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SUMÁRIO

EXECUTIVA NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM * ENEEnf *

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CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA 5ALGUMAS DÚVIDAS FREQÜENTES ... 6APRESENTADO O XXXI ENCONTRO NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM (ENEEn)

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PORQUE DISCUTIR EDUCAÇÃO E TRABALHO? 8OBJETIVOS DO XXXI ENEEN - CURITIBA: 9

TEXTOS PARA DISCUSSÃONEOLIBERALISMO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM SAÚDE

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O TRABALHO EM MARX 28CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO, IMPERIALISMO E MOVIMENTOS SOCIAIS

33

EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO HUMANA 44A POLÍTICA PARA O ENSINO SUPERIOR DO GOVERNO LULA: UMA ANÁLISE CRÍTICA

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REGIMENTO 79CARTA ABERTA CA´S E DA´S DE ENFERMAGEM DO BRASIL

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ESTATUTO DA EXECUTIVA NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM - ENEEnf

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REALIZAÇÃO 102

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EXECUTIVA NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM * ENEEnf *

“Ou os Estudantes se Identificam com o destino do seu povo, com ele sofrendo a mesma luta, ou se dissociam, e dessa forma se aliam àqueles que exploram o povo”. Florestan Fernandes

A Enfermagem hoje no Brasil representa o maior contingente de profissionais nos serviços de saúde. A mesma é uma profissão cujo cotidiano de trabalho é dividido tecnicamente, entre enfermeiros, técnicos e auxiliares. A divisão social do trabalho em Enfermagem é fato dado, sendo que esta distancia o trabalhador das reflexões acerca de suas ações (atos de enfermagem), torna o trabalho ainda mais tecnicista, fragmenta o cuidado e mercantiliza o ser humano e a saúde, tendo como conseqüência o distanciamento do trabalhador das questões políticas e filosóficas. É importante observar de que forma isso reflete na sociedade e de que forma o atual modelo de sociedade reflete na profissão.

O atual modelo de sociedade produz desigualdades, e isso não é defeito desse modelo, antes, é a maneira pela qual o mesmo se estabelece e se sustenta. As bases da sociedade capitalista neoliberal estão firmadas sobre a exploração do homem pelo homem, alienação do trabalho e do trabalhador.

Diante do atual modelo de sociedade e da atual situação da Enfermagem é preciso que o Movimento Estudantil se entenda e se reafirme enquanto movimento social e que pontue sua opção frente a este modo de organizar a sociedade vigente. Por isso afirmamos que disputamos hoje uma sociedade na qual o homem não seja alienado e explorado, onde seu trabalho seja sua maior riqueza no sentido de torná-lo sujeito da sua própria historia e capaz de mantê-lo dignamente, uma sociedade onde o homem seja o objetivo e não o lucro supremo.

O Movimento Estudantil de Enfermagem historicamente, através de seus espaços de inserção e em seus debates vem acumulando em torno dessa discussão, ao lado das estudantes e dos estudantes de diversas partes do país e dos movimentos sociais, que são parceiros na luta por uma outra sociedade, acreditando que um outro mundo é possível.

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Todo movimento social, toda entidade de classe deve nortear, basear suas reflexões, ações e participações naquilo em que acredita, nas suas bandeiras de luta.

SOCIEDADE – luta pela superação da sociedade de classes, superação da exploração do homem pelo homem e da alienação do trabalho, apontando para uma sociedade justa, igualitária e equânime;

EDUCAÇÂO – luta por uma universidade pública gratuita, laica, referenciada socialmente;

SAÚDE – defesa dos princípios do Sistema Único de Saúde e na conquista popular da saúde;

ENFERMAGEM – como prática social e construção de uma organização política da profissão, não coorporativa, e em função de conquista da emancipação do sujeito em seu processo de saúde.

FORMAÇÂO – luta por um processo pedagógico libertador que promova o estudante para uma prática comprometida socialmente.

Na busca da efetivação destas bandeiras a ENEEnf busca promover mudança de cultura e organicidade do MEEnf através da ativação e fortalecimento de processos formativos vinculados a outros movimentos sociais, entidades e instituições parceiras. A fim de proporcionar o protagonismo e a organização dos estudantes enquanto sujeitos coletivos conscientes de sua opção frente ao mundo, lutadoras e lutadores do povo.

E nesse contexto a ENEEnf realiza seus encontros e processos formativos. Anualmente a ENEEnf promove e organiza o Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem (ENEEn), momento do movimento estudantil de maior aglutinação dos estudantes de enfermagem do Brasil e maior fórum deliberativo.

A agenda da ENEEnf inclui em janeiro/ fevereiro, o Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem (CBEEn), que tem por objetivo realizar o planejamento estratégico anual do movimento estudantil de enfermagem, CA´s / DA´s e ENEEnf. Nos meses de Abril e Novembro, acontecem os Conselhos Nacionais de Entidades Estudantis de Enfermagem (CONEEEnf’s), voltados para CA´s e DA´s, visando formação política e deliberações do movimento estudantil de enfermagem. Outras atividades incluem, seminários e oficinas loco regionais.

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CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA

Quem participará do XXXI Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem (ENEEn) ?

Todos os estudantes de enfermagem!!! O ENEEn é o maior fórum deliberativo do movimento estudantil de enfermagem. Todos os estudantes, possuem direito de participação e voz, entretanto apenas estudantes comprovadamente de enfermagem e com no mínimo 75% de participação no Encontro possuem direito a voto. Assim como receberão certificado.

A Metodologia do Espaço

Acreditamos que a TRANSFORMAÇÃO SOCIAL, só acontecerá, quando mudarmos nossas práticas. Diante disso o XXXI ENEEn será organizado de maneira, que NÓS mesmos possamos realizar as atividades necessárias para nossa convivência. Haverá Mesas, GD´s, GT´s, Oficinas e Apresentações Culturais, onde NÓS somos os responsáveis. Assim como pela limpeza, organização e conservação do espaço físico. Para tal nos organizaremos em Rodas de Construção Coletiva.

As Rodas de Construção Coletiva são espaços de corresponsabilização, onde os componentes das rodas terão atividades a serem desenvolvidas ao longo do encontro. Os grupos passarão através de rodízio, por todas as atividades.

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Alvorada+ Café da

Manhã

BanheirosAlmoço

+Jantar

EspaçoMística

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ALGUMAS DÚVIDAS FREQÜENTES ...

ENEEnf (Executiva Nacional dos Estudantes de Enfermagem).

ENEEn (Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem). CBEEn (Congresso Brasileiro dos Estudantes de

Enfermagem). CONEEEnf (Conselho Nacional de Entidades Estudantis de

Enfermagem). Painel – O palestrante tem determinado tempo de fala, onde

faz a exposição de suas idéias. Mas não é aberto para falas. Mesa – Metodologia onde um palestrante fala durante um

determinado tempo, e após sua fala, abre-se o espaço para questionamentos e esclarecimentos do público.

GD (Grupo de Discurssão) – Divisão em pequenos grupos, onde existem facilitadores que fomentam a discussão. Todos são livres para fazer colocações a qualquer momento. É importante lembrar que o facilitador não é um palestrante.

Oficina – Semelhante aos GD´s, entretanto há algum tipo de construção, e ou exposição prática, em geral, existem expositores.

GT (Grupo de Trabalho) – Divisão em pequenos grupos, onde se busca encaminhar ações para serem deliberadas/pactuadas na plenária final.

Plenária Final – Momento onde os encaminhamentos do congresso serão deliberados por todo o coletivo presente. É importante lembrar, que deliberações são a partir de encaminhamentos do GT´s. Painel, Mesa e GD, não encaminham para futuras deliberações, são espaços de acúmulo e discussão.

APRESENTADO O XXXI ENCONTRO NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM (ENEEn)

Reunir os estudantes de Enfermagem não é tarefa fácil. O primeiro Congresso Internacional dos Estudantes de Enfermagem, foi realizado em Frankfurt, em 1970, onde chegou-se a conclusão que era necessário a organização dos estudantes de enfermagem em nível local, nacional e internacional, visando articularem-se para estudar e propor soluções, a principio, para demandas curriculares.

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A primeira iniciativa de organização estudantil ocorreu no ano de 1963, no Estado da Bahia, com o I CONGRESSO DE ESTUDANTES DE ENFERMAGEM, entretanto diante da conjuntura nacional e mundial, de forte repressão militar, ditaduras, esse movimento dos estudantes de enfermagem foi sufocado.

Em 1977, o país vivia a efervescência da sede de democratização. As primeiras movimentações para realização do encontro nacional de estudantes de enfermagem, ocorreram em 1976 durante o XXVIII Congresso Brasileiro de Enfermagem, realizado no Rio de Janeiro, ao ponto que uma mobilização de maior impacto, ocorreu durante a IV Semana de Saúde Comunitária, realizada em Londrina no ano de 1977 durante a Semana Santa.

O I ENCONTRO NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM foi realizado 5 a 9 de julho de 1977, na Escola de Enfermagem da USP. Contando com a participação de 9 escolas de diversos estados e 230 estudantes de enfermagem. No qual as temáticas abordadas eram referentes ao processo de enfermagem, currículo e habilitações, enfermagem em saúde publica, sindicatos de enfermagem, apresentação de trabalhos científicos e ainda, a necessidade de uma organização nacional dos estudantes de enfermagem. Nesse contexto foi constituída a comissão executiva nacional, composta por 2 delegados de cada escola e marcaram para reunir-se e organizarem o II ENEEn, este foi o embrião da Executiva Nacional dos Estudantes de Enfermagem.

A partir de então durante esses 31 anos seguintes, houve grandes transformações na economia, conseqüentemente na política e na sociedade. Diante dessas transformações foram necessárias mudanças na organização, estruturais, metodológicas e ideológicas, que configuram uma mudança de cultura e organicidade do movimento.

Para que essa transformação social aconteça o movimento estudantil de enfermagem, vem utilizando a estratégia da formação política, para o desenvolvimento do pensamento critico-reflexivo nos estudantes que desencadeiem processos libertadores para que esses possam ser sujeitos transformadores da realidade enquanto lutadores do povo.

Nessa relação dialética entre o fazer e o pensar é que vamos construindo novos sujeitos, novas consciências, novos conhecimentos, novos métodos. Enfim, é o salto de qualidade, é o processo de acúmulo de forças, que falamos e vislumbramos nas ações e lutas cotidianas. E nessa conjuntura nasce o XXXI Encontro Nacional dos

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Estudantes de Enfermagem. Que no ano de 2008 promete trazer a Curitiba (Bocaiúva do Sul), boa parte do movimento estudantil de enfermagem, para discutir e propor sobre temáticas como educação, saúde, sociedade, política e economia.

PORQUE DISCUTIR EDUCAÇÃO E TRABALHO?

O nosso XXXI ENEEn– Curitiba terá como eixo central a discussão sobre educação e trabalho. Acreditamos que discutir educação torna-se estratégico, pois lançamos nossos olhares para análise e compreensão da sociedade a partir dos elementos que por nós é apreendido e vivenciado em nosso processo de formação acadêmica. É fundamental, a defesa da Educação Brasileira, pública, gratuita e de qualidade, e o tripé fundamental da Universidade: O Ensino, Pesquisa e a Extensão. Mas para tal, precisamos compreender o funcionamento do sistema capitalista, baseada na sociedade de classes, na exploração do homem pelo homem e na alienação do trabalho, que aponta para a manutenção de uma sociedade injusta e desigual. Durante nossas discussões pretendemos apontar nossa visão para uma educação referenciada socialmente, precisamos travar a luta pela formação profissional, a partir de processos pedagógicos libertadores, que permitam a formação de trabalhadores comprometimentos socialmente.O ME tem na Educação seu palco principal de intervenção e, a partir da educação entendemos que diferentes projetos e concepções têm relação direta com a disputa de projetos de Estado e de Sociedade.Nos últimos anos a Educação pública vem sofrendo ataques do capital através de governos que, em dissonância com a vontade popular, implementa diversas contra reformas, destruindo assim a já precarizada, Universidade Publica.Essa precarização se intensificou na Ditadura Militar. Desde então o ME se coloca veemente em defesa da Universidade. Ao longo dos anos a destruição da Universidade Pública se intensificou, em consonância com o projeto Neoliberal. O governo Lula deu continuidade a essa contra reforma, implementa desde no inicio da década de 90, e que vem no bojo do projeto neoliberal globalizado, com minimização do Estado, principalmente nas áreas de prestação de serviços sociais como a educação.Como entendemos que a Educação é moldada para atender as demandas do mundo do trabalho cada dia mais precarizado e

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desregulamentado, acreditamos que seja necessário defender um mundo do trabalho regulamentado, com garantia dos direitos sociais já conquistados e aglutinarmos forças para ampliar esses direitos.Dessa maneira torna-se essencial para os estudantes de enfermagem a construção de uma conscientização crítica sobre o que é o processo de educação ao qual a Universidade Pública brasileira encontra-se colocada e como se da a relação desse desgaste e precarização da Educação com o processo de Trabalho.

OBJETIVOS DO XXXI ENEEN - CURITIBA:

GERAIS

Confrontar os estudantes de enfermagem com a REALIDADE DO POVO BRASILEIRO e trabalharmos as mudanças necessárias, a partir do protagonismos dos sujeitos;

Entendimento da reestruturação no mundo do trabalho e sua influencia no processo de Educação;

ESPECÍFICOS 1. Fomentar e fortalecer o movimento estudantil de enfermagem

no Paraná; 2. Integrar os discentes de enfermagem das universidades

brasileiras, a fim de fortalecer o movimento estudantil de enfermagem no Brasil;

3. Fornecer subsídio teórico para ser aplicado a pratica cotidiana do Movimento Estudantil e dos estudantes de Enfermagem;

4. Aprofundar as discussões sobre a realidade brasileira e conjuntura, com ênfase às questões relacionadas à educação e ao trabalho;

5. Deliberar ações para o avanço nas lutas junto aos trabalhadores e em relação à educação (Fundações de Apoio, REUNI, mercantilização do ensino etc.)

6. Despertar nos estudantes de enfermagem a consciência cidadã acerca de sua inserção e atuação política na sociedade;

7. Trabalhar as bases de uma enfermagem socialmente referenciada, no povo brasileiro;

8. Conquistar militantes para a luta do povo;9. Construir diretrizes e deliberações estudantis sobre as questões

pertinentes a atuação política da enfermagem;

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10. Escolher as sedes dos próximos Encontros da ENEEnf (91o. CONEEEnf, IV CBEEn, 92o. CONEEEnf e XXXII ENEEn);

11. Eleição da Gestão 2008/2009 da Executiva Nacional dos Estudantes de Enfermagem.

TEXTOS PARA DISCUSSÃO

NEOLIBERALISMO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM SAÚDE

Júlio César França Lima

Pesquisador LATEPS/EPSJV/FIOCRUZ

A referência para a construção desse texto foi o trabalho em saúde e o recorte escolhido envolve duas temáticas: a difusão e consolidação do neoliberalismo no Brasil e a formação profissional em saúde. Ao discutir essas temáticas procuro responder algumas questões, entre as quais: quais as mudanças decorrentes do receituário neoliberal no Sistema Único de Saúde (SUS), tendo em vista particularmente a relação público-privado?; e qual formação profissional para qual SUS?

Em função dessas questões, inicialmente retomo o conceito de saúde tal qual foi sendo construído desde o final da década de 1970 e que chega aos anos 1980, apontando para a construção de uma proposta de política de saúde de cunho universalista, igualitária e com controle social. Depois, procuro mapear os obstáculos que o SUS teve de enfrentar para sua operacionalização, na década de 1990, e as mudanças que nesse período vão sendo operadas na concepção de educação profissional em saúde.

Anos 1980: formação e participação no SUS democrático

Para iniciar essa reflexão, considero que a melhor forma de fazê-la é revisitar o conceito de saúde a partir de uma entrevista que Sergio

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Arouca1 concedeu à revista Radis da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em outubro de 2002, e publicada posteriormente na revista Trabalho, Educação e Saúde no ano seguinte (Arouca, 2003). Arouca, intelectual e militante, foi uma das principais lideranças do que se convencionou chamar de movimento da reforma sanitária brasileira, na década de 1980, que protagonizou vitórias importantes, entre as quais, a inscrição na Constituição Federal de 1988 de que “a saúde é um direito de todos e dever do Estado”, isto é, um bem público, de responsabilidade estatal e universal. Vitória importante, conquistada com a participação de um amplo leque de forças sociais no contexto da reconstrução democrática do país, que vai sendo reconfigurada nos anos de 1990.

Nessa entrevista, Arouca declara que a sua luta naquele momento, em 2002, era pela retomada dos princípios da reforma sanitária, pois na sua avaliação “a reforma acabou se resumindo à criação do Sistema Único de Saúde (SUS)”. Paradoxalmente, ao operacionalizar o sistema os dirigentes dos diversos níveis de governo abandonaram seus princípios, reduzindo a reforma ao SUS, quando na sua origem, nos anos 1980, está imbricada com a perspectiva de reforma social, isto é, com a construção de um projeto de sociedade democrática de massas, que não se reduzia ao setor saúde como aponta Fontes (2006).

Além isso, com esse projeto de reforma que ia além da reforma setorial, o movimento não podia deixar de exigir também mudanças no conteúdo e na forma de pensar e fazer saúde. Isso vai se expressar na ampliação do conceito de saúde e na necessidade de reestruturação do processo de trabalho em saúde, a partir da redefinição do seu modelo assistencial. Por outro lado, essas mudanças passam a exigir também um novo compromisso ético-político dos trabalhadores de saúde2 pautado fundamentalmente na questão da construção da democracia e na defesa da dignidade humana, assim como mudanças na materialidade das práticas e da formação em saúde.

1 Sergio Arouca foi presidente da Fundação Oswaldo Cruz no período 1985-1988. Na sua gestão foi criada a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, em 1985, onde esse autor trabalha. Foi deputado federal eleito em dois mandatos consecutivos e candidato a vice-presidência da República pelo Partido Comunista Brasileiro. Faleceu em 2003.

2 Para uma discussão sobre os “Fundamentos Ético-Políticos da Educação no Brasil de Hoje”, consultar Severino (2006).

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Para o pensamento marxista na saúde, que se desenvolve na segunda metade dos anos 1970 e que nos anos 1980 vai influenciar o movimento da reforma sanitária, a saúde é definida como o resultado das relações sociais que os homens estabelecem em sociedade e destes com a natureza, no processo de produção de sua existência. E, particularmente, como produto das relações que os homens estabelecem com as formas de organização social da produção material, que permitem ou não maior qualidade de vida, acesso à alimentação saudável, à moradia, à educação, ao trabalho, ao lazer, a serviços de saúde, entre outros. Essa concepção de saúde define um processo no qual a própria doença não pode mais ser pensada ou reduzida ao corpo biológico. Exige-se considerar também o corpo socialmente investido, isto é, verificar como o corpo do homem se dispõe em sociedade antes de tudo como agente de trabalho, pelo fato de o trabalho definir o sentido e o lugar dos indivíduos na sociedade. Quem antecipa essas discussões na década de 1970, de forma muito clara, é Cecília Donnangelo no seu livro Saúde e Sociedade (Donnangelo e Pereira, 1976). Em sua análise, a autora discute o quanto o corpo, enquanto objeto do trabalho em saúde, só se realiza, mesmo como estrutura anatômica e fisiológica, por intermédio das qualificações ou determinações que adquire no plano da existência material e social.

Esta forma de entender a saúde está na base da perspectiva de reforma social, ou, da necessidade de uma reforma que não fosse apenas setorial, da mesma forma que do boom de estudos de epidemiologia social que se verifica no período. Agrega-se a isto o destaque que passa a ser dado à dimensão de historicidade das práticas de saúde, isto é, só podiam ser compreendidas no contexto histórico de determinada sociedade e num dado momento do seu desenvolvimento.

Do ponto de vista da prática educativa ou da formação profissional em saúde, essa nova concepção de saúde vai exigir uma nova concepção de educação, segundo a qual os trabalhadores deveriam ser educados não apenas para compreender o seu papel como membro de uma equipe de saúde, mas principalmente para participar da gestão do sistema, intervir na sua organização e atuar no seu controle. Quer dizer, o par ‘formação-participação’ é conseqüência direta do lema central do movimento da reforma sanitária, sintetizada na idéia Saúde e Democracia. A formação profissional é entendida aí como uma condição sine qua non para a

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própria participação, no sentido de qualificar a intervenção dos trabalhadores na definição e organização do sistema de saúde, aliando com isso, a dimensão técnica e a dimensão política na formação dos futuros dirigentes do sistema.

Essa questão está na origem das discussões então travadas em torno da concepção politécnica de ensino no âmbito do setor saúde e um dos motivos que, ao nosso ver, pode ter influenciado a definição constitucional inscrita no artigo 18, da Constituição Federal de 1988, de atribuir ao SUS a função de ordenar a formação de recursos humanos em saúde, que até aquele momento era responsabilidade exclusiva do Ministério da Educação. Essa concepção de ensino, tributária da tradição socialista, tem por objetivo permitir o domínio dos fundamentos das diversas técnicas utilizadas na produção, e não o mero adestramento em técnicas produtivas. “A noção de politecnia diz respeito ao domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas que caracterizam o processo de trabalho produtivo moderno. Diz respeito aos fundamentos das diferentes modalidades de trabalho” (Saviani, 1987, p. 17).

Essas idéias também estão na base da defesa que Arouca vai fazer na citada entrevista, de que é preciso discutir Saúde não como uma política do Ministério da Saúde, mas como uma função permanente do Estado. Daí aponta para o papel de sensor crítico que o setor deve exercer sobre as políticas econômicas e a liderança que deve ter no desenvolvimento de práticas que, no seu entendimento, ampliam a Reforma Sanitária, não a restringindo a uma reforma setorial mas que no limite tenciona e exige uma reforma societária.

O conceito fundamental que Arouca vai enfatizar nessa entrevista é o de intersetorialidade, uma das principais diretrizes do SUS. Para ele, essa noção deve servir de base para o desenvolvimento de políticas públicas e práticas intersetoriais ou para o desenvolvimento local, integral e sustentável. Aponta que para a realização desse projeto intersetorial é necessário o estabelecimento de um governo que não seja um somatório de ministérios que disputam entre si os parcos recursos da área social, como indicam Paulani (2006) e Pochmann (2006), mas que tenha um projeto societário que permita a implementação de práticas intersetoriais.

Portanto, na década de 1980, são formuladas referências fundamentais para a construção-operacionalização do SUS, num

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contexto de ampliação dos espaços democráticos e de conquista de direitos, tanto no âmbito da saúde, como no da educação.

Anos 1990: a reforma do Estado e a universalidade do SUS

Entretanto, o SUS terá de enfrentar, na década de 1990, uma outra realidade. Podemos enumerar, com Arouca, as diversas conquistas legais que o setor saúde inscreveu na Constituição Federal de 1988, entre as quais, o princípio de universalidade, a partir do qual todo brasileiro tem direito à saúde; o dever do Estado em promover a saúde; a aprovação, em 1990, da Lei Orgânica da Saúde3; a consolidação das Conferências Nacionais de Saúde como fórum privilegiado de discussões e; a formalização dos Conselhos de Saúde com caráter deliberativo e representação de usuários, a partir da Lei nº 8.142/90. Essas vitórias foram sendo viabilizadas pelo próprio movimento sanitário, seja no interior do Estado, seja fora dele, nas instituições como a Fiocruz e em outros espaços institucionais, como as Secretarias de Saúde. Temos ainda a presença do movimento municipalista, que se torna cada vez mais forte junto com uma série de atores e movimentos sociais.

Em que pese a presença dessas forças sociais e suas conquistas, um número crescente de estudos começam a apontar a partir da segunda metade dos anos 1990, para duas questões: a privatização e a focalização no campo da saúde, que o SUS passa a enfrentar com o governo Collor. As análises apontam que a privatização na área ocorre de duas maneiras não excludentes mas complementares. Uma que, inspirado em Arouca, denomino de ‘universalização do privado’ e a segunda denominada por Correia (2000), de ‘universalização excludente’.

A primeira forma é interna ao sistema, pois decorre da própria lógica do modelo assistencial do SUS, que privilegia a atenção hospitalar e que, na ausência do Estado nos diversos municípios brasileiros, terceiriza a assistência principalmente com a contratação do setor privado filantrópico, mas não só, e a de serviços de diagnóstico e terapia, para executar a atenção à saúde da população.

3 A Lei 8.080/90 disciplina a descentralização político-administrativa do SUS, dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços. A Lei 8.142/90 dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde.

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Pela própria brecha constitucional, que considera o setor privado complementar ao setor público, este vai se consolidando e mantendo-se como o principal prestador da atenção hospitalar no país, reeditando a velha política do extinto Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social do ex-Ministério da Previdência e Assistência Social (INAMPS/MPAS), na década de 1970, tão combatida pelo movimento da reforma sanitária, e incorporado ao Ministério da Saúde, em 1993. Não é por acaso que Arouca declara, na entrevista, que o Ministério da Saúde sofreu uma ‘inampização’, isto é, transformou-se em um grande comprador de serviços médicos, mantendo o setor privado da saúde como um grande mercado para a indústria de medicamentos e equipamentos médicos. Como diria Donnagello (1976), ampliando e mantendo a mercantilização da saúde, ou, realizando a mais-valia produzida em diversos setores industriais dentro do setor saúde. Por isso, Arouca é contundente quando diz que “o SUS como modelo assistencial está falido, não resolve nenhum problema da população” (2003, p.358).

