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SILVA, Angela Cristina ; SANT'ANNA NETO, João Lima ; TOMMASELLI, José Tadeu Garcia ; TAVARES, Renato . Caracterização das chuvas no litoral norte paulista. Cosmos (Presidente Prudente), Presidente Prudente, v. 3, n.5, p. 39-48, 2005. RESUMO: O referido artigo apresenta uma tentativa de caracterização do regime pluvial no litoral norte paulista, dentro do segmento temporal (1971 a 1999), em que se procurou identificar o caráter das chuvas no que diz respeito à sua frequência, intensidade, distribuição e variabilidade têmporo-espacial, segundo a concepção de dinâmica do clima proposta por Sorre (1951), considerando-se a tipologia regional e a morfologia do relevo dentro da área de estudo. Este trabalho teve como objetivo principal contribuir para o conhecimento dos aspectos geográficos do clima, particularmente do fenômeno pluvial, bem como fornecer subsídios para o planejamento econômico e qualidade de vida da população. RESUMEN: Lo referido artículo presenta uma tentativa de caracterización Del régimen pluvial em El Litoral Norte Paulista, dentro Del segmento temporal (1971 a 1999), em que se buscó identificar El carácter de las lluvias em ló que concierne a La su frecuencia, intensidad, distribuición y variabilidad têmporo- espacial, según La concepción de dinâmica Del clima propuesta por Sorre (1951), considerándose La tipologia regional y La morfologia del relieve dentro Del área de estúdio. Este trabajo tuvo como objetivo principal contribuir para El conocimiento de lós aspectos geográficos Del clima, particularmente Del fenômeno pluvial, así como suministrar subsídios para La planificación econômica y calidad de vida de La población. APRESENTAÇÃO Os estudos em climatologia ganharam novo impulso a partir das discussões travadas mundialmente, nas últimas décadas, a respeito da questão da variabilidade e mudanças climáticas globais, tanto no intuito de se detectar possíveis variações em seu ritmo e regime, quanto em suas aplicações socioambientais. Um dos aspectos mais importantes desta análise climatológica é o de se buscar indícios de variações e anomalias do clima para se compreender os níveis de interferência do homem nas mudanças climáticas. A identificação da origem e do comportamento desta variabilidade tem se constituído num dos maiores desafios da ciência. Ayoade (1986), ao abordar a importância do clima para a compreensão da dinâmica natural das paisagens e sua interferência nas atividades humanas afirma: “O clima talvez seja o mais importante componente do ambiente natural. Ele afeta os processos geomorfológicos, os da formação dos solos e o crescimento e desenvolvimento das plantas. Os organismos, incluindo o homem, são influenciados pelo clima. As principais bases de vida para a humanidade, principalmente o ar, a água, o alimento e o abrigo, dependem do clima (...) O ambiente atmosférico influencia o homem e suas atividades, enquanto o

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SILVA, Angela Cristina ; SANT'ANNA NETO, João Lima ; TOMMASELLI, José Tadeu Garcia ; TAVARES, Renato . Caracterização das chuvas no litoral norte paulista. Cosmos (Presidente Prudente), Presidente Prudente, v. 3, n.5, p. 39-48, 2005.

RESUMO: O referido artigo apresenta uma tentativa de caracterização do regime pluvial no litoral norte paulista, dentro do segmento temporal (1971 a 1999), em que se procurou identificar o caráter das chuvas no que diz respeito à sua frequência, intensidade, distribuição e variabilidade têmporo-espacial, segundo a concepção de dinâmica do clima proposta por Sorre (1951), considerando-se a tipologia regional e a morfologia do relevo dentro da área de estudo. Este trabalho teve como objetivo principal contribuir para o conhecimento dos aspectos geográficos do clima, particularmente do fenômeno pluvial, bem como fornecer subsídios para o planejamento econômico e qualidade de vida da população.

