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    RUI MATEUS

    CONTOS PROIBIDOS

    MEMRIAS DE UM PS

    DESCONHECIDO

    PUBLICAES DOM QUIXOTE

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    ui Mateus nasce na Covi lh em 1944.Estada nos Estados Unidos e em 1964, parano cumprir o servio militar, exila-se emIngl a te r ra , on de casa . Em 1 9 7 0 ad er e Aco Soc ia l i s ta Por tuguesa , in tegrandoa sua d i reco e sendo responsve l porv r i a s a c t i v i da de s c on t ra o r e g i me deMarcello Caetano. Em 1971, vai viver paraa Suc ia , onde cont inua a exerce r ac t i -v idade pol i t i ca cont ra o regime vigentee m P or t uga l , c o l a bo ra c om o P a r t i doSoc ia l Democra ta Sueco e se l i cenc ia ,em 1975, em Cincias Sociais e Politicasna Universidade de Lund. Em Abri l de1 9 7 3 , em Bad Munste re i fe l (Aleman ha) , u m d o s c o n g r e s s i s t a f u n d a d o r e s d oPar t ido Soc ia l i s ta . A par t i r de Maro de1975, convidado pa ra o Depar tamentoInte rnac iona l do Par t ido Soc ia l i s ta e emOut ubr o de 1 9 7 6 e le i to pa ra a Comis-s o N a c i o n a l e p a r a o S e c r e t a r i a d oNa c i ona l , a s s umi ndo a r e s pons a b i l i da dep e l a s R e l a e s I n t e r n a c i o n a i s , c a r g oque e xe rc e i n i n t e r rup t a me n t e a t J unhode 1986. co-fundador das fundaes JosF on t a na , Az e do Gne c o e de R e l a e sInternacionais, assim como do Instituto deEstudos pa ra o Desenvolvimento e daC o o p e r a t i v a d e E d i e s e I m p r e s s oGrf ica . Desde 1 9 7 5 , pa r t ic ipa nas ac t i -vidades da Internacional Social ista , inte-g ra ndo v r i a s c omi s s e s i n t e rna c i ona i so u c o - o r g a n i z a n d o d i v e r s o s c o n g r e s s o se c on fe r nc i a s . e l e i t o de pu t a do e m1 9 7 9 , 1 9 8 0 , 1 9 8 3 e 1 9 8 5 . N e q u a d r oda Assemble ia da Repbl ica , e le i top re s i de n t e da C omi s s o de In t e g ra o

    Europe i a e c o -p re s i de n t e da C omi s s o" A s s e m b l e i a d a R e p b l i c a / P a r l a m e n t oEurope u" que r e ne c om t odos o s pa r -l a m e n t o s e g o v e r n o s d o s p a s e s d aC o m u n i d a d e E u r o p e i a . E n t r e 1 9 8 5 e1988 , nome a do p re s i de n t e do C on-s e l ho Di re c t i vo da F unda o Lus o -- A m e r i c a n a p a r a o D e s e n v o l v i m e n t o(FLAD). Em 1986, em subs t i tu io deMrio Soares, ento ele i to Presidente daR e p b l i c a , n o m e a d o P r e s i d e n t e d aFundao de Re laes In te rnac iona is e ,em 1 9 8 7 , esco lhid o como um do s oi t os c i os funda dore s da Euma ud i o , S oc i e -da de de e mpre e nd i me n t os Aud i ov i s ua i s .

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    CONTOS PROIBIDOSM E M R I A S D E U M P S D E S C O N H E C I D O

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    O AUTOR

    RUI Fernando Pereira MATEUS, nasceu na cidade da Covilh a 16 de Abril de 1944, filho de lvaro da Silva Mateus, comer-ciante e industrial de lanifcios, e de Conceio de Jesus Pereira.

    Estudou no liceu e no Colgio Moderno da Covilh at 1961, tendo, nesse ano, obtido uma bolsa do American Field Servicepara viver nos Estados Unidos da Amrica e estudar na Thomas Jefferson High School de Cedar Rapids, em Iowa. Viveu naquelepas nos anos de 1961-62 e 1963, tendo, em Julho de 1962, o privilgio de conhecer na Casa Branca o presidente John Kennedy.

    Em 1964, decidiu no cumprir o servio militar, abandonando Portugal para viver em Londres, onde trabalhou em restauran-tes, como tradutor-intrprete, como colaborador externo da BBC e da empresa de seu pai, que ento exportava para aquele pasgrande parte da sua produo.

    Nesta cidade conheceu, em 1968, Gunilla Margareta Nord, de nacionalidade sueca, com quem casou, no Registo Civil de Ken-sington, no dia 22 de Dezembro de 1969.

    Tambm ali conheceu o jornalista e historiador Antnio Figueiredo que o apresentou a Manuel Tito de Morais e Mrio Soa-res, aderindo, formalmente, Aco Socialista Portuguesa, em Janeiro de 1970. Fez parte da direco da ASP e constituiu naquelacidade, o primeiro grapo organizado daquele movimento no exlio, responsvel por vrias actividades contra o regime de Marcello

    Caetano.Em Junho de 1971, foi viver para a Sucia, onde organizou igualmente um novo grupo da Aco Socialista e estabeleceu con-

    tacto com o Partido Social-Democrata Sueco, com o qual passou a colaborar.Durante a sua estadia na Sucia, estudou na Universidade de Lund, concluindo a sua licenciatura em Cincias Sociais e Pol-

    ticas, em Maro de 1975.Em Abril de 1973, foi um dos congressistas fundadores do Partido Socialista, em Bad Munstereifel, na ento RFA.A partir de Maro de 1975, foi convidado para o Departamento Internacional do Partido Socialista, ento sob direco pol-

    tica de Manuel Tito de Morais. A partir de Outubro de 1976, foi eleito para a Comisso Nacional e para o Secretariado Nacionaldo PS assumindo a responsabilidade pelas Relaes Internacionais, cargo que ocupou, ininterruptam ente, at Junho de 1986. Nombito das actividades do PS, foi co-fundador das fundaes Jos Fontana, Azedo Gneco e da FRI (Fundao de Relaes Inter-nacionais), assim como da CEIG (Cooperativa de Edies e Impresso Grfica) e do IED (Instituto de Estudos para o Desenvol-vimento).

    Em 1975, foi co-responsvel pelo lanamento do Comit de Solidariedade com o PS e com a Democracia em Portugal, quereuniu pela primeira vez em Estocolmo sob presidncia do primeiro-ministro Olof Palme e, em Janeiro de 1976, organizou a con-ferncia do Porto, Europa Connosco. Em Agosto de 1976, integrou a delegao do PS a Luanda, que negociou com o presidenteAgostinho Neto e com o actual presidente, Jos Eduardo dos Santos, a normalizao das relaes diplomticas com Portugal. Pro-moveu igualmente, em 1976, a primeira reunio conjunta do Partido Socialista Operrio Espanhol e do Partido Socialista Popular,que teve lugar em Lisboa com a presena de Felipe Gonzlez e Tiemo Galvn. Dois anos depois, teve lugar a fuso daqueles dois

    partidos espanhis.Participou activamente, desde 1975, nas actividades da Internacional Socialista, pertencendo s suas principais comisses erepresentando o PS nas misses Amrica Latina (1978), Nicargua (1980) e ao Mdio Oriente (1982/3). Organizou igualmentea conferncia do Estoril para analisar os Processos de Democratizao na Pennsula Ibrica e Amrica Latina (1978), a reuniodaquela organizao que teve lugar em Lisboa em 1979, o XVI Congresso, realizado em Albufeira em 1983 e lanou, num momentoparticularmente crtico das relaes entre a Europa e os EUA, em 1985, a reunio dos Partidos Socialistas europeus da NATO,com a finalidade de encontrar possveis consensos e evitar que as profundas divises dos socialistas europeus sobre a questo dodesarmamento na Europa pudessem ser aproveitados pela Unio Sovitica.

    Desenvolveu intensa actividade enquanto observador da Unio dos Partidos Socialistas da Comunidade Europeia (hoje Par-tido Socialista Europeu), a que o PS viria a ser admitido, como membro de pleno direito, em 1980, seis anos antes da adeso dePortugal CEE. Foi efeito por unanimidade vice-presidente desta organizao, em 1983, e reeleito em 1985.

    Em 1977, fez parte da delegao oficial portuguesa s capitais da CEE e Santa S para pedir, formalmente, a adeso de Por-tugal Comunidade Europeia.

    Em 1979, foi eleito deputado pelo distrito de Leiria e, em 1980, pelo distrito de Lisboa, sendo reeleito em 1983 e 1985. Em1983, foi eleito presidente da Comisso de Integrao Europeia da Assembleia da Repblica e co-presidente da comisso Assem-bleia da Repblica/Parlamento Europeu. Esta comisso reuniu com todos os parlamentos e com todos os governos dos pases daComunidade Europeia, desde 1983 at adeso oficial de Portugal em 1985. Fez parte da delegao oficial portuguesa assina-tura do Tratado de Adeso de Portugal e da Espanha, celebrado em Lisboa e Madrid, no dia 12 de Junho de 1985. No quadroda Assembleia da Repblica, representou ainda o Grupo Parlamentar do PS nas reunies da Assembleia Parlamentar dos Pases daNATO.

    Em 1985, foi designado primeiro presidente do Conselho Directivo da Fundao Luso-Americana para o Desenvolvimento(FLAD), cargo que ocupou at 1988. Em 1987, passou a fazer parte do grupo portugus da Comisso Trilateral, uma influenteorganizao no-governamental composta por trezentas personalidades da Europa, EUA e do Japo, co-presidida pelo banqueiroDavid Rockefeller, dos EUA, pelo conde Otto Lambsdotff, da Alemanha e pelo presidente da empresa multinacional Sony, YshioAkita, do Japo.

    Em 1986, aps a eleio de Mrio Soares foi designado, em sua substituio, presidente da Fundao de Relaes Internacio-nais e escolhido, em 1987, como um dos oito scios fundadores da Emaudio, Sociedade de Empreendimentos Audio Visuais, assimcomo presidente do seu Conselho de Administrao. Esta empresa, criada a partir da Fundao de Relaes Internacionais e daCEIG, Cooperativa de Edies e Impresso Grfica, tinha como objectivo preencher o vazio da rea socialista na comunicaosociai.

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    RUI MATEUS

    CONTOS PROIBIDOSMEMRIAS DE UM PS DESCONHECIDO

    PUBLICAES DOM QUIXOTELISBOA

    1996

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    Publicaes Dom Quixote, Lda.Rua Luciano Cordeiro, 116-2.1098 Lisboa Codex Portugal

    Reservados todos os direitos

    de acordo com a legislao em vigor.

    Rui Mateus, 1996

    Foto da capa: Discusso margem de uma reunioda Internacional Socialista em Amsterdo,

    entre Mrio Soares, Rui Mateus e Helmut Schmidt,

    a 16.4.77, nas vsperas da partida de Mrio Soarespara os Estados Unidos, sobre se o Grande Emprstimoa Portugal deveria ou no ser feito atravs do F.M.I.

