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Caso da Fazenda Timboré*
NOTA DE ENSINO
Título do caso
CAMINHOS DA IMPLANTAÇÃO DA REFORMA AGRÁRIA COMO POLÍTICA
PÚBLICA – O CASO DA FAZENDA TIMBORÉ (BRASIL)
DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA
* Este caso foi produzido no ano de 2006 por Juvelino José Strozake, Doutor em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), com a colaboração de Rafael Vanzella e Tamira Maíra Fioravante, pesquisadores da FGV/EDESP, e integra a lista dos dez casos inaugurais da “Casoteca Latino-americana de Direito e Política Pública” (www.casoteca.org). O financiamento deste caso foi propiciado por acordo de cooperação técnica celebrado entre o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID e a Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas – FGV/EDESP. O projeto da Casoteca tem três objetivos: (i) fornecer um acervo de casos didáticos sobre direito e política pública na América Latina; (ii) estimular a produção contínua de novos casos por meio do financiamento de pesquisa empírica; (iii) provocar o debate sobre a aplicação do “método do caso” como uma proposta inovadora de ensino. Os casos consistem em relatos de situações-problema reais, produzidas a partir de investigação empírica e voltadas para o ensino. Evidentemente, não comportam uma única solução correta. A Casoteca permite uso aberto e gratuito de seu conteúdo, que é protegido por uma licença Creative Commons (Atribuição-Uso Não-Comercial-Compartilhamento pela mesma Licença 2.5 Brasil). A licença pode ser acessada através do link: http://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/2.5/br/.
Os trabalhos para o desenvolvimento da pesquisa aprovada no
âmbito do Projeto da CASOTECA LATINO-AMERICANA DE DIREITO E
POLÍTICA PÚBLICA sob o título Políticas de Bem-Estar e Direitos Econômicos e
Sociais, com o tema CAMINHOS DA IMPLANTAÇÃO DA REFORMA
AGRÁRIA COMO POLÍTICA PÚBLICA – O CASO DA FAZENDA
TIMBORÉ (BRASIL), foram desenvolvidos e concluídos conforme os termos do
contrato.
Neste início de redação vamos apresentar os atores presentes na
cena que constitui o caso e, assim, desenhar de modo mais definitivo sua participação
na constituição do problema objeto da pesquisa.
Os atores são:
1) o Estado Brasileiro, consistente no Poder Judiciário e no Poder
Executivo, este último organizado em torno da figura do Presidente da República e do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
2) O proprietário da terra. Conforme notícia veiculada pelo Jornal
da Tarde, edição do dia 20 de agosto de 1989, matéria que se encontra no anexo desta
pesquisa, o dono da terra, Serafim Rodrigues de Moraes, era proprietário de mais de
30 fazendas, localizadas nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Goiás.
Ainda segundo a reportagem, Serafim teria sido diretor-presidente do Agro-Banco de
Goiás, mas acabou destituído deste cargo por conta da intervenção do Banco Central.
(ver informação do Banco Central do Brasil no Anexo 01 – Ação de Desapropriação).
3) Os trabalhadores rurais, organizados e mobilizados pelo
movimento social denominado Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST). Cerca de 170 famílias estão residindo no projeto de Assentamento de
Reforma Agrária instalado na Fazenda Timboré.
4) Evidentemente que outros atores contribuíram para a
configuração e constituição do caso. Tais atores podem ser identificados na figura do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Andradina, Igreja Católica e órgãos do
Governo do Estado de São Paulo, como por exemplo o Instituto de Terras do Estado
de São Paulo.
Cada um desses atores está presente, agindo e utilizando os
instrumentos que o ordenamento jurídico predispõe para preservar ou cumprir sua
missão na expectativa de defender seus interesses ou mesmo realizar sua missão
institucional.
Outro aspecto de fundamental importância para o desenvolvimento
da pesquisa foi a realização de estudo geográfico por pesquisadora especializada, o
qual trouxe novas informações a respeito do assentamento na Fazenda Timboré, além
de ter precisado aquelas já disponíveis.
Por fim, é necessário destacar que decidimos eleger um agente
estatal - o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) - como
foco de decisão do caso. A partir disso a pesquisa passou a ser conduzida com a meta
de fornecer elementos na narrativa do caso e nos respectivos anexos a fim de que os
destinatários do material didático tomem uma decisão na perspectiva do INCRA.
A idéia é que os alunos tenham uma margem de atuação política
mais deliberada e assumida do que aquela concernente ao Poder Judiciário, sem, no
entanto, perder as premências de técnica jurídica que o INCRA tem de observar
(procedimentos, regulamentações, concretização de princípios constitucionais,
relacionamentos com órgãos estatais, inclusive judiciários etc.).
Para que a universidade possa contribuir para que o aluno consiga
encontrar respostas às questões que a política pública e o Direito apresentam, é
necessário valorizar a reflexão crítica desenvolvendo a capacidade de relacionar
dados e formular saídas, e não apenas apresentar conceitos pré-determinados. Nesse
sentido os alunos poderão optar entre medidas que assegurem direitos aos assentados
(como, por exemplo, reiniciar o processo de desapropriação), ou que restituam o
exercício de direitos ao proprietário (por exemplo, definição de indenizações ou
retomada da posse da fazenda Timboré com ou sem indenização das melhorias
realizadas no imóvel pelos assentados ao longo de quase duas décadas), ou, ainda,
que outorguem ao Poder Judiciário a função de resolver o conflito, abstendo-se da
questão. Essa definição auxiliará, enfim, na elaboração da nota de ensino, com a
identificação dos temas das aulas, da bibliografia e das outras atividades didáticas.
1. Resumo do caso (resumo da narração)
A Fazenda Timboré, de propriedade do Sr. Serafim Rodrigues de
Moraes foi classificada como latifúndio por exploração e o Presidente da República
expediu decreto considerando a área de interesse social para fins de reforma agrária.
O Incra ajuizou ação de desapropriação. Esta ação foi julgada
“caduca” porque teria passado o prazo de dois anos entre a data do decreto e o
protocolo da inicial desapropriatória.
Os trabalhadores rurais mobilizados pelo Movimento dos Sem
Terra (MST) ocuparam a área. O proprietário ajuizou uma ação de reintegração de
posse e conseguiu a liminar reintegratória. O Incra, temendo conflito social de graves
conseqüências, protocolou uma cautelar de seqüestro da posse da área. A justiça
federal determinou o seqüestro da propriedade e depositou aos cuidados da
funcionária do Incra.
Foi expedido novo decreto presidencial considerando a área de
interesse social para fins de reforma agrária e nova ação desapropriatória foi
intentada. Nesta ação o Incra obteve ordem de emissão na posse e iniciou o processo
de assentamento das famílias na área. Contra esta nova ação os proprietários
ajuizaram mandado de segurança, no qual foram vencedores.
Os proprietários também ajuizaram uma ação civil de indenização
contra a União para receber o valor da terra nua, as benfeitorias e lucros cessantes. Na
primeira instância esta ação foi julgada procedente e pende julgamento na segunda
instância. Vale lembrar que o Incra concorda em pagar o valor da terra nua,
benfeitorias e lucros cessantes.
A ação de reintegração de posse proposta pelos proprietários contra
as famílias que hoje ocupam a Fazenda Timboré foi julgada improcedente sem
julgamento do mérito.
2. Indicação dos atores, suas atribuições, funções e/ou cargos Os atores que participam do cenário deste caso são:
1) o Estado Brasileiro, consistente no Poder Judiciário e no Poder
Executivo, este último organizado em torno da figura do Presidente da República e do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). O Estado é o
responsável pela execução da política pública de reforma agrária. Esta
responsabilidade é instituída pelo artigo 184 da Constituição Federal, e pelas Leis
Ordinárias nº 4.504/64 e 8.629/93 (Anexo 04)
2) os proprietários da terra (Espólio de Serafim Rodrigues de
Moraes, falecido, e a viúva Maria Terezinha Oriente);
3) os trabalhadores rurais, organizados e mobilizados pelo
movimento social denominado Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST).
3. Enquadramento temporal e espacial da situação descrita no caso
A Situação-problema representada pelo caso da Fazenda Timboré
teve início em 1986 quando o Estado brasileiro realizou um levantamento das
possíveis propriedades que poderiam ser desapropriadas e destinadas ao programa
nacional de reforma agrária. Até hoje, passados mais de vinte anos, o Estado ainda
não conseguiu concluir a ação governamental, seja com o assentamento definitivo das
famílias, seja com o retorno da terra para as mãos dos proprietários para eles
seguirem a atividade agropecuária.
A Fazenda Timboré está localizada no município de Andradina,
Estado de São Paulo, Brasil.
4. Definição dos temas e sub-temas presentes no caso e sua problematização
4.1 - Histórico da questão agrária brasileira
O problema agrário brasileiro ou como alguns estudiosos o chamam
“a questão agrária” é um complexo e intrincado caso que reúne no seu conceito a
estrutura agrária, produção agrícola, êxodo rural, movimentos sociais e violência.
Podemos apontar como data de início do problema agrário
brasileiro o ano de 1850 com a edição da Lei Eusébio de Queiroz (Lei nº 581/1850).
