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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE PIRACICABA CLARICE SANTANA MILAGRES SAÚDE BUCAL E FRAGILIDADE EM IDOSOS DE DIFERENTES CONTEXTOS SOCIODEMOGRÁFICOS Piracicaba 2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE PIRACICABA

CLARICE SANTANA MILAGRES

SAÚDE BUCAL E FRAGILIDADE EM IDOSOS DE DIFERENTES

CONTEXTOS SOCIODEMOGRÁFICOS

Piracicaba

2017

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CLARICE SANTANA MILAGRES

SAÚDE BUCAL E FRAGILIDADE EM IDOSOS DE DIFERENTES

CONTEXTOS SOCIODEMOGRÁFICOS

Tese apresentada à Faculdade de Odontologia de

Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas

como parte de requisitos exigidos para obtenção do

título de Doutora em Odontologia, na área de

Saúde Coletiva

Orientadora: Profª. Drª Maria da Luz Rosário de Sousa

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À

VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA

PELA ALUNA CLARICE SANTANA

MILAGRES ORIENTADA PELA PROFª.

DRª MARIA DA LUZ ROSÁRIO DE

SOUSA

Piracicaba

2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE PIRACICABA

A Comissão Julgadora dos trabalhos de Defesa de Tese de Doutorado, em sessão pública

realizada em 07 de março de 2017, considerou a candidata Clarice Santana Milagres

aprovada.

Profa. Dra. Maria da Luz Rosário de Sousa

Profa. Dra. Jaira Lopes Brandão Crepschi

Profa. Dra. Marília Jesus Batista

Profa. Dra. Edna Alves Silva

Profa. Dra. Jaqueline Vilela Bulgareli

A Ata da Defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no processo de vida

acadêmica do aluno.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à minha mãe BERNADETE FERNANDES SANTANA, pelo

exemplo de mulher para a vida toda: lutadora e capaz de vencer qualquer obstáculo.

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AGRADECIMENTOS

Sinceros agradecimentos:

À DEUS que estando sempre ao meu lado pode me proporcionar o caminho, a luz e o

conhecimento para chegar ao final de mais uma etapa da minha vida e sonhando com tantos

outros!

À minha mãe BERNADETE, que esteve ao meu lado, me fortalecendo e apoiando nos

momentos de carência, crises, desânimo, cansaço e solidão. Por sempre se expressar com

palavras de carinho e incentivar, afirmando sempre, que no final tudo daria certo!

Às minhas irmãs, MARIA ALICE e RAQUEL, pelo carinho, apoio e incentivo em

minha caminhada acadêmica.

À minha orientadora, PROFA. DRA. MARIA DA LUZ ROSÁRIO DE SOUSA, que

me auxiliou nesta etapa e tanto me “puxou a orelha”, pedindo-me para escrever de forma clara

e objetiva. Obrigada pela orientação, incentivo e principalmente, pela paciência. Obrigada por

me ajudar a ver a importância dos detalhes, da releitura, do conselho dado em quaisquer

momentos. Obrigada por compreender cada momento diferente que vivenciei no decorrer

desta etapa em busca da conclusão do doutorado. Obrigada pelas aulas maravilhosas de

epidemiologia!

À Faculdade de Odontologia de Piracicaba, na pessoa do seu Diretor PROF. DR.

GUILHERME ELIAS PESSANHA HENRIQUES, instituição que tive a oportunidade de

realizar um sonho: fazer doutorado.

Ao Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de

Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas pela contribuição em minha formação.

À PROFA. DRA. ANITA NERI, que prontamente aceitou fazer parte deste projeto de

doutorado, nos concedendo informações sobre o FIBRA, através do seu banco de dados.

Ao PROF. DR. RENATO PEREIRA, pelo incentivo à docência, pela amizade sincera

e incentivo para realizar este doutorado. Obrigada pelos momentos de trabalho em nossas

férias acadêmicas, pelos ricos ensinamentos e pelas contínuas ideias a serem colocadas em

prática após mais esta etapa.

À DRA. LUISA TORRÊS, por me ensinar cada particularidade deste banco de dados.

Por ser paciente e estar junto em cada momento da escrita e finalização desta etapa.

À JUCILENE, que deixou de ser uma conhecida para se tornar uma verdadeira amiga!

À PROF. DRA. MARÍLIA, minha orientadora da especialização, pela delicadeza

como conduziu meus estudos sobre autopercepção de saúde bucal em idosos.

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Aos professores do departamento de Odontologia Social da Faculdade de Odontologia

de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas.

À ELIANA, uma secretária inestimável e competente!

Aos colegas de doutorado, aos membros do CEPAE, aos funcionários da Secretaria da

Pós-Graduação em Odontologia e aos demais professores da FOP, muito obrigada por

estarem presentes, pelo convívio e troca de experiências.

Aos meus amigos “Chegadíssimos”, por me fazerem rir nas poucas visitas que fiz à

Viçosa nestes últimos três anos. Obrigada pelo incentivo sempre demonstrado em nossas

reuniões e pelo carinho durante mais essa jornada.

Obrigada à CRISTIANE, minha psicóloga! Profissional maravilhosa e pessoa

fundamental não só por me auxiliar nas dúvidas e medos proporcionados na vida acadêmica e

em especial no doutorado, mas por ter me ajudado nas mais diversas situações.

À UNIARARAS, por me proporcionar um espaço de aplicação da docência e por mais

uma vez me trazer a certeza de estar no caminho certo.

Aos meus colegas de trabalho e alunos (crianças), tão estimados e presentes!

Aos idealizadores do Projeto FIBRA e a todos que de alguma forma contribuíram para

a realização este trabalho.

Por fim, agradeço àqueles que me mostraram o lado sombrio do ser humano. Talvez

tenha sido por essas pessoas que aprendi sobre o real significado da palavra resiliência, assim

como o valor daquelas que amamos.

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RESUMO

A proposta deste estudo transversal foi verificar a relação entre saúde bucal

autopercebida e fragilidade em idosos participantes do estudo FIBRA em contextos

sociodemográficos diversificados. O Projeto FIBRA (Fragilidade em Idosos Brasileiros) é um

estudo multicêntrico e multidisciplinar, no qual foram coletadas informações

sociodemográficas, comportamentais, de saúde geral e bucal; e fragilidade de idosos com 65

anos ou mais, residentes em zonas urbanas de 7 cidades brasileiras, totalizando 3.478 idosos.

No capítulo 1, o objetivo foi avaliar a saúde bucal e a capacidade mastigatória autopercebida

dos idosos longevos em relação aos idosos mais jovens em seis municípios brasileiros do

Estudo FIBRA, enquanto no capítulo 2, o objetivo foi verificar a relação entre capacidade

mastigatória autoreferida de saúde bucal e fragilidade em diferentes níveis contextuais e

individuais. No capítulo 1, 11,7% dos idosos eram longevos (n=273) e destes, 15,8% eram

frágeis. A conclusão encontrada foi de que os achados de saúde bucal deste primeiro estudo

sugeriram que ausência de dentes naturais e dificuldade ou dor para mastigar comida dura

estiveram relacionados à idade mais avançada, sendo mais prevalente nos idosos longevos que

nos idosos jovens. No capítulo 2, 7% dos idosos eram frágeis. No modelo final, verificou-se

que houve maior chance de serem frágeis os idosos com maior idade, os que não trabalhavam,

os deprimidos e os que auto avaliaram como pior sua saúde geral quando comparada aos

demais da mesma idade. Em relação à saúde bucal, 26% da amostra apresentou 3 ou mais

problemas funcionais negativos da mastigação e se associou com maior chance de ser frágil,

mesmo após realizado o ajuste pela idade, trabalho, depressão e avaliação de saúde bucal.

Como conclusão, foi observada que a autopercepção de saúde geral destes idosos, quando

comparada a outros da mesma idade, foi pior. Em relação aos aspectos funcionais da

mastigação, foi verificado que a capacidade mastigatória mostrou ter sido uma variável

importante a ser considerada em futuros estudos com longevidade e fragilidade, assim como a

autopercepção do idoso.

Palavras-chave: Saúde do Idoso; Idoso Fragilizado; Saúde Bucal; Odontogeriatria.

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ABSTRACT

The aim of this cross-sectional study was to verify the relationship between self-

perceived oral health and frailty in elderly participants of the FIBRA Study in diverse

sociodemographic contexts. FIBRA Project (Fragility in Brazilian Elderly) is a multi-center

and multidisciplinary study, which sociodemographic, behavioral, general and oral health

information was collected; and frailty of the elderly with 65 years or more, living in urban

areas of 7 Brazilian cities, totaling 3.478 elderly. In chapter 1, the aim was to evaluate the oral

health and self-perceived masticatory capacity of the elderly in relation to the younger adults

in six Brazilian municipalities of the FIBRA Study, while in chapter 2, the aim was to verify

the relation between masticatory self-reported health capacity and fragility at different

contextual and individual levels. In Chapter 1, 11,7% of the elderly were long-lived (n = 273)

and of these 15,8% were fragile. The conclusion was that the oral health findings of this first

study suggested that the absence of natural teeth and difficulty or pain to chew hard food were

related to the older age, being more prevalent in the elderly than in the elderly. In chapter 2,

7% of the elderly were frailty. In the final model, there was a greater chance of being frailty

older adults, those who did not work, the depressed, and those who self-rated their overall

health worse than the others of the same age. Regarding oral health, 26% of the sample had 3

or more negative functional problems of chewing and was associated with a greater chance of

being frailty, even after adjusting for age, work, depression and oral health assessment. In

conclusion, it was observed that the general health self-perception of these elderly people,

when compared to others of the same age, was worse. Regarding the functional aspects of

chewing, it was verified that masticatory capacity showed to be an important variable to be

considered in future studies with longevity and frailty, as well as self-perception of the

elderly.

Key Words: Health of the Elderly; Frailty elderly; Oral Health.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Esquema dos Aspectos Funcionais da Mastigação e da Saúde Bucal em

idosos fragilizados, adaptado de Castrejón-Pérez et al, em 2012, identificando as

variáveis do presente estudo

43

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LISTA DE TABELAS

Capítulo 1

Tabela 1 – Distribuição e frequência das características sociodemográficas,

indicadores de saúde geral, presença de fragilidade, indicadores

comportamentais/hábitos de vida e uso de medicamentos segundo o desfecho,

longevidade. Estudo FIBRA, 2008-2009

25

Tabela 2 – Distribuição e frequência das características segundo indicadores de

acesso a serviços odontológicos, autopercepção de saúde bucal e condições

funcionais da alimentação, segundo o desfecho, longevidade. Estudo FIBRA, 2008-

2009

27

Tabela 3 – Resultado final da análise multivariada bruta e ajustada das variáveis

associadas à longevidade (≥80 anos) e respectivo intervalo de confiança a 95%.

Estudo FIBRA, 2008-2009

29

Capítulo 2

Tabela 1: Característica da amostra (n=2.343). FIBRA, 2008 e 2009 46

Tabela 2 – Distribuição quanto aos aspectos funcionais da mastigação e fragilidade,

FIBRA, Brasil, 2008 e 2009

48

Tabela 3 – Análise não ajustada (bruta) e razão de chances da presença de

fragilidade em idosos de acordo com variáveis sociodemográficas,

comportamentais, de saúde geral e saúde bucal. FIBRA, Brasil, 2008 e 2009

49

Tabela 4 – Regressão logística multivariada dos fatores individuais associados à

fragilidade em idosos de 6 municípios do Brasil. FIBRA, 2008 e 2009

51

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AVE – Acidente Vascular Encefálico

IBGE – Instituto Nacional de Geografia e Estatística

DP – Desvio-Padrão

EDG – Escala de Depressão Geriátrica

FIBRA – Fragilidade em Idosos Brasileiros

IC – Intervalo de Confiança

MEEM – Mini Exame do Estado Mental

MG – Minas Gerais

PA – Pará

PB – Paraíba

PI – Piauí

RS – Rio Grande do Sul

SB – Saúde Bucal

SP – São Paulo

OR – Odds Ratio

TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 14

2 ARTIGOS

2.1 Artigo 1: Condição de Saúde Bucal Autopercebida, Capacidade Mastigatória e

Longevidade em Idosos

17

2.2 Artigo 2: Aspectos Funcionais da Mastigação e Fragilidade em Idosos de

Diferentes Contextos Sociodemográficos

37

3 DISCUSSÃO 60

4 CONCLUSÃO 62

REFERÊNCIAS 63

ANEXOS

Anexo 1 – Certificado de Aprovação do Comitê em Ética em Pesquisa 66

Anexo 2 – Pedido do Banco do Projeto Rede FIBRA 67

Anexo 3 – Declaração de Autorização para uso de Arquivos, Registros e Similares 68

Anexo 4 – Informações e Comentários Ético sobre o Projeto FIBRA 69

Anexo 5 – Dispensa do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 70

Anexo 6 – Aceite do artigo – Artigo 1 71

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1 INTRODUÇÃO

A população brasileira apresenta nas últimas cinco décadas, transições decorrentes de

mudanças nos níveis de mortalidade e fecundidade. Assim, a transição demográfica com

consequente aumento da expectativa de vida e diminuição da fecundidade levou a um

envelhecimento da população. Acompanhada da mesma, a transição epidemiológica

apresentou redução da mortalidade por doenças infecciosas e parasitárias e aumento das

doenças crônico-degenerativas (Schaan, 2007; Duarte e Barreto, 2012). Desde as décadas de

50/60, no Brasil, o crescimento do contingente idoso é maior, podendo atingir em 2015/2025

um aumento de cinco vezes o da população total (Lebrão, 2007).

