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Marxismo e descendência · 1 COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA: O CAPITAL HUMANO COMO FATOR DE PRODUÇÃO

COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA · Responsabilidade Social e Oficina CERES - Modelo de Agência de Ecoindustrialismo. Eliane Maria Pires Giavina Bianchi Doutora e Mestre em

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Marxismo e descendência · 1

COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA:

O CAPITAL HUMANO COMO FATOR DE PRODUÇÃO

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COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA:

O CAPITAL HUMANO COMO FATOR DE PRODUÇÃO

Organizadores

Marco Antonio SilveiraTaiane Cristiane Becaro

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Organizadores

Marco Antonio SilveiraTaiane Cristiane Becaro

Autores de capítulosAdiléia Souza Lima

Ana Cláudia dos SantosAmanda Martinez FragnanCybelle Borges de Souza

Eliane Maria Pires Giavina BianchiEni Aparecida Sivera Bertolini

Eugênia Vale de PaulaFelipe Demolin

Johan Hendrik Poker JúniorLaís Silva Oliveira LuzLetícia Sayuri KikuchiLucas Rodrigues Froes

Marco Antonio SilveiraMônica Cavalcanti Sá de Abreu

Oswaldo Luiz AgostinhoPriscilla Perla Tartarotti Von Zuben Campos

Renato BottiniRenato Soffner

Sabrina Kelly PontesTaiane Cristiane Becaro

Thalita Catarina Decome Poker

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Impresso no Brasil, janeiro de 2015

Copyright © 2015 by Marco Antonio Silveira

Os direitos desta edição pertencem ao CTI (Centro de Tecnologia da Informação “Renato Archer”) Rodovia Dom Pedro I, Km 143,6 – 13069-901 – Campinas SP, BrasilTelefone de contato: +55 (19) 3746-6083E-mail de contato: [email protected]ço eletrônico: http://www.cti.gov.br/gaia

OrganizadoresMarco Antonio SilveiraTaiane Cristiane Becaro

Gestão EditorialCEDET – Centro de Desenvolvimento Profissional e Tecnológico Ltda.

RevisãoAndreia Medrado

EditoraçãoVirgínia Morais

Reservados todos os direitos desta obra.Proibida toda e qualquer reprodução desta edição por qualquer meio ou forma, seja ela eletrônica ou mecânica, fotocó-pia, gravação ou qualquer outro meio de reprodução, sem permissão expressa do editor.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Marco Antonio Silveira e Taiane Cristiane Becaro (organizadores) Competitividade com qualidade de vida: o capital humano como fator de produção; Organização de Marco Antonio Silveira e Taiane Cristiane Becaro – Campinas, SP: CTI (Centro de Tecnologia da Informação “Re-nato Archer”), 2014.

ISBN 978-85-65163-07-1

1. Gestão Organizacional 2. Saúde Ocupacional 3. Inovação Tecnológica. 4. Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer. I. Título.

CDD – 658.406

Índices para Catálogo Sistemático:1. Gestão Organizacional – 658.4062. Saúde Ocupacional – 6133. Inovação Tecnológica – 338.064

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SUMÁRIO

PrefácioJorge Abrahão .................................................................................................................................... 13

Apresentação Marco Antonio Silveira e Taiane Cristiane Becaro ......................................................................... 15

seção i - competitividade com qualidade de vida: a importância do conhecimento

Capítulo 1: Competitividade com Qualidade de Vida: Estratégias e práticas baseadas na valorização do fator humano nas organizaçõesMarco Antonio Silveira e Taiane Cristiane Becaro ......................................................................... 21

Capítulo 2: Gestão do Conhecimento e de Competências para a Competitividade OrganizacionalRenato Soffner .................................................................................................................................... 39

Capítulo 3: Gestão do Conhecimento: a estruturação do processoem busca de maior qualidade no trabalhoEliane Maria Pires Giavina Bianchi ................................................................................................. 49

Capítulo 4: Lições Desaprendidas (Lessons unlearned) Renato Bottini ..................................................................................................................................... 67

seção ii - a gestão do capital humano nas organizações

Capítulo 5: Indagações críticas sobre a competitividadeorganizacional na perspectiva institucional: aspectos sociais e psicológicosJohan Hendrik Poker Júnior e Thalita Catarina Decome Poker .................................................... 79

Capítulo 6: O trabalho como potencializador da saúde mentalPriscilla Perla T. Von Zuben Campos, Letícia Sayuri Kikuchi e Marco Antonio Silveira ........... 89

Capítulo 7: Inovação, organização do trabalho e saúde mental: Um estudo exploratório sobre a percepção do trabalhoMarco Antonio Silveira, Letícia Sayuri Kikuchi e Priscilla Perla T. Von Zuben Campos(Com coautoria de Amanda Martinez Fragnan) ............................................................................ 103

Capítulo 8: Inserção da mulher no mercado de trabalho: Impactos sobre a saúde mental e qualidade de vidaAna Cláudia dos Santos e Sabrina Kelly Pontes ............................................................................. 119

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seção iii - competitividade com qualidade de vida: viabilizando soluções

Capítulo 9: A influência da Qualidade de Vida no trabalho para o desenvolvimento da competitividade das organizaçõesEni Aparecida Sivera Bertolini e Oswaldo Luiz Agostinho............................................................. 133

Capítulo 10: Consórcio Empresarial de Responsabilidade Social: um modelo de atuação em rede para melhoria da qualidade de vida com maior impacto e menor custoCybelle Borges de Souza, Eugênia Vale de Paula e Mônica Cavalcanti Sá de Abreu ..................................................................................................... 143

Capítulo 11: Competitividade com Qualidade de Vida: as ações em desenvolvimento do CTI-GAIALaís Silva Oliveira Luz, Adiléia Souza Lima e Taiane Cristiane Becaro(Com coautoria de Felipe Demolin e Lucas Rodrigues Froes) ........................................................ 157

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SOBRE OS AUTORES

Marco Antonio Silveira (Organizador)Doutor em Sistemas de Gestão e mestre em Engenharia Elétrica (Unicamp). Reconhecido pelo CNPq como pesquisador de alta produtividade nível DT-2, com mais de 90 publicações e coordenação de diversos projetos de inovação e qualidade de vida em empresas. Experiência em gestão tecnológica, empresarial e acadêmica através de atividades de direção, assessoria, ensino e pesquisa em empresas, universidades e unidades de pesquisa. Experiência como docente em diversos cursos de pós-graduação (na Unicamp, PUC-Campinas, UNISAL, INPG, entre outros). Orienta pesquisadores de vários níveis, inclusive em projetos de pós-doutorado. É pesquisador da Divisão de Gestão de Empresas do CTI/MCTI, onde coordena o GAIA/CTI.

Taiane Cristiane Becaro (Organizadora)Mestre em Economia pela Universidade Federal do Espírito Santo e graduada em Administração de Empresas pelas Faculdades de Campinas (FACAMP). Atuou na área de Gestão de Pessoas em empresa de grande porte e como docente de ensino técnico/profissionalizante de disciplinas relacionadas à Gestão Pública e Gestão de Projetos. Atualmente, é pesquisadora CNPq na modalidade DTI-B (Desenvolvimento Tecnológico Industrial) no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI).

Adiléia Souza LimaPós-graduanda em Gestão Estratégica de Pessoas (Metrocamp) e Graduada em Administração de Empresas pela Faculdade Comunitária de Campinas. Trabalhou por sete anos no setor de manufaturas da Motorola Industrial. Desde 2011 atua como pesquisadora do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), instituição vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Ana Cláudia dos SantosPsicóloga, doutora em Sociologia pela PUC-SP. Consultora na área de Gestão de Pessoas com trabalhos desenvolvidos em empresas e organizações sociais. Professora Titular do curso de Psicologia, área de Psicologia Social na UNIP – Universidade Paulista, desde 2007. Docente nas disciplinas de Psicologia Social e Supervisão de estágio na disciplina de Intervenções Psicológicas Grupais, estágio em Grupos e Comunidades.

Amanda Martinez FragnanGraduanda de Direto pela PUC-Campinas. Atuou como estagiária na área jurídica e atualmente é bolsista de Iniciação Científica (PIBIC/CNPq) no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), tendo como frente de pesquisa Legislação e fomentos governamentais para inovação.

Cybelle Borges de SouzaBacharel em Ciências Sociais e especialista em inovação tecnológica pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Há mais de 10 anos atua como consultora em responsabilidade socioambiental nas áreas de gestão de iniciativas sociais empresariais, tendo concebido três projetos de inovação que marcaram a sua trajetória profissional: Rede de Agentes de Responsabilidade Social, a partir do qual formou cerca de 300 representantes de empresas industriais filiadas à Federação das Indústrias do Estado do Ceará; Consórcio Empresarial de Responsabilidade Social e Oficina CERES - Modelo de Agência de Ecoindustrialismo.

Eliane Maria Pires Giavina BianchiDoutora e Mestre em Administração (pela FEA/USP) e Engenheira de Produção (POLI/USP). Professora na Faculdade Campo Limpo Paulista – FACCAMP (Mestrado Profissional em Administração) e editora da Revista Micro e Pequena Empresa (MPE), da mesma instituição. Atualmente, pesquisa temas ligados à Gestão Estratégica de Pessoas, Estratégia Empresarial e à Gestão de Pessoas e Subsistemas de Recursos Humanos. Atou como Diretora de RH no Grupo Ultra, Thomson Reuters e Grupo Abril, além de consultora de gestão e mudanças na Monitor e Accenture.

Eni Aparecida Sivera BertoliniDoutoranda em Engenharia Mecânica pela Unicamp, Mestre em Administração e graduada em Matemática e Administração de Empresas pela PUC-Campinas. Coordenadora do Curso de Administração da Faculdade Anhanguera de Valinhos. Pesquisadora convidada do CTI, com foco de pesquisa em Sustentabilidade Organizacional, Qualidade de Vida no Trabalho, Modelos Organizacionais e Competitividade. Possui diversas publicações nacionais e internacionais.

Eugênia Vale de PaulaBacharel em administração e mestranda em Administração e Controladoria pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Atua como tutora à distância no curso de Gestão Pública na UFC Virtual.

Felipe DemolinGraduando em Engenharia de Produção pela UNISAL. Atua como Bolsista de Iniciação Científica (PIBIC/CNPq) no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), tendo como foco de pesquisa Sistemas de Indicadores de Desempenho Organizacional.

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10 | COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA

Johan Hendrik Poker JúniorProfessor de Administração Financeira da FCA - Faculdade de Ciências Aplicadas da UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas, coordenador dos cursos de Administração e Administração Pública. Pesquisador com particular interesse nos estudos da avaliação financeira do capital intelectual, estudos da estrutura de capital das empresas e na eficiência do gasto público. Pós-doutorado no CTI Renato Archer, Mestre e Doutor em Administração pela Mackenzie e graduado em Estatística pela UNICAMP.

Laís Silva Oliveira LuzPós-graduada em Gestão Estratégica da Produção (Unicamp) e graduada em Engenharia Têxtil pela Universidade Estadual de Maringá. Atuou em consultoria empresarial, em particular com a implantação de ERP. Atualmente é pesquisadora no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), na área de Gestão Organizacional e Tecnológica, Aprendizagem Organizacional, Inovação e Fatores Psicossociais no Trabalho.

Letícia Sayuri KikuchiGraduada em Administração de Empresas pela FACAMP (Faculdades de Campinas). Tem experiência em gestão empresarial e desde 2011 é pesquisadora do GAIA/CTI, tendo como foco de pesquisa Sustentabilidade Organizacional, Capital Humano, Saúde Mental e Qualidade de Vida no Trabalho.

Lucas Rodrigues FroesGraduando em Estatística pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Bolsista de Iniciação Científica (PIBIC/CNPq) no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), tendo como foco de pesquisa Modelos Conceituais e Matemáticos Organizacionais.

Mônica Cavalcanti Sá de AbreuDoutora em engenharia de produção pela Universidade de Santa Catarina com estágio pós-doutoral no Institute of Manufacturing (IfM) da Universidade de Cambridge, mestre em Tecnologia de Processos Químicos e Bioquímicos pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Engenheira química pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Professora Associada da Universidade Federal do Ceará e coordenadora do Laboratório de Estudos em Competitividade e Sustentabilidade - LECoS da UFC. Experiência profissional nas áreas de administração, engenharia de produção e engenharia química. Desenvolve pesquisas nos temas: responsabilidade social corporativa, gestão ambiental, logística reversa, stakeholders, políticas públicas e desenvolvimento sustentável, energias renováveis e mudança climática.

Oswaldo Luiz AgostinhoDoutor em Engenharia Mecânica pela USP. Atualmente é professor associado da Faculdade de Engenharia Mecânica da Unicamp e do departamento de Produção da USP, São Carlos. Possui várias publicações nacionais e internacionais nas linhas de pesquisa: Modelos Organizacionais, Integração dos Sistemas de Negócio, Competitividade das Organizações, Estratégias para Competitividade, Automação.

Priscilla Perla Tartarotti Von Zuben CamposGraduada em Psicologia, especialista em Psicologia Organizacional e do Trabalho e pós-graduada em Docência Universitária. Consultora em Gestão de Pessoas, atua como docente na Universidade São Francisco, nos cursos de Psicologia, Administração e Engenharia de Produção, em disciplinas correlatas à Gestão de Pessoas, e de estágio supervisionado. É pesquisadora colaboradora do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), no Projeto GAIA - Grupo de Apoio à Inovação e Aprendizagem em Sistemas Organizacionais.

Renato BottiniGraduado em Engenharia Eletrônica e pós-graduado em Sistemas Digitais pela FEI (Faculdade de Engenharia Industrial). Especialista em Engenharia Ambiental pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp e PhD – Quality Management pela BSU (State University Alabama), EUA. Certificado pelo PMI (Project Management Institute) como Project Management Professional (PMP). Atua em Consultoria de Sistemas de Gestão da Qualidade/Ambiental/Segurança e Gerenciamento de Projetos, como pesquisador colaborador da Unicamp e como Professor na FEQ – Faculdade de Engenharia Química da Unicamp nos cursos de extensão/especialização.

Renato SoffnerEngenheiro e mestre pela USP e doutor em Educação pela UNICAMP. Estágio de pós-doutorado no MIT. Pós-doutorando no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI-MCT). Atua como pesquisador e coordenador do Mestrado em Educação da UNISAL, e professor pleno da FATEC de Americana (Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza).

Sabrina Kelly PontesGraduada em Administração Pública pela Universidade Estadual Paulista – UNESP. Mestre e Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Atualmente é professora titular da Universidade Paulista – Unip.

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SOBRE OS AUTORES | 11

Thalita Catarina Decome PokerMestre em psicologia social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Graduada em Psicologia pelo Centro Universitário de Santo André - UNIA. Tem como área de atuação a psicologia clínica com orientação cognitivo-comportamental, a psicologia institucional mais

voltada para área de saúde e educação. Atuou em projetos sociais no terceiro setor com crianças e adolescentes em condição de alta complexidade e risco social. Atualmente, tem direcionado suas pesquisas em identidade para crianças, adolescentes, processos de socialização/individuação. E-mail: [email protected].

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PREFÁCIO

Jorge Abrahão

Diretor-presidente do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social

Vivemos um momento inusitado, em que ganha força a visão de que é necessário mu-dar o nosso modelo de desenvolvimento, seja pelas cíclicas crises econômicas, pela pobre-za e desigualdade social, pelo avanço nos limites do planeta ou pela falta de transparência e integridade.

Diante desse enorme desafio, evidencia-se a corresponsabilidade entre os governos, a sociedade civil e as empresas. Só o envolvimento e a integração de todos esses atores po-derão dar conta da transformação necessária.

As empresas, responsáveis por dois terços da geração de riqueza e três quartos da ge-ração de empregos, têm um papel-chave nesse processo. Para exercê-lo condignamente, elas devem incorporar a sustentabilidade em suas estratégias de negócio, condicionando as tomadas de decisão à avaliação de seus impactos nas dimensões econômica, social, ambiental e ética.

É desejável que este seja um caminho voluntário das empresas, mas não se pode negar que a interferência de poderosos indutores, como consumidores, investidores, acionistas, agentes financeiros e a mídia, entre outros, é essencial para dar velocidade à mudança. O valor intangível das empresas é cada vez mais percebido por esses públicos e a gestão de risco passa a ter importância vital para a perenidade do negócio. Contudo, mais do que uma tarefa, estão instaladas oportunidades para que empresas com visão de longo prazo possam avançar e ser reconhecidas por seus diferentes públicos.

Além da adoção de práticas empresariais sustentáveis, é fundamental a participação das empresas na construção de políticas públicas que estimulem o meio empresarial a progredir na direção do desenvolvimento sustentável. A combinação de um mercado atento a práticas sustentáveis com um conjunto de sólidos marcos regulatórios pode ser a chave para atender ao senso de urgência que se coloca para a sociedade. 

Na base de tudo isso, estão as pessoas e o ambiente de trabalho. A promoção pelas empresas da qualidade de vida de seus próprios funcionários e dos trabalhadores da sua cadeia de valor é central para o desenvolvimento empresarial. Do mesmo modo, o respeito à agenda do trabalho descente e a valorização da diversidade de gênero, raça e orientação sexual são temas que podem contribuir muito para um clima de respeito, criativo e ino-vador.

A qualidade no ambiente de trabalho está intimamente ligada a fatores psicossociais que até hoje não têm sido tratados de maneira proporcional à sua importância, tanto para os colaboradores como para a própria empresa.

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14 | COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA

Desde o final do século passado, a ideia de “alta performance” ganha força e pressupõe maior eficiência no trabalho e a realização de tarefas por equipe, quebrando a rigidez do sistema racional de trabalho e aumentando a flexibilidade e a cooperação. Com o advento dessa ideia, ampliam-se também o gerenciamento e a participação dos trabalhadores nas decisões. A partir de então, o tema da qualidade de vida entra definitivamente na pauta da gestão organizacional. O bem-estar no ambiente de trabalho é, hoje, fundamental para que o indivíduo desenvolva seu potencial criativo e contribua para a competitividade da empresa.

A maioria dos métodos para se chegar à qualidade de vida no trabalho envolve refor-mulação de cargos e reestruturação da natureza do trabalho, o que implica rever os valo-res e crenças da organização, colocando-os na dimensão do desenvolvimento sustentável.

É complexo pensar a competitividade, o bem-estar dos funcionários e a inovação na dimensão de uma economia inclusiva, verde e eticamente responsável. Implica o desen-volvimento de um modelo de gestão com novas competências que podem representar ganho de vantagens competitivas para a empresa.

Este livro faz uma rara e importante relação entre competitividade e qualidade de vida e traz luz para um tema ainda pouco desenvolvido e que é pré-requisito para qualquer empresa que pense em sustentabilidade de maneira mais consistente e queira contribuir para a construção de uma sociedade mais justa e sustentável.

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APRESENTAÇÃO

Na medida em que os mercados se tornam mais complexos, competitivos e dinâmicos, novos desafios são impostos às organizações, especialmente às empresariais. Se até bem pouco tempo as empresas eram mais livres para atuar sem se preocupar com os prejuízos provocados ao meio ambiente e à sociedade, visando tão somente o seu lucro e crescimento, o nível de impactos nega-tivos provocados pelas atividades empresariais chegou a um ponto em que começaram a surgir importantes reações na sociedade.

É fundamental para o desenvolvimento socioeconômico de um país a existência de empresas com níveis de desempenho competitivo compatíveis com as exigências de mercado. De forma geral, competitividade organizacional é definida na literatura como a capacidade da empresa for-mular e implementar estratégias concorrenciais que lhe permitam obter e manter, a longo prazo, sua sustentabilidade econômico-financeira. Vale ressaltar ainda que a inovação é gerada, essen-cialmente, através da busca pela competitividade das empresas, o que revela a importância do nível competitivo das organizações para o desempenho econômico-tecnológico de um país. Mas isso não pode ser obtido prejudicando outros aspectos de igual importância para a sociedade.

Entre as maiores preocupações da Sociedade moderna estão a geração de emprego, a questão ambiental e a saúde pública. Esses três aspectos dependem, entre outros fatores, dos modelos orga-nizacionais adotados nas empresas e em outros tipos de organização, uma vez que essas impactam diretamente aqueles três aspectos.

Restaria então equacionar alguns aspectos. As organizações precisam ser competitivas para fazer frente aos desafios impostos pelos mercados atuais; um país forte precisa de empresas fortes, inclusive para poder gerar bons empregos. Como elevar o nível de competitividade, mantendo a necessária qualidade de vida? Em suma, como desenvolver modelos organizacionais que contem-plem o binômio “competitividade com qualidade de vida”?

As organizações são, em sua maioria, sistemas de alta complexidade em contínua interação com o seu ambiente externo, de onde importam os recursos necessários para a execução de suas atividades e para onde exportam os seus produtos, na forma de bens tangíveis, informações ou serviços. O questionamento da visão tradicionalista das organizações, que tende a considerar somente a viabilidade econômica das empresas, implica a proposição de novos modelos orga-nizacionais, uma vez que os atuais, em sua maioria, não abrangem adequadamente os aspectos ambientais e sociais, em especial os fatores psicossociais, subjetivos ao trabalho e presentes em todo sistema organizacional. Parte-se do pressuposto que os fatores psicossociais podem impactar tanto os processos produtivos como a saúde dos trabalhadores, cujas consequências negativas se relacionam aos problemas psicológicos e comportamentais, e para as empresas problemas sociais e administrativos, absenteísmo e acidentes de trabalho, reduzindo assim sua competitividade.

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16 | COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA

Os fatores psicossociais afetariam ainda a capacidade organizacional de inovação – aqui entendida como toda mudança que agrega valor para a organização, e que é fundamental para que as empresas possam reajustar sua atuação frente aos novos ambientes, os quais mu-dam rápida e continuamente – pois os processos que envolvem a geração, compartilhamen-to e aplicação de novos conhecimentos dependem fundamentalmente do elemento humano.

Assim, busca-se um novo direcionamento das empresas para práticas de gestão de riscos psicossociais, haja vista sua interferência em vários indicadores que afetam a produtividade, dentre os quais o absenteísmo. Considerado uma falha gerencial, a ausência dos trabalha-dores é identificada como decorrente de diversos fatores biopsicossociais e econômicos que refletem tanto nos custos diretos como nos indiretos a curto, médio e longo prazo nas or-ganizações. Estima-se que cerca de 4% do Produto Interno Bruto (PIB) sejam perdidos por doenças e agravos ocupacionais, número que pode aumentar em 10% quando se trata de países em desenvolvimento, como o Brasil, o que reflete a baixa efetividade das políticas e programas de prevenção de agravos à saúde no trabalho. 1

Este livro, que reúne textos de diferentes autores que atuam em diversas áreas do conhe-cimento, tem o propósito de contribuir para a reflexão sobre como desenvolver organizações que tenham um bom desempenho nos mercados atuais, com níveis adequados de produtivi-dade, qualidade, custos e capacidade de inovação, sem comprometer a necessária qualidade de vida no trabalho, condição necessária para a promoção da saúde física e mental de seus trabalhadores.

A seção 1, Competitividade com qualidade de vida: A importância do conhecimento, reú-ne textos sobre a gestão do conhecimento nas organizações como diferenciação para mobi-lizar o capital humano e, consequentemente, potencializar o desempenho organizacional. Após ser feita, no capítulo 1, uma introdução de alguns dos principais elementos para o de-senvolvimento de modelos organizacionais que proporcionem bons níveis de desempenho integrado com qualidade de vida para os seus trabalhadores, no capítulo 2 são apresentados embasamentos conceituais sobre a gestão do conhecimento, oriundos da filosofia, da psi-cologia, da sociologia, da pedagogia e da tecnologia. Em seguida, no capítulo 3, é feita uma discussão das estruturas de gestão do conhecimento nas organizações, no sentido de estru-turá-la para servir de base de análise para diversas situações, tendo em mente a realidade das empresas, em especial as brasileiras. No capítulo 4, por fim, é abordada a questão das lições desaprendidas, como causas ou pelo menos parte considerável das causas das frustrações da maioria dos gerentes de projetos e outros profissionais no mundo corporativo.

Na seção 2, A gestão do capital humano nas organizações, são apresentados os impactos, positivos e negativos, do mundo do trabalho, com repercussões para a competitividade or-ganizacional. Para tanto, o capítulo 5 discute e critica a definição de competitividade, por meio da expansão do conceito de criação de valor e da utilização de novos conceitos de iden-tidade e utilidade do comportamento, propondo uma visão integrada dos ambientes interno e externo como mecanismo para a promoção da identificação dos trabalhadores com a or-ganização. No capítulo 6 são abordados os aspectos positivos do trabalho, como fator capaz de prevenir distúrbios psicológicos, melhorando a qualidade de vida e, consequentemente,

1 SANTANA et al., 2006, p. 1005.

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APRESENTAÇÃO | 17

potencializando a saúde mental e o bem-estar psicológico do indivíduo que o realiza. Já o capítulo 7 apresenta a visão dos trabalhadores sobre os impactos da organização do traba-lho sobre sua função, através dos resultados de um estudo conduzido com profissionais que atuam na área de saúde mental, enquanto que o capítulo 8 apresenta tal abordagem aplicada ao universo das mulheres, mão de obra cada vez mais crescente, com repercussões na quali-dade de vida no trabalho e à competitividade.

A terceira e última seção, Competitividade com qualidade de vida: Viabilizando soluções, é resultado da atuação do Grupo de Apoio à Inovação e Aprendizagem em Sistemas Orga-nizacionais (GAIA) 2 e de seus colaboradores mais próximos, atuação essa que tem se inten-sificado nos últimos cinco anos. Dessa forma, o Capítulo 9 introduz e discute a abordagem que tem sido estudada e amplamente difundida pelo grupo, a relação entre competitividade e qualidade de vida no trabalho, com o objetivo de abordar como fatores organizacionais e humanos interagem e influenciam aquela última. Dentro dessa atuação, o Capítulo 10 relata as bases do Projeto CERES, coordenado pelo SESI-Ceará em 2010, apresentando as moti-vações, limitações, operacionalização, impactos e benefícios da atuação de empresas con-sorciadas em um projeto de Responsabilidade Social Corporativa que integra metodologias de gestão de recursos, investimento social privado, desenvolvimento de relações e gerencia-mento de projetos, influenciando diretamente o desempenho de todos os stakeholders. O ca-pítulo 11 encerra esta edição com a exposição dos estudos, pesquisas e atividades de campo em andamento do CTI-GAIA, trabalhos que têm como objetivo o desenvolvimento de mo-delos organizacionais inovadores sustentáveis e viáveis, que proporcionem simultaneamen-te, ganhos de competitividade empresarial com qualidade de vida no trabalho às empresas brasileiras intensivas em tecnologia, sobretudo as de pequeno e médio porte. Dentro desse esforço do CTI-GAIA, tais projetos enfatizam o aproveitamento do capital intelectual como fator de produção, uma vez que é entendido que seu uso competente pode proporcionar os meios necessários para permitir às empresas enfrentarem os múltiplos desafios existentes nos mercados nacionais e internacionais.

Não se pode deixar de mencionar, por fim, a colaboração frutífera e fundamental dos autores dos diversos capítulos, sem a qual certamente este livro não teria, e nem poderia ter sido materializado. Autores pertencentes a diversas instituições brasileiras que trabalham em prol do desenvolvimento e resultados dos conhecimentos focados no crescimento sus-tentável de longo prazo das organizações no país, entendido nesta edição como a integração simultânea de competitividade empresarial com qualidade de vida dos colaboradores.

Que esses textos possam contribuir para trazer mais luz, para que consigamos transcen-der aos conflitos no mundo do trabalho, unindo empregadores, trabalhadores, governo e so-ciedade civil, na busca de modelos organizacionais sustentáveis, que promovam o necessário desenvolvimento socioeconômico do país. Boa leitura a todos!

Marco Antonio SilveiraTaiane Cristiane Becaro

2 Grupo de pesquisas aplicadas da Divisão de Gestão de Empresas, sediada no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), instituto de pesquisa pertencente ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)

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(organizadores)

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SEÇÃO I

COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA:A IMPORTÂNCIA DO CONHECIMENTO

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CAPÍTULO 1

COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA: ESTRATÉGIAS E PRÁTICAS BASEADAS NA VALORIZAÇÃO DO FATOR HUMANO NAS

ORGANIZAÇÕES

Marco Antonio Silveira e Taiane Cristiane Becaro

ӹ Introdução

Na medida em que os mercados se tornam mais complexos, competitivos e dinâmicos, novos e maiores desafios são impostos às organizações, especialmente as empresariais. O atendimento dessas demandas impostas pelos mercados atuais exige da empresa altos ní-veis de desempenho competitivo, os quais não devem ser buscados desconsiderando-se as externalidades negativas ambientais e sociais geradas, tendo em vista os prejuízos sociais e ambientais associados. É esse o fundamento da sustentabilidade com enfoque Triple Bot-ton Line, introduzido pela primeira vez por Elkington (ELKINGTON, 1998), que busca a harmonização de objetivos econômicos, sociais e ambientais 1.

Entre as externalidades negativas associadas às atividades empresariais destacam-se tanto a degradação dos recursos naturais e do meio ambiente físico, como os impactos negativos na saúde física e mental dos trabalhadores. As externalidades sociais negativas trazem sofrimento aos trabalhadores e às suas famílias, oneram os sistemas públicos de saúde e os sistemas previdenciários, além de impactar os sistemas do judiciário trabalhista que se vê às voltas com um nível de processos muito acima de sua capacidade de absorção.

Dejours afirma que mesmo a ocultação das externalidades negativas provocadas pela pseudo-sustentabilidade, a fim de resguardar a imagem corporativa, contribui para a distorção comunicacional na organização, podendo impactar o nível subjetivo dos trabalhadores, por meio de um sofrimento ético, capaz de se manifestar de diversas for-mas (por exemplo, desespero, depressão, alcoolismo, revolta) como fruto de uma descom-pensação psicopatológica (DEJOURS, 2007, p. 123). A seguir são ilustrados alguns dados da magnitude desses problemas:

• Os transtornos mentais e comportamentais estão entre as principais causas de perdas de dias no trabalho (absenteísmo) no mundo. Os casos leves causam perda de quatro dias de trabalho/ano e os graves cerca de 200 dias de trabalho/ano, em

1 O termo Sustentabilidade Organizacional utilizado tem o mesmo sentido de sustentabilidade corporativa, ado-tado por alguns autores e está baseado na abordagem de Figge e Hahn: “a sustentabilidade de uma empresa é julgada de acordo com o seu desempenho econômico, ambiental e social” (BRUNORO, BOLIS, PEREIRA, SZNELWAR, 2013).

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média (DEMYTTENAERE et al., 2004), evoluindo à perda frequente de dias de trabalho devido à doença e redução de produtividade (NIEUWENHUIJSEN et al., 2006).

• Os quadros depressivos e ansiosos são as principais enfermidades mentais que causam absenteísmo-doença ao redor do mundo e são uma importante fonte de custos para os sistemas de previdência social (CATALINA-ROMERO et al., 2013).“Estima-se que 4% do Produto Interno Bruto (PIB) sejam perdidos por doenças e agravos ocupacionais, o que pode aumentar para 10% quando se trata de países em desenvolvimento. No Brasil, com base no PIB do ano 2002, essas estimativas de perda ficariam entre US$21.899,480 e US$54.748,700 refletindo baixa efetivi-dade das políticas e programas de prevenção de agravos à saúde no trabalho. Tais valores limitam-se aos custos econômicos e não incluem aqueles decorrentes dos impactos emocionais e familiares, dificilmente mensuráveis” (OIT, 2003).

• Dados da Previdência Social informam que no ano de 2010 foram concedidos mais de 2,2 milhões de novos benefícios auxílio-doença para uma população de aproximadamente 60 milhões de contribuintes. No ano de 2011, mais de dois bilhões de reais foram comprometidos para pagamento de novos benefícios pre-videnciários por incapacidade laborativa (SILVA JUNIOR e FRIDA, 2013).

• Dados recentes dão conta que cerca de 30% da população na região metropolitana de São Paulo sofrem com algum tipo de transtorno mental, dos quais 10% são considerados transtornos graves (ANDRADE, WANG, ANDREONI, et al, 2012).

Os dados acima apresentados reforçam a importância de serem desenvolvidos modelos organizacionais que estejam alinhados às fortes demandas socioeconômicas do momento atual. Com esse propósito, de contribuir para o desenvolvimento de modelos organizacio-nais sustentáveis que contemplem tanto a viabilidade econômico-financeira das organiza-ções como também as condições de trabalho de seus colaboradores, que se insere o esforço do CTI-GAIA, cujo problema a ser solucionado pode ser sintetizado da seguinte maneira: Que fatores internos da empresa têm maior potencial para promover o seu desempenho competitivo, sem prejuízo da qualidade de vida no trabalho?

Através dos estudos, pesquisas e atividades de campo do CTI-GAIA, é possível cons-tatar que o conjunto de respostas para a questão acima inclui o desenvolvimento de estra-tégias, políticas, processos e práticas que contemplem o elemento humano. Colocado em outros termos, a implantação de modelos organizacionais sustentáveis que sejam promo-tores de organizações que possam integrar competitividade com qualidade de vida requer priorizar a gestão adequada de todos os fatores que afetam os seus trabalhadores, pois esses trazem dentro de si o potencial para gerar, transmitir e aplicar o ativo econômico mais valoroso no contexto da nova economia: o conhecimento.

O destaque dado para o conhecimento como um ativo econômico fundamental se deve ao fato de que um dos desafios mais importantes impostos às organizações atuais é desenvolver práticas sistemáticas para administrar a autotransformação. Isso porque, nesse contexto, mais que em outros, o desenvolvimento econômico se efetiva a partir de inovações ou, novas combinações de materiais e forças empregadas de forma diversas, como preconizado no início do século por Schumpeter (1988, p.43), economista que apresentou o enfoque da inovação como “destruição criadora”.

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Neste capítulo, após uma contextualização inicial dos principais conceitos discutidos ao longo do livro, serão abordados alguns dos principais elementos que merecem aten-ção especial no desenvolvimento de modelos organizacionais que possam proporcionar às empresas e outros tipos de organização, condições para apresentarem bons níveis de desempenho, em termos de qualidade, produtividade, custos e capacidade de inovação, de modo integrado com qualidade de vida para os seus trabalhadores.

ӹ Enfoque sistêmico e gestão estratégica para sustentabilidade organizacional

Desde Galileu a ciência moderna tem sido dominada pelo enfoque analítico ou redu-cionista, que se caracteriza pela redução de problemas a componentes menores, visando facilitar sua análise. O paradigma analítico-reducionista tem vantagens evidentes, sendo responsável pelo ferramental metodológico que proporcionou o gigantesco desenvolvi-mento científico e tecnológico experimentado pela humanidade nos últimos séculos. No entanto, este enfoque se mostra inadequado para lidar com situações mais complexas, em que os fenômenos devem ser entendidos não só em termos de seus componentes, mas também em termos do conjunto integral das relações existentes entre eles, como desta-cado por Schoderbek et al. (1980). A mudança do enfoque analítico para o estudo dos problemas como um todo pode ser vista como uma mudança metodológica; é a mudança para o enfoque holístico ou sistêmico, enfoque usado pelos estudiosos da Teoria Geral de Sistemas – TGS.

O enfoque sistêmico foi viabilizado nas organizações através do conceito de estratégia, segundo Montgomery e Porter (1998). Esses autores citam que nos anos 60, época em que o pensamento gerencial estava orientado para funções individuais, Andrews e Christen-sen, lideraram a prestigiosa Harvard Business School em direção às ideias modernas de estratégia e, “identificaram uma necessidade urgente de uma forma holística de se pensar a empresa e, articularam o conceito de estratégia como um meio de chegar a isso” (Mon-tgomery e Porter: 1998, p. XII). A partir das últimas décadas, o conceito de estratégia ganhou o interesse do meio empresarial, transformou-se em linguagem comum entre os administradores e, gradativamente, foi sendo incorporada no cotidiano das organizações.

Este interesse, segundo Ansoff (1990, p.93), foi provocado pelo reconhecimento de que o ambiente externo da empresa é cada vez mais mutável e descontínuo em relação ao passado, e que, em consequência disso, os objetivos tratados de forma isolada são insuficientes como regras de decisão para guiar a orientação estratégica da empresa, na medida em esta se adapta a novos desafios, ameaças e oportunidades.

De fato, é crescente a percepção de que estratégias bem formuladas e adequadamen-te implantadas constituem-se em fatores fundamentais para que as organizações sejam bem sucedidas em seus propósitos, à mercê do maior alinhamento interno em torno dos seus propósitos globais, do posicionamento da organização em relação ao seu ambiente de atuação e da manutenção da coerência proporcionadas ao longo do tempo. No entanto, o fenômeno da estratégia é de grande complexidade, uma vez que ela lida com uma grande variedade de fatores inerentes à organização, tais como as expectativas dos stakeholders, as múltiplas funções desempenhadas nos departamentos, as várias dimensões organiza-

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cionais e as interações com o complexo e dinâmico conjunto de forças existentes fora da organização. Não há capacidade gerencial que consiga ter um domínio sobre tudo isso.

Da profusão de trabalhos existentes, somada à complexidade inerente ao fenômeno, resulta uma diversidade de conceituações e enfoques sobre estratégia, de modo que não há uma única definição universalmente aceita. Autores e gerentes usam o termo de maneira diferente: alguns incluem metas e objetivos como parte da estratégia, enquanto outros fa-zem uma firme distinção entre eles (MINTZBERG e QUINN, 2001, p. 19). A cada um dos vários enfoques existentes corresponde uma conceituação sobre estratégia, conceitos que transcenderiam o escopo deste projeto. Para os propósitos deste livro, dado o emaranhado de abordagens sobre estratégia, optou-se pela seguinte definição:

“Estratégia é o padrão global de decisões e ações que posicionam a organização em seu ambiente e têm o objetivo de fazê-la atingir seus objetivos de longo prazo” (SLACK, CHAMBERS, HARLAND, HARRISON, JOHNSTON, 2007, p. 89)

A escolha anterior é baseada na capacidade do enunciado proposto por Slack et al. (2007) de sintetizar três aspectos que nos parecem fundamentais para a moderna gestão organizacional:

• o alinhamento interno da organização, entendido como a consistência no que se refere a processos, ações, informações e decisões entre as suas diferentes unidades funcionais, e que se infere do excerto “do padrão global (isso é, para toda a orga-nização) de decisões e ações”;

• o posicionamento da organização em seu ambiente, condição sinequa non para a sobrevivência em ambientes competitivos, como o são a maioria dos ambientes de atuação das organizações atuais;

• a visão de longo prazo, que proporciona melhores condições para a manutenção da coerência da organização ao longo do tempo, meta desafiadora face à dinâmica do cenário atual.

A necessidade de pensar a organização de forma holística, equilibrada, responsável e com visão de longo prazo está presente na abordagem da sustentabilidade organizacional (Triple Bottom Line), que tem como base a gestão estratégica de excelência. Como discu-tido em Silveira (2011-B), através do atendimento das demandas econômicas, sociais e ambientais, a sustentabilidade organizacional pressupõe o equilíbrio no atendimento dos interesses e das necessidades de todos os stakeholders, cuja análise das relações em uma dada organização leva às seguintes reflexões:

• Dimensão econômica, que contribui para todos os cinco grupos de stakeholders: a viabilização econômica de uma organização se dá através da oferta de produtos que agregam valor aos seus clientes, vindo ao encontro dos interesses diretos de seus proprietários, na forma de retorno sobre seus investimentos, de seus funcio-nários pela manutenção de bons empregos e de seus fornecedores, pela manuten-ção de seus negócios;

• Dimensão social, com impactos diretos nos funcionários e na sociedade: a res-ponsabilidade social que deve estar presente nas organizações se reflete, em pri-meiro lugar, nas condições de trabalho oferecidas a seus funcionários.

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• Dimensão ambiental, que impacta diretamente funcionários e a sociedade: o equilíbrio ambiental nos processos e produtos produzidos pela organização é de grande interesse para toda a sociedade, especialmente daqueles segmentos que são afetados mais diretamente, como os seus funcionários e as comunidades pre-judicadas por eventuais impactos ambientais.

De fato, o atendimento do tripé da sustentabilidade descrito acima, resultante do tra-tamento holístico dispensado às organizações, é um dos principais fatores para a gestão estratégica sustentável empresarial, com contribuições para todo o desenvolvimento so-cioeconômico do país.

ӹ Gestão da inovação: a busca da competitividade organizacional

As organizações são, de acordo com uma de suas inúmeras definições, sistemas de alta complexidade em contínua interação com o seu ambiente externo, de onde importam os recursos necessários para a execução de suas atividades e para onde exportam os seus produtos, na forma de bens tangíveis, informações ou serviços. A interação com o am-biente, sob contínua transformação, implica dizer que a mudança deve ser rotina nas or-ganizações. Mais do que um jogo de palavras, essa frase evidencia que a inovação 2 – aqui entendida, como em Tidd et al. (1997, p.6), como toda mudança benéfica para a organiza-ção 3 – é condição fundamental para que as organizações possam reajustar o seu nível de competitividade frente às demais forças competitivas presentes no seu ambiente e, assim, manter seu sucesso ao longo do tempo.

A inovação tem sido, ao longo do tempo, fortemente vinculada à tecnologia, de tal modo que o termo mudança tecnológica é geralmente associado à construção de máqui-nas mais modernas e transformadas. Essa associação se dá desde que a inovação se fez presente na forma de mecanização, se acentuando profundamente com o advento da 3ª Revolução Industrial (iniciada na década de 70 e, possivelmente, ainda em curso), deno-minação dada ao conjunto de transformações ocorridas no modo de produção vigente, no qual as inovações tecnológicas se impuseram como essenciais para a diferenciação, e mesmo para a sobrevivência, das corporações.

Essa transformação fez da inovação um elemento cada vez mais importante para as organizações, transcendendo, a partir de então, seu aspecto puramente tecnológico, de modo que ela começa a ser percebida como fruto não simplesmente de uma melhor forma de montar máquinas, mas, em última instância, resultante do uso criativo do conheci-

2 A OECD (Organisation for Economic Cooperation and Development) define que “inovação tecnológica de produto ou processo compreende a introdução de produtos ou processos tecnologicamente novos e as melhorias significativas em produtos e processos existentes... As inovações tecnológicas de produto ou processo envolvem uma série de atividades científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras e comerciais...” [OECD, Manual de Oslo, 1996, p.44]. Encontram-se na literatura outras abordagens e análises sobre inovação, tipologias, relação com ciência e tecnologia, entre outros temas, cuja discussão extrapola os propósitos deste trabalho. Para um estudo mais aprofundado, recomendamos a leitura dos trabalhos citados, em especial, o de Tidd et alli (1997). 3 As inovações – sejam elas mudanças radicais, pequenas melhorias ou adaptações – resultam da aplicação do desenvolvimento científico e tecnológico (em qualquer área do conhecimento) nas organizações e, obviamente, correspondem a uma mudança. Os benefícios de uma inovação – isto é, uma mudança benéfica para a organização – podem ser ganhos, grandes ou pequenos, de eficiência no uso de algum de seus recursos ou de eficácia no aten-dimento a um dos seus vários propósitos, tais como lucratividade, melhorias internas, contribuições sociais, entre outros.

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mento, aquele capaz de gerar novos produtos, processos e serviços. De fato, na medida em que estes são gerados, e inovam-se os já existentes, novas bases são formadas para promo-ver a competitividade organizacional.

Assim, espera-se da organização uma gestão da inovação eficaz e eficiente, no sentido de que as mudanças sejam implementadas corretamente e com agilidade, e os recursos alocados e utilizados de forma racional. A eficácia na gestão da inovação requer múl-tiplas atividades para monitorar e interpretar corretamente a dinâmica do ambiente, a seleção de um conjunto de ameaças-oportunidades a que a organização deve responder, bem como o planejamento de meios para responder corretamente às mudanças reque-ridas. Essas atividades exigem, por sua vez, recursos humanos, financeiros e materiais, aumentando com isso os custos operacionais, o que nem sempre é fácil de equacionar, tanto em organizações privadas, devido à diminuição nas margens de lucro decorrente do nível de competição hoje existente, como em organizações públicas, em razão da diminuição da capacidade de investimento do Estado.

A grande quantidade de demandas e de atividades internas em uma organização im-plica ademais no seu entendimento como um todo integrado, isto é, um sistema no qual os diferentes elementos internos da empresa interagem dinamicamente entre si e com os elementos presentes no seu ambiente de atuação, de modo a contribuir para o aumento da eficácia e/ou da eficiência organizacional. Em Silveira (1999, p. 28) é apresentada uma revisão abrangente sobre o enfoque sistêmico aplicado às organizações, na qual revela que compreendê-las como um sistema em transformação, formado por múltiplos níveis de subsistemas interdependentes e que interagem entre si, oferece um meio efetivo de prover as capacidades estratégicas que são valorizadas pelos clientes e pelos segmentos de merca-do onde a organização atua, sendo essas capacidades a base para se alcançar e manter uma posição competitiva a longo prazo. A recíproca também é verdadeira, como destacado por Tidd et alli (1997, p.30), que mostra os inconvenientes de um entendimento parcial do fenômeno da inovação como, por exemplo, de que se trata de um esforço restrito à área de P&D, ou que se resume em manter os clientes satisfeitos ou, ainda, de estar restrito às mudanças tecnológicas de produtos.

Entender a organização como um todo integrado em constante transformação é, tam-bém, um fundamento da administração estratégica 4. Como já mencionado, estratégias bem formuladas e adequadamente implantadas constituem-se em fatores fundamentais para que as organizações sejam bem sucedidas, em razão do maior alinhamento interno em torno dos seus objetivos globais, do posicionamento da organização em relação ao seu ambiente de atuação e da manutenção da coerência proporcionados ao longo do tempo.

ӹ Aprendizagem organizacional e enriquecimento cognitivo do trabalho

Como dito anteriormente, a inovação se constitui um elemento essencial para a compe-titividade organizacional. Entretanto, ela não acontece por acaso: é necessário um sistema que crie uma cultura organizacional adequada, que busque a melhoria contínua, reconhe-

4 Em Ansoff e McDonell (1993) esse entendimento é analisado.

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ça os bons colaboradores, aproveite oportunidades integradas com outras organizações (como nos mecanismos de “open innovation”) e cuide da inovação disruptiva.

De fato, existe uma relação causal entre inovação e aprendizagem, esta última influen-ciada tanto por fatores organizacionais e tecnológicos, pertencentes à dimensão objetiva da organização, como por fatores sociológicos e psicológicos inerentes à subjetividade hu-mana (SILVEIRA, 2012). Disso decorre a importância de o desenho organizacional consi-derar as organizações como entidades sociais (DAFT, 2002) e, portanto, sujeitas à influên-cia dos fatores psicossociais que afetam o trabalho em suas dimensões social e subjetiva (SZNELWAR; UCHIDA; LANCMAN, 2011).

Essas considerações reforçam a visão do capital humano como um recurso estratégico da maior importância em, virtualmente, todos os aspectos da organização, sendo ainda mais crítico naqueles processos cuja dependência do conhecimento é maior, como aqueles relacionados diretamente aos fenômenos da aprendizagem e da inovação. O corolário des-sas reflexões é que “saber aprender” tornou-se uma competência estratégica fundamental para as organizações atuais, importância expressa no reconhecido termo “learning orga-nizations” (SENGE, 1990).

A capacidade de aprender possibilita à organização alcançar e manter um desempenho superior, desenvolvendo, portanto, vantagens competitivas sustentáveis ao longo do tem-po, através de melhores condições para melhorar a qualidade, para a geração de inovação, para o aprimoramento da qualidade de vida, entre outras razões (BOYETT & BOYETT, 1999). A aprendizagem, no entanto, só é possível a partir de processos mentais, que per-mitem os indivíduos procurarem, tratarem, armazenarem, utilizarem diferentes tipos de informações do ambiente, ou seja, adquirir e produzir conhecimento (ABRAHÃO et al., 2009). Com efeito, a cognição humana pode ser explicada como um conjunto de proces-sos que captam informações (processos perceptivos) e a partir delas tentam processá-las e entendê-las. Conforme estuda a escola cognitivista, as pessoas percebem e processam informações através do aprendizado, do uso da memória e da atenção.

No ambiente de trabalho, quando o trabalhador analisa a situação e desenvolve es-tratégias para agir, dá-se inicio aos processos cognitivos com a função de interpretar a situação e escolher a melhor ação para resolver os problemas encontrados no ambiente. No entanto, para que ele tome uma decisão é preciso que haja um processo contínuo entre o estímulo do ambiente, o conhecimento sobre as tarefas e o conhecimento adquirido em outras situações (ABRAHÃO et al., 2009). Este processo, denominado por Fleury e Fleury (1997, p.21) de aprendizagem, «é um processo de mudança, resultante de prática ou experiência anterior, que pode vir, ou não, a se manifestar em uma mudança perceptível de comportamento».

A inovação, como já ressaltado, envolve muito mais que mudanças tecnológicas. Os economistas “industriais” reconhecem que a criação tecnológica deve ser incorporada nos modelos de produção, cuja operacionalização é um problema organizacional, fortemente vinculado às condições da aprendizagem (PERRIN, 1998). O processo de inovação tem uma característica essencial, que é sua íntima ligação com a geração de ideias, ainda que a inovação em si seja mais do que criar uma ideia, mas colocá-la em uso. Diferentemente dos demais bens produzidos na economia, a ideia é não-rival 5 e, portanto, em geral, de

5 Um bem não-rival é aquele cujo uso por um indivíduo não impede o uso, mesmo que simultaneamente, por

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difícil exclusividade no seu uso, cuja distribuição não permite que o produtor se aproprie, mesmo que em parte, dos benefícios gerados pelo bem.

Porém, a ideia e seu potencial inovador podem ser vistos por outra ótica. Embora a exclusividade possa trazer rendimentos para o detentor da mesma, sua difusão possibili-ta que se conecte com outras ideias, provindas de origens díspares, formando uma rede na qual o processo criativo, ao invés de rival, se tornaria complementar, se alimentando mutuamente e beneficiando as diferentes partes envolvidas. Neste sentido, a inovação pro-cede da atividade cognitiva dos sujeitos e de sua integração, relacionada, portanto, a um processo específico de aprendizagem coletiva.

Portanto, como o processo de inovação não flui naturalmente, embora devesse, a cultu-ra de aprendizagem precisa ser desenvolvida nas organizações que buscam inovar diante do ambiente em constante transformação. Organizações que apresentam um verdadeiro caráter inovador apresentam características singulares, que as diferenciam das demais, a saber:

• A inovação é generalizada. Todos, sem exceção, sentem-se comprometidos com o processo de inovação;

• A inovação é estimulada. O clima de inovação é instaurado pela direção da empre-sa, sendo toda ideia nova bem-vinda, com recompensa à criatividade e à ousadia;

• A inovação não tem limites. Os experimentos estão por toda parte;• A inovação é cultuada. As conversas nas empresas inovadoras são pródigas em

histórias e lendas de pessoas que introduziram novidades, às vezes quebrando regras;

• A inovação é interativa. Existem vários canais de comunicação abertos para ga-rantir uma autêntica interação entre a direção e os funcionários, os técnicos e os vendedores, a empresa e os clientes.

