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2013.1 Rafael Ayres & Vinicius Santos UFRJ 2013.1 Caderno de Direito do Trabalho I Professor: Ivan Garcia

Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

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Page 1: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

2013.1

Rafael Ayres & Vinicius Santos

UFRJ

2013.1

Caderno de Direito do Trabalho I

Professor: Ivan Garcia

Page 2: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 1

Sumário Esqueleto: ...................................................................................................................................... 4

Aula 01 – Direito do Trabalho I dia 02/04/2013 ......................................................................... 11

Contextualização Histórica ...................................................................................................... 12

Contextualização Sociológica .................................................................................................. 13

Fontes Materiais ...................................................................................................................... 15

Breve Revisão sobre as Gerações de Direitos Fundamentais ............................................. 17

Aula 02 – Direito do Trabalho I dia 09/04/2013 ......................................................................... 18

Aula 03 – Direito do Trabalho I dia 11/04/2013 ......................................................................... 24

Princípios do Direito do Trabalho............................................................................................ 24

Dimensão dos Direitos Fundamentais ................................................................................ 26

Aula 04 – Direito do Trabalho I dia 29/04/2013 ......................................................................... 32

1° Princípio: Proteção do Trabalhador ................................................................................ 34

Aula 05 – Direito do Trabalho I dia 18/04/2013 ......................................................................... 42

2° Princípio: Irrenunciabilidade dos Direitos Trabalhistas. ................................................. 45

Aula 06 – Direito do Trabalho I dia 25/04/2013 ......................................................................... 52

3° Princípio: Continuidade da Relação de Emprego. ........................................................... 52

4° Princípio: Primazia da Realidade. .................................................................................... 56

Relação Ordinária de Emprego ............................................................................................... 58

Elementos da Relação Jurídica de Emprego. ....................................................................... 58

Aula 07 – Direito do Trabalho I dia 30/04/2013 ......................................................................... 67

Aula 08 – Direito do Trabalho I dia 02/05/2013 ......................................................................... 77

Relações de Emprego Especiais. ....................................................................................... 77

a) Empregado a Domicílio (Art. 6º, Consolidação das Leis do Trabalho). ........ 77

b) Empregado Rural (Lei 5.889 de 1973) ............................................................ 78

c) Empregado Público (Constituição Federal, artigo 37, incisos II, IV, V, ADI

2.135). ................................................................................................................................ 82

Aula 09 – Direito do Trabalho I dia 07/05/2013 ......................................................................... 88

d) Empregados domésticos (Lei 5.859 de 1972). ............................................... 88

e) Atleta Jogador de Futebol (Lei 6.354 de 1976 e Lei 9.981 de 2000) ........................... 91

f) Mãe Social (Lei 7.644 de 1987) ................................................................................... 92

g) Aprendiz (Art. 428, Consolidação das Leis de Trabalho). ............................................ 92

Relações de Trabalho Reguladas ............................................................................................. 93

a) Trabalhador Avulso (Art. 7º, inciso XXXIV, Constituição Federal/Lei) ........ 93

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b) Estagiário (Lei 11.788 de 2008) ....................................................................... 95

c) Trabalhador Voluntário (Lei 9.608 de 1998) .................................................... 97

d) Pequeno Empreiteiro/Artífice (Art. 625, alínea ‘’a’’, Consolidação das Leis

do Trabalho). .................................................................................................................... 97

e) Autônomo .................................................................................................................. 97

Aula 10 – Direito do Trabalho I dia 09/05/2013 ......................................................................... 98

Sujeitos da Relação de emprego ............................................................................................. 98

Empregador ......................................................................................................................... 98

Aula 11 – Direito do Trabalho I dia 14/05/2013 ....................................................................... 113

Aula 12 – Direito do Trabalho I dia 21/05/2013 ....................................................................... 124

Aula 13 – Direito do Trabalho I dia 28/05/2013 ....................................................................... 131

Aula 14 – Direito do Trabalho I dia 06/06/2013 ....................................................................... 148

Contrato de Trabalho ............................................................................................................ 154

Natureza Jurídica (três correntes) ..................................................................................... 154

Características do Contrato de Trabalho........................................................................... 158

Aula 15 – Direito do Trabalho I dia 11/06/2013 ....................................................................... 161

Elementos Essenciais do Contrato de Trabalho. ............................................................... 164

Aula 16 – Direito do Trabalho I dia 18/06/2013 ....................................................................... 172

Teoria das Nulidades Contratuais Trabalhistas ................................................................. 172

Contrato de Trabalho por Tempo Determinado (Exceção – Art. 445 da CLT) .................. 174

O Pré-contrato e o Pós-contrato ....................................................................................... 179

Aula 17 – Direito do Trabalho I dia 25/06/2013 ....................................................................... 180

Efeitos do Contrato de Trabalho ....................................................................................... 180

Assédio Moral (Art. 483, CLT) ................................................................................................ 181

Características do Assédio Moral. ..................................................................................... 181

Remuneração (art. 457, CLT) ................................................................................................. 183

Formas de Caracterização da Remuneração. .................................................................... 183

1° Sentido: Gênero Contraprestativo. ............................................................................... 183

2° Sentido. ......................................................................................................................... 184

Características das Parcelas Salarias ................................................................................. 184

Aula 18 – Direito do Trabalho I dia 27/06/2013 ....................................................................... 187

Aula 19 – Direito do Trabalho I dia 02/07/2013 ....................................................................... 198

Parcelas Salarias (Art. 457, CLT). ....................................................................................... 198

Salário Utilidade (Art. 458, CLT). ....................................................................................... 206

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Aula 20 – Direito do Trabalho I dia 04/07/2013 ....................................................................... 208

Utilidades Não Consideradas como Salário (Art. 458, §2°, CLT) ....................................... 208

Sistema de proteção ao salário ......................................................................................... 212

Aula 21 – Direito do Trabalho I dia 09/07/2013 ....................................................................... 218

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Esqueleto:

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Aula 01 – Direito do Trabalho I dia 02/04/2013

Ementa da Disciplina

Objetivo; Frequência;

Não faz chamada.

Avaliação; Bibliografia

o ‘’Curso de Direito do Trabalho’’ – Maurício Godinho Delgado (campeão) ; o ‘’Curso de Direito do Trabalho’’ – Alice Monteiro de Barros; o ‘’Curso de Direito do Trabalho’’ – Volia Bonfim Cassar; o ‘’Curso de Direito do Trabalho’’ – Amauri Mascaro Nascimento.

Não utilizar:

o Sinopses; o Resumos; o Esquemas.

Apontamentos; Programa E-mail: [email protected]

Fontes Materiais

Econômicas

Sociológicas

Políticas

Filosófico-Culturais

Fundamento Sociopolítico

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Contextualização Histórica

Normalmente nos manuais de Direito do Trabalho, assim como nos outros ramos, começa-se

com uma digressão histórica. Porém, essa história nem sempre é concreta.

O Direito se descola da realidade com muita facilidade. História dos manuais, em geral, não

condiz muito com a realidade, além de ser muito idealizado e descontextualizado.

No Direito do Trabalho há algo ainda mais impressionante, que às vezes deriva para a má-fé,

com conteúdo ideológico. Os manuais, nessa digressão, caracterizam o trabalho através de

uma origem atemporal, mas histórica: “um belo dia o homem trabalhou”, “o homem se fez

homem porque trabalhou”.

O trabalho tem sua origem etimológica em Roma com a palavra tripalio e tem uma conotação

negativa, de pena, punição, dor e etc. Depois, advirão contraposições como, por exemplo, na

ética protestante, onde o trabalho liberta ou é um meio para a prosperidade, tendo então uma

conotação positiva.

Isso tudo não têm a mínima importância. O trabalho que interessa é aquele que surge a partir

da Revolução Industrial (segunda metade do século XVII). O que vem antes não está

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relacionado com a forma com a qual se trabalha hoje, que é o trabalho nas sociedades

capitalistas contemporâneas.

Além do que já foi dito, a concepção de trabalho que será estudada tem a ver com a ascensão,

não só no campo cultural ou econômico, mas também no político-jurídico, da burguesia.

Somente quando tal classe ocupa o poder do Estado que o capitalismo assume a sua forma

final, tardia, contemporânea. A partir daí que se tem a fase de consolidação do capitalismo,

pois até então era uma transição.

O sistema capitalista se baseará em produção, reprodução, circulação e acumulação de capital.

Até a burguesia ocupar o poder do Estado, pelo processo revolucionário mais brando como a

Revolução Gloriosa ou no exemplo simbólico da Revolução Francesa (mais radical), todas

aquelas ideias jusnaturalistas que animaram os revolucionários (versavam sobre direitos que

estavam além do direito posto) caíram por terra. Tudo isso foi deixado de lado, pois a

burguesia já havia conquistado o poder do Estado. O passou a valer então era o que o próprio

Estado definia como direito, ou seja, o direito posto.

Contextualização Sociológica

O direito não é criação da burguesia. Contudo, esta irá se valer dele, de uma forma sistêmica

tão importante que sem ele e sem o Estado não haverá capitalismo. O Estado e o direito irão

garantir a produção de capital, assim como a sua circulação e acumulação.

O que interessa então é a primeira fase desse processo, pois a produção de capital se dá pela

relação de trabalho. É nesse momento que surge o direito do trabalho.

Produção de capital

Acumulação de Capital

Reprodução e circulação de

capital

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A relação de exploração do homem pelo homem também não foi inventada pela burguesia. No

entanto, no sistema de produção escravista, o ponto de definição dessa relação era a força. Os

instrumentos persuasivos eram baseados justamente na força para manter o escravo em sua

condição. Isso significa que, do mesmo jeito que tal relação se mantém através da força, esta

pode também destruí-la (por exemplo, uma revolta de escravos).

A relação servil feudal também é baseada na força, com o diferencial de possuir alguns

vínculos adjacentes. Há também uma relação patrimonial/patriarcal. Uma relação pessoal

entre o soberano e servo, um pacto de fidelidade. Todavia, ainda há a força.

No sistema de produção capitalista, a relação não se dá mais pela força como elemento

central, pois este passa a ser o direito, o Direito do Trabalho. A pré-condição para a relação de

produção de capital é o trabalho livre. Só o homem livre e igual é passível de se engendrar

numa relação de contrato, pois este é feito entre homens livres e iguais. É preciso, neste

momento, fazer um contrato, ainda que essa pessoa supostamente livre e igual seja

assumidamente desigual. É preciso que essa pessoa empreste a sua vontade para inaugurar a

relação contratual, o contrato de trabalho, que é mais um tipo de contrato burguês e vem a

ser essencial para a própria existência do capitalismo, para o sistema capitalista.

A partir desse momento há a possibilidade de utilização desse trabalho, pois o próprio

trabalhador quis, ao manifestar sua vontade, de se relacionar com o empregador através de

um contrato de trabalho. Não houve ameaças baseadas em força e o contrato foi firmado

porque o trabalhador é livre e igual e quis contratar, manifestando sua vontade. Isso é o que

diz a teoria do direito burguês. O trabalho livre e assalariado passa a ser então uma nova

forma de engendrar a produção social, diferente do trabalho servil ou escravo.

A relação de trabalho é baseada no contrato, e contrato é direito. Para burguesia o contrato

é lei (Pacta sunt servanda1), e é lei entre as partes.

Karl Marx usa a ideia de “fetichização”, que consiste em dizer que algo é autônomo, possui

vida própria, apesar de ser uma coisa, uma criação humana. Esse tipo de pensamento é

aplicado em relação ao direito por alguns autores que não conseguem admitir que aquele seja

uma criação humana e também um produto histórico.

Baseado nisso, é necessário estudar as fontes materiais do direito, que irão formar os

fundamentos concretos dele e devem ser investigados. Existem fontes materiais de cunho

econômico, filosófico, antropológico, psicológico, cultural etc.

Com o intuito de ser mais direto, costuma-se fazer o seguinte:

1 Pacta sunt servanda: o pacto faz servo.

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Fontes Materiais

Econômicas (Revolução Industrial)

Sociológicas (Agregação classista no espaço urbano)2

Políticas (A dupla dimensão do direito do trabalho3)

Filosófico-Culturais

Sobre o proletariado especificamente, há o lumpem proletariado que ocupa o nível mais baixo.

Karl Marx, em seu livro O 18 de brumário de Luís Napoleão, o descreve como uma figura difícil

de cooptar politicamente, pois o fato dele ser desesperado em razão de sua pobreza extrema

faz com que ele não mantenha sua fidelidade com ninguém. Ele não possui consciência de

classe e só pensa em sobreviver. O lumpem proletariado não possui fidelidade política.

Contudo, graças a uma engenharia assistencialista, o Brasil conseguiu adestrar esse lumpem

proletariado. A partir de agora esse controle, que cataloga, localiza e fideliza eleitoralmente

será mantido por qualquer partido que tome o poder. Não é à toa que o PT não precisa mais

dos movimentos sociais e sindicatos. É o efeito do bolsa família que, apesar de ter

consequências sociais muito positivas, politicamente falando, gera esse efeito temível.

O nível máximo seria a aristocracia proletária. Seriam, por exemplo, os funcionários públicos

de alto calão, que vendem sua mão de obra para o Estado e vivem nas “franjas do sistema”.

Vendem a força de trabalho com menos mais-valia e menos exploração, além de realizarem

um trabalho mais intelectualizado.

As formas de produção estão sempre mudando e tal mudança é dinâmica. O avanço da

tecnologia faz com que certas formas de produção sejam abandonadas e, a cada mudança,

mais mão de obra é dispensada.

O Stalinismo, através de uma leitura vulgar, somada a uma interpretação também vulgar do

marxismo irá dizer que tudo se reduz à luta de classes. Isso não é verdade. Há uma série de

outros aspectos da multiplicidade e conflituosidade humanas que não se reduzem a essa

questão. No entanto, a centralidade do trabalho é a centralidade da relação do homem com a

natureza e, a partir disso, da obtenção das coisas que lhe garantam a vida, em amplo sentido,

2 Isso são as classes sociais. O capitalismo as simplifica, ainda que hoje haja uma profusão de profissões e setores

sociais, pois ou o indivíduo é um proprietário privado dos meios de produção ou não. Karl Marx não diz que há somente proletários e burgueses. Muito pelo contrário, ele identifica uma série de subdivisões no proletariado e na burguesia, sendo que muitas vezes tais subdivisões apresentam interesses opostos e contrapostos e chegam a se digladiar politicamente. Fala-se, portanto, fundamentalmente daqueles que detém a propriedade privada dos meios de produção e os que não os detém – exemplos: fábricas, terra etc. É um arranjo de coisas que possibilitaram a produção dos bens da vida utilizados pelo homem. O capitalismo, com a propriedade privada, institucionalizou isso tudo com o direito. Sem direito e sem Estado não há capitalismo. Não faz sentido dizer que os liberais são contra o Estado, pois, na verdade, eles são contra algumas manifestações específicas daquele. Se o Estado acabar o capitalismo também acaba e, neste caso, tem-se o anarquismo. 3 A correlação de forças entre os setores do trabalho e produção do capital.

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é que os humanos se relacionam entre si. No centro disso está atividade humana de trabalho,

de trabalhar a natureza. Nem tudo se reduz ao trabalho, mas ele é imprescindível.

Os manuais do direito do trabalho costumam apresentá-lo com uma dimensão messiânica,

como sendo o grande protetor do trabalhador. Quem é contra este ramo do direito irá dizer

justamente o contrário, afirmando ser este um entulho autoritário do Estado sobre o homem.

Isso tudo é bobagens, pois o direito do trabalho é um artefato humano e está no centro de um

embate político (a teoria da gangorra) e, portanto, pode ser usado para diversos fins.

A cada momento histórico há um embate entre capital e trabalho e, o resultado disto,

fornecerá as bases diretas do direito do trabalho, que é o resultado do conflito entre

trabalhadores e capital. Fundamentalmente o direito do trabalho é um instrumento que

acompanha o interesse do capital; todavia, ele não se reduz a isso.

Várias normas atendem ao interesse do capital e outros atendem ao interesse da segurança do

trabalhador. O resultado final disso depende da luta de classes. No final da década de 90 o

neoliberalismo (que não é só uma ideologia, mas também práticas de cunho econômico que

trouxeram a desregulamentação e o desmonte do direito do trabalho nas normas de proteção

do trabalhador) foi uma reforma profunda no direito do trabalho onde as relações trabalhistas

foram precarizadas. Assim, as definições podem estar simultaneamente corretas.

Atualmente a “PEC das domésticas” foi aprovada. Historicamente, em termos legislativos, a

doméstica é a mucama, o escravo civilizado que pode frequentar a casa grande. Naturalizou-se

o fato de todos terem uma mucama, inclusive nos setores médios e até para a parte mais

pobre da população.

Em termos jurídicos, a primeira norma trabalhista sistematicamente editada chama-se

Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e data de 1943. O art. 7º do referido diploma exclui as

domésticas, dizendo que elas não possuíam nenhum tipo de direito trabalhista. Isso foi até

1972, quando elas passaram a ter férias de 20 dias e aposentadoria. Em 1988 alguns incisos do

art. 7º da Constituição e, atualmente, essa emenda feita “para inglês ver” onde elas possuem

todos os direitos.

A empregada doméstica deve possuir direitos, mas sua relação de trabalho tem peculiaridades

próprias. O empregador doméstico não é uma empresa (uma pessoa jurídica) e não reproduz

capital (no espaço doméstico ao menos). Tais peculiaridades não foram levadas em

consideração, o que tende a gerar uma frustração.

Uma empregada doméstica que entre com uma reclamação trabalhista pedindo horas extras

não conseguirá provar a situação e o juiz irá indeferir. Não conseguirá demonstrar seus

direitos. É uma irresponsabilidade do congressista que somente brinca com o público.

Devem-se mencionar também as ideias, estas que, segundo o filósofo alemão Hegel,

moveriam a história, e não as práticas humanas. Elas seriam a roda da história. Mas não é

exatamente assim, pois existe uma relação dialética entre ideias e movimento político

concreto que gira a roda da história. Ideias sozinhas são só ideias.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 17

Há, evidentemente, uma série de ideias que compõem um conjunto ideológico de grupos

políticos que fizeram surgir, avançar e retroceder o direito do trabalho, o que faz com que

essas ideias, de alguma forma, se constituam como fontes do mencionado ramo do direito.

Como exemplo, temos desde o pensamento social da igreja, com o papa Leão XIII, através da

encíclica Rerum Novarum, faz uma crítica ao capitalismo, individualismo até o socialismo

científico de Karl Marx e, no meio disso, o próprio pensamento reformista do capitalismo.

O direito do trabalho surge no bojo da segunda geração de direitos fundamentais. Hoje o

direito do trabalho está constitucionalizado, pois é visto como direito fundamental. Está no

título II, capítulo II da CRFB/88: “dos direitos fundamentais”.

Breve Revisão sobre as Gerações de Direitos Fundamentais

a) Direitos de Primeira Geração

A primeira geração de direitos fundamentais advém com o Estado Liberal. Os direitos

de liberdade individual e propriedade privada. A segunda geração mostra que tais

direitos são insuficientes, até mesmo para conseguirem se disseminar por si próprios,

entre a população.

Os direitos de primeira geração (liberdade de ir e vir ou de contratar) são inúteis para a

população de rua, por exemplo. Os direitos de segunda geração mostram que há outra

necessidade fundamental que antecipa seu exercício, das liberdades individuais, que

são as liberdades materiais. Para usufruir da liberdade de expressão, deve-se conhecer

a língua do país e ser consciente do contexto no qual se vive. Para se locomover, é

necessário estar inserido em relações econômicas.

b) Direitos de Segunda Geração

Na segunda geração (direitos sociais, econômicos e culturais) reconhecem a

necessidade do Estado, através de direitos de liberdade ou prestações positivas, na

forma de políticas públicas, empregarem às pessoas em necessidade, determinados

direitos como saúde, educação etc. Essa onda vem no séc. XX com a crise no

capitalismo. As crises do capitalismo são cíclicas e estruturais e trazem sempre novas

ideologias antiliberais. Os corporativismos do séc. XIX se convergiram para, muitas

vezes, ideias nazifascistas. O socialismo teve sua versão stalinista.

O capitalismo precisava mudar e, por isso, promoveu uma reforma. O resultado foi o

Estado de bem estar social, que foi uma experiência que os livros de direito do

trabalho colocam como se fossem a meta realidade do direito do trabalho. Foi

realidade nos países nórdicos, na França, na Alemanha, n norte da Itália e em outros

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 18

pouquíssimos países. O Welfare State foi uma experiência política concreta e o pacto

da social democracia foi circunstancial e geograficamente localizado. Porém, criou-se

um modelo. Em outros países como a Inglaterra o trabalhador das fábricas continuava

miserável. Os países supracitados conseguiram realizar esse feito pelo fato de haver

não só a luta dos trabalhadores organizados como também uma concessão da

burguesia, que estava com um contexto de crise estrutural e assistiu a difusão da

revolução bolchevique. A burguesia, em alguns países, perdeu o poder e, por isso, a

reforma era uma melhor opção. Houve então uma divisão do movimento operário,

onde os partidos social democratas se dividiram entre reformistas e revolucionários.

Os reformistas então deixaram de lado os ideais de revolução em prol da

democratização do espaço político e econômico.

Em termos econômicos, o que houve nesses países foi uma distribuição dos ganhos de

produtividade. Redução da margem de lucro com ampliação da base salarial média. A

segunda onda de direitos fundamentais deve ser vista sempre com uma dupla

dimensão, uma conquista do movimento operário aliado a uma concessão da

burguesia.

Aula 02 – Direito do Trabalho I dia 09/04/2013

Anteriormente, falou-se sobre os fundamentos político, econômico, social, cultural e filosóficos do Direito do Trabalho e o que merece destaque é a tentativa de desmistificar o que a doutrina de tal ramo propaga. Desmistificar a concepção de que o Direito do Trabalho é a salvação para todos os males ou que tem uma dimensão protetiva e absoluta ou ainda que é o reflexo dos interesses dos trabalhadores. Na melhor das hipóteses isso é apenas parte da verdade. Existe outra concepção de que o Direito do Trabalho é o estabelecimento prévio para a reprodução do capital.

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A forma de produzir capital tem como base precípua o contrato de trabalho. É o trabalho livre e assalariado que se insere em uma relação jurídica particular que é o contrato de trabalho. Isso remete a “teoria da gangorra”.

Na realidade, o Direito do Trabalho é constituído por um conjunto de normas cuja finalidade e interesse oscilam histórica e concretamente de acordo com a relação das forças políticas entre capital e trabalho de maneira que, em determinado lugar, circunstância ou tempo, é possível que essas forças representem melhor o capital e estejam mais fortalecidas sob condições que representem melhor o interesse do capital. Em outras situações, o movimento operário organizado imporá uma pressão sobre o Estado e a classe dominante e fará com que tal classe absorva determinadas demandas que se refletirão em normas trabalhistas que representem os interesses dos trabalhadores.

O Direito nem sempre protege o trabalhador, e nem foi criado para isso. A sua criação se deu para estabelecer relações de legitimação do trabalho assalariado e entre uma pré-condição jurídica para que possa haver reprodução do capital este que cria e tem o interesse precípuo do interesse do capital, no entanto, este ramo do Direito não se reduz a isso.

Primeiramente existe uma conformação sociopolítica que é o Estado liberal, que será predominante no século XIX. Na medida em que as burguesias nacionais vão ocupando a centralidade do poder político é estabelecida, dentro de um processo de engenharia constitucional, a reprodução da forma do Estado liberal, também chamado de Estado de Direito.

É nesse contexto que se formam os direitos fundamentais de primeira geração.

Esse Estado liberal não reconhece os direitos trabalhistas como especiais. O contrato de trabalho tem como base a relação contratual genérica, que é o contrato privado. Alguns doutrinadores inclusive dizem que a origem do Direito de Trabalho é romana, pois teria relação com o contrato de empreitada etc. No entanto, a tecnologia, a finalidade, o conjunto principiológico e a justificativa teórica do Direito do Trabalho é completamente diferente da base civilista. Chega a ser o oposto.

A mão de obra romana era escrava; portanto, o sistema de produção da vida material em Roma não era regido por tais formas de contratações. A vida material era sustentada por escravos, o que impossibilita qualquer tipo de analogia com a vida material de hoje, da sociedade industrial, capitalista e burguesa.

A partir das críticas feitas ao Estado liberal, por um lado, e da crise sistêmica e estrutural que essa mesma formulação sofre no século XX é que, efetivamente, haverá um processo histórico lento do Direito do Trabalho. Isso vai pressionando o Estado burguês para que direitos sejam assegurados. Certos movimentos operários como o cartismo e o ludismo começam a se desenvolver primeiramente na Inglaterra e, depois, na França, haverá algum desenvolvimento. Essa é a história do Direito do Trabalho, a organização proletária ainda no âmbito do Estado liberal.

No século XX, diante da fragilidade da crise estrutural do sistema capitalista, com o “crack” da bolsa em 1929 como marco e, por outro lado, o reconhecimento mais generalizado de que a primeira geração de direitos fundamentais e a forma jurídica trazida pelo Estado liberal eram insuficientes para grande maioria de a população assegurar liberdade individual e propriedade privada, onde todos são livres e iguais para contratar, se expressar, ir e vir etc. Não tem a mínima efetividade para pessoas paupérrimas como os mendigos. Eles são insuficientes, pois eram cumpridos somente por burgueses, pois tinham acesso a propriedade privada dos meios de produção.

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Faz sentido mencionar a liberdade de contratar quando, de fato, há o que contratar. O direito burguês ainda se mune da estratégia perniciosa de tomar a parte pelo todo. O que o direito burguês quer é assegurar a propriedade privada dos meios de produção da vida material. Historicamente, essa propriedade se concentrou nas mãos da burguesia enquanto todas as outras formas de produção foram erradicadas na transação feudal para a consolidação capitalista como, por exemplo, as companhias de ofício dos artesãos ou os pescadores artesanais que não podiam competir com o modo burguês de produção, restando a eles apenas a possibilidade de vender a própria mão de obra. Sobre isso, o direito irá dizer que há a propriedade privada, justamente para assegurar a propriedade privada dos meios de produção.

A propriedade privada não é criação burguesa, mas, juridicamente, proteger a propriedade privada é a forma de manter incólume a propriedade sobre os meios de produção. Com relação a isso, deve-se dizer também que o direito simula, como se fosse à mesma coisa, a propriedade privada das diferentes pessoas da sociedade, como se a propriedade privada do burguês fosse equiparável a de um morador de rua, como se o direito assegurasse a mesma coisa.

Sendo assim, quando a crítica aos direitos de primeira geração se tornou generalizada, outros direitos passaram a ser exigidos. Com isso, ocorre a criação do chamado Estado social que se caracteriza, dentre outras coisas, pelo reconhecimento de direitos de segunda geração, sejam eles culturais, econômicos etc. Aqui se protege a possibilidade dos indivíduos acessarem as suas necessidades primordiais. O Estado sai da posição absenteísta para garantir as condições materiais mínimas através de políticas públicas como previdência, educação, saúde etc. Decorre de uma reforma do Estado capitalista. A burguesia então fez essa concessão para evitar um possível processo de ruptura relacionado à classe operária, que já se encontrava organizada. Assim, depois de observar a experiência da revolução bolchevique, a burguesia preferiu fazer essa concessão e prover os direitos de segunda geração do que correr o risco de ser apeada do poder.

No bojo dessa experiência do Estado social houve outra experiência mais limitada a poucos países da Europa, o chamado Welfare State.

O Welfare State ou Estado de bem-estar social é bastante mais complexo que o Estado social, pois compreende transformações no nível político, econômico, cultural, social e em outros diversos.

Duas observações importantes: a referida experiência ocorreu nos países escandinavos, na Suíça, na Alemanha, Inglaterra, França e norte da Itália. Basicamente só ocorreu nesses países.

No plano econômico significou uma distribuição dos ganhos de produtividade, traduzindo-se por uma diminuição das taxas de lucro combinado com a ampliação da massa salarial através de uma regulação exercida pelo Estado.

O fato de tais países estarem inseridos no circuito imperialista realmente facilitou a implantação do Estado de bem-estar social, pois as empresas que distribuem os ganhos de distributividade em seus países não os distribuem da mesma maneira nos países onde

exploram a mão de obra. A não distribui os seus ganhos na Alemanha da mesma forma que o faz no Brasil.

Houve também, nesses países, uma política tributária distributivista, aplicada através de políticas públicas consistentes e concretas. O capital foi regulado no sentido keynesiano com mecanismos anticíclicos, para que o capital seja regulado de forma a evitar o subconsumo decorrente da superprodução, um exemplo seria o direito regulatório.

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No plano político, essa experiência revela um processo de democratização muito grande. Houve uma grande participação popular nos processos públicos e privados onde há o interesse público. Isso decorreu de um pacto de forças políticas. O movimento operário desses países fez um pacto (não era um compromisso de classes intermediado pelo Estado, mas sim um pacto) de forças políticas muito concretas, onde havia o partido social democrata e o partido trabalhista, de uma determinada região, que eram partidos de massa, reflexo de um sindicalismo de massa. Tais movimentos políticos retiraram de seus horizontes a ideia de ruptura revolucionária, pois para esses países a transformação significava acabar com o capitalismo, com a hegemonia da classe burguesa. Com isso, foi possível um pacto democrático e formal e até mesmo representativo burguês. É o pacto do Estado de bem-estar social.

Isso é importante para frisar o fato de que o Brasil nunca possuiu um Estado de bem-estar social. Nunca houve distribuição de ganhos de produtividade ou adoção de políticas keynesianas sistemáticas. Tão pouco houve um processo de democratização política, pois a regra é o autoritarismo.

O Estado social e o Estado de bem-estar social, os métodos de produção fordista e taylorista e o keynesianismo fez com que o capitalismo avançasse no início do século XX; no entanto, no final do mesmo século, esse pacote dá sinais de esgotamento e entra em crise. Sobre isso, foram feitos dois diagnósticos.

a) Primeiro Diagnóstico.

O primeiro foi o neoliberalismo, que defende que o problema da crise do Estado de bem-estar social é o investimento publico, pois se gastou muito dinheiro com política pública, ocasionando déficit público e inflação. Ideologicamente este discurso foi o vencedor na década de 80. Com tudo, na Inglaterra, por exemplo, que é o país de um dos ícones do neoliberalismo (Margaret Tatcher), os níveis de investimento público não foram menores do que 38%, chegando a ser 50%. No Brasil, a desestatização foi brutal e o Estado foi taxado como sendo tudo de ruim, ineficiente, lendo, burocrático etc. Muitas vezes de fato o é, mas ele não é diferente dos interesses de quem o utiliza como sendo seu comitê gestor (burguesia).

b) Segundo Diagnóstico.

O segundo discurso irá dizer que, justamente pelo fato de o Estado ser o comitê de gestão da burguesia, é que esse tipo de coisa aconteceu. Como as políticas anticíclicas não conseguiram evitar um processo de crise estrutural do próprio capitalismo, não conseguiu evitar um decréscimo no nível de acumulação de capital e a superprodução e subconsumo é que o sistema, mesmo sob a fórmula reformista do Estado de bem-estar social, entrou em crise. Com isso, o dinheiro público saiu da política pública para entrar no setor privado.

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Isso sempre foi assim, a diferença é que, em 2008, isso foi feito sem justificações liberais. A General Motors (Chevrolet, no Brasil) estava quebrando e foi salva com dinheiro público para evitar uma crise maior.

Através deste último diagnóstico é que a culpa é do próprio capitalismo e o neoliberalismo seria o pior dos remédios, pois, historicamente, já mostrou ser gerador de crise com suas ideias de desregulamentação e mão invisível do mercado. O próprio Keynes já indicou esse processo como falho.

Isso tudo tem haver com o Direito do Trabalho. Se aplicada a “teoria da balança” pode-se ver que o ramo supracitado do direito oscila muito com esses movimentos no panorama econômico, o que, em tempos de neoliberalismo, torna propícia a criação de normas em desfavor do trabalho e em favor do capital. É o movimento oposto ao Welfare State. Com tudo, pode-se afirmar que as reformas na América Latina são muito mais precarizadoras do que na Europa. Isso afeta diretamente o conteúdo das normas de Direito do Trabalho. Portanto, deve-se olhar para as normas trabalhistas para saber quais interesses que estão sendo resguardados.

Sobre o Direito do Trabalho no Brasil, o presidente Getúlio Vargas tem um papel relevante. Embora ele fosse adepto de uma ideologia corporativista na sua variante do positivismo filosófico de August Comté (que inspirou o lema “ordem e progresso” da bandeira nacional). Esse filósofo foi muito importante no Brasil, mas nem tanto na Europa, nem na própria França.

O positivismo filosófico quer racionalizar o pensamento humano, pois houve muito avanço nas ciências naturais, mas quase nenhum na área de humanas. Por isso ele cria a ciência social, pois quer harmonizar as lutas de classe em prol da nação para alcançar o progresso, baseado em ordem. Ele reconhece que o liberalismo e o individualismo, na França, trouxeram muitos problemas para os trabalhadores e daí vem seu conjunto de ideias.

A variante do Rio Grande do Sul desse pensamento era o Partido Republicano Rio-grandense. Todo o grupo político de Getúlio Vargas era desse partido, porém, ele conseguiu conciliar o Estado e trouxe, para o plano federal, as ideias corporativistas, para fazer a revolução burguesa no Brasil através da quebra do pacto oligárquico e com o perfil agroexportador do país, centrado no grande capital dos cafeeiros de São Paulo, na República Velha. Isso é a revolução de 1930.

A questão social sempre fez parte do programa de Vargas. Assim que assume o poder, ele começa a criar várias normas trabalhistas através de decreto durante o governo provisório e surgem conflitos com as indústrias. Daí surge o ministério do trabalho com duas instâncias para dirimir os conflitos (as comissões mistas de conciliação e as juntas de conciliação e julgamento).

Vargas então promove a industrialização e urbanização e muda a cara do Brasil, não tanto a ponto de romper com a divisão internacional do trabalho, pois o Brasil continua exportador, mas as mercadorias, hoje chamadas de comoditties, que são primárias, podem ser transformadas em pacotes mercantis de futuros passaram a ser valorizadas em longo prazo. Isso, todavia, não muda o fato de a industrialização ter sido tardia, de segunda mão e com tecnologia atrasada, mas pelo menos o país deixou de ser aquela velha república oligarca.

Reproduziu-se uma característica brasileira que é um processo de transformação sem ruptura aliada a uma conformação de interesses. As oligarquias cafeicultoras embora fossem, em um primeiro momento, retiradas da centralidade do poder, logo em seguida, tiveram seus interesses contemplados, havendo assim uma acomodação. Do mesmo modo, no setor industrial, que era um setor, dentro da burguesia brasileira, caudatário das oligarquias cafeicultoras paulista, fato que era possível de se notar no processo legislativo da época. Os

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industriais se sacrificavam para atender os interesses dos cafeicultores pertencentes a oligarquia brasileira, principalmente em questões de câmbio e importação – o que dificultava a aquisição de equipamentos. Vargas faz uma inversão, pois dissemina a industrialização e fortalece a burguesia industrial, colocando-a no centro do poder político, mas sem fazer reforma agrária. Houve acomodação entre os setores da elite e não houve espaço para reforma agrária.

O direito do trabalho no Brasil nasce dentro dessa perspectiva de transformação mais profunda da estrutura social brasileira.

Sobre o direito do trabalho Varguista, duas observações. A primeira é a lenda de que tal presidente criou o direito do trabalho como sendo uma cópia da Carta del Lavoro de Mussolini (algo que é falado muito pelo fato de se considerar que Getúlio era adepto das ideologias nazifascistas). Todavia, Getúlio Vargas é irredutível sob o ponto de vista de personagem política, pois incorporou quase todos os personagens da ciência política: foi o grande oligarca, o grande ditador, o socialdemocrata etc.

Os fascistas eram um partido de massas, de trabalhadores, assim como o partido nacional-socialista, embora não expressassem legitimamente o interesse dos trabalhadores, mas sim a reprodução do capital em níveis internacionais.

Essa comparação não é verdadeira. Basta abrir a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que foi editada em 1943, no meio do Estado Novo, o regime ditatorial de Getúlio Vargas, após este dar um golpe em si mesmo e fazer uma constituição baseada (realmente baseada) na constituição da Polônia. A CLT continha, então, todos os decretos do governo provisório de 1930-34, basicamente tratando de direitos individuais do trabalhador, mais as leis editadas no período constitucional de 1934-37, que é um período formalmente democrático, pois estava sob a égide da constituição de 1934. Além disso, havia uma legislação de cunho coletivo criado após o período do Estado Novo (1937) extremamente corporativista e autoritária com alguma similitude com o autoritarismo fascista. O resto foi criado a partir de diretrizes normativas estabelecidas pelo ministro do trabalho a partir dos conflitos que chegavam ao ministério do trabalho. Assim, praticamente todo o direito individual não tem praticamente nada a ver com o direito de Mussolini. O direito coletivo até tem aspectos que se aproximam do fascismo, mas não é suficiente para falar que é uma cópia da Carta del Lavoro, que é uma carta de princípios bem pequena.

Deve ser dito também do mito da outorga, que é a generalização da afirmação que Vargas entregou a legislação trabalhista para os trabalhadores como sendo o grande pai dos pobres (e eventualmente a mãe dos ricos). Quem disseminou essa tese foi o próprio Vargas para disseminar sua legitimidade perante os trabalhadores (que não era pequena). Getúlio, como um bom líder da nação, a entrega aos trabalhadores como um favor. No Brasil os direitos sociais costumam ser envarados como sendo favores e, assim, cria-se um balcão de clientela, vide Bolsa Família.

Esse mito, de um lado, parte do Getúlio, de outro, da crítica liberal aos direitos trabalhistas, que tenta desqualifica-los dizendo que no país não houve movimento operário ou conquista. Haveria, portanto, uma artificialidade nos direitos do trabalhador, pois foram criados artificialmente pelo Estado brasileiro. Daí o ponto de vista de que o direito do trabalho faz parte do entulho autoritário de Getúlio, que deve ser removido. Isso é um mito.

Vargas foi imprescindível para o direito do trabalho brasileiro e para a história do país, sem dúvida. O que se deve pontuar é que tal personagem foi habilidoso o suficiente para recolher a história do movimento operário brasileiro, que já existia desde o Império, apesar de incipiente, que não teve força para pressionar o Estado oligárquico brasileiro de modo suficiente para refletir em produção e normas que lhes protegessem. Mas as bandeiras desse movimento

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operário foram apropriadas pelo movimento político de Getúlio e essa captação é que permitiu a relação próxima com a massa de trabalhadores, tomando a frente desses movimentos para tentar legiferara a respeito desses assuntos. Mais do que isso, houve uma série de movimentos operários no governo Varguista que se colocaram a favor ou contrariamente ao presidente, que foram tratados de formas diferentes de acordo com os personagens assumidos por Getúlio.

Em um primeiro momento de governo provisório e constitucional havia sindicatos que não eram credenciados no ministério do trabalho e, ao longo do tempo, o reconhecimento jurídico desses sindicatos vai diminuindo e, chega-se a o ponto de repressão aos mesmos.

O movimento operário brasileiro é fundamental justamente por ter sido captado por Getúlio.

A doutrina põe essa relação entre Estado, capital e trabalho dentro de um molde muito abstrato e bonito, onde o Estado é um terceiro elemento que controla o capital para proteger o trabalho de forma imparcial. O direito do trabalho tem limites e possibilidades e cumpre o papel de reproduzir e manter o próprio sistema capitalista. A proteção do trabalho sempre terá um limite e não poderá esbarrar nos pilares do sistema, ainda que isso caia em contradição. Portanto, nesse caos o trabalho terá de ceder. Dentro das possibilidades variadas, há aquela de organização e compreensão coletiva dos trabalhadores e conquistas de condições de vida das pessoas inseridas nesse mundo.

O direito do trabalho é muito circunscrito em termos de sujeitos. Só tem proteção jurídica trabalhista o trabalhador empregado. No entanto, o capitalismo apresenta cada vez mais outros tipos de trabalhadores que não estão dentro do molde típico de trabalhador empregado e não gozam de nenhuma proteção social e jurídica trabalhista. Por outro lado, existem outros trabalhadores que possuem todo o tipo de proteção (o direito do trabalho costuma ser assim, utilizador de extremos), como, por exemplo, um executivo de uma multinacional que recebe um salário de R$ 200.000 por mês somado à verba de representação (seriam utilidades fornecidas pela empresa para atender seus interesses mediante demonstração, através do empregado, de sua própria força, concedendo roupas, carros, matrícula em clubes seletos etc. para manter networking) e tudo isso, para efeitos de direitos trabalhistas, no contrato de trabalho, terá valor econômico e será considerado como salário. Na hora de pedir integração de seu salário na justiça ele irá conseguir tudo, apesar de não ser um hipossuficiente.

É para esse o tipo de trabalhador que se direciona o direito do trabalho?

Então, o tratamento dado aos trabalhadores pelo direito do trabalho está cada vez mais obsoleto. É preciso absorver essas novas formas de trabalho e atribuir a elas graus de proteção distintos, assim como para as empresas. Sendo microempresa individual, pipoqueiro ou uma mega multinacional, o tratamento dado pelo direito trabalhista é o mesmo para todos os trabalhadores. É necessário um grau de modulação, levando em conta a forma de participação do trabalhador nesses ambientes.

Aula 03 – Direito do Trabalho I dia 11/04/2013

Princípios do Direito do Trabalho

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O modelo Estado Democrático de Direito é o modelo que orienta hoje a organização política

dos Estados nacionais. Esse modelo é alicerçado em dois pés: os direitos fundamentais e a

democracia. Há quem entenda que a democracia é uma modalidade de direitos fundamentais,

Para estes, o Estado Democrático de Direito é baseado apenas nos direitos fundamentais.

Isso significa que o Estado Democrático de Direito só existe, nasce, cresce, se reproduz e morre

tendo uma única obsessão: concretizar direitos fundamentais. Materializar para o cotidiano

real das pessoas desse Estado os direitos fundamentais.

Esses direitos fundamentais são fundados diante de um princípio de democracia, de

participação popular na identificação de quais sejam as necessidades, valores predominantes

(ou pelo menos majoritariamente compartilhados) em um determinado contexto histórico,

época ou país.

Diferentemente de concepções passadas, nas quais os direitos fundamentais eram muito

aproximados dos direitos naturais4, hoje se convenciona que os direitos fundamentais tem

pretensão de universalidade, mas não são universais. A concepção de mundo de uma pessoa

que more nas colinas do Afeganistão é completamente diferente da concepção dos moradores

das favelas do Rio de Janeiro5.

Os direitos fundamentais, ou os princípios que revelam aquilo que seja o mais importante para

ser assegurado pelo Estado em uma determinada nação, variam de acordo com o tempo ou o

lugar. Os direitos fundamentais não existem flutuando no ar de maneira abstrata. São um

construção concreta de maneira histórica da população. Não devem ser ainda apenas um

discurso. O professor Norberto Bobbio sempre afirmou que os direitos fundamentais já são

fatos e podem ser afirmados juridicamente. Impõem-se agora concretizá-los, ou seja,

materializá-los.

Nesta materialização é que se identifica quem está ao lado dos direitos fundamentais6 e

aqueles que usam os direitos fundamentais como mero discurso. E esse segundo grupo é a

maioria, atualmente. Na sociedade atual não existe mais ‘’direita’’ ou ‘’esquerda’’, pelo menos

autoproclamada. Todos rezam na igreja ampla dos direitos fundamentais. Ao observar o

discurso de George W. Bush ( ) filho, na fundamentação para as invasões, o belicismo, o

morticínio promovido no Iraque, encontra-se todo fundamentado nos direitos fundamentais.

Obviamente, ele não pratica os direitos fundamentais em Abu Dhabi, em Guantánamo, é

apenas um discurso.

O Direito do Trabalho, dentro do modelo do Estado Democrático de Direito, sofre a invasão da

Constituição. Sofre a repercussão de que no sistema jurídico, a centralidade é ocupada pela

Constituição e, não mais pelo Código Civil. A Constituição ocupa o epicentro deste sistema

4 Aqueles direitos universais, ahistóricos, que valiam em qualquer lugar e tempo.

5 Sua visão, valores, moral, e aquilo que é necessidade básica para essas pessoas também são diferentes.

6 Na medida de direitos que servem para resistência contra a opressão de poderes públicos ou privados; para

emancipação e autonomia do ser humano, na sua dimensão máxima.

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jurídico, irradiando seus efeitos (sobretudo naquilo que é mais importante, ou seja, os direitos

fundamentais) para todas as áreas, outros ramos do direito, inclusive o Direito do Trabalho.

Assim, este último sofre a invasão da Constituição.

Deve se perguntar que invasão é essa. O Direito do Trabalho consta nos textos Constitucionais

desde a Carta de 1934. Existem normas de direito trabalhista desde a Constituição de 1934.

Nem a ditadura militar, com a Constituição de 1967 e a Emenda de 1969 retiraram de seu

texto os direitos individuais do trabalhador. Assim, formalmente, os Direitos Trabalhistas

figuram na Constituição a muito tempo. Assim, quando se fala nessa invasão não se refere a

essa elevação formal dos direitos trabalhistas a constituição, que eles sejam alçados ao

patamar de norma constitucional. Isso já existe a muito tempo e não é novidade. A invasão diz

respeito à qualidade da percepção desta constitucionalização. A qualidade da percepção no

sentido de que o direito do trabalho passa a ser constitucionalizado. Fala-se a partir dai das

dimensões dos direitos fundamentais. Não são as gerações, mas sim as dimensões, no sentido

da extensão, da aplicabilidade do seu conteúdo. Uma dimensão subjetiva e outra objetiva.

Dimensão dos Direitos Fundamentais

a) Dimensão Subjetiva

Esta está ligada a possibilidade de concretização

do direito fundamental para o indivíduo. Durante

muito tempo esta dimensão esteve vinculada a

chamada eficácia vertical, que diz respeito à

atuação o Estado em relação ao indivíduo, no

sentido de garantia dos direitos fundamentais

deste indivíduo. Vertical, pois temos uma relação

de sujeição Estado/indivíduo para que se preserve

a esfera de proteção, um ‘’campo de força’’.

A primeira dimensão e geração dos direitos

fundamentais trazia um campo de for para o

individuo e a sua autonomia individual.

Traumatizado pela experiência do absolutismo, esse campo de força dizia respeito

justamente a uma abstenção do estado, um não fazer, um não se intrometer do

Estado, reservando para o indivíduo, uma esfera de liberdades, por exemplo, liberdade

de ir e vir, se expressar, de contratar, isto é, liberdade nas relações deste indivíduo

com outros. Caso o Estado violasse esse campo de proteção de autonomia individual

desse cidadão, automaticamente a Constituição promovia mecanismos de

recuperação desta esfera. Esses mecanismos são os remédios (Habeas Corpus,

Mandado de Segurança, Habeas Data, Mandado de Injunção).

Mais recentemente (é uma novidade pós Constituição de 1988, pós década de 1990), o

posicionamento do Superior Tribunal Federal conseguiu avançar concedendo, ainda

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em eficácia vertical, ou seja, ainda em dimensão subjetiva, aos direitos fundamentais,

direitos que não fossem apenas desta primeira geração. São os direitos de segunda

geração.

Passou-se a observar, na jurisprudência do Supremo, a entrega de direitos sociais,

econômicos, culturais para determinados indivíduos. O exemplo típico é a distribuição

de medicamentos, o direito social a saúde. Basta lembrar-se do voto leading case da

Ministra Ellen Gracie dizendo que o artigo 196 da Constituição é uma norma de

aplicabilidade imediata, tendo dos os requisitos para sua aplicação jurídica concreta. A

saúde é direito de todos e dever do Estado (preconizando inclusive solidariedade

passiva entre os entes federativos).

Obviamente, esse voto sofreu certo afã para que se concretizassem os direitos sociais,

muitas vezes carecendo de um estofo técnico um pouco melhor. O professor Daniel

Sarmento apresentou uma crítica, afirmando que isto se transformou em um

movimento pendular, em uma panaceia, uma ‘’salvação para todos os males’’,

comprometendo os recursos públicos na sua dimensão coletiva. Municípios muitas

vezes quebravam ou tinham suas políticas públicas inviabilizadas em virtude de

decisões judiciais dessa natureza. Pode se ir além observando que o orçamento, no

Brasil, não é muito levado a sério (nem quem faz, executa, e quem deveria ser

beneficiado pelos recursos públicos).

b) Dimensão Objetiva

A grande mais valia de conteúdo constitucional está na dimensão objetiva. Essa trás

uma revolução em termos de direito ou de teoria jurídica, afetando o Direito do

Trabalho, uma vez que se reconheçam normas trabalhistas com essa dimensão de

direitos fundamentais, quer na Constituição, quer na CLT ou qualquer lei ou norma

infraconstitucional.

A eficácia objetiva é afirmar que os direitos fundamentais estão além da figura do

indivíduo. Quando um país convenciona que determinado número de direitos

constituem-se fundamentais, este é o fundamento da Constituição Social deste país. A

agregação social só se justifica quando se respeitam esses direitos, pois estes são os

mais importantes, dos mais importantes, dentre os mais importantes. Dentre os

direitos que gozam de supremacia Constitucional há uma supremacia axiológica (não

formal) valorativa emprestada aos direitos fundamentais. Este estariam ali como os

valores mais preciosos da nação, valores que justificam a existência de uma

sociedade.

Quando se afetam, quando se agridem algum desses direitos, se agride justamente ao

amalgamo constitutivo da sociedade. É dizer: a violação desses direitos concorre para

a desagregação social, para um caos social, para a destruição da sociedade. Assim,

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esses direitos tem prioridade na sua garantia. Mesmo que não se afete diretamente o

indivíduo será afetado indiretamente, como membro desse corpo social.

Essa dimensão objetiva se verifica através:

a. Eficácia Irradiante.

Que, por sua vez, tem duas manifestações:

i. Interpretação Conforme a Constituição.

ii. Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais.

Devem ser aplicados não apenas em uma relação vertical (Estado X

Indivíduo), mas também em uma relação horizontal (particular X

particular), entre indivíduos particulares. Mais, entre grupos

particulares. Essa eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre

particulares.

Divide-se ainda:

1. Eficácia Horizontal Direta

Pode se dar pela incidência direita do dispositivo

Constitucional na relação jurídica concreta entre particulares.

2. Eficácia Horizontal Indireta

Caso Luth do Tribunal Constitucional Federal da, então,

Alemanha Ocidental. Marca a origem dessa possibilidade.

Nesta, a rigor, cuida-se da preservação dos direitos

fundamentais quando se aplica uma legislação

infraconstitucional.

A legislação infraconstitucional deve ser interpretada a luz dos

direitos fundamentais, tanto no seu sentido hermenêutico

principal orientador, quanto na interpretação dos seus

dispositivos (cada qual aberto a essa incidência).

Seria como se colocassem lentes ao intérprete que o

permitissem ler à legislação a luz (sob a ótica) dos direitos

fundamentais.

Isso é muito comum (como no caso Luth) quando a legislação

infraconstitucional trás cláusulas gerais, abertas ou conceitos

jurídicos indeterminados. Por exemplo, bem comum, interesse

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público, mulher honesta, condição pessoal, desídia. Uma série

de palavras que tem uma abertura semântica e que permite

ao intérprete construir um determinado sentido em

determinado caso.

Em todas essas brechas (janelas) oriundas, orienta-se ao

intérprete pela aplicação dos direitos fundamentais.

Isso é o que faz uma diferença fundamental dentro da

perspectiva da Constitucionalização do Direito do Trabalho.

Quando se fala nos princípios, estes são uma das formas (roupagens jurídicas que

vestem os direitos fundamentais). Podem estar vestidos com a roupagem de princípios

ou regras jurídicas. De uma forma ou de outra, tem a premência da forma objetiva.

Eles se impõem nas relações particulares como são as relações entre empregador e

empregado.

Outra manifestação prática da dimensão objetiva são os deveres de proteção estatal.

Em termos sintéticos afirmam o seguinte: ‘’o que legitima o Estado, isto é, o Estado só

existe (dentro do modelo de Estado Democrático de Direito) para concretizar direitos

fundamentais. ’’. Então é uma obrigação precípua de qualquer agente público ou órgão

de poder a preservação e garantia dos direitos fundamentais. Este é um dever

primordial de qualquer um que seja reconhecido como instância estatal. Não importa

o órgão, repartição ou quem se apresente como representante deste órgão público.

Sua obrigação primária é zelar pela garantia dos Direitos Fundamentais.

Assim, quando o judiciário pratica esse movimento de judicialização (ou,

eventualmente, até mesmo de ativismo) ele zela pelos direitos fundamentais.

Tudo isso convida o leitor a interpretar os dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho

(CLT) conforme a Constituição. Há uma série de dispositivos em que se verifica claramente a

recepcionalidade ou não pela Constituição Federal de 1988 caso, por exemplo, a CLT tenha

uma regra em um sentido e a Constituição Federal vá no sentido oposto. Por exemplo, normas

que impediam a mulher de realizar horas extraordinárias foram derrogadas pela Constituição

Federal, que implementou a igualdade entre os gêneros. Se o homem pode se manter para

além da duração normal da jornada de trabalho (recebendo o adicional de horas

extraordinárias respectivas), a mulher tem o igual direito de ser explorada pelo capitalista

Assim, ficou revogado o dispositivo celetista que tratava desigualmente o homem e a mulher.

Outro exemplo era a jornada noturna. À mulher era vedada a realização da jornada noturna

(das 22:00 às 5:00 horas do dia seguinte).

Esses dispositivos se confrontam evidentemente. Por isso, é caso de revogação, de não

recepção do texto celetista pela Constituição Federal de 1988. Assim também, as normas

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trabalhistas pós Constituição Federal, quando expressamente violam a Constituição, são

eivadas do vício de inconstitucionalidade.

O que se anuncia aqui é algo completamente diferente. É rever toda a relação empregatícia a

partir desta concepção de respeito aos direitos fundamentais. Essa relação privada deve ser,

prioritariamente, vislumbrada aos olhos do respeito aos direitos fundamentais porque o

próprio Estado Democrático de Direito a limitação do poder preconizada pelo Estado Liberal

sofrerá uma exponencialização.

Antes, o que era uma limitação de poder no Constitucionalismo será mega limitação de poder

no neoconstitucionalismo. Essa mega limitação será daquelas instancias das quais a ordem

jurídica reconhece o poder, pois aqui maximiza o titular deste poder, o único titular deste

poder soberano.

A tradução disto tudo é: reforça-se a ideia de delegação do poder. O poder soberano7, que é o

poder supremo em relação a todos os outros poderes (cujo detentor é o Estado), é titularizado

pelo povo. Isso é construção da Teoria do Estado, muito bem explicada no livro do professor

Dalmo de Abreu Dallari (Elementos da Teoria Geral do Estado).

No constitucionalismo do Século XIX essa limitação do poder em virtude da delegação se dava,

sobretudo, a respeito do poder público.

O poder público se limitava:

a) Em relação ao respeito dos direitos fundamentais do indivíduo;

b) Fragmentando esse poder em Executivo, Legislativo e Judiciário;

c) Organizando este Estado em esferas Federativas (União, Estados e Municípios),

repartindo competências entre estes entes federativos.

Limitava-se então o poder, de maneira que quem exercer este poder, o exercerá de forma

limitada. Essa foi à forma que o liberalismo encontrou para limitar o poder. Mesmo que

eventualmente forças não burguesa ocupassem o poder, dentro da engenharia Constitucional

burguesa, este poder estaria limitado. Não seria possível o retorno àquele arbítrio do poder

absoluto.

No Estado Democrático de Direito essa limitação de poder irá reforçar limitação dos poderes

públicos. Quem tem poder não terá poderes, pois nasceu com estes ou em virtude de uma

aquisição formal de investidura em um cargo público. O poder de um Juiz não se dá porque ele

passou em um concurso público. O poder do Governador não se dá porque ele foi eleito

majoritariamente. O poder do parlamentar não se dá porque ele foi eleito proporcionalmente.

O poder de todos estes que o exercem se dá única e exclusivamente porque o povo quis que

eles tivessem poder. Através de uma Constituição determinou como cada um acessaria a um

órgão de poder e o exerceria dentro de um âmbito de competência.

7 Se é que ele existe. Para abstração jurídica ele existe.

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Assim, legislativo, executivo e judiciário encontram a sua legitimação no poder soberano do

povo. Isso significa que toda vez que o titular deste órgão de poder estiver exercendo o seu

poder típico (o executivo criando atos administrativos, o Juiz julgando o processo, o

parlamentar criando uma lei), devem prestar contas, deverão fazê-lo justificando para o povo

porque e o que fazem ou deixam de fazer. Esta é a grande revolução substancial do

neoconstitucionalismo.

Quem tem poder deve dar satisfação ao seu delegante (o povo). Esta é uma teoria que vem

desde o Direito Administrativo Francês (virada do século XX) observa-se que, nos atos

administrativos discricionários, antigamente, apenas por um juízo de conveniência e

oportunidade o Administrador tomava sua decisão. Em um segundo momento, passa a

motivar (teoria dos motivos determinantes). Depois ele passa a justificar (mais que motivar),

argumentar para convencer o porquê que àquela decisão tomada, embora discricionária, era a

mais correta. Cria-se, assim a Teoria da Proporcionalidade8.

Essa Teoria da Invasão da Constituição, do respeito aos direitos fundamentais, transpassou a

esfera dos poderes públicos, se situando nas relações entre privados. A relação de emprego é

uma relação de poder reconhecida pela ordem jurídica. A ordem jurídica cria um poder para o

empregador, chamado poder empregatício. A esse poder de comandar a força do trabalho, do

empregador, o poder de direção, subordina-se o empregado. O empregado é trabalhador

subordinado juridicamente. Assim, a ordem jurídica reconheceu o poder. Se a ordem

reconheceu o poder deve se aplicar os postulados de respeito aos direitos fundamentais.

Quem quer que exerça poder tem que respeitar os direitos fundamentais e, no Estado

Democrático de Direito, justificar as suas decisões.

No Brasil, isto é uma revolução. É uma revolução, pois, no Brasil, existe um fenômeno

chamado Patrimonialismo. Esse fenômeno foi herdado geneticamente dos portugueses. A

genealogia deste patrimonialismo pode ser encontrada no livro do professor Raimundo Faoro

chamado ‘’Os Donos do Poder’’. Na referida obra, o professor descreve, dentro de uma

perspectiva Weberiana, a genealogia deste Estado patrimonial.

O patrimonialismo é esta promiscuidade que há entre o Espaço Público e o Espaço Privado. O

Espaço público não serve para atender ao público, mas é refém dos interesses de determinado

grupo privado (de pouquíssimas pessoas).

A população não foge a essa regra, não conseguindo verificar interesses coletivos, pois

determinados interesses privados desses grupos se impõe, quase sempre, em uma relação de

clientela, fisiologismo.

A empresa (o empreendimento econômico) dentro deste cenário sempre foi tida como uma

extensão da propriedade privada daquele detentor daqueles meios de produção. A base do

8 Teoria da Proporcionalidade: Sopesamento entre meios e fins de que vale o Administrador Público para

demonstrar porque sua decisão era mais adequada, a mais correta uma vez que ela, por exemplo, maximiza as finalidades pretendidas e prejudica minimamente os direitos fundamentais contrapostos, respeita ao máximo os Direitos Fundamentais. Fundamentar a sentença não é mais colacionar uma série de dispositivos e artigos, como no positivismo e, de forma misteriosa se alcançar uma parte dispositiva da sentença, sem nenhum tipo de lógica ou justificação para a população. Fundamentar a sentença é justificar argumentativamente porque se chegou a uma determinada decisão. Isso é um postulado do Estado Democrático de Direito.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 32

capitalismo é a apropriação privada destes meios de produção, mas isso ganha uma dimensão

social ou coletiva em determinados países.

A empresa desempenha um papel social de resultados econômicos que beneficiam uma

coletividade econômica. Ela não foi criada para isso, mas sim para dar lucro ao dono, porém

ela consegue ser inserida dentro de um cenário coletivo e cumprir uma função coletiva. No

Brasil isso é uma excrecência. A empresa privada é vista como uma extensão do quintal do

dono da empresa privada. Essa é a lógica que o empresariado opera. Assim, coisas como

democratização de informações, de decisões (que inclusive são exigidos pelos novos métodos

de produção), recebem uma resistência muito grande pelo empresariado brasileiro.

Então, principalmente no âmbito das relações de trabalho no campo privado, existe uma visão

patrimonialista das empresas que vão sonegar o exercício dessa gestão democratizada, que

deve respeitar os direitos fundamentais no exercício do poder concedido juridicamente. O

empresariado brasileiro, em virtude de décadas na qual o escravismo vigorou, acredita que é

dono da vida dos trabalhadores (obviamente, isto é uma generalização, e toda generalização

importa em erro). É um substrato cultural que existe no Brasil e ira se chocar com essa

construção constitucionalizadora do Direito em uma série de situações, tanto no respeito à

privacidade, a intimidade do empregado, quanto no respeito a sua dignidade humana,

dimensão coletiva do direito a informação, quanto na justificativa das suas decisões.

Assim, a partir deste momento, os princípios e o Direito do Trabalho inteiro serão observados

dentro de uma perspectiva crítica e de constitucionalização.

Aula 04 – Direito do Trabalho I dia 29/04/2013

Continuação dos Princípios do Direito do Trabalho

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 33

Houve um tempo em que os princípios eram considerados normas inferiores, ou sequer eram

considerados direito. A antiga Lei de Introdução ao Direito Brasileiro expõe que, caso não se

ache uma norma regra, deve-se procurar outro tipo de norma, sendo esta os princípios,

costumes ou a analogia, para suprirem então a lacuna existente. Os princípios gerais do direito

eram a última opção.

A normatividade dos princípios era mínima e a força normativa era nula. Eles sempre foram

tidos como um programa de ação política para aplicação futura incerta (quem sabe um dia

reduzir a pobreza ou desigualdades sociais, como se fosse um enfeite no ordenamento). De

uns quinze anos para cá, houve uma transformação profunda na teoria do direito e hoje há

certo consenso de que as normas jurídicas se apresentam de duas formas: as regras jurídicas e

os princípios jurídicos.

A primeira é um comando prescritivo de conduta e a segunda é uma norma mais aberta que se

apresentará como decisões políticas fundamentais e valores históricos compartilhados por

certa sociedade ou fins públicos de uma forma mais ampla. De qualquer maneira, embora

tenham conteúdo e estrutura diferentes, ambos são normas jurídicas e o que as caracterizam

precipuamente é que as normas jurídicas não são conselhos ou recomendações, mas servem

para serem impostas coercitiva e imperativamente. Têm eles a estrutura de um “dever-se”, o

elemento deontológico. Tanto princípios quanto regras possuem essa característica, uma

inovação relacionada à invasão, centralidade e normatividade conjunta da Constituição, esta

sendo muito principiológica, há que se reconhecer a normatividade dos princípios.

Todavia, princípios e regras são aplicados de formas diferentes. Isso não quer dizer que o

princípio tenha menos imperatividade, mas apenas se aplica de forma diferente.