O processo do envelhecimento pode ser afetado por diversos fatores, como

sociodemográficos exemplificados pela escolaridade e renda, o que contribui para que os

idosos constituam um grupo heterogêneo, com alguns idosos sendo robustos e alguns frágeis

(Bales e Ritchie, 2002). Segundo Fried e colaboradores (2001), fragilidade é um conjunto de

sinais e sintomas originados do declínio das funções normais do corpo, podendo apresentar

aumento da vulnerabilidade a doenças, caracterizada pela diminuição das reservas de energia,

desregulação neuroendócrina, declínio da função imune e redução da resistência a estressores

(Fried et al., 2001). Logo, a fragilidade acarreta dificuldades na execução de atividades da

vida diária (Metzelthin et al., 2010), representando, portanto, um problema de saúde pública,

principalmente pela dependência na execução destas atividades, sejam estas básicas,

instrumentais ou avançadas, no qual este idoso passa a estar submetido ao auxílio de terceiros.

Atualmente, o efeito das transformações demográficas e epidemiológicas decorrentes do

envelhecimento é constantemente foco de estudos, e a fragilidade é importante ser

reconhecida diante deste contexto (OMS, 2005; Mello et al., 2014).

Observa-se na literatura o desenvolvimento de instrumentos baseados em diferentes

definições para identificar a fragilidade sendo o termo idoso frágil utilizado pela primeira vez

em 1970, sendo referenciado somente em 1990 (Metzelthin et al., 2010; Andrade et al., 2012).

Hoje, dois grupos de pesquisa têm se destacado na busca de consenso sobre a definição de

fragilidade em idosos: um nos Estados Unidos, que utiliza o conceito de fragilidade como

uma síndrome geriátrica capaz de ser identificada por meio de um fenótipo que inclui cinco

componentes mensuráveis; e outro no Canadá, que utiliza um construto multidimensional

definindo a fragilidade utilizando uma abordagem holística, em que sua etiologia possui

natureza multifatorial e dinâmica, relacionando-a com a história ou trajetória de vida do idoso,

podendo esta, ser determinada ou modificada por fatores biológicos, psicológicos e sociais,

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cujas interações resultam em recursos e/ou déficits individuais em determinado contexto e

sendo mensurada por nove domínios (Andrade et al., 2012). O critério de Fried e

colaboradores (2001), que utiliza o conceito proposto pela escola americana, é o método mais

utilizado (Lustosa et al., 2013; Mello et al., 2014;) no qual considera o frágil o idoso aquele

que, dentre 5 indicadores apresenta três ou mais, sendo: autorrelato de perda de peso não

intencional, fadiga/exaustão, diminuição da força de preensão manual, do nível de atividade

física e da velocidade da marcha. A presença desses indicadores também possibilita classificar

o idoso em pré-frágil (quando apresenta até dois indicadores de fragilidade) e não frágil ou

robusto (na ausência dos indicadores citados).

Utilizando este critério de fragilidade, o Projeto FIBRA (Fragilidade em Idosos

Brasileiros), foi a primeira investigação multicêntrica e multidisciplinar brasileira dedicada a

estudar as condições de fragilidade em indivíduos de 65 anos ou mais. Para tal, buscou-se a

identificação das condições de fragilidade em relação a variáveis sociodemográficas de saúde,

autopercepção de saúde bucal, cognição, funcionalidade e psicossociais em idosos que vivem

na comunidade. Neri et al. (2013) verificaram que 9,1% de idosos avaliados foram

classificados como frágeis e 51,8% de idosos como pré-frágeis. (NERI et al., 2013).

A fragilidade está associada a grande prevalência de doenças crônicas. Destacam-se

doenças bucais como a cárie dentária e a periodontite, que quando não tratadas podem levar a

perda dentária (Andrade et al., 2013; Thomson, 2014). Em idosos mesmo devido à carga

cumulativa das doenças bucais resultando em significativa perda dentária, o efeito da saúde

bucal na saúde geral é ainda pouco estudado, apresentando, portanto, poucos estudos sobre

essa temática (Andrade et al., 2013). Parte dos estudos até o momento mostram que a relação

entre saúde bucal e fragilidade depende da relação entre saúde bucal e nutrição, sendo a

presença de dentes um importante fator no percurso que resulta na fragilidade (Andrade et al.,

2013; Neri et al., 2015).

Observa-se na literatura que há poucos estudos nacionais e internacionais sobre a

saúde bucal autorrelada relacionada à fragilidade (Ahmed et al., 2007; Rihs e Sousa, 2009;

Rihs et al., 2013). Também, verifica-se que pesquisas com esta temática parecem estar

relacionadas com a combinação de fatores comportamentais, de atitudes, culturais e de

experiências do idoso frente à condição questionada (Andrade et al., 2013), o que auxiliam na

compreensão desta relação com a saúde bucal autopercebida. Um trabalho, realizado com

idosos frágeis no município de Campinas verificou que os aspectos negativos da saúde bucal

foram associados à dificuldade de acesso ao tratamento odontológico, o excesso de demandas

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de saúde e os problemas alimentares, auto avaliando assim uma pior qualidade de vida (Silva

et al., 2011).

Castrejón-Pérez e colaboradores (2012) propuseram um modelo conceitual da saúde

bucal, o qual utiliza informações acerca da autopercepção de saúde bucal de idosos como

problemas na mastigação e mudança na escolha dos alimentos. A associação proposta pelos

autores demonstra a relação entre os diversos fatores da saúde bucal precária e sua

contribuição para a fragilidade, levando a um quadro de deterioração da saúde bucal. Este

modelo, aliado a busca por estudos que investiguem a relação existente entre a saúde bucal e a

fragilidade, em geral são escassos, o que aponta para a necessidade de mais estudos com essa

relação (Castrejón-Pérez et al., 2012).

A necessidade de estudar as condições de saúde bucal autopercebidas dos idosos,

associadas à fragilidade em diferentes contextos sociodemográficos poderá contribuir para

reconhecer como os idosos estão envelhecendo no Brasil e, assim, permitir que haja

planejamento dos serviços de saúde nos diversos níveis de atenção direcionadas a esse grupo

etário (Ahmed et al., 2007).

O objetivo geral deste estudo foi verificar os aspectos da saúde bucal auto percebidos

de idosos nos municípios de Campinas (SP), Belém (PA), Parnaíba (PI), Campina Grande

(PB), Poços de Caldas (MG), subdistrito de Ermelino Matarazzo (SP) e Ivotí (RS), e avaliar

sua relação com fragilidade, nos níveis individuais e contextuais. Os objetivos específicos

serão apresentados na forma de artigos que correspondem aos capítulos 1 e 2, sendo o

objetivo do primeiro avaliar a saúde bucal e a capacidade mastigatória autopercebida em

idosos longevos em relação aos idosos mais jovens nos municípios brasileiros do Estudo

FIBRA, e do segundo, verificar a relação entre a capacidade mastigatória autoreferida de

saúde bucal e fragilidade em diferentes níveis contextuais e individuais destes idosos

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17

2 ARTIGOS

2.1 CONDIÇÃO DE SAÚDE BUCAL AUTOPERCEBIDA, CAPACIDADE

MASTIGATÓRIA E LONGEVIDADE EM IDOSOS

Artigo aceito para publicação na Revista Ciência e Saúde Coletiva – 22/jul/2016 (Anexo 6) –

Título inicial cadastrado no sistema da Revista: Autopercepção de Saúde Bucal em Idosos

Longevos (Anexo 6).

Clarice Santana Milagres1, Luísa Helena do Nascimento Tôrres2, Anita Liberalesso Neri3,

Maria da Luz Rosário de Sousa4

¹Doutoranda em Odontologia (Saúde Coletiva). Faculdade de Odontologia de

Piracicaba/Universidade Estadual de Campinas. Departamento de Odontologia Social. Av.

Limeira, 901 - Caixa Postal 52 - CEP 13414-903 - Piracicaba - SP – Brasil. E-mail:

[email protected]. Tel.: (19) 98372-4454/ Tel.: (19) 2106-5200.

2Doutora em Odontologia (Saúde Coletiva). Faculdade de Odontologia de

Piracicaba/Universidade Estadual de Campinas. Departamento de Odontologia Social.

3Professora Titular na Faculdade de Educação da UNICAMP. Doutora em Psicologia pelo

Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Universidade Estadual de Campinas,

Faculdade de Educação, Departamento de Psicologia Educacional.

4Professora Titular da FOP/UNICAMP. Doutora em Odontologia (Saúde Coletiva).

Faculdade de Odontologia de Piracicaba/Universidade Estadual de Campinas. Departamento

de Odontologia Social.

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RESUMO

Objetivo: Verificar a condição bucal e a capacidade mastigatória autopercebidas em idosos

longevos (≥80 anos). Métodos: Foram utilizados dados do estudo multicêntrico FIBRA. A

amostra foi composta por 2.341 indivíduos com ausência de déficit cognitivo, com idade ≥65

anos, no período entre 2008 e 2009, onde os idosos foram submetidos à coleta de dados.

Quanto ao desfecho, a idade foi dicotomizada em 65-79 e 80 anos ou mais. A associação entre

longevidade e as variáveis sociodemográficas, comportamentais, de saúde geral e bucal e a

capacidade mastigatória autopercebida foram avaliadas pela regressão de Poisson.

Resultados: Dados completos disponíveis para 2.126 idosos. A idade média foi 70,91

(DP=±4,11) anos entre os idosos jovens e 82,70 (DP=±2,61) entre os idosos longevos. A

amostra de idosos com idade ≥80 anos foi de 11,7%. Baixa escolaridade, estado civil solteiro

e ausência de trabalho estiveram associados à longevidade, assim como autorrelato de não

possuir dentes naturais e dificuldade ou dor ao mastigar alimentos duros. Conclusões: Os

resultados sugerem a associação entre longevidade com características sociodemográficas e

de saúde bucal.

Palavras-Chaves: idosos, idosos longevos, saúde bucal, autoavaliação.

ABSTRACT

Aim: To verify the oral health conditions and self perceived chewing ability in the oldest old

(≥80 years). Methods: A multicenter FIBRA study data were used. The sample consisted of

2.341 individuals with no cognitive impairment, aged ≥65 years, between 2008 and 2009,

where the elderly were subjected to data collection. Regarding the outcome, age was

dichotomized into 65-79 and 80 and over. The association between longevity and the

sociodemographic and behavioral variables, general and oral health and self-perceived

chewing ability was assessed by Poisson regression. Results: Complete data available for

2.126 seniors. The mean age was 70,91 (SD=±4.11) years among the young elderly and 82,70

(SD=±2.61) among the oldest old. The sample of individuals aged ≥80 years was 11,7%. Low

education, single marital status and lack of work were associated with longevity, as well as

self-report has no natural teeth and difficulty or pain when chewing hard foods. Conclusions:

The results suggest an association between longevity with sociodemographic characteristics

and oral health.

Key Words: elderly, aged, 80 and over, oral health, self-assessment.

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INTRODUÇÃO

Mundialmente, estima-se que um em cada dez habitantes seja idoso1. No Brasil, os

dados do Censo Demográfico 2010 revelaram um aumento da população com 65 anos ou

mais de 4,8% em 1991, passando a 5,9% em 2000 e chegando a 7,4% em 20102. Além do

envelhecimento da população total, a proporção da população idosa longeva, ou seja, idosos

com 80 anos ou mais, está crescendo, correspondendo atualmente por 1,6% do total de idosos

brasileiros2. Com isso, a alteração da composição etária entre os idosos também se encontra

em processo de envelhecimento1,3.

Estima-se que a população longeva apresente características socioeconômicas,

psicológicas e morfofisiológicas diferenciadas em relação aos idosos mais jovens,

apresentando maior número de doenças crônicas, uso de medicamentos e busca por serviços

de saúde, com gastos elevados em saúde e riscos para o desenvolvimento de incapacidades

diversas4,5.

Alguns autores têm utilizado o termo “quarta idade” para ressaltar a condição longeva

do idoso, assim como uma categoria complementar à “terceira idade”6,7. Sendo assim, os

idosos não formariam uma população uniforme, uma vez que apresentam importantes

diferenças entre aqueles mais jovens e os longevos7. De acordo com a literatura, idosos acima

de 80 anos apresentam uma tendência ao isolamento social, maior frequência de doenças

crônicas não transmissíveis, além de outros fatores de ordem social, que tornam esse grupo

etário mais vulnerável, como por exemplo, devido à menor renda e arranjo de moradia

fragmentado4,5,8.

