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Parte I PRINCÍPIOS

BESSANT. Inovação e Empreendedorismo

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Parte IP R I N C Í P I O S

Este capítuloIntroduz o conceito de inovação e sua importância como um imperativo de sobrevi- •vência e crescimento

Trata do desafio da gestão do processo de inovação •Explora quatro temas essenciais para uma gestão eficaz da inovação •

entendimento do que estamos tentando gerenciar (o que é inovação?) •criação de condições para fazer a inovação acontecer (como a organizamos?) •estratégias em inovação (onde, por que e quando inovar?) •inovação como uma capacidade dinâmica (aprendizagem sobre a gestão da inovação) •

Apresenta um mapeamento dos demais capítulos do livro •

Objetivos de aprendizagemDepois de ler este capítulo, você compreenderá:

O que é inovação e como ela oportuniza sobrevivência e crescimento •A inovação como um processo e não como um simples lampejo de inspiração •As dificuldades em gerenciar um processo incerto e arriscado •Os temas-chave na gestão eficaz do processo de inovação •

Capítulo 1

O Imperativo da Inovação

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Inovação – Todo mundo está falando disso…Continuamos a gerenciar os negócios da P&G com inovações de ponta e excelente desem-penho no mercado. Isso permite que a empresa atinja seus objetivos durante o ano fiscal de 2007 e os seguintes. (A.G. Lafley, presidente e principal executivo da Procter & Gam-ble, falando sobre os cinco anos de crescimento sustentado da empresa.)

Estamos avaliando as lideranças da GE em relação a sua capacidade de criação. Líderes criativos são os que têm coragem de financiar novas ideias, liderar equipes para encon-trar as melhores ideias e pessoas para assumir riscos com maior preparo e método. (J. Immelt, presidente e Diretor-executivo da General Electric.)

Sempre dizemos a nós mesmos: temos que inovar. Precisamos ser os primeiros a nos supe-rar. (Bill Gates, Microsoft.)

A inovação é o divisor de águas entre um líder e um seguidor. (Steve Jobs, Apple.)

A capacidade da John Deere de continuar inventando produtos novos e úteis para os con-sumidores ainda é a chave do crescimento da empresa. (Robert Lane, Diretor-executivo, John Deere.)

Inovação é importante…Não é preciso ir muito longe para perceber a necessidade de inovação. Ela fica evidente nas milhares declarações de missão empresarial e seus documentos sobre estratégia, cada um deles enfatizando o quão importante é a inovação para “nossos clientes/ nossos acio-nistas/ nosso negócio/ nosso futuro” e, mais comumente, para “nossa sobrevivência e nosso crescimento”. A inovação aparece em diferentes anúncios de produtos, desde de spray para cabelo até de serviços de saúde. É presença marcante no coração de nossos livros de histó-ria, mostrando até que ponto e por quanto tempo influencia nossas vidas. Também está nas declarações dos políticos, ao reconhecer que nosso estilo de vida é constantemente moldado pelo processo de inovação.

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Os países da Comunidade Européia gastam 700 bilhões de dólares por ano em P&D. •Mais de 16.000 empresas, nos Estados Unidos, mantêm atualmente seus próprios laboratórios •de pesquisa e há, pelo menos, 20 empresas que têm orçamentos anuais de mais de 1 bilhão de dólares em P&D.

Não é apenas propaganda. A inovação realmente faz uma grande diferença para empresas de todos os tipos e tamanhos. A explicação é bastante simples: se não mudarmos o que oferece-mos ao mundo (bens e serviços) e como os criamos e ofertamos, correremos o risco de sermos superados por outros que o façam. Em última instância, é uma questão de sobrevivência – e a história é bastante clara a esse respeito; a sobrevivência não é compulsória! As empresas que sobrevivem são capazes de mudança focada e regular. É importante observar que a Microsoft – uma das maiores e mais bem-sucedidas empresas do mundo – adota a visão de que está sempre

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a dois anos de sua extinção! Ou, como salienta Andy Groves, um dos fundadores da Intel: “Só os paranóicos sobrevivem!”.

No lado positivo, a inovação é fortemente associada ao crescimento. Novos negócios são criados a partir de novas ideias, pela geração de vantagem competitiva naquilo que uma empre-sa pode ofertar. Os economistas têm debatido durante décadas sobre a essência da natureza des-sa relação, mas em geral concordam que a inovação responde por uma considerável proporção do crescimento econômico. Em uma publicação recente de William Baumol, o autor afirma que “praticamente todo o crescimento econômico desde o século XVIII é resultante de inovação”.

A questão sobrevivência/crescimento representa um problema para os participantes es-tabelecidos, mas é também uma grande oportunidade para que novos entrantes reescrevam as regras do jogo. O problema de um pode vir a se tornar a oportunidade de outro, e a natureza da inovação está fundamentalmente ligada ao empreendedorismo. A capacidade de avistar oportu-

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“Sempre comemos elefantes!” é a surpreendente afirmação de Carlos Broens, fundador e dirigen-te de uma firma de engenharia de precisão e fabricação de ferramentas na Austrália com inve-jável índice de crescimento. A Broens Industries é uma empresa de pequeno/médio porte, com 130 empregados, que sobrevive em um ambiente altamente competitivo exportando cerca de 70% de seus produtos e serviços para firmas tecnologicamente exigentes nos avançados merca-dos de indústria médica, aeroespacial, entre outros. A citação não se refere a hábitos alimentares incomuns, mas à sua confiança em “assumir desafios normalmente vistos como impossíveis para empresas de nosso porte” – uma habilidade que é baseada em uma cultura consiste de inovação em produtos e processos.

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As empresas que não investem em inovação colocam em risco o seu futuro. Seus negócios podem não prosperar, e elas podem não ser capazes de competir se não procurarem soluções inovadoras para problemas que surgem. (site do Governo da Austrália, 2006)

A inovação é o motor da economia moderna, transformando ideias e conhecimento em produtos e serviços. (Escritório de Ciência e Tecnologia do Reino Unido)

No Canadá, o êxito de muitas empresas de pequeno e médio porte e de alto crescimento está significativamente conectado à inovação. De acordo com o Statistics Canada, os seguintes fatores caracterizam tais empreendimentos bem-sucedidos:

A inovação é considerada a mais importante característica associada, de forma consistente, ao •sucesso.As empresas inovadoras têm como característica o crescimento mais forte ou sucesso superior •ao das não-inovadoras.Empresas que detêm fatias de mercado e apresentam lucro crescente são aqueles inovadoras. •(Governo de Manitoba, Canadá, 2006)

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nidades e criar novas formas de explorá-las é indispensável ao processo de inovação. Os empre-endedores correm riscos – mas calculam os custos da decisão de levar adiante uma ideia brilhan-te considerando possíveis ganhos caso tenham sucesso no empreendimento – especialmente se isso significa superar os participantes já envolvidos no negócio.

É evidente que nem todos os jogos envolvem resultados em termos de ganhos ou perdas. Serviços públicos, como os de saúde, educação e seguridade social, podem não gerar lucros, mas afetam significativamente a qualidade de vida de milhões de pessoas. Boas ideias, quando corre-tamente implementadas, podem resultar em serviços novos importantes e na execução eficiente daqueles que já existem – especialmente em uma época em que a pressão sobre os gastos públicos é cada vez maior. Novas ideias – sejam na forma de rádios portáteis na Tanzânia ou de sistemas de microcrédito em Bangladesh – têm o poder de mudar a qualidade de vida e a disponibilidade de oportunidade para pessoas das regiões mais pobres do planeta. A atual conjuntura econômica pede por inovação e empreendedorismo – e, em última instância, estamos falando sobre preocu-pações reais de vida e morte.

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Quando a Ponte Tasman afundou em Hobart, Tasmânia, em 1975, Robert Clifford dirigia uma peque-na empresa de transporte marítimo (ferry) e viu a oportunidade de capitalizar sobre a crescente de-manda desse transporte – e de diferenciar o seu negócio pela venda de bebidas a usuários sedentos que faziam o percurso da travessia. O mesmo foco empreendedor, mais tarde, ajudou-o a construir uma companhia – a Incat – que foi pioneira em projetos relacionados com o design de proas do tipo wave-piercing que lhe garantiu mais da metade do mercado de transporte marítimo por velozes catamarãs. O investimento contínuo em inovação ajudou essa empresa situada em uma ilha relativa-mente isolada a construir um nicho-chave em mercados civis e militares altamente competitivos.

A inovação é orientada pela habilidade de fazer relações, de visualizar oportunidades e de tirar vantagem das mesmas. Às vezes, envolve possibilidades completamente novas, como a exploração de avanços tecnológicos totalmente radicais. Novas drogas baseadas na manipulação genética instauraram uma nova era na guerra contra as doenças. Os telefones celulares, PDAs e outros dispositivos revolucionaram a forma e o momento em que nos comunicamos. Até um simples vidro de janela é resultado de inovação tecnológica radical – quase todos os vidros de janelas do mundo são fabricados pelo processo da Pilkington, conhecido como flotagem de vi-dro (float glass), que permitiu que a indústria evoluísse de um demorado processo de desgaste e polimento para a obtenção de uma superfície plana.

Igualmente importante é a capacidade de identificar onde e como novos mercados podem ser criados e fomentados. A invenção do telefone de Alexander Bell não resultou em uma revo-lução instantânea das telecomunicações – ela precisou de todo um desenvolvimento de mercado para a comunicação entre pessoas. Henry Ford pode não ter inventado o motor do automóvel, mas inventou o Modelo T – “um carro para todas as pessoas” por um preço que a maioria podia pagar –, e criou o consumo de massa do meio de transporte individual. E a eBay é um negócio multibilionário não apenas por causa da tecnologia que subjaz à ideia de seus leilões online, mas porque criou e desenvolveu esse mercado.

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A inovação não só requer a abertura de novos mercados, mas também exige a imple-mentação de novas formas de servir àqueles já estabelecidos e maduros. Companhias aéreas com preços reduzidos ainda vendem transporte, mas as inovações que empresas como a Southwest Airlines, Easyjet e Ryanair introduziram no mercado revolucionaram o transporte aéreo e fortaleceram o setor.

A inovação não ocorre apenas no segmento de produtos manufaturados; inúmeros exem-plos de mudanças radicais podem ser encontrados também no setor de serviços. Em geral, nas grandes economias, o setor de serviços representa a maioria esmagadora de atividades comerciais e laborais, o que significa que nele há potencial significativo. E os baixos custos de capital frequentemente implicam em oportunidades para novos entrantes e em introdução de inovações radicais mais promissoras no setor de serviços. Serviços bancários e de seguros on-line são hoje bastante comuns, mas transformaram drasticamente o nível de eficiência com que operam tais setores e a natureza e quantidade de serviços que podem oferecer. Novos entrantes que optaram por explorar a onda da Internet reescreveram o livro de regras de uma vasta gama de atividades comerciais – como a Amazon no varejo, a eBay no mercado de vendas e leilões, o Google em publicidade e propaganda, o Skype em telefonia. Outros utilizaram a Web para transformar modelos de negócios em áreas como linhas aéreas de baixo custo, compras online virtuais e comércio de música.

A Internet não desafia apenas os grandes bancos e varejistas, embora sejam essas as histórias que figuram nos noticiários. Ela também é uma questão – provavelmente, de so-brevivência – para milhares de pequenas empresas. Pense na forma confortável com que sua agência de viagens local costumava operar: expositores repletos de panfletos, mesas em que solícitos assistentes de vendas forneciam detalhes sobre escolhas e reservas para um feriado, busca por passagens, contratação de seguradoras e assim por diante. Agora, pense em como isso tudo pode ser feito com o simples apertar de uma tecla, no conforto de seu próprio lar – e com mais opções e custos inferiores.

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Apesar de uma mudança global na manufatura têxtil e de vestuário em direção a países em desenvolvimento, a companhia espanhola Inditex (por meio de seus pontos de varejo sob vá-rios nomes, que incluem a Zara) foi a primeira a estabelecer uma rápida e flexível reviravolta na indústria do vestuário com cerca de 2000 pontos de venda em 52 países. A rede foi fundada por Amâncio Ortega Gaona, que iniciou como uma pequena loja em La Coruña, no oeste da Espa-nha – uma região até então desconhecida em termos de produção têxtil –, em 1975. A filosofia de ação da Inditex é fundamentada na estreita relação entre design, manufatura e vendas, e a sua rede de lojas que constantemente busca informações sobre tendências de moda que são usadas para gerar novo design. Ela também testa novas ideias diretamente com o público con-sumidor, experimentando amostras de tecidos e design, recebendo rápido feedback sobre o que tem potencial de venda. A despeito de sua orientação para o mercado global, a maior parte de sua fabricação ainda é feita na Espanha, e a empresa conseguiu reduzir o ciclo entre um sinal de disparo para uma inovação e a correspondente resposta para cerca de 15 dias.

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A inovação impõe grandes desafios – e possibilita grandes oportunidades – ao setor público. A pressão pela oferta de mais e melhores serviços sem aumento de carga tributária é um quebra-cabe-ça capaz de tirar o sono de muitos servidores públicos. Mas não é um sonho inatingível – ali mesmo encontramos exemplos de inovações que mudaram a forma como opera o sistema. No segmento de assistência à saúde, por exemplo, houve grandes melhorias em serviços essenciais, como o tempo de espera. Hospitais como o Leicester Royal Infirmary, na Inglaterra, ou o Karolinska Hospital, em Estocolmo, na Suécia, conseguiram implementar melhorias significativas na velocidade, qualidade e eficácia de seus serviços em saúde, reduzindo listas de espera para cirurgias eletivas em 75% e de cancelamentos em 80% – tudo isso por meio da inovação.

