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1 AS DANÇAS DE CORTE FRANCESA NO FINAL DO SÉCULO XVI E INÍCIO DO SÉCULO XVII: UM ESTUDO DA DISTINÇÃO POR MEIO DA IMAGEM. BRUNO BLOIS NUNES Universidade Federal de Pelotas (UFPel) [email protected] Apresentação do tema: Não podemos ignorar, nos dias de hoje, que a imagem pode ser fonte histórica, o seu problema é tratá-la como tal (MENESES, 2012, p. 251). Estamos vivenciamos um mundo cada vez mais rico de representações visuais. Entretanto, ler imagens não é uma tarefa tão fácil assim quanto pode parecer ainda mais quando há uma distância temporal/cultural entre o objeto e o historiador (BURKE, 1994, p. 30). Nos dias de hoje, ainda somos considerados “analfabetos visuais” pela nossa condição de ainda estarmos acostumados com a imagem somente na sua função ilustrativa (BALDISSERA, 2010, p. 248). Toda dança é uma forma de produzir imagem. Para o estudo de uma série de danças, do período do Ancien Régime, as quais não possuem registros audiovisuais, as imagens descritivas de passos encontradas nas fontes primárias serão a principal ferramenta para elaboração de um estudo focado nas danças de corte. Algumas obras possuem somente a descrição textual do movimento, o que faz com que a imaginação do pesquisador evidencie-se na tentativa da melhor conexão possível entre o texto lido e o movimento executado sem imagem. Por outro lado, também temos obras descritivas das danças do Ancien Régime com imagens e partituras. As imagens têm como principal objetivo representar a maneira como essas danças de corte eram executadas. Estando uma vez essas imagens presentes nos documentos que servem de fonte de pesquisa, essas imagens são passíveis de estudo pelo pesquisador. Elas tornam visível a realidade representada podendo evocar, ao mesmo tempo, a ausência e presença do objeto de estudo. (GINZBURG,

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AS DANÇAS DE CORTE FRANCESA NO FINAL DO SÉCULO XVI

E INÍCIO DO SÉCULO XVII: UM ESTUDO DA DISTINÇÃO POR

MEIO DA IMAGEM.

BRUNO BLOIS NUNES

Universidade Federal de Pelotas (UFPel)

[email protected]

Apresentação do tema:

Não podemos ignorar, nos dias de hoje, que a imagem pode ser fonte histórica, o

seu problema é tratá-la como tal (MENESES, 2012, p. 251). Estamos vivenciamos um

mundo cada vez mais rico de representações visuais. Entretanto, ler imagens não é uma

tarefa tão fácil assim quanto pode parecer ainda mais quando há uma distância

temporal/cultural entre o objeto e o historiador (BURKE, 1994, p. 30). Nos dias de hoje,

ainda somos considerados “analfabetos visuais” pela nossa condição de ainda estarmos

acostumados com a imagem somente na sua função ilustrativa (BALDISSERA, 2010, p.

248).

Toda dança é uma forma de produzir imagem. Para o estudo de uma série de

danças, do período do Ancien Régime, as quais não possuem registros audiovisuais, as

imagens descritivas de passos encontradas nas fontes primárias serão a principal

ferramenta para elaboração de um estudo focado nas danças de corte. Algumas obras

possuem somente a descrição textual do movimento, o que faz com que a imaginação

do pesquisador evidencie-se na tentativa da melhor conexão possível entre o texto lido e

o movimento executado sem imagem.

Por outro lado, também temos obras descritivas das danças do Ancien Régime

com imagens e partituras. As imagens têm como principal objetivo representar a

maneira como essas danças de corte eram executadas. Estando uma vez essas imagens

presentes nos documentos que servem de fonte de pesquisa, essas imagens são passíveis

de estudo pelo pesquisador. Elas tornam visível a realidade representada podendo

evocar, ao mesmo tempo, a ausência e presença do objeto de estudo. (GINZBURG,

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2001, p. 85). O historiador deve romper com as limitações que se deixa com frequência

aprisionar onde a imagem é reduzida a “documentação visual”. (MENESES, 2012, p.

243).

Le Goff e Truong afirmam a reprovação da Igreja, durante a Idade Média,

quanto à dança nas formas de contorções do corpo e rebolados corporais (2012, p.146).

Foi nesse período que a figura de um maître de danse1, chamado Hacén Ben Solomon,

apareceu pela primeira vez em 1313 (CAMINADA, 1999, p. 79).

Bourcier explica que “no campo do pensamento e das artes, a Renascença

francesa passa pela Renascença italiana. Para compreender a evolução da coreografia na

França do século XVI, é preciso examinar a do Quattrocento2”. (2001, p.63).

