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23 CAPÍTULO II - FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL 1. CONCEITO Fazenda Pública é o termo que expressa a personificação do Estado, uti- lizado na designação de pessoas jurídicas de direito público: União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Logo, a expressão Fazenda Pública Municipal representa, entre outras, a personificação do ente público municipal. Segundo Hely Lopes Meirelles, a Administração Pública, quando ingressa em juízo por qualquer de suas entidades estatais, por suas autarquias, por suas fundações públicas ou por seus órgãos que tenham capacidade processual, re- cebe a designação tradicional de Fazenda Pública, porque seu erário é que suporta os encargos patrimoniais da demanda 3 . Vale observar, ainda, que a expressão Fazenda Pública Municipal não contempla as empresas públicas e as sociedades de economia mista, já que são estas últimas pessoas jurídicas de direito privado. Segundo o Código de Processo Civil, em seu art. 12, inciso II, os Municípios são representados em juízo por seu Procurador ou por seu Prefeito. 2. PRERROGATIVAS PROCESSUAIS A Fazenda Pública Municipal possui prerrogativas processuais próprias, em razão de sua função primordial: a defesa do interesse público. Neste contexto, elencamos alguns motivos autorizadores de prerrogativas processuais, como o caráter obrigatório de defesa por parte do ente público municipal, o maior volume de trabalho e a maior burocracia em sua atividade. Vejamos: 2.1 Prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer Conforme determina o art. 188 do Código de Processo Civil, a Fazenda Pú- blica Municipal detém prazo em quádruplo para contestar e prazo em dobro para recorrer. Importante ressaltar que tal regra é também aplicável quando a Fazenda Pú- blica Municipal atua como assistente ou como terceiro em determinada causa. Por outro lado, há casos específicos em que a regra não tem aplicação, tais como: 1. Nos juizados especiais da Fazenda Pública; 3 MEIRELES. Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 590.

CAPÍTULO II - FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL · Diante do fato de a Fazenda Pública tutelar direito público indisponível, assevera o professor Leonardo José Carneiro da Cunha 4 que,

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CAPÍTULO II - FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL

1. CONCEITO

Fazenda Pública é o termo que expressa a personificação do Estado, uti-lizado na designação de pessoas jurídicas de direito público: União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Logo, a expressão Fazenda Pública Municipal representa, entre outras, a personificação do ente público municipal.

Segundo Hely Lopes Meirelles, a Administração Pública, quando ingressa em juízo por qualquer de suas entidades estatais, por suas autarquias, por suas fundações públicas ou por seus órgãos que tenham capacidade processual, re-cebe a designação tradicional de Fazenda Pública, porque seu erário é que suporta os encargos patrimoniais da demanda3.

Vale observar, ainda, que a expressão Fazenda Pública Municipal não contempla as empresas públicas e as sociedades de economia mista, já que são estas últimas pessoas jurídicas de direito privado.

Segundo o Código de Processo Civil, em seu art. 12, inciso II, os Municípios são representados em juízo por seu Procurador ou por seu Prefeito.

2. PrErrOgATIvAs PrOCEssUAIs

A Fazenda Pública Municipal possui prerrogativas processuais próprias, em razão de sua função primordial: a defesa do interesse público.

Neste contexto, elencamos alguns motivos autorizadores de prerrogativas processuais, como o caráter obrigatório de defesa por parte do ente público municipal, o maior volume de trabalho e a maior burocracia em sua atividade. Vejamos:

2.1 Prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer Conforme determina o art. 188 do Código de Processo Civil, a Fazenda Pú-

blica Municipal detém prazo em quádruplo para contestar e prazo em dobro para recorrer.

Importante ressaltar que tal regra é também aplicável quando a Fazenda Pú-blica Municipal atua como assistente ou como terceiro em determinada causa.

Por outro lado, há casos específicos em que a regra não tem aplicação, tais como:

1. Nos juizados especiais da Fazenda Pública;

3 MEIRELES. Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 590.

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2. Quando se tratar de prazo próprio (exemplo os vinte dias para a contestação na ação popular);

3. Prazo de entrega de originais com relação a petições realizadas por meio eletrônico ou fac-símile (Lei nº 9.800/1999);

4. O prazo para indicação de assistente técnico e formulação de que-sitos (art. 421, § 1º, do Código de Processo Civil);

5. Prazo de três dias para a comprovação de interposição do recurso de agravo de instrumento (art. 526, do Código de Processo Civil);

6. Prazos na ação direta de inconstitucionalidade e nas ações decla-ratórias de inconstitucionalidade;

7. Prazo para depósito de rol de testemunhas (art. 412, do Código de Processo Civil);

8. Prazo de interposição de embargos de devedor pela Fazenda Públi-ca (art. 730, do Código de Processo Civil).

Por fim, ressaltamos que a Fazenda Pública Municipal possui prazo simples para contrarrazoar recursos, ajuizar ação rescisória e prestar informações em mandado de segurança. Não sendo para contestar, nem mesmo para recorrer de uma decisão, estes prazos não se enquadram no art. 188 do Código de Processo Civil.

2.2 Fazenda Pública Municipal e o rito sumárioO Código de Processo Civil, em relação ao procedimento sumário, dispõe

em seu art. 277, que o juiz designará a audiência de conciliação a ser realizada no prazo de 30 dias, citando-se o réu com a antecedência mínima de 10 dias, determinando o comparecimento das partes. Sendo ré a Fazenda Pública, os prazos, como visto, contar-se-ão em dobro.

Neste sentido, fica evidenciado que, para a Fazenda Pública Municipal, no rito sumário, a audiência deve ser realizada no prazo de 60 dias, contados do despacho que ordena a citação; além disso, o ente público deve ser citado no mínimo com 20 dias de antecedência.

2.3 Citação pessoal da Fazenda Pública Municipal

Dispõe o Código de Processo Civil, em seu art. 222, que a citação da Fazen-da Pública deve ser realizada de modo pessoal, ou seja, pelo Oficial de Justiça, não devendo ser realizada por correio ou edital.

Tal regra possui exceções, sendo possível a citação do ente público por carta. Temos como exemplo destas exceções o procedimento de usucapião e a atuação dos Procuradores Municipais na esfera da Justiça do Trabalho (Decre-to-Lei n º 779/69).

