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Câncer de Tireóide
Dr. Gilberto Vaz Teixeira
Introdução
A prevalência de nódulo de tireóide na população geral é em torno de 4 a
7%, sendo que 1/3 a 2/3 da população adulta possui nódulo de tireóide
diagnosticado ultrassonograficamente. A possibilidade de doença neoplásica é
a principal preocupação de pacientes que apresentam nódulos tireoidianos,
sendo que a parcela de pacientes com tal ocorrência pode chegar a 10% da
população adulta. De fato, apenas cerca de 5% do total de nódulos tireóidianos
são malignos, representando cerca de 1,5% de todos os carcinomas.
Os principais tipos de neoplasia maligna de tireóide são o Carcinona
papílifero (75% a 85% dos casos), Carcinoma folicular (10% a 20% dos casos),
Carcinoma medular (5% dos casos) e Carcinoma anaplásico (menos de 5%
dos casos). Exceto pelos carcinomas anaplásicos, que apresentam alta
letalidade, o prognóstico é geralmente bom. Estima-se uma sobrevivência
global de 95% para carcinomas papilíferos, de 77% em 10 anos para
carcinomas foliculares e de 85% em 10 anos para os carcinomas medulares
com linfonodos negativos, porém de apenas 40% para aqueles que
apresentam invasão ganglionar.
A exposição à radiação na região da cabeça e pescoço e a história
familiar são fatores identificados como positivamente associados ao câncer de
tireóide.
Outros fatores de exposição, tais como a ingesta de iodo, o tabagismo, o
consumo de álcool e a história menstrual, têm sido investigados, porém as
evidências sobre a sua importância na determinação do câncer tireoidiano são
menos consistentes.
A maioria dos casos ocorre entre adultos, porém, alguns tipos,
especialmente carcinomas papilíferos, podem ocorrer também na infância.
Uma preponderância do sexo feminino foi observada entre os pacientes na
faixa etária reprodutiva, podendo sugerir alguma relação com a expressão de
receptores de estrogênio no epitélio neoplásico.
A maioria dos carcinomas de tireóide é derivada do epitélio folicular,
exceto os carcinomas medulares, sendo estes derivados das células
parafoliculares ou células C.
Carcinoma Papilífero
O carcinoma papilífero é o carcinoma mais comum da tireóide,
correspondendo a cerca de 80% dos tumores malignos. É definido pela
Organização Mundial da Saúde como um tumor epitelial maligno que exibe
diferenciação de células foliculares com alterações nucleares características,
sendo estas a chave para o diagnóstico, não sendo necessária a ocorrência de
invasão vascular ou capsular para o diagnóstico de malignidade.
Patogenia
A ocorrência do carcinoma papilífero de tireóide mostra-se estreitamente
relacionada à ativação e rearranjo dos receptores da tirosina cinase RET ou
NTRK1 (neurotrofhic tyrosine kinase receptor 1). Os receptores da tirosina
cinase fazem a transdução de sinais extracelulares para o crescimento e
diferenciação celular, não sendo expressos na superfície das células foliculares
normais. Nos carcinomas papilíferos de tireóide, uma inversão paracêntrica do
cromossomo 10 ou uma translocação recíproca entre os cromossomos 10 e 17
coloca a transcrição do domínio de tirosina cinase do RET sob controle de
genes constitutivamente ativos nesses dois cromossomos. Os novos genes
formados são conhecidos como ret/PTC (ret/Carcinoma papilífero da tireóide).
Outras vias para o desenvolvimento do tumor também são conhecidas,
como uma mutação de ativação no gene BRAF, que codifica um intermediário
na via de sinalização da MAP cinase, e mutações no RAS (de 10% a 20% dos
carcinomas papilíferos), sugerindo uma possível relação com os adenomas
foliculares.
Adicionalmente, também existem evidências que algumas moléculas que
regulam o crescimento das células foliculares, como IL-1 e IL-8, assim como
outras citocinas, podem desempenhar papel importante na patogenia deste
câncer.
Aspecto histopatológico
Os carcinomas papilíferos são constituídos por células poligonais,
cubóides ou colunares dispostas sobre um delicado feixe fibrovascular,
formando papilas. Outros padrões também podem ser observados como áreas
foliculares, microglandulares, cribiformes, tubulares, trabeculares ou sólidas.
