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Livro do curso de campo ecologia da amazônia do ano de 2011
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Livro do curso
Ecologia da Floresta Amazônica 2011
Foto: Lucas Navarro Paolucci
2
Coordenadores e monitores
José Luiz Campana Camargo
Paulo Estefano Dineli Bobrowiec
Paulo Enrique Cardoso Peixoto
Manoela Borges
Laura Leal
3
4
Índice
Floresta fragmentada - Dimona
Projetos orientados
Eficiência de forrageio de formigas é afetada pela complexidade de habitat?
Carla Madelaire, Fernanda de Oliveira, Lucas Paolucci e Rodrigo Zucaratto........................................................................................9
Hemíptero especialista em Maieta spp. (Melastomatacea): a associação com formigas
explicaria essa exclusividade?
Talita C. dos S. Bezerra, Maria Laura F. Ternes, Thiago B. d’A. Couto e Daniele B. C. Puída.........................................................17
O recrutamento de plântulas em um fragmento é afetado pela presença de floresta
secundária em seu entorno?
Camilla P. Pagotto, Daniel I. de S. Dainezi, Guilherme H. A. Pereira e Inácio J. de M. T. Gomes....................................................23
A presença de um consumidor no recurso diminui a ocorrência de outros visitantes?
Mauro B. Monteiro-Junior, Ana Y. Y. Meiga, Gregório R. Menezes e Karla M. Campião................................................................30
Efeito de borda no teor de água foliar e sua influência na herbivoria
Raul C. Pereira, Fernando M. Resende, Franciele P. Peixoto e João Paulo C. de Menezes.................................................................36
Projetos livres
O nível de dano foliar por herbívoros e patógenos em Heliconia acuminata é
dependente do tamanho das plantas?
Thiago B. d’Araújo, Ana Y. Y. Meiga, Gregório R. Menezes, Karla M. Campião e Raul C. Pereira.................................................42
Pteridófitas inibem o recrutamento de plântulas lenhosas em florestas secundárias
Lucas N. Paolucci, Daniel I. de S. Dainezi, Fernanda M. P. de Oliveira e Inácio J. M. T. Gomes......................................................43
Variação da riqueza de fungos numa floresta com diferentes gradientes sucessionais
Franciele P. Peixoto, Daniele B. C. Puida, Camilla P. Pagotto e Carla Madelaire...............................................................................44
Existe relação entre umidade do ambiente e distribuição de briófitas em forófitos?
Guilherme H. A. Pereira, João P. C. de Menezes, Maria L. Ternes e Rodrigo Zucaratto....................................................................45
Fragmentos florestais são fontes de espécies vegetais para as áreas de floresta
secundária do seu entorno?
Fernando Resende, Talita Câmara e Mauro Brum................................................................................................................................46
5
Várzea – Catalão
Projetos orientados
Ir mais longe é garantia de persistir? Hipótese de Janzen-Connell testada em diferentes
locais de áreas alagadas
Daniele Cury, Camilla Pagotto, Franciele P. Peixoto, Lucas Paolucci e Raul C. Pereira....................................................................47
A correnteza pode afetar a diversidade beta de herbáceas entre bancos de macrófitas?
Karla M.Campião, Fernanda de Oliveira, João P. C. de Menezes, Mauro Brum e Rodrigo Zucaratto................................................55
De ladinho não é melhor: a proximidade entre árvores de munguba não aumenta o
sucesso de polinização
Ana Y. Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Daniel I. S. Dainezi, Fernando M. Resende e Inácio J. M. T. Gomes....................................62
O forrageio de vespas é influenciado pela produtividade de ambientes aquáticos?
Gregórios dos R. Menezes, Guilherme H. Pereira, Maria Laura F. Ternes, Talita C. dos S. Bezerra e Thiago B. d’A. Couto...........69
Projetos livres
O modelo de biogeografia de ilhas se aplica à comunidade de macroinvertebrados em
bancos de macrófitas?
Lucas N. Paolucci, Ana Y.Y. Meiga, Fernando M. Resende, Talita C. dos S. Bezerra e Thiago B. d’A. Couto.................................74
Relação entre disponibilidade de nutrientes e investimento heterotrófico da planta
carnívora Utricularia foliosa
Inácio J. M. T. Gomes, Camilla P. Pagotto, Carla B. Madelaire, Franciele P. Peixoto e Guilherme H. Pereira..................................75
A seleção do local de forrageio de Jacana jacana (Aves: Jacanidae) está relacionada à
riqueza de macrófitas?
Maria Laura Ternes, Daniel Dainezi, Daniele Cury, Gregório Menezes e Mauro Brum.....................................................................76
Os maiores não são mais sexies: fêmeas de Acanthagrion sp. não selecionam machos
maiores
Fernanda M. de Oliveira, João P. C. de Menezes, Karla M. Campião, Raul C. Pereira e Rodrigo Zucaratto.....................................77
Igapó – Anavilhanas
Projetos orientados
Os menores chegam primeiro em copas recém-emergidas colonizadas por aranhas?
6
João P. C. de Menezes, Fernanda de Oliveira, Karla M. Campião, Mauro Brum e Rodrigo Zucaratto...............................................78
Rota de colisão ou de fuga: o que estrutura atributos foliares de árvores de florestas
inundáveis?
Daniel I.S. Dainezi, Ana Y.Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Fernando M. Resende e Inácio J. M.T. Gomes.......................................85
Os últimos serão os primeiros? A colonização de ilhas formadas por copas de árvores
em sistemas inundáveis ocorre de maneira aleatória
Thiago B. d’A. Couto, Gregório R. Menezes, Guilherme H. A. Pereira, Maria L. Ternes e Talita Câmara........................................91
Seleção sexual na quela de machos do camarão Macrobrachium cf. amazonicum :
tamanho é documento?
Franciele P. Peixoto, Daniele Cury, Camilla Pagotto, Lucas Paolucci e Raul C. Pereira..................................................................100
Floresta contínua – Km41
Projetos orientados
Se a comida morde, eu fujo: resposta das aranhas a presas de diferentes níveis de
periculosidade
Camilla Pagotto, Daniele Cury, Daniel Dainezi, Fernanda de Oliveira e Gregório dos Reis Menezes.............................................106
Apertado, mas nem tanto: rugosidade do ambiente não influencia no tamanho de
formigas e dominância
Talita C. dos S. Bezerra, Ana Y.Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Mauro Brum Monteiro-Junior e Raul C. Pereira..........................113
Formigas em ilhas de néctar: tamanho e isolamento importam?
Guilherme H. A. Pereira, Inácio J. M. T. Gomes, Maria L. Ternes, Karla M. Campião e Rodrigo Zucaratto..................................119
A grama do vizinho é mais verde: a proximidade entre ninhos determina a composição
de plantas epífitas em jardins de formigas
João P. C. Menezes, Fernando M. Resende, Franciele Parreira, Lucas N. Paolucci e Thiago B. d’A. Couto...................................126
Projetos individuais
Formigas cortadeiras não alteram o recrutamento de plantas ao redor do ninho em uma
área de vegetação secundária na Amazônia Central
Ana Yoko Ykeuti Meiga...................................................................................................................................................................135
7
Teias com maior quantidade de recurso podem fazer com que aranhas evitem fugir
quando são ameaçadas por um estímulo do predador?
Camilla Pagotto.................................................................................................................................................................................145
Preto no branco: Por que camarões (Crustacea) de água doce apresentam diferentes
colorações?
Carla Bonetti Madelaire.....................................................................................................................................................................153
Aranhas “vermelhas” se agrupam para comer mais?
Daniel Irineu de Souza Dainezi..........................................................................................................................................................162
Quem são, quantos são e quanto se parecem: composição, riqueza e similaridade da
assembléia de formigas em clareiras e mata primária em uma floresta de terra firme na
Amazônia Central
Daniele Bilate Cury Puida..................................................................................................................................................................168
Efeito do tipo de nectário extrafloral sobre a riqueza e composição de espécies de
formigas visitantes
Fernanda Maria Pereira de Oliveira...................................................................................................................................................181
Bordas florestais alteram o porte e a estratégia de crescimento de lianas?
Fernando M. Resende.........................................................................................................................................................................190
Pernas longas para que te quero? Pulso de inundação de riachos de pequena ordem não
determina a estrutura morfológica da comunidade de formigas
Franciele Parreira Peixoto..................................................................................................................................................................199
A presença de dossel desconectado em uma estrada é limitante para a movimentação de
Glyphorynchus spirurus (Passeriformes, Dendrocolaptidae)?
Gregório dos Reis Menezes................................................................................................................................................................208
Quem tem fome tem pressa? O dano a epífitas em jardins de formigas reduz o tempo de
remoção de herbívoros em potencial
Guilherme Henrique Almeida Pereira................................................................................................................................................215
8
Quanto mais, melhor: aranhas ajudam a reduzir a herbivoria em Tococa bullifera
(Melastomataceae)
Inácio José de Melo Teles e Gomes...................................................................................................................................................225
A aranha associada à Tococa bulifera é protegida pelas formigas?
João Paulo Cunha de Menezes...........................................................................................................................................................236
Heróis, figurantes e vilões: como o recrutamento das formigas e a presença de
homópteros afetam a defesa contra herbívoros?
Karla M. Campião..............................................................................................................................................................................245
A serrapilheira atua como um filtro para formigas dispersoras de sementes?
Lucas Navarro Paolucci.....................................................................................................................................................................252
Conexões ocultas: associação entre aranhas e formigas em arbustos de Tococa bullifera
(Melastomataceae)
Maria Laura Fontelles Ternes............................................................................................................................................................259
Plantas herbáceas e ambientes heterogêneos: há lugar para a variação funcional?
Mauro Brum Monteiro Junior............................................................................................................................................................270
Porque abelhas selecionam substrato para coletar argila?
Raul Costa Pereira..............................................................................................................................................................................280
Se for pequeno ou grande eu pego, mas se balança muito eu fujo: comportamento de
forrageio em uma espécie de aranha em resposta ao custo de aquisição e ao nível de
ameaça da presa
Rodrigo Zucaratto..............................................................................................................................................................................291
Associação de formigas e da planta Palicourea corymbifera Müller Arg (Rubiaceae):
qual o efeito das formigas nas inflorescências?
Talita Câmara.....................................................................................................................................................................................301
O que determina a escolha de locais de caça por aranhas pescadoras (Trechaleidae)?
Thiago Belisário d’Araújo Couto.......................................................................................................................................................312
9
Dimona – projetos orientados
Eficiência de forrageio de formigas é afetada pela complexidade de habitat?
Carla Madelaire, Fernanda de Oliveira, Lucas Paolucci, Rodrigo Zucaratto
Introdução
O número de espécies presentes nos ambientes pode ser determinado pela capacidade do
habitat em fornecer recursos e condições ambientais favoráveis para que as espécies se
estabeleçam (Detrain & Deneubourg 2009). Variações na quantidade de recursos
disponíveis em um habitat podem ser causadas por uma série de fatores, dentre os quais
podemos destacar a estrutura do habitat. Ambientes estruturalmente mais complexos
provêem uma maior diversidade de nichos e conseqüentemente uma maior diversidade
de recursos (Begon et al. 2006). Como conseqüência, estes habitats conseguem abrigar
maior número de espécies que possuem estratégias distintas de uso dos recursos.
De maneira geral, os organismos utilizam recursos do habitat procurando
maximizar seu ganho energético líquido. Para isso, eles utilizam diversas estratégias de
forrageamento, levando em consideração a relação entre o custo e o benefício na
obtenção de recursos (Stephens 2007). Quando um habitat possui baixa disponibilidade
de recursos alimentares, indivíduos devem investir em estratégias que maximizem o
ganho energético e reduzam os gastos envolvidos na captura do alimento. Nesses
ambientes, indivíduos competem pelos recursos disponíveis e as espécies que exploram
os recursos de forma mais eficiente devem ser favorecidas.
Diferentes estratégias de forrageamento são adotadas pelas formigas para
maximizar a sua eficiência na busca por recursos (Adams 2001). Essas estratégias
podem variar em função do recurso alimentar utilizado, sendo determinadas
10
principalmente pela disponibilidade e qualidade do recurso (Blüthgen 2000). Em locais
onde a disponibilidade de recursos é baixa, formigas devem adotar estratégias que
aumentem sua eficiência no encontro e remoção dos recursos para as colônias. Nesses
locais, formigas que recrutem um grande número de operárias e dominem os recursos de
forma a torná-los indisponíveis a outras espécies de formigas podem ser favorecidas.
Nosso objetivo é investigar como a estrutura do habitat pode afetar o
comportamento de forrageio de formigas em uma floresta de terra firme na Amazônia
Central. Nossa hipótese é que a eficiência de forrageio de formigas será maior em
ambientes menos complexos estruturalmente.
Métodos
Área de estudo
Desenvolvemos este estudo na Fazenda Dimona (2º 20’S/60º 06’O), pertencente ao
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais. A área é composta por floresta de
terra firme, com fragmentos florestais circundados por floresta secundária de diferentes
idades de regeneração. Utilizamos duas áreas de floresta secundária com 10 e 20 anos
de idade, que sofreram queimadas antes do início do processo de regeneração.
Consideramos a área de floresta secundária de 20 anos o habitat mais complexo
estruturalmente e a de 10 anos o menos complexo. Dessa forma, esperamos que (i) o
recurso seja encontrado mais rapidamente e (ii) que haja maior dominância numérica de
formigas nas iscas localizadas em áreas com 10 anos de regeneração.
Coleta de dados
Utilizamos um transecto de 100 m e a cada 10 m colocamos iscas compostas por
ovo, goiabada e farinha, colocadas sobre um papel filtro na serrapilheira.
11
Cronometramos os segundos decorridos entre o momento em que colocamos a isca e o
momento em que a primeira formiga a encontrou, a fim de investigar o tempo de
encontro das iscas pelas formigas. Consideramos o encontro como o contato da formiga
com a isca. Estabelecemos 15 min como tempo máximo de observação para cada isca,
de maneira que o tempo de encontro poderia variar de 0 a 15 min. Após 30 minutos
recolhemos todas as iscas em sacos plásticos individualizados.
Separamos as formigas coletadas em morfoespécies e as identificamos até o
nível de gênero quando possível. Utilizamos o compartilhamento da isca pelas espécies
como indicadores de dominância, número de espécies por isca, a abundância relativa
(número de indivíduos por número de espécies) de formigas em cada isca.
Consideramos iscas compartilhadas aquelas que apresentaram mais de uma espécie de
formiga utilizando o recurso.
Análises estatísticas
Para testar se havia diferença entre o tempo de encontro das iscas pelas
formigas,o número de espécies e a abundância relativa de formigas nas iscas nos dois
ambientes, utilizamos o teste t de Student. Utilizamos o teste qui-quadrado para analisar
se existem diferenças no compartilhamento das iscas entre os dois tipos de hábitat.
Excluímos da análise as iscas que não foram encontradas pelas formigas dentro dos 15
min de observação já que o tempo de encontro poderia variar muito além do tempo
estabelecido.
Resultados
Observamos 13 morfoespécies de formigas nos dois locais amostrados.
Encontramos seis espécies exclusivas na capoeira de 10 anos e quatro espécies
12
exclusivas na capoeira de 20 anos. Apenas três morfoespécies co-ocoreram em ambos
os habitats, sendo elas Crematogaster sp1, Crematogaster sp 2 e Pheidole sp1 (Tabela
1).
Tabela 1. Composição da comunidade de formigas que visitaram iscas nas florestas
secundárias com 10 e 20 anos de regeneração na Amazônia Central.
Tempo de regeneração da Floresta Secundária (Anos) Taxa
10 20
Acromyrmex sp1 X
Crematogaster sp1 X X
Crematogaster sp2 X X
Camponotus sp1 X
Camponotus sp2 X
Ectatomma sp1 X
Brachymyrmex sp1 X
Solenopsis sp1 X
Pheidole sp1 X X
Pheidole sp2 X
Não identificada 1 X
Não identificada 2 X
Não identificada 3 X
Não encontramos diferença no tempo de encontro das iscas pelas formigas entre
os dois ambientes (t = 0,29; gl = 12; p = 0,78). O tempo de encontro médio foi de 193 ±
126 s na capoeira com menor complexidade e de 174 ± 104 s na capoeira com maior
complexidade estrutural (Figura 1). Não encontramos diferenças na dominância das
13
iscas pelas formigas,no número de espécies (t = -0,36; gl = 18; p = 0,72) (Figura 2), na
abundância relativa (t = -1,50; gl = 18; p = 0,15) (Figura 3) e nem no compartilhamento
da isca (χ2= 0,22; gl = 1; p = 0,64).
Idade de regeneração
Tem
po d
e en
cont
ro (
s)
0
100
200
300
400
500
10 anos 20 anos
Figura 1. Tempo médio de encontro das iscas pelas formigas em área de floresta
secundária com 10 e 20 anos de regeneração, Amazônia Central.
Idade de regeneração
Núm
ero
de e
spéc
ies
de f
orm
igas
0
1
2
3
4
5
6
10 anos 20 anos
Figura 2. Número médio de espécies de formigas em área de floresta secundária com 10
e 20 anos de regeneração na Amazônia Central.
14
Idade de regeneração
Abu
ndân
cia
rela
tiva
0
10
20
30
40
50
60
10 anos 20 anos
Figura 3. Abundância relativa média de formigas em área de floresta secundária com 10
e 20 anos de regeneração na Amazônia Central.
Discussão
A semelhança no tempo de encontro entre as áreas mostra que as formigas tem a mesma
habilidade de encontrar recursos em habitats com estruturas diferentes. O padrão de
dominância similar entre os ambientes reforça a possibilidade de que os recursos são
encontrados com a mesma eficiência em habitats distintos.
A composição de espécies de formigas das florestas secundárias de 10 e 20 anos
de regeneração foi diferente. Além disso, as espécies presentes nos dois tipos de habitat
podem utilizar os recursos de maneira similar. Nesse caso, não é possível afirmar se
houve ajuste comportamental das espécies de formigas que visitaram as iscas.
Diferentes espécies de formigas podem explorar o ambiente de formas similares
(Phillpott et al. 2010). Com base nessas similaridades, foram propostas diferentes
classificações de espécies de formigas baseadas em grupos funcionais. Um dos
15
parâmetros utilizados para tais classificações é o hábito alimentar (Andersen 1995;
Brandão et al. 2009) Portanto, é razoável supor que espécies de formigas que pertençam
ao mesmo grupo funcional ajustem seu comportamento de forrageio de forma similar
em habitats com diferentes estruturas. Sendo assim, características inerentes à espécie
ou grupo funcional de formigas podem ser mais importantes do que as do habitat na
determinação da habilidade de encontro do recurso e sua dominância.
Como as áreas amostradas são de florestas em regeneração e sofreram o mesmo
distúrbio, uma recolonização dos dois locais por grupos funcionais similares pode ter
ocorrido. Das 13 espécies encontradas no nosso estudo, nove delas são consideradas
generalistas (Brandão et al. 2009). Estas espécies exploram e dominam recursos
independentemente da concentração ou distribuição destes no espaço (Philpott et al.
2010). Por isso, espécies de formigas generalistas localizadas nos dois tipos de habitats
estudados possuíram a mesma eficiência no uso dos recursos alimentares.
As formigas desempenham funções chave nos ecossistemas tais como dispersão
de sementes e quebra de matéria orgânica. Ambientes em regeneração são mais
dependentes de funções exercidas por colonizadores iniciais, tais como as formigas.
Portanto, os papéis ecológicos exercidos por esses organismos podem ser semelhantes
em ambientes com diferentes idades de regeneração.
Agradecimentos
Agradecemos ao PDBFF pela oportunidade de participar do EFA, assim como aos
coordenadores, professores, monitores e colegas do curso. Em especial agradecemos à
monitora Laura e ao Professor Lorenzo, pelas valiosas dicas e paciência na revisão.
16
Referências
Adams, E.S. 2001. Approaches to the study of territory size and shape. Annual Review
of Ecology and Systematics, 32:277-303.
Andersen, A.N. 1995. A classification of Australian communities based on functional
groups which parallel plant life-forms in relation to stress and disturbance.
Journal of Biogeography 22: 15-29.
Begon, M., C.R. Townsend & J.L. Harper, J.L. 2006. Ecology: from individual to
ecosystems. Oxford: Blackwell Publishing.
Blütgen, N. M., W. Verhaagh, W. Goitía, K. Jaffé, W. Morawetz & W. Barthlott.
2000. How plants shape the ant community in the Amazonian rainforest canopy:
the key role of extrafloral nectarines and homopteran honeydew. Oecologia
125:229-240.
Brandão, C.R., R.R. Silva & J.H.C. Delabie. 2009. Formigas (Hymenoptera). In:
Bioecologia e nutrição de insetos: Base para o manejo integrado de pragas. (A.R.
Panizzi & J.R.P. Parra, eds.). Brasília, DF: Embrapa.
Detrain, C. & J. Deneuborg. 2009. Social cues and adaptative foraging strategies in
ants, pp. 29-52. In: Food explotation by social insects, Ecological, Behavioral, and
Theoretical Approaches (T.A. Miller ed.). Taylor & Francis Group: CRC Press.
Phillpott, S.M., I. Perfecto & C.L. Parr. 2010. Ant diversity and function in disturbed
and changin habitats, pp. 137-156. In: Ant ecology. (L. Lach., C. Parr & K.
Abbott eds.) Oxford, UK: Oxford University Press.
Stephens, D.W. 2007. Foraging: Behavior and Ecology. (D.W. Stephens, J.S. Brown,
& R.C. Ydenberg eds.). Chicago & London:The University of Chicago Press.
17
Hemíptero especialista em Maieta spp. (Melastomatacea): a associação com
formigas explicaria essa exclusividade?
Talita C. dos S. Bezerra, Maria Laura F. Ternes, Thiago B. d’A. Couto, Daniele B. C.
Puida
Introdução
O padrão de seleção dos organismos por hábitats favoráveis depende de diversos fatores
que envolvem disponibilidade de recursos, condições específicas e a presença de
competidores e predadores (Scott 2005). A presença de predadores e a disponibilidade
de recursos podem ser particularmente determinantes para o estabelecimento de presas
em certas áreas (Wooster & Sih 1995). Em locais com elevada pressão de predação e
pouca disponibilidade de recursos alimentares, os organismos podem restringir a sua
distribuição a habitats específicos que reduzam os efeitos negativos dessas pressões
(Ricklefs & Schluter 1993).
Quando os efeitos negativos das pressões de predação e alimentação variam no
mesmo hábitat, os indivíduos não deveriam ser encontrados em nenhum local particular.
No entanto, existem situações nas quais habitats específicos consistentemente
apresentam menor pressão de predação e/ou maior disponibilidade de alimento (e.g.
Vasconcelos 1991, Schoonhoven et al. 2005). Nesse caso, os organismos deveriam ser
encontrados recorrentemente no mesmo tipo de hábitat, o que poderia levar a padrões de
ocorrência exclusiva dos organismos em determinados locais.
Plantas do gênero Maieta apresentam uma interação mutualística obrigatória
com a formiga Pheidole minutula (Vasconcelos 1991). Em algumas de suas folhas essa
planta possui estruturas ocas que fornecem sítios de nidificação e abrigo para as
formigas, conhecidas como domáceas (Hölldobler & Wilson 1990). As formigas
18
normalmente atacam e predam insetos que pousem sobre a planta, patrulhando com
maior freqüência as folhas com domácea. Além disso, as formigas respondem a danos
causados na planta, ao aumentar o recrutamento nas folhas e evitar eventuais danos a
mesma. Entretanto, além das formigas, indivíduos de Maieta spp. são ocupados por um
hemíptero predador da família Reduviidae, que ocorre restrito a essa planta (Osses
2008). Apesar das formigas não atacarem o hemíptero, não se sabe por que ele ocorre
exclusivamente em Maieta spp. Nesse sentido, nos propomos a avaliar os motivos que
podem explicar essa exclusividade. Nossas hipóteses são i) o hemíptero é defendido
indiretamente contra inimigos naturais devido à presença das formigas mirmecófilas ou
ii) o hemíptero é predador das formigas mirmecófilas. Caso alguma das hipóteses que
postulam a existência de interação do hemíptero com formigas seja verdadeira,
esperamos que haja ocorrência preferencial do hemíptero em folhas com domáceas. Se a
hipótese i for verdadeira, esperamos uma maior freqüência de ocorrência do hemíptero
nas folhas com domáceas. Se a hipótese ii for verdadeira, esperamos que as formigas
interpretem a presença do hemíptero como ameaça e apresentem um tempo de resposta
maior a danos provocados nas folhas onde ele ocorre quando comparado com folhas
onde o hemíptero está ausente.
Métodos
Desenvolvemos o estudo na Fazenda Dimona, localizada a 80 km de Manaus (2º20’ S -
60º06’ O), Amazônia Central. Para avaliar se os hemípteros preferem se estabelecer em
folhas com formigas, nós realizamos buscas ativas da presença do hemíptero em 25
indivíduos de Maieta spp. Em cada planta, registramos a folha em que o hemíptero
estava presente e se nessa folha havia a presença de domáceas. Medimos o comprimento
(C) e a largura (L) das folhas analisadas e utilizamos a fórmula da área de uma elipse
19
( ) para determinar a área foliar. Calculamos a área foliar de todas as plantas
avaliadas e a dividimos na proporção de área de folhas com domáceas e folhas sem
domáceas. Utilizamos essa proporção para calcular a probabilidade esperada de
ocupação por hemípteros na ausência de seleção de hábitat. Posteriormente, nós
comparamos as proporções observadas e esperadas da freqüência de ocorrência dos
hemípteros em folhas com e sem domáceas.
Para investigar se os hemípteros são predadores potenciais das formigas
mirmecófilas, nós escolhemos folhas com domáceas com e sem hemípteros em cada
planta. Para cada folha escolhida, provocamos um dano mecânico (corte triangular a 2
cm da domácea) e registramos o tempo de reação das formigas ao dano. Consideramos
como tempo de reação o tempo entre a formiga encostar no corte e a saída da próxima
formiga após a primeira ter entrado na domácea. Como diferenças de idade das folhas
podem influenciar na intensidade da reação das formigas (Fiala et al 1989), escolhemos
folhas em posições semelhantes de ramos vizinhos, contadas a partir do ápice, como
representantes de folhas sem hemípteros. Utilizamos o teste t pareado para comparar o
tempo de reação das formigas entre as folhas com e sem os hemípteros.
Resultados
A freqüência de ocorrência de hemípteros em folhas com domáceas foi de 84% e em
folhas sem domáceas 16%. Esse padrão foi muito semelhante a proporção de área foliar.
Folhas com domáceas representaram 86,4% da área foliar total e folhas sem domáceas
13,5%. Portanto, não houve ocorrência preferencial do hemíptero em folhas com
domáceas. Quanto ao tempo de reação, as formigas apresentaram tempos semelhantes
em folhas com e sem o hemíptero (t = 0,74; gl = 19; p = 0,23; Figura 1).
20
Figura 1. Tempo de reação (s) das formigas da espécie Pheidole minutula ao dano
provocado na folha de Maieta spp. em relação à ocorrência do hemíptero. Linhas
conectam pares de folhas com e sem o hemíptero na mesma planta.
Discussão
O fato dos hemípteros não ocorrerem com maior freqüência em folhas com domáceas
indica que a sua presença em Maieta sp. não é ocasionada pela associação com Pheidole
minutula. Essas formigas possivelmente não atuam como protetoras ou como presas dos
hemípteros, mesmo quando ambos os indivíduos compartilham a mesma região da
folha. Portanto, a ocorrência dos hemípteros em Maieta spp. pode ser uma relação
determinada pelas características da planta e não pela associação com as formigas.
Colpas e colaboradores (2004) sugeriram que a distribuição do hemíptero
restrita a Maieta está relacionada com a presença de tricomas na folha e não diretamente
com as formigas. Porém, como outras espécies de plantas da Amazônia Central também
possuem tricomas, a simples presença dessas estruturas não explica o padrão de
ocorrência do hemíptero. Para complementar, sugerimos que a grande quantidade de
tricomas pode selecionar herbívoros específicos capazes de consumir Maieta spp.
Consequentemente, esses hemípteros podem ocorrer em Maieta por apresentarem uma
21
dieta especializada em herbívoros específicos dessa planta (e.g. Postali 2007). Outra
possibilidade para a especialização do hemíptero seria a escolha seletiva do sítio de
reprodução. A presença de tricomas nas folhas, ou até mesmo a presença das formigas,
pode auxiliar na proteção dos ovos contra possíveis predadores (e.g. Santos 2007).
Agradecimentos
Agradecemos a toda a equipe do PDBFF pela oportunidade do curso. Ao Prof. Paulo
Enrique pela orientação e sugestões para o desenvolvimento do trabalho. Aos colegas de
curso e professores.
Referências
Begon, M., C.R Townsend & J.L. Harper 2005. Ecology: From individuals to
ecosystems. Oxford: Blackwell Publishing Inc.
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23
O recrutamento de plântulas em um fragmento é afetado pela presença de floresta
secundária em seu entorno?
Camilla P. Pagotto, Daniel I. de S. Dainezi, Guilherme H. A. Pereira, Inácio J. de M. T.
Gomes
Introdução
Uma das principais consequências da fragmentação florestal é o surgimento de bordas.
Bordas são zonas de transição abruptas entre o fragmento florestal e o seu entorno. As
diferenças entre essas duas áreas fazem com que vários efeitos bióticos e abióticos
associados ao contato entre esses habitats adentrem para o interior do fragmento. Esse
processo é chamado de efeito de borda (Williamson & Laurance 2000).
Dentre as modificações ocorridas das bordas florestais em direção ao interior do
fragmento estão a diminuição da umidade, aumento da temperatura e luminosidade,
maior quantidade de serapilheira, invasão de espécies generalistas e maiores taxas de
predação de sementes (Harper et al. 2005, Laurance & Vasconcelos 2009). O efeito de
borda pode ter papel decisivo no desaparecimento de grandes árvores (Melo et al.
2006). Como consequência, há uma diminuição no recrutamento de plântulas quando
comparada ao interior do fragmento e a áreas de mata contínua (Benítez-Malvido 1998,
Nascimento et al. 2006, Melo et al. 2007).
Apesar dos prejuízos causados pelo efeito de borda para o fragmento, é possível
que a intensidade deles dependa da estrutura da vegetação que circunda os fragmentos
(e.g. Nascimento et al. 2006, Benítez-Malvido 1998). Por exemplo, áreas de entorno em
regeneração podem atenuar os fatores abióticos associados ao efeito de borda
aumentando a umidade e reduzindo a temperatura, a incidência luminosa (Camargo &
Kapos 1995, Didham & Lawton 1999) e a mortalidade de árvores (Mesquita et al. 1999,
24
Gascon et al. 2000). Portanto, seria razoável esperar que uma floresta em regeneração
também facilitasse o estabelecimento de plântulas na borda florestal, especialmente
quando a área de entorno tiver em um estágio avançado de regeneração.
Nosso objetivo foi avaliar como o entorno composto por floresta secundaria afeta
o recrutamento de plântulas em um fragmento florestal. Nossa hipótese é que o
recrutamento de plântulas em fragmentos não é prejudicado quando eles estão
circundados por florestas secundárias. Nossa previsão é que a riqueza e a abundância de
plântulas não mudam em relação à distância da borda.
Métodos
Nós conduzimos o estudo em uma área de terra firme na Fazenda Dimona (2o 20’S e 60o
60’O), localizada a 80 km ao norte da cidade de Manaus, AM. De acordo com a
classificação de Köppen (Peel et al. 2007), o clima da região é do tipo tropical úmido,
com temperatura média de 26,7 °C e precipitação anual de 2600 mm (Bierregaard et al.
2001).
Na Fazenda Dimona, existem fragmentos de floresta amazônica primária de 1, 10
e 100 ha submetidos a efeitos de borda com diferentes intensidades. Para testar a
previsão de que a riqueza e a abundância de plântulas não mudam em relação a
distância da borda circundada por floresta secundária, selecionamos o fragmento de 100
ha circundado por um mata em regeneração há 10 anos. Decidimos usar o maior
fragmento, pois em fragmentos grandes a redução do efeito de borda em direção ao
interior é mais facilmente detectada.
No fragmento, delimitamos três transectos de aproximadamente 100 m cada,
distantes pelo menos 30 m um do outro. Em cada transecto, estabelecemos uma parcela
de 1 m² a cada 5 m a partir da borda do fragmento (n=51). No entanto, não
25
delimitávamos a parcela quando ela coincidia com um local inacessível para coleta de
plântulas. Posicionamos os transectos a 0, 2 e 5 m de distância da borda (Figura 1). Em
cada parcela, quantificamos a abundância e o número de morfotipos de plântulas
arbóreas e palmeiras com até 50 cm de altura. Avaliamos o efeito da riqueza e
abundância de plântulas sobre a distância da borda do fragmento utilizando análise de
covariância. Consideramos os transectos como blocos.
Figura 1. Fragmento de 100 ha (em branco) circundado por floresta secundária (em
cinza). As barras representam os três transectos. O detalhe à direita evidencia o
transecto com as parcelas.
Resultados
O número de morfotipos de plântulas variou de um a 10 por parcela, enquanto a
abundância variou de um a 20 indivíduos. A riqueza aumentou em direção ao interior do
fragmento (F=8,71; gl = 3; p < 0,01; Figura 2). A abundância também aumentou em
direção ao interior do fragmento (F=9,00; gl =3; p < 0,01; Figura 3).
26
Figura 2. Resíduos da ANOVA entre riqueza de plântulas e os transectos em relação ao
gradiente de distância (m) da borda em direção ao interior de um fragmento de 100 ha na
Fazenda Dimona, Amazônia central.
0 20 40 60 80 100
Distância (m)
-8
-6
-4
-2
0
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4
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Figura 3. Resíduos da ANOVA entre abundância de plântulas e os transectos em relação ao
gradiente de distância (m) borda-interior um fragmento de 100 ha na Fazenda Dimona,
Amazônia Central.
27
Discussão
O fato de que a riqueza e abundância de plântulas aumentaram de forma contínua da
borda em direção ao interior do fragmento indica que o efeito de borda persiste mesmo
na presença da floresta secundária do entorno do fragmento. Provavelmente, mesmo que
haja uma certa redução da temperatura e incidência de luz na floresta secundária
próxima à borda (Camargo & Kapos 1995, Didham & Lawton 1999), esses fatores
ainda podem ser suficientes para inibir o recrutamento das plântulas.
Benítez-Malvido (1998) quantificou a abundância de plântulas nesse mesmo
fragmento em 1991, um ano após o seu isolamento completo. O fragmento ficou
cercado por uma vegetação semelhante a um pasto abandonado. Nessa circunstância, ela
não encontrou variação na abundância de plântulas no gradiente até 100 m no interior
do fragmento. Comparando com nossos dados, notamos que a abundância de plântulas
na borda foi menor que o encontrado por Benítez-Malvido (1998). Entretanto, a
abundância de plântulas nas parcelas do interior do fragmento (100 m) foi semelhante
entre os dois estudos. Nesse sentido, a redução da riqueza e a perda de indivíduos que
observamos na borda do fragmento indicaram que não há redução desses efeitos ao
longo de crescimento de uma floresta secundária a curto e médio prazo. Caso contrário,
o padrão de variação na abundância de plântulas observadas neste estudo deveria ter
sido semelhante ao dela.
Uma série de estratégias de manejo podem ser empregadas com o objetivo de
atenuar a degradação de fragmentos florestais associada ao efeito de borda. No entanto,
o fato de o recrutamento de plântulas ainda ser prejudicado quando há floresta
secundária no entorno indica que mesmo a presença dessa floresta pode ser uma
estratégia de preservação inadequada nesses casos.
28
Agradecimentos
Agradecemos ao PDBFF, na pessoa do Zé Luis, e aos coordenadores, Paulo Enrique e
Paulo Estefano. Ao Marcelo Tabarelli pela orientação para o desenvolvimento deste
trabalho e pelos bons momentos de filosofia e aprendizado. À Dani e Fran, pelas
contribuições na revisão da primeira versão do manuscrito. Às monitoras, Mano e
Laura, e aos demais efanos pelas contribuições para melhoria do trabalho e, sobretudo,
pelos bons momentos de risada nessa primeira semana!
Referências
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30
A presença de um consumidor no recurso diminui a ocorrência de outros
visitantes?
Mauro B. Monteiro-Junior, Ana Y. Y. Meiga, Gregório R. Menezes, Karla M. Campião
Introdução
A disponibilidade de recurso varia de acordo com as condições estruturadoras dos
ecossistemas. Os recursos sustentam uma rede complexa de interações, que influenciam
na história de vida e nas estratégias de forrageio das espécies (Raine & Chittika 2009).
A teoria do forrageamento ótimo postula que existe um balanço entre a obtenção e o
gasto de energia despendido, na qual os organismos otimizam o retorno energético pelo
mínimo de esforço possível (Charmov 1976). Dessa forma, o sucesso do forrageio
depende da disponibilidade de recurso do ambiente e da presença de outros organismos
que utilizam a mesma classe de recurso (Charmov 1976). Avaliar as estratégias de uso
de recursos entre os organismos fornece um indicativo de como a utilização e
apropriação de uma determinada fonte por um organismo interfere nas estratégias de
uso do recurso por outros organismos.
Os insetos fazem parte de uma rede complexa de interações durante a atividade
de forrageio. Sempre que possível os indivíduos evitam conflitos durante o uso de um
recurso, já que a defesa do recurso é uma atividade custosa e demanda uma grande
quantidade de energia (Speight et al. 2008). Entre os insetos sociais, como vespas
formigas e abelhas, as estratégias de forrageamento são um ponto chave nas redes de
interações, uma vez que diferentes grupos de insetos podem compartilhar os mesmos
recursos (Raine & Chittika 2009). Vespas utilizam a visão como um dos principais
mecanismos em sua atividade de forrageio. Dessa forma, vespas podem evitar fontes de
recursos que já estejam ocupadas, evitando o custo energético envolvido na defesa do
31
alimento (Speight et al. 2008). Desta maneira, a avaliação visual é usada
frequentemente por vespas durante a procura e escolha de uma fonte de recurso.
No presente estudo, avaliamos como a presença de um consumidor (uma vespa)
em uma determinada fonte de recurso influencia na freqüência de uso dessa fonte por
outros visitantes. Esperamos que a frequência de outros visitantes seja menor na fonte
alimentar que haja uma vespa presente e que esse padrão seja mais acentuado quando
outro visitante for uma vespa, visto que o estímulo visual é um importante componente
da sua estratégia de forrageio.
Métodos
Área de estudo
Desenvolvemos o estudo em uma região de floresta de terra firme localizada na Fazenda
Dimona (2º 20’S - 60º 06’O) do “Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais”
(INPA/Smiththsonian Institute), Amazônia Central. A coleta dos dados foi feita ao
longo da estrada de acesso ao acampamento da fazenda Dimona. A vegetação ao longo
da estrada é formada de uma floresta secundária com cerca de 20 anos de regeneração
dominada por espécies de Vismia.
Coleta de dados
Para avaliar como a fonte de recurso e a presença de um consumidor pode
influenciar a frequência de visitantes, estabelecemos 20 pontos amostrais ao longo da
estrada. Em cada ponto, usamos iscas feitas com uma solução de água e açúcar com
detergente armazenadas em placas de Petri. Cada placa foi colocada sobre pratos de
plástico amarelo para atrair visitantes, especialmente as vespas (L. Zanetti com. Pess.),
que são atraídas visualmente. Usamos dois tratamentos, um formado por iscas contendo
32
uma vespa morta dentro da placa de petri, e outro sem vespa (controle). Os tratamentos
foram expostos por duas horas (9h30 – 11h30) e colocados a cada 50 metros, de forma
intercalada.
Avaliamos a diferença entre o número total de visitantes e o número de vespas
atraídas entre os tratamentos (sem vespa e com vespa) utilizando Teste t.
Resultados
O número máximo de visitantes no tratamento controle foi de 11 indivíduos e no
tratamento com vespa foi de seis indivíduos. Apenas uma isca de cada tratamento não
foi visitada. O máximo de vespas capturadas no tratamento controle foi cinco indivíduos
e no tratamento com vespa foi de dois indivíduos, sendo que três unidades amostrais do
tratamento com vespa e duas unidades amostrais do controle não foram visitadas por
vespas. Os tratamentos controle e com vespas não foram diferentes quanto ao número
total de visitantes (t=1,07; df=19, p=0,29, Figura 1) e vespas atraídas (t=0,85; df=19,
p=0,4, Figura 2).
33
Figura 1. Distribuição do número total de visitantes registrados nos tratamentos sem
vespa e com vespa.
Figura 2. Distribuição do número de vespas registradas nos tratamentos sem vespa e
com vespa.
34
Discussão
O sucesso na obtenção de recurso é mediado por uma série de decisões e estratégias
comportamentais dos indivíduos e são determinantes nas interações entre as espécies
(Speight et al. 2008, Raine & Chittka 2009). Nossos resultados indicaram que a
presença de uma vespa na fonte de recurso não inibiu a chegada de outros visitantes,
sejam eles vespas ou não. Esperávamos que dentre os visitantes, as vespas exibissem
um comportamento mais evidente de evitar as iscas com uma vespa previamente
presente no recurso. Isso poderia ter ocorrido porque o comportamento territorial é uma
característica marcante em vespas e o estímulo visual é um componente importante em
sua estratégia de forrageio. Porém o uso do recurso mesmo com a presença da vespa
indicou que a estratégia comportamental mais vantajosa foi a partilha de recursos.
Quando a fonte energética não é limitante, o comportamento territorial pode não
ser vantajoso e deixar de existir (Carpenter & Macmillan 1976). Um estudo sobre
dominância entre formigas mostrou que as relações agonísticas entre espécies foram
mais freqüentes em áreas com menor densidade de recursos. Nos locais com maior
densidade de recursos a abundância das espécies dominantes foi menor, facilitando o
acesso de outras espécies a fonte de alimento (Baccaro et al. 2010). De forma similar, é
possível que os recursos disponíveis na área deste estudo não foram limitantes,
favorecendo a co-ocorrencia de espécies e a partilha dos recursos por diferentes espécies
de vespas.
Agradecimentos
Somos gratos aos professores Paulo Bobrowiec, Lorenzo Zanette e Fabrício Baccaro
pelo auxilio no campo e dicas no manuscrito. A toda organização, colegas e monitores
do “EFA 2011” e Dona Eduarda e Seu Jorge pelo agradável convívio e apoio.
35
Referências
Baccaro, F.B., S.M. Ketelhut & J.W. Morais. 2010. Resource distribution and soil
moisture content can regulate bait control in an ant assemblage in Central
Amazonian forest. Austral Ecology, 35:274-281.
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Amazonia: the Ecology and Conservation of a Fragmented Forest. London: Yale
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Ecology of Insects, Concepts and Applications (M. R. Speight, M. D. Hunter & A.
D. Watt, eds.). London: Wiley-Blackwell.
36
Efeito de borda no teor de água foliar e sua influência na herbivoria
Raul C. Pereira, Fernando M. Resende, Franciele P. Peixoto e João Paulo C. de
Menezes
Introdução
Nas últimas décadas a fragmentação de florestas tropicais tem se intensificado (Ribeiro
et al. 2009, Laurance et al. 2011). Esse processo promove a perda, isolamento e
alteração estrutural de habitats naturais, exercendo impactos negativos na diversidade
biológica (Meffe& Carroll 1997, Laurance et al. 2011). Além disso, a fragmentação
leva à criação de bordas, que são áreas de contato entre ambientes naturais e alterados.
Hábitats de borda exercem um papel chave em paisagens fragmentadas, pois
nestas áreas as mudanças abióticas e bióticas decorrentes da supressão da vegetação
nativa são mais pronunciadas (Laurence et al. 2011). Mudanças abióticas, como o
aumento da incidência de luz e ventos, são mais severas nas bordas (Kapos 1989;
Camargo & Kapos 1995). Essas mudanças estão relacionadas a alterações na estrutura e
composição taxonômica e funcional de comunidades biológicas.
Alterações ambientais também podem afetar as interações biológicas (Santos et
al. 2008, Lopes et al. 2009, Laurance et al. 2011), como a herbivoria. Variações
microclimáticas no ambiente de borda podem modificar o metabolismo das plantas,
reduzindo, por exemplo, o teor de água no tecido foliar (Coley & Barone 1996). Uma
vez que o teor de água no tecido foliar é um indicativo de qualidade da folha, essa
modificação pode diminuir os níveis de herbivoria, sendo determinante para a
preferência e desempenho dos herbívoros (Coley & Barone 1996).
O objetivo deste trabalho foi testar se bordas de fragmentos afetam
negativamente o nível de herbivoria por reduzirem o conteúdo de água do tecido foliar.
37
Esperamos que i) a área foliar danificada e o teor de água no tecido foliar sejam
menores nas bordas do que no interior do fragmento e ii) que exista uma relação
positiva entre o conteúdo de água no tecido foliar e a área foliar consumida.
Métodos Área de estudo
Desenvolvemos o estudo em um fragmento de 100 ha, circundado por uma matriz de
floresta secundária de cerca de 10 anos de idade. Este fragmento está localizado na
fazenda Dimona, aproximadamente 80 km ao Norte de Manaus, Amazonas (2°25’ S,
59°50’ O).
Coleta de dados
Como modelo de estudo, utilizamos a planta Duguetia trunciflora H. Gentry & Maas
(Anonnaceae). Selecionamos essa espécie por ser encontrada com freqüência tanto em
borda quanto no interior de fragmentos e por ser de fácil identificação. Consideramos
como plantas de borda aquelas localizadas nos primeiros 20 m em direção ao centro do
fragmento. Plantas de interior do fragmento foram amostradas a partir de 200 m da
borda.
Selecionamos 10 plantas em cada uma das áreas e coletamos ao acaso 10 folhas
de cerca de um mês de idade por planta, das quais três foram selecionadas ao acaso.
Escolhemos folhas jovens que, por emergirem sincronicamente, apresentam o conteúdo
de água mais uniforme em relação às folhas maduras (Coley & Barone 1996).
Para quantificar o teor de água foliar, retiramos uma amostra de 2 x 4 cm de
cada uma das folhas. Pesamos as três amostras de cada indivíduo numa balança de
precisão (três casas decimais) e determinamos o peso fresco médio (PF).
Posteriormente, secamos as amostras por 15 minutos em forno a uma temperatura em
38
torno de 200 °C e as pesamos para obter o peso seco médio (PS) por indivíduo.
Medimos o teor de água no tecido foliar de cada indivíduo pela razão PS/PF.
Calculamos a área total da folha (AT) pela fórmula da elipse (AT =
π*Comprimento da folha*Largura da folha/4) e a área foliar consumida (AC) por
herbívoros com o uso de papel milimetrado. Estimamos o percentual de área consumida
pela razão AC/AT*100. Testamos a relação entre a área foliar consumida e o teor de
água do tecido foliar através de uma análise de covariância, utilizando o ambiente
(borda ou interior) como covariável.
Resultados
A porcentagem média de área foliar consumida pelos herbívoros foi de 0,61 ± 1,12 %
para o ambiente de borda e de 0,34 ± 0,91% para o interior do fragmento. O teor médio
de água no tecido foliar foi de 68,5 ± 3,1%.
O percentual de área danificada (F1,16=0,73; p=0,40) e o teor de água do tecido
foliar (F1,16=0,26; p=0,61) não variaram entre as plantas dos ambientes de borda e
interior do fragmento. Não houve também relação entre o conteúdo de água no tecido
foliar e a área foliar consumida pelos herbívoros e o (F1,16=0,31; p=0,58)( Figura 1).
39
Figura 1. Relação entre o teor de água no tecido foliar de Duguetia trunciflora e a área
foliar consumida em plantas de borda (círculos preenchidos) e interior do fragmento
(círculos abertos).
Discussão
A pequena amplitude de variação no teor de água de D. truncifolia indica,
indiretamente, que não ocorre variação microclimática entre borda e interior do
fragmento. Estudos desenvolvidos no mesmo local do presente trabalho, nos primeiros
anos após o isolamento dos fragmentos, encontraram grande variação microclimática
entre a borda e o interior (e.g. Kapos 1989, Camargo & Kapos 1995). No entanto,
estudos posteriores demonstram que a sucessão vegetal da matriz ameniza o microclima
na borda de fragmentos (Didham & Lawton 1999, Laurance et al. 2011). A estrutura
secundária da vegetação da matriz, com sub-bosque e dossel bem estabelecidos, pode
atuar amenizando os efeitos dessecantes do vento e da luz. Provavelmente as condições
40
microclimáticas das bordas se estabilizaram ou voltaram aos níveis pré-fragmentação
devido à regeneração da matriz.
Uma explicação para a pequena variação na área foliar consumida entre borda e
interior é que o teor de água no tecido foliar das plantas desses dois ambientes está
dentro do espectro de forrageio dos herbívoros. Assim, a pequena variação do teor de
água foliar observado entre borda-interior pode ser insuficiente para impor pressões na
escolha e uso de recursos por herbívoros.
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41
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42
Dimona – projetos livres
O nível de dano foliar por herbívoros e patógenos em Heliconia acuminata é
dependente do tamanho das plantas?
Thiago B. d’Araújo, Ana Y. Y. Meiga, Gregório R. Menezes, Karla M. Campião, Raul
C. Pereira
A seleção por hábitats geralmente leva ao uso de manchas maiores em decorrência da
maior detectabilidade e quantidade de recursos. Em manchas maiores é esperado
proporcionalmente mais consumidores. Herbívoros possuem maior capacidade de
selecionar habitats, pois exploram ativamente o ambiente. Por outro lado, patógenos são
dispersos pelo vento e por isso não selecionam habitats. Nós testamos se existe relação
entre o tamanho de manchas da monocotiledônea Heliconia acuminata e a intensidade
de dano foliar causado por patógenos e herbívoros. Esperamos que o dano causado por
herbívoros seja proporcionalmente maior em manchas maiores e que o dano causado
por patógenos não varie com o tamanho da mancha. Cada indivíduo de H. acuminata
representa uma mancha de habitat. Determinamos o tamanho de 15 manchas pela
contagem do número de folhas, que variou de quatro a 33 (15,1±9,6). A porcentagem do
dano foliar foi estimada a partir de três folhas selecionadas aleatoriamente em cada
planta. A porcentagem média de dano por herbivoria (2,0±1,8%) e por fungos (2,4±
2,6%) foi semelhante nos diferentes tamanhos de mancha. Herbívoros que consomem
H. acuminata são generalistas e podem forragear em outras espécies de plantas. Por
isso, estes herbívoros não selecionam o habitat em função da quantidade do recurso. A
ausência de seleção de habitat encontrada para patógenos confirma o padrão esperado
para organismos dispersos pelo vento.
43
Pteridófitas inibem o recrutamento de plântulas lenhosas em florestas secundárias
Lucas N. Paolucci, Daniel I. de S. Dainezi, Fernanda M. P. de Oliveira e Inácio J. M. T.
Gomes
Algumas plantas se espalham rapidamente formando tapetes sobre o chão da floresta.
Esses tapetes podem inibir o estabelecimento de plântulas e causar um retardo no
processo de sucessão. O nosso objetivo foi investigar se a espessura da serrapilheira
afeta positivamente a cobertura da pteridófita Selagenella pedata e se essa cobertura
afeta negativamente o estabelecimento de plântulas lenhosas. Previmos que a
porcentagem de área ocupada pelo tapete de S. pedata aumenta com a profundidade da
serrapilheira.e que a porcentagem de área ocupada pela pteridófita diminua a riqueza e
abundância de plântulas. Usamos 30 parcelas de 1 m², onde medimos a profundidade da
serrapilheira e estimamos a proporção de cobertura de S. pedata. Quantificamos a
riqueza e abundância das plântulas de espécies lenhosas com até 50 cm de altura.
