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Estratégias hegemônicas e estruturas territoriais: o prisma analítico das escalas espaciais Bahia Análise & Dados, Salvador, v. 21, n. 2, p. 303-313, abr./jun. 2011 Carlos Brandão Resumo Este ensaio procura apresentar os desafios colocados na construção de elementos teóricos- metodológicos para estruturar uma problemática das decisões de sujeitos concretos, histórica e espacialmente constituídos. Propõe um diálogo inicial dessa literatura com a necessária teorização sobre decisões e poder de comando dos processos sob análise. Investiga as hierarquias de poder de comando, ações e as prováveis cadeias de reações das decisões tomadas por variados agentes e sujeitos sociais que operam em variadas escalas espaciais. Defende o retorno e o avanço das concepções que, para além de pensar identidades, analisam também interesses, ou seja, questionam a dinâmica de atores, agentes e sujeitos concretos, classes sociais e suas frações na produção de escalas e espaços. Palavras-chave: Desenvolvimento urbano-regional. Divisão social do trabalho. Escalas espaciais. Abstract This essay aims to present the challenges for the construction of theoretical and methodological elements to structure a decision problematic of concrete subjects, historically and spatially constituted. Proposes an initial dialogue of this literature with the necessary theorizing decisions and the command power of the processes under analysis. Investigates the power hierarchies of command, actions and the decisions reactions chain caused by various actors and social agents that operate on different spatial scales. Supports the return and the advance of conceptions that, in addition to thinking about identity, also examine interests, ie, question the dynamics of actors, agents and concrete subjects, social classes and their fractions in the production of scales and spaces. Keywords: Urban-regional development. Social division of labor. Spatial scales. * Doutor, Livre Docente e Titular em Economia pela UNICAMP. Professor do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ. Bolsista do CNPq. E-mail: [email protected] .

Brandão Bahia Análise e Dados 2011

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território, classes sociais

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  • Estratgias hegemnicas e estruturas territoriais: o prisma analtico das escalas

    espaciais

    Bahia Anlise & Dados, Salvador, v. 21, n. 2, p. 303-313, abr./jun. 2011

    Carlos Brando

    Resumo

    Este ensaio procura apresentar os desafios colocados na construo de elementos tericos-

    metodolgicos para estruturar uma problemtica das decises de sujeitos concretos, histrica e

    espacialmente constitudos. Prope um dilogo inicial dessa literatura com a necessria teorizao

    sobre decises e poder de comando dos processos sob anlise. Investiga as hierarquias de poder de

    comando, aes e as provveis cadeias de reaes das decises tomadas por variados agentes e

    sujeitos sociais que operam em variadas escalas espaciais. Defende o retorno e o avano das

    concepes que, para alm de pensar identidades, analisam tambm interesses, ou seja, questionam

    a dinmica de atores, agentes e sujeitos concretos, classes sociais e suas fraes na produo de

    escalas e espaos.

    Palavras-chave: Desenvolvimento urbano-regional. Diviso social do trabalho. Escalas espaciais.

    Abstract

    This essay aims to present the challenges for the construction of theoretical and methodological

    elements to structure a decision problematic of concrete subjects, historically and spatially

    constituted. Proposes an initial dialogue of this literature with the necessary theorizing decisions

    and the command power of the processes under analysis. Investigates the power hierarchies of

    command, actions and the decisions reactions chain caused by various actors and social agents that

    operate on different spatial scales. Supports the return and the advance of conceptions that, in

    addition to thinking about identity, also examine interests, ie, question the dynamics of actors,

    agents and concrete subjects, social classes and their fractions in the production of scales and

    spaces.

    Keywords: Urban-regional development. Social division of labor. Spatial scales.

    * Doutor, Livre Docente e Titular em Economia pela UNICAMP. Professor do Instituto

    Multidisciplinar da UFRRJ. Bolsista do CNPq. E-mail: [email protected] .

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    304

    INTRODUO

    A discusso regional e urbana no Brasil,

    ou a dimenso espacial de seu processo de

    desenvolvimento, precisa ganhar redobrado

    interesse e contribuies nesta quadra histrica.

    Um balano das vrias experincias

    internacionais necessita ser recorrentemente

    realizado e sistematizado para que se aprenda com

    os acertos, erros e omisses destas. A experincia

    inglesa, a mais esquecida nos levantamentos

    histricos, e as mais estudadas a italiana, a

    francesa, a americana e a latino-americana ,

    com destaque para a brasileira, requerem anlises

    detalhadas que possam iluminar a realidade atual

    e gerar projees de possveis trajetrias.

