Credo - S. Tomás de Aquino

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    SANTO TOMS DE AQUINO

    SERMO SOBRE O CREDO

    Expositio in Symbolum Apostolorum

    reportatio Reginaldi de Piperno

    Traduo e Notas:

    DOM ODILO MOURA, OSB

    EDIO ELETRNICA

    Rio de Janeiro, 2004

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    SEPARATA

    Revista Permanncia

    nos. 63/1974 a 75/1975

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    INTRODUO

    A F

    Durante a Quaresma de 1273, S. Toms, entre outros sermes,

    proferiu este, que uma das mais perfeitas exposies que

    existem sobre o Credo. Pronunciado em dialeto napolitano, foi

    traduzido fielmente (conforme atestam os testemunhos histricos)

    para o latim, pelos discpulos do Santo. Para ouvir a palavra do

    Doutor Anglico, acorriam s igrejas de Npoles, os habitantes

    dessa agitada cidade medieval e os seus alunos universitrios. Por

    isso o grande telogo usava de uma linguagem mais acessvel que

    a das suas obras teolgicas. O contedo, porm, dos seus

    sermes, conserva a mesma profundeza doutrinria e a peculiar

    ortodoxia do Doutor Comum:

    1 O primeiro bem necessrio para o cristo a f. Sem a f

    ningum pode ser chamado de fiel cristo.

    2 O primeiro bem a unio da alma com Deus. Pela f realiza-

    se uma espcie de matrimnio entre a alma e Deus, conforme se

    l no Profeta Osias: Desposar-te-ei na f. (Os 2, 20).

    Quando o homem batizado, deve, em primeiro lugar, confessar a

    f ao responder pergunta crs em Deus? porque o batismo

    o primeiro sacramento da f. O Senhor mesmo disse: O que

    crer e for batizado ser salvo (Mc 16, 16).

    O batismo sem a f destitudo de valor. Deve-se, portanto, ter

    por certo que ningum pode ser aceito por Deus sem a f. Sem

    a f impossvel agradar a Deus, diz S. Paulo (Heb 11, 6).

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    Sto. Agostinho comentando este texto da carta aos Romanos

    Tudo o que no procede da f pecado (14, 23), assim se

    expressa: Onde no existe o conhecimento da verdade eterna e

    imutvel, a virtude falsa mesmo nas pessoas retas.

    3 O segundo bem este: pela f iniciada em ns a vida

    eterna. A vida eterna no consiste seno em conhecer a Deus,

    conforme l-se em S. Joo: Esta a vida eterna, que Vos

    conheam como nico Deus verdadeiro. (Jo 17, 3). Esse

    conhecimento de Deus inicia-se aqui pela f, mas completado na

    vida futura, quando O conheceremos tal como . Por isso l-se na

    carta aos Hebreus: A f a substncia das coisas que se

    esperam (11, 11). Ningum alcanar a bem-aventurana eterna,

    sem que tivesse primeiramente o conhecimento de f, pois est

    escrito: Bem-aventurados os que no viram e creram (Jo 20,

    29).

    4 A vida presente orientada pela f: eis o terceiro bem. Para

    que o homem viva bem, convm que conhea os princpios dobem viver. Se pelo prprio esforo devesse aprender esses

    princpios, ou no chegaria a conhec-los, ou s os poderia

    conhecer aps um longo tempo. Mas a f ensina todos os

    princpios do bem viver. Ora, ela ensina que h um s Deus, que

    Deus recompensa os bons e pune os maus, que existe uma outra

    vida, e outras verdades semelhantes. Esse conhecimento

    suficiente para nos levar a praticar o bem e evitar o mal, pois diz o

    Senhor: O meu justo vive da f (Hab 2, 4).

    Eis porque nenhum filsofo antes da vinda de Cristo, apesar do

    grande esforo intelectual que despendiam, pde chegar ao

    conhecimento de Deus e dos meios necessrios para alcanar a

    vida eterna, como depois do advento do Cristo, qualquer velhinha

    chegou pela f. Eis porque Isaas profetizou assim esse advento:

    Encheu-se a terra da cincia de Deus (11, 23).

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    5 O quarto bem que pela f venceram as tentaes, conforme

    l-se nas Escrituras: Os santos pela f venceram os reinos (Heb

    11, 23). As tentaes procedem do diabo, do mundo, ou da carne.

    O diabo tenta para que tu no obedeas nem te submetas a Deus.

    Ora, pela f que o repelimos, porque pela f que conhecemos

    que h um s Deus e que s a Ele devemos obedecer. Por isso

    escreveu So Pedro: O diabo, vosso adversrio, est rondando

    para ver se devora algum: a ele deveis resistir pela f (1 Pd 5,

    8).

    O mundo nos tenta, seduzindo-nos na prosperidade, ou nos

    atemorizando nas adversidades. Mas ambas as tentaes

    vencemos pela f. Ela nos faz crer numa vida melhor, e, por isso,

    desprezamos as prosperidades do mundo e no tememos as

    adversidades. Eis porque est escrito: Esta vitria que vence o

    mundo, a vossa f (1 Jo 5, 4). Alm disso, a f nos ensina a

    acreditar que h males maiores, isto , que existe o inferno.

    A carne nos tenta, conduzindo-nos para os deleites momentneosda vida presente. Mas a f nos mostra que por eles, se a eles

    indevidamente aderimos, perderemos os deleites eternos. Por isso

    nos aconselha o Apstolo: Tende sempre nas mos o escudo da

    f (Ef 6, 16).

    Por essas razes fica provado que muito til ter f.

    6 Mas pode algum objetar: insensatez acreditar naquilo queno se v: no se deve crer seno naquilo que se v.

    Respondo a essa objeo com os seguintes argumentos.

    7 Primeiro. a prpria imperfeio da nossa inteligncia que

    desfaz essa dvida. Realmente, se o homem pudesse por si

    mesmo conhecer perfeitamente as coisas visveis e invisveis seria

    insensato acreditar nas coisas que no vemos. Mas o nosso

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    conhecimento to limitado que nenhum filsofo at hoje

    conseguiu perfeitamente investigar a natureza de uma s mosca.

    Conta-se at que certo filsofo levou trinta anos no deserto para

    conhecer a natureza das abelhas. Ora, se a nossa inteligncia

    to limitada assim, muito maior insensatez no querer acreditar

    em algo a respeito de Deus a no ser naquilo que o homem pode

    conhecer por si mesmo dEle. L-se no livro de J: Eis como Deus

    grande e ultrapassa a nossa cincia (36, 26).

    8 Segundo. Consideremos, por exemplo, um mestre que

    assimilou uma verdade e de um aluno pouco inteligente que a

    entendeu diversamente, porque no a atingiu. Ora, esse aluno

    pouco inteligente deve ser considerado como bastante tolo.

    Sabemos que a inteligncia dos Anjos ultrapassa a do maior

    filsofo, como a deste, a inteligncia dos ignorantes. Portanto,

    seria tolo o filsofo que no acreditasse nas coisas ditas pelos

    Anjos. Ele seria muito mais tolo se no acreditasse nas coisas

    ditas por Deus. L-se, a esse respeito, nas Escrituras: Foram-te

    apresentadas muitas verdades que ultrapassam a inteligncia do

    homem (Ec 3, 25).

    9 Terceiro. Se o homem no acreditasse seno nas coisas que

    v, nem poderia viver neste mundo. Pode algum viver sem

    acreditar em outrem? Como podes tu saber que este teu pai? ,

    pois, necessrio que o homem acredite em algum, quando se

    trata de coisas que por si s no as pode conhecer. Ora, ningum

    mais digno de f do que Deus. Por conseguinte, os que no

    acreditam nas verdades da f no so sbios, mas tolos esoberbos. So Paulo refere-se a esses como sendo soberbos e

    ignorantes... (1 Tm 6, 4). Por isso S. Paulo diz de si: Sei em

    quem acreditei e tenho certeza... (2 Tm 1, 12). Tudo isso

    confirmado no Livro do Eclesistico: Vs que temeis o Senhor,

    acreditai nEle (2, 8).

    10 Quarto. Pode-se ainda responder dizendo que Deus

    comprova as verdades da f. Se um rei enviasse suas cartas

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    seladas com o selo real, ningum ousaria dizer que aquelas cartas

    no vinham do prprio rei. claro que as verdades nas quais os

    santos acreditaram e que nos transmitiram como sendo de f

    crist, esto seladas com o selo de Deus. Esse selo significado

    por aquelas obras que uma simples criatura no pode fazer, isto ,

    pelos milagres. Pelos milagres Cristo confirmou as palavras do

    Apstolo e dos Santos.

    11 Pode, porm, replicar dizendo que ningum viu esses

    milagres. fcil responder a essa objeo. conhecido que toda a

    humanidade prestava culto aos dolos e que a f crist foi

    perseguida, confirmando-o, alm do mais, a histria do

    paganismo. Converteram-se todos, porm, em pouco tempo a

    Cristo. Os sbios, os nobres, os ricos, os governos e os grandes

    converteram-se pela pregao de poucos homens rudes e pobres.

    Ora, de duas uma: ou se converteram por que viram milagres, ou

    no. Se foi porque viram milagres que se converteram, a tua

    objeo no tem sentido. Se no o foi, respondo que no poderia

    haver maior milagre que esse de todos os homens converterem-se

    sem terem visto milagres. Deves te dar por vencido.

    12 Eis porque ningum pode duvidar da f. Devemos acreditar

    mais nas verdades da f do que nas coisas que vemos, por que a

    vista do homem pode falhar, mas a cincia de Deus sempre

    infalvel.

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    ARTIGO PRIMEIRO

    Creio em Deus, Pai todo poderoso,

    criador do cu e da terra

    13 Entre todas as verdades nas quais os fiis devem acreditar,

    em primeiro lugar devem acreditar que Deus existe 1.

    Convm, alm disso, considerar o que significa este nome

    Deus.

    Significa precisamente Aquele que governa e cuida de todas as

    coisas.

    Acredita, por conseguinte, na existncia de Deus, quem acredita

    que todas as coisas deste mundo so por Ele governadas, e esto

    subordinadas sua Providncia.

    1 O leitor deve estar sempre atento ao estilo de So Toms, claro, conciso e lgico.No h palavras suprfluas. As palavras, no estilo do Doutor Anglico, tm osignificado preciso e manifestam os conceitos de uma inteligncia lcida. Essasimplicidade despida de artifcios adequada comunicao da verdade pura.Nota-se que So Toms jamais apela para a emotividade ou para os recursosoratrios de sugestionamento. Ele quer que se aceite a verdade pela clarividnciada verdade. Aceita a verdade pela inteligncia, naturalmente a vontade inflamar-se- de amor por ela. Esse mtodo comunicativo de So Toms essencialmentehumano. Para o homem de hoje, condicionado pelos processos comunicativos

    audiovisuais, pela propaganda subliminal e pelos recursos emocionantes, torna-seum tanto difcil, e por isso exige um esforo de ateno, seguir a tranqila e puraapresentao da verdade feita por So Toms. O seu estilo literrio assemelha-se pureza musical do estilo de Bach. O vocabulrio de So Toms por essa razo, no muito rico, naturalmente dificultando a traduo, podendo parecer o seu estilomontono. Mas se o leitor esforar-se por penetrar na limpidez das suas frases, narica repetio dos conceitos sempre com novas modalidades, sentir-se- logoatrado pela beleza do estilo do Doutor Anglico e admirado pelas verdades queexpe. So Toms simbolizado pelo sol. O seu estilo tem os encantos da luz.

