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AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS DISFÊMICAS: uma análise sociocognitiva Silvio César Santos Rio de Janeiro Março de 2012

AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

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Page 1: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

DISFÊMICAS: uma análise sociocognitiva

Silvio César Santos

Rio de Janeiro

Março de 2012

Page 2: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

DISFÊMICAS: uma análise sociocognitiva

Silvio César Santos

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Letras Vernáculas da Universidade

Federal do Rio de Janeiro como requesito para a

obtenção do Título de Mestre em Letras Vernáculas

(Língua Portuguesa).

Orientadora: Profª. Doutora Maria Lucia Leitão de

Almeida

Rio de Janeiro

Março de 2012

Page 3: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS DISFÊMICAS:

uma análise sociocognitiva

Silvio César Santos

Orientadora: Professora Doutora Maria Lúcia Leitão Almeida

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras

Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos

requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas

(Língua Portuguesa).

Examinada por:

_________________________________________________

Presidente, Profa. Doutora Maria Lucia Leitão Almeida

_________________________________________________

Prof. Doutor Janderson Lemos de Souza – UNIFESP

_________________________________________________

Profª. Doutora Regina Souza Gomes – UFRJ

_________________________________________________

Prof. Doutor Carlos Alexandre Gonçalves – UFRJ, Suplente

_________________________________________________

Profª. Doutora Lilian Ferrari – UFRJ, Suplente

Rio de Janeiro Março de 2012

Page 4: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Eu só me percebo como um ser do mundo,

quando me comparo aos outros seres.

Page 5: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

À Manuela, a luz da minha vida.

Page 6: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

AGRADECIMENTOS

A Carlos Alexandre Gonçalves, pela sinceridade, incentivo e apoio

desde sempre.

À Maria Lúcia Leitão Almeida, orientadora, amiga, entusiasta e por

nunca ter desistido de mim.

A Mauro José Rocha, meu orientador pela simplicidade,

generosidade e gentileza, mesmo nas horas em que eu não merecia.

À Izabele, sobrinha e amiga , pelo apoio tecnológico indispensável a

qualquer pesquisa.

Aos professores e funcionários desta instituição, que cooperaram de

forma indelével para esta pesquisa.

À Tânia, à Fernanda e a Fábio, pela criteriosa revisão e pela atenta e

tradução.

A Rafael, por tirar as dúvidas em campos da ciência não percorridos

por este mestrando.

Page 7: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

RESUMO

As Construções Comparativas Superlativas Disfêmicas: uma análise sociocognitiva

Silvio César Santos

Orientadora: Professora Doutora Maria Lúcia Leitão Almeida

Resumo da dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras

Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos

necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).

A pesquisa tem por objeto de estudo as Construções Comparativas Superlativas Disfêmicas e

suas relações com os conceitos da Linguística Cognitiva. O foco centrou-se na análise de

construções que possuem grande ocorrência entre os falantes do Português do Brasil,

sobremaneira os da região sul e sudeste. O embasamento teórico privilegiou conceitos básicos

da Linguística Cognitiva como os Esquemas Imagéticos, os Modelos Cognitivos Idealizados

(LAKOFF, 1987) e os Espaços Mentais (FAUCONNIER, 1994), que servem de substrato

para a formalização em termos de Mesclagem Conceptual (FAUCONNIER, 1994, 1997;

FAUCONNIER e TURNER, 2002) e em termos de Gramática Construcional (GOLDBERG,

1995). O percurso efetuado pelo estudo intenta demonstrar que a comparação é inerente não

só à linguagem, mas a muitas operações e experiências corpóreas sensoriais e cognitivas,

relacionando a comparação à metáfora, à metonímia e à metaftonímia em relações de

correspondência interdominiais.

O corpus selecionado para a pesquisa foi obtido por meio de audiência de programas

radiofônicos e televisivos, além de pesquisas em sítios eletrônicos de busca, o que

demonstrou a frequência de uso não só na linguagem cotidiana, mas também nas mídias em

geral.

Como não foram encontrados trabalhos relacionados às Construções Comparativas

Superlativas Disfêmicas na abordagem Cognitivista, o objetivo principal deste estudo foi

sinalizar as várias possibilidades de especificação dos estudos devido à alta complexidade do

fenômeno linguístico em questão.

Palavras-chave: comparação; metáfora; metonímia; Linguística Cognitiva;

mesclagem conceptual; construção gramatical.

Rio de Janeiro

Março de 2012

Page 8: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

ABSTRACT

The Comparative and Superlative Dysphemic Constructions: a social cognitive analysis

Summary of the Master’s dissertation submitted to the Post-Graduation Program in Language

of Federal University of Rio de Janeiro –UFRJ, as part of the requirements for obtaining the

Master's degree in Portuguese Language.

Silvio César Santos

Advisor: Maria Lúcia Leitão Almeida

This research has the aim of studying the Comparative and Superlative Dysphemic

Constructions and their relationship with concepts of Cognitive Linguistics. The study was

based on the construction of the analysis that presents high productivity among the brazilian

portuguese speakers, especially the south and southeast speakers. The basis of the theory gave

more importance to basic concepts of the Cognitive Linguistics like the Image Schemas, the e

Idealized Cognitive Models (LAKOFF, 1987) and the Mental Spaces (FAUCONNIER,

1994), that serve as the essence to a formalization in terms of Conceptual Blending and in

terms of Constructional Grammar (GOLDBERG, 1995). The study wants to show that the

comparison is inherent not only to the language but also to many bodily sensory and cognitive

experiences, relating the comparison to the metaphor, metonymy and metaftonymy in

relations of the corresponding relationship interdominiais.

The “corpus” selected to the study was obtained through the hearing on radio and television

programs, in addition to the research to sites of search, and all of this demonstrated that the

use is very common in daily language and in different kinds communication vehicles.

As we did not find similar researches related to the comparative and superlative dysphemic

constructions concerning the cognitive approach, the main aim of this study is to demonstrate

the different possibilities of specification of the studies of the linguistic phenomenon that is

being discussed.

Keywords: comparison; metaphor; metonymy; cognitive linguistics; conceptual blending;

grammatical construction.

Rio de Janeiro

Março de 2012

Page 9: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

SUMÁRIO

1. A COMPARAÇÃO 11

1.1 COMPARAÇÃO e LINGUAGEM 12

1.2 COMPARAÇÃO E CORRELAÇÃO 14

2. O DISFEMISMO 16

2.1 A COMPARAÇÃO DISFÊMICA 17

3. A LINGUÍSTICA COGNITIVA 19

3.1 OS ESQUEMAS IMAGÉTICOS 22

3.1.1. Outro Exemplo 24

3.2 OS MODELOS COGNITIVOS IDEALIZADOS 24

3.3 OS ESPAÇOS MENTAIS 29

3.4 OS MAPEAMENTOS CONCEPTUAIS 34

3.4.1 Os Espaços de Entrada 36

3.4.2 O Espaço Mescla 40

4. A FIGURATIVIDADE NA LINGUAGEM 42

4.1 A METÁFORA 42

4.2 A METONÍMIA 45

4.3 A POLISSEMIA 45

4.4 A VISÃO COGNITIVISTA 46

4.4.1 A Metonímia Conceptual 48

4.4.2 A Metaftonímia 49

4.4.3 A Correspondência Metafórica 49

5. A VISÃO CONSTRUCIONAL 53

5.1 A VISÃO TRADICIONAL DA

CONSTRUÇÃO COMPARATIVA 54

5.2 A TEORIA CONSTRUCIONAL GOLDBERGUIANA 55

5.2.1 Os Princípios Goldberguianos 56

5.2.2 As Relações de Herança 57

Page 10: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

5.3 A ANÁLISE DAS CONSTRUÇÕES 58

5.3.1 A Construção Comparativa 59

5.3.2 A Construção Comparativa Superlativa 60

5.4 PROPOSTA INICIAL DE REDE CONSTRUCIONAL 63

6. METODOLOGIA 65

6.1 CONSTITUIÇÃO DOS CORPORA 65

6.2 PROCEDIMENTO DE ANÁLISE 65

7. A ANÁLISE DO CORPUS 67

7.1 A IDIOMATICIDADE 67

7.2 TIPO E OCORRÊNCIA 72

7.2.1 A Construção 1 72

7.2.2 A Transitividade da Construção 1 73

7.3 A CONSTRUÇÃO 2 75

7.4 OS CONSTITUINTES ESTRATIFICADOS 77

7.5 O TERMO COMPARANTE 78

7.6 O PROCESSO DE MESCLAGEM NAS CONSTRUÇÕES 82

CONCLUSÃO 88

REFERÊNCIAS 90

ANEXO 94

Page 11: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

ÍNDICE DE ESQUEMAS, GRÁFICOS, TABELAS E DIAGRAMAS

1.1 C

O

M

P

A

R

A

Ç

Ã

O

e

L

I

N

G

U

A

G

E

M

1

1

TIPO PÁGINA

ESQUEMA 1

ESQUEMA 2

ESQUEMQ 3

ESQUEMA 4

ESQUEMA 5

23

69

85

86

87

GRÁFICO 1

GRÁFICO 2

GRÁFICO 3

GRÁFICO 4

GRÁFICO 5

GRÁFICO 6

GRÁFICO 7

GRÁFICO 8

GRÁFICO 9

GRÁFICO 10

GRÁFICO 11

GRÁFICO 12

GRÁFICO 13

GRÁFICO 14

GRÁFICO 15

GRÁFICO 16

GRÁFICO 17

GRÁFICO 18

GRÁFICO 19

GRÁFICO 20

GRÁFICO 21

27

32

33

36

37

38

39

41

44

48

51

53

55

59

60

61

62

63

79

80

82

TABELA 1

TABELA 2

26

75

DIAGRAMA 1 64

Page 12: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

1. A COMPARAÇÃO

A comparação, antes de ser um fenômeno linguístico, deve ser encarada como

uma operação mental inerente à espécie humana e atuante em suas formas de

relacionamento social. Não é difícil vislumbrar que nossos antepassados mais remotos

mensuravam os riscos que poderiam correr na obtenção de alimentos através do cotejo

das diferentes situações e dos riscos advindos delas.

Com o incremento das relações sociais, o homem expande o processo

comparativo às múltiplas e complexas situações a que se acha exposto e, assim, além

dos riscos vitais, ele também está habilitado a fazer ilações acerca de possíveis

eventos, podendo decidir uma situação de acordo com a previsão de determinada

situação.

Com a comparação, o homem se identifica no mundo em relação aos seres

humanos e aos animais, também consegue verificar a existência das coisas, dos

processos e eventos que o cercam, desenvolvendo uma consciência ontológica

primordial à própria existência. Passamos boa parte da vida fazendo comparações entre

pessoas, objetos e entidades diversas, e esse processo é tão inerente ao mais básico

subjetivismo individual (estou aqui porque não me encontro lá) quanto ao conjunto de

conhecimentos compartilhados por um grupo específico (como a comparação entre

rochas feita por geólogos).

Também há a comparação feita por determinada comunidade, como a

comparação entre as cores, que possuem diferentes nuanças de acordo com a cultura

em questão (o que, para o brasileiro, é o azul prototípico, para o uruguaio, chama-se

celeste). E, finalmente, as comparações feitas por toda a humanidade, ao comparamos

ações rotineiras compartilhadas por todos, como andar, correr, sorrir etc.

Decorrente da operação cognitiva de comparar e de outras operações e

experiências, temos nossos padrões culturais definidos1, tais como o que é ser magro

ou gordo, alto ou baixo, bonito ou feio, quente ou frio.

1 Definidos, mas não estáticos, pois podem ser mudados por fatores diversos, tais como cultura e período

histórico.

Page 13: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

1.1 COMPARAÇÃO E LINGUAGEM

É indiscutível que o processamento da comparação ocorre na mente, mas essa

operação somente se efetivará através da linguagem, uma vez que as diversas

instanciações das sentenças comparativas conduzirão o pensamento do interlocutor

para um caminho em que entrarão em jogo os termos a serem comparados.

E diante dos elementos envolvidos na comparação, temos as comparações mais

prototípicas, que é a comparação entre seres de um mesmo universo, como “Pedro é

mais alto que João.”; passando por comparações entre seres de universos diferentes:

“João é alto como uma girafa.”

É na experiência compartilhada entre os seres humanos que baseamos a

presente pesquisa que procedeu a um recorte devido à grande produtividade de

ocorrências e tipos de sentenças comparativas, mas que não deixará de enfocar suas

características centrais.

O objeto de estudo foi definido ao levar em consideração dois aspectos das

sentenças comparativas em que interagem de forma indissociáve:l a face sintática e a

face semântica. Em relação à face sintática, nos referimos à organização e

configuração da construção, visto que sua mudança poderá interferir em seu sentido.

Há diversas configurações de construções comparativas, variando em número e

natureza dos constituintes, como assinala Lima-Hernades (2006: 3)

A expressão da comparação, contudo, manifesta-se em níveis variados de

complexidade estrutural. Assim é que se pode manifestar a comparação por

meio de orações simples com a inclusão de termos que se predispõem a esse

processamento (por ex.: o verbo preferir, anteriormente citado). Pode-se

também estabelecer a comparação por intermédio da aproximação de

orações num período composto, cujas informações são justapostas para o

encaminhamento da operação de comparar através de conjunções

específicas.

Já a informação semântica, que se agrega à configuração sintática atribui uma

carga de sentido diversa, dependendo da construção em questão e desse modo,

observamos os diversos tipos de orações comparativas já compiladas por Gramáticas

Tradicionais (BECHARA, 2001:326-7; CUNHA e CINTRA, 2007:621-2), que

Page 14: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

privilegiam a gramaticalidade das orações, classificando-as de acordo com o conectivo

ou recurso morfossintático envolvidos em:

a) comparativo de superioridade: um ser possui determinada

qualidade em grau superior a outro: “Pedro é mais estudioso

do que Paulo.”

b) comparativo de igualdade: um ser possui determinada

qualidade em grau igual a outro: “Álvaro é tão estudioso

como [ou quanto] Pedro.”

c) comparativo de inferioridade: um ser possui determinada

qualidade em grau inferior a outro: “Paulo é menos

estudioso que Álvaro.”

d) superlativo absoluto: um ser apresenta em elevado grau

determinada qualidade: “Paulo é inteligentíssimo.”

e) superlativo relativo: em relação à totalidade dos seres que

apresentam a mesma qualidade, um se sobressai por possuí-

la em grau maior ou menor que os demais: “Carlos é o

aluno mais estudioso do Colégio.”

Ao observar a análise tradicional, fica patente a importância dada à estrutura

sintática em detrimento da semântica de apenas um item - a conjunção -, no caso das

comparativas de superioridade, igualdade e inferioridade; ou de recursos

morfossintáticos, tais como o sufixo ‘-íssimo’ e o uso da configuração sintática no

superlativo absoluto.

Assim os estudos tradicionais analisam as construções comparativas

privilegiando apenas um item: ”Comparativas, se a conjunção é subordinativa

comparativa” (CUNHA e CINTRA, 2007:621), o que torna a análise eminentemente

composicional, ao preterir os demais constituintes da configuração sintática.

1.2 COMPARAÇÃO E CORRELAÇÃO

Observando mais uma vez as análises tradicionais, constatou-se que um grande

número de construções comparativas possuem uma idiossincrasia sintático-semântica

que as aproxima de outras construções do Português do Brasil.

Page 15: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

A relação entre os termos que processam a comparação pode ser definida como

uma correlação, uma vez que estão envolvidos dois termos em relação de analogia.

Essa relação não é exclusividade das construções comparativas, visto que ocorre em

outros ambientes sintáticos, mas ela possui alguns conflitos em sua descrição, porque

não se enquadra nas tradicionais relações entre orações que são classificadas como

coordenadas, quando há independência entre elas; ou subordinadas, quando existe uma

dependência da oração subordinada em relação à oração principal.

A Nomenclatura Gramatical Brasileira segue claramente os parâmetros

dicotômicos estruturalistas (MÓDULO, 2010), que não admite a inserção de uma

terceira categoria na classificação dos processos sintáticos, o que leva a alguns

conflitos em relação à correlação.

Concordamos que uma construção como “Cláudio pegou a chave do carro e

saiu” se enquadra entre as orações coordenadas pela relação de independência sintática

existente entre suas partes (Cláudio pegou a chave do carro. / Cláudio saiu.); mas a

mesma classificação não pode ser atribuída à construção “Cláudio não só pegou a

chave do carro, mas também saiu.”, uma vez que aqui não há independência

sintática e muito menos semântica (*Cláudio não só pegou a chave do carro. /

*Cláudio mas também saiu.).

Há no exemplo acima uma relação de interdependência (OITICICA, 1942), não

só sintática, mas também semântica entre as partes constituintes que imprimem uma

nuança mais enfática em relação à oração chamada de coordenada aditiva.

Rosário (2010) nos mostra que há um grupo que afirma que as construções

correlativas se processam por meio da coordenação e da subordinação como um

subtipo das coordenadas e das subordinadas (CAMARA JR., 1981; BECHARA, 2001;

LUFT, 2000; KURY, 2003), enquanto um outro grupo segue a análise de Oiticica

(1952) e situam as construções correlativas como um terceiro processo sintático

(MELO, 1978; CASTILHO, 2004; RODRIGUES, 2009; MÓDULO, 2010).

Dessa forma, um novo caminho para a pesquisa foi iniciado ainda na metade do

século passado e permanece atualmente, não só em relação às construções

comparativas, mas também às demais que apresentam a correlação como característica

principal.

Page 16: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

2. O DISFEMISMO

Diante de tantas manifestações linguísticas que traziam o sentido comparativo,

uma chamou a atenção justamente por não constar nos manuais tradicionais e

tampouco em pesquisas recentes: a Construção Comparativa Superlativa Disfêmica.

A partir desse momento instauraram-se os primeiros problemas da pesquisa: a

verificação da produtividade dessa construção e a definição da natureza semântica

disfêmica.

Fato antigo na língua, o disfemismo é um fenômeno de larga produtividade,

mas pouco estudado até o momento desta pesquisa. As menções encontradas sobre o

disfemismo encontram-se em poucos manuais de Estilística (MARTINS, 1981;

GUIMARÃES e LESSA, 1998; LAPA, 1970) ou em um compêndio com uma listagem

dividida por subtipos (KROOL,1984).

No âmbito da lexicografia, foi encontrada apenas uma entrada lexicográfica em

que Houaiss (2001) o define como:

i) emprego de palavra ou expressão depreciativa, ridícula, sarcástica

ou chula, em lugar de outra palavra ou expressão neutra (p.ex.: ficar

puto por ficar com raiva).

ii) palavra ou expressão agressiva, blasfema ou

pejorativa (p.ex.: poetastro, politicóide, reaça).

Uma vez que o objetivo principal da lexicografia não é atribuir um significado

relacionando-o ao contexto de produção discursiva, fez-se necessário uma segunda

definição que tentasse englobar algumas noções discursivas, como o fez Santos

(2009:7): “Disfemismo é um enunciado que contém uma intenção negativa, pejorativa

ou humorística que geralmente é usado em situações informais.”

