Consideraes sobre a noo de texto

Caro aluno, Hoje vamos comentar um pouco sobre a definio que podemos dar a palavra texto. Qual a importncia disso em nossas relaes empresariais e corporativas? Saber o que um texto e como ele pode ser bem construdo de fundamental importncia para que a comunicao seja eficiente e no interrompida pelas diversas barreiras como as que foram comentadas em nossa ltima aula. Ns produzimos textos o tempo todo, seja de maneira escrita, falada, gestual e, at mesmo, quando produzimos uma imagem e a colocamos em diversas redes sociais que so to acessadas pela maioria das pessoas. Assim, podemos considerar que texto tudo aquilo que transmite uma ideia e est inserido num todo e do qual no pode ser isolado, pois caso isso acontea, o sentido original daquilo que foi dito pode ser perdido ou alterado.

Para ampliarmos nossa noo a respeito do texto, leia o texto abaixo, uma tira de As cobras, de Lus Fernando Verssimo:

A leitura dos dois primeiros quadrinhos, isolados dos dois ltimos, deixaria o torcedor do time de futebol muito animado, j que o nmero de derrotas foi baixo para a expectativa dos personagens envolvidos no dilogo.

Confrontado com o terceiro e quarto, no entanto, o significado dos primeiros quadrinhos se altera consideravelmente e provoca decepo. Dois jogos foi o nmero total de partidas e, por isso, o desempenho do time no poderia ter sido pior. Um dos personagens, porm, tenta manter o otimismo, se isso for possvel!

Com a quebra de expectativa criada pelos dois quadrinhos iniciais, produz-se um efeito de humor, e o texto, no seu todo, passa a ser uma stira ao mau desempenho dos times nos campeonatos de futebol. Identificou seu time na mesma situao?!

Essa tirinha exemplar para demonstrar dois dados importantssimos na leitura de um texto:

a) num texto, o significado de uma parte no autnomo ou isolado, mas depende das outras com que se relaciona. Tanto verdade que, no caso da tirinha acima, fomos obrigados a reinterpretar o sentido dos quadrinhos iniciais, quando o confrontamos com os dois ltimos; b) o significado global de um texto no o resultado de mera soma de suas partes, mas de uma combinao geradora de sentidos. No fosse esse dado, o pequeno texto humorstico admitiria a seguinte leitura: o time de futebol alcanou muito bom desempenho com o novo tcnico j que perdeu apenas dois jogos. Qualquer leitor mdio de texto diria que interpret-lo dessa forma significa no t-lo entendido.

Em resumo, num texto o sentido de cada parte definido pela relao que mantm com as demais que formam o todo; o sentido do todo no mera soma das partes, mas dado pelas mltiplas relaes que se estabelecem entre elas.

Ao explicar o sentido da tira aqui reproduzida, usamos diversas vezes a palavra texto. Mas o que um texto? Essa palavra bastante usada na escola e mesmo fora dela. muito frequente ouvirmos frases como seu texto ficou muito bom; o texto da prova de Portugus era muito longo e complexo; os atores de novela devem decorar textos enormes todos os dias. Apesar do uso corrente da palavra, o conceito de texto no to simples: mesmo para aquelas pessoas habituadas a empregar esse termo com frequncia.

Comecemos por definir quais so as propriedades de um texto:

1. A primeira que ele tem coerncia de sentido. Isso quer dizer que ele no um amontoado de frases, ou seja, nele, as frases no esto pura e simplesmente dispostas umas aps as outras, mas esto relacionadas entre si. por isso que, nele, o sentido de uma frase depende do sentido das demais com que se relaciona. Se no levarmos em conta as relaes de uma frase com as outras que compem o texto, corremos o risco de atribuir a ela um sentido oposto quele que ela efetivamente tem.