    Atenta-se tambm neste sermo de So Toms, que, provavelmente, seria mais deum sermo, o modo como a Sagrada Escritura citada, ajustando-seespontaneamente, ao contexto e, fundamentando a doutrina exposta. Sem que seperceba, So Toms aqui realiza uma atividade teolgica inicial, quando ainteligncia, usando apenas dos primeiros esforos do senso comum procura, sem

    argumentao metafsica e sem terminologia cientfica, penetrar no contedo dasverdades reveladas.

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    Mas quem pensa que todas as coisas originam-se do acaso, no

    acredita na existncia de Deus.

    No h ningum to insensato que no creia que a natureza seja

    governada, que esteja submetida a uma providncia e que tivesse

    sido ordenada por algum, vendo que tudo se processa a seu

    tempo, com ordem. Vemos o sol, a lua e as estrelas, e muitos

    outros elementos da natureza obedecerem a um determinado

    curso. Ora, isso no aconteceria se tudo viesse do acaso.

    Eis porque seria um insensato o que no acreditasse na existncia

    de Deus. tal assero confirmada pelo salmista: O insensato diz

    em seu corao: no h Deus (Sl 13, 1).

    14 Alguns h que acreditam que Deus governa e ordena as

    coisas naturais, mas no acreditam que Deus atinja, pela sua

    Providncia, os atos humanos. Evidentemente pensam que os atos

    humanos no so ordenados por Deus. porque vem no mundo os

    bons sofrerem e os maus prosperarem, concluem que a

    Providncia Divina no atinge os homens.

    Por eles falou J: Deus anda pelos caminhos do cu, mas no

    cuida de ns (22, 14).

    Afirmar tal coisa, grande insensatez. Acontece com os que assim

    pensam, o que acontece queles que vendo o mdico bom

    conhecedor da medicina dar a um doente gua e a outro vinho,

    julgassem, no seu desconhecimento da medicina, que o mdicoestava curando por acaso, e no, por motivo ponderado.

    15 Deus tambm age como mdico. Por motivo justo e pela sua

    Providncia dispe Ele as coisas necessrias para os homens,

    quando aflige alguns bons e permite que alguns maus prosperem.

    Quem acreditasse que isso fosse obra do acaso, evidentemente

    deveria ser um insensato, como de fato o . Assim pensa, porque

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    desconhece a maneira de Deus agir, e a razo pela qual dispe as

    coisas. L-se tambm em J: Oxal Ele te revele os segredos da

    sua sabedoria e a multiplicidade dos seus planos (11, 6). Por

    conseguinte deve-se crer firmemente que Deus governa e ordena

    as coisas naturais e tambm os atos humanos. L-se no Livro dos

    Salmos: Disseram (os maus): Deus no v. O Deus de Jac no

    percebe as coisas. Compreendei agora, nscios! estultos, at

    quando sereis insensatos? Aquele que nos deu as orelhas, no

    ouve? Aquele que nos ps os olhos, no v? O Senhor conhece os

    pensamentos dos homens (103, 7-10).

    Deus v todas as coisas, os pensamentos e os segredos das

    vontades dos homens. J que tudo o que pensam e fazem est

    patente aos olhos de Deus, os homens, de modo muito especial,

    so obrigados a praticar o bem. Escreve S. Paulo aos Hebreus:

    Tudo est nu e descoberto aos seus olhos (4, 13).

    16 Deve-se acreditar que este Deus que dispe todas as coisas

    e as rege, um s Deus. A razo por qu devemos acreditar

    nessa verdade a seguinte: o governo das coisas humanas umbom governo, quando um s as dispe e as governa.

    Uma multiplicidade de dirigentes constantemente provoca

    disenes entre os sditos. Ora, como o governo divino superior

    ao humano, torna-se claro que o governo do mundo no pode ser

    feito por muitos deuses, mas por um s.

    17 Os homens so levados ao politesmo por quatro motivos:

    O primeiro, a fraqueza da inteligncia humana. H homens, cuja

    fraqueza de inteligncia no lhes permitiu ir alm das coisas

    corpreas, e, por isso, no acreditaram na existncia de alguma

    natureza superior aos seres corpreos.

    Pensaram ento que, entre aqueles seres corpreos, os mais belos

    e mais dignos deveriam presidir e dirigir o mundo, e prestaram a

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    eles um culto divino. Consideraram como sendo os corpos mais

    sublimes, os astros do cu: o sol, a lua e as estrelas. Acontece

    com eles o que aconteceu com aquele homem que, desejando ver

    o rei, foi corte, e confundiu com o rei quem logo encontrou bem

    vestido, ou exercendo alguma funo de ministro. Refere-se a

    esses o Livro do Profeta Isaas: Levantai bem alto os olhos, e

    vede a terra por baixo. Os cus evaporar-se-o como a fumaa, a

    terra envelhecer-se- como as vestes e os seus habitantes

    perecero como ela. Mas a minha salvao ser eterna, e a minha

    justia no ter fim (51, 6).

    18 O segundo motivo, a adulao dos homens. Muitos

    desejando adular os reis e os senhores, tributaram-lhes a honra

    devida a Deus. Obedeceram e se submeteram a eles. Houve quem

    os endeusassem aps a morte, e houve os que os endeusaram

    tambm em vida. L-se na Escritura: Todos saibam que

    Nabucodonosor deus da terra, e alm dele outro deus no h

    (Jud. 5, 29).

    19 O terceiro motivo provm da afeio carnal para os filhos eparentes. Alguns, levados por excessivo amor pelos parentes,

    levantaram-lhes esttuas aps a morte, e, assim foram

    conduzidos a prestar culto divino quelas esttuas. a eles que se

    refere a Escritura: Deram os homens s pedras e madeira um

    nome incomunicvel, porque submeteram-se demais a afeio aos

    reis (Sab. 14, 21).

    20 A quarta razo, pela qual os homens so levados a acreditarna existncia de muitos deuses, a malcia do diabo. Este, desde

    o incio, quis ser igual a Deus: Colocarei meu trono no Aquilo,

    subirei aos cus e serei semelhante ao Altssimo (Is. 14, 13).

    At hoje ele no revogou essa vontade. Por isso esfora-se o mais

    possvel para que os homens o adorem e lhe ofeream sacrifcios.

    No lhe satisfaz o ofertrio de um co ou de um gato, mas deleita-

    se quando lhe prestado o culto devido a Deus. Disse o demnio

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    a Cristo: Dar-te-ei tudo isto se de joelho me adorares (Mat. 4,

    9). Para que fossem adorados como deuses, os demnios

    entraram nos dolos e por meio destes davam respostas. L-se na

    Escritura: Todos os deuses dos povos so demnios (Ps. 95, 5).

    Quando os gentios oferecem sacrifcios, fazem-no aos demnios,

    no a Deus (I Cor. 10,20).

    21 muitssimo desagradvel a considerao dessas quatro

    causas do politesmo, mas representam realmente as razes pelas

    quais os homens acreditam na existncia de muitos deuses.

    Muitas vezes eles no manifestam pelas palavras ou pelo corao

    que acreditam em muitos deuses, mas pelo atos. Aqueles que

    acreditam que os astros podem modificar a vontade dos homens,

    que para agir esperam certas pocas, naturalmente consideram os

    astros como deuses que dominam os outros seres e que fazem

    prodgios. Por isso somos advertidos pela Escritura: No temei os

    sinais dos astros que os gentios temem, porque as suas leis so

    vs (Jer. 10, 2).

    Tambm aqueles que obedecem aos reis, ou aos que no devemobedecer, mais que a Deus, constituem a essas pessoas como os

    seus deuses. Adverte-nos tambm a Escritura: Convm mais

    obedecer a Deus que aos homens (At. 5, 29).

    Assim tambm os que amam os filhos e os parentes mais que a

    Deus, revelam pelos atos que acreditam em muitos deuses. Ou

    mesmo aqueles que amam mais os alimentos que a Deus, aos

    quais se refere S. Paulo com estas palavras: Dos quais o ventre deus (Tm 3, 19).

    Os que praticam a feitiaria e se entregam aos sortilgios

    acreditam nos demnios como se eles fossem deuses, porque

    pedem aos demnios o que s se pode pedir a Deus, como sejam

    revelaes e conhecimentos de coisas secretas ou futuras.

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    Como tudo isso falso, devemos acima de tudo acreditar que h

    um s Deus.

    22 Como dissemos, deve-se primeiramente acreditar que h um

    s Deus. Em segundo lugar, deve-se acreditar que este Deus

    criador, que fez o cu e a terra, as coisas visveis e invisveis.

    Deixemos por ora, de lado, os argumentos sutis e, por meio de

    um exemplo bem simples, esclareamos como todas as coisas

    foram criadas e feitas por Deus.

    Se algum indo a uma casa e desce a porta fosse sentindo calor e

    cada vez que mais nela penetrasse mais calor sentisse,

    evidentemente perceberia que havia fogo no seu interior, mesmo

    que no estivesse vendo o fogo. Acontece o mesmo conosco ao

    considerarmos as coisas deste mundo. Todas as coisas esto

    ordenadas conforme diversos graus de beleza e de nobreza, e

    quanto mais esto prximas a Deus, tanto melhores e mais belas

    so. Ora, os astros so mais nobres e mais belos que os corpos

    inferiores; as coisas invisveis, que as visveis.

    Deves ento acreditar que todas as coisas tm a origem num s

    Deus, que lhes d a existncia e a perfeio.

    L-se na Sagrada Escritura: So insensatos todos os homens que

    no conhecem a Deus, e que pelas coisas que viam, no

    compreenderam Aquele que existe, nem vendo as obras,

    conheceram o artista (Sab. 43, 1). L-se no mesmo contexto:Pela beleza e grandeza da criatura se pode conhecer e

    contemplar o seu criador (43, 5).

    Devemos, portanto, ter por certo que todas as coisas foram

    criadas por Deus.

    23 Com relao a isso, trs erros devem ser evitados.

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    O primeiro, o erro dos Maniqueus 2. Para eles, as coisas visveis

    foram criadas pelo diabo, e s as invisveis, por Deus.

    Fundamentam o seu erro numa verdade, que Deus o sumo bem

    e tudo o que por ele feito, por um ser bom, deve ser bom

    tambm; mas no distinguindo o bem do mal, creram eles que

    tudo o que de certo modo tivesse algo de mal, seria totalmente

    mal. Dizem que o fogo totalmente mal, porque queima; que a

    gua m, porque afoga; e, assim, das outras coisas que

    produzem um efeito mau. Ora, como nenhuma das coisas

    sensveis simplesmente boa, mas de certo modo m e

    deficiente, concluram que todas as coisas visveis no foram feitas

    por Deus, que bom, mas por um ser mau.

