Communicare_HelenaJacob_Feminismo

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  • 7/24/2019 Communicare_HelenaJacob_Feminismo

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    Redes sociais, mulheres e corpo: um estudo da linguagem

    fitness na rede social Instagram1

    O sistema da cultura alimentao e a linguagem fitness: estudo de umabiopoltica comunicacional da opresso feminina pela imposio de padres estticos

    corporais nas redes sociais digitais de comunicao

    Resumo: Nesta comunicao analisamos a linguagem fitness nas redes sociais e oquanto os textos da cultura estruturados nesta linguagem afetam as mulheres. Aodestacar a necessidade de alimentao e exerccios para a obteno do corpo ideal, essaslinguagens, advindas do sistema cultural alimentao, acabam por impactar e oprimirmulheres, que se acham sempre desajustadas por causa dos seus corpos. Destacamosque a anlise ser de vi!s plenamente comunicativo, tendo por base te"rica a semi"ticada cultura de #uri $otman e a discusso sobre o biopoder advindo das polticas do corpo,tal como discutido por %ichel &oucault.

    Abstract: #n this communication 'e anal()e the fitness language in social net'or*s andho' the culture of structured texts in this language affect 'omen . +tressing the need todiet and exercise to achieve the ideal bod( , these languages , arising from the cultural

    po'er s(stem , eventuall( impact and oppress 'omen , 'ho are al'a(s defiled b( their

    bodies . e emphasi)e that the anal(sis 'ill be full( communicative bias , 'ith thetheoretical basis of -uri $otman semiotics of culture and the discussion of biopo'er thatresult from the bod(s policies, as discussed b( %ichel &oucault.

    Resumen: /n esta comunicaci"n se anali)a el lenguaje de la aptitud en las redessociales ( c"mo la cultura de textos estructurados en este idioma afecta a las mujeres .0aciendo hincapi! en la necesidad de una dieta ( ejercicio para lograr el cuerpo perfecto, idiomas , derivada del sistema de poder cultural , con el tiempo los golpes ( oprimen alas mujeres, que siempre estn contaminadas por sus cuerpos. 0acemos hincapi! en queel anlisis ser sesgo totalmente comunicativo, con las bases te"ricas de la semi"tica

    -uri $otman de la cultura ( la discusi"n de biopoder que resultan de las polticas delcuerpo, como se comenta por %ichel &oucault .

    1 Instagram um aplicativo gratuito para smartphones para tirar fotos,

    escolher ltros e compartilhar o resultado nas redes sociais. Alm dos

    efeitos, possvel seguir outros usurios no prprio Instagram para

    visualizar, curtir e comentar nas imagens postadas. In:

    http:!!!.techtudo.com."rartigosnoticia#$1#$%o&'ue&e&instagram.html .Acesso em 1(.$).#$1(.

    http://www.techtudo.com.br/artigos/noticia/2012/07/o-que-e-instagram.htmlhttp://www.techtudo.com.br/artigos/noticia/2012/07/o-que-e-instagram.html
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    A mulher perfeita existe e mora nas representa1es miditicas. /la ! bonita,

    inteligente, divertida, engraada, me amorosa e amante vora)2 e, al!m de todas essas

    vantagens, come pouco e tem, por causa disso e da malhao constante, um corpoescultural, perfeito. /ssa mulher existe na tev3, nas revistas, nos jornais e, hoje,

    especialmente existe e se alimenta das redes digitais, que se tornaram um ponto de

    grande inflexo do culto 4 magre)a e ao corpo ideal.

    0oje, mais do que perfeita de c!rebro, inteligente e saga), a mulher perfeita

    precisa ter o corpo perfeito. +em gordura em excesso, esbelta, com seios e quadril nos

    tamanhos adequados e sempre magra. %uito magra. 5 assim que a mdia, em todos os

    formatos nos quais tece as tramas da comunicao, se representa e se 6vende7 a imagemda mulher de corpo ideal.

    No mundo digital, cada perfil de rede social voltado para os temas alimentao e

    corpo, que comp1em a esfera do autodenominado universo fitness, costuma ser um

    exerccio de regras imposto por uma linguagem unificada de culto 4 perfeio, sendo

    que este estado ! conseguido por meio de muito esforo e cuidado com o exercitar8se e

    o comer. /videntemente, no ! de hoje que a preocupao com o corpo e sua forma

    toma conta da vida das mulheres, como pode ser observado na obra A Tirania das

    Dietas, de $ouise &oxcroft 9:;, que traa um panorama hist"rico do embate das

    mulheres com os regimes nos ?ltimos dois mil anos da nossa hist"ria.