O envelhecimento bem-sucedido e saudável surge em contextos variados, gerando

preocupações em relação a como manter a saúde geral e a saúde bucal dos idosos. Um aspecto

relevante é a autopercepção da saúde bucal, que muitas vezes se relaciona à condição clínica

desses indivíduos9,10. Em estudo com idosos, verificou-se que o edentulismo e o uso de

próteses estiveram associados ao impacto psicossocial e funcional relacionados às

dificuldades de mastigação. Apesar desses dados apresentados, não foi possível observar

autopercepção de incômodo na condição bucal. Uma das explicações seria a capacidade de

resiliência dos idosos, por considerarem tais condições como inerentes ao processo natural do

envelhecimento, avaliando como natural as extrações dentárias, o uso de próteses e até mesmo

algumas dificuldades relacionadas à mastigação10. Além disso, a autopercepção de saúde

bucal parece estar relacionada com a combinação de comportamentos, atitudes, cultura e

experiências do idoso frente à condição questionada11.

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20

Em relação às doenças bucais, verifica-se que as mesmas causam agravos e sequelas

como as perdas dentárias, principalmente na população idosa. Esse fenômeno traz consigo

uma nova preocupação com o cuidado à saúde do idoso. Na odontologia, os problemas de

saúde bucal que mais acometem esta população são declínio da presença de dentes hígidos,

alta prevalência de edentulismo, cáries radiculares, alterações nos tecidos moles, doenças

periodontais e ausência de utilização de serviços odontológicos2-5,12. Cardos e Bujes (2010),

em uma revisão sistemática verificaram que as inter-relações entre a saúde bucal com as

funções da mastigação e da deglutição se dão pela ausência de dentes no idoso e este fato

interfere em uma deglutição eficiente, prejudicando o estado nutricional do idoso12. O estudo

realizado por Medeiros, Pontes e Magalhães Jr. (2014), verificou que os idosos referiram

possuir maiores dificuldades na mastigação com os alimentos sólidos mais duros, como

carnes, frutas e verduras cruas, e cereais, além de sentirem a necessidade de ingerir líquidos

durante a refeição para facilitar a deglutição13.

Quanto à percepção de saúde bucal entre os idosos, encontram-se variáveis envolvidas

não só em relação à capacidade mastigatória autopercebida, mas as condições funcionais de

alimentação, a facilidade de ingestão e digestão dos alimentos, a ausência de dores orofaciais

e a ligação com os atos de falar e sorrir14. Vasconcelos et al (2012), observaram que a

autopercepção de saúde bucal dos idosos estudados estava associada a fatores subjetivos ao

invés dos objetivos, ou seja, a avaliação da saúde bucal apresentou-se positiva, divergindo da

condição clínica encontrada15. Resultado semelhante foi encontrado no trabalho de Costa,

Saintrain e Vieira (2010)14.

O presente estudo objetivou avaliar a saúde bucal e a capacidade mastigatória

autopercebida dos idosos longevos em relação aos idosos mais jovens em seis municípios

brasileiros. Este trabalho justifica-se por considerar que a maioria dos estudos que verifica o

estado de saúde bucal de idosos baseia-se em indicadores clínicos odontológicos9, existindo

poucas avaliações sobre a saúde e o bem-estar a partir da percepção do idoso9,10, em especial,

do idoso longevo9. Logo, as informações geradas no presente estudo poderão contribuir para o

estabelecimento de ações específicas em saúde bucal que contribuam para o envelhecimento

saudável desta população considerando o próprio ponto de vista sobre seu estado bucal e sua

condição mastigatória.

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MATERIAIS E MÉTODOS

Estudo seccional, que utilizou dados do Projeto FIBRA, que investiga a fragilidade e

variáveis associadas em idosos de 65 anos ou mais residentes em zonas urbanas de diferentes

cidades brasileiras, no período 2008 a 2009.

O Projeto FIBRA foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos

da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (protocolo nº

208/2007) e este projeto também foi aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de

Odontologia de Piracicaba, protocolo n° 068/2015.

População Alvo

A população deste estudo foi constituída por idosos, de 65 anos ou mais, residentes em

seis municípios do país: Campinas (SP), Belém (PA), Parnaíba (PI), Poços de Caldas (MG),

subdistrito de Ermelino Matarazzo, na cidade de São Paulo (SP) e Ivotí (RS). Foram

totalizados 3.478 idosos, recrutados em domicílio e submetidos à sessão única de coleta de

dados. Dessa amostra, 2.341 indivíduos não apresentaram déficit cognitivo em ambos os

sexos, dos quais 273 (11,7%) apresentaram idade igual ou superior a 80 anos.

Plano Amostral

As seis localidades brasileiras, escolhidas por conveniência, selecionaram amostras

probabilísticas de setores censitários, cujos domicílios recrutaram idosos compreendendo

cotas de homens e mulheres de 65 a 69 anos, 70 a 74, 75 a 79 e 80 e mais, sendo estas,

proporcionalmente ao tamanho da população de idosos de cada município.

O plano amostral estabeleceu que o tamanho mínimo da amostra estimada para

Campinas e Belém (localidades com mais de 1 milhão de habitantes) deveria ser 601 idosos,

para erro amostral de 4%. Para as demais, com menos de 1 milhão de habitantes, a estimativa

foi de um mínimo de 384 idosos, para um erro amostral de 5%. O município de Ivoti que

possuía uma população menor foi contabilizado todos os idosos, num total de 646 indivíduos.

Nesse caso, o cálculo amostral utilizado foi de estimativa de uma proporção numa população

finita com α=5%, erro amostral de 5% e estimativa de 50% para a distribuição da variável em

estudo. Por esses parâmetros, a amostra de Ivoti foi estimada em 235 idosos14. Informações

detalhadas sobre a seleção dos participantes, a coleta e o protocolo encontram-se descritos no

estudo de Neri e colaboradores16.

Baseado no estudo de Fried et al (2001)17, fragilidade é uma condição clínica

geriátrica que envolve o declínio das reservas de energia, a desregulação neuroendócrina, a

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diminuição da função imune e também da resistência a estressores, sendo resultante da

interação dos riscos atuais e acumulados em relação à saúde e a sua funcionalidade. Como

consequência, estes indivíduos apresentam uma maior vulnerabilidade a desfechos clínicos

adversos17. A mensuração da fragilidade é composta por 5 itens de avaliação: perda de peso

não intencional, exaustão/fadiga, força de preensão manual (fraqueza muscular), nível de

atividade física e velocidade da marcha. O idoso considerado frágil foi aquele que pontuou

três ou mais destes critérios, pré-frágil quando apresentou pontuação de um a dois critérios e

não-frágil (ou robusto) quando não pontuou em nenhum dos cinco critérios estabelecidos17.

Esta definição foi usada pelo Estudo FIBRA, no qual foram adotados os seguintes critérios de

exclusão: presença de problemas de memória, atenção, orientação e comunicação sugestiva de

déficit cognitivo (utilização do MEEM – Mini Exame do Estado Mental, com notas de corte

baseados nos critérios sugeridos pela Academia Brasileira de Neurologia, com base em

Brucki et al (2003) menos um desvio padrão)18, incapacidade permanente ou temporária para

andar, perda localizada de força e afasia decorrente de acidente vascular encefálico (AVE),

comprometimento da fala, da motricidade ou da afetividade decorrente de doença de

Parkinson avançada, déficit auditivo ou visual grave e presença de estágio terminal. Em

relação aos critérios de inclusão, foram selecionados idosos com 65 anos ou mais, residentes

permanentes no domicílio e no setor censitário, capazes de se comunicar, entender instruções

e que concordassem em participar, portanto, idosos que não apresentassem déficit cognitivo.

Os informantes podiam ser os próprios idosos ou um familiar residente no domicílio.

Em relação às notas de corte utilizadas para exclusão pelo MEEM utilizou-se 17

pontos para os analfabetos; 22 para idosos com escolaridade entre 1 e 4 anos; 24 para os com

escolaridade entre 5 e 8 anos e 26 para os que tinham 9 anos ou mais anos de escolaridade. A

opção por tais notas de corte, também adotada por Fried et al (2001)17, Ferrucci et al (2004)19

e Bandeen-Roche et al (2006)20, foi feita porque déficits cognitivos poderiam prejudicar a

confiabilidade das respostas de autorrelato.

Coleta de Dados

A coleta de dados ocorreu de setembro de 2008 a junho de 2009, em uma sessão única

com 40 a 120 minutos de duração, a partir da assinatura do Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido (TCLE). Seguiam-se os questionários de identificação, de dados

sociodemográficos e o MEEM e verificação dos demais critérios de exclusão. Assim,

coletavam-se as demais medidas, como saúde geral, acesso a serviços odontológicos,

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comportamentos/hábitos de vida, saúde bucal e condições funcionais da alimentação

autopercebidas dos idosos incluídos neste estudo.

Variáveis do estudo

A variável idade foi coletada através da questão “qual a sua idade” de forma contínua

e posteriormente foi dicotomizada em 65-79 anos e 80 anos ou mais, sendo o desfecho deste

estudo.

As variáveis independentes foram representadas pelos dados sociodemográficos,

indicadores de saúde geral; presença de fragilidade, indicadores comportamentais/hábitos de

vida e uso de medicamentos, indicadores de acesso a serviços odontológicos, de

autopercepção de saúde bucal e condições funcionais da alimentação.

- Dados sociodemográficos: sexo (masculino e feminino), grupo étnico (branco e

outros), escolaridade em anos (4 anos ou mais e até 3 anos), estado civil (casado/casado com

companheiro e solteiro/viúvo/separado/divorciado), arranjo de moradia (outros e mora

sozinho), trabalha atualmente (sim e não).

- Indicadores de saúde geral pelo: número de doenças médicas autorrelatadas (até

uma e duas ou mais) que, segundo o idoso, foram diagnosticadas por médico no último ano

anterior à entrevista, avaliação da saúde geral (muito boa/boa, muito ruim/ruim e regular),

autopercepção da saúde comparada com outros da mesma idade (pior, igual e melhor).

- Fragilidade: pré-frágil e/ou não frágil; frágil.

- Indicadores comportamentais/hábitos de vida e uso de medicamentos: se é fumante

atualmente (sim e não), consumo de bebidas alcoólicas (nunca e outros) e quantidade de

medicamentos que faz uso nos últimos 3 meses (até um e dois ou mais).

Em relação às variáveis sociodemográficas do estudo, estas foram dicotomizadas de

acordo com sua distribuição, onde o grupo étnico como caucasiano e outros, segundo

autorrelatado dos idosos no qual foi coletado considerando a classificação: branco, preto,

pardo, indígena, amarelo e outros. A escolaridade também foi dicotomizada em anos (4 anos

ou mais e até 3 anos), onde foi obtida a partir dos seguintes itens: sem escolaridade formal, 1

a 3, 4 a 8, 9 a 11 e 12 e mais. O arranjo da moradia obteve quatro itens dos quais foram

dicotomizados em: mora sozinho e não mora sozinho [com companheiro (a), filho (s) e

outros].

Os indicadores de saúde geral e presença de fragilidade utilizaram a variável número

de doenças médicas autorrelatadas, no qual foi coletada com os seguintes itens: até uma e

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duas ou mais doenças. A avaliação da saúde geral foi verificada através das seguintes

categorizações: muito boa/boa, ruim/muito ruim e regular.

- Indicadores de acesso a serviços odontológicos (nos últimos 12 meses anteriores à

entrevista): rede de serviços de saúde odontológico (SUS e particular/convênio), frequência

no dentista nos últimos doze meses (uma vez ou mais e nunca) e motivo de não ir ao dentista

último ano (não precisou, não quis ir/dificuldade para conseguir a consulta ou para ir).

- Indicadores de autopercepção de saúde bucal e capacidade mastigatória: presença

de dentes naturais, uso de dentaduras (próteses), a dentadura machuca ou cai, alimenta-se com

dentadura, dor de dente (nos últimos seis meses), sensação de boca seca (nas últimas quatro

semanas), presença de ferida na língua, bochecha, céu da boca ou lábio (há mais de um mês),

dificuldade para mastigar e engolir alimentos, dificuldade ou dor para mastigar comida dura e

avaliação da saúde bucal (ótima, boa, regular e ruim).

Para o presente estudo, foram avaliadas 2 questões referentes à capacidade

mastigatória autopercebida (dificuldade para mastigar e engolir alimentos e dificuldade ou dor

para mastigar comida dura), as quais foram dicotômicas (sim e não)21.