    Para refuta-los Santo Agostinho apresentou o seguinte exemplo:

    se algum entrasse na casa de um operrio e a encontrasse uma

    ferramenta que o ferisse, e, por esse motivo, conclusse que o

    operrio era mau, porque usa tais ferramentas, seria um tolo,

    porque ele as usa to somente para o trabalho. Eis porque tolice

    dizer que as criaturas so totalmente ms, porque em algum

    aspecto so nocivas.

    Podem elas ser nocivas para uns, mas teis, para outros.

    Esse erro vai contra a f da Igreja, pois recitamos no Credo:

    Criador das coisas visveis e invisveis. Fundamenta-se essa

    verdade na Escritura: No princpio Deus criou o cu e a terra (Gn

    1, 1). Todas as coisas foram feitas por Ele (Jo 1, 3).

    2 O Maniquesmo uma seita sincretista, com elementos de religio persa doMasdesmo, das correntes gnsticas orientais e do cristianismo. Fundou-a Man,persa, que viveu de 216 a 776. Ela expandiu-se pelo oriente e pelo ocidentecristo, tomando na Espanha, no sculo IV, a feio priscilianista, ondeacrescentou-se doutrina a prtica de atos libidinosos, repercutindo ainda nosculo XII nas heresias dos ctaros e dos albigenses. Santo Agostinho foimaniqueu, mas antes da converso para o catolicismo j havia abandonado oManiquesmo e se passara para o neo-platonismo. Combateu os erros maniqueusem quase todas as suas obras. Sob o aspecto doutrinrio, o Maniquesmo umsistema gnstico, isto , unia princpios filosficos a idias religiosas, buscandonisso a libertao do homem. O fundamento do sistema maniqueu era o dualismoque afirmava haver dois reinos em conflito, o da luz, presidido por Deus, e o dastrevas, pelo demnio. A vida na terra uma repercusso desse conflito, onde Jesusentrou como elemento purificador, e, no fim dos tempos, haver a vitria do reino

    da luz.

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    24 O segundo erro que deve ser evitado o dos que afirmam

    que o mundo eterno 3. Coloca S. Pedro na boca dos que assim

    falam, estas palavras: Desde que nossos pais morreram, tudo

    permanece como depois do comeo da criao (2 Ped. 3, 4).

    Foram levados a essa convico porque no souberam considerar

    bem o incio do mundo. O Rabi Moiss 4 comparou-os a uma

    criana que desde o nascimento fora levada para uma ilha onde

    nunca pde ver uma mulher grvida, nem o nascimento de um

    homem. Se quando crescesse lhe fosse dito com um homem

    concebido, como carregado por nove meses no seio materno e

    como nasce, ele no acreditaria no que estava ouvindo, porque lhe

    pareceria ser impossvel um homem ser gerado no seio materno.

    Do mesmo modo comportam-se os que pensam que o mundo

    eterno, porque no lhe viram o comeo. Quem pensa assim, est

    tambm em oposio f da Igreja, pois recitamos no Credo a

    verdade: Creio em Deus... que fez o cu e a terra.

    Ora, se as coisas foram feitas, claro que no poderiam tersempre existido. L-se na Escritura: Deus disse, e as coisas

    foram feitas (Ps. 148, 5).

    3 Que o mundo foi criado por Deus sem haver matria preexistente, ex-nihilo uma verdade que s se encontra na Revelao judeu-crist.Aristteles afirmava aeternidade do mundo, tese reassumida pelo filsofo rabeAverris (1126-1198),cuja influncia nos tempos de So Toms foi considervel.

    So Toms nega, por ser a criao verdade revelada, a eternidade do mundo, masadmite que Deus poderia ter feito o mundo desde toda a eternidade, isto , queno repugna razo admitir a possibilidade da eternidade do mundo.

    So Toms assim explica o conceito de criao: (Deus) por sua ao produz todoo ser subsistente, no pressupondo nenhum outro ser, pois que Ele o princpio detoda existncia, totalmente por si mesmo. Por esse motivo pode fazer alguma coisado nada: essa ao chama-se criao(De pot. 3, 1c.).

    4 Dois grandes pensadores judeus tiveram influncia na formao da teologiacatlica: Filo, neo-platnico, que nos primeiros sculos do cristianismo trouxe fartacontribuio para a Escola de Alexandria, e o Rabi Moiss, aqui citado por SoToms, que viveu este em Crdova e Alexandria entre 1135 e 1204. conhecidona filosofia com o nome de Maimnides. considerado o maior telogo do

    judasmo. So Toms refere-se a ele sempre com muito respeito.

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    25 O terceiro erro a respeito da origem do mundo seguido por

    aqueles que afirmam ter sido o mundo feito de uma matria

    preexistente. Chegaram a esse erro, porque quiseram medir o

    poder de Deus pelo nosso. Como o homem nada pode fazer sem

    uma matria preexistente, assim tambm Deus para produzir as

    coisas usou de uma matria que j existia. Isso no verdadeiro.

    O homem nada pode fazer sem uma matria preexistente, porque

    a sua capacidade de operao limitada, e, assim s pode dar

    forma a uma matria que j existia. O seu poder est limitado

    para operar s para esta forma, e, por isso, no pode ser causa

    seno dela.

    Deus, porm, a causa universal de todas as coisas, e no s cria

    a forma, mas tambm a matria. Por isso fez todas as coisas do

    nada. Recitamos no Credo essa verdade: Criador do cu e da

    terra.

    H diferena entre criar e fazer: criar, tirar alguma coisa do

    nada; fazer, produzir uma coisa de outra coisa.

    Se Deus criou as coisas do nada, deve-se tambm acreditar que

    ele pode refaze-las todas, se elas forem destrudas. Pode dar vista

    a um cego, ressuscitar um morto e fazer outros milagres. Diz a

    Escritura: O poder est a Vs submetido, quando quereis (Sb

    12, 18).

    26 Das verdades acima enunciadas podemos tirar cinco

    concluses prticas.

    Em primeiro lugar, como devemos considerar a divina majestade.

    Se o artista superior s obras, Deus, sendo o artista criador de

    todas as coisas, evidentemente superior a tudo o que existe. Diz

    a Escritura: Se os homem atrados pela beleza dos seres

    consideraram-nos deuses, saibam eles em quanto o Senhor deles

    e mais belo que eles...; ou se ficaram admirados pelo poder dos

    seres e pelas obras que produzem, compreendam como aquele

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    que os fez mais poderoso (Sb 13, 34). Por isso tudo o que

    podemos compreender ou pensar de Deus, inferior a Ele! Diz a

    Escritura: Eis o Deus grandioso que est acima de nossa cincia

    (J 36, 26).

    27 Em segundo lugar, devemos dar graas a Deus. porque

    Deus o criador de todas as coisas, tudo o que somos e tudo o

    que temos, nos vm de Deus. diz o Apstolo: O que tens, que

    no recebestes? (1 Cor 4, 7). L-se no Saltrio: Do Senhor a

    terra e tudo o que a enche; o mundo e todos os seus habitantes

    (Sl 23, 1). Por isso devemos sempre render graas a Deus: Que

    retribuirei ao Senhor, por tudo o que Ele me deu? (Sl 115, 12).

    28 Em terceiro lugar, devemos suportar as adversidades com

    pacincia. Pois se todas as criaturas vm de Deus, e por isso so

    boas por natureza, mesmo se em alguma coisa nos prejudicam se

    nos trazem penas, devemos acreditar que essas penas foram

    enviadas por Deus. A culpa nossa, porm, no pode vir de Deus,

    porque nenhuma mal pode vir de Deus, a no ser que ela seja

    dirigido para um bem. Ora, se toda pena que nos vem enviadapor Deus, devemos pacientemente suporta-la. As penas nos

    purificam dos pecados, humilham os rus, desafiam os bons para

    o amor de Deus. l-se no livro de J: Se recebes os bens das

    mos de Deus, porque no recebemos tambm os males? (J 2,

    10).

    29 Em quarto lugar, devemos usar bem das coisas criadas. As

    coisas devem ser usadas conforme as finalidades que lhes foramdadas por Deus. As coisas foram criadas para dois fins: para a

    glria de Deus, porque todas as coisas para Si mesmo Deus as

    fez (Pr 16, 4), e para nossa utilidade, porque Deus fez todas as

    coisas para servirem aos povos (Dt 4, 19).

    Devemos usar de todas as coisas para a glria de Deus, e muito

    lhe agradaremos com isso, mas tambm para nossa utilidade,

    evitando sempre o pecado. Diz a Escritura: De vs so todas as

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    ARTIGO SEGUNDO

    Creio em Jesus Cristo, Seu nico Filho,

    Nosso Senhor

    31 No somente necessrio crerem os cristos que existe um

    s Deus, e que Ele Criador do cu, da terra e de todas as coisas,

    mas tambm necessrio crerem que Deus Pai e que Jesus

    Cristo seu verdadeiro Filho.

    Esse mistrio no um mito, mas uma verdade certa e

    comprovada pela palavra de Deus no monte, conforme a

    afirmao de S. Pedro: Porque no foi baseando-nos em fbulas

    engenhosas que vos demos a conhecer o poder e a presena de

    Nosso Senhor Jesus Cristo, mas por termos visto a Sua Majestade

    com os nossos prprios olhos. Porque Ele recebeu de Deus Pai

    honra e glria, quando da magnfica glria lhe foram dirigidasestas palavras: Este meu Filho muito amado, em quem pus as

    minhas complacncias. E ns mesmos ouvimos esta voz vinda do

    cu, quando estvamos com Ele no monte santo (II Ped. 1, 16-

    18).

    O prprio Jesus Cristo muitas vezes chama a Deus como seu Pai,

    e, tambm, denominava-se Filho de Deus.

    Os Apstolos e os Santos Padres colocaram entre os artigos de f

    que Jesus Cristo Filho de Deus, quando definiram este artigo do

    Credo: E em Jesus Cristo seu Filho, isto , Filho de Deus.

    32 Mas existiram alguns herticos que acreditaram de um modo

    perverso nessa verdade de f.

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    Fotino 5, um deles, declarou que Cristo no filho de Deus seno

    como os outros homens bons o so, os quais, por viverem bem,

    merecem ser chamados filhos de Deus por adoo, enquanto

    fazem a vontade de Deus.

    Do mesmo modo, dizem eles, Cristo, que viveu bem e fez a

    vontade de Deus, mereceu ser chamado de Filho de Deus.

    O mesmo hertico queria que Cristo no tivesse existido antes da

    Virgem Maria, mas que s comeasse a existir quando nela foi

    concebido.

    Cometeu Fotino dois erros: um, porque no disse que Ele era Filho

    de Deus segundo a natureza; o outro, porque disse que Ele

    comeou a existir, conforme todo o seu ser, no tempo, enquanto a

    nossa f afirma que Ele por natureza Filho de Deus e eterno.

    Ora, essa duas verdades encontram-se claramente expressas na

    Sagrada Escritura, opostas que so ao que ele afirma.

    Contra o primeiro erro, declara a Escritura que Jesus Cristo no s Filho de Deus, mas tambm Filho Unignito: O Unignito que

    est no seio do Pai que O fez conhecido (Jo. 1, 18). Contra o

    segundo, l-se: Antes de Abrao existir, eu j existia (Jo. 8, 58).

    Ora, certo que Abrao existiu antes da Virgem Maria.