… mas não é fácil!É uma realidade perturbadora, mas a maioria das empresas tem uma estimativa de vida menor do que a de um ser humano. Mesmo grandes empresas podem mostrar sinais preocupantes de vulnerabilidade; e, para as pequenas, as estatísticas de mortalidade são arrasadoras. Às vezes, são empresas individuais que sofrem mais com o problema – às vezes, um setor inteiro. Precisamos apenas considerar o triste destino de indústrias europeias e norte-americanas como as de motoci-cletas, ferramentas, mineração de carvão e brinquedos, para percebermos a fragilidade da maioria de nossa base industrial. O que sobe pode descer muito rápido.

Muitas pequenas e médias empresas fracassam porque não vêem ou não reconhecem a necessidade de mudança. São introspectivas, muito ocupadas em apagar seus próprios incêndios e lidar com a crise atual para se preocupar com possíveis tempestades que possam surgir. Mesmo que falem com outros sobre assuntos mais amplos, esse contato fica normalmente restrito a pes-soas de sua própria rede ou àqueles com perspectivas semelhantes, como fornecedores de bens e serviços ou clientes imediatos. O problema é que, quando chegam a entender que é preciso mudar, já é tarde demais.

E isso não se restringe a pequenas empresas – não há garantia em tamanho ou em sucesso tecnológico anterior. Observe o caso da IBM: uma empresa gigantesca que pode ser considerada responsável pelo estabelecimento de fundamentos da indústria de tecnologia de informação, que conseguiu dominar a arquitetura de hardware e software e a forma como os computadores eram comercializados. Entretanto, tal capacidade pode, às vezes, tornar-se um obstáculo para a detecção da necessidade de mudança, como ficou provado quando, no início dos anos 1990, a empresa reagiu lentamente contra a ameaça de tecnologias de rede, quase desaparecendo nesse processo. Milhares de empregos e bilhões de dólares foram perdidos, e outros dez anos foram necessários para restaurar o antigo preço de suas ações, voltando aos altos níveis com que seus investidores estavam acostumados.

Um problema comum para as empresas bem-sucedidas ocorre quando as mesmas coisas que as levaram ao sucesso – suas “competências essenciais” – tornam-se o empecilho que os impede de enxergar ou aceitar a necessidade de mudança. A reação mais comum é “a síndro-me do não foi inventado aqui”, em que a nova ideia é considerada boa, mas, de alguma forma, não parece adequada ao negócio. Um exemplo bastante conhecido é o caso da Western Union, que provavelmente era, no século XIX, a maior empresa de comunicações do mundo. Ela foi contatada por Alexander Graham Bell, que pedia ajuda para a comercializar sua nova invenção. Depois de fazer uma demonstração para altos executivos, Bell recebeu uma resposta, por escrito, que dizia: “após cuidadosa apreciação de sua invenção, que é uma novidade bastante interessan-te, chegamos à conclusão que ela não tem valor comercial. Não vemos futuro algum para um

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brinquedo elétrico”. Quatro anos após sua invenção, já existiam 50 mil telefones nos Estados Unidos e, passados 20 anos, 5 milhões. Nos 20 anos seguintes, a empresa fundada por Bell se tornou a maior corporação dos Estados Unidos.

Algumas vezes, o ritmo de mudança parece lento, e velhas respostas parecem funcionar bem. Àqueles que estão dentro do setor parece que eles entendem as regras do jogo e que possuem uma boa fatia de desenvolvimentos tecnológicos relevantes capazes de mudar as coisas. Mas o que pode frequentemente ocorrer é que a mudança venha de fora do setor – e, quando os participantes de dentro finalmente se dão conta, já é tarde demais. No final do século XIX, por exemplo, havia uma indústria bastante sólida na Nova Inglaterra, baseada na produção e distribuição de gelo. Em suas atividades diárias rotineiras, os coletores de gelo eram capazes de embarcar centenas de toneladas para todos os cantos do mundo, em viagens que duravam até seis meses, e ainda conservavam cerca de metade da carga em condições de comercialização ao final desse período. No final da década de 1870, 14 das maiores empresas na área de Boston, nos Estados Unidos, cortavam cerca de 700 mil toneladas de gelo por ano e empregavam milhares de trabalhadores. Mas a indústria foi completa-mente destruída pelos avanços que se seguiram à invenção da refrigeração e ao crescimento da mo-derna indústria de câmaras frias. O problema é que os participantes normalmente deixam de reagir de maneira rápida diante de novos sinais surgidos de fora da indústria, como foi o caso de muitos dos participantes da antiga indústria do gelo.

É claro que, para muitos, essas condições abrem novas oportunidades para ultrapassar o jogo e reescrever um novo conjunto de regras. Considere o que ocorreu em setores como o de transações bancárias online, o de contratação de seguros por telefone ou o de linhas aéreas de baixo custo – em cada um desses casos, o padrão estável existente foi destruído, alterado por novos entrantes que chegaram com modelos de gestão novos e desafiadores. Para muitos gesto-res, as inovações de modelo de gestão são encaradas como as maiores ameaças a suas posições competitivas, exatamente porque é necessário abandonar velhas práticas e modelos e aprender novos. Quando, finalmente, entendem que precisam fazê-lo, pode ser que já tenham sido ultra-passados pelos novos entrantes, a quem esse é o único modelo de gestão e aquele com o qual estão acostumados a lidar.

Isso, entretanto, não é o fim do mundo – há também muitas histórias de novas empresas e negócios que, a todo instante, surgem para substituir aqueles que fracassam. E, em muitos casos, a empresa individual pode se renovar, adaptando-se ao novo cenário e evoluindo para novas pro-postas. Observe o caso da Nokia, inicialmente uma modesta empresa do ramo de exploração de madeira e atualmente um dos maiores líderes mundiais no setor de telefonia móvel. Ou o exemplo da Stora, na Suécia, que há 12 séculos era uma sólida exploradora de corte e beneficiamento de madeira, e que prospera, ainda nos dias de hoje, embora em áreas tão diversas quanto de alimentos processados e de eletrônicos.

O desafio consiste em saber lidar com um mundo de incertezas, experimentando constan-temente novas oportunidades. Em um primeiro momento, parece óbvio que as empresas que não reconhecem a necessidade de mudança simplesmente desapareçam, enquanto as que reconhecem que “precisam mudar” podem utilizar essa disposição para construir negócios novos e próspe-ros. Mas, às vezes, aquela “mudança” é bastante dramática, desafiando as raízes sobre as quais a empresa foi criada e subvertendo muita coisa no processo. A TUI é a maior empresa de serviços turísticos da Europa, possuindo, dentre outros negócios, a Thomson Holidays, a Britannia Airways e a agência de viagens Lunn Poly. Sua origem, entretanto, remonta ao ano de 1917, quando come-çou como uma estatal prussiana líder na exploração e fusão de minérios! O papel central da Nokia como líder no setor de telefonia móvel esconde sua origem em um conglomerado de derivados de madeira com interesses tão diversos quanto botas de borracha e papel higiênico!

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“Apenas os paranóicos sobrevivem!”. Essas palavras – título da autobiografia de Andy Grove, um dos fundadores da Intel – enfatizam a necessidade de gestores estarem em constante busca não somen-te por oportunidades de inovação, mas pelos primeiros sinais de que qualquer inovação de outros possa constituir uma ameaça. Porém, muito mais que correr em pânico cego, gestores inteligentes utilizam ferramentas e técnicas para pesquisar em sua área – desenvolvendo P&D para se manter à frente da fronteira tecnológica em mudança, usando pesquisas de mercado e análises de concorrên-cia para se situar no contexto em que atuam e ferramentas de previsão – antecipações, cenários e outros – para evitar que sejam pegos desprevenidos diante de surpresas desagradáveis quando as coisas não acontecem conforme suas expectativas.

Podemos fazer isso? Um indicador dessa possibilidade advém de experiências de empresas que sobreviveram por um longo período de tempo. Enquanto a maioria das empresas possui um tempo de vida consideravelmente curto, há aquelas que sobrevivem por um ou mais séculos. Se ob-servarmos a experiência desse “clube dos 100” – empresas como a 3M, Corning, Procter & Gamble, Reuters, Siemens, Philips e Rolls-Royce –, podemos verificar que muito de sua longevidade é de-corrente de terem desenvolvido a capacidade de inovar de forma contínua. Essas empresas aprende-ram – normalmente da maneira mais difícil – como gerenciar o processo e, sobretudo, como repetir a façanha. Qualquer empresa pode ter sorte uma vez, mas mantê-la por um século ou mais sugere que existe algo mais que apenas sorte.

Gestão da inovaçãoA maioria das pessoas não hesita em reconhecer a importância da inovação e a necessidade dela para suas vidas, no sentido de garantir sua própria sobrevivência e desenvolvimento. No entanto, o que esses e outros exemplos mostram é que, para muitas pessoas, simplesmente querer que a inovação ocorra pode não ser suficiente – é preciso gerenciar o processo de maneira ativa. Mas como fazer isso?

A inovação é essencialmente centrada em três fatores principais:

geração de novas ideias •seleção das melhores •implementação •

Podemos traçar um paralelo entre inovação e biologia considerando a teoria da evolu-ção de Darwin. Os organismos vivos sobrevivem e crescem por meio da geração de varia-ção, selecionando os novos elementos que permitem a adaptação a ambientes específicos e sua propagação através das espécies. Aqueles que o fazem corretamente sobrevivem; aqueles que não conseguem, desaparecem. É a sobrevivência dos mais fortes, pura e sim-plesmente.

Mas há uma diferença bastante significativa. No caso de empresas, construímos e traba-lhamos – diferentemente da evolução natural – e temos a capacidade de interferir no processo. Em vez de mutações aleatórias e golpes de sorte, conseguimos ser um pouco mais estratégicos e objetivos, buscando e gerando nossa própria variedade, fazendo escolhas sobre quais inovações

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perseguiremos e gerenciando o processo de implementação e difusão, no sentido de garantir que sejam bem-sucedidas.

É claro que não devemos subestimar a tarefa. Por exemplo:

Geração de novas ideias – pode surgir por meio da inspiração, da transferência de outro •contexto, de questionamentos sobre necessidades de clientes ou usuários, de pesquisa de ponta ou de combinação de ideias já existentes em algo novo. E podem surgir a partir da construção de modelos alternativos para o futuro e da exploração de opções abertas dentro desses mundos alternativos. Mas, se vamos ter sucesso, precisamos estruturar formas ricas e variadas de captação de sinais iniciais, que propiciem oportunidades de variação interessantes.A seleção de melhores ideias parece bastante simples – exceto que não sabemos quais •são as melhores a menos que as experimentemos. A inovação está repleta de incer-tezas e conjeturas e a única maneira de descobrir se uma ideia vale a pena (ou não) é começar a desenvolvê-la. Assim, o processo de escolha estratégica (ou seja, quais, dentre muitas possibilidades, devem ser exploradas, considerando-se que há recursos limitados?) é um grande desafio. E, se escolhermos a ideia errada, talvez sejamos eli-minados do jogo.Implementação da nova ideia – transformando-a, de uma centelha no olhar, em um •produto, serviço ou processo acabado que as pessoas possam utilizar. Essa é uma longa jornada, governada pela lei de Murphy – se existe algo que possa dar errado, é bem pro-vável que dê! Não é apenas uma questão de gestão de projetos – equilibrando recursos contra tempo e verbas – mas fazê-lo sob condições de grande incerteza. Mesmo que se possa conduzir um projeto em meio à tormenta, concretizá-lo em termos de proposição de um novo produto, serviço ou processo, não há garantias de que as pessoas o adotarão e de que será amplamente difundido.

Este livro é resultado do que aprendemos – e do que ainda buscamos compreender melhor – sobre o instigante tema da gestão da inovação.

O que sabemos sobre gestão da inovação?O sucesso da inovação parece depender de dois ingredientes principais: recursos (pessoas, equi-pamento, conhecimento, dinheiro etc) e capacidades da organização para geri-los. O segundo é o mais difícil de controlar, mas é o que faz ou desfaz o processo. Assim, o que exige e o que sabemos sobre ele?

A inovação é a ferramenta-chave dos gestores, o meio pelo qual exploram a mudança como uma oportunidade para um negócio ou serviço diferente. É passível de ser apresentada como uma disciplina, de ser ensinada e aprendida, de ser praticada. (Peter Drucker, Innovation and Entrepreneurship,1985)

Um negócio inovador é aquele que vive e respira “fora da caixa”. Não se trata apenas de boas ideias, mas de uma combinação de boas ideias, palestra sobre inovação da equipe moti-vada e compreensão instintiva daquilo que seu cliente deseja. (Richard Branson, DTI, 1998)

Nos últimos cem anos, houve inúmeras tentativas de responder essa questão, baseadas em uma gama de estudos. As pessoas examinaram exemplos de casos, em diferentes setores, em empresas grandes e pequenas, em histórias de sucesso e fracasso – mas, sobretudo, observaram

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o cenário da experiência. Tudo o que aprendemos foi obtido no laboratório da prática, e não de alguma teoria profundamente enraizada.

Embora esses estudos nos propiciem uma série de opiniões e saberes, dentre eles avultam qua-tro temas centrais que são de vital importância. Quando se busca o sucesso na gestão da inovação, é preciso:

Compreender • o que se tenta gerenciar – quanto mais aptos forem nossos modelos mentais, melhor atuaremos com eles no modo como organizações e processos de construção e administração irão trabalhar.Compreender • o como – criar condições (e adaptá-las/configurá-las) para fazer as coisas acontecerem.Compreender • o quê, o porquê e o quando da atividade de inovação – moldando a estra-tégia do trabalho de inovação que realizamos.Compreender que isso é um • alvo móvel – gestão da inovação envolve uma capacidade dinâmica.