Análise dos Dados

Para análise de dados foi utilizado os softwares SPSS 18.0. A distribuição das

variáveis do estudo foi verificada. As análises bivariadas incluíram o teste do Qui-quadrado

para variáveis categóricas. Considerou-se, para todos os testes estatísticos, um nível de

significância de p<0,05.

Foram realizadas análises bivariadas entre as variáveis que foram comparadas,

obtendo-se como medida de associação a razão de prevalência (RP) e os respectivos

intervalos de confiança a 95% por meio da regressão de Poisson com variância robusta.

Foram incorporadas na análise multivariada as variáveis que se associaram com o desfecho,

na análise bivariada, com valor de p<0,25 e mantidas no modelo final aquelas com associação

significante no nível de p<0,05.

RESULTADOS

O estudo contou com 3073 idosos que participaram do primeiro bloco do protocolo,

sendo que 2.341 destes participaram nas duas fases. Entretanto, devido a alguns missings, por

questões não respondidas, a análise final contou com dados completos para 2.126 idosos,

sendo que as variáveis motivo de não ir ao dentista, alimenta-se com dentadura (prótese),

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dentadura machuca ou cai e quantidade de medicamentos que faz uso foram respectivamente

aquelas que apresentaram maior quantidade de não respostas (missings). Destes com

informações completas, foi verificado que 11,7% são idosos longevos (n=273). De acordo

com a tabela 1, na amostra total de idosos pesquisados, havia maior proporção de mulheres

(65,6%). Observou-se predomínio da faixa etária de idosos jovens (88,3%), onde a média da

idade verificada entre eles foi de 70,91 anos (DP=±4,11), enquanto entre os idosos longevos a

idade média foi 82,70 anos (DP=±2,61). Da amostra total, declararam-se casados ou vivendo

com companheiro (a), 50,5% dos idosos, sendo a categoria “solteiros” formada por 33,9% de

viúvos, 8,3% de solteiros e 7,3% de divorciados/separados/desquitados. Apenas 13,8%

relataram morar sozinho, enquanto aproximadamente 83% relatou não mais trabalhar.

Quanto aos idosos longevos, houve maior proporção de mulheres (59,7%),

caucasianos (61,3%) e estado civil solteiro (64,1%). Apenas 20,2% relataram morar sozinhos,

enquanto 88,9% relataram não mais trabalhar (tabela 1).

Na amostra pesquisada, foi encontrada maior proporção da presença de duas ou mais

doenças médicas autorrelatadas tanto entre os idosos mais jovens quanto entre os longevos.

Ambos apresentaram maior proporção de avaliação da saúde geral regular e melhor

autopercepção da saúde comparada com outros da mesma idade. A fragilidade foi identificada

em 5,9% dos idosos mais jovens, enquanto nos idosos longevos foi representada por 15,8%

destes indivíduos (tabela 1).

Tabela 1 – Distribuição e frequência das características sociodemográficas, indicadores de saúde

geral, presença de fragilidade, indicadores comportamentais/hábitos de vida e uso de

medicamentos segundo o desfecho, longevidade. Estudo FIBRA, 2008-2009.

Variáveis/Categorias N total = 2341

n (%)

Idosos jovens

n (%)

Idosos

longevos

n (%)

p

Sexo

Masculino 805 (34,4) 695 (33,6) 110 (40,3)

Feminino 1536 (65,6) 1373 (66,4) 163 (59,7) 0,02

Grupo étnico

Branco 1310 (56,5) 1145 (55,9) 165 (61,3)

Outros 1007 (43,5) 903 (44,1) 104 (38,7) 0,09

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Variáveis/Categorias N total = 2341

n (%)

Idosos jovens

n (%)

Idosos

longevos

n (%)

p

Escolaridade (em anos)

4 anos ou mais 1374 (58,7) 1240 (60,0) 134 (49,1)

Até 3 anos 965 (41,3) 826 (40,0) 139 (50,9) 0,001

Estado civil

Casado 1181 (50,5) 1083 (52,5) 98 (35,9)

Solteiro (viúvo, divorciado,

solteiro)

1156 (49,5) 981 (47,5) 175 (64,1) < 0,001

Arranjo da moradia

Não mora sozinho 2011 (86,2) 1794 (87,0) 217 (79,8)

Sozinho 323 (13,8) 268 (13,0) 55 (20,2) 0,001

Trabalha atualmente

Sim 386 (16,6) 356 (17,3) 30 (11,1)

Não 1941 (83,4) 1701 (82,7) 240 (88,9) 0,01

Número de doenças médicas autorrelatadas

Até 1 790 (34,1) 685 (33,4) 105 (39,0)

Duas ou mais 1529 (65,9) 1365 (66,6) 164 (61,0) 0,07

Avaliação da saúde geral

Muito boa e boa 853 (36,9) 746 (36,5) 107 (39,9)

Muito ruim e ruim 542 (23,4) 493 (24,1) 49 (18,3)

Regular 917 (39,7) 805 (39,4) 112 (41,8) 0,10

Autopercepção da saúde comparada com outros da mesma idade

Pior 152 (4,6) 141 (7,0) 11 (4,2)

Igual 524 (16,0) 475 (23,6) 49 (18,9)

Melhor 1594 (79,4) 1395 (69,4) 199 (76,8) 0,04

Presença de fragilidade

Pré-frágil e não frágil 2177 (93,0) 1947 (94,1) 230 (84,2)

Frágil 164 (7,0) 121 (5,9) 43 (15,8) < 0,001

Fumante atualmente

Não 2109 (85,8) 1855 (90,7) 254 (94,4)

Sim 349 (14,2) 190 (9,3) 159 (5,6) 0,04

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Variáveis/Categorias N total = 2341

n (%)

Idosos jovens

n (%)

Idosos

longevos

n (%)

p

Já consumiu bebidas alcoólicas

Nunca 1579 (69,1) 1385 (68,6) 194 (72,7)

Outros 707 (30,9) 634 (31,4) 73 (27,3) 0,18

Quantidade de medicamentos que faz uso

Até 1 546 (27,6) 478 (27,4) 68 (28,9)

2 ou mais 1432 (72,4) 1265 (72,6) 167 (71,1) 0,63

Verificou-se que nos dois grupos, a maioria dos indivíduos da amostra procurou o

serviço odontológico privado ou possuía algum tipo de convênio (72,4%). Entre idosos mais

jovens e idosos longevos, foi observado que 62,6% e 67,7%, não frequentaram o dentista no

último ano pesquisado, respectivamente (tabela 2). Quanto à autopercepção de saúde bucal,

verificou-se que nos 2 grupos de idosos aproximadamente 70% dos mesmos considerou a

saúde bucal como boa ou ótima. Problemas relacionados à capacidade mastigatória

autopercebida entre idosos longevos, como dificuldade para mastigar e engolir alimentos; e

dificuldade ou dor para mastigar comida dura foram relatados por 20,2% e 43,1% dessa

amostra respectivamente (tabela 2).

Tabela 2 – Distribuição e frequência das características segundo indicadores de acesso a

serviços odontológicos, autopercepção de saúde bucal e condições funcionais da alimentação,

segundo o desfecho, longevidade. Estudo FIBRA, 2008-2009.

Variáveis/Categorias N total =2341

n (%)

Idosos

jovens

n (%)

Idosos

longevos

n (%)

p

Rede de serviços de saúde odontológico

SUS 834 (27,6) 748 (38,7) 86 (35,0)

Particular/Convênio 2181 (72,4) 1187 (61,3) 160 (65,0) 0,26

Frequência no dentista (últimos 12 meses)

Uma vez ou mais 840 (36,8) 755 (37,4) 85 (32,3)

Nunca 1441(63,2) 1263 (62,6) 178 (67,7) 0,11

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Variáveis/Categorias

N total =2341

n (%)

Idosos

jovens

n (%)

Idosos

longevos

n (%)

p

Motivo de não ir ao dentista

Não precisou 713 (58,7) 618 (58,2) 95 (62,1)

Não quis ir/dificuldade para

conseguir a consulta ou para ir

502 (41,3) 444 (41,8) 58 (37,9) 0,36

Presença de dente natural

Sim 1234 (53,5) 1123 (55,1) 111 (41,4)

Não 1071 (46,5) 914 (44,9) 157 (58,6) < 0,001

Uso de dentadura (prótese)

Sim 1717 (75,3) 1505 (75,0) 212 (80,9)

Não 562 (24,7) 502 (25,0) 60 (19,1) 0,03

Dentadura machuca ou cai

Não 1298 (73,9) 1139 (74,0) 159 (73,3)

Sim 458 26,1) 400 (26,0) 58 (26,7) 0,82

Alimenta-se com dentadura (prótese)

Sim 1587 (91,5) 1394 (91,7) 193 (90,2)

Não 147 (8,5) 126 (8,3) 21 (9,8) 0,45

Dor de dente (últimos 6 meses)

Nenhuma e pouca 2043 (93,8) 1804 (93,4) 239 (96,0)

Moderada e muita 134 (6,2) 124 (6,4) 10 (4,0) 0,14

Sensação de boca seca (últimas 4 semanas)

Não 1349 (58,7) 1186 (58,5) 163 (60,8)

Sim 947 (41,3) 842 (41,5) 105 (39,2) 0,46

Presença de ferida na língua, bochecha, céu da boca ou lábio (há mais de 1 mês)

Não 2138 (93,1) 1894 (93,3) 244 (91,4)

Sim 158 (6,9) 135 (6,7) 23 (8,6) 0,23

Dificuldade para mastigar e engolir alimentos

Não 1811 (80,2) 1601 (80,2) 210 (79,8)

Sim 448 (19,8) 395 (19,8) 53 (20,2) 0,89

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Variáveis/Categorias

N total

=2341

n (%)

Idosos jovens

n (%)

Idosos

longevos

n (%)

p

Dificuldade ou dor para mastigar comida dura

Não 1456 (63,2) 1304 (64,0) 152 (56,9)

Sim 847 (36,8) 732 (36,0) 115 (43,1) 0,02

Avaliação da saúde bucal

Boa/ótima 1616 (70,4) 1429 (70,5) 187 (70,3)

Regular/ruim 678 (29,6) 599 (29,5) 79 (29,7) 0,96

A análise multivariada (tabela 3) apresentou menor prevalência de indivíduos

longevos entre as mulheres (RP=0,48, IC95% 0,37-0,62), os que não se autorrelataram

brancos (RP= 0,73, IC95% 0,57-0,95), os com 2 ou mais doenças (RP= 0,76, IC95% 0,59-

0,98) e os que fumam (RP=0,56, IC95% 0,32-0,97); e maior prevalência de idosos longevos

entre os com menor escolaridade (RP=1,47, IC95% 1,15-1,88), os solteiros (RP=2,27, IC95%

1,76-2,92) e os que não trabalham (RP=1,55, IC95% 1,06-2,28). As variáveis de saúde bucal

associadas com maior prevalência de longevidade foram o autorrelato de não possuir dentes

naturais (RP= 1,46, IC95% 1,14-1,87) e de dificuldade ou dor ao mastigar comida dura (RP=

1,34, IC95% 1,05-1,70).

Tabela 3 – Resultado final da análise multivariada bruta e ajustada das variáveis associadas à

longevidade (≥80 anos) e respectivo intervalo de confiança a 95%. Estudo FIBRA, 2008-2009.

Variáveis/Categorias RP Bruta

(IC 95%)

p

RP Ajustada

(IC 95%)

p

Sexo

Masculino 1,0 1,0

Feminino 0,78 (0,62 – 0,97) 0,03 0,48 (0,37 – 0,62) <0,001

Grupo étnico

Branco 1,0 1,0

Outros 0,82 (0,65 – 1,03) 0,09 0,73 (0,57 – 0,95) 0,017

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Variáveis/Categorias

N total =2341

n (%)

Idosos

jovens

n (%)

Idosos longevos

n (%)

p

Escolaridade (anos)

4 anos ou mais 1,0 1,0

Até 3 anos 1,00 (1,18 – 1,84) <0,001 1,47 (1,15 – 1,88) <0,002

Estado civil

Casado 1,0 1,0

Solteiro (viúvo, divorciado,

solteiro)

1,82 (1,44 – 2,30) <0,001 2,27 (1,76 – 2,92) <0,001

Trabalha atualmente

Sim 1,0 1,0

Não 1,59 (1,11 – 2,29) 0,01 1,55 (1,06 – 2,28) 0,025

Número de doenças médicas autorrelatadas

Até 1 1,0 1,0

2 ou mais 0,81 (0,64 – 1,01) 0,06 0,76 (0,59 – 0,98) 0,036

Fumante atualmente

Não 1,0 1,0

Sim 0,61 (0,37 – 1,00) 0,05 0,56 (0,32 – 0,97) 0,039

Presença de dente natural

Sim 1,0 1,0

Não 1,63 (1,30 – 2,05) <0,001 1,46 (1,14 – 1,87) 0,003

Dificuldade ou dor ao mastigar comida dura

Não 1,0 1,0

Sim 1,30 (1,04 – 1,63) 0,02 1,34 (1,05 – 1,70) 0,017

Referência do desfecho: idosos mais jovens (65-79 anos)

DISCUSSÃO

Os achados deste estudo sugerem que ausência de dentes naturais e dificuldade ou dor

para mastigar comida dura estão relacionados à idade mais avançada, sendo mais prevalente

nos idosos longevos que nos idosos jovens. O fato dos idosos mais velhos apresentarem maior

prevalência de perda dentária possivelmente está relacionado com a exposição dos dentes por

mais tempo na cavidade bucal, já que a sequela das doenças bucais tem caráter cumulativo, e

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apresenta como desfecho final a perda dentária. Ainda estudos brasileiros têm demonstrado

que a situação epidemiológica da população idosa em relação ao edentulismo e ao reduzido

número de dentes naturais afeta, em especial, a qualidade de vida nesta faixa etária, podendo

refletir em uma desfavorável expectativa de vida e longevidade22-26.