Dessa forma, a expressão linguística fica condicionada às condições de

produção do discurso e à intenção do falante que poderá adequar o discurso aos seus

propósitos interativos de acordo com o contrato comunicativo (CHARAUDEAU,

2009:56)

A produtividade das expressões disfêmicas mostra-se elevada em manchetes de

jornais populares de grande circulação no Estado do Rio de Janeiro.

“Polícia dá sacode no Borel e avisa: safados vão pra jaula.” Meia Hora de

Notícias, 04 de Janeiro de 2008.

“Bombeirão da milícia leva ferro na Z. Oeste.” Meia Hora de Notícias, 05

de Janeiro de 2008.

Page 17: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

“A coisa tá preta na Verde-e-Rosa.” Meia Hora de Notícias, 12 de Janeiro de

2008.

Com os exemplos acima, fica patente que a intenção do produtor do discurso

vai muito além de veicular uma ideia grosseira oposta ao eufemismo, ou seja, há nas

expressões uma conjugação de ideias que se veiculam à notícia levando em

consideração o local onde o fato se efetivou, os personagens envolvidos e uma visão

particular do fato em si, realizada através do disfemismo.

2.1 A COMPARAÇÃO DISFÊMICA

A comparação disfêmica, embora pouco analisada, representa grande

produtividade no Português do Brasil, como se pode observar em adágios sem datação

confirmada, mas sempre presente no ideário dos falantes (Mais comprido que trova

de gago.)

Mas outra forma de expressão linguística que carrega a semântica disfêmica e

que se mostrou muito produtiva em programas radiofônicos de grande audiência² no

Estado do Rio de Janeiro foi a Construção Comparativa Superlativa Disfêmica que

sintetiza em uma forma linguística uma qualidade como feio ou baixo ou um processo

ordinário como bater, correr ou chorar a uma entidade que, à primeira vista, em nada

se assemelha com o processo ou qualidade em questão, mas que está armazenada de

alguma forma na mente do interlocutor, como nas construções abaixo:

1) “Deu mais que chuchu na serra.” (Patrulha da Cidade, 13 de

março de 2009).

2) “Apanhou mais que mulher de malandro.” (Patrulha da Cidade,

12 de Novembro de 2008).

3) “Chorou mais que tampa de marmita.” (Patrulha da Cidade, 05

de Agosto de 2010).

4) “Se virou mais que charuto em boca de bêbado.” (Patrulha da

Cidade, 21 de janeiro de 2011).

Diante das amostras apresentadas, temos agora uma confluência da expressão

disfêmica com a noção de comparação de pelo menos dois termos- o comparante e o

comparado (MARTINS, 1981:97)- e a de superlativismo que dá à expressão uma

Page 18: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

carga disfêmica mais forte, visto que não foram observadas expressões inferlativas na

audiência dos programas nem em sítios eletrônicos.

É surpreendente como uma construção preterida durante tanto tempo pela

análise linguística pode apresentar traços tão particulares em sua composição, porque a

Construção Comparativa Superlativa Disfêmica não é apenas uma forma de linguagem

que aproveita um mote qualquer do cotidiano para fazer rir ou ridicularizar alguém ou

uma situação, mas nela estão encaixados processos variados, tais como a correlação

escalar entre os termos comparados, em que temos a noção de um sofrimento superior

a um sofrimento já intensificado (Mais fedorento que arroto de corvo.) e que se

processa na cognição do interlocutor, haja vista não ter ele vivido a maioria dos

processos que instanciam as construções.

É nesse tipo particular de expressão que a pesquisa concentrará seus esforços

para que seja obtida uma análise com bases cognitivistas que considerarão além dos

elementos linguísticos o conhecimento de mundo armazenado na mente dos falantes

durante suas vidas.

Page 19: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

3. A LINGUÍSTICA COGNITIVA

A humanidade vem se ocupando do estudo da linguagem desde sempre e é

fascinante perceber como o objeto de estudo tem sido encarado incessantemente

através de milênios e como uma característica inerentemente humana pode receber tão

diversos tratamentos dependendo do ponto de vista adotado.

Do grunhido ao discurso, muito tempo passou, mas o interesse pela capacidade

humana de se comunicar aumenta a cada dia, dando margem a vários modelos

epistemológicos de investigação.

Tínhamos algumas opções para escolher o fulcro teórico desta pesquisa, mas

como investigar construções idiomáticas com correntes linguísticas que não

privilegiam a criatividade do uso linguageiro ou que imaginam um falante ideal que se

comunica de acordo com estruturas arraigadas em seu cérebro por gerações?

A resposta veio com uma teoria que abarcasse não só a língua como objeto de

estudo, mas sim a língua como principal objeto de estudo e em constante confluência

com outras ciências que investigam o nosso pensamento, nossa cultura e nossos

movimentos corpóreos em um mundo a que todo momento fazemos referência.

Essa foi, acredito, a melhor escolha epistemológica para dar conta de

expressões linguísticas que nos trazem sensações, lembranças e experiências que

vivemos, ou – e isso é o melhor- não.

A data de fundação da linguística cognitiva ainda é controversa (cf. CUENCA

e HILFERTHY, 1999; SILVA; SALOMÃO, 2009), mas é ponto pacífico que o

embrião começou a se desenvolver nos finais dos anos 70 a partir de dissidências com

a Gramática Gerativa Padrão de Chomsky (1965) e de ampliação da Semântica

Gerativa, igualmente ligada à cisão em relação à corrente chomskyana, que, sendo uma

teoria mentalista, considerava a linguagem como mais uma faculdade autônoma

humana.

Mesmo sem uma data de fundação definida, é inegável a importância da obra

Women, fire and dangerous things (1987) de George Lakoff, que apresentou a ruptura

com o paradigma objetivista, relacionando a clássica teoria categorial ao estudo das

linguagens naturais e afirmando que o paradigma objetivista é uma idealização, uma

vez que a concepção das categorias de mundo segundo esse paradigma faz-se de modo

arbitrário e, por isso mesmo, artificial, haja vista as operações ad hoc para o

Page 20: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

enquadramento nas categorias e o desterramento atribuído aos elementos considerados

esdrúxulos ou idiossincráticos.

Fato com o qual concordamos, uma vez que a categorização clássica

aristotélica, representada no diálogo entre Hermógenes, Crátilo e Sócrates sobre a

justeza das coisas (CRÁTILO), nos informa que a categorização é totalmente arbitrária

e se baseia em características necessárias e suficientes, isto é, que seriam as

propriedades essenciais que convivem com as propriedades acidentais para que

determinado ente faça ou não parte de determinada categoria.

Em sua obra de forte cunho filosófico, Lakoff (1987:160-84) faz uma

importante assunção ao mostrar que tanto o Objetivismo quanto o Experiencialismo

são duas versões do Realismo Básico, em que o primeiro prima pela autonomia e

hermeticidade das categorias, enquanto o segundo postula a confluência de diversos

conhecimentos.

O linguista questiona os postulados da categorização clássica mostrando

exemplos de referenciação biológica e os diferentes conceitos que essa pode

enquadrar, quando mostra que a palavra ‘zebra’ somente se prestará para referir-se

corretamente uma entidade da realidade se corresponder a um grupo com as mesmas

características [comer grama], ou seja, não considera o indivíduo de um grupo, mas o

grupo em si, rementendo-nos à visão de Saussure (1916), que não aborda a

individualidade linguística, lugar onde a criatividade emerge alimentada pela vivência

pessoal e intersubjetividade do falante.

Assim, realça que o Objetivismo é um constructo epistemológico artificial que

não resiste a algumas observações empíricas e, para isso, toma como exemplo a

diferenciação categorial entre ‘zebra’ e ‘peixe’, que podem ser consideradas como

entidades pertencentes a categorias diferentes se for aplicado o critério de classificação

fenético, que considera as diferenças morfológicas e fisiológicas, mas essa ordenação

não resiste a uma classificação cladística, sendo consideradas pertencentes a uma

mesma categoria, uma vez que este critério leva em consideração a evolução de uma

espécie. E, como ambos provêm de um mesmo antepassado, provam que a

classificação categorial clássica é arbitrária porque se baseia em critérios também

arbitrários.

Para construir sua argumentação a favor do Experiencialismo, já demonstrando

como deve ser o modus operandi da Linguística Cognitiva, opera com conhecimentos

de outros campos que vão formar o fulcro epistemológico da Linguística Cognitiva.

Page 21: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Faz uso de teorias de outras ciências, como a Psicologia de Eleanor Rosch

(1976), que estudou a categorização de cores introduzindo a teoria da prototipicidade,

a Filosofia de Wittigeinstein (1994), que introduziu o conceito de semelhança de

família e afirma ter as categorias uma zona de intersecção, e não limites estanques.

Após decidido qual caminho tomar, fizeram-se necessárias duas operações

distintas, mas solidárias: a primeira, comparar o método cognitivo com o de outras

correntes linguísticas e a segunda, explicitar as operações cognitivas a serem realizadas

para embasar a análise do fenômeno.

Iniciar uma empreitada cognitivista requer um esforço singular, no sentido de

se tentar demonstrar relações entre conceitos que todos sabemos existir, mas que não

relacionamos à linguagem.

Como demonstrar para uma comunidade tão acostumada às ideias clássicas que

a linguagem não é especular e que o referente do mundo “real” não ativa apenas um

único significado em nossa mente?

Como revelar que nossas estruturas linguísticas não repousam desde sempre em

nossas mentes e que nossas vivências as modificam sem aviso prévio?

Para muitos, a Linguística Cognitiva é algo como a metafísica transcendental, à

moda de um espírito que pode ser evocado para dar conta de tal ou qual fenômeno

linguístico. O que o cognitivismo postula por observação e formalização é que não há

um nível estrutural de significação, negando a autonomia estruturalista (SILVA,

1997:112), mas que a superfície linguística interage on line com os conhecimentos

adquiridos pelos falantes e pelo espaço que os circunda.

Nega igualmente que a linguagem possa ser gerada por regras lógicas e por

traços semânticos objetivos, indo de encontro ao ideal gerativista que considera a

linguagem como mais uma faculdade humana que possui seu local no cérebro, sendo

assim, modular e isolada de outras faculdades, tais como locomoção, respiração e

visão.

O aporte gerativista considera possuir o indivíduo as estruturas em sua mente

em um estado latente que será desenvolvido com o convívio com os demais

participantes da comunidade linguística.

Achamos (LAKOFF 1987, FALCONNIER, 1997) que é o próprio convívio, ou

seja, o uso que condiciona, modifica e motiva a linguagem e que esse convívio se

encontra tanto na esfera individual quanto na esfera coletiva, que contém os costumes,

as crenças e as convicções (UNGERER e SHIMID, 2006:51-2).

Page 22: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Para embasar nossa pesquisa, levaremos em consideração alguns pressupostos

cognitivistas gerais que não raras vezes podem gerar conflitos devido à fluidez das

concepções: os Esquemas Imagéticos; os Modelos Cognitivos Idealizados (MCI) e

os Espaços Mentais, mas também utilizaremos conceitos mais específicos com a

Teoria da Metáfora e a Teoria da Mescla Conceptual.

3.1 OS ESQUEMAS IMAGÉTICOS

Não é tarefa simples apresentar conceitos que subjazem ideias tão abstratas

como linguagem, cultura e sociedade e, por esse motivo, decidimos por seguir a

explanação de Almeida e Castilho (2007), que partem de uma experiência básica

humana – a motora espacial – para o esclarecimento do conceito imagético espacial

que se apresenta “muito geral e desprovido de conteúdo proposicional e de uma

formulação linguística, e vinculado diretamente à percepção de si próprio e do

ambiente” (CASTILHO, 2007:106). Ou seja, com o nosso próprio movimento

corporal, começamos a nos dar conta de um ser e estar no mundo e é com nossos

movimentos físicos corporais que começamos a dimensionar uma segunda noção

básica: a espacial.

Mesmo não configurando a totalidade dos esquemas imagéticos (CASTILHO,

op.cit.), é graças à percepção espacial que desenvolvemos habilidades cognitivas que

abrangem distância, altura, largura, profundidade e deslocamento. Salientando que nos

esquemas imagéticos não há a presença de conteúdo proposicional, podemos afirmar

que os Esquemas Imagéticos fornecem as primeiras bases cognitivas para a formação

de frases simples, tais como “Minha boneca é mais grande que a sua.”, mas também

estão presentes em frases que revelam o poder dos Esquemas Imagéticos em nossa

linguagem ordinária, mesmo parecendo aparentemente simples “Noventa anos, já é

quase o fim da vida.”, em que a expressão ‘fim da vida’ revela a noção de distância

temporal configurada no espaço vital humano, isto é, a noção básica espacial se

coaduna com a noção biológica e cultural de tempo de vida, suportado pelo Esquema

Imagético do percurso.

No gráfico seguinte, tentamos representar de forma simplificada o caminho

percorrido da experiência básica à formulação de expressões linguísticas cotidianas:

Page 23: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Esquema 1: esquema imagético como substrato cognitivo

100m 500m 1km 2km 10km

10cm 20cm 40cm 80cm

0 ano 7 anos 20 anos 90 anos 95 anos

Nascer Crescer Amadurecer Envelhecer Morrer

Espaço como base para a noção de distância vital

Experiência espacial básica

Minha boneca é mais grande que a sua.

Espaço como base para a noção de tamanho

Page 24: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

3.1.1 Outro Exemplo

Observando-se a expressão disfêmica “Estava mais por fora que cotovelo de

caminhoneiro.”, podemos atentar que o termo ‘por fora’ se enquadra em um esquema

imagético espacial, visto que possui um sentido básico que pode ser interpretado como

‘aquele que não está por dentro’. Essa expressão parte de um sentido espacial básico

para compor no ideário do falante uma construção que significa “sem conhecimento,

sem notícia; ignorando (algo)” (HOUAISS, 2001), que, relacionada à imagem de um

motorista de caminhão ao volante, suscita uma derivação de sentido a partir

daexperiência espacial básica.

Com esse exemplo, podemos constatar como uma experiência corpórea básica

alimenta um processo linguístico que produz uma construção idiomática de fácil

entendimento para os falantes de determinada comunidade linguística.

Os Esquemas Imagéticos, por serem mais básicos e não possuírem conteúdo

proposicional, alimentam um outro conceito da Linguística Cognitiva que será

explanado a seguir: o Modelo Cognitivo idealizado.

3.2 OS MODELOS COGNITIVOS IDEALIZADOS

Neste momento estamos frente a frente com um conceito de base cultural, mas

agora avançamos um degrau no caminho que vai das experiências básicas ontológicas

– os Esquemas Imagéticos – e, por isso, não dotadas de conteúdo proposicional; às

experiências ônticas complexas, agora sim dotadas de conteúdo proposicional e de

material linguístico (LAKOFF, 1987), haja vista que é a linguagem que estrutura a

cognição, desde a mais tenra idade, como se pode observar neste passo de Herculano

de Carvalho (1967:293)

...a coisa agora sensivelmente percebida já não é mais um ser fantasmagórico e

nunca antes experimentado, - uma mancha de contornos imprecisos movendo-se

num mundo de outras manchas móveis ou imóveis, inidentificável -, mas é um

cavalo que corre no prado, ...

Page 25: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

É na própria aquisição das estruturas mais básicas da natureza humana que se

encontra o arcabouço para a construção das estruturas complexas que terão a árdua

missão de tentar organizar o pensamento humano.

Os Modelos Cognitivos Idealizados, termo cunhado por George Lakoff

(1987), foram de suma importância para embasar a oposição que o experiencialismo

adotou contra o objetivismo clássico aristotélico, que concebia as categorias do mundo

de forma mecanicamente organizadas. Sob a influência da Psicologia de Eleanor

Rosch (1976), Lakoff (1987) nos mostra que as categorias possuem limites difusos e

interconectados e que uma das razões para isso é a influência dos Modelos Cognitivos

Idealizados nas mentes dos falantes de determinada comunidade linguística.

O exemplo clássico é a palavra ‘bachelor’ (solteirão), estudada por Filmore

(1975) apud Cuenca e Hilferty (1999:75), que serviu de base para a investigação dos

efeitos de protipicidade, relacionando-os aos diversos Modelos Cognitivos

Idealizados. A análise do exemplo se presta a argumentar que, no mundo ocidental,

sob uma perspectiva judaico-cristã, o solteirão seria uma pessoa que não se casou na

idade ideal, segundo essa cultura, ou que não conseguiu se manter em união. Mas

nessa categoria não estariam incluídos o Papa e os padres católicos, visto que esses não

possuem a permissão eclesiástica para o matrimônio.

Dessa forma, procurou-se demonstrar que, mesmo em uma mesma cultura, a

compartimentalização das categorias do mundo se mostra artificial, porque cada

categoria possui modelos centrais ou prototípicos, que representam os elementos

exemplares, e modelos periféricos, que não são exemplares e podem estar em contato

com outras categorias, realizando o que Wittgenstein (1994) chamou de semelhanças

de família.

Os Modelos Cognitivos Idealizados são primeiramente modelos, porque são

paradigmas observados em determinada cultura, ou, como observa Castilho (2007):

“os MCI’s enquadram situações de maneira holística, global e utilizam critérios com

um forte lastro na experiência física e social das pessoas, em vez de categorias

estabelecidas conceitualmente e em abstrato.”. Mas também são cognitivos porque

estão em nossas mentes e, desse modo, não podem ser quantificados, muito menos

formalizados em sua totalidade, ou como bem observa Jesus (2009:31):

Mais do que entendimento de contexto, o MCI auxilia a compreensão do

pensamento humano para categorização das entidades ao seu redor, ao mesmo

Page 26: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

tempo em que não pode ser ‘encaixotado’ completamente em uma teoria

esquemática; há mais MCI’s do que esquemas teóricos para representá-los.

E, por fim, são idealizados porque não possuímos em nossas mentes estruturas

que refletem a realidade objetivamente, muito ao contrário, construímos um mundo a

partir de percepções que temos de experiências que vivemos e de situações que

imaginamos, construindo, desse modo, nossa cosmovisão. E essa idealização parece

ser o calcanhar de Aquiles do conceito, mas isso é facilmente refutado se observarmos

que os Modelos Cognitivos Idealizados fazem parte de um conjunto maior que são os

modelos culturais e, como a cultura não pode pertencer a apenas uma pessoa, é lícito

afirmar que uma mesma comunidade tem o mesmo conhecimento básico sobre

algumas coisas.

Por isso é que, no MCI de um brasileiro, o local ‘praia’ enquadra homens e

mulheres, ao mesmo tempo, com roupas de banho e - às vezes, sem as roupas - e isso é

algo compartilhado por todos desta comunidade. Essa situação de enquadre seria

inadmissível se considerarmos o MCI de um árabe muçulmano, uma vez que, nessa

cultura, não é permitido à mulher transitar em local público sem que o corpo esteja

coberto quase totalmente.

Portanto, as pessoas compartilham conhecimentos arraigados em sua cultura,

que estabilizam as informações que alimentam os MCI’s e, dessa forma, concordamos

com Ungerer e Schimid (2006:53), quando afirmam que

(...) enquanto o termo ‘modelo cognitivo’ enfatiza a natureza psicológica dessas

entidades cognitivas e permite as diferenças interindividuais, o termo ‘modelo

cultural’ enfatiza o aspecto de unidade de ser compartilhado coletivamente por

muitas pessoas.