No centro das papilas geralmente podem ser encontrados estruturas com
calcificação concêntrica, denominadas corpos de psamoma. O achado mais
importante para o diagnóstico do carcinoma papilífero é o reconhecimento dos
aspectos nucleares. Os núcleos das células são grandes, ovóides, com psedo-
inclusões citoplasmáticas e nucléolos pequenos, a cromatina é finamente
dispersa donde se origina a designação “vidro fosco” ou de “olho da órfã
Annie”. As figuras de mitoses geralmente são escassas ou ausentes.
Macroscopicamente, os tumores podem ser bem circunscritos, alguns até
encapsulados, ou infiltrantes com margens mal definidas, apresentando
padrões de lesão solitária ou multifocal (até 65% dos casos). Podem, também,
serem encontradas alterações císticas e áreas de calcificação e ossificação.
Existem variantes do carcinoma papilífero cujo conhecimento é importante
porque são semelhantes a outras lesões e apresentam características clínicas
únicas.
A variante encapsulada representa cerca de 10% de todos os carcinomas
papilíferos. Ela geralmente está confinada à tireóide, é bem encapsulada e
raramente apresenta disseminação vascular ou linfonodal, apresentando, na
maioria dos casos, prognóstico excelente.
A variante folicular apresenta os núcleos característicos do carcinoma
papilífero, mas tem arquitetura quase que totalmente folicular, necessitando de
apurado diagnóstico diferencial com os carcinomas foliculares.
A variante de células altas é caracterizada pela presença de células
colunares altas com citoplasma intensamente eosinofílico cobrindo as
estruturas papilares. Tendem a ocorrer em indivíduos mais velhos, são
geralmente grandes, com extensa invasão vascular, extensão extratireoidiana e
metástases cervicais.
A variante esclerosante difusa ocorre em indivíduos mais jovens, incluindo
crianças. O tumor apresenta um padrão papilar proeminente misturado com
áreas sólidas contendo ninhos de células escamosas. As células neoplásicas
têm propensão de invadir os canais linfáticos intratireoidianos, logo, quase
todos os casos apresentam metástases linfonodais.
A variante trabecular hialinizante é caracterizada por um padrão de
crescimento organóide, com ninhos e trabéculas de células tumorais alongadas
dentro de um estroma fibrovascular. È comum a invasão capsular ou
trabecular.
Apresentação Clínica
A maioria dos pacientes apresenta, ao exame físico, um nódulo solitário
na tireóide de consistência endurecida, geralmente menor do que 5 cm, com
bordas mal definidas, indolor e móvel com a deglutição. Não se observam
sinais de hiper ou hipotireoidismo (FIGURA 1). Rouquidão, disfagia, tosse ou
dispnéia sugerem doença avançada.
FIGURA 1. Paciente do sexo feminino apresentando nódulo tireóideo em
projeção de istmo, com característica de nódulo com consistência fibrosa,
suspeito de carcinoma de tireóide.
Após exame físico detalhado, a ultra-sonografia (USG) pode auxiliar na
definição dos diâmetros do tumor, pesquisar se a lesão é uni ou multifocal, se
esta apresenta características sólidas ou císticas, a presença de calcificações e
ainda orientar a punção aspirativa por agulha fina (PAAF). A USG com Doppler
pode também prover importantes informações acerca do padrão vascular da
lesão e suas características velocimétricas, usadas na diferenciação de
tumores benignos de malignos. O inventário das cadeias de drenagem linfática
do pescoço pelo exame de USG, pré-operatório, é fundamental para definirmos
a extensão regional da doença, e estabelecermos a necessidade de
realizarmos uma linfadenectomia associada a tireoidectomia.
A PAAF é o passo seguinte, sendo considerada o melhor procedimento
diagnóstico para o carcinoma papilífero com uma sensibilidade de 80% e
especificidade próxima a 100%. (FIGURA 2)
FIGURA 2. Produto de PAAF de nódulo de tireóide, com celularidade
consistente com padrão de carcinoma papilífero de tireóide, na qual, na lâmina
corada com HE, aumento 100X, observamos células aumentadas, pálidas, com
núcleo de aspecto vazado, apresentando “grooves” e pseudo inclusões.