Niesten, Mourik e Sanden (2012) em trabalho qualitativo caracterizando uma amostra

de 38 idosos e média de idade de 80 anos, verificaram que possuir dentes naturais esteve

associado com possuir boa saúde geral e bucal, além da obtenção de um melhor senso de

controle, conforto, aparência e funções orais27. No entanto, em nosso estudo, apesar de haver

menor número de dentes naturais em idosos longevos em relação aos idosos jovens, não foi

encontrada diferença significante na avaliação de saúde bucal entre os grupos, possivelmente

porque a ausência de dentes não interferiu na autopercepção de saúde bucal

predominantemente positiva em ambos os grupos.

A perda dentária foi ainda avaliada por Savoca e colaboradores (2010) em idosos

como um indicador de comprometimento da qualidade da dieta e no qual 35,5% da amostra

foi composta por idosos com 75 anos ou mais e representados por diferentes etnias. Segundo

os autores, o desconforto percebido pela perda de dentes pode alterar a percepção de saúde

bucal dos idosos, ao avaliarem que a mastigação não é realizada com naturalidade e conforto,

e que há necessidade de selecionar o tipo de alimento ou a forma de consumi-lo, por meio de

estratégias que facilitem a ingestão28.

Quanto à mastigação, poder-se-ia pensar na relação entre maior tempo de exposição

com maior número de perdas afetando a mastigação. Entretanto, o resultado sugere que a

dificuldade de mastigação de alimentos duros pode estar associada às alterações que ocorrem

na função do sistema estomatogmático com o envelhecimento29, pela perda de tônus e de

força muscular orofacial, dificultando o controle do bolo alimentar12. No presente estudo,

idosos relataram dificuldade ou dor ao mastigar comida dura. A mudança no padrão alimentar

também pode acarretar uma atrofia da musculatura mastigatória, repercutindo na estética

facial e autoestima do idoso, além de comprometer a própria longevidade30.

Em outro estudo, a perda de dentes foi associada à diminuição da capacidade de

mastigar e deglutir adequadamente o alimento, tendo como consequência o comprometimento

da saúde geral e o bem-estar do indivíduo, verificado pela mudança de uma dieta saudável

para uma dieta com predominância de carboidratos e alimentos menos consistentes, que não

possuem os nutrientes adequados às necessidades dos idosos30. No entanto, no presente

estudo, os idosos longevos apresentaram menor prevalência de duas ou mais doenças médicas

autorrelatadas em relação aos idosos jovens, com resultado estatisticamente significante. Este

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comprometimento da saúde geral devido às comorbidades, relatadas pelo número de doenças

médicas autorreferidas pode ocorrer por diversos fatores, e a ausência de dentes e ou a

dificuldade para mastigar deve ser avaliada neste contexto.

O estudo entre longevos japoneses verificou que a dentição inadequada devido à perda

dos dentes pode afetar o comportamento alimentar, incluindo mastigação e escolha dos

alimentos, fazendo com que os indivíduos reduzissem substancialmente o consumo de frutas,

verduras e outros nutrientes essenciais31. Esses achados também puderam ser vistos por Chen

et al, (2013), onde idosos longevos e aqueles no final da vida, apresentaram menor capacidade

de mastigação dos alimentos, fazendo-a por partes32. Tanto a perda de dentes quanto a

dificuldade para mastigar foram relatados por idosos longevos.

Wiener et al, (2010), verificaram que na amostra composta por idosos com média de

78 anos, 11,1% apresentavam dificuldade para mastigar comida dura dentre aqueles que

apresentavam hiposalivação, enquanto aqueles que possuíam xerostomia, esse percentual era

de aproximadamente 17%30. O presente estudo não encontrou associação entre a xerostomia e

a longevidade, no entanto, pode constatar que entre idosos mais jovens a sensação de boca

seca foi representada por aproximadamente 42%, enquanto nos idosos longevos foi 40%.

Os achados sociodemográficos, deste estudo caracterizaram a amostra de idosos

longevos, apresentando maiores prevalências entre caucasianos22,28-32, solteiros, com baixa

escolaridade25,26,28-32, ausência de trabalho29-32, reproduzindo o padrão dos idosos em geral dos

estudos na literatura, porém no presente estudo foram características significantes no grupo

dos idosos longevos. Este perfil sócio demográfico pode subsidiar programas de promoção de

saúde direcionados a grupos de idosos longevos.

O presente estudo apresenta limitações. Ao considerar a metodologia do FIBRA em

que foi almejada a variável fragilidade, foram analisados somente os idosos que não

apresentavam déficit cognitivo. Com relação aos indicadores de saúde geral uma

característica encontrada em relação aos idosos participantes deste estudo foi maior número

de doenças médicas autorrelatadas. Estes dados podem ser acompanhados como viés amostral

já que o estudo utiliza uma população específica em estudo seccional e em idosos. Além

disso, a literatura ainda possui reduzido número de trabalhos que abordem a saúde bucal em

idosos longevos, portanto, a discussão é pautada em trabalhos que abordaram a população

idosa de uma forma geral, porém alguns dos estudos apresentaram amostra com idade média

elevada. Quanto ao delineamento seccional do presente estudo, este não permite estabelecer

relações temporais de causa e efeito entre a saúde bucal dos idosos longevos e a capacidade

mastigatória consideradas. Apesar de ser um resultado esperado pelo efeito cumulativo das

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doenças bucais, este estudo tem mérito por estudar a saúde bucal, a nível populacional, em um

país em desenvolvimento, abordando um grande número de idosos de diferentes localidades.

No mais, a literatura, em sua grande maioria, verifica a saúde bucal através de dados clínicos

e não de autopercepção, demonstrando assim uma inconsistência entre achados que como a

redução do número de dentes naturais e a real condição de saúde bucal dos idosos.

CONCLUSÃO

Este estudo sugere que ausência de dentes naturais e dificuldade ou dor para mastigar

comida dura podem estar relacionados com longevidade. É importante salientar que os dados

obtidos foram de autorrelatos dos idosos participantes da pesquisa. Medidas que visem

proporcionar melhores condições de saúde bucal e que atendam às necessidades específicas

da população idosa, devem estar presentes para que as condições de saúde necessárias

contribuam para um envelhecimento ativo.

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2.2 ASPECTOS FUNCIONAIS DA MASTIGAÇÃO E FRAGILIDADE EM IDOSOS

DE DIFERENTES CONTEXTOS SOCIODEMOGRÁFICOS

Clarice Santana Milagres1, Luísa Helena do Nascimento Tôrres2, Anita Liberalesso Neri3,

José Leopoldo Ferreira Antunes4, Maria da Luz Rosário de Sousa5

¹Doutoranda em Odontologia (Saúde Coletiva). Faculdade de Odontologia de

Piracicaba/Universidade Estadual de Campinas, Brasil. Departamento de Odontologia Social.

2Doutora em Odontologia (Saúde Coletiva). Faculdade de Odontologia de

Piracicaba/Universidade Estadual de Campinas, Brasil. Departamento de Odontologia Social.

3Professora Titular na Faculdade de Educação da UNICAMP. Doutora em Psicologia pelo

Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Universidade Estadual de Campinas,

Faculdade de Educação, Brasil. Departamento de Psicologia Educacional.

4 Professor Titular da Faculdade de Saúde Pública da USP. Doutor em Sociologia pela

Universidade de São Paulo, Brasil. Departamento de Epidemiologia.

5Professora Titular da FOP/UNICAMP. Doutora em Odontologia (Saúde Coletiva).

Faculdade de Odontologia de Piracicaba/Universidade Estadual de Campinas, Brasil.

Departamento de Odontologia Social.

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RESUMO

Objetivo: investigar a associação de aspectos funcionais da mastigação e fragilidade em

idosos brasileiros Métodos: Participaram 2.341 idosos com 65 anos e mais, recrutados na

comunidade pelo Estudo Fragilidade em Idosos Brasileiros (FIBRA), sem déficit cognitivo e

integrantes de amostras probabilísticas de 6 cidades brasileiras selecionadas. O desfecho

fragilidade foi verificado através de 5 critérios (autorrelato de perda de peso não intencional,

fadiga/exaustão, diminuição da força de preensão manual, do nível de atividade física e da

velocidade da marcha) e dicotomizado entre frágil e não-frágil. A variável aspectos

funcionais da mastigação foi formada por um conjunto de dez questões obtidas por meio de

autorrelato, e após dicotomizada segundo o número de problemas encontrados até 2 e 3 ou

mais. Para análise estatística, foi utilizada a medida de ajuste entre os fatores contextuais; e o

desfecho fragilidade foi apresentada junto a razão de chances (OR) com seu respectivo

intervalo de confiança de 95%. A regressão logística multinível considerou seis modelos onde

os dados foram organizados hierarquicamente e todas as associações foram ajustadas sendo

removidas em sequência aquelas com menor significância estatística (p≥0,05). Resultados:

Idosos que apresentaram idade igual ou superior a 76 anos (OR=2,88), não trabalhavam

(OR=2,31), com depressão (OR=2,31), que avaliaram pior sua condição de saúde comparada

aos demais de mesma idade (OR=3,91) e possuíam três ou mais aspectos funcionais negativos

da mastigação mostraram maiores chances de apresentar fragilidade (OR=2,06; IC 95% 1,25-

3,41). Conclusão: os aspectos funcionais da mastigação foram associados à fragilidade.

ABSTRACT

Aim: to investigate the association of functional aspects of mastication and frailty in Brazilian

elderly. Methods: A total of 2.341 elderly individuals aged 65 years and over, recruited in the

community by the Fragilidade em Idosos Brasileiros Study (FIBRA), without cognitive deficit

and members of probabilistic samples from 6 cities selected countries. The frailty outcome

was verified through 5 criteria (self-report of unintentional weight loss, fatigue/exhaustion,

decrease in manual grip strength, physical activity level and walking speed) and dichotomized

between frailty and non-frailty. The variable functional aspects of mastication was formed by

a set of ten questions obtained through self report, and after dichotomized according to the

number of problems found up to 2 and 3 or more. For statistical analysis, the adjustment

measure between the contextual factors was used; And the endpoint fragility was presented

along odds ratio (OR) with its respective 95% confidence interval. The multilevel logistic

regression considered six models where the data were organized hierarchically and all

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associations were adjusted, being removed in sequence those with less statistical significance

(p≥0,05). Results: Elderly patients who were 76 years of age or older (OR=2,88) did not work

(OR=2,31), with depression (OR=2,31), who evaluated their health condition worse than the

others (OR=3,91) and had three or more negative functional aspects of mastication showed

higher odds of frailty (OR = 2.06, 95% CI, 1.25-3.41). Conclusion: functional aspects of

mastication were associated with fragility.

INTRODUÇÃO

O envelhecimento pode ser afetado por diversos fatores contribuindo para que os

idosos constituam um grupo heterogêneo, no qual há idosos robustos e idosos frágeis (Bales e

Ritchie, 2002). Com relação à fragilidade, Fried e colaboradores (2001), a conceituam como

um conjunto de sinais e sintomas originados do declínio das funções normais do corpo,

podendo apresentar aumento da vulnerabilidade a doenças. É caracterizada pela diminuição

das reservas de energia, desregulação neuroendócrina, declínio da função imune e redução da

resistência a estressores.

A fragilidade está associada a prevalência de doenças crônicas, como hipertensão

arterial, dislipidemias e artroses (Andrade et al., 2013). Destacam-se doenças bucais como a

cárie dentária e a periodontite, que quando não tratadas podem levar a perda dentária

(Andrade et al., 2013; Thomson, 2014). Em idosos a carga cumulativa das doenças bucais

resulta em significativa perda dentária, e este efeito na saúde bucal e na saúde geral

autorrelatadas é ainda pouco estudado. No entanto, o trabalho de Andrade et al. (2013),

verificou que a ausência de dentes foi importante fator na ocorrência da fragilidade,

acarretando em alterações nos hábitos alimentares devido à dificuldade de mastigação.