Assim, podemos dizer que é nossa cognição que nos faz diferentes um do outro

e, por isso, indivíduos; mas essas diferenças têm uma mesma base que se encontra em

nossa cultura e garante o entendimento entre os falantes.

Todavia, discordamos dos autores quando afirmam que os modelos culturais e

os modelos cognitivos são os dois lados da mesma moeda, pois entendemos que os

modelos cognitivos são o subconjunto dos modelos culturais, uma vez que aqueles se

encontram no âmbito da Antropologia, por abrangerem não somente experiências

cognitivas, mas também corpóreas e motoras, enquanto esses dizem respeito

principalmente às relações psicossociais entre os falantes.

Page 27: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Gráfico 1: relação de continência entre conceitos

2.2.1 Exemplo Disfêmico

Para ilustrar mais uma vez o conceito de MCI, tomaremos em análise a

expressão ‘Suou mais que tampa de marmita’, que significa a exacerbação de um

processo biológico ativado por situações de esforço físico, mal-estar orgânico ou

psicológico, e que somente poderá ser analisada sob MCI’s que enquadram o costume

de armazenar alimentos em um recipiente para um aquecimento posterior, algo que não

está contido, por exemplo, no MCI de um japonês onde a comida da marmita é

consumida em temperatura ambiente. Ou seja, uma expressão que é de fácil

entendimento para um brasileiro, mesmo que nunca tenha usado uma marmita,

parecerá incongruente para uma pessoa de MCI diverso.

Os Modelos Cognitivos Idealizados encontram-se na memória de longo prazo

(SALOMÃO, 2003:27) e, desse modo, configuram estruturas estáveis, mas não

estáticas, que fornecem a base para o entendimento comunicativo, uma vez que para a

Linguística Cognitiva, a forma linguística não é plena, porque não porta o significado;

apenas serve de guia (FAUCONNIER, 1994:1). Para demonstrar uma das formas

como a ampliação dos MCI’s se dá através da interação do ser humano com as

variantes sociais e históricas, procedemos a um teste linguístico que consiste em um

questionário composto por dez construções comparativas superlativas disfêmicas e

uma pergunta direcionada a todas as construções sobre o que o informante entendeu

acerca da frase e uma específica para cada construção, totalizando vinte perguntas, que

serão expostas em seguida:

MODELOS CULTURAIS

MCI

Esquemas

Imagéticos

Page 28: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

1) Sofreu mais que suvaco de aleijado.

a) Por que suvaco de aleijado sofre?

2) Apanhou mais que mulher de malandro.

a) Por que mulher de malandro apanha?

3) Suou mais que tampa de marmita.

a) Por que tampa de marmita sua?

4) Estava mais quebrado que arroz de terceira.

a) Por que arroz de terceira é quebrado?

5) Estava mais por fora de cotovelo de caminhoneiro?

a) Por que cotovelo de caminhoneiro fica por fora?

6) Estava mais amassado que jornal pra limpar fiofó.

a) Por que jornal pra limpar fiofó fica amassado?

7) Deu mais que chuchu na serra.

a) Por que chuchu na serra dá?

8) Se virou mais que charuto na boca de bêbado.

a) Por que charuto na boca de bêbado vira?

9) Apanhou mais que bife de segunda.

a) Por que bife de segunda apanha?

10) Apanhou mais que boi ladrão.

a) Por que boi ladrão apanha?

Page 29: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Os informantes foram divididos em duas faixas etárias e uma dessas faixas foi

subdividida em dois níveis de escolaridade para que a intuição de que forma de se

dáaquisição e ampliação de MCI’s fosse confirmada, conforme a tabela abaixo:

Tabela 1: A aquisição e ampliação de MCI’s

INFORMANTES IDADE ESCOLARIDADE ACERTOS

100 [13 – 15] 8º ano 22 (2,2%)

100 [24 – 55] 8º ano 263 (26,3%)

100 [24 – 55] Nível Superior 797 (79,7%)

A distribuição no número de acertos nos leva a duas conclusões que

corroboram a hipótese aventada anteriormente. A primeira, em relação ao mesmo

nível de escolaridade, que possuem uma grande diferença em relação ao número de

acertos, o que nos permite afirmar que o conhecimento de mundo é mais ampliado de

acordo com a idade dos informantes, visto que nas faixas que possuem o mesmo nível

escolar, mas diferentes idades, o percentual de acertos foi bem maior nas pessoas com

mais idade. A segunda conclusão a que chegamos, é que o conhecimento acadêmico

amplia de forma incisiva os MCI’s, já que podemos constatar que grupo de

informantes com a mesma faixa etária possuem índices de acertos proporcionais ao

nível de escolaridade.

3.3 OS ESPAÇOS MENTAIS

Avançando nos conceitos que serão essenciais na análise das construções

disfêmicas, chegamos a mais um do qual a Linguística Cognitiva faz uso para explicar

como se opera o entendimento comunicativo: o de Espaço Mental.

Os Espaços Mentais são definidos como “pequenos pacotes conceituais

construídos enquanto pensamos ou falamos para o entendimento e ação locais”

Fauconnier (1985:11). Mas, se fossem apenas pacotes conceptuais, seria difícil

diferenciá-los dos Modelos Cognitivos Idealizados, se não delimitarmos as diferenças

entre ambos.

Page 30: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

As diferenças entre os conceitos são bem mais salientes e se encontram

principalmente na extensão, porque os Modelos Cognitivos Idealizados, por serem

estáveis, possuem uma extensão bem maior que a dos Espaços Mentais – embora não

mensurável (JESUS, 2009); e na forma de processamento, pois os Espaços Mentais

são ativados localmente, respondendo pelo fluxo discursivo da memória de curto prazo

(SALOMÃO, 2003), enquanto os Modelos Cognitivos Idealizados servem de fonte

para a estruturação dos Espaços Mentais e se encontram na memória de longo prazo.

Desse modo, podemos afirmar que os Modelos Cognitivos Idealizados

constituem o estrato cognitivo que servirá de base para a estruturação dos Espaços

Mentais, que não durará mais que o tempo da interação.

Por estarem na mente e serem fugazes (SILVA, 2007), a ativação dos espaços

mentais é processada de forma pontual e efêmera e, por isso, seu processo é

comparado a uma bolha de sabão ou às bolhas d’água em ebulição. Como ocorrem à

medida que pensamos, falamos, lemos ou escrevemos, esse processo terá como

deflagrador algumas formas linguísticas denominadas por Fauconnier (1994:37-9) de

Construtores de Espaços Mentais (Space Builders) relativas a noções básicas, como

tempo e lugar, e outras mais complexas, como contrafactualidade e possibilidade.

Seria exaustivo e talvez contraproducente elencar as formas linguísticas

capazes de construir espaços mentais. Assim, tomaremos mais um exemplo para

explicitar o conceito.

Observemos, a título de exemplificação, a construção disfêmica “Sofreu mais

que suvaco de aleijado.”, em que podemos relacionar grupos lexicais a determinado

Espaço Mental, sem que esteja aqui falando em composicionalidade2, uma vez que a

força mais atuante aqui é o Princípio da Identificação (FAUCONNIER, 1985:184).

O verbo ‘sofrer’ ativa em nossa mente uma experiência de dano ou prejuízo

físico e/ou psicológico, que estará presente certamente em nossos Modelos Cognitivos

Idealizados sob variadas formas: dor de parto, dor de dente, dor de cabeça, dor de

cotovelo, dor da alma etc. (HOUAISS, 2001).

Já o grupo nominal ‘mais que’ é um construtor de espaços mentais responsável

pela edificação do espaço de comparação alimentado pelos Modelos Cognitivos

Idealizados, que, já vimos, provêm de um Esquema Imagético espacial, que

2 Sob uma abordagem cognitivista, uma construção é um pareamento forma-significado, isto é, o significado de

uma estrutura não repousa na soma dos significados de suas partes isoladamente, mas sim emerge da totalidade

da construção (GOLDBERG, 1995:1).

Page 31: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

relacionará o termo anterior, no caso acima, um processo físico e/ou mental, ao termo

seguinte.

E será exatamente no termo seguinte que o Cognitivismo mostrará toda a sua

elegância e refinamento na análise de termos antes relegados ao idiotismo.

O grupo nominal ‘suvaco de aleijado’ ativará um Espaço Mental de anatomia

do corpo humano: a axila. Mas não uma axila prototípica, já que o termo qualificativo

‘de aleijado’ a restringe e particulariza.

Visto que, no nosso MCI, a noção de aleijado está conectada aos aparelhos ou

instrumentos que auxiliam a locomoção do deficiente físico, tais como cadeira de

rodas, bengalas e muletas, em um modelo menos atual3, se constituíam de um bastão

com encosto na parte superior adaptado à axila, causando muitas vezes ferimentos a

essa parte do corpo. É nessa confluência de operações cognitivas que se dá o

entendimento, deixando claro, mais uma vez, que as palavras não portam o significado,

mas apenas servem de guia (FAUCONNIER, 1994)

Há de se pensar também em um intercâmbio informacional entre Modelos

Cognitivos Idealizados e Espaços Mentais, porque já vimos que, através dos MCI’s,

podemos entender expressões que representam processos que não vivenciamos e, a

partir da apreensão virtual desse conhecimento, através da formação dos Espaços

Mentais, estaremos fornecendo mais material cognitivo para alimentar os MCI’s ou,

como salienta Koch (2009: 38-9):

Isto se deve à possibilidade de ativação e transferência de unidades armazenadas na

memória de longo termo para a memória de curto termo, de modo a permitir o

tratamento da informação nela presente para posterior envio à memória de longo

termo. Há, pois, um contínuo ir-e-vir entre ambas as memórias.

(...) os dois tipos de conhecimento interagem continuamente: utilizamos o

conhecimento geral para desenvolver o conhecimento particular; este, por sua vez,

pode levar à modificação e ampliação do conhecimento geral.

É nessa ação conjunta entre os constructos teóricos que intentam demonstrar

um pouco do funcionamento de nossas mentes que enfocaremos a pesquisa, para que

se possa demonstrar nas análises que é através da nossa linguagem que se faz o

entendimento de nós mesmos, nosso com o os outros e nosso com o mundo.

3 Foi comprovado através de testes linguísticos que uma pessoa que não possui em seu MCI o modelo antigo de

muleta não consegue depreender o significado da construção, visto que, no modelo atual, a muleta não entra em

contato com a axila.

Page 32: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Abaixo, tentaremos formalizar a construção e expansão dos Espaços Mentais

nos termos de Fauconnier (1997), que nos mostra a criação de três Espaços Mentais:

a) um espaço de foco (M), que diz respeito ao contexto comunicativo em que vão

ocorrer as formas linguísticas; b) um espaço de fundação (F), em que a construção

emergirá e ativará os Espaços Mentais de acordo com as inferências produzidas pelo

falante; e um espaço de expansão (E), onde a construção será atualizada com a

convergência da forma linguística e das inferências contextuais.

No gráfico acima, podemos perceber que os elementos no espaço de foco (M)

não recebem nenhum índice, por se tratar apenas de entidades que pertencem à

situação que se enquadra nos Modelos Cognitivos Idealizados do falante; mas, a

partir da segunda projeção, entram em ação as inferências que, juntamente com as

instruções das expressões linguísticas (C), agem sobre os Espaços Mentais ativados,

que serão ressignificados na terceira projeção por meio de novas inferências.

Abaixo temos a representação de “Sofreu mais que suvaco de aleijado”, para

que passemos de uma representação geral a uma particularizada:

a

b

S

S

C

C

Gráfico 2: criação e ativação dos Espaços Mentais

M

F

E

Page 33: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

No gráfico podemos constatar a constante criação de Espaços Mentais a partir

de um espaço que representa a situação comunicativa (M), nesse caso qualquer

contexto de desconforto físico ou psicológico, que se atualiza com a construção em

análise e já constrói no espaço de fundação (F) as primeiras inferências, que serão

atualizadas novamente no espaço de expansão (E) com novas inferências e com as

instruções das expressões linguísticas (C), nesse caso as partículas “mais” e “que”,

que inserem a noção comparativa superlativa.

a

b

Sofrer a¹

Aleijado b¹

Alguém que sofre a²

Suvaco de

aleijado b²

Desconforto Físico ou

psicológico

Sofrimento além do

sofrimento

C

C

Gráfico 3: criação e ativação dos Espaços Mentais em

“Sofreu mais que suvaco de aleijado”

M

F

E

Page 34: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

3.4 OS MAPEAMENTOS CONCEPTUAIS

Os três conceitos apresentados acima fazem parte do arcabouço teórico geral da

Linguística Cognitiva e servirão para que possamos passar à explanação de um

conceito tão importante quanto os citados, não obstante serem mais específicos: o de

mapeamento conceptual.

Os mapeamentos conceptuais, executados enquanto pensamos ou falamos,

fornecem um modelo elegante e eficaz de formalizar constructos que até então

pareciam uma saída ad hoc para dar conta da análise de alguns dados linguísticos.

Por representarem a pedra de toque desta pesquisa, será necessário um

detalhamento mais demorado desse conceito, uma vez que estarão presentes os três

conceitos básicos explorados anteriormente, além de outros advindos de outras

ciências linguísticas.

Quando Fauconnier (1994) compara a linguagem à ponta de um iceberg e a

construção do sentido como a parte submersa, ele cria uma imagem fortíssima que

serve de estandarte para uma ciência que não acredita na função especular da

linguagem, mas em uma linguagem em uso em que o entendimento é feito segundo

uma situação social de interação intersubjetiva (MONDADA; DUBOIS, 1995:25).

O mapeamento tem papel crucial na estruturação do pensamento representado

pela linguagem, visto que usa a identificação, a integração e a imaginação entre

domínios (FAUCONNIER e TURNER, 2002) para compor, juntamente com os

elementos pragmáticos, a congruência comunicativa.

Um mapeamento faz-se entre, pelo menos, dois domínios, que podem se

constituir de proposições discursivas. Essas proposições ativam enquanto falamos,

escutamos, lemos ou escrevemos (SILVA, 2007) os Espaços Mentais, que, segundo

Lakoff (1987), são estruturados por Modelos Cognitivos Idealizados, que servem de

paradigma para determinada situação social e, juntamente com os Esquemas

Imagéticos, constituem os Domínios Cognitivos (CUENCA E HILFERTY, 1999).

Dessa forma, as formas gramaticais ativam os espaços mentais de um domínio,

doravante, o domínio alvo, de forma que, no domínio origem, se encontre o arquétipo

de algumas propriedades do domínio alvo e nesse as novas categorias conceptuais

(FAUCONNIER, 1997).

Mas o que serve de base para a construção desse domínio? A resposta está no

caráter enciclopédico da linguagem, que, consoante a Linguística Cognitiva, inclui o

Page 35: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

conhecimento linguístico e suas formas emergentes insuficientes para a apreensão do

significado global.

É o conhecimento de mundo adquirido desde o nascimento por cada falante que

servirá de fulcro para um domínio em que os conceitos se situam em um plano mais

geral e abstrato como poderemos ver no seguinte exemplo:

“Chiou mais que panela de pressão.”, em que o verbo que inicia a oração

preenche o domínio genérico com os diferentes significados que ativa, tais como:

emitir canto, som agudo, bradar, queixar-se, protestar (HOUAISS, 2001). E, além

disso, por ser um verbo nocional, também atua como poderoso construtor de Espaços

Mentais , um vez que suscita em nossos Modelos Cognitivos Idealizados um agente –

o chiador, que está situado em um evento/processo: o de chiar.

Mas o significado da oração não fica restrito ao verbo, colocando mais uma vez

o conceito de composicionalidade em xeque. Além da expressão “mais que”, que

acrescenta a noção comparativa superlativa, o sintagma nominal “panela de pressão”

faz uma referência prototípica a um recipiente utilizado no preparo de alimentos, mas

também pode se referir a um grupo de pessoas unidas por afinidade e interesses

comuns (Aqueles garotos formam uma panelinha muito forte.); ao orifício causado ao

dente por uma cárie e até a um tabuísmo no Português Europeu, em que tem em uma

de suas acepções: o ânus.

Uma das grandes conquistas da Linguística Cognitiva foi exterminar a divisão

entre denotativo e conotativo, defendendo que usamos em nossa linguagem ordinária

expressões tão arraigadas que nem conseguimos perceber que são metafóricas ou

metonímicas. Para isso, foi primordial desenvolver o conceito de metáfora conceptual,

que será utilizado brevemente agora, mas adiante será mais esmiuçado.

Não é raro ouvir que determinada pessoa “explodiu de raiva” ou que ficou

com a “cara quente” de ódio. Essas e outras expressões são instanciações de uma

metáfora conceptual que pode ser definida como “raiva é um fluido que se eleva com

a temperatura”. E, a partir dessa metáfora “mãe”, muitas expressões são escritas e

faladas pelos falantes a todo o instante. No exemplo em questão, a “panela de

pressão” é um recipiente que contém água e alimentos e para que funcione precisa ser

aquecida. É a partir da prototipicidade culturalmente construída desse recipiente que a

expressão ganha sentido superlativo para o interlocutor graças a uma relação

metafórica e metonímica.

Page 36: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Gráfico 4: Criação do Espaço Genérico da expressão “Chiou mais que panela de pressão”

Uma vez comparando a “panela de pressão” ao cérebro de uma pessoa

(relação metafórica) e o seu conteúdo (água e alimentos) a suas ideias e sentimentos, o

interlocutor cria um espaço genérico ancorado na metáfora conceptual “raiva é um

fluido que se eleva com a temperatura”, e, elevando a temperatura do conteúdo

(ideias e sentimentos), o cérebro procede a uma reação de causa e efeito (relação

metonímica), que resulta no evento/processo de chiar. A ativação do frame pelo MCI

de um falante enquanto entra em contato com a construção, em sua formação e uso

pode ser melhor observada no gráfico abaixo:

3.4.1 Os Espaços de Entrada

A organização do mapeamento entre os domínios faz-se quase

simultaneamente, não sendo possível uma mensuração temporal que estipule o

momento exato em que cada espaço é acionado.

Considerando que os Espaços Mentais são ativados à medida que pensamos,

falamos, ouvimos, lemos e escrevemos e que são ancorados em nossos Modelos

Cognitivos Idealizados, vamos considerar a direção sintagmática ocidental

(esquerda/direita) para expor a natureza dos espaços de entrada.

Para explicitarmos a construção dos Espaços de Entrada, utilizaremos a oração

“Suou mais que tampa de marmita.” demonstrando os elementos que habitam cada

Emitir canto

Reclamar

Culinária

Elevação da temperatura

Raiva

Alimentos

Cozinha

MCI

Page 37: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

espaço. Observando o sentido atribuído à expressão, teremos, além do elemento de

conexão “mais que”, que confere à construção a semântica comparativa, duas

informações que nos remetem a um evento/processo do mundo objetivo e figurarão

como comparado e comparante (MARTINS, 1991).

A forma verbal ”suou” ativará os Espaços Mentais que constituirão o primeiro

espaço de entrada, mas a forma é apenas uma instaciação de uma construção abstrata4

(oração comparativa superlativa disfêmica) e será representada no Espaço 1 por suas

categorias semânticas.