    A passagem das elaboraes tericas

    um patrimnio cientfico de mais de meio sculo

    para o balano das experincias e a

    sistematizao dos desafios analticos, sociais e

    polticos para a implementao de polticas

    pblicas de desenvolvimento urbano-regional no

    algo trivial ou que possa ser projeto pessoal de

    qualquer pesquisador. Deve ser assumido coletiva,

    social e politicamente pela sociedade, de forma

    ampla e crtica. Neste sentido, os balanos da

    literatura e as experincias so muito oportunos e

    bem-vindos (HAESBAERT, 2010; PORTO, 2009;

    GUIMARES NETO; BRANDO, 2009;

    DALLABRIDA, 2010; SIQUEIRA, 2010).

    Como a dimenso espacial em si j

    interface de mltiplas dimenses, nenhum campo

    disciplinar, de forma isolada, dar conta

    minimamente da riqueza de determinaes deste

    complexo processo. Ao mesmo tempo, por ser

    este necessariamente determinado pelo contexto

    histrico, social e geogrfico, tambm a busca por

    uma teoria geral e com alto nvel de abstrao ser

    sempre impossvel ou intil.

    A procura por um arcabouo terico-

    metodolgico que possa informar anlises e

    sugerir instrumentos orientadores de estratgias

    mais concretas de desenvolvimento urbano-

    regional deve acionar todo um aparato crtico

    conceitual que no apenas qualifique o debate,

    mas tambm possa sugerir nova produo social e

    poltica do espao que coloque as questes do

    poder e dos processos decisrios no centro da

    anlise e da ao.

    Prope-se aqui que o refinamento

    analtico re-querido passa pela centralidade das

    decises e do poder de comando de sujeitos

    concretos, situados e envolvidos nas disputas

    diversas (com variados instrumentos) em torno da

    construo social de determinado espao,

    investigando as hierarquias (diviso social do

    trabalho) e hegemonias de poder de comando, as

    aes e as cadeias de reao das decises tomadas

    (por agentes e sujeitos sociais que operam em

    variadas escalas espaciais). Defende-se aqui a

    necessidade de avaliar o papel de uma reflexo

    terica que prope uma sequncia analtica

    produo social do espao / diviso social do

    trabalho / dimensionamento dos poderes /

    natureza das escalas espaciais que no perca as

    referncias do ambiente macroeconmico

    nacional e da ao do Estado.

    EM BUSCA DE REFERENCIAIS TERICO-

    METODOLGICOS CRTICOS PARA A

    AO NO TERRITRIO

    A tradio da rea dos estudos urbanos

    regionais se concentrar no aspecto da

    localizao das atividades econmicas em um

    espao dado. Parte-se da desigual disposio

    espacial dos fatores de produo e da dotao dos

    recursos econmicos, a fim de demonstrar que a

    racionalidade dos agentes ao tomarem decises

    otimizadoras diante de irregularidades e

    assimetrias acaba vencendo essas frices

    espaciais. A eficincia individual do processo

    decisrio dos agentes quanto localizao

    contornaria esses obstculos advindos da

    insuficiente mobilidade dos fatores e insumos pela

    distncia fsica anteposta ao intercmbio. Ou seja,

    tudo se transformaria em uma questo de

    distribuio locacional, em um ambiente no

    construdo, mas dado naturalmente, inerte, isto

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    304

    , conformado pelas foras mercantis, sendo o

    territrio to somente receptor dessas decises

    individuais. Conforme apontado mais frente,

    este modelo terico possui ntido carter

    atemporal, no espacial e no escalar. Tambm

    no h contexto institucional e nem ambiente

    construdo por foras sociais e polticas.

    Muito diferentes so as anlises da

    corrente crtica, que ressaltam o processo

    decisrio de disputas, resistncias e lutas travadas

    em torno da produo sociopoltica do espao

    social. Assim, os estudos crticos dos processos de

    desenvolvimento ou subdesenvolvimento em sua

    dimenso urbano-regional devem se concentrar na

    anlise dos agentes cruciais e seus efeitos de

    dominao (como em Franois Perroux e Celso

    Furtado), buscando entender, orientar e ordenar

    processos complexos. Analisar at que ponto

    determinadas aes so mais ou menos

    endogeneizantes, verificar os ritmos

    diferenciados dos processos econmicos, os nexos

    de complementaridade intersetoriais, a demanda

    de insumos e outros elementos da produo que

    circula entre os ramos produtivos. Entender como

    determinada inverso se reverte em emprego (e de

    que qualidade), como se geram determinados

    excedentes e rendimentos. Mas, sobretudo, a

    interao permanente entre agentes e sujeitos forja

    e transforma estruturas, estratgias e determinados

    campos espaciais e arenas de luta e de

    conflituosidade. A existncia de comunidades

    discursivas distintas, de vises de mundo e

    interesses conflitantes, e as diferenas de recursos

    dos atores sociais, inclusive comunicacionais,

    condicionam as prticas de planejamento

    territorial e suas abordagens (COSTA, 2008, p.

    106).

