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1 UM OLHAR JUDAICO SOBRE O NOVO TESTAMENTO: AS ORIGENS JUDAICAS DO CRISTIANISMO (DAS INCOMPREENSÕES, DOS CONFLITOS E DOS PRECONCEITOS NAS RELAÇÕES ENTRE CRISTIANISMO E JUDAÍSMO) por Ev. Carlos Alberto Moreira Texto-Base das Palestras proferidas na “Semana Teológica” do STEBAN - Seminário Teológico Evangélico Batista Nacional do Estado do Rio de Janeiro em 24/07/2002 e no I Seminário de Estudos da Antigüidade Judaica em 02/10/2002, promovido pela Oficina de Estudos da Antigüidade Judaica do Núcleo de Estudos da Antigüidade do Departamento de História da UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rio de Janeiro Junho/2002

As Origens Judaicas do Cristianismo

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UM OLHAR JUDAICO SOBRE O NOVO TESTAMENTO: AS ORIGENS JUDAICAS DO CRISTIANISMO

(DAS INCOMPREENSÕES, DOS CONFLITOS E DOS PRECONCEITOS

NAS RELAÇÕES ENTRE CRISTIANISMO E JUDAÍSMO)

por

Ev. Carlos Alberto Moreira

Texto-Base das Palestras proferidas na “Semana Teológica” do STEBAN - Seminário Teológico Evangélico Batista Nacional do Estado do Rio de Janeiro em 24/07/2002 e no I Seminário de Estudos da Antigüidade Judaica em 02/10/2002,

promovido pela Oficina de Estudos da Antigüidade Judaica do Núcleo de Estudos da Antigüidade do Departamento de História da

UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Rio de Janeiro Junho/2002

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“...Sim, houve realizações e progresso. Mas houve também séculos de ignorância e de preconceito, de oportunidades desperdiçadas, de grandes injustiças e de sofrimento humano com custos imensos para judeus e não judeus. E ao fim houve o colapso da moralidade social, o malogro de uma sociedade inteira, e crueldades indizíveis foram infligidas por uma maioria a uma minoria de concidadãos. A história por inteiro, com seus altos e baixos, seus triunfos e seus desastres e derramamentos de sangue... é uma história repleta de paradoxos, ambigüidades e contradições — de dois grupos... que viveram juntos ao longo de muitos séculos, um a maioria dominante e o outro, por tempo demais, uma minoria restrita e perseguida, e com direitos limitados. Um grupo lutando com trabalho árduo e repetidas provas de lealdade para conquistar a aceitação de seus concidadãos, e a maioria no mais das vezes voltando-lhes as costas, rejeitando-os.

É verdade que sempre houve cidadãos de boa fé que se levantaram para defender a justiça — mesmo durante os terríveis anos do nazismo. Mas nunca os houve em número suficiente, enquanto outros, em demasia, a eles se opuseram, ou não tiveram a força e a coragem para se juntarem a eles. As raízes históricas desta situação infeliz eram profundas. Superstições e idéias medievais foram aceitas por tempo demais, e a elas seguiram-se, nos tempos modernos, ideologias racistas de caráter pseudo-científico. Séculos de desprezo e de injustiça deixaram suas marcas nos opressores e nas vítimas, com conseqüências altamente prejudiciais a ambos... aqui está um dos grandes paradoxos da história (...).

Michael Blumenthal (Trecho do discurso proferido por

ocasião da inauguração do Museu Judaico de Berlim, em 9 de setembro de 2001; extraído de “Revista 18”, no 1, ano I, julho de 2002, publicação do Centro da Cultura Judaica da Casa de Cultura de Israel, São Paulo, SP)

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SUMÁRIO Introdução 4 Acusações e Massacres contra os Judeus 5 O Cisma Judaico-Cristão: Estabelecendo o Pano de Fundo Judaico 13 Uma Perspectiva Judaica do Novo Testamento 16 Conclusão 18 Apêndices 21 I – Que Jesus Cristo Nasceu Judeu (Martinho Lutero) 22 II – Sobre os Judeus e Suas Mentiras (Martinho Lutero) 23 III – Relatório de H. F. Grabe 27 IV – A Primeira Cruzada – As Perseguições de 1096 (R. Schlomo Bar Shimshon) 29 V – Quadro Cronológico Resumido de Perseguições e Massacres contra Judeus 32 Bibliografia Geral 34

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UM OLHAR JUDAICO SOBRE O NOVO TESTAMENTO: AS ORIGENS JUDAICAS DO CRISTIANISMO

(DAS INCOMPREENSÕES, DOS CONFLITOS E DOS PRECONCEITOS NAS RELAÇÕES ENTRE CRISTIANISMO E JUDAÍSMO)

__________________________________________________________ Ev. Carlos Alberto Moreira (Evangelista da Comunidade Reformada da Paz; Ex-Professor contratado das cadeiras de Cultura, Literatura e Filologia Hebraica na UERJ -Universidade do Estado do Rio de Janeiro em 2001; Ex-Professor das cadeiras de Hebraico, Língua Portuguesa e Geografia Bíblica no STEBAN – Seminário Teológico Evangélico Batista Nacional do Estado do Rio de Janeiro em 2002 e 2003; Professor das cadeiras de Hebraico e Pentateuco no Seminário Teológico Congregacional do Rio de Janeiro desde 2000; Mestre em Língua e Literatura Hebraicas e Cultura Judaica pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo - FFLCH/USP). (Texto-Base das palestras realizadas em 24/07/2002, na “Semana Teológica” do STEBAN -Seminário Teológico Evangélico Batista Nacional do Estado do Rio de Janeiro, realizada na Igreja Evangélica Batista Getsêmani, Olaria, Rio de Janeiro, e em 02/10/2002 no I Seminário de Estudos da Antigüidade Judaica, promovido pela Oficina de Estudos da Antigüidade Judaica, do Núcleo de Estudos da Antigüidade do Departamento de História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ). Introdução

Começo este estudo pela leitura de um documento histórico na vida da igreja cristã, em particular da igreja protestante e reformada, para começarmos a entender como a igreja tem se comportado em relação àqueles que são os depositários iniciais da própria fé cristã, os judeus. Creio que, fazendo assim, estaremos estabelecendo uma perspectiva mais favorável para entendermos que o Cristianismo é devedor do Judaísmo e que as Escrituras cristãs (os livros do Novo Testamento) são, numa avaliação realista e positiva, mais judaicas do que podemos perceber numa leitura mais imediata. O texto em questão, do reformador Martinho Lutero, escrito em 1543 e intitulado “Sobre os judeus e suas mentiras” é uma antítese de outro texto dele, “Que Jesus Cristo nasceu judeu”, de 1523, ou seja, cerca de 20 anos anterior àquele. Esse texto de 1543, que originou toda a reflexão em torno deste trabalho, será o ponto inicial para a discussão do tema proposto, visto que nele se resume toda a carga de ambigüidades, intolerâncias e preconceitos que historicamente marcaram e ainda estão presentes nas relações entre o Judaísmo e o Cristianismo.

(Segue-se a leitura de trechos escolhidos desse texto, que está no Apêndice II deste artigo). Num momento em que o mundo vive um momento de transições, de expectativas, de

relações tão conturbadas, tão confusas, tão desordenadas, o tema que vai ser tratado é extremamente importante e pertinente, pois que os princípios morais e éticos do Judaísmo e do Cristianismo têm permeado e fundamentado durante séculos os padrões de comportamento do mundo ocidental. As relações entre estas duas fés monoteístas têm sido historicamente marcadas por indiferenças, incompreensões, disputas, guerras e massacres, como pôde ser percebido pela leitura do texto de Lutero. Este trabalho tem a intenção de tentar fazer uma abordagem diferente das Escrituras, em especial daquilo que é comumente denominado ‘Novo Testamento’, tentando reparar injustiças, erros históricos e, principalmente, a intolerância religiosa, que tem campeado, principalmente da nossa parte, os cristãos (é preciso se reconhecer isso); no nosso caso, estaremos enfatizando aquilo que o Cristianismo perdeu e tem perdido quando se afastou das suas origens e das suas raízes judaicas. Infelizmente, muito do desconhecimento e da indiferença que o Cristianismo tem demonstrado em relação ao Judaísmo e ao povo judeu tem ajudado a incrementar o anti-semitismo e o racismo, mesmo dentro das igrejas, o que é lamentável; nós todos, judeus e cristãos, sabemos e cremos que a diversidade e a multiplicidade são a marca registrada da criação, de modo que o racismo, o anti-semitismo e toda forma de discriminação são injustificáveis, pois a discriminação, seja ela de que tipo for, é equivalente ao desprezo pelo Criador.

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O filósofo Alfred North Whitehead, falando acerca do povo judeu, observou: “A história judaica, mais do que todas as outras histórias, é composta de tragédias” 1. E são tantas as tragédias judaicas, que é quase impossível citá-las todas. A história judaica é uma crônica sombria, banhada em sangue, dor, angústia e sofrimento. O povo judeu tem sofrido uma história milenar de preconceitos, discriminações, perseguições, massacres e mortes violentas. O que nos importa de perto aqui, neste momento, é que muito desse sofrimento infligido aos judeus têm sido feito em nome de valores e princípios cristãos, muitas vezes em nome do próprio Deus e do próprio Cristo. Durante séculos, a cruz e a espada foram quase irmãs gêmeas. Basta ser lembrado, por exemplo, que os nazistas, quando enviavam milhares de judeus para as câmaras de gás de Auschwitz, Birkenau, Treblinka, Dachau, Bergen-Belsen, Majdanek, Chelmno, Sobibor e outros campos de concentração, inscreviam nas entradas das câmaras esta frase interessante: “Nós os matamos porque vocês mataram nosso Deus”...2

Por isso, antes de se entrar de fato numa abordagem judaica do Novo Testamento, para que fique realçada de verdade a sua judaicidade, nós, cristãos, devemos fazer uma autocrítica do comportamento do Cristianismo em geral em relação ao próprio Judaísmo de onde ele se originou, para nos certificarmos de que a atitude quase sempre hostil dos cristãos em relação aos judeus não se justifica e não procede do verdadeiro Cristianismo. Isto é necessário para desmistificar o imenso número e a imensa variedade de lendas, mitos e mentiras que foram inventadas acerca do povo judeu, com o intuito de provar que eles eram maus por índole, por raça e por nascimento. Acusações e Massacres contra os Judeus

Como já se disse, a história judaica é uma história recheada de incompreensões e tragédias. No entanto, o desconhecimento e a indiferença em relação a essa história peculiar seja, talvez, um dos fatores mais importantes para que o Cristianismo em geral reforce a idéia de que nada tem a aprender com o Judaísmo e, mais ainda, para que se oblitere que a fonte da sua própria história está no Judaísmo.

Já nos primórdios do Cristianismo encontramos na boca de muitos pais da igreja ataques ferinos contra os judeus. Para citarmos apenas dois dos mais importantes: João Crisóstomo (o “boca de ouro”, beatificado pela igreja romana) atacava abertamente os judeus dizendo que ‘eles eram possuídos pelo demônio e que as suas sinagogas serviam de ponto de encontro para os diabos’ 3. A respeito dos judeus que criam em Jesus ele um dia exclamou: “Mantendo ligação com os que derramaram o sangue de Jesus Cristo, como podes sem horror participar da mesa santa e comungar? (...) Que os cristãos que acorrem à sinagoga temam o julgamento final de Cristo!” 4. Outro pai da igreja da mesma época, Gregório de Nissa, ao escrever sobre os judeus os chama de “assassinos do Senhor, matadores dos profetas, rebeldes e odiosos a Deus, insultores da lei, resistentes à Graça, repudiadores da Fé dos seus antepassados, comparsas do diabo, raça de víboras, delatores, caluniadores, obtusos cerebrais, malditos execráveis, lapidadores, inimigos do belo” 5. Já no seu começo, portanto, o 'Cristianismo' procurava reforçar a desfiguração da imagem humana do judeu (na verdade, esse processo já havia se iniciado bem antes do Cristianismo), ao se atribuir a ele um caráter demoníaco6; nos séculos seguintes, seriam acrescentados a essa imagem elementos diferenciadores e até bestiais, como será visto, com o objetivo de separá-lo da raça humana e de anular totalmente a sua individualidade. Esse esvaziamento da sua humanidade, na qual o judeu passou a ser apenas um sem-nome, um não-ser, um número tatuado destinado à morte anônima7, num verdadeiro processo de “coisificação” da vítima, servirá de justificativa posterior para os assassinatos em massa de populações judaicas inteiras.

1 AUSUBEL, Nathan. Conhecimento judaico. Coleção Judaica. Rio de Janeiro: A. Koogan, 1989, vol. II, “Profanação da Hóstia”, p. 686. 2 ROTH, Sidney. Como amar os judeus. São Paulo: Or Chadash, s/d. 3 AUSUBEL, op. cit., vol. I, “Igreja e Perseguição”, p. 366. 4 MARGULIES, Marcos. Os judeus na história da Rússia. Rio de Janeiro: Bloch, 1971, p. 63. 5 Idem, p. 63. 6 SELTZER, Robert M. Povo judeu, pensamento judaico. Vol. I. Rio de Janeiro: A. Koogan, 1990, p. 331. 7 FALBEL, Nachman. Kidush hashem. Crônicas hebraicas sobre as cruzadas. São Paulo: Edusp/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2001, p. 18.

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Uma das acusações históricas mais correntes contra os judeus na Idade Média era a da ‘profanação da hóstia’ 8. Essa era uma acusação que provinha da mentira trágica de que os judeus eram os “assassinos de Cristo” (e, por extensão, “deicidas”, “assassinos de Deus”). Como se não bastasse que eles fossem considerados os únicos culpados pela crucificação de Jesus (Atos 4:27,28 afirma que tanto judeus como gentios, isto é, todos foram culpados pela morte de Jesus), eles eram também condenados por, supostamente, nutrir um ódio mortal por ele. Baseado nessa fantasia, os judeus eram acusados de serem impelidos a continuar e repetir o ato da crucificação, ainda que fosse apenas simbolicamente, através da profanação da hóstia. Quase sempre a acusação era que uma hóstia sagrada fora roubada do altar de uma igreja romana por um judeu ou por um cristão subornado por um judeu com muito dinheiro. Dizia-se que os judeus “perfuravam” a hóstia e infligiam os sofrimentos da crucificação no corpo de Cristo com facas afiadas, agulhas ou outros objetos pontiagudos. A crença popular estimulava essa fantasia, pois se dizia que toda vez que os judeus secretamente espetavam a hóstia, ela, miraculosamente em outro lugar começava a sangrar, como se os seus furos fossem as próprias chagas, as próprias feridas de Cristo. E muitos membros do clero encorajavam o populacho a crer nesse “milagre”, afirmando que ‘a intenção de Deus era expor claramente o crime secreto dos judeus’, para que um castigo severo pudesse ser dado aos “inimigos de Cristo”. Quando esse tipo de acusação acontecia, as multidões ‘cristãs’ se inflamavam, a violência ficava incontrolável e aí aconteciam os massacres, com incêndios e expulsões em massa de uma cidade após outra, pagamentos coletivos de multas enormes impostas à comunidade judaica do local e, com muito mais freqüência, o confisco das suas propriedades (esse era o objetivo básico desses boatos: a expropriação dos bens e das propriedades dos judeus). A turba ensandecida matava, queimava, pilhava, violava mulheres e não poupava nem velhos e nem crianças.