RESUMEN: Lo referido artículo presenta uma tentativa de caracterización Del régimen pluvial em El Litoral Norte Paulista, dentro Del segmento temporal (1971 a 1999), em que se buscó identificar El carácter de las lluvias em ló que concierne a La su frecuencia, intensidad, distribuición y variabilidad têmporo-espacial, según La concepción de dinâmica Del clima propuesta por Sorre (1951), considerándose La tipologia regional y La morfologia del relieve dentro Del área de estúdio. Este trabajo tuvo como objetivo principal contribuir para El conocimiento de lós aspectos geográficos Del clima, particularmente Del fenômeno pluvial, así como suministrar subsídios para La planificación econômica y calidad de vida de La población.

APRESENTAÇÃO

Os estudos em climatologia ganharam novo impulso a partir das discussões travadas mundialmente, nas últimas décadas, a respeito da questão da variabilidade e mudanças climáticas globais, tanto no intuito de se detectar possíveis variações em seu ritmo e regime, quanto em suas aplicações socioambientais.

Um dos aspectos mais importantes desta análise climatológica é o de se buscar indícios de variações e anomalias do clima para se compreender os níveis de interferência do homem nas mudanças climáticas. A identificação da origem e do comportamento desta variabilidade tem se constituído num dos maiores desafios da ciência.

Ayoade (1986), ao abordar a importância do clima para a compreensão da dinâmica natural das paisagens e sua interferência nas atividades humanas afirma:

“O clima talvez seja o mais importante componente do ambiente natural. Ele afeta os processos geomorfológicos, os da formação dos solos e o crescimento e desenvolvimento das plantas. Os organismos, incluindo o homem, são influenciados pelo clima. As principais bases de vida para a humanidade, principalmente o ar, a água, o alimento e o abrigo, dependem do clima (...) O ambiente atmosférico influencia o homem e suas atividades, enquanto o

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homem pode, através de suas várias ações, deliberada ou inadvertidamente, influenciar o clima”.

Dentre os elementos do clima, o estudo da dinâmica climática da chuva se configura como um dos principais elementos, na identificação dos padrões do seu comportamento e de sua influência na sociedade. Nesse sentido, considerando a tipologia regional, partimos para uma tentativa de caracterização do regime pluvial do Litoral Norte Paulista, buscando identificar o caráter das chuvas no que diz respeito à sua variabilidade e distribuição espacial, bem como a associação deste fenômeno da natureza ao uso e ocupação do solo.

O Litoral Norte Paulista tem sido palco de diversos eventos anômalos e catastróficos relacionados à inundações e movimentos de massa. Tais episódios são desencadeados, na sua grande maioria, por eventos de chuvas intensas associadas ao acelerado processo de uso e ocupação de áreas de risco, principalmente pela população mais carente, e em decorrência da construção de grandes obras viárias tais como as rodovias Tamoios, Oswaldo Cruz, BR 101 e SP 55, resultando em centenas de vítimas e graves danos econômicos.

De acordo com a definição de SANT’ANNA NETO (1990), o Litoral Norte Paulista é a “área compreendida a partir da Serra de Juqueriquerê e a ilha de São Sebastião, no sentido sudeste-nordeste, até a Serra de Parati nos limites dos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro”, conforme Figura 1.

Como parte integrante do território paulista, a área de estudo é constituída por uma estreita faixa litorânea e por um conjunto de escarpas da Serra do Mar, que alguns trechos terminam diretamente sobre as águas oceânicas. As escarpas da Serra do Mar ocorrem sempre em formas de rebordos do Planalto Atlântico (CONTI, 1975), apresentando altitudes que variam em torno de 800 a 1200 m, sendo responsável pela ocorrência de

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chuvas dinamizadas pelas condições geográficas do local (SCR & SMA apud NUNES, 1992).

No Litoral Norte ou Lesnordeste, como sugeriu CONTI (1975) a participação dos sistemas extratropicais é menor (SANT’ANNA NETO, 1990) aliada à barreira imposta pelas serras Juqueriquerê e de São Sebastião e a disposição geral da Serra do Mar que assume uma posição mais paralela ao oceano, portanto, menos oposta à entrada de frentes, apresenta totais pluviométricos bem diferenciados em toda área de estudo, ou seja, a orografia regional age de forma a constituir barreiras que acentuam as precipitações a barlavento da serra, e do outro lado, na vertente a sotavento, diminui qualquer tipo de precipitação, formando as “sombras de chuva”. No período seco os totais pluviais colocam-se em torno dos 500 mm. E na primavera e verão eles ascendem consideravelmente, apresentando totais médios anuais de chuva superiores a 2000 mm. Logo, o litoral não apresenta uma estação seca invernal, mas sim uma diminuição da pluviosidade.

