19
255 CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO RUIZ DE MONTOYA E GABRIELE MALAGRIDA, VIDAS EXEMPLARES E MODELOS DE SANTIDADE POPULAR LUIZ FERNANDO MEDEIROS RODRIGUES 1 Prof. Dr. PPG-História – Unisinos [email protected] MSDA. GABRIELE RODRIGUES DE MOURA 2 PPG-História – Unisinos [email protected] Resumo: O artigo investiga dois casos de santidade popular que não receberam o reconhecimento oficial pela Igreja católica. Estes dois atores sociais, pertencentes à Companhia de Jesus, atuaram em tempos e regiões diferentes. Antonio Ruiz de Montoya (limenho) foi missionário nas missões do Paraguai, no séc. XVII; Gabriele Malagrida (italiano) missionou no norte-nordeste do Brasil, no séc. XVIII. O primeiro distinguiu-se por ser o principal fundador de reduções no Guairá e por ter advogado em defesa do armamento dos indígenas, em Madrid. Já Malagrida, depois de muitos anos como missionário nordeste brasileiro e entre os Guanarés e os Barbados, no Amazonas. Envolvido na trama da conjura contra D. José I, foi garroteado e esquartejado num auto de inconfidência em Lisboa. Ambos foram aclamados como exemplos de virtudes e modelos de santidade popular. Do conjunto de textos escritos sobre suas vidas e obras criou-se uma hagiografia institucional que a Companhia e as crenças populares propuseram como modelo de jesuítas, e por extensão, como modelos comportamentais sobre os quais se poderiam construir discursivamente o missionário ideal e apóstolo evangélico. Este artigo busca desenvolver, no seu horizonte de produção, estes casos de santidade e a sua não aclamação oficial. Palavras-chave: Santidade Popular, Antonio Ruiz de Montoya, Gabriele Malagrida INTRODUÇÃO Desde a fundação da Companhia de Jesus, muitos jesuítas, pelas suas vidas exemplares, foram reconhecidos oficialmente como beatos e santos. Na América colonial, os relatos de missionários apresentados como virtuosos serviram para propor à sociedade um modelo ideal de santidade pessoal, e para os membros da Companhia, como missionários jesuítas exemplares a serem imitados e venerados. Entretanto, nem todos os jesuítas propostos como modelos de santidade e de virtudes exemplares foram reconhecidos pelo magistério da Igreja Católica. Antonio Ruiz de Montoya e Gabriele 1 Este artigo é resultado das pes�uisas feitas pelo autor no �mbito do projeto �A contribui�o dos jesuíEste artigo é resultado das pes�uisas feitas pelo autor no �mbito do projeto �A contribui�o dos jesuítas expulsos, em 1759, para o conhecimento das culturas indígenas das missões do Gr�o�Pará e Mara� nh�o”, �ue conta com a com a bolsa de pes�uisa P�G/FAPERGS. 2 Este artigo é resultado das pes�uisas feitas pelo autor no �mbito do projeto �Jesuítas nas Américas”, �ue conta com a com a bolsa de pes�uisa CAPES/PROSUP, sob a orienta�o do Prof. Dr. Luiz Fernando Medeiros Rodrigues.

CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

  • Upload
    trantu

  • View
    221

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

255

CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO RUIZ DE MONTOYA E GABRIELE MALAGRIDA, VIDAS EXEMPLARES E

MODELOS DE SANTIDADE POPULAR

Luiz Fernando Medeiros rodrigues1

Prof. Dr. PPG-História – [email protected]

Msda. gabrieLe rodrigues de Moura2

PPG-História – [email protected]

Resumo: O artigo investiga dois casos de santidade popular que não receberam o reconhecimento oficial pela Igreja católica. Estes dois atores sociais, pertencentes à Companhia de Jesus, atuaram em tempos e regiões diferentes. Antonio Ruiz de Montoya (limenho) foi missionário nas missões do Paraguai, no séc. XVII; Gabriele Malagrida (italiano) missionou no norte-nordeste do Brasil, no séc. XVIII. O primeiro distinguiu-se por ser o principal fundador de reduções no Guairá e por ter advogado em defesa do armamento dos indígenas, em Madrid. Já Malagrida, depois de muitos anos como missionário nordeste brasileiro e entre os Guanarés e os Barbados, no Amazonas. Envolvido na trama da conjura contra D. José I, foi garroteado e esquartejado num auto de inconfidência em Lisboa. Ambos foram aclamados como exemplos de virtudes e modelos de santidade popular. Do conjunto de textos escritos sobre suas vidas e obras criou-se uma hagiografia institucional que a Companhia e as crenças populares propuseram como modelo de jesuítas, e por extensão, como modelos comportamentais sobre os quais se poderiam construir discursivamente o missionário ideal e apóstolo evangélico. Este artigo busca desenvolver, no seu horizonte de produção, estes casos de santidade e a sua não aclamação oficial.

Palavras-chave: Santidade Popular, Antonio Ruiz de Montoya, Gabriele Malagrida

INTRODUÇÃO

Desde a fundação da Companhia de Jesus, muitos jesuítas, pelas suas vidas exemplares, foram reconhecidos oficialmente como beatos e santos. Na América colonial, os relatos de missionários apresentados como virtuosos serviram para propor à sociedade um modelo ideal de santidade pessoal, e para os membros da Companhia, como missionários jesuítas exemplares a serem imitados e venerados. Entretanto, nem todos os jesuítas propostos como modelos de santidade e de virtudes exemplares foram reconhecidos pelo magistério da Igreja Católica. Antonio Ruiz de Montoya e Gabriele

1 Este artigo é resultado das pes�uisas feitas pelo autor no �mbito do projeto �A contribui��o dos jesuí� Este artigo é resultado das pes�uisas feitas pelo autor no �mbito do projeto �A contribui��o dos jesuí�tas expulsos, em 1759, para o conhecimento das culturas indígenas das missões do Gr�o�Pará e Mara�nh�o”, �ue conta com a com a bolsa de pes�uisa P�G/FAPERGS.2 Este artigo é resultado das pes�uisas feitas pelo autor no �mbito do projeto �Jesuítas nas Américas”, �ue conta com a com a bolsa de pes�uisa CAPES/PROSUP, sob a orienta��o do Prof. Dr. Luiz Fernando Medeiros Rodrigues.

Page 2: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

256

Malagrida s�o exemplos deste n�o reconhecimento oficial pela hierar�uia da Igreja. Antonio Ruiz de Montoya, jesuíta limenho, foi missionário na Província Jesuítica

do Paraguay na primeira metade do século XVII. Como missionário da Companhia de Jesus, em solo guayreño, Antonio Ruiz de Montoya dedicou�se n�o apenas a aprender a falar a língua dos Guaranis, Gualachos, Guayanas, Guañanas, Guayanases, Cabelludos e Coronados3, mas lutar em favor do direito destes indígenas como súditos da Coroa Espanhola. O impulso de seus talentos, virtudes e sua extensa produ��o documental fez com �ue este jesuíta fosse aclamado santo pela popula��o de Lima e Asunción e comparado com o Francisco Javier, pelos seus companheiros de miss�o; com um poderosíssimo xam�, pelos indígenas; com outros padres �ue tiveram grande import�ncia no apostolado em solo americano, tais como: Huamán Poma de Ayala (1534� 1615), Bernardino de Sahagún (1499�1540), José de Anchieta (1534�1597), Bartolomé de Las Casas (1474� 1566), José de Acosta (1539�1600), pelos historiadores, antropólogos e linguistas4.

Gabriel Malagrida foi um jesuítas extraordinário. Homem de a��o, professor, escritor, dramaturgo e missionário entre colonos e indígenas do norte/nordeste do Brasil do séc. XVIII. Malagrida também foi um autêntico desbravador dos sertões nordestinos e das florestas da Amazônia. Além do grande dinamismo apostólico, Malagrida se distinguiu pelas funda�ões de seminários e casas de recolhimentos para as �convertidas”, realizando uma das mais importantes obras sociais e espirituais na�ueles tempos (1720�1760). Exímio pregador dos Exercícios Espirituais, será chamado duas vezes à corte portuguesa para pregar retiros de convers�o ao monarca D. Jo�o V e sua esposa, D. Marianna da Áustria. Por ocasi�o do terremoto de 1755 �ue destruiu Lisboa, Malagrida acusará a corrup��o no reino como causa do �castigo divino”, provocando a ira de Sebasti�o José de Carvalho e Melo (futuro mar�uês de Pombal). Será apontado como instigador moral do atentado a D. José I por Carvalho e Melo. Acusado de heresia, será julgado pelo tribunal da in�uisi��o de Portugal e condenado ao garrote. Seu corpo seria �ueimado e as cinzas dispersas no mar. Para a Companhia, o taumaturgo Malagrida é modelo exemplar de missionário e jesuíta.

ANTONIO RUIZ DE MONTOYA: APÓSTOLO DOS íNDIOS GUARANIS E GUALACHOS

Antonio Ruiz nasceu, na Ciudad de los Reyes (Lima, Perú), no dia 13 de junho de 1585. Filho natural de Cristóbal Ruiz (espanhol de Sevilha) e, de Ana Vargas (limenha). Aos cinco anos, Antonio ficou órf�o de m�e, sendo educado pelo pai �ue pretendia levá�lo para a Espanha, onde o menino seria educado de maneira crist�. Porém, isto n�o foi possível, devido ao fato de �ue o menino adoeceu, fazendo com �ue o pai desistisse da viagem e voltasse com ele para Lima. Perdendo o pai, aos oito anos, teve �ue resolver por si próprio os rumos de sua vida, �uando foi entregue nas m�os de tutores (JARQUE I, 1900: 54�55). Desta forma, a única coisa �ue foi respeitada pelos tutores, foi desejo de seu pai de matriculá�lo no Real Colegio San Martín, fundado pelos jesuítas na cidade. Depois

3 Jean Tiago Baptista, afirma �ue os relatos dos jesuítas representam �um bom exemplo das múltiplas escamoteadas sob uma única apresenta��o étnica. Ali �uatro povoamentos s�o ocupados exclusivamente pelos [indígenas do grupo lingüístico Macro-]Jê de ent�o, conhecidos entre os missionários como Guala�chos, Guañanas (também grafado como Guayabás, Guananás ou Gayanás) e Coroados, muitos inicial�mente identificados apenas como ‘caras de macaco’” (BAPTISTA, 2009: 110. Grifos nossos).4 CHAMORRO, 2007: 257.