    /ntretanto, que a facilidade de conexo digital e o alto engajamento de

    participao que as redes sociais ensejam torna a virali)ao de formatos e de regras

    alimentares ainda mais forte hoje do que acontecia nas mdias chamadas 6anal"gicas7.

    Assim, ao inv!s de termos um padro a seguir da capa da revista da moda, hoje temos

    milhares de perfis de mulheres e pessoas incrveis que sabem comer e se exercitam na

    medida certa, que devem ser exemplos de pessoas que 6fi)eram tudo certo7 e 6que t3m

    fora, f! e foco7, tudo isso com o uso de hashtags:que exploram uma obsesso corporal

    de contornos praticamente religiosos.

    # *ashtag uma palavra&chave precedida pelo sm"olo +, 'ue as pessoas

    incluem em suas mensagens. ssencialmente, ela faz com 'ue o conte-do

    do seu post sea acessvel a todas as pessoas com interesses semelhantes,

    mesmo 'ue eles n/o seam seus seguidores ou f/s. In:

    http:pt.!i0.com"log#$1)11o&'ue&sao&hashtags. Acesso em #$ demaro de #$1(.

    http://pt.wix.com/blog/2013/11/o-que-sao-hashtags/http://pt.wix.com/blog/2013/11/o-que-sao-hashtags/
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    Nesta comunicao pretendemos traar um panorama de como operam as

    estrat!gias comunicativas das linguagens do sistema cultural alimentao, destacando

    nelas as estrat!gias das redes sociais que atuam utili)ando representa1es de uma vida

    fitness, ou seja, a linguagem da comida saudvel de fa)er e de comer @ segundo os

    seguidores deste tipo de prtica.

    ueremos destacar que tais estrat!gias atuam como foras de opresso das

    mulheres em relao aos seus corpos, facilitando o aparecimento e o fortalecimento de

    dist?rbios alimentares. Bu seja2 como passamos da atuao comunicativa da capa da

    revista e do desfile na C, tipos de comunicao no geral protagoni)adas pelas famosos,

    para as redes sociais de anEnimos que, do mesmo modo que nas estrat!gias anteriores,

    se destacam pelo discurso que parece saudvel, mas que atua de modo impositivo para

    as mulheres. Fsaremos, para isso, a fora das imagens na rede social #nstagram,

    justamente por haver um paralelo facilmente definido entre tais imagens e as capas de

    revistas de outrora, sempre tendo como ponto de partida o sistema cultural alimentao,

    de onde se originam as linguagens que comunicam usando a comida como mdia @

    muitas ve)es de si pr"pria.

    As linguagens da alimentao

    G pontuamos em trabalhos anteriores 9Gacob, :; a exist3ncia de duas

    linguagens bsicas no sistema cultural da alimentao2 culinria e gastronomia. A

    culinria, relacionada 4 arte de saber co)inhar e a gastronomia, ao pra)er de degustar e

    co)inhar alimentos, sempre implicando na espetaculari)ao de tais atos, rotineiros ou

    no que sejam na prtica alimentar.

    A gastronomia tem obtido tamanho espao como linguagem do sistema cultural

    da alimentao, que defendemos a exist3ncia de uma gastronomdia, ou seja, que a

    gastronomia j opera hoje como uma mdia que independe do suporte comunicacionalutili)ado 9idem, :;. A gastronomdia atua estabelecendo vnculos diretos com seus

    consumidores, sem pressupor um veculo ou canal de comunicao institucionali)ado.

    Nesta linguagem, ainda em estudo, a comunicao se d diretamente por um dos textos

    da cultura advindos deste sistema2 chefs de co)inha, pratos, receitas.

    %as, num sistema de retroalimentao espetacular 9Debord, , a

    gastronomdia existe apenas no cenrio comunicacional contemporJneo, no qual a

    gastronomia tem obtido enorme espao miditico nas ?ltimas duas d!cadas, assim comoa alimentao, o que levou $ipovets*( a pontuar a exist3ncia doHomo gastronomicus2

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    Bs guias de co)inha e os livros de receitas que detalham os pra)eres gastronEmicosinvadem as prateleiras das livrarias. Gamais a gastronomia, os chefs, os grandesrestaurantes, os bons vinhos foram to comentados, auscultados, postos em cena

    pelas mdias. Ao mesmo tempo, o mercado 9vinho, caf!, ch, queijos, po, gua...>

    evoluiu para nveis de qualidade superior2 se os vinhos rotineiros declinam, os dequalidade progridem. /m toda parte a oferta diversifica8se em sintonia com umademanda maior de sabores variados, de frescor, de 6naturalidade7. 9$#KBC/+L-,:;;M, p. :=>.

