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BAHIA - TERRA DE TODOS OS CHARUTOS Explicações iniciais O mundo virtual produz fenômenos inexplicáveis. Entre eles, conquistarmos amigos com os quais jamais mantivemos contato pessoal. Pois foi Luiz Thomé, um de tais amigos que, via e-mail, agora junho de 2011, me fez recordar prezado leitor, algo que estava esquecido, morto e sepultado. Perguntou-me: E o livro, saiu? Quero divulgá-lo para as comunidades de charuteiros!! Foi quando a ficha caiu. Não vou cansá-los falando dos quatro meses dia e noite dedicados a pesquisas e entrevistas. Pela parte final, onde cito as fontes, vocês poderão verificar a trabalheira. Devo apenas registrar que, por incentivo de um cidadão que se dispunha a publicar o livro, mergulhei de corpo e alma (sou assim em tudo) para tentar resgatar e retratar um pouco da história das empresas baianas de charutos. Não há nenhuma obra a respeito. Depois, bem, depois o mecenas-incentivador desistiu. Acho que não gostou da história. No fundo, desejava um texto enaltecedor, pintado de rosa, provavelmente porque mantinha, então, pretensões de entrar no ramo. Tanto que sugerira para título do livro “Os famosos baianos”. Vendo que a realidade não era da cor que esperava, saiu-se. Deu-se por esquecido. Não brigamos. Continuamos amigos. Os que lerem o trabalho concluirão que eu tinha razão. O texto retrata o quadro em 2009. De lá para cá, algumas empresas citadas encerraram suas atividades. Mantenho um banco de fotos de rótulos e anéis antigos, formado ao longo das pesquisas, que deixo de publicar, posto não considerar satisfatória a qualidade das fotografias. E, graças ao amigo Luis Thomé, eis a seguir o “livro”. __________________________________________ Bahia Terra de todos os charutos Carvalho, Hugo Adão de Bittencourt Charutos baianos: quadro das empresas baianas. Brasil – Cultura popular. 1. Fábricas de charutos da Bahia: histórico e perfil em 2009.

Bahia - Terra de Todos Os Charutos

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BAHIA - TERRA DE TODOS OS CHARUTOS Explicaes iniciaisO mundo virtual produz fenmenos inexplicveis. Entre eles, conquistarmos amigos com os quais jamais mantivemos contato pessoal. Pois foi Luiz Thom, um de tais amigos que, via e-mail, agora junho de 2011, me fez recordar prezado leitor, algo que estava esquecido, morto e sepultado. Perguntou-me: E o livro, saiu? Quero divulg-lo para as comunidades de charuteiros!!Foi quando a ficha caiu.No vou cans-los falando dos quatro meses dia e noite dedicados a pesquisas e entrevistas. Pela parte final, onde cito as fontes, vocs podero verificar a trabalheira.Devo apenas registrar que, por incentivo de um cidado que se dispunha a publicar o livro, mergulhei de corpo e alma (sou assim em tudo) para tentar resgatar e retratar um pouco da histria das empresas baianas de charutos. No h nenhuma obra a respeito.Depois, bem, depois o mecenas-incentivador desistiu. Acho que no gostou da histria. No fundo, desejava um texto enaltecedor, pintado de rosa, provavelmente porque mantinha, ento, pretenses de entrar no ramo. Tanto que sugerira para ttulo do livro Os famosos baianos. Vendo que a realidade no era da cor que esperava, saiu-se. Deu-se por esquecido. No brigamos. Continuamos amigos.Os que lerem o trabalho concluiro que eu tinha razo. O texto retrata o quadro em 2009. De l para c, algumas empresas citadas encerraram suas atividades.Mantenho um banco de fotos de rtulos e anis antigos, formado ao longo das pesquisas, que deixo de publicar, posto no considerar satisfatria a qualidade das fotografias.E, graas ao amigo Luis Thom, eis a seguir o livro.__________________________________________Bahia Terra de todos os charutosCarvalho, Hugo Ado de Bittencourt Charutos baianos: quadro das empresas baianas.Brasil Cultura popular.1. Fbricas de charutos da Bahia: histrico e perfil em 2009. 2. Charutos: odisseia, segredos, atualidade e desafiosAgradecimentosUm trabalho como este tarefa que no se executa sozinho. Alm de meu acervo e da consulta em mananciais que, de uma ou outra forma tratam do tema, contei com valiosas informaes dos depoentes entrevistados, dos fabricantes de charutos que acolheram a iniciativa de braos abertos, assim como com a cordialidade e a inestimvel cooperao dos arquivos pblicos, os quais permitiram a tomada de fotografias, importantes documentos de embasamento deste trabalho.

Afora tais pessoas, instituies e empresas - relacionadas ao final - devo tambm consignar o apoio annimo de artess e artesos do labor fumageiro, cujas experincias, a mim alcanadas pelo dia a dia de nosso relacionamento, foram de fundamental importncia.A todos, sem exceo, meus sinceros agradecimentos.__________________________________________DedicatriaNa Bahia o ofcio de fazer charutos atividade francamente feminina. Por isso - uma questo de justia - este livro dedicado s annimas mulheres baianas milhares - que, com seu trabalho, ao longo de sculo e meio, tm ajudado a construir esta odisseia. s primeiras que j se foram e quelas que continuam levantando-se s madrugadas para preparar os almoos de seus maridos, antes de irem para a faina de enrolar as folhas de fumo. Que retornam ao meio-dia para por mesa, a refeio da famlia. Que noitinha, antes de cuidarem de si, tem que servir o jantar, lavar roupas, arrumar a casa e conferir os deveres dos seus filhos. Valorosas mulheres, de cujas mos nascem os charutos da Boa Terra.__________________________________________HomenagensA Mrio Amerino da Silva Portugal, empresrio do ramo fumageiro, ardoroso defensor dos tabacos e dos charutos baianos, de cuja convivncia fraterna desfruto, desde quando cheguei Bahia em 1965. A Benjamin Menendez, que me amparou, em 1977, nos primeiros passos do aprender a apreciar charutos, iniciando-me nesta atividade qual tenho dedicado meia vida.A Fernando Meyer Suerdieck (1924-1989), de saudosa memria, sobre cujos ombros me debrucei para vislumbrar as tcnicas do plantio e do beneficiamento do tabaco.A Jean Baptiste Nardi, doutor em Histria Econmica, escritor, pesquisador da histria do fumo no Nordeste, por seus conselhos e orientaes.A todos os fabricantes, tcnicos, proprietrios de tabacarias, consumidores e estudiosos, com os quais espero continuar aprendendo. _________________________________________Homenagem especialA Flix Menendez, competente profissional e valoroso amigo, o qual, desde quando chegou ao Brasil em 1979, tem se dedicado, de corpo e alma, em prol da qualidade da manufatura dos charutos baianos e que muito colaborou com seus conhecimentos para a feitura desta obra.Meninos, eu vi.Aconteceu em maio de 2003. Meninos, eu vi.

A alegre felicidade de gente aprendendo a produzir prazer. As torcidas saindo de mos inbeis, juntando e enrolando folhas de fumo cujo contato lhes era indito e estranho.Meninos, eu vi. Sobre doze tbuas alvas, ainda virgens, as midas folhas distendidas, tentando se contrair, opondo-se ao espalmar de mos aprendizes. Eu presenciei como testemunha daquele apostolar encontro, a colorida emoo capturada pelo telo mgico que ampliava os ritualsticos gestos. Vi 24 mos, duas a duas, intentando transformar folhas de fumos em rolinhos, retratos culturais da Boa Terra.Meninos, eu vi, e ouvi segredos do fazer charutos, sados da mais baiana das bocas cubanas, a de Flix Menendez.Foi numa noite paulista quase inverno que eu vi, meninos, gente como crianas, a dar os primeiros passos do fazer e comear a soletrar a palavra Charuto. Que ali, eu vi no se escrevia com C.Escrevia-se com A de arte, A de amor, A de aprender.E vi, meninos, sentados ao fundo da inesquecvel cena, novos e experientes amantes dos charutos, formando silenciosa platia de olhares encantados como o meu que l estava no desvendar segredos de uma arte secular.Atores e plateia viveram eu vi, meninos um momento nico. Fascinados, como os doze apstolos da ceia, todos ouviram do Mestre Flix Menendez que charutos no se escrevem com C. E, ao final do espetculo da transformao do fumo em charutos, cada ator recebeu, devidamente autografada, a tbua sobre a qual operara o milagre. Uma material prova da presena do Mestre entre eles. Pela primeira vez em suas vidas e na histria dos charutos brasileiros.Meninos, eu vi. Lastimo que vocs no tenham visto._______________________________________________Estrutura do trabalhoAPRESENTAO Jean Baptiste Nardi PRIMEIRA PGINACOMEO DE CONVERSA 1. ODISSEIA O andar da carruagemNa esteira do tempoPrimeiro cenrio (1840/1880)Segundo cenrio (1881/1910)Terceiro cenrio (1911/1950)Quarto cenrio (1951/2009) Passado perdido A saga de um nome famoso Dannemann Definio do alvo Efeitos das guerras A volta por cima L se foram de roldo Pimentel e Ideal Ascenso e queda de um gigante Suerdieck Os dois irmos Um homem de sorte O terceiro comandante A vida no para Muda o curso da histria O quarto comando O derradeiro comando Golpe final

A primeira Premium Menendez & AmerinoErro de perspectiva Mudana de foco Qualidade diferenciada Produo 100% manual Reviravoltas e Caixa Preta

Diletantismo charuteiro LeCigar Correndo na frente Chaba Renascendo das cinzas Leite & Alves O futuro a Deus pertence Paraguau O ltimo adeus O rio vira charutos Mulher de fibra

2. PASSANDO A RGUA O novo empresariado Servindo a terceiros Prazer em conhec-lo

Os recentes produtores

3. ENTRE QUATRO PAREDES Gatos por lebresFundos de quintal Atabaques & CharutosBravas guerreiras 4. DESAFIOS Retrato do presenteRemando contra a mar ltima pgina MANANCIAIS Fontes O autor __________________________________________ ApresentaoO trabalho de pesquisa de Hugo Carvalho daria um livro. No simplesmente mais um dos livros sobre charutos, como aqueles encontrveis em livrarias convencionais ou tabacarias. um trabalho sobre O CHARUTO DA BAHIA, produto da nossa terra. Pela primeira vez, um autor teve a coragem de falar sobre assunto to difcil de compreender, pela raridade e disperso das fontes. Quem melhor que Hugo Carvalho para falar do charuto baiano? De origem gacha, ele se fez cidado de So Gonalo dos Campos, a 15 km de Feira de Santana e 110 da Capital, onde se aposentou aps dcadas de trabalho nas fbricas do Recncavo. Economista de formao, ele prestou seus servios, entre outras, s duas maiores empresas da Bahia, a Suerdieck e a Menendez (da qual foi um dos fundadores), tanto na rea da produo de fumo, quanto na fabricao e comercializao dos charutos. Mas, as competncias no so profissionais s. Hugo sabe desfrutar esses prazerosos momentos em que o charuto espalha seus deliciosos sabores pelo paladar e nos quais o pensamento se perde nas volutas de fumaa, procurando as nuvens. A nasce a inspirao para escrever, quase semanalmente, suas crnicas Fumaas Mgicas, hoje virtuais, que publica h cerca de 20 anos.O leitor no ver nestas pginas, como se planta o tabaco. No aprender como as mos delicadas das charuteiras enrolam, com experincia herdada de suas mes, avs e bisavs, as folhas escuras e cheirosas plantadas h sculos no Recncavo baiano, terra predileta do charuto brasileiro. No. Hugo preferiu outro caminho, deixando os interessados visitarem as lavouras que se estendem por nossos plcidos campos de Cachoeira, So Flix ou Cruz das Almas e verem nossas lindas charuteiras, cuja cor da pele se confunde com a das folhas que manuseiam.Com inegvel talento de contista, Hugo nos narra a histria da indstria dos charutos baianos, desde os primrdios at os presentes dias. Ele foge da tcnica do historiador que analisa ou comenta para alguns especialistas. Prefere deixar os fatos e os dados falarem por si, para cada leitor seguir tranquilamente os passos. Ele associa a experincia prpria e suas reminiscncias, com depoimentos de algumas personalidades que participaram da odisseia da indstria, entrevistas com os atuais fabricantes e com mulheres que continuam a tradio da fabricao caseira. Seu livro no um livro de histria, um livro de estrias. Com ele percorremos mais de um sculo e meio de criao de empresas, verdadeiras sagas familiares em algumas delas, suas evolues, seus negcios com perodos de sucessos e de dificuldades, de tristeza tambm quando se v uma histrica fbrica fechar, um nome ilustre ou uma antiga e conhecida marca desaparecerem. No seguimos uma sucesso de acontecimentos: vivemos a odisseia! Acompanhamos os desdobramentos por dentro, com a viso do ator que nos desvenda os bastidores de um mundo conhecido por poucos. Descobrimos segredos. Ficamos encantados a cada pgina.Difcil no gostar do texto. Ele foi feito para satisfazer as exigncias tanto do aficionado do charuto, quanto do universitrio, do tcnico ou do amador de literatura. At os inimigos do tabaco deveriam estar contentes: aqui no se faz apologia do charuto, no se ensina, nem se incita a fum-lo. Entretanto, implicitamente, uma defesa do charuto. No de qualquer um, mas sim do charuto da Bahia. Hugo Carvalho nos mostra que o produto tem uma histria e faz parte da tradio e da vida do povo do Recncavo, inclusive como elemento dos cultos afro-brasileiros. Ele nos faz lembrar com saudade mas, com moderao a poca de ouro, quando saam das fbricas, milhes de charutos que os brasileiros consumiam diariamente, quando milhares de famlias viviam da indstria e do comrcio do fumo.Tal tempo passou e Hugo nos ensina que no podemos deixar extinguir-se esse produto de nossa terra. Que preciso manter acesa a chama. Ele fala em desafios, porque considera que o charuto baiano ainda tem futuro e muitas estrias pela frente. Todos os seus apreciadores esperam que, por muito tempo se possa falar em Bahia, Terra de Todos os Charutos. Por enquanto, falamos deste trabalho que assim se intitula. Aguardvamos por isso, h muito tempo. Conceb-lo e escrev-lo foi desafio que somente algum como Hugo Carvalho poderia realizar. Ele o fez com brilho. Jean Baptiste NardiSetembro-2009__________________________________________

