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As coordenadoraspedagógicas comoformadoras
BEATRIZ GOUVEIA 1
Nesta entrevista, Beatriz foi convidada a
contar sobre sua pesquisa de mestrado
realizada em Boa Vista de Tupim (BA) e
a compartilhar ideias fundamentais sobre o pa-
pel de formador das coordenadoras pedagógicas.
Revista avisa lá: Em sua pesquisa você enfa-
tiza o papel da coordenadora pedagógica co-
mo formadora dentro das escolas. O que isso
significa?
Beatriz Gouveia: A formação permanente é
um direito das professoras, segundo a Lei de
Diretrizes e Bases (LDB) 9.394/96. Portanto, é
um dever das escolas e das secretarias de edu-
cação assegurar que as formações aconteçam
Beatriz Cauveia
1 Beatriz Gouveia, coordenadora de projetos do Instituto Avisa Lá, professora da pós-graduação em alfabetização do Instituto Superiorde Educação Vera Cruz e assessora em educação. Coordenadora pedagógica do material de formação Coordenador Pedagógico:função, rotina e prática, publicado pelo Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP], em parceria com o MEC. Beatriz étambém mestre em Psicologia da Educação pela PUC/SP em trabalho cujo titulo é Formação dos coordenadores pedagógicos emBoa Vista do Tupim/BA: uma experiência colaborativa, o fio por trás das missangas, com orientação da Profa. Ora. Vera MariaNigro de Souza Placco.
Menina de 6 anos de uma escola multiseriada da zona rural de Boa Vista de Tupim lê para sua comunidade
dentro da carga horária de trabalho prevista e
remunerada das professoras. Podemos notar um
esforço por parte das secretarias e das escolas
em organizarem formações. No entanto, parte
delas é concebida e desenvolvida desarticulada-
mente em relação aos contextos de trabalho das
escolas, isto é, ãquilo que acontece no ensino e
na aprendizagem. Em geral, os problemas que as
professoras enfrentam no dia a dia estão vincu-
lados ao ensino ou à aprendizagem escolar de
determinados conteúdos e, para elas, é muito
relevante encontrar interlocução formativa para
refletir sobre o conhecimento didático e sobre as
melhores condições de ensino, para incidir em
uma melhor qualidade de aprendizagem dos alu-
nos. Nesse contexto, vem ganhando especial
atenção o papel formador das coordenadoras
pedagógicas, ou da profissional responsável pelo
andamento profissional do grupo de professoras
em uma instituição. Tem-se discutido, cada vez
mais, sua responsabilidade com a formação con-
tinuada das professoras dentro da escola e seu
papel como mediadora nas trocas de experiên-
cias, dúvidas, conhecimentos e saberes no grupo,
valorizando e promovendo a construção colabo-
rativa do conhecimento.
o que a motivou a escolher o município de
Boa Vista do Tupim, localizado na região
da Chapada Diamantina, para realizar sua
pesquisa?
Minha pesquisa nasceu do desejo de analisar
um processo de formação bem sucedido. Um de-
sejo aliado a duas inquietações: por que pode
dar tão certo em alguns municípios e não em
outros? O que fez um município para que os re-
sultados fossem tão bons? Nesse sentido, o mu-
nicípio escolhido para a pesquisa foi Boa Vista do
Tupim, localizado na Chapada Diamantina/BA.
Em 2009, a rede municipal do município obteve
a melhor posição no índice de Desenvolvimento
da Educação Básica (IDEB)2 de todo o estado da
'O IDEB sintetiza dados sobre aprovação escolar e médias de desempenho nos sistemas nacionais de avaliação no Sistema Nacionalde Avaliação da Educação Básica (SAEB) e Prova Brasil. A escala varia de zero a dez.
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ENTREVISTA
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ENTREVISTA
Bahia: 5,8, quase o triplo do verificado em
2005 2,2. Uma das minhas hipóteses para tal
resultado era o trabalho de formação docente
que vinha sendo realizado pelas coordenadoras
pedagógicas das escolas. Portanto, o estudo te-
ve como objetivo analisar o processo de constru-
ção do papel formador das coordenadoras peda-
gógicas em Boa Vista do Tupim.
Por que você diria que o município tem uma
boa experiência em educação?