    No cenrio da gastro8anomia, observamos uma intensa preocupao com a

    alimentao e, dela decorrente, uma obsesso com a alimentao correta e saudvel, que

    fa) bem para o corpo @ onde se insere a linguagem fitness, como pretendemos mostrar.

    Nesta interpretao precisamos pontuar que a mente da cultura, ou seja, o

    funcionamento da cultura como um organismo, capa) de se organi)ar em processoscognitivos 9$otman, , torna8se a grande responsvel pela criao dos smbolos que

    representam a alimentao na mdia, tanto enquanto linguagem gastronomia quanto

    como gastronomdia e como fitness.

    Oonsiderando8se que a mente da cultura organi)a tais processos cognitivos,

    devemos ressaltar que as opera1es comunicativas geradoras dessas linguagens @ e

    acreditamos tamb!m geradoras da linguagem fitness @ operam na ambi3ncia

    biosmiditica, o quarto bios ressaltado por %uni) +odr! 9:;;P>, uma esp!cie de quartoJmbito existencial que vai al!m da pr"pria vida, mas opera como vida e atua na esfera

    dos neg"cios e numa pretensa virtualidade, onde a experi3ncia humana ! definida como

    relao de extenso da informao e no qual o meio configura8se como parte

    inescapvel da relao mdiaQsujeito @ que se torna visceral2

    Do ponto de vista epist3mico, a ambi3ncia biosmiditica deve acelerar a implosodaquele pensamento que nos condu) 4s heranas que se consolidaram atrav!s devis1es dicotEmicas entre a nature)a e a cultura, como mecanismo de controle e

    sobreviv3ncia de uma sociedade disciplinar 9O#%#NB, :;

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    cultural, que despre)a, em geral, o valor cultural do alimento e apenas coloca em

    discusso aspectos nutritivos e corporais.

    Bbservamos ainda mais do que uma valori)ao do poder nutritivo dos

    alimentos ou do bem8estar que eles possam tra)er, um enorme destaque, at! mesmo

    obsessivo, na conquista do corpo ideal, magro e sem gordura. Nas imagens partilhadas

    no #nstagram destacam8se os corpos perfeitos, as fotos de antes e depois das donas dos

    perfis 9antes gordas, agora magras e dentro do padro>, as hashtags de incentivo e as

    palavras de cunho religioso que impelem os seguidores daquele estilo de vida a

    continuar @ como j dito, f!, fora e foco so as mais comuns de tais hashtags.

    Oertamente nesta linguagem volta8se ao estado do alimento como rem!dio,

    comum na comunicao da alimentao na sociedade Bcidental at! o s!culo R###,

    quando se deu a valori)ao da linguagem gastronEmica. / constr"i8se tamb!m uma

    sociedade de controle, de origem biopoltica 9&oucault, :;;S>, que transforma a rede

    social num aut3ntico pan"ptico, onde todos so observados por todos e todos se

    controlam 9&oucault, . +e &oucault colocou nas suas pesquisas a questo da

    %odernidade, hoje adentramos talve) o territ"rio da p"s8p"s %odernidade, no qual o

    alimento serve de texto de controle e que controla a todos.

    A diettica e o fitness

    Alimentao e sa?de esto intimamente relacionadas e a ind?stria da

    alimentao, uma das mais poderosas do mundo, sabe bem disso. Canto que usa

    benefcios 4 sa?de e o termo alimentos funcionais 9aqueles que funcionam bem para o

    organismo> como armas de mar*eting para vender e criar marcas que possam dominar o

    mercado. Kropor que ele apresente vitaminas ou fun1es a mais al!m da nutrio pode

    ser uma inverdade biol"gica, mas uma "tima arma de mar*eting. Assim, temos a comida

    boa e a comida ruim, tal qual definida por %ontanari2

    A comida no ! TboaU ou TruimU por s s"2 algu!m nos ensinou a reconhec38la comotal. B "rgo do gosto no ! a lngua, mas o c!rebro, um "rgo culturalmente 9e, porisso, historicamente> determinado, por meio do qual se aprendem e transmitemcrit!rios de valorao. Kor isso esses crit!rios so variveis no espao e no tempo2 oque em determinada !poca julgado positivamente, em outra pode mudar de carterVo que em um lugar ! considerado uma guloseima, em outro pode ser visto comorepugnante. A definio de gosto fa) parte do patrimEnio cultural das sociedadeshumanas 9%BNCANAW#, :;;M, pag.H>.