O que ocorre quando ignoramos essas disposições? Simplificando, corremos o risco de nossas boas ideias caírem por terra. Se acreditarmos que a inovação, por exemplo, depende unicamente da ideia inicial – como em alguns personagens de desenho animado, em que uma lâmpada se acende sobre suas cabeças –, não devemos nos surpreender quando concluirmos que tal ideia não pode ser transformada em uma realidade técnica. Ou, quando o fizermos, que as pessoas não a vejam necessariamente como a melhor coisa desde o advento do pão fatiado. É preciso modelos mentais mais elaborados do que esses caso nos propusermos a conceber e gerenciar um processo de inovação.

Se simplesmente inovarmos em qualquer direção que nossa fantasia nos guiar – ou seja, não temos a menor ideia de onde e por que queremos inovar – não devemos ficar surpresos com o enorme rombo no extrato do banco, onde o dinheiro devia estar. A inovação consome recursos – tempo, energia, ideias e dinheiro – e nenhuma empresa possui recursos ilimitados. Assim, é preciso calcular estrategicamente as atividades de inovação.

Se acreditarmos que a inovação é simplesmente uma questão de deixar acontecer, criando um espaço aberto em que as pessoas possam jogar basquete, descansar em sofás confortáveis e jogar conversa fora acompanhada de muitas xícaras de café, não devemos ficar surpresos se tivermos um bando de gente com algumas ideias interessantes que, de fato, não levarão jamais a lugar algum. A inovação é uma questão de organização de diferentes peças de um quebra-cabeça do conhecimento e, principalmente, de equilibrar a criatividade com a disciplina de efetivamente fazer com que as coisas aconteçam.

Se não refletirmos e aprendermos com o processo – mesmo que o interpretemos errone-amente – corremos o risco de estarmos condenados a continuar cometendo os mesmos erros no futuro. Operamos em um mundo de grande complexidade, em que o número absoluto de elementos importantes está aumentando e, em que suas interações, faz a vida extremamente difícil de prever. Dessa forma, é preciso inovar; mas é preciso também inovar no modo como pensamos a forma de organizar e gerenciar o processo. Não é sem razão que falamos na ha-bilidade de organizar e gerenciar o processo como uma competência dinâmica!

Quer estejamos pensando sobre montar nosso próprio negócio, baseados em uma ideia brilhante, quer façamos parte do quadro de uma grande empresa do setor público ou privado, em busca de renovação de suas práticas e processos, os desafios permanecem os mesmos. Esses quatro temas são vitais. Vejamos, então, cada um deles com maior profundidade.

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Entender o quêEntão, o que é inovação e como podemos melhor compreendê-la para facilitar sua gestão? O dicionário a define como uma mudança – a palavra tem origem no latim in e novare – fazer algo novo, alterar. Definição útil, mas um pouco vaga, se realmente pretendemos gerenciá-la. As de-finições apresentadas abaixo se aproximam mais de seu significado para o propósito deste livro, principalmente aquela obtida no Departament of Trade and Industry, simples, que a considera como a exploração bem-sucedida de ideias.

Inovação é a exploração bem-sucedida de novas ideias. (Innovation Unit, Department of Trade and Industry, Reino Unido, 2004)

A inovação industrial inclui as atividades técnicas, de design, de fabricação, de geren-ciamento e comerciais envolvidas no marketing de um produto novo (ou melhorado) ou o primeiro uso comercial de um processo ou equipamento novo (ou melhorado). (Chris Freeman, The Economics of Industrial Innovation, 2. ed., Frances Pinter, Londres, 1985)

A inovação não implica, necessariamente, a comercialização apenas de grandes avan-ços tecnológicos (uma inovação radical), mas também inclui a utilização de mudanças em pequena escala no saber tecnológico (uma melhoria ou inovação incremental). (Roy Rothwell e Paul Gardiner, Invention, innovation, re-innovation and the role of the user, Technovation, 3, 168, 1985)2

Um ponto importante sobre a inovação é que, normalmente, somos propensos a compreen-dê-la tanto como a produção – um novo produto, por exemplo – quanto como o próprio processo para obtê-la. É interessante pensarmos sobre esses dois aspectos: o que mudaremos e o processo de mudança em si mesmo.

O que pode ser mudado com a inovação?A inovação assume muitas formas diferentes, mas podemos resumi-las em quatro diferentes dimensões de mudança (os “4 Ps” da inovação):

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“Você não pode fazer uma omelete sem quebrar ovos!” – e você não pode inovar sem assumir riscos. Mas o que diferencia bons gestores de inovação de apostadores é o reconhecimento de que há um processo central que pode ser organizado e administrado. Ninguém tem sorte com inovação instantaneamente – apenas se estiver no lugar certo, na hora certa. Entretanto, repetir o truque exige habilidades e conhecimento – e, particularmente, gestores de inovação com inteligência.

Compreender • o que se tenta gerenciar – quanto mais aptos forem nossos modelos mentais, melhor atuaremos com eles no modo como organizações e processos de construção e adminis-tração irão trabalhar.Compreender • o como – criar condições (e adaptá-las/configurá-las) para fazer as coisas acontecerem.compreender • o quê, o porquê e o quando da atividade de inovação – moldando a estratégia do trabalho de inovação que realizamos.Compreender que isso é um • alvo móvel – gestão da inovação envolve uma capacidade dinâmica.

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Inovação de produto • – mudanças nas coisas (produtos/serviços) que uma empresa oferece;Inovação de processo • – mudanças nas formas em que as coisas (produtos/serviços) são criadas e ofertadas ou apresentadas ao consumidor;Inovação de posição • – mudanças no contexto em que produtos/serviços são introduzidos;Inovação de paradigma • – mudanças nos modelos mentais básicos que norteiam o que a empresa faz.

Um novo design de automóvel, um novo pacote de seguro contra acidentes para bebês de colo e um novo sistema doméstico de entretenimento poderiam ser exemplos de inovação de produto. Já mudanças em métodos de fabricação e equipamentos utilizados para produzir auto-móveis ou o sistema de entretenimento doméstico, ou as rotinas e sequências burocráticas, no caso de seguros, poderiam ser exemplos de inovação de processo.

Às vezes, a linha divisória entre os tipos de inovação é bastante imprecisa – uma nova balsa a motor, por exemplo, é tanto uma inovação de produto quanto de processo. Os serviços representam um caso especial dessa imprecisão em que aspectos de produto e processo normal-mente se fundem – um novo pacote de viagens, por exemplo, é uma inovação de produto ou de processo?

A inovação pode também ocorrer por meio do reposicionamento de percepção para um produto ou processo já estabelecidos, em um contexto de uso específico. Um produto conhecido na Inglaterra, por exemplo, é o Lucozade – originalmente desenvolvido como um xarope à base de glicose para ajudar crianças e convalescentes. Essas associações com enfermidades foram abandonadas pelos detentores da marca, a Beechams (atualmente parte da Glaxo Smith Kline), quando relançaram o produto como uma bebida isotônica, voltada para o crescente mercado da boa forma física (fitness), em que é, atualmente, apresentada como um complemento auxiliar ao desempenho dos que praticam exercícios físicos. Essa mudança é um bom exemplo de inovação de posição.

Às vezes, as oportunidades de inovação surgem quando reestruturamos a forma como ve-mos algo. Fundamentalmente, Henry Ford alterou a configuração do transporte, não por haver inventado o motor a combustão (já que entrou na indústria relativamente tarde), nem por haver desenvolvido o processo de fabricação em série do mesmo (o setor já havia se configurado como indústria manufatureira 20 anos antes). Sua contribuição residiu em mudar o modelo básico, de caráter artesanal e voltado para uns poucos afortunados, para outro menos exclusivo, que prometia acesso a qualquer um por um preço que ele/ela podia pagar. A mudança ocorrida, de produção artesanal para produção em larga escala, foi nada menos do que uma revolução na forma como os carros (e, mais tarde, uma série de outros produtos e serviços) eram fabricados e comercializados. É claro que fazer a nova abordagem funcionar na prática também exigiu exten-sa inovação de produto e processo, como em design de componentes, fabricação de máquinas, remodelagem de fábricas e, especialmente, no sistema social em torno do qual o trabalho estava organizado.

Exemplos recentes de inovação de paradigma – mudança em modelos mentais – incluem o surgimento de linhas aéreas com tarifas econômicas, de ofertas de seguro e de outros serviços financeiros por telefone e de reposicionamento de bebidas, como café e suco de fruta, como produtos especiais (premium designer). Embora a imagem da Enron tenha ficado bastante com-prometida, anos mais tarde, devido a equívocos financeiros, o fato é que a empresa alcançou sucesso como uma pequena empreiteira no ramo de construção de oleodutos que soube per-

31Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

ceber o grande potencial de uma mudança de paradigma no setor de utilidades. Em uma onda de privatização e de interconexão global, por meio de sistemas de distribuição na forma de pacotes, a energia e outros recursos, como telecomunicações em banda larga, gradativamente, tornaram-se commodities que podiam ser negociados, como açúcar, coco e outros produtos do mercado de futuros.

A inovação de paradigma pode ser motivada por diversos fatores, como, por exemplo, novas tecnologias, surgimento de novos mercados com expectativas de valor diferentes, novas legislações para a indústria, novas condições ambientais (mudanças climáticas, crises energé-ticas) e outros. O surgimento das tecnologias da Internet, por exemplo, tornou possível uma completa reconfiguração da forma como conduzimos inúmeros negócios. No passado, revolu-ções semelhantes na forma de pensar foram motivadas por tecnologias como a energia a vapor, a eletricidade, o transporte de massa (através de ferrovias e, com a fabricação do automóvel, de estradas de rodagem) e a microeletrônica. Parece bastante provável que reconfigurações se-melhantes tornem a ocorrer à medida que nos familiarizamos com novas tecnologias, como a nanotecnologia ou a engenharia genética.

Da inovação incremental à inovação radical

Outro fator a ser considerado é o grau de novidade envolvido. Evidentemente, atualizar o estilo de nosso carro não é o mesmo que inaugurar um conceito completamente novo de automóvel, que possua um motor elétrico e seja feito de um novo tipo de material diferente de aço e vidro, o que seria uma inovação radical. De forma semelhante, o aumento de velocidade e precisão de um torno não é o mesmo que substituí-lo por um processo de moldagem a laser controlado por computador. Existem diferentes níveis de novidade, que vão desde melhorias incrementais menores (inovação incremental) até mudanças bastante radicais, que realmente transformam a forma como as perce-bemos e utilizamos. Às vezes, tais mudanças são comuns a setores ou atividades específicos, mas, em alguns casos, são tão radicais e difíceis de alcançar que alteram a própria base da sociedade, como foi o caso do papel desempenhado pela energia a vapor durante a Revolução Industrial ou as abrangentes mudanças resultantes de atuais tecnologias de comunicação e computação.

Componentes e sistemas

Finalmente, é preciso entender a inovação como se fosse uma daquelas bonecas russas: po-demos mudar alguma coisa em seus componentes ou podemos alterar a arquitetura de todo o sistema. Podemos, por exemplo, colocar um transistor mais rápido em um microchip de uma placa de circuitos para exibição de gráficos em um computador (inovação de componente). Ou podemos mudar a forma como várias placas são combinadas dentro do computador, de forma a criar desempenhos específicos, como num jogo para computador, ou num livro eletrônico ou e-book, ou dispositivos multimídia. Ou podemos ligar os computadores em rede para gerenciar um pequeno negócio ou escritório. Ou podemos ainda conectar as redes umas às outras na Internet (inovação de arquitetura). Há um grau específico de inovação em cada um desses níveis – mas as mudanças em sistemas de níveis mais altos, normalmente, têm implicações para os mais baixos. Se os carros, que são produto de montagem complexa, fossem, por exemplo, subitamente projetados para serem feitos de plástico, em vez de metal, ainda assim haveria espaço para a mão-de-obra de montadoras – mas custaria algumas noites de sono para os fabricantes de componentes de metal!

32 Parte I Princípios

A Figura 1.1 ilustra a gama de escolhas, enfatizando o ponto em que tal mudança pode ocorrer em nível de componente, de subsistema ou através de todo o sistema.

C O N S E L H O P A R A F U T U R O S G E S T O R E S

Inovação é sempre concebida como algo radical ou exitoso – porque gera boas manchetes. Mas, na realidade, inovação diz respeito a mudanças incrementais, fazer o que se faz de modo melhor. E, em grande parte, isso envolve trabalhar com regras estabelecidas no jogo, desempenhando melhor nossa parte em todo o quebra-cabeça. Contudo, algumas vezes, mudanças radicais são necessárias – ou ocorrem porque alguém mais as introduz. E, às vezes, a estrutura subjacente de um sistema muda e as regras antigas não mais se aplicam. (Como exemplo, ver adiante o estudo de caso relacionado com a indústria da música). Gestores capazes não esperam que a inovação seja imposta, mas desenvolvem um portfólio de possibilidades inovadoras, da incremental até a mais radical, desde o componente até toda a estrutura.

O que deve ser gerenciado?Agora, vamos tentar entender a inovação como um verbo, uma palavra de “ação”. Quais são as ações envolvidas em inovação e como podemos utilizar esse conhecimento para facilitar nossa tarefa de gerenciar o processo de maneira mais eficaz? O que nos vem à mente quando pensa-mos em inovação ocorrendo dentro de uma empresa?