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ATENÇÃO!

ATENÇÃO!

2.4 revelia e a Fazenda Pública Municipal

Em apertada síntese, pode-se dizer que a revelia é o não comparecimento do réu ao processo para apresentação de sua defesa.

A revelia possui basicamente dois efeitos:

a) Presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor e;

b) Dispensa de intimação do réu para os atos posteriores do processo.

Diante do fato de a Fazenda Pública tutelar direito público indisponível, assevera o professor Leonardo José Carneiro da Cunha4 que, sendo ré a Fazenda Pública, não se opera, quantos aos fatos alegados pelo autor, a presunção de veracidade decorrente da revelia.

É importante ressaltarmos, contudo, que, em recente decisão, de novembro de 2012, o STJ, no REsp 1.084.745, decidiu que os efeitos materiais da revelia se aplicam contra a Fazenda Pública quando a relação é direito privado. Se-gundo o Ministro Luis Felipe Salomão, os efeitos materiais da revelia não são afastados quando, mesmo citado, o Município deixa de contestar o pedido do autor, sempre que não estiver em litígio contrato genuinamente administrativo, mas sim obrigação de direito privado firmada pela Administração Pública.

Importante, então, ao Procurador do Município, ater-se a este detalhe em sua conduta profissional, já que, mesmo que ainda isolada, essa decisão no sentido de que os efeitos materiais da revelia se apli-cam contra a Fazenda Pública quando a relação é direito privado deve se consolidar em nossos Tribunais.

2.5 Contestação pela Fazenda Pública Municipal

Contestação é a peça processual de defesa inicial do réu em um processo judicial. Nela estão presentes todas as alegações frente ao pedido do autor.

Quanto à elaboração de peça contestatória pelo ente público, a melhor doutrina prega que com base na presunção de legitimidade dos atos administrativos a Fazenda Pública Municipal, representada pelo Procurador, não necessita impugnar especificamente cada fato ou dado exposto na peça processual inicial.

3. TAxAs E CUsTAs jUDICIAIs

No ordenamento jurídico pátrio, mais precisamente no Código de Processo Civil, art. 19, temos que as partes têm o dever de prover as despesas processuais.

4 CUNHA. Leonardo José Carneiro da. Fazenda Pública em Juízo. São Paulo: Dialética, 2010. p. 99.

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Neste contexto, Leonardo José Carneiro da Cunha5 ensina que o termo des-pesa constitui gênero, do qual decorrem três espécies:

a) custas: que se destina a remunerar a prestação da atividade juris-dicional, desenvolvida pelo Estado-juiz por meio de seus serven-tuários e cartórios;

b) emolumentos: que se destinam a remunerar os serviços prestados pelos serventuários de cartório ou serventias não oficializadas;

c) despesas em sentido estrito: que se destinam a remunerar tercei-ras pessoas acionadas pelo aparelho judicial, no desenvolvimento da atividade do Estado-juiz.

A partir dessa lição, asseveramos que a Fazenda Pública Municipal está dispensada do pagamento de custas e emolumentos. Entretanto, o Ente Públi-co é obrigado a pagar as despesas em sentido estrito.

São exemplos de despesas em sentido estrito o transporte do oficial de jus-tiça, os honorários do perito e a postagem de comunicações processuais.

Nesse sentido, a súmula 232 do Superior Tribunal de Justiça: “A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito”.

4. TUTELA ANTECIPADA E CAUTELArEs

Tendo por base a conceituação trazida por Leonardo José Carneiro da Cunha6, medida cautelar é o meio destinado a garantir a efetividade ou utilida-de ao provimento final de um processo principal.

Assim, a tutela antecipada é uma medida que visa tutelar um provimento satisfativo ao pedido inaugural, ou seja, o pedido realizado incidentalmente no processo via tutela antecipada é coincidente com o pedido final do litígio.

Neste contexto, pergunta-se: é possível medidas cautelares e tutelas anteci-padas frente à Fazenda Pública Municipal?

Para a resposta da pergunta exposta, precisamos fazer uma análise conjunta de alguns parâmetros legais, como a Lei nº 9494/1997, a Lei nº 12.016/2009 (Nova Lei do Mandado de Segurança) e a Lei nº 5869/1973 (Código de Processo Civil).

Tratando do tema cautelar, asseveramos a possibilidade de tais medidas frente à Fazenda Pública Municipal, sem prejuízo das vedações previstas na Lei nº 12.016/2009, em seu art. 2º. Logo, não será concedida medida cautelar em face da Fazenda Pública Municipal:

5 Op. cit. p. 122.

6 Op. cit. p. 230.

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1. Em medidas que tenham por objeto a compensação de crédito tributário;

2. Que tenham por alvo a entrega de mercadorias e bens provenien-tes do exterior;

3. Que visem reclassificação ou equiparação de servidores públicos;

4. Que almejem a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.

A tutela antecipada frente à Fazenda Pública Municipal também é possível, mas há restrições preceituadas pela Lei nº 9494/97, em seu art. 1º.

Leonardo José Carneiro da Cunha7 demonstra que não se afigura cabível a tutela antecipada conta a Fazenda Pública nos seguintes casos excepcionais:

1. Quando tiver por fito a reclassificação ou equiparação de servido-res públicos, ou a concessão de aumento ou extensão de vantagens;

2. Toda vez que providência semelhante não puder ser concedida em ações de mandado de segurança;

3. Quando impugnado, na primeira instância, ato de autoridade su-jeita, na via do mandado de segurança, à competência originaria do Tribunal;

4. Quando a medida esgotar, no todo ou em parte, o objeto da ação;

5. Para compensação de créditos tributários ou previdenciários;

6. Para a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior.

Concluindo, podemos dizer que os institutos da cautelar e da tutela an-tecipada são possíveis em face da Fazenda Pública Municipal, observadas as respectivas restrições legais.

5. rEExAME NECEssÁrIO

O ilustre doutrinador Marcus Vinicius Rios Gonçalves8 conceitua reexame necessário como sendo “a necessidade de que determinadas sentenças sejam confirmadas pelo tribunal, ainda que não tenha havido nenhum recurso das partes”.