Os dados relativos ao ano de 2002, não deixam dúvida quanto ao predomínio do setor privado na assistência hospitalar. De 7.397 hospitais existentes no Brasil, 65% estão sob o controle do setor privado. Mesmo considerando apenas os hospitais próprios e aqueles conveniados com o SUS, isto é, 5.933 hospitais, 58% são privados, e de 439.577 leitos hospitalares, 63% são leitos privados. O setor público predomina no âmbito da assistência ambulatorial ou na oferta da rede básica de serviços, que não é um setor lucrativo para a iniciativa privada. Assim, o que se verifica, ao longo do tempo, é de um lado, a ampliação da atenção básica, por meio do Programa Saúde da Família (PSF), financiado por intermédio do Piso da Atenção Básica (PAB), com base em um valor per capita nacional, que é multiplicado pela população da área, para custeio dos procedimentos - parte fixa, e por incentivos financeiros para implantação de vários programas, como Agente Comunitário de Saúde, Vigilância Sanitária etc. -parte variável. De outro lado, o financiamento da atenção hospitalar, de média e alta complexidade, sob a forma tradicional de procedimentos produzidos, um mecanismo que sempre foi denunciado como um espaço privilegiado de mercantilização (Ugá & Marques, 2005).

Nessa lógica mercantil, as instituições públicas cumprem o papel de atender às famílias pobres com alto risco de adoecimento e as empresas médicas ou agências seguradoras se tornam responsáveis

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pela assistência médica ou clínica e pelos procedimentos de alta complexidade, de maior lucratividade. Esta é uma das principais críticas que se faz à forma de financiamento das ações de saúde implantada pelo Ministério da Saúde através da Norma Operacional Básica de 1996 (NOB/96), que continua em vigor. Isto porque, de um lado, induziu fundamentalmente a oferta de uma “cesta básica” pelos municípios, através de programas que podem ser considerados focais como o Programa de Saúde da Família e de Agentes Comunitários de Saúde (PSF/ PACS), enquanto na outra ponta, a mercantilização, por intermédio do financiamento da assistência médica (Bueno & Merhy, 1997).

Esse formato parece configurar aquilo que Laurell (1994), denomina de ‘privatização seletiva’ em trabalho onde analisa a proposta do Banco Mundial para o setor saúde, em 1993. Para a autora, esta seria uma característica distintiva do processo de privatização em saúde nos países latino-americanos, no qual o setor público se torna responsável pela oferta de um pacote de serviços essenciais4, reservando ao setor privado os setores mais rentáveis da assistência clínica, considerando a relação custo/benefício.

A essa fórmula agrega-se ainda uma nova faceta, que é a introdução da forma neoliberal de gestão dos serviços públicos de saúde com a transformação dos hospitais públicos e outros serviços de saúde em agências privadas denominadas ‘organizações sociais’. Em nome da modernização gerencial, entrega-se nas mãos de agentes privados, como as cooperativas médicas, os serviços de saúde, que são financiadas com recursos públicos. O exemplo mais dramático dessa política de corte neoliberal ocorreu na gestão Paulo Maluf, com a implantação do Plano de Assistência à Saúde (PAS), na segunda metade dos anos 1990 (Elias, 1999), em que toda a rede pública do município de São Paulo foi entregue às cooperativas de trabalho e os funcionários se tornaram cooperativados. Assim, ao mesmo tempo, elimina-se a figura do servidor público com a flexibilização e a 4 As responsabilidades do Estado na área de saúde, de acordo com o Banco Mundial (1993), seria de produzir bens públicos em sentido restrito, ou seja, bens que se baseiam em critérios de não exclusividade – todos se beneficiam das medidas, tais como controle de vetores – e de não rivalidade – o seu uso não exclui o uso de outra pessoa, como certas informações -, o que para Laurell, esvazia a categoria de público de todo conteúdo histórico, valorativo e ético. Além disso, se responsabilizar por ações de grande externalidade como as campanhas de vacinação, a regulação e informação para contra-restar as imperfeições do mercado, e ações com alto rendimento de custo-benefício para aliviar a pobreza crítica, que iram conformar o pacote de serviços essenciais.

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desregulamentação das relações de trabalho, e compromete o serviço que antes era público com o faturamento, com a otimização da relação custo-benefício, com a quantidade e não com a qualidade da atenção prestada à população. Além disso, ainda temos uma forma de privatização que se dá no interior do próprio setor público, que é a terceirização de determinados setores, como os serviços de diagnóstico e terapia.

O segundo processo de privatização é a ‘universalização excludente’, que é conseqüência direta do subfinanciamento do SUS. As restrições financeiras que ao longo da década de 1990 foram reduzindo drasticamente o gasto público per capita em saúde no Brasil tiveram como conseqüência o sucateamento, a precarização crescente da rede assistencial pública existente e a baixa remuneração dos trabalhadores de saúde, o que resultou na expulsão – por isso excludente – de usuários potenciais do SUS.

Essa política de arrocho financeiro exerceu uma dupla função. A primeira é ideológica. A crise do setor saúde não é explicada como conseqüência do encolhimento do tamanho do Estado, da redução dos gastos sociais, da redução do gasto per capita em saúde, ou, como trata Leda Paulani, da expoliação dos recursos públicos. Muito ao contrário, a crise é explicada como decorrência da ineficiência do Estado, que gasta mal os poucos recursos que tem para aplicar na área social e em conseqüência da corrupção no interior do setor público. Então, nesses termos, o melhor a fazer é privatizar, entregando à iniciativa privada a administração da coisa pública, ao mesmo tempo em que transforma a racionalidade administrativa em elemento fundamental para sair da crise. Isso vai justificar a mudança da natureza jurídica dos serviços públicos, e contribuir para o desenvolvimento e expansão do mercado privado de planos e seguros de saúde.

Essa propaganda ideológica, que contou com a colaboração dos meios de comunicação de massa, diminuiu fortemente a adesão da população ao SUS e assegurou um patamar de demanda para os seguros privados de saúde, que explodiram durante os anos de 1990. E isto ocorreu porque o discurso ideológico combina-se com uma materialidade, que se expressa no fato da população chegar aos hospitais e não encontrar bons serviços, só precariedade e dificuldade de acesso: ausência de profissionais, filas intermináveis, falta de materiais e equipamentos, mal atendimento, agenda lotada etc. Uma

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situação que acaba produzindo uma sensação de que o ‘serviço público é ruim mesmo’. É um processo sutil e importante, que paulatinamente vai mudando o sentido da saúde. De bem público de responsabilidade estatal converte-se em bem privado ou bem público não estatal. A saúde deixa de ter um caráter de direito universal de cujo cumprimento o Estado é responsável, para converter-se em um bem de mercado, que os indivíduos devem adquirir (Iriart et al, 2000).

Agrega-se a isso o fato de que desde a década de 1980 os estudos indicam que a demanda por serviço supletivo de saúde já é um componente implícito das negociações entre capital e trabalho. Essa demanda por assistência médica diferenciada, por formas de seguro e serviços próprios nas empresas, torna-se um item cada vez mais forte na agenda de negociação coletiva dos trabalhadores mais organizados, o que vai fragilizar ainda mais o modelo assistencial público e universal e fortalecer as diferenciações e as segmentações no acesso aos serviços de saúde, conforme o tipo de inserção no mercado de trabalho.

A segunda função é econômica, pela necessidade de o capital controlar e colocar os grandes excedentes de capital nas áreas de produção e serviços que antes estavam nas mãos dos Estados, configurando o desenvolvimento do que Armando Boito Jr. (1999) vai denominar de uma ‘burguesia dos serviços’. Segundo alguns estudos apontam, a agenda do Banco Mundial para saúde vai se inscrever exatamente nessa ofensiva de recuperação de serviços sociais para as empresas privadas, propondo a remercantilização de tais serviços. Isso constitui um dos móveis de crítica que atualmente se faz ao Estado do Bem-Estar Social em todo o mundo, motivado pelo interesse em controlar o fundo público destinado ao setor saúde. Há dados que demonstram a importância da participação dos gastos em saúde no PIB nacional dos países capitalistas centrais. Desse ponto de vista, o próprio princípio de universalidade que se inscreveu na Constituição brasileira de 1988 é utilizado como justificativa para se ampliar a cobertura dos planos e seguros privados de saúde, já que o investimento público no país é precário.

Os dados sobre a composição do gasto em saúde no Brasil referente a 2003, retirados do estudo de Ugá & Marques (2005) ajudam a exemplificar essa questão. Elas demonstram que naquele ano o gasto público total com saúde foi da ordem de 42%, enquanto o gasto privado foi de 58%. Dos gastos privados, 20% equivalem aos

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gastos com planos e seguros de saúde e 38% ao gasto das famílias com medicamentos. Para as autoras, esse padrão de financiamento da saúde no Brasil se aproxima muito mais do modelo liberal de tipo americano, em que o gasto público é equivalente a 44%, um pouco acima do Brasil, do que da estrutura de gasto dos sistemas nacionais de saúde de cunho welfariano, de acesso universal e integral, que inspirou o movimento da reforma sanitária brasileira e que estava na base do projeto de sociedade que se discutia nos anos 1980. No Reino Unido, na Dinamarca e na Suécia, o gasto público com saúde é, respectivamente, 97%, 84% e 78%, em sua maioria, financiados pelos impostos gerais.

O que se percebe é que à medida que se criaram as condições para a inclusão das camadas populares antes excluídas do sistema previdenciário, também se criaram as condições para que os trabalhadores melhor remunerados fossem expulsos de tal sistema e do SUS, o que obrigou-os a comprar os serviços do setor privado, incrementando, assim, a mercantilização da saúde e da previdência. Sobre esse último aspecto, Paulani (2006) diz que a imposição pelo Estado brasileiro de tetos de valor reduzido para os benefícios, primeiro para os trabalhadores do setor privado no governo Fernando Henrique Cardoso, depois para os trabalhadores do setor público no governo Lula da Silva, abriu imediatamente à acumulação privada todo o imenso território da previdência, sendo que o último governo ofertou-lhe o presente mais valioso, os servidores públicos, de salário médio mais elevado e praticamente sem risco de desemprego.

Para caracterizar o crescimento vertiginoso dos planos de saúde, recorro aqui a dois estudos. O primeiro de Pires (1998), aponta que, em 1988, dez milhões de pessoas, cerca de 10% da população na época, tinha plano de saúde e que esses planos representavam uma capacidade instalada de trezentas empresas. Em 1998, um levantamento do IPEA (apud: Bodstein e Souza, 2003), informa que o setor privado autônomo – esse setor privado integra seguradoras de saúde, cooperativas médicas e empresas de medicina de grupo – acolhia, naquele ano, mais de mil empresas, movimentava cerca de 14 milhões de dólares por ano, o equivalente a 2.6% do PIB, e cobria aproximadamente 27% da população do país. Em 1996, segundo o estudo de Pires (1998), o faturamento das empresas de plano de saúde era em torno de 10 bilhões de reais, maior do que o de grandes empresas como a Volkswagen e a Ford juntas ou o dobro do faturamento da IBM. Face a esse crescimento vigoroso dos planos e

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seguros de saúde no Brasil, a questão central para o SUS se tornou a capacidade de regular esse mercado pelo Estado e sobre os critérios em que se dá a articulação público-privado na prestação de cuidados médicos, cujo marco foi a aprovação da Lei nº 9.656/1998. O debate gira em torno do questionamento sobre quanto de autonomia o mercado privado de saúde deve manter em relação ao Estado e não exatamente sobre a possibilidade de o sistema público de saúde prescindir da colaboração do setor privado (Bodstein e Souza, 2003).

Portanto, a proposta do SUS, construída sob a égide dos princípios de universalidade, equidade, integralidade, descentralização e participação social, confronta-se ao longo dos anos 1990, por um lado, com o desfinanciamento, conseqüente ao ajuste das finanças públicas para a geração do superávit fiscal, o que acaba por subordinar, como refere Pochmann (2006), as políticas sociais e no nosso caso, a política de saúde, à economia, ganhando relevo as medidas de caráter compensatório e deixando em segundo plano o sistema de proteção social universal. Por outro lado, o SUS também vai se confrontar com a estagnação social de grandes contingentes populacionais, expressa no aumento da concentração de renda e a persistência das desigualdades sociais.

O impacto do receituário neoliberal incrementado pela associação da burguesia nacional com a internacional e a conseqüente superexploração do trabalho, como destacam Cardoso (2006) e Paulani (2006), sobre a saúde da população, pode ser verificado em dois exemplos muito perversos. Um muito visível para todos e outro absolutamente invisível aos nossos olhos. O elemento visível é a violência urbana, que presenciamos a todo o momento, no nosso cotidiano, e que é um fenômeno intimamente associado ao quadro de desigualdades que se instalou no país – não está associado à questão da pobreza, só isso não explica (Noronha et al, 2005). No ano 2000, só para termos uma pálida idéia, as causas externas, que incluem homicídios e agressões, foram a segunda causa de morte no país, quase empatadas com as neoplasias, configurando a violência como um grave problema de saúde pública, em todas as regiões do pais. Ou seja, convivemos com doenças e/ou causas de morte de um lado, que são semelhantes ao quadro epidemiológico de sociedades capitalistas avançadas, como câncer, problemas de doenças do aparelho circulatório etc., e de outro lado, com doenças e/ou causas de morte que têm a ver com a desigualdade social.

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O outro exemplo, invisível para a sociedade mas que está associado à desigualdade e à deteriorização das condições de moradia e alimentação nos grandes centros urbanos, principalmente Rio de Janeiro e São Paulo, é o recrudescimento dos casos de tuberculose, principalmente a partir de 1995. São casos que têm ocorrido, principalmente, na faixa etária de 20 a 59 anos, que coincide com o período de vida de maior atividade produtiva dos homens e que, ao contrário do que se acreditava, apenas um quarto deles tem associação com a AIDS.

Nesse quadro de agravamento das questões sociais, de sonegação de condições objetivas mínimas para a existência humana, o que pode prevalecer é aquilo que Severino (2006) denomina de niilismo axiológico. Isto é, de esvaziamento dos valores, de fim das utopias, da esperança de um futuro melhor, da incapacidade de construir projetos, predominando como únicos critérios o receituário neoliberal da eficiência e produtividade, veiculados nos anos 1990 pelas agencias financeiras internacionais, nomeadamente o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Segundo o estudo de Correia (2000), esse último organismo internacional propõe uma agenda da saúde aos países por ele subsidiado agrupada em três pontos: 1º: criar um ambiente propício para que as famílias melhorem suas condições de saúde; 2º: tornar mais criterioso o investimento público em saúde; 3º: facilitar a participação do setor privado. Pelos dados apresentados acima, portanto, a análise leva a concluir que esses três pontos são viabilizados pela oferta de uma cesta básica, pelos municípios, às famílias pobres com maior risco de adoecimento, através do Programa Saúde da Família (PSF); pela racionalidade gerencial, defendida como uma das principais alternativas para sair da crise e exacerbada durante a gestão de José Serra no Ministério da Saúde, que Arouca (2003) denomina de fúria regulatória; e, por último, pela mercantilização da atenção hospitalar de média e alta complexidade, através da universalização do privado e da universalização excludente.

Entretanto, parece não haver consenso dentro do setor saúde sobre o caráter focal ou não da expansão da atenção básica, que têm como base o Programa Saúde da Família (PSF). Há uma tensão na relação focalização x universalização, o que leva algumas forças a disputar dentro do Estado a transformação dessa proposta em estratégia de implantação da universalização da saúde e, nesse sentido, como um requisito da universalidade ou forma de reorganizar o modelo assistencial. Para Arouca, por exemplo, o PSF pode ser visto de duas

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maneiras: como um programa paralelo, sem aderência ou organicidade ao SUS e, desse ponto de vista, focal, ou ser um modelo reestruturante do sistema de saúde, apoiado no conceito de intersetorialidade.

Formação Profissional em Saúde: concepções em disputa

Diante desse modelo de saúde, formalmente universal, mas que, ao contrário de universalizar a atenção pública, foi universalizando a atenção privada por meio do setor público; expulsando clientela potencial do SUS para os seguros privados, que acabam pagando duas vezes por um direito que o Estado tem o dever constitucional de conferir; e que tende a focalizar suas ações nos destituídos de renda através do SUS coletivo, como refere Bahia (2005), qual a educação profissional em saúde para qual SUS?

Antes de avançarmos, é importante situarmos a magnitude do “mercado educativo” em saúde, que é outro filão de mercantilização que se expande pelo Brasil afora. Segundo levantamento que realizamos no Censo da Educação Profissional de 2002, temos, no Brasil, 995 estabelecimentos de ensino que oferecem 1.473 cursos de educação profissional em saúde. Esses estabelecimentos e cursos, em sua maioria, estão localizados na região Sudeste, certamente porque aí também se concentra o mercado de trabalho em saúde, configurando uma importante desigualdade regional na distribuição da formação profissional em saúde no país. Dos cursos oferecidos, 81% são da iniciativa privada, apontando para o caráter eminentemente privado da formação em todas as regiões brasileiras. Os principais cursos oferecidos são de auxiliares e técnicos de enfermagem (56%). Dos alunos matriculados em todos os cursos, 63% freqüentam cursos noturnos, o que pode estar indicando que, em sua maioria, são alunos trabalhadores que não têm outra alternativa de acesso à educação profissional em saúde, senão após o expediente de trabalho (Lima et al, 2004).

Não conhecemos nenhum trabalho ou resultado de pesquisa que indique a qualidade desses cursos, o projeto pedagógico, a concepção de formação e de saúde etc. Mas o predomínio do setor privado de ensino e a precária qualidade dos cursos oferecidos, na década de 1980, particularmente na área de enfermagem, aliado ao grande contingente de trabalhadores sem formação atuando no setor público e

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à necessidade de expansão de cobertura do SUS decorrente do processo de municipalização da saúde, estão na base da organização e abertura das escolas técnicas do SUS, a partir de 1980, com o Projeto Larga Escala.

De fato, é a partir dessa iniciativa que o Estado assume progressivamente a responsabilidade pela educação profissional em saúde no país. Antes disso, a prática dominante dentro do setor público era o ‘aprender-fazendo’ na prática cotidiana e/ou por meio de treinamentos organizados por núcleos de formação e, depois, por meio de escolas de enfermagem dentro dos próprios hospitais – cada hospital tinha a sua escola para treinar/formar os seus trabalhadores.

Entretanto, com a ampliação da concepção de saúde realizada pela reforma sanitária e com a complexidade decorrente dessa ampliação, aliado ao progressivo processo de descentralização e municipalização da saúde, que se acelera nos anos 1990, isso não era mais possível. Já não bastava a experiência e o treinamento, era necessário organizar escolas técnicas de saúde para a formação e ampliação da consciência sanitária dos trabalhadores e dos futuros profissionais de saúde sobre os princípios da reforma e do projeto societário que ela enseja. Eles deviam ser educados não apenas para compreender o seu papel individual como membro da equipe de saúde, mas, principalmente, atuar coletivamente na gestão do sistema, na sua organização e controle. Portanto, uma perspectiva democrática, que associa formação e participação, encampada pelo Projeto Larga Escala, por meio de sua proposta de integração ensino-serviço. Um dos pressupostos dessa concepção pedagógica é a necessidade de uma ‘relação permanente’ entre a atividade didática e a prestação dos serviços, que sirva não só como substrato ao processo de formação, como a própria integração da escola com os serviços de saúde deve ser realizada na perspectiva de reorganização desses serviços com a participação dos trabalhadores.

Em que pese os limites e obstáculos que se colocaram para efetivação dessa perspectiva democrática de formação, que não pode ser dissociada dos próprios rumos que o SUS tomou a partir dos anos 1990; em que pese o difícil processo de afirmação e consolidação das escolas técnicas do SUS, a sua maioria vinculada às secretarias estaduais de saúde e que viveram ao longo desse tempo ao sabor das conjunturas políticas, clientelistas etc., importa destacar que nesse período se verifica uma redefinição da concepção de educação do

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SUS. Aquela concepção abrangente, que aliava formação e participação para a construção coletiva de um sistema, dá lugar a uma concepção restrita, de cunho individualista e voltada prioritariamente para o local de trabalho, muito longe da perspectiva de intersetorialidade, defendida por Arouca. Isso se verifica mais recentemente, na definição de formação profissional inscrita na Política Nacional de Gestão do Trabalho e da Educação em Saúde, como um “processo que sistematiza os conhecimentos técnicos e científicos por meio da educação profissional [...], com o objetivo de propiciar ao indivíduo o permanente desenvolvimento de aptidões, habilidades, competências específicas e posturas solidárias perante os usuários, para o exercício do trabalho e da educação a fim de inseri-lo nos setores profissionais” (Brasil, Ministério da Saúde, 2005, p. 32).

Parece-nos que esse fenômeno está associado à difusão da sociabilidade neoliberal que ao longo dos anos de 1990, principalmente a partir do governo FHC, difundiu-se no país e que do ponto de vista da formação humana, como sinaliza Severino (2006), opera a subversão do desejo, da vontade e do conhecimento, emulando uma suposta autonomia e suficiência do sujeito individual.

No plano educacional, essa ideologia se materializou, como demonstra o estudo de Ramos (2001), na adoção da pedagogia das competências, que conduz a uma abordagem individualizante da formação do trabalhador e o responsabiliza por sua empregabilidade. Uma noção que foi facilmente incorporada pelo setor saúde por um motivo, do meu ponto de vista, muito simples: porque ela destaca a imprevisibilidade do processo de trabalho. Como Ramos e outros autores já apontaram, essa noção surge do mundo do trabalho com a flexibilização e integração dos processos produtivos, que passam a valorizar a subjetividade e o saber tácito do trabalhador, passando a contrapor a partir daí a qualificação real adquirida no processo de trabalho à qualificação formal adquirida na Escola. Com isso, afirma-se a idéia de que a construção de aprendizados vai além da aquisição formal de conhecimentos academicamente validados e transmitidos pela escola, supervalorizando assim as experiências adquiridas no processo de trabalho, principalmente considerando as rápidas mudanças que se processam nos projetos de trabalho ou decorrentes dos eventos imprevistos que ocorrem com as novas formas de produção flexível.

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O trabalho em saúde tem importantes similaridades com o conjunto dos trabalhos existentes na sociedade. Entre elas, o uso dos conceitos de administração científica e racional aplicados aos cuidados; é um trabalho coletivo, que tem como lócus privilegiado de prática o hospital moderno; a incorporação crescente de equipamentos e tecnologias materiais; e o assalariamento do conjunto dos seus trabalhadores. Entretanto, é um trabalho que tal qual o trabalho educativo se completa no ato de sua produção, particularmente no processo de cuidar; é um trabalho reflexivo, de difícil racionalização e normatização; alguns dos seus produtos tem a objetividade das mercadorias, porém não tem a universalidade de seu valor de uso, como por exemplo, uma chapa de raio-X, uma bota de gesso, etc; e opera cotidianamente com as incertezas decorrentes da indeterminação das demandas, com as descontinuidades e a necessidade de prontidão no atendimento. Uma de suas características, portanto, é sempre lidar com situações de emergência e imprevisto. Esta característica é determinada pelo próprio objeto de trabalho, que se materializa num corpo socialmente investido, um objeto histórico e variável.

Nessa medida, os trabalhadores de saúde devem ser competentes para agir em função de possíveis ocorrências não previstas do processo de trabalho em saúde. Não é por acaso que é um dos trabalhos sociais mais desgastantes, tanto do ponto de vista físico, como mental e emocional. Portanto, não é por acaso também que a noção de competência foi rapidamente assimilada pelo setor saúde, mas de forma absolutamente acrítica e a-histórica. No limite, a noção de competência com sua ênfase na experiência e nos aspectos subjetivos da prática, tende a desqualificar os saberes escolares e a escola, como agente que disputa a transmissão de conhecimentos, forçando-a a se adequar não às necessidades do educando mas às necessidades do mercado de trabalho, neste caso, o de saúde.

Ao contrário, acreditamos que o acesso dos trabalhadores ao conhecimento é uma das mediações fundamentais para a transformação da sociedade. Cardoso (2006), por exemplo, afirma que para ultrapassar o ‘consenso’/consentimento/submissão, que é construído ideologicamente pelo poder, é necessário questionar os quadros de pensamento estabelecidos e essa luta ideológica não prescinde do acesso ao conhecimento, principalmente numa sociedade capitalista dependente como a brasileira. Frigotto (2006) aponta de forma muito clara, que se os conhecimentos científico, técnico e

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tecnológico são forças de dominação sob o capital, também são elementos de emancipação humana e são cruciais e necessárias a ela. Portanto, são alvos de disputa de projetos sociais antagônicos e condição sine qua non da sociedade socialista. Severino (2006) também salienta que o conhecimento é uma ferramenta fundamental que o homem dispõe para dar referências à condução da sua existência histórica e que o grande desafio que a escola deve enfrentar para superar a sociabilidade neoliberal vigente é simultânea e contraditoriamente, inserir os educandos nas malhas culturais de sua sociedade e levá-los a criticar e a superar essa inserção. Isto é, fazer um investimento na conformação das pessoas a sua cultura ao mesmo tempo que precisa levá-las a se tornarem agentes da transformação dessa cultura.