Observa-se na literatura que os idosos autoavaliaram sua saúde bucal como boa,

embora relatem insatisfação com a mastigação, em especial com os alimentos duros

(Östeiberg, 2002; Martins et al., 2010; Vasconcelos et al., 2012; Niesten et al., 2013; Putten et

al., 2013). Um estudo realizado em Campina Grande, na Paraíba, analisou 206 idosos, no qual

aproximadamente 54% destes referiam ter dificuldade para mastigar pelo menos um tipo de

alimento, principalmente carnes, saladas, vegetais e frutas cruas, demonstrando assim, uma

deficiência na capacidade mastigatória (Santos et al., 2015).

O modelo conceitual proposto por Castrejón-Pérez e colaboradores (2012) sobre os

aspectos da saúde bucal utilizou o estudo longitudinal Cardiovascular Health Study afim de

operacionalizar uma definição para fragilidade em idosos, e baseou-se também em princípios

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fisiológicos para tal, propondo critérios objetivos e mensuráveis para o fenômeno. Essa

definição apresenta o conceito de fragilidade como uma síndrome geriátrica capaz de ser

identificada por meio de um fenótipo que inclui componentes mensuráveis (Fried et al., 2001)

e dos quais três destes foram utilizados (social, funcional e; utilização de serviços

odontológicos e terapêuticos) neste estudo como responsáveis pelo surgimento da fragilidade.

Destaca-se o funcional, que inclui os aspectos relacionados a problemas na mastigação

acarretando em mudanças na escolha dos alimentos e na baixa ingestão de nutrientes

(Castrejón-Pérez et al., 2012), podendo ainda contribuir para o desenvolvimento de disfagia e

desnutrição (Tavares e Carvalho, 2012; Silva et al., 2015). Ressalta-se, que transformações

demográficas e epidemiológicas decorrentes do envelhecimento ainda estão em estudo,

tornando-se importante caracterizar o papel da fragilidade diante deste contexto, assim como

os fatores relacionados a ela (OMS, 2005; Mello et al., 2014).

O ineditismo do Projeto FIBRA (Fragilidade em Idosos Brasileiros), como uma

investigação multicêntrica e multidisciplinar brasileira dedicada a estudar as condições de

fragilidade idosos (Neri et al., 2013) pode contribuir para a verificação da relação entre

capacidade mastigatória autoreferida de saúde bucal e fragilidade em diferentes níveis

contextuais e individuais de idosos de seis municípios do Brasil. Logo, este trabalho possui o

objetivo de investigar a relação entre os aspectos funcionais da mastigação e a fragilidade dos

idosos da comunidade participantes.

MATERIAIS E MÉTODOS

Estudo seccional, que utilizou dados secundários do Projeto FIBRA (Fragilidade em

Idosos Brasileiros), que investiga a fragilidade e variáveis associadas em idosos residentes em

zonas urbanas de seis diferentes cidades brasileiras, no período 2008 a 2009 (Neri et al.,

2013).

O Projeto FIBRA tem por objetivo reconhecer as condições de fragilidade de idosos

brasileiros a partir de biomarcadores, indicadores sociais e psicológicos, vinculando-os a

doenças crônicas, comprometimento funcional, comprometimento cognitivo, saúde bucal e

condições de alimentação funcional e outros problemas comumente associados ao

envelhecimento. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres

Humanos da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas

(protocolo nº 208/2007) obtendo consentido pelo Comitê de Ética da Faculdade de

Odontologia de Piracicaba, protocolo n° 068/2015.

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População Alvo

A população desse estudo foi constituída por idosos de ambos os sexos, de 65 anos ou

mais, residentes em seis municípios do país: Campinas (SP), Belém (PA), Parnaíba (PI),

Poços de Caldas (MG), subdistrito de Ermelino Matarazzo, na cidade de São Paulo (SP) e

Ivotí (RS). Foram totalizados 3.478 idosos, recrutados em domicílio e submetidos à sessão

única de coleta de dados. Dessa amostra, 2.341 indivíduos não apresentaram déficit cognitivo

e, portanto, participaram do estudo.

Plano Amostral

Nas seis localidades brasileiras, escolhidas por conveniência foram selecionadas

amostras probabilísticas de idosos, baseadas em setores censitários e na localização do

domicílio, compreendendo cotas de homens e mulheres, sendo estas, proporcionais ao

tamanho da população de idosos de cada município. A distribuição etária dos sujeitos da

amostra foram de 65 a 69 anos, 70 a 74, 75 a 79 e 80 ou mais.

O plano amostral estabeleceu que o tamanho mínimo da amostra estimada para

Campinas e Belém (localidades com mais de 1 milhão de habitantes) deveria ser 601 idosos,

com erro amostral de 4%. Para as demais cidades com menos de 1 milhão de habitantes, a

estimativa foi no mínimo, de 384 idosos, com um erro amostral de 5%. No município de Ivoti,

cuja população era menor, foram contabilizados todos os idosos (n=646). Nesse caso, o

cálculo amostral utilizado foi de estimativa de uma proporção em uma população finita com

α=5%, erro amostral de 5% e 50% para a distribuição da variável em estudo. Por esses

parâmetros, a amostra de Ivoti foi de em 235 idosos. Informações detalhadas sobre a seleção

dos participantes, a coleta e o protocolo encontram-se descritos no estudo de Neri e

colaboradores (2013).

Os critérios de exclusão para a seleção da amostra do Estudo FIBRA foram: presença

de problemas de memória, atenção, orientação e comunicação sugestiva de déficit cognitivo

(avaliada pelo MEEM – Mini Exame do Estado Mental, com notas de corte baseados nos

critérios sugeridos pela Academia Brasileira de Neurologia, com base em Brucki et al, em

2003, menos um desvio padrão), incapacidade permanente ou temporária para andar, perda

localizada de força, afasia decorrente de acidente vascular encefálico (AVE),

comprometimento da fala, da motricidade ou da afetividade, decorrente a doença de

Parkinson avançada, déficit auditivo ou visual grave e presença de estágio terminal.

Em relação às notas de corte utilizadas para exclusão pelo MEEM utilizou-se 17

pontos para os analfabetos; 22 para idosos com escolaridade entre 1 e 4 anos; 24 para os com

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escolaridade entre 5 e 8 anos e 26 para os que tinham 9 anos ou mais anos de escolaridade. A

opção por tais notas de corte, também adotada por Fried et al. (2001) e Bandeen-Roche et al.

(2006), foi feita porque déficits cognitivos poderiam prejudicar a confiabilidade das respostas

de autorrelato.

Quanto aos critérios de inclusão da amostra do Estudo FIBRA, foram selecionados

idosos com 65 anos ou mais, de ambos os sexos, residentes permanentes no domicílio e no

setor censitário, sem déficit cognitivo, capazes de se comunicar, entender instruções e que

concordassem em participar nas fases da pesquisa. O tamanho da amostra foi de 2.341

indivíduos. Na aplicação dos questionários, os informantes poderiam ser os próprios idosos ou

um familiar residente no domicílio.

Para a classificação de fragilidade, foram utilizados os cinco critérios de Fried et al.

(2001): perda de peso não intencional, exaustão/fadiga, força de preensão manual (fraqueza

muscular), nível de atividade física (sedentarismo) e baixa velocidade da marcha. O idoso

considerado frágil foi aquele que apresentou três ou mais destes critérios, pré-frágil quando

apresentou um a dois critérios e, não-frágil (ou robusto) quando não apresentou em nenhum

dos cinco critérios estabelecidos (Fried et al., 2001). A variável fragilidade, desfecho deste

estudo, foi posteriormente dicotomizada em frágil e não frágil, sendo as categorias pré-frágil e

robusto agrupadas.

Coleta de Dados

A coleta de dados ocorreu de setembro de 2008 a junho de 2009, em uma sessão única

com 40 a 120 minutos de duração, a partir da assinatura do Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido (TCLE). Os questionários de identificação, de dados sociodemográficos e o do

MEEM foram aplicados em sequência, assim como as demais medidas de saúde geral, saúde

bucal e aspectos funcionais da mastigação autopercebidas dos idosos incluídos neste estudo

(Figura 1).

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Figura 1: Esquema dos Aspectos Funcionais da Mastigação e da Saúde Bucal em idosos fragilizados, adaptado

de Castrejón-Pérez et al, em 2012, identificando as variáveis do presente estudo (*)

Ao final da coleta de dados, o Estudo FIBRA contou com 3.073 idosos voluntários que

participaram da primeira parte do protocolo, sendo que mais de 2/3 (2.341) dos idosos

responderam-no por completo, havendo uma perda de 730 indivíduos (31,16%).

Variáveis do estudo

A variável fragilidade, dicotomizada em frágil e não frágil, foi o desfecho deste

trabalho. Em relação aos aspectos funcionais da mastigação, foi utilizado um instrumento

formado por dez questões dicotômicas (com possibilidade de resposta “sim” e “não”):

dificuldade para mastigar e engolir alimentos, mudanças no paladar ou dificuldades para

perceber e diferenciar sabores, dificuldade ou dor para mastigar comida dura, dificuldade ou

dor para engolir, sensação de alimento parado ou entalado, retorno do alimento da garganta

para a boca, pigarro depois de comer alguma coisa, engasgos ao se alimentar ou ingerir

líquidos, necessidade de tomar líquido para ajudar a engolir os alimentos e uso de remédios

para aliviar a dor de dentes (Bellini, 2006). A partir deste instrumento, criou-se uma nova

variável considerando a presença de respostas “sim”, sendo que cada sim representava um

tipo de problema ou dificuldade em algum dos aspectos funcionais da mastigação. Assim, foi

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feita a dicotomização desta nova variável em duas categorias, segundo o número de

problemas encontrados: até 2 e 3 ou mais.

Além da variável independente aspectos funcionais da mastigação, avaliou-se para

controle as demais variáveis de associação identificados na figura 1.

As variáveis independentes foram representadas pelos dados demográficos,

socioeconômicos, comportamentais, de saúde geral e saúde bucal; e aspectos funcionais da

mastigação, no qual foram divididos nos blocos 1 (variáveis demográficas e

socioeconômicas), 2 (variáveis comportamentais e de saúde geral), 3 (variáveis de saúde

bucal) e 4 (variáveis aspectos funcionais da mastigação).

- Variáveis demográficas e socioeconômicas: sexo (masculino e feminino), idade (65 a

75 e mais de 76 anos), grupo étnico (branco e outros), renda pessoal em salários mínimos

(menor e maior ou igual a um), escolaridade em anos (menor e maior ou igual a 4), chefia

familiar (sim e não).

A variável idade foi coletada através da questão “qual a sua idade” de forma contínua

e posteriormente foi dicotomizada em 65-75 anos e 76 anos ou mais. A raça auto relatada foi

estratificada em 4 categorias: branca; preta; parda/mulata/cabocla; e outras (amarela, oriental

e indígena). Esta última categoria continha apenas 1,9% dos indivíduos, sendo que nenhum

era frágil, e, portanto, não foi possível considerar esta variável na análise.

Quanto à escolaridade, esta variável foi reagrupada (até 3 anos e 4 anos ou mais),

sendo obtida a partir dos seguintes itens: sem escolaridade formal, 1 a 3, 4 a 8, 9 a 11 e 12 e

mais anos de estudo.

- Variáveis comportamentais e de saúde geral: consome bebidas alcoólicas (sim e

não), fuma (sim e não), frequência no dentista nos últimos doze meses (uma vez ou mais e

nunca), número de doenças médicas autorrelatadas (até uma e duas ou mais) que, segundo o

idoso, foram diagnosticadas por médico no último ano anterior à entrevista, presença de

depressão (sim e não) e autopercepção da saúde comparada com outros da mesma idade (pior,

igual e melhor).

A avaliação presença de depressão foi dicotomizada pela pontuação avaliada pela

Escala de Depressão Geriátrica (EDG-15), que verifica os sintomas depressivos e o estado

socioafetivo do idoso, com domínios que compreendem humor, sintomas somáticos,

interações com outros indivíduos e funcionamento motor com ponto de corte igual a seis

(Almeida e almeida, 1999).

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- Variáveis de saúde bucal: sensação de boca seca (nas últimas quatro semanas),

dentadura machuca ou cai, dentes naturais, autopercepção da saúde bucal (ruim/regular e boa

ótima), presença de ferida na língua, bochecha, céu da boca ou lábio (há mais de um mês).

Análise dos Dados

O programa utilizado para a análise estatística foi o Stata 12 (Stata Corporation,

College Station, TX). A medida de ajuste entre os fatores individuais e o desfecho foi a razão

de chances (OR) com seu respectivo intervalo de confiança de 95% (IC95%), estimados por

meio de análise de regressão logística múltipla, usando o modelo de efeitos fixos. Este

modelo permite avaliar o possível efeito das variáveis explicativas sobre a fragilidade,

levando em consideração a estrutura da amostra, que foi composta com idosos residentes em

seis cidades. Inicialmente procurou-se avaliar o efeito das variáveis contextuais, renda

nominal mediana e taxa de alfabetização (Sidra IBGE, 2010) dos municípios incluídos neste

estudo. Porém, esta análise não se mostrou viável, em função da pequena diferença de valores

observados para essas variáveis entre os municípios do estudo.

