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1 As redes de escolas dos legislativos e dos Tribunais de Contas: perfil e desafios 1 Guilherme Wagner Ribeiro Ana Paula Magalhães Assembleia Legislava de Minas Gerais Introdução Depois de uma tendência à descentralização federava que induzia certo isolamento dos entes federados na década de 90, as prácas de intergovernabilidade avançaram muito nas décadas seguintes, por meio de diferentes configurações, como os consórcios, convênios, fóruns, conselhos etc.. Essa intergovernabilidade se manifesta de forma mais vigorosa entre órgãos similares que integram os Poderes Execuvos dos diversos entes federavos, que são responsáveis pela implementação das polícas públicas, mas a aproximação entre órgãos e endades semelhantes acontece também nos Poderes Legislavo e Judiciário, assim como nos Tribunais de Contas e nos órgãos do Ministério Público. Além disso, essa aproximação, para ações conjuntas e troca de experiências, ocorrem entre órgãos similares que pertencem aos três Poderes e nos três níveis da federação, como é o caso da Rede Nacional de Escolas de Governo, que contribuir para dar densidade aos princípios da harmonia entre os Poderes e da cooperação federava. Este trabalho uliza-se do conceito de rede para discur os desafios das redes de escolas de governo, com especial atenção para as redes de escolas do legislavo e dos Tribunais de Contas. tendo como base uma pesquisa uma pesquisa em desenvolvimento que invesga a interação entre as Casas Legislavas. Nessa pesquisa, além das Escolas, consideram-se também a rede de TVs do Legislavo, a União Nacional dos Legislavos e Legisladores Estaduais – Unale, o programa Interlegis, do Senado Federal, além de outros canais de interação entre as instuições legislavas no Brasil. Para o exame das Escolas do Legislavo e dos Tribunais de Contas, foi encaminhado um quesonário para todas as Escolas desses órgãos nos âmbitos federal e estadual, além das escolas municipais que fazem parte da Associação Brasileira de Escolas do Legislavo e do Tribunal de Contas – Abel. Para a análise dos dados e produção dos sociogramas, ulizamos o programa Ucinet. O conceito de rede Concomitante aos extraordinários avanços das tecnologias de informação e comunicação – TICs -, que ampliam as possibilidades de interação entre pessoas, instuições, ideias etc., o conceito de rede se alastra por diferentes searas da vida codiana, da políca e das ciências. A palavra rede tem se tornado um termo da moda, um saco de metáforas (Musso, 2010, p. 17), porque vem sendo empregada em diversos contextos com variados sendos. É um recurso linguísco para retratar sistemas de interdependências entre pessoas, instuições, elementos da natureza etc.. No senso comum, a ideia de redes sociais remete o sujeito às plataformas virtuais de interação, como o facebook e o whatsapp, ainda que o conceito abarca qualquer conjunto de interações que vinculam pessoas ou instuições, 1 Este trabalho integra pesquisa financiada Pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, intitulada O Parlamento em rede: interações entre as Casas Legislativas.

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As redes de escolas dos legislativos e dos Tribunais de Contas: perfil e desafios1

Guilherme Wagner Ribeiro Ana Paula Magalhães

Assembleia Legislativa de Minas Gerais

Introdução

Depois de uma tendência à descentralização federativa que induzia certo isolamento dos entes federados na década de 90, as práticas de intergovernabilidade avançaram muito nas décadas seguintes, por meio de diferentes configurações, como os consórcios, convênios, fóruns, conselhos etc.. Essa intergovernabilidade se manifesta de forma mais vigorosa entre órgãos similares que integram os Poderes Executivos dos diversos entes federativos, que são responsáveis pela implementação das políticas públicas, mas a aproximação entre órgãos e entidades semelhantes acontece também nos Poderes Legislativo e Judiciário, assim como nos Tribunais de Contas e nos órgãos do Ministério Público. Além disso, essa aproximação, para ações conjuntas e troca de experiências, ocorrem entre órgãos similares que pertencem aos três Poderes e nos três níveis da federação, como é o caso da Rede Nacional de Escolas de Governo, que contribuir para dar densidade aos princípios da harmonia entre os Poderes e da cooperação federativa.