Importa destacar que a questão agrária está ligada diretamente com
a escravidão negra implementada pelo Coroa Portuguesa. Até 1850 não havia
nenhuma lei para regulamentar a propriedade e posse das terras. A progressiva
abolição do trabalho escravo realizada a partir de então representou um problema
para os grandes proprietários porque os ex-escravos poderiam ocupar as terras que
estavam sem a devida guarda porque nelas ninguém produzia e eram passíveis de
serem ocupadas. A solução encontrada antes mesmo da completa abolição do regime
escravocrata (ocorrida em 1888) foi a edição da Lei de Terras (Lei 601/1850), a qual
estabeleceu que a propriedade da terra seria obtida apenas pela venda e compra
registrada em cartório.
Portanto, a Lei de Terras, como ficou conhecida a lei 601/1850,
permitia o acesso à terra apenas para aqueles que dispunham de recursos econômicos
para sua aquisição.
Neste período o Estado inicia o processo de imigração européia e
asiática, pretendendo trazer mão-de-obra branca para substituir os negros
escravos/libertos. Aos imigrantes foram vendidas colônias de terras para que
ocupassem e as tornassem fonte de produção de alimentos.
Todavia, em que pese o início do problema e da questão agrária ser
identificado em meados do século XIX, é apenas a partir de 1960 que este assunto
toma conta dos debates na sociedade, especialmente nas universidades, igrejas,
sindicatos e partidos políticos. Neste período os camponeses posseiros que
trabalhavam nos engenhos de cana-de-açúcar na Região Nordeste do Brasil iniciam a
organização das Ligas Camponesas.
Por meio do Golpe de Estado no dia 31 de março de 1964 os
militares tomaram o poder político. Uma das primeiras ações dos militares foi a
repressão aos movimentos dos camponeses. Na área da reforma agrária, os militares
promulgaram uma lei que estava sendo debatida e elaborada no Congresso Nacional,
a Lei 4.504/64 (Estatuto da Terra). Esta lei foi a primeira a instituir um programa de
reforma agrária no Brasil.
O Estatuto da Terra é uma lei e um programa de reforma agrária
com regras claras para a colonização das regiões onde tinha muita terra e pouca gente
(Região Norte do Brasil).
A reforma agrária foi deixada de lado e os governos militares
investiram recursos apenas na colonização, transferindo milhares de famílias de
pequenos agricultores das regiões sul e sudeste para os estados do Pará, Amazônia,
Acre, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Tocantins e Maranhão.
Com a discussão sobre a elaboração da nova constituição e eleição
dos deputados constituintes, a questão da reforma agrária voltou à tona.
A Constituição Federal promulgada no dia 8 de outubro de 1988
trouxe um capítulo sobre a política agrícola e fundiária e da reforma agrária. As
regras constitucionais dessa política estão inseridas entre os artigos 184 a 191 da
Constituição Federal.
Em 1993 o Congresso Nacional aprovou e o Presidente da
República sancionou a Lei nº 8.629, regulamentando os artigos da Constituição
Federal e estabelecendo as regras para a desapropriação de terras. Ainda em 1993 foi
publicada a Lei Complementar nº 76, com o fim de instituir as regras para o
contraditório especial de rito sumário nas ações de desapropriação de terras para fins
de reforma agrária.
Em 1996 foi publicada nova Lei Complementar de nº 88, alterando
a Lei Complementar nº 76/93. Em 2001 o Governo Federal publicou uma Medida
Provisória (nº 2.183-56) alterando algumas regras da Lei 8.629/93 (Anexo 04). Entre
as alterações introduzidas pela Medida Provisória nº 2.183-56 está a impossibilidade
de vistoria de áreas que se encontram ocupadas pelos movimentos sociais de
trabalhadores rurais sem terra.
No início dos anos 80 surge no sul do Brasil o embrião do que mais
tarde seria conhecido como Movimento dos Sem Terra (MST). Ao longo dos últimos
20 anos o MST se destaca entre os diversos movimentos sociais que atuam na luta
pela reforma agrária por sua capacidade de mobilização, atuação em nível nacional,
organicidade e mobilizações de impacto social.
As principais formas de luta dos movimentos sociais são as
ocupações de terra, prédios públicos e marchas pelas rodovias. A atuação dos
movimentos é vista por parte da mídia como ações atentatórias ao Estado
Democrático de Direito. Outros, como o juiz federal José Carlos Garcia1 e o
desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Alberto
Silva Franco2 vêem nessas ações, desde que praticadas sem violência contra pessoas,
formas de luta e manifestação dos sem terra pelo reconhecimento como sujeitos no
ambiente constitucional brasileiro, porque, conforme decisão do Superior Tribunal de
Justiça3 (STJ) “a postulação da reforma agrária não pode ser confundida, identificada
com o esbulho possessório ou a alteração de limites [...]”.
4.2 - O problema agrário brasileiro
O caso da Fazenda Timboré é representativo do problema agrário
brasileiro porque, assim como ela, existem muitas outras propriedades que se
encaixam no conceito de propriedades que não cumprem a função social, portanto
podem sofrer a ação do Estado por meio da intervenção do Presidente da República e
do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária destinando-as ao Programa
Nacional de Reforma Agrária.
Conforme apontado na pesquisa sócio-econômica, realizada no
assentamento (Anexo 03), a estrutura fundiária da região de Andradina é
caracterizada pela presença de um grande número de pequenas unidades produtivas e
um reduzido número de grandes latifúndios.
Segundo estudos do Ministério do Desenvolvimento Agrário
(MDA) cerca de 45% das terras brasileiras estão concentradas nas mãos de
aproximadamente 1% da população.
1 GARCIA, José Carlos. De Sem-rosto a Cidadão – a luta pelo reconhecimento dos sem-terra como sujeitos no ambiente constitucional brasileiro. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1997. P. 74 2 FRANCO, Alberto Silva. Breves anotações sobre os crimes patrimoniais, in: SHECAIRA, Sérgio Salomão. Estudos Criminais em Homenagem a Evandro Lins e Silva (Criminalista do Século). São Paulo: Método, 2001, p. 71. 3 Superior Tribunal de Justiça (STJ) – HC 5.574/SP – Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro.
Esta concentração da propriedade se acentuou a partir de 1960,
especialmente após a tomada do poder político pelos militares por meio do golpe de
estado iniciado no dia 31 de março de 1964. A partir de então o Estado passou a
financiar a agricultura para exportação em detrimento da agricultura familiar. A
produção em larga escala exige grandes extensões de terras e a mecanização. A
concentração das terras nas mãos de poucos proprietários e a mecanização da
agricultura fizeram eclodir o êxodo rural. Segundo os estudiosos do tema, entre 1960
e 1980, cerca de 30 milhões de famílias foram expulsas do campo e seguiram rumo às
médias e grandes cidades.
O êxodo rural inverteu a polaridade cidade-campo, removendo
amplas parcelas da população do interior do País e consolidando a explosão urbana.
A população brasileira residente nas cidades que era de 31,24% em 1940, meio século
depois, saltara para 75,47%, ou duas vezes e meia maior.
Essa significativa mudança teve como fator preponderante a
concentração da propriedade da terra, que se fez das maiores já registradas em todos
os tempos, perdendo apenas, na atualidade, para aquela existente no vizinho Paraguai,
onde, coincidentemente, as maiores propriedades são pertencentes a pessoas naturais
ou jurídicas brasileiras. Retrato desse quadro de concentração da propriedade rural é o
fato de que embora as propriedades com menos de 10 hectares representem
aproximadamente 53% (cinqüenta e três por cento) do total de estabelecimentos,
ocupam menos de 3% (três por cento) da área total. De outro lado, os
estabelecimentos com área superior a 1.000 hectares, embora tituladas ou na posse de
apenas 1% (um por cento) dos proprietários de terras no Brasil, abarcam o
equivalente a 46% (quarenta e seis por cento) das terras agricultáveis4.
Ignácio Rangel em 1962 previa que o êxodo rural poderia provocar
a miséria que hoje se verifica nas grandes cidades. Segundo Rangel5 a “crise agrária
4 Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas. A economia brasileira em gráficos, 1996, p. 54. 5 RANGEL, Ignácio. A Questão Agrária Brasileira. Comissão de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco. Recife, 1962, p. 9.
brasileira, que se exprime pela formação simultânea de superprodução e de
superlotação, o Nordeste tem sido essencialmente o lugar onde se acumula a
superpopulação rural, a qual tende a fluir para as cidades, afogando-as com um
monstruoso excedente de mão de obra que, mais do que qualquer outra coisa, inibe a
industrialização e deprime a taxa de inversão”.
A concentração de tanta terra em mãos de poucos proprietários fez
surgir, segundo o Censo Agropecuário realizado pelo Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em 1985, uma clientela de
aproximadamente 4 milhões de famílias aptas aos projetos de assentamentos de
reforma agrária.
Não cabe duvidar de que as raízes do problema que se menciona
devem ser buscadas ainda nos tempos coloniais, como, analisando a questão, aponta
Regina Gadelha ao estabelecer que “a raiz é histórica, herança de uma estrutura
econômica-social desenvolvida ao longo de três séculos de colonização, tendo por
base o Latifúndio, a Monocultura e a Escravidão”6.