A doutrina, majoritariamente, indica que o reexame necessário possui na-tureza jurídica de condição de eficácia da sentença. Logo, reexame necessário é a necessidade imposta por lei pela qual as sentenças devem ser confirmadas por um tribunal superior para ter efetividade.

7 Op. cit. p. 258/259.

8 Op. Cit. P. 56

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Conforme assevera Leonardo José Carneiro da Cunha9, o reexame neces-sário não é um recurso pelos seguintes fundamentos: inexistência de previsão expressa na lei, em atenção ao princípio da taxatividade; não possui prazo de interposição; não há voluntariedade em recorrer; não há fundamentação ou ra-zões escritas e; por último, não existe legitimidade do magistrado em recorrer.

As hipóteses de cabimento do reexame necessário estão elencadas no artigo 475 do Código de Processo Civil. Segundo o inciso I deste artigo, verifica-se o reexame necessário nas sentenças proferidas em face da Fazenda Pública. Já o inciso II prega a obrigatoriedade do reexame necessário em sentença que aco-lhe, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa.

Ainda, o artigo 475 do Código de Processo Civil traz as seguintes hipóteses em que pode haver a dispensa do reexame necessário, sendo elas: condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salá-rios mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.

O reexame necessário não pode reformar para pior a sentença prolatada (proibição do reformatio in pejus), não se aplica as decisões interlocutórias e também não se aplica aos processos em que a Fazenda Pública atua como as-sistente simples.

Por fim, temos que não são cabíveis embargos infringentes e recurso es-pecial diante o julgamento do reexame necessário, cabendo apenas o recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal.

6. DENUNCIAÇÃO DA LIDE E O MUNICÍPIO

Por definição do renomado autor Marcus Vinicius Rios Gonçalves10 denun-ciação da lide é a “forma de intervenção de terceiro provocada que tem nature-za jurídica de ação. É também chamada de litisdenunciação”.

A denunciação da lide está exposta no artigo 70 do Código de Processo Civil que assim enuncia;

Art. 70. A denunciação da lide é obrigatória:

I - ao alienante, na ação em que terceiro reivindica a coisa, cujo domí-nio foi transferido à parte, a fim de que esta possa exercer o direito que da evicção Ihe resulta;

II - ao proprietário ou ao possuidor indireto quando, por força de obri-gação ou direito, em casos como o do usufrutuário, do credor pignora-tício, do locatário, o réu, citado em nome próprio, exerça a posse direta da coisa demandada;

9 Op. Cit. P. 214

10 Op. Cit. P. 188

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III - àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda.

Majoritariamente a doutrina prega que a obrigatoriedade da denunciação da lide em processo judicial só aplica-se na hipótese do inciso I, do artigo 70 do Código de Processo Civil, ou seja, ao alienante, na ação em que terceiro reivindica a coisa, cujo domínio foi transferido à parte, a fim de que esta possa exercer o direito que da evicção lhe resulta.

Há, na doutrina, uma questão polêmica sempre levantada no tema denun-ciação da lide e a Fazenda Pública, qual seja, pode a Fazenda Pública enfrentan-do uma ação indenizatória denunciar a lide o agente público causador do dano?

Em resposta ao questionamento elencado, o autor Leonardo José Carneiro da Cunha, em seu livro A Fazenda Pública em Juízo11, assevera que pode a Fa-zenda Pública denunciar a lide o agente público causador do dano se a mes-ma não agregar elemento novo a demanda. Já se a Fazenda Pública agregar elemento novo, gerando a necessidade de instrução probatória, não haverá a possibilidade de denunciação da lide do agente público causador do dano em uma ação indenizatória.

É o que tem decidido nossos Tribunais:TJ-SC - Agravo de Instrumento AI 449209 SC 2009.044920-9 (TJ-SC)

Data de publicação: 29/11/2011

Ementa: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE PELA FAZENDA PÚBLICA. ART. 70 , INC. III , DO CPC E § 6º DO ART. 37 DA CF . CABIMENTO. Nas ações de reparação de danos em que se imputa a um agente estatal culpa ou dolo na prática do ato que constitui a causa de pedir, a Fazenda Pública pode, sem agregar fato novo ao processo, denunciar a lide ao seu preposto.

7. PrEsCrIÇÃO EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA

Conceituamos prescrição como sendo a perda do direito à pretensão em razão do decurso do tempo. A prescrição, em apertada síntese, interrompe a possibilidade de se exigir judicialmente um direito.

O instituto da prescrição está elencado nos ditames do Código Civil e em leis especiais. No caso especial da prescrição em face da Fazenda Pública, o Decreto nº 20.910/1932 prega que as pretensões dirigidas a Fazenda Pública possui prazo prescricional de 5 (cinco) anos.

Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.

11 Op. Cit. P. 209

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ATENÇÃO!

Destacamos, ainda, que os juízes deverão conhecer de ofício a prescrição, nos termos da lei nº 11.280/200612. Importante ressaltar também que o artigo 8º deste Decreto dispõe que a pretensão em face da Fazenda Pública somente pode ser interrompida uma vez e, uma vez interrompida, nos termos do artigo 9º, a prescrição recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo.

Com o advento do Código Civil de 2002, surgiu a indagação frente ao prazo prescricional nas ações indenizatórias propostas em face da Fazenda Pública, já que o diploma civil em seu artigo 206 dispõe que a pretensão de reparação civil prescreve em 3 (três) anos.

Diante o tema, assevera com sabedoria o renomado doutrinador Leonardo José Carneiro da Cunha13 “ que a legislação geral atual (Código Civil de 2002) passou a prever um prazo de prescrição de 3 (três) anos para as pretensões de reparação civil. Ora, se a finalidade da normas contidas no ordenamento jurídico é conferir um prazo menor à Fazenda Pública, não há razão para o prazo geral – aplicável a todos, indistintamente – ser inferior àquele outorgado às pessoas jurídicas de direito público. A estas deve ser aplicado, ao menos, o mesmo prazo, e não um superior, até mesmo em observância ao disposto no art. 10 do Decreto nº 20.910/1932”. Isto é um ponto de extrema importância, que deve ser fielmente observado e defendido pelo Procurador do Município na condução de ações indenizatórias.