    5 A heresia do Bispo Fotino de Srmio ( 376) tem sua fonte prxima na do BispoMarcelo de Ancira ( 374) e, remota, no Monarquismo Dinmico. Esta, propaladaem Roma pelo grego Tedoto em 190, condenada pelo Papa Vitor, ensinava queCristo era simples homem e, no batismo, foi revestido de poderes divinos. Marceloensinava que havia uma mnada que evoluiu com o aparecimento do Filho, naEncarnao, e do Esprito Santo, em Pentecostes. No fim dos tempos voltaro oFilho e o Esprito para a mnada primitiva. No h, portanto, trindade eterna.Contra Marcelo foi acrescentado no Smbolo: e o seu reino no ter fim.

    S. Toms sintetiza fielmente o erro de Fotino neste sermo.

    Fotino foi condenado vrias vezes, destitudo da Diocese de Srmio e exilado. Osseus asseclas perseveraram at o sculo VII.

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    Por esse motivo, os Santos Padres acrescentaram, em outro

    smbolo 6, contra o primeiro erro: Filho de Deus Unignito; e,

    contra o segundo: nascido do Pai antes de todos os sculos.

    6 Sendo a f, por parte do homem, primeiramente um ato de conhecimento dainteligncia, devem ter sentido as palavras que exprimem as suas verdades. Porisso a Igreja, desde os tempos Apostlicos, exigia, dos que procuravam o batismo,inteligncia das palavras da f, que eram definidas. Para que essa finalidade fossealcanada, formularam-se snteses das verdades fundamentais da f com palavrasde sentido preciso, compreensvel e tradicional. Eram os smbolos da f. A palavrasmbolo, que primitivamente, na lngua grega, significava um objeto que se dividiaem duas partes, como contra-senha para identificao posterior, na tradiocatlica designava o resumo das verdades da f que identificavam a religio deCristo. Como comeava pela palavra Credo, esta tornou-se sinnimo de Smbolo.

    Na antiguidade o Credo era unido ao ritual do catecumenato, isto , na preparaopara o batismo: os electi (eleitos) acabavam a sua preparao recebendo osensinamentos do Smbolo da F (Traditio Symboli= entrega de smbolo), e depoisdeviam recita-lo diante do Bispo (redditio symboli= devoluo do smbolo). Com ocorrer dos tempos, para maior defesa contra as heresias, passou para a LiturgiaEucarstica. A sua posio atual, aps o Evangelho das Missas, foi introduzida porCarlos Magno ( 794), para combater a heresia do adopcionismo.

    Os Smbolos mais antigos e mais importantes so os seguintes:

    I) Smbolo dos Apstolos: o mais antigo Smbolo da Igreja, chamado porTertuliano de Regula Fidei, cujas origens vm dos tempos dos Apstolos,conforme a tradio. A sua mais primitiva frmula, baseada nas Escrituras, seria aseguinte:

    Creio no Pai Todo Poderoso; em Jesus Cristo, nosso Salvador; no Esprito SantoParclito, na Santa Igreja e na remisso dos pecados.

    Como se v, nele estavam contidos os Mistrios da Trindade, da Encarnao e daRedeno. A frmula atual do Smbolo Romano tem suas origens no sculo III.Consta de 12 artigos.

    II) Smbolo de Santo Atansio: uma profisso de f mais ampla, atribuda aSanto Atansio, mas provavelmente foi transmitida por Santo Ambrsio (sc. IV)que a recebera da tradio. Procura definir com bastante exatido o Mistrio daSantssima Trindade.

    III) Smbolo de Nicia: Elaborado e aprovado no Conclio Ecumnico de Nicia. OConclio de Nicia foi convocado pelo Imperador Constantino para pr fim heresia

    do arianismo (nota 8). Presidiu-o o Bispo sio e os representantes do PapaSilvestre. Participaram dele mais 300 Bispos. Na sesso de 19 de junho de 325 foiaprovado o Smbolo de Nicia, onde definido que o Filho da mesma naturezado Pai: Deus de Deus, luz de luz, verdadeiro Deus do verdadeiro Deus, gerado,no criado, da idntica natureza do Pai.

    IV) Smbolo Niceno-Constantinopolitano: Elaborado e aprovado no ConclioEcumnico de Cosntantinopla, reunido nesta cidade no ano de 31. Reproduz oSmbolo de Nicia, fazendo alguns acrscimos, principalmente com relao Terceira Pessoa da Trindade: e (ns cremos) no Esprito Santo, Senhor evivificador, procedente do Pai, que adorado e glorificado juntamente com o Pai eo Filho, e que falou pelos Profetas.

    na Igreja Oriental a frmula nica de profisso de f.

    H outras profisses de f na Igreja antiga, uma mais, outras menos,desenvolvidas, mas todas concordes no sentido das palavras e nos mistrios da f.

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    33 Sablio 7, embora tivesse dito que Cristo existiu antes da

    Virgem Maria, afirmou que a Pessoa do Pai outra no era que a do

    Filho, e que o prprio Pai se encarnou. Desse modo, a Pessoa do

    Pai seria a mesma que a do Filho. Mas isso um erro, porque

    destri a trindade das Pessoas. Contra esse erro, h a autoridade

    do Evangelista S. Joo, que nos relatou as palavras do prprio

    Cristo: Eu no sou Eu s; sou Eu e o Pai que me enviou (Jo. 8,

    16).

    Ora, evidente que ningum pode ser enviado por si mesmo. Eis

    porque Sablio errou. Acrescentou-se por isso, no Smbolo dos

    Padres: Deus de Deus, luz de luz; isto , Deus Filho de Deus Pai;

    Filho que luz, luz que procede do Pai, que tambm luz.

    nessas verdades que devemos crer.

    34 rio 8, embora tivesse afirmado que Cristo existira antes da

    Virgem Maria e que era uma a Pessoa do Pai, outra, a do Filho,

    7Sablio (sculo II) no aceitava a Trindade em Deus, mas confundia as Pessoasnuma s unidade em Deus. Para ele, as Pessoas so modos em que Deus semanifesta. A sua heresia denominada monarquianismo modalista, e, tambm,

    patripassionismo, ou, ainda, sabelianismo.

    Admitia trs manifestaes de Deus: como Pai, na criao e legislao; como Filho,na redeno, e, como Esprito Santo, na obra de santificao.

    8O Arianismo foi a mais perigosa heresia dos primitivos tempos do cristianismo.Foi seu criador um sacerdote de Alexandria, chamado Ario ( 336). Ensinava eleum certo subordicianismo, heresia mais antiga, que afirmava ser o Filhosubordinado ao Pai, negando-lhe, desse modo, identidade de natureza. Para Ario, oFilho era um ser divino de segunda ordem, o qual, por ser desprovido dos atributosabsolutos da divindade, podia realizar a criao e a redeno.

    H na doutrina de Ario dependncia da mentalidade neoplatnica reinante no seutempo. O arianismo ensinava que houve um tempo em que o Verbo no era, e

    ele (o Verbo) provm do no ser. Portanto, a Segunda Pessoa seria uma criatura.

    Condenada a heresia pelo Conclio de Nicia (nota 6), no cessou a sua obradeletria nos meios catlicos, tomando novo alento com os dois Imperadoresarianos Constncio (337-361) e Valente (364-378). O Imperador Teodrio, oGrande (379-395), reafirmando a ortodoxia catlica, conseguiu atenuar os malesdo arianismo, que por mais de 50 anos dilaceraram a Igreja. Foi definitivamentecondenado pelo Conclio de Constantinopla, de 381, aps polmicas violentas, lutase separaes entre os catlicos.

    Se a Tradio ortodoxa teve a seu lado grandes doutores da Igreja como Atansio,Baslio, Gregrio de Lauzianze e grandes Bispos, os arianos conseguiram envolvermuitos Bispos e catlicos nas suas ambguas e imprecisas frmulas heterodoxas.

    A heresia tomou tal propores nos meios catlicos que S. Jernimo chegou a

    descrever a situao com essas palavras: Lastimou-se todo o orbe e admirou-seporque estava ariano.

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    atribuiu, ao ser de Cristo, trs erros: primeiro, que Cristo foi

    criatura; segundo, que Ele foi feito por Deus como a mais nobre

    das criaturas, no desde a eternidade, mas no tempo; terceiro,

    que no havia uma s natureza de Deus Filho com Deus Pai, e,

    por esse motivo, Cristo era verdadeiro Deus.

    Tais afirmaes so evidentemente errneas por que contrrias

    autoridade da Sagrada Escritura.

    L-se no Evangelho de S. Joo: Eu e o Pai somos um (Jo. 10,

    30), isto , pela natureza. Ora, como o Pai sempre existiu, do

    mesmo modo o Filho; como o Pai verdadeiro Deus, assim

    tambm o Filho.

    Em oposio afirmao de rio, isto , que Cristo criatura, est

    declarado no Smbolo dos Padres: gerado, no feito.

    Contra o erro propalado de que Ele no era da mesma substncia

    do Pai, foi acrescentado no Smbolo: consubstancial com o Pai.

    35 Est, pois, esclarecido porque devemos crer que Cristo o

    Filho Unignito de Deus, e verdadeiro Filho de Deus; que sempre

    existiu com o Pai; que uma a Pessoa do Filho, outra, a do Pai;

    que Ele tem uma s natureza com o Pai.

    Cremos nessas verdades, aqui, pela f; conhec-las-emos, porm,

    na vida eterna, por uma perfeita viso.

    Para nossa consolao, acrescentemos algumas palavras a essas

    verdades.

    36 Devemos saber que h diversos modos de gerao,

    conforme a diversidade dos seres 9. A gerao em Deus,

    9 Aqui S. Toms esclarece-nos como a possesso do Verbo na Trindade umagerao, donde a Segunda Pessoa denominar-se tambm Filho. No texto latino a

    palavra e o conceito so expressos pelo mesmo termo verbum , podendo-seento mais de perto seguir o pensamento do Doutor Anglico.

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    diferente da gerao nos outros seres. Por isso, no podemos

    chegar a conhecer a gerao de Deus, a no ser por meio da

    gerao de criaturas que mais se aproximam de Deus e que mais

    se assemelham a Ele. Ora, como foi dito, nada se assemelha tanto

    a Deus, como a alma humana.

    H, na alma, uma espcie de gerao, quando o homem conhece

    alguma coisa pela prpria alma, que se chama conceito intelectivo.

    Esse conceito (efeito da concepo) tem a sua origem da prpria

    alma, como de um pai. Chama-se verbo (isto , palavra) da

    inteligncia ou do homem.

    A alma, portanto, gera o seu verbo, pelo conhecimento.

    O Filho de Deus, tambm, nada mais que o Verbo de Deus, no

    como se fosse um verbo (uma palavra) j pronunciado

    exteriormente, porque assim seria transitrio, mas como um

    verbo (uma palavra) concebido no interior. Eis porque o prprio

    verbo de Deus possui uma s natureza de Deus, e igual a Deus.

    O Bem-aventurado Joo, quando falou do verbo de Deus, destruiu

    as trs heresias acima definidas: a de Fotino, quando disse: No

    princpio era o Verbo; a de Sablio, quando disse: e o verbo

    estava em Deus; e a de rio, quando disse: e o Verbo era

    Deus.