    1." edio: Janeiro de 1996

    Depsito legal n. 96746/96

    ISBN: 972-20-1316-5

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    NDICE

    Introdu o: Do Tri unfo da Poltica ao Esta do dos Juzes 11Captu lo I Os Ano s da Inocnc ia (1944 -1974 ) 21Captu lo II Enfr entar as Reali dades (1974 -1975 ) 47Captu lo III A Euro pa (e a Amr ica) Con nosc o! (1975 -1976 ) 99Captu lo IV Os Governos do nosso descontentamento (1976-1978) 119Captu lo V Os anos de crise (1978 -198 1) 159Captu lo VI Revi ver o pass ado em So Bent o (1981 -1985 ) 207Captul o VII No temp o em que Deu s foi Laico, Repu blic ano e Socialista! (1985 -1986 ) 261

    Capt ulo VIII A Emau dio: Um novo desastre na Com uni ca o Social (1986 -1990 ) 285Cap tu lo IX U ma invest igao t ipo Independente (1990) 327Capt ulo X No Tribunal do jui z Roy Bean ou da ju za que gostava de ser minis tro da

    Justia? (1990-1995) 347Concluso O mal amado 365

    Anexos 375

    Anexo 1 Pri meir os apoio s f in ancei ros do PS D sueco a Mr io Soare s . Cart a de26.01.1971 377

    Ane xo 2 Carta do PS D da Noru ega de 20.02.1976, enunci ando apoios em 1974 e 1975 378Ane xo 3 Carta do PS D da Din ama rca de 8.03. 1976 des crev endo apoios ao PS em

    1974, 1975 e 1976 37 9Ane xo 4 Refe rnci a conta movi ment ada na Hola nda em nom e do PS 381Ane xo 5 Carta de Mr io Soare s de 24.09. 1075 ao ditador lbio, corone l Kadh afi 382Ane xo 6 Prime iro Proj ecto de Com uni cad o do Comi t de Esto colmo , de 27 de Agos to

    de 1975 38 4Anexo 7 Conta de Mrio Soares no Bank fur Gemeinw irksha ft 387Anex o 8 Recib os de Aires Rodri gues, secretrio nacional do PS, relativ os ao 25 de

    No v emb ro 3 8 9Anex o 9 Recibo s vrios entregues ao PS para a resistnc ia ao 25 de Nov emb ro de

    197 5 3 9 0Ane xo 10 Tran sfer ncia do PS D sueco ao PS no Ver o quent e de 1975 39 3Ane xo 11 Carta do banco PK da Sucia abrin do conta para cobrir despe sas do PS em

    197 6 3 9 4Anex o 12 Depsi tos bancri os do PS austraco e PSd sueco em 1976 395

    Ane xo 13 Outr os apoios em 1976 397An exo 14 Rela o de apoi os noru egu eses e sueco s ao PS, Portugal Hoje e UG T 3 9 8Anex o 15 Propo sta de Mr io Soares para vice-pr esident e da Internac ional Soci alis ta.. . 40 0Anex o 16 Tel egra ma de Lionel Brizola aps regres so ao Brasil, mar cand o o fim da

    ditadura 401Anexo 17 Memo rand o de recomenda es da CIA sobre misso da IS Nicarg ua 402Anex o 18 Cart a do IED de 31.03 .1981 conf irm and o falta de trans parn cia dos seus

    rgos directivo s 405

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    Ane xo 19 Manu scri to de Bern ardi no Go mes sobre a filos ofia empresa rial do PS 407Ane xo 20 Viage ns particular es pagas pela FRI 40 9Ane xo 21 Carta de Geor ge Debu nne, preside nte da Con fede ra o Europe ia de Sindic a-

    tos, ao primei ro-mi nistr o de Portugal 41 0Ane xo 22 Carta de Manu el Bullosa, de 16.11.1984, sobre naciona liza es da revolu-

    o 411An exo 23 Ter mo s de aqui s io do l ivro Portrait of a Hero, ed i to ra Widenfe ld &

    Nicholson 412Ane xo 24 Cartas da empr esa de consult ores ameri cana. Black Man afo rt Stone and Kelly,

    exig indo pagamen to por serv ios prestados ao MA SP 414Ane xo 25 Perfil curricular de Jo o Soar es anterior constit uio da Ema udi o 41 7

    Ane xo 26 Extractos do mem ora ndo confiden cial do grupo Ne ws International, do mag-nata dos media, Rupert Murd och, sobre o projec to Ema udi o 41 9Ane xo 27 Cortes ao proje cto de Com uni cad o sobre a visita de Rupert Mur doch ao Pre-

    sidente da Repbl ica, em 1987 421Anexo 28 Carta de Rupert Murdo ch confi rmand o disponibil idade para se associar

    Emaud io e FRI 42 2Anexo 29 Convite de Robert Maxwel l 42 3Ane xo 30 Protoc olo entre o empre sri o Ildio Pinh o e a Ema udi o 42 4Ane xo 31 P roject o de carta de Max wel l a Ildio Pinho 42 6Ane xo 32 Proto colo entre Robert Max wel l e Ildio Pinh o 427Ane xo 33 Carta de conf irm ao notarial da trans miss o da posi o de Carlos Mel anci a

    na Emaudi o 431Anexo 34 Carta do empresrio Stanley Ho confi rmando in teresse na Emaud io 432Anex o 35 Carta da In terf ina confir mando in teresse na Emaud io 433Ane xo 36 Regist o bancri o dos depsi tos da verba da Weid lepl an em contas da Ema u-

    dio 435Anex o 37 Planos para uma eventual associao Emaudio/ In terf i na 437Anexo 38 Docume nto comprovat ivo da transmisso de aces da Emaud io ao Part ido

    Socia l is ta 438Anexo 39 Carta de Robert Maxwel l desl igando-se da Emau dio 440An exo 40 Carta que O Independente no pub l i ca r i a 44 2Ane xo 41 Con fir ma o da Inspe co- Geral de Finan as dos depsi tos da verba da Wei -

    dleplan na conta da Em aud io 44 5Ane xo 42 Carta da Weidl epla n recti ficand o o cha mad o fax de Mac au 44 7Ane xo 43 Carta envia da a Mri o Soares pedi ndo substit uio na presid ncia da FR I.. . 44 9Ane xo 44 Cart a de demi sso de Mr io Soares da FRI de 19.12.1990 451Anex o 45 Cart a de aceita o de Ant nio Guterr es para ser mem bro da FRI 45 2

    Anex o 46 Carta ao secretrio das relaes internacionais do PS sobre ace s da FRI naEmau d io 4 5 3

    Ane xo 47 Prot ocolo entre a UG T e a Ema udi o 45 5

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    Gunilla, inimiga dahipocrisia e companheirade uma vida

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    INTRODUOdo Triunfo da Poltica ao Estado dos Juzes

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    H anos atrs, conheci em Washingtonum jovem economista de reconhecido talento que fazia parte da equipa do presidentedos Estados Unidos, Ronald Reagan. Naquela poca, o chamado fenmeno dos yup-

    pies atravessava a sua fase dourada e David Stockman, com trinta e quatro anos deidade, era j apontado como um dos jovens polticos mais promissores do seu pas.Com apenas vinte e oito anos, tinha sido pela primeira vez eleito congressista peloestado de Michigan. O presidente nomeara-o director de Management and Budget,o equivalente a ministro do Planeamento. Tinha o futuro sua frente. Quatro anos

    depois, desiludido com a hipocrisia e o trfico de influncias que caracterizavam a vidapoltica, a todos surpreenderia abandonando-a para escrever O Triunfo da PolticaKE um livro surpreendente, que revela a falta de transparncia da vida poltico-partid-ria e acusa o parasitismo daqueles que passam a vida a apregoar que esto na polticapor patriotismo e com sacrifcio pessoal, pois poderiam estar muito melhor se se tives-sem dedicado a actividades do sector privado mesmo quando se sabe que, antes deentrarem na poltica, no tinham obra nem dinheiro.

    Num pas em que as autoridades, os media e o pblico exercem um controlo rigo-roso sobre o rendimento e financiamento dos polticos e sobre as suas actividades pol-ticas e privadas, como o caso dos Estados Unidos, que se regem por cdigos de trans-parncia acima de qualquer suspeita, David Stockman revelou a subtileza de meios

    que, mesmo assim, permitem o compadrio e o trfico de influncias no dia a dia dapoltica americana.

    Em Portugal, neste pequeno pas perifrico, diminudo pela indigncia e obscure-cido pela opacidade, ensaia-se um sistema poltico-partidrio moldado pelo Partido

    ' David Stockman, The Triumph ofPolitics, Harper & Row, Nova Iorque, 1985.

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    Socialista, onde s duas dcadas aps o restabelecimento da democracia se comea adiscutir o trfico de influncias, a transparncia e, enfim, o cidado. Discusso envol-vida em tanta hipocrisia e por mtodos to falaciosos que poderemos considerar queo nosso pas, neste captulo, se encontra num espao cultural de transio entre o fas-cismo e um estado de juzes, que no vislumbra um regime de verdadeiro controloe legitimao democrtica das instituies.

    O triunfo da poltica e dos seus principais protagonistas, exactamente pelo modocomo foi construdo o regime aps o 25 de Abril, comea a revelar perigosos sinto-mas de eroso da credibilidade das instituies, evidenciados pela crescente descrenapopular. A democracia portuguesa, no actual contexto ocidental, embora irreversvel

    na sua aparncia formal, resvala perigosamente para um corpo de funcionrios semlegitimao democrtica directa ou indirecta, como , entre ns, o corpo de magistra-dos, que dominado por certas correntes que professam uma concepo militante,radical e fundamentalista da magistratura, a qual, geralmente aliada ao protagonismopoltico de alguns, tem subjacente uma cultura de interveno, quando no de contra-poder e confronto com os rgos de soberania poltico-representativos 1. A seme-lhana do que acontece em Itlia, bero do pensamento e aco fascistas que assola-riam a Europa nos anos 30, tambm hoje legtimo perguntar se o governo dos

    juzes que tem vindo a devastar aquele pas, no estar a ser aproveitado para finspolticos tambm em Portugal, onde o protagonismo de alguns juzes, recentementeconvertidos democracia, tem feito impunemente os seus progressos perante uma cadavez mais amedrontada classe poltica.

    No me tendo ocorrido escrever um livro antes, daria oportunidade, em 1990, a umsemanrio lisboeta que prometia desvendar mistrios atravs de um respeitvel jorna-lismo de investigao, de se ocupar da difcil e ingrata tarefa de investigar o estadoda Nao em matria de compadrio e trfico de influncias. Lamentavelmente, o resul-tado no passaria de uma pusilmine caa s bruxas e da reproduo de reles fugasde indisfarvel apologia fascista, bem inseridas numa estratgia, que, a vencer, con-duzir, inevitavelmente, ao estado dos juzes.

    Tratou-se do chamado fax de Macau e da cegueira com que o processo, a todosos nveis, seria conduzido. Numa total inverso de papis e segundo uma tica dificil-

    mente digerivel, a prpria jornalista de investigao se revelaria jornalista-testemu-nha empenhada, atravs da mentira e do perjrio, em cruxificar as suas fontes, aju-dando a cruzada da magistratura.

    Hoje, para repor a verdade, decidi-me a escrever o livro. E um livro de memriasem redor do Partido Socialista, duma perspectiva das suas relaes internacionais, que

    1 Mrio Belo Morgado, revista Renovar de Outubro de 1995.

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    eu dirigiria durante mais de uma dcada. No , contudo, nem poderia ser, a histriado Partido Socialista mas, essencialmente, uma contribuio para uma melhor compre-enso de como foi forjado aquele que seria a espinha dorsal do regime democrtico por-tugus actual.

    O PS acabaria por ser, acidentalmente, aquele que mais responsabilidades teria naconstruo das actuais estruturas econmicas, sociais e polticas do Pas. Ops-se opresso salazarista e sairia desiludido da chamada primavera marcelista. Acabariapor resistir aventura comunista e, depois, tentao militarista, acabando por imporo seu modelo de sociedade, a partir de 1976. Nesse percurso e nos momentos decisi-vos, teria sempre o apoio internacional dos Estados Unidos e da Europa. Da que a pers-

    pectiva internacional, em redor da qual tm girado o pas e os principais partidos pol-ticos, seja uma pea essencial para a anlise dos actuais fenmenos da nossa sociedade.Sem esses apoios, que para o PS estariam como o oxignio est para a vida, provavel-mente o regime democrtico teria sucumbido. Do mesmo modo que, em 1945, a suaausncia viabilizaria a continuao de Salazar. Mas, por outro lado, se sem eles tudoestaria em jogo, tambm a relao de dependncia criada e a institucionalizao do tr-fico de influncias iriam provocar algumas distores e vcios que o Pas hoje sente.