A umidade relativa constantemente alta, aliada a pluviosidade abundante e temperaturas elevadas e uniformes, favorece a existência de extensas formações de mata pluvial tropical ou Mata Atlântica, nas áreas serranas; vegetação de praias e dunas nas planícies litorâneas, e pequenas áreas de mangues junto à foz dos rios.

O Litoral Norte, assim como toda a zona costeira do Estado de São Paulo, destaca-se pela sua importância natural e paisagística, bem como uma extraordinária riqueza biológica, animal e vegetal, e relevante valor ecológico e socioeconômico. Notadamente, esta PE uma das regiões mais ameaçadas pela demanda urbana de ocupação do solo e utilização generalizada dos recursos naturais, na maioria das vezes de forma predatória.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Apoiados na concepção de dinâmica do clima proposta por Sorre (1951), definida como “... a série de estados atmosféricos, em sua sucessão habitual”, ajustada a metodologia desenvolvida por Monteiro (1973) para a escolha de “anos padrão”, utilizou-se para o desenvolvimento da presente pesquisa dados diários, mensais e anuais de chuva de 10 postos pluviométricos localizados dentro da área de estudo. Os dados foram extraídos do CD ROM do DAEE – Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo, para os egmento temporal compreendido entre o período 1971-1999, conforme Tabela 1.

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Após a coleta e tabulação de dados iniciou-se a homogeneização da série histórica de 29 anos através do Método de Ponderação Regional, com o objetivo de preencher as falhas existentes. Uma vez recuperadas as informações, com a utilização da planilha eletrônica Microsoft Excel 98, efetuou-se os cálculos dos totais diários, mensais, sazonais e anuais das chuvas, cálculo das médias móveis, desvios padrão e coeficientes de variação, bem como análise das chuvas intensas, máximas de 24 horas. Para a caracterização das estações do ano considerou-se o “ano civil”, representados pelos trimestres: verão (janeiro a março), outono (abril a junho), inverno (julho a setembro) e primavera (outubro a dezembro).

ANÁLISE DOS RESULTADOS

Distribuição Quantitativa da Pluviosidade Média: tendências e variações

Os dados pluviométricos do período analisado revelaram totais pluviais médios anuais em torno de 1700 a 4000 mm. Os desvios-padrão variaram de 300 a 500 mm e os coeficientes de variação apresentaram valores de ordem de 18 a 22%.

Esta distribuição das chuvas está intimamente relacionada com a disposição das vertentes íngremes da Serra do Mar que é responsável pelo efeito orográfico das chuvas e consequentemente aumento da pluviosidade com médias anuais entre 3000 a 4000 mm. A região recebe, também, grande influência da barreira imposta pela Serra de Juqueriquerê e de São Sebastião, onde a média anual da pluviosidade é inferior a 1800 mm, em que verificamos a presença de “sombra de chuva”.

As análises da distribuição das chuvas, considerando as médias sazonais demonstraram:

- VERÃO: apresenta totais pluviais médios sazonais que variam entre 600 a 1000 mm, caracterizando esta estação como a mais chuvosa do ano em todos os postos pluviométricos analisados, sendo responsável por aproximadamente 37,2% da pluviosidade anual. Assim como na distribuição média anual, as áreas mais chuvosas são aquelas próximas das escarpas da Serra do Mar.

- OUTONO: nesta estação do ano, a área de estudo recebe aproximadamente 20,1% da pluviosidade anual, com totais de chuva que

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variam entre 300 a 500 mm. Também neste caso, verificamos a influência da morfologia do relevo.