Esse ódio 'teológico' contra os judeus, que estimulava essas iniciativas individuais e locais de atacá-los, e, como foi visto, freqüentemente lideradas por clérigos mais exaltados 'em defesa de Cristo', atendia também muitas vezes, como já foi dito e se pôde perceber, a interesses materiais imediatos de autoridades seculares que precisavam regularizar as suas finanças às custas do dinheiro dos judeus. Assim, semelhantemente à acusação de “profanação da hóstia sagrada”, havia outra associada a ela, que também se originava da ficção do judeu “assassino de Cristo” e que envolvia o derramamento de sangue cristão: era a acusação de ‘assassinato ritual’ 9. Esta acusação, assim como a anterior, era usada intencionalmente como instrumento de extorsão aos judeus, da mesma forma como o foram as permanentes ameaças de expulsão dos lugares em que viviam10. Havia uma crença popular segundo a qual havia uma exigência da ‘vingativa’ religião judaica, de que uma criança cristã deveria ser assassinada num ritual secreto que envolvia a reencenação da crucificação de Jesus. Nessa cerimônia, os judeus supostamente derramavam o sangue da vítima assassinada numa bacia e — assim dizia a superstição — usavam-no no ritual de fabricação das matzot (twum) (os pães asmos, pães sem fermento) para a festa de Pessach (xop) (a Páscoa judaica). Dizia-se também que os judeus faziam isso para se livrarem do ‘fedor judaico’ que emanava dos poros dos seus corpos. Na onda da histeria coletiva e da selvageria que se seguia a essas acusações, em que qualquer criança cristã desaparecida era uma potencial vítima dos ‘cruéis e sujos assassinos de Cristo’, os judeus eram torturados e obrigados a confessar seu crime. Muitos eram ultrajados, enforcados e massacrados, outros eram esquartejados e queimados vivos. E tudo isso, lembramos, era feito em nome de Jesus. Muitas comunidades judias, quando, apesar de lutando por suas vidas e enfrentando os seus atacantes, viam que a situação era irremediável, pois seus recursos de autodefesa se esvaíam, suicidavam-se coletivamente (ato que era chamado de Kidush Ha’shem, Msh swdyq, ‘santificado ao Senhor’), para não cair nas mãos da turba descontrolada, estimulada pelas autoridades religiosas e políticas. O Kidush Ha'Shem não era simplesmente um ato desesperado de auto-sacrifício, em que os judeus matavam seus entes mais queridos, incluindo filhos, esposas, parentes e amigos, para não caírem nas mãos dos inimigos. Além de um ato de coragem, seu significado religioso mais profundo era a questão imperiosa de se

8 AUSUBEL, op. cit., vol. II, “Profanação da Hóstia”, pp. 686-687. 9 AUSUBEL, op. cit., vol. I, “Assassínio Ritual”, pp. 57-61. 10 FALBEL, op. cit., pp. 21-22.

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manterem dentro da sua fé e da fidelidade ao Deus de Israel11. É digno se lembrar que havia cristãos que acolhiam judeus e os mantinham escondidos; mas isso não era a regra e sim, a exceção. No mais das vezes, em todo lugar em que se refugiou algum judeu para se salvar da morte, alguém o denunciou. Estas acusações de assassinato ritual, por incrível que possa parecer, continuaram até o recém terminado século XX, com fatos relevantes acontecidos na Rússia e nos Estados Unidos.

Que os judeus quisessem torturar a massa da hóstia só faria sentido se eles acreditassem que Jesus realmente está presente nela (o que, obviamente, não é o caso). Da mesma forma, a idéia de sangue humano ser utilizado como ingrediente para fabricação da matzah (hum), além de ser um absurdo teológico (a própria Torah [hrwt] proíbe se comer sangue [Levítico 3:17, 7:26, 17:10-14; Deuteronômio 12:16, 15:23]), reflete o conceito da igreja romana da transubstanciação, em que os elementos da Ceia, o pão e o vinho, tornam-se o corpo e o sangue de Cristo (um outro absurdo).

Os ecos desse ódio contra os judeus podem ser encontrados também na literatura. Em seu Canterbury Tales ('Contos de Canterbury'), o poeta inglês Geoffrey Chaucer (1340-1400) reflete no 'Conto da Prioresa' a visão cristã preconceituosa da maneira de viver judaica, ao relatar como “os judeus se enfureciam quando um jovem cristão passava por seu bairro cantando um hino cristão”.

A Serpente, nossa primeira inimiga, que tem seu ninho de vespões nos corações dos judeus, bufou e disse: “Ó povo hebreu, é justo que um simples menino, tal como lhe dê na cabeça, passe por vossas ruas e lance sobre vós o desprezo? E cante com esse fim por uma causa que é contra a reverência de vossas leis?”... A partir de então os malditos judeus conspiraram para tirar do mundo o inocente menino. Contrataram adrede um assassino que tinha um esconderijo numa viela. E quando o menino chegou com seu passo infantil, os judeus agarraram-no à força e cortaram-lhe o pescoço, e lançaram seu corpo a um poço. E digo, atiraram o menino a uma fossa onde esses judeus exoneraram os intestinos.

Ó povo amaldiçoado, que não mudou desde o tempo de Herodes, que pensais lucrar com vossos pérfidos desígnios?

No mesmo conto, quando, por milagre, o suposto crime é revelado

O magistrado imediatamente sentenciou todos os judeus à morte com

tormentos e com opróbrio12.

Quando no início do século XIII, as propriedades da igreja romana estavam caindo em mãos de judeus por falta de pagamento, o papa Inocêncio III, um dos mais poderosos da Idade Média e um dos que mais propôs restrições ao status judaico, instituiu a doutrina segundo a qual os judeus tinham o direito de sobreviver, mas só em perpétua servidão.

O Senhor fez de Caim um andarilho e fugitivo na terra, mas impôs-lhe uma marca... para evitar fosse morto por alguém que o encontrasse. Assim os judeus, contra os quais clama o sangue de Jesus Cristo, se bem não devam ser mortos, a menos que o povo cristão esqueça a Lei Divina, teriam de viver como nômades para continuar na terra, até se cobrirem de vergonha e buscarem o nome de Jesus Cristo, nosso Senhor. Eis porque os blasfemos do nome cristão não deveriam ser ajudados por príncipes cristãos a oprimir os servos do Senhor, mas ao contrário deviam ser forçados à servidão de que se tornaram merecedores quando ergueram a mão sacrílega contra Aquele que veio dar-lhes a verdadeira liberdade, e assim fizeram recair Seu sangue sobre eles e seus filhos13.

11 FALBEL, op. cit., pp. 20-21. 12 MORRISON, Theodore. The portable Chaucer. New York: Viking Press, 1949, pp. 182-185. In: SELTZER, op. cit., vol. I, pp. 331, 332. 13 GRAYZEL, Solomon. The church and the jews in the thirteenth century. New York: Hermon Press, 1966, pp. 105-107. In: SELTZER,op. cit., vol. I, p. 334.

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No século XIII, a expectativa de vida era em geral muito baixa, mesmo em relação aos padrões de hoje nas áreas menos desenvolvidas. Chegava normalmente aos 35 anos na Inglaterra e na França e ia baixando ligeiramente entre as populações germânicas da Europa Central e entre os eslavos e os nórdicos. A mortalidade infantil era tão alta na Europa que a média de vida na Suécia era de 18 anos. Isto era devido às condições perigosas da vida diária daquele tempo, em que as guerras, os assaltos e as crueldades eram freqüentes. Mas um fator tão ou mais importante do que esses era a falta de higiene e de cuidados médicos, além da fome e das epidemias, que eram comuns na Europa medieval. Nesse período, os judeus já viviam confinados nos guetos, e nele, os judeus, separados do convívio social externo, mantinham uma convivência sexual sadia e regular, baseada nas leis religiosas mosaicas. O padrão de higiene pessoal e social dos judeus estava muito acima da média dos padrões gentios. Havia padarias e matadouros exclusivos da comunidade judaica; não tocavam em qualquer alimento sem antes lavar as mãos, não comiam frutas estragadas, lavavam-se após visitas a cemitérios ou à casa de enfermos. Por serem também proibidos de tomarem banhos nos rios, para não poluírem com seus corpos ‘fedorentos’ as águas usadas pelos cristãos, nos guetos havia os banhos públicos. Por causa disso, os judeus, além de procriarem mais, sofriam menos doenças. E aí surgiu a superstição de que os judeus estavam mancomunados com o demônio, por não morrerem de epidemias. A sobrevivência dos judeus, apesar das perseguições e das doenças, era considerada pelas populações medievais como sobrenatural e diabólica14. As suas capacidades sexuais e de sedução eram cercadas de mistério, por causa do seu suposto ‘contato com o diabo’. A presença constante de judeus idosos numa época em que a idade limite normalmente alcançada pelas populações cristãs era muito baixa reforçava a imagem destoante e apavorante do judeu, como a personificação do estranho, do misterioso, do estrangeiro, do ameaçador, do mágico e do traidor.

Nos meados do século XIV eclodiu na Europa a pior e a mais violenta epidemia de toda a sua história. Muitos historiadores afirmam com convicção que a epidemia era a peste bubônica, trazida nos navios dos mercadores genoveses, e que se alastrou pela Europa inteira numa velocidade incrível15. A virulência da doença foi tão grande e tão violenta que uma crônica da época afirmou que ‘de cada mil homens, mal sobreviveram algumas dezenas’ 16. Na Alemanha cerca de 50% da população foi ceifada pela epidemia. Mais uma vez, os culpados eram os judeus, ‘que queriam destruir a cristandade’. Acusados de terem envenenados os poços com uma mistura de partes animais e humanas e massa da hóstia sagrada17, todos os judeus dos países teutônicos foram queimados vivos no ano de 1348. As próprias autoridades municipais assumiram a organização e a supervisão da execução dos ‘seus’ judeus, e, antecipando-se ao massacre, preparavam de antemão a divisão dos despojos, de modo que os judeus, não colhidos pela peste, eram assassinados. Os principais instigadores da matança eram os flagelantes, bandos de fanáticos religiosos que iam de cidade em cidade chicoteando-se e espancando-se entre si, para expiar os pecados da cristandade. As comunidades judaicas que não abandonaram seus lares e seus bens e não fugiram em direção ao leste, tentavam eventualmente se defender, mas quando percebiam que isso era impossível, preferiam o martírio (Kidush Ha’shem) à apostasia18.

Escorraçados e expulsos de todos os lugares onde viviam, os judeus eram vistos com desconfiança e com ódio em todo o mundo, justamente por serem judeus, por serem os ‘assassinos de Cristo e de Deus’, apesar de o próprio Jesus Cristo ter sido, na carne, um judeu. A culpa que o judeu carregava sobre si era a sua própria existência. A vulnerabilidade e o isolamento do indivíduo judeu o colocavam numa situação em que a sua sobrevivência dependia, em última instância, dos caprichos e da boa vontade dos príncipes e das autoridades políticas e religiosas dos locais em que viviam (e em que, muitas vezes, eram apenas tolerados). Uma situação de estabilidade podia ser transformada de um momento para o outro, dependendo da maior ou menor simpatia e tolerância dos governantes para com os judeus. O 14 MARGULIES, op. cit., pp. 107-108. 15 Idem, p. 168. 16 SCHEDEL, Hartman. Das buch der cronicken und gedechtnys (Liber chronicarum). Nuremberg: Anthon Koberger, 1493, p. 33. In: MARGULIES, op. cit., p. 22. Alguns estudiosos modernos sustentam que possa ter matado mais de um terço da população da Europa. 17 SELTZER, op. cit., vol. I, p. 336. 18 Idem, p. 337.

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estereótipo negativo do elemento judeu, profundamente enraizado na civilização européia, tinha uma espécie de força própria que estava fora dos padrões racionais de explicação, permanecendo na mente coletiva e no folclore popular até nos lugares em que não havia mais judeus e infectando os países em que ainda eram considerados gente valiosa19.

Na ‘Santa’ Inquisição espanhola, a igreja e a coroa renovaram suas acusações de que os judeus matavam as crianças cristãs para a Páscoa, apesar de saberem que era proibido aos judeus, de acordo com as leis mosaicas, comer sangue. Como taberneiros e destiladores de álcool, eles eram acusados de envenenar as almas dos fiéis. Comerciando com gado, dizia-se, ‘matavam, por mágicas, bezerros nos ventres das vacas’. Como jardineiros que tomavam conta dos pomares, ‘lançavam mau-olhado nos campos’. As conversões forçadas ao Cristianismo geraram uma multidão de “cristãos novos”, também conhecidos popularmente como “marranos” (que quer dizer 'suínos', 'porcos'), na verdade, judeus disfarçados que continuavam secretamente a professar o seu Judaísmo. Descobertos, eram denunciados e entregues às autoridades religiosas e seculares para serem queimados vivos. Assim, os judeus “hereges” eram expostos publicamente aos insultos da multidão, em trajes ridículos ou numa roupa específica para execução chamada sambenito20, depois de serem torturados, para ‘confessarem’ seus crimes. Ganhou notoriedade a figura do religioso Tomás de Torquemada, por sua sagacidade em experimentar os mais diversos métodos de tortura. José Saramago, escritor português, prêmio Nobel de literatura em 1998, descreve em seu livro Memorial do Convento o grande espetáculo público que eram os autos de fé, com os condenados indo atrás do cortejo. A cidade parava para ver a grande procissão em que “estes germes malditos de Satanás, blasfemadores de Deus, inimigos de Cristo, soldados do demônio” — como os descrevia um cronista da época21

— eram queimados vivos. A multidão nas janelas se deliciava e se excitava com o cheiro de carne queimada que subia e tomava conta dos ares da cidade de Lisboa22. Em 1492 os judeus foram expulsos da Espanha e, logo depois, de Portugal em 1497. Os que ficaram, foram obrigados a se batizarem.

Um dos países em que a perseguição contra os judeus foi mais cruel e implacável foi na Polônia. Em 1653, Nathan ben Moshe Hannover, que salvou a sua vida fugindo para Amsterdam, publicou em Veneza um livro chamado Éven Metsulah (hlwum Nba)(Pedra do Abismo), onde relata vários massacres perpetrados pelos cossacos contra as comunidades judaicas. Os cossacos eram povos nômades, antigos camponeses que passavam pelas fronteiras da Rússia e da Polônia para formar acampamentos de guerreiros nas ainda selvagens estepes do sudeste da Ucrânia e sul da Rússia. No início do século XVII eles foram empregados como tropas pelo governo polonês para defender a fronteira contra os tártaros23; mais tarde foram recrutados para formarem um corpo especial da cavalaria russa. Nesse livro, escrito em hebraico, ele informa ao mundo como os judeus eram assassinados no leste da Polônia:

Muitas comunidades além do Dnieper e perto do campo de batalha, como Pereyaslaw, Baryszowka, Piratyn e Boryspole, Lubin, Lachowce e seus vizinhos, que não puderam escapar, pereceram pela santificação do Nome (al Kidush HaShem). Essas pessoas tiveram mortes cruéis e amargas... eram esfolados vivos, arrancavam-lhes a pele e a carne jogavam aos cães; cortavam-lhes as mãos, decepavam-lhes os pés e deixavam à morte os corpos nas estradas assim mutilados, só para serem destroçados pelos carros e esmagados pelos cavalos; a alguns se infligiram ferimentos e os atiraram na rua para que morressem de morte lenta; contorciam-se em sangue até o último suspiro; outros eram enterrados vivos. O inimigo massacrou crianças no colo de suas mães; rasgavam-nas pelas pernas, cortavam-nas em fatias como peixes; abriam ventres de mulheres grávidas e com o feto que arrancavam batiam no rosto das vítimas... algumas crianças foram perfuradas por lanças, assavam os nenês no

19 SELTZER, op. cit., vol. I, p. 339. 20 20 PUTEK, Jozef. Mroki sredniowiecza. Obyczaje, przesady, fanatyzm, okrucienstwa i ucisk spoleczny w Polsce

(“Trevas medievais. Costumes, preconceitos, fanatismo, crueldade e opressão social na Polônia”). Cracóvia:

Wydawnictwo Literackie, 1966, p. 340. In: MARGULIES, op. cit., p. 226. 21 21 GOMES, Hilario. Las sectas russas. Madrid: Consejo Superior de Investigaciones Científicas, Departamiento de Cultura Internacional, 1949, p. 24. In: MARGULIES, op. cit., p. 142. 22 SARAMAGO, José. Memorial do convento. 21

a ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998, pp. 47-55.