    Tentar explicar esses fenmenos de um passado recente, para compreender o pre-sente, um dos objectivos deste livro. Mas, como no poderia deixar de ser, escreversobre o PS durante este perodo sem falar dos seus principais protagonistas tornariaimpossvel alcanar essa meta. Entre eles destacam-se duas personalidades distintas e a

    relao de amor e dio que, em grande parte, determinaria o actual PS: Mrio Soa-res e Francisco Salgado Zenha. O primeiro deixaria marcas profundas que continuaroa caracterizar o PS por muito tempo. De Salgado Zenha este partido herdaria a cons-cincia moral que ainda lhe resta. Mrio Soares seria eleito Presidente da Repblica eSalgado Zenha abandonaria o partido, incompatibilizado com o seu velho amigo.Durante algum tempo, o PS iria ser um barco deriva. Recuperaria eleitoralmente, con-tudo, com o seu actual lder, Antnio Guterres. Mas, curiosamente, essa recuperao saconteceria quando este fiel discpulo de Zenha se converteu ao soarismo. Por issomesmo, esta interessante simbiose das personalidades daqueles dois principais perso-nagens ser agora examinada lupa no novo PS, para ver se ele segue o caminho daconscincia moral do seu velho protector, ou o caminho do absolutismo monr-quico e das facilidades do seu favorito ex-inimigo.

    Para j, evidente que o actual secretrio-geral do PS, j em 1976 responsvel comEdmundo Pedro, Soares Louro e Santos Ferreira1 pela campanha eleitoral do PS, conhece

    1 Santos Ferreira sucederia Menano do Amaral, era 1986, no lugar de tesoureiro do PS e seria depoisconvidado por Carlos Melancia para presidente da Companhia do Aeroporto de Macau.

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    bem as dependncias internacionais do seu partido e at, semelhana do seu anteces-sor. trata-se por tu com pelo menos seis primeiros-ministros europeus 1. Vamos verpara crer, como diz o ditado, mas, pelos primeiros indcios, temo que, do mesmo modoque Soares meteria o socialismo na gaveta, Guterres venha a meter a conscincia moraldo PS no congelador. O que um mau sinal para a democracia. Que no ter futuro seo passado no estiver esclarecido e o futuro continuai' a depender de bodes expiatrios.

    O meu livro, assim o espero, ajudar a compreender como o triunfo de alguns sefaria custa do sacrifcio de outros. O estado dos juzes est atento ao passado dosactuais polticos e no hesitar, no momento oportuno, em colaborar para a sua decom-posio.

    Eu entrei para a poltica quase por acaso. Aderi nos anos 60 minscula AcoSocialista Portuguesa por acreditar que, pela via do socialismo democrtico e atravsde um sistema pluripartidrio, Portugal viria a ser um pas igual ou melhor que aqueleonde vivia exilado a Sucia e que era ento considerado, acertadamente, a socie-dade mais justa e mais evoluda do planeta. No o socialismo utpico, igualitrio, departido nico que transforma os cidados em funcionrios do estado. O socialismo ondeos partidos se combatem no campo das ideias e onde os interesses e bem-estar dos cida-dos esto sempre em primeiro lugar. Onde os partidos polticos so a espinha dorsaldo sistema e os instrumentos para a sua modificao democrtica e no o instrumentode promoo pessoal dos seus dirigentes. Mas, infelizmente, e da a outra razo de ser

    ser deste meu livro, Portugal parece estar a perder essa importante batalha da demo-cracia. Isso atestam o crescente branqueamento da Histria e falta de transparncia dasinstituies.

    A Europa, bero da amlgama de culturas e conflitos que deram origem ao que hoje vulgarmente apelidado de civilizao ocidental, nunca produziu um modeloperfeito de democracia que garanta aos seus cidados a igualdade de acesso educa-o, ao trabalho, sade e justia. Entretanto, alguns pases, sobretudo a norte, con-seguiram ao longo dos anos conquistas importantes naquelas reas, com base numaconsidervel evoluo do conceito de respeito pelos direitos humanos, dos direitos dosanimais e da natureza. A vitria dos Aliados na Segunda Guerra Mundial, a criaoda Organizao do Tratado do Atlntico Norte, o lanamento dos alicerces da Unio

    Europeia no viabilizariam, contudo, o acesso dos pases do Sul ao fenmeno de desen-volvimento dos seus vizinhos mais a norte e, at meados dos anos 70, a Europa viveu

    1 Esta declarao de Antnio Guterres, em 1995, copiada de uma declarao idntica de MrioSoares, de 1979, quando dizia que era amigo pessoal do Schmidt, do Willy Brandt, do Callaghan, doOlof Palme... etc., para afirmar que posso pegar em qualquer momento no telefone e falar com eles.Mrio Soares, O Futuro Ser o Socialismo Democrtico, p. 134. Publicaes Europa- Amric a.

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    num clima de completa desunio. Entre democracias mais ou menos formais no Nortee Centro, ditaduras medocres e subservientes de inspirao crist na Pennsula Ib-rica, uma ditadura militar com reminiscncias pan-arbicas na Grcia e uma imensi-do de regimes comunistas totalitrios e despticos, proclamados pela via revolucio-nria em nome da classe operria, a Leste.

    O incio da luta dos Movimentos de Libertao contra o colonialismo portugusna Guin, em Moambique e em Angola, empurrados pela miopia e desinteresse oci-dental para os braos da Unio Sovitica, dariam lugar ao chamado Movimento dosCapites que a 25 de Abril derrubaria, para surpresa de todos, dentro e fora de Por-tugal, a ditadura iniciada com o Estado Novo, em 1933, por Antnio de Oliveira Sala-

    zar. Este levantamento pacfico e sem objectivos polticos claros, provocado quer porrazes de natureza sindical, quer pela derrota psicolgica dos militares portugueses nasguerras coloniais, viria a influenciar a evoluo poltica mundial deste fim de sculo.

    Durante mais de uma dcada, at entrada de Portugal como membro de plenodireito na Comunidade Europeia, em 1986, o nosso pequeno e subdesenvolvido pas,at ento quase esquecido do seu contexto europeu, mobilizaria de forma inditatodas as atenes mundiais com a sua Revoluo dos Cravos e teria reflexos pro-fundos na Europa e no Mundo. A nossa revoluo seria quase instantaneamenteadoptada por praticamente todas as foras democrticas internacionais, tendo-sedemocratas cristos, liberais, socialistas e at comunistas em todas as suas imagin-veis verses, em determinados momentos e por diferentes motivos, considerado pr-ximos do nosso 25 de Abril. Para o Partido Socialista, que protagonizaria de certomodo os aspectos positivos da Revoluo e que imprimiria a sua marca ao sistemapoltico constitucional vigente, esta seria tambm a sua dcada dourada.

    Em Abril de 1974, a social-democracia europeia entra na sua fase de apogeu. Par-tidos filiados na Internacional Socialista, a que o PS portugus tambm pertence, estoento no governo na Alemanha Federal, ustria, Blgica, Dinamarca, Finlndia, Gr--Bretanha, Holanda, Israel, Luxemburgo, Noruega e Sucia. Na Escandinvia, os movi-mentos sociais-democratas de inspirao sindical comeam a desprender-se do con-servadorismo em que a sua dependncia operria os lanara e a ansiar por ummaior protagonismo internacional. Na Gr-Bretanha, a onda de revoluo social da

    segunda metade dos anos 60 contra o chamado establishmentreabre as portas ao Par-tido Trabalhista liderado por Harold Wilson, que se mostra impotente para travar a vagaque transformaria aquele partido, tradicionalmente moderado, num dos mais radicaisda Internacional Socialista. Na Alemanha, a democracia controlada do ps-guerradeu lugar a um novo Partido Social-Democrata com forte liderana de Willy Brandte Helmut Schmidt os quais, apesar das nuances entre si, tinham o objectivo comumde transformar novamente a Alemanha num pas unificado e no motor da Europa. Na

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    ustria, com Bruno Kreisky, na Holanda, com Joop den Uyl, na Blgica e at na It-lia, graas ameaa do P.C. de Enrico Berlinguer, emergem igualmente partidossociais-democratas dispostos a dai" nova cara ao socialismo. Socialismo at ento carac-terizado essencialmente pelo seu eurocentrismo. Nos Estados Unidos tambm sopramventos de mudana e, quando o 25 de Abril acontece em Portugal, j a administraorepublicana de Richard Nixon est ferida de morte com o caso Watergate. QuandoJames Crter e Walter Mondale lanam a sua plataforma eleitoral de cooperao inter-nacional e de defesa dos Direitos Humanos, em 1976, Willy Brandt prepara-se paraser eleito presidente da Internacional Socialista, com base num programa de activida-des no muito diferente dos valores proclamados pelos democratas americanos e com

    a firme inteno de pr fim ao eurocentrismo, dando incio a uma nova fase de coo-perao internacional entre socialistas democrticos, que alcanasse todos os conti-nentes.

    A Revoluo Portuguesa tornara-se um marco essencial para a compreenso dosgrandes acontecimentos polticos mundiais da segunda metade do sculo XX, se bemque os polticos portugueses, que pouco tinham feito para que o 25 de Abril aconte-cesse. tambm no a soubessem promover, nem conseguissem dela tirar os lourosque, por direito prprio, Portugal merecia. A transformao pacfica de Portugal numpas livre e democrtico foi um acontecimento no s indito como exemplar, que viriaa contribuir de forma absolutamente decisiva para a falncia de inmeros regimes tota-

    litrios em frica, na Amrica Latina e no prprio Leste Europeu e para um desanu-viamento da tenso nas relaes internacionais.A descolonizao total do Continente Africano e os processos de democratizao

    na Pennsula Ibrica e na Amrica Latina seriam o primeiro resultado da Revoluode Abril. O fim do apartheide das ditaduras comunistas no Leste Europeu, pela viado dilogo e do pluripartidarismo, seriam tambm consequncia da vitria das forasdemocrticas, primeiro em Portugal, depois, como reflexo dessa vitria, encontrariamfora suficiente no seio da Internacional Socialista e no seio da NATO para rejeitarsolues de submisso unilateral nos chamados dilogos Leste Oeste e Norte Sul. Nabase da fora moral das foras democrticas, perante os graves conflitos entre o Lestee o Oeste e na escolha da via para a libertao dos Povos, nos anos 80, estaria sem-

    pre presente o exemplo portugus a que Andr Malraux chamaria a primeira vitriados mencheviques sobre os bolcheviques. Bastaria referir, a este propsito, a situaode ruptura a que quase se chegou no seio da NATO por causa do regime sandinista naNicargua, sobre as propostas conducentes a um processo de desarmamento unilateralna Europa Ocidental e sobre um eventual apoio europeu a formas de luta armada aconduzir por pases da Linha da Frente na frica Austral, como forma de pr fim aoregime do apartheidna frica do Sul. Seria o exemplo da moderao da vitria dos

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    mencheviques em Portugal que, na maior parte dos casos, mesmo quando a revoluoportuguesa j parecia esquecida, cimentaria as decises de bom senso que acabariampor prevalecer e moderaria os mpetos revanchistas dos republicanos norte-americanose os ataques de pacifismo serdio de alguns socialistas europeus.