Uma vez que a ação de “suar” evoca um agente, o verbo também pode evocar

desconfortos ou sofrimentos, que seriam as possíveis causas desse processo biológico,

suscitando, assim, além de um agente biológico, um paciente que sua devido a algum

desconforto não causado por ele. Desse modo, o primeiro Espaço de Entrada pode ficar

configurado assim:

Após a conexão “mais que” ocorre o sintagma nominal “tampa de marmita”

que, isoladamente, representaria um objeto do mundo objetivo, mas assume, na

interrelação com o Espaço de Entrada 1, o papel de protótipo do que sua, o que

confere à expressão a semântica disfêmica.

4 A Gramática das Construções relaciona algumas formas de herança nas quais as construções são instanciadas.

Agente

Efeito

Processo

Biológico

Líquido

Gráfico 5: o Espaço de Entrada 1

Page 38: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Fauconnier e Turner (2002) enfatizam algumas relações vitais presentes nos

mapeamentos conceptuais e, entre eles, destacam que a relação vital de identificação

seria a mais proeminente no caso da metáfora.

Considerando que a comparação pode ser encarada como uma metáfora

desenvolvida, aplicaremos essa relação vital no mapeamento nos Espaços de Entrada

1 e 2.

No segundo espaço, podemos destacar alguns atributos do sintagma nominal

”tampa de marmita”, sem considerar o sentido global da construção, algo que se dará

em um próximo processo e que uma análise composicional não daria conta.

Levando em conta que a “tampa de marmita” em questão também está

envolvida no processo/evento de “suar”, poderemos ter os seguintes atributos:

Agora, com os atributos de ambos os espaços, podemos aplicar a relação de

identidade para que possamos explicitar a relação entre os espaços:

Paciente

Efeito

Processo Físico

Líquido

Gráfico 6: o Espaço de Entrada 2

Page 39: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Paciente

Efeito

Processo Físico

Líquido

.

Analisando o mapeamento entre os espaços, o caos parece imposto, pois um

agente possui uma relação de identidade com um paciente e um processo biológico

está em direta relação de identidade com um processo físico.

Também podemos observar a identidade entre duas substâncias e entre duas

relações de efeito, uma vez que, em ambos os espaços, o líquido é a substância

resultante de um processo, seja ele físico ou biológico, que, por sua vez, já se configura

como consequência de um outro episódio5.

No Espaço 1, o processo pode ser o efeito de um esforço ou desconforto físico

ou mental, enquanto, no Espaço 2, o efeito é proveniente de um processo físico de

evaporação. Aqui está o cerne da comparação e da metáfora. Como ambos os

processos guardam similitude entre atributos que determinadas entidades

compartilham, se mantêm como disitintos, uma vez que, se compartilhassem todos os

atributos, seriam um único processo.

O suposto caos será resolvido na construção de um espaço de mapeamento em

que encontraremos os atributos que emergem dos Espaços 1 e 2 e, que, por isso,

instanciará a própria construção e configurará um espaço mais rico e completo: o

Espaço Mescla.

5 Há nesse caso outros processos envolvidos, como a metonímia e a metaftonímia, que serão analisados

posteriormente.

Agente .

Efeito .

Processo Biológico . Líquido .

PRINCÍPIO DE

IDENTIFICAÇÃO

Gráfico 7: a relação de identidade entre os espaços

Page 40: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

3.4.2 O Espaço Mescla

Depois de abordarmos as bases de cognição que fornecem substrato para a

estruturação de Espaços Mentais nos Espaços de Entrada, é necessário delinear o

espaço onde a construção em que a forma linguística manifesta o seu sentido sem a

pecha de de idiotismo: o Espaço Mescla.

No Espaço Mescla, apenas alguns atributos dos Espaços de Entrada são

admitidos, uma vez que o sentido da forma linguística emergirá do processo de fusão

entre as contrapartes, executado em milésimos de segundo pela cognição humana.

Fauconnier (1997) destaca os três modos que constituem o processo de criação

de uma estrutura emergente a partir do mapeamento entre os Espaços de Entrada:

a) composição: tomadas em conjunto, a projeção dos Espaços de

Entrada produz novas relações disponíveis que não existiam nos Espaços de Entrada

separadamente. Ou seja, na fusão, começamos a captar algumas relações inexistentes

se tomássemos os Espaços de Entrada separadamente, o que justifica a mescla.

b) completamento: o conhecimento de mundo, modelos cognitivos e

culturais, permite que o complexo da estrutura projetada na mescla seja observado

como parte de uma estrutura de conteúdo próprio maior na mescla. O modelo

desencadeado na mescla pelas estruturas herdadas está completo em uma estrutura

emergente;

Aqui percebemos que os atributos projetados na mescla constituem um

conjunto maior que o observado nos Espaços de Entrada separadamente, pois entram

todas as possibilidades de realização de cada contraparte, considerando não só o

conhecimento de dicionário, mas também o enciclopédico (CUENCA E HILFERTHY,

1999).

c) elaboração: é o trabalho cognitivo realizado na mescla de acordo

com sua própria lógica emergente. Desse modo, não deve haver soluções ad hoc para

encaixar os conteúdos dos Espaços de Entrada na estrutura emergente presente na

mescla, tais como situações pragmáticas inusitadas ou inverossímeis, mesmo porque

Page 41: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

nem todas as características dos espaços de entrada são utilizadas na estrutura

emergente da mescla, como mostra o gráfico abaixo:

O quadrilátero no centro do círculo representa a estrutura de mescla que emerge

a partir da operação de compressão entre as estruturas dos espaços de entrada, e os

pontos fora desse quadrilátero representam as estruturas que não foram selecionadas

pelo espaço de mescla, mas continuam existindo nos espaços de entrada.

. . .

Gráfico 8: o Espaço Mescla

. . . . . .

Page 42: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

4. A FIGURATIVIDADE NA LINGUAGEM

Já ao propor os conceitos básicos delineados anteriormente, a Linguística

Cognitiva também considera a figuratividade na linguagem, sobremaneira a metáfora,

como fator constitutivo, e não ornamento retórico ou desvio linguístico.

Desde a cultura clássica, as figuras de linguagem, ou retórica eram motivo de

discussões e anseios por parte dos pensadores, pois enquanto uma parte a achava

nociva em busca da verdade, outros afirmavam que o seu uso constituía fato de

excelência na produção dos discursos.

Passado o período clássico, o conjunto de figuras de linguagem

compartimentou-se e, já no século XX, formou-se uma disciplina ligada à Linguística,

mas que sempre esteve em uma espécie de limbo entre a Gramática Normativa e a

Literatura: a Estilística.

Esse isolamento deve-se ao fato de que as construções que possuem figuras

linguísticas são consideradas uma questão de desvio pela maioria dos gramáticos e

uma questão de estilo pelos literatos. O que fazer então com aquelas expressões que

são inventadas, ditas e repetidas por falantes comuns que nunca escreveram um livro e

talvez nem saibam ler?

A resposta parece difícil até para estudiosos de um mesmo campo, como

explicita Martins (1989:90): “Já Dumarsais dizia, com evidente exagero, que se fazem

mais metáforas num dia de feira do que numa sessão de Academia.” Tradicionalmente,

estudos sobre a figuratividade linguística pautados no Objetivismo Clássico que

concebem as figuras como fenômenos da linguagem e uso como privativo dos artistas.

Também concebem seu uso como estratégia de quem deseja esconder a verdade.

4.1 A METÁFORA

Considerada a mais importante das figuras de linguagem, seu significado

primeiro, de ‘ mudança’, transposição’, já apresenta seu objetivo – mudar do sentido

próprio ao figurado -, o que justifica o medo dos filosófos e o fascínio dos artistas.

Estudiosos já deixavam entrever, mesmo sem o aparato teórico atual, o viés

cognitivista em suas análises, como Bally (1951) apud Martins (1989:90) que explica:

Page 43: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

(...) as figuras de linguagem resultam da necessidade expressiva e se devem à

incapacidade de nosso espírito abstrair, de apreender um conceito, de conceber uma

ideia fora do contato com a realidade concreta. Assimilamos as noções abstratas aos

objetos de nossas percepções sensíveis, porque é o único meio de que dispomos para

delas tomar conhecimento e torná-las inteligíveis aos outros. O espírito, induzido

pela associação de duas representações, confunde num só termo a noção

caracterizada e o objeto sensível tomada como ponto de comparação (este homem é

uma raposa = este homem é astuto como uma raposa). Estas associações são

fundadas sobre vagas analogias, por vezes muito ilógicas, mas elas revelam que o

sujeito pensante extrai das suas observações da natureza exterior imagens para

representar aquilo que o seu cérebro não consegue apresentar sob a forma de

abstração pura.

Observando atentamente a explanação acima, não é difícil perceber que já

existiam coincidências com teorias mais atuais em relação à metáfora. Se, em vez de

corroborar que o nosso espírito não tem capacidade de abstrair, de apreender um

conceito e de conceber uma ideia fora do contato com a realidade concreta,

considerarmos que o nosso aparelho cognitivo se utiliza de metáforas para abstrair,

apreender um conceito e conceber uma ideia fora do contato com a realidade concreta

estaremos, dando um passo importante para deixar de pensar na metáfora como

ornamento vocabular e considerá-la como parte integrante de nossa cognição. Garcia

(2006:107) também deixa algumas cores cognitivas à mostra ao definir metáfora como

a figura de significação ( tropo) que consiste em dizer que uma coisa ( A) é outra

(B), em virtude de qualquer semelhança percebida pelo espírito entre um traço

característico de A e o atributo predominante, atributo por excelência de B, feita a

exclusão de outros, secundários por não convenientes à caracterização do termo

próprio A. Ora a experiência e o espírito de observação nos ensinam que os objetos,

seres, coisas presentes na natureza – fonte primacial de nossas impressões –

impõem-se-nos aos sentidos por certos traços distintos.

Novamente vemos aqui a menção ao espírito humano que poderíamos

aproximar à inteligência e à cognição. Mesmo fazendo menção aos objetos, seres e

coisas da natureza, o autor não privilegia o contexto e a cultura do falante,

direcionando sua definição mais uma vez para o caminho objetivista. Garcia também

introduz em sua obra uma representação esquemática da metáfora, que lembra de

forma incipiente uma mescla conceptual:

Page 44: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

No diagrama, pode ser constatado que a metáfora é vista como uma questão da

linguagem, representada em sua forma mais abstrata pelo 1° círculo e por um conceito

mais bem delineado no segundo círculo. A interseção entre os círculos representa os

atributos mais proeminentes de cada conceito.

A representação, até certo ponto elegante, não poderia dar conta de uma

possível intenção do falante de expor outros atributos comuns ao “incêndio” e ao “leão

ruivo, ensanguentado”, tal como o sentimento de tristeza inerente a uma edificação em

chamas e a um leão ensanguentado abatido por um caçador.

Fatores extralinguísticos não mencionados na representação influenciam

significativamente no sentido de construções linguísticas e também devem ser

formalizados cientificamente por uma teoria que deseje incorporá-los.

4.2 A METONÍMIA

Manuais gramaticais (BECHARA, 2001; CUNHA E CINTRA, 2007; ROCHA

LIMA, 2002; TERRA, 2002) e estilísticos (LAPA; MARTINS, 1989; GARCIA, 2006)

caminham em uma mesma direção ao sinalizar que, mesmo parecida com a metáfora,

pois usa um termo que normalmente designa uma coisa para designar outra, a

metonímia não o faz por meio de semelhança, mas sim por uma relação de

1º Círculo Plano real:

incêndio (A)

2º Círculo Plano imaginário:

Leão ruivo, ensaguentado (B)

Zona sombreada

Área de semelhança

entre os dois planos

(A é B)

Incêndio – leão ruivo, ensaguentado

Gráfico 9: modelo de representação metafórica de Garcia (2006)

Page 45: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

contiguidade, termo um tanto vago que não se aplica a todos os casos, a não ser se

ampliarmos a noção de proximidade.

Tradicionalmente, o que distingue metáfora e metonímia é o seu processo de

constituição, haja vista que enquanto aquela se baseia em relações de semelhança,

enquanto esta se fundamenta em uma relação lógica, que pode ser representada como

causa/efeito, conteúdo/continente, autor/obra, parte/todo6. Dessa forma, enquanto

na metáfora observamos semelhanças verificadas na relação entre o “incêndio” e o

“leão ruivo ensanguentado”; um caso metonímico poderia ser a frase “O leão suou para

fugir de seu algoz.”, em que o verbo ‘suar’ estaria representando uma instanciação da

metonímia causa/efeito do esforço empreendido pelo animal em fuga.

4.3 A POLISSEMIA

Por se tratar mais de um fenômeno léxico-semântico, e não de figuratividade, a

polissemia assume papel importante por revelar, entre os sentidos derivados, a

incidência da metáfora e da metonímia. Por ser condicionada pelo discurso, a

polissemia pode atribuir diversos significados a um único item lexical (Cf. Pietroforte

e Lopes, 2007:131), contribuindo, assim, na construção de imagens metafóricas e

metonímicas através de um espraiamento semântico como representado pelas várias

instanciações do verbo ‘tomar’, por exemplo:

1) Tomou a moça para dançar.

2) Tomou um copo de suco.

3) Tomou o caderno do colega.

4) Toma o táxi no Jardim Botânico.

O sentido básico de ‘ter para si’ é encontrado em todas as instanciações, sendo

modificado de acordo com as idiossincrasias semânticas de seus argumentos externos.

6 Não será feita a distinção entre metonímia e sinédoque, visto que a relação parte/todo faz parte do conjunto de

relações lógicas abarcadas pela metonímia.

Page 46: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

4.4 A VISÃO COGNITIVISTA

Opondo-se inteiramente, mais uma vez, à visão da tradição Objetivista Clássica

e ainda predominante no mundo ocidental, Johnson e Lakoff (1980:45) já começam

seu estudo contrapondo-se à ideia de ornamento e plasticidade desde sempre ligada à

metáfora:

Nós descobrimos, ao contrário, que a metáfora está infiltrada na vida cotidiana, não

somente na linguagem, mas também no pensamento e na ação. Nosso sistema

conceptual ordinário, em termos do qual não só pensamos mas também agimos, é

fundamentalmente metafórico por natureza.

Em seu primeiro capítulo, já conseguimos perceber o que faltava nas

tradicionais definições do conceito metafórico: em primeiro lugar, a mudança de

espírito (MARTINS, 1989; GARCIA, 2006) para sistema conceptual; e posteriormente

a asserção de que a metáfora não é questão somente de linguagem, mas também de

pensamento e ação.

Quando se fala em pensamento e ação, já se está na seara cognitivista, visto

que, como fulcro cognitivista, temos a relação entre o ser, seu pensamento, o ambiente,

os outros seres e as ações necessárias para essa interação. Ao afirmarem que a

metáfora está em nosso cotidiano, os autores procuram por expressões que a maioria

não entende ou não percebe como metáforas para explicarem a natureza dos conceitos

metafóricos, ou seja, empreendem um estudo semasiológico que conta com um grande

número de dados, nos quais apontam que a metáfora é produzida a todo momento por

todos os falantes.

Durante a sistematização dos conceitos metafóricos, algumas assunções foram

desenvolvidas e corroboradas através das construções. A primeira e mais inovadora é

que os conceitos metafóricos formam um sistema baseado em relações de implicações

diversas, como causalidade e subcategorização, entre outras.

Para exemplificar, afirmam que a metafora TEMPO É DINHEIRO é formada

por uma relação de subcategorização em que TEMPO É UM RECURSO e o

TEMPO É UM BEM VALIOSO. Para isso não, deixam de mencionar a cultura e as

relações econômicas em que esses conceitos se manifestam e o porquê de o tempo ter

se tornado um recurso valioso.

Page 47: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Um outro exemplo de metáfora cotidiana seria FELIZ É PARA CIMA, que

pode ser instanciada por expressões do tipo “Ele está nas nuvens.” e também implica

os conceitos MAIS É PARA CIMA e BOM É PARA CIMA, novamente em uma

relação de subcategorização. Ou seja, em alguns casos, teremos a relação entre uma

série de metáforas para chegar à compreensão de um conceito mais geral (LAKOFF,

1993).

A segunda importante contribuição da teoria metafórica de Johnson e Lakoff é

a consciência de que estruturas conceptuais metafóricas iluminam apenas parte de um

conceito, pois dependem da capacidade e intenção do falante, que é condicionado por

um estar em um tempo e em uma cultura.

Os diferentes conceitos metafóricos são distribuídos conforme seu processo de

constituição. Já foram observados casos em que um conceito metafórico é estruturado

em termos de outro (TEMPO É DINHEIRO e FELIZ É PARA CIMA), nesses

casos, o que teremos são as metáforas estruturais. Quando as metáforas tomam por

base as relações sensório-motoras e os Esquemas Imagéticos para organizar um

sistema de conceitos em relação a outro, são denominadas metáforas orientacionais.

Desse modo podemos conceptualizar BOM É PARA CIMA, porque ereta é a

posição corporal quando estamos felizes e saudáveis, e o inverso ocorre quando

estamos chateados e doentes. Assim, as noções orientacionais organizam uma série de

conceitos metafóricos em relação à determinada direção espacial.

Alguns conceitos experienciados pelos seres humanos encontram-se em tal

estágio de abstração, que não conseguimos traduzi-los a não ser usando metáforas que

usam o conceito de entidade e substância para nos referirmos a atividades, emoções e

ideias. Na construção “Estou vermelho com essa situação.”, o que ocorre é a

conceptualização do sentimento de vergonha como um objeto contido em nosso corpo,

que causa vermelhidão a determinada parte de nosso corpo, geralmente a face. Aqui

temos um sistema metafórico que inclui a metáfora conceptual SENTIMENTO É UM

FLUIDO, formando nesses casos o que é chamado de metáforas ontológicas, que

delimitam e reificam nossas experiências pessoais e mundanas.

4.4.1 A Metonímia Conceptual

Tomando como ponto de partida o exemplo “Estou vermelho com essa

situação.”, entendemos que a construção é constituída pela metáfora conceptual

Page 48: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

SENTIMENTO É UM FLUIDO, uma vez que o sentimento de timidez é

conceptualizado como um objeto/fluido que está contido em nosso corpo,

conceptualizado, por sua vez, como um recipiente, mas há dois processos cognitivos

imbricados na construção, e um de deles é o processo metonímico.

Sob uma ótica cognitivista, o que diferencia metáfora e metonímia não é apenas

a relação de contiguidade inerente à segunda, mas o prórpio modus operandi dos

processos, uma vez que a metáfora se processa através de projeções interdominiais e a

metonímia é executada em apenas um domínio cognitivo (LAKOFF E TURNER,

1989:103), em que entram em interação uma estrutura implícita, denominada Zona

ativa ou Referente lógico, e outra explícita denominada Ponto de referência (cf.

CUENCA e HILFERTY, 1999:111).

No exemplo citado, temos uma metonímia conceptual do tipo

CAUSA/EFEITO, visto que a cor avermelhada é o efeito da ação do objeto sobre a

face e, assim, teremos uma metáfora no interior de uma metonímia, como mostrado no

diagrama abaixo:

PR ZA

VERMELHO VERGONHA

PR ZA

PR= Ponto de referência

ZA= Zona ativa

Gráfico 10: projeção intradominial da metonímia

Projeção metonímica (Cuenca e

Hilferty, 1999)

Page 49: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

4.4.2 A Metaftonímia

Com o avanço dos estudos sobre a metáfora e a metonímia e a consequente

interação entre ambas, alguns autores postularam um continnum entre esses processos

conceptuais.

