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SEMANA 1 Bem jurídico tutelado. A objetividade jurídica dos crimes contra a Administração Pública é a sua normalidade funcional, probidade, moralidade, eficácia e incolumidade. Conceitos de Administração Pública e funcionário público para o Direito Penal. Embora na doutrina do Direito Administrativo a expressão “Administração Pública” sirva para expressar, em sentido estrito, as atividades realizadas pelo Poder Executivo, a doutrina do Direito Penal considera a expressão (Administração Pública) de forma mais ampla. Nesse sentido afirma Magalhães Noronha: “O conceito de administração pública, no que diz respeito aos delitos neste título, é tomado no sentido mais amplo, compreensivo da atividade total do Estado e de outros entes públicos. Portanto, com as normas que refletem os crimes contra a Administração Pública, é tutelada não só a atividade administrativa em sentido estrito, técnico, mas, sob certo aspecto, também a legislativa e a judiciária. Na verdade, a lei penal, neste título, prevê e persegue fatos que impedem ou perturbam o desenvolvimento regular da atividade do Estado e de outros entes públicos.” No que concerne ao conceito de funcionário público para o Direito Penal é de se considerar que no âmbito do Direito Administrativo, é bastante restrito tal conceito, consistindo em mera espécie de agente administrativo, o qual, por sua vez, também pertence a um gênero mais amplo, denominado agente público. Desse modo, o conceito mais amplo é o de agente público, entendendo-se como tal qualquer pessoa que exerça, a qualquer título, ainda que transitoriamente e sem remuneração, função pública. Os agentes públicos subdividem-se em: AGENTES POLÍTICOS: são aqueles dotados de ampla discricionariedade funcional e que detém exercício de parcela do poder soberano do Estado (ex. magistrados).

Aula 1 direito penal iv

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SEMANA 1

Bem jurídico tutelado.

A objetividade jurídica dos crimes contra a Administração Pública é a sua normalidade funcional, probidade, moralidade, eficácia e incolumidade.

Conceitos de Administração Pública e funcionário público para o Direito Penal.

Embora na doutrina do Direito Administrativo a expressão “Administração Pública” sirva para expressar, em sentido estrito, as atividades realizadas pelo Poder Executivo, a doutrina do Direito Penal considera a expressão (Administração Pública) de forma mais ampla. Nesse sentido afirma Magalhães Noronha: “O conceito de administração pública, no que diz respeito aos delitos neste título, é tomado no sentido mais amplo, compreensivo da atividade total do Estado e de outros entes públicos. Portanto, com as normas que refletem os crimes contra a Administração Pública, é tutelada não só a atividade administrativa em sentido estrito, técnico, mas, sob certo aspecto, também a legislativa e a judiciária. Na verdade, a lei penal, neste título, prevê e persegue fatos que impedem ou perturbam o desenvolvimento regular da atividade do Estado e de outros entes públicos.”

No que concerne ao conceito de funcionário público para o Direito Penal é de se considerar que no âmbito do Direito Administrativo, é bastante restrito tal conceito, consistindo em mera espécie de agente administrativo, o qual, por sua vez, também pertence a um gênero mais amplo, denominado agente público. Desse modo, o conceito mais amplo é o de agente público, entendendo-se como tal qualquer pessoa que exerça, a qualquer título, ainda que transitoriamente e sem remuneração, função pública. Os agentes públicos subdividem-se em:

AGENTES POLÍTICOS: são aqueles dotados de ampla discricionariedade funcional e que detém exercício de parcela do poder soberano do Estado (ex. magistrados).

AGENTES ADMINISTRATIVOS: são os servidores público sem seu sentido mais amplo, os quais desempenham funções que, a despeito de relevantes, não representam exercício de soberania, uma vez que não prestam jurisdição, não legislam, não exercitam o jus puniendi do Estado nem estabelecem as diretrizes administrativas governamentais.

AGENTES DELEGADOS: são aqueles que recebem, por delegação do Poder Público, consubstanciada em concessões ou permissões, a função de realizar obras e serviços públicos, originariamente atribuídos ao Poder Concedente, sob sua fiscalização.

AGENTES HONORÍFICOS: trata-se de particulares que colaboram com a Administração, mediante convocação ou nomeação para prestar, transitoriamente e sem remuneração, serviços em favor do Estado, sem vínculo empregatício ou estatutário (ex. mesários nas eleições).

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Distinção entre funções precípuas e concorrentes da administração pública.

As funções precípuas da administração pública são as funções vitais para a coletividade, tais como segurança pública, os meios de comunicação etc. – denominadas necessidades coletivas essenciais -, além de outras que, embora não decorram necessariamente da vida em sociedade, são também importantes para a coletividade, como o fornecimento de água e energia elétrica, sendo conhecidas necessidades coletivas instrumentais.

Distinção entre crimes funcionais próprios e impróprios.

Os crimes funcionais são divididos em duas espécies: PRÓPRIOS e IMPRÓPRIOS.

Nos crimes funcionais próprios (puros ou propriamente ditos), faltando a qualidade de funcionário público ao autor, o fato passa a ser tratado como um indiferente penal, não se subsumindo a nenhum outro tipo incriminador – atipicidade absoluta – por exemplo, a prevaricação (art. 319, CP).