    Portugal esteve no epicentro de uma grande ameaa paz tendo a solidariedadeinternacional, que nos faltou durante tantos anos, finalmente funcionado. Entre as vriasopes que se colocariam aos capites de Abril e as vrias receitas preconizadas paraPortugal prevaleceria o bom senso. Mas os partidos polticos e seus principais diri-gentes rapidamente desperdiariam este enorme patrimnio, em lutas intestinas e comvaidades provincianas. Hoje, visto de fora para dentro, Portugal regressou ao seu esta-

    tuto de pas insignificante e receptor. No foram conseguidos os grandes objectivos daRevoluo de Abril e o Pas encontra-se entre a Europa e a mediocridade. Parece queo povo portugus no consegue libertar-se do fatalismo da I Repblica. Este meu livrode memrias, assim o espero, tambm uma contribuio contra esse fatalismo.

    O chamado caso do fax de Macau ou caso Emaudio dar-me-ia o ltimo argu-mento de peso para escrever este livro. A propsito de um conflito, em nada diferentedos conflitos que devassam o interior dos partidos polticos portugueses e que se pren-dem com situaes de poder; a propsito de um financiamento poltico relativamenteinsignificante e em nada, a no ser no montante, diferente dos que tm sido feitosao longo dos ltimos vinte anos a partidos polticos e organizaes afins, confundiu--se a rvore com a floresta e iniciou-se a investigao corrupo em Portugal de tal

    forma que, ao contrrio do que tem acontecido noutros pases europeus, se inviabili-zaria o conhecimento da verdade e, como tal, o combate corrupo. Em vez de seoptar por um esclarecimento idneo e completo, a que os Portugueses tm direito, sobreo estado da Nao em matria de trfico de influncias e de corrupo, cortando o malpela raiz ou, caso se verificasse que a verdade poderia ser fatal, a Assembleia da Rep-blica em acto pblico entendesse fazer um acto de contrio para bem da democracia,criando moratrias e regras novas, o Ministrio Pblico parece ter assumido a res-ponsabilidade de definir o interesse nacional. Produzindo uma acusao sem provasnuma total inverso de valores e, mesmo admitindo a convico do investigador emrelao a um crime que no existiu, ignorando a mxima de Sneca: quem, podendo,no manda que o delito se no faa, manda que se faa

    No h Democracia sem a participao dos cidados na vida do seu pas. Esco-lheu-se definir, em Portugal, que o enfse dessa participao se faa atravs de parti-dos polticos. Mas faltam ainda definir regras estritas sobre a democracia interna nos

    1 Tese muito cara a Antnio de Almeida Santos in O Corpo de Delito, p. 172, Publ icaes Europa--Amrica.

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    partidos que os impossibilite de se transformarem, como tem vindo a acontecer emPortugal, em aparelhos burocrticos fechados que impedem essa mesma participao.E para alm da ausncia de regras que permitam, pela via individual, o acesso do cida-do actividade poltica, no existem regras idneas de financiamento dos partidosnem de transparncia para os polticos. Um pouco semelhana dos pilares moraisdo regime, a Maonaria e a Opus Dei, tudo se decide s escondidas, como se o direitodos cidados informao completa e rigorosa de como so financiadas as suas ins-tituies e dos rendimentos dos seus governantes e dos seus magistrados fosse algosuspeito, algo subversivo.

    Liberdade, Justia e Transparncia so sinnimos de Democracia. E sem esses

    ingredientes essenciais o regime portugus no passar de uma democracia com psde barro. Acontecer ento, para mal de todos ns, a converso do j em si negativotriunfo da poltica no temvel estado dos juzes!

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    Captulo I

    Os anos da inocncia

    (1944-1974)

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    Tinha vinte e trs anos quando, em 1967,tive o meu primeiro contacto com a Aco Socialista Portuguesa, constituda na Sua,trs anos antes, por Francisco Ramos da Costa, Manuel Tito de Morais e Mrio Soa-res. A minha actividade poltica at ento no passara de uma espcie de aprendiza-

    jem juvenil, no final dos anos 50, com grupos de oposicionistas locais, sobretudo comu-nistas e republicanos da cidade da Covilh, onde nasci em 1944 e vivi at aos 17 anos.Era esporadicamente convidado, um pouco como mascote, de tertlias anti-salaza-ristas de um grupo de homens que tinham, pelo menos, o dobro da minha idade e,como nico elo entre si, o gosto de boas jantaradas e o dio ao regime. Contudo,

    no sei bem a origem exacta dos meus sentimentos anti-salazaristas, at porque no seioda minha famlia pouco se falava de poltica. O meu pai era um catlico devoto e, na

    juventude, tinha pertencido Legio Portuguesa. No por razes ideolgicas con-forme viria a apurar anos mais tarde mas porque tal fazia parte das regras do seucrculo de amigos que, naquele tempo, constituam a classe mdia dominante daqueleque chegou a ser um dos mais importantes centros industriais do Pas. Imperava a forado dinheiro e das grandes fortunas rapidamente acumuladas durante a guerra.

    Enquanto fui crescendo, num ambiente imensamente feliz e despreocupado, nuncavi os meus pais participarem em qualquer tipo de actividades polticas. Eram um per-feito modelo da reduzida classe mdia que o regime salazarista produzira. A minha

    me, hoje com 82 anos, vivia mais preocupada com a educao dos seus quatro filhose com o bem-estar da famlia embora, ao contrrio do que acontecia com meu pai, nofosse muito dada s prticas da Igreja. Depois de ter sido comerciante, durante os pri-meiros anos da minha infncia, o meu pai associar-se-ia a uma empresa de tecelagemque, em virtude da adeso de Portugal EFTA (Associao Europeia de ComrcioLivre), viria a conhecer um perodo de grande prosperidade, exportando a quase tota-

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    lidade da sua produo. semelhana do que acontece em muitas famlias, eu idola-trava o meu irmo mais velho, mas a nossa relao seria interrompida quando, a par-tir dos doze anos, ele foi estudai- para Lisboa. Naquele tempo s era possvel estudarno liceu local at ao segundo ano. A minha irm tinha menos cinco anos do que eu eo meu irmo mais novo menos dez. Eu desejava ardentemente seguir as pisadas domeu irmo mais velho e estudar em Lisboa, mas logo que iniciei o primeiro ciclo pas-sou a ser possvel estudar no liceu da Covilh at ao quinto ano. Ainda pensei queteria uma oportunidade quando, no incio do terceiro ano, me envolvi numa pequenabriga com o filho de um deputado da Unio Nacional. Numa situao de evidente injus-tia s eu seria punido com quinze dias de suspenso, tendo o meu pai decidido tirar-

    -me do liceu. A minha esperana de ir para o Colgio Portugal, na Parede, onde estavainternado o meu irmo no seria entretanto concretizada. Tinha aberto um colgio par-ticular na cidade, o Colgio Moderno, onde eu ento passaria a estudar. Acontece queo seu director e meu professor de Portugus, era ferozmente anti-salazarista e oambiente no seio do colgio para a poca agradavelmente progressista.

    Quando Humberto Delgado visitou a Covilh em campanha eleitoral, tinha eu ape-nas catorze anos. A sua caravana eleitoral foi desviada pela polcia para evitar a suaentrada na cidade pelo local onde o aguardava a maior multido que eu jamais viraconcentrada. Na cidade sentia-se uma grande tenso mas tambm grande entusiasmoe esperana e, sem entender muito bem o que estava em jogo, vivi intensamente aquelacurta campanha distribuindo panfletos e manifestos de porta em porta. No me recordo

    dos discursos, mas creio que foi ento que se iniciou a minha paixo pela poltica.Trs anos depois, seguindo as pisadas de meu irmo mais velho, obtive uma bolsa

    do American Field Service para estudar e viver com uma famlia norte-americana napequena cidade de Cedar Rapids, no midwestdos Estados Unidos. Com esta famlia,com o seu filho Jon, da minha idade, e a filha Toni, dois anos mais nova, e com osmeus professores e colegas da Thomas Jefferson High School aprenderia o -b-c dademocracia e a felicidade de viver numa sociedade livre e descomplexada. As gentescom quem ali convivi e com quem, em muitos casos, trinta e cinco anos depois, aindamantenho estreitas relaes, tinham uma prtica de vida na sua comunidade e convic-es baseadas na liberdade, na igualdade de oportunidades e na defesa intransigentedos direitos humanos que, sem o afirmarem, tem mais que ver com o socialismo demo-crtico descomplexado em que acredito, do que as expresses panfletrias de muitosdos nossos socialistas oficiais. Vivi, pela TV, a fascinante experincia do presidenteJohn Kennedy, que viria a conhecer no Vero de 1962 nos jardins da Casa Branca emrecepo por ele oferecida aos bolseiros finalistas do American Field Service. Seriam,alis, John Kennedy, Olof Palme e Leopold Senghor as principais referncias polticasda minha juventude. Embora em condies to diferentes e condicionados por reali-

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    dades to distintas desenvolveram, cada um sua maneira, experincias de progresso, justia social e cultura que permanecem a esperana do socialismo democrtico nestefim de sculo. Tive a invulgar honra de conhecer os trs, se bem que em pocas e demaneiras diferentes. O meu contacto com Kennedy, no meio de estudantes vidos deo conhecer, foi meramente circunstancial, mas para mim a sua carismtica lideranarepresentava a juventude, o humor e o informalismo que tanto iria marcar o estilo dosnovos dirigentes sociais-democratas europeus dos anos 70. Com a sua Aliana parao Progresso parecia querer quebrar com o estilo pesado da diplomacia dos anos 40,criando esperanas renovadas nos povos do Terceiro Mundo que lutavam pela suaautodeterminao. Tambm no disfarava a sua simpatia pela social-democracia euro-

    peia e parecia disposto a repensar argumentos e posies tradicionais para pr fim aoavano comunista [tendo] muitos dos patriotas liberais que se sentiram intensamenteatrados pela mensagem de Kennedy pertencido Central Intelligence Agency 1.

    Apesar do impacto da cultura americana na minha formao e das insistncias daminha famlia americana, s no fiquei ento nos Estados Unidos por me recusar afazer servio militar, que me obrigaria a um estgio na Guerra do Vietname. Aps omeu regresso a Portugal em finais de 1963, senti que a obsesso com as guerras colo-niais tinha mergulhado o nosso pas num clima de indescritvel isolacionismo e histe-ria. Senti enorme dificuldade em falar com as pessoas da minha gerao, para quemfalar das minhas experincias na Amrica era o mesmo que falar de fico cientfica.Anos mais tarde, viria a notar a curiosa coincidncia de Humberto Delgado, cuja cam-

    panha eleitoral tanto marcara as minhas opes polticas, tambm ter compreendido pelaprimeira vez o significado da democracia durante a sua estadia nos Estados Unidos.

    Aps a inspeco militar consegui autorizao para uma viagem a Inglaterra deonde decidi no regressar a Portugal.