A regressão logística multinível considerou, após avaliação dos possíveis efeitos das

variáveis contextuais, seis modelos ajustados, organizados hierarquicamente, sendo o modelo

vazio sem a presença de fatores; o modelo 1 incluiu as variáveis demográficas; o modelo 2

controlou para as variáveis socioeconômicas e demográficas; o modelo 3 para variáveis

comportamentais, socioeconômicas e demográficas; o modelo 4 para variáveis de saúde geral,

comportamentais, socioeconômicas e demográficas e o modelo final, incluiu as variáveis de

saúde bucal ajustadas pelas anteriores mencionadas. Dessa forma, todas as associações foram

ajustadas pelas variáveis posicionadas no mesmo bloco e nos níveis anteriores do modelo

hierárquico, sendo removidas em sequência as variáveis com menor significância estatística

quando apresentassem p≥0,05. A comparação dos modelos construídos acorreu através da

verificação do loglikelihood, que é um indicador da qualidade de ajuste do modelo ao se

inserir variáveis explicativas.

RESULTADOS

De acordo com a tabela 1, dos idosos pesquisados, havia maior proporção de mulheres

(65,6%). Observou-se predomínio da faixa etária de idosos jovens (73,7%), onde a média da

idade da amostra foi de 72,3 anos (DP=±5,48). Da amostra total, a maioria (56,5%) declarou-

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se branca. Apenas 16,6% da amostra relatou ainda trabalhar. Predominaram idosos com

escolaridade acima de 4 anos (58,7%) e chefes de família (63,7%) (tabela 1). Também

relataram, em sua maioria (63,2%), não ter consultado no último ano com dentista (tabela 1).

Ainda, a média de problemas funcionais da mastigação foi de 1,7 (DP=±1,83) e

aproximadamente 26% da amostra apresentou 3 ou mais problemas funcionais negativos da

alimentação. A análise final deste estudo contou com dados completos das variáveis

pesquisadas de 164 idosos frágeis, representando 7% da amostra total de idosos.

Tabela 1: Característica da amostra. FIBRA, 2008 e 2009.

Variáveis Categorias n (%)

Blo

co 1

Demográfica

Sexo Feminino 1537 (65,6)

Masculino 806 (34,4)

Idade ≥76 anos 616 (26,3)

65-75 1.726 (73,7)

Raça

Outros

(Amarela/Oriental

/Indígena)

44 (1,9)

Branca 1310 (56,5)

Preta 200 (8,6)

Parda/Cabocla/Mulata 765 (33,0)

Socioeconômica

Renda pessoal ≤1SM 1073 (45,8)

>1SM 1270 (54,2)

Trabalha atualmente Não 1942 (83,4)

Sim 386 (16,6)

Escolaridade < 4 anos 966 (41,3)

≥ 4 anos 1374 (58,7)

Chefia familiar Não 849 (36,3)

Sim 1488 (63,67)

Blo

co 2

Comportamental

Consome bebidas alcoólicas Sim 707(30,9)

Não 1581 (69,1)

Fuma Sim 205 (8,9)

Não 2111 (91,1)

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Variáveis Categorias n (%)

Comportamentais

Frequência de consulta ao dentista Nunca 1443 (63,2)

≥ 1 vez 840 (36,8)

Saúde Geral

Doenças crônicas ≥ 2 1530 (65,9)

< 2 791 (34,1)

Depressão - EDG Sim 467 (22,1)

Não 1643 (77,9)

Avaliação da saúde comparada com outros da

mesma idade

Melhor 1594 (70,2)

Igual 526 (23.1)

Pior 152 (6.7)

Blo

co 3

Saúde Bucal

Boca seca Sim 948 (41,3)

Não 1350 (58,7)

Dentadura machuca ou cai Sim 459 (26,1)

Não 1299 (73,9)

Dente natural Não 1072 (46.5)

Sim 1235 (53,5)

Avalia de Saúde Bucal Ruim/regular 680 (29,6)

Boa/ ótima 1616 (70,4)

Ferida língua, bochecha, céu da boca ou lábio Sim 158 (6,9)

Não 2140 (93,1)

Aspectos funcionais mastigação

0 772 (33,4)

1-2 941 (40,7)

3 - 10 598 (25,9)

Desfecho

Fragilidade Frágil 164 (7)

Não frágil 2179 (93)

A tabela 2 apresenta a relação entre saúde bucal e os aspectos funcionais da

mastigação autorelatados com a fragilidade. Todas as variáveis, com exceção de "engasgos

para se alimentar ou ingerir líquidos" e "uso de remédios para aliviar a dor de dente" não

estiveram relacionados com a fragilidade.

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Tabela 2: Distribuição quanto a saúde bucal, aspectos funcionais da mastigação e fragilidade,

FIBRA, Brasil, 2008 e 2009.

Variáveis Não frágil

Frágil

n (%) n (%) p-valor

Saúde Bucal

Boca seca Sim 1276 (59,7) 87 (54) 0,001

Dentadura machuca Sim 410 (25,1) 49 (40,2) <0,001

Dente natural Não 980 (45,7) 92 (56,8) 0,006

Avalia de saúde bucal Ruim/regular 613 (28,7) 67 (41,6) 0,001

Ferida língua Sim 138 (6,5) 20 (12,4) 0,004

Aspectos funcionais da mastigação Até 2 882 (41) 59 (36,4) <0,001

3 - 10 524 (24,4) 74 (45,7)

Aspectos funcionais da mastigação

Dificuldade para mastigar e engolir

comida dura

Sim 154 (16) 236 (20,7) <0,001

Mudança no paladar ou dificuldade para

perceber e diferenciar sabores

Sim 339 (15,8) 53 (32,7) <0,001

Dificuldade ou dor para mastigar comida

dura

Sim 762 (35,5) 86 (53,4) <0,001

Dificuldade ou dor para engolir Sim 167 (7,8) 34 (21) <0,001

Sensação de alimento parado ou entalado Sim 387 (18) 53 (32,7) <0,001

Retorno do alimento da garganta para a

boca

Sim 191 (8,9) 24 (14,8) 0,013

Pigarro depois de comer alguma coisa Sim 326 (15,2) 39 (24,1) 0,003

Engasgos ao se alimentar ou ingerir

líquidos

Sim 393 (18,3) 37 (22,8) 0,150

Necessidade de tomar líquido para ajudar

a engolir o alimento

Sim 404 (18,8) 61 (37,7) <0,001

Uso de remédios para aliviar dor de

dente

Sim 108 (5,1) 08 (5) 0,970

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A tabela 3 apresenta a análise bruta, onde idosos com condição bucal mais

desfavorável apresentaram maior chance de serem frágeis, além de piores avaliações de saúde

geral, condições socioeconômicas e idade avançada.

Tabela 3: Análise não ajustada (bruta) e razão de chances da presença de fragilidade em

idosos de acordo com variáveis sociodemográficas, comportamentais, de saúde geral e saúde

bucal. FIBRA, Brasil, 2008 e 2009.

Variáveis Categorias Frágil n (%) OR IC 95% p

Demográficas

Sexo Feminino 111 (67,68) 1,11 0,79-1,56 0,54

Idade ≥76 anos 78 (47,56) 2,76 2,00-3,82 <0,001

Socioeconômicas

Renda pessoal ≤1SM 88 (53,66) 1,38 0,10-1,90 0,05

Trabalha atualmente Não 150 (92,02) 2,44 1,37-4,36 0,003

Escolaridade < 4 anos 88 (53,99) 1,72 1,25-2,38 0,001

Chefia familiar Não 74 (45,40) 1,52 1,10-2,09 0,01

Comportamental

Consome bebidas alcoólicas Sim 30 (19,23) 0,51 0,34-0,77 0,001

Fuma Sim 20 (12.35) 1,54 0,94-2,52 0,09

Frequência consulta dentista Nunca 114 (70,81) 1,40 0,98-2,00 0,06

Saúde geral

Doenças crônicas 2 ou mais 124 (76,54) 1,76 1,21-2,56 0,003

Depressão - GDS Sim 72 (47,06) 3,52 2,51-4,94 <0,001

Avaliação da saúde comparada

com outros da mesma idade

Igual 38 (24,36) 1,42 0,95-2,11 0,08

Pior 35 (22,44) 5,42 3,49-8,41 <0,001

Saúde Bucal

Boca seca Sim 87 (54,04) 1,75 1,27-2,42 0,001

Dentadura machuca Sim 49 (40,16) 2,01 1,38-2,94 <0,001

Dente natural Sim 92 (56,79) 1,61 1,16-2,23 0,004

Avalia SB Ruim/Regular 67 (41,61) 1,77 1,27-2,46 0,001

Ferida língua Sim 20 (12,42) 2,11 1,28-3,49 0,003

Aspectos funcionais da

mastigação

1-2 59 (36,42) 1,70 1,08-2,69 0,02

3 - 10 74 (45,68) 3,57 2,28-5,57 <0,001

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No modelo final (tabela 4), verificou-se que a variável trabalha atualmente se manteve,

representando maior chance de fragilidade os que não estavam ativamente no mercado de

trabalho. A escolaridade em anos e a chefia familiar perderam significância com a introdução

do bloco de variáveis comportamentais.

No modelo final, há maior chance de serem frágeis os idosos com maior idade

(OR=2,88, IC95% 2,01-4,13), os que não trabalhavam mais (OR=2,31, IC95% 1,18-5,53), os

deprimidos (OR= 2,31, IC95% 1,58-3,38) e os que auto avaliaram como pior sua saúde geral

quando comparada aos demais da mesma idade (OR=3,91, IC95% 2,39-6,40).

Ainda no modelo final, foi verificado que em relação à saúde bucal e os aspectos

funcionais da mastigação, o relato de possuir três ou mais problemas quanto aos aspectos

funcionais negativos da mastigação também se associou com maior chance de ser frágil (OR=

2,06, IC95% 1,25-3,41), mesmo após realizado o controle pela idade, trabalho, depressão e

avaliação de saúde bucal.

A medida de qualidade do ajuste do Loglikelihood demonstra o ajuste das variáveis

explicativas quanto ao desfecho, reduzindo-se ao se introduzir um novo bloco. Assim, o

modelo final parece ser o mais efetivo para explicar a associação com fragilidade.

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Tabela 4: Regressão logística multivariada dos fatores individuais associados à fragilidade em idosos de 6 municípios do Brasil. FIBRA, 2008 e 2009

Variáveis Modelo

Vazio

Modelo1 Modelo2 Modelo 3 Modelo 4 Modelo Final

Individuais OR(IC95%) OR(IC 95%) OR(IC 95%) OR(IC 95%) OR(IC 95%)

Demográficas Bloco 1

Sexo Feminino 1,15(0,81-1,62)

Idade ≥76 anos 2,78(2,01-3,83) 2,53(1,82-3,52) 2,69(1,91-3,78) 2,89(2,02-4,14) 2,88(2,01-4,13)

Socioeconômicas Bloco 2

Renda pessoal ≤1SM 1,05(0,73-1,50)

Trabalha

atualmente

Não 2,14(1,16-3,94) 1,89(1,02-3,49) 2,32(1,19-4,55) 2,31(1,18-4,53)

Escolaridade < 4 anos 1,43(1,02-2,01) 1,37(0,97-1,93)

Chefia familiar Não 1,41(0,99-2,00) 1,42(1,01-2,00)

Comportamental Bloco 3

Consome bebidas

alcoólicas

Sim 0,62(0,41-0,95)

Fuma Sim 1,79(1,05-3,05)

Frequência consulta

dentista

Nunca 1,22(0,84-1,79)

Saúde geral Bloco 4

Doenças crônicas 2 ou mais 1,25(0,83-1,88)

Depressão - GDS Sim 2,63(1,82-3,81) 2,31(1,58-3,38)

Avaliação da saúde

comparada com

outros da mesma

idade

Igual 1,45(0,95-2,21) 1,38(0,90-2,11)

Pior 4,16(2,54-6,80) 3,91(2,39-6,40)

Saúde Bucal Bloco 5

Boca seca Sim

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OR: Odds Ratio; IC95%: intervalo de confiança de 95%.