Como pode ser observado, a efetiva inovação depende de todas as conexões funcio-nando bem. As mudanças podem incidir diretamente no comportamento das pesso-as, surgindo restrições e reações adversas às inovações. Os envolvidos podem se sentir ameaçados pelo processo e inseguros quanto à adoção das novas tecnologias, com certa tendência à manutenção do já conhecido e à inércia; por isso, os dirigentes devem estar atentos a este fato, tomando atitudes que resultem em impactos positivos na relação en-tre os processos inovativos e como isso atinge seus funcionários.

Para Tushman e Nadler (1997), a inovação depende de funcionários motivados e dispostos a experimentar e criar. A direção da empresa é responsável pela implantação desta consciência inovadora, sustentação que, embora possa parecer paradoxal, exige ao mesmo tempo estabilidade e mudança: a estabilidade possibilita economias de esca-la e aprendizado incremental, enquanto a mudança e experimentação são necessárias à conquista de avanços nas áreas de produto, processo e tecnologia. Os autores afirmam ainda que as organizações altamente inovadoras são sistemas de aprendizagem alta-mente eficazes, de modo que a inovação não pode ser ignorada dentro da estratégia

outros. Consequentemente, a ideia é produzida apenas uma vez e o seu custo de replicação é praticamente zero. Em termos econômicos, significa que a produção de ideias envolve um custo fixo relativamente elevado e um custo mar-ginal próximo de zero. Tal característica implica em economias de escala dificultando sua produção numa economia pretensamente competitiva, na qual se teria o preço igualando-se ao custo marginal.

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competitiva das empresas, uma vez que, segundo Fleury e Fleury (1997, p.55) “a oferta é maior que a demanda e com isso é o cliente quem determina as regras de um mercado em que a competição é a palavra de ordem”.

Em tempos de concorrência acirrada, cabe aos gestores desenvolver a capacidade de aprender continuamente, buscando criar organizações que veem o processo de apren-dizagem como parte integrante de seus objetivos. Isso requer uma revolução na forma como a inovação é vista; trata-se não de uma simples mudança de maquinaria, mas de uma transformação constante em todos os processos, no funcionamento das organiza-ções e na forma como estas veem seus participantes, seus clientes diretos e gerenciais (aqueles que constituem a própria instituição).

A inovação impõe-se, assim, não apenas como fundamental para a sobrevivência das organizações existentes, mas como condição necessária para o desenvolvimento socio-econômico do país. A inovação tecnológica permitiu, historicamente, que países sem tradição científica se tornassem beneficiários do conhecimento gerado por meio de seu espírito empreendedor, ou por meio de uma política dirigida a esse objetivo.

ӹ Conhecimento em sistemas organizacionais: Capital intelectual como instrumento para inovação competitiva com qualidade de vida

Com base no que foi mencionado, pode-se afirmar que uma competência essencial para os sistemas organizacionais que atuam em ambientes competitivos, complexos e di-nâmicos é a capacidade de gerar, disseminar e assimilar novos conhecimentos ao longo de toda a sua estrutura. Uma das interessantes conceituações de conhecimento, derivadas dos filósofos clássicos, o define como uma “crença verdadeira justificada”. Em Nonaka e Takeuchi (1997), diferentes enfoques e abordagens do conhecimento são discutidos.

A efetiva difusão do conhecimento entre organizações e indivíduos envolve diversos mecanismos que são fortemente influenciados pelo processo de comunicação. Há, nesses casos, uma diversidade de métodos frequentemente utilizados que objetivam tanto dis-seminar o conhecimento quanto permitir a sua assimilação. Vários estudos realizados sobre este tema convergem ao argumentar que a difusão do conhecimento torna-se mais efetiva se houver comprometimento e interação pessoal. Já outros mecanismos utilizados, principalmente aqueles apoiados na Tecnologia da Informação prescindem da proximi-dade física, fator que se por um lado diminui (mas não necessariamente compromete) a eficácia na difusão, por outro, traz economias substanciais de tempo e de recursos.

A difusão e assimilação do conhecimento em qualquer área do conhecimento supõem a disponibilidade de informações e a necessidade de organizá-las para então, poder se apro-priar das mesmas. No entanto, a geração, disseminação, codificação, compartilhamento e uso do conhecimento não são algo trivial e de fácil implementação, na medida em que envolvem múltiplos atores e vários aspectos ligados à subjetividade do indivíduo. Com-partilhar conhecimento, sobretudo se este for tácito, ao mesmo tempo em que se constitui como etapa crítica para a criação do conhecimento individual e organizacional, também envolve uma série de dificuldades inerentes, considerando que tal processo é altamente dependente da interação entre as pessoas e requer confiança para ser implementado.

Há vários obstáculos a serem superados quando se trata de pensar mecanismos que viabilizem a socialização de conhecimentos dado que, como corroborado por Nonaka

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e Takeuchi (1997), a criação do conhecimento é efetivada não apenas pelo indivíduo – embora aquele seja gerado por este – mas também pelo grupo e pela organização. Para os autores, a criação do conhecimento passa pela distinção entre conhecimento tácito e conhecimento explícito e por vários processos de conversão entre eles que se interagem, se complementam e podem ser convertidos, estabelecendo-se um processo criativo dinâ-mico, que ocorre entre indivíduos, e dentro do indivíduo, em forma de espiral. Trata-se da espiral de criação de conhecimento, cuja interação entre os conhecimentos explícito e tácito gera quatro principais processos de conversão: a Socialização, a Externalização, a Combinação e a Internalização.

Um dos grandes desafios da gestão do conhecimento se refere a sua externalização, conversão do conhecimento tácito (subjetivo) para conhecimento explícito (objetivo), con-versão que envolve a formação de um modelo mental compartilhado e articulado por diálogo, construído e mantido por diversas variáveis dentro da organização (NONAKA e TAKEUCHI, 1997). Já no processo de internalização do conhecimento, outra principal fase desse processo, no qual se dá a transferência de conhecimento explícito em tácito, as interações tendem a ocorrer mais intensamente por um processo de tentativa e erro. “É preciso sentir [...] o conhecimento deve ser construído por si mesmo, muitas vezes exigindo uma interação intensiva e laboriosa entre os membros da organização...” (NO-NAKA; TAKEUCHI, 1997, p. 10).

É preciso analisar, portanto, as condições que possibilitam e viabilizam o estabele-cimento e a ampliação do conhecimento dentro do sistema organizacional, o qual deve configurar o cenário apropriado para a interação social de seus membros. Um caminho que vem se mostrando promissor para o desenvolvimento de modelos que proporcionem bons níveis de competitividade para a organização e para a qualidade de vida para os trabalhadores, é a gestão competente do capital intelectual, uma vez que, por se tratar em essência de “conhecimento”, aquele tem potencial para gerar valor econômico, através do desenvolvimento de uma força de trabalho constituída por trabalhadores autônomos, com capacidade de gerar os conhecimentos necessários. De fato, sabe-se que o ser hu-mano é mais criativo, participativo e reflexivo na medida em que suas necessidades mais profundas são consideradas (qualidade de vida).

A evolução dos mercados atuais, cuja dinâmica é ditada cada vez mais pelo uso do co-nhecimento, tem acrescentado os bens intangíveis – aqueles que não possuem existência física, mas representam valor para a organização – aos recursos organizacionais, sobretu-do, devido à inclusão do conceito de capital intelectual, formado pela capacidade intelec-tual humana e outros ativos intangíveis decorrentes da aplicação do conhecimento, entre eles, marcas e patentes 6 (EDVINSSON e MALONE, 1998). Sendo o capital humano, os conhecimentos e as competências do trabalhador colocados à disposição da organização, trata-se de tarefa gerencial da maior importância a capacidade de mobilizar a geração e o compartilhamento desse valioso recurso que tem na gestão competente do ser humano a criação de vantagens competitivas necessárias para a sobrevivência da organização. De

6 O conceito de capital intelectual é frequentemente caracterizado como composto de três conjuntos de fatores: capital humano – conhecimentos e competências dos colaboradores colocados à disposição da organização; capital estrutural – softwares e sistemas de gestão e demais ativos organizacionais relacionados à categoria de “propriedade intelectual” (marcas, patentes entre outros); capital de relacionamento – geração de conhecimento resultante das relações com outras organizações (como clientes e fornecedores) (SVEIBY, 1998).

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fato, essa não é uma tarefa fácil, ainda mais se considerarmos a complexidade inerente dos sistemas organizacionais que, como todo sistema social, têm nas pessoas e seus relaciona-mentos seu principal elemento.

Para um melhor entendimento dos sistemas organizacionais, uma proposta útil é a modelagem das organizações em três dimensões ou subsistemas, inextricavelmente in-tegrados: dimensão físico-tecnológico – constituída por todos os ativos tangíveis (mó-veis, equipamentos e ambiente físico-químico); dimensão organizacional – associada à concepção e estruturação da organização, constituída dos processos, estratégias, sistema de gestão entre outros elementos organizacionais; e dimensão psicossocial – relacionada à perspectiva subjetiva da vida humana, onde se situam os conhecimentos e as compe-tências individuais e onde se estabelecem as relações que podem fortalecer (ou não) os processos coletivos (ver SILVEIRA e GARDIM, 2014). Observa-se, a partir dessa pers-pectiva, a importância da dimensão psicossocial para os resultados da organização, uma vez que é nessa esfera onde se encontram o conhecimento e as competências individuais, componentes fundamentais propulsores da inovação, entendida aqui como toda mudança benéfica para a organização.

Dessa forma, para que se possa promover a desejada inovação por toda a empresa, é preciso entender o capital intelectual como um ativo econômico e, assim, reconhecer o capital humano como um recurso estratégico fundamental para o sucesso das organi-zações nos ambientes atuais. Entretanto, a dimensão psicossocial é aquela mais desco-nhecida e, portanto, ignorada e negligenciada nas organizações, o que faz com que os gestores considerem prioritariamente os fatores organizacionais mais perceptíveis, como aqueles pertencentes às dimensões física e organizacional, potencializando, com isso, os riscos associados aos fatores psicossociais, entendidos como os aspectos de concepção e gestão do trabalho e os contextos sociais e organizacionais que têm potencial de causar danos psicológicos ou físicos. Veremos a seguir que tais fatores podem impactar de forma negativa as organizações (na forma de desempenhos subótimos, índice de absenteísmo e presenteísmo), os seus trabalhadores (em termos de desgaste de bem-estar físico, mental e social) e a sociedade como um todo (como os impactos com assistência médica e benefí-cios previdenciários) (SILVEIRA e GARDIM, 2014).

ӹ Fatores psicossociais e subjetividade nas organizações

Numa perspectiva de recursos organizacionais, o trabalhador pode ser pensado como uma fonte de capital humano, condição que dependerá das suas capacidades intrínsecas e, também, do seu nível de integração (ou alinhamento) com os valores e interesses pre-dominantes na organização. Caso o trabalhador não compartilhe dos propósitos organi-zacionais, seus interesses irão divergir dos interesses dos demais indivíduos e, neste caso, na melhor das hipóteses, ele se manterá alheio às necessidades da organização, podendo chegar ao extremo de trabalhar contra os objetivos comuns da organização, inclusive, de forma inconsciente.

Especialistas citados na seção anterior, além de outros pesquisados, enfatizam a impor-tância do componente capital humano no desenvolvimento do capital intelectual por três razões: seu potencial para aumentar o capital estrutural; sua capacidade para internalizar na organização os frutos do capital de relacionamento, potencializando os resultados ad-

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vindos, e; sua capacidade para gerar novos conhecimentos. Ignorar, de modo deliberado ou não, a dimensão humana da organização é ir contra toda a dinâmica do mercado atual. Como já mencionado, em um mundo onde a informação e a tecnologia estão tão disponí-veis, a gestão competente do ser humano pode ser o diferencial que irá gerar as vantagens competitivas necessárias para a sobrevivência da organização em mercados ultracompe-titivos e dinâmicos.

Mesmo sendo difícil trabalhar com a dimensão subjetiva do ser humano, ela existe e um modelo gerencial completo não deveria deixá-la de fora. É preciso trazê-la para o cen-tro das decisões em organizações, sob pena de as decisões serem subótimas, uma vez que negam algo de existência e influências comprovadas.

O fato de ainda existirem tantas organizações que, a despeito de desconsiderarem o fator humano, conseguem permanecer ativas, explica-se pelo fato de que essa mesma ano-malia ocorre na grande maioria delas, evidenciando que o paradigma dominante ainda é o da visão tecnocrática, que considera por baixo o desempenho organizacional.

Teóricos em teoria das organizações enfatizam que toda organização é, antes de qual-quer coisa, um sistema social e como tal deve ser tratada:

“Organizações são entidades sociais dirigidas por metas, desenhadas como sis-temas de atividades deliberadamente estruturados e coordenados, e são ligadas ao ambiente externo [...]. O principal elemento de uma organização não é um edifício ou um conjunto de políticas e procedimentos: as organizações são compostas por pessoas e seus relacionamentos. [...]” (DAFT, 2002, p. 11).

A partir dessa perspectiva, e tendo em vista que os ambientes organizacionais vêm se tornando cada vez mais dinâmicos e instáveis, as abordagens que estudam a mudança organizacional normalmente enfatizam dois aspectos básicos:

• dimensões objetivas e mensuráveis da organização, constituídas pelas tecnologias, estruturas hierárquicas, departamentos, sistemas de informação, entre outros;

• dimensões subjetivas, que incluem todos os aspectos relacionados com o ser hu-mano, sejam de natureza sociológica, psicológica, fisiológica ou cultural.

Em virtude da multiplicidade de variáveis organizacionais, o enfoque sistêmico-holís-tico sobre a condução de mudanças que agregam valor à organização – ou seja, a condu-ção de inovações – aponta para a necessidade de integrar as dimensões objetivas e subjeti-vas para que o processo de mudança seja conduzido com sucesso. Nas áreas de psicologia e sociologia organizacional, por exemplo, encontram-se vários conceitos para ajudar à compreensão do desenvolvimento e comportamento das organizações, e das suas relações com os indivíduos e a sociedade. Segundo essa perspectiva, a mudança organizacional é, antes de tudo, cultural, entrando posteriormente no nível dos processos e dos recursos.

Cultura organizacional pode ser definida como o conjunto de valores e pressupostos básicos que definem o modo considerado correto de pensar, agir e sentir de uma organi-zação. A cultura tem algumas dimensões visíveis, chamadas de artefatos culturais (mobili-ário, prédio etc.), que são fáceis de ser notados, mas são os valores – normas, princípios ou padrões sociais aceitos ou mantidos pelo grupo social – que representam os pressupostos básicos da cultura organizacional, o que torna esta última, na maioria das vezes, uma ca-racterística subjetiva, ou seja, pouco visível e informal à organização.

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Dessa forma, embora tanto os fatores internos à organização (sua história, o perfil dos seus líderes, suas estruturas, a tecnologia empregada e a interação entre os membros da organização), como os fatores externos (características socioculturais da região e do seg-mento de mercado ao qual pertence à organização) influenciem a cultura organizacional inovativa, destaca-se a importância dos fatores psicossociais. Tal fato se explica, pois é na perspectiva subjetiva do trabalhador em que se situam os conhecimentos e as competên-cias individuais necessários à geração da inovação e, portanto, que influenciam o desem-penho organizacional.

ӹ Relações cooperativas e geração do conhecimento organizacional

Durante décadas, as premissas que norteavam o campo da ciência e tecnologia tinham como base a ideia de que inovação era um processo linear, no qual as fases de desen-volvimento/pesquisa, produção e comercialização de novas tecnologias constituíam uma sequência de processos bem definidos ao longo do tempo. No entanto, estudos mais recen-tes sobre os fenômenos relacionados (KLINE e ROSENBERG, 1986; DOSI, 1988; DAVID; FORAY, 1995; NONAKA e TAKEUCHI, 1997 e 2006; HASEGAWA, 2001) revelam que interações e feedbacks contínuos são características intrínsecas aos processos inovadores.

A organização não pode criar conhecimento por si só, sem a participação ativa dos indivíduos e dos processos interativos que ocorrem dentro dos grupos. Tais processos de interação, no entanto, transpassam por uma infinidade de processos psicológicos, que em sua grande maioria vão além da fronteira do consciente de cada um.

Entendida como ação coletiva essencial para a integração da sociedade, a cooperação ainda é um conceito polissêmico, analisado sob diversos ângulos. Considerando as pre-missas que divergem diante de diferentes visões e autores, relações e processos cooperati-vos — principalmente no ambiente laboral — tais abordagens frequentemente admitem a existência de “conflitos de interesses”, mesmo com estudos/teorias preconizados em épo-cas diferentes.

Há um entendimento no campo dos estudos organizacionais que tanto características estruturais e culturais quanto psicológicas são fatores que influenciam o comportamento cooperativo. Nessa perspectiva, dentre os vários intelectuais que teorizaram a temática dos grupos — Chatman e Barsade (1995); Steiner (2006); Le Bon (2008), Freud (2011) — são apontadas algumas contribuições da psicologia, pautadas principalmente pelo psi-quiatra e psicanalista inglês Wilfred Bion (1975).

Partindo do pressuposto de que o conhecimento humano é criado e expandido através da interação social, Nonaka e Takeuchi (1997) focam sua análise no processo de cria-ção e transformação do conhecimento dentro da organização, propondo uma abordagem inicialmente baseada na experiência de empresas japonesas, a já mencionada “espiral do conhecimento”. Conforme trabalham os autores, a construção do conhecimento insti-tucional é um processo em espiral, que começa no nível do indivíduo e vai subindo, ex-pandindo comunidades de interação, que cruzam os limites entre seções, departamentos, divisões e organizações (NONAKA; TAKEUCHI, 1997 e 2006).

Diante desta questão, a gestão do conhecimento, apoiada no princípio da disponibili-zação de conhecimento crítico quando necessário, ao dar suporte à sua criação e disse-minação, torna-se um importante instrumento para a sustentabilidade organizacional e

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para o processo de inovação. No nível empresarial, as redes sociais informais – sejam elas formadas por interações pessoais diretas ou mediadas por computador – se constituem em fontes importantes para a promoção da atividade inovativa, pois mantêm canais e fluxos de informação, no qual a confiabilidade e o respeito entre os atores os aproximam e os levam ao compartilhamento do conhecimento (GARDIM; CARTONI; CABALLERO, 2011).

Assim, para a construção de relações fortes — principalmente nas que visam a coo-peração —um elemento central é a confiança estabelecida entre os interlocutores das in-formações veiculadas. Neste caso, a função mais importante dos gerentes é organizar e direcionar a criação do conhecimento, ajudando o processo de construção da credibili-dade sobre a informação veiculada entre indivíduos, grupos, departamentos e diretoria. Nonaka e Takeuchi (1997, pp. 16-17) enfatizam que tanto os gestores seniores quantos os gestores de nível médio contribuem para a criação de conhecimento novo, provendo os funcionários de uma estrutura conceitual que os auxilie a dar sentido a sua própria expe-riência.

Um contexto organizacional que favorece a criação do conhecimento, como um es-paço compartilhado em movimento, favorece “as situações relacionais que energizam as pessoas tornando-as criativas, dentro de uma interação positiva e dinâmica” (NONAKA; TACKEUHI, 2006, p. 94), e colabora com o comprometimento e cooperação do indivíduo no grupo. Esse espaço/contexto pode ser físico (como um escritório ou outros locais de trabalho), mental (experiências compartilhadas, ideias ou ideais), virtual (uso de recursos tecnológicos como grupo de discussão na Internet e ferramentas colaborativas) ou a com-binação deles, sendo o aspecto mais importante a condição de favorecer a circulação de ideias para criação do conhecimento (GARDIM; CARTONI; CABALLERO, 2011).

Com efeito, a definição de uma clara e apropriada estratégia de gestão do conheci-mento apoiada por uma tecnologia da informação bem estruturada, com as ferramentas adequadas, é a chave para prover os fundamentos para a inovação e o compartilhamento do conhecimento prevalecer em toda organização (SENGE, 1990). A evolução da gestão do conhecimento pode, segundo Sveiby (2005), ser dividida em três fases principais. A primeira caracteriza-se por uma forte ênfase na utilização dos sistemas de gerenciamento de bancos de dados, no qual a intenção principal seria obter ganhos de produtividade para as empresas. A segunda fase, embora destaque a relevância dos sistemas de informação, é focada em aprimorar o direcionamento e o atendimento ao cliente. A última e atual fase surgiu no fim dos anos 1990, e privilegia o uso de recursos para a interação entre pessoas e empresas por meio de páginas web.

A gestão do conhecimento, apoiada no princípio da disponibilização de conhecimento crítico quando necessário, dá suporte a sua criação e disseminação, e é um importante instrumento para a sustentabilidade organizacional e para o processo de inovação. Preo-cupações com a gestão do conhecimento tendem a incentivar e potencializar o desen-volvimento de relações cooperativas no âmbito organizacional; assim como o estímulo à criação de relações cooperativas auxilia uma maior “aderência” (aceitação e uso) dos esforços na implementação das ferramentas que dão suporte à gestão do conhecimento.

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ӹ Conclusão

Como foi visto neste capítulo, o ser humano tem um papel central para a promoção da gestão sustentável nas organizações, entendida aqui como aquela que proporciona simul-taneamente a competitividade empresarial e a qualidade de vida dos seus trabalhadores. Essa premissa se justifica pelo fato de que novos conhecimentos, cuja aplicação é funda-mental para a geração da inovação, têm origem no ser humano, a tal ponto que, conforme afirma Senge (1990), as organizações aprendem somente através dos indivíduos que apren-dem. A aprendizagem individual não garante aprendizagem organizacional, mas sem esta nenhuma aprendizagem organizacional ocorre.

Na tentativa de responder a pergunta inicial, pode-se inferir que a importância de se-rem desenvolvidos modelos organizacionais sustentáveis que contemplem tanto a viabi-lidade econômico-financeira empresarial como as condições de trabalho aos quais estão submetidos seus colaboradores, inclui o desenvolvimento de estratégias, políticas, proces-sos e práticas que contemplem, sobretudo, o elemento humano. Em outras palavras, inclui a implantação de modelos cuja prioridade recai sobre o fator humano, pois são esses que trazem o potencial para gerar, transmitir e aplicar o ativo econômico mais valoroso no contexto da nova economia: o conhecimento.

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CAPÍTULO 2

GESTÃO DO CONHECIMENTO E DE COMPETÊNCIAS PARA A COMPETITIVIDADE ORGANIZACIONAL 1

Renato Soffner

ӹ Introdução

O capital humano é fator-chave de composição e otimização dos processos produtivos das organizações. Propomos aqui um modelo de competências focado no que se considera importante para um cidadão e trabalhador do século XXI. Mas consideramos, também, a necessidade de uma base epistemológica de suporte ao tema, sem se perder, no entanto, em detalhes teóricos, que sabidamente não devem compor, unicamente, o objetivo deste texto. A reflexão do teórico para uma aplicação prática é o que se convencionou chamar de práxis, e que deveria ser mais bem entendida e desenvolvida no meio corporativo.

Este texto não pretende ser apenas mais um dos escritos sobre tema tão polêmico e am-plo, como é a gestão do conhecimento. Acontece que o que foi apresentado, em geral, mas com notáveis exceções, às comunidades científica e corporativa, foi um excerto de senso comum e opinião pessoal no assunto, com a sensível e negativa ausência de embasamentos conceituais ao tema, oriundos da filosofia, da psicologia, da sociologia, da pedagogia e da tecnologia.

ӹ Do conhecimento

A própria definição de conhecimento, tema central das discussões aqui conduzidas, se constitui na fonte maior de preocupação para quem deseja trabalhar com gestão do co-nhecimento. Afinal, gerir quer dizer administrar; o que seria, então, administrar o conhe-cimento, se não é totalmente claro, para nós, o que seja o conhecimento? Querer estudar um objeto que, na verdade, não se consegue definir de forma exploratória, leva a uma incongruência preocupante.

Vamos, então, dar bases para o tema conhecimento, citando e discutindo diversas definições e bases epistemológicas.

Ao contrário do que o senso comum indica, conhecimento não é o mesmo que infor-mação. São conceitos diversos e devem ser diferenciados, a fim de se evitar distorções e interpretações incorretas – gestão do conhecimento não é, portanto, o mesmo que

1 Este trabalho é uma reorganização de conceitos já trabalhados pelo autor em artigo de periódico publicado.

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gestão da informação. Mesmo os especialistas na área de sistemas e de tecnologia de informação têm cometido esta interpretação errônea.

Definir conhecimento nos obriga a caracterizar um sujeito e um objeto, ou seja, o sujeito cognoscente e o objeto conhecido. O primeiro é o ator do processo de construção do conhecimento, enquanto o segundo é a base sobre a qual o processo de conhecimen-to se inicia. A interpretação de qualquer objeto do mundo concreto é, para nós seres hu-manos, e mesmo para os demais animais, informação. Qualquer som, imagem, símbolo, sensação ou reconhecimento de padrão é, para os nossos órgãos dos sentidos, aquisição de informação. É tentativa de descrever algo, ou seja, um conjunto de dados sensoriais que, tendo sido processados e integrados, assumem certo significado. Caso seja verbal, esse item de informação pode ser tanto verdadeiro como falso – informações falsas não deixam de ser informações, por lhes faltar veracidade. Mas é importante registrar que a informação pode ser, também, não verbal – visual, por exemplo. Nesse caso, é muito mais complicado falar em veracidade ou falsidade.

A partir do momento em que incorporamos essa informação, presente nos objetos do mundo concreto, estamos iniciando a transformação de informação em conhecimento, mesmo que por várias interpretações, sejam elas filosóficas, psicológicas, sociológicas ou pedagógicas.

Estamos, aqui, optando por uma linha epistemológica de orientação mais pragmáti-ca, para a qual o conhecimento consiste de modelos que, fazendo uso de informações, tentam representar o ambiente no qual está inserido o sujeito, maximizando a sua capa-cidade de resolver problemas (SOFFNER, 2005). Certamente, nenhum modelo poderá ser tão perfeito a ponto de agregar todas as informações do ambiente e representar de forma precisa a realidade. O ser humano (sujeito) busca o conhecimento para tentar fazer sentido da realidade (objeto) em que se situa. O conhecimento está, portanto, no processo de interação de um sujeito com um objeto: é nossa tentativa (subjetiva) de fazer sentido da realidade (objetiva).

O sujeito não tem apenas mente: ele tem órgãos dos sentidos, ele se movimenta, ele age sobre a realidade, em geral procurando transformá-la e adaptá-la aos seus desígnios. Todos os dados oriundos de seu sistema sensorial precisam ser processados e integrados em informações. E as informações precisam ser integradas em um modelo que o sujeito constrói e que pretende representar adequadamente (isto é, veridicamente) a realidade. Esse é o lado “sujeito” da equação. Ao pretender que sua representação seja verdadeira, o sujeito reconhece a alteridade da realidade e, mais importante, a sua irredutibilidade a estruturas puramente mentais. Do outro lado (por assim dizer) do sujeito há um ob-jeto, algo que lhe é dado a conhecer, a realidade, o mundo, seja lá como o chamemos. O conhecimento ocorre quando os dados fornecidos pelo sistema sensorial do ser humano são processados e integrados pela sua mente e se transformam em informações que exprimem enunciados sobre a realidade – enunciados esses que, como visto, podem ser verdadeiros ou falsos – e que, eventualmente, permitem a construção de um modelo teórico de como a realidade (material ou social) opera.

Por se basear em informações, que, por sua vez, são dados processados e integrados, o conhecimento tem um componente que é objetivo, não puramente mental – mesmo que o processo de construção de modelos seja tipicamente mental. Assim, a informação

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se transforma em conhecimento por meio dos processos de comparação, de consequên-cias (ou seja, quais são as implicações em decisões e ações), de conexões e relacionamen-tos, e de conversação. Já os dados brutos – símbolos sem significado – transformam-se em informação por meio da adição de significado, por contextualização, categorização (transformação em unidades de análise), cálculo (análises matemática ou estatística), correção (erros removidos), condensação (resumo em forma concisa). Conhecer signi-fica ainda associar, ligar e justapor saberes parciais e autônomos, fazer conexões entre elementos informacionais aparentemente desconexos, processar, analisar, relacionar, armazenar e avaliar informação, de acordo com critérios de relevância.

Para Polanyi (2009), sabemos mais do que podemos expressar. É a base da definição do conhecimento tácito. Este não pode ser facilmente formalizado e colocado em pala-vras, ao tentar ser explicado. É, para o autor, a base de nosso conhecimento do mundo. Já o conhecimento que pode ser formalizado, explicado, é chamado, por Polanyi, de conhecimento explícito.

O conhecimento tácito especifica o conhecimento válido de um problema, a capaci-dade de um cientista de persegui-lo, e a previsão das implicações ainda indeterminadas da descoberta a ser feita. Não é possível formalizar todo o conhecimento, sem o conceito do tácito. Operações explícitas não são capazes de determinar a natureza e a justificação do conhecimento humano. Notem-se as implicações para a gestão do conhecimento e para a própria educação.

Uma visão mais pragmática do conceito de conhecimento é a de Tiwana (2000), para quem o conhecimento é informação para a ação, informação relevante, disponível no lugar certo, no momento certo, no contexto correto e na forma correta, onde qualquer um pode usá-la nas suas decisões.

ӹ De competências

No war can be conducted successfully without early and good intelligence.

— The Duke of Marlborough

Iniciemos com algumas definições de competência:

a) Capacidade de quem é capaz de apreciar e resolver certo assunto, fazer determina-da coisa (Dicionário Aurélio Buarque de Holanda);

b) Observáveis características individuais – conhecimento, habilidades, objetivos, va-lores – capazes de predizer/causar efetiva ou superior performance no trabalho ou em outra situação de vida (David C. McLelland).

De acordo com Bloom (1974), competências são componentes dos sistemas cogniti-vo (conhecimentos), psicomotor (habilidades) e afetivo (atitudes) necessários para as ati-vidades de vida, dentro de uma perspectiva de comportamentos pessoal e profissional. Por conseguinte, competência implica na capacidade de fazer e de realizar atividades que agreguem real valor para as pessoas e para as organizações.

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Tais competências são desenvolvidas por meio de educação formal e, também, pela não formal, por meio de capacitações, treinamentos, experiências naturais e do senso comum, além da realização das habilidades inatas (genéticas e hereditárias). Gerir competências é ter visão integrada do potencial humano, desenvolvendo e utilizando estratégias de adminis-tração dos conhecimentos, das habilidades e das atitudes. É garantir um alto desempenho na educação e no trabalho, nas vidas pessoal e profissional.

É interessante notar que a certificação de competências é conceito já previsto no Caput do Artigo 41 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) – o potencial humano a ser identificado, avaliado, reconhecido, aproveitado e certificado. Para isso, podemos planejar o que poderíamos chamar de certificação de educação de alto desempenho, para os níveis de competências individuais e coletivas.

ӹ Algumas propostas conceituais

Faremos, nesta seção, a apresentação das ideias e conceitos propostos pelos autores que servem de base conceitual para este trabalho.

a) Benjamin Bloom e colaboradores

O modelo de Bloom e colaboradores, como visto anteriormente, tem utilidade quando consideramos as dimensões cognitiva, psicomotora e atitudinal, mais a proposta de men-suração dos indicadores designados, inclusive do ponto de vista da avaliação, por meio de uma sistematização da Taxonomia de Objetivos Instrucionais. Esta consideraria:

– Dimensão Cognitiva: desenvolvimento de competências intelectuais;– Dimensão Afetiva: emocional, sentimentos, valores, apreciação, entusiasmo, mo-

tivação, atitudes, juízos, opiniões;– Dimensão Psicomotora: movimento físico, sentidos, coordenação, áreas motoras e

sensoriais.

Na Dimensão Cognitiva temos as seguintes subdivisões e os verbos característicos das competências ali inseridas:

Conhecimento: reconhecer ou relembrar fato, conceito ou procedimento; apre-sentar ideias, poesia, trabalho, falar e escrever certo, tendências, classificações; investigar, indagar, definir, relembrar, reconhecer, quem, o quê, quando, como, onde, descrever, listar, associar, ordenar.Compreensão: entender fato, conceito ou procedimento; interpretar e extrapolar; explicar (algoritmo), discutir, comparar, predizer, descrever, inferir, aclarar; en-tender o significado, interpretar instruções e problemas, explicar com as próprias palavras. Aplicação: aplicar fato, conceito ou procedimento; usar numa nova situação ou nova abstração; usar, escolher, escrever, resolver, calcular, prever, produzir, preparar.Análise: Analisar fato, conceito ou procedimento; pensamento de ordem superior e crítico; concluir, analisar, separar em partes, comparar, esquematizar, ilustrar, deduzir por lógica, diferenciar entre fatos e inferências.

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Síntese: Criar fato, conceito ou procedimento; combinar partes para formar um todo maior que a mera soma das partes; novo padrão ou estrutura; combinar, compilar, construir, compor, criar, projetar, planejar, escrever, sintetizar, resolver, desenvolver, inovar.Avaliação: Avaliar fato, conceito ou procedimento; julgar mérito, solução de pro-blema, ideias; comparar, concluir, contratar, escolher, criticar, defender, avaliar, interpretar, julgar, decidir, argumentar, discutir, valorar.

Já a Dimensão Afetiva é assim estruturada:

Caracterização por valor: Manter sistema de valor que controla o comportamento (pessoal, social e emocional): autoconfiança, cooperação, ética, comprometimen-to, julgamento.Organização: Organizar valores em prioridades (conflitos, diferenças), comparar, relacionar e sintetizar valores.Valoração: Dar valor a pessoa, objeto ou comportamento.Participação ativa: Atender e reagir a fenômenos particulares, discussões, apre-sentações, questionamentos.Prontidão: Atenção às opiniões do outro, alteridade.

Finalmente, a Dimensão Psicomotora trabalha os movimentos, reflexos (não apren-didos), os movimentos fundamentais (como andar), a percepção (resposta ao estímu-lo e aos sentidos), as habilidades físicas (força, agilidade), os movimentos competentes (avançados), a linguagem do corpo, a precisão, a manipulação (como seguir um roteiro), a imitação (arte, desenho), a velocidade, a distância, e os procedimentos e técnicas (sua execução).

Um modelo de gestão de competências baseado em Bloom consideraria que cada com-binação de competências apresentadas na seção anterior poderia ser planejada pelo pro-fissional, de forma a garantir que habilidades reais e efetivas fossem desenvolvidas. Para isso, determinam-se quais são as competências necessárias para cada função ou atividade componente de trabalho. Aqui devem ser separadas competências natas daquelas básicas e essenciais desenvolvidas pela educação formal. Para cada componente, listam-se as ne-cessidades cognitivas, sensório-motoras e atitudinais pertinentes, e estima-se o valor atual em confronto com o que seria desejado após o processo de capacitação – são inseridos os valores já apresentados do modelo de Bloom, em termos de verbos e ações que caracteri-zam cada competência trabalhada.

A diferença de valor entre o real e o desejado é o que se convencionou chamar de gap, ou seja, um intervalo de competência a ser preenchido pelo processo educativo. Cada intervalo deste tipo terá associado um plano de desenvolvimento de competências, com objetivos, metas, cronogramas, currículo personalizado, meios, técnicas, tecnologias e ambientes de desenvolvimento, bem como um instrumento de avaliação e controle do processo como um todo. Lembremos que a aprendizagem é um processo de feedback loop, que precisa ser reavaliado continuamente. Este modelo é de grande interesse no meio corporativo, pois considera individualidades, que sabemos serem de grande importância para as organizações.

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b) Pierre Lévy e Michel Authier

Outra teoria interessante de gestão do conhecimento e de competências foi apresentada por Lévy e Authier (1995), no formato das árvores de conhecimentos, divulgada no livro de mesmo nome. Os autores propuseram um sistema computacional e matemático que pode-ria gerenciar as competências dos membros de uma determinada comunidade, mostrando assim, num formato padronizado, as qualificações individuais.

Os autores pensaram nas árvores como estruturas de patentes, que seriam emblemas representativos dos saberes e competências elementares de cada indivíduo. Novas paten-tes seriam atribuídas após a realização de testes e provas, no formato de simulações e de testemunhos, entre outras possibilidades.

O interessante nesta proposta é que qualquer competência pode ser considerada, inde-pendente do tipo de educação que a possa desenvolver. As pessoas passam a ser valoriza-das pelo que sabem e conhecem, e não por testes estéreis que a educação formal costuma propor.

O conjunto de patentes na árvore da pessoa compõe o brasão da mesma, sendo repre-sentação de todos os saberes, ou como dizem os autores, sua identidade cognitiva, que pode ser empregada na busca por oportunidades acadêmicas e profissionais, consistindo em interessante instrumento de gestão do conhecimento.

A gestão do conhecimento parece ser, então, mais processo que produto. Isto aprende-mos com décadas de imperfeições no modelo conceitual, e com mais fracassos que suces-sos. Mas temos uma nova visão sistêmica e sistemática do assunto, o que pode garantir que não seja, apenas, mais um modismo corporativo ou teoria acadêmica de pouca apli-cação efetiva.

c) Philippe Perrenoud

Perrenoud (2000) propõe um modelo de competências mais focado na área pedagógica, mas que pode certamente ser adaptado pelas organizações. Considera que gerir compe-tências é organizar e dirigir situações de aprendizagem, por meio do:

– conhecer conteúdos e traduzi-los em objetivos de aprendizagem– considerar representações dos sujeitos– considerar erros– compatibilizar a didática com os recursos– propor atividades de pesquisa

Já a administração da progressão das aprendizagens seria feita por meio de:

– situações-problema– visão longitudinal dos objetivos de aprendizagem– relação com teorias subjacentes– observação e avaliação de sujeitos em situação de aprendizagem– balanço periódico de competências e progressão

O mesmo autor (PERRENOUD, 1998) considera, em outra obra, que competências são o conjunto de recursos que mobilizamos para agir (e não apenas os saberes eruditos),

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mais a capacidade de agir eficazmente em determinado tipo de situação. Seriam classifi-cadas como potenciais (providas pela educação formal), realizáveis (providas pelo viver) e conhecimento na ação.

ӹ A gestão do conhecimento e do potencial humano

O conhecimento foi definido anteriormente, por ser a base do assunto e também para que ficasse clara a diferença do mesmo em relação ao conceito de informação, o que é muito importante para os objetivos deste trabalho. É pela aprendizagem que novos co-nhecimentos são construídos. Competências são o conhecimento em ação, e base para a realização do potencial humano, como tal.

Em função de tudo isso, discutido anteriormente, a gestão do conhecimento deve:

1) Processar dados em informação, por meio do significado;2) Agregar valor e utilidade à informação para que seja considerada conhecimento;3) Tal conhecimento tenha o formato de competências organizacionais e individuais,

para que possa atingir o nível de inteligência.

A cadeia epistemológica de nosso interesse leva à ação e a resultados reais, dada a visão pragmática que aqui assumimos. Movimentos de retroalimentação positiva e negativa au-xiliam no controle e melhoria de tais processos de conhecimento.

O que é, então, a gestão de conhecimento? É administrar ou gerir conhecimentos (ou seja, criar novos conhecimentos, utilizar bem o conhecimento atual, socializá-los conti-nuamente), e de forma otimizada para os nossos propósitos (sejam eles organizacionais ou pessoais). Tudo o que conhecemos ou sabemos, por meio de técnicas, métodos, práticas e processos associados, que possa aumentar o desempenho de nossas vidas, ou a com-petitividade e a sustentabilidade de um negócio via inovação e melhoria contínuas. Por ‘desempenho de vida’ nos referimos, também, a objetivos menos pragmáticos, como, por exemplo, a satisfação e a realização pessoal.

A gestão de conhecimento pode ser vista, também, como a conversão contínua de co-nhecimento tácito em explícito (vide discussão anterior baseada em Michael Polanyi), com o intuito de socializá-lo, ou o contrário quando as pessoas aprendem algo que tenha significado real para sua vida e para suas atividades profissionais. Especialistas em deter-minadas áreas do conhecimento podem ser considerados repositórios de conhecimento. Repare como é diferente se afirmar que um banco de dados é uma base de conhecimento – o que parece incorreto, do ponto de vista tratado nesta obra. A gestão do conhecimento deve garantir melhoria permanente, soluções ótimas de problemas, tomadas de decisão eficazes, produtividade, qualidade, competitividade, e inovação. Para tanto, os proces-sos de aprendizagem individuais e organizacionais devem ser permanentes, garantindo a existência de uma organização aprendente. O trinômio conhecimento < > aprendizagem < > ação é a base de sustentação deste modelo. A construção de competências é a forma pela qual tal modelo se implementa. As pessoas dotadas de técnicas e habilidades inven-tam novas máquinas, fabricam novos produtos, criam novos sistemas de comunicação, desenvolvem novas visões de mundo, enfim, constroem novos paradigmas. Neste ponto, cabe ressaltar que somente as pessoas e a forma como utilizam seus conhecimentos po-dem elevar as competências da organização.

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Usar de fato o conhecimento é torná-lo ação efetiva na empresa e na vida, por isso são competências realizadas – conhecimento aplicado.

A gestão de conhecimento deve ser uma atitude, um posicionamento de mindset das pessoas e das organizações. Temos um modelo mental muito arraigado no que se refere à centralização dos fenômenos observáveis no mundo: achamos que tudo tem que ter a figura de um agente superior comandando todos os níveis, e de forma centralizadora. Esta visão pode ser revista quando se adota um modelo mais descentralizado de visão de mundo. É preciso mudar a forma de pensar, os modelos mentais, as análises de decisão, a solução dos problemas, a colaboração, a comunicação, a interação.

Em termos gerenciais e organizacionais, a gestão de conhecimento começou a ser tra-tada formalmente como uma área do conhecimento com Nonaka e Takeuchi, no início da década de 1990, bem como com os trabalhos de Peter Senge, Thomas Davenport e Lawrence Prusak. Foi inicialmente parte das disciplinas de tecnologia e sistemas de in-formação, bem como da gestão de negócios. Mas logo se mostrou a importância de que outros campos pudessem embasar a área, como a filosofia, a psicologia organizacional e a sociologia.

Diversas empresas e organizações se dispuseram a implementar sistemas de gestão de conhecimento, sendo que a maioria dessas iniciativas acabou por confundir gestão de co-nhecimento com gestão da informação, como já tratado no início deste texto. A visão de recursos humanos se mostrou mais promissora, já que o conhecimento é, naturalmente, característica humana, em busca de desempenho incrementado, vantagem competitiva, socialização de conhecimento tácito e melhores práticas, inovação e criatividade, tudo isso do ponto de vista da aprendizagem organizacional, como já preconizava Senge em 1995. O conhecimento passa a ser visto como ativo de grande valor para a organização, inclusive no formato de capital intelectual (patentes, marcas, know-how), tanto nos níveis pessoal como organizacional.

Durante sua evolução, a gestão de conhecimento teve várias visões conceituais, como a tecnocêntrica (que em muito se confundiu com a gestão da informação, como visto), a humanística (focada no ativo intelectual e de competências das pessoas que compõem a organização), bem como a visão mais aceita, da interação sistêmica permanente entre pessoas dentro de um sistema adaptativo e complexo.

De qualquer forma, os componentes essenciais de um esforço de GC são as pessoas, os processos intensivos em conhecimento, a cultura organizacional de compartilhamento do que se conhece individualmente, a tecnologia de suporte a tudo isso (comunidades de prática, educação corporativa, e-learning, redes sociais e de relacionamento).

Mapear conhecimento seria identificar e facilitar o acesso a recursos de competências específicas, dentro e fora das organizações. Para isso, a tecnologia pode ter papel prepon-derante. As bases e repositórios de conhecimento seriam a coleção de conhecimento expli-citado, além dos próprios detentores de conhecimento tácito, como visto bem difícil de ser exteriorizado, que são encorajados a compartilhar seu conhecimento e suas competências de valor para o negócio.

Em resumo, a gestão do conhecimento trata de um conjunto de conceitos, métodos, ferramentas, práticas e estratégias para a identificação, criação, representação, utilização e socialização de componentes de conhecimento, incorporados em pessoas ou associados a

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práticas e/ou processos organizacionais, com finalidades alinhadas à estratégia da pessoa ou da organização. São processos contínuos de criação, mapeamento, utilização e socia-lização do conhecimento, numa organização ou no indivíduo, visando à agregação de valor às atividades organizacionais ou pessoais, além da melhoria das tomadas de decisão estratégicas. E conexão contínua entre pessoas, documentos e comunidades, garantindo o acesso permanente de todos ao conhecimento organizacional e apoiando a contínua socialização do mesmo, com fins de alinhamento à estratégica da organização.

ӹ Conclusão

Esperamos que as dimensões de competências aqui discutidas, a serem trabalhadas nas organizações, possibilitem melhores tomadas de decisão, resolução de problemas, pla-nejamentos e otimizações de recursos (via capacidades cognitivas e metacognitivas su-periores). Devem ser trabalhadas competências efetivas, a fim de se estar preparado para um mundo exigente em tal ativo intangível. O modelo aqui mostrado parece ter potencial para isso.

ӹ Referências Bibliográficas

BLOOM, Benjamin S. et al. Taxionomia de objetivos educacionais; volume I: domínio cog-nitivo. Porto Alegre: Globo, 1974.

BLOOM, Benjamin S. et al. Taxionomia de objetivos educacionais; volume II: domínio afetivo. Porto Alegre: Globo, 1974.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9.394/96. Brasília: Imprensa Oficial, Diário Oficial, v. 134, n. 248, 1996.

LÉVY, Pierre; AUTHIER, Michel. As árvores de conhecimentos. São Paulo: Escuta, 1995.PERRENOUD, Philippe. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: Artes

Médicas Sul, 1998.PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artes Mé-

dicas Sul, 2000.POLANYI, Michael. The tacit dimension. Chicago: The University of Chicago Press, 2009.SOFFNER, R. K. Estratégia, conhecimento e competências. Piracicaba: Degaspari, 2007.TIWANA, A. The knowledge management toolkit. New York: Prentice-Hall, 2000.

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CAPÍTULO 3

GESTÃO DO CONHECIMENTO: A ESTRUTURAÇÃO DO PROCESSO EM BUSCA DE MAIOR QUALIDADE NO TRABALHO

Eliane Maria Pires Giavina Bianchi

ӹ Introdução

A partir do final do século XX, a gestão do conhecimento vem se tornando um as-sunto vibrante nas organizações. Isso porque a competição aumentou em praticamente todos os segmentos de mercado e houve uma alteração nos diferenciais competitivos organizacionais: tecnologia não é mais um diferencial, ela pode ser facilmente copiada. A diferenciação está em outro tipo de recurso – o humano, ou melhor, a capacidade empresarial de mobilizar o capital humano e criar, usar e recriar conhecimento.

Conhecimento e aprendizagem são assuntos antigos, há tempos abordados pela filo-sofia, psicologia, sociologia, pela economia e agora entram na arena da administração. Pesquisadores que estudam a aprendizagem em ambientes de trabalho desenvolvem múltiplas abordagens sobre o assunto, discutindo conceitos, analisando casos, propon-do modelos ou discutindo a não necessidade de um modelo específico. Uma forma de considerar a gestão do conhecimento é estabelecer uma estrutura que viabilize a des-coberta, geração, transformação, captação, disseminação e compartilhamento do co-nhecimento – insumo para incremento das atividades organizacionais, visando maior qualidade, produtividade, lucratividade, inovação e, portanto a vantagem competitiva.

Nosso objetivo é discutir estruturas de gestão do conhecimento e os condicionantes dessas estruturas nas organizações. Para tal, são abordados alguns autores que estudam o assunto e um exemplo prático de aplicação dos conceitos. O resultado da discussão é um quadro referencial norteador, com múltiplas visões de estruturação da gestão do conhecimento para suportar a busca das informações e sua análise que pode servir de base de análise para múltiplas situações, sempre tendo em mente a realidade das orga-nizações, em especial no cenário de trabalho brasileiro.

ӹ Gestão do conhecimento: uma necessidade na sociedade atual

“Organizações que enfrentam condições de incerteza, ambientes em mudança e in-tensa competição devem ter capacidade de aprender e, ao fazê-lo, desenvolver novos conhecimentos” (FLEURY & OLIVEIRA Jr., 2002). A frase anterior traz uma série de significados.

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O primeiro deles diz respeito ao ambiente de mercado em que as organizações estão inseridas desde o final do século XX. “Aumento da competitividade, globalização, novas tecnologias, aumento de exigência dos clientes passam a demandar destas organizações pre-ocupação e ação constantes na diminuição de custo, no aumento de flexibilidade, na garan-tia de maior agilidade, na inovação” (BIANCHI, 2006). E esta nova postura é dependente das pessoas, ou melhor, da competência organizacional de mobilizar as pessoas em torno de um objetivo comum.

Como se sabe, a aprendizagem começa no nível individual, mas deve se expandir para o nível do grupo (um processo social) e para o nível organizacional (a institucionalização expressa em elementos organizacionais). Diversos autores desenvolveram abordagens sobre aprendizagem organizacional.

Para Senge (1998), aprendizagem organizacional é o processo pelo qual a organização está continuamente expandindo sua capacidade de criar o futuro. Senge elabora este pen-samento partindo da essência do ser humano, sua motivação a aprender, explorar e experi-mentar. Esse processo se estende para o grupo e para a organização, por meio de expansão de modelos mentais e construção de projetos coletivos. Porém, o processo de aprendizagem organizacional não se dá só nas mudanças de processos ou produtos. É necessário que esse conhecimento seja recuperado por membros da organização (FIOL & LYLOS, 1986).

Para Probst (2000 apud ELIUFOO, 2005), “conhecimento é o corpo integral de cognição e experiência que os indivíduos usam para resolver problemas, o que inclui tanto teorias como regras práticas do dia a dia, além de instruções para a ação. O conhecimento é basea-do em dados e informações, mas, diferentemente dos dados e informações, o conhecimento sempre está relacionado com as pessoas. Ele é construído pelos indivíduos e representa suas crenças sobre relacionamentos causais”. Portanto, a competitividade das organizações está relacionada à sua capacidade de se engajar em duas atividades ligadas ao conhecimento. A primeira é buscar uma forma de traduzir suas experiências em conhecimento, criando o conhecimento comum. E, a segunda é a capacidade de transferir conhecimento pelo tempo e espaço – aumentando o conhecimento comum contribuindo para a criação de novo co-nhecimento. (DIXON, 2000).

Para isso, pode ser recomendável uma ação específica empresarial de gestão do conhe-cimento, uma forma de, intencionalmente, estruturar este processo. O que se entende por estruturação de gestão do conhecimento?

ӹ Estrutura de gestão do conhecimento

Para discutir estrutura de gestão do conhecimento deve-se buscar primeiro o entendi-mento sobre estrutura organizacional. A partir desse conceito é que se pode definir estrutu-ra de gestão do conhecimento.

A estrutura nas organizações desenha as tarefas que objetivam produzir bens e serviços, enfatizando o controle dos processos, podendo também inibir a criatividade e autonomia das pessoas (ANGELONI et al, 2002), interferindo dessa forma na comunicação entre fun-cionários e departamentos, expandindo para as interações funcionais. Nos ambientes de rápidas mudanças, as estruturas devem atender às demandas internas e externas da organi-zação, visando posição competitiva no mercado. Embora, “muitas vezes, ela atue como uma pressão ou um inibidor para determinada atuação organizacional” (WOOD, 2004).