Este trabalho utiliza-se do conceito de rede para discutir os desafios das redes de escolas de governo, com especial atenção para as redes de escolas do legislativo e dos Tribunais de Contas. tendo como base uma pesquisa uma pesquisa em desenvolvimento que investiga a interação entre as Casas Legislativas. Nessa pesquisa, além das Escolas, consideram-se também a rede de TVs do Legislativo, a União Nacional dos Legislativos e Legisladores Estaduais – Unale, o programa Interlegis, do Senado Federal, além de outros canais de interação entre as instituições legislativas no Brasil. Para o exame das Escolas do Legislativo e dos Tribunais de Contas, foi encaminhado um questionário para todas as Escolas desses órgãos nos âmbitos federal e estadual, além das escolas municipais que fazem parte da Associação Brasileira de Escolas do Legislativo e do Tribunal de Contas – Abel. Para a análise dos dados e produção dos sociogramas, utilizamos o programa Ucinet.

O conceito de redeConcomitante aos extraordinários avanços das tecnologias de informação e comunicação – TICs -,

que ampliam as possibilidades de interação entre pessoas, instituições, ideias etc., o conceito de rede se alastra por diferentes searas da vida cotidiana, da política e das ciências. A palavra rede tem se tornado um termo da moda, um saco de metáforas (Musso, 2010, p. 17), porque vem sendo empregada em diversos contextos com variados sentidos. É um recurso linguístico para retratar sistemas de interdependências entre pessoas, instituições, elementos da natureza etc.. No senso comum, a ideia de redes sociais remete o sujeito às plataformas virtuais de interação, como o facebook e o whatsapp, ainda que o conceito abarca qualquer conjunto de interações que vinculam pessoas ou instituições,

1 Este trabalho integra pesquisa financiada Pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, intitulada O Parlamento em rede: interações entre as Casas Legislativas.

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como família, relações de trabalho, amizade, tráfico de influência etc. O conceito transita entre as ciências naturais e as sociais, sugerindo certa similaridade entre os dois campos científicos. Segundo CAPRA (2008, .20), onde quer que haja vida, temos rede.

As redes são compostas por dois elementos: nódulos e conexões. No desenho de uma rede, normalmente os nódulos são constituídos por uma classe de objetos (pessoas, cidades, computadores) de forma a reduzir o grau de complexidade, permitindo extrair determinadas ilações de um conjunto de relações. Todavia, isolar determinada rede é um artifício intelectual que não deixa de distorcer a realidade, uma vez que as conexões entre as pessoas não existem de forma isolada de outros elementos e fenômenos, como a conexão entre computadores, empresas, cidades. O mesmo problema ocorre com as conexões, que podem ser compostas de diferentes elementos e os cientistas isolam alguns para o exame da realidade. Se o que está em exame é a rede de esgoto ou de água, o fluxo entre as unidades dessa rede é apenas um. Não obstante, quando as unidades são pessoas e suas instituições, o desenho de uma rede irá variar de acordo com a natureza das conexões, como relação de parentesco, amizade, vínculo político, relações financeiras etc.. Quando os nódulos são pessoas, o processo de constituição de uma rede é dinâmico e irregular, porque novos nódulos podem aparecer e se incorporar à rede, enquanto outros podem desaparecer ou perder a sua centralidade.

Redes, como um fenômeno complexo e dinâmico, não são uniformes, podendo variar o grau de centralidade e o número de conexões de cada nódulo. É frequente a referência à proposta de organização de informações em rede de Paul Baran para o Departamento de Segurança dos EUA, visando a proteção dos dados em caso de ataque militar, o que está na gêneses da internet. Baran apresentou as redes como centralizadas, descentralizadas e distribuídas, representando as com as seguintes gravuras.

Além do grau da centralização de uma rede, elas podem ser examinadas a partir de outras referências, como a densidade dos vínculos. Em uma rede, pode haver vínculos mais fortes ou mais fracos, sendo que estudo clássico de Granovetter, intitulado a força dos lações fracos, revela que os mais fortes não são mais importantes que os demais. As redes podem ser classificadas, ainda, entre as primárias, aquelas que resultam do cotidiano das pessoas e suas relações, como familiares, amigos ou colegas de trabalho, ou redes construídas e fomentadas intencionalmente, como as redes de escolas em exame. Pode ser rede de instituições ou rede de pessoas, embora aquela comumente pressupõe esta. O grau de homogeneidade entre os nódulos também é uma variável importante. As diversas redes de escolas de governo têm duas bases: há as redes de escolas de um mesmo órgão espalhadas pelo território brasileiro, como a rede de escolas do Legislativo; há as redes territoriais, como a rede de escolas no Ceará, de Minas ou de Santa Catarina.