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    %esmo considerando as pondera1es do autor, hoje podemos observar uma

    homogeni)ao da construo dos textos derivadas da linguagem da comida e da

    co)inha2 por um lado h a fora da culinria e da gastronomia como linguagens da

    alimentao que fa)em parte da sobreviv3ncia humana2 por outro lado, a fora industrial

    e financeira da ind?stria dos alimentos que, aliada 4s anomalias pr"prias desses

    sistemas, como alimentos altamente industriali)ados, vo gerando a necessidade de se

    criar novas linguagens ou reestruturar aquelas antigas2 ! o que acreditamos que acontece

    com a linguagem fitness, que adentra o territ"rio daquilo que o soci"logo franc3s

    Olaude &iscler chamou de 6gastro8anomia7.

    uando abordamos o termo fitness nos referimos a um determinado modo de

    comer e de co)inhar que visa o emagrecimento eQou o ganho de massa muscular,

    especialmente entre os adeptos do fisiculturismo, comumente chamado de musculao.

    Cal linguagem, que existe desde que as dietas comearam a surgir ainda na Antiguidade

    Olssica 9&oxcroft, :;, foi denominada e potenciali)ada graas 4s redes sociais de

    compartilhamento de informa1es, especialmente o #nstagram, especiali)ado em trocas

    de imagens. Nesta rede social adeptos do universo fitness postam fotos de suas comidas,

    dietas, rotinas de treinamento fsico e, claro, fotos de seus pr"prios corpos, mostrando

    os resultados daquilo que os pr"prios usurios chamam de 6estilo de vida fitness7.

    Nesse modo de viver, usa8se o alimento como construtor do corpo perfeito. Bs

    alimentos so classificados nos seus elementos formadores2 carne ! protena, batata !

    carboidrato, verdura ! vitamina. 0 os carboidratos bons, aqueles integrais @ e os

    amados pelo fitness, como a batata8doceV e h os carboidratos ruins, como o a?car

    refinado, demoni)ado por esse estilo de vida. Xeralmente destaca8se no a preocupao

    com a sa?de daqueles que seguem esse modo de vida, mas sim com o efeito que tais

    alimentos provocam na est!tica corporal. Assim alimentam8se as obsess1es com o

    corpo, especialmente entre as mulheres. A capa de revista hoje ! um perfil de #nstagram,muitas ve)es de um anEnimo ou de um famoso que construiu a fama no mundo da

    #nternet e nas redes sociais, mais especificamente. Xeralmente fama alimentada por uma

    cultura que se alimenta iconofagicamente 9Yaitello Gr., :;;> de imagens de mulheres

    com corpos especialmente modelados para serem perfeitos. Neste caso por meio do uso

    de alimentos e ginstica.

    A obsesso pela magreza e a modelizao do corpo feminino

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    /m uma sociedade com lipofobia contuma) 9&ischler, :;;, estar um pouco

    acima do peso ! um dos maiores pecados de uma mulher e pode render in?meros

    dissabores. Fm exemplo recente ! a mat!ria do Kortal WI sobre a apresentadora e

    rep"rter do Xlobo /sporte, &ernanda Xentil, de :; de janeiro de :;

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    4 atteindre. Fne infime minorit! des femmes sont biologiquement capablesdUincarner cet id!al 9+O0$/W, :;;< V p.=I>.

    Dentro de um ambiente miditico no qual a comunicao ! constantemente

    transformada pelas tecnologias, precisamos ponderar que a alimentao vem sofrendograndes altera1es e acaba se constituindo em mais uma fonte de cobrana e de

    aprisionamento das mulheres em busca do corpo perfeito @ geralmente inacessvel 4

    grande maioria dessas pessoas, por quest1es corporais e gen!ticas.

    Assim escolhemos o #nstagram, rede social cuja principal troca comunicativa ! a

    das imagens. Kartindo do pressuposto de que vivemos numa ambi3ncia comunicativa

    biosmiditica 9+odr!, :;;:> e que no existem mais hoje as supostas fronteiras entre

    real e virtual apontadas por $ev( 9 na d!cada passada, analisar mais um objeto de

    um fenEmeno to recorrente no nosso ambiente contemporJneo miditico 8 o poder de

    influ3ncia da comunicao digital mediando comportamentos humanos na vida corporal

    @ se mostra como discusso pertinente e urgente para os caminhos da comunicao.