Se alguém lhe perguntasse quando foi a última vez em que você usou seu Spengler, é provável que recebesse um olhar intrigado. Mas, em vez disso, se lhe perguntasse quando foi a

NÍVEL DE SISTEMA

NÍVEL DECOMPONENTE

INCREMENTAL RADICAL

(novidade para oempreendimento)

(novidade parao mundo)

(fazer o que se faz,porém melhor)

Novas versões demotores de carros,

aviões, TV

Melhorias emcomponentes

Novoscomponentespara sistemas

existentes

Materiaisavançados

para melhorar odesempenho de

componentes

Novas geraçõesde produtos, p.ex.,MP3 e downloads

versus CD e fitacassete

Energia a vapor,“revolução”

de TIC,biotecnologia

FIGURA 1.1 Tipos de inovação.

33Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

última vez em que usou seu Hoover, a resposta seria bastante simples. Entretanto não foi o Sr. Hoover quem inventou o aspirador de pó, no final do século XIX, mas certo Sr. J. Murray Spen-gler. A genialidade de Hoover reside na apropriação da ideia e em sua transformação em uma realidade comercial. De modo semelhante, o pai da moderna máquina de costura não foi o Sr. Singer, cujo nome vem logo à mente e está estampado em milhões de máquinas em todo mundo. Foi Elias Howe quem inventou a máquina de costura, em 1846, e Singer quem lhe proporcionou realização técnica e comercial. É possível que o padrinho de ambos, em termos de viabilização de ideias, tenha sido o próprio Thomas Edison, que durante sua profícua vida registrou mais de 1.000 patentes. Os produtos por que sua empresa era responsável incluem a lâmpada elétrica, o filme cinematográfico de 35 mm e até mesmo a cadeira elétrica. Muitas das invenções por que Edison é famoso não foram, de fato, inventadas por ele, como é o caso da lâmpada elétrica, e sim desenvolvidos e aperfeiçoados tecnicamente, de forma que seus mercados foram abertos por Edison e sua equipe. Edison, mais do que qualquer outro, compreendeu que inventar não é o bastante e que simplesmente ter uma boa ideia não é garantia de que será disseminada ou mesmo adotada.

C O N S E L H O P A R A F U T U R O S G E S T O R E S

Diferentemente de Spengler, Howe e outros que tentaram, em vão, viabilizar suas invenções, gesto-res inteligentes percebem que a inovação é um processo extenso com vários estágios fundamentais. Ainda mais importante, evitam pensar em termos parciais ou simplistas sobre o mesmo e, em vez disso, desenvolvem modelos complexos e integrados sobre o seu funcionamento – que, então, po-dem usar para organizar e gerir. Examine a Tabela 1.1 e pense como projetaria um sistema de inova-ção que evitasse algumas armadilhas da coluna da direita.

Um dos problemas que enfrentamos na gestão é que a forma como encaramos tal obje-to é determinante na forma como o abordaremos. Dessa maneira, se possuímos um modelo simplista da forma como a inovação funciona (que ela seja apenas invenção, por exemplo), organizaremos e gerenciaremos unicamente isso. É provável que acabemos possuindo o me-lhor departamento de invenções do mundo, mas não há garantia de que as pessoas realmente queiram qualquer uma de nossas brilhantes invenções! Se, de fato, nos propusermos a geren-ciar inovação, precisaremos, então, repensar nossos modelos mentais e nos assegurarmos de que estamos trabalhando com o máximo de informação possível. Do contrário, corremos os riscos descritos na Tabela 1.1.

Em vez da imagem de desenho animado de uma lâmpada piscando sobre a cabeça da perso-nagem, precisamos encarar a inovação como uma sequência estendida de atividades: um processo. Em essência, a inovação é a sequência de tais atividades envolvidas no processo de tornar uma ideia, ou possibilidade, realidade.

Para garantir que isso ocorra, as empresas precisam gerar, selecionar e implementar, o que requer ações como:

34 Parte I Princípios

Geração depossibilidadesde inovação

Examinar e analisar seus cenários (interno e externo) a fim de captar

e processar sinais potenciais sobre inovação. Esses sinais podem ser

necessidades de vários tipos: oportunidades que surgem a partir de

atividades de pesquisa em algum lugar, pressões reguladoras

governamentais ou o próprio comportamento da concorrência.

Essas necessidades representam o conjunto de estímulos a que

a empresa deve reagir.

Selecionar, estrategicamente, desse conjunto de

gatilhos potenciais para inovação as coisas com

que a empresa comprometerá recursos de execução.

Até mesmo a empresa mais bem servida de recursos

possui limitações, de maneira que o desafio consiste

na adequada seleção daquelas coisas que possuam

melhor chance de desenvolver uma vantagem

competitiva.

Gerar Selecionar Implementar

Implementação

Tornar a inovação uma realidade. Uma vez escolhida a opção, a

empresa precisa amadurecer a nova ideia, no decorrer de vários

estágios de desenvolvimento até o lançamento final, sob a forma de

um novo produto ou serviço para o mercado externo ou um novo

processo ou método dentro da própria empresa. Durante o processo,

será preciso resolver uma série de problemas (como: onde obter

o conhecimento necessário; como recrutar e integrar diferentes

grupos de pessoas que possuam habilidades essenciais; como

solucionar problemas e imperfeições da inovação em surgimento;

como manter o projeto estritamente dentro de prazos e orçamentos

previamente definidos etc.), e é preciso fazer tudo isso em um

ambiente de grande incerteza!

Seleçãoestratégica

O processo básico mostrado no diagrama acima é o mínimo necessário para assegurar que a inovação se concretize – mas como proceder em diferentes tipos de empresas? Que fatores podem ajudar – ou atrapalhar – sua operação? Esse será o assunto da próxima seção.

Criar condições para a inovação eficienteHouve muita pesquisa em torno desse assunto e, no final deste capítulo, apresentaremos algumas referências a alguns desses bons estudos. Um dos pontos iniciais mais importantes é que as em-presas não são criadas com a capacidade de organizar e gerenciar esse processo – é preciso que aprendam e desenvolvam tais competências aos poucos, basicamente, por meio de um processo de tentativa e erro. Elas atêm-se àquilo que funciona e nisso desenvolvem suas competências, abandonando o que não parece funcionar. A inovação eficiente está intimamente relacionada à forma com que a empresa seleciona e gerencia seus projetos, como coordena recursos e insumos

35Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

de diferentes funções, como se relaciona com seus clientes, e assim por diante. Os inovadores bem-sucedidos adquirem e acumulam recursos técnicos e competências gerenciais com o passar do tempo; há inúmeras oportunidades de aprendizagem (por tentativa, experimentação, trabalho com outras empresas, questionamento de clientes e outras), mas todas dependem da disposição de a empresa encarar a inovação menos como uma loteria e mais como um processo que pode ser continuamente melhorado.

Outro ponto importante provado pela pesquisa é que a inovação precisa de gerenciamento de maneira integrada; não é suficiente ser bom em apenas uma coisa. Diferentemente de uma corrida de cem metros rasos, ela é mais comparável ao desenvolvimento de habilidades necessárias para competir de maneira eficaz em uma série de eventos, como em uma competição de pentatlo.

Então, o que as empresas devem considerar à medida em que se propõem a construir e desenvolver seu processo de inovação? Percorreremos cada etapa passo a passo.

Busca por sinais para geração de possibilidades de inovação

Os gatilhos de inovação tomam as mais diferentes formas e tamanhos e surgem de toda e qual-quer direção. Podem ter a forma de novas oportunidades tecnológicas ou de mudanças de requi-sitos por parte de mercados; podem ser resultantes de pressões políticas reguladoras ou de ativi-

TABELA 1.1 O problema dos modelos parciais

Se a inovação é apenas vista como O resultado pode ser

Forte capacidade de P&D Tecnologia que não satisfaz as necessidades de usuários e não são aceitas – “a melhor ratoeira que ninguém quer”

Domínio de especialistas de jale-co em laboratórios de P&D

Ausência de interação com outros e de conhecimento e experiências-chave sob outras perspectivas

Atendimento de necessidades de clientes

Ausência de desenvolvimento tecnológico, levando à incapacidade de obter margem competitiva

Progressos tecnológicos Produção de produtos que o mercado não deseja ou desenvolvimento de processos que não atendam às necessidades do usuário, provocando resistência em sua adoção

Domínio exclusivo de grandes empresas

Empresas pequenas e frágeis com demasiada dependência de grandes clientes

Mudanças “de sucesso” Descaso do potencial de inovação incremental; também, incapacidade de assegurar e reforçar os ganhos advindos de mudança radical porque o me-canismo do desempenho incremental não está funcionando bem

Associação com indivíduos-chave

Fracasso em utilizar a criatividade do restante dos empregados e de asse-gurar suas contribuições e perspectivas para melhorar a inovação

Geração/criação interna O efeito do “não ser inventado aqui”, em que boas ideias vindas de fora ou provocam resistência ou são rejeitadas

Geração/criação externa A inovação torna-se mera questão de preencher uma lista de compras de necessidades externas, ocorrendo pouca aprendizagem ou desenvolvi-mento de competência tecnológica internamente

36 Parte I Princípios

dade da concorrência. Esses gatilhos podem significar uma brilhante ideia que ocorre a alguém que descansa em sua banheira, ao feitio de Arquimedes, ou podem ser resultado da compra de uma boa ideia de alguém de fora da empresa.

A conclusão é bastante óbvia: se quisermos captar esses sinais, precisaremos construir an-tenas de longo alcance para esquadrinhar e buscar a nossa volta, o que também inclui especular sobre o futuro.

Seleção estratégica sobre possibilidades de avanço

O problema da inovação é que, por natureza, ela é um negócio de risco. Você não sabe apenas pela aparência se o que decidiu fazer irá se concretizar, ou mesmo se funcionará. Entretanto será preciso comprometer alguns recursos para dar início ao processo. A questão é: como construir o portfólio de projetos capaz de equilibrar riscos e possíveis recompensas? (É claro que a decisão de iniciar um negócio baseado em sua brilhante ideia nova é muito mais desafiadora para o ges-tor iniciante – a escolha reside entre prosseguir ou não e assumir o que pode significar um gran-de investimento pessoal de tempo, financiamento junto a bancos, tempo com a família, dentre outros. Mesmo quando bem-sucedido, ainda há pela frente o problema de expandir o negócio, para o que será preciso o desenvolvimento de outras ideias brilhantes.)

Assim, esse estágio consiste em escolhas estratégicas – a ideia se presta a uma estratégia comercial, baseia-se em algo que conhecemos (ou um conhecimento que podemos acessar com facilidade) e possuímos competências e recursos para desenvolvê-la?

Implementação – tornando a ideia realidade

Uma vez que se tenha captado sinais de inovação relevantes e tomado uma decisão estratégica de apostar em alguns deles, o próximo passo é tornar aquelas ideias potenciais em algum tipo de realidade, como um novo produto ou serviço, uma mudança de processo, uma alteração de modelo de negócio. De certa forma, essa fase de implementação é um pouco parecida com a tecelagem de uma “tapeçaria de conhecimento”, gradativamente combinando diferentes tramas de conhecimento (sobre tecnologias, mercados, comportamentos da concorrência) e tramando todos eles de maneira a criar uma figura que pouco a pouco se revela como uma inovação bem-sucedida.

No início, é cheia de incertezas, mas a figura torna-se, gradativamente, mais clara. En-tretanto, há uma condição: é preciso investir tempo, dinheiro e recursos humanos para des-cobrir – por meio de pesquisa e desenvolvimento, estudo de mercados, análise de atividades da concorrência, criação de protótipos, simulação e outros – e melhorar, gradualmente, nosso entendimento sobre inovação e certificar-se se há nela boa chance de sucesso. No final, isso se dará em uma forma que pode ser lançada ao público para o qual se destina – mercado interno ou externo – e, então, o conhecimento resultante de sua adoção (ou não) pode ser usado para aprimorar a inovação.

No decorrer dessa fase de implementação, é preciso equilibrar criatividade, encontran-do soluções para os milhares de problemas que surgem e, assim, eliminando imperfeições do sistema, com controle, assegurando-se de que se mantenha dentro do orçamento em termos de tempo, dinheiro e recursos empregados. Essa medida de bom senso significa que habilidade no gerenciamento de projetos de inovação, com todas as incertezas a ele inerentes, são de vital importância! Essa fase é também o momento em que precisamos combinar diferentes saberes de diferentes grupos de pessoas, de maneira tal que a combinação traga mais contribuições do que

37Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

entraves ao processo, o que pressupõe mobilização de competências na formação de equipes e seu gerenciamento.

Seria tolice investir dinheiro em um mau negócio, de modo que a maioria das empresas costuma utilizar algum tipo de estratégia de gerenciamento de riscos ao iniciar a implementação de projetos de inovação. Por meio da instalação de uma série de “portões” em diversas fases de execução do projeto – desde o início, quando provoca apenas um brilho no olhar, até que se configure num investimento de tempo e dinheiro de vulto – é possível revisá-lo e, se necessário, redirecioná-lo ou até interrompê-lo, caso algo tenha saído de controle.

Finalmente, o projeto é lançado em algum tipo de mercado – externamente, para quem possa vir a usar o produto ou serviço, e internamente, para quem decidir adotar (ou não) o novo processo que se apresenta. De qualquer forma, não existe uma garantia de que, apenas porque a inovação funciona e acreditamos que ela seja a melhor coisa desde a invenção do pão fatiado, outras pessoas partilharão da mesma opinião. Inúmeras inovações surgem dentre as populações com o passar do tempo – normalmente, esse processo segue algum tipo de formato de curva em S. Alguns indiví-duos mais corajosos decidem apostar na nova ideia e, então, gradativamente, presumindo que te-nha funcionado para aqueles primeiros, outros passam, também, a adotá-la até que, finalmente, há somente uns poucos teimosos retardatários que resistem à tentação de mudança. O bom gerencia-mento desse estágio implica em saber antecipar como as pessoas possivelmente reagirão e agregar essas projeções a nosso projeto antes que a fase de lançamento se dê – ou, pelo menos, trabalhar de forma consistente no sentido de persuadi-los depois que o lançamento já ocorreu!