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Um pouco sobre as redes de escolas de governo

Para o XI Encontro da Rede Nacional de Escolas de Governo realizado em 2014, a Enap fez um levantamento e identificou 29 redes de escolas de governo, com os recortes já mencionados, a saber, pela natureza dos órgãos a que pertencem – rede de escolas do magistratura, ou do legislativo – e territoriais, como do Estados de Minas, de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul. Adiante, faremos referência a algumas dessas experiências, visando demonstrar que essas redes assumem diferentes configurações. As redes de escolas do legislativo e de contas serão examinadas na terceira parte desse trabalho.

Registre-se, inicialmente, a trajetória da Rede Nacional de Escolas de Governo, criada em 2003 por iniciativa da Escola Nacional de Administração Pública – ENAP, que organizou o primeiro encontro nacional de instituições e órgãos responsáveis pela capacitação e formação de servidores públicos, no qual compareceram 51 escolas. A rede nacional, que hoje se constitui de 208 entidades ou órgãos federais (62), estaduais (97) e municipais (49), se define como “uma articulação informal, de livre adesão, entre múltiplas e diferenciadas instituições governamentais brasileiras interessadas e engajadas na capacitação, formação e desenvolvimento de servidores e agente públicos” (Rede, p. 1, 2013). A Enap tem um papel vital para a rede, que não existiria sem o empenho dessa entidade. Em seu site encontra-se a página virtual da rede2, com diversos documentos, como lista das instituições participantes, listas de redes internacionais similares, documentos dos encontros e das reuniões do comitê gestor, além de textos de interesse das escolas. Nessa página, os interessados podem encontrar os relatórios de todos os dez encontros da rede, que aconteceram na sede da referida escola. A cuidadosa elaboração desses relatórios, que permitem a recuperação da história da rede, é uma evidência da importância da Enap para essa articulação nacional das escolas de governo. Esses relatórios registram os impasses, as possibilidades e os desafios da rede. Discutiu-se, por exemplo, sem chegar a um consenso, sobre o papel coordenador da Enap na rede, com entendimentos que foram desde a necessidade de a referida entidade aprofundar o seu papel de articuladora até a postura oposta, de que rede não precisaria de coordenação.

Outro tema que aparece com regularidade é o da comunicação na rede: como as escolas poderiam socializar suas experiências e apresentar suas demandas fora dos encontros? Dessa demanda nasceu a proposta de criação de uma plataforma em que as escolas pudessem compartilhar suas experiências. A partir dessa demanda, a Enap, com apoio financeiro do Ministério do Planejamento, contratou o desenvolvimento de um sistema que abrigaria a comunidade virtual da rede, que recebeu o nome de Mapa. O sistema começou a funcionar em 2008 e o VII Encontro, realizado no ano seguinte, dedicou parte de sua agenda a divulgar o novo recurso tecnológico. Apesar do investimento financeiro e da energia desprendida pela Enap, o sistema não vingou, por, pelo menos, duas razões. Uma é o fato de que foi desenvolvido por empresa privada contratada para este fim, mas a manutenção e atualização do sistema após o término do contrato tornou-se um obstáculo. Parece-nos mais relevante, todavia, a outra razão, que reside na baixa adesão ou até mesmo uma resistência por parte de várias escolas, que pouco alimentavam o sistema com suas informações. Há um descompasso entre o entusiasmo com as possibilidades de cooperação expresso nos encontros e a sua incorporação na rotina das instituições.

Outra matéria que movimenta a rede é a educação a distância - ead. Há, por um lado, várias escolas de governo que têm acúmulo de experiência e conhecimento sobre o tema, como a própria Enap, a Fiocruz, a Esaf, o Serpro, Tribunal de Contas da União, Instituto do Legislativo Brasileiro – ILB – do Senado Federal. Por outro lado, diversas escolas têm seus programas de educação a distância em fase embrionária ou pretendem desenvolvê-los, de forma que é um tema propício para a troca de experiências. A possibilidade de cessão de cursos, de oferta conjunta ou disponibilização de vagas são