Primeira pgina

Pensa o poeta

A importncia do fumoJunto a nossa economiaVem do tempo imperialSendo que nossa BahiaFoi o lugar mais propcioNo foi escolha tardia.

Quando um fala mal do fumoJ tem outro que apreciaZ vive botando o fumoNo cachimbo de MariaTem at cabra levandoFumo em casa, todo dia. (ANTNIO SILVA, 1988)

Registra a imprensaSe existe alguma coisa a respeito da qual o mundo inteiro est 100% de acordo que o fumo faz mal sade; no apenas de quem fuma, mas tambm, embora no se saiba claramente com que grau de intensidade, de quem est por perto [] proibido fumar, hoje, em praticamente qualquer local fechado onde haja mais de uma pessoa []Est banida no planeta inteiro, ou quase, toda e qualquer propaganda [] lei lei. Tudo bem outras coisas, nesta vida, j foram permitidas um dia e hoje no so mais, e nem por isso o sol deixou de nascer todas as manhs. O problema que a proibio do fumo parece no bastar, para quem a defende [] A partir desse ponto de vista, quem fuma vai passando a ser olhado como portador de alguma deficincia moral, ou mau cidado, ou nocivo vida em sociedade, ou as trs coisas ao mesmo tempo []O presidente Luiz Incio Lula da Silva disse h pouco que todo mundo deve ter o direito de fumar desde que no incomode aos outros; garantiu, alis, que s fuma em sua prpria sala. Parece algo de muito bom senso, mas o homem s levou pancada. Hoje em dia, quando o tema tabaco, ter bom senso j no serve mais para dar razo a ningum. J.R.GUZZO (VEJA N 2078).__________________________________________

Comeo de conversa

Labuto no ramo fumageiro desde a dcada de 70. Trabalhei em todos os elos da cadeia, a partir do plantio do tabaco, passando pela produo de charutos e desembocando nas variadas formas de lev-los ao consumidor final. Participei da direo das duas mais importantes fbricas deste perodo, bem como da empresa agrcola que foi nossa maior exportadora de fumos especializados. Operei na distribuio atacadista, fui proprietrio de tabacarias e da primeira empresa de marketing direto dos charutos baianos, em tempos pr-internet. So mais de trinta anos voltados ao que, para mim, se converteu num estado dalma: falar sobre os charutos da Boa Terra. Tanto me animou encarar o desafio de tentar resgatar um pouco da nossa memria, pois preservar o passado garantir o futuro. nosso direito e nossa obrigao. Convivi com empresrios das mais distintas personalidades. Alguns competentes, outros sonhadores, outros mais, sem clara viso do que foi e do que o mercado brasileiro de charutos. Debrucei-me sobre o passado e o presente, testemunhando projetos bem sucedidos e autnticos fracassos. Convivi com ambos. No negcio posso no ter ainda aprendido como fazer, mas sei como no fazer. Meio caminho andado.Neste andar, percebo haver faltado ao conjunto das grandes empresas charuteiras uma ao mercadolgica unificada em favor de si prprias. Melhor dizendo, em prol do charuto baiano.Deixaram-se permanecer cada qual cuidando de si. O consumidor brasileiro ficou merc de publicaes estrangeiras as quais, como no poderia deixar de ser, prestigiam charutos de outros pases. A troca de informaes, usual entre membros de um mesmo segmento, era raridade e, quando muito, segredada ao concorrente mais prximo. No jogo do esconde-esconde, uns ficaram esperando pelos outros. Em dado momento, mais precisamente em 2001, chegou-se a cogitar a fundao da Cmara de Charutos da Bahia, a qual no saiu do papel. No Brasil, a ausncia da preocupao com os produtos naturais e suas manufaturas resultou em uma perda de espao para outros pases. No incio da nossa histria, tivemos o caso do pau-brasil. A seguir, l se foram nosso ouro e pedras preciosas. Depois, testemunhamos o caso da borracha. Do caf, nem se fala. Perdemos no marketing internacional para a Colmbia. Mais recentemente, o cupuau e a cachaa foram alvo de tentativas de apropriao externa. Agora presenciamos o abandono do cacau baiano, cuja cultura vive seu estertor. Assim vem sendo com o tabaco e os charutos produzidos no Recncavo Baiano. Imperativos polticos tm induzido o desaparecimento da atividade e nunca houve ajuda oficial relevante na defesa do renome dos charutos e dos fumos baianos. As tentativas de se conseguir apoio datam de muitos anos. Sempre frustradas. Em 1958, h meio sculo, se pleiteava a constituio de um Fundo de Recuperao da Lavoura Fumageira e da Indstria Nacional de Charutos. Quem recorre bibliografia charuteira, encontra diversificado material, focado em produtos no brasileiros. Mesmo entre autores nacionais, salvo honrosas excees, reina um quase silncio sobre nossas fbricas. Mais precisamente sobre a Bahia, centro de excelncia do fumo para charutos e seus labores.Esta obra no um trabalho acadmico, com grficos, mapas e tabelas. Portanto, no nutre pretenso em ser referncia bibliogrfica, nem resgatou muito do que foi esquecido. Intentar faz-lo demandaria anos de pesquisas.

Tampouco aborda a maneira artesanal como o tabaco se transforma em charutos, ou mitos que cercam sua produo e seu consumo. A tcnica do fabrico e os tabus emblemticos do consumir charutos esto descritos em vrios idiomas. simplesmente um livro que, tentando harmonizar datas e nmeros, revela o perfil da curva do mercado consumidor domstico, contrapartida do segmento produtor de charutos. Que, malgrado as adversidades, continuar sempre existindo, at o dia em que, prazam os cus no acontea, resolvam declar-lo ilegal. Sem faltar com a verdade, reala a importncia pouco percebida dos nossos charutos, proporcionando, de forma to ldica quanto possvel, o painel da atividade de seus primrdios aos dias correntes e as vidas que se esconderam por detrs.Nisto se resume a razo deste livro. Deixar rastros. Valorizar o que nosso. Tornar pblicos aspectos desconhecidos. Desvendar mistrios. Pontuar fatos pitorescos e curiosidades. Contestar paradigmas. Mostrar o que resta. Expor desafios. Parar para pensar.Boa leitura e boas baforadas!Bahia, outubro, 2009.HC__________________________________________1. ODISSEIAO andar da carruagemDos finais do sculo 19 at o primeiro quartel do sculo 20 os charutos, embora tivessem seu consumo disseminado entre as diversas faixas da pirmide social, foram complemento da moda das classes economicamente mais favorecidas. A aura, da decorrente, converteu-se num verdadeiro status-symbol que perpassou geraes, passando a habitar no inconsciente coletivo.Mesmo sendo um prazer de carter individual, os charutos permitem a satisfao de compartir. No o produto em si, como acontece com o chimarro dos gachos, mas a de trocar opinies, tanto sobre aromas e sabores, quanto s formas e momentos mais adequados para o consumo. Prova disto so os inmeros clubes e confrarias de charutfilos existentes Brasil afora. Renam-se dois ou trs fumadores. De forma inevitvel, a conversa descambar para o charuto amigo e companheiro. Assim como as espirais da efmera fumaa representam a dissipao dos limites, os charutos quando adequadamente consumidos provocam breves, mas inesquecveis momentos.So anos de histria, charuto a charuto, num trabalho intenso, meticuloso e especializado. Conhecer isso cria deliciosas expectativas do aguardar a hora especial do consumo.Poucos lugares no mundo renem condies para o plantio de um bom tabaco. A Bahia, em especfico a regio do Recncavo Baiano, um deles. No foi por outra razo que ali surgiram grandes empresas, que fizeram mundialmente reconhecida a fama dos charutos baianos. [] a Bahia foi parte do movimento de modernizao pelo Segundo Imprio, que resultou numa poltica de imigrao voltada para a produo de mercadorias. A renovao e ampliao do fumo foi o reabilitado de uma migrao de alemes na poca da Guerra do Paraguai (PEDRO, 1996).

A Bahia foi assim, o bero da indstria brasileira dos charutos. Muito antes de dar seus primeiros passos e ser empresarialmente organizada, a atividade existia em centenas de casas humildes, sob a forma de fabrico domstico, como natural extenso do trabalho nos campos de plantao e dos armazns de beneficiamento do tabaco. provvel que tal atividade deva ter se constitudo no embrio, do qual se valeram os empreendedores estrangeiros, em especial alemes, para montarem seus negcios, associando, enquanto foi possvel, a mo-de-obra escrava. [] a mo-de-obra explicitamente escrava era complementada com trabalho servil, to explorado quanto o escravo [] as diferenas entre homens livres e escravos eram, frequentemente, muito tnues [] (PEDRO, 1996).Recordemos que no perodo colonial, todas as possesses portuguesas estavam proibidas de ter fbricas em seus territrios. partir de 1808, com a vinda da Corte Portuguesa, que adveio a possibilidade de desenvolvimento do setor, com a abertura, em 1817, das primeiras fbricas de rap. At meados do sculo 19, o rap foi o produto derivado do tabaco mais consumido no Brasil. A produo estava centrada no Rio de Janeiro, havendo tambm fbricas na Bahia e em Pernambuco (NARDI, 2000). O charuto aparece ocupando aos poucos o lugar do rap, em finais do sculo 19. [] Ligado a uma aura de masculinidade e modernidade, seu surgimento logo dividiu os adeptos do fumo em tabaquistas (consumidores de rap) e fumistas (apreciadores de charutos). Nas ruas e saraus da poca, um e outro propagavam a preponderncia de sua opo e de suas ideias. Como o rap significava "o velho", e o charuto, "o novo" (e no podemos esquecer que o sculo XX era, ento, o novssimo sculo), o charuto venceu, e o rap desapareceu [] (SOUZA CRUZ, 2009).A princpio as cidades de Maragogipe, Cachoeira e So Flix tinham posio estratgica em funo dos meios de transporte de ento. A primeira era o caminho mais curto para a Capital. Saveiros e vapores saindo pelo Rio Paraguau via Bahia de Todos os Santos, ligavam-na a Salvador. Cachoeira, mais acima do rio, era a porta de entrada para o Serto e para a Chapada Diamantina. Cruz das Almas, como centro produtor de charutos, aparece num segundo momento. Isto devido ao desenvolvimento das rodovias que preterem a via ferroviria e o transporte fluviomarinho, a ponto de extingui-los.Vamos, agora, viajar no tempo. Nos prximos captulos abordaremos esta odisseia baiana.__________________________________________Na esteira do tempoPrimeiro cenrio (1840/1880)Nos anos 40 a 80 do sculo 19, nas bandas do Recncavo Baiano, Maragogipe e Cachoeira compunham um formidvel entreposto comercial. As terras ao sul, onde hoje temos So Flix, Muritiba, Cruz das Almas, pertenciam Cachoeira. Da mesma forma que as terras ao norte, todas chamadas Campos da Cachoeira, que vieram a se transformar em So Gonalo dos Campos.Os fumos produzidos na regio eram internacionalmente conhecidos como Mata Fina. Aos mesmos se juntavam outros, produzidos em paragens ao derredor. Chegados a bordo dos comboios ferrovirios, outros em montarias, estradas afora. Assim, alm dos fumos Mata Fina tinham-se os chamados Mata Norte, Mata Sul e Serto, cada qual de caractersticas prprias, exportados e que tambm eram matria-prima para os charutos baianos.