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GESTÃO DO CONHECIMENTO: A ESTRUTURAÇÃO DO PROCESSO EM BUSCA ... | 51

Durante o século XX, as estruturas organizacionais poderiam ser tipificadas em buro-crática – caracterizadas por tarefas rotineiras, divisões funcionais, múltiplos níveis hierár-quicos e comunicação formalizada – e força-tarefa – formações operacionais contingenciais, portanto, mais flexíveis e dinâmicas, com agregação de profissionais de departamentos dis-tintos em um projeto ou tarefa específicos. (ANGELONI op.cit, 2002).

Se “a estrutura segue a estratégia” da organização (CHANDLER apud MAXIMIA-NO, 2004), é necessário, na sua elaboração, fazer-se a análise de suas forças e limitações, detalhando-se variáveis situacionais como: o ambiente (que pode ser dinâmico ou estável); a tecnologia (natureza da atividade e uso do conhecimento que influenciam a estrutura) e o fator humano (características das pessoas que influenciam o tipo de estrutura que pode ser eficaz).

A estrutura, por um lado, exerce o controle; e por outro, pode favorecer a livre-iniciativa, a autonomia e a criatividade. Porém, um sistema totalmente aberto, onde as pessoas fa-zem livremente o que desejarem, sem uma estruturação formalizada, não produz resultados para um grupo e para uma organização. A estrutura configura-se assim como o meio para realizar os planos de uma organização. Alterar ou buscar novos modelos organizacionais significa exercitar uma flexibilidade que vise atender às necessidades do negócio da empresa.

A estruturação de uma organização pode, por si só, propiciar a gestão do conheci-mento? Qual a necessidade de se estruturar um esquema específico para sustentar este processo? Vários autores se posicionam de forma diferenciada ao responder as indagações. Alguns justificam que se deve elaborar uma estrutura específica dentro da estrutura orga-nizacional para auxiliar o processo de gestão do conhecimento. Outros argumentam que uma articulação bem feita dos elementos organizacionais (filosofia, políticas, processos e recursos) é suficiente para gerir conhecimento. Vale a pena discutir e analisar os posicio-namentos teóricos.

ӹ Uma análise sobre estrutura de gestão do conhecimento

Uma revisão das abordagens sobre estrutura de gestão do conhecimento, em ordem cro-nológica, é interessante para que se entenda a evolução do debate sobre o assunto. O inte-ressante é que cada autor tem uma visão distinta sobre conhecimento e daí, talvez derivem focos diferenciados de sua gestão.

ӹ Galbraith: aprendizagem nas organizações inovadoras

Galbraith (1997) enfoca o processo de inovação como uma oportunidade de aprendi-zagem para a organização e apresenta um modelo organizacional no qual coexistem uma estrutura operacional burocrática tradicional e a instalação de outra estrutura paralela pro-jetada para a inovação. Para ele, conhecimento é a raiz da inovação.

“É importante observar que os componentes básicos da organização inovadora nada têm de diferente dos da organização operacional. Isto é, ambas têm uma tarefa, uma estrutura, processos, sistemas de recompensas e pessoas.” (GALBRAITH, 1997). O que diferenciará uma de outra é sua estruturação. A estrutura da organização inovadora pode ser compre-endida como formada pelos seguintes elementos: pessoas desempenhando diversos pa-péis; processos diferenciadores (um paralelismo da organização criadora à tradicional) e reservas, como apresentado no quadro a seguir:

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Quadro 1: estrutura da organização inovadora

Estrutura da organização inovadora

Papéis

Gerador de idéia

Pessoa que elabora idéias para o negócio, seja pela descoberta ou criação (freqüen-temente, nível hierárquico inferior).

Patrocinador Pessoas que apóiam a idéia apresentada e aliam-se com o objetivo de inovar o pro-duto ou processo, buscando meios financeiros, políticos e materiais para levar o projeto adiante.

Orquestrador Mediador político na organização, prossegue com o processo de inovação, garan-tindo aos níveis aneriores condições de sustentabilidade do projeto. Está na dire-toria.

Processos Diferencia-dos

Esforços físico, operacional, financeiro e organizacional separados dos processos tradicionais da orga-nização. Caracterizado por um grupo de profissionais com menor controle, enfocados num objetivo comum, diferenciados da estrutura tradicional.

Reservas Unidades organizacionais estruturadas para permitir a esse grupo de profissionais sua atuação dis-tinta da rotina operacional da organização. Podem ser internas – dentro de um departamento exis-tente ou uma nova seção – ou externas – consultorias, universidades, agências de propaganda etc.

Fonte: adaptados pelos autores de GALBRAITH, J. R. Projetando a organização inovadora. in STARKEY, K. Como as organizações aprendem. São Paulo: Fortuna, 1997.

Uma das maiores dificuldades encontradas nessa estrutura organizacional é a re-sistência da organização tradicional na transferência do conhecimento desenvolvido pela organização inovadora. Questões políticas, evidenciadas nas relações interpessoais e in-tergrupais, emergem na transição de novos conhecimentos advindos de um grupo com status diferenciado, que em seu trabalho teve permissividade ao erro, espaço para maior criatividade, distância de suas atividades rotineiras da organização, contrastando com um grupo tradicional com metas, pressões de tempo e resultados esperados.

ӹ Nonaka & Takeuchi: combinação de formas de trabalho e novo papel gerencial

Nonaka e Takeuchi (1997) entendem conhecimento como uma crença verdadeira e jus-tificada. Com isso, suas reflexões têm um impacto muito forte em questões culturais, uma vez que estão quase falando de compartilhar o senso comum da realidade (BERGER & LUCKMANN, 2005).

Eles propõem uma nova estrutura organizacional em hipertexto, que permite a criação do conhecimento de forma eficaz e contínua em uma organização. O hipertexto é uma combinação ou síntese das estruturas organizacional burocrática e em força-tarefa com uma base de gestão do conhecimento.

A burocracia pode gerar resistência intraorganizacional e tensão, além de impedir a iniciativa individual, impactando negativamente a motivação, já que é fortemente depen-dente da padronização dos processos de trabalho e tem coordenação centralizada. Mas por outro lado, fortalece a especialização e acúmulo de conhecimento.

Já a força-tarefa é uma estrutura organizacional elaborada como contraponto à buro-cracia: é flexível, dinâmica e participativa, em geral utilizada para lidar com um problema temporário, com prazo determinado e meta específica. Entretanto, o novo conhecimento

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GESTÃO DO CONHECIMENTO: A ESTRUTURAÇÃO DO PROCESSO EM BUSCA ... | 53

criado em equipes de força-tarefa não é transferido com facilidade, de uma forma ampla e contínua para toda a organização.

A coexistência dessas duas estruturas, com pessoas se movimentando de uma situação a outra não é uma situação simples, e tem implicações culturais.

O terceiro elemento da estrutura em hipertexto é a base de conhecimento. Esta base é re-presentada pelos conhecimentos explícitos (tecnologia) e pelo tácito (elementos de cultura). Ela funciona como o elo entre a estrutura burocrática e a força-tarefa: o conhecimento tácito suporta a movimentação das pessoas entre as estruturas e o conhecimento explícito viabiliza a transferência formal do aprendizado. A capacidade de alternar, de forma rápida e flexível, diferentes contextos de conhecimento determina a capacidade organizacional de criação do conhecimento.

Elo fundamental neste processo é o gerente. Nonaka e Takeuchi desenham o novo pa-pel do gerente de nível médio. Segundo os autores, eles passam a ser o elo entre a realidade – linha de frente e a alta administração – a visão. Alternando papéis de líder de equipe e de força-tarefa, funcionam como verdadeiros criadores do conhecimento.

ӹ Sveiby: gestão dos atores organizacionais

Sveiby (1998) trabalha com o referencial teórico de Capital Intelectual postulando que existem os ativos intangíveis na forma de conhecimentos que não aparecem nos balanços contábeis, mas que espelham o valor de mercado da organização.

O autor determina como estruturas do conhecimento a externa – relações com clientes e fornecedores e a imagem da organização – e a interna conhecida como organização, representada pelas pessoas, cultura, sistemas e modelos administrativos.

Para esse estudioso, a principal atividade nas organizações do conhecimento é ser efi-caz na transferência desse conhecimento. Compartilha também da ideia da conversão do conhecimento idealizada por Nonaka e Takeuchi (processo iniciado em 1995).

A estrutura para a Gestão de Conhecimento na proposição de Sveiby é mais enfoca-da nos papéis desempenhados pelos colaboradores da organização do conhecimento. São eles: o profissional especialista que executa as tarefas, o pessoal de suporte que funciona como elo entre as funções, o gerente que regula o trabalho dos especialistas e busca e meta e o líder inspirador de todo o processo. As quatro instâncias são importantes e mu-tuamente dependentes, porém, visando garantir eficácia organizacional e a retenção do capital intelectual.

Como recursos para a transferência do conhecimento, Sveiby (1998) apresenta três estruturas: a exteriorização, a socialização e a interiorização, destacando o acompanha-mento do mentor ao aprendiz em situações de trabalho, um espaço físico que possibilite a socialização dos funcionários sem anteparos de comunicação visual – sem divisórias, por exemplo; assim como os jogos, dinâmicas de grupos e atividades que envolvem o não verbal, explicitando conteúdos tácitos.

O foco da gestão de pessoas deve ser reforçado por processos específicos como: trazer as pessoas certas, desenvolver essas pessoas, transmitir segurança ao longo do trabalho e da vida organizacional, estruturar e compartilhar valores e buscar ao máximo o compar-tilhamento comum.

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ӹ Davenport & Prusak: o mercado do conhecimento

Para entender como o conhecimento circunda o ambiente organizacional, os autores partem de uma analogia com o mercado de trocas, definindo alguns atores desse processo conforme demonstrado na figura a seguir.

quadro 2: o mercado do conhecimento

Os atores do mercado do conhecimentoComprador Pessoas que estão tentando resolver um probelma cuja complexidade e incerteza não permitem uma

resposta fácil. Vendedor pessoas da organização que têm reputação no mercado interno por possuir substancial conheci-

mento de um determinado processo ou assuntoCorretor Conhecidos como guardiões e demarcadores de área, articulam contato entre vendedores e com-

pradores do conhecimento.

Fonte: adaptados pelos autores de DEVENPORT, T. H.; PRUSAK, L. Conhecimento Empresarial. Rio de Janeiro: Campus; São Paulo: Publifolha, 1999.

Em todo mercado, existe um sistema de valores que os autores identificam como reci-procidade e confiança, que podem ser sinalizados pela posição e escolaridade; pelas redes informais e pelas comunidades de prática.

Na predisposição a reconhecer a existência de um mercado de conhecimentos, criar lo-cais de mercado – espaços físicos e virtuais como fóruns, feiras, salas de conversa, internets, intranets, grupos de discussão, universidades corporativas... pode trazer uma série de bene-fícios. A saber: elevação do moral da força de trabalho, maior coerência corporativa, um es-toque mais rico do conhecimento, meritocracia de ideias e rompimento de hierarquia rígida.

Davenport e Prusak (1999) afirmam que qualquer empresa que almeja priorizar a gestão do conhecimento terá que passar pelas etapas da geração, codificação e transferência do conhecimento. Salienta a premissa que uma estrutura por si só não garante a eficiência, aten-tando para a dimensão humana da gestão. Há um risco de não haver aprendizado organiza-cional. Se não há legitimação, não há institucionalização, portanto, fica-se o conhecimento no plano individual.

“Embora o termo gestão do conhecimento implique a transferência formalizada, um de seus elementos essenciais é o desenvolvimento de estratégias específicas para incentivar es-sas trocas espontâneas” (DAVENPORT & PRUSAK, 1999). Algumas das estratégias propos-tas são: rodízio de executivos de engenharia para produção; locais e clima de permissividade e incentivo para conversas e feiras e fóruns abertos que possibilitem que os funcionários interajam “informalmente”.

Para que a gestão do conhecimento não seja apenas um exercício de geração de ideias sobre o conhecimento que permeia a empresa, Davenport e Prusak (1999) propõem a estru-turação de pessoas, tecnologia e conteúdo do conhecimento através de um projeto de gestão do conhecimento.

Os autores sugerem como indicadores de sucesso de um projeto de gestão do conheci-mento: crescimento dos recursos vinculados aos projetos; crescimento no volume de conte-údo e de uso do conhecimento; um projeto tornar-se organizacional; aumento da familiari-dade com conceitos de gestão do conhecimento e evidência de retorno financeiro.

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GESTÃO DO CONHECIMENTO: A ESTRUTURAÇÃO DO PROCESSO EM BUSCA ... | 55

Como fatores de eficiência em Gestão do Conhecimento, os autores destacam: uma cul-tura orientada para o conhecimento, a infraestrutura técnica e organizacional, o apoio da alta gerência, a vinculação ao valor econômico ou setorial, orientação para processos, clare-za de visão e linguagem, a implantação de elementos motivadores não triviais, algum nível de estrutura do conhecimento e a utilização de múltiplos canais para a transferência do conhecimento.

ӹ Duguib & Brown: a estrutura institucional por si é suficiente

Para Duguib e Brown (2001), conhecimento é o know that, isto é, o saber fazer, a ação, a aplicação. Citam, inclusive, que o pensar é uma ação cognitiva, portanto, incluída no saber fazer.

Ao abordarem a gestão do conhecimento os autores polemizam, colocando em categorias extremas, a estrutura hierárquica formal das organizações e os grupos auto-organizados. Num primeiro momento pode parecer que a espontaneidade e criatividade podem ser maio-res nesses grupos e que as organizações não viabilizam a produção do conhecimento. Mas, para os autores, é o foco dado pelas organizações que viabiliza o processo de renovação do conhecimento e, se bem gerida, a organização viabiliza a espontaneidade, fundamental para o exercício da criatividade. Desta forma, uma estrutura organizacional bem arquitetada e gerida é a principal fonte de produção e renovação do conhecimento das organizações.

Os autores definem organização como um conjunto de comunidades de prática alinha-das sob uma mesma identidade e um mesmo fim. As comunidades rotinizam processos desenvolvendo assim, o conhecimento dos grupos. A organização alinha estas comunida-des, primeiro descobrindo os conhecimentos existentes e depois os mobilizando por meio de processos e estruturas para tirar o proveito das práticas espontâneas e específicas. O de-senho organizacional entrelaça e relaciona as práticas promovendo a inovação e, apoia o desenvolvimento e a circulação do conhecimento entre as comunidades de prática.

Para ajudar o processo de desenvolvimento dessas comunidades, uma organização pode tirar proveito de alguns mecanismos de gestão, segundo os autores. Um deles é viabilizar a participação dos indivíduos em diversas comunidades. Outro é utilizar mecanismos de tra-dução, isto é, conectores entre as comunidades de prática. E um terceiro é estabelecer objeti-vos de fronteira entre as comunidades: visão comum, tecnologia e processos. Indiretamente, eles reforçam o papel dos gerentes, que funcionam como os conectores na maioria dos casos e a definição dos modelos de gestão (ligados à gestão de pessoas e processos).

O aumento do conhecimento dos indivíduos, das comunidades e da organização como um todo deve ser suportado inicialmente por mecanismos de comunicação (que auxiliam a interiorização do mesmo) e depois pela prática.

ӹ Von Krogh, Ichijo & Nonaka: a gestão do contexto é fundamental.

Von Krogh, Ichijo e Nonaka (2001) partem da mesma visão de conhecimento utilizada em Nonaka e Takeuchi (1997). O conhecimento é crença verdadeira e justificada: individual, social, explícito ou implícito.

Em função dessa visão, os autores atuam na contramão de outros autores. Para eles, ge-rir conhecimento não depende de um executivo do conhecimento, nem de ferramentas de

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busca e acesso e, tampouco está preocupado somente com as informações facilmente detec-táveis e quantificáveis.

Criar o conhecimento depende de um contexto capacitante. No caso, a palavra contex-to está sendo usada quase como um sinônimo de ambiente. Algumas características deste ambiente que favorece a criação do conhecimento são: a valorização da ajuda e da contri-buição, a busca pelo compartilhamento, o exercício e o reconhecimento da confiança, o desenvolvimento de empatia, o exercício da coragem, o acesso. Cabe ressaltar que quase todas as características mencionadas levam tempo para se desenvolver, além de pressupo-rem grupos de trabalho e convívio mais estáveis. A combinação dessas características gera um ambiente de solicitude.

O desenvolvimento deste contexto pode ser feito por meio de cinco (5) fatores capaci-tantes: instilar a visão, gerenciar conversas, mobilizar ativistas, criar contexto e globalizar.

A visão mencionada é a própria visão sobre a criação e o uso do conhecimento alinha-do aos objetivos de negócio. Quando se fala em gerenciar conversas usa-se essa metáfora para enfocar o estabelecimento de linguagem, objetivos comuns, além do tempo necessá-rio para a interação entre as pessoas, a socialização.

Os ativistas são pessoas chave para ajudar o processo. Nessa proposta, os autores subs-tituem os CKOs (Chief Knowledge Officer) por qualquer pessoa que possa atuar como um integrador. Ao utilizar a atividade de coordenação, os autores praticamente definem que ativistas devem ser pessoas com habilidades gerenciais. Essa análise é justificada pela de-finição de ativismo: “(1) deflagrar e concentrar a criação do conhecimento; (2) reduzir os custos e os prazos necessários à criação do conhecimento; (3) alavancar as iniciativas de criação do conhecimento em toda a empresa; (4) melhorar as condições dos participantes da criação de conhecimento; (5) prepara participantes da criação do conhecimento para novas tarefas e; (6) incluir a perspectiva das microcomunidades no debate mais amplo sobre transformação organizacional” (VON KROGH et al, 2001).

Criar contexto para os autores envolve implementar estruturas organizacionais que fo-mentem relacionamento sólido e colaboração eficaz. Eles mencionam o “ba” um conceito de espaço que unifica espaços físicos, virtuais e mentais. A globalização para os autores é o processo de criação do conhecimento desde que surge um desafio empresarial até a transformação efetiva em um produto ou processo. Vale ressaltar que mesmo sendo bas-tante centrada nas pessoas e nas relações, a abordagem desses autores é bastante focada em estratégia, desafio empresarial e resultado.

ӹ Stewart: foco nas situações de negócio profundas em conhecimento

Para entender a contribuição de Stewart para a estrutura de Gestão do Conhecimento é necessário antes compreender seu conceito de Capital intelectual nas organizações como “a soma de seu capital humano (talento), capital estrutural (propriedade intelectual, meto-dologias, software, documentos e outros artefatos de conhecimento), e capital em clientes (relacionamentos com clientes)” (STEWART, 2002).

Para apurar os conhecimentos restritos ao negócio da empresa, o autor estabelece qua-tro passos do processo de desenvolvimento de uma estratégia de capital intelectual: iden-tificar e avaliar o papel do conhecimento em seu negócio; associar as receitas aos ativos do conhecimento que as produzem; desenvolver uma estratégia para reforçar e explorar seus

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ativos intelectuais e melhorar a eficiência do trabalho do conhecimento e dos trabalhado-res do conhecimento.

Para Stewart (2002), gestão do conhecimento é “identificar o que se sabe, captar e or-ganizar esse conhecimento e utilizá-lo de modo a gerar retornos”, transformando-o em ativo do conhecimento.

Uma contribuição singular do autor sobre o tema é seu olhar sobre o conhecimento como um produto da organização, ou melhor, dois tipos de produtos do conhecimento. Se a empresa tem um produto, então como agregar-lhe conhecimento, ou se existe um conhecimento, como convertê-lo em produto. Por essa ótica, além de retroalimentar a gestão da organização, o conhecimento gerado, obtido, divulgado e disseminado interna-mente pode e deve ser transformado em produto para o mercado externo. O autor defende a ideia de que não se vendem produtos e sim conhecimentos.

E como chegar a esse conhecimento? Através da criação e gerenciamento de projetos de conhecimento. “As empresas do conhecimento devem saber selecionar, planejar e gerenciar projetos do conhecimento, que aumentem o valor do conhecimento ou mudem a maneira como a empresa usa o conhecimento.” (STEWART, 2002). Investindo na conversão do tácito para o explícito, afirma o autor que as essas empresas “precisam de um projeto organizacio-nal que converta insight – conhecimento, inteligência, criatividade – em comportamento institucional. Elas necessitam, em outras palavras, de processos do conhecimento”.

ӹ Uma tentativa de síntese

Em função dos diferentes enfoques e abordagens, faz sentido retomar os autores de forma comparativa. Cada proposta tem uma ênfase, está baseada em alguns pressupostos e pode apresentar algumas restrições. O quadro comparativo ilustra uma reflexão sobre os modelos de estrutura de gestão do conhecimento discutidos:

quadro 3: quadro referencial de estrutura do conhecimento

visão sobreconhecimento

estrutura org. da empresa

estrutura de gestão do

conhecimento

reforço/mudança em papéis

contribuição pontos críticos

Galbraith (1997)

raiz para inovação, criatividade de pro-fissionais imersos na operação

mantêm-se a tradi-cional

cria-se uma organi-zação paralela para inovar

três novos papéis organizacionais: gerador de ideias, patrocinador e orquestrador

foco na mobilização de condições propí-cias para a inovação

como promover a integração e comu-nicação entre as duas estruturas?

Nonaka & Takeuchi

(1997)

crença verdadeira e justi-ficada

tradicional buro-crática (acumula e internaliza o conhe-cimento)

organização para-lela em força-tarefa (cria e socializa o conhecimento) e base do conheci-mento

novo papel gerencial (middle-up-down) e mobilidade organi-zacional das pessoas

abordagem integra-tiva em estrutura, papéis e processos

qualquer cultura se adapta? (valores, crenças, vivências...)

Sveiby (1998

capacidadede agir, focalizada em papéis

mantêm-se a tradi-cional

dinâmica, focada no exercício dos papéis dos atores organiza-cionais

papéis determina-dos: especialista, gerente, apoio e líder.

foco nas pessoas em ação

pouca estruturação de atividades ope-racionais de GC. Relações pessoais é outro ponto de atenção

Daven-port & Prusak (1999)

permeia a organiza-ção: observável ou implícito

mantêm-se a tradi-cional

projetos estrutura-dos para captar, de-senvolver, compar-tilhar e disseminar o conhecimento

qualquer colabora-dor pode ser agente do conhecimento, como comprador, vendedor ou cor-retor

entende a organiza-ção como ambiente de conhecimento

espontaneidade para o compartilha-mento está em toda cultura?

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visão sobreconhecimento

estrutura org. da empresa

estrutura de gestão do

conhecimento

reforço/mudança em papéis

contribuição pontos críticos

Duguib & Brown

(2001)

saber fazer é a estrutura social institucional, base de conhecimento infinitamente renovável.

mecanismos organizacionais para intermediar e interiorizar o conhecimento

gerente é o conector de comunidades de prática

valoriza aspectos tradicionais organi-zacionais para a GC

deve-se focar na preparação geren-cial.

Von Kro-gh, Ichijo & Nonaka

(2001)

crença verdadeira e justi-ficada

mantêm-se a tradi-cional

gestão de contexto: ambiente capacita-dor para a criação do conhecimento

valoriza o ativista (catalizador e coordenador do conhecimento

solicitude: definição e desenvolvimento de valores de convi-vência

como trabalhar a questão tempo: desenvolvimento do ambiente X resultado

Stewart (2002)

relacionado com o negócio: capital intelectual, capital estrutural e capital em clientes

mantêm-se a tradi-cional

projetos que gerem retorno

gerente e atores focalizados nas oportunidades de conhecimento do negócio

encara o conhe-cimento como produto vendável da organização

miopia do potencial de conhecimento (visão estreitada em atividades específi-cas do negócio)

Fonte: elaborado pelos autores

O quadro referencial mostra algumas considerações interessantes:

• Existem múltiplas visões de conhecimento norteando as abordagens dos auto-res, assim é preciso que cada organização também defina a sua visão,

• Todos os autores utilizam a estrutura organizacional tradicional burocrática como fomento para uma estruturação da gestão do conhecimento. Alguns ain-da abordam os benefícios dessa institucionalização,

• Para a estruturação de gestão do conhecimento podem-se utilizar processos específicos e formas alternativas de realizar as atividades sendo as mais valori-zadas os projetos com finalidade específica,

• O papel gerencial sempre sofre alterações quando se considera a gestão do co-nhecimento, mesmo que existam pessoas assumindo um papel de coordena-ção diferenciado. A formação e desenvolvimento desse novo gestor deve ser um ponto de atenção nas organizações,

• Refletir sobre a contribuição e os pontos críticos de cada enfoque é a principal tarefa das organizações ao avaliar, definir e implementar um modelo de gestão do conhecimento. O mapa conceitual pode funcionar como um panorama de suporte à decisão empresarial.

O quadro referencial apresentado não esgota todas as abordagens de gestão do co-nhecimento. Outras podem ser incluídas dependendo das necessidades e modelos em-presariais.

Um caso real para analisarmos a aplicação dos conceitos...

ӹ A Empresa: a corporação e uma de suas empresas

A empresa com atuação na área de informações tornou-se uma empresa global por meio de aquisições, especialmente no final da década de 1990 e início do século XXI. Sua estratégia de inovação em produtos é refletida na visão “... ser a primeira provedora do mundo em soluções...” e o foco global na sua missão “... criar uma rede global... nos mercados em que atua.”.

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Para atingir sua estratégia busca desenvolver competências essenciais alinhadas com seu objetivo: inovação radical e posicionamento seletivo (FLEURY, 2002). Além disso, é bastante focada em resultado e nas pessoas – seu principal ativo em função de sua área de atuação. Seu maior desafio na época foi integrar as organizações adquiridas em todas as regiões do globo suportando este processo com uma nova cultura.

Uma das empresas adquiridas está localizada no Brasil, onde atuou como líder de mercado sob uma administração familiar e autoritária. Esta, não apresentava o mesmo patamar de resultado das outras empresas do grupo além de ainda estar com produtos pautados em outra plataforma de negócio – produtos impressos. No caso da empresa brasileira, os desafios eram muitos: além de embarcar na estratégia global de inovação, deveria consolidar excelência operacional (FLEURY, 2002). A transformação cultural seria enorme com ênfase no desenvolvimento e aumento da participação das pessoas, busca de resultado e de um posicionamento diferenciado no mercado.

ӹ A estrutura global de gestão do conhecimento e aprendizagem organizacional

A solução desenvolvida pela organização para enfrentar seu desafio foi formalmen-te lançar um processo de gestão do conhecimento. Este processo veio acompanhado de um slogan “Share the Knowledge, Share the Future” (Compartilhe o conhecimento, compartilhe o futuro) e uma missão: ajudar a movimentar conhecimento crítico rápida e eficientemente pela empresa, produzir melhoria de processos, redução de custos e de tempo através da gestão do conhecimento e criar vantagem competitiva para os negó-cios.

Uma estrutura de papéis formais foi definida: o conselho consultivo (formado pelos executivos seniores da organização para fornecer a direção estratégica do processo); o CKO – Chief Knowledge Officer (profissional com dedicação exclusiva para criar a infra-estrutura para auxiliar o processo e ajudar a construir a cultura de gestão do conheci-mento); os patrocinadores regionais (escolhidos por características pessoais e influencia na estrutura regional que iriam capitanear, facilitar e intermediar práticas de gestão do conhecimento na região do grupo de negócios) e cada funcionário seria um trabalhador do conhecimento, tendo o papel de comprá-lo ou vendê-lo quando necessário.

O exercício do novo papel de todos os funcionários foi apoiado por uma série de recursos viabilizados para o suporte da gestão do conhecimento e uma série de novos processos de gestão. Com relação aos recursos de suporte foram implementados: webex e eRooms (ferramentas de suporte à reunião virtual para treinamentos e discussões com compartilhamento de documentos), diretório do conhecimento (para viabilizar as co-nexões entre as pessoas por meio de chaves especificas como a especialidade de atuação, experiência em projetos e experiência de negócios) e um diretório de melhores práticas online com relatos de grupos de projetos que superaram desafios e obtiveram resultados.

Com novos processos de gestão foram definidas formas de sinalizar, suportar e re-conhecer o comportamento das pessoas. O acompanhamento das estratégias, planos, resultados e dificuldades encontradas era feito por meio de reuniões mensais virtuais com os patrocinadores de todas as localidades. Uma conferência anual com todos os formalmente envolvidos com Knowledge Sharing era realizada na matriz para conso-

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lidar os resultados e envolver as pessoas-chave com novos conhecimentos por meio de contato com pensadores e estudiosos do assunto. As mudanças em políticas e proces-sos de gestão de pessoas também aconteceram: o modelo de gestão por competências recebeu a inclusão da competência – desenvolver e gerir conhecimento e o processo de avaliação de desempenho deveria contemplar esta competência em objetivos e desem-penho. Um processo de premiação anual de projetos voltados à inovação e finalizados com resultado também foi lançado.

Era, também, incentivada a criação de espaços abertos em todas as empresas: es-critórios abertos, o cyber café, e o learning center – uma espécie de biblioteca de recursos com livros, CDs, jornais, acesso à internet e mesas de reunião para facilitar a busca e o compartilhamento das informações e a busca e produção do conhecimento.

A empresa também entendia que o preparo pessoal para atuar no compartilhamento do conhecimento era importante e que, o enfrentamento dos desafios organizacionais dependia de um maior aprendizado individual e organizacional. Assim, paralelamente à estrutura de gestão de conhecimento, a organização desenvolveu a sua universidade corporativa, outra estrutura que buscava suportar o processo de consecução de resulta-dos. O foco principal da universidade corporativa está apresentado na figura a seguir:

quadro 4: slogan e prioridades da universidade corporativa

Universidade Corporativa

FOCO:Aumentar o conhecimento sobre o negócio;Aprimorar estilos gerenciais;Aumentar a efetividade pessoal;Desenvolver liderança;Fortalecer a cultura.

Fonte: elaborado pelos autores partindo de documentos da organização

Percebe-se que se privilegiava tanto o aprendizado individual quanto o do grupo. Mecanismos de gestão deixavam clara a importância dada à questão da aprendizagem e gestão do conhecimento por esta organização. Anualmente, durante o processo de revisões estratégicas e elaboração dos orçamentos de negócio, eram também analisados os desenvolvimentos e planos regionais para gestão do conhecimento e para a universi-dade corporativa. Se apresentados de forma consistente com o desenvolvimento e foco do negócio e, com clareza de estratégia e plano de ação futuro; os orçamentos eram aprovados e financiados corporativamente, isto é, não afetavam margem das empresas ou das regiões. Com isso, o processo era consolidado como uma forma importante de viabilizar as transformações e facilitar a consecução de vantagem competitiva.

ӹ A necessidade e implantação dessa estrutura no Brasil

No momento da implantação da estrutura de gestão do conhecimento na empresa brasileira, os executivos locais, juntamente com o patrocinador do conhecimento regio-nal, analisaram alguns aspectos importantes. A gestão do conhecimento era uma filoso-fia interessante, quando se vislumbravam os desafios que a empresa estava começando a enfrentar. Porém, algumas questões-chave apareceram. A estrutura desenvolvida pela

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GESTÃO DO CONHECIMENTO: A ESTRUTURAÇÃO DO PROCESSO EM BUSCA ... | 61

corporação propunha uma forma muito direta de atuação, com trocas, busca e dispo-nibilização do conhecimento. Diante da transformação cultural pela qual a empresa brasileira estava passando, este processo poderia se tornar mais uma fonte de pressão do que de ajuda. Além disso, impactos culturais como o uso do idioma inglês e as inte-rações virtuais não foram considerados pelo modelo corporativo.

Assim, o grupo executivo teve que responder a seguinte questão: Como lidar com esta nova filosofia suportando as pessoas na realização e enfrentamento dos desafios organizacionais?

O patrocinador de gestão do conhecimento da América Latina optou por negociar uma forma de customização do modelo corporativo, levando em conta as questões lo-cais. As estratégias regionais para gestão do conhecimento foram definidas como:

• Desenvolver um modelo mental comum: estabelecer uma forma de aproximar as pessoas com este novo processo, suas vantagens, suas demandas. Foi realiza-do um processo de sensibilização gerencial, um programa para a implantação das estratégias em forma de projetos multifuncionais em força-tarefa e um pro-cesso de comunicação formal extenso para todos os funcionários.

• Suportar projetos críticos: foram escolhidos três projetos estratégicos para acompanhamento especial com enfoque de KS. O esforço foi de capacitação pessoal, metodologia de gestão de projetos, e facilitar a interface internacional e comunicação com a corporação. Um desses projetos será detalhado adiante.

• Desenvolver uma plataforma de tecnologia: em função das questões de idioma uma plataforma local, mais simples que a global foi desenvolvida.

O patrocinador do conhecimento reforça que no primeiro momento houve um gran-de esforço, tanto na gestão dos projetos (em função da nova forma participativa de tra-balho) quanto no uso da plataforma tecnológica (demanda cultural focada em novos valores e pressupostos).

Vale ressaltar um projeto multifuncional que acabou desenvolvendo uma nova for-ma de trabalhar na empresa. A área de atendimento que oferecia um serviço telefônico de informações segmentadas passava por uma situação difícil: atendia somente 45% das ligações telefônicas sem padrão de resposta, com profissionais pouco preparados e desmotivados. Os clientes tinham baixo grau de satisfação (em algumas pesquisas spot demonstravam um grau de insatisfação de 85%).

Foi estabelecida uma equipe de trabalho multifuncional, em esquema de força-tarefa que, durante dois anos e meio, atuou para remodelar os processos e a estrutura da área. Esta equipe era formada por pessoas da área de recursos humanos (inclui líder do pro-jeto), três pessoas da área de marketing, duas pessoas oriundas da área de atendimento e três vindas da tecnologia.

Em termos de frentes de trabalho e definição da nova forma de atuação o esforço foi assim estabelecido:

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quadro 5: reformulação da área de atendimento da empresa brasileira

Frentes de trabalho do grupo força-tarefaDesenho da estrutura:•novo organograma com

as área de planejamen-to e conteúdo além de grupos de trabalho dire-cionados,

•dimensionamento dos atendentes,

•definição dos papéis e interrelações da área de suporte: planejamento, conteúdo e suporte técnico (esta lotada na estrutura de tecnologia),

•estabelecimento de uma biblioteca técnica,

•atendentes multifuncio-nais (pelo menos duas áreas de conhecimento),

•mudança do papel da supervisão (atuante na linha de frente).

Novos processos:•definição de padrões de

atendimento,•definição de atuação

multimídia: telefone, fax e e-mail,

•implantação da URA (unidade de resposta audível),

•definição e acompanha-mento de indicadores de desempenho de pro-cesso,

•implantação de pesquisa de satisfação de clientes trimestral, realizada por entidade terceira,

•trabalho no esquema 6 + 2 (seis horas de atendi-mento e duas horas para treinamento, projetos e reciclagem

Forma de gestão:•além da estrutura for-

mal de trabalho houve a definição de esquema de força-tarefa para as ações específicas,

•remodelagem da área para criação de espaço aberto,

•criação de comitês de análise e feedback de pro-dutos para interface com a área de desenvolvimento de novos produtos,

•processos extensos de comunicação multilateral,

•implantação de uma pla-taforma de Gestão do Co-nhecimento para suportar o dia-a-dia dos trabalhos e os processos de capaci-tação e aprendizagem

Gestão de Pessoas:•implantação de nova es-

trutura de carreira (com menos cargos), processo de treinamento planeja-do e estruturado, acor-dados entre a supervisão da área e a universidade corporativa,

•nova política de remu-neração com pesquisas externas e programas de incentivo e recompensa,

•novas políticas de traba-lho: intervalos de des-canso, banco de horas.

•coaching da gestão,•implantação de processo

de avaliação de desem-penho.

Fonte: elaborado pelos autores utilizando fontes de imformação da empresa.

Os resultados obtidos foram muito satisfatórios. Além da centralização do processo e redução de 42% do número de atendentes, as respostas passaram a ser monitoradas em du-ração da ligação e conteúdo, aumentou o grau de satisfação dos clientes (92% média anual durante o segundo ano de trabalho). Caiu para menos de 5% o número de ligações não atendidas, as pessoas passaram a se sentirem privilegiadas e, entre outros indicadores, cada profissional recebia 490 horas de treinamento por ano. A empresa foi reconhecida como TOP OF MIND em sua área de atuação.

Este tipo de esforço foi incorporado e expandido na organização em outras atividades estratégicas.

A estrutura de gestão do conhecimento também era suportada no Brasil pela universida-de corporativa. Em função do momento, das demandas organizacionais e de negócio e do perfil de pessoas da organização (a estrutura organizacional havia sido recém-desenhada com a estratégia declarada de mesclar pessoas: as de dentro aportavam conhecimento do negócio enquanto as vindas de fora traziam conhecimento de gestão empresarial), as estra-tégias e foco eram um pouco diferentes dos corporativos como segue:

• Promover o alinhamento gerencial: ações de treinamento para consolidar o co-nhecimento funcional, desenvolvimento de estilo de liderança, suporte a gestão de projetos, uso da filosofia de KS para reuniões e processos decisórios e utilização de grupos de trabalho para a formulação do planejamento estratégico.

• Compartilhar o conhecimento de processos e de negócio: currículos de treinamen-to específicos para algumas áreas funcionais. Muitas ações extrapolavam o conceito tradicional de sala de aula e acabavam se desenvolvendo com táticas alternativas:

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GESTÃO DO CONHECIMENTO: A ESTRUTURAÇÃO DO PROCESSO EM BUSCA ... | 63

reunião, campanhas de incentivo, esforços de comunicação. Vale ressaltar um des-ses programas: um workshop oferecido quinzenalmente para doze pessoas com ins-crição espontânea viabilizava a simulação do fluxo operacional da empresa

• Desenvolver habilidades e competências: eram atendidas necessidades individuais e grupais em aspectos relacionados ao negócio e desenvolvimento das pessoas.

ӹ Qualidade dos resultados atingidos

A visão de resultados está baseada na própria percepção de executivos da empresa, co-lhida durante o processo de implantação do modelo para uma posterior reflexão à luz dos modelos teóricos. Em função das diferenças de atuação e mesmo da estruturação do modelo de gestão do conhecimento, tem-se uma análise do enfoque global e uma do enfoque brasi-leiro. Vale, também, uma análise relacional entre os dois contextos.

Com relação ao contexto global, a gestão do conhecimento sempre foi uma priori-dade da alta administração. O foco sempre foi o conhecimento crítico, isto é, aquele ligado ao negócio. O processo trouxe resultados comprovados em termos de redução de custos, eficiência, inovação e satisfação dos clientes (resultados publicados internamente nos meios formais de comunicação da empresa). Porém, a filosofia foi implementada de forma parcial, já que o processo era muito dependente dos presidentes regionais e patrocinadores do co-nhecimento. Uma dificuldade do processo foi entender e prever as diferenças culturais re-gionais e locais, isto é, as ações globais vinham com força, por um lado reforçando o sentido de pertencimento à grande corporação, mas por outro, às vezes funcionando como pressão ou restrição. Em função da estratégia de crescimento da empresa (aquisição de empresas locais familiares) em parte a estrutura de KS acabou virando uma comunidade de prática do alto escalão, em função do uso do idioma inglês.

Analisando o contexto brasileiro, reconhece-se que implantar gestão do conheci-mento significa um grande esforço de mudança cultural. A consecução de resultado pôde ser observada no caso da área de atendimento. Houve extenso planejamento das ações e es-forços contínuos de envolvimento, capacitação e reforço de comportamento individual. Ao se abordar o aspecto cultural, algumas questões saltam aos olhos: uma vez estabelecidas às relações de confiança, é mais fácil compartilhar conhecimento no projeto (o conhecimento tácito) do que compartilhar na estrutura tecnológica ou outras atividades onde se enfoca o conhecimento explícito.

Observou que modelos distintos: o global – focado em diretrizes e disponibilização de recursos – e o brasileiro mais diretivo funcionaram em consonância. Aparentemente, cada entidade organizacional exerceu sua função e atuou de acordo com o momento de negócios que estavam inseridas.

ӹ Interpretando os modelos teóricos na prática

Ao observar o modelo de gestão do conhecimento partindo-se da estrutura corporativa pode-se observar a combinação de conceitos de vários autores. A motivação para se estrutu-rar um projeto de gestão do conhecimento coincide com a abordagem de Galbraith (1997), isto é, organizar para se buscar a inovação. O modelo adotado, por si, é o modelo de Daven-port & Prusak (1999) com o mercado, os compradores e vendedores e o CKO na função de

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corretor (nos materiais de referência da empresa com informações sobre o lançamento do projeto encontra-se menção explícita a esses autores). Como o foco da gestão do conheci-mento é o conhecimento crítico, pode-se encontrar no modelo corporativo Stewart (2002) que também menciona a função de CKO. Todos os autores citados também enfatizam o uso das ferramentas. Davenport e Prusak (1999) reforçam na definição do mercado a im-portância dos espaços físicos e virtuais, elementos encontrados no caso.

Sveiby (1998) coloca que uma forma de medição do resultado de ações de gestão do conhecimento é o aumento do valor intangível. Executivos da empresa brasileira re-forçam que houve aumento no valor de mercado da empresa global durante o período de 2001 a 2004 (prazo de observação utilizado para o caso). Estas informações estão disponíveis nos relatórios públicos da empresa. Porém, não se consegue afirmar que so-mente as ações de gestão do conhecimento contribuíram para esse resultado, até porque durante este período a empresa continuou investindo em outros negócios.

A empresa brasileira, ao embarcar no projeto corporativo de gestão do conhecimento, teve que refletir sobre os aspectos culturais e sobre o momento da empresa. Pelos relatos, houve uma preocupação grande com a questão do contexto para a mudança empresarial em busca de uma filosofia de compartilhamento do conhecimento. Houve a busca de for-mulação de uma visão e mentalidade comum e, a construção de um ambiente que favore-cesse a solicitude (VON KROGH et al, 2001).

Ao analisar o projeto realizado por um grupo em força-tarefa da empresa brasileira na área de atendimento, observa-se que, de uma forma não explícita, o modelo final de funcionamento da área remonta à estrutura de Nonaka e Takeuchi (1997) com a estru-tura em hipertexto definida para o funcionamento da mesma. Também nesta área são tratados os papéis como o proposto por Sveiby (1998) quando se menciona o atendente (profissional do conhecimento), sua relação com o pessoal de suporte, o novo papel da supervisão e o grupo força-tarefa do projeto atuando como liderança.

O patrocinador de gestão do conhecimento da região latino-americana acabava fun-cionando como um gerente middle-up-down em suas relações com a corporação além de ativista e CKO em suas funções básicas. (NONAKA & TAKEUCHI, 1997, VON KROGH et al, 2001 e STEWART, 2002).

Com relação ao papel esperado para o gerente da empresa brasileira pode-se observar nas definições de foco da universidade corporativa uma abordagem centrada em estilo de gestão, tomada de decisão e conhecimento de negócio que remontam as abordagens de Duguib e Brown (2001). Os resultados medidos na experiência brasileira são em termos de indicadores operacionais, que ajudam na manutenção e continuidade da filosofia de ges-tão do conhecimento, mas não necessariamente estão relacionados ao aumento de valor da empresa (SVEIBY, 1998).

A experiência prática acabou ilustrando formas de implementar a gestão do conheci-mento e que uma combinação de modelos é possível dependendo da estratégia, cultura e ambiente da gestão organizacional.

ӹ Conclusão

Observa-se que existem vários modelos e conceitos de estrutura de gestão do conheci-mento. Cada autor inclui na sua definição de estrutura um alinhamento total ou parcial

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GESTÃO DO CONHECIMENTO: A ESTRUTURAÇÃO DO PROCESSO EM BUSCA ... | 65

dos elementos que estão na definição de estrutura organizacional. Em alguns casos, os modelos podem prescindir de aspectos específicos (como a cultura).

A experiência real descrita exemplificou que um debate das ideias com as visões dos autores pode ser realizado e uma implantação utilizando várias combinações das diversas abordagens pode ser feita observando-se aspectos como: estratégia, cultura e preparo ge-rencial. Os resultados também são dependentes do modelo adotado em consonância com aspectos organizacionais.

Um determinado grau de estruturação da gestão do conhecimento parece ser sempre necessário. Por um lado, a estrutura burocrática, ainda muito utilizada em organizações nacionais e transnacionais, frequentemente não contribui com a disseminação do conhe-cimento. Assim, a busca pela flexibilidade, criatividade, interação, certa permissividade ao erro e formas de promover a busca, criação, disseminação e aplicação do conhecimento se fazem necessárias no formato de uma estrutura (filosofia, políticas, processos e recursos) paralela à estrutura organizacional tradicional.

A gestão do conhecimento no ambiente organizacional deve sempre levar em conta o fato de que as pessoas estão juntas, participando de um projeto coletivo de criação, num ambiente que deve ser solidário e sempre privilegiando o bem comum, com qualidade e significado nas relações e iterações. A estruturação do processo deve suportar a qualidade da vida em grupo reforçando o ciclo conhecer, fazer e esperar contribuindo para o aumen-to do crescimento e confiança mútuos.

ӹ Referências Bibliográficas

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geram a dinâmica da inovação. Rio de Janeiro: Campus, 1997.SENGE, P. M. A quinta disciplina: arte e prática da organização que aprende. São Paulo:

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CAPÍTULO 4

LIÇÕES DESAPRENDIDAS (LESSONS UNLEARNED)

Renato Bottini

“Os seres humanos, que são quase únicos na habilidade de aprenderem com a experiência dos outros, são também notáveis pela sua aparente tendência para o não fazerem”.

Douglas Adams

ӹ Introdução

Em 1975, ainda estudante de engenharia, o Prof. Dr. Fernando Furquim de Almeida, em uma de suas aulas brilhantes de cálculo, afirmou à classe que o homem havia pousado na Lua (1969) num feito histórico inquestionável para a humanidade, mas que teria pro-blemas em fazê-lo novamente nas décadas seguintes.

Jamais me esqueci desse dia e desse mestre que teve uma importância e influência mui-to significativas em minha vida profissional, apesar de não conseguir entender naquele momento o que ele estava querendo dizer, pois como seria possível essa dificuldade se a tecnologia iria avançar e muito provavelmente de forma exponencial?

Sobre o que o professor estava falando? Seria mesmo possível que a NASA tivesse pro-blemas no futuro (em relação àquela época) em enviar novas e mais modernas naves tri-puladas ao nosso satélite?

Pois bem, não sei se por questões políticas, financeiras ou por absoluta falta de interesse em uma nova missão tripulada à Lua (talvez tudo o que pudesse ser explorado já tinha sido concluído), fato é que apesar do incrível avanço nas tecnologias relacionadas a mis-sões espaciais, após algumas missões, a NASA não mais se interessou em novas missões tripuladas visando à exploração do satélite. Apollo 17 foi a sexta e última missão tripulada do  Projeto Apollo  à  Lua, realizada em dezembro de  1972. Os cientistas preferem fazer pesquisas próximas da órbita da Terra, como na Estação Espacial Internacional e enviar missões não tripuladas a outros planetas. Ambas as opções trazem menos custos e mais benefícios do que voltar ao satélite. Pelo menos é isso que é afirmado.

Mas independente de maiores discussões, e esse não é o foco desse capítulo, o que o professor ser referia à época, numa atitude visionária, eram as Lições Aprendidas, tão im-portantes atualmente para a manutenção e desenvolvimento das organizações. Parece que ele já antevia a preocupação das empresas com a governança e gestão do conhecimento e seu argumento era o de que a NASA poderia perder o conhecimento adquirido com as missões Apollo, a ponto de ser incapaz, pelo menos por um período de tempo, em realizar novamente o feito da época, que requereu acima de tudo, muita coragem dos envolvidos.

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O saudoso professor talvez não estivesse completamente correto acerca dessa possi-bilidade (acredito que talvez não houvesse mesmo razão para retornar ao satélite, já que seria uma missão inútil), porém, sua preocupação com conhecimento obtido a partir da vivência de uma experiência e sua utilização para modificação de um comportamento seja no nível tático, operacional ou estratégico de uma organização, estava corretíssima.

O foco da edição deste livro é “Competitividade com Qualidade de Vida”, com ênfase no capital humano como fator-chave de produção nas organizações. Portanto, é a partir, então, desse tema que irei abordar a questão das Lições Desaprendidas, como causas ou pelo menos parte considerável das causas das frustrações da maioria dos gerentes de pro-jetos e outros profissionais, especialmente no mundo corporativo onde frequentemente atuam.

Mas as lições desaprendidas que foram escolhidas para inserção neste capítulo podem ser aplicadas no nosso dia a dia e em qualquer situação, não sendo exclusivas ao capital humano de uma organização, podendo ser base de reflexão para qualquer parte interessa-da que se relaciona com o mundo corporativo ou com a sociedade de modo geral.

Muitas são as definições sobre lição aprendida. Segundo Choo, “de todo o conhecimento existente dentro de uma empresa, cerca de 80%

está armazenado na cabeça das pessoas (conhecimento tácito) em forma de experiência e não registrado em nenhum outro lugar. Do conhecimento registrado, os 20% restantes, so-mente um quinto dele está armazenado de forma estruturada” 1.

O Guia PMBoK ® (Conhecimento em Gerenciamento de Projetos) do PMI ® (Project Management Institute – EUA), em sua 5ª edição, traz em seu glossário a seguinte defini-ção de Lição Aprendida: Lições Aprendidas / Lessons Learned – O conhecimento adquiri-do durante um projeto que mostra como os eventos do projeto foram abordados ou devem ser abordados no futuro, com o objetivo de melhorar o desempenho futuro.

Independentemente de qual seja a definição escolhida (e há várias), o fato é que as Li-ções Aprendidas são fundamentais no processo de aprendizagem organizacional. E não se trata aqui de se reforçar os erros como sendo eles o conjunto ou as informações que devemos focar.

Muitas vezes ouço a máxima de que o erro é parte do aprendizado. Não concordo plenamente com tal afirmação. Sem dúvida errar faz parte de qualquer processo, especial-mente quando esse é investigativo. Já dizia Thomas Edson que “se quiser ter uma boa ideia, tenha antes uma porção delas”, contudo, entendo que são as lições que aprendemos a cada erro que nos torna melhores e mais capazes.

Basta observarmos um bebê em sua fase inicial de vida, especialmente quando está aprendendo a andar. Quantas vezes ele cai (algumas das quedas até traumatizantes) e tenta novamente tantas vezes quantas necessárias, até que finalmente consegue dar seus “primeiros passos”. Ainda bem que não há nenhum chefe ao seu lado dizendo... “Você er-rou!”, pois dessa forma, já nas primeiras tentativas, ele desistiria e não aprenderia jamais a andar.

Portanto, não é com o erro em si que aprendemos algo e sim com a forma como corrigimos esse erro e melhor, como conseguimos eliminar sua causa. Uma Lição é

1 (CHOO, C. W.) The knowing organization: how organizations use information to construct meaning, create knowledge, and make decisions. New York: Oxford University Press, 1998.

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Aprendida realmente quando ela relata o que é esperado acontecer em função de expe-riências passadas, os fatos e desvios ocorridos, a análise das causas desses desvios e o que pôde ser aprendido durante o processo.

E por que as Lições Aprendidas são tão importantes para nosso desenvolvimento quer seja no âmbito profissional como pessoal, e também para as organizações?

É claro que uma lição é de fato aprendida se conseguirmos, a partir dela, efetuar algu-ma modificação no nosso comportamento ou no comportamento da organização, e espe-ra-se que para melhor! Ela nos permite refletir acerca do que já foi feito, pensado, tentado e, por fim, planejarmos nossas próximas ações no sentido de acertar. Não conheço alguém que tente aprender para errar!