    A questo tratada com notvel clareza na Suma Teolgica em linguagemteolgica, da qual neste sermo percebe-se a influncia.

    Define S. Toms gerao, conforme realiza-se nos seres vivos, como sendo aorigem de um ser vivo, de um principio vivo conjunto. Aplica a definio possesso da Segunda Pessoa:

    Portanto a possesso do Verbo em Deus tem a formalidade de uma gerao. Eleprocede semelhana de ao inteligvel, que uma operao vital; de umprincpio vivo conjunto, como foi dito anteriormente (isto , da inteligncia divina),e de modo semelhante, porque o conceito intelectivo semelhante coisaconhecida; e na mesma natureza, porque em Deus ser e conhecer so a mesmarealidade... Por conseguinte a processo do Verbo em Deus chama-se gerao, e o

    prprio Verbo procedente chama-se Filho (S. T. I. 7, 2; cf. I. 27, 1; cf. I. 34, 2).

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    37 Mas o Verbo (a palavra) existe diversamente em ns e em

    Deus. Em ns, o verbo um acidente 10; em Deus, o Verbo de

    Deus mais identifica-se com o prprio Deus, pois nada h em Deus

    que no seja essncia de Deus.

    Ningum pode afirmar que Deus no possui um verbo, porque, se

    o fizesse, estaria tambm afirmando que em Deus no h

    absolutamente conhecimento. Como, porm, Deus sempre existiu,

    assim tambm o seu Verbo.

    38 Como o artista executa as suas obras de acordo com o

    modelo que prefigurou em sua inteligncia, que o seu verbo;

    assim tambm Deus faz todas as coisas pelo seu Verbo, que

    como o seu pensamento artstico. Por isso l-se em S. Joo:

    Todas as coisas foram feitas por Ele (Jo. 1, 3).

    39 Se o Verbo de Deus o Filho de Deus e todas as palavras

    (os verbos) de Deus possuem alguma semelhana com esse

    verbo, todos ns devemos, em primeiro lugar, ouvir com

    satisfao as palavras de Deus. Se ouvirmos com prazer aspalavras de Deus, isto sinal de que amamos a Deus.

    40 Em segundo lugar, devemos crer nas palavras de Deus,

    porque assim que o Verbo de Deus habita em ns, isto , Cristo,

    que o Verbo de Deus. L-se no Apstolo S. Paulo: Habitar

    Cristo, pela f, em vossos coraes. (Ef. 3, 17). L-se tambm

    10 S. Toms assim precisa a noo de substncia: A substncia que sujeito temduas propriedades: primeiro, no ter necessidade de um fundamento extrnsecopara ser sustentada, mas sustenta-se em si mesma; segundo, ser fundamento dosacidentes, sustentando-os, e por isso diz-se que sub-est (Pot. 9, 1). A substnciasubsiste em si mesma e sustenta os acidentes. Acidente justamente o ser queexiste, mas no subsiste, porque est ardente substncia. Acidente diz S.Toms o ser cuja essncia deve estar em outra coisa (Qdc. IX, 5, ad 2)

    Convm que o ser deles (isto , dos acidentes) seja acrescido ao ser dasubstncia, e dependente deste (C. G. IV, 14).

    O acidente um ser secundrio, mais imperfeito que o ser da substncia e, sem asua substncia, o acidente no pode existir (a no ser por um milagre de Deus). Asubstncia, diz Aristteles, o simples ser e se realiza por si mesmo: todos osoutros gneros de ser diversos da substncia, so seres de certo modo e existempela substncia. Por conseguinte, a substncia o primeiro entre os seres (Met.,

    VII, 1, 1028).

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    em S. Joo: No tendes o Verbo de Deus permanecendo em vs

    porque no acreditais nAquele que Ele enviou. (Jo. 5, 38).

    41 Em terceiro lugar, convm que sempre tenhamos o Verbo de

    Deus, que permanece em ns, como objeto das nossas

    meditaes. No conveniente apenas crer, mas necessrio

    tambm meditar, pois de outro modo, a f no nos seria til. A

    meditao sobre o Verbo de Deus muito til contra o pecado. L-

    se nos Salmos: Escondi no meu corao a Vossa palavra, para

    no pecar contra vs (Ps. 118, 11). L-se, ainda, a respeito do

    homem justo: Meditarei dia e noite na Sua Lei (Ps. 1, 2). Por

    isso sabemos que a Virgem Maria conservava todas essas

    palavras, meditando sobre elas no seu corao (Lc. 2, 51).

    42 Em quarto lugar, convm que o homem comunique aos

    outros a palavra de Deus, admoestando, pregando-a para eles e

    afervorando-lhes a f. Encontram-se nas cartas de S. Paulo os

    seguintes textos: Que nenhuma palavra m proceda da vossa

    boca, mas somente as boas palavras que edificam (Ef. 4, 29).

    Que a palavra de Cristo habite em vs abundantemente, comtoda sabedoria, culminando e admoestando uns aos outros (Col.

    3, 16); Prega a palavra, insiste oportuna e importunamente,

    repreende, pede e ameaa com toda a pacincia e com toda a

    doutrina (II Tess. 4, 2).

    43 Em ltimo lugar, devemos cumprir o que a palavra de Deus

    determinou. L-se em S. Tiago: Sede realizadores da palavra de

    Deus e no apenas ouvintes, enganando-vos uns aos outros(Tiag. 1, 22).

    44 Na mesma ordem, a Bem-aventurada Virgem Maria seguiu

    essas cinco recomendaes, quando nela foi gerado o Verbo de

    Deus. Primeiramente, ouviu: O Esprito Santo vir sobre ti (Lc.

    1, 35). Depois, consentiu pela f: Eis a escrava do Senhor (Lc.

    1, 38). Em terceiro lugar, recebeu o Verbo Encarnado e O

    carregou em seu seio. Em quarto lugar, ela O pronunciou quando

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    a Ele deu a luz. Finalmente, nutriu-O e amamentou-o. Eis porque

    a Igreja canta: A Virgem amamentava, fortalecida do cu, o

    prprio Rei dos Anjos.

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    ARTIGO TERCEIRO

    Foi concebido do Esprito Santo,

    nasceu da Virgem Maria

    45 No somente necessrio ao cristo acreditar que Jesus o

    Filho de Deus, como acima mostramos, mas tambm convm crer

    na Sua Encarnao. Por isso, o Bem-aventurado Joo, aps ter

    falado muitas coisas elevadas e de difcil compreenso, logo a

    seguir nos insinua a Sua Encarnao, quando diz: E o Verbo se

    fez carne (Jo. 1, 14).

    Para que possamos aprender algo dessa verdade, darei dois

    exemplos:

    Sabe-se que nada to semelhante ao Filho de Deus como a

    palavra concebida em nosso interior, mas no pronunciadaexteriormente. Ningum conhece a palavra enquanto est no

    interior do homem, a no ser ele, que a concebeu. Mas logo que

    proferida exteriormente, torna-se conhecida. Assim o Verbo de

    Deus no era conhecido seno pelo Pai, enquanto estava no seio

    do Pai. Mas logo que se revestiu da carne, como a palavra

    concebida no interior, pela voz, tornou-se manifesto e conhecido.

    L-se na Escritura: Depois disso foi visto na terra, e conviveu

    com os homens (Bar. 3, 38). Vejamos o segundo exemplo. Apalavra, pronunciada exteriormente, ouvida, mas no vista,

    nem se pode nela tocar. Escrita, porm, em uma folha, pode ser

    vista e tocada. Assim tambm o Verbo de Deus tornou-se visvel e

    palpvel, quando foi, de certo modo, escrito em nossa carne. Ora,

    quando numa mensagem esto escritas as palavras do rei, ela

    tambm chamada de palavra do rei. Do mesmo modo, o homem

    a quem est unido o Verbo de Deus numa s pessoa, deve ser

    chamado do Filho de Deus. L-se em Isaas: Toma o grande livro

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    e escreve nele com a pena de um homem (Is. 8, 1). Declararam

    tambm os Apstolos: Que foi concebido do Esprito Santo,

    nasceu da Virgem Maria.

    46 Com relao a este artigo do Credo, muitos caram em

    erros. Por isso os Santos Padre, em outro smbolo, o de Nicia,

    acrescentaram muitos esclarecimentos que nos permitem ver

    agora como esses erros foram destrudos.

    47 Orgenes11 afirmou que Cristo nasceu e que veio a este

    mundo para salvar tambm o demnio. Disse ainda que todos os

    demnios seriam salvos no fim do mundo. Afirmar tal coisa,

    porm, ir contra a Sagrada Escritura, pois se l no Evangelho de

    So Mateus: Afastai-vos de mim, malditos, e ide para o fogo

    eterno, que foi preparado para o diabo e para os seus anjos (Mat.

    25, 41). Por essa razo, foi acrescentado no Smbolo: Que desceu

    dos cus para ns, homens (no se diz: para os demnios) e para

    a nossa salvao. Essas palavras evidenciam, ainda mais, o amor

    de Deus para conosco.

    11Orgenes (185 253) das personalidades mais discutidas da patrstica. Filho domrtir Lenidas, cedo, pela sua notvel inteligncia, foi chamado para dirigir aEscola Catequtica de Alexandria. Visitou Roma e todo o oriente catlico. Paramelhor seguir o Evangelho mutilou-se. Sendo ordenado sacerdote irregularmente,por esse motivo foi excomungado. No abandonou, contudo, a Igreja, morrendovtima das torturas que sofreu pela f na perseguio de Dcio. De culturainvulgar, tendo exercido atividade de ensino em Roma, Cesria e Alexandria,Orgenes escreveu obras de teologia em nmero imenso, ditando-as para diversostaqugrafos, tendo at pagos em suas aulas, que eram atrados pela suasabedoria.

    A influncia de Orgenes, na teologia do Oriente antigo, equipara-se a de Santo

    Agostinho, na do Ocidente. Orgenes tentou formular um sistema teolgico,fundamentando-o no neo-platonismo e, em parte, em Aristteles. Esse ecletismofilosfico levou Orgenes a afirmar muitas teses falsas no plano da f, como otraducianismo (os pais transmitem a alma aos filhos), a eternidade do mundo, aigualdade inicial de todos os seres espirituais, a sucesso cclica dos mundos, avolta de tudo a Deus, no retorno final (apocatastase). At o inferno desaparecerno fim de tudo. Interpretava a Escritura, tambm de modo ambguo.

    So Jernimo considerou Orgenes: o pai de todas as heresias.

    Foi posteriormente condenado, diversas vezes, como herege. Orgenes foi vtimado subjetivismo na interpretao da Escritura e do otimismo, na considerao dascoisas. Faltando-lhe a filosofia verdadeira, naturalmente caiu em erros. TodaviaOrgenes sempre procurou ser fiel Igreja, em muitos aspectos o iniciador dateologia oriental, testemunho tambm, em outros, da tradio catlica. notvel asua influncia nos Padres Capadcios. Devido sua genialidade foi denominado

    Adamantino.

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    48 Fotino12, no obstante ter aceito que Cristo nasceu da Bem-

    aventurada Maria Virgem, afirmou que Ele era um simples

    homem, que, por ter vivido bem e ter feito a vontade de Deus,

    mereceu ser considerado Filho de Deus, como o so os outros

    santos. Contra essa afirmao, l-se na Escritura: Desci do cu,

    no para fazer a minha, mas a vontade de quem me enviou (Jo.