Nossas metrópoles, especialmente São Paulo e Rio de Janeiro, são
verdadeiras aglomerações desordenadas, apresentando bolsões7 de pobreza com
favelas gigantescas onde a violência explode diariamente, contabilizando, em média,
70 assassinatos em cada final de semana; aumento da miséria, fome e analfabetismo.
Os camponeses expulsos de suas posses ou propriedades
constituem um exército de desempregados e subempregados, possuindo capacidade
de alterar a correlação de força em benefício do patronato que pode baixar os salários
em razão da abundância de mão-de-obra.
6 GADELHA, Regina Maria D’Aquino Fonseca. Os núcleos coloniais e o processo de acumulação cafeeira (1850-1920): contribuição ao estudo de colonização em São Paulo. Tese de Doutorado na Faculdade de Direito da USP. São Paulo, 1982. 7 MONTEIRO, Darcy Police, A função social da propriedade e os instrumentos de intervenção urbanística, dissertação de mestrado, PUC/SP, 2000.
A par do desemprego apontado como resultado da concentração da
propriedade da terra, vale destacar que as terras brasileiras são utilizadas basicamente
para a produção de grãos para exportação. Quando não são destinadas para este fim,
servem de investimentos de longo prazo porque o valor das terras não está sujeito aos
humores dos mercados de investimentos internacionais e se valorizam
independentemente do desempenho das bolsas de valores e do mercado financeiro.
Em síntese, o problema agrário brasileiro – que a política de
reforma agrária deveria atacar e resolver – pode ser descrito com as seguintes
indicações:
1) concentração da propriedade da terra nas mãos de poucos.
Segundo estudos da FAO, cerca de 1% de pessoas detém cerca de 46% das terras no
Brasil. A grande massa de pessoas que vivem no campo trabalha na condição de
meeiro, arrendatário, bóia-fria, parceiros, ou seja, são assalariados ou semi-
assalariados.
2) ineficácia das regras jurídicas nas relações entre os proprietários
e não-proprietários. Esta situação é descrita por Moisés Vinhas8 como “contradições
do latifúndio pré-capitalista” porque a grande massa de trabalhadores do campo “são
remunerados em espécie, ou por cessão de um trato de terra, do qual não se tornam
proprietários em lugar de remunerados em dinheiro”.
3) monocultura para exportação. As terras são utilizadas apenas
para a produção de grãos para exportação, especialmente a produção de soja e milho,
ou então a produção de cana-de-açúcar para álcool combustível.
4) violência estrutural, definida como fome, condições indignas de
sobrevivência, miséria, ausência de atendimento à saúde, altas taxas de
8 VINHAS, Moisés. Problemas agrário-camponeses do Brasil, in:STEDILE, João Pedro (org.). A questão agrária no Brasil: o debate tradicional – 1500-1960. São Paulo: Expressão Popular, 2005, p. 144.
analfabetismo; e violência física9 direta, responsável pela morte de centenas de
pessoas todos os anos.
4.3 – A missão do Estado e o problema agrário brasileiro
O problema agrário brasileiro identificado de maneira simplista
como a concentração da propriedade da terra nas mãos de poucos, baixa
produtividade de produtos para o mercado interno e concentração de pessoas nas
regiões urbanas tido e apontado como causa da grande miséria existente no Brasil
pode e deve ser enfrentado pelo Estado por meio dos vários mecanismos jurídicos que
estão a sua disposição no ordenamento legal.
O Poder Constituinte originário que se reuniu na Assembléia
Constituinte convocada em 1986 escreveu na Lei Maior que os objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil são, segundo o artigo 3º da
Constituição Federal:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; [...]
A Constituição Federal também tratou do papel do Estado nos casos
em que o proprietário não desenvolve a posse da terra de maneira a cumprir com sua
função social.
Segundo o artigo 184, da Constituição Federal, as terras que não
estão cumprindo com a função social devem ser desapropriadas. O papel de interferir
9 Nos fatos conhecidos como Massacre de Corumbiara, ocorrido no dia 9 de agosto de 1995, e no que ficou conhecido como Massacre de Carajás, ocorrido no dia 17 de abril de 1996, foram mortas 30 pessoas.
no direito de propriedade que estiver em desacordo com os interesses coletivos foi
reservado à União.
O papel do Estado está estabelecido e balizado na lei, portanto o
Poder Público só pode fazer aquilo que a legislação permite.
O Estatuto da Terra (Lei 4.504/64 – Anexo 04) instituiu um
programa nacional de reforma agrária e estabeleceu bases seguras para a intervenção
estatal. A par da instituição das diretrizes gerais da política pública de reforma
agrária, instituiu um dever ao Estado.
Está escrito no Estatuto da Terra, especificamente no § 2º, do artigo
2º, que:
É dever do Poder Público (g.n.): a) promover e criar as condições de acesso do trabalhador rural à propriedade da terra economicamente útil, de preferência nas regiões onde habita, ou, quando as circunstâncias regionais o aconselhem, em zonas previamente ajustadas na forma do disposto na regulamentação desta lei; b) zelar para que a propriedade da terra desempenhe sua função social, estimulando planos para sua racional utilização, promovendo a justa remuneração e o acesso do trabalhador aos benefícios do aumento da produtividade e ao bem-estar coletivo.
Conforme foi possível observar nas citações acima transcritas,
desde a Constituição Federal até as leis ordinárias, o papel do Estado na questão
agrária está claramente delineado e é ele – ESTADO – que tem o dever político e
jurídico de realizar uma política pública capaz de alterar o atual quadro agrário
brasileiro.
Destarte, precisamos entender que as ações de desapropriação
fazem parte de uma ampla e geral política que o Estado deve realizar com vistas a
efetivar a justiça no meio rural.
4.4 - A legislação instituidora da política de reforma agrária
Nos Anexo 04 colacionamos parte da legislação que estabelece a
política pública de reforma agrária. Neste espaço vamos apenas transcrever alguns
artigos que a nosso ver são fundamentais para uma análise preliminar da política
pública de reforma agrária.
Iniciamos a pesquisa sobre a legislação agrária pelos pactos
internacionais. Verificamos que o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais foi ratificado pelo Brasil, portanto é direito interno e vinculante,
e afirma que:
2. Os Estados-Partes do presente Pacto, reconhecendo o direito fundamental de toda pessoa de estar protegida contra a fome, adotarão individualmente e mediante cooperação internacional, as medidas, inclusive programas concretos, que se façam necessárias para:
a) melhorar os métodos de produção, conservação e distribuição de gêneros alimentícios pela plena utilização dos conhecimentos técnicos e científicos, pela difusão de princípios de educação nutricional e pelo aperfeiçoamento ou reforma dos regimes agrários, de maneira que se assegurem a exploração e a utilização mais eficazes dos recursos naturais. (g.n.).
Ademais a Constituição Federal estabeleceu um capítulo sobre a
Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária. É o Capítulo III, que tem início
no artigo 184 seguindo até o artigo 191.
A legislação infraconstitucional possui diversas leis sobre o assunto.
a) Lei nº 4.504/64, também conhecida como Estatuto da Terra;
depois a lei nº 8.174/91, que fixou os princípios da política agrícola;
b) Lei nº 8.629/93, que regulamentou os dispositivos constitucionais
relativos à reforma agrária;
c) Lei complementar nº 76/96, que estabeleceu o rito especial
sumário para as desapropriações de terra; mais tarde alterada pela lei complementar
nº 88/96.
Ressalta-se, todavia que a legislação agrária tem sido
“sistematicamente um conjunto de normas jurídicas de pouca ou quase nenhuma
efetivação na prática”.10
O que se verifica é uma grande quantidade de leis, decretos e
portarias que tratam do tema. Uma das soluções seria a codificação desta legislação
permitindo a reunião de todas as normas em um único diploma legal.
Outra questão importante que deve ser enfrentada é a autonomia do
Direito Agrário como ciência específica para regulamentar a atividade dos
magistrados na tarefa de análise das questões postas para decisão.
A existência de autonomia da ciência do direito agrário permitiria
ao juiz decidir conforme princípios específicos deste ramo, e assim as decisões
tomariam por base concepções agraristas e não mais aquelas do Código Civil ou do
direito administrativo.
4.5 - A Função Social da Propriedade
O caso apresentou uma importante questão para debater em sala de
aula. A questão se refere à desapropriação de terras para fins de reforma agrária
e a questão colocada é a produtividade X função social da propriedade.
A questão pode ser apresentada nos seguintes termos: o direito
material autoriza a desapropriação das terras que não cumprem a função social ou
apenas as terras improdutivas?
A função social da propriedade rural possui uma matriz
constitucional, e autoriza e dá suporte, segundo várias interpretações, para ações de
desapropriação que podem ser intentadas com fundamento no desrespeito à legislação
10 STOREL FILHO, Antonio Oswaldo et all. A legislação e os Impasses da Política Agrária. Revista da Associação Brasileira de Reforma Agrária, volume 32, nº 1, p. 69, ago/dez 2005.
trabalhista, notadamente nos casos de trabalho escravo e desrespeito à legislação
ambiental.
A função social da propriedade não é uma limitação ao direito de
propriedade, mas faz parte do núcleo do próprio direito de propriedade. José Afonso
da Silva11 afirma que a Constituição Federal “garante o direito de propriedade, desde
que este atenda sua função social”, e nos casos de desrespeito com tais normas, a
solução é a desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida agrária do
Tesouro Nacional.