neste cenrio que surgem decorrentes da acumulao de capital da atividade fumageira agroexportadora, e do aproveitamento da mo-de-obra desocupada nos perodos entre as safras, os primeiros fabricos organizados de charutos. Conceitu-los, ento, como indstrias propriamente ditas seria exagerado. Eram fbricas-me (NASCIMENTO, 1997) no geral com menos de dez operrios, a cujas produes se adicionavam as encomendadas aos fabricos domsticos que proliferavam na regio fumageira.Neste primeiro momento, entre outras, emergem em So Flix, as fbricas Juventude de Francisco Jos Cardozo & Cia (1842), A Fragrncia de Jos Furtado Simas (1851) e Dannemann de Gerhard Dannemann (1873); em Maragogipe, a fbrica F. V. de Mello de Francisco Vieira de Mello (1852) e a firma Nogueira & Irmo (1877). Para Cachoeira se transfere, em 1853, a fbrica Utilidade de Costa Ferreira & Penna que fora fundada em Recife, dois anos antes.Alm de tais empresas pioneiras, outras havia. Em 1877 comprova-se a existncia de firmas pertencentes a Simo Duarte DAlmeida e Cndido F. Costa Oliveira em So Flix; Joo Martins Oliveira em Cachoeira; Francolino Hiplito dos Reis e Jos Neuma da Silva em Muritiba; Quintino Jos da Costa em Maragogipe (ARQUIVO PBLICO DA BAHIA).Era gente que no mais acabava, inaugurando um autntico ncleo de concentrao pr-industrial que, alm de cuidar de seu principal negcio, os armazns de fumo para exportao, voltava-se para aquilo que passava a ser a grande novidade em caras e bocas brasileiras. lgico que algumas das novis empresas charuteiras, dado seus laos com o Exterior, fruto da exportao de fumos, acionaram estes canais para projetarem alm-fronteiras, suas marcas de seus charutos. Exposies eram, naqueles tempos, o mais importante meio de marketing internacional. Em 1865, na cidade do Porto em Portugal, a fbrica A Fragrncia era premiada com sua primeira medalha de ouro. Isto voltaria a ocorrer com a mesma, em 1876, na exposio de Filadlfia nos Estados Unidos, e com a Dannemann, que igualmente marcou presena no citado evento.Em 1880, as firmas existentes despejavam no mercado pouco mais que 30 milhes de charutos para serem fumados pelos 20 milhes de sditos de Sua Majestade, o Imperador Pedro II. Um consumo bruto aparente per capita de 1,5 unidades por ano. Respeitada a proporo, nossos atuais quase 200 milhes de patrcios estariam transformando em fumaa 300 milhes de charutos, por ano.A mo-de-obra era desprotegida. As jornadas extenuantes, seis dias por semana. Domingos no eram remunerados. Frias, nem pensar. Mes levavam filhos para ajud-las. Os custos da mo-de-obra, por isso mesmo, no eram significativos. Na produo manual de charutos, o fumo despontava como sendo o mais importante item no custo direto da produo.Os pioneiros viviam mais ou menos em paz, embora o governo provincial da Bahia comeasse a voltar sua gula arrecadadora para a atividade.

Segundo cenrio (1881/1910)No decurso destes trinta anos o mercado produtor efervesce. Alm de Gerhard Dannemann que vivia na Bahia desde 1872, aporta na regio outro personagem que, da mesma forma, ir gravar seu nome na epopeia charuteira, August Wilhelm Suerdieck (1888).Acelera-se o processo de surgimento de novas empresas. Em So Felix despontam as fbricas Stender & Cia e Michaelense de Theotnio Magalhes & Cia, bem como ali vamos encontrar funcionando Dias Barreto & Cia e Cruzeiro do Sul de Jos Maurcio Vianna.

Em Muritiba, ento arraial de So Flix, se implanta a fbrica So Felista de F. Ferreira & Cia.Em Maragogipe, comeam a funcionar as fbricas Victoria de Antnio Caetano da Silva e Suerdieck de August Suerdieck.Na Vila do Curralinho, que fora distrito de Maragogipe, operava a fbrica Central de Francisco Barros Lordello.Em Cachoeira, alm da instalao de uma filial da firma gacha Poock & Cia, cuja fbrica foi batizada por Seco Bahiana, estavam presentes Zacharias da Nova Milhazzes, Lucas Frey & Cia, F. A. Jezler e a fbrica Amazona de Arajo & Cia.Em Salvador, entre outras, encontramos Pacheco & Cia, assim como as fbricas Modelo de Thom Pereira de Arajo, Liberdade de Antnio Correa e Havaneza de Manoel Correia Machado.Com tanta gente intentando lugar ao sol e por fora de variados acontecimentos, elencando-se, entre outros, mortes, escassez de capital, insucessos, associaes para fortalecimento recproco, natural que um processo progressivo de fuses, incorporaes ou sucesses, comeasse a se configurar. Naquele tempo, tudo acontecia com bastante simplicidade. A burocracia no era a dos dias correntes.Foi o caso da fbrica A Fragrncia a qual, dado a morte de seu fundador, passou a ser administrada pela firma Viva Simas. Esta, no podendo sozinha tocar o barco, associa-se ao empresrio Bernardo Rodemburg, formando a empresa Simas & Rodemburg (1899). Cinco anos depois, nova alterao, passando a chamar-se B. Rodemburg & Cia. No durou muito. Ano seguinte, 1905, a fbrica desaparece do cenrio e suas marcas so adquiridas por Stender & Cia.Outra viva tambm assume os negcios do extinto marido. A fbrica Havaneza passou a ser gerida pela empresa Viva Correia Machado.Em Maragogipe, a firma individual Francisco Vieira de Mello se transforma em A. Vieira de Mello & Cia, cuja fbrica passa a ser chamada Vieira de Mello, nome que se perpetuou.Em 1899, a empresa individual F. A. Jezler associou-se com Roberto Gustavo Hoening, incorporando a antiga fbrica Lucas Frey & Cia, da advindo a empresa Jezler & Hoening batizada como Fbrica Flor da Bahia.Com a marca de sete realizadas, este segundo cenrio foi prdigo em exposies. Em Anturpia (1885), Berlim (1886) e Chicago (1883), a fbrica Dannemann foi premiada. Na feira de 1904 em St. Louis, alm da Dannemann, compareceu Costa Ferreira & Penna, sendo ambas agraciadas. Na exposio nacional do Rio de Janeiro (1908), a par das duas citadas empresas, tambm a Suerdieck se fez presente, sendo todas reconhecidas pela qualidade de seus produtos. Em 1910 a Dannemann, confirmando sua vocao para o mercado externo e seu maior potencial econmico, comparece a dois outros eventos, Bruxelas e Buenos Aires. Medalhas no peito.E, como os exemplos quase sempre vm de alm-mar, em 1891, Rui Barbosa ministro da Fazenda, mirando-se nas experincias tributrias dos Estados Unidos, Inglaterra, Frana, Rssia e Itlia, prope um imposto de consumo sobre o tabaco. O segmento mais afetado foi o dos charutos. Os protestos da classe produtora foram generalizados.A taxa criada no estabelecia variantes para charutos de preos distintos. Era uma s, por unidade. Assim, um charuto considerado de primeira linha que custava 100 ris, a partir do novo imposto, tinha seu preo de venda aumentado em 5%. Em contrapartida, os produtos mais populares e de maior consumo, que custavam 10 e 2 ris, passaram a custar de 50% a 250% mais caros (NARDI, 1985).

O desconhecimento e a insensibilidade dos legisladores quanto s inerncias do mercado, incluindo-se a falta de representatividade poltica dos empresrios charuteiros imagine-se, Rui Barbosa era baiano - passavam a atormentar o setor.Em 1910 a populao brasileira, tipicamente rural posto que apenas a tera parte vivesse nas cidades, era representada por 24 milhes de habitantes. Consumiam-se, ento, algo ao redor de 70 milhes de charutos (NARDI, 1985). O consumo nacional anual bruto per capita subira de 1,5 para 2,9 unidades. Crescimento, no decurso de trinta anos, superior a 90%. Extrapolando-se o novo ndice para os dias correntes, as empresas charuteiras estariam produzindo cerca de 580 milhes de charutos para o mercado nacional. A partir de 1903 os charutos comearo a se defrontar com os cigarros que j vinham prontos. Chegam ao mercado os cigarros Dalila, balizando a entrada, no cenrio, da indstria cigarreira nacional de porte, cujo crescimento ir contribuir para a futura queda de consumo dos charutos.Terceiro cenrio (1911/1950)No perodo ora enfocado a sociedade brasileira deixar de ser predominantemente agrria. Nas cidades surgiro a burguesia industrial, a classe mdia e o proletariado. A importncia econmica do grande entreposto comercial formado por Cachoeira e So Flix comear a declinar. A construo da estrada Salvador-Feira de Santana, na dcada dos anos 20, facilitando o acesso rodovirio Capital, representar reduo do movimento fluviomarinho Cachoeira-Salvador.A produo charuteira baiana vai atingir seu apogeu, o processo de expurgo dos pequenos fabricos se acentua, fortalecendo-se a concentrao empresarial. A importncia da manufatura de fumos passou a ser tanta que, segundo censo de 1917, 4 empresas charuteiras e cigarreiras constavam entre as 100 maiores indstrias nacionais. Funcionavam na Bahia 164 estabelecimentos industriais de beneficiar fumo (A TARDE, 1920), mas nos idos de 1919, em realidade, apenas cinco fbricas, Suerdieck, Stender, Costa Penna, Vieira de Mello e Dannemann, dominavam 48% do mercado, produzindo em conjunto 61,2 milhes de charutos (MESQUITA, 2003). Ano seguinte a participao das mesmas chegou a 75% (NARDI, 1985).Nesta fase as firmas Aug. Suerdieck (exportadora de fumos) e A. Suerdieck (manufatura de charutos) se fundem, formando a empresa Suerdieck & Cia. (1914). Por decorrncia dos reflexos da Primeira Guerra Mundial, desaparecem inmeros fabricos sem maior expresso, satlites das grandes charuteiras.Jezler & Hoening se transforma em Hoening & Cia em 1911. Cinco anos depois, o controle de sua fbrica Flor da Bahia, passa para as mos de firma individual R. Gaschlin.A fbrica Amazona de Arajo & Cia entra em processo de liquidao. Suas marcas so compradas pela Companhia de Charutos da Bahia (1920).As firmas Dannemann e Stender se unem, tendo como sucessora a Cia. de Charutos Dannemann (1922). A fbrica Leite & Alves, ento apenas produtora de cigarros, se transfere de Salvador para Cachoeira (1936).Nasce em Muritiba a fbrica Pimentel de C. Pimentel & Cia (1937) e a Vieira de Mello sai do cenrio de Maragogipe em finais dos anos 30, sendo seus prdios adquiridos pela Suerdieck (1940).Em decorrncia da II Guerra Mundial os empregados alemes so perseguidos e demitidos sem direito a nada. Conflitos nas fbricas. As instalaes da Dannemann so depredadas e a empresa vai comear a amargar franco declnio, vindo a fechar suas fbricas de Maragogipe, Muritiba e So Felix (1948).