Encontramos que a profundidade da serrapilheira influenciou positivamente a cobertura
de S. pedata (R²=0,225; gl=1; p=0,005) e que a cobertura de S. pedata, influenciou
negativamente a riqueza (R²=0,139; gl=1; p=0,024) e abundância (R²=0,018; gl=1;
p=0,011) de plântulas. Pteridófitas são dependentes de altos níveis de umidade e a
serrapilheira retém umidade. Portanto, uma maior quantidade de serrapilheira propicia
melhores condições para o desenvolvimento de pteridófitas. O tapete formado por S.
pedata inibe o recrutamento de plântulas, modificando a estrutura do micro-habitat,
como disponibilidade de recursos, luz e temperatura. Assim tapetes de pteridófitas
podem afetar negativamente o processo de regeneração em áreas de floresta secundária.
44
Existe relação entre umidade do ambiente e distribuição de briófitas em forófitos?
Guilherme H. A. Pereira, João P. C. de Menezes, Maria L. Ternes e Rodrigo Zucaratto
Recursos e condições ambientais influenciam a distribuição dos organismos nos
habitats. Nas florestas tropicais, áreas sujeitas à inundação, como os baixios, são mais
propícias à colonização por organismos que necessitam de umidade. No caso das
briófitas, a ausência de vasos condutores para transporte de água na planta as torna mais
sensíveis à dessecação Desta forma, a umidade do ambiente pode ser uma condição
limitante para sua ocorrência. Nosso objetivo foi avaliar como a umidade do ambiente
afeta a distribuição vertical de briófitas no forófito (vegetal suporte). Nossa hipótese é
que a distribuição vertical de briófitas em forófitos e a umidade do ambiente estão
diretamente relacionadas. Esperamos que o limiar máximo de distribuição das briófitas
no forófito será maior no baixio do que no platô. Conduzimos o estudo em áreas de
baixio e platô de floresta de terra firme na Amazônia Central. Selecionamos 100
forófitos em cada área de estudo. Para avaliar o limiar de ocorrência das briófitas,
dividimos cada forófito em cinco classes de altura com 0,5 m cada, até 2,5 m do solo.
Observamos que em 77% dos forófitos do baixio as briófitas tiveram limiar máximo a
2,5 m. No platô, as briófitas ocorreram até 0,5 m do solo em 51% dos forófitos
avaliados. Em ambientes mais úmidos, como os baixios, briófitas podem colonizar
zonas mais altas dos forófitos. No platô, a ocorrência das briófitas no forófito foi
limitada a regiões mais úmidas próximas ao solo.
45
Variação da riqueza de fungos numa floresta com diferentes gradientes
sucessionais
Franciele P. Peixoto Daniele B. C. Puida, Camilla P. Pagotto, Carla Madelaire,
Sucessão é um processo no qual há mudanças na composição e estrutura de
comunidades ao longo do tempo. Essas mudanças promovem aumento da
complexidade, propiciando maior quantidade de recursos. A complexidade estrutural
possibilita um acréscimo da umidade, que é importante no estabelecimento de fungos
em florestas e que pode contribuir para o aumento da riqueza. Dessa forma, acreditamos
que haverá diferenças na riqueza de fungos em relação ao gradiente sucessional. Nossa
previsão é que haverá um aumento da riqueza no gradiente: capoeiras de 10 e 20 anos
de regeneração e floresta madura. Em cada ambiente escolhemos 15 troncos caídos,
onde amostramos a riqueza de fungos. Como o volume do substrato pode ter uma
relação positiva com a riqueza, dividimos o número de morfotipos pelo volume do
tronco. Encontramos um total de 17 morfotipos de fungos. Dez ocorreram no fragmento
de floresta madura, seis na capoeira com 20 anos e três na capoeira com 10 anos. Não
encontramos diferenças na riqueza entre os ambientes (F(2,41)=0,79; p>0,05). Contudo, a
composição variou, sendo que apenas as capoeiras compartilharam espécies. O fato da
riqueza não ter variado com relação ao gradiente sucessional, pode refletir a formação
das capoeiras, que se regeneraram a partir da supressão de uma floresta madura. Desse
modo, os troncos caídos que são os recursos para os fungos, persistiram nas capoeiras e
parecem ser equivalentes entre os ambientes.
46
Fragmentos florestais são fontes de espécies vegetais para as áreas de floresta
secundária do seu entorno?
Fernando Resende, Talita Câmara, Mauro Brum
A fragmentação florestal rompe a conectividade de habitats naturais e promove
alterações de fatores bióticos e abióticos nos ambientes remanescentes. Tais ambientes
podem servir como fonte de espécies para as áreas circundantes. Nesse trabalho,
avaliamos se o recrutamento de plântulas em uma área de floresta secundária, que
ocorre no entorno de um fragmento de mata nativa, aumenta com a proximidade da
borda do fragmento. Para isso, selecionamos um fragmento de 10 ha na Amazônia
Central a partir do qual estabelecemos quatro transectos de 30 m da borda para a
floresta secundária que ocorre no seu entorno. Em cada transecto, estabelecemos seis
parcelas de 1 x 1 m separadas por 5 m. Contamos o número total de plântulas menores
que 50 cm de altura e as caracterizamos como morfo-espécies. Contabilizamos 695
plântulas. A riqueza e a densidade de plântulas não estiveram relacionadas com a
distância do fragmento florestal. Isso indica duas possibilidades: 1) as sementes
oriundas do fragmento florestal têm as mesmas probabilidades de dispersão ao longo do
gradiente ou 2) as sementes não estão sendo dispersas ao longo das distâncias avaliadas.
Para a primeira possibilidade, é possível que os mecanismos de dispersão não estejam
limitando a chegada de propágulos na área de floresta secundária. Para a segunda
possibilidade, é possível que as plântulas que estão recrutando sejam de origem da
vegetação do entorno e não do fragmento florestal.
47
Catalão – projetos orientados
Ir mais longe é garantia de persistir? Hipótese de Janzen-Connell testada em
diferentes locais de áreas alagadas
Daniele Cury, Camilla Pagotto, Franciele P. Peixoto, Lucas Paolucci, Raul C. Pereira
Introdução
A dispersão e a predação de sementes são processos importantes para o recrutamento de
plântulas, pois vão definir o local onde a semente será depositada e onde os novos
indivíduos irão se estabelecer. Assim, esses processos exercem grande influência na
estruturação das comunidades vegetais (Jordano et al. 2005). A hipótese de Janzen
(1970) & Connell (1971) propõe que nas proximidades da planta parental os propágulos
estão adensados. Esse adensamento concentra um grande número de predadores que vão
consumir sementes e plântulas depositadas nesses locais. Dessa forma, as sementes
dispersas para longe da planta-mãe poderiam escapar da ação desses predadores e
aumentar suas chances de sobrevivência (Cousens et al. 2008).
A hipótese de Janzen-Connell prevê apenas uma relação entre a distância da
planta-mãe e a chance de sobrevivência dos propágulos (Cousens et al. 2008). Contudo,
características do local onde as sementes serão depositadas quando dispersas para longe
da planta parental também poderão influenciar no sucesso de dispersão dos propágulos
(Carson et al. 2008). Em ambientes com alta produtividade, pode haver grande
abundância de predadores generalistas (Lowe-McConnel 1999), que não
necessariamente estarão restritos às imediações da planta parental. Assim, mesmo os
ambientes distantes podem apresentar uma pressão de predação equivalente àquela
encontrada em sítios sobre a influência da planta parental.
48
Ambientes aquáticos muito produtivos sustentam uma grande abundância de
peixes, que são importantes dispersores e predadores de várias espécies vegetais
(Araújo-Lima & Goulding 1997). Nesses ambientes muitas plantas podem utilizar a
água como um vetor de dispersão. Para essas espécies, o sucesso de dispersão pode
estar condicionado ao tempo que as sementes conseguem permanecer na lâmina d’água.
Assim, quanto mais tempo a semente permanecer na água sem ser predada, maior será a
chance dela ser levada pela água por maiores distâncias.
O tempo de permanência das sementes na lâmina d’água nesse tipo de ambiente
pode ser afetado pela composição de predadores. As comunidades de peixes próximas
às margens dos rios podem apresentar uma composição de espécies distinta em relação
à calha central. Dessa maneira, essas comunidades dos dois locais poderão ter
preferências alimentares diferentes. O adensamento de recursos nas margens do rio, por
exemplo, poderia levar a uma especialização na dieta dos peixes desse local. Desse
modo, a garantia de sobrevivência das sementes dispersas pela água pode não estar
apenas relacionada à distância em relação à planta-mãe, mas também ao tipo de
ambiente onde ela é depositada.
O objetivo do nosso trabalho foi avaliar como a distância em relação à planta-
mãe e o local de deposição podem influenciar a persistência de sementes de
Pseudobombax munguba (Malvaceae) em um ambiente de várzea na Amazônia Central.
Nossa hipótese é que não somente a distância em relação à planta-mãe, mas também o
local onde a semente é depositada influenciam em sua persistência no ambiente. Nossas
previsões são que i) sementes depositadas próximas da planta-mãe serão predadas em
menor intervalo de tempo quando comparadas com as sementes depositadas longe da
planta-mãe e ii) sementes depositadas distantes da planta-mãe em ambientes de margem
49
serão predadas mais rapidamente quando comparado com ambientes distantes da planta-
mãe, na calha do rio.
Métodos
Área e modelo de estudo
Realizamos o estudo no lago do Catalão, situado na várzea do rio Solimões. Ambientes
de várzea são sistemas formados por florestas periodicamente inundadas por águas
brancas ricas em nutrientes e que apresentam uma grande variedade de habitats para a
fauna, como bancos de macrófitas, herbáceas e espécies arbóreas (Smith et al. 1998).
Nossa planta modelo foi a munguba (Pseudobombax munguba), uma árvore
comum em áreas de várzea. A munguba possui frutos deiscentes e de coloração rósea.
As sementes encontram-se envoltas por uma paina, que permite que as sementes sejam
carregadas pelo vento e flutuem na água até encontrar um sítio final de deposição. Essa
planta possui uma síndrome diplocórica de dispersão de sementes, onde as sementes são
dispersas primariamente pelo vento, sendo em seguida transportadas pela água. A
frutificação ocorre durante a época da cheia e grande parte das sementes é depositada no
rio que banha a planície. Nesses ambientes, as sementes são predadas por peixes da
família Characidae, como Triportheus angulatus, Chalceus macrolepidotus e Schizodon
fasciatus (Claro-Jr et al. 2004, Fáveri et al. 1998).
Oferta de sementes e tempo de predação
Selecionamos arbitrariamente nove indivíduos com frutos maduros para realizar
a simulação de deposição de sementes. Depositamos 10 sementes envoltas em paina em
cada um dos seguintes tratamentos: i) logo abaixo da copa da planta mãe, ii) a 25 m da
planta mãe na margem e iii) a 25 m da planta mãe na calha do rio. Observamos as
50
sementes por no máximo 5 min e registramos o tempo até a primeira semente ser
consumida pelos peixes. Testamos a diferença entre o tempo de predação das sementes
nos três tratamentos com ANOVA em blocos.
Resultados
Metade das sementes foi predada em um intervalo de tempo que variou de dois a 249 s.
O tempo de predação das sementes não variou com relação à distância da planta-mãe,
nem com o local em que as sementes foram depositadas. (F = 0,98; gl = 1; p = 0,39)
(Figura 1).
Figura 1. Tempo médio de predação das sementes de Pseudobombax munguba na
várzea em três locais: próximo da planta parental (próximo), a 25 m distante da planta
parental, na margem do rio (distante margem) e a 25 m da planta parental, na calha do
rio (distante calha). Barras representam o desvio padrão.
51
Discussão
Não observamos diferenças no tempo de remoção das sementes tanto em relação à
distância da planta-mãe, quanto em relação ao local de deposição da semente. A
hipótese de Janzen & Connell foi proposta para ambientes de terra firme, onde é bem
aceita (Carson et al. 2008). Entretanto, a hipótese deve ser aplicada com restrições em
ambientes aquáticos, pois o adensamento de predadores especialistas nas proximidades
da planta mãe em florestas de terra firme geralmente não é observado em várzeas, uma
vez que peixes desses ambientes são em sua maioria generalistas (Lucas et al. 2008).
A chance das sementes de P. munguba depositadas na margem do rio serem
predadas por peixes não depende da distância da planta-mãe. A floresta inundada
fornece um grande aporte de itens alimentares alóctones vindos principalmente da
vegetação ciliar (Goulding 1980, Claro–Jr et al. 2004). Como conseqüência, margens
dos rios podem reter maior quantidade de recursos alimentares, como insetos, frutos e
sementes, que podem ser consumidas pelos peixes que possuem hábito alimentar
generalista (Goulding 1980, Araújo-Lima & Goulding 1997, Claro-Jr et al. 2004, Lucas
2008). Logo, se recursos alóctones estão distribuídos de forma homogênea nas margens
dos rios, é possível que peixes que se alimentam desses recursos também estejam
distribuídos homogeneamente. Dessa maneira, a pressão de predação das sementes de
munguba não seria maior nas imediações da planta mãe, já que os predadores não
estariam adensados nesses locais.
Apesar das diferenças na composição de espécies de peixes entre margem e
calha do rio (Goulding 1980), o tempo de predação das sementes não diferiu entre esses
locais. Apesar de peixes de ambientes alagáveis serem bastante diversos em suas
características, eles são frequentemente generalistas (Lowe-McConnel 1999). Dessa
52
maneira, mesmo com as variações na composição taxonômica, o grupo funcional de
generalistas pode estar presente nesses dois ambientes (Araújo-Lima & Goulding 1997).
Deste modo, espécies generalistas e potencialmente predadoras de sementes devem
ocorrer tanto na calha, quanto na margem do rio.
Metade das sementes de P. munguba foi predada em um curto intervalo de
tempo. Esse fato pode ser uma evidência de que sementes de P. munguba sofrem forte
pressão de predação por peixes. Contudo, a munguba apresenta características que
podem aumentar o sucesso na dispersão de suas sementes. Essas árvores produzem
grande quantidade de frutos, com grande número de sementes. Além disso, essas
sementes são dispersas primariamente pelo vento e quanto mais distante essas sementes
são transportadas por esse vetor, menos tempo elas ficarão disponíveis para predadores
na lâmina d’água. Nesse sentido, o grande número de sementes e a presença da paina,
que possibilita a dispersão pelo vento, parecem ser adaptações importantes para o
sucesso reprodutivo de P. munguba em ambientes inundados.
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Ecologia da Floresta Amazônica. (Scariot, A. & E. M. Venticinque, eds.)
INPA/PDBFF Manaus, AM.
55
A correnteza pode afetar a diversidade beta de herbáceas entre bancos de
macrófitas?
Karla M.Campião, Fernanda de Oliveira, João P. C. de Menezes, Mauro Brum e
Rodrigo Zucaratto
Introdução
Diferentes fatores podem afetar a variabilidade na composição de espécies entre
assembléias (diversidade beta). Dois dos fatores mais comumente sugeridos como
determinantes dos padrões de diversidade beta são variações nas condições ambientais
relevantes para a sobrevivência dos organismos e a distância geográfica entre locais
(Legendre et al. 2005). Geralmente, quanto maior a diferença nas condições ambientais
e maior a distância geográfica, maior a dissimilaridade na composição de espécies entre
locais. No entanto, pouca atenção é dada ao efeito de fatores não associados à
sobrevivência ou à distribuição espacial das assembléias sobre os padrões de
diversidade beta.
Fatores que aceleram a entrada e saída de indivíduos em uma área podem
aumentar a troca de espécies entre locais e conseqüentemente aumentar a diversidade
beta sem que haja variações na sobrevivência dos indivíduos ou no padrão de distâncias
entre as assembléias (Schneck et al. 2010). Por exemplo, em locais com baixa taxa de
migração, a ocorrência de eventos estocásticos e de interações bióticas, como a
competição, podem levar a extinção local de algumas espécies. Isso é esperado porque o
tempo de permanência das espécies convivendo em um mesmo local é alto, o que faz
com que aquelas competitivamente superiores excluam outras com menor capacidade
competitiva do sistema (McCabe & Gotelli 2000). Por outro lado, onde a migração é
56
freqüente, o fluxo de espécies é maior e a colonização e emigração aumentam a
variabilidade na composição de espécies (Cook & Quenn 1995).
O processo de migração de espécies pode ser expressivo em rios, onde a
velocidade do fluxo da água pode variar bastante em diferentes trechos. Em função da
correnteza contínua, há um processo constante de chegada e saída de espécies que são
dispersas pela água (Wooster & Sih 1995). Por outro lado, em ambientes lênticos
geralmente não há correnteza suficiente para causar dispersão das espécies. O processo
de substituição de espécies associado a maior migração causada pela correnteza deve ser
particularmente importante em macrófitas aquáticas, visto que muitas delas não são
enraizadas no leito (Neiff & Poi de Neiff 2003). Nesse estudo, avaliamos se a correnteza
do rio está associada a diferenças na diversidade beta de herbáceas entre bancos de
macrófitas. Nossa hipótese é que a diversidade beta de herbáceas entre bancos de
macrófitas é maior em áreas com maior correnteza em relação às áreas de água
estagnada.
Métodos
Área de estudo
Realizamos nosso estudo em duas áreas: uma ao longo do Rio Negro (ambiente lótico) e
a outra no lago Catalão (ambiente lêntico). Ambas as áreas são influenciadas pelos
ciclos de inundação anual e pelo encontro do Rio Negro e do Rio Solimões que trazem
sedimentos de duas regiões distintas da Bacia Amazônica (Junk 1997).
57
Coleta de dados
Amostramos sete bancos no Rio Negro e sete bancos no lago Catalão. Escolhemos os
bancos de macrófitas à medida que os encontrávamos nas margens do lago e do rio,
sempre respeitando uma distância mínima de 30 m entre eles. Em cada banco de
macrófitas, paramos o barco e coletamos as herbáceas dentro do alcance de cada coletor
a partir da borda durante 3 min. Durante a amostragem, coletamos um exemplar de cada
morfoespécie de planta.
Análise de dados
Para estimar a variação na composição de espécies entre os bancos de macrófitas de
cada ambiente, fizemos uma análise de variabilidade baseada em uma Análise de
Coordenadas Principais (PCoA). Para isso, realizamos uma PCoA usando os bancos de
macrófitas como unidades amostrais em cada ambiente. Extraímos os dois eixos da
PCoA que explicaram a maior parte da variação na composição de espécies entre os
bancos de macrófitas e calculamos o centróide associado à disposição dos bancos de
macrófitas. Em seguida, calculamos a distância euclidiana de cada banco até o
centróide. Estas distâncias representam a dissimilaridade entre a composição de
espécies de cada banco em relação à composição média de cada ambiente. Por fim,
calculamos a média dessas distancias como uma estimativa da variabilidade na
composição de espécies entre pares de bancos para cada área amostrada.
Para analisar se a variabilidade na composição de espécies entre os bancos de
macrófitas do rio (ambiente lótico) é diferente da variabilidade entre os bancos de
macrófitas do lago (ambiente lêntico), utilizamos um teste de aleatorização. Para esse
teste comparamos a média da distância observada entre o centróide e as unidades
amostrais com uma distribuição das distâncias geradas pela aleatorização do conjunto
58
total de dados. Realizamos 5000 aleatorizações para gerar a distribuição nula dos
valores da média das distancias dos pontos ao centróide. Utilizamos o programa R (The
R Development Core Team 2009) para fazer as análises, usando as funções vegadist e
betadisper do pacote Vegan.
Resultados
Registramos 27 morfoespécies de macrófitas, 22 no rio e 15 no lago. Apenas oito
espécies foram compartilhadas entre os dois ambientes. A média das distâncias ao
centróide foi duas vezes maior para o rio quando comparado com o lago (F(1,12)=28,88;
p<0,001; Figura 1).
Figura 1. Análise de Coordenadas Principais dos bancos de macrófitas nos ambientes
lótico e lêntico. Os círculos cheios representam o centróide dos dois eixos associados
aos bancos coletados em cada ambiente do rio. Círculos representam a área de rio e
triângulos o lago.
59
Discussão
A maior variabilidade na composição de espécies de herbáceas entre os bancos de
macrófitas no ambiente lótico quando comparado ao ambiente lêntico indica que
diferenças no fluxo de água entre esses ambientes pode ser responsável pelo aumento da
diversidade beta no rio. Dado que as áreas são próximas, é improvável que as diferenças
observadas se devam a variações nas áreas que fornecem espécies para cada ambiente.
A alta substituição de espécies no ambiente lótico que levou a um aumento na
diversidade beta entre os bancos de macrófitas, pode também influenciar o padrão de
diversidade alfa nesses bancos. Como há um aumento da entrada e saída de espécies, é
possível que o ambiente lótico tenha um menor número de espécies nos bancos de
macrófitas, gerando uma diversidade local (alfa) pequena. Da mesma forma, o ambiente
lêntico, também pode apresentar uma baixa diversidade alfa, pois supostamente há um
efeito de dominância associado ao maior tempo de contato entre espécies em um mesmo
banco (McCabe & Gotelli 2000). Porém, visto que deve haver prevalência de uma
espécie, os bancos devem ser mais similares entre si em termo de composição. Nesse
sentido, enquanto ambos os ambientes podem apresentar diferenças na diversidade beta,
o padrão de diversidade alfa pode ser similar.
Nossos resultados demonstram que a variação na correnteza de rios pode atuar
na determinação dos padrões de diversidade beta de herbáceas entre bancos de
macrofitas em uma escala local. Macrofitas podem ser usadas como abrigo, alimento e
sítio de reprodução para muitas espécies de aves, peixes e insetos (Neiff & Poi de Neiff
2003). Portanto, alterações na intensidade da correnteza em ambientes lóticos podem
promover a homogeneização dos bancos e consequentemente comprometer algumas
dessas funções ecológicas exercidas por elas. Por outro lado, locais mais estáveis
(lênticos) também podem ser importantes para o sistema do rio devido à manutenção de
60
espécies que podem apresentar baixa sobrevivência no rio ou ainda atuar como sítio
mais estável para reprodução.
Agradecimentos
Agradecemos ao PDBFF pela oportunidade de participar do EFA, assim como aos
coordenadores, professores, monitores e colegas do curso. Em especial agradecemos ao
Professor Adriano Melo, pelas valiosas informações.
Referências
Cook, R.R. & J.F. Quinn. 1995. The influence of colonization in nested species subsets.
Oecologia, 102:413-424.
Junk, W.J. 1997. General aspects of floodplain ecology with special reference to
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a pulsing system. (W.J. Junk, ed.). Berlin: Springer.
Legendre, L., D. Borcard & P. Peres-Neto. 2005. Analyzing Beta Diversity: Partitioning
the spatial variation of community composition data. Ecological Monographs,
75:435-450.
McCabe, D. J. & N. J. Gotelli. 2000. Effects of disturbance frequency, intensity, and
área on assemblages of stream macroinvertebrates. Oecologia, 124:270-279.
Neiff, J.J. & A.S.G. Poi de Neiff. 2003. Connectivity process as a basis for the
management of aquatic plants, pp 39–58. In: Ecologia e manejo de macrófitas
aquáticas (S.M. Thomaz & L.M. Bini, eds.). Maringá: Eduem.
Schneck, F., A. Schwarzbold, S.C. Rodrigues & A.S. Melo. 2010. Environmental
variability drives phytoplankton assemblage persistence in a subtropical
reservoir. Austral Ecology, doi:10.1111/j.1442-9993.2010.02224.
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The R Development Core Team R. 2009. A language and environment for statistical
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07-0. Disponível em: http://www.R-project.org.
Wooster, D. & A. Sih. 1995. A Review of the drift and activity responses of stream prey
to predator presence. Oikos, 73:3-8.
62
De ladinho não é melhor: a proximidade entre árvores de munguba não aumenta o
sucesso de polinização
Ana Y. Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Daniel I. S. Dainezi, Fernando M. Resende,
Inácio J. M. T. Gomes
Introdução
Angiospermas podem produzir novos indivíduos tanto por meio de reprodução
assexuada quanto sexuada (Raven et al. 2001). Plantas que se reproduzem
sexuadamente podem apresentar autopolinização e/ou polinização cruzada. Plantas que
realizam a autopolinização podem ser polinizadas pelo pólen produzido na própria flor
hermafrodita ou pelo pólen vindo de outras flores do próprio indivíduo. Por outro lado,
plantas que dependem da polinização cruzada precisam ser polinizadas pelo pólen vindo
de flores de outros indivíduos coespecíficos. Com excessão de plantas que possuem
flores hermafroditas fecundadas pelo seu próprio pólen, as demais plantas dependem de
um vetor de polinização que pode ser abiótico ou biótico. Esses últimos são
considerados um dos vetores mais eficientes no transporte de pólen, pois o transportam
de uma maneira mais direcionada entre flores quando comparados aos vetores abióticos
(Baker & Baker 1983).
Vegetais desenvolveram uma série de características florais para atrair animais
polinizadores. Recursos como óleos, pólen e néctar podem atrair polinizadores
específicos que asseguram maior sucesso reprodutivo (Gorchov et al. 1993, Coelho et
al. 2002, Cariveau et al. 2004). Porém, apesar das estratégias intrínsecas de atração de
polinizadores, características ambientais também podem influenciar o sucesso de
polinização das plantas (Zimmerman 1988).
63
Uma das características ambientais que pode afetar o sucesso de polinização é a
distribuição espacial das plantas (Kershaw & Looney 1985). Indivíduos coespecíficos
mais próximos entre si podem ter maior chance de compartilhar polinizadores quando
comparados a indivíduos isolados. Portanto, a polinização cruzada e a produção de
frutos oriunda dela pode ser mais freqüente entre indivíduos próximos. Essa relação
pode ser particularmente importante em espécies auto-incompatíveis, cuja produção de
frutos depende do pólen originado de outro indivíduo coespecífico.
Nesse estudo usamos a espécie de planta auto-incompatível Pseudobombax
munguba (Malvaceae) para avaliar como a distância entre indivíduos co-específicos
influencia o sucesso de polinização. Nossa hipótese é que a proximidade entre árvores
dessa espécie aumenta o sucesso de polinização da planta. Nossa previsão é que quanto
menor a distância entre um indivíduo e seu co-específico reprodutivo mais próximo,
maior será a produção de frutos.
Métodos
Área de estudo
Realizamos este estudo no Lago do Catalão (3°9’S - 59°54’O), localizado próximo à
confluência dos rios Negro e Solimões no município de Manaus, Amazonas, Brasil. A
vegetação do local passa por um regime de cheias e vazante do rio, comum da Bacia do
Rio Solimões.
Modelo de estudo
Pseudobombax munguba é uma planta auto-incompatível que ocorre na Amazônia
Central. Essa espécie possui flores grandes, de cor branca ou creme, com antese
64
noturna, sem néctar e com uma grande quantidade de pólen. Essas características atraem
o morcego Phyllostomus hastatos, que é o único polinizador de P. munguba (Gentry
1993). Portanto, o sucesso reprodutivo de P. munguba é totalmente dependente da
polinização cruzada realizada por P. hastatus.
Estimativas de distância e de produção de frutos
Para avaliar se o sucesso de polinização de P. munguba tem relação com a distância ao
indivíduo co-específico reprodutivo mais próximo, selecionamos 30 indivíduos à
medida que os encontrávamos na margem do lago. Para estimar o número total de frutos
produzido em cada planta, contamos e somamos o número total de frutos presentes e os
pedúnculos de frutos que já haviam dispersado suas sementes. Posteriormente, medimos
a altura da coluna de água próxima ao tronco e somamos à altura emersa da planta para
estimar sua altura total. Medimos altura da coluna de água com uma corda com metal na
sua ponta, que era lançada até tocar o solo. Em seguida, estimamos a distância
visualmente para indivíduos com frutos distantes até 30 m. Para distâncias maiores do
que 30 m, marcamos a coordenada geográfica de cada indivíduo usando um GPS e
posteriormente calculamos a distância entre eles.
Avaliamos a relação entre o número total de frutos e a distância usando uma
regressão linear múltipla. Como plantas mais altas tendem a produzir mais frutos apenas
por serem maiores, inserimos a altura da planta nessa análise como uma co-variável
para controlar o efeito do tamanho da planta sobre a produção de frutos.
Resultados
As árvores de P. munguba apresentaram distância média de 41,88 ±32,07 m
(média±desvio padrão) para o co-específico reprodutivo mais próximo. A produção
65
média de frutos foi de 37,4 ±36,79 e a altura média dos indivíduos foi de 17,45 ±3,71 m.
O número de frutos produzidos por indivíduos de P. munguba não aumentou em função
da proximidade entre co-específicos reprodutivos (F(1,27)=0,53; p=0,82; Figura 1).
Figura 1. Relação entre resíduo da regressão entre o número de frutos de Pseudobombax
munguba e a sua altura e a distância entre indivíduos co-específicos reprodutivos,
localizados no lago do Catalão, Amazonas, Brasil.
Discussão
O fato da distância entre os indivíduos não estar relacionada ao número de frutos
produzidos em P. munguba indica que o sucesso de polinização nessa espécie é
independente do padrão de distribuição espacial dos indivíduos. Nesse sentido, é
provável que as áreas de forrageio de P. hastatos sejam grandes o suficiente para cobrir
diversas árvores durante o período reprodutivo de P. munguba.
Morcegos são animais que gastam muita energia para manter seu alto
metabolismo (Sibly & Brown 2007). Por isso, esses animais precisam percorrer grandes
distâncias para obter itens essenciais à sua dieta, como nitrogênio e carboidrato (Fischer
0 20 40 60 80 100 120 140 160
Distância entre indivíduos (m)
-60
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-20
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y = 0,05x -1,98
66
2000). Consequentemente, eles podem voar vários quilômetros em uma noite de
forrageio. Phyllostomus hastatos é atraído pelo valor nutritivo do pólen de P. munguba.
Entretanto, o pólen é uma recompensa de menor valor nutritivo quando comparado a
outros recursos disponibilizados por plantas para seus polinizadores, como o néctar
(Baker & Baker 1983). Assim, é possível que a grande área de forrageio e a necessidade
de percorrer várias árvores diferentes na busca de alimento, explique porque a distância
entre as árvores não afeta a produção de frutos de P. munguba.
Mesmo que a distância entre árvores não afete o sucesso de produção de frutos,
outros processos, como parasitismo, predação e competição podem variar de acordo
com a densidade populacional. Assim, visto que não há beneficio reprodutivo associado
à proximidade, se houver algum efeito decorrente da distribuição espacial de P.
munguba, é possível que ele seja negativo. Indivíduos mais próximos podem, por
exemplo, sofrer uma maior pressão de predação e/ou competição. Dessa forma,
acreditamos que é mais vantajoso para as plantas de P. munguba apresentarem
distribuição mais dispersa.
Agradecimentos
Gostaríamos de agradecer à organização do “Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos
Florestais” (PDFF) e da “Ecologia da Floresta Amazônica” (EFA), pela oportunidade. A
todos os professores e em especial à Paulo Bobrowiec e Bráulio Santos pela orientação
e acompanhamento no campo. E por fim, aos monitores, funcionários e colegas do
“EFA 2011” pelo agradável convívio e apoio.
67
Referências
Baker, G.H. & I. Baker. 1983. Evolution and diversity of floral rewards, pp. 142-159.
In: Handbook of experimental pollination (C.E. Jones & R.J. Little, eds.). New
York: Van Nostrand Reinhold Company Inc.
Cariveau, D., R.E. Irwin, A.K. Brody, L.S. Garcia-Mayeya & A. von der Ohe. 2004.
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and floral traits. Oikos, 104:15–26.
Coelho, F.M., M.C.Vega, M. Hidalgo, R. Durães & R.M. Darigo. 2002. Inflorescências
maiores são mais atrativas? Relação entre tamanho da inflorescência e
freqüência de visitação em Isertia hypoleuca Benth. (Rubiaceae). In: Curso de
Campo da Floresta Amazônica (E., Venticinque & J., Zuazon, eds.). Manaus:
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Campinas, Campinas.
Gorchov, D.L., F. Cornejo, C. Ascorra & M. Jaramillo. 1993. The role of seed dispersal
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Kershaw, K.A. & J.H.H. Looney. 1985. Qualitative and dynamic plant ecology.
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Raven, P.H., R.F. Evert & S.E. Eichhorn. 2001. Biologia vegetal. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan.
Sibly, A. & N. Brown. 2007. Effects of body size and lifestyle on evolution of mammal
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pollination, pp. 157-178. In: Plant reproductive ecology (Doust J.L. & L.L.
Doust, eds). New York: Oxford University Press.
69
O forrageio de vespas é influenciado pela produtividade de ambientes aquáticos?
Gregórios dos R. Menezes, Guilherme H. Pereira, Maria Laura F. Ternes, Talita C. dos
S. Bezerra, Thiago B. d’A. Couto
Introdução
De acordo com a teoria de forrageamento ótimo, uma estratégia de forrageamento tende
a se estabelecer quando os benefícios energéticos de um recurso forem maiores que os
custos envolvidos na sua obtenção (Ricklefs 2001). Essas estratégias são mutáveis,
podendo variar de acordo com as variações ambientais nas quais os organismos estão
submetidos (Sterner & Elser 2002). Abelhas do gênero Bombus, por exemplo,
despendem um alto gasto energético para manterem a temperatura do corpo durante o
vôo. Quando a disponibilidade de recursos é baixa, essas espécies centram sua atividade
de forrageio nos momentos do dia onde a temperatura é mais elevada (Bell 1990).
Em ambientes com maior produtividade primária é esperado que haja uma maior
disponibilidade de recursos alimentares para organismos em diferentes níveis tróficos
(Townsend et al. 2003). Como conseqüência, esses níveis tróficos podem sustentar uma
grande diversidade de organismos explorando recursos diferentes (Rossi & Hunt 1988).
Desta forma, um determinado organismo pode variar a quantidade e qualidade dos
recursos consumidos de maneira a maximizar o custo e o benefício de seu forrageio
(Scott 2005).
Vespas adultas normalmente apresentam alta variabilidade nos mecanismos de
forrageamento (Ritcher 2000). Assim, é possível que haja um ajuste no comportamento
de forrageio das vespas de acordo com a produtividade do ambiente e a disponibilidade
dos recursos alimentares (Nakasuji et al. 1976). Nesse sentido, nosso objetivo foi
investigar como ambientes aquáticos com diferentes níveis de produtividade podem
70
influenciar o forrageamento de vespas. Nossa hipótese é que vespas de ninhos próximos
à ambientes aquáticos pouco produtivos se desloquem mais durante o forrageamento.
Assim, esperamos que o fluxo de indivíduos (i.e. número de entradas e saídas) nos
ninhos seja maior em ninhos próximos a lagos mais produtivos em comparação com
lagos menos produtivos. Isso ocorreria porque é necessário menos tempo para retornar
ao ninho quando se desloca menos para encontrar o recurso alimentar.
Métodos
Nós realizamos o estudo nos lagos Catalão e Navio Velho, localizados próximos a
cidade de Manaus, Amazonas. O lago Catalão foi considerado como um ambiente mais
produtivo, pois é formado pela água branca rica em sedimentos proveniente do rio
Solimões. O lago Navio Velho foi considerado como um ambiente menos produtivo, já
que é formado pela água preta, pobre em nutrientes, proveniente do rio Negro.
Para comparar os dois sistemas, selecionamos 8 ninhos na margem de cada lago.
Em cada ninho estimamos a atividade das vespas com observações focais de cinco
minutos. Presumindo que quanto maior a disponibilidade e proximidade dos recursos,
mais rápido as vespas retornariam ao ninho, consideramos a atividade de forrageio das
vespas como a soma do número indivíduos que entravam e saíam dos ninhos.
Utilizamos teste t para comparar a atividade das vespas entre ninhos localizados em
água branca e água preta.
Resultados
Dentre os ninhos amostrados, houve uma prevalência do gênero Polistes (n = 7) no lago
de água preta e do gênero Polybia (n = 8) no lago de água branca. A atividade média
71
das vespas não foi afetada pela produtividade do ambiente (t = 0,75; df = 14; p = 0,46;
Figura 1).
Figura 1. Distribuição da atividade média de forrageio das vespas, avaliada pelo número
de entrada e saída nos ninhos em lago de água branca (n = 8) e preta (n = 8), próximos
ao município de Manaus-AM.
Discussão
O padrão de fluxo de vespas na entrada dos ninhos não é afetado pela disponibilidade de
recursos oferecidos pelo ambiente. Provavelmente, a atividade de forrageio das vespas
nos diferentes lagos estudados está mais relacionada com os hábitos alimentares dos
gêneros Polybia e Polistes.
Vespas do gênero Polybia são caracterizadas por apresentar um hábito alimentar
mais especialista (Zanette, comunicação pessoal). No entanto, essas vespas especialistas
foram localizadas apenas em ambientes com alta disponibilidade de recurso, o que
aumenta a probabilidade de captura de suas presas. Em contrapartida, Polistes spp.
foram encontradas exclusivamente em ambientes com baixa produtividade. Essas
72
vespas são diferenciadas por apresentar uma dieta mais generalista (Cervo et al. 2000),
sendo capazes de capturar uma ampla variedade de alimentos em um raio de até 650 m
do seu ninho (Prezoto & Gobbi 2005). Logo, a semelhança da atividade de forrageio de
Polistes spp. e Polybia spp. nos ambientes com diferente produtividade ocorreram,
provavelmente, pelo balanço da disponibilidade de recursos com o hábito alimentar de
cada gênero.
Agradecimentos
Somos gratos ao INPA e PDBFF, Lorenzo Zanette pela orientação, Manoela Borges,
Laura Leal e Inara Leal pelas sugestões no manuscrito.
Referências
Bell, W.J. 1990. Searching behavior patterns in insects. Annual Review of Entomology
35:447–467.
Cervo, R., F. Zacchi & S. Tullirazzi. 2000. Polistes dominulus (Hymenoptera,
Vespidae) invading North America: some hypotheses for its rapid spread.
Insectes Sociaux, 47:155-157.
Nakasuji F., H. Yamanaka & K. Kiritani 1976. Predation of larvae of the tobacco
cutworm Spodoptera litura (Lepidoptera, Noctuidae) by Polistes wasps. Kontyu
44:205–13
Richter, M. R. 2000. Social wasp (Hymenoptera: Vespidae) foraging behavior. Annual
Review Entomology, 2000. 45:121–150.
Ricklefs, R.E. 2001. The economy of nature. New York: W.H. Freeman and Company.
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Rossi A.M. & J.H. Hunt. 1988. Honey supplementation and its developmental
consequences: evidence for food limitation in a paper wasp, Polistes metricus.
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Scott, G. 2005. Essential animal behavior. Blackwell Publishing Ltd.
Sterner, R.W. & J.J. Elser. 2002. Ecological Stoichiometry: the Biology of Elements
from Molecules to the Biosphere.Princeton:Princeton University Press.
Townsend, C.R., M. Begon & J.L. Harper 2003. Essentials of ecology. Blackwell
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Prezoto, F. & N. Gobbi. 2005. Flight range extension in Polistes simillimus Zikán, 1951
(Hymenoptera, Vespidae). Brazilian Archieves of Biology and Technology,
48:947-950.
74
Catalão – projetos livres
O modelo de biogeografia de ilhas se aplica à comunidade de macroinvertebrados
em bancos de macrófitas?
Lucas N. Paolucci, Ana Y.Y. Meiga, Fernando M. Resende, Talita C. dos S. Bezerra e
Thiago B. d’A. Couto
A teoria de biogeografia de ilhas postula que o aumento do número de espécies está
positivamente associado ao tamanho da ilha e negativamente à distância da ilha ao
continente. Supostamente essa teoria também se aplica a habitats dulcícolas que contêm
bancos de macrófitas. Esses bancos abrigam comunidades de macroinvertebrados e se
encontram dispersos na água a diferentes distancias dos bancos nas margens, que podem
atuar como áreas fonte de espécies. Para avaliar se os padrões de riqueza nos bancos de
macrófitas podem ser explicados pelo modelo de biogeografia de ilhas, selecionamos 12
bancos com diferentes tamanhos e distancias da margem localizados em um lago na
Amazônia Central. Coletamos os macroinvertebrados com o mesmo esforço em cada
banco, triamos cada amostra por 15 min e separamos os organismos em morfotipos.
Esperamos que a riqueza de macroinvertebrados aumente com a área do banco de
macrófitas e com a redução da distância do banco para a margem. Encontramos em
média 11,6 morfotipos por banco (min-max=9-16). O número de morfotipos não
apresentou relação com a área (r2=0,22; F(1,8)=3,03; p=0,22), distância da margem
(F(1,8)=0,02; p=0,11) ou com a interação entre esses dois fatores (F(1,8)=1,73; p=0,55).
Nossos resultados indicam que a teoria de biogeografia de ilhas não se aplica ao sistema
estudado. Talvez, devido à proximidade dos bancos, estes constituam um sistema
conectado para os macroinvertebrados, que os utilizam como pontos de passagem para
alcançar locais mais distantes da margem.
75
Relação entre disponibilidade de nutrientes e investimento heterotrófico da planta
carnívora Utricularia foliosa
Inácio J. M. T. Gomes, Camilla P. Pagotto, Carla B. Madelaire, Franciele P. Peixoto,
Guilherme H. Pereira
Pressões ambientais podem desencadear diferentes respostas adaptativas nos
organismos. A carnivoria em plantas, por exemplo, parece ter sido favorecida em
ambientes com baixo teor nutricional por possibilitar uma forma adicional de adquirir
recursos. Entretanto, em resposta ao meio rico em nutrientes, plantas carnívoras podem
minimizar o investimento na estratégia heterotrófica se os custos energéticos envolvidos
na heterotrofia forem maiores que os custos associados ao investimento autotrófico.
Nesse trabalho avaliamos como a disponibilidade nutricional influencia no investimento
heterotrófico da macrófita carnívora Utricularia foliosa. Essa espécie ocorre na
Amazônia Central, em ambientes de água branca, com maior disponibilidade de
nutrientes e de água preta, com disponibilidade nutricional inferior. Nossa hipótese é
que indivíduos dessa espécie investem mais na estratégia heterotrófica em ambientes de
menor valor nutricional para maximizar a captação de recursos. Nossa previsão é que U.
foliosa terá maior densidade de utrículos (DU) (estruturas de captura de invertebrados)
em ambientes de água preta do que em água branca. Selecionamos 10 indivíduos de U.
foliosa em água branca e preta para quantificar a DU (razão entre o número de utrículos
e o comprimento da raiz). Indivíduos presentes na água branca tiveram maior DU
(18±17,2) que na água preta (3,5±5,1). Sugerimos que isso acontece porque a produção
dessa estrutura demanda grande investimento energético. Assim, em ambientes com
baixa disponibilidade de nutrientes a planta possui menor DU, pois os recursos não
compensam o gasto energético para sua produção.
76
A seleção do local de forrageio de Jacana jacana (Aves: Jacanidae) está
relacionada à riqueza de macrófitas?
Maria Laura Ternes, Daniel Dainezi, Daniele Cury, Gregório Menezes, Mauro Brum
A disponibilidade e variedade de recursos alimentares são fatores importantes na
seleção de habitat por animais. Para as aves onívoras, a escolha do local de forrageio
pode estar relacionada à riqueza de espécies de plantas. Habitats que abrigam maior
número de espécies vegetais possuem maior disponibilidade de microhábitats e portanto
maior variedade de recursos alimentares para estes animais. Nossa hipótese é que a ave
aquática onívora Jaçanã (Jacana jacana) seleciona bancos de macrófitas com maior
variedade de recursos alimentares. Esperamos que a presença de Jaçanãs forrageando
esteja associada a bancos com maior riqueza de espécies de macrófitas. Para avaliar esta
hipótese selecionamos um ambiente de várzea no lago do Catalão, AM. Registramos a
riqueza de macrófitas amostrando durante três minutos todas as plantas no local onde
avistamos a ave em atividade de forrageio (n=15) e em pontos aleatoriamente
escolhidos onde as aves estavam ausentes (n=15). As Jaçanãs selecionam locais de
forrageio independente da riqueza dos bancos de macrófitas (R² = 0,06 p = 0,08). A
variedade de recursos alimentares pode não ser importante para a escolha do local de
forrageamento para uma ave onívora como a Jaçanã. Como os ambientes de várzea são
altamente produtivos, o forrageamento da Jaçanã poderia estar mais associado à
quantidade que a variedade dos recursos alimentares.
77
Os maiores não são mais sexies: fêmeas de Acanthagrion sp. não selecionam
machos maiores
Fernanda M. de Oliveira, João P. C. de Menezes, Karla M. Campião, Raul C. Pereira e
Rodrigo Zucaratto
Em geral, fêmeas são o sexo mais seletivo por terem gametas energeticamente mais
custosos e em menor número. Selecionar machos de qualidade melhor pode determinar
grande parte do seu sucesso reprodutivo. Indivíduos em melhores condições usualmente
são maiores. Portanto, fêmeas que escolham machos maiores devem gerar prole de
melhor qualidade. Esperamos que na libélula Acanthagrion sp. machos com maior
comprimento em relação às fêmeas tenham maior chance de cópula. Para testar essa
previsão, amostramos três bancos de macrófitas no Rio Negro. Em cada banco,
selecionamos e fotografamos casais conectados e registramos se a conexão resultou em
cópula. Calculamos a razão comprimento do macho/comprimento da fêmea para cada
casal. Para testar a relação entre tamanho e sucesso de cópula fizemos uma regressão
logística. Amostramos 27 encontros, dos quais 16 resultaram em cópula. Machos
proporcionalmente maiores em relação às fêmeas não tiveram maior probabilidade de
cópula (χ2 = 0,39 ; gl = 1; p = 0,53). Machos de Acanthagrion sp. assediam as fêmeas
constantemente quando estas não estão em cópula. Selecionar apenas machos maiores
dispenderia muita energia para evitar agressões durante o assédio. Uma vez que machos
de libélulas retiram o esperma depositado anteriormente, a falta de preferência na
cópula pode não ser desvantajosa, pois a fêmea não sofreria agressões e não teria que
gerar prole de todos os machos com quem ela copulou.
78
Anavilhanas – projetos orientados
Os menores chegam primeiro em copas recém-emergidas colonizadas por
aranhas?
João P. C. de Menezes, Fernanda de Oliveira, Karla M. Campião, Mauro Brum e
Rodrigo Zucaratto
Introdução
A ecologia de comunidades concentra-se em investigar padrões em conjuntos de
espécies e detectar processos que geram esses padrões (Chase 2005; Lewinsohn et al.
2006). Esses padrões ocorrem em diferentes escalas e variam de acordo com a escala de
observação (Leibold et al. 2004). Em escalas maiores, as comunidades podem ser
analisadas entre paisagens. Em escalas menores, as variações dos padrões estruturadores
das comunidades podem ser analisadas em gradientes ambientais ou em manchas
temporais de condições e recursos favoráveis para a sobrevivência das espécies (Chase
2005).
Uma abordagem que integra as escalas locais e regionais é a teoria de
metacomunidades. Uma metacomunidade é o conjunto de comunidades em uma região
que apresentam isolamento entre si e estão interligadas pela dispersão das espécies
(Leibold et al. 2004). Quando analisamos estas comunidades em uma escala local,
lugares com menor número de espécies tendem a ser subconjuntos de lugares com
maior número de espécies (Almeida-Neto et al. 2008). Dentro da metacomunidade,
comunidades mais isoladas ou menores são mais sensíveis a processos estocásticos.
Processos como a extinção local de espécies são freqüentes em locais sujeitos a eventos
estocásticos ou mudanças periódicas nas condições ambientais. Nessas áreas, a
79
colonização se torna um processo importante na estruturação das metacomunidades,
pois os locais recentemente colonizados tendem a abrigar subconjuntos daqueles locais
colonizados há mais tempo (Lewinsohn et al. 2006).
A estrutura das metacomunidades também pode ser determinada pelas
características das espécies (Almeida-Neto et al. 2008). Nesse sentido, uma forma de
explicar a variação na composição e abundância dos organismos ao longo de gradientes
ambientais é a hipótese de Especialização por Escala de Tamanho (EET). Essa hipótese
presume que o tamanho do conjunto total de espécies, a taxa de crescimento da
população e o tempo de geração podem ser sumarizadas em uma única variável, o
tamanho corporal do individuo. Espécies de menor tamanho corporal tendem a ter uma
ampla distribuição e seriam as primeiras a colonizar novas áreas. (Kaspari et al. 2010).
A partir dessa hipótese, é razoável pensar que o tamanho corporal das espécies pode
gerar um padrão aninhado em metacomunidades de ambientes recém colonizados.
Consequentemente, locais onde ocorrem as espécies de maior tamanho corporal seriam
subconjuntos dos locais que abrigassem as espécies de menor tamanho.
Algumas árvores da vegetação ripária de rios sujeitos aos ciclos de inundação
ficam com as copas total ou parcialmente submersas no período da cheia (Junk, 1997).
Na vazante do rio, essas copas começam a emergir, atuando como pequenas ilhas livres
para colonização de uma ampla gama de organismos. Esse tipo de sistema, permite
investigar, se a hipótese de Especialização por Escala de Tamanho gera um padrão
aninhado em função do tamanho corporal em organismos que colonizam copas das
árvores. Nesse estudo, avaliamos se as metacomunidades de aranhas que ocorrem em
copas de árvores recém emersas apresentam um padrão aninhado em função do tamanho
corporal dos indivíduos, conforme prevê a hipótese de Especialização por Escala de
Tamanho.
80
Métodos
Área de estudo
Desenvolvemos o estudo na Estação Ecológica do Arquipélago de Anavilhanas
(02º47’S; 60º48’O) localizadas no baixo Rio Negro, Amazônia Central. Essa área está
sujeita a inundação anual que pode durar até 270 dias com uma amplitude de até oito
metros, deixando algumas árvores com as copas total ou parcialmente submersas (Junk,
1997).
Coleta de dados
Para testar a previsão de que a especialização por escala de tamanho pode promover um
padrão aninhado em função do tamanho dos indivíduos em uma comunidade, utilizamos
como modelo de estudo a copa das árvores de Symmeria paniculata e a comunidade de
aranhas que ocorrem nessas copas.
Essas árvores ficam total ou parcialmente submersas no período da cheia do rio.
No tempo da vazante, as copas começam a emergir, atuando como pequenas ilhas livres
para colonização de diversos organismos. Utilizamos as aranhas como modelo de
estudo, pois é um grupo abundante, diverso e de fácil amostragem. Além disso, a matriz
de água pode limitar a dispersão destas espécies que não voam entre as copas das
árvores. Nesse sentido, esperamos que as metacomunidades de aranhas que colonizam
essas copas apresentem um padrão aninhado em função do tamanho corporal.
Para a coleta das aranhas escolhemos 19 indivíduos de S. paniculata, com altura
máxima de dois metros em relação à superfície do rio. Escolhemos quatro ramos que
estivessem fora da água em cada indivíduo. Batemos rapidamente cinco vezes em cada
ramo e coletamos todas as aranhas que caíram na bandeja de coleta, colocada logo
81
abaixo do ramo. Em seguida, identificamos os morfotipos e medimos o comprimento do
cefalotórax. Essa medida foi usada como a medida de tamanho dos indivíduos.
Análise de dados
Consideramos os dados de presença e ausência dos morfotipos encontrados em cada
planta e fizemos a ordenação da nossa matriz de dados em função do tamanho dos
indivíduos. Verificamos o aninhamento dos resultados observados pelo teste de NODF
(nestedness measure based on overlap and decreasing fills). O método consiste em
comparar o NODF observado com os valores de NODF gerados por modelos nulos
aleatorizados (Ulrich et al. 2009). Usamos o modelo de randomização “fixo-fixo”, onde
o número de ocorrência por espécie (coluna da matriz de dados) e o número de espécies
por árvore (linha da matriz) foi mantido constante. As análises foram feitas no programa
R (The R Development Core Team 2009) usando as funções nestednodf e oecosimu do
pacote Vegan.