De maneira geral, a regra jurídica se aplica de modo disjuntivo (ou é ou não é - all or nothing)

não há como coadunar regras contraditórias para a mesma situação concreta e esse processo

impõe critérios para sua aplicação (critérios hierárquicos, especialidade e temporal). As

normas princípios não prescrevem necessariamente uma conduta ou ação humana, até

mesmo porque trabalham com um conjunto mais plural de ações, como, por exemplo, existem

vários caminhos para se reduzir a desigualdade social no caso concreto ou se alcançar a

dignidade da pessoa humana. Isso nos remonta ao prof. Robert Alexy que define os princípios

como mandados de otimização enquanto as normas regras seriam mandados definitivos (se X

então Y). No princípio há um estado ideal mais aberto e se permite que várias condutas o

alcance e a forma de se alcançar isso é gradual, sendo melhorado a cada aplicação,

trabalhando-se com limites fáticos e jurídicos.

Analisa-se é se a decisão proferida avança no sentido de reduzir a desigualdade social ou

retrocede. A cada decisão dos agentes públicos deve-se avaliar se o princípio está sendo

aplicado na medida do possível. Não faz sentido a presidente revogar o direito de propriedade

das pessoas mais ricas do país e dividir seu patrimônio entre os mais pobres, pois isso esbarra

em um limite fático. Não se pode suprimir o direito de propriedade dessa forma. Os limites

fáticos e jurídicos, assim como as condições econômicas concretas devem ser respeitadas,

observando-se também o patamar de regulação jurídica geral. Os princípios então vão

exercendo pressão em cada decisão relacionada a uma decisão concreta, sendo ela política,

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 34

jurídica, administrativa, legislativa etc., pois todas elas passam por um processo de

interpretação que devem observar os princípios, mas, aos poucos, dentro da medida do

possível, esses princípios são realizados de maneira cada vez mais otimizada. Eles orientam

todo o processo decisório e interpretativo, tendo então de ser aplicados, pois possuem

normatividade.

Os princípios se aplicam dentro de um universo axiológico na sociedade contemporânea, ainda

que eles sejam bastante contraditórios, pois os valores dos indivíduos variem cada vez mais,

diferentemente de tempos como a Idade Média. Poucos valores são compartilhados por um

grupo social mais amplo e mesmo esses se chocam com outros valores, pois não são plurais só

na percepção dos indivíduos, mas os próprios valores postos na sociedade são de diversidade

muito grande.

Dentro desse cenário, a melhor forma de se aplicar uma norma jurídica que veicula um valor

social, moral ou ético é através do processo de colisão, ou seja, reconhecer que eles estão em

iminente e potencial rota de colisão. Por isso, o processo hermenêutico é o da ponderação

entre valores. Diferente do modo disjuntivo, aqui não há esse critério, mais se deve misturar,

amalgamar os princípios que revelam valores. Funciona então como uma massa de modelar e,

dependendo do prisma pelo qual se olha ver-se-á mais um princípio do que o outro. Pode

predominar o valor A sem se eliminar o valor B, sendo que um dá o limite, o contorno do

outro. Os núcleos essenciais de um valor são respeitados, mas nenhum dos dois é excluído. Há

somente a predominância de um sobre o outro.

Há uma coleção muito grande de princípios apresentada por cada autor, onde cada um quer

reclassificar o que cada um já classificou. Os principais são apenas quatro: proteção do

trabalhador; irrenunciabilidade de direitos; continuidade da relação de emprego e primazia da

realidade (da verdade real, é de direito material no direito do trabalho).

1° Princípio: Proteção do Trabalhador

Esse princípio é teleológico (ontológico). Este princípio origina, funda o direito do trabalho.

Retoricamente é um direito protetivo e se explica como sendo protetivo do trabalhador, pois,

na relação capital-trabalho, ele deveria trazer um reequilíbrio quando se reconhece que, de

fato, essa relação é desequilibrada, como na relação do direito do consumidor. Em termos de

conteúdo há uma similitude muito grande, pois, no plano dos fatos, há alguém que quase

nunca consegue fazer prevalecer seus interesses e o outro polo, por força de seu poder

econômico, consegue fazer com que quase sempre seu interesse se imponha sobre outro. O

direito do trabalho então, teoricamente, veio para reequilibrar a relação. Esse desequilíbrio se

manifesta, sobretudo, nas relações individuais do trabalho; de um lado há a empresa, na forma

do empregador e, no outro, o trabalhador considerado individualmente, isoladamente.

Quando há um trabalhador contra uma empresa, facilmente se verifica que a empresa terá

uma facilidade enorme em impor seu interesse perante o trabalhador, na maioria das vezes,

até mesmo por que este depende economicamente da manutenção de sua relação com a

primeira, pois é dela que tira sua fonte de subsistência e, por isso reconhece-se uma

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 35

desigualdade, uma hipossuficiência, um desequilíbrio no plano dos fatos e, em virtude da

vulnerabilidade técnica em face do empregador, esse desequilíbrio e reforçado. Haveria então

uma dificuldade muito grande do trabalhador fazer valer sua vontade, pois há vulnerabilidade

técnica e hipossuficiência econômica. O Estado reconhece, em uma situação pré-jurídica,

nessa situação de abstração, a grande dificuldade de o trabalhador fazer valer sua vontade, em

uma relação contratual, por exemplo, e, por isso, o direito do trabalho vai sistematizar regras e

princípios de proteção ao trabalhador para tentar trazer um reequilíbrio.

Em termos mais concretos, o princípio da proteção realiza essa tarefa através de três

subprincípios, que dão concretude a ele.

In dubio pro operário

Norma mais benéfica

Condição mais benéfica

O primeiro refere-se ao processo de interpretação. Não tem haver com o princípio do in dúbio

pro réu do direito penal, pois este último tem a ver com questões de sopesamento probatório

e o subprincípio do in dúbio pro operário tem a ver com interpretação. O pressuposto para

este subprincípio é algo diferente do que se ensina nos manuais. Aprende-se que o processo

de interpretação é feito para se descobrir o verdadeiro sentido da lei ou da norma. Interpretar

seria descobrir o verdadeiro sentido da norma, seu sentido primevo, essencial. Tudo isso é

uma farsa.

Os juízes decidem casos bastante similares de forma diametralmente diferente. Dois

trabalhadores advindos da mesma empresa, quando demitidos, e, com causas parecidas, um

ganha 80% enquanto o outro ganhou 20%. Esse tipo de coisa chega a causar uma má

impressão sobre a advocacia. As pessoas não entendem a dinâmica do direito. O problema é

que os estudantes de direito, no início do curso são convencidos com uma série de mentiras

que se repetem ao longo dos cinco anos e, ao entrarem no mercado de trabalho, ficam

perdidos.

Como pode haver decisões diferentes se a lei é a mesma e o caso concreto é similar? Isso é

algo próprio do processo de interpretação e este não é a descoberta de um sentido primevo e

essencial da norma. Esse sentido sequer existe. Não há um único sentido verdadeiro para a

norma. Se houve um juiz estava com a verdade e o outro com o equívoco e haveria um

problema de ordem prática. Porém, a rigor, o processo de interpretação não se dá com essa

paleontologia. O processo de interpretação, de modo mais singelo, é pura e simplesmente a

atribuição de sentido que o intérprete confere à norma. Portanto, cada intérprete atribui um

sentido para a norma.

O processo de interpretação é complexo e envolve a esfera semântica de cada indivíduo assim

como as interações sociais, o inconsciente e outras coisas mais. A bagagem cultural e o

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 36

conhecimento de cada um permitem interpretações diferentes para um texto. O processo de

interpretação é dinâmico e depende de todos esses fatores.

Isso não significa que o Direito é completamente desorganizado. Existem elementos comuns,

denominadores comuns. Há um compartilhamento de bagagem teórica e de vida e mesmo de

visão de mundo, embora com valores morais variados (mesmo substrato social, como as

camadas médias urbanas). Existe uma intersubjetividade que gera um espaço de compreensão

comum. No Direito é assim, pois a norma jurídica é a mesma, então, parte-se de um

pressuposto comum, impedindo uma pulverização generalizada do processo de interpretação.

Mas, mesmo assim, é preciso dizer que o processo de interpretação é sempre plurívoco e não

unívoco, pois não se chega a um único sentido, mas a vários sentidos por existirem vários

intérpretes – interpretação como sendo o resgate de um sentido essencial e verdadeiro é um

mito, como a imparcialidade do juiz, neutralidade do Judiciário e etc.

A forma de se ter algum tipo de segurança quanto ao funcionamento do Judiciário é um

problema de administração da justiça. Não existe uma segurança completa, mas os tribunais,

sobretudo os tribunais superiores, têm como tarefa uniformizar a jurisprudência. Para isso

existe uma série de mecanismos, como o Recurso Especial ou o Recurso de Revista, que é

usado no Direito do Trabalho, no TST. Existem os embargos de divergência no processo do

trabalho e os incidentes de uniformização de jurisprudência no processo civil. Há também todo

o processo de construção sumular, sendo que estas chegam a se converter em norma jurídica

com efeitos vinculantes, através do STF. Tudo isso serve para dar uma espécie de amarra na

pluralidade hermenêutica existente.

a. In Dúbio Pró Operário

O pressuposto de tal subprincípio não é a velha unicidade hermenêutica, mas sim

sua pluralidade, pois parte do pressuposto de que o processo interpretativo é

plural, de que é possível, de uma única norma, extrair diferentes interpretações

razoáveis e possíveis. Se há diferentes interpretações razoáveis e possíveis obtidas

da mesma norma jurídica, com várias interpretações possíveis. Isso suscita a

dúvida e, no caso de se apresentarem várias interpretações possíveis e razoáveis

da mesma norma jurídica, o intérprete tem um critério, um vetor, em virtude da

proteção do trabalhador, nestes casos, deve-se eleger a interpretação que mais

favoreça o trabalhador. É um critério de interpretação que elegerá aquela mais

benéfica ao obreiro.

Isso é uma construção teórica, doutrinária e jurisprudencial muito antiga. Não está

em lei nenhuma.

Pode haver, por exemplo, uma norma que diga que os intervalos intrajornada,

destinados para o almoço, sendo, portanto, no meio da jornada, devem ser de, no

mínimo, uma hora e de, no máximo, duas horas (esse tipo de norma realmente

existe). Digamos então que, se a jornada do empregado é maior do que seis horas

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 37

ele deve tirar uma hora de almoço. Consideremos então que o empregador

conceda somente quinze minutos de almoço, contrariando a lei. A consequência

dessa norma é que, quando o empregador não concede esse intervalo, ele deve

remunerar seu empregado com o adicional de horas extras, como se fosse hora

extra. Pagará o valor da hora com o acréscimo de, no mínimo, 50% do valor dessa

mesma hora. Essa hora de almoço já é paga no salário, mas, no caso de não

conceder o intervalo, há o acréscimo de 50%.

No caso concreto existe somente quinze minutos de intervalo. Duas interpretações

são possíveis neste caso. Uma diz que o empregador desrespeitou a norma, pois

deveria ter concedido uma hora e não a deu. Não interessa o que ele concedeu, o

que interessa é que não foi uma hora. A consequência então seria que a hora seria

considerada como hora extra e, o empregado no caso tem direito a uma hora

extra. A outra interpretação leva em consideração o fato de que o trabalhador

trabalhou somente 45 minutos e não uma hora, pois houve quinze de descanso.

Segundo tal interpretação somente esses 45 minutos seriam acrescidos com o

adicional de hora extra.

São duas interpretações possíveis e razoáveis. Uma beneficia o empregado e outra

o empregador, sendo que nesta última tenta-se usar o critério de

proporcionalidade como critério de justiça, o que é razoável. Diante de duas

interpretações possíveis e razoáveis, o critério do in dubio pró operário impõe a

adoção da interpretação que beneficia mais o empregado. O TST criou uma O.J

para essa interpretação. Isso é um exemplo real (art. 66 da CLT c/c O.J9 nº 355/TST

da SDI 1).

b. Norma Mais Favorável

Se no primeiro caso havia uma norma com várias interpretações, aqui há uma

situação concreta e jurídica sobre a qual incidem várias normas. Uma única situação

sobre a qual incidem várias normas jurídicas. O primeiro caso é de hierarquização

interpretativa e o segundo de hierarquização normativa.

Qual norma se aplica ao caso concreto quando são várias as aplicáveis?

9 Orientação Jurisprudencial. É o resultado da cristalização jurisprudencial em uma etapa anterior a formação da

súmula, em um órgão do TST chamado Seção de Dissídios Individuais (SDI). A súmula é criada pelo pleno – no caso, órgão especial – do TST. Em geral, as questões são julgadas nas sessões ou de dissídio coletivo ou de dissídios individuais pelas turmas especializadas em um ou outro desses dois tipos e, com a reiteração do posicionamento daquele órgão, é possível que no âmbito da SDI se fixem essas orientações jurisprudenciais, normalmente chamadas de O.J. Se essa reiteração persiste, então essa matéria em geral é levada ao plenário e, por conseguinte, edita-se a súmula. Tem a mesma força da súmula, ou seja, quase nenhuma. É persuasiva. A súmula só tem força real quando é do STF e vinculante, pois essa obriga todos os poderes Judiciário e Executivo. Todas as outras têm efeito persuasivo, quando muito, processual. No caso a súmula do TST é requisito de admissibilidade de um recurso chamado ‘recurso de revista’, que é o recurso genérico que se encaminha para o ST, mas, fora isso, é persuasivo e o juiz reproduz o teor da súmula se quiser. Não tem ele vinculação nenhuma.

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Severino ( ) trabalha na empresa ‘’Energia que Tirou da Inércia S.A. ’’,

por exemplo. Em seu contrato individual de trabalho, estabeleceu-se uma jornada

de trabalho de oito horas, assim como uma remuneração equivalente a R$800,00.

O sindicato representativo da categoria profissional da categoria desse trabalhador

firmou, junto ao sindicato representativo da categoria econômico do empregador,

um acordo, que é chamado de convenção coletiva de trabalho. Esse contrato tem,

para o direito do trabalho, força de lei e estabelece condições de trabalho para a

categoria.

Nesta convenção coletiva que possui força de lei estabeleceu-se que ninguém na

categoria de Severino poderia trabalhar mais do que sete horas por dia, assim como

estabeleceu um piso salaria de R$ 700,00 para essa categoria. As normas de seu

contrato individual (poderia ser uma lei, o contrato foi mero exemplo), a

Constituição ou qualquer norma se aplicam a essa relação jurídica concreta. As

normas da convenção coletiva se aplicam a essa situação jurídica concreta. Poderia

haver uma profusão de normas jurídicas onde todas elas estipulassem condições de

trabalho incidentes nessa relação concreta (Severino e empregador).

Quando o conteúdo dessas normas é diferente, qual a norma que deve ser

aplicada? Usa-se então o subprincípio da norma mais favorável ao trabalhador.

Concretiza-se aqui a proteção ao trabalhador. Porém, qual a norma mais favorável

neste caso?

Pode-se interpretar que, pelos princípios, prevaleceria que Severino ( )

deveria ganhar R$800,00 por 7 horas de trabalho? Podem-se eleger os aspectos

mais benéficos de cada norma jurídica? Pegar o aspecto remuneração da norma

‘contrato individual’ e pegar da norma ‘convenção coletiva’ o aspecto duração do

trabalho?

Considerando que o comando das normas sejam somente: “trabalhadores como o

Severino ganham, no mínimo, R$700,00 por sete horas de trabalho” e “Severino

ganha R$800,00 por oito horas de trabalho”, qual é a mais benéfica? Supondo que

seja um raciocínio disjuntivo. A ideia é mostrar que normas diferentes regulam de

maneiras diferentes a mesma situação concreta. Ou supondo ainda que se trabalhe

com lei ao invés de um contrato individual.

Pegar o que as duas normas têm de melhor é uma das teorias que servem de

critério para identificação a norma mais favorável. Essa teoria é a chamada “teoria

da acumulação” e é minoritária. A outra teoria que busca identificar qual seria a

norma mais favorável é a “teoria do conglobamento”, que é majoritária.

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i. Teoria da acumulação

Pelo critério da acumulação se teria a formação de uma colcha de

retalhos, que seria uma norma de decisão constituída pelos aspectos

mais favoráveis de cada uma das normas aplicáveis ao caso. Pinça-se

década norma aplicável o aspecto mais favorável. É a teoria da

acumulação.

ii. Teoria do Conglobamento

A outra teoria é a teoria do conglobamento que aponta uma dificuldade

insuperável da outra teoria: o intérprete estaria criando uma norma que

nenhum dos autorizados como finte jurídica do Direito do Trabalho se

valeu. O legislador não criou a norma “colcha de retalhos”, tampouco o

legislador, os contratantes ou os sindicatos. Essa norma não existe como

criação e nenhum dos legitimados para criar norma ou fonte de direito

reconhecidamente válida. O intérprete não pode criar uma norma que

não exista na ordem jurídica. No caso, o critério deveria ser então

aquele que identifique in concretu, levando em consideração as

condições pessoais do trabalhador, específicas e concretas da relação

jurídica em questão à qual se quer aplicar a lei, qual norma que, em

sentido global, mais favorece o trabalhador. Para isso deve-se levar em

conta as necessidades tanto do empregado quanto do empregador, para

então analisar toda a pluralidade de aspectos da norma, para então ver

qual se deve aplicar.

Ainda assim, se for uma questão simples como somente a jornada de trabalho,

como único elemento contratual discrepante, a tarefa é mais simples.

Em regra, os dispositivos das normas coletivas têm uma validade temporal. A partir

da edição os novos trabalhadores se submetem a essas regras, se não houver

distinção, é possível pleitear os direitos da norma coletiva. Se a convenção é

anterior ao contrato individual não é possível utilizar tal contrato. Se for o

contrário, o contrato tem que se ajustar a convenção, se coadunar a ela. Inclusive, o

empregador deve conhecer a convenção coletiva de sua categoria; no entanto, não

há problema nenhum se o empregador estiver disposto à pagar acima do piso

estabelecido pela convenção. Conseguir estender a convenção para o contrato

posterior é que é bem difícil.

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In dubio pro operário é critério de interpretação. Uma norma com várias

interpretações. Norma mais favorável leva ao critério de hierarquização normativa.

Então, existe uma situação concreta com várias normas aplicáveis.

c. Condição Mais Favorável

Na terceira hipótese consideram-se condições que se alteram ao longo do tempo. A

condição contratual de trabalho se materializa no contrato de trabalho como uma

cláusula contratual. Não precisa ser expressa, pois pode ser verbal ou informal ou

mera realização no âmbito da realidade fática. Ela se materializa em uma cláusula

contratual de trabalho.

Ao longo do tempo (os contratos de trabalho tendem a se prolongar ao longo do

tempo) as condições de trabalho vão sendo alteradas e as cláusulas contratuais,

portanto, vão sofrendo alterações. O subprincípio da condição mais benéfica

regula, por conseguinte, essas alterações contratuais, das condições ou cláusulas

contratuais.

As alterações que sejam benéficas ao empregado, ou mais benéficas que as

condições anteriores serão incorporadas ao patrimônio jurídico do empregado,

transformando-se em direito adquirido. As condições que são alteradas de maneira

a beneficiar o trabalhador passam a ser direito do trabalhador. Se o salário era

R$600,00 e passou a ser de R$1.000,00, não se pode baixa-lo para R$600,00

novamente. Impera o princípio da condição mais favorável. Isso também funciona

para a remuneração variada, mas através de outros elementos – recebia 5% sobre

as vendas e passou a receber 8%; não se pode voltar ao percentual mais baixo. O

professor teria uma regra específica; ele não pode ter a jornada reduzida durante o

período letivo, mas entre semestres é possível avaliação, mas isso decorre da lei do

professor. Não se consideraria condição menos favorável ou prejudicial esse tipo de

alteração em virtude da própria morfologia de seu trabalho.

As alterações benéficas viram direito adquirido, mas as alterações que trazem

prejuízo são consideradas nulas. Há o art. 468 da Consolidação das Leis do Trabalho

que diz isso expressamente. Tal artigo reforça o sentido do princípio da condição

mais benéfica.

Em 2000 houve um conflito político interessante. Anthony Garotinho ( )

(então governador do Estado do Rio de Janeiro) e o então presidente da República,

Fernando Henrique Cardoso.

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Garotinho se valendo de um subterfúgio eleitoreiro condenou FHC ( )

dizendo que o salário mínimo proposto pelo Executivo para o Congresso aprovar de

maneira unificada não atendia ao conteúdo constitucional do art. 7º, IV da

Constituição Federal. Fernando Henrique Cardoso então se valeu do art. 22,

parágrafo único da Constituição Federal, artigo este que trata das competências

delegáveis (legislar sobre direito do trabalho é uma competência privativa e, logo,

delegável), para dizer que, se o Garotinho ou qualquer outro governador estiver

insatisfeito, que propusesse uma lei complementar no Congresso que delegue

capacidade legislativa para o ente federativo.

O Executivo então fez o Congresso aprovar (o Legislativo no Brasil não tem

independência) tal medida. O Garotinho então ganhou poder para criar (e criou)

uma lei instituindo o salário mínimo regional do Estado do Rio de Janeiro. Na época

o salário mínimo federal era de aproximadamente R$ 240,00 e o então governador

do Rio de Janeiro fixou um salário mínimo de R$ 450,00 através de uma lei estadual

que foi à Assembleia Legislativa (ALERJ) por proposta do governador. A lei dizia que

a partir de tal data vigorava no Estado do Rio de Janeiro o salário mínimo regional

de R$ 450,00, revogam-se as disposições em contrário (a lei não dizia mais nada).

Muitos empregadores que pagavam seus empregados com base no salário mínimo

federal (que é o único salário mínimo que existe nos termos da Constituição

Federal), pois ele é unificado em lei federal (reajustaram os salários de seus

empregados). Os empregadores consideraram então que quem pagava R$ 240,00

deveria pagar R$ 450,00 e, então, reajustaram contratualmente os salários de seus

empregados.

Posteriormente lei estadual foi impugnada e o Supremo Tribunal Federal a declarou

inconstitucional (ou seja, é nula, não produz efeitos) Não se fez sequer modulação.

Seria nula porque o governo do estado teria delegação para legislar sobre direito do

trabalho a respeito do inciso V do art. 7º da Constituição Federal, este que trata de

pisos salariais (era preciso relacionar certo piso salarial a certo nível de

complexidade de trabalho). Não foi o que o governador fez, pois ele simplesmente

disse: “Doravante, paga-se, no mínimo R$450,00”. Contudo, não se pode mexer no

salário mínimo. Ele é fixado em lei e é nacionalmente unificado.

Não obstante a declaração de inconstitucionalidade dessa lei estadual, os tribunais

trabalhistas aplicaram a condição mais benéfica e mantiveram essas condições, até

mesmo porque, até o julgamento do Supremo Tribunal Federal, bons meses se

passaram com pagamentos de salários reajustados. Então, o novo salário

prevaleceu não pelo suporte normativo da lei estadual, mas pela alteração

contratual pura e simples.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 42

Depois de declarada inconstitucional, Garotinho passou a propor outras leis

estaduais identificando as categorias profissionais (isso é feito até hoje, vide

exemplo das empregadas domésticas, que possuem uma lei estadual que

especificam seu piso salarial). Provavelmente muito empregados foram sacrificados

para que as empresas mantivessem seus pisos econômicos.

Aula 05 – Direito do Trabalho I dia 18/04/2013

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 43

Sobre o processo de consolidação de jurisprudência no TST, que é o órgão de cúpula do ramo

especializado do Judiciário trabalhista, que é um ramo da justiça federal. Ele é composto pelo

pleno, que no caso, em virtude do art. 93, XI da CRFB/88, como esse tribunal é composto por

mais de 25 ministros, há um órgão executivo chamado órgão especial – que existe em todo

tribunal que tenha mais de 25 membros na sua totalidade. O TST, no caso, é composto por 27

ministros. Esse órgão executa as tarefas do plenário. Ao invés de reunir todos os 27 ministros

na sessão plenária, basta que os membros do órgão especial, que são em torno de 15, realizem

essas tarefas todas incumbidas ao pleno.

O TST também é composto pela Sessão Especializada de Dissídios Individuais e pela Sessão

Especializada de Dissídios Coletivos (SDI e SDC). Além disso, existem as turmas que julgam o

recurso próprio para o TST, o chamado recurso de revista (RR).

No processo de sedimentação dos entendimentos do TST – o processo em que a jurisprudência

vai se cristalizando pela reiteração e, com isso, formando um posicionamento a respeito de

uma determinada matéria, é possível que nesse processo, os julgamentos realizados nas

turmas, por determinação de alguns recursos, caiam para as Sessões de Dissídios Individuais

ou Coletivas, dependendo da matéria que verse o recurso. NO Caso, nas SDC não vão os

recursos de revista, mas apenas os dissídios coletivos, que são um tipo ação própria, proposta

pelos sindicatos, que são as partes dessa ação.

As matérias de direito coletivo do trabalho são julgadas por essa sessão. Há turmas

especializadas que pertencem a essa sessão de dissídios coletivos e outros remédios/recursos

próprios do direito coletivo. Com o tempo, no âmbito das SDC, com a reiteração dos

posicionamentos, dos julgados etc., a sessão se reúne e delibera para formar os precedentes

normativos, organizando e facilitando racionalmente o julgamento dos seus recursos.

É uma fase do processo de construção do posicionamento do TST. No âmbito da SDI o

resultado dessa proclamação de posicionamentos é chamado de OJ (Orientação

Jurisprudencial). Essas sessões, para efeito de formação de OJs, se subdividem em nº1 -sessões

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 44

para direito material e nº2 - sessões para direito processual. Então, quando vão editar a OJ, se

é matéria de direito processual, é a subseção nº 2 que realiza o enunciado dessas orientações,

é um procedimento administrativo que o tribunal tem, é uma resolução administrativa da

sessão.

O que acontece muito frequentemente, é que a permanência das OJs e precedentes

normativos, por um tempo mais prolongado, quando o pleno ou órgão especial do TST se

reúne, muitas vezes nessa tarefa de organização de entendimento, converte-os em súmulas.

Elas sempre marcam uma posição do tribunal, a mais consolidada, mas não necessariamente

definitiva. O TST frequentemente se reúne para cancelar ou remodela-las. A súmula é então

essa afirmação do processo reiterado do TST, tribunal de cúpula. Em termos práticos, o

posicionamento adotado pelas súmulas vai indicar que, se houver recursos e mais recursos em

um processo trabalhista, vai acabar no TST e o posicionamento deste é previsível através das

súmulas. Mesmo que um juiz de primeiro grau ou um tribunal regional do trabalho se

posicione em sentido oposto ao da súmula – e podem fazer isso –, se houver um recurso

cabível ao TST, lá na cúpula dá para saber qual será o resultado se a matéria for sumulada.

Quando se falou em princípio da inalterabilidade contratual lesiva – princípio da prevalência da

condição mais benéfica –, falou-se do art. 468 da CLT que rege as alterações contratuais –

todas as alterações que representem um prejuízo direto ou indireto para o trabalhador são

consideradas nulas, não produzem efeito jurídico algum e todas as que representem um

benefício para o trabalhador se transforma em direito para ele, sendo incorporadas pelo

patrimônio jurídico do mesmo, transformando-se em direito adquirido.

Na esteira do art. 468 da CLT, há algumas súmulas interessantes. A súmula 51, I do TST merece

destaque:

TST Enunciado nº 51 - RA 41/1973, DJ 14.06.1973 - Incorporada a Orientação Jurisprudencial

nº 163 da SBDI-1 - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

Cláusula Regulamentar - Vantagem Anterior

I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente,

só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento.

A súmula trata do regulamento interno da empresa. Elas, em geral, se organizam através de

um poder normativo do empregador, um poder que ele tem para criar regras, o poder

regulamentar. É um poder só que o empregador possui, mas ele se decompõe em várias

funções e uma delas é a capacidade que ele tem no âmbito de sua empresa de criar normas e

formaliza-las. Pode-se fazer isso de várias maneiras, como, por exemplo, ofícios, circulares,

ordens do dia etc. A maneira mais genérica é o ‘regulamento interno da empresa’, que

normalmente trata sobre direitos e deveres do empregado e, ao fazer isso, mostra a face

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 45

jurídica, criadora de direitos. O regulamento da empresa tem uma natureza técnico-jurídica,

tem normas de ordem técnica.

A Súmula 51 do TST trata justamente da alteração do regulamento da empresa. O regulamento

original previa uma série de vantagens para o trabalhador da empresa, veio uma reforma no

regulamento revogando ou alterando as vantagens. Se a empresa quiser muda-lo e, nessa

mudança, retirar ou alterar uma vantagem dos empregados, essa alteração não vale para os

empregados que estão na empresa, valendo apenas para os que forem admitidos depois da

alteração. É um exemplo que materializa o princípio da condição mais benéfica, como o art.

468 da CLT.

2° Princípio: Irrenunciabilidade dos Direitos Trabalhistas.

Sobre a diferença entre normas de ordem pública e normas de ordem privada. As primeiras

são aquelas que atendem o interesse da sociedade, da comunidade, o interesse público.

Normas de ordem privada são aquelas que atendem ao interesse do indivíduo, ou de dois

quando postos em relação. As primeiras, por atenderem os interesses da sociedade são

indisponíveis, são retiradas da disponibilidade de seu indivíduo titular; ainda que direcionadas

para o indivíduo, representam um valor social, um interesse de toda a sociedade e, embora

esse indivíduo possa ser o titular de uma ordem pública, ele não dispõe dessa norma, não

pode transacionar o conteúdo dessa norma, nem negar seu conteúdo. Ela se impõe para além

de sua vontade, gostando ou não da mesma. O trabalhador não pode abdicar do direito que a

norma de ordem pública lhe confere. Isso é estranho porque vivemos em uma sociedade que

super dimensiona a figura do indivíduo e é a tradição civilista, da centralidade do indivíduo e

sua autonomia de vontade. As normas de ordem privada, essas sim, dão a liberdade para o

indivíduo fazer o que quiser com o direito – renunciar, se abster de gozar do direito etc.

As normas relacionadas ao princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, são, muitas

vezes, de ordem pública. Nem todas as normas trabalhistas são de ordem pública, mas o

princípio anuncia que haverá um grupo de normas que serão de ordem pública, que estarão

para além da disponibilidade do titular da norma.

A dignidade da pessoa humana, por exemplo, é indisponível, pois é um constituto elementar

da própria sociedade. Se há agregação social há regras fundamentais, essa é se não a mais

importante, uma das mais importantes: respeitar a dignidade da pessoa humana. Isso é um

exemplo de norma de ordem pública ou de direito indisponível presente na CRFB/88, logo no

primeiro artigo.

No direito do trabalho, muitos direitos são indisponíveis. Um indivíduo deseja trabalhar em

uma empresa. É admitido como office boy, depois é promovido a auxiliar administrativo e, em

seguida, para administrador júnior. Esse indivíduo gosta muito da empresa, assim como seus

colegas de trabalho. Um dia, ele recebe a comunicação de férias e, daqui a 30 dias esse

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funcionário ficará afastado da empresa para gozar de suas férias, recebendo seu salário

mensal acrescido de um terço (remuneração e férias). O indivíduo não quer tirar férias.

O indivíduo não quer tirar férias. A empresa não o coagiu a não tirar férias, é a livre

manifestação de vontade do trabalhador. Ele é maior e sua manifestação de vontade tem

efeitos jurídicos. No entanto, ele não pode abrir mão do direito de férias, pois é um direito que

serve para preservar a saúde do trabalhador. O trabalhador se afasta do cotidiano do trabalho

por um mês para recompor suas próprias energias para descansar por um período prolongado

de tempo, preservando sua saúde. Ele não pode renunciar ao seu direito de férias, ainda que

seja sua vontade verdadeira.

Em termos jurídicos, se o empregado insistir em vir trabalhar no tempo de suas férias, o

empregador teria de punir o empregado, advertindo-o, punindo-o ou até demitindo-o. O

afastamento do trabalhador deve ser preservado no período de férias do trabalhador. O

contrato está interrompido nesse período, o empregador não pode dar ordem ao seu

empregado.

Os direitos de ordem pública vão se colocar a par daquilo que ainda hoje se aprende como

sendo algo generalizado como sendo a história do código civil. Em termos simbólicos a

histórica do código civil é a história do indivíduo. O indivíduo nasce e adquire personalidade,

depois de um tempo, adquire capacidade. Adquirida a capacidade, essa espécie de liberdade

individual será respeitada e essa autonomia individual canalizará sua vontade. Tal vontade

ajustada com outras vontades cria relações jurídicas com outros indivíduos, que ajustam suas

vontades, isto que, por definição é contrato, enredando-se então em uma teia de obrigações,

que se materializam em contratos. Dos contratos existem alguns que são mais importantes,

com maior durabilidade/definitividade, demonstrando mais explicitamente a condição

financeira/patrimonial. Os direitos que versam sobre a propriedade e posse vão para um livro

diferentes, o de direitos reais. São direitos, entretanto, que são adquiridos através de relações

jurídicas contratuais, encetadas em uma relação de obrigação. O código civil narra a vida do

indivíduo que possui propriedade, de quem é capaz de se relacionar juridicamente em relações

de obrigações e em contratos e, dentre eles, aqueles capazes de adquirir algum tipo de

propriedade imobiliária. Esse indivíduo que já passou por tudo isso um dia irá formar um

patrimônio e fragmentá-lo, pois adquirirá uma família. Por isso é tão importante para o

homem saber a sua descendência, para não dividir seu patrimônio com os filhos de outrem – e

pai era um conceito que trabalhava com presunção jurídica, era quem figurava no registro da

criança. Um dia ele irá morrer e há então o livro de sucessões para definir o que será feito do

patrimônio com a morte do de cujus.

Isso é o código civil.

No entanto, perpassa por todo o código civil a vontade desse indivíduo. A pretensão dos

código civis, a partir do código napoleônico, era regular todo o cotidiano d avida do cidadão

burguês, o chamado sujeito de direito abstrato, pois, concretamente, muitos indivíduos não

figuravam nessas relações jurídicas por motivos óbvios, pois não tinham a pré-condição

material para poderem se enredar nessas transações. No Brasil existem fenômenos

interessantes, sobre tudo em direitos reais nas comunidades, que é um complexo de regras

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 47

paralelas ao direito estatal que funcionam como verdadeiras regras jurídicas, que se

obedecem, que organizam racionalmente a transação dos imóveis, como o direito de laje, uma

série de sublocações e outros contratos de compra e venda e etc. que não estão registrados no

RGI e não passam pelo trâmite formal do Estado – há também o direito penal, que é muito

pior.

Isso mostra que não temos um direito que pensa no indivíduo concreto, pois temos um direito

ainda com a ótica do Estado Liberal, que tinha a pretensão de regular a vida burguesa. Essa

autonomia de vontades, como é o eixo de todos os livro do código civil e é o eixo de todo o

direito privado, é tratado, em termos de direito privado, como algo identificado com uma

certa santidade. A autonomia de vontade individual deve ser respeitada como se lei fosse –

pacta sunt servanda –, se eu sou um indivíduo capaz e manifesto minha vontade e o outro com

quem eu me relaciono também é um indivíduo capaz e manifesta sua vontade e, se nossas

vontades convergem – não são a mesma vontade, a primeira é de comprar, a segunda é de

vender – pactua-se um contrato e, quando isso é feito, os termos desse pacto vincula os

participantes dessa relação com força de lei. Como se fosse lei. O pacto faz servos, transforma

os pactuantes em servos de seu próprio pacto.

A autonomia de vontades é tratada pelo direito privado como algo quase intocável.

Obviamente esse direito privado, constituído no século XIX, avançou, assim como houve a

invasão de várias normas de ordem pública e há o direito do consumidor, que é totalmente

protetivo para uma das partes contratantes, passando sobre a vontade dos pactuantes,

impondo normas de ordem pública no seio do direito civil. Mas o primeiro, historicamente,

que desafiou esse sentido privatista do direito civil foi o direito do trabalho, apresentando uma

lógica diferente, onde a autonomia de vontades tem um valor relativo, possui menos força,

pois normas de proteção ao trabalhador, não sujeitas à autonomia de vontade, foram

estipuladas.

Não é possível, por exemplo, pactuar um salário abaixo do mínimo, ainda que seja a vontade

de ambas as partes. As normas de ordem pública do direito do trabalho criam um piso duro

onde a autonomia de vontade não vale coisa alguma. A autonomia de vontade só valeria para

além desse piso protetivo de ordem pública. Se a lei estabelece um adicional mínimo de 50%

para horas extras, é possível estabelecer um adicional de 60%, mas não é possível estabelecer

menos que 50%.

Essa indisponibilidade de direitos traz um problema teórico. Quais são as normas de direito do

trabalho que efetivamente são de ordem pública e quais são as de ordem privada? Quais são

as disponíveis e quais são as indisponíveis?

Não há consenso sobre isso. O conjunto varia de acordo com a ideologia, posição de cada

doutrinador etc. Alguns reduzem ao mínimo as normas de ordem pública e dirão que, em

termos práticos, só normas de saúde e segurança do trabalhador efetivamente guardam essa

natureza de ordem pública. A outra ponta tenta fundamentar melhor a abrangência trazida

pelas normas de ordem pública. O autor Godinho Delgado traz os conceitos de

indisponibilidade absoluta e indisponibilidade relativa.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 48

Em termos bastante sintéticos, as primeiras são aquelas que refletem os direitos fundamentais

já explicitados na Constituição Federal, sendo então, no plano individual, indisponíveis, pois

foram alçados à categoria de fundamentais, assim como o registro, saúde e segurança do

empregado. As segundas são compostas por aquelas normas ou disposições contratuais onde

não se percebe evidentemente um prejuízo ao empregado. Como exemplo, um pregado que

trabalhe das nove às seis horas que passe, após uma mudança contratual, a trabalhar das nove

e meia às seis e meia. Essa transação não oferece nenhum prejuízo nem muda o salário ou

carga total do trabalho, tampouco piora suas condições de saúde. É um elemento passível de

transação. Quando não afeta aquele patamar mínimo – art. 444 da CLT –, não é indisponível.

Art. 444 - As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes

interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos

contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.

A vontade é livre desde que não se oponha às normas de proteção do trabalhador, às normas

criadas pelos instrumentos de negociação coletiva, o acordo coletivo de trabalho e a

convenção coletiva de trabalho.

O direito coletivo do trabalho é figurado pelos personagens coletivos, os sindicatos

(organizações sindicais). Ao invés de pessoas físicas ou jurídicas se relacionando, no âmbito do

direito coletivo, existem os sindicatos. Há os sindicatos de trabalhadores e os de

empregadores. Os primeiros são chamados sindicatos profissionais, categoria profissional, os

segundos de sindicatos patronais ou de categoria econômica.

A dinâmica do direito coletivo do trabalho é o estabelecimento de um processo de negociação

periódica das condições de trabalho dos representados pelo sindicato. Os sindicatos

representam suas respectivas categorias e há um processo permanente e periódico de

negociação para estabelecer as condições de trabalho da categoria. Anualmente se instala um

processo de negociação entre certas categorias, em outras é bianual, mas há sempre essa

negociação periódica. Algumas encontram um consenso, uma convergência, um denominador

comum, os sindicatos de trabalhadores e os sindicatos de empregadores. Quando se chega a

esse ponto estabelecem-se dois possíveis tipos de contrato.

Se o contrato é feito entre o sindicato de trabalhadores e uma única empresa, onde houve um

acordo, que vale para todos os trabalhadores daquela empresa ou um grupo de empresas que

negocia diretamente com o sindicato dos trabalhadores e não através do sindicato dos

empregadores, negociando então diretamente – empresa pode negociar diretamente, pois é

sujeito de direito individual e, ao mesmo tempo, sujeito de direito coletivo. Quando ela firma

esse acordo com o sindicato de trabalhadores, faz-se o acordo coletivo de trabalho.

O acordo coletivo de trabalho é então formado por sindicato de trabalhadores e empresa ou

grupo de empresas. Sua validade é para todos os trabalhadores daquelas empresas que

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assinaram o contrato. Fisicamente, é como qualquer contrato, com suas cláusulas que

estabelecem as condições negociadas, direitos e deveres.

Há também a convenção coletiva de trabalho, que é mais abrangente, pois os seus sujeitos são

os sindicatos de trabalhadores, de um lado e os sindicatos de empresas, do outro. Representa

toda a categoria profissional e econômica. Todas as empresas daquele setor e todos os

empregados, cada um deles, ficam obrigados àquelas disposições, assim como ao regime

jurídico estabelecido pela convenção.

O direito do trabalho considera o acordo coletivo de trabalho e a convenção coletiva de

trabalho como fontes de direito, fontes autônomas, pois os próprios sujeitos da relação

jurídico-social que fizeram aquelas normas e não o Estado. Mas é norma jurídica. Se o acordo

coletivo de trabalho diz uma coisa e a convenção coletiva de trabalho diz outra, o que

prevalecerá será o mais benéfico ao trabalhador – princípio da norma mais favorável.

A princípio, tanto o acordo coletivo quanto a convenção coletiva devem respeitar o patamar

mínimo de proteção legal. No entanto, uma das possibilidades de relativizar a

indisponibilidade de direitos é justamente através deles. Isso porque, se quando o trabalhador

é considerado individualmente, na maior parte das vezes, a relação é nitidamente

desequilibrada, pois tal trabalhador se vulnerabiliza ao depender daquela relação de emprego

e, em geral, adere ás condições contratuais estabelecidas unilateralmente pelo empregador, o

que a doutrina abstratamente diz, é que, em âmbito coletivo, o desequilíbrio diminui ou até

mesmo desaparece. Isso se daria pelo fato de o trabalhador, em coletividade, teria

mecanismos de pressionar o empregador que, isoladamente, não teria. O maior exemplo seria

a paralização da atividade produtiva do empregador através da greve, evidenciando assim a

dependência do empregador para com a sua mão de obra. Em tese, isso daria um equilíbrio

um pouco maior na negociação coletiva se comparada aos contratos individuais. É isso que diz

o princípio da irrenunciabilidade.

O Ministério Público tem legitimidade para entrar com uma ação anulatória de norma coletiva,

ou um trabalhador denuncia ou o próprio MP descobre através de seu trabalho de

investigação. Normalmente, a chapa rival denuncia.

A transação, no instrumento negocial coletivo, serve para promover as adaptações e

adequações para os setores diferenciados que não podem se submeter às normas gerais.

Como exemplo, o limite máximo de duração de trabalho em um dia é de oito horas. No

entanto, no caso de alguém que trabalhe embarcado, em uma plataforma de petróleo, oito

horas por dia são gastas somente com deslocamento para se chegar ao trabalho. A norma

convencional é incompatível com esse setor; por isso, o sindicato estabelece uma jornada

diferenciada, como trabalhar um mês e folgar o outro. A adequação negocial é um elemento

componente do direito coletivo e, muitas vezes, isso é feito por transação.

A CLT não tem um dispositivo que diz o que é norma de ordem pública ou privada e isso faz

com que, na prática, o princípio da irrenunciabilidade seja difícil de visualizar de forma clara.

No processo do trabalho, existe um mecanismo, uma característica da jurisdição trabalhista,

um traço conciliatório, legado de uma visão corporativista pertencente ao grupo político de

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Getúlio Vargas. Essas teorias corporativistas não foram inventadas por ele, pois já existiam no

exterior e elas compreendem as sociedades como um grande organismo composto por órgãos

onde um deles seria a classe trabalhadora e o outro a classe empresarial. Eles deveriam agir

em harmonia em prol do desenvolvimento, do progresso.

Essa visão corporativista ficou introjetada como característica da jurisdição trabalhista. No

processo do trabalho pode-se fazer acordo judicial em qualquer fase. No processo do trabalho,

desde o ajuizamento da petição inicial até a execução definitiva, a expropriação do patrimônio

do devedor, há a possibilidade de fazer acordo. Pode ter havido penhora de bens, constrição

patrimonial, não importa, em qualquer fase é possível o acordo, por conta dessa característica

conciliatória. Mais que isso, na audiência trabalhista – o processo do trabalho é concentrado

na audiência, é a etapa mais importante; isso se dá em homenagem à oralidade –, o juiz do

trabalho é obrigado, sob pena de nulidade do processo, em dois momentos, a perguntar se há

possibilidade de acordo. Isso está na lei processual trabalhista. É obrigado a perguntar as

partes se há possibilidade de acordo; do contrário, o processo pode ser todo anulado. Isso se

dá no momento em que as partes chegam à mesa de audiência, antes da instrução probatória

ou recebimento da defesa, ou antes, mesmo de começar a própria audiência – antes de se

ouvir qualquer coisa. Não sendo, no final da instrução, o juiz deve renovar, obrigatoriamente, a

pergunta.

É uma conciliação levada a sério e o juiz, o tanto quanto possível, tem que propiciar esse

acordo e favorecê-lo. Muitas vezes o próprio juiz faz proposta de acordo. Ninguém é obrigado

a fazê-lo, pois o acordo é vontade das partes, mas ele está sempre presente, acompanhando o

processo do trabalho. De fato, grande parte os processos trabalhista se resolve em acordo

judicial, em uma composição judicial. Nele, embora provavelmente tutelado por um advogado

– não há necessidade de advogado, mas normalmente as partes estão orientadas por eles, ou

mesmo pelo juiz, pois o ato que referende esse acordo é uma sentença. É um ato do judiciário,

uma sentença homologatória do acordo. Embora todos esses personagens estejam orientados

para preservação da ordem jurídica, ainda assim, no acordo judicial, muitas vezes se violam

direitos, se transacionam direitos, sobretudo da primeira proposta. O juiz nem olhou a petição

inicial ou a defesa e o valor do acordo sacrifica direito que foram violados. Como exemplo, ao

liquidar os direitos do trabalhador obtém-se o valor de mil reais e na primeira proposta a

oferta é feita por cem ou duzentos reais (10 ou 20%).

Isso ocorre com frequência, pois o empregado, normalmente, está desesperado e

desempregado. Os trabalhadores sabem que o processo demora e há o risco de sequer

receber algo, pois os sócios já desapareceram e o patrimônio acabou. Assim, o processo torna-

se inexequível.

Na realidade judicial o acordo muitas vezes contraria esse princípio da irrenunciabilidade das

normas trabalhistas. Muitas vezes, o que o direito do trabalho concede com uma mão, o

processo trabalhista retira com outra. Todo o caráter protetivo do direito material é, em

termos práticos, diluído pelo direito processual. O mal empregador, que age de má-fé, leva

esse fator em consideração na administração de seu pessoal e mantém o inadimplemento de

direitos trabalhistas de forma sistêmica porque sabem que somente uma parcela de

trabalhadores irá reclamar e, dessa parcela, uma parte fará acordo, sendo que este é melhor

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do que o REFIS, que é uma facilidade dada pelo direito tributário a uma pessoa inadimplente

de impostos pague o imposto (cobra só a metade), pois o empregador paga somente 10, 20 ou

30% do que é devido e permanece inadimplente em um grande percentual. Isso tira grande

parte da eficiência do direito do trabalho, é um problema que se começa a perceber. O

trabalhador não tem tanta proteção assim e tem muita gente se beneficiando com esses

direitos, que em termos práticos e reais e também macroeconômicos beneficia a alguns.

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Aula 06 – Direito do Trabalho I dia 25/04/2013

No estudo passado viu-se o princípio da irrenunciabilidade de direitos (abordou-se a

dificuldade teórica que esse princípio traz, ainda mais quando confrontado com a prática10). Os

princípios, às vezes, figuram bem na teoria, mas não se concretizam na vida real.

Prosseguindo com a seleção dos princípios mais importantes, passa pelo princípio da

continuidade da relação de emprego.

3° Princípio: Continuidade da Relação de Emprego.

A relação de emprego nasce para se projetar o máximo o possível através do tempo. A relação

de emprego (que é a relação jurídica base do Direito do Trabalho) nasce para se promulgar,

protrair, o máximo o possível através do tempo.

Em termos abstratos essa relação deveria durar até o momento perdesse sua capacidade de

trabalho em virtude da idade ou de qualquer fato superveniente que lhe retirasse essa

capacidade.

Então a continuidade da relação de emprego significa que estando sob a proteção do direito

do trabalho, o trabalhador permaneceria sob essa proteção até perder a capacidade de

trabalhar por idade, por exemplo, quando não conseguisse mais reunir essas condições para

continuar trabalhando. Nesse momento o trabalhador sairia da proteção do Direito do

Trabalho e passaria para a proteção do Direito Previdenciário. Em tese, seria esta a relação

social entre o Direito do Trabalho e o Direito Previdenciário.

Na prática isto não ocorre. A relação de emprego não tem esta durabilidade tão grande. Ao

contrário, cada vez é mais frequente a rotatividade da mão de obra. Antigamente era comum

que um contrato de trabalho durasse 10, 15 e até 20 anos.

Além disso, a forma como são produzidos os bens e serviços atualmente (isto é um fato

objetivo), prescinde dessa relação de continuidade. A cada segundo percebe-se mais que este

vínculo tem menor durabilidade, uma ligação cada vez mais frágil, mais tênue, entre o

trabalhador e empresa, de maneira que o próprio Princípio da Continuidade da Relação de

Emprego também estaria (do ponto de vista fático), relativizado ou comprometido.

Em termos jurídicos, esse princípio existe porque o empregado depende da relação de

emprego para obter dela a fonte de subsistência, a possibilidade de sobrevivência dele e da

sua família. Para o direito a relação de emprego é algo positivo, assim o direito deve

preocupar-se em manter a existência desta relação jurídica. Daí proclama-se o princípio da

10

Principalmente com o instituto da Conciliação Judicial presente no Processo do Trabalho.

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continuidade da relação de emprego. Essa é razão (ratio) que está por trás do princípio. Uma

das possibilidades da concretização deste princípio são as espécies de contratos de trabalho.

a. Espécies de Contratos de Trabalho

Feita a crítica da realidade fática em face da jurídica, em termos jurídicos, este

princípio aparece através de uma série de institutos, o principal deles é o dos

tipos de contratos de trabalho. Existe uma variação muito pequena de

contratos de trabalho, mas dentro das opções do direito do trabalho, a

principal classificação dos contratos é a que divide as espécies de contratos de

trabalho em duas.

i. Contratos de Tempo Indeterminado. REGRA

São aqueles que não apresentam (pelo menos prefixado) um

termo final. Segundo a teoria do contrato, termo inicial é o que

põe inicio e termo final é o que põe fim ao contrato.

No contrato por tempo indeterminado não existe essa

previsão. Entra-se na relação jurídica sem saber quando ela vai

acabar. Pactua-se a data de admissão, mas não se pactua

quando irá acabar. Assim é na maioria dos Contratos de

Trabalho.

ii. Contratos de Tempo Determinado. EXCEÇÃO

São aqueles que apresentam (pelo menos prefixado) um termo

final. São exceções das modalidades contratuais trabalhistas.

Apenas excepcionalmente o Direito do Trabalho admite

contratação por tempo determinado.

Para concretizar o princípio da continuidade da relação de emprego, tem-se a regra jurídica

que estabelece que a forma de contratação principal no direito do trabalho é através dos

contratos de tempo indeterminado. O contrato é de trato sucessivo, renove suas prestações

obrigacionais automaticamente através do tempo. São as principais obrigações do contrato de

trabalho: trabalhar (obrigação do empregado) pagar (obrigação do empregador). O contrato

não se resolve com o adimplemento destas obrigações.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 54

Isso permite que o contrato possa se prolongar o máximo de tempo o possível, garantindo-se

ali a vinculação do empregado e de sua possibilidade de subsistência.

Outra possibilidade de concretização deste princípio é através:

b. Presunção de dispensa do empregador, no caso de resilição recíproca.

Ainda que o contrato seja por tempo indeterminado, isto não significa que ele

não tenha fim. Ele pode acabar, basicamente, de duas formas:

i. Por ato de vontade de uma das partes.

É um contrato um ajuste de vontades. A vontade que reuniu os dois

contratantes pode dissolver aquela reação. O empregado não querer

mais trabalhar para o empregador, ou o empregador não querer mais

trabalhar com aquele empregado. Essa vontade é respeitada no

direito do trabalho e caracteriza a resilição unilateral11.

Sendo por tempo indeterminado, a expectativa é que ele continue,

então, a parte que toma a iniciativa de romper o contrato de trabalho

frustra a outra parte. Para minimizar os efeitos desta frustação, ele

deve avisar com antecedência (aviso prévio). A lei determina que a

parte que queira romper o contrato de tempo indeterminado avise

com antecedência de 30 dias.

Deve se ter atenção, avisar com antecedência é uma obrigação tanto

do empregador quanto do empregado.

Existe uma prática muito comum de o empregado querer ir embora,

mas não quer uma das consequências jurídicas que decorre dessa

inciativa (retenção do seu fundo de garantia). O empregado que pede

demissão não recebe o fundo de garantia, fica retido na conta

vinculada ao seu nome por três anos. Além disso, não recebe uma

multa rescisória que decorre da dispensa sem justa causa.

Essa prática consiste em um ‘’acordo’’ entre o empregador e o

empregado. O empregado conversando com o empregador (que já

não quer mais trabalhar com aquele empregado) pactua que: o

empregador demite o funcionário (como se o empregador tivesse tido

a iniciativa da dispensa do funcionário sem justa causa) e empregado

devolve a multa contratual que deveria ser paga pelo empregador. A

11

Resilição unilateral: Quando uma das partes (no caso trabalhista, empregado ou empregador) toma a iniciativa de romper o contrato de trabalho.

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vantagem para o empregado é que ele poderá levantar seu fundo de

garantia.

Em termos jurídicos, o problema dessa prática é que teria havido uma

convergência de empregado e empregador no sentido de fim do

contrato. Tanto o empregado e o empregador concordam que aquele

contrato não é mais interessante. O nome deste acordo,

juridicamente, é distrato ou resilição bilateral12.

Essa resilição seria tranquila em qualquer outro ramo do direito, no

direito do trabalho essa resilição bilateral não é tranquila. Esta

modalidade não é admitida no direito do trabalho. Neste, admite-se

apenas a resilição unilateral13 é admitida.

O distrato ou a convergência deste interesse não é admitida porque

toda vez que o direito do trabalho lê o distrato, aplica o princípio da

continuidade da relação de emprego e presume que a vontade do

empregado está viciada. Não admite essa duplicidade, essa

coadunação de vontades. Se a vontade do empregado é a mesma do

empregador, então prevalece a do empregador. Não se presume14 que

o empregado, nestas circunstâncias aderiria a essa vontade

voluntariamente, pois ele estaria abrindo mão do próprio vínculo

empregatício que supostamente lhe garante a sobrevivência. O

Princípio da Continuidade veda a resilição bilateral.

Em síntese, o direito do trabalho não admite essa resilição bilateral,

pois a coincidência de vontades de rompimento do contrato não é

aceita. Essa coincidência é sempre lida pelo Direito do Trabalho como

vontade única do empregado, pois é a vontade mais forte.

A presunção é sempre de que o empregado não abriria mão, em

conjunto com o empregador, do seu emprego. Se há esse conjunto de

vontades, provavelmente a vontade do empregado está eivada de

algum vício. Ele poderia abrir mão sozinho.

12

Termos técnicos da teoria contratual. Resilição bilateral ou distrato é a convergência de interesses no sentido da dissolução do pacto contratual. 13

Só o empregado ou empregador tomam a iniciativa de romper o contrato trabalhista. 14

A presunção é relativa, ou seja, admite-se prova em contrário.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 56

ii. A relação de Sucessão de empresas.

Os artigos 10 e 448 da Consolidação das Leis do Trabalho estabelecem

que qualquer que seja a alteração (mudança) na estrutura jurídica da

empresa15 não afetarão os direitos adquiridos dos seus empregados,

assim como não afetarão os contratos de trabalho estabelecidos entre

essa empresa e seus empregados.

Em termos bem genéricos, isso significa que o contrato de trabalho

continua independente da estrutura jurídica da empresa. O contrato

de trabalho deve ser respeitado (e este é um corolário do Princípio da

Continuidade da Relação de Emprego) independentemente do

processo de alterações que possa haver na estrutura jurídica da

empresa.

Por exemplo, se empresa MDBL, na qual trabalha Severino ( ),

transforma-se em empresa VDC, na qual continua trabalhando

Severino, não pode haver, em virtude da transformação, nenhum tipo

de efeito no contrato de Severino. Ele preserva todos seus direitos.

Assim, se a empresa MDBL devia horas extras, a empresa VDC que

comprou a MDBL deverá pagar as horas extras devidas, pois há uma

continuidade.

Destaca-se, assim, como manifestação do Princípio da Continuidade da

Relação de Emprego o instituto da sucessão de empresas que está nos

artigos 10 e 448 da Consolidação das Leis do Trabalho.

4° Princípio: Primazia da Realidade.

Aqui há uma diferença interessante do Direito do Trabalho em relação a todos os outros ramos

do direito.

O nível de abstração do direito do trabalho é consideravelmente menor em relação aos outros

ramos do direito. Essa diminuição no nível de abstração se dá muito em virtude do princípio da

primazia da realidade, que é muito encontrável no âmbito do Direito Processual e no âmbito

do Direito Material, encontra-se no direito trabalhista.

15

Por exemplo, se a empresa mudou seu nome, razão social, composição societária, tipo de sociedade (abriu o capital, por exemplo).

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 57

Esse princípio diz que a relação de emprego16 se caracteriza mais por elementos reconhecidos

na realidade dos fatos17 do que quaisquer abstrações que a Lei possa trazer.

Assim, quando se caracterizam os contratos de forma geral, há sempre elementos abstratos

que vão definir esses contratos, criando-se uma hipótese bastante ampla. No caso do contrato

de trabalho, que se definem pela relação de emprego, esses elementos que compõe o

contrato não estão tão caracterizados conceitualmente. São mais facilmente identificáveis no

plano da realidade dos fatos.

É assim porque a relação jurídica base do direito do trabalho é encontrada na realidade. Todos

os outros institutos e direitos proclamados pelo direito do trabalho vai fazer esse movimento

de retorno à realidade. Então quando se trata de qualquer instituto trabalhista, elemento

(sucessão de empresas, contrato determinado, indeterminado, terceirização) vai levar ao

mesmo movimento de retorno à verificação dos elementos da realidade. Essa realidade supera

qualquer formalização, solenidade, que é muito comum nas outras espécies contratuais não

trabalhistas. Há sempre algum tipo de solenidade ou forma que é em geral muito valorizada

nos contratos.

Nos contratos de trabalho isto não é valorizado. O que é valorizado é o reconhecimento de

determinados elementos no âmbito da realidade fática. Assim se dá na relação jurídica de

emprego e em todos os institutos do direito do trabalho.

Assim, temos um Direito que está o tempo inteiro tentando reconstituir a realidade, para

saber se é aplicado, não é aplicado e como é aplicado. Basicamente, isto proclama o princípio

da Primazia da realidade, a necessidade de foco, de enfocar a realidade diante de cada

conflito, pedida ou questionamento a respeito dos direitos trabalhistas.

Há vários exemplos desse princípio, tal como a súmula 301 do Tribunal Superior do Trabalho.

SÚMULA 301/TST. PROFISSÃO. AUXILIAR DE LABORATÓRIO. AUSÊNCIA DE DIPLOMA.

EFEITOS. CLT, ARTS. 8º, 9º, 442 E 444. LEI 3.999/61.

O fato de o empregado não possuir diploma de profissionalização de auxiliar de laboratório

não afasta a observância das normas da Lei 3.999/61, uma vez comprovada a prestação de

serviços na atividade.» Súmula mantida pelo Pleno do TST (Res. 121, de 28/10/2003). Res. 11,

de 10/04/89 DJU de 14/04/89.

Outro exemplo: existe forma para consignar controle de frequência?

Sim. A lei determina algumas formas de se controlar a frequência dos seus empregados. No

entanto, todas essas formas sucumbem diante da realidade dos fatos, que podem ser

16

A relação jurídica base do direito do trabalho é a relação de emprego. É a relação entre o empregado e empregador. 17

Então para saber se se está diante de uma relação de emprego é preciso consultar, verificar a realidade dos fatos.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 58

provadas de outras maneiras. A empresa pode apresentar, por exemplo, três volumes, cada

um de 80 páginas apenas de cartão de ponto, de controle de frequência do empregado e o juiz

desconsiderar toda aquela documentação diante do depoimento pessoal do preposto da

empresa, ou diante de uma testemunha trazida pelo empregado, que mais se aproxime da

realidade que era diferente daquela consignada naquele controle de frequência.

O empregador mandava o empregado marcar o horário de saída às 18 horas, mas continuava

exigindo que ele trabalhasse, mesmo depois da jornada. Fica fácil para o empregador, em um

possível litigio posterior, apresentar o controle de frequência e negar a existência de horas

extras prestadas. Mas, ainda que o empregador tenha apresentado esse controle de

frequência, é possível que o empregado tenha produzido um documento após as 18 horas

trabalhando pela empresa, que venha a instruir o processo. Assim, esse controle de frequência

pode vir a se confrontar com o documento apresentado pelo empregado, um eventual

depoimento de uma testemunha (gerente da empresa, por exemplo).

Enfim, consegue-se aproximar-se mais da realidade não pela forma prescrita de como se

controla a frequência (cartão de ponto), mas através de outros meios de prova. Esta deve ser a

preocupação de quem milita no direito do trabalho. Tentar se cercar daquilo que mais se

aproxima da realidade. Isto é o que impõe o princípio da primazia da realidade.

A lei diz que existe uma forma para se contratar trabalhadores no Brasil: a assinatura da

Carteira de Trabalho e Previdência Social. Esta é a forma padrão para se contratar trabalhador.

A lei diz como tem que assinar, qual o prazo para devolver-se o documento, aonde se fazem

anotações. Esta é a forma prescrita em lei.

Poderia se questionar: se o empregador não assinar a carteira de trabalho, não haverá relação

de emprego? Poderá haver sim, dependendo de elementos que serão encontrados na

realidade dos fatos que caracterizam aquele trabalhador como empregado. Isto é o que

importa.

Relação Ordinária de Emprego

Elementos da Relação Jurídica de Emprego.

Page 60: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 59

Esses elementos que se constituem no epicentro do direito do trabalho (são elementos da

relação jurídica de emprego) são quatro, a sigla é o SHOP.

Esses elementos devem estar juntos, para se caracterizar uma relação de emprego. Esses

elementos devem circular junto com a corrente sanguínea do estudioso do Direito do

Trabalho. Assim, os elementos da relação de emprego são: subordinação, habitualidade,

onerosidade e pessoalidade.

Os elementos da relação de emprego não estão na abstração da norma, mas na realidade, em

atendimento ao princípio da Primazia da Realidade (Página 47). Os Elementos da Relação

Jurídica de Emprego está na realidade dos fatos e não nas abstrações que pode ser

manifestada por algum tipo de solenidade formal. Não está na forma jurídica (abstrata), e sim

na realidade dos fatos.

Assim, se os Elementos da Relação Jurídica de Emprego estão na realidade, todos os outros

institutos do Direito do Trabalho devem ser procurados e encontrados na realidade dos fatos.

Assim, voltando ao princípio da primazia da realidade (que também é determinado pela

relação de emprego) tem uma aplicação cotidiana (corriqueira). É muito comum, ao se assistir

uma audiência trabalhista, o juiz desconstituir documentos, isto é, não leva-los em

consideração em homenagem ao Princípio da Primazia da Realidade.

Por exemplo, é muito comum o empregador exigir que o empregado constitua uma Pessoa

Jurídica para prestar serviços para o empregador. Cria a Pessoa Jurídica de forma perfeita, com

Inscrição Estadual, Municipal, C.N.P.J (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), Contrato Social

inscrito na Junta Comercial. Pode o juiz desconsiderar toda essa documentação (que

evidentemente era para fraudar a legislação trabalhista), identificando que, na realidade dos

fatos, quem prestava o serviço não era uma Pessoa Jurídica, mas sim o Severino, estando

presentes todos os Elementos da Relação de Emprego (Subordinação, Habitualidade,

Onerosidade e Pessoalidade). Assim, esses documentos devem ser extraídos dos autos.18

Começar-se-á o estudo pelo fim, pelo elemento pessoalidade:

1° Elemento: Pessoalidade

Deve se ir ao artigo 3° da Consolidação das Leis do Trabalho.