Nos 40 anos ora narrados, a classe trabalhadora alcana significativas conquistas o que, por outro lado, veio redundar em gradativas majoraes nos custos de produo dos fabricantes.No percamos de vista que charutos feitos mo so compostos por dois insumos fundamentais, um visvel, outro invisvel. Tabaco e mo-de-obra. Assim, seu custo de produo est irremediavelmente atrelado evoluo de tais componentes bsicos.Em 1917 o trabalho feminino e o infantil so regulamentados. Estipulavam-se cargas horrias, proibindo trabalho de mulheres noite e de grvidas nos meses anterior e posterior ao parto. Em 1940 institudo o salrio-mnimo, tendo como maior valor nacional 240 mil ris. Havia treze patamares regionais de valores inferiores ao teto. O estipulado para o interior da Bahia era, por certo, menor que a metade do mximo. Para se ter ideia, as dirias pagas na poca variavam de dois a cinco mil ris (CASTRO, 1941).Em 1942 o padro monetrio alterado. O Mil-ris se transforma no Cruzeiro. Ano seguinte promulgada a Consolidao das Leis do Trabalho (CLT) conquistas do operariado, aumento do custo de produo das fbricas e o maior salrio-mnimo, ao final do ano, correspondia a 300 cruzeiros. O gradativo aumento do custo da mo-de-obra foi a razo da fbrica Suerdieck iniciar um processo de mecanizao, redundando na dispensa de 300 operrios (1949).Neste perodo a Dannemann participou de trs exposies, em todas premiada: Turim (1911), Gand na Blgica (1913) e na exposio do Centenrio da Independncia, no Rio de Janeiro (1922). Ao que parece, os demais produtores, ausentes, andariam mais centrados e preocupados com os negcios no mercado interno.A produo nacional de cigarros sobe vertiginosamente. Em 1930 atingira a casa dos seis bilhes. Neste mesmo ano, os 37 milhes de brasileiros consumiram 130 milhes de charutos. Era como se cada um houvesse fumado 3,5 unidades no decurso de 12 meses. O mercado atingira seu pice. Mantida tal velocidade de consumo, ora estaramos fumando cerca de 700 milhes de charutos por ano.Vinte anos aps, ao final do presente cenrio, o consumo nacional relativo voltaria ao patamar de 1910, algo ao redor de 2,9 unidades per capita por ano. Conta fcil de ser feita. Em 1950 ramos 52 milhes de brasileiros consumindo 150 milhes de peas. Neste ano a Suerdieck, sozinha respondia por dois teros do abastecimento geral.A tal altura, a maior parte das empresas havia desaparecido e duas das restantes, estavam s vsperas do colapso. Mau sinal, pois um negcio s bom quando todos nele envolvidos lucram e se do bem. O segmento ir mergulhar numa fase muito difcil vivida por uns de imediato e por outros mais adiante.Quarto cenrio (1951/2009)A partir dos anos 50 o consumo nacional de charutos passa a declinar de forma magnfica. O hbito de fumar migrava para os cigarros, despejados aos bilhes Brasil afora, amparados por forte merchandising no cinema e ampla propaganda. Pela anlise de anncios e notcias na imprensa deste perodo, nota-se claramente que os charutos perdiam sua relevncia no contexto. Deixavam de marcar presena. A Dannemann em 1951 volta a produzir no resistindo muito tempo. Em 1955, tanto ela, quanto a fbrica Costa Penna saem do mercado. Paradoxalmente, neste mesmo ano, a Suerdieck comemora seu cinquentenrio, inaugurando um edifcio-sede no centro comercial de Salvador. Suas vendas no mercado interno, entretanto, seguiam em queda livre. luz da perspectiva do tempo, tenho impresso que tal medida, na contramo dos acontecimentos, fora uma tentativa de revigorar a imagem da empresa, ento bastante combalida pela srie de problemas com os quais se defrontava.

Cumpre evitar as pavorosas consequncias que trariam o fechamento ou extino da indstria fumageira, bradava o jornal CORREIO S. FELIX, em 1954. Os protestos se centravam nas restries s importaes de matrias-primas, nos impostos, nas barreiras alfandegrias e nos pesados nus das exigncias fiscais e trabalhistas. Tambm no deixavam de se referir concorrncia desleal do mercado subterrneo de charutos.Em um supremo esforo para se manter operando, a Leite & Alves, que produzia cigarros, sem poder de fogo para enfrentar a concorrncia das empresas cigarreiras modernizadas, d a volta por cima e ingressa, com sucesso, no mercado de cigarrilhas em 1951. No resiste concorrncia da Souza Cruz que resolvera fazer o mesmo em 1967. Fecha as portas em 1976.Estando praticamente sozinhas Suerdieck e Pimentel, novos empresrios so atrados para o ramo. Assim que, nos anos compreendidos entre 1971 e 1981, se estruturam na regio a pequena fbrica Ideal em Muritiba; a firma H. Madeiro, que vir a ser o embrio da atual fbrica Leite e Alves; o fabrico da Paraguau em Cachoeira e a Menendez & Amerino. Esta ltima em So Gonalo dos Campos, especializando-se no segmento do extrato superior de consumo, charutos de primeira linha. Com as dificuldades vigentes para importao de charutos estrangeiros e o charme de um scio cubano, a Menendez sacode o mercado e encontra um nicho, at ento pouco explorado pelos demais produtores. Pelo que veremos, esta companhia, mesmo sem ter conscincia disto, ir balizar o futuro do mercado nacional.O consumo interno em 1980 era estimado entre 22 e 25 milhes de charutos (GAZETA MERCANTIL, 1980). Acrescentemos as cigarrilhas e o charuto ento produzidos da Souza Cruz, que no costumavam ser computados, algo como 50 milhes de unidades anuais. Fiquemos, portanto com 75 milhes. Neste ano, a populao andava em 119 milhes de habitantes. Feitas as contas, nosso consumo relativo representava uma mdia bruta per capita anual de 0,63 unidade. Sendo assim, no espao de trs dcadas, o consumo absoluto cara 50,0% e o relativo 78,2%. Enquanto isto, o consumo de cigarros seguia subindo, ultrapassando a casa dos 142 bilhes de unidades (RIZZIERI, 2008).Na dcada que se iniciava novas aflies e adversidades. O salrio-mnimo no Recncavo Baiano que houvera obtido avanos correspondendo, ento, a 70,8% do maior valor nacional, dado a unificao do piso, ir representar um aumento real do custo da mo-de-obra regional em 41,3% (1984). Sero inevitveis os reflexos nos preos de venda.Correndo por fora, a penalizao tributria associada ao intenso lobby contra o tabaco, que nas bandas europeias reduzira a proporo de adultos que fumam de 40% para 35% entre os anos 78 e 84, tambm se articulava no Brasil. criado o grupo assessor ao Ministrio da Sade para controle do tabagismo no Brasil. Charutos e cigarros foram jogados na vala comum (1985). Vir mais chumbo pela frente. A alquota do IPI o imposto que incide sobre os produtos industrializados duplicada para charutos e cigarrilhas, passando de 15% para 30% (1986). Como consequncia, os preos tiveram que ser aumentados em 13%, afugentando mais os consumidores. Ainda em funo do aumento da carga tributria, decorre forte descapitalizao do setor, oriunda da necessidade adicional capital de giro e do maior custo financeiro. A empresria Gisela Suerdieck, por ocasio da festa dos 50 anos da fbrica Pimentel em 1987, em seu discurso bradava: [] Os primeiros meses deste ano foram um travo a amargar nossas gargantas. Novo congelamento, s que desta feita, nos preos internos. O dlar continuou sendo valorizado. Noutras palavras, custos diariamente se elevando [] A onda antitabagista que invade nossos lares est querendo fazer cada fumante sentir-se um criminoso [] Ainda neste ano criado o Programa Nacional de Combate ao Fumo.

Abro agora um parntese para registrar detalhe que tem passado despercebido. Em 1987 a Souza Cruz, que seguia produzindo cigarrilhas e dominava 90% deste segmento, fabricava tambm um charuto pequeno o qual, em termos de marca, era o que mais vendia no mercado interno. Por ser barato e consumido nas camadas populares, no costumava aparecer nas estatsticas charuteiras e, muito menos, nas lojas especializadas. Mas o fato que eram comercializadas cerca de oito milhes de unidades anuais de tal charuto, embora a companhia cigarreira tivesse condies de produzir at 12 milhes anuais (DCI 1987). Mesmo assim, cerca de dez anos aps, a Souza Cruz, considerando a atividade economicamente desinteressante, ir paralisar a produo de sua fbrica Inducondor, sediada em Petrpolis, RJ.Vamos em frente.Em 1988 so impostas frases de advertncia nas embalagens; so recomendadas medidas restritivas ao fumo nos locais de trabalho; criam-se os fumdromos; reduz-se o prazo de recolhimento do IPI de 30 para 10 dias. O patronato comea a pensar duas vezes, antes de admitir empregados. Afinal seria prefervel um no fumante, a um que, de vez em quando, escapasse em direo aos tais fumdromos. Por outro lado, houvesse mais capital de giro! A inflao anual anda nas alturas, alcanando 1.037% e seguir estratosfrica por sete anos. Desaparece a unidade produtora da Ideal em Muritiba. Suas marcas passam a ser produzidas pela Suerdieck. Uma fbrica a menos no cenrio. promulgada a nova Constituio Federal determinando regulamentao publicidade do tabaco.Em 1989, o ICMS - Imposto sobre Circulao de Mercadorias - aumentado de 12% para 25% nas vendas interestaduais. A medida representou reajustes de preos na ordem de 33%, sem benefcio algum para os fabricantes. Com a abertura s importaes, os charutos estrangeiros comearam a aparecer no mercado domstico. Ante a novidade e os preos cada vez mais caros dos produtos baianos, as marcas premium de charutos brasileiros sentiram o peso da indita concorrncia. A Pimentel, j sob o controle da Suerdieck, continuava com sua fbrica operando. Por pouco tempo. Em 1990 foi fechada definitivamente. Neste mesmo ano, o Ministrio da Sade dispe sobre a publicidade de produtos do fumo.Nos anos que se seguiram, estimuladas pela legislao do SIMPLES que permitia englobar o pagamento dos impostos numa s alquota reduzida, desde que o faturamento ficasse dentro de determinados valores, surgem novas empresas charuteiras. Por certo, se pudessem prever o que as aguardava, haveriam pensado duas vezes.De forma que brotaram como cogumelos entre 1997 e 2007, as empresas LeCigar, Mathe, Chaba, Dornelas, MR Charutos, Josefina, Talvis, Internacional, Tabacos da Bahia, Luiz C. Sandes, Maria G. S. Velame, Leite e Alves, Don Francisco, Puro Design, A. A. Julien, So Salvador, R. Vieira Oliveira e Tabacos Mata Fina. Algumas, inclusive, surgiram e desapareceram no citado perodo.As novas empresas, sem exceo, foram atradas por um ou mais dos seguintes fatores: 1) planos de comercializao no mercado externo; 2) legislao favorvel do SIMPLES que permitia praticar preos mais atraentes; 3) vcuo que se abrira no mercado nacional, decorrente do final melanclico da Suerdieck em 1999. Para todas o tempo propcio foi curtssimo. Exportar charutos no fcil. Que o ateste a Menendez & Amerino, intentando tal segmento desde 1978. Pior ainda, as novas empresas, da noite para o dia, foram excludas do direito aos benefcios do SIMPLES (2007). Adeus, vantagens competitivas!E enquanto os novos empresrios iam aparecendo e se acotovelavam, disputando entre si e com os produtores estrangeiros, o mercado consumidor cada vez mais estreito e elitizado, prosseguiam as medidas restritivas contra a atividade.Em 1995, uma portaria interministerial recomendava s emissoras de televiso evitar a transmisso de imagens nas quais entrevistados, convidados ou personalidades conhecidas do pblico, aparecessem fumando.No ano 2000 o Brasil, de olho no mercado cubano, visando beneficiar suas exportaes para l, firma acordo econmico com Cuba, dando como contrapartida ao referido pas, iseno de pagamento do imposto de importao sobre seus charutos entrados em nosso pas. Os consumidores nacionais vibraram. Os produtores baianos em vo protestaram. A concorrncia subterrnea que sempre existiu no Brasil no segmento dos charutos populares, procedentes de fabricos domsticos, se amplia. Passa a acontecer tambm, na linha de charutos premium. Surge o contrabando de marcas estrangeiras. No bastando as frases de advertncia nas embalagens, exigidas desde 1988, as empresas foram obrigadas a colocar imagens, bem como tiveram que comear a pagar taxas de fiscalizao sanitria para registro e renovao de produtos do tabaco (2001). Em 2002 a odisseia prossegue. Outro aumento da carga tributria. A Bahia cria o Fundo Estadual de Combate e Erradicao da Pobreza e para custe-lo majora de 25% para 27% a alquota do imposto sobre circulao de mercadorias nas vendas de charutos dentro do Estado.Ano seguinte proibida a comercializao dos produtos derivados do tabaco, via Internet.Para finalizar este passeio na esteira do tempo, em 2005 entra em vigor a CQCT - Conveno Quadro para o Controle do Tabaco, primeiro tratado internacional de sade pblica, envolvendo 192 pases membros da Organizao Mundial de Sade, com o objetivo de proteger geraes presentes e futuras das consequncias sanitrias, ambientais e econmicas, geradas pelo consumo e pela exposio fumaa do tabaco. Penso que, se tal louvvel propsito se referisse fumaa dos automveis, em vez da fumaa do tabaco, um servio muito maior estaria sendo prestado humanidade.Ah! Ia me esquecendo. Lembram-se quando registrei que, nos primrdios da atividade, a incidncia do valor da mo-de-obra no custo dos charutos feitos mo, era absolutamente inexpressiva? Pois bem e para no regredirmos muito no passado. Na entrada em vigor do Plano Real (1994) o salrio-mnimo, sem computar os custos sociais e trabalhistas que advieram ao longo da histria, se situava num contravalor de 70 dlares e agora, em 2009, anda na casa dos 238 dlares. Antigamente se fumava tabaco, hoje se fuma mo-de-obra.Pelas repercusses de tudo isto, o consumo nacional seguiu encolhendo. Do retrato atual do mercado brasileiro, tanto produtor quanto consumidor, bem como dos desafios enfrentados, irei tratar na ltima parte deste trabalho.__________________________________________Passado perdidoAs marcas comerciais, parte do passado perdido, so retratos na parede de nossa memria charuteira. Atravs de seus registros no perodo compreendido entre 1888 e 1924, acompanhados dos respectivos rtulos, foi possvel pinar dados e armar parte do quebra-cabea das informaes deste captulo. O trabalho permitiu, ao mesmo tempo, relacionar alguns fabricantes nem sempre lembrados. Mais ainda. Deixou trazer a lume, empresas charuteiras instaladas em Salvador, em finais do sculo 19 e incios do sculo 20. Para lembrarmos que, no foi s no Recncavo Baiano como usualmente se concebe que os pioneiros da epopeia estiveram presentes. Vale dizer que a maioria das fbricas soteropolitanas, se no todas, eram paralelamente voltadas produo manual de cigarros. Nada mais justo, portanto, que tenham sido implantadas no maior mercado consumidor, a capital do Estado.