Assim, o resumo de toda essa discussão poderia ser simples. Todos nós seres humanos (portanto racionais) temos uma habilidade fantástica em aprender com as nossas experiên-cias ou mesmo com as experiências de outros, porém, parece que temos uma dificuldade em colocar o aprendizado em prática. A expressão “ faça o que eu falo, mas não o que eu faço” parece ser um estigma que se encaixa muito bem neste caso.

ӹ Gerenciamento de Projetos e as lições aprendidas (Learned Lessons)

Não pretendo abordar os conceitos, regras de gerenciamento de projetos, tampouco as boas práticas de gestão de projetos, gestão do conhecimento e o uso das lições aprendidas, encontradas e descritas nas diversas literaturas disponíveis sobre o assunto.

Apenas espero ressaltar a importância do por que, quando e como o processo de lições aprendidas pode contribuir com a redução da exposição aos riscos associados a projetos; obter uma melhor compreensão das atividades envolvidas; melhorar os processos de ges-tão do conhecimento; ter o aumento sistemático das competências dos envolvidos e iden-tificar as causas raízes de sucessos e fracassos, bem como aumentando a possibilidade de sucesso de um dado projeto. Porém, esta não é uma abordagem técnica como poderá ser visto a seguir.

Ao gerenciarmos um projeto, seja ele de qualquer magnitude e complexidade, teremos várias oportunidades e possibilidades de errarmos. Infelizmente essa é a regra que quase denota uma lei natural.

Acreditarmos que nem sempre é assim, caro leitor, seria o mesmo que acreditar que a lei da gravidade possa um dia ser revogada. Não há como impedir que erros ocorram. Por isso, quanto maior o portfólio de lições aprendidas e colocadas em prática, maior a chance de sucesso do projeto.

As lições aprendidas ocorrem quando planejamos uma atividade com o objetivo de um resultado final e este não acontece, ocorrendo um desvio e então conseguimos identificar as causas raízes desse desvio e como eliminá-las, ou seja, não aprendemos com o erro e sim com as soluções que encontramos.

E isso é muito importante, pois se não déssemos atenção e nem registrássemos esses ensinamentos, ficaríamos presos a um ciclo vicioso de erros todas as vezes que fôssemos realizar algo.

Aqui podemos visualizar como foi importante o invento da escrita e do livro. Afinal de contas, todas as lições aprendidas pela humanidade (especialmente as relacionadas a eras mais antigas) foram na grande maioria registradas e documentadas através de escrita.

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Hoje, evidentemente, temos outras maneiras de fazê-lo, mas a base do conhecimento hu-mano foi mantida e aprimorada dessa maneira.

Novamente me referindo a um bebê, há uma máxima que afirma que não nascemos com um Manual de instrução e, por isso, os pais de primeira viagem sofrem muito com os cuidados e “manuseio” da criança.

Pois discordo dessa afirmação, já que inúmeras lições aprendidas foram documenta-das por um médico até famoso por seu famoso e útil “manual” intitulado “A Vida do Bebê”. Refiro-me ao Dr. Rinaldo Victor De Lamare (1910 – 2002), cujo livro com mais de cinco milhões de exemplares vendidos, é considerado como uma verdadeira Bíblia para as mães brasileiras (e muitos pais também).

O que o Dr. De Lamare fez, foi na verdade, registrar uma série de Lições Aprendidas num compêndio cuja utilidade é indiscutível. Pelo menos me salvou muitas vezes! Assim, pelo menos no Brasil, nascemos sim com um “Manual”!

Uma Lição registrada por si só não garante que erros ou os mesmos erros possam ser evitados no futuro ou que boas práticas sejam repetidas. É fundamental que haja uma sistemática estabelecida e implementada pela organização para o uso adequado destes conceitos e das lições propriamente ditas, além de como a empresa irá utilizar toda a base de conhecimento. 

Assim, deve ser estabelecido um processo com regras claras que permitam que todo este conhecimento seja registrado, armazenado e disseminado por toda organização. Ou-tra decisão importante é a forma como o conhecimento baseado na lição aprendida será disponibilizado para outras pessoas.

Existem organizações que antes de inserir algum colaborador num dado projeto, exi-ge que este passe por um período de “aprendizagem”, acessando todo o banco de lições aprendidas na área ou assunto específico na qual ele irá atuar no projeto.

Inúmeros são os métodos para captura de lições aprendidas. Na edição de Janeiro / Abril da Revista de Gestão e Projetos – GeP (Vol. 5, N. 1. Janeiro/Abril. 2014) esses méto-dos foram muito bem explicitados.

ӹ Gerenciamento de Projetos e as lições desaprendidas (Unlearned Lessons)

Umas das maneiras de se abordar a importância das lições aprendidas ou desaprendi-das, seria contemplar e analisar cada área de conhecimento indicada pelo Guia PMBoK 5ª edição, identificando em cada uma delas o que e onde é importante acertar e por último destacando os principais erros cometidos no gerenciamento de projetos em cada uma delas. Isto seria sem dúvida uma abordagem razoável. Porém, quando me propus escrever esse capítulo, pensei em registrar aqui as Lições Desaprendidas que tenho testemunhado ao longo dos anos que venho dedicando à consultoria ou academia em diversas áreas, incluindo a de gerenciamento de projetos, mais relacionadas ao comportamento das pes-soas. Espero assim acrescentar algo ao assunto, já que mais uma vez, a literatura é ampla e disponível. E tratar das 10 áreas de conhecimento indicadas no PMBoK seria, convenha-mos, nada inovador.

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Irei, portanto, descrever as experiências e ressaltar as Lições que, percebo, estão sendo Desaprendidas ao longo do tempo pelas organizações e pessoas, nos temas que a seguir estão destacados.

ӹ Experiência

Desaprendemos a respeitar e valorizar os mais experientes (na grande maioria das ve-zes, mais idosos). Lamentavelmente vivemos o que eu costumo chamar de a era do gerente gel. São normalmente jovens (nada contra a juventude, muito ao contrário) que acreditam que pelo simples fato de serem mais audaciosos e possuírem obviamente uma vitalidade maior, podem substituir o acúmulo de experiência por décadas de um profissional de mercado.

A experiência e competência são construídas com o tempo. Infeliz da organização que não consegue perceber isso. Não existe no mundo, exceção apenas aos gênios, nenhum pianista, por exemplo, que não tenha no mínimo acumulado muitos anos de experiência até atingir o nível de concertista. Certa vez assistindo a uma entrevista com nosso con-certista Nelson Freire, fiquei impressionado com o fato de que ele, após tantos concertos internacionais, incontáveis apresentações, utilizava em seus estudos e ensaios um disposi-tivo denominado metrônomo, que é muito usado nos conservatórios musicais para o ensi-no do instrumento. Perguntado pela repórter qual a razão dele utilizar esse dispositivo, já que pelo que se sabe é destinado aos aprendizes, ele humildemente afirmou: “justamente para não desaprender”.

Não podemos nos enganar quando nos deparamos com alguém realizando um feito de grande complexidade e com muita habilidade, imaginar que aquilo foi conseguido rapidamente.

Devemos, portanto, estar atentos a essa nova geração de profissionais que busca com pressa em conseguir as coisas e acredita que possa rapidamente obter experiência e co-nhecimento.

ӹ Educação

A ISO 9001:2008 (Requisitos do Sistema de Gestão da Qualidade) no requisito rela-cionado à competência dos Recursos Humanos (requisito 6.2), requer das organizações a manutenção de registros apropriados de educação, treinamento, habilidade e experiência. A educação aqui se refere ao grau de educação formal que o capital humano possui, ou seja, o último ou o mais alto grau obtido na escola.

Há de certa forma, uma confusão com o que de fato é educação e com o que é obtido na escola. A formação de cada um de nós depende não somente dos ensinamentos obti-dos na escola (estes sem dúvida, muitíssimo importantes), mas também daquilo que nos é ensinado em família, na igreja, enfim, nas diversas instituições que teremos contato ao longo da nossa vida e que irá nos moldar, formar nosso caráter, etc. Portanto, a escola é apenas um dos elementos que auxilia em nossa trajetória.

Parece que estamos de uma forma brutal, desaprendendo tudo o que de bom nos foi ensinado! E não se trata aqui de puro saudosismo. O fato é que as pessoas cada vez mais estão mal educadas umas com as outras, no ambiente de trabalho ou nas relações pessoais

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e muitas vezes agem de maneira totalmente inadequada e desrespeitosa. Chefes que tra-tam os subordinados de maneira inapropriada e até com assédios morais.

Se atentarmos para o fato de que um gerente de projetos gasta 90% de seu tempo se comunicando com as partes interessadas do projeto, a educação e o tato no lidar com as pessoas são fundamentais para o seu bom desempenho. Portanto, a educação é fator fun-damental nessa relação gerente de projetos e partes interessadas. Assim ele deve ser duro e firme com os problemas e amável com as pessoas.

ӹ Privacidade

cada vez mais as pessoas estão desaprendendo o valor e a importância de sua privacida-de. Todas as lições ou os valores que foram passados através de décadas estão sendo mar-ginalizados. Diversos programas da televisão brasileira (especialmente os “reality-shows”) que poderiam ser direcionados a reflexões, aprendizado, discussões de interesses com-partilhados e voltados para o bem-estar da sociedade e para a solução dos problemas que vivenciamos na sociedade atual, são na verdade utilizados para a exposição de problemas privados individuais e bastante íntimos. Algumas pessoas não têm nenhum pudor em postar fotos em situações comprometedoras que inclusive podem (e geralmente o fazem) ameaçar suas carreiras nas empresas, já que explicitam comportamentos muitas vezes totalmente incompatíveis com os cargos e funções que ocupam.

O relacionamento dentro de uma organização pressupõe um grande respeito entre as partes e essa exposição indevida faz com que muitas pessoas percam o respeito por outras, comprometendo a qualidade do ambiente de trabalho.

ӹ Ética

A palavra “ética” vem do grego (ethikos), e significa aquilo que pertence ao (ethos), que significava “bom costume”, “costume superior”, ou “portador de caráter” 2.

Há certa confusão quando nos referimos à ética e à moral. Não são a mesma coisa. A moral é fundamentada no exercício de nossas condutas, na obediência a costumes e hábitos recebidos (aprendidos), a ética, ao contrário, é o conjunto de nossos valores e prin-cípios. De certa forma poderíamos dividir a ética como sendo a teoria e a moral a prática. Na filosofia clássica, a ética não se resumia à moral, mas buscava a fundamentação teórica para encontrar o melhor modo de viver e conviver, isto é, a busca do melhor estilo de vida, tanto na vida privada quanto em público. Sua abrangência é tão significativa que podemos entender que em tudo que tem influência direta ou indiretamente em nossa maneira de viver, conviver ou nosso estilo de vida, a ética estará lá para nos fornecer um portfólio de lições aprendidas (valores e princípios) e cabe a cada um de nós, através de nossa conduta moral, aplicá-las ou não.

E é aqui que estamos com um grave problema! Nosso portfólio de valores e princípios está se degradando dia após dia. Estamos, portanto, desaprendendo a lidar com as si-tuações onde temos que decidir pelo “sim ou não” e vivemos um dilema perverso, e não há como evitá-lo, pois ao longo dos anos “ganhamos” mais liberdade e autonomia na

2 Ethics, The Encyclopedia Britannica: a dictionary of arts, sciences, literature and general information. 11.ª ed. New York, 1911. pp. 808-845.

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sociedade em que vivemos. É claro que esse “ganho” foi muito importante, especial-mente no nosso país que já passou por um período que para muitos dos leitores deixou marca. Refiro-me ao período da ditadura militar que também nos deixou muitas lições aprendidas. Mas voltando à questão do dilema, se por um lado ganhamos mais liberda-de, parece que numa compensação indesejável, perdemos de forma significativa a segu-rança, alguns valores importantes, alguns princípios básicos para a boa convivência e qualidade de vida, enfim, desaprendemos muito.

Novamente, sem saudosismos, mas não há como não citar alguns exemplos de conduta moral (portanto a ética posta em prática) que estamos deixando de seguir. Parece até que quanto mais se discute na sociedade atual sobre ética e conduta moral, mais imorais se tornam as práticas.

Deparamo-nos a cada dia na mídia, com maus exemplos de gestão da coisa pública por políticos corruptos, pais e famílias que não orientam os filhos através de uma moral firme e segura, escolas e educadores despreparados que apenas cumprem o papel técnico/curri-cular e não oferecem nenhuma referência de conduta, menosprezando completamente a dimensão e importância da prática educativa.

E não deixando de citar a própria mídia que estimula a competitividade, a individua-lidade (aqui me refiro à atitude egoísta, egocêntrica), o materialismo e o consumismo em proporções bastante assustadoras.

É claro que no passado também se discutiam as questões de ética e moral, na verdade esse tema sempre foi relevante, basta verificarmos os inúmeros trabalhos de pensadores, filósofos, historiadores, políticos e literatos das épocas passadas, o que, aliás, nos forneceu um vasto portfólio de ensinamentos e referências.

Entretanto, vivemos uma era apressada com grandes transformações que vêm siste-maticamente afetando os fundamentos do ser e do pensar, as formas como julgamos e decidimos, os valores e princípios. Há atualmente uma região tênue entre o que é certo e o que é errado, tudo passa a ser relativo, obscuro, as referências do bem e do mal estão confusas, o justo do injusto é etéreo.

Existem organizações que estimulam de certa forma, condutas totalmente discutíveis, mas que em seu próprio benefício passam até a serem justificadas. São organizações que pregam valores completamente distorcidos, mas que em compensação pagam bônus fi-nanceiros pelos resultados atingidos pelo colaborador, independentemente das ações que este tenha tomado e que possam até ser contrárias aos seus valores pessoais. Daí se explica os inúmeros casos de depressão em funcionários em grandes corporações e a péssima qualidade de vida no trabalho que estes enfrentam, sempre em prol da competitividade.

Existe uma frase que meu pai sempre proferia em seus ensinamentos, mesmo ele não tendo uma educação formal (escolar) que dizia mais ou menos isso: “o que a gente leva dessa vida, é a vida que a gente leva”. Sempre que posso me refiro a esta mensagem, pois ela nos faz refletir muito quanto às condutas que temos de tomar ao longo da nossa vida.

É a antítese do modo de vida da atual sociedade, que se preocupando apenas com os resultados materiais, se esquece de uma maneira incrível, que nada levaremos e somente deixaremos.

E se por acaso deixarmos apenas a matéria (riquezas acumuladas ao longo da vida), sem dúvida tivemos uma vida sem propósito ou sentido. Mas, se ao contrário, pudermos

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deixar algum legado, então algum sentido fez nossa passagem. Como dizia o primeiro ministro do Reino Unido (Benjamim Disraeli) e citado por Mario Sergio Cortella em seu livro “Qual é a tua obra?”, “A vida é muito curta para ser pequena”.

Neste mesmo livro, Cortella dedica um capítulo à Integridade, afirmando que esta (a Integridade) [...] “é o princípio ético para não apequenar a vida, que já é curta”.

Portanto, não devemos jamais nos iludir com ascensão na carreira em troca da falta de integridade que, em última instância, seria tomarmos atitudes não justas, desonestas, que se desviam dos valores e princípios nos quais acreditamos e aprendemos, agirmos com duas caras, ou seja, sem sinceridade, mesmo sabendo que em alguns casos a sinceridade poderá nos causar algum problema futuro.

E em relação à sinceridade, novamente aqui a máxima “faça o que eu falo, mas não o que eu faço” se aplica, e muito! Quantas pessoas pregam uma rigidez em relação a alguns costumes como, por exemplo, o patrão que não admite que o empregado chegue um mi-nuto sequer atrasado, mas ele mesmo não se incomoda em atrasar para aquela reunião que poderia terminar no fim do expediente de trabalho e devido ao seu atraso acaba por fazer com que todos os presentes saiam bem mais tarde. Ou então até mesmo alguns re-presentantes de igrejas que pregam a lisura no comportamento dos fiéis e depois são pegos em flagrante cometendo pedofilia na sua comunidade! É o cinismo imperando em nossa sociedade! Mas de todas as situações cínicas, uma que mais gosto (ou melhor, desgosto) em citar é a do professor que com os alunos tem uma atitude rígida contra a “cola”, mas ele mesmo em seu curso de especialização ou equivalente, se tiver oportunidade, o faz com a maior “cara de pau”.

Nada entendo de psicologia ou psiquiatria, mas sempre me foi dito que devemos tomar muito cuidado com os sociopatas, pois estes representam um enorme perigo à sociedade, sem, contudo serem facilmente percebidos. Pois assim também caracterizo os cínicos.

Cuidado com eles, e são muitos no mundo corporativo! São os “sociopatas” da ética! Representam um enorme perigo às organizações, mas não são facilmente desmascarados!

ӹ Religião

Será que também no campo da religião estamos desaprendendo?Religião, como dizia meu pai, é coisa séria! A crença deve ser acima de tudo respeitada!Mas será que a religião pode interferir de alguma forma na competitividade e qua-

lidade de vida do capital humano de uma organização? Acredito que sim e muito, pois nossas experiências e atitudes pessoais são influenciadas significativamente pela religião que temos e seguimos.

É claro que muitos acreditam que religião é coisa para ingênuos, ignorantes! Há quem diga até que religião possa ser definida como sendo um pequeno grupo de “espertos” en-ganando um grande grupo de “ingênuos”. É bem verdade que isso acontece mesmo, haja vista os inúmeros templos e facções religiosas cujo único objetivo é “tomar a grana” dos fiéis.

Mas a religiosidade, quando levada a sério, é uma grande percepção e uma grande conexão com a vida, neste caso, vida representando tudo que está além do mundo material.

As Igrejas, independente da religião à qual estão atreladas, em sua maioria, infelizmen-te sucumbem a algumas lições desaprendidas importantes.

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LIÇÕES DESAPRENDIDAS (LESSONS UNLEARNED) | 75

Muitas vivem unicamente em função de atender às necessidades materiais dos homens. Seu foco é antropocêntrico e minimalista, voltado unicamente para o bem estar do ser hu-mano. É o que poderíamos denominar de “Teologia da Prosperidade”.

Assim, percebemos que as Igrejas, a exemplo das corporações, também têm desaprendi-do muito na condução de seu papel, o que influencia direta ou indiretamente no comporta-mento do capital humano.

Nosso futuro depende SIM, de nossa experiência religiosa. Nossa qualidade de vida, po-demos ter certeza, está muito atrelada à nossa relação com Deus e o sentido da vida. A esperança é o grande mote da religião. Sem ela, caro leitor, não seguimos a vida! Quando a esperança acaba, a vida acaba! Nunca podemos desaprender essa lição.

ӹ Considerações finais

Relutei muito em escolher esse título como sendo o último assunto, ou seja, pensei ini-cialmente em adotá-lo como “CONCLUSÃO”. Mas pensando bem, conclusão de quê? Seria ainda possível concluir aquilo que já ficou óbvio para o leitor, ou seja, que nossa relação com o mundo corporativo, seja na função de gerente de projetos ou qualquer outra, transcende regras e técnicas de gestão, áreas de conhecimentos, títulos acadêmicos, especializações?

Acho que seria desnecessária essa ênfase. Está claro que nossa relação no mundo corpo-rativo, infelizmente necessária, praticamente não nos permite falhar!

Aqui não me refiro às questões técnico/administrativas, já que o erro é algo inevitável. Refiro-me, sim, às questões humanas. Não nos é permitido falhar como ser humano, ape-

sar de que errar é humano. Não podemos nem devemos admitir que o mundo corporativo nos torne robôs.

Portanto, caro leitor, seja livre e autônomo, sim! Mas como ser humano! Não faça aquilo que não desejaria que fizessem com você! Tenha a liberdade de poder escolher aquilo que você não quer fazer!

Recuse àquilo que lhe fará infeliz ou trará infelicidade ao seu colega ou seu par. Não caia na tentação de sucumbir aos indicadores de performance e produtividade a qualquer custo. Não se esqueça de que logo você nem mais fará parte dessa corporação!

Faça parte sim de uma dignidade coletiva, onde há uma sinergia positiva e onde todos serão igualmente beneficiados.

Onde o ambiente de trabalho (ou outro qualquer) onde você está inserido é feliz e as pes-soas possam compartilhar essa felicidade com muita qualidade.

Não nos esqueçamos de que somente nós, seres humanos, pelo menos os racionais, so-mos os únicos que temos a capacidade de recusar ou pelo menos contestar aquilo em que não acreditamos.

Lembremo-nos dessas lições, que quando conduzidas com equilíbrio, valem a pena, mas especialmente a minha preferida; “O que a gente leva dessa vida, é a vida que a gente leva”.

ӹ Referências Bibliográficas

PMI (PROJECT MANAGEMENT INSTITUTE). Um Guia do Conhecimento em Ge-renciamento de Projetos (Guia PMBOK®) – Quinta Edição. Newtown Square: Project Management Institute, 2013.

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CHOO, C. W. The knowing organization: how organizations use information to construct meaning, create knowledge, and make decisions. New York: Oxford University Press. 1998.)

CHISHOLM, H. The Encyclopedia Britannica: A Dictionary of Arts, Sciences, Literature and General information (11 ed.) Vol. XVIII. The Encyclopædia Britannica Company, New York, 1911.

CORTELLA, M. S. Qual é a tua obra? Inquietações propositivas sobre gestão, liderança e ética. Editora Vozes, 10ª edição, 2010.

REVISTA DE GESTÃO E PROJETOS – GeP, v. 5, n. 1. Jan/Abr, 2014).

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SEÇÃO II

A GESTÃO DO CAPITAL HUMANONAS ORGANIZAÇÕES

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CAPÍTULO 5

INDAGAÇÕES CRÍTICAS SOBRE A COMPETITIVIDADEORGANIZACIONAL NA PERSPECTIVA INSTITUCIONAL:

ASPECTOS SOCIAIS E PSICOLÓGICOS

Johan Hendrik Poker Júnior e Thalita Catarina Decome Poker

ӹ Introdução

Uma grande variedade de organizações vem desenvolvendo, ao longo das últimas dé-cadas, a busca por novas alternativas para a questão da competitividade. Essa busca pro-cura se estender a diversas dimensões da atuação organizacional, algumas se voltam para seu ambiente externo, pela expansão de novos mercados, incentivando regulações, re-formulando estruturas competitivas e criando parcerias de diversas naturezas. Outras se voltam para seu ambiente interno, orientam-se por estratégias relacionadas à inovação de produtos, processos, redução de custos e melhoria de processos produtivos. Neste contex-to, o grande desafio para os gestores é determinar critérios para descobrir e explorar estas oportunidades, para esta finalidade, como propõe Machado-da-Silva e Fonseca (1996), pode-se explorar a competitividade sob a forma de padrões institucionais.

Tomando como referência a abordagem institucional, este capítulo discute e critica o conceito de competitividade. E também, explora os mecanismos de mensuração dos benefícios gerados pelas ações organizacionais, expande o conceito de criação de valor, utilizando os novos conceitos de utilidade da identidade e utilidade do comportamento e propõe uma visão integrada dos ambientes interno e externo pela teoria institucional em consonância com a abordagem de Lapassade (1989), como mecanismo para promover ações organizacionais que promovam a identificação dos atores com a organização.

ӹ Competitividade e criação de valor

Entre gestores e empresários, é lugar comum o uso do termo competitividade para referir-se a iniciativas que promovam melhorias diversas na organização. Nessa visão in-formal nem sempre ser mais competitivo é sinônimo de ser “melhor”. A forma de determi-nar a melhor consiste na comparação entre as empresas que disputam o mesmo mercado. Uma das diferenças entre a forma como gestores e empresários em geral se apropriam do termo e a forma como a academia o aborda está no uso do termo competitividade. O ar-tigo, de Machado-da-Silva e Fonseca (1996), apresenta o termo competitividade com base em duas visões conceituais. A primeira sendo o conceito microeconômico de eficiência, especificamente na criação de valor ao investidor. A segunda sendo a abordagem baseada

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na teoria institucional. Nesta a competitividade é desenvolvida pela busca da legitimidade institucional no atendimento das regras, crenças e valores.

Na abordagem da administração estratégica, o conceito de competitividade é, geral-mente, associado à ideia de busca pela vantagem competitiva. No entanto, como demons-tram Brito e Brito (2012), este termo vem sendo abusado. Os abusos do termo surgem de sua ubiquidade. Como ocorre com diversos termos de uso cotidiano nas organizações, desenvolve uma dificuldade em se capturar corretamente o conceito e traduzi-lo sem sim-plificações ou detalhamentos excessivos. Uma forma de conceituação da vantagem com-petitiva amplamente aceita na academia a relaciona com a criação de valor aos atores en-volvidos na organização (stakeholders) (BRITO e BRITO, 2012). Nesta abordagem, a busca pelo “melhor” pode ser ampliada em sentido, não se restringindo apenas ao “melhor”, mas aos investidores (shareholders).

Neste sentido, a vantagem competitiva não poderia ser criada de forma sustentável sem que fossem respeitados os interesses dos principais atores participantes da organização. Alguns desses interesses são facilmente explicitados, a exemplo dos financiadores, que buscam da empresa o retorno de seus empréstimos e a utilidade decorrente da informação sobre a ela para utilizar com a finalidade de determinar o custo destes empréstimos. Ou-tros são complexos e interdependentes, destes podem surgir as melhores oportunidades para aumento da competitividade.

Segundo Powell (2001), um dos problemas nas definições de vantagem competitiva adotadas pelos autores da área está na associação dessa a um desempenho financeiro superior. Para o autor, deve-se questionar a utilidade do conceito se assim formulado, visto que se a vantagem competitiva estivesse restrita apenas à relação com o benefício aos investidores, esta não adicionaria qualquer explicação para a variável dependente de desempenho e, portanto não teria função. Conforme relatam Brito e Brito (2012) como resposta a Powell (2001), a academia avançou na conceituação da vantagem competitiva associando-a a criação de valor, o que representa uma visão mais abrangente do que a mera relação com o desempenho financeiro.

Esta proposição abre espaço para a proposta de Machado-da-Silva e Fonseca (1996), de emprego da teoria institucional para a compreensão da organização como um sistema social com uma amplitude de atores externos e internos a se considerar. Para compreen-der a organização como um sistema social, onde os atores se beneficiam de ganhos tanto financeiros quanto de utilidade, deve-se agora compreender como evoluiu na teoria os mecanismos de mensuração do desempenho organizacional e de criação de valor. Não obstante, no campo de estudos sobre organizações e instituições podemos recorrer à aná-lise institucional proposta por Lapassade (1989) e Lourau (1975). A importância do viés da análise institucional para as enunciações expostas está na preocupação pela dialética nas relações internas e externas entre os atores. E também, pela preocupação minuciosa no entendimento de como as relações são incorporadas no processo em que as tensões de poder pesam sobre a vida cotidiana.

ӹ Desempenho organizacional, criação de valor e utilidade

Os métodos de mensuração de desempenho organizacional empregados nas organiza-ções são vários; variedade esta decorrente da multiplicidade de interesses dos atores envol-

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vidos no desenvolvimento organizacional. Segundo Macedo-Soares e Ratton (1999), no Brasil, os principais métodos de mensuração de desempenho organizacional incluem:

a) Activity-Based Costing – voltado à eficiência em custos por atividades;b) Balanced Scorecard – dedicado à eficácia dos indivíduos no atingimento de me-

tas organizacionais;c) Economic Value Added – priorizando a efetividade na obtenção de resultados

financeiros anuais;d) Target Costing – método dedicado à eficiência no custo da operação da

organização;e) Quality Function Deployment – orientado à eficiência na qualidade dos produtos

e serviços desenvolvidos.

Segundo os autores, outros métodos apresentam uma participação minoritária em relação aos listados.

Dentre os métodos relacionados, apenas o Economic Value Added (EVA) compreende uma medida de desempenho voltada à efetividade (desempenho), visto que obtém uma quantificação objetiva do valor financeiro, ou seja, determinando criação de valor a parte dos atores da organização (investidores, financiadores, governo e funcionários). Os demais métodos identificam as melhorias, porém não provêm medidas financeiras, mas servem como indicadores de criação de utilidade.

A razão do EVA ser uma medida de criação de valor pode ser esclarecida pela sua análise. O método, também chamado lucro econômico, provê uma comparação do valor criado pela organização para alguns atores em relação ao que era esperado por eles, ou seja, a superação das expectativas dos acionistas de retorno financeiro de suas ativida-des (COPELAND et al., 2002). A forma de representação deste conceito, a partir dos dados de mercado e contábeis, é dada pela equação (1).

EVA = (ROIC – Custo médio ponderado de capital) x Capital Investido (1)

Onde:

– ROIC: Retorno sobre o capital investido, resultante do lucro operacional líquido subtraído dos impostos, dividido pelo capital investido;

– Custo médio ponderado de capital: Custo do dinheiro para a organização, deter-minado pela média ponderada entre o custo do capital para o investidor e para os financiadores;

– Capital Investido: Soma do capital investido com origem nos investidores e financiadores.

Segundo esta definição, a criação de valor se dá pela superação do custo do capital pelo retorno obtido nos investimentos realizados pela organização. Ou seja, a diferença entre o retorno do investimento e o custo do capital investido é o quanto a organização supe-rou das expectativas dos investidores e financiadores quanto à atividade da organização, levando em conta os riscos envolvidos na atividade por ela desempenhada. Este valor, se-gundo a teoria, é compartilhado entre os atores que participaram bancando e assumindo os riscos da organização (investidores, financiadores e funcionários gestores).

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Conforme Brito e Brito (2012), pode-se ampliar a outros atores a definição de criação de valor, implicando em uma ampliação do escopo desta medida, ao considerar os be-nefícios promovidos tanto à organização quanto ao cliente e ao fornecedor (FIGURA 1). Nesta visão, o EVA mensura apenas o valor apropriado pela organização, não sendo capaz de ira além das fronteiras definidas pela sua contabilidade. A expansão do conceito de criação de valor para todos os atores participantes de forma construtiva da organização (stakeholders) “abarca os vários interesses e pode ancorar o debate de competitividade de maneira mais ampla” (BRITO & BRITO, 2012). No entanto, quando se considera a medi-da financeira de valor criado, não fica claro como surge o excedente do cliente, ou seja, de onde surge a disposição a pagar.

figura 1: valor criado x valor apropriado

Valor

Criado

Excedente do Cliente

Valor Apropriado = Lucro

Parte do Fornecedor

Disposição a pagar

Preço

Custo

Custo de Oportunidade

Fonte: Adaptado de Brito e Brito (2012).

Ao se levar em conta esta questão, pode-se pensar em um incremento aos conceitos sumarizados por Brito e Brito (2012). Para tanto, se devem considerar não somente os aspectos financeiros na criação de valor, mas também o conceito de utilidade. Em econo-mia, a utilidade é uma medida de satisfação de cada ator na economia. Para os primeiros utilitaristas como Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1976), o uso do conceito de utilidade permite a sociedade, ao maximizar a utilidade total dos indivíduos, promover “a maior felicidade para o maior número de pessoas” (COSTA, 2009). Este uso da utilidade no ambiente organizacional pode ser particularmente profícuo na promoção de oportunidades para a organização, especialmente se forem considerados os desenvolvi-mentos recentes da economia comportamental e da economia da identidade.

O desenvolvimento da teoria econômica comportamental tem tamanha importância que dentre os seus estudiosos estão quatro ganhadores do prêmio Nobel: Gary Becker (motivos e erros do consumidor, ganhador em 1992), Herbert Simon (racionalidade limi-tada, ganhador em 1978), Daniel Kahnneman (ilusão de validade e viés de ancoramento, ganhador em 2002) e George Akerlof (procrastinação, ganhador em 2001). Suas pesquisas ampliaram a compreensão do processo decisório de indivíduos e organizações. Posterior-mente, Akerlof e Kranton (2005), trouxeram uma contribuição com potencial ainda maior de revolucionar as práticas de gestão das organizações, com o conceito de economia da identidade.

Ao redefinir o valor criado para utilidade criada (FIGURA 2), pode-se compreender mais facilmente a utilidade do cliente. Como exemplo, podemos imaginar situações em que a utilidade da identidade possa gerar uma maior disposição a pagar em relação a um

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produto com características similares: uma camiseta de time de futebol pode ter um valor muito maior do que uma camiseta do mesmo material, mas sem a identificação. A utili-dade, comportamental ou identitária, pode ser duradoura ou transitória. Por exemplo, a utilidade de ter um carro Chevrolet do modelo Camaro na cor amarela durante o período de sucesso de uma música popular que o evoca.

figura 2: utilidade criada x utilidade apropriada

Utilidade

Criada

Utilidade do Cliente Utilidade aos Investidores

Lucro dos Financiadores

Tributos

Utilidade aos Funcionários

Utilidade Apro-priada

Utilidade do Forne-cedor

Disposição a pagar

Preço

Custo

Custo de Oportunidade

Fonte: Adaptado de Brito e Brito (2012)

Já a utilidade ao fornecedor pode ser classificada pela forma clássica. Um forne-cedor beneficia-se tanto da margem de ganho com ele compartilhada na venda de um produto quanto de elementos menos concretos, mas de igual importância, como a uti-lidade decorrente do compartilhamento de informações, da sincronização de estoques e da redução das incertezas promovidas, por exemplo, pela integração dos sistemas de planejamento das organizações (os chamados Integrated Enterprise Resource Planning – ERP).

A utilidade apropriada (FIGURA 2) pode ser explicitada em relação aos atores que po-dem ser beneficiados. Dentre os atores beneficiados pela utilidade apropriada estão: (1) o governo, com a ampliação dos tributos em caso do aumento dos lucros gerados pela orga-nização; (2) os financiadores, com um volume maior de juros obtidos do crescimento dos lucros gerados; (3) os funcionários, que podem tanto obter ganho financeiro, caso existam programas de remuneração variável na organização, quanto obter ganhos de utilidade, como melhorias em seu ambiente de trabalho, na sua qualidade de vida, na percepção de justiça na comparação de sua remuneração e benefícios com outras organizações e dentro da própria organização. Um exemplo de aumento da utilidade identitária dos fun-cionários pode ser vista em ações organizacionais que sejam socialmente responsáveis, nestas, os stakeholders indiretos (sociedade civil, moradores do entorno das instalações da organização, organizações sociais diversas) desenvolvem uma opinião favorável da or-ganização e de seus funcionários, que se beneficiam da identificação como pertencentes à organização; (4) investidores, que além do aumento potencial de ganhos financeiros, podem obter uma ampliação de sua utilidade quando a organização age de acordo com práticas de gestão que promovem relações sérias com seus acionistas (utilidade decorren-te da redução do conflito de agência), desenvolve projetos socialmente responsáveis, que vinculam a imagem da organização e de seus investidores (utilidade de identificação com a causa promovida pelo projeto), etc.

Um elemento interessante desta proposição é que o mesmo mecanismo que mensura o ganho de utilidade pode agora ser guia para a identificação de oportunidade de aumento

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da competitividade, para isso, os gestores devem desenvolver uma visão institucional da organização e de seu meio, como propõem Machado-da-Silva e Fonseca (2010).

ӹ As subjetividades nas instituições sociais

No atual momento, para falar das relações de tempo-espaço, em que vivemos a tran-sição de conceitos e paradigmas da modernidade para a pós-modernidade, encontramos várias formas conceituais sobre as instituições sociais. Temos como principais fontes para o entendimento de instituições: Berger e Luckmann (2008), Goffman (1974), Bleger (1984), Habermas (1990), Lapassade (1989), Lourau(1975) e Harvey (2005). Embora alguns dos conceitos apresentados nas perspectivas destes autores sejam direcionados à área da saúde ou educação, acreditamos que podemos transcender o contexto. Pois, de acordo com a obra de Lapassade (1989), podemos entender as empresas como uma organização a des-peito da burocracia e administração; uma instituição pela construção dos significados, valores, normas e crenças; e também um grupo regido de forma operativa ou democrática pelos atores envolvidos.

Para discorrer sobre a questão do valor e utilidade nas organizações, entre os auto-res mencionados, elegemos Lapassade (1989), por suas proposições atenderem a algumas questões relacionadas ao cotidiano das organizações. Seu pensamento empreendeu for-mas de compreender e analisar as instituições, grupos e organizações. Suas proposições eclodiram a partir da década de 60 na França. Momento histórico caracterizado princi-palmente pela luta por relações mais democráticas e desconstruções de algumas institui-ções sociais que normatizavam a vida das pessoas de forma reducionista. Este movimento ético-político e teórico, ou seja, o da análise institucional se propõe a criticar o próprio conceito de instituição, para além da ruptura da “lealdade institucional”.

Ao recorrer a esta concepção, o modo como a teoria se orienta para a práxis é voltado para a identificação dos processos institucionais, ao mesmo tempo em que tem o objetivo de desconstruir as crenças, valores e normas ao longo do processo. Pela defesa de que as normas impedem que os indivíduos possam se autogerir. Uma vez que criam necessidades voltadas para o sistema e não para os sujeitos envolvidos nos processos. Deste modo, a análise institucional considerada até mesmo, intervencionista tem como objetivo provo-car o conflito para que a estrutura institucional seja revelada como um todo. Com base nestas enunciações, podemos dizer que a analise institucional está no campo das comple-xidades. Pois, ao mesmo tempo em que se solidifica como uma teoria e campo de estudos, vem para criticar e desconstruir o próprio conceito de instituição como é consagrado pela convenção por meio da desconstrução da hierarquia e heterogestão.

Por pressupostos, a análise institucional considera como categorias para o movimento dialético nas instituições, organizações e grupos estes três aspectos: as relações de poder, a segmentação e a micropolítica. E, na perspectiva ético-política está inserida no movimen-to institucionalista pela finalidade de fomentar um processo no coletivo de autoanálise e autogestão. Neste sentido, o papel da análise institucional seria o de questionar se algumas necessidades e demandas apresentadas nas relações entre os atores seriam de fato legíti-mas ou apenas um mecanismo de tensão de poder.

Para tal questionamento, Lapassade(1989) discute dois processos que ocorrem na ins-tituição. O primeiro é o instituinte – a construção dos valores, significados e normas. E o

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segundo é o instituído – aquilo que está cristalizado e até mesmo naturalizado. De modo geral: “O instituinte aparece como um processo, enquanto o instituído aparece como re-sultado” (LAPASSADE, 1989, p. 30). E ambas as categorias de pensamento têm por obje-tivo desvelar o funcionamento oculto da vida cotidiana. Com a finalidade de orientar as relações para autogestão e horizontalidade.

Não obstante, o entendimento da sociedade para a análise institucional, funciona em três níveis: o grupo, a organização e a instituição. O primeiro nível, o grupo, se refere às relações entre as pessoas, sendo que, o cotidiano é manifesto por ele. O segundo nível está nas organizações, em sua acepção seria a burocracia e o que normatiza no campo da ma-terialidade os procedimentos entre as relações organizacionais (empresas, universidades, etc.). E, por último, o terceiro nível é a instituição, este é um nível mais simbólico em que os hábitos, leis e valores são construídos e reguladores das relações. Sendo que os valores instituídos agem diretamente nos grupos e nas organizações.

Neste sentido, algumas demandas que são consideradas como alienantes no campo institucional, implicariam na deformação da verdade, alienando os atores. Em síntese, a análise institucional se volta para avaliar as manobras de poder e opressão dentro da ação instituinte e institucionalizada. Para que, de fato, ocorra a produção da autonomia e, em última instância, a autogestão – em que cada pessoa e grupo possam ter sua autenticidade e capacidade de se governar. Em tempos em que tudo é pensado pelo viés da acumulação, chegando a deformar a validade dos valores e da utilidade, pensar no modo como as de-mandas são construídas pode implicar na busca por “brechas” na mudança deste cenário, na qual todos sejam beneficiados.

Outra leitura proposta por autores como Habermas (1990) e Harvey (2005) é o conceito pós-moderno de instituição – no qual cada ator seria uma instituição autônoma. Em uma acepção crítica, este conceito só seria totalmente factível na realidade social, se houvessem condições suficientes para que os atores pudessem chegar ao nível de autogestão tanto na estrutura social como nas organizações. Porém, no sentido progressivo da questão, po-demos dizer que esta proposta poderia ser algo que nos orienta para as discussões atuais acerca da práxis – por ter um elemento emancipatório para todos os atores envolvidos na empresa pela busca da solidariedade, cooperação via agir comunicativo e uso do sistema a serviço das pessoas. Mas, de acordo com o pensamento de Harvey (2005), para que che-gássemos de fato a uma concepção pós-moderna de sujeito e sociedade, antes precisaría-mos superar algumas relações desiguais.

Na acepção do pensamento habermesiano, o sistema seria o mercado (dinheiro) e a burocracia (poder). Como outra instância interdependente há o mundo da vida que são as pessoas, a cultura e a sociedade. Em uma leitura mais voltada para países de capitalis-mo tardio, Habermas (2012b) afirma que as relações atuais são vividas pela colonização do mundo da vida pelo mundo sistêmico. A intencionalidade com esta afirmação não é produzir uma visão ingênua de que o sistema deveria ser banido da sociedade, mas que o dinheiro e o poder deveriam servir às pessoas e não o contrário. Em uma perspectiva voltada para a psicologia social crítica, podemos entender o quanto as subjetividades, que mais tarde são institucionalizadas, vão sendo construídas pelas interações para regula-rem a colonização. Ou seja, ao viver o cotidiano sempre encontramos a armadilha de

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institucionalizar valores e significados que não sejam as necessidades reais dos grupos, da sociedade e das pessoas.

Neste sentido, percebemos o quanto é questionável a concepção do que é “melhor” nas organizações. Pois, podemos nos deparar diante de questões como: Se realmente o con-ceito é uma demanda a serviço do mundo da vida? Ou para quem é melhor, para o mundo da vida ou o mundo sistêmico? Considerando que vivemos em uma sociedade colonizada, estas são indagações pertinentes e um convite à mudança de paradigmas, muitas vezes naturalizados pela práxis – uma práxis colonizada.

Do ponto de vista dialético, não são as respostas que nos mobilizam (elas nos aco-modam e cristalizam os modos de subjetividades sobre a vida vivida). Ao contrário, são os questionamentos que nos permitem buscar a validade, a justeza, a factibilidade e a veracidade na realidade social e principalmente pela descolonização do mundo da vida. São as perguntas que nos impulsionam, nos movem para algo. Por isso, consideramos nas exposições feitas a relevância da crítica ao conceito de “melhor” no processo de ins-titucionalização dos grupos nas organizações, não como algo rumo ao fatalismo. Mas, como orientação para entender e desnaturalizar alguns valores que são instituídos e se deformam para atender interesses do mundo sistêmico.

ӹ Conclusão

Nas palavras de Machado-da-Silva e Fonseca (1996): “Os questionamentos existentes na literatura especializada, sugerem que os modelos teóricos vigentes [aplicados às organi-zações], em especial aqueles desenvolvidos no campo da microeconomia, têm-se revelado insuficientes para suprir...” “... a exaustiva busca por concepções passíveis de proporcionar a modernização necessária, para a sua sobrevivência em um cenário de competição”. A abordagem institucional, oriunda de outras áreas de conhecimento, pode ser aplicada a organizações com grandes benefícios ao se orientar para questões que transcendam o conceito de competitividade e abordem da criação de utilidade para todos os atores par-ticipantes no processo.

Com base nestas exposições conceituais e históricas sobre as instituições sociais, cabe a seguinte indagação. Se as relações entre atores buscam aquilo que é “melhor”, atribuindo o sentido de competitividade a isso, para quem este objetivo está orientado? Para as relações entre as pessoas ou para necessidades sistêmicas? Neste sentido, defende-se o pressuposto de que a questão sistêmica em sua gênese foi concebida a serviço das pessoas e socieda-de. Porém, as determinações e dinâmicas das instituições constroem valores em que esta condição passa a ser invertida. E a possibilidade de autogestão e legitimidade no processo passa a ser suprimida.

Com a evolução das teorias econômicas nos últimos anos, foram desenvolvidas formas de se identificar os benefícios da análise institucional para as organizações e seus atores. Assim, ao resgatar a análise das relações entre os atores e de sua dinâmica, a análise ins-titucional permite que os gestores promovam novas formas de compreensão do ambiente no qual as organizações estão inseridas. Portanto, ao final de nossas exposições, propomos essa nova compreensão como possibilidade das organizações atuarem de forma a promo-ver a autogestão, internamente, e a agir de forma a criar um meio de atuação autogerido pelos seus atores parceiros, rompendo com as estruturas institucionalizantes criadas pela

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INDAGAÇÕES CRÍTICAS SOBRE COMPETITIVIDADE ORGANIZACIONAL NA PERSPECTIVA... | 87

competitividade irrefletida e pela regulação tornada anacrônica em um ambiente social-mente responsável e sustentável.

ӹ Referências Bibliográficas

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CAPÍTULO 6

O TRABALHO COMO POTENCIALIZADOR DA SAÚDE MENTAL

Priscilla Perla T. Von Zuben Campos, Letícia Sayuri Kikuchi e Marco Antonio Silveira

ӹ Introdução

Voltaire (1984) declara que “o trabalho afasta de nós três grandes males: o tédio, o vício e a necessidade”. Outra máxima se refere à frase “se você tem prazer naquilo que faz, você nunca terá que trabalhar na vida” (Confúcio, 600 a.C). Seria essa uma realidade para poucos afortunados ou um objetivo a ser percorrido? A felicidade no trabalho trata-se de um tema inquietante, afinal, quem não quer ser feliz, sentir-se bem onde está e realizado com o que faz? Embora não se possa negar a existência do sofrimento, vivenciar momentos de prazer e alegria é desejado pela grande maioria das pessoas.

O ideal seria que todos tivessem a oportunidade de realizar um trabalho que permi-tisse expressar todo seu potencial e vocação, e que fosse condizente com seu sistema de valores e crenças. Afinal, quando trabalhamos satisfeitos e realizados, ficamos mais felizes e quando estamos mais felizes nosso rendimento é maior, nos empenhando positivamente no trabalho inclusive. De fato, esta tem sido uma premissa explorada por muitos pesqui-sadores e trata-se de uma afirmação complexa, repleta de variáveis e que merece nossa atenção.

Se o contexto em que nos encontramos é farto de adversidades, o desafio está em como alcançar a satisfação no trabalho e como este pode potencializar a saúde mental. Com foco nos benefícios que o trabalho pode proporcionar ao homem, nosso interesse neste capítulo centraliza-se em examiná-lo enquanto potencializador da saúde mental, capaz de trazer possibilidades de satisfação e prazer.

Tal motivação ocorreu ao notar que no cenário atual a abordagem quanto ao significa-do do trabalho tende a referir-se aos seus aspectos negativos, entendendo-se, portanto, ser importante também abranger os aspectos positivos que ele acarreta e, deste modo, como podem ser mais bem explorados.

Destacamos que, embora cada vez mais estudiosos se interessem pela temática da saúde mental no ambiente de trabalho (ainda que com maior foco na doença), e seja de notório conhecimento sua importância tanto para a qualidade de vida dos trabalhadores quanto para a sociedade, nos últimos anos, estatísticas apresentadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no Brasil têm apontado um aumento dos transtornos mentais no trabalho. Tal constatação nos leva a refletir e analisar a necessidade de mudanças efetivas

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neste campo, a partir da concepção do trabalho enquanto potencializador da saúde men-tal dos indivíduos, e não o oposto.

A discussão aqui proposta se justifica especialmente em meio ao desejado alinhamento das empresas sob a ótica da sustentabilidade organizacional, qual seja a harmonia dos interesses econômicos, sociais e ambientais, nos quais novos e maiores desafios são postos constantemente pelo mercado às organizações, cuja superação torna-se um imperativo atual. Isso se confirma, tendo em vista os graves prejuízos sociais e ambientais decorrentes das externalidades negativas associadas às atividades empresariais, tanto da degradação dos recursos naturais e do meio ambiente, como daquelas relacionadas à saúde física e mental dos trabalhadores.

Cabe acrescentar a necessidade em se repensar os rumos do atual capitalismo, vislum-brar outros caminhos e implementar alternativas criativas que aliem produtividade com reconhecimento, realização e satisfação, buscando-se uma relação salutar entre individuo, sociedade e natureza. Pressupõe-se com isso, ser urgente a necessidade da modificação dos padrões mentais e, consequentemente, comportamentais, incluindo uma mudança da concepção de como o trabalho é percebido: a partir do resgate da valorização da vida humana.

Ao partir do pressuposto da importância do trabalho como agente capaz de potencia-lizar a saúde mental, seguiremos o desenvolvimento deste capítulo abordando seus aspec-tos positivos, de tal modo que a possibilidade dos indivíduos em se engajar em atividades que lhes sejam significativas, trazendo boas repercussões para empregado e empregador e, portanto, para a sociedade. Afinal, como muitos estudiosos vêm observando, más condi-ções de trabalho podem impactar negativamente na saúde e no bem-estar dos trabalhado-res, acarretando os mais diversos tipos de prejuízos às organizações. Em contrapartida, o trabalho, quando desempenhado sob boas condições, contribui de modo favorável para a prevenção dos distúrbios psicológicos, melhorando a qualidade de vida, consequentemen-te, potencializando a saúde mental e o bem estar psicológico.

ӹ Trabalho: Centralidade na vida do indivíduo

Uma das primeiras perguntas que usualmente são feitas ao se conhecer uma pessoa diz respeito ao seu trabalho (o que faz, onde). Geralmente, é uma prática comum, pois o trabalho está relacionado ao condicionamento social e até mesmo à identidade – torna-se parte do “eu” – e com isso, tem um papel crítico para o bem-estar psicológico, motivacio-nal e de autoestima do indivíduo.

O papel central que o trabalho exerce na vida do homem é fato histórico que vem demarcando o desenvolvimento das relações sociais e da organização política nas dife-rentes sociedades e, neste âmbito, nos constituímos socialmente, o que se torna relevante à nossa identidade, ao senso de pertencimento. Fatores como o sentimento de pertença, a vontade de estar em um grupo e a busca de um objetivo em uma sociedade são regados positivamente através de um trabalho com sentido e significado para o indivíduo.

Sobre o sentido e significado, entendemos que um leva ao outro e ambos se comple-mentam perante o funcionário e a atividade que este realiza. Como resultado de pesquisas feitas por Morin (2001), são apontadas cinco razões para se incluir sentido à atividade realizada: para pôr em prática e sempre renovar as competências; admitir uma autonomia

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perante o trabalho; sentir-se parte de um grupo; influenciar positivamente a sociedade em que vive; achar um sentido para viver e se manter ocupado.

Ao trabalhar, “o homem transforma a natureza”, contudo, por meio do trabalho, não apenas intervimos no mundo em que vivemos e temos condições de atendermos nossas necessidades físicas e materiais, mas também nos construímos. Temos a oportunidade de nos constituirmos como pessoa e mesmo sendo uma inesgotável fonte de prazer e de sofrimento, o trabalho é fundamental para manter o equilíbrio psíquico.

Claro que os aspectos econômicos não podem ser desconsiderados, uma vez que é atra-vés da autonomia financeira que obtemos independência no que se refere à sobrevivência. Porém, o dinheiro nem sempre é visto como o mais importante. Não são poucas as pes-soas que deixaram de obter salários maiores em busca de uma melhor qualidade de vida. Ademais, o salário não deve ser balizado como o único fator motivador para o trabalho, pois se sabe que mesmo tendo meios para manter-se financeiramente, muitas pessoas não o fariam, visto ser o trabalho uma maneira íntima de relação com pessoas, bem como uma forma para definição de status social.