Vejamos as palavras que a lei nos apresenta. A Constituição Federal
apresenta as seguintes regras:
Art. 5º. [...] XXII – é garantido o direito de propriedade; XXIII – a propriedade atenderá sua função social; Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. [...] Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária: I – a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra; II – a propriedade produtiva. Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará normas para o cumprimento dos requisitos relativos a sua função social. Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I – aproveitamento racional e adequado; II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
11 Curso de Direito Constitucional Positivo, 12ª edição. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 262.
Para melhor colocar a questão da função social da terra versus a
produtividade, transcrevemos trecho do acórdão exarado pelo Supremo Tribunal
Federal no Mandado de Segurança nº 22.193-3 (Anexo 01A – Ação de
Desapropriação) impetrado pelos proprietários para impedir a desapropriação da
terra:
Caracterizado que a propriedade é produtiva, não se opera a desapropriação-sanção – por interesse social para fins de reforma agrária -, em virtude de imperativo constitucional (CF, art. 185, II) que excepciona, para a reforma agrária, a atuação estatal passando o processo de indenização, em princípio, a submeter-se às regras constantes do inciso XXIV, do artigo 5º, da Constituição Federal, “mediante justa e prévia indenização”.
Temos aqui um importante tema para debate. Qual era o
verdadeiro espírito e vontade do Poder Constituinte originário quando escreveu na
Constituição o artigo 5º, inciso XXII – é garantido o direito de propriedade; e no
inciso XXIII – a propriedade atenderá sua função social ?
E qual o sentido jurídico aliado à necessidade da Nação brasileira e alcance social do Artigo 184, da Constituição?
Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.
Quando o Estatuto da Terra trata das terras particulares, ou seja, da
propriedade privada, afirma que
Art. 12. Á propriedade privada de terra cabe intrinsecamente uma função social e seu uso é condicionado ao bem-estar coletivo previsto na Constituição Federal e caracterizado nesta lei.
Art. 13. O Poder Público promoverá a gradativa extinção das formas de ocupação e de exploração da terra que contrariem sua função social.
Art. 15. A implantação da Reforma Agrária em terras particulares será feita em caráter prioritário, quando se tratar de zonas críticas ou de tensão social.
O direito de propriedade também é disciplinado pelo Código Civil
de 2002. O parágrafo 1º do artigo 1228 afirma que “O direito de propriedade deve ser
exercido em consonância com suas finalidades econômicas e sociais de modo que
sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a
fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico,
bem como evitada a poluição do ar e das águas”.
Segundo Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery12 a
função social da propriedade é um “princípio de ordem pública, que não pode ser
derrogado por vontade das partes”, portanto deve espraiar seus reflexos em todos os
processos cuja discussão é a posse ou propriedade.
Todavia, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(INCRA), órgão encarregado pela execução da política de reforma agrária utiliza
apenas o critério da produtividade/improdutividade para fundamentar as ações
desapropriatórias. É verdade que, conforme podemos notar na entrevista concedida
para este caso pela Dra. Maria Cecília Ladeira de Almeida, representante do INCRA,
o órgão está alterando sua postura e já está utilizando o critério da função social para
requerer desapropriações.
O Supremo Tribunal Federal, até o presente momento, também
segue o padrão produtividade/improdutividade para decidir as ações de
desapropriação. Este julgamento se verificou no caso do Mandado de Segurança nº
22.193-3, impetrado pelo proprietário da Fazenda Timboré, onde o STF entendeu que
a área era produtiva, portanto insuscetível de desapropriação para fins de reforma
agrária.
Para saber se uma área é produtiva ou não o Incra utiliza os critérios
de Grau de Utilidade da Terra (GUT) e Grau de Eficiência na Exploração (GEE).
Para explicar os caminhos para a obtenção do GUT e do GEE o
Ministério do Desenvolvimento Agrário e Núcleo de Estudos Agrários lançaram em 12 Código Civil Anotado e Legislação Extravagante, 2ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p.591.
2005 o Índices de Rendimento da Agropecuária Brasileira13 (Anexo Complementar
02). Segundo a publicação os índices de eficiência ou de rendimentos agropecuários
que devem ser tomados para dimensionar a produtividade de determinada área foram
estabelecidos pelo Estatuto da Terra, que mais tarde foi regulamentada pela Instrução
Especial nº 19.
Consta na publicação Índices de Rendimento da Agropecuária
Brasileira que foi a Instrução Especial nº 19, editada pelo INCRA, que
Fixou os “índices de rendimentos para produtos agrícolas” (GEE); os “índices de rendimentos para produtos extrativos vegetais e florestais” (GEE); os índices de rendimentos mínimos para produtos extrativos vegetais e florestais” (GUT); os índices de rendimentos mínimos para pecuária” (GUT) e, enfim definiu cinco zonas de pecuária, obtidas por meio do agrupamento de “microrregiões homogêneas” (que por sua vez é um agrupamento de municípios), zonas essas especificadas em mapa e em tabela que acompanhou aquela instrução (ver anexo). São esses índices que ainda hoje são utilizados pelo Incra para a classificação do imóvel rural como “produtivo” ou “improdutivo”.
Ainda segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), a
classificação que é obtida pela “aplicação dos mencionados índices de rendimentos
nos dados e nas informações fornecidas pelos próprios proprietários, quando do
preenchimento da Declaração para Cadastro de Imóveis Rurais (previsto no Estatuto
da Terra) e que se constitui no documento básico do Sistema Nacional de Cadastro
Rural (SNCR), criado pela Lei nº 5.868 de 12/12/1972”.
Vale destacar que os índices para aferição da produtividade da terra
hoje utilizados pelo Incra são os mesmos dos anos de 1975 e 1980. Tais índices ainda
não foram atualizados.
É importante que os discentes tenham acesso ao fluxograma
elaborado para esclarecer os passos que o INCRA precisa dar até a desapropriação da
terra e, de posse dessas informações, discutam com os funcionários do INCRA sobre
13 RAMOS, Pedro. Índices de rendimento da agropecuária brasileira. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário: NEAD, 2005, p. 24.
a burocracia para assentar definitivamente os trabalhadores rurais sem terra. O
fluxograma está no anexo principal desta pesquisa.
4.6 - A participação do Poder Judiciário na execução da política de reforma agrária
A ação de desapropriação intentada pelo INCRA foi anulada por
meio de um mandado de segurança, impetrado pelo proprietário, porque, segundo o
Supremo Tribunal Federal (Mandado de Segurança nº 22193-3), o INCRA não teria
efetuado a “notificação a que se refere o § 2º, do artigo 2º, da Lei 8.629/93”, portanto
teria ferido o direito ao contraditório e ampla defesa. Ademais disso, o Supremo
Tribunal Federal considerou a área produtiva, portanto, impossível de desapropriação
para fins de reforma agrária.
O Poder Judiciário deve pautar sua participação na execução da
política pública de reforma agrária visando dar guarida aos interesses sociais e
princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, facilitando o
desenvolvimento da execução da política pública ou, ao contrário, deve interpretar os
princípios constitucionais e as normas infraconstitucionais de forma a atender aos
interesses dos proprietários e impedir a desapropriação de terras?
Para melhor debatermos este ponto vale transcrever trecho do
acórdão do Supremo Tribunal Federal:
A propriedade selecionada pelo órgão estatal para o fim de desapropriação por interesse social visando à reforma agrária não dispensa a notificação prévia a que se refere o parágrafo 2º, do artigo 2º, da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, de tal modo a assegurar aos seus proprietários o direito de acompanhar os procedimentos preliminares para o levantamento dos dados físicos objeto da pretensão desapropriatória. O conhecimento prévio que se abre ao proprietário consubstancia-se em direito fundamental do cidadão, caracterizando-se a sua ausência patente violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa (CF, artigo 5º, inciso LV).
Na entrevista realizada com a Dra. Maria Cecília Ladeira de
Almeida (Anexo 02), bem como no texto entre outros de sua autoria publicado na
Revista da Associação Brasileira de Reforma Agrária14 (Anexo Complementar),
documento que segue anexo a este caso, fica claro que uma das principais
reclamações dos funcionários do Incra é “o desconhecimento da matéria agrária por
grande parte dos magistrados e membros do Ministério Público”, o que, segundo a
entrevistada, dá “margem à interpretação privatista, nos moldes do que era a
inspiração do Código Civil de 1916, ora revogado, do Direito Agrário”.
Ademais, precisamos ressaltar que o Poder Judiciário é o
desaguadouro natural de todo o inconformismo dos proprietários que se utilizam dos
mais diversos mecanismos jurídicos com a pretensão de retardar ou mesmo impedir a
realização da política de reforma agrária.
Para melhor explicitar esta questão tomaremos como exemplo a
desapropriação de imóveis para utilidade pública. Depois que o Poder Público decidiu
realizar e implementar uma avenida, rua, ou rodovia, não cabe ao proprietário
desapropriado discutir se a benfeitoria deve ou não passar no seu imóvel. Ele pode
reclamar e debater o valor da desapropriação e não o ato desapropriatório.
