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37 RESUMO CONVERGÊNCIAS E CONTROVÉRSIAS SOBRE A MUDANÇA INSTITUCIONAL: MODELOS TRADICIONAIS EM PERSPECTIVA COMPARADA Rev. Sociol. Polít., Curitiba, v. 20, n. 41, p. 37-51, fev. 2012 Recebido em 4 de abril de 2010. Aprovado em 16 de julho de 2010. Flávio da Cunha Rezende Inexiste trabalho que esclareça de fato o que vem a ser uma teoria neo-institucional da mudança e quais os elementos fundamentais para comparar-se, avaliar e construir tais teorias. O artigo propõe-se a refletir sobre esse problema. Realiza-se uma análise comparada ente quatro teorias tradicionais da mudança no novo institucionalismo. A análise apresenta os pontos de convergência e controvérsia no que diz respeito ao problema da endogeneidade, o papel das instituições formais e institucionais, padrões típicos de explicação, mecanismos causais e modos de causação típicos dos modelos neoinstitucionais. O propósito central é compreender como essas quatro abordagens tradicionais da mudança respondem aos desafios de promover a explicação dos processos de transformação institucional a partir das instituições. O estudo vai além de uma simples análise comparada de teorias e busca oferecer, de modo preliminar, um método de análise de teoria que crie condições possíveis para explorar dimensões essenciais das abordagens disponíveis sobre o problema da mudança institucional a partir do novo institucionalismo. Que elementos seriam constitutivos para representar efetivamente uma teoria neo-institucional? O método utilizado é construído a partir de problemas considerados fundamentais no avanço de uma teoria institucional. Para tanto, considera-se que um dos passos iniciais para a construção das teorias da mudança institucional seria associado, em tese, ao crescimento da demanda de análises comparativas de teorias, no sentido de compreender mais de perto quais seriam os problemas e os refinamentos necessários para a construção de teorias. PALAVRAS-CHAVE: novo institucionalismo; mudança institucional; teoria comparada; Ciência Social; Ciência Política. I. INTRODUÇÃO 1 A oferta de explicações da mudança 2 continua a representar um dos importantes desafios para a tradição neo-institucional 3 nas Ciências Sociais. O desafio básico reside na construção de teorias que possam explicar a emergência de novas instituições a partir de fatores considerados institucionais. A 1 O desenvolvimento das diversas categorias consideradas essenciais no método de análise comparada de teoria adotado resultou da observação comparada de um conjunto expressivo de modos de análise da mudança na tradição neo-institucional no contexto da pesquisa “O Novo Institucionalismo e os Limites da Explicação da Mudança Institucional na Ciência Política Contemporânea” financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ao qual manifesto a minha gratidão. 2 Peters (2005) considera que, a despeito da multiplicidade de novos institucionalismos, existem seis grandes “problemas” fundamentais no debate neoinstitucional contemporâneo. Esses problemas orientam as rotas de avanço da teoria institucional e organizam a reflexão sistemática sobre o tema. Os seis problemas são especificamente: a) o problema da regularidade versus diversidade; b) a questão da mensuração e verificação empírica; c) o problema da heterogeneidade conceitual; d) o problema da formação e agregação das preferências; e) o problema da mudança institucional; f) a relação entre comportamento individual e institucional. O problema da mudança institucional, portanto, seria um dos temas de maior dissonância entre as abordagens e autores neoinstitucionais e um dos pontos menos desenvolvidos dessas teorias. 3 Hall e Taylor (1996) sugerem que as preocupações centrais do(s) novo(s) institucionalismo(s) são basicamente: (a) a gênese institucional, que visa explicar por que e como as instituições (e a ordem social) emergem e (b) a mudança institucional que se volta para as análises de como e por que as instituições mudam.

CONVERGÊNCIAS E CONTROVÉRSIAS SOBRE A MUDANÇA … · “constituição” das teorias, isto é, as dimensões consideradas essenciais para a construção e desenvolvimento de teorias

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 20, Nº 41: 37-51 FEV. 2012

RESUMO

CONVERGÊNCIAS E CONTROVÉRSIAS SOBRE AMUDANÇA INSTITUCIONAL:

MODELOS TRADICIONAIS EM PERSPECTIVA COMPARADA

Rev. Sociol. Polít., Curitiba, v. 20, n. 41, p. 37-51, fev. 2012Recebido em 4 de abril de 2010.Aprovado em 16 de julho de 2010.

Flávio da Cunha Rezende

Inexiste trabalho que esclareça de fato o que vem a ser uma teoria neo-institucional da mudança e quaisos elementos fundamentais para comparar-se, avaliar e construir tais teorias. O artigo propõe-se a refletirsobre esse problema. Realiza-se uma análise comparada ente quatro teorias tradicionais da mudança nonovo institucionalismo. A análise apresenta os pontos de convergência e controvérsia no que diz respeitoao problema da endogeneidade, o papel das instituições formais e institucionais, padrões típicos deexplicação, mecanismos causais e modos de causação típicos dos modelos neoinstitucionais. O propósitocentral é compreender como essas quatro abordagens tradicionais da mudança respondem aos desafios depromover a explicação dos processos de transformação institucional a partir das instituições. O estudo vaialém de uma simples análise comparada de teorias e busca oferecer, de modo preliminar, um método deanálise de teoria que crie condições possíveis para explorar dimensões essenciais das abordagensdisponíveis sobre o problema da mudança institucional a partir do novo institucionalismo. Que elementosseriam constitutivos para representar efetivamente uma teoria neo-institucional? O método utilizado éconstruído a partir de problemas considerados fundamentais no avanço de uma teoria institucional. Paratanto, considera-se que um dos passos iniciais para a construção das teorias da mudança institucionalseria associado, em tese, ao crescimento da demanda de análises comparativas de teorias, no sentido decompreender mais de perto quais seriam os problemas e os refinamentos necessários para a construção deteorias.

PALAVRAS-CHAVE: novo institucionalismo; mudança institucional; teoria comparada; Ciência Social;Ciência Política.

I. INTRODUÇÃO1

A oferta de explicações da mudança2 continuaa representar um dos importantes desafios para a

tradição neo-institucional3 nas Ciências Sociais. Odesafio básico reside na construção de teorias quepossam explicar a emergência de novas instituiçõesa partir de fatores considerados institucionais. A

1 O desenvolvimento das diversas categorias consideradasessenciais no método de análise comparada de teoriaadotado resultou da observação comparada de um conjuntoexpressivo de modos de análise da mudança na tradiçãoneo-institucional no contexto da pesquisa “O NovoInstitucionalismo e os Limites da Explicação da MudançaInstitucional na Ciência Política Contemporânea”financiada pelo Conselho Nacional de DesenvolvimentoCientífico e Tecnológico (CNPq), ao qual manifesto a minhagratidão.2 Peters (2005) considera que, a despeito da multiplicidadede novos institucionalismos, existem seis grandes“problemas” fundamentais no debate neoinstitucionalcontemporâneo. Esses problemas orientam as rotas deavanço da teoria institucional e organizam a reflexãosistemática sobre o tema. Os seis problemas são

especificamente: a) o problema da regularidade versusdiversidade; b) a questão da mensuração e verificaçãoempírica; c) o problema da heterogeneidade conceitual; d)o problema da formação e agregação das preferências; e) oproblema da mudança institucional; f) a relação entrecomportamento individual e institucional. O problema damudança institucional, portanto, seria um dos temas demaior dissonância entre as abordagens e autoresneoinstitucionais e um dos pontos menos desenvolvidosdessas teorias.3 Hall e Taylor (1996) sugerem que as preocupaçõescentrais do(s) novo(s) institucionalismo(s) sãobasicamente: (a) a gênese institucional, que visa explicarpor que e como as instituições (e a ordem social) emergeme (b) a mudança institucional que se volta para as análisesde como e por que as instituições mudam.