    +eria o &aceboo* a velha ambi3ncia das vilas, onde as pessoas se encontram

    para bater papo e bisbilhotar a vida alheia[ +eria o #nstagram o velho lbum de

    fotografias, mas agora configurado para a interatividade e o contato[ Kensando do ponto

    de vista das estrat!gias sensveis de +odr! 9:;;P>, consideramos que a atribuio de

    mais uma linguagem alimentar a um estado comunicativo do universo feminino @ o

    nome fitness, que nomeia de roupas a modos de vida @ se configura em estrat!gia

    comunicativa de excluso e at! mesmo de opresso, glorificando aqueles que dela

    fa)em uso e excluindo os que no fa)em.

    Nas dominJncias culturais da linguagem 9Ga*obson, :;; trabalhamos a ideia

    de que determinadas caractersticas atraem no discurso por se mostrarem mais presentes

    e fortes do que outras. Nesse caso, investigaremos aqui como a linguagem fitness se

    mostra atuante e at! mesmo opressora para as mulheres na converg3ncia de assuntos de

    dietas, corpo ideal, ginstica e outros temas nas redes sociais @ particulari)adas na

    comunicao imag!tica via #nstagram.

    A discusso sobre mulheres, boa forma e corpo perfeito tem como um de seus

    principais nascedouros, dentre os veculos de comunicao da mdia tradicional, as

    revistas. Oriadas inicialmente como objetos de diverso das mulheres e distrao entre

    uma tarefa feminina e outra, como cuidar da casa e dos filhos 9%ira, :;;, as revistas

    passaram, especialmente a partir da d!cada de

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    Antes mesmo desse movimento que se intensificou da d!cada de

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    apar3ncia, das realidades7, o eu de cada um de n"s ! uma entidade complexa evacilante. Fma unidade ilus"ria construda na linguagem, a partir do fluxo ca"tico em?ltiplo de cada experi3ncia individual 9+ibilia, :;;M, p.=

    Neste ambiente miditico fitness das redes sociais no emerge apenas a

    exposio natural, embora excessiva, das pessoas com relao aos seus corpos. Destaca8

    se a modeli)ao dos corpos, que se tornam mdias moldveis e mutantes a

    comunicarem pelo bem8estar, sucesso social, autoaceitaoQnegao, sucesso, dinheiro,

    dentre uma infinidade de possibilidades.

    Na sociedade do hiperconsumo pontuada por $ipovets*( 9:;;I>, o corpo existe

    tamb!m para ser consumido e no apenas para ser agente mediador e transformador da

    comunicao. B consumo se d em especial no caso do corpo feminino, desrespeitado

    hist"rica e politicamente na imensa maioria das sociedades patriarcais que se

    constituram pelo mundo.

    No sistema cultural mundial, o corpo feminino ! um texto da culturaSque deve

    ser adequado, lapidado, moldado. A mulher no pode mais envelhecer. 6Bs S; so os

    novos =;7, di) um bordo muito popular hoje. A mulher de S; precisa aparentar ter =;anos, ou at! menos, de prefer3ncia. No pode envelhecer e precisa, de qualquer modo,

    ser magra. / no ter celulite ou estrias, outros pesadelos est!ticos, como bem sinteti)a a

    charge da ilustradora argentina %aitena.

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    igura "#: &oto da modelo C'igg( para editorial da revista ogue nos em maro de

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    biopoder )ela dos processos como nascimentos e mortalidades, da sa?de da populao

    gerenciando assim, a vida dos indivduos como um todo. Assim, a biopoltica surge no

    uso que se fa) do biopoder, ou seja, gerenciando8se e modificando a vida de indivduos

    que no esto fisicamente relacionados, necessariamente.

    Assim, a linguagem fitness utili)ada no #nstagram pode ser vista como uma

    estrat!gia comunicativa de origem biopoltica, pois visa gerenciar a vida de pessoas

    comuns atradas por algumas personalidades e que se sentem obrigadas a seguir aquele

    modo de vida. Acreditamos que esse 6gerenciamento de corpos7, citado por &oucault,

    esteja no cerne da questo sobre a opresso das mulheres pela linguagem fitness, to

    rica em imagens, dos perfis do #nstagram. Fsaremos, para exemplificar, c"digos

    comunicacionais e imagens desta rede social, al!m de citar exemplos das famosas6blogueiras fitness7 @ as meninas da capa de revista de hoje 8 que influenciam milh1es

    de pessoas nesses ambientes miditicos.