23 SELTZER, op. cit., vol. II, p. 768.

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fogo e então as traziam a suas mães e obrigavam-nas a comer a carne de seus rebentos; a muitas punham gatos vivos nos ventres abertos e costuravam o corpo com o gato dentro, cortando das mulheres os braços, para que não pudessem arrancar o animal, nem dar cabo à sua existência...Muitas vezes usaram os corpos das crianças judias como pontes improvisadas sobre as quais mais tarde atravessaram...

...a um arrendatário judeu, que chamava atenção por sua corpulência, os cossacos abriram o ventre e cortaram a gordura, introduzindo-a em sua boca, exclamando: “Aqui tens a gordura que adquiriste com o trabalho de nossas mãos!” Depois cortaram-lhe a pele das coxas em tiras e disseram: “Eis porque nos fizestes flagelar com as tiras de couro!” Os cossacos se acercaram de um adolescente e na presença do seu pai começaram a empurrá-lo com lanças, como se joga bola. Ocorreu pois a um deles que não seria bom torturar deste modo o filho perante o pai e então cegaram o homem antes de prosseguir torturando o filho...

...poupavam só as virgens e as mulheres bonitas, depois de as estuprarem, tomando-as como servas ou como concubinas... enforcavam os judeus... e aos cadáveres amarravam cães, deixando que perecessem juntos... Rolos da Lei foram rasgados em pedaços e transformados em botas e sapatos para seus pés... alguns foram usados para fazer fogueiras e outros para rechear os canos de suas armas. Os ouvidos zumbem ao ouvirem isso24.

O mesmo relato se ouve do famoso historiador russo Simon Dubnow:

A matança era acompanhada de bárbaras torturas. As vítimas eram

escalpeladas vivas, abertas ao meio, mortas a pauladas, queimadas em braseiros ou fervidas em caldeirões. Nem crianças de peito eram poupadas... A ordem era aniquilá-los [os judeus] e a mínima demonstração de piedade era considerada traição. Bêbados, frenéticos, os cossacos dançavam sobre os Rolos Sagrados retirados das sinagogas. Em seguida, deitavam os judeus sobre os Rolos e aí os massacravam impiedosamente. Milhares de crianças judias foram jogadas em poços ou enterradas vivas25.

Já naquela época era difícil acreditar nos relatos de Hannover, assim como foi difícil para

muitos acreditar que Auschwitz fosse possível em pleno século XX. Nesse e em outros campos de concentração, experiências como as descritas acima se repetiram. Joseph Mengele, o “anjo da morte”, parece ter lido e aprimorado essas experiências.

Em outra parte do seu relato, Hannover fala como pereceram os judeus da cidade de Niemirow nas mãos do sanguinário líder cossaco Bogdan Zinov Chmielnitski (1593-1657):

O tirano Chmielnitski — que seja apagado seu nome — ouviu que muitos judeus se haviam reunido na comunidade sagrada de Niemirow e que levaram muita prata e ouro. Ele também sabia que a congregação de Niemirow se distinguia por suas riquezas. Era uma comunidade grande e importante, símbolo de justiça, moradia da virtude, comunidade de sábios e escritores, porém agora foram mortos todos!

Então Chmielnitski — que seja apagado seu nome — mandou um certo líder, inimigo dos judeus, e com ele aproximadamente 600 espadachins contra esta nobre congregação. Além disso, ele escreveu aos magistrados da cidade que lhe ajudassem; a isto os citadinos replicaram prontamente que ajudariam com toda a sua força e vigor, não tanto por seu amor aos cossacos, mas por causa de seu ódio aos judeus...

Assim que os portões foram abertos, os cossacos entraram com as espadas desembainhadas e os habitantes da cidade também, com espadas, lanças e foices, e alguns apenas com clavas, e eles mataram os judeus em grande número. Violaram

24 DUBNOW, Simon. História universal del pueblo judío. Versión castellana de Leon Dujovne. Buenos Aires: Sigal, tomo VII: La edad moderna, p. 35; SCHIPPER, Itzhak. Beit Israel be’Polin mi-iamim rishonim vead le-imot ha’khurban (História da economia dos judeus da Polônia e Lituânia desde os primeiros dias até a divisão do país). In: SCHIPPER, Itzhak. Os judeus na Polônia desde os primeiros dias até a destruição. Jerusalém: Ha’histadrut Ha’tsionit Ha’olamit(Organização Sionista Mundial), 1948. In: MARGULIES, op. cit., pp. 226-227. Também em SELTZER, op. cit., vol. II, p. 481. 25 DUBNOW, Simon M. History of the jews in Russia and Poland, vol. I, pp. 156-157. In: SELTZER, op. cit., vol. I,pp. 7-8.

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mulheres e moças; porém, algumas das mulheres e virgens pularam dentro do fosso que cercava a fortaleza para que os cossacos não as maculassem e se afogaram na água. Muitos dos judeus que sabiam nadar também pularam dentro da água e nadaram, pensando que pudessem se salvar do massacre. Mas os cossacos (...) atiravam com suas armas dentro do fosso, matando os judeus, até que finalmente a água estava vermelha com o sangue dos mortos...

O Presidente do colégio de rabinos de Niemirow também estava lá. O nome deste sábio, nosso mestre e professor, era rabino Jehiel Michael, filho do nosso professor, rabi Eliézer, de abençoada memória. Jehiel conhecia toda a literatura rabínica de cor. Ele era muito proficiente em todas as ciências conhecidas. Ele tinha pregado ao nosso povo no sábado antes da calamidade e tinha advertido que, se o inimigo viesse — que Deus não o permitisse —, eles não deveriam mudar sua religião, mas sim morrer como mártires. E isto é exatamente o que o povo abençoado fez (...) o número de assassinados e afogados em toda a comunidade de Niemirow foi de aproximadamente 6 mil (...) Que Deus vingue seu sangue! 26

Outro símbolo do ódio contra o judeu como povo e como indivíduo é a lenda do judeu

errante27. Há muitas variantes dessa superstição, como a malhação do Judas (na verdade, o judeu) no chamado sábado de aleluia ou as lendas de animais (especialmente a do gato e a da aranha), em que Jesus é escorraçado por um judeu (ou por um animal), mas, em compensação, é ajudado por um segundo animal. A lenda em si consiste em que Jesus, carregando a sua pesada cruz ao longo da Via Dolorosa, sendo apedrejado, cuspido e ferido pela população judia de Jerusalém, tenta parar para repousar sobre uma pedra. Um judeu, no entanto, enxotando-o, não deixa o Nazareno descansar, exclamando: “Não pares aqui, ‘Rei dos Judeus’, vá em frente. Não repousarás aqui!”. Jesus então, vingativamente, lança uma maldição sobre aquele judeu (e, por extensão [está implícito na lenda], sobre todo o povo judeu), dizendo: “Eu com certeza descansarei, mas tu andarás e não interromperás jamais a tua jornada. Serás um eterno errante e vagabundo sobre a terra!”. E assim, durante séculos, vários poetas, escritores, dramaturgos e contadores de história perpetuaram e tornaram “verdadeira” a imagem sinistra do judeu errante (uma alusão ao exílio judaico), de olhar sombrio e malvado e longas barbas brancas, agiota, usurário, a própria personificação do mal. O próprio vocábulo “judiar, fazer judiação”, muito usado na língua portuguesa tanto no Brasil como em Portugal, virou sinônimo de maltratar, praticar atos de maldade28.

O século XX proporcionou a tragédia mais marcante e sem precedentes, não somente da história judaica, mas também da civilização humana: o Holocausto. A Alemanha, berço de Lutero e do protestantismo, se rendeu aos pés de Hitler e do nazismo anti-semita. Os planos para a eliminação dos judeus foram esboçados por Hitler ainda em 1925, em seu livro Mein Kampf (Minha Luta). O círculo infindável de desgraças, mentiras, mitos e superstições a respeito dos judeus, internalizado em Adolf Hitler, já se podia observar neste livro que revela toda a carga de preconceitos que iria dar origem mais tarde ao nazismo. Nele Adolf Hitler afirma:

Que eles (os judeus) não eram amantes de banho, podia-se assegurar pela simples aparência... Muitas vezes, posteriormente, senti náuseas ante o odor desses indivíduos vestidos de cáftan... A isso se acrescentem as roupas sujas e as aparências acovardadas e tem-se o retrato da raça. De fato, em nada se parecem com os alemães.

Com a eclosão da guerra, sob a omissão e as “vistas grossas” de quase todo o mundo, ele

então passou da teoria à prática. De 1939 a 1941, ou seja, desde o início da II Grande Guerra até a invasão da Rússia, a eliminação dos judeus era feita por um “processo biológico”. Os judeus, encurralados pelos soldados alemães nos guetos, morriam por falta de comida, medicamentos, roupas e higiene. Com a invasão da Rússia, começaram as execuções de judeus de cidades inteiras pelos Einsatzgruppen, os Comandos de Extermínio. Os judeus eram levados para fora

26 SCHIPPER, op. cit. In: MARGULIES, op. cit., pp. 227-228. 27 AUSUBEL, op. cit., vol. I, “Judeu Errante”, pp. 407-409. 28 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio. 2ª ed. rev e ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

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das cidades e fuzilados; após isso, seus corpos desnudos eram carregados em carroças, para serem enterrados em valas comuns ou em pedreiras, homens, mulheres, velhos, crianças, sadios ou doentes29. No final de 1941 a “solução final do problema judaico” começou a funcionar com a primeira fábrica da morte, em Chelmno, Polônia. Os infelizes das cidades tomadas pelo exército nazista eram trasladados em caminhões até as fossas comuns. Esses caminhões tinham uma carroceria fechada, com o cano de escapamento voltado para dentro dela, expelindo assim os gases no recinto fechado. Na maioria das vezes, o motor enguiçava no meio do caminho e demorava para ser recolocado em funcionamento. Os judeus no seu interior inutilmente suplicavam, imploravam, se debatiam; em cerca de 15 minutos de trajeto estavam todos mortos por asfixia. Em 1942 foram instalados os campos de extermínio na Polônia. As grandes indústrias alemãs recebiam encomendas para inventar câmaras de gás e fornos crematórios que fossem sofisticados, eficientes e rápidos. A rapidez não era tanto para poupar o sofrimento dos infelizes judeus, mas para “matar o maior número de pessoas, no menor espaço de tempo possível...” 30. Indústrias de renome mundial até hoje (I. G. Farben, Krupp Kroppers, Siemens) instalaram suas fábricas nas vizinhanças dos campos de concentração, para se aproveitar da mão-de-obra escrava dos prisioneiros fortes, selecionados para os trabalhos pesados. Elas também compravam os despojos dos mortos. Nada era desperdiçado; tudo era aproveitado: cabelos para as indústrias de estofados; ossos moídos e cinzas, para serem usados como fertilizantes; dentes de ouro arrancados e alianças de ouro cortadas com tesouras especiais; gordura humana para as fábricas de sabão; óculos, sapatos, roupas e tudo que pudesse ser aproveitado para a riqueza da “Grande Alemanha”, o “3

o

Reich, que nunca teria fim...”. As indústrias químicas forneciam o famoso gás Zyklon B para as câmaras de gás. Por onde o exército alemão passava, os judeus não eram deixados para trás: eram liquidados friamente; os mais fortes eram transportados nos trens de gado e levados para os campos de concentração e de extermínio na Alemanha e na Polônia. Os prisioneiros se arrastavam, sem comida e sem água, sombras de homens, esqueletos vivos, uma multidão assombrosa de gente moribunda. Quem não podia continuar andar ou continuar trabalhando era sumariamente fuzilado. No campo de extermínio de Birkenau, por exemplo,

... à medida que os caminhões chegavam àquele inferno carregados de crianças e, após as matarem brutalmente a coronhadas, atiravam-nas para dentro do crematório como se fora lixo31.

Os soldados nazistas “jogavam as crianças judias para cima e as alcançavam com suas

baionetas, atiravam nelas para praticar tiro ao alvo, arrancavam as crianças dos braços de suas mães e as lançavam vivas dentro de tubos com gasolina fervente...” 32

Após o final da guerra, no Processo de Nüremberg, Rudolf Ferdinand Höess, comandante de Auschwitz, em seu testemunho, fez a seguinte declaração:

(...) Em junho de 1941, recebi ordens para construir o campo de extermínio em Auschwitz. Para esse fim fui a Treblinka para ver a maneira como funcionava (...) (...) Nossas instalações eram melhores, capazes de exterminar 2.000 pessoas de cada vez, ao passo que em Treblinka, para o mesmo ritmo, eram necessárias 10 câmaras de gás (...) (...) Os que serviam para trabalhar eram mandados para o campo, outros enviados às câmaras de gás. Crianças, velhos e inválidos, sem exceção, eram exterminados. (...) Em Auschwitz enganávamos os que iam morrer, dizendo-lhes que passariam por

um processo de desinfecção, para matar piolhos (...) Com freqüência as mulheres ocultavam os seus filhos sob as pilhas de roupas, mas quando os descobríamos mandávamos exterminá-los (...)33

Neste mesmo processo, Dieter Wisliceny, oficial nazista e subordinado de Adolf Eichmann

29 ABRAHAM, Ben. Izkor (Lembre-se). São Paulo: Parma, 1979, pp. 39-42. 30 Idem, p. 46. 31 CHARMATZ, Konrad. Pesadelos. São Paulo: O Novo Momento, 1976, pp. 134-135. In: FALBEL, op. cit., p. 22. 32 KATZ, Arthur. O Holocausto. Onde Deus estava? São Paulo: Hagnos, 2002, p. 21. 33 ABRAHAM, op. cit., pp. 55-56.

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(que foi capturado por agentes do b”s [Shin Bêth, o serviço secreto israelense] em 1960 na Argentina e condenado à morte na forca em Israel em 1962) testemunhou:

Em 1944, Adolf Eichmann me disse: 'Entrarei rindo na minha sepultura, sabendo que tenho na consciência a morte de 5 milhões de judeus [cifra estimada na época por Eichmann]. Esta é uma satisfação extraordinária' (...)34

A acusação final oficial que foi apresentada ao Tribunal Internacional para os Criminosos

de Guerra Nazistas, realizado em Nüremberg em 1945, logo após, portanto, ao término da guerra, denunciou que

Os assassinatos e maus tratos eram efetuados por diversos meios, inclusive fuzilamentos, enforcamentos, asfixia por gás, inanição, compressão de grande número de pessoas em pequenos espaços, subnutrição sistemática, imposição sistemática de trabalhos forçados além das possibilidades físicas de execução, falhas na provisão de serviços médicos e cirúrgicos, pancadas, surras, brutalidade e tortura de toda sorte... Os nazistas atacaram também até crianças junto com os adultos. Mataram-nas, com seus pais, em grupos e isoladamente. Mataram-nas em lares para crianças e em hospitais, enterrando-as vivas em sepulturas, lançando chamas, apunhalando-as com baionetas, envenenando-as, fazendo experiências com elas, extraindo-lhes o sangue para usar no Exército Alemão, lançando-as em prisões e câmaras de tortura da Gestapo e em campos de concentração, onde as crianças morriam em conseqüência da fome, da tortura e de doenças epidêmicas35.