Portanto, essas questões apontam para a luta teórica e ideológica que está posta para todos aqueles que militam na educação e na saúde. Se no campo educacional a luta passa, como diz Frigotto, pela afirmação do caráter estratégico e prioritário do direito à educação escolar básica, unitária, politécnica ou tecnológica, no campo da saúde a luta central é pela afirmação do direito à saúde no espaço político e no espaço escolar.

A argumentação do Banco Mundial que fundamenta a necessidade de privatização dos serviços de saúde, como salienta Laurell (1994), parte da definição de que a saúde é um bem privado, porque é consumido por indivíduos privados. É toda uma construção lógica que, junto com outras justificativas, tem o propósito de destruir o conceito dos direitos sociais e, particularmente, o direito à saúde, pois é uma condição indispensável da privatização e da mercantilização dos serviços de saúde, visto que, a rigor, não é possível reconhecer esse direito sem especificar simultaneamente as correspondentes obrigações sociais e públicas.

No seu artigo, Laurell nos dá ferramentas para avançarmos essa discussão. Ela diz que o fato de um bem ou serviço ser consumido pelos indivíduos privadamente, não impede, em absoluto, que seja considerado de interesse público e garantido pela sociedade através do Estado.

Antes, ao contrário, as liberdades e direitos dos cidadãos, princípios fundantes das sociedades modernas, têm caráter público com independência de que sejam exercidos ou gozados individualmente, porque representam valores éticos compartilhados e

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prioridades sociais democraticamente fixadas. Dado que a saúde diz respeito diretamente à preservação da vida e ao desenvolvimento de capacidades humanas, se pode ademais sustentar que é uma necessidade humana básica, em sentido estrito. Por isso, todo ser humano deveria ter direito a satisfazer essa necessidade. Um direito que só pode ser garantido mediante a ação pública, particularmente nas sociedades marcadas por profundas desigualdades, como são as sociedades latino-americanas (op. cit., p.17).

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O TRABALHO EM MARXCarlos Ignácio Pinto

3º Ano - História/USP

"O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém, desviamo-nos dele.

A cobiça envenenou a alma dos homens, levantou no mundo as muralhas do ódio e tem-nos feito marchar

a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da produção veloz, mas nos

sentimos enclausurados dentro dela.  A máquina, que produz em grande escala,

tem provocado a escassez. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa

inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. 

Mais do que máquinas, precisamos de humanidade; mais do que de inteligência, precisamos de 

afeição e doçura!  Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo estará perdido."

(Charles Chaplin, em discurso proferido no final do filme O grande ditador.)

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 Este trabalho tem por objetivo, demonstrar como a questão do trabalho é elaborada em Marx, permeando todos os demais sentidos de sua obra; a busca da compreensão da força motriz do Capitalismo tanto como ela se apresenta a sociedade, como para Marx; a contraposição dos sentidos.

Para Marx, o homem é o primeiro ser que conquistou certa liberdade de movimentos em face da natureza. Através dos instintos e das forças naturais em geral, a natureza dita aos animais o comportamento que eles devem ter para sobreviver. O homem entretanto, graças ao seu trabalho, conseguiu dominar em parte, as forças da natureza, colocando-as a seu serviço.

"Como criador de valores de uso, como trabalho útil, é o trabalho, por isso, uma condição de existência do homem, independente de todas as formas de sociedade, eterna necessidade natural de mediação do metabolismo entre homem e natureza e, portanto, da vida humana."

  Os animais também trabalham e produzem, porem somente para atender as exigências práticas imediatas, exigências materiais diretas dos mesmos ou de seus filhotes portanto, não podendo ser livres ao trabalharem, pois a atividade dos mesmos é determinada unicamente pelo instinto ou pela experiência limitada que podem ter.

O que ocorre ao homem é diferente. Anterior a realização de seu trabalho, o homem é capaz de projetá-lo, ou seja, a capacidade de definir meios diversos que possibilitam o alcance de seu objetivo, possuindo a livre escolha da alternativa que melhor se adeqüe aos seus meios e procura segui-los.

Justamente porque o trabalho humano pode ser diferente do trabalho dos animais é que o homem modifica a natureza de acordo com suas possibilidades. O que Marx observa na História é a evolução gradativa do trabalho, naquilo que corresponde a evolução do homem e a necessidade de suprir suas necessidades frente ao meio.

"Uma formação social nunca perece antes que estejam desenvolvidas todas as forças produtivas para as quais ela é suficientemente desenvolvida, e novas relações de produção mais adiantadas jamais tomarão o lugar, antes que suas condições materiais de existência tenham sido geradas no seio da mesma velha sociedade. É por isso que a humanidade só se propõe as tarefas que

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pode resolver, pois, se se considera mais atentamente, se chegará a conclusão de que a própria tarefa só aparece onde as condições materiais de sua solução já existem, ou, pelo menos, são captadas no processo de seu devir."

Para aumentar o seu poder sobre a natureza, o homem passa a utilizar instrumentos, acrescenta meios artificiais de ação aos meios naturais de seu organismo multiplicando-se enormemente a capacidade do trabalho humano de transformar o próprio homem.

O desenvolvimento do trabalho criador aparece, assim, aos olhos de Marx, como uma condição necessária para que o homem seja cada vez mais livre mais dono de si próprio. Contudo Marx verifica que em sua contemporâniedade, o trabalho assumiu características diferentes das anteriormente pensadas: os homens que produzem os bens materiais, alguns indispensáveis a sua própria existência, porém, não se realizam como seres humanos em suas atividades.

Se no trabalho encontramos o sentido de transformação dos bens necessários a espécie, e é o trabalho o fomentador de seu progresso, como pode transformar-se em grilhão? Para conseguimos compreender este antagonismo, devemos prestar atenção no caráter do trabalho em nossa sociedade que exterioriza-se sob a forma da mercadoria.

"A riqueza de uma sociedade em que domina o modo de produção capitalista aparece como uma "imensa coleção de mercadorias", e a mercadoria individual como sua forma elementar."

Em Marx, a análise do papel da mercadoria dentro do sistema capitalista é que permite determinar o caráter do trabalho no mesmo. Busca compreender a especificidade da mercadoria dentro do sistema, e, principalmente a que se deve seu valor; especifica dois tipos de valores: aquele no qual se encontra agregado o valor do trabalho em si, mas que de certa forma, abstraí-se na aquisição do produto, e seu valor de uso que parece aos olhos do comprador como o determinante de seu preço.

O trabalho é o caráter específico que aparece no valor da mercadoria, e, ao que interessa a esta análise, confere a mercadoria a propriedade que transita em todos entendimentos de valor que a mesma possa ter: "que é a de serem produtos do trabalho."

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Contudo, em sua análise, ainda sobre o aspecto da mercadoria e trabalho, Marx permite a visualização de um fator característico de nossa sociedade: a descaracterização do produto (mercadoria) como fruto do trabalho humano. Não se conhece quem produziu, apenas o que foi produzido. O valor da mercadoria está em si mesmo e não transcende a isto.

"Ao desaparecer o caráter útil dos produtos do trabalho, desaparece o caráter útil dos trabalhos nele representados, e desaparecem também, portanto, as diferentes formas concretas desses trabalhos, que deixam de diferenciar-se um do outro para reduzir-se em sua totalidade a igual trabalho humano, a trabalho humano abstrato.

Consideremos agora o resíduo dos produtos do trabalho. Não restou deles a não ser a mesma objetividade fantasmagórica, uma simples gelatina de trabalho humano indiferenciado, isto é, do dispêndio de força de trabalho humano, sem consideração pela forma como foi dispendida."

Portanto, um dos determinantes do valor da mercadoria é o trabalho despendido em sua fabricação. Assim sendo, o trabalho não possui a característica de ser reconhecido na compra da mercadoria, porem, no valor da mesma. O trabalho despendido desta forma, tornou-se valor agregado, passando ao aspecto de "venda" da mão de obra, sem a interligação do trabalhador e o produto, surgindo neste meio, o proprietário dos meios de produção. O trabalho tornou-se uma mercadoria, a partir do momento que o trabalhador a vende como única fonte de sua sobrevivência.

"O que essas coisas ainda representam é apenas que em sua produção foi despendida força de trabalho humano, foi acumulado trabalho humano. Como cristalização dessa substância social comum a todas elas, são elas valores, valores mercantis."

Sendo o exercício do trabalho em qualquer regime econômico sucedido ao longo da História um dispêndio físico de energia, somente sob o regime capitalista vamos encontrar na força de trabalho humana a particularidade de ser fonte de valor. O valor é um fenômeno puramente social; o valor de um produto é portanto, uma função social e não função natural adquirida por representar um valor de uso ou trabalho nos sentidos fisiológicos ou técnico material.

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O pensamento econômico evolui no sentido de buscar desvendar as formas sociais de trabalho abstraindo as formas concretas de trabalho. O trabalho abstrato não está compreendido na materialidade, pois sua forma é puramente uma construção social da economia Mercantil Capitalista.

Como o trabalho abstrato é o responsável pela criação de valor em nossa sociedade capitalista, o mesmo fica dependente da expansão e consumação do modo capitalista de produção. Esta necessidade de universalização colocou-se na base do processo histórico que engendra o trabalho abstrato como aquele que cria valor.

Sob este aspecto, e na caracterização do trabalho abstrato como uma espécie de trabalho socialmente igualado, não há no mercado mundial nenhuma outra "mercadoria" capaz de regular o conjunto das diversas economias a não ser o próprio trabalho, e através de Marx , é que conseguimos chegar a esta compreensão.

No sistema atual o trabalhador produz bens que não lhe pertencem e cujo destino, depois de prontos, escapa ao seu controle. O trabalhador, assim, não pode se reconhecer no produto de seu trabalho; não há a percepção daquilo que ele criou como fruto de suas capacidades físicas e mentais, pois se trata de algo que ao trabalhador não terá utilidade alguma. A criação (o produto), se apresenta diante do mesmo como algo estranho e por vezes hostil, e não como o resultado normal de sua atividade e do seu poder de modificar livremente a natureza.

Assim sendo, se o produto do trabalho não pertence ao trabalhador e de certa forma, se defronta com o mesmo de uma forma estranha, isso somente ocorre porque tal produto pertence a outro homem que não o trabalhador. Portanto, quem se apropria de parte do fruto e do próprio trabalho operário ? Marx responde: O capitalista; o proprietário dos meios de produção.

Este trabalho gostaria de alçar vôos mais longínquos, porem, a percepção da falta de embasamento teórico não permite que o autor deste se proponha a escrever aquilo que ainda não compreende em todo seu conjunto. A vontade cede a realidade. Gostaria de poder trabalhar com o caráter da alienação e da apropriação da mão de obra por meio da caracterização desta como mercadoria, mas atenho-me ao que compreendo.

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Poucos homens tem a compreensão de sua contemporâniedade e por tal, não conseguem atuar de forma determinante dentro do meio em que vivem. Não se atua sobre aquilo que não se conhece, a não ser de forma inconsciente e despretensiosa. Marx conhecia seu tempo e o processo que trazia à mendicância humana deplorável aos homens.

Muito mais do que conhecer, ele se propôs a ensinar, através de sua obra, aquilo que pôde conhecer e desvendar. Mais do que qualquer tese, foi um homem disposto a mudar o mundo em vivia.

FONTE: http://www.klepsidra.net/klepsidra8/marx.html (acessado 30/06/08)

CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO, IMPERIALISMO E MOVIMENTOS SOCIAIS

Virgínia Fontes*

27 a 30 de abril, La Habana, 2007

Estou a cada dia mais convencida de que não há saída para a humanidade que não passe pelo fim da propriedade privada: em primeiro lugar, da propriedade privada dos meios de produção mas, sobretudo, da propriedade capitalista, dos recursos acionistas-monetários concentrados em escala gigantesca na atualidade; em segundo lugar, pelo fim de toda e qualquer propriedade privada. Somente com a plena socialização de todos os elementos da vida social poderemos ser integralmente humanos e históricos, saindo dessa pré-história que se alonga e se abate como tragédia para a maior parcela da humanidade. Essa socialização exige aprender a construir o tempo necessário para produzirmos os bens coletivamente decididos como indispensáveis à vida comum, ampliar o tempo disponível para a criação artística, literária, científica e cultural, possibilitar prazeres a inventar e que não passem mais pela compra e venda dos afetos. Implica plena socialização da cultura, das formas de organizar as relações sociais, socialização que somente pode ser plena se revolucionarmos os meios de produzir e reproduzir a existência

* Professora visitante da EPSJV/Fiocruz; Docente do Programa de Pós-Graduação em História da UFF, pesquisadora do CNPq, Docente da Escola Nacional Florestan Fernandes/MST.

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humana, reinventando a igualdade efetiva, a única forma social que permite produzir a diferença como qualidade e não meramente como sujeição ou hierarquia. Sem igualdade, não há diferença, apenas hierarquia.

Em primeiro lugar, a própria definição de capitalismo precisa ser permanentemente relembrada, de forma a não se tornar uma espécie de palavra crispada, congelada, coisificada e ossificada. Capitalismo só pode ser pensado como uma “economia” descarnada pelos próprios capitalistas, que eliminam as relações sociais de seu horizonte de cálculo. Capitalismo é uma relação de produção social (e não apenas uma relação contratual de trabalho ou uma espiral acumulativa de riquezas), que se apóia na expropriação da maioria da população das condições de assegurar a própria subsistência. Essa expropriação foi condição para seu surgimento e iniciou-se através da expulsão dos camponeses, algo que todos nos lembramos. Marx apresenta o processo de maneira bem precisa:

“Dinheiro e mercadoria, desde o princípio, são tão pouco capital quanto os meios de produção e de subsistência. Eles requerem sua transformação em capital. Mas essa transformação mesma só pode realizar-se em determinadas circunstâncias, que se reduzem ao seguinte: duas espécies bem diferentes de possuidores de mercadorias têm de defrontar-se e entrar em contato; de um lado, possuidores de dinheiro, meios de produção e meios de subsistência, que propõem a valorizar a soma-valor que possuem mediante compra de força de trabalho alheia; do outro lado, trabalhadores livres, vendedores da própria força de trabalho e, portanto, vendedores de trabalho. Trabalhadores livres no duplo sentido, porque não pertencem diretamente aos meios de produção, como os escravos, os servos etc., nem os meios de produção lhes pertencem, como, por exemplo, o camponês economicamente autônomo etc., estando, pelo contrário, livres, soltos e desprovidos deles. Com essa polarização do mercado estão dadas as condições fundamentais da produção capitalista. A relação-capital pressupõe a separação entre os trabalhadores e a propriedade das condições da realização do trabalho. Tão logo a produção capitalista se apóie sobre seus próprios pés, não apenas conserva aquela separação, mas a reproduz em escala sempre crescente. Portanto, o processo que cria a relação-capital não pode ser outra coisa que o processo de separação do trabalhador da propriedade das condições de seu trabalho, um processo que transforma, por um lado, os meios

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sociais de subsistência e de produção em capital, por outro, os produtores diretos em trabalhadores assalariados. A assim chamada acumulação primitiva é, portanto, nada mais que o processo histórico de separação entre produtor e meio de produção.”5

Acostumamos a designar o processo de expropriação dos trabalhadores como acumulação de “primitiva”, esquecendo-nos que ele precisa ser não apenas conservado como também reproduzido em escala sempre crescente. Essa dificuldade é compreensível, uma vez que o capital se apresenta seja como uma ou um complexo de unidades fabris (quando do predomínio do capital industrial) ou como a propriedade de dinheiro. Precisa ocultar cuidadosamente o fato de ser, de fato, uma maneira de expropriar crescentemente os trabalhadores e de disponibilizá-los para a produção de mais-valor. Por isso, precisamos relembrar sempre que capital e capitalismo não são apenas um modo de produzir bens ou de acumular riquezas, nem remetem a uma forma jurídica da defesa da propriedade, mas somente podem ser compreendidos pelas relações sociais que engendram, reproduzem e aprofundam. É este cerne – social – quem gera formas específicas de sociabilidade e de subjetividade, é a partir que a idéia de uma natureza humana de cunho mercantil se implanta como uma segunda pele.

Nem sempre lembramos de que:

a) Apesar da expansão do capitalismo nos últimos 250 anos, ainda há enorme massa de camponeses a expropriar no mundo. Essa expropriação continua a se abater de forma extremamente violenta sobre diversas populações, em muitos pontos do planeta. A começar pelo próprio Brasil, do qual sabemos as condições de extrema brutalidade incidindo ainda hoje sobre as populações campesinas ou agrárias, assim como o poderoso bloqueio interposto a qualquer verdadeira reforma agrária. A continuar pela América Latina, onde esse processo encontra-se em fase violentíssima e, em muitos países, se mescla com a repressão e o massacre a populações indígenas, submetidas a extremas pressões; continuando pela China, onde se legitimou o retorno da propriedade privada e onde se intensifica a expropriação camponesa;

5 Marx, K. O Capital. SP, Nova Cultural, 1985. L. 1, vol. 2, cap. 24 “A assim chamada acumulação primitiva”, p. 262. Grifos meus, VF.

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b) Esse processo de expropriação das condições de produção familiar da subsistência precisa ser permanentemente reposto para que os trabalhadores permaneçam disponíveis e voluntariamente (“livremente”) dispostos (necessitados) a vender sua força de trabalho. Assim, a expropriação dos trabalhadores não se reduz a uma condição “prévia”, que uma vez cumprida, estaria terminada. Ela persiste como sua forma de ser “primitiva”, ou seja, ela é a função social primordial do capital, se o considerarmos como é, isto é, como relação social de exploração de classes calcada sobre a base da oferta “livre” da força de trabalho ao capital;

c) Essa “liberdade” é, portanto, algo de extremamente contraditório e conflitivo no interior da sociedade capitalista. Ela é elemento fundante e crucial da exploração de classes e, portanto, precisa sempre ser redefinida pelo capital como perfeita disponibilidade da força de trabalho, tanto teórica quanto praticamente. Decerto, ao mesmo tempo essa contradição pode apontar para a necessidade organizativa dos trabalhadores, convertendo sua “livre disponibilidade gerada pela necessidade” em organização voluntária e consciente contra o capital e contra qualquer forma de exploração de classes. Mas não nos ocuparemos agora dessas contradições, fundamentais para o estabelecimento de estratégias de luta;

d) A luta permanente dos trabalhadores colocados sob tais condições de fragilidade sempre foi, portanto, imediatamente, a luta pela redução dessa instabilidade, dessa insegurança permanente; procurando impor restrições legais à plena disponibilidade da força de trabalho (preservando crianças, velhos e doentes; assegurando um limite para o tempo de venda da força de trabalho, com a limitação das jornadas e definição das aposentadorias, etc.). Em outros termos, as conquistas de direitos dos trabalhadores sempre se constituíram como denúncia dessa “liberdade” transformada em disponibilidade para o capital, convertendo-a, ao contrário, em garantia social para impedir a venda ilimitada da força de trabalho. Vale portanto lembrar, por exemplo, que as reivindicações históricas dos trabalhadores pelo direito da aposentadoria não pretendiam significar, nas sociedades capitalistas, o momento da “morte social” de seus beneficiários, mas o momento no qual o trabalhador recuperasse o uso singular de sua própria força de trabalho (ou o seu valor de uso), por não mais necessitar vendê-la para assegurar sua própria subsistência.

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e) O que estamos chamando de “mercantilização” é, de fato, um dos mais significativos processos de expropriação social (águas, ar, natureza biológica, como sementes, gens humanos, etc.)... são elementos naturais ou sociais sobre os quais não incidia propriedade e que vêm sendo arrancados da totalidade dos seres humanos e convertidos em propriedade. Isso se denomina expropriação. A expropriação não apenas converte coisas em mercadorias – expande as relações sociais que nutrem o capitalismo.

f) A expropriação permanece portanto o fulcro central da exploração capitalista, à qual corresponde, no extremo oposto da mesma relação, a concentração de recursos (meios de produção e de subsistência) capazes de ser converter em capital, para serem valorizados, aplicados na própria exploração de trabalhadores.

David Harvey, em livro recente (O novo imperialismo, SP, Loyola, 2004), apresenta esse fenômeno como se fosse a retomada de uma forma arcaica (não expandida, ou não ampliada, segundo os termos correntes), que se tornaria dominante na atualidade e o designa como “acumulação por espoliação” (ou despossessão). Extremamente sugestivo, Harvey percebe de forma nítida que o processo de expropriação que ocorre na atualidade, não mais se volta para fora do sistema capitalista, mas investe para dentro. Harvey, entretanto, parte de pressupostos que limitam o alcance de sua reflexão. Em primeiro lugar, supõe que essa forma seria qualitativamente diferente das formas corriqueiras (expandidas ou ampliadas) do capital, que ao se tornarem normalizadas e não mais prévias ou primitivas, abandonariam as características especulativas e fraudulentas que ele atribui aos momentos “primitivos”. A especulação, a fraude, o roubo aberto permaneceram sempre em paralelo com a expansão do capitalismo e com os momentos de impulsão da concentração de capitais, simultaneamente à intensificação da exploração de força de trabalho que sempre acompanhou tais momentos (na passagem para a grande indústria, na produção imperialista caracterizada pelo fordismo ou pelo atual toyotismo ou similares). Distingue pois uma “acumulação produtiva” de uma “acumulação predatória”, quando são inseparáveis uma da outra, uma vez que a questão não reside na apropriação das coisas – objetos materiais e exteriores – mas, sobretudo, na expansão da subalternização dos trabalhadores. Essa, sim, segue constituindo a base central da exploração da força de trabalho.

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A reestruturação produtiva somente pode ser compreendida (em qualquer dos momentos do capitalismo em que fenômenos similares ocorreram), como aprofundamento da “disponibilização do trabalho para o capital” e, ao mesmo tempo, do disciplinamento da força de trabalho nas novas condições de expropriação. Essa nova disciplina se impõe tanto pela violência quanto pelo convencimento. As fraudes e roubos são uma faceta, mas é preciso retomar seus aspectos mais brutais, expressos através do desemprego e do retorno de sua ameaça permanente (expropriação de direitos que limitam a disponibilização da força de trabalho); das redução das relações contratuais de contratação de força de trabalho (aprofundando a disponibilidade permanente, “livre”, da maior parcela da força de trabalho); pela coerção aberta para os renitentes (criminalização de movimentos sociais, encarceramento em larga escala de populações; supressão de direitos civis, como nos EUA e a permanência de instalações militares pesadas em torno do mundo, para conter eventuais transbordamentos internacionais de lutas sociais). A dimensão do novo convencimento só é compreensível nesse contexto repressivo, a começar pelo desemprego: a requalificação dos trabalhadores, que devem introjetar a necessidade de uma auto-empregabilidade6, em condições de concorrência extrema. E que papel cumpre, nesse processo, o que muitos chamam de revolução tecnológica? O termo me parece improcedente, pois não dá conta do processo de aprofundamento e reavivamento das relações sociais capitalistas (ressubordinação da força de trabalho e ampliação sua disponibilidade para o capital, isto é, sua expropriação). É inegável que houve uma profunda transformação da base tecnológica, mas sua compreensão efetiva se liga às maneiras pelas quais se pôde não apenas transferir capitais de um lado a outro, posto que isolado, o acúmulo de dinheiro não produz mais-valia, mas simultaneamente expropriar e fragmentar o conjunto da classe trabalhadora.

Ao lado portanto das tecnologias mais evidentes – como as telecomunicações, a microeletrônica, a robótica, a informatização, etc. - outras formas tecnológicas merecem ser levadas em consideração, como a difusão de formas de gestão voltadas para a intensificação da

6 Aqui há diferentes formas a esmiuçar: a venda de projetos sem contrapartida de contratos; a instauração de formas de “parceria” ocultando relações de trabalho (cooperativas, pequenos proprietários totalmente dependentes das grandes empresas, etc.), o trabalho doméstico e familiar em condições de dependência absoluta frente ao patronato, que não mais se apresenta de forma direta, mas indireta, através de sub-patrões.

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exploração e da disponibilização em massa dos trabalhadores como condição de sobrevivência “natural” e desejável; as tecnologias de isolamento das condições de produção e, sobretudo, dos trabalhadores cuja associação real torna-se invisível e, finalmente, a elaboração de práticas estatais de consolidação da nova disciplina de trabalho, ancorada duplamente na coerção, pela violência aberta da redução de direitos (não mais acesso à justiça para grandes parcelas de trabalhadores) e pelo encapsulamento do mercado eleitoral (democracia), realizado através do isolamento político das grandes questões econômicas, amparado pelo monopólio internacional da mídia.

A reestruturação produtiva do capitalismo contemporâneo é parte integrante de um processo imperialista, no sentido do apodrecimento social ao qual Lênin fazia referência. Para avançar na sua compreensão, parece-me ser necessário retomar a reflexão de Marx sobre o “capital portador de juros”, como forma social dominante no plano internacional. Trata-se de um capital que assume uma forma crescentemente social, isto é, como associação permanentemente competitiva de grandes proprietários de capital sob forma monetária que precisa valorizar-se em altas taxas e grande velocidade, impulsionando expropriações continuadas e altas taxas de exploração do sobretrabalho, aproveitando-se inclusive das diferenças locais, regionais e nacionais.