Art. 10. O disposto nos artigos anteriores não altera as prescrições de menor prazo, constantes das leis e regulamentos, as quais ficam subor-dinadas às mesmas regras

Ainda, leciona o doutrinador que a pretensão de reparação civil contra a Fazenda Pública se sujeita ao prazo prescricional de 3 (três) anos.

Vale notar, que a posição acima exposta é a que melhor defende a Fazenda Pública Municipal nas ações indenizatórias, malgrado decisão14 recente em contrário do STJ, que entende ser este prazo o quinquenal. Cabe, porém, ao Procurador do Município, em uma ação indenizatória em face do ente público, defender com veemência que seja observado o prazo trienal, já que mais favorável ao Município e ainda aplicável.

12 Art. 219, § 5º: O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição

13 Op. Cit. P. 89

14 REsp 1251993

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8. QUEsTÕEs DE CONCUrsOs1 – (FMP – Procurador do Estado – Acre/2012) Quanto aos processos envolvendo a Fazenda Pública, assinale a alternativa correta.

A) Não se antecipa tutela contra a Fazenda Pública.B) A Fazenda Pública tem prazo dobrado para, em geral, manifestar-se nos autos.C) A execução de sentença mandamental contra Estado será realizada em processo

autônomo.D) É de 30 dias o prazo para embargos à execução contra a Fazenda Pública.

2 – (FMP – Procurador do Estado – Acre/2012)Em relação ao reexame necessário, é correto afirmar que

A) É condição de eficácia da sentença proferida contra o Estado. B) Não cabe em caso de procedência dos embargos de devedor ajuizados em execução

fiscal.C) Não haverá, caso o Estado tenha apelado intempestivamente.D) Caberá o reexame, quando a sentença estiver de acordo com a orientação do plenário do

Superior Tribunal de Justiça.

3 – (FMP – Procurador do Estado – Acre/2012)Em relação à execução em face dos entes de Direito Público, em sede trabalhista, não tem preva-lecido o seguinte entendimento:

A) Há dispensa da expedição de precatório, na forma do art. 100, § 3º, da CF/1988, quando a execução contra a Fazenda Pública não exceder os valores definidos, provisoriamente, pela Emenda Constitucional nº 37/2002, como obrigações de pequeno valor, inexistindo ilegalidade, por esse prisma, na determinação de sequestro da quantia devida pelo ente público.

B) O sequestro de verbas públicas para satisfação de precatórios trabalhistas só é admitido na hipótese de preterição do direito de precedência do credor, a ela não se equiparando as situações de não inclusão da despesa no orçamento ou de não pagamento do precató-rio até o final do exercício, quando incluído no orçamento.

C) Os juros de mora em relação à Fazenda Pública devem observar os seguintes critérios: I - Nas condenações impostas à Fazenda Pública, incidem juros de mora segundo os se-guintes critérios: a) 1% (um por cento) ao mês, até agosto de 2001, nos termos do § 1º do art. 39 da Lei n.º 8.177, de 1/03/1991; b) 0,5% (meio por cento) ao mês, de setembro de 2001 a junho de 2009, conforme determina o art. 1º - F da Lei nº 9.494, de 10/09/1997, in-troduzido pela Medida Provisória nº 2.180-35, de 24/08/2001. II - A partir de 30 de junho de 2009, atualizam-se os débitos trabalhistas da Fazenda Pública, mediante a incidência dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, por força do art. 5º da Lei n.º 11.960, de 29/06/2009. III - A adequação do montante da condenação deve observar essa limitação legal, ainda que em sede de precatório.

D) Tratando-se de reclamações trabalhistas plúrimas, a aferição do que vem a ser obrigação de pequeno valor, para efeito de dispensa de formação de precatório e aplicação do disposto no § 3º do art. 100 da CF/88, deve ser realizada considerando-se o valor total da ação.

4 - (UEL – Procurador do Estado – Paraná/2011)Quanto ao procedimento sumário assinale a alternativa correta:

A) Sendo ré a Fazenda Pública, em razão do prazo em quádruplo para contestar, a sua cita-ção deverá ocorrer com antecedência mínima de 40 (quarenta) dias da data da audiência de conciliação;

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B) Tem caráter dúplice, sendo lícito ao réu formular, na contestação, pedido em seu favor, desde que baseado nos mesmos fatos narrados na inicial;

C) Não se admite assistência; D) É vedado ao juiz proferir sentença ilíquida;E) Não se operam os efeitos da revelia do réu se este comparece pessoalmente na audiência

de conciliação, ainda que não apresente contestação.

5 – (UEL – Procurador do Estado – Paraná/2011)A respeito da execução contra a Fazenda Pública, considere as seguintes afirmações:I – Em matéria de execução contra a Fazenda Pública, a demonstração de que houve quebra da ordem de precedência cronológica é requisito para o sequestro de verbas públicas.II – Considerando a natureza da pretensão e da violação, pode o próprio presidente do TRT no qual se processa a execução contra a Fazenda Pública, no processamento do precatório, declarar a inexigibilidade do título exequendo, com fundamento no art. 884, § 5º, da CLT.III – Está sujeita à remessa “ex officio” decisão contrária à Fazenda Pública que exceder sessenta salários mínimos e colidir com decisão do pleno do STF, súmula ou orientação jurisprudencial do TST.Alternativas:

A) Todas as afirmações são verdadeiras;B) Todas as afirmações são falsas;C) A afirmação I é verdadeira e as afirmações II e III são falsas; D) A afirmação II é falsa e as afirmações I e III são verdadeiras;E) A afirmação III é falsa e as afirmações I e II são verdadeiras.

6 – (FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR MPRJ- Procurador do Município – Niterói - RJ/2011)

Sobre a Fazenda Pública em juízo, é correto afirmar que: A) As despesas dos atos processuais, efetuados a requerimento da Fazenda Pública, serão

adiantadas pela parte contrária. B) O prazo para contestar será computado em quádruplo e em dobro para interpor e respon-

der recursos quando a parte for a Fazenda Pública. C) O prazo para a Fazenda Pública ajuizar ação rescisória é de dois anos, a partir do trânsito

em julgado da decisão, salvo nos casos de transferência de terras públicas rurais, quando aquele prazo quadruplica.