Variáveis Modelo

Vazio

Modelo1 Modelo2 Modelo 3 Modelo 4 Modelo Final

Saúde Bucal Bloco 5

Dentadura machuca Sim

Dente natural Sim

Avalia saúde bucal Pior

Ferida língua Sim

Aspectos funcionais

da mastigação

1-2 1,30(0,79-2,14)

3 - 10 2,06(1,25-3,41)

Loglikelihood -593.42

991

-574.70502 -556.64586 -520.91563 -468.34117 -464.0598

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DISCUSSÃO

Foi verificado neste estudo, que é um dos mais amplos da literatura brasileira que

busca compreender o papel da saúde bucal na fragilidade entre idosos revelou que 3 ou mais

aspectos funcionais negativos da mastigação estiveram relacionados com maior chance dos

idosos serem frágeis. As variáveis contextuais renda nominal mediana e taxa de alfabetização

dos municípios incluídos neste estudo não interferiram no resultado final, em função da

pequena diferença de valores observados para essas variáveis entre os municípios do estudo.

Estudos relacionando os aspectos funcionais da mastigação em idosos,

constataram que cerca de 40% destes indivíduos possuíam dificuldades mastigatórias e dos

quais, cerca de 60% declararam apresentar limitações ao mastigar certos tipos específicos de

alimentos, em especial os alimentos duros (Braga et al., 2002; Tramontino et al., 2009). Em

outros estudos, Tada e Miura (2014) e Moura et al. (2016), estudaram o estado nutricional e a

dentição de idosos, verificando que a perda dentária compromete a mastigação dos alimentos

destes indivíduos, alterando os hábitos alimentares para inadequados às demandas dos idosos,

além de proporcionar um desequilíbrio nutricional, com consequente perda de peso e presença

de fadiga, critérios estes utilizados em nosso estudo sobre fragilidade. Em nosso estudo 53,4%

dos idosos frágeis relataram dificuldade ou dor para mastigar comida dura, reforçando a

importância de estudos longitudinais que investiguem essa associação.

Sobre estes dados, estudos nacionais e internacionais verificam que há alteração nos

aspectos funcionais da mastigação autorelatados, em especial, a dificuldade de mastigar

comida dura, podendo causar mudança nos hábitos alimentares (Rihs et al., 2012; Yassuda et

al., 2012; Robertson et al., 2013; Niesten et al., 2013). Como consequência, verifica-se que

estes indivíduos optam por alimentos mais fáceis de serem mastigados e deglutidos (Ahmed

et al., 2007; Bulgarelli e Manço, 2008; Rihs et al., 2012; Borrego et al., 2012) e,

consequentemente podem apresentar uma piora do seu estado nutricional (Okada et al., 2010).

Essa comparação pôde ser realizada indiretamente através da pior autopercepção de saúde

geral comparada aos demais de igual idade apresentada no presente estudo.

Ahmed e colaboradores (2007), verificaram porcentagens significantes de idosos

frágeis que autoavaliaram a saúde bucal como ruim/regular. Segundo eles, em diversos

trabalhos sobre o tema, há a associação entre a autoavaliação da saúde bucal ruim com a

fragilidade, e desta forma puderam construir um modelo conceitual acerca do “ciclo da

fragilidade”. A dificuldade de mastigação não é fator exclusivo para a ocorrência da

fragilidade e, segundo Ahmed et al. (2007), é consequência de uma série de fatores como o

aparecimento da sarcopenia, posteriormente pelas diminuições das atividades metabólica e

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físicas, culminando na redução do apetite. Assim reinicia-se o clico vicioso no qual a

diminuição na força e equilíbrio podem ser preditores da fragilidade. Acrescentam ainda que

nos idosos várias causas podem conduzir a um declínio das funções normais do corpo,

incluindo a imobilidade, diminuição do apetite, má nutrição, aumento do número de doenças

crônicas e autopercepção negativa da saúde.

Compreender o papel da saúde bucal na fragilidade dos idosos pode traduzir em

direcionamento de políticas públicas para este público em particular, entretanto as ações de

saúde permeiam a compreensão de como os idosos autopercebem sua saúde geral e saúde

bucal (Niesten et al., 2013; Pegorari e Tavares, 2014;). Neste estudo, a variável de

autopercepção de saúde bucal não foi relevante nos resultados, e sim a autopercepção de

saúde geral, no qual apresentou duas vezes mais chance de se relacionar com a fragilidade.

Entretanto, aproximadamente 42% dos idosos frágeis da amostra autoavaliou sua saúde bucal

como ruim ou regular em comparação com os não frágeis (29%). Já o trabalho de Rihs et al.

(2012), 58 idosos fragilizados, separados em dois grupos (pré-frágeis e frágeis)

autoperceberam como positiva as suas condições bucais entre os frágeis, diferente deste

estudo, que entre os idosos frágeis foi verificada pior autopercepção de saúde geral, enquanto

a autopercepção de saúde bucal não foi significante. Por outro lado, o trabalho de Neri et al.

(2015) na mesma população deste presente estudo concluiu que a saúde geral pode ter sido

autoavaliada negativamente por causa do comprometimento da qualidade de vida advinda da

vulnerabilidade social. Estes autores puderam concluir que interações negativas relacionadas

às questões estruturais, sociais e em saúde podem criar um círculo vicioso de influências

deletérias à qualidade de vida dos idosos, que tendem a se refletir em autoavaliações negativas

de saúde (Neri et al., 2015).

Não trabalhar e apresentar depressão foram variáveis associadas a fragilidade e

encontradas também no trabalho de Danielewicz et al. (2016), que verificaram uma chance de

declínio cognitivo e presença de depressão duas vezes maior entre os idosos residentes nos

setores de menor renda ou que não trabalhavam. Lexomboon et al. (2012) descobriram que

dificuldade em mastigar alimentos duros tiveram chances significativamente maiores de

depressão. Entretanto estes dois autores não associaram os dados obtidos à fragilidade. Foltyn

(2015), verifica que a pior condição de saúde bucal autopercebida contribui para diminuir a

cognição e motivação do idoso, levando-o não só a fragilidade, mas a um aumento na

morbimortalidade, além do impacto na qualidade de vida.

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Quanto nível contextual desta pesquisa, o mesmo foi avaliado utilizando a variável

cidade (nível educacional e renda), que ao final mostrou homogeneidade entre os contextos

estudados, demonstrando similaridade entre esta variável nos seis municípios investigados.

O fato deste trabalho ser um estudo transversal e os idosos já se apresentarem com

perdas dentárias, impossibilita saber sobre a relação causa-efeito com problemas funcionais

da mastigação e desde quando estes foram iniciados.

Umas das principais relevâncias deste estudo é o entendimento de como as variáveis

de saúde bucal se relacionam com a fragilidade em idosos em um estudo populacional e

multicêntrico, tendo em vista que existem poucos estudos sobre a fragilidade e a sua

caraterização nos idosos, em especial nos países da América Latina.

CONCLUSÃO

Os aspectos funcionais negativos da mastigação indicaram estar associados à

fragilidade, uma vez que a presença de 3 ou mais aspectos funcionais da mastigação

relacionou com 2 vezes mais chance de haver fragilidade entre estes idosos.

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3 DISCUSSÃO

Neste estudo, a proposta de investigar a relação entre saúde bucal auto percebida e

fragilidade em contextos sociodemográficos diversificados foi alcançado através de alguns

resultados. É sugerido que ausência de dentes naturais e dificuldade ou dor para mastigar

comida dura estão relacionados à idade mais avançada, sendo mais prevalente nos idosos

longevos que nos idosos jovens; já os aspectos funcionais negativos da mastigação indicaram

estar associados à fragilidade, uma vez que a presença de 3 ou mais aspectos funcionais da

mastigação esteve relacionada à 2 vezes mais chance de haver fragilidade entre estes idosos.

Assim, os objetivos apresentados em cada capítulo foram investigados e respondidos.

Este estudo demonstra que as condições bucais têm reflexos importantes não só para a

própria piora da condição bucal, mas também podem provocar mudanças na saúde geral dos idosos.

Em especial, nesta população, há um crescente número de publicações científicas, principalmente

devido às transições demográfica e epidemiológica, evidenciadas pelo aumento da expectativa de

vida e ao maior número de indivíduos que apresentam doenças crônicas degenerativas (Duarte

e Barrteto, 2012).

Dentre os achados relacionados à saúde bucal autopercebida, verificou-se que ausência de

dentes naturais e dificuldade ou dor para mastigar comida dura apresentaram-se associados à

longevidade. O desconforto relatado pelos idosos pela perda de dentes pode alterar suas

percepções de saúde bucal, pois ao avaliarem que a mastigação não é realizada com

naturalidade e conforto, podem recorrer à seleção de tipo e forma de consumo de algum

alimento, utilizando-se, portanto, de estratégias que possam facilitar a ingestão (Savoca et al.,

2010). Nesta tese, idosos longevos e que apresentaram menor número de dentes naturais auto

relataram dificuldade ou dor ao mastigar comida dura. Este comportamento por sua vez, pode

acarretar em uma mudança no seu padrão alimentar, e consequentemente, desencadear o

surgimento de uma atrofia da musculatura mastigatória, repercutindo na estética facial e

autoestima do idoso, além de comprometer a própria longevidade (Wiener et al., 2010).

Portanto, estes idosos podem apresentar maior número de comorbidade por diversos fatores

etiológicos - como a mudança da dieta saudável para uma com predominância de carboidratos

e alimentos menos consistentes e que não possuem os nutrientes adequados às necessidades

biológicas dos idosos - assim como comprometer seu bem-estar e sua qualidade de vida

(Wiener et al., 2010).

É importante salientar que os dados apresentados nos resultados desta tese foram

obtidos de autorrelatos dos indivíduos participantes da pesquisa, e assim a ausência de exames

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clínicos nos idosos participantes impossibilitam a comparação com o autorelato de saúde

bucal destes idosos.

Quanto à longevidade, essa temática ainda possui reduzido número de trabalhos que

façam a abordagem com a saúde bucal autorrelatada. Além disso, o delineamento transversal

do estudo não permite estabelecer relações temporais de causa e efeito entre a saúde bucal dos

idosos, a longevidade e as condições funcionais de mastigação consideradas nas análises. O

mesmo é válido para o desfecho fragilidade obtido também nos resultados.

O presente trabalho contribui na compreensão das associações da saúde bucal de

idosos em nível populacional, de um país em desenvolvimento e faz uma abordagem com

participantes de diferentes localidades.

Identificamos no presente estudo que a autopercepção negativa da saúde geral pareceu ser

um importante indicador para a ocorrência da fragilidade, enquanto entre idosos jovens e longevos

não houve divergências entre essa autopercepção da saúde, que foi melhor do que em idosos

frágeis. Neri et al. (2015) estudando a mesma população deste presente trabalho concluiu que

a saúde geral pode ter sido autoavaliada negativamente por causa do comprometimento da

qualidade de vida advinda da vulnerabilidade social, concluindo que as interações negativas

relacionadas às questões estruturais, sociais e em saúde podem criar um círculo vicioso de

influências deletérias à qualidade de vida dos idosos, que tendem a se refletir em

autoavaliações negativas de saúde. Diferente deste achado, no nosso estudo sobre longevidade

este dado não foi significativo.

Quanto à saúde bucal precária, esta é mais prevalente em idosos longevos, quando

comparado aos idosos mais jovens e os aspectos funcionais negativos da mastigação

considerados um indicador para fragilidade. Este dado de saúde bucal precária não se

associou à fragilidade em idosos da comunidade. Explorar o conhecimento sobre a

longevidade e fragilidade associados a fatores de autopercepção de saúde bucal é relevante.

No entanto, dentre as diversas pesquisas analisadas, houve predominância de estudos

transversais com relatos de autopercepção da saúde bucal da idosa sendo necessário

estabelecer critérios de uniformidade.

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4 CONCLUSÃO

Este estudo pode, através de seus resultados, sugerir que ausência de dentes naturais e

dificuldade ou dor para mastigar comida dura estão relacionados à idade mais avançada, sendo

mais prevalente nos idosos longevos que nos idosos jovens. Além disso também verificou que

os aspectos funcionais negativos da mastigação indicaram estar associados à fragilidade, uma

vez que a presença de 3 ou mais aspectos funcionais da mastigação esteve relacionada à 2 vezes

mais chance de haver fragilidade entre estes idosos.

Quanto aos aspectos funcionais da mastigação, foi verificado que a capacidade

mastigatória mostrou ser uma variável importante a ser considerada em futuros estudos que

relacionem a autopercepção da saúde bucal do idoso à longevidade e à fragilidade.

É sugerido que medidas que visam proporcionar melhores condições de saúde bucal e

que atendam às necessidades específicas da população idosa, devam estar presentes para que

as condições de saúde necessárias contribuam para um envelhecimento ativo. Além disso, este

estudo buscou compreender o papel da saúde bucal autopercebida na fragilidade dos idosos,

podendo assim contribuir no direcionamento de políticas públicas, com ações de saúde que

permeiam a compreensão e como os idosos autopercebem sua saúde geral e saúde bucal.

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*De acordo com as normas da UNICAMP/FOP, baseadas na padronização internacional Committee of Medical

Journal Editors. Abreviatura dos periódicos em conformidade com o Medline.

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ANEXO 1

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ANEXO 2

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ANEXO 3

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ANEXO 4

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ANEXO 5

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ANEXO 6