    Tinha ento vinte anos e aquele pas vivia um excitante perodo de euforia liber-tria e de criatividade. O governo trabalhista de Harold Wilson, de que James Calla-ghan era ento ministro do Interior, fechava os olhos aos que se recusavam a partici-par na Guerra do Vietname e, no caso portugus, nas guerras coloniais. Emboranormalmente no oficializasse a concesso de asilo poltico aos refractrios e deserto-res norte-americanos e portugueses que iam chegando Gr-Bretanha, permitia o pro-longamento dos seus vistos de estadia, mesmo com passaportes caducados, at que ao

    fim de quatro anos pudessem ser considerados residentes naquele pas.No seio dos portugueses, onde proliferavam minsculos grupos de extrema-

    -esquerda, a nica actividade democrtica de relevo organizava-se ento, sem exign-

    1 The Agency The Rise & Decline of lhe CIA, John Ranelagh, p . 352, Cambridge PublishingLimited, 1987.

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    cias de rigidez poltico-partidria, volta do jornalista e escritor Antnio Figueiredo,antigo companheiro de Humberto Delgado e mais conhecido pelas suas crnicas naBBC. Pessoa muito respeitada por ingleses e portugueses em geral, foi graas ami-zade que estabeleci com ele e aos seus contactos com o Labour Party que foi poss-vel criar, em Londres, o primeiro ncleo organizado da Aco Socialista Portuguesano estrangeiro. Mas, apesar da sua desinteressada colaborao e de se considerar socia-lista, Antnio Figueiredo nunca aderiria Aco Socialista e s entraria para o Par-tido Socialista aps o 25 de Abril. O primeiro ncleo de Londres da Aco Socialistafoi lanado no incio de 1970 por mim, com Alberto Lagoa, Carlos Alves, Pedro Fer-reira de Almeida, Eduardo Silva e, mais tarde, urea Rego, Jos Neves e Seruca Sal-

    gado. Em Roma estavam Tito de Morais e Gil Martins, em Frana Mrio Soares,Ramos da Costa. Coimbra Martins, Liberto Cruz e, mais tarde, Jorge Campinos e, naBlgica, Bernardino Gomes. O Fernando Loureiro vivia na Sua e na Alemanha esta-vam o Carlos Novo, o Desidrio Lucas do , o Carlos Queixinhas e o Gomes Pereira.Em 1971 fui viver para a Sucia onde lanaria um novo ncleo com metalrgicos daconstruo naval dos estaleiros da Kockums, entre os quais Mrio Nobre, ArmindoCarrilho e o Jos de Matos. Estes e mais ou menos meia centena de pessoas residen-tes em Portugal constituam ento a totalidade do movimento socialista portugusembora, anos mais tarde, num sintomtico gesto da grande maleabilidade histrica quetem caracterizado o Partido Socialista, a lista de fundadores fosse refeita para no ferirsusceptibilidades, passando a integrar cento e onze nomes. Foi-me ento atribudo o

    nmero quarenta e trs, embora data da minha adeso no existisssem na ASP, queprecedeu o Partido Socialista, mais de vinte elementos.

    A corajosa campanha de Humberto Delgado, no final dos anos 50, criara umagrande esperana no seio da maioria dos portugueses. Era a primeira vez, desde o fimda Segunda Guerra Mundial, que simultaneamente Salazar, o Partido Comunista e ageneralidade dos portugueses verificavam ser possvel substituir a ditadura por umregime pluralista, semelhante ao dos outros pases da Europa Ocidental. A humilhanteexpulso de Portugal de Goa, Damo e Diu em 1961 e o incio das lutas armadas delibertao na Guin, em Angola e Moambique, em simultneo com a ignorante tei-mosia de Salazar em no querer compreender os ventos de mudana da descoloni-zao, conduziriam inevitavelmente ao xodo de dezenas de milhares de jovens por-tugueses para uma oposio activa ditadura, longe do alcance da PIDE, e ao crescenteisolamento internacional do Pas. Por outro lado, a crescente contestao maoista aocomunismo sovitico viria a pr fim ao monoplio que o PC detinha sobre a opo-sio portuguesa. Existiam, finalmente, condies para o aparecimento de um partidosocialista em Portugal, apesar do clima poltico, ento dominado pela histeria do ter-rorismo no Ultramar, no parecer favorvel criao de estruturas organizadas.

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    O nascimento da Aco Socialista, em 1964, representa assim um acto de grandeintuio poltica, que s a dedicao militante de Manuel Tito de Morais, a generosi-dade e os contactos internacionais de Francisco Ramos da Costa e o conhecido opti-mismo de Mrio Soares possibilitariam. Os ataques de que foi alvo do PC, dos in-meros grupos de extrema-esquerda e do prprio governo, indicavam a importncia quetal passo representara. Era o tempo do idealismo, da generosidade desinteressada e dasolidariedade. Nenhum de ns acreditava, contudo, que a queda do regime estivessepara breve nem ningum, ento, aderia Aco Socialista para fazer carreira poltica.Faziam-no porque imperavam, muito para alm da esperana, as convices, o senti-mento de luta pela justia social e pelo progresso de Portugal. Ou, como me escrevia

    Mrio Soares de Paris em 13 de Janeiro de 1971, num momento de invulgar pessi-mismo: infelizmente desagregao do ambiente situacionista no tem correspondidoum reforo do trabalho da Oposio. Aps o entusiasmo eleitoral, a Oposio, tantoCEUD como CDE, entrou numa espcie de hibernao. As pessoas tm medo e noquerem fazer nada, pelo menos no plano propriamente poltico.

    Quando Albert Carthy, secretrio-geral da Internacional Socialista, visitou Portu-gal em 1966, estabeleceria os primeiros contactos com democratas portugueses e reco-mendaria ao bureau daquela organizao a necessidade de contactos regulares com asforas democrticas de Portugal, da Espanha e da Grcia. A Internacional Socialistaera ento um pequeno clube poltico dominado pelo Partido Trabalhista Britnico.Limitava as suas actividades coordenao de posies dos partidos do norte e cen-

    tro da Europa1 e vivia psicologicamente balizado entre o drama da Repblica de Wei-mar e o pavor da guerra-fria. O seu prestgio estava em vias de extino por desem-penhar, no ps-guerra, um papel exclusivamente eurocentrista e ter resignado a suavocao internacionalista a um comprometedor low-profile.

    Foi durante este perodo que Ramos da Costa iniciou uma srie de contactos inter-nacionais, com o apoio de Manuel Tito de Morais que, a partir de Roma, onde se exi-lara, contava com o patrocnio do pequeno mas sempre solidrio Partido Socialista dePietro Nenni e Francesco De Martino. Em 1969, o secretrio das relaes internacio-nais do Partido Socialista Austraco, Hans Janitschek, fora eleito secretrio-geral daInternacional Socialista. A sua eleio fazia parte de um esforo concertado para dina-mizar a organizao entre Olof Palme, que nesse mesmo ano ascenderia lideranado Partido Social-Democrata e primeiro-ministro da Sucia e dois dirigentes que ossuecos tinham acolhido e protegido durante a guerra: o lder do SPD, Willy Brandt,que na altura era vice-chanceler e ministro dos Negcios Estrangeiros da RepblicaFederal da Alemanha e Bruno Kreisky, lder do Partido Socialista Austraco e ento

    ' O Partido Trabalhista de Israel era tambm um importante partido da Internacional Socialista.

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    candidato a primeiro-ministro do seu pas. Falavam em comum a lngua sueca e acre-ditavam militantemente no modelo poltico escandinavo.

    A eleio de Hans Janitschek, apoiada por estes dirigentes que constituam a cha-mada Trindade Socialista1, viria a representar uma verdadeira revoluo, durante osseis anos em que ele permaneceu frente das iniciativas da IS. Grande parte do novompeto da organizao seria dedicado ao contacto e apoio promovido por Hans Janits-chek a grupos perifricos como a Aco Socialista, o PASOK da Grcia e outros movi-mentos afins do Terceiro Mundo, como foi o caso da Unio Progressista Senegalesade Leopold Sedar Senghor, que viria dai- lugar ao Partido Socialista do Senegal. Estapoltica de abertura e de solidariedade internacional, que caracterizou o mandato do

    jovem secretrio-geral austraco, seria contudo rodeada de controvrsia. Alguns diri-gentes no concordariam com a abertura ao sul, outros acus-lo-iam de excesso deprotagonismo e, quando, em 1976, Brandt foi nomeado presidente da InternacionalSocialista, no Congresso de Genebra, Janitschek seria afastado para um lugar desegundo plano2.

    Foi exactamente Hans Janitschek, no prprio ano em que tomaria posse dos desti-nos daquela organizao, quem chefiou a misso da Internacional Socialista para obser-var as eleies legislativas de 1969 o que lhe valeu, assim como aos seus companhei-ro s3 a deteno pela PIDE e a expulso do Pas, que Marcello Caetano justificaria comoingerncia na poltica interna de Portugal. Janitschek conhecera Mrio Soares noII. 0 Congresso da IS em Eastbourne, em que fora eleito secretrio-geral, e lembra queeste usou da palavra durante seis minutos e era ento um ilustre desconhecido daslides internacionais, referido na lista de participantes como senhor Soares, proeminentesocialista portugus4. Foi ainda graas aos esforos de Janitschek que a Aco Socia-lista veio a integrar a Internacional Socialista em 1972. No sem alguma contestaointerna na minscula ASP e, sobretudo, na prpria Internacional Socialista.

    Foi tambm nesta ocasio que conheci Mrio Soares, no pequeno hotel em St.John's Wood onde aquela organizao habitualmente hospedava os seus convidadosde menor relevo. Tambm nesta altura eu demonstraria vontade de aderir ASP, emvirtude dos contactos que vinha mantendo com Manuel Tito de Morais e com o Por-tugal Socialista. A formaliza o da minha adeso s teria, contudo, lugar em Janeiro

    1 Hans Janitschek, Mrio Soares Portrait of a Hero, p. 26, Widenfel d & Nicolson, Londres, 1985.2 Hans Janitschek seria convidado por Kurt Waldheim para consultor da ONU, em Nova Iorque,

    lugar que ainda detm.3 Pierre Schori da Sucia, Brendan Halligan da Irlanda, Tom McNally da Gr-Bretanha, Vera

    Mathias da IS e dois italianos, do PSI e do PSDI.4 Hans Janitschek, ob. cit., p. 31.

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    de 1970, quando Manuel Tito de Morais me escreveu dizendo que a conversa que comeles tivera fora o suficiente para mostrar a nossa afinidade ideolgica, at e sobre-tudo, nas crticas e dvidas que [eu apresentara] sobre a ASP. Confesso no me recor-dar das dvidas ento abordadas, mas se tivermos em conta a predominncia dos gru-pos de extrema-esquerda entre os jovens que, como eu, se tinham exilado em Londres,ento essas dvidas incidiam certamente sobre questes como se a ASP se propunhamesmo lutar pelo verdadeiro socialismo democrtico ou se, semelhana do quedepreciativamente denominvamos social-democracia, a ASP no passaria de umamera organizao neo-marcelistaEsta era a linguagem utilizada pelos grupos pol-ticos da emigrao, em que predominavam jovens da extrema-esquerda que se viram

    forados a abandonar uma confortvel classe mdia no nosso pas para lavar pratospor essa Europa fora.

    Segundo Manuel Tito de Morais, todas as respostas que eu procurava estavam con-tidas no livro que era foroso ler e divulgar, de Vitorino Magalhes Godinho, O Socia-lismo e o Futuro da Pennsula. Vitorino Magalhes Godinho era considerado, em 1970,o nosso terico2 mas, curiosamente, acabaria por cair praticamente no esqueci-mento. No ser alheio a isto, mais do que o seu radicalismo, a sua oposio a MrioSoares, que ele considerava no ter uma ideia consistente3. Mas contribuiu para aconfusa definio ideolgica da Aco Socialista, cujo oportuno lanamento noassenta em bases muito slidas, nem define com rigor as suas origens. Reclama-se her-deira de Marx e da Primeira Internacional, do minsculo e elitista Partido Socialista

    criado em 1875 por Antero de Quental e Jos Fontana e at do Movimento Republi-cano que dominaria de forma anrquica a cena poltica portuguesa at ao aparecimentoda ditadura em 1926.

