Upload
daniel-brandao
View
237
Download
16
Embed Size (px)
DESCRIPTION
Análise retórica do filme "O Auto da Compadecida".
Citation preview
Alex Bruno, Ayrton Barbosa, Marcilio Emmanuel, Regivanio Maciel e Veridiano
Quirino, alunos da UNICAP, do 2º período do Bacharelado em Filosofia, trabalho
apresentado para Oficina de Retórica, em 2012.2, sob orientação da Profª Eleonoura
Enoque.
ANÁLISE DO FILME “O AUTO DA COMPADECIDA”
FICHA TÉCNICA
Título: O Auto da Compadecida
Origem/Ano: Brasil/2000
Gênero: Comédia
Tempo de Duração: 104 minutos
Ano de Lançamento: 2000
Estúdio/Distrib.: Globo Filmes
Direção: Guel Arraes e Mauro Mendonça Filho
Roteiro: Guel Arraes, Adriana Falcão e João Falcão
Produção: Daniel Filho e Guel Arraes
Prudutor Associado: Daniel Filho
Figurino: Caio Albuquerque
Das Obras de Ariano Suassuna: Torturas de um Coração (1951), Auto da
Compadecida (1955) e O Santo e a Porca (1957).
Idioma: Português
ELENCO:
Ator Personagem
Matheus Nachtergaele João Grilo
Selton Mello Chicó
Marco Nanini Cangaceiro Severino de Aracaju
Fernanda Montenegro Nossa Senhora (Compadecida)
Denise Fraga Dora, mulher do padeiro
Lima Duarte Bispo
Rogério Cardoso Padre João
Diogo Vilela Eurico, o padreiro
Maurício Gonçalves Jesus Cristo
Virginia Cavendish Rosinha
Paulo Goulart Major Antônio Morais
Luís Melo Satanás
Bruno Garcia Vicentão
Enrique Diaz Capanga De Severino de Aracaju
Aramis Trindade Cabo 70
O Auto da compadecida é um documento sobre a sociedade brasileira. Retrata seu
lado burlesco, ou seja, aquele em que a própria figura humana, mesmo vista na sua
miserável lida, torna-se engraçada. Cômicas parecem ser as histórias, sem dúvida,
porém enormemente trágicas. São tragicômicas as tramas destas histórias, intricadas por
personagens tipicamente brasileiras, na grandeza de sua fé, na pequenez de pequenos
gestos sorrateiros, na ingenuidade e na esperteza da viva inteligência de alguns, na
malfadada sina de outros, nas traições habilmente urdidas, no poder de poucos sobre
muitos e, sobretudo, na crença da vitória do amor e da justiça divina. Por tudo isso, se
ousará reafirmar aqui, peremptoriamente, de que o filme é um documento de nossa
cultura brasileira, e que tem de ser analisado a luz do par conceitual relacionada a esta
idéia de cultura, no caso as palavras-chaves Nacional e Popular. O tema geral pode ser
apreendido a partir de algumas questões que podemos formular, concernentes a história
do filme, ao caráter de seus personagens, e ao fim a que se propõe originalmente seu
texto, isto é, o propósito moralizador que é próprio a um tipo de teatro popular
brasileiro. Auto, como designado no título, é um tipo de encenação popular, corrente
durante muito tempo no nordeste do Brasil, e que se propunha a um ensinamento
religioso. Os autos tinham a função de levar ao público as exemplares vidas dos santos,
assim como os atos que os dignificaram. O auto obedece a um modelo de composição,
uma das formas teatrais e dramatúrgicas, que está muito ao gosto do povo, sua função
sendo o de instrumento de catequese, didática pelo ensinamento teológico dos
evangelhos, moralizante através do exemplo cristão da vida dos santos. Escrita pelo
dramaturgo e escritor pernambucano Ariano Suassuna, em meados da década de 50,
reproduz o modelo de textos religiosos encenados em procissões e átrios de igrejas,
como era comum naquele tempo, mantendo-se uma tradição medieval e renascentista
que parece ter vindo de Portugal, ou do mundo. Acresce-se a isto o fato de que todas as
histórias aqui alinhavadas foram recriadas a partir de histórias outras, retiradas do
universo da poesia popular brasileiras, também conhecidas como “literatura de cordel”.