Já nos crimes funcionais impróprios (impuros ou impropriamente ditos) desaparecendo a qualidade de servidor do agente, desaparece também o crime funcional, operando-se,porém, a desclassificação da conduta para outro delito, de natureza diversa – atipicidade relativa – por exemplo peculato furto (art. 312, § 1º, CP).

Conceitos de funcionário público e, funcionário público por equiparação, previstos no Código Penal; distinção do conceito de múnus público.

Funcionário público, de acordo com o art. 327 do CP, ou seja,para efeitos penais, não somente é aquele ocupante de um CARGO, que pode ser denominado de funcionário público em sentido estrito,mas também aquele que exerce emprego ou função pública. Emprego público é a expressão utilizada para efeitos de identificação de uma relação funcional regida pela CLT (empresa pública, sociedade de economia mista e exercício de atividades temporárias). Função é a atividade em si mesma, ou seja, é sinônimo de atribuição e corresponde às inúmeras tarefas que constituem o objeto dos serviços prestados pelos servidores públicos.

O § 1º, acrescentado ao art. 327 pela Lei 9983/00, criou o chamado funcionário público por equiparação, passando a gozar desse status o agente que exerce cargo, emprego ou função em entidades paraestatais (Paraestatal significa ao lado do Estado, paralelo ao Estado. Entidades Paraestatais são aquelas pessoas jurídicas que atuam ao lado e em colaboração com o Estado e, para José dos Santos Carvalho Filho, estariam enquadradas como Entidades Paraestatais as pessoas da administração indireta – autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, agências reguladoras e as entidades de cooperação governamental, ou seja, os serviços sociais autônomos, como o SESI SENAIS, SEC, SENAC etc.). bem como aquele que trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para execução de atividade típica da Administração Pública, como por exemplo administrador de hospital privado que presta atendimento a segurado da Previdência Social, bem como também a coleta de lixo, fornecimento de energia elétrica e

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iluminação pública, serviços de telefonia, serviços de transporte público etc.., estando excluído de tal equiparação quando for exploração de atividade econômica.

CONTROVÉSIA:

Qual o alcance da equiparação prevista no art. 327, § 1º, do CP, a saber: haveria equiparação a funcionário público tanto na posição de sujeito ativo quanto na de sujeito passivo?

1ª corrente – defende que há a equiparação somente quando o funcionário público é sujeito ativo do delito, com o argumento de que o art. 327, § 1º, do CP não constitui uma norma geral por força da sua posição topológica na parte final do capítulo dos crimes praticados por funcionário público contra a Administração Pública (Nélson Hungria), bem como o § 2º do art. 327, ao limitar a causa de aumento de pena aos “autores dos crimes previstos neste Capítulo” demonstrou que a equiparação do § 1º deve ficar limitada ao sujeito passivo (Delmanto).

2ª corrente – embora o art. 327 do CP na parte especial, tem característica de regra geral, como a chama o art. 12 do CP. O fato de ter sido incluída na parte especial não lhe retira essa qualidade. Ademais a lei se refere genericamente a “efeitos penais” e, assim, não há porque se excluir do conceito de sujeito passivo do crime aqueles que a lei equipara ao funcionário público como agentes do delito. (Heleno Fragoso e Mirabete), bem como o § 2º do art. 327 não justifica a primeira corrente, vez que tal parágrafo somente se referem aos sujeitos ativos dos crimes praticados por funcionários públicos em sentido próprio ou por equiparação contra a administração pública. Essa segunda posição é a adotada pelo STF e STJ, conforme ementas abaixo:.

HC nº 79823, STF

EMENTA: - "Habeas Corpus". Interpretação do artigo 327 do Código Penal. - O artigo 327 do Código Penal equipara a funcionário Público servidor de sociedade de economia mista. - Essa equiparação não tem em vista os efeitos penais somente com relação ao sujeito ativo do crime, mas abarca também o sujeito passivo. - O crime previsto no artigo 332 do Código Penal pode ser praticado por particular para obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público por equiparação no exercício da função. "Habeas corpus" indeferido.

HC nº 52989, STJ

PENAL. HABEAS CORPUS. ARTS. 288 E 333 DO CÓDIGO PENAL QUADRILHA. CONFIGURAÇÃO. CORRUPÇÃO ATIVA. FUNCIONÁRIO PÚBLICO. FLAGRANTE PREPARADO. INOCORRÊNCIA. GRAVAÇÃO DE CONVERSA POR UM DOS INTERLOCUTORES. PROVA LÍCITA. DOSIMETRIADA PENA. FUNDAMENTAÇÃO. CONCURSO MATERIAL NÃO CARACTERIZADO.

II - A teor do disposto no art. 327 do Código Penal, considera-se, para fins penais, o estagiário de autarquia funcionário público, seja como sujeito ativo ou passivo do crime. (Precedente do Pretório Excelso).

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O exercício de uma função pública, ou seja, aquela inerente aos serviços prestados pela Administração Pública, não pode ser confundido com munus publicum (encargo público), entendido como encargo ou ônus conferido pela lei e imposto pelo Estado em determinadas situações, a exemplo do que ocorre com os tutores (art. 1728 e ss. do CC) ou curadores (art. 1767 e ss. do CC), ou seja, não são considerados funcionários públicos quem exerce apenas um munus publicum (encargo público), pois nessa hipótese prevalece o interessa privado de quem o exerce.