Toda essa descrição de difícil digestão e dolorosa de se ouvir feita até aqui, que é apenas

um breve resumo de todas as atrocidades cometidas contra o povo judeu, feitas em nome de concepções equivocadas de religião, de Cristianismo, de Deus e de Cristo, nos servirá para demonstrar a necessidade de reconhecermos as raízes judaicas da fé cristã e o quanto ela é incompatível com qualquer demonstração de desprezo, de discriminação, de ódio, de preconceito e até de desconhecimento em relação ao Judaísmo e ao que temos a aprender com ele. O Cisma Judaico-Cristão: Estabelecendo o Pano de Fundo Judaico

Todo o repertório de perseguições e massacres sofridos pelo povo judeu através dos séculos se torna tanto mais surpreendente quanto mais se percebe que era feito por razões religiosas e raciais; e que aqueles que acusavam e maltratavam os judeus o faziam numa suposta defesa do Cristianismo contra as heresias e as maldades dos judeus. Não é de admirar que os judeus tenham, por muito tempo, visto o Cristianismo como uma aberração do Judaísmo e que até hoje, em sua grande maioria, tenham a Jesus como um falso messias (pois, alegam a maioria deles, apesar de Jesus até poder ter sido um grande homem, a maior prova de que ele não seria o Messias de Israel é que, em nome dele, milhões de judeus morreram ao longo da história, em todas as partes do mundo, e o Messias, ainda segundo eles, nunca viria para trazer a desgraça para Israel). Assim, como pode ter acontecido que algo que começou num ambiente e num contexto histórico, cultural e social tão judaico tenha se transformado muitas vezes em uma forma de anti-judaísmo, anti-semitismo ou mesmo na própria negação do Judaísmo? Mesmo nos círculos mais favoráveis ao Judaísmo dentro do Cristianismo tem sido encontrado aqui e ali discursos anti-semitas camuflados ou disfarçados de simples antipatias pessoais.

Esta questão é pertinente, pois Jesus era judeu, nascido de mãe judia. Os seus primeiros discípulos eram judeus, os apóstolos eram judeus; Paulo, o apóstolo dos gentios, era judeu. O Cristianismo nasceu como uma simples seita judaica, pois os primeiros cristãos eram judeus. Segundo Atos 21:20, somente em Jerusalém os judeus cristãos chegavam “a dezenas de milhares... todos zelosos da Torah (hrwt)”. Eram, contudo, ainda aceitos pelo restante dos judeus como fazendo parte da comunidade judaica.

34 ABRAHAM, op. cit., pp. 55-56. 35 AUSUBEL, op. cit., vol. II, “Nazistas”, p. 607.

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Em princípio, o Cristianismo nascente se enquadrava no quadro geral da vida judaica de então, como mais um dos movimentos messiânicos e apocalípticos que grassavam na Judéia. Eram movimentos que giravam em torno de ‘professores’ carismáticos ou pietistas, os famosos mestres rabínicos, fariseus, muitos deles tidos como profetas36. O Cristianismo debatia assuntos e lidava com questões religiosas que estavam, de fato, no roteiro do Judaísmo rabínico (ou seja, farisaico), de modo que é injusto e até errado se dizer que Jesus fazia oposição sistemática aos fariseus como grupo. Na verdade, é justo dizer, toda a prática diária de Jesus era farisaica, embora o termo “fariseu” (do termo hebraico srp, ‘parash’, separar; daí, swrp, ‘parush’,

separado, fariseu, e Myswrp, ‘prushim’, separados, fariseus) tenha passado para a história com uma carga de significados totalmente negativa (o hipócrita, o mentiroso, o falso religioso, etc.), por causa das famosas discussões de Jesus com alguns deles, transcritas principalmente no evangelho de João. A regra de ouro “Ama a teu próximo como a ti mesmo” (extraída de Levítico 19:18) já era o imperativo ético do grande Rabi Hillel, um fariseu, cerca de 30 anos antes de Cristo. Apesar de todas as disputas entre eles, por incrível que possa parecer, os cristãos primitivos compartilhavam os mesmos princípios dos sábios fariseus. Nicodemos, José de Arimatéia e muitos outros seguidores de Jesus eram fariseus (Mateus 27:57, Marcos 15:43, Lucas 23:50, João 3:1, 19:38, 39).

No ano 70 explodiu a primeira revolta dos judeus contra Roma; os judeus cristãos fugiram para a cidade de Pella (recordando-se da profecia de Jesus em Lucas 21:20-24) e assim, conseguiram escapar da destruição do templo (do qual não ficou pedra sobre pedra, conforme profetizado em Mateus 13:1,2, 24:2, Lucas 19:41-44, 21:6) e da mortandade de cerca de um milhão de judeus (segundo o historiador judeu Flávio Josefo, testemunha contemporânea dos fatos), impostas pelo exército romano liderado pelo general Tito Flávio, filho do imperador Vespasiano. Por causa disso, os zelotes, que lideravam a rebelião, passaram a considerar os judeus cristãos (hoje denominados judeus messiânicos) como traidores37.

Com a destruição do templo, os mestres farisaicos rabínicos se reagruparam e estabeleceram as bases do Judaísmo rabínico, o judaísmo que não estava mais estabelecido sobre bases sacrificiais, mas sim sobre as boas obras. Para eles, estava claro que o Cristianismo representava uma ameaça ideológica e religiosa. A bênção de proteção contra os judeus hereges (em hebraico Mynymh tkrb, Birkat ha’Minim) foi estendida aos judeus cristãos, ou melhor, aos judeus messiânicos (isto por volta do ano 90), que foram impedidos de servirem nas sinagogas, uma prática que é abundantemente mencionada no Novo Testamento e nas fontes cristãs primitivas. Várias leis foram adaptadas para separar o povo judeu dos judeus que criam em Jesus e das recém nascidas Escrituras cristãs. Isto deixava claro para todos que os primitivos rabis consideravam o Cristianismo uma heresia e que a sua prática era proibida aos judeus. Em especial, as reivindicações da messianidade e da divindade de Jesus reforçavam a visão judaica que considerava o Cristianismo como um grande e irremediável afastamento do judaísmo38.

Com o tempo, os cristãos se tornaram cada vez mais de natureza gentia, principalmente depois das decisões formalizadas pelo primeiro concílio da igreja cristã, realizado em Jerusalém (registrado em Atos 15:1-29), e dos resultados da pregação do apóstolo Paulo (lwas, Shaul em hebraico). Aliás, quando Shaul escreveu a sua carta aos Romanos (por volta do ano 57), a maioria dos judeus já rejeitava Jesus como Messias39. Para os rabinos, aqueles judeus que criam em Jesus passaram a ser vistos agora como não-judeus e não mais apenas como judeus hereges. Além disso, o Cristianismo passou a ser a religião de pagãos incircuncisos, isto é, que não tinham ascendência judaica e não haviam se convertido ao judaísmo, como eles entendiam ser necessário pela lei judaica. A bênção de proteção contra os Minim (judeus hereges) era agora estendida aos Notzrim (Myruwn, Nazarenos em hebraico), os cristãos gentios, significando que o Cristianismo era considerado uma religião separada, cujos seguidores, mesmo que tivessem 36 SCHIFFMAN, Lawrence H. Na encruzilhada: o cisma judaico-cristão. Trad. Pedro von Werden. New York: Gesher, 2001, “O Surgimento da Cristandade”. 37 STERN, David H. Manifesto judeu messiânico. Rio de Janeiro: Edições Louva-a-Deus/Comunidade Emanuel, 1989, p. 48. 38 SCHIFFMAN, op. cit., “Evidência da auto-definição judaica e cristã”. 39 SCHIFFMAN, Lawrence H. Who was a jew? Rabbinic and halakhic perspectives on the jewish-christian schism. Hoboken, New Jersey: KTAV Publishing House, 1985. In: STERN, op. cit., p. 48.

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ascendência judaica, não eram mais considerados judeus40. Mas o ponto de rompimento definitivo entre o Judaísmo e o Cristianismo, mais

especificamente entre os judeus-messiânicos (os judeus cristãos) e os assim chamados judeus-rabínicos, se deu por volta dos anos 132 a 135. Entre esses anos, num período de grande turbulência e de insurreição nacional da Judéia contra Roma, o Rabi Akiva, um líder religioso de grande prestígio, exegeta, místico e sistematizador de leis, proclamou o líder militar Shimon

Bar-Kozeva (abzk rb Nwems) (ou seja, proveniente da cidade de Kozeva, citada em I Crônicas 4:22) rei e messias de Israel41. O Rabi Akiva era a figura mais eminente e criativa do Judaísmo nas primeiras décadas do segundo século42. Ele simbolicamente transformou o nome de Bar-Kozeva em Bar-Kochvah (hbkwk rb) (em aramaico ‘Filho da estrela’, baseado no texto de Números 24:17, que diz:”Surgirá uma estrela de Jacó, um cetro se levantará em Israel”). Essa nova luta nacional judaica por sua independência e salvação nacional já vinha sendo preparada conscientemente na academia religiosa em Bnei Brak (qrb ynb, ‘filhos do relâmpago’) desde a destruição do templo de Jerusalém em 70 e contava com a participação ativa de Rabi Akiva.

No início, os judeus cristãos ficaram ao lado da insurreição, mas após a declaração de Akiva já não podiam mais apoiar nem cooperar com tal empreitada43. Os judeus-messiânicos já se consideravam salvos por aquele que eles acreditavam ser o Messias, Yeshua Ha’mashíach

(xysmh ewsy); um Messias, segundo eles e segundo a nova compreensão que eles tinham das Escrituras hebraicas, não apenas para o povo judeu, mas para todo o mundo. Jesus, ou melhor, Yeshua, havia nascido cerca de 100 anos antes, tendo seu nascimento também acompanhado pelo aparecimento de uma estrela. Por causa disso, não podiam aceitar nem jurar fidelidade a nenhum outro salvador, muito menos apoiar alguém que estava envolvido numa ação militar, uma revolta messiânica para salvar — política e não espiritualmente — uma só nação. Isto constituiu a gota d’água para os judeus rabínicos, que finalmente, tinham todos os motivos para considerarem seus irmãos, os judeus messiânicos, como hereges e traidores e se fecharem contra eles. Por sua vez, a derrota dos revoltosos diante de Roma foi a melhor prova para os judeus messiânicos de que eles estavam com a razão.

Os romanos temiam a eclosão de uma revolta judaica, porque as características até então missionárias do judaísmo eram um perigo para o império; segundo Fílon, escritor judeu da comunidade de Alexandria, no Egito, mais do qualquer povo bárbaro, a revolta judaica ameaçava a pax romana em toda a Europa, pois já havia grandes comunidades judaicas por lá. É por isso que Rabi Akiva fazia viagens missionárias às comunidades judaicas dispersas de todo o mundo, como as que fez Paulo de Tarso, num verdadeiro apostolado nacional, pregando abertamente em todas elas o inconformismo e a revolta contra Roma. Um historiador romano da época, Dio Cassius Cocceianus, conta o desfecho dessa guerra judaica contra os romanos:

Quando toda a Judéia se movimentou e os judeus em todas as partes do mundo se agitaram, (...) [o imperador] Adriano mandou contra eles seus melhores generais, com Júlio Severo, retirado da Bretanha, como chefe, para se encarregar da guerra contra os judeus. Ele não ousou atacá-los de frente, vendo seu número e desesperada resistência. Pegava-os em grupos, cortava-lhes os víveres e pôde assim, lenta mas gradualmente, esgotá-los e exterminá-los. (...) 50 de suas melhores fortalezas, 985 de seus burgos foram arrasados, 580 mil homens pereceram nos combates; e de quem pereceu de fome, doença e fogo, é incalculável o número. Por bem pouco, a Judéia toda transformou-se num deserto44.

Os judeus ficaram desapontados com sua derrota. Os romanos proibiram oficialmente

todos os judeus de entrarem ou se reunirem em Jerusalém, agora chamada de Aelia Capitolina. O imperador Adriano proibiu a prática do Judaísmo em toda a Terra Santa e todos os sábios que

40 SCHIFFMAN, Na encruzilhada: o cisma judaico-cristão, “Evidência da auto-definição judaica e cristã”. 41 MARGULIES, op. cit., p. 56. 42 SELTZER, op. cit., vol. I, p. 226. 43 STERN, op. cit., p. 48. 44 CASSIUS, Dion. Romaica (História de Roma), vol. 48, p. 32 e vol. 49, p. 12-15. In: FAU, Guy. Le dossier juif: Rome contre les juifs. Paris: Union Rationaliste, 1967. In: MARGULIES, op. cit., p. 58.

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apoiaram a guerra de Bar Kochvah foram executados, inclusive Akiva, que foi torturado até a morte45. O nome Bar Kozeva passou a significar “filho da mentira” (da raiz hebraica bzk, ‘kazav’, mentir), em alusão ao grande embuste que foi o seu messianismo. Essa derrota marcou o declínio do proselitismo judaico, do ímpeto missionário judaico, até que em cerca do ano 166, o bispo romano Soter pôde finalmente afirmar que o número de cristãos gentios já tinha ultrapassado o de judeus. O Judaísmo então se fechou na defensiva contra aquela seita que fora inicialmente considerada herética, e que passara agora a ser também traidora do sentimento nacional judaico. Os cristãos, por sua vez, cada vez menos judeus e mais gentios, transformaram-se no contraponto do judaísmo: uma religião universal. Menos de dois séculos depois, o ‘Cristianismo’ (já desfigurado pela paganização romana) se tornara a religião oficial do império. Os judeus passaram a ser uma ameaça dupla: para o império (pois eram famosos por sua insubmissão a César) e para o Cristianismo (por rejeitarem a Jesus como Deus e Messias).

Começou então um processo de desjudaização do Cristianismo. Não demorou muito e o próprio Jesus foi desjudaizado. Em muitos países onde a igreja e o estado estiveram ligados, até o início do século XX era inadmissível que alguém fizesse referência a Jesus como sendo judeu. Na iconografia, por exemplo, Jesus foi tão desjudaizado na sua aparência que cada grupo nacional e étnico apresentou um Jesus diferente, desde o Jesus de traços arianos e nórdicos, de olhos azuis e longos cabelos loiros, até o Jesus negro da Etiópia46. A igreja destituiu os judeus do seu título de “povo eleito” e se autoproclamou “o verdadeiro Israel” (a teologia da substituição). Toda a herança histórica e cultural judaica do Cristianismo foi então sistematicamente eliminada e apagada; o Cristianismo procurou a partir de então expressar a sua identidade através da deslegitimação e do desdém para com o Judaísmo, reforçando a acusação infame de deicídio e toda a carga de ódio e discriminação contra o povo judeu.

Para o Judaísmo, restava aceitar a saída daquilo que fora parte de sua família e enfatizar seu desacordo com os novos rumos tomados pelo Cristianismo. O Cristianismo, de sua parte (e nisso estamos incluindo todas as suas vertentes, como se pôde perceber na leitura do texto de Lutero), passou a fazer do julgamento negativo sobre os judeus e o Judaísmo uma parte da sua autodefinição47. Por causa das afirmações cada vez mais antijudaicas da igreja, as violências praticadas contra o povo judeu vistas anteriormente foram perpetradas e até justificadas como um dever do próprio Cristianismo. Uma Perspectiva Judaica do Novo Testamento

Se Cristo era judeu, se Paulo era judeu, se os apóstolos eram judeus e se todo o pano de fundo histórico de nascimento e construção do Cristianismo é judaico, nada mais natural do que se tentar ver nos escritos do Novo Testamento, a Brith Hadashah (hsdx tyrb), os reflexos desse Judaísmo latente. Isto não quer dizer que Judaísmo e Cristianismo sejam a mesma coisa (embora a posição deste escritor seja a de que o Cristianismo verdadeiro é o Judaísmo verdadeiro). Também não quer dizer ‘judaizar’ o Cristianismo (no sentido 'negativo' da palavra, o que por si só já consiste um paradoxo, pois, em última análise, o Cristianismo é 'positivamente' judaico). Significa, sim, afirmar que há abundantes evidências internas da “judaicidade” do Novo Testamento dentro do seu próprio texto. Tentaremos demonstrar isso através de algumas poucas e pequenas proposições, que não pretendem esgotar o assunto (por si só infindável), pois não haveria espaço nem tempo para fazê-lo; elas servirão apenas para balizar e introduzir a discussão do assunto:

a) A base do Novo Testamento grego é o Antigo Testamento hebraico; sem ele, é impossível se entender as questões, os problemas e as implicações da vida cultural judaica e do ambiente histórico do Cristianismo primitivo. A teologia e as escrituras que moldavam o modo de pensar e de ver o mundo dos primeiros cristãos eram primordialmente judaicas. A Bíblia inteira, de Gênesis ao Apocalipse, gira em torno da vida e da história do povo judeu. Embora muitos não gostem de ouvir isto, a religião cristã é filha da religião judaica48.

b) A língua é um fato social que, na grande maioria das vezes, sempre foi um veículo 45 SELTZER, op. cit., vol. I, p. 228. 46 AUSUBEL, op. cit., vol I, “Origens Judaicas do Cristianismo”, pp. 210-228. 47 SCHIFFMAN, Na encruzilhada: o cisma judaico-cristão, “Conclusões”. 48 ISAAC, Jules. Jesus e Israel. Coleção Estudos. São Paulo: Perspectiva, 1986, p.3.