De acordo com o próprio Suassuna, baseado em romances e histórias populares do
Nordeste, e em certa tradição circense. Tradição, aliás, claramente reconhecível na
estruturação dos seus dois personagens principais: João Grilo é o palhaço espertalhão,
secundado por Chico, ingênuo e covarde. O palhaço e a besta! como se chamava no
velho circo. O mesmo circo que se fez, historicamente no Brasil, movido por um caráter
tradicional e coletivo. Por outro lado ainda, note-se, com respeito à literatura de cordel,
que a sátira social é parte de uma expressiva retórica, fixada em uma poética tradicional
popular, não raramente anônima (embora alguns identificáveis, como fez, por exemplo,
Leonardo Mota, também escritor pernambucanos, no seu livro Violeiros do Norte, que
traz alguns dos cordéis diretamente relacionados ao texto de Suassuna), e cujo conjunto
de obras poderia ser identificada por uma comédia popular do Nordeste, gestada pela
comédia medieval e renascentista. Como o filme deve ser visto e analisado? Na
verdade, existem diversas maneiras de se ver um filme. Pode-se, por exemplo, assisti-lo
na perspectiva de que o mundo da imagem é um mundo de formas, sendo a
representação de uma dada realidade no plano, e que se pode, portanto, fazer uma
leitura formalista nos seus diversos ângulos: os planos, os cortes, etc – note-se, por
exemplo, que os personagens foram caracterizados de modo exagerado e caricato, o que
faz com que o filme tenha inclusive um caráter frenético na sua montagem. Pode-se
buscar, neste filme, o conteúdo da história analisando-o a partir de alguns referenciais
teóricos básicos: histórico, psicológico, psicanalítico, etc. Seria sociológico, por
exemplo, quando se quer entender a sociedade que produz aquele filme e que por esse é
retratado. No caso, a sociedade brasileira. Nordestina, agrária. Neste plano sociológico
pode-se ver também os diversos aspectos políticos que são particulares desta sociedade,
com sua estratificação social própria, bem como sua forma de mandonismo com o poder
encarnado na figura do coronel. Neste sentido acreditamos que a chave do nacional e do
popular bem explica o filme. Poder-se-ia ver o aspecto religioso também, notadamente
aquela religiosidade católica devocional, própria ao meio nordestino, com seu
misticismo, sua visão de mundo, seu valores éticos, seu imaginário (Note-se que na
seqüência do julgamento os deuses são humanos, nas suas grandiosas disputas; as
geografias hierofanicas também são imaginadas, repare como o céu é cheio de regras
morais e o inferno, que só podemos entrever através de uma porta, está abarrotado de
sofredores que padecem nas chamas eternas). No que tange a religiosidade observe-se
particularmente a figura da Virgem, afinal o auto é construído para louvá-la na sua
justiça misericordiosa, e se sua aparição é curta no enredo, repare-se que ela é decisiva
para o desfecho do filme. A Virgem, que povoa o imaginário brasileiro, é a maternal,
mãe dolorosa, Nossa Senhora. É a mediadora divina, aquela que gerou o filho de Deus,
a Compadecida, aquela que por força deste amor materno interfere piedosamente a
favor dos homens, e em torno da qual se construiu uma forte devoção mariana, que, não
raro, distinguia o catolicismo devocional daquele catolicismo oficial (Repare-se no tom
satírico com que o pároco e o bispo são retratados, como sujeitos sem moral, destituído
de escrúpulos, e querendo sempre levar vantagem. O texto é crítico a igreja, sem
contudo ser iconoclasta aos símbolos da religiosidade brasileira, ou seja, não é de
maneira alguma blasfemo). Pode-se ver, também, ainda sobre esta chave do nacional e
popular, a profunda sátira social que está contido no filme. Para esta sátira é empregada
uma linguagem visual, palpável e concreta – são casos, estórias, fatos evocados. São
casos que envolvem questões fundamentais dos nossos valores sociais, dentre os quais a
ambição e a justiça. Repare que toda a trama se desenvolve em torno de dinheiro, o que
revela uma censura a ambição cega. Em contrapartida, a justiça é julgada por um juiz
sereno, aquele que se situa acima dos homens. (Repare-se que no filme o Cristo, ou
simplesmente Manuel, é negro, isto foi posto intencionalmente na peça por Suassuna,
que faz gracejo com a questão racial brasileira). Que elementos da vida social brasileira
encontramos no filme? Em primeiro lugar um forte elemento identitário, ou seja, das
características que afirmam a identidade do brasileiro psicológicos, isto é, o modo de
sentir, o modo de pensar próprio de nosso povo. Acredito que é para este caráter dos
brasileiros que pode ser apontada com mais foco a análise. O mote do filme, como
lembra certo crítico é que “mentira com fé, nem sempre é pecado”, o que parece fazer
parte da visão de mundo do brasileiro. Portanto, nenhuma outra explicação poderia ser
tirada do filme que não visse o brasileiro como engraçado, engenhoso, satírico, e
disposto a tudo para ganhar a vida. Mas, sobretudo, este brasileiro deve ser visto como
um forte (lembre-se aqui Euclides da Cunha e o que ele diz dos sertanejos), capaz de
sobreviver a todos os percalços que a vida lhe impõe, capaz, sem dúvida, em de dar um
jeitinho em tudo (inclusive na morte, como se pode concluir pelo desfecho do filme).