    O fundador da ASP e primeiro lder do movimento, Mrio Soares, reconhece paraele prprio a influncia do socialismo humanista e cooperativista de Antnio Srgio eat o pensamento estalinista do seu antigo professor, Alvaro Cunhal. A verdade que,contrariamente ao que acontecia pelo resto da Europa, e at na vizinha Espanha como Partido Socialista Operrio fundado por Pablo Iglsias, em Portugal, a Aco Socia-lista, primeiro, e o Partido Socialista, a partir de 1973, para alm dos textos de MrioSoares que iriam sendo oficializados, nada tm que ver com os grandes movimen-tos socialistas da classe operria do fim do sculo dezanove.

    1 Corriam rumores entre os exilados de que Mrio Soares s no aceitara o convite do director decampanha de Marcello Caetano, Guilherme de Mello e Castro, para integrar as listas da ANP, em 1969,porque pretendia a garantia de um lugar no governo.

    2 Carta de Manuel Tito de Morais de 24/1/1970.3 Entrevista de Vi torino Magalhes Godinho, Semanrio de 20/10/84 .

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    A precursora do Partido Socialista no tinha qualquer passado histrico. Nascerana dcada de 60 um pouco como quem regista uma patente por iniciativa de um grupode conspiradores e de operacionais, na sua maioria ligados Maonaria, e de algunstericos influenciados pelo PCP, como foi o caso de Salgado Zenha e do prprio Vito-rino Magalhes Godinho. A evoluo terica do movimento, mais de trs dcadas apsa sua constituio, assim essencialmente caracterizada mais por razes empricas deconvenincia dos seus operacionais do que pelas teses dos seus idelogos ou pelosprincpios doutrinrios que emanam do socialismo democrtico. Esta caracterizao,que viria a ficar clebre quando o lder da oposio, Francisco S Carneiro, acusou oento primeiro-ministro Mrio Soares de meter o socialismo na gaveta com a fina-

    lidade de se manter no poder atravs de uma coligao com o partido democrata-cris-to, CDS, verifica-se frequentemente na prtica seguida desde 1964. Seria mesmomotivo de algum desdm por parte dos sociais-democratas norte-europeus que consi-deravam verdadeiramente ridcula a constante necessidade de demarcao dos socia-listas portugueses em relao social-democracia, a cuja famlia queriam pertencerembora afirmassem ser socialistas democratas e no sociais-democratas. Era um manei-rismo influenciado por Franois Mitterrand, que a Internacional Socialista consideravauma expresso de retrica e pura hipocrisia, com o objectivo de parecerem mais pro-gessistas aos olhos do mundo. Era alis um sintoma tpico do Sul da Europa, que umproeminente poltico norte-americano, anos mais tarde, comentaria com ironia, em ter-mos semelhantes aos de S Carneiro1.

    Mas no obstante a subtil distino e a demarcao progressista dos seus prin-cipais dirigentes, a verdade que a adeso dos socialistas portugueses InternacionalSocialista representa o ponto mais alto do movimento no perodo que antecedeu o 25de Abril de 1974. Na histria do PS, a sua filiao internacional sobressai destacada-mente da manifesta probreza do seu passado. O PS, sobrevivente apagado dos anos30, que no resistiu, como organizao autnoma, represso e clandestinidade, queno final da Segunda Grande Guerra era constitudo apenas por um pequeno grupo deabencerragens, sem qualquer influncia real no Pas 2.

    Em 1964, com Ramos da Costa e Tito de Morais no exlio, e os grupos de Lis-boa, do Porto e de Coimbra animados por homens como Jos Magalhes Godinho,

    Gustavo Soromenho, Raul Rego, Salgado Zenha, Jos Ribeiro dos Santos, Catanho de

    1 George Schultz, secretrio de Estado dos E.U.A. durante a presidncia de Ronald Reagan, afirmaque no seu primeiro encontro com Gonzlez este lhe ter dito ter aprendido com o presidente francs,Franois Mitterran d, a no implemen tar o program a socialista e a utilizar a poltica de mercad o. GeorgeSchultz, Turmoil & Triumph, p. 151, Mac Millan Publi shing Co., Nov a Iorqu e, 1993.

    2 Cem Anos de Esperana, Edies Portugal Socialista, Lisboa, 1979.

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    Menezes, Antnio Macedo, Mrio e Carlos Cal Brando, lvaro Monteiro, Costa eMelo, Fernando Vale, Antnio Arnaut, Antnio Campos e mais uma escassa centenade esforados militantes, espalhados pelo Pas formou-se a Aco Socialista Por-tuguesa. Iniciaram-se ento os primeiros contactos internacionais. Em 1969, na falsaprimavera caetanista, a ASP dinamizou uma campanha eleitoral semilegal e comple-tamente frustrante, a CEUD. Era apenas um embrio. Porm, em 1972, no Congressode Viena, a ASP admitida como partido membro na Internacional Socialista1. De1964 a 1972, e mesmo at 1974, s dois acontecimentos de relevo, ambos influen-ciados do exterior, teriam lugar na histria do movimento: A entrada na InternacionalSocialista em 1972 e a fundao do Partido Socialista em Bad Munstereifel, na Rep-

    blica Federal da Alemanha, em 1973, sob os auspcios da Fundao Friedrich Ebert.Pelo meio s a frustrante dinamizao da Comisso Eleitoral de Unidade Demo-crtica em 1969. No entanto, esta filiao, quer pela ausncia de suporte popular demovimentos de cariz socialista quer pela sua evidente falta de credenciais ideolgicas,seria vital para a sobrevivncia do Partido Socialista. A sua volta iriam desenrolar-seas principais e quase nicas actividades do movimento socialista portugus. ManuelTito de Morais e Francisco Ramos da Costa seriam os elementos chave para o lan-amento internacional quer da ASP quer do PS e foi por seu intermdio que MrioSoares veio a estabelecer as suas primeiras relaes internacionais pelo menos na reada esquerda2. Apesar dessa realidade, subsistia um complexo de inferioridade dos diri-gentes socialistas em relao ao PC, que os levava a fazer declaraes mais para agra-

    dar esquerda festiva pequeno-burguesa e sem qualquer noo dos acontecimentoshistricos em que participavam3.

    Em Janeiro de 1970, Manuel Tito de Morais esclarecia-me de que a ASP no filiada na Internacional Socialista, havendo srias reticncias da parte de alguns com-panheiros nossos e com razo a filiarmo-nos numa organizao que toma atitu-des um pouco estranhas na poltica internacional. Contudo, apesar de no sermos filia-dos eles esto sempre dispostos a ajudar-nos e alguma coisa tm j feito paradesmascarao do marcelismo, influindo at junto dos governos ocidentais. Evidente-mente que isto que lhe digo inteiramente confidencial e serve s para o informar danossa posio.... Mas para muitos outros At 1969, a ASP "tinha uma carga social-democrata" que no agradava a muitos sectores da esquerda [que] para ingressarem na

    1 Cem Anos de Esperana, Edies Portugal Socialista, Lisboa, 1979.2 Mr io Soai es, Le Portugal Baillon, p. 206, Calm ann-Le vy, Paris , 1972.3 Tony Benn ( The End ofan Era - Diaries 1980-1990, p. 108, Arrow Books, Londres, 1994) diria,

    aps um encontro com Mrio Soares em Lisboa, t-lo achado, ao contrrio do que esperara, um pobrevaidoso sem uma verdadeira noo dos acontecimentos histricos em que participava.

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    organizao de Mrio Soares colocaram condies. Defendiam o marxismo como "ins-pirao terica predominante" contra qualquer tentao social-democrata'.

    Em 1970 a Internacional Socialista examina as suas ligaes Aco SocialistaPortuguesa, por presso de alguns partidos com responsabilidades governamentais,entre os quais se conta o SPD, alarmados com a desproporo entre o discurso dosseus dirigentes e o exguo apoio popular demonstrado pela CEUD2 . Por outro lado,Marcello Caetano, convencido das suas boas relaes com a administrao do Presi-dente Nixon, tenta convencer os outros parceiros europeus da NATO de que o seuregime ir evoluir progressivamente para uma democracia poltica. O relatrio, de8 de Maro de 1971, da viagem que o ento deputado Assembleia Nacional, Manuel

    Jos Homem de Mello, efectuara R.F.A. a convite do governo alemo, enviado aMarcello Caetano, evidencia isso mesmo. Segundo este antigo caetanista, no encon-tro organizado pelo Ministrio dos Negcios Estrangeiros alemo com o director dasrelaes internacionais do Partido Social-Democrata alemo, Hans Eberhard Dingels,este revelou imediatamente estar a par da situao portuguesa, referindo acreditar nahonestidade de processos e no desejo de evoluir manifestado pelo presidente MarcelloCaetano. Ainda segundo Homem de Mello, Dingels aconselhara Mrio Soares amoderar os mpetos, afirmando-se partidrio e admirador convicto da experinciapoltica portuguesa em curso que, se viesse a falhar, s poderia ter como consequn-cia a tragdia fascista ou a ditadura comunista 3.

    Tudo indica que Caetano seria convencido pelos seus conselheiros de que osargumentos usados por Salazar em 1945 surtiriam efeito vinte e cinco anos depois entreos sociais-democratas do centro e norte da Europa, conhecidos como eram pelas suasfortes tradies anti-comunistas. Mas, acontece que apesar de ter encontrado algumareceptividade, como revela Homem de Mello, a oposio poltica colonial desen-volvida por fortssimos lobbies norte-americanos e a posio dos governos sociais--democratas da Escandinvia, a juntar aos j mais do que evidentes avanos militarese diplomticos dos movimentos de libertao em Moambique e na Guin, contribui-riam para impedir que a histria se repetisse.

    Nesse ano, aps reunio realizada em Paris, no ms de Maio, para eleger a suacomisso directiva,4 a ASP decidiria fazer uma consulta aos seus parcos militantes

    1 Antnio Reis ao Dirio de Notcias d e 1 6 / 0 4 / 1 9 9 3 .2 Conversa com o ento secretrio-geral da Internacional Socialista. Hans Janitschek, em Lisboa, no

    dia 5.10.93.3 Jos Freire Antunes, Cartas Particulares a Marcello Caetano, 2 vol., pp. 334 a 340, Publicaes

    Dom Quixote, Lisboa, 1985.4 Seriam eleitos para a C.D. da ASP, Tito de Morais (organizao), Mrio Soar es (relaes internacio-

    nais), Ramos da Costa (tesouraria), Gil Martins (imprensa) e Fernando Loureiro e Rui Mateus (juventude).

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    sobre a clarificao exigida pela IS. Manuel Tito de Morais, ento o principal res-ponsvel pela organizao, admite mesmo existir um problema com a InternacionalSocialista. Existiam ento relaes com a IS de pura camaradagem [sem] nenhumcompromisso nem nenhuma ligao orgnica. Mas, somos solicitados para esclare-cer a nossa posio [no obstante as] muitas incgnitas no campo ideolgico 1. ParaManuel Tito de Morais a nossa adeso [implicaria] transformar a ASP em Partido,apesar de ele ter, ento, as maiores dvidas de que sejamos capazes de o fazer, con-siderando um partido a srio, que no seja uma mistificao1.

    O ento responsvel pelas relaes internacionais tinha uma posio semelhante,se bem que muito menos sincera, que a de Manuel Tito de Morais. Era claramente

    influenciada pelos mitos anti-social-democratas do PCP e da esquerda francesa deento, camuflando as caratersticas do burgus respeitvel e do enfant gat2 qu eera, no lhe satisfazendo nenhum dos modelos socialistas [ento] em aplicao nomundo,3 uma vez que acusava as experincias para-socialistas dos sociais-demo-cratas que, sozinhos ou atravs de coligaes, conquistaram o poder em vrios pasesda Europa Ocidental... de falta de consequncia e de vigor doutrinrio que os condu-ziu quase sempre situao de leais gestores do capitalismo3. Para ele, o modelo deverdadeiro socialismo democrtico, que se propunha aplicar em Portugal, deveria sermuito diferente daquele conduzido pela famlia social-democrata, a que pediria ade-so um ms depois, e passava por uma sociedade na qual os meios de produo[seriam] colectivizados ao servio de todos, ao mesmo tempo que os poderes de deci-

    so [seriam] democraticamente controlados pela base4.Vivamos numa poca em que os primeiros fundadores do movimento socialista

    contemporneo portugus, com relevo para Mrio Soares, defendiam um papel subal-terno em relao ao Partido Comunista. O que em grande parte s no acontecia porrazes que, penso, se prendiam mais com a arrogncia e miopia de lvaro Cunhal ecom a sua, j ento, gerontocrtica direco poltica, do que com a oposio lcidados percursores do PS.