    A diviso social do trabalho deve ser a

    categoria terica bsica da investigao da

    dimenso espacial do desenvolvimento, posto que

    permeia todos os seus processos em todas as

    escalas. Expresso do estgio atingido pelo

    avano das foras produtivas, essa categoria

    mediadora a adequada para se estudarem as

    heterogeneidades, hierarquias e especializaes

    intra e inter de qualquer escala (regional, nacional,

    internacional). Capaz de revelar as mediaes e as

    formas concretas em que se processa e se

    manifesta a reproduo social no espao, expressa

    a constituio socioprodutiva interna e suas

    possibilidades (e a efetividade) de insero no

    contexto maior, isto , sua posio em uma

    relao hierrquica superior. A anlise das

    funes, processos, momentos e formas impostos

    pelo aprofundamento da diviso social do trabalho

    torna-se decisiva. Segundo Milton Santos (2002,

    p. 60):

    A cada movimento social,

    possibilitado pelo processo da

    diviso social do trabalho, uma

    nova geografia se estabelece, seja

    pela criao de novas formas para

    atender novas funes, seja pela

    alterao funcional das formas j

    existentes. Da a estreita relao

    entre diviso social do trabalho,

    responsvel pelos movimentos da

    sociedade, e sua repartio

    espacial. A diviso do trabalho

    social torna diversamente

    produtivas as diferentes pores

    de natureza, isto , atribui a uma

    paisagem a condio de espao

    produtivo. [...] A cada momento

    da diviso do trabalho, a

    sociedade total se redistribui,

    atravs de suas funes novas e

    renovadas, no conjunto de formas

    preexistentes ou novas. A esse

    processo pode chamar-se de

    geografizao da sociedade.

    Assim, esta diviso do trabalho expressa o

    permanente movimento da reproduo social,

    sendo importante analisar as intencionalidades dos

    sujeitos nesse contexto e as modalidades de

    produo e organizao espacial promovidas por

    eles.

    O resgate da problemtica da reproduo

    das classes sociais torna-se crucial para se

    entender a produo social do espao e a

    dimenso urbano-regional do desenvolvimento

    capitalista, procurando demonstrar que esta um

    problemtica atinente existncia, ao contedo e

    natureza de centro de deciso, comando e

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    305

    direo (versus heteronomia) em todo e qualquer

    recorte espacial que se proceda investigao

    comprometida, envolvendo a anlise estrutural de

    hierarquias e hegemonia. Trata-se de investigar

    estruturas, dinmicas, relaes e processos.

    preciso entender como as diversas faces de

    classes sociais se estruturaram e como se

    reproduzem. Quais so seus interesses concretos

    mobilizados e seus instrumentos e lgicas de ao

    acionados. Tais processos ocorrem, grosso modo,

    em vrios planos analticos, nveis de abstrao e

    escalas espaciais.

    O exerccio terico-metodolgico aqui

    proposto coloca no centro da anlise a

    problemtica das decises e do poder de comando

    de agentes e sujeitos concretos, que operam em

    variadas escalas espaciais nas disputas em torno

    da produo social de determinado espao.

    Conforme apontado no incio deste ensaio,

    prope-se aqui a seguinte aproximao analtica:

    produo social do espao / diviso social do

    trabalho (intersetorialidade, inter-regionalidade e

    interurbanidade) / dimensionamento dos quatro

    poderes / natureza das escalas espaciais.

    Produo social do espao

    Infelizmente, em parte pondervel das

    anlises, o espao, que deveria ser visto como

    ambiente politizado em conflito e em construo,

    posto como reificado, ente mercadejado e

    passivo, mero receptculo onde se inscrevem os

    deslocamentos/ movimentos. Constri-se uma

    narrativa espacial e escalar em que o fruto de

    relaes sociais aparece como relao entre

    objetos.

    Em contraposio a esta interpretao

    conservadora e hegemnica, a concepo terica e

    metodolgica a ser aqui adotada a da produo

    social do espao, dos conflitos que se estruturam e

    dos antagonismos que so tramados em torno

    deste quadro e ambiente construdos. No espao

    se debatem (compatibilizados ou no) projetos e

    trajetrias em reiteradas contendas. O espao

    unidade privilegiada de reproduo social, de

    processos diversos e de manifestao de

    conflitualidades. Seu tratamento, portanto, deve se

    afastar dos tratamentos que pensaram estruturas

    sem decises de sujeitos ou atores sem contexto

    estrutural. Os espaos so construes (sociais,

    discursivas e materiais), portanto, sua anlise deve

    se basear na interao entre decises e estruturas,

    nas articulaes entre microprocessos,

    microiniciativas versus macrodecises, nas vrias

    escalas espaciais em que se estruturam e se

    enfrentam os interesses em disputa. Grande parte

    das mediaes tericas e histricas deve ser tecida

    tomando o objeto escala espacial enquanto

    construo social e prisma analtico. Neste

    sentido, o desafio empreender a interpretao

    sob a tica da pluralidade das fraes de classes

    sociais em construo de um compromisso

    conflituoso produzido e pactuado em um espao

    vivo, procurando elucidar os processos a partir

    dos quais os sujeitos sociais em luta produzem

    socialmente o espao e o ambiente construdo

    (LEFEBVRE, 1974; HARVEY, 2006).