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despeito de um considerável avanço na expansão erefinamentos das abordagens neo-institucionalistasa partir dos anos 1990, diversos analistas aindaquestionam a capacidade dessas teorias em oferecerrespostas satisfatórias para compreender como asinstituições podem explicar os mecanismos damudança institucional: as instituições efetivamenteimportam?

Esse problema é considerado crítico quandose configura um descompasso crescente entre adisponibilidade e o poder explicativo das teoriasinstitucionais. Existe uma considerável reflexãosobre se as teorias institucionalistas existentesseriam, de fato, apropriadas para explicar ecompreender a mudança institucional. Os analistascomeçam a levar a sério alternativas possíveis paratratar de modo mais consistente o problema dequais seriam os critérios e condições consi-derados necessários para fazer avançar a qualidadedas explicações neo-institucionalistas.

Este artigo chama a atenção para a relevânciada necessidade de enfrentamento dessas questões,e argumenta que grande parte desse problemareside na compreensão inadequada de quais seriamos pontos considerados decisivos para odesenvolvimento de teorias institucionalistas damudança. O avanço do conhecimento sobre oselementos constitutivos de uma teorianeoinstitucional da mudança permitiria fornecersubsídios consistentes para a construção de novasteorias.

Como é largamente conhecido no contexto dapesquisa neoinstitucionalista na Ciência Social e,especialmente, na Ciência Política, o problema nãoestaria na oferta de teorias, uma vez que existemtradições bem consolidadas de análise e umestoque considerável de abordagens e possibili-dades teóricas, mas na necessidade de ampliaçãoda reflexão teórico-metodológica sobre o pro-blema da mudança institucional.

Para tanto, considera-se que um dos passosiniciais para a construção das teorias da mudançainstitucional seria associado, em tese, aocrescimento da demanda de análises comparativasde teorias, no sentido de compreender mais deperto quais seriam os problemas e os refinamentosnecessários para a construção de teorias. Inexistetrabalho que esclareça de fato o que vem a seruma teoria neo-institucional da mudança e quaisos elementos fundamentais para comparar, avaliar

e construir tais teorias. Este artigo propõe-se arefletir sobre esse problema.

O estudo vai além de uma simples análisecomparada de teorias e busca oferecer, de modopreliminar, um método de análise de teoria quecrie condições possíveis para explorar dimensõesessenciais das abordagens disponíveis sobre oproblema da mudança institucional a partir do novoinstitucionalismo. Que elementos seriamconstitutivos para representar efetivamente umateoria neoinstitucional? O método de análise aquiutilizado é construído a partir do reconhecimentodos temas e problemas considerados essenciaispara o desenvolvimento de uma teoria da mudançaa partir das instituições.

Ele realiza um esforço analítico de quatrotradições clássicas de pesquisa que vem moldandoa construção de teorias da mudança – March eOlsen (1989), North (1990), Ostrom (1990) eKnight (1992). O esforço analítico concentra-sena comparação de teorias como “configurações”que permitem compreender a lógica, os conceitose os mecanismos causais compreendidos nessasabordagens.

A metodologia ajusta-se às sugestões realizadaspor Brady, Collier e Seawright (2005) de que aanálise comparativa de teorias estejaprioritariamente orientada a partir da observaçãoe compreensão dos processos causais (CPOs)contidos nas explicações. Com efeito, parte-seda premissa de que as teorias representariamconfigurações de mecanismos causais, categoriasanalíticas bem como tipos e padrões específicosde explicação. Os autores consideram que acompreensão desses elementos é fundamentalpara a análise crítica e desenvolvimento de teoriase padrões tipológicos nas Ciências Sociais.

O artigo organiza-se da seguinte forma. Nasduas primeiras seções são apresentadas ascategorias fundamentais do método comparativoe as questões relativas ao desenho da pesquisautilizadas neste trabalho. Na seção seguinte, asquatro tradições de teorização institucionalista damudança são analisadas comparativamente, apartir das categorias analíticas sugeridas. Por fim,são apresentadas as sínteses analíticas produzidaspelas evidências comparativas e é realizado umesforço de conexão com questões de corte maisgeral para o desenvolvimento das teorias institu-cionais no contexto do novo institucionalismo.

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II. COMPARANDO TEORIAS INSTITUCIO-NAIS: DIMENSÕES ESSENCIAIS DEANÁLISE

A comparação entre teorias realizadas nestetrabalho parte de uma questão fundamental: quaisseriam os elementos considerados essenciais parauma teoria institucional da mudança e, como elasarticulam-se em cada esforço analítico específico?A análise comparada das teorias institucionalistasdesenvolve-se utilizando um método elaborado apartir de dimensões relacionadas aos elementos eproblemas considerados fundamentais em quatrocasos tradicionais. O modelo sugerido paracomparação enfoca algumas condições para quese penetre com relativa segurança na“constituição” das teorias, isto é, as dimensõesconsideradas essenciais para a construção edesenvolvimento de teorias da mudança (cf.Tabela 1). A seleção das categorias analíticasdecisivas deriva da preocupação mais geral decompreender os problemas típicos com que oscientistas sociais defrontam-se quando se voltampara oferecer uma teoria da mudança.

O ponto de partida para a definição e seleçãodos elementos constitutivos é, portanto, adefinição mais geral do que seria uma teoria neo-institucional da mudança institucional. Uma teoriainstitucionalista da mudança seria, em princípio,uma teoria que: a) oferece explicações ouinterpretações a partir de categorias analíticas ouvariáveis institucionais; b) especifique em quecondições as instituições mudam e (c) expliciteos mecanismos causais que produzem a mudança.Uma teoria neo-institucional da mudança deve,portanto, compreender como as instituiçõesproduzem a mudança, em que condições e a partirde que mecanismos causais.

O primeiro problema que emerge para aconstrução das teorias neo-institucionais estádiretamente relacionado à questão da endogenei-dade. A questão central é a de compreender comoas teorias oferecem explicações valendo-seestritamente de variáveis institucionalistas. Essecritério é considerado por diversos autores comoum dos requisitos decisivos para compreender se,de fato, as instituições realmente importam4. Seas teorias neoinstitucionais recorrerem a variáveis

não institucionais, ou utilizarem as variáveisinstitucionais apenas como variáveis interve-nientes, não deveriam ser consideradas como neo-institucionais.

A segunda dimensão analítica está relacionadaà questão de como as teorias da mudança utilizamcategorias ou variáveis que dizem respeito àsinstituições formais, informais ou de combinaçãoentre essas. Central para essa discussão está oproblema do modo pelo qual as abordagensdiferenciam-se no que se refere à conceituaçãodo que vem a ser instituição e em que aspectosdas instituições essas levam prioritariamente emconta para a definição das variáveis e categoriasanalíticas específicas para a construção dasinterpretações e explicações.

Em seguida, considera-se que as teorias damudança devem tratar do problema do papel dosagentes, ou mais amplamente, da agência.Compreender em que medida cada teoriaestabelece poderes e propriedades causais aosagentes (ou, por oposição, as estruturas) é umdos pontos de considerável diferenciação econvergência na análise comparada de teoria5. Asconsiderações sobre a agência estão diretamenteligadas ao modo específico pelo qual e como osagentes importam. O problema da agência-estrutura aparece, portanto, como um dos pontosfundamentais de comparabilidade entre teorias damudança institucional.

A concepção da mudança institucionalenvolvida em cada teoria é um elementoconstitutivo de interesse na comparação dasteorias. Há uma importante consideração de quemuitos dos problemas da construção da teorianeoinstitucionalista da mudança derivam, em parte,de aspectos relacionados a que tipos, dimensões

4 Conjunto expressivo de estudos contemporâneos nocontexto da Ciência Política (por exemplo, GORGES,2001; KNILL & LENSCHOW, 2001; LIEBERMAN,

2002; HAMMOND & BUTLER, 2003; GREIF &LAITIN, 2004; GREENER, 2005; PRZEWORSKI, 2004)converge ao questionar a validade da afirmação “asinstituições importam” quando se trata de explicar amudança institucional. Diversos problemas tais como aquestão da mudança gradual, a inclusão de modelos mentaise o problema da endogeneidade emergem como alguns dosproblemas de relevância central para o desenvolvimentode uma teoria neo-institucional da mudança.5 Esse problema aparece como relevante nas teoriasrecentes produzidas pelo neo-institucionalismo, dada aconsiderável discussão de que em muitas das abordagensos autores tratam as variáveis e categorias institucionaisapenas como variáveis intervenientes, e terminam porrecorrer a abordagens estruturais tradicionais.