Por fim, urge uma última questão: É possível estabelecer um paralelo entre o filme e a
vida contemporânea? Sem a menor dúvida, o sucesso estrondoso do texto de Suassuna
tem atravessado varias gerações, merecendo montagens no rádio, no cinema (três
adaptações), e também na televisão (duas adaptações) como é o caso da presente versão
que foi estruturada como uma mine-série, e só depois foi montada para ser exibida em
salas de cinema. O interesse do público, os mais de dois milhões de espectadores que
foram as salas de cinema para assisti-lo mesmo depois de sua exibição televisiva, nos
prova de que o tema geral que ele aborda é atemporal, fortemente ancorado numa
tradição brasileira e que, por isso mesmo, está presente no nosso cotidiano. Os valores,
a visão de mundo e o modo como esses sancionam certa noção do que somos, enquanto
brasileiros, diferentes de qualquer outro povo, em processos históricos e culturais, é a
principal contribuição do filme para que possamos pensar a vida contemporânea.
SINOPSE: Grilo é o nordestino sabido e esperto que luta pelo pão de cada dia. Ele vive várias
aventuras, provocando muitas confusões e enganando aos ricos e poderosos. Ao seu
lado está Chicó, companheiro de aventuras e estrada. Numa dessas confusões, o Grilo
acaba morrendo e vai para o julgamento final.
DIRETOR
Miguel Arraes de Alencar Filho é o nome de Guel Arraes, diretor de televisão e cineasta
importante do Brasil. Ele é filho do grande político Miguel Arraes, que foi inclusive
governador do estado de Pernambuco. Exatamente em função disso, isto é, pela posição
política que tinha seu pai, Guel Arraes morou muitos anos fora do país,principalmente
na Argélia, para onde sua família foi para o exílio, junto com o pai. Guel nasceu no
Recife, em 12 de dezembro de 1953.
Sua inclinação artística cedo despertou, mas ele desejou ser diretor, produtor, criador. E
foi para o cinema e para a televisão. Ele começou já em posição de destaque, pois foi
diretor da série: "Armação Ilimitada", direcionada aos jovens, e que fez muito sucesso,
pois reunia um trio de atores, que ficou famoso: Kadu Moliterno, Evandro Mesquita,
ambos apaixonados pela personagem de Andréa Beltrão. Essa série foi ao ar em 1985, e
ficou muitos anos no ar. Depois Guel Arraes dirigiu "TV Pirata", em 1988. E "O Auto
da Compadecida", em 1999. Essa série também fez grande sucesso, tanto que depois foi
transposta para o cinema, com a direção do mesmo Guel Arraes, no ano 2000. Foi
considerada por muitos a melhor série que a televisão já fez. Ainda na Rede Globo de
Televisão, Guel Arraes dirigiu em 1994 o humorístico: "Casseta e Planeta" e em
2000:"Brava Gente". Guel Arraes hoje é Diretor de Núcleo, na Rede Globo de
Televisão. No cinema, que é o que Guel mais gosta de fazer, em 83 ele fez montagem
de:"O Rei da Vela".Em 2000, dirigiu:"O Auto da Compadecida" e em 2008:
"Romance". Em 2008, foi produtor de: "Meu Nome Não É Johnny".