Distinção entre o conceito de funcionário público, previsto no Código Penal, e autoridade pública, prevista na Lei n 4898/1965: natureza das funções exercidas; aplicação do princípio da especialidade e derrogação tácita de dispositivos do Código Penal.

O conceito de funcionário público para fins penais está previsto no art. 327 do CP, já o conceito de autoridade pública, para efeito de aplicação da Lei 4898/65 (abuso de autoridade) está previsto no art. 5º.

O conceito de autoridade pública previsto no art. 5º da Lei 4898/65 é bastante amplo e o que é importante para tal conceito é a natureza da função exercida pelo agente e não a forma de investidura na administração pública.

A aplicação do principio da insignificância aos crimes contra Administração Pública.

 A arguição de aplicação do princípio da insignificância aos crimes contra a administração pública tem sido alegada frequentemente nos tribunais nacionais. O entendimento majoritário é no sentido de que não se aplica o princípio da insignificância a essas condutas criminosas, mesmo quando o dano patrimonial seja ínfimo, porquanto crimes contra a administração pública têm como objetividade jurídica tutelar o funcionamento regular da função estatal administrativa, tanto em seu aspecto patrimonial como o de moralidade administrativa.

Na jurisprudência há posição nos dois sentidos:

APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

INFORMATIVO 624, STF 2ª TURMA

Princípio da insignificância e Administração Pública

A 2ª Turma, por maioria, concedeu habeas corpus para reconhecer a aplicação do princípio da insignificância e absolver o paciente ante a atipicidade da conduta. Na situação dos autos, ele fora denunciado pela suposta prática do crime de peculato, em

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virtude da subtração de 2 luminárias de alumínio e fios de cobre. Aduzia a impetração, ao alegar a atipicidade da conduta, que as luminárias: a) estariam em desuso, em situação precária, tendo como destino o lixão; b) seriam de valor irrisório; e c) teriam sido devolvidas. Considerou-se plausível a tese sustentada pela defesa. Ressaltou-se que, em casos análogos, o STF teria verificado, por inúmeras vezes, a possibilidade de aplicação do referido postulado. Enfatizou-se que, esta Corte, já tivera oportunidade de reconhecer a admissibilidade de sua incidência no âmbito de crimes contra a Administração Pública. Observou-se que os bens seriam inservíveis e não haveria risco de interrupção de serviço. Vencida a Min. Ellen Gracie, que indeferia ordem. Salientava que o furto de fios de cobre seria um delito endêmico no Brasil, a causar enormes prejuízos, bem assim que o metal seria reaproveitável. HC 107370/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 26.4.2011. (HC-107370)

APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

INFORMATIVO 696, STF (CLIPPING)

RHC N. 106.731-DFRED. PARA O ACÓRDÃO: MIN. DIAS TOFFOLI...2. O Ministro Celso de Mello, em análise extremamente oportuna, destacou que o princípio da insignificância tem como vetores “a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada” (HC nº 84.412/SP, Segunda Turma, DJ de 19/11/04). Partindo desse conceito, a realidade dos autos demonstra que tais vetores se fazem simultaneamente presentes, pois, não obstante as circunstâncias em que foi praticado o delito, foi mínima a ofensividade da conduta do recorrente, não sendo reprovável o seu comportamento ao ponto de se movimentar a máquina judiciária.

INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

INFORMATIVO 412, STJ, 6ª TURMA CRIME. PREFEITO. PRINCÍPIO. INSIGNIFICÂNCIA.

A Turma, por maioria, denegou a ordem de habeas corpus por entender que a conduta do prefeito que emitiu ordem de fornecimento de combustível (20 litros) a ser pago pelo município para pessoa que não era funcionário público, nem estava realizando qualquer serviço público e, ainda, conduzia veículo privado estaria tipificada no art. 1º, I, do DL n. 201/1967. O Min. Nilson Naves concedeu a ordem aplicando, ao caso, o princípio da insignificância. Contudo o Relator entendeu que não se aplica tal princípio quando há crime contra a Administração Pública, pois o que se busca resguardar não é somente o ajuste patrimonial, mas a moral administrativa. HC 132.021-PB, Rel. Min. Celso Limongi, julgado em 20/10/2009.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.062.533 - RS (2008⁄0117945-0)

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RECURSO ESPECIAL. PENAL. PECULATO. AUTO DE AVALIAÇÃO DIRETA. PERITOS COM CURSO SUPERIOR. AUSÊNCIA DE QUALIFICAÇÃO TÉCNICA. NÃO-DESCARACTERIZAÇÃO DO DELITO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. BEM JURÍDICO TUTELADO: ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.1. In casu, trata-se de auto de avaliação direta e não laudo pericial propriamente dito, tendo sido a avaliação realizada por peritos de nível superior. O fato de não constar do laudo, a qualificação técnica dos peritos evidencia mera irregularidade, que não descaracteriza o delito, uma vez que a avaliação dos bens apreendidos não exige, de forma alguma, maiores conhecimentos técnicos ou científicos, bastando uma simples pesquisa de preços de mercado.2. O princípio da insignificância surge como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal que, de acordo com a dogmática moderna, não deve ser considerado apenas em seu aspecto formal, de subsunção do fato à norma, mas, primordialmente, em seu conteúdo material, de cunho valorativo, no sentido da sua efetiva lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma penal, consagrando os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima.3. Indiscutível a sua relevância, na medida em que exclui da incidência da norma penal aquelas condutas cujo desvalor da ação e⁄ou do resultado (dependendo do tipo de injusto a ser considerado) impliquem uma ínfima afetação ao bem jurídico.4. Hipótese em que o recorrente, valendo-se da condição de funcionário público, subtraiu produtos médicos da Secretaria Municipal de Saúde de Cachoeirinha-RS, avaliados em R$ 13,00.5. "É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes contra a Administração Pública, ainda que o valor da lesão possa ser considerado ínfimo, porque a norma busca resguardar não somente o aspecto patrimonial, mas moral administrativa, o que torna inviável afirmação do desinteresse estatal à sua repressão" (Resp 655.946⁄DF, Rel. Min. Laurita Vaz, Quinta Turma, DJ 26⁄3⁄07)6. Recurso especial improvido. 