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ou escopos da mudança elas estariam de fatotratando. Existe uma clara necessidade decompreender as razões de existência de uma amplaquantidade de teorias da mudança gerada nocontexto do novo institucionalismo. Essas seriamum reflexo direto da necessidade de apreender amudança em diversas dimensões e configuraçõesou pela natureza das explicações neoinstitucio-nalistas que teriam a especificidade de produzirexplicações tão diversas. Nesse sentido, o modeloanalítico desenvolvido aqui posiciona o problemada análise sobre a mudança como importantedimensão comparativa.

Os pressupostos teóricos utilizados por cadateoria também assumem importância decisiva.Esses informam sobre as premissas e as basesontológicas, epistemológicas e metodológicas apartir das quais cada teoria mobiliza. No contextoda pesquisa neo-institucional, é largamente conhe-cida a questão da pluralidade de institucionalis-mos, que se diferenciam em termos das suasabordagens distintivas e suas pressuposiçõessobre as instituições e a mudança institucional.

Conhecidos os pressupostos, a dimensãoseguinte está relacionada à estruturaargumentativa contida em cada teoriainsti tucional da mudança. Parte-se dopressuposto de que toda teoria contém umaestrutura lógica e que esta contém argumentosque representam a sua especificidade.Compreender uma teoria é, de fato, compreenderos processos argumentativos bem como suamatriz conceitual. O método comparativo deve,portanto, elucidar o grau de variabilidade presentenos argumentos centrais das teorias a partir dacompreensão do modo específico pelo qual osautores desenvolvem suas interpretações eexplicações do problema da mudançainstitucional.

A compreensão da natureza e tipo da variáveldependente utilizada por cada autor é também decentral interesse. Conforme considerado anterior-

mente, as teorias institucionalistas da mudançadiferenciam-se em termos dos aspectos e dimen-sões específicas da mudança com os quais elasestão realmente interessadas. É, portanto, defundamental importância destacar o que cadaabordagem tenta explicar ou interpretar quandose refere a um fenômeno tão complexo como amudança institucional. O ponto importante a con-siderar como pressuposto é que a diferenciação ea diversidade das teorias institucionais da mudançasão, em grande parte, reflexo direto dos diferentesobjetos que elas tentam compreender.

O passo seguinte do método comparativo estárelacionado à identificação e compreensão dasvariáveis independentes e condições que osesquemas teóricos utilizam. A idéia básica écompreender como cada teoria recorre a umconjunto específico de variáveis e de condiçõespara explicar a mudança institucional. Essacompreensão permite identificar, por um lado, ostipos de variáveis independentes, como elasarticulam-se e, por outro, como cada teoriaestabelece uma estrutura de condições necessáriapara a validade da teoria proposta. A partir dacomparabilidade dessas matrizes de variáveis econfigurações de condições, a análise comparadapermite compreender mais de perto saber o queimporta, como importa, e em que condiçõesimportam as variáveis sugeridas por cadaabordagem.

Por fim, a última dimensão do método volta-se para apreender os mecanismos causaiscontidos em cada uma das teorias. O pressupostoé que as teorias institucionais da mudança contêmmecanismos causais explícitos sobre como asteorias sugerem que as mudanças devam ocorrer.A compreensão dessas estruturas de mecanismoscausais permite diferenciar como as diversasteorias formulam de fato configurações relativasà conexão micro-macro e as importantesconsiderações sobre o problema entre agentes,instituições e mudança institucional.

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FONTE: o autor.

III. COMPARANDO A MUDANÇA INSTITU-CIONAL

A análise comparada das teorias da mudançainstitucional é realizada a partir de um desenho depesquisa que focaliza em quatro abordagenstradicionais geradas no interior da análiseneoinstitucionalista nos anos 1990. Essasabordagens são largamente institucionalizadascomo modelos consagrados de explicação einterpretação do problema da mudança, que têminfluenciado consideravelmente a geraçãosubseqüente das pesquisas nas Ciências Sociais.

Busca-se compreender como essas teoriasrespondem às exigências de construção de umateoria da mudança institucional. Não se trata deauferir em efetividade ou refinamentos recentes,mas, sim, o de compreender como elas lançampossibilidades analíticas para enfrentar ocomplexo problema da teoria institucional damudança. O interesse maior, portanto, é focalizaras configurações teóricas em si para propósitode análise e construção de teoria.

As teorias selecionadas obedecem a alguns

critérios básicos. Em primeiro lugar, optou-sepela relevância desses modelos teóricos para odesenvolvimento subseqüente das pesquisas nocontexto da agenda neoinstitucional a partir dosanos 1990. O segundo critério está relacionadoao pertencimento de teorias e tradições distintasda pesquisa neo-institucional. A escolha doscasos foi deliberadamente construída paraintroduzir a variabilidade das explicaçõesinstitucionalistas para a mudança a partir depressupostos, conceitos e categorias analíticas.O terceiro critério está associado à variabilidadeexibida nas teorias para a configuração davariável dependente, do conjunto de variáveisindependentes, bem como dos mecanismoscausais utilizados. Por fim, optou-se por escolherteorias que permitam ilustrar como variam asargumentações em torno do problema damudança.

O primeiro caso analisado é a teoria damudança institucional construída por North(1990) no livro Institutions, Institutional Change,and Economic Performance, que propõe umaimportante teorização da mudança a partir das

TABELA 1 – ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DAS TEORIAS DA MUDANÇA INSTITUCIONAL

ELEMENTO CONSTITUTIVO ANÁLISE

dependente

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idéias do incrementalismo e da eficiênciaadaptativa. O segundo caso é a teoria da mudançainstitucional fornecida por Ostrom (1990) no livroGoverning the Commons, que teoriza sobre osmecanismos pelos quais agentes racionaissuperam o clássico dilema da ação coletiva, emcondições de pequenos grupos e de benspartilhados (common-pool resources). O modeloseguinte é o sugerido por March e Olsen (1989)em Rediscovering Institutions, que recai naabordagem da mudança a partir do neo-institu-cionalismo sociológico, em que são enfatizadasas clássicas questões dos efeitos não intencionaise os mecanismos tipicamente introduzidos naanálise e problematização da mudança quandose considera elementos de complexidade eambigüidade que são decisivos para acompreensão das reformas institucionais. Aquarta teoria analisada é a construída por Knight(1992) em Institutions and Social Conflict, queoferece uma interpretação para a conexão entreas instituições informais e mudança institucional.

III.1. Eficiência adaptativa e mudança incre-mental

Em Institutions, Institutional Change, andEconomic Performance, North (1990) lança asbases para o desenvolvimento uma teoria neo-institucional da mudança. A partir de elementosque combinam o institucionalismo histórico comas abordagens econômicas de custos detransação, o modelo concebe os processos demudança como incrementais e gerados a partirda necessidade de adaptação eficiente dasinstituições a demandas exógenas. O pressupostobásico contido na teoria é que a mudançaincremental resulta da ação intencional dasorganizações que interagem estrategicamente comas estruturas institucionais. A teoria considera queorganizações são os agentes empreendedores damudança, e esses dependem das instituições paraproduzir a mudança.