D) Os honorários advocatícios não serão devidos pela Fazenda Pública nas execuções de sentença.

E) A reconvenção é cabível na desapropriação e admissível a intervenção de terceiros por meio de oposição.

7 – (FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR MPRJ- Procurador do Município – Niterói - RJ/2011)

Em relação à denominada suspensão de segurança, é correto afirmar que: A) O Ministério Público intervirá nos pedidos de suspensão de segurança, mas não possui

legitimidade ativa para requerê-los. B) As decisões proferidas nos pedidos de suspensão de segurança ensejam recurso especial

e extraordinário. C) O pedido de suspensão de segurança vigorará até o trânsito em julgado da decisão de

mérito na ação principal ou até outro prazo inferior fixado pelo presidente do Tribunal.D) Agravo contra decisão que indefere o pedido de suspensão da execução da liminar ou da

sentença em mandado de segurança é incabível.

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E) A interposição de agravo de instrumento pelo Poder Público acarreta preclusão lógica e consumativa para a formulação de pedido de suspensão de segurança contra a mesma decisão.

8 – (FIDENE – Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste do Estado do RS - Procurador do Município –Santa Rosa -RS -2013)Marque a alternativa correta. No processo civil, os prazos para o Município recorrer e contestar são:

A) Todos computados em dobro. B) Computados em quádruplo para recorrer e em dobro para contestar. C) Todos computados em quádruplo. D) Computados em dobro para recorrer e em quádruplo para contestar. E) Computados em dobro para contestar e em triplo para recorrer.

rEsPOsTAs:

1 2 3 4 5 6 7 8

D A D B C C C D

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CAPÍTULO xI – O EsTATUTO DA CIDADE E O PAPEL DO MUNICÍPIO EM sEU CUMPrIMENTO

1. CONsIDErAÇÕEs INICIAIs

O Estatuto da Cidade, denominação oficial da lei nº 10.257 de 10 de julho de 2001, regulamenta o capítulo “Política urbana” da Constituição brasileira, previsto nos artigos 182 e 183; ele estabelece normas que regulam o uso do solo urbano, em prol do bem coletivo, segurança, bem estar e equilíbrio ambiental. Seus princípios básicos são o planejamento participativo e a função social da propriedade.

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cida-de e garantir o bem- estar de seus habitantes.

§ 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.

§ 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no pla-no diretor.

§ 3º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro.

§ 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não uti-lizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, suces-sivamente, de:

I - parcelamento ou edificação compulsórios;

II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, asse-gurados o valor real da indenização e os juros legais.

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adqui-rir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

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ATENÇÃO!

§ 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. (grifo nosso).

O Estatuto da Cidade, em apertada síntese, busca disciplinar as figuras e institutos de Direito Urbanístico. Representa, sobretudo para os municípios, importante instrumento para uma melhor ordenação do espaço urbano, com ênfase para os problemas sociais como a moradia e saneamento, por exemplo. Hoje, com a edição da lei nº 12.836, de 2013, a crescente preocupação com a questão ambiental ganhou espaço ainda maior no Estatuto, como podemos ve-rificar no inciso XVII acrescentado por esta lei às diretrizes gerais:

Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvi-mento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, median-te as seguintes diretrizes gerais:

XVII - estímulo à utilização, nos parcelamentos do solo e nas edifica-ções urbanas, de sistemas operacionais, padrões construtivos e aportes tecnológicos que objetivem a redução de impactos ambientais e a eco-nomia de recursos naturais.

O Direito Urbanístico deve ser um tema de grande atenção do Procurador do Município, seja em seus pareceres, seja em suas atuações processuais, sobretudo pelo fato de que, desde 2001, com a medida pro-visória 2.180-35, passou a fazer parte do rol de matérias objeto da Ação Civil Pública.

Embora de predominante relevância para os municípios, a legislação sobre Direito Urbanístico possui caráter impositivo também aos outros entes federa-tivos. Neste sentido, por força do artigo 24, inciso I, da CF/1988, cabe à União legislar sobre normas gerais, no caso, o próprio Estatuto da Cidade. Caberá, en-tão, ao Município suplementar a legislação federal e estadual, no que couber, nos termos do artigo 30, inciso II, do diploma constitucional.

Importante destacar, ainda, que o Estatuto da Cidade estabelece normas de ordem pública e interesse social, logo, estas normas não podem ser derrogadas pela vontade dos particulares.

2. O PLANO DIrETOr

Segundo o artigo 39 deste Estatuto, a propriedade urbana cumpre sua fun-ção social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2º desta Lei. Vê-se, por esta redação, que o artigo 39 exige não apenas o cumprimento

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ATENÇÃO!

das diretrizes previstas no artigo 2º, mas também a necessária observância da qualidade de vida, justiça social e desenvolvimento econômico.

O artigo 40 define o que vem a ser o plano diretor:

O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.

O plano diretor representa um dos instrumentos de observância da função social da propriedade. A função social da propriedade, expressamente prevista em nosso ordenamento a partir da CF/1967, significa que o proprietário não pode utilizá-la de forma arbitrária, devendo observar um conteúdo social mí-nimo, tendo em vista que hoje a propriedade não possui mais um caráter indi-vidualista como antes; deve a mesma cumprir seu papel dentro da sociedade. Segundo Marco Maurício Toba111, este instrumento parece ser a mola funda-mental desta transformação, ao dar destaque ao plano diretor como importante instrumento da política urbana.

O plano diretor deverá estar em acordo com o plano plurianual, as diretri-zes orçamentárias e o orçamento anual, e deverá englobar o território do Muni-cípio como um todo. Ele é obrigatório nos seguintes municípios:

• Com mais de 20 mil habitantes;

• Integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas;

• Em municípios que pretendam utilizar os instrumentos de parcelamen-to, edificação ou utilização compulsórios;

• Integrantes de áreas de especial interesse turístico;

• Inseridos na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental.