Resultados
Coletamos 39 morfoespécies de aranhas nas copas de S. paniculata. O tamanho corporal
das aranhas coletadas variou de um a 10 mm. Aranhas com tamanho corporal de 3 a 6
mm foram as mais freqüentes nas copas das árvores. As metacomunidades de aranhas
não estavam aninhadas em função do tamanho corporal (NODF observado = 7,458;
NODF nulo = 5,726; p = 0,19) (Figura 1).
82
Figura 1. Ordenação das morfoespécies de aranhas em função do tamanho corporal.
Colunas representam morfoespécies de aranhas e as linhas representam as copas das
árvores de Symmeria paniculata em um ambiente de igapó na Estação Ecológica de
Anavilhanas, Amazônia Central.
Discussão
Neste estudo, nós investigamos se metacomunidades de aranhas estavam aninhadas em
função do tamanho das espécies. Era esperado que aranhas menores seriam as primeiras
colonizadoras das copas de árvores recém emersas, devido a sua ampla abundância e
distribuição. Dessa forma, as aranhas menores seriam as mais freqüentes e as maiores só
ocorreriam nas copas que abrigassem maior número de espécies, onde as menores
também ocorressem. Porém, as espécies maiores foram as mais freqüentes e isso pode
ocorrer devido a diferenças no potencial de dispersão das aranhas.
As taxas de dispersão dos organismos podem criar padrões regulares na
estruturação de comunidades. Espécies com maior potencial de dispersão teriam ampla
distribuição geográfica e as de baixo potencial de dispersão teriam distribuição restrita.
(Cook & Queen 1995). O potencial de dispersão está positivamente relacionado ao
tamanho da espécie, uma vez que organismos de maior tamanho corporal normalmente
podem se locomover por maiores distâncias. Assim, sugerimos que o potencial de
83
dispersão de cada espécie pode ser mais importante que a EET para a estruturação das
comunidades de aranhas nas copas das árvores.
Agradecimentos
Agradecemos ao Fabrício Baccaro pela orientação, ajuda na coleta e elaboração do
manuscrito. Agradecemos também a Cíntia Cornelli, Guilherme, Gregório, Laura, Talita
e Thiago que nos ajudaram na coleta das aranhas. A toda organização do EFA e aos
colegas de turma.
Referências
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85
Rota de colisão ou de fuga: o que estrutura atributos foliares de árvores de
florestas inundáveis?
Daniel I.S. Dainezi, Ana Y.Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Fernando M. Resende, Inácio
J. M.T. Gomes
Introdução
Os atributos funcionais dos organismos são características morfológicas, fisiológicas ou
fenológicas que afetam o desempenho dos indivíduos em um determinado ambiente, e
que podem variar em função das interações entre os indivíduos (intra ou
interespecificamente) ou por pressões ambientais (Violle et al. 2007). Se a variação dos
atributos funcionais dos organismos é muito pequena, isso indica que os organismos
estão convergindo. Quando a variação é grande, significa que os organismos estão
divergindo (Pillar et al. 2009). Os organismos de uma comunidade tendem a ser mais
similares em seus requisitos ecológicos, podendo convergir em seus atributos funcionais
quando submetidos à forte pressão de filtros ambientais (Pillar et al. 2009).
Em um ambiente com características muito restritivas, somente organismos que
apresentem atributos funcionais similares conseguem superar as pressões do filtro
ambiental e permanecer no habitat (Weiher & Keddy 2004, Pillar et al. 2009). Quando a
similaridade dos organismos chega ao limite, eles podem começar a divergir quanto a
seus atributos funcionais. Essa divergência permite que indivíduos usem recursos de
maneiras diferentes, mediando à coexistência dos organismos (Pillar et al. 2009). Nesse
contexto, entender os padrões de convergência e divergência funcional é importante
para que se possa compreender as estratégias dos indivíduos na exploração de seu
habitat e, consequentemente, os processos estruturadores da comunidade.
86
Áreas com características ambientais restritivas, onde as plantas podem ficar
totalmente submersas por meses, como nas áreas alagáveis da Bacia do Rio Negro, na
Amazônia, devem ter um forte efeito do filtro sobre as características das espécies do
local. Por isso, é razoável esperar que as comunidades de plantas desse local estejam
estruturadas pela convergência funcional. Entretanto, como essa área é caracterizada
pela baixa disponibilidade de nutrientes no solo, pode haver um aumento da competição
por esses recursos. Para minimizar os efeitos desse processo, a divergência funcional
também seria uma expectativa válida.
Nesse sentido, nosso objetivo é responder se a competição por recursos ou a
pressão de filtros ambientais estão atuando sobre os atributos funcionais de plantas em
áreas de florestas inundáveis. Se a competição está atuando sobre os atributos
funcionais, esperamos encontrar divergência nos atributos. Se o filtro ambiental é o que
determina, esperamos encontrar convergência nos atributos.
Métodos
Realizamos este estudo em uma floresta inundada (igapó) pelo Rio Negro, no Parque
Nacional de Anavilhanas (02˚07’S; 61˚02’O). Coletamos duas folhas maduras de oito
morfotipos de árvores em 14 pontos nas áreas alagadas do local, separados por pelo
menos 100 m um do outro. Medimos o comprimento e a largura das folhas para calcular
a média da razão comprimento/largura da folha para cada ponto. Também calculamos a
média da área foliar usando a equação da elipse (π*comprimento da folha*largura da
folha/4).
Testamos se a variabilidade da área foliar e da razão comprimento pela largura
das folhas é menor do que o esperado ao acaso. Caso isso ocorra, há evidência de que os
atributos das espécies da comunidade estão estruturados por filtros ambientais. Se essa
87
variabilidade dos parâmetros escolhidos for maior do que o esperado ao acaso, os
atributos das espécies da comunidade devem ser estruturados por competição. Se não
houver diferença entre a variabilidade observada e a esperada, o padrão randômico dos
atributos dos indivíduos da comunidade deve ser o mais parcimonioso.
Para verificar a variabilidade das folhas dentro de cada ponto de coleta, plotamos em
um gráfico os dados da área foliar em função da razão comprimento/largura da folha.
Ligamos os pontos externos do gráfico para calcular a área do mínimo polígono
convexo. Os pontos externos representam os valores de maior variação dentro do
conjunto de dados. Desta forma, foram gerados 14 mínimos polígonos convexos, cuja
área indica a variação máxima das características foliares de cada ponto amostrado. Para
estimar a variabilidade das folhas esperadas ao acaso, aleatorizamos nossos dados e
obtivemos 1000 áreas de polígono convexo. Com essas 1000 áreas de polígono,
plotamos um gráfico de distribuição de freqüência e observamos onde a área do
polígono convexo dos nossos dados se encaixava nesta distribuição.
Resultados
A área foliar foi em média 77,84 ± 45,19 cm2 (média ± desvio padrão). A razão entre
comprimento e largura foliar foi em média 2,88 ± 0,64. Como a variabilidade média da
área foliar pela razão comprimento/largura das folhas foi menor do que o esperado ao
acaso (p=0,013; Figura 1), houve convergência nos atributos foliares das espécies
estudadas.
88
Figura 1. Distribuição ao acaso da ocorrência da variabilidade da área do mínimo
polígono convexo gerado ao acaso dentro de um ponto de amostragem. A seta indica a
posição da média das áreas dos polígonos observados.
Discussão
Como a variabilidade dos atributos foliares foi menor do que o esperado ao acaso,
filtros ambientais devem estar atuando sobre as espécies da comunidade vegetal de
florestas inundáveis de igapó. Esses filtros selecionam espécies de árvores adaptadas a
condições especificas da região, como baixa disponibilidade de nutrientes no solo e
regimes sazonais de inundação com submersão parcial ou total das plantas por meses
(Keddy 1992).
Filtros ambientais podem estruturar as estratégias funcionais dos organismos que
ocorrem nas áreas com regimes periódicos de inundação. Tais organismos possuem
adaptações específicas para ocorrer nesse ambiente, como raízes aéreas, aerênquimas,
habilidade de fechar os estômatos e lenticelas e cessar o metabolismo por longos
períodos (Parolin 2001)
Dis
trib
uiçã
o da
oco
rrên
cia
Variabilidade
89
As características das espécies que compõem as comunidades vegetais são
estruturadas tanto por fatores bióticos como abióticos. O mais comum é que em áreas
pouco restritivas ocorram muitas espécies e portanto, a competição estruture a
comunidade e ocorra divergência entre os atributos das espécies. Ao contrário, em áreas
muito restritivas, com escassez de recursos e condições muito específicas, como
florestas inundáveis de igapó, um menor número de espécies consegue se estabelecer e a
comunidade passa a ser estruturada por filtros, gerando um padrão de convergência dos
atributos das espécies (Weiher & Keddy 2004). Entretanto, ainda é preciso uma melhor
compreensão de quando fatores bióticos ou abióticos terão efeito decisivo sobre a
plasticidade das diferentes características das espécies que compõem as comunidades de
plantas.
Referências
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90
Wilson, J.B. & S.H. Roxburgh. 1994. A demonstration of guild-based assembly rules
for a plant community, and determination of intrinsic guilds. Oikos, 69:267-276.
91
Os últimos serão os primeiros? A colonização de ilhas formadas por copas de
árvores em sistemas inundáveis ocorre de maneira aleatória
Thiago B. d’A. Couto, Gregório R. Menezes, Guilherme H. A. Pereira, Maria L. Ternes,
Talita Câmara
Introdução
A colonização é um dos principais processos que estruturam comunidades em
ambientes insulares (MacArthur & Wilson 1963, Brown & Kodric-Brown 1977).
Nesses ambientes, a habilidade de dispersão das espécies que saem do continente é um
fator importante para o processo de colonização (Simberloff &Wilson 1969).
Dispersores menos eficientes tendem a ocupar ilhas maiores e mais próximas da fonte,
onde as taxas de extinção são menores (Cook & Quinn 1995). Por outro lado, interações
bióticas, como competição e predação, tendem a ficar mais freqüentes com a chegada de
mais espécies (McCabe & Gotelli 2000).
Durante a colonização, a combinação de dois processos pode determinar a
chegada de novas espécies: adição e substituição de espécies. Na adição, as espécies
novas que chegam são acumuladas, não havendo extinções. Já na substituição, algumas
espécies estabelecidas são excluídas com a chegada de novas espécies, não
apresentando sobreposição (Baselga 2010). Em ilhas, é esperado que a adição de novas
espécies seja mais freqüente que a substituição (Cook & Quinn 1995). Isso ocorre
devido à ordem relativamente determinística de colonização, de modo que espécies com
diferentes capacidades de dispersão tendem a colonizar o ambiente em momentos
distintos (Cook & Quinn 1995). Já em ambientes estruturados principalmente por
interações bióticas, é esperada maior importância da substituição de espécies. Isso
porque a competição e a predação podem excluir antigos colonizadores (Simberloff
92
&Wilson 1969). Porém, ilhas que estão sendo colonizadas há mais tempo podem
acumular espécies e, conseqüentemente, interações biológicas podem se tornar mais
importantes nesses locais (Wooster & Sih 1995).
Uma maneira de mensurar o aninhamento e a substituição de espécies é a partir da
determinação da diversidade β. A diversidade β pode ser definida como a variabilidade
na composição de espécies entre locais (Magurran 2004, Anderson et al. 2006). Uma
propriedade interessante da diversidade β é que ela pode ser decomposta em um
componente associado à adição de espécies (βaninhamento) e outro (βsubstituição) à
substituição delas (Baselga 2010). Assim, ao decompor a diversidade beta nesses dois
componentes, é possível determinar qual dos processos predomina durante a
colonização.
Para testar se a colonização ao longo do tempo é determinada por adição de
espécies ou por interações biológicas, é preciso estudar um sistema que contenha ilhas
com diferentes idades e que, presumivelmente, recebam espécies por períodos distintos.
Um sistema adequado para esse estudo é o de áreas inundáveis da floresta amazônica,
como as áreas de Igapó. Nesse sistema, diferentemente de ilhas oceânicas, é possível
avaliar o processo de colonização de espécies desde a colonização inicial ao longo de
poucos meses. Isso é possível, porque nas áreas de Igapó, existem pulsos de inundação
previsíveis (Worbes 1997). Durante a cheia, a maior parte da vegetação permanece
submersa, enquanto que ao longo da vazante, a região da copa de algumas árvores se
torna gradualmente exposta. Essa região forma ilhas de vegetação que podem ser
colonizadas por organismos que permaneceram nas áreas que não sofrerem influencia
da cheia. Mesmo quando submersas, as árvores do Igapó permanecem com as folhas
verdes (Worbes 1997). Isso permite que ilhas recentes, supostamente ainda não
colonizadas, tenham características similares de colonização em relação às antigas.
93
Portanto, a colonização desses locais deve depender somente da área, distância até a
fonte e tempo de exposição das copas.
O nosso objetivo é entender como ocorre a recolonização das copas de árvores
que ficam submersas durante o período de inundação. Nossas hipóteses são que i) o
padrão de colonização dessas ilhas ocorre pela adição de novas espécies (padrão de
distribuição aninhada) ou que ii) o padrão de colonização dessas ilhas ocorre por
substituição das espécies.
Métodos
Área de estudo
Desenvolvemos o estudo em um lago no arquipélago de Anavilhanas, no Rio Negro,
localizado no estado Amazonas, Brasil (02o 07’ S – 6 o 02’ O). A área é caracterizada
por florestas de igapó sazonalmente alagadas. Realizamos a coleta quando o nível do rio
Negro havia descido aproximadamente 140 cm. Nesse período, algumas árvores já se
encontravam parcialmente expostas acima da lamina d’água.
Como modelo de estudo, escolhemos as aranhas por pertencerem a um grupo
diverso, abundante e de fácil amostragem. Além disso, a matriz de água durante a
inundação é uma barreira menos permeável à dispersão das aranhas, já que elas não
voam.
Para avaliar se o tempo de emersão das copas de árvores está relacionado com a
riqueza e a composição da assembléia de aranhas, selecionamos copas de 17 árvores,
localizadas à mesma distância da margem do lago. As árvores possuíam diâmetros
semelhantes e diferentes alturas acima da lâmina da água. Presumimos que a diferença
de altura entre o ponto mais alto das copas emersas e a superfície da água, representa o
94
tempo de exposição à colonização (utilizamos árvores com até 200 cm de altura em
relação à lâmina d’água). Em cada copa, sistematizamos a captura das aranhas
utilizando o método de cinco batidas com um bastão de madeira em quatro ramos
distintos, totalizando 20 batidas por copa. Desprezamos os ramos com folhas jovens
(coloração clara e textura tenra), visto que elas seriam sítios de colonização recente.
Coletamos as aranhas que caíam durante as batidas usando uma bandeja com álcool
70% para fixação dos organismos. Após a coleta, caracterizamos as aranhas em
morfotipos.
Utilizamos correlação de Spearman para testar se há relação entre a riqueza e a
altura da copa da árvore em relação à superfície. Para avaliar se há adição de espécies
durante a colonização, utilizamos o modelo de partição de diversidade β sugerido por
Baselga (2010). Como os padrões de substituição e aninhamento normalmente são
confundidos nas métricas de diversidade β tradicionais, decompomos os componentes
no de aninhamento (βaninhamento) e de substituição (βsubstituição). Para isso, calculamos o
índice de dissimilaridade de Simpson e de dissimilaridade de Sorensen entre todos os
pares de ilhas. Obtivemos o componente de β aninhamento ao subtrair a dissimilaridade
de Simpson da dissimilaridade de Sorensen, e o de substituição a partir da
dissimilaridade de Simpson.
Para avaliar qual componente da diversidade β foi mais importante para a
assembléia de aranhas, relacionamos as matrizes contendo os componentes βsubstituição e
βaninhamento entre todos os pares de copas com a matriz de diferença da altura da copa
entre os pares de árvores usando o teste de Mantel (999 permutações). Se a hipótese
associada à adição de espécies for verdadeira, esperamos que: i) dosséis mais altos em
relação à superfície da água possuam maior numero de espécies e ii) o componente de
aninhamento da diversidade β esteja positivamente associado á matriz de diferenças de
95
altura entre as copas. Se a hipótese associada à substituição de espécies for verdadeira,
esperamos que: i) dosséis mais altos em relação à superfície da água possuem maior
numero de espécies; ii) o componente de substituição da diversidade β esteja
positivamente associado á matriz de diferenças de altura entre as copas.
Resultados
Coletamos um total de 39 morfotipos de aranhas nas copas das árvores emersas. A
altura das copas das árvores em relação à superfície da água variou de 31 a 190 cm. A
riqueza média de morfotipos por copa foi igual a 5,9±2,1 (média±desvio padrão). A
riqueza de morfotipos de aranhas aumentou com o aumento da altura da copa emersa
(Rs=0,62, p<0,01; Figura 1). No entanto, não houve relação dos componentes de
aninhamento (r=0,11; p=0,17) e substituição (r=0,03; p=0,36) com a diferença de altura
das copas (Figura 2).
Figura 1. Relação entre riqueza de morfotipos de aranhas e altura emersa da copa das
árvores em um lago do Arquipélago de Anavilhanas, Amazonas, Brasil.
96
Figura 2. Relação entre a dissimilaridade da composição de espécies de aranhas entre
pares de copas emersas e a matriz de diferença de altura entre pares de copas emersas
das árvores em um lago do Arquipélago de Anavilhanas, Amazonas, Brasil. (A)
Dissimilaridade associada ao βsubstituição; (B) Dissimilaridade associada ao βaninhamento.
Discussão
O incremento do número de morfotipos em função do aumento da altura das copas
indica que existe um acúmulo de espécies em função da idade da ilha (i.e. o tempo de
emersão). Consequentemente, a entrada de novas espécies é maior que as extinções
locais. No entanto, a ausência de relação entre as diferenças de altura das copas e o
componente de aninhamento da diversidade β indica que não há uma sequência
determinística de chegada de espécies. Da mesma forma, a ausência de relação entre a
diferença de altura das copas e o componente β de substituição indica que a saída de
uma espécie independe da colonização de outra espécie em particular. Assim, é possível
que a colonização e a extinção em ilhas de dossel ocorram ao acaso.
97
Alguns estudos têm demonstrado que o componente aninhado é importante para a
colonização de copas de árvores submetidas a pulsos de inundação (e.g. Gonçalves et al.
2008, Pacífico et al. 2009). Avaliando a assembléia de aranhas nas ilhas de dossel do
arquipélago de Anavilhanas, Pacífico et al. (2009) observaram que as espécies de
aranhas nas ilhas menores são subconjuntos das espécies que ocorrem nas ilhas maiores.
Este padrão indica que a área, ao contrário do tempo de exposição, é um fator
estruturante da assembléia de aranhas na colonização de ilhas de dossel (Arcoverde et
al. 2010). Talvez a maior disponibilidade de área permita a coexistência das espécies, ao
reduzir a intensidade das interações entre elas.
Aranhas normalmente têm hábito generalista e predam outras aranhas menores,
sem distinção de espécie (Venticinque 1995). Assim, na colonização por aranhas em
ilhas de dossel, as interações bióticas podem gerar uma exclusão não determinada de
espécies em função da baixa especialização na dieta. Por outro lado, é possível que em
grupos com dieta especializada, a ocorrência de determinados predadores esteja limitada
à presença das presas. Além disso, a competição entre as espécies com dieta semelhante
tenderá a ser maior, aumentando a chance de que a presença de uma espécie impeça a
entrada da sua competidora. Nesse sentido, talvez o padrão de colonização por
substituição seja dependente do grau de especialização alimentar no grupo de espécies
colonizadoras.
Referências
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Arcoverde, G.B., A.A. Mendonça, D.L. Martins, G. Oliveira & P. Vieira. 2010. A altura
das copas de árvores submetidas a pulsos de inundações influencia a riqueza e a
98
estrutura de uma metacomunidade de aranhas? Livro do curso de campo “Ecologia
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100
Seleção sexual na quela de machos do camarão Macrobrachium cf. amazonicum :
tamanho é documento?
Franciele P. Peixoto, Daniele Cury, Camilla Pagotto, Lucas Paolucci, Raul C. Pereira
Introdução
A teoria de seleção sexual foi proposta como uma forma de explicar o dimorfismo
sexual e a existência de caracteres que presumivelmente reduzem a chance de
sobrevivência de indivíduos de algumas espécies. De acordo com essa teoria, certos
indivíduos podem ter vantagens reprodutivas em relação a outros do mesmo sexo por
possuírem características que aumentem as suas chances de encontro e cópula (Futuyma
1986).
A seleção sexual pode ocorrer pela competição entre indivíduos do mesmo sexo
(seleção intra-sexual) ou pela escolha de parceiros do sexo oposto (seleção inter-sexual)
(Lailvaux & Irschick 2006). A seleção intra-sexual favorece o desenvolvimento de
características utilizadas em interações agonísticas entre indivíduos do mesmo sexo. Ela
pode favorecer, por exemplo, características que confiram vantagens em interações
agressivas entre rivais pelo acesso a parceiros sexuais. Já a seleção inter-sexual
promove o desenvolvimento de características atrativas para indivíduos do sexo oposto.
Essas características permitem que indivíduos do sexo seletivo avaliem a qualidade de
seus pretendentes (Irschick et al 2007).
Machos sexualmente receptivos geralmente são mais abundantes que as fêmeas
aptas para o acasalamento (Andersson 1994). Isso faz com que haja maior pressão de
seleção sexual sobre os machos (Emlen & Oring 1977). Os machos estarão sujeitos à
pressão de seleção sexual tanto em relação às características que serão selecionadas pela
fêmea, quanto em relação aos atributos necessários para vencer a disputa com seu
101
oponente pelo acesso à ela. Nessas situações, características que indiquem a capacidade
de luta do macho para seus rivais ou a sua saúde para as fêmeas devem ser favorecidos
por seleção sexual. Fêmeas por outro lado, por não sofrerem uma pressão de seleção
sexual tão intensa quanto os machos, dificilmente apresentam características que
indiquem qualidade.
Várias características podem indicar a qualidade do indivíduo, o que pode
originar variações morfológicas nas espécies como, por exemplo, a presença de
estruturas desproporcionalmente maiores (Oliveira 2008). Dado que tais estruturas
indicam qualidade, elas devem ser mais expressivas em indivíduos que possuam
melhores condições. Além disso, se tais estruturas indicam a qualidade dos machos, elas
devem apresentar relações com características confiáveis de condição que são de
avaliação mais difícil, como o nível de simetria. Considerando que o desenvolvimento
de ambos os lados de um organismo bilateral estão sobre o controle dos mesmos genes,
o grau de assimetria de um organismo é um indicativo confiável das interferências
ocorridas durante o seu processo de desenvolvimento. Portanto, a assimetria representa
a qualidade geral do indivíduo (Palmer 1996).
Macrobrachium cf. amazonicum é um camarão de água doce que vive associado
a bancos de macrófitas (Melo 2003). Nessa espécie há um dimorfismo sexual associado
ao tamanho da quela, que é utilizada para captura de presas e para defesa (Melo 2003).
Os machos apresentam quelas maiores e mais espessas em relação às fêmeas. Apesar do
dimorfismo evidente associado a essa estrutura, a função sexual da quela ainda é
desconhecida. Dessa forma, o objetivo do nosso trabalho foi avaliar porque machos de
Macrobrachium cf. amazonicum têm quelas maiores em relação às fêmeas. Nossa
hipótese é que o tamanho das quelas é um indicativo da qualidade do macho, mas não
da fêmea.
102
Métodos
Amostramos um banco de macrófitas em um lago do arquipélago de Anavilhanas
localizado no Rio Negro, Amazonas, Brasil. No banco de macrófitas, coletamos 10
machos e oito fêmeas do camarão usando um puçá. Fixamos os indivíduos em álcool
40% e os fotografamos. Utilizamos as fotografias para medir o comprimento do corpo,
distância do ponto medial do rostro até a margem dos olhos esquerdo e direito e
comprimento da quela dos camarões usando o programa Image Tool (Wilcox et al.
2002).
Medimos a qualidade dos machos utilizando a assimetria corporal. Usamos o
módulo da diferença entre as distâncias do ponto medial do rostro até a margem dos
olhos esquerdo e direito dos machos de M. cf. amazonicum como medida de assimetria.
Assim, valores altos de assimetria indicam machos com baixa qualidade.
Camarões maiores podem ter quelas maiores simplesmente por um efeito
alométrico. Dessa maneira, para retirar o efeito do tamanho do corpo dos camarões no
tamanho da quela, realizamos uma regressão linear com essas duas variáveis e usamos o
resíduo dessa análise como variável resposta. Testamos se machos e fêmeas com quelas
maiores eram mais simétricos utilizando uma ANCOVA. Se a hipótese de que machos
com quelas proporcionalmente maiores têm maior qualidade for verdadeira, esperamos
que o resíduo da regressão entre o tamanho da quela e o tamanho corporal dos machos
seja positivamente relacionado com a simetria corporal. Para fêmeas, esperamos que
não haja relação do resíduo da regressão entre o tamanho da quela e o tamanho corporal
com a simetria.
103
Resultados
O tamanho proporcional da quela de machos e fêmeas não aumentou com a assimetria
corporal (F(1,14)<0,001; p=0,99; Figura 1).
Figura 1. Relação entre assimetria e os resíduos da regressão do tamanho da quela e
comprimento do corpo para machos e fêmeas do camarão Macrobrachium cf.
amazonicum, coletados no Arquipélago de Anavilhanas, Amazonas, Brasil.
Discussão
A ausência de relação entre o comprimento da quela e a simetria indica que essa
estrutura não demonstra qualidade do macho, seja para machos rivais ou para fêmeas
sexualmente receptivas. O dimorfismo sexual associado à quela pode ser produto da
competição direta entre machos e não da escolha das fêmeas (Lailvaux & Irschick
2006). Como a quela provavelmente não indica qualidade para machos rivais, é possível
que não haja avaliação entre eles antes dos confrontos (Arnott & Elwood 2009). Nesse
104
sentido, a quela seria uma arma de luta para causar injúrias nos rivais. A falta de
avaliação visual da quela pode ser reforçada pelo fato de que há baixa luminosidade e
visibilidade no rio Negro (Oliveira, 2001), a qual deve ser ainda menor sob os bancos de
macrófitas onde esses camarões são encontrados. Nesse sentido, a seleção visual de
machos por fêmeas ficaria comprometida e o tamanho da quela não seria um critério
crucial para a escolha.
Disputas sexuais entre machos normalmente ocorrem quando há territorialidade
ou confronto direto por fêmeas sexualmente receptivas (Andersson & Iwasa 1996).
Entretanto, como os bancos de macrófitas são hábitats homogêneos, não devem existir
marcadores ambientais que possam ser utilizados para o estabelecimento de territórios
para esses camarões. Nesse sentido, o confronto direto entre machos, quando fêmeas
estão receptivas, pode ser o principal mecanismo atuando na seleção sexual do tamanho
de quela em M. cf. amazonicum.
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106
Km 41 – projetos orientados
Se a comida morde, eu fujo: resposta das aranhas a presas de diferentes níveis de
periculosidade
Camilla Pagotto, Daniele Cury, Daniel Dainezi, Fernanda de Oliveira, Gregório dos
Reis Menezes
Introdução
A decisão acerca de obtenção de alimentos é um dos principais fatores que influenciam
a sobrevivência dos organismos (Begon et al. 2006). A teoria do forrageamento ótimo
postula que essa decisão leva em consideração os custos e os benefícios envolvidos no
forrageio, de maneira que o consumidor ajusta o seu comportamento a fim de
maximizar o ganho energético líquido (Pyke 1984). Entretanto, nem sempre o forrageio
vai obedecer à regra de maximizar a entrada de energia, pois em algumas situações isso
pode aumentar o risco de predação durante o forrageio. Em função disso, a hipótese do
forrageamento sensível ao risco prediz que a atividade de forrageamento dos
organismos é reduzida quando existe ameaça de predação (Sih 1986).
Embora a hipótese do forrageamento sensível ao risco presuma que o risco
imposto ao consumidor ocorra devido à presença do predador. Em muitos casos, a
própria presa pode apresentar um risco de injúria ou morte ao consumidor. Nessas
situações, é possível que o consumidor também ajuste seu comportamento de forrageio
em função do nível de ameaça oferecido pela presa (Del-Claro 2004). Portanto, presas
com mecanismos de defesa mais letais podem reduzir a chance de que o consumidor
invista energia no seu abate.
107
O perigo potencial representado pelas presas pode ser detectado pelos
predadores através de estímulos mecânicos, visuais e/ou químicos (Gullan & Grascon
2005). Em particular, aranhas que constroem teias para captura de presas, geralmente
não possuem uma percepção visual acurada (Viera et al. 2007). Por conta disso, a
detecção da presa geralmente está associada à teia. Essa detecção ocorre por um órgão
sensorial, que permite o reconhecimento mecânico de vibrações produzidas pela presa
(Arango & Rico-Gray 2000). O padrão de vibração das presas é informativo e sua
transmissão pelos fios da teia permite que a aranha antecipe características da presa, tais
como sua massa ou grau de atividade (Viera et al. 2007). A avaliação dessas
características permite que a aranha avalie os custos associados à captura e manipulação
da presa e os benefícios obtidos com o seu consumo (Viera et al. 2007).
Se aranhas são capazes de avaliar o retorno associado ao tamanho da presa,então
é possível que elas também ajustem o comportamento de acordo com o nível de ameaça
oriundo das defesas contra predação. Nesse sentido, nosso estudo teve como objetivo
avaliar como aranhas que produzem teias tridimensionais respondem às presas com
diferentes níveis de periculosidade. Nossa hipótese é que as aranhas reconhecem
imediatamente as presas que oferecem maior perigo e apresentam menor preferência por
elas.
Métodos
Área de estudo
Nós realizamos este estudo na reserva do km 41, localizada a 80 km ao norte de
Manaus, Brasil. A reserva é formada por floresta contínua de terra firme e faz parte de
108
uma ARIE (Área de Relevante Interesse Ecológico) sob co-gestão do Projeto Dinâmica
Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF).
Organismo de estudo
A aranha usada como modelo de predador possui cefalotórax e abdome vermelhos e
pernas pretas e vermelhas. Essa aranha constrói teias tridimensionais no sub-bosque,
normalmente bem próximas ao solo. As teias, possuem uma superfície arredondada com
a parte convexa voltada para o dossel. Essa superfície é composta por fios traçados em
várias direções e a aranha se posiciona na parte côncava dela. Entre a aranha e o solo
existem vários fios solitários traçados a partir da borda da região arredondada da teia.
Coleta de dados
Coletamos indivíduos de duas espécies de formigas para serem utilizadas como modelos
de presas com diferentes níveis de ameaça para aranhas: Ectatomma brunneum
(Ectatominae) (n=15) e Dolichoderus sp. (Dolichoderinae) (n=17). Em comparação à
Dolichoderus sp., Ectatomma brunneum é uma formiga um pouco maior, com
comportamento agressivo, possui ferrão, mandíbulas maiores e exoesqueleto mais
esclerotizado (Hölldobler & Wilson 1990). Diante disso, consideramos essa espécie
como sendo a presa mais perigosa para a aranha. Dolichoderus sp. não possui ferrão,
suas mandíbulas são menores e o exoesqueleto é menos esclerotizado. Por isso a
consideramos como modelo de presa que representa menor periculosidade para a
aranha.
Oferecemos uma única espécie de formiga em cada teia, sempre à mesma
distância em relação às aranhas. Após a colocação da formiga na teia, cronometramos o
tempo em que a aranha levou para chegar à presa (tempo de resposta) e posteriormente
109
registramos se a aranha atacou ou evitou a presa (tipo de reação). Consideramos que a
aranha atacou a presa quando (1) ela envolveu a presa com teia ou (2) tentou envolver a
presa sem sucesso. Consideramos que houve evitação da presa quando (1) a aranha
fugiu ou se afastou da presa, (2) removeu a presa da teia ou (3) permanceu na mesma
posição se balançando rapidamente.
Para avaliar o tempo de reação das aranhas em relação às duas espécies de
formigas usamos o teste Mann-Whitney. Utilizamos o teste de qui-quadrado para
analisar se o tipo de reação da aranha diferiu para as duas espécies de formiga
utilizadas. Se a hipótese de que as aranhas reconhecem imediatamente as presas que
oferecem maior perigo e apresentem maior preferência por elas for verdadeira,
esperamos que (1) o tempo de resposta das aranhas para Ectatomma brunneum seja
maior do que o tempo de resposta à Dolichoderus sp. e (2) após a detecção da presa na
teia, as aranhas evitarão Ectatomma brunneum e atacarão Dolichoderus sp.
Resultados
O tempo de resposta das aranhas foi semelhante para os dois tipos de formigas (U=93,5;
N=32; p=0,10, Figura 1). O tempo médio de resposta quando a presa foi E. brunneum
foi de 27,06 s (DP=59,5) e quando foi de Dolichoderus sp. 9,2 s (DP=8).
As aranhas atacaram mais freqüentemente quando a presa era representada por
Dolichoderus sp (χ²=17,9; gl= 1; p< 0,001). Houve ataque em 88% dos testes com
Dolichoderus sp. e apenas 12% dos testes com E. brunneum. Todos os indivíduos de
Dolichoderus sp. foram enrolados com teia. Com relação E. brunneum, sempre que a
aranha atacou essa formiga, ela tentou envolvê-la na teia, mas não obteve sucesso. Em
apenas uma ocasião a aranha removeu E. brunneum.
110
Camponotus sp. Ecta tomma sp.0
20
40
60
80
100
120
140
160
180
Tem
po d
e de
tecç
ão (
s)
Dolichoderus sp. Ectatomma brunneum
Tem
po
de
re
spo
sta
(s)
Formiga
Figura 1. Tempo de resposta (s) das aranhas em relação à oferta das formigas E.
brunneum e Dolichoderus sp. na floresta contínua do Km 41 (ARIE-PDBFF),
Amazonas, Brasil
Discussão
O tempo de reação das aranhas na presença de Ectatomma brunneum e Dolichoderus sp.
foi semelhante, o que demonstra que a detecção do nível de periculosidade dessas presas
pela aranha não é imediata. Aranhas conseguem diferenciar moscas de formigas que
caem na teia por meio das diferenças nas vibrações produzidas por estes insetos (Viera
et al. 2007). Talvez, diferentes espécies de formigas produzam um padrão similar de
vibração nas teias, impedindo que a aranha seja capaz de detectar diferenças produzidas
por diferentes espécies de formigas.
Uma vez que a aranha não distingue as vibrações nas teias produzidas pelas duas
espécies de formiga, a avaliação do nível de periculosidade talvez só seja possível
quando a aranha se aproxima dessas formigas. Sendo assim, outros mecanismos devem
permitir que ela avalie os riscos associados à captura de presas mais perigosas. Talvez
111
as aranhas usem a percepção tátil na detecção de diferenças quanto à dureza do
exoesqueleto. Além disso, outras formas de detecção associadas a pistas químicas ou o
comportamentais podem afetar a chance de predação (Viera et al. 2007).
Eventualmente o maior tamanho de E. brunneum em relação a Dolichoderus sp.
pode ter sido responsável pela menor freqüência de ataque. Presas maiores podem
oferecer maiores custos para captura ou eventualmente gerar danos mais sérios na teia, e
portanto, podem ser desvantajosas (Viera et al. 2007). No entanto, as aranhas raramente
removeram E. brunneum da teia, indicando que manter a formiga presa, mesmo sem
envolvê-la na teia pode ser vantajoso. Caso a presa permaneça na teia sem que a aranha
a envolva com seda, é possível que ela espere a formiga atingir a exaustão o que
facilitaria sua manipulação. Assim, apesar de haver maior chance de ocorrerem danos à
teia ou da presa se libertar, a aranha pode ajustar a captura para minimizar o risco de
injúrias e garantir um alto retorno energético devido ao maior tamanho da presa.
Concluímos que a percepção da aranha ao risco representado pela presa em
potencial não é determinado por vibrações na teia e que outros mecanismos permitem
que ela avalie os riscos associados à captura de presas mais perigosas. Dessa forma, não
apenas as presas podem ajustar sua atividade de forrageio de acordo com a ameaça
imposta pelo predador. O predador também pode ajustar o seu forrageio em função do
perigo associado à captura de presas, que lhe ofereçam maiores riscos durante a captura.
Referências
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use by the Green lynx spider Peucetia viridians (Oxyopidae) inhabiting
Cnidscolus aconitifolius (Euphorbiaceae). Journal of Arachnology, 28:185-194.
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aranhas. (M.O. Gonzaga., A.J. Santos & H.F. Japyassú Eds.). Rio de Janeiro:
Editora Interciência
113
Apertado, mas nem tanto: rugosidade do ambiente não influencia no tamanho de
formigas e dominância
Talita C. dos S. Bezerra, Ana Y.Y. Meiga, Carla B. Madelaire, Mauro B. Monteiro-
Junior e Raul C. Pereira
Introdução
As diferenças morfológicas dos organismos determinam como eles usam o hábitat e
exploram os recursos (MacArthur & Pianka 1966). Mesmo em grupos
morfologicamente similares, relações alométricas entre as espécies podem determinar o
uso diferencial do hábitat (Hutchinson 1959, Farji-Brener et al. 2004).
O tamanho, em particular, pode afetar a eficiência com que um organismo se
desloca em hábitats com diferentes estruturas (Thompson 1961, Morse et al. 1985,
Levin 1992). A hipótese do tamanho-grão (size-grain hypothesis) postula que o
ambiente impõe restrições aos organismos associadas ao tamanho corporal, de forma
que organismos menores são mais restritos a ambientes com mais rugosidade
(quantidade de interstícios entre as estruturas do ambiente) do que animais maiores
(Kaspari & Weiser 1999). Assim, espécies pequenas utilizam interstícios como
microhábitats, enquanto espécies grandes não têm acesso a esses ambientes, tendo que
se deslocar por cima de microhábitats de alta rugosidade.
A hipótese do tamanho-grão aparentemente explica diferenças na eficiência de
captação de recursos entre espécies de formigas (Farji-Brener et al. 2004). Formigas
maiores supostamente têm vantagem em ambientes com rugosidade baixa e média, pois
se movimentam mais rapidamente em superfícies mais planas (Bartholomew et al.
1988). No entanto, elas não conseguem se infiltrar em ambientes com alta rugosidade,
114
como o interstício do folhiço em florestas, que é explorado por formigas menores (Farji-
Brener et al. 2004).
Se a rugosidade determina quando formigas pequenas ou grandes chegarão
primeiro ao recurso, isso pode determinar quando ele será monopolizado. Espécies
pequenas em geral recrutam em massa quando encontram o recurso (Lach et al. 2010).
Já espécies grandes forrageiam solitariamente e carregam grandes quantidades de
recursos (Hölldobler & Wilson 1990). Sendo assim, se a rugosidade é alta, espécies
pequenas tendem a chegar primeiro e conseqüentemente o recurso será monopolizado.
Quando as formigas grandes chegam primeiro, se espera o padrão contrário.
Formigas apresentam elevada riqueza e abundância no solo de florestas tropicais
onde o folhiço é um componente predominante (Hölldobler & Wilson 1990). A grande
quantidade de folhiço depositada nesses ambientes fornece variedade de microhábitats
que permitem a coexistência dessas espécies (Silva & Brandão 2010). No entanto, os
processos específicos que permitem essa coexistência ainda não foram esclarecidos.
Nesse sentido, nos propomos a avaliar a hipótese que em hábitats com maior rugosidade
proporcionada pelo folhiço, formigas menores são mais eficientes para encontrar o
recurso.
Métodos
Conduzimos o estudo em uma área de platô de floresta de terra firme contínua,
localizada na Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) do Km 41 (02°24’S e
59°44’O) na Amazônia Central, Brasil. A área é administrada pelo “Projeto Dinâmica
Biológica de Fragmentos Florestais” (INPA/Smiththsonian Institute).
Para avaliar se o aumento da rugosidade do ambiente limita o acesso de espécies
grandes de formigas ao recurso, simulamos a rugosidade com um experimento pareado
115
com dois tratamentos: pouca serrapilheira (300 g, quantidade semelhante do que
encontrado na floresta estudada) e muita serrapilheira (600 g). Em cada amostra,
distribuímos a serrapilheira de cada tratamento em uma área de 50 cm x 50 cm com uma
distância de 10 cm entre eles. No centro de cada tratamento colocamos um plástico de 5
x 5 cm com uma isca composta por ovo e farinha. Montamos 15 pares experimentais
separados por 10 m de distância, a fim de evitar o acesso da mesma colônia de formigas
a mais de um par. Depois de dispor as iscas, esperamos por 1:30 h antes de coletarmos
as formigas presentes no recurso. Esse tempo é suficiente para que se estabeleça
dominância de espécies de formigas (Baccaro et al. 2009). Depois de coletar as
formigas, tiramos fotos delas e obtivemos as medidas de Weber (comprimento do tórax)
usando o programa ImageTool. Em seguida, identificamos as formigas e quantificamos
o número de indivíduos por espécie em cada isca para investigar se houve alguma
espécie dominante em cada tratamento. Consideramos uma espécie como dominante
quando ela ocorreu sozinha na isca com 10 ou mais indivíduos. Quando havia mais de
uma espécie, consideramos que a isca foi dominada quando a espécie mais abundante
apresentou mais de 10 indivíduos e mais que o dobro da abundancia em relação à
segunda espécie mais abundante na isca (adaptado de Bestelmeyer et al. 2000).
Se a hipótese de que o aumento da rugosidade do ambiente limita o acesso de
espécies de formigas maiores ao recurso for verdadeira, esperamos que no tratamento
com mais folhiço, o tamanho médio das formigas nas iscas seja menor. Além disso, o
tratamento com mais folhiço terá maior frequência de dominância nas iscas que o
tratamento com pouco folhiço. Para analisar o efeito da rugosidade do ambiente no
tamanho das formigas realizamos um teste t pareado. Para avaliar se a freqüência de
dominância das iscas diferiu entre os tratamentos realizamos um teste de qui-quadrado.
116
Resultados
Encontramos formigas nos dois tratamentos do mesmo par em oito situações. O
tamanho de formigas foi similar entre os tratamentos com muito e pouco folhiço
(t=1,20; gl=7; p=0,13; Figura 1). Aproximadamente 40% das iscas foram dominadas.
Não houve variação na freqüência de dominância das formigas entre as diferentes
quantidades de folhiço (χ²=0,51; n=30; gl=1; p=0,47).
Figura 1. Tamanho médio das formigas de cada amostra para tratamentos pareados com
muito e pouco folhiço na ARIE do km 41, Amazonas, Brasil. Linhas pontilhadas ligam
amostras pareadas de cada réplica.
Discussão
O fato do tamanho médio das formigas ter sido similar entre os tratamentos indica que
variações no volume da serrapilheira não devem funcionar como um filtro que restrinja
a chegada de espécies de diferentes tamanhos ao recurso. Talvez todo o conjunto local
de espécies tenha conseguido chegar à isca. Sem restrições associadas ao tamanho das
espécies, as interações que determinam a dominância de recursos não variaram entre os
tratamentos, o que explicaria a mesma freqüência de dominância.
117
Formigas possuem grande força física e por isso conseguem se deslocar em
ambientes complexos (Hölldobler & Wilson 1990). A grande força física deve permitir
que elas superem barreiras físicas impostas pela rugosidade do folhiço. Formigas
pequenas, por sua vez, mesmo sem a necessidade de deslocar barreiras físicas em
ambientes com maior rugosidade, devem ter que se deslocar por distâncias maiores. Isso
é esperado, pois a área de superfície deve ser maior em ambientes mais rugosos
(Bartholomew et al. 1988). Portanto, enquanto formigas grandes caminham distâncias
menores tendo que deslocar barreiras físicas, as pequenas podem contornar os
obstáculos, mas caminham distâncias maiores, resultando em um mesmo tempo de
encontro dos recursos. Nesse sentido, outras formas de partição do recurso, como
territorialidade ou partição temporal, devem explicar a coexistência de espécies de
formigas no solo de florestas tropicas.
Referências
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moisture content can regulate bait control in an ant assemblage in Central Amazonian
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119
Formigas em ilhas de néctar: tamanho e isolamento importam?
Guilherme H. A. Pereira, Inácio J. M. T. Gomes, Maria L. Ternes, Karla M. Campião e
Rodrigo Zucaratto
Introdução
A Teoria de Biogeografia de Ilhas postula que a riqueza de espécies está correlacionada
positivamente ao tamanho da ilha e inversamente relacionada ao seu grau de isolamento
(MacArthur & Wilson 1967). Isso ocorre porque ilhas com áreas maiores podem abrigar
populações maiores e, consequentemente, apresentarem menores taxas de extinção.
Da perspectiva do isolamento, a riqueza de espécies é maior em ilhas mais próximas ao
continente porque o oceano funciona como uma barreira para a migração das espécies,
diminuindo suas taxas de colonização. Sendo assim, a riqueza de espécies da ilha resulta
do balanço entre as taxas de colonização e extinção.
A teoria de biogeografia de ilhas foi inicialmente proposta para ilhas oceânicas.
No entanto, vem sendo aplicada em diferentes ambientes descontínuos que apresentam
tamanhos e graus de isolamento diferentes, tais como ilhas em lagos, fragmentos
florestais, topos de montanha e árvores em agrossistemas (Gotelli & Graves, 1996).
Nesta perspectiva, plantas que crescem isoladamente podem ser consideradas ilhas
ecológicas em escala de microhabitat para invertebrados, como formigas.
Muitas espécies de plantas tropicais produzem nectários extraflorais que atraem
alguns grupos de insetos, principalmente formigas (Cogni et al. 2010). Ao andarem
sobre as plantas, as formigas atacam e removem outros insetos, normalmente
herbívoros. Dessa forma, as formigas favorecem o crescimento e sucesso reprodutivo da
planta (Almeida & Figueiredo 2003, Leal et al. 2006). Várias espécies de formigas
podem visitar os nectários extraflorais de uma mesma planta (Almeida & Figueiredo
120
2003, Leal et al. 2006). Sendo assim, é possível que em plantas grandes e/ou com outros
co-específicos nas suas proximidades, colônias localizadas em um raio grande ao redor
da planta tenham acesso aos nectários extraflorais. Isso resultaria em uma alta riqueza
de formigas visitantes. De forma contrária, em plantas pequenas e/ou isoladas, apenas
algumas colônias localizadas nas proximidades do tronco poderiam visitar os nectários
extraflorais, havendo baixa riqueza de formigas associadas a estas plantas.
Diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi responder o que determina a
riqueza de espécies de formigas visitantes dos nectários extraflorais de Croton
lanjouwensis (Euphorbiaceae). Nossa hipótese é que o tamanho da planta e seu
isolamento em relação ao co-específico mais próximo, que funcionaria como fonte de
novos indivíduos, determinam a diversidade de espécies de formigas.
Métodos
Realizamos o estudo na estrada que dá acesso à Reserva Florestal do km 41, localizada
80 km ao norte de Manaus, AM. A vegetação na região é composta por floresta
contínua de terra firme. O clima é do tipo tropical úmido da classificação de Köppen
(Peel et al. 2007) com temperatura média de 26,7 º C e pluviosidade anual em torno de
2.186 mm. O solo dominante na área é o Latossolo Amarelo distrófico, pobre em
macronutrientes como P, K e Ca e altamente lixiviado (Chauvel et al. 1987).
Para a amostragem, adotamos a espécie Croton lanjouwensis Jabl.
(Euphorbiaceae) como modelo. A espécie tem um porte arbóreo, é pioneira e comum
em capoeiras de platô e vertente. Os indivíduos dessa espécie possuem um par de
nectários extraflorais na face abaxial da folha, próximos à inserção peciolar no limbo
foliar. Esses nectários exudam um néctar bastante atrativo para as formigas.
121
Selecionamos 15 espécimes de C. lanjouwensis (indivíduos focais) de diferentes
tamanhos e distância em relação ao co-específico mais próximo ao longo da estrada.
Como medida de tamanho, utilizamos o volume da planta focal, obtido através da altura
e do diâmetro do tronco à altura da primeira ramificação (DAR). Obtivemos o volume
multiplicando a altura total da planta pela área da circunferência do tronco, determinada
a partir do DAR. Como medida de isolamento, utilizamos o sombreamento em relação
ao co-específico. Para determinar o sombreamento, dividimos a distância entre cada
indivíduo focal e seu co-específico pelo volume do co-específico, calculado da forma
descrita anteriormente para o indivíduo focal.
Para estimar a riqueza de formigas, analisamos o número de espécies em cada
indivíduo focal durante dois minutos. Coletamos as formigas e acondicionamos em
frascos plásticos identificados e contendo álcool 70% para fixação e posterior
identificação em laboratório.
Nossa previsão é que o número de espécies de formigas visitando os nectários
extraflorais de C. lanjouwensis será maior em indivíduos de maior volume e menor grau
de sombreamento dos indivíduos co-específicos.
Resultados
Encontramos 10 espécies de formigas (Azteca sp., Camponotus crassus, Camponotus
sp., Cephalotes sp., Crematogaster erecta, Dorymymex sp., Ectatomma sp., Pheidole
sp., Pseudomyrmex peruvianus e Pseudomyrmex sp.) nos 15 indivíduos de C.
lanjouwensis amostrados. O número de espécies de formigas por planta variou de um a
quatro (2,87±0,89). O volume das plantas variou de 0,001 a 2,33 m3 (0,38±0,58) e o
sombreamento do co-específico mais próximo variou de 0,92 a 1061 m2
(840,89±365,99).
122
A riqueza de espécies de formigas não teve relação com seu volume e com o
sombreamento do co-especifico (F(14,1)=0,58451; p=0,46; Figuras 1 e 2).
Figura 1. Relação entre o resíduo da regressão entre riqueza de espécies de formigas e
sombreamento e o volume da planta C. lanjouwensis.
Figura 2. Relação entre o resíduo da regressão entre riqueza de espécies de formiga e
volume da planta C. lanjouwensis focal e o sombreamento do individuo co-especifico
mais próximo.
123
Discussão
Nesse estudo, avaliamos se a Teoria de Biogeografia de Ilhas explicava a riqueza de
formigas visitantes dos nectários extraflorais em árvores de Croton lanjouwensis.
Porém, não encontramos relação entre a área e isolamento das árvores e a riqueza de
formigas.
A relação entre formigas e plantas com nectários extraflorais é considerada um
mutualismo facultativo, pois várias espécies de formigas podem visitar a mesma planta
(Leal et al. 2006). Nessas ocasiões, pode haver tanto partilha quanto competição pelo
recurso (Longino, 1989). Essas diferentes interações entre as espécies de formigas que
visitam os nectários extraflorais podem explicar o fato de que não houve diferença na
riqueza de formigas entre os indivíduos de C. lanjouwensis estudados em função do
tamanho e isolamento. Segundo a Teoria de Biogeografia de Ilhas, todas as espécies
teriam as mesmas chances de colonizar ou se extinguir em uma ilha, e a riqueza desta
resultaria apenas do balanço entre as taxas de imigração, determinadas pelo seu grau de
isolamento, e as de extinção, determinadas pelo seu tamanho. Assim, as diferentes
interações ocorrentes entre as espécies visitantes dos nectários extraflorais de C.
lanjouwensis podem influenciar a riqueza de espécies nas plantas.
Os locais de nidificação e tamanho das colônias são fatores que afetam a
habilidade competitiva das formigas (Longino, 1989). Nesse sentido, formigas de
ninhos mais próximos e colônias mais numerosas seriam beneficiadas em relação às
demais. Além disso, algumas espécies de formigas que visitam nectários extraflorais
podem exibir comportamento territorialista (Leal et al. 2006). Indivíduos de espécies
territorialistas podem limitar o número de espécies na árvore por meio de interações
agonísticas com outras espécies. Uma das espécies de formigas que encontramos nas
124
árvores de C. lanjouwensis é Azteca sp. Indivíduos deste gênero geralmente são
dominantes numericamente e exibem comportamento territorialista (Hölldobler &
Wilson 1990). Talvez a presença de Azteca sp. tenha reduzido o número de espécies de
formigas nas árvores.