    Diviso social do trabalho

    Esta deve ser a categoria explicativa

    bsica da investigao da dimenso espacial do

    desenvolvimento capitalista, posto que permeia

    todos os seus processos em todas as escalas.

    Expresso do estgio atingido pelo

    desenvolvimento das foras produtivas, esta

    categoria mediadora a adequada para se

    estudarem as heterogeneidades, hierarquias e

    especializaes intra e inter de qualquer escala

    (regional, nacional, internacional).

    O referencial terico-metodolgico maior,

    hierarquizador das questes a serem pesquisadas,

    o da diviso social do trabalho. Seu movimento

    constante modifica, refuncionaliza, impe lgicas

    externas, adapta, distingue e revela estruturas e

    dinmicas. Promove redistribuies e redefinies

    incessantes de agentes, atividades, circuitos,

    funes etc. o vetor das transformaes

    constantes e perenes nas intertemporalidades e

    interespacialidades. Re-aloca recorrentemente

    pessoas, fatores produtivos, processos e dinmicas

    de produo. Especializa, diferencia, particulariza,

    discerne, separa/une. Coloca em consonncia,

    Vincius RodriguesRealce

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    306

    concilia, combina, coordena, coteja, confronta.

    Nesse sentido, os espaos regionais e urbanos so

    resultantes da operao de diferenciao social e

    de especializao e diversificao material e da

    sociedade. Os estudos devem investigar a base

    operativa, ou seja, o lcus espacial em que se

    concretizam tais processos e analisar os centros de

    deciso e os sujeitos histricos determinantes

    destes.

    A diviso social do trabalho em sua

    expresso espacial representa a

    redistribuio/realocao permanente e as

    redefinies incessantes de agentes, atividades,

    circuitos, funes etc. Representa a categoria-

    chave analtica, capaz de revelar as mediaes e as

    formas concretas em que se processa e se

    manifesta a reproduo social no espao (a partir

    dos processos de intersetorialidade,

    interregionalidade e interurbanidade, trs

    manifestaes socioprodutivas, regionais e

    urbanas, da diviso social do trabalho que se

    pretende destacar neste ensaio).

    A intersetorialidade expressa a

    constituio socioprodutiva interna e suas

    possibilidades (e a efetividade) de insero no

    contexto maior, isto , as manifestaes

    territoriais dos processos de produo, de

    consumo, de distribuio, de circulao. A inter-

    regionalidade expressa a coerncia no espao

    regional de tais processos e destaca circuitos,

    fluxos e espaos de circulao e reproduo do

    capi-tal e suas estruturas decisrias. A

    interurbanidade demonstra a posio em uma

    diviso interurbana e intraurbana do trabalho

    social e revela as formas de sociabilidade urbana

    em dado recorte espacial e as posies dos

    diversos espaos urbanos em uma relao

    hierrquica superior.

    Intersetorialidade ou inter-ramificaes

    necessrio analisar as estruturas

    produtivas localizadas em determinado espao

    urbanoregional enquanto densa e complexa

    trama da intersetorialidade econmica inerente

    produo capitalista. Esse sistema possui uma

    intersetorialidade marcante e apresenta

    ramificaes que se encontram em permanentes

    interaes dinmicas. Neste contexto, os conceitos

    de aparelho produtivo e sistema social da

    produo so importantes para entender as

    coerncias e complementaridades econmicas

    setorializadas, pois so muito diferenciadas as

    manifestaes territoriais dos processos de

    produo, consumo, distribuio e circulao, que

    so, por natureza, marcadamente diversificadas

    tambm no espao.

    Com o estudo desta dimenso da

    intersetorialidade possvel analisar a reproduo

    social, a natureza e o poder das foras

    produtivas/propulsivas e dos sistemas sociais de

    produo estruturados em determinado tempo-

    espao e averiguar e dimensionar as interaes

    inter-ramificaes econmicas, o conjunto de

    relaes e efeitos encadeados e os seccionamentos

    produtivos que se tecem sob condies tcnicas e

    de mercado totalmente distintas.

    Desse modo torna-se necessrio entender

    que o sistema econmico tem uma

    intersetorialidade marcante e apresenta

    ramificaes que se encontram em permanentes

    interaes dinmicas. A diviso tcnica e social

    do trabalho promove uma lgica material-

    produtiva seccionvel que compartimenta

    subdivises e gera permanentemente os

    especficos ramos econmicos. Ao mesmo tempo

    ela importante para engendrar as coerncias e as

    complementaridades econmicas e

    socioprodutivas que permitem fugir das vises

    setorializadas.