As ações de desapropriação são combatidas por diversas ações
jurídicas intentadas pelos proprietários. O mandado de segurança contra o ato
presidencial que declarou o imóvel de interesse social para fins de reforma agrária é o
mais comum. Mas também são utilizadas ações declaratórias de produtividade, ações
inominadas e até mesmo a força física para impedir os técnicos de fazerem as
vistorias nos imóveis.
Segundo as declarações da funcionária do Incra Maria Cecília
Ladeira de Almeida entrevistada neste projeto as ações dos proprietários são
protelatórias posto que buscam apenas ganhar tempo para reverter a situação de
abandono das terras que serão vistoriadas. 14 ALMEIDA, Maria Cecília Ladeira de. Reforma Agrária. Revista da Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA), v. 32, nº 1, p. 67, ago/dez 2005.
47 - A participação do incra na execução das políticas públicas
No caso em tela, o INCRA, segundo a decisão proferida pelo
Supremo Tribunal Federal, atuou com negligência, porque teria menosprezado o
comando legal do § 2º, da Lei 8.629/93, não efetuando a notificação ao proprietário.
A atuação do INCRA permitiu a anulação da ação de desapropriação.
4.8 - Outras questões
A) De quem é a responsabilidade pelo destino das famílias que
hoje residem na Fazenda Timboré?
O Poder Judiciário deverá tomar uma decisão sobre o destino das
famílias instaladas na área objeto deste projeto porque está em curso na Justiça
Federal da secção judiciária de Araçatuba uma ação de reintegração de posse movida
pelo proprietário pretendendo retirar as famílias da área.
Quais são os parâmetros para decidir uma ação de reintegração de
posse como a que se apresenta? O Poder Judiciário deverá reconhecer que o
proprietário teve sua posse esbulhada e determinar que seja reintegrado, ou, deverá
promover uma desapropriação indireta, determinando ao Poder Executivo o
pagamento em dinheiro das benfeitorias e da terra nua, e assim preservar todos os
investimentos públicos e particulares já realizados na área, bem como realizar a
intenção do Estado na execução da política pública de reforma agrária fazendo com
que as famílias permaneçam na terra?
B) Qual o valor do investimento financeiro realizado pelo Poder
Pública na Fazenda Timboré desde 1989?
Segundo os cálculos apresentados pela pesquisadora Selma
Aparecida Santos, contratada neste projeto para realizar o levantamento e catalogação
dos dados referentes aos investimentos públicos na área desde a imissão na posse ao
Incra (documento anexo), os investimentos totalizam aproximadamente cerca de 5
milhões de reais.
C) As famílias que residem no Projeto de Assentamento
Fazenda Timboré possuem algum direito e, portanto, legitimidade para
ingressar com alguma ação jurídica requerendo a permanência naquela área?
A teoria que estuda as concepções de direitos humanos afirma que
existem pelo menos quatro categorias de direitos. Tais categorias foram sendo
conquistadas ao longo do processo de construção das sociedades e da democracia.
Os direitos humanos, sejam eles direito à liberdade ou à vida –
direito de primeira geração – até o direito a um meio-ambiente sadio e equilibrado –
direito de quarta geração – são interdependentes, posto que um não existe sem o
outro.
A discussão que se trava hoje não é sobre o reconhecimento ou
positivação dos direitos, mas como bem salienta Norberto Bobbio, a luta do homem
do povo é pela efetivação dos direitos.
A efetivação dos direitos requer exige recursos. Mesmo o direito à
liberdade, tido como direito de primeira geração requer investimentos públicos, seja
para manter a polícia para impedir a violência privada, seja mantendo o Poder
Judiciário para tomar conhecimento e impedir arbitrariedades.
A principal discussão que se trava é sobre a efetivação e realização
dos direitos sociais e econômicos. Autorizadas vozes afirmam que os recursos
públicos são escassos e o orçamento público já não comporta mais despesas, portanto
a efetivação dos direitos sociais e econômicos devem ficar na dependência do
possível desenvolvimento das forças produtivas e do aumento da oferta de empregos.
Outros estudiosos afirmam que a vontade da lei deve ser respeitada
e o Estado deve alocar recursos públicos para concretizar pelo menos os objetivos
fundamentais da República Federativa estampados nos incisos do artigo 3º da
Constituição Federal, ou seja, “construir uma sociedade livre, justa e solidária,
garantir o desenvolvimento nacional e erradicar a pobreza e a marginalização e
reduzir as desigualdades sociais e regionais”.
A concretização dos direitos sociais e econômicos apresenta o
fenômeno da judicialização da política e portanto o Poder Judiciário pode decidir
questões atinentes à vinculabilidade das políticas públicas a metas que já estão na
Constituição ou nas leis ordinárias, ou seja, as pessoas do povo podem organizar
meios jurídicos para exigir via instrumentos processuais a concretização dos direitos
sociais e econômicos.
A reforma agrária pode ser identificada como realização e
efetivação do direito ao trabalho, ou direito à terra, como local privilegiado para a
realização do trabalho para os rurícolas.
Conforme já foi transcrito acima, e vale repetir aqui, o Estatuto da
Terra – lei 4.504/64 – afirma, no § 2º, do artigo 2º, que:
É dever do Poder Público (g.n.): a) promover e criar as condições de acesso do trabalhador rural à propriedade da terra economicamente útil, de preferência nas regiões onde habita, ou, quando as circunstâncias regionais o aconselhem, em zonas previamente ajustadas na forma do disposto na regulamentação desta lei; b) zelar para que a propriedade da terra desempenhe sua função social, estimulando planos para sua racional utilização, promovendo a justa remuneração e o acesso do trabalhador aos benefícios do aumento da produtividade e ao bem-estar coletivo.
O artigo 184 da Constituição Federal afirma que as terras que não
cumprem a função social serão desapropriadas e destinadas ao programa nacional de
reforma agrária.
Rodolfo de Camargo Mancuso15 e Celso Bastos16 afirmam que a
função social da propriedade está entre o rol dos direitos difusos e coletivos. Direitos
difusos pertencente a toda coletividade, e coletivo tendo por “proprietários” os sem
terra.
Os conceitos dos direitos difusos e coletivos estão postos no artigo
81, § único, inciso I e II, do Código de Defesa do Consumidor.
Se entendermos que o direito à terra ou ao trabalho na terra, seja via
reforma agrária ou decorrente do descumprimento pelo proprietário da função social
da terra é um direito difuso da coletividade e coletivo dos trabalhadores rurais
alijados da terra, haverá, por decorrência lógica, legitimidade para os sindicatos de
trabalhadores rurais ou organizações não governamentais e ao Ministério Público
Federal para propor Ação Civil Pública pleiteando a permanência das famílias
naquela propriedade.
Vale transcrever as lições do professor da EDESP Ronaldo Porto
Macedo Junior17 sobre a utilidade da Ação Civil Pública como instrumento de
controle das políticas públicas e mecanismo apto para reclamar a efetividade dos
direitos sociais
A tutela dos interesses coletivos está impregnada pela natureza polêmica e contraditória do direito social. A ação civil pública, enquanto mecanismo privilegiado da tutela de interesses coletivos, não é apenas uma forma mais racional ou adequada à sociedade de massa, mas também um instrumento pelo qual seus agentes, em especial ONGs e o Ministério Público estão ampliando os foros do debate público sobre Justiça Social, em particular nas políticas públicas, o meio por excelência de sua realização.
5. Justificativa (razões para utilização do caso) 15 A Ação Civil Pública como instrumento de controle judicial das chamadas políticas públicas, in: MILARÉ, Edis et alli., Ação Civil Pública – Lei 7.347/1985 – 15 anos. 2ª edição, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 762. 16 Revista de Processo, nº 23, p. 43. 17 MACEDO Jr., Ronaldo Porto. Ação Civil Pública, o direito social e os princípios, In: MILARÉ, Edis et alli. A Ação Civil Pública após 20 anos: efetividade e desafio. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 565.
- Definição do público-alvo Estudantes de graduação e pós-graduação dos cursos de Direito, Administração de Empresas, Sociologia, Economia, Geografia e Economia. - Definição da(s) disciplina(s) que pode(m) fazer uso do caso - Estudos dos problemas brasileiros; - Análise das políticas públicas; - Economia rural; - Sociologia rural - Direito Constitucional; - Direito Civil; - Direito Agrário; - Direito Administrativo - Definição do número de encontros destinados ao caso e sua posição dentro do cronograma de encontros da disciplina
Sugerimos que o caso seja utilizado para o estudo do Direito
Constitucional, especificamente na parte do estudo do direito de propriedade; no
estudo do Direito Civil, na parte dos direitos reais; no curso de Direito Administrativo
no que diz respeito à administração pública e implementação de políticas públicas; e
no Curso de Direito Agrário.
O número de encontros para o estudo deste caso deve ser no
mínimo de 24 horas aula, sendo possível dividir em 6 horas aula por mês, portanto, 2
horas aula por semana.
6. Objetivos pedagógicos:
Na análise de cada caso/problema sempre devemos considerar o
objetivo didático que pretendemos apresentar ao público, seja ele estudantes do
Direito ou de outra área do conhecimento humano.