A estrutura institucional existente é concebidacomo possuindo um papel dual para os agentesorganizacionais. Por um lado, ela disponibilizarecursos para os agentes, estruturando osprocessos estratégicos de aquisição deconhecimento e habilidades, que serãoconsiderados como decisivos para promover amudança institucional. Por outro, a estruturainstitucional atua como elemento restritivo,restringindo as oportunidades de maximização

para os agentes individuais.

A idéia central do modelo é que os agentesorganizacionais empreendem mudança a partir deum movimento sistemático de aquisição derecursos críticos a partir dos arranjos institu-cionais existentes. As organizações dependem,para tanto, da aquisição sistemática de recursoscríticos (conhecimento e habilidades), que apenasparcialmente influenciam a rentabilidade e o nívelassociado de eficiência organizacional. Essesrecursos nem sempre estão disponíveis nasinstituições existentes, e a aquisição desses estárelacionada aos processos de eficiência adaptativa(adaptive efficiency).

Os processos de eficiência adaptativa dasinstituições permitem compreender como asvariáveis institucionais se relacionam à mudança.Estes processos mostram-se analiticamenterelevantes para entender como as estruturas deincentivos geradas pelos arranjos institucionaisexistentes afetam o comportamento dos agentespara a resolução de problemas, gerar aprendizadoe novos conhecimentos práticos, bem como paraa redução das falhas e erros organizacionais. Nessesentido, a eficiência adaptativa informaria maisde perto o modo pelo qual um dado modeloinstitucional gera incentivos para investir naaquisição de conhecimento e aprendizado, deinduzir inovações, de absorção de riscos, dacriatividade e da disponibilidade para resolverproblemas sociais específicos.

A concepção básica da mudança incrementalpara North é centrada na idéia de que os agentesda mudança reagem de modo adaptativo àestrutura de incentivos produzida pela estruturainstitucional. Os dois mecanismos fundamentaisda teoria proposta são a mudança na estrutura deincentivos (compreendida como mudança relativanos preços) e a alteração das preferências dosagentes. A mudança institucional é compreendidacomo ajustes marginais ao complexo conjunto denormas, regras e estruturas de obediênciavoluntária (compliance) que estão contidas naestrutura institucional. Nesse sentido, o modelooferecido é basicamente centrado nos contratosformais e informais entre os agentes organiza-cionais.

A mudança institucional é preponderantementegerada pela mudança na estrutura de incentivosque alteram padrões de comportamento dosagentes sociais introduzindo novos padrões de

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racionalidade e comportamento estratégico, quesão mediados por modelos mentais existentes.Nesse sentido, o modelo proposto por Northassume importância decisiva ao papel dos valorese das idéias, bem como na interação entre ambos.

A interpretação dos processos de mudançainstitucional fundamenta-se no seguinteargumento: a mudança na estrutura de incentivosaltera a percepção dos agentes envolvidos sobreos benefícios e custos gerados pelos contratosque governam as relações entre eles. Essa novareconfiguração dos custos tende a produziriniciativas para a construção de novos contratos.Todavia, dado que os contratos estão inseridosem uma estrutura hierárquica de regras, arenegociação desejada não pode ser possível semuma mudança mais profunda nas regras. Paraalterar as regras institucionais existentes, osagentes devem alocar recursos para a mudançainstitucional desejada. No caso das normas eregras informais, a alteração dos incentivosusualmente conduz à erosão gradual das normase a introdução de novas regras informais.

Uma das principais questões levantadas pelateoria da mudança incremental está associada àmudança das instituições informais, especialmentea cultura. North sugere que a cultura não é umainvariante e que seleção natural, aprendizadosocial, bem como fatores relacionados àaleatoriedade, desempenham papel crucial. Eleargumenta que a principal explicação da mudançacultural ancora-se nas teorias evolucionáriasadicionadas ao fator transmissibilidade. A culturaé elemento decisivo para compreender os padrõesinformais de valores, normas, rotinas e crençassociais. Esses processos são usualmente maiscomplexos na realidade por mecanismos típicosde poder de agenda, ação coletiva e resistência àalteração das normas sociais.

A análise da mudança das instituiçõesinformais seria importante quando considerado oproblema da persistência destas em face damudança dos incentivos, de mudança nasinstituições formais ou para compreender maisde perto por que as instituições informais mudamem um ritmo diferente das regras formais. Nateoria da mudança incremental, todavia, o principalpapel das instituições informais seria o demodificar, suplementar ou complementar as regrasinformais. Nesse sentido, é fundamentalconsiderar novos equilíbrios informais na análise

da mudança que as mudanças institucionaisgeram, de maneira gradual, nas regras formais.

A idéia da mudança incremental encapsula arelevante percepção de que essa resulta de umacontinuada interação entre as regras formais, asregras informais e os mecanismos decumprimento e monitoramento das regras. Northsugere que um dos pontos decisivos para a teoriada mudança está no fato de que as regras formaisalteram-se, enquanto as instituições informais(compreendidas como restrições) não variam demaneira tão elástica. Com efeito, emerge umatensão continuada entre as instituições informaise as novas instituições formais, que usualmentesão inconsistentes entre si. As instituiçõesinformais, ao serem concebidas como evoluçõesgraduais de arranjos institucionais pré-existentes,tendem a demandar continuadamente novasinstituições formais. É nesse sentido que se tornadecisivo o problema da herança cultural que refletea malha de arranjos institucionais informaisproduzidas pelos agentes no tempo, que sãodotados de considerável poder de resolver dilemasde transação no passado e que continuam a sereficientes no presente. Essa tensão permanenteamplia as chances de mudança incremental.

III.2. Os limites da ação coletiva: inovaçõesinstitucionais em pequenos grupos

Em Governing the Commons, Ostrom (1990)desenvolve uma teoria da mudança institucionalque se volta para compreender a criação deinovações institucionais na gestão de benspartilhados (common-pool resources). Emcontraposição aos dilemas de ação coletivaolsonianos envolvendo agentes racionais naprodução de bens públicos, ela produz evidênciascomparativas que apontam para o fato de que,nas condições de bens partilhados em pequenaescala, os agentes comportam-se racionalmentepara superar dilemas de ação coletiva, criandoespaços de negociação, estratégias de desenhoinstitucional, bem como novas formas degovernança público-privado.

A concepção da mudança no modelo é incre-mental e seqüencial. O surgimento e a implan-tação das novas instituições envolvem umaseqüência, em que as inovações geradas em umadada região tende a causar externalidadespositivas para o sucesso potencial de outrasregiões. Esse efeito “contágio” permite quegradualmente processe-se uma transformação da

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estrutura de incentivos para o comportamentodos agentes diante da mudança é consideradocomo decisivo.

O modelo seqüencial e incremental consideraque a gradual transformação dos incentivospermite que sejam construídos espaços coletivosde gestão de políticas públicas que garantem oreforço e retroalimentação dos modelosinstitucionais. Esses espaços são consideradosdecisivos para a troca estratégica de informaçõesque atuam de maneira decisiva no monitoramentodas decisões coletivas.

Outra importante consideração relacionada àconcepção da mudança é a importante separaçãoanalítica entre os processos de gênese e amudança. Enquanto a gênese é compreendidacomo a geração de novas regras, a mudança seassocia a processos que usualmente envolvealteração incremental, seqüencial nas instituiçõesexistentes.

Por ser seqüencial, cada estágio do processode mudança nas instituições opera em analogia aum investimento que altera os incentivos ecomportamento dos agentes para a mudançaseguinte. Os processos de mudança institucionalusualmente produzem impactos sobre os espaçosdecisórios sobre as políticas públicas (policyspaces) afetando a composição dos agentesenvolvidos, as opções e alternativas estratégicasdisponíveis, a estrutura de controles de recursos,informação, bem como a estrutura de custos ebenefícios (pay-offs).