- INVERNO: estação compreendida entre os meses de julho, agosto e setembro, em que os totais pluviais médios nesta porção do litoral paulista são inferiores a 500 mm, representando em média 15,7% do total da pluviosidade média anual. Portanto, verificou-se apenas uma redução da precipitação das chuvas nesta época do ano não existindo, desta forma, uma estação seca invernal.

- PRIMAVERA: a distribuição das chuvas na primavera demonstra que está é a segunda estação com maior concentração pluvial do ano. Cerca de 27% do total médio anual, entre 400 e 900 mm são descarregados nos meses de outubro, novembro e dezembro.

Nesta primeira análise pode-se verificar, com nitidez, toda a complexidade da variação anual e sazonal da chuva no espaço. Embora os totais anuais apresentem uma forte variação de um ano para outro de modo, geral existe uma distribuição homogênea na média sazonal. Outro aspecto observado no litoral paulista diz respeito à influência do efeito orográfico na distribuição da chuva, as áreas mais elevadas, invariavelmente, apresentam totais pluviais elevados, ao passo que nas áreas de baixa altitude ocorrem decréscimos pluviais.

Distribuição Quantitativa da Pluviosidade: tendências e variações

A observação dos totais anuais da pluviosidade no Litoral Norte Paulista demonstrou que apenas o estudo das médias tende a “mascarar” as reais condições existentes nessa área. Isto é evidenciado quando analisamos, por exemplo, valores médios de chuva variando entre 1700 a 2800 mm, e vê-se que em determinados postos pluviométricos os valores máximos reais chegam até 3900 mm. Assim temos:

- Anos com pluviosidade total elevada: Dentre todos os postos pluviométricos selecionados na área de estudo, observou-se que os anos que apresentaram totais pluviais elevados foram: 1973, 1976, 1988, 1995, 1996 e 1998, cujos coeficientes de variação situam-se na ordem de 20% em comparação com as médias anuais.

- Anos com pluviosidade total reduzida: Os anos em que totais anuais estiveram acentuadamente abaixo das médias do período analisado foram: 1974, 1977, 1978, 1984 e 1990, e apresentaram cerca de 30% de desvio negativo da pluviosidade. Os anos de 1974 e 1984 foram excepcionalmente secos no Litoral Norte, com desvios negativos em torno de 400 a 700 mm.

- Anos com pluviosidade total habitual: Os anos habituais, cujos totais pluviométricos anuais apresentaram-se próximos das médias dentro deste segmento temporal foram 1971, 1980, 1981, 1982, 1983, 1985, 1989, 1991, 1997, 1999. Destes, os anos 1971, 1981, 1982, e 1989 apresentaram-se bem mais próximos dos parâmetros que caracterizam um padrão habitual, com desvios percentuais em tordo no -1% e +1%. Os anos 1972, 1991 e 1999

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apresentaram uma tendência à seco. Todavia, os anos 1980, 1983 e 1986 podem ser considerados ligeiramente tendentes à chuvosos.

- Anos com pluviosidade irregular: Os anos irregulares que apresentaram uma distribuição diversificada da pluviosidade ora com totais pluviais reduzidos em algumas áreas, ora chuvosos em outras, foram os anos 1972, 1975, 1979, 1987, 1992, 1993, 1994 e 1998.

Frequência e intensidade da Pluviosidade

Com o objetivo de compreender melhor a dinâmica pluvial da área de estudo, optou-se em fazer a análise dos dados por décadas. Nesta análise procurou-se identificar a frequência do mês, trimestre e semestre mais chuvoso, bem como a intensidade da precipitação pluvial em cada posto pluviométrico.

Quanto à distribuição mensal da precipitação, observa-se nitidamente que houve uma mudança na frequência do mês mais chuvoso e intensidade da chuva nas três décadas analisadas. Desta forma, no período de 1971/1980 vê-se que as chuvas se concentram no mês de janeiro, predominantemente em todos os postos pluviométricos analisados, sendo referido mês também o de maior intensidade das chuvas, com precipitação mensal superior a 200 m. Já no período de 1981/1990 ocorre uma ligeira mudança no quadro apresentado, onde temos o mês de janeiro ainda como o mais chuvoso, todavia ocorre uma variação na intensidade das chuvas durante os meses de dezembro a março. Finalizando, no período de 1991/1999 percebe-se uma mudança ainda maior na distribuição das chuvas quando comparamos com os períodos anteriores. Neste período, tanto a frequência quanto a intensidade da pluviometria se concentram, proporcionalmente, nos meses de fevereiro e março.

