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Capoeira Angola é Patrimônio Cultural __________________________________________________________ O estudo da Capoeira Angola possibilitou o entendimento desta enquanto um traço cultural intransferível do povo brasileiro e sobremaneira das camadas mais populares da população. A Capoeira Angola com fundamento é uma das representações culturais mais ricas do povo brasileiro. E para assegurar a sua continuidade devemos entende-la enquanto Patrimônio Cultural, e não enquanto esporte. O Patrimônio Cultural no Brasil teve grande desenvolvimento com o interesse de D. Pedro II pela antropologia , colocando coleções africanas e européias no Museu Nacional. Esta relação com a cultura negra, mesmo que política, possibilitou o uma maior aproximação dos afro-brasileiros, com este Imperador. Tal foi que na Guardo pessoal deste estavam os maiores capoeiristas da época. Com o advento da República os Museus Emílio Goeldi (Pará), Museu Paulista (SP) e Museu Nacional (RJ) empreenderam buscas de artefatos em sítios arqueológicos nacionais, principalmente os Sambaquis litorâneos do norte a sul do Brasil, afastando-se da cultura negra e incentivando a captura e prisão dos capoeiristas através de um instrumento legal. Para entendermos o que é patrimônio Cultural

Capoeira Angola é Patrimônio Cultural

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Capoeira Angola é Patrimônio Cultural __________________________________________________________

O estudo da Capoeira Angola possibilitou o entendimento desta enquanto um traço cultural intransferível do povo brasileiro e sobremaneira das camadas mais populares da população. A Capoeira Angola com fundamento é uma das representações culturais mais ricas do povo brasileiro. E para assegurar a sua continuidade devemos entende-la enquanto Patrimônio Cultural, e não enquanto esporte. O Patrimônio Cultural no Brasil teve grande desenvolvimento com o interesse de D. Pedro II pela antropologia , colocando coleções africanas e européias no Museu Nacional. Esta relação com a cultura negra, mesmo que política, possibilitou o uma maior aproximação dos afro-brasileiros, com este Imperador. Tal foi que na Guardo pessoal deste estavam os maiores capoeiristas da época. Com o advento da República os Museus Emílio Goeldi (Pará), Museu Paulista (SP) e Museu Nacional (RJ) empreenderam buscas de artefatos em sítios arqueológicos nacionais, principalmente os Sambaquis litorâneos do norte a sul do Brasil, afastando-se da cultura negra e incentivando a captura e prisão dos capoeiristas através de um instrumento legal. Para entendermos o que é patrimônio Cultural

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devemos discutir o que é patrimônio cultural. O destaque na atitudes governamentais para a questão do patrimônio cultural surgiu com o Decreto Lei 25, de 30 de novembro de 1937, no qual , em seu artigo primeiro declarava: Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no País e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu valor arqueológico, ou etnográfico, bibliográfico ou artístico. Sendo que estes bens deveriam ser inscritos em um Livro Tombo para que recebesse a devida proteção. Tal inscrição criava uma série de limitações a destruição dos remanescentes culturais, pois o Tombo impede a destruição, demolição ou mutilação do bem , mas deve este ser tombado. Começam a atuar profissionais oriundos principalmente da arquitetura. O patrimônio cultural já vinha sendo discutido internacionalmente desde a década de 20, e em 1931, em Atenas é lançada pela Sociedade das Nações os primeiros princípios internacionais em relação ao patrimônio. A partir destas considerações, e com o Estado Novo, no Brasil, a preocupação com o patrimônio se intensificou. A partir de 1950, o trabalho em relação ao patrimônio, fruto da necessidade que a lei ajudou a instalar, passa a ser realizado com maior profissionalismo, buscando o uso de técnicas documentais mais aprimoradas e precisas, no Brasil. Foram firmados convênios com instituições estrangeiras e criaram-se vários projetos com universidades e instituições nacionais e a pesquisa em relação ao patrimônio passa a ser desenvolvida por todo o país. Em 1956, no Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO, é elaborada a Carta de Nova Deli indicando a necessidade de Estado, enquanto principal interessado na história de seu país, deve apoiar o estudo, preservação, coleta e guarda dos bens de valor cultural. Recomendou-se que cada Estado Membro da UNESCO submete-se a pesquisa e exploração do patrimônio ao controle de órgão competente. A pressão da UNESCO se fez sentir nos diversos países do mundo e o Brasil, já em contato com pesquisadores estrangeiros, atua no sentido de dar mais peso a organização do patrimônio nacional. O órgão responsável na atualidade pela preservação do patrimônio cultural é o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e no Rio Grande do Sul existe a 12a Superintendência Regional do IPHAN, a qual deve fazer cumprir as leis referentes ao patrimônio. Os trabalhos de consolidação dos remanescentes culturais começaram com o estabelecimento do Decreto Lei 25, de 1937, Estes novos profissionais, formados na prática da preservação, continuaram desenvolvendo pesquisas históricas já imbuídos da recomendação da UNESCO em relação a necessidade de integração com outros profissionais . A Carta de Burra , de 1980, propõe uma série de definições que deveriam ser seguidas, as quais gostaria de destacar: - o termo bem designará um local, uma zona, um edifício ou outra obra construída, ou um conjunto de edificações ou outras obras que possuam uma significação cultural, compreendidos, em cada caso, o