Page 3: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

256 257

da inf�ncia, passou a viver de maneira turbulenta durante a juventude, abandonando os estudos e seguindo o caminho de uma vida licenciosa, �ue serviu para gastar a heran�a �ue havia recebido (Idem, ibid: 61�65). Tais fatos tiveram como conse�üência as amea�as de pris�o e a de ser desterrado. Esta vida desregrada, salvo as necessárias diferen�as, lembra a vida de Ignacio de Loyola antes de sua convers�o. Assim, pretendendo abandonar sua vida desregrada de um �uase vagabundo, dirigiu�se ao Vice Rei do Peru, solicitando permissão para seguir ao Chile, por dois anos, num plano de lutar contra os araucanos, um grupo considerado indomável. Quando estava a ponto de partir, teve um sonho estranho �ue o fez desistir da idéia. Na segunda tentativa de abandonar a cidade de Lima e, conse�uentemente, a vida complicada �ue tinha, decidiu ir para o Panamá (ROUILLON ARRÓSPIDE, 1997: 14).

Acreditamos �ue a sua forma��o em uma escola jesuíta, e por ter passado pelas vicissitudes da orfandade, ajudem�nos a entender os motivos �ue o levaram a �uerer ardentemente se confessar antes da viagem ao Panamá e a revolta �ue apresentou diante da negativa dada ao confessor �ue ele havia procurado para receber a absolvi��o (AGUILAR, 2002: 149). N�o se dando por vencido, Ruiz de Montoya foi, durante a noite, ao Colegio Máximo de San Pablo de la Compañía em busca de outro confessor. Após receber, do Pe. Juan Domínguez, a absolvi��o �ue tanto procurava, acabou conhecendo o Pe. Gonzalo Suárez, com �uem fez Montoya decidisse retomar a sua virtude abandonada por muitos anos. Foi esta disciplina, �ue o fez no ano de 1605 decidir retomar os estudos e a mudar de vida. Essa mudan�a, em parte, se deve ao fato de �ue o �tenía el P. Suárez un don especial para convertir a jóvenes de mala vida” (ROUILLON ARRÓSPIDE, 1997: 24). Ao recome�ar os seus estudos em linguística/gramática, dialética/lógica e retórica, foi aconselhado pelo seu diretor espiritual (Gonzalo Suárez) a entrar definitivamente para a Companhia de Jesus. Seguindo este conselho entrou para a Ordem de Santo Ignacio, fazendo os Exercícios Espirituais, entre os dias 20 a 28 de maio de 1605, no Colegio Mayor de San Pablo, onde terminou os seus estudos e foi admitido, em seguida, para o noviciado (Idem, ibid: 29).

Assim, em 1606, após ter passado por uma profunda convers�o, voltou ao Real Colegio de San Martín e iniciou os seus estudos superiores em Letras Clássicas, Humanidades (Literatura) e Retórica (modo de propor e meios de express�o). Os tra�os marcantes de personalidade n�o se anularam com a sua entrada na Companhia. Pelo contrário, o jesuíta os integra à�ueles típicos da forma��o jesuítica (ROUILLON ARRÓSPIDE, 1991: LXV). Do Real Colegio de San Martín, seguiria com a expedi��o de Diego de Torres Bollo em dire��o ao Chile. Para empreitada decidiu refazer os Exercícios Espirituais durante a viagem ao Chile. Acompanhou os seus companheiros para Santiago, onde permaneceram alguns dias. Prosseguiram para Córdoba de Tucumán, onde receberam orienta��o do padre Juan de Viana. Seria em Córdoba �ue Ruiz de Montoya daria prosseguimento aos seus estudos e receberia apenas um curso de teologia moral, antes da sua ordenação (JARQUE I, 1900:163�164). Consideramos como um fato importante, em meio a essa formação apressada, os exemplos de importantes nomes do grupo dos sete fundadores da Companhia de Jesus5.

5 Segundo Rabuske �os estudos superiores de Montoya – contra a tradi��o da Companhia! – tinham sido curtos, podendo dizer�se �ue n�o ultrapassaram em muito os dois anos inteiros. [...] Concedemos�lhe razões fundadas para o Estudo do Latim ou de Humanidades, tendo�lhe, contudo reservas �uanto à Filosofia. Em todo o caso achamos �ue n�o fez um Curso regular nem de Filosofia Escolástica, nem de Teologia” (RA�BUSKE, 1985: 51).

Page 4: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

258

Terminando seus estudos, foi ordenado junto a outros três estudantes, em 1611, na cidade de Santiago del Estero, por decis�o do padre Diego de Torres, com �uem foi no mesmo ano a Asunción (JARQUE I, 1900: 208). A chegada e o início do seu trabalho como missionário coincidiu com a promulgação das Ordenanzas de Alfaro, em 11 de outubro de 1611, em favor dos indígenas, na �uest�o da proibi��o do servi�o pessoal6. No ano seguinte, Antonio Ruiz de Montoya seria enviado, junto ao padre Antonio Moranta, à Província do Guayra para encontrar os padres José Cataldini e Simón Mascetta, fundadores das primeiras reducciones na regi�o: Nuestra Señora de Loreto del Pirapó e San Ignacio Miní (RUIZ DE MONTOYA, 1639: f. 7v [§ VII]).

A partir de sua chegada, o missionário passou a auxiliar os seus outros missionários nos cuidados espirituais dos guayreños e dos indígenas cate�uizados. Durante os anos

6 Na �Ordem do Tenente Geral do Governador do Paraguai e Rio da Prata”, consta a proibi��o da entrada de espanhóis na regi�o do rio Paranapanema, pelo governador Pedro de Añasco,da seguinte forma: �Por el presente mando al cap.ª Pero gar�ia y outra �ual�uer Justi�ia de guayra, �ue em ning.ª manera pre�isa ata �ue outra cosa se ordene y mande, no salgan ni embien a hacer malocas Jornadas ni entrada ning.ª a la Prov.ª del yparanapane y Atibaxiba, ni outro ningun rio �ue cayga em el paranapane, por�.to de presente se pretende redu�ir a los naturales della por médio del Padre Joseph Cataldino y el Pe. Simon Maseta de la compañia del nombre de Jesus a �uien lês esta cometida de dha redu�ion, antes para Ella lês acudiran y haran acudir com todo el favor y ayuda �ue fuere neccess.º por ser cosa tan del servi�io de dios nuestro Señor y de su magestad y bien de la tierra, ni menos consientan �ue ningún soldado ni vi�ino entre a in�uie�tar los indios con acha�ue de �ue van por la mita por�ue podría resultar alguna desorden, lo �ual guarden y cumplan y manden pregonar con penas públicamente por�ue asi conviene como del servicio de ambas majestades, �ues (sic) fecho en la assumpsion del Paraguay en veinte y seis días del mes de Nobiembre de mil y seiscientos y nueve años” (MCA I, 1951: 137). A proibi��o de nada adiantou, gerando uma situa��o problemática por parte dos jesuítas, �ue estavam no Paraguay, e guayreños, devido à excessiva exploração do trabalho indígena na extra��o da erva mate e as tentativas, por parte dos missionários de afastar os in�dígenas destes guayreños. �De modo �ue cuando Montoya llegó al Guairá, reinaba una gran insatisfacción en Ciudad Real y una hostilidad contra los ignacianos” (CHAMORRO, 2007: 253). Com isso, buscou�se como solu��o a presen�a do ouvidor do Conselho da Fazenda, Dr. Francisco de Alfaro. O ouvidor seguiu à Província do Paraguay para analisar o �ue estava ocorrendo na regi�o, dado o fato de �ue as rela�ões entre indígenas e guayreños, n�o estavam mais sendo cordiais, como ocorria no princípio da coloniza��o. As rela�ões foram evoluindo até chegar a insustentável explora��o do trabalho indígena, sob o pretexto de �ue eles deveriam pagar tributos ao Rei sob forma de encomienda. Cabendo ao Visitador Real, Francisco de Alfaro, o estabelecimento de �leis”, �ue receberiam o nome de �Ordenan�as de Alfaro”, cuja fun��o era regulamentar os princípios dos direitos indígenas. Evitando o acesso dos guayreños à comunidade indígena, afinal, estes estavam mais interessados em explorá�los. As leis foram aplicadas após o ano de 1611, entre�tanto, foram postas em prática de maneira bastante precária em diversos lugares, exceto onde estava sob a administra��o dos jesuítas. Isso se deve a uma significativa influência dos padres Diego de Torres e Mar�al de Lorenzana. As Ordenan�as acabaram de alguma forma ajudando para a melhoria da situa��o indígena, no �ue se refere às �uestões jurídicas, havendo, ao �ue parece, contribui�ões significativas por parte dos jesuítas. Isso demonstra �ue os missionários tinham �consciência de �ue o trabalho encomendado acirrava as rela�ões entre brancos e índios e valia�se desse acirramento para constituir e legitimar o processo redu�cional” (QUEVEDO DOS SANTOS, 2006: 106). Outra proibi��o de Alfaro foi a �uest�o do resgate dos índios, porém, devido as ineficiências do controle político, dos administradores espanhóis, muitas de suas Ordenan�as, n�o foram aplicadas. Todavia, as Ordenan�as n�o eram cumpridas em sua totalidade, passando a ter algumas limita�ões de algumas das ordens e, melhorias em outras tantas. Cabe lembrar �ue, contudo, as Ordenan�as n�o proibiam a encomienda, �ue obrigava os indígenas a pagarem tributos ao Rei e ao enco�mendeiros. O regime de encomienda fez com �ue houvesse cho�ues entre os guayreños e os jesuítas. Além dos já citados, autores como: ROUILLON ARRÓSPIDE, 1997: 58�65; AGUILAR, 2002: 153�154; TOR�MO SANZ e ROMÁN BLANCO, 1989: 55�57; 71�75; MELIÀ, 1988: 123�124; RUIZ DE MONTOYA, 1639: ff. 8r�11r [§§ VII�VIII]; dentre outros, tratam de maneira mais detalhada o assunto.

