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Thiago Ferreira 2º U Letras UNITAU Resumo: CAUSAS DA DECADÊNCIA DOS POVOS PENINSULARES NOS ÚLTIMOS TRÊS SÉCULOS De Antero de Quental Discurso proferido por Antero de Quental nas conferências que tomaram lugar no célebre Casino Lisbonense. Tinha por finalidade a reflexão sobre as condições políticas, religiosas e econômicas da sociedade portuguesa no contexto europeu. O próprio Antero redigiu no programa do evento que "não podia viver e desenvolver-se um povo isolado das grandes preocupações intelectuais do seu tempo”. Antero dá inicio a eu discurso falando dos tempos de outrora, em que “entre todos os povos da Europa central e ocidental, somente os da Península escaparam ao jugo de ferro do feudalismo”. Fala de uma coroa, que era mais um símbolo brilhante do que uma realidade despótica e de um povo que repugnava a opressão espiritual. Faziam eles sua religião, não a aceitavam feita. Exalta as conquistas intelectuais dos povos peninsulares e termina com nota sombria este prólogo, ressaltando que se as causas da nossa decadência existiam já latentes, nenhum olhar podia ainda então descobri-Ias. Deste mundo brilhante, criado pelo génio peninsular na sua livre expansão, passamos quase sem transição para um mundo escuro, inerte, pobre, ininteligente e meio desconhecido. Dir-se-á que entre um e outro se meteram dez séculos de decadência: pois bastaram para essa total transformação 50 ou 60 anos! Em tão curto período era impossível caminhar mais rapidamente no caminho da perdição.” No princípio do século XVII, tanto em Portugal quanto na Espanha, nasce um política antinacional, fruto de coroas anômalas, inconscientes e desnaturais, que envilecem e desacreditam as monarquias. Ambas as nações foram minguando em extensão e importância, até não passarem de espectros em meio aos povos que as rodeavam.

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Thiago Ferreira 2º U Letras

UNITAU

Resumo: CAUSAS DA DECADÊNCIA DOS POVOS PENINSULARES

NOS ÚLTIMOS TRÊS SÉCULOSDe Antero de Quental

Discurso proferido por Antero de Quental nas conferências que tomaram lugar no célebre Casino Lisbonense. Tinha por finalidade a reflexão sobre as condições políticas, religiosas e econômicas da sociedade portuguesa no contexto europeu. O próprio Antero redigiu no programa do evento que "não podia viver e desenvolver-se um povo isolado das grandes preocupações intelectuais do seu tempo”.

Antero dá inicio a eu discurso falando dos tempos de outrora, em que “entre todos os povos da Europa central e ocidental, somente os da Península escaparam ao jugo de ferro do feudalismo”. Fala de uma coroa, que era mais um símbolo brilhante do que uma realidade despótica e de um povo que repugnava a opressão espiritual. Faziam eles sua religião, não a aceitavam feita. Exalta as conquistas intelectuais dos povos peninsulares e termina com nota sombria este prólogo, ressaltando que se as causas da nossa decadência existiam já latentes, nenhum olhar podia ainda então descobri-Ias.

“Deste mundo brilhante, criado pelo génio peninsular na sua livre expansão, passamos quase sem transição para um mundo escuro, inerte, pobre, ininteligente e meio desconhecido. Dir-se-á que entre um e outro se meteram dez séculos de decadência: pois bastaram para essa total transformação 50 ou 60 anos! Em tão curto período era impossível caminhar mais rapidamente no caminho da perdição.”

No princípio do século XVII, tanto em Portugal quanto na Espanha, nasce um política antinacional, fruto de coroas anômalas, inconscientes e desnaturais, que envilecem e desacreditam as monarquias. Ambas as nações foram minguando em extensão e importância, até não passarem de espectros em meio aos povos que as rodeavam.

A realeza se tornou no mais puro absolutismo. Essa aristocracia impedia a ascensão natural de um elemento novo e essencialmente moderno: a classe média. Por isso decaiu também a vida econômica. A riqueza concentrava-se em alguns pontos excepcionais, enquanto a miséria se alargava pelo resto do país. A poesia caiu na imitação servil e ininteligente da poesia latina. Traduzir era o ideal: inventar considerava-se um perigo e uma inferioridade. E a ausência de gênios contribuiu para a queda já então eminente. “A Europa culta engrandeceu-se, nobilitou-se, subiu sobretudo pela ciência: foi sobretudo pela falta de ciência que nós descemos, que nos degradamos, que nos anulamos”.

Temos, em seguida, a sucessão natural da decadência de um povo: a depravação dos costumes. A corrupção tanto da corte quanto do povo, a religião como uma prática ininteligível, formal, mecânica. E todas essas misérias íntimas refletiam-se fielmente na literatura.