Sendo muito amplo o acervo iconogrfico limitei-me, como no poderia deixar de ser, a documentar apenas algumas marcas entre as muitas que foram esquecidas. So singulares registros para quem sabe, em futuro trabalho, possam ser todas resgatadas e oferecidas ao pblico brasileiro. Preservar a memria ao de cidadania. Document-la, atravs das marcas, oportunidade de preservar nossa cultura.Tal o propsito deste captulo. Relacionar, com base nos registros de marcas, algumas fbricas de charutos de finais do sculo 19 e incios do sculo 20. Um autntico passado perdido. A relao a seguir tenta estabelecer uma ordem cronolgica sequencial das 24 empresas detectadas. As que no tiveram apurados seus respectivos anos de fundao constam da cronologia tendo-se como referncia os anos de seus primeiros registros de marcas.Assim sendo, voltemos ao passado.1842FRANCISCO CARDOZO & CIA - FBRICA JUVENTUDEAinda funcionava em 1897, ano em que registrou a marca Quinteto. Segundo fonte secundria, esta fbrica teria sido fundada em 1842, em So Flix, ento pertencente a Cachoeira (SILVA, I.M., 2008).1851ARTHUR FURTADO SIMAS - FBRICA A FRAGRNCIAFundada no ano em referncia, esta firma individual funcionou no Largo dos Artistas, em So Flix. Por vezes se encontra o nome de Jos Furtado Simas, possivelmente irmo do fundador.A fbrica A Fragrncia participou das exposies nas cidades de Porto, Portugal e Philadlfia, USA, respectivamente em 1865 e 1876, sendo premiada em ambas.Segundo propaganda da empresa, na imprensa em 1892 (A PATRIA, N 1, So Felix), seu fundador era falecido no referido ano, posto que sob o nome de fantasia da empresa, constava Viva Simas. Deduz-se tambm, pela pesquisa dos registros das marcas Chineza e Carlo em 1893, que a sucesso da firma Viva Simas, girou sob a razo jurdica Simas & Rodemburg (1899).Em 1904, nova transformao, desta feita para B. Rodemburg & Cia. Um dos scios desta ltima, Bernardo Rodemburg, antes tambm se dedicava ao fabrico de charutos sob a denominao B. Rodemburg. Neste ano se localiza o registro da marca Dalila. Fica a indagao: teria sido pelo fato de, no ano anterior, haverem surgido no mercado os cigarros Dalila, os primeiros cigarros que j vinham prontos?Supe-se ainda, que B. Rodemburg & Cia, se extingue em 1905, quando suas marcas so compradas pela fbrica Stender & Cia. Esta empresa, por sua vez, ir se fundir com Dannemann & Cia, em 1922, gerando a Cia. de Charutos Dannemann.Pela sucesso dos registros das marcas inicialmente pertencentes Fbrica A Fragrncia, observa-se, num dado momento, o nome da firma Herm. Stoltz & Co. do Rio de Janeiro, como compradora da titularidade das referidas marcas. Tal acontece ao se extinguir a firma B. Rodemburg & Cia. Registre-se que Herm. Stoltz & Co. mantinha estreitos laos com Dannemann & Cia, a qual ir em 1922 se unir Stender & Cia para formarem a Cia. de Charutos Dannemann.Curiosidade: a marca Carlo que mostrava um jovem, quase menino, fumando, mais adiante, em 1906 na gesto de Stender & Cia, ter seu visual modificado para um adulto sentado mesa de um bar.COSTA FERREIRA & PENNA - FBRICA UTILIDADETambm fundada em 1851, pelo portugus Manoel da Costa Ferreira, na cidade de Recife, transferiu-se dois anos aps para So Flix. Sabe-se que em 1892 funcionava Rua 20 de Dezembro, nesta ltima cidade, no se podendo precisar se ali fora o endereo inicial no Recncavo Baiano.Quando da morte do fundador, seu filho Manoel Costa Ferreira Filho e o ento gerente, Manoel da Costa Penna, ingressaram na sociedade. Desconhece-se, pois, o nome primitivo da empresa a qual, provavelmente, tenha sido uma firma individual. Todos os registros encontrados incluem o nome Penna na razo social o que, de fato teria acontecido aps a morte do velho Costa Ferreira.Em 1914 ingressam na sociedade Manoel Costa Ferreira Jnior, neto do fundador e Luis Costa Penna, filho de Luis Costa Penna, simplificando-se a razo social para Costa Penna & Cia.Dezessete anos aps, morre Manoel da Costa Penna. Em 1935, em natural sucesso familiar, so admitidas na sociedade Clarisse Barros Penna e Etelvina Almeida Costa Ferreira.No perodo da II Guerra Mundial a empresa, alm da matriz em So Flix, contava com filiais em Muritiba e Cachoeira, ocasio em que a denominao social passou para Costa Penna & Cia. Ltda.Lembre-se que o mercado nacional era ento, fortemente dominado pela Suerdieck, ocupando a Costa Penna o segundo lugar. Com o processo de mecanizao das marcas populares implantado pela fbrica lder, nos anos 50, por certo que a Costa Penna, no pode acompanhar a guerra de preos implantada, dado ao diferencial de custos de produo. Isto, associado aos problemas enfrentados pela indstria charuteira no ps-guerra (falta de transporte de cabotagem, abastecimento de madeiras para produo das caixas) deve ter levado a uma gradativa deteriorao dos negcios da Costa Penna, que vem entrar em falncia em 1955.Mesmo assim a empresa gravou se nome de forma indelvel na odisseia charuteira baiana. Prova disto as inumerveis marcas que foram registradas pela empresa, entre as quais se destacam: El Palhao e Triflio em 1892; Angelina, La Sympathica e El Cario em 1893; Fbrica de Charutos Utilidade em 1903; Corneteiro em 1905; Ideal em 1907.Para encerrar, trs curiosidades.A antiga marca El Palhao, voltou a ser registrada em 1922, com a mesma imagem, mas com o nome simplificado para Palhao.A marca Ideal mais tarde, anos 60/70, ir ressurgir no mercado, produzida em Muritiba pela empresa conhecida por tal nome e que veio a ser absorvida pela Suerdieck em 1988.A marca Angelina, com nova apresentao visual, volta a aparecer no mercado brasileiro, no incio do corrente sculo, produzida para terceiros pela fbrica Tabacos Internacional da Bahia Ltda.1852VIEIRA DE MELLO & CIA. - FBRICA F.V. DE MELLOFundada em Maragogipe por Francisco Vieira de Mello, a empresa funcionou por muitos anos sob o nome do seu fundador. As marcas registradas at 1909 o eram em nome da pessoa fsica. A partir de 1910 passam a ser em nome de A. Vieira de Mello & Cia. Foram os casos das marcas Real Jia e F.V.de Mello Fbrica de Charutos, registradas em 1903 e 1904, respectivamente.Em 1920 localiza-se rtulo com o registro da marca A. Vieira de Mello & Cia que foi correta denominao da sociedade e no Vieira de Mello & Cia, conforme tem sido usualmente divulgado.Em 1877 encontra-se a citao do nome de Manoel Vieira de Mello, possivelmente um irmo, acerca do qual se l no Livro de Matrcula de Comerciantes, perodo 1854/1896, registro n 378 de 18 de maio de 1859, Arquivo Pblico do Estado da Bahia: [] Manoel Vieira de Mello, cidado brasileiro, domiciliado na cidade de Maragogipe, apresentou para registro na data margem, a sua Carta de Comerciante, matriculado de grosso, tanto nos ramos de molhados, na compra de gneros do Pas, para exportar, passada pelo Tribunal de Comrcio desta Provncia []A empresa, nos primeiros anos de atividade, teve presena marcante no mercado. Sua importncia passou a declinar nos anos 20 do sculo passado.Em documento datilografado, datado de 28 de agosto de 1923, existente no Arquivo Pblico Municipal de So Flix, relacionavam-se o Ativo e o Passivo da fbrica, at a morte do inventariado, sem citar nominalmente quem. Ao que tudo indica, teria sido o fundador, Francisco Vieira de Mello. Na moeda da poca, o mil-ris, os bens da empresa totalizavam Rs. 240:281$905, sendo compostos por Mercadorias: Rs 139:032$400; Propriedades: Rs 51:000$000; Mveis e Utenslios: Rs 14:175$000; Dinheiro em espcie: Rs 2:747$720; Saldo em conta no Banco Alemo: Rs 29:629$050 e Lucro dos charutos vendidos: Rs: 3:699$735. J seus passivos totalizavam Rs 159:674$473 sendo compostos por Diversos Credores: Rs 74:456$132; Funeral: Rs 1:151$300 e Despesas para compra de um mausolu: Rs 5:000$000. Isto significava que a firma, contabilmente, valeria Rs 80:607$432. O fundo de comrcio, ou seja, o valor de mercado de suas marcas, no referido documento, no foi citado, nem valorizado. Coisas da poca.Os derradeiros scios foram Albertino Vieira de Mello Peixoto e Jos Fbio Peixoto.Entrou em processo de insolvncia ao final dos anos 30, vez que de acordo com a imprensa da poca, seus edifcios foram adquiridos pela Suerdieck em 1940.1877NOGUEIRA & IRMOSabe-se apenas, que esta empresa funcionava em Maragogipe no ano 1877. No foram localizadas outras informaes.1890PACHECO & CIAFbrica sediada em Salvador Praa do Comrcio, 03. J funcionava em 1890, quando registrou a marca Diavolo. Por certo operou at 1892, ano em que a citada marca passou propriedade de Joo Vicente Ribeiro e, a seguir, em 1893, para Dannemann & Cia.STENDER & CIAAno fundao: 1890Cidade: So Felix, Largo dos Artistas, N 2 - 6Pelo que se deduz dos processos consultados, em 1905 foi sucessora da Fbrica A Fragrncia, fundada por Arthur Furtado Simas, em 1851.Algumas marcas registradas em 1905: Vitoriosos, Patrcia, Querida, Pio X, Dr. Murtinho.Em 1906 localizaram-se registros de Maricotta e A Bella Africana. Quanto marca Carlo no se localizou o registro original e apenas um rtulo no Arquivo Pblico de So Felix. Note-se que ao tempo da firma antecessora (Arthur Furtado Simas) houve igual marca com iconografia totalmente distinta. A marca primitiva apresentava um jovem, quase menino, fumando e sugestivamente, sob o nome Carlo constava a palavra, em espanhol, Primeros. Fato compreensvel numa poca em que o politicamente correto no existia.1892THEOTNIO MAGALHES & CIA. - FBRICA MICHAELENSEData de 1892. Em 1893 se localizam registros das marcas Michaelense, La Cadena e Torero. Sediada em So Felix, tinha tambm endereo em Salvador (Calada do Bonfim, 76), provavelmente simples depsito.1893F. FERREIRA & CIA - FBRICA SO FELISTAFuncionava em 1893 no arraial de Muritiba, ento pertencente a So Flix, ano em que registrou, entre outras, as marcas Amlia e Alarm! Em 1894 registrou a marca Fbrica So Felista.THOM PEREIRA DE ARAJO - FBRICA MODELOFuncionava em 1893, quando registrou a marca Kalifa. Localizava-se Rua Conselheiro Dantas, ns 19 e 31, em Salvador.FRANCISCO DE BARROS LORDELLO - FBRICA CENTRALFuncionava em 1893, na Vila do Curralinho (que fora distrito de Maragogipe) quando registrou a marca Estrella da Bahia.MANOEL CORREIA MACHADO - FBRICA HAVANEZA Funcionava em 1893, em Salvador na Rua das Sete Portas, freguesia de Brotas, ano em que registrou a marca Coola. Em 1905 mantinha depsito Rua do Taboo, 25, em Salvador, conforme registro da marca de Cigarrilhos Japoneses. A fbrica chamava-se Havaneza. Deduz-se que em 1907 o titular era falecido, pois o nome de fantasia apresenta-se como Maravilha, registrado pela Viva Correia Machado. Em 1916 registrada a marca Viva Correia Machado. Desta feita, num segundo rtulo, a fbrica volta a constar com a denominao anterior, Havaneza.DIAS BARRETO & CIA.Funcionava em So Flix, em 1893. No h outros registros.