Page 5: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

258 259

de 1615 até 1622, Ruiz de Montoya se dedicou a constru��o da igreja da reducción de Nuestra Señora de Loreto, ao mesmo tempo em �ue seguia o exemplo dos primeiros jesuítas �ue chegaram a Província do Paraguay, ao utilizar�se das missões volantes para entrar em contato com os caci�ues (RABUSKE, 1985: 47). Foi através desta estratégia de reuni�o dos indígenas, �ue Ruiz de Montoya teve a possibilidade de observar as distin�ões existentes entre cada tribo contatada. Essa capacidade de perceber com rapidez, até mesmo os tra�os culturais mais sutis, tornou possível �ue a sua numerosa produ��o escrita fosse repleta de detalhes minuciosos em rela��o aos hábitos indígenas e às formas de estabelecer rela�ões sociais, através da compreens�o das diferen�as e do estabelecimento de maneiras para lidar com elas.

Isso o ajudou a ampliar os confins da Civitas Dei, cristianizando e �humanizando” os indígenas, protagonizando assim, junto aos padres Simón Mascetta, José Cataldini, Cristóbal de Mendoza, entre outros, os tempos heroicos das missões feitas pelos companheiros de Jesus, na Província Jesuítica do Paraguay. Com o conhecimento obtido e o auxílio dos outros jesuítas, Ruiz de Montoya tornou�se o principal responsável, entre os anos de 1622 até 1628, pelo impulso de fundar novas reducciones: San Javier, San José, Encarnación, San Miguel, San Pablo, San Antonio, Concepción de Nuestra Señora de los Gualachos ou Concepción de Nuestra Señora de los Guañanas, San Pedro, Los Angeles de Tayaoba, Arcangeles ou Siete Arcangeles, Santo Tomás Apostól ou Tomé, e, Jesús Maria7.

Entre os anos de 1628 até 1631, durou o período Entre os anos de 1628 até 1631, durou o período das invasões bandeirantes, chefiadas por Antônio Raposo Tavares e Manuel Preto, �ue destruíram as reducciones e aprisionaram um grande número de indígenas para o trabalho escravo nos engenhos de cana de a�úcar. O envolvimento das autoridades coloniais, tanto espanholas �uanto portuguesas, fez com �ue os jesuítas ficassem abandonados junto aos seus índios diante da violência dos paulistas. Foi decidido não lutar ou resistir às invasões, pois não havia como os indígenas se defenderem usando arcos e flechas contra os arcabuzes �ue os bandeirantes utilizavam (RABUSKE, 1985: 48).

A solu��o foi a de escapar dos bandeirantes abandonando o Guayra, em um êxodo organizado por Ruiz de Montoya �ue reuniu cerca de 12 mil indígenas, �ue aceitaram o plano fugir junto com os padres. A transmigra��o ocorreu em 1631, pelo rio Paranapanema, descendo o rio Paraná até às Sete Quedas. As balsas ou canoas foram jogadas com o intuito de enganar os bandeirantes, o �ue fez o �povo Israelico” seguir o resto do trajeto a pé até a regi�o mesopot�mica argentina (entre os rios Paraná e Uruguay), onde já existiam reducciones estabelecidas (RUIZ DE MONTOYA, 1639: f. 49r [§ XXXVIII]).

Do grupo �ue fugiu junto aos jesuítas restou o número de 4 mil índios, �ue ajudaram a fundar as novas reducciones de Nuestra Señora de Loreto e San Ignacio del Yabebirí. Neste período de crise, os jesuítas acabaram assumindo um papel de lideran�a junto aos caci�ues, ao demonstrarem seguran�a e firmeza diante das situa�ões de fome e epidemias, �ue ocorreram após a transmigra��o (GADELHA, 1985: 127�128). Nos anos seguintes,

7 Conforme Guillermo Furlong, �en la fundación de todas estas Reducciones intervino o como misionero o como superior de las misiones del Guayrá, el Padre Antonio Ruíz de Montoya, pero todas ellas fueron perseguidas y deshechas, en gran parte, por el sanguinario proceder de los paulistas” (FURLONG, 1962: 107). Para Ernesto Maeder e Ramón Gutiérrez foram �de ubicación y existencia incierta fueron las de San Pedro y de Concepción de Gualachos. También corresponden a esa área la ermita de Nuestra Señora de Copacabana y el Tambo de las minas de hierro” (MAEDER e GUTIÉRREZ, 2009: 21).

Page 6: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

260

estas duas reducciones, e as outras �ue foram criadas posteriormente, se estabeleceram; en�uanto as já existentes e as �ue estavam sendo fundadas nas regiões do Tape e Itatines8, sofreriam com o retorno dos bandeirantes.

Neste período, mais especificamente em 1636, Ruiz de Montoya foi nomeado Superior de Todas as Missões. Logo tratou de iniciar as visitas às reducciones, devido às amea�as de um iminente ata�ue por parte dos bandeirantes. A rea��o para os jesuítas decidirem tomar atitudes drásticas contra tais ameaças foi a invasão e destruição das reducciones do Tape, entre os anos de 1637 e 1638. Novamente, Ruiz de Montoya assumiu a organiza��o da fuga dos indígenas para a regi�o do Paraná e Uruguay, indo contra as ordens do Provincial Diego de Boroa, �ue n�o concordava com o abandono da regi�o.

Novamente, as autoridades coloniais nada fizeram para deter ou punir os bandeirantes. Tentando resolver o problema definitivamente os jesuítas organizaram a Sexta Congrega��o Provincial, onde foi decidido �ue Ruiz de Montoya e Francisco Díaz Taño seriam enviados para Madrid e Roma, respectivamente, para denunciarem os crimes cometidos pelos bandeirantes, a conivência das autoridades coloniais, a defesa do armamento indígena, como também, para pedirem o envio de novos missionários (MELIÀ, 2008: 6).

Díaz Taño conseguiu retornar ao solo americano (primeiramente no Rio de Janeiro, e, depois seguiu para a regi�o do Paraná e Uruguay) em 1640, trazendo consigo um grupo de novos missionários (MCA III, 1969: 329�334, 335�343); todavia, Ruiz de Montoya prosseguia em Madrid acompanhando o processo movido contra os bandeirantes e o de defesa do armamento (MELIÀ, 2008: 8). O armamento chegou às m�os indígenas, antes da resolu��o final do Conselho das Índias, pois em 1639 e 1640, o governador de Buenos Aires, Don Pedro de Lugo y Navarra, concedeu armas aos índios para �ue estes defendessem as reducciones do Paraná e Uruguay, nas batalhas de Caazapaguazú (1639) e M’bororé (1641)9.

8 Nesse ponto podem ser incluídas as reducciones do Paraná e Uruguai, as da regi�o do Tape e as do Itatines, a partir das considera�ões de Ernesto Maeder e Ramón Guitiérrez: �En el Paraná y Uruguay occidental se fundaron los siguientes pueblos: San Ignacio del Paraná o Guazú (1610), Encarnación de Itapúa (1615), Concepción de Nuestra Señora (1620), Corpus Chrsti (1622), Nuestra Señora de los Reyes de Yapeyú (1626) y San Francisco Javier (1629). En los afluentes del alto Paraná se ubicaron Nuestra Señora de la Natividad del Acaray (1624) y Santa María la Mayor del Iguazú (1626). […] Las reduc�ciones formadas al este del río Uruguay, fueron San Nicolás del Piratini (1626), Nuestra Señora de la Candelaria de Caazapamini (1627), Mártires del Caaró (1628), San Carlos del Caapí (1631), Apóstoles Pedro y Pablo, en Aricá (ex Natividad) (1632), Santo Tomé de Ibití (1632) y Nuestra Señora del Acaraguá o del Mbororé. De ubicación incierta resulta San Francisco Javier del Tabitiú, un sitio anterior del San Javier de 1629. Poco después, en camino a las serranías del Tape, se agregaron San Miguel (1632), San José (1633), Santa Ana del Igaí (1633), Jesús Maria del Ibiticaray (1633), San Joa�uín (1633) y Santa Teresa del Curití (1633). Las últimas fundaciones fueron San Cristóbal (1634) y Santo Cosme y Damián de Ibitimirí (1634). Incierta es la ubicación de la misión de Nuestra Señora de la Visitación. En la región del Itatín, las misiones sufrieron traslados, concentraciones y divisiones sucesivas. De los cuatro poblados iniciales, Ángeles de Tacuaty, San José de Ycaray, San Benito de Yray y Natividad de Nuestra Señora de Taragüí (1632), se formó uno en Yatebó (1634), para después, entre 1635 y 1647 dividirse en dos: Nuestra Señora de Fe y San Ignacio de Caaguazú” (MAEDER e GUTIÉRREZ, 2009: 21).9 As Batalhas de Caazapaguazú e M’Bororé foram muito importantes para o fim do ciclo de apresamento indígena por parte dos bandeirantes. Por�ue têm relev�ncia pelo empenho das lideran�as indígenas e dos jesuítas na defesa de suas reducciones. Segundo Kern, dentre os jesuítas, podemos colocar como um dos principais articuladores �o Irm�o Domingos de Torres, �ue participou como ‘assistente técnico�militar’ na orienta��o do ainda emergente exército guarani, nos importantes combates de Caa�apagua�u e M’Bororé (1639 e 1641), o responsável pela orienta��o e organiza��o da milícia das Redu�ões no momento mais

Page 7: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

260 261

A vitória nestas duas batalhas auxiliou Ruiz de Montoya na argumenta��o de �ue os indígenas tinham o direito de defesa como súditos da Coroa Espanhola, possibilitando �ue ele pudesse retornar, em 1643, a cidade de Lima, onde entregaria as Cédulas Reais para o Vice�rei do Perú, Don Pedro de Toledo y Leiva (FURLONG, 1962: 126). O missionário apenas conseguiu a autoriza��o do Vice�rei, após a chegada do ex�governador do Paraguay, Lugo y Navarra, �ue o ajudou a convencer as autoridades a liberarem o armamento (AGUILAR, 2002: 165�166).