    Os setores so identificados e qualificados

    pela sua insero especfica na estrutura produtiva

    e nas categorias de uso (consumo durvel e no

    durvel, intermedirios e bens de capital). Os

    seccionamentos produtivos so elos constitutivos

    do aparelho produtivo, de se identificarem setores

    lderes que tenham capacidade de arrastar outros

    setores e distingui-los de setores de suporte e de

    outros meramente complementares de atividades

    dinmicas, com reproduo do capital social em

    seus diversos ciclos, porm, tomado em seu

    conjunto.

    Estudar as ramificaes, a intersetorialidade, deve

    ser fundante nos estudos urbano-regionais, pois:

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    307

    A categoria econmica de ramo,

    como relaes entre produto-

    mercadoria (reproduzvel),

    processo de produo e processo

    de circulao, d um sentido ao

    conceito de ciclo do capital social

    investido no ramo [] Esta

    categoria constitui o quadro em

    que devemos operar para nos

    entregarmos a um estudo dos

    movimentos do capital, das fases

    do seu ciclo global e para situar

    em seguida as fraes do capital

    que interveem no ciclo, ou seja, as

    fraes dominantes (PALLOIX,

    1973, p. 24).

    O ciclo da frao de capital social

    invertido no ramo tem um lcus especfico de

    reproduo.

    Nestes lugares de reproduo do capital

    social aparecem as fraes dominantes de

    reproduo do capital social, segundo o

    predomnio de tal ou tal processo (produo,

    circulao etc): capital bancrio, capital industrial,

    capital comercial, profundamente inseridos no

    quadro regional (PALLOIX, 1973, p. 29).

    Assim, o que se pretende desenvolver em

    futuras pesquisas so formas de se analisarem os

    elos constitutivos do aparelho produtivo, de se

    identificarem setores lderes que tenham

    capacidade de arrastar outros setores e distingui-

    los de setores de suporte e de outros meramente

    complementares de atividades dinmicas, com

    forte relao de dependncia intersetorial etc.

    Analisar essa intersetorialidade inserida em

    determinado ambiente macroeconmico tambm

    fundamental, embora a lgica microeconmica

    tambm precise ser examinada. Neste sentido,

    captar devidamente os determinantes vindos da

    setorialidade do funcionamento da economia

    capitalista torna-se decisivo. Esta se apresenta

    como uma pluralidade de subdivises, sees e

    ramos produtivos com marcantes especificidades.

    Quem trabalha com os impactos e as expresses

    espaciais, urbano-regionais, de tal dinmica

    precisa construir recorrentemente mediaes

    tericas e histricas complexas para que o campo

    da economia poltica possa realmente prover

    contribuies com substncia para o avano da

    investigao sobre o funcionamento das

    economias e sociedades regionais e urbanas

    especficas.

    Interregionalidade

    Para o entendimento desta dimenso da

    diviso social do trabalho, importa, tendo por base

    as orientaes metodolgicas de Harvey e

    Braudel, afirmar que o plano analtico inter-

    regional deve tratar de centrar a abordagem na

    articulao, coeso e integridade dos processos

    que se do em determinado espao, explicitando

    seus mecanismos de coordenao e regulao: o

    que os autores denominaram, respectivamente,

    coerncia estruturada e coerncia imposta.

    David Harvey (1973, p. 171) inicia suas

    pesquisas crticas questionando-se sobre os

    vrios mecanismos de coordenao modos de

    integrao econmica que so parte integral da

    base econmica da sociedade porque atravs

    deles que os vrios elementos na produo so

    reunidos e as diversas atividades socialmente

    produzidas da sociedade so unidas em algo

    coerente. Trinta anos depois, o autor pensa

    acerca dos espaos urbanoregionais que

    alcanam certo grau de coerncia estruturada em

    termos de produo, distribuio, troca e consumo

    ao menos por algum tempo. Os processos

    moleculares (da acumulao de capital)

    convergem, por assim dizer, na produo da

    regionalidade (HARVEY, 2003, p. 88).

    Convergem tambm na produo social da inter-

    regionalidade.

    Tambm Braudel (1979) corretamente se

    perguntava sobre o processo de coerncia

    imposta no mbito de uma economia monetria.

    A literatura crtica recente na rea

    avanou muito ao realizar um tratamento analtico

    rigoroso dos paradoxos e relaes dialticas entre

    fluidez/mobilidade do capital, vis--vis os

    processos que so caracterizados pela fixidez das

    formas de ancoragem espacial dos processos

    econmicos, sociais e sua crescente faculdade de

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    308

    acionar/mobilizar/captar/ capturar e reagir s

    diferenciaes territoriais.

    Esses paradoxos e contradies devem ser

    in-vestigados, reelaborando-se categorias

    analticas que procurem elucidar a estrutura e a

    dinmica dos diversos circuitos, fluxos e espaos

    de circulao e reproduo do capital, a fim de se

    lograr apreender o mais relevante dos processos

    de desenvolvimento em suas dimenses espao-

    temporais.