1894JOS MAURCIO VIANNA - FBRICA CRUZEIRO DO SULFuncionava em So Flix, em 1894. Sem registros.1897ZACHARIAS DA NOVA MILHAZESFuncionava em 1897 em Cachoeira, ano em que se encontraram os registros de suas marcas Cometa e Zacharias N. Milhazes. No h outros dados a respeito. 1898ANTNIO CORREA - FBRICA LIBERDADEFuncionava em 1898, quando registrou a marca Liberdade. Localizava-se Rua Conselheiro Saraiva, n 26, em Salvador.1899LUCAS FREY & CIA.Apurou-se apenas, que esta empresa funcionou em So Flix, tendo sido sucedida, provavelmente em 1899, pela firma Joezler & Hoening Fbrica Flor da Bahia.JEZLER & HOENING - FBRICA FLOR DA BAHIAEsta empresa surge em Cachoeira no ano de 1899, com o nome fantasia Fbrica Flor da Bahia, constando em alguns dos rtulos Antiga fbrica Lucas Frey & Cia, de So Flix.Nasce da associao do anterior fabricante F.A.Jezler, que em 1893 registrara as marcas Colibri e Hspero e que veio a se associar a Roberto Gustavo Hoening. Tanto que, em 1911, a denominao social consta como sendo Hoening & Cia.Em 1916, conforme documentado em fotos, Hoening & Cia sucedida por Rodolpho Gaschlin, de nome empresarial R. Gaschlin (letra A com trema). Esta, ano seguinte, em novos registros de marcas, grafa seus rtulos como sendo R. Gaeschlin o que, suponho, deva ter sido para que a pronncia em portugus se aproximasse da pronncia original. A empresa ento, se identificava como Casa Suissa (com dois esses).1902ANTONIO CAETANO DA SILVA - FBRICA VICTRIAFuncionou em Maragogipe. Fundada provavelmente em 1902, primeiro ano em que se encontram os registros, entre outros, das suas marcas: Cartolla, Nh-Nh, Roquetes e Macedos. A marca Victria Fbrica de Charutos foi registrada em 1903.1903POOCK & CIA - FBRICA SECO BAHIANAInstalou-se em Cachoeira, no ano de 1903, sendo filial da empresa Poock & Cia, sediada na cidade de Rio Grande (RS). A fbrica funcionou com o nome Seco Bahiana. Em 1906, entre muitas outras, localizam-se os registros das marcas Ns 1032 e 1047.Em 1912, ano em que so registradas inmeras marcas, entre elas Marrocos e Superiores (Troianos), a empresa j se transformara em sociedade annima, sob a denominao Companhia de Charutos Poock.1919PEDRO DE JESUS. Funcionava na cidade de Santo Antnio de Jesus em 1919, ano em que se localizou o registro da marca da empresa.ARAUJO & CIA - FBRICA AMAZONANo localizado ano de sua fundao. Sabe-se que em 1919, alm de registrar o nome fantasia da empresa, tambm registra as marcas Amadores e Bohemios. Nos requerimentos respectivos a empresa declarava-se em liquidao, - fato, no mnimo curioso - sendo sita Praa Conde dos Arcos, s/n em Salvador, com fbrica de charutos em Cachoeira.Ano seguinte, 1920, suas marcas foram averbadas para Companhia de Charutos da Bahia, empresa sobre a qual no se obtiveram outras informaes.1932FALCO & CIA.Nas pesquisas procedidas no Arquivo Pblico Municipal de Cachoeira, encontramos referncia citada firma, via anncio no jornal A ORDEM, janeiro 1932: Fumem PARTICULARES, o charuto fabricado com os melhores fumos da Bahia. Falco & Cia Cachoeira.Data desconhecidaP. RODRIGUES & CIA. exceo do selo de garantia, reproduzido neste livro, no foram encontrados quaisquer informaes quanto referida empresa, que funcionou em So Flix. Vale consignar que o nico original existente de tal selo me foi cedido por Flix Menendez que o recebeu, a ttulo de curiosidade, de uma empresa holandesa.__________________________________________

A saga de um nome famosoDefinio do alvoQuando Gerhard Dannemann iniciou sua saga, desembarcando no porto de Salvador e partindo em direo ao Recncavo Baiano, no poderia imaginar que iria se converter em legendria figura dos charutos. Veio como tantos outros alemes, mergulhar sua vida na atividade tabaqueira, negcio de relevante importncia no Imprio do Brasil.No sei onde, nem quando aprendeu nosso idioma. Mas sei que, homem educado, conquistou em pouco tempo, influentes amizades no mundo poltico provincial. Amizades que lhe foram muito teis, como veremos mais adiante. No s isso. Dotado de personalidade marcante, se transformou em inconteste liderana empresarial no setor fumageiro.

Encantou-se pela Bahia. Mais ainda pelo casario colonial dos sculos 16 e 17 e suas igrejas, cenrio-prespio e fervilhante centro de negcios, no ponto onde o Rio Paraguau, descendo em cachoeiras, deixava de ser navegvel. Era o porto de Cachoeira, ltima parada para saveiros e vapores que no podiam subir rio acima, mas que rio abaixo, invadindo as guas da Bahia de Todos os Santos, escoavam para a capital da Provncia da Bahia, as riquezas do Recncavo e outras tantas que chegavam do Serto, a bordo das marias-fumaas com seus apitos estridentes.Gerhard Dannemann preferiu a margem direita do rio. Talvez pela razo da paisagem oposta ser mais rica em casarios e assim, se comprazer com o encantador cenrio barroco, deslizando morros abaixo. Se isto no foi, deve ter sido pelos comboios da Estrada de Ferro Central da Bahia terem ali, o ponto final de seus trilhos. Ainda no havia ponte para a travessia do rio.No perde tempo. Mal completado um ano de sua chegada, cuida em se estabelecer na manufatura de charutos, juntando-a com a atividade exportadora de tabaco. Penso trouxera consigo tal intento, que a deciso no fora algo circunstancial. Pequenos fabricos de charutos eram constncia. Assume um destes negcios. Em fontes secundrias, tenho encontrado um nome para este ponto de partida, Schnarrennbruch, mas tanto no contexto global de somenos importncia. O fato que, como fruto da medida, surge a empresa Dannemann & Cia (1873). E toca o barco, correndo roas de fumo e cuidando do fabrico. Passa a conhecer a regio, palmo a palmo. Na verdade, So Flix fora escolhida para a matriz do negcio, por contar com menor concorrncia de fabricantes de charutos.Em 1880, seu amigo Ludwig Kruder convidado para ingressar na sociedade. Os negcios prosseguem e prosperam sendo a empresa agraciada por Dom Pedro II, com o ttulo de Imperial Fbrica de Charutos Dannemann. Isto, acontecido em 1883, por si mesmo, revela o grau de influncia poltica conquistada por Dannemann, em seus primeiros dez anos de Brasil.Neste mesmo ano, comea a se realizar o sonho dos ribeirinhos e do empresariado cachoeirense. A construo da ponte metlica, ligando os 365 metros de gua que separavam as duas margens, a qual inaugurada, dois anos aps. Finalmente o trem chegava Cachoeira e, para se atravessar o rio, os barcos foram-se.Fico aqui, imaginando o pioneiro Dannemann, nos mornos crepsculos da regio, sentado beira do cas, por trs de um mar de velas de saveiros, apreciando os guindastes a vapor, que aos poucos erguiam a superestrutura metlica da ponte, encomendada Inglaterra. Cofiando a barba, fazendo planos, fumando um charuto e matutando quanto prxima marca a ser produzida. A Dannemann, entre todas as fbricas baianas, foi campe na quantidade de marcas de charutos. E, como quem ama uma terra, nela deita razes, no ano da proclamao da Repblica, j casado com Aleluia Navarro Dannemann, Gerhard vira Geraldo. Naturaliza-se brasileiro. Creio deva ter ido a Paris, participar da Exposio Internacional, onde a empresa foi premiada com sua terceira medalha de ouro. Houvera antes, recebido duas outras, em Anturpia e Berlim.Havendo se transformado numa liderana empresarial, bem sucedido comercial e socialmente, para a poltica foi um passo. As terras que escolhera para viver e trabalhar, sitas margem direita do rio, antiga freguesia e depois vila, so elevadas condio de cidade com o nome So Flix do Paraguau. Topnimo mais tarde, simplificado para So Flix. Por sua reputao e pelas amizades granjeadas, entre elas a do governador da Bahia, o mdico Manoel Vitorino Pereira, Dannemann nomeado intendente da nova cidade, em 1889. Revelou-se grande administrador. Tanto que nas eleies havidas em 1893, foi eleito o primeiro prefeito de So Flix. Excelente por sinal. Para completar a lista de sucessos, a empresa novamente premiada. Desta vez, na cidade de Chicago.