2 http://www2.enap.gov.br/rede_escolas/

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elementos que fazem da educação a distância um catalizador da rede. Além disso, cursos são sempre oportunidades para ampliar as redes de contato profissional dos participantes, mas cursos a distância facilita a participação de profissionais de diferentes regiões em virtude das facilidades proporcionadas por essa modalidade de ensino, em especial, a redução do custo, na medida que não envolve deslocamento, e a flexibilidade do horário. O tema tem tamanha força aglutinadora da rede que foram organizados cinco encontros nacionais de educação a distância paralelos ao encontro das escolas de governo. O primeiro encontro foi organizado pela Escola de Governo do Paraná, com a participação de 120 gestores. No ano seguinte, a Escola de Governo do Rio Grande do Norte se encarregou de organizar segundo encontro, com a participação de 250 servidores. O terceiro encontro, que aconteceu em 2009, ficou a cargo da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, da Fundação Fiocruz, alcançando o número de 328 participantes. O IV Encontro Nacional de Ead para a Rede de Escolas de Governo aconteceu em fortaleza em 2011 com 248 participantes e foi organizado pela Escola de Gestão Pública. No ano seguinte, aconteceu o V Encontro em Brasília, sob a coordenação da Escola de Administração Fazendária,

Para se integrar à rede, basta a manifestação de interesse por meio de correspondência impressa ou eletrônica sem nenhum custo, permitindo à instituição participar dos encontros anuais e eventualmente ser informada de oportunidades de formação. Há, pois, o risco que a direção de uma instituição faça tal manifestação e a equipe que a suceder não tomar conhecimento de que faz parte da rede, até que receba uma mensagem ou ofício. O vínculo institucional, como já foi dito, passa pelas pessoas, sobretudo em redes de baixa densidade, como a rede nacional, que sofre os efeitos da rotatividade dos dirigentes das instituições, reduzindo a densidade da rede. No X Encontro de Escolas que aconteceu em 2014, no qual poderia ir o dirigente da Escola e mais um servidor, mais da metade dos participantes compareciam pela primeira vez a um evento da rede. Com efeito, a interação entre as instituições como manifestação dessa rede é baixa, salvo nos encontros anuais. No período entre 2003 e 2014 foram realizados dez encontros, sempre na sede da Enap em Brasília, e cinco encontros sobre educação a distância nas Escolas de Governo, em diferentes cidades (Curitiba, Natal, Rio de Janeiro, Fortaleza e Brasília) e sob o patrocínio de distintas instituições. A educação a distância provoca grande interesse das escolas de governo. A rede nacional quase se confunde com os seus encontros, porque, além dele, há eventual compartilhamento de informações sobre oportunidade formativa. Houve a

A maior interação entre as escolas fica a cargo de sub-redes, que se organizam em virtude de recorte territorial, como a rede do Rio Grande do Sul, de Minas Gerais, de Santa Catarina, ou pela natureza dos órgãos e entidades, como, por exemplo, as escolas do legislativo ou as dos Tribunais de Contas.

Entre as sub-redes, destaca-se no âmbito federal o Sistema de Escolas de Governo da União – SEGU -, instituído pelo Decreto nº 5.707, de 23 de fevereiro de 2006, que estabelece a Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoal do governo federal, composto por 17 instituições e órgãos responsáveis pela capacitação de servidores, tendo a ENAP como coordenadora. Entre as atribuições desse sistema, está o auxílio ao processo decisório do Comitê Gestor da Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoal. A troca de experiências é uma das tônicas que motivam a articulação dessas instituições federais. Desde 2011, vem sendo realizados eventos bimestrais, o que oferece maior densidade a essa rede, o que é facilitado pela proximidade geográfica, porque todas elas estão sediadas em Brasília. Nessas reuniões, recebeu especial atenção o debate sobre a certificação em especialização por instituições que não integram o sistema formal de educação, matéria em exame no Conselho Nacional de Educação e no Ministério da Educação desde 2012. Essa rede de escolas federais assume o duplo papel: de advocacy em instâncias político-administrativas e a de troca de experiências e cooperação. Integram esse sistema, entre as instituições legislativas, o Centro de formação da Câmara dos Deputados – Cefor -, e o Instituto Legislativo Brasileiro – ILB.

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No Estado do Paraná, a rede foi articulada a partir de 2004 por iniciativa da Escola de Governo daquele Estado, que estabeleceu vínculos com as sete instituições de ensino superior mantidas pelo governo estadual. De forma cooperativa, as instituições ofereceram diversas turmas de curso de Especialização em Formulação e Gestão de Políticas Públicas, totalizando, entre 2006 e 2008, 572 concluintes (Carvalho, 2012, P.6). O termo rede aqui sofre certo deslocamento semântico, porque não é uma articulação de escolas de governo, na medida em que envolve instituições de ensino superior públicas que poderiam contribuir com a qualificação dos servidores. A experiência teve continuidade, sendo ofertados outros cursos em ação conjunta entre as Escolas de governo daquele Estado, inclusive duas turmas de mestrado. O Paraná é o único Estado que não consolidou sua Escola do Legislativo, razão pela qual não participa da referida rede de escolas estadual.