    Averiguar estruturas decisrias e a

    natureza da atuao dos agentes econmicos, por

    exemplo, do mundo da finana e do mundo

    produtivo, procurar entender como vai

    redefinindo-se, na histria, o modo de

    relacionamento entre os heterogneos espaos

    urbano-regionais. A acumulao de capital

    promove a coerncia imposta a processos, lgicas

    e dinmicas muito diversas e variadas. A

    articulao, a abertura e a integrao de mercados

    recondicionam as economias aderentes, forando-

    as convergncia e reacomodao de suas

    estruturas, fundando uma dada inter-regionalidade

    coercionada pelo acirramento da concorrncia

    inter e intraterritorial. Multiplicam-se as

    interdependncias e as complementaridades inter-

    regionais, que podem acarretar o aumento tanto

    das potencialidades quanto de suas

    vulnerabilidades. Metamorfoseia-se a densidade

    econmica de pontos seletivos no espao: sua

    capacidade diferencial de multiplicao,

    reproduo e gerao de valor e riqueza; sua

    capacidade de articulao inter-regional; o grau e

    a natureza das vinculaes e a densidade dos

    circuitos produtivos. Mudam-se os ncleos

    dinmicos de comando que exercem diferentes

    espcies de atratividade e dominao e geram

    estratgicos ou no pontos, eixos e ns de maior

    ou menor potncia reprodutiva e capacidade de

    apropriao. Diversificam-se os fluxos, o

    movimento de seus eixos de circulao e seu

    potencial produtivo, a estrutura socio-ocupacional

    de seus habitantes etc.

    Se at aqui foram ressaltados os aspectos

    materiais e econmicos da necessria anlise das

    inter-regionalidades de determinado espao

    urbano--regional, cabe destacar, por fim, que no

    se pode deixar de considerar neste contexto as

    lgicas territoriais do poder, os processos sociais

    em sua operao no tempo e no espao,

    procurando levar em conta a competio e a

    especializao inter-regionais, pois o que

    acontece exatamente quanto dinmica interna e

    s relaes externas depende da estrutura de

    classes que surge e dos gneros de aliana de

    classes que se formam (HARVEY, 2003, p. 88).

    Torna-se necessrio, assim, decifrar o papel das

    coalizes polticas, das hierarquias (e das

    coerncias construdas espacialmente) e das

    hegemonias que estruturam os processos sociais

    em seus vrios nveis, instncias e territrios.

    Interurbanidade

    preciso averiguar recorrentemente as

    estruturas que conformam a interurbanidade, as

    relaes e interaes entre espaos sociourbanos e

    sua posio no concerto de uma diviso

    interurbana e intraurbana do trabalho social,

    conformando uma determinada sociabilidade em

    variados planos e dimenses espaciais. tambm

    necessrio pensar dinamicamente a natureza das

    formas urbanas de organizao social, a

    reproduo social da existncia da vida material

    que se projeta no espao urbano.

    A pesquisa crtica deve investigar os

    determinantes do crescimento urbano, as

    hegemonias das coalizes armadas no espao

    urbano e sua projeo desde dentro da rede urbana

    e do sistema de cidades regionais. Projeo esta

    que se processa desde o espao interno da cidade

    e de seu hinterland.

    Os processos urbanos devem estar

    inseridos no complexo tema da reproduo social,

    produzido pela constante pugna das faces de

    classes sociais e a consolidao de hegemonias e

    lutas contra-hegemnicas, analisando as mltiplas

    fraes de capital (mercantil, agrrio, industrial,

    bancrio).

    preciso elaborar instrumentos analticos

    de uma economia poltica da manifestao dos

    processos sociais no espao urbano,

    problematizando estruturas e sujeitos produtores

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    309

    dos espaos intra e interurbanos. Neste contexto,

    os estudos urbanoregionais devem assumir a

    conflitualidade inerente e a contenda perene de

    interesses mltiplos e seus variados loci de

    possibilidade de concertao, ou no, de projetos

    em disputa e das coalizes e arco de alianas que

    vo armando-se em cada conjuntura histrica e

    territorial.

    A rede urbana constitutiva e

    constituinte, integrante e

    estruturadora/articuladora do movimento e da

    dinmica da regio. preciso estudar suas

    permanncias, rupturas, normas e ritmos, seu

    regime de expanso, questionando sua insero e

    posio nos sistemas e complexos de cidades

    existentes em vrias escalas espaciais. A rede

    urbana expressa tambm uma hierarquia de

    decises que so tomadas e que circulam. Ela

    um reflexo, na realidade, dos efeitos acumulados

    da prtica de diferentes agentes sociais

    (CORRA, 2005, p. 27).