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza

não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

18

Sistema fraudulento da pejotização, melhor explicado mais adiante.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 60

Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição

de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual.

Assim, o artigo 3° caracteriza o empregado: ´´toda pessoa física´´. Assim, indica o artigo que na

relação de emprego existe pessoalidade em relação à figura do empregado. A figura do

empregado é sempre uma Pessoa Física.

Essa exigência de ser Pessoa Física se justifica por um motivo muito simples, se exige dessa

pessoa (na relação de emprego) o trabalho. É uma ação inerente a energia vital de uma pessoa

humana. A força de trabalho está essencialmente (fundamentalmente) a ideia (figura) de uma

pessoa física.

A força de trabalho alienada pelo trabalhador é uma energia imaterial inerente à condição

humana.

Como a lei no artigo 3° quer definir essa pessoalidade, é mais do que uma relação entre a força

de trabalho e a pessoa física do trabalhador. Entre essa inexorável vinculação que há na

produção desta energia imaterial que é à força de trabalho e o ser humano que lhe aciona.

Em termos jurídicos, a pessoalidade representa não apenas que o trabalhador é pessoa física,

mas que também este trabalho é exigido em termos contratuais de maneira personalíssima ou

infungível19. Toda relação no contrato de trabalho é infungível.

Por exemplo, a empresa pode contratar quinhentos mil trabalhadores, no entanto, cada

contrato de trabalho encerra uma obrigação infungível. Quando a empresa seleciona,

identifica e admite um trabalhador, ela quer a força de trabalho daquele trabalhador, e apenas

daquele trabalhador naquela relação contratual. Ela pode ter 499.999 outras relações

contratuais, mas naquela relação contratual, naquele contrato, interessa a empresa aquela

força de trabalho daquele empregado, e apenas daquele empregado.

A energia de trabalho que se desprende do trabalhador é demandada de maneira infungível

pelo empregador, de forma que o empregado enviar outra pessoa para trabalhar no lugar

dele. O empregado que tem essa obrigação infungível não pode se fazer substituir por ato da

própria vontade, essa é a consequência da pessoalidade.

Isso não significa que o empregado não possa ser substituído, mas não é o empregado que

substitui a si próprio. É a empresa que em determinada circunstância poderá substituí-lo, em

termos específicos determinados pela lei. Mas o empregado não pode por ato de vontade

próprio se fazer substituir, em virtude dessa condição personalíssima.

A Rede Globo de Televisão ( ) é um grupo econômico que congrega várias empresas,

trabalha na contratação de seus trabalhadores, na maior parte, com uma rede de

subcontratação, através de terceirização, através de contratos com outras empresas. Em geral,

tem-se os núcleos artísticos, estes núcleos estão ligados a outras empresas. A mesma

19

Basta lembrar-se da obrigação infungível.

Page 62: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 61

contratação técnica é vinculada também em contratos de terceirização, de maneira que

empregados com carteiras assinadas, há muito poucos.

Se observar uma obra de dramaturgia (uma novela), entre o elenco daquela obra, somente os

atores mais antigos tem vínculo de emprego com a Rede Globo. Todos os demais são

subcontratados através de terceirização ou de um expediente (que ficou muito comum, não

sendo um privilégio da Rede Globo) chamado pejotização20.

O sistema da PJtização.

A pejotização funciona da seguinte forma: o candidato entra no processo de seleção,

disputa uma vaga com 300 candidatos. Neste processo que dura 6 meses, o candidato

passa por uma série de entrevistas, dinâmicas de grupo, dinâmicas individuais, provas

(técnicas, psicotécnicas, psicológica, grafotécnica), isto é, escaneiam a alma do

candidato para saber quais são suas habilidades profissionais, técnicas e seu perfil

psicológico (afetividades, comportamento em um nível de relação que se tenha).

Ao final do processo, um candidato será selecionado. É óbvio que a empresa

reconheceu no candidato características personalíssimas que se coadunam com a

expectativa que ela tem para a ocupação daquele posto de trabalho. Não apenas a

experiência profissional (currículo), mas um conjunto de qualidades verificado pela

empresa e que se adaptam aquilo que é a expectativa da empresa para o atendimento

daquele cargo.

Na última entrevista, o preposto da empresa seleciona o candidato, dizendo que este

será contratado, havendo um único, porém, para que se efetue a contratação, o

candidato deverá constituir uma Pessoa Jurídica, pois a emprega não contrata pela via

celetista. Assim, juridicamente se estabelecerá um vínculo entre a Pessoa Jurídica que

o candidato criou e a Pessoa Jurídica do ‘’empregador’’.

A relação contratual fica sendo o Candidato que constituiu a Pessoa Jurídica

trabalhando todo dia, normalmente, como qualquer empregado. Cumprirá as ordens

do empregador (subordinação), desempenhará suas tarefas tendo suas

responsabilidades (próprias do seu trabalho).

Caso apareça um auditor fiscal do trabalho na empresa, não encontrará nenhum

empregado, apenas ‘’empresas que prestam serviços’’ para o empregador. O fiscal

observará que a suposta ‘’empresa que presta serviço’’ só tem um funcionário, que

por um acaso é o mesmo que está trabalhando diretamente, se ele falta não há

ninguém para substituir, se ele não comparece e não avisa é punido.

20

Neologismo, PJtização.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 62

Obviamente, este ‘’sistema de pejotização’’ é fraudulento em relação ao Direito do

Trabalho. É fraudulenta, pois objetiva afastar a pessoalidade e descaracterizar a

Relação de Emprego, afastando a aplicação da CLT.21

Não há como se negar que há uma relação de pessoalidade. Primeiro, pois aquela

relação contratual encerra-se na alienação (transferência) da força de trabalho.

Segundo, pois a obrigação é exigida pela empresa de maneira infungível. O empregado

não pode se fazer substituir como ato de própria vontade. A Pessoa Jurídica funciona

apenas como um véu.

Não é ilegal uma Pessoa Jurídica contratar outra Pessoa Jurídica. Mas, isso pode

apresentar-se como uma fraude ao elemento pessoalidade, para afastar um vínculo de

emprego existente.

Nem sempre que há a pessoalidade há vinculo de emprego. Para ter vínculo de emprego

(relação de emprego) é necessário que haja os quatro elementos juntos (SHOP –

Subordinação, Habitualidade, Onerosidade, Pessoalidade). Se faltar um elemento da relação

de emprego, não há relação de emprego. Pode haver qualquer outro tipo de relação (de

cunho civil, comercial, empresarial, administrativo), qualquer outro ramo do direito poderá

tutelar esta relação, mas não incidirá o direito do trabalho.

Existe a pessoalidade sem haver a subordinação. Por exemplo, um escritório de advocacia. A

ilegalidade está em fraudar (forjar) uma suposta relação autônoma que, na verdade, é relação

de emprego.

2° Elemento: Habitualidade

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza

não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição

de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual.

Destaca-se aqui a expressão: ‘’... que prestar serviços de natureza não eventual a

empregador...’’.

Natureza não eventual significa não episódica. O trabalho não pode se realizar em um único

evento ou em episódios muito espaçados.

21

Este parágrafo é comentário do Rafael Ayres.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 63

A relação de emprego não o é eventual. Ela se materializa em uma prestação de serviços não

eventual, mas sim habitual, reiterada, com frequência.

A primeira dificuldade é quantificar essa frequência22. O que é habitual, em termos

quantitativos? A lei não diz, não fala, pois irá depender de determinadas condições de fato.

Pode se aferir se há ou não habitualidade através de alguns critérios.

O primeiro critério para se aferir se, na prática, há ou não habitualidade é a consideração

integral do contrato, da relação jurídica entre empregado e empregador (trabalhador e

tomador do serviço). Deve se saber desde quando um trabalha para o outro. O primeiro

critério é a análise temporal integral da relação entre trabalhador e tomador do serviço.

Por exemplo, o funcionário começou a trabalhar para este tomador do serviço à 15 anos.

Assim, o termo inicial desta relação faz 15 anos. O primeiro aspecto do primeiro critério é o

termo inicial da relação. Uma vez que se identifica o termo inicial desta relação, passa-se a

observar reiteração (frequência) deste trabalho. Essa consideração integral faz toda a

diferença.

Assim, tendo-se um trabalho que é realizado uma vez a cada 15 dias (quinzenal), para saber se

ele é episódico ou não, deve-se observar essa totalidade. Se ele trabalha há um mês e trabalha

quinzenalmente, ele trabalhou apenas duas vezes. Seria muito pouco trabalho para se

identificar uma habitualidade.

Mas, se ele trabalha de 15 em 15 dias, há 20 anos, isso significa que durante esses 20 anos o

tomador do serviço contava com ele a cada 15 dias. Sem dúvida alguma esse trabalho é

habitual.

Assim, o primeiro aspecto que irá ser levado em consideração23 é essa repetição do trabalho

no curso dessa relação jurídica tomada integralmente, isto é, na sua totalidade.

Para esta primeira teoria, então, habitual é um serviço prestado com uma frequência razoável

dentro de um lapso temporal que compreenda toda a relação jurídica integral entre o

empregado e empregador, dentro do intervalo.

Essa teoria veio a ser aprimorada, pois ainda sim era um critério pouco definido. No fim das

contas, como a lei não estabelece um critério quantitativo é a doutrina que irá tentar trazer

uma racionalidade para constituição desta habitualidade. Depois da Teoria da Repetibilidade

(ou repetição) criou-se outra teoria.

Esta teoria é a vinculação pela inserção na atividade fim da empresa. Aqui se fala em

empregador como empresa (atividade econômica). Toda atividade econômica tem uma

finalidade ou conjunto de finalidades, de maneira que os trabalhadores que se insiram nesta

finalidade econômica do empreendimento, são todos eles considerados dotados de

habitualidade, independentemente da frequência, repetição.

22

Todo dia? Uma vez por semana? Uma vez por mês? Uma vez por ano? 23

Que também é a primeira teoria, denominada Teoria da Repetição ou Repetibilidade.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 64

Por exemplo, Severino ( ) trabalha para empresa , que fabrica

(os famosos pincéis atômicos). Severino imprime as letras brancas. Com a tecnologia que a

empresa usa, isto é, a máquina que Severino opera, faz um estoque de 10.000 canetas uma

vez a cada três meses. Esse é ainda o tempo de vazão para que o estoque se esgote.

Assim a necessidade que a empresa tem do serviço do Severino ( ) é uma

vez a cada três meses. Se Severino for mais que três vezes, haverá muito estoque, eles não

conseguirão vender, o preço do produto irá baixar. Se há muita oferta o preço abaixa e isso

não é interessante para a empresa. A necessidade da empresa é que Severino vá trabalhar lá

uma vez a cada três meses.

Em uma empresa que fabrique canetas, a função do Severino de imprimir as letras do próprio

produto é atividade fim, e não atividade meio24. Está se ajudando a fazer aquilo que a empresa

vende. Para a Teoria da Inserção na atividade fim da empresa, independente da frequência

(uma vez a cada três meses), o serviço é habitual, em virtude da necessidade que a empresa

tem.

Será habitual todo serviço inserido na atividade fim, pois ele é designado a partir da

necessidade do próprio empregador.

Se Severino ( ) vai lá a cada três meses e o contrato tem apenas três meses, obviamente

não haverá habitualidade, mas sim eventual. Mas se Severino já trabalha lá há 10 anos e está

inserido na atividade fim (aqui já se coaduna dois critérios), ter-se-á a habitualidade.

Ainda sim a doutrina conseguiu superar esta teoria, chegando a uma terceira teoria. Além da

repetição e inserção nas atividades fins, existe uma terceira teoria para caracterizar a

habitualidade que é a chamada de Previsão de Repetibilidade (ou inserção nas atividades

normais da empresa). Esta terceira teoria é um pouco mais abrangente que a inserção nas

atividades fim.

Defende esta terceira teoria que será habitual todo serviço que houver previsão de repetição

dentro da empresa. Seja esse serviço inserido na atividade fim, ou na atividade meio.

Por exemplo, um curso privado de prestação de serviços educacionais. Neste curso há turmas

de manhã, tarde e noite. A atividade fim é a prestação de serviços educacionais. Estão ligados

a atividade fim o pessoal da Administração, os professores, os coordenadores. Todos os

envolvidos com a prestação dos serviços educacionais, estão ligados de alguma maneira a

atividade fim.

24

Exemplos de atividades meio: manutenção e limpeza, segurança e vigilância, secretaria, ou seja, não está inserido no objeto daquela empresa. A atividade fim da empresa é identificada através do objeto descrito no contrato social (que tipo de produtos ou serviços que a empresa produz).

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 65

Mas, para que o curso se sustente adequadamente, é necessário que haja a limpeza das salas.

Conservação e Limpeza, em um curso de prestação dos serviços educacionais, não é atividade

fim, mas é obvio que o curso precisa deste serviço reiterado. Assim, se houver a contratação

de uma faxineira, servente ou auxiliar de serviços gerais. Esta pessoa, embora não esteja

vinculada a atividade fim, tem o seu serviço como sendo parte da previsão de repetição.

Para esta teoria, todo serviço que tenha uma previsão de repetição tem habitualidade, seja

atividade fim, seja atividade meio. Desta forma, o Direito do Trabalho quis deixar certa

flexibilidade para formação dos contratos.

Um bom exemplo seria um quiosque adquirido na praia de Geribá (Búzios-RJ). Irá prestar

serviços de veraneio vendendo cervejas, salgados, refeições, e etc. O empresário que tiver um

bom contador fará as contas e perceberá que não vale a pena adquirir esses produtos no

inverno. Não há movimento nessa época do ano. É prejuízo certo, não vale a pena funcionar

nesses meses.

Porém, ao se aproximar Novembro, Dezembro, o quiosque bomba. O que o empresário

compra, ele vende. Percebe-se que este negócio só vale a pena funcionar em alguns meses do

ano, por exemplo, de seis em seis meses.

Esse tipo de estabelecimento precisa de um garçom. O garçom fará parte da atividade fim. Ele

só trabalhará seis meses no ano. Este funcionário tem habitualidade? DEPENDE. Se é uma

sazonalidade em que se possa verificar ao longo de vários anos.

É assim que se vê, no caso concreto, como se dá a habitualidade: primeiro observando o

contrato inteiro (há quanto tempo ele trabalha), segundo se verificando se há a possibilidade

de repetição (repetibilidade). Se não houver essa repetibilidade, deve se observar se ele se

insere nas atividades fim e, caso não se insira nas atividades fins, se ele se insere nas

atividades normais, ou seja, aquelas que têm previsão de repetição.

OBSERVAÇÃO: Lei do empregado doméstico (Lei 5.859 de 1972).

A lei do empregado doméstico estabelece em seu artigo primeiro que empregado doméstico é

aquele que presta serviços ‘’de natureza continua’’. Portanto, definindo de forma diferente o

empregado doméstico em relação ao empregado celetista. Percebe-se que ele não fala

serviços de natureza não eventuais, mas serviços de natureza contínua, definindo de forma

diferente.

Em virtude disto surgiram dois entendimentos. O primeiro entende que continuidade e

habitualidade são sinônimas (ou não eventualidade e continuidade são sinônimas). Para esta

primeira corrente, não há diferença nenhuma. A segunda corrente defende que se foi escrita

de forma diferente, é porque queria designar coisas diferentes, portanto, continuidade deve

ser algo diferente de não eventualidade (habitualidade).

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 66

Mas, a lei do empregado doméstico tampouco define quantitativamente o quanto é essa

frequência, ou essa continuidade. Para quem sustenta que se quer designar uma coisa

diferente (e no caso do empregador doméstico não se pode valer da inserção nas atividades

meio ou inserção nas atividades normais, já que o empregador doméstico não tem atividade

nenhuma, ele é uma pessoa física), sugere-se como uma construção teórica dominante, a

reiteração e a frequência do trabalho doméstico deve ser geral que a do trabalho não

doméstico. Continuidade dá uma ideia de frequência maior, essa ideia que tem sido

compartilhada pela doutrina.

Mais recentemente, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (mas não cristalizada

em súmula) tem mantido um posicionamento de que mais do que dois dias na semana

caracterizaria uma continuidade exigida pela Lei do Empregado Doméstico. Assim, até dois

dias, não haveria essa caracterização, não sendo empregado doméstico aquele trabalhador

que frequenta o ambiente de trabalho doméstico em até dois dias na semana.

Isso não é pacífico, mas passou para o entendimento comum e as pessoas acreditam que até

dois dias na semana não cria vínculo. Esse é um entendimento muito controvertido.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 67

Aula 07 – Direito do Trabalho I dia 30/04/2013

3° Elemento: Onerosidade

É um elemento contratual famoso, presente em uma série de relações contratuais. Ele marca o

caráter retributivo, sintagmático do contrato de trabalho.

O sinalágma principal de um contrato de trabalho: o trabalhador entrega para o empregador

sua energia imaterial (suor, lágrimas ou sangue , por exemplo) e, em retribuição, a

empresa oferece valores em pecúnia. O trabalhador trabalha mediante salário.

Na relação de emprego o que move o trabalhador é a possibilidade de obtenção de recursos

que servirão para garantia da subsistência de sua família. Ele trabalha em troca de dinheiro. É

possível que parte dessa remuneração25 não seja imediatamente expresso em moeda. É

possível que o empregador entregue alguma utilidade, bem da vida que serve para o

empregado, por exemplo, habitação, transporte, alimentação. Pode o empregador, como

parte da remuneração (jamais como remuneração integral, não se admite o truck system26)

pode ser através da oferta de utilidades, que antes seriam satisfeitas com a própria

remuneração. Então, ao invés do empregador paga parte da remuneração oferecendo

habitação, transporte e etc.

25

Aquilo que o empregador paga a título de salário. 26

Sistema de troca.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 68

Pode o empregador ainda conceder liberalidades, por exemplo, a empresa que paga a escola

dos filhos dos empregados27. É raro, mas acontece. Essas liberalidades não tem caráter salarial,

pois já é uma vantagem do empregado receber aquela utilidade. As atividades que são em

retribuição pelo serviço prestado terão natureza salarial.

Por exemplo, Severino ( ) estava desempregado durante um ano e meio até que foi

admitido pela empresa X,Y,Z Ltda, que prometeu pagar no ato da admissão R$ 1.000,00 reais

por mês. Severino trabalhava todos os dias (habitualidade), se submetia as ordens do

empregador (subordinação), pessoalmente (de maneira infungível). Mas, no final do mês (até

o quinto dia útil do mês subsequente28), a empresa ao invés de pagar ao Severino avisa a

Severino que não poderá lhe pagar. A situação se repete nos dois meses subsequentes.

Segundo o Princípio da Primazia da Realidade há onerosidade neste contrato. Há onerosidade,

pois há expectativa (elemento subjetivo) de se receber. Há uma intenção de o empregado

receber. Ele entrou naquela relação para receber.

A onerosidade é verificada de duas formas: mediante o aspecto objetivo e subjetivo.

Aspecto Objetivo da Onerosidade

Dá-se pelo fato do Pagamento. Por exemplo, a empresa remunerava todo mês,

quinzenalmente, todo dia, etc. Se já o fazia, já se tem a onerosidade. Este é o aspecto

objetivo da onerosidade.

Em síntese, a onerosidade revela-se pelo fato do pagamento.

Aspecto Subjetivo da Onerosidade

Ainda que não tenha havido remuneração, quer por inadimplência do empregador,

quer porque jamais realmente houve um pagamento, pode ser verificada a

onerosidade através do aspecto subjetivo.

Este, é a intenção onerosa do empregado, caracteriza também a onerosidade, ainda

que não tenha havido o fato do pagamento.

Polêmica: Há onerosidade no trabalho do sacerdote? Sacerdote é aquele que é investido em

uma função diferenciada de professar uma fé religiosa.

27

As Casas Sendas, antes de passarem para o grupo do Abílio Diniz. 28

É o prazo para o pagamento do salário.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 69

Ele está ali para difundir uma fé religiosa. Foi investido naquele cargo para que pudesse

exercer o ministério de difusão dessa fé. Assim, ele está ali pela fé ou está ali pela expectava

da contraprestação que ele irá receber?

O caráter oneroso é determinante, inclusive, do status ocupado dentro da estrutura da

entidade religiosa. Há possibilidade de progressão funcional de acordo com o nível de

arrecadação dos fiéis que o sacerdote consegue obter, e isso reflete na sua remuneração. É o

plano de carreira sacerdotal. Está vinculado, justamente, a capacidade de arrecadação. Irá se

posicionar em localidades em que a arrecadação é sempre interessante a medida e proporção

que ele revela essa capacidade, qualificação, de conseguir fazer com que os fiéis contribuam.

O tribunal reconheceu uma vez que o caráter oneroso era realmente o substancial para o

sacerdote. Mas, a onerosidade contribuiria para o crime de exploração da fé pública.

É uma questão ainda não definida, há uma controvérsia jurisprudencial acerca do sacerdote.

4 Elemento: Subordinação

Este é o elemento mais importante da relação de emprego. Há inclusive doutrinadores que

distinguem a relação de trabalho genérica para a relação de emprego especificando: relação

de emprego é a relação do trabalho subordinado. Assim, a subordinação é o elemento mais

importante na relação de emprego.

Ela se concretiza na predeterminação pelo empregador do modo de como o trabalho deve ser

realizado.

No contrato de trabalho existe liberdade das partes para inserirem-se na relação contratual.

Esta liberdade transforma-se em menos liberdade no caso do trabalhador. Isto porque

juridicamente este se submete as ordens e as predeterminações que são unilateralmente

criadas unilateralmente pelo empregador. Isto é, na grande maioria dos contratos o

empregador determina como o trabalho será realizado. Determina e impõe ao seu empregado

e este, por ser subordinado, irá se submeter a essas determinações.

Aspectos da Subordinação.

Econômica (hipossuficiente)

Subordinação Técnica (vulnerabilidade)

Fático-Jurídica

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 70

Estas subordinações decorrem da própria lei. No final do artigo 3° da Consolidação das Leis do

Trabalho extrai-se: ‘’sob a dependência deste’’. Isto é, o empregado presta o serviço sob a

dependência do empregador. Esta dependência é econômica, técnica e fático-jurídica? É

fático-jurídica.

1° Aspecto: Da Dependência Econômica (hipossuficiente).

Não é necessariamente econômica. A grande maioria dos trabalhadores trabalha porque

precisa sobreviver. Economicamente depende daquela relação jurídica para dela extrair sua

fonte de subsistência. Assim, obviamente, na maioria das relações de emprego, há uma

dependência econômica. Mas, não é estritamente econômica, pois é possível que o

empregado tenha uma relação econômica boa o suficiente para prescindir daquela relação de

subsistência e se mantenha nela.

Por exemplo, Severino ( ) queria trabalhar na ‘’Energia que Tirou da Inércia S.A. ’’.

Sempre foi seu sonho, desde criança. Ingressa novo e vai sendo promovido ao longo do tempo.

Severino se realizava existencialmente trabalhando para essa empresa. Severino só era feliz

quando estava na empresa trabalhando. Um belo dia Severino ganha na mega-sena.

Obviamente, não precisa mais dos R$ 850,00 reais de remuneração mensal. Mas, ele tem tanta

satisfação em trabalhar na indústria que continuou trabalhando. Neste caso, ele não tem

dependência econômica, mas trabalhando na indústria, manterá a subordinação fático-

jurídica, pois, naquela relação com seu empregador, quem define o que ele vai fazer é o

empregador.

2° Aspecto: Da Dependência Técnica (Vulnerabilidade Técnica).

Não necessariamente o trabalhador depende tecnicamente do empregador. Isto é, nem

sempre o empregado tem a vulnerabilidade técnica. Via de regra, o empregado precisa das

orientações técnicas de como deve proceder.

Por exemplo, Severino ( ) irá trabalhar na máquina 5. Para trabalhar na máquina 5 o

procedimento deverá ser apertar a alavanca 1, depois a alavanca 4 e 2. Ele depende destas

orientações para realizar seu trabalho. Ele depende dessas orientações técnicas na maioria dos

casos. Mas, existem outros casos em que o empregado além de não depender das ordens tem

muito mais conhecimento técnico do que o empregador.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 71

Por exemplo, James ( ) é um trabalhador altamente qualificado. Ele tem pós-

graduação no MIT. É um farmacêutico de renome. Foi contratado por uma empresa de

medicamentos para chefiar o setor de novos produtos. James foi contratado a peso de ouro. O

empresário é formado em Administração de Empresas. O empregador não é gabaritado em

química, embora tenha uma indústria farmacêutica. Obviamente, James tem maiores

conhecimentos em química do que o Empregador. Assim, não cabe ao empregador dar

instruções técnicas a James. Mas, sendo funcionário da empresa, James deverá se submeter ao

horário de entrada, saída, responsabilidades e etc.

Assim, há uma esfera de autonomia criada dentro de uma relação subordinada. Isso pode

existir. Seu trabalho não é totalmente autônomo, mas tem alguma esfera de autonomia. Isso é

verificado no âmbito fático.

A subordinação, em geral, é fático-jurídica, técnica e econômica. Mas não necessariamente

serão essas duas últimas.

Assim, a predeterminação de tarefas e responsabilidades é a subordinação. O empregador

conduz essa relação. Em síntese: ‘’o empregador manda e o empregado obedece’’. Além de

mandar, ele controla as ordens emanadas. Ele fiscaliza as ordens emanadas. Determina,

controla e fiscaliza. Se não for cumprida a ordem, ele pune o empregado.

Tudo isso caracteriza (sob o ponto de vista fático/concreto) a existência ou não de

subordinação. É importante perceber que esse controle e essa fiscalização passam por uma

reformulação cada vez maior.

3° Aspecto: A Subordinação através do Controle, Fiscalização e Supervisão

O Direito do Trabalho Brasileiro nos últimos 20 anos sofre com a reformulação do sistema

produtivo. Este começa a se adaptar a essas reformulações do sistema produtivo.

O artigo 6° da Consolidação das Leis do Trabalho foi reformado em 2011:

Art. 6o Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o

executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam

caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 72

Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se

equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando,

controle e supervisão do trabalho alheio.

Ou seja, observa-se o parágrafo único: os meios telemáticos e informatizados de comando,

controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e

diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.

O parágrafo único quer dizer que a fiscalização não precisa ser pessoal, podendo ser feita, por

exemplo, através do computador, e-mail, celular, twitter ou qualquer mecanismo telemático

ou informático.

Experimenta-se, assim, um processo de reformulação dada a partir da chamada reestruturação

produtiva. Essa restruturação produtiva (Toyotismo/acumulação flexível) são métodos de

produção novos que determinam uma nova morfologia do trabalhos, isto é, novos tipos e

métodos de trabalho.

Antes, tinha-se a esteira de produção (fordismo) com cada trabalhador em seu posto de

trabalho, repetindo aquelas tarefas de baixa qualificação para um consumo em série de uma

sociedade de consumo em massa. Atualmente, existe o chamado just in time. Produz-se

baseado na demanda. Produz-se menos.

Por exemplo, o proprietário de um carro novo que tenha seu retrovisor quebrado. Se o modelo

for antigo, basta que o dono vá à Robauto. Se for novo, o proprietário deverá ir à autorizada, e

provavelmente terá que esperar pela peça de 30 a 40 dias. A produção é em baixo estoque,

sob demanda. Este é o novo método de produção.

O trabalho era individual, basta lembrar se do Carlitos no filme Tempos Modernos. Neste,

havia um fiscal informando ao Carlitos o que ele deveria fazer.

Atualmente, reúnem-se cinco trabalhadores formando-se uma equipe, porém, sem a figura do

fiscal. A equipe receberá por resultados. Quem produzir menos receberá menos. Quem

produzir mais receberá mais. Tudo, obviamente, com um mínimo de produção (meta).

Neste método dispensa-se a figura do fiscal. O próprio trabalhador assume a figura do fiscal e

irá fiscalizar o colega. Esse é o trabalho em equipe. O nome até sugere uma solidariedade, mas

na verdade está-se aumentando a fragmentação e o conflito entre os próprios trabalhadores,

acirrando a concorrência e individualidade entre cada membro da equipe.

Page 74: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 73

Existe outras técnicas para acirrar ainda mais a concorrência como oferecer prêmios a quem

atingir a maior meta. É a máxima do burro e da cenoura29. Com isto, todos irão se degladiar

para receber o resultado.

Essa reformulação do sistema produtivo ira absorver todo esse processo de renovação

tecnológica da chamada terceira revolução industrial. Robótica, telematica e informática são

inovações engengradas pelo capita para serem aproveitadas para que o capital se reproduza

mais. Esse processo de absorção da tecnologia dispensa mão de obra, reformulando o trabalho

daqueles aqueles que permanecerem.

Ao mudar-se o trabalho, altera-se também o controle e fiscalização. Não existe mais a

separação entre tempo no trabalho e tempo fora do trabalho.

O modelo Toyotista é o modelo que captura a subjetividade do trabalhador. Marx afirmava

que o capitalismo era transformar tudo em mercadoria. Alguns entenderam que deveria se

transformar inclusive o trabalhador. Sim, o trabalhador é mercadoria. É uma mercadoria

mágica, afinal gera mais valor do que se paga por ela. Até porque, se o empregador

(empresário) pagasse mais do que a mão de obra vale, ele não teria lucro.

Mas, ele era mercadoria dentro do horário de trabalho. Agora ele é uma mercadoria muito

mais especializada, pois é uma mercadoria dentro e fora do horário de trabalho. O

empregador busca essa fidelização do empregado.

Por exemplo, o divulga a seus funcionarios a ideologia de que o funcionário é

mais fiél a empresa se ele não cobra as horas extras. Essa é a marca da fidelidade.

O processo de fidelização pode ir além. Por exemplo, o trabalho em relação aos conceitos. O

funcionário passa a ser chamado de colaborador ou associado. Qualquer escritório de direito

possui a figura do associado. Faz-se um cálculo mirabolante, para que no final ele ganhe

0,000000001% do Capital Social. Essa é a verdadeira captura da subjetividade. Esse

‘’associado’’, em razão do título, terá que virar a noite trabalhando no escritório.

Assim, o artigo 6 altera a noção de subordinação. Não precisa mais haver a figura da

fiscalização direta. A subordinação se dá pelos mecanismos objetivo de controle daquele

trabalho. São objetivos através da adesão do trabalhador a finalidade da empresa, e através

dos meios que a tecnologia permitiu. Por exemplo, é possível que o funcionário tenha que

mandar um relatório por email, sendo que ele nunca viu para quem ele está mandando.

Atualmente, perdeu-se a figura do fiscal de chão de fábrica. Há um controle objetivo. A

subordinação é estrutural.

29

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 74

O Curso de Direito do Trabalho do professor Maurício Godinho Delgado trás um capitulo sobre

a Subordinação Estrutural ou Reticular. São formas de subordinação objetivas, trazidas pelos

novos métodos de produção. Não é mais objetiva, aquele controle pessoal, físico, a fiscalização

direta. É possível a congregação com outras formas de controle, supervisão e fiscalização.

4° Aspecto: A Gradatividade da Subordinação

A subordinação não é disjuntiva30. A subordinação funciona de maneira gradativa. Alguns

funcionários tem mais subordinação, outros menos. Quem mais tem subordinação é aquele

que mais depende do empregador.

5° Aspecto: A Parasubordinação

O que tem menos subordinação é o autônomo. Neste não há relação de emprego. O

trabalhador autônomo é o prestador de serviços, o representante comercial, é o contrato de

agência e distribuição, o comissionado, o empreiteiro (esses três últimos regulados pelo

Código Civil).

Entre a subordinação e a autonomia existe ainda uma zona cinzenta. Por exemplo, um alto

diretor da empresa com muita autonomia (financeira, gerencial e vários subordinados). Um

profissional liberal gabaritado pela empresa. Esses trabalhadores tem pessoalidade,

habitualidade, mas a subordinação fica em uma zona cinzenta, será necessário olhar detalhes

da relação. Detalhes, por exemplo, como se dava o controle e a fiscalização (se era só uma

prestação de contas gerais ou algo mais cotidiano). Terá que se de perto.

Alguns doutrinadores defendem que para esta zona cinzenta deve se criar uma nova

modalidade contratual. O trabalhador que não é nem subordinado nem autônomo deveria ser

caracterizado como o parasubordinado. Essa figura não existe no Brasil, apenas no direito

comparado. Alguns países tem essa figura intermediária.

O Direito Italiano, por exemplo, afirma que o parasubordinado é aquele que não tem

hipossuficiência econômica (pois recebe muito bem), tem grande grau de autonomia, mas

trabalha vinculado a algum empregador. Os italianos exemplificam com grandes diretores de

obras cinematográficas. No Brasil seria o Gugu. O Gugu tem autonomia para criar no

programa, para contratar pessoas e certa autonomia financeira. Mas, ainda que não tenha a

hipossuficiência econômica e autonomia, ele trabalha para a emissora.

Mas, esse tipo de funcionário, para o Direito Italiano, não é um funcionário que precise de

toda a proteção. Ele tem outros direitos, mas não os mesmo direito de um operário, por

exemplo.

30

Não é oito ou oitenta, isto é, ou tem ou não tem subordinação.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 75

6° Aspecto: Ajenidad

Poderia se traduzir por alheabilidade, isto é, aquilo que é alienável, aquilo que é levado para

outro. Grande parte da doutrina traduz por alteridade. Aquilo que sai do trabalhador e vai para

outro. Outro é alter, por isso alteridade.

Alguns autores afirmam ser um requisito separado da relação de emprego. Ao invés dos

quatro (SHOP), seriam cinco. Mas o melhor entendimento (Ivan Garcia) entende que envolve o

conceito de subordinação. Assim, deve se embutir na subordinação.

Por exemplo, o trabalhador entrega sua força de trabalho para o empregador. Principalmente

quando este trabalhador é uma empresa há a transformação desta energia imaterial que é a

força de trabalho (braçal ou intelectual, não importa), dentro da empresa31, aderindo-se vários

fatores de produção a força de trabalho do trabalhador, virando capital (dinheiro). Assim,

quando reunida (congregada) com os demais fatores de produção, a força de trabalho se

transforma em dinheiro.

A ajenidade diz que a força de trabalho do trabalhador é alienada em favor do empregador. Ela

sai do corpo do empregado e vai para o empreendimento econômico produtivo, afim de ser

transformada em dinheiro. Se o empregador recebeu do empregado a força de trabalho

alienada, o empregador, ao valorizar seu empreendimento econômico com trabalho alheio, irá

se responsabilizar pela sorte do empreendimento, pela sorte do seu negócio, pela sorte do

resultado desta unidade econômico produtivo.

No capitalismo a livre iniciativa é um direito fundamental. Mas, é um direito fundamental de

quem tem capital. Quem não tem capital, e ai pode ser até emprestado do banco, não tem

como congregar fatores de produção, não tem como adquirir meios de produção para neles

agregarem fatores de produção. Quem consegue a propriedade desses meios de produção e

consegue produzir, tomando a iniciativa econômica, submete-se a um ambiente de

concorrência interempresarial (capitalista).

O capitalismo é bom, mas não é para qualquer um. Se o capitalista não tiver condições de

superar a concorrência, esta te liquida. Seu empreendimento econômico não irá perdurar.

Quase 99% da força de trabalho brasileira são absorvidas por pequenas e micro empresas.

Essas empresas tem a duração média de dois anos. Elas não conseguem permanecerem ativas

no mercado concorrencial por mais de dois anos.

A ajenidad determina que uma vez que o empregador paga pela força de trabalho e a

incorpora no empreendimento, a sorte do empreendimento é do empregador. Se ele auferir

largos lucros, este será do empregador. Ele não é obrigado a abrir mão de seu lucro (ganho de

produtividade). No Estado de Bem Estar Europeu o empresário é obrigado a partilhar parte dos

seus ganhos de produtividade com os empregados. Porém, se o empreendedor amargar um

grande prejuízo, este será apenas do empregador, não podendo ser transferido para o

31

A empresa é congregação da unidade econômico-produtiva. Unidade de diversos fatores de produção.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 76

empregado. Em síntese o empregador assume o risco da atividade econômica. O empregador

não pode transferir o risco do seu negócio para o empregado.

Por exemplo, Severino ( ) era frentista. Quando

chega o carro do poderoso Thor. Poderoso Thor manda

completar o tanque com gasolina ULTRAPOWER, mas

pagou em cheque. Mas, como o cheque era do Thor, o

frentista imaginou que não haveria problema. Severino

nem faz a consulta no cadastro de inadimplentes.

Quando o empregador foi depositar o cheque, este foi

devolvido por insuficiência de fundos (ainda não havia

recebido a mesada). O frentista não poderá sofrer

nenhum desconto em virtude da inadimplência do Thor.

Como Severino não realizou a consulta no cadastro, ele

pode ser punido, mas não com desconto. O risco do

negócio é do empregador, não pode ser transferido ao empregado. O empregado cometeu

uma falta contratual, podendo ser punido com uma das três formas que a legislação aceita:

advertência, suspensão ou demissão com justa causa, mas não pode ser punido com

desconto32.

Não pode ser punido com desconto, pois o risco é do empregador. Se o empregador aceita

essa modalidade de pagamento, o risco é apenas dele. Quem aceita cheque corre o risco de

receber um cheque sem fundo. O risco pode ser minimizado com a consulta ao cadastro de

inadimplentes do SPC e SERASA. Mas, não trás o risco a zero, afinal aquele cheque pode ser o

primeiro inadimplido na vida do emissor do cheque.

32

Os descontos estão definidos na CLT no artigo 462, e não pode ser em virtude de inserção no risco. Apenas quando há um dolo do empregado em causar prejuízo.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 77

Aula 08 – Direito do Trabalho I dia 02/05/2013

Relações de Emprego Especiais.

Algumas relações de emprego são qualificadas por leis específicas da categoria de maneira

peculiar, ou seja, além dos quatro elementos apresentam peculiaridades dentro desses quatro

elementos. Pode ser ainda que essas modalidades acrescentem peculiaridades aos quatro

elementos já conhecidos (Subordinação, Habitualidade, Onerosidade e Pessoalidade).

Aqui se apresentam algumas das relações de emprego que apresentam qualidades especiais,

isto é, peculiaridades especiais que são muito cobradas em algumas relações de trabalho. Deve

se ter atenção neste ponto, pois se falou em relações de trabalho e não em relações de

emprego, mas que por algum motivo são reguladas por leis que concedem algum direito

trabalhista ou regulam este trabalho, de maneira que o Direito do Trabalho vai se aproximar

desta regulação.

Não são normas tipicamente de relações de emprego. Podem até conceder direitos

trabalhistas, mas são relações de trabalho. Algum daqueles elementos do SHOP está faltando

nestas relações. Ou não há interesse público em manter esta relação submetida as regras

genéricas de direito do trabalho.

a) Empregado a Domicílio (Art. 6º, Consolidação das Leis do Trabalho).

O artigo 6° trás a possibilidade do trabalho em domicílio, determinando que não se

distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador o executado

no domicílio do empregado e o executado a distância, desde que estejam

caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Assim, tanto faz o empregado trabalhar em casa ou dentro do ambiente da empresa.

Isto não retirará a qualidade de relação jurídica de emprego desta relação.

Este é um artigo antigo. O exemplo típico dentro do modelo produtivo anterior eram

as costureiras. Estas são controladas pelo número de tarefas, produtividade,

qualidade. Poderia ainda, no caso destas, a utilização de mão de obra familiar para

auxiliar o trabalho da costureira.

Hoje, este processo de terceirização fez com que quase não haja mais costureiras

dentro das indústrias têxteis. No próprio ramo de criação de roupas há um processo de

terceirização.

No Brasil essa terceirização se transformou em uma precarização da força de trabalho,

ou seja, diminuição (degradação) das condições de vida deste trabalho e

trabalhadores. Passou-se a assistir ainda o acréscimo de trabalho escravo (que tem se

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 78

valido muito de mão de obra imigrante, da Bolívia, principalmente) no âmbito da

costura.

O empregado a domicílio terá uma exponencialização a partir do chamado

teletrabalho e de todo aquele processo de captura da subjetividade33.

b) Empregado Rural (Lei 5.889 de 1973)

Outra relação de emprego especial é a do trabalhador rural. Este, assim como o

trabalhador doméstico, apresentava-se na Consolidação das Leis do Trabalho no artigo

7°.

Getúlio Vargas teve muita dificuldade de regularizar a situação do trabalhador rural.

Na década de 30 e 40 (quando essa legislação trabalhista está começando a ser feita)

80% da população brasileira estavam no campo. A grande massa de trabalhadores não

vinha sendo contemplada pelos direitos trabalhistas. Em 1943, ao terminar-se a etapa

de regularização do processo consolidando as leis na Consolidação das Leis do

Trabalho, o artigo 7° menciona os rurais da seguinte maneira:

Art. 7º Os preceitos constantes da presente Consolidação salvo quando fôr em cada

caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam :

a) aos empregados domésticos, assim considerados, de um modo geral, os que

prestam serviços de natureza não-econômica à pessoa ou à família, no âmbito

residencial destas;

b) aos trabalhadores rurais, assim considerados aqueles que, exercendo funções

diretamente ligadas à agricultura e à pecuária, não sejam empregados em atividades

que, pelos métodos de execução dos respectivos trabalhos ou pela finalidade de suas

operações, se classifiquem como industriais ou comerciais;

Assim, há basicamente três categorias: rural, empregado público e empregado

doméstico. A Consolidação das Leis do Trabalho menciona essas três figuras de

trabalhadores para dizer que estes estão excluídos do regime de proteção celetistas.

Como na época não havia nenhum tipo de legislação que protegesse, esses

trabalhadores não tinham proteção nenhuma.

Quando Getúlio Vargas volta (década de 50), começando seu mandato em 1951, tenta

articular a regulamentação de direitos para os trabalhadores em conjunto com a

reforma agrária. Mas, como já está em um contexto de guerra fria, o próprio Getúlio

33

Já se falou que as novas formas de produzir realizam.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 79

irá se posicionar para radicalização de um nacionalismo mais a direita. Um processo de

polarização político.

Assim, o projeto de Reforma Agrária e regularização dos direitos do trabalhador rural.

Isso só irá acontecer com a Ditadura Militar, com a Lei 5.889 de 1973. Aqui se

apresentam, pela primeira vez no Brasil, direitos ao empregado rural. A ditadura tinha

um projeto inteligente de incorporar o processo de Reforma Agrária que já havia sido

instalado pelo Jango34. A ditadura se apropriou deste processo e insere o processo de

reforma agrária junto com o processo de interiorização e colonização (sobretudo da

Amazônia Legal).

Esta lei do trabalhador rural prevê não apenas a tipificação do trabalho rural

(trabalhador rural como empregado), como também na mesma lei se prevê outras

relações de trabalho do trabalhador rural, sem vínculo empregatício35. Estas últimas

são relações de trabalho e não de emprego, mas estão previstas no mesmo diploma

normativo.

No que concerne ao empregado rural, à lei do trabalhador rural define esse

empregado rural de uma forma interessante. Em última análise, é empregado rural

quem trabalha para empregador rural.

Para se saber o trabalhador é urbano ou rural para fins de aplicação da lei do

trabalhador rural, deve se olhar não para o empregado, mas para o empregador rural.

O empregador rural é aquele que trabalha em propriedade rural. Ou seja, a lei designa

o chamado prédio rústico, geralmente em zona rural do município, mas que

desenvolve atividade agrícola, pecuária e agroindustrial. Essas atividades constituem o

que a lei designa como prédio rústico.

A atividade agroindustrial é aquela que promove a primeira transformação sob a

matéria-prima, sem lhe retirar as características próprias. Por exemplo, a pessoa que

processa o leite pasteurizando, ensacando para comercializá-lo. Este leite sofreu uma

primeira transformação. Mas, o leite continua sendo leite. Então a comercialização

desse leite já industrializado é atividade agroindustrial. Porém, se essa mesma

empresa, através do leite, produz queijo ou outros derivados, retirou-se as

características próprias daquela matéria-prima, e a atividade passa a ser industrial,

para efeitos de caracterização do empregador.

É possível ainda que o empregador congregue as duas atividades, sendo classificado

como empregador urbano. Então todos os empregados desta indústria (desta

atividade industrial que congrega também atividade agroindustrial, mas prevalece a

atividade industrial), serão trabalhadores urbanos, e não trabalhadores rurais.

34

Jango dentro das reformas de base dá amplitude e profundidade ao processo de reforma agrária. 35

As questões de parceria, meação, empreitadas em associação com o proprietário rural.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 80

Por exemplo, Severino ( ) lida com os bois da fazenda de uma empresa de

pecuária para corte e exportação de carnes. Severino nunca pôs os pés na cidade. No

entanto, se essa atividade pecuária passa por uma associação com algum processo

industrial de derivados, por exemplo, fazendo laticínios com essa carne, tirando as

propriedades inerentes a matéria-prima para este produto, embora Severino nunca

tenha ido na cidade, ele passa a ser um trabalhador urbano.

Por exemplo, em outra empresa pecuária que só desenvolve atividade pecuária existe

um funcionário que nunca foi para o campo. Ele atua na bolsa de valores de mercados

futuros, vendendo das ações para o mercado futuro. É um titulo mobiliário. Irá ser

transacionado na bolsa de futuros.

Esse funcionário mora em São Paulo e nunca saiu da cidade, mas trabalha nessa

empresa de pecuária. Ele é um trabalhador rural, pois trabalha para uma empresa

rural, exclusivamente de pecuária.

Assim, para saber se um empregado é rural para fins de atribuição dos direitos

contidos na Lei 5.889 de 1973, deve-se olhar seu empregador e a atividade deste. Se

for uma atividade agrícola, pecuária ou agroindustrial36, será uma empresa rural e

todos seus empregados terão os direitos contidos na lei do trabalhador rural.

Com a Constituição de 1988 o artigo 7°, em seu caput, faz uma equiparação entre os

trabalhadores urbanos e rurais (há uma equiparação de direitos). Assim, atualmente,

com a Constituição de 1988, houve uma equiparação de direitos com o trabalhador

urbano.

Claro, que daí nasce a pergunta, se são iguais porque se estuda separadamente? Em

razão de apenas um aspecto, a única diferença que remanesce entre o trabalhador

urbano e rural é a jornada de trabalho e, consequentemente, o adicional noturno.

Assim, o único aspecto distintivo entre o empregado urbano e empregado rural, é a

jornada de trabalho noturna e diurna.

a. Jornada Noturna

i. Urbano (das 22h/5h).

Para o empregado urbano considera-se jornada noturna aquele que vai

das 22 horas de um dia até às 5 horas do outro dia.

Diferentemente da jornada noturna do trabalhador rural, o trabalhador

urbano tem uma jornada de apenas 7 horas.

36

A que promove uma primeira alteração sem retirar as características inerentes da matéria-prima.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 81

Isso significa que, no que concerne a jornada noturna, o trabalhador

urbano é mais protegido que o trabalhador rural. A hora noturna do

empregado urbano é menor. O horário noturno do empregado urbano é

menor. Isso significa que cada hora não dura 60 minutos e a própria

Consolidação das Leis do Trabalho diz isso no artigo 73, §1°.

Art. 73. Salvo nos casos de revezamento semanal ou

quinzenal, o trabalho noturno terá remuneração superior a do

diurno e, para esse efeito, sua remuneração terá um acréscimo

de 20 % (vinte por cento), pelo menos, sobre a hora diurna.

§ 1º A hora do trabalho noturno será computada como de 52

minutos e 30 segundos. (Redação dada pelo Decreto-lei nº

9.666, de 1946).

Isso porque a jornada noturna é reduzida, privilegiando o trabalhador que

trabalha exclusivamente em jornada noturna, trabalha apenas 7 horas, se

for trabalhador urbano.

Quem trabalha em jornada mista, o que passa das 22 horas receberá o

adicional noturno, mas não terá a vantagem de ter redução do horário,

pois a jornada dele é mista, e o adicional é de 20%. Há um acréscimo

remuneratório, por compensar de o trabalhador estar trabalhando em um

horário que geralmente é direcionado para o descanso.

ii. Rural.

O empregado rural tem uma jornada noturna distinta, se se trabalha no

âmbito da pecuária, ou no âmbito das atividades agrícolas.

No caso do trabalhador rural não há o decréscimo de horas. Ele tem a

jornada de trabalho de 8 horas, igual a diurna, mas recebe um adicional

superior, de 25%.

1. Pecuária (das 20h/4h).

No caso da pecuária, nós temos o horário

das 20 horas da noite até às 4 horas da

madrugada. Na pecuária, em geral, se acorda

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 82

mais cedo.

É natural do trabalho com a pecuária que se acorde mais cedo,

pois o tem-se um melhor ciclo do leite.

2. Atividades Agrícolas (das 21h/5h).

Nas atividades agrícolas (lavoura) o horário é das 21horas até as 5

horas da manhã.

c) Empregado Público (Constituição Federal, artigo 37, incisos II, IV, V37, ADI

2.135).

Existem vários regimes de contratação, várias possibilidades de contratação no âmbito

da Administração Pública. Duas são as principais: os celetistas e os estatutários.

Principais, mas não são as únicas, existem os militares, temporários e uma série de

outras possibilidades de contratações no âmbito da Administração Pública.

O Direito do Trabalho só é aplicado no âmbito do chamado emprego público

(celetista). Não é originariamente um regime mais adequado para o âmbito da

Administração Pública, ou pelo menos, para as funções da Administração Pública que

exercem o chamado múnus público, que exercem atividades que materializam o

interesse público. Este, em geral, é mais adequado ser realizado por servidores

públicos que tenham o regime do cargo público (estatutários).

Isso ocorre, pois quando a Administração Pública age exercendo seu poder de império,

seu poder de polícia, exercendo ou manifestando qualquer forma de interesse público,

pode contrariar interesses econômicos, políticos, que historicamente são muito fortes

no Brasil.

Assim, é preciso resguardar esse servidor (no caso, com regime de contratação), que

permita exercer a sua atividade (múnus público) sem que sofra nenhum tipo de

consequência, para o bem da realização do interesse público. Assim, tradicionalmente,

se atribui a este tipo de servidor o regime do cargo público ou estatutário, pois é este

estatuto que irá proteger o servidor público para que ele possa bem exercer o seu

múnus público.

Mas, nem todos que trabalham na Administração Pública realiza este interesse

público. Então, já como se divide a Administração Pública em Direta e Indireta, já se

tem nas chamadas Empresas Estatais (Sociedades de Economia Mista e Empresas

37

Súmula 390 do Tribunal Superior do Trabalho.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 83

Públicas), um interesse gerencial muito maior, um jus gestioni muito mais presente. O

Estado atuando, muitas vezes, como se fosse privado.

Assim, a própria Constituição Federal de 1988 estabelece que a atividade econômica

não deva ser delegada ao estado, ela é reservada para a iniciativa privada. No entanto,

às vezes há interesse público de o Estado participar destas atividades econômicas, e

fará esta participação através das chamadas Empresas Estatais.

É possível que estas mesmas estatais prestem serviços públicos. Nestas hipóteses a

figura se altera por completo, pois nestes casos se estará na concepção de interesses

públicos, e não gerenciando meramente interesses privados. Há um interesse público

proeminente na prestação de serviços públicos. Mas se a natureza for meramente

econômica, então, privilegia-se a caracterização dessas empresas com algo mais

aproximado do âmbito privado.

Para as empresas estatais, tradicionalmente se delegava o regime de contratação de

empregados públicos. Para os demais entes da Administração Pública (Administração

Direta, Autárquica e fundacional), o regime de contratação era o do cargo público.

No Brasil, isso nunca foi muito bem delineado. Até porque o Estado Patrimonial

Brasileiro sempre fez com que o Estado fosse fonte da concepção de interesses

particulares. Assim, vigora na Administração Pública o interesse das Elites.

A Constituição de 1988 tentou organizar um pouco isso, fixando um padrão geral de

contratação dos servidores públicos no artigo 39. O artigo 37, em seu caput, quis

ajeitar a Administração Pública.

Quanto à contratação de pessoal, o artigo 39 estabelecia uma diretriz. Esta era que os

órgãos da Administração passassem a organizar seu pessoal conforme o interesse

público ou não na realização do serviço. Para isso a Constituição estabeleceu a criação

de um Regime Jurídico Único de pessoal. Cada ente federativo, cada órgão de

Administração Pública Direta ou mesmo Indireta deveria estabelecer um Regime

Jurídico que passaria por esta percepção.

Onde houver interesse público, deverá se contratar servidores públicos estatutários.

Sempre que houver interesse público, para o bem do Princípio da Impessoalidade, da

Moralidade Administrativa e até da Eficiência é preciso que se designe um estatuto,

que reconheça direitos, prerrogativa e deveres.

O Estatuto seria a melhor forma para aquelas instituições que realizem o interesse

público de qualquer forma. Seria a maneira pela qual se conseguiria realizar este fim

público. Esta é a lição da Constituição. A União tomou a iniciativa e estabeleceu seu

Regime Único a partir da lei 8.112 de 1990.

Dez anos após a Constituição ter sido promulgada, o presidente Fernando Henrique

Cardoso teve outra concepção de Administração Pública, informado pelo

neoliberalismo. A ideia era administrar o Estado como se fosse uma empresa privada,

afastando a figura do estatuto.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 84

Ele apresentou um projeto de Emenda Constitucional que previa uma reforma

profunda na estrutura administrativa (a chamada reforma administrativa do Estado).

Dentro desta reforma, estava incluída a reforma do artigo 39, estabelecendo no

projeto de Emenda Constitucional, que todo pessoa da Administração passaria a ser

celetista. Não existiria mais ninguém com estabilidade na proposta de Emenda. Essa

proposta foi votada transformando-se na Emenda 19 de 1998.

A questão da contratação de pessoal não ficou como governo Fernando Henrique

gostaria. Foi apresentada uma Emenda substitutiva, e esta Emenda foi aprovada.

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios

instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e

planos de carreira para os servidores da administração pública direta,

das autarquias e das fundações públicas. (Vide ADIN nº 2.135-4)

O resultado é que o artigo 39 terminou vazio. Mas, a rigor, o que a reforma

estabeleceu foi uma liberdade de contratação de regime de pessoal. A Constituição

originariamente previa o regime jurídico único. Suprimiu-se a palavra ‘’regime jurídico

único’’ da Constituição. A interpretação foi que ficaria a critério de cada órgão da

Administração Pública a liberdade plena de contratação. Assim, o mesmo ente

federativo que antes estava adstrito a um regime jurídico único e eventualmente

delegar sua função privada a terceiros, agora, o ente federativo poderá adotar o

regime celetista, estatutário ou misto.

Houve uma flexibilização, não se impôs o regime celetista de forma genérica e

obrigatória para todos, como era a proposta do governo. De 1998 a 2008 (10 anos)

houve um movimento de volta, de desorganização do gerenciamento de pessoal. Cada

ente federativo escolhia um regime, podendo inclusive escolher os dois.

Em 2008, identificou-se um problema. Quando a Câmara dos Deputados apresentou o

substitutivo referente ao artigo 39, mudou a redação do projeto (originalmente

apresentada pelo governo, que obrigava ao regime celetista). No processo legislativo,

quando se muda por emenda em uma das casas um determinado aspecto da lei, o

projeto deve ser votado na outra casa, ainda que já tenha passado por lá. Neste caso,

houve emenda na Câmara dos Deputados, mas não passou no Senado. A Emenda foi

publicada sem passar no senado. Um vício de Inconstitucionalidade formal claro.

Após 10 anos da reforma administrativa, sai à decisão do Supremo Tribunal Federal na

Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn n° 2.135) declarando a

Inconstitucionalidade da Emenda. A rigor, deveria ser restaurado o regime jurídico

único previsto na Constituição.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 85

Seja para empregado público, seja para cargo público, o requisito genérico de

contratação (para o bem da moralidade e impessoalidade) é a aprovação prévia em

concurso público.

Quando a Constituição trouxe esse

dispositivo, não havia nem sido encerrado o

processo constituinte, mas a gritaria era

enorme, pois o Estado sempre foi o local da

realização de favores pessoais, do

empreguismo, nepotismo, fisiologia, etc.

O artigo 19 distribuiu os ingressos do trem da

alegria. Aquele que já está trabalhando a mais

de cinco anos a data da promulgação da

Constituição, este terá o ingresso para o trem da alegria e não precisará fazer concurso

público.

Todos aqueles que entraram antes de 1983 entravam direto no trem da alegria. Para

quem entrou depois dessa data, nos últimos cinco anos, não havia ingresso no trem da

alegria. Estes serão exonerados na medida em que a Administração Pública irá prover

concurso público, para a colocação daqueles que meritoriamente deverão ocupar o

lugar. Quem não era estatutário, não teria direito ao estatuto, isto é, os celetistas não

teriam estabilidade, mas ninguém iria exonera-lo.

O artigo 19 ainda vai além. Para limpar as lágrimas dessas crianças, se os servidores

resolverem fazer concurso, por desencargo de consciência, esse tempo de serviço

contará como título.

O artigo 19 do ADCT (Ato Das Disposições Constitucionais Transitórias) dá estabilidade

para aqueles que entraram na Administração Pública pela porta dos fundos.

Art. 19. Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das

fundações públicas, em exercício na data da promulgação da

Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não

tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37, da Constituição,

são considerados estáveis no serviço público.

§ 1º - O tempo de serviço dos servidores referidos neste artigo será

contado como título quando se submeterem a concurso para fins de

efetivação, na forma da lei.

§ 2º - O disposto neste artigo não se aplica aos ocupantes de cargos,

funções e empregos de confiança ou em comissão, nem aos que a lei

declare de livre exoneração, cujo tempo de serviço não será

Page 87: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 86

computado para os fins do "caput" deste artigo, exceto se se tratar de

servidor.

Em 1998 a atual secretária de educação do município do Rio de Janeiro (Cláudia Agostinho) era

a secretária de Administração Federal do Fernando Henrique. Ela fez um levantamento no

âmbito da União para descobrir quantos são os servidores que teriam menos de cinco anos,

não estando contemplados com os ingressos para o trem da alegria, e deveriam ser

exonerados.

Na época, ela encontrou 33.000 servidores nesta situação. Obviamente, ninguém foi

exonerado, afinal 33.000 servidores são 33.000 votos.

Para legitimar a situação, ele se vale da lei de responsabilidade fiscal. Nesta, os gastos com

pessoal não podem exceder 60% do orçamento. Como se gasta muito menos que 60% ainda

que se incluam esses 33.000, está dentro do limite de gasto com o pessoal, que a lei de

responsabilidade fiscal obriga.

Obviamente, ninguém foi mandado embora.

Essa situação gerou problemas na justiça do trabalho. Por exemplo, no município de Varre e

Sai o prefeito era muito amigo era muito amigo do vereador Quinzinho da pipoca. Este pediu

para o prefeito contratar o irmão dele Vinícius ‘’O feio’’, advogado para procuradoria do

município. Nosso exemplo é posterior a Constituição de 1988.

Mas, o prefeito que contratou Vinícius ‘’O feio’’ perdeu a eleição, ganhando a oposição. Este,

por sua vez, troca a procuradoria. Para estimular a saída, a prefeitura deixa Vinícius sem

salário. Após três meses Vinícius decide processar o município, na Justiça do Trabalho. Este

contrato é nulo, afinal não tem um pressuposto jurídico fundamental, ou seja, para trabalhar

na administração pública, na forma do artigo 37, §2° da Constituição Federal, tem que ter

Concurso Público.

Mas, a justiça do trabalho não entendeu o contrato como nulo. Afinal, a Constituição também

diz que é fundamento da República a valorização social do trabalho. Quem trabalha tem que

ter o reconhecimento ou a valorização social, embora o contrato fosse nulo.

O Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 363:

TST Enunciado nº 363 - Res. 97/2000, DJ 18.09.2000 - Republicação - DJ 13.10.2000 -

Republicação DJ 10.11.2000 - Nova Redação - Res. 111/2002, DJ 11.04.2002 - Nova redação -

Res. 121/2003, DJ 21.11.2003.

Contrato Nulo - Contratação de Servidor Público sem Concurso - Efeitos e Direitos

A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso

público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 87

pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas,

respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do

FGTS.

Editou ainda a Súmula 390, ainda sobre Direitos do Empregado Público.

Súmula nº 390 - TST - Res. 129/2005 - DJ 20, 22 e 25.04.2005 - Conversão das Orientações

Jurisprudenciais nºs 229 e 265 da SDI-1 e da Orientação Jurisprudencial nº 22 da SDI-2

Estabilidade - Celetista - Administração Direta, Autárquica ou Fundacional - Empregado de

Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista

I - O servidor público celetista da administração direta, autárquica ou fundacional é

beneficiário da estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988. (ex-OJ nº 265 da SDI-1 - Inserida

em 27.09.2002 e ex-OJ nº 22 da SDI-2 - Inserida em 20.09.00)

II - Ao empregado de empresa pública ou de sociedade de economia mista, ainda que admitido

mediante aprovação em concurso público, não é garantida a estabilidade prevista no art. 41 da

CF/1988. (ex-OJ nº 229 - Inserida em 20.06.2001)

Houve uma evolução grande da jurisprudência que passou pela exigência (baseado na teoria

dos motivos determinantes) de fundamentação para dispensa do empregado concursado

celetista.

Ainda há uma divergência em relação a isso. Alguns entendem que se a Sociedade de

Economia Mista e a Empresa Pública agem como se privado fosse, basta o pé na região

anatômica, sem dar satisfação a ninguém. Outros adotam a teoria dos motivos determinantes,

afirmando que a demissão tem que ser motivada. Claro que motivar não é nenhuma

dificuldade.

Page 89: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 88

Aula 09 – Direito do Trabalho I dia 07/05/2013

Esse rol apresentado é, na verdade, exemplificativo. São várias as relações especiais de

emprego, inclusive, o próprio advogado tem regras próprias, com legislação própria (O

Estatuto da Advocacia).

O artigo 20 do Estatuto da Advocacia determina que o advogado tenha a jornada de trabalho

(quando for empregado) de quatro horas por dia. O advogado empregado, salvo se tiver

dedicação exclusiva, a jornada salta de quatro para seis horas por dia. Assim, o advogado que

tenha dedicação exclusiva deveria trabalhar 6 horas, na sétima hora deveria receber adicional

de hora extra.

As empresas de advocacia resolveram esse problema criando a figura do advogado associado.

O advogado associado é aquele que não manda em ninguém, trabalha como qualquer um e

tem essa designação do cargo.

d) Empregados domésticos (Lei 5.859 de 1972).

A empregada doméstica é a evolução genética da chamada mucama. A mucama era a

escrava docilizada, que não se rebelava, e por isso poderia partilhar do convívio do

senhor e de sua família na casa grande.

Esse convívio privado demonstra a origem do empregado doméstico, inclusive a

origem da própria exclusão histórica do empregado doméstico em relação aos direitos

trabalhistas.

A rigor, culturalmente, se projetou esse preconceito que se mantém historicamente

com os negros e escravos em geral.

Esta é a origem. As mulheres tinham uma aproximação maior com a casa grande não

apenas para fins de realização das tarefas domésticas, mas também para sofrer as

consequências do intercurso sexual que peculiarmente marcou as origens miscigenais

brasileiras.

O reflexo disso é o de total ausência de reconhecimento de direitos, historicamente

falando. A empregada doméstica que existe desde a época colonial, só terá direitos

reconhecidos em 1972. Se considerar que a Consolidação das Leis do Trabalho é de

1943, nota-se que os direitos da empregada doméstica só foram ser reconhecidos 29

anos depois.