Além desses principais trabalhos relatados acima, Guel Arraes foi produtor de: "O Auto
da Compadecida", "Caramuru, A Invenção do Brasil","Lisbela e o Prisioneiro", "Os
Normais-O Filme", "Meu Tio Matou Um Cara", "O Coronel e o Lobisomem".
Miguel Arraes ganhou os prêmios: Melhor Diretor e Melhor Roteiro, no Grande Prêmio
Cinema Brasil, com:"O Auto da Compadecida". Prêmio de Público, no Festival de
Cinema Brasileiro de Miami, pelo mesmo:"Auto da Compadecida". Em 2010, dirigiu o
filme "O Bem Amado", inspirado na novela de mesmo nome, que fez muito sucesso na
TV Globo, no ano de 1973.
AUTOR
Ariano Vilar Suassuna, advogado, professor, teatrólogo e romancista, desde 1990 ocupa
a cadeira número 32 da Academia Brasileira de Letras. Filho de João Suassuna e de Rita
de Cássia Villar nasceu em 16 de junho de 1927 na cidade de Nossa Senhora das Neves,
atual João Pessoa, capital da Paraíba. Ariano estava com um pouco mais de três anos
quando seu pai, que havia governado o Estado no período de 1924 a 1928, foi
assassinado no Rio de Janeiro, em conseqüência da luta política às vésperas da
Revolução de 1930. No mesmo ano, sua mãe se transferiu com os nove filhos para
Taperoá, onde Ariano Suassuna fez os estudos primários. No sertão paraibano Ariano se
familiarizou com os temas e as formas de expressão que mais tarde vieram a povoar a
sua obra. Em 1942, a família se mudou para Recife e os primeiros textos de Ariano
foram publicados nos jornais da cidade, enquanto ele ainda fazia os estudos pré-
universitários. Em 1946 Ariano iniciou a Faculdade de Direito e se ligou ao grupo de
jovens escritores e artistas que tinha à frente Hermilo Borba Filho, com o qual fundou o
Teatro do Estudante Pernambucano. No ano seguinte, Ariano escreveu sua primeira
peça, "Uma Mulher Vestida de Sol", e com ela ganhou o prêmio Nicolau Carlos Magno.
Após formar-se na Faculdade de Direito, em 1950, passou a dedicar-se também à
advocacia. Mudou-se de novo para Taperoá, onde escreveu e montou a peça "Torturas
de um Coração", em 1951. No ano seguinte, voltou a morar em Recife. O Auto da
Compadecida (1955), encenado em 1957 pelo Teatro Adolescente do Recife, conquistou
a medalha de ouro da Associação Brasileira de Críticos Teatrais. A peça o projetou não
só no país como foi traduzida e representada em nove idiomas, além de ser adaptada
com enorme sucesso para o cinema. No dia 19 de janeiro de 1957, Ariano se casou com
Zélia de Andrade Lima, com a qual teve seis filhos. Foi membro fundador do Conselho
Federal de Cultura, do qual fez parte de 1967 a 1973 e do Conselho Estadual de Cultura
de Pernambuco, no período de 1968 a 1972. Em 1969 foi nomeado Diretor do
Departamento de Extensão Cultural da Universidade Federal de Pernambuco - UFPE,
ficando no cargo até 1974. Ariano estava sempre interessado no desenvolvimento e no
conhecimento das formas de expressão populares tradicionais e, no dia 18 de outubro de
1970, lançou o Movimento Armorial, com o concerto "Três Séculos de Música
Nordestina: do Barroco ao Armorial", na Igreja de São Pedro dos Clérigos e uma
exposição de gravura, pintura e escultura. O escritor também foi Secretário de Educação
e Cultura do Recife de 1975 a 1978. Doutorou-se em História pela Universidade Federal
de Pernambuco, em 1976 e foi professor da UFPE por mais de 30 anos, onde ensinou
Estética e Teoria do Teatro, Literatura Brasileira e História da Cultura Brasileira.