Mas nem todos têm a oportunidade de escolher suas atividades profissionais e atuar no que traz prazer. No entanto, suas tarefas podem ser desempenhadas de modo mais gratificante, por meio de programas específicos realizados sob orientação de profissionais especializados na área de gestão de pessoas, contando obviamente com o apoio efetivo tanto da liderança e dos fundadores, quanto do corpo funcional. Para entender um pouco melhor no que se refere às ações organizacionais e o papel dos profissionais com foco no comportamento organizacional, segue uma situação hipotética 1.

Uma atendente exerce suas atividades como recepcionista em um serviço de saúde e muitas reclamações são recebidas por conta de seu comportamento com os pacientes que buscam o serviço (impaciência, desatenção, entre outros). Esta situação pode ser interpre-tada como um desajuste de função e que a funcionária não se sente satisfeita com o que faz, o que lhe gera sofrimento. A primeira opção seria demiti-la, porém trata-se de uma funcionária com outras qualidades que não podem deixar de serem notadas. A fim de avaliar a situação e verificar o que poderia ser feito sobre o caso, um profissional da área de gestão de pessoas é convidado para diagnosticar a situação e propor a intervenção ne-cessária. Após observação e análise, como resposta, aquele sugere a rotação de cargo por um período especifico.

Para tanto, é proposto à atendente que atue na área administrativa e após análise, ve-rifica-se potencial para a funcionária da área administrativa atuar em seu lugar (pois se trata de uma pessoa sociável, comunicativa, paciente e calma). Inicialmente há recusa, gerada por medo, insegurança e desconfiança por parte da atendente, mas no decorrer dos dias esta se identifica com as atividades desempenhadas, o mesmo ocorre com a outra funcionária. Ao questionar a atendente se ela gostaria de retornar a seu posto inicial, esta prefere efetivamente atuar na área administrativa, cujas tarefas são desempenhadas com maestria, as funcionárias mais satisfeitas, os pacientes melhor atendidos e a organização em bom funcionamento.

1 Este é um caso hipotético, qualquer semelhança trata-se de mera coincidência. Esta prática deve ser bem orien-tada e trabalhada de modo cauteloso, a fim de evitar ações no que concerne a desvio de função.

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No caso ilustrado, pode-se notar que por meio de uma rotação dos cargos foi-lhes proporcionada à oportunidade de obter a reorientação profissional, de modo a estimular o desenvolvimento de suas aptidões e habilidades, tendo como repercussão positiva um trabalho mais saudável. Para tanto, foi necessário o investimento da organização no ge-renciamento estratégico de pessoas.

Ademais, entendemos que o trabalho (não o emprego) é uma importante forma de pe-dagogia do caráter, sendo que na concepção de Karl Marx aquele é um meio privilegiado para a autoexpressão do indivíduo. Neste caso, pessoas que não canalizam sua energia para uma atividade, podem simplesmente se desconectar do convívio social, seja pela vio-lência ou mesmo pela passividade e apatia. Segundo Marx (1988):

“Como criador de valores de uso, como trabalho útil, é o trabalho, por isso, uma condi-ção de existência do homem, independentemente de todas as formas de sociedade, eterna necessidade natural de mediação do metabolismo entre homem e natureza e, portanto, vida humana”.

O trabalho constitui um espaço importante na sociedade em que vivemos. Além de ser bom e imprescindível à condição humana, ele está na base de toda a sociedade e quando tem sentido e significado, ocupa o tempo do trabalhador de modo benéfico. Aliás, pouco adianta estar empregado e não ter trabalho, pois o trabalho fornece objetivos ao trabalha-dor, metas a serem alcançadas, organiza seu tempo e o mantém ocupado da melhor ma-neira, para que ele possa “plantar e colher seus frutos”. Segundo France (1948), “o trabalho distrai a nossa vaidade, engana a nossa falta de poder e faz-nos sentir a esperança de um bom evento. Distrai-nos da própria vida, desvia-nos da visão assustadora de nós mesmos; é um santo remédio para a ética e a estética”.

Dado o significado do trabalho na vida das pessoas, Codo, Sampaio & Hitomi (1993) o relacionam enquanto o momento expressivo do homem, sendo sua possibilidade a da felicidade, da liberdade, da loucura e da doença mental. Tornamo-nos seres sociais a partir do trabalho; ele tem um papel central em nossas vidas. Para Codo (1993, p.196), quan-do trabalhamos em condições gratificantes, gostamos do produto realizado; alguns até se apaixonam por ele, como os escritores, por exemplo, mas quando trabalhamos sub-jugados, imprimimos raiva ao produto, acarretando consequências desastrosas para as organizações, tais como acidentes de trabalho, problemas afetivos e sofrimento psíquico, originando uma carga psíquica e sofrimento para o trabalhador 2.

Isto posto, precisamos repensar o modo como o trabalho é concebido na sociedade capitalista 3, uma vez que ao invés de propiciar a realização do indivíduo, relacionamos o trabalho exatamente ao oposto, reduzindo-o a um “fardo que precisa ser carregado”. Os paradigmas precisam ser revistos, mudanças precisam acontecer, inclusive em nosso

2 Dejours (1987) propõe uma nova disciplina, denominada psicodinâmica do trabalho, na qual o foco se dá a partir da dinâmica do trabalho, tanto como produtor de sofrimento e adoecimento, quanto também de saúde e prazer. Para Dejours (1993), a atividade profissional não é só um meio de ganhar a vida, mas também uma forma de inserção social, em que aspectos psíquicos e físicos estão fortemente implicados.3 No sistema capitalista, o trabalho se transforma em força de trabalho, tornando-se uma mercadoria. E neste con-texto, as organizações (cujas ações interferem no ambiente, influenciando-o e cuja finalidade é a obtenção do lucro), subestimam e restringem a dimensão psicossocial, ao buscarem a obtenção imediata de bons resultados produtivos e financeiros, o que determina um estado perigoso à sobrevivência organizacional.

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sistema de valores e no modo como interagimos com o mundo em que vivemos, ou seja, uma mudança cultural em larga escala.

ӹ Trabalho saudável

Passamos a maior parte de nosso tempo produtivo no trabalho. Constatado isto, é im-prescindível que o ambiente de trabalho seja sadio, harmonioso, o mais agradável possível. A Organização Mundial da Saúde (2010) dimensiona que “a riqueza do negócio depende da saúde dos trabalhadores”, indicando que um local de trabalho saudável é aquele em que “trabalhadores e os gestores colaboram para o uso de um processo de melhoria contínua da proteção e promoção da segurança, saúde e bem-estar de todos os trabalhadores e para a sustentabilidade do ambiente de trabalho”.

A construção psicossocial de organizações saudáveis, orientadas para a saúde e qua-lidade de vida, implica a adoção de pressupostos culturais de base humanista 4, algo que não se discute, porque está historicamente “naturalizado” (de modo que as organizações também podem ser denominadas humanizadas). Compreendemos esse tipo de organiza-ção como aquela voltada à responsabilidade para com os seus funcionários e ao ambiente externo, agregando valores que não somente a maximização do retorno para os acionistas.

Organizações inteligentes promovem seu capital intelectual e percebem a saúde como um investimento, ao invés de custo. Isto ocorre por meio de uma cultura focada no bem--estar do indivíduo, considerando-o como um ser biopsicossocial 5 e preocupada com a transformação do sofrimento em prazer. Contudo, cabe ponderar que a ausência de sofri-mento não implica o comportamento saudável, uma vez que nossas necessidades nunca serão atendidas completamente. Deste modo, não se deve esperar somente o prazer e fugir do sofrimento, até porque os conflitos são inevitáveis e frequentemente irão surgir.

Alias, é preciso salientar que embora os conflitos surjam, a forma como eles são con-duzidos é o que faz a diferença. Os processos de mudanças ocorrem, mas como eles são administrados é que trará bons resultados ou não; a comunicação é falha, mas ações cor-retivas e preventivas neste sentido é que irão acarretar a transformação de riscos em opor-tunidades. Enfim, na medida em que situações adversas surgirem, se bem gerenciadas, poderão favorecer um ambiente de trabalho mais benéfico. O que se dá por meio do ge-renciamento estratégico do comportamento organizacional e uma liderança em nível de excelência.

Seria utopia desconsiderar o sofrimento. Entretanto, quando as pessoas sentem-se va-lorizadas, incluindo a percepção quanto à importância e reconhecimento do que fazem, a vivência do prazer é propiciada, viabilizando momentos criativos, felizes e gratificantes. Com isto, a adaptação ao trabalho e produtividade tendem a ser melhores e doenças ocu-pacionais podem ser evitadas ou pelo menos minimizadas.

Uma forma de propiciar este ambiente inclui o resgate quanto ao respeito pelo homem no trabalho, como um dos meios para se alcançar um ambiente salutar. Mas podemos verificar outros meios, tal como o modelo proposto pela OMS (2010), que compreende quatro áreas-chave, as quais podem ser mobilizadas ou influenciadas por meio de inicia-

4 Um pressuposto cultural é aquilo que é tido como verdade irrefutável numa organização (FREITAS, 2007).5 A visão biopsicossocial teve sua origem na medicina psicossomática e tem como premissa a visão integrada do ser humano.

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tivas voltadas a ambientes de trabalho saudáveis: o ambiente físico de trabalho (refere-se à estrutura), a dimensão psicossocial (inclui a cultura organizacional e fatores “estressores” do local de trabalho), os recursos para a saúde pessoal (ambientes de apoio que a empresa proporciona aos trabalhadores) e o envolvimento da empresa na comunidade (se refere às atividades nas quais uma empresa pode participar, ou conhecimentos e recursos que pode prover para apoiar o bem-estar físico e social). É possível com isso, construir e manter um ambiente de bem-estar não só para os empregados e os empregadores, mas também para a sociedade, com uma perspectiva de qualidade de vida que extrapola o ambiente de trabalho.

De modo geral, as características que sobressaem nas organizações saudáveis estão as-sociadas às relações de respeito entre empregados e empregadores, havendo adaptação ao trabalho, flexibilidade e mudança, oportunidades de aprendizagem contínua, respeito à diversidade, atenção aos cuidados familiares, comunicação com fluxo aberto em todas as direções, possibilidades de diversão e tempo livre, e assim por diante.

A construção de relações humanas mais saudáveis no ambiente de trabalho só é pos-sível pela mudança de valores e atitudes fundamentais, que consiste na mudança do con-texto físico e psicossocial nos quais os gestores e demais trabalhadores criam nas organi-zações tradicionais, no contexto capitalista predador. Construir organizações saudáveis pressupõe ainda enfrentar o desafio da mudança profunda nas organizações, pela via da educação intensiva, baseada em valores fortemente compartilhados e em uma concepção ampla de qualidade de vida; diz respeito a mudanças culturais – de ideias e de crenças básicas – em relação à saúde, ao trabalho e à melhoria contínua do capital psicológico, social, e econômico.

Enfim, podemos inferir que um trabalho saudável, que promove a saúde e o bem-estar do indivíduo, e no qual há a preocupação em se estabelecer relações de parceria, além de propiciar pessoas felizes e comprometidas, fomenta a sustentabilidade organizacional.

ӹ Satisfação no trabalho

A satisfação no trabalho pode ser entendida como um estado emocional prazeroso, um sentimento agradável. O prazer e o sentimento de realização que podem ser obtidos na execução de tarefas dão um sentido ao trabalho, levando à felicidade, de modo que quando uma pessoa está feliz com seu trabalho, provavelmente estará mais satisfeita com sua vida, o que geralmente traz repercussões positivas ao ambiente que a cerca e assim sucessivamente.

Embora o prazer seja um processo subjetivo, efetivamente, muitas pessoas relatam que um trabalho que tem sentido é aquele que corresponde à personalidade, aos talentos e aos desejos delas e também resulta das possibilidades de desenvolver sua autonomia e per-ceber seu senso de responsabilidade. Isso é oferecido por uma organização que deixa os empregados serem os administradores de suas atividades e que, por meio da presença de mecanismos de feedback, lhes mantém informados sobre a evolução do seu desempenho e lhes permite fazer os ajustes necessários para melhorá-lo.

Quando o indivíduo tem “liberdade” e pode resolver problemas durante a realização do trabalho, exercendo seu julgamento para tomar decisões relativas à organização das suas atividades, o sentimento de competência e eficácia pessoal é reforçado, influenciando

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diretamente não só no desenvolvimento da autonomia pessoal, mas também na satisfação e motivação. Além disso, o fato de ter que resolver problemas e vencer dificuldades resulta em sentimentos positivos e estimula o desenvolvimento de novas competências, tais como a capacidade de criar e inovar.

Hart (1999, apud LEITE e MELO, 2009) explana que os benefícios que o trabalho ofe-rece são importantes para o bem-estar, especialmente quanto a aspectos que envolvem oportunidades de interação e inserção social, identidade, propósito e objetivos, preenchi-mento do tempo livre, desafios que poderão ser enfrentados com as habilidades pessoais, status, além da renda. Deste modo, o interesse do trabalho em si mesmo parece estar asso-ciado, por um lado, ao conjunto de valores, de interesses e de competências do indivíduo e, por outro lado, ao grau de correspondência das exigências do trabalho.

O líder tem um papel fundamental na manutenção da satisfação no trabalho e por isso ele deve estar capacitado para exercer sua função em nível de excelência, incluindo saber como gerenciar o comportamento organizacional em parceria com profissionais estudiosos do comportamento humano. Muitas vezes, preocupados apenas com o lucro (metas, resultados, números), os líderes acabam ignorando os sentimentos e emoções de seus liderados, acarretando consequências como o absenteísmo, presenteísmo, rotativi-dade, falta de comprometimento, doenças ocupacionais entre outras. Em compensação, quando se preocupam com o bem-estar do funcionário, comumente eles despertam o sentimento de pertença, lealdade e engajamento.

Empresas preocupadas em obter vantagem competitiva e um melhor desempenho de seu pessoal, buscam manter seus funcionários satisfeitos. Afinal, se a insatisfação pode gerar prejuízos tanto para o indivíduo quanto para a organização, de outro modo, a satis-fação pode ser fonte de saúde, prazer e felicidade.

ӹ Impactos da intensidade de trabalho sobre a satisfação profissional

A compreensão quanto à intensidade de trabalho se faz útil, visto que em muitas situa-ções, tal condição pode gerar desgaste físico e mental do indivíduo, levando muitos funcio-nários a se afastarem de seus afazeres. Segundo Guimarães e Grubits (Kahn apud. 1991):

A carga de trabalho total é a carga de trabalho combinada de exigências relacio-nadas com o trabalho remunerado e com o não remunerado. Deve incluir todas as formas de atividades produtivas, ou seja, o conjunto de atividades realizadas pelas pessoas que contribuem aos bens e serviços que outras utilizam.

A carga de trabalho total compreende também o desempenho e as horas extras no trabalho, as atividades domésticas, o cuidado com os filhos, a atenção a familiares (...) e a colaboração com organizações de voluntariado ou sindicatos (FRANKENHAUSER, 1993a, 1993b, 1996; KAHN, 1991). Conforme relatado por Spector (2012), três estudos geo-graficamente diversificados, conduzidos nos Estados Unidos, Canadá e Suécia respectiva-mente, e feitos a partir dos relatos dos próprios funcionários, verificaram que as cargas de trabalho correlacionam com uma variedade de desgastes. Os pesquisadores encontraram significativas correlações da carga de trabalho com os desgastes psicológicos de ansiedade, depressão, frustração, exaustão, insatisfação no emprego e intenção de demissão, além de desgastes físicos de sintomas de saúde.

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Segundo Guimarães e Grubits (2004, p.94), a carga de trabalho pode ser sentida dife-rentemente por cada trabalhador, de modo que existe uma série de fatores que a influen-ciam: aspectos relacionados com a organização do trabalho, espaço de trabalho, tecnolo-gia e ambientes tóxicos, térmicos e vibratórios. Os autores também apontam a existência da carga de trabalho mental como relacionada ao trabalho mental que o indivíduo realiza, ou seja, o conjunto de tensões induzidas pelas exigências do trabalho realizado.

A partir dos conceitos acima expostos, é possível observar que a carga de trabalho resulta de vários fatores e que muitas variáveis influenciam o modo como cada traba-lhador reage em relação a sua carga de trabalho. Contudo, é notório elucidar que a carga de trabalho quando em excesso acaba por interferir na satisfação do trabalhador. Bons funcionários já se demitiram ou adoeceram por conta de uma carga de trabalho demasia-da. Em algumas situações, por falta de orientação, outras por não saberem ‘falar não’, os trabalhadores acabam aceitando todas as atividades do departamento e sobrecarregam-se até saturar-se, entre outros diferentes tipos de situações certamente conhecidas.

Evidente que vários são os fatores que interferem na satisfação dos trabalhadores no que concerne à carga de trabalho, conforme foi retratado. Salientamos a importância de mais estudos que busquem avaliar o impacto da carga de trabalho sobre a satisfação pro-fissional, afinal, as organizações precisam se atentar para as consequências negativas à saúde tanto do indivíduo, quanto da organização.

ӹ O trabalho como recurso terapêutico e agente de transformação

Considerando que o trabalho ocupa um lugar central na vida do indivíduo, iremos ex-plorar nesta seção, a partir da perspectiva de diferentes autores, seu caráter de transforma-ção do sofrimento em prazer, pois como já exposto anteriormente, nota-se a necessidade de investigar a relevância do trabalho enquanto agente transformador e até mesmo como recurso terapêutico, divergindo da maioria das abordagens, que retrata seus aspectos pa-togênicos.

É relevante para a saúde mental trabalhar e ser reconhecido: quando o indivíduo sente que o que realiza é importante, sua autoestima melhora. O trabalho, imbuído de aspectos prazerosos para o trabalhador, pode ser entendido como variável formadora da subjetivi-dade humana quando propicia ao trabalhador reconhecer em sua atividade, inclusive nos resultados do trabalho realizado. Para Clot (2010, p.299), “estar em atividade é sentir-se bem; e sentir-se bem é ser o sujeito ou os sujeitos de uma atividade mediadora no decorrer da qual progride o poder de agir”.

O trabalho não é apenas um espaço aberto ao investimento subjetivo. De acordo com Dejours (1994), é também um espaço de construção de sentido, de construção da identida-de, como forma de continuar o processo de formação da história do sujeito, revelando-se como um mediador privilegiado entre inconsciente e campo social e entre a ordem singu-lar e coletiva, sendo necessário refletir sobre como as experiências de trabalho produzem essa construção de subjetividade.

Bürke & Bianchess (2013) apontam as ideias de Zanelli (2004), o qual resgata um con-ceito formulado por Freud sobre saúde mental como sendo a capacidade de amar e traba-lhar. Assim, estar saudável mentalmente implica que o sujeito consegue conciliar em sua vida o amor e o trabalho. O autor destaca que estas são duas grandes áreas na vida do ser

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humano adulto: o amor, traduzido nos afetos, nos amigos, na família e no erotismo; e o trabalho, na profissão, no dinheiro, na classe social, na produção, no consumo. Pelo amor reproduzimo-nos, pelo trabalho produzimo-nos – produzir e reproduzir explica a nossa existência. O indivíduo então, não se realiza em si mesmo, ele somente constrói quando se espelha no outro, no grupo, na sociedade.

Se favorável, o trabalho pode ser um agente transformador da condição de vida em que a pessoa se encontra. Enquanto agente de transformação, Bürke & Bianchess (2013) concordam com Lussi, Matsukura e Hahn (2010) que se referem ao trabalho como uma prática que promove integração e legítima sociabilidade aos indivíduos, favorecendo o re-conhecimento nas diferentes classes sociais, grupos e comunidade, e entendendo a opor-tunidade de voltar a trabalhar como forma de ampliar as possibilidades da inserção social e melhorar os níveis de saúde.

Como meio de inclusão social de pessoas portadoras de sofrimento mental, o trabalho se afirma enquanto um direito de cidadania. Para Rodrigues, Marinho e Amorin (2010), pessoas portadoras de distúrbios não podem se desvincular da dimensão da vida relacio-nal. A esfera da casa, da comunidade através do círculo de vizinhança, amigos, lazer, o suporte mútuo em substituição ao isolamento social que provoca o adoecimento, se negli-genciados na atenção psicossocial, reproduzem a dependência institucional. Neste campo, o trabalho tem um caráter positivo por favorecer a ampliação da esfera da vida doméstica para a vida pública de pessoas portadoras de transtorno mental.

Ademais, o trabalho é uma forma de compreender e explicar o adoecimento mental, pois no processo de adoecimento mental dos trabalhadores o que se verifica é o rompi-mento com o mundo do trabalho, devido às internações psiquiátricas constantes, levando a rupturas e dificuldades de (re) inserção no trabalho por parte das pessoas portadoras de transtorno mental e usuárias de substâncias psicoativas. O trabalho é ainda um recurso importante de proteção às recaídas e às crises por meio da ocupação da mente e do tempo, pois é necessário que atividades substituam preocupações ou pensamentos negativos. Os autores destacam Lima e Brescia (2002), os quais sugerem que o trabalho pode e deve ser visto como um recurso terapêutico válido até mesmo no tratamento dos distúrbios men-tais graves.

Rodrigues, Marinho e Amorin (2010) apontam para a necessidade de resgatar a ques-tão do trabalho pelos Centros de Atenção Psicossocial junto aos usuários, não para procu-rar uma inserção imediata no mundo do trabalho, mas para a valorização desta dimensão da vida, cujo sentido é construído pela história e pela narrativa do próprio sujeito. Outra pesquisa realizada por Bürke & Bianchess (2013) comprova a importância do prazer no trabalho para uma autorrealização do profissional, uma melhor e mais adequada adap-tação do trabalho ao ser humano, evitando doenças profissionais. Os resultados obtidos possibilitam compreender aspectos do trabalho que favorecem a (re) inserção social, tais como: criação de vínculos, auxílio na autonomia dos usuários, como promotor da autoes-tima e das relações sociais e, além disso, a geração de satisfação e prazer.

Bürke & Bianchess (2013) destacam em sua pesquisa que o aspecto das relações so-ciais através do trabalho como forma de participar da sociedade vai ao encontro dos objetivos da reforma psiquiátrica enquanto valorização do sujeito como cidadão de di-reitos e deveres. Em contrapartida, os autores destacam que o trabalho cumpre a função

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de ocupação da mente, modo de pensar bastante antigo no tratamento das doenças mentais, com a finalidade de controlar pensamentos, devaneios e domesticar o compor-tamento. Este modo de pensar reflete uma manutenção da condição de vida do usuário e não se apresenta como um modificador, pois podemos dizer que ocupar a mente para não pensar na doença é também ter dificuldade para pensar como viver, apesar dela. Esta perspectiva distancia-se daquela em que o trabalho é visto como produtor de sub-jetividades, como agente transformador do sujeito.

É interessante o fato de que os entrevistados da pesquisa em nenhum momento apon-taram aspectos que identificam o trabalho como prejudicial a sua saúde. Para os autores, na medida em que compreendemos que o trabalho não é só um meio de ocupação da mente, mas sim um produtor de subjetividades, aquele pode desempenhar a função de ser resignificante. Isto é, com o fazer, o sujeito investe na possibilidade de constituir uma nova subjetividade, um novo jeito de viver, descobre/reconhece capacidades, habilidades. Por fim, Bürke & Bianchess (2013) afirmam que no contexto atual a via para fomentar e preservar a (re) inserção social através do trabalho precisa ser revista de maneira a criar soluções para as dificuldades encontradas pela equipe, usuários e familiares com relação a uma estabilidade financeira que garanta segurança, sustento e possibilidades de bem--estar.

Perante o exposto, embora seu valor não deva ser superestimado, pode-se inferir que o trabalho tem uma função terapêutica essencial na cura de transtornos mentais, sendo um mecanismo eficaz na promoção da saúde. Como já mencionado em outras seções, isso se deve à relação entre identidade e trabalho, pois a posição que a atividade profissional re-munerada ocupa na vida do indivíduo, em especial quando lhe propicia melhor qualidade de vida e independência financeira, deve ser considerada um recurso válido no tratamen-to de doenças mentais.

Sendo as organizações compostas por pessoas, obter maior conhecimento sobre como elas se comportam no trabalho e como se deve proceder para compreender e conduzir seu comportamento torna fundamental para enfrentar os desafios organizacionais. Mesmo que não existam receitas prontas, o simples fato de ampliar o conhecimento sobre o as-sunto auxiliará neste processo.

Cada indivíduo que compõe a organização tem uma percepção diferente do mundo que o cerca, afinal, cada um tem sua singularidade e possui um comportamento peculiar. Cada um de nós também está sujeito a doenças psicológicas, de modo que um ambiente com pessoas que têm dificuldades para enfrentar suas disfunções podem acarretar outros problemas, inclusive agravar os demais. Por isso, ao invés de abstrair-se dos problemas, é preciso aprender a diagnosticá-los e a lidar com eles, canalizando-os de modo positivo. Implica em esforço, reconstrução e é preciso envolvimento da liderança e também dos profissionais que atuam na área de gestão de pessoas.

ӹ Saúde mental no ambiente laboral

Uma extensa pesquisa feita em 2002 pelo Datafolha com os brasileiros de todo o país para saber como é vida no trabalho mostrou que apesar da maioria (61%) se considerar feliz, satisfeito com o relacionamento com os colegas e com seu próprio desempenho, 77% gostariam de ter um negócio próprio. Entretanto, observando-se os resultados constatou-

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-se tal ocorrência entre os brasileiros que não têm carteira assinada, direitos trabalhistas, com menor salário ou rendimento mensal e mais horas trabalhadas.

Seriam apenas estes aspectos o suficiente para viabilizar um trabalho saudável? Sendo assim, por que o índice de afastamento em decorrência dos transtornos mentais no traba-lho, de acordo com estatísticas apontadas pelo INSS, tem aumentado? Vistos os impactos que o trabalho provoca sobre a saúde mental, é imprescindível repensar-se a forma como este ocorre.

O trabalho no Brasil, de acordo com Rigotto (1994), nos últimos quinze anos levou pelo menos 60.000 pessoas à morte e 300.000 a mutilações incapacitantes. Neste sentido, o au-tor coloca que o “progresso” gerado nos últimos 60 anos de industrialização não resolveu os problemas básicos que levam às “doenças da miséria”, induzindo ainda à elevação das doenças crônico-degenerativas, cardiovasculares, profissionais, mentais e do câncer.

É urgente que haja um resgate da promoção da saúde do trabalhador, por meio de po-líticas e ações que favoreçam a transformação das organizações. Não apenas com foco em questões financeiras, mas também com propósitos mais humanitários. Pode até parece um tanto quanto ingênuo e até mesmo utópico, mas o resgate do valor humano se faz vital em um contexto cada vez mais insustentável, no qual não é o planeta que está em risco, mas sim a espécie humana.

Pontes (2013), com base em alguns dados e situações resultantes da precariedade do trabalho, questiona a importância de se pensar em novas formas de organização do traba-lho e dos impactos sobre a saúde mental dos trabalhadores, visto que a saúde do trabalha-dor não é independente da atividade que se realiza, bem como avulsa à realidade social em que o sujeito e as organizações estão inseridos, tal como exposto na pesquisa supracitada.

Temos ciência de que há muitas coisas em “jogo”, muitos “interesses”, e que as mudan-ças não são fáceis. Porém, ao que tudo indica, para que seja possível sobreviver é preciso rever, repensar e transformar de forma positiva o cenário mundial, com foco nos valores humanos e não econômicos, tendo neste ultimo, o “ter” em detrimento do “ser”, favoreci-do pelo mercado consumista.

Reforçando a concepção do aspecto financeiro, autores como Maslach e Leiter (1999) expõem que a finalidade econômica costuma ser o método padrão utilizado para enfatizar a necessidade em se tomar ações a respeito do desgaste físico e emocional. Entretanto, os autores argumentam que os valores humanos em si e por si mesmos deveriam ter prio-ridade no trabalho, porque afinal, priorizá-los é a atitude correta a se adotar. Os autores esclarecem que os valores econômicos são tão importantes quanto os valores humanos e justificam que a contribuição agregadora de valor é essencial se a empresa quer crescer em longo prazo, uma vez que contribui não apenas para seu bem-estar econômico, mas também para a sua qualidade de vida, de modo que o enfoque nos valores humanos pode fazer a diferença no trabalho.

Ademais, acrescentam outra razão para argumentar a favor dos valores humanos. Re-ferem-se à sinergia que ocorre entre os valores pessoais e os valores da organização que atraíram o indivíduo a determinado local de trabalho, de modo a poder potencializar a energia criativa que estimula grupos e organizações inteiras a fornecerem contribuições extras, e permite pessoas de diversas culturas, tendências políticas e situações econômicas a trabalharem juntas.

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Os autores remetem à questão dos valores, pois estes geralmente são pensados de ma-neira positiva, consequentemente, influenciando o comportamento do mesmo modo. Em sua concepção, se as pessoas trabalham em harmonia com seus valores e capacidades, elas estão mais comprometidas com o trabalho e menos sujeitas ao desgaste físico e mental. Todavia, eles alertam que tais valores não podem apenas ser declarados, precisam, de fato, serem praticados.

Podemos afirmar, portanto, que a saúde mental no ambiente de trabalho requer uma ação integrada na busca da solução de problemas comuns. É preciso repensar o ritmo intenso, a sobrecarga de trabalho, os estímulos à competição acirrada, as consequências do sistema no qual estamos envolvidos, onde estamos e aonde queremos chegar. É neces-sário, enfim, o resgate de valores humanos, bem como o olhar crítico do indivíduo sobre si mesmo e sobre o mundo.

ӹ Conclusão

A necessidade de estudos sobre os fatores presentes numa organização com maior po-tencial para promover simultaneamente a competitividade da organização e a qualidade de vida no trabalho, se deve ao fato de que o investimento em fatores que melhoram tanto os indicadores econômico-financeiros, como os indicadores humano-sociais tendem a ge-rar o desejável desenvolvimento socioeconômico da organização.

Mesmo que seja por razões econômicas, modificações veem ocorrendo na forma como algumas organizações estão lidando com seus “talentos humanos”. Afinal, para sobrevi-verem e manterem-se competitivas, as organizações precisam de pessoas criativas e inova-doras. Logo, podemos entender que mesmo que não seja um motivo ideal e até mesmo no-bre, mediante as demandas da globalização, o homem, compreendido enquanto “capital intelectual”, passa a ser valorizado e percebido como crucial para conquistar-se a tão al-mejada “vantagem competitiva”. Ocasionando um ‘estopim’ para algumas mudanças com relação ao modo como as pessoas são compreendidas e administradas pelas organizações.

Surge então a necessidade do gerenciamento estratégico dos talentos humanos. Para-digmas estão sendo quebrados: o homem que antes acreditava ser facilmente substituído começa a ser visto como alguém que dificilmente pode ser ‘trocado’. O amor, dedicação, lealdade, empenho, entre outros são atributos que passam a serem valorizados pelas or-ganizações. Entendendo a necessidade em reter o indivíduo, torna-se imperativo rever a forma como o trabalho vem sendo concebido, de modo a “transformar sofrimento em prazer” e com isso, beneficiar tanto o empregado quanto o empregador. A questão da administração não é tentar eliminar o sofrimento no trabalho, mas sim propiciar aos tra-balhadores condições para que eles mesmos consigam gerir seu sofrimento, em proveito próprio e da organização.

Destacamos por fim, que quando as pessoas sentem prazer pelo que fazem, costumam empregar toda a energia necessária para alcançar seus objetivos e, neste sentido, ao invés de fardo, o trabalho se transforma em um meio de manutenção da saúde e qualidade de vida: um potencializador da saúde mental. Não apenas uma forma de se obter a manuten-ção financeira, ele constitui na dignidade e meio para se alcançar a realização pessoal, o que gera resultados positivos não apenas ao sujeito, mas também à coletividade, incluindo as organizações de trabalho.

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A vida é um dom precioso, um presente único. O ser humano nasce para, primordial-mente, ser feliz. O trabalho, algo tão importante na vida, deve ser fonte de felicidade, um espaço de prazer e uma forma de aprimoramento do ser humano. Para tanto, é necessário que se resgate o valor do individuo no trabalho, para que ele possa se desenvolver de modo integral e deste modo, contribuir para a tão almejada vantagem competitiva, essencial à sustentabilidade organizacional.

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CAPÍTULO 7

INOVAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E SAÚDE MENTAL: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO SOBRE A PERCEPÇÃO DO TRABALHO 1

Marco Antonio Silveira, Letícia Sayuri Kikuchi e Priscilla Perla T. Von Zuben Campos

(Com coautoria de Amanda Martinez Fragnan)

ӹ Introdução

A relevância de estudos sobre os fatores presentes numa organização com maior poten-cial para promover simultaneamente a competitividade da organização e a qualidade de vida no trabalho, se deve ao fato de que o investimento em fatores que melhoram tanto os indicadores econômico-financeiros como os indicadores humano-sociais tendem a gerar o desejável desenvolvimento socioeconômico da organização.

Os resultados obtidos em vários estudos sinalizam fortemente no sentido da viabilida-de de organizar os fatores organizacionais de modo tal que possam contribuir significa-tivamente para o desenvolvimento sustentável da organização, melhorando de forma in-tegrada o seu desempenho. Nessa perspectiva, os resultados disponíveis na literatura são bastante significativos, destacando-se que ações bem planejadas, como o desenvolvimento de um ambiente organizacional adequado, podem favorecer o desempenho competitivo da empresa e os seus trabalhadores.

Outro aspecto importante é o impacto positivo da promoção de mecanismos coope-rativos, os quais possuem bom potencial para incrementar o desempenho da empresa em seus múltiplos aspectos. A grande maioria dos mecanismos para promoção da coo-peração interna possui uma relação custo/benefício bastante favorável para a empresa, uma vez que os custos para sua implantação são relativamente baixos quando compara-dos com os retornos potenciais para várias dimensões organizacionais. A despeito dis-to, têm-se como exemplos o estímulo ao trabalho envolvendo vários departamentos, a promoção de projetos multidisciplinares, o desenvolvimento de ambiente que contribua para o acolhimento e respeito aos trabalhadores e o reconhecimento ao desempenho em equipe (e não somente ao desempenho individual).

Assim, empresas que promovem a qualidade de vida no trabalho contribuem para in-tegrar uma série de importantes benefícios para todas as partes interessadas. Tais organi-zações, com uma maior valorização do funcionário, investimentos na geração de conhe-

1 Este capítulo é uma reorganização do trabalho apresentado no IV Congresso Internacional de Gestión Tecnoló-gica e Innovación (COGESTEC), em Cartagena (Colômbia), em novembro de 2014.

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cimento e a contínua busca de inovação tecnológica e organizacional possuem seu lugar à frente dos concorrentes na corrida da vantagem competitiva e na promoção de benefícios sociais. São essas as organizações promotoras do efetivo desenvolvimento socioeconômi-co que devem ser cada vez mais valorizadas pelas várias instâncias públicas e privadas da sociedade.

Tal conjuntura arremete aos temas referentes a capital humano e inovação, sendo am-plamente discutidos tanto no meio acadêmico quanto no meio organizacional, visto que o investimento no capital humano tende a resultar em novas tecnologias, sistemas e servi-ços, uma vez que o trabalho intelectual, segundo Drucker (1997), é o principal recurso de capital, o investimento fundamental e o centro de custos de uma economia desenvolvida.

A discussão aqui proposta se justifica especialmente neste momento histórico em que os mercados atuais impõem novos e maiores desafios às organizações, em especial as em-presariais, cuja superação deve considerar não só os impactos das suas atividades no meio ambiente físico, como na qualidade de vida e na saúde física e mental dos seus trabalha-dores.

Muitas das características das organizações na atualidade, por força da globalização e pela ênfase no uso da tecnologia da informática, imprimiram nova fisionomia ao mundo do trabalho, o que faz com que as organizações procurem soluções mais imediatas e iné-ditas. Deste modo, o tipo de trabalho e o ritmo imposto por ele não deixam muito tempo para o indivíduo dar-se a atenção merecida. Embora as pessoas reajam diferentemente a situações difíceis, sabe-se que estas podem ter consequências futuras, tanto de ordem física como psicológica, não saudáveis e quando isto ocorre, muitas dessas organizações acabam por desaparecer (BERGAMINI & TASSINARI, 2008).

Assim, a empresa perfeita descrita nos manuais de administração indica representar uma abstração sem correspondência na prática, pois embora continue funcionando e com bons resultados produtivos e financeiros, nota-se que grande parte está desorganizada no que se refere ao aspecto comportamental e neste quadro, tendem a ser suprimidas. Torna-se necessário, portanto, atentar-se às razões que determinam este estado perigoso à sobrevivência organizacional e buscar medidas adequadas a fim de reverter tal situação.

Perante o exposto, este artigo tem o objetivo de apresentar os resultados de um estudo conduzido com profissionais que atuam na área de saúde mental, de modo a identificar suas visões a respeito dos impactos da organização do trabalho nos colaboradores. Neste âmbito, adiante, serão apresentados de modo sucinto alguns conceitos teóricos que en-volvem esta pesquisa, de forma a fundamentá-la, baseando-se na teoria de autores que já estudaram e se aprofundaram nas mesmas ideias.

ӹ Significado do trabalho

Os primeiros estudos sobre o sentido do trabalho foram realizados por dois psicólogos, Hackman e Oldhan (1975), que afirmam ser “importante, útil e legítimo para aquele que o realiza” (Tolfo e Piccinini, 2007, p.39). Para eles, três características são fundamentais:

I. A pluralidade de atividades que exijam a utilização de diversas competências, fazendo com que exista a identificação do trabalhador com a execução da tarefa;

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II. Um trabalho que não represente alienação, ou seja, que a atividade realizada seja conhecida do início ao fim pelo colaborador, além de identificar o signi-ficado real do trabalho, aliando os resultados com o ambiente em que vive, a autonomia de realizar as atividades da forma que desejar, além de estabelecer o sentimento de total responsabilidade sobre os atos que concretiza;

III. O retorno de seu desempenho (feedback), de forma com que o colaborador possa identificar prováveis erros e agir de forma com que estes sejam corrigidos da melhor maneira.

A partir disso, Morin (1996) caracteriza o sentido do trabalho como um esquema for-mado por três partes: o significado, a orientação e a coerência. Uma vez que o significado representa o valor que é atribuído ao trabalhador através da atividade realizada, a orienta-ção é o que se busca através de suas ações, e a coerência se caracteriza pela harmonia entre o homem e o trabalho nas suas relações internas.

Complementando as teorias sobre significado do trabalho, a equipe de investigação Meaning of Work International Research Team (MOW) identifica que o sentido do traba-lho pode ter influências diretas nas atividades laborais, eficiência e flexibilidade dos traba-lhadores, pois tem a capacidade de possibilitar as crenças sobre o que é viável e tolerável no trabalho. Como confirma Morin (2001, p.14), “É importante que a organização das tarefas e das atividades torne-se favorável à eficiência e que os objetivos visados e os resultados es-perados sejam claros e significativos para as pessoas que o realizam.”.

A pesquisa relata que mesmo que as pessoas tenham condições mais do que suficien-tes para viverem sem trabalho, não o fariam, pois acreditam que além de uma forma de se manter financeiramente, o trabalho é uma maneira íntima de relação com pessoas. O senso de pertencimento, a vontade de estar em um grupo, a busca de um objetivo em uma sociedade, todos esses fatores são regados positivamente através de um trabalho com sen-tido e significado para o colaborador.

É válido ressaltar a relação de equivalência entre os significados de sentido e significa-do do trabalho perante trabalhos acadêmicos e científicos. Porém, estudos de Hackman e Oldman (1975) e Morin (1996) podem relatar a distinção entre os conceitos abordados, como relatados em Tolfo e Piccinini (2007, p. 40):

“... entende-se como significado do trabalho a representação social que a tarefa executada tem para o trabalhador, seja individual (a identificação de seu trabalho no resultado da tarefa), para o grupo (o sentimento de pertença a uma classe única pela execução de um mesmo trabalho), ou social (o sentimento de executar um tra-balho que contribua para o toda a sociedade).”

Com isso, chega-se à conclusão de que sentido e significado se complementam perante o colaborador e a atividade que o mesmo realiza. Os resultados de pesquisas realizadas por Morin (2001) apontam cinco razões para se incluir sentido à atividade realizada: para pôr em prática e sempre renovar suas competências; admitir uma autonomia perante seu trabalho; sentir-se parte de um grupo; influenciar positivamente a sociedade em que vive; achar um sentido para viver e manter-se ocupado.

Pode-se notar, portanto, a presença de fatores essenciais na criação de um trabalho com reflexão para o colaborador. Através de renovação das competências, procurando

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sempre a inovação tanto pessoal quando profissional, busca-se uma atividade que agregue sentido ao que o trabalhador sabe e está apto a fazer, a aprendizagem organizacional rela-cionada a essas competências levam a uma maior fonte de experiências e sabedoria para aquele que o realiza. Seguindo o conceito das “organizações que aprendem” (Senge, 1990), empresas que seguem tal representação são caracterizadas pelo estímulo ao aprendizado e transformação contínua das pessoas, o que soma à organização conhecimentos que postos em prática são fontes de sucesso organizacional.

Maior habilidade e sabedoria naquilo que o colaborador faz, o leva a sentir-se mais autônomo na realização de suas atividades; a confiança depositada nele juntamente com o acompanhamento necessário para a concretização de suas tarefas levam à autoconfiança que se torna característica de um profissional com excelência naquilo que realiza. O for-talecimento das competências individuais, relacionadas às atividades atribuídas ao pro-fissional são fontes de conhecimento, eficiência e eficácia, pois uma atividade realizada por quem a conhece e busca as melhores maneiras de realizá-la será geradora de melhores resultados e menores custos organizacionais.

O senso de pertencimento dentro do grupo em que realiza o trabalho, leva ao traba-lhador a um maior desenvolvimento pessoal (Morin, 2001), no sentido de que as relações interpessoais no ambiente de trabalho contribuem para o desenvolvimento de suas iden-tidades. Pesquisas relatam que o trabalho com sentido é aquele que pode ser realizado com pessoas as quais possa haver identificação, pessoas de qualidade, que somem nas atividades e que apesar das dificuldades do dia a dia seja prazeroso trabalhar com elas, sejam colegas de departamento, sala, repartição. O fato de trabalhar com outras pessoas resulta em uma maior cooperação, além de funcionar como estimulante próprio para o trabalhador, o que o faz crer no trabalho com sentido em suas relações no ambiente de trabalho. Como afirma Morin (2001, p. 17):

“Contribuindo para o desenvolvimento dos laços sociais, o trabalho permite aos administradores escapar do sentimento de isolamento, viver melhor sua solidão e encontrar seu lugar na comunidade. Neste sentido, o trabalho permite passar por cima dos problemas existenciais, como a solidão e a morte.”

Um trabalho com sentido e significado ocupa o tempo do trabalhador. Há relatos de que pode haver sofrimento por falta de trabalho, por isso, o sentido do trabalho está em situar a vida do trabalhador em objetivos, organizar seu tempo e manter-se ocupado da melhor maneira, ter algo o que fazer e algo do qual se beneficiar, além de dar um real sentido às suas férias, frutos do seu trabalho por um determinado período (Morin, 2001).

O trabalho organizado de maneira eficiente, que conduza a resultados úteis, que é acei-tável, que garante a segurança e a autonomia é, portanto, considerado um trabalho com significado e de grande valor, pois estimula as necessidades para o crescimento da pessoa e seu senso de responsabilidade.

ӹ Dimensão psicossocial nas organizações

Estudiosos em teoria das organizações enfatizam que toda organização, seja ela uma empresa, hospital, universidade ou qualquer outra modalidade, é, antes de qualquer coisa, um sistema social e como tal deve ser tratada:

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“Organizações são entidades sociais dirigidas por metas, desenhadas como sis-temas de atividades deliberadamente estruturados e coordenados, e são ligadas ao ambiente externo... O principal elemento de uma organização não é um edifício ou um conjunto de políticas e procedimentos: as organizações são compostas por pesso-as e seus relacionamentos. [...]” (DAFT, 2002).

As empresas estão inseridas em mercados que trazem uma gama imensa de desafios a serem superados. Num ambiente assim, é de se esperar que os gestores – que em sua grande maioria tem formação com viés tecnicista (engenheiros e técnicos) ou tecnocrático (administradores e economistas) – considerem prioritariamente os fatores mais evidentes, como aqueles pertencentes às dimensões física e organizacional. Assim, a dimensão psi-cossocial é aquela mais desconhecida e, portanto, negligenciada. Isso é um grande equi-voco que cobra um preço alto das organizações (na forma de desempenhos sub-ótimos), dos seus trabalhadores (incluindo os gestores que também são submetidos a sofrimentos psíquicos e emocionais) e da sociedade como um todo, que arca com todos os ônus das mazelas socioeconômicas decorrentes dessa negligência.

Cox e Griffiths (1995), discorrem sobre os riscos psicossociais, destacando que são to-dos os aspectos do desenho e gerenciamento do trabalho, e os contextos social e organi-zacional, que têm potencial para causar dano físico ou psicológico. De acordo com tal apontamento, pode-se entender que os aspectos psicossociais também têm potencial tanto para trazer benefícios aos trabalhadores, como para afetar o desempenho competitivo da organização (de maneira positiva ou negativa). Como ilustrado na figura 1:

figura 1. relação simplificada de causalidades dos fatores psicossociais na empresa

Determinam:• Qualidade de vida• Qualidade dos processos• Custos, Produtividade• Inovação

Fatores Psicossociais na Empresa•Desenho e Gestão do Trabalho•Contextos social e institucional

Estados Emocionais e Psíquicos

Saúde FísicaSaúde Mental

Acidentesde Trabalho

Fonte: Baseado em Silveira e Gardim (2014)

Além dos impactos nos indivíduos, a dimensão psicossocial tem uma grande impor-tância para os resultados da organização. É nessa dimensão que se enquadram os co-nhecimentos e as competências individuais, que são base do capital humano e do capital

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intelectual, importantes ativos econômicos no contexto da nova economia que se baseia muito na gestão competente da inovação.

Os aspectos psicossociais também são essenciais para se construir relações que po-dem fortalecer (ou não) os processos organizacionais. Esquecemo-nos que a organização é um sistema social, onde todo trabalho é coletivo: o sentido que damos para as relações humanas irá afetar diretamente os resultados dos processos em termos de produtividade, qualidade, prazos, custos e outros indicadores. Assim, trabalhar por ambientes com bom clima organizacional, onde vicejam relações cooperativas é uma maneira bastante efetiva de se conseguir melhores resultados financeiros.

ӹ Desempenho competitivo: Inovação e capital intelectual nas empresas

As organizações, como a maioria das empresas, são sistemas complexos em contínua interação com o seu ambiente externo. Uma vez que as características do ambiente de atuação dessas entidades mudam rápida e incessantemente, é crucial que modificações internas apropriadas sejam incessantemente implantadas. (Tidd; Bessant; Pavitt, 1997). Nesse contexto dinâmico atual, é desejável que as contínuas inovações estejam integradas ao longo de toda a estrutura organizacional, sob pena de não serem internalizadas com a agilidade e a organicidade requeridas.

Para que se possam viabilizar relações simbióticas empresa-trabalhador, entende-se o capital intelectual como um ativo econômico e, assim, o capital humano passa a ser reco-nhecido como um recurso estratégico fundamental para o sucesso das organizações nos ambientes atuais. Ademais, à medida que o conhecimento é aceito como um recurso eco-nômico, questiona-se como mensurá-lo, já que esse ativo proporcionará ao seu possuidor a geração de benefícios futuros, que alterarão o patrimônio das organizações.

De acordo com Mayo (2003), as pessoas não podem ser avaliadas segundo os princí-pios financeiros tradicionais, por se tratarem de ativos intangíveis, somado ao fato de que tal aspecto vem mudando progressivamente desde 1990, sendo atribuído um valor muito mais alto aos “ativos intangíveis” tais como conhecimento, competência, marcas e siste-mas. Segundo Almeida (2008), o capital intelectual é o ponto de partida para a capacida-de de inovação e determina sua capacidade de inovação e aprendizagem organizacional, afinal, para inovar é preciso que as ideias otimizadoras que agregam valor e integram indivíduos e empresas, sejam implantadas.

Cabe salientar que na abordagem da teoria neoclássica, os recursos organizacionais limitam-se a capital, trabalho e terra. Atualmente, o resultado financeiro é visto como sendo constituído tanto de lucratividade como de valor de longo prazo do acionista. De fato, não é surpreendente que existam correlações positivas entre o indivíduo e o desem-penho, como exposto. Mayo (2003) esclarece que empresas como a Johnson & Johnson e a Cadbury já haviam há muito tempo notado empiricamente que quanto melhor o trata-mento dado às pessoas, maior a chance de a organização ser bem-sucedida.

Sob tal circunstância, faz-se emergente que as empresas reconheçam o ativo intangível na sua produção de forma efetiva, visto ser a inovação, condição básica para o sucesso das organizações no mercado atual, o qual muda continuamente e exige níveis de desempe-nho sucessivamente melhores. E, a gestão competente do capital humano – componente fundamental na geração e consolidação do capital intelectual – é o fator que alavanca a

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inovação de produtos, de processos, de serviços e de outros aspectos de interesse para uma organização empresarial, como o design de produto, a estrutura organizacional, os métodos gerenciais, as relações no trabalho, entre outros aspectos.

ӹ Saúde mental no ambiente laboral

A saúde é um problema de todo país e conforme aponta Berlinguer (1983), cada um tem um dever a cumprir, para colocar um fim à demolição psicofísica daqueles que criam as riquezas do país e que estão sujeitos à pior exploração. Situações tais como pressões cons-tantes por aumento de produtividade e do nível de responsabilidade, acúmulo de funções, problemas de relacionamento com a chefia ou com grupo de trabalho, más condições de trabalho, dentre outras, geram o sofrimento psíquico no trabalho, provocando doenças ocupacionais, como gastrite, síndrome do pânico, alcoolismo, depressão, estresse, para-noia, drogadição.

Dados recentes revelam que cerca de 30% de pessoas que sofrem com algum tipo de transtorno mental na região metropolitana de São Paulo, 10% são considerados transtor-nos graves (ANDRADE, L.H., WANG, Y.P., ANDREONI, S., et al, 2012). Os transtornos mentais e comportamentais estão entre as principais causas de perdas de dias no trabalho no mundo. Os casos leves causam perda de quatro dias de trabalho/ano e os graves cerca de 200 dias de trabalho/ano, em média (DEMYTTENAERE et al., 2004). Esses quadros são frequentes e comumente incapacitantes, evoluindo ao absenteísmo pela doença e re-dução de produtividade (NIEUWENHUIJSEN et al., 2006).

Entende-se assim que a prevenção dos distúrbios psicológicos potencializa a saúde e a qualidade de vida dos funcionários, uma vez que o bem-estar psicológico propicia maior estabilidade emocional, motivação, eficácia no trabalho, criatividade e inovação, bem como o aumento da autoestima e sensibilidade aos objetivos da empresa, gerando maior produtividade, resultados e, consequentemente, o diferencial competitivo. Em contrapar-tida, o mal-estar psicológico pode causar menor concentração e poder de decisão, dimi-nuição da agilidade, queda de produtividade, acidentes, entre outros.