O município conseguiu bons resultados na
aprendizagem de todos os sujeitos envolvidos na
rede: coordenadoras, professoras e alunos. To-
dos avançaram. As coordenadoras apontam que
depois que iniciaram um trabalho formativo,
atrelado ao que acontece nas salas de aula com
as professoras, observaram um maior compro-
misso e empenho em realizar planejamentos
mais coerentes e adequados à realidade dos alu-
nos. Apresentaram também maior autonomia
para analisar os resultados da aprendizagem
das crianças e planejar as situações didáticas. O
tempo, a coerência e a continuidade são temas
centrais para a formação continuada. Para que
haja mudanças na aprendizagem dos alunos e
na prática das professoras, é preciso combinar
tempo - para consolidar a política de formação
-, coerência das propostas teóricas e das bases
conceituais durante o processo formativo e con-
tinuidade por parte dos agentes de formação
(profissionais das equipes técnicas e coordena-
doras). Em 2011, ano em que fiz a pesquisa, já
fazia 12 anos que a gestão da educação munici-
pal mantinha a política de formação. A continui-
dade desta e o tempo eram elementos presentes
no processo de formação de Boa Vista do Tupim,
no entanto, a coerência das propostas não de-
pende apenas da permanência do grupo político;
é necessário que os resultados expressem a me-
Ihoria da qualidade da aprendizagem dos alunos.
E foi o que aconteceu.
Quais foram as principais ações da Secretaria
Municipal de Educação de Boa Vista do Tupim
que contribuíram para a construção do papel
formador das coordenadoras pedagógicas?
O município de Boa Vista do Tupim fez uma
parceria com o Instituto Chapada> em 2001,
com a condição de que o município criasse o
cargo de coordenadora pedagógica e de forma-
dora (técnico) das coordenadoras, o que foi feito.
Portanto, a ação inicial foi compreender que pa-
ra assegurar a melhoria na aprendizagem seria
necessário investir na constituição de uma equi-
pe de profissionais da educação e no processo
de formação continuada de todos eles: professo-
ras, coordenadoras, diretoras, formadoras e
equipes técnicas. O município instituiu o papel
do coordenador pedagógico nas escolas e imple-
mentou uma estrutura de formação, criando
uma equipe técnica na Secretaria para apoiar o
trabalho de formação permanente das educado-
ras. Isto é, Boa Vista do Tupim criou uma rede
colaborativa de formação. Os pressupostos do
processo da rede é o de que as escolas precisam
se tornar espaços de formação permanente e as
professoras devem ser consideradas como profis-
sionais e não alunas, isto é, pessoas com uma
responsabilidade social definida por sua profis-
são, que é a de ensinar. E, para tanto, foi organi-
zado um grupo de coordenadoras para assumir
o trabalho de formação das professoras nas es-
colas. A proposta era que a formação estivesse
estreitamente articulada ao contexto de trabalho
das professoras, que fosse centrada nas escolas.
As coordenadoras então passaram a ocupar o
lugar de formadoras, de articuladoras de uma
rede de aprendizagem dentro das escolas.
Quais as principais necessidades formativas
das coordenadoras durante o processo de
constituição de seu papel de formadora den-
tro da escola?
As coordenadoras reconhecem a necessida-
de do estudo permanente e asseguram diferen-
tes momentos na rotina para a formação das
professoras, assim como para a sua própria for-
mação. Para constituírem o papel de formado-
ras, as coordenadoras de Boa Vista do Tupim,
investem na própria formação e aproveitam os
espaços de reflexão organizados pela Secretaria
para trabalhar saberes específicos, necessários
para sua função.
As coordenadoras desse estudo apontaram
as seguintes contribuições da formadora para
aprimorarem o seu desenvolvimento profissional:
• Apoio no planejamento das pautas, nas formas de
ensino e na condução dos conselhos de classe;
• Acompanhamento individual para atender às
questões específicas de cada coordenador, con-
tribuindo com o processo de crescimento e
aperfeiçoamento dos coordenadores enquanto
formadores das professoras;
'Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP) é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) quetrabalha como uma rede mobilizadora da comunidade escolar - de secretários municipais de educação a professores -, em váriosmunicípios da Chapada Diamantina (BA).
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• Acompanhamento de salas de aula para atrelar
a prática e a teoria;
• Devolutivas individuais das observações;
• Participação nos planejamentos de cada coor-
denadora;
• Criação de minigrupos de estudos para apro-
fundar conteúdos específicos.
Os espaços de formação destacados são ora
individuais, ora coletivos. Em todos eles, a for-
mação está articulada ao contexto de trabalho.
Quais os principais desafios nesse processo?