Ostrom chama a atenção para a necessidadede criar uma teoria da mudança institucionaldotada de endogeneidade. Para tanto, ela sugereuma alternativa de reconsideração sobre as basesconceituais do problema da criação de novasinstituições a partir de variáveis essencialmenteinstitucionais. Para conferir endogeneidade, elapropõe que a análise da mudança seja de umaabordagem em que as regras institucionais sejamcompreendidas como operadores deônticos quecriam limitações, exigências e, ao mesmo tempo,ampliam e possibilitam a ação dos agentes. Osanalistas devem partir para a identificação dasregras que estruturam uma dada posição de statusquo que caracterizam as regras institucionaisexistentes.

O ponto de partida para a construção domodelo analítico é a pressuposição de que, quando

consideradas as condições de escalas reduzidas ebens partilhados, os modelos tradicionais revelam-se inapropriados para dar conta dos mecanismosque operam na criação de instituições por agentesracionais. Eles carecem de estabelecer com maiorprecisão quais seriam as variáveis endógenas eexógenas aos sistemas institucionais que importampara explicar a mudança nas instituições. Trêsausências são consideradas como críticas nasteorias tradicionais da ação coletiva: a)desconsideram a reflexão sobre o caráterincremental e auto-reflexivo dos agentes nosprocessos de mudança institucional; b)desconsideram os efeitos das instituições políticase das políticas públicas e c) negligenciam o papelestratégico da informação e dos custos detransação associados à mudança.

A autora considera que modelos que partemde pressupostos como informação completa,simetria perfeita, infalibilidade, custos nulos demonitoramento e enforcement e reduzidacapacidade de mudança, mostram-se poucoapropriado para compreender a mudança a partirdas instituições. Os modelos dotados deendogeneidade devem permitir aos analistas acompreensão de variáveis e mecanismos quegeram transformações essenciais nos incentivospara os agentes estratégicos em um dado contextoinstitucional.

O esquema teórico enfatiza as variáveis quesão mais relevantes para a compreensão dosprocessos de mudança institucional produzidaspelos agentes racionais levando em consideraçãoo contexto das regras existentes. O ponto departida para o modelo é a idéia de ação racionalsituada dos agentes. A teoria especifica asvariáveis internas aos agentes: benefíciosesperados, custos associados, normasinternalizadas e taxas de desconto em relaçãoao futuro. O comportamento dos agentes éconsiderado como racional diante da mudança,comparando os custos e benefícios esperadosdiante de uma situação potencial de mudança.Os agentes tendem a optar por estratégias emque os custos esperados sejam menores que osbenefícios potenciais da ação. Para tanto, elesdependem consideravelmente do contexto, apartir da consideração de fatores situacionais edo estoque informacional que eles possuemsobre as regras do jogo em cada contextoespecífico.

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A avaliação estratégica de uma dada alternativade mudança institucional depende, portanto, dainformação sobre os custos associados damudança, bem como dos custos demonitoramento e compliance envolvidos no novomodelo institucional. A estrutura de normasinternas e as taxas de desconto em relação aofuturo são profundamente afetadas pelo nível deinformação que os indivíduos possuem sobre ocontexto e sobre as alternativas de mudança. Ateoria institucional da mudança proposta contémum modelo de causação proposto que colocacomo decisiva a relação entre o retorno líquidocomparativo percebido pelos agentes entre duasalternativas institucionais: a posição de status quoe alternativas de mudança proposta. Longe deserem ações calculistas dos agentes, os processosde mudança representam decisões informadas dosagentes sobre a incerteza e, nesse sentido, asinstituições importam consideravelmente.

A mudança institucional não é espontaneamentegerada quando os agentes encontram-se diantede alternativas institucionais em que os benefíciosexcedam os custos. A mudança institucionaldepende de fatores associados à incerteza ecomplexidade do ambiente da decisão estratégicados agentes. A mudança é considerada comosendo de elevada dificuldade mesmo quando osgrupos são pequenos, quando os grupos possueminformações sobre o contexto e futurasalternativas de mudança ou mesmo quando existecapital social. Existem condições específicas quepotencializam a mudança e que dependem dasvariáveis internas as instituições e outras que sãoconsideradas como externas.

As condições necessárias que potencializama emergência da mudança também sãoespecificadas. Ela tem maior chance deocorrência quando: a) a maioria dos agentescompartilha a compreensão de que eles serãoprejudicados caso não adotem uma nova posiçãode status quo; b) os efeitos gerados pelasinstituições são percebidos pelos como um bempúblico; c) agentes são dotados de uma reduzidataxa de desconto em relação ao futuro; d) osagentes enfrentam reduzidos custos deinformação, transformação das regras; e)compartilhamento de normas de reciprocidadee de confiabilidade que podem ser utilizadas comocapital social para inicializar o processo demudança e f) o grupo envolvido é relativamentepequeno e estável. Ela considera que embora o

tamanho do grupo importe, ele não é umacondição tão relevante para compreender amudança como as demais.

III.3. Ambigüidade, complexidade e o problemada mudança institucional

Em Rediscovering Institutions, March e Olsen(1989), apresentam outra concepção tradicionalpara a análise e interpretação da mudança nocontexto do neo-institucionalismo. Partindo deuma crítica aos modelos de escolha racional, osautores sugerem que variáveis institucionais taiscomo significado da ação, os rituais, a comple-xidade, ambigüidade e os elementos normativosda ação institucional sejam decisivos para explicaros processos de transformação e reformainstitucional. Eles trabalham em uma fronteirateórica que tenta combinar elementos do novoinstitucionalismo sociológico com as análises depolíticas públicas.

A concepção da mudança institucionaloferecida pelos autores é lastreada por umaargumentação clássica dos estudos e análises depolíticas públicas: as reformas são eventos deelevada complexidade e usualmente falham. Asreformas institucionais usualmente sãocompreendidas como processos dotados de efeitosnão intencionais, de falhas seqüenciais e deelevada complexidade, em que as intençõesoriginais dos agentes quase sempre sãoterminadas, modificadas ou rejeitadas. Exatamentepor possuírem essas características, é que oestudo sistemático das reformas institucionais, emque se busca compreender os mecanismos e osprocessos específicos envolvidos, sãofundamentais para as Ciências Sociais e para aCiência Política.

O ponto de partida para a teoria da proposta éo da possibilidade da mudança das instituições.Todavia, eles consideram que essas mudançasdistanciam-se da ação racional dos agentes. Asmudanças usualmente envolvem complexidade esão carregadas de efeitos perversos, derivadosda interação entre os agentes, as instituições e oambiente em que se insere a mudança. Acomplexidade associada aos processos demudança reduz em muito a possibilidade decompreender objetivamente a articulação demecanismos causais envolvidos, bem como osreais impactos da mudança institucional para osagentes no curto e longo prazo.

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Centrados na idéia de efeitos não intencionais,os autores consideram que as reformas sejamcompreendidas como estratégias de adaptaçãonão antecipadas diante de conseqüênciasimprevistas. As reformas envolvem elevadacomplexidade que é gerada a partir das múltiplascamadas intenções e interesses diante depossibilidades de alteração do status quo.

O ponto de partida para a teoria é a concepçãoarticulada da existência de três níveis (oucamadas) de sistemas de ação: os agentes, asinstituições e a matriz institucional. A matrizinstitucional envolve um conjunto complexo deorganizações que opera como o contexto para osagentes. Os processos de mudança operam nessestrês níveis de realidade e como estes gerammecanismos previstos e imprevistos para aprodução das reformas. Há uma complexidade eambigüidade típicas nos processos de mudançaque usualmente requerem uma transformaçãoprofunda em diversos níveis da realidade.

O mecanismo decisivo para explicar por queas reformas usualmente são complexas deriva daidéia de conflito entre as preferências estratégicasdos agentes nos diversos níveis de realidade. Ateoria considera como provável que diante damudança os agentes, as instituições e as matrizesinstitucionais devam possuir demandasdivergentes. Inexistiria qualquer razão a priori paraconsiderar que os interesses individuais dosagentes pela mudança serão mutuamenteconsistentes ou irão importar da mesma formapara as três esferas da realidade. Essadesarticulação de intenções e interesses explicaem grande parte por que as reformas usualmentefalham.