ӹ Percepção do Trabalho

Buscando-se ampliar o entendimento sobre as interações entre fatores psicossociais relativos à organização do trabalho e os trabalhadores, em especial, nas influências exerci-das sobre a saúde mental, a capacidade de desempenho e a qualidade de vida no trabalho, foi realizada em 2013 uma pesquisa exploratória baseada em entrevistas semiestruturadas com profissionais da área de saúde mental (SILVEIRA et ali, 2013).

A coleta de dados foi feita através de entrevistas com doze profissionais da área de saúde mental. Para tanto, foi elaborado um questionário semiestruturado, com perguntas abertas e fechadas e, seguindo a recomendação de vários autores, dentre eles Marconi e Lakatos (1999), foi feito um pré-teste para evidenciar possíveis falhas nesse instrumento da pesquisa. Tal procedimento foi fundamental para se chegar ao questionário final, pois várias questões foram suprimidas, incluídas ou alteradas.

Foram utilizados alguns métodos padrões na realização das entrevistas. Antes de ini-ciá-las, explica-se a inquietação dos pesquisadores deste projeto no que se refere à com-

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preensão quanto ao universo humano, a fim de estimular e desenvolver modelos organi-zacionais que favoreçam a saúde mental, mantendo o bom desempenho da organização (sustentabilidade). Em seguida, que o interesse é investigar o trabalho no mundo organi-zacional.

Sabe-se de antemão que quase sempre existem múltiplas possibilidades de reação do ser humano. Nesses casos, foi solicitado aos entrevistados pensarem naquilo que é mais provável, ou em que existem maiores ocorrências (por exemplo, ser suscetível às relações humanas). Por último, antes de fazer uma pergunta é definida a conceituação da variável de interesse e, ainda, quando aplicável, é explicado o que se quer saber, tendo o cuidado para não induzir respostas.

As perguntas contidas no questionário abordavam os seguintes aspectos: a saúde men-tal do trabalhador, a organização do trabalho, a subjetividade do trabalhador e o seu de-sempenho profissional. Além disso, havia questões sobre as características de personali-dade do trabalhador como importância subjetiva da carreira profissional e a sensibilidade às relações humanas. O documento prioriza perguntas que abarcam aspectos que relacio-nem a influência do trabalho na saúde mental, as percepções do individuo em relação ao seu trabalho e como os transtornos mentais são influenciados pelas atividades laborais.

Os respondentes foram questionados sobre a sua orientação teórica e abordagem cien-tífica através de questões como o grau de influência de fatores genéticos, dos primeiros anos de vida, da história de vida e do ambiente social, na saúde mental (e nos transtornos mentais). Também foi importante saber o tipo de experiência profissional, se em clínica ou instituições de saúde, e o nível de formação acadêmica.

ӹ Resultados e Discussão

Visando contribuir para o conhecimento sobre como o trabalho pode afetar a saúde mental, esta pesquisa apresentará a análise de três das quatorze questões levantadas entre os doze participantes deste estudo, a fim de obter maior compreensão sobre como a influ-ência e a percepção do trabalho interfere nos processos de inovação organizacional.

Afinal, a inovação não acontece por acaso e neste sentido é preciso ter um sistema que crie uma cultura organizacional adequada, busque a melhoria contínua, reconheça os bons funcionários, aproveite oportunidades integradas com outras organizações (como nos mecanismos de “open innovation”) e cuide da inovação disruptiva.

E possível atestar de acordo com Kanaane (2009) que, com exceção das condições de sobrevivência e subsistência, o trabalho possibilita ao indivíduo exercer sua potencialida-de criativa, desde que as condições ambientais e profissionais sejam facilitadoras, levando--o à plena realização. As energias individuais e grupais, se canalizadas efetivamente para a concretização de objetivos pessoais e/ou profissionais, possibilitam ao ser humano con-dições de dar vazão a suas potencialidades, resultando em realização pessoal.

Através do trabalho, o homem pode modificar seu meio e a si mesmo, à medida que possa exercer sua capacidade criativa e atuar como copartícipe do processo de construção das relações de trabalho e da comunidade na qual se insere. Mediante o exposto, os relatos a seguir, embasados por pesquisas teóricas sobre o assunto, objetivam fornecer subsídios para maior compreensão quanto ao assunto tratado, sinalizando a importância do traba-lho como estimulador das capacidades humanas.

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No que se refere à pergunta do grau de influência que o trabalho pode ter na saú-de mental, a maior parte dos sujeitos entrevistados consideram alta, destacando o papel significativo que ele exerce na vida do indivíduo. Esta concepção é tratada por Kanaane (2009), o qual questiona o sentido do trabalho na tentativa de identificar nele, o significado atribuído à existência de cada um.

Para corroborar essa afirmação, Samapio, Hitomi e Ruiz in Codo (1995) destacam que existe uma onipresença do trabalho humano em todas as expressões da vida social, abo-nando, portanto, as impressões abarcadas pelos entrevistados no que tange ao papel do trabalho como definidor da cidadania do indivíduo. Dejours (1997) caracteriza o trabalho como um elemento de formação da identidade psíquica e social do indivíduo que atua e produz e como um elemento estruturante da sociedade, sendo um veiculador da cultura e da ordem civilizatória.

Outro aspecto retratado pelos participantes desta pesquisa refere-se ao modo o qual o trabalho é concebido na sociedade capitalista, podendo este exercer em alguns casos o papel de exclusão ou de inclusão social e, consequentemente, de gerador de maior ou menor saúde mental. O trabalho adquire também uma conotação negativa, pois, diante de certas condições, ele é capaz de servir como um instrumento de dominação, capaz de produzir sofrimento.

De acordo com Barros (2001), é a organização do trabalho que determinará se este é fonte de prazer ou de sofrimento. Quando a organização é flexível e possibilita negociação de normas e regras dos processos de trabalho, quando os funcionários têm maior autono-mia e participação na gestão das demandas individuais e da instituição, o trabalho tende a mostrar-se mais prazeroso e satisfatório. Ao contrário, pode-se gerar um ambiente pro-pício ao sofrimento.

Num sentido positivo, o trabalho é um fator de cura, de desenvolvimento, do contrário, adoecimento. Em seus relatos, um dos entrevistados faz menção ao Anuário Estatístico da Previdência Social de 2011, o qual apresenta que mais de 211 mil pessoas foram afastadas em razão de transtornos mentais, gerando um gasto de R$ 213 milhões em pagamentos de benefícios. Neste sentido, questionam-se quais as providências necessárias para se evitar tais gastos, porém, mais do que aspectos financeiros, devem-se considerar os efeitos intan-gíveis e seus impactos na sociedade como um todo.

Para reforçar tal posição, cumpre-se transcrever o comentário de um dos entrevista-dos, o qual coloca que “neste mundo onde o ter vale mais que o ser, tudo é descartável, as empresas querem a produção, mas não se preocupam em trabalhar com a prevenção dos problemas, pois deveria ter uma equipe multiprofissional com psicólogo, fisioterapeuta, nutricionista, entre outros para trabalhar com este profissional quando percebesse que algo não está indo bem”. Tal alegação sugere a importância em se considerar os fatores psicossociais que permeiam o mundo do trabalho.

Hoje, os chamados transtornos mentais, relacionados ao trabalho, ocupam lugar sig-nificativo nas causas de afastamento do trabalho e na concessão de benefícios previdenci-ários, sendo crescente a demanda de trabalhadores acometidos por adoecimento mental que procuram os serviços de Saúde do Trabalhador (ARAUJO, PINHEIRO & GREGGIO, 2011). Muito mais que simples meio de subsistência, o trabalho constrói laços sociais, é fonte de reconhecimento pessoal, tendo importância vital na construção da subjetividade,

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sendo essencial para o equilíbrio e para a saúde psíquica. Entretanto, em condições ad-versas, pode tornar-se fonte de adoecimento, não apenas orgânico, mas também psíquico ou mental.

Em sua maioria, concordam os entrevistados quanto ao fato de que o grau de influência do trabalho na saúde mental depende das características de cada pessoa, sendo necessário considerar-se, portanto, a constituição de cada um. Para Heloani e Capitão (2003), não é raro encontrar pessoas que, por uma condição de sua psicodinâmica interna, possuem a propensão a trabalhar em excesso e a divertir-se muito pouco; outras, pelo contrário, passam os dias a divertirem-se; outras ainda não conseguem fazer nem uma coisa nem outra. Sabe-se hoje que tanto o trabalho, quanto a diversão em proporções satisfatórias são critérios para avaliar um funcionamento psíquico saudável.

Segundo Friedmann (1983), deve-se considerar o papel que o trabalho desempenha para o indivíduo, atestando que a concepção de trabalho corresponde ao engajamento e às predisposições pessoais. Neste quesito, um dos respondentes faz menção quanto à importância do papel ativo da área de gestão de pessoas nos processos de recrutamento, seleção e acompanhamento sócio funcional a fim de buscar identificar os trabalhadores que tenham fragilidades psíquicas e, portanto, tomar as providências cabíveis.

Tal cenário destaca a importância de serem adotados comportamentos e ações mais fle-xíveis pelos profissionais da era da empregabilidade, atentos às mudanças na organização do trabalho, implementando constantemente o redirecionamento profissional sem, con-tudo, desconsiderar a “história pessoal e profissional”, mas possibilitando sempre o surgi-mento de atividades profissionais diferenciadas, de acordo com os segmentos de mercado, a demanda existente e considerando-se a Ética, o resgate da cidadania e, consequentemen-te, o desenvolvimento do potencial humano. (KANAANE, 2009).

Em um dos relatos obtidos, foram consideradas as consequências que o mundo do trabalho capitalista impõe à sociedade e neste sentido, acredita-se que quaisquer pessoas, mesmo as mais saudáveis do ponto de vista mental, estão suscetíveis ao sofrimento psí-quico, de modo a acarretar transtornos mentais mais ou menos leves/patológicos. Isto é, partir do momento, em que o trabalhador não consegue atingir os resultados esperados, as expectativas da empresa ou da equipe de trabalho, ele pode adoecer mentalmente, mes-mo sendo considerado saudável.

Faz-se necessário alertar, conforme descrevem Heloani e Capitão (2003), que a orga-nização do trabalho não cria doenças mentais específicas, visto que surtos psicóticos e a formação de neuroses dependem da estrutura da personalidade que a pessoa desenvolve desde o início da sua vida, chegando a certa configuração relativamente estável, após o período de ebulição da adolescência quando as condições sociais são relativamente favorá-veis, antes mesmo de a pessoa entrar no processo produtivo. Em contrapartida, os autores concordam com Dejours,(1992:122 apud Heloani e Capitão 2003) ao afirmar que “o defeito crônico de uma vida mental sem saída mantido pela organização do trabalho tem prova-velmente um efeito que favorece as descompensações psiconeuróticas”.

Para Heloani e Capitão (2003), o mundo do trabalho que por um lado poderia auxiliar o homem em sua qualidade de vida, por outro lado apoiado pelos que mantêm o contro-le do capital, avassala o homem em todos os seus aspectos. Esse princípio de realidade adentra e fere o psiquismo humano, fazendo com que as pessoas sintam-se exigidas e

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assim, o sentimento de impotência e de desvalorização, leva as pessoas pouco resistentes a degenerarem-se rapidamente, avilta de si qualquer potencial humano que pudesse se somar às conquistas da civilização.

No que refere à pergunta quanto à existência de outros fatores da personalidade que podem modular a influência do trabalho na saúde mental, os entrevistados consideram que nenhuma teoria deve descartar o aspecto da personalidade, sendo importante que o indivíduo trabalhe o autoconhecimento em busca da realização pessoal e profissional.

Mudanças ocorridas no mundo do trabalho têm alterado substancialmente as relações de trabalho e as relações socioculturais-econômicas alterando consequentemente os sen-tidos que vão sendo atribuídos ao trabalho. Conforme apontam Araújo e Sachuk (2007), tais modificações impõem aos indivíduos novas percepções, novas formas de agir, pensar e sentir o seu fazer.

Percepção, na concepção de Penna (1993), se refere a uma forma restrita de captação de conhecimentos, manifestada em função de uma perspectiva. O autor acrescenta que a per-cepção pode desempenhar o papel de função defensiva, ou de proteção contra eventuais estímulos ou constelações de estímulos que se possam revestir de significado ameaçador e lesivo. Neste aspecto, verificou-se que os entrevistados consideram a percepção do próprio trabalho como influente na saúde mental.

Ainda em relação à percepção, os entrevistados atribuem importância ao significado do fazer, sendo que ao se acreditar que o que se faz e o que se produz são importantes de alguma forma, influencia positivamente na saúde mental, todavia, o contrário tende a gerar doenças do trabalho.

De certa forma, segundo Kanaane (2009), ao sentir-se participante de um processo de trabalho, o indivíduo tende a responsabilizar-se pelo mesmo. Tal participação propor-ciona-lhe consciência mais ampla de si mesmo e dos meios de produção e possibilita-lhe desenvolver sua liberdade de opção diante do contexto de trabalho e, por extensão, da sociedade de maneira geral. Consequentemente, este caminho possibilita-lhe apropriar-se de sua cidadania, proporcionando-lhe condições de desenvolvimento e equilíbrio psico-lógico.

Neste sentido, os entrevistados acreditam que o valor dado ao trabalho poderá deter-minar como o sujeito buscará estratégias para lidar com as cargas impostas e até mesmo minimizar o sofrimento. Assim, estar produtivo, sentir-se importante no que se faz é po-sitivo, em contrapartida, o oposto, (incompreensão, insatisfação constante nos resultados, pressão incessante, perseguição, dentre outros aspectos), gera transtornos tais como an-siedade, depressão, agressividade, perda de libido e sensação de incompetência.

Em seus estudos, Sato in Codo (1995) corrobora as afirmações expostas ao descrever que para os trabalhadores o trabalho é penoso quando seu contexto gera incômodo, esfor-ço e sofrimento demasiados, sobre o qual (contexto) ele não tem controle.

Ao questionar os entrevistados se existem outras variáveis ou aspectos relacionados ao trabalho que gostariam de mencionar, estes apontam a remuneração como sendo algo essencial, considerando que a falta de preocupação com a situação financeira previne do-enças mentais e, além disso, salários melhores garantem maior resiliência em ambientes laborais doentes. Aspectos como temperatura ambiental compatível e nível de ruído ade-quado foram citados.

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Neste aspecto, Fernandes et al (2006) indicam que as condições gerais do trabalho, ou seja, uma série de aspectos da situação de trabalho e do sobretrabalho podem atuar de forma conjunta no desencadeamento de transtornos mentais, onde vários aspectos se inter-relacionam.

Em complemento, Kanaane (2009) destaca que as condições atuais existentes na si-tuação de trabalho, de maneira geral, têm gerado, para parte significativa dos trabalha-dores, desajustes comportamentais, estresses, somatizações, inadequações ao trabalho e ao meio no qual o mesmo se insere. O autor destaca estudos desenvolvidos que atestam que a insatisfação do homem no trabalho, ocasiona desajustamentos e inadaptações, verificadas pelo elevado índice de acidentes de trabalho.

Ainda no que se refere a outras variáveis ou aspectos relacionados ao trabalho que os entrevistados gostariam de citar, foi mencionada a sexualidade, alegando que esta é prejudicada em decorrência do aumento quanto às exigências organizacionais, per-meada pela globalização do mundo do trabalho, de modo a “roubar” a sexualidade do trabalhador, a energia da sexualidade e, além disso, estimular aspectos relacionados ao homossexualismo.

A despeito disto, Freud (1974/1939 apud Araujo, Pinheiro & Greggio, 2011), em li-nhas gerais, comenta que nenhuma outra técnica para a conduta da vida captura o indi-víduo tão firmemente à realidade quanto a enfase concedida ao trabalho, pois este, pelo menos, fornece-lhe um lugar seguro numa parte da realidade, na comunidade humana. A possibilidade que esta técnica oferece de deslocar uma grande quantidade de compo-nentes libidinais sejam eles narcísicos, agressivos ou mesmo eróticos, para o trabalho profissional e para os relacionamentos humanos a ele vinculados, empresta-lhe um va-lor que, de maneira alguma, está em segundo plano.

A relação do trabalho com a família também foi mencionada, uma vez que pode cor-roborar para o desequilíbrio da família e como consequência provocar o adoecimento no trabalhador.

É importante que ocorra a existência de uma relação salutar entre o contexto profis-sional e familiar, afinal, de acordo com Goméz (2003 apud Teixeira e Nascimento, 2011), a conciliação trabalho-família é alcançável quando os dois domínios se desenvolvem de forma satisfatória.

Tendo em vista que trabalho e família ocupam um lugar constituinte na vida do indi-víduo, para Dejours (1999), em um cenário em que as pressões do trabalho são constan-tes, faz-se necessário que ocorra a elaboração de estratégias defensivas. Nisto, a família (considerando essas exigências do funcionamento psíquico de quem trabalha) pode co-operar com a pessoa, ajudando-a a manter suas estratégias defensivas, ou do contrário, se opor, em muitos casos, porque não consegue suportá-lo.

Ademais, torna-se importante a realização de práticas efetivas na organização que promovam a conciliação entre trabalho e vida familiar por meio de políticas efetivas reconhecidas como facilitadoras da conciliação entre trabalho e família (GUERREIRO & PEREIRA, 2006). Dessa forma, pode-se pensar na relevância do papel da organização, na medida em que a gestão possa assegurar políticas e práticas que favoreçam o bom desempenho profissional, bem como a relação do trabalhador com a família, respeitan-do-se assim a saúde mental do colaborador, pois de outro modo, além de trazer efeitos

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nocivos à saúde do trabalhador, acaba por prejudicar sua produtividade e capacidade criativa.

ӹ Conclusão

A presente pesquisa aponta que os profissionais entrevistados pertencentes às várias linhas teóricas das áreas da psicologia e da psiquiatria avaliam ser alta a influência que o trabalho pode ter na saúde mental, o qual exerce papel expressivo na vida do indivíduo. Neste contexto, torna-se substancial considerar suas modificações ao longo do tempo, bem como o significado a ele atribuído, podendo ser composto de muitos aspectos, dentre eles a percepção, compreendida como um processo subjetivo e que, de acordo com os par-ticipantes da pesquisa também influencia na saúde mental.

Ao perceber-se como parte de um processo, entendendo e acreditando que o que se faz, o que se produz é importante de algum modo, os entrevistados acrescentam que haverá influência positiva na saúde, proporcionando condições de desenvolvimento e equilíbrio psicológico, corroborando aos processos de inovação organizacional.

Assim, estar produtivo, sentir-se importante no que se faz é positivo, em contraparti-da, o oposto, (incompreensão, insatisfação constante nos resultados, pressão incessante, perseguição, dentre outros aspectos), geram transtornos tais como ansiedade, depressão, agressividade, estresse, somatizações, perda de libido, inadequações ao trabalho, ao meio e sensação de incompetência.

Para tanto, é preciso que as organizações repensem sua função, pois de acordo com Barros (2001), é a organização do trabalho que determinará se o mesmo é fonte de prazer ou sofrimento e neste sentido, faz-se importante atentar ao modo como o trabalho é con-cebido na sociedade capitalista contemporânea, inclusive. De acordo com a concepção de um dos entrevistados, deve-se considerar que quaisquer pessoas, mesmo as mais saudá-veis do ponto de vista mental, poderão ser compelidas ao sofrimento psíquico, de modo a acarretar transtornos mentais mais ou menos leves/patológicos.

Cabe mencionar que, embora para os entrevistados, a organização do trabalho não crie doenças mentais específicas, aquela pode ser uma facilitadora, e neste sentido, nenhuma teoria deve descartar o aspecto da personalidade, levando-se em conta a constituição de cada um e o grau de influência que o trabalho acarreta na saúde mental.

Torna-se relevante citar Dejours, (1992:122 apud Heloani e Capitão 2003), para o qual, “o defeito crônico de uma vida mental sem saída mantido pela organização do trabalho tem provavelmente um efeito que favorece as descompensações psiconeuróticas”, levando as pessoas pouco resistentes a degenerar-se rapidamente e aviltar de si qualquer poten-cial humano que pudesse se somar às conquistas da civilização (HELOANI E CAPITÃO, 2003). Nesta esfera, não estariam assim as organizações agindo como catalisadoras ou inibidoras da inovação?

Buscando maior entendimento entre os entrevistados quanto a outros fatores que pos-sam influenciar a saúde mental no trabalho, foram obtidas respostas relacionadas a ques-tões financeiras, componentes libidinais, relação trabalho e família, além de ambiente físico e outras condições gerais, fomentando outras implicações. Dentre elas, observa-se que, de acordo com Araújo, Pinheiro e Greggio (2011), tem sido crescente a demanda de trabalhadores acometidos por adoecimento mental que procuram os serviços de Saúde

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do Trabalhador, ocupando lugar significativo nas causas de afastamento do trabalho e na concessão de benefícios previdenciários. Quais os efeitos disto? Por si só, não competiria pensar-se em políticas públicas neste campo?

Por fim, sugere-se a continuidade do presente estudo quanto à investigação da influên-cia do trabalho na saúde mental e, com isto, contribuir para que em primeira instância, conforme apontado por um dos respondentes, a área de gestão de pessoas tenha um papel ativo e, portanto, busque identificar dentre os trabalhadores aqueles que tenham fragili-dades psíquicas para que as providências cabíveis sejam tomadas.

É essencial, deste modo, a realização de ações efetivas na organização que promovam políticas e práticas que favoreçam o bom desempenho profissional, respeitando a saúde mental do funcionário, pois de outro modo, além de trazer efeitos nocivos à saúde do trabalhador, acaba por prejudicar sua produtividade e consequentemente sua capacidade criativa, acarretando, assim, implicações quanto ao desenvolvimento do potencial huma-no.

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CAPÍTULO 8

INSERÇÃO DA MULHER NO MERCADO DE TRABALHO: IMPACTOS SOBRE A SAÚDE MENTAL

E QUALIDADE DE VIDA

Ana Cláudia dos Santos e Sabrina Kelly Pontes

ӹ Introdução

Mudanças no universo do trabalho no pós-guerra alteraram de maneira significativa o processo de produção e trabalho das organizações. Tais mudanças se fizeram neces-sárias para que o capital pudesse retomar seu crescimento e alavancar sua competitivi-dade.

Essas mudanças ocorreram no fim dos anos 60 e início dos anos 70, quando o mun-do capitalista presenciou a crise de acumulação do padrão taylorista/fordista, princi-palmente nos países capitalistas avançados. Profundas transformações econômicas e sociais em nível mundial – como a crise do petróleo, que agravou a crise de 1973, dimi-nuindo os lucros – não mais possibilitaram sustentar o formato produtivo anterior, que resultou na passagem do processo de acumulação em massa para a acumulação flexível. Para que esta transição resultasse em aumento da competitividade e dos lucros, foi ne-cessário um cenário onde as forças produtivas estivessem pautadas na reestruturação do capitalismo, com objetivo principal de recuperar as formas de acumulação do capital.

Essas transformações, oriundas da própria concorrência intercapitalista e da necessi-dade de controlar as lutas sociais provenientes do trabalho, acabaram por provocar uma resposta do capital à sua crise estrutural.

Diante da nova conjuntura, as empresas buscaram ser cada vez mais competitivas in-troduzindo novas técnicas de gestão da produção e da força de trabalho. A nova estrutu-ra produtiva das empresas passou a ser mais flexível, o que possibilitou às organizações recorrerem frequentemente à diminuição de seu tamanho em função da terceirização de diversas atividades.

Nesta perspectiva, as empresas passaram a terceirizar, reduzir seus níveis hierárqui-cos, restringir seus orçamentos (e, portanto custos), tendo como objetivo o aumento da produtividade, do lucro e da competitividade.

Ainda no pós-guerra, a partir de 1950 mais ou menos, o tema Qualidade de Vida no Trabalho (QVT), passa a ser discutido e a fazer parte das mudanças pelas quais passam as relações de trabalho na sociedade em rápida transformação, como forma de tentar amenizar os impactos do trabalho na saúde dos trabalhadores.

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Em paralelo a estes acontecimentos, mas não independente a eles, tem-se uma ele-vada participação das mulheres no mercado de trabalho, apesar da crise, coincidindo este aumento com uma importante ampliação da precariedade do emprego no mesmo período. (HIRATA, 1997). Isto posto, o capítulo tem como objetivo apresentar que as mudanças no universo do trabalho têm impactado a saúde mental das mulheres e que este impacto afeta a competitividade das organizações, uma vez que esta é uma mão-de--obra em elevada expansão.

Para tanto, o capítulo abordará inicialmente as transformações no mundo do traba-lho, pós década de 70, a inserção das mulheres no mercado de trabalho, o processo de adoecer como construção social, saúde mental das mulheres e por fim qualidade de vida no trabalho e repercussões na competitividade.

ӹ Reestruturação Produtiva e mudanças no trabalho

A década de 70 foi marcada por intensas modificações no universo do trabalho. A microeletrônica possibilitou configurar as organizações de uma maneira que foi pos-sível controlar grandes corporações a distancia e também enxugá-las e flexibilizá-las.

Nas palavras de Harvey (1992):

“Ela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de traba-lho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços fi-nanceiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inova-ção comercial, tecnológica e organizacional” (HARVEY, 1992, p.140).

Abramides & Cabral (2003) também definem a reestruturação produtiva como um processo baseado no aumento de produtividade, eficiência, qualidade, novas formas de tecnologia e de gestão, validando-se por intermédio das inovações tecnológicas. Desta forma, tem-se que o processo de acumulação flexível acontece de uma reestruturação da produção que impõe uma nova forma de gerir a produção e consequentemente a força de trabalho, através de técnicas de gestão mais flexíveis e participativas.

Em relação às mulheres, no mercado de trabalho, podemos afirmar que mudanças sig-nificativas ocorreram, ou seja, as mulheres se mantiveram no mercado de trabalho, apesar da crise que marcou os anos 80 (CARLOTO, 2002).

No Brasil, o crescimento da oferta de emprego feminino nos anos 1970 se deu graças à expansão de ramos industriais que normalmente empregam mulheres. Ao mesmo tempo tem-se uma deterioração do salário mínimo e um reordenamento de estratégias de ma-nutenção familiar: mulheres e menores integram-se ao mercado de trabalho industrial, como consequência da crise (BRUSCHINI, 2007).

Fatores como a degradação do salário dos trabalhadores obrigou as mulheres, de todos os níveis de instrução e das camadas médias da população, a buscarem uma comple-mentação à renda familiar. Um segundo fator foi o acelerado ritmo de industrialização que demandou novos trabalhadores ao surgimento de mais postos de trabalho, incluindo o trabalho feminino. O terceiro ponto refere-se às mudanças nos valores em relação ao papel da mulher na sociedade, o quarto ponto à diminuição da fecundidade reduzindo o número de filhos por mulher que facilitou, por consequência, a entrada da mulher para

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o trabalho além da casa e por fim, o aumento da escolaridade e acesso das mulheres às universidades (CARLOTO, 2002).

Para Harvey (1992), apesar do acesso de algumas mulheres e minorias étnicas a posi-ções profissionais mais valorizadas, as novas condições de trabalho exacerbaram ainda mais a fragilidade de grupos desprivilegiados. A entrada massiva das mulheres no mer-cado de trabalho, segundo o autor, não substituiu papéis até então socialmente definidos. Elas ainda são as responsáveis pelos cuidados com a casa e com a família, taxadas como aquelas que apenas ajudam no orçamento da família.

Permanecem ainda como as principais responsáveis pelas atividades domésticas e cui-dados com os filhos e demais familiares, o que representa uma sobrecarga para aquelas que também realizam atividades econômicas (BRUSCHINI, 2007, p.542).

Pesquisa realizada por Bruschini (2007) revelou que de todos os fatores ligados à esfera reprodutiva, a presença de filhos pequenos é aquele que mais dificulta a atividade produ-tiva feminina, uma vez que, o cuidar dos filhos é uma das atividades que mais consome o tempo de trabalho doméstico das mulheres. De acordo com a autora, as mães dedicam a estas atividades quase 32 horas do seu tempo semanal, um número bem mais elevado, muito superior ao da média feminina geral e mais ainda ao das mulheres que não tiveram filhos. Apesar de sobrecarregadas na esfera reprodutiva, a autora constata que todas as mães, mesmo as de filho muito pequeno, abaixo de 2 anos, que consomem 35 horas sema-nais, aumentaram sua participação no mercado de trabalho (BRUSCHINI, 2007).

Verifica-se, portanto, que parte das mulheres, principalmente as com filhos pequenos, já chegam a sua atividade profissional com uma carga de trabalho extra. Temos então, parafraseando Borsoi (1995), que o universo produtivo e reprodutivo são dois mundos que se complementam e se confundem, não podendo, portanto, serem vistos separados um do outro. Também levar em conta o contexto fora do ambiente de trabalho ao qual as pessoas estão sujeitas facilita o entendimento da relação saúde/trabalho e doença, bem como favo-rece e facilita práticas de ação.

ӹ O adoecer enquanto construção social

O ser humano, ao longo de seu desenvolvimento, constrói e estrutura formas – tanto em relação ao corpo quanto em relação à mente – de ser e reagir aos mais adversos estí-mulos aos quais ele pode estar submetido, sempre com o sentido de manter o equilíbrio de seu organismo. Aquilo que a pessoa é no momento presente é o resultado de várias experiências que vivenciou no decorrer da sua história. Quando alguém reage aos diver-sos impactos a que está submetido no seu cotidiano, carrega neste processo uma volta ao equilíbrio. Mas, estes impactos fazem parte de sua vida e as tensões que eles provocam podem deixar marcas e modificar o corpo da pessoa. Daí a tendência em se compreender os processos de adoecer, não como um evento casual na vida de uma pessoa, mas, sim, como resposta de um indivíduo que vive em uma sociedade, em constante interação com outras pessoas, parte ativa de microestruturas inseridas em uma macroestrutura social e cultural, situada em determinado ambiente físico e que procura resolver, da melhor ma-neira possível, sua existência no mundo (FRANÇA & RODRIGUES, 1999).

Dentro desta perspectiva, o adoecer surge como a expressão de conflitos resultantes das dificuldades em lidar com tão complexas interações. Diversos estudos médicos e psi-

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cológicos revelam que o ser humano tem demonstrado dificuldade em lidar com estímu-los estressores ambientais e sócio-econômico-culturais da sociedade industrial e urbana, podendo-se compreender um grande número de doenças – principalmente aquelas mais frequentes do homem urbano contemporâneo – que denunciam, expressam e revelam a forma da pessoa viver, a sua qualidade de vida e sua maneira de interagir com o mundo.

Estatísticas referentes às causas de afastamento do trabalho por doença e aposentadoria por invalidez mostram que a hipertensão arterial, doenças das articulações e distúrbios mentais são as mais frequentes, sendo estas últimas as que causam mais afastamentos, en-quanto a hipertensão é a que provoca maior número de aposentadorias. Assim, as doenças infecciosas cedem o seu lugar de proeminência às doenças que estão mais relacionadas às características do modo de produção industrial (FRANÇA & RODRIGUES, 1999).

Pode-se ver, então, a importância da compreensão das formas de adoecer dentro de uma perspectiva histórica e relacional que leve em consideração a história de vida da pes-soa, sua forma de ser, sentir e reagir e de suas inter-relações sociais (FRANÇA & RODRI-GUES, 1999).

As mudanças ocorridas na economia mundial na última década, caracterizadas pelo aumento da produção com menor número de trabalhadores empregados, com automação, terceirização, precarização e aumento da informalidade, têm causado novos prejuízos à saúde dos trabalhadores. Vivenciamos assim, um aumento de “novas” doenças relaciona-das ao trabalho, como as LER/DORT e sofrimento. (3ª CNST, 2005).

Estas doenças podem afetar todos os trabalhadores e trabalhadoras, porém, em relação às mulheres que trabalham é preciso considerar que as características morfofisiológicas do organismo das mulheres, segundo Borsoi (1995), demandam certas medidas de ade-quação do ambiente de trabalho e alguns cuidados especiais para que o trabalho seja rea-lizado com eficiência. Isto não significa que as mulheres devam ser tratadas como frágeis e incapazes nas situações de trabalho, apenas como diferentes.

Pesquisas têm apontado que as mulheres apresentam um maior índice de absenteísmo--doença quando comparadas aos homens. Esta morbidade está relacionada à quantidade de atribuições que a mulher teve de assumir quando passou a se dedicar ao trabalho fora de casa. Disto resulta uma quantidade excessiva de tarefas, muitas vezes, com sono inade-quado, que deriva, possivelmente, em desordem no seu estado de saúde (BORSOI, 1995).

Tem-se, portanto, que para analisar o trabalho das mulheres, é preciso não somente considerar o processo de trabalho e as relações que ali se desenvolvem, mas, em conjunto a estes aspectos, a jornada feminina que, na maioria, das vezes, se diferencia da jornada masculina. Mulheres têm apresentado consideravelmente mais sintomas de angústia psi-cológica e desordens depressivas do que homens. Alguns estudos apontam que a inserção da mulher no mercado de trabalho é fator determinante ou contribuinte para a ocorrência de Transtornos Mentais Comuns (TMC) (LUDERMIR & MELO FILHO, 2002). Pesquisar o impacto do processo de trabalho sobre, não apenas, o corpo da mulher, mas, principal-mente, sobre sua saúde mental é pensar sobre sua qualidade de vida.

ӹ Inserção no mercado de trabalho e Saúde Mental das Mulheres

A mulher na sociedade contemporânea exerce uma postura ativa na sociedade, o que significa constituição de uma família, o exercício de atividades laborais diversas e a colabo-

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ração ou sustento total financeiramente de seu grupo familiar. Sua entrada e permanência no mundo do trabalho aconteceram por diversos fatores, mas, as atividades que exerce e seu ganho financeiro estão relacionados a aspectos sociais, culturais e econômicos de cada sociedade. No Brasil, segundo a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2011, havia 190,7 milhões de brasileiros, sendo 51,5% mulheres. Ainda, segundo do IBGE, na PME (Pesqui-sa Mensal de Emprego) de 2011, as mulheres representavam 43,4% da população ocupada, sendo os homens, 56,6%. Por outro lado, sua participação no mercado de trabalho, mesmo sendo menor que a dos homens, 45,3% contra 63,4%, apresentou um crescimento de 2003 a 2011. Em 2003, o indicador foi de 40,5%, passando para 45,3% em 2011.

Por outro lado, a participação da mulher no mercado não reflete em sua condição sala-rial, ou seja, as mulheres ganham em torno de 28% menos que os homens, segundo mesma pesquisa do IBGE em 2011. Porém, sua condição produtiva, é possível afirmar, é maior que a dos homens já que a mulher exerce atividades além da organização, mas também a elas estão relacionadas às atividades domésticas, as práticas de trabalho que são exercidas em sua casa, com sua família, de uma maneira geral, fica sob a responsabilidade da mulher. Saffioti (1979) afirma que a tradição à qual à mulher cabe desempenhar atividades no âmbito doméstico, ou seja, no lar, estão intrinsecamente relacionadas a utilizar dos elementos femininos as necessidades da organização econômico-social capitalista. O trabalho da mulher no âmbito doméstico complementa e se utiliza deste patrimônio para produzir e acumular cada vez mais capital.

Estes aspectos sociais provocam nas mulheres um questionamento sobre sua própria condição humana. A participação ativa no desenvolvimento econômico e social propor-cionou, por exemplo, a diminuição da taxa de fecundidade das famílias e a sua inserção no mundo produtivo, ocasionou a sua exposição a determinados riscos a doenças profis-sionais. Em 2013, a OIT (Organização Internacional do Trabalho) divulgou documento informativo sobre a prevenção das doenças profissionais no mundo e aponta que tem au-mentado as perturbações mentais como o estresse relacionado ao trabalho, o assédio psi-cológico, intimidação, assédio moral, assédio sexual e outras formas de violência. Foram identificadas relações entre estresse, abuso de álcool e drogas, assim como relação entre o estresse e doenças musculoesqueléticas, cardíacas e do sistema digestivo. Outro aspec-to interessante apontado pela OIT é que a “a crise econômica e a recessão levaram a um aumento do estresse relacionado com o trabalho, da ansiedade, da depressão e de outros distúrbios mentais, tendo mesmo conduzido algumas pessoas ao extremo suicídio” (OIT, p.6).

Estes aspectos demonstram um avanço da OIT ao citar como doenças profissionais, mesmo de modo restritivo, as perturbações mentais e de comportamentos. Segundo mes-mo relatório, há 160 milhões de doenças no mundo que não são fatais, mas que resultam da atividade profissional. Além disso, há fatos e situações de ordem econômica e social que podem levar ao agravamento do quadro.

Existe a necessidade de identificação da importância dos transtornos mentais como um problema de saúde pública, independente da questão do trabalho. Doenças como transtornos depressivos e transtornos cardiovasculares, substituem nos países subdesen-volvidos, no caso dos continentes asiáticos e latino-americanos, a desnutrição, complica-

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ções perinatais e doenças infectocontagiosas (ANDRADE, VIANA e SILVEIRA, 2006). A mulher apresenta vulnerabilidade a sintomas ansiosos e depressivos, especificamente no período reprodutivo. Andrade, Viana e Silveira (2006) apontam que:

“a depressão é comprovadamente, a doença que mais causa incapacitação em mulheres, tanto em países desenvolvidos como naqueles em desenvolvimento. No mundo, a morte por suicídio é a segunda causa de morte para mulheres na faixa de 15 a 44 anos de idade, sendo precedida somente por tuberculose” (ANDRADE, VIANA E SILVEIRA, 2006, p. 44).

No mundo do trabalho este quadro tende a permanecer. As pressões decorrentes da or-ganização do trabalho, da jornada dupla relacionada ao trabalho e à vida doméstica, da con-dição familiar, história de vida, condição biológica e personalidade são fatores de risco asso-ciados à depressão. Andrade, Viana e Silveira (2006) apontam também outros transtornos relacionados à mulher a partir de estudos epidemiológicos como transtornos de ansiedade, transtornos alimentares, transtornos associados ao ciclo reprodutivo, transtornos mentais associados ao puerpério, transtornos mentais associados à perimenopausa e menopausa e violência contra a mulher, neste caso, sendo a violência identificada como fator de risco pelas consequências que ela traz para a mulher nos aspectos relacionados à sua saúde.

Barreto (2003) em pesquisa para compreender a relação saúde-doença no trabalho, partindo da mediação das emoções, conversou com trabalhadores e trabalhadoras que apresentavam como característica comum limitações para produção em decorrência de doenças ou acidentes do e no trabalho. Seu estudo mostra que a partir do momento que contavam as suas histórias, outras situações geradoras de sofrimentos surgiram, ou estavam presentes, mesmo ao longo do tempo transcorrido. As mulheres (56,8%), no es-tudo, revelaram maior frequência de situações de humilhações quando comparadas aos homens (43,2%), demonstrando um controle maior da força de trabalho feminina. Ou-tro aspecto evidenciado é que 99% das mulheres pesquisadas ocupavam funções de su-bordinação, ajudantes ou auxiliares de produção. Houve também, na conversa das mu-lheres com a pesquisadora, que estas que exerciam o papel de ‘cuidadoras’ de outros, no caso de familiares, pai, marido, filhos e adoecidos da família, o que ocasiona a ruptura com o trabalho remunerado. Este aspecto demonstra que para as mulheres “os projetos individuais e a realização profissional são postergados e relegados quando casam ou têm filhos, sendo naturalizado socialmente que as mulheres devem retornar para o espaço privado/doméstico” (BARRETO, 2003, p. 203). Já, quando tentam conciliar trabalho e vida doméstica, vivenciam o sentimento de culpa, porque para elas, há um “’descuidar dos seus’, sendo constantemente responsabilizadas por parte de seus maridos” (idem).

O que se observa é que a mulher convive intrinsecamente com diversos mundos, e aca-ba sendo responsabilizada pela organização de muitos deles. Programas de qualidade de vida não devem desconsiderar esta realidade das mulheres, devem ser projetados de modo a desenvolver ações que conciliem trabalho e família.

ӹ Qualidade de vida no trabalho

A preocupação com a qualidade de vida do trabalhador remonta à década de 70 do sé-culo passado. Chiavenato (2010) aponta o professor Louis Davis (Universidade da Califor-

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nia, Los Angeles), percursor do movimento, por sua preocupação com o bem-estar geral e saúde dos trabalhadores no desempenho de suas atividades e, desta forma, cunhou o termo qualidade de vida no trabalho, decorrente de seu projeto de delineamento de cargos naquele momento histórico. No período pós-segunda guerra mundial, havia uma gran-de preocupação com a competitividade internacional e o surgimento de programas ge-renciais que propunham elevar a produção, minimizar os conflitos na organização eram bem-vindos. O movimento pela QVT ganha expressão e adeptos nas organizações, pois relaciona a preocupação com a saúde dos trabalhadores e seu bem-estar, com a eficácia organizacional.

Para Chiavenato (2010), houve o desenvolvimento de outras conceituações por par-te de autores europeus abordando aspectos da abordagem sociotécnica e da democracia industrial, mas o movimento atualmente envolve tanto os aspectos físicos e ambientais, como psicológicos do local de trabalho. Ele ganhou força e tenta equilibrar posições an-tagônicas, ou seja, “de um lado, a reivindicação dos colaboradores quanto ao bem-estar e satisfação no trabalho e, de outro, o interesse das organizações quanto aos seus efeitos potenciadores sobre a produtividade e a qualidade” (CHIAVENATO, 2010, p.487).

Barreto (2003, p. 116) ao conversar com os trabalhadores e trabalhadoras de diversos segmentos industriais, setor das indústrias químicas, farmacêuticas e cosméticos, aponta com reserva os programas de qualidade de vida, pois podem ser qualificados como ‘em-belezamento’ da empresa, já que há a persistência de omissões de diagnósticos, subnotifi-cações de doenças, persistência de condições insalubres, baixos salários, precarização do trabalho, relações autoritárias e abuso de poder, que caracterizam a violência psicológica, que os trabalhadores são vítimas, e não são vistos, ou são suprimidos e esquecidos, nas políticas de recursos humanos das empresas. A autora menciona ainda que os programas de QVT compactuam com uma exigência social atual de um corpo saudável que atende aos interesses do capital no sentido de elevar a produtividade das empresas, mas sem o compromisso de fato, com a saúde dos trabalhadores ou, acrescentamos, com sua condi-ção social. Segundo relato dos trabalhadores e trabalhadoras, os programas de QVT são, teoricamente, extensivos a todos, porém, na realidade, quem participa são funcionários administrativos, executivos e de vendas.

Para as mulheres este aspecto fica mais complexo, pois se trata de uma situação so-cial de dupla jornada de trabalho e isto não parece ser uma preocupação das empresas. Embora tenham adquirido avanços expressivos no mundo do trabalho, como ganho sa-larial, ascensão na carreira, melhoria em sua condição de trabalho, ainda persistem as diferenças tradicionais entre homens e mulheres no âmbito doméstico. Melo, Considera e Sabbato (2006, p. 436) relacionam essa dualidade de práticas exercida pela mulher à figura de Janus, em que “as mulheres têm uma face voltada para o lar e a outra para a rua, num grande esforço de sobrevivência, num tempo de ruptura de um código milenar.” Devido à desigualdade social presente no Brasil, as mulheres em uma condição econômica menos favorecida, vivem essa condição de uma maneira mais agravante, apontam os autores. As relações entre os homens com as mulheres não se modificaram, e para haver mudan-ça, efetiva, no papel da mulher, deveria haver, em contrapartida, uma mudança no papel masculino, ou seja, mesmo com a ausência da mulher no âmbito doméstico, devido a sua inserção no mercado, esta é responsabilizada por estes afazeres, cabendo a ela o exercício deste papel.

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Ao trabalhar o conceito de QVT é necessário não deixar de mencionar os aspectos sociais e culturais presentes ligados à mulher e, neste sentido, é interessante refletir que as ações em programas de saúde e qualidade de vida devem configurar em perspectiva de propostas para relações de gênero, ou seja, considerar que a mulher na sociedade está intrinsecamente ligada ao homem e que nesta ligação está presente a relação de poder de um sobre o outro, no caso, do homem sobre a mulher (ARAÚJO, 2005). Neste sentido, se-ria importante que as ações das empresas avaliassem estas relações e pudessem direcionar seus programas para a forma como os trabalhadores vivem, identificando suas necessida-des de tempo, formação e qualificação e características biológicas. Os programas e ações QVT estariam assim, mais próximos à realidade vivida por eles.

A mulher deve ser considerada em sua totalidade e a preocupação com a sua saúde e as doenças possíveis, anteriormente mencionadas, são decorrentes de fatores relacionados à forma como vive, às relações que estabelece com o outro.

As ações dos programas de QVT só podem ser reconhecidas se produzirem resultados para todos quando os empregadores evidenciarem ao grupo de trabalhadores que são eles a parte fundamental e necessária para o desenvolvimento organizacional. Geralmente os programas estão relacionados a exercícios físicos como ginástica laboral ou controle do álcool e drogas, mas também a programas de capacitação, como treinamento e desenvol-vimento de pessoal e, benefícios, como distribuição de cesta-básica ou assistência-médica.

A implantação dos programas está atrelada também à consulta aos trabalhadores, por exemplo, por uma pesquisa interna que propicie o diagnóstico da empresa e traga elemen-tos de interesse dos trabalhadores para o programa, como está o ambiente de trabalho, como se sentem no trabalho e o que esperam da empresa. A implantação de diferentes programas está atrelada às características da organização, à cultura organizacional. A im-plantação de exercícios físicos, por exemplo, faz com que as pessoas sintam-se melhores e, por sua vez, atividades como treinamento atendem às necessidades de investimento no desenvolvimento do trabalhador, melhorando sua criatividade, potencial, autoestima. Então, diferentes estratégias, de acordo com as características da organização, atendem a diferentes interesses. De qualquer forma, Alves (2011) aponta que indiretamente as ações atingem a saúde dos trabalhadores, colaborando para sua melhora nos aspectos que se re-ferem à sua promoção e à prevenção, e para a empresa, há um aumento na produtividade e investimento positivo em sua imagem junto aos trabalhadores.

O que se deve refletir é que nenhum programa ou ação de QVT irá desaparecer com conflitos gerados pela relação entre capital e trabalho, porém, há uma perspectiva para os trabalhadores nessas ações, já que abre um canal de comunicação com a empresa e se fundamenta na forma como as atividades estão organizadas e nas relações entre os funcio-nários, nas práticas de trabalho entre os homens e as mulheres. Segundo Limongi-França (2009, p. 168) a qualidade de vida no trabalho “representa hoje a necessidade de valoriza-ção das condições de trabalho, da definição de procedimentos da tarefa em si, do cuidado com o ambiente físico e bons padrões de relacionamento”.

Para as mulheres, seria um caminho inicial incluir ações que considerem suas caracte-rísticas sociais, culturais e biológicas, como retratadas aqui neste capítulo, e atendam, des-ta forma, suas necessidades, contribuindo para uma relação de igualdade entre os gêneros.

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De qualquer forma, é junto com o homem que a mulher poderá reavaliar sua condição de trabalho e poderá desenvolver outras histórias profissionais, outras histórias de vida.

ӹ Conclusão

As transformações no mundo do trabalho, no pós-guerra, afetaram todos os trabalha-dores em função das diversas mudanças que surgiram nas formas de gerir a produção. Foram solicitados aos trabalhadores e trabalhadoras uma maior exigência em sua for-mação educacional e qualificação específica para o exercício de suas práticas de trabalho, pressão com relação a um maior desempenho produtivo para adequar às necessidades da organização. Estas exigências vieram impositivas para homens e mulheres, porém, para as mulheres, sua inserção no mundo do trabalho não as livrou da responsabilidade das atividades domésticas. Cabe a elas o exercício de diversas atividades tanto no mundo do trabalho como no âmbito doméstico, ou seja, no lar, com a família, no cuidado com os filhos. Estas atividades estão relacionadas com a forma como vivem, como a sociedade espera que desempenhem este papel, como culturalmente a mulher vai assimilando este viver. O que se observa é que há uma sobrecarga de responsabilidades para as mulheres que podem ocasionar um processo de adoecimento, identificado, por exemplo, por au-mento de sua pressão arterial ou, surgimento de doenças relacionadas à saúde mental, como depressão ou ansiedade.

Diante disso, seria interessante que os programas de QVT, originários de uma preo-cupação com o bem-estar dos trabalhadores, atendessem às necessidades psicossociais destas mulheres, por meio de uma gestão participativa em que os próprios trabalhadores e trabalhadoras pudessem opinar sobre as atividades físicas, políticas de benefícios, de treinamento e desenvolvimento organizacional. Aí, de fato, seria possível afirmar que o conceito de QVT está relacionado ao respeito pelas pessoas, conforme aponta Chiavenato (2010), já que a competitividade organizacional, a qualidade e produtividade, passam pe-los programas de QVT ao quais as empresas usufruem.

Neste sentido, os programas de QVT estariam se comprometendo a atingir a especifici-dade feminina ao olhar para a condição histórica, social e cultural da mulher e propuses-sem, em suas ações, a figura do homem, para pensar sobre esta partilha dos trabalhos, dos espaços, das ações, do poder, presentes em nossa sociedade. Assim, junto com os homens, poder-se-ia criar uma nova relação institucional e, desta maneira, podendo refletir sobre as relações de gênero.

A empresa, ao promover um programa de QVT sob um prisma que atenda às necessi-dades humanas considerando seus aspectos psicossociais, que promova uma integração entre estes aspectos e a organização, sua estrutura, tecnologia, sistemas de recompensas, valores e políticas internas, estará investindo não só na formação do trabalhador, mas em cidadania organizacional.

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SEÇÃO III

COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA: VIABILIZANDO SOLUÇÕES

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CAPÍTULO 9

A INFLUÊNCIA DA QUALIDADE DE VIDANO TRABALHO PARA O DESENVOLVIMENTODA COMPETITIVIDADE DAS ORGANIZAÇÕES

Eni Aparecida Sivera Bertolini, Oswaldo Luiz Agostinho

ӹ Introdução

O mundo em que vivemos é mutável e turbulento, as mudanças são constantes (Chia-venato, 2010). Os desafios em termos de diversidade das organizações e complexidade do ambiente em que operam, ajudam a complicar ainda mais o panorama com que as orga-nizações se defrontam.

Como diz Besteiro (2010), as empresas estão inseridas nesse ambiente competitivo, complexo, cheio de oportunidades e desafios. Acompanhar as mudanças tecnológicas e de gestão de forma sustentável são objetivos das organizações que buscam permanecer nesse mercado.

Daí entra a competitividade como a capacidade das organizações de formular e imple-mentar estratégias concorrentes que lhe permitam uma condição privilegiada perante as demais empresas e uma posição sustentável no mercado.

Segundo Chiavenato (2010), existe uma nova ordem mundial, a globalização está der-rubando fronteiras, ultrapassando diferentes línguas e costumes e criando um mundo inteiramente novo e diferente. Os líderes das grandes organizações estão voltados para a competitividade organizacional em uma economia globalizada. Devido ao fato de que o mercado é dinâmico, complexo e extremamente competitivo, o grande desafio é sobrevi-ver neste mercado globalizado, onde as empresas precisam gerar vantagem competitiva para sobreviver e serem capazes de crescer.