A cintilografia também pode ser usada para diferenciar nódulos frios
(geralmente malignos) e quentes (geralmente benignos), assim como avaliar
recidivas e metástases, porém não é tão sensível e específica quanto a PAAF.
Além dos exames de imagem e da PAAF, pode-se efetuar testes de
função tireoidiana dosando-se os níveis séricos de tiroxina - T4 (normal entre
4.5-12.5 mcg/dL), triiodotironina - T3 (normal entre 100-200 ng/dL) e do
hormônio estimulador da tireóide - TSH (normal entre 0.2-4.7 mIU/dL), que
estando aumentados podem sugerem disfunção tireoidiana, não sendo, porém
específicos para câncer de tireóide, tampouco para o carcinoma papilífero. O
prognóstico é muito bom para a maioria dos pacientes, com taxa de sobrevida
em 10 anos próxima a 95% para os estágios mais favoráveis. Os principais
fatores envolvidos na definição do prognóstico são a idade, a presença de
extensão extratireoidiana e de metástases à distância, e a variante histológica
do tumor. Destes, a idade mostrou-se como fator mais importante, sendo o
prognóstico melhor para pacientes com menos de 40 anos.
Tratamento
A ressecção cirúrgica é o tratamento de escolha para o câncer de tireóide,
sendo que vários tipos de operações podem ser empregados dependendo do
tamanho e das características da lesão. No entanto, a tireoidectomia total é
considerada como a cirurgia mínima para o tratamento desta doença, haja vista
que possibilita um seguimento fidedigno no pós operatório, a partir da dosagem
de tireoglobulina, trata a doença multifocal, presente em 30% a 50% dos casos,
e permite a pesquisa de corpo inteiro, e dose terapêutica complementar de iodo
radioativo. (FIGURA 3)
FIGURA 3. Produto de tireoidectomia total, sendo visualizado nódulo
encapsulado de 1,1 cm, na transição istmo/lobo direito, com diagnóstico
histológico de carcinoma papilífero da tireóide.
As cadeias linfáticas de risco devem ser cuidadosamente investigadas,
pré-operatoriamente, e tratadas com esvaziamento cervical, no caso de doença
linfática regional presente. No ato operatório, se algum linfonodo suspeito é
encontrado, o mesmo é ressecado e submetido à biópsia de congelação. Caso
seja positivo para doença metastática, realiza-se o esvaziamento cervical,
geralmente seletivo. Os níveis de drenagem linfática de risco para o carcinoma
de tireóide são os níveis VI (compartimento central), III (jugulo-carotídeo médio)
e IV (jugulo-carotídeo inferior). (FIGURA 4)
FIGURA 4. Imagem mostrando leito operatório cervical anterior, após
realização de tireoidectomia total e esvaziamento cervical seletivo nível VI
(compartimento central), sendo visualizado traquéia, artérias carótidas comuns
e n. laríngeo recorrentes.
Após a tireoidectomia total, o paciente é submetido à pesquisa de corpo
inteiro com I131, sempre realizada com níveis de TSH elevados, para
diagnóstico de metástases regionais e a distância, podendo ser realizada após
dose terapêutica, geralmente acima de 100 mci, ou somente para pesquisa, até
5 mci. (FIGURA 5)
FIGURA 5. Mapeamento de corpo inteiro pós-dose terapêutica de iodo
radioativo 250 mci, revelando restos de captação cervical anterior em leito de
tireoidectomia total, e intensa captação pulmonar bilateral, por metástase
hematogênica de carcinoma papilífero da tireóide.
Após a pesquisa de corpo inteiro, com ou sem o tratamento com
radioiodo, o paciente é tratado com hormônio tireoidiano, usualmente a
levotiroxina, em dose supressiva, ou seja, deixando-se o TSH em seu limite
inferior com a intenção de se evitar o estímulo ao crescimento de metástases
microscópicas não detectadas pela pesquisa de corpo inteiro. Segue-se
também com dosagens de tireoglobulina sérica, que está indetectável ou muito
baixa após a tireoidectomia total. Aumentos da tireoglobulina indicam suspeita
de doença ativa, quando se torna necessária nova pesquisa metástases, com
ultrassonografia, mapeamento de corpo inteiro, PAAF ou até PET/CT. Este
seguimento tão importante está evidentemente prejudicado nas tireoidectomias
parciais, quando a dosagem de tireoglobulina torna-se não confiável, nem é
possível a utilização do iodo radioativo.