Concluímos que o tamanho e o isolamento das árvores de C. lanjouwensis não
determinam a riqueza de espécies de formigas visitantes dos seus nectários extra-florais,
e que outros fatores, como interações interespecíficas, poderiam influenciar a riqueza de
formigas nessa espécie de planta.
Referências
Almeida, A.M. & R.A. Figueiredo. 2003. Ants visit nectaries of Epidendrum
denticulatum (orchidaceae) in a Brazilian Rainforest: effects on herbivory and
pollination. Brazilian Journal of Biology, 63(4):551-558.
Chauvel, A., Y. Lucas & R. Boulet. 1987. On the genesis of the soil mantle of the
region of Manaus, Central Amazonia, Brasil. Experientia 43:234-241.
Cogni, R., A.V.L. Freitas & P.S. Oliveira. 2003. Interhabitat differences in ant activity
on plant foliage: ants at extrafloral nectaries of Hibiscus pernambucensis in sandy
and mangrove forest. Entomologia Experimentalis et Applicata 107:125-131.
Gotelli, N.J. & G.R. Graves. 1996. Null models in ecology. Washington & London:
Smithsonian Institution Press.
Hölldobler, B. & E.O. Wilson. 1990. The Ants. Berlim: Springer‐Verlag.
Leal, I.R., E. Fischer, C. Kost, M. Tabarelli & R. Wirth. 2006. Ant protection against
herbivores and nectar thieves in Passiflora coccinea flowers. Ecoscience 13:431-
438.
125
Longino, J.T. 1989. Geographic variation and community structure in an ant-plant
mutualism: Azteca and Cecropia in Costa Rica. Biotropica, 21:126-132.
MacArthur, R. & E.O. Wilson. 1967. The theory of Island Biogeography. New Jersey:
Princeton University Press.
Peel, M.C., B.L. Finlayson & T.A. McMahon. 2007. Updated world map of the
Köppen-Geiger climate classification. Hydrology and Earth System Sciences,
11:1633–1644.
126
A grama do vizinho é mais verde: a proximidade entre ninhos determina a
composição de plantas epífitas em jardins de formigas
João P. C. Menezes, Fernando M. Resende, Franciele Parreira, Lucas N. Paolucci e
Thiago B. d’A. Couto.
Introdução
Comunidades são delimitações arbitrárias de várias populações vivendo e interagindo
em um mesmo local e no mesmo intervalo de tempo (Emlen 1977, Ricklefs 1990). A
estrutura dessas comunidades pode ser influenciada por fatores bióticos e abióticos que
operam em várias escalas espaciais e temporais (Ribeiro et al. 2007). As influências
desses fatores resultam principalmente de propriedades intrínsecas de cada organismo e
das interações existentes entre eles. Dessa forma, a coexistência entre espécies vegetais
pode ser explicada por diferentes processos, dentre eles a sucessão ecológica, os filtros
ambientais ou a distribuição aleatória de espécies dentro da comunidade (Horn 1974,
Hubbell 2001, Silvertown 2004).
O processo de sucessão propõe que há adição e/ou substituição de espécies ao
longo de um gradiente temporal, de forma que haja mudança na composição e na
riqueza de espécies da comunidade ao longo do tempo (Horn 1974). Assim, pressupõe-
se que comunidades em um mesmo estágio sucessional tendem a ser mais similares em
relação à composição de espécies. Por outro lado, as comunidades podem ser
organizadas através da seleção por filtros ambientais. Assim, as características do
ambiente selecionam as espécies que vão ocorrer na comunidade devido à sua
capacidade de utilizar determinados recursos (Begon et al.1990). Nestes casos, as
comunidades teriam uma composição de espécies mais semelhante devido à
similaridade das condições e recursos.
127
Há comunidades onde as espécies se distribuem de maneira aleatória no tempo e
no espaço. Essas comunidades são preditas pela teoria neutra, que considera que todas
as espécies possuem a mesma capacidade de utilizar os recursos e que sua ocorrência
depende de processos estocásticos. O pressuposto dessa teoria é de que as espécies são
ecologicamente equivalentes e que teriam chances iguais de sobreviver e reproduzir
(Hubbell 2001). Assim, o único processo que limitaria a ocorrência de uma espécie seria
a probabilidade de dispersão. Dessa forma, é esperado que comunidades mais próximas
geograficamente sejam mais similares simplesmente devido à menor probabilidade das
espécies colonizarem lugares distantes.
Os jardins de formigas são modelos de comunidades formados por um complexo
mutualismo, onde plantas epífitas são beneficiadas pela dispersão, nutrição e proteção
decorrente das associações com as formigas. Por outro lado, as raízes das epífitas
fornecem recursos alimentares e reforçam a estrutura do ninho (Hölldobler & Wilson
1990). Dentre as plantas epífitas conhecidas, apenas um pequeno número ocorre em
comunidades formadas nesses jardins. Estudos relataram que há uma seleção das
sementes pelas formigas devido a compostos atrativos, além de haver uma dinâmica de
facilitação no estabelecimento das epífitas (Lodi 2010). Dessa forma, não se sabe como
a comunidade de epífitas se organiza ao longo do tempo e do espaço.
Nosso objetivo foi avaliar qual processo estrutura as comunidades de epífitas dos
jardins de formigas. Nossas hipóteses são que i) as comunidades de epífitas são
estruturadas por sucessão, que ii) as comunidades de epífitas são estruturadas pelos
filtros ambientais e que iii) as comunidades de epífitas são estruturadas de forma
aleatória.
128
Métodos
Área e modelo de estudo
Realizamos esse estudo em uma área de floresta de terra firme na Reserva Km 41, do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (INPA/PDBFF), localizada a
cerca de 80 Km ao norte de Manaus (AM), na Amazônia Central (2o 24' S e 59o 44'). A
temperatura média anual da região é de 27 ºC e a precipitação é de cerca de 2.300 mm
por ano.
Os jardins de formiga consistem em agregados de epífitas reunidas por formigas
de diferentes espécies que vivem em parasimbiose (Davidson 1988). Na Amazônia
Central, os jardins são formados por duas espécies de formigas, Camponotus femuratus
(Formicinae) e Crematogaster levior (Myrmicinae) (Leal 2010). Indivíduos de
Crematogaster levior incorporam sementes de plantas epífitas às paredes dos seus
ninhos (Hölldobler & Wilson 1990). Quando essas sementes germinam, as raízes das
epífitas aumentam a estabilidade da colônia junto à planta suporte (Hölldobler &
Wilson 1990). Existem 16 espécies de plantas epífitas que ocorrem em associação a
esses ninhos (Jacovak 2006). Essas espécies apresentam sementes pequenas, frutos
suculentos e nectários florais e extraflorais.
Coleta de dados
Amostramos 18 jardins de formigas nas margens da estrada de acesso à Reserva Km 41.
Coletamos todas as espécies de epífitas presentes em cada jardim e classificamos em
morfotipos. Utilizamos a área dos jardins como um indicativo de sua idade, uma vez
que jardins de formigas recém formados são menores, aumentando sua área ao longo do
129
tempo. Calculamos a área dos jardins (AJ) pela fórmula da elipse (AJ= π*comprimento
do jardim*largura do jardim/4) (Jacovak 2006).
Para caracterizar as condições ambientais dos locais em que se encontram os
jardins, avaliamos três variáveis ambientais: i) disponibilidade de luz, ii) número de
ramificações utilizados para a sustentação do jardim e iii) altura do jardim em relação ao
solo. A disponibilidade de luz pode influenciar o estabelecimento de epífitas (Huston,
1995). O número de ramificações do forófito pode influenciar o formato e na estrutura
do jardim, que pode determinar a disponibilidade de microhabitats para as epífitas. A
altura dos jardins, por sua vez, pode alterar as condições microclimáticas nas quais eles
estão submetidos. Assim, jardins localizados mais próximos do solo estão sujeitos a
temperatura e umidade mais elevadas que aqueles mais altos. Portanto, esses três fatores
ambientais podem influenciar a composição de epífitas associadas aos jardins de
formigas e atuarem como filtros ecológicos nesse sistema. Medimos a disponibilidade
de luz com um esfero-densiômetro convexo próximo ao tronco da árvore suporte.
Calculamos a altura dos jardins com auxilio de fita métrica e quantificamos o número de
ramificações do forófito utilizado para a sustentação do jardim.
Para saber se as comunidades de epífitas são estruturadas de forma aleatória,
sendo limitadas apenas pela dispersão das espécies, medimos a distância geográfica
entre os jardins. Para os jardins localizados até 10 m, calculamos a distância com
auxílio de fita métrica. Para aqueles localizados a distâncias superiores a 10 m,
marcamos a coordenada geográfica de cada jardim utilizando um GPS e,
posteriormente, calculamos a distância entre eles.
130
Análise de dados
Para testar quais desses processos estruturam as comunidades de plantas epífitas
presentes nos jardins de formigas, calculamos uma matriz de similaridade de Sorensen
baseada na ocorrência de morfotipos das epífitas em cada jardim. Calculamos também
uma matriz para as diferenças das áreas entre jardins, uma para as diferenças das
variáveis ambientais padronizadas (i.e. os dados originais são divididos pelo maior valor
de cada variável ambiental) e outra para as diferenças das distâncias geográficas entre
os jardins de formigas. Relacionamos essas três matrizes, separadamente, com a matriz
de similaridade de morfotipos de epífitas. Testamos essas relações pelo teste de Mantel
com 999 permutações utilizando o pacote Vegan do software R (R Development Core
Team 2011).
Caso as comunidades de epífitas sejam estruturadas por sucessão, esperamos que
jardins com áreas similares apresentem composição florística similar. Caso sejam
estruturadas por pressão de filtros ambientais, esperamos que jardins com condições
ambientais similares apresentem composição florística similar. Por último, caso a
comunidade de epífitas dos jardins de formigas seja estruturada de forma aleatória,
esperamos que jardins mais próximos entre si sejam similares floristicamente.
Resultados
A área média dos jardins foi de 759,2 cm², variando de 42,5 a 2.409 cm². Em relação às
variáveis ambientais, a altura média dos jardins amostrados foi de 3,2±1,5 m
(média±desvio padrão), a luminosidade média foi de 87% ±0,09 e o número médio de
ramificações da árvore suporte utilizados para a sustentação do jardim foi de 2,3 (min-
máx=1-6). Quanto às relações entre as matrizes, não observamos relação entre a
similaridade de espécies de epífitas e as áreas dos jardins de formigas (r=-0,04; p=0,68;
131
Figura 1) e nem entre a similaridade florística e as variáveis ambientais dos jardins
(r=0,12; p=0,19; Figura 1B). Contudo, observamos que jardins mais próximos entre si
possuem maior similaridade de espécies de epífitas quando comparados aos jardins mais
distantes (r=-0,36; p=0,01; Figura 1C).
Figura 1. Relação entre similaridade de espécies de plantas epífitas em jardins de
formigas e A) diferença de área (∆ Área do ninho), B) diferença entre as variáveis
ambientais (∆ Variáveis ambientais) e C) diferença da distância (∆ Distância entre
ninhos) entre jardins de formiga na Amazônia Central.
132
Discussão
A idade dos jardins não é determinante na composição de epífitas associadas às
formigas. Assim, nossos resultados não suportam as conclusões de Davidson (1988), de
que há um processo de facilitação no estabelecimento de epífitas associadas aos jardins
de formigas ao longo do tempo. Da mesma maneira, variáveis ambientais não atuam
como filtros nas comunidades de epífitas, provavelmente devido à oferta não limitante
de recursos, como luminosidade e áreas para construção de ninho. Ambientes com
grande oferta de recursos possibilitam a co-ocorrência de mais espécies, o que não
limitou a distribuição de epífitas associadas aos jardins. Desse modo, neste sistema não
há um padrão recorrente de abundância de espécies no tempo e no espaço.
Por outro lado, a composição de morfotipos de epífitas foi mais similar entre
jardins próximos. Essa maior similaridade pode ser devido à maior chance de formigas
removerem sementes de epífitas de jardins próximos, simplesmente por questões
probabilísticas. As sementes de epífitas são levadas para os jardins por C. levior ao
longo da sua construção. Essas formigas apresentam área de forrageio restrita às
imediações dos jardins, havendo maior probabilidade de que coletem recursos em áreas
próximas aos seus ninhos. Dessa forma, jardins de formigas próximos atuam como
fonte de sementes de epífitas que podem ser incorporadas aos demais jardins pelas
formigas. Como as espécies de epífitas que ocorrem em jardins de formigas não são
encontradas fora deles (Lodi 2010), outros jardins mais próximos devem, de fato, ser as
únicas fontes de sementes disponíveis para a colonização de jardins.
Sendo assim, a proximidade entre jardins é um fator determinante na
composição de espécies de epífitas nessas comunidades. Formigas devem usar as
sementes de epífitas disponíveis nos jardins mais próximos, não havendo seleção de
espécies que serão incorporadas aos ninhos.
133
Referências
Begon, M., J.L. Harper & C.R. Townsend. 1990. Ecology: individuals, populations and
communities. London: Blackwell, Scientific publications.
Davidson, D.W. 1988. Ecological-studies of Neotropical ant gardens. Ecology, 69:1138-
1152.
Emlen, J.M. 1977. Ecology: an evolutionary approach. Massachusetts: Addison-Wesley
Reading.
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Heidelberg.
Horn, H.S. 1974. The ecology of secondary succession. Annual Review of Ecology and
Systematics, 5:25-37.
Hubbell, S.P. 2001. The unified neutral theory of biodiversity and biogeography. New
Jersey: Princeton University Press.
Huston, M.A. 1995. Biological diversity: The coexistence of species on changing
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Jacovak, A.C.C. 2006. Jardins suspensos da Amazônia: composição florística e
sucessão de espécies em jardins de formiga. In: Livro do curso de Ecologia
Amazônica (J.L. Camargo, P.E. Peixoto & P.E. Bobrowiec, eds). Manaus: INPA-
PDBFF.
Leal, L.C. 2010. Camponotus femuratus (Formicidae: Myrmicinae) recruta operárias em
resposta a compostos voláteis das epífitas em jardins de formigas. In: Livro do
curso de Ecologia Amazônica (J.L. Camargo, P.E.C. Peixoto & P.E.D.
Bobrowiec, eds). Manaus: INPA-PDBFF.
134
Lodi, S. 2010. Aninhamento em jardins de formigas. In: Livro do curso de Ecologia
Amazônica (J.L. Camargo, P.E. Peixoto & P.E. Bobrowiec, eds). Manaus: INPA-
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R Development Core Team. 2011. R: A language and environment for statistical
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Ribeiro, S., M. Borges, M. Leite, & T. Postali. 2007. Dissimilaridade florística em
relação a distâncias espaciais em Melastomataceae. In: Livro do curso de Ecologia
Amazônica (G. Machado & J.L. Camargo. eds). Manaus: INPA-PDBFF.
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Silvertown, J. 2004. Plant coexistence and the niche. TREE, 19: 605-611.
135
Km 41 – projetos individuais
Formigas cortadeiras não alteram o recrutamento de plantas ao redor do ninho em
uma área de vegetação secundária na Amazônia Central
Ana Yoko Ykeuti Meiga
Introdução
Herbívoros são considerados espécies-chave para o ecossistema, pois podem alterar o
crescimento e sobrevivência de plantas (Fowler et al. 1989). A densidade de plantas
pode ser afetada por esses organismos de forma direta, através do consumo de tecidos
foliares por herbívoros, reduzindo o crescimento e a sobrevivência dessas plantas. De
forma indireta, os herbívoros modificam as condições abióticas do ambiente, pois ao
cortar as folhas das plantas criam pequenas aberturas no dossel que podem afetar a
germinação e o estabelecimento de plantas (Crawley 1983).
As formigas cortadeiras (Hymenoptera: Formicidae) são herbívoros generalistas
que incluem uma grande variedade de plantas em sua dieta. Essas formigas podem
remover até 50% das espécies de plantas dentro de sua área de forrageio (Fowler et al.
1989). Ao cortar as folhas, as formigas exercem uma forte pressão de herbivoria sobre
plantas que estão dentro de sua área de forrageio, o que leva à redução do recrutamento
de plantas nesses locais (Farji-Brener & Illes 2000, Bieber et al. 2010, Corrêa et al.
2010). Essa pressão pode ser maior em áreas próximas dos ninhos uma vez que as
formigas possuem forrageio do tipo central, sempre saindo dos ninhos para forragear e
retornando para este mesmo ponto em seguida (L.C. Leal com. pess.). Como
consequência, o recrutamento de plantas pode ser 40% menor em áreas próximas dos
ninhos que em locais aleatórios (Corrêa et al. 2010).
136
Tecidos foliares são os principais itens coletados por formigas cortadeiras
(Wirth et al. 2003). As formigas utilizam tecidos foliares como substrato para o cultivo
de fungos dos quais se alimentam (Farji-Brener & Illes 2000). Plantas pioneiras, folhas
jovens e/ou com baixo teor de água são preferidas por estas formigas (Rockwood &
Glander 1979, Meyer et al. 2006). Plantas pioneiras possuem alto investimento em
crescimento vegetativo. Como consequência, alocam poucos recursos para defesa contra
herbívoros, o que faz com que essas plantas sejam mais palatáveis para formigas
(Hubbel & Wiemer 1983, Urbas 2004). Folhas jovens são menos espessas quando
comparadas com folhas maduras. Essas folhas possuem menores concentrações de
lignina e carboidratos, o que aumenta a qualidade nutricional da folha (Feeny 1970,
1976). Além disso, folhas jovens são mais finas o que facilita o corte pelas formigas
(Waller 1982 a, b). Folhas com baixo teor de água aumentam a concentração de solutos
nas folhas, e consequentemente, sua qualidade nutricional para herbívoros (Vasconcelos
& Cherrett 1996, Meyer et al. 2006). Plantas com essas características devem ser mais
consumidas pelas formigas cortadeiras, o que reduz a representatividade de plantas com
essas características em áreas próximas dos formigueiros.
Neste contexto, as perguntas deste trabalho foram: (1) qual a influência da
distância dos ninhos de formigas cortadeiras no recrutamento de plantas? (2) como
atributos foliares podem afetar o recrutamento de plantas nos ninhos de formigas
cortadeiras? Minhas hipóteses são que o recrutamento de plantas é maior em áreas mais
distantes do ninho e que plantas mais difíceis de serem cortadas recrutam em áreas mais
próximas do ninho.
137
Métodos
Área de estudo
O estudo foi realizado na Fazenda Esteio (02º24’S e 59º44’O), na Área de Relevante
Interesse Ecológico (ARIE-PDBFF), co-gerida pelo “Projeto Dinâmica Biológica de
Fragmentos Florestais” (INPA/Smiththsonian Institute), localizada na Amazônia
Central, Amazonas, Brasil. A reserva é composta por floresta primária de terra firme,
abrangendo aproximadamente 10.000 ha. A temperatura média anual é de 26,7 ºC, com
precipitação média anual de 2.186 mm.
Coleta de dados
Selecionei 15 ninhos de formigas cortadeiras do gênero Atta, próximos da borda da
capoeira com a estrada ZF3 (Zona Franca 3). Os ninhos distavam no mínimo 10 m entre
si e estavam entre 1 e 5 m da borda. Em cada ninho, amostrei três parcelas de 1 m2
distantes 0, 3 e 6 m do ninho. Coloquei as parcelas sempre paralelas à estrada para ter o
mesmo efeito da borda em todas as parcelas. Quantifiquei o número total de plantas
dentro de cada parcela. Gramíneas e plantas maiores de 1 m de altura não foram
incluídas na amostragem. Como atributo de espessura da folha, considerei a massa
foliar específica no qual quanto maior a massa foliar mais espessa é a folha. Para avaliar
a massa foliar específica das plantas, coletei uma folha de três plantas de cada parcela.
A massa foliar específica foi calculada através da média do peso (g)/ área foliar (cm2).
Análise estatística
Realizei um teste de ANOVA em blocos, onde cada ninho foi considerado um bloco e
as distâncias foram os tratamentos. Minhas previsões são que a densidade de plantas
138
será maior em parcelas mais distantes do ninho das formigas cortadeiras e que plantas
com maior área foliar específica estarão recrutando mais próximas dos ninhos de
formigas cortadeiras.
Resultados
No total de 15 ninhos amostrados, coletei 45 indivíduos, com média de 4,4 ± 3,6 (±
desvio padrão) plantas por parcela. A densidade de plantas não aumentou em função da
distância do ninho de Atta spp. (F(2,28)=2,30; p=0,12; Figura 1).
Figura 1. Densidade de plantas recrutadas a diferentes distâncias de ninhos de formigas
cortadeiras, na Amazônia Central, Brasil. Os pontos indicam as médias e as barras
indicam o intervalo de confiança a 95%.
A massa foliar específica foi de 0,016 g/cm2 (min; máx = 0,0; 0,21 g/cm2). A
massa foliar específica das plantas não variou entre as diferentes distâncias para os
ninhos de formigas cortadeiras. (F(2, 18)=1,12; p=0,3; Figura 2).
139
Figura 2. Massa foliar de plantas localizadas a diferentes distâncias dos ninhos de
formigas cortadeiras, Amazônia Central, Brasil. Os pontos indicam a média e as barras
indicam o intervalo de confiança a 95%.
Discussão
O recrutamento das plantas não aumenta de acordo com a distância dos ninhos,
provavelmente porque as formigas cortadeiras continuam exercendo a mesma pressão
de herbivoria mesmo em diferentes distâncias do ninho. Dentro da sua área de forrageio,
formigas estão consumindo folhas independente da sua espessura, uma vez que plantas
com folhas mais espessas não estão recrutando em áreas próximas ao ninho.
Como o trabalho foi desenvolvido em uma área de borda, onde há maior
predominância de plantas pioneiras, é possível que as formigas estejam utilizando todas
as espécies que elas encontram dentro da sua área de forrageio. Plantas pioneiras são
preferencialmente coletadas por formigas cortadeiras, por possuírem menor defesa
contra herbívoros (Hubbel & Wiemer 1983, Howard & Wiemer 1986, Urbas 2004).
Além disso, estas plantas apresentam baixa variabilidade nos atributos foliares, o que
faz com que as formigas não precisem selecionar plantas com atributos foliares
140
específicos. Dessa forma, a área sob influência das formigas cortadeiras em bordas
florestais podem ser maiores que o encontrado em florestas maduras, reduzindo o
recrutamento de plantas, mesmo que estas estejam distantes dos ninhos.
Diferente do encontrado neste trabalho, Corrêa et al. (2010) observaram que em
áreas de floresta madura localizadas no interior de fragmentos de Mata Atlântica, os
ninhos de formigas cortadeiras e seus arredores apresentam baixa densidade de plantas.
Porém, eles observaram que a densidade de plantas aumenta gradualmente com a
distância dos ninhos. Em áreas de florestas maduras, plantas pioneiras reduzem sua
representatividade, dividindo espaço com plantas de estágio tardio de regeneração,
tolerantes a sombra. Estas plantas são menos palatáveis para as formigas, por
apresentarem grande quantidade de compostos secundários de defesa contra herbivoria,
como os taninos. Sendo assim, formigas devem concentrar seus esforços de coletas
sobre algumas espécies de plantas pioneiras de floresta madura, que são mais palatáveis.
Como consequência, plantas tolerantes a sombra, comuns em áreas de floresta madura,
conseguem escapar da pressão de consumo desses herbívoros e recrutar em áreas mais
distantes dos ninhos.
Desta forma, a área sob influência dos ninhos de formigas cortadeiras pode ser
mais ampla em áreas de borda, o que afeta o recrutamento de plantas em áreas mais
distantes dos ninhos. Como consequência, estas formigas podem atuar como agentes
amplificadores dos distúrbios causados pela abertura das bordas florestais, impedindo a
regeneração da vegetação em áreas sob influência dos seus ninhos.
Agradecimentos
Gostaria de agradecer à organização do “Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos
Florestais” (PDBFF) e da “Ecologia da Floresta Amazônica” (EFA), pela oportunidade
141
de participar do curso. A todos os coordenadores, professores e monitoras, em especial a
Paulo Enrique, pela discussão nas idéias iniciais. À Laura Leal e Manô Borges, por me
acompanharem na coleta de dados. Paulo Bobrowiec e Laura (novamente) pelas
correções e pela paciência no decorrer do projeto. À Talita Câmara e Tiago Belisário
pela ajuda na triagem do material coletado e as longas discussões sobre os resultados
deste trabalho, à Karlinha Campião e Carla Madelaire pelas revisões. E por fim, a todos
os funcionários e colegas do “EFA 2011” pelos momentos inesquecíveis e de agradável
convívio e apoio.
Referências
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reprodutivo de espécies arbustivo-arbóreas da Floresta Atlântica Nordestina. Tese
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145
Teias com maior quantidade de recurso podem fazer com que aranhas evitem
fugir quando são ameaçadas por um estímulo do predador?
Camilla Pagotto
Introdução
Os organismos possuem estratégias de defesa que variam de acordo com o contexto
ambiental em que vivem (Begon et al. 2006). Diferentes tipos de predadores, por
exemplo, induzem estratégias de defesa distintas em uma mesma presa (Gullan &
Grascon 2005), como alterações no uso de comportamentos crípticos em resposta a
presença de predadores com caça ativa ou com caça do tipo senta-e-espera (Blois-
Heulin et al. 1990).
A fuga, em particular, também pode ser considerada como uma forma de defesa.
No entanto, essa estratégia pode estar associada a um deslocamento por distâncias
relativamente longas e altas velocidades o que pode resultar num alto custo energético
(Krebs & Davies 1993). Isso pode ser agravado quando o organismo tem que abandonar
seu território ou recurso alimentar, visto que ele pode perdê-los para organismos
competidores (Krebs & Davies 1993). Nesse caso, os organismos podem ser mais
resistentes à fuga.
Uma das estratégias de fuga em aranhas que constroem teias é de se atirar da teia
(Vieira et al. 2007). Além disso, algumas espécies utilizam uma estratégia adicional que
consiste em se debater rapidamente. Isso parece ser um comportamento relacionado à
evitação de parasitóides (Resh & Cardé 2003). Assim, quando expostas a um predador
em potencial, indivíduos de algumas espécies de aranhas podem optar por adotar uma
estratégia de defesa que envolva a permanência na teia ou abandono temporário dela.
146
Para as aranhas, o abandono da teia pode representar um comportamento mais
eficiente do que o comportamento de se debater já que a fuga impede que o parasitóide
se aproxime para capturá-las. Por outro lado, o abandono da teia demanda um alto custo
energético no seu deslocamento, além de aumentar as chances de perder a teia e o
recurso alimentar nela estocado (Vieira et al. 2007). Portanto, é razoável supor que teias
que possuem maior quantidade de presas devem reduzir a motivação de abandono pelas
aranhas frente a uma ameaça de predação. Diante disso, tenho como hipótese que o
aumento do valor da teia devido à quantidade de alimento reduz a propensão da aranha
fugir quando há ameaça de predação. As predições associadas a essa hipótese são de
que, com estímulo mecânico no dorso da aranha, simulando um predador (1) a
freqüência de abandono das teias pelas aranhas será menor quando as teias possuírem
recursos alimentares em relação a teias sem recurso e que (2) o tempo de abandono das
teias pelas aranhas será maior na presença do recurso alimentar do que nas teias sem
recurso.
Métodos
Área de estudo
Realizei o estudo em uma floresta tropical úmida de terra firme, no km 41 que faz parte
de um conjunto de polígonos da Área de Relevante Interesse Ecológico PDBFF (Projeto
Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais) localizada a 80 km de Manaus, AM,
Brasil. De acordo com a classificação de Köppen (Peel et al. 2007), o clima da região é
do tipo tropical úmido, com temperatura média de 26,7 °C e precipitação anual média
de 2600 mm (Bierregaard et al. 2001).
147
Organismo modelo
Utilizei como modelo de hospedeiro, uma espécie de aranha que constrói teias
tridimensionais e é muito comum próxima ao solo da floresta. Essas aranhas são
vermelhas com pernas de coloração vermelha e preta, sem espinhos aparentes. As teias
são construídas aproximadamente a 30 cm do solo. A parte da teia mais distante do solo
é composta por uma malha de fios de seda transpassados em várias direções e
interligados à vegetação. Essa região forma uma superfície curva, com a parte convexa
voltada para o dossel. Essas aranhas posicionam-se na parte inferior da superfície
convexa e podem ser encontradas em teias agrupadas ou solitárias.
Coleta de dados
Selecionei por inspeção visual 30 teias com aranhas solitárias. Em 15 teias ofereci
cupins como recurso, sendo que em cada teia coloquei quatro cupins. Nessas teias que
correspondem ao tratamento com recurso (CR), esperei que as aranhas envolvessem os
cupins nos fios de seda e antes de consumi-los, simulei um ataque do parasitóide usando
uma pinça. Para isso, encostei a ponta da pinça recorrentemente na parte dorsal da
aranha. Induzi esses estímulos ininterruptamente em cada indivíduo por 60 s. Durante a
simulação, tomei cuidado para que a teia não fosse danificada, o que poderia interferir
na resposta das aranhas. No tratamento sem recurso (SR), realizei o estímulo da mesma
maneira, como descrito anteriormente, no entanto sem a oferta prévia de cupins.
Para avaliar a freqüência de abandono das teias com e sem recurso pelas aranhas
usei o teste de qui-quadrado. Para investigar se houve diferença no tempo de abandono
da teia com e sem o recurso, utilizei o teste t.
148
Resultados
Nos dois tratamentos, todas as aranhas adotaram o comportamento de se debater logo
após o início do estímulo, sendo que nenhuma aranha fugiu para a vegetação antes de
realizar esse comportamento. A freqüência de abandono da teia não diferiu entre as
aranhas. A porcentagem de abandono foi de 42% para as teias com recurso e 58% para
teias sem recurso. O tempo de abandono da teia na presença do recurso alimentar foi 15
vezes maior do que o tempo de abandono no tratamento (t=1,77; gl=28; p=0,04; Figura
1). O tempo médio de abandono no tratamento sem o recurso foi de 47 ±18,7 s
(média±desvio padrão) e no tratamento sem recurso foi de 33 ±26,2 s .
CR SR
Tratamento
0
10
20
30
40
50
60
70
Tem
po a
té o
aba
ndon
o da
tei
a (s
)
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Figura 1. Tempo de abandono (s) da teia por indivíduos de uma espécie de aranha na
presença (CR) ou ausência (SR) do recurso alimentar na teia. Os indivíduos estavam
localizados na ARIE PDBFF, Manaus, Brasil
149
Discussão
A semelhança na freqüência de abandono de teias, com ou sem recurso, indica que a
presença do recurso não afeta a chance da aranha abandonar a teia. No que diz respeito
aos resultados sobre o tempo de abandono da teia, o recurso parece ser um fator
relevante nessa decisão. O abandono da teia e conseqüentemente do recurso pode ter um
custo associado à sua perda justificando o maior tempo até o abandono da teia pela
aranha.
Uma vez que aranhas que constroem teias dependem exclusivamente de presas
interceptadas para se alimentar, é possível que elas passem por períodos longos de
inanição (Wise 1993, apud Vieira et al. 2007). Nesse sentido, a decisão de abandonar o
alimento pode estar relacionada a um custo excessivamente alto, justificando o maior
período de exposição a um possível predador.
Demorar mais para sair, necessariamente aumenta a exposição aos predadores.
Portanto deve haver algum mecanismo de compensação que tenha possibilitado a
evolução da maior permanência quando há mais alimento. Eventualmente o aumento do
risco de predação não seja tão alto quanto os benefícios associados à retenção de mais
recursos (Verbolin 2006). Por outro lado, a quantidade de recursos alimentares nas teias
poderia então, ser um indicativo ao parasitóide de que a chance de sucesso em parasitar
essas aranhas pode ser maior.
Os dois comportamentos de fuga parecem ser ajustáveis de acordo com o
contexto. Da mesma maneira que predadores diferentes induzem comportamentos
diferentes em uma mesma presa (Wellborn et al. 1996), o mesmo pode ocorrer na
presença de maior quantidade de recursos frente a um mesmo predador. A maior
quantidade de recursos torna o local de forrageio mais valioso, levando a presa a se
arriscar mais em função do ganho potencial caso ela sobreviva à predação.
150
Agradecimentos
Gostaria de agradecer à coordenação do EFA, pela oportunidade única e indescritível de
participar de um curso como esse. A todas as pessoas envolvidas na logística desse
curso, incluindo à Adriane, que com prontidão atendia todas as minhas ligações e e-
mails. Ao Zé por me dar as boas vindas de coração aberto, apostando que essa chance
não seria perdida pra mim. Ao Paulinho “sempre” Rainbow pelo grande incentivo, por
me fazer aprender que com toda humildade, simplicidade, preocupação e carinho que
jamais vi em um professor. Ao Paulinho Mau (depois dos cachorros, entendi o pq do
mau... rs) pelas excelentes conversas, que me ensinou a curtir cada momento, sem cair
no vício de querer chegar logo lá, pela ajuda mais que valiosa para realizar o trabalho
individual e por me animar em todos os momentos que ficou pesado. À Bonitora Laura,
pelas boas conversas, por todo carinho, atenção, incentivo e abraços doces! À Bonitora
Ursinho, pelo montão de coisas que aprendi, por ensinar com as atitudes, pela paciência
e pelas excelentes conversas. Muito obrigada à todos EFAnos 2011, pelo aprendizado,
pela excelente convivência, pelas risadas incríveis e pelas piadas “sempre muito
apropriadas”. Á Formiga Atômica, pelas bons momentos de dança. Ao Ninfobaby e
Coceirinha pela paciência e bons momentos em campo. Ao Tio Sukita e Marilaqui, por
animar incessantemente esse curso. À Ana Fofa, super companheira em Manaus. Ao
Dionewalker, pelas boas histórias. Ao Drag, pelas danças, conversas e por nunca ficar
bravo com a zueira. Ao Daniel, pelo voto de confiança e pelo incentivo durante o
trabalho individual. A Fofucha, pelas palavras fofas e pelo cuidado com as pessoas. A
Maria Laura Golfinho, pelos abraços mais energizantes, pela calma e serenidade. Ao
Guilherme pelos excelentes momentos que compartilhamos, pelos segredos e pelo
carinho incrível. Ao Fernando, um bom par de dança, uma pessoa muito gentil de lidar.
A Dani, pela grande felicidade de trabalhar junto. Ao Matrix, pelos paieros que vinham
151
junto com as conversas “mais trabalhadas” na metafísica possível. Ao Fred Mercury,
pela baita ajuda no projeto individual. A Skol, por além de me ensinar um monte, pela
felicidade em ganhar uma amiga incrível e mega companheira nas besteiras (tooodas
elas). Ao Inácio, por entrar na minha vida de uma maneira linda, deixando comigo
muitas lembranças boas. A Missfrega, pelo carinho, amizade, cumplicidade e incentivo
e pelos trabalhos deliciosos que fizemos juntas. Ao Seu Cardoso, pela ajuda e paciência.
A Dona Eduarda pelo rango delicioso e ao Bebezão por se preocupar e cuidar da gente.
Para finalizar, a todos os professores que contribuíram com o nosso avanço: Bráulio,
Fabrício, Ana, Rafael, Adriano, Jansen, Inara, Lorenzo, Elder, Cíntia e especialmente ao
Marcelo Taberelli, pelo incentivo, humildade e por me ensinar como um bom cientista
deve transitar entre genes e ecossistemas.
Referências
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ecossystems. Victoria: Blackwell Publishing.
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153
Preto no branco: Por que camarões (Crustacea) de água doce apresentam
diferentes colorações?
Carla Bonetti Madelaire
Introdução
O motivo dos organismos selecionarem os ambientes onde vivem envolve um conjunto
de fatores abióticos e bióticos. A teoria da seleção de habitat afirma que entre os
mecanismos envolvidos na escolha de um ambiente estão as restrições fisiológicas de
cada indivíduo, a distribuição dos recursos e as relações interespecíficas, como a
predação (Morris 2003). Tais mecanismos podem atuar como pressão seletiva sobre o
comportamento e, em alguns casos, sobre a morfologia dos animais (Endler 1991; Lima
1998). Por sua vez, esses dois atributos são importantes na determinação de ocupação
de microhabitat (Sih 1982).
A ocupação de microhabitats pelos macroinvertebrados em ambientes de lagos e
poças, por exemplo, pode ser afetada pela predação por peixes (Cook & Streams 1984).
Por outro lado, o sucesso desses predadores depende, dentre outros fatores, do tempo de
resposta da presa. Em ambientes aquáticos, tal tempo de resposta é frequentemente
determinado pelo tamanho, contraste no substrato e movimentação da presa (Ware
1973). A importância da camuflagem de presas no substrato já foi demonstrada para
vários grupos (Edmunds 1974; McFall-Ngai 1990). Um dos exemplos mais bem
documentados são os experimentos de predação realizados com hemípteros aquáticos do
gênero Notonecta. Estes organismos podem apresentar diferentes níveis de melanização,
que podem variar desde coloração esbranquiçada que contrastam no substrato escuro,
até indivíduos altamente melânicos, que são mais visíveis em um substrato claro (Cook
& Streams 1984). Quanto à movimentação da presa, já foi observado para
154
macroinvertebrados que quanto mais o animal se movimenta, mais rápido o predador o
localiza (McPeek 1990). Além disso, a movimentação implica em um alto custo
energético. Portanto, a presa tende a não fugir imediatamente, e nem por longas
distâncias, após a detecção do predador (Healey 1984), principalmente se o animal
encontra-se bem camuflado no ambiente.
Camarões ou pitús (Crustacea) de ambientes dulcícolas apresentam diferentes
tipos de coloração que parecem estar relacionados a um padrão de camuflagem, visto
que podem ser predados por peixes (Vidalenc et al. 1999), ou até mesmo por aves (Sick
1997) e mamíferos (Emmons & Feer 1997). Tal padrão de coloração pode variar em
tonalidades desde translúcido até altamente melanizado (observação pessoal). Pode-se
ressaltar que o ambiente que esses animais ocupam na Amazônia Central (igarapés e
poças adjacentes) é dotado de grande variedade de habitats (Mortatti 2004). Dentre
estes, destacam-se as extensas áreas cobertas por areia branca e os densos bancos de
folhiço submersos (substrato caracteristicamente de coloração marrom escuro). Nesse
sentido, os padrões de coloração dos camarões de igarapés e poças devem estar
relacionados ao uso de diferentes substratos, supostamente adequados à camuflagem
contra predadores.
Considerando que a coloração dos animais pode estar relacionada com o tipo de
ambiente que esses organismos exploram, minha hipótese é que camarões de diferentes
colorações escolhem um substrato mais vantajoso quanto à camuflagem, mediante à
exposição de diferentes habitats. Além disso, esses animais teriam respostas
antipredatórias diferenciais de acordo com o ambiente. Minha expectativa é que
camarões claros, quando expostos aos dois ambientes, escolham o substrato de areia,
enquanto camarões escuros escolham substrato de folhiço. Também espero que, quando
submetidos à perturbação por um predador potencial, camarões claros se desloquem por
155
distâncias menores em substrato de areia e por distâncias maiores em substrato de
folhiço. Por outro lado, camarões escuros se deslocariam por distâncias menores em
substrato de folhiço e por distâncias maiores em substrato de areia.
Métodos
A área de estudo é uma floresta de terra firme, localizada na Reserva do Km 41(2°26´S,
59°45´O) 80 km ao norte de Manaus, Amazonas, Brasil. A reserva é considerada uma
Área de Relevância e Interesse Ecológico (ARIE) e é co-gerida pelo Projeto Dinâmica
Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF). Coletei os camarões de diferentes
colorações, tamanhos e morfotipos com uma peneira, em áreas marginais de um
igarapé. Acondicionei os animais em um saco plástico com água e folhiço até o horário
do experimento.
Para realização do experimento de seleção de habitat utilizei sete bandejas
(30cm x 54cm x 10cm), onde simulei o ambiente natural dos igarapés. Cada bandeja foi
dividida em duas partes iguais e cada parte foi preenchida com um substrato diferente:
areia e folhiço. O volume das bandejas foi completado com água. Cada animal foi
colocado individualmente no meio da bandeja, entre os dois ambientes. Após 30
minutos de aclimatação, observei qual dos ambientes o animal escolheu permanecer.
Anotei a cor do indivíduo (claro ou escuro) e qual ambiente ele escolheu (areia ou
folhiço). Este experimento foi feito com 44 indivíduos, classificados visualmente
quanto à coloração em claro (N = 24) e escuro (N = 20).
Realizei um segundo experimento para estimar a distância de fuga. Para isso,
utilizei duas bandejas (30cm x 54cm x 10cm): uma preenchida totalmente com areia e
outra com substrato de folhiço. Os animais eram colocados individualmente na bandeja
com areia, depois eram trocados para a bandeja com folhiço. Em cada bandeja, eu
156
aproximava meu dedo da parte posterior do animal, simulando a aproximação de um
predador. Em seguida, medi com uma trena a distância que cada indivíduo se deslocava.
Este experimento foi feito com 30 indivíduos, classificados visualmente quanto à
coloração em claro (N = 15) e escuro (N = 15). Os dois experimentos foram realizados
em ambiente sombreado, com animais recém coletados e no mesmo período do dia
(tarde). Não houve variação na coloração de cada animal ao longo dos experimentos.
Para testar se houve escolha de ambiente pelos camarões de diferentes
colorações, utilizei o teste qui-quadrado. Para testar se os animais apresentavam
distâncias de fuga diferentes de acordo com sua coloração e substrato em que estavam
expostos, utilizei uma análise de variância (ANOVA) de dois fatores. Os valores de
distâncias de fuga não estavam distribuídos normalmente. Assim, transformei os dados
em log10 antes de realizar a análise estatística. Todos os testes foram realizados no
programa STATISTICA 7.0 Stat Soft, Inc. 2004, e o nível de significância adotado foi
de 5%.
Resultados
Camarões claros e escuros utilizaram o ambiente de forma diferente (χ² = 9,47; gl = 1; p
= 0,003). Indivíduos de coloração clara apresentaram freqüências de escolha muito
parecidas entre os substratos, selecionando 46 % das vezes o folhiço, e 54% a areia. Por
outro lado, dos 20 camarões escuros observados, 90% selecionaram o substrato de
folhiço. Quanto ao experimento de distância de fuga frente ao estímulo de predação, não
houve diferença no deslocamento para ambos os tipos de camarão, nos dois habitats
(F(1,28)=1,46; p=0,23; Figura 1).
157
AREIA FOLHIÇO0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1,0
1,1
1,2
1,3
Log
10 d
a di
stân
cia
de f
uga
(cm
)
Figura 1. Distância de fuga de camarões claros e escuros em ambientes de areia e
folhiço. Legenda: média da distância de fuga do camarão claro; média da
distância de fuga do camarão escuro; as barras verticais representam o intervalo de
confiança de 95%.
Discussão
Os camarões claros não apresentaram preferência na escolha de substrato,
provavelmente porque tanto no fundo claro, quanto no escuro os indivíduos não
apresentam contraste pronunciado. E é justamente por não apresentar contraste em
nenhum dos substratos, que os animais podem escolher tanto a areia como o folhiço
como habitat e abrigo. A coloração translúcida associada à camuflagem já foi observada
para outros camarões e peixes em igarapés da Amazônia (Carvalho et al. 2006), sendo
tal registro interpretado como um padrão morfológico de convergência evolutiva entre
esses dois grupos. Essa característica possibilita o uso eficiente de um amplo espectro
de habitats dentro do igarapé (Carvalho et al. 2006). O pitú melanizado, por outro lado,
ocupou quase exclusivamente o substrato de folhiço. Isso porque o animal melanizado
158
apresenta um contraste muito mais pronunciado no substrato de areia do que no
substrato de folhiço. Assim, os camarões escuros provavelmente ficam limitados a
explorar as margens do igarapé e poças adjacentes, onde os bancos de folhiço são
abundantes.
Não foram observadas diferenças na distância de fuga dos camarões em função
da coloração do animal. Isso parece indicar que mesmo possuindo padrões de
camuflagem, a fuga deve ser a solução mais vantajosa a partir de determinado ponto de
aproximação de estímulo predatório. No ambiente aquático, a taxa de movimentação de
um organismo é um indicador do risco de predação. Assim, animais que habitam locais
com menor pressão predatória podem ter maiores taxas de movimentação, tanto para
fuga quanto na busca por recursos. Por outro lado, animais expostos a ambientes com
forte pressão predatória têm vantagem ao adotarem a estratégia de menor taxa de
movimentação (Wellborn et al. 1996). Vidalenc et al. (1999) estudou a dieta de duas
espécies de peixes de igarapé no mesmo local deste estudo e descreveu que os camarões
integram apenas 10% da dieta desses animais. Nesse sentido, os resultados
experimentais de distância de fuga encontrados no presente estudo podem indicar que a
pressão de predação no ambiente natural não seja intensa o suficiente para alterar o
comportamento de resposta antipredatória.
Os diferentes usos de habitats por camarões de diferentes colorações pode
indicar que esses organismos detectam e ajustam sua localização espacial de forma a
evitar que predadores orientados visualmente os encontrem. Além disso, padrões de
camuflagem que abrangem maior número substratos, como o padrão translúcido,
poderiam ser mais vantajosas em termos de exploração de uma ampla gama de habitat.
Abordagens experimentais, como a realizada neste estudo, geram interessantes
questionamentos a serem testados em ambiente natural. Futuros estudos contemplando o
159
uso de microhabitat in situ por camarões com diferentes padrões de coloração podem
corroborar o presente experimento e esclarecerem questões ainda mais amplas sobre a
distribuição espacial desses organismos.
Agradecimentos
À coordenação do EFA, por me dar essa oportunidade única e inesquecível de
aprendizado e troca de experiências em plena Floresta Amazônica Central.
Aos meus mais novos amigos de infância, os EFAnos guerreiros que durante esta longa
jornada me fizeram crescer e amadurecer em sentido acadêmico e pessoal. Espero
também ter contribuído na formação de vocês.
Aos professores e monitoras, que também contribuíram sobremaneira para minha
formação.
Ao seu Jorge e Dona Eduarda pelos comes e bebes memoráveis.
Ao Rafael Leitão e Manô, pelas contribuições excelentes para este manuscrito.
Especialmente, sou grata a Misstrago (Camilla), Garota fantástico (Inácio), Paulinho
bom, Paulinho mau e Manô por nossas conversas sérias e de bobagens que foram
sempre encorajadoras e muito divertidas. Guardarei vocês para sempre na mente e
coração.
Referências
Carvalho, L.N., J. Zuanon & I. Sazima. 2006. The almost invisible league: crypsis and
association between minute fishes and shrimps as a possible defence against
visually hunting predators Neotropical Ichthyology, 4(2):219-224.
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Cook, W.L. & F.A. Streams. 1984. Fish Predation on Notonecta (Hemiptera):
Relationship between Prey Risk and Habitat Utilization. Oecologia, 64(2): 177-
183.
Edmunds, M. 1974. Why are there good and poor mimics? Biological Journal of the
Linnean Society, 70: 459-466.
Emmons, L.H. & F. Feer. 1997. Neotropical rainforest mammals, a field guide.
Chicago: The University of Chicago Press.
Endler, J.A. 1991. Variation in the appearance of guppy color patterns to guppies and
their predators under different visual conditions. Vision research, 31(3): 587-
608.
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influencing differential vulnerability to predators, Ecology 71:1714–26
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Oecologia, 136:1–13.
Mortatti, A.F. 2004. Colonização por peixes no folhiço submerso: implicações das
mudanças na cobertura florestal sobre a dinâmica da ictiofauna de igarapé de
terra firme, na Amazônia Central. Dissertação de Mestrado, INPA/UA, Manaus.
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Vidalenc, D., M.G. Soares, J.M. Perez & L. Naka. 1999. Dieta e comportamento
alimentar de duas espécies de peixes insetívoros de um igarapé da Amazônia
Central. pp. 83-84. In: Ecologia da floresta amazônica. (J. Zuanon, ed.) Manaus:
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Ware, D.M. 1973. Risk of epibenthic prey to predation by rainbow trout (Salmo
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Wellborn, G.A., D.K. Skelly & E.E. Werner. 1996. Mechanisms creating community
structure across a freshwater habitat gradient. Annual Revision Ecololy
Systematic, 27: 337–363.
162
Aranhas “vermelhas” se agrupam para comer mais?
Daniel Irineu de Souza Dainezi
Introdução
Artrópodes como abelhas, cupins, afídeos, besouros, camarões e aranhas podem
apresentar algum nível de organização social com o objetivo de aumentar a proteção dos
indivíduos, melhorar as chances de forrageamento ou aumentar o sucesso reprodutivo
(Wilson 1971, Alexander 1974, Gullan & Cranston 2005, Whitehouse & Lubin 2005,
D’Ettorre 2007). Para atingir um desses objetivos, os indivíduos podem cooperar uns
com os outros e em alguns casos se especializar em diferentes tarefas dentro da sua
sociedade. Nesses casos, atingir o objetivo do grupo é mais importante do que o
aumento da aptidão dos indivíduos (Whitehouse & Lubin 2005). Por outro lado, quando
uma sociedade é formada sem que haja cooperação entre os indivíduos, como na
maioria das espécies de aranhas sociais, o aumento da aptidão dos indivíduos é o mais
importante (Gullan & Cranston 2005, Whitehouse & Lubin 2005).
Em aranhas que constroem teias, formar sociedades com teias agrupadas pode
aumentar a área de captura de presas (Whitehouse & Lubin 2005). Essa estratégia pode
ser vantajosa, pois o aumento na área de captura acontece sem que indivíduo precise
gastar mais energia na construção de uma teia maior (Viera 2007).
Como o agrupamento de teias pode aumentar a chance de captura de presas, meu
objetivo é avaliar se o agrupamento de teias aumenta o sucesso das aranhas em adquirir
alimento. Aranhas que formam grupos unindo suas teias provavelmente comem mais
frequentemente do que as aranhas que constroem teias solitárias. Com isso espero
encontrar com maior frequência aranhas com o abdômen maior nas teias agrupadas do
163
que com teias solitárias, uma vez que o tamanho do abdômen pode indicar que a aranha
ingeriu uma presa.
Métodos
Área de estudo
Realizei este estudo na ARIE (Área de Relevante Interesse Ecológico) do km 41 (02º
24’ S, 59º 52’ O), localizada a 80 km ao norte de Manaus, Brasil. A reserva está sob co-
gestão do Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF). A área é
formada por floresta tropical úmida de terra firme, possui temperatura média anual de
26 ºC e precipitação anual variando entre 1900 e 2300 mm.
Organismo de estudo
A aranha ainda não identificada, denominada “vermelha”, possui teia tridimensional,
construída no sub-bosque a uma distância de no máximo 1 m do solo. A porção superior
da teia, geralmente está voltada para o dossel e tem uma malha mais densa de fios
traçados em várias direções do que as laterais da teia. A aranha se posiciona no centro
da teia, na parte abaxial. Muitas vezes, aranhas dessa espécie constroem teias uma ao
lado da outra, podendo compartilhar os fios de suporte, formando uma teia contínua
com várias aranhas. Nestes agrupamentos cada aranha permanece em sua teia, podendo
ocasionalmente andar na teia das outras aranhas.
Coleta e análise dos dados
Coletei 50 aranhas “vermelhas” em um transecto de 1000 m. Destas, 25 aranhas
estavam em teias solitárias e outras 25 aranhas foram coletadas em teias com duas ou
mais aranhas da mesma espécie. Em cada agrupamento de teias coletei aleatoriamente
apenas uma aranha. Como o abdômen das aranhas expande quando elas comem, assumi
164
que a área superficial do abdômen é um bom indicativo da frequência com que elas se
alimentam. Para medir a área do abdômen usei fotografias digitais das aranhas dispostas
em papel milimetrado, medidas no programa Image Tool. Como aranhas maiores
também podem ter o abdômen proporcionalmente maior, removi esse efeito da análise
usando uma regressão linear da área do abdômen, que aumenta conforme a quantidade
de alimento ingerida pela aranha, pela largura máxima do cefalotórax de cada aranha,
que é uma região que não varia de tamanho com quantidade de alimentos ingeridos.