O contexto de sucessoA concretização de ideias pode parecer muito simples, mas esse é um processo que não ocorre no vácuo. Está sujeito a uma série de influências internas e externas que determinam o que é possível e o que, de fato, ocorre. E porque não acontece no vácuo, é influenciado e moldado por uma variedade de diferentes fatores. A inovação necessariamente requer:

Liderança e direção estratégicas bem-definidas, bem como o emprego de recursos que •a viabilizem. Inovação implica assumir riscos, adentrar territórios novos e, muitas vezes, completamente inexplorados. Não queremos contar com a sorte – simples-mente mudar as coisas só para ver no que dá ou pelo simples gosto pela mudança. Nenhuma empresa dispõe de recursos que possa desperdiçar de maneira displicente, como quem atira a esmo, sem alvo definido – inovação requer estratégia. Entretanto, é preciso ter certo grau de coragem e liderança, afastando a empresa daquilo que todos estão fazendo ou que sempre fizemos e conduzindo-a a novos territórios.Uma empresa inovadora, em que estrutura e ambiente de trabalho permitam que as pes- •soas explorem sua criatividade e compartilhem seu conhecimento, de forma a propiciar mudanças. É bastante comum encontrarmos prescrições sobre empresas inovadoras que enfatizam a necessidade de eliminar burocracia, estruturas inoperantes, paredes que bloqueiem a comunicação e outros fatores que impeçam a circulação e a realização de boas ideias. Mas é preciso cautela para não cair na armadilha do caos, pois nem toda inovação funciona em ambiente orgânico, descontraído, informal ou “desleixado” – e esses tipos de organização podem, às vezes, operar contra interesses de uma inovação de sucesso. É preciso determinar a medida apropriada de organização – ou seja, a aque-la mais adequada, dadas as contingências operacionais. Escassez de ordem e estrutura pode ser tão prejudicial quanto seu excesso.

38 Parte I Princípios

Canais proativos através de limites dentro da empresa e com agentes externos que pos- •sam colaborar no processo de inovação, como fornecedores, clientes, financiadores e patrocinadores, conhecimento técnico especializado e outros. A inovação do século XXI definitivamente não é uma atividade solo, mas sim um jogo com múltiplos partici-pantes que, como já referido, extrapola os limites departamentais da empresa e alcança agentes externos que possam vir a colaborar no processo de inovação. Vivemos em tempos de globalização em que conexões e a habilidade de encontrar, formar e explorar relacionamentos criativos são condições essenciais.

A Figura 1.2 apresenta o modelo resultante – o que é preciso levar em consideração se nos propusermos a gerenciar bem a inovação.

Aprender a gerenciar a inovaçãoSeja qual for seu tamanho ou setor, toda e qualquer empresa está buscando encontrar formas de me-lhor gerenciar esse processo de renovação. Não há respostas definitivas, mas cada empresa precisa buscar a solução mais apropriada para a sua condição específica. Há empresas que desenvolvem seus próprios métodos de fazer as coisas, e alguns funcionam melhor do que outros. Qualquer empresa pode lograr êxito uma vez, mas a verdadeira habilidade de gestão da inovação reside na capacidade de repetir o feito. Ainda que não haja garantias em se tratando de inovação, inúmeras evidências sugerem que as empresas podem e, de fato, aprendem a gerenciar o processo na busca por sucesso, construindo e desenvolvendo conscientemente sua “capacidade de inovação”.

Gerar Selecionar Implementar

Liderança e direcionamento

estratégicos

Organização inovadora

Vínculos

proativos

FIGURA 1.2 Modelo simplificado para a gestão da inovação.

39Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

C O N S E L H O P A R A F U T U R O S G E S T O R E S

Se quisermos gerenciar a inovação, devemos fazer as seguintes perguntas:

Temos mecanismos de capacitação eficientes para o processo central? •Temos direcionamento estratégico e comprometimento em relação à inovação? •Temos uma empresa com perfil inovador? •Construímos conexões proativas promissoras? •Estimulamos e desenvolvemos nossa capacidade de inovação? •

Essas questões aplicam-se de forma indiscriminada, ainda quando as respostas pareçam nos levar a direções diferentes, dependendo de onde partimos. Uma empresa recém-entrante pode não precisar de um processo muito formal e estruturado para organizar e gerenciar a ino-vação. Mas uma empresa do tamanho da Nokia precisará prestar bastante atenção a estruturas e procedimentos adotados para construir um portfólio estratégico de projetos que pretenda ex-plorar, e gerenciar riscos, à medida que passam de ideias a uma realidade técnica e comercial. Mesmo grandes empresas devem possuir recursos extensivos, que lhes permitam construir um malha global de redes para apoiar suas atividades, enquanto as novas entrantes podem ser vulne-ráveis a ameaças de elementos de seu cenário que simplesmente desconheciam, e com as quais nem sequer se relacionavam.

Ao longo deste livro, examinaremos como esses aspectos se apresentam em diferentes tipos de empresas inovadoras e como a melhor compreensão dos mesmos pode ajudar a melhorar as chances de duradouro sucesso em inovação. Por ora, vamos tratar da questão de estratégia de inovação.

O quê, por que e quando – o desafio da estratégia de inovaçãoA aquisição de capacitação para organizar e gerenciar a inovação é uma grande conquista – no entanto, a menos que essa capacitação seja canalizada para uma direção adequada, a empresa corre o risco de “se produzir toda sem ter festa para ir”! O último tema que precisamos abordar é onde e como a inovação pode ser usada para obter vantagem estratégica. A Tabela 1.2 apresenta alguns exemplos de diferentes formas de atingi-la – talvez você queira complementar a lista com ideias próprias.

O problema não é a escassez de maneiras de obter vantagem competitiva pela inovação, mas, antes, quais delas escolher e por quê. Essa é uma decisão que qualquer empresa precisa tomar, seja uma recém-entrante, decidindo acerca da (relativamente) simples questão de aderir ou não à entrada em um mercado hostil com sua nova ideia, ou uma empresa de grande porte, tentando abrir um novo espaço de mercado por meio da inovação. A força policial precisa ava-liar, estrategicamente, como irá empregar seus escassos recursos para conter a criminalidade e manter a lei e a ordem, enquanto os hospitais se preocupam em equilibrar recursos limitados diante de demandas crescentes por serviços de saúde.

Podemos considerar a estratégia como um processo de exploração do espaço definido pe-los quatro tipos de inovação – os 4Ps anteriormente mencionados. Cada um dos 4Ps de inovação pode ocorrer ao longo de um eixo que varia de mudança incremental a radical; a área indicada

40 Parte I Princípios

TABELA 1.2 Vantagens estratégicas por meio da inovação

Mecanismo Vantagem estratégica Exemplos

Novidade em oferta de produ-to ou serviço

Oferecer algo que ninguém mais pode Apresentar o(a) primeiro(a) Walkman, caneta esferográfica, câmara fotográfica, máquina de lavar pratos, atendimento bancário por telefone, venda online etc. ao mundo.

Novidade em processo

Oferecer algo de modo que outros não conseguem – mais rápido, com custo infe-rior, mais personalizado etc.

O processo de flotagem de Pilkington, o processo Bessemer, Internet Banking, venda online de livros etc.

Complexidade Oferecer algo que outros acham difícil de fazer

Motores Rolls-Royce e de aeronaves – apenas poucos concorrentes podem dominar a complexidade mecânica e metalúrgica envolvida.

Proteção legal da propriedade intelectual

Oferecer algo que outros não podem, a não ser por meio de licença ou paga-mento de outras taxas

Medicamentos de grande vendagem, como o Zantac, Prozac, Viagra etc.

Ampliação da série de fatores competitivos

Mudar a base de concorrência – por exemplo, de preço de produto para preço e qualidade, ou preço, qualidade, escolha

A fabricação de carros japoneses – que, sistematicamente, alteraram a agenda competitiva de preço para qualidade, flexibilidade e escolha, para prazos menores entre lançamentos de novos modelos, entre outros – e, não nego-ciando uma das possibilidades contra as demais, mas sim oferecendo todas.

Senso de oportu-nidade

Ter a vantagem de ser o primeiro.Isso pode valer significativa parcela de mercado na área de novos produtos

Amazon.com, Yahoo - outros podem surgir, mas a vantagem permanece com os primeiros.

Ter a vantagem de aprender rápido – às vezes, ser o primeiro significa enfrentar grandes dificuldades inesperadas, e faz mais sentido ver outra pessoa enfrentá-las e depois seguir na mesma trilha, atua-lizando o produto

O Palm Pilot e outros assistentes pes-soais digitais ocupam uma grande parcela do mercado em crescimento. Na verdade, o conceito e o design foram projetados no Newton, produto da Apple, descartado cerca de cinco anos antes devido a problemas de software.

Design robusto de plataforma

Oferecer algo que fornece a plata-forma sobre a qual outras variações/gerações de produto podem ser desenvolvidas

A arquitetura do Walkman – passando por minidisk, CD, DVD, MP3, iPod.Boeing 737 – com mais de 30 anos, seu projeto ainda é adaptado e configurado para atender a diferentes usuários – uma das mais bem-sucedidas aeronaves do mundo em termos de vendas.Intel e AMD com as diferentes variantes de suas famílias de microprocessadores.

(continua)

41Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

pelo círculo na Figura 1.3 é o espaço de inovação potencial dentro do qual uma empresa pode operar. Quando ela realmente atua e por que – e quais as áreas que negligencia – são as questões para a estratégia de inovação.

Como podemos escolher quais opções são as mais pertinentes? Precisamos fazer essa pergunta levando em conta dois aspectos essenciais: onde pretendemos chegar como em-presa (qual é nossa estratégia comercial básica) e como a inovação pode viabilizar isso? Conhecemos a direção que escolhemos seguir (isso depende de alguma competência que já possuímos ou a que tenhamos acesso)? Tais indagações formam a base para a discussão estratégica que precisa começar.

TABELA 1.2 (continuação)

Mecanismo Vantagem estratégica Exemplos

Reescrita de regras

Oferecer algo que representa um con-ceito completamentenovo de produto ou processo, um jeito diferente de fazer a coisas, tornando os modelos anteriores obsoletos

Máquinas de escrever versuscomputadores com editores de texto, gelo versus refrigeração, lâmpadas elétri-cas versus a gás ou a óleo

Reconfiguração de partes do pro-cesso

Repensar o modo como partes do sis-tema funcionam juntas – por exemplo, desenvolvimento de redes mais eficien-tes, terceirização e coordenação de uma empresa virtual

Zara e Benetton, no ramo de vestuário; Dell, no de computadores; Toyota, quan-to ao gerenciamento de sua cadeia de fornecimento

Transferência através de dife-rentes contextos de aplicação

Recombinar elementos estabelecidos para mercados diversos

Rodas de policarbonato transferidas de mercados de aplicação, como o de ma-las com rodinhas, para o de brinquedos infantis, como micro-scooters leves

Outros? Inovação é sempre encontrar novas maneiras de fazer coisas e de obter van-tagem estratégica; assim, haverá lugar para novos modos de ganhar e de reter vantagens

Napster – essa empresa começou de-senvolvendo software que permitiu aos fãs de música trocarem suas composi-ções favoritas pela Internet; o programa Napster ligou pessoa a pessoa (P2P) ao fornecer uma conexão rápida. O seu potencial para alterar a arquitetura e o modo de operação da Internet era bem maior e, embora tivesse restrições legais, seus seguidores desenvolveram uma in-dústria imensa baseada em downloading e em compartilhamento de arquivos eletrônicos.

42 Parte I Princípios

Além do estado estável – o desafio da mudança descontínuaMesmo se as empresas reconhecem e aceitam a necessidade de inovar de forma contínua, o risco é de que tenham dificuldade em montar um plano estratégico adequado. A limitação de recursos pode lhes dar a impressão de estarem “colocando poucos ovos em poucas cestas ou nas erradas”. A inovação pode assumir muitas formas diferentes, desde uma simples melhoria incremental daquilo que já existe até um desenvolvimento de opções totalmente novas.

O desafio é que as empresas tomem conhecimento do extenso território dentro do qual as possibilidades de inovação existem e tentem desenvolver um portfólio estratégico que cubra esse vasto território de maneira eficiente, equilibrando riscos e recursos.

Produto

(serviço)

Processo

Posição

Paradigma

(conceito de

negócio)

Faça melhor Faça diferente

Incremente

seu produto

Algo que seja

completamente diferente

Prime pela

“excelência”Mudança radical de processo

Estenda, aprofunde,

segmente mercados

Encontre novos campos

a explorar

Mude o modelo

de negócioReescreva as regras

P O S I Ç Ã O

“ PA R A D I G M A” M O D E LO M E N TA L

P R O D U TO S E R V I Ç O

P R O C E S S O INOVAÇÃO

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FIGURA 1.3 Explorando o espaço de inovação.

43Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

Em grande parte, a inovação ocorre dentro de um conjunto de regras de jogo já conhecido e envolve participantes que tentam inovar fazendo exatamente aquilo que já fazem (produtos, processos, posições etc.), só que melhor. Alguns gerenciam o processo de maneira mais eficaz que outros, mas as “regras do jogo” são por todos aceitas e não mudam.

No entanto, às vezes, algo acontece que desloca essa estrutura e altera as regras do jogo. Por definição, esses eventos não são comuns, mas possuem a capacidade de redefinirem o espa-ço e seus limites – eles descortinam novas oportunidades, ao mesmo tempo em que desafiam os participantes existentes a recomporem o que estão fazendo à luz dessas novas condições.