Em casos avançados em que o tumor se mostra irresecável e há
presença de metástases podem-se utilizar os quimioterápicos cisplatina e
doxorubicina como terapia paliativa assim como radioterapia para controle local
do crescimento do tumor.
Carcinoma Folicular
Os carcinomas foliculares correspondem de 10% a 20% de todos os
tumores da tireóide. Sua incidência é maior em áreas de bócio endêmico,
sendo a deficiência de iodo o principal fator contribuinte. Há também uma maior
incidência em pacientes do sexo feminino, com mais de 60 anos. Alguns casos
estão associados à síndrome de câncer hereditário não-medular da tireóide,
que caracteriza-se por tumores oxifilíticos múltiplos, associados a alterações
cromossômicas 19p13.2.
Patogenia
Cerca de 50% dos carcinomas foliculares de tireóide apresentam
mutações na família de oncogenes RAS, sendo mais comuns as mutações do
NRAS. Um terço dos tumores ainda apresenta uma translocação entre o gene
homebox PAX8 e o receptor PPARγ1. Essas duas alterações gênicas
constituem duas vias moleculares distintas e que não se sobrepõem, sendo
ambas, responsáveis pelo desenvolvimento dos carcinomas foliculares.
Aspecto Histopatológico
O exame macroscópico é um dos aspectos mais importantes na análise
de um nódulo de histogênese folicular. A identificação da cápsula fibrosa e os
possíveis tipos de invasão devem ser cuidadosamente analisados, ainda sim é
impossível a distinção macroscópica de um adenoma folicular de um carcinoma
folicular minimamente invasivo. O tamanho é muito variável, entre 1 e 10 cm, e
eles são circundados por uma fina cápsula fibrosa. São lesões sólidas, firmes e
brilhantes. Alterações degenerativas, como fibrose central e focos de
calcificação, às vezes estão presentes.
As lesões são compostas por folículos agrupados, trabéculas ou áreas
sólidas, exibindo raramente um padrão papilífero focal. As células tumorais são
cubóides ou colunares baixas, com núcleos hipercorados ou pálidos, com
nucléolos inconspícuos, podendo apresentar pleomorfismo nuclear.
A presença de invasão vascular ou capsular são os achados que
distinguem um carcinoma folicular de um adenoma. Aumento da celularidade,
padrão de crescimento sólido ou pleomorfismo celular não são sinais de
malignidade. A invasão vascular pode ser detectada em vasos localizados na
cápsula ou imediatamente adjacente a esta. A invasão capsular é detectada
pela transgressão tumoral completa da cápsula fibrosa e geralmente é
concomitante com a invasão vascular. Ao contrário dos carcinomas papilíferos,
a disseminação linfática é rara sendo mais comum a via hematogênica.
Os carcinomas foliculares de tireóide são divididos em minimamente
invasivos e extensamente invasivos. Os minimamente invasivos são lesões
encapsuladas que mostram invasão capsular focal e invasão de pequenos e
médios vasos presentes na cápsula ou adjacentes, sem extensão extra-
tireóidea. Estas lesões tem excelente prognóstico. Os extensamente invasivos
mostram invasão de vasos de maior calibre, invasão capsular evidente, áreas
de necrose e extensão para os tecidos adjacentes.
Apresentação Clínica
A apresentação clínica mais comum é de um nódulo indolor, palpável na
região da tireóide, com 11% deles mostrando metástases já na fase inicial.
Como os carcinomas foliculares não apresentam a tendência de invasão
linfática, raramente os pacientes irão exibir adenopatias cervicais. A
disseminação hematogênica geralmente acomete ossos, pulmões, fígado e
outras localizações. O prognóstico depende da extensão da invasão tumoral e
do estágio de apresentação.
A PAAF é excelente no diagnóstico do carcinoma papilífero (sensibilidade
e especificidade muito elevadas), porém, é muito pouco específica nos
carcinomas foliculares quando o resultado usual de “padrão folicular” não faz
diagnóstico diferencial com bócios, adenomas e tireoidites crônicas. Estes
resultados são considerados suspeitos para malignidade, levando ao
tratamento cirúrgico diagnóstico.
Métodos de imagem como radiografia simples de tórax, tomografia
computadorizada e ressonância magnética são úteis na avaliação de
metástases.