O Rio Grande do Sul seguiu perspectiva semelhante: o Decreto nº 48.273, de 23 de agosto de 2011, instituiu a Rede Escola de Governo, no âmbito da Fundação para o Desenvolvimento de Recursos Humanos. O Comitê Pedagógico da Rede é composto por representantes de órgãos responsáveis pela capacitação e formação de servidores, inclusive da Assembleia Legislativa do Estado e do Tribunal de Contas, e das Universidades parceiras, nos termos da Portaria nº 2.959, de dezembro de 2011. Em parceria com as Universidades e com orçamento do Estado, foram oferecidos, entre 2011 e julho de 2013, sete cursos de pós-graduação, 101 cursos de extensão e 65 eventos, como seminários e oficinas, envolvendo um orçamento de sete milhões de reais. Em Santa Catarina, também há uma articulação entre os três Poderes, além do Ministério Público e do Tribunal de Contas, substanciada em convênio de cooperação institucional assinado em dezembro de 2012.

No Ceará, a articulação em rede é reflexo direto da participação nos eventos da Rede Nacional. Algumas instituições inspiraram-se no modelo federal e promoveram uma articulação de nove instituições integrantes dos três Poderes, além do Ministério Público e do Tribunal de Contas. Para o melhor desenvolvimento dos trabalhos, há uma coordenação colegiada composta por três membros eleitos para mandato de um ano, com reuniões mensais, e uma secretaria executiva. A existência dessa rede foi importante para o início de uma rede nordestina de escolas de governo, que teve um primeiro encontro em setembro de 2013 e outro em 2014.

Desde 2003, foi instituída em Minas Gerais Rede de Escolas de Governo – Reap. Entre as redes mencionadas até agora, é a mais informal, porque não há um instrumento legal, como decreto ou convênio, que a institui. Composta por órgãos e entidades dos três Poderes estaduais, além do Ministério Público e do Tribunal de Contas, conta também com a participação de órgãos do Município (Escola do Legislativo da Câmara Municipal) e da União (Escola da Advocacia Geral do Estado). Seu funcionamento acontece em torno de iniciativas, como a organização de Congressos de Direito Constitucional com a PUCMinas, ou seminários de educação corporativa, em que variam as instituições envolvidas e a coordenação. Uma comunidade no moodle e um grupo no facebook são espaços onde se pode compartilhar documentos e ideias, ainda que pouco visitados. Escolas de Câmaras Municipais, notadamente no Sul do Estado, com o apoio da Escola de Contas do TCE e a participação de Associações de Municípios da região iniciaram um processo de criação da Rede de Educação Corporativa Mineira, com a realização de dois encontros.

Verifica-se que as redes de escolas assumem diferentes configurações. Em seguida, vamos focar nas redes de escolas do legislativo e dos Tribunais de Contas, que tem como epicentro a Abel, Associação de Escolas do Legislativo e dos Tribunais de Contas. Uma associação não é necessariamente uma rede, mas a sua ação pode alimentar uma rede.

A rede de escolas do Legislativo e dos Tribunais de Contas

A Escola de Pernambuco teve a iniciativa de organizar em 2001 o 1º Encontro das Escolas do Legislativo do Brasil, com a participação, além da anfitriã, de representantes de Minas Gerais, Santa

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Catarina, Rio Grande do Sul e do Instituto de Estudos e Pesquisas sobre o Desenvolvimento do Estado do Ceará, criado em 1988 e desenvolvendo atividades pedagógicas desde 1999.

“Em maio de 2003, quando representantes de vinte assembleias legislativas reuniram-se em Brasilia para fundar uma associação, havia onze escolas criadas e sete efetivamente instaladas. A elas se juntaram, ainda que funcionassem de maneira um tanto diferente, órgãos de ensino do Legislativo Federal – ILB e a Universidade do Legislativo (Unilegis), do Senado Federal; o Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento (Cefor, da Câmara dos Deputados, e o Instituto Serzedello Corrêa (ISC), do Tribunal de Contas da União.” (Cosson, 2008, P. 20).