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conteúdo e o entorno a que pertence. Devemos entender a capoeira angola é um bem e cuja significação cultural ainda não foi plenamente estudada, mas já reconhecemo-la com de grande importância para o Patrimônio Nacional. - a substância será o conjunto de materiais que fisicamente constituem o bem. A substância da capoeira está não somente nos artefatos musicais utilizados pelos praticantes da angola, mas o fundamento, a vivência, as outras expressões culturais que a acompanham, a estrutura identitária e o valor de resistência. - o termo conservação designará os cuidados a serem dispensados a um bem para preservar-lhe as características que apresentem uma significação cultural. De acordo com as circunstâncias, a conservação implicará ou não a preservação ou a restauração, além da manutenção; ela poderá, igualmente, compreender obras mínimas de reconstrução ou adaptação que atendam às necessidades e exigências práticas. A capoeira angola vem sendo conservada pelos mestres mais antigos da Bahia que não estão sendo respeitados pela Legislação da Educação Física que pretende dominar o mercado de trabalho sem a mínima preocupação com a questão cultural que mesma expressa. - o termo manutenção designará a proteção contínua da substância, do conteúdo e do entorno de um bem e não deve ser confundido com o termo reparação. A reparação implica a restauração e a reconstrução, e assim será considerada. A manutenção da capoeira angola deve ser assegurada não somente como um bem mas como um valor a ser difundido, ela não pode ser reconstruída , adaptada , ou reparada, ela deve ser mantida, e para isso devemos respeitar os mestres angoleiros, e toda a filosofia que a angola traz a restauração será o restabelecimento da substância de um bem em um estado anterior conhecido. Esta restauração tem se tornado possível somente pelo estudo e confrontação da capoeira desenvolvida nas academias do Rio Grande do Sul e verificando as perdas que esta vem sofrendo, e que poderão sofrer com esta ação da Confederação de Educação Física com base na nova lei da Educação Física. - o uso compatível designará uma utilização que não implique mudança na significação cultural da substância, modificações que sejam substancialmente reversíveis ou que requeiram um impacto mínimo. A capoeira angola deve manter seu uso, ou seja, o de resistência cultural, o de transmissor de valores populares o que a Constituição Federal nos proporciona. Constituição da República Federativa do Brasil - 1988, foi promulgada por Assembléia Nacional Constituinte, sendo Presidente da República, José Sarney. De uma maneira geral, a nova Constituição descentraliza o poder e devolve ao Legislativo a exclusividade de legislar, ao suprimir o mecanismo dos decretos-leis, embora mantenha a possibilidade do Presidente legislar mediante medidas excepcionais. Muitas normas jurídicas da lei ordinária, que figuravam antes somente no Código Penal, Código Civil e Consolidação das Leis do Trabalho, passaram a constar, agora, da Constituição, que em seu conjunto, é bastante explícita. No tocante à cultura e aos bens culturais, nunca antes um texto constitucional