Comparei o resíduo da regressão entre a área do abdômen e a largura do cefalotórax de
aranhas que formam grupo e aranhas solitárias usando o teste t.
Resultados
A área média do abdômen das aranhas “vermelhas” que vivem agrupadas (0,75 mm² ±
0,22) (média ± desvio padrão) foi semelhante à área média do abdômen das aranhas
solitárias (0,71 mm² ± 0,22), assim como a largura média do cefalotórax das aranhas
“vermelhas” que vivem agrupadas (0,55 mm ±0,08) e solitárias (0,54 mm ± 0,08). Não
houve diferença no tamanho relativo dos abdomens entre as aranhas “vermelhas” que
constroem teias solitárias e as aranhas “vermelhas” que se agruparam em teias
comunitárias (t=0,9; gl=49; p=0,64) (Figura 1).
165
grupo solitária
Agrupamento das aranhas
-0,08
-0,06
-0,04
-0,02
0,00
0,02
0,04
0,06
0,08
Res
íduo
da
regr
essã
o en
tre
área
do
abdô
men
e la
rgur
a do
cef
alot
órax
(cm
2 )
Discussão
Muitas espécies de aranhas utilizam o agrupamento de teias como forma de aumentar a
captura de presas (Whitehouse & Lubin 2005). Porém, nesse estudo o agrupamento das
teias das aranhas “vermelhas” não aumentou a quantidade de alimentos consumidos por
essas aranhas. Possivelmente porque algumas aranhas poderiam dominar o agrupamento
de teias e consumir primeiro as presas capturadas. Assim, apenas alguns poucos
indivíduos dentro do grupo ficariam constantemente alimentados. Isso faria com que a
chance de encontrar um indivíduo do agrupamento de teias com o abdômen cheio fosse
a mesma que encontrar uma aranha solitária com o abdômen cheio. Por este motivo a
Grupo Solitárias
Organização espacial das aranhas nas teias teias
Res
íduo
da
regr
essã
o en
tre
área
do
abdô
men
e
larg
ura
do c
efal
otór
ax (
mm
²)
Figura 1. Tamanho do abdômen das aranhas que agrupam teias e das aranhas que
permanecem sozinhas nas teias, estimado pelo resíduo da regressão entre a área do abdômen
e a largura do cefalotórax das aranhas. Os quadrados vazios representam a média e as barras
verticais o erro padrão.
166
variação do tamanho dos abdomens das aranhas que constroem teias em grupo e as
aranhas solitárias é muito parecida.
Como essa aranha não possui comportamento agônístico quando outra aranha
compartilha a sua teia, alguns indivíduos conseguem pegar as presas das teias de outras
aranhas (observação pessoal). Isso também beneficiaria os indivíduos não dominantes,
que teriam acesso a presas capturadas nas teias dos indivíduos dominantes quando estes
estivessem alimentados (Whitehouse & Lubin 2005, Viera 2007). Aranhas que
permanecem solitárias, por outro lado, teriam que investir energia na captura de mais
presas que ficassem aderidas na sua teia (Viera 2007).
A aranha “vermelha” poderia ser considerada uma aranha colonial, pois pode
construir suas teias unidas e formar agrupamentos com várias aranhas que não
cooperam diretamente umas com as outras (Whitehouse & Lubin 2005). Indivíduos
coloniais costumam se agrupar ao redor de locais com grande disponibilidade de
alimento (Whitehouse & Lubin 2005). Essas aranhas permanecem nas suas próprias
teias, mas podem retirar comida das teias de outras aranhas (Wilson 1971). Esse tipo de
organização social pode ser vantajosa porque faz com que os indivíduos economizem
energia na manipulação da presa e na construção e manutenção das teias (Gullan &
Cranston 2005).
Agradecimentos
Agradeço ao PDBFF e aos coordenadores, Paulo Enrique e Paulo Estefano pela
oportunidade que mudou minha forma de enxergar como se fazer ciência. A Franciele
Parreira pela ajuda a um aracnofóbico, como eu, na manipulação das aranhas em
laboratório. À Karla Magalhães Campião e Carla B. Madelaire, pela paciência e
contribuições na revisão das primeiras versões deste manuscrito. A Camilla Presente
167
Pagotto por todo o apoio e incentivo. Às monitoras, Mano e Laura, e a todos os amigos
efanos pelas contribuições para melhoria do trabalho e, sobretudo, pelos momentos
incríveis que passamos juntos aqui na Amazônia!
Referências
Alexander R.D. 1974. The evolution of social behavior. Annual Review of Ecology and
Systematics, 325-383.
D’Ettorre P. 2007. Evolution of Sociality: You are what you learn. Current Biology,
17:66-68.
Gullan P.J. & P.S. Cranston 2005.The insects: an outline of entomology. U.K.:
Blackwell Publishing.
Viera, C. 2007. Teias e forrageamento. pp 45-65. In: Ecologia e comportamento de
aranhas. (M.O. Gonzaga., A.J. Santos & H.F. Japyassú, eds.). Rio de Janeiro:
Editora Interciência.
Whitehouse, M.E.A. & Y. Lubin 2005. The functions of societies and the evolution of
group living: spider societies as a test case. Biology Review, 80:347–361.
Wilson E.O. 1971. The insect societs. U.S.A.: A Havard paperback.
168
Quem são, quantos são e quanto se parecem: composição, riqueza e similaridade
da assembléia de formigas em clareiras e mata primária em uma floresta de terra
firme na Amazônia Central
Daniele Bilate Cury Puida
Introdução
Os processos que determinam a abundância local e a distribuição das espécies em uma
área representam uma das grandes questões da ecologia de comunidades. Uma das
teorias propostas para explicar a estruturação das comunidades é a teoria da sucessão ou
facilitação. Essa teoria postula que a colonização de áreas perturbadas ocorre
primeiramente pelos organismos colonizadores, adaptados às condições adversas que
surgem com a alteração do hábitat original. Os colonizadores promovem modificações
no hábitat, tornando a área adequada para a colonização por outras espécies que são
capazes de se estabelecer na área somente após a chegada das espécies iniciais (Hairston
1989). Se a facilitação ocorre, espera-se que haja uma sequência de substituição de
espécies ao longo de um gradiente temporal. Essa substituição de espécies ao longo do
tempo é chamada de sucessão ecológica e tem início a partir de perturbações ou de
transformações que ocorrem no ambiente (Townsend et al.2003).
Alguns tipos de perturbações são inerentes à dinâmica do ecossistema e
constituem mecanismos de geração e manutenção da diversidade local. Em florestas
tropicais, a formação de clareiras é um dos processos responsáveis pela criação de
novos hábitats e pelo aumento da heterogeneidade do ambiente. As clareiras são
formadas pela queda de árvores, o que promove alterações na estrutura da vegetação e
nas condições microclimáticas locais. Essas modificações possibilitam que certas
espécies vegetais (espécies pioneiras) colonizem a área e se estabeleçam no ambiente
169
(Rose 2000). As clareiras exercem uma forte influência na demografia e na estrutura
populacional de espécies pioneiras em florestas tropicais (Melo & Tabarelli 2003;
Álvarez-Buylla & Martinéz-Ramos 1992), pois permitem que essas espécies, adaptadas
a alta luminosidade, possam persistir nesses ambientes tipicamente sombreados.
A sucessão em clareiras para as espécies vegetais é relativamente bem
representada na literatura (Rose 2000). Entretanto, para as espécies animais, pouco se
conhecesse a respeito do processo sucessional em clareiras de florestas tropicais
(Rodrigues 2009, Vasconcelos 1999). Se a estrutura da vegetação é alterada pela
formação de uma clareira, provavelmente a comunidade animal, principalmente aqueles
que apresentam uma forte relação com a vegetação, também deve acompanhar o
processo sucessional. A comunidade de formigas, por exemplo, responde as
modificações na vegetação ocorridas durante a sucessão. Florestas secundárias, em
estágio sucessional avançado, possuem maior riqueza de espécies do que áreas de
pastagem e florestas em estágio inicial de sucessão (Vasconcelos 1999). Florestas
secundárias em estágios sucessionais mais avançados possuem uma composição de
espécies de formiga mais semelhante às florestas não perturbadas, comparado às
florestas em estágios iniciais de sucessão (Vasconcelos 1999). É razoável supor que
perturbações naturais em menor escala, como as promovidas pela formação de clareiras,
também podem provocar mudanças na comunidade de formigas.
As formigas cortadeiras, por exemplo, podem ser sensíveis às modificações no
microclima promovidas pela alteração da vegetação dominante (Lach et al. 2010). A
disponibilidade de alimento ou de recursos para os ninhos também pode ser maior em
clareiras. Devido ao aumento da abundância de plantas pioneiras nesses ambientes,
várias espécies de formigas podem ser beneficiadas, uma vez que essas plantas possuem
maior palatabilidade e presença de nectários extra-florais (Urbas et al. 2007). Formigas
170
especialistas e predadoras também poderiam ser beneficiadas pelas clareiras. A maior
incidência de luz nesses ambientes, associada ao aumento da heterogeneidade de
hábitats decorrente das alterações na estrutura da vegetação, podem promover o
aumento da diversidade de artrópodes, disponibilizando mais presas para formigas
predadoras (Torres 1984). Dessa forma, as clareiras podem representar uma mancha de
alta qualidade para as formigas, oferecendo alta quantidade e concentração de recursos.
O objetivo desse estudo foi avaliar as modificações que ocorrem na estrutura da
assembléia de formigas decorrentes da formação de clareiras. Minhas hipóteses são que
as alterações provocadas por esse distúrbio promovem mudanças na assembléia de
formigas e que essas modificações seguem um gradiente sucessional. Dessa forma,
espero encontrar uma baixa similaridade da composição das assembléias de formigas
entre as clareiras e mata primária e, ainda, uma relação negativa da riqueza de espécies
de formigas com a idade das clareiras.
Métodos
Área de estudo
Realizei esse estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico PDBFF do km 41, co-
gerida pelo Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF/INPA),
localizada a 80 km ao norte da cidade de Manaus, Amazonas, Brasil. A vegetação na
área é formada por uma floresta tropical úmida de terra firme. A altura do dossel é de 30
a 37 metros de altura, com árvores emergentes de até 50 metros (Bernard 1997).
171
Coleta de dados
Amostrei as formigas em 11 clareiras e 11 áreas de mata primária, separadas por
uma distância de 20 metros. Para amostrar as formigas, usei iscas compostas por uma
mistura de ovo, farinha, goiabada e laranja. Em cada ambiente (clareira e mata), cinco
iscas foram distribuídas, mantendo certa distância (± 0,5 m) entre elas para evitar a
dominância da isca. Posicionei as iscas diretamente na serrapilheira, na parte mais
central de cada clareira e na mata adjacente. As iscas foram oferecidas por um período
de 1 h e, após esse período, as formigas foram recolhidas, acondicionadas em sacos
plásticos e levadas ao laboratório para classificação. As formigas foram identificadas até
o gênero, quando possível, ou em morfotipos.
Para classificar o estágio sucessional de cada clareira (idade), assumi que o
diâmetro das plântulas presentes nas clareiras mais recentes seria menor do que o
diâmetro das plântulas encontradas em clareiras em estágio sucessional mais avançado.
Uma parcela de 1 m2 foi estabelecida no centro de cada clareira, onde o diâmetro de
todas as plântulas presentes foi registrado com o auxílio de um paquímetro. O diâmetro
médio das plântulas de cada parcela representa, dessa forma, minha medida do estágio
sucessional da clareira.
Análise de dados
Comparei a similaridade da composição da assembléia de formigas presente nas
clareiras e na mata adjacente por meio do índice de similaridade de Jaccard (CJ). Avaliei
a relação entre o estágio sucessional da clareira e a riqueza de espécies com uma
regressão linear simples. Para investigar se a semelhança da composição de espécies
entre as clareiras e a mata aumentava com a idade da clareira, realizei uma regressão
entre o índice de similaridade de Jaccard e o estágio sucessional da clareira.
172
Resultados
No total, amostrei 34 morfotipos de formigas e a riqueza de morfotipos foi
semelhante entre os dois ambientes. Registrei nas clareiras e na mata 22 e 25
morfotipos, respectivamente. As clareiras e as matas adjacentes compartilharam 13
morfotipos. Encontrei nove morfotipos de formiga exclusivas nas clareiras, enquanto
que na mata registrei 12 morfotipos restritos a esse ambiente. Os morfotipos mais
comuns em clareiras foram Crematogaster sp.1, Solenopsis sp.2, Solenopsis sp.3 e
Pheidole sp.11, que representaram 43% dos morfotipos amostrados (Tabela 1). Na
mata, os morfotipos mais comuns foram Pheidole sp.12; Solenopsis sp.2 , Solenopsis
sp.3, Pachycondyla sp. e Crematogaster sp.1, que representaram 43% do total dos
morfotipos amostrados (Tabela 1).
Tabela 1. Frequência relativa de ocorrência dos morfotipos de formiga registrados em
clareiras e na mata primária em uma floresta de terra firme na Amazônia Central.
Ambiente
Espécie Clareira (%)
(N= 11 sítios) Mata (%)
(N= 11 sítios) Ectatoma sp. 18 Pachycondyla sp. 27 36 Crematogaster sp.1 45 36 Crematogaster sp.2 9 Crematogaster sp.3 9 Crematogaster sp.4 27 Crematogaster sp.5 9 9 Crematogaster sp.6 27 18 Tapinoma sp. 9 Solenopsis sp.1 9 9 Solenopsis sp.2 45 45 Solenopsis sp.3 45 45 Solenopsis sp.4 9 18 Solenopsis sp.5 18 18 Pheidole sp.1 9 9 Pheidole sp.2 9 18 Pheidole sp.3 18 Pheidole sp.4 9 Pheidole sp.5 9
173
Pheidole sp.6 9 Pheidole sp.7 27 Pheidole sp.8 9 Pheidole sp.9 9 9 Pheidole sp.10 9 Pheidole sp.11 45 Pheidole sp.12 54 Pheidole sp.13 9 Morfo 1 9 Morfo 2 18 Morfo 3 9 Morfo 4 9 Morfo 5 9 18 Morfo 6 9 Morfo 7 9
Os ambientes de clareira e mata apresentaram, em média, uma baixa
similaridade (CJ = 0,20±0,21, Figura 1). A similaridade média dentro de cada ambiente
também foi baixa (CJ clareiras = 0,15±0,13; CJ mata = 0,13±0,11; Figura 3). A riqueza
de espécies não aumentou com a idade da clareira (R2 = 0,222; F(1,9) = 0,222; p = 0,661)
e similaridade da composição de espécies entre os dois ambientes não foi relacionada
com o estágio sucessional da clareira (R2 = 0,321; F(1,9) = 1,06; p = 0,321, Figura 3,
Tabela 2).
1
74
C
1 C
2 C
3 C
4 C
5 C
6 C
7 C
8 C
9 C
10
C11
M
1 M
2 M
3 M
4 M
5 M
6 M
7 M
8 M
9 M
10
M11
C
1 1
C
2 0
1
C
3 0.
1 0
1
C4
0.1
0 0.
1 1
C5
0 0
0.1
0 1
C
6 0.
2 0
0 0
0.1
1
C
7 0.
1 0
0.2
0 0.
2 0.
1 1
C
8 0.
1 0
0 0.
1 0.
2 0.
2 0.
1 1
C9
0 0
0.1
0 0.
5 0.
1 0.
1 0.
1 1
C
10
0.1
0 0
0.1
0.3
0.2
0.2
0.5
0.2
1
C
11
0.1
0 0.
1 0
0.2
0 0.
1 0.
0 0.
4 0.
1 1
M
1 0
0 0
0.1
0 0
0 0.
1 0
0.1
0 1
M2
0.2
0 0
0 0.
2 0.
1 0
0.2
0.2
0.2
0.2
0.0
1
M3
0.1
0 0
0 0
0.2
0 0
0 0
0.1
0.0
0.0
1
M
4 0
0 0.
5 0
0.2
0 0.
3 0
0.1
0 0.
1 0
0 0
1
M5
0 0
0.2
0 0.
2 0
0 0.
1 0.
1 0.
2 0.
1 0
0.1
0 0.
3 1
M6
0 0
0.1
0.1
0.1
0.1
0.2
0.0
0.1
0.1
0.1
0.2
0 0.
1 0.
2 0
1
M7
0.1
0 0
0.1
0.1
0.2
0.2
0.5
0.1
0.6
0 0.
2 0.
1 0
0 0
0.1
1
M
8 0.
1 0
0 0
0.1
0.1
0 0.
3 0.
1 0.
1 0.
1 0
0.2
0.1
0 0.
2 0
0 1
M
9 0.
1 0
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1 1
Fig
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Riqueza
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2.5
3.0
3.5
Diâmetro médio plântulas (mm)
Figura 2. Relação entre a riqueza de morfotipos de formigas em clareiras e o diâmetro médio
das plântulas (estágio sucessional da clareira) em uma floresta de terra firme na Amazônia
Central.
0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 3.5
Diâmetro médio plântulas (mm)
0.0
0.1
0.2
0.3
0.4
0.5
0.6
0.7
Similaridade (CJ)
Figura 3. Relação entre a similaridade dos morfotipos de formiga entre clareiras e mata
primária em função do diâmetro médio das plântulas (estágio sucessional da clareira) em uma
floresta de terra firme na Amazônia Central.
176
Os morfotipos Crematogaster sp.1, Solenopsis sp.3 e Solenopsis sp.4 foram
registrados na maioria dos estágios sucessionais das clareiras (Tabela 2). Encontrei os
morfotipos do gênero Pheidole apenas nas clareiras de estágios mais intermediários e
avançados de sucessão (diâmetro médio das plântulas entre 1,96 e 3,37 mm) (Tabela 2). Cada
morfotipo desse gênero esteve presente em apenas uma clareira e nenhum deles co-ocorreu
em uma mesma clareira (Tabela 2).
Tabela 2. Morfotipos de formiga registrados em clareiras. Números entre parênteses
representam o diâmetro médio das plântulas (mm), usado como estimativa do estágio
sucessional de cada clareira.
Clareira
Espécie C2
(0,42) C1
(0,48) C3
(1,36) C10
(1,71) C9
(1,82) C7
(1,94) C8
(1,96) C5
(2,23) C4
(2,39) C11
(2,92) C6
(3,37) Pachycondyla sp. X X Crematogaster sp.1 X X X X X Crematogaster sp.3 X Crematogaster sp.4 X X X Crematogaster sp.5 X Crematogaster sp.6 X X X Tapinoma sp. X Solenopsis sp.1 X Solenopsis sp.2 X X Solenopsis sp.3 X X X X X Solenopsis sp.4 X X X X X Solenopsis sp.5 X X Pheidole sp.1 X Pheidole sp.2 X Pheidole sp.9 X Pheidole sp.10 X Pheidole sp.11 X Morfo 2 X X Morfo 4 X Morfo 5 X Morfo 6 X Morfo 7 X
Discussão
Diversas espécies de formiga podem ser beneficiadas por perturbações no hábitat. Vários
estudos mostram que ambientes perturbados, como as bordas de fragmentos florestais,
possuem maior riqueza de espécies de formiga (e.g. Carvalho & Vasconcelos 1999; Leal
177
2003; Sobrinho & Schoereder 2007). Entretanto, as perturbações naturais geradas pela
abertura de uma clareira na floresta não representam um fator capaz de alterar o número de
espécies de formigas que pode se estabelecer nesses locais. A quantidade de recursos
alimentares para as formigas em clareiras pode ser equivalente àquela oferecida na mata
adjacente. Dessa forma, os dois ambientes podem sustentar uma riqueza semelhante de
espécies de formigas.
A assembléia de formigas é sensível à perturbação gerada pela formação de uma
clareira. As clareiras e a mata adjacente diferem quanto à composição da assembléia de
formigas e essa diferença tende a ser mantida em clareiras com diferentes estágios
sucessionais. Formigas predadoras especialistas são negativamente afetadas pelas
perturbações no hábitat (Andersen 2000). A espécies predadora encontrada nesse estudo,
Pachyccondyla sp., pode não encontrar nas clareiras a mesma disponibilidade de alimento
oferecido na mata, restringindo sua distribuição à esse ambiente ou ocorrendo apenas em
clareiras mais antigas.
O gênero Pheidole é outro gênero de formiga que parece ser sensível à formação de
clareiras. As espécies desse gênero são tolerantes à sombra (Andersen 2000) e também
parecem responder ao gradiente sucessional. Encontrei morfotipos de Pheidole sp. apenas em
clareiras em estágios sucessionais intermediário e avançado. Além disso, na mata primária
capturei mais de um morfotipo de Pheidole por local de amostragem, enquanto nas clareiras
somente um morfotipo foi registrado por local. No ambiente mais restritivo das clareiras, o
comportamento dominante dessa formiga provavelmente não permite a coexistência de mais
de um morfotipo desse gênero.
A assembléia de formigas não segue uma sequência sucessional de substituição de
espécies em clareiras. Clareiras e mata adjacente são divergentes quanto à composição de
espécies e essa diferença tendem a ser mantida ao longo do gradiente sucessional. As
178
alterações nas condições ambientais promovidas pelas clareiras podem estabelecer nichos que
só podem ser ocupados por determinados grupos de formigas. Entretanto, o mesmo tipo de
ambiente também não apresentou uma convergência na composição das espécies de formiga.
Dessa forma, as regras de montagem da composição de espécies dentro de cada um desses
locais seria um processo aleatório, ligado à história de colonização e extinção local (Hérault
2007). Entretanto, as espécies que podem se estabelecer no mesmo tipo de ambiente seriam
ecologicamente equivalentes e a ocupação de um sítio dependeria apenas das restrições da
capacidade dispersiva das espécies (Hubbel 2001)
Agradecimentos
Agradeço a todos que me ajudaram na realização do PI: Paulinho Enrique pelas orientações
no delineamento e ajuda nas análises, Laura, Fernanda e Lucas pela identificação das
formigas, Sr. Cardoso pelas dicas das localizações das clareiras e a Ana e ao Paulo Estéfano
pelas sugestões no manuscrito.
A parte isso, quero agradecer imensamente ao Zé Luís, ao Paulinho Enrique e ao Paulo
Estéfano pela oportunidade de vivenciar esses 30 dias incríveis na floresta Amazônica, no
melhor lugar do mundo para aprender ecologia! Participar do EFA foi, sem dúvida, uma das
experiências mais intensas que tive, pessoal e profissionalmente. Agradeço também às
monitoras e aos professores pelas inúmeras correções dos relatórios, pelas críticas e puxões de
orelha, mas buscando sempre extrair o melhor de nós. E por fim, agradeço a todos os Efanos,
meus mais novos amigos de infância, pela convivência, discussões, risos, festinhas e afins.
Vocês são inesquecíveis !!
179
Referências
Álvarez-Buylla, E.R. & M. Martinéz-Ramos. 1992. Demography and allometry of Cecropia
obtusifolia, a neotropical pioneer tree . An evaluation of the climax pioneer paradigm
for tropical rain-forests. J. Ecol., 80: 275-290.
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environmental stress and disturbance. In Ants: standard methods for measuring and
monitoring biodiversity (Agosti, D., J.D. Majer et al. eds). Washington, DC;
Smithsonian Institution Press.
Bernard, E. 1997. Estratificação vertical de comunidades de morcegos em clareiras abertas em
matas de terra firme da Amazônia Central. Dissertação de mestrado, Instituto Nacional
de Pesquisas da Amazônia, Manaus, AM.
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Hérault, B. 2007. Reconciling niche and neutrality through the emergent group approach.
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Hubbel, S.P.2001. The unified neutral theory of biodiversity and biogeography. Princeton and
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Ecologia e conservação da Caatinga. (Leal, I.R., M. Tabarelli & J.M.C. Silva, eds).
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Rodrigues, R., A.F. Lima , S. Gandolfi, A. G. Nave. 2009. On the restoration of high diversity
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Conservation, 142:1242–1251
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Guyana. Georgetown, Guyana: Tropenbos Guyana Series 9.
Sobrinho, T.G. & J.H. Schoereder. 2007. Edge and shape effects on ant (Hymenoptera:
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Vasconcelos, H.L. 1999. Effects of forest disturbance on the structure of ground-foraging ant
communities in central Amazonia. Biodiversity and Conservation, 8: 409:420.
181
Efeito do tipo de nectário extrafloral sobre a riqueza e composição de espécies de
formigas visitantes
Fernanda Maria Pereira de Oliveira
Introdução
As formigas são organismos dominantes em todo o mundo com cerca de 12.500 espécies
descritas (Bolton 2006). Em ecossistemas terrestres, elas possuem uma grande importância
funcional, estando envolvidas em diversos tipos de interações com outros organismos em
todos os níveis tróficos (Oliveira 1997). Na literatura são descritas várias associações
mutualísticas de formigas com plantas (Folgarait 1998). Entre essas associações temos as
interações obrigatórias e especialistas e as interações facultativas e generalistas. Como
exemplo das interações obrigatórias e especialistas há o sistema mirmecófita-formiga, onde a
planta oferece abrigo para a colônia de formigas, que por sua vez defende a planta contra
herbívoros (Huxley & Cutler, 1991). As interações facultativas e generalistas incluem as
associações com os nectários extraflorais onde as formigas se alimentam de néctar e, em
troca, fornecem defesa para a planta contra possíveis predadores (Elias 1983).
Os nectários extraflorais são glândulas secretoras de néctar que não estão relacionadas
diretamente com a polinização. Eles podem ocorrer em várias partes da planta como folhas,
frutos e na parte externa das flores (Elias 1983). Em algumas regiões do mundo, o néctar
produzido por essas glândulas pode ser o principal recurso alimentar para as formigas (Rico-
Gray & Oliveira 2007). No entanto, por ser uma interação facultativa e não específica, a
composição da assembléia de formigas que utiliza os nectários pode ser muito variável (Rico-
Gray & Oliveira 2007).
A disponibilidade do recurso oferecido pelo nectário extrafloral pode variar de acordo
com a sua morfologia e a sua localização na planta (Elias 1983). Nectários localizados entre
182
os folíolos, por exemplo, parecem ser mais visíveis e disponíveis para os visitantes do que os
nectários localizados na parte abaxial da folha. Além disso, nectários variam em relação ao
tamanho, existindo nectários mais proeminentes do que outros, o que pode resultar em uma
diferença na disponibilidade de néctar secretado (Elias 1983).
A morfologia e a localização do nectário associado ao comportamento de forrageio
diferenciado entre as espécies de formigas podem possibilitar que alguns grupos de formigas
visitem e se beneficiem mais de um tipo de nectário do que de outro. Em função disso, o meu
objetivo foi investigar se a assembléia de formigas que utilizam nectários extraflorais como
recurso varia em função do nectário. Minha hipótese é que nectários extraflorais com recurso
mais acessível serão compartilhados por um número maior de espécies de formigas quando
comparado a nectários extraflorais menos acessíveis na planta.
Métodos
Área de estudo
Realizei o estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico Projeto Dinâmica Biológica de
Fragmentos Florestais (ARIE PDBFF) (2°24’ S-59°44’ O), localizada a 80 km ao norte de
Manaus, Amazonas, Brasil. A vegetação é caracterizada como uma floresta tropical úmida
(Pires & Prance 1985). A área de estudo é cortada por uma estrada responsável pela criação
de uma borda florestal, onde coletei os dados para este estudo.
Modelos de estudo
Para este estudo escolhi duas espécies de árvores de pequeno porte que possuem diferentes
tipos de nectários extraflorais. Utilizei indivíduos pertencentes ao gênero Inga spp.
(Fabaceae) e indivíduos da espécie Croton lanjouwensis (Euphorbiaceae). Inga spp. possui
183
nectários interfoliolares que são proeminentes e com uma depressão na parte central (formato
panela) onde ocorre acúmulo de néctar. Croton lanjouwensis possui um par de nectários
pequenos sem cavidade na parte abaxial da folha próxima ao pecíolo, e não acumula néctar.
Dessa maneira, eu espero que os nectários de Inga spp. sejam visitados por um maior número
de espécies de formigas e que a composição de espécies de visitantes varie mais do que nos
nectários extraflorais de C. lanjouwensis.
Coleta de dados
Observei 30 indivíduos de Inga spp. e 30 indivíduos de C. lanjouwensis que possuíam
formigas em seus nectários extraflorais. Esses indivíduos apresentavam aproximadamente 2
m de altura, para que eu pudesse observar toda a planta. Observei as formigas que estavam
visitando os nectários por toda a planta e as coletei. Identifiquei as formigas até o nível de
gênero com auxílio da chave de identificação de Bolton (1994) e depois as separei em
morfoespécies.
Análise de dados
Avaliei se o número de espécies de formigas visitando os nectários foi maior em Inga spp. do
que em C. lanjouwensis utilizando um teste qui-quadrado. Para isso, criei quatro categorias
que representavam o número de espécies que visitavam os nectários no momento da
observação. As categoria 1 representou os indivíduos que possuíam apenas uma espécie de
formiga visitando seus nectários. A categoria 2, 3 e 4 representou os indivíduos que possuíam
duas, três e quatro espécies de formigas visitando seus nectários, respectivamente.
Avaliei se a composição de espécies de formigas que visitavam os nectários
extraflorais variava mais entre os indivíduos de Inga spp. em relação ao de C. lanjouwensis.
Para isso, ordenei os indivíduos por meio de escalonamento multidimensional não-métrico
184
(NMDS). A ordenação foi baseada em matrizes de similaridade calculadas utilizando o índice
de Bray-Curtis a partir de dados de presença e ausência das espécies de formigas. Utilizei os
escores dos dois primeiros eixos do NMDS porque eles explicaram melhor a variação na
composição de espécies de formigas que estavam visitando os indivíduos observados.
Calculei a distância de cada ponto ao centróide, extraí a média dessas distâncias e fiz um teste
Mann-Whitney.
Resultados
Encontrei um total de 18 espécies pertencentes a oito gêneros de formigas visitando os
indivíduos de C. lanjouwensis e Inga spp. Em Inga spp. foram registradas 10 espécies de
formigas pertencentes a seis gêneros, e as espécies mais frequentes foram as dos gêneros
Pheidole e Crematogaster. Em C. lanjouwensis foram registradas 15 espécies de formigas
pertencentes a oito gêneros, e as espécies de formigas que mais frenquentes pertencem aos
gêneros Ectatomma e Camponotus (Tabela 1).
Tabela 1. Espécies de formigas que visitaram os nectários extraflorais de Croton lanjouwensis
e Inga spp. e número de indivíduos onde cada espécie de formiga ocorreu.
Espécies de formigas
C. lanjouwensis
Inga spp.
Azteca sp. 3 1
Camponotus sp.1 1 0
Camponotus sp.2 7 1
Camponotus sp.3 1 0
Cephalotes sp. 2 0
Crematogaster sp.1 7 6
Crematogaster sp.2 2 5
Crematogaster sp.3 0 3
Dolichoderus sp. 4 2
185
Ectatomma sp.1 0 3
Ectatomma sp.2 11 3
Pheidole sp.1 9 12
Pheidole sp.2 1 0
Pheidole sp.3 2 0
Pseudomyrmex sp.1 4 0
Pseudomyrmex sp.2 2 0
Não identificada 1 0 1
Não identificada 2 1 0
O número de espécies de formigas observadas visitando os nectários extraflorais de C.
lanjouwensis foi maior do que o de Inga spp. (χ2=12,10; gl=3; p=0,007). Dentre os 30
indivíduos de Inga spp., 87% foram visitados por uma única espécie de formiga e 23% foram
visitados por mais de uma espécie de formiga. Já em C. lanjouwensis 53% foram visitados
por mais de uma espécie de formiga, enquanto 47% dos indivíduos foram visitados por uma
única espécie de formiga (Figura 1). A variação na composição de espécies de formigas em
Inga spp. foi maior do que em C. lanjouwensis (U=217,00; p=0,0005, Figura 2).
186
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120
categoria 1categoria 2categoria 3categoria 4
Inga spp.C. lanjouwensis
Figura 1. Frequência das categorias de riqueza de formigas que visitaram os NEFs de Inga
spp. e de Croton lanjouwensis. A categoria 1 representa as plantas que foram visitadas por
uma única espécie de formiga, a categoria 2, 3 e 4 representam as plantas que foram visitadas
por duas, três e quatro espécies de formigas, respectivamente.
NMDS Eixo 1
-5 -4 -3 -2 -1 0 1 2 3
NMDS Eixo 2
-1,5
-1,0
-0,5
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0stress: 0,01
Figura 2. Ordenação por meio de escalonamento multidimensional não-métrico (NMDS) dos
indivíduos de Croton lanjouwensis e Inga spp. A ordenação foi baseada em matrizes de
similaridade de Bray-Curtis utilizando dados de presença e ausência das espécies de formigas
visitando os nectários extraflorais. Círculos preenchidos correspondem aos indivíduos de
Croton lanjouwensis e círculos vazios correspondem aos indivíduos de Inga spp.
187
Discussão
As características dos nectários podem influenciar a assembléia de formigas que dependem
desse recurso, modificando a riqueza e a composição de espécies das formigas que visitam
esses nectários. Entretanto, as estratégias de forrageio utilizadas pelas formigas são
importantes nessa interação e refletem na própria assembléia de formigas que conseguem
explorar esse recurso.
O nectário extrafloral de Inga spp. oferece uma acessibilidade maior ao recurso devido
à sua morfologia e localização (Oliveira & Del-Claro 2005). Entretanto, esse fácil acesso pode
fazer com que o néctar seja utilizado por outros invertebrados além das formigas, aumentando
assim a competição por esse recurso. Em função disso, a utilização do recurso por outros
grupos não formicídeos pode fazer com que um menor número de espécies de formigas visite
esse tipo de nectário extrafloral.
Os nectários extraflorais de Inga spp. estavam geralmente dominados por uma única
espécie de formiga pertecente aos gêneros Crematogaster ou Pheidole. Esses gêneros são
compostos por formigas com comportamento agressivo, com alta taxa de recrutamento e que
dominam o recurso rapidamente (Hölldobler & Wilson 1990). Isso pode explicar uma maior
variação na composição de espécies entre os indivíduos de Inga spp., ainda que, de maneira
geral, um menor número de espécies estivesse os visitando. Essas formigas provavelmente
encontram o recurso e não permitem o compartilhamento com outras espécies. Assim a
maioria dos indivíduos de Inga spp. acaba por ter uma única espécie de formiga visitante,
porém a espécie dominante pode variar de indivíduo para indivíduo.
A morfologia e a localização do nectário extrafloral podem fazer com que algumas
espécies de formigas se beneficiem mais do que outras. Somado a isso, algumas espécies de
formigas tendem a dominar o recurso, impedindo o compartilhamento do mesmo (Parr &
Gibb 2010). Dessa maneira, embora a interação entre nectários e formigas seja considerada
188
facultativa e não específica, essa interação pode ser determinada pelo tipo de nectário e pelo
comportamento de forrageio das formigas.
Agradecimentos
Agradeço a todos que organizaram o EFA 2011. Aos Coordenadores Paulo Enrique e
Paulo Estéfano, e às Bonitoras Laura e Manô pela paciência, ensinamentos e por tocarem esse
curso de maneira tão especial. A Ana e Manô (again!) pelas correções desse relatório. Aos
colegas de curso pela companhia em todos os momentos. Ao meu alter ego, Marilaqui, por ter
me tornado uma pessoa mais agradável e divertida durante o curso. Em especial, gostaria de
agradecer a Talita e Rodrigo Sukita. A primeira por aguentar a Fernanda e o segundo pelo
combustível emprestado à Marilaqui.
Referências
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1758–2005. Harvard University Press, Cambridge, Massachusetts. 2006. CD-ROM.
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Rico-Gray, V.& P.S. Oliveira. 2007. The ecology and evolution of ant-plant interactions.
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190
Bordas florestais alteram o porte e a estratégia de crescimento de lianas?
Fernando M. Resende
Introdução
A modificação de florestas tropicais pela atividade antrópica leva à criação de bordas
florestais. As bordas são áreas de contato entre ambientes nativos e alterados, onde mudanças
decorrentes da supressão da vegetação são mais pronunciadas (Laurance et al. 2011). Essas
mudanças levam a formação de ambientes diferenciados nas áreas florestais próximas à borda.
Nesses ambientes, muitos fatores abióticos como temperatura, incidência luminosa,
intensidade de ventos e umidade são alterados. Essas alterações resultam em grandes
modificações na estrutura de comunidades vegetais.
Ambientes de borda de florestas apresentam grande variação de temperatura em
decorrência do aumento na incidência luminosa nessas áreas (Camargo & Kapos 1995). O
aumento dessa incidência luminosa favorece a proliferação de plantas pioneiras e reduz a
capacidade de germinação e estabelecimento de espécies vegetais tolerantes à sombra,
características do interior de floresta (Bruna 1999, Benítez-Malvido & Martinez-Ramos 2003,
Uriarte et al. 2010). Nos hábitat de borda, também ocorre o aumento da incidência e
intensidade de ventos (Laurance 1997). O aumento da turbulência na vegetação das bordas de
florestas, associadas à redução da disponibilidade hídrica, levam ao aumento da taxa de
mortalidade de árvores (Kapos et al. 1993, Ferreira & Laurance 1997, Malcolm 1998,
Didham & Lawton, 1999). Como árvores grandes e emergentes têm copas expostas a intensa
radiação solar e evaporação, a mortalidade dessas árvores é maior em relação à mortalidade
de árvores de pequeno e médio porte (Laurance et al. 2000).
Taxas elevadas de mortalidade de árvores de maior porte nos ambientes de borda
podem acarretar em alterações na estrutura da vegetação (Laurance et al. 2000). Um dos
191
grupos vegetais influenciados por essas alterações é a comunidade de lianas (Hegarty &
Caballé 1991, Laurance et al. 2001). Lianas são trepadeiras lenhosas que germinam no solo e
dependem de árvores como suporte (forófito) para atingir o dossel e se desenvolverem
(Ribeiro et al. 1999). Dessa forma, é possível que a redução no número de árvores de maior
porte nos ambientes de borda acarrete também na redução de lianas de maior porte. Além
disso, espera-se que bordas florestais, por apresentarem maior incidência de ventos,
selecionem espécies de lianas com estruturas preênsis, como gavinhas e espinhos. Essas
estruturas oferecem suporte mecânico e permitem o crescimento sobre o forófito.
Dessa forma, meu objetivo foi avaliar como ambientes de borda alteram a estrutura da
comunidade de lianas. Minhas hipóteses são que ambientes de borda i) diminuem o porte das
lianas devido a redução do porte do forófito e ii) selecionam estratégias de fixação das lianas.
Espero que ambientes de borda apresentem lianas de menor diâmetro e que exista relação
entre o diâmetro das lianas e o diâmetro das árvores suporte. Espero também que a proporção
de lianas com estruturas preênsis seja maior próximo às bordas da floresta.
Métodos
Área de estudo
Esse estudo foi desenvolvido na Reserva Km 41, que integra a Área de Relevante Interesse
Ecológico (ARIE) Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF). A área é
uma unidade de conservação federal co-gerida pelo Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia.A Reserva localiza-se a cerca de 80 Km ao norte de Manaus, Amazonas, Brasil
(02º 24’ S e 59º 22’ O). A vegetação da Reserva é caracterizada por Floresta Tropical
Ombrófila Densa e apresenta dossel de cerca de 35 m de altura, com árvores emergentes que
192
podem alcançar 55 m. A coleta de dados foi realizada ao longo da borda entre a estrada de
acesso e a mata adjacente que compõe a Reserva.
Coleta de dados
Estabeleci 22 pontos de amostragem, sendo 11 pontos distribuídos na borda da floresta e 11
pontos no interior da floresta. Em cada ambiente, os pontos distavam 20 m entre si.
Para evitar que a coleta de dados fosse feita em uma vegetação que foi suprimida durante a
construção da estrada, os pontos na borda da floresta foram dispostos a uma distância de 5 m
da borda da floresta. Alterações microclimáticas advindas da criação da borda podem atingir
até os 300 m iniciais da área florestada (Laurance et al. 2002). Devido a isso, os pontos do
interior da floresta foram estabelecidos a uma distância superior a 500 m da estrada, para
garantir a ausência de influência da borda.
Amostrei as cinco lianas enraizadas mais próximas de cada ponto de amostragem.
Considerei apenas os indivíduos lianescentes que usavam uma árvore como suporte e que
apresentavam diâmetro superior a 0,5 cm. Medi o diâmetro de cada liana a uma altura de 1,3
m a partir da base do caule. Para avaliar se existe relação entre o diâmetro das lianas e o das
árvores suporte, medi também os diâmetros das árvores utilizadas pelas lianas como apoio.
Registrei a estratégia de sustentação vertical (i.e., presença ou ausência de estrutura preênsil)
de cada indivíduo lianescente. As lianas com estruturas de fixação na gema apical não foram
incluídas nesse estudo.
Comparei os valores dos diâmetros das lianas de cada ambiente usando o teste de
Mann-Whitney. Testei a relação entre os diâmetros das lianas e das árvores suporte através de
uma análise de covariância, utilizando os pontos de amostragem como covariável. Comparei a
proporção de lianas com estrutura preênsil em cada ambiente utilizando o teste qui-quadradro.
193
Resultados
Amostrei 110 lianas nos dois ambientes analisados. O diâmetro das lianas variou de 0,6 a 15,3
cm, sendo que a maioria (87,27%) foi inferior a 5 cm. No ambiente de borda o diâmetro
médio das lianas foi de 1,81 cm e variou de 0,7 a 13,69 cm, enquanto que no interior da área
florestada foi de 3,24 cm e variou entre 0,6 e 15,3 cm. A porcentagem de lianas com diâmetro
menor que 2,5 cm na borda florestal foi de 87,27% (48 indivíduos lianescentes), enquanto no
interior da área florestada a porcentagem de indivíduos desse porte foi de 56,36% (31
indivíduos). Houve diferenças também no número de lianas de grande porte (diâmetro ≥ 10
cm) encontrado nos diferentes ambientes. A borda florestal tinha apenas uma liana desse
porte, enquanto no interior da floresta registrei três indivíduos. Assim, as lianas no habitat de
borda apresentam diâmetro maior que no interior da floresta (n=22; U=24; p=0,016; Figura
1).
Mediana
25%-75%
Borda Interior
Ambiente
0
1
2
3
4
5
Diâ
met
ro d
as li
anas
(cm
)
Figura 1. Relação entre diâmetro das lianas em dois ambientes (borda e interior de floresta)
em uma área de floresta de terra firme. As barras representam os percentis (25 - 75%) e os
quadrados vazios a mediana.
194
O diâmetro das árvores suporte amostradas variou de 0,7 a 88,3 cm. A maioria delas
(80,9%) foi inferior a 15 cm de diâmetro. No ambiente de borda, o diâmetro médio foi de
12,01 cm, variando de 1,3 a 101 cm. Já no interior da floresta o diâmetro médio foi de 24,10
cm, o qual variou entre 0,7 e 88,3 cm. Houve relação entre o diâmetro das lianas e o das
árvores suporte (F=26,87; P<0,001; Figura 2).
0 20 40 60 80 100
Diâmetro das árvores (cm)
0
2
4
6
8
10
12
14
16
Diâ
met
ro d
as li
anas
(cm
)
Figura 2. Relação entre diâmetro das lianas e o diâmetro das árvores suporte em uma área de
floresta de terra firme. Foram consideradas as lianas estabelecidas nos dois ambientes
avaliados nesse estudo (borda e interior de floresta).
Em relação à estratégia de fixação, 42% das lianas presentes no ambiente de borda e
38,18% das encontrados no interior da floresta apresentaram estruturas especializadas em
fixação. Dentre as estrutura de fixação, foram identificadas gavinhas de origem caulinar e/ou
foliar e espinhos recurvados, que são utilizados como ganchos. Não houve relação entre a
estratégia de fixação das lianas e o ambiente (χ=0,16; df=1; p=0,69).
195
Discussão
Os resultados demonstram que existe efeito da borda da floresta no diâmetro dos indivíduos
lianescentes, sendo que lianas estabelecidas na borda da floresta apresentam diâmetro menor
que aquelas estabelecidas no interior da floresta. Isso pode ser explicado devido à redução de
árvores suportes altas nas áreas adjacentes às bordas. A redução de árvores de maior porte
limita o crescimento e a sobrevivência de lianas de grande porte, já que as lianas dependem da
estrutura do forófito para se desenvolverem.
Em relação às estruturas utilizadas pelas lianas para o crescimento, os resultados
demonstram que ambientes de borda não selecionam espécies de lianas com estruturas de
fixação específicas para auxiliar na sustentação. Portanto, espécies de lianas que apresentam
estruturas preênsis especializadas para ascensão no forófito não são beneficiadas nos
ambientes de borda. Lianas que não apresentam estruturas especializadas em sustentação
podem apresentar outras estratégias de fixação como: 1) troncos flexíveis (lianas rasteiras),
que se enrolam em outras plantas, ou 2) caule espirado (volúvel), que cresce em volta de outro
tronco (Ribeiro et al. 1999). Lianas que apresentam essas estratégias, também são aptas a
crescerem em ambientes que recebem alta incidência de ventos, como as bordas florestais.
Como áreas sob influência de bordas florestais têm sido criadas em ritmo acelerado
nos últimos anos (Broadbent et al. 2008) e lianas podem ter importantes impactos na
dinâmica de florestas e áreas impactadas (Laurance et al. 2001), um maior entendimento
sobre os fatores relacionados à estruturação de comunidades de lianas tem importantes
aplicações para o manejo de florestas.
Agradecimentos
Primeiramente agradeço ao INPA e ao PDBFF pela oportunidade única de participar do EFA
2011. Com certeza esse curso trará ótimas conseqüências em minha vida acadêmica e pessoal.
196
Agradeço aos competentes coordenadores Rainbow Master e New Marilaqui pelos
conhecimentos transmitidos e pela dedicação total ao bom andamento do curso. Aos demais
professores que contribuíram para a qualidade do curso. Às monitoras Ursinho Carinho e
Laura Pezinho de Ouro pelos ensinamentos, amizade e afrontas escritas nos relatórios. À
Dona Eduarda e Seu Jorge pela dedicação no preparo da comida e pelas brincadeiras na hora
do almoço. A todos os colegas do curso pela amizade e pelos momentos de risada e
descontração vividos nos 30 dias de convivência na magnífica Selva Amazônica. Sem vocês o
curso não seria especial como foi. Sentirei saudades!
Referências
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species recruitment in tropical rain forest fragments. Biotropica 35:530–541.
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199
Pernas longas para que te quero? Pulso de inundação de riachos de pequena ordem não
determina a estrutura morfológica da comunidade de formigas
Franciele Parreira Peixoto
Introdução
O estudo da estrutura de comunidades trata dos processos que influenciam os padrões de
distribuição das espécies, no tempo e no espaço, e que determinam várias características das
assembleias, como abundância relativa, riqueza e composição de espécies (Schamp et al.
2008). Dentre esses processos, competição e predação são frequentemente utilizados para
explicar variações tanto na abundância quanto na riqueza de espécies. A riqueza de espécies
também pode mudar nas comunidades ao longo do tempo em resposta a fatores abióticos, o
que é conhecido como processo de sucessão (Horn 1974). Além disso, o histórico evolutivo
das espécies pode determinar os padrões de composição em cada comunidade (Pillar et al.
2009).
Além de usar variações na abundância relativa, riqueza e composição, é possível
avaliar também a organização de atributos funcionais das espécies, dentro e entre assembleias
para detectar os processos responsáveis pela estruturação de comunidades (Schamp et al.
2008). Atributos funcionais são características morfológicas, fisiológicas ou fenológicas que
afetam o desempenho dos indivíduos em relação às pressões do ambiente (Violle et al. 2007).
Assim, sob a pressão de um filtro ambiental, apenas as espécies que possuem os atributos que
lhes conferem capacidade de suportar tais condições estarão aptas a sobreviver nesse local
(Keddy 1992). Dessa forma, a existência de um filtro ambiental seleciona espécies com
características similares levando a convergência de determinados atributos funcionais dentro
de uma comunidade (Pillar et al. 2009).
200
Em florestas de terra firme na Amazônia Central há pulsos de inundação imprevisíveis
que estão associados aos rios de primeira ordem. As inundações ocorrem com frequência e
são de curta duração (Ribeiro et al. 1999). Porém, apesar da curta duração, esses pulsos
podem representar alterações drásticas nas características físicas do ambiente e podem
influenciar no estabelecimento de invertebrados terrestres no gradiente de inundação (Adis &
Junk 2002). Assim, esses organismos serão selecionados por esse filtro ambiental de acordo
com suas adaptações, como a tolerância a inundação ou comportamento migratório (Adis &
Junk 2002).
Um grupo de invertebrados que pode ser afetado pelas inundações são as formigas de
solo, que dependem desse ambiente para forrageio e reprodução (Hölldobler & Wilson 1990).
Como os pulsos de inundação podem representar um filtro, é possível que grupos com uma
morfologia que favoreça a locomoção sobre a lâmina d’água sejam selecionados. Em
particular, um maior tamanho das pernas em relação ao corpo possibilita melhor distribuição
do peso corpóreo. Essa característica possibilita que o organismo utilize a tensão superficial
da água para permanecer na superfície e assim possa se deslocar durante os eventos de
inundação (Adis & Junk 2002). Portanto, se o pulso de inundação representar um filtro
ambiental que restringe a morfologia das formigas, as espécies presentes em áreas sujeitas aos
pulsos de inundação dos igarapés devem ser morfologicamente mais semelhantes entre si e
apresentar patas mais longas em relação ao corpo do que formigas presentes em áreas que não
estão sujeitas aos pulsos de inundação. Assim, o objetivo desse trabalho foi avaliar qual o
efeito da inundação sobre a estruturação funcional das comunidades de formigas de solo.
Minha hipótese é de que há um filtro ambiental associado ao pulso de inundação
influenciando a estrutura morfológica das formigas de solo.
201
Métodos
Área de estudo
Realizei o estudo na ARIE PDBFF (Área de Relevante Interesse Ecológico Projeto Dinâmica
Biológica de Fragmentos Florestais), localizada a cerca de 80 km ao norte de Manaus.
Realizei as coletas no Km 41 (2°24’S; 59°44’O), um dos polígonos que compõem essa
unidade de conservação. A vegetação da área é de floresta tropical úmida de terra firme e
possui formações de relevo definidas como platô, vertente e baixio. As áreas de platô são as
mais altas, com solos argilosos e bem drenados. As vertentes são faixas de transição entre
essas áreas mais altas e áreas com menor altitude, chamadas baixio. As vertentes podem
eventualmente ser afetadas pelos pulsos de inundação, apenas em eventos de grande
magnitude. Já os baixios são planícies aluviais que são fortemente afetadas pelos pulsos de
inundação, de curta duração, com solos em geral encharcados por chuvas e com acúmulo de
sedimentos (Ribeiro et al. 1999).
Delineamento amostral
Para este estudo utilizei os ambientes de platô e baixio. Amostrei 15 pontos em cada
ambiente. A distância entre os pontos foi de no mínimo 10 m para evitar dependência entre as
amostras. Para a captura das formigas em cada ponto, utilizei uma isca composta por proteína,
carboidrato e açúcar (ovo, farinha de milho e goiabada). Ofereci quatro iscas por ponto,
dispostas nos vértices de um quadrado de 40 cm de lado, para evitar a dominância de uma
espécie. Oferecer mais de uma isca por ponto pode prevenir que uma espécie dominante
impeça o acesso ao recurso por outras presentes no local. Nos dois ambientes realizei as
coletas a partir das 9:00 h e mantive as iscas nos pontos durante 1h.