Tal concentração de enormes montantes de recursos aprofundou a exigência de valorização de tais massas monetárias sob todas as formas de exploração da força de trabalho. A mais valia relativa se une à mais-valia absoluta, a reproduz, a estimula. O processo de produção associa, na atualidade, trabalhadores altamente qualificados (com contratos de trabalho capazes de assegurar temporariamente o pagamento de previdências complementares e fundos de pensão) a trabalhadores completamente destituídos de direitos. Pior ainda, desprovidos do próprio horizonte de possibilidade de vir a conquistá-los, pela própria desigualdade interposta entre eles, erigida agora como separação hierárquica não apenas no interior das empresas, mas no conjunto da vida social. Desde a hierarquia entre as empresas terceirizadas, até a rígida separação dos bairros. É como se o trabalho complexo se divorciasse fisicamente do trabalho simples, ao mesmo tempo em que o recria e amplia, posto que seguem se complementando.

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Essas massas de trabalhadores desprovidos de direitos, não mais contidos pela disciplina despótica no interior das fábricas, seguem entretanto sendo educados, adestrados e disciplinados pelo capital, através tanto das “requalificações para a empregabilidade” quanto através da “responsabilidade social” empresarial a qual, levada a termo de forma pontual mas amplíssima, atua em grande parte com recursos públicos. Sequer deverão perceber-se como trabalhadores, como mão de obra disponível para o capital: devem ver-se como empresários de si mesmos, “empreendedores” formados em cursos de empreendedorismo social, vendedores de sua “capacidade” de trabalho sob quaisquer condições, “voluntários” de sua própria necessidade. Em outros termos, à construção de um “capital social anônimo”, corresponde a formação de “trabalhadores anônimos”. Não mais batalhões disciplinados de trabalhadores reunidos numa fábrica, mas pequenos grupos, “células” (e o termo é da própria reestruturação produtiva) cuja reunião parece obedecer a um cérebro distante mas onipresente. Efetivamente (e o trabalho de João Bernardo nos ajuda a compreender o fenômeno), as funções de coordenação dessa massa de trabalhadores, cuja cooperação agora não é mais imediata, exige a formação de gestores de um novo tipo. Não se limitam, entretanto, ao Estado e devem, atuar em todos os espaços de formação dos trabalhadores: nas empresas, nas escolas, nos sindicatos, no setor público.

Um programa educativo de subalternização de massas já está em curso (cf. Lucia Neves, A pedagogia da hegemonia. SP, Xamã, 2006).

Nada há de similar com a noção de “multidão”, forjada por Negri, que esquece totalmente as profundas desigualdades que se vêm impondo às massas de trabalhadores, nessa etapa de subordinação massiva do trabalho ao capital. Esquece, convenientemente, os processos de exploração da força de trabalho. Estamos diante de um formidável impulso da acumulação capitalista, a cada dia mais destruidor, e sua destruição primeira incide sempre sobre a as formas de luta da própria força de trabalho, sobre a classe trabalhadora. O capital precisa que ela seja disponibilizada, “liberada”, para que ele se perpetue. Por bem ou por mal.

Os movimentos sociais precisam, mais do que nunca, estar atentos às formas de expansão contemporânea do capital e de suas modalidades de subalternização de trabalhadores e de apassivamento ou de redução ao silêncio respeitoso através de um processo

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contemporâneo peculiar, que estou designando como conversão mercantil-filantrópica de movimentos sociais de base popular. Trata-se de fenômeno contraditório (Arantes, 2004), surgido no próprio processo de lutas sociais, e consiste na admissão (e, em alguns casos, até mesmo no estímulo) de algumas demandas populares, direcionando-as através da elaboração de projetos financiáveis, para a produção de serviços de cunho assistencial. Essa conversão resulta num apassivamento das lutas sociais, encapsuladas em reivindicações de cunho imediato (corporativas) e circunscritas a níveis de consciência coletiva elementar (Neves, 2005, passim).

Ao longo da década de 1980, se disseminaram novos intelectuais-militantes que criticavam fortemente a pressuposição da existência de classes sociais, insistindo em que apenas a vivência específica de cada segmento ou setor deveria ser enfatizada, como Alain Touraine e outros. As classes sociais seriam algo de muito “abstrato” e de “muito econômico” e não recobririam todas as modalidades da rica vida social das populações, para eles. Apresentavam portanto o conceito de classes como se fosse apenas uma modalidade classificatória e não uma cisão social fundamental, que produz – e marca – o conjunto das experiências na vida social. Para eles, nos bairros pobres não haveria classes sociais, apenas nas fábricas. Para eles, desempregados não pertenciam a nenhuma classe. Criticavam um Marx (que inventaram) por economicismo reducionista, enquanto realizavam uma das operações reducionistas mais perversas – a redução do horizonte da vida social de inteiras populações a seu entorno imediato.

Em direção similar, muitos militantes, sinceramente engajados na melhoria das condições sociais da maioria da população e sinceramente decepcionados com os rumos de muitos partidos abandonariam a militância (e a reflexão) voltada para o fim das classes sociais, concentrando-se na atividade local, pontual.

Apoiados em formas locais de solidariedade e auto-ajuda, empreenderam importantes lutas, mas esbarravam na dificuldade de recursos. O encontro entre intelectuais dispostos a apoiar movimentos que se mantivessem estreitamente nos limites corporativos e lutas sociais que se debatiam com escassez de recursos impulsionou a constituição de entidades de cunho filantrópico, no qual a autonomia reivindicada deixava de ser capaz de produzir contra-hegemonia, não devendo mais forjar uma visão de mundo revolucionária, mas a

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autonomia de cada segmento, organizado em torno de demandas específicas, corporativas.

A expansão de igrejas e o acirramento da concorrência entre elas teria também um papel importante, reforçando a característica filantrópica de tais entidades. Múltiplas fontes de financiamento internacional apoiaram essa dinâmica, inclusive para fazer frente ao risco de que outras formas de conexão internacional impulsionassem as reivindicações localizadas na direção de uma contestação mais abertamente anti-capitalista (o que também ocorria no âmbito das lutas e organizações localizadas).

Na década de 1990, as entidades patronais, os bancos de desenvolvimento e de cooperação internacional, as grandes fundações privadas e o próprio Banco Mundial passariam a apoiar e a financiar resolutamente muitas dessas entidades e a criar suas próprias.

O perfil de uma expressiva parcela da militância se alterava, convertidas em prestadora de serviços de apoio a “projetos sociais”, profissionalizando-se como assessores de movimentos populares. A militância se transformava em emprego, os serviços profissionais prestados poderiam – e deveriam - ser remunerados conforme o mercado, segundo as condições de pagamento dos movimentos sociais ou, caso mais freqüente, através da orientação para obtenção de recursos junto a agências financiadoras. Novas especializações técnicas se definiam, como a de formuladores de projetos e a de agenciadores de recursos, nacionais e internacionais. Cursos de gestão de projetos sociais passaram a ser oferecidos internacionalmente, como uma das especializações similares a MBAs (Master of Business Administration).

Pela mesma brecha em que a filantropia se imiscuía na militância, desaparecia do horizonte a contradição entre fazer filantropia, ser militante e ser remunerado de maneira mercantil por essa atividade. Imediatamente em seguida, desaparecia também a contradição entre essas atividades e o empresariamento social, ou o engajamento de trabalhadores (supostamente voluntários) para trabalhar sem contratos, desprovidos de direitos, sem jornadas estabelecidas, na expectativa de que tal atividade lhes garantisse, em algum momento, a sonhada “empregabilidade”.

Esse movimento ocorre em paralelo a uma idealização do conceito de sociedade civil – como se esta se limitasse apenas ao

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âmbito popular. A sociedade civil, assim encarada, seria o momento “utópico” da vida social, o momento virtuoso. Essa idealização obscurece a enorme expansão de entidades empresariais com atuação intensa nessa área e que se apresentam como “utopia” patronal. Gramsci critica fortemente essa concepção liberal de sociedade civil, ao demonstrar como as lutas de classes atravessavam os aparelhos privados de hegemonia e como estes se conectam, se imbricam no Estado.

Aliás, a intensificação da atuação patronal nessas entidades leva a supor que sua atividade não apenas realiza uma contenção dos movimentos populares, impedindo a emergência de uma consciência ético-política (contra-hegemônica ou revolucionária). Nas condições do predomínio internacional do capital monetário, essas entidades parecem educar (e explorar) trabalhadores para jornadas sem limites, trabalho sem direitos, política sem horizontes.

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HARVEY, David O novo imperialismo, SP, Loyola, 2004.

EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO HUMANA

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Ivo Tonet

Introdução

Formar integralmente o homem. Mas, o que significa exatamente isso? Pode-se definir esse conceito de modo a que seja um ideal válido para todos os tempos lugares? Parece que não. Então, o que significaria isso, hoje? E como articular, hoje, a atividade educativa com uma formação humana integral? Muitas perguntas. Tentaremos refletir sobre essas questões ao longo desse artigo.

Formação humana

Talvez nenhuma palavra tenha expressado tão bem a idéia de formação humana como a palavra grega paidéia. Paidéia exprimia o ideal de desenvolver no homem aquilo que era considerado específico da natureza humana: o espírito e a vida política. Mas, por isso mesmo, essa formação era privilégio apenas de alguns poucos, os cidadãos. Além disso, excluía todo tipo de atividades – as que lidavam com a transformação da natureza – que não fossem condizentes com essa natureza propriamente humana.

A humanitas romana, o humanismo renascentista e a Bildung alemã também expressam, cada uma com nuances próprias, esta mesma idéia de uma ampla e sólida formação do ser humano. Não por acaso, todas elas são profundamente devedoras da cultura grega clássica.

No entanto, essas palavras, que expressam momentos altos da trajetória humana, também deixam entrever a unilateralidade com que era vista essa formação humana. É sempre o cultivo do espírito que é privilegiado. Mesmo quando, como entre os gregos e romanos, se acentua a necessidade de formar o corpo e o espírito, a ênfase está na formação deste último. Quanto ao primeiro, trata-se apenas do seu cultivo através de exercícios físicos de forma a possibilitar o pleno desenvolvimento das faculdades espirituais.

O que era inteiramente deixado de lado nesse processo de formação do humano era a problemática do trabalho, da transformação da natureza, da manipulação da matéria para a produção da riqueza. Entende-se que assim fosse porque até o adventodo capitalismo as tarefas eram de responsabilidade de seres considerados de condiçãoinferior. Daí porque a formação se dirigia apenas àquelas

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pessoas que, não precisando trabalhar, podiam dedicar-se integralmente às atividades de cunho espiritual.

Nem é preciso fazer menção à Idade Média para constatar mais ainda esta separação e este desnível entre o trabalho material e as atividades espirituais.

Quando o capitalismo entrou em cena, houve uma profunda mudança nessa idéia da formação humana. Na verdade, houve até uma inversão entre trabalho e formação cultural. O trabalho passou a ser privilegiado como a atividade principal. Não, porém, o trabalho como uma atividade criativa, explicitadora das potencialidades humanas, mas o trabalho como simples meio de produzir mercadorias e, especialmente, a mercadoria das mercadorias, que é o dinheiro. Certamente, a formação cultural ainda era bastante valorizada, especialmente no período ascensional do capitalismo, ou seja, até a realização plena da revolução burguesa. No entanto, ela passava a ser cada vez mais perpassada pela lógica do ter, terminando por ser uma espécie de cereja no bolo da acumulação da riqueza material.

Coube a Marx, e a outros pensadores que desenvolveram as suas idéias, lançar os fundamentos de uma concepção radicalmente nova de formação humana. E o fundamento desta concepção radicalmente nova encontra-se exatamente na apreensão da correta articulação entre espírito e matéria, entre subjetividade e objetividade, entre a interioridade e a exterioridade no ser social.

Tomando como ponto de partida do trabalho, considerado como o ato ontológico-primário do ser social, Marx constata que este ser não se define pela espiritualidade, mas pela práxis. Ora, esta última é exatamente uma síntese de espírito e matéria, de subjetividade e objetividade, de interioridade e exterioridade. Na realidade, ele mostra que entre interioridade e exterioridade não há uma relação de exclusão, nem de soma, mas uma relação de determinação recíproca. Desta determinação recíproca é que resulta a realidade social.

Para compreender melhor o impacto desta descoberta, lembre-se a definição aristotélica do homem. Definição que predomina quase que integralmente até hoje no pensamente ocidental. Ele define o homem como um animal racional. Contudo, o que o define, especificamente, é a racionalidade, porque a animalidade nos é comum com os animais.

É interessante notar como é a descoberta de que há uma determinação recíproca entre esses dois momentos que constituem o ser social que

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permite compreender as formas concretas desta relação ao longo da história. Por exemplo, é o fato de a produção da riqueza material ser realizada pelos escravos ou pelos servos que permite entender o privilegiamento concedido ao espírito na formação humana. No caso da sociabilidade capitalista, é a centralidade do trabalho abstrato que permite entender a subordinação da formação cultural/espiritual/humana aos imperativos da produção da riqueza e, portanto, a impossibilidade de uma autêntica formação humana integral.

Certamente, a formação humana é sempre histórica e socialmente datada. Por isso mesmo não é possível definir, de uma vez para sempre, o que ele seja como se fosse um ideal a ser perseguido. Porém, como o processo de tornar-se homem do homem não é apenas descontinuidade, mas também continuidade, é possível apreender os traços gerais dessa processualidade, traços esses que, não obstante a sua mutabilidade, guardarão uma identidade ao longo de todo o percurso da história humana.

Assim, pode-se dizer partindo dos fundamentos onto-metodológicos elaborados por Marx, que o processo de o indivíduo singular tornar-se membro do gênero humano passa pela necessária apropriação do patrimônio – material e espiritual – acumulado pela humanidade em cada momento histórico. É através dessa apropriação que este indivíduo singular vai se constituindo como membro do gênero humano. Por isso mesmo, todo obstáculo a essa apropriação é um impedimento para o pleno desenvolvimento do indivíduo como ser integralmente humano.

Se olharmos as coisas de um ponto de vista histórico, veremos que, nas sociedades primitivas, portanto, antes da existência das classes sociais, a formação dos indivíduos era um processo do qual participava diretamente toda a comunidade. Todos podiam e, para a sua sobrevivência até deviam, ter acesso ao patrimônio material e espiritual da comunidade. Todavia, dado o precário desenvolvimento material e espiritual da humanidade nesse período, também o patrimônio era muito limitado e, portanto, limitado era o desenvolvimento dos próprios indivíduos.

A entrada em cena da sociedade de classes produziu um duplo efeito na história da humanidade. Por um lado, possibilitou um desenvolvimento muito rápido das forças produtivas e também da riqueza espiritual. Por outro lado, a divisão da sociedade em classes

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excluiu a maioria da população do acesso à riqueza acumulada pela humanidade. O que fazia com que essa massa ficasse confinada a um nível muito próximo da animalidade.

Por outro lado, a propriedade privada, com a divisão do trabalho, também deu origem ao fenômeno da alienação, do qual participam não apenas os explorados, mas ttambém os exploradores. Os explorados, por motivos óbvios. Os exploradores, porque o seu acesso à riqueza acumulada pressupõe uma relação que reduz à desumanização a maior parte da humanidade. Além disso, porque a divisão do trabalho faz com que eles mesmos sejam levados a privilegiar o lado espiritual e a menosprezar a atividade que é o fundamento por excelência do ser social, que é o trabalho. Por tudo isso, a formação dos próprios exploradores não pode deixar de ser unilateralizante e, de certa maneira, deformada.

A sociedade capitalista também é uma sociedade de classes. Porém, entre ela e as formas anteriores – asiática, escravista, feudal e outras – há uma diferença importante. É que nas formas anteriores a desigualdade era tida como algo natural. Por isso mesmo, a exclusão das classes subalternas do acesso à riqueza também era visto como algo absolutamente natural. Ao contrário, na sociedade burguesa é proclamada a igualdade de todos os homens por natureza. O que significa que, em princípio, todos eles deveriam poder ter acesso ao conjunto do patrimônio humano. No entanto, como isso, de fato, não é possível (justifica-se essa impossibilidade pela desigualdade que resultaria da livre iniciativa, expressão do inato egoísmo humano), a dissociação entre discurso e realidade efetiva impõe-se como uma necessidade. Proclama-se o direito de todos a uma formação integral. Mas, de um lado, a maioria é excluída do acesso aos meios que possibilitariam essa formação e, de outro, essa mesma formação é definida privilegiando os aspectos espirituais: formação moral, artística, cultural, intelectual.

Curiosamente, mas não por acaso, na sociedade burguesa, essa formação integral também a inclui a preparação para o trabalho. Quando, porém, essa formação é desnudada dos seus elementos superficiais e ideológicos, deixa ver que ela nada mais é do que a formação de mão-de-obra para o capital. Como o caráter de mercadoria da força de trabalho não é questionado, antes é tomado como algo natural, então essa parte da preparação “integral” nada mais é do que a transformação do ser humano em mercadoria apta a

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atender os interesses da reprodução do capital. Em Trabalho assalariado e capital, Marx faz um belíssimo resumo do que acontece com o trabalhador no momento da produção. Diz ele (1970: 27)

A força de trabalho é pois uma mercadoria que seu proprietário, o trabalhador assalariado, vende ao capital. Para que? Para viver. Pois bem, a força de trabalho em ação, o trabalho mesmo, é a própria atividade vital do trabalhador, a própria manifestação da sua vida. E é esta atividade vital que ele tem que vender a outro para assegurar-se os meios de vida necessários. Quer dizer que sua atividade vital não é para ele mais do que um meio para poder existir. Trabalha para viver. O trabalhador nem sequer considera otrabalho parte da sua vida; para ele é muito mais um sacrifício da sua vida. (...) Para ele a vida começa ali onde terminam estas atividades (tecer, fiar, tornear, construir, cavar, etc. ...I. T. ), na mesa da sua casa, no banco da taverna, na cama. As doze horas de trabalho não têm para ele sentido algum como tecer, fiar, etc, mas apenas como meio para ganhar o dinheiro que lhe permite sentar à mesa ou no banco da taverna e deitar-se na cama.

Por seu lado, o aspecto espiritual da formação “integral” também sofre deformações. Isto porque, estando todo o processo de autoconstrução humana mediado pela propriedade privada de tipo capitalista, a própria formação espiritual não poderia escapar dessa lógica.

Começa pelo fato de que somente quem tem dinheiro – essa mercadoria das mercadorias – pode ter acesso a esses bens. A medida do dinheiro é também a medida do acesso. Mas, mesmo o pleno acesso aos bens materiais e espirituais que compõem o patrimônio da humanidade na sociedade capitalista tem, por sua própria natureza, um viés profundamente deformador. Se pensarmos que a formação moral e ética é uma parte importantíssima desse processo, veremos imediatamente como uma apropriação centrada no indivíduo e, portanto, oposta aos outros indivíduos, induz a uma deformação da personalidade. Isso porque toda essa formação leva o indivíduo a aceitar como natural uma forma de sociabilidade que implica que o acesso de uma minoria esteja alicerçado no impedimento do acesso da maioria.

Vale enfatizar: uma formação integral do ser humano, no sentido que a definimos acima, é uma impossibilidade absoluta nessa forma de sociabilidade regida pelo capital. Uma formação realmente integral

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supõe a humanidade constituída sob a forma de uma autêntica comunidade humana, e esta pressupõe, necessariamente, a supressão do capital.

Se definimos a formação humana integral como o acesso, por parte do indivíduo, aos bens, materiais e espirituais, necessários à sua autoconstrução como membro pleno do gênero humano, então formação integral implica emancipação humana. Vale dizer, uma forma de sociedade na qual todos os indivíduos possam ter garantido esse acesso. Porém, uma tal forma de sociedade requer, necessariamente, um tipo de trabalho que tenha eliminado a exploração e a dominação do homem pelo homem. Somente uma sociabilidade baseada nessa forma de trabalho poderá garantir aquele acesso.

Essa forma de trabalho foi denominada por Marx de “trabalho associado” ou “associação livre dos produtores livres”. Uma forma de trabalho que se caracteriza pelo domínio livre, consciente e coletivo dos produtores sobre o processo de produção e distribuição da riqueza. Na medida em que todos trabalhem, segundo as suas possibilidades, e possam apropriar-se daquilo de que necessitam, segundo as suas necessidades, estará posta a matriz para a justa articulação entre espírito e matéria, subjetividade e objetividade. O trabalho, voltado para o atendimento das necessidades humanas e não para a reprodução do capital, se transformará, nos limites que lhe são próprios, numa real explicitação das potencialidades humanas.

Por sua vez, esta forma de trabalho possibilitará – a todos – o acesso à riqueza espiritual e o auto-desenvolvimento naquelas atividades mais especificamente humanas. Com isso estarão dadas as condições para um desenvolvimento harmonioso – o que não quer dizer isento de conflitos – dos diversos aspectos do ser humano.

Educação e formação humana

Como se articulam, então, hoje, educação e formação humana?

Costuma-se dizer que a educação deve formar o homem integral, vale dizer, indivíduos capazes de pensar com lógica, de ter autonomia moral; indivíduos que se tornem cidadãos capazes de contribuir para as transformações sociais, culturais, científicas e tecnológicas que

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garantam a paz, o progresso, uma vida saudável e a preservação do nosso planeta. Portanto, pessoas criativas, participativas e críticas.

Afirma-se que isto seria um processo permanente, um ideal a ser perseguido, de modo especial na escola, mas também fora dela.

Como se vê, está aí estabelecida aquela dicotomia a que aludimos acima: de um lado um ideal estabelecido sob a forma de um dever-ser e, de outro lado, uma realidade objetiva que segue caminhos próprios, inteiramente contrários às prescrições desse ideal. A teoria pedagógica tradicional, que se prolonga com muita expressividade até hoje, pensa que essa contradição entre ser e dever-ser é algo natural, que não pode ser inteiramente eliminada. Por isso mesmo, a busca eterna de melhorias seria o caminho para tentar harmonizar o ideal com a realidade objetiva.

Ora, esta é exatamente a maneira idealista de pensar a questão da relação entre educação e formação humana, ou seja, uma forma que parte do céu para a terra. O estabelecimento do ideal seria uma tarefa do espírito, da consciência, da subjetividade.

A realização prática consistiria na tentativa permanente de configurar a realidade objetiva a partir do que foi estabelecido.

Na esteira de Marx, nosso caminho vai da terra para o céu, isto é, da análise do processo real, objetivo, como ele resulta da atividade dos indivíduos concretos. A partir desta análise buscamos delimitar o conceito de formação humana. O mesmo teremos que fazer agora em relação à educação, exatamente para podermos não prescrever normativamente, mas verificar o processo concreto e as possibilidades que se abrem no seu interior para a articulação entre a educação e a formação humana nos dias de hoje.

Como já tratamos mais extensamente, no livro Educação, cidadania e emancipação humana, da natureza da educação, permitimo-nos fazer, aqui, um resumo do que lá dissemos.

Se partimos, com Marx, do ato do trabalho como aquele ato que funda o ser social, veremos que ele é uma atividade eminentemente social. Portanto, uma atividade que exige a cooperação entre os indivíduos, qualquer que seja a forma que esta cooperação assuma. Por outro lado, também perceberemos que não nascemos humanos,

mas nos tornamos humanos. Que não são leis biológicas que nos dizem o que devemos fazer para atender as nossas necessidades, mas

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que isto se dá pela apropriação daquilo que se tornou patrimônio do gênero humano.

É neste momento que descobrimos a natureza e a função social da educação.

Cabe a ela, aqui conceituada num sentido extremamente amplo, a tarefa de permitir aos indivíduos a apropriação dos conhecimentos, habilidades e valores necessários para se tornarem membros do gênero humano.

Com a entrada em cena da sociedade de classes, também a educação foi, por assim dizer, “seqüestrada”, isto é, organizada, em seu conteúdo e em seus métodos, de modo a atender os interesses das classes dominantes. Mas, de novo, nas formas de sociabilidade anteriores à burguesa, a desigualdade social, aceita como natural, fazia com que a desigualdade na educação também fosse vista como algo inquestionável.

Na sociedade burguesa, ao contrário, onde é proclamada a igualdade natural, supõe-se que a educação deveria propiciar a todos os indivíduos aquela formação integral a que acima nos referimos. Quando isso não acontece, as causas desse insucesso não são buscadas na matriz da sociabilidade burguesa, que é o capital, mas em inúmeros outros fatores, como má administração, falta de recursos, desinteresse, etc.

Por sua natureza, a sociedade burguesa está assentada em uma contradição insanável. A forma do trabalho, que lhe dá origem – a compra-e-venda de força de trabalho – leva à produção da desigualdade social. Esta é uma determinação insuperável nos limites da sociedade burguesa. Não há como impor ao capital uma outra lógica que não seja a da sua auto-reprodução através da exploração do trabalho. Por outro lado, a reprodução do capital exige, também, e ao mesmo tempo, a instauração da igualdade formal. Capitalistas e trabalhadores são livres, iguais e proprietários e assim têm que ser para que o capitalismo se reproduza.