C O N S E L H O P A R A F U T U R O S G E S T O R E S

Na maior parte do tempo, a gestão da inovação trata do “estado estável” – fazer o que fazemos, porém melhor, e sob um conjunto de regras compartilhado por todos. Entretanto, sabemos que, ocasionalmente, “nos puxam o tapete”, com o impulso de mudanças no contexto tecnológico, políti-co e de mercado. Dessa forma, gestores capazes trabalham para desenvolver não só a capacidade de administrar a inovação sob condições estáveis, mas também para criar ao menos habilidade de ir em frente e atuar sob condições adversas. Eles geram recursos para pesquisa de projetos em situações “perfeitas” (blue sky), enviam batedores para detectarem os primeiros anúncios de mudanças radicais, financiam empreendedores internos e ações com capital de risco. E, no limite, encontram maneiras de fazer indagações constrangedoras do tipo “como destruiremos esse negócio?” – e utilizam isso para detectar áreas potenciais de vulnerabilidade.

O que parece ocorrer é que, para um dado conjunto de condições tecnológicas e merca-dológicas, há um longo período de relativa estabilidade, durante o qual um fluxo contínuo de variações em torno de um mesmo tema básico de inovação ocorre. Na essência, isso caracte-riza melhoria de produto/processo dentro do padrão conhecido como “fazer o que já fazemos, só que melhor”. A caneta esferográfica BIC, por exemplo, foi originalmente desenvolvida em 1957, mas ainda hoje permanece um produto forte, com vendas diárias de 14 milhões de unidades em todo o mundo. Embora pareça ter superficialmente o mesmo formato, um exame mais detalhado revelaria a ocorrência de uma série de mudanças de ordem incremental em materiais, tintas, tecnologia de esfera, dispositivos de segurança, entre outros.

Mas essas condições de inovação de “estado estável” são pontuadas por desconti-nuidades ocasionais e, quando tais mudanças ocorrem, uma ou mais condições básicas (tecnológicas, mercadológicas, sociais, reguladoras etc.) são radicalmente alteradas. Nesse processo, as “regras do jogo” subjacentes mudam e um novo campo de oportunidade para inovação se abre. Condições de tipo “faça diferente” surgem, por exemplo, quando ocor-re uma mudança radical ao longo da fronteira tecnológica ou quando aparecem mercados completamente novos.

O Capítulo 7 apresentará mais detalhadamente a questão de inovação descontínua e como é possível gerenciá-la. O que é preciso ficar claro, desde já, é que, sob tais condições (que por sorte não ocorrem todos os dias), faz-se necessário um conjunto diferenciado de abordagens para organizar e gerenciar a inovação. Se tentarmos utilizar os modelos convencionais que fun-cionam em condições de estabilidade, descobriremos que perdemos terreno e corremos o risco de sermos superados por participantes novos e mais ágeis.

44 Parte I Princípios

Desenvolvimento de competências pessoaisA inovação não acontece por acidente, como vimos neste capítulo. É resultado de um processo sis-temático e organizado de mudança administrada, que transforma novas ideias em realidades de su-cesso. As competências gerenciais estão no âmago desse processo, seja em termos de iniciação de

I M P A C T O S O C I A L E E S T R A T É G I C O

Muito da inovação de que ouvimos falar trata de produtos e serviços comerciais – mais dispositivos adicionados aos nossos telefones celulares, carros mais rápidos e com melhor desempenho, per-sonalização crescente de nossa experiência de varejo, ou viagens aéreas, vendas de livros, seguros e atendimento bancário com menor custo. Mas, à parte desse papel propulsor para o crescimento econômico, a inovação traz implicações sociais mais amplas que tornam o entendimento e o geren-ciamento do processo um desafio central para todos os nossos cenários de futuro. Por exemplo:

Inovação em operações de microcrédito, em países pobres como Bangladesh ou Tanzânia, tem •revolucionado partes do setor financeiro e abriram o acesso a capital de entrada para milhares de pessoas que continuam a incrementar seus negócios, criar oportunidades de emprego e de-senvolver a economia local mais ampla.Inovação em sistemas de energia sustentáveis oferece uma alternativa para escapar da armadi- •lha dos combustíveis fósseis, com sua espiral de preços e decrescente disponibilidade.O desejo crescente por produtos e serviços “verdes” (ecológicos) alimenta a demanda por inova- •ção por meio de uma série de setores – a ponto de uma grande empresa de consultoria, a Arthur D. Little, definir sustentabilidade como “o fundamento novo e superior” para a inovação.Maiores expectativas de vida, taxas de nascimento invariáveis ou decrescentes e provisão inade- •quada de pensões indicam que uma bomba está prestes a explodir em muitas economias de “paí-ses desenvolvidos”. O atendimento de expectativas em campos como o de cuidados com saúde e bem-estar social, na contrapartida de recursos limitados, irá exigir uma inovação radical em todo o quadro, não apenas de produtos e serviços, mas também quanto a modelos que subjazem ao modo como isso é organizado e providenciado – e financiado.Lei e segurança encabeçam a lista de preocupações em muitas cidades do interior e, às vezes, •são consideradas batalhas perdidas. Mas a experiência do Departamento de Polícia de Nova York, na década de 1990, sugere que a inovação pode ter um papel decisivo também nesse contexto. Quando Wiliam Bratton foi designado Chefe de Polícia, em 1994, os assassinatos estavam em alta e roubos, os furtos e assaltos à mão armada haviam chegado a tal ponto que muitos pensavam que a cidade estava em declínio irreversível. O contingente de 36.000 policiais sentia-se desmo-ralizado e incapaz de agir, e a instituição mostrava-se suscetível a brigas internas e acusações mútuas de responsabilidade. Entretanto, em menos de dois anos, ele introduziu inovações que reverteram o cenário– as taxas de assassinato caíram 50%, as de agressões, 39%, e as de assaltos, 35%, enquanto a confiança dos cidadãos cresceu de 37% para 73%. Após a sua saída, em 1996, seus sucessores mantiveram essa orientação positiva.

Esses – e muitos outros exemplos – apontam para a relevância da inovação como instrumento e condutor social. Entretanto, a obtenção de benefícios e a minimização de consequências ne-gativas dependem, de modo crucial, de como enfrentamos o desafio de entender e gerenciar o processo de inovação.

45Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

um novo negócio, de renovação ou reinvenção de uma empresa já estabelecida ou na oferta de novas possibilidades de desenvolvimento comunitário por meio de empreendedorismo social. Mas empre-endedorismo não é apenas um novo nome para especulação. Ao contrário, ele envolve energia e com-prometimento motivados e centrados – bem como um conjunto de habilidades básicas, que inclui:

Uma clara compreensão do processo e de seus diferentes elementos. •Planejamento e gerenciamento de projeto contra todo um cenário de incertezas. •Trabalho em equipe: habilidade para trabalhar com outros indivíduos em condições de •incerteza.Liderança estratégica: possuir uma visão e ser capaz de compartilhá-la. •Capacidade de aprendizagem: habilidade de avaliar o que funciona e por que razão e •de alimentar o sistema com essa informação para melhorar o desempenho na próxima oportunidade.

Finalmente, é válido lembrar alguns conselhos úteis de uma velha, mas sábia, fonte. Em seu famoso livro O Príncipe, Nicolau Maquiavel advertiu os futuros inovadores:

Devemos lembrar que não há algo mais difícil de planejar, mais incerto quanto ao sucesso ou mais perigoso de gerenciar do que a criação de um novo sistema, uma vez que seu inicia-dor tem por inimigos todos aqueles que se beneficiariam com a preservação da velha insti-tuição e por meros incentivadores aqueles que ganhariam com a instauração de uma nova.

Resumo do capítuloA inovação é um imperativo de sobrevivência. Se uma empresa não for capaz de •mudar o que oferece ao mercado e as formas como cria e entrega seus produtos, certamente estará em apuros. Uma inovação contribui para o sucesso competitivo de muitas maneiras: é um recurso estratégico para levar a empresa onde ela deseja estar, seja proporcionando valor acionário para as de setor privado, oferecendo serviços públicos de melhor qualidade ou permitindo a criação e o crescimento de novos em-preendimentos.

A inovação não ocorre simplesmente porque a desejamos – é resultado de um processo •complexo que envolve riscos e precisa de gerenciamento cuidadoso e sistemático. O processo básico envolve três passos: acesso a novas ideias, seleção das boas e sua im-plementação. O desafio consiste em dar cada um desses passos de maneira organizada e ser capaz de repetir o feito.

A pesquisa, reiteradamente, sugere que, se quisermos obter sucesso na gestão da ino- •vação, é preciso:

entender • o que estamos tentando gerenciar: quanto mais precisos e organizados fo-rem nossos modelos mentais, maior a probabilidade de construirmos e gerenciarmos organizações e processos que funcionem;entender o • como: criando condições (e adaptando-as/configurando-as) para viabilizá-lo;entender o • quê, o porque e o quando da atividade de inovação: estratégia moldando o trabalho de inovação que fazemos;entender que a inovação é um alvo móvel: gerenciá-la requer a construção de • capa-cidade dinâmica.

46 Parte I Princípios

A inovação pode assumir diferentes formas, mas podemos reduzi-la a quatro dimen- •sões de mudança (os 4Ps):

Inovação de produto • – mudanças nas coisas (produtos/serviços) que uma empresa oferece.Inovação de processo • – mudanças nas formas como as coisas (produtos/serviços) são criadas e oferecidas ou disponibilizadas.Inovação de posição • – mudanças no contexto em que produtos/serviços são intro-duzidos.Inovação de paradigma • – mudanças nos modelos mentais básicos que orientam o que a empresa faz.

As inovações podem estar situadas dentro de qualquer uma dessas dimensões, em um •espectro que varia de “incremental” (do tipo “fazer o que já fazemos, só que melhor”) até “radical” (do tipo “fazer algo completamente diferente”). Podem ser inovações de componente único ou podem ser parte de uma “arquitetura” ou sistema integrado que apresenta muitos e diferentes componentes agregados de uma forma específica.

A inovação não é um evento único, como uma lâmpada que acende sobre a cabeça de •um personagem de desenho animado. É um processo ampliado de busca e seleção de ideias de mudança e de viabilização e concretização das mesmas – um novo produto ou serviço que as pessoas usem e valorizem ou um novo processo que elas adotem em sua rotina de trabalho. Podemos pensar nesse assunto em termos de um modelo simplifica-do de três estágios:

Busca de sinais que indiquem possibilidades de inovação. •Seleção estratégica de possibilidades para levá-las adiante. •Implementação/ transformação da ideia em realidade. •

Esse processo básico não ocorre no vácuo – é altamente influenciado por inúmeros •fatores. Assim, a inovação requer:

Direção e liderança estratégicas claras, além de emprego de recursos que a viabilizem. •Organização inovadora em que a estrutura e o ambiente estimulem as pessoas a ex- •plorarem sua criatividade e compartilharem seus conhecimentos para promover mu-danças.Conexões proativas entre os setores ou departamentos dentro da empresa e entre a empre- •sa e muitos agentes externos que possam contribuir no processo de inovação: fornecedo-res, clientes, bancos e financeiras, fontes especializadas de conhecimentos e outros.

Qualquer empresa pode ter sorte uma vez, mas a verdadeira habilidade de gestão da •inovação reside na capacidade de repetir o feito. Assim, se realmente queremos geren-ciar o processo de inovação, devemos nos fazer as seguintes perguntas:

Temos mecanismos de capacitação eficientes para o processo central? •Temos direcionamento estratégico e comprometimento quanto à inovação? •Temos uma empresa de perfil inovador? •Construímos conexões proativas promissoras? •

47Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

Estimulamos e desenvolvemos nossa capacidade de inovação? •

Desenvolver a capacidade de organizar e gerenciar inovação é uma grande conquis- •ta, mas também é preciso considerar onde e como a inovação pode ser usada para a obtenção de vantagem estratégica. Dois temas essenciais são importantes nesse caso. Primeiramente, qual é nossa “estratégia comercial” básica e como a inovação nos permitirá atingi-la? Em segundo lugar, sabemos alguma coisa sobre a direção que tomaremos, ou seja, está baseada em alguma competência que já possuímos ou a que tenhamos acesso?

Na maioria das vezes, a inovação ocorre dentro de um conjunto de regras de jogo que •já está claramente definido e envolve participantes que buscam inovar fazendo o que já fazem (produto, processo, posição etc.), só que melhor. No entanto, às vezes, algo que muda as regras do jogo ocorre, como quando surge uma mudança radical na fronteira tecnológica ou um mercado completamente diferente. Quando isso acontece, preci-samos de abordagens diferentes para organizar e gerenciar a inovação. Se tentarmos utilizar os modelos convencionais que funcionam em condições de estabilidade, desco-briremos que perderemos terreno e correremos o risco de sermos superados por parti-cipantes novos e mais ágeis.

GlossárioInovação Processo de tradução de ideias em produtos, processos ou serviços úteis – e utilizáveis.

Inovação de arquitetura Mudanças em todo um sistema; por exemplo, mudar de uma dada arquitetura de computador para uma forma completamente diferente de processamento de in-formação.

Inovação de componente Mudanças em termos de componentes de um sistema maior; por exemplo, um transistor mais rápido em um microchip de um computador.

Inovação de paradigma Mudanças em modelos mentais subjacentes que orientam o que a empresa faz.

Inovação de posição Mudanças no contexto em que produtos/serviços são introduzidos.

Inovação de processo Mudanças nas formas em que produtos/serviços são criados e disponi-bilizados.