• Incluídos no cadastro nacional de Municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos. (Incluído pela Lei nº 12.608, de 2012)

A obrigatoriedade ou não do plano diretor deve ser fielmente observada pelo Procurador do Município, para que assim o ente público não se encontre em uma situação irregular, sujeito a sanções legais pre-vistas na lei de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/1992)

Nos termos do §3º do artigo 40, o plano diretor deverá ser revisto, pelo menos, a cada dez anos, o que deixa claro seu aspecto dinâmico, devendo estar sempre atualizado com a realidade do município.

111 MEDAUAR, Odete; ALMEIDA, Fernando Dias Menezes. (org.). Estatuto da Cidade. São Paulo: 2004. Editora Revista dos Tribunais. P. 243

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O plano diretor, em seu processo de elaboração e na fiscalização de sua implementação, deverá garantir a realização de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas da comu-nidade, a publicidade dos documentos e informações produzidos bem como o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos.

3. DOs INsTrUMENTOs DE POLÍTICA UrBANA PrEvIsTOs NO EsTATUTO DA CIDADE

Segundo José Afonso da Silva112, os instrumentos de política urbana são meios e medidas de que serve o Poder Público para executar as medidas urba-nísticas. Podemos verificar, na lei nº 10.257/2001, os seguintes instrumentos:

3.1 Parcelamento, edificação ou utilização compulsóriosEste instrumento, nos termos do artigo 5º do Estatuto, poderá determinar

o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, devendo fixar as condições e os pra-zos para implementação da referida obrigação. Neste caso, o proprietário rece-berá notificação, averbada no cartório de registro de imóveis, pelo ente munici-pal. Após 3 tentativas frustradas a notificação será realizada por meio de edital.

Nos termos do §6º do mesmo artigo, em caso de transmissão do imóvel, por ato inter vivos ou causa mortis, posterior à data da notificação, ocorre a trans-ferência das obrigações de parcelamento, edificação ou utilização previstas no art. 5º desta Lei, sem interrupção de quaisquer prazos (previstos no §4º113). Isso deixa clara a natureza propter rem desta obrigação.

3.2 IPTU progressivo no tempoUsado em caso de descumprimento do parcelamento, edificação ou uso com-

pulsórios, é um imposto cobrado por no máximo cinco anos, com parcelas anu-ais majoradas de modo sucessivo, desde que observados os seguintes requisitos:

• Que o valor seja fixado em lei municipal;

• Não exceda duas vezes o valor do ano anterior;

• Seja respeitada a alíquota máxima de 15% (em atenção ao princípio tri-butário de vedação de caráter confiscatório). Neste sentido, nos termos do §2º do artigo 7º, após cinco anos de sua cobrança, caso não tenha ocorrido o parcelamento, edificação ou uso, deve ser cobrada a alíquota máxima até resolução do problema.

112 SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico brasileiro. São Paulo, Editora Malhieros, 1997, p. 358

113 § 4º Os prazos a que se refere o caput não poderão ser inferiores a: I - um ano, a partir da notificação, para que seja protocolado o projeto no órgão municipal

competente; II - dois anos, a partir da aprovação do projeto, para iniciar as obras do empreendimento.

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Segundo determina o §3º deste artigo, é vedada a concessão de isenções ou de anistia relativas à tributação progressiva de que trata este artigo. (sobre a progressividade do IPTU, vide item 6.2 do capítulo 3)

3.3 Desapropriação com pagamento em títulosOcorrendo o descumprimento do parcelamento, edificação ou uso compul-

sórios mesmo após os cinco anos de cobrança do IPTU progressivo no tempo (§3º do artigo 7º), poderá o Município, nos termos do artigo 8º, caso não opte em persistir na cobrança do imposto, proceder à desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos da dívida pública.

Segundo o §1º deste artigo 8º, os títulos da dívida pública terão prévia aprovação pelo Senado Federal e serão resgatados no prazo de até dez anos, em prestações anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real114 da indeniza-ção e os juros legais de seis por cento ao ano.

O Município terá o prazo máximo de 5 anos para adequar o imóvel desa-propriado, podendo passar a obrigação por meio de alienação ou concessão à terceiros com devido procedimento licitatório.

Sobre o tema desapropriação urbanística, vide item 5.1 do capítulo 5

3.4 Usucapião especial de imóvel urbanoA usucapião especial de imóvel urbano foi criada pela CF/1988, nos termos

do disposto no artigo 183 do texto constitucional; até então, em nosso ordena-mento, havia apenas a previsão da usucapião do Código Civil de 1916 (artigos 550 e 551), e também na lei nº 6969/1981, que dispõe sobre a aquisição, por usucapião especial, de imóveis rurais.

Segundo determina o artigo 9º do Estatuto, aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

Já o artigo 10, que trata da usucapião coletiva, dispõe que as áreas urba-nas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados, ocupadas por po-pulação de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural. Neste caso, o possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, desde que ambas sejam contínuas.

114 Valor real da indenização: valor da base de cálculo do IPTU, descontado o montante de benfeitorias públicas no bairro, e sem expectativas de ganhos, lucros cessantes e juros compensatórios.

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ATENÇÃO!

A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis. Nesta sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cada possuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais diferenciadas.

São partes legítimas da ação de usucapião especial urbano:

• O possuidor, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente;

• Os possuidores, em estado de composse;

• Como substituto processual, a associação de moradores da comunidade, com personalidade jurídica.

Na ação de usucapião é obrigatória a intervenção do Ministério Público. Com os benefícios ao autor a assistência judiciária gratuita, inclusive no cartó-rio de registro de imóveis. Neste sentido, cabe ao Procurador do Município, quando o ente público for parte interessada na ação, verificar a regularidade formal da mesma, caso contrário, a ação estará eivada de nulidade.

3.5 Direito de superfícieÉ o direito concedido pelo proprietário a outrem, mediante escritura públi-

ca registrada, do uso do solo, subsolo ou espaço aéreo relativo ao seu terreno. Esta concessão pode ser gratuita ou onerosa. Na morte do superficiário, os di-reitos transmitem-se aos seus herdeiros.

Nos termos do §3º do artigo 21, o superficiário responderá integralmente pelos encargos e tributos que incidirem sobre a propriedade superficiária, ar-cando, ainda, proporcionalmente à sua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e tributos sobre a área objeto da concessão do direito de superfície, salvo disposição em contrário do contrato respectivo.