Tratamento
De forma semelhante ao carcinoma papilífero, o tratamento de escolha
baseia-se na ressecção cirúrgica do tumor empregando-se a tireoidectomia
total com esvaziamento cervical dependendo das características e do estádio
do tumor. No pós-operatório também se utiliza a terapia com iodo radiotivo para
eliminação de eventuais metástases ou tumor residual na tiróide e levotiroxina
na supressão do TSH.
Os quimioterápicos cisplatina e doxorubicina são usados na terapia
paliativa em casos avançados, assim como radioterapia para controle local das
metástases.
Carcinoma Medular
O carcinoma medular da tireóide é um tumor maligno com origem nas
células C parafoliculares. São secretoras principalmente de calcitonina, mas
podem secretar outros peptídeos como somatostatina, serotonina e peptídeo
intestinal vasoativo (VIP). Correspondem a cerca de 5% a 10% de todos os
tumores malignos de tireóide. Podem ocorrer na forma esporádica ou familiar ,
ou associada a síndrome de neoplasias endócrinas múltiplas (MEN tipo IIA ou
IIB). (FIGURA 6)
FIGURA 6. Ganglioneuromatose lingual em paciente portadora de
neoplasia endócrina múltipla tipo IIB, sendo portadora de carcinoma medular
de tireóide.
A forma esporádica corresponde a aproximadamente 70% a 80% dos
casos atingindo principalmente adultos na faixa etária entre os 40 e 50 anos. A
variedade hereditária (autossômica dominante com alta penetrância e
expressão variável) é encontrada em 20% a 30% dos casos, ocorrendo em
pacientes mais jovens ou até mesmo na infância.
Patogenia
Os carcinomas medulares de tireóide estão associados a mutações na
linhagem germinativa do protooncogene RET que afetam resíduos ricos em
cisteína nos domínios extracelular ou intracelular da tirosina cinase, levando a
ativação constitutiva do receptor.
Aspecto Histopatológico
Os carcinomas medulares são, de modo geral, lesões circunscritas,
raramente encapsuladas, sendo que mesmo lesões pequenas podem exibir
padrão infiltrativo. Apresentam consistência firme, de coloração branco-
acinzentada ou vermelho acastanhada, localizadas principalmente no terço
superior dos lobos laterais, porém, tumores bilaterais e multicêntricos são
comuns em casos familiares. Lesões maiores podem apresentar necrose e
hemorragia.
Na microscopia se observam blocos, ninhos ou ilhotas de células
poligonais ou fusiformes, permeados por delgados septos fibrovasculares. As
células mostram núcleos arredondados ou ovalados com cromatina fina e
nucléolo indistinto. Pleomorfismo nuclear e figuras mitóticas são incomuns.
Depósitos amilóides acelulares derivados de moléculas de calcitonina alteradas
podem estar presentes no estroma adjacente. Acredita-se que focos de
hiperplasia de células C parafoliculares representem as lesões precursoras que
dão origem aos carcinomas medulares.
Apresentação Clínica
Os pacientes apresentam uma massa única e indolor na maioria dos
casos esporádicos. Alguns pacientes podem ter sintomas de doença invasiva
como dor e rouquidão. Metade dos pacientes com carcinoma medular de
tireóide esporádico tem linfonodos metastáticos no momento do diagnóstico.
80% dos casos de tumores com mais de 2 cm de diâmetro, possuem
metástase linfática regional. Ocasionalmente, há metástases à distância em
pulmões, fígado, ossos e cérebro. Cerca de 1/3 dos casos de carcinoma
medular de tireóide esporádico tem diarréia, mediada por hormônios. No
exame de USG, o nódulo pode ser único, na forma esporádica, e a punção faz
a suspeita de malignidade que pode ser confirmada por estudo
imunohistoquímico. A calcitonina sérica costuma estar elevada. Podem-se
realizar testes de estímulo com cálcio e/ou pentagastrina, para diagnóstico
precoce em casos familiares, bem como a detecção do RET mutado. Existem
outras doenças em que há elevação de calcitonina, como câncer de mama e
pulmão, tireotoxicose e hipotireoidismo, o que deve ser levado em conta no
diagnóstico diferencial. A dosagem sérica do CEA geralmente está elevada,
acompanhando a elevação da calcitonina, nestes tumores, sendo os dois
marcadores, utilizados no monitoramento pós-operatório do controle da
doença.