BIOGRAFIA DOS PROTAGONISTAS:
Matheus Nachtergaele nasceu em São Paulo, em 3 de janeiro de 1969. Ele é um ator
de teatro, cinema e televisão. Também atuou em dublagens. Seu início foi em teatro. No
começo de 1990, fez parte da "Companhia de Teatro Vertigem", onde tinha a direção de
Antônio Araujo. Em 1995 e 96, Matheus fez a peça: "O Livro de Jó", que lhe deu o
Prêmio Shell e o Prêmio Mambembe, como Melhor ator de teatro. Seu sucesso o levou
à televisão (Rede Globo), onde estreou na minissérie Hilda Furacão como Cintura Fina.
O sucesso na minissérie o levou a atuação como protagonista na também minissérie que
se tornou telefilme Auto da Compadecida, baseado na obra de Ariano Suassuna, no
papel de João Grilo. Atuação essa que lhe rendeu o Grande Prêmio do Cinema Nacional
como Melhor Ator. Desde então, tem feito inúmeras participações no cinema nacional e,
no ano de 2008 estreou como diretor sem nunca ter deixado de lado o teatro e a
televisão.
Selton Mello nasceu em Passos – MG, no dia 30 de dezembro de 1972. Filho do casal
Dalton Natal Mello e Selva Aretusa de Fiqueiredo Mello, e irmão do também ator
Danton Mello. Selton Figueiredo Mello mudou-se ainda criança com a família para São
Paulo. Seu primeiro trabalho na TV foi no seriado Dona Santa, em 1981, e, aos nove
anos, atuou na novela Braço de Ferro, ambos da Rede Bandeirantes.
Quando começou a trabalhar na Rede Globo, na novela Corpo a Corpo (1984), Selton
Mello mudou-se novamente com a família para o Rio de Janeiro. Sua estreia no cinema
foi na comédia Uma Escola Atrapalhada, dos Trapalhões, em 1990, no papel de Renan.
Um de seus personagens mais marcantes é o Chicó, da minissérie O Auto da
Compadecida (1999). Por conta do sucesso, a história foi levada ao cinema.
Recentemente brilhou nas telonas em duas histórias baseadas em fatos reais: no papel de
um ex-traficante carioca em Meu nome não é Johnny, e em Jean Charles, onde deu vida
ao brasileiro assassinado no metrô de Londres pela polícia ao ser confundido com um
terrorista. Selton tornou-se um dos grandes expoentes do cinema nacional, lançando
vários trabalhos em sequência e se aventurou também como diretor no longa Feliz
Natal, além de ter dirigido o video clipe de Esconderijo, da cantora Ana Cañas, em
2009. No ano de 2010 voltou à TV, estrelando a minissérie global A Cura, vivendo o
personagem Dimas Bevilláqua. Ainda no mesmo ano, ele participou do filme Federal,
ao lado de Carlos Alberto Riccelli e do ator norte-americano Michael Madsen. Além da
produção Lope (que estreou no Brasil em março de 2011), de Andrucha Waddington,
como o personagem Marqués de Navas.
GÊNERO DO DISCURSO DO FILME
Jurídico - Podemos afirmar que este trecho é jurídico por utilizar elementos de cunho
judiciário, como devesa, apresentação de provas em relação ao veredicto final. Dando
também uma ênfase em uma infração no caso da morte dos pais do garoto Severino e
uma conclusão do caso:
“Severino enlouqueceu depois que a polícia matou seus pais”.
Outros pontos a serem observados na afirmação dita que é jurídico pode ser o ambiente
que compõe de júri, réus advogado de defesa e de acusação.
CENA ANALISADA: JULGAMENTO
Linha Nº 1ª PARTE
01 JOÃO GRILO - Valha-me nossa Senhora,/ Mãe de Deus de Nazaré!
02 A vaca mansa dá leite,/ a braba dá quando quer.
03 A mansa dá sossegada,/ a braba levanta o pé.
04 Já fui barco, fui navio,/ mas hoje sou escaler.
05 Já fui menino, fui homem,/ só me falta ser mulher.
06 Valha-me nossa Senhora,/ Mãe de Deus de Nazaré!
07 DIABO – Lá vem a Compadecida! Mulher em tudo se mete. GENERALIZAÇÃO
APRESSADA (Falácia de Relevância): 08 JOÃO GRILO - A senhora se zangou com o versinho que eu recitei?