    Analisando a dinmica da interurbanidade

    cabe observar a estrutura fundiria rural

    (importante para a dinmica interurbana que se

    produz em determinado territrio) e tambm a

    urbana, que preservam clientelisticamente os

    espaos de reproduo do capital mercantil em

    suas diferentes faces (imobilirio, comercial,

    transportes e outros servios). Quando avana a

    interiorizao pelo hinterland, produzem-se

    variados espaos urbanos, constituindo densas

    economias urbanas e modernas estruturas

    produtivas regionais, que acabam por soldar

    interesses mercantis mais arcaicos em torno da

    expanso urbana. Geralmente, as cidades e seus

    entornos vo enredando-se na malha desses

    interesses patrimonialistas e especulativos e se

    firmam como uma espcie de estufa, campo

    frtil para o cultivo destas fraes do capital

    mercantil. No territrio urbano-regional se

    apresenta uma equao poltico-econmica eficaz

    entre os proprietrios fundirios, o capital de

    incorporao, o capital de construo e o capital

    financeiro, que passam a desfrutar de condies

    vantajosas e a auferir ganhos extraordinrios. Essa

    coalizo conservadora tem os seus interesses

    assegurados pelos cartrios, cmaras de

    vereadores, Poder Judicirio, dentre outros

    aparelhos, travando as possibilidades de

    rompimento com o atraso estrutural e de avanar

    no direito cidade e na gesto democrtica e

    popular dos espaos regionais e urbanos.

    Conjunturalmente, esse amplo arco de alianas

    conservadoras ganha ares mais modernos,

    promovendo alguma reestruturao nas

    articulaes urbano-regionais do mercado de

    terras e de moradias e das relaes promscuas

    entre proviso pblica de infraestrutura

    econmica e valorizao fundiria.

    Assim preciso conduzir reflexes que

    posicionem a questo urbano-regional neste

    contexto analtico, da discusso dos centros de

    deciso, do estudo das faces sociopolticas, a

    partir da hiptese de que as fraes do capital tm

    papel destacado no pacto de poder oligrquico e

    financeiro, rentista, e que o patrimonialismo e a

    apropriao territorial so as principais marcas do

    Brasil, de seu espao urbano como lcus do poder

    e da sociabilidade.

    H processos evolucionrios em que as

    relaes interurbanas tambm se constituram em

    mecanismos propulsores de crescimento urbano e

    criativas formas de transmisso do avano

    material capitalista. Desse modo, fundamental

    explorar analiticamente os dinamismos intrnsecos

    aos processos que se desenrolam em um ambiente

    de diversidade urbana. Estas imposies

    articuladoras transformam a natureza das

    vinculaes e densificam, diversificam e

    complementam circuitos, primeiro mercantis e

    depois produtivos, integrando setorialismos, inter-

    regionalidades e dinmicas interurbanas segundo

    uma diviso social do trabalho crescente e em

    outro ritmo.

    Em suma, muitos desafios so colocados

    para a construo de elementos terico-

    metodolgicos que logrem estruturar uma

    problemtica das decises de sujeitos concretos,

    histrica e espacialmente constitudos.

    Prope-se aqui um dilogo inicial dessa

    literatura com a necessria teorizao sobre

    decises e poder de comando dos processos sob

    anlise, investigando hierarquias de poder, aes e

    provveis cadeias de reao das decises tomadas

    por agentes e sujeitos sociais que operam em

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    310

    variadas escalas espaciais, construindo

    socialmente determinado espao. Defendem-se

    aqui o retorno e o avano das concepes que,

    alm de pensar identidades, analisem tambm

    interesses, ou seja, questionem a dinmica de

    atores, agentes e sujeitos concretos, classes sociais

    e suas fraes na produo de escalas e espaos.

    A discusso de escalas deve ser tomada

    como decisivos planos analticos e nveis de

    abstrao que podem lograr dar sentido

    organizao da reproduo social da vida,

    tomando-se a escala enquanto categoria analtica e

    enquanto categoria da praxis poltica, cultivando

    uma perspectiva das variadas escalas espaciais em

    movimento. Sugere-se buscar o refinamento do

    arcabouo terico-metodolgico sobre decises e

    poder de comando dos sujeitos concretos, situados

    e envolvidos na construo social de determinado

    espao. Assevera-se que dever-se-ia discutir os

    centros de deciso e seus mecanismos de

    legitimao, assumindo a conflituosidade e a

    dinmica de ao das distintas faces das classes

    sociais, que elaboram escalas e narrativas

    escalares de forma dinmica, no confinadas, mas

    relacionais.

    As escalas espaciais no devem ser

    tomadas to somente em sua dimenso ordenada

    cartogrfica-analgica-mtrica, mecanicista e

    geometral, nem vistas como mera relao de

    proporcionalidade, dotadas de representao e

    comensurabilidade de medidas de tamanho e

    enquanto entidades fixas.