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atrelado às questões da nacionalidade. Não é diferente o caso do Novo Testamento. Embora a individualidade judaica não esteja definidamente limitada aos aspectos relacionados com a língua (já que há judeus falando, de fato, as mais diversas línguas do planeta, e não apenas o hebraico), nem à raça (pois há judeus brancos, negros, pardos e até amarelos), nem à nacionalidade (pois há o judeu americano, o brasileiro, o israelense, etc.), os próprios termos encontrados no texto do Novo Testamento comprovam que Jesus, os seus discípulos e todo o ambiente das Escrituras são judaicos. Sua mãe Maria (o nome grego Μαριαν, Marían, é uma helenização do nome hebraico Myrm, Miriam) era judia, bem, como já foi dito, a grande maioria das personagens que aparecem no Novo Testamento. Seus nomes são, em sua maioria, nomes judeus: José (de Powy, Yosséf), Tiago (ou Jacó, de bqey, Yaakov), Simão (ou Simeão, de Nwems, Shim’on), Judas (ou Judá, de hdwhy, Yehudah), João (de Nnxwy, Yohanan), Mateus (ou Matias, Matatias, de whytytm, Matiytiyahu), Paulo (ou Saul, de lwas, Shaul), etc. O nome Jesus, muito comum naqueles tempos, vem das transcrições grega (Ιησους) e latina (Iésus) do nome hebreu ewsy, Yeshua, que já era uma redução de hewswhy, Yehoshuah. O próprio título “Cristo” (Χριστος, Christós) é um equivalente do termo judeu xysm, Mashiach, em português ‘Messias’, ‘ungido, escolhido’. Apesar da língua do Novo Testamento ser o grego (há fortes indícios de que o evangelho de Mateus tenha sido escrito originalmente em hebraico), a língua dos judeus daquele tempo era o aramaico, uma língua muito próxima do hebraico, que era já nesse tempo a língua da liturgia. O aramaico, assim como o hebraico, o ídiche e o ladino são línguas intimamente ligadas à história judaica.

c) Jesus viveu como judeu, misturado com judeus e observando as suas festas e tradições. Como todo homem judeu do sexo masculino, cumpriu aos 8 dias de vida as prescrições mosaicas quanto à circuncisão (a cerimônia de Brith Milah, hlym tyrb [literalmente ‘pacto da palavra’]) (Lucas 2:22-24). Aos 13 anos fez seu Bar-Mitzvah (hwum rb, cerimônia em que o menino judeu é introduzido pela primeira vez à leitura da Torah) (Lucas 2:42). Como todo judeu piedoso, ia comumente à sinagoga no dia do shabat (tbs) (Marcos 1:21. 6:2, Lucas 4:16). Apesar da preeminência dos rabinos fariseus e dos doutores da Torah na explicação da porção diária das Escrituras (a Parashah, hsrp), qualquer judeu instruído podia participar dela e todo judeu que estivesse de passagem podia tomar a palavra e ser convidado a falar à congregação49; era o caso de Jesus. A figura do Maguid rabínico, uma espécie de pregador itinerante, (de dygm, o ‘contador de histórias’) era um tipo popular judaico muito familiar nos séculos XVI e XVII. Entre alguns dos costumes mais difundidos e utilizados por esses pregadores populares estava o da pregação ao ar livre. Jesus era um tipo de maguid do primeiro século.

d) Jesus não veio como um pregador que usava de práticas e artifícios estranhos à sua época. Pelo contrário, ele usou os mesmos métodos empregados pelos grandes rabinos de seu tempo; em outras palavras, ele veio como um verdadeiro judeu. As pregações ilustradas de metáforas, parábolas, alegorias, citações e alusões bíblicas seguiam o mesmo método de elaboração empregado pelos grandes pregadores moralistas das sinagogas e que estavam estabelecidas no Midrash (srdm). Mesmo em suas críticas aos judeus do seu tempo, ele usou de imagens e figuras tipicamente judaicas para demonstrar o seu ensino. Quando de seus embates com alguns líderes rabínicos fariseus, ele usou abundantemente do repertório que os próprios fariseus utilizavam contra aqueles seus colegas “que falavam bonito, mas não agiam bem”. Os rabinos chegavam a zombar e a classificar os vários tipos de fariseus em categorias: o ostentador (o que carregava as suas mitzvot [twum, plural de hwum, mitzvah, ‘mandamento’] nos ombros), o autovalorizante (que bate com os joelhos um no outro dizendo:”Esperem por mim — tenho que cumprir uma mitzvah”), o “que sangra” (aquele que para evitar olhar para uma mulher a fim de não ter pensamentos eróticos, colide desajeitadamente contra a parede e sangra o rosto), o “pilão” (aquele que anda como um pilão de almofariz, com os olhos no chão, fingindo humildade e perguntando: “Indiquem-me mais alguma mitzvah que eu possa cumprir”) e, por fim, aquele que era fariseu apenas porque tinha medo de que Deus o

49 ISAAC, op. cit., p. 46.

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castigasse50. Assim, a impressão superficial de que o Judaísmo daquele tempo era uma religião degenerada e que não passava de um legalismo sem alma não corresponde à verdade dos fatos. A despeito de todo excesso que possa ter existido, tudo nessa época indica a existência de uma intensa e profunda vida religiosa em Israel51.

e) O evangelho de João afirma que Jesus “veio para o que era seu” (João 1:11). Jesus mesmo disse que ele havia sido enviado primeiramente “às ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mateus 10:6, 15:24). Na “grande comissão” dada aos seus discípulos a ordem é que “começassem em Jerusalém” (Lucas 24:27; Atos 1:6-8). Paulo, o apóstolo dos gentios, disse que o evangelho era “primeiro para o judeu” (Romanos 1:16). É interessante observar que tanto a ‘grande comissão’ quanto a anotação de Paulo em Romanos 1:16 vieram depois da suposta “rejeição“ do povo judeu a Jesus. Isto contradiz substancialmente a denominada “Teologia da Substituição”, que afirma que a igreja substituiu Israel e que as promessas de Deus feitas a Israel no Antigo Testamento foram passadas para a igreja. É importante observar também que a “dispersão” judaica (a Golah, hlwg) já era uma realidade nos tempos de Jesus havia séculos. A maior parte do povo judeu já vivia fora de Éretz Israel (larsy Ura, a Terra de Israel). Assim, o povo judeu daquele tempo em sua massa nem sequer conheceu Jesus, o que invalida a tese de que os judeus, como um todo, “repeliram ou rejeitaram” Jesus (insinuação baseada em Mateus 27:25). Antes, o próprio Novo Testamento o atesta, por toda parte por onde Jesus passou — com algumas poucas exceções — o povo judeu que o conheceu o acolheu com entusiasmo52. Mesmo depois da sua crucificação, como já foi visto, a multidão judia dos que o admiravam e se tornaram seus seguidores aumentou significativamente, só sendo alterada essa situação quando os judeus já não podiam mais serem judeus e crerem em Jesus ao mesmo tempo.

f) Pelo menos duas cartas do Novo Testamento são dirigidas diretamente a comunidades judaicas: a Epístola aos Hebreus (1:1) e a Epístola de Tiago (1:1). Muito das incompreensões e das discussões que são feitas em torno dessas duas cartas só existem porque não se leva em conta seu pano de fundo judaico.

g) O papel da Torah dentro do Novo Testamento é ainda motivo de controvérsias e discussões dentro do círculo teológico cristão. Mas a própria existência dessa discussão demonstra que o Cristianismo não é um simples rompimento com o seu fundamento judaico, e nem pode prescindir dele. Pelo contrário, torna-se claro que há uma linha de continuidade na história de ambos os grupos, que precisa ser investigada, estudada e retomada, se todos quisermos sermos coerentes e fazermos justiça à verdade dos fatos. Conclusão

O conhecimento da história das relações entre o Cristianismo e o Judaísmo nos traz algumas reflexões importantes. Uma delas é que não podemos simplesmente fechar os olhos para algumas atitudes e posturas arrogantes e equivocadas que a igreja cristã tem adotado em relação aos judeus no decorrer de dois mil anos de existência formal, se não se quiser ou não se admitir que os fiéis do Antigo Testamento, judeus em sua grande maioria, também faziam parte daquilo que o Cristianismo entende por 'igreja'. Muitos desconhecem que mesmo um nome da envergadura de Lutero, que, numa época de repressão ao livre pensamento foi corajoso e se voltou contra aquilo que a igreja romana instituía como fé cristã verdadeira, tomou posições lamentáveis a respeito do Judaísmo. Ele mesmo chegou a fazer outras afirmações perigosas:

Se encontro um judeu para batizar, conduzi-lo-ei à ponte do Elba, pendurar-lhe-ei uma pedra no pescoço e o empurrá-lo-ei à água, batizando-o em nome de Abraão! Estes canalhas zombam de nós e de nossa religião!...

Espero que jamais serei tão estúpido a ponto de me circuncidar! Prefiro cortar

o seio esquerdo de minha Catarina e de todas as mulheres!...

50 AUSUBEL, op. cit., vol. I, “Origens Judaicas do Cristianismo”, pp. 213-214. 51 ISAAC, op. cit., p. 35-43. 52 Idem, p. 103-130.

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Não posso converter os judeus; Nosso Senhor, o Cristo, não o conseguiu; mas posso lhes fechar o bico, de maneira que não lhes restará outra alternativa senão ficarem dispersos pela terra53.

Os argumentos e as posições de Lutero, indubitavelmente um campeão da fé, foram

posteriormente usados pelo nacional-socialismo alemão, o nazismo, para perpetrar a maior chacina que a história humana já pôde registrar: o Holocausto, uma ferida aberta na história judaica que nunca irá cicatrizar. Na Alemanha nazista do século XX, sob o comando de Adolf Hitler e a omissão da igreja romana e de muitas igrejas protestantes, o mundo viu a destruição premeditada, organizada e sistemática de 6 milhões de almas judias, sendo que 1 milhão destas eram crianças. As justificativas para estes atos bárbaros muitas vezes estavam revestidas de verniz teológico-religioso; infelizmente, muitas vezes por puro desconhecimento (e o desconhecimento muitas vezes gera o medo e o preconceito), o nome de Cristo, um judeu, era usado para se legitimar essas barbáries. O anti-semitismo faz mal aos judeus porque os prejudica política e fisicamente; mas o anti-semitismo prejudica muito mais o Cristianismo porque é, acima de tudo, imoral e espiritualmente destrutivo.

Uma outra conclusão importante é que todos temos muito a aprender uns com os outros, mas os cristãos, em especial, talvez tenham muito mais a aprender com os judeus. Depois de vinte séculos de mortes, sofrimentos e perseguições, os judeus desenvolveram um senso muito mais agudo do que é viver em comunidade. É sabido e notório que os judeus são famosos por se ‘ajudarem’ uns aos outros, em qualquer atividade em que estejam envolvidos (embora essa observação não deixe de ser também preconceituosa). Esse senso de grupo (ou ‘espírito de corpo’) ainda está muito longe de ser uma marca do Cristianismo (apesar de o Novo Testamento fazer diversas vezes alusões a ele [I Coríntios 12:12-30]). Eles aprenderam a conhecer todas as nações e a conviver com elas (e também, compreensivelmente, a desconfiar delas). Aprenderam a suportar todos os climas, a vencer obstáculos, problemas e dificuldades que para muitos outros povos pareceriam impossíveis de serem superados. Veja-se, por exemplo, a produção de frutas, flores, legumes e verduras no deserto árido do moderno Estado de Israel. Estas virtudes (a perseverança, a adaptabilidade, a iniciativa, a energia, a ambição, a vontade e a necessidade de se superar) foram construídas apesar das restrições econômicas e sociais impostas sobre eles, apesar das leis opressivas feitas especialmente contra eles, apesar dos pogroms, das cruzadas, das câmaras de gás e dos campos de concentração e de extermínio. Apesar de tudo e de todos, o povo judeu tem contribuído proporcionalmente muito mais que qualquer outro povo para o progresso do conhecimento, da cultura, da arte e da ciência, abençoando o mundo com indivíduos do porte de Albert Einstein, Charles Chaplin, Steven Spielberg, Roman Polansky, os irmãos Marx, Moses Mendelsohn, Baruch Spinoza, Franz Kafka, Anne Frank, George e Ira Gershwin, Leonard Bernstein, Aaron Copland, Stephen Wise, Heinrich Heine, Rosa de Luxemburgo, Hannah Arendt, Paul Ehrlich, Henrietta Szold, Moses Hess, Benjamin Disraeli, Max Planck, Richard Feyman, Niels Bohr, Hertz, Maimônides, Martin Buber, Max Nordau, Sigmund Freud, Marcel Proust, Claude Levi-Strauss, Émile Durkheim, Walter Benjamin, Leon Trotsky, Theodor Hertzl, Golda Meir, Bob Dylan, Lerner e Lowe, Paul Simon, Art Garfunkel, Paul Newman, Woody Allen, Isaac Bashevis Singer, Stefan Zweig, Franz Boas, Eric Hobsbawn, Noam Chomsky, Albert Sabin e tantos outros que ocuparam e continuam ocupando as mais altas posições da civilização humana.

Quando se começa esse processo de redescobrimento das raízes históricas judaicas do Cristianismo, uma visão mais intensa, real e perfeita do que é o Cristianismo e de quem é Jesus nos acompanham, tornando o Cristianismo mais rico, mais tolerante e mais digno de ser vivido. Uma nova consciência de Deus nos faz ver que há a possibilidade do aprendizado, do enriquecimento e do crescimento do respeito mútuo entre judeus e cristãos, apesar da histórica desconfiança, do ressentimento mútuo e de todos os mal-entendidos que ainda permanecem vivos dentro de cada grupo. Cabe a nós, estudantes, professores, teólogos, religiosos e livres pensadores em geral, que estudam essa questão, especialmente no nosso caso, os protestantes

53 53 POLIAKOV, Léon. De Cristo aos judeus da corte. História do anti-semitismo I. Coleção Estudos. São Paulo:

Perspectiva, 1979, pp. 191-192.

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e evangélicos, o papel importante de estimuladores do diálogo, de procurarmos manter as portas abertas entre o Cristianismo e o Judaísmo, desmistificando todos os mitos e incompreensões que foram criados ao longo da história e que têm ajudado a perpetuar a impressão de que o próprio Cristo teria dado início à lamentável série de barbáries cometidas contra o povo judeu.

Por fim, se nós estivermos nesse processo conhecendo mais e melhor a Jesus, ou, se alguém preferir, Yeshua, o judeu que é o maior nome da história da humanidade e que a dividiu em antes e depois dele, penso que estaremos também conhecendo a razão da nossa própria existência, da existência do Cristianismo e do povo judeu.