A análise da variação sazonal da pluviosidade nas três décadas demonstrou uma alternância no semestre e no trimestre mais chuvoso. No período 1971/1980 as chuvas concentraram-se nos meses de novembro a abril, ocasionando chuvas intensas com alturas superiores a 1300 mm. No semestre menos chuvoso (maio a outubro) a diminuição das chuvas é considerável. Registraram-se valores de 1000 mm nas áreas mais chuvosas e 400 mm nas menos chuvosas. Nesta década, o trimestre com maior frequência e intensidade das chuvas é apresentado de forma desigual na região analisada; em alguns postos pluviométricos é representado pelos meses de nov-dez-jan e em outros pelos meses de dez-jan-fev. Já trimestre menos úmido concentra-se nos meses de jun-jul-ago.

No período de 1981/1990 o semestre mais chuvoso, com maior frequência e intensidade das chuvas, é representado pelos meses de dezembro a maio. O semestre menos úmido é representado pelos meses de maio a outubro; todavia no semestre de junho a novembro verifica-se os menores valores pluviais (400 mm a 1000 mm). O trimestre mais chuvoso está distribuído entre os meses dez-jan-fev e jan-fev-mar, sendo este último o trimestre que recebe os maiores montantes de chuva. Já o trimestre mais seco permanece o mesmo da década anterior, representado pelos meses de jun-jul-ago.

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Verifica-se que o período de 1991/1999 o semestre de outubro a março recebe os maiores valores de precipitação; contudo o semestre de janeiro a junho apresenta uma maior frequência das chuvas. Notadamente, há uma alteração no semestre mais seco se compararmos com as décadas anteriores, sendo nesta década representado pelo semestre de abril a setembro. Também observa-se uma predominância do trimestre mais úmido (jan-fev-mar) e mais seco (jun-jul-ago) em todos os postos pluviométricos analisados.

Variação Têmporo-Espacial da Pluviosidade

Para demonstrar o comportamento pluviométrico espacial do Litoral Norte Paulista dentro do segmento temporal (1971-1999), utilizou-se os parâmetros sugeridos por SANT’ANNA NETO (1990):

- Ano Chuvoso - ano com pluviosidade elevada (excepcionalmente chuvoso), ou seja, com índices superiores a 25% da média normal.

- Ano Tendente a Chuvoso - ano com pluviosidade ligeiramente elevada, próxima a média normal, com desvio entre +12,5% e 25%.

- Ano Habitual – ano com pluviosidade normal ou habitual, cujo total pluvial situa-se dentro dos desvios médios padrão, variando de -12,5% a +12,5% dos índices habituais.

- Ano tendente a Seco – ano com pluviosidade ligeiramente reduzida, próxima a média normal, com desvios entre -25% e -12,5%.

- Ano seco – ano com pluviosidade reduzida (excepcionalmente seco), ou seja, com índices inferiores a -25% da média normal.

- Ano irregular – aquele cuja pluviosidade apresentou uma distribuição diversificada, ora mais seco em algumas áreas, ora chuvoso em outras.

Assim, dos 29 anos analisados, aproximadamente 20,6% apresentaram pluviosidade irregular, 27,6% caracterizaram com pluviosidade reduzida ( seco ou tendente a seco), 20,6% demonstraram padrões habituais e 31% com pluviosidade elevada (chuvoso ou tendente a chuvoso).

Quanto à variabilidade sazonal, temos:

- VERÃO: reconhecida como a estação mais chuvosa do ano, verificou-se que aproximadamente 31% dos verões podem ser considerados como habituais, sendo caracterizados neste padrão dos anos (1971, 1972, 1980, 1981, 1982, 1983, 1986, 1989, 1991). Neste segmento temporal ainda verificou-se um período excepcionalmente seco no verão que são representados pelos anos (1977, 1984, 1990, 1992 e 1997), destacando o ano de 1984 em que o período de estiagem se prolongou até o outono.