Ainda em Lima, Ruiz de Montoya envolveu�se na defesa da Companhia de Jesus diante das acusa�ões feitas pelo bispo de Asunción, Don Bernardino de Cárdenas10, �uest�o esta �ue se prolongou pelos seus seis últimos anos de vida. Em Lima, o missionário dedicou parte de seu tempo aos cuidados espirituais dos escravos negros, a ensinar língua Guarani, dar orienta��o espiritual, e, escrever. Ao falecer em 1652, Ruiz de Montoya não era mais apenas um missionário, ele havia se tornando um padre santo, um xamã poderosíssimo vestido com uma soitana preta. Seus �filhos” foram buscá�lo em Lima para enterrar e manter o �Sol Resplandecente” (Quaracytî11) perto deles, na reducción de Nuestra Señora de Loreto (ROUILLON ARRÓSPIDE, 1997: 355).

SANTO PADRE XAMÃ

Desde a sua entrada na Companhia de Jesus (1605), Antonio Ruiz de Montoya come�ou a ser reconhecido pelos superiores como um santo. Os relatos dos provinciais do Paraguay reconheciam os seus feitos heroicos, visões proféticas e diversos milagres relacionados à convers�o dos indígenas. O primeiro provincial do Paraguay, Diego de Torres Bollo, foi o primeiro a observar as experiências místicas de Montoya, �uando este ainda era novi�o. Sonhos proféticos diziam a Montoya �ue ele logo seria enviado a um

importante da história do conflito entre jesuítas e bandeirantes. Militar de carreira, tornou�se membro da Companhia e terminou sendo o ‘mestre dos índios no manejo das armas de fogo’. Foi ele �ue feriu com um tiro na coxa o chefe paulista da Bandeira de Caa�apá�gua�u” (KERN, 1982: 188). Foi nessa mesma batalha de Caazapaguazú �ue o padre Diego de Alfaro morreu com um tiro no pesco�o. Como essas batalhas n�o s�o o tema da presente pes�uisa, consideramos oportuno indicar os estudos feitos por: TORMO SANZ e ROMÁN BLANCO, 1989: 220�225; AGUILAR, 2002: 287�351; dentre outros. O assunto também é trata�do na documentação jesuítica: MCA III, 1969: 303�314, 329�334, 345�368.10 O confl ito entre o Frei Bernardino de Cárdenas e a Companhia de Jesus, no Paraguay, iniciou após a O conflito entre o Frei Bernardino de Cárdenas e a Companhia de Jesus, no Paraguay, iniciou após a nomea��o de Cárdenas como Bispo da diocese de Assumpción por Felipe IV. Nas primeiras cartas envia�das pelo bispo ao rei, o primeiro demonstrava simpatia pela Companhia, contudo, após se interessar por uma propriedade na cidade de Assumpción pertencente aos jesuítas, amea�ou�os de expuls�o da Província do Paraguay. Para obter êxito na empreitada, aproveitou a nomea��o de Diego Escobar y Osório, como novo governador do Paraguay, para influenciá�lo contra os jesuítas. As inúmeras acusa�ões, feitas por Cárdenas contra os jesuítas, incluiriam o uso herético de palavras escandalosas, oriundas de um cate�cismo todo escrito em Guarani. Seguindo com o seu plano, aproveitou a morte de Escobar y Osório, para assumir o governo da cidade. Este fato perdurou até a nomea��o de Sebastián de Léon como governador interino de Assumpción, no mesmo ano da morte do governador, 1649. Como governante, Don Léon, restabeleceu a ordem, fazendo várias repara�ões aos danos sofridos pelos jesuítas e ordenou �ue o Bispo de Cárdenas fosse exilado à Chu�uisaca, local onde o bispo faleceu em 1666 (AGUILAR, 2002: 167�169; MELIÀ, 2008: 10�11).11 Os autores �ue retomaram este assunto foram: CHAMORRO, 2007: 259; ROUILLON ARRÓSPIDE, Os autores �ue retomaram este assunto foram: CHAMORRO, 2007: 259; ROUILLON ARRÓSPIDE, : 259; ROUILLON ARRÓSPIDE, 259; ROUILLON ARRÓSPIDE, 1997: 100; MELIÀ LITTERES, 2010: 72.

Page 8: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

262

campo repleto de selvagens, estando cercado por homens mais reluzentes do �ue o sol (RUIZ DE MONTOYA, 1997: 30). Ao ser enviado ao Paraguay, os relatos sobre essas experiências come�aram a ser abundantes. Visto pelos seus companheiros de miss�o como um var�o apostólico, homem de muita ora��o e de insigne santidade, tornou�se personagem principal de muitas cartas contando os seus sucessos. Os relatos de presen�a divina e sucessos vindouros, muito fre�uentes na Conquista Espiritual, s�o atribuídos nas caras �nuas (dos padres Diego Ferrer, Ignacio Hernat, Juan de Salas, José Cataldini, Simón Mascetta; além dos provinciais, Diego de Torres, Nicolás Durán Mastrilli e Pedro de Oñate) as visões proféticas e o constante �diálogo” �ue Montoya mantinha com a Virgem de Loreto. Esse �dom” tornou�se t�o evidente, �ue os indígenas passaram a considerá�lo a reencarnação do lendário xamã Quaracitî (Sol Resplandecente), �ue havia regressado para salvá�los. Após os �uase 30 anos como missionário no Paraguay, foi enviado para advogar na Corte madrileña pela causa do armamento indígena. Nestes 5 anos de vida cortes� (1638�1643), Montoya previu �ue só morreria ao regressar ao solo paraguaio (JARQUE IV, 1900: 239). Como relatado pelo padre Simón de Ojeda, esta previs�o se concretizou. Montoya, ao conseguir a libera��o do armamento indígena pelo vice�rei do Peru, pode chegar até Salta, contudo, precisou regressar a Lima para defender a Companhia de Jesus das acusa�ões feitas pelo bispo de Cárdenas (ASTRAIN V, 1916: 592�624). Ao falecer, em 11 de abril de 1652, os exemplos de sua santidade o fizeram ser aclamado como santo pelos moradores de Lima e Asunción. As autoridades eclesiásticas e coloniais, além dos populares, compareceram ao Colegio Maximo de San Pablo. Durante o enterro, grande parte dos presentes beijavam o corpo, outros tocavam os rosários. Pela �uantidade de pessoas tentando guardar reli�uias, fez com �ue o enterro fosse apressado para evitar �ue o desnudassem ou arrancassem os dedos e cabelos (ROUILLON ARRÓSPIDE, 1997: 355).

Seriam essas relí�uias (peda�os de batina ou trechos das cartas) �ue iniciariam os relatos dos milagres e cura de doen�as graves, atribuídos a Montoya. Os relatos desta santidade foram todos reunidos por Francisco Jar�ue (primeiro biógrafo de Antonio Ruiz de Montoya). O autor inicia relatando sobre o caso de uma senhora moradora de Lima, �ue sofria de um grave c�ncer �ue já estava alastrado por �uase todo o corpo. Ao receber uma relí�uia (uma carta escrita por Montoya), esta senhora encostou o papel em sua perna. No dia seguinte, estava curada das chagas e os vestígios da doen�a estavam todos impregnados no papel (JARQUE IV, 1900: 242�243). Contudo, foram os indígenas foram os �ue receberam maiores gra�as e milagres. Testemunhas das diversas vezes em �ue ficou �suspenso no ar” en�uanto estava em ora��o, das previsões, o aclamavam cada vez mais como um santo, o maior xam� de todos. No translado do corpo para as reducciones, os indígenas foram, mais uma vez, testemunhas da santidade de Montoya. Em meio a uma tempestade �ue destruiu as embarca�ões dos indígenas, a �ue se encontrava o corpo do jesuíta se manteve intacta.

O segundo caso relatado é o de Nicolás Ruiz, ajudante de Montoya nas missas. Ruiz tomado por uma disenteria �ue o fazia pôr sangue para fora ao colocar uma carta escrita por Montoya em seu ventre se curou. Trechos dessa carta foram distribuídos pelo padre Pedro Comentalli entre os devotos (Idem, ibid: 249). O terceiro caso de cura foi a de um índio carpinteiro �ue sofria do mesmo mal �ue o anterior. Ao colocar a carta sobre o local de enfermidade foi curado. O último caso, foi a de uma menina de 6 anos, filha de um caci�ue. A menina sofria de um problema cardíaco. Como era um caso mais grave, foi lhe dado várias tiras da carta para �ue sempre �ue precisasse, as pusesse sobre o cora��o.

Page 9: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

262 263

Tal fato, fez com �ue a menina nunca mais voltasse a sofrer do mal (Idem, ibid: 250).

GABRIELE MALAGRIDA, MODELO DE VIDA EXEMPLAR

Gabriele Malagrida nasceu aos 5 de dezembro do ano de 168912, numa pe�uena cidade comasca, Menaggio, da Diocese de Nova Como, �ue pertencia ao Ducado de Mil�o. Seu pai, Giacomo Malagrida, era doutor em medicina, médico particular dos Du�ues Farnese de Parma e Placência, Eduardo e Doroteia, parentes da rainha viúva de Espanha Elizabete Farnese; e mestre na arte médica na Academia Real de Turim. Religioso, Giacomo Malagrida, atendia os pobres, visitando os doentes com fre�uência, ainda �ue tivesse �ue percorrer longas dist�ncias a pé. A m�e de Gabriele Malagrida, Angela Rusca, era mulher religiosa e virtuosa. O casal tivera onze filhos (�uatro mulheres e sete homens); Gabriele era o �uarto entre os irm�os.

Na biografia escrita por Matias Rodrigues13, companheiro de Malagrida, em latim da época, o autor narra �ue desde o início da sua inf�ncia, Malagrida já se entregara e se submetia aos seus pais com piedosos e ótimos costumes. Construía em casa pe�uenos altares, aos �uais convidava seus amigos a reverenciarem por amor a religi�o; desprezando os jogos infantis para dedicar�se à virtude, com o seu exemplo. E, pelos costumes angélicos, recebera o alcunha de �Anjo”.

Com nove anos, foi enviado a Como, sendo inscrito entre os alunos do Colégio Gallio em 1698. Ali, na sexta�feira, 31 de mar�o de 1702, na Capela do andar superior, Malagrida, com 13 anos, será admitido aos �dois primeiros anos” do Seminário.