O objetivo didático deve ser alinhavado na nota de ensino, e ele
vem dividido em conteúdos e habilidades. As atitudes de análise e soluções perante o
relato consistem nas habilidades abstratamente consideradas. Os conteúdos são os
parâmetros com que as soluções/decisões e/ou as análises serão justificadas; são os
pontos de partida para a construção dos argumentos visando à persuasão e discussão
com os alunos.
O método do caso adota, assim, uma determinada perspectiva,
desenvolvendo a habilidade de decidir e/ou analisar, sabendo justificar essa decisão e
a análise a partir da aplicação de determinados conteúdos. Com isso o aluno aprende
a usar os argumentos, alcançar legitimidade, identificar os interesses implicados nos
fatos e prever as conseqüências de suas decisões.
Entre os objetivos pedagógicos que o caso pretende alcançar
podemos destacar:
a) diminuir o preconceito com o tem reforma agrária;
b) discutir o sentido social e jurídico das ocupações de terras como
mecanismo de pressão política apto a reclamar direitos
constitucionais;
c) valorizar o papel do trabalhador sem terra no processo de
reforma agrária;
d) rediscutir a função social da propriedade; e
e) discutir os critérios para se determinar a produtividade das
terras.
As questões preliminares que o método do caso põe são:
6.1 - Questões gerais
A participação do Estado brasileiro na configuração/construção do
problema agrário brasileiro. A partir do golpe militar de 1964 o Estado passou a
desenvolver políticas públicas intervencionistas com o fim de industrializar algumas
regiões urbanas e na área rural promover a agricultura da monocultura para
exportação. Destarte, o Estado brasileiro possui responsabilidade direta no atual
quadro de conflitos nos meio rural. Tal responsabilidade é decorrente das políticas
realizadas nas décadas de 1970 e 1980, e na não realização dos comandos
constitucionais e infra-constitucionais elaborados a partir da Constituição de 1988.
1) Qual a real definição do problema agrário brasileiro, ou em
outras palavras: no que consiste o problema agrário no Brasil?
2) Quais os interesses que estão em jogo?
3) Segundo a legislação qual é o papel que o Estado deve
desempenhar para enfrentar o problema agrário?
4) Quais os interesses que devem prevalecer?
6.2 - Questões sobre a legislação
1) A legislação existente é suficiente para o Estado desenvolver e
cumprir com sua tarefa na política de reforma agrária?
2) O Direito Agrário pode ser visto como um ramo autônomo na
Ciência do Direito?
3) A codificação da legislação agrária é uma saída para o Estado
melhor enfrentar e resolver o problema agrário?
4) A reunião de toda a legislação agrária em um único diploma
poderia favorecer a concepção e elaboração de princípios próprios do Direito
Agrário?
5) A legislação agrária, seja constitucional ou ordinária, agregada
aos princípios constitucionais da dignidade humana e função social da propriedade
pode ser classificada como direitos difusos e coletivos?
6.2.3 Questões específicas
1) Quais as possíveis soluções que o caso apresenta?
2) Como decidir? E como decidir esse caso?
3) O Supremo Tribunal Federal poderia determinar a
desapropriação indireta da Fazenda Timboré e determinar o pagamento da terra nua?
Como?
4) Qual a atitude que o INCRA deveria ter tomado após o
julgamento do Mandado de Segurança nº 22.193-3 - SP?
As questões apresentadas neste caso/problema apontam a
possibilidade de trabalho com, essencialmente, com quatro perspectivas:
1) do Estado, porque tem o dever de realizar as políticas públicas
idealizadas na Constituição Federal e nas leis infraconstitucionais;
2) do Poder Judiciário, porque tem a última palavra na permissão
ou não na execução final das ações do Poder Executivo;
3) das famílias cadastradas no INCRA que esperam ver realizado
seu direito humano fundamental do acesso à terra;
4) do proprietário da terra, que resistirá à desapropriação.
Portanto, também podemos apresentar as questões preliminares na
seguinte perspectiva: como o INCRA deve atuar na execução da política pública de
reforma agrária para não permitir brechas jurídicas capazes de impedir a realização da
vontade do legislador?
Ou ainda, em outras palavras: é possível agir de forma a impedir a
utilização de expedientes jurídicos por parte dos proprietários impedindo a realização
da desapropriação de terras? Como o Judiciário deve decidir?
Para desenvolver essas habilidades, é necessário que o aluno
domine certos conteúdos. Tais conteúdos perpassam o conhecimento do arcabouço
jurídico constitucional e infraconstitucional, centrando a atenção especificamente na
questão dos princípios constitucionais que poderiam se apresentar em confronto.
Desde logo apresentamos a questão da função social da terra como
comando constitucional que dá suporte para as ações de desapropriação em confronto
com o conteúdo do inciso II do artigo 185 da Constituição Federal que isenta a
propriedade produtiva da desapropriação para fins de reforma agrária.
Ainda vale destacar os problemas na execução da política pública
oriundos da participação do Poder Judiciário. Portanto podemos começar a debater
sobre quais as insuficiências que existem no seio da magistratura e por que se
multiplicam os problemas na esfera judiciária e qual deve ser a postura do Poder
Executivo diante deste problema?
Os conteúdos jurídicos que podem auxiliar no desenvolvimento
dessas questões concernem à política judiciária e poderiam explicitar melhor como o
Poder Judiciário pode lidar com o princípio da instrumentalidade das formas e outras
normas de calibração na perspectiva da realização da política pública denominada
reforma agrária.
Ainda restam as questões atinentes ao aparelhamento dos órgãos
públicos para melhor desempenharem seu papel. Então a discussão pode começar
com a seguinte questão: o que é o INCRA e o que o INCRA pode ser? Como ele
poderia concretizar o princípio da função social da propriedade previsto na
Constituição da República?
6.2.4 - Conteúdo programático
A seguir apresentaremos uma proposta de conteúdo programático
de uma cadeira equivalente a 2 (dois) semestres de horas/aula envolvendo discussões
sobre Direito e Política Pública na área do Direito Constitucional, sub-área Direito
Agrário. A proposta que segue foi formulada porque verificamos que pouquíssimas
faculdades de direito oferecem noções sobre direito agrário, e o desconhecimento do
assunto por parte dos operadores do direito que lidem com a reforma agrária é um dos
motivos que atravancam o andamento das ações de desapropriação.
Módulo I – Introdução ao Direito Agrário Constitucional. Objetivo: Oferecer instrumental básico para o conhecimento do problema agrário brasileiro, bem como noções sobre o Direito Constitucional Agrário, focando essencialmente o papel do INCRA no desenvolvimento da política pública de reforma agrária.
Ementa: (1) Histórico da estrutura fundiária no Brasil: a) sesmarias, b) regime das posses, c) República, d) Lei Eusébio de Queirós e Lei 601/1850. (2). Visão geral da estrutura agrária brasileira na atualidade e o desenvolvimento nacional: a) o problema agrário brasileiro; b) o desemprego nas grandes cidades; c) os conflitos agrários. (3) Constituição Federal no que diz respeito à função do Estado e da Reforma Agrária: a) conteúdo, razão social determinante de sua inclusão, efetividade do artigo 3º da CF; b) conceito sociológico da reforma agrária; c) conceito jurídico da reforma agrária. (4). Função social da propriedade como mecanismo apto a possibilitar a ação do Estado na execução da política pública de reforma agrária: a) artigos 5º, inciso XXII e XXIII, 170, 184, 185 e 186 da CF. (5) Leis ordinárias que estabelecem regras para desapropriação de terras para fins de reforma agrária. Módulo II – O Caso da Fazenda Timboré Objetivo: Proporcionar ao discente o contato com um caso-problema que envolve a atuação do Estado, a resistência do proprietário rural, a ação dos movimentos sociais e o papel do Poder Judiciário. Ementa: (1) Leitura da narrativa do caso. (2) Análise da entrevista da Dra. Maria Cecília Ladeira de Almeida. (3) Análise das entrevistas dos trabalhadores rurais assentados na Fazenda Timboré. (4) Análise do relatório sócio-político realizado pela pesquisadora Selma Aparecida dos Santos. Módulo III - O papel do INCRA na realização da Reforma Agrária
Objetivo: Apresentar os princípios que regem a administração pública, a
configuração do INCRA na estrutura do Poder Executivo e seu papel na execução da reforma agrária.