Goossens (2002:323) denomina de metaftonímia essa interação e verifica nas

expressões em inglês casos de metonímia dentro da metáfora e, mais raramente, como

foi mostrado acima, metáfora dentro da metonímia (SILVA, 2006:144).

Kövecses (2000) direciona seu foco para a constituição conceptual das emoções

e sentimentos pela grande ocorrência de interação metáfora/metonímia e assume que

ambos se processam a partir da metonímia EFEITO PELA CAUSA.

Desse modo, essa metonímia serve como base para a metáfora conceptual

SENTIMENTO É UM FLUIDO, em construções do tipo “Estou até aqui com

você.”, que acompanhada de um gestual característico de levar a mão até a testa como

que indicando um nível, é formada a partir da concepção de que SENTIMENTO É

UM FLUIDO que se encontra em nosso corpo, conceptualizado como recipiente, e

que o efeito é o estado emocional gerado possivelmente pela falta de paciência com

alguém.

No âmbito das construções comparativas superlativas disfêmicas, temos a

instanciação “Suou mais que tampa de marmita.”, em que a projeção metafórica

entre o verbo ‘suar’ e a entidade ‘tampa de marmita’ é licenciada, também pela

metonímia EFEITO PELA CAUSA, já que o suor é o efeito de um esforço físico ou

desconforto físico-psicológico e serve de fulcro para o sistema metafórico conceptual

SENTIMENTO É UM FLUIDO, CANSAÇO É UM FLUIDO, DESCONFORTO

É UM FLUIDO, mas com a particularidade de conter um comparante superlativo e,

por isso, ser disfêmica, em que o FLUIDO ultrapassa os limites do corpo (continente).

4.4.3 A Correspondência Metafórica

A definição clássica cognitivista nos ensina que “a essência da metáfora é

compreender e experienciar uma coisa em termos de outra” (JOHNSON E LAKOFF,

1980:48), que a metáfora é “um mecanismo que envolve a conceptualização de um

domínio de experiência em termos de outro” ( FERRARI, 2011:92).

Page 50: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Essa relação entre as coisas ou os domínios se processa através de

correspondências entre conceitos, constituídas de um Domínio-origem que empresta

seus conceitos a um Domínio-destino sobre o qual os conceitos são sobrepostos

(CUENCA e HILFERTY, 1999:101). Para licenciar a correspondência devemos saber

o que será incluído em cada domínio, de modo que a formalização possa estar de

acordo com o objetivo de generalização da teoria.

Como temos mais facilidade de apreender um conceito abstrato via concretude

ou reificação, na grande maioria das metáforas conceptuais, o Domínio-origem será

constituído de conceitos mais básicos e acessíveis à compreensão (Sweetser, 1990:18).

Assim, na construção “Ele já percorreu um longo caminho na vida.”, estamos

conceptualizando TEMPO utilizando o conceito ESPACIAL e como o conceito

ESPACIAL é mais concreto e acessível do momento de nosso nascimento até a nossa

morte com as relações motoras de deslocamento e o TEMPO como constructo

abstrato humano é de difícil apreensão, será mais viável e comunicável apreender o

TEMPO através do conceito ESPACIAL, como na construção “Ele está bem

distante do início da carreira.”, em que a noção de tempo de serviço é considerada

em termos de distância, logo, ESPACIAL.

Sabendo a constituição de cada domínio, o próximo passo de formalização é a

própria correspondência, que são as projeções do Domínio-origem no Domínio-

destino e que, segundo Lakoff (1987), dividem-se em dois tipos.

A correspondência ontológica é composta de relações analógicas que existem

entre as partes mais relevantes de casa domínio. Assim, quando conceptualizamos

EMOÇÕES em termos de FLUIDOS e instanciamos a construção “Meu sangue

ferve quando te vejo.”, temos a relação de similaridade entre uma EMOÇÃO (ódio,

amor) e um FLUIDO CORPORAL (o sangue).

Já a correspondência epistêmica é composta por ideias que se aplicam a

ambos os domínios. Quando utilizamos a construção “Minha mente pifou.”,

conceptualizamos MENTE em termos de MOTOR e a noção inerente é extraída da

função de ambos, visto que a MENTE funciona em prol do organismo e o MOTOR

funciona em prol de uma máquina.

Interessante é comparar a formalização realizada por Garcia (2006:108) e a

correspondência metafórica, como no diagrama abaixo:

Page 51: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Aparentemente as diferenças estão entre as relações de interseção propostas por

Garcia (2006) e as projeção de Lakoff e Johnson (1980). Mas não é só isso. Na relação

entre os círculos, Garcia (2006) não indica que atributos entram em confluência nos

dois círculos, podendo o interlocutor, motivado por suas crenças e sua cosmovisão,

fazer suas próprias inferências acerca da metáfora em questão.

Em contrapartida, o modelo de projeções deixa claro que nem todos os aspectos

do Domíno-origem são projetados no Domínio-destino, uma vez que o que se quer

iluminar com a metáfora é a natureza violenta de ambos os domínios, e não outros

aspectos, como a fragilidade de um leão ensanguentado ou a tristeza gerada por um

1º Círculo Plano real:

incêndio (A)

2º Círculo Plano imaginário:

Leão ruivo, ensaguentado (B)

Zona sombreada

Área de semelhança

entre os dois planos

(A é B)

Incêndio – leão ruivo, ensaguentado

Cor rubra . Fúria . Fragilidade . Morte .

Modelo de representação metafórica de Garcia (2006)

Domínio-origem

leão

Domínio-destino

incêndio

Projeção conceptual metafórica

Gráfico 11: semelhanças e diferenças nas formalizações

.Cor rubra

.Fúria

.Tristeza

.Morte

Page 52: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

incêndio. Essa seleção projetiva é algo essencial, uma vez que “a correspondência

entre o que dizemos e um estado de coisas no mundo é sempre mediada por nossa

compreensão dessa afirmação e do estado de coisa” (Lakoff e Johnson, 1980:291).

A importância da teoria metafórica conceptual para o estudo em pauta se

justifica pela relação intrínseca entre comparação e metáfora. A metáfora tem sido

tradicionalmente baseada em noções de similaridade e comparação (Ungerer e Schmid,

2006:258) ou como uma comparação abreviada (Lessa e Guimarães, 2008:47).

Mas é quando encaramos a figuratividade como constitutiva da linguagem e a

linguagem como meio para a interação entre falantes com suas vivências sociais e

históricas que percebemos a magnitude do processo de correspondência, capazes de

criar novas maneiras de compreender saberes que não são apreensíveis apenas por

nossos sentidos básicos, mas pela cooperação dos sentidos, pela relação do corpo com

o ambiente, com outros corpos e com o próprio corpo e a linguagem, o que aumentará

o conhecimento de mundo do indivíduo.

Lakoff e Johnson (1980) justificam a atenção prestada à metáfora pelo motivo

de ela reunir razão e imaginação, mas não de qualquer forma. O que ocorre é uma

correspondência harmônica, cognitivamente estruturada por um processo imaginativo

ancorado na razão, de tal modo que não apenas aquele que criou a construção possa

entendê-la, interagir e usá-la, mas que possa ser apreendida, senão por todos, por

grande parte dos que compartilham sua base cultural e social.

Os pioneiros encontraram grande apoio para a teoria com o surgimento da

mesclagem conceptual ancorada nos três “I’s” da mente (Fauconnier e Turner, 1994;

2002), que representam a imaginação, a identificação e a integração.

Pela imaginação tomamos contato com um conceito ou categoria apenas de

forma abstrata e idealizada. A partir desse momento, já começamos o processo de

identificação com algo mais concreto e presente em nossas mentes para que possamos

entendê-lo melhor e fazer com que os outros também o entendam. Tendo emergido da

imaginação e identificado com algo mais concreto, o próximo passo é a integração,

que reunirá os aspectos ou atributos que queremos enfatizar para que uma nova

categoria possa surgir. Não aquela imaginada inicialmente nem a identificada com algo

do mundo externo. O que teremos agora será informação nova em forma de

comparação, metáfora, metonímia ou metaftonímia, que reunirá a linguagem, a razão,

a imaginação, os sentimentos e experiências no mundo e com o mundo.

Page 53: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

5. A VISÃO CONSTRUCIONAL

Comparar disfemicamente significa incorporar forças semânticas a

processos/eventos comuns à vida cotidiana, ou seja, extrair da construção uma força

expressiva presente na natureza da disfemia, seja ela a de depreciar, ridicularizar, ou

fazer rir.

Deste modo, a idéia disfêmica emerge do conhecimento humano que ao

comparar tem sempre de colocar os elementos em algum nível, seja de igualdade,

superioridade ou inferioridade e, no caso supracitado, o nível será vertical, tendo

sempre um elemento mais afetado que outro. Mesmo que o primeiro elemento esteja

localizado em um nível muito baixo na escala, o segundo elemento ainda localizar-se-á

em um patamar inferior, conforme o gráfico abaixo:

Adaptado de Salomão (2009)

a i

P

b

P k

a: sujeito {Ø}

P: apanhar

Pia

b: bife de segunda

Pka

Pi > Pk

B A

Gráfico 12: representação da construção “Apanhou mais que bife de segunda.”

Page 54: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Onde a elipse A representa o espaço mental que emerge do primeiro evento e a

letra i indica o grau em que se encontra na escala; enquanto a elipse B representa o

grau k que a expressão suscita na escalaridade.

5.1 A VISÃO TRADICIONAL DA CONSTRUÇÃO COMPARATIVA

É ponto pacífico na maioria dos estudos tradicionais o conceito e constituição

das construções comparativas; entretanto, a noção orgânico-semântica optava por

soluções que davam conta de quase tudo, relegando as exceções ao plano das

idiossincrasias e trivialidades.

O conceito de comparação não será revisto, uma vez que já foi explicitado, mas

sua sintaxe carece de alguns questionamentos. É comum e aceita pelos os que optam

por uma visão tradicional o expediente da elipse verbal relacionada ao segundo termo

de expressões como:

“Suou mais que tampa de marmita [sua].”; mas, mesmo os estudos

tradicionais deixaram vir à tona - de forma incipiente - as forças cognitivas que agem

sobre a linguagem, como se pode observar no excerto de Lima (2002:79):

“Frequentemente dá-se na oração comparativa, a elipse de termos da oração principal,

os quais a inteligência supre com facilidade”.

A referida inteligência em uma abordagem cognitiva não diz respeito apenas à

inteligência dicionarística, mas à enciclopédica e às experiências vividas pelo homem

em seu devir sócio-histórico.

Porque, se a inteligência fosse automatizada para suprir a falta de verbo na

oração, ela ficaria presa à cena evocada pelo primeiro verbo e isso não é uma condição

sine qua non, como percebeu Azeredo (2000:112-3), ao analisar a construção “A

cidade estava (tão) silenciosa como um cemitério.”, em que nega a elipse

argumentando que o cemitério não estava silencioso, mas era silencioso. Mais uma vez

a “inteligência” vai suprir as necessidades sintáticas, mas se o cemitério é ou estava

silencioso, ou enfeitado, ou sombrio dependerá exclusivamente dos Modelos

Cognitivos Idealizados (MCI) e frames (enquadramento) ativados pelos falantes.

A expressão “cemitério” pode evocar muitos espaços mentais e cabe ao falante

escolher através de suas experiências aquele que mais se adéqua ao contexto em

questão, conforme representado no esquema abaixo:

Page 55: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

como

Nesse capítulo, tentaremos aplicar um tratamento teórico às elipses nas orações

comparativas do Português utilizando os princípios goldberguianos que serão

mostrados adiante e aplicados na análise da construção.

5.2 A TEORIA CONSTRUCIONAL GOLDBERGUIANA

O modelo construcional escolhido para embasar este estudo foi o de Goldberg

(1995), devido ao cuidadoso tratamento das construções através das relações de

heranças e análise por meio de princípios metodológicos cognitivistas, o que tornará

possível a demonstração e formalização do caminho percorrido por uma construção

mais básica à construção comparativa superlativa disfêmica.

Para Goldberg (op. cit), uma construção é uma par forma-significado, tal que

algum aspecto da forma ou do significado não é estritamente preditível das partes

componentes da construção ou de outras construções previamente estabelecidas.

Dessa forma, o conceito saussuriano de morfema é ampliado para palavras,

frases, períodos, discurso e, assim, consegue-se conceber significados básicos que

emergem não de cada item lexical, mas da construção como um todo, combatendo o

conceito de composicionalidade.

Entre as vantagens da abordagem construcional, têm-se a indicação dos

argumentos dos verbos a partir da construção e não de contextos específicos, como o

verbo “dar” que prototipicamente se apresenta como um verbo de três lugares, mas

que na construção instanciada: “Deu mais que chuchu na serra.”, o verbo não possui

nenhum de seus argumentos internos, mas nem por isso carece de sentido, pois o

significado não jaz sobre ele ou seus argumentos internos, senão sobre toda a

A cidade estava silenciosa como um cemitério

era silencioso.

era bonito.

era sombrio.

estava enfeitado.

Gráfico 13: as várias possibilidades do implícito

Page 56: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

construção2. Com isso tem-se uma economia na descrição semântica porque o

significado do evento não é circunscrito ao verbo e também não é preciso descrever

cada contexto em que o verbo ocorre.

Essas vantagens abrem espaço nos estudos linguísticos para os idiomatismos

que necessitam de uma série de processos cognitivos para a sua compreensão, uma vez

que seu significado não pode ser depreendido a partir da soma dos significados de seus

elementos constituintes.

5.2.1 Os Princípios Goldberguianos

Goldberg (1995:3) postula alguns princípios a que as construções devem ser

submetidas para que possam realmente ser consideradas um pareamanto forma-

significado. Entre eles, há dois princípios que devem ser obedecidos quando ocorre a

fusão na formalização da construção.

São eles: o Princípio da Coerência Semântica, que afirma que apenas os papéis

semanticamente compatíveis podem ser fundidos; e o Princípio da Correspondência

que assevera que cada papel participante lexicalmente designado deve ser fundido com

um papel argumental da construção.

Entretanto, em alguns casos, como na comparação, ocorre a não designação de

um papel argumental, como acontece com o verbo “pedir” que normalmente ocorre

com três papéis argumentais: a) alguém que pede; b) algo que é pedido; c) e alguém

que recebe o pedido. Mas na comparativa disfêmica “Jorge pede mais que filho de

cego.”, dois papéis argumentais não são instanciados, mas sabemos de sua existência.

Esse fenômeno foi nomeado por Goldberg de complementos nulos, que podem ser

definidos quando o referente é recuperável pelo contexto; mas, se não conseguirmos

recuperar o referente, estaremos diante de um complemento nulo indefinido, como na

construção acima, em que sabemos que alguém pediu algo, mas não podemos definir o

que.

Outro fenômeno importante é sombreamento, que ocorre quando um dos

participantes existe, mas não é instanciado na construção. É o que ocorre quando não

conseguimos saber a quem é feito o pedido na construção supracitada. Esses

8 Em estudo sobre como condições culturais interferem em uma construção gramatical, Bronzato (2000) afirma

que a destransitivização de alguns verbos, tais como “dar”; “meter”; “fumar”; “engolir” é causada por um

rompimento de regra de conduta social.

Page 57: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

fenômenos serão de extrema importância na representação e na análise das construções

comparativas. Os outros fenômenos citados por Goldberg são o corte e a absorção de

papel, que não serão exemplificados aqui por não terem participação incisiva nas

construções comparativas proposta por este estudo.

Outros princípios de base cognitiva enumerados por Goldberg são:

Princípio da Motivação Maximizada, que relaciona a sintaxe e a

semântica de duas construções e afirma que essas relações devem motivadas

maximamente;

Princípio da Não-Sinonímia assevera que duas construções

sintaticamente distintas devem ter a semântica ou a pragmática distinta e se expande

por duas ilações: a primeira diz que duas construções sintaticamente distintas e

semanticamente sinônimas devem ser pragmaticamente distintas; e a segunda afirma

que duas construções sintaticamente distintas e pragmaticamente sinônimas devem ser

semanticamente distintas.

Os dois últimos princípios enumerados por Goldberg trabalham em conjunto e

se relacionam à economia semântico-pragmática, uma vez que o Princípio do Poder

Expressivo Maximizado afirma que o inventário de construções é maximizado para

atender aos propósitos comunicativos e o Princípio da Economia Maximizada diz

que o número de construções é minimizado o tanto quanto possível dado o princípio

anterior, ou seja, teremos o máximo de construções para podermos nos comunicar, mas

desse conjunto teremos o mínimo de construções possível.

5.2.2 As Relações de Herança

As construções possuem relações entre si, formando a Rede de Construções de

determinada língua. Em seu estudo seminal, Goldberg enumera quatro tipos de

relações entre construções em que uma construção herda características formais ou

semânticas de uma construção mais básica. O primeiro é a relação por polissemia, em

que se estabelece uma relação entre a semântica da construção base e cada extensão

que esse significado pode adquirir nas construções herdadas. O seguinte é a herança

por subparte, em que uma construção é propriamente a subparte de uma construção

base e existe independentemente dessa. O terceiro tipo de herança é por instanciação,

nesse caso, todos os elementos da construção base são instanciados na construção

Page 58: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

herdada. O último caso diz respeito ao mapeamento metafórico entre construções, ou

seja, o domínio semântico de uma construção é mapeado para outra por uma extensão

metafórica.

5.3 A ANÁLISE DAS CONSTRUÇÕES

Comparar entidades a entidades ou eventos/processos a eventos/processos é um

evento básico da experiência humana e, seguindo a fundamentação teórica de

Goldberg (1995), podemos codificar esse evento através de uma sentença básica do

Português.

Como fora dito anteriormente, temos três modos principais de comparar em

Português: pela superioridade, inferioridade e igualdade. Nessa análise, focaremos

nossos esforços nas construções comparativas, em um primeiro momento, para, em

seguida, analisarmos as de superioridade e, por fim, examinar as comparativas

superlativas disfêmicas.

O valor semântico básico da construção comparativa é “comparar

algo/alguém a algo/alguém”, e, nessa operação, temos um primeiro elemento

comparado (X) a um segundo elemento comparante (Y), uma característica/função que

os aproxima – sempre representada por um verbo ou verbo mais predicativo - que os

aproxima (Z) e um graduador (G), ou seja, a estrutura argumental dessa construção

pode ser representada por:

Page 59: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

COMPARAR <comparador característica graduador comparante>

Onde o primeiro e o segundo termo compartilham uma mesma característica.

5.3.1 Construções Comparativas

O modelo de formalização proposto por Goldberg e representado em seguida

segue a diretriz da fusão dos papéis argumentais da construção, indicados na parte

superior no pólo semântico, com os papéis participantes do evento, indicados na parte

inferior no pólo sintático. E, desse modo, tanto os papéis desempenhados pela parte

semântica e pela contraparte sintática obedecem ao Princípio da Correspondência

visto anteriormente. A letra R indica a relação predicativa que ocorre na construção e

que poderá ser instanciada por qualquer verbo que obedeça ao Princípio de

Coerência.