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APÊNDICES

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APÊNDICE I

Que Jesus Cristo nasceu Judeu (1523)54 Martinho Lutero

A partir da Escritura quero contar a razão que me move a crer que Cristo é um judeu,

nascido de uma virgem, a fim de poder porventura também atrair alguns judeus à fé cristã. Pois esses nossos estúpidos, os papas, os bispos, os sofistas e os monges — essas rudes cabeças de asno — até agora trataram os judeus de tal maneira que quem quisesse ser um bom cristão, deveria a rigor tornar-se um judeu. E se eu tivesse sido um judeu e tivesse visto tais patetas e idiotas regerem e ensinarem a fé cristã, eu teria preferido tornar-me um porco a um cristão.

Pois eles lidaram com os judeus como se fossem cachorros e não seres humanos; nada mais fizeram do que recriminá-los e tomar-lhes a propriedade. Quando os batizaram, nada lhes demonstraram da doutrina ou da vida cristã, mas apenas os subjugaram à “paparia” e à “mongeria”. Assim, quando eles [os judeus] viram que o judaísmo tem a Escritura tão fortemente a seu favor e que o cristianismo tem sido pura conversa fiada, sem apoio qualquer na Escritura, como poderiam eles aquietar seu coração e tornarem-se bons e verdadeiros cristãos? Eu próprio ouvi de judeus piedosos batizados que, se não tivessem em nosso tempo ouvido o evangelho, teriam permanecido toda sua vida judeus sob o manto de cristãos. Pois eles confessam nunca terem ouvido qualquer coisa acerca de Cristo de parte de seus batizadores e mestres.

Tenho esperança de que, se lidarmos amigavelmente com os judeus, ensinando-os limpidamente a partir da Escritura sagrada, muitos se tornarão cristãos verdadeiros, retornando à fé de seus pais, profetas e patriarcas. Dela eles são afugentados, ainda mais quando se rejeita seu judaísmo sem deixar valer nada, lidando exclusivamente com arrogância e desprezo para com eles. Se os apóstolos, que também foram judeus, tivessem lidado assim conosco, gentios, como nós gentios com os judeus, jamais teria surgido qualquer cristão entre os gentios. Pois, se eles lidaram conosco gentios de modo tão fraternal, também nós, de nossa parte, devemos lidar fraternalmente com os judeus, a fim de eventualmente convertermos alguns. Pois nós mesmos ainda não percorremos um longo caminho, muito menos chegamos ao alvo.

E mesmo que nos gloriemos por nosso estado, contudo somos gentios, ainda assim. Os judeus, porém, são do sangue de Cristo; nós somos cunhados e estrangeiros, eles são amigos de sangue, primos e irmãos de nosso Senhor. Por isso, se pudéssemos nos gloriar no sangue e na carne, os judeus estariam mais próximos de Cristo do que nós. [...] Peço, portanto, a meus estimados papistas, quando estiverem cansados de me acusar de ser um herege, que comecem a me acusar de ser um judeu.

Daí por que aconselho que sejamos simpáticos com eles: enquanto fizermos uso de violência e de mentiras e os acusarmos de utilizar o sangue cristão para tirarem de si o mau cheiro, e não sei que outras futilidades, e os impedirmos de viver e de trabalhar entre nós em nossa comunidade, e os forçarmos a praticar a usura — como poderão vir a nós?

Se quisermos ajudá-los [aos judeus], devemos praticar com eles não a lei do papa, mas a do amor cristão, acolhendo-os amigavelmente, deixando que se desenvolvam, assumam uma profissão e trabalhem, a fim de que obtenham razão e espaço entre nós e ao nosso redor, ouçam e vejam nossa doutrina e vida cristãs, e eles estarão conosco de coração... Embora alguns sejam teimosos, que importa? Pois nem todos nós somos bons cristãos.

54 D. Martin Luthers Werke. Kritische gesamtausgabe. Weimar: Hermann Böhlau, 1983, vol. 11, pp.314-316. In: ALTMANN, Walter. Lutero e libertação. Releitura de Lutero em perspectiva latino-americana. São Paulo: Ática/ São Leopoldo: Sinodal, 1994, pp. 261263; POLIAKOV, op. cit., pp. 190-191.

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APÊNDICE II

Sobre os Judeus e suas Mentiras (1543)55 Martinho Lutero

Eu me havia proposto nada mais escrever acerca dos judeus ou contra os judeus. No

entanto, já que percebi que essa gente miserável e destituída da salvação não cessa de atrair para si também a nós, isto é, os cristãos, decidi publicar este livrinho, a fim de que eu seja encontrado entre aqueles que opuseram resistência a tal empreendimento venenoso dos judeus, tendo advertido os cristãos de se precaverem contra eles. Eu não teria pensado que um cristão pudesse se deixar fazer de bobo pelos judeus, entrando em sua miséria e desgraça. No entanto, o diabo é o deus deste mundo e, onde quer que a palavra de Deus esteja ausente, ele tem uma tarefa fácil, não somente com o fraco, mas também com o forte. Que Deus possa nos ajudar. Amém.

Graça e paz no Senhor. Caro senhor e bom amigo, recebi um tratado no qual um judeu trava um debate com um cristão. Ele [o judeu] se atreve a perverter as passagens das Escrituras que nós citamos em testemunho da nossa fé, a respeito de Cristo, Nosso Senhor e de Maria, sua mãe, e as interpreta muito diferentemente [de nós]. Com este argumento ele pensa que pode destruir a base da nossa fé.

Esta é a minha resposta para ti e para ele. Não é meu propósito entrar em altercação com os judeus ou deles aprender, como interpretam e compreendem a Escritura. Já conheço tudo isso muito bem. Muito menos lido com o assunto, na pretensão de converter os judeus; pois isso é impossível. Dois excelentes homens, Lira56 e Burguense57, juntamente com outros, já descreveram para nós, respectivamente a cerca de 200 e 100 anos atrás, a vil interpretação dos judeus. De fato, eles a refutaram completamente. Entretanto, isto não serviu de ajuda nenhuma para os judeus e eles só ficaram piores. Falharam em aprender qualquer lição da terrível agonia que tem sido sua [história] por quatorze séculos no exílio. Nem puderam obter, por meio de prantos veementes e lamentos a Deus, como eles supõem, um fim definido para isso. Se essas desgraças não os ajudaram, é razoável presumir que nossa explicação os ajudará muito menos.

Eles pretendem ser povo de Deus através de seu fazer, obras e ser exterior, não por pura graça e misericórdia, como, afinal, todos os profetas e os verdadeiros filhos de Israel tiveram que fazer.

Agora falaremos do artigo principal, em que intercedem diante de Deus pela vinda do Messias. [...] Aí pretendem [...] ser profetas seguros de que o Messias não tenha vindo, mas ainda esteja por vir [...]. Provaremos, portanto, que quanto a esse artigo, que diz respeito ao Messias, nós temos a fé verdadeira e eles erram totalmente.

[Segue-se abordagem das — pretensas — difamações dos cristãos, de Jesus e de Maria, por parte de judeus. Ato seguinte, Lutero defende a necessidade de unidade religiosa, culminando com a sugestão de expulsão territorial dos judeus].

Portanto, um cristão deve estar contente e não discutir com os judeus. Mas se você tiver de discutir ou quiser conversar com eles, não diga mais do que isso: “Escuta, judeu, você já se deu conta que Jerusalém e vosso reino, junto com o Templo e vosso sacerdócio foram destruídos há mais de 1460 anos?...” Dai aos judeus esta noz para quebrar, deixai que a mordam e discutam-na quanto queiram. Pois uma cólera divina tão cruel mostra demasiado claramente que se enganam com toda certeza, que estão errados e perdidos. Até uma criança percebe isto...

55 D. Martin Luthers Werke, op. cit., vol. 53, pp. 417-552. In: ALTMAN, op. cit., pp. 263-265; Gegen die juden und ihre lügen. In: POLIAKOV, op. cit., pp. 186-191; a maior parte do texto porém é tradução pessoal do autor. 56 Nicholas de Lyre (1270-1349[?]) escreveu estudos controversos contra o judaísmo, entre eles “De diversis contra judaeus” e “De messia... ad judaei argumenta”. 57 Pablo de Santa Maria (1350-1435), o Burguense, nasceu Solomon Halevi. Era membro de uma família proeminente de Burgos, na Espanha. Converteu-se ao Catolicismo Romano.

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... Em verdade, os judeus, sendo estrangeiros, não deveriam nada possuir, e aquilo que possuem deveria ser nosso. Pois não trabalham e nós lhes damos presentes. Eles detêm no entanto nosso dinheiro e nossos bens, tornaram-se nossos amos em nosso próprio país e em sua dispersão. Quando um ladrão rouba dez gulden, enforcam-no; mas quando um judeu rouba dez barris de ouro graças à sua usura, fica mais altivo que o próprio Senhor! Gabam-se do fato, e fortificam sua fé e seu ódio contra nós, e dizem entre si: — “Vêde como o Senhor não abandona seu povo na dispersão. Nós não trabalhamos, e preguiçamos e nos repimpamos agradavelmente; os malditos goim devem trabalhar por nós, e temos seu dinheiro: destarte, somos seus senhores e eles, nossos criados!”...

... Até este dia não sabemos ainda que diabo os conduziu a nosso país; não somos nós que fomos procurá-los em Jerusalém!

Ninguém os quer; o campo e as estradas lhes estão abertos; podem ir a seu país quando aprouver; nós lhes daremos de bom grado presentes para nos livrarmos deles, pois são para nós um fardo pesado, um flagelo, uma pestilência e uma desgraça para nosso país. A prova é que foram freqüentemente expulsos à força: da França (que chamam de Tsarpath), onde possuíam um ninho fofo; recentemente da Espanha (que chamam de Sepharad) seu ninho preferido; e neste ano ainda da Boêmia onde, em Praga, tinham um outro ninho de predileção. Enfim, em meu tempo, de Ratisbona, de Magdeburgo, e de muitos outros lugares...

... Eles não viviam tão bem em seus campos sob Davi e Salomão quanto vivem em nossos campos, onde roubam e pilham todos os dias. Sim, nós os temos cativos — assim como tenho cativos meu cálculo, minhas úlceras, ou qualquer outra doença que adquiri e que devo sofrer: eu bem que gostaria de ver (estes míseros) em Jerusalém, com os judeus e seu séquito!

Sendo certo que não os temos cativos, como atraímos tais inimizades da parte de tão nobres e santos personagens? Não chamamos suas mulheres de prostitutas, como eles o fazem com Maria, a mãe de Jesus, não os chamamos de filhos da p... (prostituta), tal como o fazem com Nosso Senhor Jesus Cristo.

Não os amaldiçoamos, nós lhes desejamos todo o bem deste mundo, em carne e espírito. Nós os albergamos, os deixamos comer e beber conosco, não raptamos e não matamos seus filhos, não envenenamos suas fontes, não estamos corrompidos por seu sangue. Merecemos pois uma cólera tão feroz, a inveja e o ódio destes grandes e santos filhos de Deus?...

... Saiba, ó Cristo adorado, e não te enganes, que à parte do Diabo não tens inimigo mais venenoso, mais encarniçado, mais amargo que um verdadeiro judeu, que procura verdadeiramente ser judeu (als einen rechten Juden, der mit Ernst ein Jude sein will).

Agora, aquele que tem desejo de acolher estas serpentes venenosas e estes inimigos encarniçados do Senhor e de honrá-los, de se deixar roubar, pilhar, manchar e se maldizer por eles, aquele deve tomar o judeu a seu cargo. Se isto não lhe basta, não precisa mais que ir além, arrastar-se em seu c... e adorar este santuário, glorificar-se em seguida de ter sido misericordioso, de ter fortificado o Diabo e seus filhos, a fim de blasfemar Nosso Senhor adorado e o sangue precioso que nos resgatou. Ele será então um cristão perfeito, pleno de obras de misericórdia, a quem Cristo recompensará no dia do Juízo Final pelo fogo do Inferno (onde será assado junto) com os judeus...

... a fim de que nós, alemães, saibamos o que é um judeu... Pois é tão fácil converter um judeu quanto converter o Diabo. Pois um judeu, um coração judeu, é duro como um bordão, como a pedra, como o ferro, como o próprio Diabo. Em suma, são filhos do Diabo, condenados às labaredas do Inferno...

... Talvez alguma santa alma misericordiosa dentre nós cristãos será de opinião que sou muito grosseiro com estes pobres e miseráveis judeus, escarnecendo e zombando deles. Ó Senhor, sou muito pequeno para zombar de semelhantes diabos: eu gostaria muito de fazê-lo, mas eles são bem mais fortes que eu em caçoada, e têm um deus que é mestre na arte da caçoada; ele se chama Diabo e mau espírito...

... O gói maldito que sou não pode compreender como fazem para ser tão hábeis, a não ser pensando que quando Judas Iscariotes foi enforcado seus intestinos rebentaram, se esvaziaram e os judeus enviaram talvez seus servos, com pratos de prata e cântaros de ouro, para recolher a urina de Judas com os outros tesouros, e em seguida comeram e beberam esta m..., e assim adquiriram olhos tão penetrantes que enxergam nas Escrituras glosas que não foram encontradas nem por Mateus e nem pelo próprio Isaías, sem falar de nós, goim

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malditos... Não posso compreender senão (admitindo) que eles transformaram Deus em Diabo, ou

antes em servo do Diabo, executando todo o mal que deseja o Diabo, corrompendo as almas infelizes e enfurecendo-se contra ele mesmo! Em suma, os judeus (em seu conjunto) são piores que os diabos (em seu conjunto). Ah! Deus, meu bem-amado pai e criador, tenha misericórdia de mim que, em defesa própria, devo falar tão vergonhosamente de tua Majestade divina e eterna contra teus malditos inimigos, os diabos e os judeus. Sabes bem que o faço pelo ardor de minha fé, e em honra de Tua Majestade; pois se trata para mim de todo meu coração e de toda minha vida...

Que devemos, pois, fazer, nós cristãos, com esse povo rejeitado e amaldiçoado dos judeus? Desde que eles vivem entre nós, não devemos tolerar sua conduta, já que sabemos bem como eles mentem, injuriam e blasfemam. Se o fizermos, estaremos nos tornando participantes das suas mentiras, maldições e blasfêmias. Não podemos apagar o inextinguível fogo da ira divina, do qual os profetas falaram, nem converter os judeus. Com oração e temor a Deus devemos exercer uma misericórdia afiada [scharfe Barmherzigkeit], para porventura salvar alguns das chamas e do braseiro. Nós não devemos nos vingar. Eles já estão com a vingança ao pescoço, mil vezes pior do que lhes podemos almejar. Quero [porém] dar [às autoridades políticas] meu conselho fiel.

Por conseguinte, não pode nem deve ser para nós cristãos uma brincadeira, mas matéria de grande seriedade, buscarmos conselho contra essa realidade, a fim de salvarmos nossas almas dos judeus, isto é, do diabo e da morte eterna. E [o conselho] é este, como dito acima:

Primeiro: Que se incendeiem suas sinagogas e escolas, e, quem puder, jogue enxofre e piche. E quem pudesse também lançar fogo do inferno, seria igualmente bom. Enterrem e cubram com sujeira o que não se queimar, para que nenhum homem jamais veja uma pedra ou cinza delas. Que isto seja feito em honra de nosso Senhor e da Cristandade, a fim de que Deus possa ver nossa seriedade e determinação e todo o mundo tal exemplo, que nós somos cristãos e que, sabendo [o que eles dizem], não perdoamos ou toleramos tais injúrias, maldições e blasfêmias acerca de seu Filho e dos cristãos, de modo que se até agora temos tolerado em ignorância tais casas (em que os judeus têm blasfemado tão vergonhosamente contra Deus, nosso querido criador e pai, com seu Filho), agora lhes temos dado sua devida recompensa. Pois tudo o que nós toleramos no passado sem o saber — e eu mesmo não estava atento a isso — será perdoado por Deus. Mas se nós, agora que estamos informados, protegermos e defendermos tais casas dos judeus, que estão bem debaixo do nosso nariz, nas quais eles injuriam, blasfemam, amaldiçoam, caluniam e difamam a Cristo e a nós (como foi ouvido acima), será o mesmo que se nós próprios estivéssemos fazendo tudo isso e até pior, como sabemos muito bem. Que suas casas também sejam arrasadas e destruídas, pois elas têm a mesma finalidade de suas sinagogas. Em vez disso, que eles se alojem debaixo de marquises ou em celeiros, como os ciganos. Isto os [forçará a irem] para sua pátria, pois eles não são senhores em nosso país, como se gabam, mas eles sim é que estão vivendo no exílio e no cativeiro, como incessantemente se lamentam diante de Deus a nosso respeito.