    6, 38). Ora, evidente que no teria descido do cu, se a no

    estivesse; e, se fosse um simples homem, no poderia ter estado

    no cu. Para afastar esse erro, foi acrescentado: desceu dos

    cus.

    49 Mans13ensinava que Cristo foi sempre Filho de Deus e que

    desceu do cu, mas que no possua verdadeira carne, pois que

    esta era apenas aparente. Isso falso. Ora, no convinha ao

    Mestre da verdade, mostrar-se com alguma falsidade. Por isso,

    como apareceu em verdadeira carne, devia tambm possui-la. L-

    se no Evangelho de So Lucas: Palpai e vede, porque o Esprito

    no tem carne nem ossos, como me vedes possuir (Lc. 24, 39).

    Para afastar tal erro, os Padres acrescentaram: E se encarnou.

    50 Com relao a Ebion 14, que era judeu, aceitava ele que

    Cristo tivesse nascido da Bem-aventurada Maria, mas de uma

    unio carnal, e de smen humano. Isso, porm, falso, porque o

    Anjo disse: O que nascer dela, obra do Esprito Santo (Mat. 1,

    20). Para afastar esse erro, os Padres acrescentaram: Do Esprito

    Santo.

    12Fotino (ver nota n 5).

    13Mans (ver nota n 2).

    14Ebionitas. Propriamente no h o fundador Ebion, mas o nome da seita deriva dotermo pobreza, em hebraico. Esta seita vinha dos tempos apostlicos, constituam-na judeus-cristos que no aceitavam a doutrina do Apstolo Paulo, nem adivindade de Cristo. Esperavam tambm um reino terreno messinico de mil anos(Milenarismo = quiliasma). A seita espalhou-se pela Sria e perseverou at o sc.

    V.

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    51 Valentino 15aceitava que Cristo tivesse sido concebido pelo

    Esprito Santo, mas tambm ensinava que Cristo trouxera um

    corpo celeste e o depositara na Bem-aventurada Virgem, e que

    este corpo era o de Cristo. Por esse motivo, dizia, a Bem-

    aventurada Virgem nada fizera seno ter-se dado como

    receptculo daquele corpo, e, que este passava por ela, como por

    um aqueduto. Mas tal afirmao falsa, porquanto o Anjo disse:

    O santo que de ti nascer, ser chamado Filho de Deus (Lc. 1,

    35). Do mesmo modo, o Apstolo: Quando chegou a plenitude

    dos tempos, enviou Deus o seu Filho feito de mulher (Gal. 4, 4).

    Eis porque os Padres acrescentaram no Smbolo: Nasceu da

    Virgem Maria.

    52 Ario16 e Apolinrio 17afirmaram que Cristo era o Verbo de

    Deus e que nasceu da Virgem Maria, mas que no possua alma,

    estando em lugar desta, a divindade. Mas isto contra a Escritura,

    onde se encontram estas palavras de Cristo: Agora, a minha

    alma est perturbada (Mt. 26, 38). Para refutar o erro de ambos,

    os Santos Padres acrescentaram no Smbolo: E fez-se homem.

    Ora, o homem constitudo de alma e corpo. Por conseguinte, Elepossuiu tudo o que o homem pode possuir, exceto o pecado.

    53 Pela expresso fez-se homem so destrudos todos

    os erros acima enumerados, e todos os que possam surgir. Foi

    destrudo, por essa expresso, principalmente o erro de Eutquio18

    15Valentino Gnstico Alexandrino que difundiu sua doutrina em Roma pelos anosde 136 a 160. Grande talento oratrio, formulou um sistema doutrinrio religioso-filosfico baseado na filosofia neoplatnica. Tornaram-se os valentinianos

    perigosos, porque usavam os mesmos ritos da Igreja e, assim, iludiam e atraiamos catlicos.

    16Ario (Ver nota n 8).

    17Apolinrio Bispo de Laodicia, na Sria, aplicou a doutrina da tricotomiaplatnica a Cristo, de modo que Cristo no teria alma racional. O Logos fazia svezes dela, sendo Cristo constitudo de carne, alma animal e do Logos. Sem operceber, Apolinrio de fato ensinava que o verbo se encarnou em um serirracional. No obstante ter combatido o Arianismo, Apolinrio, pelo conceito falsoa respeito da humanidade de Cristo, caiu neste erro. Diversos Snodos condenaramo apolinarismo, os Padres Antioquenos logo o rejeitaram e o Imperador Teodsio,em 388, exilou os seus adeptos. A heresia foi absorvida pela Igreja Ortodoxa,manifestando-se mais tarde na forma do nonofisitismo. Apolinrio faleceu em 390.

    18 Eutquio era Arquimandrita de Constantinopla, piedoso, mas sem culturateolgica. Com Eutquio inicia-se a grande luta monofisita, que terminar na Igreja

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    que ensinou ter havido uma mistura, isto , que havia uma s

    natureza em Cristo, oriunda da divina e da humana, de modo que

    Cristo no era nem simplesmente Deus, nem simplesmente

    homem. Tal afirmao falsa, porque, se no fosse falsa, Cristo

    no seria homem como fora definido: fez-se homem.

    destrudo tambm o erro de Nestrio19 que afirmou que o Filho

    de Deus reuniu-se ao homem s por inabitao. falsa tambm

    essa doutrina, porque ento no estaria escrito apenas homem,

    mas no homem. O apstolo declara que Cristo foi homem: Foi

    reconhecido, conforme se apresentou, como homem (Fil. 2, 7).

    L-se tambm em So Joo: Por que me quereis matar, eu, um

    homem que vos disse a verdade que ouvi de Deus? (Jo. 8, 40).

    com o Conclio Ecumnico de Calcednia, 451. Em forte oposio ao nestorianismo(ver nota 19), os monofisitas ensinavam que em Cristo h uma s natureza, adivina, pois a natureza humana de Cristo foi divinizada, no sendo mais igual nossa. Em Cristo haveria uma e nica natureza. Eutquiu agiu com muitaviolncia contra os que afirmavam haver duas naturezas em Cristo, identificando-os com os nestorianos.

    No Conclio de Calcednia, foi lida a carta do Papa Leo Magno (440-461) sob

    grande aplausos, na qual era condenado o monofisitismo e o nestorianismo. Assimescrevia o Papa:

    Ns ensinamos e professamos um nico e idntico Cristo... em duas naturezas,no confusas e no transformadas entre si, no divididas, no separadas, pois aunio das naturezas no suprimiu as diferenas, antes, cada uma das naturezasconservou as propriedades e se uniu com a outra numa nica pessoa e numa nicahiptese.

    A heresia monofisita difundiu-se pela cristandade, aceitando-a ainda hoje as igrejasOrtodoxa da Armnia, da Abissna (coptas) e da Sria (jacobitas).

    19 Nestrio, monge piedoso e bom orador, foi eleito Bispo de Constantinopla em428. Seguindo a escola teolgica antioquena, que exagerava de tal modo adistino das duas naturezas de Cristo a ponto de parecer afirmar a existncianEle de duas pessoas, Nestrio levou ao extremo as teses antioquenas negandohaver em Cristo s a Pessoa Divina. Consequentemente, Maria era apenas me deCristo, no Me de Deus (Teotkos).

    So Cirilo Alexandrino de modo contundente combateu o erro de Nestrio, tendo oPapa Celestino I apoiado a doutrina deste Padre.

    Firme no erro e na Ctedra de Constantinopla que deveria renunciar, Nestriosolicitou do Imperador Teodrio II a convocao de um Conclio Ecumnico paradirimir a questo. Realizou-se este em feso, no ano de 431, presidido por Cirilo,representante do Papa, sendo Nestrio destitudo da funo episcopal e reafirmadaa dualidade de natureza em Cristo e a unidade de pessoa. Maria foi declaradaTeotkos. O Conclio, que o terceiro ecumnico, no publicou novo Smbolo de f,considerando o Smbolo Niceno suficiente. A heresia nestoriana difundiu-se peloOriente, entre os indianos, chineses e monges e no sculo XVI os nestorianoscaldeos voltaram ao seio da Igreja Catlica. Subsistem ainda adeptos do

    nestorianismo no norte do Iraque.

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    54 Dessa exposio sobre o 3 artigo do Credo, podemos tirar

    algumas concluses prticas para nossa instruo. Em primeiro

    lugar, para confirmao da nossa f. Se algum falasse de uma

    terra longnqua, na qual nunca estivera, no seria to bem aceita

    a sua palavra como seria, se a conhecesse.

    Antes da vinda de Cristo, os Patriarcas, os Profetas e Joo Batista

    falaram algumas verdades a respeito de Deus. Os homens, porm,

    no acreditaram nelas como acreditaram em Cristo, que este com

    Deus, e, mais do que isso, constitua um s ser com Ele. Eis

    porque a nossa f foi muito mais confirmada pelas verdades

    transmitidas por Cristo. L-se em So Joo: Ningum jamais viu

    a Deus. O Filho Unignito, que est no seio do Pai, nos revelou

    (Jo. 1, 18). Muitos mistrios da f, que antes estavam velados,

    nos foram revelados aps o advento de Cristo.

    55 Em segundo lugar, para elevao da nossa esperana.

    Sabemos que o Filho de Deus no sem elevado motivo veio a ns,

    assumindo a nossa carne, mas para grande utilidade nossa. Fez,

    para consegui-la, um certo comrcio: assumiu um corpo animado,e dignou-se nascer da Virgem, para nos entregar a sua divindade;

    fez-se homem, para fazer o homem, Deus. L-se em So Paulo:

    Por quem temos acesso pela f nessa graa, na qual

    permanecemos, e nos gloriamos na esperana da glria dos filhos

    de Deus (Rom. 5, 2).

    56 Em terceiro lugar, para que a nossa caridade seja mais

    fervorosa. Nenhum indcio mais evidente da caridade divina doque o Deus, Criador de todas as coisas, fazer-se criatura; o do

    Senhor nosso, fazer-se nosso irmo; o do Filho de Deus, fazer-se

    filho de homem. L-se em So Joo: Tanto Deus amou o mundo,

    que lhe deu o Seu Filho (Jo. 3, 16). Pela considerao dessa

    verdade, deve ser reacendido e de novo em ns afervorado, o

    nosso amor para com Deus.

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    57 Em quarto lugar, para conservao da pureza de nossa

    alma. A nossa natureza foi a tal ponto enobrecida e exaltada pela

    unio com Deus, que foi assumida para consorciar-se com uma

    Pessoa Divina. Por esse motivo o Anjo, aps a Encarnao, no

    permitiu que o Bem-aventurado Joo o adorasse20, quando antes

    permitira que at os maiores Patriarcas o fizessem. O homem,

    pois, reconsiderando e atendendo prpria exaltao, deve

    perceber como se degrada e avilta a si e prpria natureza, pelo

    pecado. Por isso escreve So Pedro: Por quem nos concedeu as

    mximas e preciosas promessas, para que nos tornssemos

    consortes da natureza divina, fugindo da corrupo da

    concupiscncia que existe no mundo (II Ped. 1, 5).