Ementa: (1) Princípios regentes da administração pública e responsabilidade do Estado. (2) os princípios regentes da administração pública. 1) o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado. 2) o princípio da indisponibilidade do interesse público, pela administração. 3) o princípio da legalidade. 4) o princípio da impessoalidade. 5) o princípio da moralidade. 6) o princípio da publicidade. 7) o princípio da eficiência. 8) o princípio da motivação. 9) o princípio da razoabilidade. 10) o princípio da proporcionalidade. 11) o princípio republicano. 12) o princípio democrático. 13) o princípio da dignidade da pessoa humana. 14) o princípio da ampla defesa e do devido processo legal. 15) o princípio da continuidade do serviço público. 16) o princípio da tutela. 17) o princípio hierárquico. 18) o princípio da segurança jurídica. 19) o princípio do controle jurisdicional. 20) o princípio da responsabilidade do estado.Administração pública indireta. (3) Deveres/poderes/competências da administração pública.Natureza jurídica do INCRA. Organograma funcional do INCRA. Questões orçamentárias das autarquias federais. Normas que regulamentam o trabalho dos funcionários do INCRA. Distribuição das atividades no organograma geral. (4) Legislação agrária atual. Conjunto de normativas contraditórias, a lentidão e a interpretação da Lei Pelo Poder Judiciário nas ações de desapropriação. Passo a passo na questão do Rito Sumário. Módulo IV – A ação do Estado na política pública de reforma agrária, a resistência do particular e a interpretação do Poder Judiciário. Objetivo: conhecer os princípios e regras constitucionais, as leis ordinárias materiais e processuais que autorizam o Estado a intervir no patrimônio particular, as garantias materiais e processuais ao particular e a interpretação do Poder Judiciário. Ementa: (1) Análise dos anexos com cópias das ações de desapropriação, seqüestro, acórdão exarado no mandado de segurança, ação de reintegração de posse (processo nº 2005.61.07.000594-0) e a sentença neste processo. (2) Análise das entrevistas dos juízes federais e do procurador federal. (3) Análise do fluxograma indicativo do caminho percorrido pelo INCRA na desapropriação de terras para fins de reforma agrária.
6.2.5 - Habilidades
As habilidades que o estudo do caso-problema da Fazenda Timboré
propõe a desenvolver podem ser descritas como:
(a) ampliar a conscientização sobre temas atuais que desafiam os
administradores públicos;
(b) estimular a compreensão da real dimensão do problema
agrário brasileiro e seus reflexos no conjunto da sociedade brasileira;
(c) estimular a capacidade de compreender a política pública de
reforma agrária como missão do Estado, envolvendo seus três Poderes, com fim
último de realizar os objetivos fundamentais da República instituídos no artigo 3º da
Constituição Federal;
(d) proporcionar a compreensão do conteúdo e alcance do
princípio da função social da propriedade rural e seus reflexos no Processo (civil,
agrário e administrativo);
(e) permitir maior discernimento do papel que o INCRA deve
desempenhar na execução da política pública de reforma agrária;
(f) possibilitar maior desenvolvimento da faculdade de análise
dos papéis dos diversos atores que estão presentes no problema agrário brasileiro;
(g) estimular a participação, iniciativa e criatividade na busca de
soluções para os problemas concretos por parte dos discentes;
6.2.6 - Atitudes
A principal atitude que o caso-problema da Fazenda Timboré deseja
construir é eliminação do preconceito que cerca o tema reforma agrária. É sabido que
este tema suscita o afloramento das paixões quando colocado em debate. Através da
análise do caso, é possível perceber que o Estado tem uma missão a cumprir, e
quando seus agentes se empenham na sua execução, surgem conflitos diretos entre os
interesses individuais e coletivos, e conflitos indiretos, resultando em demandas
judiciais que emperram a atividade do Estado em prejuízo da coletividade.
7.1 Descrição das atividades de preparação destinadas ao professor
- Assistir ao vídeo Pelos Caminhos da América, produção da equipe
do cineasta espanhol Almodóvar.
- Leitura dos artigos 3º, 184 e 186 da Constituição Federal.
- Leitura do acórdão do Mandado de Segurança processo nº 22193-
3, proferido pelo Pleno do Superior Tribunal de Justiça (STF).
- Leitura do parecer do Procurador da República Paulo de Tarso
Garcia Astolphi.
7.2 Descrição das atividades de preparação destinadas aos alunos (“nota de aula”: orientações que devem ser dadas aos alunos em momento anterior à aula)
Antes de iniciar a aula onde será tratado do tema do caso-problema
da Fazendo Timboré é necessário chamar a atenção dos alunos para o problema que a
discussão pode trazer se o foco da discussão se ater ao viés ideológico que o tema
reforma agrária traz. Os alunos precisam ser convocados a analisar o caso os olhos
voltados para a realidade agrária e o papel do Estado.
7.3 Descrição das dinâmicas que serão utilizadas na sala de aula:
- Seminários apresentados pelos discentes.
- Exposição sobre o tema pertinente dos diversos atores
envolvidos no caso (representantes do INCRA, juízes federais,
geógrafos, trabalhadores rurais assentados em projetos de
reforma agrária, outros)
- Exposição de vídeos sobre o tema.
- Questões para orientação do debate (três dimensões: conteúdo, processo e comportamento)
a) Qual é a configuração da estrutura agrária brasileira?
b) Em que medida o caso-problema da Fazenda Timboré pode
ser utilizado para compreendermos o problema agrário brasileiro?
c) Como o Estado agiu no caso-problema da Fazenda Timboré?
d) Qual o significado do princípio/norma da função social da
propriedade rural e como ele foi analisado no caso da Fazenda Timboré?
e) O custo do assentamento das famílias realizado com a
desapropriação indireta da Fazenda Timboré é compatível com os recursos públicos
alocados no orçamento do INCRA para a desapropriação direta de outras áreas com o
mesmo potencial de assentamento (número de famílias)?
f) Qual é a atual situação das famílias que estão ocupando a
Fazenda Timboré?
- Definição do momento de utilização de cada espécie de questão (estímulo à compreensão dos fatos, estímulo à análise dos conceitos, interrupção e alteração do foco do debate, etc.)
As questões estão divididas em três grupos elementares: a) papel do
Estado e estrutura agrária brasileira; b) análise do caso-problema Fazenda Timboré;
c) estudo do trabalho do INCRA na realização da política pública de reforma agrária.
O primeiro passo é compreender o papel do Estado moderno na
configuração das atuais sociedades. O Estado não possui apenas o papel de
gerenciador de crises, mas acima de tudo, o papel de fomentador do desenvolvimento
social, econômico com vistas a permitir que todos tenham acesso pelo menos à
educação, saúde, trabalho e moradia.
Realizado este passo, é necessário estudar o caso objetivando
compreender os acertos e desacertos da ação do Estado na execução da política
pública de reforma agrária na Fazenda Timboré.
E o próximo passo é estudar a atual forma de intervenção do Estado
na área da reforma agrária, partindo do estudo do INCRA, analisando a legislação que
institui a reforma agrária, tudo com a pretensão de formar pessoas com capacidade de
formular e apresentar saídas para o problema da distribuição e democratização do
acesso `a terra como forma de construção do Estado Democrático de Direito previsto
no artigo 1º da Constituição Federal.
- Indicação de possíveis respostas, sugestões de abordagem e de justificativas teóricas e pedagógicas.
As respostas apresentadas em sala de aula ou nos trabalhos
acadêmicos solicitados devem trazer possíveis soluções dentro dos parâmetros
constitucionais e infra-constitucionais, enfocando, sempre que possível, a
participação direta do INCRA.
A premissa que sugerimos como ponto de partida para toda
abordagem do tema é que a realização da Reforma Agrária é uma necessidade da
Nação e uma obrigação do Estado.
- Indicação de possíveis pontos controvertidos que podem surgir na discussão em sala de aula a) O Brasil não precisa de reforma agrária; b) A Constituição Federal garante imunidade à terra produtiva; c) Os sem terra, depois que ganham as terras, vendem a voltam para outras
ocupações.
A discussão sobre reforma agrária, sua necessidade ou não, deve ser
pautada pelos ditames da Constituição Federal. A nossa Carta Magna de 1988 é do
tipo dirigente, e apresenta um programa econômico para o Brasil, e é neste contexto
que a reforma agrária precisa ser analisada.
A desapropriação de terras mesmo quando produtivas deve ser
amplamente debatida porque a produtividade da terra deve estar em consonância com
os demais requisitos da função social da propriedade elencados no artigo 186 da
Constituição Federal.
- Formas de utilização dos anexos
A forma de utilização dos anexos fica a critério de cada professor.
No entanto, é importante que cada discente tenha a oportunidade de acesso aos
anexos, especialmente à legislação que estipula as regras da política agrária.
8.1 Tempos sugeridos para as dinâmicas em sala de aula
A dinâmica em sala de aula deve privilegiar a compreensão dos
fatos, dos conteúdos e o papel que o INCRA possui no sistema normativo e
administrativo, e que estão dentro do caso-problema.
Portanto, o tempo sugerido para a análise do caso, tomando como
base 4 horas/aula, o tempo destinado à análise dos fatos de ser de 1 hora, a análise dos
conteúdos de 1 hora e o estudo e compreensão do papel do INCRA deve ser de 2
horas.
8.2 Sugestões para encaminhamento de “conclusão da aula”
A conclusão da aula deve ser pautada pela necessidade de respostas
concretas de modo a atender aos interesses superiores do Estado, considerando
sempre a necessidade de observâncias dos direitos e garantias elementares
individuais.
8.3 Sugestões de atividades de “consolidação” a serem desenvolvidas pelos alunos (atividades extra-classe)
Assim como a Constituição Federal (artigo 126, § único)
recomenda ao juiz, sempre que necessário, para melhor dirimir os conflitos fundiários
que se faça presente no local do litígio, é de bom alvitre que seja recomendado aos
estudantes a visita in loco nas áreas conflituosas ou projetos de assentamento de
trabalhadores rurais. Tais visitas devem ser precedidas de contatos e agendamento
prévios com representantes das famílias acampadas ou assentadas. As visitas devem
ser realizadas com o tempo mínimo de 2 dias, e os estudantes devem,
necessariamente, pernoitar no acampamento ou assentamento, e assim conviver com
as pessoas o período diurno e noturno.