B A

comparador comparante

Gráfico 14: os papéis semânticos da construção

Page 60: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Fusão

de

papéis

Obrigatoriamente ocorrerá nas construções a presença de um verbo, de um

graduador e de um elemento de conexão. A natureza semântica do verbo influirá

decisivamente na natureza dos elementos comparados, uma vez que se ocorrer verbo

de ligação estar-se-á comparando entidades através de estados e/ou processos: “Estava

mais perdido que cachorro em dia de mudança.”; mas se o verbo for nocional, a

comparação será feita entre eventos, podendo ocorrer ou não entidades ”Correu mais

que boi ladrão.”. Devido à frequência do verbo nessa construção, a

característica/função não foi representada no esquema, uma vez que a função é sempre

representada por um verbo ou um verbo e um predicativo.

5.3.2 A Construção Comparativa Superlativa

A Construção Comparativa Superlativa está ligada à construção mais básica por

meio de um link de instanciação porque consegue fundir todos os papéis nos dois

pólos, mas irá ser uma construção diversa da comparativa de igualdade e da de

inferioridade, uma vez que sua semântica é diferente e, assim, obedecerá ao Princípio

da Não-sinonímia.

Para melhor exemplificar, vamos instanciar a construção com o verbo chorar:

Sem: COMPARAR < comparador graduador comparante >

R: instância PRED

meio < >

Sx: V SUJ¹ CONECTOR SUJ²

Gráfico 15: o pareamento forma-significado

Page 61: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Fusão

de

papéis

5.3.3 A Com

strução Comparativa Superlativa Disfêmica

Como bem observa Nascimento (2006), corroborando Goldberg (1995), os

estudos das construções são em sua maioria circunscritos à sintaxe, mas a noção

construcionista pode atuar desde o morfema até – em estudos mais recentes – ao

discurso.

A Construção Comparativa Superlativa Disfêmica constitui um nó da Rede de

Construções do Português que se interliga a construções de diversas naturezas e por si

própria já constitui uma rede, ou melhor, uma mescla entre dois tipos de construções: a

Construção Comparativa Superlativa e uma construção formada por SN modificado

por um SPrep ou um SAdj que projeta o disfemismo por metáfora.

Como instanciações dessa construção, podemos citar as seguintes:

“Apanhou mais que mulher de bêbado.”

“Apanhou mais que mulher de malandro.”

“Apanhou mais que gato de desenho animado.”

“Apanhou mais que pandeiro de forró.”

“Apanhou mais que puta pobre.”

Sem: COMPARAR < comparador graduador comparante >

R: instância CHORAR < chorador¹ mais que chorador² >

meio

Sx: V SUJ¹ CONECTOR SUJ²

Gráfico 16: formalização da construção “André chorou mais que bebê.”

Page 62: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

em que o termo comparante é formado por uma construção que se mescla ao termo

comparado e daí emerge o significado disfêmico.

Poder-se-ía postular que a Construção Comparativa Superlativa Disfêmica seria

igual à Construção Comparativa Superlativa, mas, para refutarmos essa afirmação,

basta invocarmos novamente o Princípio de Não-Sinonímia, porque desta vez o que

muda, além da sintaxe é a pragmática, devido aos contextos específicos onde os

disfemismos são usados.

A título de exemplificação retornaremos ao gráfico da página 50, mas agora

indicando como os MCI’s do falante influem na decisão a ser tomada para a

compreensão da construção.

Sem: COMPARAR < comparador graduador comparante >

R: instância APANHAR < apanhador¹ mais que apanhador² >

meio

Sx: V SUJ¹ CONECTOR SUJ²

Gráfico 17: formalização da construção “Apanhou mais que pandeiro de forró.”

Page 63: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Apanhou mais que pandeiro de forró.

5.4. PROPOSTA INICIAL DE REDE CONSTRUCIONAL

Desse modo, podemos postular uma pequena e incipiente Rede das

Construções Comparativas do Português, sem que haja a pretensão de esgotamento do

assunto e continuando sempre na investigação por outros nós construcionais.

A Rede proposta abaixo conta com as construções comparativas prototípicas e

uma expansão representada pelas disfêmicas como fora proposto por esse estudo.

a i

P

a: sujeito {Ø}

P: apanhar

Pia

b: pandeiro de forró

Pka

Pi > Pk

b

P k

é barato

é sem ritmo

é muito batido

é harmônico

é feio

Gráfico 18: as ativações dos Espaços Mentais do SN “pandeiro de forró” e

a representação da escalaridade disfêmica

Page 64: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

A proposta inicial de uma Rede de Construções torna iminente a necessidade e

vontade de ligações com outras Redes Construcionais, que apresentará a língua como

um sistema – não o sistema saussuriano -, mas um sistema que irá incorporar além da

linguagem, todas as operações cognitivas e conhecimentos do ser humano.

Diagrama 1: Representação inicial da Rede Construcional Comparativa

Page 65: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

6. METODOLOGIA

Nesse capítulo, descreveremos os procedimentos realizados na busca dos

dados, com as dificuldades inerentes a uma pesquisa que não pôde contar com estudos

precedentes que pudessem nortear tanto a coleta de dados quanto o modo de

classificação das construções envolvidas.

6.1 CONSTITUIÇÃO DOS CORPORA

A obtenção dos dados dos corpora foi realizada em três etapas: a) a leitura de

arquivos dos jornais populares “Meia-Hora de Notícias” e “Expresso”, do período de

janeiro de 2008 a dezembro de 2009; b) a audiência diária do programa radifônico

“Patrulha da Cidade7”, em que as construções eram proferidas para dar ênfase a uma

história policial, no período de outubro de 2009 a janeiro de 2012; c) a pesquisa em

sítio de busca eletrônica ”Google”.

Com a leitura dos periódicos, constatou-se a produtividade das construções que

possuíam a semântica disfêmica, mas não eram, em sua maioria, comparativas

superlativas, o que direcionou a coleta de dados para o programa radiofônico que

veiculava frequentemente as construções desejadas. Percebeu-se com as audiências

que as construções se repetiam com certa frequência, possivelmente por se repetirem

também as situações de crime a elas vinculadas.

Com a pesquisa em sítios de busca, foram encontradas muitas construções que

faziam parte do acervo linguístico da comunidade gaúcha, sobremaneira a população

que reside em áreas próximas às fronteiras, que usa com bastante frequência as

construções por elas representarem um modo típico de falar do gaúcho.

6.2 PROCEDIMENTO DE ANÁLISE

Depois do agrupamento inicial dos dados, houve uma seleção preliminar para

identificar as construções que possuíam a mesma configuração sintática e uma segunda

seleção para ordenar as construções por natureza semântica. A primeira seleção

7 O programa que é líder de audiência no horário há 52 anos é veiculado pela Rádio Tupi no Estado do Rio de

janeiro é composto de reportagens de fatos policiais e de algumas dramatizações com rádioatores.

Page 66: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

objetivou provar um dos princípios da Gramática das Construções (o Princípio da Não-

Sinonímia) para demonstrarmos que realmente se tratava de duas construções distintas,

mas bem próximas na rede construcional.

Já a segunda seleção primou por caracterizar a nuança semântica inerente ao

termo comparante, que possui a força disfêmica relacionada a outras forças semânticas,

o que permitiu que se fizessem observações qualitativas representadas em gráficos (cf.

páginas 75-6).

Após a seleção, o estudo centrou seus esforços nos objetivos gerais de

descrever e analisar as Construções Comparativas Superlativas Disfêmicas sob o

aporte teórico da Linguística Cognitiva e, formalizá-las em termos de mesclagem

conceptual e como um nó da rede construcional das Construções Comparativas do

Português do Brasil, bem como analisá-las como parte de uma estrutura mais genérica

da linguagem responsável por correlações

Page 67: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

7. A ANÁLISE DO CORPUS

Por se tratar de construções usadas sobremaneira no registro oral, a coleta dos

dados para a pesquisa, em um primeiro momento, tornou-se onerosa por ter de contar

com a audiência frequente de programa radiofônico para que se pudessem transcrever

as construções disfêmicas.

Um grande ganho na coleta dos dados foi tomar conhecimento de que, na

variante diatópica do Rio Grande do Sul, as Construções Comparativas Superlativas

Disfêmicas já faziam parte do acervo linguístico dessa comunidade e já estavam

estratificadas no ideário gauchês, fato constatado por meio de pesquisa eletrônica em

sites de busca.

7.1 A IDIOMATICIDADE

Abarcando um grande número de gêneros, tais como ditos populares,

provérbios e ditados, entre outros, as construções linguísticas chamadas de

idiomatismos ou idiotismos são assim chamadas por terem alguns aspectos em comum,

como o fato de não serem composicionais, ou seja, o sentido das construções não pode

ser apreendido a partir da soma do sentido de seus constituintes. E também pelo fato de

possuírem uma estrutura mais ou menos fixa.

Em relação ao primeiro aspecto, tomaremos como exemplo a construção “Mais

por fora que surdo em bingo.”, em que a compreensão não se atém à soma dos

significados de cada constituinte, mas a uma confluência de conhecimentos

linguísticos, como o teor polissêmico da expressão ‘por fora’; processos cognitivos,

como a compreensão do Esquema Imagético projetado em um domínio de

entendimento comunicacional que serve de alicerce para as metáforas conceptuais

INTELIGÊNCIA É POR DENTRO e IGNORÂNCIA É POR FORA, que são

instanciadas por expressões metafóricas, como “Mais por dentro que biquíni de

mulata.“ e “Mais por fora do que arco de barril.”, além de outras construções mais

ordinárias e frequentes, como “Passei ao largo do assunto durante minha errática

vida acadêmica.” ( palpit. Blogspot.com/ 2009/10/empirismo – inglês.html), em que a

construção ‘ao largo’ constrói um Espaço Mental de desinteligência, porque é

alimentado por um Esquema Imagético espacial exterior, e pela Metáfora Conceptual

IGNORÂNCIA É POR FORA, ou de sentido oposto, como “Agora que entrei no

Page 68: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

assunto, espero que me permita compartilhar a minha teoria.”

(www2.uol.com.br/vyaestelar/eusofrimento.htm), em que o verbo ‘entrar’ ativa o

Espaço Mental de entendimento a partir do substrato fornecido por um Esquema

Imagético espacial interior que também serve de fulcro à metáfora conceptual

INTELIGÊNCIA É POR DENTRO.

Além dos conhecimentos linguísticos, o interlocutor precisa contar com o

conhecimento enciclopédico para evocar e enquadrar a cena de um surdo em um bingo

e conseguir conceber a presença de um deficiente auditivo em um jogo em que,

normalmente, os números são falados.

Já em relação à estrutura sintagmática, há alguma discordância entre pesquisas

em relação à estratificação e composicionalidade. Cuenca e Hilferty (1999) relativizam

o conceito de composicionalidade e sugerem um continnum entre “frases feitas” que

possuem estruturas mais ou menos analisáveis.

Para corroborar sua tese, explanam sobre a diferença de não-literalidade e não-

composicionalidade e sugerem, juntamente com Gibbs (1990:427-8), que “a

compreensão é executada em um termo da imagem veiculada pelo Domínio origem.”

Discordamos dessa ideia, uma vez que o Domínio-origem possui estruturas

mais básicas e acessíveis à compreensão humana e, por isso, mais suscetíveis a

operações semânticas lexicais, como a homonímia e a polissemia.

Preferimos considerar a operação de compreensão em termos de mesclagem

conceptual, porque com este aparato podemos reunir os conhecimentos linguísticos,

enciclopédicos, além dos aspectos mais proeminentes de espaços de entrada, que serão

alimentados com os Esquemas Imagéticos, os Modelos Cognitivos Idealizados e os

Espaços Mentais.

Para demonstrar ambas as hipóteses, tentaremos representar no esquema abaixo

as projeções metafóricas entre os domínios:

Page 69: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Esquema 2: mescla conceptual da construção “Mais por dentro que biquíni de mulata.”

Espaço Genérico

. compreensão .

. anatomia .

. vestuário .

interior . entendimento .

. interior

. carnaval

. etnia

. fantasia

. . .

Espaço de Entrada 1 Espaço de Entrada 2

Espaço de Mescla

Mais por dentro Biquíni de mulata

Page 70: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Na representação acima, pode-se perceber que, no Domínio-origem, os estratos

cognitivos são mais escassos, uma vez que são constituídos basicamente por um

Esquema Imagético espacial e sua extensão polissêmica; enquanto, no Domínio-

destino, a expressão ‘biquíni de mulata’ suscita uma cena mais rica, uma vez que o

sintagma constrói muitos Espaços Mentais, como os de carnaval, anatomia e

vestuário, entre outros. Desse modo, ao contrário do que afirmam alguns autores (cf.

CUENCA e HILFERTY,1999; GIBBS, 1990), não podemos generalizar o domínio

onde o significado idiomático se veicula, uma vez que, no idiomatismo analisado, a

imagem metafórica disfêmica é veiculada no Domínio-destino, o que não quer dizer

que, em outros casos, o Domínio-origem seja o maior responsável pela veiculação da

imagem.

Voltando para o outro aspecto inerente aos idiomatismos, teremos de analisar a

questão da composicionalidade se esta for pensada em termos de um continnum, pois

há construções com níveis diferentes de estratificação. Jesus e Miranda (2003:269), em

seu trabalho sobre as Construções Condicionais Universais Proverbiais, postulam três

níveis de idiomaticidade.

Em um extremo do continnum, encontram-se os idiomas abertos, que são as

construções genéricas da rede, sem traços de idiomaticidade. Um exemplo de

construção comparativa idiomática aberta seria “O rio Amazonas é maior que o rio

Sena.”, em que os constituintes da construção podem ser substituídos por possuir ainda

um forte atributo composicional e o pelo sentido global ainda estar fortemente

veiculado ao sentido de cada constituinte.

Em um nível intermediário do continnum, localizam-se os idiomas

semiabertos, definidos como as construções proverbiais não cristalizadas, criadas no

dia-a-dia com base na estrutura proverbial e com traços de idiomaticidade.

Na outra extremidade do continnum, encontram-se os idiomas formulaicos,

que são os provérbios já cristalizados na comunidade de fala. São marcados por traços

idiomáticos.

Como tratamos de construções comparativas em vez de provérbios,

encontramos um obstáculo para enquadrar algumas construções que já estão em um

processo avançado de cristalização, como:

Page 71: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

“Deu mais que chuchu na serra.”

“Mais feliz que pinto no lixo.”

Acho que a definição de Jesus e Salomão considerou dois critérios em sua

constituição: um construcional-sintagmático, que considera os elementos constituintes

e suas respectivas posições e níveis de estratificação, e outro variacionista, que localiza

a construção em determinado nível de cristalização em relação à comunidade de fala.

Dessa forma não ficou claro qual critério é mais prestigiado para a definição do

conceito, uma vez que os exemplos citados pelas autoras para cada nível de

idiomaticidade:

“Quem é demitido por justa causa tem direito a 40%do saldo do FGTS.“

“Quem bate cartão, não vota em patrão.”

“Quem semeia vento, colhe tempestade.”

fazem parte da mesma configuração sintática [Quem P,Q] e o que os diferencia é o

nível de estratificação de seus constituintes. Optamos, assim, por adotar apenas o

primeiro critério - o construcional-sintagmático – e, por se tratar de um estudo de base

eminentemente semântica e não variacionista, decidimos enquadrar as Construções

Comparativas Superlativas Disfêmicas entre as construções semiabertas, pois as

instanciações deixam clara a estratificação de alguns constituintes, uma vez que, na

primeira [V+ mais que + SN], temos estratificados o intensificador ‘mais’ e o nexo

comparativo ‘que’; e na segunda, [mais + SAdj + que + SN], temos novamente

estratificados o intensificador e o nexo comparativo, impulsionando a semântica

comparativa.

7.2 TIPO e OCORRÊNCIA

A pesquisa encontrou 132 instanciações da Construção Comparativa

Superlativa Disfêmica, mas entre os dados apresentaram-se dois tipos de configuração

sintática - que continuam circunscritas entre as comparativas superlativas disfêmicas -,

que possuem ocorrência desigual.

Page 72: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Considerando os dados sob um olhar geral e corroborando tanto estudos

tradicionais quanto pesquisas mais atuais, percebe-se que a Construção Comparativa

Superlativa Disfêmica é constituída por cinco termos:

a) um comparado: termo que se encontra elíptico em todas as

ocorrências, mas é sempre recuperável pelo co-texto;

b) um comparante: termo sempre explícito que se relaciona

semanticamente com o termo comparado;

c) a característica comum: o atributo que aproxima os termos

comparado e comparante;

d) o intensificador comparante: que intensificará o evento ou processo

representado pela característica comum;

e) o nexo comparativo: elemento responsável pela conexão entre o

termo comparado e o termo comparante.

7.2.1 A Construção 1

A primeira construção a ser observada tem a seguinte configuração sintática:

[Verbo + mais que + SN]. Sob essa configuração foram observadas 18 instanciações,

tais como:

1) “Corre mais que notícia ruim.”

2) “Rolando mais que pau de enchente.”

3) “Chorou mais que tampa de marmita.”

4) “Suou mais que tampa de marmita.”

5) “Sofreu mais que sapato de cego.”

Em relação ao primeiro termo – o comparado – podemos observar que se

encontra elíptico em todas as ocorrências, uma vez que as construções em tela podem

ser usadas para enfatizar situações diversas, mas sempre com o objetivo de imprimir

cores mais intensas aos eventos com os quais estão relacionados.

A característica comum aos dois domínios em questão é representada, nos

dados analisados, por verbos que encabeçam a construção e sempre indicam um

processo, seja ele físico, como representado pelos dois primeiros exemplos; biológico,

Page 73: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

como indicam os verbos ‘chorar’ e ‘suar’; ou psicológico, como explicitado pelo

verbo ‘sofrer’.

Por representarem ações executadas frequentemente pelo ser humano, esses

verbos necessariamente precisam se encontrar no Domínio-origem, uma vez que as

noções que representam são mais básicas e acessíveis ao aparato cognitivo humano e

apresentam, nos casos acima, valores prototípicos.

Os movimentos corporais de correr e rolar são executados logo nos primeiros

anos de vida, algo que acontece igualmente aos processos biológicos de chorar e suar,

que executamos ainda de forma inconsciente nos primeiros dias de vida. E o que dizer

do processo de sofrimento, que experienciamos antes mesmo do nascimento?

A asserção acima não pretende generalizar a natureza verbal ou semântica

representada no Domínio-origem, mesmo porque encontramos instanciações, tais

como:

6) “Deu mais que chuchu na serra.”

7) “Apanhou mais que bife de pensão.”

8) “Chiou mais que panela de pressão.”

Em que os verbos se apresentam em um sentido não prototípico devido a

polissemia, embora o sentido seja facilmente entendido pelo conhecimento

enciclopédico do falante, que, ao ouvir a primeira instanciação, sabe instantaneamente

que sentido atribuir ao verbo ‘dar’8, mesmo não possuindo ele o argumento interno.

O mesmo ocorre com os demais verbos, que também não se encontram em seu

significado primeiro, mas por uma extensão de sentido, que pode ser atribuída ao uso

informal. Nesse ponto, a pesquisa encontrou um interessante fato para explicitar e

corroborar o aporte teórico cognitivista: a influência dos fatores sociais nas formas

linguísticas.