202
Triagem e medidas corporais
Morfotipei as formigas utilizando critérios associados à cor, tamanho e forma do corpo,
tamanho e forma da mandíbula e formato do gaster (parte posterior do corpo). Separei um
indivíduo de cada morfotipo para cada ponto amostrado. Fotografei esses indivíduos
separados para medir o tamanho da perna posterior esquerda e o tamanho lateral da cabeça até
a mandíbula. Fiz as medidas utilizando o programa Image Tool. Calculei a proporção do
tamanho da perna pelo tamanho da cabeça de cada indivíduo e a chamei de tamanho
padronizado da perna (TPP).
Para avaliar se as pernas mais longas estavam relacionadas aos ambientes de baixio,
realizei um teste t para a medida de TPP das formigas entre os ambientes de platô e baixio.
Em seguida calculei a variância do valor de TPP entre os morfotipos para cada ponto. Quando
a comunidade continha apenas um morfotipo, utilizei dois indivíduos para realizar o cálculo
da variância. Com os valores de variância por ponto realizei um teste Mann-Whitney para
comparar a variância no TPP entre os ambientes, baixio e platô. Assim, se a hipótese de que
há um filtro ambiental associado ao pulso de inundação influenciando a estrutura morfológica
de comunidades de formigas for verdadeira, espero que i) o tamanho médio de TPP seja maior
em ambiente de baixio em relação a ambiente de platô e que ii) haja menor variância na
medida de TPP dentro das comunidades de baixio em relação às comunidades de platô.
Resultados
O ponto com o maior riqueza pertencia ao ambiente de baixio, com seis morfotipos
registrados. Houve uma média de dois morfotipos para cada comunidade de platô (DP=0,64)
e uma média de três morfotipos para cada comunidade de baixio (DP=1,08). Não houve
diferença nas médias das medidas de TPP entre os ambientes de platô e baixio (t=0,23; gl=27;
p=0,40; Figura 1). Também não houve diferença, entre os ambientes de platô e baixio, com
203
relação às variâncias de TPP dos morfotipos de formigas em cada ponto (n=29; U=99;
p=0,39; Figura 2).
Baixio Platô
Ambiente
2.4
2,5
2,6
2,7
2,8
2,9
3,0
3,1
Méd
ia d
e T
PP
Figura 1. Médias da proporção do tamanho da perna pelo tamanho da cabeça das formigas
(TPP) nos ambientes de platô e baixio em floresta de terra firme na Amazônia Central. O
ponto central representa a média, as caixas o erro padrão e as barras indicam o intervalo de
95% de confiança.
Baixio Platô
Ambiente
-0,2
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
1,4
Var
iânc
ias
das
med
idas
de
TP
P e
ntre
pon
tos
Figura 2. Mediana das variâncias da medida de proporção do tamanho da perna pelo tamanho
da cabeça (TPP) em cada ponto nos ambientes de platô e baixio em floresta de terra firme na
Amazônia Central. Os pontos centrais representam as medianas, as caixas os quartis de 25% e
75% e as barras a amplitude de variação sem os pontos extremos.
204
Discussão
Pernas maiores em relação ao corpo não são selecionadas nas comunidades de formigas de
solo em ambiente de baixio. Além disso, não houve menor variação no tamanho das pernas,
em relação ao corpo, relacionado a esse ambiente. Isso indica que esse tipo de morfologia não
é favorecida pelos pulsos de inundação a que o baixio está submetido. Dessa forma, o pulso
de inundação nessas áreas não representa um filtro ambiental para características
morfológicas funcionais do grupo das formigas de solo.
Em sistemas sujeitos a períodos prolongados de inundação parece haver um filtro
ambiental para invertebrados terrestres, que representa um importante fator na estruturação
das comunidades (Adis & Junk 2002). Isso é demostrado, por exemplo, pela menor
diversidade de invertebrados terrestres em ambientes periodicamente alagados, em
comparação com ambientes que não estão sujeitos aos pulsos de inundação na Amazônia
Central (Adis & Junk 2002). No entanto, as áreas de baixio apresentam pulsos de inundação
curtos que podem não representar pressão suficiente para que haja convergência morfológica
nesse grupo.
Outros tipos de adaptação a pulsos de inundação são reconhecidas para invertebrados
terrestres, além das morfológicas (Adis & Junk 2002). Características fisiológicas, como por
exemplo, capacidade de permanecer submerso, estão entre as várias possibilidades de
adaptações às regiões alagáveis (Adis & Junk 2002). Também é possível que a sobrevivência
do grupo às inundações seja devido à características comportamentais, como a migração. A
migração vertical de invertebrados terrícolas é menos comum e geralmente ocorre em lugares
com pulsos mais intensos de inundação (Adis & Schubart 1984). A migração horizontal é
mais comum e poderia ocorrer com facilidade no baixio, devido à proximidade das áreas de
vertente. Essas áreas estão quase sempre fora da influência das inundações e poderiam ser um
refúgio durante esses eventos. Assim, o comportamento migratório durante as inundações
205
pode fazer com que o pulso de inundação não represente um filtro ambiental sobre
características morfológicas das formigas.
Agradecimentos
Gostaria de agradecer às pessoas que me ajudaram no desenvolvimento de meu trabalho.
Primeiramente a professora Inara, que me ajudou com a ideia, o Paulinho Rainbow Master,
por TUDO e a professora Ana pelas correções e pela paciência. Obrigada Daniel por me
ajudar com as fotos e Mauro por cuidar de mim no campo. Lucas, Inácio, Fer e Talita, valeu
pela ajuda com as formigas!
Gostaria de agradecer a oportunidade do caralho de participar dessa loucura que é o EFA!!!
Agradeço aos coordenadores, Paulinho mau e Paulinho bom e às monitoras Luizão Manô e
pela ajuda. Manôoo adorei te conhecer, você é uma fofa! Obrigada a todos os professores que
compartilharam da nossa loucura e que ao longo do curso nos ensinaram muito!! Obrigada
Seu Jorge por todos os porras de cada dia e a dona Eduarda pela comida deliciosa.
Em especial gostaria de agradecer às pessoas, que a partir de agora, são muito
importantes em minha vida e que me ensinaram muito!!!! Valeu por todos o momentos
inesquecíveis meus amigos da turma EFA 2011!!!!! Meu clã, obrigada pelas “conversas”.
Meus queridos sentirei saudades!!! Miss trago (Camila), você é tuuuudo de bom gata,
divertida e maluca! Adorooo!!! Skol (Carla), você é uma fofa e tem o dom de ser doce! Dani
bananinha (Dani), minha companheirona!!! Te Adoro! Viva os fungos!! (haha) Garota
Fantástica (Inácio), você é uma delícia (haha). Obrigada por cuidar de mim e me fazer rir
muito. Vai la em casa que vai ter bolo!! (Kkkkk). Monange (Gui), não há como explicar o
quanto te adoro! Obrigada por tudo lindão do axé. Jone (João), você é a pessoa mais meiga
que eu conheço, vou sentir sua falta. Aí Danô! Avatar estranho (Maria Laura), a pessoa mais
transcendental do EFA (KKK). Matrix (Mauro), um cara muito sangue bom! Que brisaaa!!!
206
Dê um beijo na Suelen! Gato Beluga (Rodrigo), obrigada por fazer todos rirem muito!!
Coceirinha (Lucas), sempre disposto a ajudar! Você é 10. Formiga atômica (Talita), você é
muito linda e meiga! Obrigada pelas conversas!! Gata Marilaqui (Fernanda), você é
inexplicavelmente divertida!! Fofuxa pantaneira (Karla), a mais fofa de todas, mas que depois
foi mal influenciada! (KKK) Dregue (Gregório), você é dos meus mano! Ta ligado?
Japoneusa (Ana), a mais linda do EFA 2011!!! Inveja! Mister partoba (Daniel), obrigada pela
ajuda no trabalho, vou te visitar no pantanal! Miojo (Fernando), adorei te conhecer mineiro!!!
Fraga?? Chupa cabra (Thiago), o primeiro candango gente boa que eu conheço!! (haha) e
Ninfo bebê (Raul), companheiro de vários trabalhos, aprendi muito com você!!!
Um imenso obrigada!!!!!!!!!
Ps: Quem quer que seja meu anjo, muito obrigada!!!!
Referências
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the concept of trait be functional! Oikos, 116:882-892.
208
A presença de dossel desconectado em uma estrada é limitante para a movimentação de
Glyphorynchus spirurus (Passeriformes, Dendrocolaptidae)?
Gregório dos Reis Menezes
Introdução
A abertura de estradas geram efeitos negativos sobre os organismos em florestas
tropicais (Laurance et al. 2009). Os impactos imediatos dessas vias incluem a perda de habitat
e mortalidade por colisões com os veículos (Forman 2002). Posteriormente, também ocorrem
mudanças associadas à estrutura e ao microclima nas bordas das matas adjacentes às estradas,
causando alterações na distribuição e na movimentação das espécies (Laurance et al. 2009).
As aves insetívoras de subosque estão entre as espécies mais sensíveis aos distúrbios
advindos da abertura de estradas (Stouffer & Bierregaard Jr. 1995, Stouffer et al. 2006).
Dentre essas aves, as guildas das espécies solitárias de subosque, dos seguidores de formigas
e dos formadores de bandos mistos contêm as aves que mais evitam os ambientes de borda e o
cruzamento de estradas (Develey & Stouffer 2001, Laurance et al. 2004, Laurance & Gomez
2005). A abrupta ruptura do habitat pelas estradas, o aumento da luminosidade, a queda de
umidade, a alta concentração de predadores e as mudanças na estrutura da vegetação desses
locais de borda são fatores que inibem a ocorrência dessas espécies (Laurance et al. 2004).
As alterações florestais associadas à criação de estradas são menos intensas em
pequenas estradas vicinais não-pavimentadas e com pouco tráfego de veículos (Laurance et
al. 2009). No geral, essas vias são mais estreitas, podendo haver conexão do dossel entre suas
margens. Esse aumento de conexão pode favorecer a formação de galerias e aumentar a
permeabilidade da estrada para as espécies de aves florestais (Laurance et al. 2004). Desta
forma, espécies associadas aos ambientes florestais, como as aves insetívoras de subosque
podem ser menos prejudicadas, pois ficam sujeitas a uma ruptura mais branda da floresta.
209
O objetivo do presente estudo foi avaliar como o fechamento do dossel entre margens
de uma estrada pode influenciar na capacidade de uma espécie de ave insetívora de subosque
formadora de bando misto a cruzar essa via. Minha hipótese é que a conexão entre as copas
pode facilitar a movimentação desta ave. Assim espero que em trechos da estrada com dossel
fechado, os espécimes cruzem mais frequentemente a estrada que nos trechos de dossel
aberto.
Métodos
Área de estudo
Esse estudo foi realizado em uma estrada não pavimentada que passa por uma floresta
contínua de terra firme (60°00’O, 2°20’S), localizada a cerca 80 km ao Norte de Manaus,
Brasil. Essa estrada foi aberta na década de setenta para promover acesso a fazendas de gado.
Com a desativação das fazendas, houve o crescimento da vegetação na sua borda. Essa via
possui cerca de 6 m largura, tráfego de veículos reduzido e margens com vegetação em
diferentes estágios de regeneração. Ao longo da estrada é possível encontrar áreas com dois
diferentes níveis de estruturação da vegetação das margens: (1) Dossel fechado - quando as
copas das árvores entre as duas bordas se tocavam e (2) Dossel aberto - quando as copas das
árvores das bordas não se tocavam.
Espécie estudada
A espécie utilizada como modelo de estudo foi o Glyphorynchus spirurus (Dendrocolaptidae).
Esse arapaçu apresenta distribuição geográfica por todo o bioma Amazônico e em uma
pequena faixa de Mata Atlântica na costa leste do estado da Bahia (Ridgely & Tudor 1994). O
Glyphorynchus spirurus habita o interior e bordas de florestas, integra a guilda das aves
210
insetívoras de subosque formadoras de bando misto, é capaz de cruzar estradas estreitas não-
pavimentadas (Laurance et al. 2004) e responde bem a simulação de invasão territorial com o
uso do playback (G. Ferraz, comunicação pessoal)
Técnica de playback e experimentos conduzidos na estrada
O playback tem sido uma técnica apropriada para testar a incidência de uma espécie de ave
em determinada área (Boscolo et al. 2006), bem como para acessar sua capacidade de
movimentação entre habitats descontínuos (Develey & Stouffer 2001, Awade & Metzger
2008). Esta técnica consiste em emitir a vocalização da espécie, simulando a invasão
territorial por um intruso co-específico e estimulando o indivíduo a responder em defesa de
seu território (Falls 1981).
As gravações utilizadas nas seções de playback eram compostas por três sequências de
1 min de vocalização da espécie alvo em intervalos de 30 s. Inicialmente foi realizado uma
seção de playback na estrada para estimular a aproximação do espécime até a borda da mata.
Quando o indivíduo era detectado visualmente ou auditivamente próximo a borda, uma nova
seção de playback era iniciada na borda oposta, para estimular a ave a cruzar a estrada. Nas
situações em que as aves não atravessaram a estrada, ela foi observada por mais 5 min sem
playback. Para evitar que a reprodução dos cantos fosse conduzida mais de uma vez dentro do
território de um mesmo indivíduo, os pontos amostrais foram espaçados no mínimo 200 m um
do outro. Os experimentos foram conduzidos durante as primeiras horas do dia entre 06:00 h e
10:00 h e no entardecer das 16:00 h às 17:30 h. Nesses horários a temperatura do dia é mais
amena e as aves são mais ativas.
211
Resultados
Dos 25 pontos amostrais, em 20 deles G. spirurus respondeu a reprodução artificial do seu
canto. Em todos os casos, apenas um indivíduo se aproximou. A resposta de G. spirurus foi
sempre no primeiro minuto de cada seção. Após a reprodução do canto na margem oposta, os
indivíduos cruzavam a estrada logo nos primeiros segundos de simulação. A frequencia de
travessia de indivíduos de G. spirurus não diferiu entre os trechos de estrada com dossel
aberto e fechado (Tabela 1). Apenas 10% dos indivíduos não cruzaram a estrada.
Tabela 1. Número de indivíduos de G. spirurus que cruzaram a estrada com dossel aberto e
fechado, quando estimulados pela técnica de playback.
Movimentação de G. spirurus Tipo de dossel da estrada
Não cruzou Cruzou
Fechado 1 9
Aberto 2 8
Discussão
Como o arapaçu foi capaz de atravessar estradas em quase todas as amostragens, é provável
que pequenas estradas não sejam barreiras para movimentação dessa ave. Isso indica que
indivíduos dessa espécie podem incluir pequenas manchas de floresta descontínuas em seu
território e atravessar essas vias durantes processos dispersivos.
Ao contrário de diversas espécies de aves insetívoras de subosque que são
negativamente afetadas pela fragmentação do habitat, o G. spirurus consegue permanecer em
fragmentos florestais pequenos e isolados (Stouffer & Bierregard Jr. 1995). O
estabelecimento dessa ave nesses fragmentos está relacionado com a habilidade dos
212
indivíduos de deslocar pela matriz de entorno. O fato dele cruzar a estrada independente da
cobertura do dossel pode explicar porque essa espécie é capaz de manter populações viáveis
em fragmentos florestais. Possivelmente a ausência de um dossel entre os fragmentos não
representa uma barreira dispersiva para indivíduos de G. spirurus.
Os estudos que propuseram avaliar a movimentação das aves em estradas centraram
suas análises em guildas de forrageio (Laurance et al. 2004). Aves de bando misto, no geral,
não se deslocam em áreas de borda de floresta e dificilmente atravessam áreas abertas
(Develey & Stouffer, 2001; Laurance et al. 2004). Por outro lado, G. spirurus apresenta
capacidade de se deslocar por habitat descontínuos, diferente de outras espécies do bando
misto. Assim, estratégias de manejo que visem a conectividade do habitat contemplando
apenas guildas podem ser ineficazes para a preservação das espécies, casos as características
específicas de cada uma sejam mais relevantes para a chance de cruzamento de áreas não
florestas do que as características que determinam a guilda.
Agradecimentos
Gostaria de agradecer ao Paulo Estefano e ao Paulo Henrique pela oportunidade de participar
do curso e contribuírem de uma forma inestimável para minha formação de cientista. Rafael
Leitão pela revisão do manuscrito. Gonçalo Ferraz, Tatiane e Kahl pelas dicas e discussões
sobre as aves. A todos os colegas da turma do EFA pelas trocas de experiência, momentos
alcoólicos e amizade. Ao Seu Jorge, Dona Eduarda e Seu Cardoso pela amizade e
aprendizado ao longo de todo mês de Floresta Amazônica. Aos professores: Braulio,
Tabarelli, Fabrício, Elder, Cíntia, Lorenzo, Adriano, Inara, Jansen, Ana e Zé Luis. Não
poderia deixar de agradecer aos meus orientadores Alexander Christianini e Érica Hasui por
me incentivarem a participar do curso e pela confiança em toda jornada do mestrado.
213
Agradeço também ao Programa de Pós Graduação em Diversidade Biológica e Conservação,
Ufscar-Sorocaba, pelo auxílio financeiro durante o curso e a CAPES pela bolsa de mestrado.
Referências
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connectivity of two Atlantic rainforest birds and their response to fragmentation.
Austral Ecology, 33: 863-871.
Boscolo, D., J. P. Metzger & J. M. E. Vielliard. 2006. Efficiency of playback for assessing the
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change and bird abundance in Amazonian rainforest fragments. Conservation Biology,
20: 1212–1223.
215
Quem tem fome tem pressa? O dano a epífitas em jardins de formigas reduz o tempo de
remoção de herbívoros em potencial
Guilherme Henrique Almeida Pereira
Introdução
Insetos sociais têm maior habilidade competitiva quando comparados a outros insetos
(Grimaldi & Engel 2005). Em geral, organismos sociais dividem tarefas dentro colônia. Os
machos e as rainhas são responsáveis pela reprodução e as outras fêmeas se dividem entre as
atividades de cuidado com a prole, manutenção do ninho, busca por alimento e defesa
(Wilson 1971, Hölldobler & Wilson 1990).
A divisão de tarefas entre os insetos sociais pode se modificar em função da integridade
das colônias. Em colônias de formigas, por exemplo, é possível que as operárias, responsáveis
pelo forrageio, sejam recrutadas para a proteção do ninho quando ele é submetido a danos
(Hölldobler & Wilson 1990). Da mesma forma, indivíduos relacionados à defesa podem sair
da colônia em busca de alimento para suprir suas reservas quando a quantidade de recursos
estocados é pequena (Hölldobler & Wilson 1990). Uma vez que o número de indivíduos em
uma colônia é relativamente constante em curtos intervalos de tempo, é possível que colônias
de formiga submetidas a danos que comprometam a integridade do ninho estejam sujeitas
uma demanda conflitante (Begon 2006). Nesse sentido, o maior investimento em defesa pode
estar relacionado ao decréscimo da atividade de forrageio.
Jardins de formigas são interações desenvolvidas entre duas espécies de formiga e
plantas epífitas, muito comuns em florestas tropicais da América do Sul e Ásia (Hölldobler &
Wilson 1990). Nesse tipo de interação, as formigas são atraídas por compostos nutritivos
presentes na parte externa de sementes de epífitas e após consumi-los incorporam as sementes
às paredes dos ninhos (Hölldobler & Wilson 1990). Ao germinarem, as epífitas conferem
216
maior estabilidade ao ninho pelo desenvolvimento do sistema radicular e podem prover
recursos alimentares como nectários extra-florais, sementes e frutos ricos em nutrientes para
as formigas (Hölldobler & Wilson 1990, Shultz & McGlynn 2000). Em contrapartida, as
epífitas são favorecidas pela alta concentração de nutrientes nos ninhos e pela defesa das
formigas contra o ataque de herbívoros (Santos 1999). Uma vez que as epífitas de jardins
provêem abrigo e alimento para as formigas, a manutenção da integridade do ninho pode ser
dependente da integridade das epífitas. Nesse sentido, meu objetivo nesse trabalho foi
investigar como formigas de jardim respondem à integridade das epífitas em seus ninhos.
Minha hipótese é que as formigas investem mais na defesa das epífitas que no forrageio no
forófito em jardins cujas epífitas apresentam dano foliar.
Métodos
Área de estudo
Realizei o estudo na Fazenda Esteio que está inserida na Área de Relevante Interesse
Ecológico PDBFF, localizada na Amazônia Central, cerca de 80 km ao norte de Manaus, AM,
Brasil. A vegetação da região é composta por floresta ombrófila densa contínua de terra firme.
O clima é do tipo tropical úmido de acordo com a classificação de Köppen (Peel et al. 2007)
com temperatura média anual de 26,7 ºC e pluviosidade anual variando entre 1900 e 2500 mm
(Lovejoy & Bierregaard 1990).
Os jardins de formigas da Amazônia Central são formados pela associação
parasimbiótica das espécies de formiga Camponotus femoratus (Formicinae) e Crematogaster
levior (Myrmicinae) (Omena 2009). Formigas C. levior iniciam a construção dos ninhos em
plantas lenhosas ou na base de epífitas (Leal 2010). Após a construção, formigas C. femoratus
colonizam os jardins ocupando câmaras adjacentes aos ninhos das fundadoras (Omena 2009).
217
Até o momento, 16 espécies de epífitas foram descritas em associação com os ninhos dessas
espécies de formigas, das quais quatro estão sempre presentes nos jardins: Peperomia
macrostachya (Piperaceae), Codonanthes calcarata (Gesneriaceae), Anthurium trinerve e
Philodendron megalophyllum (Araceae) (Jacovack 2006).
Delineamento amostral
Amostrei 20 jardins situados a até 2 m do solo em forófitos (árvores suporte)
localizados ao longo da estrada que dá acesso à ARIE-PDBFF. Medi o maior e o menor
comprimento de cada jardim para estimar a sua área. Calculei a área de cada jardim (AJ)
usando a forma da elipse (AJ=π*comprimento maior*comprimento menor/ 2). Para testar o
efeito da integridade do jardim sobre o comportamento de defesa das formigas, dividi os
jardins em dois grupos: injuriado e íntegro. Como os jardins apresentaram dimensões
variadas, distribuí jardins grandes e pequenos equitativamente entre os grupos. Para o
tratamento injuriado, removi cerca de 10% das folhas das epífitas de 10 jardins. Para o
tratamento íntegro, mantive as epífitas intactas.
Um dia após a injúria, simulei a presença de herbívoro nos jardins dos dois grupos para
avaliar o comportamento de defesa das formigas. Utilizei cupins Nassutitermis sp. como
modelo de herbívoro. Coloquei dois cupins por grupo, um no tronco do forófito e o outro no
ramo das epífitas. Em cada jardim sorteei o local em que depositei primeiro cada cupim. Usei
cola branca para fixar os cupins a 10 cm do jardim nos dois locais (forófito e epífita).
Cronometrei o tempo de remoção do cupim pelas formigas após colocá-los em cada local.
Durante a realização do experimento, evitei tocar no forófito a fim de não provocar uma
reação de alarme nas formigas e influenciar no tempo de remoção dos cupins. Se as formigas
investem mais na defesa do jardim que no forrageio no forófito quando a integridade das
epífitas é ameaçada, espero que (i) nos jardins injuriados, o tempo de remoção do cupim seja
218
menor na epífita e maior no forófito, (ii) nos jardins íntegros, espero que a localização do
cupim não influencie no tempo de remoção e (iii) entre os jardins, espero que o tempo de
remoção do cupim localizado na epífita seja menor nos jardins injuriados quando comparados
aos íntegros.
Transformei os dados em logaritmo para cumprir os pressupostos de normalidade e
homogeneidade de variâncias. Realizei uma análise de variância com medidas repetidas para
comparar o tempo de remoção entre os tratamentos e os locais de posição dos cupins.
Considerei os tratamentos dos jardins (injuriado e íntegro) como variável explicativa e os
locais de um mesmo jardim (forófito e epífita) como medida repetida.
Resultados
A área dos jardins variou entre 44 e 3141,6 cm2. Em 18 dos 20 jardins, Peperomia
macrostachya (Vahl) A. Dietr. (Piperaceae) foi a única epífita associada aos ninhos. Em
relação às espécies de formiga, observei a ocorrência de C. femoratus e C. levior em 16
jardins. No entanto, somente C. femoratus removeu os cupins. Nos outros quatro jardins (com
os menores tamanhos) apenas C. levior estava presente. Nesses jardins não houve remoção
dos cupins.
O tempo de remoção dos cupins no forófito e na epífita foi semelhante entre os jardins
injuriado e íntegro (FTratamento*Local (1,18)=0,0002; p=0,99, Figura 1). Não houve diferença no
tempo de remoção entre a epífita e o forófito (FLocal (1,18)=3,52; p=0,08), No entanto, nos
jardins injuriados as formigas removeram os cupins quatro vezes mais rápido quando
comparados aos jardins que não receberam injúria (FTratamento (1,18)=4,41; p=0,05).
219
Figura 1. Tempo de remoção do herbívoro na epífita e no forófito de jardins de formiga,
íntegros e submetidos a injúrias físicas, em floresta ombrófila densa contínua de terra
firme na Amazônia Central, Amazonas, Brasil. Pontos indicam médias e barras verticais
indicam o intervalo de 95% de confiança.
Epífita Forófito
Localização do herbívoro
0
1
2
3
4
5
6
Tem
po d
e re
moç
ão (s)
Jardim injuriado Jardim íntegro
Discussão
O menor tempo de remoção do cupim nos jardins de formiga submetidos à injúria indica que
o dano nas epífitas estimula o recrutamento das formigas, principalmente operárias de C.
femoratus, mesmo 24 h após o dano. Contudo, a semelhança no tempo de remoção do cupim
no forófito e na epífita dos jardins injuriados indica que não há um maior investimento da
colônia na defesa em jardins submetidos à herbivoria.
Estudos relatam que a herbivoria estimula o recrutamento de formigas e reduz o tempo
de resposta à presença de herbívoros em plantas mimercófitas imediatamente após o dano nas
folhas (Emílio et al. 2005, Trevelin 2007, Gonçalves-Souza 2007, Capurucho 2010). Este
comportamento é observado também nos jardins de formiga, onde há recrutamento expressivo
220
de indivíduos de C. femoratus (Vieira-Neto et al. 2006, Mundim et al. 2007, Leal 2010) uma
espécie eficiente na defesa do ninho e das epífitas do jardim (Leal 2010). No entanto, uma vez
que não foi observada diferença no tempo de remoção dos cupins entre a epífita e o forófito, o
maior recrutamento nos jardins injuriados deve estar associado a alguma atividade diferente
da defesa. A epífita mais freqüente nos jardins (P. macrostachya), além de proporcionar
sustentação aos ninhos, têm nectários extra-florais e é fonte de alimento para as formigas
(Jacovak 2006). Talvez o dano a que elas foram submetidas tenha alertado as formigas de que
houve uma redução no suprimento alimentar das colônias. Como consequência, o número de
formigas pode ter aumentado em toda a região próxima ao jardim. A maior atividade de
forrageio reduziria o tempo de encontro dos cupins tanto nas epífitas quanto no forófito.
Apesar de aparentemente haver maior recrutamento de indivíduos para busca de
alimento, a semelhança no tempo de remoção dos cupins na epífita e no forófito indica que o
aumento do investimento em forrageio não compromete a defesa proporcionada às epífitas
pelas formigas. Porém, se há um aumento no forrageio, isso pode indicar que o fornecimento
de alimento das epífitas é mais importante que a estabilidade que suas raízes proporcionam
aos ninhos. Caso contrário, a atividade de defesa deveria ter sido maior.
Agradecimentos
Lembrar de todas as coisas que aconteceram nestes dias é um momento muito especial e que,
apesar da nostalgia de tamanha felicidade, dá um apeeeerto no peito. Nóoo! Já é a saudade
batendo à porta...gritando, loucamente atrás de mim..rs. Mas vamos lá... Obrigado Zé Luis,
Paulinho Enrique (Rainbow Master) e Paulinho Estéfano (New Marilaqui) por me permitirem
voltar à Mazônhia e poder vivenciar estes 30 dias (in)teeeensos de EFA. E às monitoras
preferidas, Manô (Coração gelado) minha super bonitora (FRAG e EFA 2011) e Laura
(Pezão), por me deixar ir para o Céu nos 45’ do segundo tempo, adoooro! Vcs são demaaais!
221
A todos vocês, obrigado pelos dias muito bons de puxões de orelha e aprendizado e outros
dias melhores ainda de amizade, conversas sobre vida, trabalho, e farra é claro,
gonorâaante..rs. Aos meus mais novos suuuperamigos, com os quais vivi quase 10 anos em 30
dias, muito obrigado pelos momentos de companheirismo, coleguismo, amizade, palhaçada e
putaria que passamos juntos em meio a prazos e noites sem dormir à entrega de relatórios
intermináveis, não eh mesmo Pezão? rs. Ao João Jony Walker por sua história inusitada de
vida, que me ensinou muita coisa. À Fernandinha Marilaqui pelos momentos que passamos
lindamente juntos e que ainda passaremos em Recife, no Rio e no mundo afora, vamos arrasar
gata! À Fran, pelo carinho sem fim e pelas massagens que me salvaram, delícia! Juro que
casaria contigo...rs, ano que vem vou p’ra Goiás . À Ca(mila), amor, pelo carinho infinito com
que me acolheu já na primeira semana...vamos nos ver em Sampa! Ao Rodrigo Tio Sukita
(bunitah!) que conheci no EFA..rs, pelas injeções de ânimo que nos deu, junto com Marilaqui
Roxeli, ao longo desses 30 dias. À Dani Bananinha, Karlinha Fofuxa Pantaneira e Ana
Japoneusa, que fofas meu Deusu..obrigado pelo carinho. Ao Maurão Matrix e à Lauracea
Avatar Estranha, cujos mundos foram uma ótima fulga nos momentos de tensão. Ào Inácio
Garota Fantástico, pelo intelecto e conversas jogadas fora. À Talitinha Formiga Atômica, pelo
exemplo de trabalho, linda! Ao Ninfobebê Raul pela inteligência precoce que muito me
ensinou. Ao Dreg Gregório, Lucas Coceirinha, ao Fernando Miojo, ao Thiago Lobisomem, à
Carla Skol e ao Daniel Mr. Partoba, obrigado pelas risadas e aprendizado. É isso galera!
Obrigado a todos por tuuudo! Além de São Paulo, Pernambuco e Goiás, aguardo convites
para encontrá-los nesse Brasilsão afora e espero todos no Rio...Ou onde eu estiver, nessa
louca vida acadêmico-científica! Tenho um carinho especial por cada um. Obrigaduuuuú!
Não poderia esquecer de agradecer à Adriane pelo carinho e atenção, ao seu Jorge (porra!) e
Dona Eduarda pelo frango nosso de cada dia, ao Seu Cardoso e a todos que não conheci mas
foram fundamentais para realização desta 20ª edição do EFA. Ah! Não poderia deixar de
222
agradecer ao meu brother Tiago Amorim (Preto - EFA 2010), pessoa incrível que foi decisivo
para que eu participasse desse curso, obrigado camarada! Obrigado ao curso de Pós-
Graduação em Ciências Ambientais e Florestais da UFRRJ e à minha mãe..rs, pelo apoio. Te
amo, mãe! Vc tbm pai! E a todos aqueles que, pela emoção e nervosismo do momento, fui
impedido de lembrar, muito obrigado!
Referências
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Quanto mais, melhor: aranhas ajudam a reduzir a herbivoria em Tococa bullifera
(Melastomataceae)
Inácio José de Melo Teles e Gomes
Introdução
Em florestas tropicais, a herbivoria pode afetar importantes aspectos estruturais e funcionais
de comunidades vegetais, já que cerca de 50% das espécies de insetos dessas florestas são
herbívoros (Almeida-Cortez et al. 2004). Para diminuir as pressões exercidas por esses
herbívoros, as plantas apresentam estratégias de defesa variadas (Coley & Barone 1996).
Essas estratégias de defesa podem ser diretas ou indiretas. Na defesa direta, as plantas podem
produzir estruturas, como tricomas e espinhos e/ou investir em produção de compostos
químicos de defesa, como alcalóides e terpenóides (Schaller 2008). Por outro lado, a defesa
indireta ocorre quando plantas apresentam associações com predadores ou parasitóides de
herbívoros. Esses predadores e parasitóides são atraídos por recursos disponibilizados pelas
plantas e consomem os herbívoros, evitando que estes predem a planta (Bruinsma & Dicke
2008).
A estratégia de defesa indireta pode ser facultativa, quando os organismos envolvidos
podem persistir no ambiente na ausência dos seus parceiros (Boucher et al. 1982). Contudo, a
relação entre os organismos também pode ser obrigatória, quando nenhuma das partes
consegue persistir na ausência da outra (Moraes & Vasconcelos 2009). Exemplos clássicos de
defesas indiretas obrigatórias ocorrem entre formigas e plantas, chamadas mirmecófitas
(Beattie 1985, Benson 1985, Davidson & McKey 1993). Essas relações são espécie-
específicas e os parceiros dependem um do outro para sua sobrevivência (Beattie 1985).
Nesses sistemas, as colônias de formigas recebem abrigo e/ou alimento da mirmecófita e a
226
protegem contra os herbívoros ao se alimentarem dos insetos que visitam a planta (Schaller
2008).
Além das formigas, outros artrópodes podem se associar de maneira específica com
plantas mirmecófitas (Venticinque & Fowler 1996). Dentre esses artrópodes, as aranhas são
os mais frequentemente encontrados (Letourneau & Dyer 1998, Rosado et al. 2004, Kasper
2006). Em algumas mirmecófitas, ocorrem algumas aranhas que se alimentam exclusivamente
das formigas que habitam a planta (e.g. Price et al. 1986, Letourneau & Dyer 1998). Por
exemplo, aranhas das espécies Dipoena banksii e D. bryantae são predadoras especialistas de
formigas associadas às plantas Piper obliquum e Hirtella myrmecophila, respectivamente
(Gastreich 1999, Rosa 2008). Como consequência, a presença dessas aranha diminui o
patrulhamento das formigas sobre as folhas em que elas estão presentes, aumentando a
herbivoria nessas partes da planta (Gastreich 1999, Rosa 2008). Faiditus subflavus é um outro
exemplo de aranha que ocorre em plantas mirmecófitas (Santos 2007). Essas aranhas são
associadas à mirmecófita Maieta guianensis, que é ocupada pela espécie de formiga Pheidole
minutula. Nesse sistema, as aranhas dependem da formiga que, ao protegerem sua colônia,
protegem a ooteca de F. subflavus, maximizando o sucesso reprodutivo da aranha (Santos
2007).
Em outra mirmecófita amazônica, Tococa bullifera (Melastomataceae), há a presença de
uma aranha (aqui chamada aranha amarela) associada ao sistema formado por essa planta e a
formiga Azteca spp. (Vasconcelos & Davidson 2000). Sabe-se que não há interações
agonísticas entre a aranha amarela e as formigas associadas a T. bullifera (Menezes 2011).
Essa espécie de aranha constrói teias orbiculares que são voltadas para fora do eixo central do
ramo da planta e seus pontos de inserção estão em duas ou três folhas (obs. pess.). Esse
formato de teia sugere que a aranha se alimenta dos insetos que vêm visitar a planta. Dessa
227
forma, a aranha amarela estaria consumindo possíveis herbívoros de T. bullifera, reduzindo a
sua pressão de herbivoria.
O objetivo deste trabalho é analisar se há efeito da aranha amarela sobre T. bullifera.
Minha hipótese é que as aranhas amarelas protegem T. bullifera contra herbivoria. Minhas
previsões são (1) o índice de herbivoria foliar será menor em ramos de T. bullifera que
possuírem maior número de aranhas amarelas e (2) o índice de herbivoria foliar de T. bullifera
aumentará após a remoção das aranhas amarelas dos ramos.
Métodos
Área de estudo
Realizei o estudo na Reserva do Km 41 (2° 24’ S; 59° 44’ O), a cerca de 80 km ao norte de
Manaus. A reserva é considerada uma ARIE (Área de Relevante Interesse Ecológico) e é
gerida pelo ICMbio e pelo Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF).
Modelos de estudo
A planta Tococa bullifera é um arbusto de sub-bosque que atinge no máximo 3 m de
altura. Ela possui estruturas ocas nas bases de suas folhas, que são conhecidas como
domáceas. Essas estruturas são ocupadas principalmente pelas colônias de formigas do gênero
Azteca e eventualmente outras espécies de formigas, como Crematogaster laevis
(Vasconcelos & Davidson 2000). Essas espécies de formigas vivem nessas plantas e reduzem
a herbivoria de T. bullifera ao se alimentarem dos seus herbívoros. A aranha amarela, cuja
espécie ainda não foi possível identificar, se encontra associada a esse sistema. Não há
registros da ocorrência dessa espécie em T. bullifera. Entretanto, ela foi encontrada
228
abundantemente em toda a área de estudo, sempre associada a essa planta (ver outros
trabalhos neste volume, em Menezes J.P.C e Ternes M.L.F).
Delineamento
Selecionei 25 indivíduos de T. bullifera ao longo das trilhas da área estudada. Em cada planta,
escolhi um ramo ao acaso e estimei a herbivoria média utilizando o índice proposto por Dirzo
& Domingues (1995). Esse índice atribui uma categoria de herbivoria para cada uma das
folhas de acordo com a porcentagem de área foliar consumida: 0% (categoria 0); 1-5%
(categoria 1); 6-12% (categoria 2); 13- 24% (categoria 3); 25-50% (categoria 4) e 51-99%
(categoria 5). Em seguida, contei o número total de indivíduos de aranhas amarelas presentes
em cada ramo.
Para testar a previsão 2, selecionei 19 dos 25 indivíduos de T. bullifera amostrados.
Após estimar a herbivoria de cada ramo, removi todas as aranhas amarelas do ramo focal e
ramos adjacentes, que poderiam funcionar como fonte para recolonização do ramo focal pela
aranha amarela. Voltei a estimar a média do índice de herbivoria de cada ramo depois de 48 h.
Análises estatísticas
Para a análise da relação entre o número de aranhas e a média do índice de herbivoria, utilizei
uma regressão linear simples. Transformei os dados usando log10, uma vez que a distribuição
dos dados não era normal. Para verificar se houve efeito da remoção das aranhas na herbivoria
foliar, comparei as médias dos índices de herbivoria antes e depois da remoção usando um
teste t-pareado.
229
Resultados
O número médio (± desvio padrão) de aranhas encontradas por ramo foi de 4,48 (± 4,1). O
índice de herbivoria média encontrada foi de 1,96 (± 0,82). A herbivoria foi maior nos ramos
com menos aranhas amarelas quando comparada aos ramos com maior quantidade de aranhas
(F(23,2)=9,87; r2=0,30; p=0,005; Figura 1). Após 48 h da remoção das aranhas amarelas, o
índice de herbivoria aumentou em 0,19 (t=-2,19; gl=18; p=0,042; figura 2).
Figura 1. Relação do índice de herbivoria e do número de aranhas amarelas por ramo de
Tococa bullifera.
-0,2 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4
Número de aranhas
-0,1
0,0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
Índ
ice
de
her
biv
ori
a
Número de aranhas (log10)
Índi
ce d
e he
rbiv
oria
(lo
g 10)
y= -0,3165x + 0,4615
230
Discussão
A aranha amarela contribui para que T. bullifera seja menos consumida por
herbívoros. Ramos com maior número de aranhas apresentam menor consumo foliar por
herbívoros. O aumento da herbivoria das folhas de T. bullifera após a remoção das aranhas
amarelas reforça a importância da presença delas para a proteção da planta. Esse aumento da
herbivoria após a remoção das aranhas poderia ser o efeito do tempo. Entretanto, o fato de a
maior quantidade de aranhas nos ramos estar relacionada às baixas taxas de herbivoria reforça
que essa diferença não é meramente efeito do tempo. Em apenas 48 h, as taxas de herbivoria
não deveriam aumentar significativamente sem um processo biológico atuando sobre esse
sistema.
A grande concentração de aranhas amarelas em um mesmo ramo gera uma grande
quantidade de teias cobrindo parte da superfície aérea, impedindo ou inibindo que insetos
herbívoros se aproximem da planta. Uma vez que o herbívoro consiga alcançar a planta, T.
bullifera ainda conta com a defesa das formigas que vivem associadas às suas domáceas
(Vasconcelos & Davidson 2000). Dessa forma, existe um efeito sinérgico da aranha e da
Figura 2. Valores médios dos índices de herbivoria em cada um dos ramos de Tococa
bullifera antes e 48 h depois da remoção das aranhas amarelas.
Antes da remoção Após a remoção
Índi
ce d
e he
rbiv
oria
231
formiga sobre a predação de herbívoros em T. bullifera. Caso haja algum efeito negativo da
aranha sobre a planta, ele seria associado ao consumo dos seus visitantes florais.
O fato de a aranha amarela estar associada ao sistema da mirmecófita T. bullifera e da
formiga Azteca e ajudar na defesa da planta sugere que se trata de uma terceira espécie
envolvida nesse mutualismo. A presença da aranha amarela nesse sistema é particularmente
curiosa, pois em outras mirmecófitas da família Melastomataceae, as aranhas associadas têm
papéis diferentes, como predação ou parasitismo das formigas. Uma vez que as diferentes
espécies de aranhas têm papéis diferentes em cada planta, os processos evolutivos que
levaram a esse mutualismo são distintos. A melhor compreensão da via evolutiva desses
sistemas pode ajudar a entender alguns processos que estruturam comunidades e os fatores
que agem sobre a manutenção das espécies nos ambientes naturais.
Agradecimentos
Concluir o EFA me remete à sensação do dever cumprido. Essa sensação é uma mistura de
êxtase e melancolia. Êxtase pela felicidade em fazer algo que já era um sonho antigo e
melancolia porque tudo o que é bom acaba em melancolia quando acaba. Tenho de agradecer
pelas ajudas oferecidas pelos meus orientadores, Dr. José Henrique Schoereder e Dr. Ricardo
Ildefonso de Campos. Devo profundos agradecimentos aos coordenadores do 20º EFA pela
oportunidade. Ao Dr. José Luis Camargo pela chance e por confiar em mim. Ao Paulinho do
mau (The new Marilaqui), pelas ótimas conversas profissionais e sobre a vida. Ao meu
querido Paulinho do bem (Master ultra mega aloka rainbow), que me ouviu, me orientou me
fez crescer muito e, com toda sua purpurina, tornou os dias negros do EFA em arco-íris. Meus
sinceros agradecimentos à monitora Laureth pezão pelas palavras, pelos conselhos e por me
chamar de gato nas festinhas. À monitora mais mãezona que já conheci, Manô do clã do meu
coração: obrigado pelas conversas e por ser uma grande amiga. Ao seu Jorge, dona Eduarda e
232
seu Cardoso por trabalharem duro e fazer tudo acontecer. Como deveria agradecer à turma
que deixou de ser a turma de um curso de férias para ser a galera do mês mais intenso da
minha vida? Tenho de agradecer com todo meu coração aos 19 navegantes dessa aventura
selvagem. Devo agradecer ao Lucas coceirinha, meu companheiro laborecóide, que foi
sempre um forte seguro nesse mês. À Camila Cãmis, minha mais nova amiga de infância, que
me ouviu, me zelou, me aconselhou, me acrescentou e se tornou uma pessoa tão expressiva na
minha vida. À Carlinha Skol, por ser minha grande amiga de falar besteiras e planejar zoeiras
que alegraram nossos dias. Ao Daniel, por me ensinar muito no dia-a-dia com seu jeitão nerd.
À Dani Banininha, por dividir comigo todo o deslumbramento que este lugar causa na alma
de um biólogo. Ao Maurão, por ser tão diferente do convencional e por me mostrar os
caminhos alternativos das sensações e do pensamento. Ao Thiagão Lambisomem, por ser o
líder da matilha que varava as madrugadas. À Fran Missfrega, pelos carinhos, massagens e
meiguice irrepreensíveis de uma goiana nata. Ao Fernando, pela amizade que vou levar pras
minas gerais. Ao João Jhonny, por ser de um dos três “b”de Minas Gerais e relembrar comigo
da minha segunda terra natal. À Karlinha Fofuxa Pantaneira, pela calma e harmonia que
irradiava da sua presença. Ao Raul, pela alegria e sinceridade de cada papo. Ao Guilherme
Monange, por me fazer amadurecer em cada conversa e discussões de trabalho que tivemos.
À Ana Japoneuza, que se soltou e se tornou a linda Ana que me cativou. À Laurinha, por
aguentar minhas bizarrices rindo comigo e me fazer sorrir em cada abraço. Ao Greg Drag,
pela grande disposição e preocupação em ser um bom amigo. À Talita, por me surpreender
com a pessoa linda que ri, argumenta, compartilha e ensina. Não poderia deixar de agradecer
junta e lindamente ao casal mais espetacular deste curso: Marilac e seu apêndice, Sukita. Sua
relação alegrou meus dias, meus ralatórios, minhas noites, minhas festas e meu mês; parabéns
pela linda amizade que construíram. Meus caros, valeu pelas zueiras, ralações, ralatórios,
233
festas, bebedeiras, viagens, papos, amizades, cumplicidades, aventuras, histórias e estórias.
Muito obrigado!
Referências
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relation to resource availability: tradeoffs or common responses to environmental
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235
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Amazon. Ciência e Cultura, 40:71‐73.
236
A aranha associada à Tococa bulifera é protegida pelas formigas?
João Paulo Cunha de Menezes
Introdução
A seleção de habitat pode ser definida como a escolha que os indivíduos fazem por locais
favoráveis à sua sobrevivência (Orians 1991). Em geral, os locais selecionados possuem
maior disponibilidade de recursos, maior facilidade para a captura de presas ou oferecem
abrigo contra predadores (Allan 1995).
A presença de predadores pode induzir mudanças na escolha do habitat em algumas
espécies (Lima 1998). Frequentemente, as presas selecionam novos habitats quando o
predador se aproxima dos habitats originalmente ocupados por elas (Welborn et al. 2006). Por
isso, é provável que as presas sejam capazes de detectar a presença de predadores e mudar de
lugar em resposta (Wooster & Sih 1995).
Em alguns casos, a associação entre espécies reduz a chance de predação (Wooster &
Sih 1995). Por exemplo, lagartas de algumas espécies de borboleta, da família Lycaenidae, se
beneficiam da proteção conferida por formigas. Nesta relação ambos são beneficiados: as
formigas recebem alimento (exudato) e, por sua vez, protegem as lagartas conta inimigos,
como parasitas, competidores e ou predadores (Pierce et al, 2002). Em aracnídeos, a seleção
por habitats associados à presença de outros organismos (Tallamy 1999) pode ocorrer como
uma forma de defesa contra parasitóides, que em geral, possuem habito de forrageamento
diurno.
Na Amazônia Central, associações entre plantas, formigas e aranhas são comuns. Por
exemplo, a aranha Faiditus subflavus, associa-se exclusivamente a plantas mirmecófitas das
espécies Maieta guianensis e Maieta poepigii (Fáveri 1998, Kasper 2006, Requena 2007).
Nessas plantas a aranha supostamente se apoveita das formigas para conseguir proteção
237
adicional da ooteca contraoredacao (Requena 2007). Outra planta mirmecófita que possui
associação com uma espécie de aranha é Tococa bulifera, (Melastomataceae). Além da
presença da aranha, T. bulifera apresenta associação mutualística com formigas
Crematogaster laevis (Mayr) (Myrmicinae) ou Azteca sp. (Dolichoderinae) que colonizam
estruturas constituídas por um par de câmaras ocas localizadas na base das folhas, conhecidas
como domáceas (Vasconcelos & Davidson 2000). A aranha associada a T. bulifera possui teia
orbicular que fica tencionada em forma de funil. Durante o dia a aranha visivelmente
permanece muito próxima da domácea, mas se afasta sempre da domáceas quando é tocada
por alguma formiga. Apesar da ocorrência mais frequente da aranha na base das folhas
próximas às domáceas de T. bulifera (observação pessoal), não se sabe por que essa aranha
ocorre exclusivamente nessa planta. Predadores e parasitóides de aranhas de modo geral são
diurnos, podendo alterar o comportamento de forrageio das aranhas em relação ao período do
dia. Neste contexto, meu objetivo foi avaliar se as aranhas encontradas em T. bulifera se
estabelecem próximas às domáceas para utilizar as formigas como proteção contra predadores
ou parasitóides. Se isso ocorrer, espero que i) as aranhas fiquem mais próximas às domáceas
no período diurno, ii) que o tempo de captura de presa pela aranha seja maior durante o dia
que durante a noite e iii) que as aranhas se estabeleçam próximas as domáceas que possuem
maior número de formigas.
Métodos
Área de estudo
Realizei este estudo na Fazenda Esteio (Km 41), localizada cerca de 80 km ao norte de
Manaus, AM, Amazônia Central. A reserva esta inserida na Área de Relevante Interesse
Ecológico PDBFF. A vegetação é formada por floresta ombrófila densa contínua de terra
238
firme (Ribeiro et al. 1999). O clima é do tipo tropical úmido de acordo com a classificação de
Köppen (Peel et al. 2007) com temperatura média anual de 26,7 ˚C e pluviosidade anual
variando entre 1900 e 2500 mm (Lovejoy & Bierregaard 1990).
Coleta e análise dos dados
Selecionei 19 indivíduos de T. bullifera localizados por busca ativa no interior da mata. Em
cada planta, avaliei o comportamento de apenas uma aranha associada a uma das domáceas.
Para evitar um eventual viés na resposta das aranhas causado por diferentes espécies de
formigas que ocorrem em T. bullifera, amostrei apenas plantas com colônias de
Crematogaster laevis. Evitei tocar nas plantas durante a amostragem para não estimular
reação de alarme nas formigas, que pudesse gerar alterações comportamentais nas aranhas.
Para testar se existe diferença entre a distância da aranha até a domácea por período do
dia, medi a distância da aranha em relação à domácea mais próxima, em cada período do dia
(dia e noite). Como medi as distâncias nos mesmos indivíduos nos dois períodos, realizei um
teste t pareado.
Com o objetivo de testar se o tempo de captura de uma presa pela aranha é maior
durante o dia em relação à noite, ofertei uma formiga para as aranhas (Pheidole minutula) em
cada período do dia. Escolhi a P. minutula, por ser menor que a aranha e por isso, dificilmente
representaria uma ameaça de predação a aranha e à integridade da teia. Em seguida,
cronometrei o tempo que a aranha levou para se aproximar da presa. Realizei um teste t para
comparar o tempo de reação das aranhas em resposta a deposição de P. minutula entre o dia e
a noite.
Para avaliar se as aranhas se estabelecem próximas às domáceas que possuem maior
número de formigas, coletei a domácea utilizada pela aranha como ponto de apoio para o
estabelecimento da teia e também a domácea mais próxima sem a presença da aranha no
239
mesmo ramo. Para cada domácea quantifiquei o número total de formigas presentes. Para não
perder o pareamento dos dados das aranhas e formigas do mesmo ramo, transformei os dados
de abundancia de formigas em um valor binário (0, 1). Para isso, dividi os pares representados
pela domácea com aranha e pela domácea sem aranha de uma mesma planta em dois grupos
(selecionados ao acaso). Associei o valor 1 a cada par de um grupo e o valor 0 a cada par do
outro grupo. Para o valor 1 considerei a domácea próxima a aranha como sendo focal e para o
valor 0 considerei a domácea sem a aranha próxima como sendo a focal. Após separar os
grupos, subtraí o número de formigas das domáceas focais do das não focais para cada par.
Com os valores obtidos realizei uma regressão logística. Sendo assim, se as aranhas escolhem
domáceas com maior número de formigas, espero que pares com denominação 1 apresentem
valores positivos da diferença entre o número de formigas entre as domáceas focal e não
focal. Para o valor 0 espero valores negativos para a diferença entre o número de formigas
entre as domáceas focal e não focal.