    Instagram, imagem e corpo perfeito: opresso comunicacional

    $ipovests*( e +erro( 9:;;M, p.SP8SI> defendem que vivemos no mais apenas

    uma nova era de economia do mercado que estimula excessivamente o consumo, como

    pontuado constantemente por autores como Yauman 9:;;I>, Oanclini 9, Gen*ins9:;;M> e o pr"prio $ipovets*( 9:;;P>V a grande questo hoje ! tamb!m a de nova era de

    individualismo, que determina valores do consumo e das aspira1es e do estar no

    mundo do pr"prio indivduo2

    /m ruptura frontal com a ideologia das civili)a1es anteriores, organi)adas demaneira holista com o fundamento sagrado, o individualismo constitui um sistema

    de valores que p1e o indivduo livre e igual como valor central da nossa cultura,como fundamento da ordem social e poltica. /ssa configurao de valores se afirmaplenamente na hist"ria a partir do s!culo R###, tornando8se o princpio primeiro daordem pluralista e liberal. Oom os modernos, consagram8se os princpios daliberdade individual e da igualdade de todos perante a lei2 o individuo se firma comoo referencial ?ltimo da ordem democrtica. Kela primeira ve) na hist"ria, as regrasda vida social, a lei e o saber no so mais recebidos de fora, da religio ou datradio, mas construdos livremente pelos homens, ?nicos autores legtimos de seumodo de ser coletivo $ipovests*( e +erro( 9:;;M, pag SP8SI>.

    &ischler 9idem, =P:8=PH> fala dos movimentos que levam a mulher a ser mais e

    mais obcecada com a magre)a2 a mulher como objeto de consumo e de uso da moda e a

    juvenili)ao extrema, a mulher que no pode envelhecer. Nesse sentido o autor

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    pondera que o corpo feminino seria sempre um objeto sem sujeito, sem identidade,

    adequado ao consumo, colocando ainda uma outra oposio importante2 a mulher

    perfeita versus a mulher me ou, como &ischler pondera, a mulher reprodutiva x mulher

    produtiva. alori)a8se nessa imagem das redes sociais a mulher perfeita, a imagem

    almejada, nelas causa estranhe)a uma foto de uma mulher grvida @ logo aparecer o

    comentrio 6no parece voc3\7. 5 nesse sentido que aparecem os discursos de

    celebridades que postam suas fotos nas redes sociais magras, mesmo pouco tempo ap"s

    terem um beb3.

    Ouriosamente os perfis fitness do #nstagram que fa)em mais sucesso entre o

    p?blico comum so aqueles de mulheres em boa situao de vida e que, se no so ricas,

    esto muito perto de tal estgio socioeconEmico. Kor no precisarem trabalhar em

    horrio comercial, nem perderem horas em transporte urbano brasileiro, a condio

    dessas mulheres em se constiturem como exemplos para milh1es de seguidoras j cria

    uma imagem estranha e de pura mitologia para esse p?blico. Devemos observar que, no

    geral, os parJmetros que regem a obsesso pelo corpo perfeito tamb!m adv!m de

    mulheres nada comuns, como as modelos das capas de revistas e nos comerciais de tev3,

    aproximando tais estrat!gias comunicativas.

    Xabriela Kugliesi e Yella &alconi so os nomes mais famosos desse universo.

    Kugliesi tem mais de < milho de seguidores e Yella &alconi, brasileira que mora nos

    /FA e que ! apontada como 6musa inspiradora7 do movimento fitness nas redes

    sociais, tem mais de < milho e =;; mil seguidores. +o n?meros realmente espantosos

    e que crescem continuamente. Ambas transformaram os corpos delas graas ao binEmio

    alimentao regrada e exerccio fsico e mostram constantemente o resultado de tal

    processo, destacando sempre que a alimentao ! a pea8chave da transformao @

    claro, uma alimentao que siga os preceitos fitness.

    B perfil de Yella &alconi ! o mais famosoV mineira, &alconi se mudou para os/FA no final da primeira d!cada dos anos :;;; e l comeou a fa)er ginstica com

    frequ3ncia. Ao perceber que s" teria o corpo que almejava seguindo aquilo que os

    autodenominados 6&itners7 chamam de comida limpa 9]eatclean, a hashtag que denota

    esse tipo de alimento>, criou uma conta no #nstagram em :;

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    Atualmente grvida, Yella &alconi declarou no perfil e em vrias entrevistas que

    6pega leve7 nos treinos, rotina de exerccios ainda pesada para a maioria das mulheres.