Por serem dotadas de grande ambigüidade eexibirem conflitos de preferências em níveisprofundos da realidade, existem limites dosmodelos de mudança planejada e intencional. Osautores consideram como fundamental rever aquestão da mudança institucional intencional. Elessupõem três razões para considerar comparcimônia a dimensão intencional das reformas.A primeira razão seria de que existe umconsiderável nível de adaptação mais superficialdas mudanças que pode ser influenciado pela açãointencional. É possível influenciar a transformaçãogradual por meio do estimulo (ou inibição) dosprocessos adaptativos dos agentes por meio dedesenhos institucionais intencionais. Em segundo

lugar, embora se considere que as regras e rotinasinstitucionais sejam relativamente estáveis, estassão usualmente incompletas, dada a questão daambigüidade. A teoria sugere que é possívelinfluenciar as reformas com desenhosinstitucionais que tentam reduzir o problema daambigüidade a partir da compreensão doselementos contextuais que envolvem a mudança.Em terceiro lugar, é possível produzir choquestransformadores nas instituições. Assim como nocaso das mudanças mais superficiais, essastransformações não podem ser controladas comprecisão, mas podem ocorrer por planejamento eintencionalidade.

A causação contida da teoria da mudançainstitucional proposta pelos autores é que estaocorre como resposta sistêmica adaptativa.Modelos institucionais irão alterar suas rotinas,comportamento e processos como reação aocontexto. Alteração significativa no contextoproduz alteração na ação e comportamentoorganizacional e institucional.

A análise da mudança adaptativa fundamenta-se, segundo os autores em seis abordagenstradicionais para a mudança: evolucionária;racionalidade limitada; erros e tentativas; barganhae negociação; modelos epidemiológicos decontágios e modelos de restauração institucional.Cada uma dessas abordagens envolve mecanismosbásicos (tidos como anomalias) que sãofundamentais para compreender a mudançainstitucional a partir da incerteza e da ambigüidade.A análise da mudança em cada situação que seconsidere poderá utilizar esses mecanismostípicos que cada um dos modelos sugere. Darconta da complexidade dos processos da mudançaconsiste em compreender mais de perto comoesses mecanismos sugeridos produzem amudança adaptativa sistêmica.

Esses modelos introduzem as variáveis emecanismos que os autores consideram decisivospara a análise. A primeira categoria que os autoressugerem como importante para compreender aquestão da mudança é a capacidade de manter aatenção dos agentes em torno da mudançainstitucional. A atenção é usualmente tida comorecurso político crítico e depende do problemade montagem de complexas coalizões e redessociais em torno das agendas de reformas. Asreformas demandam elevada energia política paraa consolidação e a institucionalização da atenção

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em torno das reformas. Portanto, o modo peloqual se configura o processo de mobilização dosagentes é uma importante categoria analítica paracompreender como os agentes comportam-se emrelação à mudança. A capacidade de atenção dosagentes aos objetivos seqüenciais de uma dadareforma é limitada e emerge como um dosproblemas típicos enfrentados pelos analistas damudança.

A segunda categoria analítica consideradacomo fundamental para a análise da mudança dizrespeito ao fato de que as inovações institucionaissão elas próprias transformadas quandoexecutadas em um dado contexto. Por seremincompletas, as reformas usualmente introduzemnecessidades por alterações nas reformas, o queintroduz incerteza e ambigüidade ao processo.Outro mecanismo-chave na análise é a armadilhada competência (competency trap). A introduçãode reformas exitosas são usualmente consideradascomo fatores de inibição de mudanças dado queelas criam barreiras para a utilização de novasestratégias inovadoras, novos procedimentos enovas tecnologias organizacionais e institucionaispara a produção e difusão das reformas. Ospadrões exitosos tendem a gerar um efeito indutorsobre as novas políticas de transformaçãoinstitucional.

A concepção e difusão dos processos dereformas institucionais usualmente dependem dofato de que se considere a existência de grandeambigüidade e inconsistência no que se refere aosvalores e significados inseridos nas idéias demudança. As reformas são parte de um sistemade valores e crenças coletivas inseridas em umdado sistema social, que são fundamentalmentealteradas nos processos de mudança.

A crítica aos modelos de escolha racionalreside também na idéia de que as estruturas depreferências não são tidas como dadas ou fixas.Os modelos de ambigüidade partem daconcepção de que os agentes e as instituiçõesalteram suas estruturas de preferências ao longodo processo decisório, como adaptaçõesestratégicas às demandas do contexto. Osobjetivos e intenções originais das reformasusualmente alteram-se como conseqüênciasimprevistas da ação ou como diretamenterelacionadas aos processos inovadores que elasintroduzem. A transformação das intençõesoriginais das reformas assume centralidade como

problematização para a teoria da mudança porduas vias: a) pelo fato de que elas, em si, ilustrama complexidade envolvida no modo pelo qual asreformas realmente operam em um dado contextoe b) pelo fato de que elas operam comoobstáculos para as reformas, dado que, aodepender de tempo e controle intencional daspreferências, as reformas pressupõem que asestruturas de preferências em torno da mudançadevam ser estáveis e consistentes.

III.4. Conflito distributivo, barganha e a mudançanas instituições sociais

Em Institutions and Social Conflict, Knight(1992) elabora uma teoria institucional da mudançainstitucional voltada para explicar a emergência emudança das instituições sociais informais a partirde um modelo que enfatiza o papel estratégico doconflito distributivo que as instituições produzem.

O ponto de partida para a análise é uma críticaaos modelos tradicionais da mudança institucional.Ele argumenta tanto as teorias institucionais damudança como as teorias do desenho institucionalseriam consideradas problemáticas. A críticareside no fato de que essas abordagens oferecemtratamento inapropriado para dois problemas. Oprimeiro está relacionado diretamente à questãodos conflitos inerentes aos efeitos distributivosdas ordens institucionais; o segundo estariarelacionado à dificuldade dessas abordagens emcompreenderem de maneira mais efetiva comooperam os mecanismos que produzem a conexãoentre o conflito distributivo e a mudançainstitucional.

Knight sugere que uma teoria da mudança devaprivilegiar a conexão necessária entre a açãoindividual e as instituições sociais. Para tanto, eleopta pela abordagem da escolha racional6,compreendendo que as instituições emergem emudam a partir de escolhas estratégicas realizadaspor agentes com interesses conflitantes sobre amudança institucional, a qual seria mais adequadapara capturar a dimensão estratégica do conflito

6 Ele reconhece explicitamente duas opções teóricas pararealizar essa conexão entre a ação individual e asinstituições: a teoria da escolha racional e a teoria dasnormas sociais. Ele fundamenta sua escolha metodológicapor motivos teóricos e práticos. Esse compromisso teóricoé similar aos sugeridos por Elster (1989a) e Coleman(1990) para as possibilidades de explicação da ação social.

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social.

A ênfase na distributividade considerada peloautor sugere uma inflexão considerável notratamento do problema da mudança pelas teoriasinstitucionais. O autor afasta-se de uma teoria damudança que considera as instituições sociaiscomo restrições socialmente produzidas para osatores sociais como uma coletividade, e considera,por oposição, que as instituições sociais (e amudança) são de fato concebidas como açõesestratégicas de alguns atores sociais para produzirrestrições sobre outros agentes com os quais estãoem interação repetida.

A explicação proposta pela teoria enfatiza ummodelo de causação em que o conflito sobre asexpectativas sociais e a credibilidade dos esforçosempreendidos pelos agentes aparecem comovariáveis centrais para compreender a emergênciaespontânea das instituições informais. A principalimplicação dessa forma de causação é que asinstituições não representariam um equilíbriosocial eficiente, mas uma conseqüência queemerge do conflito distributivo sobre as escolhasdiante de alternativas institucionais factíveis.