Acrescento aqui, o Cinquecento3, que também trouxe autores importantes para a

evolução artística/cultural desse período. Graças a esses acontecimentos, a arte de

dançar floresceu nas cortes nos séculos XVI e XVII (VUILLIER, 1898, p. 12).

No Ancien Régime, as danças voltam a ser executadas seja como forma de

propaganda, seja como forma de adulação ao rei. O reino francês torna-se, novamente, o

mais rico e populoso da Europa no final do século XV. É também, nesse período, que se

organiza a vida de corte na França.

A partir de Francisco I, uma verdadeira vida de corte organiza-se pela

primeira vez. Ele agrupa fidalgos não titulares de cargos do Estado, que são

confiados a especialistas. Os cortesãos têm vocação para lutar com brio e

para procurar refinamento do comportamento com o objetivo de elaborar uma

arte de viver com elegância. Para esta nova sociedade, a dança, aperfeiçoada

pela Itália, será um exercício apaixonante (BOURCIER, 2001, p. 69).

Durante esse período, realizou-se o que podemos chamar de uma “importação”

de outras danças que foram introduzidas na corte francesa: da Espanha vieram o

canário, a chacona (dança de destaque no século XVII) e a passacale que numa

suavização de movimentos vem com o formato de chacona; da Itália chegam a pavana

1 maître de danse: figura responsável pelo ensino dos passos de dança utilizados nas cortes. 2 Quattrocento: época de manifestações artístico/culturais em que figuram artistas ilustres como o pintor

Botticelli, o escultor Donatello e o humanista Leonardo Bruni. 3 Cinquecento: realizações de cunho artístico/culturais onde se destacaram entre outros Leonardo da

Vinci, Michelangelo e Maquiavel.

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(uma das principais danças dessa época) e o pazzo mezzo. Da Provença vem a volta

(BOURCIER, 2001, p. 70 e 71). Podemos adicionar ainda a allemande adotada no

reinado de Luís XIV (CAMINADA, 1999, p. 111).

Embora houvesse essa influência, também eram dançadas na corte francesa

outras danças típicas como a gavota e Bourcier relata que essas danças de corte estavam

destinadas a reinar até o fim do século XVIII (2001, p.71).

Dentre as danças desse período Arbeau (2013, p. 128-174) comentou sobre

diversos branles que foram, muito deles, representados por partituras em seu livro

(2013, p. 128-174):

Figura 1 – Tabulação musical com passos de branle (Orchesography, 2013, p. 164)

Referencial Teórico-Metodológico:

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A sociedade de corte era uma sociedade do ver, do controle gestual de acordo

com a ocasião, da maneira de falar, da busca da distinção e da “arte” do gasto excessivo

do dinheiro como demonstração do nível social a que estava inserido dentro dessa

sociedade (ELIAS, 2001, p. 86 e 194). Além disso, as vestimentas e os perfumes

também são peças fundamentais para essa sociedade de corte que cria, dessa forma, uma

“arte da aparência”. As várias camadas de roupas e os perfumes carregam o que se pode

chamar de “uma encenação enganadora” (RODRIGUES, 1999, p. 164).

Elias analisa a transformação da sociedade de corte nos séculos XVI e XVII:

“Lentamente, a corte real e a sociedade de corte se transformam em uma formação

social cujos costumes, usos, e até a maneira de falar, de vestir e de movimentar o corpo

ao andar, bem como os gestos durante as conversas, contrastavam notavelmente com os

costumes das formações não cortesãos”. É dessa transformação que surge o que o autor

chama de “cultura de corte” (2001, p.194). Não possuem mais o hábito de comer junto

com seus dependentes e fazem uso de salas de jantar separadas (RODRIGUES, 1999, P.

38).

Segundo Caminada o ensino regular dessas danças tornou-as mais disciplinadas,

teorizadas e, consequentemente, menos espontâneas (1999, p. 80). Foi sob o patrocínio

dos reis Luís XIII e Henrique IV e do cardeal Richelieu que a dança prosperou na

França. (VUILLIER, 1898, p. 12). No Ancien Régime, a dança de corte em específico

não se desenvolve como Arte. As regras, posturas e ações constantemente repetidas dos

passos impediam o desenvolvimento da dança de corte como Arte tornando-a, muitas

vezes, ferramenta política. Como exemplo, temos Jean-Baptiste Colbert

(superintendente das edificações reais e conhecido pela sua reputação de homem

trabalhador que não gastava dinheiro em coisas inúteis), que patrocinava as artes, pois

acreditava no seu potencial como uma das formas de glorificação do rei (BURKE, 1994,

p. 61).