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Eis então que Antero se propõe a enumerar as causas dessa decadência, sendo elas três: A primeira tinha a ver com Catolicismo de Trento, que vivia do dogmatismo e da disciplina cega, que levou à Inquisição. A segunda atribuiu-a ao Absolutismo, tão nefasto para a vida política e social como o Catolicismo para a Igreja. A terceira causa (sem discutir o heróico das Descobertas) tinha a ver com as Conquistas Marítimas que levaram à decadência econômica da Metrópole.

“Assim, enquanto as outras nações subiam, nós baixávamos. Subiam elas pelas virtudes modernas; nós descíamos pelos vícios antigos, concentrados, levados ao sumo grau de desenvolvimento e aplicação. Baixávamos pela indústria, pela política. Baixávamos, sobretudo, pela religião.”

O Concílio de Trento organizou o catolicismo de uma maneira completa, poderosa, formidável, e até então desconhecido. Em uma época em que todos clamavam por uma reforma liberal, em harmonia com o espírito da época, chegando muitos até a desejar uma conciliação com os protestantes. Em Roma, contudo, o absolutismo papal tinha uma opinião divergente. Esta reforma humanizadora, contudo, não foi adotada pela igreja. Roma não queria cair. Não podendo resistir mais à idéia do concílio, explora essa idéia em proveito próprio, tornando-o numa arma de guerra e dominação. “Condena sem apelação a razão humana, e dar essa base ao seu edifício”. Só o Papa pode julgar os bispos e os padres. É a impunidade para o clero. Os tratados do concílio fazem do nome cristão um símbolo de morte, ao passo em que a educação jesuítica faz das classes mais elevadas máquinas inteligentes e passivas e do povo, fanáticos corruptos e cruéis.

“Esta causa actuou principalmente sobre a vida moral: a segunda, o absolutismo, apesar de se reflectir no estado dos espíritos, actuou principalmente na vida política e social.”

A respeito do Absolutismo, Antero pontuou que ele se assentou sobre as ruínas das instituições locais. Caiu sobre a península, uma centralização monárquica, pesada, uniforme, caiu sobre a Península. A centralização do absolutismo, prostrando o povo, corrompia ao mesmo tempo o rei, possesso “daquela loucura cesariana com que a Natureza faz expiar aos déspotas a desigualdade monstruosa, que os põe como que fora da Humanidade”. O autor cita também exemplos de monarquias que sujeitavam também o povo, sem com isso impedir seu progresso, como a francesa. Entre os povos peninsulares, todavia, o espírito aristocrático da monarquia opunha-se ferrenhamente aos progressos da classe média, impedindo o desenvolvimento da burguesia, “a classe moderna por excelência, civilizadora e iniciadora, já na indústria, já nas ciências, já no comércio”.

Então, a estas “influências deletérias”; às causas morais e políticas já citadas, junta-se uma terceira, de caráter sobretudo econômico: as Conquistas. Antes, brilhantes embaladoras dos poemas epopéicos, as Conquistas vieram a se tornar, também, uma das maiores causas da decadência. Em uma época em que a riqueza e a vida das nações eram extraídas da atividade produtora, ou seja, do espírito de trabalho e de indústria, aquelas monarquias insistiam no destino marítimo de outrora e na guerra esterilizadora.

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“Dera-se, com efeito, durante o século XVI, uma deplorável revolução nas condições econômicas da sociedade portuguesa, revolução sobretudo devida ao novo estado de coisas criadas pelas conquistas. O proprietário, o agricultor, deixam a charrua e fazem-se soldados, aventureiros: atravessam o oceano, à procura de glória, de posição mais brilhante ou mais rendosa.”

O abandono dos campos acabou por aumentar nas capitais o contingente da miséria, da domesticidade ou do vício. Como conseqüência disso temos a diminuição das culturas.

“Não se fabrica, não se cria: basta o ouro do Oriente para pagar a indústria dos outros, enriquecendo-os, instigando-os ao trabalho produtivo, e ficando nós cada vez mais pobres, com as mãos cheias de tesouros! Importávamos tudo: de Itália, sedas, veludos, brocados, massas; da Alemanha, vidro; de França, panos; de Inglaterra e Holanda, cereais, lãs, tecidos. Havia então uma única indústria nacional... a Índia!”

Em suma, com as Conquistas, deixou-se de lado a produção interna, Portugal passou a importar, os ricos viviam do ouro proveniente das colônias e os pobres passavam fome.