Resultados
A distância entre a aranha e a domácea durante o dia (0,26±0,31 cm) foi 11 vezes menor do
que durante a noite (3,05±2,19 cm) (t=5,42, gl=18, p<0,001; Figura 1). O número de formigas
nas domáceas não determinou a ocorrência da aranha associada a T. bulifera (χ²=0,61, gl=1,
p=0,22). O tempo de reação da aranha na presença de uma presa não diferiu entre os períodos
do dia (t=0,38, gl=36, p=0,35, Figura 2). Embora tenha ocorrido aproximação da aranha nas
presas, as aranhas retiraram todas as formigas da teia sem as predar. Durante as observações,
o único evento de predação foi de um díptero.
240
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
Dia Noite
Dis
tânc
ia (c
m)
Período do dia
Figura 3. Distâncias dos indivíduos de uma espécie de aranhas da domácea mais próxima em
Tococa bullifera durante o dia e noite, em uma área de floresta contínua de terra firme na
Amazônia Central.
Dia Noite
Período do dia
0
50
100
150
200
250
300
350
Tem
po (
s) d
e re
spos
ta d
a ar
anha
fren
te a
pre
sa
Figura 4. Tempo de resposta dos indivíduos de uma espécie de aranha frente à presença de
uma presa (Pheidole minutula), no período diurno e noturno em uma floresta contínua de terra
firme na Amazônia Central.
241
Discussão
A proximidade da aranha às domáceas durante o dia pode indicar que as formigas fornecem
algum tido de proteção. Uma vez que as formigas protegem a planta contra ataques de
herbívoros e parasitas, as aranhas podem ser beneficiadas. Porém, essa proteção não está
associada com o número de formigas nas domáceas. Em relação ao tempo de resposta frente a
uma presa, não é possível avaliar se as aranhas mudam seu tempo de reação por período do
dia uma vez que elas não predaram as formigas.
A presença da aranha próxima à domácea no período da manhã possivelmente está
relacionada ao horário de forrageamento dos parasitóides. Se eles são mais ativos durante o
dia, as aranhas podem ganhar mais proteção ao se aproximarem das formigas nas domáceas.
Crematogaster laevis, apresenta uma defesa química, liberando acido fórmico pelo abdômen.
Desta forma, o potencial de defesa proporcionada por cada formiga pode ser mais importante
que o número de indivíduos presentes na domácea, uma vez que poucas formigas são
suficientes para oferecer proteção indireta às aranhas.
O fato das aranhas não escolherem domáceas com maior número de formigas, pode
estar relacionado ao comportamento desses himenópteros. As formigas ficam constantemente
forrageando ao longo da planta. Portanto, é possível que a aranhas estejam sempre próximas
de uma formiga caso o predador se aproxime. Assim o tempo de resposta de defesa da aranha
pela formiga pode ser independente da proximidade da aranha até a domácea.
As aranhas não predaram as formigas P. minutula ofertadas. Uma vez que a C. leavis é
maior e possui defesa química, possivelmente as aranhas também não predam as formigas
presentes em T. bulifera. Por outro lado, o fato da aranha ter predado uma mosca durante as
observações pode indicar que eventualmente as aranhas são especializadas em predar dípteros
parasitóides das formigas.
242
Agradecimentos
Agradeço imensamente aos organizadores do EFA 2011 (20º edição, uhuuuu), pela
oportunidade de participar de um curso que foi enriquecedor sob todos os aspectos. Ganhei
experiência e inspiração para me tornar uma pessoa e um profissional bem melhor. Agradeço
ao Thiago Kloss (Fanfarrão) pelo apoio moral e pelo trabalho corrigido, valeu mesmo
brother. Agradeço a todos os professores e corretores que tivemos, em especial a Ursinho
coração gelado (Manú) e Luizão (Laura), nossas adoradas monitoras. Agradeço também a
toda equipe “técnica”, e a todo pessoal que soube mostrar que somos um grupo e não uma
cambada. Agradeço a companhia e o bom humor de todos os companheiros de curso:
Ninfobaby (Raulzito), Matrix (Mauro), Bom dia (Thiago), Garoto Fantástico (Inácio),
Marilaqui (Fernandinha), Skol (Carla), Formiga Atômica (Talitinha), Miss Frega (Fran), Miss
Trago (Camilinha), Japoneusa (Ana), Dani Bananinha (Daniela), Coceirinha (Lucas), Drag
(Gregório), Fofuxa Pantaneira (Karlinha), Mister Partoba (Daniel) e Miojo (Fernado) e
agradeço em especial meus vizinhos de rede, Avatar Estranho (Maria Laura), Tio Sukita
(Rodrigo) e Mr. Baudinho (Guilherme). Por fim agradeço de forma especial o Rainbown
master (popularmente conhecido como Paulo Enrique), por ter sido muito mais que um
coordenador. Bons conselhos, puxões de orelha e reflexões da vida (conversa de bêbado
mesmo) e New Marilaqui (Paulo Estevano) por todos os conselhos e dicas de estatistica...
Tenho certeza que sentirei saudades de todos.....
Referências
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243
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Wooster, D. & A. Sih. 1995. A review of the drift and activity responses of stream prey to
predator presence. Oikos, 73:3-8.
245
Heróis, figurantes e vilões: como o recrutamento das formigas e a presença de
homópteros afetam a defesa contra herbívoros?
Karla M. Campião
Introdução
Mutualismo pode ser definido com uma interação inter-específica, em que os membros de
ambas as espécies envolvidas tem maior valor adaptativo quando ocorrem juntas do que
quando ocorrem separadamente. Esse tipo de interação é bem documentada para várias
espécies, principalmente em ambientes tropicais, onde muitas plantas oferecem algum tipo de
benefício, como abrigo ou néctar, aos animais que “prestam serviços” de polinização,
dispersão de sementes e proteção contra herbívoros (Bronstein 1998, Bronstein et al. 2006).
Muitas espécies de plantas tropicais produzem nectários extra-florais que atraem
alguns grupos de insetos, principalmente formigas (Cogni et al. 2003). Ao consumirem o
néctar, as formigas protegem a planta em que estão forrageando, patrulhando as folhas e
removendo outros insetos, geralmente herbívoros. Dessa forma, as formigas diminuem as
taxas de herbivoria e favorecem o crescimento e o sucesso reprodutivo da planta (Almeida &
Figueiredo 2003, Leal et al. 2006). Esse tipo de interação é considerada um mutualismo
facultativo, porque várias espécies de formigas podem visitar os nectários extra-florais de
uma mesma planta e essas visitas podem ser eventuais ou recorrentes (Bronstein 1998,
Almeida & Figueiredo 2003, Leal et al. 2006). O uso dos nectários extra-florais pelas
formigas também varia de acordo com o recrutamento. Algumas formigas forrageiam
solitárias e outras recrutam membros da colônia e forrageiam agrupadas (Hölldobler &
Wilson 1990, Bruna et al. 2004). Nesses casos, o nível de proteção pode variar de acordo com
a espécie e/ou abundância de formigas que visitam a planta (Bronstein 1998, Bruna et al.
2004, Bronstein et al. 2006).
246
Outro fator que pode afetar as interações formiga-planta e formiga-herbívoro é a
presença de outras fontes de açúcar na planta, como pulgões (Homoptera) (Bronstein 1998).
Enquanto se alimentam da seiva da planta, os homópteros excretam um exudato açucarado de
qualidade nutricional superior ao dos nectários extra-florais, e assim também atraem
formigas. Uma vez que esse exudato é consumido pelas formigas, os homópteros se tornam
uma importante fonte de recurso para elas, que passam então a protegê-los de predadores e
parasitóides (Del-Claro & Oliveira 1993). O efeito da presença de homópteros sobre as
plantas hospedeiras ainda é controverso. Embora a infestação por homópteros seja,
geralmente, muito prejudicial à planta, o exudato liberado por esses insetos atraem formigas
que podem conferir proteção indireta a planta hospedeira. Dessa forma, o benefício da
proteção contra herbívoros seria maior que os custos da infestação (Del-Claro & Oliveira
1993). Por outro lado, a escolha preferencial das formigas pelo exudato do homóptero poderia
minimizar a proteção da planta contra herbivoria, já que este se tornou a principal fonte de
recurso.
Nesse estudo, eu avaliei como a resposta à herbivoria difere de acordo com o
recrutamento das formigas e quanto à presença de homópteros. Minha primeira previsão é que
formigas que recrutam e forrageiam em grupo vão responder mais rapidamente ao ataque de
herbívoros, já que estão em maior número do que formigas que não recrutam. Espero também
que a presença de homópteros diminua o patrulhamento nas folhas, aumentando o tempo de
resposta contra o ataque de herbívoros.
Métodos
Realizei o estudo na estrada que dá acesso à Reserva Florestal do km 41 (02°24’S e 59°44’O),
localizada na Amazônia Central, a cerca de 80 km ao norte de Manaus, AM, Brasil. A reserva
247
faz parte de uma Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) sob co-gestão do Projeto de
Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF).
Utilizei como modelo de estudo a planta Vismia japurensis (Hypericaceae). Essa
espécie de porte arbóreo é comum em capoeiras no platô e na vertente. Seus indivíduos
possuem um par de nectários extraflorais próximos à inserção peciolar no limbo foliar
abaxial. Esses nectários exudam um néctar que é atrativo para as formigas. A composição de
espécies de formigas visitantes varia entre ramos e entre indivíduos de V. japurensis.
Amostrei 30 indivíduos de V. japurensis, 18 com homópteros e 12 sem homópteros. Escolhi
um ramo de cada planta no qual houvesse apenas uma morfoespécie de formiga. Considerei
formigas que recrutam as que forrageavam em grupo de 6 ou mais indivíduos da mesma
espécie. Dentre os ramos selecionados de cada indivíduo de V. japurensis, 13 foram visitados
por formigas que não recrutam e 17 por formigas que recrutam.
Para averiguar se o recrutamento de formigas e a presença de homópteros afetam o
mecanismo de defesa contra os herbívoros de V. japurensis, fixei um cupim vivo (simulando
um herbívoro externo) no meio da nervura central na folha mais apical do ramo. Registrei se o
cupim foi removido e cronometrei o tempo que as formigas levaram para removê-lo. O tempo
máximo estabelecido de observação foi de 8 min por planta. Se o cupim não fosse removido
nesse tempo era registrada a não remoção. Para avaliar se o recrutamento e a presença de
homópteros influenciavam na remoção de herbívoros fiz um teste de log-linear. Para avaliar
se essas variáveis afetavam o tempo de remoção do herbívoro utilizei uma análise de
variância (ANOVA) de dois fatores.
Resultados
Os cupins foram removidos em 77% dos indivíduos de V. japurensis. A proporção de cupins
removidos pelas formigas que recrutaram foi de 45,0% na presença e 66,6% na ausência de
248
homópteros. Formigas que não recrutaram removeram os cupins todas as vezes, independente
da presença do homóptero. O tempo médio (em segundos, ± desvio padrão) de remoção do
cupim para formigas que recrutaram foi de 143 s (± 127,1) na presença e de 173 s (± 184,4)
na ausência de homópteros. Para formigas que não recrutaram, o tempo médio de remoção do
cupim foi de 142 s (± 99,4) na presença e de 161 s (± 161,1) na ausência de homópteros. Não
houve efeito do comportamento de recrutamento (χ2 =6,27 GL= 3 p= 0,09), presença de
homóptero (χ 2 =0,19 GL= 2 p= 0,91) ou da combinação dessas duas variáveis (χ 2 =0,06 GL=
1 p= 0,81) na remoção dos cupins. O comportamento de recrutamento (recrutam e não
recrutam) e a presença de homóptero também não afetaram o tempo de remoção dos cupins
pelas formigas (F(30, 1)= 0,252; p= 0,62; Figura 1).
Figura 1. Tempo de remoção do cupim em plantas com e sem homópteros por formigas que
não recrutam e que recrutam. Os pontos representam as médias e as barras o intervalo de
confiança (95%).
não sim
Recrutamento de formigas
0
50
100
150
200
250
300
350
400
Tem
po d
e re
moç
ão (
s)
Homóptero presente Homóptero ausente
249
Discussão
A fonte de variação mais importante no mutualismo facultativo é que diferentes parceiros
oferecem diferentes magnitudes de benefício. A qualidade de proteção à planta apresenta
grande variação de acordo com a espécie de formiga (Bronstein 1998). Neste estudo, eu
avaliei se formigas que recrutavam conferiam a V.japurensis maior proteção contra
herbívoros do que formigas que não recrutavam. A resposta contra herbívoros não variou de
acordo com o recrutamento das formigas. Vários outros aspectos, além do número de
formigas por planta, podem determinar o nível de proteção, como distância até os ninhos de
formigas e número de nectários na planta hospedeira (Longino 1989, Bronstein 1998).
Formigas podem forragear agrupadas ou solitárias, e durante o forrageio podem exibir
comportamentos territoriais ofensivos e defensivos. A agressividade varia de acordo com a
espécie, sendo que as mais agressivas podem conferir maior proteção à planta (Hölldobler &
Wilson 1990, Bruna et al. 2004). Embora a remoção do cupim tenha ocorrido em 100% das
plantas visitadas por formigas que não recrutaram, o nível de agressividade não está
relacionado ao recrutamento, mas é um atributo da espécie (Hölldobler & Wilson 1990). É
possível que o nível de agressividade da espécie de formiga seja mais importante que o
recrutamento na proteção dos indivíduos de V.japurensis contra a herbivoria.
O nível de proteção conferido à planta também não variou com a presença do
homóptero. Embora as formigas só visitassem os nectários extra-florais quando não haviam
homópteros, quando presentes, esses não diminuíam a proteção das formigas contra
herbívoros externos. A interação entre formigas e plantas com nectários extra-florais é
bastante comum, mas apenas 7,3% das angiospermas que tem esses nectários também estão
associadas a homópteros (Rosumeck et al. 2009). As implicações da interação formiga-
planta-homóptero ainda são pouco conhecidas e algumas hipóteses foram propostas para
explicar a evolução dessa interação.
250
Foi proposto que os nectários extra-florais evoluíram como um mecanismo para atrair
as formigas associadas a homópteros. Uma vez que as formigas deixassem de consumir o
exudato dos homópteros, deixariam também de protegê-los contra predadores e parasitóides e,
conseqüentemente, eles teriam menores taxas de sobrevivência e reprodução. Porém, muitas
observações têm demonstrado que as formigas preferem a seiva dos homópteros em relação a
dos nectários extra-florais (Del-Claro & Oliveira 1993, Bronstein et al. 2006). Uma outra
hipótese é que a presença de homópteros atrai um maior número de formigas e pode assim
aumentar a defesa indireta da planta (DelClaro & Oliveira 1993). Os resultados deste estudo
não indicam qualquer influência da presença de homópteros nos indivíduos de V.japurensis, e
o principal fator de variação na proteção pode ser a agressividade das formigas que visitam
essas plantas.
Agradecimentos
Agradeço ao PDBFF e a todos os parceiros que possibilitaram a realização desse curso, pela
oportunidade única de aprendizado. Agradeço a Manô e Rafa (que me ajudaram muito a
melhorar esse manuscrito) e também ao Daniel, Skol e Lucas pela revisão do texto. Ao
Paulinho Estefano e todos os professores, pelos ensinamentos e bons momentos durante o
curso. Às bonitoras Laura e Manô, pela ajuda, parceria e amizade nesses trinta dias.. vocês
são ótimas. À Dona Eduarda e Seu Jorge, pela goiabada e suco de caju de cada dia.. e
também ao Seu Cardoso e todos os motoristas. Agradeço de coração à todos os amigos de
curso, por fazerem esse mês tão inesquecível. E por fim, sou muitíssimo grata ao Paulinho
Enrique pela orientação nesse projeto e ensinamentos que são para vida toda, pela confiança,
pelo exemplo de profissionalismo e amabilidade e pelos momentos de diversão. Obrigada!
251
Referências
Almeida, A.M. & R.A. Figueiredo. 2003. Ants visit nectaries of Epidendrum denticulatum
(Orchidaceae) in a Brazilian Rainforest: effects on herbivory and pollination.
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Bronstein, J. L., R. Alarcón & M. Geber. 2006. The evolution of plant-insect mutualisms.
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Bruna, E. M., D.M. Lapola & H.L. Vasconcelos. 2004. Interspecific variation in the defensive
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of ants as plant biotic defences. Oecologia, 160: 537-549.
252
A serrapilheira atua como um filtro para formigas dispersoras de sementes?
Lucas Navarro Paolucci
Introdução
Em florestas tropicais, a zoocoria é responsável pela dispersão de 60 a 95% das espécies
vegetais (Howe & Smallwood 1982). Nesses ambientes, as formigas são um dos principais
grupos animais dispersores de sementes, devido à sua alta abundância e diversidade
(Hölldobler & Wilson 1990, Byrne 1994). Como dispersores secundários as formigas têm
importante papel por facilitar a germinação de sementes. Elas fazem isso ao limpar o fruto ou
semente e ao remover os diásporos para a região próxima do ninho (Leal & Oliveira 1998,
Leal et al. 2007). Nestes locais, o solo pode ser mais rico em nutrientes favorecendo o
estabelecimento das plântulas (Passos & Oliveira 2002, 2004). Além disso, nos ninhos há
menor pressão de predação (Janzen 1970, Connell 1971), o que aumenta a probabilidade de
sobrevivência das sementes e plântulas (Giladi 2006, Leal et al. 2007).
Um importante parâmetro para se avaliar a eficiência do serviço de dispersão é a
distância a que a semente é transportada. Quanto maior a distância que a semente é dispersa,
menor a competição entre a planta-mãe e as plântulas (Giladi 2006). A eficiência do dispersor
vai depender das condições ambientais do local ao redor da semente. Ambientes mais abertos
favorecem o forrageamento de formigas maiores, ao passo que uma serrapilheira mais densa
favorece o forrageamento de formigas menores (Kaspari & Weiser 1999, Farji-Brener et al.
2004). Em formigas, o tamanho das pernas é um fator que determina a habilidade de se mover
pela serrapilheira, de modo que pernas maiores permitem que a formiga passe sobre os
interstícios da serrapilheira. Por outro lado, pernas maiores dificultam a exploração entre
interstícios, que podem conter recursos alimentares e abrigos (Farji-Brener et al. 2004). Deste
modo, a percepção dos interstícios ambientais aumenta na medida em que o tamanho corporal
253
diminui (Kaspari & Weiser 1999). Como formigas menores em geral dispersam sementes a
distâncias menores do que formigas maiores (Ness et al. 2004), a quantidade de interstícios
pode afetar indiretamente a eficiência de dispersão, atuando como filtro no tamanho das
espécies e consequentemente na eficiência de dispersão de sementes.
Meu objetivo foi avaliar como as características estruturais da serrapilheira
influenciam na eficiência de dispersão de sementes por formigas. Minha hipótese é que
serrapilheira mais densa diminui a eficiência de dispersão de sementes por formigas. Espero
que em locais onde a serrapilheira é mais profunda a semente seja dispersa por menores
distâncias.
Métodos
Área de estudo
Este estudo foi conduzido na Amazônia Central, em uma área de floresta de terra firme na
Reserva km 41 (2o24' S - 59o44' O). A reserva é gerenciada pelo Projeto Dinâmica Biológica
de Fragmentos Florestais (INPA/PDBFF) e está localizada a 80 km ao norte de Manaus
(AM).
Coleta de dados
Selecionei 30 estações de observação distantes entre si no mínimo 10 metros. A profundidade
da serrapilheira das estações variou entre 0 e 15 cm. A profundidade da serrapilheira foi
utilizada como medida para quantidade de interstícios ambientais, de modo que quanto maior
a profundidade, maior a quantidade de interstícios. Cada estação de observação foi formada
por 10 sementes de girassol comercial (Helianthus annuus) depositados sobre quadrados de
papel filtro. Os conjuntos de sementes foram colocados um pouco abaixo da camada
254
superficial da serrapilheira. Cada estação foi observada por um período de 3:30 h. Quando
uma semente era removida, medi a distância de dispersão, que foi usada como medida de
eficiência de dispersão. Coletei as formigas que removeram as sementes de girassol para
identificação taxonômica.
Análise estatística
Para avaliar se a profundidade da serrapilheira influenciou a distância de dispersão das
sementes, fiz uma regressão linear. Quando mais de uma semente foi removida de uma
mesma estação de observação, utilizei a média das distâncias das sementes removidas. As
estações de observação que não foram acessadas por nenhuma formiga foram excluídos das
análises. Estações de observação com formigas mas sem remoção de sementes foram
considerados com distância de remoção igual a 0 metros.
Resultados
Observei 12 espécies de formigas de 4 subfamílias removendo sementes (Tabela 1). A
distância média de remoção foi de 12,6±11,15 cm (média±desvio padrão) (mínimo = 0 cm;
máximo = 80 cm). Das 300 sementes ofertadas, 21 delas foram observadas sendo removidas e
três estações de observação atraíram formigas, mas sem remoção. A quantidade de interstícios
ambientais não afetou a distância em que as formigas removeram as sementes de girassol
(F(1,25)=0,66; p=0,42, Figura 1).
255
Tabela 1. Espécies de formigas que foram coletadas removendo as sementes de girassol
(Helianthus annuus), tamanho dos indivíduos, número de sementes dispersadas, distância
média, número de eventos de dispersão e profundidade média da serrapilheira.
Espécie Subfamília Tamanho Total de
sementes
dispersadas
Distância de
dispersão (cm)
(média±DP)
N. de
eventos
de
dispersão
Profundidade da
serrapilheira (cm)
(média±DP)
Acromyrmex sp1 Myrmicinae Grande 1 40 1 0
Crematogaster
sp1
Myrmicinae Pequena 1 11 1 15
Gnamptogenys
sp1
Odontomachus
sp1
Ectatomminae
Ponerinae
Grande
Grande
2
1
8
10
1
1
5
11
Pachycondyla
sp1
Ponerinae Grande 1 10 1 11
Pheidole sp1 Myrmicinae Pequena 1 9 1 5
Pheidole sp2 Myrmicinae Pequena 6 5,1±1,33 2 7,5±1,22
Pheidole sp3 Myrmicinae Pequena 5 6,8±1,64 2 14,75±1,78
Pheidole sp4 Myrmicinae Pequena 1 29 1 8
Pheidole sp5
Pheidole sp6
Myrmicinae
Myrmicinae
Pequena
Pequena
1
0
54
0
1
0
6
5,6±6,65
Pheidole sp8 Myrmicinae Pequena 1 60 1 3
256
0 5 10 15
010
20
30
40
50
Profundidade da serapilheira (cm)
Distância de remoção das sementes (cm)
Figura 1. Relação entre a profundidade da serrapilheira (cm) e a distância de remoção (cm) de
sementes de girassol (Helianthus annuus) por formigas de serrapilheira em uma área de
floresta de terra firme na Amazônia Central.
Discussão
O número de interstícios gerados pelas diferenças na profundidade de serrapilheira não atua
como filtro que seleciona o tamanho das espécies de formigas. Isso se deve ao fato que tanto
as formigas maiores, quanto as formigas menores puderam acessar as sementes nas diferentes
profundidades avaliadas (Tabela 1). Assim, em solos onde há deposição variada de
serrapilheira, o tamanho das formigas dispersoras é mais importante para a eficiência de
dispersão das sementes do que as características da serrapilheira.
O fato de a serrapilheira não atuar como filtro para o tamanho de formigas pode ser
devido a características das espécies. As formigas maiores podem acessar o recurso por cima
da serrapilheira, enquanto as menores se deslocam entre os interstícios da serrapilheira. Ao
passar sobre a serrapilheira, formigas maiores precisam contornar ou transpor eventuais
barreiras físicas, ao passo que as menores caminham por entre as folhas e galhos. Como
257
consequência, formigas pequenas percorrem maiores distâncias do que as formigas maiores
para acessar as sementes, já que a área de superfície percorrida deve ser maior em ambientes
com serrapilheira mais densa (Bartholomew et al. 1988). Mesmo que as maneiras de
exploração do ambiente difiram entre formigas grandes e pequenas, ambos os grupos
conseguem explorar os recursos da serrapilheira e transportar as sementes com mesma
eficiência.
Agradecimentos
Agradeço primeiramente ao PDBFF/INPA pela maravilhosa oportunidade de participar do
EFA, que foi uma experiência única e inesquecível. Ao Paulinho Enrique, pela descontração e
por compartilhar com todos seu vasto conhecimento sempre de maneira clara, atenciosa e
paciente. Ao Paulinho Estefano, pelos auxílios sempre que necessário e disposição e paciência
ao esclarecer dúvidas. Às monitoras Manô e Laura, pela ótima convivência e amizade, e por
aguentarem as besteiras escritas nos relatórios e ainda assim sugerirem ótimas ideias. A todos
os professores que passaram pelo curso, e que contribuíram enormemente para o meu
aprendizado e crescimento profissional. À D. Eduarda e ao Seu Jorge, pela convivência
agradável e por prepararem nossa comida de todo dia com muita dedicação. A todos os
colegas do EFA 2011, que fizeram com que esses 30 dias de ralação se transformassem em
momentos inesquecíveis e que com certeza vão deixar muitas saudades. À Floresta
Amazônica, por guardar diversos segredos que instigam nossa curiosidade de pesquisador e
por nos fazer sentir insignificantes perto das forças da natureza.
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259
Conexões ocultas: associação entre aranhas e formigas em arbustos de
Tococa bullifera (Melastomataceae)
Maria Laura Fontelles Ternes
Introdução
A distribuição das espécies no ambiente está relacionada à seleção de habitats favoráveis ao
seu estabelecimento. Essa relação pode ocorrer de acordo com diversos fatores que envolvem
disponibilidade de recursos, presença de competidores e predadores (Scott 2005). A seleção
do habitat pode depender também da coexistência com outras espécies. Neste caso, os
organismos podem ocorrer associados por meio de uma série de interações, como
mutualismo, predação ou comensalismo (Begon 2006).
O mutualismo ocorre quando ambas as espécies interagem e se beneficiam com esta
interação (Begon 2006). Este é o caso de algumas plantas mirmecófitas, que exibem
associações mutualistas com formigas. Estas plantas exibem estruturas vegetais ocas
chamadas domáceas, onde formigas estabelecem sua colônia (Vasconcelos & Davidson
2000). Enquanto a planta oferece abrigo para as formigas, estas conferem proteção para a
planta por se alimentarem de herbívoros que podem predar a planta hospedeira (Beattie 1985).
O mutualismo entre formigas e plantas mirmecófitas é um sistema bem descrito na
literatura (De Albuquerque 2005, Capurucho et al 2010, Martins & Osses 2004, Osses 2004,
Postati 2007, Romero & Izzo 2004, Rosado et al. 2004, Silva et al. 2005, Vasconcelos 1991,
Vasconcelos 1993, Vasconcelos & Davidson 2000). Porém, outros organismos parecem se
beneficiar dessa associação, o que pode indicar um sistema com maior complexidade de
interações. Um exemplo desta situação é a Tococa (Tococa bullifera Melastomataceae), uma
planta mirmecófita de porte arbustivo, que possui uma espécie de aranha associada. Apesar
260
desse artrópode predador ser encontrado frequentemente em Tococa, não se conhece o papel
dele neste sistema de interação.
Nesse sentido, me proponho a avaliar qual o tipo de interação que ocorre entre as
aranhas e formigas em Tococa bullifera. Minhas hipóteses são i) a aranha é predadora das
formigas mirmecófilas ou ii) a aranha compete com as formigas mirmecófilas por alimento.
Se a primeira hipótese for verdadeira, a aranha é uma ameaça para a formiga e por isso o
tempo de resposta das formigas a danos provocados nas folhas é maior onde a aranha ocorre
quando comparado com folhas onde não tem aranha. Se a segunda hipótese for verdadeira,
espero um número menor de formigas dentro das domáceas que possuem aranhas nas folhas
próximas, pois as aranhas podem competir por alimento com as formigas reduzindo o
tamanho da colônia na domácea.
Métodos
Desenvolvi este estudo na Reserva do km 41 (02º24’S, 59º52’O), uma área sob co-gestão do
Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (INPA/Smithsonian Institution),
localizada a 80 km ao norte de Manaus, AM, Brasil. A vegetação local é caracterizada por
uma floresta tropical úmida de terra firme. A precipitação média é de 2.186 mm/ano e
temperatura média anual é de 26,7 oC (Lovejoy & Bierregaard 1990).
Amostrei 18 indivíduos de T. bullifera com a presença de aranhas. A aranha posiciona
sua teia orbicular na inserção das folhas apoiando os fios-âncora na parte abaxial da folha,
próxima à entrada da domacea, porém sem contato com as formigas. Em cada planta,
selecionei um ramo onde registrei o número de domáceas e de aranhas em suas teias. Para
avaliar o tempo de resposta das formigas aos danos foliares, fiz um corte em uma folha a 2 cm
da entrada da domácea com e sem aranhas próximas. Considerei como tempo de resposta o
momento da detecção do dano pela formiga até o recrutamento das formigas na domácea.
261
Utilizei um teste t-pareado para comparar o tempo de reação das formigas entre folhas com e
sem aranhas.
Para testar a competição por alimento entre formigas e aranhas, selecionei um ramo
em cada arbusto de T. bullifera e estimei a abundância de formigas e aranhas. Para obter a
estimativa da abundância de formigas desse ramo, coletei duas domáceas, uma com aranha
próxima à sua abertura e outra sem aranha. Obtive a média do número de formigas destas
duas domáceas e multipliquei pelo número total de domáceas do ramo para obter o valor de
abundância de formigas por ramo. No mesmo ramo, contei o número de teias com aranhas.
Fiz uma análise de Regressão Linear para avaliar a relação do número de teias com aranhas e
a abundância de formigas nos ramos.
Resultados
O tempo médio de resposta das formigas ao dano provocado nas folhas com aranhas foi de
21,9±19,3 segundos (média±DP), variando entre 4 e 80 segundos, enquanto a média do tempo
na ausência de aranhas foi 22,2±16,3 segundos, variando entre 5 e 72 segundos. O tempo de
resposta das formigas ao dano provocado na folha não foi diferente entre domáceas com e
sem aranhas próximas à sua abertura (t=0,16; gl=17; p=0,87; Figura 1).
262
Figura 1. Tempo de resposta, em segundos, das formigas ao dano provocado na folha de
Tococa bullifera com e sem aranhas próximas a abertura das domáceas. As linhas conectam
pares de folhas com e sem a aranha na mesma planta.
Para cada aranha no ramo houve um incremento de 46 formigas. Entre os 18 ramos
amostrados, o número estimado de formigas encontradas nas domáceas com aranhas próximas
variou de 6 a 78, enquanto nas domáceas sem aranhas variou de 5 a 61 indivíduos. A
abundância estimada de formigas por ramo variou entre 18 até 858 formigas. A abundância de
aranhas variou entre 1 a 15 indivíduos por ramo. Ao contrário do esperado, houve uma
relação positiva entre a abundância de formigas e aranhas (F(1,16) = 29,38, gl = 17, p<0,01;
Figura 2).
Aranha
263
0 2 4 6 8 10 12 14 16
Número de teias com aranhas
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
Est
imat
iva
do n
úmer
o to
tal d
e fo
rmig
as
Figura 2. Relação entre a abundância de formigas nas domáceas de Tococa bullifera e o
número de aranhas por ramo. A reta ascendente indica a direção da relação entre a abundância
de formigas e aranhas.
Discussão
O fato das formigas terem tempo de resposta semelhante aos danos foliares em ramos com e
sem aranha indica que as formigas não detectaram o aracnídeo como ameaça de predação. Por
serem mais abundantes na presença de aranhas, ambas devem coexistir sem competir por
recursos alimentares. A predação de formigas por aranhas pode ocorrer em algumas plantas
mirmecófitas (Letourneau & Dyer 1998, Rosado et al. 2004) como em Piper spp.
(Piperaceae) e Hirtella myrmecophila (Chrysobalanaceae). As aranhas do gênero Dipoena que
constroem suas teias nessas plantas mirmecófitas predam as formigas que vivem em suas
domáceas (Gastreich 1999, Rosado et al. 2004). Em Piper spp., a presença de aranhas
predadoras de formigas provavelmente não interfere na atividade de proteção das formigas
mirmecofilas contra herbívoros (Letourneau & Dyer 1998), pois a taxa de consumo de
264
formigas é baixa, aproximadamente de uma formiga a cada três dias. Possivelmente, a taxa de
reposição de formigas contrabalanceie o consumo pela aranha predadora. Por outro lado,
Gastreich (1999) demonstrou que a presença de Dipoena. banskii diminui a eficiência das
formigas em proteger a planta contra herbívoros no sistema Piper spp..
A dieta das aranhas que constroem teias em T. bullifera provavelmente é composta por
insetos voadores que caem nas teias, já que as formigas patrulham todo o arbusto, impedindo
que outros insetos subam ao longo da planta mirmecófita para a aranha capturar. De fato, esta
aranha foi observada alimentando-se de uma pequena mosca enroscada em sua teia (J.P.
Menezes, comunicação pessoal).
Outra planta mirmecófita, Maieta (Maieta spp. Melastomataceae), mostra um sistema
similar ao observado em T. bullifera, onde existe interação planta – formiga – aranha
(DeOliveira, 1995). Em Maieta ocorre ainda um hemíptero predador associado (Osses 2004,
Santos 2007). A aranha Faiditus subflavus seleciona a Maieta para estabelecer sua teia na face
abaxial das folhas e próximo à entrada das domáceas, a aranha coloca sua ooteca (Kasper
2006). Santos (2007) demonstrou experimentalmente que o sucesso reprodutivo das aranhas
em Maieta está ligado ao posicionamento de sua ooteca próximo à entrada das domáceas.
Possivelmente, a ooteca recebe proteção indireta das formigas (Pheidole Minutula) contra
predação. O mesmo autor observou que a presença e a quantidade de formigas determinam a
colonização da planta por F. subflavus, que se fixa principalmente em folhas com mais
formigas. A associação que ocorre entre formiga e aranha na Maieta também pode ocorrer na
Tococa, uma vez que não houve evidência de competição e predação na associação entre
formigas e aranhas.
Em Tococa, o posicionamento das teias na parte abaxial das folhas, na entrada da
domácea pode ser estratégico para a aranha. A maior abundância de teias onde tem mais de
formigas nas domáceas pode sugerir que as formigas conferem proteção para as aranhas como
265
em Maieta. A seleção de Tococa como habitat pelas aranhas implica na coexistência com
formigas e a evidência de associação entre estas espécies poderia seguir o modelo da Maieta,
como proposto por Santos (2007). Visto que não existem informações sobre esta espécie de
aranha, recomenda-se avaliar se as formigas protegem os sítios de oviposição das aranhas
para caracterizar a interação mutualística formiga-Tococa-aranha.
Agradecimentos
Agradeço ao INPA e PDBFF por fazerem a diferença na Amazônia Brasileira. À
Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC e ao Programa de Pós Graduação em Zoologia
por viabilizarem minha participação neste curso. À coordenação do EFA 2011 pela produção
e efeitos especiais. Afinal de contas, alegria não tira a competência do trabalho. Em especial
aos Paulos (Enrique e Estefano) e monitoras (Manoela e Laura) pela paciência e resiliência
humorística perante as intempéries dos nossos relatórios. A todos os professores/orientadores
que também corrigiram nossas pérolas, esclareceram dúvidas e nos mostraram o que é ciência.
A todos os colegas de turma por fazerem do EFA uma experiência incrível, com momentos
hilários que deixarão saudades. Ao Tim Maia por ter profetizado parte de nossas refeições
diárias “...suco de caju, goiabada para a sobremesa...”. Agradeço aos Céus por existir na
Terra um lugar como Anavilhanas. À Floresta Amazônica, que nos faz pequenos diante de sua
magnitude e nos lembra que somos só mais um organismo dentro de um grande sistema.
Assim, devemos respeito a todas as formas de vida ao nosso redor.
Referências
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270
Plantas herbáceas e ambientes heterogêneos: há lugar para a variação funcional?
Mauro Brum Monteiro Junior
Introdução
Fatores que determinam os padrões de distribuição e abundância dos organismos
atuam como filtros ambientais. Esses filtros ambientais podem limitar a ocorrência de
espécies que não possuem mecanismos fisiológicos para tolerá-los (Lambers 1998). As
espécies que são selecionadas pelos filtros ambientais e compõem a mesma comunidade,
apresentam características similares. Dependendo do tipo de ambiente essa similaridade pode
influenciar de maneira diferenciada na intensidade de competição entre os organismos de uma
mesma comunidade (Keddy 1992). Em ambientes homogêneos, pode ocorrer uma limitação
na similaridade funcional dos organismos e espécies melhores competidoras devem excluir
outras espécies pelo princípio da exclusão competitiva (MacArthur & Levins 1967). Se o
ambiente for heterogêneo, diferentes padrões espaciais podem ser formados, como gradientes
ambientais ou microhabitat com características específicas (Wiens 2000). Assim, com uma
maior disponibilidade de nichos os organismos podem se estabelecer dentro do habitat de
maneira diferenciada (Wisheu 1998; Wiens 2000).
Uma abordagem que tenta explicar a coexistência de espécies vegetais em diferentes
ambientes, relaciona os atributos funcionais das plantas com seu nicho efetivo (McGill et al.
2006). Os atributos funcionais são características morfológicas ou fisiológicas das plantas que
respondem às variações nas disponibilidades de recursos e condições ambientais (Westoby &
Wright 2006). Mudanças nessas características desempenham um papel importante no
crescimento e sobrevivência das plantas que ocorrem ao longo de gradientes ambientais e
habitats heterogêneos (Garnier et al. 2001; Ackerly 2003). Características morfofisiológicas
das folhas como por exemplo, a massa foliar específica (massa seca da folha/área foliar) e a
271
área foliar, são dois atributos funcionais que respondem a fatores ambientais como
disponibilidade de luz, uso de nutrientes e eficiência no uso de água . (Abrans et al. 1994;
Cornelissen et al 2003; Ackerly 2003). A categorização de espécies a partir dessas
características nos fornece indicativos da funcionalidade e das estratégias ecológicas
apresentadas pelas espécies da comunidade (Garnier et al., 2001; Ackerly, 2003).
Nas florestas tropicais de terra firme da Amazônia Central, as comunidades vegetais
distribuem-se ao longo de gradientes edafo-topográficos conhecidos como platô, vertente e
baixio (Laurance et al., 2010). A composição da comunidade vegetal encontrada ao longo
desse gradiente é determinada pela capacidade de ajuste das espécies às variações do tipo de
solo e topografia (Ribeiro et al. 1999, Carneiro 2004). Nas áreas de platô, os solos
encontrados possuem alto teor de argila e são pobres em nutrientes (Ribeiro et al 1999). Os
baixios são caracterizados por solos hidromórficos, sujeitos a inundações imprevisíveis e de
curta duração (Junk et al. 1989). As áreas de baixio são consideradas mais heterogêneas em
relação às áreas de platô, pois a amplitude de variação das características abióticas como
disponibilidade de nutriente, abertura do dossel e o teor de água é maior (Brum 2011). Essas
diferenças particulares entre o platô e o baixio podem atuar como filtro ambiental
selecionando as espécies capazes de sobreviver em cada ambiente.
Trabalhos recentes têm estudado plantas herbáceas para entender a estrutura de
comunidades tropicais e padrões de distribuição geográfica de biodiversidade (Drucker 2005).
Na floresta de terra firme, há uma diversidade de espécies herbáceas associadas as
fitofisionomias contrastantes do platô e do baixio (Drucker 2005). A capacidade dessas
espécies de ocuparem esses ambientes deve estar relacionado a variação funcional que esses
organismos desenvolvem. Nesse sentido, o objetivo desse trabalho foi verificar se plantas
herbáceas que ocorrem nos ambientes de baixio apresentam maior variação funcional do que
plantas herbáceas que ocorrem em áreas de platô. Minha hipótese é que em ambientes mais
272
heterogêneos há uma maior variação funcional do que em ambientes menos heteregeneos.
Deste modo, espero que haja maior variação nos valores de área foliar e massa foliar
específica nas áreas de baixio do que nas áreas de platô.
Métodos
Área de Estudo
Realizei este estudo em uma Área de Relevante Interesse Ecológico Projeto Dinâmica
Biológica de Fragmentos Florestais – ARIE PDBFF (02º 24’ S, 59º 43’ O), localizada 80 km
de Manaus, Amazonas, Brasil. A vegetação da área é classificada como floresta tropical
úmida de terra firme que apresenta variações de relevo definidas como platô,vertente e
baixio (Laurance et al., 2010). Platos são as áreas mais altas, que apresentam solos argilosos
bem drenados e pobres em nutrinetes. As vertentes estão localizadas na diferença de nível
entre as calhas dos igarapés e a superfície dos platôs. Podem variam de 70 a 80 metros, com
um solo mais argiloso nas partes mais altas e mais arenosos nas partes mais baixas (Laurance
et al., 2010). As áreas de baixio são influenciadas por pulsos de inundações imprevisíveis e de
curta duração dos igarapés. Os solos dos baixios possuem uma grande quantidade de areia e
recebem muito sedimentos oriundos do platô e da vertente (Junk et al.1989; Laurance et al.,
2010).
Coleta de Dados
Para investigar se a variação de atributos funcionais das comunidades de herbáceas nas áreas
de baixio é maior do que nas áreas de platô utilizei a área foliar (AF) e massa foliar específica
(MFA=massa seca da folha/área foliar) como atributos funcionais. Para reconhecer as plantas
herbáceas em campo, segui a descrição feito por Ribero e colaboradores (1999), que definem
273
que ervas como plantas terrestres de caule não lenhoso que podem viver dentro da água ou em
solos muito encharcado.
Estabeleci 10 parcelas na área de platô e 10 parcelas na área do baixio, as parcelas tinham
tamanho de 4 x 4 m. Instalei uma parcelas após a outra como uma distancia de 20 m entre
elas. No de platô instalei as parcelas cerca de 20 m longe da trilha, pois plantas herbáceas
podem se beneficiar em ambientes alterados (McIntyre et al 1995). Na área de baixio, instalei
as parcelas as plantas ao longo da beira do igarapé.
Em cada parcela, coletei uma folha de cada espécies,Para obter dados da AF, coloquei
uma folha de cada espécies por parcela em uma placa com fundo branco ao lado de uma fita
métrica. Tirei uma fotografia da folha e posteriormente calculei a área foliar de cada foto no
programa ImageJ. Depois de fotografar todas as folhas, coloquei as folhas para secar durante
40 minutos no forno a gás. Em seguida, pesei cada folhas em uma balança de precisão para
obter a massa seca de cada folha. Calculei a MFA dividindo a massa seca da folha pela sua
área. Quando as folhas eram muito grandes, optei por obter a massa foliar especifica cortando
um quadrado de área conhecida de 2 x 2 cm, assim dividi a massa do quadrado pela sua área.
Analises estatísticas
Para avaliar se a variação nos atributos é maior no baixio quando comparado ao platô
Utilizei os seguintes procedimentos: calculei a média de AF e MFA das plantas em cada
parcela. Posteriormente calculei a média desses valores para cada ambiente. A média de MFA
e AF de cada ambiente determinam o centróide da distribuição desses dados. Uma vez
determinado o centróide, calculei a diferença de AF e MFA de cada parcela em relação ao
centróide. Utilizei esses valores das diferenças para calcular a distância euclidiana de cada
parcela até o centróide formado pelas parcelas de cada local. Quanto maior a distância
euclidiana em relação ao centróide formado pelas diferenças de MFA e AF, maior é a
274
variação desses atributos no ambiente. Deste modo, espero que as distâncias euclidianas
sejam maiores nas áreas de baixio do que nas áreas de platô. Com os dados das distâncias
euclidiana, comparei esses valores entre os dois ambientes, platô e baixio, com um teste t.
Resultados
Nesse trabalho amostrei um total de 126 índivíduos de plantas herbáceas, sendo que 85
plantas estavam no baixio e 41 plantas estavam no platô. A AF das herbáceas no baixio teve
um valor médio de 118 cm² (DP=48,54), enquanto que a AF das plantas amostradas no platô
teve um valor médio de 119 cm² (DP=35,27). Para as herbáceas do baixio, o valor médio da
MFA das herbáceas foi de 5,04 g/m² (DP=1,5), enquanto que para o platô a média desse
atributo foi de 6,30 g/m² (DP=2,4). A média da distância euclidiana de cada parcela até o
centróide formado pelas parcelas de cada ambiente foi de 40,59 no baixio e 29,73 no platô
(Figura 1). Ao comparar a variação das distâncias euclidianas entre o platô e o baixio não
encontrei diferenças nas variações dos atributos analisados entre as ambientes (t=1,22; gl=18;
p=0,11).
275
Baixio Platô
Ambiente
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
Distância euclidiana de cada parcela até o centróide formado pelas
parcelas de cada local.
Figura 1. Média da distância euclidiana de cada parcela até o centróide. A média de MFA e
AF de cada ambiente determinam o centróide da distribuição desses dados. O quadrado
preenchido significa os valores médios das distâncias euclidianas, e as barras correspondem
ao intervalo de confiança.
Discussão
Apesar do ambiente do baixio ser considerado um habitat heterogêneo (Drucker 2005; Brum
2011), a comunidade de herbáceas do baixio não apresentou maior variação nos valores de
MFA e da AF, em relação as herbáceas que ocorrem no platô. Isso significa que as diferenças
abióticas existentes entre platô e baixio não são suficientes para que a comunidade herbácea
do baixio apresente maior variação funcional que a comunidade no platô.
A área foliar é um atributo de importância funcional para a fotossíntese e para o
balanço hídrico das plantas (Cornelissen et al. 2003). Plantas tendem a minimizar as áreas
foliares em ambientes secos para diminuir as taxas de evapotranspiração (Chapin III et al.
2002). Em florestas tropicais úmidas á água tende a ser abundante, mesmo na estação seca,
276
pois as elevadas taxas de evapotranspiração da floresta deixam a atmosfera com alta saturação
de vapor de água. A alta saturação pode manter um ciclo hidrológico florestal que garanta
disponibilidade homogênea de água em ambientes mais secos como o platô (Harrison 2010).
Se a água está disponível ao longo de todo o gradiente, variações na área foliar seriam
menores. Além disso, se a disponibilidade de água não é limitante, não haveria nenhuma outra
pressão que justificasse variações na área foliar, mesmo quando as características do solo e de
luminosidade são mais variáveis.
Também não encontrei diferença para os valores de MFA entre as comunidades de
plantas herbáceas do platô e baixio. No baixio, eu esperava que houvesse maior variação
desse parâmetro em função da variação dos tipos de solo. Por outro lado, plantas que ocorrem
em solos pobres, geralmente apresentam valores de MFA mais elevados, pois o custo de
construção de uma folha é alto nesses ambientes (Chapin III et al 2002). Os solos amazônicos
são extremamente pobres em nutrientes (Ribeiro et al. 1999). Talvez a semelhança na
variação dos valores de MFA no baixio e no platô ocorra porque há uma limitação nutricional
para plantas herbáceas em ambos os locais. Se a limitação for alta, ela poderia restringir
outras variações associadas a modificações ambientais em menor escala. Assim, as plantas
herbáceas em ambos os sistemas podem convergir em características funcionais independente
da heterogeneidade local, pois pode haver uma restrição mais importante para a morfologia
em menores escala.
Agradecimentos
Gostaria muito de agradecer ao Paulo Estefano e ao Paulo Henrique pela oportunidade de ter
participado do EFA e dizer que eu aprendi muito nesse mês. Posso dizer com certeza: “-O
EFA foi um divisor de águas na minha vida!”. Sem dúvida tenho um enorme prazer conhecê-
los. Ao Sr. Jorge e a D. Eduarda pela sagrada e deliciosa comida de todos os dias. Ao Zé Luis
277
pelo grande carinho e pelas conversas filosóficas sobre os mistérios do mundo. Aos grandes
amigos que eu conheci nesse mês intenso e divertido. Os nomes de cada um estão dentro de
mim, vou leva-los para sempre em todos os lugares que eu estiver. Um carinho especial para
todos os professores Braulio, Tabarelli, Fabrício, Elder, Cíntia, Lorenzo, Adriano, Janzen,
Inara, Rafael e Ana. As monitoras Laura e Manô que foram nossas mãezinhas. Um abraço aos
Guaribas que ficavam “rezando” junto comigo e a Manô nessas noites de selva. Ao Clã que
ajudava espairecer as idéias. A Manô e a Ana Andrade que foram as corretoras do meu
relatório e me ensinaram a enxergar meus erros na hora de escrever. Ao Gregório, Inácio e
Camila que foram meus melhores amigos nessa jornada.
Também quero agradecer meu orientador Rafael S. Oliveira por sempre botar uma fé
em mim e me incentivar muito nas empreitadas biológicas. A Suellen minha namorada linda
que me fez sentir tantas saudades. Meus pais que me botaram no mundo e com isso foi
possível eu estar aqui.
Referências
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280
Porque abelhas selecionam substrato para coletar argila?
Raul Costa Pereira
Introdução
Indivíduos que maximizem o ganho energético líquido durante o forrageio devem ser
favorecidos por seleção natural (Smith 2006). Nesse sentido, foi proposta a teoria do forrageio
ótimo que postula que deve haver um balanço que minimize os gastos associados com a busca
e exploração de recursos e maximize o retorno energético fornecido por ele (Charnov 1976).
Para espécies que carregam o recurso antes de consumi-lo, os custos do transporte
também devem ser considerados. Pássaros que levam alimento para filhotes (Kacelnick
1984), abelhas que levam pólen para a colônia (Schmid-Hempel 1986) e vespas caçadoras que
armazenam presas no ninho (Araújo & Gonzaga 2007) são exemplos de organismos que tem
gastos energéticos associados ao transporte de recursos. Nesses casos, o peso e distância do
recurso até o ninho, a energia necessária para seu transporte, o número de deslocamentos
necessários e o tamanho corpóreo do indivíduo determinam o tamanho de carga que o
indivíduo é capaz de transportar (Charnov 1976, Krebs & Davies 1993). A quantidade ótima
de carga será aquela que maximize o ganho energético do indivíduo e minimize os custos
associados ao transporte (Charnov & Orians 1973).
Características do hábitat e a qualidade de recursos podem influenciar na carga ótima
(Robakiewicz & Daigle 2004). Por exemplo, em ambientes onde recursos de qualidade são
abundantes, os indivíduos tendem a diminuir a carga transportada e aumentar o número de
viagens (Krebs & Davies 1993). Além disso, independente das características do recurso e do
hábitat, o tamanho corpóreo individual também pode determinar a habilidade de explorar
recursos (Mittelbach 1981). Como indivíduos maiores em geral são mais fortes e experientes,
eles possuem maior capacidade de carregar e manipular recursos (Schoener 1971, Polis 1984).
281
Grande parte da teoria de tamanho ótimo de carga foi criada para modelar o transporte
de alimento por animais (Charnov 1976, Krebs & Davies 1993). Entretanto, organismos não
transportam somente recursos alimentares. Por exemplo, algumas espécies de abelhas da
Amazônia Central podem procurar e remover argila de regiões específicas em barrancos
associados a riachos de pequena ordem (localmente conhecidos como igarapés). Essa argila
provavelmente é utilizada para a construção de ninhos. Os indivíduos removem pequenos
pedaços de argila com a mandíbula e os agregam no último par de patas. O fato das abelhas
ignorarem outras fontes de argila encontradas a poucos metros indica que alguma
característica do substrato deve atuar na escolha da argila por abelhas. A quantidade de água
na argila em particular varia ao longo do barranco. A argila molhada é mais densa. Argila
mais seca por outro lado deve ser mais dificilmente agregada nas patas devido à menor
umidade. Logo, a quantidade de água no substrato talvez influencie na seleção e na eficiência
de remoção de argila pelas abelhas.