Neste período de estudos Gabriele Malagrida exercitou, sob a dire��o do P. César Airoldo, da Congrega��o Somasca14, a Gramática, a Retórica e a Filosofia. Segundo seu biógrafo, Malagrida se empenhava tanto nos estudos �ue por vezes era obrigado a relaxar. Contudo, n�o descuidava de partilhar o seu saber com os demais. Na Retórica e Poética foi t�o exímio �ue as suas anota�ões eram lidas e ouvidas por todos. Isto lhe valeu o convite a participar da academia em honra de Santo Tomás em S. Jo�o Pedementano. O progresso das letras se observa na virtude e piedade. Como fiel observador das normas do colégio, ao terminar os estudos de Filosofia, foi convidado a assumir o cargo de bedel para supervisionar os clérigos do colégio. De costume, este era um ofício �ue se encarregavam

12 Os catálogos referentes ao Maranh�o trazem a data de nascimento de Malagrida como sendo 18 de Os catálogos referentes ao Maranh�o trazem a data de nascimento de Malagrida como sendo 18 de dezembro (os primeiros) e 18 de setembro (os últimos, ARSI, Bras. 28, f. 6r). Matias Rodrigues registra no seu manuscrito a data de �14 dias das calendas de outubro”, isto é, 18 de setembro. Mas conforme o livro de registros batismais da Igreja Arcipetral de Menaggio, o seu nascimento é de 5 de dezembro de 1689. E esta é a data mais aceita. 13 Biblioté�ue Municipale D’Ajaccio [Córseca], Fonds Cardinal Fesch � Fonds Ancien. Cote � MSS Biblioté�ue Municipale D’Ajaccio [Córseca], Fonds Cardinal Fesch � Fonds Ancien. Cote � MSS 117: De vita Ven. P. Malagridae, e Soc. Jes., libri IV a P[atre] Math[ia] Rodriguez elecubrati. [Manu�scrit]. � Romae, [18° siècle], 1762.14 A Ordem dos Clérigos Regulares de Somasca ( A Ordem dos Clérigos Regulares de Somasca (Ordo Clericorum Regularium a Somascha � O.C.R.S.), também chamados de �Religiosos Somascos ou Somascos”, é uma ordem religiosa católica de tipo mona�cal, fundada por S�o Jerónimo Emiliano (Veneza, 1481 � Somasca, 1537), destinada a socorrer as crian�as órf�s e pobres. A ordem foi estabelecida em 1568, sobre a base da chamada �Companhia dos Servos dos Pobres” de 1534, constituída por sacerdotes e irm�os leigos �ue abandonavam o mundo para se dedica�rem às virtudes evangélicas e à assistência aos pobres nas obras fundadas pelo próprio Jerônimo. Progres�sivamente tomou a forma de congrega��o religiosa, passando a chamar�se posteriormente de �Somasca”, pela localidade onde se estabeleceu a sua sede.

Page 10: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

264

aos religiosos de fora do colégio, mas pela sua maturidade, Malagrida já o exercia, ao mesmo tempo �ue assistia aulas com os dominicanos, uma vez �ue o Colégio Gallio n�o tinha aulas de Teologia.

Dois episódios s�o indicados pelo biógrafo de Malagrida como causas motivadoras de sua opção à vida religiosa: o primeiro foi ao presenciar a devota morte de um religioso doente; o segundo, �uando representava uma pe�a teatral no colégio e deu�se conta do despojamento do Cristo crucificado, em contraste com os ricos trajes de cena �ue usava, animando�o a viver em modo símile.

Uma vez �ue o seu pedido para entrar na congrega��o dos padres somascos foi rejeitado, Gabriele Malagrida voltou para a sua família. E, como já tinha as ordens menores, com fre�uência exercia os ministérios correspondentes, além da doutrina crist�. Transferindo�se para Mil�o, entrou no Colégio Helvético e ali estudou um ano de Teologia Moral.

Aos 22 anos, pede para ser admitido ao noviciado da Companhia, mas tendo receio de comunicar pessoalmente a sua decis�o ao pai, parte para Mil�o, deixando uma carta para ser entregue pelo cunhado. Muito provavelmente, temia a oposi��o paterna, uma vez �ue o pai pedira o bispo de Como, um canonicato para o filho, e também por�ue o próprio bispo pensava em dar a Malagrida encargos na diocese. Em Mil�o, Malagrida teve �ue esperar por cerca de seis meses antes de ser aceito pelos jesuítas, sendo enviado logo depois ao noviciado em Gênova (aos 5 de novembro de 171115). Segundo os catálogos da Vice�Província do Gr�o Pará e Maranh�o, Malagrida tinha dois anos de Retórica, dois de Filosofia e três de Teologia.

Matias Rodrigues anota �ue desde este período, Malagrida despojava�se da veste do homem velho, vestindo a do homem novo, nula alus�o à carta paulina aos Efésios (Ef. 4, 22�23), acentuando a dedica��o de Malagrida no �combate” para se revestir das virtudes crist�s e vencer as atitudes desordenadas. O biografo ressalta a perfeita linearidade entre a vida do novi�o Malagrida e o costumeiro do noviciado da Companhia: silêncio e modéstia, ocupando o tempo inteiro da medita��o e o restante do tempo com coisas úteis; estudando a história da Companhia e de seus membros, para lhe imitar nas virtudes da caridade, da obediência, da humildade e da paciência, entre outras. Mas sobretudo, Matias Rodrigues sublinha a virtude da mortifica��o da carne, com abstinências e dos sentidos, com a flagela��o do corpo e outros rigores.

É importante notar �ue o papa Bento XIV com a De Servorum Dei Beatficatione et Beatorum canonizatione16, ao apresentar um �uadro completo da tradi��o eclesiástica em matéria de culto e de canoniza��o dos santos, modificou os critérios e as normas para o reconhecimento oficial da Igreja da santidade. No livro III, sobre as virtudes heroicas, o papa esbo�ava os contornos fundamentais do ideal católico da santidade, estabelecendo uma doutrina (na verdade, n�o nova) com maior precis�o terminológica. Inserido pela primeira vez o conceito pelo Colégio dos Salmaticenses17, numa suplica de 6 de fevereiro

15 Os catálogos da Província de Mil�o d�o como data de entrada na Companhia, 23 de outubro; o refer� Os catálogos da Província de Mil�o d�o como data de entrada na Companhia, 23 de outubro; o refer�ente à Vice�Província do Gr�o�Pará e Maranh�o, a 28 da�uele mês (ARSI, Bras. 28, f. 6r).16 Benedictus PP. XIV, Benedictus PP. XIV, De servorum Dei beatificatione et beatorum canonizatione. In Benedicti XIV ... olim Prosperi ... de Lambertinis Opus de servorum Dei beatificatione et beatorum canonizatione, nunc primum in septem volumina distributum. Editio novissima. In typographia Bassenensi, sumptibus Remon�dinianis. Venetiis, 1766.17 Trata�se do grupo de autores dos cursos de Filosofi a escolástica e Teologia Moral divulgados pelos Trata�se do grupo de autores dos cursos de Filosofia escolástica e Teologia Moral divulgados pelos mestres do colégio filosófico dos Carmelitas Descal�os de Alcalá de Henares, Espanha, e do colégio

Page 11: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

264 265

de 1602 ao papa Clemente VIII, para a canoniza��o de Teresa de Jesus, o conceito de heroicidade das virtudes come�ou a aparecer entre os anos de 1614 e 1616 nas rela�ões dos Uditores da Rota. Todavia, se o papa Urbano VIII n�o usava este conceito nos seus decretos, falava nas cartas apostólicas de 1629, com as �uais concedia o título de beato ad interim a Gaetano di Thiene e, em 1630, a Jo�o de Deus. Por conseguinte, com Bento XIV, a centralidade da fama miraculorum vem a ser substituída pelo novo conceito de conceito de fama sanctitatis (LEONI, 1992: 83). E esta era alcan�ada através do exercício em grau heroico das virtudes, na �ual a santidade, como maturidade plena da vida vivida coerentemente com a caridade se transformava na dimensão mais peculiar do cristão ideal, e por extens�o, do �jesuíta modelo”, segundo a imagem desenhada por Ignacio de Loyola nas Constitui�ões da Companhia18. Daí a constante insistência do biografo na precocidade da vivência destas virtudes por Malagrida. Seriam o testemunho mais importante, de acordo com os c�nones da época, para a sua santidade.

Sucessivamente ao tempo em Gênova, Malagrida volta a Mil�o para os estudos humanísticos (Retórica), onde fez o seu período de magistério. Passou dois anos em Adjaccio (Córsega), ensinando gramática e onde compôs a pe�a teatral, o Ammanus, com tema devocional. Ali também se ocupa dos alunos internos do colégio e do ensino de catecismo para os de fora. Depois foi para o colégio de Nice por um ano e mais outro ano em Vercelli. De volta à Gênova, fez mais um ano de Teologia, sendo ordenado em julho de 172119.

En�uanto esteve em Gênova, Malagrida escreveu uma carta para o Geral Tamburini20, pedindo para ser enviado para as missões na Índia. A ocasi�o se apresentou com a passagem do P. Visitador Bento da Fonseca, buscando jesuítas para a Vice�Província do Maranh�o, em 1719. De Gênova partiu para Lisboa e, de lá, para S. Luís do Maranh�o, onde chegou no fim do ano de 1721, com 30 anos de idade. Muito embora pedisse para ser enviado como missionário às aldeias indígenas, Malagrida ainda necessitava concluir os estudos de letras e prestar o seu �examen ad gradum”21.