09 COMPADECIDA - Não João, por que eu iria me zangar?
10 Tem umas graças mas eu até acho bom. Quem gosta de tristeza é o diabo.
11 DIABO - Protesto!
12 JESUS - Eu sei que você protesta, mas eu não tenho o que fazer meu velho,
13 discordar da minha mãe é que eu não vou.
14 DIABO - Grande coisa esse chamego que ela faz pra salvar todo mundo.
15 Acaba desmoralizando tudo.
16 SEVERINO - Você fala assim porque nunca teve mãe!
17 JOÃO GRILO - É “mermo”! Um sujeito ruim desse só sendo filho de
chocadeira.
18 COMPADECIDA – Pra quê você me chamou João?
19 JOÃO GRILO - É que esse filho de chocadeira quer levar a gente pro inferno.
20 Eu só podia me pegar com a senhora “mermo”.
21 COMPADECIDA - Vou ver o que eu posso fazer. (vira-se para Jesus)
22 Intercedo por esses pobres, meu Filho, que não têm ninguém por eles.
23 Não os condene.
24 DIABO - Eu apelo para justiça!
25 JOÃO GRILO - E eu para misericórdia!
26 COMPADECIDA - É preciso levar em conta a pobre e triste condição do homem.
27 Os homens começam com medo, coitados,
28 e terminam por fazer o que não presta quase sem querer. É medo.
29 DIABO - Medo de quê?
30 COMPADECIDA - De muitas coisas; do sofrimento, da solidão,
31 e no fundo de tudo, medo da morte.
32 JESUS - E é a mim que você vem dizer isso? A mim que morri abandonado, até por meu pai.
33 COMPADECIDA - Mas não se esqueça da noite no jardim, do medo que você teve que
passar.
34 Pobre homem, feito de carne e sangue, como qualquer outro e, como
35 qualquer outro, abandonado diante da morte e do sofrimento.
36 DIABO – Medo da morte todo mundo tem e nem por isso se tornam pessoas virtuosas.
Falácia do Acidente
37 Em que é que esse medo fez o padeiro e a mulher, por exemplo, se tornarem melhores?
38 Medo da morte por se só não redime os pecados!
39 COMPADECIDA - Mas na hora da morte às vezes sim.
40 Na oração da Ave Maria os homens pedem para eu rogar por eles na hora da morte, e eu rogo;
41 e olho para eles nessa hora e vejo que muitas vezes é na hora de morrer que eles encontram o
42 que procuraram a vida toda.
43 Foi o que aconteceu com Eurico e Dora quando iam ser fuzilados pelo cangaceiro:
44 CANGACEIRO - Eu acho que por aqui “tá” bom, eu vou andando até a igreja e de lá eu atiro
“visse”?
45 É o tempo de uma Ave Maria, vocês vão rezando de lá que eu vou rezando de cá que é
46 pra não ter perigo da Santa não escutar, não é?
47 EURICO - A gente sempre pensa que vai poder esticar a vida mais um bocadinho.
48 DORA - Por mais que eu goste de viver eu sempre me perguntei se eu queria que minha vida
49 se espichasse além da sua. Agora eu sei, eu não ia aguentar ver você morrer.
50 Eu quero morrer primeiro Eurico!
51 EURICO - Oh Dora, por que você me traiu esse tempo todo?
52 DORA - Acho que foi por isso “mermo”:
53 Trair você era lhe matar um pouquinho dentro do meu coração.
54 Eu tinha tanto medo de lhe perder de uma vez, que eu ia tentando lhe perder aos
pouquinhos.
55 EURICO - Tenha cuidado não, agora a gente vai ficar juntos pra sempre.
56 Oh seu moço, eu tenho um último pedido pra fazer pro senhor: é pra gente morrer
junto.
57 CANGACEIRO - Ah, é bom que economiza uma bala,
58 quando fizer as contas vou achar que matei menos um. (atira e mata os dois com um só tiro)
59 COMPADECIDA - Alego em favor dos dois, o perdão que o marido deu a mulher na hora da
morte, abraçando-se com ela para morrerem juntos,
60 O mais ofendido pelos fatos que ela praticava era ele e, no entanto, ele rezou por ela.
61 JESUS - Está recebida a alegação. Quanto ao Padre e o Bispo?
62 COMPADECIDA - Na hora da morte eles também tiveram a sua revelação:
63 CANGACEIRO - É, dizem que matar padre dá um azar danado...
64 PADRE - Sobretudo para o padre.
65 CANGACEIRO - Eu queria que antes de atirar os senhores me perdoassem dos meus pecados
“visse”?