Inovação de produto Mudanças nas coisas (produtos/serviços) que uma empresa oferece.

Inovação descontínua Inovações radicais que mudam as “regras do jogo” e instauram um ou-tro em que novos participantes normalmente levam vantagem.

Inovação incremental Pequenas melhorias em produtos, serviços ou processos existentes – “fazer o que já se faz, só que melhor”.

Inovação radical Mudanças significativamente diferentes em produtos, serviços ou processos – “fazer o que fazemos de forma diferente”.

Invenção Surgimento de uma nova ideia.

48 Parte I Princípios

Fontes e leituras recomendadasA importância da inovação como uma necessidade estratégica imprescindível é evidenciada em inúmeros estudos de caso – alguns dos melhores podem ser encontrados em:

Christensen, C. (1997) The Innovator’s Dilemma. Harvard Business School Press, Boston, Mass.Dell, M. (1999) Direct from Dell. HarperCollins, New York.Dyson, J. (1997) Against the Odds. Orion, London.Garr, D. (2000) IBM Redux: Lou Gerstner and the Business Turnaround of the Decade. Harper-Collins, New York.Hamel, G. (2000) Leading the Revolution. Harvard Business School Press, Boston, Mass.Kim, W. and Mauborgne, R. (2005) Blue Ocean Strategy: How to Create Uncontested Market Space and Make the Competition Irrelevant. Harvard Business School Press, Boston, Mass.Tidd, J. and Hull, F. (eds) (2003) Service innovation: Organizational Responses to Technologi-cal Opportunities and Market Imperatives. Imperial College Press, London.Utterback, J. (1994) Mastering the Dynamics of Innovation. Harvard Business School Press, Boston, Mass.Von Stamm, B. (2003) The Innovation Wave. John Wiley & Sons, Ltd, Chichester.Womack, J., Jones, D. et al. (1991) The Machine that Changed the World. Rawson Associates, New York.

Discussão mais detalhada sobre a abordagem dos 4Ps pode ser encontrada em:

Francis, D. and Bessant, J. (2005) Targeting innovation and implications for capability develop-ment. Technovation, 25 (3), 171–183

Os temas de inovação radical e incremental são desenvolvidos nas seguintes fontes:

Benner, M.J. and Tushman, M.L. (2003) Exploitation, exploration, and process management: the productivity dilemma revisited. Academy of Management Review, 28 (2), 238.Imai, K. (1987) Kaizen. Random House, New York.

A ideia sobre inovação de arquitetura e de componentes foi primeiramente discutida em:

Henderson, R. and Clark, K. (1990) Architectural innovation: the reconfiguration of existing product technologies and the failure of established firms. Administrative Science Quarterly, 35, 9–30.

A concepção de inovação como processo e as formas como pensamos nesse processo são apre-sentadas em:

Rothwell, R. (1992) Sucessfull industrial innovation: critical success factors for the 1990s. R&D Management, 22 (3), 221–239;Van de Ven, A. (1999) The Innovation Journey. Oxford University Press, Oxford.

Uma boa visão sobre os desafios dp século XXI pode ser encontrada em:

Chesborough, H. (2003) Open Innovation: The New Imperative for Creating and Profiting from Technology. Harvard Business School Press, Boston, Mass

A estratégia de inovação será discutida mais adiante neste livro; para mais informações consulte:

49Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

Burgelman, R., Christensen, C. et al. (eds.) (2004) Strategic Management of Technology and Innovation. McGraw Hill Irwin, Boston.

O tema de inovação “descontínua” é explorado em:

Foster, R. and Kaplan, S. (2002) Creative Destruction. Harvard University Press, Cambridge;Bessant, J., Lamming, R. et al. (2005) Managing innovation beyond the steady state. Technova-tion, 25 (12), 1366–1376;Day, G. and Schoemaker, P. (2000). Wharton on Managing Emerging Technologies. John Wiley & Sons, Ltd, New York.

Referências 1 Drucker, P. (1985) Innovation and Entrepreneurship. Harper & Row, New York. 2 Rothwell, R. and Gardiner, P. (1985) Invention, innovation, re-innovation and the role

of the user. Technovation, 3, 167–186.

Questões para discussão 1 A inovação é gerenciável ou é apenas uma atividade aleatória em que, às vezes, temos

sorte? Se ela é gerenciável, como as empresas podem organizá-la e administrá-la? Que princípios gerais deveriam ser aplicados?

2 “Construa uma ratoeira melhor e o mundo encontrará o caminho até sua porta!” Isso é verdade? Quais são as limitações de ver a inovação simplesmente como o surgimento de uma ideia brilhante? Ilustre sua resposta com exemplos dos setores secundário ou terciário.

3 Quais são os estágios principais envolvidos em um processo de inovação? Quais são os tipos característicos de atividades que ocorrem em cada estágio? Como seria tal processo de inovação para:

uma cadeia de lanchonetes •um fabricante de equipamento de testes eletrônico •um hospital •uma seguradora •uma empresa entrante no ramo da biotecnologia •

4 Fred Bloggs foi um jovem cientista brilhante, detentor de um PhD e de uma patente de novo algoritmo para monitoramento de atividade cerebral e constatação precoce de possíveis derrames. Estava convencido do valor de sua ideia, tanto que a levou ao mercado após vender seu carro, pegar dinheiro emprestado da família e de amigos e fazer um grande empréstimo junto a uma instituição financeira. Ele faliu, apesar de ter impressionado médicos com uma versão de demonstração. Seu fracasso poderia estar associado ao fato de ele possuir uma visão parcial de como a inovação funciona? Como poderia evitar o mesmo erro no futuro?

50 Parte I Princípios

5 Como a inovação funciona enquanto processo de criação e transferência de conheci-mento? Exemplifique sua resposta com casos relevantes.

6 Se a inovação é cada vez mais uma questão de gestão do conhecimento, que tipos de desafios essa abordagem impõe ao gerenciamento de processo?

7 Como se pode utilizar o conhecimento para obter vantagem competitiva em um merca-do competitivo – e como essa vantagem pode ser protegida e preservada?

8 Como a inovação contribui para a vantagem competitiva? Justifique sua resposta com exemplos tanto de produção/fabricação como de serviços.

9 A inovação é importante para os serviços públicos? Com exemplos, indique como e onde ela pode ser uma questão estratégica importante.

10 Você é indicado para ser o novo diretor de uma pequena instituição filantrópica que presta assistência a pessoas sem moradia. Como a inovação poderia melhorar a forma de operação de sua empresa?

11 A inovação pode assumir muitas formas diferentes. Dê exemplos de inovações de pro-duto/serviço, processo, posição e paradigma (modelo mental).

12 A abordagem de tarifas de baixo custo em empresas de aviação mudou inteiramente a maneira como as pessoas escolhem e utilizam serviços de transporte aéreo – e sig-nificou tanto uma fonte de crescimento para novos participantes como também uma ameaça constante para alguns já existentes. Que tipos de inovações podem ser identifi-cadas nesse caso específico?

13 Você foi contratado como consultor por um fabricante de brinquedos de médio porte que vem perdendo mercado no ramo de blocos de montar para outros tipos de brin-quedos. Quais orientações para inovação você recomendaria a essa empresa para recuperar sua posição competitiva? (Use a estrutura dos 4P para refletir sobre as possibilidades.)

14 A inovação proporciona grandes saltos, momentos de descoberta e avanços tecnoló-gicos radicais – não é verdade? Utilizando exemplos dos setores de fabricação e de serviços, elabore um caso sobre a importância de inovação incremental.

15 Descreva e exemplifique o conceito de plataformas em inovação de produto e processo, indicando como tal abordagem pode ajudar a diluir os altos custos de inovação em um período de tempo mais longo.

16 Quais são os desafios que os gestores podem enfrentar ao tentar organizar um fluxo estável de inovação incremental?

Exercícios em grupo 1 Vantagem estratégica por meio da inovação

Pense sobre uma empresa com que você esteja familiarizado e sobre as outras empresas ou as participantes do setor. Como cada um deles escolhe e se posiciona para obter vantagem

51Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

estratégica e como utilizam a tecnologia para fazê-lo? Eles podem praticar menores preços, ou fazer grandes investimentos em máquinas inteligentes que os ajude a obtê-la, ou podem oferecer os melhores modelos de produto, complementando tudo isso com um grande com-prometimento com design e P&D.

Pesquise estratégias, não apenas da empresa escolhida, mas de outras do mesmo setor, e descreva como o setor é definido por empresas que utilizam tecnologia para ob-ter vantagem competitiva. Você pode utilizar a Tabela 1.2 para ajudá-lo a refletir sobre o que elas estão fazendo para consegui-lo e registrar suas conclusões.

2 Forças propulsoras para inovação estratégicaConsidere uma empresa com que você esteja familiarizado; liste as “forças propulsoras” para inovação tecnológica estratégica. Quais são as principais fontes de demanda e de que forma estão exigindo determinadas respostas de empresas competidoras? Quais são as principais tendências em tecnologia e como estão moldando novas oportunidades que as empresas podem explorar para obterem vantagem? Complete os espaços na tabela com suas ideias. Depois disso, acrescente uma projeção para o futuro – qual é sua previsão para daqui a cinco, 10, 20 anos? O cenário seria praticamente o mesmo ou seria possível que o surgimento de novos pontos com exigências de novas demandas ou oportunidades para novas tecnologias mudasse as regras do jogo?

Escala de tempoPressões por parte de demanda exigindo inovação

Oferta de tecnologia gerando oportunidades

AgoraEm 5 anosEm 10 anosEm 20 anos

3 No quadro abaixo, enumere as formas possíveis para que uma empresa possa ser capaz de explorar o conhecimento, a fim de obter vantagem competitiva. O que seria neces-sário para criar e manter tal vantagem?

Fonte de vantagem competitiva Exemplos

O que é preciso gerenciar para criar e manter tal vantagem?

Por exemplo: possuir um pro-duto com design exclusivo

Aspirador de pó de Dyson Como protegê-la legalmente – patentes, direitos autorais etc.?

Tarefas 1 Padrões de inovação setorial

Imagine que você trabalha para uma empresa que fabrica brinquedos infantis. Enu-mere as principais mudanças que o setor sofreu nos últimos 25 anos em termos de sua contribuição à competitividade. Quem (ou qual empresa) foram os vencedores e os perdedores e por quê? Depois, tente responder às seguintes perguntas:

52 Parte I Princípios

Como o setor mudou e como a tecnologia permitiu (ou poderia ter permitido) lidar •com tais alterações?Que novas tecnologias surgiram e como foram exploradas? •Quais são as principais exigências de mercado (preço, qualidade, • design, custo-mização, velocidade de resposta etc.) Como a tecnologia afetou a capacidade das empresas para atendê-las?Se um(a) novo(a) entrante viesse a participar do setor, o que seria preciso oferecer a fim •de se tornar o(a) líder de mercado e como a tecnologia poderia contribuir para isso?

Talvez seja necessário pesquisar o setor como um todo para compor esse quadro. Re-suma sua pesquisa em forma de tópicos que enfatizem o papel estratégico que a tecno-logia desempenha

O quadro abaixo, parcialmente completo, pode ser bastante útil:

Principais mudanças na indústria Principais novas tecnologias

Principais demandas de mercado e como a tecnologia as afeta

Como se tornar um líder de mercado

Grande influência da TV e de filmes – aumentando os apelos comerciais

Eletrônicos e capacidade de programação

Forte pressão sobre o preço – impulsiona fa-bricação de baixo custo – relevância da tecnologia na manutenção de custos baixos, enquanto possibi-lita qualidade

Profunda compreensão de mercado e habilidade de veicular adequadamente essa visão dentro da em-presa e de configurar seus produtos de forma a aten-der a essas demandas

Pressões sobre o preço fa-zem com que a fabricação atual seja mais viável em países do Extremo Oriente

Jogos de TV/vídeo e de computador – como con-correntes de brinquedos tradicionais, mas também como complementos que podem estender seu alcan-ce. Por exemplo, os blocos de montar de Lego + computador = brinquedos programáveis.

Maior ênfase em tecnolo-gias de design

Ampla base de conheci-mento – especialmente em tecnologias recentes como computadores e software, mas também no design de partes

Indústria da moda com altos riscos – e benefícios para produtos adequados

Acesso a redes de distri-buição

Custos de novas tecnolo-gias implicam redução de número de jogadores que podem permanecer no jogo de desenvolvimento de novos produtos – con-solidando, assim, a indústria

Sólida capacidade em design e marketing

53Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

2 Sucesso e fracasso em inovaçãoAs inovações não acontecem por acidente – e nem sempre dão certo. São influenciadas por uma série de fatores: estruturas organizacionais, dinâmica de equipe de projetos, tomada de decisão estratégica, eventos tecnológicos e mercadológicos, dentre outros. Usando exemplos e/ou sua própria experiência, liste os principais fatores gerenciais/or-ganizacionais que pareçam afetar o resultado da inovação em produtos ou processos.

ESTUDO DE CASO 1Inovação em ação: a natureza mutante da indústria fonográfica

Primeiro de abril de 2006. Além de ser um dia em que, tradicionalmente, se pregam peças nos ou-tros, também foi quando se atingiu outro marco dentro do universo de mudanças rápidas da indús-tria fonográfica. Crazy, canção de Gnarls Barkley, tornou-se parte da história da música pop como a primeira música, na Inglaterra, capaz de superar, sozinha, todos os números em termos de vendas de download. Comentando o fato de que a canção já havia sido “baixada” mais de 31 mil vezes, apesar de ter sido somente disponibilizada para venda em lojas no dia 3 de abril, Gennaro Castaldo, porta-voz da varejista HMV, disse: “Isso representa não apenas um divisor de águas na maneira como os álbuns de música são compilados, mas mostra que a era dos downloads legais começou… se as cópias físicas se esgotarem das prateleiras com a mesma velocidade, o álbum pode competir pela posição de maior venda do ano.”