Segundo: Que se lhes tomem todos os seus livros — livros de oração, escritos talmúdicos (nos quais tais idolatrias, injúrias, maldições e blasfêmias são ensinadas), também toda a Bíblia —, sem deixar uma folha sequer, e que sejam preservados para aqueles que se converterem. [...]

Terceiro: Que lhes seja proibido de hoje em diante, a eles e aos seus rabis, sob pena de perderem o corpo e a vida, de louvar a Deus, dar-lhes graças, orar e ensinar publicamente entre nós e em nosso país. Podem fazê-lo em seu próprio território ou onde o puderem, sem que nós cristãos precisemos ouvi-lo ou disso tomar conhecimento... Eles [os rabis] perderam o direito a tal ofício [o de ensinar] ao manterem os pobres judeus cativos sob os mandamentos de Moisés [em Deuteronômio 17:10-13], nos quais os ordena obedecerem a seus mestres sob pena de morte, embora Moisés claramente adicione: “o que eles te ensinarem de acordo com a lei do Senhor”. Estes vilões ignoram isso. Dissolutamente usam a obediência do pobre povo de forma contrária à lei do Senhor, infundindo neles este veneno maldito e blasfemo. Da mesma maneira o papa também nos quer manter cativos com a declaração de Mateus 16:18 (“Tu és Pedro...”), induzindo-nos a acreditar em todas as mentiras e farsas que saem da sua mente diabólica. Eles não ensinam de acordo com a palavra de Deus e por isso perderam o direito de ensinar [...]

Quarto: Que lhes seja proibido pronunciar o nome de Deus em nossos ouvidos, pois nós

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não podemos ouvi-lo ou tolerá-lo de boa consciência. [...] E quem ouvi-lo de parte de algum judeu, denuncie-o à autoridade ou lhe atire cocô de porco quando o vir, afugentando-o. Ninguém seja misericordioso ou bondoso nesse particular, pois estão em jogo a honra de Deus e a salvação de todos nós (inclusive dos judeus). [...]

Quinto: Que se suspenda aos judeus totalmente a proteção e o acesso às estradas. Pois eles não têm ocupação no campo, já que não são senhores, nem funcionários públicos, nem artesãos, ou algo similar [...]

Sexto: Que se lhes proíba toda usura, tomando-lhes todo dinheiro e jóias de prata e de ouro, colocando-os de lado sob guarda. A razão desta medida é que, como foi dito acima, eles não têm nenhum outro meio de ganhar a vida que não seja a usura, e através disso eles nos têm furtado e roubado tudo que possuem. Agora, esse dinheiro não poderia ser usado de nenhuma outra maneira que não fosse a seguinte: onde quer que um judeu fosse sinceramente convertido, ele poderia receber cem, duzentos ou trezentos florins, conforme a sua situação pessoal pudesse sugerir. Com isso, ele poderia se estabelecer em alguma ocupação para sustentar sua mulher e seus filhos, além de algum velho ou doente [que estivesse entre os seus]. Pois tais ganhos diabólicos são malditos, se não forem usados com a bênção de Deus numa causa boa e valiosa [...]

Sétimo: Que se coloque na mão dos judeus e judias jovens e fortes mangual, machado, enxada, pá, roca e fuso, de modo que obtenham seu pão no suor do seu rosto, como é imposto aos filhos de Adão, em Gênesis 3:19. Pois não é apropriado que eles nos deixem a nós, malditos goim, trabalhando com o suor do nosso rosto, enquanto eles, o povo santo, gastam seu tempo atrás do fogão, regalando-se e fartando-se e, acima de tudo, vangloriando-se blasfemamente do seu senhorio sobre os cristãos, através do nosso suor ... deve-se sacudir esses patifes preguiçosos pelos fundilhos das suas calças.

[Se tudo isso se mostrar ineficaz, há ainda uma sugestão adicional:] Já que devemos permanecer puros da blasfêmia dos judeus, não participando dela, devemos estar separados, devendo eles ser banidos de nosso território. Que cogitem, então, de [chegar à] sua pátria.

Portanto, peço aos nossos governantes que tenham súditos judeus que exercitem uma misericórdia afiada para com esse povo desprezível, como foi sugerido acima, para ver se isso ajudaria (embora seja duvidoso). Eles [os governantes] precisam agir como um bom médico que, quando a gangrena começa, procede sem misericórdia para cortar, serrar e queimar carne, veias, ossos e tutano. Este procedimento deve ser seguido também nesse caso. Incendeiem-se suas sinagogas, proíba-se tudo que eu enumerei antes, forcem-nos a trabalhar, tratem-nos severamente, como fez Moisés no deserto, matando três mil para que o povo todo não perecesse. Certamente eles [os judeus] não sabem o que estão fazendo; além disso, como possessos, não querem conhecer, ouvir ou aprender. Seria errado ser misericordioso e corroborar a conduta deles. Se isto não ajudar, devemos expulsá-los como cães loucos, para que não nos tornemos participantes de sua abominável blasfêmia e de todos os seus outros vícios e desta forma merecermos a ira de Deus e sermos condenados juntamente com eles. Eu fiz o meu dever. Que cada um faça o seu. Estou isento [de culpa].

Meu tratado, espero, dará ao cristão (que de nenhum modo tem desejo de se tornar judeu) material suficiente não só para se defender do cego e venenoso judeu, mas também para ser o inimigo da malícia, das injúrias e das maldições dos judeus; não somente para entender que a fé deles é falsa, mas que também certamente estão possessos por todos os demônios.

Aqui paro, e não quero mais nada ter a fazer com os judeus; não escrever nem sobre e nem contra eles. Já tiveram o bastante. Que Cristo, nosso querido Senhor, misericordiosamente os converta e firme e inamovivelmente nos preserve no seu conhecimento, que é a vida eterna.

Amém.

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APÊNDICE III Documento 2999-PS, submetido ao Tribunal Militar Internacional, Nüremberg

Relatório de H. F. Grabe, traduzido do “Der Nationalsozialismus, Dokumente 1939-1945” - págs. 313-316.58

“Eu abaixo assinado, Hermann Friedrich Grabe, declaro, sob juramento: De setembro de 1941 a janeiro de 1944, fui gerente comercial e engenheiro-diretor de

uma filial da empresa de construções Solingen, do Sr. Josef Jung, situada em Sdolbunow, na Ucrânia. Nesta condição, era minha função visitar as fábricas da empresa. Ambas se encontravam em Dubno, na Ucrânia. Sob contrato com um escritório de construção do exército, a empresa tinha ordens de levantar galpões de armazenamento de grãos no antigo aeroporto de Dubno.

A seguir descrevo as circunstâncias que fizeram com que eu fosse testemunha da liquidação do gueto e da execução deste ato...

Em 5 de outubro de 1942, quando eu estava visitando o escritório em Dubno, meu mestre-de-obras, Hubert Moennikes, de 21 Aussenmuehlenweg, Hamburgo-Harburg, disse-me que nos arredores do lugar, judeus de Dubno haviam sido assassinados e enterrados em três grandes fossas, cada qual com 30 metros de comprimento e 3 metros de profundidade. Cerca de 1.500 pessoas haviam sido mortas diariamente. Na noite de 13 para 14 de julho de 1942, todos os habitantes do gueto, que contava com cerca de 5.000 judeus, que viviam ali desde bem antes dos pogroms, foram liqüidados. Como os fuzilamentos haviam acontecido na sua presença, ele ainda estava bastante transtornado com o fato.

Em razão disso, dirigi-me ao lugar acompanhado de Moennikes e vi perto do local grandes montes de terra, de aproximadamente 30 metros de comprimento e 2 metros de altura...

(...) as portas das casas estavam escancaradas, as janelas arrombadas. As ruas estavam juncadas de pedaços de roupas, de sapatos, de roupa interior, de bonés, de chapéus, de casacos, etc. (...) Ao canto de uma casa jazia uma criança, com menos de um ano, com o crânio esmagado. À volta da criança havia sangue e pedaços de cérebro colados à parede. Estava vestida apenas com uma camisola (...)

(...) Muitos caminhões estavam em frente aos montes de terra. Uma milícia ucraniana armada fez descer o povo que estava dentro dos caminhões, sob a supervisão de um SS. Os homens da milícia agiam como guardas. Todas essas pessoas tinham uma estrela amarela remendada na frente e nas costas de suas roupas, de modo que pudessem ser reconhecidas como judeus.

Moennikes e eu fomos direto para as fossas. Ninguém nos impediu. Então ouvi tiros de fuzil em rápida sucessão, vindos detrás de um dos montes de terra. As pessoas que haviam sido tiradas dos caminhões — homens, mulheres, crianças de todas as idades — sob a fiscalização de um SS com uma chibata, despiam-se e colocavam a roupa em montes separados: sapatos, vestidos, roupa interior. Vi um monte de sapatos de 800 a 1.000 pares, enormes montes de roupas brancas e de roupa exterior. As pessoas despiam-se sem gritar nem chorar; as famílias juntas abraçavam-se, beijavam-se, diziam-se adeus e esperavam que lhes fizesse sinal outro SS, de pé, perto do poço. Também ele tinha na mão um chicote. Durante os 15 minutos que fiquei perto da fossa não ouvi nenhuma queixa, nem nenhum pedido para ser poupado. Reparei numa família de oito pessoas: um homem e uma mulher, ambos por volta de 50 anos, com seus

58 Depoimentos: Relatório de H. F. Grabe, traduzido do “Der Nationalsozialismus, Dokumente 1939-1945”, págs. 313-316. In: ABRAHAM, op. cit., pp. 50-52. A maior parte do texto porém é tradução livre do próprio autor do texto original em Encyclopaedia Judaica. Encyclopaedia Judaica Jerusalem. Jerusalem: Keter Publishing House / New York: The Macmillan Company, 1971, vol. 8, “Holocaust”, pp. 867-868.

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filhos de cerca de um, oito e dez anos, bem como duas moças de aproximadamente vinte a vinte e quatro anos. Uma senhora idosa de cabelos completamente brancos levava a criança de um ano em seus braços, cantava-lhe uma canção qualquer e embalava-a, fazendo cócegas nele. O pequenino sorria de contente. Os pais olhavam para a criança, de lágrimas nos olhos. O pai levava pela mão um rapaz de dez anos e falava-lhe docemente. O pequeno lutava para conter as lágrimas. O pai apontou-lhe o céu com um dedo, acariciou-lhe a cabeça parecendo explicar-lhe qualquer coisa. Foi nesse momento que o SS, que estava perto da fossa, gritou alguma coisa para o seu companheiro, que agrupou cerca de vinte pessoas e as mandou colocarem-se atrás do monte de terra. Entre elas estava a família que mencionei. Recordo-me perfeitamente de uma moça esguia e morena, que ao passar por mim, apontou para si mesma com o dedo e disse: 23 anos. Dei a volta ao monte e vi a fossa enorme, onde as pessoas estavam comprimidas e estendidas uma sobre as outras; viam-se apenas as cabeças. De quase todas saía sangue que lhes corria da cabeça sobre os ombros pelas costas abaixo. Alguns dos fuzilados ainda gemiam e se moviam. Alguns levantavam os braços e voltavam a cabeça, para mostrarem que ainda estavam vivos. A fossa já estava quase 2/3 cheia. Em meu entender, já lá devia encontrar-se cerca de 1000 pessoas. Olhei para o atirador. Era um SS, que estava sentado em terra, à beira da fossa, com as pernas dependuradas, a pistola-metralhadora cruzada sobre os joelhos; estava fumando um cigarro. As pessoas, completamente nuas, desceram uma escada cavada na parede de terra da fossa; escorregando sobre as cabeças dos fuzilados deitados, foram até ao lugar que o SS lhes indicou. Deitaram-se diante dos mortos e dos feridos; alguns acariciavam os que ainda estavam vivos e falavam-lhes em voz baixa. Depois, ouvi uma série de tiros. Olhei para a fossa e vi corpos se contorcerem com cabeças imobilizadas sobre os corpos que já estavam estendidos antes deles. O sangue corria das nucas. Fiquei admirado de que não tivessem dado ordem de me ir embora, mas vi também nas proximidades dois ou três empregados dos Correios, uniformizados. A próxima leva já se aproximava, descia para a fossa, alinhava à frente das últimas vítimas, e foram fuzilados. Ao voltar para o outro lado do monte de terra vi chegar outro carregamento. Desta vez, havia doentes e inválidos. Uma senhora muito idosa e magra, com pernas extremamente finas, foi despida por outras pessoas que já estavam nuas, enquanto duas outras ajudavam-na a se levantar. A mulher parecia estar paralisada. As pessoas nuas carregaram a mulher em torno do monte de terra. Saí dali com Moennikes e dirigi de volta para Dubno.

Na manhã do dia seguinte, quando visitei de novo o lugar, vi aproximadamente 30 pessoas nuas estendidas perto da fossa — cerca de 30 a 50 metros de distância dela. Algumas delas ainda estavam vivas; olhavam fixamente à sua frente e pareciam não sentir nem o frio da manhã, nem perceber os operários da minha empresa que estavam em volta. Uma moça de aproximadamente 20 anos pediu-me para lhe dar suas roupas e ajudá-la a escapar dali. Naquele momento ouvimos um carro se aproximando rapidamente e percebi que era um grupo SS. Afastei-me dali. Dez minutos depois ouvimos tiros das cercanias da vala. Os judeus que ainda estavam vivos foram obrigados a jogar os corpos nas valas; depois disso, eles mesmos tiveram de deitar na fossa para serem executados com tiros no pescoço.

Juro perante Deus que isto é a pura expressão da verdade.

Assinado: Hermann F. Grabe Wiesbaden, 10 de novembro de 1945.

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APÊNDICE IV

A Primeira Cruzada As Perseguições de 109659

R. Schlomo Bar Shimshon ... E veio também o Satan, o papa de Roma [o papa Urbano II, N. E.], a criminosa, e

ordenou a todos os povos gentios que acreditam no rebento do adultério [isto é, Jesus, N. E.], os filhos de Seir [isto é, os cristãos; Edom, na tradição rabínica, indicava a Roma pagã e, mais tarde, a Roma cristã, N. E.], ... que se reunissem para ir até Jerusalém... E foram ao túmulo de sua superstição que o aceitaram como sua divindade... e deliberaram fazer o mal ao povo de Deus dizendo: “Por que haveríamos de ocupar-nos em lutar contra os ismaelitas ao redor de Jerusalém se se encontra entre nós um povo não temente à nossa divindade, ainda mais que seus antepassados penduraram-no? Por que deveríamos deixá-los em paz e por que eles deveriam habitar entre nós? Comecemos por eliminá-los e depois seguiremos o nosso caminho...”

... E foi no dia três de Sivan [27 de maio], que era um dia santo e de abstinência para Israel [twewbs,Shavuoth, isto é, Pentecostes, N. E.] pelo recebimento da Torah... E foram santificados para elevarem-se até Deus, todos juntos, pois eram generosos em vida e na morte, não se separando... e realizaram-se as intenções dos cruzados, que as concretizaram sem que adiantasse qualquer pagamento, jejum, penitência, clamor ou caridade, sem que se encontrasse alguém que pudesse fazer frente à desgraça. Nenhum guia, nenhum potentado... pôde defender os seus estudiosos.