A competitividade é uma questão de associar recursos e capacidade às oportunidades do ambiente e pressupõe, portanto, a necessidade de um alinhamento estratégico entre as metodologias tecnológicas e de gestão para que possam obter os melhores resultados. Uma resposta a essa necessidade é a atuação conjunta de empresas que juntas conseguem participar de um mercado cada vez mais complexo, atendendo à necessidade de um con-sumidor exigente.

Outro fator determinante para a competitividade e o bom desempenho da organiza-ção é deter a capacidade de responder rápido às mudanças ambientais (Agostinho, 2009). Nesse cenário, as mudanças podem ser frequentes, muitas vezes drásticas e a rapidez de

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resposta assume um papel fundamental para se conseguir desenvolver projetos, produtos e se colocar no mercado de forma rápida e precisa para conseguir um bom desempenho.

O objetivo central desse capítulo é analisar a relação entre competitividade e qualidade de vida no trabalho (QVT), no sentido de abordar como fatores organizacionais e huma-nos interagem e influenciam a QVT, através de medidas de satisfação pessoal do trabalha-dor, de indicadores de saúde (física e mental) e de segurança no trabalho.

A QVT e a competitividade são elementos necessários para o desenvolvimento tan-to do homem quanto das organizações. São componentes do mundo organizacional que estão estreitamente interligados. Podem representar tanto para o indivíduo quanto para a organização uma fonte de desenvolvimento ou de estagnação. Mas para que isso ocorra, é preciso que as condições oferecidas atendam ou não às exigências humanas e organiza-cionais necessárias à melhoria da qualidade de vida no trabalho que, por sua vez, afeta o nível de produtividade (Silva; Matos, 2003).

E, falando de trabalho humano, não se pode deixar de citar questões ambivalentes tais como autonomia e dominação, liberdade e controle, satisfação e insatisfação, prazer e sofrimento (Bidet, 2001). Entretanto, os estudos gerados por tal corrente teórica – ini-cialmente conhecida como “psicopatologia do trabalho” – buscavam primordialmente in-vestigar a saúde no trabalho em um contexto local, dificultando a universalização de suas discussões acerca dos males provocados pelo trabalho (Lallement et al., 2011).

ӹ O capital intelectual como vantagem competitiva

O capital intelectual é a soma do conhecimento de todos em uma empresa, o que lhe proporciona vantagem competitiva. Ao contrário dos ativos com os quais os empresários e contabilistas estão familiarizados – propriedades, fábricas, equipamentos, dinheiro; cons-titui a matéria intelectual: conhecimento, informação, propriedade intelectual, experiên-cia que pode ser utilizada para gerar riqueza. (Stewart, 1998) 

A concretização dos objetivos e das estratégias organizacionais depende significati-vamente das pessoas. O capital humano agrega trabalho, inteligência, conhecimento e aprendizado constante à organização, gerando inovação e competitividade. Entretanto, a maximização do potencial humano requer das organizações e da Gestão de Pessoas processos e ações favoráveis à produtividade, ao comprometimento e ao desenvolvimento do conhecimento organizacional, práticas de qualidade de vida no trabalho, buscando manter a saúde, segurança e autoestima e proporcionar bem estar, satisfação e desenvolvi-mento dos profissionais (Girardi, 2012).

As condições de competitividade mudaram radicalmente nos últimos anos da década de 90 e nos primeiros anos do novo milênio, devido alguns fatores como: redução do tem-po de chegada de produtos ao mercado, o aumento da diversificação de produtos coloca-dos à disposição dos consumidores, massificação dos meios de comunicação e transporte de informações. Alguns autores chamam esse novo ambiente de Era do Conhecimento, onde o ativo principal passa ser o Conhecimento, juntamente com os ativos fixos da Era Industrial. Devido a esses fatores, novos modelos organizacionais buscam atributos de agilidade, capacidade de resposta e inovação. Novos projetos, seja de produtos ou serviços com tempos de efetivação cada vez menores, tornam-se frequentes.

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A vantagem competitiva sustentável passa a ser construída pelo conhecimento. No-naka e Takeuchi (1997) pontuam que o conhecimento é o principal elemento de com-petitividade organizacional e que a criação de conhecimento gera inovação contínua e vantagem competitiva.

Seja a competitividade em custos, qualidade, velocidade ou inovação, o essencial é o conhecimento. Novos processos, aumento da produtividade, tudo isso permite reduzir custos, o que se consegue através do conhecimento.

Afirma Sveiby (2000) que o conhecimento é a base da estrutura interna e externa da empresa. Para poder competir e enfrentar os desafios de um mercado cada vez mais exi-gente, as empresas têm que investir nos seus recursos humanos, pois o conhecimento, conforme relata Padoveze (2000), é gerado e operacionalizado pelo ser humano, acumula-do e administrado pela sociedade para satisfação de suas necessidades. 

O conhecimento é um atributo inerente e exclusivo do ser humano, é o centro da vida humana, é o motor responsável por todo progresso e desenvolvimento que está sendo presenciado hoje.

Para Chiavenato (2005), o conhecimento passou a representar um importante diferen-cial competitivo para as empresas que sabem adquiri-lo, mantê-lo e utilizá-lo de forma eficiente e eficaz, e esse conhecimento passou a gerar o Capital Intelectual.

O conhecimento, material intelectual bruto, transforma-se em capital intelectual, a partir do momento que passa a agregar valor aos produtos/serviços.

Constituem o capital humano o conhecimento acumulado, a habilidade e experiências dos funcionários para realizar as tarefas do dia a dia, os valores, a cultura da empresa, e diversos ativos intangíveis, ou seja, as pessoas que são os ativos humanos da empresa. A principal estratégia da empresa será de atrair, reter, desenvolver e aproveitar ao máximo o talento humano, que será cada vez mais, a principal vantagem competitiva.

O cenário atual do mercado e o crescimento da globalização fazem emergir nas empre-sas a necessidade da valorização do capital humano para garantir produção e competitivi-dade. Takeda e Xavier (2009) comentam que as organizações têm focado seus esforços na tentativa de possuir um diferencial, como garantia de vantagem competitiva. E algumas empresas perceberam que concentrar a atenção no seu capital humano seria uma alterna-tiva viável.

A condição básica para um ambiente preocupado com a competitividade nas organi-zações, para França (2007), é criar modelos gerenciais efetivos de QVT, onde o desafio das organizações está em gerar o bem-estar do seu capital humano, num ambiente competiti-vo, altamente tecnológico e de alta produtividade.

Sendo assim, o desempenho organizacional pode ser avaliado através de medidas rela-cionadas com a capacidade de inovação, qualidade e competitividade.

ӹ A Qualidade de Vida no Trabalho

A expressão Qualidade de Vida no Trabalho surgiu, de acordo com Rodrigues (2007), na década de 50, na Inglaterra, a partir dos estudos de Eric Trist e seus colaboradores, com a intenção de agrupar o trinômio indivíduo/trabalho/organização.

Mas a expressão QVT passou a ser utilizada publicamente no início da década de 70, principalmente nos EUA, devido à preocupação com a competitividade internacional e o

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grande sucesso dos estilos e técnicas gerenciais dos programas de produtividade japonesa, centrado nos empregados. Existia uma tentativa de integrar os interesses dos empregados e empregadores através de práticas gerenciais que pudesse trazer maior motivação e redu-ção dos conflitos (Sodré, 2013).

A QVT é uma evolução do conceito de Qualidade Total, uma vez que as condições positivas de trabalho e a satisfação das necessidades pessoais levam a um maior nível de produtividade e de comprometimento (Bitencourt, 2004).

A QVT vem ganhando expressão nas organizações como uma das estratégias da Ges-tão de Pessoas, por elevar a competitividade, melhorando as condições de trabalho, au-xiliando a organização no alcance dos seus objetivos. O desafio da QVT é ampliar o re-conhecimento do capital humano nas organizações e gerar melhores condições de vida, por meio de uma gestão participativa, comunicação eficiente, desenvolvimento pleno das pessoas e apoio (Limongi-França; Arellano, 2002).

Zavaglia (2006) define a qualidade de vida no trabalho como o resultado das transfor-mações impostas pela globalização, a qual conduziu as empresas à revisão de processos para a sobrevivência e competitividade. De acordo com Girardi (2012), qualidade de vida no trabalho cria condições favoráveis ao conhecimento, resultando em uma organização com profissionais mais comprometidos e satisfeitos, maior produtividade, desenvolvi-mento e competitividade.

Girardi (2012) diz que QVT é uma ferramenta que contribui para a Gestão do Conheci-mento organizacional, gerando satisfação e elevando a produtividade, o comprometimen-to, a aprendizagem e a competitividade.

Julião (2011) destaca que o trabalho é essencial para o ser humano. É através do traba-lho que o individuo desenvolve suas habilidades, se relaciona e cria valor. Na medida em que o homem trabalha, ele modifica o mundo e esse mundo também o modifica, numa transformação contínua.

Consequentemente, em função de todas estas transformações no trabalho desponta a qualidade de vida no trabalho, cujo foco está centrado no indivíduo, procurando oferecer ao trabalhador boas condições laborais para que ele desenvolva sua tarefa com satisfação e bem-estar (Timossi et al., 2009).

Corroborando, Rose et al. (2006) ressalta que um dos fatores importantes para se obter um bom nível de QVT nas organizações é que esta se preocupe com o bem-estar e com o nível de satisfação de seus funcionários.

No ambiente de trabalho, o nível de pressão por resultados, a concorrência e a com-plexidade por um espaço no mercado, obriga os profissionais a resultados de curto prazo, maior e melhor capacidade de produção e desenvolvimento de novas competências, que acabam gerando estresse e doenças ocupacionais.

Inúmeros são os fatores externos (doenças e adversidades) que permeiam o trabalho das pessoas e a falta de políticas de QVT adequadas causam danos tanto para a empresa quanto para o colaborador como: redução da produtividade, custos elevados, rotatividade, produtos e serviços de baixa qualidade, insatisfação, stress, depressão, intimidação, falta de criatividade, assédio, violência entre outros.

Qualidade de vida e saúde são ativos importantes que envolvem dimensões física, inte-lectual, emocional, profissional, espiritual e social. Práticas inadequadas no ambiente de trabalho geram impacto negativo na saúde física e emocional dos empregados e na saúde financeira das empresas. Baixa motivação, falta de atenção, diminuição de produtividade

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e alta rotatividade criam uma energia negativa que repercute na família, na sociedade e no sistema médico (Carmello, 2014).

Por outro lado, as organizações precisam se preocupar em oferecer um ambiente que traga ao indivíduo: conforto, respeito, segurança e bem-estar, entre outros. Ou seja, a or-ganização deve oferecer um ambiente propício e que favoreça o uso de suas capacidades. E, se aplicado um programa de Qualidade de Vida nas Organizações, encoraja e apoia hábitos e estilos de vida que promove saúde e bem estar entre os funcionários durante a sua vida profissional.

Com o intuito de promover um ambiente que estimule e dê suporte ao indivíduo e à empresa, um programa de Qualidade de Vida conscientiza seu capital humano sobre como a saúde está diretamente relacionada à qualidade e competitividade.

Carmello (2014) destaca que os programas de Qualidade de Vida objetivam facilitar mudanças no estilo de vida, combinando ações e campanhas para consciência, comporta-mento e envolvimento, que suportam suas práticas de saúde e previne doenças.

Mas o conceito de QVT é muito amplo e não pode ficar limitado apenas a programas de saúde ocupacional, medicina preventiva, palestras motivacionais e estudos ergonômi-cos. Deve abordar também os fatores extrínsecos, tais como relacionamentos no ambiente de trabalho e fora dele, assim como o próprio trabalho em si e fatores intrínsecos como os valores, ambição, sentimentos, necessidades pessoais.

Encorajando a cuidarem e gerenciarem sua saúde, os profissionais adquirem um ganho substancial na sua satisfação e crescimento, há aumento de produção e redução de custos para a empresa. As empresas têm mais benefícios, tais como, empregados mais motivados e atentos, redução dos acidentes de trabalho, baixas taxas de enfermidade, menos absen-teísmo, melhoria da imagem corporativa, melhoria nas relações humanas e redução de rotatividade.

ӹ A gestão da qualidade de vida no trabalho

A gestão da QVT é um processo de responsabilidade da Gestão de Pessoas e tem como princípio básico promover um ambiente saudável de trabalho, para aumentar a satisfação das pessoas e a produtividade da organização, assim como estimular a participação das pessoas nos processos de trabalho (Zavaglia, 2006).

Como se pode notar, a gestão da QVT exige uma capacidade das organizações de gerir ações que envolvem o planejamento e implantação de melhorias e inovações gerenciais e tecnológicas de forma cuidadosa no ambiente de trabalho.

Cavassani (2006) diz que a busca pela QVT e a implementação de ações visando melhorias para as pessoas não pode ser considerada como um custo nas planilhas das organizações, uma vez que os custos com afastamentos e ações trabalhistas são maiores do que uma medida preventiva. Transformar o ambiente de trabalho em vantagem competitiva, visando à satisfação de seu capital humano, mais retorno terão em pro-dutividade, criando assim a visão de uma organização mais privilegiada, competitiva e equilibrada.

Sodré (2013) elenca uma série de fatores para a QVT: satisfação com o trabalho exe-cutado, as possibilidades de futuro na organização, o reconhecimento pelos resultados alcançados, salário percebido, os benefícios auferidos, o relacionamento humano dentro do grupo e da organização, o ambiente psicológico e físico de trabalho, a liberdade e res-

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ponsabilidade de decidir e as possibilidades de participar. O desempenho no cargo e o clima organizacional representam fatores importantes na determinação da QVT.

A missão estratégica de um programa de Qualidade de Vida, delineada por Sodré (2013), canaliza seus esforços para alcançar os seguintes resultados:

• Aumentar os níveis de satisfação e saúde do colaborador/consumidor/comunida-de. (Força de trabalho mais saudável)

• Melhorar o clima organizacional (ambiente, relações e ações saudáveis)• Afetar beneficamente no processo de formação e desenvolvimento humano, agre-

gando competências (capacidade e atributos)• Influenciar na diminuição da pressão no trabalho e do distresse individual e or-

ganizacional (Menor absenteísmo/rotatividade; Menor número de acidentes)• Melhorar a capacidade de desempenho das atividades do dia a dia. (Maior

produtividade)

A QVT só pode ser atingida com a constante interação das pessoas e gestores, mediante um diálogo aberto e sincero. As pessoas ficam motivadas ao dar sugestões, serem ouvidas, debater ideias, ajudar no crescimento da empresa.

Os gestores devem permitir que seus colaboradores assumam riscos que podem acar-retar em erros e usarem as falhas como instrumento pedagógico, buscando o aperfeiçoa-mento e a melhoria contínua.

Outro fator a ser pensado é a criatividade, pois as empresas dependem da criatividade de seus colaboradores para se manterem competitivas. As pessoas criativas passam a con-tribuir com novas ideias e ações, estando sempre em busca de melhores soluções para os problemas apresentados.

A criatividade é um recurso valioso e que está associada ao conhecimento, ela não surge do nada. Criatividade é a habilidade de descobrir novas soluções para um proble-ma. Seja através de uma ideia, um método, uma novidade ou um mecanismo novo, algo inédito ou no desenvolvimento de uma melhoria, que passa a ser chamado de inovação.

Existem muitas razões para se abordar a competitividade com QVT, sejam elas para manter o sucesso das organizações ao longo do tempo, aumentar a satisfação dos cola-boradores, obter ganhos significativos de desempenho operacional, reduzir afastamentos (absenteísmo e presenteísmo), diminuir conflitos e problemas trabalhistas, promover saú-de física e mental, desonerando os sistemas públicos de saúde e previdência social.

O absenteísmo e o presenteísmo são doenças organizacionais, afirma Cunha (2012). No absenteísmo, o trabalhador deixa de comparecer à empresa, conforme a frequência exigi-da. Independente dos motivos, tais como indisposição para o trabalho, insatisfação com a atividade que exerce ou com o salário; além de motivos de ordem particular e familiar. Sua aceitação como profissional na empresa é prejudicada de forma significativa, podendo culminar em demissão. É fácil identificar quantas faltas cada funcionário apresenta em determinado período.

Ainda de acordo com Cunha (2012), o absenteísmo pode ser dividido em cinco classes:• Absenteísmo voluntário – ausência no trabalho por razões particulares, não jus-

tificadas por doenças; • Absenteísmo por doença – inclui todas as ausências por doença ou por procedi-

mento médico, excetuam-se os infortúnios profissionais;

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• Absenteísmo por patologia profissional – ausências por acidentes de trabalho ou doença profissional;

• Absenteísmo legal – faltas no trabalho amparado por lei, tais como: gestação, nojo, gala, doação de sangue e serviço militar;

• Absenteísmo compulsório – impedimento ao trabalho devido à suspensão im-posta pelo patrão, por prisão ou outro impedimento que não permita o trabalha-dor chegar ao local de trabalho.

Já o presenteísmo é caracterizado pela presença “parcial” do funcionário, ou seja, ele está presente na empresa, mas não desempenha suas tarefas de forma satisfatória e com-pleta. Nesse caso, o funcionário apresenta desmotivação, deixando de produzir o espe-rado e comprometendo o bom andamento das atividades normais da empresa, podendo influenciar outros trabalhadores.

Algumas doenças infecciosas como a gripe e a sinusite ou desvios psicoemocionais como estresse, depressão, problemas familiares, mau relacionamento no ambiente de tra-balho e desmotivação são as mais comuns no presenteísmo. Como consequência, os fun-cionários sentem-se desanimados, irritados e cansados. A competitividade organizacional e o acúmulo de funções fazem com que essas pessoas estejam presentes, porém não estão produzindo.

Tanto o absenteísmo como o presenteísmo são entendidos como causa e consequência de políticas internas que precisam ser analisadas. Ambas estão relacionadas com a redu-ção da capacidade para o trabalho e tem a mesma essência, a ausência. O absenteísmo sendo a ausência física e o presenteísmo a ausência mental, intelectual, de pensamento e de concentração no trabalho.

O absenteísmo e o presenteísmo podem ser estudados como desvios nos padrões com-portamentais esperados na saúde da organização, pois comprometem o desempenho pro-fissional, a produtividade, a qualidade do trabalho executado, impactando diretamente sobre o resultado esperado.

Alguns fatores psicossociais influenciam o trabalho, dos quais incluem, mas não estão limitados à:

• Ambiente interno: clima organizacional, apoio dos supervisores, oportunidades para crescimento, demanda de trabalho, pressão com relação ao cumprimento de prazos e metas, flexibilidade nas decisões, autonomia, recompensa e reconheci-mento, clareza do trabalho, concepção do trabalho, comunicação eficiente, clara e transparente;

• Cultura organizacional: políticas, normas e procedimentos relacionados à digni-dade e respeito para com todos os trabalhadores, assédio e intimidação, discri-minação de gênero, intolerância à diversidade étnica ou religiosa, falta de apoio a estilos de vida saudáveis;

• Estilo de gestão de comando e controle: oportunidade para desenvolvimento pes-soal, consultas, negociações, comunicação recíproca, feedback construtivo, ges-tão do desempenho de forma respeitosa;

• Investimentos em capacitação: oferecimento e incentivo para participar de cur-sos, treinamentos, eventos relacionados ao trabalho, desenvolvimento de novos conhecimentos, aprendizagem integrada, estímulo para inovação;

• Apoio para um equilíbrio entre vida profissional e familiar;

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• Medo da perda de emprego relacionado a fusões, aquisições, reorganizações ou devido ao mercado de trabalho/economia.

A segurança, saúde e bem-estar dos trabalhadores são preocupações que se estendem para além dos indivíduos e suas famílias. Ela é de grande importância para a produtivi-dade, competitividade e sustentabilidade das empresas, assim como para as economias nacionais e regionais.

Uma atenção especial a esses fatores evita afastamentos e incapacidades para o tra-balho, minimiza os custos com saúde e os custos associados com a alta rotatividade tais como treinamento, e aumenta a produtividade em longo prazo, bem como a qualidade dos produtos e serviços.

Outro ponto a ser analisado são os conflitos trabalhistas que podem ser evitados por um relacionamento próximo entre organizações e funcionários e com boas práticas da gestão de pessoas.

É necessário que as organizações tenham um controle sobre seu passivo trabalhista, buscando transformar ameaças em oportunidades, identificando possíveis focos originá-rios de ações trabalhistas e implantando uma política de prevenção.

Manter suas boas práticas trabalhistas, ou seja, compatibilizar a busca por uma maior produtividade dos seus colaboradores sem afrontar a legislação protetiva laboral e previ-denciária.

Além de todas as leis que regem as relações de trabalho é de suma importância que as organizações estejam integradas em relação às normas que orientam e protegem a integri-dade física, mental e moral de seus trabalhadores, como por exemplo, as Normas Regula-mentadoras de Medicina e Segurança do Trabalho.

ӹ Conclusão

O objetivo principal desse capítulo foi identificar como a qualidade de vida no traba-lho pode contribuir para a competitividade nas organizações e mostrar como os fatores humanos e organizacionais interagem e estão interligados.

Neste contexto, Vasconcelos (2001) afirma que a qualidade de vida no trabalho cons-titui-se na peça-chave do desenvolvimento humano e profissional, pois são nas organiza-ções que o indivíduo trabalhador, encontra seu sucesso ou sua frustração, situações estas que interferem diretamente no seu bem estar psicossocial, assim como no seu rendimento e desempenho profissional.

O conceito de QVT parte do principio de que um conjunto de ações de uma empresa que envolve diagnóstico e implantação de melhorias e inovações gerenciais, tecnológicas e estruturais, dentro e fora do ambiente de trabalho, que visa propiciar condições plenas de desenvolvimento humano para e durante a relação do trabalho. (França, 1997).

É fato que as empresas estão cada vez mais preocupadas com as condições de trabalho de seus funcionários, implantando programas de QVT, pois através da satisfação pessoal, os funcionários contribuem melhor na busca dos resultados.

Os estudos aqui apresentados, assim como o espectro teórico em que se aborda o traba-lho, esperam contribuir para o aprofundamento da discussão de alternativas que possibili-tem à organização e seus gestores a cumprir com seus compromissos de desenvolvimento.

Existem muitos métodos para viabilizar a Competitividade com QVT, uma delas é através da modelagem e simulação de sistemas organizacionais.

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Este capítulo não tem a pretensão de esgotar esse assunto, muitos estudos acontecem e deverão ainda acontecer nos meios educacionais e organizacionais a fim de contribuir para a gestão da QVT nas organizações.

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CAPÍTULO 10

CONSÓRCIO EMPRESARIAL DE RESPONSABILIDADE SOCIAL: UM MODELO DE ATUAÇÃO EM REDE PARA MELHORIA DA QUALIDADE DE

VIDA COM MAIOR IMPACTO E MENOR CUSTO 1

Cybelle Borges de Souza, Eugênia Vale de Paula e Mônica Cavalcanti Sá de Abreu

ӹ Introdução

O grande desafio das indústrias atualmente é garantir qualidade de vida para os seus trabalhadores e dependentes, bem como para a comunidade próxima ao seu distrito in-dustrial. Nesse contexto, muitas empresas já começaram a assumir responsabilidades sociais e políticas que vão além das exigências legais e preenchem o vácuo regulatório na governança global (SCHERER; PALAZZO, 2011). Esse novo papel desempenhado pe-las empresas é consequência da ineficiência do Estado em prover integralmente serviços como saúde, educação e lazer para a sociedade. No mundo globalizado, segundo Abreu et al. (2013), as empresas são muito mais que instituições privadas que operam dentro de regras de um particular sistema legal, possuindo responsabilidades mais amplas com a sociedade e tornando-se importantes atores políticos econômicos nesta sociedade global. Porém, na maioria das vezes, esse desafio só pode ser realizado se acompanhado de altos custos e gastos de tempo e pessoas, fazendo com que muitas empresas rejeitem o conceito de Responsabilidade Social Corporativa.

O Ceará, assim como a região nordeste de uma forma geral, é uma região que sofre pela escassez de recursos, logo se faz necessária a otimização dos recursos investidos, considerando que existe uma sobreposição muito grande de iniciativas sociais por parte do governo, de ONGs e por parte das empresas.

Em uma iniciativa inovadora, 7 (sete) empresas cearenses se unem para otimizar re-cursos e gerar maior impacto na vida de mais de 500 (quinhentas) famílias, incluindo funcionários e comunidade, no distrito industrial de Maracanaú, segundo município com maior arrecadação do estado.

Até então, as mesmas empresas não tinham tido experiência semelhante, pois o con-ceito mais difundido no Brasil no âmbito dos negócios empresariais que buscam uma atuação sustentável consiste na atuação responsável, porém, de maneira individual. O Projeto CERES, portanto, apresenta o conceito de investimento social coletivo, sem deixar

1 Este capítulo é uma reorganização do trabalho apresentado no XVII SEMEAD – Seminários de Administração da FEA-USP, em outubro de 2014 (ver PAULA, SOUZA e ABREU, 2014).

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de considerar as especificidades e níveis diferentes de cada empresa no tocante a Respon-sabilidade Social.

Nas últimas décadas, com a ascensão da nova competição, a cooperação entre organi-zações assume uma maior importância devido à dificuldade das empresas em atender às exigências competitivas isoladamente. No momento em que duas ou mais organizações percebem a oportunidade de alcançar conjuntamente seus objetivos e obter ganhos mú-tuos, a cooperação entre elas se desenvolve (BALESTRIN; VERSCHOORE, 2008). Essa cooperação, comumente utilizada na realização de parcerias de negócios, também pode se desenvolver a partir de grupos de empresas atuando em forma de consórcio com o objeti-vo de praticar ações de Responsabilidade Social Corporativa e Cidadania Corporativa – o que podemos destacar no projeto CERES.

O Consórcio Empresarial de Responsabilidade Social (CERES) foi desenvolvido em 2010 como projeto de inovação com o objetivo de formar grupos de empresas, localizadas em comum região geográfica, para a atuação coletiva em projetos sociais. A missão do Projeto CERES é desenvolver modelo de Investimento Social Privado coletivo através de consórcios de empresas buscando maior efetividade de ações de Responsabilidade Social Corporativa, integrando metodologias de gestão de recursos, investimento social privado, desenvolvimento de relações e gerenciamento de projetos, que possa ser replicado nas diversas regiões brasileiras.

A formação de consórcios evidencia-se como proposição eficaz para as empresas que demandam soluções sociais, quer seja voltada para o público interno quer seja para o público externo (GUIA CERES, 2012). Essa estratégia é capaz de proporcionar outros benefícios às empresas e aos beneficiários, além da atuação em Responsabilidade Social Corporativa (RSC) e Cidadania Corporativa (CC), pois contribui para o desenvolvi-mento do território a médio e longo prazo, quanto maior for o nível de sinergia dos investimentos.

Este capítulo analisa a história do Projeto CERES, apresentando motivações, limita-ções, operacionalização e impactos do projeto CERES em Maracanaú através de pontos de vistas de diferentes atores ilustrados pelos representantes do SESI-CE, coordenador institucional da iniciativa, das empresas consorciadas e dos beneficiários do projeto.

ӹ O Consórcio Empresarial de Responsabilidade Social (CERES): Estrutura e Motivações

Em 2008, o Serviço Social da Indústria (SESI/CE) inicia a criação do Núcleo de Res-ponsabilidade Social Empresarial e idealiza um projeto, financiado pelo Departamento Nacional na linha de fomento de Inovação, para criação de uma rede de empresas com atuação em responsabilidade social. Esse Projeto, denominado Programa Agentes de Res-ponsabilidade Social, foi transformado em um programa de educação continuada e cons-titui um dos principais fundamentos para a criação do projeto CERES.

Desde o início, o Programa Agentes de Responsabilidade Social foi formatado para ca-pacitar representantes das empresas industriais para o desenvolvimento de competências essenciais para a atuação em rede e tinha também o propósito de envolver a alta direção das empresas. O Programa iniciou a primeira turma de empresas em 2008 e até o ano de 2014, foram capacitados cerca de duzentos e sessenta agentes em mais de cento e quarenta

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empresas. Esses agentes formados foram distribuídos em subcomitês, com a finalidade de discutir ações de Responsabilidade Social.

A partir da criação desses subcomitês, em 2010, a gerente do SESI, Cybelle Borges, em pareceria com o Professor Doutor Cleber Dutra, conceberam o projeto CERES (Consórcio Empresarial de Responsabilidade Social) para a atuação mais efetiva dos agentes de res-ponsabilidade social e engajá-los em ações coletivas. Elaborou-se então o segundo projeto de inovação, submetido ao Departamento Nacional do SESI, o qual pretendia estimular a formação de consórcios, para o qual foram convidadas quatro empresas localizadas na Região da Barra do Ceará, bairro da cidade de Fortaleza-CE.

Em 2012, o CERES iniciou suas atividades em Maracanaú com a estruturação imediata de duas instâncias de governança, conforme GUIA CERES 2012:

1. Comitê técnico, formado pelos agentes em responsabilidade social; e2. Comitê gestor (formado pelos diretores das empresas participantes).

A gerente do Projeto CERES explica a concepção do mesmo:

“Planejar e identificar as necessidades de maneira conjunta, planejar a partir dessas necessidades e executar os projetos, otimizando recursos. Fazer juntos para ter maior impacto social e menor custo. Durante as reuniões do Comitê gestor foi possível analisar o ganho de visão estratégica que líderes de grandes e médias empre-sas conseguem ter ao se depararem com problemas semelhantes e poderem decidir conjuntamente as ações de melhoria.”

(Gerente do Projeto CERES)

O Comitê Técnico do CERES consiste em um fórum técnico-consultivo destinado a discutir, propor, planejar, desenvolver, monitorar e avaliar soluções de investimentos so-cioambientais compartilhados voltadas para o público interno e dependentes, bem como para comunidade externa. Este comitê é composto por representantes técnicos das em-presas consorciadas e por representantes técnicos do SESI. Os referidos representantes e seus suplentes deverão ser designados pela alta direção da empresa. O Conselho Gestor de Maracanaú delibera sobre investimentos e ações socioambientais compartilhadas entre as indústrias participantes, promove e fomenta projetos compartilhados de responsabilidade socioambiental voltados para colaboradores e suas famílias e comunidade externa através de parcerias entre o SESI, Poder Público municipal, estadual e federal, iniciativa privada e entidades da sociedade civil. Este conselho é composto por proprietários ou dirigentes das empresas industriais partícipes do CERES Maracanaú e pelo Presidente da Federação das Indústrias do Ceará. Essa estrutura garante o funcionamento e operacionalização do Consórcio e a participação efetiva de todas as indústrias envolvidas no projeto.

Após a fase de diagnóstico e sensibilização, as empresas interessadas assinam um ter-mo de adesão no consórcio. No CERES de Maracanaú participam sete empresas, dentre as quais seis são de grande porte e uma de médio porte: GERDAU, SERLARES, ESMAL-TEC, COBAP, HIDRACOR e MARISOL.

Para o SESI-CE, os fatores que motivaram a criação dos Consórcios foram: o impacto modesto da RSC; o assistencialismo versus a sustentabilidade; o desalinhamento e confli-tos; a superficialidade da RSC; o baixo nível de consciência dos indivíduos e grupos e; a falta de capacitação dos interlocutores nas empresas (GUIA CERES, 2012).

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Outra motivação para a implantação do CERES foi o fato de a responsabilidade social ainda ser vista como filantropia por parte das empresas e não como uma ferramenta de gestão. O analista do SESI corrobora com essa visão; para ele:

“a visão do SESI é que a indústria talvez não seja tão madura, não seja ainda o momento que ela perceba a importância dessas questões sociais, do impacto disso sobre a própria competitividade e produtividade, logo, é dever do SESI fomentar isso antecipando uma tendência”.

(Analista do SESI/CE)

A estrutura em rede, formada pelos consórcios empresariais, também aumenta a rede de relacionamento do SESI e oferece oportunidades para a venda de outros produtos ofer-tados além daqueles oferecidos através do consórcio. A gerente do projeto CERES salienta essa motivação:

“O SESI precisava de uma estratégia de relacionamento com essas empresas. Portanto, o CERES também serviria para aproximar o SESI com seus clientes, pos-sibilitando a entrada de outros produtos, exatamente porque responsabilidade só-cio ambiental como estratégia poderia levar exatamente produtos de educação, de saúde, de estilo de vida, de qualidade de vida. A responsabilidade social, portanto, trabalharia a gestão da empresa, para inclusão de produtos do SESI”

(Gerente do Projeto CERES)

Maracanaú é um município cearense localizado a 16 km da capital Fortaleza e carac-teriza-se como um importante município por sediar o mais importante distrito industrial do estado. Possui o segundo maior PIB do Ceará, atrás apenas de Fortaleza, e o terceiro maior produto interno bruto per capita do estado. Segundo o IBGE (2014), o município possuía, em 2012, 3.554 empresas instaladas (dentre indústrias, comércio e serviços). En-tre os municípios que formam a grande Fortaleza, Maracanaú em termos estaduais, é o quarto município mais populoso do Ceará, de acordo com o IBGE (2014), com cerca de 210 mil habitantes em 2010.

Apesar de sua importância, Maracanaú tem indicadores sociais gravíssimos, de acordo com a gerente do projeto CERES: repetência escolar no ensino médio, violência e baixa sinergia entre as empresas. No diagnóstico levantado pelo SESI, foi percebido que o mu-nicípio sofreu um vertiginoso crescimento populacional, motivado principalmente pela construção de vários conjuntos habitacionais, que exerceram forte atração junto à classe trabalhadora de Fortaleza, expulsa de seu habitat pela falta de condições de sobrevivência e forçada a se abrigar na periferia do Distrito Industrial. Na educação, constatou-se que as taxas de abandono e de reprovação da 1ª série do ensino médio foram as mais altas comparadas a outras séries: 11,1% e 21,4%, respectivamente. Também foi averiguado que 23,94% da população entre 10 e 14 anos tiveram mortes causadas por fatores externos como a violência.

“Nós fizemos inicialmente este diagnóstico social, a partir de dados secundários sobre a questão da educação e identificamos essa repetência no ensino médio. E se

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há uma grande repetência do fundamental pro médio, quer dizer que a mão de obra que a indústria vai demandar estava seriamente ameaçada. Além de informações sobre o alto índice de violência, outros indicadores socioeconômicos foram a base para sensibilizarmos as empresas para que elas se organizassem de forma mais es-truturada”

(Gerente do Projeto CERES)

Após a formação dos Agentes de Responsabilidade Social, o SESI promoveu vários en-contros de mobilização e sensibilização com os representantes da alta direção das empre-sas de Maracanaú (que possuíam agentes de RS formados) para a formação do consórcio. É obrigatória a formação de pelo menos um agente de responsabilidade social formado no curso.

“Nós capacitamos os agentes para que eles tenham uma linguagem comum, para que eles possam inclusive criar vínculos e criar relacionamento. Porque não existe relacionamento entre CNPJs, existe relacionamento entre pessoas, só há facilitação de processos, se as pessoas comprarem a ideia, se elas se conhecerem, se elas confia-rem umas nas outras. Então nós fazemos toda essa parte de mobilização das empre-sas, adesão, capacitação dos agentes, realizamos o diagnóstico, em cada empresa, e apresentamos a visão externa e interna”.

(Gerente do projeto CERES).

“Comprometer não só esses agentes, mas as respectivas indústrias, que elas é que passaram a ser as proponentes desse projeto não mais as pessoas físicas”.

(Analista do SESI)

A equipe coordenadora do CERES apresenta às empresas consorciadas um projeto a partir do portfólio de produtos do SESI. No caso específico do CERES de Maracanaú, foi escolhido primeiramente um projeto que investia na infância:

“Nós conseguimos fazer com que todas vissem que o investimento em educação infantil para parte de proteção à criança, era quase zero, então nós levamos os in-dicadores sociais externos, oficiais e colocamos que as empresas pouco investiam na questão da infância, então desenhamos um projeto a partir desse dado. Vocês querem permanecer investindo pouco na infância frente a esses indicadores sociais externos ou nós podemos investir em algo juntos? Levei um projeto que já existia no SESI, que era voltado para crianças de 07 a 16 anos, voltado para o esporte, esse projeto já era executado, mas no CERES ele foi superdimensionado no sentido de gestão”.

(Gerente do projeto CERES)

O primeiro projeto escolhido para o CERES de Maracanaú foi o SESI Atleta do Futuro (SAF). O Atleta do Futuro é um programa do SESI que utiliza o esporte para promover a educação e a inclusão social de crianças e adolescentes. Em aulas de iniciação motora e prática esportiva são ensinados valores como: ética, trabalho em equipe, superação, res-peito, autoestima e saúde (PORTAL DA INDÚSTRIA, 2014).

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O SAF foi desenvolvido desde 2012 e ao todo atendeu 500 crianças, sendo 130 da co-munidade e 370 filhos de funcionários das empresas participantes. A consultora do SESI explica como acontece as escolhas das crianças participantes do SAF:

“A empresa é orientada a beneficiar prioritariamente os filhos de seus funcioná-rios, no entanto, cada empresa fica livre para beneficiar também crianças da comu-nidade do entorno. Uma vez feita essa definição por parte da empresa, é realizada uma pesquisa de demanda na empresa para identificar o perfil dos filhos dos traba-lhadores, bem como assessoria por parte do SESI para que a empresa defina o grupo de crianças da comunidade”.

(Consultora do SESI)

Os custos do SAF são rateados pelas empresas participantes do CERES e a estrutura física e a equipe pedagógica são fornecidas pelo SESI-CE. O desenvolvimento do projeto acontece de forma semestral onde a criança participante tem atividades esportivas duas vezes na semana durante um turno. São realizadas reuniões trimestrais para o acompa-nhamento do projeto.

Em uma pesquisa realizada pelo SESI em outubro de 2012 junto a 76 funcionários de quatro das empresas participantes do CERES Maracanaú, constatou-se que o desempe-nho escolar de 80,4% das crianças participantes do SAF melhorou. Com o SAF, 94% dos funcionários passaram a ter uma melhor imagem da empresa que trabalham. 48,7% des-ses funcionários se consideraram mais satisfeitos com a empresa, 32,9% mais engajados e 23,7% mais produtivos. Esses resultados constatam que o SAF colaborou estrategicamente com a melhoria de desempenho social das empresas do CERES e com a qualidade de vida dos funcionários e seus dependentes.

Outros dois projetos foram desenvolvidos pelo CERES Maracanaú, porém, de acordo com a consultora do SESI, estes foram projetos menores (em duração e impacto). O pro-jeto Cozinha Brasil teve duração de quatro meses e foi destinado aos responsáveis pelas crianças participantes do SAF. O objetivo principal deste projeto era promover a educação alimentar e o aproveitamento total dos alimentos e de forma secundária, contribuir para melhoria da renda das famílias.

O projeto Voluntariado teve duração de seis meses (junho a dezembro de 2013). Este projeto envolvia os funcionários das empresas consorciadas nas visitas em um orfanato e em uma escola pública da região de Maracanaú, onde foram desenvolvidas ações como educação ambiental, atividades lúdicas, educação alimentar, dentre outras.

ӹ Limitações

No Brasil não há uma cultura associativa ou de cooperação forte, logo o projeto enfren-tou dificuldades na fase de sensibilização das empresas. Além disso, a gerente do projeto CERES percebia a dificuldade quanto à dependência das empresas em relação ao SESI-CE, para ela:

“Não está na essência do negócio pensar em projetos sociais, infelizmente. Quan-do estava começando a rede dos Agentes de Responsabilidade Social, eu tentei fazer com que essa ‘bandeira’ surgisse e fosse construída com eles, mas infelizmente o SESI

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teve que mostrar, mais ou menos, o “como fazer” (...) As empresas têm muitas dificul-dades, de disponibilizar pessoal, de capacitar pessoas para uma área que eles ainda não conseguem verificar, tangibilizar retorno, então, nós (equipe do SESI) temos que fazer um esforço constante, nós que fazemos a gestão dos consórcios, de mostrar um retorno tangível, palpável”.

(Gerente do Projeto CERES)

A estratégia de formação de consórcios foi questionada pela direção do SESI-CE. A gerente do projeto CERES fala sobre a sua visão em relação aos consórcios e contrapõe a visão da direção do SESI-CE:

“O consórcio é uma estratégia de venda de produto interessante, mas ela é uma estratégia de relacionamento de longo prazo, e o SESI, como as instituições, quer vender produto, vender logo, não tem visão de relacionamento para conquistar e para construir juntos. A minha visão é de cocriação, eu quero cocriar com os clientes e o SESI não tem essa percepção, o SESI quer vender o que tem, quer tirar os produtos da prateleira”.

(Gerente do Projeto CERES)

A falta de uma cultura para o associativismo e para busca de soluções coletivas, aliada a visão de retorno imediato dos investimentos, tanto por parte empresas como do próprio SESI, foram fatores limitantes para o avanço e evolução do Projeto CERES em outros territórios e até mesmo na região de Maracanaú. As limitações também advêm da pouca pró-atividade do setor público em buscar parcerias para o desenvolvimento de ações, de modo a impactar no desenvolvimento da Região.

ӹ Resultados para as empresas

O CERES de Maracanaú, segundo a gerente do projeto CERES, é de todos o consórcio mais bem sucedido. Isto é consequência do porte das empresas participantes, da identida-de cultural do distrito industrial de Maracanaú em detrimento às outras regiões e por ter sido o segundo consórcio realizado. O sucesso do CERES de Maracanaú também é res-saltado através das entrevistas realizadas com representantes de quatro das sete empresas participantes do consórcio.

Evidenciaram-se fatores como a interação entre as empresas, os impactos do projeto para os funcionários, a comunidade e para a própria empresa, as dificuldades e ganhos adquiri-dos com a participação da empresa no projeto e a forma de mensuração desses resultados.

• INTERAÇÃO ENTRE AS EMPRESAS:

“A gente ficou muito próximo e abre portas para outros tipos de encontros, ou-tros tipos de conversas (...) a gente às vezes pensa em alguma ação e liga para outra empresa, troca ideias, às vezes a gente divide com eles alguma dificuldade e acaba ficando mais próximo”.

(Gerente de Gente e Gestão, Hidracor)

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“A interação houve porque a gente se reúne com os consorciados assim como uma cooperação. Quando a gente se reúne, acaba que a gente ganha um relacionamento (...) a gente acabou fazendo essas alianças estratégicas e isso aí estimula e incentiva e a gente acaba fazendo valer uma melhoria em prática”.

(Gerente de RH, Cerbras)

“A partir do momento em que a gente sela esse compromisso, há uma aproxima-ção natural, a gente acaba se aproximando das empresas”.

(Coordenadora da Qualidade/Desenvolvimento, Cobap)

“Só de estar a equipe reunida, isso vai aproximando bastante, a cada reunião que tem, uma série de ações são tomadas, então uma série de outras reuniões, encontros são feitos, isso aproxima bastante”.

(Diretora comercial, Cobap)

“A gente também usa essa rede para servir de benchmarking (...) a gente autoriza visitas para conhecer nossas práticas, a gente também vai conhecer as práticas que podem ser interessantes para a gente”.

(Gerente de RH, Cobap)

• IMPACTOS DE PROJETO CERES:

“Temos vagas destinadas para alunos do orfanato aqui de Maracanaú, que a gente já fez alguns trabalhos com eles e para uma escola também. Então elas acabam tendo contato com a empresa que elas não teriam se não fosse esse projeto, então ela (comunidade) reconhece a empresa como socialmente responsável, melhora a ima-gem, melhora os indicadores socioambientais e gente acredita que vai melhorando, mas não a curto prazo, vai ser com o tempo e maior envolvimento em projetos”.

(Gerente de Gente e Gestão, Hidracor)

“Ele (projeto) supre carências que atendem um universo de pessoas muito gran-de”.

(Diretor Administrativo Financeiro, Hidracor)

“O atleta do futuro foi uma satisfação imensa que eles (funcionários) tiveram de colocar os filhos para praticar atividades esportivas, então melhora o clima e melho-ra a imagem da empresa socialmente responsável”.

(Gerente de RH, Cerbras)

“O maior impacto que a gente percebe é promover ações para ajudar a sociedade, é o maior impacto positivo. E aqui, internamente, é a troca de conhecimentos que é o mais rico de tudo para qualquer empresa, é essa abertura e conhecer práticas que

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dão certo em determinados lugares que podem ser utilizados pra melhorar praticas internas”.

(Gerente de RH, Cobap)

“a questão do reconhecimento social é muito forte, a gente percebe o retorno ex-terno nesse sentido”.

(Coordenadora da Qualidade/Desenvolvimento, Cobap)

• DIFICULDADES DO PROJETO CERES:

“São poucas indústrias que participam e reúnem pessoas aqui para dar apoio, que gasta tempo, que é também um recurso”.

(Gerente de RH, Cerbras)

“Como são uma quantidade pequena (de empresas), são sete empresas, então o projeto só vale a pena se todas aderirem, então, às vezes quando é feita a votação, três querem, duas querem, por conta de fatores internos, às vezes investimento, às vezes porque o foco tá direcionado para outra área”.

(Coordenadora da Qualidade/Desenvolvimento, Cobap)

“Cada empresa tem sua limitação, cada empresa está em um nível diferente de ver a responsabilidade social”.

(Analista de RH, Esmaltec)

• GANHOS DO PROJETO CERES:

“os nossos principais ganhos foi ter iniciado em responsabilidade social, porque era muito pouco, hoje ainda é para o que a gente imagina que deva ser; mas hoje a gente só tem algo através desse consórcio”.

(Gerente de Gente e Gestão, Hidracor)

“Melhora o reconhecimento da empresa como socialmente responsável; deu um impacto maior e melhora a imagem como consequência”.

(Gerente de RH, Cerbras)

“Os colaboradores ficam motivados com as ações que as empresas desenvolvem, e eles têm a oportunidade de participar das ações desenvolvidas”.

(Assistente socioambiental, Cobap)

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“A melhoria da imagem, aumento da produtividade, comunicação das empresas, e até mesmo internamente, entre as pessoas, quando a gente faz algum projeto que envolve voluntários, muito desses voluntários não se conhecem, eles passam a se conhecer, eles são de setores diferentes, então traz engajamento melhor dentro da fábrica”.

(Assistente socioambiental, Cobap)

“Com o peso de outras seis empresas facilitando os processos, têm projetos que a empresa não teria como participar individualmente, mas com o consórcio, com outras empresas, a gente participa”.

(Analista de RH, Esmaltec)

• MENSURAÇÃO DOS RESULTADOS DO PROJETO CERES:

“A empresa passa a ser mais conhecida e a imagem dela perante as pessoas vai se tornando diferente, a gente não chega a medir, a gente não tem como medir isso, se está sendo efetivo. Mas a gente acredita que é uma das formas mais genuínas de trabalhar a imagem da empresa”.

(Gerente de Gente e Gestão, Hidracor)

“É intangível mesmo. Pela observação. Indicador não tem. Indicador de retorno não tem”.

(Coordenadora da Qualidade/Desenvolvimento, Cobap)

“Hoje a gente ainda não tem essa sistemática, mas com amadurecimento da área social, é justamente a gente levantar esses dados, mensurar indicadores sociais e de repente encontrar outras formas de avaliar isso (...) o investimento está tendo retor-no, mas a gente não tem de forma concreta, então a gente não pode falar”.

(Diretora Comercial, Cobap)

Os resultados das entrevistas com os representantes das empresas consorciadas mos-tram que há evolução da RSC. Os entrevistados mostram-se conscientes do papel da em-presa como provedora de melhores condições sociais para seu público interno e externo e reconhecem a importância da formação do consórcio. Impactos na melhoria da imagem e reconhecimento da empresa como socialmente responsável foram citados.

Outros importantes ganhos com o projeto CERES foram as trocas de informações en-tre as empresas e as parcerias realizadas em outros âmbitos além do tema RSC. Os repre-sentantes entrevistados salientaram a prática de benchmarking entre as empresas partici-pantes do CERES, revelando a importância da atuação em rede.

As dificuldades encontradas relatadas pelas empresas giram em torno da pequena quantidade de indústrias participantes do CERES. Essa dificuldade também é explicitada pela coordenação do SESI quanto à sensibilização das empresas.

A mensuração dos resultados do projeto para as empresas participantes é feita de for-ma empírica (através de relatos e observação) e a falta de indicadores é explicitada pelos

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CONSÓRCIO EMPRESARIAL DE RESPONSABILIDADE SOCIAL: UM MODELO ... | 153

entrevistados. Apesar disso, os representantes das empresas afirmam que os resultados do projeto CERES são positivos para as empresas, para a comunidade e para os funcionários.

ӹ Resultados do projeto ceres para os beneficiários

A Associação Novo Oriente, fundada desde 1983, atua atendendo as demandas da co-munidade Novo Oriente de Maracanaú. Segundo os representantes da Associação, a co-munidade é muito carente e as diversas ações da Associação contribuem para o desenvol-vimento da comunidade.

O atual secretário da Associação (antigo presidente) explica que a relação Associação--Empresas nem sempre é bem sucedida. Apesar da proximidade da Associação com o distrito industrial de Maracanaú, essa aproximação nem sempre acontece:

“Temos algumas relações com empresas aqui em Maracanaú, mas é muito difícil essa relação com os empresários (...) as empresas do distrito industrial são ‘contadas nos dedos’ as que fazem o social, a maioria dos empresários tem alguma dificuldade de investir no social com as comunidades, com as entidades, às vezes pela falta de aproximação, às vezes eles estão sempre na retaguarda de alegar que as empresas estão no sacrifício, que as empresas estão com carga tributária muito alta (...) então qualquer ação de uma empresa aqui ou acolá em uma entidade comunitária é algo inédito. A maioria, quando ajuda, é pontual”.

(Secretário da Associação Novo Oriente)

A história da Associação Novo Oriente se encontra com a história do CERES a partir do ano de 2012. Segundo o vice-presidente da Associação, mais de 120 crianças foram atendidas pelo projeto SESI Atleta do Futuro, proporcionado pelo CERES. O elo da As-sociação com o projeto CERES vem de uma parceria com a Gerdau, uma das empresas participantes do CERES de Maracanaú. O vice-presidente salienta que a empresa, além da destinação de suas vagas no projeto SAF, contribuiu com infraestrutura e outros auxílios para a comunidade Novo Oriente:

“A nossa associação é a única que tem essa ajuda, porque esse projeto é destinado para os filhos dos funcionários das empresas. (...) Esse projeto do esporte atende hoje, nesse ano de 2014, 50 crianças, que de manhã estudam e de tarde vão pro SESI (local onde acontece o SAF)”.

(Vice-presidente da Associação Novo Oriente)

Os responsáveis pela Associação Novo Oriente demostram conhecimento sobre a im-portância da atuação do projeto CERES, em especial ao projeto SAF, isso é evidenciado através da fala do vice-presidente da associação:

“O Consórcio é um grupo de empresas que estão focadas em atender a questão da responsabilidade social através da prática do esporte, então eles alinharam as empresas que são associadas ao SESI pra que eles pudessem fazer um trabalho den-tro da indústria para os filhos dos funcionários (...) então a gente como Associação, abriu os olhos das outras empresas (para também ser beneficiada)”.