Nascia a Associação Brasileira de Escolas do Legislativo - Abel, para cujo parto o então diretor do Instituto Legislativo do Brasil – ILB - Florian Madruga, teve um papel destacado, mesmo porque já trazia certa experiência de práticas colaborativas similares entre as gráficas de órgãos públicos.Florian segue como presidente da entidade até hoje. Nos anos seguintes à formação da Abel, deu-se continuidade ao processo de criação de escolas nas assembleias legislativas, ao, mesmo tempo que se iniciava um movimento de criação de escolas em Câmaras Municipais, primeiro nas capitais e cidades polos e, posteriormente, se estendendo a cidades menores. Pode-se dizer que, atualmente, muitas Câmaras Municipais estão criando escolas do legislativo, em um fenômeno de contágio, em parte, devido à visibilidade que projetos intitulados parlamento jovem vêm ganhando entre os legislativos municipais.

A Associação Brasileira de Escolas do Legislativo – Abel - foi criada em 2003 durante a Conferência Nacional dos Legisladores e dos Legislativos Estaduais. Em sua criação, destaca-se o papel do então Diretor do Instituto Legislativo Brasileiro – ILB - (órgão do Senado), que preside a Associação até hoje. Florian já trazia a experiência de seu envolvimento na entidade associativa das gráficas das entidades federativas, do período em que foi diretor da gráfica do Senado. No ano seguinte de sua criação, por sugestão do então diretor da Escola do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul, e sob o argumento da proximidade entre as Casas Legislativas e as Cortes de Contas, a Abel estendeu o campo de seus associados para admitir a participação das escolas dos Tribunais de Contas. É um número pequeno de Escolas de Contas que permanecem associadas à entidade e participam de seus eventos, mas tal participação sempre enriquece os encontros da Abel. Registre-se que as escolas dos Tribunais de Contas, notadamente depois do Programa de Modernização dos Tribunais de Contas – Promoex -, como se verá adiante, mantém uma interação densa, constituindo uma rede própria.

A rede de escolas do Legislativo apresenta, assim, maior grau de formalidade do que qualquer uma das referidas experiências, na medida em que ela se corporifica na Associação Brasileira de Escolas do Legislativo, que tem uma receita decorrente do pagamento de anualidade dos mais de 100 associados. A formalidade não se traduz, necessariamente, em densidade, e é possível reconhecer, nessa rede, suas sub-redes. Seja como for, a rede vem se ampliando de forma significativa. A principal atividade da entidade é a realização de dois encontros anuais, um deles de forma concomitante à Conferência Anual da União dos Legislativos Estaduais. Além disso, mantém uma assessoria de comunicação, que, além de cobrir os eventos, mantém atualizada as páginas da entidade na internet e no facebook. As escolas do legislativo do sudeste também mantém um grupo no facebook, no qual divulgam suas iniciativas e trocam informações.

As escolas do legislativo das Assembleias e o atuam comumente em três frentes. De um lado, cuidam da capacitação do corpo funcional da própria instituição. Como lidam com a gestão do conhecimento próprio do legislativo, como, por exemplo, a técnica legislativa, comumente oferecem, junto com o Interlegis, um programa do Senado Federal, cursos para os vereadores e servidores de Câmaras Municipais. Por fim, atende a demanda da sociedade por atividades que ajude às pessoas a conhecer melhor o poder legislativo, em especial, os estudantes. Na atuação para formação dos vereadores e dos servidores de Câmaras Municipais, acaba constituindo uma rede de relação com o Legislativo Municipal e com as escolas de Câmaras existentes em seus respectivos Estados. Assim, há uma sub-

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rede entre Escolas do Legislativo de Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais e suas escolas, pelo menos, no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Minas Gerais, como se verá adiante.