Para pacientes assintomáticos mas portadores de um RET positivo pode-
se inclusive aventar a possibilidade de tireoidectomia profilática.
Tratamento
O tratamento cirúrgico é a única opção terapêutica e deve ser realizado
de forma completa e o mais rápido possível após o diagnóstico. A cirurgia é a
tireoidectomia total, com esvaziamento cervical seletivo de compartimento
central de oportunidade, associado a esvaziamento cervical seletivo ou radical
modificado lateral eletivo, baseado em variáveis de doença familiar, tamanho
do tumor primário, idade do doente, níveis de calcitonina e presença de doença
linfática regional. Doença cervical residual ou inoperável pode ser tratada com
radioterapia externa.
As recidivas após a tireodectomia total podem ser acompanhadas
dosando-se os níveis basais de calcitonina e CEA, e através de testes de
estímulo com gastrina ou cálcio.
Carcinoma Anaplásico
Os carcinomas anaplásicos são tumores indiferenciados do epitélio
folicular, constituindo a forma mais agressiva de neoplasia maligna da tireóide.
Representam de 3% a 5% de todos os tumores do órgão. Mostram discreto
predomínio em mulheres com uma media de idade em torno dos 65 anos.
Aproximadamente metade dos pacientes apresenta história de bócio
multinodular, enquanto 20% a 30% apresentam concomitantemente um tumor
tireoidiano bem diferenciado, geralmente um carcinoma papilífero.
Patogenia
Estes tumores podem surgir de novo ou através da desdiferenciação de
um carcinoma papilífero ou folicular bem diferenciado. Mutações de ponto de
inativação localizadas no gene supressor de tumor p53 são comuns nos
carcinomas anaplásicos.
Aspecto Histopatológico
Na macroscopia, se mostram invasivos com freqüente extensão para
partes moles e estruturas adjacentes do pescoço, como laringe, traquéia,
faringe e esôfago. São pardacentos, com áreas de necrose e hemorragia.
A microscopia revela a existência de três possíveis padrões histológicos:
células gigantes pleomórficas e, ocasionalmente, multinucleadas; células
fusiformes com aparência sarcomatosa; uma mistura de células gigantes e
fusiformes; e uma variante de células pequenas e anaplásicas. Focos de
diferenciação papilar ou folicular podem estar presentes em alguns casos,
sugerindo uma origem de tumor bem diferenciado.
Apresentação Clínica
O tumor apresenta-se como uma massa de crescimento rápido com
extensa invasão local e metástases precoces, mais frequentemente para os
pulmões, as supra-renais e os ossos. Os sintomas mais comuns são
rouquidão, disfagia e dispnéia, estando relacionados com o extenso
crescimento local(FIGURA 7). A síndrome da veia cava superior também pode
fazer parte das manifestações.
FIGURA 7 – Carcinoma anaplásico de tireóide apresentando massa em
pescoço fixa.
Para diagnóstico do carcinoma anaplásico não se pode contar com
exames laboratoriais específicos e mesmo a BAAF pode não fornecer material
adequado levando a necessidade de uma biópsia cirúrgica da tireóide. Exames
de imagem são úteis para a detecção de metástases linfonodais e à distância.
(FIGURA 8)
FIGURA 8.. Angio RNM de pescoço, em paciente com 62 anos de idade,
portadora de carcinoma anaplásico de tireóide, mostrando massa cervical
anterior estendendo-se e infiltrando artérias carótidas comum e tronco
braquiocefálico.
Em cerca de metade dos casos, a lesão é inoperável e metastática ao
diagnóstico inicial, apresentando prognóstico reservado.
Quase todos os pacientes morrem, a maioria de sufocamento, em 6 a 8
meses, com média de 3 meses. Praticamente todos vão a óbito em 1 ano.
Tratamento
O tratamento de escolha é a ressecção total do tumor, quando isto se
mostra factível, acompanhada de irradiação pós-operatória com feixe externo e
quimioterapia adjuvante. No entanto, a não ser em casos iniciais, o prognóstico
dos pacientes mesmo após a cirurgia costuma ser muito ruim, atingindo uma
mortalidade de até 50% em 6 meses.