Percebe-se, então, que desigualdade real e igualdade formal não são dois momentos separados, mas partes de uma mesma e incindível totalidade.

Isto se reflete no âmbito da educação sob a forma de uma contradição entre o discurso e a realidade objetiva. O primeiro proclama uma

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formação integral, isto é, livre, participativa, cidadã, crítica para todos os indivíduos. O segundo proclama, no seu movimento real, a impossibilidade daquela formação. É escusado dizer que a regência está nas mãos da realidade objetiva, de modo que a realização de uma formação integral jamais pode se transformar em uma efetividade.

Deste modo, fica claro que o discurso da formação integral, sem o questionamento das raízes da desigualdade social, sem uma firme tomada de posição contra a lógica do capital, contribui, não importa se consciente ou inconscientemente, para a reprodução de uma forma de sociedade inteiramente contrária àquela proclamação.

Se não bastasse a lógica própria do capital, a trágica situação em que está mergulhada hoje a humanidade, devida à crise estrutural do capital, mostra que o processo de deformação tanto da sociedade como dos indivíduos é cada vez mais intenso. Sob a regência do capital, a humanidade foi se tornando uma entidade cada vez mais unitária, mais interdependente. Porém, no seu interior, as oposições – entre os países, as classes, os grupos sociais, os indivíduos – foram se tornando cada vez mais profundas.

Em resumo, se uma educação cidadã, participativa, crítica, incluindo aí a formação para a capacidade de pensar, de ter autonomia moral, a formação para o trabalho, a formação física e cultural, a formação para a defesa do meio ambiente, do desenvolvimento sustentável é a mais elevada contribuição que a educação pode dar para a construção de uma autêntica comunidade humana, então chegamos à absurda constatação de que isto nada mais significa, ao fim e ao cabo, do que formar para a escravidão moderna. Pois, a relação capital-trabalho implicará sempre a exploração do homem pelo homem e, portanto, uma forma de escravidão.

Ora, a educação é um poderoso instrumento para a formação dos indivíduos.

Mas, como já vimos, nas sociedades de classes ela é organizada de modo a servir à reprodução dos interesses das classes dominantes. Na sociedade capitalista isto é ainda mais forte e insidioso porque as aparências indicam que uma formação de boa qualidade é acessível a todos, enquanto a essência evidencia que tanto o acesso universal quanto a qualidade não passam de uma falácia.

É, pois, inútil dar voltas à inteligência para – tanto do ponto de vista teórico como do ponto de vista prático – querer conceituar e levar à

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efetivação uma educação que contribua para a formação humana integral no interior desta forma de sociabilidade. O que, segundo nos parece, se pode e deve pensar são atividades educativas – portanto, não a educação no seu conjunto – que estejam inseridas na luta pela transformação radical da sociedade. Contribuir para uma educação integral, hoje, só pode ter o significado de formar indivíduos comprometidos – teórica e praticamente – com a construção de uma forma de sociabilidade – o comunismo – em que aquela formação integral possa efetivamente ser realizada.

Já demonstramos, tanto em nosso livro Educação, cidadania e emancipação humana, como em vários artigos, que formar para a cidadania não é formar para a emancipação humana em sua plenitude. Mas, como a emancipação humana plena só pode se realizar para além do capital, então, hoje, a educação integral, na forma como ela é possível, implica o compromisso com a luta pela construção de uma outra sociedade.

Esta afirmação tem enormes implicações para a ação de todos aqueles que se ocupam de atividades educativas, tanto em sentido lato como em sentido estrito.

Considerando que a educação é um poderoso instrumento ideológico de controle do capital sobre a reprodução social, não apenas na escola, mas também fora dela, é preciso ter claro que é de uma luta que se trata e não de uma simples questão técnica. Trata-se de uma luta entre duas perspectivas radicalmente diferentes para a humanidade, como já explicitamos em dois artigos intitulados A educação numa encruzilhada e Educação e concepções de sociedade. Também é preciso ter claro que, nessa luta, como em toda sociedade de classes, as idéias dominantes são as idéias das classes dominantes. De modo que a luta pela construção de uma sociedade plenamente emancipada se desenvolve em condições extremamente adversas. Contudo, as alternativas existem já que o capital não pode exercer um domínio absoluto, sob pena de se auto-destruir.

Isto considerado, desenvolver atividades educativas que pretendam contribuir para a construção de uma sociedade em que a formação integral dos indivíduos seja possível implica, em primeiro lugar, o conhecimento claro, sólido e racionalmente sustentado dos fins que se quer atingir. Fins esses que devem brotar da análise do processo histórico-social real e não da mera subjetividade. Com isto queremos

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dizer que é preciso ter clareza do que significa uma sociedade plenamente emancipada.

Considerando o descrédito em que caíram, nos dias de hoje, as idéias de socialismo, comunismo, emancipação humana, superação do capitalismo, pode-se imaginar a imensidade da tarefa que se apresenta já nesse simples momento.

Em segundo lugar, é preciso conhecer a realidade social concreta, aí estando implicadas a história da humanidade, a forma capitalista da sociabilidade e a natureza da crise por que ela passa hoje bem como seus rebatimentos sobre a realidade mais próxima na qual se atua.

Todo esse conhecimento supõe, por sua vez, um conjunto de fundamentos que dificilmente poderão ser encontrados no ideário dominante das ciências humanas e da filosofia hoje. Estas áreas são, hoje, dominadas por idéias que muito mais contribuem para obscurecer do que para iluminar a realidade. Onde, então, poderão ser encontrados esses fundamentos e as teorias que mais contribuam para a compreensão da realidade? Na perspectiva radicalmente nova e radicalmente crítica instaurada por Marx e naqueles que, após ele, resgataram esse caráter radicalmente novo e crítico de sua teoria. Tal afirmação pode parecer excessiva, para dizer o mínimo. Mas, se considerarmos a enormidade e a gravidade dos problemas que a humanidade enfrenta hoje, veremos facilmente como é necessária uma teoria que permita ir à raiz dos problemas. Todas as teorias que pretenderam ou pretendem apenas contribuir para aperfeiçoar esta forma de sociabilidade e não para transformá-la integralmente não apenas não conseguiram e não estão conseguindo o seu objetivo, mas, pelo contrário, estão contribuindo para agravar a situação da humanidade. E isso por um motivo muito simples. Por que, como demonstrou muito bem I. Mészáros (2005), o capital não pode ser controlado e sua lógica é cada vez mais destrutiva. Pode ser erradicado, na medida em que sua raiz – a compra-e-venda de força de trabalho for arrancada e substituída por outra, o trabalho associado. Mas, não pode ser controlado, porque, após ter-se instaurado, sua lógica adquire uma dinâmica superior a qualquer força social.

Pode-se argumentar que a teoria marxiana, que se pretendia radical, também não conseguiu contribuir para atingir os objetivos propostos. Isso é verdade. Porém, ela tem uma enorme vantagem em relação ás outras. E essa vantagem consiste no fato de que ela aponta para uma

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possibilidade real, a erradicação do capital, enquanto as outras pretendem o controle dele, o que é uma impossibilidade absoluta.

Por isso mesmo, uma atividade educativa que pretenda contribuir para formar indivíduos comprometidos com a construção de uma sociedade em que a formação integral seja possível requer o resgate da teoria marxiana, mais precisamente, naquelas interpretações –sabe-se que há muitas interpretações do pensamento de Marx – que reponham o seu caráter radicalmente crítico e revolucionário.

Em terceiro lugar, implica desenvolver atividades que incentivem as pessoas a participar ativamente das lutas sociais que estejam articuladas com a transformação radical da sociedade e não apenas com a cidadania. Isto porque, como dizia Marx, as idéias apenas transformam a mente, o que certamente é muito iortante. Mas, para que transformem a realidade, é necessário que elas se tornem força material e isso se dá através da ação prática.

Referências bibliográficasCHASIN, J. Marx: estatuto ontológico e resolução metodológica. In: TEIXEIRA, J.F.S.

Pensando com Marx. São Paulo: Ensaio, 1996.

LEONTIEV, A. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.

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MÉSZÁROS, I. Para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2005.

TONET, I. Educação, cidadania e emancipação humana. Ijuí: Unijuí: 2005

______, Educação e concepções de sociedade. In: Universidade e Sociedade, n. 19, 1999.

______, A educação numa encruzilhada. In: MENEZES, A.M.D., e FIGUEIREDO, F. F. (orgs) Trabalho, sociabilidade e educação. Fortaleza: Ed. UFC, 2003.

A POLÍTICA PARA O ENSINO SUPERIOR DO GOVERNO LULA: UMA ANÁLISE CRÍTICA

Patrícia Vieira Trópia¹

¹ Professora da Faculdade de Educação da PUC-Campinas e pesquisadora do Centro de Estudos Marxistas da Unicamp. Este texto foi elaborado

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inicialmente para a Semana da Pedagogia da UFSCar, organizada pela Coordenação do curso de Pedagogia e pelo Centro Acadêmico de Pedagogia, realizada entre os dias 10 e 14 de setembro de 2007.

I. Introdução

Uma das artimanhas político-ideológicas colocadas em prática pelos governos neoliberais no processo de construção de sua hegemonia tem sido a apropriação de históricas bandeiras defendidas pela esquerda. Este é o caso da crítica ao caráter elitista das universidades públicas brasileiras. Não obstante, ao aludir aos supostos privilégios do ensino universitário no Brasil, os ideólogos neoliberais, longe de buscar sua real democratização, pretendem ocultar – por meio de ações pretensamente “inclusivas” e desenvolvimentistas – a natureza perversa e regressiva de suas propostas e, sobretudo, atrair o apoio dos setores populares. Na luta ideológica e teórica é preciso decifrar os interesses em jogo e os reais alcances das políticas, sob pena de apoiarmos mudanças e reformas que justamente reforçam e aprofundam as características mais negativas e perversas que se esperava superar.

O objetivo deste artigo é analisar a política para o ensino superior no governo Lula (2002-2007) como resultante de um processo político de alianças e embates de classes e frações de classes no Brasil, na atual fase do capitalismo neoliberal. Apesar de amplamente dominante, esta política encontra-se em disputa. Por isso analisar os interesses de classes em jogo constitui, para o pensamento crítico, uma tarefa teórica e politicamente necessária.

Antes de procedermos à exposição do tema proposto para este artigo, faz-se necessário apresentar os pressupostos de nossa análise, quais sejam: 1) As relações sociais são, invariavelmente, relações entre classes em presença e em disputa; 2) Toda política estatal resulta dos conflitos de interesses de classes e frações de classe em luta. Uma determinada política não resulta da vontade de indivíduos, como forjou a historiografia vulgar de cunho positivista, nem resulta da vontade de uma única classe. A partir da análise da composição das classes em uma situação concreta, é possível afirmar que há situações hegemônicas, ou seja, que uma das classes ou frações de classe consegue fazer com que seus interesses econômicos imediatos e exclusivos predominem sobre os interesses de outras classes e frações de classe. Mas esse predomínio resulta, invariavelmente, de um enfeixamento, da confluência dos interesses em disputa na cena política. Uma metáfora para representar esta concepção de política é a

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brincadeira “cabo de guerra”. Imagine-se não um “cabo de guerra”, mas vários feixes de “cabos”, cada qual sendo pressionado em uma direção, e a direção vitoriosa nunca é aquela inicialmente pretendida, mas a possível diante das forças aliadas, opostas e contrapostas; 3) A política educacional do governo Lula expressa, até o presente momento, a vitória das classes e frações de classe dominantes, em particular do capital financeiro, que contou, para conquistar esta hegemonia, com o apoio da burocracia estatal, vis-a-vis do Ministério da Educação, da burguesia nacional industrial, da nova burguesia de serviços, de alguns setores das classes médias, bem como de setores populares. Por sua vez, encontrou a resistência de alguns setores organizados (Conlutas, por exemplo) e de uma fração das classes médias: o funcionalismo público federal, especialmente.

Dividimos este artigo em duas partes: na primeira analisamos os principais eixos da política do governo Lula durante o período 2002-2007 e, na segunda, apresentamos algumas das orientações e posições defendidas por aquelas forças sociais na luta pela conquista de seus objetivos. Os interesses das frações burguesas e de algumas frações das classes médias convergiram para, e neste sentido apoiaram, a proposta de reforma do ensino superior brasileiro.

II. Primeira Parte

II.1 A política para o ensino superior no primeiro governo Lula (2003-2006)

A política do governo Lula para o ensino superior se iniciou com a constituição de um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) encarregado de analisar a situação do ensino superior no País e apresentar um plano de ação. O resultado do trabalho do GTI foi a produção de um relatório que se tornou público no final de 20032. Este documento fazia um diagnóstico até certo ponto catastrofista da situação da educação superior, em especial das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), dada a crise fiscal do Estado e a suposta incapacidade do Estado brasileiro de realizar novos investimentos. Esta crise não se restringiria apenas às IFES, mas também às instituições privadas, que, em função da expansão recorde durante o governo FHC, naquela conjuntura se encontravam “ameaçadas pelo risco de uma inadimplência generalizada”3 e de uma crescente desconfiança em relação à formação e aos diplomas4.

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A urgência na adoção de medidas justificar-se-ia em função da meta de expansão de 30% das vagas no ensino superior – expansão acordada pelo Brasil e os Organismos Internacionais e definida como meta pelo Plano Nacional de Educação5. Assim, sob o discurso de justiça social e de democratização do ensino superior, o GTI apresentaria as seguintes soluções para enfrentar a crise: a criação de um programa emergencial de apoio ao ensino superior, especialmente às universidades federais, e a realização de uma Reforma Universitária mais profunda. Esta reforma teria que perseguir quatro objetivos.

1) Ampliação do quadro docente e de vagas para estudantes: o governo estabelecera uma meta para 2007 (chegar a 2,4 milhões de vagas no sistema federal). Esta meta seria atingida por meio da abertura de concursos nas IFES, mas também de algumas alternativas como a criação de novas bolsas da CAPES, para aproveitar professores aposentados e recém doutores nas atividades de ensino de graduação. Propunha também o aumento da carga horária dos professores em sala de aula, o aumento no número de alunos e a educação à distância.

2) Educação à Distância: de acordo com o relatório do GTI, a universidade pública brasileira, mesmo expandindo o número de vagas presenciais e considerando a ampliação de recursos, não teria condições de aumentar as vagas de forma maciça em curto e médio prazo, por isso a educação à distância seria a única forma de viabilizar a democratização do ensino. Um dos mais convictos apoiadores desta proposta era o então ministro da Educação, Cristovam Buarque, que no mesmo ano publicaria um livro, patrocinado pelo MEC e pela UNESCO, em que defendia a criação de uma “universidade aberta”6.

Esta ênfase no ensino à distância defendido como a única forma de encurtar o tempo necessário para, e viabilizar, a democratização do ensino superior ocultaria uma demanda das agências internacionais interessadas na abertura do mercado do ensino superior brasileiro para a concorrência internacional. Como a implantação do capital estrangeiro no ramo educacional não ocorre nas mesmas bases do capital industrial – pois a construção, criação e manutenção de universidades estrangeiras oneraria suas mantenedoras e tornaria o ensino um “mau negócio”, a perspectiva do ensino à distância torna-se, não apenas mas também, para esta fração do capital, economicamente, providencial7.

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3) Autonomia Universitária: de acordo com o relatório do GTI, a superação da crise financeira que paralisa as universidades está condicionada à autonomia universitária, na realidade um eufemismo que oculta a proposta de desregulamentação didático-científica (como liberdade de flexibilizar currículos), financeira e administrativa (liberdade de captar e administrar recursos, definir prioridades e estruturas de gastos e planejamento). Segundo o relatório,

“a autonomia deve conferir à universidade, de forma participativa e transparente, competência para dispor sobre sua organização administrativa, suas questões financeiras e suas políticas em matéria educacional, sem interferência de outros órgãos do Governo, nos limites constitucionais. A relação com o Governo e o Estado se daria no momento de sua avaliação, quanto aos aspectos da boa gerência, feita pelo TCU, e pelo Sistema Nacional de Avaliação e Progresso do Ensino Superior do MEC”8.

Propõe-se cobrar taxas de estudantes e facilitar a busca de recursos junto à iniciativa privada, cujos passos seriam a criação ou regularização das Fundações, vinculadas às Instituições de Ensino Superior (IES), e as Parcerias Público-privado. A autonomia financeira também seria garantida por meio da redução de pessoal, bem como da flexibilização nas formas de contratação de pessoal;

4) Financiamento: a dependência das universidades dos orçamentos públicos – sobretudo os constitucionais – constitui o principal problema na avaliação do GTI. Como parte dos recursos públicos destinava-se ao pagamento de salários e aposentadorias, as IFES não teriam como aportar recursos para recuperação de prédios, nem adquirir equipamentos novos, modernizar os laboratórios e atualizar acervo das bibliotecas para o ensino de graduação. Por isso, as propostas principais do GTI consistiam em conter gastos com folha de pagamento e viabilizar a entrada de recursos privados na IES.

*****

Este diagnóstico realizado pelo GTI e as ações sugeridas foram, com breves alterações, incorporados às versões do Anteprojeto de Reforma Universitária, levadas ao público pelo então ministro Tarso Genro em 2004 e 2005. Ao encaminhar os anteprojetos para conhecimento e “discussão pública”, o governo Lula cumpriu um importante papel no processo de difusão ideológica, na medida em que pode, por assim dizer, testar o impacto das propostas ali

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apresentadas. Neste processo, alguns temas serviram como uma espécie de termômetro para o Ministério da Educação, tais como: a redução do papel do Estado a agente avaliador e regulador do ensino superior, o aumento da participação da sociedade – leia-se mercado – na definição dos projetos e investimentos públicos (parceria público-privada), a adoção de medidas afirmativas e de uma política de cotas para compensar o elitismo do ensino superior, o financiamento público para IES particulares e a flexibilização do sistema de ensino superior. Vulgarizada como uma medida democrática pelos seus proponentes, os anteprojetos de lei ocultariam objetivos conservadores e regressivos. Vejamos a posição de alguns analistas.

Os analistas do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN) têm sido unânimes em apontar que os reais objetivos da Reforma Universitária – sob a aparência de revitalizar as universidades públicas, regulamentar o setor privado e democratizar o acesso ao Ensino Superior – seriam: privatizar o sistema federal de ensino superior; restringir a autonomia das universidades públicas apenas à liberdade de captar recursos financeiros; garantir a total autonomia das IES privadas9; condicionar o repasse dos recursos ao desempenho (daí a importância do SINAES); cortar recursos, transferir aposentados e pensionistas da folha de pagamento das universidades para o Tesouro Nacional e captar recursos na iniciativa privada por meio das Fundações (daí as Parcerias Público-Privadas); abertura para o capital internacional no ensino. Segundo Leher10, os objetivos da reforma universitária seriam: consolidar o eixo privado como vetor do fornecimento da educação superior; reduzir o papel do Estado à condição de regulador do ensino superior; naturalizar a diferença entre os sistemas de ensino, reservando aos jovens das classes populares um ensino de qualidade inferior; transformar a universidade em organização de serviços demandados pelo capital metamorfoseados como inovação tecnológica; converter a educação tecnológica em um braço da ação empresarial; aumentar o controle governamental (produtividade, eficiência e ideológica, reguladas por meio da avaliação) e do mercado (financiamento e utilitarismo) sobre a universidade pública, inviabilizando a autonomia e, principalmente, a liberdade acadêmica.

Ao mesmo tempo em que os pressupostos e as versões do anteprojeto de lei eram debatidos por alguns segmentos da sociedade brasileira, a política estatal para o ensino superior era paralelamente implementada. Não nos cabe aqui analisar as razões desta defasagem

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entre o trabalho da frente política que assumiu a tarefa de propor o texto da reforma universitária e as ações governamentais que colocaram em prática – utilizando a figura política da Medida provisória – a Lei de Inovação Tecnológica, as Parcerias Público-Privadas, o Decreto que normatiza a Educação à Distância, além das medidas já adotadas para a Educação Profissional. Mas para atender às “pressões vindas do mercado” (abertura do ensino superior ao capital internacional, implementação de políticas que pudessem salvar as IES privadas do crescente déficit de candidatos e da inadimplência, reduzir os gastos públicos e garantir o superávit primário por meio da reestruturação do modelo de universidade pública), o governo Lula descartou os instrumentos políticos que teriam um caráter mais democrático.

Vejamos, então, as principais ações políticas para o ensino superior no primeiro governo Lula.

1) Prouni – Muito embora tenha enviado o Projeto de Lei do Prouni ao Congresso Nacional para tramitação, o governo Lula editou, em 10 de setembro de 2004, a Medida Provisória (MP) nº 213, que instituiu o Programa Universidade para Todos. Posteriormente, o Decreto nº 5.245, de 18 de outubro de 2004, regulamentou a MP e a Portaria nº 3.268, de 19 de outubro de 2004, estabeleceu os procedimentos para adesão das Instituições Privadas de Educação Superior ao Prouni. Em 2005, o Prouni foi transformado na Lei nº 11.096/05. Defendido por seus propositores como a mais democrática das ações do governo Lula, o Prouni estende a todas as instituições privadas (com ou sem fins lucrativos), que a ele aderirem, isenção de: Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social e Contribuição para o Programa de Integração Social11.

Em 2005, primeiro ano de vigência do Prouni, aderiram 1.142 instituições privadas, ou seja 59% do total, enquanto em 2006 este índice foi de 57,6% – o que equivale a 1.232 IES12. A pronta resposta das IES privadas ao Prouni pode ser compreendida pelos benefícios financeiros advindos da renúncia fiscal. Muito embora tenha incentivado, o governo também inviabilizou, ao estabelecer alguns regulamentos, que outras IES aderissem ao Programa – o que de resto gerou fortes e orgânicas reações por parte das entidades

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representativas das instituições de ensino particulares, como veremos na segunda parte deste artigo.

2) O SINAES – Instituído pela Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, com o objetivo de conduzir o processo de avaliação da educação superior e definir as regras para autorização de IES e de cursos, o SINAES reforçaria o papel do Estado como regulador do sistema. O seu objetivo oculto é ajustar a educação superior brasileira às exigências de avaliação inseridas nos documentos emanados dos organismos internacionais, de forte cunho quantitativo e competitivo. Supostamente um indutor do aumento da qualidade de cursos e fiscalizador das instituições particulares, o SINAES serviria, na realidade, para coagir as IES a se adequarem ao modelo que está sendo implantado.

3) A Lei de Inovação Tecnológica – Aparentemente democrática e de estímulo à arrecadação de novos recursos, esta Lei acaba incentivando a criação de nichos privilegiados que recebem recursos para seus grupos, mas não para a universidade pública que cede espaço físico, laboratórios, equipamentos (o investimento mais oneroso) e os próprios pesquisadores. Conforme o texto da Lei 10.973, de 2004, as Instituições de Ciência e Tecnologia poderão:

I – compartilhar seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demais instalações com microempresas e empresas de pequeno porte em atividades voltadas à inovação tecnológica, para a consecução de atividades de incubação, sem prejuízo de sua atividade finalística;

II – permitir a utilização de seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demais instalações existentes em suas próprias dependências por empresas nacionais e organizações de direito privado sem fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, desde que tal permissão não interfira diretamente na sua atividade-fim, nem com ela conflite.

Outro aspecto que chama a atenção é a possibilidade de pagamento dos pesquisadores civis e militares pelo seu envolvimento

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em projetos patrocinados pela Lei – o que garante o recebimento de recursos para os grupos de pesquisa que despertem interesse das grandes empresas por meio dos Fundos Setoriais, mas não para a Universidade, e que mina, ainda mais nestas áreas, os laços de solidariedade trabalhista e profissional. Em uma conjuntura de desregulamentação dos direitos trabalhistas e de contenção salarial, para cientistas das áreas tecnológicas, a Lei atrai pelo seu apelo financeiro (renda extra) e ideológico, na medida em que converte o docente em “empreendedor” e “empresário”, cujo capital é, diga-se de passagem, o patrimônio público. Além disso, são previsíveis as conseqüências para as áreas de pesquisa básica e nas ciências sociais e humanas – que são atrativas apenas quando rebaixadas ao patamar da produção meramente ideológica. Trata-se, portanto, de mais uma medida que institucionaliza o controle do mercado sobre a pesquisa científica, bem como a privatização da pesquisa universitária.

4) As Parcerias Público-Privadas (PPP) – As Parcerias Público-Privadas foram regulamentadas pela Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que “institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública”. Segundo Lopreato, as PPPs “foram pensadas para fazer os investimentos que o setor público deixou de realizar porque tem que gerar o superávit primário exigido na manutenção da sustentabilidade da dívida que o mercado requer”13. Criadas para toda a administração pública direta e indireta, os contratos de parceria reservam ao Estado a função de distribuidor e pagador, enquanto ao parceiro privado (nacional ou internacional) cabe gastar, contratar obras e serviços e gerir o projeto.

5) Eduação à Distância – Em dezembro de 2005, já na gestão Fernando Haddad, o governo Lula assinou o decreto nº 5.622, de 19 de dezembro de 2005, regulamentando a oferta da educação à distância no Brasil. Este Decreto, em conjunto com a Lei das Parcerias Público-Privadas, consolida a abertura do mercado educacional brasileiro ao capital estrangeiro. Mais uma vez o Governo se anteciparia à “Reforma Universitária”, sem o crivo parlamentar e sem o debate com a comunidade acadêmica.