7.2.2 A Transitividade da Construção 1

Vimos anteriormente que o registro em que as construções se encontram toma

os verbos em seu sentido menos usual, como pode ser observado na construção “Se

9 Mesmo possuindo mais de 95 acepções (FERREIRA, 1989), o falante é capaz de aferir o sentido exato.

Page 74: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

virou mais que charuto em boca de bêbado.”, em que o verbo ‘virar-se’, possui um

significado prototípico de mudança de direção ou posição (cf. Houaiss, 2001), mas no

contexto em que foi empregado toma o significado de ‘esforço empregado na

consecução de um objetivo’.

Além de transmutar o significado verbal, o fato de ser pronunciado em um

contexto informal também causa mudança em sua valência, de forma que os verbos

observados na Construção 1 são em sua totalidade intransitivos, mesmo aqueles que

em outros contextos poderiam apresentar a bitransitividade, como o verbo ‘dar’, que

foi destransitivado na construção “Deu mais que chuchu na serra.”, fato que

Bronzato (2000:78-9) denomina de complementação interdita, uma vez que o

argumento interno não é explicitado por fatores atribuídos ao rompimento de uma

regra de conduta, motivada por prática de polidez positiva para a proteção da face do

falante (GOFFMAN, 1983).

Como essa hipótese foi comprovada apenas com verbos que revelam tabus

sociais, como sexo e drogas, não podemos utilizá-la com outros verbos que também

perderam sua transitividade, como o verbo ‘reclamar’ em “Reclamou mais que sogra

de genro desempregado.” e o verbo ‘chiar’ em “Chiou mais que panela de

pressão.”.

A hipótese que será defendida na pesquisa levará em consideração a natureza

discursiva e generalizante inerente às construções comparativas superlativas

disfêmicas, que se assemelham aos ditados populares por sua configuração sintática

relativamente fixa, mas deles se diferenciam pela sua função pragmática, que não é de

ensinamento moral, mas de ridicularização de uma ideia.

Foi observado anteriormente sobre os verbos que encabeçam a Construção 1 o

fato de possuírem um conceito mais básico e acessível à compreensão, mesmo quando

usados fora de seu significado prototípico. Isso nos fez elaborar a ilação de que, nos

casos observados, incluindo o caso do verbo ‘dar’, a função discursivo-pragmática

obriga os verbos a permanecerem intransitivos, pois a finalidade é que a construção dê

conta de inúmeras situações, tornando-se, assim, generalizante para toda a mulher que

não possui um comportamento afetivo condizente com as regras sociais, como no

exemplo anterior. Mas também a toda situação que envolva algum tipo de sofrimento,

seja ele físico, moral ou psicológico, no caso do verbo ‘sofrer’, que poderá ser

representada pela instanciação “Sofreu mais que suvaco de aleijado.”

Page 75: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Desse modo, asseveramos que a intransitividade verbal inerente à Construção 1

deve-se a um fator discursivo-pragmático, com o objetivo de generalizar uma ideia

para que seja utilizada por situações básicas da vida cotidiana e como o discurso é um

produto social (Charaudeau, 2009:29), produzido em forma de contrato pelas

representações linguageiras, a mudança morfossintática emerge para fortalecer o

arcabouço cognitivista, que prima pelas influências sociais na linguagem, entre outras

coisas.

7.3 A CONSTRUÇÃO 2

A segunda construção configurada sintaticamente como [Mais + Qualificador

+ que + SN], não é encabeçada por um verbo, mas sim pelo intensificador

comparante ‘mais’. Embora tenha algumas semelhanças com a Construção 1, como a

elipse do termo comparado e a natureza semelhante entre o verbo da Construção 1 e a

maioria dos sintagmas adjetivais da Construção 2, visto que ambos representam um

processo9, os sintagmas adjetivais que constituem a característica comum entre o

termo comparado e o termo comparante não compartilham da mesma natureza

sintática, representando uma qualidade ou um processo.

Nos dados, foram observadas 76 ocorrências de sintagmas adjetivais que

representam qualidade, como nos casos abaixo:

1) “Mais sujo que pau de galinheiro.”

2) “Mais grosso que papel de enrolar prego.”

3) “Mais gelado que focinho de cachorro.”

4) “Mais por fora que cotovelo de caminhoneiro.”

5) “Mais difícil que nadar de poncho.”

Os dados nos mostram que o Domínio-origem novamente é composto por

conceitos que representam categorizações básicas do ser humano, que são baseadas

intrinsecamente em comparações, uma vez que o ser humano apreende os conceitos de

9 Adotamos aqui a lição de Mattoso Camara (1970) que afirma que privilegia o adjetivo em detrimento do

particípio, dizendo que este é no fundo um adjetivo com as marcas nominais de gênero e número, mas em vez de

expressar uma qualidade de um ser, expressa o processo que nele se passa.

Page 76: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

sujo, grosso, gelado, por fora e difícil ao compará-los por experiência sensório-

motora-espacial com os conceitos de limpo, fino, por dentro e fácil.

Nos dados restantes, foram observadas 45 ocorrências em que o sintagma

adjetival representa um processo, conforme os exemplos a seguir:

1) “Mais perdido que cego em tiroteio.”

2) “Mais amontoado que teta de porco.”

3) “Mais engordurado que telefone de açogueiro.”

4) “Mais enfeitado que carroça de cigano.”

5) “Mais perfumado que mão de barbeiro.”

em que podemos perceber claramente os processos de perder-se, amontoar-se,

engordurar-se, enfeitar-se e perfumar-se, o que fornecerá mais atributos para o

Domínio-origem, por evocar uma cena mais rica, ainda que também intente uma

generalização situacional.

Uma outra hipótese aventada pela pesquisa é que, independentemente da

natureza semântica do sintagma adjetival, seja qualificativa ou processual, as

diferenças morfológicas entre as construções desencadeiam uma diferença na

configuração sintática, uma vez que, na Construção 1, a característica comum que

une os termos é representada sempre por um verbo nocional e esse verbo ocupa a

primeira posição na configuração [Verbo + mais que + SN], enquanto na segunda

construção, a primeira posição é ocupada pelo intensificador comparante, ainda que

existam construções a com a configuração [S.Adj + Mais + que + SN], como:

6) “Vocês não tem vergonha na cara, e ficam apontando defeito do

Serra, e não olham pro próprio RABO sujo mais que pau de

galinheiro.” (http://voce.estadao.com.br/robimc,10)

7) “Legislativo perdido mais que “cego em tiroteio”.”

(http://blogdoleunam.wordpress.com/2011/11/23/legislativo-

perdido-mais-que-cego-em-tiroteio)

Page 77: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

8) “Vaidade acima de tudo e de todos para comandar um time

quebrado mais que arroz de terceira.”

(www.opovo.com.br/www/opovo/esportes/tcomentarios_933313.ht

m)

que por serem bem menos produtivas que a Construção 2, uma vez que não foram

encontrados dados que correspondessem a todas as instanciações da Construção 2,

preferimos encará-las como uma variação da mesma, sendo essa a sua representação

menos prototípica.

Aqui constatamos novamente que a mudança semântica de um dos termos acarreta

uma mudança na configuração sintática, mas, por não ser o objeto principal dessa

pesquisa, a hipótese acima será investigada em um outro momento.

7.4 OS CONSTITUINTES ESTRATIFICADOS

Uma vez classificadas entre as construções que possuem a configuração

sintática semi-aberta, as construções comparativas superlativas disfêmicas apresentam

em ambas as configurações vistas anteriormente:

[Verbo + mais que + SN]

[Mais + S.Adj + que + SN]

o intensificador comparante e o nexo comparativo como elementos estratificados,

uma vez que as outras posições podem ser preenchidas por um grande número de

elementos, dependendo da situação e da carga disfêmica que se queira atribuir e

porque não ocorreram instanciações com intensificadores como ‘muito’ ou

‘bastante’, muito menos nexos comparativos como ‘tal qual’; ‘como’; e ‘que nem’.

O papel exercido por esses termos é o de estabilização sintática e semântica,

visto que o intensificador comparante atribui às construções as noções superlativa e

comparativa, e o nexo comparativo faz a concatenação sintática entre os termos que

serão comparados, indicando sempre à sua esquerda o termo comparado e à sua

direita o termo comparante, porque não foram observados dados com uma possível

ordem inversa do tipo:

Page 78: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

*”Sapato de cego mais que sofreu.”

*”Mais cavalo de carteiro que apressado.”

em que podemos constatar claramente que a primeira parte da construção precisa estar

ocupada obrigatoriamente por uma forma que represente uma qualidade ou um

processo que será intensificado posteriormente para se relacionar com o sintagma

nominal que se posicionará obrigatoriamente à direita do nexo comparativo.

7.5 O TERMO COMPARANTE

Conforme foi observado na seção anterior o Domínio-origem, nos casos

analisados, é constituído de processos e qualidades básicas presentes no cotidiano de

todos nós.

Como nas construções analisadas o objetivo do falante é produzir um

enunciado que contenha uma intenção negativa, pejorativa ou humorística que

geralmente seja usado em situações informais (Santos, 2009), podemos inferir que essa

intenção estará representada no Domínio-destino, que será representado em todos os

dados por um sintagma nominal.

Encontramos 124 instanciações de sintagmas nominais que possuem diversas

naturezas semânticas, distribuídas em locativo, posse, finalidade, modal, temporal,

qualificativo, companhia, causa, não-posse, instrumento e procedência, conforme

tabela abaixo:

Page 79: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Natureza Semântica Instanciações Frequência

Instrumento Mais seco que tiro de 12 cano serrado. 1/132 – 0,75%

Procedência Mais duro que salame de colônia. 1/132 – 0,75%

Locativo Se virou mais que charuto em boca de bêbado. 37/132 – 28,03%

Posse Mais comprido que trova de gago. 57/132 – 52,54%

Finalidade Mais amassado que jornal pra limpar fiofó. 4/132 – 3,03%

Modo Mais feio que tombo com a mão no bolso. 7/132 – 5,30%

Tempo Mais feliz que puta em dia de pagamento de

quartel.

2/132 – 1,51%

Qualificativo Apanhou mais que bife de segunda. 19/132 – 14,39%

Companhia Mais desconfiado que cego com amante. 2/132 – 1,51%

Causa Mais feio que indigestão de torresmo. 1/132 – 0,75%

Não-posse Mais quente que frigideira sem cabo. 1/132 – 0,75%

Tabela 2: a natureza semântica dos termos comparantes

Gráfico 19: índice de cada nuança semântica

Page 80: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Na tabela e no gráfico, podemos perceber como os sintagmas preposicionados

que fornecerão substrato cognitivo para o Domínio-destino se encontram em

diferentes níveis de ocorrência, dependendo de sua natureza semântica.

Uma vez sustentado e constatado que o Domínio-origem possui as

experiências mais básicas e acessíveis ao nosso sistema cognitivo, teremos que

comprovar que o Domínio-destino contém um substrato cognitivo mais complexo,

pois dele derivará a noção de disfemia a partir de entidades que, em um primeiro

momento não possuem qualquer tipo de semelhança com o processo ou a qualificação

presentes no Domínio-origem.

Pensando em termos de continnum, verificamos, conforme abaixo, que a

nuança semântica de posse ocuparia o centro da gradação, ou seja, seria o sintagma

nominal mais prototípico nas orações comparativas superlativas disfêmicas, seguida da

noção de locativo.

As noções de modo, tempo, qualificação e finalidade ficam mais afastadas

ainda do centro prototípico, sucedidas pelas noções semânticas de causa,

instrumento, procedência, companhia e não-posse, que figuram como os sintagmas

nominais menos prototípicos nas orações comparativas superlativas disfêmicas.

Verificando os dados, fez-se necessário formular uma hipótese para justificar a

grande ocorrência da noção de posse entre as construções (52,54%) em relação às

outras noções.

Entre algumas direções teóricas a serem tomadas, achamos a teoria de Fillmore

(1975) a mais adequada, por ter ele cunhado a conceito de frame como “um sistema de

escolhas linguísticas”, afirmando que a escolha de determinada forma aciona outras

formas que com ela interagem. Considerando, também, as noções de perspectiva

sintática, ele mostra que determinada escolha seleciona os papéis sintáticos

relacionados com a forma linguística privilegiada.

Mais tarde, ele relaciona o conceito de frame às estruturas cognitivas de

conhecimento codificadas nas palavras, incluindo, assim, além da sintaxe, o

conhecimento de mundo do falante.

O conceito de frame terá um papel de grande importância para tentarmos

entender por que a noção de posse é a mais frequente nas construções, mas devemos

entender agora que, ao lermos, falarmos, escrevermos ou escutarmos um sintagma

nominal como ‘cego com amante’ construímos um frame de ‘cego’ e um de

‘amante’, mas além desses, também construímos subframes de ‘namoro’ e

Page 81: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

‘adultério’, entre outros, que constituirão uma rede de frames que ajudará o

interlocutor a captar o sentido desejado.

Mas além do conceito de frame, teremos que utilizar também o conceito de

script, que será a sequência de eventos contidos em um frame, ou seja, no sintagma

‘cego com amante’, os frames possuem scripts que podem ser representado da

seguinte maneira:

Com a representação das sequências de eventos suscitados pelos frames de

namoro e adultério, podemos observar que o frame seria o enquadre sintático e cultural

de determinado evento, sendo estático; enquanto a sequenciação dos atos desse evento

é representada por um script, que poderá variar de cultura para cultura e, inclusive,

dentro de uma mesma cultura, mas que terá uma base comum. E como é constituído

por sequências, é dinâmico.

Observando os sintagmas, percebe-se que as nuanças semânticas mais

frequentes entre os sintagmas preposicionados são a de posse e a de lugar. Tomando

como ponto de partida a premissa das Construções Gramaticais que afirma que uma

Conhecer uma

pessoa

Gostar da pessoa

Paquerar a pessoa

Ficar com a pessoa

Conhecer outra

pessoa

Gostar da outra

pessoa

Paquerar a outra

pessoa

Ficar com as duas

pessoas

Gráfico 20: representação dos atos seqüenciais (scripts)

Page 82: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

construção é um pareamento forma-significado, observamos, primeiramente, uma

diferença na forma das preposições entre os sintagmas citados acima. Duas são as

preposições encarregadas de fornecer a semântica dos sintagmas acima: a preposição

‘de’ e a preposição ‘em’.

Em relação à noção de posse e de lugar, os frames suscitados pelos sintagmas

são mais ricos e dinâmicos porque envolve em seus papéis temáticos um possuidor e

um possuído, quando falamos em posse e de uma entidade situada em um local, ao

falarmos da noção locativa, sendo cada um responsável pela ativação de Espaços

Mentais variados, que apresentam scripts complexos para a apreensão do sentido.

Em instanciações com sintagmas nominais que indicam lugar, como “Mais

perdido que cego em tiroteio.”, o sintagma ativa alguns Espaços Mentais, tais como

o de deficiência física, dificuldade de locomoção, criminalidade e suas consequências,

mas essa riqueza de Espaços Mentais não se traduz em complexidade de script, uma

vez que a preposição ‘em’ introduz uma noção estática ao evento, não proporcionando,

assim, um grande número de atos sequenciais.

Já em relação à noção de posse, temos um frame com scripts mais complexos,

uma vez que em instanciações como “Mais enfeitado que carroça de cigano.”, temos

a ativação de Espaços Mentais de meio de transporte, meio rural, cultura cigana,

vestuário e outros mais, que configuram um número maior de sequência de atos, uma

outra razão para a maior dinamicidade do frame gerado por sintagmas que possuem a

natureza semântica de posse é a supremacia de ocorrência do atributo [+ animado] do

sintagma nominal que encerra a construção, visto que sua frequência é três vezes maior

(49 ocorrências) que a dos sintagmas nominais com a semântica locativa que possuem

o atributo [- animado].

Abaixo apresentamos o gráfico comparativo com os scripts de cada sintagma

preposicionado das instanciações citadas acima:

Page 83: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Gráfico 21: diferença entre os atos sequenciais

o que indica que a maior frequência entre os sintagmas nominais que indicam a

noção de posse se justifica pela maior facilidade de comparar uma situação cotidiana

com a riqueza de imagens produzida por esse sintagma e suas relações entre o

possuidor e o possuído.

7.6 O PROCESSO DE MESCLAGEM NAS CONSTRUÇÕES

Nesta seção, tentaremos promover a confluência de todos os conceitos vistos

até aqui. Para essa empresa, nos submeteremos ao ultimato de Lakoff e Johnson (2002)

que asseveram que “qualquer teoria adequada ao sistema conceptual humano terá de

dar conta de como os conceitos são 1) embasados, 2) estruturados, 3) relacionados uns

com os outros e 4) definidos.”

O cego se encontra em

uma troca de tiros

Fica desorientado por

não enxergar

Um meio de transporte

é enfeitado por alguém

Esse alguém tem como

costume se enfeitar

Essa pessoa usa enfeites

brilhantes tanto na

carroça, quanto no

animal

A carroça está pronta

para a festa ou

cerimônia

cego em tiroteio carroça de cigano

Page 84: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Os conceitos com os quais trabalharemos são embasados por nossas

experiências interacionais com o mundo e com nós mesmos, incluídas, entre essas, as

experiências corpóreas, motoras, sensoriais e intuitivas.

Os conceitos serão estruturados nos aparatos cognitivos mais básicos da

natureza humana:

a) os Esquemas Imagéticos: que, mesmo não dotados de conteúdo

proposicional, influenciam no pensamento, na ação e na linguagem,

uma vez que transportam as sensações corpóreas, sobretudo

orientacionais para a constituição e apreensão do significado;

b) os Modelos Cognitivos Idealizados: que constituirão a base

social, histórica e cultural que falantes de uma mesma comunidade

compartilham, para que se produza a compreensão:

c) os Espaços Mentais: que fermentam a todo o momento em nossas

mentes toda vez que são estimulados por palavras e frases e, por isso,

representarão o estrato mais emergente nos domínios existentes na

mescla.

As relações entre os conceitos farão uso de operações que são “o cerne da mais

simples possibilidade de significado” (FAUCONNIER e TURNER, 2002) e são

denominadas como os três “I’s” da mente:

a) identidade:que juntamente com a oposição são produtos acabados

fornecidos pela consciência depois de um trabalho elaborado de

cognição;

b) integração: é a parte mais complicada do processo de integração

conceptual, que elabora estruturas e propriedades dinâmicas e

restrições operacionais; mas normalmente é totalmente

despercebida, uma vez que trabalha rapidamente nos bastidores da

cognição:

Page 85: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

c) imaginação: é indispensável, uma vez que a identidade e a

integração não podem dar conta do significado e do seu

desenvolvimento. Mesmo na ausência de estímulos externos, o

cérebro pode produzir simulações imaginativas.

A mesclagem conceptual pode se dar em variados níveis, desde o mais

superficial, em que os domínios serão constituídos pelas formas linguísticas

emergentes, até a um nível mais abstratos em que entrarão em cena os conceitos

expostos acima.