    Nas trs dcadas que separam a ditadura militar de 1926 da candidatura do gene-ral Humberto Delgado, em 1958, a oposio portuguesa seria exclusivamente domi-nada pelos comunistas, sobretudo aps a reorganizao do Partido Comunista Portu-gus liderada por lvaro Cunhal, em 1941. O total afundamento dos socialistasportugueses aps a implantao da Repblica, e a ausncia de outras alternativas demo-

    1 Circular confidencial da ASP de 28/09/1971.2 Mrio Soares , Portugal: Que Revoluo?, p. 9, Perspectivas e Realidades, Lisboa, 1976.3

    Le Portugal Baillon, p. 287.4

    Idem, p. 288.

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    crticas credveis, impediriam que a vitria dos Aliados na Segunda Grande Guerra jogasse a favor da implantao de um regime democrtico em Portugal. Os grupos deoposio ao regime salazarista encontravam-se totalmente dispersos e destitudos deobjectivos. As suas poucas iniciativas no encontrariam o menor eco junto dos portu-gueses e todos os contactos com foras democrticas internacionais permaneceriaminteiTompidos. As organizaes de oposio ditadura, como Movimento de UnidadeNacional Anti Fascista (MUNAF) criado em 1943 e, depois, o Movimento de UnidadeDemocrtica (MUD), eram impulsionados pelo Partido Comunista e no resistiriam tentao de apressarem a queda da ditadura por mtodos violentos ao mesmo tempoque, utilizando o nome de alguns democratas, aspiravam a uma vida legal que pro-

    clamava a mudana pela via eleitoral. Assim, o ex-ministro da l. a Repblica e presti-giado gro-mestre da maonaria, general Norton de Matos, enquanto presidente doMUNAF encabearia em Agosto de 1945 o falhado golpe de estado constitudo poroficiais fiis ao Partido Comunista e reapareceria, em 1949, como candidato s elei-es presidenciais sob a bandeira da Oposio Democrtica Unificada. O MUD,entretanto, tinha sido dissolvido no ano anterior, em 1948, aps vrias tentativas falha-das de golpes de estado e revoltas militares. O longo perodo de isolamento interna-cional dos socialistas e a impotncia dos grupos da chamada oposio democrtica parase autonomizarem em relao aos comunistas impediria os aliados de descortinaremno nosso pas a existncia de foras democrticas alternativas e o prprio MUD juve-nil seria acusado alguns anos mais tarde de cer a emanao pura e simples do Par-

    tido ComunistaA situao de marginalidade e de profundas contradies em que vivia a chamada

    oposio democrtica seria exemplarmente tipificada por um dos seus dirigentes quegarante poder afirmar, com conhecimento de causa, que [aquele movimento juvenil]no o foi, apesar de um nmero dos seus dirigentes estar ligado ao Partido Comunista. verdade que [o PC] foi um dos seus motores essenciais, mas no foi o nico... Defacto, a maior parte dos aderentes no tinha posio ideolgica definida e situava-senuma perspectiva unitria antifascista1! E bvio que, no limiar da guerra fria, entreo brilhante golpe estratgico de Salazar posicionando-se, aos olhos dos aliados vence-dores, a Gr-Bretanha e os EUA, como um bastio da luta contra o comunismo e

    as afirmaes do pequeno grupo de abencerragens, sem qualquer influncia real noPas2 de que a oposio a Salazar era constituda na sua maior parte por aderentesque no tinham posio ideolgica definida e se situavam numa perspectiva unitriaantifascista, era mais convincente a posio do matreiro ditador.

    1 Le Portugal Baillon, p. 58.2 Mrio Soares no prefcio do livro Cem Anos de Esperana.

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    Na realidade, a incapacidade dos socialistas e dos democratas portugueses para seorganizarem e manterem relaes com os seus congneres europeus, aps o desalentoem que caram com as divises da l. a Repblica, permitiram a quase exclusivaimplantao do Partido Comunista e inviabilizaram o estabelecimento de um regimedemocrtico em Portugal, em 1945. E, no obstante a grande desiluso da chamadaoposio democrtica portuguesa perante a opo dos vencedores da Guerra, nema vitria de Clement Attlee1 e dos trabalhistas britnicos, em 1945, valeu aos socia-listas portugueses. que, se os havia, ningum no resto da Europa sabia onde esta-vam. Mesmo assim, em 1973, a conscincia do seu passado de relaes subalternasem relao aos comunistas e a evidncia dos maus resultados a que esse relaciona-

    mento conduzira Portugal anteriormente no seriam motivos suficientes para demo-ver a direco do ainda jovem movimento socialista de um acordo com o PartidoComunista. Mrio Soares, desiludido com as promessas da primavera marcelista ecom o resultado da CEUD nas eleies de 1969, iniciaria uma longa viagem voltado Mundo, acabando por se exilar em Frana, em 1970, aps garantida a sua sobre-vivncia econmica enquanto consultor do grupo econmico de Manuel Bullosa2.Neste pas acabaria por ser profundamente influenciado pela plataforma unitria queMitterrand viria a estabelecer com Marchais, passando ento a ser o principal defen-sor de um acordo entre os socialistas portugueses e o Partido Comunista, segundo omodelo francs e a que chamaria contrato poltico. E, sem grandes consultas ao seupequeno grupo poltico, este contrato transformar-se-ia num pacto de governo, aps

    reunio clandestina dos dois partidos que teve lugar em Paris, em Setembro desseano. Do qual, por sua vez, s no resultou um programa de aco comum, porque oPC desconfiava das expectativas que os fundadores da ASP tinham manifestado emrelao chamada primavera marcelista e estava convencido de que os socialistasno tinham o menor peso no que eles consideravam ser o conjunto do movimentodemocrtico portugus.

    De facto, o nico trunfo dos socialistas era o terem sido admitidos, um ano antes,na Internacional Socialista. Organizao que a Unio Sovitica pretendia penetrar, ape-sar das crticas s suas caractersticas social-democratas! Mas o PCP, emboraseguindo as superiores directivas do PCUS3 em matria de poltica externa, estava des-

    1 Clement Attlee foi lder do Partido Trabalhista e primeiro-ministro da Gr-Bretanha de 1945 a1955. A emergncia dos trabalhistas aps a Segunda Grande Guerra chegou a convencer muitos anti--salazaristas de que esse simples facto seria o suficiente para a queda do ditador portugus.

    2 Manuel Bullosa foi um dos principais empresrios portugueses de antes do 25 de Abril. Era donodo Crdito Predial Portugus, Sacor e Banco Franco-Portugus, de Paris.

    3 Partido Comunista da Unio Sovitica.

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    fasado da realidade nacional e preferiria desenvolver a sua relao de domnio sobreo MDP/CDE, em detrimento do potencial e das virtualidades da aliana desejadapor Soares. Mas, para o lder socialista, sob fogo cruzado da propaganda do regime eda extrema-esquerda, o acordo com o PC seria uma credencial preciosa que dissipariaalgumas dvidas no seio da Internacional Socialista. Dvidas semelhantes s que exis-tiam em relao a Franois Mitterrand. O acordo de Soares com o PC jamais seria,contudo, um acordo honroso para os socialistas, dada a evidente subalternidade em quese colocavam. To-pouco vinha ao encontro da orientao seguida pela esmagadoramaioria dos partidos irmos da Europa. Mas, apesar disso, Soares desenvolveriatodos os esforos para o dar a conhecer junto dos parceiros da IS, pedindo-me mesmo

    que o traduzisse para sueco, o divulgasse e o mostrasse ao Partido Social-DemocrataSueco1.

    Como analisarei mais frente, o sonho unitrio da maioria do PS s terminaria em1975, aps a clebre declarao de Salgado Zenha contra a unicidade sindical. MrioSoares demoraria, contudo, bastante mais tempo a assumir esse divrcio.

    A transformao do pequeno grupo que constitua a Aco Socialista no PartidoSocialista era, acima de tudo, mais do que uma necessidade sentida, uma exigncia daInternacional Socialista. Demonstrava o empenhamento e generosidade do secretrio--geral Hans Janitschek e o crescente sentimento da social-democracia europeia de queera necessrio a todo o custo romper com a sua tradicional filosofia eurocentrista. Ape-sar disso, as relaes internacionais iniciadas por Ramos da Costa e Tito de Morais apartir de 1964 s seriam elevadas a um nvel prestigiante bastante depois da revoluodo 25 de Abril e em virtude da percepo de alguns dos principais dirigentes da Inter-nacional Socialista de que o que estava em jogo, em Portugal, era a possibilidade de,pela primeira vez na histria, os mencheviques poderem derrotar os bolcheviques.

    Alis, a prpria sobrevivncia do socialismo democrtico estava em jogo. A datada fundao da Aco Socialista, os primeiros contactos internacionais foram efectua-dos por Francisco Ramos da Costa que vivia exilado em Paris e que, pela sua natu-reza generosa e extrovertida, criaria grande simpatia entre alguns dirigentes socialis-tas. Participaria, nomeadamente, na reunio da Internacional Socialista que teve lugarem Estocolmo em 1968 e foi presidida pelo popular primeiro-ministro sueco, TageErlander. A sua deslocao fizera-se a convite do j mencionado secretrio-geral daInternacional Socialista, Albert Carthy. Em Estocolmo conheceria, entre outros, WillyBrandt, Olof Palme, Golda Meir, Bruno Kreisky e o ento presidente da IS, o austracoBruno Pitterman. Vindo de Argel, onde deixara os conflitos pessoais e polticos emque os membros da Frente Patritica de Libertao Nacional se vinham envolvendo

    1 Carta particular de Mrio Soares, de 28/09/1973.

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    cada vez mais, tambm Manuel Tito de Morais viria a encontrar em Roma a protec-o do Partido Socialista Italiano, ento dirigido por Francesco de Martino. O que lhefacilitaria, igualmente, importantes contactos junto dos partidos socialistas europeus.Em Lisboa, tambm Mrio Soares tinha, desde o incio da dcada de 60, estabelecidocontactos com um funcionrio da embaixada da Dinamarca, simpatizante do PartidoSocial-Democrata Dinamarqus, xel Buus1 e com um funcionrio da embaixada dosEstados Unidos, de nome Diego Ascensio. Um outro contacto internacional do inciodos anos 60, que provaria vir a ter grande utilidade para a carreira de Mrio Soares,foi a amizade que estabeleceu com Marvin Howe, jovem correspondente itinerante do

    New York Times em Lisboa e na capital marroquina, Rabat. Depois de algumas men-

    es na imprensa internacional, Marvin Howe conseguiria junto de um grupo de libe-rais norte-americanos, seus amigos, que se reclamavam das tradies de Norman Tho-mas2, juntar alguns correspondentes estrangeiros no Overseas Press Club de NovaIorque com quem Soares comentaria os seus pontos de vista sobre a poltica colonialde Marcello Caetano. E, graas assustadora mediocridade e provincianismo dosgovernantes de ento, Mrio Soares, ainda em Nova Iorque, seria aconselhado a noregressar a Portugal.