Em 1943, a regra do artigo 7°, alínea a) contempla a empregada doméstica justamente

para dizer que ela não tem direito nenhum. Afirma-se que a empregada doméstica não

tem nenhum daqueles direitos que serão admitidos para os trabalhadores em geral.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 89

Em 1972 quando se inauguram os direitos para a empregada doméstica, essas ainda

sim são pouquíssimos. Basicamente para inseri-la no sistema previdenciário, que é um

sistema contributivo. Assim, ele passaria a contribuir para a previdência social e em

contra partida gozaria de seus benefícios. Outro direito de suma importância é a

concessão de férias de 20 dias.

Em 1988 o rol de direitos da empregada doméstica amplia-se. Ao final do artigo 7°

insere-se um parágrafo único que destaca alguns poucos direitos para a empregada

doméstica. Assim, nem os direitos constitucionais integrais do trabalhador foram

reconhecidos em 1988, sendo reconhecidos apenas em 2013.

Nesta última PEC reconheceram os direitos individuais, presentes na Constituição, para

a empregada doméstica. Ainda não houve uma equiparação. Não está se atribuindo

todos os direitos da Consolidação das Leis do Trabalho para a empregada doméstica,

mas está se reconhecendo os direitos da Constituição que seriam para os

trabalhadores, também aplicados a empregada doméstica.

Enquanto antes, eram apenas alguns do artigo 7°, agora todos os direitos presentes

neste artigo estão assegurados. Não é a equiparação, mas já é um avanço. Ainda que

tenha sido feito de maneira bastante demagógica, pois a emenda constitucional

simplesmente suprime o parágrafo único do artigo 7°. A ilação que se faz disso é que o

empregado doméstico passa a ter todos os direitos do artigo 7° da Constituição

Federal.

Isto é um avanço em termos, pois pode se transformar em mais uma promessa não

cumprida, uma vez que os direitos estatuídos na Constituição (que são os principais

direitos do trabalhador), mas precisam ser detalhados, especificados. Como se ira

conseguir entregar esses direitos para a empregada doméstica levando em

consideração que o empregador doméstico é um empregador especial, diferente, que

não possui atividade econômica, não desenvolve atividade econômica, não gera

nenhuma atividade com fins lucrativos (tal como diz a lei do empregado doméstico).

A lei da empregada doméstica estabelece três características a respeito do que seja a

empregada doméstica.

Art. 1º Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de

natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito

residencial destas, aplica-se o disposto nesta lei.

Os três elementos caracterizadores são:

Serviço de natureza continua.

A lei não trata de serviço prestado de maneira não eventual, como a

Consolidação das Leis do Trabalho, mas vale-se de outra expressão: natureza

continua. Note para um bom filólogo, continuo, não habitual, não eventual,

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 90

possam guardar um grau de sinonímia, para o direito, quando o legislador se

vale de expressões diferentes, em geral ele quer designar coisas diferentes.

A natureza continua nesta hipótese exigiria uma frequência distinta da

reconhecida para a não eventualidade da frequência do artigo 3° da

Consolidação das Leis do Trabalho.

O empregado doméstico tem que reiterar sua prestação de serviço de forma

mais frequente que o empregado de forma geral.

Mesmo que o contrato de trabalho tenha duração de 15 anos, não se admitiria

uma frequência pequena. O celetista que trabalha uma vez por mês a 15 anos

pode verificar a habitualidade.

Já no empregado doméstico, a continuidade identifica uma necessidade de

reiteração desse trabalho.

É nesta reiteração que vem a questão da jurisprudência não sumulada, que é

entendimento de turma do Tribunal Superior do Trabalho que apresenta um

mínimo de três dias para caracterizar essa natureza continua. Só é empregado

quem trabalha no mínimo três dias na semana.

Assim, para maior parte da doutrina, natureza continua representa algo mais

frequente que serviço não eventual (artigo 3° da Consolidação das Leis do

Trabalho). Mas a lei não fala quanto. Temos apenas aquele entendimento de

uma das turmas do Tribunal Superior.

Presta Serviços de Finalidade Não Lucrativa.

Há dois problemas na redação do dispositivo. Serviço algum tem finalidade

lucrativa, a não ser o serviço que supostamente pode ser aquele prestado por

alguém que detenha os meios de produção.

Trabalhador não tem finalidade de lucro. Empregado muito menos. Ele tem a

finalidade de remuneração pelo seu trabalho. O que o empregado faz é obter

sua força de trabalho, obtendo a contraprestação onerosa. O empregado tem

o serviço caracterizado como oneroso, é o O do SHOP. Quem tem finalidade

lucrativa é o empregador.

Em síntese, empregado doméstico é o empregado que trabalha para

empregador que não tem finalidade lucrativa.

A finalidade lucrativa que caracteriza o empreendimento pela via da sociedade

empresária é uma meta que pode ser alcançada ou não. Está sempre

condicionada a uma série de variáveis concorrenciais, econômicas, que não

dependem simplesmente da vontade do dono do empreendimento ou dos

sócios da empresa.

Não é possível que a empregada doméstica seja desviada para uma atividade

econômica. Por exemplo, supondo que o empregador tenha uma padaria

localizada do outro lado da rua de sua residência. Em razão disto, ele diz que

sua empregada (Severina) deve recolher a primeira fornada de pães às 5 horas

da manha todos os dias e depois ela vai para casa trabalhar em seu expediente

normal.

Page 92: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 91

No momento que ela vai à padaria, ela desvirtua seu contrato de trabalho de

doméstica para um contrato de trabalho de natureza celetista. Aplica-se um

princípio do direito do trabalho. Alterou-se o contrato. A empregada foi

contratada como doméstica, mas na prática se exige serviço de alguém que

não é doméstico, mas sim celetista. Quem tem mais direitos é o celetista,

então se alterou o contrato estabelecendo uma situação mais benéfica, logo o

direito do trabalho vai ler esse contrato como de um celetista.

Outro exemplo seria a empregada que desenvolve a atividade de cozinhar, isso

é uma atividade de doméstica comum, mas que a empregadora valendo-se da

perícia que a empregada tem começa a comercializar os produtos culinários

que ela cria. Está se aproveitando da força de trabalho da empregada para

uma atividade econômica com finalidade lucrativa.

Trabalho realizado no âmbito residencial do empregador.

É necessário esclarecer o que é âmbito residencial. Não é a casa, nem o

domicílio civil. Âmbito residencial representa toda e qualquer tarefa realizada

no espaço da vida privada do empregador doméstico e de sua família.

É o que se faz no cotidiano. Por exemplo, jardineiro é empregado doméstico,

ainda que trabalhe do lado de fora da residência. Motorista particular idem.

Mas, se esse motorista particular servir não só ao seu empregador doméstico,

mas também começar a realizar tarefas concernentes a empresa que é titular

seu empregador doméstico, ele não será mais empregado doméstico,

passando a ser empregado celetista comum.

Outro exemplo é o caseiro, por exemplo, que fica na casa de veraneio do

empregador. O caseiro é empregado doméstico.

e) Atleta Jogador de Futebol (Lei 6.354 de 1976 e Lei 9.981 de 2000)

O jogador de futebol tem um contrato de tempo determinado, que serve para aferir a

condição física e técnica do jogador a cada lapso temporal. Então as condições são

estabelecidas em virtude do desempenho do atleta durante o período.

Se o jogador joga mal, é possível que o clube repactue aquele contrato em condições

menos favoráveis ao devedor, já se ele está jogando muito bem, isso propicia uma

recontratação em condições mais favoráveis. Existem várias peculiaridades: o contrato

é por tempo determinado, existe cláusula indenizatória (caso o contrato seja rompido

antes do determinado).

Page 93: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 92

f) Mãe Social (Lei 7.644 de 1987)

Parece mão de santo, mas não é. Presta serviço de assistência social em determinadas

instituições, sobretudo para órfãos que precisam dessa figura do adulto para uma

troca mais próxima de assistência afetiva psicológica ou social. Por exemplo, a

fundação casa.

Isso é muito importante, pois as experiências de desafeto ou não afeto causam um

grau de alienação a criança que para ela pouco importa matar ou morrer.

g) Aprendiz (Art. 428, Consolidação das Leis de Trabalho).

Está positivado no artigo 428 da Consolidação das Leis do Trabalho e é uma relação

especial de emprego em que o menor pode ser contratado.

Existe uma maioridade trabalhista definida pela Constituição, em seu artigo 7°, inciso

XXXIII estabelece que ninguém no país pode trabalhar com menos de 16 anos.38

Não se pode trabalhar com menos de 16 anos, pois para o projeto Constitucional

brasileiro, menores de 16 anos devem estar integralmente dedicados a sua formação

educacional e humana. A ideia é tão louvável quando distante da maioria dos jovens.

O aprendiz fica no artigo 428 que estabelece uma relação especial de emprego dos

maiores de 14 anos. Antigamente o contrato de aprendizagem era entre 14 e 18 anos.

Hoje em dia estenderam para 24 anos. Chama-se de menor aprendiz um galalau de 24

anos (é praticamente o reconhecimento da falência do sistema social do país).

Art. 428. Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por

escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao

maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de

aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu

desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e

diligência as tarefas necessárias a essa formação.

Nesta hipótese há uma possibilidade de trabalho para os menores de 16 anos ou

jovens até 24 anos, para que esse tipo de trabalho contribua no sentido da sua

formação técnica profissional.

38 Tentem ler isso sem rir

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 93

Essa formação deve ser metódica, assistida ou lastreada por algum tipo de

método/organização. Não é simplesmente colocar o aprendiz em qualquer lugar e

fazer qualquer coisa.

O aprendiz diz respeito à formação técnico profissional. O estagiário, que pode

confundir, diferentemente do aprendiz é necessariamente um estudante que cuida da

sua formação educacional. E como é formação educacional, é formação mais ampla do

que a técnica profissional. A técnica profissional está restrita a um tipo de saber

técnico de profissão tecnológica ou qualificação profissional. O saber educacional é

muito mais amplo, envolvendo formação cultural.

O objeto da aprendizagem é diferente do objeto do contrato de estágio. Nesta

primeira há vinculo de emprego, na segunda não. O sujeito menor aprendiz (além de

necessariamente estar dentro da faixa de idade, que não há essa exigência para o

estagiário) não se exige que ele esteja necessariamente na condição de estudante.

Mas, atualmente entende-se que ele tem que estar desenvolvendo algum tipo de

atividade educacional.

Relações de Trabalho Reguladas

a) Trabalhador Avulso (Art. 7º, inciso XXXIV, Constituição Federal/Lei)

É o portuário que está em uma relação que foi regulada também mais recentemente

de forma diferente. Antes o sindicato era muito poderoso, pois era um sindicato que

organizava as várias categorias profissionais que compõem esses agrupamentos

chamados de avulsos. São os trabalhadores da zona portuária.

Quando chega o navio em um porto, se tem uma dificuldade de encontrar no navio

quem é o empregador, pois a tripulação do navio é, por exemplo, tailandesa, a

bandeira é da Grécia, o capitão é inglês, o armador é francês, a carga é dos mais

variados lugares do mundo e vão se direcionar a mais variados sujeitos no Brasil. Fica

muito difícil de se identificar quem é o empregador, o responsável pela contratação

desses trabalhadores que fazem a carga e descarga desses navios. Por isso a relação é

especial.

É feita de maneira que se têm várias funções, desde o pessoal do bloco (faxina) até o

pessoal que orienta a atracagem do navio (práticos), que trabalham em um sistema de

rodizio. Quem organiza esse rodizio, historicamente era o sindicato. O rodizio era

chamado de parede.

Era um sindicato que tinha muita força, pois negociava com os interesses mais

variados. Essa influencia fez com que não fosse um sindicato que representasse tanta a

Page 95: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 94

categoria, mas representasse os interesses de uma diretoria que se perpetuava em

cada porto do Brasil. Criaram-se dinastias no sindicato de portuários. Existiam uma

infinidade de problemas.

A lei 8.630 de 1993 veio romper com essa organização pelo sindicato e criou-se uma

instituição chamada Órgão Gestor de Mão-de-obra. Este órgão tem composição

paritária. O Sindicato dos Trabalhadores faz parte da composição do órgão, mas não

está mais sozinho. Ali se tem o operador portuário, o interesse das empresas e todos

representados nesse conselho que é o Órgão Gestor de mão-de-obra.

Assim, nesta hipótese tem-se a questão de que o empregador não vai ser definido,

logo receberá os recursos dessa operação do operador portuário e fará o pagamento

dos direitos trabalhistas para os trabalhadores portuários, que são autônomos,

eventuais ou guardam algum tipo de autonomia (a maioria não tem autonomia), mas

não tem habitualidade, e por isso não se tem relação de emprego.

Embora não tenham relação de emprego a Constituição no artigo 7°, inciso XXXIV,

determina a equiparação de direitos entre os empregados e os trabalhadores avulsos.

Embora seja uma relação de trabalho, eles têm todos os direitos trabalhistas.

A Constituição reconheceu que dada a hipossuficiência (vulnerabilidade) desses

trabalhadores, embora eles não tenham os elementos da relação de emprego, eles

necessitam da proteção social do direito do trabalho.

A Constituição entrega para eles essa proteção social, os direitos trabalhistas. Essa

concessão abre perspectiva para uma concessão necessária no direito do trabalho.

De cada cinco trabalhadores, apenas dois são empregados formalizados. Existe uma

série de trabalhadores que necessitam de proteção social e não dispõem destas.

Em 2004 ocorreu uma transformação relacionada a esse fenômeno. Foi a Emenda

Constitucional 45, que é a reforma do judiciário. Esta, ampliou a competência da

justiça do trabalho, em termos processuais, para processar e julgar não só os conflitos

oriundos da relação de emprego como tradicionalmente fazia, mas também para

processar e julgar os conflitos oriundos das relações de trabalho. Quais relações de

trabalho? Todas a exceção dos servidores públicos estatutários, na forma do artigo

114, inciso I da Constituição Federal.

Há quem questione que não faz o menor sentido a justiça do trabalho julgar relações

como a do prestador de serviços, do profissional liberal, aplicando sobre essa relação o

direito civil ou eventualmente o direito do consumidor, pois o prestador de serviços de

acordo com o código de defesa do consumidor é fornecedor. Então é possível

encontrar o vício da prestação do serviço assim como um vício da comercialização do

próprio produto.

O tomador do serviço desse profissional liberal toma esse serviço como destinatário

final, na maior parte das vezes.

Page 96: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 95

Então todas as relações de trabalho, com a emenda 2004, passaram a competência da

justiça do trabalho.

A ideia da reforma era que criassem relações de direito material, onde relações de

trabalho recebessem direitos trabalhistas.

b) Estagiário (Lei 11.788 de 2008)

O Estagiário (pela lei) é necessariamente

estudante, não existe estagiário que não

seja estudante. A lei diz que o estagiário

tem que ser estudante matriculado no

ensino médio, superior, especial e

fundamental. Assim, admite-se como

estagiário, se nos últimos dois anos ele

estiver matriculado na modalidade

profissional de jovens e adulto. Definira

os tipos de atividade educacional que ele

tem que ter para se qualificar como

estudante.

O estágio é ato educativo supervisionado pela escola ou pela academia. O estágio

torna-se parte integrante do processo pedagógico dessas instituições como escola ou

academia (faculdade/universidade). Visa à preparação para o trabalho produtivo de

educandos e o aprendizado de competências objetivando o desenvolvimento do

educando para o trabalho e para a vida cidadã.

O estágio é definido pela instituição de ensino como requisito para aprovação no curso

como estágio obrigatório ou mera complementação da carga horária (não obrigatório).

Visa o aperfeiçoamento ou complementação da formação acadêmica ou profissional

do estudante por meio de aprendizagem social, profissional e cultural.

O estagiário deve participar em situações reais de vida e de trabalho. Essa inserção é

que vai contribuir para o processo educacional do estagiário.

Estagiário tem Subordinação, Habitualidade, Onerosidade e Pessoalidade. E se estão

presentes todos os elementos da relação de emprego, porque não é uma? Porque a lei

não quer que seja . E para não ser relação de emprego, a lei ficou ainda mais clara

em relação a isso (afinal é muito fácil caracterizar como relação de emprego), existem

quatro requisitos que devem ser respeitados, se não o forem ter-se-á caracterizada a

relação de emprego.

Page 97: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 96

A lei exige em seu artigo terceiro os requisitos:

Matrícula e frequência regular do educando em curso de educação superior,

profissional, de ensino médio, de educação especial e nos anos finais do

ensino fundamental na modalidade de educação de jovens e adultos.

Celebração de acordo de compromisso entre o educando, a parte concedente

do estágio, e a instituição de ensino.

Compatibilidade entre as atividades desenvolvidas no estágio e aquelas

prevista no termo de compromisso. Termo de compromisso este que deve vir

com um plano de atividades do estágio em anexo. Esse plano de atividades do

estágio deve estar compatível com as atividades previstas no termo de

compromisso.

Cumprimento dos demais requisitos legais. Este requisito encontra-se no

artigo 15. Vale dizer que se descumprido qualquer requisito legal da lei 11.788,

retira-se a possibilidade de afirmar que a relação é de estágio.

a. Sujeitos da Relação de Estágio

São três: a Instituição de ensino (que antes era mero interveniente, agora é

parte na relação), a parte concedente e o estagiário. Isso significa que se

passou a atribuir a instituição de ensino à obrigação de fiscalizar essa relação.

Poderia ainda a instituição de ensino ir in loco, para verificar quais são as

condições que o estagiário está estagiando.

A instituição de Ensino além de celebrar o contrato, ela avalia as instalações da

concedente, e a sua adequação a formação do estagiário, comunica à

concedente o calendário letivo e a data das avaliações, indica um orientador

que avalia as atividades do estagiário e exige do estagiário relatório periódico.

A parte concedente de estágio é tanto pessoa jurídica de direito privado

quanto público, como profissionais liberais registrados em sua instituição de

classe. O advogado que não tenha escritório, também pode ter estagiário, e

com isso reproduzir o ciclo cármico de liberação dos seus próprios recalques.

b. Direitos do Estagiário

Jornada de trabalho de 4 horas por dia totalizando 20 horas semanais, se for o

caso de ensino profissional, fundamental, especial. 6 horas diárias ou 30 horas

semanais se for o caso de ensino superior. E até 40 horas semanais para cursos

não presenciais com previsão no projeto pedagógico.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 97

Avaliações periódicas e finais reduzem a jornada ao menos pela metade. O

prazo do contrato é de até dois anos e a bolsa é facultativa para o estágio

obrigatório. Recesso de 30 dias ao ano e remunerado, caso haja bolsa

(novidade de 2008), gozados preferencialmente coincidindo com as férias

escolares.

Quanto à saúde e segurança as regras trabalhistas são todas aplicadas,

inclusive a obrigação de contratar seguro de vida para estagiário.

Pelo estatuto da advocacia o estagiário não pode fazer absolutamente nada

sozinho, sob pena desta infração ser registrada na OAB e ele jamais poder

pegar a carteira. Ele não pode realizar nada sozinho porque a responsabilidade

é sempre do advogado. Este é o profissional e é este que será

responsabilizado.

c) Trabalhador Voluntário (Lei 9.608 de 1998)

Quem fizer trabalho voluntário é bom que veja a lei 9.608 de 1998. É o trabalho que

não tem onerosidade, não tem intenção onerosa. O intuito é altruístico.

d) Pequeno Empreiteiro/Artífice (Art. 625, alínea ‘’a’’, Consolidação das Leis do

Trabalho).

e) Autônomo

É aquele que não tem subordinação. Existem uma infinidade de relações jurídicas de

direito comercial, empresarial, civil e outros ramos, em que o trabalhador é autônomo.

a. Prestador de Serviços (art. 593 a 609 do Código Civil).

b. Empreiteiro (art. 610 a 620 do Código Civil).

c. Representante Comercial (Lei 4.88/1965).

Page 99: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 98

Aula 10 – Direito do Trabalho I dia 09/05/2013

Sujeitos da Relação de emprego

Empregador

Legislação Aplicável

O artigo 2° da Consolidação das Leis do Trabalho, afirma que considera-se empregador a

empresa, individual ou coletiva que assumindo os riscos do negócio, da atividade econômica,

admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços.

Além do artigo 2° da Consolidação das Leis do Trabalho, o artigo 3° da lei 5.889 de 1973 define

o empregador rural, o qual foi fartamente definido.

Há ainda o artigo 15, §1° da lei 8.036 de 1990 (FGTS) diz que entende-se por empregador a

pessoa física ou jurídica de direito privado ou público, que admitir trabalhadores a seu serviço

ou figurar como fornecedor ou tomador de mão-de-obra, independente da responsabilidade

solidária ou subsidiária que eventualmente venha a obrigar-se.

Essa definição encontra-se na lei do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e é um

tanto quanto abrangente, que não se irá entrar agora para não confundir, sobretudo será vista

a terceirização a qual a lei faz menção mais adiante, de forma separada, como forma mais

específica de contratação. Modalidade especial e exceptiva de contratação.

Por enquanto, ficar-se-á com o caput do artigo 2° da CLT:

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos

da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

O empregador é definido em termos econômicos pela CLT (não há uma designação

tipicamente jurídica). Em termos jurídicos, o empregador seria a pessoa física ou jurídica, mas

a CLT não quis assim definir. O empregador é a empresa, mas não disse que é a pessoa física

ou jurídica que se mantém no polo passivo da relação empregatícia.

A Consolidação das Leis do Trabalho fez isso deliberadamente, de propósito. Quis o legislador

vincular a definição a esse conceito meta jurídico econômico de empresa, pois foi estuário de

uma série de concepções teóricas que vigorou ao longo do século XIX que podem ser reunidas

sob o nome de corporativismo.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 99

Doutrinas Corporativistas

São várias as teorias corporativistas, de diferente matérias (alguns mais autoritários e outros

mais democráticos), mas o que as une aparecendo como um denominador comum entre todas

as teorias, é a ideia de que classe trabalhadora e classe empresarial (burguesia e proletariado)

são como órgãos distintos do mesmo corpo social (nacional).

Como órgãos do mesmo organismo atuam em harmonia, em colaboração, conjugação, um

com o outro. As teses corporativistas contrariam o postulado socialista de luta de classes.

Ao adentrar-se a filosofia, observa-se que há duas grandes linhas a respeito do metabolismo,

da vida social. Existem aqueles que acreditam que a sociedade se desenvolve de forma

dinâmica, mas tendendo sempre ao consenso. Existem outras teorias (é uma tradição filosófica

bastante extensa) dizendo que as sociedades tem seu movimento sempre no sentido de

ruptura, luta entre setores sociais e de ruptura.

As teorias corporativistas todas se agregam dentro da compreensão de que a sociedade

tendem ao consenso. Diferente daquelas teorias/filosofias que entendem que a sociedade

tendem ao conflito, e não ao consenso.

De toda maneira, já se ouviu falar na frase do Leon Duguit: ‘’quando o direito dá às costas a

realidade, a realidade se vinga e dá as costas para o direito’’. A consequência é que o direito

não vive sem a realidade, mas a realidade vive sem o direito.

Leon Duguit fez parte de um conjunto de doutrinadores que estabeleceram a empresa a partir

da teoria do engajamento (teoria do ato condição). O empregado se engajaria na empresa não

como um negócio jurídico dependente da vontade, mas como um ato jurídico (condição) que

se vale de dispositivos de ordem pública preexistentes.

A teoria que vingou foi a de Maurício Bauriu. Esta defende que a relação jurídica de emprego

repousa na instituição empresa, com a ideia de empreendimento comum aos homens que nele

se incorporam a estrutura hierárquica fundada nos propósitos supra individuais da instituição.

É interessante observar que essas ideias são do século XIX, mas serão revalorizadas no século

XXI, com o modelo Toyotista de métodos de produção essas ideais corporativistas voltam a

tona.

Page 101: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 100

O movimento de empresariarização39 consistem nas empresas transformarem o trabalhador

no empresário, em um colaborador, mais um participante autônomo do processo de

realização do empreendimento.

Por exemplo, o escritório de advocacia tem a figura do associado. São eufemismos para se

tentar, sob o ponto de vista ideológico convencer o trabalhador de que ele não é um simples

trabalhador. Como se o cargo ou essas designações tivessem um condão de transformar a

realidade.

Os modelos de produção toyotistas capturam mais a subjetividade do trabalhador do que os

métodos fordistas do século XX. O recurso ideológico utilizado é o corporativismo, entendendo

a empresa como uma instituição da qual o empregado faz parte integrante. A empresa40 faz

parte da vida do trabalhador. Por exemplo, o trabalhador chega na empresa e faz Tai Chi

Chuan no primeiro horário, depois realiza uma dinâmica de grupo para saber quais são os

problemas fundamentais do setor de trabalho. Feito isso, ele começa a produzir, para depois

ter um horário no qual terá outra dinâmica (sobre como inovar na produção, por exemplo).

O trabalhador concorrerá não apenas com seu trabalho especializado, mas contribui com suas

ideias para melhoria dos fluxos empresariais, do processo de inovação de produtos,

resultados, enfim, concorre para que com sua subjetividade, intelectualidade, a empresa passe

a se desenvolver. Obviamente, tudo isso é realizado em uma ambiência de que ele faz parte

dessa empresa.

Essas ideias já estavam presentes na designação da natureza jurídica do empregador como

instituição.

Quando a Consolidação das Leis do Trabalho foi criada a Comissão de Notáveis designada por

Getúlio Vargas para criar a CLT estava dividida. Tinha alguns corporativistas dentro da

concepção institucionalista, inclusive o presidente da comissão e alguns outros,

contratualistas, que não queriam ver essa relação jurídica pautada dentro dessa integração do

trabalhador na empresa, mas queria verificar um distanciamento jurídico, colocando a relação

entre pessoas jurídicas, à Pessoa Física do empregado e a Pessoa Física ou Jurídica do

empregador, em termos contratuais.

No final das contas a Consolidação das Leis do Trabalho conseguiu congregar as duas teses,

tanto as dos institucionalistas quanto a dos contratualistas. No caput do artigo 2° se tem a

consagração da tese institucionalista identificando o empregador com a empresa. Empresa

não é pessoa física ou a pessoa jurídica.

Empresa é uma organização de fatores de produção tendo em vista uma finalidade econômica.

Empresa é o empreendimento, é a atividade econômica em si. É uma atividade econômica

orgânica que transparece por meio de uma unidade de fatores de produção. A força de

trabalho é mais um fator de produção que se coaduna com demais outros fatores de produção

(local da prestação do serviço, maquinário, a marca, as patentes), enfim, todo esse conjunto

de propriedades materiais e imateriais, organicamente situados na unidade, faz com que se

39

Neologismo 40

O Zaibatus japonês.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 101

gere a empresa. A empresa é essa dinâmica, esta movimentação econômica que tem por fim

gerar e acumular capital. Gerar capital que é acumulado por seus proprietários.

Essas reuniões dos fatores produtivos fazem desenvolver as forças produtivas. O capitalismo

como em nenhum outro sistema desenvolveu as forças produtivas e, inclusive, para que esse

desenvolvimento das forças produtivas fosse possível, desenvolveu a tecnologia e a ciência. O

Cientificismo do século XIX caminha com o desenvolvimento das técnicas de produção.

Atualmente, quando se fala em robótica, em nanotecnologia, todos esses processos de ponta

da tecnologia estão diretamente vinculados a processos de produção de bens ou serviços.

Estão inseridos neste patamar de bens de produção.

Isso foi desenvolvimento do capitalismo, de forma sem precedentes. O problema é que o

resultado deste desenvolvimento das forças produtivas em termos de riqueza e conhecimento

é apropriado privadamente. Muitos ainda falam, (tirando o problema ecológico, pois é um

problema transnacional, não pode ser resolvido no âmbito do Estado Nacional), sobretudo os

neoliberais, que não há recursos naturais para suprir a subsistência de certo número de

pessoas na sociedade.

É conhecida a teoria de Thomas Malthus, que defendia que enquanto a população crescia em

progressão geométrica, a produção de alimentos crescia em progressão aritmética.

Atualmente, há quem defenda um neomalthusianismo e afirmam que não há condição dos

bens materiais suprirem a vida humana na terra. A consequência lógica é que haverá sempre

em todas as sociedades escassez e, inclusive, algumas sociedades inteiras serão consideradas

excluídas. Basta observar o continente africano, como exemplo simbólico dessa exclusão

mundial.

O que é omitido deliberadamente é que o capitalismo já superou este problema malthusiano.

A produção de bens e serviços que supram a vida humana em razão do incremento

tecnológico que se chegou, permite que se suscite vida material no deserto mais inóspito do

planeta. Assim, não haveria um problema de escassez no sentido de que inexoravelmente

haverá excluídos. O problema da exclusão não é este, mas que esses bens da vida se

convertem no capitalismo em mercadoria e, portanto, possuem um preço. Esse sim é o fator

de exclusão, pois nem todos conseguem pagar este preço.

O problema de desequilíbrio social, desigualdade social, é menos um problema da natureza,

como quer fazer crer o neoliberalismo, mas um problema de distribuição de bens, riqueza,

conhecimento, enfim, todos os bens e serviços que suprem a vida material.

Os institucionalistas irão apresentar a ideia de que o trabalhador se insere na empresa.

Deixando de lado todo o aspecto ideológico, de que o trabalhador se integra voluntariamente

a essa dinâmica e isto lhe trás felicidade, pois ele se acha também um empresário. Por

exemplo, o lema do era ‘’venha colaborar com o senhor Walton41, e por isso o

funcionário deve fazer horas extras e não exigir a remuneração pelas mesmas. É a precarização

da precarização.

41

Falecido ex-presidente da rede Walmart, Samuel Robson Walton.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 102

Existe um documentário chamado ‘’O custo alto do baixo preço’’ (2005) sobre o

que mostra sua política empresarial, ela pega o que há de ruim no Toyotismo com o que há de

pior no fordismo. Eles conseguem combinar as políticas e colocar na empresa.

O trabalhador da não consegue pagar plano de saúde. Ele fica no dilema entre

comprar a comida mensal ou pagar o plano de saúde. Nos Estados Unidos 35% da população é

excluída do direito a saúde. O atual programa de governo do presidente Barack Obama é a

realização de políticas públicas e, em virtude disto, foi chamado de bolchevique.

Essa integração entre trabalhador dando o suor e a empresa retribuindo com remuneração,

para fins de direito é muito importante.

Ao se entender essa relação, se entende o que é empregador, grupo econômico, sucessão de

empresas, compreende-se como se dá o contrato de trabalho e a responsabilidade trabalhista

de uma forma geral. É mais importante compreender essa dinâmica que os próprios institutos

(empregador, grupo econômico e sucessão de empresa), afinal é ela que os funda.

A dinâmica é uma relação de troca e, portanto, o trabalhador dessa relação vende a sua força

de trabalho. A doutrina irá dizer que ele não vende a força de trabalho, que não é uma relação

de troca mercantil, pois isso seria uma degradação muito grande da degradação humana e da

dignidade humana do trabalhador.

Mas, ipso facto, o que acontece é a venda da força de trabalho para o empregador. O

trabalhador vende sua energia imaterial, que é a força de trabalho. Sua força de trabalho

braçal, intelectual, e etc.

É essa energia imaterial que ele entrega para o empregador em troca de uma remuneração e

do pagamento dos direitos trabalhistas.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 103

A mágica do sistema está que essa energia de trabalho, quando se incorpora a este

empreendimento, quando se congrega com os demais fatores de produção, se transforma em

mais dinheiro. O trabalho valoriza o empreendimento econômico, traz mais valor para o

empreendimento econômico. Em troca dessa força de trabalho o empregador paga o salário e

os demais direitos trabalhistas.

As obrigações prestacionais principais no contrato de trabalho é trabalhar (do empregado) e a

obrigação principal que responde reciprocamente ao trabalho é o pagamento do salário

(empregador). Essas obrigações são pressupostamente (reciprocamente) condicionadas. Se a

empresa não paga o salário o trabalhador não precisa trabalhar. Se o trabalhador não trabalha,

a empresa não é obrigada a pagar. Há um condicionamento recíproco nesta relação.

Essa é à base do sinalagma da relação contratual. Aqui já se entende a relação contratual como

se entende a relação material. As outras obrigações trabalhistas são acessórias, tanto do

empregador quanto do empregado.

Por outro lado, a lógica do direito do trabalho aponta no sentido de que aquela pessoa,

entidade que se beneficiou, se valorizou através da força de trabalho alheia, é sempre (em

regra) o responsável para pagar o salário e os direitos trabalhistas. Essa é à base da

responsabilidade trabalhista. O responsável trabalhista é o empregador, porque ele ou seu

empreendimento foi beneficiado (valorizado) pela força de trabalho do empregado.

Todo aquele que se beneficia diretamente pela força de trabalho do trabalhador é sempre o

apontado como sendo o responsável pelo cumprimento das obrigações trabalhistas dentro

dessas obrigações a principal é pagar salário. Isso será muito importante quando se estudar

terceirização.

Empresa

Universalidade de pessoas e bens organizados em vista de um determinado fim econômico. A

empresa se distingue do estabelecimento. O estabelecimento é um conjunto de bens

corpóreos e incorpóreos que instrumentalizam a empresa formando uma unidade técnica,

econômica e produtiva. Uma unidade destacável. O estabelecimento é uma fração unitária de

um todo orgânico empresarial. É um pedaço destacável da empresa.

Em termos práticos, o estabelecimento será visualizado rapidamente em uma filial. A filial é

uma unidade autônoma. A filial de uma empresa é um estabelecimento. Uma sucursal, se ela

for autônoma econômico produtiva é um estabelecimento.

A doutrina gosta de fazer essa distinção, pois às vezes é possível alienar um pedaço da

empresa sem que a empresa deixe de existir. O empreendimento continua, apenas a filial de

número 29 foi extraída deste empreendimento principal.

Em virtude desta identificação do empregador com a empresa, que a CLT faz no caput, do

artigo 2°, em relação ao empregador, não existe pessoalidade. Esta existe apenas a respeito do

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empregado. Aquela ideia da obrigação infungível em virtude de que a força de trabalho é um

elemento inexoravelmente extraído da pessoa humana do trabalhador, não se aplica ao

empregador.

No que tange a empresa não existe pessoalidade. Isso permite que com muito mais facilidade

se proceda à desconsideração da personalidade jurídica. Está previsto em uma série de

diplomas legais, mas usa-se com mais frequência o artigo 28 do Código de Defesa do

Consumidor, pois é definidor dos termos mais abrangentes no que concerne a

desconsideração da personalidade jurídica, bastando substituir a expressão Direito do

Consumidor por Direito do Trabalho.

Ou seja, sempre que essa personalidade jurídica apareça como um óbice para o cumprimento

dos direitos trabalhistas será procedida à desconsideração dessa personalidade jurídica.

Assim, no Direito do Trabalho, com muito mais facilidade é feita a desconsideração da

personalidade jurídica.

A diferença entre desconsideração da Pessoa Jurídica e da Personalidade Jurídica.

A desconsideração da personalidade jurídica não se confunde com despersonalização da

pessoa jurídica. Esta é feita pela fiscalização do trabalho naquelas hipóteses de fraude a

pessoalidade. Para se fraudar o elemento da pessoalidade o tomador do serviço pede (ou

exige) do trabalhador a criação de uma Pessoa Jurídica, no sistema fraudulento (prática

fraudulenta) denominada ‘’pejotização’’42.

Nas hipóteses de pejotização, o judiciário trabalhista, a fiscalização do trabalho ou ainda o

Ministério Público do Trabalho desconsideram não a personalidade jurídica43 (criada pelos

empregados com intuito de fraudar a lei), mas desconsideram a pessoa jurídica para fins de

caracterização de relação empregatícia.

Quando o fiscal chega à empresa e identifica o número de, por exemplo, 100 trabalhadores, e

solicita o livro de registro desses empregados. Mas, o empregador se defende afirmando que

naquela empresa não tem empregados, nem registros, afinal, nenhum deles são empregados,

todos são pessoas jurídicas prestando serviços para o empregador.

O fiscal do trabalho, curioso com esse fato (uma empresa que não tem empregados, apenas

empresas trabalhando para ela), entrevista os trabalhadores, percebendo que o serviço é

prestado de forma infungível. Todo dia, quem vai a empresa trabalhar são as mesmas pessoas,

para fazer o mesmo tipo de trabalho. Ora, o fiscal rapidamente perceberá que há

pessoalidade. Se também houver habitualidade, onerosidade e subordinação, não haverá uma

relação empresarial. Esta empresa é uma anteposição fraudulenta daquilo que de fato deveria

se caracterizar, que é uma relação de emprego.

42

A prática fraudulenta é exaurida na página 53. 43

A desconsideração da personalidade é apenas para fins de execução.

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Em face de tudo isso, o fiscal do trabalho desconsidera essa pessoa jurídica. Para o fiscal do

trabalho essa pessoa jurídica do trabalhador não existe, e deverá multar a empresa por não

ter registrado os trabalhadores.

Assim, existe essa diferença entre a Desconsideração da Pessoa Jurídica e a Desconsideração

da Personalidade Jurídica.

Quando o juiz desconsidera a personalidade jurídica, ele não declara a inexistência da pessoa

jurídica. Esta continua funcionando para todos os efeitos, apenas que naquele processo para a

execução, ao invés dele executar os bens da empresa, ele irá diretamente no patrimônio dos

sócios. Por isso ele desconsidera a personalidade jurídica. Completamente diferente a

Desconsideração da Pessoa Jurídica. Nesta hipótese não se desconsidera a personalidade, mas

a própria pessoa jurídica.

Não existe essa pessoa jurídica, ela foi criada abstratamente para fraudar a relação de

emprego. Quem permite essa desconsideração é o artigo 9° da Consolidação das Leis do

Trabalho.

Art. 9º - Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar,

impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.

Qualquer meio para fraudar o direito do trabalho, será considerado nulo. Assim, não se

considera a existência daquela pessoa jurídica.

O afastamento do Direito do Trabalho não é uma questão passível de discussão. Ou seja, não

depende da vontade do empregado ou do empregador que tipo de relação jurídica eles irão

empreender. A ordem jurídica deixa claro que se há SHOP há relação de emprego. Essa não é

uma questão sujeita a deliberação das partes. Trata-se de uma questão objetivamente

resolvida, assim sendo, se existir SHOP, haverá relação de emprego.

Além disso, dada à natureza de ordem pública das normas trabalhistas, elas se impõem

imperativamente para além da vontade do titular do próprio direito. Assim, ainda que o

trabalhador perceba que é melhor ele ganhar R$ 1.500,00 sem ter a carteira assinada do que

ganhar 900,00 com a carteira assinada, isto não estará sujeito a sua vontade.

A empresa e a proibição de assunção de riscos por parte do trabalhador

O empregador que se beneficia da força de trabalho é obrigado a pagar as obrigações

trabalhistas e a assumir os riscos da sua própria atividade econômica. Qualquer

empreendimento econômico está sujeito a uma concorrência interempresarial ou capitalista,

do que resulta seu sucesso ou fracasso. A probabilidade de fracasso é maior que a de sucesso.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 106

O sucesso e o fracasso são resultados que se destinam apenas aos titulares, representantes da

empresa, não sendo possível transferir o risco da atividade econômica para o trabalhador.

Dos empregadores que não são Pessoa Jurídica.

O artigo 2°, no parágrafo 1° repara uma caracterização que decorre da realidade dos fatos. Por

exemplo, a relação de empregou estruturou-se com base na relação daquele trabalhador com

a empresa. Em virtude disto, observa-se ainda uma série de institutos do direito do trabalho

sendo criados tendo por base esta identificação: empregador/empresa.

Porém, no âmbito da realidade fática nem todo empregador (nem todo mundo que contrata

trabalho alheio) dentro das características do SHOP é empresa. Nem todos empregadores

congregam fatores de produção com objetivo de lucro, para desenvolver algum tipo de

atividade econômica, sendo possível, inclusive, que o empregador seja pessoa física, que não

desenvolva atividade econômica44.

Por outro lado, também existem pessoas jurídicas que tampouco possuem ou desenvolvem

atividades econômicas, por exemplo, as associações sem fins lucrativos (ONGs, Associações

Beneficentes). Existem uma série de formalizações de Pessoas Jurídicas que não contém

nenhum tipo de finalidade econômica ou, pelo menos, não contém em seu objeto o objetivo

de aferir lucro.

Os profissionais liberais não caracterizados como Pessoa Jurídica, embora tenham resultado

econômico, também se valem de trabalhadores e não desenvolvem atividade econômica nos

termos do parágrafo primeiro, artigo 2° da Consolidação das Leis do Trabalho.

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que,

assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a

prestação pessoal de serviço.

§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de

emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as

associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que

admitirem trabalhadores como empregados.

Assim, equiparam-se ao empregador todas essas figuras que não tem atividade lucrativa.

Também são empregadores quando contratam trabalhadores com os requisitos da relação de

emprego.

44

Exemplo clássico, o empregador doméstico.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 107

A rigor, o entendimento correto não seria de uma equiparação, mas seriam tão empregadores

quanto os outros. Em última análise é empregador todo aquele que contrata trabalhador com

subordinação, habitualidade, onerosidade e pessoalidade.

Grupo Econômico

O parágrafo segundo, do artigo segundo da Consolidação apresenta uma modalidade

empresarial de associação interempresarial que suscita um instituto próprio no direito do

trabalho, que é chamado grupo econômico.

§ 2º - Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas,

personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou

administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de

qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de

emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das

subordinadas.

O primeiro passo é entender o que é um grupo econômico. Por exemplo, temos a empresa A,B

e C, todas com personalidade jurídica independente. Elas se coadunam através de uma figura

de Direito Comercial formalizada como, por exemplo, o consórcio de sociedades, mais

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 108

conhecido como holding, aonde há uma empresa que subordina as demais. Coordena

econômica, financeiramente, contabilmente e, às vezes, até tecnicamente das demais.

Pode ainda que a vinculação seja econômica, mas não formal ou, pelo menos, sem essa

subordinação. O parágrafo 2° refere-se exclusivamente a figura do holding, ou seja, da

empresa controladora (subordinante) e das empresas controladas subordinadas.

O grupo econômico trabalhista tal como preconizado pela jurisprudência e pela doutrina, não

se restringe a figura da holding (consórcio de sociedades). Tem-se o grupo econômico sempre

que duas empresas se colidam, se reúnam para algum tipo de atividade econômica comum.

Não é necessário que elas desenvolvam o mesmo tipo de atividade econômica, mas que o

resultado das atividades de cada uma se entrelace de alguma forma. Pode ser o resultado

financeiro, econômico, não importa, mas devem se consorciar.

Então os grupos econômicos para fins do Direito do Trabalho podem aparecer sob a forma de

subordinação de algumas empresas para outra ou de coordenação. Isto não é uma

terceirização. O resultado econômico não é uma prestação de serviços por parte de uma delas.

No grupo econômico há uma counião, uma cooperação entre atividades econômicas, distintas

ou não. Sempre que houver essa integração empresarial45, ou seja, qualquer vinculação

associativa econômica entre essas empresas caracteriza, portanto, o grupo econômico para

fins de direito do trabalho.

Consequência da constituição de grupo econômico no direito do trabalho.

Se essas empresas que atuam de forma subordinada ou coordenada estão integradas

economicamente, considera-se cada uma dessas Pessoas Jurídicas como se fizesse parte da

mesma empresa, do mesmo empreendimento.

Se é apenas um empreendimento, não importa se haverá direta ou indiretamente

solidariedade passiva trabalhista. Se o trabalhador da empresa A (teve sua carteira assinada

pela empresa A) não recebe o adicional de horas extras, seu décimo terceiro ou direitos

trabalhistas. Esse crédito trabalhista em favor do trabalhador pode ser exigido de quaisquer

empresas pertencentes ao grupo econômico. Pois, subsiste uma solidariedade passiva

trabalhista entre as empresas do grupo econômico, isto é, o estabelecimento de uma

vinculação creditícia sem hierarquia, são codevedores.

Assim, pode o trabalhador reclamar contra todas, algumas, o credor trabalhista pode escolher

contra aquele que terá maior probabilidade de quem ele irá exigir seu crédito trabalhista.

Em síntese, o grupo econômico referenciado pelo parágrafo segundo do artigo 2° é um

mecanismo que serve para facilitar a vida do trabalhador, a obtenção do crédito trabalhista,

45

Em termos de Direito Empresarial essa integração pode se vislumbrar através dos mecanismos de concentração empresarial (fusão, cisão, incorporação).

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 109

criando uma solidariedade trabalhista entre empresas que pertençam ao mesmo grupo

econômico.

Se essas distintas Pessoas Jurídicas são congregadas em uma única atividade empreendedora,

econômica, é a atividade econômica que deve pagar os direitos trabalhistas.

O empresário Antônio Ermírio de Moraes é presidente do grupo econômico .

Este grupo econômico tem várias empresas, de diferentes atividades46, que estão

subordinadas em um consórcio de empresas, em um holding. Existe uma sociedade

controladora e outras controladas. Se um trabalhador da empresa Votorantim Metais que não

recebeu direitos trabalhistas pode processa quaisquer outras empresas do Grupo Votorantim

que deverão responder pela dívida trabalhista. Cabe direito de regresso entre as empresas.

Tese do Empregador Único (Súmula 129 do Tribunal Superior do Trabalho)

Em relação a grupo econômico há um desdobramento teórico da tese da solidariedade passiva

que está na lei, cristalizada na súmula 129 do Tribunal Superior do Trabalho, geradora da tese

do empregador único.

TST Enunciado nº 129 - RA 26/1982, DJ 04.05.1982 - Mantida - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e

21.11.2003

Prestação de Serviços - Empresas do Mesmo Grupo Econômico - Contrato de Trabalho

A prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo econômico, durante a

mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de

trabalho, salvo ajuste em contrário.

O exemplo clássico seria a doméstica que presta serviços para diferentes membros da família.

Poder-se-ia questionar se, uma vez que compatíveis às jornadas, haveria vários contratos de

trabalho. Sim, haveria vários contratos de trabalho, pois quando se percebem os elementos da

relação de emprego (SHOP), não há exclusividade. O empregado não é, necessariamente,

exclusivo do empregador para ser empregado deste.

Assim, não compõe requisito da relação de emprego a exclusividade, de maneira que se ele

pode compatibilizar a sua jornada de trabalho em vários empregadores diferentes ele terá

diferentes vínculos empregatícios.

46

Por exemplo, a Votorantim Metais (VM) que trabalha com alumínio, a empresa Fibria, formada a partir da empresa Votorantim Celulose e Papeis, a empresa de cimento (Cimento Rio Branco S.A. e EngeMix), instituição financeira (Banco Votorantim).

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Preceitua a súmula 129 que se assim fizer o trabalhador, compatibilizando sua jornada de

trabalho para diferentes empresas, mas estas empresas pertencem ao mesmo grupo

econômico, não haverá vários contratos, mas apenas um único contrato, não caracterizando a

coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário.

A súmula 129 preconiza esta tese, chamada de Tese do Empregador único. Para quem a adota

(como o Tribunal Superior do Trabalho), não só haveria solidariedade passiva das empresas

pertencentes ao grupo econômico em relação aos empregados de cada uma delas, mas

haveria solidariedade, uma obrigação solidaria do empregado em relação a cada uma das

empresas.

Isto é, na medida em que os distintos empregadores (distintos donos das empresas

pertencentes ao holding) organizassem essa divisão, o trabalhador estaria obrigado a prestar

serviços e subordinado a todos os titulares de cada empresa. Se for dada a ordem que ele

trabalhará metade do seu tempo na empresa A e metade na empresa B, para quem adota a

tese do empregador único, entende que esta é uma ordem legitima e o empregado está

subordinado a ela. É como se ele trabalhasse em filiais diferentes de uma mesma empresa.

Ele irá trabalhar para pessoas jurídicas diferentes do mesmo grupo econômico. A adoção da

tese do empregador único acarreta uma série de consequências (já cobradas em exame de

ordem). Apresentar-se-á aqui duas delas.

a) Trabalhadores em distintas pessoas jurídicas, mas pertencentes ao mesmo grupo

econômico podem pleitear entre si equiparação salarial.

O artigo 651 da Consolidação das Leis do Trabalho estabelece os requisitos para que

um trabalhador possa pedir a equiparação em relação a outro. Por exemplo, existe

outro trabalhador na empresa que faz as mesmas coisas do que ele, mas recebendo

duas vezes mais que ele. Ele pode pedir a equiparação, sustentando que seu trabalho

é igual ao do outro.

Um dos requisitos estabelecidos pelo artigo 651 é que os dois trabalhadores

trabalhem na mesma empresa, ou seja, para o mesmo empregador. Então, para quem

adota a Tese do Empregador Único, não há como não sustentar que ambos devem

receber a mesma coisa. Assim, é possível o preenchimento deste requisito para

equiparação salarial em hipótese de trabalhadores de empresas diferentes, mas

pertencentes ao mesmo holding.

Sucessão de Empregadores

Está positivada nos artigos 10 e 448 da Consolidação das Leis do Trabalho. Para a doutrina, a

sucessão de Empregadores tem três requisitos:

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Art. 10 - Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos

adquiridos por seus empregados.

Art. 448 - A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará

os contratos de trabalho dos respectivos empregados.

a) Transferência da titularidade ou mudança na estrutura jurídica;

Neste requisito, tanto faz alterar o empregador, como no caso da compra das sendas,

quanto mudar o tipo de empresa (por exemplo, uma limitada [LTDA] tornando-se uma

sociedade anônima [S.A]), haverá sucessão de empresas.

b) Manutenção da atividade Econômica;

Embora a roupagem jurídica tenha mudado, a atividade material empresarial se

mantém.

c) Continuidade da prestação de serviços.

Os efeitos da sucessão só se operam quando o trabalhador que trabalhava para A,

continua trabalhando para B. Os artigos 10 e 448 asseguram o direito deste

trabalhador, que prestou continuamente os serviços através do comando final.

Um exemplo da Sucessão de Empregadores está nas . Eram titularizadas pelo

Arthur Sendas, assassinado recentemente. Antes de seu fim trágico, Arthur Sendas havia

transferido para o Grupo Pão de Açúcar, titularizado à época por Abílio Diniz, sua empresa.

Assim, o que era Pessoa Jurídica Sendas foi transferida para Pão de Açúcar. O

empreendimento continuou o mesmo, supermercados. O trabalhador de Sendas tenha

direitos adquiridos que não foram pagos. Para este, existe o artigo 10 e o 448, pois a mudança

na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos do trabalhador, nem

tampouco afetará as cláusulas contratuais. Esse trabalhador pode ter seu contrato alterado,

mas de acordo com o Princípio da Proteção ao trabalhador, em sua tradução da condição mais

benéfica (art. 448) pode alterar-se apenas para melhor, jamais para pior.

A mudança da empresa não sujeita o empregado a regras desfavoráveis a ele. Continua

vigorando o princípio da condição mais benéfica.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 112

De maneira geral, defende o Direito do Trabalho que esta dinâmica material, do

empreendimento, irá receber uma roupagem jurídica (que em geral será uma das figuras de

direito empresarial). Mas, para o Direito do Trabalho isso pouco importa tendo importância,

apenas, relativa.

Essa roupagem que veste a dinâmica econômica, empresarial, tem pouca importância,

podendo ser alterada ao longo do tempo. É possível que haja uma alteração subjetiva do polo

empregatício. Essa alteração não pode afetar direitos do trabalhador e as cláusulas contratuais

já convencionadas com esse trabalhador.

O Grupo adquiriu o fundo de comércio, os estabelecimentos, os contratos com

fornecedores, assumiu as praças, os locais estratégicos, isto é, uma série de fatores positivos.

Mas quando adquire essa empresa, adquire também algumas dívidas. Dentre esses passivos

adquire os passivos trabalhistas. O artigo 10 e o artigo 448 afirmam que quem compra uma

empresa assume os passivos trabalhistas.

É comum e recorrente que na transação empresarial que se estipule que os trabalhadores até

a data da assinatura do contrato e que tenham direitos trabalhistas fiquem sob a

responsabilidade dos antigos donos. A partir da data da transferência, estes trabalhadores

ficam sob a responsabilidade da empresa sucessora.

Esse tipo de contrato é absolutamente desprezado pelo direito do trabalho. A

responsabilidade é da empresa sucessora. Isso não é passível de negociação. Em regra, é o

sucessor trabalhista que assume o passivo trabalhista. Cabe regresso contra o empregador

antigo.

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Aula 11 – Direito do Trabalho I dia 14/05/2013

A sucessão de empregadores também justifica aquela noção de que o empregado não se

vincula a uma pessoa física ou jurídica, mas se vincula, quando o empregador é empresa,

diretamente ao empreendimento econômico, à atividade econômica. Essa noção é tão

fundamental que hoje se vende, como se fosse novidade, o conceito de subordinação

estrutural ou subordinação objetiva (ou ainda subordinação reticular). Nada disso tem

importância (ou no máximo tem importância relativa) quando já se conhece essa relação do

empregado com a atividade econômica.

O trabalhador mantém uma relação bilateral, sinalagmática, com o empreendimento

econômico, ao menos quando o empregador é empresa, quando ele desenvolve atividade

econômica e, portanto, tem finalidade lucrativa. Nessa relação o empregado entrega para o

seu empregador a sua força de trabalho47 e, em troca, recebe, diretamente, o salário e,

indiretamente, recebe as demais obrigações trabalhistas e parcelas trabalhistas como décimo

terceiro salário, gratificações, adicionais etc. que o Direito do Trabalho exige que seja pago.

Essa é a relação típica que ata o empregado ao empregador (empresa). O legislador redator da

Consolidação das Leis do Trabalho, assim como a comissão designada por Getúlio Vargas, não

se preocuparam com a roupagem jurídica desse empreendimento econômico, com a forma

jurídica contratual ou a estrutura contratual jurídica, que é a aparência. Não se quis saber da

aparência, mas sim da essência, o que está por detrás, onde o empregado realmente se

vincula, ou melhor, que é que materialmente pode satisfazer o pagamento da venda da força

de trabalho.

Não é uma abstração jurídica que vai pagar o empregado, mas sim a reunião concreta dos

fatores de produção, de ganhos ou serviços, e a dinâmica do empreendimento econômico. A

unidade, a organização dinâmica é que vai dar conta de satisfazer essas necessidades

concretas, o pagamento do salário do trabalhador. Logo, vincula-se essa força de trabalho e,

em termos jurídicos, o próprio empregado a esse organismo econômico.

A sucessão de empregadores está, de novo, reproduzindo essa mesma ideia, dizendo que tal

atividade econômica pode trocar e roupagem jurídica o quanto quiser (era um LTDA e virou

uma S/A, ou era uma ME e virou outra coisa) que não irá importar.

A designação do direito empresarial não importa no direito do trabalho. É indiferente ao

direito trabalhista se abriu o capital, teve alteração no contrato social ou se mudou de dono.

Isso em nada interfere nos direitos adquiridos trabalhistas, no patrimônio jurídico do

empregado e também não interfere nas convenções contratuais já avençadas, pois elas serão

preservadas. Isso independe da mudança que houver.

47

Que é uma energia imaterial que se materializa no trabalho braçal ou intelectual.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 114

A alteração é permitida para melhorar a situação do trabalhador (subprincípio da condição

mais benéfica). No entanto, caso haja mudança do dono da empresa, o trabalhador não perde

seus direitos, pois os artigos 10 e 448 da Consolidação das Leis do Trabalho garantem isso. A

configuração final será responsabilizada pela manutenção das cláusulas contratuais e pelo

cumprimento dos direitos trabalhistas. Havendo sucessão de tipos jurídicos, o sucessor, a

conformação final, responde pelos direitos trabalhistas.

Art. 10 - Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os

direitos adquiridos por seus empregados.

Art. 448 - A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não

afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.

Por exemplo, a empresa XPTO tinha seu quadro funcional com seus funcionários de confiança

e virou empresa XYZ. A empresa XYZ demitiu um empregado advindo da antiga conformação

XPTO. Quem demitiu foi XYZ e a sucessão já havia sido operada e houve a continuação, ainda

que por um dia, do contrato. Se paga, então, as verbas trabalhistas de acordo com o tipo de

dispensa, isto é, com justa causa ou sem justa causa (sem motivo técnico, econômico, contábil,

disciplinar etc.).

Se for necessário fazer mudança no quadro estrutural, há que se pagar o preço, como pagar os

direitos dos trabalhadores que foram demitidos seja lá por quais motivos. Isso é um elemento

inerente ao negócio, pois a confiança é algo subjetivo e a nova administração não deposita sua

confiança nos funcionários antigos e, portanto, os demite. O empregador transfere seus

poderes aos empregados de confiança e para isso ele admite outras pessoas. Isso é do próprio

negócio.

Ao se adquirir uma empresa, a pessoa que adquiriu sabe que os cargos de confiança estão

sendo guardados por pessoas que ele não conhece logo, em que não deposita confiança. Até

haveria alternativa que, dependendo do tipo de cargo de confiança, poderia, ao invés de

demitir, poderia “rebaixar” esse empregado de confiança.

Os 3 Quesitos da Sucessão de Empregadores (Sucessão de Empresas)

1° Quesito: Transferência do comando final ou Transferência da titularidade jurídica (a

mudança na estrutura jurídico-formal).

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 115

2° Quesito: A Manutenção da Atividade Econômica.

A manutenção da atividade econômica (alguns falam de manutenção parcial, ao menos da

atividade fim). Quando se fala em incorporação, diversifica-se a atividade econômica uma vez

que a empesa se tornou maior e, por isso, para alguns, não haveria necessidade de

preservação total da atividade econômica, mas manter a atividade fim, uma coerência, pois

isso que dá ideia de fixação do trabalhador ao empreendimento econômico.

3° Quesito: Continuidade da prestação do Serviço do Empregado.

O terceiro requisito vem sendo alterado pela doutrina e pela jurisprudência mais

recentemente. É a exigência da continuidade da prestação de serviço do empregado ao longo

do processo de transformação da estrutura jurídica. O empregado foi contratado pela

estruturação A e tem que ser manter trabalhando na configuração B, sob o império da nova

configuração formal. Só quando o empregado se mantivesse depois desse processo de

transformação, na configuração final é que haveria propriamente sucessão, a

responsabilização dessa nova configuração empresarial final, o sucessor trabalhista.

As Exceções ao 3° Quesito: Continuidade da Prestação do Serviço:

a) 1ª Exceção: A transformação social ocorrida no âmbito do processo judicial já em

trâmite.

No entanto, na prática, a jurisprudência apresentava já uma exceção. Era a transformação

social ocorrer no âmbito do processo judicial já em trâmite.

Por exemplo, um empregado foi admitido pela empresa XPTO, tendo o seu contrato de

trabalho inteiro com a empresa XPTO e foi demitido pela empresa XPTO. No entanto, achando

que tinha direitos trabalhistas, o ex-empregado processa a empresa XPTO. Ao longo do

processo a empresa XPTO é vendida para a empresa XYZ. A relação jurídica do empregado

sempre foi com a empresa XPTO, esta que figurava no polo passivo do processo, mas ela

deixou de existir, foi sucedida pela empresa XYZ. Nesse caso, embora não tenha havido

continuidade na prestação de serviço (a relação contratual se encerrou antes da alteração), a

empresa XYZ é a única responsável por esse passivo trabalhista em potencial, pois o processo

ainda não acabou. A empresa XYZ assume esse passivo e é sucessora no processo.

Tradicionalmente essa era a hipótese em que se dispensava a continuidade da prestação de

serviço quando a sucessão se operava no curso do processo trabalhista. Durante o processo

teve uma sucessão.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 116

b) 2ª Exceção: Empobrecimento do empregador original em virtude da transferência de

ativos.

Com as intensificações do processo de interação, inclusive empresarial, a doutrina tem aberto

novas hipóteses de sucessão que dispensam também a continuidade da prestação de serviço.

De maneira sintética, qualquer mudança interempresarial que afete os contratos de trabalho

pelo empobrecimento do empregador original em virtude, basicamente, da transferência de

ativos saudáveis da empresa originária.

Com os processos tradicionais, em geral, tinha-se um arrendamento ou uma compra e venda

para a aquisição de controle do capital social da empresa. Estas são as formas tradicionais de

interação interempresarial.

Passou então a aparecer formas como incorporação, fusão, cisão nas quais não se tem,

propriamente, uma liquidação do patrimônio ou da configuração societária anterior.

Transferem-se partes da empresa para uma empresa nova. Não é a empresa que passa a

compor integralmente uma nova estrutura jurídica, mas agora são ativos (às vezes a marca, o

fundo de comércio, alguns estabelecimentos etc.) e, quando disso decorre o empobrecimento.

Nesta hipótese, A transfere parte do seu empreendimento para B, mas continua a existir tanto

A quanto B. Cindiu-se o empreendimento, não houve continuidade da prestação de serviço,

pois o empregado de A permaneceu na parte remanescente de A.

Hoje, esses novos processos apresentam, eventualmente, o empobrecimento da configuração

social original, causando risco de prejuízo de parcelas trabalhistas. Quando o Judiciário

reconhece essa hipótese de que o processo de transformação empresarial resultou em um

risco para satisfação de obrigações trabalhistas, ele declara a sucessão mesmo que não tenha

havido a continuidade da prestação de serviço.

Isso ocorreu no Brasil na época das privatizações e o é um exemplo. O não

passou inteiramente para o e, por conta disso, houve um processo de reorientação societária

do , este que tinha muitas dívidas com os trabalhadores48. Para que não houvesse sucessão

o começou a promover a demissão de tais trabalhadores justamente para se esquivar da

continuidade da prestação de serviço. O referido banco então criou programas de demissão

em massa e demissão voluntária para tentar romper esses vínculos.

Por outro lado, as agências melhor localizadas passariam para o ou para quem ganhasse o

processo de concorrência da privatização. As agências já vinham com um número de

funcionários enxuto. O excesso de funcionários sem compromisso com eficiência e

produtividade que serviam para manutenção de relações clientelistas (cabide de empregos)

que existia no foi enxugado para deixa-lo apto a venda. Obviamente os trabalhadores

48

Muitas derivavam de uma previdência feita com regras específicas para os servidores do BANERJ, era uma previdência fechada e deficitária, e havia também dívidas trabalhistas.

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sofreram com isso, pois não receberam suas verbas trabalhistas da rescisão nem os direitos

trabalhistas a serem pagos.

O Judiciário, ao contemplar tal situação, vendo que os trabalhadores foram demitidos às

vésperas da privatização, como atos preparatórios para a venda, o trabalhador tem em risco

seus direitos trabalhistas, pois o estava deficitário e existe uma difícil burocracia do Estado

para se cobrar tais direitos (precatórios). Além disso, esse mesmo Estado favorece através de

um processo negocial uma estrutura empresarial que tomou conta do empreendimento, que

hoje é do .

Houve uma mudança empresarial onde os ativos saudáveis foram transferidos e os passivos, o

patrimônio podre, ficou todo com o e isso afeta o empregador original, o próprio .

Vendo isso, o Judiciário disse que aqui há sucessão (isso foi feito mediante requerimento).

O disse que não houve continuidade da prestação do serviço, mas, no caso, o Judiciário

disse que não precisaria.

Sobre isso, a OJ 261, da SDI nº1:

BANCOS. SUCESSÃO TRABALHISTA. Inserida em 27.09.02

As obrigações trabalhistas, inclusive as contraídas à época em que os empregados

trabalhavam para o banco sucedido, são de responsabilidade do sucessor, uma vez que a

este foram transferidos os ativos, as agências, os direitos e deveres contratuais,

caracterizando típica sucessão trabalhista.