Na impossibilidade de visitar uma ocupação de terra ou
assentamento, vale a pena exibir para os estudantes alguns vídeos que tratam dos
conflitos agrários.
8.4 Atualização de dados importantes para a narrativa do caso
O professore deve, a título de atividade extra-classe, solicitar para
um grupo de alunos pesquisar e atualizar as informações sobre a situação do caso-
problema. A atualização das informações pode ser realizada através de visita no
assentamento ou através de pesquisa na internet sobre o andamento dos processos na
Justiça Federal.
8.5 Sugestões de avaliação (conteúdos e habilidades a serem avaliados, momento e
forma da avaliação)
Sugerimos que a avaliação seja realizada em duas etapas. A
primeira avaliação deve ser realizada quando o conteúdo conceitual proposto neste
caso estiver atendido e a leitura do caso satisfeita. Esta primeira avaliação deve ter em
mira a necessidade de analisar a realidade da sociedade brasileira tendo em mente o
problema agrário brasileiro. O estudante precisa compreender a situação global do
país que ele vive e em que medida a questão agrária influencia nos problemas
sentidos por todos.
A segunda avaliação deve ser feita no final das discussões do caso.
Neste momento o que se espera do estudante é que seja capaz de apresentar uma saída
concreta para o problema da Fazenda Timboré. A saída concreta deve ser apresentada
no momento em que o Presidente da República expediu o decreto considerando a área
de interesse social para fins de reforma agrária. Outra solução concreta que se espera
do aluno é no atual estágio do problema, ou seja, qual a melhor solução para o caso
neste momento. Esta solução deve passar necessariamente pela análise do valor que
será pago ao espólio do proprietário e garantia de permanência das famílias na
Fazenda Timboré.
REFLEXÕES LIVRES SOBRE O CASO
1. A Reforma Agrária como condição para o desenvolvimento
nacional
O caso CAMINHOS DA IMPLANTAÇÃO DA REFORMA
AGRÁRIA COMO POLÍTICA PÚBLICA – O CASO DA FAZENDA TIMBORÉ
(BRASIL) é uma ótima oportunidade para os professores de economia política
discutirem com seus alunos a oportunidade e necessidade da realização da reforma
agrária como condição para o desenvolvimento nacional.
A discussão, problematização apontamentos sobre possíveis novas
saídas para o problema da democratização do espaço e meios de produção das
matérias primas no meio rural destinadas à produção dos alimentos para a grande
massa de consumidores residentes nas grandes cidades é condição essencial para a
construção de uma nação justa e democrática.
A discussão sobre reforma agrária apresenta uma constante tensão
sobre qual o melhor modelo de agricultura que deve ser financiado pelo Estado. A
compreensão do conjunto de elementos que compõem os dois principais modelos – o
agro-exportador ou agricultura familiar -, suas vantagens e desvantagens, benefícios
sociais, convivência entre os dois modelos, é de fundamental importância para os
administradores públicos.
No anexo complementar 05 tem um texto do Professor Titular do
Departamento de Geografia da USP Ariovaldo Umbelino de Oliveira “Por que
reforma agrária?” que apresenta importantes pistas para este debate.
2. As ocupações de terras (ou invasões) e o Direito Penal
Toda semana os jornais trazem notícias sobre ocupações de terras
promovidas por movimentos sociais e, invariavelmente, os editorialistas clamam pela
aplicação do Direito Penal contra os manifestantes que participam de tais atos.
O caso CAMINHOS DA IMPLANTAÇÃO DA REFORMA
AGRÁRIA COMO POLÍTICA PÚBLICA – O CASO DA FAZENDA TIMBORÉ
(BRASIL) apresenta uma situação ímpar para estudos nesta seara. Analisando todos
os fatos que compõem o caso é possível concluir que as famílias conseguiram sua
fixação na Fazenda Timboré porque decidiram ocupar a propriedade. Não fosse a
ocupação, certamente aquelas famílias estariam residindo nas periferias das pequenas,
médias e grandes cidades, aumentando a concentração nas regiões urbanas e
contribuindo com o aumento da violência.
Todas as pessoas, ou suas lideranças, poderiam ser denunciadas por
esbulho possessório – ou mesmo outros tipos penais – em razão da ocupação da
Fazenda Timboré?
É papel do Estado utilizar instrumentos do Direito Penal como
mecanismo de repressão contra movimentos que exigem a concretização dos direitos
conquistados na Carta Magna?
As mobilizações sociais em prol da reforma agrária podem ser
classificadas como desobediência civil?
Estas são algumas questões que podem ser retiradas do caso para
fins de estudo e compreensão de um dos principais problemas que afligem a
sociedade brasileira.
DEPOIMENTO SOBRE A PESQUISA
A elaboração, apresentação e redação final do caso CAMINHOS
DA IMPLANTAÇÃO DA REFORMA AGRÁRIA COMO POLÍTICA PÚBLICA –
O CASO DA FAZENDA TIMBORÉ (BRASIL), só foi possível graças ao trabalho e
empenho dos colaboradores da EDESP/FGV Rafael Domingos Faiardo Vanzella e
Tamira Maira Fioravante. Sem as constantes reuniões, troca de opiniões,
comentários e correções do foco central do caso levados a efeito pelos colaboradores,
a redação ficaria incompleta. Da constante troca de idéias surgiu uma grande
amizade.
Decidimos apresentar o caso da Fazenda Timboré porque
ele possui todos os requisitos para sustentar importantes estudos sobre a
política pública de reforma agrária e a utilização das regras processuais
do direito como bastião impeditivo ao seu andamento.
A importância do caso Timboré também se deve ao drama que ele
carrega. São 170 famílias que estão assentadas mas que vivem em constante incerteza
quanto ao futuro porque o INCRA ainda não finalizou o trabalho de desapropriação
da terra, e mesmo que remota, a possibilidade de serem obrigadas a deixarem a terra
existe.
Nossa primeira fonte de pesquisa foi a ação de reintegração de
posse movida pelo proprietário contra as 170 famílias que estão ocupando a área. A
partir deste processo foi possível identificar todas as outras ações que estão
tramitando, ou que tramitaram tendo por objeto a área da Timboré. São mais de 10
ações processuais ajuizadas para defender os interesses dos proprietários.
Com as cópias dos processos em mãos, foi necessário fazer uma
programação de pesquisa onde pudéssemos obter informações sobre a real situação
das famílias que residem na área. Além do levantamento sócio-econômico,
precisávamos ouvir as pessoas que vivem e trabalham na terra.
A oitiva dos outros atores estava na nossa programação inicial, e
assim entrevistamos um Procurador Federal que elaborou parecer na ação de
reintegração de posse, e ouvimos uma procuradora do INCRA. Ouvimos ainda 3
(três) juizes federais.
Um dos juízes ouvido foi justamente aquele que decidiu a liminar
na Cautelar de Seqüestro proposta pelo INCRA. O Dr. Sérgio Lazzarini, hoje
exercendo a advocacia, muito gentilmente nos recebeu em seu escritório localizando
nas proximidades da Avenida Paulista, e relatou sua atuação na 21ª Vara da Justiça
Federal de São Paulo, vara especializada nas questões agrárias.
Ouvimos ainda os juízes federais Luciano de Souza Godoy e Paulo
Sergio Domingues. Nos receberam em seus gabinetes e muito gentilmente
concederam as entrevistas. O juiz Luciano de Souza Godoy é doutor em Direito
Agrário pela Universidade de São Paulo e hoje é juiz-convocado pelo Tribunal
Regional Federal da 3ª Região.
A Dra. Maria Cecília Ladeira de Almeida, pós-graduada em Direito
Agrário, procuradora do INCRA em São Paulo, é professora de Direito Agrário na
Universidade Mackenzie e nos recebeu em uma primeira entrevista nas dependências
da Mackenzie, e no segundo momento nas dependências do INCRA. Pessoa com
vastíssimo conhecimento sobre o problema agrário brasileiro, e que deve,
necessariamente, ser convidada para ministrar aulas sobre este assunto.
As perguntas apresentadas aos entrevistados foram elaboradas com
a participação das três pessoas que participaram na construção do caso. No decorrer
das entrevistas surgiram outras questões e assim eram formuladas novas perguntas.
O maior desafio a vencer foi realizar as entrevistas com os
camponeses. Passamos dois dias e duas noites no assentamento que está em fase de
implantação na Fazenda Timboré. Nesse período convivemos com 12 famílias, e
entrevistamos uma pessoa de cada uma dessas 12 famílias. As moradias são precárias,
as estradas de difícil acesso, e a assistência técnica do Poder Público é apenas uma
promessa repetida ano após ano.
A visita aos maiores interessados no caso foi de fundamental
importância para compreender as razões da luta daquelas famílias para permanecer na
terra.
A viagem até o local do conflito foi crucial para o bom andamento
do processo de pesquisa. Sem essa atividade o projeto ficaria pela metade e
certamente não compreenderíamos as razões subjetivas que determinam a vontade
dos trabalhadores rurais sem terra em permanecer naquele pedaço de chão.