    O governo portugus conhecia de antemo as suas posies sobre a guerra colo-nial, mas desconhecia por completo o funcionamento da comunicao social interna-cional, confundindo telegramas das agncias noticiosas com campanhas antiportugue-sas na imprensa internacional. Marcello Caetano no se conteve e, deixando cair a

    ltima mscara de tolerncia e de abertura que evidenciara quando tomara posse poucomais de um ano antes, mandou instaurar um processo-crime ao dirigente socialista.A verdade que, apesar do empenho de Marvin Howe, os telegramas dos correspon-dentes que participaram na dita conferncia de imprensa do Overseas Press Clubpouco eco teriam ento na imprensa internacional. Segundo o ex-ministro dos Neg-cios Estrangeiros de Salazar, Franco Nogueira, revelaria ao historiador Jos FreireAntunes, Marvin Howe no era ainda uma correspondente, mas uma principiante 3.Tal no corresponde, contudo, verdade. Tendo em conta que sobre ela j na alturarecaam suspeitas de ser uma conexo da CIA 4 e conhecidas as ligaes de grandesrgos de comunicao social americanos com os servios secretos como viria a serconfirmado pela Comisso de Inqurito a que presidiu o congressista norte-americano

    1 xel Buus seria nomeado embaixador da Dinamarca em Portugal em 1985.2 Norman Thomas, seria o grande pioneiro do Movimento Socialista dos Estados Unidos da Amrica.3 Jos Frei re Antunes, Os Americanos e Portugal, vol .I, p. 90, Publ icaes Dom Quixote, Lisboa,

    1986.4 Jos Freire Antunes, ob. cit., p. 91.

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    Edward Boland', ento no s ela no seria uma principiante, como seria mesmo umagrande profissional e foi por obra e graa dos seus esforos que Mrio Soares come-ou a ser conhecido da imprensa internacional. Foi, alis, atravs dos seus textospblicos e das suas recomendaes margem do jornalismo, que a CIA poucoatenta oposio portuguesa durante os anos de Johnson aprendeu a soletrar o nomede Mrio Soares2. De qualquer modo, foi a partir das iniciativas da correspondentedo New York Times e, em particular, de uma carta que ela enviaria ao Special Assis-tant to the President, Bill Moyers 3, em Outubro de 1965, que Mrio Soares iniciariauma srie de contactos com um dos membros da delegao da CIA em Lisboa. MrioSoares refere-se a esses co ntactos no seu livro Portugal Amordaado como contactos

    com um secretrio da embaixada americana em Lisboa 4 mas tudo leva a crer que j se trataria de Diego Ascencio, que o ento chefe de informaes da PIDE lvaroPereira de Carvalho, identificaria como sendo um dos membros da pequena estaoda CIA em Lisboa3. Ascencio seria uma das relaes mais precisosas de ento deSoares e ainda hoje continuam a manter relaes de amizade.

    No admira, portanto, que ainda hoje muitas pessoas continuem a ter uma imagemdistorcida do que uma certa imprensa difundiria em tons dourados, aps 1974, sobreos chamados contactos internacionais dos socialistas portugueses e do Partido Socia-lista. Com as incessantes romarias polticas do ps 25 de Abril e a constante exibiode grandes figuras da cena poltica europeia e norte-americana, como Harold Wilson,James Callaghan, Olof Palme, Willy Brandt, Bruno Kreisky e, entre muitos mais,Edward Kennedy, ficar-se-ia com a ideia de que estes no s protegiam e apoiavam aAco Socialista Portuguesa com mundos e fundos como recebiam, de braos abertos,os seus dirigentes no exlio ou na clandestinidade. Nada poderia ser mais diferente, sebem que esta distoro da histria tivesse ento algo de premeditado.

    1 Na sequncia do inqurito sobre as relaes da CIA com os mediu a que presidiu o congressistaEdward Boland, o famoso colunista Cyrus Sulzberger, da famlia proprietria do jornal New York Times,admitiria que era normal a existncia de contactos regulares entre correspondentes daquele dirio noestrangeiro com agentes da CIA. Entre outras actividades apuradas encontrava-se o financiamento deeditoras, o reconhecimento de que dezenas de agentes da CIA tinham trabalhado como correspondentesestrangeir os de jorna is america nos e agncias noticios as. Um artigo sobre o assunto, da autoria de

    Cyrille Fali, The CIA and the Media: An Overview, seria publicado pela primeira vez em 20/02/1978na revista Afrique-Asie, de Paris.2 Jos Freire Antunes, ob. cit., p. 91.3 Marvin Howe escreveria uma carta ao acessor do presidente Lyndon Johnson a oferecer-se para

    pr a Administrao americana em contacto com porta-vozes qualificados da oposio. Jos FreireAntunes, ob. cit., p. 90.

    4 Mrio Soares , Portugal Amordaado p. 540, Arcdia, Lisboa, 1974.5 Jos Freire Antunes, ob. cit., p. 56.

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    Em circunstncias que descreverei noutros captulos, eu teria a grande honra deconhecer em 1983 o ento presidente de Moambique, Samora Machel. Era injusta-mente conhecido em Portugal pelas anedotas racistas que o transformavam sempreno intrprete vtima, ignorando totalmente os seus grandes dotes humanos. Acon-tece que Samora Machel gostava de contar ele mesmo histrias sobre os portugue-ses e s vezes, com grande sentido de fair play, transformava-se a si prprio navtima da anedota. Uma noite, numa conversa que teve comigo em Maputo, satis-faria a minha curiosidade sobre pormenores da transio dizendo-me, meio a srio meioa brincar, que, quando assumiu o poder pela primeira vez, uma das suas primeirasmedidas foi s sair rua com pelo menos o dobro dos motards da escolta policial que

    o antigo governador colonial utilizava. Para a populao diria perante o meu ar dedivertido espanto era um sinal de que o novo presidente moambicano era duasvezes mais importante que o ex-governador colonial! Ora vem esta maravilhosa his-tria a propsito da imagem que, no nosso pas, se vendeu com xito empobre-cida populao, farta do seu longo isolamento internacional. A ideia, a partir domomento que se sabe que os portugueses querem seguir um destino comum ao dosseus congneres europeus, de que quem tinha amigos ricos na Europa era rei! Chegar--se-iam mesmo a descrever relaes internacionais sem o menor sentido de modstiae das propores, tendo o lder socialista afirmado at ser evidentemente... amigopessoal do Schmidt, do Willy Brandt, do Callagham, do Olof Palme, do Yoergensen 1,do Kreisky, do Mitterrand, etc. Posso pegar em qualquer momento no telefone e falar

    com eles2. Mesmo que fosse verdade em 1979 e que, com excepo de Mitterrand,Mrio Soares conseguisse falar com qualquer desses amigos pessoais numa lingua-gem comum, esta afirmao visava o mesmo objectivo dos motards de Samora Machel.A realidade era contudo muito diferente, sobretudo, antes do 25 de Abril de 1974!

    Desde o lanamento da ASP que os socialistas portugueses encontravam imensasdificuldades em ser reconhecidos em termos de igualdade pelos seus congneres euro-peus e o acolhimento poltico e logstico aos dirigentes portugueses com excepoda ocasional foto protocolar em reunies internacionais estava longe de ser solid-rio e, muito menos, caloroso. Enquanto exilado, o lder do movimento socialista por-tugus nunca seria recebido oficialmente, nunca participaria em nenhuma confernciade imprensa conjunta, em nenhuma conferncia de lderes ou reunio bilateral pblicacom nenhum dos dirigentes da Internacional Socialista. No h registo de declaraesconjuntas de Soares com nenhum dos amigos acima mencionados e no se conhece

    1 Trata-se, segundo creio, do ex-primeiro-ministro da Dinamarca, Anker Joergensen.2 Mrio Soares, O Futuro Ser do Socialismo Democrtico, p. 134, Publicaes Europa-Amri ca,

    Lisboa.

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    um nico acto conjunto, nem sequer um simples almoo, que revele aquela intimidade.A excepo de Mitterrand, jamais conseguiria encontrar nos escritos de Palme, Kreisky,Brandt ou Wilson, nem to-pouco nas suas biografias, uma nica referncia ao lderportugus comprovativa daquela autoproclamada amizade. E estes so os exemplos dafamlia socialista. Em contraste, por exemplo, Felipe Gonzlez, apesar de pertencentea uma gerao mais jovem, frequentemente referenciado por todos eles. No seu livrode memrias, o ex-chanceler alemo e presidente da Internacional Socialista, WillyBrandt. diz mesmo que com o jovem Felipe Gonzlez.... [sentiu] uma forte ligaodesde o princpio1. A situao de desconsiderao pelo nosso esforo, enquanto diri-gentes polticos no exlio, era tal que Mrio Soares chegaria a ter mesmo momentos

    de desespero com os seus anfitries do Partido Socialista Francs que, apesar deestai" na oposio e ser, na cena internacional, um partido relativamente insignificante,raramente o recebia e s em casos excepcionais se encontrava com o ento secretriodas relaes internacionais, Robert Pontillon. E, apoio material, nem v-lo! Por outrolado. como j se disse, para alm da foto ou aperto de mo protocolares, os contactosdo lder portugus faziam-se de uma posio humilde e algo humilhante com funcio-nrios dos partidos da Internacional ou, como grande conquista, com os secretrios dasrelaes internacionais desses partidos. Estes exemplos de falta de solidariedade eramgeneralizados, mas para isso evidente que contribua o conhecimento dos partidosestabelecidos da exiguidade da nossa influncia na sociedade portuguesa, que con-trastava, no tamanho, com o radicalismo francesa dos dirigentes da Aco Socialista.

    Os socialistas europeus tinham a sensao de que o recm-nascido movimentosocialista portugus era uma criao artificial pequeno-burguesa ou, como diria maistarde o conhecido e radical ex-ministro britnico, Tony Benn, referindo-se ao lder doPS, bastava olhar para ele para ver que nada tinha que ver com o socialismo da classeoperria2. As dificuldades eram tais, que os poucos financiamentos teriam que serarrancados quase fora. Perante um pedido de ajuda para o ncleo da Aco Socia-lista que acabara de ser constitudo em Londres, o primeiro ncleo devidamente orga-nizado no exlio, o Partido Trabalhista respondia lamentar, mas no estar em posiode poder contribuir para a manuteno duma sede. Contudo, se conseguirem obter umespao talvez possamos contribuir com uma mquina de escrever, estantes, secretrias,

    etc., de que ns prprios j no necessitemos

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    .No mesmo ano, Bernt Carlsson, secretrio internacional do partido irmo da Su-cia escrevia a Mrio Soares em Paris: que a direco [do PSD sueco] considerou o

    1 Willy Brandt, Minnen, p. 324, Bergh & Bergh, Estocolmo, 1990.2 Tony Benn, Againsl the Tide. Diaries 1973-76, p. 445, Arrow Books, Londres, 1989.3 Carta do secretrio internacional do Partido Trabalhista Britnico de 20/07/1971.

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    seu pedido de ajuda financeira de 15 de Outubro, 1971. Foi decidido dar uma contri-buio de 10000 coroas suecas1, tendo, aps novo pedido de Mrio Soares, no anoseguinte, o referido funcionrio anunciado uma nova contribuio de 10000 coroassuecas2. Mesmo assim esta fonte, que tendo em conta os valores cambiais da altura,e as contribuies dos outros partidos, era extremamente solidria, parece ter secado.

    Manuel Tito de Morais escrever-me-ia em Novembro de 1973, pedindo-me para ira Estocolmo falar ao Carlsson. Ficou de se encontrar [com ele] aqui em Roma mas nodeu sinal de vida, depois de ter recusado a ajuda material que lhe pedramos. Deviasv-lo e falar tambm ao Schori 3, no para pedir nada mas para manter