O propósito da sucessão é facilitar a sucessão do crédito trabalhista, favorecer para que o

empregado receba seus direitos trabalhistas. Menos importará um requisito doutrinário que

não está na lei, à continuidade de prestação do serviço, do que aplicar a sucessão para se

atingir a finalidade dita acima.

A princípio isso foi para os funcionários mandados embora, mas depois, os que ficaram no

também processaram o , uma vez que alguns deles possuíam algumas dívidas trabalhistas,

mesmo que os vínculos tenham se mantido, ainda que temporariamente, com o . Alguns

obtiveram a declaração da sucessão.

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Exceções à sucessão

1ª Exceção: Sucessão Eivada de fraude.

Não acontece sucessão quando há fraude. O empregador

está atolado em dívidas e, um empresário de má-fé, para se

livrar da possibilidade das dívidas da empresa afetarem seu

patrimônio pessoal, pergunta a um funcionário: “você quer

ser demitido ou quer manter seu emprego”? Optando por

manter o emprego, o funcionário assina em um contrato,

sem saber o que está assinando.

Aquele é um contrato em que o empresário transfere sua

empresa para o seu empregado (ele torna-se aquela famosa

fruta cítrica, o ‘’laranja’’, representado pela imagem ao

lado).

Isso é um vício de consentimento, uma fraude, uma coação. Isso é um argumento para o

empresário alegar que houve a sucessão de empregadores, pois se alterou a titularidade do

empreendimento. A responsabilidade trabalhista seria do sucessor, no caso o empregado fruta

cítrica, que não possui nenhum tipo de bem, extremamente pobre, que assinou o contrato

sem ler. Nesta hipótese, remanesce a responsabilidade do empresário original.

2ª Exceção: Empregador Doméstico.

Empregador doméstico também não há sucessão. Ele é vinculado à pessoa física no âmbito

familiar. Se o empregado passa de mãe para filha é uma nova relação de emprego, pois se

criou um novo âmbito residencial ou mesma entidade familiar.

Empresa de empregador individual também não gera sucessão. Os herdeiros não assumem

essas dívidas.

3ª Exceção: Em caso de falência.

No caso de falência, em virtude de expressa imposição da lei de falências, a lei 11.101 de 2005,

não há sucessão. Quando as empresas se encontram em um estado de insolvabilidade onde a

mantença da atividade econômica se torna impossível, pois o resultado econômico não

consegue satisfazer suas obrigações, a empresa pode recorrer à recuperação judicial, onde ele

pede um prazo para “respirar” em relação ao pagamento dessas obrigações e apresenta um

plano de recuperação, um tempo para executar tal plano, para reativar a atividade econômica,

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reequilibrando-se. Pode ser também que ela mesma ou um credor da empresa proponha

judicialmente a falência, que é o fim da empresa. O juiz declara que a empresa quebrou, faliu,

a atividade econômica cessou e liquida-se o que sobrou. Há uma congregação dos credores da

empresa que se habilitam no processo e há uma ordem de preferencia para pagamento de tais

credores, estabelecida por lei, e vê-se até onde o pagamento da empresa pode pagar. Os

credores quirografários, por exemplo, não têm nenhum privilégio. O processo de falência serve

justamente para liquidar esse patrimônio.

Desde sempre o crédito trabalhista é privilegiado, assim como o crédito do governo (mas o

primeiro é o trabalhista). O previdenciário também é privilegiado. A lei de falências entende

que a atividade econômica é o suprassumo da atividade humana, ela é bem liberal, e com sua

ideologia entende que uma sociedade só vive em virtude das atividades econômicas privadas,

a livre iniciativa, que é valorizada por ela. O que importa é que alguma atividade econômica se

mantenha ou venha a ser retirada da que se extinguiu em virtude da falência ou ainda tirar o

máximo de novas atividades econômicas daquela empresa que faliu. A lógica é estimular ao

máximo novas atividades econômicas, sempre tentando recuperá-la primeiro, pois a atividade

econômica é muito desejável socialmente, pois, segundo essa lógica, é dela que se extraem os

empregos. O individuo que desenvolve alguma atividade econômica gera empregos.

Obviamente a atividade econômica não existe sem empregos, logo, aqui há uma simbiose.

Existe emprego para existir atividade econômica e existe atividade econômica para existir

emprego. Isso não é um favor que o empresário faz. Essa lógica de favor é o típico enfoque da

cultura patrimonial brasileira que foi transposta para o nosso liberalismo, ela nem existe tanto

nos países que fizeram revolução burguesa. O Brasil não tem direitos, tem favores.

O art. 141, II da referida lei:

Art. 141. Na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive da empresa ou de suas filiais,

promovida sob qualquer das modalidades de que trata este artigo:

II – o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante

nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do

trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho.

§ 2o Empregados do devedor contratados pelo arrematante serão admitidos mediante novos

contratos de trabalho e o arrematante não responde por obrigações decorrentes do contrato

anterior.

Se alguém, adquirindo ativos dessa empresa falida, conseguir desenvolver uma atividade

econômica ou incrementar uma atividade que já existia, ganha o prêmio de não ser sucessor

trabalhista. Ao se comprar uma filial, por exemplo, o dinheiro paga aos credores desse

processo falimentar. Botando o empreendimento nessa filial, não haverá sucessão trabalhista.

Indo a esse processo de falência e encontrando nele um estabelecimento com insumos,

máquinas etc. e, adquirindo esses ativos e mantém esses trabalhadores, contratando-os,

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criando um empreendimento econômico e usa os trabalhadores da empresa falida não haverá

sucessão e esses contratos serão novos contratos de trabalho.

A lei chegou a ser questionada pela ADIn 3.934-DF, mas não há vício de inconstitucionalidade

nela.

4ª Exceção: Aquisição de Empresa Pertencente a Grupo Econômico.

É uma nova exceção a sucessão de empresas.

Ao se adquirir uma empresa que pertencia a um grupo econômico – que é uma série de

empresas coordenadas ou subordinadas a outra empresa que desenvolve algum tipo de

atividade econômica conjunta. Ao adquirir uma empresa dentre tantas que pertenceu ao

grupo, nesse caso, a empresa teria solidariedade passiva em relação as demais componentes

do grupo e, após a sucessão, deixaria de ter a solidariedade. Não há sucessão das obrigações

solidária do grupo econômico. Sobre isso, OJ 411, da SDI nº 1:

SUCESSÃO TRABALHISTA. AQUISIÇÃO DE EMPRESA PERTENCENTE A GRUPO ECONÔMICO.

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO SUCESSOR POR DÉBITOS TRABALHISTAS DE EMPRESA

NÃO ADQUIRIDA. INEXISTÊNCIA. (DEJT divulgado em 22, 25 e 26.10.2010)

O sucessor não responde solidariamente por débitos trabalhistas de empresa não adquirida,

integrante do mesmo grupo econômico da empresa sucedida, quando, à época, a empresa

devedora direta era solvente ou idônea economicamente, ressalvada a hipótese de má-fé ou

fraude na sucessão.

Empregados de confiança

Existem dois grupos de empregados de confiança:

Altos profissionais

Aqueles inseridos nas posições mais elevadas da hierarquia da empresa, de sua organização

hierárquica (os grandes diretores da empresa). Esses empregados já são contratados para uma

função de confiança e suas posições hierárquicas revelam remunerações diferenciadas, pois

são aqueles que estão no topo e ganham mais.

Este primeiro grupo são os altos empregados, os mega diretores da corporação que são

contratados a peso de ouro no mercado e têm uma autonomia muito grande dentro dos

elementos de seus próprios contratos. Têm grande poder de comando na empresa e às vezes

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 121

têm tanta autonomia gerencial que podem, em certos casos, em um só ato, em um cheque

que assinam, podem acabar com o empreendimento econômico de uma vez só.

São grandes diretores jurídicos, comerciais etc. e desde o início do contrato já exercem uma

parcela considerável do poder típico do empregador, o representando quase sempre. Mas,

ainda assim são empregados e, portanto, alguém manda neles. Eles têm desde o início do

contrato essa característica de confiança

Empregados de confiança específica (Art. 62, inciso II da CLT)

Denominação da professora Alice Monteiro de Barros: são aqueles que ingressam na empresa

sem qualquer poder de direção, mas que, ao longo do contrato, são promovidos a um cargo de

confiança tendo transferidos para si uma parcela do poder de gestão do empregador.

Art. 62 - Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:

II - os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos

quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes

de departamento ou filial.

Já este segundo grupo, são empregados normais, sem nenhum tipo de poder, que não

mandam em nada, pelo contrário, recebem ordens como todo e qualquer empregado.

Todavia, ao longo do seu contrato, certas qualidades são reconhecidas pelo empregador,

suscitando a promoção desses empregados para alguma função e confiança, como chefe do

setor, supervisor ou ainda gerente geral. De fato, ele não tinha nenhum poder passando a ter

algum. Passa a mandar em outros empregados, determinar o que outros empregados fariam

ou mesmo admitir e demitir empregados. São poderes típicos do empregador em maior ou

menor dimensão. São poderes típicos de gestão.

O art. 62, II da Consolidação das Leis do Trabalho sustenta que esse empregado tenha

suprimido os direitos da duração do trabalho, além do poderes de gestão, ele deve ganhar um

acréscimo remuneratório de, ao menos, 40% do que ganhava antes da promoção. Para que ele

seja excluído de uma série de direitos ele deve ter um acréscimo remuneratório para

compensar a série de direitos que serão suprimidos desse empregado de confiança específica.

Um desses direitos é que o empregado de confiança específica não tem limite de duração de

trabalho (oito horas por dia/44 horas semanais). Esse tipo de direito não atinge empregados

de confiança. Se esse empregado, de fato, realmente exercita poder de gestão (realmente

comandando, isto é, efetivamente exercer o poder de gestão e ganhar pelo menos 40% a mais

do que ganhava).

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 122

Deve-se notar que, no primeiro caso (Altos Profissionais), se ele é desde sempre um

empregado de confiança e, na verdade, só perde confiança quando perde o próprio emprego

(entrou como diretor e saiu como diretor). Ingressou como empregado de confiança e saiu

como tal.

No segundo caso não é assim. O art. 468, parágrafo único, da Consolidação das Leis do

Trabalho permite que o empregador, não depositando mais confiança nesse empregado, retire

o cargo de confiança, revertendo o empregado ao cargo efetivo, original, antes ocupado.

Suprime-se, então, apenas o cargo de confiança e, possivelmente os 40% a mais que se

pagava.

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita à alteração das

respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não

resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de

nulidade da cláusula infringente desta garantia.

Parágrafo único - Não se considera alteração unilateral a determinação do

empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo,

anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.

Esse caso excepciona tanto a possibilidade de rebaixamento quanto de redução de salário.

Excepciona temporariamente. Há a súmula 372 do TST que diz:

Nº 372 GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. SUPRESSÃO OU REDUÇÃO. LIMITES. (conversão das

Orientações Jurisprudenciais nºs 45 e 303 da SBDI-1) - Res. 129/2005 - DJ 20.04.2005

I - Percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador,

sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo

em vista o princípio da estabilidade financeira. (ex-OJ nº 45 - Inserida em 25.11.1996)

II - Mantido o empregado no exercício da função comissionada, não pode o empregador

reduzir o valor da gratificação. (ex-OJ nº 303 - DJ 11.08.2003)

Então, a princípio, esse segundo grupo de empregados de confiança está relacionado a um

cargo de confiança precário que depende desse elemento subjetivo do empregador ou do

superior hierárquico que o represente. Enquanto esse superior/empregador depositar

confiança nesse empregado, este manterá seu cargo de confiança. Mas confiança é um

elemento subjetivo e, o empregador não querendo mais, evidencia-se como tal quesito é

precário e, assim, pode suprimir essa função de confiança, revertendo-o ao cargo efetivo, que

ocupava antes da promoção.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 123

Suprime-se a remuneração suplementar desde que o indivíduo possua menos de dez anos

nessa função de confiança, pois, do contrário, se ele se mantiver lá por dez anos ou mais, a

reversão é possível, mas a remuneração não pode ser diminuída, pois o acréscimo fica

incorporado em virtude do tempo em que tal trabalhador ocupou aquela função.

Esse empregado também pode ser transferido sem anuência (art. 469, § 1º da CLT). Fica

também excluído da estabilidade decenal, que hoje é um direito que não existe mais para

ninguém, mas que, enquanto existente, não era atribuído ao empregado de confiança

específica. Então, se o empregado fosse de confiança específica, poderia ser rebaixado, não

precisaria ser necessariamente demitido.

No entanto, se é um alto funcionário, aí tem que mandar embora e contratar um novo diretor.

Isso é do cotidiano da empresa, mesmo que não tenha havido nenhuma reestruturação na

estrutura jurídica da empresa os diretores mudam o tempo inteiro.

O cargo de confiança na Administração Pública é possível tanto para celetista quanto para

estatutários. Sendo celetista o princípio é o mesmo, é muito parecido com o segundo grupo. A

precariedade que existe na Administração Pública também existe no âmbito privado, é o

mesmo princípio.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 124

Aula 12 – Direito do Trabalho I dia 21/05/2013

Poder diretivo

O poder típico do empregador no contrato de trabalho é o poder de direção (poder diretivo ou

ainda poder empregatício).

A ordem jurídica reconhece que na relação entre empregado e empregador existe um

desequilíbrio de poder, pois um deles é detentor de poderes e o outro não é. Esses poderes

decorrem evidentemente do direito de propriedade privada dos meios de produção. Quem

dota e reconhece esse poder ao empregador é a ordem jurídica e, em ultima análise, é o titilar

da ordem jurídica, o povo.

Embora ninguém acredite nisso, todo o poder autorizado pela ordem jurídica só é autorizado

por que se trata de uma delegação do povo. O povo construiu a ordem jurídica e disse que tais

personagens terão poderes (governadores, juízes, empresários e etc.).

O poder do empregador é uno, decorrente do direito de propriedade, para que possa

comandar o meio de produção e organizá-lo, assim como fazer com que o empreendimento

atenda as finalidades econômicas que ele determina. Congrega então os fatores de produção e

manda nos mesmos, dentre eles, a força de trabalho.

É um poder uno, mas é fragmentado didaticamente, onde cada autor faz sua divisão. Deve-se

compreendê-los como um poder uno concedido pela ordem jurídica em virtude do direito da

propriedade privada dos meios de produção.

Ele terá um aspecto organizacional se o empregador é o dono dos meios de produção,

organizando-os da forma que melhor pensar, pois ele é o proprietário dos mesmos e os

organiza como bem entender. Em termos de pessoal, se manifesta como poder hierárquico,

pois os funcionários são dispostos dentro de uma hierarquia. Os métodos de produção atuais

têm horizontalizado a organização dessas pessoas.

Era muito comum nos modelos fordistas as hierarquias das empresas tomarem a forma de

pirâmides. A estrutura de cargos e funções, tradicionalmente, também é uma pirâmide, esta

que é desenhada pelo próprio empregador, até mesmo o nome dos cargos é ele quem faz com

sua livre criatividade.

Existe também um poder de fiscalização, supervisão, controle, que por sua vez decorre da

capacidade de criação de normas sobre o que o empregado poder ou não, deve ou não fazer.

Além do poder regulamentar, que é a capacidade do empregador de criar normas, existe o

poder disciplinar, que é o poder mais visível do empregador, com o qual pode aplicar sanções,

punições ao empregado. O Estado atribui então certa coercitividade às ordens do empregador.

Na visão atual e constitucionalizada do Direito do Trabalho esses poderes foram mais

limitados, pois devem respeitar os direitos fundamentais.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 125

O poder do empregador, diretivo ou empregatício, é uno. Ele não o exerce de forma individual,

não é possível das ordens para todos os funcionários em todos os setores de todas as

empresas de um grande grupo econômico. Então, poder se dilui ao longo da hierarquia da

empresa, ele se despersonaliza, para que possa ser exercício, na figura dos sócios, dos titulares

do empreendimento, dos proprietários privados do meio de produção e se impessoaliza

mesmo quando não há propriedade privada dos meios de produção, quando não há atividade

econômica, quando o empregador o é por equiparação, que contrata empregado, mas não é

empresa.

Em síntese: Empregador é quem contrata o serviço dotado de Subordinação, Habitualidade,

Onerosidade e Pessoalidade.

O poder diretivo é visualizado através da capacidade que o empregador tem de criar normas,

estas que terão maior ou menor abstração. Vão desde a ordem direta da circular que

determina o que o empregado tem que fazer, como se portar, por exemplo, e até o

regulamento da empresa. Toda a capacidade de criar normas do empregador é chamada de

poder regulamentar (portarias e ordens de serviço, por exemplo). Às vezes atingem todos os

empregados, ou só de um determinado estabelecimento (unidade destacável da empresa, sem

fazer com que ela deixe de existir ou perca sua dinâmica) ou certos empregados etc.

O poder regulamentar então se concretiza por excelência no regulamento da empresa, este

que serve no contrato de trabalho como clausula de adesão, pois o empregado adere àquilo

que é disposto no regulamento da empresa, e as normas do regulamento da empresa passam

a compor o contrato de trabalho de cada um dos empregados. Em tese, no momento da

contratação, o empregado deveria ter conhecimento do regulamento da empresa e como é

cláusula contratual isso deveria condicionar a aceitação do empregado na admissão. Se existir

uma norma com a qual o empregado não concorde ele teria de conhecer.

Em termos de abstração contratual, as regras do regulamento da empresa integrariam o

contrato de trabalho, pois o empregado adere a tais regras, pois não é ele quem as cria, mas

sim o empregador. Ele adere às cláusulas gerais do contrato de trabalho e às normas que

compõem o regulamento da empresa.

Se o regulamento faz parte do contrato, o que vale para o contrato como princípio da condição

mais benéfica vale também para o regulamento da empresa. As alterações no regulamento da

empresa ficam condicionadas ao subprincípio da condição mais benéfica (as alterações

contratuais que representem um benefício ao empregado são incorporadas como direito

adquirido do empregado e as que acarretam prejuízo são consideradas como nulas de pleno

direito). Isso serve para o regulamento da empresa. Se a alteração do regulamento da empresa

apresentar um prejuízo para o empregado, não terá valor contratual, pois é condição menos

benéfica, seja um prejuízo direito ou indireto.

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Sobre isso, art. 468 da Consolidação das Leis do Trabalho c/c súmula 51 do Tribunal Superior

do Trabalho.

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das

respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não

resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de

nulidade da cláusula infringente desta garantia.

Parágrafo único - Não se considera alteração unilateral a determinação do

empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo,

anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.

TST Enunciado nº 51 - RA 41/1973, DJ 14.06.1973 - Incorporada a Orientação Jurisprudencial

nº 163 da SBDI-1 - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

Cláusula Regulamentar - Vantagem Anterior

I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas

anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do

regulamento.

II - Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um

deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro. (ex-OJ nº 163 da SBDI-1

- inserida em 26.03.1999)

Se o regulamento é alterado e tal alteração causa um prejuízo para os trabalhadores sob o

império do regulamento anterior, ela será nula para eles. Só valerá para os que forem

admitidos após a alteração.

Se o empregado percebe que, havendo dois regulamentos, cada um tem suas vantagens e

desvantagens, tanto o antigo quanto o alterado, e ele está sob um regulamento e,

considerando-se que há a possibilidade de migrar para o outro regulamento, se o empregado

optar pelo novo, ele ficará somente com o novo, se optar pelo antigo, ficará somente com o

antigo. Optar por um deles é renunciar ao outro, é semelhante à teoria do conglobamento, se

há duas normas em vigor, adere-se inteiramente a uma delas.

O poder disciplinar é onde se visualiza melhor o poder do empregador, a capacidade que ele

tem de punir os empregados, aplicar sanções. Não adiantaria nada a capacidade de

regulamentar sem coercibilidade. É o poder de aplicar sanção aos empregados que infringem a

regra, que a descumprem, infringem o poder de comando do empregador. Desobedeceu-se ao

poder de comando, como o empregado é subordinado, vêm às sanções.

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Sanções Aplicadas Pelo empregador

Tipo de sanção que podem ser aplicadas pelo empregador:

Advertência;

Suspensão disciplinar;

Dispensa por justa causa.

A Inaplicabilidade da Multa

As multas e os descontos salariais não podem existir no contrato de trabalho como mecanismo

de punição. Multas raramente existem, um exemplo seria na lei do jogador de futebol, mas é

um caso peculiar, de rescisão antecipada. Em geral, não se admite multa no contrato de

trabalho, até mesmo porque ela seria um mecanismo de transmitir para o empregado o risco

da atividade econômica quando a atividade econômica é do empregador, assim como o risco.

O empregado vende a força de trabalho e não deve ter nenhum risco do negócio transferido

para ele. Não se admite multas como modalidade de poder disciplinar.

1ª Sanção: Advertência

A advertência sequer tem base legal, é um costume que já foi consolidado pelo entendimento

jurisprudencial e pela doutrina. É a punição mais branda que se realiza pela explicitação da

falta cometida para o empregado. É também ciência, pois o cientifica o empregado de que ele

cometeu uma falta, dizendo que a conduta realizada é uma falta, infração disciplinar, contrária

à regulamentação interna da empresa e contrária às determinações do empregador.

Recomenda-se então que o empregado não volte a incorrer nesse erro, sob pena de punição

mais gravosa.

A advertência não tem forma, pode ser escrita ou verbal, é o ato de cientificar o empregado de

que ele cometeu a falta e, como consequência adverte-lo para que este não volte a cometê-la.

Alguns empregadores se preocupam com o fato de os empregados não assinarem a

advertência. O empregador tem que se resguardar que efetuou a punição, tem que provar o

ato de punir, mas o ato não tem forma, ela pode ser verbal e provado por testemunha, que é o

meio de prova hábil. O documento é mais eficaz, mas sua ausência não invalida o ato, pois

pode ser provado por outro mecanismo.

Testemunha é quem conhece o fato (independente de quem for). Não importa se é

empregado também, pode até ser empregado com processo contra a empresa. O que não

pode é mentir em juízo, pois ela esta lá para contribuir com a justiça.

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2ª Sanção: Suspensão

A suspensão implica o ato de afastamento do empregado por um período de uma a trinta dias

sem a respectiva remuneração. O empregado fica afastado compulsoriamente, impedido de

trabalhar e, me virtude disso, não recebe os dias em que é afastado pelo empregador. O art.

474 da Consolidação das Leis do Trabalho é o único dispositivo que alude a suspensão diz:

Art. 474 - A suspensão do empregado por mais de 30 (trinta) dias consecutivos

importa na rescisão injusta do contrato de trabalho.

O caso do art. 474 é o empregador que comete uma falta, qualificada como grave49 e suscita o

rompimento do contrato, suscita ao empregado romper o contrato por culpa do empregador.

As sanções não têm ordem, hierarquia ou forma. O empregador as aplica como achar que deve

no exercício do seu poder de direção. Ele tem discricionariedade. Durante muito tempo

vigorou a tese da insindicabilidade do conteúdo da suspensão, da quantificação da suspensão.

O Judiciário não sindica, não interfere na designação do conteúdo, na quantificação da

suspensão feita pelo empregador (não poderia dizer que quinze ou vinte dias é muito ou

pouco).

Hoje a Constituição mudou um pouco dessa história, assim como o limite do poder pela

legitimação da soberania popular ou limite para respeitar os direitos fundamentais. O

empregador tem poder porque o povo determinou, através da constituição e legislação

infraconstitucional, que ele tivesse poder. O empregador não exerce o poder para si e, nesse

sentido, ele deve respeitar as outras deliberações da soberania popular, expressamente as que

dizem respeito aos direitos fundamentais.

A quantificação da suspensão passa pelo crivo da proporcionalidade. Quando o empregador

suspense seu empregado por vinte dias, o que é absolutamente excessivo, pois fica 2/3 do mês

sem receber, o que causa grande impacto, deve levar a uma justificativa razoável quando

houver questionamento. O empregador tem poder, mas deve justificar esse afastamento, que

deve ser dado caso a falta tenha tido uma gravidade muito grande.

As punições muito longas são mais raras, fala-se muito em razoabilidade e proporcionalidade,

exige-se justificação, prestação de contas. Quem concedeu o poder foi o povo e, através dele,

o Judiciário pode exigir justificativa. O Judiciário então, hoje, passa a adotar uma postura não

de substituir o empregador na quantificação, mas de exigir a motivação.

Essa falta não precisa estar expressa no regulamento, mas deve decorrer logicamente das

obrigações contratuais, quando muitas dessas são tácitas, como, por exemplo, não quebrar o

instrumento de trabalho dolosamente. Em caso de acidente é discutível, mas se houver

49

Considera-se grave, pois impede a convivência entre empregado e empregador.

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negligência ou dolo, aí é possível a punição sem previsão. Porém não é cabível uma punição

por algo que nunca tenha se relacionado com o contrato de trabalho do empregado.

3ª Sanção: Dispensa por Justa Causa

Contudo, há um critério para a dispensa por justa causa. Só é possível punir através da

dispensa por justa causa quando a falta cometida for grave. A falta grave é aquela que impede

a manutenção do contrato, da relação contratual empregatícia. Quem determina quais são as

faltas graves é a lei. Estão quase todas concentradas no art. 482 da CLT e são as principais.

Art. 482 - Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo

empregador:

a) ato de improbidade;

b) incontinência de conduta ou mau procedimento;

c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do

empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual

trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;

d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha

havido suspensão da execução da pena;

e) desídia no desempenho das respectivas funções;

f) embriaguez habitual ou em serviço;

g) violação de segredo da empresa;

h) ato de indisciplina ou de insubordinação;

i) abandono de emprego;

j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer

pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima

defesa, própria ou de outrem;

k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o

empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa,

própria ou de outrem;

l) prática constante de jogos de azar.

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Os critérios para aplicação das punições que hoje são reconhecidamente indagadas pelo

Judiciário são:

Nexo causal: para que haja punição deve ter havido uma falta (o Judiciário

verifica se houve ou não falta, mas não substitui o empregador para dizer que

a quantidade de dias foi muita ou pouca, até pode passar a fazer isso com base

na constituição, mas não pode substituir o empregador);

Imediaticidade: o empregador deve punir imediatamente, tão logo tomou

conhecimento da falta. O empregador conduz a relação jurídica com o

empregado, se há uma falta e o empregador não faz nada quer dizer que a

falta não é muito representativa para o contrato, não faz diferença, é o perdão

tácito do empregador, decorrente da falta de punição quando o empregador

conhecia a infração. Não punir imediatamente é perdoar tacitamente. Isso

significa dizer que não poderá punir depois, ou é imediatamente ou não. Ela

não possui, no entanto, uma quantificação cronológica. O empregador, assim

como na falta grave, precisa de um tempo de convicção, de certeza, de que a

falta está sendo cometida, e por quem (autoria e objetividade da falta). O

aspecto cronológico é relativo. Depende da circunstância concreta;

Singularidade (non bis in idem): é a singularidade, para cada falta cometida há

uma e apenas uma punição. Não é possível, pelo mesmo fato ou conjunto

fático aplicar uma advertência e, em seguida, uma suspensão. Se já optou por

advertência, ela é o bastante para a falta cometida, se optou pela suspensão,

ela já é o bastante para a falta. Não se pode romper a singularidade.

A dispensa por justa causa sempre aparece quando se leva em consideração as condições in

concretu do empregado. Quando se analisa a constituição de uma conduta faltosa de natureza

grave para fins de se apurar a legalidade ou não da dispensa por justa causa, se analisa a

situação do trabalhador levando-se em consideração as peculiaridades concretas daquele

trabalhador. Não existe aqui, na analise da culpabilidade, como no direito penal, o critério do

homem médio. Essa abstração não existe no direito do trabalho para fins de punição para

dispensa por justa causa, de falta grave. A compreensão da gravidade da falta leva em

consideração as qualificações pessoais do empregado. Às vezes o empregado não tem sequer

condições intelectuais e cognitivas para compreender que a falta é, de fato, grave e isso deve

ser levado em consideração. É um critério muito mais concreto do que o utilizado no direito

penal.

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Aula 13 – Direito do Trabalho I dia 28/05/2013

Terceirização

Terceirização como exceção (Súmula 331 do TST)

A equação contratual trabalhista se encerra na fórmula do contrato realidade. Isso foi visto no

princípio da primazia da realidade. É a conciliação das visões de mundo dos componentes que

moldaram a Consolidação das Leis do Trabalho.

Metade era contratualista, mas não queriam reproduzir mimeticamente o contratualismo do

direito civil e, por isso, defendiam que era um contratualismo mais cunhado com uma base

social.

A outra metade era institucionalista, influenciada por ideias corporativistas, acreditavam que a

relação de emprego se dava pela adesão do empregado aos fins institucionais da empresa. Era

mais que um mero contrato ou vontade em relação às obrigações do contrato. Existe uma

colocação da vontade do empregado no mesmo sentido e direção dos fins institucionais da

empresa. A Consolidação das Leis do Trabalho foi redigida com a conjugação das duas visões.

Há um contrato, mas esse é o contrato realidade e pode-se dizer que empregador é todo

aquele que se coloca em uma relação jurídica tomando e recebendo um serviço prestado por

um trabalhador que presta serviço de forma habitual, onerosa e pessoal.

O elemento institucional verifica-se com a fixação do empregado no empreendimento

econômico e não importa qual é o sujeito de direito que formaliza esse polo da relação

jurídica, pois esse sujeito de direito tem um a importância relativa, é a roupagem jurídica, o

que importa e o próprio empreendimento econômico do tomador do serviço.

Essa é a conjugação de fatores de produção (máquina, imóvel, marca, matéria prima, insumo,

força de trabalho etc). As articulações desses elementos formam a atividade econômica

organizada denominada empresa. Sobre isso o artigo 2º e 3° da CLT:

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo

os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de

serviço.

§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego,

os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou

outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como

empregados.

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§ 2º - Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas,

personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de

outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade

econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis

a empresa principal e cada uma das subordinadas.

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza

não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição

de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual.

Contemplam-se as relações meramente contratuais das associações beneficentes e a relação

contratual econômica, coração da relação jurídica trabalhista (na qual o empregador

desenvolve atividade econômica e desenvolve atividade lucrativa cujo objetivo é lucro). Onde

o empregador é a empresa, o conjunto patrimonial e extrapatrimonial que se articula para o

desenvolvimento da atividade econômica tem um valor econômico e esse valor serve de

garantia para a satisfação dos diretos trabalhistas.

A finalidade do direto do trabalho é garantir que esse trabalhador receba o pagamento de

direitos trabalhistas. Isso se faz dizendo que o empregado está vinculado ao empreendimento

econômico, pois quando entrega a energia imaterial da força do trabalho e esta e absorvida

pelos fatores de produção, essa energia se transforma em valor econômico. Se esta

valorizando o empreendimento, nada mais justo do que ter tal empreendimento como

garantia de cumprimento das obrigações trabalhistas.

O responsável pelas obrigações trabalhistas em termos contratuais é o empregador, mas, para

além da figura jurídica do empregador, é o próprio empreendimento econômico. Tanto é o

empreendimento econômico que se este se superdimensiona para além de uma única pessoa

jurídica, e se visualiza na associação de várias pessoas jurídicas, tem-se o grupo econômico.

Quando ele muda de roupa jurídica, há a sucessão de empregadores. Em ambos os casos, o

empregado está vinculado, assim como sua força de trabalho, ao empreendimento

econômico. E a logica que informa ontologicamente a essência do direito do trabalho.

O contrato de trabalho que irá formalizar essa relação é o contrato sinalagmático, isto é, as

prestações obrigacionais dos sujeitos guardam uma reciprocidade. É bilateral porque é uma

pressuposição recíproca das prestações de cada parte, esta que caracteriza o contrato de

trabalho. Esse sinalágma é informado justamente por essa condição material da dinâmica

econômica. A obrigação principal do empregador e pagar o salario, a do empregado e

trabalhar, prestar serviço.

As outras obrigações do contrato de trabalho residem no fato de o empregador, além de pagar

o salário, irá pagar a remuneração de férias, o décimo terceiro, depositará o FGTS, enfim, as

obrigações acessórias. Já o empregado, este pode ter outras obrigações também, como se

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manter uniformizado, cumprir um determinado procedimento ou devolve o instrumento de

trabalho no final do serviço. Mas o contrato de trabalho é bilateral por natureza,

independentemente das obrigações acessórias.

O contrato é bilateral porque se exige do empreendimento econômico que foi beneficiado

pela força de trabalho que cumpra as obrigações trabalhistas. O responsável por pagar as

obrigações trabalhistas e aquele que se beneficiou, ou teve seu empreendimento beneficiado,

pela mão de obra.

A terceirização vem para ser uma exceção a essa regra. Há um rompimento da relação

bilateral, sinalagmática.

Os processos de inovação tecnológica sempre estiveram presentes como auxilio aos modos de

produção, historicamente. Quando surge o capitalismo, a inovação tecnológica passa a fazer

parte de sua vida, é um componente essencial para a própria existência do capitalismo que se

mantenha um processo constante e permanente de inovação tecnológica. Desde o fim do

feudalismo, fase de transição toda moderna, “descobrimento” do Brasil nas grandes

navegações, até os séculos XVIII/XIX há esse processo constante que se acelera e o capitalismo

vai se consolidando como modo de produção dominante. Essa inovação tecnológica então vai

se acelerando também.

O recurso a esses elementos tecnológicos não dizem respeito só aos padrões produtivos. Há

quem diga que há várias revoluções industriais. A primeira seria a do vapor, a segunda da

energia elétrica, a terceira a do microchip e microprocessador de dados. Há quem entenda que

isso é um processo continuo. Isso não importa.

Para visualizar a terceirização o que importa é que, além do padrão produtivo, a tecnologia, a

racionalidade cientifica entra não só no padrão de produção, que incrementa os fatores ou

meios de produção, mas também por meio do que se produz e as técnicas cientificas serão

aplicadas no interior do processo de produção (métodos de produção). Quem estuda os

métodos de produção e a Administração.

No começo do século XX os métodos de produção começaram a ter grande cientificidade e

racionalidade com o fordismo que criou métodos científicos de produção para maximizar e

racionalizar o trabalho humano e aumentar os resultados. Organizam-se melhor os processos e

adequam-se as formas de produzir e de organizar os trabalhadores da empresa.

Além de Henry Ford, o século XX também viu o relógio taylorista de Frederick Taylor. É bem

representado por “tempos modernos” de Charles Chaplin. Grandes unidades fabris com mão

de obra pouco qualificada que desempenha um processo repetitivo e braçal segmentado e

fragmentado na esteira de produção. Essas unidades fabris manipulavam todo o processo de

produção, da matéria prima ao produto final. Produzia-se em série para uma sociedade de

consumo em massa.

Esse padrão deu excelentes resultados de acumulação de capital durante o século XX e casou

por 30 anos com o modelo de organização de Estado com o modelo de Estado de Bem-Estar

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 134

social (no entanto houve um “escorregão feio” em 1930). Mas, de uma maneira geral, o saldo

do fordismo e do taylorismo como métodos de produção é muito bom.

No final do século XX o capitalismo entra em crise de novo. Alguns culpam o Estado de Bem-

Estar social, outros culpam o capitalismo. De um jeito ou de outro esses métodos não

conseguiam mais manter o nível de acumulação de capital e com esses novos métodos vem à

terceirização. O toyotismo é um deles também, com sua produção “just in time” que é o

modelo de acumulação flexível ou pós-fordismo. É o modelo vigente, mas obviamente ainda

existem técnicas de produção fordista. Ao invés de grandes unidades fabris concentra-se a

produção. Há a etapa de concepção do produto, como o desenho dos carros, na matriz da

Volkswagem na Alemanha e, depois, a etapa de execução que se reduziu à montagem e,

quando muito, uma rede de comercialização que são as concessionárias autorizadas. Não tem

mais todas aquelas etapas produtivas, pois agora se especializa na montagem ou

comercialização – nessa nem tanto. O resto do carro é terceirizado. Cada pedaço do carro é

feito por uma empresa especializada naquele componente do carro – chassi, para-brisas,

limpadores de para-brisas, retrovisores etc.

Agora se produz sob demanda, quase sob encomenda, é o “just in time”, o estoque baixo. A

produção foi ainda mais racionalizada. Isso permite certa customização dos produtos e nichos

de mercados com clientes sofisticados e mais sofisticados ainda, com pesquisa de consumo

etc. Isso é acumulação flexível. Sequer existem cargos de fiscalização agora, pois os próprios

funcionários fiscalizam uns aos outros, é uma política de controle e há uma rede de

informação que faz com que essas informações cheguem ao chefe.

A terceirização é o imperativo dos novos métodos de produção, pois ela implica, aos menos

para os trabalhadores, em duas possibilidades, como a terceirização da produção que, no setor

de contratação de pessoal, se transformou em uma terceirização de serviços. Terceirizar a

produção especializada, agora se terceiriza também o serviço especializado, como segurança,

vigilância, manutenção, limpeza etc.

O empregador concentra-se agora só na sua atividade, as outras são prestadas por mão de

obra de terceiros especializados. Há também a terceirização da própria mão de obra, que é

diferente de contratar um serviço especializado onde a mão de obra e um dos fatores. Quando

se contrata uma empresa de manutenção de serviços de computadores, a mão de obra é um

dos fatores, mas existem outros, pois eles vêm com seus próprios instrumentos de trabalho

por exemplo. Já na terceirização de mão de obra se está intermediando gente, não se presta

nenhum serviço, se junta gente e distribui gente é intermediar mão de obra diretamente.

Essa prática sempre foi vedada pelo direito do trabalho porque é como se se transformasse o

trabalhador em uma coisa, uma mercadoria que se aloca, aluga, arrenda, usa na atividade etc.

Isso era chamado de marchandage e o modelo toyotista a trouxe devolva.

Em ambas as modalidades há uma pessoa interposta na relação entre empregado e quem se

aproveita diretamente da força de trabalho do empregado. Há uma relação com três sujeitos,

o trabalhador que continua cedendo sua energia imaterial, a força de trabalho; no entanto,

aquele que tem seu empreendimento beneficiado pela força de trabalho exime-se da

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 135

responsabilidade de custear com as obrigações trabalhistas, transferindo-a para a empresa

interposta que fornece a mão de obra, seja só mão de obra, seja mão de obra inserida no

serviço.

Ou a empresa interposta é uma empresa locadora de mão de obra ou é uma prestadora de

serviços especializados. De qualquer maneira a relação jurídico-formal se da entre a empresa

interposta e o trabalhador. Isso é um contrato de trabalho. Quem assina a carteira de trabalho

é a empresa interposta, esta que assume a responsabilidade de cumprir com as obrigações

trabalhistas, mas o trabalhador não trabalha para essa empresa diretamente, mas para a

empresa tomadora de serviços. Há então uma triangulação e, entre as duas empresas, há um

contrato de natureza civil, com igualdade entre as partes e autonomia de vontade das mesmas

para estipular os termos do contrato, este de natureza civil. Isso contraria o direito do trabalho

e sua regra de ouro – quem se beneficia do trabalho alheio custeia as obrigações trabalhistas.

Essa terceirização, ou essa imposição, que já era uma contingência econômica, foi reforçada

pela ideologia neoliberal. Temos o reconhecimento na produção em rede pela propaganda

neoliberal, pelo menos, de uma possibilidade de produção muito mais democratizada e

dividida, permitindo combater os monopólios. No entanto, o que se percebe é o contrário,

pois a Toyota, que trabalha vinculada com mais umas vinte empresas terceirizadas, que

trabalha com mais umas cem mil empresas terceirizadas e isso vira uma cadeia. Não é que o

monopólio das transnacionais tenha acabado, mas a forma como esse monopólio se estrutura

hoje é uma forma em rede.

Por outro lado, proliferou-se o conceito de que a terceirização seria um dado inelutável,

inexorável, insuperável, a realidade econômica é essa e não há o que fazer. Essa naturalização

deve sempre ser levada de forma relativa, pois dizer que é a natureza das coisas ou o

imperativo da ordem econômica é algo que se deve desconfiar. A globalização e a estruturação

produtiva pela terceirização são construções humanas, feitas historicamente, que apesar de

ser algo feito com algum tipo de força ou hegemonia, pode, em tese, ser mudado. Esse

discurso pode ser contestado e deve.

Apresenta-se também o discurso que a terceirização aumenta a oferta de trabalho, de

empregos e mesmo aumenta a qualidade dos mesmos. A realidade e a história brasileira

mostram o exato oposto, pois ela tem sido a porta de entrada da precarização das condições

de trabalho. Não é a única forma de precarizar, mas é um jeito de substituir um trabalho com

mais proteção trabalhista por um com menos e, em geral, é o que acontece na terceirização de

mão de obra e serviços.

Em termos jurídicos, contrato de trabalho é caracterizado por ser uma relação sinalagmática.

Por conta disso, o empregado cede a força do trabalho para receber o salário e demais

obrigações trabalhistas. Esse condicionamento recíproco que marca o sinalagma do contrato

de trabalho também se justifica de forma lógica. Além de ser um elemento contratual, jurídico-

formal, caso o contrato e a relação jurídica sejam despidos desse elemento, encontra-se uma

relação muito lógica, pois, seja para o empregador empresa (principalmente) ou não-empresa

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(por equiparação), irá valorizar o empreendimento do empregador empresa e beneficiar o

empregador não empresa.

É uma questão de raciocínio. Aquele que se beneficia (direta ou indiretamente) da força de

trabalho alheio ou que tem seu empreendimento econômico beneficiado pela força de

trabalho alheio está enriquecendo em função do trabalho de alguém, valorizando seu

empreendimento ou atividade, econômica ou não, em função do trabalho alheio.

Se há um processo de valorização dessa força de trabalho, promovida no empreendimento ou

atividade não econômica do empregador, nada mais justo do que provisionar uma parte desse

enriquecimento para justamente garantir a satisfação dos direitos trabalhistas.

Aquele que se beneficia (direta ou indiretamente) da força de trabalho alheio é o responsável

pelas obrigações trabalhistas. O contrato de trabalho funciona nessa lógica. Formalmente o

responsável trabalhista é quem assina a carteira de trabalho e é o empregador, mas,

materialmente, o responsável, seja uma incorporação, um imbróglio jurídico gigantesco, o

responsável trabalhista é aquele que mais imediatamente teve seu empreendimento

beneficiado pela força de trabalho do trabalhador, é ele a quem a lei irá apontar como

responsável.

A terceirização vem como exceção à regra acima exposta. O direito do trabalho lida com isso,

que está na realidade trabalhista e no Judiciário, através da súmula 331 do Tribunal Superior

do Trabalho, pois ainda não há uma lei para este tema.

SÚMULA 331 DO TST - CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação

do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e

31.05.2011.

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo

diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº

6.019, de 03.01.1974).

II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo

de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37,

II, da CF/1988).

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância

(Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços

especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e

a subordinação direta.

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IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a

responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que

haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem

subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa

no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na

fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço

como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das

obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas

decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

A súmula rompe com a lógica que defende que é possível terceirizar quando a atividade é

meio do tomador, e não pode terceirizar quando é fim. Essa lógica não é correta à luz da

súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, pois ela permite a terceirização mesmo em

atividade fim, em hipóteses especiais.

É importante entender que a súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho é responsável por

fazer a terceirização permanecer como exceção. A súmula irá impor uma série de obstáculos

formais. Só há terceirização lícita quando se cumpre todos os requisitos da súmula 331 do

Tribunal Superior do Trabalho. Os obstáculos servem justamente para manter a terceirização

como exceção, para que ela não se converta em regra, não se generalize no mercado de

trabalho brasileiro.

Caso todos os obstáculos sejam cumpridos, a terceirização é lícita, todavia, faltando apenas

um a ser cumprido, será ilícita.

Terceirização ilícita é terceirização que não existe, pois não é válida para o direito do

trabalho. Se não se autoriza a delegação do custeamento trabalhista para um terceiro, a

terceirização, a exceção, cai-se na regra. A regra é que quem se beneficia da força de

trabalho alheia custeia os encargos trabalhistas.

O Judiciário ainda está caminhando na formalização da terceirização.

Se a empresa interposta assinou a carteira de trabalho do trabalhador terceirizado,

simplesmente não importa, o responsável trabalhista verdadeiro assine de novo. O vínculo

sempre se forma com quem toma o serviço diretamente, que explora a força de trabalho

diretamente, valorizando seu empreendimento ou atividade não econômica diretamente. A

regra é o contrato bilateral, o sinalágma do contrato de trabalho.

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A Origem da Terceirização e sua Evolução.

O nascimento, como terceirização da produção.

Na origem da terceirização está a terceirização da produção. No método pós-fordista há a

terceirização da produção. É a indústria automobilística que se reduz à montadora, reunindo

pedaços do carro criados por empresas especializadas que servem como atividades meio dessa

montadora. A atividade fim é conceber o veículo, criar, montá-los e vende-los. A atividade

meio é a empresa de chassi, pneu etc.

Da Terceirização da produção para a terceirização de serviços.

Da terceirização da produção foi-se para a terceirização de serviços e, em uma empresa de

serviços, pode haver diversos serviços que serão delegados para terceiros e que serão mais

bem prestados por terceiros (empresa especializada em segurança e vigilância, por exemplo,

pois, por ser especializada, tem condições de prestar um serviço melhor do que aquele

contratado pelo empregador sem experiência na área).

Da Terceirização de Serviços para terceirização da mão-de-obra.

Da terceirização de produção foi-se a terceirização de serviço. Desta foi-se para a terceirização

de mão de obra. Isso significa contratar um trabalhador através de uma empresa cuja

finalidade é vender trabalhadores. É uma contratação por intermediários, por uma empresa

interposta é ilegal. No capitalismo, ao invés de contratar o trabalhador como mercadoria

(escravo), contrata-se sua força de trabalho. O trabalhador não deve ser só uma pessoa, mas

um sujeito de direitos, livre e igual, pois deve fazer o contrato e só é possível fazer o contrato

sob essas condições.

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O capitalismo precisa do trabalho assalariado livre para que o sujeito de direitos trabalhador

tenha sua força de trabalho contratada que, quando articulada com os outros fatores de

produção da empresa, dará muito mais dinheiro do que dava a produção agrícola, cafeeira

escrava etc., pois haverá maior acumulação e capital. Assim acabou a escravidão

Porém, o capitalismo tem franja e, em alguns momentos, precisa super explorar o trabalhador.

Não é escravismo, de antes do capitalismo, pois vivemos outro modo de produção, ele é um

super explorado. O Brasil teve um salto de crescimento muito grande com as “commoditties”

desde a década de 90 até agora, pagou-se dívidas e houve acumulação de capital (somos o

primeiro produtor de carne, soja e trigo). No entanto a ONU disse que isso foi conseguido á

base de super exploração do trabalho e alta degradação do meio ambiente, uso irracional dos

recursos naturais e ambientais.

A terceirização de mão de obra (e não os outros tipos) vai se assemelhar a essa super

exploração do trabalho. A terceirização de produção é menos regulada pelo direito do trabalho

e é vista como grupo econômico. A terceirização de serviços é terceirização de trabalho

também, mas não é somente da mão de obra, pois envolve o know-how. A terceirização de

mão de obra é a intermediação da mão de obra. Esta última, a marchandage, que é

transformar o trabalhador em mercadoria, é proibida, à exceção da lei 6.019 de 1974 que

dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas.

Na referida lei a relação tripartida da terceirização há a permissão por um prazo de

trabalhadores que são agrupados, reunidos, selecionados e eventualmente treinados e

capacitados pela empresa de trabalho temporário (empresa locadora de mão de obra, como

diz a lei) aluga gente para a empresa tomadora de mão de obra. É um contrato civil. Seria um

contrato temporário. Seria quase como uma compra por catálogo, um aluguel de gente,

contratar via empresa interposta, que faz locação de mão de obra. O direito de trabalho não

permite isso, mas a lei 6.019 de 1974 abriu a primeira exceção.

Há certa semelhança com a “pejotização”, mas nesta é através de empresa prestadora de

serviços que, na realidade, não presta serviço nenhum, pois o que está sendo contratado é a

mão de obra.

A terceirização pode ser feita através da lei 6.019 de 1974 e os requisitos da súmula 331 do

Tribunal Superior do Trabalho foi transposta para elas. Faltando um deles o Judiciário

despreza e considera só quem trabalhou e quem tomou o serviço, que se apropriou

diretamente do serviço.

O inciso III da súmula trata da terceirização de serviços:

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de

vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de

serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a

pessoalidade e a subordinação direta.

Há a empresa prestadora de serviços e a empresa tomadora de serviços.

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Requisitos para Terceirização

1º Requisito: Especialização;

2º Requisito: Atividade meio da tomadora;

3º Requisito: Ausência de pessoalidade;

4º Requisito: Ausência de subordinação:

São quatro obstáculos que a súmula estabelece para serem transpostos para a terceirização

ser lícita. Neste caso funciona-se como a montadora de automóveis, mas em termos de

prestação de serviços. Delega-se para empresas especializadas a prestação de determinados

serviços, pode-se terceirizar qualquer coisa que seja a atividade meio, enquanto empresa

tomadora de serviços, e, então, procuram-se as empresas inseridas nessa atividade meio

sendo que o trabalhador terceirizado é empregado na empresa interposta, mas presta o

serviço para a empresa tomadora de serviços.

1º Requisito: Especialização

A empresa prestadora de serviços deve prestá-los de forma especializada, o serviço é um todo

orgânico e o trabalho humano é apenas um dentre diversos fatores, não o único, pois não

pode sê-lo. Se só se aloca mão de obra, se está intermediando mão de obra. Exemplo: uma

empresa de conservação e limpeza que só faz juntar trabalhadores de um lado para pô-los

para trabalhar de outro lado. Isso é uma empresa prestadora de serviços e o contrato de

natureza civil firmado com a empresa tomadora está vinculado com o número de

trabalhadores inclusive.

Quanto mais trabalhadores, mais alto o valor do contrato. Só tem trabalhador e mais nenhum

diferencial é intermediação de mão de obra, que não pode ser feita fora da lei 6.019 de 1974.

A empresa de conservação e limpeza pode apresentar um diferencial no mercado, alguma

técnica (limpar fachadas, processo de higienização de carpete diferenciado, por exemplo),

fornece os materiais de conservação de limpeza, cuidado especial com material sensível etc.

Por isso, se torna serviço especializado, mas é uma unidade orgânica inserida no mercado

concorrencial. Tem que ser especializada. Só locação de mão de obra é terceirização ilícita,

pois só locação de mão de obra deve observar a lei 6.019 de 1974.

2º Requisito: Ser Atividade Meio

Os serviços apresentados pela empresa prestadora de serviços estão ligados à atividade meio

da tomadora, pois não podem prestar serviços na atividade fim na tomadora. Essa

diferenciação é complexa e normalmente se usa o contrato social da empresa tomadora. Olha-

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se o objeto do contrato social. Por exemplo, uma empresa metalúrgica que faz ligas metálicas.

Todas as atividades que correm para a produção de tais ligas são atividades meio. As etapas

produtivas para a produção desse bem é atividade fim e o resto é atividade meio. No entanto,

existem contratos em que existem várias atividades fim e aí é mais difícil se identificar.

Outra dificuldade é que a definição de atividade meio varia de acordo com a autonomia do

serviço prestado ou a importância deste para o gerenciamento estratégico da empresa

tomadora (uma definição da manutenção ou não do negócio da tomadora).

O departamento jurídico de uma tomadora pode ser terceirizado. As grandes corporações,

quase todas, terceirizaram os serviços jurídicos e houve a precarização do serviço, fazendo

com que o salário do advogado caia bastante.

O departamento de recursos humanos pode ser terceirizado, dependendo da autonomia

gerencial desse setor, ou seja, do que esse departamento faz concretamente. Se apenas

gerencia informações trabalhistas, tributárias, arquiva dados (se concorre nesta uma empresa

que possui um determinado sistema de computador que organiza esse tipo de informação e

assegura que as obrigações estarão em dia). Essas parecem ser atividades meio, aí pode

terceirizar.

No entanto, existem departamentos de pessoal que tomam toda decisão referente à

admissão, punição e demissão de empregados. Imagine uma empresa onde não se pode

admitir ninguém, pois isso é delegado, o mesmo para demissão e punição. Isso é abrir mão do

poder empregatício e isso pode levar risco ao seu próprio empreendimento. Quem é

proprietário privado dos meios de produção não abrirá mão de seu poder de gerir seu próprio

negócio (poder diretivo).

Pode até haver uma consultoria, mas quem decide é o proprietário dos meios de produção,

que pode ou não acatar os planos do administrador, do gestor ou demitir todos eles. Ele não

irá delegar o serviço inteiro para outra empresa, pois não há sentido em ter uma empresa e

não poder geri-la.

Então, interferir nos comandos e gestão estratégicos que dizem respeito à própria

manutenção do seu empreendimento se aproxima da atividade fim e isso é indelegável.

Muitas vezes só na prática dá para saber se é atividade meio ou atividade fim. Deve-se olhar a

realidade da empresa.

Isso se aplica menos ao setor público. A atividade fim do setor público é o interesse público,

que é um conceito jurídico indeterminado. No caso do ascensorista que trabalha nos

elevadores do tribunal é fácil de perceber a terceirização (não estão relacionadas à atividade

fim), mas existem meios de burla como as O.S, que são concessões, contratos de parceria ou

concessão, que se fazem (não mediante terceirização de serviço propriamente dito, mas são

brechas aberta por leis, pela Constituição estadual).

No caso do ascensorista, não é ele que em si que tem a especialização, mas a empresa que

fornece os serviços de ascensoristas, portaria etc. Na Faculdade Nacional de Direito - UFRJ as

ascensoristas são terceirizadas, a segurança também. O tomador é a Administração Pública.

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3º Requisito: Ausência de Pessoalidade

Não pode haver pessoalidade entre o trabalhador terceirizado e a empresa tomadora. A

pessoalidade é a identificação da pessoa que via trabalhar de acordo com as suas qualidades e

características pessoais. A empresa tomadora não pode ter nenhum tipo de ingerência a

respeito da pessoa que vai trabalhar para ela, via empresa de prestação de serviços. Quem

decide quem vai ou não trabalhar é só a empresa prestadora de serviço.

A empresa tomadora de serviços não pode identificar nem o grupo de pessoas (mulheres de

até vinte anos de idade com peso aproximado de sessenta quilos, seguranças negros de altura

de 1,90m e aproximadamente cem quilos). Contrata-se o serviço, pouco importa quem vem, o

que foi contratado foi o serviço prestado. Caso se contrate uma empresa de manutenção de

computadores, pouco importa se vem o profissional A, B ou C, o que importa é o serviço.

Nesse sentido a rotatividade de mão de obra em uma empresa tomadora é sempre

interessante para que não se formem esses vínculos de pessoalidade.

Houve um caso fraude na qual o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região já se valeu da

prática de manter as pessoas contratadas para segurança, ascensorista, mas mudar as

empresas interpostas (praticamente mudou o uniforme, as pessoas continuaram). Como pode

mudar a empresa prestadora de serviço e manter a pessoa? Não pode, caracteriza

pessoalidade. Os trabalhadores terceirizados da empresa A se mantiveram com a empresa B,

isso é pessoalidade, terceirização ilícita.

Excepcionalmente podem-se identificar os trabalhadores terceirizados (presta-se serviço para

uma empresa que tem um estabelecimento em um prédio comercial que identifica todas as

pessoas que ingressam no prédio, com credencial para passar a roleta). Nesse caso, para

agilizar o serviço, manda-se a lista e os terceirizados são identificados diretamente, mas a

empresa tomadora não está determinando quem vai trabalhar, pois isso foi feito pela empresa

prestadora de serviço. Isso não é pessoalidade. Sempre que for justificável a identificação do

terceirizado não ilicitude, motivo de segurança é uma.

O que pode ser feito é: “com este funcionário terceirizado X, o contrato não está sendo

cumprido adequadamente”. Nesse caso, avisa-se à empresa interposta e esta troca ou não

troca. Caso continue não cumprindo pode ensejar algum tipo de cláusula penal porque o

serviço não está sendo cumprido ou faz-se a substituição para regularizar o serviço. A empresa

tomadora pode comunicar que tal empregado não está prestando o serviço de maneira

adequada, mas não pode falar que tal trabalhador não voltará mais lá, pois isso é

subordinação, é uma ordem. Pode haver a comunicação entre empresas e a empresa

prestadora de serviço o retira de lá.

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4º Requisito: Ausência de subordinação

O tomador do serviço ou seu preposto não pode determinar o modo de realização do trabalho

do trabalhador terceirizado. Quem determina o modo de realização o trabalho do trabalhador

é empregador, este que não é a empresa tomadora, mas sim a prestadora de serviços que,

essa sim, o determinará. Quem comanda esse contrato é a empresa prestadora de serviço e a

tomadora nunca pode interferir ou fiscalizar a mão de obra individual, mas somente o serviço

através da mão de obra, mas isso é diferente de dar ordens diariamente.

Um exemplo: a UFRJ contratou empresa terceirizada para prestação de serviços de limpeza, aí

o professor Flávio Martins (diretor nesta época) caminha pelos corredores da faculdade junto

com o Douglas, que é o fiscalizador desse serviço. De repente, flagram um funcionário

pendurado no ventilador para poder limpar a parte de cima do mesmo. Eles vão sair correndo

para o segundo andar e pegar o telefone para ligar para a empresa prestadora de serviços para

comunicar a situação? Não.

O professor Flávio Martins pode dar ordens simples, por exemplo, “não passe tal produto na

mesa, pois essa mesa é centenária, é da época da faculdade do Brasil, da faculdade livre etc”.

Isso é uma situação pontual, é diferente de ficar todo dia falando com o empregado. Ele, nesse

caso, irá se reportar sobre o mau serviço prestado. Havendo um motivo razoável, é possível

dar ordens.

Subordinação é o controle sistemático de cada empregado com emanação de ordens e

discriminação de tarefas e controle e punição. O tomador não pode punir o empregado

terceirizado, suspender o mesmo, que faz isso é o empregador. Caso contrário, não

cumprido qualquer dos requisitos, o vínculo forma-se com o tomador do serviço.

Não há terceirização ilícita, o direito do trabalho só enxergará quem trabalhou e quem se

beneficiou diretamente. Quem se beneficiou com o trabalho alheio é o responsável pelo

cumprimento das obrigações trabalhistas. É responsabilidade integral e exclusiva do tomador.

Não há solidariedade ou subsidiariedade aqui,

O inciso IV trata de responsabilidade no caso de terceirização lícita. A empregadora é a

empresa de trabalho temporário ou prestadora de serviço (empresa interposta).

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a

responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que

haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

Na responsabilidade subsidiária, temos um obrigado, que é o principal e, em um nível

hierárquico inferior, o subsidiário. Para o inciso IV da súmula 331 o principal é a empresa

interposta e o subsidiário é o tomador do serviço. Só se busca o patrimônio do segundo

quando se demonstra execução inviável do patrimônio da empresa interposta.

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Na obrigação subsidiária há hierarquia entre os devedores, diferente da solidária, onde não há

hierarquia, pois estão situados no mesmo plano, são codevedores.

Requisitos para que a Empresa Tomadora Responda Subsidiariamente (inciso IV, da

Súmula 331).

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a

responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações,

desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo

judicial.

A terceirização aqui é lícita, cumpriu todos os requisitos da lei 6.019 de 1974 e inciso III da

súmula, mas ainda assim a súmula tenta assegurar o crédito trabalhista atribuindo

responsabilidade subsidiária para a empresa tomadora. Isso dentro do processo. Existem dois

requisitos de ordem processual para que essa responsabilidade subsidiária se aplique ao

tomador.

1º Requisito: A Empresa Tomadora deve ter participado da relação processual.

O primeiro é que a tomadora tenha participado da relação processual e conste no polo passivo

da reclamação trabalhista desde o começo, é reclamada, “litisconsórcio passivo necessário”,

entre aspas porque só a lei pode criar isso, mas estamos usando uma súmula. O mesmo

serviria para criação de responsabilidade subsidiária. Há um problema de legalidade da

súmula, mas o Tribunal Superior do Trabalho não liga para isso, até mesmo porque ele fez a

súmula. Teoricamente pode-se argumentar, e é verdade, que isso infringe a separação dos

poderes. Isso se justifica para preservar a ampla defesa e o contraditório da própria tomadora.

2º Requisito: Conste também no título executivo judicial

O segundo é que conste também o título executivo judicial – decisão transita em julgado,

como sentença ou acórdão, que deve condenar expressamente, de modo subsidiário, a

reclamada, a tomadora. Isso desafia os Embargos de Declaração.

O inadimplemento implica a responsabilidade subsidiária. Isso é responsabilidade objetiva, não

se falou em momento algum em culpa. É objetiva. Nas defesas do tomador sempre tem o

argumento de não haver culpa in elegendo, pois procurou contratar empresa idônea,

reconhecida pelo mercado e que presta serviços para grandes corporações há muito tempo e

não haver culpa in vigilando, pois todas as obrigações trabalhistas deveriam ser comprovadas

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 145

para a tomadora, antes de ela pagar o preço pelo serviço (apresentar folhas de pagamento,

recolhimentos previdenciários).

No entanto a empresa e os sócios sumiram, era uma empresa de fachada (isso ocorre muito

frequentemente com empresas interpostas). Todos os endereços dos sócios eram

fraudulentos e, aí, cai-se no patrimônio da tomadora para se garantir o direito trabalhista do

trabalhador. Mesmo alegando isso tudo o Judiciário vai para o patrimônio da tomadora.

Obviamente, para parte da doutrina, por não ser possível uma súmula criar responsabilidade

objetiva, pois esta decorre somente de lei, pois não tem poderes para isso, em termos

teóricos, a responsabilidade seria subjetiva, por mais que não se extraia isso do texto. O texto

não diz expressamente que é objetiva e ela não pode ser presumida. Em concurso diz-se que é

subjetiva, na prática é sempre usada como objetiva. Se a interposta não aparece à tomadora

arca com a dívida na prática. Tem que estar no polo passivo ou na sentença (ou acórdão).

Lei de Trabalho Urbano Temporário (lei 6.019 de 1974)

Requisitos para Contratação do Empregado Temporário:

Prazo (3 meses);

Admissibilidade;

Registro no TEM e outras formalidades.

O contrato de trabalhador temporário deve durar, no máximo, três meses, para que essa

condição não se generalize. A lei prevê hipótese de prorrogação de mais três meses através de

autorização do ministério do trabalho através do órgão chamado superintendência regional do

trabalho, que será responsável por absorver os requerimentos justificados de prorrogação. Se

houve algo positivo na prorrogação, como promessa de contratação de parte dos funcionários,

pode-se prorrogar por mais três meses. Mais que isso não pode.

O segundo diz respeito a hipóteses de admissibilidade. Não são quaisquer hipóteses que

permitem contratação de trabalhador temporário. A lei determina apenas duas.

Hipóteses de Contratação do Empregado Temporário

1ª Hipótese: Substituição Temporária de Pessoal.

A primeira é a substituição temporária de pessoal regular ou permanente da tomadora, esta

que tem seu pessoal próprio, mas, eventualmente, há necessidade de substituir um

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 146

empregado que está afastado com o contrato suspenso, interrompido, doente, de férias,

licença maternidade etc. O prazo ainda é três meses.

2ª Hipótese: Acréscimo extraordinário de demanda da tomadora.