Problemática de Pesquisa:

A historiografia da dança não é ampla. Em geral encontram-se variados livros

sobre a história geral da dança, cuja abordagem não é pautada por uma rigorosa

pesquisa histórica. Muitas vezes os livros sobre a dança acabam por serem redundantes,

se autorreferindo e não realizando uma pesquisa original. Entre os livros gerais sobre

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dança de salão encontram-se: História da Dança no Ocidente do Paul Bourcier, História

da Dança da Maribel Portinari, Pequena História da Dança do Antônio José Faro,

Fundamentos de dança de salão da Bettina Ried, Dança: bem-estar e autoconfiança da

Cínthia Ceribelli, History of Dance: an interactive arts approach de Gayle Kassing,

Pre-Classic Dance Forms de Louis Horst, Histoire de la Danse à Travers les Âges de F.

Ménil, Manuel des Danses de Société de Alexandre (professeur), National Rhythms,

African Roots de John Charles Chasteen, A History of Dancing from the Earliest Ages to

Our Own Times de Gaston Vuillier, Nouvelle Méthode pour Apprendre L’Art de la

Danse sans Maître de Brives (maître de danse), Théorie pratique du danseur de société

de Brunet (professeur de danse), Almanach Dansant de Guillaume Learn to Dance de

Colette Redgrave.

Outro tipo de bibliografia sobre dança é a que trata de gêneros musicais

específicos, como: A Description of the Correct Method of Waltzing de Thomas Wilson,

Caribbean Currents: Caribbean Music from Rumba to Reggae de Peter Manuel e

Kenneth Bilby, The Book of Salsa de César Miguel Rondón, Samba de Gafieira: a

história da dança de salão no Brasil do Marco Antônio Perna e Maxixe: a dança

excomungada do Jota Efegê.

Muitas das fontes primárias são encontradas na Biblioteca Nacional da França.

Dentre aquelas que tratam sobre as danças de corte (principalmente do século XVI e

XVII), algumas podem servir como boa base de estudo sobre as danças realizadas no

período. Entre os livros, tratados e manuscritos desse período faço uma breve descrição

sobre alguns deles:

1) De arte saltandi et choreas ducendi de Domenico da Piacenza (ou Ferrara) [1401-

1500], 55 p.: Domenico da Piacenza foi professor de futuros maîtres de danse como

Antonio Cornazzano e Guglielmo Ebreo. Seu tratado é um dos primeiros registros

escritos sobre dança que chegaram até nós.

2) S’ensuit l’art et instruction de bien dancer de Michel Toulouze [1496-1501], 24 p.:

obra reeditada em fac-símile em Londres no ano de 1936 e não possui capa. Trata em

particular da basse danse, possui diversas partituras e no seu final apresenta uma

imagem.

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3) Il Ballarino de Fabritio Caroso (1581), 424 p.: manual de dança dedicado a grã-

duquesa Bianca Capello de Medici. Em 1600 ele edita Nobilità di Dame uma versão

com uma maior variedade de passos.

4) Traité de danses: auquel est amplement résolue la question, à savoir s’il est permis

aux chrestiens de danser de Lambert Daneau (1582), 98 p.: trata-se de uma crítica

quanto à degeneração da corte pelo fato da mesma permitir práticas como dança e jogo.

A obra apresenta alguns sonetos no seu início, não possui imagens e o índice encontra-

se no final do livro.

5) Nuove Invenzione di balli. de Cesare Negri (1604), p. 309: é considerado o primeiro

texto que menciona o uso da posição en dehors dando início à elaboração das cinco

posições básicas do ballet definidas por Pierre Beauchamp. Na verdade, foi lançada uma

edição menos completa dois anos mais cedo que se chama Le Grazie d’ Amore.

6) Choregraphie ou l’art de’crire la dance, par caracteres, figures et signes

demonstratifs de Raoul-Auger Feuillet (1700), 96 p.: O livro utiliza-se de desenhos

representados por círculos, pontos, retas para demonstrar os diversos movimentos de

dança. Possui também quadros com a coreografia das danças, como chassés,

contratempos e piruetas.

A análise é realizada, basicamente, em duas obras que são tratados de dança: a

primeira – Orchésographie – publicada em 1589 contendo notas musicais e imagens

dos passos das danças e a segunda – Apologie de la Danse – lançada em 1623, com

descrição dos movimentos, porém sem imagens.

Figura 2 – Thoinot Arbeau (Biblioteca Nacional da França)

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1°) Orchésographie et traicté en forme de dialogue, par lequel toutes personnes peuvent

facilement apprendre et practiquer l'honneste exercice des dances de Thoinot Arbeau

(1589), 208 p.: tratado em forma de diálogo sobre as diversas danças da França do

século XVI. Palavra que vem do grego (orkhesis + graphein + ia), ela significa a arte de

escrever a dança representando seus passos e movimentos4. Possui diversas imagens

onde o autor exemplifica alguns movimentos e sua respectiva nomeação (ARBEAU,

1589, p. 41e – 48d). Descritos com precisão o número de etapas dos passos e os seus

floreios, muitas vezes, estão associados às notas musicais sendo mais de 40 melodias

(entre la volte, la courante, l’allemande, canaries e vários branles) e mais de 40

ilustrações. Além disso, contém relatos sobre música militar, batidas em tambores e

marchas. Possui mais de dez edições com traduções em outras línguas.