66 BISPO - Mas, para perdoar, antes você tem que se arrepender e desistir de nos matar.
67 CANGACEIRO - Me arrependo depois...
68 BISPO - Vá se arrepender no inferno!
69 CANGACEIRO - Então não tem jeito não, que nem que seja no inferno
70 tenho que obedecer as ordens do capitão.
71 PADRE - Não podemos negar-lhe a absolvição senhor Bispo.
72 BISPO - O que nós não podemos é abençoar um assassino, ainda por cima o nosso!
73 PADRE - Somos sacerdotes Eminência, nossa missão é salvar as almas,
74 mesmo que a gente não consiga salvar as nossas.
75 Lembre-se senhor Bispo da oração que Jesus fez pelos seus carrascos.
76 BISPO - Pai, perdoai-lhes, eles não sabem o que fazem. (é baleado e morre)
77 PADRE - Meu Deus, por que nos abandonastes? (também é baleado e morre)
78 COMPADECIDA - Eles seguiram o seu exemplo, meu Filho, perdoando seus assassinos.
79 DIABO - É sempre assim, depois de morrer todo mundo fica bonzinho. Ironia.
80 COMPADECIDA - Quanto a Severino...
81 JESUS - Quanto a esse deixe comigo. Não foi sua morte que o redimiu, mas a morte de seus
pais.
82 Com oito anos de idade ele conheceu a fera que existe dentro dos homens.
83 SEVERINO - Escapei daquele massacre sem querer; passei a vida desafiando a morte.
84 JESUS - Severino enlouqueceu depois de a polícia matou a família dele,
85 ele não era responsável pelos seus atos. Está salvo!
86 DIABO - Isto é um absurdo contra o qual...
87 JESUS - Contra o qual... Eu já sei que você protesta, mas não recebo seu protesto,
88 você não entende nada dos planos de Deus.
89 Severino está salvo, ele foi um mero instrumento da cólera divina.
90 Severino, meu filho, pode ir por ali.
91 DIABO - Afinal, qual é a sentença?
92 JOÃO GRILO - Um momento Senhor, posso dar uma palavra?
93 JESUS - A senhora o que acha minha mãe?
94 COMPADECIDA - Deixa João falar meu Filho!
95 JESUS - Fale João.
96 JOÃO GRILO - Os quatro últimos lugares do purgatório estão desocupados?
97 JESUS - Estão...
98 JOÃO GRILO - Pegue esses quatro camaradas e bote lá.
99 COMAPDECIDA - É uma ótima solução meu Filho.
100 Dá pra eles pagarem o muito que fizeram e ainda assegura a salvação deles.
101 JOÃO GRILO - E tem a vantagem de descontentar esse camarada aqui que é pior que carne
de cobra. Metáfora
102 “Tá” vendo ele aqui de costas?
103 JESUS – Estou.
104 JOÃO GRILO - Isso é de ruim!
105 JESUS - Minha mãe o que é que acha?
105 COMPADECIDA - Ai, eu ficaria muito satisfeita.
106 JESUS - Então está concedido, podem ir vocês quatro.
107 DIABO - Ah, não tem jeito. Homem que mulher governa...
1ª PARTE
FIGURAS DE LINGUAGEM E FALÁCIAS
Falácia do Acidente (generalização não qualificado) quando o personagem
generaliza uma colocação e dela tira conclusões .
Generalização Apressada (falácia de relevância): A generalização é feita
apressadamente. Não há casos suficientes para justificar a conclusão.
Figura de construção: Ironia - Remete a um Conceito contraditório ao real sentido.
Figura de palavra: metáfora. É uma comparação abreviada. Que desvia o sentido
próprio, para um sentido figurado.