Novamente, o biógrafo Matias Rodrigues anota �ue, contrariamente ao �ue se deveria esperar, Malagrida aplicou�se nas confissões, dentro e fora do colégio de S. Luís, nas prega�ões e em outros ministérios próprios da Companhia, sem deixar de se dedicar com afinco à prepara��o do exame. Restará no Maranh�o até 1753. Deste primeiro período de missão no Brasil, os testemunhos sobre a vida cotidiana de Gabriel Malagrida abundam de informações hagiográficas, por vezes exageradas, uma vez que as poucas fontes que foram conservadas são quase todas favoráveis a Malagrida. Nos arquivos,

no entanto, poucas informações de fontes não jesuítas podem ser encontradas. Suspeita-se que, depois da cruenta execução de Malagrida e da expulsão da Companhia de Portugal, o ministério pombalino, na sua política anti-jesuítica, tenha censurado e eliminado muita

documentação sobre Malagrida.

teológico de Salamanca (Colegii Complutensis). 18 Sobre as Virtudes na Companhia de Jesus, veja�se: Sancti Ignatii de Loyola Constitutiones Societatis Jesu. Tomo I: Monumenta Constitutionum praevia; Tomo II: Textus hispanus [ed. por A. Codina], Romae: IHSI, 1934, 1936 (= MHSI 63 64), nn. 813; 671; 637; 260; 263; 148,156; 66�68,98,285,297; 117; 340; 518; 486; 582; 522; 516,520,819; 55,256; 48; 523; 624; 431; 423; 725�728.19 ARSI, ARSI, Med. 63, f. 186r.20 ARSI, ARSI, Med. 41, f. 133r.21 É o exame fi nal �ue compreende toda a Filosofi a e Teologia, depois do �ual é considerada concluída É o exame final �ue compreende toda a Filosofia e Teologia, depois do �ual é considerada concluída a forma��o de estudos do jesuíta e �ue antecedia a profiss�o perpetua na Companhia. Do bom desem�penho neste exame dependia a concess�o da profiss�o de 4 votos e a possibilidade de acesso a cargos de governo.

Page 12: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

266

O que se pode recolher com segurança dos testemunhos nos documentos que se conservaram permite traçar um regime de vida segundo o qual Malagrida era incansável, grande orador popular, completamente dedicado ao apostolado, à oração e à penitência

corporal. O P. João Brewer, seu companheiro de missão, assim descrevia uma sua jornada típica:

Durante o ano de 1747, o P. Malagrida morou comigo na Miss�o do Ibiapaba, de 5 a 17 de fevereiro, e pude observar o seu modo de viver. Depois de um brevíssimo sono, e deita uma rigorosa flagela��o, se preparava para a medita��o. Depois de recitar as hora canônicas dirigia�se ao confessionário, onde permanecia até às 10:00. Em seguida, subia ao tablado, elevado para este fim na igreja, onde explicava a doutrina crist�, depois da �ual, suposta a santa confiss�o, se preparava ao santo sacrifício da missa, �ue celebrava com grande devo��o dentro da meia hora, segundo as prescri�ões. Fica em a��o de gra�as até a primeira hora da tarde e, às vezes, além. De volta para casa, comia alguma fava ou um pouco de leite, deixando a farinha brasileira, e, em lugar da farinha, vez por outra, acrescentava como complemento um bocadinho de café, ou um ou dois �mondubi” [amendoim], �ue é um fruto com um núcleo de pe�uena noz, de cor e de sabor n�o diferente, de tamanho um pouco maior. Quase sempre se absteve de carne e peixe.No entanto, en�uanto comia, ou se ocupava ao mesmo tempo em escrever cartas ou escutava a leitura de algum capítulo da Imitação de Cristo. E esta exígua refei��o lhe bastava por 24 horas. Concluído o ofício divino, preparava o serm�o, na �ual pregava com tanta devo��o e zelo, �ue às vezes lhe chegava a faltar a voz, e, se por ventura, durante o serm�o lhe faltasse um vocábulo em português, supria�o com um latino ou italiano. O mesmo acontecia ao escrever cartas. Terminado o serm�o, atendia as confissões e as medita�ões até tarda noite. O venerável P. Malagrida era de estatura mediana, benévolo e alegre na conversa��o, e, embora tratasse o seu corpo com contínuos jejuns e trabalhos, todavia n�o apresentava macilência; pelo contrário, o seu rosto era sempre hilariante e benigno, as faces rubicundas, de cabelos cor castanho, �ue davam um pouco ao preto e [a barba] totalmente branca. A mais perfeita representa��o do P. Gabriele Malagrida é dada pela estátua de S. Francisco Xavier, com 4 palmos de altura, �ue se conservava sobre o altar maior, do lado do Epístola [à direita do altar], na igreja da Miss�o de Ibiapaba, tendo em conta �ue esta imagem tinha a barba de cor castanha (MURR, 1788: 41)22.

Neste relato, é importante ressaltar a rela��o de simetria entre Malagrida e o grande apóstolo das missões no Oriente e co�fundador da Companhia, Francisco Javier. Aliás, para se ter a no��o da import�ncia desta rela��o, deve�se considerar �ue a própria canoniza��o do fundador da Companhia, Ignacio de Loyola, foi muito favorecida pela causa de canoniza��o do próprio Francisco Javier, �ue justamente a partir de 1748 foi considerado o patrono das missões. Alguns comentaristas afirmam �ue sem Francisco Javier, a causa de canoniza��o de Ignacio teria sido bem mais difícil. O acostamento destes dois jesuítas, Malagrida e Francisco Javier, evocam portanto o protótipo modelar do missionário na Companhia.

O P. Ro�ue Hunderpfund, também companheiro de Malagrida nas missões do Maranh�o, relatava �ue:

22 Para todo o relato do P. Brewer, ver as pp. 41�54 (trad. do latim).

Page 13: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

266 267

Nas vastas zonas desérticas do Brasil, na maior parte das vezes, viajava a pé, e nunca fez uso de alguma bebida inebriante; de nada mais se nutria se n�o somente de legumes e de frutas. Era de estatura média, de corporatura magra, só pele e ossos, todavia com olhos vívidos e luminosos, alegre no rosto e de colora��o rósea, os cabelos de cor castanho claro, a barba muito longa e toda branca, bran�uíssima. Assim o vi no Maranh�o de volta do Brasil em 1747, �uando tinha 60 anos (MURR, 1788: 300).

O território de apostolado do P. Malagrida abrangia o Pará�Maranh�o até a Bahia e Nordeste, cerca de 2.000 km. Como companhia de viagem, Gabriele Malagrida levava consigo uma imagem de Maria, a �ual usava para as suas prega�ões populares, levando�a em prociss�o ao final das missões. À imagem, o povo do sert�o atribuía prodígios extraordinários, e ao próprio Malagrida como um �taumaturgo”. Especial aten��o pastoral, a exemplo do próprio fundador Ignacio de Loyola, o jesuíta italiano dedicava às públicas pecadoras, para as �uais empenhou�se na funda��o de institutos de recolhimento. Além do povo em geral, Malagrida foi particularmente sensível às necessidades do clero secular; ora reavivando a vida crist�, ora promovendo, sob o seu estímulo e exemplo, a�ões de mutir�o para o reparo das igrejas.

Um exemplo desta vitalidade pastoral de Malagrida foi registrada na carta do consultor de D. Jo�o V, D. Frei Inácio de Santa Teresa.

Apresentando�me o vigário [de Est�ncia, Sergipe] a lamentável situa��o de abandono e de pouco zelo dos fieis da sua igreja, fiz uma prega��o com tanta for�a e felicidade, �ue me presentearam 900.000,00 réis em dez dias, além de �uanto me prometeram recolher nos dias seguintes. Tudo ficou nas m�os do vigário. E para dar maior calor às missões, na tarde do último dia, convidei todos a carregarem pedras e eu mesmo fui com eles com os meus dois companheiros jesuítas. Que espetáculo belo e santo de ver�se. Toda a�uela multid�o (foram mais de 4.000 pessoas, segundo os cálculos dos meus companheiros) correu ao glorioso trabalho, carregando n�o mais ad pompam e cantando os hinos das missões. Limparam todo o rio, �ue estava cheio de pedras. E, como na�uele momento n�o havia bois para ajudar no transporte, n�o se envergonhou uma boa escolta de valentes jovens de puxar uma carreta como se fossem eles mesmos os bois. Cena �ue n�o sei se convidava mais a rir pela novidade ou a chorar pela devo��o e ternura �ue inspirava (BNP, Reservados, cód. 1527: ff. 603ss).

Malagrida nunca deixou de ser homem de letras. Além de incansável e din�mico missionário popular e junto aos índios, sem nunca deixar o apostolado dominical, viajando a pé toda a noite do sábado, também foi professor de Teologia para os alunos da Companhia (por 4 anos).

Deve�se a sua iniciativa a cria��o de seminários diocesanos pelo norte�nordeste do Brasil. Especialmente no norte/nordeste brasileiro, o clero secular era escasso e com má forma��o teológica. Fundou seminários na Paraíba (1745), em Belém (1748), em S. Luís do Maranh�o (1752) e já se preparava para fundar um também no Rio de Janeiro, �uando foi chamado à Lisboa. Todavia, a funda��o de seminários encontrou n�o poucas dificuldades, a come�ar pela oposi��o do bispo do Maranh�o, ao �ual competia essa faculdade, segundo os c�nones do Concílio de Trento. Na verdade, muito embora estivesse munido de cédulas reais �ue lhe permitiam a funda��o de seminários, no tempo de D. Frei Miguel de Bulhões, bispo do Pará, Malagrida entrou em cho�ue tanto com o bispo, �uanto com o próprio governador, irm�o de Sebasti�o José de Carvalho e Melo. O

Page 14: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

268

problema recaía numa das condi�ões necessárias para a aprova��o real das funda�ões: a garantia de auto�sustenta��o dos seminários.

Malagrida também se empenhou na funda��o de casas de recolhimento de �convertidas”. Fundou bem dois conventos destinados a elas: em 1738 a�uele de Soledade, na Bahia; e em 1742, a�uele de Iguara�u, em Pernambuco. Os dois dedicados ao Sagrado Cora��o de Jesus. No momento da sua primeira volta ao Reino, em 1750, Malagrida tinha fundado 4 conventos para irm�s, 3 casas para as prostitutas convertidas e 3 seminários, além da reconstru��o de várias igrejas.