Uma mesma frase pode ter sentidos distintos dependendo do contexto dentro do qual est inserida. Precisemos um pouco melhor o conceito de contexto. a unidade maior em que uma unidade menor est inserida. Assim, a frase (unidade maior) serve de contexto para a palavra; o texto, para a frase, etc. O contexto pode ser explcito, quando expresso com palavras, ou implcito, quando est embutido na situao em que o texto produzido. Veja o exemplo da notcia abaixo sobre a questo da espionagem norte-americana em territrio brasileiro:

Obama diz que EUA miram "reas de preocupao"

04 de Setembro de 201318h16 www.noticias.terra.com.br

Em declaraes na Sucia nesta quarta, a caminho da reunio do G20, o presidente americano disse que a inteligncia dos Estados Unidos no est "bisbilhotando os e-mails das pessoas ou escutando seus telefonemas". "O que ns estamos tentando fazer mirar, bem especificamente, em algumas reas de preocupao", disse Obama, acrescentando que tais reas incluem aes contra o terrorismo, armas de destruio em massa e segurana ciberntica.

Se considerarmos apenas o que disse o presidente Obama sobre o caso de espionagem que foi revelado recentemente por um ex-integrante do servio secreto dos Estados Unidos, daramos, sem dvida, razo ao presidente americano, devido ao histrico de ataques terroristas ao longo da histria de nosso vizinho do norte.

Porm, se continuarmos lendo a notcia, perceberemos que, mesmo comentando que a inteno no era bisbilhotar, o que os documentos mostram que ligaes particulares de Dilma Rousseff foram monitoradas, como segue:

Autoridades brasileiras esto cticas sobre como as comunicaes privadas de Dilma teriam entrado nessas categorias. O Brasil no uma base conhecida de operaes terroristas, no produz armas nucleares e tem sido uma democracia estvel e aliado cordial dos EUA nas ltimas trs dcadas.

[...] A reportagem da TV Globo mostrou o que afirmava ser um slide da NSA de

junho de 2012, que apontava os padres de comunicao entre Dilma e seus auxiliares mais prximos. [...]

O ministro das Comunicaes, Paulo Bernardo, um dos auxiliares em que Dilma mais confia, disse na tera-feira que o Brasil ainda tem de receber uma explicao "razovel" dos Estados Unidos. "Acho que essa espionagem indiscriminada no tem a ver a com segurana nacional", disse o ministro. " uma espionagem com um carter comercial, industrial."

Bernardo disse que a espionagem era "mais grave do que fica parecendo primeira vista", o que pode explicar a razo que levou Dilma a buscar um pedido de desculpas depois de inicialmente pedir uma explicao por escrito dos EUA.

Aps a leitura completa, inclusive levando em conta o contexto, ou seja, a situao que precedeu o escndalo da espionagem, percebemos a construo total do sentido, e que, se a inteno no era bisbilhotar, ela no foi bem entendida pelos membros do servio secreto americano! Assim, as frases ganham sentido porque esto correlacionadas umas s outras.

Um texto , pois, um todo organizado de sentido. Dizer que ele um todo organizado de sentido implica afirmar que o texto um conjunto formado de partes solidrias, ou seja, que o sentido de uma depende das outras.

Que que faz que um conjunto de frases forme um texto e no um amontoado desorganizado? So vrios os fatores. Citemos por enquanto dois. O primeiro a coerncia, isto , a harmonia de sentido de modo que no haja nada ilgico, nada contraditrio ou nada desconexo. A base da coerncia a continuidade de sentido, ou seja, a ausncia de discrepncias. Em princpio, seria incoerente um texto que dissesse Pedro est muito doente. O quadrado da hipotenusa igual soma do quadrado dos catetos. Essa incoerncia seria dada pelo fato de que no se percebe a relao de sentido entre as duas frases que compem o texto. Um outro fator a ligao das frases por certos elementos que recuperam passagens j ditas ou garantem a concatenao entre as partes. Assim, e m No chove h vrios meses. Os pastos no poderiam, portanto, estar verdes, o termo portanto estabelece uma relao de decorrncia lgica entre uma e outra frase. Esse segundo fator menos importante que o primeiro, pois, mesmo sem esses elementos de conexo, um conjunto de frases pode ser coerente e, por conseguinte, um todo organizado de sentido. Observe o texto abaixo, de Carlos Drummond de Andrade:

O que se diz

Que frio! Que vento! Que calor! Que caro! Que absurdo! Que bacana! Que tristeza! Que tarde! Que amor! Que besteira! Que esperana! Que modos! Que noite! Que graa! Que horror! Que doura! Que novidade! Que susto! Que po! Que vexame! Que mentira! Que confuso! Que vida! Que talento! Que alvio! Que nada...