Prestgio, recursos e poder formaram assim, o trip da crescente projeo da Dannemann, nos dez anos que se seguiram. Em 1904 seus produtos, expostos em St. Louis (USA) recebem outro Grande Prmio. Neste mesmo ano, Johann Adolf Jonas ingressa na sociedade. Dannemann sabia o que fazia. Homem realizado e bem sucedido, via se aproximar o tempo de voltar terra natal. Cuidava, portanto, de preparar algum que pudesse, junto com Eduardo Dannemann Filho, ficar em So Flix cuidando dos negcios.Foi o que aconteceu em 1908. Dado expanso do comrcio de fumo, charutos e outros negcios, Geraldo Dannemann e Ludwig Kruder se desligam da direo da empresa permanecendo scios comanditrios e retornam para a Europa, onde continuaram a servio da firma. Naquele momento, ficava claro que o mercado externo era o principal alvo.Efeitos das guerrasSob a gesto de J. Adolf Jonas a empresa seguiu crescendo, sendo premiada nas exposies do Rio de Janeiro (1908) e Buenos Aires (1910). Em 1911 contava com fbricas em So Flix, Maragogipe, Muritiba e Nag. Chegava a 2.200 o nmero de empregados (O PROPULSOR, So Flix, 1911). Em 1913 a empresa recebe outro grande prmio, na exposio da cidade de Gand, na Blgica.Pela continuada participao em eventos internacionais, v-se que, por detrs de tudo, estava Dannemann articulando o trabalho de difuso do nome da companhia. E assim foi at 1921, quando vem a falecer, ano em que Johann Adolf Jonas naturaliza-se brasileiro. Passa a chamar-se Joo Adolfo e, como seria natural, o mentor maior da organizao.A Primeira Guerra Mundial resultara em muitas e danosas conseqncias para o setor fumageiro baiano, enfraquecendo, dado reduo dos negcios, as empresas charuteiras e exportadoras. Assim, para se fortalecerem, as fbricas Dannemann e Stender, resolvem unir esforos, resultando como sucessora a Cia de Charutos Dannemann (1922). Joo Adolfo Jonas que passara a presidi-la, tendo como diretor o suo Ernesto Tobler, cuida logo de apresentar a nova empresa na Exposio do Centenrio da Independncia, no Rio de Janeiro, quando premiada.Dado juno havida, nos anos a seguir a empresa retomou o patamar de seus negcios, mas Dannemann continuava fazendo falta como ponta de lana na Europa, na defesa e difuso dos interesses empresariais. Joo Adolfo Jonas morre em 1937, substitudo por seu filho de mesmo nome, sem tempo para participar dos momentos difceis que a empresa enfrentaria mais na frente. Gato escaldado tem medo at de gua fria. Em 1938, esboando-se o cenrio de outra guerra, a Dannemann que houvera enfrentado o drama do conflito anterior, com seus charutos desaparecendo do mercado europeu, para se proteger de novos prejuzos, firma diversos contratos de franquia na Europa, autorizando a produo da marca naquele continente. Tais contratos, que aqui no foram registrados, estipulavam que os fumos para produo dos charutos fossem comprados da Dannemann brasileira. O esquema montado legalizava os charutos feitos no continente europeu, os quais passaram a ser vendidos como oriundos no Brasil.A medida salvaguardava a presena da marca na Europa, porm no resolvia os problemas oriundos do mercado domstico o qual, como vimos, no fora o alvo principal da companhia no seu nascedouro. Mas no esqueamos que, mesmo assim, a Dannemann conquistara posio de relevo no cenrio nacional.

As coisas continuam a se complicar para a Cia. de Charutos Dannemann manter em operao fbricas que no mais trabalhavam para exportao. Na minha interpretao dos fatos, induzo que a capacidade ociosa se tornara enorme, dado transferncia do direito para produo na Europa. Por isso e para garantir fluxo de caixa, via aumento das exportaes de fumo, alm de fechar a fbrica de Nag, novos contratos de franquia so firmados em 1941. Ou seja, a empresa, conscientemente ou no, abdicava da manufatura local de charutos, esperando que as vendas de fumos para o exterior, compensassem o grave desequilbrio no qual se envolvera.Como as desgraas nunca andam sozinhas, sempre vm acompanhadas, o Brasil declara em 1942, estado de beligerncia contra as naes do Eixo. A onda antinazista que varreu o pas, se abate sobre a Dannemann de forma implacvel e injusta. Ningum se lembrou do passado e dos bons servios prestados pelo precursor Dannemann. Muito menos do relevo da empresa no cenrio econmico regional. Alm das perseguies contra os alemes natos, seus confinamentos e demisses sem nada receberem, num inconseqente gesto, a turba se abate sobre os prdios e instalaes da Dannemann, depredando o escritrio em Salvador, bem como as fbricas de So Felix, Muritiba e Maragogipe. Batia na prpria cara. Acabava assim, com o ganha-po de muita gente.A empresa fica sob interveno das autoridades nacionais, sendo nomeado o extinto IBF Instituto Baiano do Fumo, para administr-la. Houvesse dinheiro das burras oficiais para recuperar os estragos. E como ficava a conduo das rotinas da empresa, exercida pelos tcnicos alemes demitidos? O resultado foi o ingresso numa fase de franco declnio. No tendo IBF dado conta do recado, vem a ser substitudo por novo interventor, o Banco do Brasil, representado por Paulino Jaguaribe de Oliveira o qual, se de charutos conhecesse alguma coisa, seria porque, talvez os fumasse. Mas isto no o bastante. A espinha dorsal da companhia fora quebrada. O conhecimento e a experincia, acumulados ao longo de setenta anos, haviam sido jogados fora. Quem duvidar que intente assumir uma empresa charuteira, sem nunca ter ralado no cho de fbrica e sem haver, centenas de vezes, espalmado fumos e aprendido a distinguir suas nuances.Em 1945 somam-se convergncias negativas. Ao despreparo de comando se junta a queda de exportaes de fumos para a Europa, sustentculo financeiro da empresa. Para dar uma aparncia mais brasileira, tomou-se uma providncia cosmtica. Mudou-se a razo social para CBCD - Cia. Brasileira de Charutos Dannemmann. Claro que para viabilizar financiamentos com vistas a soerguer o negcio.Nada adiantou. As fbricas so fechadas em 1948. S em So Flix foram 1.000 os demitidos. Nos trs anos seguintes, a empresa prosseguiu apenas no segmento da exportao de fumos. Seus charutos desapareceram do mercado nacional. Os do exterior, l continuavam sendo fabricados pelos franqueados. Em 1951 so reabertas as fbricas de So Flix e Muritiba. Segundo apurei em relatrio existente no Arquivo Pblico de So Flix, em agosto do referido ano a produo das duas fbricas alcanou 4 milhes de charutos, sendo o estoque final de quase 8 milhes de unidades.Em 1953 a exportao de fumos, fonte de recursos para custeio das fbricas, deixa de ser feita pela CBCD. Os fumos para produo de charutos Dannemann no exterior, passam a ser abastecidos pela Dannemann Exportadora de Fumos Ltda, com capital holands. Empresa criada justamente para tal finalidade. A fabricao local tendo que conviver apenas com o resultado das vendas no mercado domstico, no resiste. Em decorrncia, entra em processo de insolvncia, vindo a falir em 1954, fechando as duas fbricas e o escritrio na capital baiana.

A empresa fica acfala, em bom portugus, a Deus dar. Em tal momento, o gestor da CBCD era Francisco Arago.Da em frente, foram outros 15 anos de idas e vindas.Os bens da empresa foram leiloados em 1961, tendo a Suerdieck arrematado prdios, mquinas e equipamentos. Comeam disputas pela propriedade da marca. A Suerdieck se oculta por detrs de uma nova empresa denominada Dancoin Dannemann Comrcio e Indstria Ltda, em nome da qual Francisco Arago arremata as 70 marcas de charutos e 28 de fumos que foram leiloadas. Em funo disto, em 1962, as marcas Dannemann, voltam a serem ofertadas no Brasil, produzidas na fbrica da Suerdieck de Cachoeira, sob licena da Dancoin. Em 1963 para assegurar a exclusividade da fabricao brasileira das marcas Dannemann, a Dancoin requer a baixa da CBCD na Junta Comercial da Bahia, como produtora de charutos. Tambm, sem levar em conta os antigos contratos de franquia, intenta exportar para a Alemanha. Deu-se mal. Esta operao foi embargada sob a alegao que os direitos de venda da Dancoin eram restritos ao mercado nacional. Perdendo a demanda na Europa, a Dancoin parte para registrar a marca Dannemann em outros mercados externos.Em 1965, em virtude de ao jurdica interposta por um dos scios da CBCD, o registro da empresa revalidado voltando, portanto a existir. Apenas no papel. Sem sede, sem fbrica, sem empregados.Passam-se dois anos e a demanda internacional pela distribuio da marca chega a um acordo. O mercado europeu ficou com o empresrio George Koch e o restante com a Dancoin. Esta, alm de aceitar a retirada do nome Dannemann de sua razo social, passando a intitular-se Dancoin Comrcio e Indstria Ltda, reconheceu o direito da CBCD voltar a produzir charutos para a Europa.

A volta por cimaEm funo do acordo, a CBCD Cia. Brasileira de Charutos Dannemann, amparada pelos franqueados europeus, torna a produzir charutos em So Flix em 1970, abrindo sete anos aps, uma pequena unidade na cidade de Cruz das Almas. A Dannemann era ento comandada por um grupo suo-alemo, tendo de um lado a famlia sua Burger e, do outro, a empresa Melitta alem.Passara o perodo das tormentas. Os brasileiros voltaram a encontrar charutos Dannemann, nas tabacarias nacionais.Em 1981 Hans Joseph Maria Leusen, holands de origem e cnsul honorrio de seu pas na Bahia, residente no Brasil desde 1962, por desfrutar da confiana dos controladores da Dannemann, assume a presidncia da organizao brasileira.Em 1988, ao se completarem 115 anos de fundao, o controle da companhia passa s mos do grupo suo Burger Soehne. Era ponto de partida para nova etapa na vida empresarial. Para comemorar a efemride, assim como o centenrio da emancipao de So Flix, a empresa compra as runas do prdio que fora o bero de sua histria. Reconstri o mesmo, mantendo a belssima fachada primitiva e ali instala um ponto voltado para as artes e a cultura. O Centro Cultural Dannemann, inaugurado em 1989.Em 1995, transfere o fabrico de charutos de Cruz das Almas para So Flix, integrando-o nova infraestrutura que montara. Agora, na margem do rio, onde Dannemann testemunhara a construo da ponte, o nome famoso prossegue sua saga.

O atual guardio da marca Dannemann e seu comandante no Brasil, Hans Leusen, profundo conhecedor da empresa aqui e alm-mar, ao ser entrevistado, revelou-se firme em suas colocaes quanto indstria charuteira.Eis, em sntese, suas opinies sobre o momento presente. [] o fumo sempre ter chance de sobreviver [] os governos no tm o mesmo vigor contra as bebidas e as drogas, que adotam contra o fumo [] na Holanda as aes contra o fumo so de tal ordem que em muitos coffee-shops permitido fumar maconha, mas cigarros e charutos, no [] os fumantes iro encontrar espaos onde podero fumar [] lcool e tabaco sempre existiro [] as bitolas grandes dos charutos, sero substitudas no futuro, pelos small-cigars [] a Dannemann no Brasil se preocupa acima de tudo com sua imagem [] no sacrifica seu padro de qualidade para reduzir custos [] no faz nenhum tipo de concesso comercial [] da seus charutos serem mais caros []As marias-fumaas, os saveiros e suas velas, o tempo levou. Mas a Dannemann, o Paraguau e sua ponte continuam. Por certo Hans Leusen, ao evocar o passado, contemplando a paisagem barroca na outra margem do rio, vendo as mulheres trabalhando na fbrica rodeadas de obras de arte, nutre justificado orgulho em presidir a companhia. Hoje, a exemplo do pioneiro, enquanto fuma seu charuto, senta-se ao cais em frente fbrica, se enamora do rio, mira a ponte, acompanha o presente e sonha com o futuro.__________________________________________L se foram de roldoMuritiba que fora arraial e depois distrito de So Flix, elevada categoria de vila em 1919 e de cidade em 1922. Seu lema, criado em 1955, o dstico latino ASCENDIT FUNMUS AROMATUM, - subiu o aroma do fumo - clara aluso ao plantio do tabaco como fator preponderanteda economia municipal, poca.Suas lavouras de fumo eram reconhecidas pela excelente qualidade. Tanto que hoje, o municpio de Cabaceiras do Paraguau, desmembrado de Muritiba em 1989, o mais importante dos centros produtores remanescentes da afamada variedade Mata Fina. Muritibanas de nascimento, vida e morte, Ideal e Pimentel tm aqui suas histrias.