    Escalas so inerentemente inexatas e

    dinmicas. No podem ser tomadas enquanto

    unidades imutveis ou permanentes, pois so

    justamente inscritas e esculpidas em determinado

    espao e erguidas ou erigidas, material e

    simbolicamente, em processos, por natureza,

    sociais. Trata-se de pensar as escalas espaciais

    enquanto instncias e entidades em que a vida

    social organizada e reproduzida, e no em uma

    representao cartogrfica, afast-las das

    concepes restritas e estticas que as tomam

    como dados e interpret-las sob o prisma de sua

    natureza eminentemente relacional, contestvel,

    processual e contingente, passando a tom-las

    enquanto lcus e veculo in situ, atravs dos quais

    as relaes socioespaciais se estruturam e operam.

    Uma escala s pode ser definida e

    qualificada apenas em relao s outras. Parte das

    dinmicas e lgicas escalares, em geral em em

    particular, jaz justamente nos nexos e coerncias

    interescalares.

    Encontrar a escala adequada que defina

    determinado campo em que anlises possam ser

    realizadas, alianas possam ser construdas e

    estratgias de resoluo dos problemas detectados

    possam ser implementadas buscar, de forma

    perene, a escala de observao adequada para a

    elucidao e tomada na devida conta dos

    fenmenos sobre os quais se deseja intervir.

    Escala enquanto categoria analtica e

    escala enquanto categoria da praxis poltica no

    esto apartadas. Selecionar analiticamente a escala

    mais conveniente dos problemas observados

    faculta melhor diagnostic-los e possibilita sugerir

    coalizes de poder e decises estratgicas sobre

    como enfrent-los. O desafio (simultaneamente)

    cientfico e poltico , portanto, procurar definir o

    que e com que meios cada escala pode revelar,

    mobilizar, contestar, acionar, regular, comandar e

    controlar. A escala tambm demarca o campo das

    lutas sociais, d concretude a bandeiras, clivagens

    e orientaes de lutas e aes polticas, delimita e

    cria a ancoragem identitria, a partir da qual se

    logra erguer/estruturar um contencioso em relao

    a imposies (por vezes ameaadoras)

    provenientes de outras escalas, ou da mesma.

    Todos estes processos escalares so tensos

    e marcados por assimetrias e desigualdades.

    Explicita-se, neste contexto, a natureza desigual e

    combinada do desenvolvimento capitalista. A

    coexistncia, simultnea e dinmica, de espaos

    mais desenvolvidos e menos desenvolvidos o

    resultado do desenvolvimento geogrfico

    desigual. Mas tambm condio para o processo

    de continuada valorizao do capital (THEIS,

    2009, p. 249). O desenvolvimento desigual,

    envolvendo dominao e irreversibilidade de

    espaos diferenciais, impe hierarquias, relaes

    de fora assimetricamente constitudas e

    exercidas. Gravitaes, centralidades, isto ,

    polaridades esto, assim, diversamente

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    311

    distribudas no espao. H movimentos de atrao

    e repulso de estruturas com complexidade dspar,

    com potncia assimtrica e heterognea,

    configurando lgicas hierarquizadas. A discusso

    desses processos e foras desemboca na questo

    terminal do poder diferencial de capacidade de

    deciso, fruto de uma correlao de foras que

    est sintetizada na hegemonia. Como sntese, o

    poder de comando, de dominao de classe,

    exercido e legitimado tendo por base determinada

    equao poltica, que se configura em um arco de

    alianas, um pacto de poder, assentado em certa

    correlao de foras polticas, que d direo e

    domnio das condies sociais em determinado

    territrio.

    Em todas as escalas espaciais preciso

    tambm analisar os agentes no hegemnicos, a

    concretude de sua reproduo social, material e

    identitria, sua permanente produo de

    territorialidades e elaborao de temporalidades,

    prticas espaciais, experimentaes cotidianas em

    singulares espaos vividos. Portanto decisivo

    dimensionar a capacidade de as faces

    subalternas resistirem, reivindicarem e

    empreenderem lutas contra-hegemmicas que

    ampliem o exerccio da cidadania, requalificando

    recorrentemente sua fora contestatria,

    organizativa, insurgente, de resistncia e

    emancipatria.

    Neste contexto, os espaos nacionais no

    podem se configurar apenas enquanto plataformas

    de valorizao mercantil e financeira, atravs de

    formas de acumulao primitiva permanente e/ou

    por acumulao por despossesso (BRANDO,

    2010b). foroso enfrentar a espoliao urbano-

    regional (KOWARICK, 1981), isto , a

    somatria de extorses e dilapidaes que se

    realizam no territrio e constituem os processos

    urbano-regionais nos pases perifricos. Ou seja,

    enfrentar todas as manifestaes de espoliao

    territorial, buscando construir e aglutinar foras

    polticas e sociais para constituir a justia

    territorial e o direito ao espao social.

    Podem contribuir para essas disputas as

    anlises rigorosas das estratgias de acumulao,

    das pautas de valorizao e das agendas polticas

    dos projetos hegemnicos postos em cada pas,

    cidade ou regio, pesquisas hoje insuficientemente

    implementadas na rea dos estudos urbano-

    regionais.

  • BAHIA Anlise & Dados 21 (2) Carlos Brando

    312

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