Nas atividades voltadas para a sociedade, destacam-se os projetos intitulados de parlamento jovem, que, apesar da adoção da mesma terminologia, assumem diferentes configurações3. Uma referência é o modelo da Assembleia Legislativa de São Paulo, em que os jovens simulam o exercício do mandato, discutindo e votando proposições. O modelo da ALSP inspirou o Centro de Formação da Câmara dos Deputados, que segue este modelo. Em Minas Gerais, não há a simulação no exercício da representação popular, porque os jovens são estimulados a atuar como cidadãos em interação com as Casas Legislativas. Em Minas, o projeto é uma articulação inicialmente entre a Assembleia Legislativa e a Pontifícia Universidade Católica e, a partir de 2010, se expandiu, agregando Câmaras Municipais do interior. No final de um ano, os participantes definem o tema do ano seguinte, que será discutido nos municípios na primeira etapa e representantes trazem as propostas aprovadas para a discussão e plenária na etapa final na sede da Assembleia Legislativa. Em 2014, o tema foi a o envelhecimento e envolveu 27 Câmaras Municipais, sendo que 18 municípios desenvolvem a etapa municipal organizados em polo e 9 deles, notadamente por razão geográfica, atuam de forma articulada. Em 2015, o tema foi a violência, que envolveu 41 Câmaras Municipais e, em 2016, a mobilidade urbana já conta com 50 Câmaras envolvidas na construção de propostas por parte de seus jovens.

Para compreender melhor a organização das redes de Escolas do Legislativo e dos Tribunais de Contas, utilizando-se o serviço do site Survey Monkey, foi encaminhado, por correio eletrônico, questionário a todas as escolas do legislativo e de contas estaduais e federais, além das municipais associadas à Abel. Além disso, foi encaminhado aos participantes do XX Encontro da Abel realizado em Porto Alegre em novembro de 2014, bem como às escolas municipais indicadas pelas Escolas do Legislativo de Assembleias legislativas. O questionário trazia um rol de instituições em que o respondente poderia assinalar indicando com quem estabeleceu, entre 2013 e 2014, algum tipo de relação adiante descritas, podendo incluir outras instituições municipais, porque não é possível constar da lista todas as escolas de Câmaras Municipais. Incluindo as instituições locais mencionadas por qualquer dos 49 questionários respondidos, obteve um total de 162 escolas do governo. Excluídos os nódulos com os quais não se reconheceu nenhum vínculo, restou uma rede com 132 nódulos.

O questionário buscou identificar a interação entre as escolas dos Legislativo e dos Tribunais de Conta a partir de sete questões, que se referem a: a) a realização conjunta em eventos formativos, b) realização conjunta de cursos e de eventos de educação para a cidadania, c) compartilhamento de material didático, d) disponibilização de profissional para atividade formativa de outra instituição; e) participação em evento formativo de outra instituição e f) a busca por informações. Algumas dessas redes, como a busca de informação, são direcionadas, enquanto outras, como a realização conjunta de eventos, são não direcionadas.

Como se verá adiante, os resultados dessa pesquisa sugerem certa proeminência da Escola do Legislativo da Assembleia de Minas Gerais nessa rede. É difícil saber, por um lado, o quanto esse destaque se deve a fatores objetivos, como ser a primeira escola do legislativo estadual e nacional do país, estar consolidada institucionalmente e ter entre as suas diretrizes o trabalho em parceria com outras instituições; e, pelo outro, o quanto se deve a uma variável subjetiva, uma vez que o pesquisador faz parte do quadro de servidores dessa instituição. Esta é uma limitação desta pesquisa. Os dados foram posteriormente trabalhados pelo programa Ucinet, que forneceu os sociogramas que apresentaremos em seguida.

Para facilitar o preenchimento do questionário, cada quesito relacional foi sempre desdobrados em três, para que o respondente indicasse a existência de algum vínculo com: a) Escolas do Legislativo

3 O termo parlamento jovem no google trouxe 433 mil referências.

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federais ou estaduais, sem apresentado o rol completo delas; b) Escolas de câmaras municipais, que, além da lista de associadas da Abel, o respondente poderia acrescentar outras; c) Escolas dos Tribunais de Contas, cujo rol completo constava do questionário. Indagou-se, por exemplo, se o respondente teria realizado algum evento presencial em parceria com alguma outra escola do Legislativo ou do Tribunal de Contas.

Em relação a realização conjunta de eventos presenciais, foram localizados 100 nódulos ativos, com um total de 284 relações. Dentre os 5 quesitos, é a que apresenta a sub-rede com maior número de nódulos e conexões.

Os nódulos verdes são Escolas do Tribunal de Contas, os vermelhos são escolas dos legislativos federais e estaduais e os amarelos, das Câmaras Municipais. Verifica-se a centralidade da ELE da ALMG e a Escola do Tribunal de Contas da União. Essa sub-rede apresenta claro padrão de homofilia, ou seja, tem forte padrão de relações entre instituições da mesma categoria, exceto a Escola do Legislativo de Minas Gerais, com forte interação com escolas municipais. Algumas Escolas de Câmaras Municipais se destacam, como de São Paulo, e de Pouso Alegre.