    +uas fotos @ de comidas e de treinos 8 so sempre sucedidas por um breve texto do tipo

    testemonial 9em ingl3s e em portugu3s>, como podemos ver nafigura 2

    igura !: Kostagem do perfil 6bella.falconi7 de

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    Bs novos canais inaugurados na internet tamb!m se colocam a servio desse mesmofim2 a construo da pr"pria imagem. Ao permitirem a qualquer um ser visto, lido eouvido por milh1es de pessoas @ mesmo que no se tenha nada especifico a di)er 8,tamb!m possibilitam o posicionamento da pr"pria marca como personalidadevisvel. ^s ve)es, por!m, vislumbra8se certa fragilidade nessa auto exposio2 umafalta de sentido que paira sobre experi3ncias subjetivas puramente alterdirigidas e

    assombra os personagens edificados nesse movimento de exteriori)ao dasubjetividade. /ssa car3ncia denota o crescente valor atribudo ao mero ato de seexibir, de ser visvel mesmo que seja na fugacidade de um instante de lu) cirtual, emesmo que no se disponha de nenhum sentido para apoiar e nutrir tal ambio9+#Y#$#A, :;;M, p.:S:>.

    No perfil de &alconi h muitas fotos de exerccios e, principalmente, muitas

    selfiesP com pouca roupa, mostrando o corpo perfeito to almejado @ que a dona do

    perfil, &alconi, possui. A comida est presente o tempo todo, no formato fitness2 pouca

    gordura e carboidrato, muita protena. B perfil tamb!m mostra propagandas das marcas

    que a modelo patrocina e at! algumas fotos de 6gente normal7, como uma escapada

    comendo cheeseca*e e chocolate, por exemplo. As principais so da linha &resh %eal

    Klan, que tamb!m ! parceria de Yella &alconi.

    No queremos colocar aqui que o perfil da modelo seja nocivo, mas que ele

    alimenta a obsesso das mulheres, pois poucas conseguem seguir uma vida to regrada,

    por in?meros impedimentos. Atualmente grvida, ela fa) campanha pela diminuio

    pela obsesso pelo corpo perfeito mas, ao mesmo tempo, posta a cada dois dias, em

    m!dia, uma foto sua de bquini mostrando a barriga @ em pouco se assemelha 4 grande

    maioria das mulheres que engravidam 9figura !>.

    Xabriela Kugliesi 9figuras tem o perfil mais pol3mico, alvo de vrios

    questionamentos na internet sobre a exposio que ela fa) de produtos comerciais sem

    lhes atribuir o r"tulo de propagandaI. B perfil no #nstagram foi originado pelo blog

    6Cips S $ife7, que Kugliesi teria iniciado em :;

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    usado por esse grupo para se autodefinir, so gerenciados por uma empresa de

    comunicao.

    As postagens so dirias, de = a posts por dia, em m!dia. Neles Kugliesi

    sempre mostra refei1es, produtos que prometem ajudar na conquista do corpo ideal,

    al!m de exerccios com igual prop"sito e locais para se alimentar e ajudar a emagrecer e

    a comer de acordo com os ideias fitness. /m boa parte das postagens a dona do perfil

    exibe o corpo considerado perfeito2 magro, sem gordura extra nenhuma, firme e

    bron)eado. B verdadeiro sonho de consumo de mulheres comuns @ tudo que Xabriela

    Kugliesi no !.

    igura #: Kostagem do perfil 6gabrielapugliesi7 de

  • 7/24/2019 Communicare_HelenaJacob_Feminismo

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    No artigo 6Oom que corpo eu vou7 9:;;, p., %aria Wita Lehl afirma que

    para n"s, o corpo costuma ser a primeira condio de felicidade, pois a imagem que o

    individuo apresente 4 sociedade vai determinar a felicidade no por despertar o desejo

    de algu!m, mas visa construir autoestima e amor pr"prio. /la di) ainda que a

    possibilidade de esculpir um corpo ideal, com a ajuda de t!cnicos e qumicos do ramo,

    confunde8se com a construo de um destino, de um nome, de uma obra. 0oje as

    pessoas acham que podem traar seu destino, e dentre os itens do destino estaria o

    corpo, perfeitamente moldvel nessa perspectiva.