Antero de Quental, já próximo de sua conclusão, apontou também que estes três fatores de decadência já citados são conseqüência um do outro – o erros políticos e econômicos sucessivos têm como decorrência natural a opressão dos fracos e a decadência. “Fomos os Portugueses intolerantes e fanáticos dos séculos XVI, XVII e XVIII: somos agora os Portugueses indiferentes do século XIX”. Os erros mudam sua natureza, mas persistem num povo que não se propõe a opor-se a eles. O nome que o autor dá a isso é Revolução.

“Meus senhores: há 1800 anos apresentava o mundo romano um singular espectáculo. Uma sociedade gasta, que se aluía, mas que, no seu aluir-se, se debatia, lutava, perseguia, para conservar os seus privilégios, os seus preconceitos, os seus vícios, a sua podridão: ao lado dela, no meio dela, uma sociedade nova, embrionária, só rica de ideias, aspirações e justos sentimentos, sofrendo, padecendo, mas crescendo por entre os padecimentos. A ideia desse mundo novo impõe-se gradualmente ao mundo velho, converte-o, transforma-o: chega um dia em que o elimina, e a Humanidade conta mais uma grande civilização.Chamou-se a isto o Cristianismo.Pois bem, meus senhores: o Cristianismo foi a Revolução do mundo antigo: a Revolução não é mais do que o Cristianismo do mundo moderno.”

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QUESTÕES1. SEGUNDO ANTERO DE QUENTAL, QUAIS FORAM OS TRÊS FENÔMNOS QUE

CONDUZIRAM OS POVOS PENINSULARES A SUA DECADÊNCIA?“Esses fenômenos capitais são três, e de três espécies: um moral, outro político,

outro econômico. O primeiro é a transformação do catolicismo, pelo Concílio de Trento. O segundo, o estabelecimento do absolutismo, pela ruína das liberdades locais. O terceiro, o desenvolvimento das conquistas longínquas.”

2. A DESPEITO DO PENSAMENTO DA ÉPOCA, QUE CLAMAVA POR UMA REFORMA LIBERAL, O QUE FEZ A IGREJA PARA NÃO PERDER PODER? Não podendo resistir mais à idéia do concílio, explora essa idéia em proveito próprio,

tornando-o numa arma de guerra e dominação. “Condena sem apelação a razão humana, e dar essa base ao seu edifício”. Só o Papa pode julgar os bispos e os padres. É a impunidade para o clero. Os tratados do concílio fazem do nome cristão um símbolo de morte, ao passo em que a educação jesuítica faz das classes mais elevadas máquinas inteligentes e passivas e do povo, fanáticos corruptos e cruéis.

3. EM QUE SENTIDO O ABSOLUTISMO CONTRIBUI PARA ESSA DECADÊNCIA?A centralização do absolutismo, prostrando o povo, corrompia ao mesmo tempo o

rei, possesso “daquela loucura cesariana com que a Natureza faz expiar aos déspotas a desigualdade monstruosa, que os põe como que fora da Humanidade”. Entre os povos peninsulares, o espírito aristocrático da monarquia opunha-se ferrenhamente aos progressos da classe média, impedindo o desenvolvimento da burguesia, “a classe moderna por excelência, civilizadora e iniciadora, já na indústria, já nas ciências, já no comércio”.

4. “ANTES, BRILHANTES EMBALADORAS DOS POEMAS EPOPÉICOS, AS CONQUISTAS VIERAM A SE TORNAR, TAMBÉM, UMA DAS MAIORES CAUSAS DA DECADÊNCIA”. EXPLIQUE A FRASE DE ANTERO DE QUENTAL.Em uma época em que a riqueza e a vida das nações eram extraídas da atividade

produtora, ou seja, do espírito de trabalho e de indústria, aquelas monarquias insistiam no destino marítimo de outrora e na guerra esterilizadora. O abandono dos campos acabou por aumentar nas capitais o contingente da miséria, da domesticidade ou do vício. Como conseqüência disso temos a diminuição das culturas. Em suma, com as Conquistas, deixou-se de lado a produção interna, Portugal passou a importar, os ricos viviam do ouro proveniente das colônias e os pobres passavam fome.

5. O QUE, SEGUNDO ANTERO DE QUENTAL, SERIA NECESSÁRIO PARA QUE OS POVOS PENINSULERES SE RECUPERASSE SEU “LUGAR” NA CIVILIZAÇÃO?

“Que é pois necessário para readquirirmos o nosso lugar na civilização? Para entrarmos outra vez na comunhão da Europa culta? É necessário um esforço viril, um esforço supremo: quebrar resolutamente com o passado. Respeitemos a memória dos nossos avós: memoremos piedosamente os actos deles: mas não os imitemos. (...)Esta é a tendência do século: esta deve também ser a nossa. Somos uma raça decaída por ter rejeitado o espírito moderno: regenerar-nos-emos abraçando francamente esse espírito. O seu nome é Revolução.”