Os desafios são inúmeros. Fundamental é
encontrar recursos para enfrentá-Ios. Ao assumi-
rem seus postos nas escolas, as coordenadoras
não se tornam formadoras de um dia para o ou-
tro. Para se tornarem formadoras e agirem co-
mo tais, e, quem sabe, para se reconhecerem
como autoridades técnicas diante de um grupo,
não basta uma nomeação ou a entrega de uma
nova rotina com uma lista de atribuições. A
Secretaria de Educação, em parceria com o
Instituto Chapada, propõs caminhos para que a
construção do papel de formadora da coordena-
dora pedagógica fosse feita com a consistência
e a seriedade necessárias: a constituição de
equipes de formação (envolvendo todos os su-
jeitos no processo) viabilizou uma rotina de tra-
balho para as coordenadoras, assegurando os
momentos da formação. Além disso, garantiu
momentos de discussão coletivos, de grupos de
estudos, de planejamentos, de observação em
sala de aula e momentos para o acompanha-
mento individual. As pautas das coordenadoras
para propor cada uma dessas ações, foram dis-
cutidas e acompanhadas pelas formadoras.
Outro caminho a destacar é o da decisão de co-
locar o conhecimento didático da leitura e escri-
ta para assumir um papel central na formação.
A proposta foi tratar das interações que se pro-
duzem entre a professora, os alunos e o objeto
de ensino e discutir os problemas que estão vin-
culados ao ensino ou à aprendizagem escolar
de determinados conteúdos, bem como debater
sobre as melhores condições de ensino para in-
cidir em uma melhor qualidade de aprendizagem
dos alunos.
Conte um pouco da rotina das coordenadoras
de Boa Vista do Tupim. Como elas fazem para
acompanhar a prática das professoras e rea-
lizar os encontros de formação coletivos?
Uma rotina bem estruturada é fundamental
para que a coordenadora consiga viabilizar seu
papel como formadora na escola. Ela é uma es-
trutura de apoio para o exercício profissional da
coordenadora pedagógica, isto é, para organizar
a sua rotina, ela pode se orientar por metas,
objetivos e ter clareza em relação às suas atri-
buições na escola. As rotinas das coordenadoras
de Boa Vista do Tupim são compostas por ativi-
dades relacionadas ao acompanhamento do tra-
balho das professoras, ao acompanhamento das
aprendizagens dos alunos, à formação das pro-
fessoras e à gestão da escola como um todo,
junto com a diretora. Essas atividades estão ar-
ticuladas a uma rotina em que o papel de forma-
dora se evidencia, isto é, um ritmo diário que
pretende ajudar as professoras a qualificar o seu
trabalho. Vejamos algumas das atividades pre-
sentes na rotina: encontros coletivos semanais
com as professoras (como um espaço privilegia-
do para a reflexão sobre a prática pedagógica);
observações/acompanhamento do trabalho das
professoras e da sala de aula; planejamento dos
encontros de orientação com cada professora ou
série; momentos de estudo e autoformação.
Como a equipe das formadoras contribuiu pa-
ra construir a rede colaborativa de formação?
Esse estudo partiu do pressuposto de que a
melhoria da qualidade da escola pública não é
fruto de uma ação isolada, externa e pontual de
formação. Ao contrário, pressupõe um conjunto
de ações interligadas, envolvendo os diversos
atores que compõem o cenário educativo. As
coordenadoras são responsáveis pela formação,
porém, não podem assumir a tarefa sozinhas.
Podemos dizer que a rede de formação do muni-
cípio de Boa Vista do Tupim parece estar harmo-
niosamente articulada, as ações de formação
estão interligadas, isto é, as coordenadoras são
responsáveis pela formação das professoras, se
corresponsabilizam pela qualidade dos resulta-
dos da aprendizagem das crianças, e recebem
apoio político e institucional das equipes técni-
cas das Secretarias e do Instituto Chapada. Todos
os sujeitos envolvidos nessa cadeia de forma-
ção se corresponsabilizam e oferecem o apoio
técnico e formativo ao sujeito da formação a ele
interligado.
o que podemos generalizar da experiência de
Boa Vista como estrutura de formação para
outras secretarias?
Entendo que a valorização da rede colabo-
rativa, a compreensão do papel de formadora
das coordenadoras pedagógicas e o necessá-
rio apoio político e técnico a todos os envolvidos
em um processo de formação, são aspectos da
experiência de Boa Vista do Tupim que podem
inspirar e contribuir com outras estruturas de
formação .•
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