Quanto ao material didático, é a sub-rede que apresenta menor densidade, com 55 nódulos ativos e um total de 65 relações. Os órgãos que mais forneceram material didático foram o Interlegis, as Escolas do TCU e o Cefor – Câmara dos Deputados -, e as Escolas da ALPE e da ALMG são as que mais utilizam material de outras instituições.

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A participação em eventos organizados por outras instituições é uma interessante forma de promover parcerias, ainda que as possibilidades sejam maiores em redes de escolas com proximidade territorial. Nestes casos, é possível a cessão de vagas excedentes e residuais para as demais escolas de governo. Em redes dos Legislativos e dos Tribunais de Contas, essa participação ocorre quando o curso tem como público alvo os profissionais de entidades similares. Nesta rede, com participação de 66 nódulos e um total de 111 relações, a Escola do TCE do Rio Grande do Norte, a ELE de Pouso Alegre – MG e a Escola do TCU foram as instituições mais participativas nos eventos e cursos organizados por outras instituições.

A sub-rede correspondente à troca de informações possui 75 nódulos ativos em um total de 161 relações. É uma esparsa, com baixo grau de centralização, subrede em que muitas instituições procuram e são procuradas para fornecer informações, sendo que ELE da ALMG, o Interlegis, e o Cefor/Câmara dos Deputados e a ELE de ALSC foram as instituições mais procuradas para fornecer informações, entanto ELE de Betim, a Escola do TCE Goias (Municipal, a ELE de Monte Sião e ELE Curitiva foram as instituições que mais procuram informações.

Por fim, cabe visualizar a rede total, refletindo a soma das sub-redes já comentadas, em que se destacam as Escolas do Tribunal de Contas, da ALMG e o Interlegis/Senado. A rede como um todo se mostra bastante coesa.

Conclusão

Os dados da pesquisa revelam que se trata de duas redes, as do legislativo e do Tribunal de Contas, com alguns pontos de intercessão. A rede de Escolas do Legislativo é fortemente estimulada pela Associação Brasileira de Escolas do Legislativo e do Tribunal de Contas – Abel -, em especial, por meio de seus encontros. A rede das escolas dos Tribunais de Contas tem como epicentro a Escola do Tribunal de Contas da União. Em ambos os casos, a realização de eventos comuns e a troca de informações são as interações que oferecem maior densidade a essas redes.

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Referências

Barabasi, Albert-Laszló. Linked. A nova ciência dos networks. São Paulo: Ed. Leopardo, 2009CAPRA, Fritjof. Vivendo redes. Duarte, F.; Squant, C.; Souza, Q. (org.). O tempo das redes. São Paulo: Perspectiva, 2008. Pg. 17-30.Cosson, Rildo. Escolas de democracia. Escolas do Legislativo. Brasilia: Câmara dos Deputados, 2008.Granovetter, Mark. The strength as weak ties: a network theory revisited. Sciological Theory, v. 1 (1983), p. 201-233. Wasserman, Stanley e Faust, Katherine. Social Network Analysis. Cambridge University Press, Cambridge U.K., 1999.

ResumoA exposição apresenta dados parciais de uma pesquisa realizada com o apoio da Pontifícia Universidade Católica intitulada o Parlamento em Rede. Nesta pesquisa, apura-se várias redes de interação entre as Casas Legislativas e os resultados a serem apresentados referem-se à rede de escolas do legislativo e dos Tribunais de Contas. Foram encaminhados questionários para todas as escolas de Contas e dos Legislativos Estaduais, bem como das Câmaras Municipais que integram a Associação Brasileira de Escolas do Legislativo e de Contas – Abel, visando apurar práticas de cooperação entre as instituições. Os dados são tratados por meio do programa Ucinet, que permite visualizar a composição da rede, além de fornecer dados sobre sua morfologia, como centralidade dos atores.

Sobre os autoresGuilherme Wagner Ribeiro - Analista Legislativo da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Graduado em Direito (UFMG), Mestre em Educação (UFMG), Doutor em Ciêncais Sociais (PUCMinas). Compôs o Comitê Gestor da Rede Nacional de Escolas de Governo entre 2014 e 2015. Endereço eletrônico: [email protected] Paula Magalhães - Acadêmica de Direito pela PUC-MG.