    58 Em quinto lugar, a meditao dos mistrios da Encarnao

    aumenta em ns o desejo de nos aproximarmos de Cristo. Se

    algum, irmo de um rei, dele longe estivesse, naturalmente

    desejaria aproximar-se dele, estar com ele, permanecer junto

    dele. Ora, sendo Cristo nosso irmo, devemos desejar estar com

    Ele e nos unirmos a Ele. Com relao a esse desejo, l-se em So

    Mateus: Onde quer que esteja o cadver, a se apresentaro osabutres (Mat. 24, 28). So Paulo desejava dissolver-se para estar

    com Cristo: esse desejo cresce tambm em ns pela considerao

    do mistrio da Encarnao.

    20 L-se no Apocalipse que Joo tentou adorar o Anjo vigoroso (Apo. 18, 21). Mas

    foi admoestado a que no o fizesse (Apo. 19, 10).

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    ARTIGO QUARTO

    Padeceu sob o poder de Pncio Pilatos, foi crucificado,

    morto e sepultado

    59 Como necessrio ao cristo acreditar na Encarnao do

    Filho de Deus, tambm necessrio acreditar na sua Paixo e

    Morte, por que, como disse S. Gregrio, em nada nos teria sido

    til o seu nascimento, se no favorecesse Redeno. Essa

    verdade, isto , que Cristo morreu por ns, de tal modo difcil

    que a nossa inteligncia pode apenas conhece-la, mas, de modo

    algum, por si mesmo descobri-la. Isso confirmado pelas palavras

    do Apstolo: Farei uma obra em vossos dias, que nela no

    podereis acreditar se algum antes no a tiver revelado (At 13,

    41). Confirma-o tambm o que falou o Profeta Habacuc: Ser

    feita uma obra em vossos dias que ningum acreditar quando for

    narrada (Hab 1, 5).

    A graa e o amor de Deus para conosco so to grandes, que Ele

    fez por ns mais do que podemos compreender.

    60 No se deve, porm, crer que quando Cristo morreu por ns,

    a Divindade tambm morreu. NEle morreu a natureza humana;

    no morreu enquanto Deus, mas enquanto homem.

    Trs exemplos esclarecero essa verdade.

    Um deles, encontramos em ns mesmos. Sabe-se que quando um

    homem morre, na separao que h entre a alma e o corpo, a

    alma no morre, mas o corpo, a carne.

    Assim tambm na morte de Cristo no morreu a divindade, mas a

    natureza humana.

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    61 Pode-se aqui fazer a seguinte objeo: Se os judeus no

    mataram a divindade, evidentemente o pecado deles, matando

    Cristo, no foi maior do que se tivessem morto um outro homem.

    62 Respondamos a essa objeo:

    Se algum sujasse as vestes com as quais o rei estava vestido,

    cometeria falta to grande como se tivesse sujado o prprio rei.

    Assim tambm os judeus. Como no puderam matar a Deus,

    matando a natureza humana assumida por Cristo, eles mereceram

    severa punio, como se tivessem assassinado a prpria

    divindade.

    63 Como dissemos acima, o Filho de Deus o Verbo de Deus, e

    o Verbo de Deus Encarnado como a palavra de Deus escrita em

    uma carta. Se algum rasgasse a carta do rei, cometeria a mesma

    falta daquele que tivesse rasgado a palavra do rei.

    Por isso os judeus pecaram to gravemente como se tivessemmorto o Verbo de Deus.

    64 Mas perguntas:

    Que necessidade havia de o Verbo de Deus padecer por ns?

    Grande necessidade, e por duas razes. Uma, porque foi

    remdio para os nossos pecados; outra, porque foi um exemplopara as nossas aes 21.

    21 Na Suma Teolgica (III, 46), S. Toms analisa as razes da Paixo de Cristo.No havia necessidade absoluta da Paixo de Cristo (art. 1), seria possvelencontrarem-se outros modos de salvar o homem (art. 2), mas baseado em Sto.Agostinho, o Doutor Anglico afirma que o modo redentor realizado pela Paixo foio mais conveniente (art. 3). Apresenta as seguintes razes de convenincia: ohomem v o quanto Deus o amou, e levado a amar a Deus por gratido; Cristo,na Paixo, deu exemplo de obedincia, humildade, constncia e justia, virtudesnecessrias salvao; prometeu a graa e a glria, alm de salvar o homem dopecado; lembrando-se de que foi salvo pelo Sangue de Cristo, o homem evita opecado; a dignidade do homem elevada, pois venceu o diabo pelo qual fora

    vencido; e a morte merecida pelo pecado, foi superada pela morte de Cristo.

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    65 Foi sim, um remdio, porque contra todos os males que

    contramos pelo pecado, encontramos o remdio na Paixo de

    Cristo 22.

    Contramos pelo pecado cinco males.

    66 O primeiro, a prpria mancha do pecado 23. Quando um

    homem peca, conspurca a sua alma, porque, como a virtude

    embeleza, o pecado a enfeia. L-se em Barruch: Por que ests,

    Israel, na terra dos inimigos, e te contaminaste com os mortos?

    (Br 3, 10).

    Mas a Paixo de Cristo lavou esta mancha. Cristo, na sua Paixo,

    fez do seu sangue um banho para nele lavar os pecadores: Lava-

    os do pecado no sangue (Ap 1, 5) 24. No Batismo a alma lavada

    no Sangue de Cristo, por que este recebe do Sangue de Cristo a

    fora regeneradora. Por isso, quando algum batizado se macula

    pelo pecado, faz uma injria a Cristo e o seu pecado maior que o

    cometido antes do batismo. L-se na Carta aos Hebreus: O quedesprezou a lei de Moiss, aps ouvido o testemunho de dois ou

    trs, deve morrer (Heb 10, 28-29). Como no deve merecer

    Note-se que estes Sermes sobre o Credo foram pronunciados quando Sto. Tomsescrevia a III Parte da Suma, em Npoles, onde trata da Paixo de Cristo.

    22 Cristo pela sua Paixo libertou-nos do pecado como causa desta libertao, isto, instituindo a causa da nossa libertao, em virtude da qual possam semprequaisquer pecados serem perdoados presentes, passados e futuros; como omdico que faz o medicamento capaz de curar todas as doenas, tambm asfuturas (S. T. III, 49, 1 ad. 3).

    23 Mancha propriamente refere-se s coisas corpreas, quando algum corpo limpoperde a sua pureza pelo contato com outro corpo, como vestes, ouro e prata. Nascoisas espirituais deve-se usar o termo mancha em semelhana com as coisascorpreas. A alma do homem possui uma dupla nitidez: uma, derivada doresplendor da luz da razo; (...) outra, derivada da luz divina, isto , da sabedoriae da graa. (...). H como que um sentido de tato na alma, quando adere a algumacoisa pelo amor. Quando peca, adere a algumas coisas contra a luz da razo e adivina luz. Donde ser chamado o detrimento dessa nitidez, proveniente de talcontato, metaforicamente, de mancha da alma (S.T. III, 86,1).

    24 Porque a Paixo de Cristo realizou-se como certa causa universal da remissodos pecados, necessrio que seja aplicada a cada um para destruio dosprprios pecados. Isto feito pelo batismo e pela penitncia, e pelos outrosSacramentos, que possuem a eficcia derivada da Paixo de Cristo (S.T. III, 49,1

    ad. 4).

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    maiores suplcios, aquele que pisou no Sangue do Filho de Deus e

    considerou impuro o Sangue da Aliana?

    67 O segundo mal que contramos pelo pecado nos tornarmos

    objeto da averso de Deus. Assim como quem carnal ama a

    beleza da carne, do mesmo modo Deus ama a beleza espiritual,

    que a beleza da alma. Quando, por conseguinte, a alma se deixa

    contaminar pelo mal do pecado, Deus fica ofendido e odeia o

    pecador. L-se no Livro da Sabedoria: Deus odeia o mpio e a sua

    impiedade (Sb 14, 9) 25. Mas a Paixo de Cristo remove essas

    coisas, por que ela satisfez ao Pai ofendido pelo pecado, cuja

    satisfao no poderia vir do homem. A caridade e a obedincia de

    Cristo foram maiores que o pecado e a desobedincia do primeiro

    homem. L-se em S. Paulo: Sendo inimigo, fomos reconciliados

    com Deus pela morte do seu Filho (Rm 5, 10) 26.

    68 O terceiro mal a fraqueza. O homem, pecando pela

    primeira vez, pensa que depois pode abster-se do pecado.

    Acontece, porm, o contrrio: debilita-se pelo primeiro pecado e

    fica inclinado a pecar mais.

    O pecado vai dominando cada vez mais o homem, e este, por si

    mesmo, coloca-se em tal estado que no pode mais se levantar.

    como algum que se lanou num poo. S pode sair dele pela

    fora divina.

    Depois que o homem pecou, a nossa natureza ficou debilitada,

    corrompida, e, por isso mesmo, ficou ele mais inclinado para opecado.

    25 Assim como foram os homens os que mataram Cristo, tambm o foi o Cristomorto. A caridade do Cristo padecente foi maior que a maldade dos seusmatadores. Por isso a Paixo de Cristo foi mais vantajosa para reconciliar Deuscom todo o gnero humano, que para provoca-lO ira. (S.T. III, 49, 4 ad 3).

    26 A Paixo de Cristo causa a remisso dos pecados como uma redeno. PorqueEle a nossa cabea, pela sua Paixo, que suportou pela obedincia e pelacaridade, libertou-nos como membros seus do pecado, como se fosse isso o preodo pecado; como um homem que, pelos atos meritrios feitos pela mo, seredimisse do pecado cometido pelos ps. Assim como o corpo natural um sconstitudo pela diversidade dos membros, tambm toda a Igreja, que o Corpo

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    Mas Cristo diminuiu essa fraqueza e debilidade, bem que no as

    tenha totalmente apagado.

    O homem foi fortalecido pela Paixo de Cristo e o pecado,

    enfraquecido, de sorte que este no mais o dominar. Pode, por

    esse motivo, auxiliado pela graa divina, que conferida pelos

    sacramentos cuja eficcia recebem da Paixo de Cristo, esforar-

    se para sair do pecado. L-se em S. Paulo: O nosso velho homem

    foi crucificado juntamente com Ele, para que fosse destrudo o

    corpo do pecado (Rm 6, 6). Antes da Paixo de Cristo, poucos

    havia sem pecado mortal. Mas, depois dela, muitos viveram e

    vivem sem pecado mortal.

    69 O qual mal a obrigao que temos de cumprir a pena do

    pecado. A justia de Deus exige que o pecado seja punido, e a

    pena medida pela culpa. Como a culpa do pecado infinita,

    porque ela vai contra o bem infinito, Deus, cujo mandamento o

    pecador desprezou, tambm a pena devida ao pecado mortal

    infinita.

    Mas Cristo pela sua Paixo livrou-nos dessa pena, assumindo-a Ele

    prprio. Confirma-o S. Pedro: Os nossos pecados (i. ., a pena do

    pecado) Ele carregou no seu corpo (1 Pd 2, 24).