No meio do dia, Emico, o cruel, inimigo dos judeus, veio com todo o seu exército até as portas da cidade, e os citadinos abriram-nas para eles. E os inimigos de Deus disseram uns aos outros: “Vejam que nos abriram as portas, agora nos vinguemos dos que derramaram o sangue do crucificado”. E os tementes a Deus, filhos da Santa Aliança, ao verem aquela enorme multidão... voltaram-se ao seu Criador... devido às tribulações, aos jejuns e penitências que fizeram, não tinham força para fazer frente aos inimigos...

... Então todos [os judeus] gritaram em voz alta, dizendo ao mesmo tempo: “Agora não devemos tardar mais, pois os inimigos já se estão aproximando de nós. Apressemo-nos e santifiquemo-nos como holocausto a Deus. E todo aquele que tiver uma faca examine-a e verifique para que não esteja com falhas, e degolenos para que santifiquemos o Nome de Deus, o Eterno, e depois degole-se a si mesmo, pela sua própria garganta, ou enterre a faca em seu próprio abdome...”

...E os inimigos atiraram sobre eles pedras e flechas, mas eles não temeram e não fugiram. Então [os inimigos] atacaram com a espada todos os [judeus] que encontraram e os sangraram até o fim. Aqueles que se encontravam nas salas, vendo o que se fazia com esses justos e percebendo o inimigo aproximar-se para atacá-los, gritaram todos: “Não há melhor do que santificarmos ao Nosso Deus, e santificaremos nossas almas em holocausto”. E ali as mulheres, tomadas de coragem, degolaram seus filhos e filhas e também a si mesmas. E muitas pessoas tomaram coragem e sacrificaram suas esposas e seus filhos. A amorosa e delicada mãe sacrificou a criatura que a fazia feliz. E todos, homens e mulheres, sacrificaram uns aos outros, e as donzelas, noivas e noivos olharam através das janelas e gritaram em alvoroço: “Olhai e vede, nosso Deus, o que estamos fazendo para santificar o seu Grande Nome, sem que nos convertamos ao crucificado e rejeitado em seu tempo...”

...E os inimigos levantaram-se contra eles e mataram crianças e mulheres, jovens e velhos em um dia, não poupando sacerdotes e não tendo misericórdia pelos idosos, dos infantes e dos 59 Hebräische Berichte über die Judenverfolgungen während der Kreuzzüge. In: NEUBAUER, A. & STERN, M. Quellen zur Geschichte der Juden in Deutschland. Berlim: Leonhard Simion, 1892, vol. II. In: FALBEL, op. cit., pp. 78-97.

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que ainda eram lactantes, nem para com as grávidas tiveram compaixão, não deixando nenhum resto... pois todos [os judeus] quiseram santificar o Nome de seu Criador, e ao caírem os inimigos sobre eles gritavam em voz alta, com um único coração e boca: “Ouve, ó Israel. Adonai é nosso Deus, Adonai é Único”...

... E quando os inimigos chegaram aos quartos e quebraram as portas, encontraram-nos agonizantes e ainda mergulhados em seu sangue. Então, tomaram seu dinheiro e desnudaram-nos. Matando aqueles que restaram,... E quando os santos viram que o inimigo os estava vencendo e que não poderiam fazer frente a eles muito mais, apressaram-se os homens, mulheres e crianças a sacrificar de início as crianças, e, em seguida, as piedosas mulheres passaram a atirar pedras pelas janelas sobre o inimigo, que respondia atirando pedras sobre elas, que por sua vez recebiam-nas até que seus corpos e rostos ficassem estraçalhados em pedaços, e elas insultavam e amaldiçoavam os cruzados em nome do pendurado desprezível e ídolo abominável: “Em quem vocês confiam? Numa carcaça podre!”...

... E os inimigos mataram todos aqueles que se encontravam no quarto e desnudaram-nos. Vede Adonai e observai o que minha boca poderia narrar. Então, os cruzados começaram a profanar em nome do pendurado, fazendo o que queriam com aqueles que encontravam... não deixaram nenhum sobrevivente.

... E havia na sala um rolo da Torá, e os cruzados chegaram até o lugar e rasgaram-no em pedaços. E ao ver isso... um jovem de nome R. Davi, filho do rabino R. Menachem, chamou-os e disse-lhes: “Meus irmãos, rasguem vossas roupas em honra da Torá”. E rasgaram suas roupas. Quando encontraram um cruzado na sala, levantaram-se todos, homens e mulheres, apedrejaram-no e mataram-no. Os cruzados e os citadinos, ao verem que o cruzado morrera, lutaram contra eles e subiram no telhado da casa em que se encontravam os filhos da Santa Aliança, quebraram-no e atiraram flechas, e atingiram-nos, ferindo-os, até que exterminaram todos....

... E os cruzados e citadinos saíram de lá e com violência entraram na cidade por um lugar, pois já haviam realizado suas intenções contra seus inimigos. E naquele lugar escondia-se David bar Natanael, o gabai [zelador da sinagoga], com sua esposa e filhos e todos os seus parentes, e no mesmo lugar encontrava-se um clérigo. E o clérigo disse-lhes: “Vede que no palácio e castelos do bispo ou no palácio do conde não restou ninguém, todos foram mortos, atirados e pisados como calçamento nas ruas, com exceção dos poucos que foram batizados e mais tarde voltaram à sua Torá. Também tu, faze a mesma coisa: assim poderás salvar-te, a ti, a teu dinheiro e a toda a tua casa das mãos dos cruzados”. Retrucou o homem temente a Deus: “Agora vai para fora e fala aos cruzados e aos citadinos em meu nome para que venham todos a mim”. E o clérigo, ao ouvir as palavras do piedoso senhor David, o gabai, ficou muito contente, e disse: “Pois este judeu importante teve vontade de ouvir nosso conselho”. E correu para fora para dizer ao povo o que o justo lhe mandara dizer. Eles também se alegraram e juntaram-se ao redor da casa aos milhares e dezenas de milhares. Ao vê-los, o justo, confiante no Deus de seus antepassados, disse: “Vós, filhos do pecado, acreditais numa divindade que é um bastardo e pendurado, e eu acredito em um Deus Eterno, que habita o alto dos céus, no qual depositei minha confiança até este dia, e assim farei até minh'alma expirar. E sei da verdade, pois vós, ao me matardes, minh'alma repousará no paraíso, iluminada pela luz da vida, enquanto vós descereis ao poço da escuridão para a vossa terrível desgraça eterna. E, na Geena, vós e vossa divindade sereis julgados e estareis fervendo em excremento, pois ele é filho de uma prostituta”.

E ao ouvirem as palavras do piedoso, ficaram muito irados por tê-los ofendido e dito tais blasfêmias. Então levantaram suas bandeiras e acamparam ao redor da casa. Começaram a gritar e a chamar o nome do pendurado, e subiram até ali, matando-o juntamente com sua justa esposa, seu filho e filha, sogro, serva, e todos de sua família, morrendo todos santificando o Nome. Ali morreram o justo e seus familiares, e foram atirados pelas janelas à rua.

...E lá havia muitas mulheres que santificaram o Nome do Criador. Até suas almas expiraram por não se quererem converter ao crucificado: senhora Raquel... E eles [os cruzados] levaram as mulheres piedosas defronte ao pátio da igreja e tentavam convencê-las a aceitar as águas do batismo. E quando chegaram à igreja, elas não quiseram entrar na casa da idolatria deles, e fincaram pé no umbral contra a sua vontade, não querendo entrar na igreja e cheirar o cheiro do incenso, da abominação. E quando os cruzados viram que elas não queriam o seu

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vômito e que se apegavam com força e segurança no seu Deus vivo, com todo o coração, atiraram-se sobre elas com machados e bastões, e ali morreram as puras mulheres santificando o Nome...

... E depois, quando os filhos da Santa Aliança que se encontravam nos quartos foram mortos, caíram sobre eles os incircuncisos para despir seus corpos e tirá-los de lá, e atiraram-nos desnudos pelas janelas à rua, uns sobre os outros, até formarem um alto monte. Muitos deles ainda viviam ao serem atirados, e suas almas ainda estavam ligadas ao corpo, e ainda havia sinal de vida, pois acenavam com os seus dedos: “Dêem-nos um pouco de água para beber”. E os cruzados, ao verem isso, que ainda possuíam um pouco de vida, diziam-lhes: “Queiram vos batizar, e dar-vos-emos água para beber e ainda vos podereis salvar”. E eles meneavam suas cabeças e olhavam para o seu Pai que está nos céus dizendo: “Não”, e apontavam com seus dedos ao Deus, bendito seja, sem poder tirar de suas bocas qualquer palavra devido à quantidade de ferimentos que lhes fizeram. E ainda continuavam a agredi-los com muitas pancadas, até que os matassem pela segunda vez.

Tudo isso foi feito pelos cruzados e por aqueles que os acompanhavam àqueles [os judeus] cujos nomes e cujo modo de agir naquela ocasião lembramos... Deus das alturas lembrá-los-á e fará sua vingança com presteza em nossos dias... Esses que mataram são condenados à desgraça eterna, e os que foram mortos santificando o Nome Santo do Deus Onipotente foram para o mundo do além, e suas almas encontram-se no paraíso para a vida eterna, amém.

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APÊNDICE V

Quadro Cronológico Resumido de Perseguições e Massacres contra Judeus 60

66-70 – Revolta judaica contra Roma termina com a reconquista romana da Judéia e a destruição de Jerusalém e do Segundo Templo. 74 – Queda de Massada. 300 – Primeiras restrições aos direitos legais judaicos. 455-475 – Perseguições aos judeus no Império Persa; sinagogas e academias são fechadas. 530 – Início de novas restrições aos direitos dos judeus na lei romana. 612 – Início de repetidos atos de legislação antijudaica e perseguição na Espanha visigótica, culminando com a declaração de ilegalidade do judaísmo em 694. 614 – Os judeus voltam a Jerusalém durante a invasão persa da Palestina. 1008 – Judeus do Egito perseguidos por Al-Hakim. 1096 – Massacre dos judeus da Renânia pelos cruzados. 1144 – Acusação de assassínio ritual em Norwich. 1146 – Início da perseguição dos judeus na Espanha muçulmana pelos Almôadas. 1171 – Libelo de sangue em Blois (primeiro na França). 1182-1198 – Expulsão dos judeus dos domínios reais na França por Filipe II Augusto. 1190 – Massacre de judeus em York. 1240 – Disputa religiosa em Paris, levando à queima do Talmud em 1242. 1263 – Disputa religiosa em Barcelona. 1255 – Acusação de assassínio ritual em Lincoln. 1288 – Libelo de sangue em Troyes. 1298-1299 – Perseguições de Rindfleisch na Alemanha. 1306 – Filipe IV, o Bom, ordena a expulsão dos judeus da França. 1315 – Judeus chamados de volta à França. 1336-1339 – Massacres de Armleder na Alemanha. 1391 – Massacres e conversões forçadas em Castela e Aragão. 1348-1349 – Massacres da Peste Negra, principalmente na Europa Central e França. 1394 – Expulsão final da França. 1413-1414 – Disputa religiosa em Tortosa. 1421 – Perseguição a judeus na Áustria. 1424 – Expulsão de Colônia. 1439 – Expulsão de Augsburgo. 1449 – Distúrbios anticonversos em Toledo. 1452-1453 – O pregador franciscano João de Capistrano faz campanha contra os judeus e instiga expulsões. 1473 – Libelo de sangue em Trento. 1473-1474 – Massacre de conversos em Córdoba. 1450-1500 – Expulsão dos judeus de muitas cidades e distritos da Alemanha. 1462 – Estabelecimento do gueto de Frankfurt. 1492 – Os judeus são expulsos da Espanha. 1497 – Os judeus são obrigados a se batizarem ou serem expulsos de Portugal. 1553 – Queima do Talmud na Itália. 1554 – Estabelecimento da censura da Igreja para os livros judaicos. 1555 – O Papa Paulo IV manda os judeus de Roma para o gueto. 1614 – Expulsão temporária dos judeus de Frankfurt-sobre-o-Meno. 1648-1649 – Revolta cossaca sob o comando de Bogdan Chmielnitski com massacre generalizado de judeus.

60 SELTZER, op. cit., vol. I: pp. 150-154, 292-297; vol. II: pp. 451-453, 506-509.

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1655-1667 – Invasão russa e sueca na Polônia levam a novos massacres de judeus poloneses. 1670 – Judeus expulsos de Viena; alguns foram readmitidos. 1745-1748 – Banimento temporário dos judeus de Praga. 1750 – Decreto restritivo aos judeus da Prússia de Frederico, o Grande. 1768 – O mais sério ataque aos judeus na Ucrânia polonesa por grupos armados de Haidamacks (o massacre de Uman). 1791 – Mercadores judeus excluídos da Rússia Central, mas com permissão para se estabelecer em Odessa. 1819 – Tumultos antijudaicos na Alemanha. 1824 – Tentativas russas de implementar o plano para deportar os judeus nas aldeias. 1835 – Revisão do código russo de leis relativo aos judeus, com restrições adicionais à residência. 1840 – Libelo de sangue de Damasco. 1871-1872 – Ataques aos judeus na Romênia. 1881-1882 – Onda de pogroms na Rússia. 1882 – Leis de maio restringindo os direitos da moradia dos judeus. 1894-1899 – O Caso Dreyfus na França. 1887 – Cotas restritivas para a admissão de judeus nas escolas e universidades. 1903 – Pogrom de Kishinev. 1905-1907 – Onda de pogroms na Rússia envolvendo as Centúrias Negras. 1911-1913 – Caso do libelo de sangue de Beiliss. 1918-1920 – Onda de 2.000 pogroms na Ucrânia durante a Guerra Civil. Instituições comunais judaicas abolidas na Rússia. 1929 – Tumultos árabes em Jerusalém e outras cidades da Palestina. 1933 – Nova lei do serviço público começa a eliminação de judeus na Alemanha da maioria das profissões. 1935 – Leis de Nüremberg estabelecem uma definição racial da cidadania alemã, reduzindo os judeus à condição de súditos alemães. 1937 – Muitos intelectuais judeus e judeus membros da velha guarda comunista liquidados durante as repressões stalinistas (Trótsky, Lunatcharsky,etc.); medidas discriminatórias antijudaicas introduzidas nas universidades polonesas. 1938 – 9 e 10 de novembro, a Kristallnacht (Noite de Cristais), a destruição nazista das sinagogas e ataques aos judeus na Alemanha. 1937-1939 – Legislação antijudaica e outras medidas anti-semitas pelos governos pró-nazistas na Romênia e Hungria. 1940 – Nazistas estabelecem “guetos” judaicos em cidades do leste europeu. 1941 – Tumultos e ataques aos judeus no Iraque. 1941-1942 – Einsatzgruppen alemães assassinam 2 milhões de judeus na U.R.S.S. ocupada. 1942 – Conferência de Wansee em Berlim para organizar o transporte dos judeus dos países satélites nazistas para os campos da morte. 1942-1944 – Os seis campos de extermínio — Chelmno, Auschwitz, Belzec, Sobibor, Majdanek e Treblinka — em pleno funcionamento para asfixiar os judeus e outros “indesejáveis” no Reich nazista. 1946 – Pogrom de Kielce na Polônia. 1948-1952 - “Anos Negros” da comunidade judaica soviética; supressão da cultura e liderança judaicas. 1952 – Julgamento público em Praga, marcado por propaganda antisionista e anti-semita; execução secreta de eminentes escritores em ídiche na U.R.S.S. 1953 – Prisão de eminentes médicos judeus soviéticos, acusados de planejar o assassinato de oficiais do governo (a “Conspiração dos Doutores”). 1968 – Depois da Guerra dos Seis Dias, intensas campanhas antisionistas na U.R.S.S. e na Polônia. O anti-semitismo na Polônia resulta na imigração da maioria dos judeus poloneses remanescentes. 1992 – Atentado a bomba à Embaixada de Israel em Buenos Aires. 1994 – Atentado a bomba à AMIA – Associação Mutual Israelita Argentina em Buenos Aires.

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