A sua a��o também se estendeu às missões entre os indígenas do Maranh�o: os Aruás, Caicaizes, Guanarés, Barbados, Gamellas, Cerobis e Harois. N�o poupou esfor�os para missionar estes grupos, contados entre os mais difíceis pelos demais missionários. Além da diversidade de língua e cultura, havia ainda as normais dificuldades da geografia e topografia típicas do norte do Brasil: desertos cheios de capoeiras e pedras, e longas dist�ncias de navega��o em canoa por rios. Os imprevistos eram muitos. Certa vez, ao virar a canoa em �ue navegava, ele �ue n�o sabia nadar, foi salvo por dois índios remeiros, os �uais lhe fizeram entender �ue se desejasse ser levado à margem do rio, deveria aumentar a recompensa combinada (machados, facas, imagens, contas de vidro, anzóis...); ou ainda, depois de entregar todos os dons �ue levava consigo, os índios Caicaizes o abandonaram num bos�ue, sem se�uer lhe deixar um pouco de comida, �ue davam aos seus c�es. Malagrida se salva, comendo a sua cinta das suas cal�as e alguns frutos do mato. Ou como �uando os Guanarés o amarraram a um tronco e iniciaram a dan�a da morte. No momento em �ue estava para ser abatido, uma velha do grupo o salvou contando �ue uma outra tribo (os Caicaizes), depois de terem matado e comido o P. Villar tinha sido infectada por uma grave epidemia. Empurrado até uma canoa no rio Itapicuru, foi expulso da regi�o.

A dificuldade em con�uistar a confian�a das tribos indígenas um foi dos maiores desafios na missiona��o de Malagrida. Escrevendo ao P. Geral, aos 4 de agosto de 1727, Gabriele Malagrida manifestava o seu desacordo com os métodos da política geral de �pacifica��o” dos índios, sentindo�se inclusive incompreendido e, até mesmo, manipulado pelos seus superiores, �ue apoiavam as expedi�ões punitivas dos portugueses contra os indígenas revoltosos (ARSI, Bras. 26, ff. 252r�255v).

Em 1754, depois de ter passado 30 anos no Brasil, Malagrida volta definitivamente para Portugal, a pedido da rainha�m�e, D. Marianna d’Austria, �ue o havia conhecido em 1750, �uando pregava exercícios espirituais, atendia ao rei D. Jo�o V e buscava ajuda financeira para as obras �ue fundava no Brasil. Agora, o missionário recebia a tarefa de preparar à morte a rainha e fundar casas de exercícios no palácio real e em outros lugares do reino. Algumas dificuldades com o provincial frearam as suas inciativas. Por ocasi�o do terremoto de 1755, Malagrida entregou�se completamente ao auxílio das vítimas, estimulando�as a convers�o, e imputando à corrup��o dos costumes a causa do �castigo divino”.

Estas ideias colocou�as por escrito no panfleto Juizo da verdadeira causa do terremoto que padeceo a corte de Lisboa... (MALAGRIDA, 1756, BNP, Reservados, cód. 6.688 P.). As tensas rela�ões entre a Companhia de Jesus no Brasil e em Portugal com o ministro de D. José I, Sebasti�o José de Carvalho e Mello, se complicaram. Carvalho atribuiu a Malagrida a acusa de ser a sen�o a causa, uma das causas da ira divina contra Lisboa. O fato forneceu ao ministro elementos �ue azedaram ainda mais a rela��o da Companhia com a monar�uia. Poucos anos depois, em 1759, por ocasi�o de um atentado contra o rei, a Companhia seria expulsa do Brasil e supressa no reino de Portugal. Seus

Page 15: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

268 269

membros encarcerados ou expulsos para os Estados da Igreja. Malagrida dera exercícios espirituais à Mar�uesa dos Távoras.

Em 11 de janeiro de 1759, sem �ual�uer acusa formal, foi aprisionado com outros, como inspirador moral do atentado ao rei. Mas, en�uanto os envolvidos no atentado foram sentenciados e brutalmente executados, Malagrida n�o foi envolvido nem no juízo, nem na senten�a de condena��o. Malagrida foi incriminado pelo Tribunal da In�uisi��o de Portugal, controlado pelo irm�o de Sebasti�o José de Carvalho e Mello (Paulo), por heresia, falsas profecias e obscenidade. O objetivo era destruir a fama de santidade de Malagrida, desacreditando o nome da Companhia em Portugal.

Em 21 de setembro de 1761, com uma grande manifesta��o pública organizada, Malagrida foi arrastado pelas ruas de Lisboa, com as m�os amarradas às costas, com a boca amorda�ada com um peda�o de madeira, levando na cabe�a uma espécie de mitra de papel, vestindo a batina de jesuíta. Em pra�a pública, foi garroteado. Seu corpo foi �ueimado e suas cinzas lan�adas ao mar. Tinha 72 anos de idade.

CONCLUSÃO

Nos corpus dos escritos �ue formam as principais fontes da espiritualidade inaciana, a �virtude” ou �virtudes” se referem a contextos muito variados e com �ualifica�ões e significados diferentes. Nos textos inacianos, encontramos o uso do termo �virtude” em rela��o ao significado medieval de �virtus”. Em geral, este termo latino era utilizado para significar o �ue se poderia traduzir por �for�a” (dynamis) de Deus, da �ual fala S. Paulo, e a �virtus” (areté) de Aristóteles. Em alguns textos inacianos, o primeiro sentido, i.e., de dynamisi tem uma conotação não moral, e se refere ao poder ou a força divinas (EE 2). Mas é o segundo sentido �ue mais abunda na literatura inaciana. E esta sim, tem uma conota��o fortemente moral, mas sempre no contexto da vida crist� (ou, no caso das Constitui�ões e outros escritos da Companhia, na vida religiosa na Companhia de Jesus) e no horizonte teologal no �ual as virtudes humanas n�o se concebem sem a virtus divina.

Em geral, tanto no singular, �uanto no plural, o termo �virtude” se refere a uma ideia comum �ue a relaciona com a vida moral da pessoa, i.e., de uma vida segundo a ordem moral, vida de integralidade, íntegra ou segundo o reto modo de proceder. Daí �ue à �virtude” se associe a �bondade” (Const. 813, por exemplo). Por isso, na ótica da Companhia, há uma estreita rela��o (�uase �ual �causa e efeito”) entre �virtude” e o �hábito de fazer o bem” (en�uanto habilidade ad�uirida mediante o exercício perseverante de uma determinada atividade), ou a constante dispositio do espírito na virtude da �ual se vive retamente ou se atua em conformidade com a lei moral. É neste sentido �ue nos textos fundacionais da Companhia se enfatiza a import�ncia capital das práticas concretas para a a�uisi��o da virtude e para de distanciar de todas as afei�ões desordenadas [EE 245]. As narra�ões sobre a vida de Antonio Ruiz de Montoya e Gabriele Malagrida entram dentro deste horizonte conceitual.

Os exemplos acima mostram os autores escreveram as �vidas” de Antonio Ruiz de Montoya e de Gabriele Malagrida considerando os conceitos do �ue se entendia como História nos séculos XVII e XVIII para os fins de um processo de beatifica��o e/ou canoniza��o. Fundamentalmente, tratava�se de uma forma narrativa �ue objetivava

Page 16: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

270

mostrar vícios e, sobretudo, virtudes heroicas. O caráter retórico deste tipo de narra��o n�o tem por objeto contar a verdade no sentido moderno do termo, mas �moralizar” a partir do verossímil. Verossimilidade e fic��o só se separariam a partir do séc. XIX e, portanto, conforme a História, de acordo com o modelo vigente clássico dos sécs. XVI a XVIII, é um gênero da Gramática (assim como a literatura), regulada pelas regras da retórica. Neste sentido, as vidas exemplares dos dois jesuítas descritos neste artigo respondem a esta expectativa, na medida em �ue seguiam as regras retóricas clássicas, além do conceito de �virtude” da tradi��o crist� e �virtudes heroicas” de Bento XIV. Isto, como já se acentuou, provocou uma mudança de eixo na centralidade da fama miraculorum, pela sua substitui��o pelo conceito de fama sanctitatis. Além disto, como a Retórica propunha a persuas�o através do ensinar, divertir e transformar, estes três aspectos estar�o presentes nas narra�ões das vidas exemplares: ensinar verdades morais�dogmáticas e virtudes, divertir o ouvinte e transformar os sentimentos, isto é, imitar as virtudes.

Como tais narrativas se destinavam a um amplo público de leitores, tanto ad intra �uanto ad extra da Companhia, os autores das �vidas”, �ue a�ui apresentamos como exemplo, sublinharam com insistência as �virtudes heroicas” dos dois jesuítas descritos. Indiretamente, opondo�os aos modelos n�o virtuosos de missionários e de leigos. Implicitamente, narram uma Historia magistra vitae (conforme o conceito clássico de Cícero). Daí a abund�ncia dos testemunhos �à vista”, orais e escritos de pessoas �ue ou tinham convivido com os personagens exemplares ou deles tinham ouvido falar de forma bem precisa. A afirma��o de �ter visto” ou do �ter ouvido” atestava a verossimilidade do narrado e, ao mesmo tempo, dava legitimidade à vida exemplar. Mas n�o só, as narra�ões �localizam” os personagens exemplares dentro de uma din�mica clássica histórica (conforme Cícero, a História como res gesta), incluindo�os dentro do plano de salva��o. Neste sentido, a narrativa sobre estes personagens aparece como uma autêntica rerum gestrarum, isto é, rica em detalhes �ue possibilitassem recuperar uma história, conta�la, mais �ue fazer a história. Por isso mesmo, a história destes missionários virtuosos é magistra vitae; por�ue suas vidas revelam atitudes e virtudes dignas de serem imitadas, servindo para o bem viver dos demais jesuítas, por exemplo. E este era o objetivo de tais narra�ões: ensinar e estimular a imitar as virtudes. centralidade da fama miraculorum vem a ser substituída pelo novo conceito de fama sanctittatis. Disto resultava, finalmente, um modelo exemplar de jesuíta missionário e de crist�o.

REfERêNCIAS BIBLIOGRáfICAS

MANUSCRITOS

Carta do P. Gabriele Malagrida, missionário no Brasil, a D. Frei Inácio de Santa Teresa, bispo dos Algarves, conselheiro de D. Jo�o V, in BNP, Reservados, cód. 1527, ff. 603ss.Cópia de uma Carta do P. Gabriel Malagrida, missionário do Maranh�o, ao P. Geral. Maranh�o, 4 de agosto de 1727., ARSI, Bras. 26, ff. 252r�255v.De vita, morte, et causa mortis Gabrielis Malagridae Jesuitae. Manuscrito, ARSI, Vitae, 64.