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brasileiro lhes dedicou tanto espaço. Pela primeira vez surge a denominação patrimônio cultural e sua definição. Outra novidade é a distinção entre patrimônio cultural e natural, este último sob a denominação ambiental. O meio ambiente, aliás, passa a constar de capítulo especifico. A ação popular tem explicitado, no novo texto, seu papel na defesa do patrimônio cultural e do meio ambiente. Em destaque na Constituição da República temos o seu artigo 5o onde todos somos iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Este pressuposto deveria ser o norte de toda ação do brasileiro capoeirista pois a igualdade e a liberdade não poderiam ser violados. Mas o que acontece em relação a capoeira neste país, os que professam uma capoeira onde o corpo tem mais valor que a filosofia que ela engendra, uma dita "capoeira objetiva" (Instrutor "Montanha" do Grupo Abadá)- "capoeira contemporânea" ("Coelha" Grupo Abadá) - "capoeira helicóptero" - "capoeira jiu jitsu", vemos este princípio básico da sociedade sendo violado, onde não existe mais a segurança do corpo e mesmo o direito a vida. Onde a superioridade física de um indivíduo pode ser utilizada para a desagregação da liberdade e igualdade de outro, sem o respeito ao limite do ser. A capoeira que prezamos é a que consideramos um bem patrimonial de valor cultural . Devemos então cobrar isto de nossos representantes legais pois que nós do ACCARA temos esta consciência do bem público. Pois segundo esta constituição compete a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios (Art. 23): - "proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;" - E isto pressupõe proteger a verdadeira capoeira, nos seus fundamentos e filosofia mais puros, pois por bens podemos entender os gestos e pensamentos culturais tradicionais apreendidos e perpetuados pela oralidade e pelas formas de fazer. -"impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;" - é contra esta descaracterização da capoeira, com a inclusão de artes marciais estrangeiras dentro do corpo de gestos técnicos e pensamentos da capoeira, e contra sua destruição enquanto bem de valor histórico, artístico e cultural, e condenando a sua visão enquanto atividade desportiva, a qual consideramos que a capoeira não o é, lutamos contra tudo isso. - " proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;" - procurar não falsear a verdade em relação a esta arte nacional permitindo o verdadeiro conhecimento que vem sendo transmitidos pelos velhos mestres baianos, do que é a capoeira, porque foi criada, como se estruturou e como deve ser mantida. Assim como compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre a proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e

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direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; educação, cultura, ensino e desporto; (Art. 24). Bem como aos Municípios compete "promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual" (Art. 30). Sendo assim importante que estes representantes estaduais, federais e municipais orientem-se sobre quem vem tentando representar a capoeira no Brasil, Rio Grande do Sul e no Município de Porto Alegre. Questionarem-se sobre quem está preocupado em sua preservação enquanto Patrimônio Cultural e quem está ligado a atuações de cunho puramente desportivo e de auto-representação. Segundo o artigo 215 o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais, sendo que este protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras e das de outros grupos participantes do processo cívilizatório nacional e a lei disporá sobre a fixação de datas comemorativas alta significação para os diferentes segmentos étnicos nacionais. Esta proteção pressupõe uma ação imperativa por parte das autoridades no sentido de preservar a capoeira, como uma arte genuinamente nacional, estando como um direito cultural antes de qualquer ação que priorize um cunho desportivo, o qual vem apenas para degradar este que é um dos maiores patrimônios afro-brasileiro, ainda resistente perante esta sociedade globalizada. Os artigos 220 e 221, referentes à comunicação social, expressam princípios que interessam à questão cultural pois que ditam que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão, e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto na Constituição e a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei. É uma pena que isto não esteja sendo realizado, pois a mídia está voltada para aquela capoeira de cunho puramente desportiva e que em nada vem a acrescentar no desenvolvimento cultural de nossa Nação, e acaba criando falsas imagens do capoeirista nacional, normalmente sendo visto como um ser humano corpulento e com "cara de mau" o qual pode destroçar todos os outros seres humanos, que se sejam seus oponentes. A capoeira não busca oponentes, busca sim integração e resistência a opressão cultural, manifesta no Neoliberalismo globalizante. Não podemos nos render aos propagadores de tais idéias devemos resistir e para tanto nos valer dos nossos direitos assegurados pela nossa lei maior a Carta Magma. A Carta Magma propõe no seu artigo 5o nos seguintes termos que "qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao

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patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência". Isto nos permite agir junto ao Ministério Público Federal e ao Ministério da Justiça, solicitando ações contra o Estado (Municípios, Estado ou Governo Federal) caso a contínua agressão ao patrimônio cultural brasileiro, que é a capoeira, venha a permanecer. Não gostaríamos que outros arcassem com a responsabilidade de perpetuação de uma cultura, que visivelmente desconhecem. Falamos aqui destes ditos capoeiristas da capoeira helicóptero, capoeira jiu jitsu, capoeira objetiva, capoeira contemporânea, entre outras novas titulações apresentadas para a capoeira para mascarar as reais intenções destes mal feitores. Este é o meu manifesto.

Texto: Autor e Foto disponíveis em Bibliografia. Pg 06 www.capoarte.v10.com.br