Para construir sua teoria, Knight recorre àteoria da barganha. Ele considera que alternativasteóricas tais como a teoria das convenções sociaisou a teoria das trocas, que são tradicionalmenteutilizadas para a explicação da emergênciaespontânea (e mudança) institucional não seriamadequadas, dado que elas não posicionam oconflito distributivo entre agentes estratégicos, istoé, a barganha7 não assume centralidade.

Embora essas teorias reconheçam o conflitode interesses no problema da mudança, elasfundamentam-se em mecanismos que convertemnaturalmente ações individuais estratégicas eminstituições que são coletivamente benéficas, ouque a adesão voluntária dos agentes acontece umavez que as instituições são produzidas. Eleconsidera que as conseqüências distributivas e

as assimetrias de poder são os caminhos básicospara explicar a mudança institucional.

O argumento fornecido por Knight é que, paraexplicar a mudança, as teorias devem focarprimariamente o conflito estratégico e osmecanismos de solução cooperativa que emergede uma dada estrutura de barganha entre osagentes. Ele sugere uma teoria em que o conflitodistributivo e a assimetria de poder, de corteestrutural, possam ser incorporados à teoria daescolha racional, que se centra na escolhaestratégica a partir da racionalidade a partir deuma configuração de preferências em torno dealternativas institucionais possíveis. A teoria daemergência espontânea das instituições sociais éarticulada em dois movimentos analíticos: a análiselógica da estrutura básica da interação social paraa emergência das instituições sociais e a tentativade introduzir os efeitos gerados pelo contexto nosagentes sociais.

A premissa básica para a teoria da barganhada mudança proposta por Knight é a consideraçãoda assimetria de poder entre os agentes. A partirdessa premissa, parte-se para compreender osefeitos da mudança sobre essas assimetrias. Osagentes que possuem vantagem relativa podemagir no sentido de gerar estruturas de adesão dosdemais agentes às instituições como se essasfossem as melhores respostas estratégicas. Nessesentido, os agentes sociais cooperam com umadada ordem institucional não porque elasrepresentam melhorias de Pareto, mas,contrariamente, porque a cooperação resultariano melhor resultado disponível para os agentes.Por envolver conflitos distributivos, a mudançainstitucional é lenta e usualmente envolveconsideráveis custos para os agentes sociais.

A teoria pressupõe que os agentes sociais irãocontinuar cooperando com as instituições sociaisexistentes até que as seguintes condições sejamverificadas: a) condições externas variam e alteramos benefícios de longo prazo gerados pelasinstituições; b) outros arranjos institucionaispermitam superar de maneira mais adequada oproblema da ação coletiva. A solução institucionalpara o problema da ação coletiva seria, paraKnight, uma tentativa de alterar as expectativasdos agentes adicionando a questão olsoniana dotamanho dos grupos. Para Knight, quanto maioro grupo maior serão os custos de mudanças nasexpectativas dos agentes, e, conseqüentemente,

7 Para Elster (1989b), o problema da barganha entreagentes sociais configura-se quando existem conflitos depreferências diante da possibilidade de uma soluçãocooperativa para o problema de escolha entre ordensinstitucionais. O problema da barganha seria distinto doproblema da ação coletiva, uma vez que a existência devárias ordens institucionais pode contribuir para a nãoemergência de uma ordem cooperativa específica.

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maior a complexidade do problema da mudançainstitucional.

A estrutura básica da interação social propostapor Knight para o problema da mudança institu-cional como jogos cooperativos fundamenta-seem um tratamento analítico como um problemasimplificado da barganha. O equilíbrio cooperativoemerge e auto-reforça-se a partir das estratégiasracionais dos agentes. Com essa simplificação,ele pretende responder à importante questão daconexão entre a mudança institucional no nível“macro” e a criação de novas formas institucionaisno nível micro.

Essa conexão é realizada pela teoria ao propora compreensão da relação entre os recursos queproduzem assimetrias de poder em uma sociedade(nível macro) e os fatores que estão associados àsolução do problema das interações sociais pormeio dos quais as instituições sociais emergem.O elemento central da teoria da barganha propostapor Knight é a relação entre dois fatores: a) aassimetria de recursos e b) credibilidade, aversãoao risco e preferências temporais dos agentes.

Ao considerar a estruturação do conflitodistributivo entre os agentes, a teoria daemergência das instituições, considera que amudança é gerada pelos agentes, de modoestratégico, mas que elas não ocorrem de formaarbitrária e que não refletem diretamente osinteresses dos agentes. As ordens institucionaisemergem como efeitos não antecipados dosconflitos substantivos em torno da questãodistributiva que uma ordem institucional engendra.As condições empíricas que são necessárias paraa teoria são as conseqüências distributivas geradaspelas regras informais, estrutura de poder e umarede de interações sociais repetidas.

Por fim, a teoria busca compreender comonovas mudanças seriam possíveis. A mudança nasregras informais pode ocorrer seja por alteraçõesnas conseqüências distributivas seja portransformações no poder relativo de barganha dosagentes. Alterações nas conseqüências distributivasproduzem modificações nos incentivos para osagentes buscarem estrategicamente a construçãode novas posições do status quo, e essas podemocorrer de duas maneiras: por mudança nascondições externas ou por efeitos não antecipados.

IV. CONCLUSÕES

A análise comparada das quatro teorias neo-institucionais da mudança institucional tratadasneste estudo permitiu compreender padrõesconstitutivos que são de grande interesse para odesenvolvimento e avanços na produção de novasteorias nesse campo específico de pesquisa.Discutimos aqui os principais resultadoscomparativos nesses padrões constitutivos, naforma dos principais pontos de convergências edissensos entre as categorias analíticasselecionadas para o estudo comparativo.

A primeira convergência é que as teoriasestudadas partem de uma crítica ou complemen-tação das concepções da mudança sugerida pelasabordagens convencionais da escolha racional. Asteorias neo-institucionais são geralmente cons-truídas a partir de elementos que fundamentamuma crítica às concepções da escolha racional.Essa crítica manifesta-se de várias formas: sejadiretamente da crítica ao problema da açãocoletiva ou da barganha estratégica entre atoresracionais, seja por que considera como variáveisoutros elementos que estão diretamenteconectados às regras institucionais existentes, oumesmo aos efeitos não intencionais típicos dosprocessos de mudança.

Quanto ao papel das instituições informais eformais, é importante considerar que os modelosneo-institucionais analisados tentam considerar apremissa de que elementos mais densos do queas regras formais importam para a análise damudança. Isso se deve ao fato básico de que elespartem do pressuposto de que as instituiçõesrepresentam o contexto que se organiza a partirde normas institucionalizadas, de estruturas deincentivos para os agentes ou mesmo comocamadas da realidade. O ponto de partida para asquatro teorias é que os agentes (por diferentesconcepções) estão situados em um contextoinstitucional e operam produzindo mecanismosintencionais e não intencionais para produzir amudança institucional; as conexões entre osinteresses estratégicos e o contexto a partir doqual as regras formais e informais permitem dotaros agentes de reflexividade em torno daspossibilidades de mudança em um dado contexto.Os modelos convergem para a noção de que asmudanças institucionais são fortementeinfluenciadas pelos valores, pela cultura e pelosfatores situacionais, elementos que não devem ser

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desconsiderados em uma teoria da mudança quese leve a sério.

No que se refere à endogeneidade, isto é, aopapel das variáveis institucionais para a construçãoda teoria, a análise comparativa revela que asinstituições importam de modo convergente. Nasquatro engrenagens da mudança consideradas,observa-se que as instituições operam como umcontexto a partir do qual os agentes interagemestrategicamente, por diferentes vias, para alterara estrutura institucional existente. Na realidade,os modelos institucionais oferecidos conferemdiferentes possibilidades para a interação entreagência e estrutura, gerando diferentes modelosde causação e mecanismos causais envolvidos.Nesse sentido, as instituições criam oportunidadesestratégicas da mudança, seja pela via da eficiênciaadaptativa dos agentes, como efeitos nãointencionais e ambigüidade, normas internalizadasou pela questão do conflito distributivo. Asinstituições são concebidas tanto comoengrenagens que geram incentivos para osagentes, seja pela via das oportunidades, seja pelasrestrições.