    Foi de tal modo exuberante a virtude da Paixo de Cristo, que ela

    s foi suficiente para expirar todos os pecados de todos os

    homens, mesmo que fossem em nmero de milhes. Eis o motivopelo qual aquele que foi batizado, foi tambm purificado de todos

    os pecados. tambm por este motivo que os sacerdotes

    perdoam os pecados. Do mesmo modo, aquele cujo sofrimento

    mais se assemelha ao da Paixo de Cristo, consegue um maior

    perdo e merece maiores graas.

    Mstico de Cristo, considerada como se constitusse uma s pessoa com a suacabea, que Cristo. (S.T. III. 49, 1 c).

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    70 O quinto mal contrado pelo pecado foi nos termos tornados

    exilados do reino do cu. natural que aqueles que ofendem o rei

    sejam obrigados a sair da ptria. O homem foi afastado do paraso

    por causa do pecado: Ado imediatamente aps o pecado foi

    expulso do paraso, e sua porta lhe foi trancada.

    Mas Cristo, pela sua Paixo, abriu aquela porta e novamente

    chamou os exilados para o reino 27.

    Quando foi aberto o lado de Cristo, foi tambm a porta do paraso

    aberta; quando o seu Sangue foi derramado, a mancha foi

    apagada, Deus foi aplacado, a fraqueza foi afastada, a pena foi

    expiada, e os exilados foram convocados para o reino. Por isso

    que foi logo dito ao ladro: Estars hoje comigo no Paraso (Lc.

    23, 43).

    Observe-se que nesse momento no foi dito outrora; que

    tambm no foi dito a outrem nem a Ado, nem a Abrao, nem

    a David; foi dito, hoje, isto , logo que a porta foi aberta, e o

    ladro pediu e recebeu perdo. L-se na carta aos Hebreus:Confiantes na entrada no santurio pelo Sangue de Cristo (Heb.

    10, 19).

    Fica assim esclarecido como a Paixo de Cristo foi til, enquanto

    remdio contra o pecado.

    Mas a sua utilidade no nos foi menor, enquanto ela nos serviu de

    exemplo.

    71 Como disse S. Agostinho: A Paixo de Cristo suficiente

    para ser modelo de toda a nossa vida. Quem quer que queira ser

    27 Pela Paixo de Cristo fomos libertados, no apenas do pecado comum a toda anatureza humana, quer quanto culpa, quer quanto ao reato da pena, pois Elepagou o preo por ns; mas tambm dos pecados prprios de cada um de ns, queparticipamos da Sua Paixo pela f, pela caridade e pelos sacramentos da f. Eassim, pela Paixo de Cristo nos foi aberta a porta do reino dos cus (S.T. III 49,

    5 c).

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    perfeito na vida, nada mais necessrio fazer seno desprezar o

    que Cristo desprezou na cruz, e desejar o que nela Ele desejou.

    72 Nenhum exemplo de virtude deixa de estar presente na

    cruz. Se nelas buscas um exemplo de caridade, ningum tem

    maior caridade do que aquele que d sua vida pelos amigos (Jo.

    15, 13).

    Ora, foi o que Cristo fez na cruz.

    Por isso, j que Cristo entregou a sua vida por ns, no nos deve

    ser pesado suportar toda espcie de males por amor a Ele. O que

    retribuirei ao Senhor, por todas as coisas que Ele me deu? (Ps.

    115, 12).

    73 Se procuras na cruz um exemplo de pacincia, nela

    encontrars uma imensa pacincia. A pacincia manifesta-se

    extraordinria de dois modos: ou quando algum suporta grandes

    males pacientemente, ou quando suporta aquilo que poderia ser

    evitado e no quis evitar.

    Cristo na cruz suportou grandes sofrimentos: vs todos que

    passais pelo caminho parai e vede se h dor igual minha! (Jes.

    1, 17) Como a ovelha levada para o matadouro e como o cordeiro

    silencioso na tosquia (I Ped. 2, 23) 28.

    28 Considerando-se a suficincia, a mnima Paixo de Cristo seria suficiente para

    libertar o gnero humano de todos os pecados; considerando-se, porm, aconvenincia, foi preciso que padecesse todas as espcies de sofrimentos (S.T.46, 5 ad 3).

    No Cristo padecente houve verdadeira dor sensvel, que causada pela que nocivo ao corpo, e dor interior, que causada pelo conhecimento de algummalefcio, chamada tristeza. Ambas as dores foram mximas, em Cristo, entre asdores da presente vida. (...) A causa da dor sensvel foi a leso corporal, nElemuito forte devido ao sofrimento ter sido generalizado por todo o corpo, devidotambm ao tipo de sofrimento, por que a morte dos crucificados a mais cruel eacerba... (...) A causa da dor interior foi, em primeiro lugar, o pecado de todo ognero humano, pelo qual satisfazia sofrendo...; em segundo lugar, especialmentesofreu devido aos judeus e aos outros causadores da sua morte, e, principalmente,devido aos discpulos, que se escandalizaram pela Paixo de Cristo; em terceirolugar, (a causa da dor interior) foi ter que perder a vida corporal, o que

    naturalmente horrvel natureza humana (S.T. III 46, 6 c).

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    Cristo na cruz suportou tambm os males que poderia ter evitado,

    mas no os evitou: Julgais que no posso rogar a meu Pai e que

    Ele logo no me envie mais que doze legies de Anjos? (Mt. 26,

    53) 29.

    Realmente, a pacincia de Cristo na cruz foi imensa! Corramos

    com pacincia para o combate que nos espera, com os olhos fitos

    em Jesus, o autor da nossa f, que a levar ao termo: Ele que, lhe

    tendo sido oferecida a alegria, suportou a cruz sem levar em

    considerao a sua humilhao (Heb. 36, 17).

    74 Se desejares ver na cruz um exemplo de humildade, basta-

    te olhar para o crucifixo. Deus quis ser julgado sob Pncio Pilatos

    e morrer: A vossa causa, Senhor, foi julgada como a de um

    mpio (Jo. 36, 17). Sim, de um mpio, porque disseram:

    Condenemo-lo a uma morte muito vergonhosa (Sab. 2, 20).

    O Senhor quis morrer pelo seu servo, e Aquele que d a vida aos

    Anjos, pelo homem: Fez-se obediente at morte (Fil. 2, 8)

    75 Se queres na cruz um exemplo de obedincia, segue quele

    que se fez obediente ao pai, at morte: Assim como pela

    desobedincia de um s homem, muitos se tornaram pecadores;

    tambm pela obedincia de um s homem, muitos se tornaram

    justos (Rom. 5, 19).

    76 Se na cruz ests procurando um exemplo de desprezo das

    coisas terrenas, segue quele que o Rei e o Senhor dosSenhores no qual esto os tesouros da sabedoria, mas que na cruz

    29 Desse modo Cristo foi causa de sua Paixo e Morte. Poderia impedir a suaPaixo e a sua Morte, primeiramente reprimindo os adversrios, de modo que noo quisessem ou no pudessem matar; em segundo lugar, porque o seu espritotinha o poder de conservar a natureza da sua carne, para que no fosse oprimidapor alguma leso a ela infligida (a alma de Cristo, porque estava unida ao Verbo naunidade da pessoa tinha tal poder, como diz Agostinho). Por que a alma de Cristono repeliu do prprio corpo o sofrimento infligido, mas quis que a sua naturezacorporal sucumbisse sob aquele malefcio, dito que ps a sua alma, ou que

    voluntariamente morreu (S.T. III. 47, 1 c).

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    aparece nu, ridicularizado, escarrado, flagelado, coroado de

    espinhos, na sede saciado com fel e vinagre e morto.

    No deves te apegar s vestes e s riquezas, porque dividiram

    entre si as minhas vestes (Ps. 29, 19); nem s honras, porque

    Eu suportei as zombarias e os aoites; nem s dignidades,

    porque puseram em minha cabea uma coroa de espinhos que

    tranaram; nem s delcias, porque na minha sede deram-me

    vinagre para beber (Ps. 68, 22)

    Comentando este texto da Carta aos Hebreus Que, apesar de

    lhe oferecerem alegria, suportou a cruz, desprezando a

    humilhao dela (Heb. 12, 2) , Agostinho, nos diz: O homem

    Cristo Jesus desprezou todos os bens terrenos, para mostrar que

    devem ser desprezados.

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    ARTIGO QUINTO

    Desceu aos infernos, ao terceiro dia

    ressurgiu dos mortos

    77 Como dissemos acima, a morte de Cristo consistiu na

    separao da alma e do corpo, como na morte dos outros homens.

    Mas a divindade estava de tal modo ligada ao homem Cristo, que,

    apesar de a alma e o corpo terem se separado entre si, a prpria

    Deidade 30 sempre esteve unida ao corpo e alma de um modo

    perfeitssimo. Eis por que no sepulcro estava presente o Filho de

    Deus, o qual desceu tambm com a alma aos infernos 31.

    30 Usa So Toms na mesma frase as palavras divindade (divinitas) e deidade(deitas), que, de certo modo, podem ter o mesmo significado. Mas deitas precisade maneira mais perfeita o contedo da essncia divina.

    Quer dizer que a perfeio divina, a Deitas, creia acima, no apenas de tudo o que

    existe, mas de tudo que podemos conceber: [...] ela uma outra perfeio, queno nem a sabedoria, nem a bondade, nem a intelectualidade, nem nada do queso essas coisas, mas a Deidade, perfeio singular e transcendente, infinitamentesimples (H. Nicolas Dieu connu comme inconnu Desicle Paris, 1966,pg. 138).

    A palavra divindade usada para exprimir a essncia divina enquanto conhecidapela razo abstrativa, ao passo que os telogos usam mais Deitas para exprimir aessncia divina enquanto conhecida pela f: o conhecimento da f atinge a vidantima de Deus, que s se tornar perfeito na viso beatfica. (cfr. Garrigou-Lagrange, De Deo Uno Paris, 1937, pg. 245).

    31 A questo da descida de Cristo aos infernos longa e claramente tratadaprincipalmente na Suma Teolgica (III, q. 52).

    Na morte de Cristo apesar de a alma ter sido separada do corpo, nenhum dos dois

    foi separado da Pessoa do Filho de Deus. Por isso deve-se dizer que, no trduo damorte, todo o Cristo estava no sepulcro, porque toda a sua Pessoa estava a pelocorpo a ela unido; semelhantemente esteve todo no inferno, porque toda a Pessoade Cristo estava a devido alma a ela unida, e tambm (se pode dizer) que todo oCristo estava em toda parte devido sua natureza divina (III, 52, 3, c).

    de como Cristo esteve presente e atuou nas diversas partes do inferno, assim nosesclarece So Toms:

    De duas maneiras pode estar uma coisa em algum lugar: de uma maneira, peloseu efeito (e dessa maneira Cristo desceu em qualquer dos infernos, masdiversamente; no inferno dos condenados produziu o efeito de argi-los da suaincredulidade e malcia: aos que estavam detidos no purgatrio, deu a esperanade alcanarem a vida eterna; aos Santos Patriarcas, que apenas devido ao pecadooriginal, entravam no inferno, infundiu-lhes o lumem da glria eterna). De outra

    maneira uma coisa dita estar em algum lugar pela sua essncia: e deste modo aalma de Cristo desceu somente ao lugar do inferno, no qual estavam detidos os

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