PECULATO – art. 312

Bem jurídico tuteladoTutela a Administração Pública, particularmente em relação a seu próprio interesse patrimonial e moral.

Elementos do tipo (subjetivo, descritivos e normativos)

Elemento objetivo: referem-se ao aspecto material do fato. Existem concretamente no mundo dos fatos e só precisam ser descritos pela norma, como por exemplo, o objeto do crime, o lugar, o tempo, os meios empregados o núcleo do tipo (verbo).

Elemento normativo: “FUNCIONÁRIO PÚBLICO” ao contrário dos descritivos, seu significado não se extrai da mera observação, sendo imprescindível um juízo de valoração jurídica, social, cultural histórica religiosa, bem como qualquer outro campo

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do conhecimento humano. Aparecem em expressões como “sem justa causa”, “indevidamente”, “documento”, “funcionário público”, “dignidade”, “decoro” ...

Elemento subjetivo: no peculato-apropriação, de acordo com parte da doutrina, somente há elemento subjetivo geral, ou seja, o DOLO (vontade livre e consciente de transformar a pose em domínio, isto é, vontade de apropriar-se de coisa móvel pertencente ao Estado, de que tem a posse em nome do próprio Estado). O dolo é, na espécie, a vontade de assenhorar-se de bem móvel (animus rem sibi habendi), com consciência de que pertence ao Estado, invertendo o título da posse. Porém, há entendimento o professor PEDRO ALEIXO (O Peculato no Direito Penal brasileiro – tese de concurso público para UFMG) onde afirma que “não é concebível o peculato mediante apropriação sem proveito, e para que o desvio seja incriminado como peculato é indispensável que haja o proveito.” Nesse sentido, adota-se que em ambas as modalidades do caput do art. 312, há o elemento subjetivo específico, ou seja “EM PROVEITO PRÓPRIO OU ALHEIO”. Já no peculato-desvio, além do elemento subjetivo específico “EM PROVEITO PRÓPRIO OU ALHEIO” há o elemento subjetivo geral, isto é, DOLO (vontade livre e consciente de empregar a coisa em finalidade diversa daquela predeterminada administrativamente). No peculato-furto há o DOLO (vontade livre e consciente de subtrair ou concorrer para a subtração da coisa móvel), além também do elemento subjetivo específico, ou seja, “EM PROVEITO PRÓPRIO OU ALHEIO”. No peculato culposo o elemento subjetivo (e normativo) é representado pela culpa, que consiste na atuação funcional sem observância do dever objetivo de cuidado que concorre para a prática de crime doloso de outrem contra a Administração Pública

Sujeitos do delito

SUJEITO ATIVO – é crime próprio, ou seja, somente pode ser praticado por funcionário público ou aquele expressamente equiparado a este para fins penais.

SUJEITO PASSIVO – é o Estado e as demais entidades de direito público relacionadas no art. 327,§ 1º, do CP. Se o bem móvel for particular, na hipótese de peculato-malversação,o proprietário ou possuidor desse bem também será sujeito passivo.

Consumação e tentativa

Consumação – o momento consumativo do peculato-apropriação é de difícil precisão, pois depende, em última análise de uma atitude subjetiva. A consumação do crime e, por extensão, o aperfeiçoamento do tipo coincidem com aquele em que o agente, por ato voluntário e consciente, inverte o título da posse, passando a reter o objeto material do crime (dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel). Consuma-se, enfim, com a inversão da natureza da posse, caracterizada por ato demonstrativo de disposição da coisa alheia. No peculato-desvio se consuma quando o agente dá a coisa móvel destinação diversa daquela estabelecida pela Administração Pública, objetivando auferir proveito próprio ou alheio. Portanto, consuma-se o delito quando o desvio da coisa se realiza em contrariedade a qualquer finalidade de utilidade pública. O peculato-furto se consuma quando o agente realiza a subtração da coisa móvel, saindo a res furtiva da indisponibilidade da Administração Pública e passando para a disposição do sujeito ativo. O peculato culposo consuma-se no momento em que outrem executa a subtração

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contra a Administração Pública, facilitada ou viabilizada pela atuação funcional culposa do funcionário público

Tentativa – é admissível, pois trata-se de crime material, sendo certo que seu iter criminis pode ser fracionado. Inexiste tentativa no peculato culposo.

CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA:

Trata-se de CRIME PRÓPRIO (aquele que exige qualquer condição especial do sujeito ativo); quanto ao resultado é CRIME MATERIAL (que exige resultado naturalístico para a consumação); CRIME COMISSIVO (o verbo nuclear implica a prática de uma ação); CRIME DOLOSO E CULPOSO (pois há previsão legal para a figura culposa); CRIME DE FORMA LIVRE (pode ser praticado por qualquer meio ou forma pelo agente); CRIME INSTANTÂNEO (o resultado opera-se de forma imediata, sem se prolongar no tempo); CRIME UNISSUBJETIVO (pode ser praticado, em regra, apenas por um agente); CRIME PLURISSUBSISTENTE (pode ser desdobrado em vários atos, que, no entanto, integram a mesma conduta).

Figuras típicas: Peculato furto, peculato culposo, peculato desvio.

PECULATO-APROPRIAÇÃO – ART. 312 1ª PARTE

PECULATO-DESVIO – ART. 312 2ª PARTE

PECULATO-FURTO ART. 312, § 1º

Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:

        Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

        § 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

No art. 312, § 1º, do CP, há previsão de duas modalidades de peculato-furto, ou seja: a) o funcionário público executa diretamente a subtração da res furtiva aproveitando-se da facilidade proporcionada pela sua condição de agente público; b) o funcionário público concorre para que outrem realize a subtração da coisa móvel, valendo-se da facilidade

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obtida pela sua qualidade de agente público. Essa segunda hipótese constitui uma forma de concurso de agentes necessário, em que o funcionário público coopera consciente e voluntariamente para que terceira pessoa realize a subtração da res furtiva.

       

Modalidade culposa

Peculato culposo

        § 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:

        Pena - detenção, de três meses a um ano.

A expressão “concorrer culposamente” significa que o funcionário público realiza seus atos funcionais sem observar o dever de cuidado objetivo necessário para impedir que a coisa móvel de que tem a posse seja subtraída ou desviada por outrem. A cooperação culposa tanto pode se efetivar por uma ação como por omissão culposa, sendo imprescindível que a ação ou a omissão proporcionem a prática do delito doloso por outrem contra a Administração Pública.

Vale destacar que o funcionário público não concorre diretamente no fato (e para o fato) executado por outrem, mas, por força de sua desatenção ou descuido, propicia ou possibilita, culposamente, que outrem pratique um delito contra a Administração Pública. Não obstante haja um concurso de agentes não intencional, inexiste algum vínculo subjetivo entre o funcionário público e o autor do crime doloso praticado. Há, na verdade, uma espécie de autorias colaterais, isto é, ambos os delitos são realizados sem vínculo subjetivo entre os autores.

OBS: a expressão PECULATO DE USO refere-se ao comportamento do funcionário público de usar momentaneamente sem animus dominus a coisa móvel (pública ou particular) de que tem a posse em razão da função estatal, devolvendo-a, após sua utilização, nas mesmas condições à Administração Pública. É o uso temporário da coisa móvel para atender a interesse particular, seguindo-se sua imediata devolução à Administração Pública. Sendo assim, inexiste tipicidade penal, haja vista o art. 312 do CP exigir a realização do comportamento típico com animus habendi sobre a coisa móvel.

Portanto, o peculato de uso constitui um mero ilícito administrativo e punível pelas sanções do direito administrativo. Vale frisar, que o PECULATO DE USO é previsto especificamente nas infrações praticadas por prefeitos, a exato teor do art. 1º, II, do Decreto-Lei 201/67.

Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores:

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...

Il - utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos;

Reparação do dano e extinção da punibilidade.

§ 3º - No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.

Dispõe o § 3º do art. 312 que na hipótese de reparação do dano se precedente à sentença criminal irrecorrível, extingue-se a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta. No peculato doloso, a compensação, a reparação do dano ou a restituição do objeto material não excluem o crime, constituindo apenas circunstância atenuante (art. 65, III, “b”, CP)

O concurso de pessoas e a incidência do art. 30, do Código Penal: comunicabilidade das circunstâncias pessoais.

A qualidade de funcionário público do agente se estende também aos coautores ou partícipes do delito (art. 30, CP), contudo, se o particular desconhece ser o sujeito ativo funcionário público, responde por outro crime, excluindo-se o peculato, pois, nesse aspecto, o terceiro participante incorre em erro de tipo, na medida em que essa condição especial do autor não entrou na esfera de conhecimento do terceiro que, por isso mesmo, não pode por ela responder.

Distinção do delito de peculato dos delitos de falsificação de documento, furto e apropriação indébita.

FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO E PECULATO - se o funcionário praticar crime de falsidade para obter dinheiro, valor ou qualquer outro bem pertencente à Administração Pública, deverá responder por concurso material de crimes, pois os momentos consumativos e os objetos jurídicos são diversos, além do que se trata de duas condutas bastantes distintas. O STF orienta-se no sentido da existência do concurso formal de crimes.

Furto e apropriação indébita: na apropriação a coisa é licitamente entregue pelo dono ao agente, para determinada finalidade, passando este, depois de algum tempo, a dela dispor como se fosse sua. Na apropriação indébita, frise-se, a posse do agente sobre o bem é desvigiada. No furto, o agente não tem posse do bem, apoderando-se deste contra a vontade da vítima, que desconhece a subtração. Na hipótese em que o agente tem a mera detenção provisória do bem (v.g., vendedor de loja, caixa de supermercado), esta é exercida sob a vigilância do proprietário, de modo que o apoderamento do objeto implica a configuração de crime de furto e não apropriação indébita.