- OUTONO: aproximadamente 20,6% dos anos do período analisado apresentaram um padrão habitual nesta estação do ano (1971, 1977, 1982, 1986, 1990 e 1991). Notadamente os outonos de 1973, 1976, 1983, 1987 e 1988 foram caracterizados por totais pluviais excepcionalmente chuvosos. Por outro lado, o ano de 1984 apresentou um período de extrema redução da pluviosidade em todo Litoral Norte Paulista, sendo que o restante dos anos apresentou um padrão irregular.

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- INVERNO: observou-se que 27,6% das ocorrências apresentaram invernos caracterizados com padrões habituais (1971, 1972, 1981, 1984, 1996, 1998 e 1999). Em apenas 17,25 dos casos pode-se verificar períodos com pluviosidade elevada, em que destacamos o ano de 1976 como o mais expressivo. Todavia, os invernos secos representaram 20,6% do universo de análise (1974, 1975, 1985, 1988, 1991), com especial atenção ao inverno de 1978 que apresentou total pluvial reduzido em todo o litoral. Por não apresentarem uma distribuição das chuvas bem definida, caracterizamos os demais anos como irregulares.

- PRIMAVERA: considerada a segunda estação mais chuvosa do ano, apresenta totais pluviais elevados em 27,6% do segmento temporal analisado (1973, 1975, 1980, 1986, 1992, 1995, 1997, 1998). Em 31% ocorreram totais sazonais próximos as médias (1971, 1972, 1974, 1976, 1979, 1981, 1982, 1983 e 1999), caracterizando o período como habitual. /Apenas em 4 anos (1978, 1985, 1990 e 1991), apresentaram índices bastante reduzidos, destacando a primavera de 1989, em que o período de estiagem prolongou-se até o verão de 1990. Nesta época do ano a distribuição das chuvas apresentou-se bastante irregularidade, cerca de 24,2% da série temporal.

Escolha dos anos-padrão

- Ano padrão-habitual (1971) – os dois anos que apresentaram uma distribuição anual das chuvas mais próximo das médias foram os anos 1971 e 1982. Todavia o ano 1971 apresentou em todas as unidades de análise totais anuais e sazonais próximos das médias do período analisado, com uma pequena tendência à seco em apenas uma das dez unidades espaciais.

- Ano padrão excepcionalmente chuvoso (1996) – no segmento temporal 1971-1999, três anos apresentaram pluviosidade mais elevada (1973, 1976 e 1996). Porém, a análise da distribuição sazonal da chuva demonstrou que no ano de 1996 o verão foi extremamente chuvoso, com exceção do Posto Burrifas em Ilha Bela, cujos totais anuais foram inferiores à média.

- Ano padrão excepcionalmente seco (1984) – os mais caracterizados como de pluviosidade reduzida foram (1974, 1984 e 1990). A opção pelo ano 1984 se deu em função da acentuada estiagem de verão que se prolongou até o outono, em praticamente todas as unidades espaciais de análise.

Painel Têmporo-Espacial da Pluviosidade

Após a escolha dos “anos-padrão” de pluviosidade habitual e excepcionais (seco e chuvoso), construímos os painéis têmporo-espaciais para o Litoral Norte. Para a confecção desses painéis foram utilizados os totais mensais do ano 1971 (habitual), de 1996 (excepcionalmente chuvoso) e de 1984 (excepcionalmente seco). O perfil representativo do Litoral Norte está compreendido entre o eixo São Sebastião (Posto Maresias) até Ubatuba (Posto Picinguaba), totalizando oito postos pluviométricos ao longo da costa litorânea.

Confirmando o resultado de estudos anteriores, pode-se verificar que o Litoral Norte Paulista não apresenta um período de estiagem significativo, mas

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apenas uma redução da pluviosidade no período de junho a agosto, onde os totais pluviais médios mensais não são inferiores a 50 mm. Nos meses de dezembro a março temos a intensificação das chuvas, cujos totais mensais ultrapassam os 300 mm (Figura 2).

