônia que convergiu com fluxo zonal de leste vindo do Atlântico
tropical (Figura 7b). É importante frisar que essa característica não é climatológica. Perfis verticais
das anomalias dessas variáveis juntamente com o movimento vertical Omega, médias entre 54oW-
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36oW e 1oN-14oS, mostraram características físicas favoráveis (desfavoráveis) a atividade
convectiva no mês de janeiro de 2004 e composição de anos com janeiro chuvosos e (anos com
janeiros secos). A média entre as longitudes de 54oW a 36ºW dessas variáveis, sobre o NEB, foi
consistente, para o mês de janeiro de 2004 e para a composição de anos chuvosos, indicando
anomalia negativas de omega e do fluxo meridional, desde a superfície até 600 hPa, entre as
latitudes de 7ºN–25ºS, e movimento vertical ascendente, acima da média, desde a camada
superficial até 300 hPa.
Comparando a anomalia de janeiro de 2004 com anos considerados de ocorrência com muita
chuva e pouca chuva no mês de janeiro, podemos afirmar que em 2004 teve uma grande
similaridade com a anomalia dos anos considerados chuvosos, embora que para a composição
desses anos a configuração em algumas variáveis apareceram menos evidentes. Como também uma
relativa discrepância com os anos considerados secos. Na média dos baixos níveis, se observou uma
intensificação dos ventos alísios de nordeste para os anos chuvoso e uma intensificação dos ventos
alísios de sudeste nos anos considerados secos.
Essas características fazem com que ocorra uma penetração ou diminuição de umidade do
Oceano Atlântico e da Amazônia, possibilitando o aumento ou decréscimo das chuvas na região do
NEB. Quando ocorre uma intensificação dos ventos alísios de nordeste e intenso fluxo de umidade
proveniente da região Amazônica, a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) fica mais
intensa possibilitando com que haja condições mais favoráveis a penetrações e permanência das
frentes frias vindas da região sudeste do Brasil. Segundo Nobre [8], nos anos considerados como
chuvosos, a ZCAS situa-se mais ao norte da região do NEB e nos anos considerados como secos,
mais ao sul. De acordo com Kodama [4], [5] a ZCAS está associada com a intensa atividade
convectiva da região Amazônica, formando-se ao longo de jatos subtropicais em altos níveis.
A relevância desses estudos diagnósticos, está no fato de que como pré-estação chuvosa do
NEB e seus sistemas atmosféricos transientes provocadores de chuva são ainda de difícil previsão;
esses resultados que identificam padrões relativos à esses eventos de chuva extremos (chuvosos e
secos) são importantes para futuramente servirem de possíveis indicadores de prognósticos. Pois, a
medida que os modelos numéricos avancem na representação das características físicas da
atmosfera tropical é provável que a previsão oriunda dos mesmos possa representar essas situações.
Estudos futuros que investigarão a sensibilidade dos resultados da modelagem numérica
comparados a esses estudos observacionais devem ser encorajados.
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