Na presente situação, deve o Procurador do Município verificar, em eventual execução tendo por objeto a omissão no recolhimento de IPTU, se o pólo passivo na ação está de acordo com este §3º, sob pena de sofrer esta execução fiscal uma ação de embargos de terceiro, por ilegiti-midade passiva

Extingue-se o direito de superfície, nos termos do artigo 23: no término do prazo estabelecido em contrato quando for por tempo determinado e no descumprimento das obrigações contratuais. Extinto o direito de superfície, o proprietário recupera o domínio do terreno, com as benfeitorias introduzidas. Neste caso, como já alertado acima, cabe o Procurador verificar a real legiti-midade passiva de uma eventual ação executiva.

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ATENÇÃO!

3.6 Direito de preempçãoSegundo o artigo 25 do Estatuto da Cidade, o direito de preempção confere

ao Poder Público Municipal preferência para aquisição de imóvel urbano ob-jeto de alienação onerosa entre particulares. É um direito de preferência com finalidade urbanística, de interesse social.

Baseada no plano diretor, lei municipal prévia delimitará as áreas em que incidirá o direito de preempção e fixará prazo de vigência, não superior a cinco anos, renovável a partir de um ano após o decurso do prazo inicial de vigência.

Nos termos do § 5º do artigo 27115, a alienação processada em condições diversas da proposta apresentada é nula de pleno direito. Em caso de venda não notificada ao Município, cabe ao Procurador defender judicialmente eventual direito do ente público municipal já que, segun-do o §6º, neste caso, o Município poderá adquirir este imóvel pelo seu valor venal, ou seja, pelo valor da base de cálculo do IPTU, ou ainda pelo valor da proposta, se inferior.

3.7 Outorga onerosa do direito de construir e alteração do uso do soloO direito de construir, assim como o direto de propriedade, não é absoluto,

já que igualmente ligado à função social da propriedade. Este instrumento de política urbana permite o direito de construir acima do coeficiente de apro-veitamento adotado ou alteração do uso do solo, mediante contrapartida do beneficiário. Pode ocorrer em áreas pré fixadas no Plano Diretor.

Segundo o §1º do artigo 28, coeficiente de aproveitamento é relação entre a área edificável e a área do terreno.

Este instrumento é um importante instrumento a ser utilizado pelo Muni-cípio, pois dá a opção, na hipótese de autorizar a construção acima do referi-do coeficiente, de se valer de uma contrapartida a ser oferecida pelo particu-

115 Art. 27. O proprietário deverá notificar sua intenção de alienar o imóvel, para que o Município, no prazo máximo de trinta dias, manifeste por escrito seu interesse em comprá-lo.

§ 1º À notificação mencionada no caput será anexada proposta de compra assinada por terceiro interessado na aquisição do imóvel, da qual constarão preço, condições de pagamento e prazo de validade.

§ 2º O Município fará publicar, em órgão oficial e em pelo menos um jornal local ou regional de grande circulação, edital de aviso da notificação recebida nos termos do caput e da intenção de aquisição do imóvel nas condições da proposta apresentada.

§ 3º Transcorrido o prazo mencionado no caput sem manifestação, fica o proprietário autorizado a realizar a alienação para terceiros, nas condições da proposta apresentada.

§ 4º Concretizada a venda a terceiro, o proprietário fica obrigado a apresentar ao Município, no prazo de trinta dias, cópia do instrumento público de alienação do imóvel.

§ 5º A alienação processada em condições diversas da proposta apresentada é nula de pleno direito.

§ 6º Ocorrida a hipótese prevista no § 5o o Município poderá adquirir o imóvel pelo valor da base de cálculo do IPTU ou pelo valor indicado na proposta apresentada, se este for inferior àquele.

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lar, o que acaba por atender ao interesse público. O Procurador do Município deve, em eventual parecer acerca da viabilidade ou não de concessão desta outorga, analisar de forma criteriosa o preenchimentos dos requisitos neces-sários para tal outorga.

A forma de cobrança e as hipóteses cabíveis desta outorga estão previstas no artigo 30, que determina:

Lei municipal específica estabelecerá as condições a serem observadas para a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso, determinando:

I – a fórmula de cálculo para a cobrança;

II – os casos passíveis de isenção do pagamento da outorga;

III – a contrapartida do beneficiário.

3.8 Operações urbanas consorciadas e potencial adicional de construção

Nos termos do §1º do artigo 32, operação urbana consorciada pode ser defi-nida como o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Públi-co municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários perma-nentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área trans-formações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental.

Este tipo de operação, segundo Márcia Valquíria Batista dos Santos116 na obra Estatuto da Cidade – comentários, representa a possibilidade do Poder Público se associar com a iniciativa privada no intuito de efetuar melhorias em determinadas regiões, obviamente com vistas ao desenvolvimento urbano. Segundo ela, na cidade de São Paulo, estas operações já vêm sendo utilizadas como forma de viabilizar a recuperação de determinadas regiões.

O §2º deste artigo elenca, de forma exemplificativa, as medidas que pode-rão ser previstas nas operações urbanas consorciadas:

I – a modificação de índices e características de parcelamento, uso e ocupa-ção do solo e subsolo, bem como alterações das normas edilícias, considerado o impacto ambiental delas decorrente;

II – a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas em desacordo com a legislação vigente.

III - a concessão de incentivos a operações urbanas que utilizam tecnolo-gias visando a redução de impactos ambientais, e que comprovem a utilização, nas construções e uso de edificações urbanas, de tecnologias que reduzam os impactos ambientais e economizem recursos naturais, especificadas as moda-lidades de design e de obras a serem contempladas. Esta medida foi incluída pela lei nº 12.836/2013.

116 Op. Cit. P. 215

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Um ponto que merece especial atenção neste instrumento é a possibilidade de emissão pelo Município de certificados de potencial adicional de construção, previsto no artigo 34. Estes certificados são valores mobiliários emitidos pelo Município como meio de pagamento de contrapartida à determinada outorga de Direito Urbanístico Adicional dentro do perímetro de uma Operação Urbana Consorciada. Eles serão alienados em leilão ou utilizados diretamente no paga-mento das obras necessárias à própria operação; são livremente negociados, mas conversíveis em direito de construir unicamente na área objeto da operação.