Primeiro atoComo natural, em Muritiba se instalaram grandes empresas exportadoras de tabaco com seus armazns de compras, beneficiamento e enfardamento, assim como inmeras fbricas de charutos. Entre todas a mais importante foi a Pimentel.Em 1937, Cndido Pimentel Filho (1890-1975), ento ligado ao mercado de fumo em folhas, resolve dividir sua atividade, fundando a empresa C. Pimentel & Cia. Fazia parte da sociedade Wilhelm R. Overbeck que vem a se desligar em 1941, sendo substitudo por Adlia Simes Pimentel (CORREIO DE S. FELIX, 1942). Eram os tempos de efervescncia dos charutos, dedicando-se produo dos tipos de grande aceitao, consumidos pelos extratos intermedirios da pirmide social. Cndido que tambm era poltico, havendo sido o vice-presidente da primeira Cmara de Vereadores da cidade, instalada em 1936, escolhe como cores emblemticas o verde e o amarelo e, como slogan, Pimentel um charuto para cada gosto. Gisela Suerdieck, no discurso proferido quando do cinquentenrio da Pimentel (1987), registrava [] logo lhe chegaram as primeiras dificuldades. No transcurso da 2 Guerra, suspenso o comrcio com o mercado alemo, grande cliente do fumo brasileiro, cresciam seus estoques. Faltava-lhe capital para oxigenar seu negcio. Em 1941, em So Paulo, conhece e abre as portas da empresa para aquele que lhe seria o fiel scio [] o comerciante Desidrio Tobias [] (Arquivos do Autor).Desidrio Tobias ingressa, portanto na sociedade para dar-lhe suporte financeiro. Passa a bancar as compras anuais de tabacos e, como compensao, assume a distribuio dos charutos em So Paulo, atravs da empresa Irmos Tobias Ltda.Morrendo Cndido, o filho Carlos Augusto Pimentel (1933-1980) assume a direo da empresa, mantendo a forma mais tradicional e antiga de se produzir charutos mo. No usava moldes. Aps os fumos da bucha (miolo) terem sido envoltos com o capote, para alcanar a uniformidade estrutural dos charutos, valia-se de papel encorpado enrolando-os um a um. Chamava-se a isso de cafornotes, os quais s eram retirados ao momento dos charutos receberem suas capas.Com a morte prematura de Carlos Augusto Pimentel, Renato Julio dos Santos que trabalhava na fbrica desde 1942, ingressa na sociedade, passando a cuidar do dia a dia.A ex-charuteira Anatlia Conceio da Silva depe: [] comecei a trabalhar aos 14 anos, em 1949, na Pimentel [] tinha muitas aprendizes na faixa dos 14 a 15 anos que eram escondidas quando chegava o pessoal da fiscalizao do Ministrio do Trabalho [] minha mestra chamava-se Neuzinha que cuidava s de ensinar [] tinha mais ou menos 50 meninas num total de 250 pessoas [] o enchimento era todo feito mo [] anos depois usaram mquinas de pedal, onde s eram homens que trabalhavam [] o resto tudo eram mulheres [] os homens no queriam trabalhar [] homem no entrava no salo da charutaria [] o velho Cndido era muito querido [] pagava at contas das funcionrias [] seu filho Carlos tambm [] trabalhei a vida inteira na Pimentel [] foram 40 anos [] quando ela fechou em 1989, ainda fiquei por l mais um ano, junto com o resto do pessoal da diretoria do sindicato dos empregados []

Segundo atoMarinaldo Albergaria de Souza (1929-1971), nos idos dos anos 60, possuindo um alambique, juntou o lcool ao tabaco, dando incio a um fabrico de charutos, aos quais batiza, mais adiante, por Ideal. A escolha deste nome no era indita. Tal marca existira no passado, registrada em 1907, pela firma Costa Ferreira & Penna. Marinaldo desenvolveu o negcio at quando, em 1971, um infausto acidente automobilstico ceifa sua vida, aos 42 anos. sua mulher, Dalva Souza, para sobreviver, restava o caminho de tantas outras vivas que sucederam maridos no ramo charuteiro. Cito duas, como exemplos. A Viva Simas que sequenciara os negcios de Arthur Furtado Simas, Fbrica A Fragrncia, So Flix e a Viva Correia Machado que sucedera seu marido Manoel Correia Machado, Fbrica Havaneza, Salvador.Como se v, alm do marcante emprego da mo-de-obra feminina no fabrico de charutos, constatamos tambm inmeras vezes, ao longo da odisseia, a presena da mulher no comando das operaes. Por isso que em 1971, vamos encontrar Dona Dalva, como era conhecida por todos, frente da empresa Viva Marinaldo A. Souza, instalada Rua Albrico Fraga, 214, no centro de Muritiba. Charutos simples, de torcida mida, feitos mo por 30 operrias.Naquela poca, ainda sem grandes bices ao comrcio charuteiro, havia espao e consumidores para charutos de preos mais acessveis, sombra do outrora enorme guarda-chuva que abrigava as marcas populares. Especialmente porque os charutos Ideal eram 100% naturais, no usando papel alcauz ou fumo homogeneizado para as sub-capas, prtica que estava sendo consagrada pela Suerdieck, a maior produtora nacional. Tal diferencial combinado com custos fixos quase nulos permitia Ideal, um cmodo nicho no mercado.

Mas, como compreensvel, o relativo sucesso da empresa, acabou por atrair atenes de dois empresrios de So Paulo, Sasa Marcus e Roberto Nardi que vislumbraram a oportunidade de desenvolvimento do negcio. Algo semelhante ao acontecido com o novo empresariado charuteiro baiano, no comeo do corrente sculo. quando surge em 31 de julho de 1986 a empresa Manufactura de Charutos Ideal Ltda, tendo como scios os citados empresrios, sem experincia anterior no ramo, mas que pelos seus relacionamentos no mercado sulista, esperavam ampliar as vendas. Dona Dalva, no mais proprietria, l continuou sua labuta, como gerente.

Terceiro atoGisela Suerdieck compra em 1986 a tradicional fbrica Suerdieck nas mos da Melitta, negociao que tive o ensejo de acompanhar de perto.Sabendo da tendncia declinante do mercado interno, como forma de assegurar-se nossa maior participao, sugeri comprarem-se a Ideal e a Pimentel, ideia abraada por Gisela Suerdieck a qual, em realidade, sonhava e agia para se converter na nica produtora de charutos no Brasil. Tanto que, certa feita, me confidenciara sua inteno de vir, um dia, sentar na principal cadeira da Menendez & Amerino. Fui incumbido dos contatos e gestes junto a Desidrio Tobias, controlador da Pimentel e aos scios proprietrios da Ideal. As negociaes correram quase em paralelo.Assim que em fevereiro de 1987, Gisela Suerdieck compra os ativos da fbrica Pimentel, seu fundo de comrcio e marcas, bem como o direito distribuio no mercado paulista. Valor da operao: 500 mil dlares. De tal quantia, 30% foram pagos a vista e o restante acordado para 12 prestaes mensais. A Pimentel contava com 140 empregados, produzindo 60 distintas variedades e marcas, boa parte exportada para a Alemanha. A superintendncia da fbrica, a exemplo do que ocorria com a da Suerdieck, passou minha responsabilidade e a direo tcnica foi assumida por Fernando Fraga. Afastei-me do grupo em maio de 1989 e Fernando Fraga em 1998, quando fundou a Chaba Charutos da Bahia Ltda, em Alagoinhas.A denominao social da empresa foi mudada para Pimentel Indstria de Charutos Ltda, adotaram-se os mtodos de produo da Suerdieck, modernizaram-se as embalagens mantendo-se as cores verde e amarela, reduziu-se para 22 a quantidade de marcas para o mercado interno. Para dinamizar os negcios, em setembro 1987, realizaram-se em Muritiba, grandes festividades pelo transcurso dos 50 anos da empresa. Lembro-me ainda de duas, das muitas faixas alusivas ao evento.Um charuto emprega muita gente, dois charutos empregam muito mais.A alegria do fabricante de charutos ver seu produto pegar fogo.Quanto Ideal foi adquirida em janeiro de 1988, pelo contravalor de 62 mil dlares, pagveis em quatro parcelas mensais, a partir de maio do referido ano. O imvel onde se localizava a fbrica no entrou na negociao. As operaes fabris l foram mantidas, ao incio, sob contrato de locao.Os estoques de fumos e materiais de embalagem da Ideal oravam em 851 mil cruzados e seus ativos fixos em 954 mil. Os empregados da Ideal foram indenizados e, aos poucos, admitidos na unidade da Pimentel.

ltimo atoPor questes estratgicas, entre elas a tentativa de se manter uma aparente concorrncia, as empresas Suerdieck, Pimentel e Ideal foram mantidas juridicamente separadas. As vendas da Ideal passaram a serem feitas por intermdio de representantes comerciais; as da Pimentel foram confiadas rede de distribuio atacadista da Suerdieck. A identidade visual das marcas das duas fbricas foi refeita. As formulaes padronizadas e unificadas, com vistas a se alcanarem ganhos na escala de produo. Os charutos das linhas de combate vinham semiprontos da fbrica da Suerdieck em Maragogipe, onde eram produzidos mquina, sendo distribudos para receberem a capa e os acabamentos finais nas unidades da Pimentel e da Ideal. Graas a tais aquisies, em 1988 quando os negcios de charutos populares estavam declinando, ano aps ano a Suerdieck conseguiu, em relao a 1985, aumentar suas vendas fsicas em 17,8 %.Passado o tempo, vejo que a padronizao da produo das marcas no fora, sob o aspecto comercial, uma boa ideia. O mercado logo reconheceu ser tudo farinha do mesmo saco, como se diz vulgarmente. Os produtos das fbricas adquiridas haviam perdido suas identidades.Os fatos transcorreram rpidos. Com as vendas decrescentes, no mais valia a pena manterem-se duas unidades de fabrico. Em finais de 1989 foi desativada a produo da unidade de Muritiba. A produo das marcas da Ideal e da Pimentel foi transferida para Maragogipe. At 1992, ano em que a unidade produtora desta ltima cidade tambm foi fechada, levando-se tudo para Cruz das Almas. Do prdio da Pimentel em Muritiba restam runas, melhor dizendo, s a parede frontal. Assim, dez anos antes da bancarrota do Grupo Suerdieck (1999), as fbricas Pimentel e Ideal se foram de roldo.Em 2009 intentei colher testemunhos de Renato Julio dos Santos e Dalva Souza, que bem conheciam os passados das suas respectivas fbricas. Tarde demais. Ambos haviam falecido.Cara o pano. Acabara a odisseia charuteira muritibana.__________________________________________Ascenso e queda de um gigante

A poesia tem a propriedade de muito dizer, com poucas palavras. O poeta feirense ANTNIO ALVES DA SILVA produziu o cordel Centenrio da Chegada ao Brasil de August Suerdieck, trabalho inserido nas comemoraes da efemride, em 1988. Com leveza e simplicidade, o cordelista transcorreu inspirado, sobre a vida da empresa. Em homenagem cultura popular nordestina, selecionei algumas estrofes, transcritas neste captulo e noutras partes do livro.Em paralelo, para no entediar os leitores com a mesma remisso sucessiva, registro que alm de pesquisas em outras fontes, como principal manancial e elo condutor deste captulo, devidamente autorizado, me vali da obra indita Suerdieck, Epopeia do Gigante, de UBALDO MARQUES PORTO FILHO. A este estudioso e autor baiano cabem, portanto, os mritos maiores de parte das informaes capturadas, que a seguir narrarei, embora minha leitura dos fatos possa haver levado, em alguns casos, a concluses e consideraes distintas.

Mais uma anotao, agora de cunho ortogrfico. Assim como Bahia se escreve com a letra h, o nome da cidade-palco dos principais acontecimentos narrados, contrariando a regra de se g