II. 2 A política para o ensino superior no segundo governo Lula

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No primeiro ano do segundo mandato, o governo Lula intensificou o processo de mudanças no ensino superior, consagrando a visão mercantil, utilitarista e regressiva. Mercantil porque consagra a visão da educação como uma mercadoria; utilitarista pois tão somente voltada ao mercado de trabalho e à empregabilidade; regressiva pois significa um retrocesso em termos científicos e culturais para a educação e a cultura brasileiras – aumentando a dependência cultural e científica do País relativamente aos países centrais.

A publicação do PDE, a criação da REUNI, da Universidade Aberta, da Universidade Nova e recentemente do Banco de professores-equivalente constituem um conjunto de medidas voltadas ao que podemos chamar de desmonte do modelo de universidade pública brasileira e sua substituição por variados modelos de formação superior.

Neste primeiro ano, vem se difundindo a concepção de que o modelo de universidade, fundado na indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, é caro, está falido e precisa ser diversificado. Esta diversificação foi consagrada pela LDB que criou quatro tipos de instituições de ensino superior e definiu regras, condições e funções diferentes a cada uma delas. Com as propostas em curso, os modelos de graduação que tendem a se expandir são os de graduação mais curta, profissionalizante, técnica e generalista14. Os determinantes desta tendência encontram-se no atual estágio de desenvolvimento do capitalismo e da divisão internacional do trabalho, que impõe, aos países da periferia do capitalismo, o lugar de consumidores e não de produtores de ciência e tecnologia.

As universidades de pesquisa, aquelas que demandam alto investimento, corpo docente qualificado e com dedicação exclusiva, só poderão existir em pequeno número (os centros de excelência) e para atender aos interesses da produção (Lei de Inovação Tecnológica e PPP). Por sua vez, é atribuído um papel ideológico ao ensino superior – possível em uma conjuntura de desemprego estrutural. Este papel é o de servir de instrumento de coesão social15.

Passemos agora às ações estatais para o ensino superior:

1) O Plano de Desenvolvimento da Educação – Defendido pelo presidente Lula durante a cerimônia de assinatura dos atos normativos “como o Plano mais abrangente já concebido neste País para melhorar

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a qualidade do sistema público e para promover a abertura de oportunidades iguais em educação”, o PDE, lançado em abril de 2007, é um conjunto de 28 ações. Entre as mais polêmicas estão aquelas relacionadas às Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) e à formação de professores. O aspecto mais polêmico da ação relativa às IFES não é a proposta de duplicação do número de vagas. Esta é uma medida importante e democrática. Mas ela vem acompanhada de um conjunto de pré-condições, como por exemplo a flexibilização dos cursos e a redução do custo por aluno. Ou seja, as Universidades que aderirem ao Programa de Reestruturação das Universidades (REUNI) terão suplementação financeira desde que – abrindo mão de sua autonomia – adotem o polêmico modelo de ensino superior flexível. Outra ação polêmica é a contratação de professor equivalente, medida que desregulamenta tanto a forma de seleção quanto de contratação de professores.

Flexibilização curricular e trabalhista, racionalização de recursos e ensino à distância como forma de democratização do acesso e de formação de professores são também os pressupostos que vêm sendo defendidos para a implantação do Programa de Reestruturação das Universidades Federais, o REUNI, da Universidade Aberta, do Banco de professores-equivalentes, bem como a proposta de implantação da Universidade Nova. Vejamos.

2) REUNI – por meio do Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007, o governo Lula instituiu o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, cujo objetivo é “criar condições para a ampliação do acesso e permanência na educação superior, no nível de graduação, pelo melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades federais.” Sua meta é “a elevação gradual da taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais para noventa por cento e da relação de alunos de graduação em cursos presenciais por professor para dezoito, ao final de cinco anos, a contar do início de cada plano”16. Além desta meta, cujo pressuposto é a racionalização dos gastos públicos, por meio do aumento do número de concluintes e do número de alunos, por professor, o decreto tem como meta a reorganização dos cursos de graduação. Entre as diretrizes do Programa está a diversificação das modalidades de graduação, que podem ser mais bem compreendidas por meio da proposta de Universidade Nova.

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3) Universidade Aberta – O decreto nº 5.800, de junho de 2006, instituiu o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) voltado para o desenvolvimento da modalidade de educação à distância, com a finalidade de expandir e interiorizar a oferta de cursos e programas de educação superior no País. Os objetivos explícitos da UAB são:

“oferecer cursos de licenciatura e de formação inicial e continuada de professores da educação básica; oferecer cursos superiores para capacitação de dirigentes, gestores e trabalhadores em educação básica dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; oferecer cursos superiores nas diferentes áreas do conhecimento; ampliar o acesso à educação superior pública; reduzir as desigualdades de oferta de ensino superior entre as diferentes regiões do País; estabelecer amplo sistema nacional de educação superior à distância; e fomentar o desenvolvimento institucional para a modalidade de educação à distância, bem como a pesquisa em metodologias inovadoras de ensino superior apoiadas em tecnologias de informação e comunicação”17.

Estes objetivos ocultam que a transformação da educação superior em um crescente e lucrativo negócio exige a redução de custos, o que implica inserir o ensino à distância nos cursos de graduação. Ocultam, neste sentido, os interesses do capital estrangeiro em investir diretamente na educação superior brasileira. Bastante polêmica é, neste sentido, a ênfase na modalidade à distância para formação de inicial e continuada de professores, na medida em que a queda na demanda pelas licenciaturas, seja em universidades públicas ou particulares, pretende ser enfrentada por meio da formação à distância.

4) Banco de professores-equivalente – A Portaria Normativa Interministerial, nº 22 de 30 de abril de 2007, definiu as regras para composição do banco de professores-equivalente. O Banco de professores-equivalente corresponderá à soma dos professores efetivos e substitutos em exercício na universidade. A portaria faculta às universidades federais a realização de concurso público para prover os cargos de professor de terceiro grau, faculta a contratação de substitutos, ou seja quebra, mais uma vez, o estatuto do servidor público e flexibiliza a forma de contratação.

5) Universidade Nova – A proposta da Universidade Nova até o presente momento não foi aprovada oficialmente. Dois documentos são importantes para conhecermos quais são os pressupostos e as

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idéias que a animam. O primeiro é o texto “Universidade Nova: reestruturação da arquitetura curricular na Universidade Federal da Bahia – minuta de anteprojeto” e o segundo é o documento não-oficial “Plano Universidade Nova de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais Brasileiras”. O primeiro documento, após exposição da história das universidades no mundo e no Brasil, apresenta o modelo norte-americano e o novo modelo europeu – identificado como modelo da Universidade de Bolonha – e compara-os ao existente no Brasil. A Universidade Nova resultaria da confluência destes modelos, que têm em comum a divisão do ensino superior em dois ciclos – um generalista (de 2 a 3 anos), não necessariamente propedêutico, e outro profissionalizante. Segundo analistas do ANDES, quando confrontada ao modelo de política econômica, voltada ao permanente contingenciamento de recursos, e à escassez de vagas na etapa profissionalizante, “o Ciclo Básico ranqueador instalado se tornaria, indubitavelmente, um mecanismo adicional de exclusão social”18. Basicamente, a proposta de Universidade Nova consiste em substituir os exames vestibulares pelo ENEM e pela criação de um ciclo básico de três anos dentro do ensino superior, que dará uma formação geral ao estudante garantindo-lhe um “bacharelado interdisciplinar”. Somente após completar este ciclo é que o aluno optaria pela carreira que desejasse cursar – se ainda desejar uma carreira superior. Além da reestruturação curricular, a Universidade Nova teria como metas, entre outras, o aumento dos índices de aprovação nas IES, definido em 90%, e o aumento das cotas e ações afirmativas para alunos negros e carentes.

Um outro aspecto que deve ser destacado é o de que a Universidade Nova, na medida em que tem os modelos norte-americano e europeu como referência, pretende tornar o ensino superior brasileiro compatível à mobilidade externa, bem como à entrada de investimentos estrangeiros no País. Afinal, com currículos e modelos de formação semelhantes, rompe-se uma das barreiras à entrada do capital externo.

Sublinhemos, então, antes de passarmos à segunda parte deste artigo, as duas principais linhas ideológicas utilizadas pelos membros do governo Lula na legitimação de suas propostas: a suposta falência e o elitismo do atual modelo de universidade pública, bem como a necessária democratização do acesso ao ensino superior. Por meio destas duas linhas, procurou-se legitimar todas as ações

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implementadas para o ensino superior. Mas, quais os reais interesses das classes e frações de classe frente a tais ações?

III. Segunda Parte

III. 1 O ensino superior no Governo Lula e as classes e frações de classe em disputa

Como as diferentes classes e frações de classe apóiam, assimilam ou rejeitam as políticas do governo Lula para o ensino superior? Para responder a esta questão, analisaremos algumas orientações e posições das frações da burguesia, das classes médias e dos setores populares diante da política em curso para o ensino superior.

III.1.1 O ensino superior e os interesses da fração financeira do capital

A fração financeira do capital tem se beneficiado duplamente pela política neoliberal. Por um lado, esta fração da burguesia, que havia se beneficiado com a política de abertura econômica, redução de gastos sociais, privatização de empresas e serviços públicos e desregulamentação das relações de trabalho (flexibilização na contratação e reforma da previdência), implementada durante o governo FHC19, têm seus interesses gerais preservados com a atual política econômica do governo Lula de produção de superávit primário para pagamento da dívida externa ou de contingenciamento de recursos, por meio do Plano de Aceleração do Crescimento. Representada pelos organismos internacionais como o Banco Mundial, esta mesma fração do capital procurou submeter os países periféricos e endividados às políticas de ajuste estrutural, vale dizer, políticas econômicas que viabilizaram a abertura econômica e o aumento da dependência da Brasil20. Por outro, o capital financeiro também se beneficia na medida em que, desde 1990, alguns programas e ações derivados de políticas educacionais dependem, para se viabilizar, de acordos e contratos de empréstimos com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) ao País – o que exemplifica a função propriamente financeira do BID, mormente travestida de “apoio ao combate à pobreza”21. Segundo Silva, no período 1987-1994, os empréstimos realizados pelo Banco Mundial para a educação passaram de 2% para 29% do total22.

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Por sua vez, passam a ser criadas instituições financeiras voltadas exclusivamente para o setor educacional23, bem como se observa o crescimento de linhas de crédito e financiamento para alunos (para pagamento de mensalidades) e professores (antecipação ou pagamentos de salários em atraso) – o que evidencia que esta fração ganha com os efeitos mais perversos da expansão de vagas e das próprias IES particulares24.

III.1.2 O ensino superior e os interesses da nova burguesia de serviços

A burguesia de serviços não é uma fração do capital nova no Brasil, mas ela vem se expandindo desde a ditadura militar. Com o advento do neoliberalismo, este setor do capital vem crescendo exponencialmente, sobretudo a partir de 1995. Como a origem da nova burguesia de serviços está, em grande medida, no capital comercial, este segmento tende a conceber o ensino superior como mera mercadoria, como mero valor de troca. O que isso significa? Que cursos não rentáveis não são criados; áreas do conhecimento são desconsideradas; o sentido crítico iluminista da universidade de esvazia; a universidade se torna operacional.

A nova burguesia de serviços no campo da educação cresceu com a política neoliberal de redução de gastos sociais e de privatização, assumindo, portanto, funções sociais relegadas pelo Estado. Esta fração do capital está organizada em torno do Fórum Nacional da Livre iniciativa na Educação. Este Fórum – uma espécie de Think thanks da educação – congrega 25 entidades representativas e mantenedoras do setor educacional privado com o objetivo de influir na reforma da educação superior. Dentre os documentos publicados pelo Fórum, um especialmente reflete as concepções e os objetivos imediatos deste segmento das classes dominantes. Vejamos.

O documento intitulado “Agenda Positiva”, de julho de 2005, encaminhado ao MEC pela Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) e pelo Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior no Estado de São Paulo (SEMESP), propunha a alteração de vinte e quatro pontos que estariam estrangulando o setor privado, das quais destacamos algumas.

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1. Excesso de normas regulamentadoras – solicita-se que seja vedado ao executivo o poder de estabelecer regulamentos (desregulamentação) do ensino superior, em particular solicita a supressão da prerrogativa de reconhecer e renovar o reconhecimento das IES.

2. Revogação do artigo 20 do decreto 3.860/01. Este referido decreto determina a apresentação de certidões negativas de débitos fiscais para reconhecimentos de cursos nas IES. Vista como uma fiscalizadora, esta medida é contestada por seu caráter supostamente interventor e prejudicial aos alunos que teriam seus diplomas impedidos de serem emitidos.

3. Revogação das portarias 1.670/94 e 1.120/1997, que dispõem sobre a obrigatoriedade de publicação de currículos e edital de processo seletivo – considerado oneroso e desnecessário.

4. Lei sobre anuidade escolar – Lei nº. 9.870/97. Esta lei é criticada pelas mantenedoras por supostamente estimular a inadimplência, na medida em que garante direitos anuais dos alunos. As mantenedoras defendiam a rescisão contratual e a não entrega de diplomas, caso os alunos ficassem mais de dois meses inadimplentes.

5. Nova qualidade do ensino superior – Essa visão tem como imperativo a adoção de mecanismos inovadores de gestão e de reorganização das instituições de educação superior, cujo foco é a promoção do ensino de massa diferenciado para atender as economias modernas que ficam cada vez mais dependentes de conhecimentos intensivos; portanto, dependem mais dos graduados do ensino superior, que constituem uma “massa de trabalho pensante”. A instituição de ensino superior tem o compromisso de formar não somente bons profissionais em busca de emprego, mas também criadores de empregos em mercados de trabalho mutantes.

6. Duração da hora/aula. As mantenedoras contrapunham-se à proposta de hora aula de 60 minutos – medida que, se aprovada, poderia gerar aumento de carga horária dos cursos e aumento de salário de professores.

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7. Utilização do Fundo de Garantia por tempo de serviço. Apoiavam uma proposta de utilização do FGTS para pagamento de mensalidades escolares – quando se sabe que este fundo pode ser historicamente utilizado em casos de demissão ou para construção de casa própria ou no caso de enfermidades graves.

8. Limitação de alunos por sala de aula. As mantenedoras se opunham à qualquer medida que limitasse o número de alunos por sala nas disciplinas teóricas. Alegaram que a redução ou limitação do número de alunos por sala elevava os encargos educacionais.

A análise crítica do documento “Agenda Positiva” permite-nos compreender quais são as expectativas e os interesses imediatos deste segmento frente à política para o ensino superior. Os interesses da nova burguesia de serviços estão direcionados à redução da esfera de intervenção do Estado no ramo educacional. Esta fração do capital focaliza sua crítica, sobretudo, à função reguladora do Estado brasileiro, em particular do Ministério da Educação, como podemos concluir:

“O MEC tem extrapolado no seu poder de regulação ao condicionar a avaliação institucional e de cursos à comprovação da regularidade fiscal, restringindo, assim, o princípio da livre iniciativa e confundindo a entidade mantenedora (associação, fundação e sociedade) e a entidade mantida (Universidades, Centros Universitários, Faculdades Integradas, Faculdades, Institutos Superiores de Educação e Centros de Educação Tecnológica). (...)

Em face dos princípios da livre iniciativa (liberdade de organização e de concepção da estrutura organizacional), a aprovação de modificações nos estatutos e regimentos das instituições de ensino é de estrita competência de seus órgãos colegiados, aprovados pela entidade mantenedora. Os atuais procedimentos do Ministério da Educação, ao exigir que as modificações desses documentos sejam encaminhadas para sua aprovação, têm conduzido a uma situação insustentável pela demora de anos, prejudicando instituições e alunos”.25

Mas é preciso considerar que esta crítica à política do governo Lula é pontual e ideológica. Este segmento tem se beneficiado com

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taxas de lucro nada desprezíveis. Segundo dados divulgados pelo jornal Folha de S. Paulo, o setor educacional movimenta por ano cerca de R$ 15 bilhões, com margem de lucro líquida que variou nos últimos anos entre 18% e 7,7% ao ano26. Segundo estudo encomendado, pela ABMES, à Hoper Marketing Educacional,

“as oportunidades são muitas e o ensino segue sendo um ótimo negócio. No entanto, estamos chegando ao fim do “ciclo de ouro” da expansão do ensino superior privado e com isso aproxima-se o “momento da verdade”. A abundância na demanda fazia com que os erros e o amadorismo da gestão fossem sendo encobertos pela grande quantidade de captação de novos alunos. Algumas IES fizeram dívidas para serem pagas com o grande aumento na quantidade de alunos que acreditavam iriam ter todos os anos. Agora a realidade é outra e iremos finalmente ficar sabendo quem veio para ficar”.

Apontada como um dos entraves ao aumento da lucratividade do setor, a intervenção estatal por meio de regulamentações é, como pudemos verificar, criticada como nefasta. Mas, esta posição não é doutrinária; na realidade ela oculta que a “livre iniciativa econômica” nunca pode, nem poderá jamais, sobreviver sem o intervencionismo estatal que, no limite, defende a propriedade privada, sanciona e pune os “maus pagadores”, entre outros instrumentos legais. Por sua vez, a nova burguesia de serviços, tanto quanto pode e logo que se viu em apuros diante do aumento da inadimplência, aderiu ao Prouni, buscando nos cofres públicos um incentivo à livre concorrência.

III.1.3 O ensino superior e os interesses da burguesia industrial

O outro segmento da burguesia nacional interessado na reforma é a burguesia industrial. A burguesia industrial nacional tem, não obstante, uma concepção algo diferenciada sobre as funções do ensino superior. Esta fração não aceita a privatização total da educação superior. A burguesia industrial nacional tem procurado pressionar os governos nacional e estadual pela manutenção das universidades públicas de excelência – os centros de excelência – para produção de Ciência e Tecnologia para o país como uma forma de atender aos seus interesses imediatos – ou seja que a universidade produza ciência e tecnologia para a produção. Esta demanda da burguesia industrial não

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é recente. Como evidencia Rodrigues, a criação do Instituto Euvaldo Lodi (IEL) em 1969, pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), teve por objetivo “promover a integração universidade-indústria”27. Criado a partir da recomendação do Grupo de Trabalho da reforma universitária de 1968, o IEL procurou induzir os interesses da burguesia industrial nas universidades brasileiras, por meio da formulação do perfil técnico profissional e de investimentos diretos em pesquisas científicas e tecnológicas. De lá para cá, esta dupla estratégia não foi abandonada. Rodrigues analisa algumas publicações do IEL, onde são expressas as concepções e preocupações dos industriais brasileiros com o do ensino superior. Dentre tais preocupações está a avaliação de que o modelo de universidade pública constitui um entrave à competitividade. Mas o que interessa à burguesia industrial não é o fim do modelo de universidade pública, tal como apontam os representantes da burguesia de serviços e da burguesia financeira. À fração industrial interessa a manutenção da universidade pública de pesquisa, porém subordinada aos interesses da indústria. Neste sentido, é criticada a transferência irresponsável de recursos públicos para quaisquer particulares. Defende-se que o repasse de recursos às universidades de excelência, isto é àquelas voltadas à produção de ciência produtiva e tecnologia, esteja subordinado à garantia de participação direta das empresas no processo de decisão sobre alocação dos recursos. Mas o aspecto que mais chama atenção é a escolha do parceiro preferencial da burguesia industrial: as instituições públicas28. São estas instituições que têm as condições, históricas e estruturais, para a produção de conhecimento e que permitem a reversão ou transferência do conhecimento socialmente produzido e produtivo para a indústria nacional.

Assim, o que é um fim para a nova burguesia de serviços – a mercantilização da educação – é para a burguesia industrial um meio – ou seja, uma forma estratégica de buscar a valorização do capital através de novas técnicas e tecnologias.

III.1.4 O ensino superior e os interesses das classe médias

Nossa hipótese é a de que a política para o ensino superior tem o apoio das frações da classe média. A criação do programa “Universidade para todos”, apesar de focalizado, baseado na compra de vagas em universidades particulares em troca da isenção fiscal – seja das IES sem fins lucrativos (isenção fiscal), seja as denominadas

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filantrópicas (isenção previdenciária) – tem atraído aqueles segmentos das classes médias excluídos historicamente das universidades públicas. Tomemos a posição de duas entidades de classe média em relação à política do governo Lula para o ensino superior: O UNE – União Nacional dos Estudantes – e o MSU – Movimento dos Sem Universidade.

Muito embora tenha como tônica a defesa da expansão do ensino superior público, o Movimento dos Sem Universidade apóia a política do Prouni e a de cotas. O Prouni “é uma idéia e conquista do MSU” afirmam seus dirigentes. O MSU surgiu em 2000, vinculado aos cursinhos populares, alguns deles articulados ao movimento estudantil. Os objetivos do MSU são a

“luta pela democratização da universidade e pela transformação cultural do Brasil. (...) O MSU surgiu da organização dos Cursinhos Populares, do ativismo social da Pastoral da Juventude do Meio Popular e da Pastoral da Juventude, do movimento Hip-Hop organizado, dos movimentos de educação popular, da participação de estudantes e educadores da rede pública e de universidades brasileiras e dos lutadores e lutadoras do movimento social”29.

A condição de classe média de seus integrantes, aliada à influência católica e, portanto, humanista, ajudam a compreender os limites deste movimento social. Teoricamente, o MSU defende uma perspectiva culturalista, típica da abordagem pós-moderna sobre os novos movimentos sociais30.

Já a União Nacional dos Estudantes tem funcionado como classe apoio à proposta de “reforma universitária” do governo Lula. É possível dizer que, além do apoio, a UNE portou-se como entidade militante e de convencimento ideológico em torno dos benefícios da proposta de reforma universitária. Por meio da “Caravana da UNE pelo Brasil”, os dirigentes da entidade percorreram o País e difundiram as supostas vicissitudes da reforma: a regulamentação do ensino privado, com foco nas mensalidades, ampliação de vagas públicas, garantia de mais verbas do orçamento federal da educação para o ensino superior público e a destinação de mais recursos para a assistência estudantil. Embora critique a mercantilização da educação superior, por meio da campanha “Nossa educação não está a venda”, esta crítica está centrada no risco à desnacionalização da educação.

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A presente política que consolida 1) a expansão da privatização do ensino superior, 2) o desmonte do modelo único de universidade pública, 3) os centros de excelência, e 4) a hierarquia entre as IES, ou seja a coexistência de instituições de ensino superior de vários tipos (centros de excelência, cursos de caráter técnico, profissionalizante ou generalista) encontra, como dissemos, o apoio de amplos setores das classe médias. Mas as razões que levam as frações da classe média a convergir no apoio à política para o ensino superior são bastante distintas. Enquanto a baixa classe média – que se encontra em uma situação de desvantagem na concorrência pelas vagas nas universidades públicas e por isso anseia pela justa ampliação do ensino superior – tem uma posição ambígua – ora de apoio à ampliação de vagas nas instituições públicas, ora de apoio à expansão de vagas nas particulares – seja por interesse imediato, seja por ressentimento de classe –, a alta classe média apóia a presente política para o ensino superior justamente por que ela dualiza, e neste sentido, distingue, a seu favor, os diplomas, o que de resto lhe garante as melhores oportunidades no mercado de trabalho. Segundo Boito Jr.,

“a alta classe média tem razões econômicas para ver com bons olhos essa nova cidadania que cria uma dualidade, em áreas como saúde, educação e previdência, entre, de um lado, um ramo público decadente, voltado para os trabalhadores de renda baixa, e, de outro lado, um ramo privado em expansão, voltado para a burguesia e demais setores de alto rendimento. Essa cidadania dual reproduz a posição privilegiada ocupada pela alta classe média, assegurando-lhe, por exemplo, melhor formação escolar e uma espécie de reserva de mercado dos postos de trabalho mais bem remunerados”31.

Até aqui, evidenciamos que o apoio das frações da burguesia e das classes médias à política para o ensino superior do governo Lula é um apoio interessado. Ou seja, há, em maior ou menor grau, aspectos da política que satisfazem aos interesses destes segmentos sociais. Mas e os setores populares? Quais seriam, finalmente, as razões do impacto desta reforma entre os setores populares?

Uma das razões do impacto desta reforma entre os setores populares, inclusive organizados, é o Programa Universidade para Todos. Seus defensores procuraram e tiveram êxito ao difundir que o Prouni era a mais democrática e revolucionária das propostas para o ensino superior. Souberam, ao mesmo tempo, minimizar o fato de que este programa repassa recursos públicos de monta para as instituições

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privadas, por meio da renúncia fiscal. Neste processo de difusão e ocultação, os defensores do Prouni atraíram mesmo aqueles que, enquanto classe, dele não se beneficiam. É possível verificar que jovens negros, pobres, moradores das periferias das cidades são pinçados às IES públicas por meio da política de cotas e às IES particulares por meio do Prouni. Mas disso não se pode concluir que, com tais políticas, esteja em curso uma mudança na natureza de classe do ensino superior brasileiro.