3.9 Transferência do direito de construirComo já afirmado anteriormente neste capítulo, o Estatuto da Cidade con-

feriu aos Municípios a tarefa de regular o direito de construir, por meio de lei (daí a importância deste tema no contexto da advocacia pública munici-pal). Segundo o artigo 35, lei municipal, com base no plano diretor, poderá au-torizar o proprietário de imóvel urbano, privado ou público, a exercer em outro local, ou alienar, mediante escritura pública, o direito de construir previsto no plano diretor ou em legislação urbanística dele decorrente, quando o referido imóvel for considerado necessário para fins de:

I – implantação de equipamentos urbanos e comunitários;

II – preservação, quando o imóvel for considerado de interesse histórico, ambiental, paisagístico, social ou cultural;

III – servir a programas de regularização fundiária, urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda e habitação de interesse social.

A mesma faculdade poderá ser concedida ao proprietário que doar ao Poder Público seu imóvel, ou parte dele, para os fins previstos nos incisos I a III do caput.

As condições relativas à aplicação da transferência do direito de construir serão estabelecidas na lei municipal a que se refere o caput.

3.10 Estudo de impacto da vizinhançaA licença de construção, ampliação ou funcionamento para determinados

empreendimentos ou atividades dependerá de estudo de impacto de vizinhan-ça (EIV), nos termos do disposto no artigo 36. Estes empreendimentos e ativi-dades passíveis de licença serão definidos em lei municipal.

De extrema semelhança com o EIA-RIMA, do Direito Ambiental (sem, con-tudo, substituí-lo), o EIV se mostra de expressiva importância dentro do con-texto do urbanismo, pois analisa a viabilidade de um empreendimento dentro do contexto da comunidade como um todo, e não apenas em pontos isolados. Neste sentido, conforme está expresso no artigo 37, este estudo deve contem-plar os efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população da região, incluindo, no mínimo:

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ATENÇÃO!

• o adensamento populacional;• os equipamentos urbanos e comunitários;• o uso e ocupação do solo;• a valorização imobiliária;• a geração de tráfego e demanda por transporte público;• ventilação e iluminação;• paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.

O Procurador do Município, quando da elaboração de um parecer sobre a concessão de licença de construir, ampliar ou funcionar, deve es-tar sempre embasado neste estudo de impacto de vizinhança, já que é ele que permite uma análise mais técnica e objetiva do objeto a ser concedido.

4. PAssO A PAssO DA ATUAÇÃO DO PrOCUrADOr DO MUNICÍPIO NOs INsTrUMENTOs DE POLÍTICA UrBANA - PArCELAMENTO, EDIFICAÇÃO OU UTILIZAÇÃO COMPULsórIOs - IPTU PrOgrEssIvO NO TEMPO - DEsAPrOPrIAÇÃO

• Imóvel que não esteja cumprin-do sua função social, nos termos

da lei nº 10.257/2001;

• O município poderá determinar o parcelamento, a edificação ou

a utilização compulsórios do solo urbano não edificado, subutiliza-do ou não utilizado, fixando as

condições e os prazos para imple-mentação da obrigação;

• Notificação do particular, pes-soalmente; após 3 tentativas, deve ser realizado por meio de edital,

• Infrutífero este instrumento, o município pode instituir o IPTU progressivo no tempo, cobrado por no máximo cinco anos, com

parcelas anuais majoradas de modo sucessivo, desde que o va-

lor seja fixado em lei municipal, não exceda duas vezes o valor do ano anterior e seja respeitada a

alíquota máxima de 15%;

• No caso descumprimento da função social, mesmo após os

cinco anos de cobrança do IPTU progressivo no tempo, poderá o município, caso não opte em

persistir na cobrança do imposto, proceder à desapropriação do

imóvel, com pagamento em títu-los da dívida pública;

• No caso de desapropriação, o município terá o prazo máxi-mo de 5 anos para adequar este imóvel desapropriado, podendo passar a obrigação por meio de

alienação ou concessão à terceiros por meio de licitação.

O ESTATUTO DA CIDADE E O PAPEL DO MUNICÍPIO EM SEU CUMPRIMENTO

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5. FLUxOgrAMA - PArCELAMENTO, EDIFICAÇÃO OU UTILIZAÇÃO COMPULsórIOs - IPTU PrOgrEssIvO NO TEMPO - DEsAPrOPrIAÇÃO

APÓS TRÊSTENTATIVAS, É

POSSÍVEL ANOTIFICAÇÃO POR

EDITAL

NOTIFICAÇÃO DOPROPRIETÁRIO DEIMÓVEL QUE NÃO

ESTEJA CUMPRINDO A FUNÇÃO SOCIAL DA

PROPRIEDADE

PRAZO DE 5 ANOSPARA O MUNICÍPIO

ADEQUAR O IMÓVEL À FUNÇÃO SOCIAL DA

PROPRIEDADE

DESAPROPRIADO O

IMÓVEL, PAGAMENTO

AO PROPRIETÁRIO COM

TÍTULOS DA DÍVIDA

PÚBLICA

INSTITUIÇÃO DO IPTU PROGRESSIVO NO TEMPO

PASSADOS 5 ANOS, MES-MO COM ACOBRANÇA DO

IPTU, O IMÓVEL AINDA NÃO ATENDE À FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

MANUTENÇÃO DO IPTU PROGRESSIVO NO TEMPO

OU

DESAPROPRIAÇÃO SANCIONATÓRIA

NÃO OCORRÊNCIA DO PARCELAMENTO, EDI-FICAÇÃO OU UTILIZA-ÇÃO DO IMÓVEL NAS CONDIÇÕES E PRAZOS

ESTABELECIDOS

6. MODELOs DE PETIÇÕEs E MANIFEsTAÇÕEs

6.1 Modelo de ação judicial de desapropriação

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA _____ COMARCA DE ________

O Município de _________, pessoa jurídica de direito público interno, inscrito no CNPJ/MF n.º _______, sediado em _______, Estado de _______, na Rua __________, n.º______ – representado por seu procurador que esta subscreve, vem com a devida vênia à presença de Vossa Excelência, com fundamento na lei nº 10.257/2001 e em