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Entendimento dos Tribunais Superiores.

JURISPRUDÊNCIA PECULATOINFORMATIVO 712, STF(1ª TURMA)Peculato de uso e tipicidade

É atípica a conduta de peculato de uso. Com base nesse entendimento, a 1ª Turma deu provimento a agravo regimental para conceder a ordem de ofício. Observou-se que tramitaria no Parlamento projeto de lei para criminalizar essa conduta.HC 108433 AgR/MG, rel. Min. Luiz Fux, 25.6.2013. (HC-108433)

INFORMATIVO 715, STF(CLIPPING)AG. REG. NO HC N. 108.433-MG

RELATOR: MIN. LUIZ FUX

EMENTA: PROCESSUAL PENAL E CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL. INADMISSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA JULGAR HABEAS CORPUS: CRFB/88, ART. 102, I, D E I. HIPÓTESE QUE NÃO SE AMOLDA AO ROL TAXATIVO DE COMPETÊNCIA DESTA SUPREMA CORTE. PECULATO-DESVIO. NÃO CONFIGURAÇÃO. PECULATO-USO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. RELEVÂNCIA DA ARGUMENTAÇÃO. CONCESSÃO EX OFFICIO DA ORDEM. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO.

1. É indispensável a existência do elemento subjetivo do tipo para a caracterização do delito de peculato-uso, consistente na vontade de se apropriar definitivamente do bem sob sua guarda.

PECULATO MEDIANTE ERRO DE OUTREM – art. 313Bem jurídico tuteladoTutela a Administração Pública, particularmente em relação a seu próprio interesse patrimonial e moral.

Elementos do tipo (subjetivo, descritivos e normativos)

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Elemento objetivo: referem-se ao aspecto material do fato. Existem concretamente no mundo dos fatos e só precisam ser descritos pela norma, como por exemplo, o objeto do crime, o lugar, o tempo, os meios empregados o núcleo do tipo (verbo).

Elemento normativo: “FUNCIONÁRIO PÚBLICO” ao contrário dos descritivos, seu significado não se extrai da mera observação, sendo imprescindível um juízo de valoração jurídica, social, cultural histórica religiosa, bem como qualquer outro campo do conhecimento humano. Aparecem em expressões como “sem justa causa”, “indevidamente”, “documento”, “funcionário público”, “dignidade”, “decoro” ...

Elemento subjetivo: somente há elemento subjetivo geral, ou seja, o DOLO (vontade livre e consciente de apropriar-se daquilo que recebeu por erro de outrem). O dolo deve apresentar-se em momento posterior ao recebimento, quando, normalmente, o sujeito ativo encontra-se de boa-fé.

Sujeitos do delito

SUJEITO ATIVO – é crime próprio, ou seja, somente pode ser praticado por funcionário público ou aquele expressamente equiparado a este para fins penais.

SUJEITO PASSIVO – é o Estado e as demais entidades de direito público. Se o bem móvel, dinheiro ou outra utilidade, for particular, na hipótese de peculato-malversação, o proprietário ou possuidor desse bem também será sujeito passivo.

Consumação e tentativa

Consumação – o momento consumativo dessa modalidade de peculato, a exemplo do art. 312, é de difícil precisão, pois depende, em última análise de uma atitude subjetiva. A consumação do crime ocorre com a efetiva apropriação do objeto material (dinheiro ou qualquer utilidade), ou seja, quando o funcionário público torna seu o patrimônio que recebeu, no exercício do cargo público, por erro de outrem, sendo irrelevante o prejuízo efetivo para a Administração Pública. A consumação do crime em tela ocorre quando se verifica a apropriação da coisa, ou seja, quando o agente inverte o título de posse em domínio, e não apenas com o mero recebimento do bem entregue..

Tentativa – é admissível, pois trata-se de crime material, embora de difícil configuração..

CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA:

Trata-se de CRIME PRÓPRIO (aquele que exige qualquer condição especial do sujeito ativo); quanto ao resultado é CRIME MATERIAL (que exige resultado naturalístico para a consumação); CRIME COMISSIVO (o verbo nuclear implica a prática de uma ação); CRIME DOLOSO (pois não há previsão legal para a figura culposa); CRIME DE FORMA LIVRE (pode ser praticado por qualquer meio ou forma pelo agente); CRIME INSTANTÂNEO (o resultado opera-se de forma imediata, sem se prolongar no tempo); CRIME UNISSUBJETIVO (pode ser praticado, em regra, apenas por um agente);

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CRIME PLURISSUBSISTENTE (pode ser desdobrado em vários atos, que, no entanto, integram a mesma conduta).

OBS: a maioria da doutrina entende que o erro, no presente delito, deve ser ESPONTÂNEO, isto é, nãoprovocado pelo sujeito ativo, ou seja, o funcionário público, pois não sendo espontâneo, ou em outros termos, sendo provocado pelo funcionário público, poderia haver desclassificação para outra figura típica, como por exemplo estelionato. Contudo, ROGÉRIO GRECO e GUILHERME DE SOUZA NUCCI, entendem que o erro tanto pode ser provocado, como espontâneo, concluindo GRECO “que a lei não limita que o mencionado erro seja espontâneo, somente fazendo menção ao fato de que o agente tenha recebido o dinheiro ou qualquer utilidade mediante o erro de outrem.”.

Figura típica.

Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem:

        Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

CONCUSSÃO – art. 316

Bem jurídico tuteladoTutela a Administração Pública, mais especificamente a moralidade e a probidade da Administração Pública. Secundariamente, protege-se o interesse patrimonial e a liberdade individual do administrado, já que a concussão é análoga ao delito de extorsão.

Elementos do tipo (subjetivo, descritivos e normativos)

Elemento objetivo: referem-se ao aspecto material do fato. Existem concretamente no mundo dos fatos e só precisam ser descritos pela norma, como por exemplo, o objeto do crime, o lugar, o tempo, os meios empregados o núcleo do tipo (verbo).

Elemento normativo: “FUNÇÕES” ao contrário dos descritivos, seu significado não se extrai da mera observação, sendo imprescindível um juízo de valoração jurídica, social, cultural histórica religiosa, bem como qualquer outro campo do conhecimento humano. Aparecem em expressões como “sem justa causa”, “indevidamente”, “documento”, “funcionário público”, “dignidade”, “decoro” ...

Elemento subjetivo: há elemento subjetivo geral, ou seja, o DOLO (vontade livre e consciente de exigir vantagem indevida do sujeito passivo, direta ou indiretamente), como também há o elemento subjetivo específico que é representado pela finalidade da ação que visa a vantagem indevida “PARA SI OU PARA OUTREM”.

Sujeitos do delito

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SUJEITO ATIVO – é crime próprio, ou seja, somente pode ser praticado por funcionário público. Não é indispensável que seja no exercício da função,podendo ocorrer nas férias,no período de licença ou mesmo antes de assumi-la, desde que o faça em razão dela.

SUJEITO PASSIVO – o Estado, representando todo e qualquer órgão ou entidade de direito público e, secundariamente, também o particular lesado.

Consumação e tentativa

Consumação – a consumação do crime de concessão ocorre com a simples exigência do sujeito ativo, ou seja, no momento em que o sujeito passivo toma conhecimento do seu conteúdo Não é necessário que se efetive o recebimento da vantagem exigida; se ocorrer, o recebimento dessa vantagem indevida representará o exaurimento do crime, que se encontra perfeito e acabado com a imposição do sujeito ativo..

Tentativa – é inadmissível, pois se trata de crime unissubsistente, isto é, de ato único, não admitindo fracionamento. Contudo, concretamente, pode ser que a exigência se revista de diversos atos, como, por exemplo, a exigência da vantagem indevida é feita por meio de correspondência, que se extravia, sendo interceptada pela autoridade policial antes de a vítima conhecer seu conteúdo. Nessa hipótese, pode, teoricamente, dependendo da idoneidade de exigência, caracterizar-se tentativa de concussão.

CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA:

Trata-se de CRIME PRÓPRIO (aquele que exige qualquer condição especial do sujeito ativo); quanto ao resultado é CRIME FORMAL (que não exige resultado naturalístico para a consumação); CRIME COMISSIVO (o verbo nuclear implica a prática de uma ação); CRIME DOLOSO (pois não há previsão legal para a figura culposa); CRIME DE FORMA LIVRE (pode ser praticado por qualquer meio ou forma pelo agente); CRIME INSTANTÂNEO (o resultado opera-se de forma imediata, sem se prolongar no tempo); CRIME UNISSUBJETIVO (pode ser praticado, em regra, apenas por um agente); CRIME UNISSUBSISTENTE OU PLURISSUBSISTENTE (que pode ou não, dependendo da forma que é praticado, ser desdobrado em vários atos, que, no entanto, integram a mesma conduta).

Figura típica

Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:

        Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

OBS: O entendimento majoritário é no sentido de que “vantagem indevida” abrange tanto o proveito econômico como também aquele de natureza não patrimonial, de valor

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imaterial, simplesmente para satisfazer sentimento pessoal, como por exemplo, a concessão de um título honorífico, a conferência de um título de graduação, enfim, a vantagem indevida pode não ter necessariamente valor econômico        

Excesso de exação

        § 1º - Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza:  (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)

        Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)

Bem jurídico tuteladoTutela a Administração Pública, na qualidade de administração fazendária. A objetividade jurídica é a proteção do normal funcionamento da Administração Pública, para fins de evitar o abuso no exercício da arrecadação das receitas tributárias. Secundariamente, protege-se a dignidade individual e o patrimônio do contribuinte, que não deve ser alvo de medidas gravosas e vexatórias praticadas por funcionários públicos encarregados da arrecadação das receitas fiscais.

OBS: o termo EXAÇÃO significa, nos termos do dispositivo legal, uma cobrança rigorosa de tributo. Portanto, o crime de excesso de exação refere-se ao comportamento que ultrapassa os limites jurídicos permitidos no exercício da função de arrecadar tributos. Em essência o dispositivo legal incrimina a exação ou exigência abusiva.

Elementos do tipo (subjetivo, descritivos e normativos)

Elemento objetivo: referem-se ao aspecto material do fato. Existem concretamente no mundo dos fatos e só precisam ser descritos pela norma, como por exemplo, o objeto do crime, o lugar, o tempo, os meios empregados o núcleo do tipo (verbo).

Elemento normativo: “TRIBUTOS” e “CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS” ao contrário dos descritivos, seu significado não se extrai da mera observação, sendo imprescindível um juízo de valoração jurídica, social, cultural histórica religiosa, bem como qualquer outro campo do conhecimento humano. Aparecem em expressões como “sem justa causa”, “indevidamente”, “documento”, “funcionário público”, “dignidade”, “decoro” ...