A segunda é o acréscimo extraordinário de demanda da tomadora. A empresa tomadora tem

uma demanda anual média, e, extraordinariamente, de forma pontual ou sazonal, pode haver

uma demanda excepcional de produtos ou serviços e, para dar conta disso, dessa demanda da

tomadora, pode haver contratação de pessoal pela empresa de trabalho temporário. É o caso

de comercio varejista no final do ano, com o natal que é na época do décimo terceiro ou no dia

dos pais etc. Demonstrando esse acréscimo extraordinário de demanda para o ministério do

trabalho e possível a contratação temporária.

Aqui é uma exceção onde se permite terceirizar na atividade fim. Indica-se o trabalhador que

se quer, se dá ordens para ele e está inserido na atividade fim e há também subordinação

(contratação de funcionário temporário em comércio varejista, por exemplo). Mas não há

onerosidade da empresa tomadora para com o trabalhador, pois a empresa tomadora paga a

empresa interposta, esta quem paga o salário, as obrigações trabalhistas. A empresa tomadora

não paga nada ao trabalhador, mas paga o preço dele mais a taxa de administração e algo

equivalente a encargos que ela não tem que pagar ao trabalhador.

Qual a vantagem de contratar o funcionário temporário? Não era melhor fazer um contrato de

experiência de 90 dias? Em geral o preço equivale entre os encargos pagos em relação a um

trabalhador permanente, ou até menos, em relação ao que se paga para uma empresa de

trabalho temporário, mas a vantagem é o tempo ganho com capacitação e seleção, pois a

empresa interposta já fez todo esse processo seletivo.

Isso também é uma forma de precarização do trabalho, gera flexibilização e reduz a mão de

obra, há sempre a ameaça de ser substituído. No caso do substituto a sempre uma isonomia,

pois o substituto deve ganhar sempre o mesmo que o substituído, mas no caso da demanda

extraordinária não.

Formalidades Para Contratação de Trabalho Temporário.

A lei também apresenta uma série de formalidades.

Contrato escrito empregado e empresa de trabalho temporário (ou empregado, se

este pessoa física);

Contrato escrito entre empresa de trabalho temporário e empresa tomadora;

Registro da empresa de trabalho temporário no MTE.

Há a exigência de fazer o registro no TEM, eventualmente no CRPJ, na junta comercial

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 147

A empresa de trabalho temporário deve também, além de tudo, registrar no TEM para

identificar o tipo de trabalhador ofertado, verificar se os contratos estão precarizando muito a

condição de seus trabalhadores. Não há fiscais suficientes e na prática não há fiscalização. Mas

é uma formalidade e se não for cumprida a terceirização é ilícita. Se a terceirização é ilícita o

vínculo forma-se com o tomador.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 148

Aula 14 – Direito do Trabalho I dia 06/06/2013

Terceirização na Administração Pública

A rigor, a terceirização da Administração Pública começou antes de ela ser inserida no âmbito

privado. O decreto-lei 200 de 1967 estabeleceu pioneiramente, quando se tentou organizar a

Administração Pública, a possibilidade de transferir para terceiros privados as atividades que

não eram desenvolvidas sem nenhum tipo de consecução ao interesse público, como

conservação e limpeza, vigilância, ascensoristas.

Todas essas atividades estavam presentes na Administração Pública, mas não vislumbravam

nenhum tipo de interesse público e, evidentemente, por esse motivo, não necessitavam da

mesma proteção.

É interessante notar que tais atividades, já no decreto-lei 200 de 1967, eram vistas como

passíveis de serem ofertadas como serviço orgânico. A ideia da Administração Pública sempre

foi essa, que a terceirização fosse tomada por ela como serviço e não como contratação de

mão de obra.

Especifica-se aqui (pois a Administração constantemente burla esse tipo de aspecto) é que a

terceirização possível em seu âmbito é a de serviços, que evidentemente será regulada pela lei

8.666 de 1993 (lei de licitações e contratos). O serviço está definido em tal lei, assim como as

modalidades de contratação de serviços e, dessa forma, se estabelece que tais serviços devam

ser feitos com cuidado especial na escolha, sendo que tal cuidado se materializa justamente no

edital de licitação, pois nele se pedem garantias e apresentam-se exigências quanto à

solvabilidade da empresa prestadora de serviços.

Tem-se também a possibilidade de vislumbrar o patrimônio da empresa prestadora de

serviços. É uma série de requisitos que inexistem no âmbito privado. A Administração Pública

tem muito mais mecanismos para se cercar da solvabilidade (patrimônio) da empresa

prestadora de serviços. É bem menos arriscado para Administração que uma empresa

prestadora de serviços venha inadimplir com as parcelas trabalhistas e desapareça (algo que

acontece frequentemente no âmbito privado).

Logo, o problema da Administração Pública não é propriamente um problema em relação à

qualidade da prestadora de serviço, pois esse aspecto é até bem selecionado. Após isso, ao

longo da realização do contrato, a Administração Pública também controla de forma mais

rígida que a tomadora privada de maneira que possui uma série de formalidades (relatórios,

por exemplo) e uma pessoa em selecionada como responsável para fazer o acompanhamento

(a lei 8.666 de 1993 define todas essas obrigações ao longo do contrato). O dever de

fiscalização serve para que o controle e vigilância dessas obrigações trabalhistas sejam feito

mais detalhadamente.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 149

O trabalho temporário na Administração Pública.

A grande burla ao artigo 37...

O problema é que a Administração Pública quer burlar as hipóteses de terceirização

relacionadas ao serviço e tenta fazer isso através, basicamente, do artigo 37, inciso IX da

Constituição Federal que autoriza a contratação de trabalho temporário (não tem nada a ver

com o conceito de trabalho temporário da lei 6.019 de 1974).

A lei 8.745 de 1993 dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a

necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX do art. 37 da

Constituição Federal. Esta discrimina o que é especial interesse público e traz as hipóteses de

contratação de pessoas em regime temporário e inclusive, por essa lei, a contratação pode vir

sem concurso público.

Na forma da lei 8.666 de 1993 a licitação de contratação de pessoas, se dá por concurso, mas

há as hipóteses de urgência, emergência ou substituição por processo seletivo simplificado,

que é o que a UFRJ faz para contratar professor substituto, que é uma hipótese presente na lei

8.745 de 1993, dentre outras possibilidades de contratação.

Assim, a Administração Pública por muitas vezes, tentará se valer dos institutos e lei acima

mencionados para contratação de pessoal para cumprir funções de serviços, que deveriam ser

contratados por meio de serviços, ou para contratar pessoas que estão no âmbito da

finalidade da Administração Pública50. É uma farra de irregularidades com relação à

terceirização. Todas elas são irregulares e, por isso, não podem constituir vínculo.

A regra para contratação de pessoal é o art. 37, II, parágrafo segundo da Constituição Federal,

o concurso público. A Administração Pública constantemente tenta burlar isso e esse é o

grande problema.

Existem problemas decorrentes no âmbito da contratação da contratação pública de celetistas

(empregados públicos) sem concurso público que levou à criação da súmula 363 do Tribunal

Superior do Trabalho51. Isso mostra que o Brasil tem muita dificuldade de adota e concretizar

um projeto republicano (projeto burguês), criado na época da Revolução Francesa, pois as

relações feudais que foram transpostas pelo antigo regime eram pessoais, tanto no âmbito do

trabalho.

Fosse à corporação de ofício ou no feudo a relação é pessoal uma vez que o vassalo mata e

morre pelo senhor feudal e este protege a vida do vassalo. É uma relação pessoal, até pelo

nome. Na corte havia também essas relações pessoais, patrimoniais, historicamente. É isso

50

Inclusive isso é vislumbrado por que muitas vezes se substitui pessoal de carreira por pessoal contratado através de contrato temporário, algo não permitido por toda essa legislação. Às vezes, tem-se até provimento dos cargos por concurso público, no qual as pessoas são aprovadas, mas não são chamadas e são contratados por terceirização pessoal. 51

Pode ser vislumbrada na íntegra na página 78.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 150

que burguesia queria romper, pois havia a ideia de que se acessava o poder em virtude de

contato e conhecimento pessoais, confundindo-se o espaço público com o privado, é o

patrimonialismo. O Estado cultural é uma das mazelas sociais que infectam o DNA brasileiro.

A Constituição Federal de 1988 deu um passo importante no sentido de acabar com o Estado

patrimonial, ao menos sob o ponto de vista das regras jurídica. O caput do art. 37 demonstra

os princípios republicanos de origem burguesa que servem para superar o Estado patrimonial,

mas a constituição continua sendo desrespeitada e as pessoas são colocadas para dentro da

Administração Pública em qualquer órgão, ente federativo, autarquia, fundação ou, no âmbito

das estatais de direito privado, as empresas públicas e sociedades de economia mista sem o

concurso público.

Isto ainda é um grande problema para a Administração Pública uma vez que toda relação

clientelista e fisiológica é feita com base na nomeação (vote em mim e eu colocarei seu filho

em um cargo dentro da Administração). Essas teias de relações fisiológicas e clientelistas

continuam na realidade do país.

A terceirização que é vendida serve para tornar a produção mais eficiente, assim como os

serviços, pois se contrata pessoal especializado e a tendência é que a produção melhore.

Deixa-se de se contratar qualquer um para se contratar uma pessoa especializada e, desta

forma, é possível se concentrar na sua atividade fim e melhora-la. A ideia é qualificar a

produção de bens e serviços.

A Administração Pública deveria se valer desse exemplo. No entanto é usada (assim como o

âmbito privado o faz para precarizar e reduzir custos simplesmente, ao invés de se preocupar

em qualificar a produção), não para avançar no sentido de romper o Estado patrimonial, mas

como instrumento do patrimonialismo e burlar as regras do concurso público, assim como as

regras de proteção estatutária e regulatória do celetista.

Quem exerce interesse público invariavelmente se confrontará com interesses políticos e

econômicos, portanto, esse sujeito deve estar protegido para que, de fato, consiga atingir o

interesse público. Esse sujeito precisa de regras de proteção, mas, criou-se a imagem de que o

servidor público é um vagabundo. Existem vários que são, mas não é por causa disso que o

gênero todo é. Chega a ser pré-histórico rotular o Estado como ruim ou ineficiente por

natureza. Os serviços públicos funcionam bem em outros países. O Estado foi criado pelo

homem, portanto, pode o homem torna-lo bom ou ruim, não há algo bom ou ruim por

natureza quando se fala de criações humanas. Deve-se para com essa fetichização, assim como

se deve parar de fetichizar a natureza humana como ruim.

Em todo caso, em termos administrativos, o problema da Administração Pública, é

efetivamente o concurso público como o principal. O decreto 2.271 de 1997 que regulamenta

a lei 8.666 de 1993. Existem também algumas instruções normativas que especificam ainda

mais esse decreto.

Se um serviço foi contrato e, nos termos do inciso III da súmula 331 do Tribunal Superior do

Trabalho (na íntegra na página 129), tem pessoalidade ou subordinação, a terceirização é

ilícita. Não há sequer terceirização a ser considerada. No âmbito da Administração vale o

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 151

mesmo raciocínio, mas a consequência é diferente. No âmbito privado, se não há

terceirização, o vínculo é formado com o tomador do serviço.

Aplicando-se esse raciocínio com a Administração Pública (vínculo com a tomadora do serviço,

que seria a própria Administração) chega-se ao mesmo problema que se tenta sanar. Não pode

entrar na Administração como pessoa contratada sem concurso público.

O inciso II da súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho menciona a hipótese da

terceirização no âmbito da Administração Pública. A partir daqui existem algumas correntes:

1ª Corrente: Não tem vínculo e, ou descarta-se a possibilidade de terceirização lícita e

havendo, na verdade, uma nomeação irregular, um servidor de fato, um trabalhador

que trabalhou no âmbito da Administração Pública sem poder trabalhar e, por isso,

aplica-se como direitos desse trabalhador a súmula 363 do TST. Esta determina que ele

só tenha direito aos salários e fundo de garantia. Aplica-se a mesma consequência para

terceirização lícita e ilícita que é a responsabilidade subsidiária para pagar os direitos

trabalhistas desse sujeito que foi contratado através de uma terceirização de serviços

que era ilícita, pois não tinha todos os requisitos.

2ª Corrente: Adota o inciso V da súmula 331 do TST que é voltado para casos de

terceirização lícita. A consequência da terceirização lícita no âmbito privado é a

responsabilização obrigatória da empresa interposta e, em caso de inadimplência,

implica a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços. No âmbito da

Administração Pública, a terceirização lícita é tratada no inciso V da súmula 331 do

TST. Exige-se que a responsabilidade subsidiária seja condicionada por culpa da

Administração. A responsabilidade subsidiária só a alcançará se restar demonstrada

sua culpa.

Na realidade, a súmula só está se adequando à Ação Direta de Constitucionalidade 16 que foi

julgada pelo Supremo Tribunal Federal em 2012. A responsabilidade da Administração Pública

era veiculada pelo inciso IV, que tinha a mesma redação com a única diferença do acréscimo

da expressão: “como tomador a Administração Pública”. Inadimpliu o empregador caiasse na

responsabilidade subsidiária desde que haja participado do processo e desde que conste no

título executivo judicial.

Os requisitos eram iguais assim como forma de redigir. Havia uma responsabilidade

perceptivelmente objetiva que, em tese, é subjetiva, mas na prática era objetiva, pois não se

questionava nada sobre culpa.

No final da súmula 331, o Tribunal Superior do Trabalho, propositalmente colocava entre

parênteses “art. 71 da lei 8.666 de 1993”. Tal artigo diz que a Administração Pública não possui

nenhuma responsabilidade por descumprimento de obrigação trabalhista, dentre outras, de

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 152

empresa contratada para prestar serviços. A Administração não poderia se responsabilizar por

nada que se refira a obrigações trabalhistas assumidas pela empresa contratada para prestar

serviço para ela.

Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários,

fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.

§ 1º - A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais

e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu

pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o

uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis. (Redação dada

pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 2º - A Administração Pública responde solidariamente com o contratado pelos

encargos previdenciários resultantes da execução do contrato, nos termos do art. 31

da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 3º (Vetado). (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994)

Com isso, as fazendas provocaram o supremo porque entenderam que o TST estava julgando a

inconstitucionalidade do art. 71. Isso não é verdade, pois o TST, mesmo conhecendo o art. 71

da supramencionada lei, defendia que não era o caso de aplica-lo em tais hipóteses em virtude

de norma mais favorável que deva ser aplicada, quais seja, os direitos trabalhistas. Era uma

questão de utilização do princípio da norma mais favorável, afastando da incidência o art. 71

do que propriamente a declaração de inconstitucionalidade do mesmo, o que jamais foi feito,

mas poderia ter sido pelo controle difuso (concreto) de constitucionalidade desde que e

estabelecesse a reserva de plenário.

A responsabilidade da Administração era subsidiária e objetiva. Suscitaram no Supremo

Tribunal Federal que o Tribunal Superior do Trabalho estaria declarando a

inconstitucionalidade do art. 71, então submetia-se a própria lei 8.666/93 à revisão de sua

constitucionalidade, à confirmação desta na ADC 16. O Supremo disse que a lei é

integralmente constitucional, está adequada à Constituição Federal de 1988 então possui

nenhum problema de vício de constitucionalidade.

No entanto, no mesmo julgado da ADC 16 o supremo reserva a liberdade, a faculdade, para o

TST e demais tribunais do trabalho para, em determinados casos concretos, afastarem a

incidência de tal artigo quando vislumbrarem que há culpa in elegendo ou culpa in vigilando.

Com isso, como o TST foi prestigiado pela ADC 16, ele mudou o texto da súmula 331,

adequando-o ao julgado de tal ADC para afastar qualquer tipo de reclamação das fazendas

públicas.

Criou-se então o inciso V e destacou-se a responsabilidade da Administração Pública do inciso

IV da responsabilidade geral sobre terceirizações lícitas. Além disso, tirou-se a Administração

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do inciso IV para o inciso V dizendo que ela também responde subsidiariamente, todavia, para

tal, ela tem que ter demonstrada a culpa, especialmente à culpa nos termos da lei 8.666/93.

O TST fez uma interpretação sistemática da lei 8.666/93 e da ordem jurídica. Não é possível

olhar a lei 8.666 e só enxergar o art. 71. Tal artigo retira a responsabilidade da Administração

justamente porque esta fez de tudo para se afastar da responsabilidade, isto é, escolheu

criteriosamente com uma série de formalidades, vigiou detidamente com uma série de

formalidades e não se afastou do dever de fiscalização etc.

O grande problema hoje é que essa fiscalização não é feita, por 90% das reclamações

trabalhistas onde há questionamento da terceirização, que até é lícita, mas não fiscaliza o

contrato, não fiscaliza se a empresa prestadora está cumprindo com suas obrigações nos

termos da lei 8.666 de 1993 (esta que trata de toda a burocracia sobre como a Administração

irá fiscalizar o cumprimento das obrigações, exigindo inclusive documentação periodicamente,

só pagando a empresa interposta se os empregados forem pagos e se o INSS e o FGTS forem

recolhidos). É uma burocracia gigantesca que garante a irresponsabilidade da Administração

Pública.

No entanto, a prática é uma farra. O administrador público escolhe a empresa prestadora de

serviço por interesse próprio e não a fiscaliza. Com relação a isso não adianta a fazenda

reclamar do art. 71 da lei 8.666/93 e sobre a isenção de responsabilidade da Administração. É

claro que ela tem e responde subsidiariamente se for lícita sendo demonstrada a culpa. Como

empregadora, ela tem as obrigações trabalhistas.

]O art. 71 afasta qualquer responsabilidade da Administração Pública por inadimplementos

trabalhistas das empresas contratadas. Ela respondia subsidiariamente, mas sem culpa. Aludia-

se no dispositivo o art. 71 onde o TST falava que conhecia o artigo, mas não o aplicava, era

uma decisão salomônica. O TST também não justificava a decisão com relação ao privado, pois

insere uma responsabilidade subsidiária a qual não se sabe de onde veio; uma

responsabilidade subjetiva mais difícil ainda de se saber de onde veio e não dava satisfação a

ninguém; no entanto, o STF fez uma chamada em relação ao TST e aí houve essa inflexão.

A culpa deve ser provada por quem tem interesse na responsabilidade subsidiária da

Administração. Por exemplo, se há um trabalhador de uma empresa terceirizada que presta

serviço para a Petrobrás e tal empresa terceirizada não paga esse trabalhador sendo que essa

mesma empresa passa por uma crise, é natural que o trabalhador fique com receio de ter seus

direitos pagos; daí é natural querer que a Petrobrás seja chamada para o pagamento dessas

parcelas. Como o trabalhador iria provar que a Petrobrás cumpriu todos os requisitos da lei

8.666/93 para escolha, fiscalização etc? Toda documentação necessária que a Petrobrás detém

(e muitas vezes só ela mesma que detém) para fazer essa fiscalização, como ter acesso a tudo

isso enquanto trabalhador? Em virtude disso, hoje os tribunais sustentam algumas teses de

cunho processual em relação a essa culpa e sua prova, como e por quem ela é provada.

Em termos processuais, a princípio, presume-se que essa culpa existe (é uma presunção

relativa [juris tantum]). A Administração que vem afastar a culpa ao juntar toda a

documentação. Existe um artigo no Código de Processo Civil sobre exibição de documento de

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 154

quem o tem em seu poder. O documento é da Administração e ela deve exibi-lo de qualquer

maneira. Essa é a primeira corrente: presume-se a culpa e a Administração se quiser a afasta.

A outra saída processual é a inversão do ônus, do reclamante para o reclamado dada a

vulnerabilidade para se produzir a prova. A base disso é o artigo 6º do Código do Consumidor.

Esses dois expedientes têm sido utilizados para que a culpa seja provada pela própria

Administração Pública. Na prática o resultado é o mesmo, são caminhos diferentes que

chegam ao mesmo lugar e nos dois se exonera o empregado de provar a culpa. Um auxiliar de

serviços gerais jamais iria provar que a Administração não fiscalizou sua empresa.

Para concluir basta ler o último inciso da súmula 331. A enunciação parece óbvia, mas havia, já

na jurisprudência, algum tipo de controvérsia em relação ao período de responsabilidade

quando os empregados trabalhavam em vários tomadores diferentes. Então, delimitou-se

efetivamente essa responsabilidade para com o período que se trabalhou no tomador, não

tendo este responsabilidade, obviamente, com relação ao período em que aquele trabalhou

em outras empresas tomadoras – e são todas as parcelas trabalhistas desse período em que

aquele trabalhou na tomadora do serviço.

Contrato de Trabalho

O contrato de trabalho é a regra, a terceirização é exceção.

Natureza Jurídica (três correntes)

Sobre a natureza jurídica do contrato de trabalho, existem três correntes principais: os

anticontratualistas, os contratualistas clássicos e os contratualistas contemporâneos.

1ª Corrente: Os Contratualistas:

Os contratualistas clássicos tentarão relacionar os contratos de trabalho com os contratos

afins. A natureza jurídica é a forma que o Direito encontra de dar cientificidade para os seus

institutos. A rigor, no direito do trabalho, usa-se uma perspectiva mais histórica e o assunto

fica menos abstrato.

Sob uma perspectiva histórica, existem duas formas de se explicar o contrato de trabalho.

Como o direito do trabalho surge muito de um pensamento antiliberal, contra o liberalismo

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que dizia “deixe fazer, deixe passar” (laissez faire, laissez passer52) e ninguém interfere na

relação: empregado vs. empregador, pois o Estado não pode se intrometer nisso, pois se os

dois são agentes capazes que façam a relação que quiserem. O liberalismo analisava a relação

de emprego desde uma perspectiva contratual e liberal, ou seja, isenta de qualquer

intervenção estatal.

2ª Corrente: Os Anticontratualistas.

Os anticontratualistas diziam que isso era um absurdo, pois o Estado deveria intervir, pois

entre o fraco e o forte, entre o rico e o pobre a lei liberta e o contrato oprime, a liberdade

oprime e a lei liberta. É preciso a atuação positiva do Estado para proteger o trabalhador, pois

dando liberdade aos dois, o trabalhador será engolido pelo empregador sem que possa fazer

nada. Essa era a realidade das classes trabalhadoras pós-revolução industrial antes do advento

do direito do trabalho; as pessoas trabalhavam vinte horas por dia e caíam mortas na esteira

de produção sendo que sempre havia substitutos para serem explorados da mesma forma.

Dizia-se então que esse contrato era livre, perguntava-se ao

trabalhador: “quer trabalhar vinte horas”? E este, sem escolha,

aceitava, viva a liberdade! O trabalhador concordou, então era a

vontade dele e isso deveria ser considerado à luz do pacta sunt

servanda, as partes são servas do contrato, é o princípio vinculante do

contrato baseado na autonomia de vontade. Pactua-se o que quiser,

vinte horas de trabalho, salário de cinco reais.

Em relação a isso, têm-se vários grupos de pensamento, desde corporativistas a socialistas e

fascistas, gente de direita e esquerda, que dirão que o liberalismo deveria acabar e o Estado

deveria intervir.

Então, os anticontratualistas, principalmente os de matrizes corporativistas francesas e

alemãs, dirão que o contrato de trabalho se explica pelo fato da prestação do serviço do

empregado, sendo este fato como uma integração do empregado a atividade empresarial

como um todo. O contrato de trabalho se explica pelo ato de trabalho, o ato da prestação de

serviço somado a uma série de condições que se estabelecem em virtude dessa prestação de

serviço.

São condições estatutárias, de proteção do trabalhador, de adesão do trabalhador às

finalidades da empresa corporativista. A relação entre empregado e empregador é vista como

uma relação harmônica, como uma relação orgânica; um é o cérebro e o outro o coração do

grande corpo nacional, da nação. Classe trabalhadora trabalha em conjunto e no mesmo

sentido e direção da classe empresarial, rumo ao progresso.

52 Sim, eu falo francês . Ok, só um pouquinho, mas falo mais que o Rafael Ayres.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 156

Sendo assim, os anticontratualistas explicam o contrato de trabalho como ato condição. É o

ato do contrato da prestação de serviço e a condição estabelecida pelo Estado que levanta e

cria um estatuto de proteção ao trabalhador. A teoria institucionalista é uma das teorias que

dizem que o trabalhador não se liga senão a instituição da empresa, ele adere às finalidades

institucionais da empresa. Quando ele presta serviço a uma empresa ele se integra a empresa

e adere às ideias, a finalidade da empresa, ele concorre e colabora para que a finalidade seja

atingida.

Muito disso está sendo retomado no pós-fordismo. Os anticontratualistas explicavam dessa

maneira e não se falava em contrato, pois a teoria contratual liberal e sua vontade não

estariam inseridas aqui. O contrato de trabalho não é originado na vontade das partes, mas no

fato da prestação de serviços, tanto que só há relação de emprego quando há um serviço

prestado de maneira subordinada, habitual, onerosa e pessoal. Antes de o sujeito começar a

trabalhar dessa forma não há contrato de trabalho (pode haver para os contratualistas), mas

para os anticontratualistas não.

Isso remete a questão do pré-contrato. Por exemplo, o processo de seleção para uma vaga e

os estudantes da UFRJ são selecionados por terem um futuro promissor (o que interessa a

empresa), mas, ao mesmo, tempo, eles ainda estão imaturos demais para o trabalho e, por

conta disso, paga-se um curso avançado de idiomas no exterior para realizar contratos

internacionais ou de formação técnica no setor da empresa, tudo custeado pela empresa

interessada. Sem eles sequer terem começado a trabalhar, para que tais estudantes obtenham

know-how.

Ao voltarem, eles resolvem não trabalhar para a empresa que pagou o curso, mas para a

concorrente que fez uma proposta melhor, incide aí responsabilidade civil. Tem que ter

indenização, é um efeito do pré-contrato. O contrário gera a mesma situação, se os estudantes

se endividam para pagar o curso e, ao chegarem ao Brasil, a empresa não quer mais contratá-

los, pois já contratou outros profissionais, isso gera efeito pré-contratual como a indenização

para ressarcir os danos material e moral advindos da quebra da promessa de contratação, pois

a empresa se comprometeu a contratar e não contratou.

Não houve prestação de serviço em nenhuma das duas hipóteses. Sendo assim, os

contratualistas irão dizer que, na verdade, o contrato de trabalho, como todo contrato, é

baseado na vontade. Para os contratualistas clássicos, essa vontade é um dogma, um núcleo

principal do contrato e este só existe enquanto persistir a vontade, pois esta que interessa.

Muitas vezes então, a teoria contratual clássica tentará buscar nos contratos de cunho civil a

explicação para o contrato de trabalho. É um contrato de compra e venda, de prestação de

serviços, de empreitada, de mandato, de comissão mercantil (o Código Civil atual traz essa

modalidade por exemplo, comissão mercantil, agência e distribuição no caso de vendedor,

representação comercial da lei do representante comercial) e tenta explicar o contrato

trabalhista com base nos contratos em espécie do direito civil previstos no Código Civil e do

direito empresarial.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 157

3ª Corrente: Os Contratualistas Contemporâneos

É claro que esses contratualistas clássicos erravam até mais que os anticontratualistas quando

se referiam ao contrato de trabalho e por isso foram todos superados. Os contratualistas

contemporâneos encontraram uma maneira mitigada de se elaborar e justificar o contrato de

trabalho dizendo que tem que ter vontade no contrato de trabalho, pois não houve coação. É

uma vontade bem pequena, pois é mais uma necessidade, mas há um espaço de orientação

para suprir essa necessidade, escolhendo a empresa A ou B, se dedicando mais a uma do que a

outra para conseguir um emprego. Então, há um elemento volitivo, ainda que muito pequeno.

O empregador manifesta sua vontade de contratar aquele empregado em espécie. Então há

vontade.

No entanto, essa vontade será limitada a esse momento inaugural de convergência de

interesses do trabalhador querer trabalhar para aquela empresa e do empregador querer

contratar aquele trabalhador. Depois, essa vontade será limitada por dispositivos de ordem

pública e orientada pelo princípio da realidade. Há um uruguaio chamado Mario de la Cueva

que “matou a charada” do contrato de trabalho, tendo grande aceitação que criou a teoria do

contrato realidade.

Teoria do Contrato-Realidade (professor Mário de la Cueva)

Mario de la Cueva criou a teoria do contrato realidade absorvendo os elementos factuais do

ato condição, nessa compreensão de que o contrato se compõe por essa realidade dos fatos.

Por exemplo, o limite de jornada fixado pela lei e pela Constituição Federal é de oito horas. Se

um sujeito é contratado e no contrato por escrito ficou convencionado que este trabalharia

oito horas por dia, dentro do limite legal e constitucional. No entanto, desde o primeiro dia até

depois de dez anos ele sempre trabalhou apenas sete horas por dia, o empregador nunca

exigiu mais do que isso, com sete horas de horário de trabalho o trabalhador era liberado e,

portanto, fixou-se essa regra; todavia, por escrito, estava convencionado oito horas diárias.

Após dez anos o empregador diz precisar de oito horas. Como está no contrato de trabalho e a

lei autoriza até oito horas, o trabalho então passaria a ser de oito horas. O contrato foi

alterado? O contrato é de sete ou de oito horas? Escrito é oito e na prática é sete.

No contrato civil seria de oito horas, mas no contrato de trabalho é de sete horas. Isso remete

à primazia da realidade, pois o que importa é o que acontece na realidade e não aquilo que é

convencionado abstratamente, solenemente, formalmente. O que está formalizado importa

menos. Como na prática sempre foram sete horas e temos o contrato realidade (a vontade era

oito, mas a vontade é sete) o contrato é de sete horas por dia.

O art. 468 da CLT não permite a alteração in pejus e, exigir a oitava hora leva ao pagamento de

adicional de horas extras, pois a jornada normal do empregado é de sete horas, pois o

contrato realidade determinou isso. O empregador não tinha necessidade de oito horas, mas

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sete, então, cristalizou-se essa condição contratual tornando a jornada do trabalhador uma

jornada de sete horas.

É um caso semelhante ao mencionado em relação ao ex-governador Garotinho, onde a lei não

valia nada, mas o aumento de salário foi dado e criou-se uma condição mais benéfica na

realidade. Os salários majorados foram mantidos, mas não em função da lei mágica, mas em

função da condição mais benéfica.

No caso da Consolidação das Leis do Trabalho, a sua comissão redatora era metade composta

por institucionalistas (variante anticontratualistas) e metade contratualista contemporânea. A

disputa entre os dois foi consolidada com a teoria do professor Mario de la Cueva e os artigos

da Consolidação das Leis do Trabalho caminham todos no sentido do contrato realidade, a

teoria que sintetiza melhor o contrato de trabalho. Nem a vontade vale o que os civilistas

acham que vale, nem também só pode ser uma condição de fato, mero resultado da atuação e

prestação de serviço do empregado, até mesmo porque aquela integração não vale muito,

pois ele é muito mais pré-burguês do que burguês. A burguesia traz a impessoalidade para as

relações humanas.

Características do Contrato de Trabalho

1ª Característica: Privado

O contrato é privado, com dois privados que pactuam a relação jurídica e, quando um polo da

relação, o contratante é a Administração Pública, no regime celetista, ela faz isso como se

privado fosse53. Eventualmente houve a contratação de servidor celetista por outros entes da

Administração Pública direta, mas hoje, com a declaração de inconstitucionalidade da Emenda

Constitucional 19 do artigo 39 da Constituição Federal, nas pessoas de direito público,

estabelece-se a orientação do regime jurídico único estatutário, ao menos para as tarefas

pautadas no interesse público, as outras podem ter terceirização, privatização, concessão,

parceria.

2ª Característica: Pessoal

É pessoal em relação ao empregado e não ao empregador. É a infungibilidade que se exige da

prestação de serviço do empregado, é intuitu personae.

53

O regime celetista é próprio das pessoas de direito privado do âmbito da Administração Pública, as estatais

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3ª Característica: Consensual

É consensual porque não há formalidade específica. Está presente no art. 442 da Consolidação

das Leis do Trabalho. É mais do que consensual, pois, na verdade, a forma prescrita em lei não

se constitui como elemento essencial do contrato de trabalho. Não faz a menor diferença da

relação jurídica e para validade da mesma. O contrato de trabalho tem forma prescrita em lei

nos artigos 13 e seguintes da CLT. A forma é a assinatura da carteira de trabalho e previdência

social (CTPS). A lei estipula uma forma para contratar trabalhador, é a carteira de trabalho. É a

forma mínima.

Em não tendo a assinatura da carteira de trabalho, o art. 442 irá dizer:

Art. 442 - Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso,

correspondente à relação de emprego.

Parágrafo único - Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade

cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem

entre estes e os tomadores de serviços daquela. (Incluído pela Lei nº 8.949, de

9.12.1994) (Vide Mensagem de veto)

Muitos criticavam o art.442 da CLT pelo fato dele ser uma tautologia (não se explica, se remete

o conceito ao próprio conceito). Não se sabe o que o contrato individual de trabalho é, mas se

sabe que ele corresponde à relação de emprego e vice-versa. Sempre que houver relação de

emprego há contrato de trabalho e o contrato de trabalho é relação de emprego, que é

S.H.O.P. Pode-se não saber o que é contrato de trabalho, mas sabe-se o que é S.H.O.P. A

relação de emprego e o contrato de trabalho são S.H.O.P.

Esse S.H.O.P se dá através de um acordo tácito ou expresso, pois pode ser expresso quando a

vontade se exterioriza de alguma forma, por exemplo, por escrito, onde se assume a forma

legal do contrato de trabalho com a assinatura da carteira de trabalho ou de qualquer outra

formalidade, mas pode ser expresso verbalmente, onde os elementos do contrato de trabalho

são identificados verbalmente. Diz-se quais são as cláusulas contratuais e o trabalhador adere

ao contrato, é expresso verbal.

No entanto, o contrato não precisa nem ser expresso verbal nem expresso por escrito, pois

pode ser tácito segundo o art. 442 da CLT. Ninguém disse nada, mas há vontade e esta é

reconhecida na consecução dos elementos práticos, no cotidiano. É raríssimo. Um exemplo:

em uma casa de campo alguém se oferece para cortar o capim (contrato de empreitada), após,

o mesmo se oferece para o conserto da caixa d’água, para cerca etc. Passou então a ir todo o

dia para fazer esses serviços, no final do mês, pagava-se uma soma de dinheiro. Ninguém

convencionou nada, mas foram apresentados os elementos da relação de emprego S.H.O.P.

Pode ocorrer de o dono da casa passar a dar ordens, para o conserto de tais e tais coisas, surge

aí a subordinação, por exemplo, o fato do sujeito ir todo dia faz surgir a habitualidade, como só

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ele trabalhava surgia a pessoalidade e, como se pagava no final do mês, havia a onerosidade.

Operou-se o contrato tácito. Há vontade, pois o trabalhador fez isso porque queria e o dono da

casa também tinha vontade de mantê-lo trabalhando. Há vontade, mas é tácita.

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Aula 15 – Direito do Trabalho I dia 11/06/2013

4ª Característica: Sucessivo

Conteúdo depreendido da própria relação de emprego.

5ª Característica: Oneroso

Conteúdo depreendido da própria relação de emprego.

6ª Característica: Alteridade

Conteúdo depreendido da própria relação de emprego.

7ª Característica: Ato Condição (Artigo 444 da CLT)

Art. 444 - As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre

estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às

disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam

aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.

A natureza jurídica do ato condição tem a sua evidencia no artigo 444. É ato condição, pois o

contrato de trabalho se realiza pelo ato da prestação do serviço do empregado (sem esta

prestação não há contrato de trabalho), que se reveste de uma série de condições.

Em termos de teoria contratual o artigo 444 apresenta uma relativização da autonomia

individual de vontades.

Assim, se no Direito Civil o elemento dogmático mais sagrado é a autonomia individual de

vontades. No direito do trabalho essa autonomia individual de vontades vai ficar relativizada.

Segundo preceitua o artigo 444 o contrato de trabalho estabelece um piso de proteção para o

trabalhador.

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Nós podemos validar a autonomia de vontade das partes. Mas para aquém54 deste piso de

proteção do contrato de trabalho essa autonomia de vontade não tem valor, é anulada,

invalidada diante do imperativo das normas de ordem pública.

Diferentemente do contrato de cunho civil, com o pacta sunt servanda (princípio vinculante

das vontades entre as partes) no contrato de trabalho a vontade das partes não vale tudo,

ainda que essa vontade seja isenta de qualquer vício de manifestação (consentimento). Isto é,

ainda que não haja vício de consentimento ela não vale quando se confronta com dispositivo

de ordem pública, na forma do artigo 444.

São dispositivos de ordem pública: os contratos coletivos de trabalho (normas coletivas de

trabalho, as convenções e acordos coletivos) e decisão das autoridades competentes55.

Assim, o contrato de trabalho é um ato de vontade condicionado pelas normas de ordem

pública. Não é possível que o trabalhador abra mão destas. Bastar voltar ao Princípio da

Irrenunciabilidade dos Direitos Trabalhistas.

Deve ter atenção, pois para além do piso a autonomia é livre. Por exemplo, se o empregador

que acordar um adicional de horas extras no percentual de 80% é permitido, porém, se ao

revés, quer acordar um percentual de 30%, é permitido.

8ª Característica: Validade Contratual

O plano da norma e ato jurídico, no estudo teórico, apresenta quatro tipos:

O ato jurídico trabalhista também perpassa por esses planos. A norma trabalhista tem

existência quando fisicamente ela possui um texto que lhe garanta um titular de direitos, um

objeto e uma forma.

54

Sinônimo: abaixo. 55

É decisão das autoridades competentes toda regulação infralegal ditada pelos órgãos do poder executivo. Portarias, normas regulamentares, decretos regulamentares, isto é, normas do poder executivo que dão fiel cumprimento a lei especificando e detalhando-as.

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A validade contratual irá se verificar na especificação teórica e constitucional desses elementos

de validade do ato jurídico no plano da existência. É uma qualificação desta existência. Não é

toda existência que é válida, apenas aquelas que respeitam o determinado pelo Código Civil:

Agente capaz;

Objeto lícito, possível e determinado ou determinável;

Forma prescrita ou não defesa em lei.

São os requisitos de validade de qualquer ato jurídico e, em termos de ato jurídico trabalhista

esses elementos aplicam-se igualmente. Esses elementos de validade contratual vão

incrementar os elementos de existência da relação de emprego, no caso do contrato de

trabalho, é o SHOP.

É possível que haja relações jurídicas em que se consegue identificar o SHOP, mas ainda sim

esse contrato de trabalho não consegue ser identificado como de acordo com a ordem

jurídica, pois faltam elementos de validade como, por exemplo, agente capaz; objeto lícito,

possível, determinável; forma prescrita ou não defesa em lei.

Planos de Validade da Norma Jurídica/ato jurídico:

1° Plano: Eficácia/Validade

Dá-se na aptidão que essa norma/contrato tem para produzir efeitos jurídicos. É a capacidade

de incidir em situações jurídicas concretas produzindo efeitos jurídicos. A (abstrato) a

produção de efeitos jurídicos é reconhecida no plano abstrato, por exemplo, com as

perguntas: a norma esta pronta? O contrato tem todos os elementos de existência e validade?

Se sim, está apto para produzir efeitos jurídicos. É quase uma decorrência lógica e, por isso,

abstrata.

2° Plano: Efetividade

Porém, ao adentrar-se o plano da realidade concreta esta eficácia se transforma em

efetividade. A efetividade é a eficácia social, real, concreta histórica. É possível a existência de

relação contratual ou norma jurídica (pode-se sempre fazer esse paralelo relação

contratual/norma jurídica) que tenha existência, validade, eficácia, mas que não tenha

efetividade ou seja, não funcione na sociedade brasileira. Muitas normas do direito trabalhista

são desprovidas de efetividade.

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Elementos Essenciais do Contrato de Trabalho.

Os elementos de existência são superados com a análise dos requisitos da relação de emprego

(SHOP). Os elementos são os mesmos do artigo 104 do Código Civil (agente capaz, objeto lícito,

possível e determinável, forma prescrita ou não defesa em lei).

Esses são os elementos essenciais do contrato, sem estes o contrato é nulo de pleno direito. O

estudo da validade do contrato de trabalho irá desembocar no estudo da nulidade do contrato

de trabalho.

1° Elemento: Capacidade do Agente

No contrato de trabalho, a capacidade do agente se refere à figura do empregado, pois o

menor quando desenvolve atividade empresarial ele preenche uma das condições para sua

própria emancipação, nos termos do Direito Civil.

Assim, não faz sentido falar em capacidade do agente por parte do empregador. Ele não tem

pessoalidade e, além disso, o próprio desenvolvimento da atividade econômica já é causa de

emancipação.

No que concerne ao empregado à capacidade para a vida do trabalho se dá a partir dos 16

anos, na forma do artigo 7°, inciso XXXIII da Constituição Federal. Menor de 16 anos não pode

trabalhar, pois deve ser destinado a outras atividades (relativas à sua formação enquanto

indivíduo tal como escolar, humana). É vedado o trabalho para o menor de 16 anos.

A própria regra afirma que entre 16 e 18 anos (quando há a capacidade relativa) é vedado o

trabalho noturno, insalubre ou perigoso.

Há quem critique essa regra sustentando ser um absurdo o menor de 16 anos não poder

trabalhar. De fato, há determinadas atividades que comportariam o trabalho do menor, até

por serem menos degradantes do que se submente o menor no Brasil.

Mas, sempre irá se encontrar uma situação hipotética mais monstruosa do que a norma deseja

proteger. Por exemplo, é melhor o menor em um trabalho assalariado do que como ‘’vapor’’

ou ‘’olheiro’’ do tráfico. É possível desfiar-se um rosário de monstruosidades das quais

comparativamente serão situações melhores que o trabalho do menor.

Mas a norma não é para criar comparações. Ela é uma proposição normativa para a construção

de um país. O projeto de país é aquele no qual os menores de 16 anos estão estudando e

cuidando de sua formação humana. Porém, para que se alcance em concreto essa norma, para

que isto se torne efetivo é necessário uma série de políticas públicas e transformações sociais.

Assim, a capacidade do agente até os 16 anos se dá de forma relativa e após o 18 se dá de

forma absoluta.

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A lei 8.069 de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) veda para o menor relativamente

incapaz atividades penosas atividades penosas, que ponham em risco a moralidade, a

incolumidade física e intelectual e a prorrogação da jornada na forma do artigo 413 da

Consolidação das Leis do Trabalho.

A diferença do contrato de trabalho do relativamente capaz para o absolutamente capaz é

absolutamente nenhuma, uma vez que não se exige a assistência do menor para celebração do

contrato de trabalho.

Existem dois dispositivos na CLT praticamente em desuso que estabelecem essa distinção. O

primeiro é a assistência do responsável no momento de rescindir o contrato quando se dá a

quitação das verbas rescisórias (na forma do artigo 439). O artigo 17, caput diz que a

assinatura da CTPS (Carteira de Trabalho e Previdência Social) assinada pelos pais supre a

representação em todos os demais atos contratuais.

Esses dois dispositivos diferenciam o relativamente capaz (entre 16 e 18 anos) e o trabalhador

absolutamente capaz (maior de 18).

Contra o menor de 18 anos não corre a prescrição (artigo 440 da CLT).

2° Elemento: Objeto lícito, possível e determinável.

A ilicitude para fins contratuais trabalhistas possui uma peculiaridade. Não é qualquer afronta

a ordem jurídica que caracteriza ilicitude para fins de objeto ilícito do contrato de trabalho.

Como o contrato de trabalho tem por objeto atividade uma que se perfaz na prestação de

serviço por parte do empregado. Este desenvolve algum tipo de serviço, que será o objeto do

contrato de trabalho.

Para o Direito do Trabalho o objeto ilícito somente se apresenta quando a atividade humana

que materializa o objeto do contrato de trabalho coincide com uma atividade tipificada como

crime pelo direito penal. O empregado foi contratado para desempenhar a atividade tipificada

como crime. Apenas nesta hipótese tem-se o objeto ilícito, quando há essa coincidência.

Assim, se a atividade do obreiro se constituir em irregularidade administrativa, fiscal, civil ou

trabalhista, por exemplo, não haverá objeto ilícito para fins de nulidade do contrato de

trabalho.

Assim, deve se distinguir o trabalho irregular ou proibido do trabalho ilícito. Trabalho ilícito é o

que tem o objeto ilícito. Trabalho irregular é aquele em desacordo com alguma norma estatal.

Quanto à contravenção a OJ 199 da SDI-1 trata de uma contravenção, dizendo que é nulo o

contrato. Determina essa OJ que é nulo contrato de trabalho celebrado para o desempenho de

atividade inerente a prática do jogo do bicho, ante a ilicitude de seu objeto o que subtrai o

requisito de validade para formação do ato jurídico.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 166

Essa OJ foi formulada porque muitos tribunais regionais do trabalho estavam validando o

contrato do apontador do jogo do bicho. Muitos tribunais estavam dando o vínculo e, por mais

incrível que parece, não apenas com as atividades de fachada dos banqueiros do jogo do

bicho, mas vínculo com algumas atividades comerciais que se beneficiavam da movimentação

do jogo do bicho como padarias, bancas de jornal.

Evidentemente se fazia uso de toda teoria do Direito Penal de desconstrução do jogo do bicho

como atividade ilícita, mas o Tribunal Superior do Trabalho, por uma questão de coerência

vetou e editou a OJ em sentido contrário.

3° Elemento: Forma prescrita ou não defesa em lei.

Art. 13 - A Carteira de Trabalho e Previdência Social é obrigatória para o exercício de qualquer

emprego, inclusive de natureza rural, ainda que em caráter temporário, e para o exercício por

conta própria de atividade profissional remunerada.

Art. 29 - A Carteira de Trabalho e Previdência Social será obrigatoriamente apresentada, contra

recibo, pelo trabalhador ao empregador que o admitir, o qual terá o prazo de quarenta e oito

horas para nela anotar, especificamente, a data de admissão, a remuneração e as condições

especiais, se houver, sendo facultada a adoção de sistema manual, mecânico ou eletrônico,

conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho.

A lei prescreve uma forma que é a assinatura da

Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS).

Do artigo 13 ao artigo 56 nós temos a forma prescrita

em lei para celebração do contrato de trabalho.

Esta forma não é um elemento essencial do contrato de

trabalho, afinal, a ausência da assinatura da carteira

não é causa de nulidade do contrato.

A forma prescrita em lei para o contrato de trabalho não se constitui (em regra) como

elemento essencial do contrato. Tem forma prescrita em lei, mas não é requisito essencial,

apenas meio de prova.

Assim, o contrato pode ser expresso verbalmente ou tácito, desde que corresponda a relação

de emprego, conforme dita o Princípio da Primazia da Realidade.

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Existe uma modalidade de contrato de trabalho (relação de emprego celetista) cuja forma é

essencial, que é o contrato com a Administração Pública (empregado público).

A forma estabelecida para o empregado público é a aprovação prévia em concurso público de

provas ou provas e títulos. Este é um requisito formal da essência do ato. É essencial para se

trabalhar na Administração Pública a admissão por via de concurso público.

Logo, via de regra a forma não é essencial à validade do ato, apenas em casos excepcionais

(concurso público).

Diferença entre o Ato Nulo Civil e o Ato Nulo Trabalhista

Deve se frisar esse estudo, pois a teoria das nulidades será orientada de forma diferente que a

teoria das nulidades do Direito Civil.

No Direito Civil o ato nulo ele supera, invalida, prejudica o plano da eficácia. Assim, no Direito

Civil o contrato nulo é aquele que não produz efeitos jurídicos. O Direito Civil não reconhece

efeitos jurídicos de um contrato declarado nulo. Se um contrato é declarado nulo por um juiz

de direito, dizer que ele não produz efeitos jurídicos leva o juiz a tentar recompor a situação

anterior existente a pactuação do contrato nulo. Chama-se reconstituição da situação jurídica

anterior, o status quo ante. O juiz que declare a nulidade deve tentar recompor a situação

juridicamente dada anteriormente a pactuação do contrato nulo.

Assim, se há um contrato de compra e venda que por algum vício de validade é declarado nulo

(o agente não era capaz, a forma era proibida, o objeto era ilícito, por exemplo), deve o juiz

recompor a situação jurídica anterior, restituindo a coisa de volta para o alienante e

restituindo o dinheiro pago ao comprador. Tentará, em termos patrimoniais, reconstituir a

situação jurídica anterior.

Para maior compreensão, ouviremos uma história triste...

Diretamente de Asgard, nosso amigo, o pequeno Thor (imagem

ao lado) quando tinha 15 anos, pegou seu porquinho (repleto de

notas de 100 dólares, que seu pai generosamente lhe concedia) e

decidiu comprar uma . O vendedor lhe informou que o

veículo custava R$ 1.500.000,00 reais. Quando quebrou seu

porco, Thor descobriu que possuía o dinheiro em espécie.

No início, o vendedor estava relutante, mas quando viu o dinheiro

em espécie, ficou interessado na comissão. Assim, firmaram um

contrato de compra e venda. O contrato consumou-se naquele

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ato.

Pequeno Thor decidiu levar sua nova ferraria para

impressionar seus amigos e amigas. Pequeno Thor decidiu

levar ‘’seu broto’’ para dar uma volta. Porém, durante o

percurso viu atravessando a rua um ciclista e, em uma

manobra evasiva brusca, desviou do ciclista (dessa vez ele

desviou) e abalroou o poste.

O caso foi levado até o judiciário e o juiz ao deparar-se com o contrato vê-se compelido a

declará-lo como nulo, tentando reverter o status quo ante. Para reverter deve-se restituir o

carro (com abatimento proporcional) e o que dinheiro deve ser devolvido ao adquirente.

Reconstituiu-se o status quo ante, afinal a nulidade não gera efeitos.

É como se desde o momento que pequeno Thor sai da loja com o carro, para o direito aquilo

não vale nada. Aquela sucessão de eventos pode ser reconhecida sob o ponto de vista fático,

mas não jurídico.

Quando se trata de direitos patrimoniais a reconstrução do status quo ante guarda um tipo de

facilidade, afinal o ato é puramente patrimonial.

Para compreendermos a nulidade no Direito do Trabalho ouviremos outra história triste...

Nossa segunda história envolve o jovem Severino, morador da zona rural de Campos dos

Goytacazes. É uma cidade simpática, uma paisagem bucólica do Rio de Janeiro.

O jovem Severino não foi abençoado pela genética do nosso super-herói Thor. Como passava

necessidades, para sua sobrevivência foi em busca de um emprego, conseguindo trabalho em

uma usina de cana-de-açúcar, participando do corte de uma safra. O corte da cana-de-açúcar é

um ato complexo, pois quando se corta cana, desta depreende-se uma farpa que pode lesionar

o cortador.

O pagamento é feito conforme a pesagem da cana. Quanto mais peso der a cana cortada mais

se ganha. Jovem Severino trabalhou por um ano, por uma safra, para esta usina de cana-de-

açúcar.

Porém, houve uma fiscalização do Ministério do Trabalho e identificou que jovem Severino

tinha apenas 15 anos.

O juiz diante da situação observa que o agente era incapaz, mas pactuou o contrato de

trabalho. Esse contrato é nulo.

Porém, ainda que nulo, Severinho até poderia devolver o valor pago, mas o empregador não

poderia devolver a energia imaterial que Severininho lhe deu, ainda que o empregador desse a

Severinho muitas latas de Nescau, a energia que dá gosto. Uma vez que esta energia

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incorpórea é alienada ela não pode ser mais restituída. Há uma impossibilidade fática de

recomposição do status quo ante, em qualquer situação trabalhista. Não há reversibilidade,

pois ainda que o juiz (em termos obrigacionais) fixasse quanto o trabalhador deve, não há

como se fazer a mesma coisa com o empregador.

Assim, quando se constrói uma teoria das nulidades trabalhistas o primeiro aspecto

considerado é a impossibilidade fática da reversão ao status quo ante, pelo simples fato de ser

impossível reverter à energia imaterial no corpo do trabalhador.

O segundo aspecto é que a teoria das nulidades trabalhistas deve considerar o artigo 884 do

Código Civil. Este artigo estabelece uma norma que não é exclusiva do Direito Civil, mas um

princípio da Teoria do Direito que irá se materializar nesta norma, que é a vedação ao

enriquecimento sem causa.

Por exemplo, se este menor de idade não tiver recebido os direitos trabalhistas próprios de um

contrato de trabalho válido. Para melhorar o exemplo, colocar-se-á um empregador que

objetivando se locupletar contratou o menor sabendo que o contrato seria nulo e o menor não

teria direito aos direitos próprios de um contrato de trabalho válido.

Ao agir assim, o empregador se enriqueceu ilicitamente, pois a força de trabalho do

Severininho tem valor, mas não contraprestacionou aquilo que o direito manda pagar por

força de trabalho semelhante de absolutamente capazes. Essa vedação ao enriquecimento

sem causa evita com que o empregador passe isento de pagar a contraprestação devida.

Assim, para se vislumbrar a teoria das nulidades deve se observar os seguintes aspectos:

a) Impossibilidade de recomposição do status quo ante.

b) Vedação ao enriquecimento sem causa.

c) Princípio da Valorização Social do Trabalho Humano (Art. 1°, inciso IV, Constituição

Federal).

d) Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (Art. 1°, inciso III, Constituição Federal)

Esta teoria vem sendo apresentada por parte da doutrina. Alguns doutrinadores não menciona

a teoria das nulidades peculiar ao direito do trabalho. Para esta teoria o contrato é nulo,

porém o direito reconhece alguns efeitos.

Assim, o contrato de Severininho é nulo, não se forma vínculo de emprego, não há que se falar

em assinatura da carteira de trabalho, direitos trabalhistas próprios do contrato de trabalho,

mas há que se falar no reconhecimento de alguns efeitos.

Antigamente, falar-se em contrato nulo que gere efeitos era uma loucura, mas atualmente

este contrato já recebeu, inclusive, nomenclatura legal, sendo doutrina, jurisprudência e lei.

Assim, no direito do trabalho o contrato é nulo, mas produz efeitos.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 170

A dificuldade é identificar quais são esses efeitos gerados pelos contratos nulos. Para isso,

deve se voltar para as causas de nulidades.

A análise é casuística, dependendo do caso haverá mais ou menos efeitos reconhecidos. Por

exemplo, no caso de agente incapaz serão alguns efeitos, no caso de forma prescrita em lei

serão outros efeitos e no caso de objeto ilícito serão outros efeitos.

Nulidade no caso de Agente Incapaz

No caso de agente incapaz, estabelece a doutrina que se produzem no mínimo todos os

efeitos de um contrato normal, para evitar o enriquecimento sem causa.

A produção desses efeitos todos decorrente de contrato nulo de menor de idade não se

formalizam como direitos trabalhistas. Usa-se como critérios (parâmetros ou base de cálculo)

aquilo que um trabalhador maior de idade ganharia.

Por exemplo, se Severininho ganhou R$ 1.000,00 reais e um trabalhador maior ganharia R$

4.000,00, o empregador deve a Severininho R$ 3.000,00. Mas atenção, não é a título de férias,

13° ou FGTS, pois esses são direitos trabalhistas e o contrato de trabalho não é valido.

Esses valores serão pagos a título de indenização, mas não a titulo de serviços prestados na

relação de emprego, em um contrato de trabalho, pois não há contrato de trabalho.

Nulidade no caso de Forma Prescrita ou Não Defesa em Lei.

Já foi até trabalhado nesse caderno. É a incidência da súmula 363 (página 78) do Tribunal

Superior do Trabalho e o artigo 19-A da Lei 8.036 de 1990 que dispõe sobre o FGTS.

É interessante que a própria súmula utiliza a expressão ‘’contraprestação pactuada’’ e não

salário, pois este é pago a título de contrato trabalhista, que não há neste caso.

Assim, é o pagamento de um equivalente a contraprestação pactuada em relação ao número

de horas trabalhadas. Se houve trabalho, deve haver contraprestação.

O artigo 19-A da Lei 8.036 de 1990 dispõe justamente sobre o a incidência do FGTS na hipótese

de contrato nulo.

Para quem sustenta a tese de que deveria haver uma ponderação de interesses e direitos

fundamentais colidentes em cada caso de nulidades, essa foi uma ponderação mal feita, na

qual se generalizou a hipótese de contratação sem concurso público. Muitas vezes a pessoa

que está recebendo o ‘’salário’’ e o Fundo de Garantia foi participante da maracutaia.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 171

Nulidade no caso de objeto ilícito

Neste, não se reconhecem efeitos. O Sopesamento que se dá entre Valorização Social do

Trabalho e bem jurídico ofendido pesa mais para o bem jurídico ofendido. Não é possível que

se valorize socialmente um trabalho que a sociedade já definiu como crime.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 172

Aula 16 – Direito do Trabalho I dia 18/06/2013

Teoria das Nulidades Contratuais Trabalhistas

Não há uma teoria própria para as nulidades contratuais trabalhistas e, por isso, aplica-se a

teoria genérica do direito civil, ou seja, o contrato é nulo e não produz nenhum tipo de efeito.

Sobre as modalidades do contrato, é possível encontrar na doutrina as classificações sobre os

tipos de contrato de trabalho sobre uma série de aspectos. Com relação ao fator tempo é

possível encontrar a diferenciação mais importante, pois os separa em contratos de tempo

indeterminado e de tempo determinado.

Deve-se fazer uma remissão à lógica estudada no tópico da terceirização. A terceirização é

uma exceção e, como tal, o direito do trabalho cumpre a tarefa de apresentar e criar uma série

de obstáculos para que essa exceção não aconteça reiteradamente, não deixe de ser

excepcional para se converter em regra. No caso desses tipos de contratos acontece algo

parecido. O contrato por tempo indeterminado é a regra e o de tempo determinado é à

exceção de maneira que o direito do trabalho e a CLT criam uma série de obstáculos para a

não ocorrência, no plano da realidade, os contratos por tempo determinado, para que estes se

mantenham como excepcionalidade.

A regra é a contratação por tempo indeterminado. Essa é a contratação que não prevê termo

final. As partes entram no contrato sem saber quando este acabará. A ausência de fixação de

termo atende ao princípio da continuidade das relações de emprego. A relação de emprego

nasce para se prolongar o máximo possível no decorrer do tempo, logo, a modalidade

contratual adequada a essa contratação indefinida no tempo e que pode se esticar o máximo

possível através do tempo é o contrato de tempo indeterminado.

Com isso tem-se a característica do contrato ser de trato sucessivo, o que permite que tal

contrato se prolongue o máximo possível através do tempo. O contrato deve se prolongar por

que dele depende o empregado e sua família, assim como a subsistência de ambos. Por tal

motivo é que o direito quer a manutenção desse contrato e daí advém a regra sobre o tempo

indeterminado da contratação.

Não há forma para essa contratação de tempo indeterminado. A forma genérica para a

contratação é a assinatura da carteira de trabalho. Todavia, essa forma não se constitui como

requisito essencial do ato jurídico, do negócio jurídico, contrato de trabalho, pois sua ausência

é suprida pela declaração judicial do vínculo empregatício. Mesmo que não haja assinatura na

carteira de trabalho o vínculo pode ser reconhecido e declarado em juízo sem nenhum

problema.

Esse contrato não tem uma forma solene e é o próprio contrato que corresponde à relação de

emprego. Existindo relação de emprego e não sendo atendidos os requisitos específicos do

contrato de tempo determinado o que existe é contrato de tempo indeterminado (mesmo

quando não se assina a carteira ou mesmo o contrato tácito é contrato por tempo

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 173

indeterminado). O contrato por tempo determinado sempre será escrito (uma das regras de

ouro). Não há contrato de tempo determinado que não seja escrito. Caso alguém “contrate de

boca” uma empregada doméstica por um período de experiência de 90 dias esse contrato de

tempo determinado não é válido, pois se não for por escrito não está valendo; o tipo de

contrato feito na situação aludida é, então, de tempo indeterminado, que é a regra.

A súmula 212 dirá justamente isso, que o contrato de tempo indeterminado é aquele que é

presumido quando nenhuma formalidade for realizada. O ônus da prova também é tratado

pela súmula.

Há uma presunção de que todos os contratos, a princípio, são de tempo indeterminado e,

excepcionalmente, é que se terá de provar que realmente se trata de um contrato de tempo

determinado e, nesse caso, será necessário provar que todos os requisitos impostos pela lei

para realizar tal modalidade de contrato foram cumpridos.

O efeito principal do contrato de tempo determinado é que a resolução do contrato, sua

extinção, não exige a denúncia prévia, a comunicação prévia da outra parte. No contrato de

tempo indeterminado as prestações obrigacionais automaticamente se renovam. Então, se o

empregado trabalhou 30 dias e o empregador pagou o salário, isso não significa que o contrato

tenha se consumido. Se ninguém tomou nenhuma atitude o contrato está automaticamente

renovado e o trabalhador irá trabalhar mais 30 dias e irá receber novamente. A expectativa do

empregado é que aquele contrato continue e a do empregador também. Não há termo final

pré-fixado, então ele continuará. No entanto, isso não significa que as partes não possam

romper o contrato, pois podem fazê-lo por ato de vontade, tanto do empregado quanto do

empregado.

Contudo, no contrato de tempo indeterminado, surge um efeito necessário; caso, por obra da

vontade de uma das partes, se uma delas manifestar a vontade de romper o contrato56, deve

avisar com antecedência à outra parte o desejo de romper o contrato (aviso prévio). É uma

obrigação legal, ele é obrigado pela lei, tanto o empregado quanto o empregador. A

comunicação prévia, na resilição (rompimento por ato de vontade) de uma das partes em um

contrato de tempo indeterminado, é obrigatória e é o efeito principal dos contratos de tempo

indeterminado.

Esse contrato admite tanto a forma individual quanto a plúrima57. É uma subespécie de

contrato por tempo indeterminado que permite a contratação de vários indivíduos ao mesmo

tempo que demonstram uma vontade única; sendo assim, o contrato se enfeixa e uma

pluralidade de sujeitos/trabalhadores).

OBS: O que ocorre em alguns casos é que o empregador não paga a indenização do aviso

prévio que estava obrigado a conceder (obrigação legal). Quando não se concede aviso prévio

comete-se ato ilícito e deve-se pagar indenização. Essa indenização é o valor equivalente aos

56

Justamente porque nesse momento está frustrando a expectativa de continuidade da outra parte sobre a continuidade do contrato. 57

Esta forma gera certa divergência na doutrina, pois alguns entendem que é a mesma coisa que o contrato de equipe enquanto outros não (firmar em um único instrumento uma relação contratual que se divide com uma série de sujeitos, por exemplo, banda de música contratada).

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 174

30 dias que agora é proporcional aos 90 dias. É isso que se paga quando não se demite sem

justa causa e sem pagar todos os direitos do empregado.

A história dos institutos do direito do trabalho como substituição, interrupção e alteração em

geral estão relacionados ao contrato por tempo indeterminado.

Contrato de Trabalho por Tempo Determinado (Exceção – Art. 445 da CLT)

É exceção. É aquele que possui termo final pré-fixado. As suas modalidades estão previstas, a

princípio, no art. 443 da CLT, mas a legislação esparsa também traz outras modalidades de

contrato por tempo determinado. De qualquer maneira há a necessidade de previsão legal.

O § 1º fala sobre a prefixação do termo final, que pode ser termo certo que é o pré-fixado

propriamente, que significa designar a data do fim do contrato no momento da contratação,

fazendo com que empregado e empregador já ingressem no contrato sabendo exatamente a

data do fim deste.

A prefixação também pode se dar vinculando a um acontecimento suscetível de previsão

aproxima e, ainda, da execução de serviços especificados (o contrato acaba quando

determinada obra acabar ou quando a copa do mundo começar; se relaciona a algum evento

estranho ao contrato, mas que tenha previsão aproximada). Não é possível fixar o tempo final

do contrato a um evento que não seja passível de uma obtenção lógica, de uma previsão (por

exemplo, colonização de marte não é algo razoavelmente previsível [ e ]).