A concepção da mudança é outro ponto deconvergência. Os quatro autores aproximam-seda noção de que a mudança institucional écomplexa, incremental e seqüencial. As quatroteorias deixam claro que a mudança institucionalnão deriva simplesmente de escolhas poralternativas institucionais em que os custossuperam os benefícios, mas de condiçõesespecíficas para promover a transformação, emque esta processa-se por meio de vários meca-nismos. As abordagens consideram que amudança ocorre e que depende de elementoscomo tempo, aprendizado, adaptação e elementosnão intencionais.

Por fim, vale considerar que as teorias neo-institucionais sugerem que as instituiçõesimportam. Isso significa que está à disposição dosanalistas um conjunto de possibilidades analíticasque são úteis para a análise da mudança narealidade empírica quando se quer compreenderos mecanismos causais que levam as instituiçõesa produzirem a mudança institucional. Parte dosproblemas com as teorias neoinstitucionais é queos analistas usualmente não consideram aimportância crucial de “pensar as teorias comovariáveis”. As teorias neoinstitucionais existentesdevem ser pensadas como variáveis na construçãode teoria e na importante conexão da teoria coma realidade. Os modelos institucionalistaspermitem que os teóricos utilizem-se deabordagens analíticas dotados de categorias quepossam penetrar na complexidade da realidadeinstitucional. A mudança não deriva de forçashistóricas incontroláveis ou de estruturas rígidas,mas da complexa interação entre agentes, escolhase instituições. Nesse sentido, introduzir variáveiscomo valores, crenças, escolhas estratégicas enão intencionalidade exige criatividade e desenhosde pesquisa que sejam oportunos para a pesquisasocial. O estudo da mudança institucional emergecomo um terreno ainda não inexplorado pelasteorias neo-institucionalistas.

Pensar dessa forma implica essencialmenteconsiderar seriamente as instituições na explicaçãoda mudança. Os diversos modelos institucionais,por sua abrangência e abertura a diferentes modosde operacionalização, podem ser combinadas demodo mais efetivo em desenhos de pesquisa queexpliquem melhor a mudança em um conjuntoespecífico de configurações. O enfrentamento doproblema empírico da mudança requer que seelaborem teorias plausíveis sobre a mudançainstitucional a partir das instituições.

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 20, Nº 41: 255-260 FEV. 2012ABSTRACTS

THE GLOBAL FIRESTORM OF LAW AND ORDER: ON PUNISHMENT ANDNEOLIBERALISM

Loïc Wacquant

This article reflects on the international reception of the book Prisons of Poverty as revelator ofpenal developments in advanced societies over the past decade. It shows that the global firestorm of“law and order” inspired by the United States that the book detected in 1999 has continued to ragefar and wide. Indeed, it has extended from First- to Second-World countries and has altered punishmentpolitics and policies around the globe in ways that no one foresaw and would have thought possiblesome 15 years ago. It extends the analysis of the role of think tanks (especially the ManhattanInstitute) in the diffusion of US-style crime-fighting notions and nostrums in Latin America as oneelement of the international circulation of pro-market policy packages fostering the punitivemanagement of poverty. It elaborates and revises the original model of the link between neoliberalismand punitive penality, leading to the analysis of state-crafting in the age of social insecurity developedin the book Punishing the Poor.

KEYWORDS: Criminal Justice; Zero Tolerance; Think Tanks; Penal State; Policy Transfer;Neoliberalism; Globalization.

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THE PROBLEM OF POLITICAL PARTICIPATION WITHIN THE DELIBERATIVE MODELOF DEMOCRACY

Francisco Paulo Jamil Almeida Marques

This paper discusses the premises of the deliberative model of democracy as they address the issueof political participation. We attempt to clarify what political participation means for those who usethis model, while at the same time looking at some of the major critiques that have been directedtoward it. Through a review of an important part of the literature, and without losing sight of earliersystematizations of democratic theory, three fundamental conditions for engendering participationaccording to this discursive model are pointed to: political institutions should create and offer citizensopportunities to participate in public input; improvement in people’s socio-economic condition mustbe made; attention should be given to particular principles that have consistent regulatory influenceon the interactions and arguments in question. This is followed by attention to the criticisms raisedand flaws detected by deliberationism’s detractors. At the end of the text, a summary of the strengthsand weaknesses of the model is presented, along with a discussion of the problem of participation incontemporary democracies.

KEYWORDS: Participation; Deliberation; Democracy; Representation.

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CONVERGENCE AND CONTROVERSY ON INSTITUTIONAL CHANGE: TRADITIONALMODELS IN COMPARATIVE PERSPECTIVE

Flávio da Cunha Rezende

At present there is a paucity of work that seeks to clarify what a neo-institutional theory of changeis and what the fundamental elements to compare, evaluate and construct such a theory would be.The present paper proposes reflections on this issue. We carry out comparative analysis of four neo-institutionalist theories of social change. We present points of convergence and controversy regardingthe problem of endogeneity, the role of formal and informal institutions, typical explanatory patterns,causal mechanisms and the causal modes that typify different neo-institutional models. Our maingoal is to understand how these four traditional approaches to change respond to the challenge to

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 20, Nº 41: 255-260 FEV. 2012

explain processes of institutional change starting from institutions themselves. The study goes beyonda simple comparative analysis of theories and seeks to offer, in a preliminary sense, a method for theanalysis of theory that makes it possible to explore the essential dimensions of available approachesto institutional change through the new institutionalism. What are the constitutive elements that makeup an institutional theory per se? The method we use is constructed starting from the problems thatare considered fundamental in the advancement of an institutional theory. For these purposes, wesuggest that the one of the initial steps in the construction of theories of institutional change can beseen as associated with the growth of a demand for comparative analysis of theories, in the sense ofa closer understanding of the problems entailed and refinement needed for the building such theories.

KEYWORDS: New Institutionalism; Institutional Change; Comparative Theories; Social Science;Political Science.

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“WE HAVE A DREAM” – SOCIAL SCIENTISTS AND THE CONTROVERSY ON RACIALQUOTAS IN PRESS

Luiz Augusto Campos

Through research that looks at opinion columns published in the major Brazilian press, we analyzethe position that the country’s social scientists have taken on the issue of the racial quota system thathas been implanted in some of its universities. Our main goal is to demonstrate the plurality ofopinions embroiled in the controversy, in order to then identify commom lines of argument. Initially,we discuss the validity of two widely-disseminated interpretations of the controversy: the one whichsees the polemic as a moment of collision between two antagonistic ideals of justice and anotherwhich sees the polemic as a new phase in discordant public sphere images of Brazilian racial reality.Finally, we conclude by suggesting that the discrepancies detected are not based on irreconcilabledifferences. Rather, the majority of the actors involved mobilize similar bases of justification in orderto further their arguments.

KEYWORDS: Racial Quotas; Intellectuals; Social Scientists; Public Controversy; Press.

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BRAZILIAN ENERGY POLICY IN AN ERA OF GLOBALIZATION: ENERGY ANDCONFLICTS OF A DEVELOPING STATE

José Alexandre Altahyde Hage

The purpose of this article is to analyze how developing States such as Brazil are faring in the ambitof globalization.. We intend to show that globalization has largely not contributed in advantageousways to developing states, due to their difficulties in building national power.. In these cases,globalization itself can be used as a means to concentrate influence within industrialized States,making relationships difficult on both sides. We also intend to examine how these issues correspondto the role Brazil may represent as large scale ethanol and oil producer. Finally, we. seek to understandhow the country can become a major producer of energy while at the same time building nationalpower in the age of globalization. .

KEYWORDS: Brazilian National Power; Globalization; International Politics; Energy.

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