A bandeira da democratização do ensino por meio do Prouni também atraiu, como já mencionamos, os setores operários organizados. A posição de cinco centrais sindicais – CUT, CGT, Força Sindical, CGTB e CAT – está expressa no documento intitulado “Ensino para Todos! 50% para as públicas”. Segundo seus signatários, “concordamos com a proposta, já prevista em lei, de transformar os 20% das vagas das universidades privadas isentas de tributos, em bolsa integral para alunos provenientes da escola pública e de famílias de baixa renda, como medidas emergenciais na ampliação do acesso”32. Jorge Venâncio, coordenador de alfabetização da Confederação Geral dos Trabalhadores do Brasil, afirmou, durante um seminário realizado pelo MEC com as entidades sindicais, que a reforma da educação superior deve fazer com que os trabalhadores tenham presença mais expressiva nas universidades. Para ele, “o sistema de cotas vai revolucionar o meio universitário, pois vai permitir a entrada em massa de alunos das classes mais pobres”33. A expectativa de acesso dos setores populares ao ensino superior é justa. Mas a crença na democratização social por meio do Prouni e na neutralidade da reforma universitária é questionável. Não causa espanto se esta posição é defendida por uma central como a Força Sindical, historicamente identificada com o neoliberalismo e com a visão de parceria entre capital e trabalho. Mas, quando entre signatários e apoiadores do documento está a CUT, há que se perguntar: quais as razões deste apoio?

A participação de lideranças da CUT em campanhas publicitárias de algumas IES particulares leva-nos a algumas conclusões que extrapolam o terreno da investigação científica. Mas, à parte o denunciado processo de cooptação de lideranças sindicais pelo governo Lula, há que se considerar aquilo que enunciamos na introdução deste artigo. O neoliberalismo tem se utilizado, de forma habilidosa, de algumas históricas bandeiras da esquerda para lograr seus interesses. Ao aludir aos privilégios do ensino superior brasileiro

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e propor, como forma de confronto a estes privilégios, políticas que estimulam a expansão do ensino privado, a “privatização branca” do ensino público, o estreitamento entre universidade e empresa, o governo Lula não enfrenta as reais causas da existência de um histórico sistema elitista e utilitarista. Mais do que isto, este governa estimula o ressentimento de classe e, ao fazê-lo, sela um quadro de dominação ideológica burguesa complexo e politicamente eficaz.

IV. Conclusão

Com este artigo procuramos analisar os interesses políticos e ideológicos que estão ocultos nas várias ações que compõem a política para o ensino superior do governo Lula. Procuramos, também, evidenciar que a proposta de reforma do ensino superior do governo Lula encontrou – apesar dos conflitos inerentes a esse processo – forças aliadas (burguesia financeira, nova burguesia de serviços e burguesia industrial) e forças apoio (classes médias e alguns setores populares). O cenário apresentado é, portanto, muito adverso às forças sociais contrapostas. Mas estas forças sociais – setores do movimento estudantil que fazem hoje oposição à direção da UNE, a Coordenação Nacional de Lutas e setores organizados do funcionalismo público federal e estadual (associações docentes) resistentes ao desmonte da universidade pública – têm lutado no plano teórico e político contra a política para o ensino superior do governo Lula. Estas forças, ainda que minoritárias, têm procurado denunciar o caráter regressivo das reformas em curso, bem como mobilizar estudantes, professores, funcionários públicos em geral e demais segmentos sociais em torno de uma tarefa política tão difícil, quanto necessária: barrar o processo de privatização do ensino superior e de desmonte do modelo universitário público brasileiro.

Notas:2 BRASIL, Decreto de 20 de outubro de 2003.3 Segundo Carvalho, “o crescimento da oferta de vagas foi mais acelerado que a evolução na procura

pelas instituições particulares, reduzindo a relação candidato/vaga de 2,2 em 1998 para 1,6 em 2002. O esgotamento da expansão pela via privada fica ainda mais evidente quando se observa o percentual de vagas não preenchidas pelo vestibular nestas instituições. Enquanto em 1998, a proporção já era de 20%, em 2002, as vagas não preenchidas saltam para 37%.” Cristina Helena de Almeida Carvalho, “Política para o ensino superior no Brasil (1995-2006): ruptura e continuidade nas relações entre público e privado”. XXIX Encontro Anual da ANPED, Caxambu, 2006, p. 5. Para uma análise do relatório do GTI ver: Ver: Célia Regina Otranto. “A reforma da educação superior do governo Lula: da inspiração à implantação”. XXVI Encontro Anual da ANPED, Caxambu, 2002.

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4 Lembremos que no início do segundo mandato do governo FHC, o papel do Conselho Nacional de Educação sofrera críticas tanto do setor privatista, quanto, inclusive, de dois intelectuais aliados a Fernando Henrique Cardoso: a antropóloga Eunice Durhan e o filósofo José Arthur Giannotti, os quais, na ocasião, criticaram a criação desmedida de instituições particulares, a abertura sem critério de novos cursos e as irregularidades cometidas pela maioria delas.

5 Vale relembrar que o Plano Nacional de Educação estabelecera como meta que, ao menos, 40% das vagas no ensino superior seriam em instituições públicas, meta que foi vetada pelo, então, presidente Fernando Henrique Cardoso.

6 Cristovam Buarque A universidade numa encruzilhada. Brasil, MEC/Unesco, 2003, p.18.

7 Para uma análise da relação entre didática, recursos do ensino e economia capitalista, ver o excelente trabalho de Gilberto Luiz Alves. A produção da escola pública contemporânea. Campinas, Autores Associados, 2001.

8 BRASIL, idem.

9 Como veremos na segunda parte deste artigo, os interesses imediatos da nova burguesia de serviços estariam voltados para a liberdade de criar e extinguir cursos; fixar currículos; fixar objetivos pedagógicos; fixar número de vagas por curso; regular livremente projetos de pesquisa; conferir diplomas; estabelecer normas para admissão, exclusão e transferência de discentes/docentes/funcionários; fixar todo tipo de contratos e convênios. É preciso esclarecer, contudo que a desregulamentação defendida pela nova burguesia de serviços é, na realidade, uma ideologia, na medida em que esta mesma fração demanda intervenção do Estado, por exemplo, na criação de sanções e punições aos “mau pagadores”. Iniciativas têm sido tomadas para alterar a legislação educacional e permitir que inadimplentes que completem três meses sem pagar sejam impedidos de freqüentar o ensino superior.

10 Apud Célia Maria Otranto. “Desvendando a política da educação superior do governo Lula”. Revista Universidade e Sociedade, ano XVI, nº 38, jun. 2006, p.18 a 39.

11 Segundo Otranto, casos estes recursos derivados da perda de impostos e pagamentos das bolsas fossem direcionados às universidades federais, novos professores poderiam ser contratados e todos os cursos de graduação poderiam ser oferecidos no horário noturno. A tendência seria chegar, em três ou quatro anos, a 1 milhão de novas matrículas nas universidades públicas e não às 120 mil bolsas prevista pelo Prouni. Ver: Célia Regina Otranto. “A reforma da educação superior do governo Lula: da inspiração à implantação”. XXVI Encontro Anual da ANPED, Caxambu, 2002.

12 Segundo dados divulgados pelo MEC, em 2005, a renúncia fiscal – gerada pelas isenções – foi de R$106.000 mil, em 2006, de R$ 114.000 mil, e em 2007 de R$126.000 mil.

13 Francisco Lopreato. “Finanças Públicas, PPP e Universidade”. Caderno ADunicamp, fevereiro de 2005, p. 9.

14 Cadernos ANDES, nº 25, agosto de 2007.

15 Cadernos ANDES. Idem.

16 Brasil, Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007.

17 Brasil, Decreto nº 5.800, de 8 de junho de 2006.

18 Cadernos ANDES, idem, p.22.

19 Armando Boito Jr. Política Neoliberal e Sindicalismo no Brasil. São Paulo, Xamã Editora, 1999.

20 Roberto Leher. Da ideologia do desenvolvimento à ideologia da globalização: a educação como estratégia do Banco Mundial para “alívio” da pobreza. São Paulo, SP: USP, 1998, p. 136. (Tese de Doutorado).

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21 Para uma análise da natureza financeira dos programas PROEP e PROMED, ver a tese de doutorado de Roberto Antonio Deitos. O capital financeiro e a educação no Brasil. Campinas, 2005.

22 Silva, Maria Abádia da. Intervenção e consentimento: a política educacional do Banco Mundial. Campinas, SP: Autores Associados: São Paulo: Fapesp, 2002, p. 102.

23 Em 2001, foi criada a empresa Ideal Invest voltada ao financiamento de recursos para expansão e melhorias das instituições de ensino superior através de linhas de crédito, com investimento de 7 milhões de reais. Em 2003, esta empresa lança o Programa de Crédito Estudantil Ideal Invest para financiar mensalidades atrasadas, em curso e futuras.

24 O FIES – Programa de Financiamento Estudantil – do governo federal, gerenciado pela Caixa Econômica Federal, financia atualmente até 50% das mensalidades em mais de 1.400 IES particulares. Encontra-se em tramitação uma proposta de financiamento de 100% das mensalidades.

25 Fórum Nacional da Livre Iniciativa na Educação. “Agenda Positiva”, 7 de julho de 2005. Ver: http://www.forumdeeducacao.org.br/documentos/documentos.asp. Site consultado em 15 de setembro de 2007.

26 Jornal Folha de S. Paulo. “Com lucro em queda, universidades mudam”, 05/02/2006.

27 José Rodrigues. Os empresários e a educação superior. Campinas. Autores Associados, 2007, p. 34.

28 José Rodrigues. Idem, p. 57.

29 Ver: http://www.msu.org.br/index.htm. Site consultado em 15 de novembro de 2007.

30 Patrícia Vieira Trópia. “A inserção de classe dos trabalhadores não-manuais: um debate com a bibliografia marxista sobre a classe média”. XXX Encontro Anual da ANPED, Caxambu, 2007.

31 Armando Boito Jr. “Hegemonia neoliberal e governo Lula”. Revista Crítica Marxista. Rio de Janeiro, Editora Revan, nº 17, 2003, p. 4.

32 Brasil, Ministério da Educação, “Ensino para Todos! 50% para as públicas”. Publicado em 9/07/2004. Ver: http://www.educacao.gov.br/reforma/Documentos/DOCUMENTOS/2004.7.23.15.15.56.pdf. Consultado em 15 de novembro de 2007.

33 Brasil, Ministério da Educação, Ver: “Reforma do ensino superior recebe contribuições de centrais sindicais”. Publicado em 20/10/2004. Ver: http://mecsrv04.mec.gov.br/reforma/Noticias_Detalhe.asp?Codigo=7256. Consultado em 15 de novembro de 2007.

REGIMENTOXXXI Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem

ENEEn

I - DO ENCONTRO NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM (ENEEn)

Art. 1º- São objetivos do Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem (ENEEn):I - Reunir os estudantes de enfermagem, de modo a discutir e deliberar as questões relativas à educação, ao desenvolvimento científico e prático

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de enfermagem, suas relações com a saúde da população em seus aspectos sociais, políticos e econômicos, bem como o intercâmbio cultural visando a integração de seus participantes;II – Aprovar eventual reforma do estatuto da ENEEnf;III – Deliberar posicionamentos políticos que são do interesse do movimento estudantil de Enfermagem;IV – Deliberar sobre os casos omissos no presente estatuto;V – Aprovar a indicação da sede do próximo Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem (ENEEn), dos Conselhos Nacionais de Entidades Estudantis de Enfermagem (CONEEEnf’s) e do Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem (CBEEn).

Art 2º - São objetivos do XXXI Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem (ENEEn):I - Entendimento da reestruturação no mundo do trabalho influência no processo de Educação;II - Espaço de formação para o Movimento Estudantil de Enfermagem (MEEnf);III - Espaço de deliberação para avanço nas lutas junto aos trabalhadores e em relação à Educação (Fundações de Apoio, REUNI, Mercantilização do Ensino e etc.);IV - Eleger a gestão 2009 da ENEEnf;V - Tirar a sede dos próximos encontros do MEEnf – 91° CONEEEnf, IV CBEEn, 92° CONEEEnf e XXXII ENEEn;

o II - DA ASSEMBLÉIA GERAL

Art. 3º - Deverá ser realizada durante o ENEEN (Encontro Nacional de Estudantes de

Enfermagem) pelo menos uma Assembléia Geral, sendo este o órgão de deliberação suprema da ENEEnf.

Art. 4º - São membros da Assembléia Geral todos os estudantes inscritos no ENEEN, mas somente terá direito a voto os Estudantes, comprovadamente, de Enfermagem e que tenham participação comprovada em, no mínimo, 75% das atividades do presente encontro, ficando o controle a cargo da Comissão Organizadora.§ 1º A Assembléia Geral funcionará, como poder deliberativo, com maioria simples de seus membros em primeira chamada e após trinta minutos, em segunda chamada, com o quorum presente.

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§ 2º - As decisões votadas em assembléia geral serão aprovadas obedecendo-se a critérios de maioria simples, identificando-se os votos através dos crachás.§ 3º - Os encaminhamentos para as votações serão executados pela coordenação da mesa da Assembléia Geral somente se o assunto em pauta for debatido previamente ou mediante defesa das propostas divergentes.§ 4º - As decisões votadas e aprovadas em Assembléia Geral só poderão ser anuladas ou modificadas em essência por outra Assembléia Geral.

III - DA COMISSÃO ORGANIZADORA

Art. 5º - A Comissão Organizadora deverá ser composta pela a Comissão local, Coordenação Nacional da ENEEnf, e qualquer outro (s) CA/DA’s que desejem participar.

Art. 6 º - Compete à comissão organizadora garantir a infra-estrutura do encontro dentro das condições satisfatórias de segurança, higiene e saúde, devendo prover, para tal:I - No mínimo três refeições diárias em local específico para tal;II - Alojamento íntegro com garantia de segurança e privacidade para as delegações no período das 09h00min h do dia 19/07 à 21h00min h do dia 26/08.A comissão organizadora não se responsabilizará por pertences pessoais dos participantes do encontro. Assim como pela segurança dos participantes extramuros do evento, exceto quando for uma atividade do encontro.III - Providenciar salas para as reuniões e plenárias, de acordo com o caráter da reunião e de fácil acesso.IV - Oferecer os primeiros socorros.V - Garantir hospedagem e passagens para palestrantes, oficineiros, outros.VI - Prover pastas para participantes contendo, no mínimo, caneta, bloco, programação, caneca, crachá, material de subsidio para discussão e regimento interno do ENEEn.VII - Os tíquetes refeição serão entregues por critérios estabelecidos pela Comissão Organizadora.VII - Os certificados para membros efetivos deverão ser entregues a representantes das delegações, antes do inicio da plenária final, os quais irão repassá-los aos componentes de sua delegação que tenham atingido

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no mínimo 75% de freqüência, dado que será fornecido pela Comissão Organizadora.IX - Providenciar transportes para todos os participantes, quando necessário, para deslocar os participantes para EVENTOS relativos ao encontro.X - A Comissão Organizadora não se responsabiliza por alojamento e alimentação de participantes que cheguem antes do inicio do Encontro. Este é de responsabilidade das delegações.Obs: Dia 19/07 não haverá café da manhã, 23/07 a principio não haverá almoço e jantar ,e dia 26/07 não haverá jantar.

IV - DOS PARTICIPANTES

Art 7o- A inscrição de participantes de faculdades/ escolas, de CA’s e DA’s que compõem a gestão da ENEEnf, será aceita apenas após a apresentação de relatório comprobatório da realização do Pré- ENEEn, dentro do prazo limite de 25 de Junho de 2008.

Art 8o- A inscrição de participantes de faculdades/ escolas, de CA’s e DA’s que não compõem a gestão da ENEEnf, será aceita mesmo sem realização de Pré ENEEn. Nestas este terá caráter facultativo.

Art 9 º - Metodologicamente serão formadas as Rodas de Construção Coletiva.§ 1º - As Rodas de Construção serão formados por representantes das diferentes delegações e serão responsáveis por desenvolver atividades de organização do XXXI ENEEn.§ 2º - As rodas são espaços de corresponsabilização, onde os componentes das rodas terão, atividades a serem desenvolvidas ao longo do encontro. Os grupos passarão através de rodízio, por todas as atividades.

Art 10 º - Todos os participantes são responsáveis pela manutenção e zelo do espaço do encontro, assim como a possíveis danos ao patrimônio.

Art. 11 º - Receberão certificado, os participantes com 75% ou mais de presença no encontro.Os controles de presença serão recolhidos pela comissão local 30min antes do encerramento de qualquer atividade.

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V - DAS INSCRIÇÕES

Art. 12O. - Cada escola/ faculdade de enfermagem poderá inscrever apenas uma delegação, através de sua entidade estudantil representativa:

§ 1º - A escola que ainda não possui entidade representativa dos estudantes de enfermagem ou que comprovem sua inoperância poderá participar com um grupo de estudantes organizados para esta finalidade.§ 2º - A participação no ENEEN fica aberta a outros profissionais e acadêmicos inscritos, tendo direito à voz, mas não a voto.§ 3º - Os inscritos terão direito à alimentação, alojamento e impressos do evento.§ 4º - Cada escola deverá informar o número aproximado de participantes até trinta dias antes do ENEEN, efetuar o pagamento antecipadamente através de conta bancária da Comissão Organizadora ou ainda no ato da inscrição, de acordo com valores estabelecidos.§ 5º No processo de inscrição nos eventos é necessário comprovante de matrícula para garantir direito de voto na Assembléia.

Art. 13 º - O Dialogo com a Comissão Organizadora deverá ser feito via, CA/DA de referência da locorregional, estes estão responsáveis pela articulação entre as diferentes instituições. Seguem os CA’S e DA’s de referência:Locorregional Norte I (PA, AM e AP) = UNIFAPLocorregional Norte II (AC e RO) *Locorregional Nordeste I (BA e SE) *Locorregional Nordeste II (RN, PB, PE e AL) = UFRNLocorregional Nordeste III (CE, PI e MA) = UFPILocorregional Sudeste I RJ = UNIRIO e ES = UFESLocorregional Sudeste II (SP) = UNESPLocorregional Sudeste III (MG) = UFMGLocorregional Centro-Oeste I (DF, GO e TO) *Locorregional Centro-Oeste II (MT e MS) *Locorregional Sul I (PR e SC) *Locorregional Sul II (RS) *

* Obs: As locorreginais que não possuem CA/DA de referência deverão entrar em contato com a Comissão Organizadora de maneira direta.

Art. 14 º - A inscrição da delegação deverá obedecer aos preços estipulados:

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§ 1º - O pagamento da inscrição deverá ser realizada por DEPÓSITO BANCARIO NOMINAL NA BOCA DO CAIXA.§ 2º - Dados Bancários: Caixa Econômica – Conta Poupança: 13622-0 Operação: 013 e Agência: 0369, a favorecida: Indianara Ximenes Fracaro.§ 3º - O comprovante de depósito deverá ser apresentado no momento do credenciamento, para confirmação da inscrição.

Art. 15o- A ficha de inscrição, por entidade, deverá ser enviada, devidamente preenchida, para o endereço eletrônico: [email protected]

VI – DO CREDENCIAMENTO

Art. 16 º - O credenciamento será realizado no dia 19 de Julho de 2008, a partir das 09h00min h até o inicio das atividades do Encontro.

Art. 17º - Para o credenciamento se oficializar a delegação deverá portar:I - Ficha de Inscrição da Entidade e individuais devidamente preenchidas.II - Comprovante de matricula dos participantes;III - Comprovante de depósito, com o valor das inscrições.

Art. 18º - Os casos omissos neste regimento ou no Estatuto da ENEEnf serão decididos na Assembléia Geral do Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem – ENEEn.

XXXI Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem.“Educação: instrumento de libertação popular ou mercadoria a serviço

do capital???”Comissão Organizadora XXXI ENEEn – Curitiba.Executiva Nacional dos Estudantes de Enfermagem

Gestão 2008/2009.

CARTA ABERTA CA´S E DA´S DE ENFERMAGEM DO BRASIL

Curitiba, 29 de junho de 2008.

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Esta carta tem como objetivo informar como se dará o processo de composição da gestão 2009/2010 da Executiva Nacional dos Estudantes de Enfermagem (ENEEnf) e convocar as entidades para compor e construir as lutas do Movimento Estudantil de Enfermagem (MEEnf).

O Encontro Nacional de Estudantes de Enfermagem (ENEEn) é o maior fórum de construção e deliberação do MEEnf. Este encontro é realizado anualmente pela ENEEnf e cumpre com o objetivo de aglutinar estudantes de enfermagem de todo país em torno de discussões que são pertinentes tanto à nossa formação profissional quanto na realidade que estamos inseridos. É neste espaço que ocorre a eleição dos D.A’s e C.A’s para a composição da gestão da ENEEnf no qual todos os estudantes presentes tem direito a voz e voto na plenária final que acontece no último dia do Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem (ENEEn).

O QUE É SER GESTÃO DA ENEEnf?

A ENEEnf vem trabalhando, nos últimos anos, em regime de Coordenação Nacional agregando os Centros e Diretórios Acadêmicos (CA´S / DA´S) com o objetivo principal de organizar seus eventos e atividades internas, garantindo que as deliberações apontadas pelos estudantes e suas entidades representativas, nos espaços promovidos pelo Movimento Estudantil de Enfermagem sejam efetivadas.

Atualmente, a Coordenação Nacional passa por um período de 1 (um) ano de gestão e é composta da seguinte forma: 3 Coordenações Estruturais; 12 Coordenações Loco Regionais e 6 Coordenações Temáticas.

A Coordenação Nacional compõe-se por: Coordenação de Articulação Nacional, composta por 3 (três) CA’s/ DA’s de enfermagem do Brasil; Coordenação de Comunicação, composta por 1 (um) CA/ DA de enfermagem do Brasil; Coordenação de Finanças, contando com 2 (dois) CA’s/ DA’s de enfermagem do Brasil; Coordenações Temáticas, compostas no máximo por 2 (dois) CA´s/DA´s de enfermagem do Brasil e Coordenações Loco Regionais, cada uma composta por 1 (um) CA / DA como representante:

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ÂMBITO LOCAL: CA’s e DA’s

ÂMBITO LOCO-REGIONAL

Coordenações Loco-Regionais

–Sul 1: RG–Sul 2: SC e PR–SE 1: RJ e ES–SE 2: SP–SE 3: MG–CO 1: MS e MT–CO 2: DF e TO e GO–NE 1: BA e SE–NE 2: AL, PE, RN e PB–NE 3: CE, PI e MA–N 1: AM e AC e RO–N 2: PA e AP e RR

ÂMBITO NACIONAL

Coordenações Nacionais

•Temáticas:•Educação•Educação em Enfermagem•Ed. Popular e Extensão•Saúde•Gênero•Enfermagem

•Estruturais:•Articulação Nacional•Finanças•Comunicação

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PROCESSO ELEITORAL

O processo eleitoral é um momento político importante no ENEEn, pois além de exercermos a prática da democracia, as entidades estudantis presentes apresentam suas propostas à entidade e a sua realidade local ao MEEnf. A eleição da próxima gestão da ENEEnf ocorrerá na plenária final antes da deliberação dos locais dos próximos espaços construídos pela entidade e de todos os encaminhamentos formulados no encontro que deverão ser construídos pela mesma ao lado dos estudantes.

O método de como ocorrerá o processo eleitoral vem sendo discutido pelo conjunto dos DA’s e CA’s que vem compondo a gestão e em fóruns da entidade, como no 89º Conselho Nacional de Entidades Estudantis de Enfermagem (CONEEEnf) realizado em Uberlândia que deliberou que os CA`s e DA´s que desejarem compor da atual gestão da Coordenação Nacional da ENEEnf deveriam apresentar uma carta de princípios no III Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem que ocorreu na cidade de Fortaleza em janeiro deste ano.

Diante disso, mantendo este método para o processo eleitoral que foi deliberado no 89º CONEEEnf, os DA’s/CA’s interessados em disputar a gestão deverão apresentar em forma de documento na plenária final do XXXI ENEEn suas propostas de maneira sistematizada de acordo com discussão prévia levando em

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consideração a conjuntura local do DA/CA, articulação da pasta com a luta local e as propostas de luta que o DA/CA aponta para a coordenação, sendo a apresentação de 5 minutos. Este documento construído pelo CA/DA servirá como um material de registro histórico da executiva e como um instrumento de construção das ações da Gestão que está sendo composta.

Compreender a conjuntura local é fazer a avaliação das demandas e possibilidades de contribuição do determinado Centro Acadêmico à construção da Executiva Nacional dos Estudantes de Enfermagem, em sua próxima gestão, avaliando assim a responsabilidade e o entendimento do compromisso com o próprio Movimento.

Desta forma, CONVOCAMOS os Centros e Diretórios Acadêmicos de Enfermagem a comporem a ENEEnf e contribuir na construção da luta desta entidade, que é a luta pela transformação social.

“Ou os estudantes se identificam com o destino do seu povo, com eles sofrendo a mesma luta, ou se dissociam de seu povo e, nesse caso, serão aliados daqueles que exploram o povo.”