Como o objetivo de qualquer teoria é alcançar o máximo em generalização,

decidimos representar, em um primeiro momento, a mesclagem que ocorre em um

nível mais abstrato, para que possamos tentar englobar todas as construções

comparativas superlativas disfêmicas.

Intensificação

de uma ideia:

DISFEMIA

Experiência

básica

Entidade do

mundo

objetivo

C.C.S.D

Espaço Mescla

Espaço de

Entrada 1 Espaço de

entrada 2

Espaço Genérico

Identidade

Comparação

Esquema 3: mescla conceptual dos processos cognitivosnas

Construções Comparativas Superlativas Disfêmicas

Page 86: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

No diagrama anterior, focalizamos no Espaço Genérico a finalidade discursiva

das construções comparativas superlativas disfêmicas e, a partir dessa necessidade,

como são selecionados os substratos conceptuais no Espaço de Entrada 1, que

identifica experiências básicas humanas, sejam elas processos (sumir, chorar, dar,

virar-se, suar), ou qualidades (feliz, triste, amontoado, baixo, por fora) para encontrar,

por meio da operação de integração, as entidades do mundo objetivo no Espaço de

Entrada 2, que serão comparadas através da imaginação, que deixará emergir o

sentido novo que não se encontra, em sua totalidade, em nenhum dos espaços de

entrada separadamente.

Dessa forma, acreditamos ter definido a mescla conceptual dos dois tipos de

construções analisadas neste estudo, além das não prototípicas, como “Sujo mais que

pau de galinheiro.”, tomando, assim, um passo para a generalização conceptual das

construções e orientando para a representação das instanciações.

Nos diagramas abaixo, efetuaremos a representação da mescla conceptual dos

dois tipos de construção analisadas na pesquisa e ancoradas na mescla conceptual

subjacente exposta acima:

Page 87: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

. Movimento .

. Fumo .

. Alcoolismo .

. Anatomia .

Mudança de . direção

Superação de . dificuldades

. Debilidade

. Tipo de cigarro

. Alcoólatra

. Parte do corpo

C.C.S.D

Espaço Mescla

Espaço de

Entrada 1

Espaço de

entrada 2

Espaço Genérico

Esquema 4: mescla conceptual da construção

“Se virou mais que charuto em boca de bêbado.”

Page 88: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Em ambas as representações temos as instanciações do modelo apresentado

como o nível subjacente das orações comparativas superlativas disfêmicas. Percebe-se

claramente que o Espaço de Entrada 1 fornece sempre as experiências mais básicas

humanas, enquanto no Espaço de Entrada 2 encontram-se as entidades do mundo

objetivo que servirão de termo comparante para a operação.

É interessante notar também a diferença na quantidade de projeções entre os

espaços de entrada, que explicita apenas a operação de identidade, ficando por conta da

imaginação do falante a apreensão do significado.

. compreensão . . Trânsito . . Anatomia .

Falta de . entendimento

local externo .

. Condutor

. Parte do corpo

. Maneira de dirigir

C.C.S.D

Espaço Mescla

Espaço de

Entrada 1

Espaço de

entrada 2

Espaço Genérico

Esquema 5: mescla conceptual da construção

“Mais por fora que cotovelo de caminhoneiro.”

Page 89: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

8. CONCLUSÃO

Quando nos deparamos com fatos linguísticos pouco analisados ou preteridos

pelos pesquisadores, as dúvidas aumentam em relação a que caminho adotar para

nortear uma pesquisa. Esse foi o caso das Construções Comparativas Superlativas

Disfêmicas, que permaneciam pulsantes no registro popular, mas longe de qualquer

abordagem científica.

O tipo especial de comparação chamou a atenção por sua produtividade e pelas

operações cognitivas responsáveis por atualização na língua. Analisar um fenômeno

inerente à espécie humana como um processo de identificação das coisas do mundo

nos levou a grande questão vigente ainda hoje na Linguística: a categorização das

coisas do mundo.

O mote principal da pesquisa foi a escassez de estudos relacionados ao

fenômeno, que nos fez caminhar por caminhos pouco explorados até este momento.

Não dar a devida atenção ao disfemismo é, antes de qualquer coisa, negar um modo

particular de referenciar os eventos do mundo que se encontra supostamente

organizado, usando a quebra de expectativa (BERGSON, 1983:33) para atribuir à

forma linguística significados que pertencem à cognição do falante.

À medida que a pesquisa se desenvolvia, mais caminhos apareciam com

encruzilhadas e bifurcações proporcionais à complexidade do fenômeno disfêmico

comparativo, que usa a relação de interdependência comum a outras construções

correlativas, como as condicionais e alternativas, acrescida da peculiar semântica.

Como muitas direções foram abertas com o avanço da pesquisa, torna-se

necessário esclarecer que este estudo preferiu optar por um objetivo de caráter mais

geral, uma vez que a análise defrontou-se com processos que agem em conjunto como

a escalaridade que relaciona três processos: um básico da vida cotidiana, um referente

a uma situação particular e um terceiro que é a mescla dos dois e que é acionado pela

imaginação do falante que será relacionada com os postulados da Linguística

Cognitiva. Outro processo inerente ao fenômeno comparativo superlativo disfêmico é a

primazia do conhecimento enciclopédico sobre o dicionarístico na apreensão do

significado das construções, uma vez que a hipótese tradicional da elipse verbal nas

construções comparativas cai por terra após a análise das construções que privilegia

mais os processos cognitivos que as pistas gramaticais.

Page 90: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

A pesquisa procurou demonstrar as particularidades das construções que se

configuram, em um primeiro momento como uma correlação sintático-semântica em

que o primeiro termo exprime ordinariamente um evento ou processo comum e

frequente, mas que com as instruções linguísticas adquirem os atributos comparativos

e superlativos.

Essa é primeira visão da construção que se apresenta mais linguística pela

própria ‘estabilidade’ da linguagem, mas a partir desse ponto, temos a presença da

quebra de expectativa, do inusitado, do imaginativo que emergirão no segundo termo

da correlação, formando com o conjunto a interação entre a forma linguística e os

processos cognitivos metafóricos, metonímicos e metaftonímicos.

Acreditamos que o grande ganho da pesquisa foi sublevar uma construção

pouco estudada para um nível de análise científico, demonstrando a grande

complexidade dos processos envolvidos, mas sem ter a pretensão de dar como acabado

o estudo em relação a ela, visto que com as várias possibilidades apresentadas neste

estudo, fica aqui a possibilidade de ampliação e aprofundamento em trabalhos

posteriores com as Construções Comparativas Superlativas Disfêmicas, seja nos

caminhos apontados pela pesquisa, seja em outros que com certeza não foram

vislumbrados por ela.

Page 91: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

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Page 95: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

ANEXO 1 – Explanação sobre a zona de ativação do termo

comparante

Referente Linguístico Referência Disfêmica

Corre mais que notícia ruim Diz-se comumente que o povo se interessa mais por notícias ruins.

Rolando mais que pau de

enchente

A madeira em uma tromba d’água.

Rebola mais que minhoca nas

cinzas.

A minhoca sofre porque não consegue respirar.

Deu mais que chuchu na serra. Local ideal de plantio.

Sofreu mais que suvaco de

aleijado.

Parte do corpo em que a muleta fica encaixada.

Apanhou mais que mulher de

malandro.

Pessoa que não respeita as outras.

Chorou mais que tampa de

marmita.

Fica com gotículas d’água quando aquecida.

Apanhou mais que bife de

segunda.

Carne dura que precisa ser amaciada.

Apanhou mais que bife de pensão. Idem.

Se virou mais que charuto em

boca de bêbado.

A pessoa alcoolizada fica com a coordenação motora reduzida.

Suou mais que tampa de marmita. Fica com gotículas d’água quando aquecida.

Reclamou mais que sogra de

genro desempregado.

Um genro desempregado não é bem visto pela sogra.

Ardendo mais que acarajé baiano. Iguaria que leva muito tempero, principalmente pimenta.

Apanhou mais que carne de

pescoço pra virar filé.

Carne dura que precisa ser amaciada.

Chiou mais que panela de

pressão.

Som da água em forma de vapor que sai da válvula.

Sumiu mais rápido que comida

em festa de maconheiro.

O consumo de maconha causa aumento de apetite.

Sofreu mais que sapato de cego. Por não ver, o cego tropeça muito.

Mais sujo que pau de galinheiro. O poleiro fica sujo com as fezes dos galináceos.

Mais baixa que bunda de cobra. Porque fica em contato com o solo.

Mais grosso que papel de enrolar

prego.

O papel precisa ser espesso para não ser rasgado pelo prego.

Mais quebrado que arroz de

terceira.

Arroz de baixa qualidade.

Mais gelado que focinho de

cachorro.

Parte do cão com temperatura inferior à epiderme.

Mais amassado que jornal pra

limpar fiofó.

O papel é amassado para que fique mais macio.

Page 96: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Mais por fora que cotovelo de

caminhoneiro.

Modo como o caminhoneiro costuma dirigir.

Mais por dentro que biquíni de

mulata.

Modo como as passistas de carnaval usam sua indumentária.

Mais feliz que pinto no lixo. Local onde há fartura de alimentos.

Mais perdido que cego em

tiroteio.

Desorientação pela falta de visão.

Mais afiada que língua de sogra. É comum dizer que a sogra fala mais do que deve.

Mais amarrado que pacote de

despacho.

Por ter muitos materiais que podem quebrar, como velas e bacias de barro.

Mais amontoado que teta de

porca.

Por possuir a porca entre 18 e 24 mamas.

Mais apertado que rato em

guampa.

Diz-se do rato metido em um recipiente estreito.

Mais apressado que cavalo de

carteiro.

Por ter um tempo pré-determinado para realizar o serviço.

Mais assanhada que solteirona em

festa de casamento.

Pela possibilidade de arrumar um acompanhante.

Mais assustado que cachorro

embarcado.

Assusta-se pela diferença de piso.

Mais comprido que trova de gago. O gago demora muito para pronunciar as palavras.

Mais conhecido que parteira de

campanha.

Pessoa responsável pelos partos de determinada localidade.

Mais contrariado que gato a

cabresto.

O gato não se acostuma com correntes.

Mais curto que estribo de anão. Porque é adaptado para o tamanho do anão.

Mais desconfiado que cego com a

amante.

O cego não sabe quem pode estar presenciando o adultério.

Mais devagarzito que enterro de

viúva rica.

A resignação é proporcional aos bens da falecida.

Mais difícil que nadar de poncho. Por ser uma calça muito larga, dificulta os movimentos corporais.

Mais empacado que burro de

mascate.

O burro anda muito, cansa e empaca.

Mais encolhido que tripa grossa

na brasa.

Desidratação em que perde água e gordura em consequência da elevação da temperatura.

Mais enfeitado que bidê de china. Considera-se que a prostituta possui um gosto extravagante.

Mais enfeitado que bombacha de

turco.

Considera-se o povo turco como uma comunidade que gosta de se enfeitar.

Mais enfeitado que carroça de

cigano.

Considera-se o povo cigano como uma comunidade que gosta de se enfeitar.

Mais enfeitado que mula de

mascate.

Os mascates enfeitam a mula para chamar a atenção dos fregueses.

Mais enfeitado que santo

milagroso.

As pessoas levam enfeites para as imagens que representam os santos.

Mais engordurado que telefone de

açougueiro.

O telefone fica engordurado devido ao ambiente em que se encontra.

Mais enrolado que linguiça de O modo como a linguiça fica exposta para a venda.

Page 97: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

venda.

Mais entravado que carteira de sovina. O sovina não abre a carteira para não dar dinheiro.

Mais esburacado que poncho de

calavêra.

Diz-se da roupa do mendigo.

Mais escasso que passarinho em

zona de gringo.

Os turistas têm por hábito capturar os pássaros silvestres para levá-los para seus lares.

Mais esperto que cavalo de

contrabandista.

O animal sabe onde são os esconderijos.

Mais extraviado que chinelo de

bêbado.

O chinelo é perdido durante o porre.

Mais faceiro que égua com dois

potrilhos.

A alegria da fêmea que deu cria a dois potros.

Mais faceiro que ganso novo em

taipa de açude.

O filhote de ganso que está em cima de uma tábua.

Mais faceiro que mosca em rolha

de xarope.

Por ter grande quantidade de açúcar ou mel.

Mais fechado que baú de

solteirona.

Lugar onde podem estar os segredos de uma pessoa.

Mais fedorento que arroto de

corvo.

Por comer carne em decomposição, não deve ter um hálito agradável.

Mais fedorento que pano de

balcão.

É usado na limpeza de modo geral.

Mais feia que mulher de cego. Como não vê, não consegue avaliar a beleza física.

Mais feio que briga de foice no

escuro.

Não se sabe o que pode ser ferido.

Mais feio que indigestão de

torresmo.

Alimento com muita gordura e difícil digestão.

Mais feio que sapato de padre. A simplicidade é um dos votos dos padres.

Mais feliz que puta em dia de

pagamento de quartel.

Aumenta o movimento nos bordéis nesse dia.

Mais fino que assobio de papudo. Ave com o canto muito agudo.

Mais folgada que luva de

maquinista.

A luva precisa ser larga devido à temperatura elevada em que trabalha o maquinista e à transpiração.

Mais folgado que cama de viúva. Uma cama de casal em que dorme apenas uma pessoa.

Mais gordo que gato de

bolicheiro.

É o animal de estimação do dono de bar.

Mais informado que gerente de

funerária.

Sabe de todas os falecimentos da localidade e seus desdobramentos.

Mais intrometido que piolho na

costura.

O inseto não consegue sair da trama do tecido.

Mais nervoso que gato em dia de

faxina.

O felino não tem onde ficar.

Mais nervoso que potro com

mosca no ouvido.

Incômodo causado pelo inseto.

Mais perdido que cachorro em

procissão.

Animal desorientado pelo grande número de pessoas.

Page 98: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Mais perfumado que mão de barbeiro. O profissional tem contato contínuo com colônia.

Mais por fora que arco de barril. Anel usado para fixar as lascas de madeira.

Mais quente que frigideira sem

cabo.

Precisa ser manuseada diretamente no metal.

Mais redondo que alpargata de

gordo.

O calçado toma a foram do pé do obeso.

Mais seco que tiro de 12 cano-

serrado.

Com o cano da arma mais curto, o som se modifica.

Mais sério que guri borrado. A criança fica sem jeito ao defecar nas calças.

Mais triste que urubu em

tronqueira.

Lugar onde o pássaro fica à espera de alimento.

Mais afiada que navalha de

barbeiro caprichoso.

Profissional que cuida bem de seus instrumentos.

Mais amontoado que uva em

cacho.

Modo de frutificação.

Mais ansioso que anão em

comício

A pessoa não consegue ver o candidato.

Mais apagado que fogão de

tapera.

Um fogão em uma casa abandonada.

Mais apertado que queijo em

cincha.

Queijo colocado entre a barriga do equino e a peça de arreio usada para fixar a sela.

Mais apertado que bombacha de

fresco.

Diz-se do modo como o homossexual usa a calça do gaúcho.

Mais arisca do que china que não

quer dar.

Mulher que se recusa a ter relação sexual.

Mais assustado que guri em

cemitério.

Medo que a criança tem dos mortos.

Mais assustado que cachorro em

canoa.

Insegurança causada no animal pelo ambiente.

Mais assustado que cavalo

passarinheiro.

É o equino que se assusta com muita facilidade.

Mais atirado que capataz de

estância grande.

Segurança exacerbada gerada por se trabalhar em uma grande propriedade.

Mais atirado que alpargata em

cancha de bocha.

Diz-se do sapato atirado na pista de jogo de bocha.

Mais caro que argentina nova na

zona.

Valor elevado de mulher estrangeira no prostíbulo.

Mais conhecido que feijão em

cardápio de quartel.

Frequência com que o alimento é servido.

Mais constrangido que padre em

puteiro.

Local não usual para um eclesiástico.

Mais comprido que putiada de

gago.

O gago demora muito para pronunciar as palavras.

Mais comprido que esperança de

pobre.

Capacidade frequente nos mais humildes.

Mais comprido que suspiro em

velório.

Forma de resignação.

Page 99: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Mais comprido que cuspe de

bêbado.

O álcool muda a consistência da saliva.

Mais curto que coice de porco. Por ter o animal as pernas muito curtas.

Mais duro que salame da colônia. Tipo de embutido pouco macio.

Mais enrolada que namoro de

cobra.

Forma como os répteis acasalam.

Mais feio que tombo de mão no

bolso.

Dessa forma, não há como proteger nenhuma parte do corpo.

Mais feio que facada na bunda. Lugar incomum para o fato.

Mais feio que briga de touro. Violência gerada por disputa entre animais de grande porte.

Mais feio que rodada de cusco em

lançante.

Quando um cachorro cai de um terreno muito íngreme.

Mais feio que paraguaio baleado. Tem relação com a rivalidade entre paraguaios e gaúchos.

Mais por fora que surdo em bingo A pessoa não escuta o locutor pronunciar os números.

Mais por fora que cabelo de côco. É a aparência da casca do coco, depois de ressecada.

Mais forte que porteiro de cabaré. Homem corpulento colocado na entrada do estabelecimento para impor respeito.

Mais forte do que peido de burro

atolado.

Gases gerados pelo esforço do animal.

Mais gasto que fundilho de

tropeiro.

O tropeiro gasta essa parte da calça por ficar muito tempo em montaria.

Mais gostoso que beijo de prima. Diferença gerada por não ser permitida socialmente.

Mais grosso que dedo

destroncado.

Efeito decorrente de uma luxação.

Mais grosso que parafuso de

patrola.

Parafuso de uma niveladora de terraplanagem.

Mais grosso que rolha de poço. Tampa de grande dimensão.

Mais grudado que bosta em

tamanco de leiteiro.

É muito sujo pois o profissional procede à ordenha no curral.

Mais inchado que sapo bulido. Algumas espécies de sapo incham para dar ao predador a impressão de maior estatura.

Mais ligeiro que enterro de

bexiguento.

Para que ninguém mais se contamine com a varíola.

Mais magro que guri com

solitária.

Devido aos vermes, o corpo não consegue absorver os alimentos satisfatoriamente.

Mais medroso que velha em

canoa.

Local que geralmente gera temor em uma senhora.

Mais medroso que cascudo

atravessando galinheiro.

Temor sentido por um besouro ao estar em um ambiente em que é um dos alimentos.

Mais metido que merda em

chinelo de dedo.

Quando se pisa em fezes de animais.

Mais metido que dedo em nariz

de piá.

Criança com esse hábito.

Mais perdido que peido em

bombacha.

A bombacha é uma calça que se usa bem larga no corpo.

Mais perdido que cebola em

salada de frutas.

Porque o bulbo não é usado em salada de frutas por seu gosto forte.

Page 100: AS CONSTRUÇÕES COMPARATIVAS SUPERLATIVAS

Mais nojento que mocotó de

ontem.

Depois de armazenado por um dia, a iguaria forma uma película de gordura espessa.

Mais vagaroso que tropeiro de

lesma.

Pessoa que montaria em molusco conhecido por sua lentidão.

Mais à vontade que bugio em

mato de boa fruta.

É o macaco que está em um ambiente com fartura de alimentos.

Mais virado que bolacha em boca

de velha.

Por não ter dentes, a idosa usa a saliva para ajudar na digestão.