    &elicidade ! a moeda mais vendida no #nstagram. Kor trs de discursos

    motivacionais se esconde uma realidade de eterna vigilJncia e controle, onde quem

    segue monitora aqueles que segue e ! monitorado por quem ! seguido. Nessa estruturapara vigiar @ e talve) at! mesmo, punir @ a comunicao se mostra em estrat!gias

    recorrentes nessas redes sociais, que se constituem como marcas identitrias fortes da

    linguagem alimentar fitness2

    &so de hashtags moti'adoras: frases ou palavras curtas que visam

    relacionar as pessoas e marca8las a se tornarem visveis nas postagens

    dos outros. Oomo dito anteriormente ]&ora]&!]&oco so das mais

    usadas no #nstagram, fa)endo uma juno entre o tem que ser forte e

    focada para aguentar e a f! religiosa @ mesmo que voc3 no aguente, a f!

    te salva. otos de antes e depois:mostrar o antes e o depois da vida fitness !

    fundamental para essa linguagem. %ostra como o biopoder agiu bem e

    todas as pessoas que 6se converteram7 a esse estilo de vida hoje so bem

    sucedidas. otos de bi(u)ni mostrando o corpo: imagens que devoram imagens,

    onde mulheres teriam como princpios inspirar suas seguidorasV na

    realidade acaba se estabelecendo uma competio de quem est mais ou

    menos magra e musculosa. otos de comidas saud*'eis e uso de hashtags saud*'eis: ]eatclean !

    uma verdadeira ordem para aos fitners @ ao consumir muita protena,

    verduras e legumes, nenhuma fruta 9porque ! carboidrato>, enfim,

    seguindo uma dieta que jamais poderia ser para um grupo inteiro, esse

  • 7/24/2019 Communicare_HelenaJacob_Feminismo

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    p?blico considera estar se alimentando de maneira limpa, sem

    industriali)ados e comidas no saudveis. otos de todas as refei+es, mesmo (ue a comida no sea apetitosa:

    na comida fitness, no importa se a comida deve, para atingir estEmagos,

    ser bonita e apetitosa, como di) a gastronomiaV nessa linguagem a

    comida deve ser limpa e saudvel @ e todas as refei1es precisam ser

    fotografas para que se mostre estar comendo do modo correto.

    Nestas estrat!gias da linguagem fitness, que ! derivada do sistema cultural da

    alimentao, pois ! o alimento seu ator principal de constituio, destacamos o poder

    que elas podem ter de influenciar sim de modo positivo algumas pessoas mas que, no

    geral, as mulheres so impactadas negativamente.

    Nutricionistas s!rios aconselham sempre as pessoas a procurarem um servio de

    orientao alimentar exclusivo, montado de acordo com as particularidades de cada

    corpo. uando um perfil de #nstagram posta fotos de seu processo de emagrecimento

    bem sucedido, naturalmente aquelas imagens iro impactar e contaminar um grande

    grupo de pessoas, os seguidores. +e esses seguidores fa)em tudo que foi indicado e no

    conseguem o mesmo corpo @ algo invivel fisiologicamente @ vem a frustrao. +esequer tentam, mas entram nessa rede social para se alimentar visualmente daquelas

    imagens, mais frustrao.

    Kontuamos que esta pesquisa est apenas no seu incio, mas que a linguagem

    fitness consegue atuar como uma ferramenta opressora como as to citadas capas de

    revistas. %esmo que agora os modelos sejam de pessoas menos famosas e que, quando

    famosas, constituam suas carreiras nas pr"prias redes sociais, os mecanismos de

    construo de ideais inatingveis, to discutidos em outras mdias, esto sereconfigurando nas redes sociais. Devemos observar com muita ateno como as

    mulheres j so e sero atingidas por essa estrat!gia biopoltica, para que ela no se

    transforme realmente em uma estrat!gia to opressora quanto as capas de revistas

    femininas ou desfiles de moda so at! a contemporaneidade.

    Refer-ncias .ibliogr*ficas

    YA#C/$$B Gr., N.A "ra da #conofagia. +o Kaulo2 0ac*er /ditores, :;;.YAF%AN, _. $ida para %onsumo & a transformao das pessoas em mercadoria.Wio deGaneiro2 Gorge _ahar /ditor, :;;I.

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    OANO$#N#, N. %onsumidores e %idados. Wio de Ganeiro2 /ditora F&WG,