Quando associamos a morfologia do relevo ao regime pluvial, podemos verificar que a barreira imposta pela Serra de Juqueriquerê na área compreendida entre São Sebastião e Caraguatatuba favorece a formação de ”sombras de chuva”, com uma redução significativa da pluviosidade e um período de estiagem mais prolongado, que vai de maios a agosto apresentando pluviosidade inferior a 100 mm.

O ano de 1971, caracterizado como o de pluviosidade mais próxima das médias anuais, apresentou um padrão habitual em quase todos os postos pluviométricos de nosso universo de análise, com um regime tendente à seco

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apenas do posto Maresias, localizado no município de são Sebastião, em que a estiagem de inverno foi mais rigorosa, atingindo alturas pluviais de 50 mm.

As chuvas se concentraram no período de outubro a maio, com uma maior intensidade nos meses de janeiro a março, em que os totais mensais chegaram a atingir 450 mm. Verifica-se uma sensível redução da pluviosidade entre os postos Porto Novo e Maresias, em consequência das “sombras de chuva” ocasionadas pela orografia do relevo. Neste ponto, tem-se o prolongamento da estação seca que vai de maio a outubro, em que os totais pluviais de chuva não ultrapassam os 100 mm (Figura 3).

O ano de 1996, caracterizado como o de maior pluviosidade dentro do segmento temporal analisado, apresentou um regime pluvial marcado por chuvas abundantes que se estenderam do verão até a primavera em todo Litoral Norte. Esta faixa litorânea recebeu um acréscimo significativo dos totais pluviais mensais, sendo que a porção mais úmida, entre Picinguaba e Maranduba, chegou a atingir alturas superiores a 600 mm o verão e 250 mm na primavera (Figura 4). O período de estiagem, compreendendo os meses de junho a agosto também recebeu um aumento na pluviosidade, apresentando totais de chuva superiores a 50 mm. Porém, vê-se que os postos São Sebastião e Ilha Bela apresentaram valores de chuva bem inferiores, quando comparados com outros postos pluviométricos localizados neste eixo.

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O ano de 1984, escolhido dentro do segmento temporal de nosso universo de análise como o ano mais caracterizado para o padrão excepcionalmente seco, apresentou uma diminuição acentuada das chuvas no verão, outono e inverno em todos os postos pluviométricos analisados, com totais pluviais mensais inferiores a 350 mm (Figura 5).

O período de maior estiagem ocorreu entre os meses de maio a julho, quando a pluviosidade chegou a atingir os 50 mm. Todavia, houve um acréscimo das chuvas na primavera, elevando os totais pluviais mensais até os 300 mm na região de Picinguaba até Maranduba.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em termos de distribuição espacial da pluviosidade, as precipitações quase sempre ocorreram em quantidades desiguais no Litoral Norte, apresentando uma redução sistemática da chuvas no canal de São Sebastião e à sotavento da Serra Juqueriquerê, confirmando o efeito de “sombra de chuva”. Os totais pluviais mais elevados são encontrados no município de Ubatuba,

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especificamente no posto Mato Dentro, localizado no sopé da Serra do Mar, o que se explica por condições de natureza geográfica.

Os meses de verão, mais chuvosos, com aproximadamente 50% de dias com chuva e maiores frequências de precipitação acumulada em três dias igual ou superior a 100 mm, são os que historicamente registraram maior número de eventos de escorregamentos de encostas, quedas de barreiras e enchentes nos municípios do Litoral Norte, conforme registros da Defesa Civil. Desta forma, verifica-se que existe uma relação direta entre a precipitação pluvial e os movimentos de massa e inundações, dada a instabilidade natural desta região.

Finalizando, esperamos com esse singelo trabalho poder cooperar com a população residente nos municípios abrangidos pela pesquisa e com a Coordenadoria Estadual de defesa Civil, no sentido de fornecer subsídios que possam auxiliar no desenvolvimento de ações preventivas que visem proteger a vida, saúde e integridade física e patrimonial dos cidadãos, através de procedimentos mais eficientes e integrados destinados ao enfrentamento de desastres decorrentes a dinâmica natural.

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