Linha Nº 2ª PARTE
01 JESUS - Agora nós João Grilo.
02 DIABO - Pelo menos esse eu faço questão de levar.
03 JESUS - Você que é tão sabido, que é que você tem a dizer em sua defesa?
04 JOÃO GRILO - Nada não Senhor.
05 JESUS - Como nada? Chegou a hora da verdade.
06 JOÃO GRILO - É por isso que estou lascado. Comigo era na mentira.
07 DIABO - Ainda bem que reconhece.
08 COMPADECIDA - Você mentia para sobreviver João!
09 JOÃO GRILO - Mas eu também gostava. Eu acabei pegando gosto de enganar aquele povo.
10 COMPADECIDA - Não, porque eles lhe exploravam; a esperteza é a defesa do pobre,
11 a esperteza era a única arma que você dispunha contra os maus patrões.
12 JOÃO GRILO - Agradeço sua intervenção, mas devo reconhecer que não vivi como um santo.
13 DIABO – “Tá” se fazendo de humilde pra ela tomar as dores dele!
14 JOÃO GRILO - Do jeito que eu sou ruim, pode até ser isso mesmo.
15 COMPADECIDA - Não! Não se entregue João, esse é o pai da mentira, está querendo lhe confundir.
16 JOÃO GRILO - A verdade é que eu nunca fui nenhum santo e nem tive uma morte gloriosa como a
17 dos meus companheiros.
18 COMPADECIDA - João foi pobre como nós, meu Filho, e teve que suportar as maiores dificuldades
19 numa terra seca e pobre, como a nossa. Apelo à Piedade
20 Pelejou pela vida desde menino, passou sem sentir pela
21 infância, acostumou-se a pouco pão e muito suor. Na seca comia macambira, bebia o sumo do
22 xiquexique, passava fome, e quando não dava jeito ele se juntava a um grupo de retirantes que ia tentar
23 sobreviver no litoral. Humilhado, derrotado, cheio de saudade; e logo que tinha notícia da chuva,
24 pegava o caminho de volta, animava-se de novo como se a esperança fosse uma planta que cresce com
25 A chuva; e quando revia sua terra dava graças a Deus por ser um sertanejo pobre, mas cheio de fé.
26 Peço-lhe muito simplesmente que não o condene. Prova técnica
27 JESUS - O caso é duro, compreendo as circunstâncias em que João viveu,
28 mas isso também tem limite, e acho que não posso salvá-lo.
29 COMPADECIDA - Dê-lhe meu Filho então, outra oportunidade.
30 JESUS - Como?
31 COMPADECIDA - Deixa João voltar.
32 JESUS - Você se dá por satisfeito?
33 JOÃO GRILO - Ah, de mais! Pra mim é até melhor porque daqui pra lá eu tomo cuidado pra hora de
34 morrer e não passo nem no purgatório, que é para não dar gosto ao cão.
35 COMPADECIDA - Então João, fica satisfeito?
36 JOÃO GRILO - Eu fico quem deve estar danado é o filho de chocadeira.
37 (o diabo tenta atacar João, mas Nossa Senhora o defende e o diabo volta pro inferno).
38 O que ele teve meu Deus?
39 COMPADECIDA - Na raiva olhou pra você e me viu!
FIGURAS DE LINGUAGEM E FALÁCIAS
Apelo à Misericórdia (relevância) quando o personagem utiliza de piedade e
compaixão, é colocada clemência e a simpatia saindo do contexto justo para o
emocional, pode ser também legítimo ou falacioso dependendo da circunstância.
TIPOS DE PROVAS
Provas técnicas (intrínsecas) quando o personagem na defesa do réu utiliza de recursos
visuais como fotos, filmagens, e auditivas como gravações para persuadir o júri.
Referências:
DA SILVA, Eleonoura Enoque. Tópicos em Teoria Da Argumentação- Texto
em elaboração: para uso exclusivo em sala de aula. Recife-PE: Universidade
Católica de Pernambuco , 2012.
http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/analises_completas/a/auto_d
a_compadecida. Acesso em: 12/09/2012;
http://www.slideshare.net/klaun/o-auto-da-compadecida-uma-anlise-do-ponto-
de-vista-dos-estudos-culturais-da-cultura-de-mdia. Acesso em: 12/09/2012;
Kino Digital – Revista Eletrônica de Cinema e Audiovisual, nº 1, dez. 2006.
Acesso em: 12/09/2012;
SUASSUNA, Ariano. Auto da compadecida. 1. ed. Rio de janeiro: Agir, 1957.
203 p. (teatro moderno ; 3).