Page 17: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

270 271

Vita del P. Gabriele Malagrida della Provincia del Maragnone. Manuscrito, ARSI, Vitae, 94.ARSI, Bras. 28, f. 6r.ARSI, Med. 63, f. 186r.ARSI, Med. 41, f. 133r.De vita Ven. P. Malagridae, e Soc. Jes., libri IV a P[atre] Math[ia] Rodriguez elecubrati. [Manuscrit]. � Romae, [18° siècle], 1762.Biblioté�ue Municipale D’Ajaccio [Córseca], Fonds Cardinal Fesch � Fonds Ancien. Cote � MSS 117.

OBRAS EDITADAS

AGUILAR, Jurandir Coronado. Conquista Espiritual: A História da Evangeliza��o na Província Guairá na obra de Antônio Ruiz de Montoya, S.I. (1585�1652). Roma: Pontifícia Universitá Gregoriana, 2002.

ASTRAIN, Antonio de. História de La Compañía de Jesús en La Asistencia de España: Vitellesch, Carrafa, Piccolomini (1615�1652). Tomo V. Madrid: Administración de Razón y Fé, 1916.

AZEVEDO, Jo�o Lúcio d’. Os Jesuítas no Grão-Pará: suas missões e a coloniza��o. Coimbra: Impr. da Universidade, 1930.

BAPTISTA, Jean. T. O Temporal: sociedades e espa�os missionais. S�o Miguel das Missões: Museu das Missões, 2009.

________. O Eterno: cren�as e práticas missionais. S�o Miguel das Missões: Museu das Missões, 2009.

BENEDICTUS PP. XIV. De servorum Dei beatificatione et beatorum canonizatione. In Benedicti XIV... olim Prosperi... de Lambertinis Opus de servorum Dei beatificatione et beatorum canonizatione, nunc primum in septem volumina distributum. Editio novissima. In typographia Bassenensi, sumptibus Remondinianis. Venetiis, 1766.

BORJA GÓMEZ, Jaime Humberto. Historiografía y hagiografia: vidas ejemplares y escritura de la historia en el Nuevo Reino de Granada. Fronteras de la Historia, 12, pp. 53�78, 2007.

BUTIÑÁ, Francisco. Vida del P. Gabriel Malagrida de la Compañía de Jesús, quemado como hereje por el Marqués de Pombal. Barcelona: Impr. de Francisco Rosal y Vancell, 1886.

CAEIRO, José. Jesuítas do Brasil e da Índia na perseguição do Marques de Pombal. (De exílio Provinciarum Transmarinarum Assistentuae Lusitanae Societatis Jesu). Academia Brasil. de Letras. Baía: ETS, 1936.

CHAMORRO, Graciela. Antonio Ruiz de Montoya: promotor y defensor de lenguas y pueblos indígenas. História Unisinos, v. 11, n.2, pp. 252�260, maio/agosto de 2007.

CORTESÃO, Jaime. Manuscritos da Coleção de Angelis I. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1951�1969.

COUTINHO, Marcus Odilon. O Livro proibido do Padre Malagrida. Jo�o Pessoa:

Page 18: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

272

UNIGRAF, 1986.

ECKART, Anselmo. Memórias de um Jesuíta prisioneiro de Pombal. Braga/S�o Paulo: L.A.I./Loyola, 1987.

FRANCESCO, Leoni. I processi di canonizzazioni attraverso i secoli: problemi e prospettive. In: OTRANTO, Giorgio; PALESE, Salvatore [ed.]. Giacomo Varingez da Bitetto: fra storia e culto popolare. Per Storia dela Chies adi Bari. Bari: Edipuglia, 1992.

FURLONG, Guillermo. Misiones y sus pueblos guaraníes. Buenos Aires: Imprenta Balmes, 1962.

GADELHA, Regina Maria d’A�uino Fonseca. Montoya e as rela�ões de produ��o nas missões. Anais do VI Simpósio Nacional de Estudos Missioneiros - Montoya e as reduções num tempo de fronteiras. Santa Rosa: Fac. Filos. Ciências e Letras Dom Bosco, 1985, pp. 119�131.

GOVONI, Ilário. Pe. Malagrida, o missionário popular do Nordeste. Porto Alegre: L.E. P. Reus, 2000.

________. Gabriele Mlagrida. martire di ieri, modelo per oggi. In: Civiltà Cattolica, ano 141, vol. 4/3367�3372, pp. 119�130, 1990.

JARQUE, Francisco. Ruiz de Montoya en Indias (1608-1652) [1662]. Madrid: editado por Victoriano Suárez, 1900 (Volumes I e IV).

KERN, Arno Alvarez. Missões: uma utopia política. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1982.

KRATZ, Wilhelm. Der Prozess Malagrida nach den originalakten der in Torre doTombo in Lissabon. In: Archivum Historicum Societatis Iesu, 4, pp. 1�43, 1935.

LAMEGO, Alberto. Pela terra Goytacaz. Bruxelas/Niterói: Ed. d’ Art Oficial, 1923�1941.

LEITE, Serafim, História da Companhia de Jesus no Brasil. 10 vols., RJ/Lisboa: Civ. Bras./INLP, 1938�1950.

MAEDER, Ernesto J.A.; GUTIÉRREZ, Ramón. Atlas territorial y urbano de las misiones jesuíticas de guaraníes. Argentina, Paraguay y Brasil. Sevilla: Consejería de Cultura, 2009.

MALAGRIDA, Gabriel. Juizo da verdadeira causa do terremoto que padeceo a corte de Lisboa no primeiro de Novembro de 1755 / pelo padre Gabriel Malagrida da Companhia de Jesus, Missionario Apostolico. Lisboa: Oficina de Miguel Soares, 1756 (BNP, Reservados, cód. 6.688 P.).

MARTÍNEZ, Julio Luis. Virtudes. In: CASTRO, José García de [dir.]. Diccionario de Espiritualidad Ignaciana (G-Z). Grupo de Espiritualidad Ignaciana. Madrid: Mensajero/Sal Terrae, 2007, pp. 1774�1778.

MELIÀ, Bartomeu. El guarani conquistado y reducido: Ensayos de etnohistoria. Asuncion: Universidad Catolica, 1988.

________. Un catecismo bilingüe en guaraní y castellano. In: RUIZ DE MONTOYA,

Page 19: CONSTRUÇÃO DA SANTIDADE E ESCRITURA DA HISTÓRIA. ANTONIO · Antonio Ruiz de Montoya ... provocando a ira de Sebasti o José de Carvalho e ... Seguindo este conselho entrou para

272 273

Antonio. Catecismo de la lengua guarani (1640). Asunción: Centro de Estudios Paraguayos �Antonio Guasch” (CEPAG)/ Fondec, 2008, pp. 5�35.

MENDONÇA, Marcos Carneiro de. A Amazônia da era pombalina. S�o Paulo: Gráfica Carioca, 1963 (3 volume).

MURR, Christoph Gottlieb von (Hrsg.). Journal zur Kunstgeschichte und zur allgemeinen Literatur. Bd. XVI, Nürnberg, 1788.

MURY, Paul. História de Gabriel Malagrida da Companhia de Jesus, apóstolo do Brazil no século XVIII estrangulado e queimado no Largo do Rocio de Lisboa aos 21 de setembro de 1761. Transladado a Português e Prefaciado por Camillo Castello Branco. Lisboa: Livr. Ed. Mattos Moreira, 1875.

PLATEL, Relazione della condanna del gesuita Gabriele Malagrida dall’ abate Platel scritta a um vescovo. Lisbona: Michele Rodriguez, 1761.

SANCTI Ignatii de Loyola. Constitutiones Societatis Jesu. (Tomo I: Monumenta Constitutionum praevia; Tomo II: Textus hispanus [ed. por A. Codina]). Romae: IHSI, 1934, 1936 (= MHSI 63 64).

QUEVEDO DOS SANTOS, Júlio Ricardo. As Missões Jesuítico�Guaranis. In: CAMARGO, Fernando; GUTFREIND, Ieda; REICHEL, Heloísa (dir.) Colônia. Passo Fundo: Livraria e Editora Méritos, 2006, pp. 103�133.

RABUSKE, Arthur. Antônio Ruiz de Montoya: vida e obra em geral. Anais do VI Simpósio Nacional de Estudos Missioneiros - Montoya e as reduções num tempo de fronteiras. Santa Rosa: Fac. Filos. Ciências e Letras Dom Bosco, 1985, pp. 43�56.

RODRIGUES, Luiz Fernando Medeiros. Conquista recuperada e liberdade restituída: a expuls�o dos Jesuítas do Gr�o�Pará e Maranh�o (1759). Dissertatione ad Doctoratum in Fac. Hist. ac Bonorum Culturalium Ecclesiae, PUG, Romae, 2006.

ROUILLON ARRÓSPIDE, José Luis. Introdución. In: RUIZ DE MONTOYA, Antonio. Sílex del Divino Amor (1648 c.). Lima, Perú: Pontificia Universidad Católica del Perú/Fondo Editorial, 1991, pp. XIX�XCIII.

________. Antonio Ruiz de Montoya y las Reducciones del Paraguay. Asunción, Paraguay: Centro de Estudios Paraguayos �Antonio Guasch”, 1997.

RUIZ DE MONTOYA, Antonio. Conqvista espiritval hecha por los religiosos de la Compañía de Iesus, en las Prouincias del Paraguay, Parana, Vruguay y Tape. Madrid: Imprenta del Reyno, 1639.

________. Conquista Espiritual feita pelos religiosos da Companhia de Jesus nas Províncias do Paraguai, Paraná, Uruguai e Tape. 2ª edi��o. Porto Alegre: Martins Livreiro Editor, 1997.

TORMO SANZ, Leandro; ROMÁN BLANCO, Ricardo. Montoya y su lucha por la libertad de los índios: Batalla de Mbororé. S�o Paulo: Eveloart, 1989.