Assim, em plena floresta de exclamaes, vai se tocando pra frente.

Carlos Drummond de Andrade. Poesia e prosa. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1983. p. 1 379.

Faltam elementos de ligao entre as partes no primeiro pargrafo, mas a ltima frase, Assim, em plena floresta de exclamaes, vai-se tocando pra frente, produz a unidade de sentido. O texto deixa de ser um amontoado aleatrio de exclamaes, adquirindo coerncia e, dessa forma, mostrando o carter estereotipado de nossa linguagem cotidiana.

2. O texto produzido por um sujeito num dado tempo e num determinado espao. Esse sujeito, por pertencer a um grupo social num tempo e num espao, expe em seus textos as ideias, os anseios, os temores, as expectativas de seu tempo e de seu grupo social. Todo texto tem um carter histrico, no no sentido de que narra fatos histricos, mas no de que revela os ideais e as concepes de um grupo social numa determinada poca. Cada perodo histrico coloca para os homens certos problemas e os textos pronunciam-se sobre eles. Por exemplo, em nossa poca, em que os recursos naturais do planeta correm o risco de esgotar-se, aparece o discurso ecologista que mostra a necessidade de preservar a natureza com vistas manuteno da espcie humana.

No h texto que no mostre o seu tempo. Cabe lembrar, no entanto, que uma sociedade no produz uma nica forma de ver a realidade, um nico modo de analisar os problemas colocados num dado momento. Como ela dividida em grupos sociais, que tm interesses muitas vezes contrrios, produz ideias divergentes entre si. A mesma sociedade que gera a ideia de que preciso pr abaixo a floresta amaznica para explorar suas riquezas, produz a ideia de que preservar a floresta mais rentvel. Cabe lembrar, no entanto, que algumas ideias, em certas pocas, exercem domnio sobre outras, ganhando o estatuto de concepo quase geral na sociedade.

Poderamos dizer que um texto , pois, um todo organizado de sentido e produzido por um sujeito num dado espao e num dado tempo.

Duas concluses podemos tirar dessa noo: a) uma leitura no pode basear-se em fragmentos isolados do texto, j que o

significado das partes determinado pelo todo em que esto encaixadas; b) uma leitura, de um lado, no pode levar em conta o que no est no interior do

texto e, de outro, deve levar em considerao a relao, assinalada, de uma forma ou de outra, por marcas textuais, que um texto estabelece com outros.

Com isso em mente, ao produzir um texto em sua empresa, quer seja ele escrito, verbal ou visual, leve em conta a situao, o contexto e faa o mximo para que as informaes sejam expostas de maneira coerente, estabelecendo relaes de significado entre as partes e construindo um todo harmonioso. Assim, dificilmente suas ideias sero distorcidas ou perdero o objetivo para o qual foram direcionadas.

Em nossas prximas aulas, iremos estudar estratgias de coerncia e coeso, mas por hora, vamos exercitar nossa capacidade de ler um texto e interpret-lo de acordo com as informaes apresentadas, sem partirmos de nosso ponto de vista, mas do que o autor quis dizer. Para que isso seja feito, foram disponibilizados dois textos curtos que devero ser lidos antes de o questionrio ser respondido.

O primeiro a respeito das questes que giram em torno do desenvolvimento do Brasil, e o segundo traz a discusso sobre a imagem de um jogador de futebol ser vinculada a uma determinada marca de higiene pessoal.

Leia os textos com ateno, tenho certeza de que voc no encontrar dificuldades em realizar a tarefa! Grande abrao e at a nossa prxima aula!

Professora Luciana Uhren