Figura 3 – Passos de Gavotte (Orchesography, 2013, p. 85)

4 Definição dada pelo site http://www.dicionarioinformal.com.br/orquesografia/

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Figura 4 – O tambor no uso da marcha (Orchesography, 2013, p. 38)

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2°) Apologie de la danse et la parfaicte méthode de l’enseigner tant aux cavaliers

qu’aux dames de F. de Lauze (1623), 75 p.: é um tratado de dança divido em duas

partes (uma para os cavalheiros dedicado ao Marquês de Buckingham e outra para as

damas dedicado à Marquesa de Buckingham). Apologie não possui ilustração, nem

notas musicais das danças comentadas. Diante desse fato, muito provavelmente, uma

edição bilíngue francês/inglês foi publicada em 1952 por Joan Wildeblood com

introdução e notas do mesmo.

O autor começa o tratado mencionando um possível plágio realizado pelo maître

de danse Barthélemy de Montagut em sua obra Louange de la danse5 (LAUZE, 1623, p.

1-3). Logo após, como o próprio título da obra já menciona, é feita uma apologia à

dança. Cita, entre outros, Sócrates e Platão como sábios a favor do exercício da dança

(LAUZE, 1623, p. 13).

É sugerido aos que não possuem prática na dança que realizem exercícios

fazendo o uso de um ponto de apoio (apoiar as mãos numa mesa) para facilitar a

5 Essa obra encontra-se na Biblioteca Nacional da Inglaterra através do site:

http://explore.bl.uk/primo_library/libweb/action/display.do?tabs=moreTab&ct=display&fn=search&doc=

BLL01009499593&indx=2&recIds=BLL01009499593&recIdxs=1&elementId=1&renderMode=popped

Out&displayMode=full&frbrVersion=&dscnt=2&fromLogin=true&tab=local_tab&dstmp=14004484029

45&vl(freeText0)=louange%20de%20la%20danse&vid=BLVU1&mode=Basic

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execução dos movimentos (LAUZE, 1623, p. 28 e 29). Trata-se de uma didática no

ensino da dança já realizada em princípios do século XVII.

O autor também escreve sobre a não obrigatoriedade de várias ilustrações para

explicar os movimentos de dança, conforme segue:

“CEVX qui croyent l’observation de plusieurs figures du tout nécessaires

pour biĕ monstrer à danser par livre, & representer plus naïvemĕt les

mouvemens qui se doivent observer à la danse, ne s’accordent pas mal avec

cest Orateur, qui ayant iadis à haranguer en plain Senat sur un faict três-

attroce, commit ceste lourde faute d’en proposer un tableau devant les yeux

des Iuges, se fiant plus aux traits muets d’une morte peinture qu’à l’energie

d’une eloquence vive” (LAUZE, 1623, p. 25).6

Figura 5 – Capa do livro Apologie de la Danse de 1623 (Biblioteca Nacional da França)

6 “Aqueles que acreditam que ensinar a dançar corretamente a partir de um livro requer numerosas

ilustrações, a fim de descrever mais claramente os movimentos que devem ser observados na dança, estão

de acordo com aquele idoso Orador, que tendo que fazer um discurso fastidioso num Senado sobre um ato

muito atroz comete negligência grave de propor uma mesa diante dos olhos dos juízes confiando mais nos

traços mudos de uma pintura morta, do que na energia de uma eloquência viva.” Traduzido por Bruno

Blois Nunes.

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Portinari salienta sobre a questão da apropriação feita pelas classes dominantes

das danças vindas de manifestações populares. Por possuírem indumentárias de difícil

movimentação por causa de seu peso e volume e, para que esses passos fossem

executados na corte, eles foram adaptados de acordo com o requinte do ambiente. Mais

adiante, esse mesmo autor comenta: “A espontaneidade inicial é substituída assim por

floreios nos passos, postura estudada, movimentação codificada” (1989, p. 55). A dança

de corte aparece como forma de distinção social e caberia, mais tarde, aos maîtres de

danse ajudar a aristocracia da corte na execução dos passos de dança.

Considerando que não há possibilidade de se adquirir registros audiovisuais do

período do Ancien Régime, as imagens serão a principal ferramenta de estudo visual das

danças de corte.

A imagem, nesse caso em específico, terá suma importância como forma de

reprodução detalhada e correta dos passos.

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