Elemento subjetivo: há somente elemento subjetivo geral, ou seja, o DOLO (vontade livre e consciente de exigir o recolhimento de tributo ou contribuição social indevidos,ou pelo emprego de meio vexatório ou gravoso na sua cobrança não

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legalmente autorizado), ou seja, DOLO DIRETO (indicado pela expressão “que sabe”) e DOLO EVENTUAL (contido na fórmula “que deveria saber”).

Sujeitos do delito

SUJEITO ATIVO – é crime próprio, ou seja, somente pode ser praticado por funcionário público que tem competência administrativa para o recebimento do tributa ou da contribuição social.

SUJEITO PASSIVO – o Estado, representando todo e qualquer órgão ou entidade de direito público.

Consumação e tentativa

Consumação – a consumação do crime de excesso de exação da seguinte forma: a) na primeira modalidade do delito, a consumação ocorre com a realização da exigência, não se reclamando o recebimento efetivo do tributo devido, que no caso, constituirá mero exaurimento do delito; b) na segunda modalidade, o crime se consuma com o emprego do meio vexatório ou gravoso, não autorizado legalmente para cobrar o tributo devido..

Tentativa – a forma tentada é de difícil ocorrência, porquanto o delito normalmente é executado com um único ato. Não obstante, a tentativa é admissível quando a execução da conduta criminosa – em qualquer uma de suas modalidades – for fracionável em atos, como, por exemplo, na forma escrita da conduta.

CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA:

Trata-se de CRIME PRÓPRIO (aquele que exige qualquer condição especial do sujeito ativo); quanto ao resultado é CRIME FORMAL (que não exige resultado naturalístico para a consumação); CRIME COMISSIVO (o verbo nuclear implica a prática de uma ação); CRIME DOLOSO (pois não há previsão legal para a figura culposa); CRIME DE FORMA LIVRE (pode ser praticado por qualquer meio ou forma pelo agente); CRIME INSTANTÂNEO (o resultado opera-se de forma imediata, sem se prolongar no tempo); CRIME UNISSUBJETIVO (pode ser praticado, em regra, apenas por um agente); CRIME PLURISSUBSISTENTE (que pode ser desdobrado em vários atos, que, no entanto, integram a mesma conduta).

§ 2º - Se o funcionário desvia, em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos:

        Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

É uma modalidade especial de excesso de exação, que se configura quando o funcionário público “desvia em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos.”. trata-se, portanto, de uma qualificadora do delito de excesso de exação.

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A conduta típica do presente delito caracteriza-se quando o funcionário público DESVIA (isto é, altera o destino ou aplicação) em proveito próprio ou de outrem (ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO), o que recebeu indevidamente (recebimento de pagamento sem previsão legal) para recolher aos cofres públicos (cobrança sob o fundamento de legalidade ou contribuição devida). A conduta criminosa realiza-se em dois momentos: a) recebimento ao erário; b) desvio, em proveito próprio ou de outrem, do que indevidamente, no todo ou em parte, recebeu.

Confronto com o delito de extorsão: semelhanças e dessemelhanças; concurso de crimes ou conflito aparente de normas.

CONCUSSÃO E EXTORSÃO - na concussão o sujeito ativo é funcionário público, e, em razão da função, exige vantagem indevida, cedendo a vítima, exclusivamente, em virtude do metus auctoritates causa (que traduz a situação em que o cidadão atua com reverência e temor quando está diante de uma autoridade pública). Caso haja ameaças explícitas contra a vítima, devem elas necessariamente estar relacionadas ao exercício da função pública, por exemplo, fiscal da Prefeitura que exige que um vendedor ambulante lhe assine um cheque em branco, sob pena de sua barraca ser apreendida. A extorsão, contudo, configurar-se-á: a) quando houver o emprego de violência contra a vítima; ou b) quando houver o emprego de grave ameaça que não tenha qualquer relação com a função pública exercida pelo agente, por exemplo, fiscal da Prefeitura que aponta um revólver para o camelô e exige que este lhe assine um cheque em branco. A pena prevista para o delito de extorsão é mais grave (art. 158, CP), em face dos meios empregados na prática delitiva.

Confronto com os delitos de corrupção ativa e passiva.

CONCUSSÃO E CORRUPÇÃO ATIVA - Segundo a jurisprudência, são incompossíveis esses crimes, isto é, não é possível a existência concomitante de ambos. É que a vítima, que entrega o dinheiro exigido no crime no crime de concussão, não pode ser considerada sujeito ativo do delito de corrupção ativa, pelo simples fato de que a corrupção ativa pressupõe que o particular livremente ofereça ou prometa a vantagem, o que não ocorre quando há primeiramente a prática do delito de concussão, pois o particular é constrangido a entregar a vantagem.

CONCUSSÃO E CORRUPÇÃO PASSIVA - na corrupção passiva, em sua primeira figura, o núcleo do tipo penal é o verbo "solicitar", isto é, pedir vantagem indevida. A vítima, no caso, cede livremente ao pedido do funcionário público, podendo, inclusive, obter algum benefício em troca da vantagem prestada. Na concussão, pelo contrário, o agente exige, isto é, impõe à vítima determinada obrigação, e este cede por temer represálias.

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