Um dos aspectos menos visíveis, porém mais desafiadores, da Internet é o impacto que teve – e continua a ter – na indústria de entretenimento. Esse é o caso específico da música. De certo modo, essas influências podem parecer confinadas à oferta de novos canais de varejo eletrônico por meio dos quais se pode obter o último CD de sua preferência – como é o caso da Amazon.com, da CD-Now ou de uma centena de outros sites. Essas inovações aumentam a escolha e a oferta de serviços de compra de música e demonstram algumas mudanças econômicas em termos de “con-centração de riqueza/poder de compra” da nova onda comercial da Internet.

Mas, atrás desse incremento que aparenta ser basicamente a mesma transação comercial, está uma mudança mais fundamental na forma como a música é criada e distribuída e no modelo de negócio em que toda a indústria da música está atualmente baseada. O modelo antigo envolvia, basicamente, uma rede complexa em que letristas e artistas dependiam de artistas e repertório para selecionar algumas peças, uma equipe de produção, uma gravava em estúdios sofisticados e caros; uma equipe de produção, que tratava da fabricação de discos físicos, fitas cassetes e CD e outra equipe de marketing e distribuição, a quem cabia assegurar a divulgação, publicidade e disse-minação do produto para um mercado global cada vez mais expressivo.

Muitas mudanças importantes debilitaram essa estrutura, o que resultou em significativo rompimento para a indústria. Velhas competências passaram a não ser mais relevantes, ao passo que a aquisição de novas tornou-se uma questão de urgência. Até mesmo nomes bem-conhecidos, como é o caso da Sony, encontraram dificuldades em manter a liderança à medida que novos en-trantes se tornaram capazes de explorar a economia da Internet. O básico dessa mudança consiste em seu potencial para criar, armazenar e distribuir música em formato digital – um problema que ocupou muitos pesquisadores por muito tempo.

Uma solução, desenvolvida por um dos Fraunhofer Institutes, na Alemanha, é um padrão baseado em protocolo de nível 3 de Motion Picture Experts Group (MPEG), ou MP3. O MP3 cons-titui um algoritmo eficaz para o gerenciamento de um dos grandes problemas de transmissão de arquivos de música: o de compressão. Arquivos de áudio normais possuem uma grande amplitude

54 Parte I Princípios

de frequências e são, portanto, muito grandes e pouco adequados para transferência rápida pela Internet – especialmente para uma população que pode estar usando modems relativamente len-tos. Com o MP3, uma compressão mais eficaz é alcançada por meio da eliminação de frequências que o ouvido humano não consegue detectar – dessa forma, os arquivos a serem transferidos se tornam bem menores.

Em consequência disso, os arquivos em MP3 podem ser rapidamente disponibilizados pela Internet e compartilhados com relativa facilidade. Existem vários programas para conversão de ar-quivos de áudio normais – como CD – para MP3 e vice-versa.

O que isso significa para a indústria fonográfica? Em uma primeira instância, músicos aspi-rantes não dependem mais de serem descobertos por caça-talentos de grandes gravadoras que podem arcar com os custos de gravação e produção de um CD físico. Em vez disso, podem usar um software caseiro de gravação e produzir seu próprio CD ou MP3 – e então distribuir seu produto em nível global por meio de newsgroups, salas de bate-papo virtuais, etc. Nesse processo, eles criam uma indústria de música paralela e muito mais direta que deixa participantes e artistas existentes à margem.

Tais mudanças não são necessariamente ameaçadoras. Para muitas pessoas, a diminuição de barreiras à entrada abriu a possibilidade de participar da indústria – ao fazerem e comparti-lharem música sem as complexidades e custos de um contrato formal de gravação e os recursos de uma grande gravadora, por exemplo. Há também oportunidades de inovação em processos periféricos, como é o caso do setor de publicações, em que as revistas de canções e letras se tornam suscetíveis à diminuição de barreiras através da aplicação de tecnologia digital. O jor-nalismo e as atividades correlatas tornam-se cada vez mais abertos; atualmente, crítica musical e outras formas de comentários são possíveis através de grupos especializados de usuários e canais em rede de computadores, quando, anteriormente, só eram objeto de um número limi-tado de publicações. A compilação de quadros de popularidade e sua respectiva publicidade também se tornaram mais acessíveis, à medida em que o meio foi alterado do CD e fitas cassetes físicos distribuídos e vendidos por meio de canais estabelecidos, para novos dispositivos como MP3, distribuídos via Internet.

Como se não fosse o bastante, a indústria é também desafiada por outra fonte – compartilha-mento de música entre usuários conectados via rede de computadores. Embora seja tecnicamente ilegal, essa prática de compartilhar música de álbuns gravados que os usuários possuem sempre aconteceu – mas jamais na escala que a Internet proporciona. A maior parte da indústria formal de música está bastante preocupada com os aspectos legais – como proteger os direitos autorais e como se assegurar de que royalties sejam pagos, na verdadeira proporção, àqueles que participam da produção e distribuição. Mas, uma vez que as pessoas podem compartilhar música em formato MP3 e distribuí-la em âmbito global, o potencial para policiar o sistema e arrecadar royalties torna-se extremamente difícil de ser sustentado.

Essa situação foi ainda mais agravada com a introdução de outra inovação tecnológica: P2P (pessoa a pessoa) ou compartilhamento de arquivos. Sean Fanning, um jovem estudante de 18 anos de idade, apelidado de Napster, ficou intrigado com o desafio de compartilhar com seus ami-gos o acesso a suas coleções pessoais de álbuns gravados. Ele concluiu que, se os transformassem em formato MP3, seria possível criar um programa como uma espécie de central de troca que facilitaria seu compartilhamento.

O resultado – o site Napster.com – oferecia um software sofisticado que permitia transações do tipo P2P. Na realidade, o servidor Napster não hospedava músicas em seus arquivos – mas, dia-riamente, milhões de trocas eram feitas por pessoas de todo o mundo que compartilhavam suas músicas. Isso resultou em uma grande ameaça para a indústria formal de música, já que não en-

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volvia qualquer pagamento de royalties. Inúmeras ações de grande visibilidade foram impetradas; entretanto, mesmo com a restrição de atividades do Napster, o problema não foi totalmente sana-do. Atualmente, existem muitos outros sites parecidos, imitando e até ampliando o que o Napster começou – sites como o Gnutella, Kazaa e Limewire levaram a ideia de P2P mais além e permitem a troca de arquivos de muitos formatos diferentes: texto, vídeo etc. No caso específico do Napster, o excepcionalmente bem-sucedido site fechou um contrato com um gigante do entretenimento, o Bertelsman, que abriu caminho para serviços por assinatura, gerando alguma receita para lidar com a questão dos royalties.

As expectativas de que políticas de proteção – patentes e direitos autorais – minimiza-riam o impacto dessa revolução foram frustradas pela decisão de uma Corte de Apelação nor-te-americana que rejeitou as acusações de que as transações P2P violavam os direitos autorais. Seu veredicto dizia: “A História tem mostrado que o tempo e as forças de mercado normalmente trazem equilíbrio entre interesses, seja a nova tecnologia um teclado eletrônico, uma copiadora, um gravador, um vídeo cassete, um PC, um karaokê ou um tocador de MP3”. (Personal Computer World, nov. 2004, p.32).

Surpreendentemente, as novas oportunidades surgidas a partir dessa inovação não foram aproveitadas pela indústria fonográfica, e sim por fabricantes de computadores, especialmente a Apple que, paralelamente ao lançamento de seu famoso tocador de MP3, i-Pod, criou um site co-nhecido como i-Tunes, que disponibiliza para seus usuários milhares de músicas para download a 99 centavos de dólar cada. Em suas primeiras semanas de operação, em fevereiro de 2006, ele registrou um milhão de acessos. A bilionésima canção, Speed of Sound, foi adquirida como parte do álbum X&Y da banda inglesa Coldplay, por Alex Ostrovsky, de West Bloomfield, Michigan. “Espero que cada cliente, artista e empresário do ramo, pare e reflita no dia de hoje sobre a conquista que conjuntamente alcançamos nos últimos três anos”, disse Steve Jobs, diretor-executivo da Apple. “Mais de um milhão de canções foram até agora legalmente vendidas e baixadas em todo o mun-do, representando a maior força contra a pirataria de música e o próprio futuro da distribuição de música, na medida em que saímos do CD para a Internet.”

Essa foi, sem sombra de dúvida, uma mudança dramática, a ponto de que, em 2005, se vendia mais canções via Internet, na forma de downloads, do que CDs, e estimava-se, para 2006, uma mudança ainda mais abrangente, em que a maioria de vendas seria via download. Novos participantes estão surgindo para dominar o jogo, como a Tesco e a Microsoft. E as mudanças não param por aí. Em fevereiro de 2006, a banda Arctic Monkeys ficou na liderança de todas as listas de canções mais tocadas na Inglaterra e acabou com um punhado de prêmios da in-dústria da música – embora sua ascensão tenha se dado inteiramente por meio de marketing viral pela Internet, em vez de por meio de canais de publicidade e promoção convencionais. Fazendo pequenas apresentações na cidadela de Sheffield, no norte da Inglaterra, a banda sim-plesmente distribuiu CDs de suas músicas antigas a seus fãs, que passaram a disseminá-los na rede de computadores. “Eles tornaram-se conhecidos do público por meio da Internet, e eram tema em salas de bate-papo, todos estavam falando sobre eles”, afirmou Gennaro Castaldo, da HMV Records, levemente preocupado. David Sinclair, um jornalista dedicado ao rock, acredita que seja “um alerta a todas as gravadoras, a indústria, se você assim o preferir. Isso os pegou desprevenidos. Estamos vivendo em uma era completamente diferente, que os Arctic Monkeys contribuíram significativamente para instaurar”.

Os sinais para a indústria fonográfica indicam um futuro bastante claro, da mesma ma-neira que empresas de transporte aéreo de tarifas reduzidas transformaram o setor de aviação comercial. Na esteira da indústria fonográfica, o novo alvo pode ser a indústria de filmes e entre-tenimento, em que temores semelhantes já podem ser sentidos. Ou o crescente setor de jogos

56 Parte I Princípios

para computadores, cujas mudanças em favor de fabricantes em menor escala se dão através da imitação dos Arctic Monkeys e da utilização de marketing viral para construírem uma base de vendas.

Perguntas sobre o estudo de caso 1 Neste capítulo, levantou-se a ideia de que a inovação pode ser de “arquitetura” – mudanças

que implicam combinação de coisas diferentes para compor um sistema integral. Exemplos disso podem ser encontrados em um automóvel, em um serviço de telefonia móvel ou em um hospital. A inovação pode ser também de “componentes” – as partes que integram aque-les sistemas – como, por exemplo, o motor, os freios, o tanque de combustível, o sistema elétrico e outras partes que integram o automóvel. Mudanças em termos de componentes podem ocorrer isoladamente, mas quando toda a arquitetura é alterada, há, normalmente, grandes ganhadores e perdedores.

Ao avaliar o estudo de caso, identifique as mudanças de arquitetura e as de componentes. Quais são as implicações para diferentes concorrentes, em termos de ameaças iminentes ao seu negó-cio, e de que maneira poderiam reagir? Utilize o quadro a seguir para orientar suas respostas.

Inovação de arquitetura Inovação de componente

Possível ameaça/oportunidade para o jogador 1 – e por quePossível ameaça/oportunidade para o jogador 2 – e por que etc.

2 Inovação com eliminação e criação de competências

Tente uma reavaliação do caso, considerando as seguintes questões:

Em que medida as inovações resultantes criam novas competências (ou seja, aproveitam •o que um participante do setor já sabe para reforçar sua posição) ou eliminam competên-cias (isto é, é algo completamente novo que exige a aprendizagem de novos truques)?E para quem? (pense sobre os diferentes concorrentes da indústria da música – quem são •os possíveis ganhadores e perdedores?)Que estratégias uma empresa deve empregar para explorar oportunidades? (novamente •pense a respeito dos diferentes participantes do setor e como devem defender suas posi-ções ou buscar novas oportunidades).

57Capítulo 1 O Imperativo da Inovação

Utilize o quadro abaixo para organizar suas respostas.

Uma gravadora estabelecida

Uma empresa entrante oferecendo

lazer pela rede

Uma empresa de publicação musical

(detentora de direitos autorais de letra e música etc.) Outros exemplos

A mudança desen-volve competências? Por quê?

A mudança elimina competências? Por quê?

O que você pode fazer para proteger e melhorar sua po-sição?

3 Você pode assinalar os diferentes tipos de inovação do estudo de caso? Quais delas foram incrementais e quais foram radicais/descontínuas? Por quê? Dê exemplos que justifiquem sua resposta.

4 Vantagem estratégica em inovação pode ser obtida através da combinação de quatro tipos básicos de inovação: produto/oferta, processo, posição e paradigma (modelo mental). (Ver página 30. para relembrar o assunto). Por meio de exemplos para ilustrar sua resposta, res-ponda como o padrão de vantagem estratégica foi alterado na indústria de música.

5 A “revolução” da indústria fonográfica é resultado do desenvolvimento de novas tecnologias? Ou ocorre devido à mudança de demandas – naquilo que o público quer e está disposto a pagar? Ou se trata de uma combinação dessas duas possibilidades? Que lições essas ex-periências têm a ensinar a alguém que esteja querendo entrar nessa indústria como novo participante? E de que maneira um participante já estabelecido pode agir para preservar sua posição? Exemplifique.