Nesse trabalho me propus a avaliar as seguintes hipóteses: i) indivíduos maiores
transportam maiores quantidades de argila; ii) indivíduos selecionam argila com condições
intermediárias de umidade; e iii) abelhas tem menor eficiência de exploração de argila em
substratos com muita água. Se a hipótese i for verdadeira, espero que a) a distância antero-
posterior das abelhas tenha relação positiva com a área de argila agregada nas patas. De
acordo com a hipótese ii, espero que b) a argila do barranco não manipulada tenha maior
abundância de indivíduos coletando argila que substratos de argila mais seca e mais úmida.
Com relação a hipótese iii, espero que c) abelhas terão menor taxa de acumulo de argila nas
patas em substratos molhados; e d) abelhas transportarão menos argila quando a umidade da
argila for maior.
282
Métodos
Área de estudo
Amostrei um trecho de 2 m de barranco de argila localizado em um igarapé na fazenda Esteio,
pertencente à Área de Relevante Interesse Ecológico do Projeto Dinâmica Biológica de
Fragmentos Florestais (PDBFF). Amostrei duas espécies de abelhas que removem argila
especificamente desse local. Ambas apresentam comportamento de coleta de argila bastante
similar, agregando grânulos de argila no último para de patas posteriores. As abelhas iniciam
a remoção de argila por volta das 6:00 h, permanecendo ativas até as 18:00 h.
Tamanho corpóreo x quantidade de carga
Para testar se o tamanho da agregação de argila transportada aumenta com o tamanho
corporal, usei uma câmera SONY HX1 para filmar indivíduos das duas espécies de abelha
removendo argila. Filmei as abelhas das 6:00 as 7:00 h e das 11:00 até 12:00 h por dois dias.
Durante as filmagens, coloquei escalas graduadas em 5 mm espalhadas ao longo das áreas de
coleta de argila, de forma a sempre manter uma escala próxima da abelha filmada. Retirei das
filmagens um “quadro” de cada indivíduo logo antes dele abandonar o barranco. Nessas
imagens, medi o comprimento linear antero-posterior da abelha e a largura e comprimento das
agregações de argila em uma das patas posteriores usando o programa ImageTool. Calculei a
área de argila removida usando a fórmula da área da elipse. Relacionei o comprimento das
abelhas e a raiz quadrada da área da agregação de argila em uma das patas anteriores. Utilizei
a raiz quadrada da área da agregação para remover o efeito de uma eventual relação
exponencial ter sido causada pela diferença no número de dimensões entre o comprimento
antero-posterior (linear) e a área de argila (bidimensional). Para testar essa relação fiz uma
283
regressão linear com os dados de comprimento antero-posterior e área removida
transformados em logaritmo.
Preferência de substrato
Para testar se abelhas preferem a argila não manipulada do barranco, impedi o acesso das
abelhas ao barranco com um plástico e ofertei argila com diferentes quantidades de água. Fiz
seis blocos de amostragem, com três tratamentos cada: controle (argila do barranco não
manipulada), argila seca (seca no forno por 10 min) e molhada (com consistência semelhante
ao observado após chuvas). Coloquei a argila de cada tratamento em duas placas de Petri
(diâmetro de 9 cm). Assim, cada bloco consistia em seis placas com três tratamentos. Alterei a
ordem das placas no experimento a cada bloco. Contei o número de abelhas coletando argila
em cada placa a cada 2 min por 10 min em cada bloco. Esperei meia hora em cada bloco antes
de iniciar a contagem para que as abelhas se acostumassem com a nova disposição dos
substratos. Calculei a média de indivíduos em cada tratamento por cada bloco e testei se o
logaritmo da abundância média diferiu entre os tratamentos de tipo de substrato com uma
ANOVA em bloco.
Qualidade do substrato x eficiência de exploração do recurso
Para testar se abelhas têm menor taxa de remoção de argila no substrato molhado, filmei as
abelhas removendo argila no barranco sem alterações (n=21) e após molhar o barranco com
aproximadamente 1 l de água (n=17). Nas filmagens, selecionei dois “quadros” de um mesmo
indivíduo coletando areia em diferentes momentos (separados por no mínimo 30 s).
Considerei o intervalo de tempo entre os quadros como o tempo de acumulação de argila. Em
cada quadro, medi o comprimento linear antero-posterior dos indivíduos e a área de argila na
mesma pata posterior no primeiro e no segundo quadro. Calculei a diferença de área das
284
agregações de argila nos dois quadros do mesmo indivíduo. Estimei a taxa de acúmulo de
argila ao dividir a quantidade acumulada de argila pelo tempo de acumulação. Transformei os
dados em logaritmo e testei se a taxa média de acumulação de argila diferiu entre o barranco
controle e molhado usando teste t.
Para avaliar se o tamanho final das agregações de argila varia entre o barranco sem
alterações e molhado, utilizei quadros das filmagens que registravam os indivíduos logo antes
deles abandonarem o barranco. Nessas imagens, medi o comprimento linear antero-posterior e
a área da agregação de argila em uma das patas posteriores para cada indivíduo (n=20 para
cada tratamento). Como indivíduos maiores devem transportar mais argila, o tamanho da
agregação de argila deve ser dependente do tamanho da abelha. Portanto, removi esse efeito
obtendo o resíduo da regressão entre o tamanho dos indivíduos e o tamanho final das
agregações de argila transformadas em logaritmo. Testei se os valores médios desse resíduo
diferiam entre o barranco controle e o barranco molhado usando teste t.
Resultados
Abelhas maiores levaram mais argila (F(1,38)=58,43; r=0,61; p<0.001), e essa relação foi
exponencial mesmo quando calculei a raiz quadrada da área de argila na pata da abelha
(Figura 1). Na presença dos três tratamentos associados à umidade do substrato, a abundância
média de abelhas foi 44% maior no tratamento de argila seca quando comparada a argila
controle, e 94% maior que na molhada (F(2,10)=27,8; p<0.001; Figura 2). Com relação à
remoção de argila, as abelhas removeram em média 0,008 mm2 (dp=0,07) de argila por
segundo e transportaram em média 6,5 mm2 (dp=4,56) de argila. A taxa de remoção (t=1,0;
df=36; p=0,31; Figura 3) e a quantidade de argila removida por indivíduo (t<0.01; df=38;
p=1; Figura 4) não foram menores na argila molhada quando comparada ao controle.
285
y = 0.5605e0.1183x
0
1
2
3
4
5
7 9 11 13 15 17
Áre
a de
arg
ilare
mov
ida0,
5
Tamanho do indivíduo (mm)
Figura 1. Relação entre o tamanho das abelhas e a raiz quadrada da área de argila removida
em um barranco próximo a um igarapé na Fazenda Esteio, Amazônia Central.
Figura 2. Número médio de abelhas coletando argila em cada tratamento de umidade da argila
na Fazenda Esteio, Amazônia Central. As barras verticais representam o desvio padrão.
286
Figura 3. Taxa de remoção de argila por abelhas de acordo com o nível relativo de umidade
da argila de um barranco de igarapé na Fazenda Esteio, Amazônia Central.
Figura 4. Resíduo da regressão entre os valores transformados em logaritmo de tamanho dos
indivíduos e área de argila removida em duas categorias de umidade do substrato de um
barranco próximo a um igarapé na Fazenda Esteio, Amazônia Central.
287
Discussão
A relação positiva entre o comprimento antero-posterior das abelhas e a área de argila
acumulada nas patas posteriores indica que a carga ótima transportada depende do tamanho
do indivíduo. Ao contrário do esperado, abelhas preferem substratos mais secos para coletar
argila. No entanto, essa preferência não pode ser explicada pelo aumento da eficiência de
exploração do recurso, já que a taxa de remoção e a área de argila removida na pata traseira
foram similares entre a argila controle e a umidecida.
A relação exponencial entre tamanho e quantidade de argila transportada indica que
indivíduos maiores carregam quantidades desproporcionalmente maiores de argila. Isso
contraria a relação linear entre a quantidade de carga transportada e massa corpórea
encontrada para abelhas que carregam pólen (Schimid-Hempel 1986). Logo, é possível que
indivíduos grandes contribuam mais para o transporte de argila, pois os pequenos deveriam
fazer um número desproporcionalmente maior de viagens para levar a mesma quantidade de
argila que uma abelha grande.
A preferência pelo substrato seco pode estar associada às facilidades de coletar os
grânulos mais leves da argila com pouca água. Como o tratamento de argila seca não usava a
argila totalmente desidratada, a água presente na argila ainda pode ser suficiente para manter a
agregação dela nas patas. Porém, visto que as abelhas preferem a argila com menor umidade,
a coleta de argila do barranco observada em condições naturais seria sub-ótima quando
comparada a utilização da argila seca ofertada nos experimentos. Isso pode indicar que há
falta de recursos ótimos disponíveis no raio de captura dos indivíduos. Por outro lado, o
mecanismo envolvido na seleção da quantidade de água no substrato em pequena escala
espacial e temporal pode estar associado à habilidades cognitivas individuais. Abelhas têm
um sistema de tomada de decisões no qual a acurácia da escolha depende do tempo de
avaliação do recurso (Chittka et al. 2003). Em geral, essa avaliação e a aprendizagem são
288
rápidas (Real 1991). Assim, é possível que as abelhas avaliem a qualidade da argila
disponível e selecionem aquela com menos água antes de iniciar a coleta dos grânulos.
A eficiência na exploração do recurso não explicou a preferência por substratos com
menos água. Entretanto, considerando que a argila molhada é mais densa, uma mesma
quantidade de argila seria mais pesada molhada do que seca. Nesse sentido, abelhas
carregariam a mesma quantidade de argila independente da quantidade de água no substrato,
mas gastariam mais energia transportando argila molhada devido ao maior peso.
A seleção de substratos com menos água pode influenciar na energia gasta para o
transporte da argila. No entanto, a semelhança na taxa de acumulo de argila indica que o custo
associado com a aquisição da argila não afeta essa preferência, da forma como é prevista pela
teoria do tamanho ótimo de carga (Krebs & Davies 1993). Por outro lado, o menor gasto
energético para obter uma mesma quantidade de recurso que é menos denso, pode ser o
mecanismo associado com a preferência pelo substrato com menos água.
Agradecimentos
Agradeço a todos que compartilharam esse intenso mês comigo. Sou grato a seu Cardoso, seu
Jorge e Dona Eduarda pelo trabalho silencioso na logística e na cozinha, que nos manteve
funcionando. Aos professores que sempre estiveram dispostos a ajudar. A Manú pelo bom
humor ácido que tanto me ajudou. A Paulo Estéfano pelas dicas. Ao Paulinho pela paciência e
pela montanha de conhecimento transmitido. A Laura pela paciência, risadas e boa vontade
sempre. Por fim, mas não menos importante, aos atores principais do EFA, meus colegas.
Satisfação imensa conhecê-los. Agradeço em especial ao Thiago pelo mau humor constante e
ao Greg pelo bom humor constante. E a Talita por sempre desligar meu computador nos
momentos mais oportunos.
289
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291
Se for pequeno ou grande eu pego, mas se balança muito eu fujo: comportamento de
forrageio em uma espécie de aranha em resposta ao custo de aquisição e ao nível de
ameaça da presa
Rodrigo Zucaratto
Introdução
A teoria do forrageamento ótimo prediz que aqueles organismos que conseguem maximizar
seu ganho energético com um mínimo de esforço despendido serão favorecidos pela seleção
natural (Krebs & Davies 1993). Dessa maneira, o comportamento de forrageio pode ser
determinado pelos custos e benefícios relacionados à obtenção de alimento. Este balanço é
influenciado por fatores como tamanho e conteúdo nutricional da presa, bem como pelo
tempo e energia gastos na sua obtenção (Ricklefs 2000). A energia é gasta durante a
subjugação e manipulação da presa, enquanto o tempo é gasto durante sua procura
(MacArthur & Pianka 1966).
Mesmo que a seleção natural possa favorecer os indivíduos que são capazes de
maximizar seus ganhos energéticos, em muitos casos a busca por recursos pode aumentar a
probabilidade de detecção desses indivíduos pelos seus predadores (Sih 1980). Nesse sentido,
a predação pode ser uma força seletiva que modela as estratégias de forrageio (Verdolin
2006). Quando a predação é alta, os forrageadores podem alterar seu comportamento de modo
a reduzir os riscos de predação e não necessariamente para maximizar o ganho energético
(Abrams 1992). Em função disso, foi proposta a teoria do forrageamento sensível ao risco,
que prediz que a atividade de forrageamento dos organismos é reduzida quando existe ameaça
de predação (Sih 1980).
Embora a teoria do forrageamento sensível ao risco presuma que muitos organismos
reduzam suas atividades de forrageio sob ameaça de predação, em muitos casos, a própria
292
presa pode ser uma ameaça para seu predador (Del-Claro 2004). Tal ameaça pode ser
representada, por exemplo, por compostos químicos tóxicos ou por atributos físicos da presa,
potencialmente danosos ao predador (e.g. Ruxton et al. 2004). Sendo assim, o predador
também pode ajustar seu comportamento de forrageio em função do nível de ameaça imposto
pela presa.
Geralmente um predador pode detectar o perigo representado pelas presas usando
estímulos mecânicos, visuais e/ou químicos (Gullan & Grascon 2005). Algumas aranhas, por
exemplo, constroem teias de interceptação que as permitem aumentar a sua área de percepção
e captura das presas. Para isso, elas mantêm contato constante com alguns fios da teia.
Quando um organismo é interceptado pela teia, os fios de seda transmitem estímulos
vibratórios que permitem à aranha detectar algumas das características da presa capturada,
como por exemplo, sua massa corpórea (Viera 2007).
Em estudo realizado por Pagotto et al. (2011) sobre os fatores que afetam o
comportamento de forrageio em uma espécie de aranha, foram usadas duas espécies de
formigas (Ectatomma brunneum e Dolicoderus sp.) como modelos de presa. Nesse estudo,
eles concluíram que a aranha evitou a formiga mais agressiva. No entanto, quando comparada
à Dolicoderus sp., E. brunneum é maior e apresenta comportamento mais agressivo. Dessa
forma, não foi possível separar o efeito da massa do efeito da agressividade sobre o
comportamento de forrageio da aranha. Presas muito grandes, apesar de representarem um
benefício, podem ter um custo muito alto associado à dificuldade de manipulação pela aranha.
Além disso, elas podem gerar um dano muito grande à teia. Por isso, de acordo com o
forrageio ótimo, o custo dessas presas seria alto em relação ao benefício, justificando a
evitação de Ectatomma sp, independente da sua agressividade. Sendo assim, nesse estudo tive
como objetivo avaliar como uma espécie de aranha ajusta seu comportamento de forrageio em
relação ao nível de ameaça e ao custo de captura da presa. Se a teoria do forrageio ótimo
293
explica o comportamento de forrageio da aranha, minha hipótese é essa aranha evitará presas
de tamanho corporal grande. Por outro lado, se o comportamento de forrageio for explicado
pela teoria do forrageio sensível ao risco, minha hipótese é que a aranha evitará presas mais
agressivas.
Métodos
Área de estudo
Conduzi este estudo na fazenda Esteio que pertence a Área de Relevante Interesse Ecológico
PDBFF. A fazenda está localizada a 80 km ao norte de Manaus, AM. A vegetação do local é
formada por uma floresta ombrófila densa de terra firme. O clima é do tipo tropical úmido de
acordo com a classificação de Köppen (Peel et al. 2007). A temperatura média anual é de 26,7
ºC e a pluviosidade anual é 2186 mm.
Organismo de estudo
Como modelo de predador, utilizei uma espécie de aranha não identificada que apresenta
cefalotórax e abdôme vermelhos e pernas pretas e vermelhas. Estas aranhas constroem suas
teias a aproximadamente 50 cm do solo. As teias são tridimensionais e apresentam uma
superfície arredondada com a parte convexa voltada para o dossel. Essa superfície é composta
por fios traçados em várias direções. A teia é presa ao solo ou nos troncos das árvores por
meio de fios solitários traçados a partir da região convexa.
294
Coleta de dados
Utilizei quatro espécies de formigas com diferentes tamanhos corporais e níveis de ameaça
para aranhas: Dolichoderus sp. (n = 10), Ectatomma sp. (n = 10), Odontomachus sp. (n = 10)
e Pseudomyrmex sp. (n = 10). Dolichoderus sp. e Pseudomyrmex sp. apresentam tamanho
corporal pequeno quando comparadas a Ectatomma sp. e Odontomachus sp. Pseudomyrmex
sp. é territorial e ocorre associada a diferentes espécies de plantas do gênero Tachigali,
atacando qualquer organismo que se aproxime da planta onde a colônia está estabelecida. Para
isso, ela usa mandíbulas e um ferrão que contém defesas químicas. Dolichoderus sp.
apresenta apenas defesa química, porém dificilmente a utiliza (Hölldobler & Wilson 1990). Já
Odontomachus sp. e Ectatomma sp. se defendem utilizando mandíbulas e um ferrão. Porém,
Odontomachus sp. possui mandíbula maior e utiliza tanto a mandíbula quanto o ferrão muito
mais freqüentemente que Ectatomma sp. (Holldobler & Wilson 1990).
Para avaliar o comportamento de forrageio da aranha, percorri algumas trilhas dentro
da área de estudo e escolhi 40 teias à medida que as encontrei. Para cada teia encontrada,
ofereci uma das espécies de formiga, sempre à mesma distância em relação às aranhas e
nunca colocando mais de uma espécie de formiga por teia. Após a colocação da formiga na
teia, cronometrei o tempo que a aranha levou para se aproximar da presa (tempo de resposta)
e posteriormente registrei se a aranha atacou ou evitou a presa (tipo de reação). Considerei
que a aranha atacou a presa quando ela a envolveu com seda ou tentou envolver mas não
obteve sucesso. Considerei que a presa foi evitada quando a aranha fugiu ou se afastou da
mesma depois da aproximação inicial. Observei cada teia por um período máximo de 10 min.
Para avaliar se houve diferença no tempo de resposta das aranhas em relação às quatro
espécies de formigas, utilizei uma análise de variância (ANOVA). Se a hipótese de que as
aranhas evitam presas de tamanho corporal grande for verdadeira, espero que o tempo de
resposta das aranhas quando ofereci Dolichoderus sp. e Pseudomyrmex sp. seja menor do que
295
o tempo de resposta à Ectatomma sp. e Odontomachus sp. Se a hipótese de que as aranhas
evitam presas mais agressivas for verdadeira, espero que o tempo de resposta das aranhas
frente a Odontomachus sp. e Pseudomyrmex sp. seja maior do que o tempo de resposta à
Dolichoderus sp. e Ectatomma sp.
Resultados
A aranha atacou e envolveu em seda todos os indivíduos de Dolichoderus sp., Pseudomyrmex
sp. e Odontomachus sp., que foram colocadas na teia. Porém, para Ectatomma sp., somente
quatro foram envolvidas em seda. Ao colocar os indivíduos de Ectatomma sp. na teia, eles
causavam vibrações na teia visivelmente maiores que os indivíduos das outras espécies. Em
geral a aranha fugia quando essas vibrações ocorriam. Quando a aranha não fugia, ela parava
e ficava na mesma posição se balançando rapidamente, fugindo em seguida. Quando coloquei
Dolichoderus sp., Pseudomyrmex sp. e Odontomachus sp. na teia, as aranhas se aproximaram
das formigas e começaram a envolvê-las com seda. Para envolver as formigas, as aranhas
mantinham-se a certa distância das mesmas. Para isso, elas liberavam seda pelas fiandeiras e
utilizavam as duas patas traseiras para envolver as presas. Apesar de não haver quantificação,
em alguns momentos, as aranhas paravam de envolver as formigas em seda e encostavam o
prossoma nas mesmas, voltando a envolvê-las em seguida. Porém, isso só foi observado para
Dolichoderus sp. e Pseudomyrmex sp.
O tempo médio de resposta das aranhas quando a presa foi Dolichoderus sp. foi de 5 s
(DP=5,78), para Pseudomyrmex sp. foi de 89 s (DP=150,15), para Odontomachus sp. foi 23,5
s (DP=16,17) e para Ectatomma sp. foi de 407,5 s (DP=264,40). O tempo de resposta das
aranhas foi maior para Ectatomma sp. do que para Dolichoderus sp., Odontomachus sp. e
Pseudomyrmex sp. (F(3,36)=12,52; p<0,001; Figura 1).
296
Dolichoderus sp. Ectatomma sp. Odontomachus sp. Pseudomyrmex sp.
Espécie de formiga
0
1
2
3
4
5
6
7
Log
do
tem
po d
e re
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s)
Figura 1. Tempo de resposta da aranha em relação às quatro espécies de formigas com
diferentes tamanhos corporais e níveis de agressividade, oferecidas em suas teias. Os círculos
representam as médias e as barras o intervalo de 95% de confiança.
Discussão
O fato da aranha ter atacado uma das presas de tamanho corporal grande indica que ela não
avalia os custos adicionais associado à captura dessas presas. Da mesma forma, o nível de
ameaça da presa aparentemente não afeta o comportamento de forrageio da aranha. Sendo
assim, as teorias de forrageamento ótimo e forrageamento sensível ao risco não explicam o
comportamento de forrageio nessa espécie de aranha.
As aranhas que fazem teia são predadoras que não buscam ativamente pelas suas
presas (estratégia do tipo senta-e-espera - Krebs & Davies 1993). Esse tempo de espera pode
fazer com que os animais passem por longos períodos de inanição, e portanto, se arrisquem
mais na captura de presas (Sih 1980). Isso pode explicar o fato da aranha ter selecionado
297
presas de tamanho corporal grande. Quanto ao nível de ameaça, formigas mais agressivas
podem usar o seu ferrão ou a mandíbula para causar injúrias às aranhas. Porém, por manterem
certa distância das formigas enquanto as imobilizavam, isso reduzia a chance de serem
atingidas pelo ferrão ou pela mandíbula. Posteriormente, uma vez imóveis pela seda, essas
presas poderiam deixar de oferecer riscos às aranhas.
Se as aranhas não avaliam os custos associados à captura de presas, resta saber por que
elas evitaram Ectatomma sp. Uma possibilidade pode estar associada ao fato de que essas
formigas causaram vibrações maiores na teia do que as outras espécies. Como a vibração da
teia permite à aranha antecipar algumas das características da presa (Vieira 2007) é possível
que a intensidade do balanço causado por Ectatomma sp. seja muito forte e a aranha interprete
essa vibração como sendo algo que possa destruir sua teia. Isso levaria ao comportamento de
fuga da aranha.
Se a aranha realmente desiste de Ectatomma sp. ao confundí-la com algo que possa
destruir sua teia, é possível que talvez o comportamento de captura de presas seja determinado
por um limiar de custo. Ao invés de realizar uma avaliação linear dos custos e benefícios das
presas, a aranha pode desistir do ataque sempre que a presa ultrapassar um limite máximo de
custo, independentemente do benefício.
Agradecimentos
Poder participar do EFA foi algo que sempre desejei, pois acreditava que seria algo grandioso.
Hoje não acredito mais, TENHO CERTEZA! Agradeço imensamente ao PDBFF pela
oportunidade. Obrigado a toda a equipe que esteve por trás das cortinas fazendo a coisa
funcionar. Sou grato aos professores Paulo Estéfano (Paulinho Mau), Paulo Enrique (Paquita
Rainbow Master) e Zé Luiz, por permitirem que eu fizesse parte desse Big Brother da Floresta
e aprendesse muuuuuuuuuito! Ao Rainbow (hétero enrustido) gostaria de agradecer pelas
298
conversas de bêbado, por acreditar no meu potencial, por me incentivar a seguir em frente,
por ter me ajudado com as coletas de campo do PI e por todo o carinho e dedicação a esse
bando de malucos (valeu paquita!!!!). Um obrigadão a todos os professores que por aqui
passaram compartilhando conosco suas experiências de vida. Agradeço às bonitoras Manô
“coração gelado” (que de gelado não tem nada) e Laura Luanny Luizão (Pezão). Manô, valeu
por suprir minha abstinência de chocolate, e, Pezão, valeu por me fazer perder noites de sono
corrigindo relatórios madrugada à fora, podendo contemplar o céu maravilhoso de
Anavilhanas, I love you!!! Aos meus 19 (quase finteee) novos amigos, por compartilharmos
experiências incríveis no meio da Amazoinhaaaa Central, por rirmos com a “ósguia” à noite,
por mergulharmos juntos no Rio Negro, pelas festinhas, pelas cachaças, pelos projetinhos e
momentos de desesperos em meio a tantos relatórios, e por me agüentarem 30 dias falando
besteira o tempo todo. Valeu Camilinha, Dani, Jonny, Raulzito, Maurão, Drag, Daniel,
Lauracea (gata você é zen!), Monange, Skol, Lucas Cocerinha, Inácio (tá ouvindo??), Fran,
Miojo, Japoneusa, Lambisomen, Talitinha e minhas duas gatas Fernandinha e Fofuxa, vocês
são uma cambada de gonorantes!!!!! Fernandinha Paquita Rochele do Sertão você é
10000000000...e quantos mais zeros existirem , obrigado por compartilhar esses “momentos
lindamente” e “tomar uns bons drinqui” comigo. Fofuxa você ensinou a todos nós que a
paciência é uma virtude!!! Muito obrigado por sentar comigo na hora que a coisa não andava
e me manter calmo. Não poderia deixar de agradecer à minha orientadora Alexandra Pires,
por todo apoio e carinho e por acreditar em mim sempre (valeu Lelê). Ao programa de Pós-
Graduação em Ciências Ambientais e Florestais da UFRRJ por custear minhas despesas com
as passagens aéreas. Aos amigos do Mestrado Ju, Patrícia, Renata, Israel e Arthur. À Dona
Eduarda e Seu Jorge (porrahhh) pelo frango nosso de cada dia. Ao seu Cardoso por ter me
abandonado embaixo de uma Tachi e por nos ajudar em campo! Enfim, a todos os que direta
ou indiretamente tornaram a minha vida melhor... Obrigaduuuuuuuuuuuuu!!!
299
Referências
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of interacting foraging adaptations. American Naturalist, 140:573–600.
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Pagotto, C.P., D. Cury, D. Dainezi, F. Oliveira & G. R. Menezes. 2011. Se a comida morde,
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Interciência.
301
Associação de formigas e da planta Palicourea corymbifera Müller Arg (Rubiaceae):
qual o efeito das formigas nas inflorescências?
Talita Câmara
Introdução
Plantas polinizadas por vetores bióticos apresentam uma grande variedade de recursos, como
óleos, pólens e néctar para a atração dos animais (Bronstein et al. 2006). O néctar é
comumente produzido nas flores e é composto principalmente por água e carboidratos. Ainda
que o néctar ofertado pelas plantas atraia os polinizadores efetivos, ele pode atrair também
outros visitantes florais: os pilhadores. Os pilhadores (“ladrões de néctar”) consomem o
néctar produzido nas flores, mas não contribuem para a reprodução das plantas (Irwin &
Brody 1999). Plantas visitadas pelos “ladrões de néctar” muitas vezes têm suas flores
danificadas. Geralmente, os pilhadores acessam o néctar perfurando a corola da flor ou
reaproveitando perfurações feitas por outros pilhadores e/ou herbívoros de flores (Bronstein et
al. 2006). Como estratégia de defesa, algumas plantas desenvolveram, ao longo da evolução,
estruturas denominas de nectários extraflorais (NEFs) (Rosumeck et al. 2009).
Os NEFs são glândulas secretoras de néctar que não estão envolvidos diretamente com
a polinização (Elias 1983). Essas glândulas estão localizadas nos órgãos vegetativos e/ou ao
redor das flores e frutos. Uma das hipóteses para o desenvolvimento dos NEFs é para atração
dos pilhadores de néctar de flores. Dessa forma, o impacto da ação desses organismos nas
flores e no recurso disponível para atração dos polinizadores seria minimizado (Elias 1983).
Além de atrair os pilhadores, os NEFs atraem também insetos que indiretamente podem
conferir defesa as plantas contra seus inimigos naturais (Koptur 1992).
Associações entre plantas com NEFs e formigas são bastante comuns. Formigas são
atraídas pelo néctar e ao defendê-lo de outros visitantes, protegem as plantas contra os
302
herbívoros (Heil & McKey 2003). Esse comportamento beneficia a planta, aumentando sua
aptidão (Oliveira et al. 1987, Leal et al. 2006, Rodrigues et al. 2004). Além de expulsar
herbívoros foliares da planta, a hipótese “Proteção de Pilhadores de Néctar” (Nectar-Thieve
Protection Hypothesis) postula que as formigas presentes nos NEFs (localizados ao redor das
flores) podem aumentar o sucesso da polinização, expulsando pilhadores de néctar das flores
(Der Pijl 1954). Diante desse contexto, meu objetivo é entender o papel das formigas em
inflorescências que apresentam NEFs. Minha hipótese é que as formigas protegem as
inflorescências de herbívoros de flores e os pilhadores. Espero que (1) inflorescências sem
formigas apresentem uma maior porcentagem de danos do que inflorescências com formigas,
(2) inflorescências sem formigas ocorra uma perda maior de botões florais e (3)
inflorescências sem formigas terão maior número de visitantes florais do que inflorescências
com formigas.
Métodos
Área de estudo
Realizei o estudo na Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) do Projeto de Dinâmica
Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF), localizada a 80 km ao norte de Manaus -
Amazonas, Brasil (02º24’ S – 59º44’ O). A reserva encontra-se em uma floresta contínua de
terra firme, onde a vegetação da região é caracterizada como Floresta Ombrófila Densa.
Espécie estudada
Como modelo de estudo, utilizei a espécie Palicourea corymbifera MÜLL. ARG.
(Rubiaceae). Dentre as espécies locais que estavam no período de floração e que possuíam
NEFs, P. corymbifera era a mais abundante e fácil de reconhecer em campo.
303
Palicourea corymbifera é uma árvore de pequeno porte com inflorescências em forma
de corimbo com flores amarelas e tubulares. Essa espécie pode ser encontrada no interior e
com muita freqüência em borda de florestas (Brito 2000). Selecionei apenas aqueles
indivíduos que se encontravam na borda da floresta ao longo da estrada, onde são comumente
encontrados (Brito 2000).
Coleta de dados
Para avaliar se a presença de formigas diminui os danos causados por pilhadores nas
inflorescências de Palicourea corymbifera, selecionei 10 indivíduos. Os indivíduos tinham
aproximadamente 2,5 m de altura e estavam na beira da estrada, distante pelo menos 10 m um
do outro. Em cada planta, escolhi duas inflorescências de ramos caulinares vizinhos.
Inicialmente (tempo inicial = T0), quantifiquei a porcentagem de botões florais e flores
danificados em cada inflorescência. Removi as formigas de umas das inflorescências. Depois
de remover as formigas, isolei as inflorescências passando graxa na base da inflorescência
para evitar o acesso das formigas nos botões florais e flores. Após 48 h do isolamento das
inflorescências (tempo final = T1), quantifiquei novamente a porcentagem de botões florais e
flores danificadas de cada inflorescências (isoladas e não isoladas).
Para avaliar se as formigas diminuem a perda de botões florais por predadores,
quantifiquei o número de botões florais no T0 e no T1 em inflorescências com formigas e sem
formigas nos 10 indivíduos selecionados de P. corymbifera. Calculei a diferença do número
de botões entre o T0 e T1 em cada inflorescência com e sem formiga. Os botões que se
transformaram em flores do T0 para o T1 foram excluídos da análise.
Para investigar se a presença de formigas altera o número de visitantes florais nas
inflorescências de P. corymbifera , realizei observações diretas nas inflorescências onde
excluí as formigas e nas inflorescências sem exclusão das formigas. Observei no mesmo dia
304
todos os indivíduos selecionados (n=10). Para cada indivíduo, observei simultaneamente as
inflorescências com e sem formiga durante 20 min entre o horário das 6:00 h até 9:20 h da
manhã, visto que os visitantes florais da espécie focal são mais ativos nesse horário (Silva
2000).
Análise de dados
Para investigar se inflorescências isoladas das formigas apresentam uma maior porcentagem
de botões florais e flores danificadas no T1, utilizei o teste de Análise de Variância (ANOVA)
de Medidas Repetidas. As variáveis dependentes foram a porcentagem de botões florais e
flores danificadas e o tempo de isolamento, enquanto a variável independente foi a presença e
ausência de formigas nas inflorescências. Usei o teste-t pareado para avaliar se inflorescências
sem formigas apresentam uma maior diferença de botões florais perdidos no T1. A variável
dependente foi a diferença de botões florais perdidos e a variável independente a presença e
ausência de formigas nas inflorescências. Para avaliar se inflorescências sem formigas são
mais visitadas por pilhadores e herbívoros de flores, utilizei também o teste-t pareado. A
variável dependente foi número de visitantes florais e variável independente foi a presença e
ausência de formigas nas inflorescências.
Resultados
As inflorescências de Palicourea corymbifera foram visitadas por formigas pertencentes a
quatro gêneros: Azteca, Crematogaster, Dolichoderus e Ectatomma. No entanto, as formigas
encontradas em P. corymbifera não protegeram as inflorescências. No T1, inflorescências com
formigas apresentaram porcentagem de botões florais e flores danificadas (14% ± 24%; média
± DP) similares aquelas encontradas em inflorescências sem formigas (9% ± 12%; média ±
305
DP; F(1,18)=1,51; p=0,23; Figura1). Adicionalmente, a presença de formigas não diminuiu o
número de botões florais perdidos no T1 (t=0,76, gl=9, p=0,47, Figura 2).
Com formiga Sem formiga-10
-5
0
5
10
15
20
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T1
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T0
Figura 1. Porcentagem de botões florais e flores danificadas por inflorescências de Palicourea
corymbifera (n=10) submetidas a experimento de remoção de formigas, em estudo
desenvolvido na ARIE do PDBFF, Amazônia Central, Brasil. Os quadrados representam a
porcentagem média de botões florais e flores danificadas e as barras representam o intervalo
de confiança (95%). Os quadrados não preenchidos representam a porcentagem de botões
florais e flores danificadas por inflorescência no T0 e os quadrados preenchidos no T1 para os
mesmos indivíduos de P. corymbifera.
306
Figura 2. Número de botões florais perdidos após 48 h em inflorescências com e sem
formigas de Palicourea corymbifera (n=10), em estudo desenvolvido na ARIE do PDBFF,
Amazônia Central, Brasil. As linhas conectam os valores dos pares de inflorescências com e
sem formigas em cada indivíduo de P. corymbifera.
Ao investigar a influência das formigas nos visitantes florais de P. corymbifera,
observei no total 30 visitas. Os visitantes observados nas inflorescências estavam distribuídos
dentro das ordens Diptera, Hemyptera, Homoptera, e Hymenoptera. Apenas uma única visita
foi feita por uma ave. Contudo, as formigas não interferiram no número de visitantes florais
em P. corymbifera (t=1,92; gl=9; p=0,08; Figura 3). A média de visitantes em inflorescências
com formigas (1,8 ± 1,4; média ± DP) foi similar às inflorescências sem formiga (1±0,9;
média ± DP).
307
Figura 3. Número de visitantes florais nas inflorescências com e sem formigas de Palicourea
corymbifera (n=10), em estudo desenvolvido na ARIE do PDBFF, Amazônia Central, Brasil.
A linha conecta os valores dos pares de inflorescências com e sem formigas em cada
indivíduo de P. corymbifera.
Discussão
O fato de Palicourea corymbifera apresentar nectários extraflorais (NEFs) nas inflorescências
e atrair as formigas, não implica em maior proteção contra herbívoros florais e pilhadores. É
provável que as formigas apenas utilizam o recurso oferecido pela planta, sem defendê-las dos
visitantes florais antagônicos. Tal fato pode estar associado com a riqueza de espécies de
formigas que visitam P. corymbifera.
Grupos de formigas apresentam eficiência distinta no recrutamento e na agressividade
quando expostas aos seus inimigos naturais (Ness et al. 2006). As espécies de formigas que
patrulharam as inflorescências de P. corymbifera eram todas de hábito alimentar onívoro, mas
com diferentes estratégias de forrageio. Formigas do gênero Ectatomma são caracterizadas
308
por forragear solitariamente, enquanto os gêneros Azteca, Crematogaster e Dolichoderous.
forrageiam por recrutamento (Hölldobler & Wilson 1990). Essas espécies raramente ocorrem
no mesmo indivíduo e podem variar no número de indivíduos presentes nas inflorescências de
acordo com o dia (observações pessoais). Sendo assim, provavelmente, tanto a substituição de
espécies de formigas entre os indivíduos de P. corymbifera como a diferença de
comportamento e agressividade das formigas, pode resultar na variação de respostas aos
danos encontrados nas inflorescências.
Como a interação de plantas com NEFs e formigas é um evento que envolve muitos
indivíduos da mesma colônia de formigas, interagindo com a mesma planta, o benefício
adquirido pela planta depende da quantidade de formigas (Ness et al. 2006). A maioria das
espécies de formigas encontradas em P. corymbifera forrageia por recrutamento. A eficiência
dessa estratégia depende do número de indivíduos envolvidos (Ness et al. 2009). Nesse
sentido, uma das possíveis razões por não ter encontrado diferença no número de visitantes
florais em inflorescências com e sem formigas, pode estar associado a quantidade de formigas
patrulhando as inflorescências. Se formigas operárias ocorrem em baixa densidade nas
inflorescências, estas podem não se tornar ameaças aos herbívoros florais e/ou pilhadores.
Esses animais geralmente são maiores e apresentam uma fuga rápida em relação ao ataque das
formigas “guardiãs” quando em poucos indivíduos.
Apesar de vários trabalhos terem documentado os benefícios das formigas para as
plantas com NEFs em relação à produção de flores, frutos e sementes (Oliveira et al. 1987,
Rodrigues et al. 2004, Leal et al. 2006), estas podem não atuar como boas protetoras contra
herbívoros florais e pilhadores. Portanto, a defesa biótica conferida às plantas com NEFs pode
depender das espécies de formigas e também dos atributos reprodutivos da planta que elas
defendem.
309
Agradecimentos
Agradeço aos organizadores do EFA, pela oportunidade de participar no curso e contribuir
para minha formação como futura pesquisadora. Aos coordenadores, Paulinho (Rainbow
Master) e Paulinho Mau, por todos os incentivos e conversas. Às bonitoras Laura (Luizão) e
Manô (Ursinho) pelos auxílios na correção dos relatórios e pela companhia durante os
trabalhos em campo. Sem vocês não seria a mesma coisa! Novamente, agradeço ao Paulinho
Mau, pela sua paciência em me ensinar. A Ana e a Manô pela revisão do meu relatório. Ao
seu Cardoso pela companhia durante o campo e pelas histórias aventureiras. Ao seu Jorge e
dona Eduarda pela preocupação constante com meu bem estar e pelas comidas deliciosas.
Agradeço em especial também, a Fofuxa Pantaneira (Karlinha), Marilaqui (Fernandinha) e
Ninfobaby (Raulzito) pelas contribuições para a realização do meu trabalho. E por fim, mas
não finalmente, agradeço aos meus colegas efanos, pelos bons momentos, conversas e risos
durante os 30 dias. Essa etapa com certeza será inesquecível em minha vida!
Referências
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312
O que determina a escolha de locais de caça por aranhas pescadoras (Trechaleidae)?
Thiago Belisário d’Araújo Couto
Introdução
Indivíduos podem selecionar habitats específicos que aumentem sua eficiência de forrageio e,
conseqüentemente, sua aptidão (Morris 2003). Para predadores do tipo senta-e-espera, a
escolha do substrato pode ser um aspecto fundamental para determinar a eficiência de captura
de presas (Morse 2006). Como o sucesso da estratégia senta-e-espera depende da
aproximação da presa, organismos que utilizam esse tipo de estratégia necessitam de
mecanismos muito eficientes para escolher sítios de caça.
Além do tipo de substrato, a colonização de locais de caça também pode depender do
estabelecimento prévio de outros indivíduos. Portanto, a possibilidade de selecionar locais
mais eficientes de caça tende a se tornar menor com o aumento da densidade populacional
(Rosenzweig 1981). Ainda, a competição por melhores locais pode depender do tamanho dos
competidores. Competidores maiores e mais experientes tendem a ser mais eficientes na
escolha dos melhores locais, uma conseqüência do incremento da habilidade de procura e
manipulação de presas com a experiência adquirida (Mittelbach 1981). Além da capacidade
de escolha, indivíduos maiores tendem a ser mais competentes na defesa do território (Arnott
& Elwood 2009) e, conseqüentemente, possuem maior tendência de permanecer em locais
com mais recursos.
Aranhas da espécie Trechalea sp. (Trechaleidae) são predadoras que caçam usando
estratégia do tipo senta-e-espera e forrageiam preferencialmente em substratos próximos a
pequenos riachos como rochas, troncos e vegetação arbustiva (Silva et al. 2005). Indivíduos
dessa espécie utilizam as pernas posteriores para se ancorarem em substratos próximos aos
riachos e estendem as pernas anteriores sobre a superfície da água para caçar invertebrados,
313
anfíbios e peixes (Silva et al. 2005, Costa-Pereira et al. 2010). Nesse sistema, é possível que
em superfícies pouco inclinadas em relação à lâmina d’água dificultem a visualização da
presa por refração e, assim, tenham influencia no sucesso de captura. Além disso, a inclinação
da superfície pode ser determinante para a estabilidade do local de caça, pois variações no
nível da água podem deixar os pontos de caça parcial ou totalmente submersos. Elevações
equivalentes do nível da água tendem a submergir maiores áreas foliares de ambientes menos
inclinados, considerando folhas da mesma forma. Além das possíveis vantagens do ângulo da
superfície utilizada para a caça, maiores velocidades de corrente podem aumentar o fluxo de
presas, aumentando a taxa de captura de determinados locais de caça.
Uma vez que indivíduos de Trechalea sp. são abundantes nas margens de riachos na
Amazônia, é possível que eles selecionem locais de caça e compitam por eles. Portanto, meu
objetivo nesse estudo é i) entender qual característica do hábitat que indivíduos de Trechalea
sp. utilizam para selecionar áreas de caça e ii) avaliar se há competição intraespecifica de
Trechalea sp. na escolha de áreas de caça. Tenho como hipóteses que i) as aranhas escolhem
locais com melhor posicionamento para a caça e que ii) indivíduos competem para se
estabelecer nos melhores locais de caça.
Métodos
Área de estudo
Realizei as coletas em um riacho de terra-firme de segunda ordem (localmente conhecido
como igarapé) localizado no km 41, Fazenda Esteio, pertencente à Área de Relevante
Interesse Ecológico do Projeto de Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (ARIE
PDBFF). A ARIE está localizada a 80 km ao norte de Manaus (2°24’S; 59°44’O) e abrange
uma área de aproximadamente 10.000 ha de floresta ombrófila densa (Bruna et al. 2004).
314
Coleta de dados
Coletei 20 indivíduos de Trechalea sp. (Araneae: Trechaleidae), entre 23:00 e 01:00 h, em
folhas nas margens do igarapé. Considerei como possíveis locais de caça, apenas as folhas
próximas à superfície da água. Mensurei a velocidade local de corrente (VLC) e o ângulo da
superfície foliar (ASF) em relação à superfície da água para cada local de caça utilizado pelas
aranhas. Calculei a VLC como o tempo médio percorrido por um objeto flutuante pela
distância de 23 cm por três vezes. Para medir o ASF, considerei a superfície da água como
ângulo zero e utilizei um transferidor. Como a aranha pode se posicionar tanto na face abaxial
quanto adaxial da folha, eu considerei a folha perpendicular a superfície da lâmina d’água
como ângulo máximo (i.e. 90°). Isso porque folhas com mais de 90°, pela possibilidade de
transitar entre as superfícies adaxial e abaxial, possuem a mesma funcionalidade como
superfície para caça para a aranha que folhas com o ângulo inferior correspondente (e.g. 60° e
120º).
Para comparar o ASF entre locais com e sem aranhas, também medi a angulação em
relação à superfície da folha sem aranha que se encontrava mais próxima da folha ocupada
pela aranha. Entre 22:30 e 00:00 h da noite posterior a noite de coleta, coletei as novas
aranhas colonizadoras nas mesmas folhas ocupadas pelas aranhas residentes removidas na
noite anterior. Em laboratório, pesei as aranhas residentes e as colonizadoras de cada folha
com a balança AWS® miniPRO.
Análise de dados
Para testar se aranhas selecionam habitats com ângulos mais próximos a 90°, utilizei uma
regressão logística. Porém, para manter o pareamento dos dados na análise, fiz uma
transformação com base na diferença de ângulos entre os pares de folhas da mesma planta.
315
Dos 20 pares, sorteei 10 que receberam código 1 e 10 que receberam código 0. Considerei a
folha com aranha como folha focal para os pares 1 e a folha sem aranha como focal para os
pares 0. Para cada par, subtrai o valor do ângulo da folha focal do valor da folha não focal. Se
as aranhas selecionam folhas mais perpendiculares em relação à lâmina d’água, eu espero que
pares de folhas com denominação 1 apresentem diferenças positivas entre ângulos e pares de
folha 0 tenham diferenças negativas.
Utilizei regressão linear simples para testar a relação do peso da aranha com a VLC e
entre o peso da aranha com o ASF. Para testar a probabilidade da aranha colonizadora ser
menos pesada que a aranha residente, utilizei uma análise semelhante a utilizada para testar se
aranhas selecionam habitats com ângulos mais próximos a 90°. Da mesma maneira, sorteei
quais seriam os pares com denominação 1 e pares 0. Calculei a diferença de massa dos
residentes e colonizadores para pares 1 e a diferença de massa dos colonizadores e residentes
para os pares 0. Utilizei uma regressão logística para testar a probabilidade do indivíduo focal
ser residente em relação a diferença de peso para o individuo não focal. Se a competição
intraespecífica é importante na seleção de locais de caça, eu espero que I) aranhas mais
pesadas selecionem locais de caça com maior velocidade de correnteza, II) aranhas mais
pesadas ocupem superfícies mais perpendiculares à lâmina d’água e III) aranhas
colonizadoras tenham menor massa que as residentes removidas.
Resultados
O ângulo das superfícies utilizadas pelas aranhas foi de 63,2±23,2° (média±desvio padrão) e
das superfícies não utilizadas de 54,2 ±23,5°. A velocidade média de corrente foi de
0,13±0,07 cm/s. A massa das aranhas residentes foi de 0,09±0,05 g e das aranhas
colonizadoras de 0,09±0,06 g. Houve maior ocupação dentro do par por superfícies mais
verticais em relação à superfície da água que superfícies mais inclinadas (χ²=4,79; gl=1;
316
p=0,03; Figura 1). Não houve relação do peso das aranhas com o VLC (r²=0,01; F(1, 18)=0,27;
p=0,61; Figura 2A) ou com o ASF (r²=0,02; F(1, 18)=0,31; p=0,58; Figura 2B). Aranhas
colonizadoras não foram menos pesadas que as residentes (χ ²=0,08; gl=1; p=0,78; Figura 3).
Durante a procura das aranhas, observei a presença da estrutura refletora, denominada
tapetum lucidum, nos olhos dos indivíduos de Trechalea sp.
Figura 1. Probabilidade da folha focal conter uma aranha da espécie Trechalea sp.
(Trechaleidae) em relação à diferença angular entre cada par de folha focal e folha não focal
nas margens de um igarapé de terra-firme da Amazônia Central.
317
Figura 2. Relação da massa de indivíduos de Trechalea sp. (Araneae: Trechaleidae) com A)
velocidade local de corrente (VLC) e com B) o ângulo da superfície foliar (ASF) do local de
caça nas margens de um igarapé de terra-firme da Amazônia Central.
Figura 3. Probabilidade do indivíduo focal de Trechalea sp. (Araneae: Trechaleidae) ser
residente da folha em relação à diferença de massa (g) entre os indivíduos focal e não focal
nas margens de um igarapé de terra-firme da Amazônia Central.
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Discussão
A utilização de superfícies, incluindo as verticais, para caça por aranhas da família
Trechaleidae já foi descrita (Silva et al. 2005). Porém, este é o primeiro trabalho que relata a
preferência das aranhas dessa família por superfícies verticais para caça. Sugiro duas
possíveis explicações não excludentes para essa preferência. Primeiro, substratos mais
verticais podem ser mais eficientes para capturar presas que se movimentam abaixo da
superfície da água em decorrência da refração da luz. Isso porque quanto mais perpendicular o
observador estiver em relação à superfície da água, menor o desvio da imagem do objeto
submerso (F. Rezende, comunicação pessoal). Essa explicação pode ser válida mesmo
considerando que Trechalea sp. cace no período noturno, pois a presença de tapetum lucidum
nessas aranhas é uma evidência de que a visão é um sentido importante para a captura de
presas. Essa estrutura otimiza a visão durante a noite e é característica de organismos que
vivem em ambientes com escassez de luz. A segunda explicação seria que pequenas variações
naturais do nível dos igarapés podem favorecer o ancoramento das pernas posteriores em
superfícies perpendiculares em relação à água. Para uma mesma variação no nível da água, há
uma tendência de maior submersão de superfícies mais inclinadas. Logo, locais de caça mais
perpendiculares seriam preferencialmente selecionados por serem mais estáveis.
Os resultados das relações da massa das aranhas com o ASF e com o VLC e da massa
dos indivíduos residentes e colonizadores indicam que não existe competição intraespecífica
pelas áreas de caça. Considerando que as aranhas selecionam superfícies mais verticais, a
ausência de relação da massa das aranhas com o ASF é um forte indício de que a competição
não é um fator que exerça grande influência na escolha das áreas de caça. Assim, é provável
que locais de caça com superfícies verticais não sejam um recurso limitante. Quanto ao VLC,
é possível que a disponibilidade de presas não varie em relação às diferentes velocidades de
corrente observadas. Como aranhas caçadoras possuem, em geral, dieta generalista (Nyffeler
319
1999), é possível que elas encontrem presas independentemente da velocidade de corrente.
Apesar de algumas variações no uso do ambiente, presas potenciais das aranhas podem ser
encontradas tanto em remansos, quanto em trechos com correnteza (Bűhrnheim & Cox-
Fernandes 2003, Nessimian et al. 2008).
Apesar da seleção por habitats mais favoráveis ter grande importância para aumentar a
aptidão dos organismos, a competição entre aranhas da espécie Trechalea sp. pelos melhores
locais de caça pode não ocorrer em ambientes onde o recurso não é limitante. Assim, mesmo
competidores ruins, como indivíduos menores e mais jovens, podem utilizar habitats mais
favoráveis para forragear quando sua disponibilidade é alta.
Agradecimentos
Agradeço ao PDBFF pela estrutura do curso EFA 2011, ao Paulo Enrique (Ofuscado) pela
sugestão de projeto, auxílio no delineamento amostral e revisão do manuscrito, ao Raul
Pereira (Zé Bonitinho) pelo auxílio nas coletas e pelas válidas sugestões para o trabalho, à
Ana Meiga (Japa) pelo auxílio nos procedimentos de laboratório, ao Paulo Estefano
(Marilaki) pelas sugestões, ao Fernando Rezende (Ortigossa) pelas aulas de física de 2° grau,
à Camila Pagotto (Misstrago) pela ajuda no antigo projeto frustrado e à Laura Leal (3/4) pela
revisão do manuscrito e auxílio no projeto anterior, frustrado.
Referências
Arnott, G. & Elwood, R.W. 2009. Assessment of fighting ability in animal contests. Animal
Behaviour, 77:991-1004.
Bruna, E.M., D.M. Lapola & H.L. Vasconcelos. 2004. Interspecific variation in the defensive
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Costa-Pereira, R., F.I. Martins, E.A. Sczesny-Moraes & A. Brascovit. 2010. Predation on
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Nessimian, J.L., E.M. Venticinque, J. Zuanon, P. De Marco Jr, M. Gordo, L. Fidelis, J. D’arc
Batista & L. Juen. 2008. Land use, habitat integrity, and aquatic insect assemblages in
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