São os termos certos an (quanto à data) e quando (quando se dará essa data). São,

respectivamente, o fato do fim do contrato e a data do fim do contrato. Porém, não precisa ser

certus an e quando, podendo ser apenas certus an e incertus quando, que é a modalidade de

vinculação de previsão antecipada ou de vinculação à execução do serviço58. O fato do fim é

certo e está dentro de uma previsibilidade limitada pelo seu prazo máximo, mas não se sabe

exatamente quando. Esse tipo de contrato é válido, desde que inserida no espaço temporal do

prazo máximo.

Isso está previsto no §2º do art. 443, que restringe restrições quanto ao conteúdo do contrato.

A natureza do serviço normalmente é dada pelo tipo de trabalho do empregado (a qualidade

da profissão, do trabalho desempenhado pelo trabalhador é por período determinado – alínea

a). Quando o tipo de serviço se consuma em um determinado tempo pode-se contratar por

contrato de tempo determinado. Na alínea b, não se está falando do trabalhador, mas da

empresa, do empregador, quando a própria empresa tem atividades de caráter também

58

não se sabe exatamente quando o serviço fica pronto, mas há uma previsibilidade que insere o contratante na possibilidade de contratação pelo prazo máximo.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 175

transitório, como as empreiteiras. Por fim, a alínea c prevê sobre contrato de experiência. Há

também hipóteses em leis específicas59:

Lei 6.019 de 1974 (Dispõe sobre o Trabalho Temporário nas Empresas Urbanas);

Lei 9.601 de 1998 (Dispõe sobre o contrato de trabalho por prazo determinado);

Lei 9.615 de 1998 (Lei Pelé).

O contrato de experiência é também chamado de contrato de prova e verificam se, depois da

experiência, ambos conseguem alcançar suas expectativas. Fixa-se um termo pré-estabelecido

(experiência até a data X) e, então, conseguindo-se suprir as expectativas da outra parte,

torna-se possível fazer um contrato de tempo indeterminado onde a continuidade informa

como princípio da relação.

Os prazos estabelecidos estão no art. 445 da CLT. As leis específicas podem apresentar prazos

diferenciados, mas costumam ficar no prazo de dois anos. No art. 443 alíneas a e b são o prazo

máximo de dois anos e a alínea c (contrato de experiência) não poderá exceder 90 dias. Se o

prazo de dois anos acaba e, no dia seguinte, o trabalhador volta a trabalhar na empresa (e o

empregador não se manifesta) o contrato por tempo determinado se transforma em contrato

de tempo indeterminado.

O professor Godinho Delgado chama esse fenômeno de conversão qualitativa, pois se

transforma em algo melhor, com mais qualidade (consequência da extrapolação do prazo). O

mesmo serve para o contrato de experiência que tem seu prazo extrapolado. É um contrato

só, como se nunca houvesse havido o primeiro, é um contrato só de tempo indeterminado,

para todos os efeitos de direito, quando há a conversão qualitativa.

Um exemplo que se dá para serviço cuja natureza justifique a predeterminação são, além

daqueles serviços rápidos, os casos até da lei 6.019/74 nos casos de substituição de pessoal; a

empresa tem um quadro de pessoal próprio e, às vezes, tem a necessidade de substituir um

empregado que se encontra em férias, interrompido ou suspenso por acidente de trabalho etc.

(encostado na previdência). Como é necessário reocupar aquele posto de trabalho, é possível

contratar por tempo determinado se o serviço justifica-se pela transitoriedade, ou seja, há

substituição, onde há expectativa do trabalhador retornar em até um ano, pode-se fazer um

contrato por tempo determinado e, no caso, o termo final será “quando o trabalhador

recuperar a sua capacidade de trabalho” ou “quando der baixa no benefício previdenciário”.

Pode-se contratar diretamente pelo contrato de tempo determinado ou via terceirizada

(trabalho temporário). Devem-se analisar os benefícios de cada tipo de contratação. Se é um

trabalho que demanda capacitação, treinamento, processo seletivo elaborado e custe

dinheiro, pode ser mais fácil recorrer a uma empresa de trabalho temporário e, caso contrário,

é melhor contratar diretamente.

59

Que são outras possibilidades de contratação por tempo determinado.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 176

Prorrogação do Contrato pro Tempo Determinado (art. 451 da CLT).

O art. 451 da CLT fala sobre prorrogação. Se o contrato de tempo determinado for prorrogado

mais de uma vez ele se torna de tempo indeterminado, isso significa dizer que o primeiro

contrato só pode ser prorrogado até uma vez.

O dispositivo do art. 451 da CLT tem que ser lido conforme o dispositivo do art. 445 da CLT.

Pode-se prorrogar até uma vez o contrato de tempo determinado respeitando o prazo

máximo. Não é possível alcançar o prazo máximo e prorrogar o contrato. Pode-se ter uma

única hipótese de prorrogação dentro do período máximo.

Se o período máximo é de dois anos eu posso contratar por seis meses prorrogáveis mais um

ano; posso contratar seis meses mais seis meses. Está-se dentro do período. Não posso

contratar seis meses mais seis meses e mais outros seis meses, pois, apesar de respeitar o

prazo máximo, já são duas prorrogações. Também não é possível contratar um ano mais um

ano e meio, pois extrapola o prazo máximo e tampouco dois anos mais dois anos. É uma

prorrogação dentro do limite máximo. É a mesma lógica para o contrato de experiência.

Page 178: Caderno Ungido de Direito Do Trabalho i

Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 177

Exceção ao Limite de Prorrogação (Lei Pele).

No caso da lei 9.601 de 98 (Lei Pelé) há a possibilidade de mais de uma prorrogação dentro do

prazo. É dos contratos mais precarizados do direito do trabalho. A cada mês há o receio de

demissão. Isso até dois anos onde a prorrogação pode ser feita mensalmente.

Sucessividade (Art. 452 CLT).

O art. 452 da CLT fala da sucessividade. A regra vale para a unicidade de forma geral. Há um

contrato de tempo determinado onde os prazos foram cumpridos corretamente. Mas a

empresa sentiu necessidade do trabalhador, devido seu alto desempenho e quer contratá-lo

de novo para outra substituição ou empreitada. Não é possível contratá-lo imediatamente por

outro contrato de tempo determinado. Entre dois contratos de tempo determinado deve

haver um espaço mínimo de seis meses levando-se em consideração ainda o tipo do segundo

contrato de tempo determinado.

Não seria possível fazê-lo, por exemplo, com o contrato de experiência, sobretudo para a

mesma função, pois já houve a experimentação e haveria apenas uma locupletação com vários

contratos de experiência e uma precarização. Se já houve a experimentação e se deseja aquela

mão de obra, deve-se contratar nos termos do contrato de tempo indeterminado.

Na prática a jurisprudência entende que, na maior parte dos casos, quando se tem menos de

seis meses, aplica-se a acessio temporis que é a unicidade do contrato. Não havendo outra

relação de vínculo de emprego o juiz pode declarar a unicidade dos contratos e, mesmo

havendo vínculo, às vezes ela é também declarada, pois não há exclusividade para a relação de

emprego. É um contrato só de tempo indeterminado. Se forem empregadores diferentes não é

possível, somente se for um grupo econômico, mas completamente diferentes não. É para

mesmo empregador e em casos de sucessão.

Sendo assim, o art. 452 da CLT, a princípio trata da sucessividade. Menos de seis meses o

segundo contrato necessariamente é de tempo indeterminado. Parte da doutrina considera

que, além disso, considera-se um único contrato de tempo indeterminado. A regra dessa

sucessão vale para contratos de tempo determinado e indeterminado.

Se no contrato de tempo indeterminado o principal efeito é a expectativa gerada nas partes

pela continuidade pela relação de emprego, no contrato de tempo determinado a expectativa

é inversa, pois as partes esperam que o contrato vá acabar no prazo pré-fixado ou no

acontecimento pré-estabelecido. Não há a expectativa de continuidade indefinida. Não há

sentido de aviso prévio aqui.

Se o prazo é dois anos, tem-se a expectativa de ficar empregado por dois anos e, além disso,

não se sabe. Na extinção do contrato não há oura expectativa senão a de alcançar esse termo

final, isso significa que frusta a expectativa à parte que rompe o contrato antes do termo final.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 178

Indenizações em virtude do Rompimento do Vínculo Contratual (Art. 479 e 480 CLT).

Esse é o caso das indenizações previstas nos art. 479 e 480 da CLT, que é o caso da dispensa

antecipada.

Rompimento por parte do Empregador (art. 479 da CLT).

O art. 479 da CLT não tem muita lógica, mas quer dizer que, por exemplo, o contrato seja de

um ano, ao se chegar ao sexto mês, o empregador resolveu demitir o empregado. O

empregado esperava por mais seis meses de salário. O art. 479 da CLT diz que a indenização

que o empregado deve receber pela dispensa antecipada é o que o empregado esperava

receber, só que pela metade. Ainda tem 40% do FGTS (tem gente que discute isso). Então,

recebe-se a indenização sem prejuízo do FGTS (lei 8.036/90 e dec-lei 99.684/90 art. 9º).

Recebem-se também as verbas resilitórias.

Rompimento por parte do Empregado (art. 480 da CLT).

O art. 480 da CLT trata da situação na qual o empregado rompe antecipadamente o contrato

antes do prazo do termo final. Há discussão se o prejuízo mencionado no artigo é presumido

ou precisa ser provado. A indenização não poderá exceder aquela que o empregado deveria

receber na mesma situação.

Cláusula assecuratória da Rescisão Antecipada (art. 481 da CLT).

Sobre o art. 481 da CLT, nos contratos de tempo determinado, em alguns casos, faz-se o

contrato de tempo determinado, mas quer ficar livre para romper esse contrato a qualquer

momento. Isso acontece sobre tudo quando se fixa um termo final muito grande e o setor tem

uma rotatividade acentuada. Muitas vezes o empregador quer se ver livre do seu empregado

antes do prazo final.

Coloca-se então uma cláusula no contrato de tempo determinado que faça com que na prática

ele seja igualzinho a um contrato de tempo indeterminado, sobretudo quanto aos efeitos da

extinção, é a cláusula assecuratória da rescisão antecipada. Além disso, deve assegurar esse

direito também para o empregado, sem sofrer os efeitos dos artigos 479 e 480 da CLT. Os

efeitos serão os mesmos do contrato indeterminado no tocante a extinção (aviso prévio).

Logo, é possível haver aviso prévio em um contrato de tempo determinado.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 179

O Pré-contrato e o Pós-contrato

A questão do pré-contrato desafiou a doutrina durante muito tempo, sobretudo os

anticontratualistas e institucionalistas que diziam que o contrato de trabalho era um ato

condição (só a contrato de trabalho com S.H.O.P e não existiria nenhuma efeito quando não se

verificasse no plano da realidade dos fatos a prestação de serviço dentro do S.H.O.P).

No entanto, é possível verificar alguns efeitos pré-contratuais que não serão efeitos de direitos

trabalhistas propriamente ditos, mas indenizações muito mais baseadas no direito civil do que

no direito do trabalho, mas ainda sim são efeitos do contrato de trabalho e serão reconhecidos

pelo direito do trabalho e serão apurados e executados e efetivados pela justiça do trabalho.

O pré-contrato tem negociações preliminares, a fase de entendimentos e conversações entre

os interessados, de entrevista e conversações que não geram expectativa de direito e ou

direito adquirido. O pré-contrato vai se configurar de forma mais ampla quando cria

expectativas de fato com a promessa da contratação, muitas vezes por escrito, geralmente

atrelado com a exigência de realização de despesas, seja para o empregado ou para o

empregador e, assim, os efeitos civis indenizatórios se darão de parte a parte.

Naturalmente, o direito do trabalho vislumbrará mais as hipóteses em que o empregado tem

esse prejuízo. Muitas vezes o empregado recebe a promessa de contratação, mas exige-se que

o mesmo faça um curso, tendo assim despesas, para ser contratado, havendo depois uma

desistência culposa que causa dano e que deve ser ressarcida à luz do direito civil. São efeitos

jurídicos contratuais obrigacionais que se dão antes da prestação de serviço com

características do S.H.O.P.

Os mesmos efeitos se percebem no pós-contrato, porém, costumam ser mais específicos,

como a cláusula de quarentena quanto a empresas concorrentes ou em determinados setores,

que podem ser muitas vezes invalidadas em face da liberdade de profissão presente no art. 5º

da CRFB/88, pois muitas vezes a carreira profissional é inviabilizada. Outra cláusula importante

é a de sigilo profissional em relação a determinadas informações e dados e também

conhecimentos que não podem ser repassados após a extinção do contrato.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 180

Aula 17 – Direito do Trabalho I dia 25/06/2013

Efeitos do Contrato de Trabalho

Sobre efeitos do contrato o professor Godinho Delgado fala que o contrato tem efeitos

próprios condizentes com as obrigações de empregado e empregador onde a principal

obrigação do primeiro é trabalhar e a principal obrigação do segundo é pagar o salário.

Efeitos Conexos ao Contrato de Trabalho (Professor Mauricio Godinho Delgado)

A par desses efeitos próprios, existem outros efeitos próprios (que ainda não são os conexos)

que são paralelos, como o pagamento de algumas verbas trabalhistas ou o dever de restituir

algum instrumento de trabalho ou ainda lealdade ou boa-fé. Como efeitos conexos o autor

supracitado traz dois:

Decorrentes de Contrato Paralelo de Propriedade Industrial.

Quando o empregado invente alguma coisa e passa a ter direitos de propriedade industrial em

decorrência do contrato de trabalho (a propriedade intelectual), que decorre da criatividade e

inventos do trabalhador, se subdivide em propriedade industrial e direito autoral (obra

artística) e ainda direito de software. A propriedade industrial é o direito sobre o invento em si

(físico) que é possível patentear e explorar comercialmente.

Há uma zona de interseção com a relação de emprego porque os efeitos desse contrato

segundo a lei de propriedade industrial variam de acordo com o tipo de contrato de trabalho.

Se o empregado foi contratado para criar softwares ele não terá como patentear aquele

invento, pois foi contratado para isso, logo, a propriedade industrial do invento pertencerá à

empresa. Quando não ocorre dessa maneira, existem duas formas:

a) Quando a empresa concorre instrumentalmente para que aquela criação tenha

havido, seja com recurso ou material de qualquer natureza e;

b) Quando não concorre com nenhum tipo de participação material, pois o empregado

inventou sozinho e teve a ideia sozinho.

No primeiro caso, a empresa divide os direitos industriais, quando concorre com os

instrumentos , dividindo os direitos comerciais e de patente com o empregado e, no outro, os

direitos são exclusivamente do empregado.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 181

Assédio Moral (Art. 483, CLT)

O assédio moral ainda não foi tipificado, não existe lei que o regulamente; no entanto, a

jurisprudência tem criado alguns critérios para identificá-lo. A jurisprudência entende que

assédio moral é uma hipótese de violência moral que acarreta em indenização por dano moral

por violação à moral e aos direitos de personalidade do empregado. É violência moral que se

distingue de outras hipóteses de violência moral que acarretam também indenização por dano

moral e de outras que não acarretam tais indenizações.

Ofender o empregado é violência moral e leva à indenização, mas não é assédio moral. É

possível haver episódios de violência moral que não acarretem em indenização como, quando,

por exemplo, o chefe desconta seu mau humor no empregado, mas se desculpe pelo excesso.

É um episódio comum, mas não é um crime.

O assédio moral reúne uma série de características:

Vertical e descendente: do superior hierárquico para o inferior hierárquico;

Vertical e ascendente: do inferior hierárquico ao superior hierárquico. Não é comum

na iniciativa privada, pois o empregado pode ser mandado embora uma vez que o

empregador detém o poder de direção. No entanto, no âmbito da Administração

Pública isso pode acontecer mais facilmente porque os cargos de chefia não são postos

em relação, necessariamente a uma hierarquia. Por exemplo, o reitor da universidade

não tem ingerência sobre o contrato de trabalho do professor. Quem manda no

professor é o chefe de departamento, sendo que esse cargo é rotativo. A hierarquia é

mais fraca neste âmbito.

Há também o movimento que é ascendente e descendente ao mesmo tempo. Imagine um

chefe novo de um grupo que já possui as práticas todas viciadas e o chefe novo quer

estabelecer novas regras. O grupo se revolta contra o chefe e começa a sabotá-lo. No instante

que o chefe usa seu poder de direção para coibir esse tipo de prática e não recebe o suporte

das instâncias superiores a eles. Aí tem seu poder esvaziado. Tem-se o assédio ascendente (do

grupo) e descendente (dos superiores) que esvaziaram seu poder de direção.

Características do Assédio Moral.

1ª Característica: Sistematicidade;

Episódios de violência moral repetidos sistematicamente. Não pode ser um único episódio de

violência moral. Xingar um empregado uma única vez já é um episódio passível de dano

moral e que caracteriza uma situação indenizável. No assédio moral precisa-se da reiteração

para caracterizar o próprio assédio. Os episódios de violência moral vão se repetindo, mas, por

si mesmas, não são tão explícitas, contundentes, mas sim camufladas de poder de direção, de

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 182

ordens, de exercício de supervisão e controle do contrato de trabalho ou mesmo de

brincadeira.

É muito comum a desqualificação repetida, sem ofender diretamente, como dizer que o

serviço feito é sempre ruim, ainda que seja igual ao de outro trabalhador considerado bem-

feito. Ou quando mesmo o empregador não fornece subsídios suficientes para a realização de

um bom trabalho (instrumentos ou informações, por exemplo). Pode demitir o trabalhador,

mas não é necessário ficar ameaçando-o constantemente (por exemplo, “esse tipo de relatório

não costuma durar muito na empresa, você será demitido qualquer hora dessas”). Não precisa

aterrorizar o empregado.

Esse tipo de situação acaba levando ao assédio horizontal, pois o instinto de competitividade e

individualismo e ainda sobrevivência faz com que os colegas de trabalho, ao perceberem o

isolamento do trabalhador que sofre o assédio moral por parte do empregador, acabam

reproduzindo esse assédio ao invés de se solidarizarem – ainda para ficarem “bem com o

chefe”. Isso acontece eventualmente na vida de todo mundo, pois no capitalismo não se

trabalha por realização pessoal, mas sim por sobrevivência, ainda que parcialmente, dada a

escolha de uma qualificação. O dissabor já é inerente do trabalho, quanto mais com o assédio

proposital e direcionado a uma determinada pessoa.

2ª Característica: Intencionalidade do assediador.

O assediador faz propositalmente o assédio. Pode ser até uma intencionalidade inconsciente

ou totalmente consciente, mas não é sem querer. Há uma intencionalidade do assediador e há

também uma direcionalidade ao assediado. Se o empregador exige o conteúdo do contrato de

trabalho gritando não configura violência ou assédio moral, pois se está exigindo o que está no

contrato de trabalho (professor não concorda), pois é contra a civilidade e polidez. A prática

difusa não caracteriza o assédio moral, mas sim a direcionalidade. X assedia W ou W,Y e Z.

3ª Característica: Temporalidade.

A jurisprudência não aceita que a repetição sistemática se dê por um curto espaço de tempo.

Às vezes se caracteriza por anos de prática e, depois de tanto tempo, com a degradação do

ambiente de trabalho (do ambiente inteiro, é um clima ruim). O meio ambiente do trabalho

não é só físico (ruídos, iluminação, iluminação e etc), mas também as relações humanas e o

empregador devem zelar sobre isso uma vez que é ele que comanda e conduz os contratos.

Portanto, ele deve colocar ordem para não haver desequilíbrio entre as relações

interpessoais. O trabalho se torna um sofrimento. Ao longo do tempo isso leva ao pedido de

demissão (às vezes a intenção é justamente essa), não se quer demitir o empregado

diretamente e, então, faz-se o assédio para que o próprio empregado peça demissão. Outras

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 183

vezes o trabalhador não pede demissão e tem algum tipo de patologia psicológica que, muitas

vezes, é grave. Isso não é definitivo, mas é o que aparece na jurisprudência hoje.

4ª Característica: Intencionalidade

Por intencionalidade deve-se entender o conjunto de práticas deliberadas que emanaram

daquela pessoa específica. Intencionalidade está liga a direcionalidade nesse sentido, partiu de

X e foi à Y, é algo claro de perceber. Não há consenso também sobre quais dos títulos do art.

483 da CLT o empregador viola quando comete o assédio moral, dependerá muito da prática

do assédio. Quando caracterizado como poder de direção pode se encaixar em rigor excessivo

e é então possível invalidar o pedido de demissão e caracterizar que houve uma falta grave do

empregador e pedem-se os efeitos da rescisão indireta. Em alguns casos mais raros poderia se

pedir a reintegração, mas só se o problema for superado, pois isso até pioraria o assédio.

Independentemente de rescisão há dano moral que é o aspecto contratual conexo.

Remuneração (art. 457, CLT)

Para os leigos remuneração e salário é a mesma coisa. Tecnicamente, remuneração não é

salário. Isso se deduz do art. 457 da CLT.

Formas de Caracterização da Remuneração.

A primeira ideia que se tem é que remuneração é igual a salário somado à gorjeta. De uma

forma geral, há dois sentidos apresentados pela doutrina para caracterizar remuneração.

1° Sentido: Gênero Contraprestativo.

Em um primeiro sentido é gênero contraprestativo não empregatício, mas de toda relação de

trabalho, qualquer humana que esteja relacionada a trabalho humano exceto relação de

emprego. É o termo genérico para aquilo que se paga como contraprestação ao trabalho,

exceto prestação e emprego, por exemplo, honorários (advogados), vencimentos (servidores

públicos) e soldo (militares) são espécies do gênero remuneração. Alguns dizem que é

simplesmente um gênero contraprestativo e que salário é uma de suas espécies, seria a

espécie de remuneração da relação de emprego (seria uma derivação da primeira acepção),

poderia ser considerada uma segunda.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 184

2° Sentido: Exclusividade da Relação de Emprego.

Outra acepção mais diferenciada e mais próxima da CLT diz respeito ao interior da relação de

emprego. Já dentro da relação de emprego haveria parcelas de natureza genérica, de natureza

inominada e parcelas típicas da própria relação empregatícia, que só existem nela e

conformam o centro dela que são as parcelas salarias. Dentro a relação de emprego haveria

um gênero contraprestativo não salarial e teria uma espécie contraprestativa adequada típica

da relação empregatícia que é o salário.

Na relação de emprego pode haver parcelas pagas ao empregado que são típicas da relação de

emprego (salariais) e outras que podem ser pagas ao empregado, mas não são típicas, mas

circunstanciais e pagas eventualmente ao empregado (parcelas remuneratórias), nome

genérico, ou ainda seriam não salariais simplesmente.

Salário só tem na relação de emprego, é mais fácil identifica-lo e, por oposição, identificar

assim o que é remuneratório. Para identificá-lo é necessário se deter à realidade dos fatos

(primazia da realidade) e verificar três características. Se as três características estiverem

presentes, é parcela salarial, não importa o nome e, portanto, compõe o salário. O salário é um

complexo de parcelas que detém a natureza salarial (as três caraterísticas).

A importância prática disso se dá pelo fato de que muitas parcelas trabalhistas são calculas

nesse total do complexo salarial. O 13º salário (gratificação de natal) é uma parcela salarial e

sua base de cálculo é o complexo salarial. Calcula-se tudo que recebeu ao longo do ano com a

natureza salarial. Todo o complexo salarial, mês a mês, é isso que informará a base de cálculo

para pagar o 13º salário. Assim é com a remuneração de férias e com o desconto do FGTS para

calcular 8% sobre todas as parcelas de cunho salarial etc.

Características das Parcelas Salarias

As parcelas de natureza salarial ou não salarial serão apresentadas pela doutrina com

definições conceituais clássicas: “o que é uma gratificação, um adicional, um prêmio, um

abono, uma diária pra viagem etc.” Porém, a importância prática disso é saber se a parcela de

fato é ou não salário.

Na prática pode ser que o empregador chame de não salarial é algo que é salarial para se livrar

dessa natureza. Isso é uma fraude para reduzir determinados encargos trabalhistas (FGTS, 13º

salário etc.).

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 185

1ª Característica: Habitualidade

A primeira característica na natureza salarial da parcela é a habitualidade. Deve ser paga

habitualmente. Não há definição dessa frequência. Se o pagamento se repete por mais de três

meses consecutivos, para jurisprudência, embora não seja um critério fixo ou legislado,

costuma caracterizar habitualidade.

2ª Característica: Paga Diretamente pelo Empregador

A segunda característica é que ela deve ser paga diretamente pelo empregador para o

empregado. Sai diretamente das mãos do empregador para as mãos do empregado. Nem

sempre isso acontece. A gorjeta em seu sentido original é paga pelo cliente, voluntariamente

(vide o caso do garçom), ele só a recebe porque trabalha em determinado restaurante, logo, é

em virtude do contrato de trabalho, mas ela não é paga pelo empregador diretamente. A

gorjeta é cobrada na conta e rateada pelo empregador hoje em dia, por exemplo. Ver súmula

354.

As chamadas gueltas. Acontece muito com vendedor de eletrodomésticos ou em farmácias

que são comissões pagas por certos fornecedores de produtos pela venda diferenciada ou

incrementada de tais produtos. Ganha para “empurrar” o produto (o empregador autoriza

isso).

3ª Característica: Contraprestatividade.

O terceiro e último requisito é a contraprestatividade específica ao serviço ordinariamente

prestado pelo empregado. O terceiro elemento é o que exige mais atenção. Aqui há uma

Contraprestatividade. A remuneração, de um modo geral, de esse caráter de contraprestação

para retribuir um serviço prestado. O salário é pago para retribuir o serviço tal como é

prestado ordinariamente, cotidianamente, normalmente e, de novo, deve-se se socorrer do

princípio da primazia da realidade.

Um exemplo, o adicional (noturno, de insalubridade, de periculosidade) são parcelas

remuneratórias que servem para indenizar a submissão do empregado por uma condição

excepcionalmente mais gravosa que a normal. Submeter o empregado à jornada noturna ou à

uma hora a mais de trabalho ele recebe um adicional, é uma compensação. Em tese, são

parcelas de natureza indenizatória pagas ao empregado submetido à condição mais gravosa.

Se todos os dias o empregado faz horas extras, se o cotidiano dele é fazer horas extras, desde

quando foi admitido até o último dia do contrato. Aquilo que era para ser eventual passa a ser

salarial, pois é como ordinariamente presta o serviço. Deixa então de ser indenizatório para ser

salarial. Há a conversão da natureza do adicional; deveria ser não salarial, remuneratória, mas,

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de fato, passa a ter um adicional de natureza salarial e aí e incluído no cálculo para o 13º

salário.

Contratar uma pessoa e colocar a distribuição dos valores como sendo dois mil reais de salário

e vinte e oito mil reais de direito de imagem é fraude. A separação é prevista em lei, mas para

descaracterizar a natureza salarial coloca-se uma parcela instrumental paralela. É um contrato

comercial paralelo ao contrato de trabalho, que é o contrato de direito de imagem. Isso é

assessório ao contrato de trabalho. É uma distribuição não equânime e não correspondente ao

valor de mercado ao direito de imagem.

O prêmio é uma parcela, em tese, não salarial. É algo que não é ordinário, mas sim esporádica.

Serve para contraprestacionar algo específico como um desempenho muito bom fora da

normalidade, até mesmo para estimular um tipo de conduta ou rendimento. Não é todo dia e

nem para todo mundo, é algo para uma condição extraordinária. No entanto, se pega o

contracheque de alguém onde há o salário base de 500 reais e um prêmio de 500 reais. Isso vai

se repetindo ao longo de vários meses.

Na hora do 13º salário vêm somente 500 reais, pois o prêmio não é parcela salarial. Isso é

burlar a lei, o princípio da primazia da realidade. Na verdade, sabe-se que isso é salário

independentemente do nome prêmio, pois o que está sendo pago como tal está remunerando

o serviço como ele é feito todos os dias, ordinariamente prestado. Isso impõe natureza salarial

às parcelas. O 13º salário deve ser mil reais.

Sobre §1º do 457 da CLT o salário pode ser pago de forma fixa, variável ou mista (uma parte de

fixa e outra variável). A comissão é paga habitualmente em função do contrato, ou se é

exclusivamente comissionista e no contrato se recebe 2,5% sobre as vendas ou 500 reais mais

2% de comissão fixado em contrato e é algo habitualmente. Quem paga a comissão é o

empregador e retribui o serviço prestado todo o dia. Logo, tem natureza salarial. Mas o

dispositivo acima referido já trata do complexo salarial dando alguns exemplos de parcelas. A

importância fixa estipulada é chamada de salário base ou salário básico.

O complexo salarial a que se refere o § 1º pode se decompor em salário base e sobre salário

(somando todos os “penduricalhos” pagos no Brasil não se chega ao salário dos países

desenvolvidos). No sobre salário há as parcelas tipificadas pela lei, no dispositivo mencionado,

e outras não tipificadas, instituídas pela criatividade privada, depende da criatividade do

empregador, que pode estipular o nome de uma parcela salarial que preencha as três

características, com natureza salarial que compõe o complexo salarial, mas não é salário base.

O salário base pode ser fixo, variável ou misto e pode ser pago em dinheiro ou, além disso,

parcialmente pago em utilidade, como o fornecimento do bem da vida que seria destinado a

ser suprido pelo salário do empregado – transporte, alimentação etc.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 187

Aula 18 – Direito do Trabalho I dia 27/06/2013

Salário não é apenas a quantia fixa e ajustada em contraprestação ao serviço realizado pelo

empregado. Essa quantia fixa corresponde ao salário base60.

Este salário base pode ser:

Fixo;

Variável;

Misto (parte fixa e variável).

O salário é composto do salário base e o sobre salário, tal como especificado no parágrafo

primeiro do artigo 457 da CLT. Este trás como exemplo de parcela salarial comissões,

percentagens, gratificações, diárias para viagens e abonos.

A tipificação não é relevante para validade, mas o reconhecimento à natureza salarial da

parcela quando ela se apresentar.

Para isso apresentam-se aqueles três elementos indicadores da presença da natureza salarial:

Habitualidade;

Pagamento direto pelo empregador para o empregado61;

Caráter Contraprestativo62;

A princípio, o empregador não pode pagar parcelas habituais por benevolência ou

generosidade (isso é uma crítica do empregador). Se a parcela for habitual e sair das mãos do

empregador ganhará natureza salarial, pois, ao ser pago, supõem-se para o serviço que o

empregado presta normalmente. Não se pode presumir que o empregador que tem com o

empregado um contrato de trabalho, lhe fornecerá pagamento, dádivas, senão por conta do

próprio contrato de trabalho.

Se o empregador paga e, a princípio, não há nenhuma condição especial para esse pagamento,

que justifique esse pagamento, sendo este habitual, será salário, não importando o nome que

tenha. A parcela será salarial mesmo que não esteja tipificada no §1° do art. 457 da CLT. Esta

relação irá ainda além. Mesmo que a parcela esteja com um nome classificado pela doutrina

como não salarial, se a parcela tiver Habitualidade, caráter contraprestacional e for pago pelo

empregador diretamente, será considerada salário.

60

Aquilo que é ajustado para que o empregado trabalhe. 61

Sai das mãos do empregador para as mãos do empregado, diretamente. 62

Este será revelado através desta retribuição ao serviço que o empregado realiza ordinariamente. É retribuição ao serviço cotidianamente prestado. Essa ordinariedade faz com que se analise a realidade desta relação contratual. Tudo que o empregador paga para determinado empregado que haja determinação ordinária tem natureza salarial.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 188

As parcelas consideradas não salariais terão algum elemento que as condiciones como

excepcionais. Poderão ter ainda algum tipo de indicação legal específica que retire a natureza

salarial da parcela como, por exemplo, o vale transporte. Este é concedido por força de lei. É

um benefício para o trabalhador, pois o empregador passa a custear a maior parte do

transporte que o empregado utilizar. É obrigação legal do empregador.

Assim, se a lei impõe ao empregador essa obrigação legal que trás uma vantagem para o

trabalhador, assim a própria lei entende justo que se retire a natureza salarial do vale

transporte, excluindo qualquer tipo de caracterização com natureza salarial do vale transporte.

O valor do vale transporte custeado pelo empregador não integra o complexo salarial63.

A lei da participação nos lucros e resultados exclui desta parcela a natureza salarial. A

participação nos lucros e resultados (PLR), a princípio, sendo obedecidos todos os requisitos da

lei, não tem natureza salaria. Por exemplo, é preciso que a norma coletiva (convenção coletiva

ou acordo coletivo) determine a possibilidade de participação no PLR. Deve-se repeitar o

interregno da PLR, aonde é um espaço de tempo aonde, empresarialmente, se verifica quais

foram os resultados da empresa.

Assim, no mínimo, se paga PLR semestralmente. Se for paga com uma periodicidade menor

que a semestral rompe com a exigência legal de PLR. Força de lei, o PLR só poderá ser pago

semestralmente ou anualmente, pois é o período que a empresa avalia quais foram os

resultados. Não se pode permitir a participação em resultados sem verificar quais estes foram,

isto é, se houve lucro.

Na prática, no intuito de fraudar a lei, alguns empregadores pagam o PLR mensalmente, sem

nenhuma previsão em norma coletiva (acordo coletivo), apenas por ato unilateral do

empregador. Esse nome PLR não é o PLR denominado pela legislação, o qual não tem natureza

salarial. Assim, uma participação nos lucros que é paga mensalmente terá a natureza salarial.

Características do Salário

1ª Característica: Natureza Alimentar.

A primeira e a mais importante é que as verbas salariais, que compõem umas das vigas do

contrato de trabalho64, é a natureza alimentar. É do salario que o empregado retira a sua e de

sua família a fonte de subsistência. Assim, o caráter alimentar reforça o sentido da importância

do contrato de trabalho. É justamente esse caráter que visa atender as necessidades essenciais

vitais do trabalhador.

63

Quantum total salarial. 64

O pagamento do salário peculiarmente caracteriza essa relação de emprego diferente de outras relações humanas de caráter remuneratório

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 189

2ª Característica: Continuidade (forfetário).

Tem a característica de ser contínuo e a doutrina chama de forfetário (francesismo). Remete

justamente a obrigação do empregador em se comprometer a pagar o salário independente da

sorte do empreendimento.

Esse caráter contínuo é uma consequência do elemento da relação de emprego alheabilidade

(Ajenidad). É a impossibilidade de transferir o risco do negócio para o empregado. Se o

empregado realizou o trabalho para qual foi contratado, isso é o que importa, ele deve receber

de maneira contínua e sem interrupção seu salário.

Ou seja, estando ou não a empresa saudável no mercado, não fará diferença. O caráter

contínuo impõe essa obrigação ao empregador mesmo que seu empreendimento esteja

passando por dificuldades. A súmula 173 do TST reforça essa obrigação imposta ao

empregador.

TST Enunciado nº 173 - RA 102/1982, DJ 11.10.1982 e DJ 15.10.1982 - Ex-Prejulgado nº 53 -

Mantida - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.

Vínculo Empregatício - Cessação das Atividades da Empresa - Salário

Extinto, automaticamente, o vínculo empregatício com a cessação das atividades da empresa,

os salários só são devidos até a data da extinção.

Referências:

- Art. 467, Remuneração - Contrato Individual de Trabalho - Consolidação das Leis do Trabalho

- CLT - DL-005.452-1943

obs.dji: Atividade (s); Cessação; Empresa; Extinção do Vínculo Empregatício; Relação de

Emprego; Salário; Trabalho com Vínculo Empregatício e Avulso

Assim, se a empresa está encontrando dificuldades, mas continua a existir, mantém-se a

obrigação do pagamento do salário. Apenas quando empresa cessa suas atividades

econômicas é que fica desonerada de continuar o pagamento do salário. Afinal, não havendo

mais a prestação do serviço não há que se falar em contraprestação salarial.

Essa reciprocidade entre as prestações obrigacionais é o próprio sinalagma. Se o empregado

não trabalhou, a empresa não tem obrigação de pagar o salário.

3ª Característica: Indisponibilidade.

O salário também tem a característica de ser indisponível. Assim, o empregado não poderia,

por ato de vontade renunciar ao direito de receber seu salário.

A indisponibilidade atinge mais que a renuncia, alcançando também a transação. O empregado

só pode transacionar na hipótese majoração do salário. A transação é lícita desde que não haja

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 190

prejuízo ao empregado, na forma do artigo 468 da CLT. É o princípio da Condição mais

Benéfica ao Empregado.

A princípio, não é possível transacionar quando o resultado apresentar condição mais lesiva (in

pejus). Assim, é vedada:

Renúncia;

Transação in pejus.

É ainda irredutível. Nesta há a participação do sindicato. Cabe lembrar a regra do artigo 7°,

inciso VIII da Constituição Federal.

Assim, a redutibilidade é possível em virtude de negociação coletiva com a participação dos

sindicatos. Mas, em uma circunstância de transação, de concessões recíprocas. Não pode

haver mera renúncia, nem com suporte do sindicato, nem através de convenção coletiva.

Logo, quando há a redução salarial, os trabalhadores ganham vantagens que justifique a

redução salarial. Quando assim não for, essa própria convecção coletiva pode ser anulado pelo

judiciário trabalhista.

Não se pode reduzir o salário através da negociação individual (empregado sozinho com

empregador), pois, em tese, quando a negociação é feita com o sindicato haveria um equilíbrio

com a possibilidade de manifestação de interesses (uma equalização na possibilidade de impor

os interesses), uma vez que os trabalhadores estariam organizados coletivamente, tendo

instrumentos de pressão65. Existe uma série de mobilizações que podem causar um prejuízo

incrível e pressionar a empresa a alcançar, aderir os interesses dos trabalhadores.

Em tese, pois em um país em que o sindicato nunca foi muito bem desenvolvido, não há

tradição de organização sindical forte e o que se tem são sindicatos que ao invés de lutar pelos

interesses dos trabalhadores, comungam os interesses dos patrões.

Exemplo Histórico Econômico de Convenção Coletiva in pejus.

No processo de consolidação neoliberal, a indústria automobilística foi diminuindo (o processo

de downsizing). Ao longo dos anos de 1990 e 2000, essas metalúrgicas que abasteciam as

empresas de automóvel (principalmente no ABCD paulista) foram absorvendo tecnologia e

diminuindo de tamanho.

Assim, houve uma necessidade de dispensa de trabalhadores, em virtude do próprio processo

de inovação tecnológica66.

Produz-se de outra forma, necessitando-se de menos trabalhadores do que antes se precisava.

Então, ao longo desses anos verificaram-se muitas convenções coletivas que objetivando o

65

Manifestação e greve, por exemplo. 66

Robotização e informatização.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 191

reduzir ou frear o processo de demissão em massa, permitia a redução de salário (quase

sempre com redução de jornada proporcional67). Fazia-se uma reorganização reduzindo a

jornada e diminuindo o salário e, em troca, assegurava os trabalhadores no emprego. A

negociação coletiva criava estabilidade, garantias provisórias de emprego.

Assim, conjuga-se o inciso IV com o inciso XIII, do artigo 7° da Constituição Federal. Este inciso

XIII fala da jornada de trabalho que também é flexibilizável por norma coletiva.

4ª Característica: Periodicidade (art. 459 da CLT).

O salário é periódico. Na forma do artigo 459 da CLT o pagamento do salário em qualquer que

seja a modalidade de trabalho, não deve ser estipulado por período superior a um mês, salvo

em que concerne a comissões, percentagens e gratificações, estabelecendo a periodicidade

máxima do trabalho.

Além disso, quando o salário for estipulado por mês, deverá ser efetuado, no mais tardar até o

quinto dia útil do mês vencido, ou seja, até o 5° dia útil do mês subsequente ao trabalhado. Em

síntese, o empregado trabalha um mês e no final deste recebe o salário. Esse final do mês

pode se estender até o quinto dia útil do mês subsequente. É o prazo máximo para o

pagamento.

Assim, o salário pode ser pago diariamente, por hora, semanal, quinzenal e, no máximo,

mensal. O salário, além de contínuo (2ª Característica) é periódico, sendo obrigação de trato

sucessivo do empregador. É a principal obrigação prestacional do empregador, que

corresponde ao trabalho prestado pelo empregado. O sinalagma contratual trabalhista está

justamente na troca do salário pela força de trabalho do empregado. Logo, se o empregado

não trabalha, falta, por exemplo, não há obrigação de pagar salário.

5ª Característica: Comutatividade.

A doutrina coloca ainda o aspecto comutativo do salário. É encontrada como característica do

contrato de trabalho e irá se repetir na questão do salário.

Se o sinalagma corresponde à reciprocidade de obrigações68, para

doutrina majoritária há uma equivalência de valores entre essas

obrigações. Dissemina-se com esse elemento (característica) o

entendimento que o salário do empregado vale justamente aquilo que a

força de trabalho dele pode ser aferida em termos de valor. Conclusão

lógica, o que o empregador paga é justo, pois há comutatividade.

Emocionante , o atleta cai em prantos, mas isso não corresponde à

realidade.

67

As jornadas eram necessárias, mas dentro da nova forma de produzir. 68

A obrigação de trabalhar tem a reciprocidade jurídica do pagamento do salário.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 192

Se assim fosse, o empresário não experimentaria lucros. Quando o empregado trabalha ele

produz com sua força de trabalho valor que se agregam aos fatores produtivos. Essa força de

trabalho agregada produz valor econômico. Defende a comutatividade que o valor econômico

produzido pelo empregado seria igual ao pago pelo salário (lindo, só que não ).

O Capitalismo e a Mais Valia.

Se assim fosse, se a empresa devolvesse para o

trabalhador tudo aquilo que ele trabalha, não

haveria lucro. Os manuais, em geral, trazem a

comutatividade como elemento tanto do contrato

de trabalho, quanto do salário.

A mágica do sistema capitalista é que ele gera um

valor superior àquele que é pago ao empregado. Ao

se debruçar ainda mais nessa relação, observa-se

que esse valor pago, na verdade, é valor produzido

pelo próprio trabalhador.

Por exemplo, o trabalhador que chega a empresa às 8 horas e começa a produzir valor, As

12h00min horas, ele produziu uma quantidade X de valor. Em 30 dias, durante o período das

08h00min as 12h00min horas, tem-se o valor do salário dele. Foi o próprio trabalhador que

produziu seu valor. Obviamente ele produziu associado em uma organização que congrega os

demais fatores produtivos.

Se fosse comutativo ele iria embora para casa as 12h00min, pois já produziu o valor do salário.

Mas a lógica do sistema é fazer com que ele trabalhe mais. O tempo posterior as 12h00min é o

necessário para a reprodução da força de trabalho.

O salário como valor de troca vai ser aferido pelas condições de oferta e procura do mercado.

Esse tempo posterior é chamado de excedente, cuja valoração é o + valor (mais valia), da qual

se apropria o empregador privadamente.

Existem várias maneiras de se extrair mais valia. Por exemplo, exigindo do empregado que ele

fique mais tempo físico, cronológico, excedente trabalhando (e isso pode ser estendido com

horas extras). Também é possível (e o processo produtivo tem consciência disso), incorporar

tecnologia que aumente a produtividade69, acelerando-a.

Por exemplo, se com o maquinário A ele precisa das 8h00min até as 12h00min para produzir a

quantidade de valor quer será equivalente ao seu salário, com a máquina B, mais moderna,

mais desenvolvida, ele consegue as 9h00min da manhã terá conseguido produzir a quantidade

69 Produtividade é a quantidade de produção dividia pelo tempo.

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de valor necessário para cobrir o próprio salário. Aumenta-se assim a margem de excedente.

Nota-se que a jornada não foi diminuída, mas aumenta-se a mais valia.

Assim, a doutrina de vanguarda, que pode considera da melhor doutrina (e neste sentido

professor Ivan Garcia/UFRJ) como sendo uma característica do salário, pelo menos não

paritariamente.

O Direito do Trabalho tenta esconder essa desigualdade. O Direito do Trabalho não foi criado

apenas para os trabalhadores. Ele cumpre também as necessidades do capital, um deles é a

escamotear a mais valia.

Fixação do Salário.

A fixação do salário pode se dar por unidade de tempo ou de obra. Normalmente, se fixa o

salário por unidade de tempo. Por exemplo, o trabalhador receberá R$600,00 reais por mês e

trabalhará, todos os dias úteis da semana, de 09h00min as 18h00min.

Unidade de Tempo.

Isto é unidade de tempo. O trabalhador fica a disposição do empregador, recebendo,

executando ou aguardando ordens.

Unidade de Obra.

Nesta, fixa-se um salário de acordo com o resultado da obra (atividade) realizada pelo

empregado. Pode se ajustar o salario sobre comissão, venda, ato (tarefa), comissão sobre

venda, por peça produzida. Por exemplo, paga-se um real por cada peça. Outro exemplo, pode

o empregador enumerar um número de tarefas e remunerar conforme a realização das

mesmas.

Esse salário por Unidade de Obra é variável. Quanto mais resultado o empregado produzir,

quanto mais roupa ele vender, quanto mais peças ele produzir, quanto mais tarefas ele

conseguir realizar, mais ele irá ganhar.

Hoje, no chamado pós-fordismo, os novos métodos de organização da produção, esse tipo de

estipulação do salário tem sido formulado de forma muito interessante.

Estabelecem-se trabalhos compartilhados, em equipe, e condiciona ao resultado do time a

remuneração desses empregados. Ao se ter o condicionamento das pessoas em uma equipe

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(teamwork ou jobshare), se o trabalhador adoece ou é mais lento (por questões peculiares

dele), o time irão pressionar esse cara, pois a remuneração dele está no fogo.

Não é mais necessária a formalização do controle própria do poder empregatício. O

condicionamento remuneratório prescinde do fiscal, pois os próprios trabalhadores se

fiscalizam. Isso ainda é somado a um intenso processo de individualização e competitividade.

Pagamento do Salário

O salário deve ser pago nos termos do artigo 463 e 464 da CLT. Existem algumas regras que

devem ser observadas:

A periodicidade máxima é mensal (459 da CLT);

A prestação em espécie do salário será paga em moeda corrente do país (art. 463 da

CLT);

Ω - A lei não admite pagamento em moeda estrangeira. O salário deve ser

pago em moeda nacional, corrente e em espécie. O precedente normativo70

117 da SDC, admite o pagamento em cheque, mas se assim o fizer, a empresa

dará ao trabalhador tempo necessário para descontá-lo no mesmo dia71.

Deve ser efetuado contra recibo assinado pelo empregado (Art. 464 da CLT)72;

A quitação passada pelo empregado, com assistência sindical de sua categoria, com

observância dos requisitos do parágrafo do artigo 477 tem eficácia liberatória em

relação às parcelas expressamente consignadas no recibo (Súmula 330 do TST);

Terá força de recibo o comprovante de depósito em conta bancária a verba para este

fim, com consentimento deste, no estabelecimento de crédito próximo ao local de

trabalho (§ único, 464, CLT);

O pagamento do salário será efetuado em dia útil e no local de trabalho (Art. 465,

CLT);

Ω - Quanto ao tempo: em dia útil. Quanto ao local: no local do trabalho, dentro

do horário de serviço ou imediatamente após o encerramento deste, salvo

quando efetuado por depósito em conta bancária, observado os requisitos.

É vedado o salário complessivo (Súmula 91, TST);

Ω - Este consiste no pagamento de diversas parcelas salariais sob um só título

(rubrica).

70

A OJ da SDI equivale ao precedente normativo (PN) da SCD. 71

Binômio para utilização do cheque como forma de pagamento: mesma praça + tempo útil para que ele possa pegar o dinheiro no dia do pagamento. 72

Se tratando de analfabeto será mediante impressão digital.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 195

É vedado qualquer tipo de desconto, salvo os decorrentes de acordo coletivo ou

adiantamento (art. 462, CLT).

Existe uma exceção quanto às autoridades. Algumas autoridades podem receber o salário fora

do local de trabalho, no local onde melhor atender aos interesses dessas atividades. Como

atualmente tudo é feito por depósito bancário, essa regra já caiu em desuso.

Truck System (Vedado pelo artigo 462, §2° e 3° da CLT).

Esse é um dos institutos mais antigos do Brasil, mas não é exclusivo deste. Já foi inclusive

abordado em novelas (Terra Nostra, Esperanza) com imigrantes na plantação de café.

A cafeicultura do Vale do Paraíba do Sul (RJ, Vassouras) era uma cafeicultura baseada na mão-

de-obra escrava. Teve proeminência no começo do século XIX.

Na segunda metade do século XIX a pressão, sobretudo inglesa, contra o trabalho escravo

brasileiro começará a se tornar mais efetiva, encarecendo cada vez mais o contrabando do

trabalho escravo.

É uma série de medidas, que vão desde 1.840 (quando o Brasil se compromete que irá acabar

com o tráfico negreiro) até 1.888. São quase 50 anos que o Brasil tentava engabelar a

Inglaterra das medidas que ela queria implementar para acelerar o capitalismo no mundo

inteiro, que a Inglaterra interessava, pois esta era uma potencia avançada. Tudo isso sobre um

discurso humanitário, que não podia haver essa barbárie que era exploração do trabalho

escravo.

A mão-de-obra assalariada (leia-se imigrante) passa a ser utilizada no Oeste Paulista,

principalmente após a segunda metade do século XIX. Os resultados experimentados pelos

cafeicultores (SP) eram muito melhores que da cafeicultura do Vale do Paraíba (RJ).

Superavam em produtividade, preços e etc. Utilizando mão-de-obra imigrante, se fazia o

assalariamento.

Quando começa o assalariamento no Brasil, pelo menos dentro desse setor produtivo mais

proeminente agrário, O que não significa que não existia assalariamento dentro do setor

industrial. Basta lembrar-se do Barão de Mauá, no século XVIII. Mas a industrialização não era

disseminada no Brasil, e a proeminência econômica era da cafeicultura paulista. Isso vai dessa

segunda metade do século XIX até 1930.

A agricultura cafeeira se torna não apenas o principal setor produtivo/econômico como

também por reflexo político da ‘’política do café com leite’’ na República.

Quando se instala o trabalho assalariado no Brasil, sobretudo no OESTE paulista. Já se tem o

chamado truck system.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 196

Para entendê-lo, basta ler os parágrafos segundo e terceiro do artigo 462 da CLT.

Art. 462 - Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do

empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositvos de lei ou de

contrato coletivo.

§ 1º - Em caso de dano causado pelo empregado, o desconto será lícito, desde de que

esta possibilidade tenha sido acordada ou na ocorrência de dolo do

empregado. (Parágrafo único renumerado pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

§ 2º - É vedado à empresa que mantiver armazém para venda de mercadorias aos

empregados ou serviços estimados a proporcionar-lhes prestações "in natura" exercer

qualquer coação ou induzimento no sentido de que os empregados se utilizem do

armazém ou dos serviços.

§ 3º - Sempre que não for possível o acesso dos empregados a armazéns ou serviços

não mantidos pela Empresa, é lícito à autoridade competente determinar a adoção de

medidas adequadas, visando a que as mercadorias sejam vendidas e os serviços

prestados a preços razoáveis, sem intuito de lucro e sempre em benefício dos

empregados.

O precedente normativo 68 da SDC disciplina:

Nº 68 EMPREGADO RURAL. FALTAS AO SERVIÇO. COMPRAS (positivo) - Autoriza-se o chefe de

família, se empregado rural, a faltar ao serviço um dia por mês ou meio dia por quinzena, para

efetuar compras, sem remuneração ou mediante compensação de horário, mas sem prejuízo

do repouso remunerado, desde que não tenha falta injustificada durante o mês.

As pessoas que ficam trabalhando em empregadores isolados, elas adquirem seus víveres e

gêneros de primeira necessidade, em geral, do próprio empregador. Assim, o próprio

empregador fornece farinha, azeite, arroz, feijão, etc.

Muitas vezes, essa contratação paralela se faz a partir do estabelecimento de uma linha de

crédito que, pelos preços praticados, resulta-se impagável pelo salário que o empregado

recebe. Assim, toda vez que ele vai ao armazém comprar o mínimo que precisa para

sobreviver, acaba contraindo uma dívida que é sempre superior ao recebido como salário,

ficando sempre devendo ao trabalhador. Esse sistema de criação de dívida constante é o

denominado Truck system.

Esse Truck system vedado pela CLT se converte na principal causa da redução do trabalhador a

condição análoga à escravidão.

Atualmente há um crime tipificado no Código Penal (redução à condição análoga a escravidão)

e no Direito do Trabalho denomina-se de Escravidão Contemporânea, que se baseia

justamente no Truck System (sistema de troca). Não apenas nele, mas através dele, sobretudo.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 197

O empregado contrai dívida atrás de dívida e jamais sairá da fazenda, pois moralmente

encontra-se compelido a honrá-las.

É importante historicamente, pois vai do inicio assalariado brasileiro até os dias de hoje, com o

trabalho escravo contemporâneo.

A velha CLT de 1943 já previa sua possibilidade, vedando sua prática.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 198

Aula 19 – Direito do Trabalho I dia 02/07/2013

Parcelas Salarias (Art. 457, CLT).

Vamos analisar agora algumas parcelas que estão tipificadas no art. 457, como sendo parcelas

salariais, integrantes do salário. Tirando os adicionais, todos estão no § 1º do art. 457.

Essas parcelas vão aparecer tal como definidas, vão ser conceituadas pela doutrina de forma

genérica, (abstrata). Com exceção dos adicionais, todas as outras parcelas, originalmente, não

tinham essa natureza salarial, mas, pelo próprio comportamento dos empregadores, elas

passaram, para beneficiar o empregado, natureza, definida na lei, como sendo salarial.

Mas o que interessa saber é que, independentemente do nome, do conceito, qualquer

parcela, com qualquer nome, terá sempre natureza salarial quando preencher os três

requisitos (quando for paga habitualmente, quando for paga diretamente das mãos do

empregador para o empregado e quando retribuir o serviço tal como ele é prestado

cotidianamente, ordinariamente).

Assim, estudam-se agora as parcelas que têm natureza salarial.

Comissões

a) Momento de Pagamento (Art. 446 da CLT);

b) Vendedor Viajante (Lei. 3.207 de 1957);

c) Súmula 27 do Tribunal Superior do Trabalho;

São pagas como salário variável, na modalidade por unidade de obra (e não por unidade de

tempo). São quantias ajustadas proporcionalmente a um resultado.

Fixa-se uma percentagem que vai corresponder a uma atividade do empregado. Ele ganha X%

sobre aquilo que ele deve fazer como objeto do seu contrato de trabalho.

Irredutibilidade da comissão.

O art. 7, inciso VI da Constituição Federal, estabelece uma regra que torna o salário irredutível,

com a exceção do estipulado em norma coletiva.

No caso das comissões, a irredutibilidade não se atém ao valor nominal global (ao quantum

que ele recebe ou a média do que ele recebe). O que fixa a irredutibilidade da comissão é o

valor do percentual.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 199

Por exemplo, se o vendedor ganha 3% sobre as vendas, esse percentual não pode ser

reduzido. No caso de transferência do empregado para estabelecimento com produtividade

maior, essa questão é controversa. O vendedor receberá mais, pois a loja vende mais ou vende

produtos mais caros. Nesse caso, alguns sustentam que é possível a redução do percentual se

o valor real não diminuir.

Mas, o entendimento majoritário é que a irredutibilidade salarial do comissionista refere-se ao

percentual, não sendo, portanto, possível à redução de percentual. Nesse caso, não haveria

nenhum prejuízo ao empregador continuar pagando o mesmo percentual, pois ele vendeu

mais. Não se aplica a teoria da imprevisão.

Teoria da imprevisão

Um fato adjacente ao contrato, de forma imprevisível, que transforma uma cláusula contratual

em excessivamente onerosa para uma das partes.

Tirando a teoria da imprevisão, a irredutibilidade é do valor da percentagem. Esse é o

entendimento consolidado de forma majoritária.

Nos contratos onde o pagamento do salário é exclusivamente variável, através de comissões,

naturalmente há uma determinada transferência do risco do negócio para o empregado. Essa

história de que nunca pode haver a transferência do risco do negócio para o empregado é

relativizada, porque todo comissionista tem que transferir para o seu contrato de trabalho

certo risco, certa álea.

No entanto, o que se procura preservar é o mínimo. Ou seja, o pagamento de um mínimo que

proteja o trabalhador, fixado ou pelo salário mínimo (inc. IV do art. 7º, CF) ou pelos pisos

salariais que estão previstos no inc. V do mesmo artigo. São sistemas de proteção salarial do

trabalhador que tenha salário variável.

Art. 466 – nas vendas parceladas, a prazo, o empregador só tem a obrigação de pagar

e o empregado só tem o direito de exigir o pagamento quando a parcela vence. É

possível que o empregador adiante (é raro) Sendo assim, ele paga a comissão de

acordo com que vai recebendo cada parcela pelo produto vendido pelo vendedor.

Efeitos pós-contratuais da comissão.

Só há direito de receber mediante pagamento das prestações, se rompe o contrato de

trabalho antes do término do pagamento das prestações (ainda que tenha sido demitido por

justa causa), a cada vencimento da prestação, o empregador tem que pagar. Como o

empregador não quer esse vínculo perpetuado, pelo nº de prestações a se vencerem, ele

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antecipa o pagamento dessa comissão na rescisão contratual, como verba resilitória, mas, a

rigor, seriam devidas apenas com seus vencimentos respectivos. A cada prestação, elas

passam a ser exigíveis.

Por exemplo, um vendedor de carros vendeu cinco carros. Porém quatro seriam pagos apenas

no mês de dezembro. Porém, o vendedor decide pedir as contas no mês de novembro.

Tecnicamente, o valor da comissão devida só deveria ser pago quando os carros forem pagos

pelo consumidor, no caso, em dezembro. Mas é prática empresarial quitar essa dívida já na

rescisão, adiantando o vencimento, para extinguir de vez o vínculo (às vezes o empregador é

bonzinho, mas só às vezes).

Vendedor Viajante (pracista)

É o caixeiro viajante. Tal instituto entrou em desuso. Mas existem regras específicas na Lei

3.207 de 1957. Ele figura próximo ao representante comercial.

Conseguindo um pretenso cliente, para que essa transação seja realizada, é preciso que o

empregador aceite esse cliente. Sendo assim, o vendedor deve se assegurar que o comprador

será um bom pagador, fornecendo tais dados ao empregador. Só depois que o empregador dá

o aceite é que o vendedor viajante pode efetuar a venda, e a partir daí, exigir a sua comissão.

Precedente normativo nº 97, da SDC:

PROIBIÇÃO DE ESTORNO DE COMISSÕES (positivo)

Ressalvada a hipótese prevista no art. 7º da Lei nº 3207/1957, fica vedado às empresas o

desconto ou estorno das comissões do empregado, incidentes sobre mercadorias devolvidas

pelo cliente, após a efetivação de venda.

Se a venda, mesmo dada como boa, dado o aceite, ela não se ultimar, ou seja, se num

determinado prazo, o comprador quiser desfazer o negócio, a comissão do vendedor pode ser

estornada. O empregador pega de volta essa comissão paga. Isso não pode acontecer no

comissionista urbano ou qualquer outro vendedor. Uma vez que a venda foi realizada, corre

o risco do negócio pelo empregador. A gente até viu o exemplo do cheque sem fundos, pago

pelo PODEROSO THOR. Não pode ser descontado da comissão do empregado. O empregado

pode ser punido, advertido ou até mandado embora, mas não pode descontar do salário dele.

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Gratificações (art. 457, §1º da Consolidação das Leis do Trabalho)

Originalmente não eram dotadas de natureza salarial. Passaram a ser dotadas dessa natureza

pela periodicidade, pela frequência que elas estavam sendo pagas como forma de mascarar

determinado tipo de retribuição ao serviço ordinariamente prestado. Dava-se a gratificação

como tipo de suplemento à remuneração do empregado e supostamente em condições

especiais, mas que não apareciam. Então, as gratificações ajustadas passaram a ter natureza

salarial e estão tipificadas no art. 457, § 1º. As gratificações devem ser pagas em virtude de

fato objetivo NÃO gravoso ao empregado e alheio à conduta do empregado.

Por exemplo, a gratificação de Natal, mais conhecida como 13º salário73. Gratificação de

função (quando o empregado é promovido, empregado de confiança, que tem um acréscimo

remuneratório (no mínimo 40%), em geral, tem rubrica de “gratificação de função” ou

“gratificação de função de confiança” ou “gratificação de confiança”.

Em virtude de uma determinada função, mesmo que transitória ou precária, como é o caso da

confiança, o empregado recebe esse acréscimo remuneratório por meio dessa rubrica.

A gratificação por tempo de serviço estabelece que determinados empregadores (vai

depender do regulamento interno da empresa, vai depender de norma coletiva) paguem aos

seus empregados uma gratificação pelo tempo que se estendeu naquele contrato de trabalho:

anuênio, biênio, triênio, quinquênio. Ele alcançou uma condição de fato, não gravosa e alheia

à conduta do empregado. Ele não fez nada de especial/diferente. A periodicidade dessa

gratificação pode ser inferior a seis meses: a cada 5, 3 meses.

A Participação nos Lucros e Resultados (PLR) tem natureza remuneratória ou não salarial. Não

entra em gratificação.

No caso da PLR essa periodicidade não tem essa liberdade que tem a gratificação. A PLR pode

ser paga no máximo no intervalo de seis meses, mas frequentemente no intervalo de um ano,

porque é o tempo necessário para se aferir o resultado da empresa, para saber se houve ou

não lucro.

Exemplos de Gratificações:

i. Natal (13º Salário).

ii. Função (Confiança).

iii. Tempo de Serviço.

73

Todo empregador (tem matriz constitucional), tem a obrigação de pagar a todo empregado o 13º salário.

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a) Súmula 152 – Ajuste Tácito;

A CLT quando tipifica a gratificação fala em “gratificações ajustadas”, ou seja,

decorrentes do contrato. Mas sabemos que o contrato pode ser ajustado tacitamente,

pela identificação dos elementos no plano da realidade dos fatos que compõem a

relação de emprego.

Também há a gratificação, a parcela remuneratória, pode ser ajustada de maneira

tácita, pelo fato do pagamento dessa parcela. De novo, são aquelas três regrinhas

(habitualidade, pagamento diretamente das mãos do empregador para as mãos do

empregado e a retribuição ao serviço ordinariamente prestado). A súmula diz

exatamente isso: quando a lei fala em ajuste, pode ser um ajuste tácito.

Todo mês vem no contracheque do empregado “gratificação por liberalidade”. É o

nome dado muitas vezes por alguns empregadores para não figurar como gratificação.

Como há um contrato que ata as duas pessoas, presume-se que tudo que se paga é

decorrência do contrato. Ele pode pagar por mera liberalidade a contribuição para os

médicos sem fronteira, ajuda aos mendigos. Mas se ele mantém com o empregado

uma relação trabalhista, o juiz não via presumir liberalidade. Ao contrário, sobretudo

se a parcela é habitualmente paga, se é paga diretamente de suas mãos para a mão do

empregado e este realiza o serviço tal como sempre realizou, o judiciário vai presumir

que está pagando porque é empregado. E se está pagando porque é empregado é

porque é salário.

A mera designação LIBERALIDADE no contracheque não exclui a natureza do ajuste

tácito. O ajuste tácito vai aparecer pela própria constância da parcela, pelo fato da

reiteração do pagamento da parcela. É isso que a súmula 152 diz.

b) Súmula 203 – Tribunal Superior do Trabalho;

c) Súmula 207 – Supremo Tribunal Federal.