Florestan Fernandes

Comissão Metodológica do XXXI ENEEn - Curitiba

Executiva Nacional dos Estudantes de Enfermagem - ENEEnf

Gestão 2008 / 2009

ESTATUTO DA EXECUTIVA NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM - ENEEnf

TÍTULO IORGANIZAÇÃO

CAPÍTULO IDA DENOMINAÇÃO, SEDE E AFINS

Artigo 1º - A Executiva Nacional dos Estudantes de Enfermagem, referida a partir deste parágrafo como “ENEEnf”, é a entidade máxima de representação e organização dos estudantes de enfermagem do Brasil, sendo independente de quaisquer partidos políticos ou instituições religiosas, não tendo fins lucrativos e de

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caráter permanente, tendo como sede da gestão um Centro Acadêmico (CA) ou Diretório Acadêmico (DA) da Coordenação de Articulação Nacional.

Parágrafo único: O endereço do CA ou DA sede deverá ser registrado junto com a Ata de Posse, durante o Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem – CBEEn.

Artigo 2º - Constituem objetivos fundamentais da ENEEnf:I – Congregar os estudantes de enfermagem do Brasil, possibilitando unidade das suas ações com o fim de solucionar seus problemas;II – Incentivar a criação de entidades de base representativas (CA’s e DA’s), livres e independentes de qualquer órgão ou poder;III – Promover o contato e o intercâmbio com outras entidades em nível Municipal, Regional, Nacional e Internacional, visando sempre o fortalecimento e a unidade do Movimento Estudantil;IV - Custear, se possível financeiramente, as despesas dos estudantes em representação da Coordenação Nacional da ENEEnf mediante repasse e recibos da atividade.V – Realizar anualmente as atividades previstas pelo calendário da ENEEnf, previamente divulgado, em conjunto com uma comissão local.VI – Integrar a defesa dos interesses e direitos dos estudantes de enfermagem, com compromisso social.VII - Defender a saúde como direito de todos e dever do Estado, lutando pela efetivação dos princípios do Sistema Único de Saúde.VIII – Lutar por uma educação pública e gratuita de qualidade.IX – Participar dos espaços deliberativos da UNE objetivando trazer para os estudantes as questões enfrentadas por esta entidade, bem como levar para ela as lutas específicas dos estudantes de enfermagem, sendo sempre autonomia perante União Nacional dos Estudantes.

Parágrafo único: A ENEEnf, reconhece a União Nacional dos Estudantes (UNE) como entidade representativa de todos os estudantes de graduação do Brasil.

CAPÍTULO II

Artigo 3º - O patrimônio da ENEEnf consta de uma parte física e outra financeira.

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§ 1º - O patrimônio físico da ENEEnf poderá compor de um espaço físico, sede, material de imprensa, propaganda e arquivo e outros instrumentos oriundos de compras ou doações.§ 2º Poderá integrar o patrimônio financeiro da ENEEnf: a) doação, auxílio herança, subvenção; b) contribuição voluntária, paga pelos sócios e entidades associadas, salvo contribuições de pessoas ou entidades comprovadas ou suspeitas de envolvimentos criminais.

§ 3º O incentivo a contribuições dos CA´s e DA´s, bem como a “arrecadação” das contribuições poderá acontecer no Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem.§ 4º Os lucros ou prejuízos decorrentes da organização dos eventos promovidos pela coordenação nacional serão discutidos caso a caso, e negociados entre a coordenação nacional da ENEEnf e a comissão local.

§ 5º Não havendo acordo entre as partes a decisão se dará na próxima instância deliberativa da ENEEnf (CONEEEnf ‘s, ENEEn e CBEEn).

§ 6º Os lucros e os prejuízos dos encontros locais e regionais serão discutidos caso a caso, pela comissão local, a Coordenações de Articulação Nacional e regional da Coordenação Nacional da ENEEnf. Não havendo acordo será discutido no próximo fórum deliberativo da CN- ENEEnf. Artigo 4º - Em caso de dissolução do ENEEnf, a Assembléia Geral, convocada para este fim, decidirá a respeito de seu patrimônio, estabelecendo seu destino.

CAPÍTULO IIIDOS SÓCIOS

Artigo 5º - São sócios da ENEEnf todos os estudantes regularmente matriculados nos cursos de graduação em Enfermagem e/ou habilitação e licenciatura em Enfermagem.

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Artigo 6º - Os sócios da ENEEnf não respondem pessoalmente por obrigações contraídas pela ENEEnf, salvo a comprovação de má-fé.

TÍTULO IIADMINISTRAÇÃO

CAPÍTULO IINSTÂNCIAS DELIBERATIVAS

Artigo 7º - As instâncias deliberativas da ENEEnf terão em caráter de prioridade a seqüência:1 – Assembléia Geral do Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem2 – Conselho Nacional das Entidades Estudantis de Enfermagem, juntamente com o Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem. 3 – Reuniões da ENEEnf.4 – Encontros locorregionais e Encontros Regionais dos Estudantes de Enfermagem (EREEn’s).

DA ASSEMBLÉIA GERAL

Artigo 8º - Deverá ser realizada durante o ENEEn (Encontro Nacional de Estudantes de Enfermagem) pelo menos uma Assembléia Geral, sendo este o órgão de deliberação suprema da ENEEnf.

Artigo 9º - À Assembléia Geral compete;I – Aprovar eventual reforma deste estatuto;II – Deliberar posicionamentos políticos que são do interesse do movimento estudantil de Enfermagem. III – Deliberar sobre os casos omissos no presente estatuto;IV – Aprovar a indicação da sede do próximo Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem (ENEEn), dos Conselhos Nacionais de Entidades Estudantis de Enfermagem (CONEEEnf’s) e do Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem (CBEEn).

Artigo 10º - São membros da Assembléia Geral todos os estudantes inscritos no ENEEn, mas somente terá direito a voto os Estudantes, comprovadamente, de Enfermagem e que tenham participação comprovada em, no mínimo, 75% das atividades do presente encontro, ficando o controle a cargo da Comissão Organizadora.

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§ 1º A Assembléia Geral funcionará, como poder deliberativo, com maioria simples de seus membros em primeira chamada e após trinta minutos, em segunda chamada, com o quorum presente. § 2º No processo de inscrição nos eventos é necessário comprovante de matrícula para garantir direito de voto na Assembléia.

Artigo 11º - A Assembléia Geral será autônoma em suas decisões.

§ 1º - As decisões votadas e aprovadas em Assembléia Geral só poderão ser anuladas ou modificadas em essência por outra Assembléia Geral.§ 2º - As decisões votadas em assembléia geral serão aprovadas obedecendo-se a critérios de maioria simples, identificando-se os votos através dos crachás.

§ 3º - A mesa da Assembléia Geral, mediante aprovação da plenária, deverá ser composta por um membro, pelo menos, da Coordenação Nacional da ENEEnf, um membro, pelo menos, da comissão organizadora do ENEEn e demais membros eleitos em reunião de delegados.

§ 4º - Os encaminhamentos para as votações serão executados pela coordenação da mesa da Assembléia Geral somente se o assunto em pauta for debatido previamente ou mediante defesa das propostas divergentes.

DA ASSEMBLÉIA GERAL EXTRAORDINÁRIA

Artigo 12º - A Assembléia Geral Extraordinária só poderá ser realizada no ENEEn, com no mínimo, seis horas de antecedência, devendo ser suspensas todas as atividades do ENEEn marcadas para este horário.§ 1º - A convocação da Assembléia Geral Extraordinária será feita mediante abaixo assinado de pelo menos 30% dos membros inscritos no ENEEn ou quando solicitada pela reunião de delegados. O pedido deverá ser encaminhado à Comissão Organizadora do ENEEn.

DO CONSELHO NACIONAL DE ENTIDADES ESTUDANTIS DE ENFERMAGEM - CONEEEnf

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Artigo 13o - O Conselho Nacional de Entidades Estudantis de Enfermagem, CONEEEnf, é a instância deliberativa imediatamente inferior à Assembléia Geral e de mesmo valor ao do Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem.

Artigo 14º - As deliberações no CONEEEnf serão feitas através de um voto por entidade (CA ou DA).

§ 1º - Caso a escola não tenha entidade representativa dos estudantes, os delegados aos CONEEEnf`s deverão ser eleitos pela base.

§ 2º - Será necessária a comprovação de indicação de delegado pelo DA/CA ou assembléia do curso apresentando ata de indicação.

Artigo 15º - São objetivos dos CONEEEnf`s:I – Caráter: formativo, deliberativo e avaliativo para questões gerais do MEEnf. II – Deliberar sobre a estrutura do ENEEn caso haja necessidade.III – Promover a integração dos estudantes de enfermagem em nível nacional;IV – Fazer a prestação de contas do ENEEn anterior no 2º CONEEEnf.V – No 1º CONEEEnf fazer balanço do CBEEn e no 2º, fazer do ENEEn.

Artigo 16º - Haverá 02 (duas) reuniões ordinárias do CONEEEnf, sendo que a primeira deverá ser realizada no feriado de finados, no mês de novembro, e a segunda deverá ser realizada na semana santa, no mês de abril, nos locais definidos anteriormente pela Assembléia Geral do ENEEn. As datas deverão ser flexíveis, mas previamente divulgadas.

Parágrafo único: Deverá ser observado o calendário de cada evento, CONEEEnf’s e Encontro Locoregional/EREEn/ ENEEn/ CBEEn, para que não haja incompatibilidade de datas, garantindo, assim, a participação dos delegados em ambos os eventos.

Artigo 17º - As reuniões ordinárias do CONEEEnf terão duração mínima de dois dias consecutivos e as reuniões extraordinárias ficarão a critério de quem as convocar.

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Artigo 18º - Poderão ser convocados CONEEEnf’s extraordinários mediante a necessidade da comissão organizadora do ENEEn ou ainda por 70% dos membros da coordenação nacional da ENEEnf.

DO CONGRESSO BRASILEIRO DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM - CBEEn

Artigo 19º - O Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem acontecerá no mês de janeiro de cada ano estendendo-se de 5 a 7 dias. Será composto por até dois delegados de cada entidade de base representativa dos estudantes de enfermagem e mais 10 estudantes, preferencialmente, do CA ou DA, além da gestão atual da ENEEnf e a gestão eleita no último ENEEn.

Artigo 20º - São objetivos do Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem:I – Caráter: deliberativo, formativo, planejamento;II – Avaliar a dinâmica do Movimento Estudantil de enfermagem, assim como de sua Executiva, no ano de gestão;III – Fazer o planejamento anual das atividades, nacional e locorregional, objetivando deliberar ações a cerca das bandeiras de trabalho tirado no ENEEn anterior; IV – Empossar a gestão eleita no último ENEEn;

CAPÍTULO IIDA COORDENAÇÃO NACIONAL DA ENEENF

Artigo 21º - A coordenação nacional da ENEEnf é uma instância de execução e organização, estando subordinada às decisões tomadas nas instâncias deliberativas. A coordenação nacional da ENEEnf é formada por:

1º - Coordenação de Articulação Nacional2º - Coordenação de Finanças4º - Coordenação de Comunicação5º - Coordenações Temáticas Nacionais6º - Coordenações Loco-Regionais

Artigo 22º - São atribuições da coordenação nacional da ENEEnf:

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I - Representar a ENEEnf ativa e passivamente, judicial e extra judicialmente.II - Zelar pelo patrimônio da ENEEnfIII - Divulgar os anuais e relatórios e garantir os encaminhamentos das instâncias deliberativas.IV - Convocar reuniões extraordinárias do CONEEEnf e da própria coordenação nacional quando necessário.V - Compor a comissão organizadora dos eventos da ENEEnf.VI - Deve procurar se fazer presente no mínimo um representante da coordenação nacional nos encontros e eventos pertinentes ao movimento estudantil de enfermagem.VII - Manter contato e colaboração permanente com entidades, movimentos sociais, instituições parceiras e sociedade civil organizada,promovendo e incentivando as relações dos estudantes de enfermagem com as mesmas. VIII - Realizar o balanço das coordenadorias, nos quatro espaços nacionais;IX - Outorgar poderes de representação para a propositura de eventuais ações de defesa dos direitos dos estudantes de Enfermagem, na forma da lei 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor) e lei 7347/85 (Ação Civil Pública).

Artigo 23º - Atribuição das Coordenações:

§ 1º - DA COORDENAÇÃO NACIONAL DE ARTICULAÇÃO

I - Articulação das Coordenadorias Nacionais.II - Representar a ENEEnf nacional e internacionalmente, quando necessário.III - Assinar documentos e representar a ENEEnf ativa e passivamente, judicial e extra judicialmente.IV - Cabe a um dos CA que compõem a Coordenação da Articulação Nacional, ser sede da ENEEnf.

§ 2º - COORDENAÇÃO DE COMUNICAÇÃO

I - Coordenar a construção de Políticas estratégicas que visem a comunicação em âmbito nacional e internacional.II - Manter um arquivo centralizado e atualizado com documentação e endereços, contato de entidades, tornando-o acessível.

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§ 3º - COORDENAÇÃO DE FINANÇAS

I - Coordenar a construção de uma política de financiamento.II - Administrar o patrimônio da ENEEnf, repassando-o à próxima Coordenação Nacional quando esta tomar posse após o Congresso Nacional da ENEEnf;III - Receber subvenções, auxílio e contribuições destinadas à entidade.IV - Movimentar contas bancárias e aplicações da ENEEnf.V - Manter em dia toda a documentação financeira da ENEEnf e coordenar a execução do planejamento anual de despesas da mesma, organizar balancete e relatórios financeiros;VI - Divulgar a prestação de contas, apresentando extratos bancários e outros documentos que comprovem os dados fornecidos.

§ 4º - COORDENAÇOES TEMÁTICAS NACIONAIS

I - Assessorar e sistematizar nacionalmente as discussões acerca de suas temáticas. II - As atribuições específicas de cada coordenação serão definidas no momento em que serão criadas em seus propósitos e será aprovado no Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem.

§ 5º - COORDENAÇÕES LOCO-REGIONAIS

I - Atuar como facilitador da articulação da Rede de CA´s e DA´s de sua Loco-RegiãoII - Representar Nacionalmente a sua rede.III - Representar em sua Loco-Região a Coordenação Nacional da ENEEnf.

Artigo 24 º - As reuniões da Coordenação Nacional serão abertas à participação de todos os estudantes de enfermagem, sendo restrito o voto aos CA’s e DA’s de Coordenações da Executiva Nacional quando se tratar das competências atribuídas em artigo 22.

CAPÍTULO IIIDAS ELEIÇÕES

Artigo 25 º - A Coordenação Nacional compõe-se por:

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Coordenação de Articulação Nacional, composta por três CA’s/ DA’s de enfermagem do Brasil;Coordenação de Comunicação, composta por um CA/ DA de enfermagem do Brasil; Coordenação de Finanças, contando com dois CA’s/ DA’s de enfermagem do Brasil;Coordenações Temáticas, compostas no máximo por 02 CA´s/DA´s de enfermagem do Brasil;.Coordenações locorregionais, cada uma composta por um CA / DA como representante:

Locorregional Norte I (PA, AM e AP)Locorregional Norte II (AC e RO) Locorregional Nordeste I (BA e SE)Locorregional Nordeste II (RN, PB, PE e AL) Locorregional Nordeste III (CE, PI e MA) Locorregional Sudeste I (RJ e ES) Locorregional Sudeste II (SP) Locorregional Sudeste III (MG)Locorregional Centro-Oeste I "Cerrado" (DF, GO e TO) Locorregional Centro-Oeste II "Pantanal" (MT e MS)Locorregional Sul I (PR e SC) Locorregional Sul II (RS)

Artigo 26 º - Coordenação Articulação, Finanças, Comunicação e as Temáticas, deverão ser eleitas em julho, no ENEEn.

Artigo 27º - As Coordenações Temáticas são flexíveis em seus temas, cabendo a Assembléia Geral no ENEEn, mantê-las ou modificá-las.

Artigo 28º - As coordenações loco-regionais serão eleitas nos processos loco-regionais até o segundo CONEEEnf. Parágrafo único: Cada Rede Loco-Regional teria um representante na Coordenação Nacional da ENEEnf.

Artigo 29º - As Coordenações Nacionais da ENEEnf serão compostas por CA´s e DA´s, cabendo as estas entidades a responsabilidades nacionais assumidas.

Parágrafo único: A gestão do CA/DA eleita para exercer uma coordenação na ENEEnf deverá exercê-la todo o período da gestão.

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Esclarecendo que mesmo que esta perca a eleição do CA ou DA, exercerá o cargo na gestão da ENEEnf até seu final. Podendo esta trabalhar junto com a nova gestão que assumiu.

Artigo 30 º - A gestão do CA eleita para Coordenação da ENEEnf indicaria um nome que representará juridicamente a ENEEnf.

Artigo 31 º - Na assembléia Geral do ENEEn, os CA’s e DA’s interessados em compor as Coordenações, exceto as locos se candidatarão mediante a defesa de seu interesse nestas, para a plenária. As candidaturas estarão sujeitas a aprovação da plenária.

TITULO IIIENCONTROS E EVENTOS

CAPÍTULO I

DO ENCONTRO NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM – ENEEn

Artigo 32º - O Encontro Nacional dos Estudantes de Enfermagem – ENEEn - tem como objetivos:

§ 1º - Reunir os estudantes de enfermagem, de modo a discutir e deliberar as questões relativas a educação, ao desenvolvimento científico e prático de enfermagem, suas relações com a saúde da população em seus aspectos sociais, políticos e econômicos, bem como o intercâmbio cultural visando a integração de seus participantes.

Artigo 33º - O ENEEn deverá ser realizado no mês de julho, com duração, média, de 7 dias. I - A construção do ENEEn ficará a cargo da Comissão Organizadora. II - A estruturação do ENEEn passará também a fazer parte do Congresso Brasileiro dos Estudantes de Enfermagem.

Artigo 34º - Cada escola de enfermagem poderá inscrever apenas uma delegação, através de sua entidade estudantil representativa.

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§ 1º - A escola que ainda não possui entidade representativa dos estudantes de enfermagem ou que comprovem sua inoperância poderá participar com um grupo de estudantes organizados para esta finalidade. § 2º - A participação no ENEEn fica aberta a outros profissionais e acadêmicos inscritos, tendo direito à voz, mas não a voto.

§ 3º - Terão direito à alimentação, alojamento e impressos do evento apenas os inscritos no mesmo.§ 4º - Cada escola deverá informar o número aproximado de participantes até trinta dias antes do ENEEn, efetuar o pagamento antecipadamente através de conta bancária da Comissão Organizadora ou ainda no ato da inscrição.

Artigo 35º - Cabe a cada delegação a escolha de um delegado e um suplente para representá-la junto à reunião de delegados.

§ 1º - Cabe aos delegados participarem de reuniões de caráter deliberativo durante o ENEEn levando as deliberações destas para as suas delegações e vice-versa.

§ 2º - Cabe aos delegados serem responsáveis durante o encontro pela organização deste e pela responsabilização da sua delegação. Junto à comissão organizadora. Artigo 36º - Das reuniões de delegados

§ 1º - São membros das reuniões de delegados do ENEEn todos os estudantes de enfermagem inscritos no ENEEn sendo restrito o direito de voto aos delegados.

§ 2º - No primeiro dia do ENEEn, deverá ser convocada uma reunião de delegados para troca de informações.§ 3º - As reuniões de delegados poderão ser convocadas pela comissão organizadora do ENEEn, ou por 50% dos delegados presentes no ENEEn, com no mínimo 4 horas de antecedência salvo em situações que comprometam a organização e participação no encontro. Tendo a obrigação de comunicar, a todas as delegações presentes o responsável pela convocação.

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§ 4º - A reunião deverá ser realizada com 50% mais um dos delegados, em primeira convocação e após trinta minutos, em segunda convocação com o quorum presente.

§ 5º - A reunião dos delegados não devera coincidir com outra atividade do ENEEn a não ser em caráter extraordinário.

§ 6º - Caso a reunião dos delegados não chegue a uma conclusão deverá ser convocada uma assembléia geral extraordinária do ENEEn para discutir sobre a questão.§ 7º - A escolha da sede do encontro nacional do ano seguinte deverá obedecer ao critério de rodízio das regiões e dos estados desta região. É facultado à região abster-se da sua vez de sediar o ENEEn. O mesmo critério é válido para os CONEEEnf`s e o CBEEn.

§ 8º - Deverão ser criados regimentos individuais para o CBEEn, ENEEn e CONEEEnf’s baseados no estatuto da ENEEnf.

DOS TRABALHOS CIENTÍFICOS

Artigo 37º - Ficará a cargo de uma Comissão Pedagógica decidir sobre os critérios gerais para aprovação e apresentação de trabalhos no ENEEn.

I - A apresentação de produção científica ficará restrita a trabalhos das pessoas inscritas no encontro e aprovado pela Comissão Pedagógica.

DA COMISSÃO ORGANIZADORA

Artigo 38º - A Comissão Organizadora deverá ser composta pela a Comissão local, Coordenação Nacional da ENEEnf, e qualquer outro (s) CA´s/DA’s que desejem participar.

Artigo 39º - Compete à comissão organizadora garantir a infra-estrutura do encontro dentro das condições satisfatórias de segurança, higiene e saúde, devendo prover, para tal:I - No mínimo três refeições diárias em local específico para tal;II - Alojamento íntegro com garantia de segurança e privacidade para as delegações;III - Providenciar salas para as reuniões e plenárias, de acordo com o caráter da reunião e de fácil acesso.

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IV - Oferecer os primeiros socorros.

§ 2º - Garantir hospedagem e passagens para palestrantes, oficineiros, outros.

As passagens dos palestrantes poderão ser negociadas com as entidades que fizerem indicações mediante a impossibilidade da comissão organizadora.

§ 3º - Prover pastas para participantes contendo, no mínimo, caneta, bloco, programação, caneca, crachá, material de subsidio para discussão e regimento interno do ENEEn.

§ 4º - Os tíquetes refeição serão entregues por critérios estabelecidos pela Comissão Organizadora.

§ 5º - Os certificados para membros efetivos deverão ser entregues ao delegado na cerimônia de encerramento, os quais irão repassá-los aos componentes de sua delegação que tenham atingido no mínimo 75% de freqüência, dado que será fornecido pela Comissão Organizadora.

§ 6º - Providenciar transportes para todos os participantes, quando necessário, para deslocar os participantes para eventos relativos ao encontro.

Artigo 40º - A composição da comissão organizadora deverá ter uma coordenação para organizar e divulgar informações e encaminhamentos de questões relativas ao evento, bem como subcomissões para viabilizar atribuições da mesma.

Artigo 41º - A Comissão Organizadora deverá acatar as decisões das reuniões de delegados e da Assembléia Geral.

Artigo 42º - A Comissão Organizadora do ENEEn, mediante empecilhos que coloquem em risco a viabilização do encontro, terá autonomia para estabelecer critérios organizacionais que não constem neste estatuto ou no regimento interno do ENEEn, desde que respaldados pelo CONEEEnf e o CBEEn.

§ 1º - esta decisão deverá ser repassada às entidades com antecedência, mínima, de 20 dias.

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§ 2º - Se ocorrerem durante o encontro a reunião de delegados tem a autonomia, para a tomada de decisão.

TÍTULO IVDAS DISPOSIÇÕES GERAIS

CAPÍTULO 1DO SÍMBOLO DA ENEENF

Artigo 43º - A bandeira da ENEEnf é constituída de um retângulo de cor azul que representa a cor universal da enfermagem, tendo em seu interior o mapa do Brasil em cor branca que representa a paz que tanto almejamos, e ao centro uma lâmpada de cor verde que representa a cor nacional da enfermagem e uma chama em cor vermelha que representa a força, a luta e a garra dos estudantes de enfermagem.

Artigo 44º - Dentro da lâmpada está escrito ENEEnf. Desta forma a bandeira poderá representar os representantes de enfermagem, o movimento estudantil e os encontros nacionais de enfermagem.

CAPÍTULO 2DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

Artigo 45º - Este estatuto poderá ser mudado ou alterado em outra Assembléia Geral dos Estudantes de Enfermagem convocados para este fim com um prazo mínimo de dois anos após sua aprovação.

Inciso I - A Assembléia Geral do ENEEn é soberana, podendo apresentar emendas aoEstatuto se convocada para este fim, durante o próprio ENEEn. Artigo 46o - Haverá um regimento interno aprovado em Assembléia Geral no ENEEn.Artigo 47º - Revogam-se as disposições anteriores desde que contrárias a este Estatuto.

Artigo. 48 – Este Estatuto passar a vigorar, a partir da data da sua publicação.

Santo André – SP, 23 de julho de 2005.

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REALIZAÇÃO:

EXECUTIVA NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ENFERMAGEM – ENEEnf

Gestão 2008 / 2009

Coordenação de Articulação Nacional: UERJ; UFU e UFC Coordenação de Coordenação de Comunicação: UNIRIO Coordenação de Coordenação de Finanças: PUC-PR Coordenação de Educação: UNEB e UFMA Coordenação de Enfermagem: UFS Coordenação de Formação em Enfermagem: UNICAMP e UFBA Coordenação de Saúde: USP Coordenação de Educação Popular e Extensão: UECE Coordenação de Gênero: São Camilo/SP e UNIFESP

Organização:Centro Acadêmico de Enfermagem Alice Michaud – PUC/PRColetivo Levanta ou CAE?!

Contatos: [email protected]: www.eneenf.org.br

Para participar da lista de discussões envie um e-mail para:[email protected]

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