(Vice-presidente da Associação Novo Oriente)

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Os impactos do projeto SAF na vida das crianças da comunidade são percebidos atra-vés dos relatos das mães para os responsáveis pela Associação Novo Oriente:

“A gente sabe através das mães, elas param a gente na rua, diz que o aluno me-lhorou na escola, que ele está tendo um rendimento bem legal dentro de casa, que o projeto é maravilhoso. Não vi nenhuma mãe reclamando. Eles, no SESI têm toda uma estrutura de profissionais, estrutura física, então elas (mães) não têm o que reclamar”.

(Vice-presidente da Associação Novo Oriente)

O vice-presidente da Associação explica como acontece a comunicação sobre a partici-pação da comunidade no projeto SAF e a ligação com o CERES de Maracanaú:

“A gente repassa pra essas mães em reunião (...) que essa é a única comunidade que tem essa oportunidade; que a empresa está destinando as vagas pra elas (crian-ças da comunidade) em vez dos filhos dos funcionários. A gente passa que tem essa parceria, esse consórcio, que as empresas Gerdau e a Serlares são colaboradoras da nossa comunidade”.

(Vice-presidente da Associação Novo Oriente)

A importância da Responsabilidade Social Corporativa é ressaltada através do relato do vice-presidente da Associação. Ele explica a diferença de visão por parte da comuni-dade em relação a uma empresa participante do CERES, a Gerdau, multinacional líder no segmento de aço:

“A Gerdau era uma empresa que há alguns anos atrás tinha a questão da po-luição, porque soltava muita fumaça. Então a Gerdau mudou muito o perfil dela (...). Antigamente, o pessoal (da comunidade) via a Gerdau de uma forma e hoje vê totalmente diferente, até porque a Gerdau entra muito com a questão da responsa-bilidade social, não só com o projeto Atleta do Futuro, mas com outras parcerias”.

(Vice-presidente da Associação Novo Oriente)

O vice-presidente ressalta que o SAF deveria contribuir mais beneficiando a comu-nidade, pois o projeto privilegia primeiramente os filhos de funcionários das empresas consorciadas:

“Seria muito bom se cada empresa (do CERES) destinasse um percentual maior de vagas para a comunidade, não vou nem dizer pra gente necessariamente, pra outras associações também, outros bairros (...). Às vezes, essas crianças têm o pai desempregado ou não ligado à indústria, e precisam de um envolvimento em um projeto social”.

(Vice-presidente da Associação Novo Oriente)

Percebe-se, assim, que o exercício da Cidadania Corporativa por parte do CERES possi-bilitou um auxílio à população de Maracanaú e um início de relacionamento com a comu-nidade. A Associação Novo Oriente percebe a importância da atuação do consórcio empre-sarial, porém, ainda considera as práticas do CERES incipientes face às muitas demandas da comunidade de Maracanaú.

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ӹ Conclusão

Ao longo deste capítulo é possível perceber a importância da atuação de empresas em rede para o alcance de ações mais eficazes de RSC. O Consórcio Empresarial de Responsabi-lidade Social de Maracanaú é formado por sete empresas que, com o apoio do SESI-CE, con-seguiram impactar na vida de mais de 500 crianças e, consequentemente, de 500 famílias.

Apesar das limitações encontradas na implantação e desenvolvimento do Projeto CE-RES, sua atuação colabora na promoção do desenvolvimento econômico da comunidade, o equilíbrio trabalho-família e melhores condições de vida tanto para o público interno como para a comunidade.

Inicialmente concebido para a formação de redes entre micro e pequenas empresas, o CERES, surpreendentemente, atendeu demandas de grandes empresas, o que ratifica a ne-cessidade de disseminação do tema e elaboração de processos estruturados para geração de maior eficácia dos investimentos.

O SESI-CE, no seu papel de articulador (coordenador) da rede, apresenta-se como im-portante agente capaz de fazer com que as empresas dialoguem a respeito de preocupações sociais e tenham uma redução dos custos de ações com impactos positivos na imagem e nos relacionamentos com a comunidade. Essa articulação desenvolve um processo que ainda não é natural para as empresas cujo core business não contempla questões sociais.

Neste sentido, percebe-se que a atuação em rede é uma tendência no mundo corporativo à medida que buscar soluções com o engajamento dos stakeholderes é uma necessidade e um grande desafio para as empresas.

ӹ Referências Bibliográficas

ABREU, M. C. S.; LIMA, B. C. C.; SOARES, F.A.; SILVA, V. M. M.; CUNHA, L. T. O exer-cício da cidadania corporativa contribuindo para a transformação da realidade social da comunidade Serviluz. Revista Brasileira de Estratégia, v. 6, n. 2, p. 165-177, 2013.

BALESTRIN, A.; VERSCHOORE, J. Redes de cooperação empresarial: estratégias de ges-tão na nova economia. Bookman, 2008.

PAULA, E. V.; SOUZA, C. B.; ABREU, M. C. S. Trajetória histórica e benefícios sinérgicos do Consórcio Empresarial de Responsabilidade Social no distrito Industrial de Mara-canaú (CE). In: XVII SemeAd - Seminários em Administração, 2014, São Paulo. XVII SEMEAD, 2014.

PORTAL DA INDÚSTRIA. SESI. Atleta do Futuro. Disponível em: <http://www.portal-daindustria.com.br/sesi/iniciativas/programas/atletadofuturo/2012/03/1,1901/o-que-e.html> Acessado em 15 de julho de 2014.

SERVIÇO SOCIAL DA INDÚSTRIA (SESI). Guia Ceres: modelo de consórcio empresarial de responsabilidade socioambiental - metodologia para sustentabilidade sociotecnológica. Departamento Regional do Estado do Ceará. Fortaleza: Departamento Regional do Estado do Ceará, 2013.

SCHERER, A. G.; PALAZZO, G. The new political role of business in a globalized world: A review of a new perspective on CSR and its implications for the firm, governance, and democracy. Journal of Management Studies, v. 48, n. 4, p. 899-931, 2011.

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CAPÍTULO 11

COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA: AS AÇÕES EM DESENVOLVIMENTO DO CTI-GAIA 1

Laís Silva Oliveira Luz, Adiléia Souza Lima e Taiane Cristiane Becaro

(Com coautoria de Felipe Demolin e Lucas Rodrigues Froes)

ӹ Introdução

A queda da visão tradicionalista das organizações, que tende a considerar somente a viabilidade econômica das empresas implica a proposição de novos modelos organizacio-nais, uma vez que os atuais, em sua maioria, não abrangem adequadamente os aspectos ambientais e sociais, em especial os fatores psicossociais, subjetivos ao trabalho e presen-tes em todo sistema organizacional. Parte-se do pressuposto que os fatores psicossociais podem impactar tanto os processos produtivos como a saúde dos trabalhadores, cujas consequências negativas se relacionam aos problemas psicológicos e comportamentais, e para as empresas problemas sociais e administrativos, absenteísmo e acidentes de traba-lho, reduzindo assim sua competitividade.

Os fatores psicossociais afetariam ainda a capacidade organizacional de inovação – aqui entendida como toda mudança que agrega valor para a organização, e que é funda-mental para que as empresas possam reajustar sua atuação frente aos novos ambientes, os quais mudam rápida e continuamente – pois os processos que envolvem a geração, compartilhamento e aplicação de novos conhecimentos dependem fundamentalmente do elemento humano.

Assim, busca-se um novo direcionamento das empresas para práticas de gestão de ris-cos psicossociais, haja vista sua interferência em vários indicadores que afetam a produ-tividade, dentre os quais o absenteísmo. Considerado uma falha de gestão, a ausência dos trabalhadores é identificada como decorrente de diversos fatores biopsicossociais e eco-nômicos que refletem tanto nos custos diretos como nos indiretos a curto, médio e longo prazo nas organizações.

Sendo assim, o problema do absenteísmo, cujas causas são multifatoriais, necessita de uma atenção especial e um trabalho sistemático, haja vista a escassez de estudos de geren-ciamento do absenteísmo realizados no país e, quando há, o tratamento pontual é tratado de forma isolada deste problema principalmente pelas áreas de serviço social, saúde e

1 Este capítulo é baseado em trabalhos do CTI-GAIA, aprovados em congressos realizados no ano de 2014. Es-tes trabalhos descrevem as principais metodologias desenvolvidas por Silveira (ver SILVEIRA et al., 2014a; 2014b; 2014c), que vêm sendo utilizadas nos projetos em andamento do grupo.

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segurança no trabalho dificultando um diagnóstico preciso sobre a ausência dos traba-lhadores nas organizações. Uma vez que diversos outros elementos podem impactar na satisfação pessoal dos trabalhadores, uma das maiores causas atribuídas do absenteísmo, faz-se necessária uma intervenção de forma contundente no clima organizacional, tratan-do de maneira direta os aspectos psicossociais que inferem naquele problema.

Este capítulo relata as bases de atuação do CTI-GAIA, que nos últimos cinco anos vêm intensificando o desenvolvimento de estudos e projetos para a viabilização de modelos organizacionais inovadores sustentáveis que proporcionem simultaneamente, ganhos de competitividade empresarial com qualidade de vida no trabalho às empresas brasileiras intensivas em tecnologia, sobretudo, as de pequeno e médio porte. Estes projetos, cuja articulação lida com um grande número de variáveis multidimensionais relacionadas a diversos agentes, aspectos e objetivos envolvidos, têm como ênfase o aproveitamento do capital intelectual como fator de produção, uma vez que seu uso competente pode proporcionar os meios necessários para permitir às empresas enfrentarem os múltiplos desafios existentes nos mercados nacionais e internacionais.

ӹ Capital intelectual como instrumento para inovação competitiva: saúde e qualidade de vida no trabalho

A Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS) define saúde como “um es-tado de completo bem-estar físico, mental e social”, que “não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade” 2. Já o termo qualidade de vida, cunhado em 1958 pelo eco-nomista J.K. Galbraith, é definido pela OMS como “(...) a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações” (WHOQOL GROUP, 1998).

Observa-se, assim, que o termo qualidade de vida é um conceito usado para medir as condições de vida do indivíduo, em termos de bem-estar físico, mental, psicológico e social. Em relação ao ambiente de trabalho, Sato (1991) destaca que tal conceito incorpora noções como motivação, satisfação, saúde-segurança no trabalho, envolvendo discussões mais recentes sobre novas formas de organização do trabalho e novas tecnologias.

Situações como ambiente de trabalho hostil, assédio, fracasso, mudanças constantes na organização do trabalho, fatores relacionados ao tempo, alinhados com o nível de pres-são exercida junto ao trabalhador, são fatores que podem provocar desgaste físico e, por conseguinte, distúrbios mentais, contribuindo, dessa forma, para a baixa qualidade de vida no trabalho. Estressores decorrentes do ambiente, conteúdo ou contexto do trabalho podem estar associados a potencial desencadeamento de impactos negativos sobre a saú-de, desempenho e satisfação do trabalhador (SAUTER et al., 1998, apud SILVA-JUNIOR e FISCHER, 2014), além de absenteísmo e presenteísmo, uma preocupação crescente para as organizações.

2 Disponível em: http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/OMS-Organiza%C3%A7%C3%A3o-Mundial-da-Sa%C3%BAde/constituicao-da-organizacao-mundial-da-saude-omswho.html.

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ӹ Absenteísmo e presenteísmo: um dos principais problemas da indústria

A Organização Internacional do Trabalho – OIT (1991) conceitua absenteísmo como o período de ausência laboral atribuível a uma incapacidade do indivíduo, com exceção daquela derivada de gravidez normal ou prisão. Enquanto curtos períodos de ausência podem estar associados a fatores sociais e/ou ocupacionais, longos períodos de ausência são indicadores mais confiáveis do estado de saúde do trabalhador (SILVA-JUNIOR e FIS-CHER, 2014).

Conforme relatam Pinheiro e Razzouk (2014), em referência a Demyttenaere et al. (2004), os transtornos mentais e comportamentais estão entre as principais causas do absenteísmo no mundo, fenômeno mundial crescente que, além de constituir-se um in-dicador da qualidade de vida no trabalho, impacta diretamente na competitividade das organizações. Os custos relacionados à necessidade de se treinar ou de se contratar outro profissional para exercer a função do funcionário ausente são exemplos dos prejuízos ge-rados pelos distúrbios mentais.

Entretanto, os custos totais gerados por estes transtornos costumam ser subestimados, apesar das fortes evidências de seus impactos sociais na redução da produtividade no trabalho. Tal dificuldade se relaciona ao presenteísmo, definido como a perda ou a dimi-nuição da capacidade laboral por motivos de saúde que ocorrem quando o indivíduo está fisicamente presente no ambiente de trabalho.

Assim, enquanto as organizações conseguem facilmente rastrear o tempo dispendido pela ausência no trabalho, a diminuição do desempenho laboral e o aumento no índice de erros e acidentes de trabalho, por exemplo, permanecem como um custo oculto e, em geral, maior para muitos empregadores (SCHULTZ et al., 2009). Conforme informa a Revista CIPA (2012, apud PONTES, 2012, p. 138), o presenteísmo demonstra impactos na produtividade três vezes superior, em média, ao absenteísmo. “Uma empresa que tenha 1,5%, 2% de absenteísmo, é possível que tenha 4,5% a 6% de presenteísmo”.

Os prejuízos resultantes do aumento do absenteísmo e do presenteísmo, no entanto, não impactam somente a indústria. Gastos com assistência médica e benefícios previ-denciários, tais como auxílio-doença, aposentadoria precoce por invalidez, estão entre os principais custos gerados para a saúde pública, a seguridade social e para o sistema judici-ário. Não podemos deixar de mencionar, por fim, que outro fator favorável à subestimação dos custos relacionados às ausências e incapacidade no trabalho se relaciona à dificuldade das áreas de gestão de pessoas das empresas de realizar uma gestão holística sobre as causas-raiz deste problema, o que prejudica um conhecimento mais preciso sobre os siste-mas organizacionais. Conforme afirmam Silveira e Gardim (2014), a maioria dos avanços neste sentido resulta mais de imposições e restrições legais e pontuais – como limite da jornada de trabalho, redução de impactos ambientais e respeito às leis trabalhistas. Aktouf (1996) adverte a existência de mecanismos sutis de manipulação que disfarçam ainda a atual concepção do ser humano como custo e recurso.

Reconhece-se, portanto, a necessidade de se considerar a subjetividade individual nas formas organizacionais de trabalho, dado a influência daquela para a saúde física e mental dos trabalhadores e, consequentemente, para o desempenho organizacional. Um traba-lhador doente certamente impactará na produtividade da empresa, seja pelo baixo ren-dimento e qualidade da sua função, ou de ausências ao trabalho por motivo de doença

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física ou mental. Parte-se do pressuposto, confirmado pelas observações de campo dos projetos realizados pelo CTI- GAIA ao longo de 2014, que grande parte dos problemas organizacionais, em geral atribuídos a causas gerenciais de grande complexidade, deriva de falhas específicas, sobretudo, dos elementos pertencentes à dimensão psicossocial da organização, uma vez que é nesta dimensão onde se encontra a base do capital humano e do capital intelectual, importantes ativos econômicos da economia contemporânea.

Neste sentido, as metodologias – em geral metodologias simples e de baixo custo – uti-lizadas nas ações desenvolvidas com diversas empresas parceiras do grupo (Método para Diagnóstico Sistêmico Multidimensional; Método Business Process Management (BPM) e Grupos Operativos), têm como propósito identificar as principais falhas estruturais da empresa, e a partir disso, poder atuar de maneira específica na raiz do problema organi-zacional.

ӹ Metodologia CTI-GAIA

I. Método para Diagnóstico Sistêmico Multidimensional

O método para diagnóstico sistêmico multidimensional visa analisar a viabilidade de implantar mecanismos de baixo custo que permitam aumentar a geração e a incorporação de novos conhecimentos aos processos internos da empresa, promovendo o desenvolvi-mento integrado desta e trazendo ganhos nas dimensões competitiva e humana. Através do método é possível identificar as falhas específicas nos elementos da empresa, especial-mente naqueles pertencentes à dimensão organizacional e psicossocial e os ajustes neces-sários para promover a integração entre as dimensões.

Este método inclui a análise das três dimensões (física & tecnológica, organizacional e psicossocial) de forma integrada, pois uma análise individual normalmente resulta em um diagnóstico ineficiente e inconsistente com ações isoladas, que até poderiam gerar efeitos positivos, mas de pouca eficiência. De fato, grande parte dos problemas existentes nas empresas (na produtividade, qualidade, capacidade de inovação, saúde, satisfação, se-gurança, etc.) é efeito de dois tipos de causas primárias.

Na figura 1 é apresentada uma ilustração dessas relações de causalidade, com os tipos de causas primárias, como previsto pelo método.

figura 1 – causas primárias e efeitos

CAUSA•Deficiência específica do elemento•Desajuste entre elementos

EFEITOS•Perda de competitividade•Prejuízo ao colaborador

Fonte: elaboração própria.

Esse método de diagnóstico busca identificar a causa raiz dos problemas, uma vez que isso aumenta a eficácia das ações e a eficiência dos recursos envolvidos. A seguir, apresen-tamos uma ilustração da ação integrada e seus efeitos (figura 2).

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figura 2 – ação integrada e seus efeitos

CAUSA•Melhoria do elemento específic0•Ajuste entre elementos

EFEITOS•Ganhos de competitividade•Benefícios ao colaborador

AçãoIntegrada

Fonte: elaboração própria.

II. Método Business Process Management (BPM)

Uma organização é um todo integrado cujos resultados em termos de custos, prazos, qualidade, imagem, cultura e/ou clima interno são influenciados por um grande núme-ro de fatores presentes em diferentes esferas, tais como, os vários setores/departamentos, os níveis hierárquicos, as dimensões de existência da empresa e os múltiplos elementos externos à organização. A complexidade inerente à organização tende a levá-la para uma espécie de “esquizofrenia organizacional”, o que torna o processo gerencial uma atividade complexa e multidisciplinar.

De fato, a complexidade de qualquer sistema depende do número de elementos que o compõe, da quantidade de variáveis associada a cada elemento e do nível de interação entre eles. Assim, a complexidade de uma organização irá depender do seu porte, diversi-dade de processos, tecnologias, entre outros aspectos (SILVEIRA, 2011).

Business Process Management ou BPM é uma metodologia que une gestão de negó-cios e tecnologia da informação com foco na otimização dos resultados das organizações. Segundo (BALDAM et al., 2009), esta é uma ação estruturada, que se baseia na visão por processos, de análise e melhoria contínua dos elementos de processo de uma organização que inclui métodos, técnicas e ferramentas para dar apoio ao planejamento, implantação, gerenciamento e análise.

Para Smith e Fingar (2007), o método BPM abrange além da descoberta, desenho e implantação dos processos de negócio, também o controle executivo, administrativo e de supervisão sobre eles, garantindo que eles estejam em conformidade com os objetivos de negócios para garantir a satisfação dos clientes. As ferramentas do BPM descrevem o processo de negócio através de pessoas, máquinas, tarefas e sistemas e também inclui a descrição de custo, consumo dos recursos e tempo necessário para cada um desses com-ponentes.

III. Psicologia Social: Grupos Operativos

A psicologia social pode ser dividida em duas modalidades: psicológica e sociológica. A primeira busca a explicação para os sentimentos, pensamentos e comportamentos das pessoas na presença real ou imaginária de outros indivíduos (ALLPORT, 1954), enquanto a psicologia sociológica tem como premissa o estudo da experiência social que a pessoa adquire diante do envolvimento com a convivência em diferentes grupos sociais (STE-

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PHAN e STEPHAN, 1985). O pressuposto básico é que as pessoas demonstram um com-portamento diferente quando pertencem a um grupo social, do que se vivessem de forma isolada, pois carregam consigo a ideia de uma mente coletiva.

O conceito de grupo, numa visão cartesiana, inclui a soma de diversos elementos in-dividuais com vários elementos em que cada ser mantém sua unidade, sem se relacionar com os outros. Já numa visão coletivista, as pessoas passam a ser importantes quando pertencem a um grupo sem a consciência individual. Pichon–Rivière (1998) denomina de grupo operativo o conjunto de pessoas que possuem um objetivo comum, através do qual o indivíduo continuamente se transforma, aprende e ensina.

Um dos princípios do grupo operativo, segundo Pichon-Rivière (1998), é o vínculo, tido como a base da construção do indivíduo e do grupo, pois são constituídos por todas as relações sociais do sujeito. Além do vínculo, acionado muitas vezes por motivações psicológicas e resultado de determinada conduta que tende a se repetir no futuro, outra atividade importante para a técnica do grupo operativo é a tarefa, em que são comparti-lhadas as necessidades em volta dos objetivos comuns.

Os vínculos sociais em grupo podem gerar reflexões importantes e levar ao “saber aprender”, competência estratégica fundamental para as organizações atuais, cunhado, seminalmente, de learning organizations, por Senge (1990). A capacidade de aprender permite à organização alcançar e manter um desempenho superior e, portanto, desen-volver vantagens competitivas sustentáveis ao longo do tempo, proporcionando melhores condições em termos de criação de força de trabalho comprometida e energizada, de ge-ração de conhecimento e, consequentemente, de inovação (BOYETT & BOYETT, 1999).

A organização, entretanto, não pode criar conhecimento por si só, sem a participação ativa dos indivíduos e dos processos interativos que ocorrem dentro dos grupos, estes últimos determinados por uma infinidade de processos psicológicos que, em sua grande maioria, vão além da fronteira do consciente de cada um. Destaca-se então que o principio básico através do uso de grupo operativo é promover, por meio de uma técnica integrativa, os processos de contínua aprendizagem e, dessa forma, de mudança.

ӹ Estudos de Campo CTI-GAIA • Método para diagnóstico multidimensional em empresa do Setor Eletrônico 3

Como dito acima, o método para diagnóstico sistêmico multidimensional visa analisar e identificar mecanismos de baixo custo que permitam aumentar a geração e a incorporação de novos conhecimentos aos processos internos da empresa, promovendo o desenvolvimento integrado desta e trazendo ganhos nas dimensões competitiva e hu-mana com qualidade de vida. A metodologia utilizada neste projeto incluiu a aplicação de entrevistas, dinâmicas e workshops, com a participação de colaboradores e gestores, a fim de coletar informações, conhecer o ambiente organizacional, e a partir da identificação

3 Trabalho aprovado no XXI Simpósio de Engenharia de Produção (Simpep/UNESP’), realizado em Bauru (SP), em novembro de 2014, e aceito para publicação na Revista Eletrônica Gestão & Saúde, em 2015 (vide SILVEIRA et al., 2014b).

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dos problemas macro da empresa e das áreas, orientar as ações a serem implantadas em cada uma delas.

• A Empresa Piloto

De médio porte e sediada em SP, a empresa estudada é líder no mercado de sensores. Seu portfólio de produtos pode ser sintetizado nas seguintes categorias: Automação de Manufatura (Factory Automation): diversos tipos de sensores; Automação de Processos (Process Automation): instrumentos para atmosferas explosivas e redes industriais; e Ser-vice: assistência técnica.

Para participação do projeto, foram incluídas, inicialmente, as seguintes áreas: Vendas Factory Automation (FA) – automação de sensores; Vendas Process Automation (PA) – O P&D da empresa; Marketing – área de suporte à equipe de vendas e ao desenvolvimento de novos produtos e relações com o mercado; Engenharia de Aplicações – área de suporte técnico à equipe de vendas, ao cliente e ao desenvolvimento de novos produtos.

• O Projeto

Através das entrevistas, dinâmicas e workshops realizados com os trabalhadores dos processos envolvidos no projeto, foi possível identificar os pontos fracos da empresa, pon-to-alvo do projeto, os quais têm origem nas seguintes quatro grandes falhas:

I. Estrutura organizacional não preparada para o envelhecimento do corpo de funcionários. De base tecnológica, a empresa não tem se preparado para a su-cessão de seus fundadores e colaboradores, problema confirmado através da opinião predominante de que o conhecimento da Empresa está concentrado principalmente nos funcionários antigos. Soma-se a isso a dificuldade da em-presa em demitir, mesmo àqueles funcionários que estão acomodados ou que são resistentes a mudanças;

II. Baixa integração e sinergia entre setores. Característica ampliada pela estru-tura departamentalizada: fluxo dos processos fragmentado, de modo que cada setor executa sua atividade sem grandes interações com os demais, tornando as responsabilidades não tão claras, e impedindo maior senso de equipe e, portan-to, de comprometimento com os resultados;

III. Falha na comunicação interna. Resultante da baixa integração entre os seto-res, a comunicação na empresa é falha e em geral traz grandes ruídos, pois nem sempre ocorre de forma oficial, gerando distorções;

IV. Baixa pró-atividade. Observaram-se diversas reclamações sobre a falta de proatividade e comprometimento dos colaboradores.

O Gráfico a seguir ilustra os principais problemas apontados pelos colaboradores da Empresa.

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gráfico 1. principais problemas levantados nas entrevistas

Principais problemas levantados nas entrevistas

É possível perceber que o problema mais citado é a falta de integração e cooperação entre as áreas e pessoas, foco principal de atuação do projeto aqui apresentado e que teve um bom resultado após a aplicação das ações demonstradas mais adiante.

Além dos colaboradores, foi realizada uma dinâmica com os gestores, e algumas pes-soas envolvidas nos processos alvo, com objetivo de validar todas as informações obtidas através das entrevistas. Durante a aplicação da dinâmica pôde-se perceber que há muitas divergências dentro da empresa com relação a diversos assuntos, de modo que grande parte dos problemas levantados foi validada, como mostram as tabelas abaixo.

tabela 1 – relação entre as áreas da empresa

Relação entre áreas da Empresa Concordototalmente

Concordo parcialmente

Discordo parcialmente

Discordo totalmente

Existe um bom relacionamento entre as áreas da empresa, havendo integração e colaboração entre os funcionários.

0 2 4 2

As informações geradas em outras áreas não são utilizadas nos departamentos 1 6 0 1

A estrutura de departamentos e setores da em-presa é adequada às atividades. 0 4 4 0

Fonte: Elaboração própria

No que se refere à relação entre as áreas da empresa, 75% dos entrevistados acredi-tam que o relacionamento e a integração entre os setores na empresa não são bons. Para corroborar esse item, observa-se que 75% das pessoas concordam parcialmente que as informações geradas em outras áreas não são utilizadas. Metade das pessoas acredita que

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COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA:AS AÇÕES EM DESENVOLVIMENTO ... | 165

a estrutura de departamentos e setores está adequada à realidade da empresa, porém, a outra metade não.

tabela 2 – inovação & conhecimento

Inovação & Conhecimento Concordototalmente

Concordo parcialmente

Discordo parcialmente

Discordo totalmente

O conhecimento na empresa é sempre repassado aos novos funcionários. 0 4 1 3

O conhecimento da empresa está concentrado principalmente em funcionários antigos. 2 4 2 0

As atividades de Inovação estão incorporadas às atividades da empresa 0 2 5 1

O conceito de inovação está claro para todos os funcionários da empresa 1 2 3 2

Fonte: Elaboração própria

No que se refere à transferência de conhecimento, 50% dos gestores concordam que o conhecimento é transferido e 50% deles discordam, indicador que é reforçado pelo fato de 75% dos entrevistados acharem que o conhecimento da empresa está concentrado princi-palmente em funcionários antigos. A maioria não concorda, porém, que as atividades de inovação estão incorporadas às atividades da empresa, e 62,5% dos gestores acreditam que o conceito de inovação não está claro para todos da empresa.

tabela 3 – comportamento

Comportamento Concordototalmente

Concordo parcialmente

Discordo parcialmente

Discordo totalmente

Os profissionais da empresa em geral são pró--ativos 0 4 2 2

Os funcionários da empresa são motivados e comprometidos com o desenvolvimento da em-presa

1 2 4 1

Fonte: Elaboração própria

Em relação à pró-atividade dos funcionários, 50% dos entrevistados concordam par-cialmente com a afirmativa, enquanto que 25% discordam totalmente e 25% discordam parcialmente. Percebe-se, contudo, que há divergências no conceito de pró-atividade para os funcionários da empresa, certamente um problema decorrente da falta de clareza na definição das responsabilidades e atribuições de cada pessoa.

Quando o assunto é motivação e comprometimento dos funcionários, um gestor con-corda totalmente e um gestor discorda totalmente com esse quesito, sendo que a maioria discorda parcialmente. Há, dessa forma, diferentes visões na empresa, pois duas pessoas estão enxergando exatamente o oposto, o que reforça o desalinhamento entre as áreas e pessoas da empresa.

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• Ações desenvolvidas na empresa

Após a identificação dos problemas-chave na empresa, foram realizadas as seguintes atividades:

I. Definição dos focos prioritários para alinhamento de todas as áreas da Em-presa. Os focos foram definidos e validados pelos gestores com base no pla-nejamento estratégico da empresa do ano de 2012 e nas necessidades atuais identificadas;

II. Workshops de Integração de Áreas e Processos para identificar “Rede clien-te/ fornecedor interno”. Foi desenhada a Rede Cliente/fornecedor Interno, identificadas as interações e problemas entre as áreas e delineadas as ações de melhoria. Os processos foram mapeados em três focos: fluxo de atividades, interações externas e fluxo de informações;

III. Pesquisa das relações entre organização do trabalho e elementos psicosso-ciais. Foi aplicado um questionário para validar os problemas levantados nas entrevistas, dinâmicas e Workshops. O levantamento possibilitou um melhor direcionamento das ações para cada área.

IV. Ações para conhecer as atividades do grupo. Foi desenvolvido um questio-nário padrão para que cada colaborador pudesse escolher pessoas da Empre-sa para entrevistar e conhecer suas atividades do dia a dia e suas dificuldades na execução do trabalho. A aplicação deste questionário fez com que cada pessoa entendesse como é o dia das pessoas entrevistadas e desmitificou a ideia de que algumas pessoas “não faziam nada ou que demoravam para en-tregar uma atividade”.

As entrevistas também possibilitaram o delineamento de algumas metas e ações de melhoria. São elas:

I. Criação de um Grupo de Coordenação das Áreas de Mercado. Participaram do grupo gerentes das áreas envolvidas no projeto, com o objetivo de discutir e definir ações de mercado a nível gerencial. O resultado das reuniões foram bem positivas e ações as discussões gerou tomadas de ações para resolver problemas que se arrastavam há anos na Empresa;

II. Criação de um Grupo Tático de Melhoria e Integração dos Processos de Mercado. Participou do grupo um colaborador de nível tático de cada área envolvida no projeto, com objetivo de discutir e definir ações de melhoria a nível tático, que posteriormente foram repassadas aos gestores do Grupo de Coordenação das Áreas de Mercado;

III. Workshops de Integração e Apresentação das Áreas. Todas as áreas envolvi-das no projeto puderam apresentar suas atribuições e responsabilidades para as demais áreas da empresa. Cada área pôde apresentar sua estrutura, ativi-dades e características (problemas, dificuldades, etc.);

IV. Apoio ao Plano de Sucessão. Foram definidos objetivos e competências es-senciais de cada área, para apoiar no desenvolvimento do plano de sucessão da empresa, além de outras atividades desenvolvidas paralelamente em várias

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COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA:AS AÇÕES EM DESENVOLVIMENTO ... | 167

áreas da empresa, tais como elaboração de um plano de Premiação e Boni-ficação, apoio na implantação de um CRM, criação de reuniões periódicas para acompanhamento nas áreas e entre as áreas, diversas capacitações, entre outras.

• Resultados alcançados

A aplicação do estudo e ações atingiu o objetivo e mostrou evoluções positivas. Ini-cialmente, alguns colaboradores se mostraram resistentes e descrentes com a aplicação das atividades propostas, mas posteriormente foi notável o empenho e dedicação de todos para que de fato as mudanças ocorressem. Alguns desses resultados positivos que foram obtidos são apresentados a seguir:

I. Com a definição dos objetivos da Empresa foi possível a disseminação de seus valores e estratégias; a definição do programa de sucessão; uma maior integra-ção entre áreas; a capacitação de seus funcionários; e a definição de competên-cias essenciais de cada área;

II. Definição da rede cliente-fornecedor interno; III. Mapeamento dos processos de interesse nas Áreas Piloto em três focos: fluxo de

atividades, interações externas e fluxo de informações; IV. Desenvolvimento das competências baseadas em Gestor educador (gestores

que mobilizam capacitação, participação e comprometimento da equipe); V. Alinhados de alguns indicadores e mecanismos de reconhecimento; VI. Aplicação de mecanismos de integração trabalho-capacitação-desenvolvimen-

to (TCD) adequados a cada área; VII. Estratificação dos problemas por natureza, origem e gravidade e seus impactos

potenciais na Empresa; VIII. Aplicação de uma série de pequenos mecanismos para melhorias nos pro-

cessos nas Áreas Piloto visando aumento de produtividade e de qualidade, bem como minimização de ocorrências indesejadas;

IX. Os gestores ficaram mais integrados, de modo que foi notório o aumento de motivação dos colaboradores.

De modo geral, os resultados do projeto foram expressivamente positivos, de tal modo que foi elaborada uma proposta para dar continuidade ao projeto desenvolvido pelo grupo na empresa.

• Programa de Melhoria da Qualidade de Vida do Trabalhador (PMQVT) no Ceará 4

• Descrição da empresa piloto

A empresa piloto deste projeto é de médio porte, gerando mais de 2000 empregos di-retos. Líder no ramo de águas minerais, bebidas mistas e refrigerantes, a empresa possui características inovadoras e um grande potencial industrial, ao incentivar e apoiar a ini-

4 Trabalho aprovado no XXI Simpósio de Engenharia de Produção (Simpep/UNESP), realizado em Bauru (SP), em novembro de 2014 (vide SILVEIRA et al., 2014a).

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ciativa de seus colaboradores na busca de inovação em seus produtos, processos e serviços, além de buscar parcerias com pesquisadores de Instituições Científicas e Tecnológicas.

O novo processo de suporte à Empresa consistirá em uma técnica de produção de pro-gramas de melhoria da qualidade de vida do trabalhador, cujo objetivo é reduzir o absen-teísmo decorrente de doenças não transmissíveis (DNT) – principalmente o câncer, doen-ças cardiovasculares, doença pulmonar crônica, diabetes e doenças mentais – provocadas por condições de trabalhado desgastantes e problemas sociais. Consequentemente, este projeto visa contribuir para o aumento da eficiência do gasto da Empresa em pagamento de pessoal da produção.

• O Projeto

O Programa de Melhoria da Qualidade de Vida do Trabalhador, ou PMQVT, realiza-do em parceria com o Serviço Social da Indústria – SESI, do Ceará, divide-se em quatro subprocessos. No primeiro deles, de desenvolvimento e planejamento do projeto, ocorre a averiguação do ambiente organizacional para que problemas de cunho psicossocial se-jam identificados. Neste momento, todos os níveis hierárquicos da empresa devem ser motivados a fim de que uma política interna seja estabelecida. Também deve ocorrer um comprometimento dos gestores para manutenção do programa.

Na segunda etapa é feita a modelagem e desenho do PMQVT, através do desenvolvi-mento das ações, de forma holística e acessível, e do delineamento de metas de combate às doenças não transmissíveis. Na terceira etapa os programas são expandidos visando alcançar a totalidade da empresa, de modo a desenvolver, além disso, a cultura interna de otimização de produção via qualidade de vida do funcionário, do uso dos programas implementados e de comunicação eficaz entre todos os níveis da organização. Registros devem ser gerados para acompanhamento.

No quarto estágio ocorre a verificação de cumprimento e redefinição das metas, análi-se dos programas e desenvolvimento de possíveis melhorias, envio de feedback e avaliação interna da eficácia dos procedimentos e documentação das mudanças detectadas. Ao lon-go da pesquisa, do desenho e da implantação do novo processo de suporte na Empresa, a equipe executora do projeto lida com um conjunto de desafios tecnológicos relacionados a cada um dos subprocessos:

I. Subprocesso de desenvolvimento e planejamento: os principais desafios se re-lacionam à identificação das maiores fontes de custos e de perda de competiti-vidade (produtividade, qualidade e capacidade de inovação) da empresa, asso-ciadas à força de trabalho. Dessa forma, a questão-chave que se coloca é: como identificar, por meio de análise estruturada, os comportamentos de risco que impactam e modificam as operações da empresa? Como medir tais impactos?

II. Subprocesso de modelagem e desenho: nesta etapa, as principais questões a serem respondidas são: quais mecanismos demonstram efetividade no incenti-vo a comportamentos que reduzam os fatores de risco? Quais aspectos devem ser considerados ao planejar as ações, considerando seu impacto na cadeia de valor? Como elaborar um plano de ações integradas que possa proporcionar bem-estar aos trabalhadores, abarcando suas necessidades e desafios de uma

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forma que também aumente o desempenho organizacional? Como representar um modelo abrangente e integrado que reúna seus mais diversos componentes? Como converter declarações de direção estratégica para alcançar melhor de-sempenho organizacional por meio do bem-estar do trabalhador, em medidas e metas que possam ser ligadas às operações?

III. Subprocesso de implantação: quando e como devem ser apoiados comporta-mentos saudáveis? Como apoiar a adesão dos funcionários à iniciativa a qual propõe o projeto? Como alinhar os funcionários com o contexto de resistên-cia institucionalizada para a mudança comportamental? Como monitorar e aprender sobre os problemas, barreiras e desafios? Como podem a saúde e o bem-estar ser medidos em nossa força de trabalho?

IV. Subprocesso de avaliação: como o sucesso pode ser medido e incentiva-do? Como medir o retorno sobre o investimento de um programa específico? Como testar e adaptar a iniciativa incluindo a medição de seu desempenho em relação ao bem-estar do trabalhador e ao seu impacto financeiro?

• Etapas do Projeto

Para resolver esses desafios, a equipe do projeto é responsável pela realização de um ciclo de vida contínuo de atividades integradas ao Business Process Management (BPM). O ciclo pode ser sumarizado por um conjunto gradual e interativo de atividades que in-cluem: (1) Planejamento, (2) Análise, (3) Desenho e Modelagem, (4) Implantação, (5) Mo-nitoramento e Controle e (6) Refinamento. Abaixo, segue uma breve exposição de cada uma das principais atividades do projeto que devem ser seguidas por sua equipe executora.

I. Planejamento estratégico. O ciclo de vida do projeto começa com o desen-volvimento de um plano estratégico alinhado com a estratégia corporativa da empresa, composto por visão, missão, objetivos, indicadores, clientes, ser-viços e empregados. Para isso, primeiramente é desenvolvida uma análise da estratégia da empresa, com base em seu plano de negócios. Em seguida, define-se a oferta de serviços do novo processo para atender aos objetivos da estratégia corporativa. Essa etapa é formalizada por meio do acordo de prestação de serviços do novo processo, elaborado segundo normas técnicas internacionais e padrões de gerenciamento reconhecidos, e estabelecido entre a equipe executora do projeto e a diretoria da empresa piloto.

II. Análise de processo. A análise de processo incorpora várias metodologias com o propósito de entender os atuais processos de gestão de PMQVTs no contexto das metas e objetivos definidos anteriormente no plano estratégico. A análise deve conter quaisquer das seguintes desconexões: (i) objetivo de desempenho não alcançados; (ii) falha nas interações com o cliente; (iii) va-riações de processo e; (iv) gargalos.

III. Modelagem e desenho de processo. Para atender ao plano estratégico, as atividades de desenho têm como foco a transformação radical do processo analisado na etapa anterior. As atividades de desenho do novo processo se concentram no esboço cuidadoso de como o trabalho ocorrerá de modo a in-tegrar o PMQVT aos trabalhadores. O desenho definirá o que a organização

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espera da gestão de PMQVT e responderá questões como: o quê, quando, onde, quem e como o trabalho ponta-a-ponta será realizado. Um importante componente do desenho é também assegurar a implementação de métricas e controles gerenciais apropriados para medição de desempenho e conformi-dade do projeto.

IV. Implementação de processos. A implementação de processos é a realização do desenho aprovado da gestão do PMQVT documentado em procedimentos e fluxo de trabalho, de modo que, somente pequenos ajustes devem ocorrer durante esta atividade.

V. Monitoramento e controle de processo. As atividades de medição e monito-ramento fornecem informações-chave de desempenho de processos, através de métricas relacionadas às metas e ao valor para a organização. A análise de informações de desempenho de processos pode resultar em atividades de melhoria, redesenho ou reengenharia.

VI. Refinamento de processo. A medição e o monitoramento contínuo do novo processo fornecem informações necessárias para que o gestor do processo ajuste recursos para atingir os objetivos estabelecidos. O refinamento, dessa forma, aborda aspectos de ajustes e de melhorias pós-implementação do novo processo com base nos indicadores e informações-chave de desempenho.

• Resultados Esperados

Em termos gerais, espera-se com este projeto implantar a metodologia contida no PMQVT, de modo que auxilie a área de recursos humanos da empresa a reduzir o índice de absenteísmo, melhorando a eficiência do gasto com folha de pagamento. Com isso, busca-se promover o desenvolvimento socioeconômico da organização, isso é, aumen-tar seus lucros financeiros de forma integrada com a geração de benefícios sociais por ela gerados.

• Gestão integrada de fatores psicossociais para inovação organizacional em indústria da Bahia 5

• A empresa piloto

Localizada no estado da Bahia, a empresa piloto deste projeto pertence a um grupo multinacional do setor alimentício, mais especificamente, do ramo de processamento de cacau. Em razão do processo de fusão em andamento com uma grande corporação, o grupo que, junto com mais duas organizações, é atualmente responsável por cerca de 70% do processamento de amêndoas de cacau do Brasil, se tornará o maior processador de cacau do mundo.

Com a fusão, a empresa, que hoje possui 220 funcionários, tem identificado alguns problemas, em especial aqueles decorrentes do estresse do ambiente de trabalho que envolve a mudança de gestão. Essa transformação interna no ambiente de trabalho é um

5 Trabalho aprovado no IV Congreso Internacional de Gestión Tecnológica e Innovación (COGESTEC), realizado na Colômbia, em novembro de 2014 (vide SILVEIRA et al., 2014c).

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dos motivos pela escolha da organização, uma vez que, através da ação, piloto é possível diagnosticar as falhas estruturais sistêmicas e entender a origem das principais dificul-dades existentes na empresa e com isso agir na causa-raiz dos problemas.

• O Projeto

O projeto em parceria com o Serviço Social da Indústria – SESI, da Bahia, que tem como objetivo a redução do índice de absenteísmo da indústria da região, se baseia na implantação de um conjunto integrado de mecanismos de baixo custo para a correção de falhas sistêmicas e de desalinhamentos entre as várias dimensões organizacionais.

A intervenção na empresa se dará, considerando os Processos de Gestão Empresarial e Desenvolvimento de Pessoas, por meio da Psicologia Social aplicada em dois Grupos Operativos (Trabalhadores e Líderes Imediatos), cada qual formado por, no máximo, quinze pessoas, que se reunirão por cerca de duas horas mensais, em um período de nove meses. Com isso, espera-se atingir os seguintes objetivos principais:

I. Processos de Gestão Empresarial

I. Diagnosticar as falhas estruturais sistêmicas que estão na origem dos principais problemas existentes na empresa; II) implantar, em cooperação com a direção e os ges-tores da empresa, um conjunto integrado de mecanismos de baixo custo com atuação nas dimensões organizacional e psicossocial da empresa; III) medir, avaliar e poten-cializar os benefícios obtidos nos aspectos previamente definidos, os quais incluem: i) reduzir custos e outras consequências negativas associadas a afastamentos, tanto por acidentes como por problemas de saúde física e mental; ii) melhorar a qualidade de vida no trabalho, proporcionando benefícios à saúde dos trabalhadores, em especial à saúde mental; iii) contribuir para ganhos de competitividade, tendo como referência indicadores de desempenho previamente definidos, os quais podem estar associados à qualidade, produtividade, custos segurança e/ou capacidade de inovação.

Para tanto, a metodologia utilizada consiste em: i) avaliar os riscos-custos-benefícios das ações com potencial de melhoria, visando definir as ações prioritárias; ii) desenvol-ver um plano de ação definido em conjunto com os gestores da Empresa, baseado na análise detalhada das causas dos problemas atuais; iii) utilizar somente mecanismos de baixo custo, que tenham alta relação custo/benefício; iv) melhorar o desempenho dos processos em termos de qualidade, produtividade, custos, segurança e/ou capacidade de inovação; v) diminuir os impactos negativos (em custos e quantidade) causados por afastamentos de trabalhadores.

II. Desenvolvimento de Pessoas

No que tange ao desenvolvimento de pessoas, as ações do projeto visam: I) caracte-rizar o perfil do grupo piloto; II) acompanhar o perfil dos trabalhadores absentos; III) desenvolver pessoas para permear a busca do aprendizado através da cotidianidade e das relações sociais estabelecidas no ambiente de trabalho.

Para se chegar a tais objetivos, a técnica baseia-se em: i) reuniões grupais com o enquadre específico que determinam: tempo, duração, frequência, coordenador e ob-

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servador; ii) grupo centrado em tarefa – tarefa explícita (aprendizagem, diagnóstico e tratamento) e tarefa implícita (modo como cada um se relaciona com o outro realizar a tarefa solicitada).

• Etapas principais do projeto

O projeto se divide em sete etapas: i) início do projeto, com a formação dos grupos operativos na Empresa; ii) modelagem ao Negócio da Empresa (Estrutura Organizacional, perfil dos trabalhadores, Sistema de SST); iii) coleta e análise de dados iniciais (planejar, coletar, avaliar e organizar dados e indicadores relacionados com a Qualidade de Vida do Trabalhador); iv) planejamento de ações de melhoria (estabelecer relações causais, elabo-rar proposta de ações, capacitar grupos); v) implantação e acompanhamento das ações de melhoria (implantar ações de melhoria e monitorar resultados); vi) medições e avaliação final dos resultados obtidos; e vii) elaboração do relatório final.

Para o gerenciamento do desenvolvimento dessas etapas, são definidos objetivos espe-cíficos, bem como indicadores e metas associados, os quais estão sintetizados no quadro a seguir.

quadro 1. objetivos específicos, indicadores e metas

Objetivo específico Indicador Meta

a) Diagnosticar falhas estruturais sistêmicas

b) Capacitar Executivos, líderes imediatos e trabalhadores

c) Implantar mecanismos com atu-ação nas dimensões organizacio-nal e psicossocial da empresa

d) Medir, avaliar e potencializar os benefícios da: • Redução dos custos associados

a afastamentos• Melhoria da qualidade de vida

no trabalho

Nº de diagnóstico realizado

Número de grupos/pessoas capaci-tadas

Ações implementadas do Plano de Ação

Marco zero

Redução de afastamentos e custos relacionados à saúde Redução do nº de atendimentos mé-dico

2 diagnósticos (Gestão e Grupo Operativo)

3 grupos com no máximo 15 pessoas em cada

Cumprimento de 100% do Plano de Ação

Redução de 15% do número de afas-tamentos e de 5% em relação aos custos

Fonte: Elaboração própria

• Resultados Esperados

Os principais resultados previstos com a implantação do projeto incluem: i) a obtenção de um diagnóstico abrangente da empresa, contendo a identificação das principais falhas estruturais sistêmicas; ii) a implantação de um conjunto de ações de baixo custo para correção tanto das causas-raiz dos problemas, como de suas consequências; iii) o desen-volvimento de grupos internos capacitados visando dar autonomia para manter e ampliar os benefícios ao longo do tempo; iv) a capacitação de gestores da empresa, visando boas práticas na gestão dos fatores psicossociais presentes em suas equipes; v) a geração de me-lhorias no sistema para promoção da saúde e da segurança no trabalho, e da qualidade de

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COMPETITIVIDADE COM QUALIDADE DE VIDA:AS AÇÕES EM DESENVOLVIMENTO ... | 173

vida no trabalho, proporcionando benefícios à saúde dos trabalhadores, em especial, à sua saúde mental; vi) a redução de afastamentos e dos custos decorrentes desses afastamentos, e de outras consequências negativas associadas a acidentes e problemas de saúde física e mental; vii) melhorias no sistema de gestão; viii) a contribuição para ganhos de competi-tividade, tendo como referência, indicadores de desempenho previamente definidos com a empresa, que podem estar associados à qualidade, produtividade, custos, segurança e/ou capacidade de inovação.

Em termos gerais, os benefícios esperados do projeto são melhorias do clima organi-zacional e na organização do trabalho que, ao reduzir os riscos psicossociais no ambiente de trabalho, contribuem para o aumento tanto da qualidade de vida como do capital in-telectual e, com isso, o desempenho operacional da empresa e a satisfação dos seus traba-lhadores.

ӹ Conclusão

A desconsideração dos impactos negativos na força de trabalho provocados por mo-delos organizacionais equivocados vem cobrando um alto preço das indústrias brasileiras na forma de diminuição da sua produtividade, qualidade e capacidade de inovação. Além disso, se forem considerados os custos associados às suas externalidades sociais, mesmo empresas supostamente “lucrativas” teriam reveladas a sua inviabilidade econômica, de-vido aos custos financeiros gerados nos sistemas previdenciário, de saúde e trabalhista, além da diminuição da capacidade produtiva dos trabalhadores afetados, os transtornos gerados na vida dos seus familiares, entre outros problemas.

A solução para esses graves problemas inclui necessariamente a busca de inovações organizacionais que contemplem tanto a competitividade empresarial como a qualidade de vida dos trabalhadores. Essas inovações organizacionais, se gerenciadas com compe-tência, resultam em aumento de capital humano e, por conseguinte, de capital intelectual, precioso recurso no contexto da nova economia.

Os resultados dos projetos de campo em andamento do CTI-GAIA corroboram o fato de que a organização de diversos desses fatores organizacionais – como bom clima organi-zacional, carga de trabalho adequada, acolhimento pelos colegas, informações integradas com acesso comum, enriquecimento cognitivo – contribuem para alcançar a tão buscada sustentabilidade, integrando, simultaneamente, ganhos de competitividade com qualida-de de vida no trabalho. Vale destacar que os mecanismos utilizados pelo grupo para iden-tificar e atuar nos problemas nas empresas-piloto são, em sua maioria, métodos simples e de baixo custo. Isso faz com que tais mecanismos sejam acessíveis a grande maioria das empresas brasileiras, além de desmistificar a associação frequentemente feita de que a resolução de muitos problemas organizacionais necessariamente exige um grande esforço financeiro, motivo pelo qual ela muitas vezes não é levada a cabo pelos empresários, ou ainda de que, é inerentemente complexa, embora simplicidade nem sempre denote facili-dade, mas algo que não é impossível de se realizar.

Dentro dessa trajetória de atuação do grupo nos últimos anos, um importante projeto tem sido vislumbrado a curto e médio prazo, definindo os próximos caminhos a serem traçados pelo CTI-GAIA. Este projeto tem como proposta a modelagem e simulação do

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comportamento organizacional – definido como a interação entre as múltiplas variáveis humanas e organizacionais – para que, através do uso de modelos matemáticos e de fer-ramentas computacionais se crie um sistema de apoio à tomada de decisão, sem, contu-do, descuidar dos elementos subjetivos – e, por sua vez, complexos – que caracterizam tal problemática. Espera-se com este projeto um novo direcionamento para a gestão do fator humano, incansavelmente retratado pelos autores deste livro como fator-chave de produção, dado seu papel como viabilizador de organizações competitivas promotoras da sustentabilidade.

Os desafios à frente são imensos, mas as expectativas para com a tarefa incessante de mobilizar as empresas à gestão socialmente responsável e, consequentemente, ao desen-volvimento socioeconômico do país, são ainda maiores. Mãos à obra!

ӹ Referências Bibliográficas

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