A gratificação era dada como suplemento à remuneração do empregado, sendo muitas vezes

usadas para mascarar o valor do salário pago. Por isso ela passou a ter natureza salarial.

Adicionais

Pagas em virtude da submissão do empregado a condição mais gravosas;

a) Adicional Noturno – Súmula 60 e 265;

b) Adicional de Horas extra – Súmula 291;

c) Adicional de Insalubridade/Periculosidade – Súmula 47, 80, 228 e 248.

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Não são vedações para a designação do empregador. Ele pode impor que seus empregados

trabalhem nessas condições mais gravosas e em decorrência disso ele tem a obrigação de

pagar um adicional

A princípio, a natureza do adicional é indenizatória, remuneratória, não salarial. No entanto, se

esses adicionais se prolongam como retribuição ao serviço tal como sempre foi prestado, o

empregado foi admitido para trabalhar em jornada noturna e contínua, logo, a natureza desse

adicional não é indenizatória apenas, porque preenche a lista de três elementos (pagou com

habitualidade, pagou das mãos do empregador e para retribuir o serviço tal como ele é

prestado), ele nunca experimentou outro tipo de trabalho (diurno), ele sempre trabalhou na

jornada noturna, que no caso do urbano é das 22 h às 5h do dia seguinte. Essa jornada que é

exclusivamente noturna vai merecer, para cada hora trabalhada, o adicional de 20% sobre o

valor da hora, do salário-hora.

Os adicionais são acumuláveis. Quanto mais condições gravosas/onerosas são impostas ao

empregado, mais adicional deve ser pago. Ele recebe adicional noturno e extrapola a duração

de 7 horas, vai receber adicional de horas extras. A única impossibilidade de acumulação, que

evidentemente anuncia o interesse do capital, é a de adicional de insalubridade com

periculosidade. De fato, a acumulação é possível, mas ele tem que escolher qual dos dois

adicionais vai receber.

O adicional de periculosidade é ganho quando ele está lidando com inflamáveis, eletricidade,

com alguma condição de perigo. Ele pode lidar com inflamável, material explosivo e pode,

além disso, se submeter a condições ergométricas desfavoráveis, algum agente biológico

patológico ou algum agente físico (som alto, temperatura baixa) que são condições de

insalubridade, onde há um agente químico, físico ou biológico que cause risco à saúde do

trabalhador.

Integração ≠ Incorporação.

Tecnicamente, não se pode confundir um com o outro. O art. 457, §1, CLT começa com a

palavra “integram”.

Integrar:

Integrar é compor, fazer parte, levar em consideração o valor da parcela para efeito do cálculo

do complexo/conjunto/do todo salarial.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 204

Todas as parcelas têm natureza salarial, a princípio. O que integra o complexo salarial: as

gratificações ajustadas, os adicionais habituais, as comissões. Integram o salário, ou seja,

consideram-se esses valores para efeito de cálculo do total salarial. Isso é integração. Se essas

parcelas se repetem todos os meses, elas integram o pagamento de:

O 13º, o fundo de garantia (8% sobre o total salarial = R$ 3.000,00), aviso prévio, remuneração

férias (R$ 3.000,00 + 1/3), repouso semanal, etc, são calculados a partir dos R$3.000,00. Isso é

integração (considerar para efeito de cálculo).

Incorporar:

Não significa considerar para efeito de cálculo, quer dizer fazer parte do patrimônio jurídico do

empregado, fazer parte definitivamente do patrimônio jurídico do empregado (direito

adquirido). Incorporar quer dizer transformar em direito adquirido. Dá ideia de definitivade, é

para sempre, ou seja, enquanto mantiver a relação contratual, ele tem esse direito (direito

adquirido).

O adicional NUNCA incorpora à remuneração do empregado. O adicional integra o salário

enquanto essa condição mais onerosa faz parte do trabalho desse empregado. Enquanto de

fato ele estiver fazendo hora extra, àquelas horas integrarão o salário, serão computadas

como salário. No dia que não houver mais essa condição onerosa (volta ao horário normal ou

deixa de trabalhar à noite, não tendo mais adicional noturno, sai da câmara frigorífica), o

trabalhador deixa de ganhar o adicional (mesmo que ele tenha ficado muitos anos ganhando

esse adicional). Vai ter redução de salário, pois deixa de ganhar o adicional.

O adicional de horas extras incorporava, mas depois da súmula 291 passou a não incorporar

mais. Eles, como os outros adicionais, integram, se forem habituais, mas não incorporam à

remuneração do empregado.

Se o empregador suprimir as horas extras, há a supressão do adicional correspondente. No

entanto, se essas horas extras forem habituais, pagas habitualmente há mais de um ano, o

empregador tem que pagar uma indenização, pelo princípio da estabilidade financeira do

empregado. Indenização que equivale a uma média mensal de horas extras para cada ano que

ele trabalhou com horário extraordinário. É paga de uma única vez, no momento da supressão

para que ele não tenha um abalo na sua estabilidade financeira.

Exeção:

OBSERVAÇÃO Gratificação por função de confiança incorpora-se depois de 10 anos – art. 46,

p.u. e súmula 372 TST.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 205

Diárias para viagem

a) Limitação/integralidade do valor;

b) Súmula 101/319;

c) OJ 292 (Cancelada).

Tudo que o funcionário gasta em decorrência da viagem tem que ser ressarcida pela empresa.

Sua natureza é indenizatória (não é salarial) e está vinculada à prestação de conta.

O problema é que algumas empresas, para disfarçar o salário, dizia que determinado valor

pago era de viagem, sendo que não era. Por causa disso, o legislador presumiu uma diária de

viagem com natureza de salário. Por causa da má-fé histórica de alguns empregadores.

Art. 457, par. 2º CLT: não se inclui no salário, desde que não excedam 50% do salário

percebido pelo empregado. A contrário senso, inclui-se no salário (leia-se integra o

salário) a diária para viagem que extrapola 50% do salário total do empregado. Em

geral, se determina pelo salário-base.

Ele ganha salário-base de R$ 1000,00 e pela natureza do seu contrato, ele viaja muito e o total

das diárias supera R$ 500,00, é de R$ 600,00, esse valor integra o salário. Súmula 101.

Extrapolando 50% do salário total do empregado, integra ao salário mesmo que não seja

frequente. Integra o valor total das diárias de viagem, não apenas o excedente. Mesmo que

não seja frequente, porque se presume que é salário. Se for frequente, entram naqueles três

elementos. Se não for frequente, tem indícios de fraude. Se ele não viaja tanto, por que tanto

valor de diária para viagem? Para evitar fraude, é entendido que é salário.

Ajuda de custo (Art. 457, §2º).

a) Unitário

Cálculo do Salário:

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Art. 457, par. 2º: são parcelas pagas de forma unitária para despesa com mudança, com

transferência.

Contratar uma empresa para mudar os móveis. O empregador está mandando o empregado

se mudar. O empregador paga de uma única vez. Isso não se inclui no salário. É uma parcela

única pela mudança/transferência.

Salário Utilidade (Art. 458, CLT).

O salário não precisa ser pago integralmente em dinheiro. Uma parte do salário pode ser paga

por essas prestações in natura/em espécie. O valor dessas prestações, para que sejam

integradas ao salário, tem que ter habitualidade por força do contrato ou costume, ser

fornecido diretamente pelo empregador e ser retribuição específica ao serviço prestado pelos

empregados.

Para saber se a prestação in natura integra ou não o salário, faz-se a seguinte pergunta:

Se a parcela é uma condição (sine qua non) PARA prestar o serviço, ela é instrumento de

trabalho. Não tem como prestar o serviço sem que o empregador forneça essa parcela in

natura. Nesse caso, não é salário. Tem natureza meramente instrumental. Por exemplo,

uniforme.

Se a parcela é PELO serviço prestado, é em retribuição ao serviço prestado, é o 3º elemento

caracterizador do salário. Tem natureza salarial. O valor da prestação in natura integra o

salário.

Outra característica da parcela para que ela seja chamada salário utilidade ou salário in natura:

impossibilidade do empregador cobrar por essa prestação in natura. Se essa parcela é em

retribuição ao serviço prestado (trocando comida e habitação por trabalho), o empregador não

está vendendo a alimentação, a habitação, o transporte paralelo ao contrato de trabalho.

Se o empregador cobra qualquer quantia pela parcela in natura, está ali criando um contrato

paralelo, mesmo que a quantia seja módica/simbólica (R$ 1,00 por mês pelo fornecimento de

refeição no refeitório). Não é condição para o trabalho. Ele está cobrando por um valor

pequeno. É uma vantagem concedida ao empregado. Não é pelo serviço prestado porque ele

não está dando a alimentação em troca do trabalho; ele está cobrando, por um valor

vantajoso.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 207

Ele está vendendo a alimentação, mesmo com prejuízo, mas ele ganha tendo os benefícios

para o empregado (felicidade, produtividade, elementos subjetivos). Nesse caso, até por uma

questão de justiça, a lei retira a natureza salarial da parcela.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 208

Aula 20 – Direito do Trabalho I dia 04/07/2013

Nós introduzimos aula passada o salário utilidade, que é o salário in natura, que não é pago em

dinheiro, mas que é fornecido em algum tipo de utilidade, de prestação pelo empregador para

o empregado.

O art. 458 da CLT, diz que o salário não precisa ser pago integralmente em pecúnia, uma parte

dele pode ser paga em utilidades fornecidas ao empregado pelo empregador. Não há um

limite codificado em lei, preciso, para os salários em geral. Para o salário mínimo, estipula-se

que até 70% pode ser entregue em prestações in natura. De forma analógica, aplicam-se aos

demais salários, mas não há uma fixação precisa de até quanto será pago em dinheiro e

quanto em utilidades. Então, até 70% em in natura e 30% em dinheiro.

O art. 458, CLT, estabelece os limites, características desse salário.

Art. 458 - Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os

efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações "in natura"

que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao

empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou

drogas nocivas. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

Utilidades Não Consideradas como Salário (Art. 458, §2°, CLT)

Ela será salário utilidade quando a prestação for para o serviço, do contrário não é salário, e

pelo serviço, aqui sim tema natureza salarial. Se for como retribuição pelo tem natureza

salarial, se for para, um instrumento para, uma condição para, não tem natureza salarial.

O § 2º reforça essa dimensão:

Art. 458, § 2o Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como

salário as seguintes utilidades concedidas pelo empregador: (Redação dada pela Lei nº

10.243, de 19.6.2001)

I – vestuários, equipamentos e outros acessórios fornecidos aos empregados e

utilizados no local de trabalho, para a prestação do serviço; (Incluído pela Lei nº

10.243, de 19.6.2001)

II – educação, em estabelecimento de ensino próprio ou de terceiros, compreendendo

os valores relativos a matrícula, mensalidade, anuidade, livros e material

didático; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

III – transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno, em percurso

servido ou não por transporte público; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

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IV – assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada diretamente ou mediante

seguro-saúde; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

V – seguros de vida e de acidentes pessoais; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

VI – previdência privada; (Incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)

VIII - o valor correspondente ao vale-cultura. (Incluído pela Lei nº 12.761, de 2012)

Observem a preposição “para” no inciso I, então se o vestuário (uniforme, equipamento de

proteção, acessório) se for um instrumento de trabalho é claro que é PARA o serviço e não

pode ter natureza salarial. No caso, o bem, a coisa, é do próprio empregador.

1ª Utilidade: Vestuários, equipamentos e outros acessórios

Inciso II: o empregador que faz isso jamais poderá ser onerado por isso. Tampouco o

empregador, sejam os estudos para ele ou para seus filhos.

2ª Utilidade: Transporte destinado ao deslocamento para o trabalho

Inciso III: antigamente só tinha natureza

salarial, quando o transporte coincidia

com o serviço público de transportes

para o local de trabalho, entre o local de

trabalho e casa do trabalhador. Essa é

uma confusão muito frequente, pois

vamos estudar no semestre que vem

outro instituto chamado Horas “in

itinere”74 que diz respeito a jornada do

trabalho.

Em geral, esse tempo não é computado na jornada de trabalho. No entanto, diz a lei, no que

concerne a jornada que se computa sim no contrato de trabalho, no tempo de serviço, o

tempo que despendeu de seu lar ao local de trabalho, quando não há transporte público e a

empresa fica situada em local de difícil acesso, e, portanto, só pode chegar ao local de

trabalho, com o transporte oferecido pelo próprio empregador, transformando-se em

instrumental de seu serviço.

74

Horas “in itinere” nada mais é do que o tempo que o empregado gasta até o seu local de trabalho e para o retorno

quando o transporte desse empregado é fornecido pelo empregador, isto em se tratando de local de difícil acesso ou

então não servido por transporte público. Fonte: http://www.sebraesp.com.br/index.php/169-produtos-online/gestao-de-pessoas/publicacoes/artigos/6761-o-que-sao-horas-in-itinere

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 210

Um exemplo são os helicópteros custeados pela Petrobrás para se chegar nas plataformas

petrolíferas no meio do oceano. Nos demais casos, em que há transporte público, mesmo que

de qualidade péssima, não são computados na jornada. Para o aspecto da remuneração, o

transporte antes só não tinha natureza salarial quando era do horário “in itinere”, atualmente,

o inciso III generalizou, e retira-se a natureza salarial de qualquer transporte destinado para o

trabalho em percurso servido ou não para o transporte público.

3ª Utilidade: Habitação e Alimentação

§ 3º - A habitação e a alimentação fornecidas como salário-utilidade deverão atender

aos fins a que se destinam e não poderão exceder, respectivamente, a 25% (vinte e

cinco por cento) e 20% (vinte por cento) do salário-contratual. (Incluído pela Lei nº

8.860, de 24.3.1994)

Essa limitação, que já existe no salário mínimo, ela é reproduzida para todos os salários. É para

não se ter uma desproporção muito grande. Por exemplo, o valor que é integrado no salário

(para efeitos de salário utilidade) se o empregador fornece vale alimentação. Soma-se o valor

de todos os vales por mês que se têm o valor total. Às vezes ele fornece a comida num

refeitório, ficando mais difícil de calcular qual será o valor, então se faz o valor médio de um

prato parecido num restaurante das redondezas, por exemplo.

Outro exemplo, o empregado receba do empregador um apto na Delfim Moreira, na Vieira

Souto por que a empresa fica do lado. Ganha remuneração de R$ 10.000,00. Ele não poderia

pagar um aluguel com esse dinheiro? Esse apto é condição exclusiva para ele trabalhar? Se ele

não morasse na Delfim Moreira ele não poderia trabalhar então? Claro que não! Não é uma

condição exclusiva, não é uma condição sine qua non75 ela não tem caráter instrumental não é

“para”. E se não é “para” é “pelo”! É só uma vantagem que o empregador está dando ao

empregado. Então o salário dele é R$ 10.000,00 + o uso do apto na Delfim Moreira, não a

propriedade. Seria como se fosse adicionado o preço do aluguel do apto ao salário dele.

Um aluguel desses custa uns R$ 5.000,00. Mais do que 25% de 10.000. Então, eu só posso

integrar 2.500, de modo que não tenha um enriquecimento excessivo do empregado em

virtude de uma vantagem que o empregador está fornecendo. É muito melhor ele morar com

um imóvel já fornecido pelo empregador, sem nenhum custo para o empregado, do que

custear com o valor de seu salário um apto pior. É o valor do uso, da utilidade, que será o valor

de mercado, que pode ser provado com recortes imobiliários, de classificados, etc.

Em relação à alimentação, há um permissivo para retirar a natureza salarial que a lei 6.321 de

1976, que estabelece o programa de alimentação ao trabalhador (PAT). Este incentiva as

empresas a fornecerem a alimentação para os seus trabalhadores, com benefícios fiscais, se

submetendo a uma série de regras previstas na lei. Aderindo ao PAT ela pode fornecer

75

“sem a/o qual não pode ser”

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 211

alimentação através de refeitórios próprios, de fornecimento de cestas básicas, ou através do

vale refeição (VR).

Neste caso, a adesão ao PAT, todo esse fornecimento tem retirada a natureza salarial. Agora,

se a empresa não aderiu ao PAT, mesmo com VR, diz a Súmula 24176 do TST tem natureza

salarial e integra ao salário sim! A princípio, o fornecimento de VR, exceto se o empregador

deduz um desconto simbólico do salário do empregado. Neste caso, o empregador estaria

celebrando um contrato acessório/paralelo ao contrato de trabalho, no qual ele fornece

alimentação ou o VR com a dedução de um valor módico, R$1,00, por exemplo. Também

haverá a limitação do art. 458, § 3º, de não exceder a 20% do salário-contratual.

As demais utilidades, não são feitas referências a esta limitação. Quanto à habitação, também

temos o afastamento salarial pela instituição de contratos paralelos, como locação e

comodato. Então o empregador entrega a habitação, mas celebra um contrato paralelo de

locação, ai já não se pode falar que aquela habitação seja objeto de salário, de conversão em

parcelas de natureza salarial. Eu, como proprietário do imóvel, apenas aproveito a

oportunidade e alugo o imóvel.

No caso da habitação, especificamente a lei do inquilinato (8245/91) prevê um prazo

específico para a desocupação de inquilinos, locatário, que seja empregado do locador quando

a relação de emprego acabar.

A alimentação é fornecida de forma incentivada pela lei. No caso do transporte ela é oferecida

de maneira obrigatória, através da concessão de vale transporte (VT), lei 7.418 de 1985, é

obrigatória para todos os empregados que tenha necessidade de se locomover através de

transporte, o empregador tem a obrigação de pagar o vale transporte. Na verdade, o

empregado ele contribui com até 6% de seu salário para o custeio dos vales, e o empregador

complementa com o resto. Para quem ganha pouco, vale muito a pena, já que o desconto não

é muito representativo.

O salário-utilidade vai aparecer não nessas hipóteses, pois a própria lei 7418/85 quando impõe

uma obrigação da empresa custear parte do transporte, retira a natureza salarial desse vale.

VT não tem natureza salarial, mas eventualmente um veículo fornecido pelo empregador para

o empregado, poderia caracterizar o elemento salarial, sobretudo quando esse veículo fica a

disposição do empregado para outros fins que não a locomoção para o trabalho. Pode-se ver

isso no art. 458, § 2º, III, CLT.

Antigamente se a empresa fornece um carro ao trabalhador para que ele se locomova ao

trabalho para realizar o seu contrato de trabalho durante a semana, “para” o trabalho, mas no

fim de semana não tinha como se justificar tal instrumentalidade, com o empregado podendo

usar esse carro para ir fazer picnic com a família, então neste caso era pelo trabalho, era um

76

Súmula nº 241 do TST

SALÁRIO-UTILIDADE. ALIMENTAÇÃO (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

O vale para refeição, fornecido por força do contrato de trabalho, tem caráter salarial, integrando a remuneração

do empregado, para todos os efeitos legais.

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plus. A OJ 246, TST77 retirou essa cisão entre usar para o trabalho, retirando a natureza

salarial, mesmo quando o empregado fica com o carro durante o fim de semana.

Quanto ao vestuário, só devemos fazer menção a separação da legitimidade entre a

vestimenta pessoal e do uniforme. O uniforme, como o próprio Art. 458, §2º, I, CLT diz, é

instrumento de trabalho, logo, não poderia ser possível o desconto do salário do empregado

pelo uniforme, muitas empresas prosseguem com esse desconto, que só poderá ser

autorizado por norma coletiva. Caso haja tal desconto, este será ilegal.

A peculiaridade se encontra com os vendedores de lojas de roupa, onde há este desconto

também, só que este é camuflado, como uma cota para gastar com roupas da própria loja, mas

que usa o preço de custo da roupa, e não o preço de venda. O problema é que essa compra,

como em qualquer contrato de compra e venda, deve partir de um ato de vontade.

É comum o empregado não quer usar a roupa da loja, mas o empregador o obriga a usar a

roupa da loja. Neste caso, se caracteriza também como uniforme e o desconto é ilegal.

Acabando o contrato de trabalho, e ele não querendo mais aquela roupa, ele tem que devolver

esta roupa, como teria de devolver qualquer uniforme, nesses casos ele pode pedir o

ressarcimento dos descontos, como descontos indevidos.

Algumas empresas para os altos-executivos fornecem uma verba de representação para que

eles comprem roupas de grife, que a jurisprudência chama de “auxílio-paletó”, de modo que

esteja bem vestido para se relacionar com os outros executivos de outras empresas, fornecem

também a matrícula e a mensalidade de clubes, a chamada rede de relacionamentos. Na FGV,

como ele não dominam o português, ele só sabem falar de “Network”, carros de luxo.

Enfim, tudo isso será de natureza salarial se não for demonstrado um caráter instrumental,

será apenas considerado como um extra, mas muitas vezes, quando vemos reclamação de

altos diretores, administradores e presidentes de empresa, contra o empregador, observa-se

que fazem o pedido de natureza salarial dessas verbas de representação, inclusive do auxílio-

paletó, com muita probabilidade de êxito em ser integrado ao salário do trabalhador.

Sistema de proteção ao salário

Tem três aspectos de proteção ao salário do empregado.

Quanto ao valor do salário;

Quanto à intangibilidade do salário;

Quanto à isonomia.

77

Súmula 246. Salário-utilidade. Veículo. (cancelada em decorrência da sua conversão na Súmula nº 367) - DJ 20.04.2005

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 213

1° Aspecto: Quanto valor

Princípio da irredutibilidade salarial (art. 7º, VI, CRFB/88), com o permissivo da norma coletiva

possa prever a redução num processo de transação.

O mais importante, é que o direito do trabalho estabelece pisos, limites mínimos de

pagamentos de salários. Neste caso temos o salário mínimo (art. 7º, VI, CRFB/88) e os salários

profissionais (art. 7º, V, CRFB/88).

O salário mínimo é nacionalmente unificado em lei de competência da União (Congresso

Nacional), visando satisfazer o mínimo, para a satisfação da dignidade humana, que se faz

através da satisfação das utilidades citadas lá no próprio dispositivo, o que demonstra a

inconstitucionalidade dos salários mínimos que nós vimos ai sendo pagos ao longo da história.

Lembrando que ele foi instituído juridicamente em 1930, mas na prática, só foi implementado

em 1940.

De 40 para cá, tivemos dois períodos, na ditadura varguista e no período democrático

varguista, quando o João Goulart (Janguinho, para os íntimos78) foi ser ministro do trabalho e

deu um aumento extraordinário para U$ 200,00 no salário mínimo e teve de ser demitido, os

generais queriam a sua cabeça, mas como ele era muito experiente em ser caçado por

generais, perdeu a pasta do ministério do trabalho no governo democrático do Vargas (1951-

1954, até que suicidaram ele79).

Mas com valor que ultrapassava o patamar de duzentos dólares realmente dava para satisfazer

aquelas utilidades originárias, de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte. A

CRFB/88 acrescentou a essas utilidades a saúde, educação, o lazer e a previdência social para

ser custeado pelo salário mínimo, o que é sintomático, pois se fantasiam esses elementos das

políticas públicas, quando estes deveriam ser públicos, mas que no fundo não o são, pois há

essa reserva ao salário mínimo para o pagamento de tais utilidades. Mas enfim, ele é

unificado, e todos os dispositivos da CLT que falam em salário mínimo regional, não foram

recepcionados pela CRFB/8880.

A última recomendação sobre o salário mínimo é a vedação aos reajustes periódicos81, em

súmula vinculante nº 4 do STF, no sentido de que não é possível estipular em contrato,

legislação em qualquer objeto jurídico indexação com base no salário mínimo, não pode servir

de índice de reajuste de nada, pois ele é em sua essência constitucional, sofredor de reajustes

78

79

80 Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral,

agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; 81

Súmula Vinculante 4 STF - Salvo nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como

indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão

judicial.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 214

periódicos, independente de inflação, pois se entende que estes reajustes cumprem o sentido

de significar, valorizar o trabalho humano.

Então, como ele sofre esses reajuste periódicos, não se pode ter um contrato que se tenha

como critério esse valor, pois este sofrerá junto os reajustes do salário mínimo, e isso

pressiona os preços e a inflação, por este motivo que o constituinte vedou a vinculação do

salário mínimo para qualquer fim e o STF, embora o TST tenha um entendimento contrário, o

supremo vem insistindo nisso, por que há práticas, inclusive em dispositivos da CLT, onde há

tal vinculação. Como exemplo referido pelo supremo na sumula 4, é o adicional de

insalubridade, que de acordo com o artigo 195, CLT82, ele é estabelecido em % de 10, 20 ou

40%, dependendo do grau de insalubridade (mínimo, médio ou máximo) do salário mínimo.

Então o STF diz que não vale nada, embora a CLT diga isso, ela que se vire e ache outro critério

. E assim, muito contratos eram celebrados com base no salário mínimo, mas a atual

vedação imposta pelo STF impedem que novos sejam feitos. O problema da súmula vinculante

nº 4, é que ela impediu que os tribunais fixassem este outro critério. Qual era a ideia então do

supremo? Pressionar o legislativo, pois é ele quem deve regular a regra substitutiva da CLT.

Mas essa pressão não tem efeito nenhum no país, já que o legislativo não legisla por que há

uma necessidade da ordem jurídica que ele legisla, mas sim de acordo com seus interesse e

pressão que ele sofre. Então não adianta o supremo dizer que o legislativo é quem tem que

regular, ele vai fazer isso se ele quiser ! E ai o tribunal ficou de mão atada, sem saber a

base em que pagaria o adicional de insalubridade, sem poder o tribunal estipular outro

critério. Na prática o filho malcriado do TST , editou a súmula 22883, criando

critério, dizendo que seria feito a partir do salário básico do trabalhador, tal qual é o adicional

82 Art . 195 - A caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do

Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo de Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho,

registrados no Ministério do Trabalho. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

§ 1º - É facultado às empresas e aos sindicatos das categorias profissionais interessadas requererem ao Ministério

do Trabalho a realização de perícia em estabelecimento ou setor deste, com o objetivo de caracterizar e classificar

ou delimitar as atividades insalubres ou perigosas. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

§ 2º - Argüida em juízo insalubridade ou periculosidade, seja por empregado, seja por Sindicato em favor de grupo

de associado, o juiz designará perito habilitado na forma deste artigo, e, onde não houver, requisitará perícia ao

órgão competente do Ministério do Trabalho. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

§ 3º - O disposto nos parágrafos anteriores não prejudica a ação fiscalizadora do Ministério do Trabalho, nem a

realização ex officio da perícia. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

83 Súmula nº 228 do TST

ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO (redação alterada na sessão do Tribunal Pleno em 26.06.2008) - Res. 148/2008, DJ 04 e 07.07.2008 - Republicada DJ 08, 09 e 10.07.2008. SÚMULA CUJA EFICÁCIA ESTÁ SUSPENSA POR DECISÃO LIMINAR DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

A partir de 9 de maio de 2008, data da publicação da Súmula Vinculante nº 4 do Supremo Tribunal Federal, o adicional de insalubridade será calculado sobre o salário básico, salvo critério mais vantajoso fixado em instrumento coletivo.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 215

de periculosidade. Há uma reclamação constitucional sobre tal sumula que ainda não foi

julgada em definitivo, apenas suspendendo eficácia da sumula, mas na prática os tribunais

mimados vem aplicando esse critério, que hoje, NA PRÁTICA, é fixado em 10, 20 e 40% do

salário base, persistindo essa lacuna legal.

Os pisos salariais são estipulados de acordo com a complexidade da profissão, através de 3

medidas: o Salário Profissional, que é aquele regulado em lei específica, no caso, a advocacia

tem uma tabela de honorários mínimos. O Salário Normativo é aquele fixado em sedes de

dissídio coletivo, por sentença normativa, cujos sujeitos desse tipo de processo são os

sindicatos, que propõe em justiça para que os tribunais decidam sobre as condições desse

trabalho, de qual seria o reajuste salarial, fixando um piso salarial. Será um Salário

Convencional, quando o resultado da negociação, convenção coletiva de trabalho afirmar o

valor do trabalho. Tendo alguns critérios de pagamento, e entrando na intangibilidade quanto

ao pagamento, já falamos do prazo mensal até o 5º dia útil para ser pago no horário do serviço

ou imediatamente após84. As comissões são pagas na forma do art. 466, CLT85, o local do

pagamento do salário, é o local do trabalho, quando ele é pago em cheque, o cheque tem que

ser de agência próxima ao trabalho ou pago em horário bancário que dê tempo o suficiente

para se locomover à agência, de modo que consiga sacar em espécie o valor, e o pagamento é

em moeda nacional diretamente ao empregado, vedado outra moeda86.

Descontos legais

O 462, CLT87 estabelece a regra geral para se descontar os salários, do que poderá ser

descontado no salário, que é só o que está no 462 ou em leis específicas, como a lei Pelé para

84

Art. 465. O pagamento dos salários será efetuado em dia útil e no local do trabalho, dentro do horário do serviço ou imediatamente após o encerramento deste, salvo quando efetuado por depósito em conta bancária, observado o disposto no artigo anterior. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.1997) 85

Art. 466 - O pagamento de comissões e percentagens só é exigível depois de ultimada a transação a

que se referem.

§ 1º - Nas transações realizadas por prestações sucessivas, é exigível o pagamento das percentagens e

comissões que lhes disserem respeito proporcionalmente à respectiva liquidação.

§ 2º - A cessação das relações de trabalho não prejudica a percepção das comissões e percentagens

devidas na forma estabelecida por este artigo.

86

Art. 463 - A prestação, em espécie, do salário será paga em moeda corrente do País.

Parágrafo único - O pagamento do salário realizado com inobservância deste artigo considera-se como

não feito.

87

Art. 462 - Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo

quando este resultar de adiantamentos, de dispositvos de lei ou de contrato coletivo.

§ 1º - Em caso de dano causado pelo empregado, o desconto será lícito, desde de que esta possibilidade

tenha sido acordada ou na ocorrência de dolo do empregado. (Parágrafo único renumerado pelo

Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

§ 2º - É vedado à emprêsa que mantiver armazém para venda de mercadorias aos empregados ou

serviços estimados a proporcionar-lhes prestações “in natura” exercer qualquer coação ou induzimento

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 216

jogadores de futebol, que prevê desconto por uma multa, cláusula penal para a rescisão

antecipada. Não se pode penhorar o salário, descontos para fins de parcela contratual

alimentar (pensão alimentícia pode!), mas as outras é reservado a intangibilidade do salário. O

empregador só pode descontar nos casos:

1) de adiantamento, que não é propriamente um desconto, ele só vai deduzir o que adiantou,

quando for pagar o restante;

2) propriamente desconto são aquelas parcelas discutidas em lei, estão inclusas também as

normas coletivas, que tem força de lei. Por exemplo, quem já trabalhou na vida sabe que no

contracheque, vem a palavra “descontos”, e tal valor é relativo ao imposto de renda, outro

para o INSS (L8213/91), o PAT também autoriza descontos a título de alimentação, pensão

alimentícia (art 734, cpc88), contribuição sindical (54589 e 57890, CLT), etc.

3)a norma coletiva também pode estabelecer descontos, é o caso do desconto de uniforme. A

própria norma coletiva pode prever o desconto de outras parcelas de contribuição sindical mas

não A contribuição sindical típica, chamadas de contribuições assistenciais, confederativas, ou

outras estabelecidas em norma coletiva, só que para essas tem uma súmula do STF Nº 66691, a

no sentido de que os empregados se utilizem do armazém ou dos serviços. (Incluído pelo Decreto-lei nº

229, de 28.2.1967)

§ 3º - Sempre que não fôr possível o acesso dos empregados a armazéns ou serviços não mantidos pela

Emprêsa, é lícito à autoridade competente determinar a adoção de medidas adequadas, visando a que

as mercadorias sejam vendidas e os serviços prestados a preços razoáveis, sem intuito de lucro e

sempre em benefício das empregados. (Incluído pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

88 Art. 734. Quando o devedor for funcionário público, militar, diretor ou gerente de empresa, bem

como empregado sujeito à legislação do trabalho, o juiz mandará descontar em folha de pagamento a

importância da prestação alimentícia.

Parágrafo único. A comunicação será feita à autoridade, à empresa ou ao empregador por ofício, de que

constarão os nomes do credor, do devedor, a importância da prestação e o tempo de sua duração.

89

Art. 545 - Os empregadores ficam obrigados a descontar na folha de pagamento dos seus

empregados, desde que por eles devidamente autorizados, as contribuições devidas ao Sindicato,

quando por este notificados, salvo quanto à contribuição sindical, cujo desconto independe dessas

formalidades. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 925, de 10.10.1969) Parágrafo único - O recolhimento à entidade sindical beneficiária do importe descontado deverá ser

feito até o décimo dia subseqüente ao do desconto, sob pena de juros de mora no valor de 10% (dez por

cento) sobre o montante retido, sem prejuízo da multa prevista no art. 553 e das cominações penais

relativas à apropriação indébita. (Incluído pelo Decreto-lei nº 925, de 10.10.1969) 90

Art. 578 - As contribuições devidas aos Sindicatos pelos que participem das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação do "imposto sindical", pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo. (Vide Lei nº 11.648, de 2008) 91

STF Súmula nº 666 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 4; DJ de 10/10/2003, p. 4; DJ de 13/10/2003, p.

4.

Contribuição Confederativa - Exigibilidade - Filiação a Sindicato Respectivo

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 217

súmula do diabo estabelece que tirando a contribuição sindical, todas as outras tem de ser

aprovadas pelo empregado.

Quando é então que o empregador desconta com algum tipo de discricionariedade? Quando

um empregado realiza algum dano ao patrimônio do empregador, sendo que este dano só

pode ser descontado quando haja culpa grave do empregado + previsão contratual expressa

desde o momento da admissão, não podendo ser inserida no curso do contrato, pois ai seria

uma alteração in pejus do contrato. A sumula 342, tst92 reforça isso.

(51-45)

A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição, só é exigível dos filiados ao

sindicato respectivo.

92

Súmula nº 342 do TST

DESCONTOS SALARIAIS. ART. 462 DA CLT (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

Descontos salariais efetuados pelo empregador, com a autorização prévia e por escrito do empregado, para ser integrado em planos de assistência odontológica, médico-hospitalar, de seguro, de previdência privada, ou de entidade cooperativa, cultural ou recreativo-associativa de seus trabalhadores, em seu benefício e de seus dependentes, não afrontam o disposto no art. 462 da CLT, salvo se ficar demonstrada a existência de coação ou de outro defeito que vicie o ato jurídico.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 218

Aula 21 – Direito do Trabalho I dia 09/07/2013

Proteção contra discriminação

É importante diferenciar o princípio da isonomia com um dos seus corolários, uma das suas

consequências, que é o princípio da não discriminação.

O princípio da isonomia é a diretriz geral que estabelece a necessidade de tratamento

equânime/igual para pessoas situadas na mesma espécie ou nas mesmas situações. A

isonomia pode se desdobrar em discriminações negativas e discriminações positivas.

Discriminações Positivas

São as ações afirmativas: políticas de cota. No caso do Direito do Trabalho (DT), por exemplo, a

cota para deficientes físicos. As empresas com determinado número de empregados, pelo

menos mais de 100 empregados, necessariamente, devem manter 5% (esse percentual varia

de acordo com o número de empregados) de empregados portadores de deficiência física ou

necessidade especial. Esta é uma política discriminatória positiva.

Ainda que um empregado portador de deficiência física seja demitido, o percentual tem que

ser mantido, sob pena de multa da fiscalização do Trabalho, do Ministério do Trabalho e do

próprio Ministério Público do Trabalho.

O princípio da não discriminação vai tanto dizer respeito à discriminação positiva como à

discriminação negativa.

Discriminações Negativas

As discriminações negativas são obstadas pelo DT e elas são de toda ordem. Hoje, 2013, o

anuário do IBGE, ainda apresenta a mulher recebendo 69% do salário do homem; para fazer a

mesmíssima tarefa, na mesma qualidade de funções, paga-se, em geral, em média, para a

mulher, 69% do que paga-se para o homem.

No caso brasileiro, as discriminações são cumulativas. Se se trata de uma mulher negra, esse

percentual cai para 40%.

Por esses números, é possível perceber as várias discriminações sofridas pela mulher

brasileira. Não é só salarial, mas de acesso ao mercado de trabalho, de ascensão funcional.

Têm-se muito menos mulheres chefes do que homem. No mundo jurídico também. É uma

raridade ver mulher jurista.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 219

Evidentemente, é o projeto de opressão cultural sistemático do qual todos nós somos frutos,

resultados e reprodutores, homens e mulheres. O homem machista é sempre criado por uma

mulher machista ou tem uma mãe machista que reproduz o machismo na cabeça dele. É

cultural, e aí nós temos esse problema no mercado de trabalho muito forte.

Para cada livro/manual de uma jurista mulher, utilizam-se 20, 30, 100 de homens. Vê-se logo a

distribuição não equânime nesse sentido.

Voltado para o mercado de trabalho, o princípio da não discriminação é a diretriz vedatória de

tratamento discriminatório/diferenciado à pessoa em virtude de fator injustamente

desqualificante. Desqualificar um empregado em relação a outro em virtude de qualquer uma

dessas condições: idade, gênero, sexo, raça etc.

Subdivisão da proteção contra discriminação.

Nós temos no DT um sistema de proteção contra discriminação. As diretrizes gerais desse

sistema estão na Lei nº 9.029/1995.

Proíbe-se, nessa lei, a discriminação desqualificante de mulheres, de menores de idade, de

deficientes físicos, discriminação por tipo de trabalho (trabalho braçal, intelectual),

discriminação do tipo de profissão (trabalhador avulso, trabalhador celetista). Tem-se ali um

sistema geral de proteção.

Mas, se tem também, um sistema de proteção salarial, contra discriminação salarial, que vai se

subdividir em:

Equiparação salarial (art. 461, CLT);

Reenquadramento;

Desvio de função

O reenquadramento e o desvio de função não têm uma previsão expressa na ordem jurídica

trabalhista. Decorrem de construção doutrinária e jurisprudencial.

Equiparação salarial

Parte do pressuposto de que trabalho igual corresponde a salário igual. Todo mundo que

trabalha da mesma forma deve receber o mesmo salário. A CRFB/88 já estabelece isso (art. 7º,

XX e XXX), e a CLT, no art. 461, define o que é trabalho igual.

O que é trabalho igual para fins de equiparação salarial? O que é trabalho igual para fins de

equalização desses salários?

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 220

Antes de definir a equiparação nesses critérios de equiparação, é importante a gente atentar

para o fato de que em toda equiparação a gente vai ter o PLEITEANTE da equiparação e o

MODELO ou PARADIGMA, que é aquele de quem se pretende o salário igual e aquele com

quem se pretende a identificação do trabalho.

MODELO ou PARADIGMA é, portanto, a referência de quem se pretende obter o salário igual,

uma vez que se concebe que realizam o mesmo tipo de trabalho.

O PLEITEANTE sempre pleiteia/requer a equiparação salarial com vistas a um MODELO, a um

PARADIGMA.

Toda reclamação trabalhista que contiver pedido de equiparação tem que apresentar um

modelo: com quem se quer ter o salário equiparado. Não adianta dizer que ganha muito

menos do que muita gente na empresa que faz a mesma coisa. Tem que dizer que faz o

trabalho igual a uma determinada pessoa, que ganha, por exemplo, duas vezes ou 20% a mais.

O pleiteante vai pleitear as diferenças de salário até hoje e a alteração salarial para equiparar o

salário, doravante, ao desse modelo ou paradigma.

Falta a gente verificar os requisitos.

O art. 461, CLT, estabelece:

Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na

mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade.

§ 1º Trabalho de igual valor, para os fins deste Capítulo, será o que for feito com igual

produtividade e com a mesma perfeição técnica, entre pessoas cuja diferença de tempo de

serviço não for superior a 2 (dois) anos.

§ 2º Os dispositivos deste artigo não prevalecerão quando o empregador tiver pessoal

organizado em quadro de carreira, hipótese em que as promoções deverão obedecer aos

critérios de antiguidade e merecimento.

§ 3º No caso do parágrafo anterior, as promoções deverão ser feitas alternadamente por

merecimento e por antiguidade, dentro de cada categoria profissional.

§ 4º O trabalhador readaptado em nova função por motivo de deficiência física ou mental

atestado pelo órgão competente da Previdência Social, não servirá de paradigma para fins de

equiparação salarial.

Requisitos:

1º - Identidade de funções

2º - Trabalho de igual valor, que significa:

- Mesma produtividade

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 221

- Mesma perfeição técnica

3º - Mesmo empregador

4º - Mesma localidade

5º - Diferença de tempo inferior a 2 anos

6º - Inexistência de quadro de carreira

O art. 461, CLT estabelece 6 (seis) requisitos que devem ser demonstrados (todos) para que se

possa qualificar o trabalho como igual e, por consequência, obter a remuneração igual ou a

diferença de remuneração do modelo ou paradigma.

1º - Identidade de funções

Primeiramente, deve-se repetir que cargo não se confunde com função. Para o DT, cargo é

uma coisa e função, outra. E o que a lei exige aqui é a identidade de funções, e não de cargos.

Cargo é nomen iuris, a nomenclatura, o nome que é atribuído a uma função ou a conjunto de

funções.

Função é aquilo que o empregado faz de fato, é o conjunto de tarefas, de responsabilidades,

de atribuições que o empregado tem, por força do contrato de trabalho. A função, então,

obedece ao princípio da primazia da realidade.

Já o cargo é só uma designação, é só o nome, que pode ser determinado em virtude da

categoria profissional, pela criação de uma categoria que cria os cargos que compõem essa

categoria, pela criatividade privada do empregador. O empregador tem o poder

organizacional, logo, ele organiza o seu pessoal em estruturas hierárquicas de cargos. Ele cria

planos de cargos dentro do seu poder organizacional. Ele organiza todos os fatores produtivos

e organiza também a força de trabalho dentro da empresa. Então, o empregador pode criar

esses nomes. Por exemplo, Auxiliar Administrativo I, Auxiliar Administrativo II, III, e assim

sucessivamente. Isso é cargo.

E a função é aquilo que ele faz de fato. É com isso que o legislador da CLT está preocupado:

identidade de funções, identidade do conjunto de atribuições, tarefas e responsabilidades que

são designados tanto para o requerente quanto para o modelo ou paradigma. Eles têm que

fazer a mesma coisa.

Parece um tanto amplo/genérico dizer que eles têm a mesma função. A lei, então, trata de

especificar isso. Como eu consigo aferir essa identidade de funções? Eu consigo aferir isso com

trabalho de igual valor.

2º - Trabalho de igual valor

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Esse valor é bem próximo do valor de troca da força de trabalho (valor econômico). E esse

valor é aferido por dois subcritérios: a produtividade e a perfeição técnica.

Realizar as mesmas coisas não é simplesmente dizer que um e outro fazem petição inicial, a

mesma função. Eu preciso de mais, para saber se o trabalho é igual. Eles fazem o mesmo

número de PI? Ou o mesmo nº de PI num determinado espaço de tempo? Eles têm a mesma

produtividade (produção/tempo)? Eles produzem a mesma quantidade de tarefas num

determinado espaço de tempo? Isso é a produtividade. É o aspecto quantitativo do valor do

trabalho que ele desempenha.

E ainda, com a mesma perfeição técnica? Um faz uma PI toda rebuscada, cheia de citações,

referências a acórdãos, a doutrinadores. O outro faz uma PI simples, concisa, sem citar

ninguém objetiva, dizendo: aconteceu isso e eu quero isso e fim. Qual a que tem a melhor

perfeição técnica? Tem como aferir isso? Se for na área trabalhista, é a segunda, sem dúvida

nenhuma. É quase como um requisito subjetivo das petições trabalhistas a clareza, a concisão

e a objetividade. No caso do processo do trabalho, se privilegiam as petições mais simples,

concisas e objetivas. Até porque no processo civil onde se enaltece esse formalismo, quando

tem acórdão, o juiz pula.

Esse elemento da perfeição técnica é um elemento qualitativo. Ele vai ser mais difícil de ser

aferido quanto maior a intelectualidade do trabalho ou se se trata de um trabalho artístico.

Dois pintores. Qual o quadro que tem a maior perfeição técnica? Um usa um tipo de técnica e

o outro, tipo diferente. Qual a mais perfeita? Depende de quem está olhando o quadro. É

muito difícil de ser aferido num trabalho intelectual ou artístico, mas num trabalho braçal, até

pode ver o acabamento da peça produzida; na prestação de serviço, aquele prestado com mais

educação, que cativa mais a clientela. Aí se tem o aspecto qualitativo, podendo de alguma

maneira ser aferido.

A perfeição técnica também pode ser verificada pela qualificação educacional, profissional e

técnica do empregado. Muitas vezes, eles até realizam a mesma tarefa, desempenham a

mesma função e até mesmo com a mesma produtividade, mas um tem curso na UFRJ e o

outro tem curso numa faculdade qualquer, ou seja, qualquer uma outra. Então, ele tem mais

qualidade, mais perfeição técnica. Um tem pós-graduação, um tem mestrado, um tem um

curso específico, especialização, e o outro não tem. Isso pode dar uma ideia de uma

qualificação técnica maior. Portanto, não é um critério absoluto, não é um critério definitivo,

mas isso contribui para que haja a equiparação ou a diferenciação de salários.

3º - Mesmo empregador

Ambos, pleiteante/requerente e modelo/paradigma, trabalhem para o mesmo empregador. O

que parece se óbvio aqui, às vezes, complica quando a gente está diante de um grupo

econômico, por exemplo, diante de transformações da estrutura jurídica da empresa. Os dois

trabalhadores têm que ter passado por todas as etapas de transformação dessa estrutura

jurídica, transformação do tipo de sociedade, transformação dos sujeitos que titularizam o

empreendimento. Estou falando de grupo econômico, estou falando de sucessão de empresas.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 223

Quando a súmula 129, TST, traz a tese do empregador único para o entendimento do TST,

então se estabelece que é possível a equiparação entre trabalhadores de empresas diferentes,

de pessoas jurídicas diferentes, mas que pertençam ao mesmo grupo econômico.

Quando eu adoto a tese do empregador único, eu estou indo além da solidariedade passiva do

§ 2º do art. 2º da CLT. Eu não tenho somente solidariedade passiva; eu tenho solidariedade

ativa. Eu tenho só a obrigação de que todos têm em conjunto, as várias empresas do grupo

econômico, de pagarem a um empregado da empresa A. Isso é o que já diz a lei; é a

solidariedade passiva. Facilitação do crédito do trabalhador. Com a tese do trabalhador único,

eu tenho solidariedade ativa, ou seja, deste trabalhador para com todas as empresas do grupo.

Não é só a empresa que o contratou que subordina esse trabalhador, senão todas as

empresas. O grupo inteiro é o empregador, é o empregador único. Todas essas empresas

configuram como um só empregador para cada empregado. O empregado foi contratado pela

empresa A. Se a empresa B exige algum tipo de ordem/tarefa para esse empregado, ele vai ser

também subordinado a esta empresa, se eu adoto a tese do empregador único, que não está

na lei, mas na súmula 129. E é esta mesma súmula que permite compreender que o

empregado na empresa B preenche a condição de mesmo empregador quando se adota a tese

do empregador único.

Então, eu tenho um vendedor da empresa A que ganha R$ 1.000,00 e tenho um vendedor da

empresa B que ganha R$ 2.000,00. Eu tenho que verificar todos os critérios.

Eles têm a mesma função. Enquanto vendedores, eles fazem o mesmo tipo de venda. Também

têm a mesma produtividade: em média, vendem X imóveis. Eles têm a mesma perfeição

técnica: têm a mesma qualificação, trabalham nas mesmas condições e têm a mesma

qualidade. Trabalham para o mesmo empregador? Aqui há a dúvida. Se eu não adoto a tese do

empregador único, não tem equiparação, pois eles trabalham para empregadores diferentes,

cada empresa remunera o seu vendedor como acha que deve. Mas, se eu adoto a tese do

empregador único, eles trabalham para o mesmo empregador, e, nesse caso, o vendedor que

ganha R$ 1.000,00 vai requerer a diferença salarial, vai requerer a equiparação salarial ao do

que ganha R$ 2.000,00.

4º - Mesma localidade

Localidade aqui é o espaço territorial com as mesmas características socioeconômicas. Quase

sempre, na prática, equivale ao mesmo município, ou a mesma metrópole, quando o

município já tem conurbações (Rio e Niterói, Rio e Nova Iguaçu, Rio e Nilópolis). Não tem

grandes discrepâncias socioeconômicas que justifiquem ali uma diferença de salário.

Mas se for “Rio e Santarém” é completamente diferente. As relações de abastecimento, as

relações de fluxos de produtos e de bens são diferentes; os preços praticados para os diversos

produtos são muito diferentes, de maneira que essa diferença de localidade pode justificar a

diferença salarial. Nas regiões onde se pratica a média de preços mais baixa, costuma-se pagar

remuneração menor/mais baixa, até para que ele possa ter um poder aquisitivo compatível

que se apresenta na região sócioeconômica.

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Rafael Ayres Marques & Vinicius Santos Caderno de Direito do Trabalho Página 224

A mesma localidade, na prática, representa o mesmo município ou mesma região

metropolitana.

5º Diferença de tempo inferior a 2 anos

No § 1º do art. 461, CLT, nós vimos a condição de que a diferença de tempo no serviço não

seja superior a 2 (dois) anos. Notem: diferença de tempo em favor do modelo/paradigma. O

modelo/ paradigma não pode estar trabalhando há muito mais tempo do que o requerente. Se

ele está trabalhando há muito mais tempo que o requerente, devemos nos lembrar daquele

ditado: “antiguidade é posto”. A diferença temporal justifica a diferença salarial: ele tem mais

experiência, ele está lá há mais de 2 anos, o outro tem menos de 2 anos naquela função. Dois

anos é o tempo razoável que o legislador entende que se adquira essa experiência que justifica

essa diferença na remuneração. Ele tem mais do que 2 anos de serviço (é o que fala o § 1º,

mas vocês vão entender mais de 2 anos na função).

Pode ser que o pleiteante tenha entrado na empresa há 10 anos. O modelo entrou há 3 anos,

mas entrou na função Auxiliar Administrativo I. O pleiteando chegou agora na função Auxiliar

Administrativo I. Quem está há mais tempo na empresa (tem mais tempo de serviço na

empresa) é o pleiteante. Quem está mais tempo na função Auxiliar Administrativo I é o

modelo. E essa diferença justifica a diferença salarial. Se ele entrou hoje na função que já

estava há 3 anos o modelo, portanto há mais de 2 anos, nesse caso, justifica. Para que haja

equiparação salarial, a diferença de tempo tem que ser inferior a 2 (dois) anos. Se o modelo

estivesse há um ano, não se justificaria a diferença salarial. Estaria cumprindo mais esse

requisito para a equiparação.

6º - Inexistência de quadro de carreira

Esse requisito está nos §§ 2º e 3º do art. 461, CLT.

Leitura da súmula 6 do TST.

A existência de quadro de carreira vai supor que haja uma organização hierárquica que

determine o cargo, função e salário, sendo certo que essa organização deva ser homologada

no Ministério do Trabalho que vai aferir se se respeita objetivamente os critérios alternados de

antiguidade e merecimento. Há a busca/dinâmica constante de verificação de merecimento,

de índices de produtividade, de índices objetivos, índices que vão determinar se uma pessoa

vai ascender funcionalmente e outra não, e é isso que vai, no caso, inseri-las em cargos

diferentes e terem, portanto, remunerações diferentes.

Na verdade, o quadro de carreira, com esses critérios e com essa forma, vai tentar minimizar

alegações do tipo: “eu faço a mesma coisa que o outro”. Eventualmente pode fazer, mas não

faz sempre, não tem a mesma qualidade, porque essa qualidade está verificada por esses

critérios, porque, se fizesse, ele teria a vez de ascender funcionalmente, como pode ser que

terá. Eles estão posicionados em cargos distintos dentro desse cargo de carreira.

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Nós vimos que o cargo não interessa tanto, mas passa a interessar se nós tivermos critérios

objetivos de ascensão funcional ou de alocação nesses quadros, que é o que elide/afasta a

equiparação pelas regras dos §§ 2º e 3º do art. 461, CLT.

Esse é o principal critério de isonomia salarial, de proteção do salário contra a discriminação. É

a equiparação salarial.

Percebam que não é nada simples se provar a equiparação salarial, pois tem que se provar

todos os seus requisitos e mais um que não está na lei, que é a simultaneidade, que é um

requisito lógico.

Requisito da simultaneidade

É necessário que os contratos de paradigma e empregado pleiteante coincidam

temporalmente, ainda que por um único dia. Eles têm que ter trabalhado para a empresa no

mesmo momento, simultaneamente, ainda que a coincidência não ultrapasse de um dia.

A empresa pagava R$ 5.000,00 para o seu Auxiliar Administrativo I. Achando que estava

pagando muito, o demitiu, que era o único Auxiliar Administrativo I que ela tinha. No dia

seguinte, contratou outro Auxiliar Administrativo I. Não houve coincidência temporal dos dois

contratos. Contratou este para pagar R$ 2.000,00, para fazer as mesmas funções. Ele

preencheu todos os 6 requisitos, mas ele não pode pedir a equiparação com o ex empregado,

porque os contratos não foram coincidentes temporalmente, não foram simultâneos. Eu só

posso pedir equiparação se houver coincidência temporal, ou seja, terem trabalhado na

empresa no mesmo momento. Se um trabalhou em um momento e o segundo em outro

momento, não é possível pedir a equiparação. A empresa pode perfeitamente, demitindo o

Auxiliar Administrativo I, contratar um novo empregado pela metade do salário.

Respondendo: São todos aqueles requisitos no mesmo momento.

Aluno pergunta algo sobre um substituto eventual. Um gerente sai de férias e outra pessoa o

substitui na função.

R.: A princípio, eles têm direito ao mesmo salário, mas vai depender de que tipo de contrato se

estará efetivando com esse substituto. A princípio, o substituto tem o salário do substituído,

porque ele vai fazer as mesmas funções. A exceção é o tipo de contrato. Se for terceirização de

mão de obra, terceirização pela Lei nº 6.019/74, ela própria garante a isonomia salarial. O art.

12 dessa lei diz: o salário do substituto tem que ser igual ao salário do substituído, salvo

alguma gratificação ou vantagem de natureza pessoal: o empregado tem doutorado, por

exemplo. É uma condição pessoal. Salvo isso, o salário tem que ser o mesmo, porque se

pressupõe aqui o trabalho igual. No caso de outras modalidades de terceirização, não há o

estabelecimento de uma regra expressa sobre essa equiparação. No entanto, a jurisprudência

(há uma OJ que agora não me lembro) atribui, no caso de terceirização ilícita com a

Administração Pública, o direito de equiparação salarial quando ocorre substituição por

terceirização. Ou seja, substituir alguém na AP por terceirização já é ilícito, mas se o sujeito

trabalhou fazendo exatamente a mesma coisa que o concursado fez, essa OJ concede a

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equiparação. Com base nessa OJ, muitos juízes julgam que o terceirizado de uma maneira

geral tem direito à equiparação salarial, embora se compreenda que a terceirização é um

mecanismo para redução de custos: terceiriza-se para não pagar o mesmo que se paga a um

empregado, contrata-se por um valor menor, então, ele receberia menos. Há essa polêmica.

Então, depende do tipo de contrato que é feito com o substituto. Se é um contrato por tempo

determinado, tem direito à equiparação.

Aluno intervém: um funcionário que substitui o gerente que está de férias.

Resposta: Então, ele foi contratado não para aquela função de gerência. É um desvio de

função. O substituto teve sua função desviada. Ele foi contratado para uma função e,

circunstancialmente, está substituindo o chefe ou outro empregado. Isso acontece muito na

prática. Como o contrato de trabalho não define expressamente o conjunto de funções, você

diz: você está sendo contratado como advogado, mas que funções você vai fazer?

Acompanhamento processual, carga, audiência, sustentação oral, petições, petição inicial,

contestação? Isso não está especificado. Logicamente, são funções factíveis por qualquer

profissional advogado. Compreende-se que é inerente ao seu contrato o desempenho de

tarefas que são próprias da profissão de advogados, mas eu não preciso colocar lá por escrito,

até porque isso vai criar um limitador. Vamos supor que eu tenha esquecido de colocar

sustentação oral no tribunal e haja necessidade da empresa de o empregado sustentar num

processo difícil. Como eu não coloquei no contrato, a gente vai cair no art. 483, alínea “a”

(estou antecipando matéria do próximo semestre).

Art. 483. O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida

indenização quando:

a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por Lei, contrários aos bons

costumes ou alheios ao contrato;

Quando o empregador exigir serviço alheio ao contrato é uma infração grave do empregador

ao contrato de trabalho e suscita a chamada rescisão indireta. O empregado pode rescindir o

contrato por culpa do empregador e receberá todas as parcelas indenizatórias como se fosse

mandado embora sem justa causa. Portanto, é muito arriscado para o empregador limitar o

número de funções. Ele não vai fazer isso. Se ele combinou que o empregado vai fazer A, B e C,

colocou isso no papel e amanhã se ele precisar de D, e não está no contrato, é exigência de

serviço alheio ao contrato. E a própria dinamicidade da empresa orienta que não se fixe um

conjunto de atribuições. Tem uma série de funções e tarefas que são próprias à qualificação

profissional do trabalhador que ele dá conta e que eu não vou restringir porque eu preciso

explorar essa mão de obra da maneira ótima, da melhor maneira possível para a concepção do

meu empreendimento. Então, eu não vou limitar o número de tarefas.

Por outro lado, as tarefas profissionalmente menos qualificadas, as profissões que não têm

uma qualificação profissional sofisticada, as que não precisam de curso superior, têm uma

grande dificuldade de verificação de qual conjunto de tarefas faz parte do contrato e qual não

faz parte.

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Por exemplo, se eu pedir para um advogado limpar uma latrina, essa função é alheia ao

contrato, ainda que no contrato não conste nada sobre as funções desse advogado, porque ele

tem uma qualificação profissional que não compreende a limpeza de latrina, para a qual,

inclusive, não precisa de nenhuma qualificação, mas de qualquer maneira, não faz parte da

formação acadêmica do advogado.

Por outro lado, se eu tenho um trabalhador que é minimamente qualificado, se eu tenho um

Auxiliar de Serviços Gerais. Severino foi contratado para fazer reparos, limpeza do chão, faxina,

cuidar da parte elétrica, reparos hidráulicos. Não mencionei “limpar latrina”. Ele está

trabalhando 2/3 anos. Eu digo: além de tudo isso que você faz, você vai também limpar latrina.

Ele pode usar o art. 483, alínea “a”, sob o argumento de que sobre essa tarefa não havia nada

combinado? É a lei ou contrato. Como ele vai provar isso? Art. 456, parágrafo único, que trata

da prova do contrato:

À falta de prova ou inexistindo cláusula expressa a tal respeito, estender-se-á que o

empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal.

Há no dispositivo um conceito jurídico indeterminado: condição pessoal. E é exatamente aqui

que o empregador vai trabalhar dizendo: limpar latrina é compatível com a condição pessoal

dele. Ele podia se desincumbir muito bem dessa tarefa. Ele limpa muito bem o chão e pode

muito bem limpar a latrina. É inerente à condição pessoal dele. Ele não tem o diploma de

advogado. Nesse caso, o empregado poderia dizer: a minha condição pessoal para o contrato

de trabalho é representado pela minha profissão, advogado. Não se coaduna com a minha

condição pessoal exigir esse serviço.

O que o art. 483, alínea “a” dá com uma mão, o art. 456, parágrafo único, tira com a outra,

esvazia, sobretudo para as funções de trabalhadores menos qualificados. Quem tem uma alta

qualificação vai se safar, mesmo que não esteja no contrato, porque não faz parte da sua

condição pessoal. Mas se o empregado tem uma profissão pouco qualificada, dificilmente ele

vai dizer que não faz parte do contrato. É pau para toda obra. Ele aguentou, faz parte do

contrato. Ele aguenta fazer, eu posso inserir tantas tarefas quantas eu quiser no contrato de

trabalho dele que não vai dar ensejo à argumentação de que está alheio ao contrato, nos

termos do art. 483.

Então, essa história de desvio de função é uma coisa muito complicada. Eu contratei para fazer

A e começo a exigir também B, C e D. Eu vou estar sempre relacionando o art. 456, parágrafo

único, com o art. 483, aliena “a”.

Se eu conseguir provar que esse acréscimo desvirtua da minha condição pessoal para o que eu

fui contratado, se esse acréscimo é muito diferente daquilo para que eu fui contratado, eu caio

no art. 483. Se não, considera-se como parte integrante do contrato.

Mas se esse serviço que eu fui fazer a mais corresponde ao serviço de um outro empregado na

empresa, eu posso pleitear o salário dele? Havia uma pessoa que só fazia aquele a mais que

agora está a cargo de outro empregado. É o caso da substituição em que o empregado, além

de fazer as suas tarefas, substitui o que entrou de férias. Ele não deixa de fazer o que fazia

antes para somente substituir o colega que está de férias. Em geral, ele acumula, suprindo o

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que está de férias, porque a empresa não contrata outra pessoa. Há um desvio de função.

Quando não dá para dizer que é serviço alheio ao contrato (art. 483), faz parte do contrato

(art. 456, parágrafo único). Neste caso, o empregado diz: tudo bem, eu faço o a mais, faço

hora-extra e consigo segurar, mas vou ganha mais, posso pleitear mais alguma coisa?

Resposta: Depende. Se há um quadro de carreira que especifique essas tarefas e relacione com

o cargo, porque há um critério objetivo.

O desvio de função, também chamado de desvio de fato, só vai acarretar um acréscimo

remuneratório quando tiver uma lei, uma norma coletiva ou um quadro de carreira que

estabeleça objetivamente.

Por exemplo, o empregado foi contratado para fazer A + B. Na substituição a outro empregado

de férias, também vai fazer C. Se for possível aferir numa norma coletiva que quem faz C ganha

X R$, por exemplo, a lei do radialista esmiúça as funções e estabelece salários diferenciados:

operador de mesa, locutor, programador. É um critério objetivo que permite aferir esse desvio

de função. É muito difícil a procedência de acréscimo salarial com base em desvio de função de

fato. É muito difícil provar isso, mas é uma possibilidade.

O reenquadramento é mais fácil, porque aqui, necessariamente, eu tenho um quadro de

carreira.

O desvio de função, então, pode acontecer quando não há quadro de carreira. E de fato

acontece. Mas como eu vou provar que para essa função a empresa remunerava de maneira

diferenciada ou especificamente em virtude dessa função se ganhava uma quantidade

qualquer? Não dá para saber. No reenquadramento, não. No reenquadramento, você tem uma

empresa organizada com um quadro de carreira, que não precisa ter os mesmos critérios da

equiparação, não precisa ser homologado pelo Ministério do Trabalho, não precisa ter critérios

alternados de ascensão funcional por antiguidade e merecimento, mas tem lá o

estabelecimento objetivo das clivagens/separações de cargo, função e salário. E com base

nesse quadro de carreira, o empregado que teve a sua função originária desviada, pode

pleitear o reenquadramento: “eu comecei fazendo as funções do Aux. Adm. I, e hoje eu

acumulo funções do Aux. Adm. I, do II e do III”. Quem ganha mais é o III. Ele pede o

reenquadramento para III, porque ele faz 90% das funções de III, 100% da de II e 100% das

funções de I, ou 80% das funções de I, de II e de III. Ele vai ter de provar que está inserido

dentro desse cargo e pleiteia o reenquadramento. Essa é uma outra possibilidade que se abre,

não expressamente legislada; são construções da jurisprudência que estabelecem outras

formas de isonomia salarial.

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